guia de gestao de cobrancas

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Verlag Dashöfer Portugal Edições Profissionais Rua Braamcamp, 13 - 2º 1250-049 Lisboa Tel.: +351 213 101 900 Fax: +351 213 152 597 GUIA DE GESTÃO DE COBRANÇAS Copyright (C) Verlag Dashöfer Portugal Edições Profissionais

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O objectivo deste pequeno guia é fornecer algumas pistas às empresas de média, pequena e micro dimensão que se vêem confrontadas com a dificuldade de, em tempo útil, conseguirem recuperar os seus créditos.

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  • Verlag Dashfer PortugalEdies ProfissionaisRua Braamcamp, 13 - 21250-049 Lisboa

    Tel.: +351 213 101 900Fax: +351 213 152 597

    GUIA DE

    GESTO DE COBRANAS

    Copyright (C) Verlag Dashfer Portugal Edies Profissionais

  • GUIA DE GESTO DE COBRANAS

    Verlag Dashfer Portugal Edies Profissionais GUIA DE GESTO DE COBRANAS

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  • NDICE

    Capitulo I O Problema Dos Atrasos De Pagamento

    Capitulo II Comportamentos Compatveis Com A Aco Comercial

    1 - Mtodos De Preveno

    2 - Informao Sobre Os Clientes

    2.1 - Sugestes

    2.2 - Informao No Caso Das Entidades Comerciais Individuais Ou Colectivas

    3 - Bases De Dados

    3.1 - Legalizar Uma Base De Dados

    3.2 - Obrigaes Dos Responsveis Dos Ficheiros

    3.3 A Cnpd

    Capitulo III Organizao Dos Departamentos De Cobranas

    Captulo IV Uso De Indicadores Para Controlo Do Crdito Concedido

    1 Empresa E Sector

    2 Perfil Do Devedor

    3 Poltica De Crdito

    4 Perfil Da Cobrana

    Capitulo V - Elementos Dos Procedimentos De Cobranas

    1 Ideias Gerais

    2 - Precaues Contra Maus Pagadores

    2.1 Cartes De Crdito

    2.2 Cheques Problemticos

    2.3 Reclamaes

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  • Capitulo VI Procedimentos De Cobrana

    1 Cobranas Por Empresas Especializadas

    2 Alguns Meios Contenciosos

    2.1 - Injuno

    2.2 A Deciso Arbitral

    3 - Anlise Da Reforma Da Aco Executiva

    4 - Papel Do Solicitador De Execuo

    Capitulo VII - Anlise Dos Custos De Cobrana Judicial

    1 - Custos De Uma Aco De Cobrana

    1.1. Custos Indirectos

    1.2 - Custos Directos

    1.2.1 Custas Da Injuno

    1.2.2 Custas Da Execuo

    1.2.3 Custos Do Solicitador De Execuo

    2 - A Partir De Que Montante Se Torna Interessante Uma Cobrana Judicial

    Capitulo VIII Importncia Das Garantias Contratuais

    Capitulo IX Sugestes Do Autor

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    Ficha Tcnica

  • INTRODUO

    O objectivo deste pequeno guia fornecer algumas pistas s empresas de mdia,

    pequena e micro dimenso que se vem confrontadas com a dificuldade de, em tempo

    til, conseguirem recuperar os seus crditos.

    As sugestes constantes deste Guia no dispensam, antes aconselham, a consulta de

    especialistas.

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  • CAPITULO I

    O PROBLEMA DOS ATRASOS DE PAGAMENTO

    A questo das cobranas dos crditos das empresas um tema cuja actualidade e

    importncia dispensam qualquer apresentao. Tem como antecedente prvio o

    problema dos atrasos dos pagamentos que, numa poca de crise econmica como a

    que se vive actualmente, rapidamente se transformam em no pagamentos.

    A questo da solvabilidade dos devedores crtica para a concesso do crdito e, por

    consequncia, essencial a criao de mecanismos legais que assegurem aos credores

    a fcil cobrana dos seus crditos e a reparao dos prejuzos causados pela mora dos

    devedores, combatendo o incumprimento das obrigaes comerciais com medidas

    eficazes.

    Desde meados dos anos 90 a Comisso Europeia tem-se preocupado com este tema.

    Comeou por apresentar uma Recomendao relativa aos prazos de pagamento em

    1995, depois publicou em 1997 um relatrio sobre o mesmo tema e, por fim,

    apresentou, em 1998, uma Proposta de Directiva que viria a dar origem Directiva

    2000/35 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29.6.2000, que estabeleceu

    medidas contra os atrasos de pagamento nas transaces comerciais. Esta Directiva foi

    transposta para o direito interno portugus pelo DL 32/2003, de 17 de Fevereiro.

    Os atrasos de pagamentos constituem cerca de 25% dos casos de insolvncia de

    empresas credoras, estimando-se que causem uma perda anual de 450.000 empregos

    ao na U.E. e de 23,6 mil milhes de dvidas no cobradas. Os atrasos de pagamento

    rondariam os 90 mil milhes de euros/ano e as perdas de juros a 10,8 mil milhes de

    euros ano.

    Em 1996, nos diversos pases europeus, os prazos mdios de pagamento apresentavam

    valores bastante dspares. Portugal apresentava-se em penltimo lugar, com 91 dias de

    prazo mdio (soma da mdia de prazos contratuais com a mdia de atrasos de

    pagamento), apenas ultrapassado pela Grcia (94 dias), mas bem acima da mdia do

    espao EU (57 dias) e representando mais do triplo da Noruega (27 dias). Alis todos os

    pases latinos esto acima da mdia e abaixo dela os pases escandinavos, anglo-

    saxnicos e germnicos.

    Isto resulta de as legislaes dos Estados-Membros da U.E. serem muito desiguais

    quanto ao contedo e eficcia das medidas que adoptaram. Assim, as taxas de juros de

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  • mora so muito mais elevadas nos pases anglo-saxnicos e escandinavos (18% a

    24%) do que nos latinos (8% a 12%).

    Certos pases adoptaram medidas especficas visando limitar os prazos de pagamento.

    So os casos: da Frana que fixa prazos limite de pagamentos relativos a vendas de

    produtos perecveis; da Itlia, quanto a relaes sub contratuais; da Espanha, que

    impe a prestao de garantias pelo devedor quando o prazo de pagamento ultrapassa

    60 a 120 dias; do Reino Unido, onde a lei permite ao juiz declarar que um prazo de

    pagamento anormalmente longo constitui um atraso de pagamento e permite a cesso

    a terceiro de direitos sobre juros por uma credora que seja PME.

    No nosso ordenamento jurdico diversas disposies legais versam sobre esta questo,

    para alm de normas especficas dos Cdigos Comercial e Civil (dvidas dos

    comerciantes casados, solidariedade passiva como regra nas obrigaes comerciais,

    etc), algumas medidas legais que, em tempos mais recentes, visaram essa linha de

    preocupaes: DL 262/83, regime das injunes, recente reforma do regime das

    execues, etc..

    Em todo o caso, constata-se que a Directiva 2000/35/CE se quedou por algumas

    medidas de carcter pontual e subsidirio, denunciando alguma incapacidade para

    enfrentar a gravidade do mal.

    Esse mesmo carcter fragmentrio e de limitado alcance se repercutiu no do DL

    32/2003, embora seja justo considerar, partida, que confere alguns importantes

    meios para os credores empresariais melhorarem a eficincia da cobrana dos seus

    crditos para com outros empresrios.

    s medidas implementadas por este diploma nos referiremos com mais pormenor nos

    captulos sobre cobranas em contencioso e garantias

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  • CAPITULO II

    COMPORTAMENTOS COMPATVEIS COM A ACO COMERCIAL

    Hoje em dia nenhuma empresa pode manter, no seu enquadramento financeiro, um

    desequilbrio significativo e exorbitante causado por maus pagadores, pois isso coloca

    seriamente em risco sua sobrevivncia no mercado.

    Tentando eliminar esse tipo de factor, tentaremos descrever como devem agir as

    organizaes em face do no pagamento dos seus crditos, definindo critrios e

    sugerindo cuidados que devero ser tomados para que os lucros no sejam nulos e no

    sejam gerados mais custos, por reduo da margem lquida, e, em ltima instncia,

    gerando prejuzos que comprometero a sua sobrevivncia. Como negociadores os

    empresrios devem verificar quais as decises que devem tomar para se precaverem

    de perdas futuras. A preocupao com a busca de iniciativas e alternativas podem levar

    tais organizaes a mudar a maneira de administrar sua carteira de clientes no sentido

    da satisfao das partes que negoceiam, reduzindo significativamente o incumprimento.

    O empresrio bem preparado para os negcios e atento s frequentes mudanas do

    mercado deve ter conscincia de que o incumprimento pode ser evitado, antes de

    efectuada a venda, atravs de aces de carcter preventivo bastante simples. O bom

    senso manda que no processo de concesso de crdito ou de venda sejam considerados

    o valor da venda ou do crdito, a quantidade mdia de clientes, os custos das pesquisas

    sobre os clientes, o perfil dos clientes, a rapidez do processo, a imagem da empresa e a

    quantidade de pessoal envolvido; enfim, todos os elementos essenciais, sem, contudo,

    criar um controle exagerado que possa causar srios obstculos ao processo. Mesmo

    levando em conta os custos que envolve, a preveno apresenta-se como um excelente

    caminho para evitar o problema do incumprimento crnico, pois os recursos

    imobilizados sero mnimos se comparados ao enorme prejuzo que pode trazer um

    ndice muito alto causado por esse problema.

    Apesar de tomadas as precaues, como um comportamento altamente profissional na

    hora da venda, um preo competitivo e uma completa anlise de crdito, pode porm

    acabar por surgir uma falta de pagamento e, consequentemente, o prejuzo. Ser ento

    necessrio uma reflexo sobre as consequncias do eventual no recebimento e,

    principalmente, sobre a maneira mais eficaz para resoluo do impasse. Considerando

    que o incumprimento um factor prejudicial maioria das empresas, necessrio

    analisar as suas causas, objectivando, com isto, evitar que os ndices ora observados se

    elevem. De entre os muitos factores que poderiam justificar os altos ndices de

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  • incumprimento verificados tanto na indstria como no comrcio, o principal a actual

    crise econmica. De facto, o abrandamento da actividade econmica tende a agravar o

    incumprimento dos prazos de pagamento, assim como o agravamento do custo do

    crdito tende a levar certas empresas a substituir o crdito bancrio pela dilao dos

    pagamentos. Existem ainda certos factores estruturais que agravam o problema, como

    a cultura do pagamento atrasado de entidades pblicas e de empresas industriais e de

    grande distribuio, que se transformou num verdadeiro comportamento econmico

    desses poderosos agentes.

    Actualmente, o mercado est cada vez mais competitivo e globalizado, a comunicao

    social e os recursos financeiros alteram as suas caractersticas e normas com uma

    rapidez surpreendente. Constatamos com facilidade depararem-se os agentes

    econmicos com muitos obstculos existentes no mercado, entre eles o incumprimento.

    A capacidade dos empresrios de negociarem apresenta-se como essencial pois as

    empresas esto expostas competio de concorrentes internos e externos, com

    grande conhecimento no mercado em que actuam, e com excelente capacidade de

    venda dos seus produtos e servios que, invariavelmente, possuem qualidade e preos

    mais atraentes.

    Nesse contexto, muitas empresas preocupam-se nica e exclusivamente com a venda,

    esquecendo-se de uma regra bsica e fundamental na gesto de negcios, que a

    anlise de crdito baseada em mtodos cientficos.

    As pessoas negoceiam sempre, muitas vezes at inconscientemente, no percebendo

    que o fazem. Contudo, so poucas as pessoas que atingem o cume numa negociao,

    ou seja, o acordo. Quando negoceiam, as pessoas estabelecem sempre algum tipo de

    relacionamento, comunicam-se por meio de canais, tornando este processo um caso de

    comunicao interpessoal. Ora, ouvir no custa dinheiro e todos ns temos uma

    profunda necessidade de ser compreendidos. Ao satisfazer essa necessidade o

    empresrio pode fazer com que a negociao tome outro rumo. Ouvir requer pacincia

    e autodisciplina. Ouvir no fcil, mas pode ser algo valioso; proporciona uma janela

    para o pensamento da outra parte. Permite ao empresrio envolver a outra parte na

    tarefa conjunta de entender o seu problema, fazendo com que ela fique mais disposta a

    ouvi-lo.

    Diante da nova realidade que se apresenta, as formas adoptadas pela maioria das

    empresas na anlise e negociao com os incumpridores e eventuais insolventes,

    devem passar certamente por uma reviso, contemplando tcnicas e posturas

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  • adequadas. Negociar transforma-se em desafio, principalmente para as pequenas e

    mdias empresas, que nem sempre contam com profissionais especializados na

    conduo dessa tarefa.

    Todas as empresas tm que lidar com clientes problemticos. No somente com o

    pagador lento, para quem todas as tcnicas existentes podem ser exigidas para

    assegurar o pagamento, como tambm com o cliente que est em dificuldades

    financeiras, o qual ter srias dificuldades para efectuar o pagamento Algumas

    empresas procuram, quando muito, verificar se o tomador de recursos possui garantias

    necessrias, quando o fundamental identificar a sua capacidade de pagamento no

    futuro, pois l que ocorrer ou no a solvncia.

    Por outro lado, todas as empresas sentem uma grande dificuldade em lidar com a

    actividade de cobrar o que os seus clientes lhes devem. uma realidade, muito natural,

    pois a empresa no uma entidade financeira que vive de conceder crditos, isto , a

    mercadoria de um Banco ou de uma empresa financeira o dinheiro, e por isso

    trabalham profissionalmente. Seno vejamos, imagine que concede crditos de

    100.000,00 a determinados clientes agora experimente ir a algum Banco contratar um

    emprstimo de 1.000,00. Sente-se na frente do gerente e veja se ele lhe concede o

    emprstimo com a mesma velocidade, simplicidade e facilidade com que os seus

    funcionrios operam na sua empresa.

    Acontece que, para utilizar uma das ferramentas de Marketing, e quando possuem um

    bom capital disponvel, as empresas resolvem financiar os seus clientes para aumentar

    as vendas e conquistar mais clientes. Ora, esta atitude s pode ser interpretada no

    sentido de o empresrio querer actuar em duas reas de actividade distintas, isto , a

    primeira produzir e comercializar os seus produtos e a segunda a de actuar como uma

    empresa financeira.

    Porm, falta ao empresrio preparao e experincia do Banco ou da empresa

    financeira na actividade de cobrana. Desde logo, importa referir que nenhuma

    empresa comercial, industrial, prestadora de servios, agropecuria, etc., tem a

    obrigao de financiar os seus clientes. Os preos praticados devem ser para

    pagamentos vista, ou melhor, dinheiro c e mercadoria l.

    Mas, como o fornecedor facilita para pagar o que se lhe compra em 15, 30 e at em 60

    dias, as empresas adoptaram, por isso, a prtica de transferir o benefcio para os seus

    clientes. Contudo o fornecedor geralmente uma grande empresa capitalizada, e

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  • possivelmente muito experiente a lidar com o crdito, enquanto o empresrio, muitas

    vezes sem experincia comercial, lana-se a conceder financiamentos com base no

    prazo de crdito que recebeu. possvel que o empresrio perca dinheiro, enquanto o

    seu fornecedor vai, certamente, receber tudo o que lhe financiou, j que o empresrio

    no vai querer perder a fonte de rendimento que so os seus produtos e preos

    especiais.

    Muitas vezes o financiamento que os fornecedores concedem para que o empresrio

    tenha a mercadoria nas prateleiras disposio dos seus clientes, um prazo para que

    ela seja vendida e nunca falte nada no ponto de venda. Por erro, o vendedor do

    distribuidor incentiva o empresrio a vender a crdito, j que paga com prazo. Mas,

    aqui est o alerta, as empresas devem primeiro aprender a controlar o seu capital

    disponvel para que no sucumbam num turbilho de crditos a receber e muitas contas

    a pagar, e, pior ainda, as prateleiras vazias.

    O domnio das tcnicas de cobrana assim um exerccio dirio que consiste em

    identificar as tcnicas que mais se adaptam ao seu trabalho. Existem vrias, as mais

    comuns so: em carteira (cobrana por tesouraria, cobrana pessoal), bancria

    (cobrana simples, cobrana desconto, por empresa de factoring), jurdica (protesto de

    letras, por intermdio advogado ou servios jurdicos) etc.

    Tudo pode funcionar naturalmente se todos os clientes pagarem em dia, mas, como

    nem sempre esta a realidade, uma empresa tem de se organizar para o que

    geralmente ocorre quando os clientes se atrasam nos pagamentos. Para isso a empresa

    deve montar uma Equipa de Cobranas, constituda por um grupo que trata da anlise e

    concesso de crditos e por outro grupo que trata das cobranas.

    A concesso de crdito passa por se obter as informaes completas e escritas de todos

    os candidatos a crdito. Proceder a anlise e pesquisa minuciosa de cada ficha, conferir

    se todos os dados so verdadeiros, e ter quem seja capaz de tomar a deciso de

    conceder ou no crdito quele candidato.

    Aqui tudo parece muito simples, o que se admite, mas trabalhoso, requer que se

    sigam regras e tcnicas, alm de consumir uns 2 ou 3 funcionrios experientes, o que

    as empresas resistem em contratar, mas depois surge a possibilidade de perda no caso

    de quem esteja no acto da venda da concesso do crdito no seja muito experiente

    prtico no sector.

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  • 1 - MTODOS DE PREVENO

    A questo que se coloca a seguinte: como pode uma empresa pode proteger-se

    contra o incumprimento de maus pagadores e cobrar dbitos atrasados, em tempos

    difceis, sem perder o cliente.

    Diz o povo que quem empresta dinheiro aos amigos, no final ou perde dinheiro ou

    perde o amigo. Na administrao empresarial, contudo, praticamente impossvel

    seguir a conhecida regra geral "amigos, amigos, negcios parte". Na economia

    moderna, toda transaco comercial (incluindo a prestao de servios) envolve algum

    tipo de operao de crdito ou, no mnimo, a concesso de um perodo de carncia para

    o pagamento. Assim, clientes e fornecedores que compram e vendem a prazo ou em

    condies especiais devem ser considerados, ambos, os melhores amigos da empresa,

    pois - juntamente com seus funcionrios - viabilizam o negcio.

    Nas pequenas e micro empresas, em que as transaces ocorrem de maneira muito

    mais pessoal do que entre as grandes empresas, as relaes com clientes e

    fornecedores processam-se dentro de um crculo de interdependncia financeira muito

    maior: a empresa oferece algum tipo de crdito aos compradores para garantir a sua

    fatia do mercado; em contrapartida, ela tende a beneficiar-se com prazos mais

    alongados para pagamento de seus fornecedores de servios e matrias-primas. Nesse

    crculo, certas empresas de boa reputao, que eventualmente atravessem um

    momento difcil ou imprevisto, tambm conseguem obter condies especiais de

    pagamento dos seus parceiros comerciais, que arriscam em alguma medida o capital na

    tentativa de manter ou ampliar seu mercado.

    Nessa roda-viva de credores/devedores, o xito de todo o pequeno ou micro

    empreendimentos depende da sua capacidade de administrao da dvida, que se forma

    como elemento inerente ao funcionamento do livre mercado. Para que o passivo no

    cresa sem controlo e venha a criar dificuldades de liquidez ou mesmo force a

    empresa a contrair emprstimos para compensar a falta de capital disponvel ,

    preciso que o empresrio saiba como proteger-se contra a incumprimento e receba as

    contas atrasadas sem perder o cliente amigo.

    Embora a venda a prazo seja a principal fonte de maus pagadores e contas em atraso,

    s uma produo de escala muito pequena pode sobreviver sem programa de crdito.

    Mesmo os armazns de bairro possuem um livro de contas mensais. Os sectores

    intermedirios da produo industrial e de prestao de servios so normalmente

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  • dependentes de um regime de franquia recproca. Os seus clientes sejam empresas

    maiores ou menores pagam as facturas recebidas em 30, 60 ou at 90 dias depois da

    entrega. No giro comercial esse tipo de crdito por "perodo de graa" (compre hoje,

    pague s em Janeiro) tornou-se um recurso essencial para atrair novos clientes pela

    oferta de melhores condies de pagamento do que a concorrncia.

    Assim, praticamente todas as empresas recebem algum crdito ou franquia dos

    fornecedores e transferem pelo menos parte desse crdito para os clientes. Essa

    engenharia financeira funciona enquanto as empresas adoptam uma poltica de crdito

    comum e de acordo com a sua realidade, pois basta que se atrase um pagamento para

    que todo o grupo de empresas associadas sofra problemas de liquidez. A empresa que

    no estabelecer o seu programa especfico de crdito, por sua vez, submete-se s

    condies dos clientes e fornecedores. Mesmo assim, algumas contas vo

    necessariamente atrasar-se, e ser preciso desenvolver algumas tcnicas de cobrana

    para que a recuperao do dinheiro seja o menos prejudicial possvel nas relaes da

    empresa com o cliente.

    2 - INFORMAO SOBRE OS CLIENTES

    Um cobrador bem sucedido deve saber como atacar, deve fazer qualquer coisa para

    obter o seu dinheiro, sempre no limite legal e moral. A realidade, porm, outra e,

    desde logo, o cobrador lida com seres humanos, no com mquinas.

    A informao sobre os clientes vital para o processo de cobrana. As empresas devem

    construir bases de informao sobre os seus clientes e conjugar essa informao com

    os diversos departamentos da empresa implicando os comerciais, os financeiros, etc.

    As bases de dados so instrumentos cuja a utilizao deve ser feita com algum cuidado.

    De facto, o enquadramento legal que rege esta realidade impe limites que devem ser

    tidos em conta e a que nos referimos mais adiante.

    A melhor informao sobre os clientes deve comear por ser obtida na fora das

    vendas, na medida em que ela constitui o primeiro contacto do cliente com a empresa,

    e deve depois ser completada por outros departamentos da empresa. A recolha de

    informao dever ser feita conjugando a necessidade da sua recolha e a exigncia de

    concretizao do negcio

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  • Ningum melhor do que a fora de vendas que tem o primeiro contacto directo com o

    cliente para proceder a uma avaliao deste e a essa recolha, em muitos casos esta

    constituiu a nica oportunidade.

    Mas tambm ningum se encontra melhor posicionado para perceber qual a informao

    sobre o cliente cuja recolha por um lado permite a concretizao do negcio e por outro

    prossiga os objectivos de proteco do crdito cujo o cliente no pague.

    2.1 - SUGESTES

    Assim avanamos com as seguintes sugestes, que podem ser seguidas todas ou s

    algumas em funo de cada cliente, produto vendido ou servio prestado:

    2.1.1 - Exigir-se a apresentao de documentos pessoais (Bilhete de Identidade e

    Nmero de Identificao Fiscal, confirmando a assinatura que consta nos mesmos);

    2.1.2 - No aceitar que o cliente diga o nmero do Bilhete de Identidade e Nmero de

    Identificao Fiscal, mas sim solicitar a apresentao dos documentos na hora da

    compra a pronto (se for paga com cheque) ou em prestaes;

    2.1.3 - Solicitar comprovativo de residncia (contas de gua, luz, telefone etc.);

    2.1.4 - Requerer comprovativo de rendimentos (recibo de vencimento, declarao de

    IRS, contrato de trabalho);

    2.1.5 - Efectuar a confirmao de dados do cliente por telefone fixo (confirmao de

    residncia, de emprego ou de uma referncia);

    2.1.6 - Quando se tratar de cliente antigo, actualizar sempre os dados do processo

    interno, obtendo a confirmao por telefone;

    2.1.7 - Trabalhar com cartes de crdito e de dbito, pois as taxas cobradas pela

    empresa administradora so compensadas pela garantia de recebimento dos valores.

    H uma forte tendncia no mercado para a popularizao do carto de dbito;

    2.1.8 - As contas bancrias recm abertas apresentam um alto ndice de

    incumprimento. Por lei, o comerciante no obrigado a receber pagamentos por meio

    de cheques. Por um lado, as instituies de crdito devem rescindir qualquer conveno

    que atribua o direito de emisso de cheques por quem, pela respectiva utilizao

    indevida, revele pr em causa o esprito de confiana que deve presidir sua circulao,

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  • mas por outro, a instituio de crdito sacada obrigada a pagar, no obstante a falta

    ou insuficincia de proviso, qualquer cheque emitido atravs de mdulo por ela

    fornecido, de montante no superior a 12 500$*. No entanto, constitui recusa justificada

    de pagamento de cheque de montante no superior a 12 500$*, o furto, o roubo,o

    extravio, o abuso de confiana, o endosso irregular, a rasura no extenso para caber

    dentro do montante atingido pela obrigatoriedade de pagamento, a apropriao

    ilegtima e a existncia de srios indcios de falsificao.1

    Assim, sugere-se aos comerciantes e empresrios que fixem em cartaz visvel, as

    informaes ao cliente, como por exemplo: S aceitamos cheques mediante

    apresentao do Bilhete de Identidade No aceitamos cheques de terceiro; a

    mercadoria s ser entregue aps boa cobrana etc.

    2.1.9 - Nenhum estabelecimento obrigado a aceitar cheques, mas dever informar de

    forma clara o consumidor que: No aceitamos pagamento em cheque ou carto.

    Chamamos a ateno para as situaes de cheque falso, que no se tratam de

    situaes de falta de proviso, mas crime de falsificao. Neste caso, o consumidor que

    viu o seu cheque falsificado no tem culpa, a instituio bancria tambm no e o

    prejuzo acaba por sobrar para o empresrio.

    Para que os falsificadores no tenham acesso aos cadastros comerciais, sugerimos que

    o comerciante ou empresrio mantenha os dados pessoais dos clientes em ficheiro

    prprio e no no verso do cheque.

    Outra alternativa a implantao de um sistema de carto prprio, que tambm uma

    das formas de adquirir a fidelidade do cliente dando-lhe crdito e alavancando as

    vendas.

    2.2 - INFORMAO NO CASO DAS ENTIDADES COMERCIAIS INDIVIDUAIS OU

    COLECTIVAS

    A recolha de informao no caso dos clientes que sejam comerciantes quer individuais

    quer colectivos funda-se nas razes apontadas antes. Esta recolha deitar mo das

    mais diversas fontes.

    Desde logo, sugere-se uma apreciao preliminar da consistncia do estabelecimento

    comercial do cliente. Se for uma sociedade recente h quanto tempo este

    estabelecimento est aberto ao pblico, qual a opinio da praa, incluindo aqui

    relatrios de crdito, informaes bancrias.

    1 DL n 454/91, de 28/12, alterado pelo DL n 316/97, de 19/11, e pela Declarao de Rectificao n 1-C/98, de 31/1, e Aviso n 1741-C/98 (2 Srie). 4/2.

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    14

    * Montantes em escudos ainda estipulados no texto da Lei e do Banco de Portugal. 12500 = 62.35

  • Na sequncia e no mbito da recente reforma da aco executiva foi criada uma base

    de dados de execuo a que nos referiremos mais adiante2 e que importa ao

    empresrio consultar. Esta base de dados pode ser um instrumento valioso para uma

    apreciao preliminar do crdito a conceder a cliente determinado.

    Se se tratar de uma sociedade j com algum tempo de giro comercial importa saber se

    os scios so os mesmos desde a sua fundao ou se entretanto ocorreram no seu

    histrico cesses de quotas, geralmente indicadoras do mau andamento do negcio.

    Nestas situaes o empresrio dever rodear-se de cuidados.

    Ainda aqui sugere-se tambm que seja recolhida informao de carcter pessoal das

    pessoas individuais que se encontram por detrs daquelas entidades colectivas. Assim,

    identificao de scios, e cnjuges se casados, moradas, que outros rendimentos

    auferem.

    Se o cliente j um cliente anterior no sentido de j terem sido estabelecidas relaes

    comerciais anteriores, aconselha-se, numa situao de atraso de pagamento, a

    recolherem-se a informaes actualizadas.

    Em todas estas situaes de recolha de informao o factor tempo fundamental.

    3 - BASES DE DADOS

    A recolha de informao sobre os clientes que referimos anteriormente passa

    necessariamente pelo uso das novas tecnologias de tratamento de informao quer ao

    nvel da recolha do seu armazenamento e relacionamento, da consulta e da difuso.

    A utilizao da informtica na gesto administrativa, contabilstica financeira, em todos

    os sectores da sociedade permite uma melhor sistematizao de informao, com

    reflexos visveis ao nvel dos ganhos de produtividade, rigor, rapidez na recolha da

    informao e uma resposta satisfao dos utilizadores.

    Se verdade que a informtica se apresenta como instrumento adequado

    sistematizao, produo e distribuio da informao, ela suscita problemas no que se

    refere proteco da privacidade em face do tratamento de dados pessoais

    2 Ver, infra, pg. 41

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    15

  • A Lei 67/98, de 26 de Outubro, transps para a nossa ordem jurdica a Directiva a n

    95/46/CE e estabeleceu, como princpio geral, que o tratamento de dados pessoais se

    deve processar de forma transparente e no estrito respeito pela reserva da vida

    privada, bem como pelos direitos, liberdades e garantias fundamentais (art. 2).

    O regime da lei aplica-se ao tratamento de dados pessoais por meios total ou

    parcialmente automatizados, bem como ao tratamento por meios no automatizados de

    dados pessoais contidos em ficheiros manuais ou a estes destinados (art. 4. n. 1).

    Para os tratamentos manuais existentes data da entrada em vigor da lei s

    necessrio cumprir as exigncias estabelecidas nos artigos 7, 8, 10 e 11 no prazo

    de 5 anos (cf. art. 50 n. 1).

    A nica excepo aplicao da lei ocorre quando estiverem em causa dados pessoais

    tratados por pessoas singular no exerccio de actividades exclusivamente pessoais ou

    domsticas. A expresso uso pessoal ou domstico deve referir-se aos tratamentos

    utilizados por pessoa individual e no contexto de interesses estritamente pessoais ou

    domsticos (no contexto restrito do domicilio familiar).

    Estaro assim afastados desta excepo todos e quaisquer ficheiros instalados numa

    empresa, que contenham qualquer informao, de qualquer natureza e

    independentemente do respectivo suporte, de pessoa singular identificada ou

    identificvel, caso em que os empresrios devem proceder legalizao das Bases de

    Dados.

    3.1 - LEGALIZAR UMA BASE DE DADOS

    O tratamento de dados pessoais est sujeito a registo ou autorizao prvia por parte

    da CNPD Comisso Nacional de Proteco de Dados.

    Para legalizar a sua base de dados os empresrios devem preencher um formulrio

    existente de que juntamos em anexo uma minuta, que dever conter a assinatura do

    responsvel do tratamento dos dados, que a pessoa singular ou colectiva que,

    individualmente ou em conjunto com outrem, determine as finalidades e os meios de

    tratamento dos dados pessoais.

    3.2 - OBRIGAES DOS RESPONSVEIS DOS FICHEIROS

    Os empresrios que procedam constituio de Bases de Dados devem

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    16

  • 3.2.1.1 - Legalizar os tratamentos de dados pessoais junto da comisso nacional de

    proteco de dados, previamente sua constituio.

    3.2.1.2 - Proceder depois ao tratamento dos dados de forma lcita e leal, recolhendo

    apenas a informao necessria e pertinente finalidade que elegeram.

    3.2.1.3 - Permitir ao titular dos dados o acesso e correco das informaes sobre si

    registadas, transmitindo-as, em linguagem clara e rigorosamente correspondente ao

    contedo do registo.

    3.2.1.4 - Manter os dados exactos e, se necessrio, actuais. Assegurar o consentimento

    expresso do titular dos dados sempre que tal for exigido.

    3.2.1.5 - Garantir gratuitamente o direito de eliminao dos dados utilizados para a

    mala directa, quando requerida pelo titular.

    3.2.1.6 - Devem ter sistemas de segurana que impeam a consulta, modificao,

    destruio ou acrescentamento dos dados por pessoa no autorizada a faz-lo e que

    permitam detectar desvios de informao intencionais ou no.

    3.2.1.7 - Respeitar o sigilo profissional em relao aos dados tratados.

    3.2.1.8 - Interromper imediatamente o tratamento quando actuem em

    desconformidade com a lei e tenham recebido da entidade competente directriz nesse

    sentido.

    3.2.1.9 - Destruir os dados, decorrido o prazo de conservao autorizado.

    Os empresrios que procedam constituio de Bases de Dados No devem

    3.2.2.1 - Utilizar os dados recolhidos para finalidade incompatvel com a da recolha.

    3.2.2.2 - Realizar interconexo (forma de tratamento que consiste na possibilidade de

    relacionamento dos dados de um ficheiro com os dados de um ficheiro ou ficheiros

    mantidos por outro ou outros responsveis, ou mantidos pelo mesmo responsvel com

    outra finalidade) de dados pessoais, salvo autorizao legal ou autorizao da CNPD.

    3.3 A CNPD

    A CNPD - Comisso Nacional de Proteco de Dados uma entidade administrativa

    independente, a quem compete controlar e fiscalizar o cumprimento das disposies

    legais e regulamentares em matria de dados pessoais, em rigoroso respeito pelos

    direitos do homem e pelas liberdades e garantias consagradas na Constituio e na lei.

    De entre as suas atribuies e competncias ressaltam as de: Autorizar, previamente, o

    tratamento de dados, a interconexo de dados pessoais e a sua utilizao para fins no

    determinantes da recolha, bem como o tratamento de dados pessoais relativos ao

    crdito e solvabilidade; Registar os tratamentos de dados pessoais; Dispensar quando

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    17

  • houver fundamento legal, o direito de informao; Fixar o tempo de conservao dos

    dados pessoais em funo da finalidade.

    De entre essas competncias ressalta a possibilidade de isentar certas bases de dados

    da prvia autorizao.

    Assim nos termos da Autorizao de Iseno n. 3/99 relativa Facturao e Gesto

    de Contactos com Clientes, Fornecedores e Prestadores de Servios foi determinado que

    esto isentos de notificao CNPD os tratamentos automatizados com a finalidade

    exclusiva de facturao, gesto de contactos com clientes, fornecedores e prestadores

    de servios.

    3.3.1 Os dados pessoais tratados para esse fim devem ser os estritamente necessrios

    realizao dessa finalidade, limitando-se s seguintes categorias de dados:

    3.3.1.1 - Dados de identificao: Nome, data de nascimento, morada, telefone, fax, e-

    mail, nmero de identificao fiscal e nmero de identificao bancria ;

    3.3.1.2 Outros dados: os referidos no n. 5 do art. 38 do Cdigo do IVA, bem como os

    meios de pagamento, instituio financeira, nmero de aplice e entidade seguradora,

    no caso de recurso a entidades seguradoras no mbito da finalidade prevista no art.

    1.

    3.3.2 - Os dados pessoais referidos podem ser conservados pelo perodo mximo de 10

    anos, sem prejuzo da sua conservao, para alm daquele prazo, em caso de

    pendncia de aco judicial, com limite de trs meses aps trnsito em julgado.

    3.3.3 - So destinatrias dos dados as entidades a quem estes devam ser comunicados

    por fora de disposio legal, ou aquelas a quem, contratualmente, o titular dos dados

    consinta a comunicao, no mbito daquela finalidade

    3.3.4 - Esta iseno no prejudica a obrigao do responsvel do ficheiro quanto ao

    direito de informao, constante no artigo 10 da Lei 67/98, de 26 de Outubro.

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    18

  • CAPITULO III

    ORGANIZAO DOS DEPARTAMENTOS DE COBRANAS

    Na actividade empresarial em geral fala-se frequentemente em conceder e solicitar

    crdito para se produzir, comercializar, criar stocks, etc. Assim prtica comum nos

    pases de moeda estvel iniciar-se um negcio com dinheiro de terceiros. Torna-se uma

    rotina estar-se sempre a conceder crdito e recebendo (cobrando), isto , gerando

    rendimentos para se conceder mais crditos.

    comum vermos empresas fazer do crdito um instrumento de Marketing divulgando

    que com aprovao rpida o cliente leva o produto praticamente na hora, e com

    mtodos de trabalho apropriados. O ponto fundamental ao conceder crdito est na

    experincia de quem administra o sector e forma sua equipe, no controle dos resultados

    da venda e do recebimento e num processo dinmico de actualizao, colhendo

    informaes rpidas e precisas do mercado.

    Na gesto do risco e do crdito h uma regra fundamental: quanto mais cedo o credor

    agir, maiores sero as possibilidades de reaver o dinheiro. Essa uma recomendao,

    dada por empresas especializadas nos servios de cobranas.

    Porm, na administrao de pequenas facturaes, a utilizao de servios de cobrana

    apenas o ltimo recurso, pois a engenharia financeira contempornea dispe de

    outras alternativas originais e inovadoras para enfrentar o problema.

    Por outro lado, a maioria das pequenas e micro empresas com problemas de

    recebimento de dvidas no tm condies de contratar os servios de especialistas para

    receber os pagamentos atrasados. Os empresrios que se encontram nessa situao

    crtica (de vtimas do incumprimento) acabam por agir em relao aos seus

    pagamentos atrasados de forma intuitiva, pressionando os devedores de acordo com

    seus instintos e experincia. Mesmo agindo por conta prpria, essas empresas podem

    conseguir melhores resultados no recebimento de dvidas se racionalizarem e

    sistematizarem o processo de cobrana.

    Com o auxlio de programas informticos contendo sistemas de contabilidade

    especficos para antecipao e acompanhamento da acumulao de dvida a receber,

    possvel desenvolver um "mini sector de cobrana" dentro de qualquer pequena ou

    micro empresa, estabelecendo um conjunto de medidas de baixo custo que realmente

    ajude a recuperar o que lhes devido. J existem alguns programas informticos

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    19

  • desenvolvidos com objectivo especfico de organizar a cobrana nas pequenas e micro

    empresas. Alguns desses programas incluem servios completos de cobrana com

    modelos de cartas que vo progressivamente aumentando a presso sobre o devedor,

    sem criar um clima hostil e contraproducente. O programa tem ferramentas auxiliares

    para organizao dos dbitos em atraso, permitindo o clculo e a fcil localizao do

    histrico de cada conta atrasada, alm de numerosas comparaes, ideias e

    recomendaes para o "desenvolvimento da atitude correcta" na negociao da

    cobrana. Aplicados como instrumento suplementar ao programa de contabilidade da

    empresa, tais "software" podem facilitar o processo de cobrana, economizando muito

    tempo til ao pequeno empresrio.

    A organizao desse servio interno de cobrana depende, em primeiro lugar, da

    definio da poltica de crdito da empresa. Todo empresrio, por menor que seja o seu

    negcio e por menos organizadas que tenha as suas ideias sobre a questo, deve ter

    definida uma poltica de crdito.

    No dia a dia da actividade econmica, a poltica de crdito varia de empresa para

    empresa, alm de se alterar em funo dos factores mais diversos: condies do

    mercado, eficincia administrativa, liquidez de caixa e outros elementos especficos de

    cada conta, como a credibilidade do devedor, os laos de parentesco ou amizade entre

    credor e devedor, o grau de interdependncia das empresas etc. Antes de criar uma

    unidade para gerir as cobranas, o empresrio deve efectuar uma anlise ao seu

    prprio comportamento, estabelecendo o desempenho presente e passado da sua

    empresa em relao acumulao e recuperao de pagamentos em atraso. Nessa

    auto-reflexo, deve identificar as tendncias gerais de sua poltica informal de crdito,

    comparando-a com a da concorrncia. Aps identificar quais as experincias mais

    satisfatrias na rea, os empresrios podem definir as linhas mestras uma norma-

    guia para a sua aco. Isso ser a base de um sistema operacional objectivo de

    cobrana, que leve em conta as necessidades da empresa, as peculiaridades do ramo,

    as condies do mercado. Ou seja, a sua poltica de crdito.

    A definio dessa poltica de crdito no constitui exerccio intelectual diletante, mas

    instrumento de grande utilidade, desde que seja acompanhada pela implementao de

    um pequeno cdigo de conduta ou procedimento padro. Que tambm serve para

    expor claramente quais as regras da casa em relao ao crdito. A incluso de certos

    pormenores especficos dessa poltica de crdito em contratos de adeso, por exemplo,

    evitar grandes mal-entendidos e muito desgaste pessoal na hora da cobrana.

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    20

  • O histrico de uma poltica de cobrana coerente revela-se, tambm, como um

    importante instrumento quando a empresa precisa obter crditos e financiamentos.

    Alm do saldo positivo na recuperao do que deve, demonstra que h preocupao ou

    compromisso com o pagamento em dia. Um regime de cobrana catico e

    descoordenado pode custar muito mais do que a quantia devida, complicando a

    administrao e a contabilidade, desactualizando as previses e at mesmo interferindo

    em metas estratgicas. A empresa que adopta diferentes polticas de crdito para

    devedores em situaes semelhantes arrisca-se a projectar uma imagem prejudicial,

    sendo facilmente acusada de favoritismo e de imprevisibilidade.

    Ao criar um mini sector interno de cobrana, a maioria dos empresrios surpreender-se-

    com os resultados positivos obtidos com o desenvolvimento de mtodo sistemtico e

    eficiente para recuperar os pagamentos atrasados. Isso, no entanto, exige disciplina,

    persistncia, tempo e recursos. A cobrana de atrasados desgastante e no se deve

    tornar o ncleo central do negcio.

    O tratamento da cobrana um caso especial para cada equipa, por vrias razes, de

    que relataremos duas a seguir:

    1 As empresas que no tm concorrncia e so exclusivas no mercado e, por isso,

    no querem e nem precisam de vender para quem no tem crdito. Como elas no se

    encontram to dependentes dos clientes, podem seleccion-los segundo os seus

    critrios. So geralmente indstrias ou comrcios exclusivos.

    Estas empresas utilizam uma rigidez fortssima nas exigncias e condies para quem

    perdeu o crdito e s voltam a vender a prazo aps muito custo.

    A percentagem de incumprimento nestas empresas costuma ser baixssima e no

    ultrapassa os 3 a 4% das contas a receber por ms.

    2 As empresas que sofrem uma grande concorrncia, que geralmente so empresas

    que precisam muito dos seus clientes quer por eles possurem uma grande fonte

    alternativa de escolha, quer pela necessidade de vender muito para ampliar mercado ou

    atender uma grande produo de sua fbrica ou fornecedor.

    Estas empresas so flexveis na concesso do crdito e na cobrana. Trabalham com

    uma taxa de incumprimento mais alta, chegando de 12 a 20% sobre as contas do ms.

    Assim, antes de mais, importa motivar a equipa de cobranas da empresa para a

    importncia das cobranas e para a necessidade da preveno. Esta questo no deve

    ser exclusiva do departamento de cobranas mas beneficiar de todas as contribuies

    dos restantes departamentos da empresa.

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    21

  • Para tanto deve providenciar-se uma formao especfica sobre esta matria fora de

    vendas da empresa motivando-os no sentido de prevenir os negcios de concretizam.

    Em especial para a obteno de informao credvel sobre os clientes que trazem para

    empresa. Tal exigncia poder concretizar-se levando os vendedores a obterem, dos

    clientes, o preenchimento de formulrios, de forma a conseguir o mximo de elementos

    informativos, e a aceitao de contratos de adeso que contenham as regras de poltica

    de crdito da empresa.

    A motivao que referimos deve ser estendida aos restantes elementos da empresa

    motivando-os no sentido de transmitirem empresa todas as informaes que possam

    obter relativamente aos clientes desta mesmo que no desempenhem na empresa

    qualquer funo directamente relacionada com o processo comercial lato sensu.

    Por outro lado o departamento de cobranas deve considerar sempre o factor tempo.

    Assim quando chegar o momento de agir, isto , quando tiver conhecimento do

    vencimento das facturas deve providenciar todas as aces posteriores com brevidade e

    celeridade.

    O tempo um factor de mxima importncia quando falham os pagamentos. Logo que

    se verifiquem atrasos de pagamentos, o departamento de cobranas deve dar incio e

    executar as diligncias de pr-contencioso e mesmo j de contencioso considerando

    toda a informao recolhida do cliente e no mais curto espao de tempo possvel.

    Na sequncia da reforma de aco executiva3 impem-se hoje s empresas credoras

    duas atitudes.

    Uma atitude pr activa no sentido de diligncia para que o crdito ao ser concedido

    esteja devidamente sustentado em matria de informao sobre o cliente, ao mesmo

    tempo que se impe uma atitude de rapidez na execuo de todo o processo prvio ao

    incio do processo contencioso em Tribunal.

    3 Ver, infra, pgs. 37 e seg.

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    22

  • CAPTULO IV

    USO DE INDICADORES PARA CONTROLO DO CRDITO

    CONCEDIDO

    Como referimos anteriormente a poltica de concesso de crdito a prtica mais

    comum.

    O empresrio ao responder s questes que se seguem, poder avaliar a realidade do

    seu sector econmico em relao ao endividamento da sua empresa, assim como as

    linhas de crdito oferecidas pelos seus fornecedores ou as que oferece aos seus

    clientes.

    Isso permite situar a sua empresa no seu contexto e saber se o seu negcio est a

    conceder mais linhas de crdito do que a concorrncia; se esse crdito est a

    possibilitar uma maior penetrao no mercado por oferecer melhores condies de

    pagamento; e se tais pagamentos esto a ser feitos em dia de modo a manter o

    equilbrio do seu sector financeiro.

    1 EMPRESA E SECTOR

    1.1 possvel estimar, de modo geral, qual a percentagem da facturao da sua

    empresa que est imobilizada em linhas de crdito e prazos de carncia abertos a

    clientes?

    1.2 O crdito factor determinante e generalizado no seu ramo de negcio?

    1.3 Faz um uso intensivo da concesso de crdito e de pagamentos fraccionados

    entre empresas e clientes?

    1.4 Da mesma forma, qual a percentagem do facturao geral que corresponde

    quantia comprometida com endividamento da sua empresa junto a fornecedores e

    intermedirios?

    1.5 possvel identificar se esse endividamento recproco tem aumentado ou

    diminudo ao longo dos anos?

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    23

  • 1.6 Quais os factores que se tornam presentes nos perodos ou temporadas de maior

    endividamento da empresa (alteraes tecnolgicas, redefinio do mercado,

    instabilidade econmica, novos produtos, alteraes bruscas de custo etc.)?

    1.7 A sua empresa apresenta um perfil de crdito semelhante ao da concorrncia?

    2 PERFIL DO DEVEDOR

    2.1 Qual a caracterstica comum do seu principal grupo de clientes em relao ao

    crdito?

    2.1.1 So empresas com tendncia ou circunstancialmente expostas a crises de

    liquidez?

    2.1.2 So consumidores de baixo poder aquisitivo que facilmente atrasam as

    prestaes de compras a crdito? So pontuais?

    2.2 Organize os nmeros da sua contabilidade (quantidades, valores, clientes)

    referentes a vendas a prazo feitas por dia ou por semana, procurando identificar:

    2.2.1 O nmero de pagamentos em dia feitos por dia ou semana;

    2.2.2 O nmero de pagamentos em atraso feitos por dia ou semana;

    2.2.3 O nmero de contas que entram em atraso por dia ou semana;

    2.3 Com os dados recolhidos acima, faa uma estimativa de:

    2.3.1 Quantas facturas originais so emitidas por ms?

    2.3.2 Quantas facturas so recebidas depois do vencimento?

    2.3.3 Qual o prazo mdio desse atraso?

    2.3.4 Com quantas, sem pagamento, fecha o balano do ms?

    2.3.5 Se essas dvidas fossem saldadas em dia, onde investiria esse dinheiro? (Ou

    aonde est a deixar de investir, devido aos maus pagadores)?

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    24

  • 2.4 Analise o histrico de aprovao desses crditos e procure elementos comuns que

    poderiam ter indicado tratar-se de maus pagadores. Procure identificar se:

    2.4.1 Na nsia de efectuar a venda, a sua empresa subestimou o risco ao aprovar o

    crdito?

    2.4.2 O sector que aprova o crdito da sua empresa seguiu os procedimentos padro

    de verificao com todos os devedores?

    2.4.3 Haveria alguma medida especial ou suplementar que pudesse tornar os seus

    funcionrios mais atentos a possveis incumpridores?

    2.5 Identifique que tipo de desculpas ou justificaes so oferecidas pelos seus

    clientes para o atraso de pagamento:

    2.5.1 Todos usam o mesmo argumento geral (Ah, esta crise...)?

    2.5.2 Quais as justificaes especficas mais frequentes nos diferentes grupos de

    clientes com contas atrasadas?

    2.5.3 Quantos se interessaram em renegociar uma forma de pagamento?

    2.5.4 Quantos fogem do assunto ou assumem posio de confronto?

    2.5.5 A maioria dos devedores pertence a determinada categoria ou grupo dentro do

    mercado?

    2.6 Sobre os seus mtodos de cobrana:

    2.6.1 Os clientes voltam a comprar na sua empresa quando o crdito restabelecido?

    2.6.2 A empresa oferece as mesmas condies de crdito para esses ex-

    incumpridores?

    2.6.3 H muitos casos de devedores recorrentes?

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    25

  • 3 POLTICA DE CRDITO

    Nas perguntas seguintes, tente identificar as reas em que sua poltica de concesso de

    crdito se apresenta mais vulnervel, seja na triagem de clientes dignos de crdito ou

    no mtodo e na atitude no momento da cobrana.

    3.1 Ao apresentar um oramento, por escrito ou informalmente por telefone,

    costume os seus empregados deixarem bem claro qual a poltica de crdito da firma?

    3.2 H um critrio definido de forma a requerer o depsito de parte do valor da

    compra? Esse depsito pago contra-entrega da mercadoria ou prestao do servio ou

    como sinal de confirmao da encomenda?

    3.3 H linhas definidas de financiamento: depsitos mnimos, percentagem do total a

    deixar de entrada etc.?

    3.4 Os clculos dos juros cobrados baseiam-se exclusivamente no acompanhamento

    da inflao ou prev (antecipa) variao de custos e perodos de maior procura, quando

    a empresa precisar de mais capital disponvel para aumentar a produo?

    3.5 A empresa oferece vantagens e descontos especiais para pagamentos vista?

    3.6 Aceita pagamento por carto de crdito?

    3.7 Oferece vantagens para novos clientes?

    3.8 Facilita ou financia ordens especiais?

    4 PERFIL DA COBRANA

    Identifique a seguir o seu actual sistema ou mtodo de cobrana:

    4.1 Qual a demora mdia entre a concretizao da venda e a emisso da factura?

    4.2 Qual a demora entre a emisso da carta de cobrana e a data de vencimento da

    factura?

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    26

  • 4.3 Quantas cartas de cobrana so emitidas antes de tentar recuperar o pagamento

    por contacto telefnico e, posteriormente, com visita de representante da empresa ou

    empresa de cobrana?

    4.4 Qual o custo em tempo e dinheiro investido na cobrana de atrasados (cartas,

    correio, telefonemas, empresas de cobrana etc.)?

    4.5 Em alguma circunstncia j perdoou ou perdoa dvidas em renegociao de

    pagamentos?

    4.6 Quanto tempo decorre entre o vencimento de uma factura e o incio do processo

    de cobrana?

    4.7 J utilizou empresas de cobrana especializadas? Calcula quanto deixou de

    receber por no cobrar por conta prpria?

    4.8 A empresa possui um sistema de incentivo aos seus empregados para cobranas

    feitas com xito?

    4.9 J tentou lanar campanhas especiais de incentivo ao pagamento (do tipo pague

    at o dia tal e ganhe um presente). Com que resultado?

    4.10 Tem ideia clara acerca da eficincia mdia de seus mtodos de cobrana?

    4.11 De quanto em quanto tempo rev a poltica de cobrana?

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    27

  • CAPITULO V

    ELEMENTOS DOS PROCEDIMENTOS DE COBRANAS

    1 IDEIAS GERAIS

    Na desagradvel e frequentemente constrangedora hora de cobrar uma conta atrasada,

    o xito depende de no se perder o cliente at se recuperar o dinheiro. Esse cliente

    pode estar a passar por genuno aperto circunstancial. O importante desenvolver uma

    atitude positiva, encorajadora, mas mantendo uma posio lgica, flexvel e

    determinada. O empresrio deve encarar a cobrana dos seus pagamentos em atraso

    como uma parte inerente do processo, sem se intimidar ou envergonhar no momento

    de exigir o pagamento.

    Caso a factura tenha sido enviada pelo correio no traga de volta o cheque ou ordem de

    pagamento, impe-se um contacto mais directo com o devedor. Primeiro, por meio de

    carta oficial, lembrando-lhe a sua inteno de continuar o processo de cobrana at

    receber o que lhe devido. Se o devedor no questionar a razo da carta, deve um

    representante da sua empresa procur-lo, estabelecendo dilogo inicial por telefone e

    depois em visita pessoal. Evite a atitude de confronto dos cobradores tradicionais, que

    importunam, pressionam e ameaam os devedores. muito mais eficiente desenvolver

    uma abordagem com tom de voz agradvel e discurso firme, claro, compreensivo,

    profissional e, principalmente, amigvel.

    A melhor forma de abordar o assunto fazer a cobrana soar nos ouvidos do devedor

    como uma oferta de ajuda e bom conselho para que ele consiga saldar as dvidas.

    Mesmo que as justificaes do devedor sejam extremamente precrias e irritantes, o

    cobrador no deve deixar que os seus sentimentos transpaream. No primeiro contacto

    pessoal, o essencial convencer o mau pagador de que est seriamente determinado a

    recuperar o que lhe devido, mas, tambm, que se interessa pela situao do devedor:

    ningum quer que ele ponha as contas em dia sendo destrudo no processo.

    Toda a tentativa de cobrana tem de ultrapassar a barreira das explicaes duvidosas

    de difcil comprovao que o devedor provavelmente apresentar em sua defesa.

    preciso interrog-lo com persistncia e tentar perceber se ele est a ser sincero ou a

    exagerar. Mesmo que sejam argumentos verdadeiros, o cobrador deve manter a cabea

    fria, sem desenvolver um sentimento de culpa por colocar o endividado contra a

    parede, justamente quando este vive um grande aperto.

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    28

  • Tente negociar sempre um acordo, com nova data de pagamento ou pagamento em

    prestaes da dvida dentro das possibilidades de ambas as partes.

    Na maioria dos casos de cobrana mais demorados e complexos, a soluo negociada

    ainda mais vantajosa do que a cobrana judicial, que fica com uma percentagem

    muito grande do que arrecada e ainda desgasta a imagem da empresa.

    Por negociao directa, o cobrador pode apresentar um desconto para a dvida (por

    exemplo, 20 ou 30%), dependendo de prazos e valores. Assim, possvel economizar

    tempo e dinheiro, minimizando as perdas e preservando as relaes com o cliente (que

    poder recuperar-se financeiramente, no futuro).

    Antes de deslocar pessoal das suas funes quotidianas para investigar o paradeiro do

    devedor, calcule a relao custo/benefcio da cobrana ao domiclio. A experincia

    demonstra que no vale a pena investir no resgate individual de pequenas dvidas.

    2 - PRECAUES CONTRA MAUS PAGADORES

    H dois tipos de clientes que desaparecem, mudando de endereo e telefone, sem

    deixar fonte de contacto: as pessoas que desaparecem de surpresa, devido a

    circunstncias de fora maior na vida pessoal, como viagem repentina, doena e morte

    na famlia ou separao de casais; e pessoas endividadas com inteno consciente de

    escapar dos credores.

    As pessoas honestas que desaparecem involuntariamente, com toda probabilidade

    saldaro seus dbitos por iniciativa prpria, a fim de restabelecer o crdito. Os maus

    pagadores "profissionais", por outro lado, dificilmente sero localizados; provavelmente

    tm dvidas com tanta gente que sero mnimas as possibilidades de a empresa reaver

    o dinheiro, mesmo contratando empresa especializada de cobrana.

    No dia a dia os maus pagadores dispem de trs veculos principais para acumular suas

    dvidas: pagamento por carto de crdito, cheques problemticos ou pela devoluo de

    mercadoria.

    2.1 CARTES DE CRDITO

    Praticamente todos os negcios sofrem perdas ao aceitar pagamentos com carto de

    crdito, pois podem estar a vender para carto roubado, cancelado ou com seu limite

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    29

  • de crdito esgotado. Contra essas perdas, imprevisveis em princpio, possvel tomar

    algumas precaues:

    2.1.1 S efectue a venda depois de o carto ser validado pelo banco ou companhia

    emissora.

    2.1.2 Confira a identidade do portador do carto com outro documento com fotografia

    (alm do Bilhete de Identidade), tomando o cuidado de comparar bem se coincidem as

    assinaturas dos documentos e a que o comprador aps na assinatura.

    2.1.3 Utilize um servio de proteco ao crdito, conferindo sempre via Internet ou

    telefone o histrico do comprador a prazo e esclarecendo bem caso surjam homnimos.

    2.1.4 Anote o endereo e o telefone. Se necessrio, atrase um pouco a venda e

    confira, na operadora de telefones se o nmero corresponde ao endereo fornecido.

    2.1.5 Anote o nmero e a data de emisso do bilhete de identidade no comprovativo

    da venda que vai para a contabilidade da empresa.

    2.2 CHEQUES PROBLEMTICOS

    Cheques devolvidos, cancelados ou sem proviso constituem um problema para as

    empresas. H o custo da devoluo do cheque e renovao do desconto, taxas

    bancrias e, principalmente, perda do dinheiro. Ao lidar com cheques, preciso

    desenvolver a tcnica de cobrana na seguinte direco:

    2.2.1 Estabelea um procedimento nico para receber qualquer tipo de cheque e no

    abra excepes, nem para clientes novos ou nem para compradores regulares.

    2.2.2 Examine pacientemente o cheque, conferindo se tudo est preenchido clara e

    correctamente: nome impresso e assinatura, data, em nome de quem o cheque

    emitido, se o valor numrico corresponde ao da compra e valor escrito por extenso.

    2.2.3 Evite aceitar cheque avulso, que no lhe permite verificar o nmero de srie.

    2.2.4 Nunca aceite cheques com rasuras.

    2.2.5 - Anote sempre o nmero de telefone e o endereo no verso do cheque.

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  • 2.2.6 Confira a assinatura com outros documentos com fotografia, alm do Bilhete de

    Identidade.

    2.2.7 Considere a possibilidade de contratar empresas de factoring. Essas empresas

    conferem por telefone cada cheque, identificando os maus pagadores que mais

    frequentemente emitem cheques problemticos.

    2.2.8 Telefone para o banco do cheque e averigue se existe tal conta e se est activa,

    com fundos disponveis.

    2.2.9 Sempre que aceitar um cheque duvidoso, tente deposit-lo o mais rapidamente

    possvel.

    2.2.10 Nas situaes de venda pelo correio, nunca se renda tentao de agradar

    cliente apressado e, sob presso, entregar a mercadoria antes de descontar o cheque.

    2.2.11 Cheque mal preenchido. Mesmo que seja emitido por cliente da mais alta

    confiana, ele que o reembolse rapidamente. De outro modo acabar por lhe custar

    tempo e dinheiro, caso o banco no efectue o desconto, devido a um lapso qualquer do

    sacador no preenchimento do cheque.

    2.2.12 Em ltima instncia, muitos maus pagadores s saldaro suas dvidas e iro

    recuperar os cheques sem proviso mediante a ameaa de cobrana judicial. Assim,

    entregue a um advogado a cobrana dos cheques com os quais tenha perdido todas as

    esperanas de receber a dvida e inclua os clientes que os emitiram na lista dos

    "indesejveis".

    2.3 RECLAMAES

    Muitos clientes reclamam hoje sobre a qualidade dos bens comprados ou dos servios

    prestados. O cliente que no estiver satisfeito, pode adiar um determinado pagamento

    enquanto se averigua a pertinncia da sua reclamao. Esse tipo de atraso no

    pagamento pode ser altamente custoso para a empresa. As reclamaes, de modo

    geral, envolvem alegao de cobrana indevida ou sem autorizao, ou suspenso do

    pagamento por receber mercadoria com defeito ou com especificaes incorrectas. Eis

    algumas recomendaes para se proteger contra esse tipo de dificuldade para receber:

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    31

  • 2.3.1 A melhor precauo , sempre que possvel, testar a mercadoria na frente do

    comprador e faz-lo assinar documento em que a pessoa se diz satisfeita com a

    mercadoria que est a receber.

    2.3.2 As pequenas empresas que operam com venda por catlogo so as mais

    expostas aos maus pagadores com carto de crdito, pois aceitam ordem por telefone

    ou pelo correio, no tendo como averiguar semelhana de documentos e assinaturas.

    Essas firmas podem proteger-se contra a fraude, solicitando o nmero do telefone do

    comprador e depois telefonando de volta para confirmar a ordem. Aqui, aps conferir a

    identidade e os dados sobre o carto, importante fazer o comprador repetir o nmero

    da conta.

    2.3.3. Finalmente, confie na sua intuio. Se sentir que alguma coisa no est bem

    com o comprador ou com o carto, argumente que aquela mercadoria s pode ser

    vendida a dinheiro vivo ou simplesmente recuse-se a vend-la com desculpa aceitvel.

    2.3.4 - Para dar o benefcio da dvida a seu cliente, mesmo que alguma coisa indique

    que h algo est errado, adie a venda, argumentando que a reposio de stocks

    demorar alguns dias. Convide o interessado a deixar sinal de compra. Nesse meio

    tempo, poder conferir a validade do carto.

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    32

  • CAPITULO VI

    PROCEDIMENTOS DE COBRANA

    1 COBRANAS POR EMPRESAS ESPECIALIZADAS

    O mtodo tradicional de cobrana por meio de empresas especializadas ou servio

    jurdico ainda so os mais amplamente adoptados, sendo os mais indicados para as

    grandes quantias consideradas irremediavelmente perdidas ou contra empresas em

    fase de recuperao. Na cobrana de pequenos valores, o emprego desses servios s

    recomendado quando h um grande volume de operaes em atraso. As empresas de

    cobrana pressionam os devedores pelo correio, por telefone e pessoalmente, na casa e

    no trabalho. Se nada surtir efeito, encaminham a execuo da dvida para a Justia.

    Esse regime de cobrana por terceiros consegue recuperar pelo menos parte da dvida

    em cerca de 60% dos casos. Os cobradores modernos dispem nos seus computadores

    de grandes bancos de dados sobre empresas e indivduos com problemas crnicos de

    crdito. Em caso de grandes dvidas, muitas utilizam investigadores particulares e

    servios jurdicos especializados em acordos extrajudiciais. Apesar das cartas

    ameaadoras, dos desmoralizantes telefonemas para o emprego, 90% do dinheiro

    resgatado vem de acordos estabelecidos entre as partes para evitar a cobrana judicial.

    Pelos seus servios, essas firmas de recuperao de dvidas cobram os custos de

    investigaes e procedimentos especiais (investigaes, localizao de bens etc.) mais

    uma fatia de 35 a 50% da quantia recuperada. Mesmo que no recuperem o dinheiro,

    tais servios de cobrana acabam por fornecer ao credor farta munio contra o

    devedor, incluindo registos de ligaes telefnicas, listas de clientes e fornecedores do

    caloteiro, fichas policiais.

    2 EXPEDIENTES DE COBRANA JUDICIAL

    o momento apropriado para analisar expedientes de cobrana judicial, resumida e

    autonomamente. Dois dos expedientes de cobrana judicial que podero ser teis, pelas

    vantagens que apresentam, para a efectiva cobrana dos crditos so a Injuno e a

    deciso arbitral que versaremos de seguida, reservando aco executiva uma

    abordagem mais detalhada .

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    33

  • 2.1 - INJUNO (Decreto-Lei n. 269/98, de 1 de Setembro)

    A injuno apresenta-se como um expediente judicial atravs da qual o empresrio

    credor poder obter de forma clere e simplificada ou, o pagamento da sua dvida, ou,

    quando tal no acontea, um ttulo executivo vlido, apresentando-se como uma

    vlvula de escape via contenciosa habitual que consiste numa aco declarativa para

    posterior interposio da aco executiva.

    O processo de injuno encontra-se, no entanto, limitado quanto ao seu mbito de

    aplicao. S poder operar quanto s obrigaes pecunirias emergentes de contratos

    de valor no superior alada do tribunal de 1. instncia ( 3 740,98) ou, desde o

    Decreto-Lei n. 32/2003, de 17 de Fevereiro, quanto s chamadas obrigaes

    emergentes de transaces comerciais e, nestes casos, independentemente do

    montante da dvida.

    Especificando entende-se por transaco comercial qualquer transaco entre empresas

    ou entre empresas e entidades pblicas, qualquer que seja a respectiva natureza, forma

    ou designao, que d origem ao fornecimento de mercadorias ou prestao de

    servios contra uma remunerao.

    O requerimento de injuno apresentado, escolha do credor, na Secretaria do

    Tribunal do lugar do cumprimento da obrigao ou na do domiclio do devedor, que,

    depois de notificado para pagar a quantia pedida, acrescida da taxa de justia paga, ou

    para deduzir oposio pretenso. Nada fazendo, o Secretrio Judicial apor no prprio

    requerimento de injuno a designada frmula executiva, o que lhe conferir a fora

    executiva essencial para a prossecuo da respectiva aco executiva.

    Este regime especial, criado expressamente para facilitar a cobrana de dvidas,

    apresenta-se como uma forma til para o credor obter a satisfao do seu crdito, no

    s pela sua simplicidade e rapidez mas, tambm, pelo seu custo.

    De facto o procedimento injuntivo obedece a um estrutura simples, que corre sempre

    na Secretaria Judicial competente, salvo os casos de oposio execuo, de frustrao

    da notificao do requerido ou quando se suscite alguma questo sujeita a deciso

    judicial. Casos em que se a injuno for de valor superior a 3 740,98 determina-se o

    seu prosseguimento em aco declarativa ordinria ou sumria, se for de valor inferior

    quele montante em aco declarativa especial.

    No que diz respeito ao seu custo, a Injuno pauta-se por no se apresentar

    dispendiosa, fundamentalmente quando confrontada com os outros meios processuais

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    34

  • ao dispor do credor. A taxa de justia a pagar est dependente do valor da prpria

    dvida e nica, salvo nos casos, referidos anteriormente, em que o processo tenha de

    correr fora da secretaria de injuno, casos em que se ter de pagar custas nos termos

    gerais. A esta questo voltaremos mais adiante.

    Para alm das vantagens j apresentadas a obteno de um ttulo executivo por esta

    via apresenta tambm vantagens em sede de execuo de que se destaca a regra da

    penhora sem necessidade de prvio despacho judicial.

    Como referimos anteriormente a Directiva 2003/35 procurou desencadear uma maior

    efectividade da cobrana de dvidas em atraso atravs da previso de que os Estados-

    Membros assegurassem a possibilidade de obter um ttulo executivo vlido,

    independentemente do montante da dvida, em regra no prazo de 90 dias a contar da

    apresentao do requerimento ou petio pelo credor, ao tribunal competente, desde

    que no haja impugnao da dvida ou aspectos processuais.

    O nosso legislador decidiu utilizar para este fim o processo de injuno, regulado pelo

    DL 269/98, de 1 de Setembro, tendo no entanto de introduzir uma modificao

    relevante nos pressupostos processuais respectivos: a eliminao do limite de valor que

    at ento limitava o uso desse processo. Tal limite continua porm a valer para as

    dvidas que no sejam abrangidas pela esfera material do DL 32/2003.

    Esta inovao conduziu, alis, este diploma a introduzir diversas alteraes no regime

    processual da injuno, que seria ocioso estar aqui a referenciar.

    2.2 A DECISO ARBITRAL (Lei 31/86, de 29 de Agosto)

    Nos termos do artigo 48., n. 2 do Cdigo de Processo Civil as decises arbitrais tm a

    mesma fora executiva de uma sentena proferida por Tribunal Comum, o que significa

    que poder servir de fundamento a uma posterior aco executiva.

    O objectivo deste expediente a resoluo de um litgio em Tribunal Arbitral, que

    composto por um ou vrios rbitros, sempre em nmero impar, podendo as partes

    livremente design-los, ou convencionar o modo como sero escolhidos a

    denominada arbitragem ad hoc. Uma outra soluo ser a de confiar a uma entidade

    institucional, um Centro de Arbitragem (regulados pelo Decreto-Lei n425/86 de 27 de

    Dezembro) a organizao e funcionamento do prprio Tribunal Arbitral arbitragem

    institucionalizada.

    A arbitragem voluntria determinada por ambas as partes, ou mediante a insero de

    uma clusula num contrato (clusula compromissria), que as vincula resoluo de

    todos os litgios da emergentes por um Tribunal Arbitral, ou, numa situao de litgio

    actual, ainda que afecto a Tribunal Judicial, por meio de um compromisso arbitral, ou

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    35

  • seja, um acordo entre as partes em litgio. O nico limite que a lei aqui impe o de o

    litgio respeitar, somente, a direitos disponveis, considerando estes como aqueles que

    as partes podem livre dispor.

    Na liberdade das partes encontra-se, tambm, a possibilidade de escolha das prprias

    regras deste processo, tal como, de igual forma, a de determinar qual o critrio

    segundo o qual os rbitros devem julgar, isto , se de acordo com a lei ou segundo a

    equidade.

    O processo arbitral apresenta fortes vantagens, principalmente quando comparado com

    os processos que correm nos Tribunais Judiciais, que so sobejamente conhecidos pela

    sua morosidade na resoluo de um litgio. De facto, estamos perante um expediente

    processual caracterizada pela celeridade, no s pelos curtos prazos que so fixados

    para ser proferida a sentena arbitral, mas tambm pela simplicidade dos seus trmites

    e incidentes processuais, ao que se junta o facto de os prprios rbitros serem

    escolhidos pelas partes e de estar na sua esfera de liberdade a opo por um

    formalismo processual bastante mais aligeirado, podendo elas, ainda, renunciar aos

    recursos, que constituem eles tambm uma das causas da morosidade dos Tribunais

    Judiciais.

    A tudo isto acresce a maior confidencialidade sobre o litgio e forma da sua resoluo,

    vantagem preciosa nos tempos que correm.

    As partes, de qualquer forma, sempre podero recorrer a um Centro de Arbitragem

    que por sua disposio os regulamentos, os meios e o pessoal necessrio e

    adequado realizao da arbitragem, designando os rbitros e assegurando a sua

    competncia tcnica e a sua conduta tica, para alm de fiscalizar a marcha do

    processo, o cumprimento dos prazos e assegurar s partes os custos da arbitragem,

    fixados por tabelas em moldes razoveis.

    3 - ANLISE DA REFORMA DA ACO EXECUTIVA

    O Regulamento (CE) n. 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, que veio

    substituir a Conveno de Bruxelas, de 27 de Setembro de 1968, relativa

    Competncia Judiciria e Execuo de Decises em Matria Civil e Comercial, teve

    como um dos seus objectivos o de simplificar os procedimentos relativos s Execues.

    Na mesma linha, as prprias autoridades europeias, estudam j a viabilidade de

    instituio de um ttulo executivo europeu e, de igual forma, a harmonizao dos

    diversos regimes da penhora de depsitos bancrios.

    Em Portugal, a aco executiva sofreu, desde logo, alteraes com a reviso de 1995-

    1996 do Cdigo de Processo Civil, alargadas, posteriormente, com o Decreto-Lei

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    36

  • 274/97, de 8 de Outubro, que estendeu o mbito do processo sumrio de execuo, e o

    Decreto-Lei 269/98, de 1 de Setembro, que veio reformular o processo de injuno. No

    entanto, sempre se manteve, nas suas linhas gerais, o velho esquema dos actos

    executivos.

    A introduo massificada, nos tribunais, de milhares de aces executivas para

    cobrana de dvidas, resultado do crescimento do consumo pelos particulares, sempre

    estimulados pela facilidade de acesso ao crdito, determinou a impossibilidade de se

    proceder execuo dos crditos em tempo til. De facto, esta consequncia nefasta

    para a administrao da justia traduzia-se, na prtica, como que um prmio ao

    incumprimento.

    A reforma da aco executiva consubstanciada no Decreto-Lei 38/2003, de 8 de Maro,

    visou, fundamentalmente, a simplificao de todo o procedimento executivo, tornando-

    o mais clere. Optou-se por circunscrever a interveno do juiz de execuo aos actos

    de natureza jurisdicional, isto , os inseridos na reserva constitucional de jurisdio,

    nomeadamente nos casos de litgios gerados em sede executiva e carecidos de deciso.

    Desta forma, por exemplo, para os actos materiais da cobrana de uma dvida

    dispensada a sua interveno.

    Esta libertao do juiz de execuo das tarefas processuais que no envolvem uma

    funo jurisdicional levou criao de uma nova personagem na cena judicial

    portuguesa: o agente de execuo, designado por solicitador de execuo.

    Trata-se, no fundo, de fazer penetrar na Justia a ideia de outsourcing, dando azo a

    que as histricas atribuies do aparelho judicirio sejam como que privatizadas numa

    tentativa de satisfazer a prpria economia, no fosse o pontual cumprimento das

    obrigaes e a eficcia e eficincia da sua cobrana forada um dos ndices econmicos

    ponderados na apreciao da competitividade da economia quando se projectam aces

    de investimento.

    No entanto, a interveno do juiz de execuo tem de ser expedita, sob pena de

    comprometer as expectativas do credor e do prprio solicitador de execuo. Por isso, e

    bem, a lei estabelece prazos curtos para a interveno do juiz de execuo4.

    Importa, agora, analisar mais em detalhe o contedo desta reforma, as suas novidades

    e as vantagens, tentando, sempre que necessrio, nunca perder de vista o regime que

    vigorava anteriormente.

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  • 3.1 - A fase da demanda:

    Permite-se, agora, em determinadas circunstncias, que a execuo comece pela

    penhora, sem a prvia citao do devedor, isto , s depois da penhora ser dado ao

    devedor conhecimento completo da execuo que corre contra ele e, ao mesmo tempo,

    ser ele chamado para se defender5, dando-se, desta forma, prioridade penhora.

    Tudo depender, essencialmente, da natureza do ttulo executivo de que o empresrio

    se encontra munido.

    Nas execues intentadas com fundamento numa deciso judicial ou arbitral, ou em

    requerimento de injuno ao qual tenha sido aposta a frmula executria dispensada,

    sem mais, a citao prvia do devedor. J nos casos em que o ttulo executivo consista

    em documento exarado ou autenticado por notrio, ou em documento particular com

    reconhecimento presencial da assinatura do devedor, exige-se, em cumulao, para

    que tal acontea, que o montante da dvida no exceda 14 963,94 e se prove de

    forma documentada a interpelao do devedor. Nos casos em que excede aquele valor,

    que o credor mostre ter exigido o cumprimento da obrigao por notificao judicial

    avulsa6.

    A estes casos acresce a execuo fundada em ttulo de obrigao pecuniria, tal como

    um cheque ou uma letra, desde que essa obrigao esteja vencida, o seu valor no

    exceda 14 963,94 e a penhora no recaa sobre bens imveis, estabelecimento

    comercial ou direito real menor (por exemplo, o usufruto e o direito de superfcie) que

    sobre eles incida ou quinho em patrimnio que os inclua7.

    No entanto, por um lado, a lei impe, em certos casos8, a citao prvia do devedor,

    nomeadamente, quando a execuo tem por fundamento um ttulo extrajudicial de

    emprstimo contrado para aquisio de habitao prpria hipotecada com garantia.

    Por outro lado, a prpria lei dispensa, obrigatoriamente, a citao prvia do devedor

    quando, no registo informtico de execues9 conste a meno da frustrao, total ou

    parcial, de anterior aco executiva movida contra ele, prevendo-se, ainda, a

    possibilidade do juiz dispensar a citao quando o credor mostre justificado receio,

    alegado pelo credor, da perda da garantia patrimonial do seu crdito em divida, tal

    4 Cfr. art. 809. do CPC. 5 Ver, infra, pgs. 40 e seg. 6 Cfr. art. 812.-A, n. 1 e 812.-B, n.1 do CPC. 7 Cfr. art. 812.-A, n. 1, al. d) do CPC. 8 Nas situaes enumeradas no art. 811., n. 7 do CPC. 9 Ver, infra. pgs. 41e seg.

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    38

  • como, pelos mesmos motivos, quando ocorra especial dificuldade em realizar a citao,

    designadamente por ausncia do citando em parte certa10.

    3.2 - Oposio do Devedor:

    A oposio do devedor reveste duas modalidades consoante vise reagir contra a

    execuo (oposio execuo) ou contra a penhora (oposio penhora).

    A oposio execuo corresponde aos antigos embargos de executado, embora agora

    siga sempre a forma sumria11, que se caracteriza por ter uma tramitao mais

    aligeirada e, por isso mesmo, mais clere.

    Interessa distinguir os casos em que a citao do devedor subsequente penhora e

    aqueles em que, pelo contrrio, essa citao prvia ao acto da penhora.

    Sendo citado aps a penhora, o devedor poder cumular a oposio execuo com a,

    eventual, oposio penhora12. Ao invs, quando ele chamado ao processo antes de

    realizada a penhora, a oposio execuo e a oposio penhora constituem meios

    distintos, com prazos diferentes para serem levadas a cabo.

    A oposio penhora permanece com a estrutura que tinha desde a reviso de 1995-

    1996.

    O despacho de recebimento da oposio execuo tem como consequncia, sempre

    que o devedor citado depois da penhora, a suspenso da execuo, sem prejuzo de o

    juiz considerar necessrio o reforo ou substituio da penhora13. Trata-se, do nosso

    ponto de vista, de uma opo arriscada do legislador pois, com toda a certeza, levar

    utilizao da oposio execuo como mero expediente dilatrio, com o escopo de

    diferir o pagamento da dvida pelo devedor.

    J nos casos de citao prvia, o regime anterior mantm-se, uma vez que o

    recebimento da oposio execuo s suspende o prprio processo de execuo se for

    prestada cauo ou quando, invocando o devedor a falsidade da sua assinatura aposta

    em documento particular que sirva de ttulo executivo, apresente documento que

    constitua princpio de prova de que aquela assinatura no genuna14.

    O devedor pode, ao opor-se execuo ou no prazo da oposio penhora, requerer a

    substituio dos bens penhorados por outros ou por cauo idnea, desde que fiquem

    assegurados os fins da execuo15.

    10 Cfr Art. 812.-B, n. 2 a 4 do CPC. 11 Cfr. art. 817., n. 2 do CPC. 12 Cfr. arts. 813., n. 2 e 863.-B, n.1, al. a) do CPC. 13 Cfr. art. 818., n. 2 do CPC. 14 Cfr. art. 818., n. 1 do CPC. 15 Cfr. art. 834., n. 3, al. a) e 5 do CPC.

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  • Novidade a responsabilidade a que o credor se encontra sujeito quando, no havendo

    lugar citao prvia do devedor, procedente a oposio execuo. Tratar-se-,

    ento, de responsabilidade por execuo injusta, que o far incorrer em multa

    correspondente a 10% do valor da execuo, com o valor mnimo de 10 unidades de

    conta e o valor mximo do dobro da taxa de justia, quando no tenha agido com

    prudncia16, para alm da eventual responsabilidade civil pelos danos causados e da

    responsabilidade criminal em que possa tambm incorrer.

    3.3 - A fase da Penhora:

    Neste campo surgiram diversas e importantes novidades.

    Importa comear por dizer que a penhora passa a ser realizada pelo Solicitador de

    execuo17. De forma a facilitar a sua concretizao foi criado o denominado Registo

    Informtico de Execues uma das mais importantes inovaes do novo regime que,

    com muita pena, no foi acompanhado da criao da lista de pessoas sem patrimnio

    conhecido tal como tinha sido proposto no projecto para a reforma que deve por ele

    ser consultado18 antes de dar incio s diligncias dirigidas penhora e que contm,

    entre outros19, os dados relativos identificao do devedor, o rol de processos,

    anteriores ou pendentes, intentados contra ele e o respectivo resultado, os bens

    penhorados, e os crditos reclamados, acompanhados dos respectivos valores e da

    identificao dos respectivos titulares.

    De acordo com as informaes que constem do registo, ou o agente de execuo dar

    incio aos actos preparatrios da penhora de bens, diligenciando no sentido de

    identificar e localizar bens penhorveis ou, nos casos em que contra o devedor est j

    em curso uma outra execuo para pagamento de quantia certa e mediante certos

    requisitos20, requerer secretaria a remessa do processo executivo pelo qual

    responsvel para incorporao na execuo constante da base de dados, o que ter

    uma de duas consequncias: estando a primeira execuo na fase de concurso de

    credores, a segunda execuo valer como reclamao de crditos, caso contrrio,

    constituir-se- uma coligao de credores21.

    16 Cfr. art. 819. do CPC. 17 Ver, infra, pgs. 42, 47 e seg. 18 Cfr. art. 832., n. 2 do CPC. 19 Cfr. art. 806., n. 1, 2 e 4 do CPC. 20 Cfr. art. 832., n. 4 e 5 do CPC Ser titular de direito real de garantia que no seja privilgio creditrio geral sobre bem penhorado na primeira execuo e que no tenha, ainda, sido proferida a sentena de graduao. 21 Cfr. art. 832., n. 3 a 5 do CPC.

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  • De facto, estamos perante um instrumento repleto de virtudes. Para alm de facilitar e

    acelerar todo o procedimento da penhora, o registo informtico de execues, a breve

    trecho, permitir no s evitar que prossigam execues inteis mas, tambm,

    identificar os devedores que no pagam as suas obrigaes, constituindo, assim, um

    instrumento a ter em conta por qualquer empresa na administrao do crdito que

    concede e no acompanhamento das suas relaes comerciais, uma vez que a prpria

    lei a permitir a sua consulta por quem tenha relao contratual ou pr-contratual com o

    titular dos dados ou por quem revele outro interesse atendvel na consulta22.

    A reforma aboliu a figura da nomeao de bens que, regra geral, cabia ao devedor e

    constitua um dos factores que prejudicavam a rpida e efectiva cobrana do crdito.

    Actualmente, inclui-se no mbito das atribuies do Solicitador de execuo a escolha

    dos bens a penhorar23 e s quando no so encontrados bens penhorveis suficientes

    ser notificado o credor para os indicar e, caso este no o faa, o devedor, que ficar

    sujeito a sano pecuniria compulsria que se aplicar se se vier a descobrir que tinha

    bens, tendo omitido declar-lo ou tendo feito declarao falsa24.

    Na escolha dos bens a penhorar est o Solicitador de execuo vinculado a

    determinados limites, nomeadamente, o da penhora se dever cingir aos bens

    necessrios ao pagamento da dvida em causa e das despesas previsveis com a

    execuo e, numa lgica de eficcia, o de dever comear por aqueles cujo valor

    pecunirio seja de mais fcil realizao. Excepo a que permite a penhora, por

    excesso, de bens imveis ou de estabelecimento comercial se, no patrimnio do

    devedor, no se encontrarem bens que permitam o pagamento integral da dvida no

    prazo de seis meses25.

    Daqui se pode retirar a concluso de que a penhora de depsitos bancrios, abonos,

    vencimentos, salrios, rendas, dever preceder a de bens mveis, sujeitos ou no a

    registo, seguindo-se a dos estabelecimentos comerciais, imveis e direitos.

    Neste mbito, salient