POLÍTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES, DESENVOLVIMENTO
PROFISSIONAL E (RE) CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DOCENTE
O painel ora proposto visa discutir três experiências de formação de professores, sendo
duas de formação inicial e uma de formação continuada que se originaram de programas
específicos: Pronera, Parfor e a Política de Formação em Educação de Jovens e Adultos. Os
artigos tem em comum a preocupação com as influências que os processos formativos
exercem sobre as representações, saberes e práticas dos professores, reconhecendo que o
desenvolvimento profissional é um continum que articula múltiplos tempos e espaços de
socialização e profissionalização. O primeiro artigo aborda as condições de socialização
(contexto familiar e escolar em municípios predominantemente rurais) de professores
egressos do Parfor, antes do ingresso na profissão. A partir dessas trajetórias, busca-se
compreender suas influências sobre a formação inicial e, por sua vez, a forma como a
formação inicial, com as configurações históricas existentes, influencia decisivamente a (re)
construção identidades pessoais e profissionais. O segundo artigo deriva de uma pesquisa
concluída sobre a relação teoria e prática no Curso de Pedagogia desenvolvido em parceria
com o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra e da relação dessa experiência com
o Curso de Pedagogia, proposto ao Plano Nacional de Formação de Professores da
Educação Básica - Parfor. O terceiro capítulo analisa o modo como vai se constituindo a
identidade docente de professores da Educação de Jovens e Adultos. A pesquisa investigou
professores da EJA do município de Bragança, Pará, que cursaram a Especialização em
EJA oferecido pela UFPA, no intuito de compreender as seguintes questões: Quais os
sentidos e significados que os professores atribuem a Educação de Jovens e Adultos? Que
escolhas orientam sua forma de agir/trabalhar em sala de aula? Que reflexões sobre a EJA e
sobre sua ação docente apontam para afirmações e ou rupturas de sua identidade docente na
EJA?
Palavras-chave: Políticas Educacionais. Formação de Professores. Desenvolvimento
Profissional.
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A PESQUISA NO PROCESSO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES A
PARTIR DO CHÃO DA ESCOLA
Georgina Negrão Kalife Cordeiro
RESUMO
Trata este artigo sobre pesquisa realizada com egressos de Curso de Pedagogia, na qual se
discute a importância da pesquisa no processo de formação de professores, a partir de duas
experiências desenvolvidas pela Faculdade de Educação da Universidade Federal do Pará,
Campus Belém. Os cursos foram de Licenciatura em Pedagogia, adotando a metodologia da
Pedagogia da alternância, que procura instituir o processo de formação articulando teoria e
prática na elaboração das propostas pedagógicas. As experiências foram originadas com
demandas distintas; sendo uma feita pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra e outra
pelo Plano Nacional de Formação de Professores para a Educação Básica. Serviram de
referência para esse estudo os seguintes autores: Roseli Caldart e Paulo Freire. A
metodologia utilizada foi de cunho qualitativo, de caráter exploratório tendo a observação e
a entrevista como instrumentos. Dentre os resultados encontramos uma equipe de
profissionais da educação atuando na escola com claras evidencias em suas práticas
pedagógicas de que a concepção freireana de educação e os princípios da educação do
campo de fato são vivenciados e construídos coletivamente no cotidiano, como fruto das
experiências curriculares vividas nos cursos de formação de professores..
Palavras chave: Formação de Professores; Pedagogia da Alternância; relação teoria-prática
Tratar sobre a formação de professores tendo como foco a pesquisa e a escola
pública, implica em fundamentar o porquê dessa relação. Este artigo deriva de uma
pesquisa concluída sobre a relação teoria e prática no Curso de Pedagogia desenvolvido em
parceria com o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra e da relação dessa
experiência com o Curso de Pedagogia, proposto ao Plano Nacional de Formação de
Professores da Educação Básica - PARFOR.
A Faculdade de Educação da Universidade Federal do Pará –UFPA, Campus
Belém, há 60 anos vem trabalhando com esse objetivo, traçando uma trajetória marcada
pelas reflexões e adequações conforme as exigências legais e sociais a cada tempo.
Nas duas últimas décadas, vivenciou experiências diversificadas no âmbito da
formação de professores para públicos diferenciados, conforme demanda apresentada por
movimentos sociais e por programas governamentais.
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No ano de 2000, em parceria com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra – MST, desenvolveu experiência de formação de professores de assentamentos de
reforma agrária e em 2010 participou na oferta de Cursos de Pedagogia para professores da
rede pública dentro do Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica –
PARFOR.
Em que pese estar a Universidade sempre atenta para atender as demandas da
sociedade, causou estranheza ao corpo docente de modo geral da Faculdade de Educação da
UFPA, ser demandada pelo MST para a oferta de um curso para formação de professores
visando atender aos professores das escolas de assentamento do referido movimento.
O passo inicial foi a criação de uma comissão formada por professores e
representantes do MST, para elaborar o projeto de curso de modo que atendesse as
necessidades e a realidade das escolas dos assentamentos localizados na área rural dos
estados demandantes, visto tratar-se de uma organização/representação regional do
movimento.
A comissão elaborou um projeto de curso a partir da resolução que vigia o curso
ofertado à comunidade com acréscimos de temáticas específicas. Esses acréscimos diziam
respeito a temas específicos pautados na concepção de educação do campo, que ao
considerar o campo como espaço de vida e de singularidades que a escola urbana não
contemplava, razão pela qual necessitava de um projeto específico para formação de
professores em exercício nas escolas do campo.
Deste modo o projeto político pedagógico do Curso de Pedagogia, tomou o nome
fantasia de Pedagogia da Terra, pautado e inspirado na luta travada pelo MST, tendo como
uma de suas propostas, a mobilização das massas pela conquista da terra em oposição à
classe latifundiária e ao Estado.
Este movimento, como diz Vendramini (2006), desenvolve ações que envolvem
desde a elaboração de um projeto político e social para o país, através da organização dos
trabalhadores rurais, até a participação em relações internacionais formando redes de
oposição a políticas de cunho neoliberal. Assim, juntando homens e mulheres do campo e
da cidade, o MST organiza frentes de massa em volta de um objetivo que vai além da
ocupação da terra, traduzida em seu lema “Ocupar, resistir, produzir” esse produzir envolve
também um novo modelo de sociedade, do qual a educação é um instrumento fundamental.
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E é na história das sociedades como produção social do homem, que vamos
encontrar a proposta educacional do MST, desenvolvida em parceria com a Universidade
Federal do Pará, na formulação da proposta vivenciada através da turma Onalício Araújo
Barros, do Curso de Pedagogia. Na proposta curricular do curso, a metodologia da
alternânciai se aplica conforme sua realidade e assumida como princípio em seu processo
educativo.
É este o diferencial incrustado no Curso de Pedagogia desenvolvido pela Faculdade
de Educação da UFPA, Campus Belém, no período de 2000 a 2005.
A pesquisa foi desenvolvida entre os egressos do Curso no sentido de identificar a
materialização da relação teoria e prática, vivenciada no Curso através de pedagogia da
alternância. A pedagogia da alternância vai caracterizar a turma de Pedagogia e diferencia-
la das demais turmas ofertadas pela Universidade, não só pela metodologia, mas também
pelas características dos alunos conforme cita o Projeto Político Pedagógico.
O Curso que ora delineamos se destina para um grupo de pessoas que apresenta
características distintas daquelas que ingressam no Curso de Pedagogia do
Campus do Guamá. Esse grupo é constituído de professores que já militam na
educação em funções docentes e não docentes. Além disso, são profissionais que
desenvolvem uma práxis política em um contexto social concreto, que é a luta
pela terra, em torno da qual se desenvolve a luta pela vida e pela cidadania.
(UFPA, 2000, p. 8)
Vimos que, os docentes/discentes, além do exercício da profissão, são também
militantes de uma causa social, que se entregam à luta por um projeto de sociedade. Nesse
caso, adota-se a metodologia da pedagogia da alternância, que se caracteriza pelo Tempo
Escola e Tempo Comunidade, que são tempos e espaços específicos que se alternam entre o
período de férias ou recesso escolar dos professores e os tempos em que trabalham, uma
vez que são professores das escolas nos assentamentos.
No Projeto Político Pedagógico do Curso, amparado em legislação específica, um
percentual da carga horária de cada disciplina era trabalhado na etapa nas instalações da
UFPA, enquanto o percentual restante ficava para ser desenvolvido nas comunidades
(assentamentos) de origem de cada aluno, aliando ao fato de atender ao contido no projeto
político pedagógico em seus princípios curriculares, a pesquisa como forma de
conhecimento e intervenção na realidade social
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Nesse formato cada Tempo Escola tinha duração de 45 e 35 dias letivos,
considerando-se os períodos de janeiro a março e julho a agosto respectivamente – em que
previa-se possíveis alterações ao longo da implantação do Projeto, de forma a viabilizar o
Curso. Essas possíveis alterações estavam presentes no projeto político-pedagógico do
curso (2000, p. 23) em suas várias dimensões e, particularmente, na dimensão Pesquisa e
Prática Pedagógica,
Esta dimensão deverá contemplar um corpus de conhecimento sobre a produção
cientifica no campo educacional, cujo recorte será o trabalho pedagógico nas suas
múltiplas dimensões. Partindo dos campos de saberes anteriores, que apontam
para a inclusão de campos-sínteses nos quais se expressam unidades integradoras
do conhecimento educacional, os estudos decorrentes desta dimensão deverão
incidir sobre saberes que possibilitem aproximações conceituais sucessivas à
realidade empírica, a ser interrogada, compreendida, analisada, planejada e
modificada pelo profissional da educação em formação, numa perspectiva de
totalidade.
O projeto trazia, assim, a flexibilidade como um dos elementos estruturantes, que
permitia a prática da construção coletiva a partir da realidade das escolas nas quais os
professores em formação trabalhavam.
No final de cada etapa realizava-se avaliação com a participação ativa da turma,
com a coordenação do MST e com os professores da referida etapa.
Esse procedimento era próprio da proposta do MST, como consta na obra de
Caldart (2003, p. 100):
[...] algumas exigências específicas desse processo formativo tais como: [...]
vincular mais diretamente o currículo do curso com as demandas concretas de
formação dos participantes, à medida que implica num ir e vir constante entre
diferentes práticas e estudos teóricos, faz das próprias práticas pedagógicas nas
comunidades parte integrante do currículo, [...] permite um processo acelerado de
ajustes ou transformações na proposta pedagógica do Curso, em função de sua
permanente avaliação pelo conjunto das pessoas envolvidas, direta ou
indiretamente, com seus resultados.
Como fruto dessas avaliações, ocorridas ao longo das três primeiras etapas, foi-se
amadurecendo a ideia de planejá-las por disciplinas afins, para que os trabalhos do Tempo-
Comunidade não fossem mais individuais (disciplinas), mas tivessem o caráter
interdisciplinar num único trabalho. E assim surgiu a proposta – a partir da 4ª Etapa – de
que os trabalhos do Tempo-Comunidade fossem planejados em conjunto pelos professores
das disciplinas afins.
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Esse movimento de construção curricular estava baseado na concepção freireana de
educação, que leva-nos a pensar a partir da Pedagogia da Autonomia, o que se espera da
escola e do educador numa perspectiva crítica, conforme afirma Freire, A reflexão crítica
sobre a prática se torna uma exigência da relação teoria e prática sem a qual a teoria
pode ir virando blá blá,blá e a prática ativismo (1998, p.24).
Com base nessas ideias os alunos procuraram desenvolver seus trabalhos, com
destaque o fato de que, nesta obra, Freire convoca os educadores a fazerem opções,
assumindo suas posições como sujeitos transformadores de sua realidade, transformadores,
ainda no sentido de alterar a ordem estabelecida, inspirados nesse pensamento de que é
preciso resistir e avançar na luta sem tornar-se radical e sim aberto aos processos de
construção coletiva, evitando tornar-se o ator principal o “dono” da verdade.
Neste ponto, a materialização da relação teoria e prática no processo de formação de
professores, torna-se viável com a pedagogia da alternância que através da pesquisa a partir
da realidade do docente/formando, oportuniza reflexão sobre a prática desenvolvida e a
alteração da mesma numa relação que estabelece uma nova práxis.
A práxis, neste sentido, é junção da teoria e da prática, ao relacionar as teorias
estudadas com as práticas refletidas e aproximadas ao que se acredita ser o política e
humanamente correto, encontram respaldo no pensamento de Freire, quando assim se
posiciona,
A libertação autêntica, que é a humanização em processo, não é um coisa que se
deposita nos homens. Não é uma palavra a mais, ôca, mitificante. É praxis, que
implica a ação e a reflexão dos homens sobre o mundo para transformá-lo. (1979,
p. 77).
A práxis é a atividade concreta pela qual os sujeitos humanos se afirmam no mundo,
modificando a realidade objetiva e, para poderem alterá-la, transformam-se primeiro.
A práxis é a atividade que, envolve o pensar, o problematizar, e nesse processo
realiza-se a humanização, o tornar-se consciente, o voltar-se sobre si mesmo, e isso vai
tornando o sujeito mais livre e mais consciente.
Esta reflexão era uma constante nos momentos coletivos e também individualmente,
mas sobrepunha-se sempre o coletivo. Eles estavam na escola, trabalhavam na escola e
eram lideranças no assentamento, ou seja, exerciam sua militância num conjunto de
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atividades inextrincáveis, o curso, as atividades de leitura, as teorias, só ajudavam na
reflexão cotidiana das práticas educativas ali desenvolvidas, isto está bem explícito na fala
de alunos do curso.
Esta foi uma semana de desafios; estudar para garantir as atividades do curso de
pedagogia da terra, que não são poucos; continuar e concluir o curso de formação
de professores alfabetizadores (PROFA) e mais os trabalhos do curso de
educação infantil, além de todas as responsabilidades que possui uma professora
do projeto de reintegração. (Diário de Campo, Aluna D).
Em relação ao curso pedagogia da terra, concluímos o trabalho de estatística que
foi de caráter coletivo, que exigiu bastante de cada um/a de nós responsáveis,
principalmente pelo fator de mexer com nossas fragilidades internas do Setor de
Educação do Assentamento Palmares, as quais nos levam a necessidade urgente
de refletirmos profundamente, sobretudo, planejarmos as possíveis intervenções
político-pedagógicas que nos cabe estar à frente. (Diário de Campo, Aluna L).
A práxis (ação-reflexão-ação) traz sempre a marca da reflexão sobre a ação, não se
admite uma ação que não seja desencadeadora de uma profunda reflexão teórica sobre a
mesma. As atividades e estudos do Curso, com forte determinação do Movimento,
oportunizam esse ciclo de reflexões, não uma prática desvinculada, mas uma prática
vinculada a um projeto de sociedade, alimentada por sonhos e utopias capazes de fazer o
diferencial na proposta curricular.
Foi com esse diferencial na proposta curricular, que em 2010 a Faculdade de
Educação adere ao Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica –
PARFOR, do Campus Belém. O PARFOR é resultado da ação conjunta do Ministério da
Educação (MEC), de Instituições Públicas de Educação Superior (IPES) e das Secretarias
de Educação dos Estados e Municípios, no âmbito do PDE - Plano de Metas Compromisso
Todos pela Educação.
Segundo o Projeto Político Pedagógico, o eixo estruturador do currículo (docência,
gestão educacional e coordenação do trabalho pedagógico) aglutina em torno de si três
núcleos articuladores que, por sua vez, organizam as atividades curriculares segundo a sua
especificidade: o Básico, o de Aprofundamento e Integrador.
Os núcleos agrupam e organizam as atividades curriculares, mas não respondem ao
problema histórico de fragmentação e compartimentalização do conhecimento. Por sua vez,
a diversificação curricular que admite, além das disciplinas, outras formas de atividades
como oficinas, seminários etc. não garante uma inovação curricular se as grandes fundações
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da ciência moderna não são alteradas. Coloca-se então o problema da Integração
Horizontal e, por sua vez, a necessidade de constituição de espaços curriculares em que
roteiros para a ação interdisciplinar possam ser delineados.
A matriz curricular do curso tem uma carga horária de 3.200 horas e, é desenvolvida
de forma diferenciada, buscando uma integração entre ensino, pesquisa e extensão, uma vez
que os estudantes do curso já são professores, diretores, técnicos das escolas públicas
atuando sem a devida formação.
Dessa forma, a prática desses sujeitos no local em que vivem é um elemento
fundamental como eixo articulador do currículo do curso, considerando a unidade entre
ensino, pesquisa e extensão.
O formato do Curso de Pedagogia/PARFOR oportuniza que a prática social e a
prática pedagógica dos professores se revelem nas ações desencadeadas pela metodologia
da pedagogia da alternância. Essa opção foi possível pela experiência já feita pela
Faculdade de Educação, na turma de Pedagogia da Terra, embora nem todos os professores
tenham aderido à proposta.
Considerações finais
Podemos dizer que a Formação de Professores vem sendo pautada na pesquisa, a
partir do chão da escola, conforme nos demonstra as experiências vivenciadas com os dois
cursos de Pedagogia, ofertados em circunstâncias distintas, uma demandada pelo
movimento social, acreditando num projeto de desenvolvimento para o país a partir dos
trabalhadores do campo, e outro dentro duma política de governo que está pautada em um
projeto de desenvolvimento que privilegia o capital.
Cabe a nós, educadores, investir e apoiar cada vez mais projetos de pesquisa que
tenham o foco no cotidiano das escolas, não numa pesquisa de alguém que está fora, mas
dos próprios sujeitos que conseguem problematizar a sua prática e, distanciando-se,
conseguem refletir e redirecionar as praticas educativas que resultarão na construção de um
novo momento, na realização de sonhos que estão presentes nas mentes e nos corações dos
que almejam uma nova forma de organização da sociedade. O que carece urgentemente é a
realização da articulação dos saberes científicos presentes nas ementas das disciplinas
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curriculares com o saber tradicional/experiência feita dos alunos, e a adesão à proposta por
parte dos professores universitários.
A pesquisa implica em conhecer a realidade, para a partir dela, iniciar o processo de
problematização que culminará nas descobertas e intervenções consequentes às
necessidades levantadas. Nesse sentido, nos dois cursos, os alunos planejavam a pesquisa a
ser realizada no Tempo Comunidade, juntamente com os professores de cada turma, para
que no período seguinte do Tempo Comunidade, seja trabalhado através de projetos de
extensão, facilitando assim a articulação teoria e prática, tão necessária no processo de
formação de professores, que deve sempre ser um processo de construção, de recriação a
partir das situações concretas vividas pelos professores.
Essa relação sujeito-objeto, na perspectiva aqui trabalhada, oportuniza que o
discente/professor da rede básica, possa, numa atitude de pesquisador, após iniciar o curso,
olhar, estranhar o seu ambiente, e à luz dos conhecimentos científicos, abordados nos
componentes curriculares, problematizá-lo e buscar alternativas que correspondam às suas
necessidades e compartilhá-lo no coletivo de sua comunidade, escola e região, nas ações de
extensão, materializando assim, os pilares da educação superior da IES que é o ensino a
pesquisa e a extensão.
Os princípios norteadores do projeto político pedagógico vêm sendo trabalhado ao
longo desse percurso, de modo que, a cada período que antecede o Tempo Universidade,
reúnam-se os professores universitários para planejamento e construção das temáticas a
serem desenvolvidas em cada turma, considerando o conhecimento já antes elaborado e
construído como resultado dos trabalhos do Tempo Comunidade. É neste ponto que se
apresenta o outro desafio acima citado, a adesão e envolvimento dos professores à proposta
aqui apresentada.
Atualmente, com as turmas pesquisadas se observa a apreensão e a pratica
pedagógica vivenciada a partir da pesquisa na realidade da escola. Lembremo-nos que a
proposta trata sobre a formação de professores, tendo a pesquisa como base e como
propulsora do processo de aquisição do conhecimento e na aplicabilidade concreta dos
princípios da educação libertadora de base Freireana.
Referências
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CALDART, Roseli Salete, Pedagogia do Movimento Sem terra: escola e mais do que
escola. Rio de Janeiro: Vozes, 2000.
,__________ Roseli Salete, MOLINA, Monica (Orgs.) Por uma educação do campo
.Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes 2004.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática pedagógica. São
Paulo: Paz e Terra, 1998.
________Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 2000.
PARÁ, UFPA/ICED (2010). Projeto Político Pedagógico do Curso de Pedagogia
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ, Instituto de Ciências da Educação. Projeto
político pedagógico - Curso de Pedagogia. Belém, 2001
VENDRAMINI, Célia Regina. Terra Trabalho e Educação: experiências socioeducativas
em assentamentos do MST. Ijui-RS: Editora UNIJUI, 2000.
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CONSTITUIÇÃO DA IDENTIDADE DOCENTE NA EDUCAÇÃO DE JOVENS
E ADULTOS
NEVES, Joana d’Arc de Vasconcelos -
UFPA-FACED-BRAGANÇA-PA
Descortinando o cenário
O presente estudo tem como objetivo analisar o modo como vai se constituindo a
identidade docente dos professores da Educação de Jovens e Adultos no município de
Bragança.
Nosso interesse pelo tema da identidade nasce de um projeto de pesquisa
desenvolvido pelo Centro de Documentação e Memoria de EJA na região Amazônica, cujo
objetivo era investigar a constituição identitária de professores da EJA, entendendo que as
representações que esses profissionais têm de si como docentes interferem em sua prática
pedagógica e nas relações que desenvolvem com os sujeitos do espaço escolar.
Na pesquisa que ora apresentamos, nos dedicamos, primeiramente, a compreender e
discutir o conceito de identidade tendo em vista sua apropriação conceitual para o campo
teórico da formação de professores da EJA para, em um segundo momento, analisar nos
discursos dos professores de EJA no município de Bragança os sentidos e significados que
dos que buscam formação específica em EJA atribuem a Educação de Jovens e Adultos;
identificar as escolhas que orientam suas forma de agir/trabalhar em sala de aula; analisar
de que forma essas reflexões sobre a EJA e sobre sua ação docente para o professor nesta
modalidade de ensino apontam para afirmações e ou rupturas de sua identidade docente na
EJA.
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Construindo o enredo: o conceito de identidade e a identidade docente na EJA
Partido campo teórico da sociologia principalmente dos postulados de Dubar (1997)
assumimos neste trabalho a ideia de que a identidade é resultado do processo de
socialização, que compreende o cruzamento dos processos relacionais ( o sujeito é
analisado pelo outro dentro dos sistemas de ação nos quais os sujeitos estão inseridos) e
biográficos (que tratam da história, habilidades e projetos da pessoa).
Isto significa dizer:
a) A identidade nunca é dada, é sempre construída e a (re) construir, em uma
incerteza maior ou menor e mais ou menos durável;
b) A identificação vem do outro, mas pode ser recusada para se criar outra.
c) Usa categorias socialmente disponível para estabelecer os processos de
identificação;
d) Os sujeitos assumem diversas identidades.
Assim, o processo de constituição da identidade, no campo conceitual de Dubar
(1997), se constitui em um movimento de tensão permanente entre os atos de atribuição
(que correspondem ao que os outros dizem ao sujeito que ele é, e, que o autor denomina de
identidades virtuais) e os atos de pertença (em que o sujeito se identifica com as atribuições
recebidas e adere às identidades atribuí- das).
Enquanto a atribuição corresponde à identidade para o outro, a pertença indica a
identidade para si, e o movimento de tensão se caracteriza, justamente, pela oposição entre
o que esperam que o sujeito assuma e, seja, e o desejo do próprio sujeito em ser e assumir
determinadas identidades. Logo, o que está no cerne do processo de constituição identitária,
segundo o autor, é a identificação ou não identificação com as atribuições que são sempre
do outro, visto que esse processo só é possível no âmbito da socialização.
Dubar (1997) sintetiza a constituição das formas identitárias a partir da ocorrência
de dois processos: o relacional e o biográfico. O primeiro diz respeito à identidade para o
outro, em que as transações assumem um caráter mais objetivo e genérico; enquanto o
biográfico, corresponde à identidade para si, cujas transações são mais subjetivas, e
compreende as identidades herdadas e identidades visadas. Desse modo, os processos
relacional e biográfico concorrem para a produção das identidades. Assim, a identidade
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social é marcada pela dualidade entre esses dois processos, e a dialética, estabelecida entre
eles, é o cerne da análise sociológica da identidade para esse autor.
Nesse sentido, o movimento pelo qual os professores se fazem professores não se dá
em linha reta, a dinâmica das interações e experiências vivenciadas por esses sujeitos (do
percurso, antes, durante e depois da graduação) se entrecruzam e fomentam identificações
com (a docência) um determinado público ou modalidade, como nos diz Freire (1997)
“ninguém começa a ser educador numa certa terça feira às quatro horas da tarde. Ninguém
nasce educador ou marcado para ser educador. A gente se faz educador, a gente se forma,
como educador, permanentemente, na prática e na reflexão da prática". (p.58).
Ao se tratar da especificidade da identidade docente na Educação de Jovens e
Adultos o debate tem recaído sobre a visão de que aos profissionais que atuam para atender
o processo educativo desse público (jovens e adultos, seja em programas ou para o sistema
de ensino), não é exigida nenhuma formação específica de área, e, muitas vezes, as pessoas
que atuam como docentes, principalmente em programas, sequer têm formação.
Segundo Machado (2008) A ausência de uma formação adequada (tanto inicial
quanto continuada) acaba por contribuir para a perpetuação do local marginal ocupado pela
EJA no sistema educacional, pois sem esta, é mais difícil ainda para os professores
construírem respostas e estratégias para os diferentes dilemas vivenciados na prática
educativa e construírem as identidades para si.
Dentro deste cenário, cabe ressaltar que o reduzido número de oferta de disciplina
voltados para a formação da EJA nos currículos dos cursos de graduação, não contempla o
que recomenda as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da
Escola Básica, Parecer CNE/CP Nº 009/2001, ou seja, que no Brasil, um curso de formação
de professores não pode deixar de lado a questão da educação de jovens e adultos, que
ainda é uma necessidade social expressiva, O que nos leva a afirmar no que se refere à
formação inicial em nível superior, que ainda existe uma grande lacuna nas licenciaturas
quanto ao reconhecimento da EJA como lócus de formação específica e permanente como
política de Estado (SOARES, 2006).
As lacunas das formações iniciais e continuadas voltadas para uma formação
especifica, no campo teórico da EJA, analisadas por Leôncio Soares (2006) e Margarida
Machado (2008) entre outros, apontam para a necessidade de pensar a especificidade dos
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alunos da EJA e de superar a prática de trabalhar com eles da mesma forma que se trabalha
com os alunos do ensino fundamental ou médio regular, visto que, apesar de se tratar das
mesmas etapas de escolaridade (ensino fundamental e médio), os jovens e adultos, por
estarem em outros estágios de vida, possuem experiências, expectativas, condições sociais,
culturais, históricas e psicológicas que tanto demarcam diferenças quanto os distanciam do
mundo infantil e adolescente. Tais proposições trazem então, uma referência, elementos
que permitem dizer que os professores que se dedicam à docência na EJA devam ser
capazes de desenvolver metodologias apropriadas, conferir novos significados aos
currículos e às práticas de ensino.
Desta forma, quando trazemos o debate da identidade docente para este cenário do
campo teórico da EJA, percebemos que é um tema complexo, multifacetado, pois não se dá
num determinado momento. Pelo contrário, se fôssemos utilizar uma imagem, poderíamos
dizer que essa construção que se dá em forma de mosaico em virtude das nuances que a
constitui, que estão para além da formação inicial, mas que passa pelos campos de atuação
que pode atuar ( Alfabetização, Movimentos Populares, EJA Prisional, PROEJA,
PROJOVEM, EJA fundamental, EJA médio... etc)
Neste sentido, analisar (compreender) a constituição da identidade docente passa
para necessidade de destacarmos na dinâmica das relações que constituem os aspectos
objetivos (as relações que os professores estabelecem com a profissão de trabalho na EJA e
com a retribuição concreta que dá com o seu trabalho para a sociedade) e os aspectos
subjetivos desse processo (a-identidade para si, valores construídos ao longo da vida
pessoal e profissional).
Assim, para analisarmos a constituição da identidade docente na EJA dos
professores do município de Bragança que buscam formação especifica no curso de
especialização em EJA 2014/2015, compreendendo as dimensões objetiva e subjetiva desse
processo, buscamos:
a) Identificar os sentidos e significados que os professores da EJA que buscam
formação específica em EJA atribuem a Educação de Jovens e Adultos;
b) Mapear as escolhas que orientam suas forma de agir/trabalhar em sala de aula;
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c) Analisar de que forma essas reflexões sobre a EJA e sobre sua ação docente para
o professor da apontam para afirmações e ou rupturas de sua identidade docente
na EJA.
No intuito de alcançar esses objetivos a pesquisa de campo foi realizada por meio
de uma abordagem qualitativa na qual se utilizou entrevistas semiestruturadas. Essa técnica
foi escolhida, pois segundo Moreira e Caleffe (2006), “permite exercer certo tipo de
controle sobre a conversação, embora se permita ao entrevistado alguma liberdade. Ela
também oferece oportunidade de esclarecimento de qualquer resposta quando necessário.”
(p.169).
Para tanto a pesquisa foi desenvolvida na cidade de Bragança -PA com os 40
professores que cursaram a Especialização em Educação de Jovens e Adultos na UFPA
Campus de Bragança 2014-2015.
O processo deu-se da seguinte forma: a) utilizou-se um roteiro com perguntas
objetivas e, em seguida das resposta apresenta-se ao entrevistado alguma tarjeta contendo
palavras-chave. Esse modelo de roteiro nos possibilitou controlar os direcionamentos e ao
mesmo tempo garantir que os professores poderiam discorrer livremente sobre as questões.
As entrevistas foram gravadas e depois transcritas.
Após as transcrições, as falas dos entrevistados foram analisadas a partir dos
sentidos e significados que estes professores apresentam sobre: a) aspectos objetivos, b)
aspectos subjetivos, e c) rupturas e modelos, conforme apresenta-se a seguir:
Escrevendo o release
A)-ASPECTOS OBJETIVOS: AS RELAÇÕES QUE OS PROFESSORES
ESTABELECEM COM A PROFISSÃO DE TRABALHO NA EJA E COM A
RETRIBUIÇÃO CONCRETA QUE DÁ COM O SEU TRABALHO PARA A
SOCIEDADE
A concepção de EJA presente nos discursos dos professores entrevistados,
reverencia a ideia de ser um caminho diferenciado possível escolhido por uma demanda de
sujeitos em condição social adversa, é a oportunidade de estudo para as pessoas que não
tiveram oportunidade de estudar (PROFESSORES).
Neste cenário, esses professores demarcam em seus discursos duas concepções para
definir o aluno da EJA. A) “(...) são alunos tem esperanças e sonhos de conseguirem algo
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mais da vida (...); B) pessoas com dificuldades, mas apesar das adversidades querem algo
da vida.
Diante deste público, a EJA se configura aos educadores que assumem esta
modalidade ensino como um desafio diante da diversidade de alunos de refletir sobre a
realidade desses educandos. Neste sentido, há no discurso dos professores entrevistados de
que a EJA possui um papel diferente da escola regular (é muito mais do que ensinos
teóricos, filosóficos ), há um outro lugar da EJA (tem muita coisa) , embora, não se tenha
muito claro que lugar seja este (tem muito coisa ainda pra se fazer), conforme
identificamos no professor.
então a concepção que eu tenho hoje de EJA, é que ainda apesar de tudo,
tem muita coisa ainda a se fazer por esses jovens, tem muita coisa. E não
só na parte teórica, prática, filosófica, mas tem muita coisa ainda pra se
fazer. (professora (P2)
Embora os professores não tenham claro como realizar essa reflexão da realidade do
aluno para referenciar o ponto de partida do trabalho docente na EJA, eles apresentam no
seu discurso, a orientação necessária, para o desenvolvimento de práticas mais
humanizadas e em sintonia com as necessidades desses educandos em sua busca por
oportunidade.
Estudiosos do campo teórico da EJA como Haddad (2012), destacam que o desafio
na contemporaneidade é marcado pela necessidade de um planejamento que considere as
características, necessidades e disponibilidades dos sujeitos envolvidos. Procurar promover
articulações com a sociedade onde estão inseridos garantido não apenas o acesso e a
permanência mais o sucesso escolar, uma escola como um lugar de possibilidades de uma
existência mais humanizada. Nessa direção:
Lutar pela humanização fazer-nos humanos é a grande tarefa da
humanidade. Aí está situada toda tarefa pedagógica: contribuir com a
humanização. Este o sentido do fazer educativo. Este o sentido de tantas
renuncias feitas pela infância, adolescência, juventude popular para
permanecer na escola, para dividir tempos de escola e trabalho. Este é o
sentindo de esperar melhorar de vida, de sair dessa vida aperreada,
indigna de gente. A escola como um tempo mais humano, mais
humanizador, esperança de uma vida menos inumana. (ARROYO, 2000,
p. 240)
De acordo com Freire (1997), “não é possível respeito ao educando, à sua
dignidade, a sua identidade fazendo-se, se não se levam em consideração as condições em
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que eles vêm existindo.” (p. 64). Não obstante, a realidade enfrentada pelos alunos deve ser
articulada com os conteúdos para que estes percebam a relação entre conhecimento e a
possibilidade de conquista de um viver mais digno. Sobre isso Freire nos monstra a
necessidade do trabalho docente estar articulado a humanização do processo educativo:
“Constatar esta preocupação (com a humanização) implica,
indiscutivelmente, reconhecer a desumanização, não apenas como
viabilidade ontológica, mas como realidade histórica. É também, e talvez
sobretudo, a partir dessa dolorosa constatação que os homens se
perguntam sobre a outra viabilidade – a de sua humanização. Ambas, na
raiz de sua inconclusão, os inscrevem num permanente movimento de
busca. Humanização e desumanização, dentro da história, num contexto
real, concreto, objetivo, são possibilidades dos homens enquanto seres
inconclusos e conscientes de sua inconclusão.” (FREIRE, 2011, p. 40)
Nesse sentido atuar na EJA direciona os educadores a assumirem uma postura
profissional humilde e respeitosa e que corresponda aos anseios dos educandos em suas
condições reais de existência. Traz também a esses professores a necessidade do modelo
docente da EJA buscar a aproximação com a dimensão humana.
Isto significa dizer que a prática docente reivindica em sua essência, um nova forma
de ser professor da EJA :
“Nosso dever de oficio será mais complexo, exigirá um
profissionalismo mais refinado diante das marcas de desfigurações
humanas que a infância e adolescência trazem na passagem da rua e
do trabalho para a escola. Possivelmente a primeira exigência desse
profissionalismo refinado será não separar crianças e adolescentes,
não catalogá-los pelas lacunas e maracas de desumanização que
possam trazer. Evitar toda manifestação de segregação (por não
dominar a lectoescrita), por indisciplina, pelos hábitos e
indisciplinas que tiveram que aprender pra sobreviver na barbárie.”
(ARROYO, 2000, p. 245-246)
Assim, entendemos que a concepção de EJA presente nos discursos dos professores
entrevistados indica a compreensão dessa modalidade a partir dos sujeitos que ela é voltada.
Dito de outra forma, são os educandos que fazem a EJA ser o que é, enquanto modalidade,
o que acaba por inscrevê-la, também, como um lugar ou caminho de oportunidades para
esses alunos conquistarem uma existência mais humana, critica.
Em síntese de acordo com a compreensão que tivemos da fala dos professores
pensar a EJA é enxergar nela os educandos que a compõem. Diante disso, saber o que os
professores pensam sobre a EJA se constituiu como o primeiro passo para compreender
como os mesmos se fazem professores da modalidade. Visto que essas concepções estão
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presentes quando preparamos as aulas ou as provas, quando pensamos a função social das
escolas e da docência e quando são elaboradas políticas e propostas curriculares.
Assim, corroboramos com Arroyo (2011) quando afirma que a docência está diante
de um novo referencial identitário. “Se os alunos nos exigem pensar, dar conta de sua
educação, somos obrigados a aprender o que nem sempre aprendemos nos cursos de
formação, de licenciatura ou de pedagogia – a sermos educadores”. (p.24).
Nessa direção, pensar a EJA a partir dos educandos e tomar as necessidades dos
mesmos como novo referencial para a pratica docente na EJA, nos permite pensar que este
é um caminho necessário para a (re)configuração do educador para construir sua identidade
docente na EJA.
B) - OS ASPECTOS SUBJETIVOS: A-IDENTIDADE PARA SI, VALORES QUE
PASSAM A ORIENTAR A PRATICA PROFISSIONAL.
A categoria construção identitária “identidade para si” se constitui a partir da imagem
que o sujeito tem se si (autoimagem). É um processo biográfico que se articula com outras
dimensões e acaba por estruturar o que Dubar (2005) denominou de identidade
social/profissional do indivíduo. Nessa perspectiva, a identidade é compreendida como,
“resultado a um só tempo estável e provisório, individual e coletivo subjetivo e objetivo,
que conjuntamente constroem os indivíduos e definem as instituições.” (p.136). Não
obstante, essa forma identitária se dá a partir de internalizações e aceitação do papel
legitimado coletivamente por uma determinada categoria e ao mesmo tempo reivindicado
junto à sociedade. É a partir desse pressuposto que construiremos nossa análise dos
discursos dos professores.
A partir dos discursos dos professores, enxergamos o processo de constituição de
identidade docente (identidade para si) a partir de uma formação no próprio trabalho na
EJA, ou seja, atuando na EJA os professores se descobriram professores de EJA, conforme
destacamos nos discursos abaixo:
(...) eu trabalho com o ensino fundamental, mas eu deixo bem claro, que a
partir do momento que eu comecei a trabalhar com adultos, com jovens e
adultos, aqui eu tô me realizando melhor, do que trabalhando com
crianças, porque lá é uma maneira, uma metodologia diferente e aqui é
outra metodologia (professor P 13)
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(...) eu fui percebendo a partir do momento que eu trabalhei com a
primeira turma (de EJA), eu fui percebendo: “é aqui que eu quero”.
(professor –P35)
Esse processo de aceitação/internalização caracteriza a aquisição por parte desses
docentes de uma forma identitária intrínseca a natureza da prática que os mesmos
desenvolvem com os alunos desta modalidade de ensino, são justificados nos discursos dos
professores pelo motivo de sentirem mais importante para o processo educativo deste
aluno.
Na EJA eu descobri, assim, que os alunos têm uma carência muito grande,
tem carência (...) em vários aspectos. E como professor de educação física
eu descobri aqui, eu senti, assim, que tenho uma função maior, digamos
assim, sou mais necessário, nas turmas da EJA. (professor P 26)
(...) tenho uma satisfação muito grande de trabalho aqui e apesar de tudo,
pra mim não (é tempo) tá nada perdido ainda, somos elos de
transformação na escolarização. (professor P 20)
Ao perceberem o papel decisivo de assumem na realidade da Educação de Jovens e
Adultos os educadores se realizam (enquanto docentes) e encontram o verdadeiro
significado da profissão. Estar na EJA significa estar com a EJA e tudo o que isso implica.
Não obstante, nas interações com os atores que também compõem esse contexto
(outros professores da modalidade e principalmente com os alunos) os professores se fazem
educadores, essas implicações caracterizam a EJA como lugar privilegiado de
reconfigurações da identidade do docente da EJA. Nessa direção:
O trabalho constitui um espaço para a ocorrência de negociações
identitárias, as quais darão origem a uma estrutura de identidade
profissional. A identidade profissional resulta das relações e interações no
trabalho, fundada em representações coletivas variadas, construindo atores
do sistema social, institucional ou empresarial.” (DUBAR, 2005 P. 273)
Nessa direção entendemos que os professores de EJA tem no contexto da própria
modalidade o seu lugar de conquista de identidade, nesse processo eles acabam por
estabelecer negociações identitárias a partir da ação prática (o que não significa dizer
ausência de teoria) que desenvolvem no interior da modalidade, isto implica dizer que a
reflexão permanente sobre a própria pratica torna-se um referencial decisivo na assunção da
identidade docente.
Por fim, consideramos que o movimento de constituição de identidade docente se
inscreve como processo de reflexão sobre a prática no contexto em que esta se desenvolve.
Não obstante, esse processo torna-se ainda mais decisivo no contexto da Educação de
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Jovens e Adultos, pois, dada ausência de centros de formação especifica, a formação de
educadores de EJA sempre foi um pouco pelas bordas, nas próprias fronteiras onde a EJA
acontece. (ARROYO, 2006). Em suma, podemos concluir, pragmaticamente, que a EJA
tem formado/constituído seus próprios educadores, ou estes tem se formado a partir dela,
contextualmente e na permanente reflexão da prática.
C) - AFIRMAÇÕES E OU RUPTURA DE MODELO
Em um contexto onde a pratica traz à tona a ideia de que a função do educador da EJA
precisa ser reconstruído, novas configurações são estabelecidas revelando desta forma, a
eminencia da ruptura de antigos modelos. No caso do município de Bragança, a ausência
de uma formação especifica para a EJA, em que professores do ensino regular ingressam na
modalidade, destacam em seus discursos que ao se perceberem em um contexto educativo
diferenciado, os a lógica da necessidade de se constituir docente sobre uma outra lógica,
sob a ameaça de se perder o aluno, como destacamos nos discursos abaixo:
(...) a EJA ela tem que ter um olhar diferente, o professor da EJA
ele tem que ser um pouco mais sensível (...) é um tempo menor, é
uma realidade diferente. Por isso é preciso fazer diferente (PROFESSOR (P28)
(...) é nesses momentos difíceis que a gente vai se encontrando, como
professor, tá entendendo, então, a gente, antigamente o aluno tinha que se
adequar ao professor, ao educador, hoje em dia não. (PROFESSOR (P32)
Ao demarcarem em seus discursos a consciência de que atuar na Educação de Jovens e
Adultos exige uma postura diferenciada, antigamente o aluno tinha que se adequar ao
professor, ao educador, hoje em dia não, ou a gente se adequa ao aluno, ou nós vamos
perdê-los , estes professores produzem a reflexão que o modelo conteudista outrora
exercido no ensino regular, não atende as especificidades da EJA, não adianta você
colocar conteúdo, conteúdo, conteúdo, o ritmo deles é diferente (...) não adianta ficar só
no quadro e no giz, eles não se concentram, aí eles passeiam mesmo, eles gostam de
passear. (PROFESSOR P.1)
Entretanto, apesar da tomada de consciência da necessidade de mudanças para
constitui-se como educadora da EJA, cabe ressaltar que esse conhecimento construído na
prática por mais efetivo que seja, tem suas limitações para materializar de fato o processo
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de rupturas com o modelo anterior, evidenciando ainda mais, as lacunas deixadas pelos
cursos de formação no sentido de preparar os professores para atuarem na EJA.
Desta forma, torna-se imperativo reconfigurar os cursos de formação tanto inicial
quanto continuada de modo que estes passem a considerar o pressuposto de que a EJA tem
no seu contexto especificidades que exigem rupturas com modelos engessados e
consagrados pela tradição do ensino regular.
Nesta lógica se a EJA precisa ser pensada a partir da demanda que ela atende, não
obstante, os elementos que apontam para a (re)constituição de identidade dos educadores
que atuam nesta modalidade (construída no exercício da docência) precisam servir de
parâmetros a partir do qual os cursos de formação deverão estruturados fomentando uma
perspectiva mais problematizadora que considere o contexto da EJA um espaço de
teorização possibilitando, assim, a construção de novos caminhos para esta modalidade.
ESCREVENDO O RELEASE
A análise dos resultados revelam a existência de elementos (re)constituidores das
identidades docentes na EJA dos professores do município de Bragança que buscam
formação especifica no curso de especialização em EJA 2014/2015 na medida em que estes
passaram por meio da experiência e vivencia docente nesta modalidade de ensino a
sentirem-se desafiados pelos próprios alunos a considerarem as suas características, as suas
necessidades e as suas disponibilidades como mecanismo de garantia do direito ao acesso, à
permanência e ao sucesso escolar.
Dentro dos contextos objetivos no qual a materialidade da vivencia da docência
desses professores os impulsionaram a busca de uma formação especifica no intuito de
superar as lacunas de sua formação inicial, uma consciência de sua incompletude diante dos
desafios que esta realidade se apresenta.
Desta forma podemos pensar que na medida em que estes profissionais apresentam
como elemento fundante sua pratica a necessidade da compreensão de quem são os alunos
da EJA, significa dizer que eles têm consciência desse momento da necessidade de
reconstrução da identidade docente no sentido de se aproximar de valores mais humanos e
emancipatórios que os valores regulatórios.
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Este resultados, nos leva a refletir, que no movimento dialético entre as dimensões
objetivas e subjetivas constituidoras da identidade docente, que na medida que os
professores buscam caminhos para aproximar a EJA de processos educativos mais humanos
e emancipatórios do que regulatórios (ao buscarem um curso de especialização especifico
em EJA) eles terminam apresentando os elementos para que os cursos de formação de
professores repensem seus currículos um perfil menos generalista e incorporar um perfil
mais rico de educador múltiplo, que vá além de ensinar os conteúdos, um educador muito
mais plural que o educador de escola formal.
Enfim, podemos dizer que estamos, neste momento, vivenciando no município de
Bragança, um momento decisivo, de críticas e tensões que poderá nos levar a termos ou não
uma educação de jovens e adultos com suas especificidades, políticas de formação com
suas especificidades e consequentemente, identidades docentes diferenciadas.
Referencias
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ARROYO, Miguel Educação de Jovens e Adultos: um campo de direitos e de
responsabilidade pública. In: GIOVANETTI, Maria Amélia, GOMES, Nilma Lino e
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ARROYO, Miguel Currículo, território em disputa, Petrópolis: vozes, 2011.
DUBAR, Claude. Para uma teoria sociológica da identidade. Em A socialização. Porto:
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FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São
Paulo: Paz e Terra, 1997.
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MACHADO, Maria Margarida Formação de professores para EJA Uma perspectiva de
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disponivel em www.esforce.org.br
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MOREIRA, H.; CALEFFE, L. G. Metodologia da pesquisa para o professor
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NÓVOA, António. Diz-me como ensinas, dir-te-ei quem és e vice-versa. In: FAZENDA,
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SOARES, Leôncio. O educador de jovens e adultos e sua formação. Educação em
Revista, n. 47, p. 83-100, jun. 2008.
TRAJETÓRIAS DE FORMAÇÃO DA DOCÊNCIA DE EGRESSOS DO PLANO
NACIONAL DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES – PARFOR
Eliana da Silva Felipe
Universidade Federal do Pará
RESUMO
O trabalho em tela se propõe a compreender as condições de socialização (contexto
familiar e escolar em municípios predominantemente rurais) de professores egressos do
Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica – Parfor, anteriormente ao
ingresso na profissão. A partir dessas trajetórias, busca-se analisar suas influências sobre a
formação inicial e, por sua vez, a forma como a formação inicial, com as configurações
históricas existentes, incidiu no processo de (re) construção da identidade pessoal e
profissional dos professores, na sua maioria, atuando nos anos iniciais do Ensino
Fundamental. Serviram de base para o estudo vinte trabalhos na forma de memorial ou
relato de experiência, submetidos à Faculdade de Educação da Universidade Federal do
Pará como requisito para a conclusão do Curso de Pedagogia. A análise do material
empírico, em confronto com o corpus teórico adotado (CONTRERAS, 2002;
SACRISTAN, 2005; NOVÓA, 1992, 1999), permite reconhecer as precárias condições de
socialização que configuraram o ingresso na docência, as precárias condições de trabalho
que atualmente precisam equacionar em contextos sociais bastante adversos, entrecortadas
com o papel decisivo da formação em nível superior na elevação da autoestima pessoal e
profissional, do comprometimento com a melhoria da qualidade da educação,
particularmente da educação pública, sobre a qual os professores julgam poder incidir,
ainda que reconhecidas as dificuldades econômicas e sociais que configuram a realidade
onde estão inseridos.
Palavras – chave: formação, professor, Parfor.
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INTRODUÇÃO
A explosão da escola (escolarização de massas), resultado do ingresso de grupos
com as mais diversas características, até então excluídos do processo de escolarização,
adensou os desafios da escola pública no país a partir do final do século XX. Se o primeiro
desafio era o da expansão, o segundo, não menos problemático, era o da qualidade,
necessária para garantir a esses novos grupos o direito de aprender.
As demandas socioeconômicas dos novos modelos produtivos, os avanços
civilizatórios que resultam da conquista de direitos por grupos historicamente
invisibilizados redefiniram o papel da escola na sociedade contemporânea e o estatuto da
profissão docente. Diversidade, diferença, cidadania compõem os marcos de uma sociedade
em mudança e de um conjunto de novas tarefas que a profissão docente precisa assimilar.
As funções atribuídas ao ensino aumentaram em extensão e complexidade, "onde se espera
que a educação dê respostas a problemas cada vez mais complexos sobre crises
econômicas, sociais e culturais de nossa sociedade” (APPLE, 1989, apud CONTRERAS,
2002).
Uma revolução educacional pela formação dos professores foi a tônica dos
programas governamentais na área de educação desde a década de 1990. Inicialmente, pela
formação em serviço, que atraiu projetos de grande monta para o cotidiano das escolas, e
posteriormente, pela formação inicial em nível superior.
O Decreto nº 6.755, de 29 de janeiro de 2009, instituiu a Política Nacional de
Formação de Professores da Educação Básica – Parfor, programa emergencial instituído
para atender o disposto no artigo 11, inciso III do referido Decreto. Implantado em regime
de colaboração entre a Capes, os entes federativos (estados, municípios o Distrito Federal)
e as Instituições de Educação Superior – IES, é o maior programa de formação de
professores em curso no Brasil.
Ainda que não possamos desconsiderar a importância da formação para a mudança
educativa, há de se considerar as condições de socialização dos professores, antes do
ingresso na profissão, e as condições de exercício profissional que configuram a sua
atuação nas mais diversas realidades educativas do país, em geral, e da Amazônia paraense,
em particular.
A complexidade que se busca no quadro de novos desafios societários e
educacionais é reinstaurar a historicidade dos professores. No âmbito da formação realizada
pelo Parfor, objeto deste estudo, perpassa por perscrutar aspectos dessa historicidade que
comumente se anuncia em suas dimensões globais e gerais, mas não se examina em suas
especificidades: Que percursos educativos constituíram a identidade pessoal e profissional
de professores que participaram do Parfor? Como esses processos identitários
influenciaram a formação em nível superior? Como a formação em nível superior incidiu
nesses processos e que expectativas profissionais os professores vislumbram com a
conclusão do curso? Delimitadas essas questões, este estudo visa identificar percursos
formativos e profissionais que configuram esse grupo profissional, analisar suas influências
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
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sobre a formação em nível superior e, por sua vez, o modo como a formação em nível
superior incide sobre essas trajetórias.
PERCURSOS METODOLÓGICOS
As fontes deste estudo foram constituídas a partir da exploração e seleção de
memoriais de formação e relatos de experiência apresentados pelos professores do Parfor à
Faculdade de Educação da Universidade Federal do Pará, sob a forma de Trabalho de
Conclusão de Curso, como requisito para a conclusão do Curso de Pedagogia. Esses
trabalhos foram apresentados em defesa pública entre os anos de 2014 e 2015, e podem ser
acessados na Biblioteca do Instituto de Ciências da Educação da Universidade Federal do
Pará.
No âmbito das metodologias qualitativas, relatos de experiência e memoriais de
formação são referenciados como documentos pessoais. Por documento pessoal
compreende-se “um relato em que se dá conta da experiência de uma pessoa que expõe sua
atividade como ser humano e como participante da vida social” (BLUMER apud
ZABALZA, 2004, p. 32). Por meio dos documentos individuais pretende-se conhecer
dimensões gerais e globais relacionadas à identidade pessoal e profissional dos professores.
Reconhecido o valor dos memoriais de formação e relatos de experiência como
objeto de pesquisa, há de se considerar as condições de produção dessas fontes. Os relatos
autobiográficos são elaborados a partir da perspectiva particular de quem participa do
processo contado, de forma que os acontecimentos que o narrador escolhe para contar são
influenciados pela natureza subjetiva dessa ação. Por sua vez, por ser a memória seletiva,
há “uma valorização implícita dos acontecimentos relatados” (PRADO; SOLIGO, 2010).
Se há enormes virtualidades no uso dessas fontes (expressam vivências,
sentimentos, crenças), há também riscos que precisam ser considerados, entre eles, a
exacerbação da individualidade. Nesse sentido, é necessário considerar que "embora relatos
de vida sempre façam referência à singularidade de uma vida, eles refletem a coletividade
social de que se trate" (BOLÍVAR, 2002, p. 180).
Para descrever, analisar e interpretar o material coletado adotou-se fases da análise
de conteúdo proposta por Bardin (2006), que podem ser sintetizadas da seguinte forma: pré-
análise, exploração do material, realização de inferência e interpretações.
Entre os temas recorrentemente encontrados nos memoriais e relatos de experiência
dos professores destacam-se: configuração familiar, processos de escolarização no Ensino
Fundamental e Ensino Médio, ingresso na docência, condições de trabalho, ingresso na
universidade, relação com a universidade, dificuldades, descobertas e aprendizagens
resultantes do processo de formação em nível superior, compromissos com a transformação
da escola. A partir desses temas elaboramos a exposição e a discussão dos resultados.
HISTÓRIAS DE VIDA DE PROFESSORES DO PARFOR: SOCIALIZAÇÃO,
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FORMAÇÃO, PROFISSIONALIZAÇÃO, CONTEXTOS DE VIDA E DE TRABALHO
De forma combinada, três ideias-força foram úteis para estabelecer os pontos de
partida desse estudo. Em Sacristán (2002, p. 24), a ideia que em razão do baixo prestígio
profissional da docência, “os sistemas de formação não podem atrair os melhores do
sistema educativo e da sociedade [...] Com isso, de um ponto de vista estritamente
profissional, as condições de formação nunca serão as melhores possíveis”. Em Contreras
(2002, p. 150), "que os professores não seres passivos que interiorizam as tradições e as
práticas escolares sem maior capacidade de resposta". Em Nóvoa (1992, p. 24), o
entendimento que “a formação de professores pode desempenhar um papel importante na
configuração de uma „nova‟ profissionalidade docente, estimulando a emergência de uma
cultural profissional no seio do professorado e de uma cultura profissional no seio das
escolas”.
1. Configurações familiares
Os professores referenciados neste estudo possuem uma história comum. Nas
histórias individuais é possível apreender uma história social, que se configura pelo não
acesso aos bens materiais e culturais considerados relevantes para a elevação das
capacidades humanas. São filhos e filhas de pais e mães não escolarizados, submetidos a
formas de trabalho de baixo reconhecimento social e de pouco impacto na melhoria das
suas condições de vida. Esse é um elemento de aproximação nas trajetórias narradas pelos
professores.
Meus pais agricultores, sempre labutaram, com muito sacrifício na plantação de maniva para
a produção de farinha, a fim de obter o sustento econômico de nossa família. Isso porque
não tinham estudos suficientes que lhes permitissem conseguir um emprego remunerado.
(SODRÉ, 2014, p. 9.)
Meu pai era ajudante de pedreiro e não tinha emprego fixo. Por este motivo, vivíamos nos
mudando de cidade. Minha mãe se dividia entre o trabalho de casa e o trabalho na roça.
Ambos analfabetos, não tinham como nos orientar nas tarefas de casa e, tão pouco nos
incentivaram a estudar. (CHAVES, 2014, p. 8).
São herdeiros – pais, mães e filhos – de um modelo social excludente, o liberalismo,
incapaz de integrar os pobres no seu ideal de progresso e desenvolvimento. A falta de
acesso à escolarização e o subemprego são faces dessa exclusão que afetam gerações
inteiras na medida em que atuam na produção de quadros de desigualdades sociais que
historicamente o Estado e suas instituições não conseguiram equacionar.
O acesso à escola e à participação na produção de um tipo de conhecimento que crie
novas de relação com o mundo, com a linguagem, com as pessoas, embora não seja
determinado pela origem social, não pode ignorá-la.
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2. Socialização escolar: do Ensino Fundamental à Educação Superior
Pode-se dizer que a exclusão social (ao trabalho digno, à escola como lugar de
afirmação de direitos, aos valores da cultura) é socialmente produzida e culturalmente
mediada. Essa mediação da exclusão, particularmente pela escola, articula o conjunto de
narrativas dos professores quando se referem às dinâmicas de escolarização fundamental de
que participaram. Falta de escolas, dificuldade de acesso às escolas existentes, atraso na
escolarização em razão da falta de escolas com Ensino Fundamental completo em
comunidades rurais de municípios onde residiam, relação negativa com o saber escolar,
traduzida como “aprendizagem pelo medo”, são marcas constitutivas desses percursos na
perspectiva dos professores, hoje.
Concluí o ensino fundamental menor, sempre em classes multisseriadas, na mesma escola.
Nessa escola, permaneci até os 12 anos de idade, isso porque cursei por dois anos o ciclo II,
não por ser reprovada, mas porque o acesso a 5ª série era difícil por conta da distância da
escola que ficava em outro município (Vigia) e da situação financeira de minha família que
era precária. (SODRÉ, 2014, p. 9).
A apropriação da escrita e do conhecimento lógico-matemático por crianças e
jovens, ou seja, das habilidades, usos e práticas que deles podem derivar para a afirmação
da cidadania, não pode se efetivar em níveis desejáveis se os professores não se
apropriaram dessas virtualidades em seus contextos de aprendizagem, e não resignificaram
essas trajetórias em confronto com outras experiências formativas.
Ler, escrever, pensar matematicamente são inseparáveis das funções da escola,
contudo, a percepção dos professores sobre sua história de escolarização é de que foram
pouco desafiados a desenvolver uma relação positiva com esses saberes.
Apesar de ter sido pouco estimulada a me tornar leitora, o meu processo de escolarização
reacendeu o desejo e a necessidade de ler para aprender. (MESQUITA, 2015, p. 15).
Recordo que sempre tive dificuldades em matemática e acho que por isso pouco me
identifico com ela. Vivi experiências negativas, que me marcaram profundamente [...].
(CÁSSIA, 2015, p. 17).
Os repertórios culturais dos professores e sua percepção sobre eles não podem ser
secundarizados na análise das condições de formação e de exercício profissional docente. E
no caso particular dos professores de que trata este estudo pode-se afirmar que eles não
puderam se beneficiar das melhores escolas, dos melhores professores e de redes de
relações sociais cujas interações fossem mobilizadoras de uma relação positiva com
conhecimentos que, na condição de professores, lhes cabe ensinar quando se trata da
escolarização básica de crianças e jovens. Daí a pertinência da crítica de Sacristán (2002, p.
25), que “ninguém pode dar o que não tem. E se os professores não cultivam a cultura, não
podem dar cultura”.
O ingresso no Ensino Médio não modifica essas contradições sociais, e para a
maioria dos professores é neste nível de escolarização que se define sua insercão no
magistério. Pode-se dizer que a profissionalização para a docência se configura pela falta de
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escolha, na partida; e pelo encantamento, na chegada. Inicialmente, as razões de ingresso
em um curso de profissionalização para o magistério estão circunscritas ao mundo das
necessidades. Ela é anterior à identidade. Essas razões são de ordem prática e mantém
relação entre si: o fato da oferta de ensino para o nível Médio admitir somente duas
habilitações profissionais: magistério ou contabilidade e, no caso do magistério, a
possibilidade de ingresso imediato no mercado de trabalho.
[...] um dos fatores de grande relevância que me levaram a optar pelo curso foi a facilidade
de conseguir emprego. Interessava-me à possibilidade de ganhar meu próprio dinheiro para
poder minimamente sustentar e ajudar meus pais. (MESQUITA, 2015, p.17).
Ser professora nunca foi o meu sonho, tinha vontade de prestar vestibular para psicologia.
Inicialmente, o que me levou a trabalhar como educadora foi a falta de opção no mercado
profissional em meu município. (CARDOSO, 2015, p. 17).
Se a escolha inicial foi orientada pela necessidade e pela falta de maiores opções de
escolha, por dentro do curso de formação a identidade com a docência foi sendo construída,
para a qual concorreram experiências bem-sucedidas, principalmente na relação com
professores e com as disciplinas que ministravam, especialmente as específicas do
magistério como didática e prática de ensino. E ainda que enfrentando dificuldades
financeiras e pedagógicas, esses professores exemplares contribuíram para que ficassem.
Antes da conclusão do curso muitos já haviam se inserido no mercado de trabalho.
Em suas primeiras experiências submeteram-se a contratos precários de trabalho, lotação
em escolas que exigiam grande tempo de deslocamento, jornadas de trabalho exaustivas,
condições de trabalho inadequadas para o cumprimento das funções da escola. A
efetivação na profissão por meio de concurso público diminuiu a pressão sobre os
professores, particularmente no que se refere à ameaça de retaliações dos governos locais.
Com muito esforço e superação, meu empenho me levou à aprovação no Concurso Público
[...]. Essa foi uma das maiores realizações pessoais de minha vida, durante minha trajetória
de educadora, pois, a partir de tal conquista, não precisaria mais me preocupar em garantir
uma vaga por nomeação ou indicação de algum político influente, haja vista que, agora eu
havia alcançado meu objetivo profissional: ser concursada e livre para lutar por meus
direitos. (MOREIRA, 2014, p. 37).
Além da instabilidade profissional, a mobilidade entre as várias etapas da educação
básica, particularmente entre a educação infantil e os anos iniciais do Ensino Fundamental,
entre a educação básica e a educação de jovens e adultos – que comportam conhecimentos
e práticas bastante diversas, ao lado do remanejamento de uma escola para outra são
trajetórias comuns implicadas na história dos professores.
O remanejamento outro aspecto que passou a ser tornar um dilema anual em minha
profissão, já que a partir de 2010 até agora, estou sempre mudando de escola, fato que acaba
causando impactos negativos à profissão. (SODRÉ, 2014, p. 35).
Essas condições de socialização, formação e exercício profissional podem produzir
a diminuição da capacidade associativa dos professores, elemento importante da construção
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de uma cultura profissional assentada na cooperação e na co-formação (NÓVOA, 1999, p.
18). Sem vínculos com a cultura das escolas estão mais susceptíveis ao individualismo e ao
isolamento das redes coletivas de trabalho, portanto, dos conhecimentos que elas
mobilizam.
Por sua vez, elas afetam decisivamente o horizonte de expectativas sobre a
formação em nível superior e o desempenho acadêmico, após vencida a barreira do
ingresso. A universidade como sonho e oportunidade traduz a percepção de um lugar, vista
por aqueles que estavam fora dele, como inatingível. Ao perscrutar os documentos
acessados, um aspecto de significativa frequência refere-se ao significado e valor social da
universidade pública na vida dos professores. Alguns frequentavam cursos em instituições
privadas anteriormente ao ingresso no Parfor, mas a realização pessoal e profissional é
creditada à oportunidade de realizar um curso superior na Universidade Federal do Pará.
Em 2011, o sonho de ter nível superior surgiu novamente. E, para minha alegria, fui
selecionada para o curso de Pedagogia do PARFOR (Plano de Ações Articuladas Formação
de Professores da Educação Básica) da Universidade Federal do Pará (UFPA), na qual todos
têm um sonho de estudar. (CHAVES, 2014, p. 12).
O imperativo da necessidade se impõe agora sobre outra feição, a garantia do
emprego, que desencadeou a procura por instituições privadas como parte do esforço
individual para permanecer na profissão.
Assim, precisava de alguma maneira cursar o nível superior, não simplesmente pela vontade
de querer estudar, mas pela necessidade de aperfeiçoar minha profissão e consequentemente
garantir meu emprego. (SODRÉ, 2014, p 40).
O sonho de ingressar em uma universidade pública foi sendo confrontado com
dificuldades que se mostraram mais conflituosas no início do curso. Provenientes de uma
escola em que a autonomia é pouco requerida, a exigência de ler, escrever, argumentar se
constituiu no primeiro elemento de tensão entre essas trajetórias e a cultura acadêmica
consagrada na universidade. Por sua vez, técnicas que exigiam maior autonomia de estudo
encontraram um professorado sem muita expertise para lidar com essa nova realidade, e
formadores por vezes refratários a reconhecer e intervir pedagogicamente nessas
dificuldades. Assim, desistir do curso se colocou no horizonte de possibilidades de muitos
professores.
Quando comecei a graduação, senti muitas dificuldades, pois eu estava há muito tempo sem
estudar, sem prática de leitura e escrita extensiva. (PANTOJA, 2015, p. 32).
O inicio foi muito complicado, não era adaptada ao hábito da leitura e os professores
cobravam muito a questão da interpretação textual. (CARDOSO, 2015, p. 24).
Na medida em que essas distâncias foram sendo diminuídas e a cultura acadêmica
assimilada, os professores puderam se beneficiar do processo de formação, adensando
teoricamente as suas práticas educativas. No processo de confronto teoria-pratica crenças
foram rejeitadas, outras afirmadas.
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A teoria não constituiu obstáculo à reflexão da prática, tampouco diminuiu a
capacidade dos professores de pensar sobre o seu trabalho. Experiências e saberes
profissionais encontraram ancoragem na teorização educacional, permitindo aos
professores reconhecer a natureza histórica e social da sua profissão, e a contribuição que a
reflexão crítica, teoricamente embasada, pode trazer para a ampliação do domínio sobre o
seu trabalho.
EFEITOS DA UNIVERSIDADE SOBRE A VIDA PESSOAL E PROFISSIONAL DOS
PROFESSORES
A articulação entre conhecimento acadêmico, que insere o indivíduo no mundo, na
história social da sua profissão, e o conhecimento profissional, que o remete para as
dinâmicas da escola e da sala de aula, dinâmicas igualmente históricas e sociais, é uma via
que pode reconciliar ciência e experiência, pessoa e mundo e servir de instrumento para
enfrentar, no campo político, cultural e social, o baixo prestígio do magistério e de seus
profissionais.
Lacunas na formação inicial são comumente associadas aos currículos dos cursos
responsáveis pela profissionalização dos professores. Há um apelo explícito para que se
dedique maior atenção aos conteúdos que os professores precisarão ensinar nas escolas de
Educação Básica (GATTI, 2011). Em que pese a sua importância, há de se considerar que a
formação profissional comporta aquisições que extrapolam o plano das competências para
ensinar.
A elevação da autoestima pessoal e profissional constitui um das repercussões mais
marcantes da atuação da universidade na vida dos professores. A percepção do crescimento
pessoal e profissional inaugura uma relação nova consigo e com os outros, baseada na
autoconfiança. Sentem-se rejuvenescidos (pessoal e profissionalmente) e vitoriosos,
percepção que melhora a relação com a profissão, valoriza a docência e eleva a sua imagem
pública.
Hoje, possuo uma postura acadêmica diferenciada, onde tenho facilidades na aquisição de
novos conhecimentos que colaboram com as minhas experiências profissionais.
(PANTOJA, 2015, p. 32).
Durante as aulas na universidade UFPA me senti importante em exercer essa profissão, em
reavaliar minhas práticas e melhorar, crescer como pessoa e como profissional [...]. (SILVA,
2014a, p.33).
Cursar o PARFOR foi um marco importante na minha vida não apenas como professora. De
certa forma, rejuvenesci, como profissional e como pessoa. (CÁSSIA, 2015, p. 24).
Os significados que os professores atribuem às suas ações permitem reconhecer
mudanças reais ou em latência. Ao referenciar práticas, condutas, valores, modos de ser e
estar na profissão eles elaboram uma reflexão sobre si mesmos na qual se pode apreender,
no âmbito pessoal e profissional, a evolução de suas perspectivas e expectativas.
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A evolução de expectativas define um dos modos como a formação repercute na
trajetória de vida dos professores. Uma postura profissional aberta, comprometida com a
criação de alternativas que garantam aos alunos o direito de aprender constitui uma segunda
ordem de repercussão da formação inicial na cultural profissional dos professores da
Educação Básica. Essa dimensão subjetiva do desenvolvimento profissional não produz
apenas disposições favoráveis à profissionalização da docência; cria práticas, institui novas
racionalidades.
[...] Hoje ao refletir sobre a maneira como eu estava ensinando [...] percebo que em alguns
momentos estava reproduzindo as mesmas práticas que fui ensinada pelos professores do
Ensino Fundamental. (MOREIRA, 2014, p. 26).
Tornei as aulas mais dinâmicas e compreendi que meus alunos são capazes de construir seu
conhecimento através de aulas que proporcionem o desenvolvimento de suas habilidades,
foram conhecimentos essenciais que o curso de Pedagogia me proporcionou. (SILVA,
2015b, p. 51).
O PARFOR me oportunizou confrontar o meu conhecimento prático, tão significativo, com
as questões teóricas que antes eram julgadas por mim como pouco relevantes. Esse
confronto foi rico em experiências intelectuais aliadas as vivências de grande importância.
(CRUZ, 2014, 36).
A conexão pensamento-ação não segue necessariamente uma lógica linear. O
pensamento-desejo pode estar claro sem que a ação o esteja (ZABALZA, 2004, p. 19). A
maior ou menor conexão entre esses dois campos é sempre um caminho aberto, que
comporta disposições, motivação para ação, um entorno cultural e profissional que
mobilize as aquisições intelectuais e práticas dos professores.
DAS DIFICULDADES DO PROCESSO DE FORMAÇÃO AO COMPROMISSO COM A
MELHORIA DA ESCOLA
As políticas educacionais visam resultados. No âmbito da política de formação de
professores da Educação Básica, elas perpassam por aumentar a competência pedagógica
dos professores para que estes possam atuar na melhoria do desempenho escolar dos
alunos. A problemática que se coloca na relação entre meios e fins é que comumente se
valoriza os pontos de chegada em detrimento dos pontos de partida.
No caso particular do Parfor, as histórias de vida dos professores exigiam que outras
condições de formação, muito mais favoráveis a não fazer coincidir no presente
desvantagens sociais e educacionais encontradas no passado, na gênese das suas trajetórias
de vida e de trabalho, se colocassem no centro da concepção da política educacional. A
escolha de realizar a formação em universidades públicas, pelos seus acúmulos em
pesquisas e programas educacionais, assume grande relevância no quadro das dinâmicas
culturais que é preciso criar para formar melhor os professores. Mas não é suficiente.
Os professores podem olhar para trás e reconhecer o quanto evoluíram em seu
desenvolvimento profissional, o quanto se sentem mais preparados para lidar com os
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direitos da aprendizagem de crianças e jovens, mas esses avanços não foram alcançados
sem dificuldades, que em grande medida repercutem sobre a efetividade dos fins da
política.
[...] durante todo esse tempo, foi necessário renunciar as férias escolares, cujo período é
oferecido para descansar e recompor as energias em preparação ao próximo período de
aulas. Assim, é preciso renunciar ao descanso, deixar casa, família para se entregar
inteiramente aos estudos. (SODRÉ, 2014, p. 43).
As escolhas políticas têm consequências. Intensidade, concentração, falta de tempo
para assimilar conhecimentos novos e consolidar aprendizagens, combinados com
trajetórias pessoais e profissionais produzidas em contextos bastante adversos à promoção
do direito à educação, acabam em certa medida recapitulando os pontos de partida que
contribuíram para fazer dos professores o que são, e por sua vez, diminuindo as
possibilidades de democratização efetivas da escola e do saber que produz.
[...] o cansaço e falta de tempo suficiente para trabalhar detalhadamente as disciplinas e
conteúdos necessários, eram fatores que diretamente contribuíam para que a aprendizagem e
total aproveitamento do curso não fossem completos. (SODRÉ, 2014, p. 43).
É nesse movimento feito de dificuldades e possibilidades que os professores vão
redefinindo sua identidade profissional e seu horizonte de futuro.
Apesar das visíveis dificuldades, considero que a formação acadêmica no curso de
Pedagogia representou uma base de importantes subsídios para obter visões mais amplas, no
sentido de que as transformações são necessárias e possíveis, ainda mais quando estamos
diretamente inseridos na realidade que se quer mudar. (SODRÉ, 2014, p. 50).
CONCLUSÃO
A formação inicial, com qualidade acadêmica e profissional, constitui uma
dimensão importante do desenvolvimento profissional. Mas é necessário equacionar a
distância entre idealização da profissão e a realidade de vida e trabalho dos professores.
Ao ingressar na formação inicial em nível superior, os professores trazem consigo
uma história de vida. Há de se tomar as escolas e os professores em seus contextos reais,
mas, igualmente, ultrapassá-los, isso porque os professores não reproduzem tão somente
essas condições, mas interagem com elas, produzindo mediações para seus conflitos e
dificuldades.
A elevação da autoestima, o irrompimento de uma cultura profissional que atribui
pouco valor à atividade teórica, a autoconsciência de se estar mais preparado para enfrentar
os desafios do ensino e da aprendizagem, o reconhecimento de que os alunos, ainda que em
contextos socialmente desfavorecidos podem aprender são conquistas pessoais e
profissionais de valor intangível na vida dos professores. Por sua vez, essas disposições
criam novos ambientes nas salas de aula, no entrono das escolas, cuja configuração
constitui um horizonte de investigação futura.
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A formação inicial está diretamente associada à produção de efeitos positivos na
qualidade da educação pública. Superar a lógica do processo-produto e reinstaurar a
historicidade das escolas, dos professores e dos alunos é um caminho promissor para fazer
avançar a pesquisa no âmbito da educação.
Não se pretende com isso tornar os professores vítimas das suas circunstâncias, nem
tão pouco eximir a universidade da responsabilidade de crítica sobre os modelos de
formação que pratica e dos resultados que produz. Há de se reconhecer os pontos de partida
para se poder avaliar os pontos de chegada, e quando se trata de mudança social,
reconhecer a diversidade de percursos e processos pode contribuir para se pensar
alternativas para escolas reais, professores reais.
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