motivaÇÃo e estratÉgias de aprendizagem …...a compreensão leitora é uma habilidade que se...
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XVIII SEDU - SEMANA DA EDUCAÇÃO
I CONGRESSO INTERNACIONAL DE EDUCAÇÃO
CONTEXTOS EDUCACIONAIS: FORMAÇÃO, LINGUAGENS E DESAFIOS
MOTIVAÇÃO E ESTRATÉGIAS DE APRENDIZAGEM NO ENSINO FUNDAMENTAL
Aline Guilherme Maciel Santos UEL - [email protected]
Aloyseo Bzuneck UEL - [email protected]
Eixo 2: educação básica
Resumo O presente estudo, de natureza quase-experimental, delineou procedimentos para nove sessões de intervenção com o objetivo de promover avanços em estratégias de compreensão leitora e motivação. As abordagens teóricas utilizadas nessa investigação foram a Teoria de Expectativa-valor, Teoria do Processamento da Informação, bem como abordagens gerais cognitivistas acerca da compreensão leitora. Participaram do estudo alunos da 5.ª série do ensino fundamental de uma escola da rede pública de uma cidade do estado do Paraná, Brasil. As intervenções aconteceram no próprio ambiente escolar, atendidos todos os procedimentos éticos exigidos numa pesquisa com seres humanos. O grupo experimental foi constituído pelos alunos com baixo rendimento escolar e que, por isso, participavam de aulas de reforço em sala de apoio. Para comparações, formou-se também um grupo controle, de igual número de alunos da mesma série escolar que, por apresentarem rendimento satisfatório, não participavam da sala de apoio. Os dois grupos de alunos foram avaliados em três momentos por meio dos seguintes instrumentos: (a) Escala de Estratégias de Aprendizagem Voltadas para a Leitura; (b) Técnica de Cloze; (c) Avaliação da Autopercepção e Percepção da Tarefa de Adolescentes nos Domínios de Português e de Matemática, e; (d) questões de interpretação de Problemas de Matemática. O Grupo Experimental participou de nove sessões de intervenção, nas quais recebiam apoio motivacional e ensino de estratégias de aprendizagem para compreensão de leitura. Os resultados mostraram ganhos nessa habilidade, sendo que a maioria dos participantes atingiu o Nível Independente em leitura. Houve também melhora no uso de estratégias de aprendizagem, mas não aumento da motivação em termos de expectativa e valor. Os resultados obtidos no presente estudo podem ser úteis a educadores e psicopedagogos, além de revelarem a importância da formação de docentes capazes de aprender e ensinar de modo estratégico, visando o desenvolvimento da compreensão leitora e da motivação para aprender. Palavras-Chave: estratégias de aprendizagem; compreensão leitora; teoria expectativa-valor; autoconceito de capacidade; intervenção.
Introdução
O presente estudo de intervenção partiu da experiência pessoal de
queixas reiteradas de professoras e psicopedagogas de que muitos alunos do
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ensino fundamental aprenderam a ler e escrever, mas não sabem interpretar textos.
Essa queixa tem fundamento, como tem sido revelado por avaliações oficiais
brasileiras, como por exemplo o Programa Internacional de Avaliação de
Estudantes (Pisa) — Programme for International Student Assessment —, da
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O
desempenho médio dos estudantes brasileiros na avaliação de leitura foi de 407
pontos, valor significativamente inferior à média dos estudantes dos países
membros da OCDE: 493 (MEC, 2018).
Compreender um texto requer, como argumentam Brandão e
Spinillo (1998; 2001) e Gomes (2008), que o leitor atribua significados, faça
inferências, construa relações entre os enunciados de modo a integrá-los,
identificando e selecionando as informações mais importantes, o que supõe
conhecimentos de mundo e conhecimentos linguísticos. Aí está explicitada a razão
de uma grande tarefa de todo professor ou professora do ensino fundamental. O
ensino da leitura não deve limitar-se a levar as crianças ao domínio da
decodificação, mas principalmente à compreensão do que se está lendo, como
também em desenvolver as estratégias que potencializam essa compreensão
(GOMES, 2008; GONÇALVES, 2007; KLEIMAN, 2004; SOLÉ, 1998).
Motivação e Estratégias de Aprendizagem
Diversas pesquisas, transversais e longitudinais, relatadas por
Wigfield & Eccles (2000; 2002), descobriram que, no decorrer das séries escolares,
declinam a crença dos alunos sobre sua competência, as expectativas de sucesso
e a valorização de diferentes tarefas. Em particular, Archambault, Eccles e Vida
(2010) chegaram ao resultado de que, ao longo de todo o ensino fundamental, 90%
das crianças avaliadas sofreram quedas significativas em sua motivação para a
leitura e a escrita.
Mas, a questão chave é esta: em última análise, o que os motiva?
Pintrich (2003) apresentou cinco famílias de constructos que, segundo teorias
sociocognitivas contemporâneas e por dados de pesquisas, representam
motivadores eficazes para os alunos se envolverem nos processos de
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aprendizagem. Entre essas famílias são citadas as autopercepções de capacidade
e a altos níveis de valorização das aprendizagens.
A Teoria Expectativa-valor (ECCLES; WIGFIELD, 2002) considera
simultaneamente a valorização da tarefa e a expectativa de sucesso como
determinantes cruciais do desempenho, da persistência e da própria escolha de
tarefas a serem realizadas. Tais expectativas e valorização, por sua vez, são
influenciados pelas crenças sobre tarefas específicas, que consistem de
percepções de competência, percepção da dificuldade de cada tarefa, das metas
pessoais e de esquemas referenciados ao self. São também influenciadas pelas
memórias afetivas, pelas próprias interpretações de resultados anteriores, bem
como pelas atitudes e expectativas de outras pessoas para com eles. Em suma, as
percepções dos indivíduos sobre determinada tarefa e suas interpretações sobre o
resultado obtido são influenciados pelas crenças e pelos comportamentos sociais,
pelo meio cultural e eventos históricos (ECCLES; WIGFIELD, 2002).
No entanto, para ter êxito nas aprendizagens escolares não basta
que o aluno esteja motivado, mas é necessário que ele também domine
conhecimentos básicos, relevantes para o processamento de qualquer conteúdo
novo e, sobretudo, que conheça e utilize estratégias eficazes de aprendizagem
(BORUCHOVITCH, 2007; BZUNECK, 2001). A título de exemplo, para aprender a
interpretar um texto requer-se o conhecimento básico de saber ler, entre outros.
Entretanto, é imprescindível que o aluno também saiba como identificar as ideias-
chave de cada parágrafo, monitorar a atenção no momento da leitura, fazer notas
sobre o que considerar relevante, entre outras estratégias que potencializam o
desenvolvimento daquela habilidade e resultados desejáveis de aprendizagem.
A compreensão leitora é uma habilidade que se adquire com o
emprego de estratégias adequadas e que devem ser ensinadas. Segundo Joly,
Santos e Marini (2006), estribadas na literatura, o termo estratégia, no contexto da
leitura, consiste de habilidades cognitivas e metacognitivas. As estratégias
cognitivas são os procedimentos adotados para tratar especificamente a informação
contida no texto, o que inclui a construção do significado. Já as estratégias
metacognitivas, aplicadas à compreensão leitora, implicam a consciência dos
processos usados na compreensão e incluem planejamento, monitoramento e
regulação das atividades cognitivas.
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A intervenção em estratégias de aprendizagem tem-se mostrado
eficaz no desempenho de alunos de todos os níveis de ensino. Ensinar o aluno a
aprender utilizando estratégias cognitivas e metacognitivas potencializa as
experiências de sucesso escolar e, consequentemente, melhora as crenças de
competência do aluno (BORUCHOVITCH, 2007). O suprimento de tais
necessidades potencializa a qualidade motivacional dos estudantes, pois estes se
sentem mais seguros, capazes e preserva-se o senso de que determinada situação
está sob seu controle.
Objetivos
Três objetivos nortearam a presente investigação, caracterizada
como quase-experimental. O primeiro foi verificar se uma intervenção de ensino e
treinamento de estratégias promoveria avanços em compreensão leitora em alunos
de baixo rendimento escolar. O segundo objetivo foi avaliar se, com a intervenção,
melhoraria a utilização de estratégias de aprendizagem voltadas à compreensão
leitora. Por último, buscou-se descobrir se a motivação dos alunos para Português
seria fortalecida em função da intervenção em estratégias de compreensão leitora.
Metodologia
Alunos participantes
De um total de 68 alunos de quatro turmas de 5.ª série de uma
escola, foram selecionados 19 para a presente intervenção, identificados pelo
rendimento insatisfatório nas disciplinas de Português e Matemática e inseridos num
programa de reforço em sala de apoio, denominado contraturno. Apenas oito,
porém, persistiram nas sessões de intervenção, três do sexo masculino e cinco do
sexo feminino. Para que se empreendessem análises de comparação entre os
dados desse grupo experimental formou-se um grupo controle de igual número,
extraído por escolha aleatória das mesmas salas de aula e que, pelo seu
rendimento, não precisavam frequentar as salas de apoio.
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Instrumentos
Todos os 16 alunos da amostra selecionada foram submetidos a
quatro tipos de avaliação. Para a investigação do uso de estratégias foi utilizada a
Escala de Estratégias de Aprendizagem voltadas para a Leitura, baseada numa
escala mais ampla de Boruchovitch e Santos (2001). No presente caso, foram
selecionadas apenas 11 questões específicas de estratégias de leitura. Além disso,
a escala Likert considerou cinco alternativas de resposta, desde não (valor 1) até
sempre (valor 5).
O diagnóstico da compreensão leitora foi feito de duas formas, ou
seja, pela Técnica de Cloze e por um questionário aberto sobre compreensão de
problemas de matemática. Por último, a Motivação para interpretação de texto e
para a disciplina de Português foi medida pela escala de Autopercepção de
capacidade e de Expectativa-Valor. Esse questionário, também em escala Likert, foi
elaborado por Maciel e Bzuneck (2011), com base na Teoria de Eccles e Wigfield
(2000). O questionário compunha-se de 13 itens que se referiam a três constructos:
autopercepção de capacidade (três itens), expectativa de sucesso em Português
(um item) e valorização dessa disciplina (10 itens). A seleção dos itens e sua
distribuição pelas três categorias resultou da concordância de dois juízes
independentes que examinaram uma lista inicial de 16 itens. Foram levantadas as
médias grupais dos dez itens relativos a expectativa-valor e, por outro lado, dos três
itens de autopercepção de capacidade.
Para avaliar o progresso em compreensão leitora, pela técnica de
Cloze, foram utilizados os critérios e as categorias propostas por Bormuth (apud
GOMES, 2008). O nível de frustração (ou insatisfatório) corresponde a acertos
abaixo de 44%, o nível médio entre 44% e 57%, e acima desse valor considera-se
como nível independente. Com base para as avaliações utilizou-se o texto “Nós e
nosso lugar”, retirado do livro didático de Geografia para 6o ano do ensino
fundamental (SAMPAIO, 2005), com 196 palavras e 35 lacunas. Essa técnica foi
aplicada no pré e no pós-teste com os alunos do grupo experimental. Foi utilizada
a correção sinônima e ponderada na avaliação das respostas nas lacunas, isto é,
considerou-se como acerto o uso de palavras sinônimas, conforme dois dicionários
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da língua portuguesa (FERREIRA, 1999; HOUAISS, 2010) e não foram levados em
consideração os erros gramaticais.
O problema de matemática, retirado do livro “A Conquista da
Matemática – 6º ano” (CASTRUCCI; GIOVANNI; GIOVANNI JR., 2009), era seguido
de cinco perguntas destinadas a identificar a qualidade da compreensão do seu
teor. Foi utilizado o mesmo problema nas duas fases de avaliação (pré e pós-teste).
Para avaliar as respostas obtidas, foram atribuídos 20 pontos a cada resposta
correta, e para última questão, relacionada com a resolução do problema, foram
considerados 20 pontos apenas para os alunos que tentaram resolver o problema
com cálculos matemáticos, e 10 pontos para aqueles que apenas mencionaram o
que fariam.
Procedimentos
Os oito alunos do grupo experimental, que passaram pela
intervenção, e os oito de controle foram submetidos, como pré-teste, à avaliação de
compreensão leitora e da motivação para Português. Na sequência, os oito alunos
do grupo experimental foram submetidos a procedimentos de intervenção, que
consistiram numa série de nove sessões semanais, cada qual com a duração de 45
minutos, ao longo de três meses. Os feriados daquele semestre impediram a
regularidade dos encontros semanais. Cada sessão iniciava-se com uma
experiência de socialização para despertar a motivação pelos trabalhos, a qual era
seguida do ensino e treinamento de estratégias específicas de leitura. A partir da
segunda sessão, fazia-se também recapitulação da sessão anterior.
O ensino e treinamento de estratégias, visando a compreensão
leitora, incluía táticas que despertassem o interesse antes da leitura de cada texto
selecionado para a ocasião, como sugerido por Solé (1998). Ainda por sugestão
dessa mesma autora, foram trabalhadas, nas nove sessões de intervenção, as
seguintes estratégias: identificação dos objetivos do texto apresentado; revisão e
atualização de conhecimentos prévios relevantes; estabelecimento de previsões
sobre o que viria mais adiante no texto, e; formulação de perguntas e respostas
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sobre o mesmo. Ao final, cobrava-se de cada participante a explicitação da ideia
principal do texto e um resumo por escrito.
Resultados
Os dados deste estudo serão apresentados em associação com os
objetivos. Análises quantitativas mostrarão comparações entre os dois grupos nos
tempos: pré-teste, pós-teste e pós-teste postergado.
Efeitos dos procedimentos de intervenção na melhoria da compreensão leitora
O primeiro objetivo da investigação foi verificar o nível de
compreensão leitora dos estudantes do grupo experimental, após as sessões de
intervenção, em comparação com o pré-teste. Para verificar a consecução desse
objetivo, foram analisados os dados obtidos por meio da técnica de Cloze e do
Problema de Matemática.
Em relação aos níveis de compreensão leitora, pela técnica do
Cloze, descobriu-se que, no pré-teste, quatro dos oito alunos apresentaram nível de
frustração, ou seja, insatisfatório. Esses alunos passaram a apresentar melhores
níveis, sendo dois alunos no nível médio e dois no nível independente. Além disso,
apesar de um aluno ter piorado seu desempenho nessa segunda avaliação, nenhum
deles permaneceu no nível insatisfatório de leitura após o programa de intervenção.
Pelo método de questões sobre Problema de Matemática, cinco alunos desse grupo
apresentaram melhora na compreensão leitora, dois dos quais com avanço de 40%
e nenhum deles acusou piora.
Uso de estratégias de aprendizagem para a compreensão leitora
O segundo objetivo do estudo foi avaliar se houve incremento da
utilização de estratégias de aprendizagem voltadas à compreensão leitora, após a
intervenção, no caso do grupo experimental, e também na comparação com os
alunos do grupo controle. Como peculiaridade nessa avaliação, todos os alunos
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preencheram a respectiva escala tanto no pós-teste logo ao final das sessões de
intervenção, como num pós-teste postergado, que ocorreu dois meses mais tarde
(Tabela 1).
Ambos os grupos apresentaram aumento discreto nas médias
dessa medida no pós-teste quando comparadas com o pré-teste e um aumento
pouco maior no pós-teste postergado. Como detalhe, porém, cinco alunos do grupo
experimental apresentaram escores mais elevados no pós-teste postergado do que
no pré-teste, ao passo que no grupo controle, apenas quatro apresentaram ligeira
melhoria.
TABELA 1: MÉDIAS E DESVIOS PADRÃO DOS DOIS GRUPOS NO USO DE ESTRATÉGIAS DE
APRENDIZAGEM, NOS TRÊS MOMENTOS DE AVALIAÇÃO
GRUPO CONTROLE GRUPO EXPERIMENTAL
MÉDIA D. P. MÉDIA D. P.
PRÉ-TESTE 2,25 1,31 2,40 1,41
PÓS-TESTE 2,30 1,40 2,43 1,41
TESTE POST. 2,72 1,43 2,77 1,35
Fonte: própria autora (2019)
Motivação para Português em termos de Expectativa-Valor e Autoconceito de Capacidade
O terceiro objetivo da pesquisa foi avaliar a motivação de alunos
para Português, a fim de verificar as possíveis alterações após a intervenção. A
hipótese era que, pelo aperfeiçoamento da compreensão leitora e pelo progresso
no domínio de estratégias associadas a essa habilidade, os alunos revelariam
incremento de sua motivação para com a disciplina de Português, em termos de
expectativas de sucesso e valorização e, adicionalmente, de autoconceito de
capacidade. As comparações foram entre o grupo experimental e o de controle, em
cada uma das três fases de pré-teste, pós-teste e pós-teste postergado como pode
se observar na figura abaixo.
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Fonte: própria autora (2019)
A figura 2 mostra as curvas representativas dos escores de cada
grupo a cada fase de avaliação, com os valores incluídos na tabela anexada. Cabe
destacar a semelhança entre os escores médios dos dois grupos no pré-teste e no
pós-teste postergado, mas o grupo experimental apresentou, no pós-teste
postergado, notável aumento na medida de expectativa e valor em relação ao
Português. Embora os alunos do grupo de controle tenham revelado pontuações
mais altas no primeiro pós-teste do que os colegas do grupo experimental pode ser
explicado pelo fato de já se sentirem seguros da aprovação. A experiência de êxito,
ao final do ano, por si só já alimenta as expectativas positivas e a valorização da
disciplina.
Discussão
A questão crucial que se coloca é se produziu algum efeito positivo
a passagem de alunos com baixo rendimento por uma intervenção remediadora, na
qual se trabalhou com treinamento em estratégias de aprendizagem. Os resultados
fornecem conclusões, ao menos em parte, animadoras. Os dados finais do grupo
submetido à intervenção devem ser apreciados tanto em comparação com os do
grupo de controle como, sobretudo, com os próprios escores na avaliação inicial,
anterior ao procedimento.
Pré-teste Pós-teste Pós-teste Post.
GC 4,18 4,53 4,42
GE 4,1 4,13 4,46
3,8
3,9
4
4,1
4,2
4,3
4,4
4,5
4,6
Médias
Figura 2. Comparações entre o GC e GE referente à Expectativa-valor em Português
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Assim, em primeiro lugar, pelos resultados com a técnica de Cloze
e com as questões sobre Problemas de Matemática, verificou-se melhoria na
compreensão leitora nos alunos do grupo experimental, com uma única exceção.
Em particular, todos os que partiram do nível insatisfatório deixaram essa condição
no pós-teste. Esse é um dado similar ao encontrado nos estudos de Gomes (2008)
e Santos e Oliveira (2010), sugerindo a eficácia desse tipo de intervenção.
Quanto aos efeitos da intervenção sobre a utilização de estratégias
de aprendizagem voltadas à compreensão leitora, os resultados não evidenciaram
progresso no pós-teste, mas somente no pós-teste postergado. Como explicar a
ausência de efeito positivo da intervenção, por ocasião do primeiro pós-teste? As
circunstâncias da sua aplicação podem ter contribuído para isso. Como ela ocorreu
no último dia de aulas na sala de apoio, na última semana do ano, o clima de
agitação poderia ter levado a descuido nas respostas, fácil de ocorrer quando se
trata de escalas. Adicionalmente, não se descarta a presença de alta ansiedade
naqueles alunos pela expectativa do resultado iminente sobre se passariam ou não
de ano. Em suma, é razoável o julgamento de que as condições pouco favoráveis
em que foi feita essa avaliação causaram distorção nos seus resultados. Já o pós-
teste postergado, no início do ano letivo subsequente, ocorreu num clima
descontraído e livre de qualquer medo ou ansiedade, permitindo a conclusão de
que seu resultado reflete mais fielmente a condição dos alunos. Ou seja, pela
avaliação postergada, foram identificadas melhorias na utilização de estratégias de
aprendizagem voltadas à leitura. Neste sentido, os presentes resultados alinham-
se com os de outros estudos de intervenção, com objetivos similares, como o de
Gomes (2008), Guthrie (2006), Hulleman e Harackiewiez (2009), Santos (2004).
A mesma justificativa para os dados das estratégias pode ser
avocada em relação aos resultados sobre a motivação para a disciplina de
Português, em termos de expectativa e valor. Também nessa medida, surgiu
progresso maior apenas no pós-teste postergado. Neste sentido, o presente
resultado alinha-se com os de Pintrich (2002), em que o valor da tarefa estava
vinculado a uso mais frequente de estratégias e ao desempenho dos alunos. Em
outras palavras, há uma relação positiva entre a utilização de estratégias de
aprendizagem e a motivação, em termos de expectativa e valor pelo Português. O
grupo de controle apresentou um salto qualitativo no pós-teste, ao contrário do pós-
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teste postergado, em que houve uma queda naquela medida. Na medida de
autopercepção de capacidade, não era de se esperar evolução nos escores, já que
eram relativamente altos desde o pré-teste e assim se mantiveram. Neste sentido,
aqui não se verificou o fenômeno de queda nesse constructo, apontado por Wigfield
& Eccles (2000; 2002).
De resto, como observaram Yeager e Walton (2011), intervenções
na área educacional não têm efeito mágico imediato. Num estudo com alunos de 4ª
série, Villiger e cols. (2012), verificaram que a intervenção para compreensão leitora
não surtiu o efeito esperado, mas exerceu influência positiva sobre a motivação. Os
autores explicaram esse dado argumentando que aquelas crianças já estavam
numa condição permanente de treinamento nessa habilidade, ao contrário da
motivação, que era uma área negligenciada. Além disso, no caso do presente
estudo, pode-se supor que a motivação, medida com base na abordagem específica
de expectativa-valor, não apresentou melhora porque não se achava em nível muito
baixo desde o início. Por esse motivo, avaliações com outras abordagens, como de
metas de realização, poderiam oferecer dados mais completos sobre melhora ou
não da motivação, o que remete à necessidade de mais pesquisas.
Considerações Finais e Limitações
Para educadoras e psicopedagogas, os resultados do presente
estudo exploratório sugerem que quando se trata de alunos com dificuldade de
aprendizagem em qualquer disciplina, inclusive em matemática, o diagnóstico deve
sempre incluir uma avaliação da compreensão leitora, já que deficiências nessa
habilidade comprometem as aprendizagens. Procedimentos de remediação,
talhados para cada caso, têm o potencial de reverter um quadro de fracasso escolar,
dispensando, em muitos casos, o recurso a terapias mais sofisticadas.
Como limitação aponta-se a necessidade de um maior número de
sessões interventivas, bem como a frequência contínua, procurando manter
intervalos semanais. Outra limitação é o momento de aplicação dos testes,
evitando-se aplica-los em momentos de alta ansiedade, tal como a semana que
antecede a finalização das aulas e recebimento do rendimento acadêmico.
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AGRADECIMENTOS
À agencia de fomento capes /CNpq pela bolsa concedida à
estudante para realização desse trabalho.
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XVIII SEDU - SEMANA DA EDUCAÇÃO
I CONGRESSO INTERNACIONAL DE EDUCAÇÃO
CONTEXTOS EDUCACIONAIS: FORMAÇÃO, LINGUAGENS E DESAFIOS
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