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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – São Paulo - SP – 05 a 09/09/2016
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A Mulher à Frente e Atrás da Câmera: Leituras Sobre a Participação Feminina no
Filme A Árvore de Marcação, de Jussara Queiroz1
Luana Araújo de França2
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Resumo:
O filme a Árvore de Marcação, de Jussara Queiroz, aborda um conflito em defesa do acesso à
água em uma cidade do Nordeste brasileiro. A reivindicação é liderada pela Irmã Adriana e
um grupo de crianças representado pela menina Jocélia. Os elementos teóricos para a
compreensão do objeto emanam de uma breve discussão sobre o Nordeste como local de
representação simbólica, um tipo de categoria discursiva no cinema brasileiro, atrelada muitas
vezes, à valorização de personagens e qualidades atribuídas ao sexo masculino. Quanto ao
debate de gênero, abordaremos as contribuições dos estudos sobre mulher e cinema em
Mulvey (1983), Kaplan (1995) e Kuhn (1991). O referencial historiográfico sobre o Nordeste
vem de Albuquerque Jr. (1999); na construção da realidade sob o olhar da comunicação,
usamos o conceito de codificação em Flusser (2013) e Hall (2003).
Palavras-chave: Jussara Queiroz; Protagonismo feminino; Nordeste; Mulher e Cinema.
Introdução
A questão de gêneros tem ganhado espaço na Academia, sociedade, mídia e sofre
constante atualização, tanto prática quanto teórica. O seguinte trabalho pretende trazer
contribuições sobre a mulher no cinema e protagonismo feminino no filme A árvore de
Marcação, dirigido por Jussara Queiroz, trazendo um olhar sobre o cinema brasileiro que leve
em consideração a presença feminina nos dois lados da câmera, conectando a trajetória da
diretora ao contexto histórico e ideológico de seu tempo. Enquanto profissional, ela atua em
um período de fundamental importância e que afeta direta produção artística nas mais diversas
linguagens. Estudou cinema na Universidade Federal Fluminense (UFF) na década de 1970,
quando o Brasil vivia uma ditadura civil-militar.
1 Trabalho apresentado no DT 4 – Comunicação Audiovisual, GP Cinema do XVI Encontro dos Grupos de Pesquisa em
Comunicação, evento componente do XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.
2 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Estudos da Mídia (PPgEM), da UFRN. Aluna em Missão de Estudos na
Universidade de São Paulo no semestre 2016.1 através do Programa de Cooperação Acadêmica - Procad USP/UFRN/UFMS
Edital 071/2013. E-mail: [email protected].
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Na mesma época, em nível internacional, o debate de gênero avança no campo da
pesquisa acadêmica. A introdução do olhar feminista representa uma ruptura teórica nos
Estudos Culturais britânicos no sentido de fornecer categorias de análise que permeiam o
âmbito das representações e recepção da produção cultural e midiática relacionada às
mulheres. Em 1975, Laura Mulvey publica o ensaio “Prazer visual e cinema narrativo” no
qual constrói uma crítica feminista ao questionar os modos de codificação da forma feminina
pelo cinema narrativo hollywoodiano, recorrendo à perspectiva estruturalista e psicanalítica.
O Cinema enquanto mediador de representações existentes no campo social e
individual permite articular discursos em torno de uma identidade cultural de grupos, pessoas
e lugares. Mostra um modo de ser e estar no mundo, estabelece um posicionamento diante do
que é visto. Apresenta-nos um conteúdo composto de conceitos e imagens criados por alguém
a respeito de outrem ou de algo.
1. Do objeto de estudo: resumo do filme e processo produtivo
Baseado no livro Crianças em Ação, do Padre Reginaldo Veloso, A árvore de
Marcação tem como cenário a vila de Marcação, no estado da Paraíba. As filmagens
iniciaram em 1987 com apoio da Embrafilme e interrompidas por problemas financeiros. Com
a estatal fechada em 1990, a busca por outros investimentos angariou uma coprodução com a
emissora de TV alemã Zweites Deutsches Fernsehen (ZDF).
O enredo inicia pelo relato de Jocélia, estudante de direito no Rio de Janeiro que
remonta à memória acontecimentos vividos quando ainda era menina em seu local da origem,
Marcação. Ao retomar cronologicamente a trajetória da jovem, levanta os pontos
fundamentais para a narrativa. Tudo começara com a chegada de uma freira, a Irmã Adriana,
um fato curioso e inesperado, pois logo no primeiro momento via-se uma mulher simples, que
não usava hábito. As desconfianças por parte dos adultos não tiram das crianças a vontade de
saber quem é aquela mulher, conhecendo-a e rapidamente construindo uma relação de
cumplicidade. A freira que deveria ensinar o catecismo torna-se amiga e redefine
substancialmente a vida daquele lugar.
O que começara com uma pergunta sobre os problemas do lugar, deriva num
questionamento sobre tudo que aflige as crianças, suas famílias e a comunidade de modo
geral. Ressalta um aspecto ligado ao período da ditadura militar e o temos que a repressão
causara nas pessoas gerando conformismo pela incompatibilidade de forças.
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A vida de Marcação gira em torno da cultura da cana-de-açúcar e produção de filé de
caranguejo, envolvendo tanto mão de obra adulta como infantil. As condições precárias, os
baixos salários desenvolvem uma atmosfera de pobreza sobre todos os moradores,
independente de faixa etária, tornando necessária a existência do trabalho infantil para ser
possível aumentar os rendimentos familiares.
É a partir da vinda da freira Adriana, seu contato inicial com as crianças e o
desenvolvimento de uma amizade sólida que todo esse contexto passa a sofrer mudanças. A
inércia dos adultos, o medo da ação não se faziam presentes nas crianças, que começando a se
reunir embaixo de uma árvore, em meios às brincadeiras levam à frente um movimento sem
uma ambição ideológica definida, mas que visava mudanças gradativas no lugar.
O ponto essencial ocorre quando, por algum motivo, o prefeito então decide que a
partir dali a água do chafariz público seria cobrada e, para um lugar de pessoas pobres, isso é
uma afronta à dignidade porque muitos certamente deixariam de atender outras necessidades
básicas. Diante dos acontecimentos e amparados pela freira, essas crianças, após inúmeros
encontros decidem comprar a briga, produzem um abaixo assinado reivindicando o acesso à
água nos moldes anteriores. Vão ao gabinete do prefeito e demais instâncias responsáveis e só
após muita insistência conseguem realmente reconquistar a água gratuita.
Por mais que aparentemente seja um enredo simples, contempla um reduto de aspectos
sobre a cultura brasileira e nordestina, da concentração de poder, do autoritarismo e
exploração dos mais pobres, principalmente ao referenciar os entes da ordem pública agindo
contrariamente ao interesse de todos, empregando o medo e submissão sobre o povo, que a
partir da reação das crianças, consegue abrir os olhos e lutar por suas conquistas.
2. O Nordeste como fenômeno comunicativo: estratégias simbólicas para construir uma
realidade
A comunicação humana tece o véu do mundo codificado, o véu da arte, da ciência,
da filosofia e da religião, ao redor de nós, e o tece com pontos cada vez mais
apertados, para que esqueçamos nossa própria solidão e nossa morte, e também a
morte daqueles que amamos. Em suma, o homem comunica-se com os outros; é um
“animal político”, não pelo fato de ser um animal social, mas sim porque é um
animal solitário, incapaz de viver na solidão. (FLUSSER, 2013, p.91).
Este trecho mostra o papel da comunicação, de como ela transita sobre inúmeras
esferas que determinam nossa existência, capacidade de ser e estar no mundo. O ser humano
assim o é não apenas como resultado de um conglomerado celular ou um incidente evolutivo,
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somos diferentes na medida em que podemos estabelecer relações entre o universo físico e o
das ideias.
Ao traçar um paralelo do mundo natural e dos conceitos, delegamos ao abstrato uma
função condicionante no que se refere ao modo de como constituímos relações de significados
e significantes, que transitam no âmbito do indivíduo e do social.
Para Flusser (2013, p.89), a comunicação humana é um “processo artificial”, baseada
em artifícios, descobertas, ferramentas, instrumentos, ou seja, em símbolos organizados em
códigos. A forma humana de se comunicar ocorre, segundo ele, de maneira não “natural” na
medida em que, na fala, não são produzidos sons naturais a exemplo do canto dos pássaros e
que a escrita, não é um gesto natural.
Stuart Hall (2003, p. 394) coloca em questão a artificialidade na comunicação, também
ressaltando o código enquanto referencial atribuído de significado: “A articulação de um
signo arbitrário – seja visual ou verbal – com o conceito de um referente é o produto não da
natureza, mas de uma convenção, e o convencionalismo dos discursos requer a intervenção e
o apoio dos códigos”.
Os códigos são, portanto, um modo no qual as mensagens são organizadas, imbuídas
de regras e determinantes que estabelecem relação entre si na transmissão de conteúdos.
Trazer esta noção para o trabalho decorre da necessidade de entender sob uma perspectiva
teórica como este mundo natural se transforma na região Nordeste do Brasil, enquanto
território dotado de características específicas, virando um signo visual e verbal traduzido na
linguagem cinematográfica.
O Nordeste se torna o centro de inúmeras abordagens formuladas a partir de discursos
que o atribuem significados definidos, cuja repetição confirma a emergência de um padrão
formador de uma realidade. Neste aspecto, a análise ocorre na dimensão da comunicação
mediada a partir de um dispositivo técnico, tendo em vista que o objeto deste artigo se trata de
um filme.
Albuquerque Júnior (1999) em seu trabalho intitulado “A invenção do Nordeste e
outras artes” traça o caminho de como acontece o processo de construção do Nordeste, de
como ele passa a surgir no contexto histórico do país enquanto um recorte espacial repleto de
sentido.
Tal “invenção” não deriva apenas uma sucessão de episódios marcantes, mas constitui
um panorama que retrata o regional no campo da produção histórica. O autor constrói uma
cartografia poética e científica capaz de resgatar elementos do imaginário social e afetivo do
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local, em contraponto à abordagem fatalista derivada de uma explicação centrada na tríade
natureza, política e economia.
O ideário em torno do Nordeste pressupõe uma unidade entrelaçada no aspecto da
cultura, etnia e geografia. Há uma espacialização imagética e textual que reflete relações de
poder instituídas onde se distribui significados. Ao trazer os percalços de construção histórica
da região, Albuquerque Júnior (1999) ressalta a produção de uma espacialidade baseada numa
distribuição dos sentidos.
Este local simbólico deriva também de uma sucessão e variadas formas de linguagens
existentes, intrínsecas ao processo e inseparáveis de qualquer instituição. Ambas, segundo
Albuquerque Jr. (1999), não apenas “representam o real, mas instituem reais”. Dentro de um
campo de enunciação, os discursos demarcam o espaço e o legitima; mediam uma realidade
que existe fora deles, mas que necessariamente dependem da linguagem para se tornarem algo
dotado de sentido.
O local de enunciação do discurso sobre o Nordeste enquanto região decorre pela e na
linguagem, e constitui formas de inteligibilidade que nos permitem estabelecer modos que
identificam uma realidade. Hall (2003, p.393) descreve:
[...] não há discurso inteligível sem a operação de um código. Os signos icônicos
são, portanto, signos codificados também – mesmo que aqui os códigos trabalhem
de forma diferente daquela de outros signos. Não há grau zero em linguagem.
Naturalismo e “realismo” – a aparente fidelidade da representação à coisa ou ao
conceito representado – é o resultado, o efeito, de uma certa articulação especifica
da linguagem sobre o “real”. É o resultado de uma prática discursiva.
Sobre a linguagem, também a consideramos em sua abrangência no aspecto
cinematográfico. Há a dimensão técnica existente neste tipo de construção da realidade. Esta
incorpora em si todas as etapas de produção dos espaços, mediando signos e codificando-os
numa possibilidade comunicativa que traz em si uma complexidade na medida em que resulta
da combinação entre os discursos visuais e auditivos.
Harry Pross (1990) classifica os meios entre primários, secundários e terciários. A
mídia primária é aquela que permite a comunicação sem instrumentos nem aparatos; a
secundária deriva da necessidade do aparato na produção e a terciária depende de aparelhos
tanto na transmissão quanto na recepção.
Tais distinções são importantes na medida em que caracterizam a qualidade de
simbolização existente em cada tipo de mídia e resumem de maneira simples a discussão em
torno da “artificialidade” da comunicação anteriormente vista em Flusser (2013) e Hall
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(2003). Portanto, delimitam conceitualmente a organização em códigos e ferramentas não
naturais. O primeiro tipo de meio pode ser exemplificado através da fala, gestos; o segundo
pode ser uma fotografia e o último, a televisão ou o cinema.
O cinema traz em si características dos três tipos de mídia colocados por Pross (1990),
porque acontece na fala, no gestual, sua forma primordial advinda da fotografia o insere na
secundária e sua necessidade de aparato para emissão e recepção, indo da película, câmera,
projetor e tela o fazem mídia terciária.
Todos estes elementos podem ser encarados enquanto possibilidade representativa, no
caso específico da região Nordeste, e sob o olhar cinematográfico, denota o discurso atrelado
à imagem, articulando o verbal e o visual de forma a conectar elementos que referenciam uma
percepção do lugar, reforçando uma concepção sobre o espaço derivada de signos icônicos.
3. A mulher no Cinema: perspectivas teóricas de análise
A ensaísta feminista e diretora cinematográfica Laura Mulvey (1983) discorre em
Prazer visual e cinema narrativo3 sobre as formas pelas quais são atribuídos papeis
tradicionais ao corpo das mulheres em tela, cuja aparência é codificada de forma a emitir um
impacto erótico, demonstrando a condição feminina como algo passivo. Ela constrói uma
crítica feminista ao cinema hollywoodiano recorrendo a uma perspectiva estruturalista e
psicanalítica. Para Mulvey (1983, p. 438):
A mulher existe na cultura patriarcal como significante do outro masculino, presa
por uma ordem simbólica na qual o homem pode exprimir suas fantasias e obsessões
através do comando linguístico, impondo-as sobre a imagem silenciosa da mulher,
ainda presa a seu lugar como portadora de significado e não produtora de
significado.
Defende no texto a existência de um direcionamento do olhar, que é masculino e
transfigura para a câmera maneiras de simbolizar o corpo e a presença feminina a partir de
uma representação formal que reflete uma concepção ideológica dominante do cinema. Suas
críticas recaem sobre o padrão hollywoodiano, no qual, segundo Mulvey, a mulher aparece
como imagem e o homem como dono do olhar.
3 Ensaio publicado por Mulvey em 1975 na revista britânica Screen. Não se trata necessariamente de um estudo científico
sobre a mulher no cinema, a autora coloca questionamentos sobre uma perspectiva de crítica que considera a representação de
gênero. Vale ressaltar a ebulição do movimento feminista nesse período e a inserção do tema e seu desenvolvimento do ponto
de vista teórico. Laura aborda aspectos da construção da imagem feminina no cinema clássico, sugerindo pontos importantes
na análise: a sociedade moldada na estrutura patriarcal, a psicanálise, de onde a ideia do inconsciente masculino e a
semiologia como ferramenta de tradução do “olhar masculino” enquanto signo que se efetiva na linguagem cinematográfica.
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A árvore de Marcação, enquanto produto fílmico, possui uma história diferente dos
padrões de Hollywood. Sua produção não se deu necessariamente dentro de uma lógica
capitalista, pois começou subvencionado pela estatal Embrafilme, muito menos cristaliza a
presença feminina enquanto estrela, alvo de admiração e beleza.
Ainda que distintas, tais ideias são importantes até como referência comparativa nas
leituras porque se fundamentam sobre como os discursos e as técnicas são empregadas na
produção de um tipo de representatividade feminina. Ao se demarcar uma noção de
identidade nordestina sob os atributos da masculinidade, podemos transpor o mesmo
raciocínio na medida em que os padrões de olhar se constroem sobre premissas semelhantes
das que ela critica.
Kaplan (1995) faz um levantamento de inúmeros aspectos que acompanham a
abordagem e evolução da crítica feminista do cinema a partir da década de 1970, elencando
suas características no contexto da narrativa clássica cinematográfica, bem como abordando
produções independentes.
Em A mulher e o cinema: os dois lados da câmera, a norte-americana E. Ann Kaplan
trata da relação sobre cinema e feminismo, ressaltando as escolas de pensamento presentes na
crítica feminista que se estendem pelos campos da sociologia, política, estruturalismo e
psicanálise. Uma obra extensa e detalhada, que coloca os avanços e questionamentos
presentes no debate, trazendo análise conceitual através de sua aplicação no estudo fílmico.
A obra se divide em dois contextos antagônicos, onde a primeira parte se dedica à
análise de filmes do cinema hollywoodiano clássico e contemporâneo, no qual inicia: “o olhar
é masculino?” e se isto seria “por razões inerentes à estrutura da linguagem, ao inconsciente,
aos sistemas simbólicos e assim todas estruturas sociais?” (Kaplan, 1995, p. 45).
No cinema, o olhar é direcionado de três maneiras distintas4:
a) Dentro do próprio texto fílmico;
b) O espectador;
c) O olhar original da câmera.
O prazer da experiência do cinema inicia no ato de olhar, na narrativa clássica, este se
basearia na diferença sexual estabelecendo os modos de codificação da imagem feminina. Na
letra “a”, ocorre quando a mulher torna-se objeto do olhar masculino através do contato, em
4 O que se chama de Escopofilia, ou prazer sexual em olhar, é ativado pela própria situação do cinema: a sala escura, a
maneira como o olhar do espectador é controlado, a abertura da câmera e depois a do projetor, o fato do espectador assistir a
imagens que se movem, cooperam para fazer a experiência cinematográfica próxima ao sonho, mais do que é possível em
qualquer outra arte. (KAPLAN, 1995, p.33)
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“b”, quando há a identificação com esse olhar pelo espectador e em “c” a câmera enquanto
dispositivo técnico de tradução do olhar para o quadro.
O uso da psicanálise como ferramenta de desconstrução do cinema clássico abriria
uma possibilidade de reconhecimento dos mitos patriarcais que posicionam a mulher como o
“outro”, eterno e imutável. A autora ainda considera sua relevância justamente para o “estudo
da organização social e industrial característico do século XX” servindo como ferramenta
analítica na medida em que os modelos psíquicos criados, sobretudo a partir do fim do século
anterior - com a consolidação das estruturas capitalistas sociais e interpessoais - exigiram uma
máquina (o cinema) capaz de fornecer resposta imediata que libertasse o inconsciente.
A segunda parte do livro baseia-se na análise de filmes do cinema feminista
independente, tanto de autoras norte-americanas como europeias. Entram trabalhos da própria
Laura Mulvey, Yvonne Rainer, Marguerite Duras e Margareth Von Trotta. Nas temáticas,
permanecem alguns signos da feminilidade já existentes, a exemplo da maternidade,
relacionamentos o silêncio como resistência, mas desta vez visando compreender como estas
qualidades da mulher seriam reformuladas para apresentar o feminismo como método ao
tratar sobre a vida das mulheres.
Ao demarcar uma possibilidade de ruptura com o modelo dominante patriarcal, este
tipo de crítica representa antes de tudo posicionamento político. A análise fílmica feminista
mostra uma busca por espaço que questiona a possibilidade de uma abordagem histórica
própria das mulheres. Será que ela existe? A qualidade de “possível” permeia as colocações
das autoras na medida em que pretendem transformar o discurso em posicionamento teórico.
A tentativa de contraposição ao domínio da visão masculina, de onde os modelos de
representação feminina teriam um status “eterno”, delegando à mulher uma condição de
marginalidade simbólica acontece na medida em que:
As cineastas exploram o problema da definição do feminino numa situação onde as
mulheres não têm voz ativa, não têm discurso, não têm um lugar de onde possam
falar, e examinam os mecanismos através dos quais as mulheres são relegadas à
ausência, ao silêncio e à marginalidade, tanto na cultura como nos textos clássicos e
no discurso dominante. (KAPLAN, 1995, p.27)
Isto desencadeia também uma visão sobre o fazer cinematográfico. Para as críticas de
cinema feministas da Inglaterra, ele seria um contracinema5. O avanço para a prática pelas
5 A ruptura não se dá apenas de maneira teórica, a resposta ao cinema narrativo tradicional seria também através do uso da
técnica cinematográfica para construir uma alternativa de representação do feminino desligada à forma dominante produzida
a partir do olhar masculino.
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diretoras seria a resposta à dominância do olhar masculino, aliando assim a teoria e a prática.
Sobre esta relação:
A teoria e a prática não são redutíveis uma à outra, parecem, no entanto, que as duas
áreas de trabalho pelas quais estou interessada se dirigem mais e mais às mesmas
questões. Estas incluem: as relações entre películas, realizadores e espectadores, as
formas de prazer que as mulheres podem sentir ao ver películas, e a natureza e
implicações das imagens femininas que constroem os distintos tipos de cinema.
(KUHN, 1991, p.11) 6
A imagem feminina - para além do cinema hollywoodiano - também se faz presente
nos mais diversos tipos de cinema, em seus variados contextos produtivos e culturais. Annette
Kuhn (1991) acrescenta a importância do reconhecimento dos fatores culturais na
configuração das relações de sexo e gênero. Na tentativa de identificar sobre quais
dispositivos a sociedade transforma a sexualidade biológica em produtos da atividade
humana, entende-se como a mulher se torna, enquadrada ideologicamente, sob as formas de
representação social dominante.
O desafio da crítica feminista sobre a representação da mulher flui para o debate sobre
a produção cinematográfica, de onde ficam inúmeros questionamentos, fundamentais no
processo de definição do que então seria o contracinema dito feminista: qual a relação entre
as intervenções culturais realizadas por mulheres e intervenções culturais feministas? A
mulher cineasta reproduz os códigos dominantes na representação das mulheres? O fato de ter
uma mulher na autoria do filme muda o olhar? É possível uma abordagem histórica própria
das mulheres? A ruptura ocorre na produção na narrativa ou no momento da interpretação?
A ideia de autoria permeia a análise com o intuito de colocar em evidência a
personalidade do trabalho de Jussara Queiroz enquanto diretora, de onde podemos de antemão
fazer algumas perguntas: Que temas ela trabalha? Com que abordagem? Há um foco em
questões ligadas à mulher e ao feminismo em seus filmes? Existe ligação com o debate de
gênero feito no exterior?
4. As mulheres de A árvore de Marcação: autora e personagens
4.1 Jussara Queiroz: nasceu no dia 04 de janeiro de 1956 na cidade de Jucurutu,
Rio Grande do Norte. Iniciou o contato com a sétima arte precocemente, pois seu pai era
proprietário do único cinema da cidade onde morava. Ainda criança brincava de projetar
filmes feitos com figurinhas de chiclete dentro de caixas de fósforos. Seu primeiro trabalho
6 Tradução nossa
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profissional seria como assistente de montagem no filme Boi de Prata, dirigido por Augusto
Ribeiro Júnior, rodado na década de 1970, mas lançado apenas no ano de 1980, sendo este o
primeiro longa-metragem rodado no Rio Grande do Norte e com apoio da Embrafilme.
Aos 18, mudou-se para o Rio de Janeiro, para cursar Comunicação na Universidade
Federal Fluminense (UFF), formando-se, respectivamente em jornalismo e cinema em 1980 e
1982. Entre 1975 e 1979 trabalha com produções de caráter mais experimentais em câmera
Super-8, produzindo tanto para a Embrafilme como TV Educativa. Teve a carreira
interrompida na década de 90 devido a problemas de saúde.
O conteúdo político, a referência ideológica à esquerda e a mobilização popular são
aspectos fundamentais contidos nas obras de Jussara Queiroz, que mesmo seguindo a linha
documental na maioria dos seus filmes não abandona o experimentalismo.
Estes fatores perpassam questões diretamente ligadas a um período importante da
história do cinema brasileiro, tanto nas suas concepções práticas - no que refere aos modos de
financiamento e produção através da criação da Embrafilme (1969-1990) - e teóricas,
atreladas ao tipo de pensamento cultivado pelos autores da época, no qual o debate político
produzido por uma intelectualidade de esquerda universitária e de classe média, que passa a
ocupar o cerne da produção cultural brasileira, sob a crença de uma arte revolucionária, com
refúgio no popular, em busca de uma afirmação da identidade nacional através da “fé no
povo”.
Entre os filmes dirigidos por Jussara Queiroz, encontram-se Fora de ordem (1982);
Acredito que o mundo será melhor (1983); Um caso de vida ou morte (1985); Um certo meio
ambiente (1986); e A árvore de Marcação (1987-1993).
4.2 Irmã Adriana: A freira interpretada pela atriz Marcélia Cartaxo é um dos
personagens na medida em que seu surgimento no filme é ponto essencial na ruptura
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narrativa. A chegada da Irmã Adriana na vila de Marcação causa inicialmente estranhamento
e comentários por parte dos adultos, sobretudo pela ausência do hábito. Na convivência com
as crianças, a experiência lúdica das brincadeiras em grupo torna-se o espaço para a discussão
dos problemas do local: trabalho infantil, latifúndio, coronelismo e a cobrança pela água, que
antes era gratuita.
“De repente chegou a mulher que diziam que era freira, totalmente normal, ainda jovem. Era
uma pessoa de quem se gosta logo e um pouco misteriosa também...Ela ainda se vestia como
a gente e dormia numa rede como todo mundo.”7
“Vocês lembram como foi que cheguei aqui? Vim como qualquer uma de vocês, morando
numa casa igual à de vocês, carregando água...vim para ser irmã de vocês. Logo nos
primeiros dias, seus filhos se aproximaram de mim, fizeram amizade comigo e isso foi motivo
de muita alegria. Nas conversas que tivemos, nas brincadeiras, até nas rezas a gente
descobriu muitas coisas, e aí começamos esta luta. Mas teve gente que em vez de gostar e
apoiar, achou ruim, não sei por que. O povo tá acostumado demais a esperar, a esperar uns
pelos outros, a esperar pelos grandes, a esperar por Deus. A gente já devia ter aprendido que
quem espera pelos outros nem ajuda, nem se ajuda. Quem espera pelos grandes termina
sendo enganado, e quem espera por Deus já devia ter lembrado: Deus nos deu cabeça pra
pensar, olhos pra enxergar, pernas pra andar, braços pra agir e duas mãos para repartir. É o
que estamos fazendo, mas tem gente que não quer reconhecer esta luta, por isso, tirei da
mala o traje de freira, e como freira eu vim para a rua, pra dizer pra todo mundo que dou
todo apoio a essas crianças. Quero pedir a vocês, pelo amor de Deus, pelo amor que têm a
seus filhos, pelo amor que têm a esse lugar, que apoiem a luta pela água de graça!”
7 Citações em itálico indicam diálogos transcritos do filme.
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4.3 Jocélia: A narradora do filme é sob seu ponto de vista e sua voz que a história é
apresentada ao espectador. Jocélia era uma das meninas mais destacadas no grupo das
crianças durante a reivindicação da água. A “neguinha atrevida”, assim descrita pelo jagunço,
reaparece já adulta contando sua trajetória. Conseguiu sair do interior do Nordeste e foi para o
Rio de Janeiro, onde trabalha e cursava faculdade de Direito.
“Senhor prefeito, novamente o senhor não trouxe a água e teria sido tão simples para o
senhor. No mundo inteiro, em todos os lugares onde existe chafariz público e gente pobre, a
água é de graça, pelo menos a água, mas o senhor faz questão que a gente pague por um
pouquinho dela. Quem de vocês tem dinheiro? Quem pode pagar a água? A maioria de nós
nem tem trabalho, e quem se sacrifica no canavial não recebe o que merece, nem um pedaço
de terra e os caranguejos que a gente pega são para os pratos de outras pessoas e o senhor,
seu prefeito, ainda nos tirou a água. Os nossos pais não se defendiam, sempre se deixaram
amedrontar, mas chegou uma pessoa aqui e fez aquilo que eles deveriam ter feito: a Irmã.
Ela virou a nossa irmã, ela nos ajudou a nos defender e a criar coragem. Será que temos
algum futuro se a gente não se defende? Vamos lutar para um pagamento justo, vamos lutar
pelo nosso trabalho, vamos lutar por tudo aquilo que a terra nos oferece. O ar para respirar
e a água para beber e novamente a água vai pertencer a todos, a todos nós”
5. Algumas considerações
Aluna de Nelson Pereira dos Santos na UFF, Jussara Queiroz bebeu na fonte do
Cinema Novo durante sua formação de cineasta. Jussara militava pelo cinema e através dele.
Atuou principalmente entre as décadas de 1970 a 1990. A árvore de Marcação viu o fim da
Embrafilme. Ela precisou buscar outros tipos de financiamento e conseguiu através da
emissora alemã ZDF.
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Não dá para fazer uma pesquisa sobre gênero em seus filmes, ainda mais falando sobre
as mulheres, sem trazer sua trajetória e sua formação humana, a forma que via o mundo e
como traduzia isso para os filmes. Este trabalho é um encontro de significações. Jussara, uma
mulher nordestina que vai para o Rio de Janeiro em plena ditadura estudar cinema. Seus
filmes trazem esse espaço de significação latente no cinema brasileiro e traz mulheres fortes
como a própria autora.
Falamos sobre Nordeste no início já que é este o lugar sobre o qual Jussara fala e de
onde ela fala. Há sim uma “ideologização” do Nordeste no cinema militante de esquerda, uma
crença no “povo” como ator revolucionário, de onde viria a resistência contra o imperialismo
estrangeiro e o despertar contra a tirania no país. A formação do espaço e do homem
nordestino como um paradigma da brasilidade se fez presenta nas mais diversas expressões
artísticas, seja na música, literatura e sobretudo no cinema na década de 1960 com sua
“estética da fome”. Mesmo assim, existe em A árvore de Marcação outra possibilidade, esta
advém da enunciação feminina que marca a força de sua narrativa e por quê não?
Os textos da crítica feminista cinematográfica abordam o momento de ascensão das
mulheres e questionam a possibilidade de uma história que leve em consideração a existência
do feminino como agente e não somente como um signo imutável. Representam um marco
histórico importante e trazem justamente os problemas existentes no tema, mas creio que para
nós, brasileiros e latino-americanos, a aplicação de conceitos pensados no cinema
hollywoodiano não são 100% eficazes. O foco da crítica era ainda a sociedade norte-
americana e europeia industrializada e as diretoras do contracinema feminista advinham deste
contexto. Eis que nisso surge um porém: como enxergar o feminino enquanto possibilidade no
cinema brasileiro? Quem são as mulheres produzindo filmes por aqui e em que momentos?
A consolidação do Nordeste enquanto discurso no cinema brasileiro, ocorre na maioria
das vezes sobre a figura e personagens masculinos: o cangaceiro, o coronel, o padre, o
jagunço. A construção simbólica refletia, isto é claro, a estrutura patriarcal dominante.
Percebe-se a visão romantizada do povo e até mesmo das mulheres como seres da virtude
plena no filme, mas o que mais intriga são os questionamentos que o tema oferece. Falar de
mulher o cinema é uma emergência constante de perguntas.
Uma mulher nordestina fazendo filmes, ainda mais em períodos de dificuldade de
acesso às tecnologias, de ditadura militar, e tentativas de buscar um modelo de cinema
tipicamente nacional, concerne o questionamento: um espelho ou uma visão romantizada do
feminino? Seria este o espaço de ambivalênciade sentidos?
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – São Paulo - SP – 05 a 09/09/2016
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Ao descrever as personagens Jocélia e Irmã Adriana por suas falas, contrapomos os
personagens masculinos tradicionais: prefeito, capanga e delas que se erguem de maneira
autônoma e conseguem transformar o local sem a dependência de uma figura masculina, mas
ao mesmo tempo sem buscar soluções individuais ou violentas.
As mulheres são um elemento de significação, desde a freira ou a criança, não se
apresentam ao espectador como um signo limitado, elas se transformam e transformam o
contexto. A crítica feminista questionava o status de “eternidade” sobre o qual persistia a
representação dos papeis femininos, mesmo sendo mães, religiosas ou donas de casa, ao
transpor para uma perspectiva onde a mulher é um ser dotado de personalidade e não reflexo
do que se espera dela, altera o simbolismo existente em torno do ser mulher e da feminilidade.
Talvez um dos pontos essenciais que ajudem a diferenciar uma visão masculina e
feminina é a potencialidade da mulher progredir e assim fazer interferindo no meio. Não basta
uma contraposição onde a mulher cresce à semelhança da ideologia masculina dominante. A
história masculina de transmissão de poder, de ascensão de grupos, marginalização de outros
contadas pelos vitoriosos parece não ser mais suficiente.
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – São Paulo - SP – 05 a 09/09/2016
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Referências
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