inicial indenização prisão indevida marcos duarte

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ___ VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE SÃO PAULO MARCOS DUARTE , brasileiro, solteiro, portador do RG nº 24.901.191, inscrito no CPF/MF 420353238- 86, residente e domiciliado à Rua Analândia, nº 526, ap. 91, Jd. Joaquim, Santa Barbara do Oeste/SP, possuidor do aparelho de telefonia móvel nº (0XX19) 8106-3989, por intermédio da Defensora Pública que a esta subscreve, nos termos do artigo 128 da Lei Complementar 80/94 com as alterações da Lei Complementar 132/09, vem respeitosamente perante Vossa Excelência, propor AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS

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Defensoria Pública do Estado de São Paudo

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Page 1: Inicial Indenização Prisão Indevida Marcos Duarte

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ___ VARA DA

FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE SÃO PAULO

MARCOS DUARTE, brasileiro, solteiro, portador

do RG nº 24.901.191, inscrito no CPF/MF 420353238-86, residente e

domiciliado à Rua Analândia, nº 526, ap. 91, Jd. Joaquim, Santa

Barbara do Oeste/SP, possuidor do aparelho de telefonia móvel nº

(0XX19) 8106-3989, por intermédio da Defensora Pública que a esta

subscreve, nos termos do artigo 128 da Lei Complementar 80/94 com

as alterações da Lei Complementar 132/09, vem respeitosamente

perante Vossa Excelência, propor

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS

em face da FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, pessoa jurídica

de direito público interno, a ser citada na pessoa do Procurador Geral

do Estado, na Rua Pamplona, 227, Jardim Paulista, CEP 01405-902,

pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos.

Page 2: Inicial Indenização Prisão Indevida Marcos Duarte

I. Dos fatos.

O autor respondeu a dois processos criminais,

tendo sido condenado.

O primeiro processo tramitou perante a 21ª Vara

Criminal Central da Capital, tendo o autor sido condenado à pena de

02 anos de reclusão, por delito de falso. O segundo processo tramitou

perante a Vara da Comarca de Santa Isabel, tendo sido o autor

condenado à pena de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão,

pela prática do delito de receptação e por quadrilha ou bando.

Assim, toda sua pena somou 05 (cinco) anos e

06 (seis) meses de reclusão.

De acordo com a folha de antecedentes (F.A.) do

sentenciado, o início do cumprimento da reprimenda teria se dado em

30 de março de 2006. Tendo havido interrupção de 06 (seis) meses e

23 (vinte e três) dias na execução, a data prevista para cumprimento

integral era 23 de abril de 2012, conforme constou da F.A.

Ocorre que houve um erro de cálculo por parte

da serventia, tendo sido desconsiderado período anterior de prisão

cautelar, que deveria ter sido detraído da condenação final.

Assim, de forma diligente e percebendo o erro

de cálculo da serventia, a direção da penitenciária onde o preso

estava recolhido – Franco da Rocha II –, ao antever o cumprimento

integral da pena, em 27 de março de 2012 enviou ofício ao Juízo das

Page 3: Inicial Indenização Prisão Indevida Marcos Duarte

Execuções da Comarca de Guarulhos, apontando que o término de

cumprimento da pena trazido na F.A. estava equivocado e

ressaltando que o autor teria ficado cautelarmente preso entre 02 de

setembro de 2002 e 15 de outubro de 2002, tempo que deveria ter

sido detraído da pena final, nos termos do artigo 42 do Código Penal.

Logo, ao contrário do que havia constado da F.A.

de Marcos, o cumprimento integral da pena se daria em 11 de março

de 2012, e não em 24 de abril desse ano.

Não obstante o erro de cálculo e, ainda que a

penitenciária tenha apontado esse erro ao juízo, tal informação foi

ignorada e os autos foram à conclusão apenas em 19 de abril de

2012, quando o autor já havia cumprido 01 (um) mês e 08 (oito) dias

de pena além de sua condenação.

Assim, apenas em 19 de abril de 2012 foi

expedido o alvará de soltura, relativamente a uma pena que

já havia sido integralmente cumprida há 01 (um) mês e 08

(oito) dias.

Na decisão judicial que declarou extinta a pena,

o r. juízo reconheceu que o sentenciado teria cumprido pena “a

maior”. Assim, simplesmente considerou a detração analógica e

declarou extinta também a pena de multa.

Contudo, o fato é que o autor permaneceu

ilegalmente preso, por um erro de cálculo da serventia, por mais de

um mês.

Page 4: Inicial Indenização Prisão Indevida Marcos Duarte

Ainda mais grave é o fato de que o erro foi

devidamente comunicado pela direção da penitenciária, mas a

serventia, em vez de levar os autos imediatamente à conclusão,

esperou cerca de um mês para fazê-lo, sem qualquer justificativa

plausível.

Dessa maneira, além do dano extra-patrimonial

referente aos direitos da personalidade, como a liberdade, moral,

honra, boa fama e respeitabilidade, que foram lesados durante o

período de prisão indevida, o autor sofreu danos materiais, pois foi

afastado por um mês de suas atividades laborais.

Em razão disso, não lhe restou alternativa,

senão buscar o judiciário para obter a indenização pelos danos

sofridos.

II. Do direito.

A Constituição Federal em art. 37, § 6º

preceitua:

“As pessoas jurídicas de direito público e as de

direito privado prestadoras de serviços

responderão pelos danos que seus agentes,

nessa qualidade, causarem a terceiros,

assegurado o direito regresso contra o

responsável nos casos de dolo ou culpa”.

Page 5: Inicial Indenização Prisão Indevida Marcos Duarte

Assim, uma vez que os escreventes e

funcionários do cartório são agentes do poder público, bem como o

instituto de identificação responsável pelo cálculo errado da pena do

autor, deve o Estado ser responsabilizado e indenizar o Autor, fato

comprovado pela certidão que indica que houve erro no

cumprimento.

Ressalte-se que o volume de serviços da Vara

de Execuções de Guarulhos não elide a responsabilidade, já que se

trata de responsabilidade objetiva, bem como considerando-se

que o erro foi devidamente comunicado pela Penitenciária, mas a

comunicação não foi processada com a urgência que merecia.

Assim, para a caracterização do dever de

indenizar, basta demonstração da conduta lesiva e do dano,

comprovando-se o nexo de causalidade entre aquela ação e o

resultado gerado.

O Código Civil. no artigo 186, estabelece:

Art. 186- Aquele que, por ação ou omissão

voluntária, negligência ou imprudência, violar

direito e causar a outrem, ainda que

exclusivamente moral, comete ato ilícito.

O artigo 927 do mesmo ordenamento jurídico

é mais específico no que tange ao presente pedido:

Page 6: Inicial Indenização Prisão Indevida Marcos Duarte

Art.927- Aquele que, por ato ilícito, causar

dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá a obrigação de

reparar o dano, independente de culpa, nos

casos especificados em lei, ou quando a

atividade normalmente desenvolvida pelo

autor do dano implicar, por sua natureza, risco

para os direitos de outrem.

O Código Civil preceitua, por sua vez, em seu

art. 944 que a indenização se mede pela extensão do dano.

O dano a direito fundamental do autor vem

demonstrado de plano pela documentação que instrui a petição

inicial, sendo que o próprio juízo reconheceu que o sentenciado teria

cumprido pena superior à determinada na condenação.

Em face dos princípios publicísticos, não é

necessária a identificação de uma culpa individual para deflagrar-se a

responsabilidade do Estado. Esta noção civilista é ultrapassada pela

idéia denominada de faute du service entre os franceses. Ocorre a

culpa do serviço ou "falta de serviço" quando este não funciona,

devendo funcionar, funciona mal ou funcionada atrasado. Esta é a

tríplice modalidade pela qual se apresenta e nela se traduz um elo

entre a responsabilidade tradicional do Direito Civil e a

responsabilidade objetiva. (...) Em suma: a ausência do serviço devido

ao seu defeituoso funcionamento, inclusive por demora, basta para

configurar a responsabilidade do Estado pelos danos daí decorrentes

em agravo dos administrados.

Page 7: Inicial Indenização Prisão Indevida Marcos Duarte

Verifica-se dos fatos narrados e dos

documentos acostados aos autos que o ato cometido pelos agentes

do Estado, qual seja, erro no cálculo da pena, foi responsável pela

indevida permanência do autor em presídio por 01 (um) mês e

08 (oito) dias.

a. Do Dano Moral

Além disso, não se pode deixar de mencionar

que o dano moral é indenizável, nos termos da Constituição Federal,

em seu art. 5°, inciso X, que diz:

Art.5, X- são invioláveis a intimidade, a vida

privada, a honra e a imagem das pessoas,

assegurado o direito a indenização pelo dano

material ou moral decorrente de sua violação;

LXXV - o Estado indenizará o condenado por

erro judiciário, assim como o que ficar preso

além do tempo fixado na sentença;

Vale ressaltar que a personalidade é formada

por um conjunto de valores que compõem o patrimônio do ser

humano, podendo ser objeto de lesões em decorrência de atos

ilícitos. A constatação da existência de um patrimônio moral e a

necessidade de sua reparação, na hipótese de dano, constitui marco

importante no processo evolutivo de garantia de direitos e merece

Page 8: Inicial Indenização Prisão Indevida Marcos Duarte

ser respeitado.

Nas circunstâncias em que o ato lesivo afeta a

personalidade do indivíduo, sua honra, sua integridade psíquica, e

seu bem-estar, causando-lhe uma indisposição de espírito, a maneira

de reparar o dano causado é o pagamento de uma soma pecuniária

que permita ao lesado uma compensação pela sua dor.

Dessa forma, como a prisão por período

superior ao devido, por erro da serventia, causou ao autor o

sentimento de indignação, constrangimento, tristeza, desespero,

vergonha e angústia, e uma vez que não é possível voltar ao passado

para mudar esse acontecimento, não há outra maneira, senão a

reparação pecuniária, para tentar amenizar as conseqüências do

equívoco ocorrido.

A indenização tem caráter dúplice, para

compensar os abalos morais sofridos e para coibir as corriqueiras

omissões dos agentes públicos quanto à ocorrência de prisões ilegais.

No que se refere ao quantum indenizatório,

requer-se o valor de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais) a título de

danos morais, atualizados e com juros contabilizados desde a data do

evento danoso, conforme súmula 362 do STJ.

O “quantum” da indenização se justifica, por

certo, eis que, não bastasse o autor ter ficado ilegalmente preso por

mais de um mês, ainda são de se considerar as características

completamente degradantes do local onde ficou custodiado.

Page 9: Inicial Indenização Prisão Indevida Marcos Duarte

O período de custódia ilegal deu-se na

Penitenciária Nilton Silva – Franco da Rocha II. De acordo com próprio

sítio eletrônico da Secretaria de Administração Penitenciária, trata-se

de estabelecimento com vagas para 852 presos, mas com uma

população total de 1737 presos. Ou seja, o presídio comporta mais

que o dobro do número de presos que poderia comportar.

Desnecessário mencionar que a custódia ilegal

de mais de um mês em um estabelecimento com essas

características provoca danos psíquicos irreversíveis.

O afamado caos em que se encontra o

sistema penitenciário brasileiro deve ser sopesado para o

arbitramento da indenização, dada a responsabilidade objetiva que a

Constituição Federal atribui ao Estado.

As privações extremas impostas pelo cárcere

a contingentes gigantescos de pessoas desumanizadas pelo meio em

que são coagidas a habitar, por certo, criam um ambiente propício à

revolta e à necessidade de afirmação de uma independência, o que

se dá à revelia dos valores sociais responsáveis pela legitimidade do

funcionamento do sistema penal e penitenciário.

Sobre as condições dos estabelecimentos

penais brasileiros, onde a regra consiste na violação sistemática de

direitos humanos, vale trazer a conclusão constante do relatório da

recente Comissão Parlamentar de Inquérito instaurada para investigar

a realidade do sistema carcerário:

Page 10: Inicial Indenização Prisão Indevida Marcos Duarte

“Apesar de normas constitucionais transparentes, da excelência

da lei de execução penal e após 24 anos de sua vigência e da

existência de novos atos normativos, o sistema carcerário

nacional se constitui num verdadeiro inferno, por

responsabilidade pura e nua da federação brasileira

através da ação e omissão dos seus mais diversos

agentes” (fonte: Procuradoria Geral dos Direitos do Cidadão.

Disponível em 12 de novembro no sítio eletrônico <

http://pfdc.pgr. mpf.gov.br/grupos-de-trabalho/sistema-prisional

/CPIsistemacarcerario.pdf >, g.n.).

Poucos exemplos parecem mais claros que o

sistema carcerário brasileiro quando se quer demonstrar a

potencialidade do Estado de tornar-se um agente traumático.

Assim, a prisão ilegal por mais de um mês já

ensejaria uma elevada indenização por danos morais. No caso dos

autos, contudo, a prisão ilegal por tal período em um estabelecimento

com as características apresentadas acima é aviltante em um Estado

que se proponha democrático e fundado na dignidade da pessoa

humana, não podendo o Poder Judiciário mostrar-se leniente quando

uma lesão de tal calibre se afigura.

b. Lucros cessantes.

Os lucros cessantes, ou “aquilo que se deixou de

ganhar”, estão previstos no art. 402, do Código Civil, que alude:

Page 11: Inicial Indenização Prisão Indevida Marcos Duarte

“Salvo exceções expressamente previstas em

lei, as perdas e danos devidas ao credor

abrangem, além do que ele efetivamente

perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar”.

De acordo com Maria Helena Diniz é:

“Alusivo à privação de um ganho pelo credor

[...], em razão do descumprimento da obrigação

pelo devedor” (Maria Helena Diniz, Curso de

Direito Civil, 2º volume: teoria geral das

obrigações – 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.

409).

Deste modo, uma vez que já se estabeleceu o

nexo causal e o resultado danoso, a Ré deve arcar com os valores

que o requerente deixou de ganhar por não poder trabalhar como

auxiliar de descarga de caminhão, atividade que exercia antes da

prisão e que voltou a exercer assim que foi solto.

O autor percebia remuneração mensal no valor

de R$ 600,00 (seiscentos reais), conforme declaração do mesmo, de

onde retirava o seu sustento e o de sua família. Com a sua prisão,

deixou de receber a aduzida quantia e, consequentemente, ficou

impossibilitado de prestar auxílio aos seus familiares.

Os lucros cessantes, portanto, consistem no

valor acima mencionado, pois é aquilo que o autor deixou de lucrar.

Page 12: Inicial Indenização Prisão Indevida Marcos Duarte

Diante disso, requer-se a condenação da ré ao

pagamento de lucros cessantes no valor R$ 600,00 (seiscentos reais).

III. Dos pedidos.

Diante do exposto, requer:

a) seja a ré condenada ao pagamento de R$

50.000,00 (ciquenta mil reais) a título de danos

morais e R$ 600,00 (seiscentos reais), a título de

danos materiais, totalizando 50.600,00, tudo

corrigido desde a data do fato com correção

monetária e juros;

b) A citação da ré para que apresente sua

defesa, sob pena de sofrer os efeitos da revelia

c) pela produção de todos os meios de prova em

direito admitidas, além dos documentos já

juntados;

d) pela concessão do benefício da gratuidade de

justiça, diante da hipossuficiência do autor;

Dá-se à causa o valor de R$ 50.600,00

(cinqüenta mil e seiscentos reais).

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Termos em que,

Pede Deferimento

São Paulo, 1º de agosto de 2012.

Bruno Shimizu

Defensor Público

Núcleo Especializado de Situação Carcerária

Patrick Lemos Cacicedo

Defensor Público

Núcleo Especializado de Situação Carcerária