histÓria da educaÇÃo fÍsica na bahia: o percurso da
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA - UFBA FACULDADE DE EDUCAO
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO
ROBERTO GONDIM PIRES
HISTRIA DA EDUCAO FSICA NA BAHIA:
O PERCURSO DA FORMAO PROFISSIONAL
SALVADOR 2007
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ROBERTO GONDIM PIRES
HISTRIA DA EDUCAO FSICA NA BAHIA:
O PERCURSO DA FORMAO PROFISSIONAL
Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Educao da Universidade Federal da Bahia, como requisito para obteno do ttulo de Doutor em Educao.
ORIENTADOR: Prof. Dr. Edivaldo Machado Boaventura.
SALVADOR 2007
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Autorizo, exclusivamente para fins acadmicos e cientficos, a reproduo total ou
parcial desta Dissertao por processos fotocopiadores ou eletrnicos.
Ass.: _____________________________ Salvador, 13 de Dezembro de 2007.
P747 Pires, Roberto Gondim Histria da Educao Fsica na Bahia: O percurso da
formao Profissional / Roberto Gondim Pires: Salvador, 2007. 154p.
Tese (Doutorado em Educao)
Universidade Federal da Bahia / Faculdade de Educao. Programa de Ps-Graduao em Educao, 2007. Orientador: Prof. Dr. Edivaldo Machado Boaventura.
1.Histria. 2.Educao Fsica 3.Formao Profissional. I. Ttulo. CDD 796.42
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TERMO DE APROVAO
ROBERTO GONDIM PIRES
HISTRIA DA EDUCAO FSICA NA BAHIA: O PERCURSO DA FORMAO PROFISSIONAL
Tese aprovada como requisito para obteno do ttulo de Doutor em Educao do Curso de Ps-graduao em Educao da Universidade Federal da Bahia, pela seguinte banca
examinadora:
________________________________________________ Edivaldo Machado Boaventura - Orientador
Doutor em Administrao Educacional, Universidade do Estado da Pensilvnia. Universidade Federal da Bahia.
__________________________________________________ Augusto Csar Rios Leiro
Doutor em Educao, Universidade Federal da Bahia (UFBA). Universidade Federal da Bahia.
Universidade do Estado da Bahia.
__________________________________________________ Ivan Lus Novaes
Doutor em Educao, Universidade Shebroke Canad. Universidade do Estado da Bahia (UNEB)
Faculdade Rui Barbosa.
___________________________________________________________ Lino Castellani Filho
Doutor em Educao, Universidade de Campinas UNICAMP Universidade de Campinas
_____________________________________________________________ Sara Martha Dick
Doutora em Educao, Universidade Federal da Bahia UFBA Universidade Federal da Bahia
Salvador, 13 de dezembro de 2007.
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Peo licena s mulheres de minha vida para fazer uma dedicatria aos homens
de minha vida.
A Edvaldo, painho, que partiu no transcurso da elaborao desta tese, sabendo que
esta sensao de vitria que agora sinto com a concluso da mesma teria um significado
diferente para ele. Com toda certeza, ele atribuiria muito mais valor do que em todas as
vitrias que j obtive. Isto porque sua torcida pelo nosso sucesso foi sempre muito grande.
Painho, sei que ests vibrando no cu, pois sabes que tens uma parcela bastante
significativa em minha formao. SAUDADES!!!
A Gabriel, meu filho, meu nego, com toda a certeza a presena mais viva de Deus em
minha vida. Esta minha busca constante de conhecimento precisa significar algo mais do que
produo acadmica, deve apontar condies mais dignas de vida para a tua gerao, TE
AMO!!!
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AGRADECIMENTOS
minha me, mainha, fiz-me em seu colo, fruto das sombras de sua ternura, mas tambm de sua bravura, de mulher e educadora, e da luz do seu sorriso. A voc todas as minhas vitrias.
Vinha, minha esposa, que soube e sabe compreender as exigncias desta atribulada vida acadmica, mas que sempre esteve e est presente trazendo alguns dos elementos necessrios para o bom xito deste trabalho; amor, alegria e amizade.
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, no s pela oportunidade de realizao deste trabalho, mas principalmente por possibilitar-me trilhar esta propalada vida acadmica.
Ao Departamento de Sade da UESB, pois sem dvida minha formao acadmica e continuada est vinculada aos debates e embates propiciados por este rgo.
Ao Programa de Estudos Ps-graduados em Educao da UFBA, pela oportunidade de realizao deste curso de tamanha envergadura.
Ao Prof. Dr. Edivaldo Boaventura, pela dedicao, seriedade e incentivo dado a todos os profissionais de Educao Fsica que tem buscado a possibilidade de ampliar seus conhecimentos, e especialmente pela orientao deste trabalho, e tambm pela sua gentileza e sensibilidade, demonstrando que a produo acadmica pode existir com elementos que dignificam a nossa vida: amor, respeito e honestidade.
A minha amiga Clia Tanajura pela presteza com que sempre me tratou e pelo apoio dispensado no processo seletivo deste curso.
A minha amiga Gleide Magali, pela presena de sua amizade e pelo apoio aos desafios por mim assumidos, desde a Direo do Departamento de Sade da UESB.
Ao Mestre, Professor e grande amigo Bahia, pelo seu carinho, dedicao e incentivo desde a graduao, tudo que dissesse neste momento seria pouco para expressar a minha admirao e gratido pelo que hoje represento.
Ao Prof. Alcir Ferraro, pelo muito que fez pela Educao Fsica na Bahia, e pela total colaborao dada, para que este trabalho se tornasse realidade.
A todos os entrevistados, todos aqueles que no entrevistei, e muitos que nem mesmo sei quem so, mas que tem sua parcela de contribuio na construo da Educao Fsica baiana.
Ndia, secretria do Programa, pela pacincia e carinho com que sempre me tratou.
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A todos os Professores do Programa de Ps-graduao em Educao da UFBA, pelo apoio incondicional.
A Danilo e Kiko, que, na condio de monitor e amigo, foi solidrio e partilhou esse esforo de forma coletiva com muita dignidade e carinho.
Aos meus irmos (Vnia, lvaro, Antnia, Aurlio e Thiago) pelo apoio que deram, de diferentes formas e em diferentes momentos, a realizao deste curso.
A minha mais nova famlia, A DIREC 13, pelo acolhimento e pela possibilidade de materializar alguns dos fundamentos deste curso que ora concluo.
Aos meus amigos Srgio, Jnior, Nanri, Rogrio Tosta, Tmara, Danilo, Edvaldo, Wellington, Ded, Janana pela certeza do apoio.
A famlia Mesquita Mendes pela torcida, admirao e apoio incondicional.
Aos amigos de Salvador, Carla, Dani, Meia, Loura, Luciene, D. Lcia, Tom, pela certeza da torcida e pelo carinho dispensado a minha famlia.
Aos meus colegas do Curso de Educao Fsica da UESB, tenho a certeza que esta ser a primeira de tantas outras Teses de nosso Curso.
Aos professores Csar Leiro e Ivan Novaes pelo apoio dado desde a qualificao deste trabalho.
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RESUMO
A presente pesquisa tem como objetivo principal analisar a trajetria da formao profissional em Educao Fsica na Bahia, procurando recuperar uma das possveis histrias desta rea de conhecimento neste Estado. A razo que nos motivou a mergulhar nesta temtica foi a necessidade de produzir fontes que pelo menos em determinado aspecto, registre e guarde a memria desta rea do saber no Estado da Bahia. A investigao tem como eixo central de discusso perceber as influncias que os Cursos Superiores de Educao Fsica sofreram nas suas implementaes, a que demandas respondiam e sob que objetivos foram idealizados, assim como, de que forma se articularam na organizao e desenvolvimento da Educao Fsica na Bahia. Com o fim de analisar a trajetria da Formao Profissional da Educao Fsica na Bahia, buscamos, a partir de uma opo metodolgica pautada na pesquisa histrica, utilizar fontes documentais, alm de realizar entrevistas com atores desta temtica, visando promover relaes mais estreitas entre a memria dos entrevistados com outras fontes documentais. Por fim, procuramos sistematizar informaes que de alguma forma preencham as lacunas existentes na Histria da Educao brasileira e, por conseqncia, existentes tambm na Histria da Educao baiana e da Educao Fsica brasileira e baiana. Foi possvel perceber a existncia de trs perodos distintos no percusso da Formao profissional da rea, quais sejam: O Curso da Universidade Catlica como irradior da Formao em Educao Fsica na Bahia, a partir de um referencial especifico de formao; o Curso da Universidade Federal da Bahia como um instrumento de mudana no perfil da formao e os Cursos das Universidades Estaduais como responsveis pela interiorizao do processo de formao em Educao Fsica na Bahia.
Palavras chave: Histria, Educao Fsica, Formao Profissional.
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ABSTRACT
The present research has the main objective to analyze the trajectory of the professional formation in Physical Education in the Bahia, being looked for recoupong one of possible histories of this area of knowledge in this State. The reason that motivated us to dive in this thematic one was the necessity to produce sources that at least in determined aspect, register and keep the memory of this area of knowing in the State of the Bahia. The intended inquiry has as central axle of quarrel to perceive the influences that the Superior Courses of Physical Education in the Bahia had suffered in its implementations, the one that demands answered and under that objective had been idealized, as well as, of that forms if they had articulated in the organization and development of the Physical Education in the Bahia. With the purpose to analyze the trajectory of the Professional Formation of the Physical Education in the Bahia, we will search for, from a methodology option in the historical research, to use documentary sources, besides carrying through interviews with actors of this thematic one, aiming at to promote narrower relations between the memory of the interviewed ones and other documentary sources. Finally, we wait to systemize informations that of some form also fill in the existing gaps in the History of Brazilian Education and, for consequence, existing in the History of the bahian Education and the Brazilian and bahian Physical Education. It was possible to perceive the existence of three distinct periods in the way of the professional formation of this area, which are: The Course of the Catholic University as the first institution of the Formation in Physical Education in the State of Bahia, with a referencial specify of formation; the Course of the Federal University of the Bahia as an instrument of change in the profile of the formations process and the Courses of the State Universities as responsible for the internalization of the process of formation in Physical Education in Bahia.
Key-words: History, Physical Education, Professional Formation.
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SUMRIO
TESE UM MOMENTO DE VIDA ................................................................................. 10
CAPTULO 1 A CONSTRUO SOCIAL DO OBJETO DE ESTUDO ........................................... 16 1.1 DELIMITAO DO PROBLEMA E OBJETIVO DO ESTUDO .............................. 16 1.2 A JUSTIFICATIVA DO ESTUDO .............................................................................
18 1.3 PESQUISA HISTRICA E EDUCAO FSICA . .................................................. 20 1.4 OPO METODOLGICA ....................................................................................... 25 1.5 ESTRUTURA DA TESE ............................................................................................. 31
CAPTULO 2 FORMAO PROFISSIONAL EM EDUCAO FSICA NO BRASIL ................ 33 2.1 ANTECEDENTES 33 2.2 AS PRIMEIRAS ESCOLAS DE EDUCAO FSICA DO BRASIL ...................... 38 2.3 A ESCOLA PADRO ................................................................................................. 41 2.4 A REVISO DO CURRCULO EM EDUCAO FSICA ...................................... 45 2.5 A HORA E VEZ DO CURRCULO MNIMO ........................................................... 46 2.6 LICENCIATURA E BACHARELADO....................................................................... 48 2.7 AS ATUAIS DIRETRIZES CURRICULARES .......................................................... 50 2.8 A ARENA DE CONFLITOS ....................................................................................... 51
CAPTULO 3 FORMAO PROFISSIONAL EM EDUCAO FSICA NA BAHIA .................. 56 3.1 ANTECEDENTES ....................................................................................................... 57 3.2 PROJETOS DE CURSOS DE EDUCAO FSICA ................................................. 63 3.3 O PRIMEIRO CURSO DE EDUCAO FSICA DA BAHIA ................................. 66
CAPTULO 4 O CURSO DE EDUCAO FSICA DA UFBA .......................................................... 79 4.1 DA HISTRIA CONTADA AO INCIO DA HISTRIA ......................................... 79 4.2 CONQUISTA HISTRICA COM DESENCONTROS PEDAGGICOS ................. 88
CAPTULO 5 A EXPANSO DO ENSINO DA EDUCAO FSICA NA BAHIA .........................
99 5.1 A INTERIORIZAO DO ENSINO DA EDUCAO FSICA NA BAHIA: DESTAQUE AO PAPEL DA UNIVERSIDADES ESTADUAIS BAIANAS ................. 100
EPLOGO...........................................................................................................................
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REFERNCIAS ................................................................................................................
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APNDICES ..................................................................................................................... 115
ANEXOS ............................................................................................................................
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TESE UM MOMENTO DE VIDA
Toda pessoa sempre a marca das lies dirias de outras tantas pessoas
Gonzaguinha
Ningum nasce feito: experimentando-nos no mundo que nos fazemos Paulo Freire
Trazer no primeiro momento deste trabalho um pensamento do professor Paulo Freire,
no por acaso, sem dvida acreditar que no se pode separar o homem do mundo e como
ele mesmo diz: A histria no existe s no homem ou s no mundo. A histria no existe
sem os dois: homem e mundo .
O autor nos diz ainda que a histria no pode existir sem o homem e o mundo porque,
na sua viso, a histria no um processo mecanicista no qual os homens so meras
incidncias dos fatos nem o resultado de puras idias de alguns homens forjados em sua
conscincia. Pelo contrrio, a histria, como tempo dos acontecimentos humanos, feita pelos
homens ao mesmo tempo em que os homens se vo fazendo nela. Essas reflexes sugeridas
pelo professor Paulo Freire foram fundamentais para a minha opo de iniciar este estudo
contando um pouco da minha trajetria no mundo da educao. Trazendo as dialogizaes
dialticas estabelecidas entre o homem e a realidade, que segundo ele: o conhecimento pouco
a pouco, vai levando o homem a perceber a realidade nas suas diversas formas solidariamente.
Justificada a opo por essa forma de apresentao do trabalho e de onde partiu
historicamente toda a minha inquietao, fruto da minha conscincia de ser incompleto e
inconcluso, convido o leitor a uma rpida imerso na trajetria dessa incompletude, na nsia
de saber: quem eu sou? De onde venho? Como cheguei at aqui? Onde posso chegar?
A idia de discutir a Histria da Educao Fsica na Bahia e as tramas que subjazem a
esse processo, refletindo diretamente na constituio do seu campo neste Estado, surge, no
bojo de discusses desenvolvidas desde a graduao, mas fundamentalmente durante a minha
investigao de Mestrado, na Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo (PUC/SP), no
Programa de Ps-Graduao em Histria, Poltica e Sociedade.
Neste sentido, cumpre-me a difcil tarefa de apresentar em algumas laudas, minha
trajetria acadmico/profissional, algo que por certo demandou no s sacrifcios, desafios,
indecises e incertezas, mas tambm ganhos e vitrias.
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Realizei meu curso de graduao na Universidade Federal da Bahia - UFBA, onde
cursei Licenciatura Plena em Educao Fsica entre os anos de 1990 a 1994. Na verdade, a
iniciativa de buscar um curso como Educao Fsica, deu-se por uma vivncia desportiva
anterior. At ento, meu objetivo principal era perceber e aprender no curso as mais variadas
tcnicas e tticas dos desportos, alm de fundamentar-me sobre os elementos constitutivos da
preparao fsica; com isso, pensava eu, estaria habilitado a ser um bom tcnico desportivo.
Para a minha felicidade e tambm dos meus alunos, encontrei no Curso de Educao
Fsica da UFBA aquilo que no fui buscar. Comecei a ter a compreenso do movimento para
alm do gesto motor e entender as discusses que envolvem a cultura corporal do movimento.
Importante sublinhar que o perodo de minha graduao caracterizou-se pelos debates
freqentes da rea, possibilitados inclusive pelas produes acadmicas que questionavam
mais veementemente o eixo paradigmtico da atividade fsica (Taffarel, Castellani, Medina,
Giraldelli, Apolnio, entre outros).
Durante a minha graduao, procurei ter vrias experincias em estgios no
curriculares nas mais diversas reas (clubes, academias, avaliao funcional, eventos
esportivos, escolas de ensino fundamental e mdio, entre outros), buscando descartar aquelas
reas com as quais no me identificava e no eram condizentes com o meu projeto histrico,
mais pela experincia e no pelo preconceito.
Aps a concluso do meu curso de graduao retornei para Jequi com vrios projetos
e idias que no chegaram a bom termo, um pouco pela resistncia daqueles que atuavam e
atuam na rea da Educao Fsica da cidade e regio, outro tanto pela inexperincia e
imaturidade daquele que quis fazer revoluo por um dia . Atuei no ano de 1995 no Centro
Educacional Ministro Spnola - escola particular de ensino fundamental e mdio e em
escolinhas desportivas no Ginsio de Esporte estadual, alm de trabalhar com avaliao
funcional em academia.
No ano de 1996, recebi um convite para retornar a Salvador e trabalhar no Colgio
Sartre. Vi neste convite uma oportunidade de aproximar-me novamente da Universidade, no
sentido de burilar meus projetos, buscando outras formas de implement-los. Aceitei de
pronto o convite, retornei a Salvador, tive uma nova aproximao com a UFBA. Nesta poca,
tive a oportunidade de passar na seleo para professor substituto da Escola Tcnica Federal
da Bahia, onde atuei por seis meses.
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No mesmo ano de 1996, foi aberto o edital de Concurso Pblico para professor
auxiliar para Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB)
Campus de Jequi.
Como j estava convencido de que o meu projeto profissional era para ser desenvolvido em
Jequi, pois desejava servir ao meu torro, no tive dvidas, inscrevi-me, preparei-me e
participei do processo, obtendo aprovao e, em julho de 1996, tive a honra de ser convocado
pela UESB para integrar o seu quadro de docentes.
Sou professor da UESB h onze anos. Sempre em regime de dedicao exclusiva, o
que significa dizer, que neste perodo dediquei a integralidade de minha capacidade
profissional exclusivamente Universidade pblica, procurando cumprir rigorosamente o
papel que entendo ser inerente e inalienvel figura do professor de ensino superior.
Pois bem, ingressei na UESB com a funo de ministrar as disciplinas de prtica
desportiva (na poca obrigatria para todos os cursos de graduao), tinha plena conscincia
do que motivara a sua implementao nas universidades brasileiras a partir da Reforma
Universitria de 1968: desmobilizao dos estudantes; e via a uma grande oportunidade de
caminhar na contramo dos objetivos elencados em 1968.
No ano de 1997 foi implantado o curso de Licenciatura Plena em Educao Fsica da
UESB, fui vice-coordenador da equipe de implantao e posteriormente vice-coordenador do
Colegiado de Curso, ao tempo em que, junto com outros atores, pensvamos e
materializvamos o primeiro curso de especializao em Educao Fsica em uma
Universidade pblica.
Ao longo da existncia do Curso de Licenciatura Plena de Educao Fsica da UESB,
ministrei disciplinas ligadas rea da Histria e do Lazer, assim como, disciplinas ligadas s
pesquisas de final de curso dos discentes. Neste sentido, lecionei as seguintes disciplinas:
Histria da Educao Fsica, Metodologia do Voleibol, Recreao e Lazer, Estgio
Supervisionado III (Lazer), Seminrio I e Seminrio II. Dentre as principais atividades,
gostaria de destacar as aes de pesquisa desenvolvidas na disciplina Recreao e Lazer que
culminou com dois trabalhos: um realizado no Conjunto Penal de Jequi e outro em trs
prostbulos desta cidade, cujos resumos foram apresentados no Encontro Nacional de
Recreao e Lazer em Natal (RN) e as aes desenvolvidas na disciplina Estgio
Supervisionado III, onde realizamos um estgio de vivncia no assentamento do Movimento
dos Sem Terra, MST, em Vitria da Conquista/BA (Amaralina), cujo resultado tambm
culminou com uma publicao nos anais do I Congresso Brasileiro de Extenso Universitria
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em Joo Pessoa, no ano de 2002, sob o ttulo Assentando o lazer: o estgio supervisionado
de lazer como uma forma de atividade de extenso .
Tive a honra (SIM, isso muito me honra) de algumas vezes merecer o convite e ser
homenageado por formandos em Educao Fsica e Fisioterapia como paraninfo e como
patrono das turmas. Parece-me ser uma das homenagens das mais significativas, pois
representa um reconhecimento pelo nosso compromisso com os alunos, com a rea e com a
Universidade.
Em julho de 1998, concorri a uma vaga no Curso de Mestrado Interinstitucional em
Educao que foi realizado por meio de convnio assinado entre UESB/PUC-SP, a fim de
investigar aspectos mais aprofundados sobre a histria da Educao Fsica na Bahia, j que
neste Estado quase no h estudos histricos relativos Educao Fsica, e isso, sem dvida,
parecia-me uma grande lacuna.
Os meus estudos de Mestrado, realizados entre agosto de 1998 a dezembro de 2000,
possibilitaram-me fazer um estudo histrico da Educao Fsica na Bahia, com a dissertao
sob o ttulo: A Influncia da Escola Nacional de Educao Fsica e Desportos (Rio de
Janeiro) no desenvolvimento da Educao Fsica da Bahia, dcadas de 1940
1970.
importante que se diga que no existiu de nossa parte a pretenso de reconstruir
exaustivamente uma trajetria, ou muito menos de esgotar as possibilidades de escrita da
histria sobre o assunto (alis, misso quase impossvel). O intuito do trabalho no foi o de
contar A histria da Educao Fsica na Bahia, mas, perceber mudanas, diferenas e
continuidade nos discursos e na prtica no tocante a influncia da Escola Nacional de
Educao Fsica e Desportos (ENEFD) na Bahia, bem como procuramos analisar
acontecimentos que marcaram uma poca e contriburam para outros acontecimentos
representativos posteriores.
medida que me aproximava das referncias tericas do Curso de Mestrado, ia tendo
a noo exata de que debater histria no estabelecer certezas, mas , sobretudo, reduzir o
campo das incertezas, no dizer tudo sobre uma determinada realidade ou objeto, mas
explicar o que nesses fundamental, pois todas as nossas concluses devem ser entendidas
como provisrias, pois podem ser aprofundadas e revistas por trabalhos posteriores.
Enfim, comeava a perceber que o estudo que debruce sobre a histria deve passar por
uma compreenso de que estamos a falar dos homens e das mulheres e suas construes
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sociais, da sua atuao na sociedade, compreender antes de tudo que o homem e a mulher teve
e tem uma atuao concreta.
Aps a concluso dos crditos tericos do Curso de Mestrado realizados em So
Paulo, retornei Bahia, Jequi, e a pedido dos meus pares assumi a Coordenao do
Colegiado do Curso de Educao Fsica da UESB, e como marca da gesto destacamos a
elaborao do processo que em 13 de junho de 2003 redundou no reconhecimento do Curso
pelo Conselho Estadual de Educao. Implementamos outras aes frente do Colegiado
como: elaborao do projeto do primeiro Curso de Especializao em Educao Fsica em
Universidade pblica da Bahia, com consultoria do professor Fernando Reis do Esprito Santo
(UFBA); aprovamos e desenvolvemos um projeto de pesquisa institucional sob o ttulo: O
Curso de Licenciatura Plena em Educao Fsica da UESB: perspectivas para a reformulao
curricular. Na verdade, tratou-se de uma pesquisa-ao que procurou contemplar a
participao de todos que direta ou indiretamente esto envolvidos com o curso. Esta
pesquisa, sem dvida, continua dando as bases para pensarmos a reforma curricular do nosso
curso.
Estivemos envolvidos tambm, ao longo de nossa trajetria na UESB, com Projetos de
Extenso Institucional, coordenando treze desses projetos. Orientei e oriento monografias de
final de curso de graduao e ps-graduao, especificamente nas reas da Histria e do
Lazer; participo regularmente dos encontros cientficos da rea, mantendo regularidade de
publicao em peridicos; procuramos participar dos programas de bolsas de monitorias
institucionais, possibilitando desta forma aos alunos uma vivncia acadmica na perspectiva
do ensino; participamos do Curso de Especializao em Metodologia do Ensino de Educao
Fsica, no qual procuramos investigar as relaes entre o Lazer e a Formao Profissional na
Bahia; estamos vinculados a dois grupos de pesquisa no CNPq sendo um dos grupos na linha
da Educao.
No ano de 2000, participei ativamente da greve geral dos professores das
universidades estaduais e, em dezembro daquele mesmo ano, fui eleito Diretor Sindical da
Associao de Docentes da UESB, para o binio 2000/2002, estes anos no s foram
importantes como necessrios para a minha compreenso geral do movimento docente, e suas
formas de articulao interna e externa. Notadamente destacaramos a nossa participao na
articulao feita para elaborao do novo Estatuto do Magistrio Superior da Bahia.
Ocupei o to honroso como desafiador cargo de Diretor do Departamento de Sade da
UESB, maior Colegiado setorial da UESB, espao que no momento contava com 103
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professores, 03 cursos de graduao (Enfermagem, Fisioterapia e Educao Fsica), 13
projetos de pesquisa institucional, 14 projetos de extenso, 01 PQI
Programa de
Qualificao Institucional
UESB/ Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC e 03
Cursos de Especializao dentre outras atividades.
Em plena elaborao desta Tese e com a mudana do governo Estadual, rompendo um
perodo, a nosso juzo, de descaso e desmando, sobretudo na educao, um novo desafio se
apresentou para mim, nada mais, nada menos, do que ser convidado a assumir a Diretoria
Regional de Educao com sede no municpio de Jequi, Diretoria esta que comporta vinte e
cinco municpios em sua jurisdio e aglutina setenta e oito escola sob sua responsabilidade, a
tarefa sem dvida rdua, mas o desejo de realizao ainda maior.
Termino essa apresentao com a impresso de que ela tem um ar de memorial, mas
acho que no poderia ser outra a inteno do que me move a fazer essa pesquisa. Ao reler essa
apresentao ou memorial como queiram, sinto que este estudo guarda coerncia com a minha
trajetria acadmica e profissional fazendo uma interface com a minha histria de vida que
certamente teve um papel fundamental no que constru at agora, e no que se apresenta para
amanh ou depois de amanh. Espero. Afinal continuo acreditando que ningum nasce
feito .
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CAPTULO 1
A CONSTRUO SOCIAL DO OBJETO DE ESTUDO
1.1 DELIMITAO DO PROBLEMA E OBJETIVO DO ESTUDO
Este estudo insere-se no Programa de Pesquisa e Ps-Graduao em Educao, em
nvel de Doutorado, da Universidade Federal da Bahia, tendo como campo de pesquisa:
histria da Educao Fsica na Bahia; histria de instituio de nvel superior; histria da
disciplina e formao profissional. Traz no seu bojo a perspectiva de contribuir com a
pesquisa histrica da Educao Fsica brasileira, mais especificamente no Estado da Bahia,
entendendo a relevncia que possui para esta rea de conhecimento e particularmente para o
desenvolvimento da historiografia da Educao Fsica brasileira. Dando, assim, continuidade
aos estudos j iniciados no mestrado em Educao, cuja temtica se assemelha e se prolonga,
do ponto de vista temporal.
A presente pesquisa pretende fazer um estudo histrico da Educao Fsica na Bahia,
com recorte temporal da dcada de 1970 at os dias atuais (2006), perodo de existncia de
Cursos Superiores de Educao Fsica na Bahia. Ademais, embora o perodo proposto para o
estudo possa parecer largo e amplo, no existe de nossa parte a pretenso de reconstruir
exaustivamente uma trajetria, ou muito menos de esgotar as possibilidades de escrita da
histria sobre o assunto.
Portanto, a pesquisa tem em sua essncia, alm da necessidade de identificar a
trajetria da Formao Profissional em Educao Fsica na Bahia, a insero de outras vozes,
de outros atores e autores na historiografia local, tendo como ponto de partida a participao
direta ou indireta em momentos que conduziram e produziram uma viso sobre esse assunto.
Neste sentido, o problema central desta pesquisa : Qual a trajetria da formao
profissional em Educao Fsica na Bahia?
Desse modo, o intuito deste trabalho no o de contar a histria da Educao Fsica na
Bahia, mas sim de examinar certos aspectos que nos animam no momento; enfim, este estudo
tem como objetivo conhecer e analisar a trajetria da formao profissional em Educao
Fsica na Bahia.
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Saliento inicialmente que debater histria no estabelecer certezas, mas sobretudo,
reduzir o campo das incertezas, no dizer tudo sobre uma determinada realidade ou objeto,
mas explicar o que nesses fundamental, pois todas as nossas concluses devem ser
consideradas como provisrias, porque podem ser aprofundadas e revistas por trabalhos
posteriores. Enfim, precisamos acreditar e saber que a histria ao mesmo tempo que nos ajuda
a explicar a realidade, pode nos ajudar a transform-la.
Portanto debruar sobre o estudo histrico ter uma preocupao explcita com a
verdade, pois, como afirma Borges (1993), desde que um homem ou mulher assumem atitude
de historiador ou historiadora, tem que esquecer todas as consideraes, como o amor aos
amigos e o dio aos inimigos, pois a histria da qual foi retirada a verdade nada mais do que
um conto sem proveito.
Neste sentido, defendemos a idia que a compreenso de histria deve estar vinculada
a percepo de falar dos homens e mulheres e suas construes sociais, da sua atuao na
sociedade, compreender antes de tudo que o homem e a mulher teve/tem uma atuao
concreta. Desta forma, concordamos com Certeau (2000) quando ele afirma que a histria
deve ser uma prtica social e que, devem ser condenados as posies que, confundem cincia
histrica e empenho poltico, legtimo observar que a leitura da histria do mundo se
articula sobre a vontade de transform-lo. Enfim a histria deve ser uma cincia da mutao e
da explicao da mudana.
Assim, pretendemos analisar, luz das fontes documentais disponveis, bem como dos
Depoimentos dos professores e dirigentes de Cursos Superiores de Educao Fsica na Bahia
os ambientes em que os referidos cursos foram implementados, destacando as aes mais
efetivas na implementao de projetos definidores na organizao e reorganizao das
diretrizes de polticas de Educao Fsica, Esporte e Lazer para o Estado da Bahia, bem como
a que demandas respondiam.
Enfim, esperamos ampliar o espectro de compreenso acerca dos interesses, motivos,
mbitos determinantes das mudanas de eixo na formao profissional em Educao Fsica na
Bahia. Colocamo-nos o desafio de reconstruir uma das possveis histrias da Educao Fsica
baiana, pois entendemos que, para a melhor compreenso de nosso momento atual, faz-se
mister o estudo e a compreenso da sua gnese, a busca de nossas razes.
O estudo de Pires (2001), o qual trataremos a seguir, de alguma forma desvela a forte
influncia sofrida pela primeira Escola de Educao Fsica da Bahia, Universidade Catlica
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do Salvador, pela Escola Nacional de Educao Fsica e Desportos (ENEFD) primeira Escola
de Educao Fsica civil do Brasil vinculada uma Universidade, Universidade do Brasil,
contudo criada sob a influncia e ambiente militar. Essa Escola (ENEFD) desempenhou um
determinante papel na formao profissional da Educao Fsica brasileira, sendo na poca
considerada como Escola Padro da Educao Fsica no Brasil. A ENEFD interferia
diretamente em seus alunos, muitos dos quais na qualidade de bolsistas, que, ao voltarem aos
seus Estados, divulgaram o conhecimento adquirido e auxiliaram na organizao da Educao
Fsica.
Pires (2001, p.78) conclui seu trabalho dizendo: a influncia da ENEFD na
organizao e desenvolvimento na Educao Fsica baiana foi marcante e est identificada.
Agora, se tudo isto ainda est refletido na prtica assunto para outras pesquisas .
Continuamos a acreditar que existem outras histrias, outros sujeitos, outros atores e
autores dentro de nossa temtica, que ainda esto ocultos dentro desta historiografia ou
passam desapercebidos como coadjuvantes.
Enfim, avaliamos que muito se tem a fazer e a sistematizar sobre a histria da
Educao Fsica na Bahia, e, sob meu olhar, este estudo, no encerra nada, ele talvez inaugure
uma possibilidade de se fazer outras investigaes, que discuta, estas e outras questes em
sentidos diversos.
1.2 A JUSTIFICATIVA DO ESTUDO
A pesquisa histrica na Educao Fsica brasileira tem experimentado, nos ltimos
anos, algo que at bem pouco tempo atrs era difcil de se imaginar. Observa-se hoje, tanto
quantitativa, quanto qualitativamente, um volume de produes das mais diferentes temticas
e das mais variadas localidades.
Acreditamos que este salto, que por assim dizer, a Educao Fsica realizou, foi muito
por conta do quadro que comeou a se configurar na dcada de 1980. Escrever sobre histria
da Educao Fsica no Brasil torna-se um mecanismo e um meio de refletir sobre as prticas
elaboradas no passado, sugerindo novas propostas de atuao profissional no presente. Este
perodo foi marcante sobretudo em funo da dita abertura democrtica, e em funo disso foi
um perodo assinalado pelo desenvolvimento de pesquisa em Histria da Educao, o que
garantiu Histria uma maior importncia para a rea.
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Na perspectiva de discusso e elaborao de novas prticas de atuao profissional, j
foram realizados vrios Encontros Nacionais especficos e lanados vrios volumes do livro:
Pesquisa histrica na Educao Fsica brasileira, uma importante obra que, segundo seu
organizador, Ferreira Neto (1996), oferece em seu conjunto um panorama da pesquisa
histrica no que se refere a objetos, orientaes tericas, fontes, periodizao; reunindo num
mesmo espao, parte da produo mais relevante da pesquisa histrica da Educao Fsica
brasileira.
Infelizmente essa preocupao relativa histria da Educao Fsica, refletida
diretamente no aumento da produo cientfica e nas aes acima levantadas, parece no
encontrar muito eco na Bahia, Estado que comporta atualmente vinte e trs cursos de
formao de professores, mas que no tem privilegiado estudos do ponto de vista histrico.
Estes dados por si s justificam a importncia e relevncia deste estudo, pois, sobretudo,
objetiva diminuir a lacuna existente na Histria da Educao e da Educao Fsica brasileira e
baiana.
A nica obra que trata o assunto no Estado da Bahia at o ano de 2001 a de autoria
de Alcyr Naidiro Fraga Ferraro, A Educao Fsica na Bahia: memrias de um professor,
publicada no ano de 1991 pelo Centro Editorial e Didtico da Universidade Federal da Bahia.
Essa obra, embora importante, necessita de outros estudos que discutam seus assuntos em
sentidos diversos, porque no garante rigor metodolgico de uma pesquisa histrica. Isso de
alguma forma deixa uma lacuna no sentido de no preencher as necessidades da demanda
oriunda dos cursos de formao que temos atualmente na Bahia.
A outra obra a dissertao de mestrado de Roberto Gondim Pires (2001) onde o
autor procura fazer um estudo histrico da Educao Fsica na Bahia, com recorte temporal
entre as dcadas de 1940 a 1970, conforme foi descrito anteriormente. A problemtica central
do estudo foi identificar a influncia da ento escola padro da Educao Fsica brasileira,
ENEFD, na organizao e desenvolvimento da Educao Fsica no Estado da Bahia.
A carncia literria a respeito da histria da Educao Fsica na Bahia, bem como a
inexistncia de arquivos acessveis e organizados, documentos e registros que retratem e que
de alguma forma preserve a memria desta rea de saber em nosso Estado, levaram-nos a
mergulhar neste tema. No temos a inteno, em momento algum, de escrever a histria
definitiva. Temos a clareza de que precisaremos de outros estudos que discutam tal histria
em sentidos diversos. Nossa pretenso fundamental a de proceder uma discusso adequada
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dentro das caractersticas adotadas: uma possvel interpretao histrica traada a partir das
fontes elencadas.
Na verdade, estas nossas modestas reflexes encaminham para outras anlises, talvez
mais aprofundadas da pesquisa histrica, ou seja, porque no se faz pesquisa histrica sobre
Educao Fsica na Bahia? Onde estaro as causas? Na Formao Acadmica? Por que os
pesquisadores no acham importante? O campo de estudos muito rido e complexo?
Porm, acreditamos que quase tudo est por fazer e tudo possvel. J no cedo para
pesquisar sobre a histria da Educao Fsica na Bahia, histria esta que precisa ser
documentada, com os autores e sujeitos sociais que a construram a partir de suas aes.
Segundo Carr (1996) o passado que devemos estudar no um passado morto, mas um
passado que ainda est vivo no presente. Assim se o passado tem determinada relao com a
compreenso do presente, o presente tambm apresenta parmetros, inferncias e injunes
que balizam nossa ida ao passado.
Parafraseando Vieira (1998), fazer histria como conhecimento portanto, recuperar a
ao dos diferentes grupos que nela atuam, procurando entender os seus papis numa
sociedade que se quer homognea, mas que na verdade totalmente heterognea.
Enfim, temos a perspectiva de fazer uma pesquisa de base, esperamos tambm com
este estudo estar contribuindo mais uma vez com a realizao de um desejo e um sonho do
professor Alcyr Ferraro que teve a preocupao inicial de escrever sobre a histria da
Educao Fsica baiana, satisfazendo o que ele expressou em uma das passagens de seu livro:
"se este livro puder servir de ponto de partida para as pesquisas e estudos sobre a Educao
Fsica em nosso Estado, ter alcanado seu objetivo . (1991, p.15)
1.3 PESQUISA HISTRICA E EDUCAO FSICA
Nos ltimos anos, tem sido possvel notar um significativo aumento nas produes
relativas histria no mbito da Educao Fsica brasileira. Depois de um longo perodo,
nutrindo-se exclusivamente dos estudos de Fernando de Azevedo e de Inezil Penna Marinho,
estudiosos pioneiros da histria da Educao Fsica e do Esporte no Brasil, verifica-se a partir
da dcada de 1980 um crescente nmero de iniciativas ligadas a essa temtica.
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Segundo Victor Mello (1999) a histria da pesquisa histrica da Educao Fsica no
Brasil pode ser classificada em trs fases.
Na primeira fase podemos considerar que
[...] a produo nacional era pequena, a utilizao de livros importados era notvel. Destacam-se os livros de Laurentino Lopes Bonorino e colaboradores (1931), primeira publicao especfica do gnero escrita no Brasil, e as contribuies de Fernando de Azevedo. (MELO,1999, p. 33).
Mello (1999) aponta que a influncia desta fase impregnar os estudos futuros:
[...] a utilizao bem restrita de fontes; um carter militante, a histria servindo para provar e legitimar algo j previamente estabelecido irreversivelmente; a preocupao central exacerbada com o levantamento de datas, nomes e fatos; uma histria pautada nica e exclusivamente na experincia de grandes expoentes; uma histria que no busca uma periodizao interna, preferindo se vincular a periodizao poltica geral; uma histria traada superficialmente em longos perodos. (p.34).
O prprio conceito de histria busca origens da evoluo da Educao Fsica, dentro
de uma viso dos acontecimentos histricos que, encarados como um progresso linear, servem
para legitimar e explicar plenamente o presente.
A segunda fase, como afirma Mello (1999), marcada pelo incio de uma produo e
preocupao maior com os estudos histricos, tanto nos aspectos qualitativos quanto nos
quantitativos (p.35).
Destaca-se neste perodo a obra de Inezil Penna Marinho, que para Mello (1999) se
constitui num dos maiores, seno o maior, estudioso da histria da educao fsica e do
esporte no Brasil (p.35). A obra de Marinho citado por MELLO (1999) um exemplo de
estudo histrico bem desenvolvido nos padres da histria documental-factual (p.35), rompe
com a fase anterior principalmente na sua compreenso terica e metodolgica. Conforme
Mello (1999) o que diferencia substancialmente a obra de Marinho da fase anterior :
[...] sua preocupao central com a histria da Educao Fsica e do Esporte no Brasil, at ento pouco abordada em estudos que preferiam uma abordagem mundial mais ampla; e passam pela sua incrvel erudio e preparao terica, que o leva, por exemplo, a utilizao de fontes mais diversificadas: leis, teses da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro e de Pernambuco (alm da Faculdade de Direito), livros pioneiros relacionados rea de Educao Fsica e Esporte, smulas e resultados de competies esportivas, jornais e outros peridicos, livros sobre a Histria do Brasil, entre outras. (p. 36).
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Contudo, de acordo com Mello (1999) a obra de Marinho no rompe decisivamente
com a fase anterior:
[...] a periodizao ainda exterior ao objeto de estudo, isto , ligada a periodizao poltica nacional; suas obras ainda so um levantamento de datas, fatos e nomes, apresentados seqencialmente, ano aps ano, sem uma preocupao maior com a anlise crtica deste material; continua a apresentar uma "histria oficial", onde os grandes expoentes recebem lugar de privilgio absoluto. (p.36).
Por conta destas similaridades, Marinho foi alvo de severas crticas por alguns
estudiosos que detinham uma outra compreenso terica. Entretanto, poucos foram os que
buscaram conhecer profundamente a vida e obra de Inezil Penna Marinho, preferindo
construir suas crticas em cima de um nico livro, que era na verdade um resumo de outra
obra de quatro volumes" (MELLO,1999, p.36).
Os seus artigos e discursos publicados nos arquivos da ENEFD esto, segundo Mello
(1999), entre suas obras mais marcantes no campo da Histria (p.37) ... Seu discurso por
ocasio de sua posse como catedrtico da cadeira de Histria e Organizao da Educao
Fsica e Desporto da ENEFD (1958) e tambm o discurso de paraninfo das turmas da ENEFD
de 1953 (p.37). Foram muito marcantes e esclarecedores:
O importante no estudo da histria, no a memorizao de fatos e datas, no a fixao daquilo que os compndios formalizam e, algumas vezes, at padronizam. Como professor de histria desejo suscitar em meus alunos o interesse que os leve investigao dos fatos, ao aproveitamento das experincias por outros povos, interpretao consciente dos dados oferecidos sua razo . (MARINHO,1958 apud MELLO, 1996, p.37-38).
A terceira fase da pesquisa histrica da Educao Fsica brasileira para Mello (1999)
caracterizada pela mudana das caractersticas dos estudos at ento desenvolvidos, a partir,
fundamentalmente, da crtica obra de Inezil Penna Marinho e como pano de fundo de uma
inspirao terica marxista (p.39). Neste sentido destaca-se o estudo: Educao Fsica no
Brasil: a histria que no se conta, de Lino Castellani Filho, publicado no ano de 1988, hoje
ainda, uma das obras mais lidas em nossa rea. importante destacar e neste sentido
contextualizar, que esta obra surge bastante influenciada pelas discusses peculiares
Educao Fsica da dcada de 1980, portanto muito preocupada em fazer uma crtica
ideolgica necessria da Educao Fsica brasileira, revelando a sua trajetria at ento
desenvolvida.
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Este estudo pode ser considerado um marco, uma vez que abre a possibilidade para
novas pesquisas sob a orientao da concepo marxista de histria, apresenta uma viso
panormica dos papis sociais representados pela Educao Fsica no palco social brasileiro.
Este texto, segundo Ferreira Neto (1996), inovador tanto na abordagem marxista que
inaugura na historiografia da Educao Fsica brasileira, quanto na utilizao do uso de
fontes.
Embora nesta fase as mudanas e rupturas que levantamos acima tenham sido
extremamente significativas, mais notadamente o desvelar dos aspectos ideolgicos,
orientados pela concepo marxista, Mello (1999) indica que alguns problemas das fases
anteriores persistiram, alm de um novo problema ter emergido (ou reemergido):
metodologicamente, no que se refere histria, as obras so mais confusas e incompletas
(p.39).
A periodizao continua a se submeter a especificidades exteriores ao objeto, alm de referendarem uma impresso de continuidade e linearidade sempre to presente em todas as fases anteriores; a histria entendida como responsvel por explicar linearmente o presente, fato agravado por uma compreenso que parte do presente com hipteses traadas j basicamente confirmadas, o que praticamente faz forjar no passado os elementos necessrios para provar a hiptese inicial; a exasperao da crtica ao carter documental-factual das obras anteriores findou por muitas vezes no dispensar de datas, fatos e nomes, to importantes em qualquer estudo historiogrfico. (MELLO, 1999, p.39).
De qualquer forma, o carter panormico do trabalho de Castellani Filho (1988)
deixou os espaos necessrios para outros estudos mais aprofundados sobre determinados
perodos, onde j se anuncia uma mudana de postura nos estudos histricos em nossa rea,
influenciado sobretudo pela mudana de postura das pesquisas na Histria da Educao
brasileira. nesse particular que surgem as pesquisas de Soares (1994) e Goellner (1992).
Soares (1994) aprofunda a discusso sobre o pensamento mdico-higienista como
marca registrada do contexto social brasileiro e, inclusive, da Educao Fsica no perodo de
1850 a 1930. J Goellner (1992) percebe uma lacuna ao traar a trajetria do mtodo francs
da instituio militar at a instituio escola, com ateno ao perodo de 1920 a 1946.
No que se refere a fontes, foram utilizados: livros; artigos; relatrio de congressos;
atas de reunies de associaes mdicas; anais de congressos, entre outras. Quanto
orientao terica, pode-se dizer que Soares (1994) se manteve na tradio marxista, embora
sem fazer referncia a alguma fonte especfica. Goellner (1992) assume a concepo
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materialista da histria, preocupando-se em interpretar de como e porque as coisas se
passaram de uma maneira e no de outra qualquer.
No debate que se estabeleceu recentemente no campo da Educao Fsica, tem sido
posto em tela um outro modelo, ou poderamos chamar conforme Mello (1999) um Novo
Movimento de se construir o conhecimento histrico. Nesta perspectiva podemos situar os
estudos de Lima (1980), Bercito (1991), Lima (1992), Paiva (1994), Mello (1996),
Grunennvaldt (1997) e Pires (2001) entre outros. Estes estudos tm sua identificao
principalmente pela aproximao, claramente assumida pelos sujeitos, em relao s
contribuies plurais das cincias sociais para a produo do conhecimento histrico.
Lima (1980) procura atravs da Educao Fsica apreender a construo de um projeto
de corpo para o homem brasileiro, num tempo (Estado Novo) e no espao (formas
arquiteturais), com destaques para aqueles onde os diferentes segmentos da sociedade passam
a se expressar livremente. Para tal fim, assume como referenciais bsicos as contribuies de
Michel Foucault.
O intento de Bercito (1991) discutir a proposta de disseminao da Educao Fsica
como prioridade para os aspectos poltico-ideolgicos em 1930 - 1945. O objetivo de Lima
(1992) est configurado na busca da compreenso da Educao Fsica e do desporto no
Estado de Gois no perodo de 1961 a 1965. J Paiva (1994) constri uma histria do Colgio
Brasileiro de Cincias do Esporte, no perodo de 1978 a 1993, a partir das contribuies
sociolgicas de Pierre Bourdieu, bem como das aproximaes possveis da Nova Histria.
Em sua tese de doutoramento, Souza (1994) articula a histria do ensino da Educao
Fsica em Belo Horizonte a partir das relaes de gnero entre 1897 a 1994. Por sua vez,
Mello (1996) recupera uma verso de histria da Escola Nacional de Educao Fsica e
Desportos, com nfase para o perodo de 1939 a 1968, como ponto chave do estudo "a perda
de status da outrora prestigiosa Escola de formao de professor de Educao Fsica do Brasil,
como conseqncia de uma conjuno de fatores a ela extrnsecos e intrnsecos" (MELLO,
1996, p.8). um estudo pioneiro sobre a temtica, que tem seus mritos na medida em que
contempla a diversificao de fontes documentais. O propsito de Grunennvaldt (1997) est
em analisar a fundao da ENEFD, para verificar as relaes de dependncia da Educao
Fsica com a poltica do Estado Novo e seus protagonistas, os militares, captando os
elementos que constituem a essncia historicamente construda e suas implicaes sobre a
Educao Fsica no Brasil.
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Assim, Lima (1980), Paiva (1994), Souza (1994), Mello (1996) e Grunnenvaldt (1997)
apresentam com objetividade e clareza, o que e como as categorias de Michel Foucault, Pierre
Bourdieu, Le Goff, Edward Thompson e Antnio Gramsci foram utilizadas, respectivamente,
em suas pesquisas. As fontes utilizadas nestes estudos foram diversificadas: alm de
documentos escritos, foram utilizadas entrevistas (Depoimentos e histria de vida) e visuais
(fotografias, filmes, capas de revistas).
1.4 OPO METODOLGICA
Trata-se de uma pesquisa histrica, do tipo analtica, caracterizada por uma abordagem
qualitativa, visando a investigao de valores, conhecimentos e atitudes acerca do objeto de
estudo e sua influncia na realidade histrico/social da Educao Fsica no Estado da Bahia
De acordo com Oliveira (1998) a abordagem qualitativa possui, dentre outras
caractersticas, a facilidade de poder descrever a complexidade de um determinado problema,
compreender e classificar processos dinmicos experimentados por grupos sociais, apresentar
contribuies no processo de mudana e permitir, com maior profundidade, a interpretao
das particularidades dos comportamentos ou atitudes das pessoas.
Nesse sentido, precisamos compreender que:
Uma abordagem metodolgica consciente, consistente e adequada sem dvida um grande passo para melhorarmos a qualidade de nossa produo historiogrfica, afastando, inclusive, a concepo de que um amontoado de datas e fatos agrupados cronologicamente pode ser considerado um bom estudo histrico. (MELLO, 1996).
Compreendendo que durante muitos anos a Educao brasileira e por conseqncia a
Educao Fsica brasileira norteou-se por uma concepo positivista de histria, e que a
caracterstica de histria acontecimental esteve sempre em destaque, pretendemos lidar com
outra concepo de histria, na qual dentre outras coisas tenha um enfoque totalizador do
objeto de investigao, na busca no s de aparncias mas de todo desenrolar do objeto
investigado, buscando conhecer e compreender a realidade como prxis.
O professor Alcyr Ferraro nos faz um balano no que se refere a arquivos e
documentos relacionados Educao Fsica na Bahia:
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[...] a pobreza de documentos que comprovam os acontecimentos da educao fsica e do desporto em nosso Estado [...]. At mesmo o arquivo inativo que existia na antiga superintendncia de educao fsica e nas reparties subseqentes - como o Departamento de Educao Fsica e a Diviso de Educao Fsica- teve sua documentao destruda ou extraviada no perodo em que se instalou no Estdio Otvio Mangabeira. Do exposto, conclui-se que as dcadas de 40 a 80 so absolutamente carentes de documentos que atestam os fatos desses perodos, com exceo de informes obtidos nos arquivos de jornais. (FERRARO, 1991, p.13).
Essa afirmativa foi constatada in loco quando da realizao da nossa pesquisa de
mestrado, realmente a despreocupao em guardar a documentao e a memria em nosso
Estado flagrante.
Neste sentido, acreditamos que no nosso contexto, a histria oral nos abre uma grande
possibilidade, de sistematizar uma possvel histria da Educao Fsica na Bahia, pois
segundo Le Goff (1992).
A histria faz-se com documentos escritos, sem dvida. Quando estes existem. Mas pode fazer-se, deve fazer-se sem documentos escritos, quando no existem. Com tudo o que a habilidade do historiador lhe permite utilizar para fabricar o seu mel, na falta das flores habituais. Logo, com palavras, signos, paisagens e telhas .(p. 540).
Importante ser posto que a busca de uma contribuio histrica crtica e original no
deve significar, contudo, o abandonar de datas e fatos: No se pode desprezar um rigoroso
esforo em armazenar datas e fatos, que comeam a se perder, talvez por interpretaes
errneas de crticas aos estudos documentais-factuais
(MELO, 1996, p.4). Devemos fugir,
entretanto, de verdades estabelecidas, tentando compreender as contradies existentes no
desenvolvimento histrico de qualquer objeto de estudo. Le Goff (1992) cr que a
cronologia... continua sendo um conjunto de referncias que sem dvida deve ser
enriquecido, flexibilizado, modernizado, mas que permanece fundamental para o prprio
historiador, para o jovem e para o grande pblico (p.7).
A histria oral temtica, proposta metodolgica do presente estudo, compromete-se
com:
[...] o esclarecimento ou opinio do colaborador em relao a algum fato definido. Ela busca a verdade de quem presenciou um acontecimento ou que pelo menos dele tenha alguma verso discutvel ou contestatria. Admite o uso do questionrio ou entrevista guiada para esclarecer os fatos e detalhes. Baseia-se tanto em documentos como em fontes orais, que servem para esclarecer informaes contidas nos documentos analisados. (MALINA; AZEVEDO, 1998, p.17).
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Neste sentido pretendemos redimensionar o uso convencional das fontes estabelecidas,
buscando desta forma, um dilogo entre os documentos (do arquivo do Conselho Estadual de
Educao, Secretaria de Educao e Escolas Superiores de Educao Fsica e tambm dos
sujeitos que vivenciaram o momento histrico que agora nos interessa) e fontes (tudo que se
presta a contar a histria, todos os vestgios que nos permitam ampliar a compreenso
historiogrfica, sejam documentos, relatos orais, iconografias) de outra natureza,
prioritariamente os relatos orais.
Embora a entrevista seja o cerne e a parte fundamental dos estudos que se utilizam da
histria oral, preciso ser dito que nem todo estudo que se utiliza de entrevista um estudo de
histria oral. Assim, para um estudo caracterizar-se como tal, preciso ter determinados
cuidados: preocupar-se com o no dito, isto , sinais dos mais variados, silncios, falhas de
memrias; preocupar-se em no s revelar fatos, mas esclarec-los a partir da compreenso de
quem os viveu de alguma forma; preocupar-se fundamentalmente com os aspectos histricos;
transcrev-los na ntegra, j que um dos objetivos produzir um documento histrico.
[...] o testemunho, quando possvel, sempre enriquecedor. A Educao Fsica vem
assimilando procedimentos metodolgicos da histria oral h alguns poucos anos e a
experincia tem sido frutfera e sobrevive s crticas - s vezes ferozes (OLIVEIRA, 1998,
p.8). clea Bosi (apud OLIVEIRA, 1998), sai em nossa defesa, pois considera, como ns, que
a veracidade do narrador no nos preocupa tanto: com certeza seus erros e lapsos so menos
graves em suas conseqncias que as omisses da histria oficial.
Assim, as fontes orais mostram-se fundamentais nesta pesquisa, como forma de
complementao dos dados, por conta da dificuldade de obteno de outras fontes
documentais para essa investigao. Acreditamos que a possibilidade de ouvir indivduos que
at ento no tiveram sua compreenso apreendida, nos proporcionou novas representaes
que por certo abriram novas possibilidades de interpretaes para o que aqui se pretende.
A partir da compreenso do desempenho e da trajetria do sujeito, o indivduo que
vivenciou o momento histrico, conseguimos ampliar nossas fontes de informaes, j que
isto nos possibilitou perceber os elos significativos de conexo entre os acontecimentos
relatados.
Por fim, procuramos promover um cotejamento das informaes colhidas nestas
diferentes fontes, utilizando-as como eixo central de discusso.
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Os entrevistados foram escolhidos entre os professores, ex-alunos e dirigentes de
Cursos Superiores de Educao Fsica da Bahia, sem a preocupao de amostragem
estatstica. A anlise dessas entrevistas se deu numa perspectiva muita mais qualitativa, a
partir da viso do pesquisador.
Os entrevistados foram os professores Newton Miranda, Alcyr Ferraro, Raimundo
Coelho, Jos Coelho, Paulo Matta, com a preteno de colher informaes acerca do processo
que antecedeu a criao do Curso de Educao Fsica da UCSAL, ou seja, o perodo em que a
Bahia na contava com nenhum Curso Superior em Educao Fsica, necessitando desta forma
enviar pretensos professores para estudarem na ENEFD no Rio de Janeiro.
Os demais entrevistados na tentativa de possibilitar a construo da trilha da formao
profissional em Educao Fsica na Bahia do percurso da Ucsal at as Universidades
Estaduais da Bahia foram: Alcir Ferraro, Hlio Campos, Geogeocohama, Csar Leiro,
Valfredo Drea, Ana Anglica Barbosa, Jorge Adilson Gondim, Dilza Ata, Jandira Simes,
Iraci Picano e Samuel Macedo.
Tivemos a inteno de cotejar todas as informaes referentes ao nosso objeto de
estudo, qual seja: o percurso da formao profissional em Educao Fsica na Bahia, mas
temos conscincia dos nossos limites, e neste sentido, mapeamos tudo aquilo que circunscreve
o objeto de estudo, mas nos aprofundamos, na nossa anlise, nos cursos pblicos e no curso
da UCSAL, pelo simbolismo e pela influncia sofrida e exercida no nosso cotidiano.
Apresentamos, a seguir, os cursos existentes:
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CURSOS DE EDUCAO FSICA
INSTITUIO DATA DE INCIO CIDADE
UNIVERSIDADE CATLICA DO SALVADOR
01/03/1973 SALVADOR
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA 03/06/1988 SALVADOR FACULDADES MONTENEGRO 01/09/1989 IBICARA
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO SUDOESTE DA BAHIA
01/03/1997 JEQUI
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA
03/03/1997 FEIRA DE SANTANA
UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA 08/03/1999 GUANAMBI FACULDADE SOCIAL DA BAHIA 18/02/2002 SALVADOR FACULDADES DE CINCIAS AGRRIAS E DA SADE - FAS UNIME
05/08/2002 SALVADOR
FACULDADES DE TECNOLOGIA E CINCIAS FTC
09/09/2002 SALVADOR
FACULDADES DE TECNOLOGIA E CINCIAS FTC
01/01/2003 ITABUNA
FACULDADE NOBRE DE FEIRA DE SANTANA FAN
01/01/2004 FEIRA DE SANTANA
UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA UNEB
23/07/2004 ALAGOINHAS
UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA UNEB
23/07/2004 JACOBINA
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SANTA CRUZ UESC
16/08/2004 ILHUS /ITABUNA
FACULDADES JORGE AMADO 26/08/2004 SALVADOR FACULDADE DO SUL FACSUL 15/09/2004 ITABUNA FACULDADE DE TEIXEIRA DE FREITAS FACTEF
14/02/2005 TEIXEIRA DE FREITAS
FACULDADES DE TECNOLOGIA E CINCIAS FTC
14/02/2005 VITORIA DA CONQUISTA
FACULDADE REGIONAL DA BAHIA
FARB UNIRB 15/08/2005 SALVADOR
FACULDADE DELTA FACDELTA 13/01/2006 SALVADOR FACULDADE MARIA MILZA FAMAM 14/02/2006 CRUZ DAS
ALMAS FACULDADE SO FRANSCISCO DE BARREIRAS FASB
30/10/2006 BARREIRAS
FACULDADE REGIONAL DE ALAGOINHAS
03/11/2006 ALAGOINHAS
Fonte: INEP, 2007
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Nossa inteno fundamental foi colher nestes Depoimentos, entre outras coisas:
informaes sob em que ambientes foram implementados os referidos Cursos? Para responder
a quais demandas? Quais foram as suas aes mais efetivas na implementao de projetos
definidores na organizao e/ou reorganizao das diretrizes de Polticas de Educao Fsica,
Esporte e Lazer para o Estado da Bahia?
Para nos ajudar a responder e compreender essa trajetria, foram elaborados dois
roteiros de entrevistas: um roteiro destinado a ser aplicado ao Curso da Universidade Catlica
do Salvador, que, por ter sido o pioneiro, guarda muitas especificidades e simbologias, e outro
para ser aplicado aos cursos das outras instituies, notadamente as pblicas. Esta distino se
fez necessria dado o contexto historico de constituio e implementao dos referidos
Cursos, as referncias terico-metodolgicas e legislao que orientavam a elaborao de
projetos de cursos de Educao Fsica no Brasil.
Thompson (1998) nos aponta outra vantagem da histria oral que a torna mais rica,
viva, comovente e verdadeira: o fato de a evidncia oral transformar os objetos de estudo em
sujeitos, ao contrrio da histria tradicional, em que o historiador estuda os atores da histria
distncia, fazendo com que ele sempre esteja sujeita a interpretaes do prprio historiador.
Cabe-nos lembrar que existem muitas lacunas histricas em nossa rea e que as
experincias com o levantamento de fontes e organizao de arquivos, fundamentais para os
que se envolvem com a histria, ainda tm se mostrado bastante incipientes.
Acreditamos que as fontes orais mostram-se bastante interessantes para se fazer uma
reconstituio da histria, considerando tambm aspectos subjetivos; resgate de informaes
perdidas; ampliao dos estudos em reas marginalizadas, em que predominam zonas de
obscuridades. Assim, optamos por duas perspectivas simultneas e no excludentes: as
preocupaes de contemplar lacunas deixadas pela documentao tradicional, privilegiando a
memria por si s como objeto de estudo e as ligaes entre histria e memria. Enfim,
consideramos que as fontes orais no s so interessantes como tambm imprescindveis na
tentativa de possibilitar uma original investigao da histria da Educao Fsica em um
Estado (Bahia), no qual ela no foi profundamente discutida.
Neste estilo de trabalho, a tarefa de produzir conhecimentos histricos se torna mais
vlida, especialmente rica e atual, j que parte de uma reflexo terica, passa por um trabalho
emprico, estabelecendo um maior vnculo com os sujeitos da pesquisa que em muitos
momentos se tornando sujeitos e objetos da mesma, constituindo-se desta forma uma nova
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fonte para pesquisas posteriores, sobretudo nas reas em que a carncia documental
flagrante, e finalmente produz conhecimento cientfico. Isto tudo, a nosso juzo, um
processo que permite ao pesquisador transformar-se no que sempre pretendeu ser - um
historiador.
Finalmente, cabe esclarecer que, no desafio de construir uma Histria da Educao
Fsica na Bahia, nos dispomos a respeitar as vises e posies encontradas entre memria e
documentos, mas temos a clareza de que, como pesquisador, precisamos fazer consideraes
prprias, a partir do nosso ponto de vista; consideraes impregnadas de um processo de
interpretao que de forma alguma exclui nossa percepo de mundo.
Ao tentar escrever uma possvel Histria da Educao Fsica na Bahia, do ponto de
vista da formao acadmica e profissional pretendemos fundamentalmente perceber alguns
aspectos de seu cotidiano. E longe de desconsiderar os inmeros acontecimentos que foram
observados no cenrio histrico nacional (o governo ditatorial; a queda de uma ditadura; a
transformao brutal do pas rumo industrializao; a promulgao da nova LDB; a
produo de uma constituio; a mobilizao e ascenso dos movimentos sociais, inclusive
dos estudantes; a ascenso de um trabalhador Presidncia da Repblica; dentre outros), no
pretendemos privilegi-los em nossa anlise, a no ser aqueles reflexos e impactos de
diferentes naturezas que por ventura forem perceptveis e determinantes para a compreenso
do cotidiano de nosso objeto. Nossa preocupao bsica est em demonstrar as lgicas
internas que se estabeleceram nesse cotidiano.
1.5 ESTRUTURA DA TESE
Este trabalho ser apresentado da seguinte forma:
Construo social do objeto de estudo, onde apresentamos nossa justificativa,
problema, objetivo da pesquisa e a opo metodolgica do estudo, procurando desta forma
situar do ponto de vista espacial e temporal o ncleo de nossa investigao, constituindo-se
como o primeiro captulo.
O captulo 2 sob o ttulo Formao profissional em Educao Fsica no Brasil, tem por
objetivo identificar os primrdios da sistematizao da formao profissional em Educao
Fsica no Brasil; demonstrar os bastidores da idealizao e implementao das primeiras
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Escolas de Educao Fsica no Brasil; analisar as legislaes que interferiram no processo de
formao curricular da Educao Fsica brasileira.
O captulo 3 - Formao profissional em Educao Fsica na Bahia, tem por objetivo
abordar: os primrdios da Educao Fsica na Bahia; a UCSAL como irradiadora da formao
profissional neste Estado, j o captulo 4 apresenta o Curso de Educao Fsica da UFBA
como responsvel pela mudana do perfil de formao, e o captulo 5 apresentando as
Universidades Estaduais como responsveis pela interiorizao em torno do debate da
Educao Fsica na Bahia.
No eplogo apresentamos as sistematizaes e concluses de nosso trabalho,
esperando desta forma sinalizar lacunas e indicar possibilidades de outras investigaes que
caminhem em sentidos diversos.
Nos anexos apresento as entrevistas concedidas, transcritas na ntegra, transformando-
as assim em documento, e possibilitando dessa forma que sejam tiradas outras concluses
e/ou sejam concedidos a elas outros tratamentos.
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CAPTULO 2
FORMAO PROFISSIONAL EM EDUCAO FSICA NO BRASIL
A prtica sistematizada da Educao Fsica no Brasil sofreu muitas influncias das
escolas de ginsticas europias, notadamente da Sucia, Alemanha, Frana e Inglaterra.
Importante destacar que os difusores desta prtica no Brasil, foram imigrantes, que no
vieram com este propsito, ser professores de ginstica, mas desenvolver trabalhos na
agricultura brasileira, todavia, como esta cultura j eram bastante desenvolvida em seus pases
de origem, eles, os imigrantes, acabaram se constituindo como um dos primeiros professores
de Educao Fsica do Brasil.
A partir de ento, a discusso sobre a prtica da atividade fsica sempre esteve em tela
em nosso pas, sobretudo, com um pensamento que hegemonicamente atribua a funo de
forjar um homem disciplinado e obediente, apontando para uma perspectiva de
desenvolvimento e progresso. Neste contexto o celebre Parecer de Rui Barbosa (1882)
estabelece um marco, sobretudo nos primrdios do perodo republicano e incio do sculo
XX, na defesa da implementao efetiva da Educao Fsica em nosso pas.
Este captulo pretende fazer este passeio na formao profissional em Educao Fsica
no Brasil, procurando mostrar suas implementaes e contradies, as mudanas oriundas de
determinantes legais, enfim, tudo aquilo que nos possibilite visualizar melhor a sua trajetria.
Alguns autores e pesquisadores ajudaro, com suas obras e pesquisas, nessa reconstituio.
2.1 ANTECEDENTES
Segundo Soares (1994) e Souza Neto (2004) o perodo compreendido entre 1824 e
1931 foi marcado no Brasil, especialmente no Rio Grande do Sul, com a imigrao de colonos
alemes, pelo desenvolvimento dos exerccios fsicos. Podemos pensar que foi nesse perodo
que, surgiram, as primeiras tentativas de formao profissional em Educao Fsica de forma
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sistematizada, identificada desta forma no trabalho desenvolvido pelos mestres de arma,
instrutores, treinadores, assim denominados em funo de seu escalo de origem.
Ainda em 1832, o deputado Martim Francisco Ribeiro de Andrada defende na
comisso de definio da Assemblia Constituinte um projeto sobre educao da sociedade
que recebeu emenda de Jos Mariano de Albuquerque Cavalcante, sugerindo uma premiao
para quem apresentasse um plano de Educao Fsica, Moral e Intelectual.
Em 1837 o deputado baiano Antonio Ferreira Frana apresentou Cmara um projeto
em favor da cultura e da instruo onde indicava a insero da ginstica e defesa do corpo
entre outras cadeiras no programa das escolas de primeiras letras. Mas a atividade fsica
somente passa a fazer efetivamente parte dos programas escolares da Corte em 1851 por obra
do ex-deputado e ento Ministro do Imprio, Luiz Pedreira do Couto Ferraz com a conhecida
Reforma Couto Ferraz. Sua regulamentao foi expedida trs anos depois e entre as matrias a
serem obrigatoriamente ministradas estavam a ginstica no primrio e a dana no secundrio,
mas somente nas escolas da Corte.
O Ato Adicional da Reforma Educacional dizia que tanto a Educao Primria como a
secundria ficariam a cargo das provncias e o ensino superior a cargo da Corte
(administrao Nacional), portanto cada provncia, adotava as disciplinas que melhor se
adaptavam s necessidades do perodo. Neste sentido, em 1852, Toureiro Aranha, presidente
da provncia do Amazonas determina que em seu programa escolar constar a Educao
Fsica, que seria ministrada tambm para o grupo feminino, respeitando suas peculiaridades.
O Inspetor Geral da Instruo Pblica do Municpio da Corte fazendo uma viajem pelo Pas,
demonstra sua preocupao com a continuidade da prtica da ginstica na escola secundria,
principalmente pela falta de estrutura das escolas.
Esprito Santo (2004) afirma que, com as reformas educacionais, desde 1854, a
ginstica1 obrigatria nos seus programas curriculares, apesar de no implementada, por
ausncia de professores/as2 e muita resistncia contrria da elite dominante que entendia ser a
ginstica coisa para homens, j que a mesma era oriunda das instituies militares, e proibiam
suas filhas de freqentarem as aulas.
1 como a Educao Fsica era concebida inicialmente no mbito escolar 2 os primeiros professores/as de Educao Fsica civis no Brasil se formam a partir de 1931. E nesta poca toda fundamentao cientfica dos exerccios eram formuladas por mdicos.
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A necessidade de se formar professores de Educao Fsica surge com a reforma
Couto Ferraz, em 1851, e, mais especificamente, trs anos depois, com sua regulamentao
atravs da Lei n 630, que confere a obrigatoriedade da ginstica nas escolas.
Todavia lembra Betti (1991) que, na prtica, a efetiva implantao da Educao Fsica
ficou restrita, at os primeiros anos da dcada de 1930, s escolas do Rio de Janeiro, como
municpio da corte imperial e capital da Repblica, e s Escolas Militares.
A realidade que no existia no Brasil qualquer instituio civil que formasse
professor de Educao Fsica e, com isso, surge tambm um grande descompasso entre a
formao profissional e a demanda social.
Segundo Oliveira (1998), paralelo a esta situao, no ambiente militar, j se
encontravam entre os oficiais acima da patente de sargento, em hierarquia decrescente, os
contramestres de ginstica, mestres de natao, instrutores das armas especiais, de ginstica e
natao e instrutores de ginstica, fazendo com que, de fato, fossem eles os profissionais da
Educao Fsica no meio civil.
Oliveira (1998) lembra que, de acordo com Inezil Penna Marinho (1943), a primeira
turma diplomada por curso oficial, em nvel federal, no Brasil, ocorreu em 1929, atravs do
Curso Provisrio de Educao Fsica, no barraco da Escola de Sargentos da Infantaria do
Exrcito, onde, alm dos militares, professores pblicos primrios se inscreveram. Foram 90
(noventa) formados num curso de durao de cinco meses, dos quais apenas 20 (vinte) eram
civis.
Nesse mesmo ano, a Associao Brasileira de Educao (ABE) critica os traos
militares que so delineados para a Educao Fsica nacional, inclusive pela tentativa de
subordin-la, via decreto, ao Ministrio da Guerra com a criao do Conselho Superior de
Educao Fsica.
O professor Inezil Penna Marinho (1943) afirma e indica que uma das primeiras
iniciativas de sistematizao da formao profissional em nossa rea se deu em 1902, com a
fundao, por iniciativa do Coronel Pedro Dias de Campos, de uma escola de esgrima, com
sede no Batalho de Caadores, no Quartel da Luz, So Paulo, com formao bsica em
ginstica.
Era flagrante a proximidade da Educao Fsica com as estruturas militares, a sua
introduo aqui no Brasil esteve muito ligada a experincia francesa. Em 1907, a misso
militar francesa funda o embrio da Escola de Educao Fsica da Fora Policial do Estado de
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So Paulo. A partir de 1908, em nome da segurana nacional, a instruo militar se torna
obrigatria nas escolas secundrias brasileiras, com a presena de diversos segmentos
militares no sistema de ensino.
possvel ento perceber que os militares deram incio incluso da prtica de
exerccios fsicos em seus programas de formao, tendo inclusive influncia decisiva na
organizao e no desenvolvimento inicial da Educao Fsica nas escolas e na sociedade
como um todo, juntamente com os imigrantes, que chegavam ao pas e traziam conhecimentos
adquiridos em seus pases. Fundamentalmente, foram os militares os primeiros professores de
Educao Fsica do Pas (MELO, 1999).
Em 1909, foi criada a Escola de Educao Fsica da Fora Policial, proposta do
Coronel Paul Bologny, comandante da misso francesa que viera contratada pelo Governo de
So Paulo, com a funo de instruir aquela fora.
Segundo Melo (1996), s no ano de 1905 que podemos assistir primeira iniciativa
de carter nacional, no que se refere formao de profissionais em Educao Fsica: o
projeto do deputado Jorge de Morais. O referido projeto tinha a inteno de criar duas Escolas
de Educao Fsica, uma civil e outra militar, sem mencionar, entretanto, o nvel dessa
formao. Melo (1996) diz que mesmo possvel especular que tal projeto tenha sido escrito
com auxlio direto de militares franceses que estavam no Brasil em misses oficiais. Esse
projeto, embora aprovado, no se concretizou.
Conforme Melo (1996), em 1922, fundado o Centro Militar de Educao Fsica, que
daria origem a uma das escolas de Educao Fsica mais importante no Brasil: a Escola de
Educao Fsica do Exrcito (EsEFEx), no Rio de Janeiro, criada com a inteno inicial de
formar instrutores, monitores, mestre d arma, monitores de esgrima e mdicos especializados
para o Exrcito. Seus cursos eram predominantemente oferecidos para militares e,
eventualmente, civis podiam realizar o curso de monitor.
Entre nomes que este Centro Militar de Educao Fsica (e posteriormente EsEFEx)
teve a responsabilidade de formar, figuram algumas personalidades, que, por assim dizer,
deram o tom da Educao Fsica em vrias localidades: o tenente Laurentino Lopes Bonorino,
mais tarde um dos responsveis pela organizao da pioneira Escola de Educao Fsica do
Estado do Esprito Santo, e tambm o tenente Hermlio Gomes Ferreira, futuro professor e
diretor da Escola Nacional de Educao Fsica e Desporto
(ENEFD).
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Ainda em 1922, comeam a aparecer as reformas estaduais de ensino, abrindo
caminho para as reformas nacionais que surgem a partir de 1930. A primeira delas ocorre em
So Paulo, seguida pelo Cear, Rio Grande do Norte, Distrito Federal, Pernambuco, Paran,
Minas Gerais e Bahia. Estas reformas foram idealizadas por educadores que posteriormente
fundaram a Associao Brasileira de Educao.
Entre os civis, como afirma Melo (1996), esta movimentao em torno da formao
profissional em Educao Fsica s retomada em 1927, com o deputado Jorge de Morais,
criticando a no-execuo do projeto de 1905, que previa a criao de duas escolas de
Educao Fsica voltadas para a formao profissional, em seu pronunciamento ele afirma,
segundo Marinho (1943)
[...] urge, Sr. Presidente, que o governo desperte, que o parlamento e o executivo tomem medidas no sentido de organizar um aparelhamento de Educao Fsica, para que o brasileiro no continue evoluindo entregue a erros, a preconceitos que so prejudiciais a raa....(p.37)
Ainda segundo Melo (1996), o I Congresso Brasileiro de Eugenia, realizado em 1929,
aprovou como proposio, entre outras coisas, a organizao de escolas superiores de
Educao Fsica, para convenientemente preparar os professores indispensveis cultura
fsica nacional. Essa proposta estava em consonncia com um iderio em construo na
poca, como aponta Carvalho:
Na dcada de 20, na intensa efervescncia ideolgica que a caracterizou, so constitudos, na disperso de movimentos aparentemente dspares, discursos sobre o pas (...). Tal o caso da larga circulao que tiveram (...) encenaes de um povo brasileiro que privilegiam imagens da doena, do vcio, da degenerescncia, a ausncia de carter, muito freqentemente sintetizadas na amorfia em que o pas figurado como organismo. (apud MUNAKATA, 1996, p. 193-194).
A Educao Fsica se viu contemplada neste projeto de regenerao do povo brasileiro
e passou a ser merecedora de grande destaque, visto que poderia co-participar e, por assim
dizer, transformar os nossos habitantes em um povo: viril, corajoso e ao mesmo tempo fiel,
obediente e dcil, que, segundo o discurso ideolgico e dominante da poca, era to
indispensvel ao desenvolvimento da nao. Vislumbrava-se dar extrema ateno a uma boa
preparao fsica e moral da populao brasileira, procurando promover a sade, atravs de
uma prtica que pudesse proporcionar esses valores. As palavras de Peregrino Jnior so
exemplares:
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O problema brasileiro e no caso particular da nossa terra e nossa gente, neste grave momento de introspeco brasileira, em que um dos grandes problemas do Brasil o de criar a conscincia nacional do povo, a Educao Fsica um elemento principal dessa grande obra de construo cultural e formao espiritual do povo brasileiro. Sendo impossvel e alm disso ilgico, dissociar o corpo do esprito, cuja unidade, no pensamento de Carrel, cada vez mais ntima e compacta, s se pode cogitar de melhorar as condies do homem brasileiro cuidando ao mesmo tempo de sua cultura, de sua sade, sua estruturao moral, e isso s poder se conseguir com uma sbia poltica ideolgica , como quer Pende, utilizando como elemento fundamental a Educao Fsica, que nas suas mltiplas conseqncias
morfolgica, fisiolgica, espiritual e ticas, permitir-nos- aperfeioar os valores dirigentes e criadores das elites e as aptides produtoras das massas. Utilizando essa grande arma moderna de estruturao humana, pelo esforo simultneo nestes dois sentidos o da preparao cultural das elites e o da formao eugnica das massas, que se pode realizar afinal o milagre da formao integral do homem brasileiro
forte de corpo, claro de esprito e puro de corao. (PEREGRINO JNIOR apud LIMA, 1980, p.7-8).
Inezil Penna Marinho d-nos uma idia dos discursos que circulavam na poca:
[...] desenvolvimento harmnico do corpo e do esprito, concorrendo assim para formar o homem de ao fsica e moralmente sadia, alegre e resoluto, cnscio de seu valor e de suas responsabilidades e preparar a mulher para a misso do lar, dando-lhe ainda a possibilidade de substituir o homem em trabalho compatvel com o sexo feminino, a tornar cada brasileiro de ambos os sexos aptos a contribuir eficazmente para a economia e defesa da nao. (apud LIMA, 1980, p. 67).
2.2 AS PRIMEIRAS ESCOLAS DE EDUCAO FSICA DO BRASIL
Em meio a esse fervilhar de idias, no incio da dcada de 1930, assistiu-se criao,
no mbito civil e estadual, de Departamentos e Escolas de Educao Fsica Civil nos Estados
do Esprito Santo e So Paulo. No Estado do Esprito Santo, em 1931, com iniciativa de
Laurentino Bonorino, tenente do exrcito, cria-se o curso especial de Educao Fsica para a
formao de normalistas especialistas. Este curso, apesar de ser dirigido por militar,
constituiu-se como o primeiro curso civil reconhecido.
Todavia, consideramos que o primeiro programa sistematizado de Educao Fsica no
Brasil, foi o curso da Escola de Educao Fsica do Estado de So Paulo, criado em 1931, mas
que s comeou a funcionar em 1934. Este curso tinha como propsito formao de dois
profissionais distintos, quais sejam: instrutor de ginstica e o professor de Educao Fsica.
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Ao instrutor de ginstica, os seus saberes deveriam abarcar o estudo da vida humana
em seu aspecto celular, anatmico, funcional, mecnico, preventivo, estudo dos exerccios
fsicos da infncia idade madura, estudos dos exerccios motores, ldicos e agonsticos. Ao
professor de Educao Fsica, os saberes deveriam ser norteados sobre os estudos do processo
pedaggico e de desenvolvimento do aluno, estudos dos exerccios motores e artsticos e
estudos dos fatos e costumes relacionados as tradies das provas na rea dos exerccios
fsicos e motores.
A partir de ento, e mais precisamente, correspondendo primeira era Vargas, mas
especificamente durante o Estado Novo (1937 1945), a Educao Fsica estruturou-se
profissionalmente na luta pelo seu espao na sociedade. Neste sentido ganhou como principal
reforo, no seu processo de legitimao para a rea e o reconhecimento social de seus
profissionais, a Constituio de 1937, que tornou a Educao Fsica obrigatria nas escolas,
fazendo desta forma, surgir outras demandas relacionadas profisso, a exemplo da
necessidade de se constituir um currculo mnimo para a graduao.
Portanto, o Estado Novo (1937 1945) necessitava de um homem novo, e este homem
deveria ter orgulho de sua ptria e de sua nacionalidade, deveria ter seus direitos de cidadania
garantidos para que adquirissem uma nova tica. Era um momento de promoo do homem
brasileiro, com uma ideologia de desenvolvimentismo nacionalista. Neste sentido, segundo
Vanilda Paiva (1983) a poltica educacional se transforma, pois o novo regime de autoridade
tinha metas definidas e ideologia prpria a ser difundida pela Educao, e se expressava
atravs das crticas ao beralismo, o anticomunismo e a valorizao do ensino profissional,
procurando retirar do processo educacional a necessria reflexo sobre a sociedade. Foi a
poca do incentivo marcante da interveno estatal na economia, defendendo o nacionalismo
econmico. Prova deste pensamento a criao do Conselho Nacional do Petrleo, a
Companhia Siderrgica Nacional e a Fbrica Nacional de Motores. Criou-se o salrio
mnimo. Neste contexto, relata Getlio Vargas, citado por CASTELLANI (1988, p.84), a
contribuio da Educao Fsica na ideologia nacionalista:
[...] no sendo uma simples fornecedora de noes tcnicas, mas um instrumento de integrao da infncia e da juventude na Ptria, nos interesses sociais que lhes so incorporados, a educao da mocidade, nos preceitos bsicos estabelecidos pelo novo Estado, ser um elemento no s eficaz, como at decisivo na luta contra o comunismo e outras ideologias que pretendam contrariar e subverter o ideal de nacionalidade e as nossas inspiraes cvicas, segundo as quais a juventude agora mais do que nunca, ser formada...
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Segundo Melo (1996), justamente na dcada de 1930, na capital federal, que se
comea a delinear a possibilidade de criao de uma Escola Nacional, ligada a uma
Universidade. importante dizer que, at ento, nenhum dos cursos de Educao Fsica
existentes no pas era vinculado Universidade. Para Melo (1996), alguns militares mais
diretamente ligados aos rumos da Educao Fsica no Brasil comearam a vislumbrar e se
deixaram contagiar pela ambio da ctedra, abandonando paulatinamente a idia de ligar a
Escola de Educao Fsica ao Ministrio da Guerra.
O VII Congresso Nacional de Educao, em 1935, dedicou sua temtica central
Educao Fsica e aprovou como indicativo a criao de uma Escola Nacional de Educao
Fsica, ligada Universidade do Rio de Janeiro, futura Universidade do Brasil. Esse
Congresso, para o professor Inezil Penna Marinho (1943), foi muito importante para traar os
caminhos da fundao da futura ENEFD.
Melo (1996) sugere que provavelmente tivesse existido resistncias internas de alguns
intelectuais que no desejavam ver na Universidade uma profisso como a de Educao
Fsica, que para alguns no necessitaria de formao superior, sem falar no fato de ela dar
nfase ao fsico em detrimento do intelectual. Mas, ainda segundo Melo (1996), o
desenvolvimento da Educao Fsica brasileira era uma questo de tempo, pois estava
tambm diretamente ligada, entre outros, aos interesses governamentais de um estado de
exceo e nunca demais lembrar que parte de nossa intelectualidade apoiou o Estado Novo
(1937-1945).
Em 1937, a Secretaria Geral do Conselho de Segurana Nacional elaborou um projeto
de lei propondo a criao do Conselho Nacional de Desportos, do Instituto Nacional de
Educao Fsica e da Escola de Educao Fsica e Desportos. Como podemos observar, a
Educao Fsica estava destacada com um papel bastante singular, ligada desta forma a um
projeto de segurana nacional, algo muito mais complexo do que simples preocupao com
uma d