direito propriedade - luiz edson fachin

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11/2/2014 Envio | Revista dos Tribunais http://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/latestupdates/delivery/document 1/24 DA PROPRIEDADE COMO CONCEITO JURÍDICO DA PROPRIEDADE COMO CONCEITO JURÍDICO Revista dos Tribunais | vol. 621 | p. 16 | Jul / 1987 DTR\1987\163 Luiz Edson Fachin Professor de Direito Civil na Pontifícia Universidade Católica do Paraná e na Faculdade de Direito de Curitiba-PR - Mestre em Direito das Relações Sociais peia Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Área do Direito: Civil Sumário: 1.Introdução - 2.Do conceito histórico-sociológico - 3.Do conceito dogmático-doutrinário - 4.Do conceito jurídico-positivo: Os conceitos legais, o projeto 634/75 e o Direito Comparado - 5.Conclusão. Bibliografia 1. Introdução O fito do presente estudo, condicionado por limitações de diversas ordens, é muito mais evidenciar (no sentido de revelar aspectos considerados fundamentais e que se encontram de certo modo internalizados) do que reduzir o problema a uma solução ou demonstração teorética. A conceituação do direito de propriedade não é demasiado frisar - constitui tema que trespassa o universo estrito do Direito positivado, não conseguindo, pela sua natureza, minimizar-se diante de situações metajurídicas substanciais. Isso se revela na apreciação do elemento histórico e na constatação de que o conceito não existe isolado de um sistema. Muito oportuna, aliás, é a advertência de Roger Garaudy de que "nem sempre o mais difícil é resolver os problemas. Às vezes, é colocá-los". 1 É provável que seja o caso em tela, ao menos do ponto-de-vista teórico. Indubitavelmente, a propriedade, como instituto jurídico e político, é uma das questões cruciais nos diversos momentos históricos, ainda que de modo diferenciado. O seu estudo tem motivado teorias e praxis: a especulação científica - que, por tal caráter, não pode ser parcial ou excludente - estimula filósofos, juristas e interessados dos mais diversos ramos da Ciência. O Direito, apesar de não albergar todas as questões fundamentais acerca da matéria, não se curva ao silêncio dogmático que quer confiná-la a uma mera conformidade legal. Aqui comparecem as luzes de José de Oliveira Ascensão, ao afirmar, acertadamente, que "a ordem jurídica não é uma estrutura estática e acabada, mas uma ordem evolutiva, uma resposta diferente a cada nova situação social. O jurista tem de ser o agente desta incessante atuação da, ordem jurídica". 2 Entre nós; ensina o Prof. Orlando Gomes que "o jurista não pode desconhecer que determinou, e está a determinar, de par com outros fatores, sensíveis transformações nas instituições jurídicas que, tradicionalmente, compõem o quadro do Direito Privado: a família, a propriedade e o contrato". 3 A amplitude do problema defere-lhe a complexidade peculiar. Não há, porém, como desconhecê-la. Nessa direção, assevera Limongi França que "suma é a importância da propriedade, não, apenas na disciplina do Direito das Coisas, no campo do Direito Privado; como ainda, em meio ao Direito em geral". 4 Daí decorre o dever de abordar, num primeiro passo, a idéia de propriedade sob as mais diversas formas, encontradas nos períodos primitivos, anteriores ao Direito clássico, no próprio Direito clássico, no "Direito ocidental e no Direito contemporâneo Comparado. Cabe, ainda, verificar o Direito Positivo, interno, em suas diversas "manifestações, inclusive na evolução constitucional acerca da matéria. Não ficam de fora da análise a concepção da função social da propriedade, a doutrina social da Igreja e a concepção socialista. Num segundo passo cabe a incursão na doutrina acercado direito real de propriedade, Seu conteúdo e extensão, a observação de algumas de suas variações interessantes, como a dita propriedade imaterial e, especialmente, a propriedade superficiária, bem como outros aspectos das limitações à propriedade. Arrematando, observar-se-á o universo que se apresenta diante do que se pretende conceituar como direito de

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DA PROPRIEDADE COMO CONCEITO JURÍDICO

DA PROPRIEDADE COMO CONCEITO JURÍDICO

Revista dos Tribunais | vol. 621 | p. 16 | Jul / 1987DTR\1987\163

Luiz Edson FachinProfessor de Direito Civil na Pontifícia Universidade Católica do Paraná e na Faculdade de Direitode Curitiba-PR - Mestre em Direito das Relações Sociais peia Pontifícia Universidade Católica deSão Paulo Área do Direito: CivilSumário: 1.Introdução - 2.Do conceito histórico-sociológico - 3.Do conceito dogmático-doutrinário - 4.Doconceito jurídico-positivo: Os conceitos legais, o projeto 634/75 e o Direito Comparado -5.Conclusão. Bibliografia 1. Introdução

O fito do presente estudo, condicionado por limitações de diversas ordens, é muito mais evidenciar(no sentido de revelar aspectos considerados fundamentais e que se encontram de certo modointernalizados) do que reduzir o problema a uma solução ou demonstração teorética. Aconceituação do direito de propriedade não é demasiado frisar - constitui tema que trespassa ouniverso estrito do Direito positivado, não conseguindo, pela sua natureza, minimizar-se diante desituações metajurídicas substanciais. Isso se revela na apreciação do elemento histórico e naconstatação de que o conceito não existe isolado de um sistema.

Muito oportuna, aliás, é a advertência de Roger Garaudy de que "nem sempre o mais difícil é

resolver os problemas. Às vezes, é colocá-los".1 É provável que seja o caso em tela, ao menos doponto-de-vista teórico.

Indubitavelmente, a propriedade, como instituto jurídico e político, é uma das questões cruciaisnos diversos momentos históricos, ainda que de modo diferenciado. O seu estudo tem motivadoteorias e praxis: a especulação científica - que, por tal caráter, não pode ser parcial ouexcludente - estimula filósofos, juristas e interessados dos mais diversos ramos da Ciência. ODireito, apesar de não albergar todas as questões fundamentais acerca da matéria, não se curvaao silêncio dogmático que quer confiná-la a uma mera conformidade legal. Aqui comparecem asluzes de José de Oliveira Ascensão, ao afirmar, acertadamente, que "a ordem jurídica não é umaestrutura estática e acabada, mas uma ordem evolutiva, uma resposta diferente a cada nova

situação social. O jurista tem de ser o agente desta incessante atuação da, ordem jurídica".2

Entre nós; ensina o Prof. Orlando Gomes que "o jurista não pode desconhecer que determinou, eestá a determinar, de par com outros fatores, sensíveis transformações nas instituições jurídicasque, tradicionalmente, compõem o quadro do Direito Privado: a família, a propriedade e o

contrato".3

A amplitude do problema defere-lhe a complexidade peculiar. Não há, porém, como desconhecê-la.Nessa direção, assevera Limongi França que "suma é a importância da propriedade, não, apenasna disciplina do Direito das Coisas, no campo do Direito Privado; como ainda, em meio ao Direito

em geral".4

Daí decorre o dever de abordar, num primeiro passo, a idéia de propriedade sob as mais diversasformas, encontradas nos períodos primitivos, anteriores ao Direito clássico, no próprio Direitoclássico, no "Direito ocidental e no Direito contemporâneo Comparado. Cabe, ainda, verificar oDireito Positivo, interno, em suas diversas "manifestações, inclusive na evolução constitucionalacerca da matéria. Não ficam de fora da análise a concepção da função social da propriedade, adoutrina social da Igreja e a concepção socialista. Num segundo passo cabe a incursão nadoutrina acercado direito real de propriedade, Seu conteúdo e extensão, a observação de algumasde suas variações interessantes, como a dita propriedade imaterial e, especialmente, apropriedade superficiária, bem como outros aspectos das limitações à propriedade. Arrematando,observar-se-á o universo que se apresenta diante do que se pretende conceituar como direito de

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propriedade, buscando vislumbrar em pronunciamentos legislativos pátrios e estrangeiros e de

Tribunais brasileiros o entendimento acerca do instituto.

2. Do conceito histórico-sociológico

2.1 A questão terminológica na matéria

Uma palavra preliminar é necessária para apreender o significado do que seja "conceituação"aplicada ao direito de propriedade. No rigor lógico, "conceituar" corresponde a proceder por juízos,as, mais das vezes intuitivos. Mas não é esse sentido formal que pode ter alguma relevância. Viade regra, "conceituar" e "definir" são termos apresentados em sinonímia.

A terminologia, nesse caso, pode não apresentar maior relevância, especialmente levando emconta, uma decodificação do discurso de Ferdinand de Saussure (Cours de Lihsuistique Genérale),de que é uma grande ilusão, considerar, um termo simplesmente como uma palavra isolada dosistema de que ela faz parte. Com isso se antevê todas as dificuldades que se apresentam doponto-de-vista terminológico, para efetivamente apreender o "conceituar". Ocorre, todavia; que ocaminho da elucidação, in casu, não, é por aí, inclusive porque - como afirma o Prof. Caio Mário -

"não existe um conceito inflexível do direito de propriedade".5

Inobstante essas considerações, é interessante verificar que, num outro plano, na doutrina seencontram indagações sobre o sentido etimológico do termo "propriedade". A Profa. Maria HelenaDiniz, e. g., apresenta duas origens: "Para uns, o vocábulo vem do latim proprietas, derivado deproprius"designando o que, pretende uma pessoa: Assim, a propriedade indicaria numa acepçãoampla toda relação jurídica de apropriação de um certo bem corpóreo ou incorpóreo. Outrosentendem que o termo "propriedade" é oriundo de domare, significando sujeitar ou dominar,correspondendo a idéias de domus, casa, em que o senhor da casa se denomina dominus. Logo,

domínio seria o poder que se exerce sobre as coisas que lhe estiverem sujeitas".6 Esta segundaacepção, como se nota, é, originariamente mais restrita muito embora, atualmente, o emprego daspalavras "propriedade" e "domínio"; se faça sem muito discrímen.

Em síntese, o sentido dos termos, tanto do conceito em si quanto do termo "propriedade", passa ater relevância à medida, que se desvendam os elementos históricos que lhes dão substrato.

2.2 Breve retrospecto histórico

É irrefutável a relevância do elemento histórico na análise jurídica, inclusive porque diz respeito aopróprio Direito. Consoante Castanheira Neves, "o Direito é essencialmente histórico. E isto porqueé ele mesmo historicidade e faz história", ressalvando: "Ele é histórico não porque p seu tempo é o

passado, mas porque, o seu tempo é o futuro a precipitar-se e a moldar o presente".7

Na síntese da evolução histórica do instituto emerge a constatação de que as condiçõeseconômicas e políticas determinaram a origem e o desenvolvimento da propriedade, sob uma formaou outra. Período que tem fugido ao estudo dos juristas é aquele que antecede o Direito clássico.Em verdade, as informações dessa fase são parcas, contraditórias e, por isso, discutíveis. É certo,todavia, que a propriedade tem, portanto, evolução histórica estreitamente relacionada com achamada luta de classe. Nesse estádio primitivo, consoante as pesquisas de Morgan e asconclusões de Engels, é possível admitir que a propriedade comum constituiu a primeira forma de

propriedade, diretamente ligada à concepção então vigente acerca da família.8 Contra esseentendimento autores afirmam que nesse estádio a vida consistia numa situação depromiscuidade, o que levaria à impossibilidade de visualizar qualquer forma de organização oudesorganização social.

À concepção comunal seguiram-se transformações históricas que desembocaram na estatuição dapropriedade pelo Direito Romano. Lembra o sempre presente Tristão de Athayde que "os romanosforam propriamente os criadores do direito da propriedade privada, do direito abstrato, do direito

privado".9 Reconhece Arnoldo Wald que o Direito Romano elaborou a teoria da propriedade que se

mantém, mutatis mutandis, na época contemporânea entre nós.10 O Prof. Caio Mário estabeleceligeira conexão teórica dessa evolução, afirmando que "a princípio foi o fato, que nasceu com aespontaneidade de todas as manifestações fáticas", e mais tarde foi a norma que o disciplinou,

afeiçoando-o às exigências e à harmonia da coexistência.11 Difícil é concordar com esse Jurista denomeada quando fala em necessidade de dominação. Nessa linha, entende Washington de BarrosMonteiro que "parece que a propriedade, nos primórdios da civilização, começou por ser coletiva,transformando-se, porém, paulatinamente, em propriedade individual"; mais: "trata-se, contudo,

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de ponto obscuro da história do Direito e sobre o qual ainda não foi dita a última palavra".12 Maislúcido, entende Orlando Gomes que o estudo jurídico da propriedade pressupõe o conhecimento de

sua evolução histórica.13

O Direito Romano, ao que consta ocupou-se 'mais dos elementos da propriedade do que lhe dar umconceito, muito embora, numa fórmula conhecida, tenha-lhe traçado o conteúdo: "dominium estjus utendi et abutendi, quatemus juris ratio patitur". Verifica-se que a propriedade quiritária foiprimitivamente, no Direito Romano, o único modo de propriedade reconhecido. Tinha comopressupostos a qualidade de cidadão romano, ares mancipi e o modo de aquisição. Desenvolveu-se, posteriormente, a propriedade bonitária ou do jusgentium. Antes, somente ao cidadão romanoera dado o privilégio de adquirir a propriedade, pela mancipatio. Mais tarde, aduz Caio Mário naobra citada, estendeu-se o jus commercii aos estrangeiros, ampliando-se a aquisição do soloitálico, e depois além deste; e, a par daquela modalidade aquisitiva hermética, surgiram novosusos e os jurisconsultos elaboraram novas técnicas: traditio, injure cessio.

Ressalta Arnoldo Wald que a propriedade em Roma constituiu direito absoluto e perpétuo,excluindo-se a possibilidade de exercitá-la vários titulares. A Idade Média, por seu turno,consagrou a superposição de propriedades diversas incidindo sobre um único bem, e a RevoluçãoFrancesa restaurou, com novos e amplos matizes, o individualismo.

Afirmando que "nenhuma descrição do sistema feudal pode ser rigorosamente precisa, porque ascondições variavam muito, de lugar para lugar", Leo Huberman esclarece sobre os dois caracteresimportantes do sistema feudal: "Primeiro, a terra arável era dividida em duas partes, umapertencente ao senhor e cultivada apenas para ele, enquanto a outra era dividida entre, muitosarrendatários; segundo, a terra era cultivada não em campos contínuos, tal como hoje, mas pelosistema de faixas espalhadas. Havia uma terceira característica marcante: o fato de que osarrendatários trabalhavam não só as terras, que arrendavam mas também a propriedade do

senhor"14

Sobre essa fase histórica José de Oliveira Ascensão faz interessante ligação entre um dos'caracteres fundamentais dos direitos reais com o fim do regime feudalista: "O numerus claususinscreve-se, ou, pelo menos, pode-se inscrever, neste movimento. Abolidos os vínculos feudais einstaurada uma nova ordem dos direitos sobre as coisas, um sistema fechado serve à maravilhapara perpetuar as conquistas obtidas; tudo o que se não adaptar ao esquema legislativo é

rejeitado".15

A afirmação máxima do direito de propriedade nos moldes próximos ao hoje contemplado entre nósse dá com o Code Napoleón, o Código da Propriedade, em seu art. 544: "La propriété est le droitde jouir et disposer des choses de la maniere plus absolue".

Uma obra com que se depara o pesquisador é a de Décio Ferraz Alvim.

Esta obra tem o mérito de colocar-se numa posição indiscutivelmente clara: que a propriedadeprivada é conforme à lei natural e à natureza racional do homem, e é o elemento assegurador dafamília. Que essa posição se choca frontalmente com o entendimento de outros pensadores queinvestigaram a origem histórica tanto da propriedade quanto da família, disto não há menor dúvida.Mas aquele mérito referido é a colocação nítida que tem a tese Concepção Institucional daPropriedade do ponto-de-vista ideológico.

Diz Décio Ferraz Alvim (p. 10) que a propriedade permite ao homem desenvolver amplamente o seuser. A propriedade, em última análise, é o poder de apropriação, e não somente de titularidade.Toda manifestação de poder em uma sociedade onde a contrapartida não pode ser feita emmesmo nível, de expressão é uma forma de opressão. Portanto, afirmar que a propriedade propiciaao homem a sua realização pessoal é, em certo sentido, diverso de entender que o homem,individualmente, somente se realiza com o bem dos homens, coletivamente.

Afirma ainda aquele autor (p. 11) que "a idéia de propriedade decorre do natural domínio dohomem sobre os bens materiais, e se apresenta como um poder moral e jurídico". Registra-se queo homem passou a utilizar-se da propriedade, transformando-a de comum em privada.

Se assim for, não é possível conceber que a idéia de propriedade decorra de natural domínio dohomem sobre os bens materiais, porque este domínio somente se processou com as alteraçõesverificadas nas condições econômicas, o que vale dizer que naturalmente o homem não efetivavaesta apropriação e somente se realiza com aquelas alterações econômicas. Tem razão,entretanto, quando diz que a propriedade apresenta-se como poder moral e jurídico. Mais do que

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isso: a propriedade é um poder econômico.

Adiante (p. 15) explica que é a propriedade na forma privada aquela decorrente de princípio deDireito Natural. A propriedade privada, num sentido lato, não é um direito natural. O institutodesenvolveu-se ao longo da História, consoante as determinantes econômicas, dentro de contínualuta de classe. Aliás, nesse senso largo, a propriedade é uma criação das necessidadeseconômicas manifestas por determinado grupo de indivíduos. Adiante veremos a opinião de JaimeAugusto Cardoso de Gouveia, que refuta tal entendimento de Décio Ferraz Alvim.

Entender que a "propriedade privada funda-se num princípio de lei natural" é conceber, numa certaangulação do problema, o instituto como anterior ao homem. Assim concebido, concluir-se-ia queesta origem metafísica da propriedade decorre, do "necessário equilíbrio para a realização do bemcomum". Porém, a propriedade também é um instituto de Direito, e o Direito é um fato cultural, eos fatos culturais são produtos do homem ao longo de sua história.

Sendo a concepção da propriedade uma concepção cultural, vale dizer, posterior ao homem, seudesenvolvimento também não obedece a princípio de ordem natural, porque, se assim fosse, oentendimento da propriedade permaneceria sempre inalterado, porque o bem comum, ao menos noque se depreende do pensamento daquele autor, é inalterável. Tal idéia de inalterabilidade seriauma conseqüência da identificação entre o bem comum e a propriedade (na forma privada),identificação, esta, que os tempos modernos não têm recebido com muito entusiasmo.

A propriedade, enquanto titularidade genérica de apropriação, engloba parcelas preponderantes do

sistema de vida material,16 Saliente-se que a doutrina clássica define propriedade "como apossibilidade de exercer um poder sobre uma coisa, de acordo com a vontade do titular,

respeitados as leis e os direitos de 'terceiros",17 conforme consenso que se observa em Pothier,Windscheid e, inclusive, Scialoja. Entre nós, Teixeira de Freitas focalizou o direito de propriedadecomo direito sobre a substância e utilidade, sendo direito real, quer perpétuo, quer temporário, deum só dono sobre um bem. Observam-se, então, dois aspectos distintos: o jurídico - ou relaçãoexterna, ligada ao direito exclusivo do proprietário sobre a coisa - e o econômico - ou relaçãointerna, existente entre o proprietário e o bem, isto é, o jus utendi, fruendi et abutendi.

Lembra Arnoldo Wald que a propriedade, para a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão,consistiu em direito inviolável e sagrado. Ressalta, ainda, que tanto o art. 544 do CC francêsquanto o art. 436 do Código italiano de 1865 estatuem que a propriedade é o direito de gozar edispor do bem de modo absoluto. Salienta que, a partir da Constituição de Weimar, há progressivoreconhecimento de efetivar uma ordem econômica e social com implicações para a questão dapropriedade, de forma a construir uma, nova etapa frente ao já superado laisser faire, laisserpasser. Em verdade, há todo um desencadeamento de fatos e idéias entre o Feudalismo e aRevolução Francesa, bem como no procedimento liberalista dos fisiocratas, fundamentando asmudanças de ângulo para formular a equação deste problema. A Revolução Francesa procurou darum caráter democrático à propriedade, abolindo privilégios, cancelando direitos perpétuos,consoante menciona Caio Mário da Silva Pereira; porém, este fito da burguesia ficou diretamentecondicionado aos seus interesses econômicos e políticos, de forma que a propriedade alteravasuas concepções tradicionais para, servir a uma nova classe social em busca de poder: aburguesia. A nova fórmula de dominação econômica e política do Feudalismo que sucedeu aoEstado universal dos romanos, foi substituída pela Revolução Francesa com o império dosprincípios de igualdade soberania e justiça. Daí a concepção encontrada de que o meio dedominação de uma classe sobre outra é a exploração das classes dominantes, que surge comregime da propriedade privada. Logo, para que não haja a sujeição de classes é necessário,segundo a teoria do materialismo histórico, a abolição da propriedade privada.

Em síntese, na época atual nota-se de um lado, a propriedade coletiva dos bens de produção, ede outro, a noção de propriedade como direito individual de acordo com os regimes capitalistas.Tanto Caio Mário da Silva Pereira quanto Orlando Gomes admitem a forte tendênciacontemporânea de crescente socialização da propriedade.

Em dissertação de doutoramento, Jaime Augusto Cardoso de Gouveia, trazendo a noção de que apropriedade não é um direito, mas função social baseada em um critério de utilidade, edesenvolvendo estudo a propósito da natureza da propriedade como Junção social, considera oDireito Natural "uma velha fantasia da humanidade, que a Ciência moderna tem desfeito, seminteiramente a haver destruído, como disse Windscheid". Por isto, acrescenta "ao Direito Natural

não se pode ir, pois, buscar o fundamento jurídico da propriedade".18

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Para Proudhon a palavra "propriedade" apresenta dois significados: em primeiro lugar "designa aqualidade pela qual uma coisa vale por si e pela virtude que lhe é própria e a distingueespecialmente" (propriedades do triângulo ou dos números propriedade do ímã); em segundo lugar"exprime o direito de um ser inteligente e livre sobre uma coisa: é nesse sentido que a tomam os

jurisconsultos".19 No livro O Que É a Propriedade? Proudhon refere-se à definição da propriedade,dada pelo Direito Romano: "jus utendi et abutendi re sua, quatemus juris ratio" - isto é, o direitode usar e abusar dos bens, contanto que a razão de direito o permita, estabelecendo vinculaçãocom o art. 544 do Código de Napoleão. A origem e o desenvolvimento da propriedade, de maneiradiversa com a apresentada precedentemente, são tratados por Proudhon nas seguintes teoriassobre a instituição da propriedade: considerada como direito natural, estudo sobre a ocupação e alei civil, o trabalho e a necessidade como causas eficientes da propriedade. Na mesma obra fazsuas 10 proposições: 1.ª) a propriedade é impossível porque do nada exige qualquer coisa; 2.ª) 'apropriedade é impossível porque, onde é admitida, a produção custa mais do que vale; 3.ª) apropriedade é Impossível porque, para um dado capital, a produção está na razão do trabalho, não

na propriedade; 4.ª) a propriedade é impossível porque, com ela, a sociedade se devora; 5.ª) apropriedade é impossível porque é mãe da tirania; 7.ª) a propriedade é impossível porque, aconsumir o que recebe, o perde; ao amealhar, anula-o; ao capitalizar, volta-o contra a produção;8.ª) a propriedade é impossível porque o seu poder de acumulação é infinito e só se exerce sobrequantidades finitas; 9.ª) a propriedade é Impotente contra a propriedade e 10.ª) a propriedade éImpossível porque é a negação da igualdade.

O Prof. Orlando Gomes, a respeito das transformações da propriedade, fornece - desde apropriedade privada até a propriedade coletiva - um quadro da posição contemporânea daquestão, ressaltando, desde logo, a insistente tendência de sua socialização (no sentidomarxista). Nos regimes de economia capitalista a produção é coletiva, "enquanto a apropriação éindividual. A abolição da propriedade privada extinguiria esta contradição, instaurando apropriedade coletiva dos bens de produção. Segundo A. Menger, in El Estado Socialista, citado porOrlando Gomes, os bens devem ser distribuídos em três grupos aos quais correspondem trêsformas jurídicas. Tendo por critério a função econômica, aquele Jurista os classificou em bens deconsumo - para os quais a forma jurídica apropriada é a propriedade privada - bens de uso - cujaforma não pode ser única, alguns comportando a propriedade individual e outros necessitando delimitações de direito - e bens de produção, que devem ser socializados. Por isto fala-se empropriedade coletiva dos bens de produção. Todavia, como adverte Orlando Gomes, "certatendência para a substituição dos proprietários particulares pelo Estado não pode ser considerada

socializadora".20 Esta intervenção do Estado na economia traduz os contornos do que sedenomina, nacionalização. Porém, os bens de produção continuam submetidos ao regime dapropriedade privada. Como se pode depreender, a nacionalização de certos bens para o domínio doDireito Público não afeta o regime capitalista. Da mesma forma, a democratização oupopularização da propriedade não se inserem na concepção marxista, porque é substancialmenteuma alteração conceitual. As restrições ao exercício do direito de propriedade, inclusive peloestabelecimento de deveres aos proprietários (como pode ser verificado na Constituição daRepública (LGL\1988\3) Federal alemã de 1949, art. 14; "A propriedade obriga"), também não seenfeixam na tendência socializante. É o que denomina de humanização da propriedade,destacando-se a teoria da função social da propriedade. Lembra o Prof. Orlando Gomes que atendência de humanização teve origem na reação contra a concepção individualista dapropriedade, porém fundamentalmente não diferem: ambas mantêm o princípio da propriedadeprivada. O que a distingue fundamentalmente, aduz, das outras tendências assinaladas para asocialização, a nacionalização e a democratização é o sentido de suas repercussões. As outrasvisam ao direito de propriedade na sua extensão, por assim dizer, social. Restringem ou alargamsua órbita. O movimento para a humanização o alcança apenas na intensidade. A humanizaçãoestá ligada às teorias de abuso de direito e de direito-dever. Atualmente, a teoria do abuso dedireito, procurando justificar a crescente imposição das restrições ao exercício do direito depropriedade, não explica nem justifica o fenômeno da humanização da propriedade.

A observação destas transformações no entendimento da propriedade leva a concluir a estreitavinculação entre a concepção da propriedade e as condições econômicas encontradas nodesenvolvimento da história, como entre os romanos, na Idade Média, no individualismo daRevolução Francesa e nos regimes econômicos contemporâneos.

2.3 A doutrina social da Igreja

A doutrina social da Igreja Católica, baseada no Cristianismo, considera, via de regra, a

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propriedade como sendo um direito natural do homem. Mas não a propriedade comum dos homens,e sim a propriedade cuja posse e uso estão nas mãos de um homem. É o que se depreende daencíclica Rerum Novarum do Papa Leão XIII: "Assim, esta conversão da propriedade particular emcoletiva, tão preconizada pelo Socialismo, não teria outro efeito senão tornar a situação dosoperários mais precária ...". Logo, é a propriedade privada que a Igreja Católica entende comodecorrência do Direito Natural, pois para ela, o direito natural à propriedade é consagrado peloconsenso unânime dos homens e pela lei, tanto humana como divina.

A encíclica Mater et Magistra, assinada pelo Papa João XXIII em 1961, reafirma que a economiadeve ser obra da iniciativa particular. Foram promulgadas outras encíclicas que mantiverambasicamente os mesmos princípios: Pacem in Terris, do Papa João XXIII; Populorum Progressio, doPapa Paulo VI, em 1979; Redemptor Hominis, do Papa João Paulo II. A esta doutrina social daIgreja Católica segue-se, portanto, todo um conjunto de pensamento católico sobre apropriedade, a terra, o capital e o trabalho, cujas idéias autores denominam de cristianização,orientação mantida pelas novas cartas papais recentes.

Em verdade; a resposta da Igreja Católica às questões sociais foi provocada pelo impacto dasidéias marxistas no meio do operariado, afastando-o dos mitos e ritos da região. Com a encíclicaRerum Novarum, diz Henry George, ao comentar o documento do Papa Leão XIII, o Vaticano

elaborou sua primeira investida contra este impacto provocado na massa de assalariados.21 Oautor de A Condição do Trabalho afirma que "o direito de propriedade privada estáincontestavelmente ... ligado às coisas produzidas pela razão e providência humana. Mas nãopode estar ligado às coisas criadas pela razão e providência divina". Henry George contesta oargumento do Papa Leão XIII de que a propriedade privada da terra tem o apoio da opinião doshomens deu ao mundo a paz e a tranqüilidade e, assim, tema sanção divina. Diz, ainda, o PapaLeão XIII que o direito de propriedade privada da terra decorre da Natureza e não foi inventadopelos homens. Igualmente aqui observa-se a inexistência de fundamentação histórica.Obviamente, esta visão da Igreja Católica sobre a questão da propriedade decorre do própriocontexto divino em que ela está inserida ou se fez inserir, ao inverso da concepção domaterialismo histórico.

2.4 Breves considerações preliminares acerca da teoria marxista da propriedade

A propriedade para a teoria marxista tem contexto diverso do entendimento tradicional, pois osmatizes da orientação econômico·política são diversos daqueles que o sistema da propriedadeprivada gera. Por conseguinte, a propriedade, como titularidade de qualquer meio de produção,deve ser compreendida como parcela fundamental de todo componente marxista, tanto que podeser sintetizado na abolição da propriedade privada.

É necessário discernir, preliminarmente, esboços fundamentais dessa teoria. O conceitomaterialista da História e o postulado da luta de classes são das linhas mais importantes na teoria.Diz Haroldo Lask que "a essência da escola marxista se baseia na aceitação de dois princípiosfundamentais. O primeiro é que "as formas de produção na vida material condicionam o carátergeral dos processos sociais, políticos e espirituais da vida". O segundo princípio é que, enquantoos meios de produção são possuídos privadamente, a classe que os possui utiliza-se do poderestatal como uma arma coercitiva de manutenção da propriedade". Para verificar o pensamentomarxista é importante conhecer conceitos encontrados no Manifesto Comunista de fevereiro/1848, segundo o qual a história das sociedades é a história da luta de classes. A burguesiamoderna, portanto; decorre de um processo de transformações na produção e na troca. O intentode abolição da propriedade privada é a, ameaça à existência dessa sociedade embora não sejaexclusiva do Comunismo a abolição das relações de propriedade da História. O Comunismopropugna a abolição da propriedade burguesa que nasceu da extinção da propriedade feudal. Arevolução comunista, todavia, propugna a ruptura mais radical com as relações de propriedadetradicionais: o trabalho, a riqueza e á terra são bens comuns. Diz, ainda, o Manifesto: "Oscomunistas apóiam todo e qualquer movimento revolucionário contra o estado de coisas social epolítico existente. Em todos estes movimentos, colocam em primeiro plano a questão dapropriedade".

Ainda segundo Lask,22 o Manifesto provocou quatro perspectivas básicas: vinculou a necessidadede uma transformação inevitável com as causas que a geraram; relacionou tal mudança às classessociais; explicou por que era lógico supor que o conflito entre o Capitalismo e o Socialismo seria oúltimo conflito, a derradeira fase dos confrontos decorrentes das contradições econômicas esociais; e também demonstrou que os homens podem tomar consciência de seu posicionamento

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histórico, para a liberdade econômica e social.

A expressão positiva da propriedade privada superada corresponde a aniquilar tudo o que não ésuscetível de ser possuído por todos como propriedade privada. Logo, "a superação da propriedade

privada é, por isso, a emancipação total de todos os sentidos e qualidade humanas ...".23 Tal é adimensão real da propriedade nessa concepção. A abrangência desse entendimento deságua naestrutura econômica, dado que o modo capitalista de apropriar-se dos bens é decorrente do modo

capitalista de produção, ou seja, a propriedade privada capitalista.24

Três fatos fundamentais marcam, segundo tal concepção, a produção capitalista: 1)concentração dos meios de produção em poucas mãos; 2) organização do trabalho como trabalho

social; 3) constituição do mercado mundial.25

O que nos impõe a questão é reconhecer, acima desta polêmica, que a propriedade é uma dasquestões mais relevantes. Pela análise das obras dos pensadores marxistas chega-se a estaconclusão. Até a reflexão inserida em outro contexto que não o marxista aponta este aspecto,ressaltando que a supressão da propriedade privada é a reconciliação do homem com a Natureza.E a posição de Chambre, representando uma tomada de posição da reflexão cristã frente aoMarxismo. E Chambre refere-se ao Marxismo-Leninismo como reexame total do mundo do homem,das estruturas do mundo capitalista: Religião, Filosofia, Direito, Estado; explicação total do mundodo homem e do homem, e uma esperança, "na medida em que propõe a libertação das alienação.

2.5 A "função social" da propriedade

O absolutismo no exercício da propriedade sofreu a intervenção de idéias que progressivamenteconstruíram a doutrina da denominada função social da propriedade. Ressalta Eduardo Espínola:"desde que, na Constituição de Weimar (1919), se proclamou que a propriedade obriga, em todas

as legislações mereceu o pronunciamento acolhida",27 Várias Constituições hispano-americanas, v.g., contemplam o conceito de propriedade como função social do México (1948); art.27; daColômbia (1936), art. 30; do Equador (1945); da Venezuela (1945), art. 65, e de Cuba (1940),arts. 87 e 90.

A função social relaciona-se com o uso da propriedade; alterando por conseguinte, algunsaspectos pertinentes a essa relação externa que é o seu exercício. E por uso da propriedade épossível apreender o modo com que são exercitadas as faculdades ou os poderes inerentes aodireito de propriedade. Destaca, ainda, Eduardo Espínola que o pressuposto de confiança recíprocae boa-fé, que se integra no moderno conceito de obrigação, encontra correspondência na funçãosocial, implícita no direito de propriedade, no sentido de consideração à solidariedade social,compreendendo os direitos do proprietário e os deveres que lhe são impostos pela política

legislativa".28

Larenz refere-se ao art. 14 da atual Constituição da República (LGL\1988\3) Federal alemãsegundo o qual a propriedade obriga. Seu uso deve servir ao bem da coletividade, frisando Larenzque somente a Constituição de Weimar elevou a idéia da função social da propriedade à categoria

de princípio jurídico.29

Ao se referir à função social da propriedade, aduz Trabucchi que "l'affermazione costituzionale,che essenzialmente tende a dare una giustificazione del diritto esclusivo, vuole anche inserire nellarigida concezzione individualistica di tale diritto soggetivo il momento del dovere. Il jus exludendi

omnes alios e cosi temperato da un imperativo richiamo alla collaborazione sociale".30

O BGB traz o cunho social desse direito visando a evitar o abuso em seu exercício. Seguem seucondicionamento o Código Civil (LGL\2002\400) suíço e o italiano. Dispõe, por seu turno, aConstituição italiana de 1947 que a lei fixará "il modo di acquisto, di godimento e limite alIo scopodi assicurarne la funzione social e di renderla accessible a tutti" (art. 42). Ao comentar essemesmo artigo em matéria de desapropriação, Domenico Sorace discute o sentido em que deve sertomada a expressão "função social", concluindo que, pelo menos, deve corresponder à

consideração do indivíduo não somente uti singulus ou uti civis, mas sim uti socius.31A propósito,é muito acertada a advertência de Eduardo Espínola de que a função social não desnatura esseinstituto de Direito Privado.

Cabe também salientar que a doutrina da função social da propriedade corresponde a umaalteração conceitual do regime da propriedade privada, no sentido de que sobre o regimetradicional é aplicado o da função social, de indisfarçável utilidade contemporânea; não é,

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todavia, questão de essência, mas sim pertinente a uma parcela da propriedade que é a suautilização, em que pese a todo o esforço de eminentes Autores agraristas para demonstrar oinverso.

O processo histórico de apropriação do homem sobre a terra desenvolveu-se de modo artificial, eem cada época a propriedade constituiu-se de contornos diversos, conforme as relações sociais eeconômicas de cada momento. O grau de complexidade hoje alcançado pelo instituto dapropriedade deriva indisfarçavelmente, do grau de complexidade das relações sociais. Portanto,especialmente em matéria da propriedade, não há, a rigor raciocínio puro ou abstrato, pois devemser levadas em conta todas as determinantes sociais.

A propriedade rural (que nada mais é do que a propriedade aplicada a um uso específico), p. ex.,recebe um tratamento legislativo especial à medida que se destaca da propriedade como um todo,para receber reconhecimentos político e jurídico de que se constitui suporte para continuação dostatus quo vigente. Em outras palavras, qualquer alteração substancial neste sentido há de serprecedida de alterações essenciais do sistema no qual a propriedade encontra-se inserida.

A discussão sobre a função social da propriedade é ponto presente na temática do Direito Agrário,especialização do Direito Civil. Uma das maiores autoridades no assunto, o Prof. Fernando PereiraSodero, ressalta a necessidade de compatibilizar reivindicações sociais a um conceito depropriedade de cunho social não mais absoluto, limitando o uso da terra para os interesses dacomunidade, sobrepondo, portanto, os deveres do proprietário aos seus direitos.

O princípio repercute na utilização, racional e econômica da terra, porém, seus efeitos aí não seesvaem: estabelece, ainda, restrições à utilização da propriedade, impondo também deveres.

É bem verdade que tal princípio não chega a afirmar que o trabalho constitui-se no único modopara ter a propriedade: afirma que somente o trabalho do homem sobre a terra é que legitima asua propriedade. Como se vê, são duas posições não, excludentes; contudo, basicamentedistintas. A primeira consiste uma inversão entre domínio e trabalho; a segunda tão-somente incluino bojo do domínio o elemento "trabalho", como fator de legitimação, mas não como condição sinequa non para adquirir o direito de propriedade.

Outros países já apresentam concepções no Direito Agrário que se posicionam de modo maisavançado ou pelo menos diverso sobre o problema. A Venezuela, p. ex.: em conferência proferidapelo Prof. Roman J. Duque Corredor sobre "La posesión civil y la posesión agraria", no 1.º EncontroInternacional de Jus-Agraristas, realizado em maio/81, em Belém, tais concepções distintas, sãoobservadas diz aquele Professor que todo homem tem direito a ser proprietário da terra, mais emrazão de seu trabalho do que em consideração de um título. Logo, a terra deve ser de quem atrabalhe. Evidente que, à medida que tais concepções forem aprofundadas, o regime tradicional dapropriedade privada há de ser superado.

Daí a questão da função social da propriedade comportar observações de ordem geral e de ordemespecífica, tendo em vista, nestas últimas, o Estatuto da Terra, principalmente.

Lato sensu, a doutrina clássica define propriedade como a possibilidade de exercer um poder sobreuma coisa, conforme lembra Arnoldo Wald. Tratando-se de propriedade privada, hoje, constatam-se algumas alterações conceituais intrínsecas: é a nacionalização, a democratização, ahumanização e a cristianização da propriedade. Todos estes movimentos não alteram ó institutoda propriedade privada. Alguns atribuem à propriedade privada uma função social. Esta funçãosocial mantém o sistema privado, mas o disciplina em favor da coletividade, readaptando adefinição dado pelo Código Civil (LGL\2002\400) pelo conceito dos antigos romanos.

"Stricto sensu"a função social da propriedade é um dos princípios basilares do Direito Agrário.Afirma Raymundo Laranjeira, em sua Propedêutica do Direito Agrário, que, "partindo-se da análiserespeitante ao funcionamento da propriedade privada da terra com a ilação de que o seu" simples"uso personalíssimo, e gozo destacado dos seus frutos não traziam contribuição efetiva para odesenvolver de um país ou benefícios para o proletariado dos campos, se chegou fácil à idéia dafunção social da terra".

Assim é que a Constituição Federal (LGL\1988\3) e o Estatuto da Terra atribuem à propriedadeprivada uma função social, condicionando o uso da terra ao bem-estar coletivo.

Daí a considerar que a propriedade é uma função social toma-se um passo, ao que parece,insustentável. Pugliatti coloca a questão nos seus exatos termos: "A completare l'analisi delladefinizione legale della proprietà e necessario esaminare la piu comune questione che oggi vien

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posta in relaziope al concetto della proprietà: se essa cioè, debba intendersi como funzione social,

o se essa abbia una funzione sociale".32 A propriedade temuma função social, princípio jurídicoaplicado ao exercício das faculdades e poderes que lhe são inerentes. Aduz Pugliatti: "Funzione e

diritto soggettivo sono entità che divergono e non si possono conciliare".33 Aquele princípio,portanto, não transmuda realmente a propriedade para o Direito Público através da noção defunção. A expressão "função social" corresponde a limitações, em sentido largo, impostas aoconteúdo do direito de propriedade. Tais restrições dão nova feição ao Direito e na épocacontemporânea constituem matéria de vasto estudo, especialmente na seara do DireitoAdministrativo. Ao Direito Privado o princípio comparece como relevante dado a compor o quadrohistórico do instituto.

2.6 Escorço da evolução constitucional brasileira na disciplina do direito de propriedade

É consenso doutrinário que as Constituições brasileiras, desde 1824 até 1969, consagram apropriedade como direito individual inviolável, na linha do art. 17 da Declaração dos Direitos doHomem e do Cidadão, de 1789: "Como a propriedade é um direito inviolável e sagrado, ninguémdela pode ser privado, a não ser quando a necessidade pública legalmente comprovada o exigirevidentemente e sob condição de justa e prévia indenização".

A Lex Maxima imperial garantia o direito de propriedade em toda a sua plenitude. Rezava o art.179, XXII, da CF de 1824: "É garantido o direito de propriedade em toda a sua plenitude. Se obem público legalmente verificado exigir o uso. e emprego da propriedade do cidadão, será elepreviamente indenizado do valor dela. A lei marcará os casos em que terá lugar esta únicaexceção, e dará as regras para se determinar a indenização". Sem maiores alterações formais, aprimeira Constituição Republicana (LGL\1988\3) tratou da matéria no art. 72, § 17: "O direito depropriedade mantém-se em toda a sua plenitude, salvo a desapropriação por necessidade ouutilidade pública, mediante indenização prévia".

O princípio da função social da propriedade ingressa na Constituição de 1934: "É garantido odireito de propriedade, que não poderá ser exercido contra o interesse social ou coletivo, na formaque a lei determinar. A desapropriação por necessidade ou utilidade far-se-á nos termos da lei,mediante prévia e justa indenização" (art. 113, XVII). Em linha formal similar encontra-se o art.141, § 16, da Carta de 1937, esta inspirada, como se sabe, em fontes notadamente diversasdaquela.

É a expressão da Constituinte de 1946 que estatui o efetivo condicionamento da utilização dapropriedade ao bem-estar coletivo. Tal limitação decorreu de novo substrato aplicado ao direito depropriedade, derivado do repúdio ao individualismo econômico. Incorpora-se, aqui a consagraçãoda superioridade do interesse público sobre o individual, resguardando-se, no entanto, os

pressupostos básicos do direito individual.34

Após 1964 foram impostas diversas alterações na Constituição Federal (LGL\1988\3) vigente,sendo discutível se em 1967 e em 1969 a Carta outorgada pode efetivamente tomar o conceito deConstituição. A preocupação formal com o aspecto social foi mantida, discrepando, todavia, dapraxis "que se procedeu. É a propriedade, na atual Constituição Federal (LGL\1988\3), enquadradacomo direito individual garantido pela lei, sob os limites da função social a ela aplicada.

Depreende-se desse breve itinerário que as alterações havidas nos diversos textos constitucionaisrefletem as transformações sociais e políticas, as quais impingiram, nos vários momentoshistóricos, diferentes contornos a uma mesma moldura.

A garantia do direito de propriedade é invocada pelos nossos Tribunais, com fundamento na LexMaxima, sob diversos ângulos. Exemplo disso é o que consta do julgamento do RE 80.340-RJ pela1.ª Turma do STF, em 10.5.77, especialmente o voto do Min. Bilac Pinto, então relator, verbis:"Vejo, assim, como afrontada, em nome de considerações extrajurídicas, a garantia constitucionaldo direito ele propriedade, no contexto, das decisões que ignoram o clamor da embargante,legítima titular do domínio do imóvel, e pretenderam dar por resolvida a questão no singelo

esquema da reintegratória de posse movida pela Diocese contra o pároco rebelde".35 Esclarece asúmula do julgado:

"Embargos de terceiro - Bens da Igreja Ortodoxa no Brasil reivindicados, em decorrência de cisma,pela diocese do pároco rebelde - Embargos, em execução, da paróquia dados por improcedentesOfensa ao princípio constitucional que garantia o direito de propriedade, pois, sendo a paróquiapessoa jurídica regularmente constituída, tem o direito de reger seu patrimônio conforme seus

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próprios estatutos - Recurso extraordinário. conhecido e provido, dando-se pela procedência dosembargos de terceiro".

Outro modo de socorrer-se da proteção constitucional é o recurso às garantias jurídicas que deladecorrem, do que são exemplos as argüições de vícios nas transmissões imobiliárias. É o que sedepreende, v. g., de julgamento do TJSP constante da RT 412/187.

A segurança das relações jurídicas pode ser combinada, a nível de argumentação, paraindividualizar a proteção jurídica ao direito de propriedade. Isso se verifica, p. ex., nas discussõesde venda de áreas de terras ad corpus ou ad inensuram, seguindo-se, ulteriormente, litígiodesaguado no Poder Judiciário acerca do verdadeiro objeto da transmissão. À determinação doobjeto e sua plena aderência ao direito de propriedade deferem-se mecanismos jurídicos deproteção. O que se resguarda, in casu, no é o proprietário alienante ou o adquirente, mas sim oprincípio do direito de propriedade sobre o objeto a ele inerente de modo incindível. A propósito écabível menção ao acórdão da 2.ª Câmara Cível do TJSP lançado nos autos de Ap. cível 251.262

em 1.6.76,36 que discute a matéria nos termos supra. Estes reflexos, ora mais intensos eestreitos, ora mais tênues e mediatos ilustram a reprodução hierárquica da norma constitucionalde proteção ao direito de propriedade.

3. Do conceito dogmático-doutrinário

3.1 O conceito do direito real de propriedade

O direito de propriedade é questão básica de Direito das Coisas.37 É o centro de irradiação que,

congrega as demais categorias dos direitos reais, afirma Serpa Lopes.38

A indagação de seu conceito são geralmente contrapostos os elementos que compõem o seuconteúdo, a exemplo de como procedem as legislações. Busca-se, assim, conceituar tendo em

vista a amplitude do direito real de propriedade.39

As teorias tradicionais formuladas a propósito do fundamento jurídico da propriedade não fornecem

maiores luzes à conceituação.40

Remontando a Clóvis Beviláqua, o conceito encontrado não minimiza os problemas para a,definição, pois define a propriedade como "o poder assegurado pelo grupo social à utilização dos

bens da vida física e moral".41 Lafayette Rodrigues Pereira manifesta-se, a propósito, afirmandoque "o direito de propriedade, em sentido genérico, abrange, todos os direitos que formam o nosso- patrimônio, isto é, todos os direitos que podem ser reduzidos a valor pecuniário. Mas,ordinariamente, o direito de propriedade é tomado em sentido mais restrito, como compreendetão-somente o direito que tem por objeto direto ou imediato as coisas corpóreas: Nesta acepção

se lhe dá mais geralmente o nome de domínio".42 A sinonímia entre propriedade e domínio já foireferida retro, como sendo realmente verificável stricto sensu; a submissão das coisas corpóreasà rubrica de objeto imediato do direito real de propriedade é, contudo, discutível, por doisaspectos: o primeiro, que vislumbra como objeto imediato do direito real o feixe de poderes oufaculdades inerentes à propriedade, sendo a coisa objeto media to, como ensina o Prof. ArrudaAlvim; o segundo, não exclui do universo dos objetos do direito real de propriedade as ditas coisasincorpóreas. Pontes de Miranda entende que, "em sentido amplíssimo, propriedade é o domínio ouqualquer direito patrimonial", posicionando-se na linha do Cons. Lafayette. Resta, entretanto, casoseja aceito esse entendimento, indagar quais os direitos que compõem o patrimônio. A redargüiçãopode tornar, em tese, inválido o raciocínio acima, em face da complexidade do discrímen entredireitos de cunho patrimonial e aqueles que não possuem essa chancela. O conceito largo de

Pontes de Miranda,43 além disso, como ele mesmo adverte, trespassa o Direito das Coisas.

A Profa. Maria Helena Diniz destaca que árdua é a tarefa de conceituar a propriedade, sugerindoque o critério mais acertado é o de reduzir a propriedade aos seus elementos essenciais positivos- direitos de usar, gozar, dispor e reivindicar (cf. Scialoja, Teoria della Proprietà nel DirittoRomano, v. 1). A base da conceituação, como se vê, é o conteúdo. Assim procedendo,acrescenta, na sua obra já citada, que a "propriedade se apresenta como unidade de - poderesque podem ser exercidos sobre uma coisa, e não como uma soma ou um feixe de faculdadesdistintas, cada uma das quais suscetível de desmembrar-se do todo para surgir como direitofracionado. A propriedade é a plenitude do direito sobre as coisas; as diversas faculdades, que

nela se distinguem, são apenas manifestações daquela plenitude".44 Tais afirmações não ignoramo princípio do desmembramento que dá ao direito de propriedade peculiar elasticidade; apenas

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estão a mostrar a correta idéia de unidade e consolidação

As mesmas dificuldades na conceituação são referidas por Caio Mário, optando, também, poraquele critério supramencionado ao definir a propriedade como "o direito de usar, gozar e dispor da

coisa, e reivindicá-la de quem injustamente a detenha".45 É o que se apreende do textocodificado brasileiro. Apresenta Caio Mário o jus utendi como a faculdade de colocar a coisa aserviço do titular, sem modificação na sua substância; o jus fruendi como a percepção de frutos,naturais ou civis; o jus abutendi como a disponibilidade, atributo que tem o sentido do jusdisponendi, e não o de abusar ou destruir a coisa; e finalmente, a rei vindicatio, pela qual oproprietário vai buscar a coisa daquele que a possui injustamente e consagrada na jurisprudênciabrasileira a ação do proprietário não possuidor contra o possuidor não proprietário. A qualidade deposse injusta não se apura - tão-somente pela interpretação a contrario sensu do art. 489 do CC,

pois a jurisprudência, a exemplo do acórdão do TJPR, 2.ª Câmara, julgado em 21.9.77,46 entende,diante de casos concretos, que a significação de posse injusta, na revindicatória, é tomada emsentido amplo, não tendo, necessariamente, que ser viciosa, bastando que seja sem direito depossuir.

Evidente que a isso é possível contradizer com o argumento de que sei trata de uma exacerbaçãodo abrigo legal, ao proprietário, numa demonstração que foge à mera legalidade e édogmaticamente insustentável no juízo petitório.

Vale referir que, acerca do conteúdo da propriedade, é interessante o que apresenta a parte geraldo estudo de Sérgio de Andréa Ferreira, tratando do exercício e limitações da propriedade. Édiscutível, porém, em certo sentido, sua afirmação de que o direito de propriedade, "emborabásico em nosso sistema de direitos individuais e econômico-sociais, não é um direito fundamental,

no sentido em que o é a liberdade pessoal".47 Em tese, isso é correto. Realmente no sistemajurídico positivo brasileiro, no qual sé insere a propriedade na categoria dos direitos individuais,seria erro grosseiro compará-la, quanto à essência ao direito à liberdade. Todavia, isso abstraído,é incompleto o entendimento extraído de análise que se faça da propriedade sem considerar que,em Sentido largo, a apropriação tem muito de estreito com o universo da liberdade individual.Afirmar o contrário corresponde a defender aquela posição cristalizada pelo liberalismo econômicoe pela exacerbação do individualismo.

Por outra parte, o direito real de propriedade - plena in repotesta - pode ser conceituado,consoante o Prof. Orlando Gomes, à luz de três critérios: o sintético, para o qual é a submissão deuma coisa, em todas as suas relações, a uma pessoa o analítico, para o qual é o direito de usar,fruir e dispor de um bem, de reavê-lo de quem injustamente o possua; o descritivo, para o qual éo direito complexo, absoluto, perpétuo e exclusivo, pelo qual uma coisa fica submetida à vontade

de uma pessoa, com as limitações da lei.48 Como se vê, a caracterização do definido éidentificada com o seu conceito. De qualquer modo, válido é o esforço e, como reconhece OrlandoGomes, a definição, mesmo deficiente isoladamente, dá uma noção suficientemente clara a.odireito de propriedade. Explicita Orlando Gomes que é direito complexo em face do feixe de direitosconsubstanciados nas faculdades de usar, gozar, dispor, e reivindicar a coisa que lhe serve deobjeto; é absoluto porque, de um lado, confere ao titular o poder de decidir se deve usar a coisa,abandoná-la, destruí-la ou limitá-la, pelo desmembramento e de outro, porque o oponível ergaomnes; é perpétuo porque tem duração ilimitada e não se extingue (somente) pelo não uso; e éexclusivo dado o jus prohibendi, que consiste no poder de proibir que terceiros exerçam sobre acoisa qualquer intervenção. Para tanto, a nível instrumental, o Direito fornece ao proprietário Osmeios de defesa ou recuperação da coisa. Na hipótese de que tem o proprietário a posse, farta éa jurisprudência que se amolda à concretização dó jus prohibendi. É o caso da reintegração deposse; a propósito, depara-se com acórdão da 2.ª Câmara Cível do TJRS nos autos de Ap. 5.536,julgado em 29.5.73, onde consta que, "se o domínio do imóvel foi transferido, e se erapreexistente o, como dato denunciado, evidentemente também operou-se a transferência daposse indireta, detida pelo anterior proprietário. Em conseqüência, as ações (no caso é areintegratória) que competiam ao antigo senhor também passaram ao novel titular do domínio".Assim, a transferência do domínio importa, em tese, a transferência da posse, com o mesmo

colorido que à detinha o anterior proprietário.49

Na, doutrina estrangeira os obstáculos à conceituação não são menores e os rumos tomados para,suplantá-los não são diversos. Reconhece Martín Wolff que o conceito de propriedade é denatureza equívoca, ministrando ensinamento já esposado por parte da doutrina brasileiraretrocitada: "En el lenguaje corriente, perto también en la terminología científica, se usa a veces

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en un sentido amplio, sociado a la idea político-sociológica de patrimonio, y otras veces en unaacepción más estrecha pero contenida en la primera, que permite distinguiria como un derechoespecífico frente a otros derechos patrimoniales. La primera acepción, la másamplia, es también laadoptada por el Derecho Constitucional; el desarrolo de la segunda, más estricta, corresponde a la

dogmática del Derecho Privado".50 Aduz Martín Wolff que a propriedade somente pode ser definidarelativamente, isto é, em relação a um ordenamento jurídico e social historicamente dado. Doponto-de-vista dogmático, o direito de propriedade é um direito subjetivo de índole especial, quenão se confunde com as faculdades particulares contidas na propriedade. Fora a abstraçãoconceitual, o conteúdo da propriedade a que finda por defini-la, inclusive a distinguindo dosdireitos reais limitados.

PugliaHi procede a um longo estudo sobre a definição da propriedade no novo Código Civil(LGL\2002\400) italiano, iniciando por reconhecer que "sono a tutti note le interminabili polemiche

suscitate dai tentativi di dare una definizione, della proprietà".51 Para ele, a definição dapropriedade, com base no novo texto legislativo pode ser expressa nos seguintes termos: "Laproprietà e il diritto reale fondamentale avente per coptenuto la facoltà di godimento pieno edesclusivo della cosa da parte dei proprietario con i limite, gli oneri e gli obblighi specifici stabilitidall" ordinamento giuridico".

Como se vê, a definição também se dá tendo em mira o conteúdo do direito de propriedade, apartir do fato, ressaltado por Trabucchi, de que o Codice não definiu o direito de propriedade masindicou o seu conteúdo.

Pacchioni, ao tratar do conceito de propriedade no antigo e no novo Código Civil (LGL\2002\400)italiano, afirma que o novo Código mantém a propriedade individual, condicionada a uma funçãoeminentemente social:

"La proprietà dunque, secondo il nostro Codice, e individuale, ma tale è entro i ilimite postodall'ordinamento giuridico dello Stato, che assegna ad essa una funzione sociale. Fra i dui estremiopposti di una proprietà individuale ilimitata e incontrollata, e dell'abolizione della proprietà privata,il nostro nuovo Codice Civile ha saggiamente preferito conciliare, nel modo che si e ditto, la tuteladell'individuo e quella della intera società, dando alla proprietà individuale conservata como base

del nostro ordinamento economico-giuridico una funzione piu spiccatamente sociale".52 Essasíntese, ao que parece, é aplicável não somente ao Direito italiano, mas também em grande partedo Direito contemporâneo ocidental.

3.2 O objeto jurídico do direito de propriedade

Em preliminar, cabe referir que a abordagem em tela não compreende a propriedade públicarelativa a certos bens. As peculiaridades e extensão do tema não permitem tratá-lo nessepequeno estudo. A propriedade pública ou do Estado é matéria dos tratados de DireitoAdministrativo, mesmo quanto aos bens dominiais, e em nossa abordagem tem maior ou menorinteresse à medida que se intensifica ou atenua a intervenção do Estado no domínio econômico.Em nosso sistema, fundamental é a propriedade particular ou privada, ainda que histórica, e

originariamente todos os bens 'pertenceram ao domínio público.53

Feita essa ressalva introdutória, é de bom alvitre frisar que a matéria relativa ao objeto jurídicotem relevância a partir da verificação da importância que tem o conteúdo do direito real depropriedade para caracterizá-la. Outra advertência necessária é a de que as realidades jurídicasreferidas adiante servem apenas para exemplo e argumentação, como ocorre com a menção dodireito autoral e da propriedade superficiária.

"Na problemática conceitual da 'propriedade não se pode omitir uma palavra sobre o seu objeto",diz Caio Mário, adiantando que, em tese, todos os bens são apropriáveis, isto é: o homem, comosujeito da relação jurídica, tem a faculdade de dominação sobre todas as coisas dentro dos limitese restrições legais. Em diferentes contextos sociais, portanto, em diferentes ordenamentosjurídicos, essa tese sofre a correspondente graduação. Em nosso sistema jurídico a noção depropriedade pode abranger os bens corpóreos e os incorpóreos. "É certo - reconhece, ainda, CaioMário - que em puro rigor, a condição de sujeito de direito sobre bens incorpóreos se designa poroutros apelidos. É certo, também, que os direitos de autor na atualizada revisão terminológica econceitual desbordam da relação dominial. Mas à amplitude semântica do vocabulário jurídico não

repugna designar a titularidade dos direitos sobre bens "incorpóreos de propriedade".54

Desse ponto emerge o problema da extensão do direito de propriedade, especialmente da

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propriedade imóvel em relação ao solo, subsolo e ao espaço aéreo. A preferência do art. 526 doCC brasileiro pelos critérios da utilidade - em toda a extensão útil ao exercício - e do interesse nãopode opor-se o proprietário a trabalhos até onde não tenha interesse em impedi-los. Essa questãoacaba revelando que, em algumas realidades jurídicas, as distinções entre o Direito Público e oPrivado são relativamente tênues. A propriedade superficiária, mencionada adiante, é nessecontexto exemplo disso.

Arnoldo Medeiros da Fonseca, ao discorrer sobre os direitos reais, refere-se à noção de coisa,dando notícia da bipartição dos direitos reais em moterivis e intelectuais, propugnada, inclusive,pela tese de doutorado de Rigaud (Le Droit Réel. Histoire et Théorie. Son Origine Institutionnelle,1912). Refere-se, também, à divisão proposta por Prodan em direitos reais jurídicos e direitos

reais gerais.55 No fundo dessa questão terminológica está o problema de inserir-se no bojo doconceito de propriedade a chamada propriedade imaterial.

A controvérsia é patente. Orlando Gomes entende que a propriedade incorpórea não pode serassimilada à propriedade, sendo uma quase-propriedade. Subsiste, segundo o Orlando Gomes, a

doutrina de que o objeto do direito de Propriedade não pode ser senão bens corpóreos.56

Fundamenta essa posição pelos seguintes argumentos: 1) o objeto do direito de propriedade há deser coisa especificamente determinada; 2) o objeto há de ser materializado ou corporificado,havendo tantos direitos de propriedade quantos os bens. Está com razão o Professor, na esteirade Wolff, ao afirmar que à propriedade imaterial não se aplica o regime jurídico da propriedadecorpórea, o que não corresponde a negar naquele caso a existência da propriedade, mas tão-somente o fato de que (com acerto) o caso em exame não se submete ao clássico regime dodireito real.

Nessa linha, ao tratar do objeto do direito, afirma Enneccerus que se denominam "objeto" quasetodos os objetos dos direitos, incluindo os objetos materiais (coisas) e os imateriais. Essaaparente restrição ao conceito de coisas não retira do universo do objeto do direito bensimateriais, muito embora a referência direta sempre leve a pensar nesse sentido limitado de que

nos fala Enneccerus: "Sólo son cosas en sentido legal los objetos corporales".57

Mesmo com esse esforço, a tendência doutrinária observada é a de reduzir o conceito de coisa aobjeto material, que seria o único suporte do direito real.

Gatti faz distinção entre o objeto do direito real do ponto-de-vista interno que é a coisa mesma -e do ponto-de-vista externo - que é a conduta de abstenção do sujeito passivo do direito real. O'que nos interessa é o primeiro aspecto, sobre o qual se pronuncia o Código Civil (LGL\2002\400)argentino, definindo: coisas são os objetos materiais suscetíveis de ter um valor; bens são objetossuscetíveis de valor; e o conjunto de bens de uma pessoa constitui seu patrimônio. Assim, osbens compreendem os objetos imateriais e as coisas, objetos materiais ou corporais. EsclareceGatti:

"Entre los conceptos de bien y de cosa existe una relación de género y especie. Los biens puédenser de dos clases: corporales e incorporales, o lo que es lo mismo, materiales o inmateriales.Cuando los bienes son corporales e inmateriales, no existe término que los designe, por lo cual, o

bien se emplean aquellas expresiones (bienes que no son cosas)".58 A questão surge exatamenteaí: em relação aos bens que não são coisas. Conclui taxativamente Gatti, após longo estudo, quesem coisa, isto é, sem objeto material ou corpóreo que lhe sirva de suporte, é impossível aexistência de direito real. Os direitos constituídos sobre bens que não são coisas, para utilizar suaexpressão, constituem categoria especial de direitos, cujo regime não se confunde com o dodireito real. Veremos isso adiante, a ferirmos sucintamente a problemática do direito autoral.

a) A propriedade superficiária

Mesmo em síntese, cabe referir algumas variações do tema em face de diferentes ângulos por quese pode enfocar o conteúdo do direito de propriedade. Um novo enfoque aos jus aedificandi traz

em relevo o direito de superfície, advertência, de certo modo, já feita por Gastone Martini.59

Além disso, o projeto 634/75 do novo Código Civil (LGL\2002\400), no art. 1.263, inclui entre osdireitos reais, logo após a propriedade, o de superfície, à qual o projeto dedica oito artigos no tít.IV do Livro III, que trata do Direito das Coisas. O Prof. Miguel Reale, supervisor da ComissãoElaboradora e Revisora do Código Civil (LGL\2002\400), em exposição ao Ministro da Justiçapublicada pelo DCN de 13.6.75, destacou "a substancial alteração feita na enumeração taxativados direitos reais, entre eles se incluindo a superfície".

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Elogiando a atitude, Jackson Rocha Guimarães afirma que "a inclusão da superfície na enumeração'

dos direitos reais foi uma orientação sábia do projetista de 1972".60

Parcas são as abordagens do direito de superfície pelos autores nacionais contemporâneos,realidade compatível com a exclusão que fez o Código Civil (LGL\2002\400) desse direito real aoelencar taxativamente os tipos reais no art. 647 vigente. Clóvis Beviláqua justificou a exclusãopelo fato de que o princípio consagrado pelo atual CC no art. 43 considera a superfície como partecomponente do solo, que não se desprenderia dele para constituir um jus in re aliena. OutrosCódigos contemporâneos, como o recente Código Civil (LGL\2002\400) português, capitulam odireito de superfície (t. V do Livro III) com sentido ligeiramente oposto ao entendimento acima deClóvis Beviláqua: "O direito de superfície consiste na faculdade de construir ou manter, perpétuaou temporariamente, uma obra em terreno alheio, ou de nele fazer ou manter plantações" (art.1.524 do Código português). Na Itália Trabucchi dá os caracteres básicos do instituto, abordando

as hipóteses de direito de superfície do Código Civil (LGL\2002\400) italiano.61 Pacchioni, ao

estudar o Codice em vigor, também trata da matéria, com breve retrospecto histórico.62

A matéria é realça da com novas considerações acerca do direito de superfície, destacando-o dapropriedade como tal.

O relevo tem ainda maior razão de ser em face do ordenamento urbanístico das cidadescontemporâneas.

A propriedade superficiária, patamar ainda a ser explicitado, entre nós, do direito de propriedade,fica a merecer, especialmente frente à tipologia real do direito expectativo, tratamento doutrináriocompatível; cujo solo fértil é tema que de per si, merece dissertação, longa e acurada.

b) A propriedade na ordenação urbanística

Muito embora residam dogmaticamente no âmbito do Direito Público, as limitações edilícias,constituindo-se em restrições ao exercício do direito de propriedade, correspondem ao progressivoentendimento contemporâneo acerca da sobreposição dos interesses coletivos aos privados. Já sedisse que o ordenamento estético urbano consiste em exemplo manifesto desta tendênciaindisfarçável em relação à propriedade.

Diz J. M. de Carvalho Santos que a propriedade, no seu conceito moderno, está sujeita arestrições não só impostas pela utilidade pública e interesses da coletividade, mas a outras

motivadas por interesses particulares oriundos da solidariedade social.63 As restrições ao uso dapropriedade, especialmente no concernente às edificações em concentrações populacionais,revelam que seu aspecto crucial se assenta no direito de propriedade, como reconhece San Tiago

Dantas ao tratar dos direitos de vizinhança.64

A propósito, ensina Diogo de Figueiredo Moreira Neto que "as limitações administrativas edilícias,objeto e estudo do Direito Administrativo, são imposições públicas, universais, gratuitas,unilaterais, definidas em leis ou regulamentos, que reduzem o uso da propriedade fundiária no

interesse público da segurança, salubridade e estética das comunidades".65 A defesa estética dascidades, consoante o Prof. Dalmo Dallari, é, efetivamente, preocupação antiga, à qual nos últimos

tempos tem sido imprimido maior zelo.66 Nota Bielsa, ao tratar das restrições e servidõesadministrativas, que a "preocupação do Poder Público, com relação à arquitetura e àornamentação das cidades, teve a sua origem no Direito Romano, no seu período imperial, quandoforam traçadas numerosas disposições sobre o assunto. Numerosas eram as restrições impostaspelas leis romanas por motivos estéticos, como, p. ex., a proibição da retirada de colunas que

embelezavam a casa".67 A legislação reinícola de Portugal, especialmente as Ordenações Filipinas,evidenciaram uma preocupação acentuada pela estética das cidades, sem chegar, porém, àsminúcias do estabelecimento de normas para determinação de estilos. O Direito brasileiro, naesteira das tradições angariadas daqueles diplomas legais, permitiu às Municipalidades a fixação deposturas. Com o advento do Código Civil (LGL\2002\400) o vicinato recebe restrições legais,inclusive de ordem, estética. Hoje, com a relevância auferida pelo Direito aplicável à propriedadeurbana, tomaram ainda maior fôlego as formas de intervenção do Poder Público na propriedadeprivada, promovendo a efetivação do poder de polícia ou, mesmo, disciplinando as relações entreparticulares, como revelam as normas administrativas, a exemplo dos códigos de posturas, e aprópria jurisprudência, inclinada a dar guarida à proteção estética da urbe.

Julgado interessante é o contido no ac. 16.191, de 11.10.78, da 4.ª Câmara Cível do TJPR, na Ap.

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1.971/76: "As construções urbanas estão sujeitas a uma série de limitações, quer de origem danossa lei substantiva, o Código Civil (LGL\2002\400), ou administrativa, das quais se origina opoder de polícia das Municipalidades". No caso em pauta, em que o Município promoveu em juízo ocumprimento de norma edilícia; disse mais, o Tribunal: "É inquestionável, no caso, o direito doautor de, exercendo seu poder de polícia, estabelecer o controle técnico-funcional das edificaçõesurbanas do âmbito de sua competência, pois, no sentido de assegurar a higiene, a estética, acomodidade e a segurança, pode ele, validamente, expedir prescrições reguladoras dessasconstruções, exigindo, para sua melhor fiscalização, que os proprietários, antes que construam oureformem, obtenham, para tanto, a necessária licença".

As decisões do STF encontram-se direcionadas para esse entendimento. A exemplo acórdãounânime da 2.ª Turma, de 16.6.46, dando como lícitas as restrições impostas em posturasmunicipais ao direito de construir, no interesse coletivo; outra decisão no acórdão" da 1.ª Turmano RE 67.298, concernente às restrições em condomínios de apartamentos: "A fachada de umedifício de apartamentos compõe um conjunto arquitetônico, projetado por artista especializado.Os condôo minas adquirem seus apartamentos não só porque o interior das unidades imobiliáriassatisfaz suas necessidades de moradia como, também, porque o exterior do edifício agrada seu

gosto artístico".68

O fundamento constitucional que condiciona a propriedade ao bem-estar coletivo, substrato últimodas limitações, é encontrado na jurisprudência. Assim julgou a 1.ª Turma do STF ,no RE 76.864:

"O direito de construir deve ser exercido em harmonia com os regulamentos administrativos, atéporque a Constituição Federal (LGL\1988\3) garante a propriedade, mas a erige em função

social".69

c) A propriedade, imaterial

Referindo que as diversas formas de propriedade intelectual incluem o direito do autor, a patentedo inventor, entre outras, Clóvis Beviláqua já destacava, num lance de clarividência jurídicaencontrada em sua defesa do projeto, de Código Civil (LGL\2002\400), que seria possível quetodos os direitos do autor, mais tarde, se reunissem para constituir um corpo de leis à parte, o

Código dos Direitos Intelectuais.70A matéria também interessa ao conteúdo do direito depropriedade e de modo direto à fixação de, seu objeto. O Cons. Joaquim Ribas alertava que adivisão entre coisas corpóreas e incorpóreas não pode ser olvidada frente ao que chamou deestado atual da jurisprudência pátria e estrangeira, dando conta de graves objeções acerca de

sua admissão nos Códigos modernos, referindo-se à opinião contrária de Teixeira de Freitas.71

Ao que parece, Gatti enveredou firme pelo caminho apontado por Teixeira de Freitas, ao entenderque "sin un objeto, material o corporal que le sirve de soporte, es imposible la existencia del

derecho real".72 Para Gatti, nada mais errôneo do que considerar a propriedade intelectual umdireito real. Os direitos intelectuais constituiriam categoria independente de direitos, uma terceiraespécie de direitos patrimoniais, ao lado dos pessoais e dos reais.

O Prof. Luiz M. Correia menciona o duplo aspecto do direito autoral, que se insere nesse contexto,nos seguintes termos: "é pessoal, porque, realmente, como disse Bluntschil, a obra tem um valorpecuniário, entra para o acervo de nossos bens, para a composição do nosso patrimônio, e recai

sobre uma coisa tangível: o livro, o painel, o fuste de coluna, a estátua, qualquer obra d'arte".73

Em oração de abertura do III Ciclo de Estudos Autorais, proferida no Salão Nobre do SenadoFederal, em Brasília, em 1976, o Prof. Antônio Chaves destacou que "a relevância do direito deautor está intimamente relacionada com a própria importância da criação intelectual: origem,

base, desenvolvimento de tudo quanto existe de belo e de construtivo no mundo".74 Refere-se,ainda, à promulgação da Lei 5.988, de 14.12.73, e do Dec. 76.275, de 15.9.75, que organizou oConselho Nacional de Direito Autoral, como marcos importantes da evolução do direito do autor.

O tema, aqui, é apenas tocado para ilustrar a complexidade na determinação do objeto do direitode propriedade. Vale dizer, também, que a jurisprudência tem-se ocupado com interessantematéria sobre o direito do autor, cabendo mencionar acórdão de 12.12.78 da 1.ª Câmara do 1.ºTACivSP, no qual consta da manifestação do então relator, Dr. Carlos Ortiz, no sentido de que "acriação intelectual é a determinante da classificação de uma obra como literária, artística oucientífica, cobrindo o seu autor com a proteção constitucional que lhe assegura o direito exclusivode utilização". No caso concreto, decidiu-se, nessa linha, com acerto, que, compilar ou coletartextos de leis, arrumando-os com índices e remissões em rodapés, ainda que constitua prestação

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que exige gabarito técnico e trabalho exaustivo de pesquisa, não chega a constituir criaçãointelectual científica, e muito menos artística ou literária. Os limites entre o que é e o que não éfruto da criação podem merecer, casuisticamente, discussão. O relevante é evidenciar amovimentação da máquina judiciária para dirimir litígios oriundos da chamada propriedadeimaterial.

d) A propriedade industrial

Breves palavras merece, também, a chamada propriedade, industrial. Segundo Tavares Paes, "apropriedade recai" sobre, bens materiais (res quae tangi possunt) e imateriais, (res quae tangilton,possunt, quase in jure consistunt). Nestes últimos - que nos interessam neste passo - incluem-se

a propriedade artística, a propriedade industrial e a propriedade literária."75

A Lei 5.772, de, 21. 12.71, regula, entre nós, a propriedade industrial. É o Código da PropriedadeIndustrial, a regular o direito industrial, autônomo, com princípios próprios e institutos peculiares.

Consoante o art. 5.º desse Código, o autor de invenção, de modelo de utilidade, de modeloindustrial e de desenho industrial tem o direito de obter patente que lhe garanta a propriedade e ouso exclusivo nas condições da lei. Estribado em Edoardo Bosio (Le Privative Industriall nel DirittoItaliano, Turim, UTET, 1891, n. 2), Tavares Paes, afirma que "nem no Direito Romano este direitoviera regulamentado, podendo-se, quando muito, incluí-lo nas res incorporales isto pela pouca

valia com que era tido o trabalho manual à época, privativo dos derrotados e dos escravos".76 Apartir de 28.4.1809 o Brasil passou a proteger legalmente o direito às invenções. A ConstituiçãoImperial assegurou aos inventores direitos sobre suas produções. Em 1830, alguns anos após,alteração legislativa permitiu maior eficácia à proteção daqueles direitos, sendo que,ulteriormente, passou a vigorar a Lei 3.129, de 14.10.1882. A primeira Constituição Republicana(LGL\1988\3) não ficou alheia à matéria e a Constituição de 1934 assegurou aos inventores seusdireitos, com a ressalva de serem qualificados de privilégios temporários, norma incorporada àConstituição de 1946. Na vigente Lex Maxima mantém-se a proteção constitucional. Consta daUniversal Declaration of Human Rights, art. 27, n. 2, que todo indivíduo tem direito à proteção dosinteresses morais e materiais que lhe correspondam por motivo das produções científicas, literáriase artísticas de que seja autor.

Acerca da patente de invenção, Vicente Ráo e José Frederico Marques, em parecer publicado,entendem que, "com a patente, concretiza-se o privilégio, uma vez que este não resulta dosimples fato da criação intelectual... A patente destina-se a premunir o inventor contra os riscosa que ficaria exposta a divulgação do invento.

Ela é que assegura, como a Constituição imperativamente determina, a todo inventor, o privilégio

temporário de explorar e usufruir seu invento".77

Arremata Pontes de Miranda afirmando que, em vez de definir invenção, a lei determina ospressupostos para a patenteabilidade. Assim, entende que, tratando-se de novo modo de fabricarprodutos industriais, de máquina ou de aparelho mecânico ou manual para a fabricação de taisprodutos, ou de novo produto industrial, ou processo para se conseguirem melhores resultados, há

invenção industrial.78

4. Do conceito jurídico-positivo: Os conceitos legais, o projeto 634/75 e o DireitoComparado

Os conceitos legais, o projeto 634/75 e o Direito Comparado

O art. 524 do nosso CC não dá, de modo direto, um conceito 'do direito de propriedade,inclinando-se a elencar os poderes e faculdades inerentes ao seu conteúdo, que é o mais extensodos direitos reais. Essa é a orientação predominante nas codificações, propiciando, assim, quevenha a lume uma conceituação implícita, ,derivada da caracterização do direito de propriedade,como bem evidenciou a doutrina já examinada.

"O sentido clássico do direito de propriedade não é, evidentemente, alterado pelo projeto 634/15.Aliás, da redação do art. 524 ("Alei assegura ao proprietário o direito de usar, gozar e dispor deseus bens, e de reavê-los do poder de quem quer que injustamente os possua") não difere aredação do art. 1.266 do projeto ("O proprietário tem ,a faculdade de usar, gozar e dispor dacoisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua, ou a detenha").A troca do termo "direito" por "faculdade" em relação ao jus utendi, fruendi et abutendi atende aosentido desses poderes do proprietário, diferenciando tal faculdade do direito de reaver a coisa. A

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inclusão da noção de detenção no texto do projeto não altera o sentido do anterior, pois aprecariedade' é um dos vícios que pode caracterizar a posse injusta.

O direito de propriedade enquadra-se no exame dos direitos reais na legislação comparada.Consoante os autores pátrios, o Código Civil (LGL\2002\400) brasileiro recebeu, nessa matéria,influência dos Códigos de Portugal, da Alemanha e da França, muito embora nosso diploma civilnão se tenha sujeitado exclusivamente a qualquer desses sistemas. Em relação à propriedade,manteve-se, nos termos do Prof. Orlando Gomes, fiel à concepção individualista, sem acolher suasexagerações: "Embora tenha seguido a orientação alemã quanto à necessidade da transcriçãopara a aquisição do direito de propriedade dos imóveis, não adotou o sistema da publicidade

material, nem o princípio da abstração da causa".79

O BGB também não define diretamente o que se entende por Eigentum. O § 903 do CC alemãodispõe que "o proprietário de uma coisa pode, sempre que a lei ou o direito de um terceiro não se

opuser, dispor da coisa à sua vontade e excluir outros de qualquer intromissão".80

Não difere dessa posição o Código Civil (LGL\2002\400) suíço ao dispor, no art. 641: "Leproprietaire d'une chose a le droit d'en disposer librement, dans les limites de la loi" indicando

indiretamente os elementos do direito de propriedade.81

O primeiro artigo do Código Civil (LGL\2002\400) português que trata do direito de propriedaderefere-se ao objeto desse direito, limitando-o às coisas corpóreas. Adiante, o art. 1.305.º tambémtrata do conteúdo do direito de propriedade, em direção similar à do nosso Código: o proprietáriogoza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que le

pertencem, dentro dos limites da lei e com observação das restrições por ela impostas.82

No mesmo sentido a disciplina positiva pelo Código Civil (LGL\2002\400) italiano, consagrada pelotít. II do Livro Terceiro, art. 832: "II proprietario lia diritto di godere e disporre delle cose in modo

pieno ed esclusivo, entre i ilimiti e con l'osservanza degli obblighi dall'ordinamento giuridico".83 Aseguir, o art. 834 contém disposição semelhante àquela estampada pela Constituição Federal(LGL\1988\3) brasileira ao garantir a propriedade, em sua plenitude, com exceção de regularprocedimento expropriatório: "Nessuno pua essere privato in tutto o in parte dei beni di suaproprietà, se non per causa di pubblico interesse, legalmente di chiara to, e contro il pagamento diuna giusta indennità".

No Código Civil (LGL\2002\400) mexicano é digna de menção a transição propugnada da tendênciaindividualista oriunda do Direito e da legislação napoleônica para a teoria progressista, queconsidera o direito de propriedade como meio de cumprir uma verdadeira função social. Não se,considera a propriedade como um direito individual; mas sim como um direito mutável, que devemodelar-se às necessidades sociais. Ao tentar positivar tais intenções, o Código Civil(LGL\2002\400) do México agravou a intervenção do Estado em matéria de expropriação: "Lapropiedad no puede ser ocupada contra la voluntad de su dueño, sino por, causa de utilidadpública y mediante indemnización" (art. 831): No mais, a orientação não discrepa dos diplomaslegais referidos, dispondo o art. 830 desse Código que "el propietario de una cosa puede gozar y

disponer de élla con las limitaciones y modalidades que fijen las leyes".84

O Direito soviético difere dos sistemas jurídicos que têm como substrato o regime capitalista.

O Prof. Orlando Gomes, a respeito da aplicação (prática) da doutrina marxista, reporta-se aosistema soviético, "no qual foi abolida a propriedade privada dos bens de produção e mantida a

dos bens de usos e consumo".85A propriedade socialista dos meios de produção desdobra-se emestatal - a terra, as águas, as minas, as florestas, as fábricas, as usinas, os bancos, as ferrovias,a navegação marítima, fluvial e aérea, as instalações telegráficas, telefônicas e radiofônicas,entre outras - e em cooperativa. Sobre os bens de uso e de consumo - p. ex., as residências -mantém-se propriedade individual, que consiste em exceção ao princípio da municipalização dos

prédios.86 A propósito, lembra Orlando M. Carvalho que "a Constituição considera tal sistemaeconômico como preponderante, mas não exclusivo. Étolerada a existência da pequena economia

privada de camponeses individuais e, artesões, baseada em seu trabalho pessoal".87 A luta pelasocialização da propriedade, na União Soviética, verifica-se desde a Revolução de Fevereiro. Apartir de 1917 concretiza-se, paulatinamente, a estatização das terras e dos bancos.

Dispõe o art. 4.º da CF (LGL\1988\3) soviética de 1936 que "a base econômica da URSS consisteno sistema econômico e na posse socialista dos utensílios e meios de produção ... com abolição da

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propriedade privada .. . e com a eliminação da exploração do homem pelo homem".88 O preceitoconstitucional estabelece que a propriedade do Estado é do próprio povo, ao lado de propriedadecooperativa coletiva (art. 5.º). A Constituição da URSS garante o "direito de propriedadeparticular dos cidadãos aos proventos do seu trabalho, de suas economias, de sua pequenacultura, de instrumentos de uso doméstico "e utensílios, de objetos de uso pessoal, assim como odireito de herança de bens pessoais" (art. 10). A lei também permite "empresas particulares empequena escala, sejam de camponeses ou artesãos" (art. 9.º). Frisam E. K. Hunt' e Howard J.Sherman que a economia é planejada, portanto, centralmente, pois a grande maioria das terras e

das fábricas é de propriedade pública.89

E o que caracteriza a propriedade exclusiva do Estado? Redargúi Raísa Jalfina: "En primer lugar,son cosas que pueden, entregarse a empresas, organizaciones (entre ellas, organizaciones

estatales) y a ciudadanos únicamente en usufructo".90 O Estado, além disso, disciplina e controlaa utilização do bem dado em usufruto. Como a propriedade é realmente a principal (ou, pelomenos, uma das principais) categoria econômica própria de cada sociedade, esse regime diverso éfruto de diversas relações sociais e econômicas, como a pequena síntese retro evidencia.

5. Conclusão. Bibliografia

No presente estudo observamos em três perspectivas a questão ela conceituação do direito depropriedade: a histórica, a doutrinária (no seio da Ciência Jurídica) e a legal. A opçãometodológica não buscou, evidentemente, esgotar a matéria, ou apresentar conceito uno e rígidonem apresentar angulações rígidas, ou estanques.

No prisma histórico-sociológico verificou-se que a cada momento histórico corresponde umacaracterização da propriedade. A transformação das relações sociais, quando profunda, sempreatingiu o instituto da propriedade, amoldando-o ao novo status quo.

Na visão dos juristas, inseridos exclusivamente no campo do Direito, evidencio-se entendimentorelativamente uníssono, indisfarçável comunhão acerca desse direito real, em cuja definição sãoutilizados os elementos que constituem seu conteúdo; Um dos problemas encontrados naconceituação é a indefinição doutrinária acerca do objeto do direito real de propriedade, valedizer, em relação à sua amplitude ou extensão. A acepção ampla de que propriedade é o domínioou qualquer direito patrimonial comporta em seu bojo a propriedade imaterial, ao menos no queera tem de patrimonialidade. Em sentido mais restrito, reduz-se a propriedade às faculdades deusar, gozar e dispor da coisa corpórea e ao direito de reavê-la de quem a possua ou detenhainjustamente. O direito real, em si, é, no caso pleno, complexo, absoluto, hipoteticamenteperpétuo e exclusivo.

Colocada a definição neste ângulo, exsurge a discussão acerca do objeto do direito depropriedade, centrada basicamente na chamada propriedade imaterial. Inobstante as váriasposições sobre o tema, a titularidade dos direitos sobre bens incorpóreos corresponde à noção depropriedade, mesmo de modo peculiar ou especial, deixando de lado alguns caracteres dapropriedade enquanto direito real. Outras variações do conteúdo da propriedade, como o direito desuperfície, algumas manifestações das restrições de direito público ao exercício da propriedade, odireito derivado da propriedade intelectual, a invenção na propriedade industrial etc., pelo menosalargam a discussão pertinente ao objeto da propriedade.

No plano legislativo denota-se a opção dos Códigos pela não conceituação direta do direito real depropriedade, seguindo o caminho da caracterização desse instituto pelo seu conteúdo. Há umaconceituação implícita ou indireta emanada da fixação dos poderes, faculdades e direitos dosproprietários. Assim é no Direito pátrio, bem como no Direito estrangeiro estudado. À luz do DireitoComparado, destacou-se o Direito soviético com as suas peculiaridades.

Conclui-se, por conseguinte, que, em perspectivas distintas, são encontradas diferentesrespostas à conceituação do direito de propriedade, evidenciando-se que, em sistemas cujasrelações sociais que formam o substrato do regime jurídico não apresentam de um contexto paraoutro alterações ou discrepâncias fundamentais, mantém-se similar a postura conceitualdogmática do direito de propriedade, constituindo um núcleo comum. A reunião dos enfoqueshistórico, doutrinário e jurídico-positivo permite, ao menos, vislumbrar o universo da conceituaçãodesse instituto, sendo relativamente suficiente para um estudo breve e modesto fornecer umsucinto retrato escrito dessa realidade jurídica.

Bibliografia

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* Nota doAutor: Dedico o presente trabalho ao Dr. José Manuel de Arruda Alvim Netto, exemploímpar de Jurista e Mestre.

26. H. Chambre, De Marx a Mao-Tsé-Tung - introdução Critica ao Marxismo-Leninismo, São Paulo,p. 289.

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1. Roger Garaudy, Marxismo do Século XX. 2. José de Oliveira Ascensão, O Direito, Introdução e Teoria Geral (Uma Perspectiva Luso-Brasileira), p. 504. 3. Orlando Gomes, conferência "A função renovadora do Direito", Revista da Faculdade de Direitoda UFPR 12/39 e ss. 4. R. Limongi França, Manual de Direito Civil, v. 3.º/104. 5. Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, 4.ª ed., v: IV/71. 6. Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil Brasileiro, v. 4.º/85. 7. Antônio. Castanheira Neves, Questão de fato - Questão de Direito ou O Problema Metodológicoda Juridicidade (Ensaio de uma Reposição Critica), p. 906. 8. Friedrich Engels, A origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado (trabalho relacionadocom as Investigações de L. H: Morgan), 5.ª ed. 9. Tristão de Athayde, Introdução ao Direito Moderno (O Materialismo Jurídico). 10. Arnoldo Wald, "Propriedade", in Repertório Enciclopédico do Direito Brasileiro, v. 42/117. 11. Caio Mário da Silva Pereira, ob. cit. 12. Washington de Barros Monteira, Curso de Direito Civil, 3.ª ed., p. 85. 13. Orlando Gomes, Direitos Reais, 3.ª ed., p. 112. 14. Leo Huberman, História da Riqueza doHomem,15.ª ed., p. 14. 15. José de Oliveira Ascensão; A Tipicidade dos Direitos Reais, p. 74. 16. Cf. Orlando Gomes, ob. cit. 17. Arnoldo Wald, ob. cit. 18. Jaime Augusto Cardoso de Gouveia, Construção Jurídica da Propriedade, Lisboa, Papelaria eTipografia Paulo. Guedes, 1919, p. 62. 19. Proudhon, O Que É aPropriedade?,2.ª ed. 20. Orlando Games, ob. cit., pp. 114, 123 e 127. 21. Henry George, A Doutrina Social da Igreja, incluindo A Condição do Trabalho e a encíclicaRerum Novarum. 22. Harold J. Lask, O. "Manifesto Comunista" de Marx e Engels, em apêndice A Significação doManifesto Comunista na Sociologia e na Economia, por J. A. Schumpeter, 2.ª ed. 23. Karl Marx, Manuscritos Econômico-Filosóficos e Outros Textos Escolhidos, 2.ª ed., p. 6. 24. Idem, O Capital - Crítica da Economia Política, v. II/881, "Produção da mais-valia absoluta eda mais-valia relativa", Livra I, Parte V. 25. Idem, O Processo Global da Produção Capitalista, v. IV/305, Livro III. 27. Eduardo Espínola, Posse, Propriedade/Compropriedade ou Condomínio/Direitos Autorais, pp.127 e ss.

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28. Idem, ibidem. 29. Karl Larenz, Derecho Civil - Parte General, p. 79. 30. Alberto Trabucchi, Istituzioni di Diritto Civile,26.ªed., p. 409. 31. Damenica Sarace, Espropriazione della Proprietà e Misura dell'Indennizzo, 1.ª Parte, p. 280. 32. Salvatore Pugliatti, La Proprietà nel Nuovo Diritto, p. 141. 33. Idem, ibidem. 34. Cf. Alvacir Alfredo Nicz, "A evolução constitucional do direito de propriedade", Estudo Jurídicos2/15 (revista da Universidade Católica da Paraná). 35. RTJ 81/473. 36. RT 489/99. 37. Arnoldo,Wald, ob. cit., v. 42/114. 38. M. M. de Serpa Lopes, Curso de Direito Civil, 2.ª ed., v. VI/226. 39. Cf. J. M. de Carvalho. Santas, Código Civil (LGL\2002\400) Brasileiro Interpretado, 9.ª ed., v.VII. 40. Washington, de Barros Monteiro (ab. cit., 21.ª ed., 1982. p. 82) reproduz as teorias daocupação, da lei (apoiada em Hobbes, Bossuet, Mirabeau, Benjamin Constant e Bentham, além deMontesquieu), da especificação e da natureza humana, essa a doutrina da Igreja Católica, járeferida. 41. Clóvis Beviláqua, Direito das Coisas, p. 127. 42. Lafayette Rodrigues Pereira, Direito das Coisas, v. I/97 e 98. 43. Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, 3.ª ed., t. XI/9. 44. Maria Helena Diniz, ab. cit., v. 4.º/84. 45. Caio Mário, ob. cit., v. IV/50. 46. RT 522/235. 47. Sérgio de Andréa Ferreira, O Direito de Propriedade e as Limitações e IngerênciasAdministrativas, p. 5. 48. Orlando Gomes, ob. cit., 6.ª ed., 1978, p. 99. 49. RT 458/231. 50. Martín WoJff, Tratado de Derecho Civil - Derecho de Cosas (comEnneccerus e Kipp). 3.ª ed.,t. 3.º, v. 1/321. 51. Idem, ibidem. 52. G. Pacchioni, Elementi diDiritto Civile, 4.ª ed., pp. 211 e 212. 53. Cf. J. O de Lima Pereira, Da Propriedade no Brasil (Estudo sobre a Origem e Formação daPropriedade no Brasil),p. 12: "verifica-se, assim, que osbens imóveis no Brasil, a princípiopropriedade exclusiva do Estado, passaram a constituir duas grandes classes, em relação às

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pessoas a que pertencem: a dos bens públicos e a dos bens particulares". Acerca da matériaapresenta-se bibliografia vasta, bem representativa da extensão do assunto, que não cabe emanálise breve 'e incidental. Dentre as estudas sobre a matéria ressaltam-se especialmente aquelesque de, per si já têm um, valor histórico, cama as abras de Paulo Garcia, Terras Devolutas, BeloHorizonte, Livraria Oscar Nicolai, 1959; J. Peçanha de Figueiredo; Terras Devolutas, São Paulo,Impressora Comercial, 1936; Mário de Assis Moura, Terras Devolutas, São Paulo, Saraiva, 1946;Ruy Cirne Lima, Terras Devolutas, Porto Alegre, Globo, 1935, e Sesmarias e Terras Devolutas,Porto Alegre, Sulina, 1954; Jacy de Assis, Ação Discriminat6ria, 1.ª ed., Rio, Forense, 1978; Altirde Souza Maia, Discriminação de Terras, v. 6, Fundação Petrônio Portella-MJ, Brasília 1982. Emperiódicos: Paulo Carneiro Maia, '"Sesmarias', RT 236/30-39, junho/55; Humberto Hayadt de SouzaMello, "Terras devolutas, Revista de Informação Legislativa 3-II/113-139, 1966; "As terraspúblicas no Estatuto das Terras", RDA 85/372-394, 1966; parecer do ex-Ministro do STF JoséCastro Nunes In RF 159/71-80, maio-junho 55; parecer de Pontes de Miranda In RF 145/91-99,1953. 54. Caio Mário, ob. cit., v. IV/86. 55. Arnoldo Medeiros da Fonseca, "Direitos reais, Repertório Enciclopédico do Direito Brasileiro, porJ. M. de Carvalho Santos, coadjuvado por José Aguiar Dias, v. XVIII/74. 56. Orlando Gomes, ob. cit., 6.ª ed., p. 101. 57. Ludwlg Enneccerus, Derecho Civil Parte General, 2.ª ed., t. I, v. 1/532. 58. Edmundo Gatti, Teoria General de los Derechos Reales. 2.ª ed., p. 193. 59. Gastone Martini, Disciplina Urbanistica e Tutela dello Patrimonio Storico, Artistico e Paesistlco,p. 145. 60. Jackson Rocha Guimarães, "O anteprojeto do Código Civil (LGL\2002\400) e o Direito dasCoisas", RT 452/278. 61. Trabucchi, ob. cit., p. 471. 62. Pacchioni, ob. cit., pp. 227 e ss. 63. Carvalho Santos, ob. cit., v. VII/5. 64. F. C. de San Tiago Dantas, O Conflito de Vizinhança e sua Composição, 2.ª ed. 65. Diogo de Figueiredo Moreira Neto, Curso de Direito Administrativo, p. 421. 66. Dalmo Dallari, Legislação Municipal e Direito de Construir, p. 55. 67. Rafael Bielsa, apud Themístocles Brandão Cavalcanti, Tratado de Direito Administrativo, p.445. 68. RTJ 51/333. 69. RTJ 71/812. 70. Clóvis Beviláqua, Em Defesa do Projeto de Código Civil (LGL\2002\400) Brasileiro, p. 119. 71. Joaquim Ribas, Direito Civil Brasileiro, p. 388. 72. Gatti, ob. cit., p. 87. 73. Luiz M. Correia, O Direito de Propriedade, o Domínio e Posse, Rio, ed. Jornal do Comércio,1920, p. 71. 74. RT 503/249.

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75. Paulo Roberto Tavares Paes, Propriedade Industrial, p. 1. 76. Idem, p. 72. 77. Vicente Ráo e José Frederico Marques, "Propriedade industrial", RT 511/47. 78. Pontes de Miranda, "Propriedade Industrial", RT 511/50. 79. Orlando Gomes, ob. cit., 6.ª ed., p. 398. 80. Código Civil (LGL\2002\400) Alemão, trad. do Prof. Souza Diniz, Rio, Record, 1960. 81. Code Civil Suisse, editado pela Chancellerie Fédérale, Berna, 1979. 82. Código Civil (LGL\2002\400) Português, por Jacinto Fernandes Rodrigues Bastos, 3.ª ed.,Coimbra, Livraria Almedina, 1972. 83. Codice Civile, por Rosario Nicolô e Adolfo Di Majo, Milano, Giuffrè, 1981. 84. Código Civil (LGL\2002\400), 51.ª ed., México, Editorial Porrúa, 1982. 85. Orlando Gomes, ob. cit., 3.ª ed., 1969. 86. Idem, p. 117. 87. Orlando M. Carvalho, URSS - Um Estado Socialista de Operários e Camponeses, p. 128. 88. Cf. Sidney e Beatrice Webb, URSS - Uma Nova Civilização, v. 2.º, Rio. 89. E. K. Hunt e Howard J. Sherman, Sistemas Econômicos Comparados. 90. Raísa Jalfina, El Derecho de Propriedad del Estado en la URSS.