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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
AVM – FACULDADE INTEGRADA
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
GUARDA COMPARTILHADA NA PRESPECTIVA DA
MEDIAÇÃO:
contribuindo na construção da parentalildade de pais separados
FLORINDA LOPES DA SILVA
ORIENTADOR: PROF. WILLIAM ROCHA
Rio de Janeiro 2016
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2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
AVM – FACULDADE INTEGRADA
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
Apresentação de monografia à AVM Faculdade Integrada como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em .Mediação em conflito com ênfase em família
GUARDA COMPARTILHADA NA PRESPECTIVA DA
MEDIAÇÃO:
contribuindo na construção da parentalildade de pais separados
Rio de Janeiro 2016
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AGRADECIMENTOS
Gratidão ao Cósmico por todas as oportunidades e especificamente por mais essa conquista. Ao meu orientador Prof. William Rocha pela disponibilidade. Aos queridos professores pela competência e entusiasmo pela Mediação.
Aos amados colegas de turma, amigos e festeiros
À minha filha, Flavia, pelo valioso apoio no mundo da informática.
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4
DEDICATÓRIA
.
4
Às minhas netas Anya e Laura que alegram a
minha vida e me impulsiona a vencer desafios.
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RESUMO
Este trabalho é o resultado de uma pesquisa bibliográfica acerca da
mediação relacionando-a a guarda compartilhada e aliada a minha experiência
e questionamentos de mediadora judicial. A proposta do estudo é aprofundar o
arcabouço teórico da mediação visando às ações de família, especialmente
nas de convivência e guarda concomitante a atuação do mediador. O público
alvo são os mediadores em exercício e não leigos, tendo em vista a
especificidade do tema. Na mediação todo processo deve ser realizado pelos
participantes. O mediador é o facilitador da comunicação que ajuda os
mediandos, através de técnicas e ferramentas, na compreensão de seus reais
interesses possibilitando mudanças na forma de lidar com o conflito e viabilizar
um possível acordo satisfatório para todos os envolvidos. Pretendemos trazer a
luz a discussão do impacto na família na pós separação, principalmente nos
filhos .e sistematizar o Modelo Linear: seu processo, técnicas e ferramentas a
fim de propiciar ao mediador de família subsídios para uma atuação segura e
adequada, ajudando os pais a desconstruir os conflitos existentes para um
relacionamento respeitoso, focado no bem estar dos filhos.
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METODOLOGIA
O presente trabalho é uma ampla pesquisa bibliográfica sobre Guarda
Compartilhada e Mediação, enfatizando o papel do mediador na condução de
mediações de família.
As fontes de pesquisa estão relacionadas à separação dos pais, guarda
dos filhos, mediação e atuação do mediador de família.
A fundamentação do tema trabalhado teve como referência os autores
Chisthoper Moore, Juan Carlos Vezzulla, André Azevedo Gomma, Françoise
Dolto, entre outros. Tivemos como base bibliográfica, também, as leis que
fundamentaram e regulamentaram a Guarda Compartilhada e a Mediação,
tendo em vista serem arcabouço teórico mais consistente nesta área.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
A GUARDA COMPARTILHADA 9
CAPÍTULO II
A MEDIAÇÃO 17
CAPÍTULO III
O MEDIADOR DE FAMILIA 27
CONSIDERAÇÕES FINAIS 39
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFIAS 41
ÍNDICE 43
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INTRODUÇÃO
O presente trabalho apresenta o resultado do estudo do papel da
Mediação na construção da Guarda Compartilhada de pais separados,
privilegiando as relações familiares em detrimento do arcabouço jurídico. A
disputa da guarda dos filhos é uma questão recorrente nos tribunais
acarretando enorme sobrecarga emocional, principalmente para os filhos.
Com a Lei nº 13.058, de 22 de dezembro de 2014 que rege a Guarda
Compartilhada, reforça a tendência da grande parcela dos juízes no que tange
a convivência entre pais e filhos, modificando o modelo tradicional do genitor
guardião. No entanto, a Lei não modifica de imediato o entendimento das
pessoas envolvidas, sendo em muitos casos necessário um trabalho efetivo
para o amadurecimento e transformação dos variados sentimentos envolvidos
na relação familiar.
Nesse sentido, a Mediação mostra-se um instrumento eficaz na
condução de questões de família e, sobremaneira, na convivência entre pais
separados e filhos, em virtude de suas técnicas e ferramentas possibilitar que
as partes construam uma nova forma de relação.
Nosso interesse sobre o tema advém de atuarmos como mediadora
judicial em dois Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania
(Cejuscs) no município do Rio de Janeiro. E sentir necessidade de aprofundar
o estudo sobre Mediação e do mediador nas ações de família, mormente nas
de convivência e guarda. dos filhos
Esse estudo compreende três capítulos. No primeiro capítulo
abordaremos a Guarda Compartilhada com o histórico de implantação no
Judiciário Brasileiro e as implicações decorrentes da separação entre pais e os
filhos menores.
A Mediação suas técnicas, ferramentas, princípios e o procedimento
junto aos mediandos são tratados no segundo capítulo.
O terceiro capítulo tece considerações da parte psicológica e sobre o
manejo apropriado para melhor atuação nos casos de Guarda Compartilhada.
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CAPÍTULO I
GUARDA COMPARTILHADA
1.1 COMO OS FILHOS VIVENCIAM A SEPARAÇÃO DOS PAIS
São os filhos que marcam a passagem da família da esfera privada para
a social. Com os filhos o casal conjugal, quando formado, torna-se também,
casal parental e às identidades de homem e mulher agregam-se as de pai e
mãe com o peso e expectativas individuais e sociais carreadas por estas
funções. Com os filhos alarga-se a fronteira familiar havendo maior intercâmbio
com o meio social e também controle por parte da sociedade e do Estado. A
criança que há um tempo praticamente pertencia aos pais paulatinamente
passa a ser considerada em sua individualidade com seus direitos a serem
passíveis de proteção do Estado. Entretanto, os conflitos advindos das funções
paterna e materna, da conjugalidade e parentalidade, que muitas vezes criam
impasses levados ao Judiciário (Groeninga: 2016).
Os conflitos não terminam necessariamente com a separação ou
divórcio. Muitas famílias pós-divórcios continuam com conflitos internos.
No meio de batalhas judiciais da separação encontram-se crianças e
adolescentes que dada a sua condição de vulnerabilidade e de dependência de
seus responsáveis se vêem envolvidos pela situação que se apresenta.
O sofrimento dos filhos, anos após o termino do casamento não está
relacionada à separação conjugal em si, mas a forma do relacionamento que
os pais constroem entre eles (Ahrons, 1995, Cerveny, 2006, Despert, 1970 in
Costa e Jura, 2011).
Geralmente as pessoas pensam que há um “divórcio dele” e um
“divórcio dela”. Porém há uma terceira versão, é a versão dos filhos sobre a
separação. O divórcio representa uma experiência diferente para adultos e
crianças.
Para o adulto a separação é à saída de um relacionamento infeliz. No
entanto, os pais não se dão conta de que o filho compartilha muito pouco com
a visão deles e o quanto de ajuda precisa para começar a aceitar as mudanças
que essa separação ocasiona. Poucos filhos têm consciência de que os pais
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estão sofrendo, mesmo que tenham presenciado cenas de violência. A
conexão entre comportamento dos pais e o rompimento do casamento não é
simples para os filhos.
O que é bom para os pais divorciados, talvez não satisfaça nem um
pouco as necessidades dos filhos. Espera-se que as crianças se comportem
como pequenos adultos. No entanto, elas apresentam níveis diferentes de
resistência e precisam de tipos diferentes de apoio depois do rompimento. As
mais vulneráveis são as que necessitam de maior ajuda porque a mudança é
mais dura para elas.
Quando um casamento termina na gravidez ou nos primeiros anos do
filho, a criança tem necessidade de estabelecer seus primeiros
relacionamentos em um ambiente estável para ter a noção de uma rotina e
cuidados previsíveis. O apoio da família extensa no restabelecimento dessa
nova dinâmica familiar é extremamente importante no acolhimento do novo
membro.
Em seu estudo Peck e Manocherian (1995) in Juras e Costa (2011)
apontam que a faixa etária de seis a oito anos é a que sofre maior impacto do
divórcio visto que elas conseguem compreender de certa forma o que está
acontecendo, porém não possuem maturidade suficiente para lidar com o
rompimento.
A criança diante da separação dos pais e da possível disputa em torno
de sua “guarda” presencia falas contraditórias e situações ambíguas que ela
não tem como entender e responde com vários sintomas. Ocorre, também, que
muitos filhos sentem-se culpados pela separação dos pais, em razão dos
encargos e responsabilidades de sua criação.
Nos casos de famílias reconstituídas muitas crianças ficam confusas
com os novos vínculos quanto às questões de paternidade e filiação, não
sabendo qual a sua posição no novo contexto familiar e qual seu lugar no
desejo dessas várias pessoas que passarão a fazer parte de sua vida.
Segundo Cohen (2002) in Hack e Ramires o adolescente perante o
divórcio dos pais pode desenvolver uma autonomia prematura com
desidealização de cada pai. Também sentimentos de raiva e confusão podem
levar a problemas de relacionamento, uso de substâncias, decréscimo do
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desempenho escolar, depressão, agressividade, comportamentos
inadequados.
Os filhos, na adolescência, se preocupam se seguirão os passos dos
pais e lutam contra uma sensação de que também falharão em seus
relacionamentos. Contudo, é ao se tornarem adultos que os filhos de pais
divorciados sofrem mais. Sentem a ausência de imagens interiores de um
homem e de uma mulher numa relação estável em contrapartida as
recordações do fracasso dos pais em preservar o casamento (Wallerstein e
Blakeslee, 2002)
A intervenção indevida e excessiva do Estado, através do Judiciário, na
relação pais e filhos pode acarretar muitos enganos e danos, alguns deles
irreversíveis. Cabe ao Judiciário, portanto, auxiliar a família na buscar de
soluções produtivas para o desenvolvimento de seus membros, especialmente
as crianças, demonstrando a consciência de seu real papel na sociedade.
Os profissionais precisam privilegiar os papéis parentais em detrimento
dos conjugais porque o conflito levado ao Poder Judiciário enfraquece a família
como local natural do espaço civilizatório primário e protetor dos filhos e
também para que pais e filhos não carreguem vida afora o peso de um
passado não discutido (Souza e Silva, 2012; Winnicott,1980).
A separação dos pais não pode significar para a criança uma restrição
ao seu direito de convivência com ambos e com as famílias materna e paterna.
O reconhecimento das diferenças, o afeto, a responsabilidade e a solidariedade
são qualidades essenciais e fundamentais para que a família, mesmo
transformada, atinja sua finalidade em ser espaço do desenvolvimento das
crianças e também dos adultos.
Portanto, a responsabilidade dos cuidados com os filhos, cabe a ambos
os pais. A legislação sensível a imposição da nova realidade da família
brasileira criou dispositivos legais para a construção da guarda compartilhada.
Por ser um instituto relativamente novo no Brasil, necessário se faz que
algumas considerações a respeito sejam elaboradas, a fim de esclarecer o
tema.
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1.2. A GUARDA COMPARTILHADA
A guarda compartilhada além de estar em sintonia com a organização da
família atual, quebra a supremacia do modelo tradicional da guarda unilateral,
aquela atribuída a um só dos genitores que fica com a responsabilidade
exclusiva de decidir sobre a vida da criança, restando ao outro apenas o
tradicional sistema de visitas.
Entender a trajetória da construção gradativa da guarda compartilhada
na legislação brasileira faz-se necessário um breve retrospecto dessa Lei que
atende prioritariamente os interesses e diretos dos filhos.
A importância da prioridade da proteção integral da criança e do
adolescente foi ressaltada a partir da Constituição Federal de 1988 no art. 227:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010).
A legislação reforçou e especificou essa missão por meio do Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA) em 1990 e do Código Civil.(2002) e do Novo
Código Civil (2016).
O ECA nos artigos 21 e 22 fundamenta a guarda compartilhada
estabelecendo que:
Art.21 O pátrio poder será exercido em igualdade de condições pelo pai e mãe, na forma que dispuser a legislação civil, assegurando a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer a autoridade judiciária competente para a solução da divergência. Art.22 – Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes, ainda no interesses destes, a obrigação de cumprir e fazer as determinações judiciais. Parágrafo único. A mãe e o pai, ou os responsáveis, têm direitos iguais e deveres e responsabilidades compartilhados no cuidado e na educação da criança, devendo ser resguardado o direito de transmissão familiar de suas crenças e culturas, assegurados os direitos da criança estabelecidos nesta Lei. (BRASIL, 1990)
A guarda compartilhada alicerça-se definitivamente no Judiciário através
da Lei nº 13.058, de 22/12/2014 que altera os arts. 1.583, 1.584, 1.585 e 1.634,
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da Lei nº 10.406 de 10/01/2002 (Código Civil) para estabelecer o significado da
expressão “Guarda compartilhada” e dispor sua aplicação:
Art 1.583 § 2º: Na Guarda compartilhada, o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos. Art. 1.583 §3º: Na Guarda compartilhada, a cidade considerada base de moradia dos filhos será aquela que melhor atender os interesses dos filhos. (BRASIL,1990)
Apesar de ser praticamente uma unanimidade entre os juízes de família
a opção pela guarda compartilhada para os filhos com pais separados, há
casos nos quais a guarda unilateral é a mais adequada. A Lei nº 13.058 altera
a abrangência da guarda unilateral, na tentativa de equalizar a convivência dos
pais:
Art. 1.583 §5º: A guarda unilateral obriga o pai ou mãe que não a detenha a supervisionar os interesses dos filhos, e, para possibilitar tal supervisão, qualquer dos genitores sempre será parte legítima para solicitar informações e/ou prestação de contas, objetivas ou subjetivas, em assuntos ou situações que direta ou indiretamente afetem a saúde física e psicologia e a educação dos filhos. (BRASIL,1990)
A referida Lei demonstrando preocupação no convívio entre pais e filhos
especifica a guarda nos casos de litigioso entre os pais, no artigo abaixo:
Art. 1.584 §2º: quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guardado filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guardado menor. (BRASIL,1990)
Nesse sentido, espera-se que sejam minimizados os possíveis efeitos
nocivos da guarda unilateral, como afastamento do genitor não guardião e a
possível manipulação dos filhos.
A guarda compartilhada quebra a herança de uma rígida divisão de
papéis e funções entre o pai e a mãe. Ela explicita o compartilhar das
responsabilidades que resultam em formas de relacionamento familiar, em
tempos que não mais a mulher tem a exclusividade na criação dos filhos, e em
que é crescente a consciência da importância da função paterna (Duarte, 2012
e Groeninga, 2015).
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Muitas vezes, nas relações pós-separação as funções que eram
exercidas de forma complementar enquanto os pais estavam juntos, na
separação acabam sendo distorcidas, dando lugar a atribuição de culpas aos
abandonos, as diversas formas de competição e abusos de direitos, são alguns
dos muitos exemplos (Groeninga, 2015)..
A guarda compartilhada é uma modalidade de guarda de filhos menores
de dezoito anos completos não emancipados ou maiores incapacitados
enquanto durar a incapacidade, que vem crescendo nos últimos anos, como a
maneira mais evoluída e equilibrada de manter os vínculos parentais com os
filhos após o rompimento conjugal (Silva: 2011).
A autora complementa ser necessária uma responsabilização de ambos
os genitores acerca de todas as decisões e eventos referentes aos filhos. Os
pais discutem, decidem, e participam em igualdade de condições exatamente
da mesma maneira como faziam quando estavam unidos conjugalmente, de
forma que nenhum deles ficará relegado a um papel secundário, apenas como
provedor de pensão ou limitação de visitas de fim de semana. Não há
omissões de informações escolares ou médicas, nem sobre viagens ou
comemorações, mantendo a conduta que os pais tinham quando estavam
juntos.
Portanto, na guarda compartilhada ambos os pais continuam exercendo
em comum a guarda, dividindo a responsabilidade legal sobre os filhos e
compartilhando as obrigações pelas decisões importantes relativas a prole.
Busca-se atenuar o impacto negativo que a ruptura conjugal tem sobre o
relacionamento entre os pais e filhos, pois mantém pai e mãe envolvidos na
sua criação, validando-lhes o papel parental permanente, ininterrupto e
conjunto.
É importante distinguir guarda alternada e Guarda compartilhada. A
primeira caracteriza-se pelo exercício da guarda alternadamente, segundo um
período de tempo pré determinado, que pode ser anual, semestral, mensal ou
mesmo no dia a dia, sendo que no período que a criança estiver com aquele
genitor, as responsabilidades, decisões e atitudes caberão exclusivamente a
este. Ao término do período os papéis se invertem. Enquanto que na Guarda
compartilhada não se inclui a idéia de alternância de dias, semanas, meses de
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exclusividade na companhia de um dos genitores. A proposta dessa guarda
não é compartilhar a posse, mas a responsabilidade pela educação, saúde,
bem estar emocional dos filhos. Na visão dos especialistas a chamada guarda
alternada é prejudicial à formação das crianças e adolescentes ante a
supressão de referências básicas de moradia, hábitos alimentares, grupo de
amigos etc. (Silva, 2011).
A guarda compartilhada é aplicável, igualmente, no caso de dissolução
das famílias homoafetivas cumprindo os princípios constitucionais da dignidade
da pessoa humana e da não-discriminação por razão de sexo, visando
basicamente o interesse da criança que, nestes casos é continuar a se
relacionar com suas mães ou seus pais.
Para Dolto (1988) a criança precisa saber que pertence a famílias de
duas linhagens parentais que conjuntamente com os grupos étnicos e os
grupos de amigos sociais integram a criança e os pais em sua história, sua
língua e sua cultura.
É incontestável que a manutenção de laços com a família mais ampliada,
trará incontáveis benefícios à educação e ao desenvolvimento da criança e do
adolescente.
A Lei nº12.398/2011 do Código Civil parágrafo único artigo 1.589 Da
convivência dos avós com os netos reforça uma prática comum e saudável e
dispõe o seguinte:
Parágrafo único. O direito de visita estende-se a qualquer dos avós, a critério do juiz,observados os interesses da criança ou do adolescente. VII – a guarda e a educação dos filhos, regulado o direito de visita que, no interesse da criança ou do adolescente, pode, a critério do juiz, ser extensivo a cada um dos avós. (BRASIL, 2011)
O convívio sistemático com os avós possibilitará a criança ampliar o
sentimento de pertencimento do seu grupo familiar contribuindo para seu
amadurecimento afetivo.
A aplicação da guarda compartilhada além da vantagem da convivência
sistemática dos filhos com ambos os pais, afastando a tendência às
tradicionais visitas quinzenais alternadas até porque pai e mãe não podem ser
considerados visita precisa fundamentalmente do amadurecimento e
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estabilidade emocional dos pais para administrar as questões relevantes dos
filhos.
Nesse sentido, a mediação poderá e deverá ser um instrumento eficaz
do Judiciário para a construção dessa nova dinâmica familiar.
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CAPÍTULO II
A MEDIAÇÃO
Trataremos nesse capitulo acerca da mediação judicial, tendo como
método teórico o Modelo Linear, por ser o utilizado nos Tribunais brasileiros.
2.1. A MEDIAÇÃO NO JUDICIÁRIO BRASILEIRO
A mediação, derivada do latim “mediatio”, que significa intervenção,
intercessão, simboliza a aproximação das partes interessadas por meio de um
terceiro (intermediário), o qual, lançando mão de uma intervenção pacífica e
neutra, busca levar as partes conflitantes a realizarem acordos ou darem cabo
às suas controvérsias.
Partindo de uma compreensão mais ampla de mediação, é possível
afirmar que todos nós em algum momento fomos mediadores em nossas vidas:
na família, no trabalho, com amigos. No entanto, o enfoque desse trabalho não
é a mediação informal, mas, a mediação alicerçada em um corpo teórico
especifico.
Yarn, Douglas in Azevedo Gomma (2012) define a mediação técnica,
como sendo:
Um processo autocompositivo segundo o qual as partes em disputa são
auxiliadas por uma terceira parte, neutra ao conflito, ou um painel de pessoas
sem interesse na causa, para auxiliá-las a chegar a uma composição. Trata-se
de uma negociação assistida ou facilitada por um ou mais terceiros na qual se
desenvolve processo composto por vários atos procedimentais pelos quais o
terceiro imparcial facilita a negociação entre pessoas em conflito, habilitando-as
a melhor compreender suas posições e a encontrar soluções que se
compatibilizam aos seus interesses e necessidades. (Yarn in Azevedo, 2012)
A mediação tem protocolos diferenciados da conciliação. Conquanto
ambas consistam em procedimentos de negociação assistida por um terceiro
imparcial sem poder decisório, a conciliação é um procedimento mais simples,
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célere e objetivo que visa exclusivamente o acordo sobre uma controvérsia
pontual e, por isso autoriza uma atuação mais contundente do conciliador,
permitindo-lhe fazer sugestões e até expressar sua opinião. Por isso, a
conciliação é adequada aos casos em que não há vinculo entre as partes, ou
seja, nos conflitos decorrentes de relações temporárias, transitórias, como por
exemplo, questões de consumo. (Almeida & Pantoja, 2016)
Tanto a conciliação como a mediação são considerados métodos de
autocomposição assistida, com técnicas, habilidades e procedimentos
específicos na resolução de disputas.
Na mediação se aplicam todas as técnicas aucompositivas não havendo
restrição de tempo para sua realização. Em todo processo de mediação tem-se
a preocupação de manter os vínculos entre os envolvidos, estabelecer a
comunicação, prevenir novos conflitos. É coordenada por dois ou mais
mediadores com o objetivo de possibilitar que as habilidades e experiências
dos profissionais se agreguem para a melhor condução do conflito.
A mediação entra definitivamente no cenário jurídico brasileiro com a Lei
nº 13.140 de 26/06/2015 que dispõe sobre sua atuação como meio de solução
de controvérsias.
O Novo Código de Processo Civil (18/03/2016) nos artigos 694 e 696
normatiza a promoção da solução consensual dos conflitos pelo Estado,
reforçando a importância da conciliação e da mediação como instrumento de
pacificação social de acesso à justiça. O Código anterior não fazia menção à
mediação, referia-se apenas a conciliação. (Almeida & Pantoja, 2016)
Art. 694 Nas ações de família todos os esforços serão empreendidos para
solução consensual da controvérsia, devendo o juiz dispor do auxilio de
profissionais de outras áreas de conhecimento para a mediação e conciliação.”
Art. 696. A audiência de mediação e conciliação poderá dividir-se em tantas
sessões quantas sejam necessárias para viabilizar a solução consensual,
sem prejuízo de providências jurisdicionais para evitar o perecimento do
direito. (Brasil, 2016)
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Portanto, o Judiciário está buscando com celeridade uma solução
harmônica e adequada em relação à complexidade dos conflitos que permeiam
a sociedade. Em nosso estudo daremos ênfase as controvérsias familiares.
2.2. O CONFLITO NO OLHAR DA MEDIAÇÃO
Via de regra, o conflito é tido como um fenômeno negativo nas relações
sociais que proporciona perdas para ao menos uma das partes envolvidas. Na
moderna teoria do conflito o mesmo é tido como um fenômeno natural nas
relações de quaisquer seres vivos e que é possível percebê-lo de forma
positiva.
Pode ser definido como um processo ou estado em que duas ou mais
pessoas divergem em razão de metas, interesses ou objetivos individuais
percebidos como mutuamente incompatíveis (Yarn, 2012).
Perceber o conflito de forma negativa desencadeia uma reação de luta
ou fuga ou resposta de estresse agudo. Enquanto, perceber o conflito como
algo positivo ou potencialmente positivo, o mecanismo de luta ou fuga tende a
não ser desencadeado ante a ausência de percepção de ameaça, o que
facilita, por sua vez, o relacionamento dos envolvidos (Azevedo, 2012)
Moore (1998) destaca duas formas de conflito: os destrutivos que trazem
atitudes competitivas e os construtivos que levam a ações cooperativas.
O autor caracteriza o conflito destrutivo por uma tendência à expansão e
a intensificação. Como resultado, frequentemente, se torna independente de
suas causas iniciais, com a probabilidade de continuar após elas terem se
tornado irrelevante ou esquecidas. A tendência de intensificar conflitos resulta
do conjunto de três processos interrelacionados: a) processos competitivos
envolvidos na tentativa de vencer o conflito; b) processos de percepção
distorcida; c) processos de compromissos causados por pressões de
consistência cognitiva e social. Esses processos dão origem a um ciclo
mutuamente reforçado que geram ações e reações que intensificam o conflito.
Rubin e Kriesberg (2012) complementam que há uma progressiva
escalada, em relações conflituosas, resultante de um círculo vicioso de ação e
reação. Cada reação torna-se mais severa do que a ação que a precedeu e
cria uma nova questão ou ponto de disputa, originado as espirais de conflito.
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Essa escalada do conflito torna as causas originárias progressivamente
secundárias à medida que os envolvidos mostram-se mais preocupados em
responder a ação que imediatamente antecedeu sua reação.
Morton Deutsch (2012) define um processo destrutivo pelo
enfraquecimento ou rompimento da relação social preexistente à disputa em
razão da forma pela qual esta é conduzida. As feições competitivas tornam-se
evidentes quando cada parte busca vencer a disputa não percebendo a
existência de interesses mútuos. Em processos destrutivos há a tendência de o
conflito se expandir ou tornar-se mais acentuado no desenvolvimento da
relação processual.
Moore (1998) enumera os seguintes efeitos em um processo destrutivo:
1. A comunicação entre as partes é de desconfiança e empobrecida. A
possibilidade de erro e desinformação aumenta.
2. Expectativa de que a solução do conflito pode ser imposta apenas
por um dos lados por meio da força, fraude ou esperteza.
3. Atitude hostil e receosa aumenta as diferenças e minimiza a
percepção de similaridades, levando a uma visão distorcida sobre a
outra parte, intensificando e perpetuando o conflito e transformando-
o em uma disputa competitiva, mesmo se o conflito não emergir de
um relacionamento competitivo.
Moore destaca, também, as peculariedades do conflito: a) o número de
questões envolvidas; b) o número de participantes implicados de cada lado da
questão; c) os custos que os participantes estão dispostos a arcar em relação à
manutenção do conflito; d) o comportamento que os participantes têm para
com o outro; e) a intensidade das atitudes negativas entre si.
O autor aponta como causas de conflito nos relacionamentos: a) as
percepções equivocadas, b) a comunicação improdutiva, c) emoções intensas
e d) comportamento negativo e repetitivo.
Rosenberg (2006) aponta formas de comunicação que contribuem para
um comportamento violento em relação aos outros e a nós mesmos, as quais o
autor designa como “comunicação alienante da vida”. Um comportamento
muito comum é o julgamento moralizador que traz expressões de culpa, insulto,
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depreciação rotulação, crítica, comparação e diagnósticos, bastante freqüentes
nas ações judiciais e é a negação da responsabilidade.
Para Vezzulla (2005) a mediação é indicada nos casos em que seja
importante preservar e até melhorar o relacionamento, mas nunca piorá-lo. No
entanto, sem uma comunicação respeitosa destrói-se essa possibilidade, a de
mudança entre as partes,
Na mediação todo processo deve ser feito pelos participantes. O
mediador é o facilitador da comunicação que através de técnicas e
ferramentas, ajuda a compreensão dos mediandos de seus reais interesses
possibilitando mudanças na forma de lidar com o conflito e viabilizando um
possível acordo.
2.3. FERRAMENTAS DA MEDIAÇÃO
A mediação em seu arcabouço teórico apresenta ferramentas utilizadas
pelo mediador durante o processo, objetivando desarmar as partes de suas
defesas e acusações e buscar cooperação na busca de soluções práticas. De
forma breve, apresentaremos algumas ferramentas.
1.Recontextualização ou paráfrase: o mediador estimula a parte a
entender uma situação de forma mais positiva para que assim as partes
possam extrair soluções também positivas. Ex: “Acho esse valor de pensão
alimentícia absurdo para o meu filho de quatro anos”. Intervenção do mediador:
“Você precisa entender mais detalhadamente os gastos do seu filho?”
2. Afago ou reforço positivo: consiste em uma resposta positiva do
mediador para o mediando ou para o advogado, sendo muito útil com os
patronos na valorização de sua presença, trabalho e colaboração.
3. Sessões privadas ou individuais: são encontros realizados entre os
mediadores com cada uma das partes separadamente. Os advogados devem
participar com seus respectivos clientes. Em geral, em mediação de família é
comum as sessões individuais, que são indicadas no caso das partes não
estarem se comunicando de modo eficiente, tais como um elevado grau de
animosidade entre os participantes, uma dificuldade de uma ou ambas as
partes de expressar adequadamente seus interesses, a percepção que
existem particularidades importantes no conflito que somente em uma sessão
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reservada serão obtidas, por solicitação das partes ou de uma delas, nesse
caso, será realizada igualmente com ambas. O tempo utilizado será o mesmo
para as partes, mantendo-se o principio da imparcialidade.
4. Inversão de papéis: utilizada prioritariamente nas sessões
individuais, tendo o mesmo formato para ambas as partes. Visa estimular a
empatia. O mediador solicita que uma parte se coloque no lugar do outro na
situação conflitante e vice-versa.
A confidencialidade mantém-se assegurada, como em todo processo
de mediação. Só serão revelados os assuntos que cada parte permitir que
seja levada para reunião conjunta. .Cabe ressaltar, que não há restrição
quanto à quantidade de sessões, o mediador avaliará o momento em que as
partes estarão em condições de estarem frente a frente em uma comunicação
produtiva. No entanto nem toda mediação requer sessões individuais,
5. Normalização: em regra, as partes se sentem constrangidas por
desconforto. Cabe ao mediador tornar o conflito como algo natural em
qualquer tipo de relação.
6. Enfoque prospectivo: os processos autocompositivos, como a
mediação, voltam-se para soluções que atendam os interesses reais das
partes, assim, tem-se o enfoque voltado para o futuro.
7. Validação de sentimentos: identificação dos sentimentos que a parte
desenvolveu em decorrência da relação conflituosa .Deve ser abordado como
uma conseqüência natural e legitima que a parte possui. Aplicada nas sessões
privadas para sentimentos que somente uma parte venha a manifestar. Em
sessões conjuntas sentimentos semelhantes.
8.Teste de realidade: consiste em estimular a parte a comparar sua
proposta com o mundo externo, como percebido pelas demais pessoas. É
recomendada a utilização da técnica de validação de sentimentos antes ao
teste de realidade. Deve ser prioritariamente aplicada nas sessões individuais,
seguindo o mesmo protocolo da técnica de inversão de papéis.
Essas ferramentas são empregadas pelo mediador em todo processo
de mediação, que veremos a seguir.
23
2.4. O PROCESSO DE MEDIAÇÃO
Explanaremos sucintamente as principais etapas do processo de
mediação, tendo como referencial o Modelo Linear, a saber: 1.declaração de
abertura; 2.exposição de razões pelas partes; de questões, 3.identificação de
interesses e sentimentos; 4. esclarecimentos acerca de questões, interesses e
5.sentimentos e resolução de questões.(Azevedo Gomma, 2012)
1.Declaração de abertura:
É um momento do acolhimento por ser o inicio da construção do espaço
do mediador com aquelas pessoas, que são únicas.Estabelece o tom de
comunicação que se pretende imprimir na mediação.. Inicia-se o rapport , que é
o estabelecimento de uma relação de confiança entre o mediador com aquelas
partes especificamente. Esclarece o papel do mediador, diferenciando-o de
outras formas que atuam na composição do conflito, como a conciliação e
arbitragem. Os advogados, sempre bem vindos, são assessores dos
mediandos e parte importante no acordo. São prestadas de forma clara
instruções e explicações quanto ao processo de mediação dando ênfase aos
princípios da mediação, a saber: informalidade, oralidade, boa fé,
imparcialidade, confidencialidade, voluntariedade.
Deteremos, aqui, apenas ao princípio da confidencialidade que
determina que o que se passa na mediação é sigiloso, só as pessoas, os
advogados e a equipe de mediação devem saber sobre seu teor. O mediador
não poderá ser arrolado testemunha no processo. A única exceção de quebra
de confidencialidade é se for revelado algo que possa ser configurado como
crime.
O destaque para esse princípio deve-se a minha experiência como
mediadora em casos de família por acontecer com freqüência insinuações de
abusos com os filhos quando estão com o outro genitor. O mediador através de
perguntas adequadas concluirá se deverá ou não encerrar a mediação e
retornar ao juiz da Vara de Família para as providências cabíveis por estar
enquadrado em crime contra incapaz.
2.Exposição de razões pelas partes:
Terminada a sessão de abertura os mediandos aderindo a mediação
começam cada um por seu turno o seu relato. Objetiva reunir informações
24
para o mediador registrar as posições, questões e interesses As partes se
escutam percebendo a posição do outro. de forma respeitosa. Começa a fala
quem moveu a ação. Essa etapa termina com o resumo.
O mediador apresenta as partes o resumo que é o conjunto dos
discursos de ambos colocando as duas perspectivas em uma única descrição
de forma positiva, identificando questões interesses e necessidades em comum
e divergente. O relato precisa ser organizado e de modo neutro. É o momento
de legitimar sentimentos em comum, os divergentes só nas sessões privadas.
Certifica-se que o resumo esteja de acordo com o pensamento das partes,
caso não esteja os mediandos fazem as devidas correções.
Embora a técnica do resumo seja associada a essa fase da mediação,
deverá ser empregada em todas as etapas do processo, como por exemplo, a)
após uma troca de informações relevantes; b) após as partes terem sugerido
possíveis soluções c) para lembrar as partes seus reais interesse d) para
apaziguar ânimos (Azevedo: 2012). É uma ferramenta útil quando o mediador
“se perde”, terminando como uma pergunta, por exemplo: “e o que vamos fazer
agora?”
3.Identificação de questões, interesses e sentimentos:
O mediador através do relato das partes e de perguntas identificou as
questões e os interesses em comum e os divergentes. Consiste na análise do
discurso das partes e na distinção entre o interesse aparente ou manifesto e o
interesse real das partes. Essa etapa é conhecida como a pauta de trabalho.
Discriminar as pautas objetiva e subjetiva diferenciando os interesses
manifestos dos interesses reais e identificando valores e necessidades
desatendidas serão os norteadores do trabalho do processo de mediação.
Em nossa prática, percebemos que a comunicação entre os envolvidos
é sempre o motivo inicial da discórdia, que tende a expandir o conflito, nesse
item é plausível abranger a pauta subjetiva, como por exemplo,
ressentimentos guardados da separação, que dificultam, sobremaneira, a
comunicação parental. É nessa etapa da mediação que se torna visível para
os mediandos seus interesses reais. Exemplo de uma pauta de guarda:
25
� Comunicação (incluindo sentimentos que fazem parte da pauta
subjetiva)
� Convivência com os pais e famílias materna e paterna
� Projeto de vida familiar (divisão de responsabilidades, sustento etc)
4.Esclarecimento acerca de questões, interesses e sentimentos
Essa fase visa primordialmente, à construção de alternativas para cada
item da pauta, com vistas a eleger opções que contemplem os interesses de
todos e gerem satisfação mútua.
Após a concordância das partes com os itens da pauta, o mediador
estabelece a melhor estratégia para continuação da mediação.
É o momento de construir a ZOPA (zona de um possível acordo), que é
a intercessão entre os interesses e a resistência de cada parte para o acordo,
isto é, a zona que surge o interesse mútuo. O mediador trabalha nas sessões
individuais esse ponto de intercessão de interesses com cada parte
separadamente, visando construir a melhor opção para ambos.
Terminada as sessões privadas com cada parte, a etapa seguinte é a
sessão conjunta, em que se buscará conciliar os interesses revelados nas
sessões individuais. As partes serão estimuladas a se comunicarem para
chegarem a propostas de interesse mútuo.
5. A Construção do Acordo
Esta é a fase de redação e revisão do texto de acordo e de eventual
adequação de alguns de seus termos e de ratificação do compromisso das
partes. Nas mediações de família, é fundamental, nessa etapa, a presença
dos advogados, dos quais falaremos no próximo capitulo.
Entretanto, a mediação não visa simplesmente à assinatura do acordo,
como bem disse Azevedo Gomma (2012), destina-se além, primordialmente,
educar as partes para futuras situações de resolução de disputas e estimulá-las
ao entendimento recíproco. O autor completa que o acordo vai se moldando a
vontade conjunta das pares, em razão da nova perspectiva que estas passam
a ter em relação ao conflito. Portanto, a solução dever ser apresentada pelas
partes com o mediador como facilitador.
26
Considera-se uma mediação exitosa aquela que alcançou seus
propósitos, ou seja, o empoderamento das partes, a compreensão da
controvérsia, mudanças positivas na comunicação e relacionamento. O acordo
acontece frequentemente se alcançado os propósitos citados,
No entanto, nem todo caso produz resultados satisfatórios com a
mediação, se certos requisitos não estiverem presentes. Caso as partes
estejam muito litigantes sem desejarem se comunicar, o resultado com a
mediação tende a ser prejudicado, tendo em vista que as partes precisam ser
capazes de resolver suas questões com os recursos que possuem.
Em não havendo entendimento o mediador redige a ata de mediação
retornando para a Vara de origem para decisão do juiz. Seguindo o principio da
confidencialidade não são fornecidas informações que foram divulgadas nas
sessões de mediação.
Entretanto, todo esse escopo teórico necessita do trabalho do
mediador com habilidades para utilizar as técnicas e ferramentas adequadas a
cada caso. É sobre a atuação do mediador que falaremos no próximo capitulo.
27
CAPÍTULO III
O MEDIADOR DE FAMÍLIA
Neste capitulo tentaremos focar nos impasses que ocorrem
frequentemente nas mediações de família, especificando as demandas por
convivência, incluindo a guarda e formas de atuação do mediador frente a
essas situações. Cabe ressaltar que a mediação de família cumpre o mesmo
protocolo estabelecido para a Mediação em geral, explanada no capitulo
anterior.
3.1. O MEDIADOR E A DINÂMICA DA SEPARAÇÃO DOS
PAIS
Os direitos e deveres implícitos na Lei nº 13.058, de 22/12/2014 que
estabelece o significado da Guarda Compartilhada, nem sempre são
suficientes para os pais resolverem os diversos problemas que se apresentam
no relacionamento familiar, pois permeado de interesses explícitos e implícitos,
sentimentos verbalizados e não verbalizados formam muitas vezes muros
quase intrasponiveis, que sozinhos não têm condições de ultrapassar.
A separação situa-se no rol de acontecimentos traumáticos da vida,
portanto é questionável até que ponto se pode esperar que pessoas, num
período de vulnerabilidade emocional, tomem decisões importantes, como a
reestruturação da sua vida e a dos seus filhos.
Nesse sentido, os mediadores precisam ser capazes e ter sensibilidade
de reconhecer o nível de desestabilização que cada um dos mediandos está
vivenciando para compreender a motivação dos mesmos para chegar a um
acordo.
A mediação familiar é indicada para todos os tipos de famílias. Nas
famílias multiculturais, homoafetivas os mediadores precisam respeitar suas
diversas especificidades e ao mesmo tempo ter o cuidado de estar atento a
preconceitos e estereótipos.
Os mediadores precisam ampliar seu conhecimento e sensibilidade a
grupos de culturas e etnias diferentes, como as minorias de modo que sua
28
atuação seja pautada no principio da neutralidade, um dos princípios da
mediação.
O mediador familiar não é um conselheiro nem um terapeuta familiar.
Seu trabalho está alicerçado nas teorias do conflito e da mediação. É
importante ressaltar que os mediadores precisam ter em consideração a
complexidade dos casos e mediar em assuntos que sejam treinados e
competentes. Se o mediador não tiver a experiência e conhecimentos
necessários, deverá declinar para outro mediador mais qualificado (Parkinson,
2008).
O conhecimento e experiência adquiridos em sua profissão de origem
são extremamente válidos para o mediador. No entanto, é essencial distinguir
entre o papel de mediador e o exercício de sua profissão. É necessário que o
mediador se distancie da sua intervenção profissional para utilizar as técnicas e
instrumentos próprios da mediação.
No mediador surgem sempre sentimentos e pensamentos no decurso da
mediação, referentes aos mediados. No entanto, deve identificá-los para
diferenciar os que são originados pelos seus preconceitos e associações
pessoais e que limitarão seu trabalho, dos que contribuirão para a
compreensão da situação em pauta e que podem ajudá-lo no processo de
mediação (Vezzulla, 2005).
Nesse sentido, o mediador precisa estar ciente dos seus próprios
conflitos familiares, seus preconceitos e de sua visão de mundo para não fazer
uma possível transferência com a situação que está mediando e/ou com um
dos genitores. Caso tal fato ocorra precisa ter maturidade e ética para se
colocar impedido de continuar nessa mediação. Se essas identificações forem
recorrentes, cabe ao mediador uma auto-análise para entender a necessidade
de buscar um atendimento terapêutico e/ou mudança para outro campo de
mediação.
Portanto, o mediador tem a obrigação de conhecer bem seus limites e
habilidades pessoais já que seu papel é auxiliar os mediandos a se libertarem
de seus preconceitos e a encontrarem caminhos criativos para solucionares
seus conflitos.
29
Segundo o Fórum de Mediadores Familiares ocorrido em maio de 2000
na Inglaterra a conduta do mediador deve ser pautada em:
� Respeitar a individualidade de cada pessoa
� Mostrar humildade, compaixão e tolerância
� Manter a distância adequada
� Facilitar a comunicação
� Criar esperança no futuro
� Desenvolver a capacidade de perceber o não-verbal (Parkinsosn, 2008).
Nas disputas judiciais a qualidade do relacionamento familiar mostra-se
difícil, instável com acentuadas falhas na comunicação, passando do
relacionamento anterior de entendimento e cooperação para um clima de
competição incompatibilidade, provocações, brigas e ressentimentos que
acabam por comprometer vínculos afetivos. (Duarte, 2012)
A dinâmica frequentemente volátil dos ex-casais pode estabilizar de
alguma forma no processo de mediação O mediador familiar pode ajudar o ex-
casal a retomar o diálogo e negociarem a reestruturação da nova dinâmica
familiar, buscando estimular cada um dos mediandos, a envolverem-se nas
tomadas de decisões, incentivando-os a falar e a ouvir as questões e os
interesses do outro em um clima de empatia e cordialidade, evitando situações
de manipulação de poder de um lado e de humilhação de outro.
Não basta, ao mediador ter conhecimento teórico de mediação, faz-se
necessário saber identificar no que o conflito ou disputa em foco poderá
contribuir para a melhoria de vida das partes envolvidas.
3.2. TRABALHANDO O CONFLITO
Segundo Ury (2015) o conflito, também pode ser uma oportunidade,
pois, tem a possibilidade de transformar o oponente em aliado. A auto
observação durante situações de conflito é um desafio, que detectará os
sentimentos e emoções, principalmente, os recorrentes, pois, apontam para
interesses e reivindicações. Ouvir a si mesmo com empatia,é o maior desafio
porque os maiores obstáculos para conseguir o que se quer não é através do
30
outro, mas sim em nós mesmos, porque ouvir a si próprio não é um exercício
apenas intelectual, mas também uma manifestação emocional e física.
O autor mostra que por trás de reações impetuosas, em momentos de
confronto. está a mentalidade hostil ganha-perde, na base do pressuposto de
que só uma parte deve sair vitoriosa e não ambas. Mesmo quando há o desejo
da cooperação, tem-se o receio que o outro tire proveito da situação. O que
sustenta essa mentalidade é o senso de escassez, o medo de que os recursos
não sejam suficientes e por isso é necessário garantir nossa parte, mesmo que
em prejuízo do outro. Com freqüência, o resultado dessa forma de agir é os
dois lados ficarem com menos.
Em minha experiência como mediadora judicial, percebo que as partes
chegam com propostas fechadas querendo que o outro mude de atitude, faça
concessões, muitas vezes culpando-o sem se perceber co-responsável
daquela situação. Esse conjunto de atitudes é característico da negociação
baseada em posições, que é algo que as partes decidem indicar como objeto
do conflito. Cada parte entende que para ganhar o outro precisa perder, porque
vê a outra parte como seu oponente. Nas mediações cuja ação é a guarda, é
comum a culpar o genitor guardião pelo impedimento do convívio com os filhos
e em contrapartida o genitor não guardião querer a guarda só para si, excluindo
o outro genitor.
Esse modelo adversarial vem sendo praticado há milênios por
civilizações, países, grupos e indivíduos. Consiste na única forma de negociar
que as pessoas conhecem. O rateio, a barganha, a informação não revelada, a
desconfiança na proposta do outro, a sensação de que pode estar sendo
enganado está impregnado culturalmente em toda sociedade. Essa é a
negociação baseada em posições ou barganha distributiva, mesmo a
expressão sendo desconhecida é amplamente praticada. (Azevedo, 2012)
É uma repetição continua da mesma alegação que só consegue reforçar
o discurso do oponente, fechando-se na sua posição que será tão solidificada
como a do outro. (Vezzulla, 2005).
A posição encobre os interesses. Cabe ao mediador através da escuta
ativa e de perguntas descobrir o que está latente no discurso das partes.
Enquanto mediador tem-se continuamente o aprendizado de transmutar
31
posição em interesse, sobretudo nas de família. O mediador precisa distinguir
com exatidão a posição dos interesses de cada parte e os interesses
convergentes. Trabalhar as necessidades de cada um e não as posições dos
mediandos, diferenciando nas suas características pessoais e únicas.
A posição é o pedido: O quê? O motivo que ensejou o processo, o que
está sendo reivindicado. Quero a guarda do meu filho.
Já os interesses e necessidades é o Por quê? Está embutido de forma
velada no pedido. É aquilo que se necessita e é o que realmente importa. Há
interesses explícitos e implícitos (porque peço o que peço?). Ex: Por que você
quer a guarda?A resposta mais comum é para conviver e participar mais da
vida dos meus filhos.
Entender os interesses é o passo mais importante no primeiro momento.
O mediador não trabalha com as posições, mas com os interesses que são os
aspectos que levam as partes a decidir conflitar. Mesmo em posições opostas
há interesses comuns compatíveis, porque só há divergência por uma mesma
situação em que ambos tomam posições diferenciadas.
3.3 AS PERGUNTAS
O mediador não tem acesso ao processo para preservar o principio da
imparcialidade, não se contaminando com os argumentos e provas das partes.
A mediação se propõe a trabalhar com a oralidade, sendo que as partes
relatam na sua ótica a situação conflitante.
A mediação tem o intuito das partes se comunicarem, no entanto, há
ocasiões em que a intervenção do mediador é importante para um desenrolar
harmonioso. Quando uma parte impõe-se a outra, repetição das mesmas
questões de forma ineficiente troca de ofensas, palavras de baixo escalão. A
intervenção do mediador, na maioria das vezes é através de perguntas.
Portanto, as perguntas são instrumentos fundamentais no processo
de mediação, possibilitam melhor compreensão de todos, incentiva novas
possibilidades com criatividade, cria clima de colaboração, interrompe uma
discussão, fortalece as relações.
Na mediação pergunta-se apenas o necessário, o mediador deve buscar
somente as informações que precisa para compreender quais os pontos
32
controvertidos, quais os interesses e sentimentos precisam ser esclarecidos a
fim de serem resolvidos ou os mediando passarem a ter outro olhar.
O mediador é um exemplo de comunicação para os mediandos.
Independente do tipo de perguntas, o importante é o objetivo que se tem ao
fazê-las. Exemplificamos algumas que poderão ser formuladas em mediação
de família:
� Abertas: permite ao mediando responder o que lhe vier livremente a
mente, não tem orientação da resposta. Ex: Quando você e seu ex-
marido/ ex-mulher pararam de se falar?
� Fechadas: limitadas a sim ou não. Ex: Seu ex-marido/ ex-mulher tem
visto os filhos?
� Lineares/ Informativas: perguntas diretas, geralmente usadas no início
da mediação. Utilizadas para conhecer melhor a situação. Ex: Que
situações trouxeram você à mediação?
� Reflexivas: o mediador convida a pessoa a pensar, a gerar opções,
tomar consciência. Ex: Como você pensa/gostaria que fosse a
comunicação entre você, seus filhos e o pai dos seus filhos? Como você
poderia conseguir?
� Circulares: rompem com o pensamento linear, já construído pelo
interlocutor, apontando as relações e conexões do conflito. Promove um
novo enquadre da situação, com intuito de uma reflexão prospectiva..
Esse tipo de pergunta é utilizado em sessões privadas porque é um
pensar do mediando sobre seus atos. Equivale a técnica de inversão de
papéis. Ex: O que você sente quando fala para seu ex-marido/ex-mulher
que ele/ela é irresponsável, mau pai/mãe? E como você acha que
ele/ela se sente com suas palavras? Como você gostaria que fosse o
relacionamento entre vocês dois?
O mediador precisa estar atento para não fazer perguntas: a) por
curiosidade, b) para saber quem tem razão, c) para tornar culpada uma das
partes, d) para demonstrar poder.
33
3.4. A ATUAÇÃO DO MEDIADOR
O mediador de família precisa ter claro alguns dos Princípios Básicos da
Children Act: aplicáveis a realidade brasileira para trabalhar com os pais:
1. O bem-estar dos filhos é soberano 2. Os pais têm responsabilidades para com os filhos e não direitos 3. A responsabilidade parental continua não termina com a separação, 4. Os pais devem estar de acordo tanto quanto possível sobre as suas
decisões em relação aos filhos levando em consideração os interesses dos filhos e suas possibilidades.
Parkinsons (2008) mostra que o mediador colabora com os pais na
reorganização das responsabilidades e funções da nova família, elaborando
planos que definem partilhar as responsabilidades parentais e como aplicá-las
na prática. Um plano de parentalidade privilegia normalmente:
� Saúde: controles médicos e dentários, cuidados durante a doença � Educação: escolha da escola, assuntos escolares, trabalhos de casa,
atividades extraclasse, reuniões e eventos escolares � Educação religiosa � Feriados, férias, aniversários, festas, saídas � Atividades esportivas � Disciplina: regras, limites, respeito pelas regras do outro genitor,
acordo se outro membro tem qualquer autoridade sobre os filhos. � Emergências: a quem contatar e como � Contatos com outros membros da família como será viabilizado. � Responsabilidade pela segurança e desenvolvimento do filho:
educação sexual, � Comunicação: entre os pais e destes com os filhos. Este item é de
imensa importância, pois é o pilar para a realização dos demais itens..
Em tempos modernos a comunicação entre os pais e destes com os
filhos pode ser estabelecida através de emails, whatsapp, redes sociais. Essa
forma de comunicação é bem salutar, principalmente para o ex-casal que na
forma escrita pode ser mais conciso em suas mensagens, evitando possíveis
atritos.
Parkinsons (2008) explana que os pais têm tendência para
apresentarem versões diferentes dos acontecimentos com o fim de
justificarem o seu próprio ponto de vista. Uma maneira de construtiva de
34
começar consiste em convidar cada um dos pais a descrever cada filho, de
modo que a criança se personaliza e não um simples nome para o mediador.
Os pais sentem-se orgulhosos dos seus filhos e normalmente gostam de falar
deles. A descrição dos interesses e da personalidade de cada filho como um
individuo. O mediador pode auxiliá-los a concentrarem nesse retrato, sem se
desviarem em ataques mútuos.
A autora apresenta uma lista de perguntas sobre os filhos: � A personalidade e temperamento da criança � O nível de desenvolvimento da criança físico, emocional, intelectual � Como é eu comportamento na escola: aproveitamento e amigos � Como é que a criança se entende com seus irmãos � A saúde da criança � Os interesses e atividades da criança � Quaisquer necessidades ou dificuldades especiais � Como é que os pais sabem que a criança está feliz � Como é que sabem que a criança está aborrecida
A maneira como os pais respondem a essas perguntas, bem como o
conteúdo das respostas mostram ao mediador como é que se comunicam e
ouvem um ao outro.
Ainda que a mediação tenha visão prospectiva, questões voltadas para
o passado, é por vezes útil para os pais perceberem se antes da separação
eram capazes de tomar decisões em conjunto sobre a educação, saúde,
religião dos filhos e de que forma poderão organizar essas decisões no pós
separação.
Outra maneira de possibilitar a reflexão dos pais é através de
perguntas hipotéticas centradas no futuro. Os mediadores podem sugerir que
pensem entre uma sessão e outra, como “dever de casa”, por exemplo:
� Como vocês gostariam que seus filhos contassem a separação de vocês quando fossem adultos?
� Que tipo de informações sobre os filhos você pensa em partilhar com seu ex parceiro (a)?
� Que apoio você espera no futuro do seu ex cônjuge? � Que tipo de relacionamento você deseja ter no futuro com seu ex
cônjuge?
Na sua especificidade a mediação possui algumas possibilidades,
como construir acordos temporários. Esse recurso é bem aceito pelos pais que
35
estão em conflito em relação a decisões sobre a forma de administrar a Guarda
compartilhada, por exemplo.
O mediador de família ao escutar de um dos pais a preocupação que o
filho pode estar em risco, na maioria das vezes suspeita de abuso sexual, deve
explorar imediatamente as bases desse receio. O mediador precisa ter clareza
se é uma manobra em relação ao litígio entre os pais e se o declarante já
tomou algumas medidas. No caso, do acusador sustentar a denúncia, a
mediação precisa ser suspensa, e encaminhado o processo ao juiz da Vara de
Família com relato sucinto, indicando necessidade de providências. Se, por
outro lado, o denunciante não sustentá-la a mediação continua, sendo essas
questões trabalhadas, principalmente, nas sessões privadas.
Parkinsons (2008) elenca outras situações inadequadas para a
mediação, necessitando que o mediador encerre e encaminhe o caso a
autoridade competente para as providências cabíveis, tais como:
� Abuso doméstico dos filhos � Reconhecimento ou alegação de abuso dos filhos � Comprometimento psiquiátrico � Incapacidade mental � Uso de álcool e drogas que interfiram na capacidade de tomar
decisões � Não adesão as regras da Mediação
Vezzulla (2005) sintetiza os três aspectos que o mediador precisa
trabalhar com as partes: 1) auxiliar a dividir os conflitos subjetivos dos conflitos
objetivos; 2) investigar os interesses, desmontando o discurso de posição;
3)prestar atenção às emoções dos mediados para serem usadas positivamente
na busca dos interesses reais em comuns e divergentes e não dificultem o
processo de mediação.
Em mediações de família, percebemos que os sentimentos ficam
aflorados, ocorrendo diversas vezes descontrole emocional das partes ou de
uma delas. O mediador precisa demonstrar segurança, habilidade, aplicar as
técnicas mais apropriadas e principalmente entender que quando uma pessoa
apresenta atitudes agressivas é porque sente medo, o mesmo acontece
quando pára ou foge para não enfrentar o problema. Esse medo, sentimento
próprio de quem sente seu equilíbrio ameaçado, favorece a escalada da
36
violência, levando as partes a confundirem a pessoa com o problema e a
construírem o discurso da posição, acreditando que ele será o melhor escudo
protetor da fragilidade que sentem. O medo bloqueia o raciocínio, a afetividade,
a criatividade e os valores fundamentais importantes para a mediação e para a
vida.
3.5. OS ADVOGADOS NA MEDIAÇÃO
O advogado é o profissional de confiança dos mediandos tendo a
possibilidade de influenciar tanto positiva como negativamente no processo de
mediação.
O mediador necessita de ter visão positiva dos advogados, pois podem
agregar muito para o êxito da mediação. No entanto, cabe ao mediador
conduzir a sessão de tal forma para que esses profissionais se sintam
integrantes do processo de mediação, participando na assessoria a seus
clientes, tendo inclusive possibilidade de orientá-los reservadamente durante o
intervalo da sessão, como também, na construção do acordo, caso seja
viabilizado.
Segundo Azevedo Gomma (2012) a atuação do advogado em processos
autocompositivos é bastante distinta daquela adotada em procedimentos
heterocompositivos. Essa mudança decorre, principalmente, das características
da mediação. O advogado deverá estimular troca de informações, auxiliar seu
cliente a compreender melhor a perspectiva da outra parte, assessorar a parte
a se expressar de maneira clara seus interesses, sentimentos e questões não
tutelados pela ordem jurídica; estimular opções criativas para a resolução da
controvérsia baseada nos interesses das partes.
A OAB/RJ corrobora a mesma linha de conduta do advogado na
mediação e especifica:
No papel de assessor jurídico, sua função será a mesma de qualquer outro
método de resolução de conflitos: a busca pela concretização dos interesses
de seu cliente. Entretanto, diferentemente do que ocorre no processo
adversarial, sua postura deve ser colaborativa. Ao advogado compete auxiliar:
na escolha do mediador; na identificação dos interesses de cada um dos
participantes; no oferecimento dos marcos legais; na busca por soluções
37
mutuamente inclusivas; na redação de um acordo com validade e eficácia
legal; e, no caso de acordo parcial, conferir seguimento ao processo judicial ou
a outro método adequado de resolução de conflitos. Na Mediação, é preferível
que as pessoas exprimam-se livremente, embora os advogados possam
manifestar-se, quando pertinente. O papel mais importante do advogado na
Mediação consiste na propositura de soluções criativas de mútuo benefício,
mesmo porque, para os envolvidos no conflito, costuma ser mais difícil a tarefa
de vislumbrar novas opções.
É fundamental, na sessão de abertura deixar claro o papel dos
advogados frente aos seus clientes, ao processo e com a mediação. Caso sinta
necessidade de prestar maior esclarecimento, o mediador após a sessão de
abertura poderá ter uma sessão privada com os advogados para ficar claro a
importância de seus clientes exporem os fatos, sentimentos, necessidades,
enfim dizer o que desejam.
Não há necessidade da participação do profissional em todas as
sessões, tendo em vista que na mediação de família trabalha-se basicamente
com sentimentos. No entanto, é fundamental firmar o compromisso que o
acordo só será realizado na presença do advogado.
3.6. PARTICIPAÇÃO DOS FILHOS NA MEDIAÇÃO
As crianças e adolescentes não participam presencialmente da
mediação, no entanto, toda sessão gira em torno dos seus interesses. O
mediador tem como um dos papéis trazer a voz da criança para a discussão.
Até porque os filhos têm direitos, pai e mãe obrigações e responsabilidades.
São os filhos que têm direito ao convívio com ambos os pais, com as
famílias materna e paterna de forma harmônica e o mais igualitária possível.
Como discutido no primeiro capitulo, são eles que mais sofrem com a
separação dos pais, decisão que não tomaram e muitas vezes não desejam.
O mediador de família necessita possuir um conhecimento teórico das
relações familiares para através das técnicas e ferramentas da mediação
propiciar aos pais a compreensão das necessidades dos filhos. Um dos
aspectos mais valiosos da mediação é levar os pais a olharem os filhos como
38
indivíduos e a considerarem os seus sentimentos e necessidades em paralelo
com os seus próprios.
É importante reconhecer os esforços dos pais no cuidado com os filhos,
especialmente, na separação que a estrutura familiar sofre um abalo em
diversos aspectos. Quanto maior a disputa maior a probabilidade dos filhos
estarem envolvidos nela.
O foco da mediação são as crianças e adolescentes e os pais se sentem
confortados em concentrarem a atenção nos filhos. Apreciam a objetividade em
discutir como as tarefas e decisões em relação aos filhos serão conduzidas de
forma prospectiva. Anteriormente o centro das desavenças, os atritos do ex-
casal, muda para o interesse mútuo, o bem-estar dos filhos. A comunicação
começa a fluir melhor e pendências ficam mais fáceis de serem abordadas.
Para se ter opções é preciso sentir-se parte do problema e desta forma pensar
em benefícios mútuos e não em benefícios exclusivos, é desenvolver uma
consciência critica.
Muitas vezes os filhos vêem-se em um triângulo emocional,
frequentemente, sendo a moeda de troca de interesses entre os pais. É comum
nesses casos surgir o conflito de lealdade, isto é, quando os filhos ou uma
parte dos filhos, apóiam um dos pais por pressão deste, por sentir que este
está fragilizado, por ser quem cuida, por pensarem em protegê-lo, em
contrapartida demonstram hostilidade ao outro genitor., mesmo que o ame.
Esse conhecimento é importante para o mediador, mesmo que não atue
diretamente sobre a situação, poderá ter uma atuação mais segura e
adequada.
Podem ser utilizadas técnicas no sentido de incluir indiretamente a
presença dos filhos. Uma delas é pedir aos pais um retrato de cada filho,
solicitando sua descrição. O mediador pode auxiliá-los a concentrarem nesse
retrato para perceberem a individualidade de cada um dos filhos.
O trabalho do mediador, particularmente o de família exige constante
atualização teórica, habilidades, sensibilidade, e muita paixão, própria de todo
trabalho voluntario.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a implantação do novo Código de Processo Civil, em março de
2016, a Guarda Compartilhada, isto é, a concessão da guarda a ambos os
pais no que tange as decisões da vida dos filhos, tornou-se unanimidade
entre os juízes e importante alternativa para pais separados com filhos
menores. Isso pressupõe uma comunicação entre os genitores de forma
clara e respeitosa, que não acontece apenas com a sentença do juiz -
precisa ser construída.
A preocupação central que impulsionou esse trabalho não foi analisar
as leis que regem a Guarda Compartilhada e a Mediação, já contempladas
em diversos estudos. O cerne da questão foi o questionamento se a
mediação apresenta em seu corpo teórico as condições de ser o mais
adequado instrumento autocompositivo na construção da Guarda
Compartilhada para filhos de pais separados.
Meu interesse como mediadora judicial foi o aprofundamento do
arcabouço teórico do Modelo Linear de Mediação para utilização em casos de
convivência e guarda, visando a construção da nova parentalidade. Como
também na manutenção e/ou restabelecimento dos vínculos com a família
materna e paterna.
A mediação é citada em artigos do Novo Código Civil como instrumento
de viabilização da Lei nº 13.058, de 22/12/2014 que dispõe sobre a aplicação
da Guarda Compartilhada. A fim de desempenhar um papel importante nessa
mudança de conduta estimulando a solução pacífica de conflitos,
preferencialmente, familiares.
Segundo Azevedo (2012) um dos benefícios da mediação consiste no
empoderamento das partes. Empoderamento é a tradução do termo inglês
empowerment e significa a busca pela restauração do valor e poder das partes
para que ambas estejam aptas a melhor dirimir futuros conflitos.
Enfim, empoderar é fazer com que a pessoa adquira consciência das
suas próprias capacidades e qualidades, a partir das técnicas aplicadas no
decorrer do processo de mediação. Outra vantagem é a oportunidade para as
partes falem sobre seus sentimentos em um ambiente neutro. Há também, a
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possibilidade de administração do conflito de forma a manter ou melhorar o
relacionamento anterior com a outra parte. A celeridade e baixo custo do
processo de mediação são outras vantagens.
Na mediação todo processo deve ser feito pelos participantes. O
mediador é o facilitador da comunicação entre as partes visando mudanças na
forma de como lidar com o conflito e viabilizar um possível acordo.
Portanto, entendemos ser a mediação o método autocompositivo mais
adequado para as ações de família, sobremaneira, àquelas com disputa da
guarda dos filhos.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, T. Caixa de Ferramentas em Mediação – aportes práticos e teóricos. São Paulo: Dash Editora, 2014. AZEVEDO, A.G. (org) Manual de Mediação Judicial. Brasil: Ministério da Justiça, 2012. BRASIL. Código Civil. Brasília, 2016. _____. Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasília, 1990. _____. Lei 13.058. Brasília, 2014. _____. Lei 13.140. Brasília, 2015. DOLTO, F. Quando os pais se separam. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1988. DUARTE, L.P,L. A guarda dos filhos na família em litígio: uma introdução da Psicanálise com o Direito. Rio de Janeiro: Editora Lumen Jurís, 2012. GROENINGA, G.C. A Guarda Compartilhada – a efetividade do poder familiar in Guarda Compartilhada Coltro e Delgado. São Paulo: Editora Método, 2016. HACK, S.M.P.K. e RAMIRES, V.R.R. Adolescência e divórcio parental: continuidade e ruptura dos relacionamentos. Rio de Janeiro: Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2010. JURAS,M.M. e COSTA,L.F. O divórcio na perspectiva com filhos menos de 12 anos. Estilos da Clínica. São Paulo, vol.16 nº.1 , jun. 2011. ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL Comissão de Mediação de Conflitos. Rio de Janeiro, sem data. SILVA, D.M.P. Mediação e Guarda Compartilhada: conquistas para a família. Curitiba: Juruá, 2011 SOUZA e SILVA, F.A. A judicialização dos conflitos afetivos in Família do século XXI: aspectos jurídicos e psicanalíticos, Rio de Janeiro: EMERJ, 2013. WALLERSTEIN,J; LEWIS, J,BLAKESLEE,S. Filhos do Divórcio, São Paulo: Edições Loyola , 2002.
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WINNICOTT, D. W. Fatores de integração e de ruptura na vida familiar in A família e o desenvolvimento do individuo. Belo Horizonte: Interlivros, 1980.
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ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2 AGRADECIMENTOS 3 DEDICATÓRIA 4 RESUMO 5 METODOLOGIA 6 SUMÁRIO 7 INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
A GUARDA COMPARTILHADA 9 1.1. COMO OS FILHOS VIVENCIAM A SEPARAÇÃO DOS PAIS 9
1.2. A GUARDA COMPARTILHADA 12
CAPÍTULO II
A MEDIAÇÃO 17
2.1. A MEDIAÇÃO NO JUDICIÁRIO BRASILEIRO 17
2.2. O CONFLITO NO OLHAR DA MEDIAÇÃO 19
2.3. FERRAMENTAS DA MEDIAÇÃO 21
2.4. O PROCESSO DE MEDIAÇÃO 23
CAPÍTULO III
O MEDIADOR DE FAMÍLIA 27
3.1. O MEDIADOR E A DINÂMICA DA SEPARAÇÃO DOS PAIS 27
3.2. TRABALHANDO O CONFLITO 29
3.3. AS PERGUNTAS 31
3.4. ATUAÇÃO DO MEDIADOR 33
3.5. OS ADVOGADOS NA MEDIAÇÃO 36
3.6. PARTICIPAÇÃO DOS FILHOS NA MEDIAÇÃO 37
CONSIDERAÇÕES FINAIS 39 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 41 ÍNDICE 43