1
1
2
_______________________________________________________ 3
4
Base Científica das Mudanças Climáticas 5
6
Contribuição do Grupo de Trabalho 1 ao 7
Primeiro Relatório de Avaliação do 8
Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas 9
______________________________________________________ 10
11
Sumário Executivo 12
______________________________________________________ 13 14 15 Autores Coordenadores: 16 Tércio Ambrizzi; Moacyr Cunha de Araújo Filho. 17
18
Autores Principais: 19 Abdelfettah Sifeddine; Alexandre Araújo Costa; Alexandre de Siqueira Pinto; Alexandre Lima 20
Correia; Alice Marlene Grimm; Antonio Ocimar Manzi; Chou Sin Chan; Cleber Ibraim 21
Salimon; Cristiano Mazur Chiessi; Dieter Carl Ernst Heino Muehe; Dora Maria Villela; Edmo 22
José Dias Campos; Everaldo Barreiros de Souza; Fábio Roland; Francisco William da Cruz 23
Júnior; Gabriela Bielefeld Nardoto; Gilvan Sampaio de Oliveira; Humberto Ribeiro da Rocha; 24
Ivan Bergier; Jean Pierre Henry Balbaud Ometto; Luiz Antonio Martinelli; Marcelo Corrêa 25
Bernardes; Marcia Akemi Yamasoe; Mercedes Maria da Cunha Bustamante; Newton La Scala 26
Júnior; Patricia Pinheiro Beck Eichler; Paulo Nobre; Rômulo Simões Cezar Menezes; 27
Theotonio Mendes Pauliquevis Júnior; Valério De Patta Pillar. 28
29
Autores Colaboradores: 30 Abdelfettah Sifeddine; Adriano Marlisom Leão de Sousa; Alan Rodrigo Panosso; Alberto 31
Ricardo Piola; Aldrin Martin Perez Marin; Alex Enrich Prast; Aline de Holanda Nunes Maia; 32
Aline Sarmento Procópio; Álvaro Ramon Coelho Ovalle; Ana Luiza Spadano Albuquerque; 33
André Megali Amado; André Rosch Rodrigues; Astolfo G. M. Araujo; Bastiaan Adriaan 34
Knoppers; Beatriz Beck Eichler; Carlos Alberto Nobre Quesada; Carlos Eduardo de Rezende; 35
Carlos Gustavo Tornquist; Celso Von Randow; Cimélio Bayer; Corina Sidagis Galli; Donato 36
Abe; Edmilson Freitas; Edmo José Dias Campos; Edson José Paulino da Rocha; Eduardo 37
Arcoverde de Mattos; Eduardo Barretto de Figueiredo; Eduardo G. Neves; Eduardo Siegle; 38
2
Elisabete de Santis Braga; Elizabethe de Campos Ravagnani; Eloi Melo Filho; Enio Pereira de 39
Souza; Enrique Ortega Rodriguez; Everardo Valadares de Sá Barretto Sampaio; Expedito 40
Ronald Gomes Rebello; Felipe Mendonça Pimenta; Flávio Barbosa Justino; Francinete Francis 41
Lacerda; Francisco de Assis Diniz; Frederico Scherr Caldeira Takahashi; Gabriel Constantino 42
Blain; Gilvan Sampaio de Oliveira; Gilvan Sampaio de Oliveira; Guilherme Ruas Medeiros; 43
Guillermo Oswaldo Obregón Párraga; Henrique de Melo Jorge Barbosa; Ilana Elazari Klein 44
Coaracy Wainer; Iracema Fonseca de Albuquerque Cavalcanti; Iracema Fonseca de 45
Albuquerque Cavalcanti; Janice Romaguera Trotte-Duhá; João dos Santos Vila da Silva; Jorge 46
Alberto Martins; José Fernando Pesquero; Jose Galizia Tundisi; José Maria Brabo Alves; Juan 47
Ceballos; Julio Carlos França Resende; Leila Maria Véspoli de Carvalho; Lincoln Muniz Alves; 48
Luciana della Coletta; Luciano Ponzi Pezzi; Ludgero Cardoso Galli Vieira; Luiz Antonio 49
Cândido; Luiz Augusto Toledo Machado; Luiz Carlos R. Pessenda; Manoel Alonso Gan; 50
Manoel Ferreira Cardoso; Manoel Ferreira Cardoso; Marcia Akemi Yamasoe; Marcos Djun 51
Barbosa Watanabe; Marcos H. Costa; Marcus Jorge Bottino; Maria de Fátima Andrade; Mariane 52
M. Coutinho; Michel Michaelovitch de Mahiques; Moacyr Araújo; Olga Tiemi Sato; Orivaldo 53
Brunini; Osmar Pinto Júnior; Paulo Nobre; Paulo Polito; Prakki Satyamurty; Regina Rodrigues; 54
Reindert Haarsma; Renato C. Cordeiro; Ricardo de Camargo; Ricardo de Camargo; Rita Yuri 55
Ynoue; Roberto Antonio Ferreira de Almeida; Ronald Buss de Souza; Ruy Kenji Papa de 56
Kikuchi; Simone Aparecida Vieira; Simone Sievert Costa; Solange Filoso; Sonia Maria Flores 57
Gianesella; Vanderlise Giongo; Vera Lúcia de Moraes Huszar; Vinicius Fortes Farjalla; Wagner 58
Soares; Weber Landim de Souza; Yara Schaeffer-Novelli. 59
60
Revisores: 61 Alan Cavalcanti da Cunha; Ana Luiza Spadano Albuquerque; Felipe Mendonça Pimenta; 62
Fernando Ramos Martins; Flavio Jesus Luizão; Gilberto Fernando Fisch; Heitor Evangelista da 63
Silva; Henrique de Melo Jorge Barbosa; Ilana Elazari Klein Coaracy Wainer; Ilana Elazari Klein 64
Coaracy Wainer; Juan Carlos Ceballos; Luiz Gylvan Meira Filho; Marcelo de Paula Corrêa; 65
Maria Assunção Faus da Silva Dias; Maria Cristina Forti; Maria Valverde; Pedro Leite da Silva 66
Dias; Pedro Leite da Silva Dias; Regina Luizão. 67
68
69
___________________________________________________________ 70
Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas - Secretaria Executiva 71 Cidade Universitária, Centro de Tecnologia, Sala G-106. Ilha do Fundão, Rio de Janeiro – RJ. 72
CEP: 21.949-900. Tel.: (21) 2562-7030/ 2562-8326 73 www.pbmc.coppe.ufrj.br 74
75 76 77 78
Excluído: Duhá ;79
Excluído: 80
3
Sumário Executivo Primeiro Relatório de Avaliação do GT1 do PBMC 81 _________________________________________________________________________________ 82
Capítulo 1 – Introdução e Principais Questões Discutidas 83
Este primeiro capítulo do Sumário do Grupo de Trabalho 1 traz uma síntese das 84
principais contribuições para o Primeiro Relatório de Avaliação Nacional (RAN1) do 85
Grupo de Trabalho 1 (GT1) – Bases Científicas das Mudanças Climáticas – do Painel 86
Brasileiro de Mudanças Climáticas (PBMC), cujo objetivo é avaliar os aspectos 87
científicos do sistema climático e de suas mudanças. 88
O papel das forçantes antrópicas sobre o processo de aquecimento global vem 89
sendo destacado pelos sequentes Relatórios de Avaliação desenvolvidos pelo Painel 90
Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC, em inglês). Tais avaliações são 91
baseadas na análise acumulada de grandes quantidades de dados observacionais, sobre 92
os quais são utilizadas técnicas sofisticadas visando à compreensão dos mecanismos 93
atuantes e das margens de incerteza em suas determinações. 94
Diante da complexidade que abrange o clima do planeta, é de se esperar que a 95
qualidade das análises realizadas e a redução de incertezas nas projeções das mudanças 96
climáticas globais e regionais sejam diretamente relacionadas à quantidade de estudos 97
científicos e de levantamentos existentes nas diferentes regiões do planeta. Uma análise 98
simples da literatura referenciada pelo GT1 do Quarto Relatório de Avaliação (AR4) do 99
IPCC evidencia o desequilíbrio interhemisférico e regional nos quantitativos de 100
produção científica e de levantamentos observacionais utilizados na avaliação, 101
traduzindo a necessidade de esforços adicionais para minimizar estas diferenças. 102
Diante destas evidências, o PBMC foi instituído em setembro de 2009 103
considerando o potencial de contribuição do Brasil para a compreensão das mudanças 104
climáticas globais, bem como da necessidade de uma abordagem nacionalizada sobre o 105
tema. O PBMC é um organismo científico nacional criado pelos Ministérios da Ciência, 106
Tecnologia e Inovação (MCTI) e do Meio Ambiente (MMA), cujo RAN1 é composto de 107
três volumes, correspondentes às atividades de cada Grupo de Trabalho 108
(www.pbmc.coppe.ufrj.br). Com estrutura espelhada no IPCC, o PBMC objetiva 109
fornecer avaliações científicas sobre as mudanças climáticas de relevância para o Brasil, 110
incluindo os impactos, vulnerabilidades e ações de adaptação e mitigação. As 111
informações científicas levantadas pelo PBMC são sistematizadas por meio de um 112
processo objetivo, aberto e transparente de organização dos levantamentos produzidos 113
pela comunidade científica sobre as vertentes ambientais, sociais e econômicas das 114
4
mudanças climáticas. Desta forma, o Painel poderá subsidiar o processo de formulação 115
de políticas públicas e tomada de decisão para o enfrentamento dos desafios 116
representados por estas mudanças, servindo também como fonte de informações e de 117
referência para a sociedade. 118
O Volume 1 do RAN1 está estruturado de acordo com o escopo previamente 119
definido pelos Autores Principais dos capítulos do GT1. Os levantamentos aqui 120
apresentados resultam de uma extensa pesquisa bibliográfica, a qual se procurou (i) 121
evidenciar as implicações para o Brasil dos principais pontos do GT1 do Quarto 122
Relatório de Avaliação (AR4) do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas 123
(IPCC, em inglês); bem como (ii) registrar e discutir os principais trabalhos científicos 124
publicados após 2007, com destaque para aqueles relacionados mais diretamente às 125
mudanças climáticas na América do Sul e no Brasil. 126
127
Capítulo 2 – Observações Ambientais Atmosféricas e de 128
Propriedades da Superfície 129
Este capítulo apresenta resultados observacionais a respeito de variações de parâmetros 130
ambientais que podem representar efeitos da variabilidade climática natural de longo 131
período e, em alguns casos, indicações de efeitos da ação humana. 132
As séries temporais climáticas são um produto de interações complexas do 133
sistema climático terrestre, representando um efeito combinado de oscilações intra e 134
interanuais, decenais e interdecenais e até escalas de tempo maiores (por exemplo, 135
milhares a milhões de anos), que são naturais do sistema climático. A separação dessas 136
variações naturais das alterações antrópicas não é uma tarefa fácil, e talvez nem possível 137
na maioria dos casos, tendo em vista que tais resultados são geralmente baseados em 138
séries temporais de observações feitas durante períodos relativamente curtos, bem 139
inferiores às escalas de tempo paleoclimatológicas tratadas no Capítulo 4. Portanto, é 140
necessária cautela na atribuição das causas das variações observadas. 141
O conhecimento do clima presente é o primeiro e necessário passo para o 142
conhecimento do clima futuro. O futuro se aproxima a cada ano de uma vez e a 143
adaptação ao futuro próximo deve ser parte do problema geral da adaptação ao futuro 144
distante. A adaptação ao clima do próximo ano ou da próxima década, quer haja ou não 145
aquecimento global ou outras mudanças antrópicas, deve ser uma das prioridades 146
nacionais, principalmente em países em desenvolvimento. 147
5
Tendo em vista as dimensões continentais do Brasil e a diversidade de regimes 148
climáticos e de influências sobre seu clima, é necessário ressaltar a necessidade de 149
estudos observacionais para bem conhecê-lo, em termos de suas características, 150
mecanismos e variabilidade. Na Figura SEF.1 é mostrado um painel abrangente dos 151
regimes sazonais de precipitação da América do Sul (Grimm, 2011). Estudos (p.ex., 152
Zhou e Lau, 2001; Paegle e Mo, 2002; Grimm e Zilli, 2009; Grimm, 2011) revelam o 153
grande impacto da variabilidade interanual, que pode produzir alterações por um fator 154
maior que quatro nas chuvas sazonais em certas regiões, como a Amazônia. A maior 155
fonte de variabilidade interanual são os eventos El Niño e La Niña. 156
157
158
Figura SEF.1. Ciclos anuais de precipitação em regiões de 2,5°×2,5° latitude-longitude, calculados com 159
pelo menos 25 anos de dados no período 1950-2005 (Adaptado de Grimm, 2011). 160
161
As variações decenais/interdecenais (consideradas com escala de tempo acima 162
de oito anos) apresentam menor diferença entre fases opostas (alterações por até fator de 163
dois), mas são relevantes em termos de adaptação porque são persistentes, podendo 164
causar secas prolongadas ou décadas com mais eventos extremos de chuva. Os modos 165
de variabilidade interdecenal produziram forte variação climática na década de 1970, 166
devido à superposição de efeitos da mudança de fase de diferentes modos nesta década 167
6
(Grimm e Saboia, 2012). Portanto, análises de tendências em séries relativamente curtas 168
de parâmetros climáticos, que compreendem períodos antes e depois desta década, não 169
são conclusivas. 170
A grande maioria das tendências detectadas na precipitação do Brasil pode ser 171
explicada por mudanças de fase em oscilações interdecenais e, portanto, não podem ser 172
consideradas provas de mudanças climáticas. Por exemplo, as principais tendências 173
detectadas são consistentes com a variação produzida na segunda metade do século 174
passado pelo primeiro modo interdecenal de chuvas anuais, que é significativamente 175
correlacionado com um modo de tendência de temperatura da superfície do mar (TSM), 176
mas também com a Oscilação Multidecenal do Atlântico (OMA) e com a Oscilação 177
Interdecenal do Pacífico (OIP, IPO em inglês). Estes resultados mostram tendências 178
negativas no norte e oeste da Amazônia, positivas no sul da Amazônia, positivas no 179
Centro-Oeste e Sul do Brasil, ausência de tendência no Nordeste. A tendência de 180
aumento da precipitação entre 1950-2000 no Sul do Brasil e outras partes da baixa 181
Bacia do Paraná/Prata, também notada por Haylock et al. (2006), principalmente entre 182
o período anterior e posterior à década de 1970, aparece em outros modos interdecenais. 183
Esta tendência é suportada por séries um pouco mais longas, mas apresenta inversão na 184
última década. 185
Para verificar se as tendências associadas com o 1º modo interdecenal de 186
precipitação se devem apenas a mudança de fase da OMA ou se são parte de 187
comportamento consistente de mais longo período, seriam necessárias: i) séries mais 188
longas de precipitação e ii) consistência entre estas “tendências” e as mudanças de 189
precipitação apontadas nessas regiões pelas projeções de mudanças climáticas feitas por 190
numerosos modelos. Portanto, é necessário esperar algum tempo para ter certeza sobre 191
tendências na precipitação do Brasil e também verificar sua consistência com projeções 192
climáticas, o que no momento não ocorre, talvez ainda por falhas nos modelos. Da 193
mesma forma, ainda é difícil detectar mudanças antrópicas nos eventos extremos de 194
precipitação, cujas variações também parecem estar mais relacionadas com oscilações 195
climáticas naturais. 196
Estudos de tendência da temperatura utilizando dados de estação sobre a 197
América do Sul limitam-se, na sua maioria, ao período entre 1960-2000 (Vincent et al., 198
2005; Obregon e Marengo, 2007; Salati et al., 2007; Marengo e Camargo, 2008). Os 199
resultados mais significativos referem-se às variações de índices baseados na 200
temperatura mínima diária, que indicam aumento de noites quentes e diminuição de 201
7
noites frias na maior parte da América do Sul, com consequente diminuição da 202
amplitude diurna da temperatura, especialmente na primavera e no outono. Estes 203
resultados são mais robustos para as estações localizadas nas costas leste e oeste dos 204
continentes e são confirmados para séries em períodos mais longos. A enorme escassez 205
de dados de estação sobre vastas áreas tropicais como a Amazônia e o Centro-Oeste e 206
Leste do Brasil limitam o estabelecimento de conclusões acuradas para estas regiões 207
usando dados de estação. Estudos recentes mostraram que fatores como mudança de uso 208
da terra e queima de biomassa podem influenciar a temperatura nestas regiões, 209
sobretudo na Amazônia e no Cerrado; porém se desconhece a magnitude e extensão 210
espacial do sinal de longo prazo dessas influências sobre a temperatura em superfície. Já 211
o efeito da mudança de uso da terra e da liberação de calor antrópico nos grandes 212
centros urbanos sobre o fenômeno de ilha de calor urbana tem sido bem estudado e 213
documentado. 214
Dados de reanálises desde 1948 (Collins et al., 2009) fornecem evidência de que 215
tem aumentado a temperatura em baixos níveis na atmosfera de forma mais acentuada 216
em direção aos trópicos do que nos subtrópicos da América do Sul durante o verão 217
austral, tendo a temperatura média anual junto da superfície nos trópicos apresentado 218
tendência positiva desde então, enquanto nos subtrópicos há tendência negativa desde 219
meados da década de 1990. 220
O aumento da temperatura também foi verificado sobre o Atlântico Tropical, 221
sugerindo que possam ter ocorrido mudanças no contraste oceano-atmosfera e, portanto, 222
no desenvolvimento do sistema de monções. Estas mudanças podem causar alterações 223
no regime de precipitação e nebulosidade e ter um impacto desconhecido na 224
temperatura e no clima local. 225
Mudanças nos campos médios globais e na TSM antes e após o período 226
conhecido como “climate shift” no final dos anos 70 (Zhang et al., 1998; Deser et al., 227
2004; Deser e Phillips, 2006) podem ter exercido importante papel no regime de 228
temperaturas e respectivas tendências e precisam ser considerados para se avaliar 229
corretamente o efeito do aquecimento global sobre a América do Sul. Neste contexto, 230
também é importante avaliar o impacto de oscilações climáticas naturais interdecenais 231
sobre a temperatura na América do Sul (Barros et al., 2006; Pereira Filho et al., 2007). 232
Quer sejam variações naturais que venham a ser revertidas após uma ou mais 233
décadas, quer sejam tendências reais causadas por ação humana, tais variações 234
necessitam ser conhecidas para que seja possível planejar a adaptação a elas, para 235
8
enfrentá-las em seus aspectos negativos ou delas tirar o máximo proveito. A magnitude 236
tanto das variações naturais como das mudanças climáticas antrópicas tem repercussões 237
para a sociedade, uma vez que diversas atividades econômicas, particularmente a 238
hidroeletricidade e a agricultura, são afetadas com variações de longo prazo, 239
principalmente do elemento climático precipitação. 240
241
Capítulo 3 – Observações Costeiras e Oceânicas 242
Este capítulo apresenta uma síntese das mudanças observadas em processos oceânicos e 243
costeiros no Atlântico Sul e no Brasil. São apresentados estudos focando diferentes 244
aspectos de mudanças no oceano, com ênfase na região do Atlântico Sul, dos trópicos 245
até latitudes austrais. Especial atenção é dedicada à região oeste do Atlântico Sul e à 246
zona costeira ao longo do continente sul-americano, procurando identificar possíveis 247
mudanças nessas regiões e suas correlações com alterações do clima em grande escala. 248
O oceano participa de forma decisiva no equilíbrio climático. Devido à sua 249
grande extensão espacial e à alta capacidade térmica da água, é indiscutível que o 250
aumento do conteúdo de calor dos oceanos e o aumento do nível do mar são indicadores 251
robustos de aquecimento do planeta. Recentemente vários esforços têm sido 252
despendidos na reavaliação de dados históricos, permitindo interpretações mais 253
confiáveis por mais longos períodos de tempo (e.g., Stott et al., 2008; Hosoda et al., 254
2009; Roemmiech e Gilson, 2009; Durack e Wijffels, 2010; Helm et al., 2010). 255
A grande maioria dos estudos científicos realizados nos últimos 5 anos têm 256
confirmado, de forma indiscutível, o aquecimento das águas oceânicas. A temperatura 257
da superfície do mar (TSM) no Atlântico tem aumentado nas últimas décadas (e g.: 258
Rayner et al., 2006; Domingues et al., 2008; Lyman e Johnson, 2008; Ishii e Kimoto, 259
2009; Levitus et al., 2009; Gourestki e Reseghetti, 2010; Lyman et al., 2010). No 260
Atlântico Sul, esse aumento é intensificado a partir da segunda metade do século XX, 261
possivelmente devido a mudanças na camada de ozônio sobre o Polo Sul e também ao 262
aumento dos gases efeito-estufa (Arblaster e Meehl, 2006; Rayner et al., 2006). 263
O conhecimento dos padrões de variabilidade da salinidade é essencial para se 264
obter uma descrição detalhada da circulação oceânica em todas as escalas. Isto porque a 265
salinidade é uma variável que, juntamente com a temperatura, afeta a densidade da água 266
do mar e os padrões de circulação oceânica associados a ela. 267
9
De forma consistente com um clima mais quente, estudos baseados em dados 268
globais de concentração de sal mostram mudanças de salinidade da superfície do mar 269
(SSS) de forma consistente com o aumento da temperatura do planeta (Boyer et al., 270
2005a, 2007; Roemmich e Gilson, 2009; Durack e Wijfels, 2010). Há indicações que a 271
salinidade do oceano Atlântico tropical e equatorial está aumentando nas últimas 272
décadas (Curry et al., 2003; Donners e Drijfhout, 2004; Boyer et al., 2005; Durack e 273
Wijffels, 2010), principalmente nas camadas acima da termoclina. No Atlântico Sul há 274
também indicações de aumento da salinidade no giro subtropical, reforçando a 275
tendência de que a região subtropical está se tornando mais quente e mais salina (e.g: 276
Sato e Polito, 2008; Durack e Wijffels, 2010; Lumpkin e Garzoli, 2011). 277
Já em altas latitudes, onde se formam as massas d’água que ocupam o fundo dos 278
oceanos globais, nota-se uma diminuição de 0,1 a 0,5 de salinidade ao norte de 45oN, da 279
superfície até o fundo. Há também evidências de redução da salinidade nos primeiros 280
500 m do oceano austral (Curry et al., 2003), enquanto que, em médias latitudes, 281
observa-se um aumento da salinidade associada do lado norte da Corrente do Atlântico 282
Sul, dentro do giro subtropical, e diminuição da salinidade ao sul da mesma. Uma vez 283
que não é observada uma tendência significativa da descarga fluvial no Atlântico, tais 284
mudanças ocorrem aparentemente devido às mudanças na componente Evaporação-285
Precipitação (E-P) sobre os oceanos e às alterações no processo de formação de águas 286
de fundo em altas latitudes. Estabelecer programas observacionais de longa duração no 287
oceano profundo é fundamental para a determinação das mudanças da salinidade, 288
observada a falta de dados e a baixa significância estatística de alguns resultados de 289
estudos especialmente no Atlântico Sul. 290
Nas camadas superiores do oceano há evidências claras do aumento do conteúdo 291
térmico de calor. A Figura SEF.2, composta de resultados de recentes estudos baseados 292
em um amplo conjunto dados incluindo bati-termógrafos descartáveis (XBT), 293
flutuadores Argo e outros, no período 1993 – 2008, mostra que o conteúdo de calor na 294
camada de 0 a 700 m do oceano global está aumentando a uma taxa média de 0,64± 295
0,29 W m-2
para todo o planeta (Lyman et al., 2010; Trenberth, 2010). Esse aumento no 296
armazenamento de calor em toda a profundidade coberta pelos flutuadores Argo é um 297
indicativo de que o oceano está se aquecendo abaixo dos 700 m. 298
299
10
300
Figura SEF.2. Variação do conteúdo de calor na camada de 0 a 700 m do oceano global (linha preta). A 301
tendência positiva da ordem de 0,64 W m-2 indica o aquecimento da camada superior do oceano. A linha 302
azul representa a variação do conteúdo de calor para 0-2000 m, baseada em 6 anos de dados Argo. A 303
taxa de aumento de 0,5 m-2 sugere que uma parte do aquecimento está acontecendo em profundidades 304
superiores a 700 m (Trenberth, 2010). 305
306
Há fortes indícios que as características dos eventos de El Niño no Pacífico estão 307
mudando nas últimas décadas (e.g: Ashok et al., 2007; Ashok e Yamagata, 2009; Yeh et 308
al., 2009). Como consequência, tem havido uma mudança nos modos de variabilidade 309
da TSM no Atlântico Sul. Essas alterações nos padrões de TSM favorecem precipitações 310
acima da média ou na média sobre o norte e nordeste brasileiro e mais chuvas no sul e 311
sudeste do Brasil. 312
Importantes massas de água estão também se alterando de acordo com o Quarto 313
Relatório de Avaliação do Clima do IPCC (IPCC-AR4, 2007). As “águas modo” (águas 314
de 18oC) do Oceano Sul e as Águas Profundas Circumpolares se aqueceram no período 315
de 1960 a 2000, cuja tendência continua durante a presente década. Aquecimento 316
similar ocorreu também nas “águas modo” da Corrente do Golfo e da Kuroshio. Como 317
consequência, é bastante provável que pelo menos até o final do último século a Célula 318
de Revolvimento Meridional do Atlântico (CRMA) venha se alterando 319
significativamente em escalas de interanuais a decenais, segundo conclusão do IPCC-320
AR4 e de estudos mais recentes (e.g., Graham et al., 2011). 321
No Atlântico Sul, vários estudos nos últimos anos mostram que, em 322
consequência ao deslocamento do rotacional do vento em direção ao polo, o transporte 323
de águas do Oceano Índico para Atlântico sul, fenômeno conhecido como o “vazamento 324
das Agulhas”, vem aumentando nos últimos anos (Biastoch et al., 2008, 2009). 325
11
Mudanças no giro subtropical do Atlântico Sul associadas a mudanças na salinidade das 326
camadas superiores são observadas através de análises de dados obtidos remotamente 327
por satélite e in situ. Resultados de observações e modelos sugerem que o giro 328
subtropical do Atlântico Sul vem se expandindo, com um deslocamento para sul da 329
região da Confluência Brasil-Malvinas (Sokolov e Rintoul, 2009). 330
Os estudos analisados pelo IPCC-AR4 (2007), dentre outros mais recentes 331
(Leuliette e Miller, 2009; Letetrel et al., 2010; Leuliette e Scharroo, 2010), também 332
apontam para variações no conteúdo de calor e na elevação do nível do mar, em escala 333
global. Variações nessas propriedades promovem alterações nas características das 334
diferentes massas de água, o que fatalmente leva a alterações nos padrões de circulação 335
do oceano. Consequentemente, mudanças na circulação levam a alterações na forma 336
como o calor e outras propriedades biológicas, físicas e químicas são redistribuídas na 337
superfície da Terra. 338
O nível do mar está aumentando e variações de 20 a 30 cm esperadas para o 339
final do século XXI já devem ser atingidas, em algumas localidades, até meados do 340
século ou até antes disso (e.g., Woodworth et al. 2009; Grinsted e Moore, 2010). Na 341
costa do Brasil são poucos os estudos realizados com base em observações in situ. 342
Mesmo assim, taxas de aumento do nível do mar na costa sul-sudeste já vêm sendo 343
reportadas pela comunidade científica brasileira desde o final dos anos 80 e início dos 344
anos 90 (Mesquita et al., 1986, 1995, 1996; Silva e Neves, 1991; Harari e Camargo, 345
1995; Muehe e Neves, 1995; Neves e Muehe, 1995). Diferentemente, em escala global, 346
são relativamente numerosos os estudos observacionais e numéricos que consideram a 347
complexa combinação de fenômenos que resultam nas variações de escala global do 348
nível do mar, cujos resultados ainda mantém razoáveis discordâncias acerca do seu 349
comportamento em longas escalas de tempo. 350
A dinâmica das trocas gasosas entre a atmosfera e o oceano exerce um papel 351
fundamental nos ciclos biogeoquímicos, como também nas mudanças climáticas. Desde 352
o período Pré-industrial, os níveis de CO2 atmosférico têm aumentado em 353
aproximadamente 40%, sendo atualmente o maior dos últimos 800.000 anos. A 354
absorção do CO2 atmosférico pelos oceanos provoca alterações no balanço químico dos 355
oceanos, em especial alterando o pH e o equilíbrio dos íons carbonatos e do estado de 356
saturação de calcita e aragonita, causando grande repercussão sobre organismos 357
marinhos. Medidas realizadas desde a década de 80 mostram um decréscimo de pH em 358
0,3 a 0,4 unidades. Outra forma de avaliar as transferências do carbono entre a 359
12
atmosfera e o oceano pode ser através de medidas da acumulação de carbono nos 360
sedimentos marinhos. Em grande parte do Oceano Atlântico Sul Tropical e Subtropical 361
a acumulação de carbono orgânico nos sedimentos é basicamente controlada pela 362
produtividade primária nas águas superficiais. Estudos demonstram também que de 363
0,5% a 3% da produção primária das plataformas continentais e do talude e cerca de 364
0,014% dos oceanos profundos fica acumulada nos sedimentos, o que pode causar uma 365
baixa eficiência no transporte de carbono para os sedimentos devido às altas taxas de 366
reciclagem nas águas superficiais. Ainda, estudos paleoceanográficos mostram que o 367
acúmulo de carbono nos sedimentos durante o Último Máximo Glacial foi cerca de 2 a 368
3 vezes maior do que durante o Holoceno, provocado por mudanças na química da água 369
do mar, na circulação e nos padrões de estratificação e formação de camadas de mistura. 370
O aumento das concentrações de CO2 assim como o aumento do nível do mar, de 371
temperatura, mudanças no volume e distribuição das precipitações afetarão de modo 372
variável o equilíbrio ecológico de sistemas recifais e de manguezais (e.g., Behling et al., 373
2004; McLeod e Salm, 2006; Baker et al., 2008; González-Dávila et al., 2010; Albright 374
e Langdon, 2011), dependendo da amplitude destas alterações e das características 375
locais de sedimentação e espaço de acomodação. 376
A amplitude da linha de costa do Brasil, que atinge regiões tropicais e 377
subtropicais, leva a uma variedade de feições fisiográficas onde se abrigam os 378
manguezais, com diversidade de estruturas pouco monitoradas em escalas temporais. 379
Essa diversidade de características, sob as quais se desenvolvem os manguezais, exige 380
monitoramentos de médio e longo prazos, em pontos representativos ao longo da costa. 381
O fato de o manguezal ser um ecossistema extremamente adaptável às variações 382
ambientais onde se insere, exige muito mais tempo (décadas) de observações para 383
identificar respostas consideradas normais em relação àquelas que estariam sendo 384
manifestadas diante de novas condições ambientais. 385
Ao longo da extensão da linha de costa brasileira são vários os trechos em 386
erosão, distribuídos irregularmente e muitas vezes associados aos dinâmicos ambientes 387
de desembocaduras (Muehe 2006; Dominguez, 2009). Diversas são as áreas costeiras 388
densamente povoadas que se situam em regiões planas e baixas, cujas construções em 389
áreas próximas à linha de costa por vezes comprometem o balanço sedimentar local e 390
podem iniciar e/ou acelerar processos erosivos locais. Ainda, os já existentes problemas 391
de erosão, drenagem e inundações nestas áreas podem ser amplificados em cenários de 392
mudanças climáticas. 393
13
Um aumento da evaporação devido ao aumento da temperatura deverá se refletir 394
em aumento do transporte eólico no litoral do Nordeste semiárido levando ao aumento 395
da transferência de sedimentos da praia para o campo de dunas e, conseqüente, ao 396
aumento do déficit de sedimentos. Em algumas áreas do litoral Sul e Sudeste, o 397
aumento da frequência e intensidade de ciclones extratropicais tenderá a aumentar a 398
recorrência de eventos extremos com ondas altas, ventos fortes e precipitações intensas. 399
Reajustamentos das formas e dos sedimentos de praias em amplos trechos do litoral do 400
Nordeste causados pelo efeito das ondas sobre os arenitos de praia, bem como pelas 401
mudanças no transporte litorâneo, implicará em erosão e acumulação sedimentar 402
localizadas. 403
Conforme a Terra entra num período de mudanças climáticas antrópicas rápidas, 404
com possibilidades de mudanças climáticas perigosas nas próximas décadas, o 405
conhecimento da biologia e da geoquímica envolvidas nesses processos e seu papel no 406
clima da Terra exigem uma prioridade crítica de pesquisas. O Brasil, hoje, encontra-se 407
apto a participar de estudos mais minuciosos de modelagem climática (Tollefsson, 408
2010), tanto em termos de recursos humanos como tecnológicos. 409
É necessário considerar os diagnósticos sobre a biodiversidade no oceano e 410
estabelecer políticas de conservação de forma interligada às políticas que estabelecem o 411
uso de combustíveis fósseis, o uso do solo, qualidade das águas dos rios, controle da 412
poluição atmosférica, entre outros. O plâncton, no papel de base da cadeia alimentar 413
marinha, é extremamente importante no controle do balanço de gases terrestres, sendo 414
estes organismos muito frágeis e dependentes das próprias condições físicas e químicas 415
dos oceanos, cujas alterações no seu metabolismo devido às mudanças ambientais 416
extremas ainda são imprevisíveis. 417
418
Capítulo 4 – Informações Paleoclimáticas Brasileiras 419
Este capítulo exibe o conjunto de estudos paleoclimáticos desenvolvidos com registros 420
continentais e marinhos brasileiros e, subordinadamente, de outros países da América do 421
Sul e dos oceanos adjacentes. Com base nestes estudos, os autores buscam apresentar 422
quais as evidências observacionais do clima do passado que contribuem para o 423
entendimento das variabilidades climáticas observadas no presente e para a inferência 424
de cenários prognósticos de mudanças no clima do Brasil e do continente sul-425
americano. 426
14
As análises realizadas permitem afirmar que as mudanças na insolação recebida 427
pela Terra em escala temporal orbital (i.e., dezenas de milhares de anos) foram a 428
principal causa de modificações na precipitação e nos ecossistemas das regiões tropical 429
e subtropical do Brasil, principalmente aquelas regiões sob influência do Sistema de 430
Monção da América do Sul (SMAS). Valores altos de insolação de verão para o 431
Hemisfério Sul foram associados a períodos de fortalecimento do SMAS e vice-versa. 432
Com base na afirmação acima, buscou-se estabelecer o estado da arte em relação 433
às evidências da existência de registros das mudanças orbitais e seus impactos sobre os 434
ciclos hidrológicos, como também sobre os ecossistemas continentais em regiões 435
tropicais e subtropicais do Brasil. O padrão de variação de precipitação em escala 436
orbital deve ser ainda melhor estabelecido para o continente sul-americano com dados 437
de outras regiões brasileiras. Torna-se extremamente importante neste estágio um 438
esforço conjunto da comunidade científica dedicada à paleoclimatologia no sentido de 439
se obter e analisar testemunhos lacustres e marinhos longos em regiões chaves para um 440
melhor conhecimento dos impactos dos parâmetros orbitais sobre os ciclos hidrológicos 441
como também sobre a vegetação. 442
Os registros paleoclimáticos e paleoceanográficos disponíveis na literatura 443
evidenciam fortes e abruptas oscilações no gradiente de temperatura entre as altas e 444
médias latitudes do Atlântico Norte e a porção equatorial do mesmo oceano, que 445
causaram variações abruptas de pluviosidade tanto no regime de chuva associado às 446
monções sul-americanas, quanto na área diretamente afetada pela Zona de 447
Convergência Intertropical (ZCIT). Na escala temporal milenar foram observadas fortes 448
e abruptas oscilações no gradiente meridional de temperatura do Oceano Atlântico bem 449
como na pluviosidade associada ao SMAS e à ZCIT. A causa destas mudanças 450
climáticas abruptas (aquelas que se processam em grande escala geográfica, perduram 451
tipicamente por várias centenas a poucos milhares de anos, e que ocorrem no intervalo 452
de tempo de algumas décadas ou menos, e causam rupturas substanciais nas sociedades 453
humanas e sistemas naturais - Clark et al., 2008)) reside aparentemente em marcantes 454
mudanças na intensidade da Célula de Revolvimento Meridional do Atlântico (AMOC, 455
do inglês Atlantic Meridional Overtuning Circulation). Períodos de enfraquecimento 456
desta célula foram associados a um aumento na precipitação das regiões tropicais e 457
subtropicais do Brasil. 458
Apesar dos avanços no conhecimento dos eventos abruptos milenares que 459
ocorreram no período glacial e deglacial, é necessária ampla expansão desses estudos 460
15
para novas áreas, tendo em vista determinar: (i) a distribuição espacial no continente 461
sul-americano das anomalias positivas de precipitação durante os eventos Heinrich 462
Stadial; (ii) a distribuição espacial no Atlântico Sul das anomalias de temperatura e 463
salinidade da superfície do mar durante os eventos Heinrich Stadial (HS); (iii) a 464
distribuição vertical no Atlântico Sul das anomalias de temperatura e salinidade durante 465
os eventos HS; (iv) a velocidade da resposta dos diversos biomas às modificações na 466
precipitação associadas aos eventos HS; e (v) os mecanismos pelos quais os eventos 467
milenares abruptos modulam ciclos em escala secular a decenal de variação de 468
pluviosidade nos trópicos da América do Sul. Uma vez que é altamente provável que a 469
AMOC apresente diminuição na sua intensidade (aproximadamente 25%) no futuro 470
próximo (até o final do século XXI) (e.g., Meehl et al., 2007) estudos mais 471
aprofundados dos impactos das mudanças pretéritas na intensidade da AMOC sobre o 472
clima da América do Sul e dos oceanos adjacentes se fazem altamente necessários, 473
principalmente quanto à ocorrência de extremos hidrológicos. 474
O conhecimento a respeito das mudanças na paleocirculação da porção oeste do 475
Atlântico Sul é ainda bastante restrito e fragmentado (Figura SEF.3). Extensas regiões 476
da margem continental leste da América do Sul não apresentam praticamente nenhum 477
estudo com resolução temporal mínima e modelo de idades confiáveis. Adicionalmente, 478
a ausência praticamente completa de estudos que abordem as mudanças abruptas da 479
última glaciação e que tratem do último interglacial representa uma importante barreira 480
no sentido de utilizar cenários pretéritos de circulação da porção oeste do Atlântico Sul 481
como análogos futuros. 482
483
16
484
Figura SEF.3. Média anual da temperatura da superfície marinha (oC) para a porção oeste do Atlântico 485
Sul (Locarnini et al., 2010) e localização dos testemunhos sedimentares marinhos. Testemunhos com 486
dados disponíveis apenas para o Último Máximo Glacial estão representados por círculo brancos 487
(MARGO Project Members, 2009); testemunhos com dados disponíveis para outros períodos estão 488
representados por círculos amarelos (GeoB3910-2: Arz et al. (2001), Jaeschke et al. (2007); 489
GeoB3129/3911-3: Weldeab et al. (2006); GeoB3202-1: Arz et al. (1999); SAN76: Toledo et al. (2007a, 490
b); 7606: Gyllencreutz et al. (2010); 36GGC: Came et al. (2003); Carlson et al. (2008); Pahnke et al. 491
(2008); GeoB6211-2: Chiessi et al. (2008); SP1251: Laprida et al. (2011)). 492
493
Marcantes alterações na circulação da porção oeste do Atlântico Sul foram 494
reconstituídas (Figura SEF.4) para o Último Máximo Glacial (LGM, do inglês Last 495
Glacial Maximum - de 23 a 19 mil anos calibrados antes do presente (cal ka AP), a 496
última deglaciação (de 19 a 11,7 cal ka AP) e o Holoceno (de 11,7 a 0 cal ka AP). 497
Dentre elas pode-se citar: (i) uma diminuição na profundidade dos contatos entre as 498
massas de água intermediária e profunda durante o LGM que foi caracterizada por uma 499
célula de revolvimento meridional de intensidade similar à sua intensidade atual; (ii) um 500
aquecimento das temperaturas de superfície do Atlântico Sul durante eventos de 501
diminuição na intensidade da AMOC em períodos específicos da última deglaciação 502
(e.g., Heinrich Stadial 1 (entre aproximadamente 18,1 e 14,7 cal ka AP) e Younger 503
Dryas (YD - entre aproximadamente 12,8 e 11,7 cal ka AP)); e (iii) o estabelecimento 504
de um padrão similar ao atual de circulação superficial na margem continental sul do 505
Brasil entre 5 e 4 cal ka AP. 506
507
17
508
509
Figura SEF.4. Registros paleoceanográficos da porção oeste do Atlântico Sul desde o Último Máximo 510
Glacial e indicadores de temperatura provenientes das altas latitudes dos Hemisférios Norte e Sul. A 511
latitude de cada registro pode ser encontrada na figura. Todos os registros encontram-se com seus 512
modelos de idade originais. As três barras de cor cinza verticais marcam o LGM-Último Máximo Glacial 513
(Mix et al., 2001), HS1-Heinrich Stadial 1 (McManus et al., 2004) e YD-Younger Dryas (Rasmussen et 514
18
al., 2006). Outras abreviações usadas na figura: CB-Corrente do Brasil, ivc-ice volume corrected, SSM-515
salinidade da superfície do mar, sw-sea water, T-temperatura, TSM-temperatura da superfície do mar, 516
VPDB-Vienna Pee Dee Belemnite, e VSMOW-Vienna Standard Mean Ocean Water. 517
518
Estudos de calibração executados com amostras de superfície de fundo da 519
porção oeste do Atlântico Sul estão disponíveis para uma quantidade razoavelmente 520
grande de indicadores paleoceanográficos apesar da densidade amostral ser, na maior 521
parte dos casos, baixa (e.g.: Harloff e Mackensen, 1997; Mulitza et al., 2003; Frenz et 522
al., 2004; Baumann et al., 2004; Mahiques et al., 2004; Vink et al., 2004; Sousa et al., 523
2006; Chiessi et al., 2007; Mahiques et al., 2008; Regenberg et al., 2009; Groeneveld e 524
Chiessi, 2011). A aplicação criteriosa destes indicadores em testemunhos sedimentares 525
com alta taxa de deposição e com modelos de idades robustos trará marcante avanço no 526
conhecimento paleoceanográfico da porção oeste do Atlântico Sul, como pode ser 527
observado nos últimos anos. 528
Apesar das primeiras referências a paleo-níveis do mar do Holoceno no Brasil 529
terem completado um século (Branner, 1902; Hartt, 1975), estudos sistemáticos 530
começaram apenas em meados da década de 60 do século passado (e.g., Andel e 531
Laborel, 1964; Delibrias e Laborel, 1969). Uma quantidade significativa de indicadores 532
foi datada e o padrão geral transgressivo-regressivo do nível relativo do mar é aceito por 533
toda a comunidade. O nível máximo do mar na costa do Brasil após o LGM foi 534
registrado no Holoceno Médio, com valores por volta de 5 m acima do nível atual 535
(Elevação Máxima do Holoceno, EMH) entre aproximadamente 6 e 5 cal ka AP e 536
diminuiu gradativamente até o início do período industrial. 537
No entanto, os estudos de indicadores do nível relativo do mar na plataforma 538
continental são ainda escassos. Isto deixa uma lacuna que precisa ser preenchida para 539
que se possa entender quando e como o nível relativo do mar inundou a plataforma e se 540
encaminhou para a EMH bem como períodos de rápida elevação do nível relativo do 541
mar típicos da última deglaciação. Ressalta-se que existem também ocorrências de 542
recifes que podem fornecer informações adicionais sobre o comportamento do nível 543
relativo do mar. Estudos que tenham produzido curvas detalhadas do comportamento do 544
nível relativo do mar na plataforma continental setentrional são inexistentes e precisam 545
ser perseguidos. Ainda, a utilização de modelos teóricos juntamente com os dados de 546
campo representa um avanço na abordagem das variações do nível relativo do mar que 547
permitirá identificar e quantificar os fatores locais e regionais com maior eficácia. 548
19
Análises paleoantracológicas (i.e., análises de restos de carvões pretéritos) 549
indicam que por um longo período do Quaternário tardio (i.e., últimas dezenas de 550
milhares de anos) o fogo tem sido um fator de grande perturbação em ecossistemas 551
tropicais e subtropicais e, juntamente com o clima, de suma importância na 552
determinação da dinâmica da vegetação no passado geológico. É importante enfatizar 553
que a combustão da biomassa é a segunda maior fonte de emissão do gás carbônico, o 554
principal gás do efeito estufa, para a atmosfera, que sob determinadas condições 555
climáticas passadas, como no LGM, pode ter representado um papel importante para a 556
evolução do ciclo do carbono da Terra. 557
Pode-se assumir que a substituição de floresta por biomas com vegetação mais 558
aberta, tais como cerrado, campos e savanas, se dará através da ocorrência de 559
paleoincêndios devido à quantidade de combustível disponível e principalmente durante 560
as estações secas. Isto evidencia a necessidade de uma compreensão mais completa da 561
interação entre os incêndios, o clima e a superfície terrestre, na medida em que tal 562
análise pode auxiliar a separar os fatores críticos para a dinâmica de ecossistemas 563
modernos. 564
Apesar de ainda existirem marcantes controvérsias a respeito de pontos 565
importantes relacionados à ocupação humana das Américas (e.g. idade das primeiras 566
migrações, quantas levas de migrações ocorreram, por quais caminhos se processaram 567
as migrações), pode-se afirmar que toda a América do Sul já estava ocupada pelo Homo 568
sapiens por volta de 12 cal ka AP (Roosevelt et al., 1996; Kipnis, 1998; Prous e Fogaça, 569
1999; Araujo e Neves, 2010) e tais ocupações já mostravam padrões adaptativos e 570
econômicos distintos entre si (Roosevelt, 2002). A aparente estabilidade na ocupação 571
humana do Brasil foi interrompida entre cerca de 8 e 2 cal ka AP (evento este 572
denominado de “Hiato do Arcaico” - Araujo et al., 2005), com significativo abandono 573
de sítios e depopulação em escala regional que devem estar associados a marcantes 574
mudanças climáticas. A partir do início do primeiro milênio DC, nota-se um quadro de 575
mudanças sociais e políticas, manifestadas em padrões claramente visíveis no registro 576
arqueológico. A relativa rapidez, a aparente sincronia e a amplitude da escala geográfica 577
dessas mudanças podem ter resultado dos eventos de mudança climática, com a 578
estabilização de condições semelhantes às atuais, ocorridas a partir do ano 1.000 AC. 579
As informações paleoclimáticas a respeito do último milênio no Brasil são 580
extremamente fragmentadas e esparsas. A Pequena Idade do Gelo (de aproximadamente 581
1400 a 1700 AD) foi caracterizada nas porções tropicais e subtropicais da América do 582
20
Sul ao sul da linha do equador por um aumento na precipitação (Reuter et al., 2009; 583
Bird et al., 2011) que provavelmente está associado a um fortalecimento do SMAS, 584
possivelmente controlada pela diminuição da temperatura da superfície do mar (TSM) 585
do Atlântico Norte (e.g., Mann et al., 2009; Reuter et al., 2009; Bird et al., 2011), e a 586
uma desintensificação da AMOC. Entretanto, os mecanismos climáticos associados não 587
estão consolidados e o número de registros paleoclimáticos e paleoceanográficos 588
disponíveis em ambientes tropicais (e subtropicais) deste evento é particularmente 589
reduzido. Para preencher as lacunas existentes e para melhorar nosso entendimento a 590
respeito das variações climáticas naturais multidecenais e seculares faz-se urgente a 591
busca, coleta, análise e interpretação de novos arquivos paleoambientais que tenham 592
registrado as condições climáticas do último milênio em alta resolução temporal. 593
Registros paleoclimáticos fornecem diretrizes que servem para avaliar modelos 594
numéricos do sistema climático (Figura SEF.5), assim como são ferramentas úteis que 595
podem sugerir novos modelos conceituais para explicar variações do clima. Estudos 596
baseados em modelos numéricos do sistema climático mostraram que a América do Sul 597
foi genericamente dominada por condições climáticas mais frias e secas durante o 598
LGM, embora substanciais variações foram notadas regionalmente e como efeito da 599
sazonalidade. Neste cenário, as mudanças mais intensas ocorreram durante o verão 600
austral. Estudos estão em curso para caracterizar em detalhe a evolução climática da 601
região da Mata Atlântica durante o Holoceno com o auxílio de modelos numéricos. 602
De forma geral, observa-se um número ainda bastante restrito de registros 603
paleoclimáticos e paleoceanográficos provenientes do Brasil e da porção oeste do 604
Atlântico Sul. De fato, apenas nos últimos anos foram publicados os primeiros estudos 605
(e.g., Cheng et al., 2009; Chiessi et al., 2009; Souto et al., 2011; Laprida et al., 2011; 606
Stríkis et al., 2011) para algumas regiões (e.g., região Centro-Oeste, Zona de 607
Confluência Brasil-Malvinas) e temas (e.g., temperatura da superfície do mar para o 608
Holoceno, variabilidade multidecenal e secular na precipitação). Neste sentido, é de 609
suma importância que lacunas nesta área do conhecimento sejam preenchidas nos 610
próximos 10 anos. 611
21
612
Figura SEF.5. Distribuição de reconstituições paleoclimáticas (círculo laranja: seco; círculo azul: 613
úmido) e histogramas simulados de precipitação normalizados pelo desvio padrão mostrando as 614
anomalias entre o Último Máximo Glacial e o período atual. As barras em azul e em laranja dos 615
histogramas denotam o verão e o inverno austral, respectivamente. Extraído de Wainer et al. (2005). 616
617
Capítulo 5 – Ciclos Biogeoquímicos e Mudanças Climáticas 618
Este capítulo visa investigar como os principais processos biogeoquímicos seriam 619
afetados pelas mudanças climáticas nos principais biomas e bacias brasileiras. Devido à 620
falta de informações espaciais compatíveis com as escalas dos biomas brasileiros 621
(Tabela SET.1), as análises feitas neste capítulo foram concentradas em regiões de cada 622
bioma onde informações encontram-se disponíveis. Ao mesmo tempo em que esse tipo 623
de limitação nos impede de fazer uma generalização para um determinado bioma, tal 624
limitação serve como um alerta sobre a carência destas informações em escalas 625
compatíveis com as grandes áreas de nossos biomas. Há uma carência crítica de 626
informações para determinados biomas como os Pampas, o Pantanal e a Caatinga. Um 627
volume maior de informações se encontra na Amazônia e, secundariamente, no Cerrado. 628
Somente recentemente estudos têm sido desenvolvidos na Mata Atlântica, mas ainda 629
concentrados em algumas poucas áreas. 630
631
632
633
634
22
Tabela SET.1. Informações fisiográficas e climáticas sobre os principais biomas brasileiros. 635
Bioma Área (km²) Vegetação1 Solos1 Clima2
Amazônia 4,20 Florestal Tropicais inférteis Equatorial
Mata Atlântica 1,11 Florestal Tropicais inférteis Tropical úmido
Pantanal 0,15 Arbustiva-herbácea Tropicais inférteis Tropical semi-
úmido
Cerrado 2,04 Arbustiva-herbácea Tropicais inférteis Tropical semi-
úmido
Caatinga 0,84 Arbustiva-herbácea Tropicais férteis e inférteis Tropical semi-árido
Pampa 0,18 Arbustiva-herbácea Sub-tropicais férteis Sub-tropical
1 Tipo de estrato predominante da vegetação. 636 2 Característica geral dos solos. 637
638
O homem vem, inadvertidamente, alterando a disponibilidade de dois elementos 639
fundamentais à vida: carbono e nitrogênio; além de alterar um dos parâmetros mais 640
importantes no funcionamento de sistemas aquáticos e terrestres: a temperatura do ar. 641
Mudanças de temperatura afetam a distribuição de energia em todo o globo, interferindo 642
na distribuição de chuvas e, consequentemente, na disponibilidade de água. 643
No Brasil são esperadas mudanças profundas e variáveis no clima conforme a 644
região do país (Marengo et al., 2009). É esperado que essas mudanças afetem os 645
ecossistemas aquáticos e terrestres do Brasil. O país engloba seis biomas terrestres 646
(Amazônia, Mata Atlântica, Pantanal, Caatinga, Cerrado e Pampas), que englobam 647
alguns dos maiores rios do mundo, como o Amazonas, o Paraná e o São Francisco; e 648
uma costa com cerca de 8.000 km, contendo pelo menos sete grandes zonas estuarinas e 649
toda a plataforma continental. 650
As informações sobre reservatórios e fluxos de carbono e nitrogênio são poucas 651
em nossos biomas. Os dados existentes são fragmentados em termos espaciais e 652
sazonais. Os dois mais importantes reservatórios de carbono e nitrogênio são os solos e 653
a vegetação. Estoques de nutrientes nos solos são geralmente quantificados até 1 metro 654
de profundidade. É importante salientar que há um decréscimo exponencial das 655
concentrações de carbono e nitrogênio em relação à profundidade do solo, tornando-se 656
difícil qualquer tipo de extrapolação. Dessa forma, os maiores estoques de carbono e 657
Formatado: Português
(Brasil)
23
nitrogênio até 1 metro de profundidade do solo foram encontrados na Mata Atlântica, 658
seguindo-se a Amazônia e o Cerrado. 659
Quanto aos estoques de carbono e nitrogênio acima do solo destacam-se a Mata 660
Atlântica e, especialmente, a Amazônia como tendo os maiores estoques. 661
Interessantemente, apenas na Amazônia e no Pantanal os estoques de carbono e 662
nitrogênio são mais elevados na biomassa acima do solo em relação aos estoques do 663
solo, nos outros biomas os maiores estoques se concentram efetivamente nos solos. 664
O retorno de carbono ao solo via queda das folhas teve uma variação muito 665
menos acentuada entre os biomas. Os sistemas florestais tendem a ter uma transferência 666
ligeiramente maior em relação aos sistemas herbáceos-arbustivos, mas não tão mais 667
elevado se levarmos em consideração a maior biomassa acima do solo observada nos 668
sistemas florestais. Por outro lado, a transferência de nitrogênio é significativamente 669
maior nos sistemas florestados da Amazônia e Mata Atlântica em relação aos sistemas 670
herbáceos-arbustivos como o Cerrado e a Caatinga. A despeito das grandes diferenças 671
nos estoques de carbono do solo, as variações nos fluxos de CO2 para a atmosfera 672
(quando o carbono que foi fixado através do processo de fotossíntese retorna à 673
atmosfera) não foram elevadas entre os biomas, principalmente se excluirmos a 674
Amazônia, onde os fluxos de CO2 foram claramente maiores. 675
O fluxo de N2O do solo para a atmosfera é também considerado uma perda de 676
nitrogênio do sistema. Neste caso as diferenças são mais acentuadas entre os biomas, 677
tendo a Amazônia os maiores fluxos, seguido da Mata Atlântica; enquanto fluxos muito 678
baixos foram detectados para o Cerrado. No caso da fixação biológica de nitrogênio 679
(FBN), as maiores entradas estão associadas aos sistemas florestais da Amazônia e Mata 680
Atlântica, seguidas do Cerrado e, finalmente, do Pantanal e da Caatinga com uma 681
quantidade de nitrogênio fixada anualmente significativamente menor que os três 682
biomas citados acima. Quanto à deposição atmosférica de nitrogênio, os valores foram 683
semelhantes entre os biomas, e na maioria dos casos abaixo dos valores que entram via 684
FBN, e ligeiramente mais elevados em relação aos fluxos de N2O para a atmosfera. 685
Prever prováveis efeitos das mudanças climáticas sobre os ciclos 686
biogeoquímicos que ocorrem nesses biomas é extremamente complexo devido à 687
escassez de dados fundamentais. A previsão mais crítica para a região Amazônica é a 688
“savanização” da floresta (Amazon dieback) que acarretaria perdas significativas nos 689
estoques de carbono tanto do solo como da vegetação. Neste cenário, previsto pelo 690
modelo HadCM3 do Hardley Center, o clima mudaria a tal ponto que o resto da floresta 691
24
seria substituído por uma vegetação tipo savana (Cox et al., 2004; Marengo et al., 692
2009). No entanto, Huntingford et al. (2013), utilizando uma compilação maior de 693
modelos climáticos globais, contrapões à ocorrência da ”savaniação” da Floresta 694
Amazônica, ao apresentar simulações que não reproduzem as condições ambientais e de 695
resposta da floresta para que este processo seja estabelecido.Apesar de pouco provável, 696
tais mudanças se refletiriam não apenas no ciclo do carbono, como também no ciclo do 697
nitrogênio. 698
A Mata Atlântica estoca quantidades apreciáveis de carbono e nitrogênio em 699
seus solos, principalmente em maiores altitudes. Os aumentos previstos para a 700
temperatura do ar na região Sudeste do Brasil (Marengo et al., 2009, 2010) levariam a 701
um aumento nos processos de respiração e decomposição, gerando um aumento nas 702
perdas de carbono e nitrogênio para a atmosfera. A pergunta que permanece por falta de 703
informações é se essas perdas seriam compensadas por um aumento na produtividade 704
primária líquida do sistema. 705
Uma das mais notáveis características das florestas tropicais é sua habilidade de 706
estocar grandes quantidades de carbono e nitrogênio, tanto acima como abaixo do solo 707
(Trumbore et al., 1995). Segundo Meier e Leuschner (2010), um aumento na 708
temperatura pode transformar ecossistemas florestais em fontes de carbono. Este fato 709
ocorreria, pois haveria um aumento nas emissões de CO2 do solo causado pelo aumento 710
da temperatura e do CO2 na atmosfera que não seria compensado pela absorção de CO2 711
pela fotossíntese. Nos campos sulinos dos Pampas, similarmente à Mata Atlântica, os 712
solos detêm um apreciável estoque de carbono. Portanto, aumentos na temperatura 713
previstos para o futuro aumentariam as emissões de CO2 para a atmosfera. 714
O balanço entre a vegetação lenhosa e a vegetação herbácea é um importante 715
aspecto da fisionomia do Cerrado. A vegetação lenhosa tem estoques de nutrientes mais 716
recalcitrantes na forma de raízes profundas e caules, enquanto a vegetação herbácea é 717
mais prontamente decomposta pelo fogo (Miranda e Bustamante, 2002). Em áreas onde 718
a duração da seca fosse maior favoreceria em tese um aumento na incidência de fogo, 719
que por sua vez, favoreceria o aparecimento de uma vegetação herbácea (Filgueiras, 720
1991), implicando em mudanças importantes no funcionamento do Cerrado. A 721
produtividade primária do Cerrado pode potencialmente ser reduzida frente às 722
mudanças climáticas projetadas para este bioma. O aumento da temperatura 723
provavelmente resultará em uma redução do processo fotossintético nas plantas do 724
Cerrado (Berry e Björkman, 1980), implicando em um possível decréscimo de sua 725
25
biomassa. Adicionalmente, na estação seca, o Cerrado passa a ser uma fonte de carbono 726
para a atmosfera. Portanto, um aumento na duração deste período implicaria também em 727
uma redução na produtividade primária do Cerrado, bem como pode potencialmente 728
resultar em um aumento na vulnerabilidade ao fogo que no Cerrado (Mistry, 1998). 729
Aumentando-se a ocorrência de eventos de fogo resultaria em uma diminuição nos 730
estoques de biomassa e nutrientes através de escoamento profundo, erosão, transporte 731
de partículas e volatilização. 732
As projeções feitas por Marengo et al. (2009, 2010), mostram uma redução no 733
valor total e aumento da variabilidade nos padrões de precipitação para o bioma 734
Caatinga; além de um aumento no número de dias secos e aumento da temperatura do 735
ar. As possíveis consequências dessas mudanças no clima seriam secas mais intensas e 736
frequentes, inundações e perda de potência na geração de energia hidroelétrica (MMA, 737
2004). A produção de alimento também seria seriamente afetada e o aumento na 738
variabilidade das precipitações afetaria também a pecuária. A vegetação natural da 739
Caatinga é relativamente bem adaptada à falta de água e altas temperaturas. No entanto, 740
não se conhece os limites deste bioma tornando-se extremamente importante que 741
estudos de longo prazo sobre o funcionamento da Caatinga sob condições extremas 742
sejam realizados para a futura adaptação deste bioma às mudanças globais que se impõe 743
no futuro. 744
Do ponto de vista biogeoquímico, alterações no Pantanal devem ser similares ao 745
que pode ocorrer no Cerrado devido à latitude e algumas semelhanças fitofisionômicas. 746
Contudo, o Pantanal experimenta naturalmente mudanças drásticas que podem estar 747
ligadas ao tempo e posição média no verão austral da banda de chuva da Zona de 748
Convergência do Atlântico Sul (ZCAS). 749
Não há ainda informações suficientes sobre os efeitos dos cenários de mudanças 750
climáticas sobre o funcionamento dos campos sulinos, ou Pampas, os quais guardam 751
apreciáveis estoques de carbono em seus solos. As baixas temperaturas contribuem para 752
o acúmulo de matéria orgânica no solo; portanto, um aumento nas temperaturas como 753
previsto, levaria a um aumento nas taxas de decomposição, aumentando as emissões de 754
CO2 para atmosfera. Da mesma forma que o observado para a Mata Atlântica, não é 755
possível ainda prever se esse aumento nas emissões seria compensado por um aumento 756
na produtividade primária líquida do sistema. 757
De forma geral, há uma grande incerteza em relação aos efeitos de alterações 758
climáticas nos recursos hídricos do Brasil. As bacias hidrográficas mais importantes do 759
26
país, segundo seus atributos hidrológicos e ecológicos são as do Amazonas, Tocantins-760
Araguaia, Paraná, Paraguai e São Francisco. Essas bacias cortam regiões que devem 761
sofrer diferentes impactos relacionados às alterações de temperatura e precipitação 762
(volume e frequência de chuvas), com efeitos distintos na disponibilidade de água ao 763
uso humano assim como à manutenção de processos ecológicos. As projeções 764
climáticas propostas por Marengo et al. (2010) para este século (até 2100) apontam que, 765
regionalmente, também é previsto o aumento de eventos extremos associados à 766
frequência e volume de precipitação. Os cenários apontam para diminuição na 767
pluviosidade nos meses de inverno em todo país, assim como no verão no leste da 768
Amazônia e Nordeste. Da mesma forma, a frequência de chuvas na região Nordeste e no 769
leste da Amazônia (Pará, parte do Amazonas, Tocantins, Maranhão) deve diminuir, com 770
aumento na frequência de dias secos consecutivos. Este cenário deverá impor um stress 771
sério aos já escassos recursos hídricos da região Nordeste. Em contraste, o país deve 772
observar o aumento da frequência e da intensidade das chuvas intensas na região 773
subtropical (região sul e parte do sudeste) e no extremo oeste de Amazônia. 774
775
Capítulo 6 – Aerossóis Atmosféricos e Nuvens 776
Este capítulo apresenta uma revisão de algumas das principais contribuições científicas 777
para a caracterização dos efeitos dos aerossóis atmosféricos sobre o Brasil, incluindo o 778
papel exercido por suas fontes naturais e antrópicas, como queima de biomassa, 779
poluição urbana, dentre outras e para o entendimento dos processos de microfísica de 780
nuvens. O texto visa, ainda, identificar algumas lacunas de entendimento importantes 781
que requerem avanços do ponto de vista teórico, observacional e de modelagem com 782
vistas ao seu preenchimento. Tais contribuições e lacunas encontram-se ligadas 783
particularmente: 784
Ao entendimento dos processos de produção e transporte de aerossóis sobre o 785
continente sul-americano, incluindo fontes naturais e antrópicas locais e 786
remotas; 787
À influência desses aerossóis na formação de nuvens, ao servirem como núcleos 788
de condensação (CCN) e de gelo (IN), incluindo o papel de sua variabilidade 789
espacial e temporal, o que inclui contrastes dramáticos como o identificado na 790
Amazônia, associados à ocorrência de queimadas predominantemente nas 791
porções sul e leste dessa região e sobre o Brasil central, durante a estação seca; 792
27
Às propriedades microfísicas das nuvens sobre o continente sul-americano, 793
incluindo observações em nuvens quentes e de fase mista já realizadas sobre 794
território brasileiro, e as possíveis implicações sobre as propriedades radiativas e 795
sobre o ciclo hidrológico; 796
Ao papel das nuvens e da convecção sobre a circulação e sobre a termodinâmica 797
da atmosfera em escalas maiores, bem como à representação das mesmas em 798
modelos numéricos de circulação geral e de área limitada. 799
800
Os aerossóis exercem um papel importante no clima. Participam do balanço 801
radiativo, espalhando e/ou absorvendo radiação solar e terrestre. No balanço climático 802
global, os aerossóis têm um papel de resfriamento, já que sua forçante radiativa líquida 803
é negativa (Solomon et al., 2007). Além de interagir diretamente com a radiação, é sobre 804
uma fração das partículas de aerossóis (os chamados CCN, do inglês Cloud 805
Condensation Nuclei) que se formam as gotículas de nuvens em seu estágio inicial de 806
formação. 807
Diferentemente dos gases de efeito estufa, que tem um tempo de permanência na 808
atmosfera da ordem de anos, os aerossóis tem um ciclo de vida na atmosfera da ordem 809
de alguns dias, no máximo semanas. Os mecanismos de remoção dos aerossóis são 810
relacionados à sua faixa de tamanho. No caso da moda grossa, a deposição gravitacional 811
é muito importante. Já as partículas da moda fina, por terem velocidades terminais de 812
deposição gravitacional muito baixas, estão sujeitas ao transporte pelos ventos, podendo 813
ser levadas a milhares de quilômetros de onde foram produzidas. Exemplo disso são as 814
plumas de queimada que se espalham por milhões de km2 pelo continente sulamericano, 815
nos meses da estação seca (Freitas et al., 2005, 2009). 816
O 4º relatório do IPCC (Solomon et al., 2007) apresentou estimativas de 817
magnitude para a forçante radiativa de aerossóis (dividida nos efeitos direto e indireto1). 818
Além de ser uma forçante que resulta em resfriamento da atmosfera, sua barra de 819
incerteza (principalmente para o chamado efeito indireto dos aerossóis) é a maior de 820
todas. De fato, o efeito radiativo dos aerossóis nas nuvens pode ser desde muito 821
pequeno, até atingir valores que confrontam o efeito da forçante do CO2, por exemplo. 822
1 O efeito direto dos aerossóis corresponde ao espalhamento ou absorção de radiação de onda curta ou
longa. O efeito indireto é o mecanismo pelo qual os aerossóis modificam as propriedades microfísicas
das nuvens, com impactos sobre suas propriedades radiativas (especialmente o albedo, o que
caracteriza o chamado 1o efeito indireto, efeito Twomey ou efeito no albedo), a cobertura total de
nuvens e o seu ciclo de vida (2o efeito indireto, efeito Albrecht ou efeito no ciclo de vida)
28
Além disso, apesar do entendimento de que elevadas concentrações de aerossóis podem 823
inibir a formação de chuva quente, ainda é bastante incerto o seu efeito sobre o campo 824
total de precipitação (Rosenfeld et al., 2008), uma vez que a maior parte da chuva 825
observada em superfície está associada a nuvens de fase mista. No caso do efeito dos 826
aerossóis na precipitação devido às queimadas, Vendrasco et al. (2009) discutem um 827
possível mecanismo dinâmico que explica os resultados contraditórios na literatura 828
(aumento ou diminuição da precipitação) devido às queimadas. Estas são algumas das 829
motivações para o grande interesse da comunidade científica no aumento do 830
conhecimento do efeito dos aerossóis no clima. 831
O entendimento do papel dos aerossóis no clima exige uma caracterização de 832
suas fontes predominantes, sejam naturais ou antrópicas, e das suas propriedades 833
capazes de alterar os efeitos direto e indireto. 834
Neste contexto, diversos experimentos realizados na região amazônica foram 835
capazes de qualificar e quantificar de maneira bastante completa a composição do 836
aerossol presente na atmosfera amazônica. As primeiras campanhas intensivas de 837
medidas aconteceram nos anos 80, com os experimentos ABLE (Amazonian Boundary 838
Layer Experiment) (Harriss et al., 1988, 1990). Os resultados obtidos nestes 839
experimentos motivaram a criação do experimento LBA (Experimento de Larga Escala 840
da Biosfera Atmosfera da Amazônia) (Avissar e Nobre, 2002; Davidson e Artaxo, 841
2004), que consolidou um sólido corpo de conhecimentos científicos nesta área. 842
A composição do aerossol natural na região amazônica pode ser observada 843
durante a estação chuvosa, quando atividades relacionadas às queimadas são 844
desprezíveis. A conclusão geral dos trabalhos focados na região é de que o aerossol 845
natural amazônico é uma soma das contribuições do transporte de aerossol marinho para 846
dentro do continente (4%), episódios de transporte de poeira do Saara (9%) e emissões 847
biogênicas da vegetação (87%) (Pauliquevis et. al., 2012). Em termos de contribuição 848
absoluta à massa do material particulado, as emissões biogênicas primárias são 849
dominantes (Pauliquevis et al., 2012; Artaxo et al., 2002; Gilardoni et al., 2011). 850
Na quantificação das emissões de origem antrópica, no Brasil, as principais 851
fontes antrópicas de gases de efeito estufa estão relacionadas às mudanças de uso da 852
terra. Durante a estação seca, as queimadas constituem a principal fonte de partículas de 853
aerossol para a atmosfera de vastas áreas do Brasil, particularmente sobre o arco do 854
desflorestamento na região amazônica e áreas de cultivo de cana-de-açúcar. De acordo 855
com o Inventário Brasileiro de Emissões de Gases de Efeito Estufa (MCT, 2013), em 856
29
1994, cerca de 75% das emissões de CO2 estavam relacionadas a este setor. Sabe-se 857
que a parte predominante destas emissões ocorria no Arco do Desflorestamento na 858
Amazônia, onde a conversão de florestas em áreas agrícolas ou de pastoreio acontece a 859
taxas elevadas. Não há menção às emissões de partículas de aerossóis no Inventário. 860
Entretanto, sabe-se que no caso de queimadas esta grande emissão de CO2 está 861
fortemente vinculada a emissões de partículas (Yamasoe et al., 2000), com fatores de 862
emissão bem determinados. Soma-se a isso a grande quantidade de biomassa envolvida 863
nas queimadas quando se trata da região amazônica (da ordem de 200-400 ton ha-1
) e a 864
extensão das plumas de queimada, que alcança a escala continental, conforme 865
evidências a bordo de sensores orbitais (Freitas et al., 2005a, 2005b, 2009). A 866
importância das queimadas feitas na região amazônica pode ser observada através da 867
Figura SEF.6, referente ao ano de 2010. À esquerda, é mostrado o número total de focos 868
de queimada no ano de 2010 e, à direita, a profundidade óptica de aerossóis (AOD, 1 = 869
550 nm), obtida pelo sensor MODIS. Pode-se observar que, ainda que a maior 870
concentração de focos ocorra no estado do Tocantins, leste do Mato Grosso, sudeste do 871
Pará, com quantias importantes de focos no Paraguai, Bolívia, e São Paulo (porções 872
leste e norte), os maiores índices de AOD ocorreram sobre Rondônia e Mato Grosso, 873
além da Bolívia. Essa discrepância é explicada pelo diferente conteúdo de biomassa 874
queimada. De fato, o impacto da queima de biomassa de floresta primária na Amazônia 875
é muito maior do que em outros tipos de vegetação como cerrado ou culturas agrícolas. 876
877
878
30
Figura SEF.6. Acima (esquerda), número de focos de
queimada no ano de 2010 (fonte:
http://sigma.cptec.inpe.br/queimadas/);
Acima (direita), valor médio anual (2010) de
profundidade ótica de aerossóis na moda fina
(fonte: NASA, obtido em
http://disc.sci.gsfc.nasa.gov/giovanni/overview/index.html).
A direita: campo de ventos e concentração de aerossóis
em, um episódio de queimadas em agosto de 2002,
mostrando como emissão e campo de ventos interagem
gerando a distribuição espacial da pluma.
Como pode ser deduzido pela mesma Figura STD.6 (acima a direita), as plumas 879
de fumaça podem se estender por centenas a milhares de quilômetros de distância dos 880
focos emissores, podendo atingir regiões ainda com vegetação intacta ao norte, a 881
Cordilheira dos Andes, a oeste, as porções sul e sudeste da América do Sul, passando, 882
por exemplo, sobre Buenos Aires, na Argentina, e o oceano Atlântico, com vários 883
episódios de detecção sobre a cidade de São Paulo (Freitas et al., 2005, 2009; Landulfo 884
et al., 2005). Esta extensão de cobertura da pluma de queimadas está associada com o 885
padrão de ventos. Com a alta pressão que se estabelece na região do Brasil Central na 886
estação seca, o caminho preferencial das plumas é no sentido anti-horário, seguindo o 887
jato de baixos à leste da cordilheira dos Andes. Isto é o que se pode ver na figura na 888
parte inferior da Figura SEF.6 (Freitas et. al., 2012). 889
Por outro lado, há uma importante contribuição de emissões situadas em regiões 890
urbanas, fruto principalmente de emissões veiculares. Ainda que não sejam majoritárias 891
no conteúdo total de emissões, as partículas de aerossol das emissões urbanas exercem 892
papel importante no clima urbano e na saúde pública das metrópoles brasileiras (e.g: 893
Andrade et al., 2012). A Tabela SET.2 abaixo sintetiza as informações referentes a 894
algumas localidades brasileiras. 895
896
Tabela STD.2. Concentração média, em μg/m3, de material particulado inalável, fino e BC medidos em 897
seis capitais brasileiras de 2007 a 2008, e em áreas sujeitas a queimadas com a contribuição relativa de 898
BC no PM2.5. PM2.5 = partículas inaláveis finas de diâmetro inferior a 2,5 micrómetros (µm), 899
PM10 PM2.5 BC %BC
31
São Paulo 34 2814b 116 3814
Rio de Janeiro - 1711b 3,42,5 207
B. Horizonte - 158b 4,53,3 3113
Curitiba - 1410b 44 3011
Porto Alegre - 1310b 54 2611
Recife - 73b 1,91,1 2612
Rondôniac
(estação seca) 8364 6755 76 112
Alta Florestad
(estação seca) 3725 6355 86
CETESB (2011); ref. ano 2009
2Andrade et al. (2012)
cArtaxo et al. (2002)
dMaenhaut et al. 900
(2002) inclui apenas moda grossa. 901
902
Majoritariamente, tanto nas regiões urbanas como sob influência de queimadas, 903
ocorre um acréscimo significativo na massa de particulado na moda fina. A 904
consequência disso é um impacto grande no aumento da incidência de doenças 905
respiratórias. Aliado a isto, o particulado fino tem tempo de residência mais elevado, o 906
que torna eficiente seu transporte a distâncias muito grandes da sua fonte. Em particular, 907
no caso de queimadas, as plumas oriundas da queima de biomassa na Amazônia 908
atingem porções significativas da América do Sul, tendo um grande efeito na forçante 909
radiativa direta e indireta (ver Capítulo 7). Além disso, como parte significativa do 910
material particulado ocorre na forma de Black Carbon2, quando em suspensão esta 911
pluma tem a capacidade de aquecer os níveis médios da troposfera gerando estabilidade 912
atmosférica e inibição da convecção rasa (Koren et al., 2004; Feingold et al., 2005). 913
Enquanto do ponto de vista de incidência de problemas de saúde na população 914
deve-se considerar a massa do material particulado como o indicador mais adequado, no 915
caso do efeito dos aerossóis em nuvens a concentração (número) de partículas na 916
atmosfera é o valor mais relevante. Isto se deve ao fato de que para a formação de uma 917
gota de nuvem deve haver uma partícula de aerossol aonde o vapor de água possa se 918
depositar. Assim, considerando a hipótese de que a quantia de vapor na atmosfera seja a 919
mesma, o número de gotas na base de uma nuvem será muito maior se ela se formar a 920
partir de uma massa de ar poluída do que quando comparada com uma massa de ar 921
limpa. Consequentemente, o raio efetivo da distribuição de gotas na base destas duas 922
nuvens hipotetizadas acima será muito diferente – devido à suposição de que o conteúdo 923
de vapor se conserva. 924
2 O Black Carbon, que em português tem diversos nomes (p.ex. “negro de fumo”, ou “carbono negro”) é a fração do material
particulado que tem a propriedade de ser forte absorvedor de radiação. Corresponde a chamada fuligem, e tipicamente é associada a
processos de combustão como motores a combustão e queima de biomassa.
32
Medidas realizadas na bacia amazônica durante o experimento LBA/SMOCC 925
(Smoke Aerosols, Clouds, Rainfall and Climate) 2002 (Fuzzi et al., 2007) em região de 926
pastagem em Rondônia cobriram um período com intensa atividade de queimadas 927
(setembro), transição (outubro) e o início da estação chuvosa (novembro). Pode-se notar 928
claramente o grande aumento no número de partículas no período seco em função das 929
queimadas. Observa-se também que esse grande aumento no número de partículas 930
ocorre principalmente a partir de 50 nm de diâmetro, uma faixa de tamanho na qual a 931
partícula de aerossol já tem significativa capacidade de atuar como CCN. Como 932
parâmetro de comparação, o número médio de partículas em região remota da 933
Amazônia reportado por Zhou et al. (2002) é de 450 cm-3
. 934
Em áreas urbanas, no Brasil, não há trabalhos que reportem medidas de 935
concentração de partículas. É importante que tal tipo de medida seja realizada para que 936
seja possível criar estimativas da influência das emissões urbanas na microfísica de 937
nuvens. A maioria dos estudos das propriedades dos CCN e das nuvens na América do 938
Sul se concentra na Região Amazônica (e, em menor extensão, sobre o Nordeste). 939
Constituem-se em trabalhos focando análise de dados de satélite e, em menor número, 940
campanhas intensivas de medidas de campo. Além disso, trata-se de conhecimento 941
recente, portanto insuficientemente aprofundado. 942
Martins et al. (2009), a partir de medidas com aeronave, estudaram as 943
propriedades dos CCN na Região Amazônica, comparando regiões limpas e regiões sob 944
intensa atividade de queima de biomassa. Observou-se um decréscimo generalizado na 945
concentração de CCN desde o final da estação seca até o início da estação chuvosa. A 946
comparação entre dias poluídos e dias limpos mostra uma concentração de CCN pelo 947
menos cinco vezes maior para os dias poluídos. Diferenças ainda maiores foram 948
observadas quando áreas limpas e poluídas foram comparadas para uma mesma data. 949
Valores médios de concentrações menores que 200 cm-3
para as regiões limpas e 950
maiores que 1200 cm-3
para as regiões poluídas foram registrados. Os valores não 951
incluem medidas realizadas diretamente sobre os focos de queimada. Observou-se ainda 952
que a concentração de CCN segue um ciclo diurno acompanhando a queima de 953
biomassa, ou seja, os valores se apresentaram maiores à medida que os voos foram 954
realizados em horários mais tardios. As diferenças observadas entre os espectros de 955
CCN de condições limpas e poluídas indicaram que a atividade de queima de biomassa 956
é mais eficiente em produzir, principalmente, partículas pequenas e com pequena fração 957
solúvel. Por sua vez, Pöschl et al. (2010) mostraram que partículas finas, faixa em que 958
33
predominam os CCN, são predominantemente compostas de material orgânico 959
secundário formado pela oxidação de precursores biogênicos, enquanto que partículas 960
grossas, importantes nucleadores de gelo, consistem de material biológico emitido 961
diretamente pela floresta. 962
Jones e Christopher (2010), usando a técnica de análise das componentes 963
principais aplicada aos dados do MODIS (Moderate Resolution Imaging 964
Spectroradiometer), TRMM (Tropical Rainfall Measuring Mission) e produtos de 965
reanálises do NCEP, estudaram as propriedades estatísticas da interação aerossóis-966
nuvens-precipitação sobre a América do Sul em busca de indicativos do efeito indireto 967
dos aerossóis sobre os processos associados a nuvens quentes. Os dados foram 968
coletados durante o período seco da região amazônica (setembro de 2006), época em 969
que a espessura ótica dos aerossóis (AOT) produz valores acima de 1,0 para extensas 970
áreas da América do Sul, não se restringindo à região amazônica. Os autores 971
trabalharam com a hipótese de que se os efeitos indiretos (e também o semi-direto) se 972
manifestarem, em condições poluídas, como conseqüência da redução nos processos de 973
colisão e coalescência ou aumento na estabilidade, deveria haver uma diminuição na 974
precipitação estratiforme em comparação com condições mais limpas no mesmo 975
ambiente. Comparando amostras sem chuva, com chuva e com chuva intensa (>5 mm h-
976
3), concluíram, porém, que as condições atmosféricas de maior escala são mais 977
importantes para o desenvolvimento da precipitação do que a concentração de aerossóis. 978
Os resultados de Williams et al. (2002) sugerem que a ausência de distinção entre os 979
parâmetros elétricos dos regimes poluído e limpo na bacia amazônica, coloca em dúvida 980
o papel dos aerossóis na intensificação da eletrização de nuvens e reforçam a idéia de 981
um papel preponderante da dinâmica. 982
Andreae et al. (2004) sugerem que a fumaça produzida a partir das queimadas na 983
Amazônia produz efeitos significativos sobre a microestrutura das nuvens, com uma 984
redução dramática no diâmetro médio das gotículas, inibindo a colisão-coalescência. As 985
estimativas dos autores são de que em nuvens convectivas, dinâmica e 986
termodinamicamente similares, a iniciação da precipitação deixa de ocorrer a cerca de 987
1,5 km acima de sua base (como em nuvens marítimas) e passa a ocorrer a 5 km em 988
nuvens poluídas ou ainda mais acima em pirocúmulos. Esta noção é corroborada tanto 989
por Freud et al. (2008) que discutem que há um aumento consistente em cerca de 350 m 990
na altitude sobre a base da nuvem na qual a colisão-coalescência dispara a formação de 991
chuva quente para cada 100 núcleos de condensação (a uma supersaturação de 0,5%) 992
34
adicionados por cm3. Indícios no mesmo sentido são apresentados por Costa e 993
Pauliquevis (2009), cujos resultados apontam para altitudes de chuva quente (isto é, a 994
altitude em que o processo de formação de chuva quente se inicia) indo de 1200-2300 m 995
em ambientes marítimos e costeiros a 5400-7100 m em ambientes influenciados por 996
queimadas, assim como por Costa e Sherwood (2005) que sugerem uma relação 997
praticamente linear entre a profundidade de chuva quente (diferença entre a altitude de 998
chuva quente e a altura da base da nuvem) e a concentração de gotículas, pelo menos até 999
valores de ordem de 3000 cm-3
. 1000
Outro aspecto importante a ser considerado, além da concentração de gotículas, 1001
é a variabilidade na forma de sua distribuição, que constitui ao mesmo tempo um fator 1002
fisicamente relevante no desenvolvimento da precipitação e uma incerteza importante 1003
na modelagem dos processos de nuvens. Costa et al. (2000a) discutiram a possibilidade 1004
de representação de distribuições de gotículas observadas por funções analíticas, o que 1005
permitiria simular processos em nuvens por meio de parametrizações de microfísica 1006
“totalizada” (ou bulk). Os autores encontraram que essas distribuições só podem ser 1007
representadas com um mínimo de adequação por funções analíticas que contenham dois 1008
ou mais parâmetros livres, com destaque para as distribuições de Weibull e gama (casos 1009
particulares da distribuição gama generalizada, e.g. Liu e Daum 2004) e lognormal. Ao 1010
contrário do que é tipicamente admitido, porém, não é possível representar, com um 1011
mesmo parâmetro de forma, espectros de gotículas em nuvens formadas em diferentes 1012
ambientes ou mesmo espectros de gotículas em regiões diferentes da mesma nuvem ou 1013
em estágios diferentes do seu ciclo de vida. Costa et al. (2000a) chegam a discutir o 1014
papel exercido por processos como o crescimento condensacional e a mistura de 1015
parcelas sobre a forma do espectro (e as implicações disso sobre a modelagem). Santos 1016
et al. (2002), por sua vez, apontam o papel potencialmente exercido por processos de 1017
mistura em nuvens cúmulos na configuração de regiões com diferentes propriedades 1018
(uniformes ou variáveis com respeito à concentração de gotículas e à forma do 1019
espectro). 1020
Menos estudado do que a influência que as alterações antrópicas sobre o campo 1021
de aerossóis exercem sobre “nuvens quentes” (isto é, que contêm apenas material 1022
condensado na fase líquida) é o papel que das alterações antrópicas sobre “nuvens 1023
frias”, compostas por cristais de gelo e “nuvens de fase mista”. Como apontam Wang e 1024
Penner (2010), o fato de nuvens cirrus cobrirem tipicamente mais de 20% do planeta faz 1025
com que as mesmas sejam importantes para o balanço radiativo planetário. Nuvens 1026
35
convectivas profundas, particularmente nos trópicos, são responsáveis por mecanismos 1027
de transporte vertical cruciais para a circulação geral atmosférica. 1028
No entanto, como apontado por Rosenfeld et al. (2008), o processo de inibição 1029
da chuva quente em nuvens rasas ou nos estágios iniciais de desenvolvimento de 1030
convecção profunda (Rosenfeld, 1999; Andreae et al., 2004; Costa e Sherwood, 2005), 1031
dá lugar a processos bem mais complexos quando a fase de gelo é introduzida. 1032
Incertezas associadas ao comportamento de nuvens convectivas profundas ao serem 1033
influenciadas por aerossóis de origem antrópica são, portanto, bastante significativas. 1034
Aprofundar a investigação das nuvens frias e, principalmente de nuvens convectivas de 1035
fase mista, é essencial para melhor compreender como mudanças antrópicas sobre o 1036
campo de aerossóis pode interferir sobre a precipitação e a circulação atmosférica em 1037
maior escala face ao seu papel na microestrutura da convecção profunda. 1038
Contando com os aspectos discutidos anteriormente, o efeito dos aerossóis e 1039
nuvens no tempo e clima em escalas local, regional e global, tem recebido maior 1040
atenção recentemente. No que tange especificamente sobre os aerossóis no Brasil e na 1041
América do Sul, estudos como os de Zhang et al. (2009), utilizando modelagem 1042
regional (RegCM3), têm evidenciado potenciais impactos dos aerossóis provenientes de 1043
queimadas sobre a circulação atmosférica de grande escala, com modificações no 1044
comportamento da monção da América do Sul devido ao aumento da estabilidade 1045
termodinâmica sobre o Sul da Amazônia. Estes autores propõem que aumentos na 1046
estabilidade e pressão à superfície, bem como um escoamento divergente nessa região 1047
pode levar ao reforço de atividade ciclônica e aumento da precipitação no sudeste do 1048
Brasil, Paraguai e nordeste da Argentina. É particularmente importante nesse sentido o 1049
tipo de desenvolvimento de modelagem que vem sendo realizado, com a inclusão de 1050
módulos complexos de química da atmosfera, emissão de aerossóis e outros processos 1051
envolvendo queimadas, como o realizado por Freitas et al. (2005, 2009). 1052
Existem modelos de grade e modelos espectrais. Os modelos espectrais usam 1053
harmônicos esféricos para representar processos dinâmicos. Neste caso, as 1054
parametrizações de convecção ocorrem no espaço físico e não no espaço espectral. 1055
Apesar de alguns modelos modernos já atingem resoluções abaixo de 4 km, nas 1056
quais a parametrização de convecção não é necessária, muitas vezes, entretanto, a 1057
discretização dos modelos numéricos faz com que a representação dos fenômenos 1058
atmosféricos seja truncada em harmônicos cujos comprimentos são, na maior parte dos 1059
casos, maiores do que os da escala convectiva. Como a representação da atividade 1060
36
convectiva é fundamental para a energética e ciclo hidrológico do modelo, o efeito da 1061
convecção para estes casos é representado através de parametrizações dos processos 1062
convectivos. As parametrizações convectivas permitem então obter o efeito dos 1063
fenômenos não resolvíveis na grade dos modelos em função das variáveis que são 1064
resolvidas. Há uma série de abordagens propostas na literatura. Todas elas são derivadas 1065
de três tipos básicos: 1) Esquemas do tipo ajuste convectivo: proposto por Manabe et al. 1066
(1965) esse tipo de esquema supõe que sempre que os efeitos radiativos e/ou dinâmicos 1067
reduzem a taxa de resfriamento da troposfera abaixo de um certo nível crítico, é feito 1068
um ajuste de massa e energia de modo que um perfil estável é recuperado. Problema 1069
típico com esse tipo de esquema é a arbitrariedade da determinação do perfil para o qual 1070
o modelo é ajustado. 2) Esquemas do tipo Kuo (1965, 1974): relacionam a ocorrência e 1071
a intensidade da convecção com a convergência de umidade de grande escala. O 1072
esquema depende de um parâmetro b, que define o porcentual da convergência de 1073
umidade que vai ser usada para umedecer a coluna atmosférica, enquanto o restante é 1074
usado para aquecer a coluna por liberação de calor latente. A dificuldade em determinar 1075
o valor de b é uma das limitações desse tipo de esquema. 3) Esquemas do tipo fluxo de 1076
massa: proposto inicialmente por Arakawa e Schubert (1974), esse tipo de esquema 1077
supõe que o conjunto de nuvens em uma região está em quase equilíbrio com as 1078
forçantes de grande escala. Neste esquema as nuvens consomem a energia potencial 1079
produzida pelo efeito desestabilizador da grande escala. Conforme a intensidade da 1080
forçante de grande escala, o fluxo de massa convectivo necessário para manter a 1081
convecção em equilíbrio pode ser calculado. Em tese, o efeito radiativo das nuvens está 1082
incorporado no esquema clássico proposto por Arakawa e Schubert (1974) através do 1083
efeito radiativo na estabilidade termodinâmica. Entretanto, o detalhamento do efeito 1084
radiativo é, em geral, muito primitivo nos modelos atmosféricos usados na escala 1085
climática. 1086
Neste contexto, fica evidente que a modelagem dos processos envolvendo 1087
nuvens na maior parte dos modelos globais e regionais utilizados para previsão de 1088
mudanças climáticas no Brasil e no mundo ainda se caracteriza pela utilização de um 1089
grande número de simplificações nos processos envolvendo nuvens. É particularmente 1090
significativo que as escalas dos movimentos convectivos não sejam explicitamente 1091
resolvidas na grande maioria desses modelos, em função de recursos computacionais e 1092
de que os modelos atualmente disponíveis para os estudos de tempo e clima estejam 1093
quase todos presos ao paradigma da utilização de parametrizações de convecção. Ao 1094
37
mesmo tempo em que há uma variedade de hipóteses de fechamento dessas 1095
parametrizações, com os modelos comumente exibindo grande sensibilidade à escolha 1096
do esquema de convecção, tal paradigma é evidentemente limitado em função dos 1097
artificialismos subjacentes à fragmentação dos processos físicos envolvendo nuvens em 1098
diferentes componentes dos modelos atmosféricos (comumente, os modelos possuem 1099
esquemas separados para cobertura de nuvens, nuvens estratiformes, nuvens 1100
convectivas rasas e/ou profundas). 1101
Existe uma tendência a se contornar essa limitação intrínseca das 1102
parametrizações de convecção, resolvendo explicitamente as nuvens ou pelo menos 1103
construindo representações fisicamente consistentes das mesmas, através de uma das 1104
seguintes estratégias, como sugerido, por exemplo, por Adams et al. (2009): 1105
. elhorar a resolução espacial ao ponto de dispensar inteiramente as 1106
parametrizações de convecção, mesmo em simulações da circulação geral. sso foi o que 1107
se obteve, por exemplo, através do Earth Simulator, em que simulações globais com 1108
espaçamento de grade de 3,5 km foram realizadas com êxito (Tomita et al., 2005). 1109
. sar modelos de con unto de nuvens na construção de parametrizações de 1110
convecção. efinidos como “modelos capazes de resolver nuvens individuais, cu o 1111
domínio é grande o suficiente para conter várias nuvens e cu o tempo de execução é 1112
longo o suficiente para conter vários ciclos de vida de nuvens” ( andall et al., ). s 1113
modelos de con unto de nuvens encontram usos variados, dentre eles, contornar a 1114
chamada “via empírica” para construção de parametrizações, adotando uma “via física” 1115
(Randall et al., 1996; Moncrieff et al., 1997). 1116
. so de modelos de con unto de nuvens em substituição direta das 1117
parametrizações de convecção, constituindo a chamada superparametrização (Randall et 1118
al., 00 Khairoutdinov e andall, 00 Grabo s i, 00 , 00 ). a 1119
superparametrização, a coluna do modelo de maior escala é substituída por um modelo 1120
de conjunto de nuvens, geralmente bidimensional, que passa a responder pelo conjunto 1121
dos processos físicos em escala de sub-grade. e imediato, a interação das nuvens com 1122
a radiação, o efeito de ra adas de sistemas precipitantes sobre os fluxos de superfície, o 1123
transporte de energia, momentum e água por tais sistemas e o cálculo da precipitação 1124
são todos representados de forma coerente entre si, por meio de um único modelo físico 1125
e não através de parametrizações que não se intercomunicam. Segundo Khairoutdinov e 1126
Randall (2001), Grabowski (2003) e Randall et al. (2003), o uso da superparametrização 1127
38
tem assegurado êxito na representação de processos que envolvem a interação entre 1128
nuvens e fen menos de grande escala (como ondas planetárias). 1129
Em todos esses casos, a adoção de modelos com capacidade de explicitamente 1130
resolver nuvens, como “modelos de con unto de nuvens” ( C s) faz com que as 1131
incertezas relativas à microfísica sejam trazidas à tona irremediavelmente. 1132
Um exemplo interessante sobre o papel da interação nuvem/radiação no contexto 1133
do efeito da emissão de aerossóis por queimadas é encontrado em Vendrasco et al. 1134
(2009). Neste trabalho é discutido o efeito da escala e intensidade das fontes de emissão 1135
de aerossóis na precipitação. O aumento da intensidade das fontes de pequena escala 1136
espacial leva à formação de plumas de escala espacial suficientemente longa para gerar 1137
gradientes horizontais de temperatura que sustentam circulações termicamente 1138
induzidas que, por sua vez, intensificam a precipitação. Fontes de emissão de aerossóis 1139
de menor intensidade e de maior escala espacial tendem a aumentar o efeito 1140
estabilizador dos aerossóis e, portanto, diminuem a precipitação. Entretanto, Vendrasco 1141
et al. (2009) não incluem o efeito dos aerossóis de queimada de biomassa na microfísica 1142
das nuvens e recomendam explorar o mecanismo das circulações térmicas geradas pelo 1143
efeito radiativo com o efeito da microfísica. 1144
1145
Capítulo 7: Forçante radiativa natural e antrópica 1146
Este capítulo apresenta a definição formal de forçante radiativa, do potencial de 1147
aquecimento global e do potencial de temperatura global, que são grandezas utilizadas 1148
para padronizar uma metodologia de comparação, e que permitem estimar 1149
quantitativamente os efeitos de diferentes agentes climáticos. O capítulo apresenta uma 1150
revisão bibliográfica de estudos recentes, efetuados sobre o Brasil ou sobre a América 1151
do Sul, que identificaram alguns dos principais agentes climáticos naturais e antrópicos 1152
atuantes no país. Embora a intenção fosse apresentar, em números, a contribuição para a 1153
forçante radiativa atribuída aos diferentes agentes, a inexistência de trabalhos científicos 1154
no país para vários deles trouxe outra dimensão ao capítulo. 1155
O clima é controlado por diversos fatores, chamados agentes climáticos, que 1156
podem ser naturais ou originados de atividades humanas (antrópicos). Um determinado 1157
agente climático pode contribuir para aquecer o planeta, como, por exemplo, os gases de 1158
efeito estufa antrópicos, enquanto outro agente pode tender a resfriá-lo, como as nuvens. 1159
Ao tomador de decisões seria conveniente conhecer qual a influência quantitativa de 1160
39
cada agente climático para que suas ações possam ser baseadas em resultados 1161
científicos, e não apenas em questões de natureza política. Frente à magnitude numérica 1162
dos efeitos de um dado agente climático, o tomador de decisão poderá analisar o 1163
custo/benefício de determinadas ações para diminuir tais efeitos, ou eventualmente 1164
buscar soluções de adaptação a um cenário decorrente desses efeitos. Por exemplo, é 1165
importante conhecer qual a contribuição de cada agente climático para as variações de 1166
temperatura na superfície do planeta, ou mesmo no Brasil. No entanto, os modelos 1167
climáticos mais modernos e sofisticados ainda precisam de anos de desenvolvimento 1168
para que forneçam resultados confiáveis e consistentes para previsões de mudanças 1169
climáticas: ainda há grandes divergências entre previsões de temperatura, cobertura de 1170
nuvens, precipitação, etc. elaboradas com modelos diferentes. 1171
O conceito de forçante radiativa, definida no Painel SEP.1, é um passo 1172
intermediário que não necessita, em princípio, de modelos climáticos para seu cálculo, 1173
por isso os valores de forçante radiativa podem ser mais objetivamente interpretáveis. 1174
Uma forçante radiativa positiva significa que um agente tende a aquecer o planeta, ao 1175
passo que valores negativos indicam uma tendência de resfriamento. Uma 1176
inconveniência do conceito de forçante radiativa é que em geral ela é expressa em 1177
termos de Wm-2
(Watt, ou potência, por metro quadrado), que é uma unidade menos 1178
familiar que temperatura em graus Celsius, por exemplo. Se um agente climático 1179
representa uma forçante radiativa de +2 Wm-2
, isso indica que ele tende a aquecer o 1180
planeta. Uma vez determinado o valor da forçante radiativa de um agente, pode-se usar 1181
esse valor em modelos climáticos que procurarão traduzi-lo, por exemplo, como 1182
mudanças de temperatura à superfície, ou mudanças no volume de chuvas, etc. Como os 1183
modelos climáticos ainda apresentam resultados bastante divergentes, um mesmo valor 1184
de forçante pode dar origem a diferentes previsões, dependendo do modelo climático 1185
escolhido e das condições em que ele é utilizado. É nesse contexto que o conceito de 1186
forçante radiativa oferece um meio de comparação entre diferentes agentes climáticos, 1187
independentemente da precisão dos modelos climáticos atuais. A quantificação 1188
numérica da intensidade da forçante radiativa permite ao tomador de decisão visualizar 1189
quais os agentes mais significativos, classificando-os por ordem de magnitude relativa. 1190
Calcular a forçante radiativa de um agente climático é como definir uma escala padrão, 1191
que permite a possibilidade de se estimar a intensidade de sua perturbação sobre o 1192
clima, para algum local ou região do globo. 1193
40
1194
Painel SEP.1 – Definição de forçante radiativa
A forçante radiativa devido a um agente climático é definida como a diferença em
irradiância líquida na tropopausa, entre um estado de referência e um estado
perturbado devido ao agente climático. As temperaturas de superfície e da troposfera
são mantidas fixas, mas permite-se que a estratosfera atinja o equilíbrio radiativo. O
estado de referência pode ser a ausência do agente climático, ou seu impacto em uma
dada situação ou época, como, por exemplo, no início da Revolução Industrial
(aproximadamente 1750) adotado pelo IPCC - Intergovernmental Panel on Climate
Change (Forster et al., 2007).
1195
Além de agentes climáticos independentes, ocorrem também situações de inter-1196
dependência entre agentes, chamados processos de retroalimentação, que tornam ainda 1197
mais complexa a compreensão de qual o efeito climático final de um certo agente. 1198
Alguns agentes climáticos podem influenciar o ciclo hidrológico. Por exemplo, alguns 1199
estudos mostram que a fumaça emitida em queimadas na Amazônia pode alterar o 1200
funcionamento natural das nuvens, diminuindo o volume de chuvas que essas nuvens 1201
podem produzir. Se isso acontece, então a menor ocorrência de chuvas pode favorecer a 1202
ocorrência de um número ainda maior de queimadas, e assim se estabelece um ciclo de 1203
retroalimentação. Em tais ciclos de retroalimentação, as relações de causa e efeito são 1204
complexas, e por esse motivo a avaliação do impacto sobre o clima é denominada efeito 1205
radiativo, e não uma forçante radiativa. Essa distinção é utilizada de forma rigorosa 1206
neste capítulo: agentes climáticos que atuam de forma independente exercem forçantes 1207
radiativas; aqueles que interferem em ciclos de retroalimentação exercem efeitos 1208
radiativos. 1209
É importante levar em consideração escalas de tempo e espaço. Mudanças 1210
climáticas que ocorrem em longo prazo, em escalas de milhares a milhões de anos, são 1211
controladas por variações orbitais do planeta. No entanto, numa escala de centenas de 1212
anos as mudanças orbitais são virtualmente irrelevantes, e outros fatores predominam. 1213
Um exemplo é a influência antrópica sobre o clima devido à emissão de gases de efeito 1214
estufa, que vem causando um aumento anômalo da temperatura média na superfície do 1215
planeta. 1216
Os efeitos climáticos mais significativos em escalas de dezenas a centenas de 1217
anos, no Brasil, são os efeitos radiativos de nuvens, a forçante radiativa dos gases de 1218
41
efeito estufa, a forçante de mudança de uso do solo, e a dos aerossóis (fumaça) emitidos 1219
em queimadas por fontes antrópicas. A Tabela SET.3, discutida em detalhe no texto do 1220
capítulo, apresenta uma compilação de resultados, encontrados na literatura científica, 1221
sobre os principais efeitos radiativos de agentes climáticos no Brasil. 1222
Nuvens exercem um efeito radiativo natural, mas suas propriedades podem ser 1223
alteradas pela ação humana (e.g., efeitos indiretos de aerossóis, mudança de 1224
propriedades da superfície, entre outros). Essas alterações podem envolver processos de 1225
retroalimentação, com possíveis impactos sobre o ciclo hidrológico, causando alterações 1226
na disponibilidade de água doce, ou na frequência de ocorrência de eventos extremos de 1227
precipitação, como secas ou tempestades severas. Os resultados compilados neste 1228
capítulo mostram que as nuvens constituem o agente climático mais importante do 1229
ponto de vista de balanço de radiação sobre a Amazônia, reduzindo em até 110 Wm-2
a 1230
radiação à superfície, e contribuindo com cerca de +26 Wm-2
no topo da atmosfera. Isso 1231
significa que as nuvens na Amazônia atuam causando em média um resfriamento da 1232
superfície, mas um aquecimento do planeta. Cabe ressaltar que o modo de distribuição 1233
vertical das nuvens desempenha um papel fundamental nos resultados obtidos: nuvens 1234
altas tendem a contribuir com um efeito de aquecimento do planeta, enquanto nuvens 1235
baixas tendem a resfriá-lo. Desse modo, é importante destacar que esse resultado não 1236
pode ser automaticamente estendido para outras regiões, com padrões de nuvens e 1237
características de superfície diferentes da região amazônica. 1238
No Brasil a principal fonte de gases de efeito estufa e aerossóis antrópicos é a 1239
queima de biomassa, utilizada como prática agrícola ou na mudança da cobertura do 1240
solo. Como técnica agrícola, as queimadas são empregadas no combate de pragas e na 1241
limpeza de lavouras com objetivo de facilitar a colheita, como no caso do cultivo da 1242
cana de açúcar. O uso de queimadas para alteração do uso do solo é observado 1243
especialmente na região amazônica. No caso dos gases de efeito estufa, grande parte do 1244
esforço das pesquisas no Brasil atualmente se concentra na elaboração de inventários de 1245
emissão. Não se encontram na literatura científica estimativas de cálculos da forçante 1246
radiativa desses gases considerando as condições das emissões brasileiras. 1247
Aerossóis antrópicos, emitidos principalmente em queimadas, podem absorver e 1248
refletir a luz do Sol. Essa interação direta entre aerossóis e a luz (radiação) solar define 1249
a forçante radiativa direta de aerossóis. Vários estudos quantificaram essa forçante de 1250
aerossóis antrópicos, sobretudo na Amazônia. Uma média ponderada de alguns dos 1251
42
resultados compilados neste capítulo resultou em uma forçante radiativa de -8,0±0,5 1252
Wm-2
, indicando que, em média, a fumaça emitida em queimadas contribui para resfriar 1253
o planeta, contrapondo-se parcialmente ao aquecimento causado por gases de efeito 1254
estufa antrópicos. É muito importante, no entanto, ressaltar que aerossóis e gases de 1255
efeito estufa têm escalas de tempo e espaço muito diferentes: enquanto gases de efeito 1256
estufa tendem a se espalhar aproximadamente de modo uniforme sobre o planeta, e têm 1257
tipicamente vida média de centenas de anos, aerossóis emitidos em queimadas na 1258
Amazônia espalham-se sobre grande parte do continente da América do Sul, e têm vida 1259
média de dias (são removidos da atmosfera e depositam-se sobre a superfície). Assim, a 1260
comparação das forçantes de aerossóis e gases de efeito estufa não pode ser feita 1261
diretamente. 1262
43
Tabela SET.3. Quantificação da forçante radiativa do aerossol antrópico, da mudança no uso do solo e 1263
do efeito radiativo de nuvens sobre o Brasil e a América do Sul. 1264
Agente Região Condiçãoa
Valorb (Wm
-
2)
Fonte dados Referência
Nuvens Amazônia SUP, 24hc [-110; -50] Modelo climático, satélite Betts et al., 2009
Amazônia SUP, 24hc -76 Modelo climático Miller et al., 2012
TDA, 24hc +26
Uso do Solo Amazônia TDA -23,7±2,9 Satélite, modelo radiativo Sena et al., 2013
TDA, 24h -7,1±0,9
Aerossol antrópico:
Efeito Direto
Amazônia SUP, 24hd -39,5±4,2 Sens. remoto, modelo radiativo Procópio et al., 2004
ATM, 24hd +31,2±3,6
TDA, 24hd -8,3±0,6
Amazônia TDA, 24hc -16,5
Modelo climático, medidas in-
situ Liu, 2005
Atlântico tropical TDA, 24he -1,8 Satélite, modelo radiativo Kaufman et al., 2005
ATM, 24he +2,9
América do Sul TDA, 24h [-8; -1] Modelo climático, satélite Zhang et al., 2008
SUP, 24h [-35; -10]
América do Sul TDA, anual [-1,0; -0,2] Satélite Quaas et al., 2008
Amazônia TDA -13,0±3,9 Satélite, modelo radiativo Patadia et al., 2008
TDA, 24h -7,6±1,9
Amazônia TDA, 24h -5,6±1,7 Satélite, modelo radiativo Sena et al., 2013
Floresta -6,2±1,9
Cerrado -4,6±1,6
Aerossol antrópico:
Efeitos Indiretos
Hemisfério Sul TDA, 24hc, alb -0,70±0,45 Revisão da literatura
Lohmann e Feichter,
2005
Global, sobre
continentes TDA, 24hc, ind -1,9±1,3
Atlântico tropical TDA, 24he, alb -1,5 Satélite, modelo radiativo Kaufman et al., 2005
TDA, 24he, ind -9,5
América do Sul TDA, 24h, ind [-5; +20] Modelo climático, satélite Zhang et al., 2008
América do Sul TDA, anual, alb [-0,10; -0,02] Satélite Quaas et al., 2008
Atlântico tropical [-5,00; -0,05]
Total aerossóis e nuvens Amazônia TDA, 24hc -9,8
Modelo climático, medidas in-
situ Liu, 2005
Atlântico tropical TDA, 24he -11,3 Satélite, modelo radiativo Kaufman et al., 2005
SUP, 24he -8,4
América do Sul TDA, 24h [-10; +15] Modelo climático, satélite Zhang et al., 2008
44
SUP, 24h [-35; -5]
a) Indica a posição vertical na coluna atmosférica (TDA: topo da atmosfera; SUP: superfície; ATM: coluna atmosférica) para a 1265 estimativa em questão, o domínio temporal de cálculo (valor instantâneo, média de 24h ou média anual), e o componente do efeito 1266 indireto analisado (alb: albedo; ind: total dos efeitos indiretos); b) Valores entre colchetes indicam intervalos de mínimo e máximo 1267 apresentados nas referências. Quando disponíveis, as incertezas apresentadas pelos autores são indicadas; c) Domínio temporal 1268 presumido (não informado explicitamente na referência); d) Estado de referência com profundidade óptica de aerossóis de 0,11; e) 1269 Estado de referência com profundidade óptica de aerossóis de 0,06. 1270
1271
As mudanças antrópicas no uso do solo, como por exemplo o processo de longo 1272
prazo de urbanização das cidades brasileiras, ou a conversão de florestas para a 1273
agropecuária na região amazônica desde 1970, resultaram em modificações de 1274
propriedades da superfície vegetada como, por exemplo, o albedo (refletividade da 1275
superfície). No caso da Amazônia, em geral, substitui-se uma superfície mais escura 1276
(floresta), por superfícies mais brilhantes (e.g. plantações, estradas, construções, etc.), o 1277
que implica em uma maior fração da luz solar sendo refletida de volta ao espaço. 1278
Encontrou-se um trabalho sobre a mudança de albedo em regiões desmatadas desde 1279
1970 na Amazônia, que estimou em -7,3±0,9 Wm-2
como a magnitude dessa forçante 1280
antrópica. Note-se que esse valor é semelhante à forçante de aerossóis antrópicos, 1281
porém, é importante salientar que o desmatamento na Amazônia tem caráter 1282
virtualmente “permanente” (i.e. a maioria das áreas degradadas em geral não volta a ser 1283
recomposta como floresta primária), enquanto aerossóis de queimada têm vida média da 1284
ordem de dias. Essas observações indicam a necessidade de se realizar estudos mais 1285
aprofundados sobre essa forçante originada nos processos de mudança de uso do solo, 1286
em especial, incluindo-se o efeito da urbanização histórica e da expansão agropecuária 1287
em nível nacional e em várias escalas temporais. 1288
Aerossóis também interagem com nuvens, modificando suas propriedades. As 1289
nuvens modificadas, por sua vez, interagem com a radiação solar. Dessa forma, define-1290
se a forçante indireta (i.e. mediada pela interação com nuvens) de aerossóis. As 1291
estimativas de forçante radiativa para os efeitos indiretos de aerossóis encontradas na 1292
literatura apresentaram uma ampla gama de valores. A maioria dos resultados tem sinal 1293
negativo, variando entre cerca de -9,5 a -0,02 Wm-2
para diferentes tipos de superfície, 1294
indicando condições de resfriamento climático. Este é um tópico que ainda necessita de 1295
mais estudos de caracterização e verificações independentes, para que esse componente 1296
da forçante antrópica sobre o Brasil possa ser adequadamente representado em modelos 1297
climáticos. 1298
Excluído: o 1299
45
Não foram encontrados trabalhos avaliando a forçante radiativa no Brasil devido 1300
ao aerossol de origem urbana, ao aerossol natural de poeira oriunda da África, ou de 1301
erupções vulcânicas, nem à formação de trilhas de condensação pelas atividades da 1302
aviação comercial. Essas forçantes radiativas, por hora desconhecidas, podem, ou não, 1303
serem comparáveis àquelas devido a gases de efeito estufa e aerossóis antrópicos. Os 1304
trabalhos analisados na elaboração deste capítulo evidenciam a existência de lacunas 1305
significativas em estudos de forçantes radiativas no Brasil. Conhecer com precisão a 1306
magnitude dessas forçantes, e aprimorar a compreensão de seus impactos, resultará em 1307
melhorias nos modelos de previsão de tempo e clima. Tais modelos são ferramentas 1308
importantes para instrumentalizar a tomada de decisões políticas e econômicas diante 1309
das mudanças climáticas que vêm atuando no país. 1310
1311
Capítulo 8 – Avaliação de modelos globais e regionais 1312
climáticos 1313
Neste capítulo é apresentado um resumo da habilidade de modelos numéricos em 1314
reproduzir o clima presente da América do Sul. São descritas características e 1315
desenvolvimentos do Modelo Brasileiro do Sistema Terrestre (BESM), do modelo 1316
atmosférico global do Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos – CPTEC e 1317
modelos regionais climáticos visando estudos de mudanças climáticas. No modo 1318
climático os modelos globais utilizam resolução horizontal de cerca de 200 km 1319
enquanto os modelos regionais geralmente utilizam a resolução de cerca de 50 km. 1320
Métodos estatísticos de downscaling e resultados sobre o Brasil são apresentados. 1321
Processos de retroalimentação oceano-atmosfera, radiação-nuvem, biosfera-atmosfera 1322
são discutidos e resultados de simulações numéricas são apresentados. São discutidas 1323
também avaliações dos modelos globais atmosféricos, acoplado e regionais em 1324
representar os alguns fenômenos meteorológicos que atuam na região como El Niño-1325
Oscilação Sul, Zona de Convergência do Atlântico Sul, Zona de Convergência 1326
Intertropical, Ciclones extratropicais, Modo Anular do Hemisfério Sul e Jato de Baixos 1327
Níveis. Apesar da existência de alguns erros sistemáticos, em geral os modelos 1328
numéricos simulam satisfatoriamente estes fenômenos. Problemas de poluição 1329
atmosférica e do efeito da ilha de calor são simulados para a megacidade de São Paulo e 1330
consequências para mudanças climáticas são discutidas. A problemática da elevação do 1331
46
nível do mar é discutida. Incertezas em simulações do clima presente são exploradas a 1332
partir de variações de configuração de um mesmo modelo, o HadCM3, ou a partir de 1333
diferentes modelos que possuem diferentes configurações, sejam globais atmosféricos, 1334
globais acoplados oceano-atmosfera, ou regionais climáticos. 1335
Modelos climáticos globais e regionais tem tido grandes avanços nos últimos 1336
anos em termos da representação de processos e fenômenos críticos para estudo das 1337
mudanças climáticas globais, seus impactos sobre o Brasil e ações de mitigação. De 1338
forma geral, pode-se considerar que parte do avanço vem do aumento da resolução 1339
espacial e parte da inclusão de controles climáticos provenientes de novas componentes 1340
do sistema e da interação entre elas. O Brasil tem se destacado nesta área, através do 1341
desenvolvimento de modelos atmosféricos regionais e globais, a exemplo dos modelos 1342
atmosféricos regionais Eta e BRAMS e dos modelos globais atmosférico e acoplado 1343
oceano-atmosfera do CPTEC. Como fruto da maturidade em modelagem atmosférica e 1344
ambiental brasileira, surgiu e está em pleno desenvolvimento o Modelo Brasileiro do 1345
Sistema Terrestre (BESM), coordenado pelo INPE com participação de diversas 1346
Universidades e instituições de pesquisa no Brasil e no exterior. O BESM é baseado no 1347
modelo acoplado oceano-atmosfera global do CPTEC/INPE, ao qual estão sendo 1348
integrados componentes de química atmosférica e aerossóis, vegetação dinâmica, fogo e 1349
hidrologia continental, gelo e biogeoquímica marinha, além da descarga fluvial nos 1350
oceanos. Característica marcante do BESM é sua ampla gama de atuação, abrangendo 1351
escalas de tempo de dias à paleoclimática. As principais características do BESM estão 1352
listadas na Tabela SET.4. 1353
1354
Tabela SET.4. Características do modelo BESM. 1355
MCGOA Referências compo-
nentes
Res. Acoplador
Prazo
integração
Convecção
cumulus Radiação
Esquema de
superfície
Camada limite
planetária
BESM [1, 2] Atmos: CPTEC;
Oceano: MOM4p1
Atmos
T062L28;
Oceano
~1x1 L50
FMS [3] 1961-2105 Grell [4] Lacis &
Hansen [5] SSiB [6]
Mellor & Yamada
[7]
1. Nobre, P., et al., Climate simulation and change in the Brazilian Climate Model. J. Climate, 1356 2013: p. In press. 1357
2. Nobre, P., et al., Coupled ocean-atmosphere variations over the South Atlantic ocean. J. Climate, 1358 2012. 25(18): p. 6349-6358. 1359
3. Griffies, S.M., Elements of MOM4p1., in GFDL Ocean Group Technical Report No. 62009, 1360 NOAA/Geophysical Fluid Dynamics Laboratory. p. 444. 1361
4. Grell, G.A. and D. Devenyi, A generalized approach to parameterizing convection combining 1362 ensemble and data assimilation techniques. Geophys. Res. Lett., 2002. 29(14). 1363
47
5. Lacis, A.A. and J.D. Hansen, A parameterization of the absortion of solar radiation in the 1364 Earth's atmosphere. J. Atmos. Sci., 1974. 31: p. 118-133. 1365
6. Xue, Y., et al., A simplified biosphere model for global climate studies. J. Climate, 1991. 4: p. 1366 345-364. 1367
7. Mellor, G.L. and T. Yamada, Development of a turbulence closure model for geophysical fluid 1368 problems. Reviews of Geophyis. and Space Physics, 1982. 20: p. 851-875. 1369
1370
A informação sobre cenários climáticos futuros, derivada de modelos de 1371
circulação geral, os MCG, apresenta-se em escalas espaciais (240 a 600 km) geralmente 1372
incompatíveis com as escalas requeridas para estudos de impactos. O refinamento de 1373
escala (downscaling) das projeções de mudanças climáticas produzidas pelos MCG 1374
requer a incorporação de informações locais e é particularmente importante para áreas 1375
de topografia complexa, ilhas e regiões costeiras ou ainda áreas com cobertura do 1376
solo/uso da terra extremamente heterogêneos (Murphy, 1999; Wilby et al., 2004; Vrac et 1377
al., 2007). Os métodos de downscaling podem ser de natureza temporal ou espacial. As 1378
principais características dos modelos regionais utilizados por grupos brasileiros para 1379
geração de cenários de mudanças climáticas estão resumidas na Tabela SET.5. 1380
1381
Tabela SET.5. Modelos regionais climáticos com integrações de cenários de mudanças climáticas sobre 1382
América do Sul. 1383
MCR Instituição Referência Res. Prazo
integração
Convecção
cumulus
Microfísica
de nuvens Radiação
Esquema
de
superfície
Condição
de
contorno
Camada
limite
planetária
Eta-
CPTEC INPE
Pesquero et
al. (2009);
Chou et al.
(2012);
Marengo et
al. (2012);
40km/38L
1961-
1990;
2011-
2040;
2041-
2070;
2071-2100
Betts e
Miller
(1986); Janjic
(1994);
Zhao
scheme
(Zhao et
al., 1997)
Lacis e
Hansen
(1974); Fels
e
Schwarzkopf
(1975);
Chen e
Dudhia
(2001; NOAH)
Mesinger
(1977)
Mellor
Yamada
2.5
(Mellor e
Yamada,
1974)
Eta-CCS INPE
Pisnichenko
e
Tarasova
(2009);
50km/38L
1961-
1990;
2071-2100
Betts e
Miller
(1986); Janjic
(1994);
Ferrier
scheme
(2002)
Lacis e
Hansen
(1974); Fels
e
Schwarzkopf
(1975);
Chen e
Dudhia
(2001; NOAH)
Mesinger
(1977)
Mellor
Yamada
2.5
(Mellor e
Yamada,
1974)
HadRM3P UKMO
Collins et
al. (2006);
Alves e Marengo
(2010);
50km/L19
1961-
1990; 2071-2100
Gregory e
Rowntree
(1990); Gregory
e Allen
(1991);
Smith
(1990)
Edwards e
Slingo
(1996)
Cox et al.
(1999)
4lyrs,
(MOSES
I)
Davies
(1976) Smith
(1990)
RegCM3 ICTP
Giorgi e
Mearns
(1999);
Da Rocha
et al.
(2009);
50 km /
L30
1961-
1990;
2071-2100
Grell
(1993) Pal et al.
(2000) Kiehl et al.
(1996)
Dickinson
et al.
(1993; BATS)
Davies
(1976) 5
rows
buffer zone
Holtslag et
al. (1990)
Formatado: Português
(Brasil)
48
1384
Existem três principais tipos de incertezas inerentes às simulações do clima: 1) 1385
as concentrações e emissões dos gases de efeito estufa, 2) a arquitetura do modelo 1386
numérico e 3) as parametrizações dos processos que ocorrem em escala inferior à da 1387
grade dos modelos. Em relação às incertezas na modelagem do clima, segundo 1388
Ambrizzi et al. ( 007), toda técnica de regionalização ou “downscaling” contém erros 1389
derivados do modelo global que força o modelo regional, e ainda que isto não seja um 1390
erro na regionalização, precisa ser levado em conta. Técnicas diferentes de 1391
regionalização podem produzir diferentes simulações do clima local ainda que todas 1392
fossem forçadas pelo mesmo modelo global. Em relação às incertezas nas 1393
parametrizações, não há uma solução unânime que resolva corretamente os processos 1394
físicos. 1395
Adicionalmente, vários outros fatores contribuem para as incertezas nas 1396
simulações do clima como os processos estocásticos e não-lineares do sistema 1397
climático, aspectos randômicos das forçantes naturais e antrópicas, desconhecimento da 1398
completa condição inicial do sistema climático e a não representação de todos os 1399
processos atmosféricos em um modelo numérico. 1400
A Tabela SET.6 recomenda técnicas para tratar as incertezas. A destreza dos 1401
modelos regionais na América do Sul tem sido similar à obtida com modelos globais no 1402
clima do presente (Ambrizzi et al., 2007). Assim, regiões como o Nordeste, a Amazônia, 1403
o Sul do Brasil, o Noroeste do Peru-Equador e o Sul do Chile apresentam uma 1404
previsibilidade melhor no clima do presente, comparada com regiões como o sudeste-1405
centro oeste do Brasil. Supondo que a capacidade para simular o clima no futuro seja a 1406
mesma que no presente, então podemos dar maior credibilidade às projeções de clima 1407
para o futuro nas áreas de menores erros. Neste estudo os autores apresentam a tabela 1408
abaixo, no sentido de listar alguns dos problemas de incerteza na construção de cenários 1409
climáticos. 1410
1411
Tabela SET.6. Cadeia de incertezas na construção de cenários climáticos (adaptado de Ambrizzi et al., 1412
2007). 1413
Fonte da Incerteza Representação no MCR Como tratar incerteza
Emissões futuras Sim Utilizar modelos para uma
variedade de cenários de emissão
Taxa de emissão à concentração
Não
Uso de modelos de ciclo de
carbono e modelos de química
atmosférica
49
Pouco entendimento,
representação imperfeita de
processos em modelos de clima
(incerteza científica)
Em desenvolvimento Uso de projeções de vários
modelos globais de clima
Variabilidade natural do clima Sim Uso de conjunto de simulações de
MCG com várias condições
iniciais
Acrescentar detalhe espacial e
temporal Não
Usar outros modelos regionais de
clima + “downscaling” estatístico
1414
Com o intuito de incluir alguma informação da incerteza de modelagem 1415
numérica nas projeções regionalizadas (downscaling) o projeto CREAS (Cenários 1416
REgionais de Mudança de Clima para América do Sul - Marengo e Ambrizzi, 2006; 1417
Ambrizzi et al., 2007) utilizou três modelos regionais nas simulações do clima presente 1418
para o período de 1961-1990. Erros em comum entre os modelos regionais foram 1419
identificados, bem como erros característicos de cada modelo. 1420
Os resultados mencionados acima são exemplos de que não há uma 1421
metodologia ideal, ou modelo numérico preferencial, todos apresentam erros e acertos. 1422
Além do modelo numérico, também se desconhece a resolução espacial suficientemente 1423
adequada para resolver o sistema climático. 1424
A incerteza nas formulações dos modelos numéricos para resolver o sistema 1425
climático se reflete na magnitude dos erros sistemáticos das simulações. Estas 1426
avaliações dos erros por sua vez também contém incertezas na qualidade das 1427
observações, cuja rede sobre América do Sul é deficiente do ponto de vista espacial e 1428
temporal. As incertezas sobre as medidas observacionais afetam diretamente a robustez 1429
da avaliação dos modelos climáticos. 1430
1431
Capítulo 9 – Mudanças ambientais de curto e longo 1432
prazo: projeções, reversibilidade e atribuição 1433
Projeções geradas por modelos globais e regionais que levam em consideração os 1434
diferentes cenários de emissões globais de gases do efeito estufa (GEE) propostos pelo 1435
IPCC (2007) são revisdados neste capítulo. 1436
Cenários futuros do clima são projeções geradas por modelos climáticos que levam em 1437
consideração os diferentes cenários de emissões globais de gases do efeito estufa (GEE) 1438
propostos pelo IPCC. Atualmente, a melhor ferramenta científica disponível para a 1439
geração das projeções de mudanças ambientais é o downscaling (regionalização) 1440
50
dinâmico, cu a técnica consiste em usar um modelo climático regional “aninhado” a um 1441
modelo climático global (ver Capítulo 8 para maiores detalhes sobre modelagem). 1442
Basicamente, os dados dos conjuntos (ensembles) de modelos globais com baixa 1443
resolução espacial (~ 100 a 200 km2) são utilizados como condições de fronteira para o 1444
modelo regional que realiza as simulações em alta resolução espacial (~ 25 a 50 km2). 1445
Diversos estudos sugerem que o downscaling proporciona uma representação mais 1446
realística do clima nas diversas regiões do território Brasileiro, onde fatores regionais 1447
(proximidade com o oceano, topografia acentuada, solo e vegetação, dentre outros) 1448
funcionam como importantes moduladores das condições de tempo e clima, adicionados 1449
às forçantes de grande escala que são capturadas pelos modelos globais. Os resultados 1450
científicos consensuais (e.g., Ambrizzi et al., 2007; Marengo, 2007; CCST-INPE, 2011; 1451
Marengo et al., 2012) das projeções regionalizadas de clima nos diferentes biomas do 1452
Brasil, considerando os períodos de início (2011-2040), meados (2041-2070) e final 1453
(2071/2100) do século XXI, são resumidos na Figura SEF.7. As mudanças percentuais 1454
na chuva e temperatura (ºC) são relativas aos valores do clima atual (final do século 1455
XX). A Figura SEF.7 mostra projeções de mudanças na chuva e temperatura para os 1456
períodos de verão (Dezembro a Fevereiro – DJF) e inverno (Junho a Agosto – JJA). 1457
Dependendo do cenário futuro de aquecimento global com baixa ou alta emissão de 1458
GEE, tais valores podem respectivamente oscilar entre ~5% e ~20% em precipitação e 1459
~1ºC e ~5ºC na temperatura. Um aspecto consensual a se ressaltar, observado nas 1460
publicações recentes da comunidade científica brasileira e internacional, é a expectativa 1461
de diminuição significativa das chuvas em grande parte do centro-norte-nordeste do 1462
território Brasileiro. Os modelos de previsão de clima sugerem alta probabilidade de 1463
aumento dos eventos extremos de secas e estiagens prolongadas principalmente nos 1464
biomas da Amazônia, Cerrado e Caatinga, sendo que tais mudanças acentuam-se a partir 1465
da metade e final do século XXI. No que se refere à temperatura do ar na superfície, 1466
todas as projeções indicam condições de clima futuro mais quente, em função não só do 1467
aquecimento induzido pelas emissões antrópicas de GEE como também por processos 1468
regionais (urbanização, desmatamento, dentre outros) que alteram o balanço de energia 1469
propiciando aquecimento da superfície. 1470
1471
1472
1473
1474
51
1475
Figura SEF.7. Projeções regionalizadas de clima nos biomas brasileiros da Amazônia, Cerrado, 1476
Caatinga, Pantanal, Mata Atlântica (setores nordeste e sul/sudeste) e Pampa para os períodos de início 1477
(2011-2040), meados (2041-2070) e final (2071/2100) do século XXI, baseados nos resultados científicos 1478
de modelagem climática global e regional (ver texto para Referências). As regiões com diferentes cores 1479
no mapa indicam o domínio geográfico dos biomas. A legenda encontra-se no canto inferior direito. 1480
1481
Em geral, as projeções climáticas possuem desempenho (skill) relativamente 1482
melhor nos setores norte/nordeste (Amazônia e Caatinga) e sul (Pampa) do Brasil e 1483
desempenho inferior no centro-oeste e sudeste (Cerrado, Pantanal e Mata Atlântica). 1484
Conforme ilustra a Figura SEF.7, as projeções consensuais para os biomas 1485
brasileiros, baseadas nos resultados científicos de modelagem climática global e 1486
regional, são as seguintes: 1487
1488
» AMAZÔNIA: Reduções percentuais de 10% na distribuição de chuva e aumento de 1489
temperatura de 1º a 1,5ºC até 2040, mantendo a tendência de diminuição de 25% a 30% nas chuvas e 1490
aumento de temperatura entre 3º e 3,5ºC no período 2041-2070, e redução nas chuvas de 40% a 45% e 1491
aumento de 5º a 6º C na temperatura no final do século (2071-2100). Enquanto as modificações do clima 1492
associados às mudanças globais podem comprometer o bioma em longo prazo (final do século), a questão 1493
atual do desmatamento decorrente das intensas atividades de uso da terra, representa uma ameaça mais 1494
imediata para a Amazônia. Estudos observacionais e de modelagem numérica sugerem que caso o 1495
desmatamento alcance 40% na região no futuro, estima-se mudança drástica no padrão do ciclo 1496
hidrológico com redução de 40% na chuva durante os meses de Julho a Novembro, prolongando a 1497
duração da estação seca, além do aquecimento superficial em até 4ºC. Assim, as mudanças regionais 1498
Excluído: ?1499
52
decorrentes do efeito do desmatamento somam-se àquelas provenientes das mudanças globais, 1500
constituindo condições propícias à savanização da Amazônia, um problema que tende a ser mais crítico 1501
na região oriental. 1502
» CAATINGA: Aumento de 0,5º a 1ºC da temperatura do ar e decréscimo entre 10% e 20% 1503
da precipitação durante as próximas três décadas (até 2040), com aumento gradual de temperatura de 1,5º 1504
a 2,5ºC e diminuição entre 25% e 35% nos padrões de chuva no período de 2041-2070. No final do século 1505
(2071-2100) as projeções indicam condições significativamente mais quentes (aumento de temperatura 1506
entre 3,5º e 4,5ºC) e agravamento do déficit hídrico regional com diminuição de praticamente metade (40 1507
a 50%) da distribuição de chuva. Essas mudanças podem desencadear o processo de desertificação da 1508
caatinga. 1509
» CERRADO: Aumento de 1ºC na temperatura superficial com diminuição percentual entre 1510
10% a 20% na chuva durante as próximas três décadas (até 2040). Em meados do século (2041-2070) 1511
estima-se aumento entre 3º a 3,5ºC da temperatura do ar e redução entre 20% e 35% da chuva. No final 1512
do século (2071-2100) o aumento de temperatura atinge valores entre 5º e 5,5ºC e a diminuição da chuva 1513
é mais crítica, entre 35% e 45%. Acentuação das variações sazonais. 1514
» PANTANAL: Aumento de 1ºC na temperatura e diminuição entre 5% e 15% nos padrões 1515
de chuva até 2040, mantendo a tendência de redução nas chuvas para valores entre 10% e 25% e aumento 1516
de 2,5º a 3ºC da temperatura em meados do século (2041-2070). No final do século (2071-2100) 1517
predominam condições de aquecimento intenso (entre 3,5º e 4,5ºC) com diminuição acentuada dos 1518
padrões de chuva de 35% a 45%. 1519
» MATA ATLÂNTICA: Como este bioma abrange áreas desde o sul, sudeste até o 1520
nordeste brasileiro, as projeções apontam dois regimes distintos. Porção Nordeste (NE): aumento 1521
relativamente baixo nas temperaturas entre 0,5º e 1ºC e decréscimo nos níveis de precipitação em torno 1522
de 10% até 2040, mantendo a tendência de aquecimento entre 2º e 3ºC e diminuição pluviométrica entre 1523
20% e 25% em meados do século (2041-2070). Para o final do século (2071-2100) estimam-se condições 1524
de aquecimento intenso (aumento de 3º a 4ºC) e diminuição de 30% e 35% na chuva. Porção Sul/Sudeste 1525
(S/SE): até 2040 as projeções indicam aumento relativamente baixo de temperatura entre 0,5º e 1ºC com 1526
um aumento de 5% a 10% na chuva. Em medos do século (2041-2070) mantêm-se as tendências de 1527
aumento gradual de 1,5º a 2ºC na temperatura e de aumento de15% a 20% nas chuvas, sendo que essas 1528
tendências acentuam-se ainda mais no final do século (2071-2100) com padrões de clima entre 2,5º e 3ºC 1529
mais quente e entre 25% a 30% mais chuvoso. 1530
» PAMPA: No período até 2040 prevalecem condições de clima regional de 5% a 10% mais 1531
chuvoso e até 1ºC mais quente, mantendo a tendência de aquecimento entre 1º e 1,5ºC e intensificação 1532
das chuvas entre 15% e 20% até meados do século (2041-2070). No final do século (2071-2100) as 1533
projeções são mais agravantes com aumento de temperatura de 2,5º a 3ºC e 35% a 40% de chuvas acima 1534
do normal. 1535
1536
Em virtude do alto grau de vulnerabilidade sócio-ambiental das regiões norte e 1537
nordeste do Brasil, ressalta-se que as projeções mais preocupantes para o final do século 1538
53
são para os biomas Amazônia e Caatinga. Ambas apresentam tendências de 1539
aquecimento na temperatura do ar e de diminuição da chuva maiores do que a variação 1540
média global (CCST-INPE, 2011). Em termos de atribuição de causa física, sugere-se 1541
que essa mudança climática de redução na chuva associa-se aos padrões oceânicos 1542
tropicais anomalamente mais aquecidos sobre o Pacífico e Atlântico (ver Capítulos 2 e 3 1543
para detalhes das anomalias da Temperatura da Superfície do Mar e impactos) esperados 1544
num clima futuro de aquecimento global. Por sua vez, estes modificam o regime de 1545
vento de forma a induzir diminuição no transporte de umidade e a prevalência de 1546
circulação atmosférica descendente (células de Hadley e Walker) sobre o Brasil tropical, 1547
inibindo a formação de nuvens convectivas e explicando assim as condições de chuva 1548
abaixo do normal (e.g., Grimm e Ambrizzi 2009; Freitas e Ambrizzi 2012). 1549
Incertezas: embora na última década tenha havido melhorias substanciais na 1550
ciência do sistema terrestre (com formulações mais completas dos processos físicos, 1551
químicos e biológicos, incluindo suas complexas interações, dentro dos modelos do 1552
sistema climático global), aliado ao significativo avanço tecnológico em simulação 1553
computacional, as projeções climáticas e ambientais geradas pela modelagem climática 1554
trazem consigo diversos níveis de incertezas, cujas categorias principais são: Incerteza 1555
sobre os cenários de emissões: as emissões globais de GEE são difíceis de prever, em 1556
virtude da complexidade de fatores socioeconômicos, como demografia, composição 1557
das fontes de geração de energia, atividades de uso da terra e do próprio curso de 1558
desenvolvimento humano em termos globais; Incerteza sobre a variabilidade natural 1559
do sistema climático: os processos físicos e químicos da atmosfera global são de 1560
natureza caótica, de forma que o clima pode ser sensível às mudanças mínimas 1561
(variações não-lineares) que são difíceis de serem mensuradas tanto nos dados 1562
observacionais como nos resultados dos modelos; Incertezas dos modelos: A 1563
capacidade de modelar o sistema climático global é um grande desafio para a 1564
comunidade cientifica, sendo fatores limitantes a representação ainda incompleta de 1565
processos como o balanço de carbono global e regional, o papel dos aerossóis no 1566
balanço de energia global, a representação dos ciclos biogeoquímicos e fatores 1567
antrópicos como desmatamento e queimadas (as nuvens também são importantes fontes 1568
de incerteza nos modelos climáticos – ver Capítulos 7 e 8 para detalhes). Por outro lado, 1569
ainda que sejam usados os mesmos cenários de emissões, diferentes modelos produzem 1570
diferentes projeções das mudanças climáticas, constituindo assim outra fonte de 1571
54
incerteza, a qual pode ser minimizada através da aplicação de conjuntos de simulações 1572
(ensembles) de modelos globais e regionais. 1573
Em geral os modelos proporcionam resultados satisfatórios sobre o 1574
comportamento do clima presente (século XX). Portanto, a despeito das incertezas 1575
citadas, as projeções sobre a análise consistente das mudanças climáticas futuras ao 1576
longo do século XXI são plausíveis e necessárias. Estas se constituem em informações 1577
inovadoras e valiosas tanto para fins de mitigação de impactos e vulnerabilidade junto à 1578
sociedade que habita os diferentes biomas brasileiros quanto para aperfeiçoar o 1579
planejamento de ações de adaptação e minimização dos efeitos das mudanças 1580
climáticas. Considerando as diferenciadas projeções resultantes de potenciais impactos 1581
socioeconômicos e ambientais, devido às mudanças do clima nos diferentes biomas 1582
brasileiros, já é possível (e recomendável) o planejamento e tomada de decisão imediata 1583
e de longo prazo. 1584
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[Fabiana1] Comentário: Q
ual a referência??? Só tem de
2011!
Excluído: ¶1735
GRIMM, A.M.1736
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Unidos), Padrão:
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