o fretamento individual como modalidade alternativa …
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
FACULDADE DE DIREITO
MÁRCIO DAYVE ALENCAR NASCIMENTO
O FRETAMENTO INDIVIDUAL COMO MODALIDADE ALTERNATIVA NO SISTEMA DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO INTERMUNICIPAL DE PASSAGEIROS DO ESTADO DO CEARÁ
FORTALEZA
2009
MÁRCIO DAYVE ALENCAR NASCIMENTO
O FRETAMENTO INDIVIDUAL COMO MODALIDADE ALTERNATIVA NO SISTEMA DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO INTERMUNICIPAL DE PASSAGEIROS DO ESTADO DO CEARÁ
Monografia submetida à apreciação da Banca Examinadora do Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel.
Área de Concentração: Direito Administrativo
Orientadora: Profa. Dra. Raquel Coelho Lenz Cesar
FORTALEZA/CE
2009
MÁRCIO DAYVE ALENCAR NASCIMENTO
O FRETAMENTO INDIVIDUAL COMO MODALIDADE ALTERNATIVA NO SISTEMA DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO INTERMUNICIPAL DE PASSAGEIROS DO ESTADO DO CEARÁ
Curso de Graduação em DireitoFaculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará
Aprovado em: ____/____/____
Banca Examinadora:
____________________________________Raquel Coelho Lenz Cesar
____________________________________Willian Paiva Marques Junior
____________________________________Francisco Davi Peixoto
DEDICATÓRIA
À Mara, minha namorada,companheira incansável e amiga incondicional
pelo estímulo, apoio e carinho nos momentos mais difíceis,pela doce companhia e ternura da convivência dia-a-dia,
com todo o meu amor e admiração.
Ao meu pai, Joaquim José do Nascimento,a quem devo minha vida e formação moral,
pelo exemplo de hombridade, honradez e simplicidade,com todo o meu respeito, admiração e carinho.
AGRADECIMENTOS
A conclusão desta monografia jurídica foi possível graças a colaboração de muitas
pessoas, a quem gostaria de expressar meus sinceros agradecimentos:
À minha mestra, Raquel Coelho Lenz Cesar, por todo o apoio, incentivo e
compreensão com que me orientou, e por nunca ter desacreditado na conclusão desta
pesquisa.
Aos professores William Paiva Marques Junior e Francisco Davi Peixoto, pela
grande compreensão e presteza com que me atenderam, aceitado participar da Banca
Examinadora desta monografia.
À minha namorada Mara, pela paciência nas minhas ausências, pelo constante
incentivo e apoio em toda a minha caminha acadêmica, por cada nota-de-aula e cada hora de
estudo compartilhada, pela imensa ajuda na elaboração deste trabalho.
Aos mestres, que honradamente considero amigos, Dr. Igor Vanconcelos Ponte e
Dr. Daniel Sousa Paiva da Procuradoria Jurídica do Departamento Estadual de Trânsito,
pelos numerosos ensinamentos, pela oportunidade a mim concedida de iniciar minha
caminhada nas trilhas do Direito dos Transportes, pelo apoio, e acima de tudo, pela amizade.
A todas as demais pessoas que contribuíram de alguma forma para a realização
deste trabalho. Conseguimos!
RESUMO
A evolução das sociedades e o incremento da circulação de bens e pessoas,
conferiu às Políticas Públicas de Transito e Transportes papel sócio-político-econômico de
extrema relevância, uma vez que se constituem como fator determinante do bem-estar da
coletividade, verdadeira matéria de interesse público, à qual o Estado deve dispensar especial
atenção. Nesse contexto, o Transporte Rodoviário Passageiros destaca-se por configurar-se
como serviço sensivelmente necessário, porém, muitas vezes insuficiente. No segundo
semestre de 2008, em função de alterações na estrutura da Administração Pública estadual do
Ceará, a atividade fiscalizatória do Serviço de Transporte Rodoviário de Passageiros foi
incrementada, o que conferiu maior exposição à problemática que envolve a atividade. Nesse
contexto, a atuação do órgão gestor da atividade no Estado do Ceará – Departamento Estadual
de Trânsito – em relação à utilização do serviço de táxi para deslocamentos entre municípios,
tem gerado ampla discussão nos diversos setores sociais relacionadas ao assunto. É em
atenção a esta realidade que nos ocupamos no presente trabalho, estudando inicialmente os
aspectos conceituais do Transporte, identificando-o como “serviço” e caracterizado tal
cometimento como serviço público ou como atividade típica da iniciativa privada, analisando
os aspectos distintivos das várias modalidades conforme as quais pode ser ofertado à
sociedade, e avaliando a disciplina legal específica sobre a matéria, para, por fim, avaliar o
papel do Estado enquanto ente responsável pela salvaguarda do interesse público.
ABSTRACT
The evolution of societies and the increasing of the movement of goods and
people, has given to the Traffic and Transport Public Policy a socio-political and economic
role of extreme importance, since it is a factor determining the welfare of the community, a
real matter of public interest, to which the state should pay special attention. In this context,
the Road Passenger Transport is distinguished by setting up a service substantially necessary,
however, often inadequate. In the second half of 2008, due to changes in the structure of state
government of Ceará, the state cotrol of road passenger transport service was increased, which
gave more exposure to the problems surrounding the activity. In this context, the role of
manager of business in the State of Ceará - Transit State Department - for the use of taxi
service to travel between cities, has generated extensive discussion in various social sectors
related to the subject. It’s paying attention to this reality that we deal in this work, initially
studying the conceptual aspects of transport, identifying it as "service" and characterized it as
an public service or as an activity typical of private enterprise, examining aspects of
distinctive ways as which can be offered to society, and evaluating a specific legal discipline
on the subject, to, finally, evaluate the role of the state as entity responsible for safeguarding
the public interest.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.........................................................................................................................8CAPÍTULO 1 - O CONTRATO DE TRANSPORTE.........................................................10
CAPÍTULO 2 - TRANSPORTE DE PASSAGEIROS: SERVIÇO PÚBLICO, ATIVIDADE ECONÔMICA E REGULAÇÃO..................................................................232.1.1 Definições........................................................................................................................242.1.2 Princípios.........................................................................................................................282.1.2.1 Princípios Administrativos Gerais................................................................................292.1.2.2 Princípios Previstos na Lei de Concessão de Serviços Públicos..................................332.1.3 Da Classificação dos Serviços Públicos..........................................................................412.1.4 Da Execução dos Serviços Públicos................................................................................502.1.4.1 Desconcentração, Desconcentração e Descentralização...............................................502.1.4.2 Outorga e Delegação.....................................................................................................512.1.4.3 Execução Direta e Execução Indireta...........................................................................53
CAPÍTULO 4 - DA COMPETÊNCIA FEDERATIVA DO SERVIÇO PÚBLICO DE TRANSPORTE.......................................................................................................................82
INTRODUÇÃO
Neste estudo serão tratados temas relativos ao Serviço de Transporte de
Passageiros, especificamente sobre a modalidade Rodoviária Intermunicipal no âmbito do
Estado do Ceará. Discorrendo sobre tal matéria, abordaremos desde questões relativas ao
conceito de tal serviço, e os modais sob os quais é realizado, até os problemas fáticos
observados no contexto do nosso Estado, propondo, ao final, e possíveis soluções.
Tal estudo passa pela problemática da conceituação de Serviço Público e pela
caracterização do Transporte Rodoviário de Passageiros como atividade estatal ou privada,
levando-se em consideração as diversas modalidades conforme as quais pode ser ofertado à
sociedade. Busca-se, precipuamente, identificar qual deve ser a postura do Estado, enquanto
entidade destinada à salvaguarda do interesse coletivo, no que tange ao controle de tal
atividade.
A hipótese trabalhada concentra-se na análise da viabilidade jurídica da
utilização do serviço de táxi como modalidade de transporte intermunicipal, tendo em vista
ser esta uma da prática que, apesar de bastante comum, tem sido combatida pelo órgão
responsável pela gestão de Sistema de Transporte do Estado do Ceará (DETRAN-CE).
Os objetivos de tal trabalho são identificar as características essenciais de tal
serviço e averiguar qual o ente federativo competente para discipliná-la, e se há possibilidade
conciliação entre os interesses conflitantes, dos transportadores, dos usuários, das Autoridades
Estaduais e Municipais.
Nesse contexto examinaremos o que dispõe a Constituição Federal sobre o
serviço de Transporte e a sua repartição de competência, bem como a disciplina
infraconstitucional do Estado do Ceará sobre a matéria, e a repercussão de tal regramento na
atividade fiscalizatória estadual.
CAPÍTULO 1 - O CONTRATO DE TRANSPORTE
1.1 NOÇÕES PRELIMINARES: TRANSPORTE, TRÂNSITO, SERVIÇO E CONTRATO
Seguindo uma linha metodológica tradicional, o primeiro passo empreendido no estudo de
determinado assunto, via de regra, é traçar-lhe o conceito, a sua definição.
Tal propósito, no entanto, às vezes se apresenta como uma tarefa árdua. De fato, a
dificuldade em se enunciar uma definição minimamente universal demonstra-se
proporcionalmente inversa à “simplicidade” do objeto em estudo.
Destarte, quanto mais elementar, básico, é o conceito, mais difícil é enunciar-lhe
um significado. Senão vejamos: o que requer maior esforço intelectual, traçar uma definição
de “dicionário” ou de “livro”, conceituar “reta” ou “ponto”?
Servimo-nos desta digressão “filosófica” a título de ilustração, na tentativa de
justificar, a modesta abordagem que traremos ao conceito de Transporte.
Para termos uma primeira noção sobre o assunto, recorremos às mais óbvias
fontes: o Houaiss1 e o Aurélio2. Ambos, como de praxe, elucidam: transporte é o ato de
transportar, ou o meio que se utiliza para transportar algo, ou alguém.
Pouco adiante, percebe-se que o substantivo “transporte” é formado por derivação
regressiva3 do verbo “transportar”, que é sinônimo de “levar”, “conduzir”, “carregar”,
“transferir”, de um lugar a outro determinado objeto ou ser.1 “s.m. (1721 cf. RB) 1 ato ou efeito de transportar; transportação 2 veículo que serve para transportar 3 qualquer veículo para transportar tropas e provisões de forças armadas em campanha 4 fig. sensação de entusiasmo, de arrebatamento; transportamento” [...]. HOUAISS, A. Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa. Versão 2.0. São Paulo: Objetiva, 2007. CD-ROM2 “Substantivo masculino. 1.Ato, efeito ou operação de transportar; transportação, transportamento. 2.V. veículo (1) 3.Veículo de provisões para um exército em campanha. 4.Cont. Soma que se transporta da página de um livro (de contas) para outra, ou de uma coluna para outra” [...]. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Eletrônico Aurélio versão 5.0.. Rio de Janeiro: Positivo Informática, 2004. CD-ROM3 Dá-se o nome de derivação regressiva ao processo de formação de palavras em que a palavra primitiva sofre regressão, isto é, perde elementos de sua forma original. Este tipo de processo é observável, sobretudo, na formação de substantivos originados de verbos. Tais substantivos são denominados, “deverbais”. As formas nominais que lembram ações são formadas por este tipo de derivação.
Etimologicamente, “transportar” advém da junção do prefixo latino “trans” ao
verbo “portáre”, que encerram, respectivamente, as idéias de “além de”, “para lá de”, “depois
de”, e “portar”, “levar”. Nota-se que está intrínseca a idéia de “movimento”, “deslocamento”,
mas também a de condução.
Nesse contexto, tem-se o ensejo de uma diferenciação que, conforme veremos
adiante, embora extremamente tênue, é de grande importância prática e jurídica, qual seja a
distinção entre Transporte e Trânsito.
Sigamos o mesmo raciocínio: consultando mais uma vez Houaiss e Aurélio tem-
se que trânsito significa, dentre outras denotações e conotações, o ato de transitar. É,
novamente no significado verbal que se observa mais facilmente a sutil diferença entre os
conceitos: enquanto transportar implica “levar ou conduzir (seres animados ou coisas) a
(determinado lugar), carregar”4, transitar é “passar ou andar ao longo, entre ou através de,
percorrer”5. Ou seja, enquanto o resultado da ação “transitar” incide sobre o próprio agente; a
conseqüência do “transporte” incide, não somente sobre o agente, mas sobre o objeto da
atividade, que pode ser um ser inanimado, ou um outro sujeito (passivo).
Em outras palavras, embora ambos envolvam a idéia de locomoção,
pressuponham a movimentação de um ponto a outro do espaço, diferencia-se transporte de
trânsito, na medida em que a este compreende tão somente a circulação, a locomoção do
próprio agente, enquanto a aquele tem uma finalidade, a movimentação de um objeto (ou ser)
distinto. Assim, o transporte sempre pressupõe o trânsito, enquanto que o trânsito pode
ocorrer sem que haja a realização de um serviço de transporte.
Tal noção, entretanto, trata de atividades por demais vagas, abstratas; isto é, sem
grande relevo para o estudo jurídico. Sob tal concepção, o transporte e o trânsito não podem
sequer ser considerados atos jurídicos – mas tão somente fatos – na medida em que consistem
em meros acontecimentos, independentes de relação jurídica. Passam a interessar ao direito
apenas se envolverem um bem jurídico.6
4 HOUAISS, 20075 HOUAISS, op. cit.6 A respeito de atos e fatos jurídicos, cf.. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Parte Geral. 2. ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2005. 1 v. p. 277-278.
Diferentemente, passam a ser de grande relevância para o direito, quando se
configuram como atos jurídicos, quando identificam-se como atividade que enseja o
surgimento de uma relação jurídica.
Seguindo tal raciocínio, o transporte passa realmente a ser objeto de estudo da
ciência do Direito a partir do momento em que envolve atos destinados à satisfação do
interesse de um sujeito distinto do agente. Em verdade, o transporte é juridicamente relevante
quando configura-se como serviço realizado conforme um acordo de vontades, segundo o
qual o agente realiza a movimentação, o deslocamento, de alguém, ou algo em benefício de
outrem.
É conforme esta acepção da atividade que nos ocuparemos neste estudo:
analisaremos o Transporte como serviço e como contrato.
Neste aspecto, a distinção entre aqueles dois conceitos ganha superior
proeminência para o Direito. Enquanto o Transporte é juridicamente importante por
estabelecer uma relação jurídica particular7, isto é, entres os sujeitos diretamente interessados
(o transportador e a pessoa transportada, ou para quem se transporta algo), o Trânsito importa
ao direito em função de outras formas de relação, preponderantemente difusas, pois que não
há vínculo jurídico imediato no simples fato de transitar. Ora, quando alguém transporta
outrem, ou algo para outro sujeito, há que se convir que há um vínculo jurídico obrigacional
específico entre esses indivíduos, o mesmo não se pode dizer em relação a quem
simplesmente transita.
1.2 CONTRATO DE TRANSPORTE: BREVE HISTÓRICO
Em verdade, o contrato de transporte está entre os mais primitivos. Pode-se falar em tal
atividade desde as primeiras comunidades humanas em que o homem passou a dominar a
utilização de animais como meio de locomoção.
7 Veremos adiante que, embora em um primeiro momento a relação de transporte seja particular, entre os contratantes, esta é apenas uma das facetas de tal atividade, que também tem repercussões no âmbito do Direito Público.
As conseqüências jurídicas de tal contrato também não são novidade: desde 1930
a.C. se tem registros de disposições sobre a responsabilidade do transportador: nas leis de
Esnunna (região da Acádia, próxima ao rio Tigre),8 que em uma de suas disposições aduzia
que o barqueiro negligente responderia por tudo aquilo que ele havia deixado afundar
Já na época dos gregos, sabe-se que os meios de transporte eram de muita
importância, porém não há conhecimento do tratamento jurídico que era dado a essa forma
contratual.
No Direito Romano, temos conhecimento que haviam dispositivos que regulavam
o transporte marítimo, era a Lex Rhodia, que tratava da hipótese de avarias marítimas e do
lançamento ao mar dos bens transportados quando a nave estava em perigo.9
A evolução da sociedade impulsionou a evolução dos transportes. Na França do
Séc. XVII, o Rei Luís XIV concedeu licença para a exploração de cinco rotas dentro da
cidade de Paris, as quais deveriam seguir os seguintes critérios, que foram definidos por
Blaise Pascal10: as naves deveriam seguir sempre os mesmo trajetos, obedecendo aos horários
previamente estabelecidos, mesmo que não houvesse passageiros; cada passageiro pagaria
uma única passagem pelo assento que ocupasse, independente de quantos assentos vazios
existissem; se o passageiro quisesse trafegar por mais um setor, deveria pagar nova passagem.
Tais preceitos norteiam o serviço de transporte público até os dias de hoje.
Esta forma de transportar os passageiros franceses decaiu por conta de novas
exigências do Parlamento Francês, que impossibilitou o acesso à massa mais pobre da
sociedade ao transporte coletivo daquela época.
Apenas 150 anos depois fora retomado o conceito de transporte público, ainda na
França, com o amplo acesso à camada mais carente da sociedade; com os mesmos conceitos
definidos por Pascal e com a criação do Omnibus (palavra em latim, que significa “para
todos”), por Stanislas Baudry, vindo a operar em algumas cidades européias e em Nova
Iorque.
8 GUIMARÃES, Paulo Jorge Scartezzini. Dos Contratos de Hospedagem, de Transporte de Passageiros e de Turismo. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 839 Ibidem. p. 8410 Foi um filósofo religioso, físico e matemático francês, que como filósofo criou uma das afirmações mais pronunciadas pela humanidade nos séculos posteriores: “O coração tem razões que a própria razão desconhece”.
No Brasil, a primeira estrada de ferro foi inaugurada em 1854, ligando o que hoje
temos por Rio de Janeiro à Petrópolis; e no mesmo ano, Salvador inaugura o uso de bondes
puxados por animais. Vindo a surgir o bonde elétrico somente em 1900, e a primeira
companhia aérea nacional, em 1927.
Por conta deste “atraso” em relação às outras nações mais modernizadas, o Brasil
ainda não possuía uma legislação una que regulamentasse o contrato de transporte de uma
forma geral, uma vez que o Código Comercial data de 1850 e o Código Civil de 1916,
conclui-se, portanto, que à época, as relações jurídicas pertinentes ao transporte como um
todo, não estavam ainda consolidadas, possuindo apenas algumas leis esparsas, como veremos
a seguir.
1.3 A DISCIPLINA CIVILISTA
Embora o transporte, como negócio jurídico, há muito já fosse plenamente
empregado pela sociedade, nas suas formas mais variadas (como observado em tópicos
anteriores), não havia ainda uma legislação específica que norteasse sua aplicação, tanto o é
que a letra civil de 1916 não trazia qualquer referência à disciplina ora tratada, sendo a sua
matéria regulada, de forma precária, pelo Código Comercial em conjunto com algumas
poucas leis que traziam sustentação a algumas situações em particular, mas não ao Contrato
de Transporte como um todo.
Com o advento do Novo Código Civil (Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002),
foi sanada essa deficiência no nosso ordenamento, que trouxe uma longa regulamentação
deste tipo contratual; passamos, então, a contar com uma disciplina própria para os Contratos
de Transporte, trazida nos arts. 730 a 756 da norma supra, onde são traçadas diretrizes para o
escorreito cumprimento desta modalidade de contrato, que agora é tido como típico11.
11 Tem-se por contrato típico aquele que tem todo o seu perfil e regulamentação estipulada em lei, no caso, o Código Civil de 2002 (BRASIL. Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial [da] União, Brasília, DF, 11 jan. 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 05 jun. 2009).
Desta forma, ficando esclarecida que é inédita a aparição desta espécie contratual
em nosso ordenamento, passemos à análise da sua conceituação, assim como das diversas
variações existentes.
1.3.1 Conceito e Natureza Jurídica
A legislação civil, em seu art. 730, não aguardando por uma definição doutrinária,
é clara na conceituação daquilo que se caracteriza por contrato de transporte: “Pelo contrato
de transporte alguém se obriga, mediante retribuição, a transportar, de um lugar para outro,
pessoas ou coisas.”12 Contudo, restou apenas aos doutrinadores trazer uma maior e melhor
especificação da definição deste contrato típico, que é caracterizado principalmente como
uma “atividade desenvolvida pelo transportador, de deslocamento físico de pessoas e coisas
de um local para outro, sob sua total responsabilidade”.13
Vale ressaltar que o transporte realizado deve ser eivado de todo o cuidado e
presteza, uma vez que a responsabilidade de levar as pessoas ou a carga ao seu destino sem
qualquer dano ou avaria é do transportador14. Ou seja, toda a responsabilidade de entregar as
pessoas ou mercadorias na forma em que lhes foram confiadas é do próprio carregador, que,
para isentar-se da culpa, deverá demonstrar que o evento danoso ocorreu por “culpa da vítima,
força maior ou fato exclusivo de terceiro”.
Podemos vislumbrar que a natureza jurídica do Contrato de Transporte é a de um
contrato de adesão, no qual uma das partes detém o monopólio da definição das cláusulas,
cabendo ao outro pólo, apenas, aderir ou não as estipulações contratuais, não havendo
discussão acerca de seus termos. Porém estas condições devem estar de acordo com os
preceitos normativos, pois, do contrário, suas cláusulas podem passar a ser discutidas pelas
vias judiciárias, no caso de haver qualquer prejuízo à parte contratante.
12 BRASIL, 11 jan. 2002.13 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Contrato e Atos Unilaterais. 3. ed. rev. Atual. São Paulo: Saraiva, 2007. 3 v. p. 45214 Denomina-se, doutrinariamente, esta responsabilidade de Obrigação de Resultado, a qual não sendo adimplida acarreta na responsabilização objetiva por qualquer dano ou avaria causada no percurso do transporte, e, conseqüentemente, a obrigação de indenizar, na forma dos arts. 734 e 389 do Novo Código Civil.
No caso em tela, as cláusulas contratuais, geralmente, vêem impressas no bilhete
de passagem (quando do transporte de pessoas) ou no conhecimento de embarque (no
deslocamento de mercadorias). Mas também pode ocorrer de no transporte de pessoas não
haja a tradição de um bilhete, permanecendo, assim as cláusulas numa forma tácita, porém,
nunca inexistentes. Nesta situação, um simples aceno de mão, para que o veículo
transportador permita seu embarque, implica na aceitação do contrato de adesão de transporte,
na forma e condições pré-estabelecidas pelo transportador, como já dito, dentro das condições
legais.
Por fim, vale ressaltar que, para que o contrato de transporte se configure como
tal, se faz necessário que o objeto da avessa seja especificamente o deslocamento de pessoas
ou mercadorias de um ponto a outro, pois, do contrário, o transporte não vai passar de um
mero acessório ao contrato principal, que pode ser uma compra e venda, por exemplo, em que
o vendedor se responsabiliza pela entrega da mercadoria na residência do comprador; o que
acontece sucessivamente em compras realizadas pela rede mundial de computadores.
1.3.2 Elementos
No contrato de transporte podemos identificar três elementos básicos, quais
sejam: o transportador, o passageiro ou mercadoria e a transladação. Passemos então a
identificar cada um deles.
Transportador é aquele a quem as pessoas, ou coisas, são confiadas para que
sejam feitas a trasladação e a entrega sob sua inteira responsabilidade. Esta figura pode se
apresentar sob a forma de pessoa física ou jurídica, ofertando a prestação do serviço de
deslocamento de pessoas e/ou mercadorias.
O passageiro ou mercadoria é aquele que necessita ser transportado de um lugar a
outro, com todo cuidado e segurança que o próprio contrato lhe assegura. O contratante pode
ser o próprio passageiro, ou pode ser um terceiro que adquiriu a passagem para entregar ao
viajante.
A trasladação é a remoção, transferência, mudança, locomoção, de pessoas ou
coisas de um lugar a outro. Mesmo que este deslocamento não percorra grandes distâncias,
podendo, até mesmo, ser dentro de um mesmo ambiente.
Podemos considerar ainda a existência de um outro elemento, o destinatário, que, embora
não faça parte da relação contratual, também possui uma série de obrigações e de direitos,
os quais podemos citar, por exemplo: o ônus de verificar o estado em que se encontra a
coisa transportada, pois do seu silêncio, enseja na concordância da forma da entrega; o
ônus de ir buscar a coisa no destino em que o contrato estipulou que ela fosse entregue.
1.3.3 Características
Como qualquer outro contrato típico, o Contrato de Transporte é caracterizado por
alguns aspectos, que os diferenciam dos demais, e que merecem ser estudados um a um, para
uma melhor visualização deste instituto. Vejamos, então quais as suas principais
características:
a) Bilateral – por haver prestações recíprocas entre as partes, não devendo
ser, necessariamente, prestações equivalentes15. O transportador deve
deslocar as pessoas ou as coisas de um ponto de partida ao seu destino,
enquanto que o passageiro ou o expedidor da coisa, deve pagar o preço
estipulado no contrato;
b) Oneroso – o contrato traz vantagens e obrigações para ambas as partes,
com exceção do transporte feito de forma gratuita (carona ou por
amizade), em que as responsabilidades são extracontratuais16;
15 No caso do transporte coletivo de pessoas, o preço definido em contrato é sempre inferior ao valor real do serviço, pois presume-se que a coletividade de passageiros, cada um pagando a sua parcela, resultará, enfim, no preço justo pela prestação do serviço.16 Art. 736. Não se subordina às normas do contrato de transporte o feito gratuitamente, por amizade ou cortesia. (BRASIL, 11 jan. 2002).
c) Consensual – pois há o aperfeiçoamento da relação contratual com o
acordo de vontades das partes, que pode ser expresso tácito, como um
simples aceno ao motorista do transporte coletivo;
d) Não Solene – uma vez que não necessita de qualquer formalidade pré-
definida em lei para se realizar;
e) Comutativo – pois já é do conhecimento das partes as prestações
inerentes à relação que estar por se estabelecer, já antevendo quais as
vantagens e os ônus de cada um; e
f) De Duração – já que o contrato não se realiza em tempo único, se
protrai no tempo até a sua extinção, de forma continuada.
1.3.4 Da Distinção Entre o Contrato de Transporte e Demais Congêneres
Conforme observa TEODORO JUNIOR17, transporte visto como atividade, “é
antiqüíssimo e, nas origens, se confundia com uma locação de serviços ou, mais
especificamente, como uma empreitada, porquanto se considerava o transportador como
alguém que se encarregava de realizar uma obra para outrem.”. Hodiernamente, no entanto,
não se concebe mais tal redução.
Muito embora a própria legislação civil traga a definição daquilo que é o contrato
de transporte, muito ainda se confunde tal instituto com outras formas contratuais, como a
locação e o reboque. Cabe, então, a nós fazer algumas distinções entre todas essas relações
contratuais.
1.3.4.1 O Contrato de Transporte e a Locação de Veículo
A Locação distingue-se do contrato de transporte em muitos aspectos. O primeiro
deles é o fato de que, na locação, o objeto do contrato é a cessão do uso do meio de transporte
17 200? apud GONÇALVES, 2007, p. 452.
à parte contratante, que decide qual o destino final das mercadorias, havendo, então a
transferência da posse do meio utilizado para o transporte, não propriamente este serviço.
O locador não tem qualquer responsabilidade sobre o transporte, pois não é ele,
quem faz o deslocamento da carga, mas sim o locatário, que é quem recebe a posse da nave,
ou seja, a coisa é locomovida sob a responsabilidade e risco do contratante.
Em suma, nesta forma contratual, o transportador continua responsável pelo
escorreito cumprimento do deslocamento da carga, mas a diferença principal é que o
transportador é aquele que contrata o aluguel, ou seja, o locatário, que é quem recebe a posse
do meio de transporte; e aquele que cede o meio é exonerado de quaisquer responsabilidades
que o proprietário da nave transportadora tenha no regime do contrato de transporte.
1.3.4.2 O Contrato de Transporte e o Reboque
No que tange ao serviço de Reboque, a distinção é bem simples. Nesta
modalidade contratual, o rebocador é uma máquina de grande força, que é contratada para
fornecer esta tração a um outro meio desprovido de impulso necessário para a sua locomoção
ou manobras.
No contrato de reboque não há qualquer responsabilidade do rebocador para com
a carga durante o trajeto; há tão-somente o fornecimento da tração e de pessoal para realizar o
reboque, que pode ser de um navio, ou de um avião, por exemplo.
O contrato de reboque pode ainda subdividir-se em reboque-manobra e reboque-
transporte, o qual a contratação gira em torno da realização do serviço de levar a nave a um
destino previamente convencionado; enquanto no primeiro, a prestação do serviço se
concentra apenas na realização de manobras de auxílio à nave rebocada.
1.4 A INTERDISCIPLINARIEDADE DO SERVIÇO DE TRANSPORTE
Como se pode observar, a partir dos comentários expendidos no tópico inicial
deste estudo, o contrato de transporte, a priori, envolve relações jurídicas puramente bilaterais
em que, de um lado, obriga-se o transportador e, do outro, o contratante. Assim, em primeiro
plano, o braço do Direito que primeiramente se ocupa com o transporte é o Civilista.
Entretanto, é forçoso reconhecer a interdisciplinaridade que envolve o tema, pois,
hodiernamente não se admite ignorar-se a repercussão social que reveste a atividade
transportista. De fato, não há qualquer sombra de dúvida, e igualmente, não há novidade, em
se afirmar que o transporte é de interesse da coletividade. Isto é, o contrato que há
(muitíssimo) tempo integrava a esfera de interesses apenas daqueles por ele vinculados, hoje
figura entre os interesses difusos da sociedade.
Com efeito, a partir do incremento das relações interpessoais e do
desenvolvimento sócio-econômico das sociedades, a circulação de bens e pessoas assume
papel de extrema relevância, uma vez que é fator condicionante de tal desenvolvimento, da
qualidade de vida dos indivíduos, e até da satisfação de direitos fundamentais.
Atividades comerciais, industriais, educativas, recreativas, etc., dentre as mais
diversas áreas de atuação, pressupõem, na maioria das situações, o deslocamento de pessoas e
produtos. Assim, tal locomoção é de interesse de toda a sociedade, e não só daqueles que
pretendem deslocar-se: o comerciante, por exemplo, embora não contrate nenhum transporte
para si, depende da chegada de mercadorias e consumidores ao seu estabelecimento; da
mesma forma, o industrial depende da circulação de seus produtos; bem como interessa a toda
a sociedade que o direito à educação das crianças não seja obstaculizado pela falta de meios
de locomoção.
Quando tal movimentação passa a ser significativamente realizada mediante a
celebração de contrato de transporte, pode-se dizer que o serviço passou a ser essencial,
estratégico, para a coletividade.
Em tal contexto, isto é, quando a mobilidade dos indivíduos ou de seus bens passa
a ser representativamente condicionada pela disponibilidade de meios de transporte
“contratáveis”, tal serviço, e não só a circulação em si, passa a ser de interesse coletivo. E, à
medida que interessa a sujeitos alheios à relação contratual, extrapola a esfera de interesse que
anteriormente era apenas dos sujeitos “contratantes”. Surgem então, relações jurídicas difusas
decorrentes daquela essencialidade do serviço.
As relações de transporte, que anteriormente eram bilaterais, particulares,
assumem caráter difuso, conquanto envolvem não só os sujeitos diretamente obrigados, mas
afetam toda a coletividade. E a existência de tais relações jurídicas difusas, caracterizadas pela
ausência de destinatários específicos, embora envolvendo interesses de todos, acarreta uma
maior necessidade de proteção pelo Poder Público.18
A este respeito, observe-se que o Código de Defesa do Consumidor - CDC (Lei n°
8078/90), em seu art. 81, parágrafo único, inciso I, define interesses ou direitos difusos como
os "transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e
ligadas por circunstâncias de fato". Consoante, Ada Pellegrini GRINOVER, assim os
conceitua:
O outro grupo de interesses metaindividuais, o dos interesses difusos propriamente ditos, compreende interesses que não encontram apoio em uma relação-base bem definida, reduzindo-se o vínculo entre as pessoas a fatores conjunturais ou extremamente genéricos, a dados de fato freqüentemente acidentais e mutáveis: habitar a mesma região, consumir o mesmo produto. (...)
Completa, afirmando ainda que "a satisfação de um interessado implica,
necessariamente, a satisfação de todos, ao mesmo tempo em que a lesão de um indica a lesão
de toda a coletividade”.19
O caráter difuso dos interesses envolvidos, bem como a essencialidade do serviço
de transporte, deixam claro que, não obstante o caráter privado do serviço, cabe ao poder
público o controle da atividade, pois é seu o dever de cumprir com suas funções em busca de
satisfazer os interesses coletivos. 18 A própria função administrativa do Estado é decorrente da presença de interesses com dimensão coletiva e projeção gregária, como ensinou Fernando Lemme WEISS (Os direitos difusos e a interseção entre as competências constitucionais concorrentes e privativas. Jus Navigandi, Teresina, n. 136, 19 nov. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4507>. Acesso em: 10 jun. 2009) citando Diogo de Figueiredo Moreira Neto em palestra ministrada na Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro, denominada Noções preliminares – Atividade Administrativa – Regime jurídico administrativo, publicada na Revista de Direito da Procuradoria Geral, 2001. 54 v. p. 506.19 GRINOVER, Ada Pellegrini. Novas Tendências Na Tutela Jurisdicional Dos Interesses Difusos, Revista AJURIS: da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, n. 31, p. 82, jul. 198.
O Estado assume o controle público do serviço de transporte, porém a realização
da atividade continua sendo levada a cabo por um particular, e se dá por celebração de um
contrato. O que vale dizer que estamos diante de um negócio jurídico, pertencente ao campo
do Direito Privado e com um caráter interdisciplinar passando pela esfera mercantil, civil,
administrativa e consumerista.
Isto posto, é mister que se ressalte a presença do Estado com grande papel regulamentador,
com vistas à proteção do interesse comum – ligado a questões de sanidade, segurança e
desenvolvimento – não obsta a que o transporte se origine de um acordo privado de
vontades, que se efetiva, regra geral, pela prestação e pela contraprestação, ou seja, um
contrato definido como privado, em termos doutrinários. Eis, portanto, o caráter
interdisciplinar do tema ora abordado: a um só passo, é instituto de Direito Privado, mas
que tem fortes implicações na esfera do Direito Público.
CAPÍTULO 2 - TRANSPORTE DE PASSAGEIROS: SERVIÇO PÚBLICO, ATIVIDADE ECONÔMICA E REGULAÇÃO
Como aludido no item 1.4 deste estudo, serviço de transporte envolve relações
jurídicas bilaterais, entre transportador e transportado, que, em primeiro plano, configuram-se
como relações privadas. Em verdade trata-se, a priori, de um contrato privado, inclusive, sob
regência do Código Civil.
No entanto, a intensificação dos deslocamentos de pessoas e mercadorias, a
evolução do comércio e o aprimoramento dos meios de transporte conduziram para que o
serviço assumisse um considerável caráter de essencialidade, configurando-se como atividade
de interesse geral.
Considerando tal realidade, impende que dentre os objetivos do presente estudo
esteja a caracterização do Serviço Público e da Atividade Privada Regulamentada pelo
Estado, bem como a análise das conseqüências jurídicas desta identificação. Assim, cumpre-
nos explanar, ainda que de forma sucinta, aspectos elementares e distintivos de tais conceitos,
a fim de saber onde o Estado deve estar presente, e quando a sua presença, no exercício de
atividade privada, se configura como violação ao princípio da subsidiariedade20, em afronta à
esfera de liberdade reservada constitucionalmente à iniciativa privada.
Nesse sentido, vale salientar que, conforme veremos a seguir, o enquadramento do
Transporte como atividade de caráter essencialmente público ou eminentemente privado é de
suma importância para definição do modo como deve ser abordada pela Administração, quer
quanto à própria execução da atividade, quer quanto à sua gestão, planejamento,
regulamentação e/ou controle.
2.1 SERVIÇO PÚBLICO: NOÇÕES BÁSICAS21
20 Abordaremos mais detalhadamente tal tema, mas, por ora, importa lembrar que, conforme o art. 1º, IV, da Constituição Federal, a “livre iniciativa” é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil.21 Considerando que o presente tópico visa a lançar luz apenas sobre aspectos essenciais dos serviços públicos, privilegiaremos a objetividade do estudo e não abordaremos em profundidade questões de ordem histórica e
2.1.1 Definições
Em análise deveras superficial, tem-se que a expressão serviço público é formada
pelo substantivo serviço qualificado pelo adjetivo público: o primeiro deriva do latim servitiu,
que, em tradução literal, significa “a escravidão” ou “os escravos”, sugere “ato ou efeito de
servir; exercício de cargos ou funções obrigatórias; duração desse exercício; ou desempenho
de qualquer trabalho, emprego ou comissão” 22, enfim, prestação, realização ou atividade;
enquanto o segundo relaciona-se ao Estado, ou à coletividade a ele atrelada. Assim, a
expressão indica atividade realizada pelo Poder Público, (ou) voltada à coletividade.
Tal raciocínio, entretanto, não é suficientemente abrangente para a definição do
conceito ora estudado. Com efeito, é próprio dos institutos mais elementares ser necessário
esforço igualmente maior para a sua conceituação.
Por tal motivo, a definição de Serviço Público não é ponto uníssono na doutrina
pátria, bem como não o é na literatura estrangeira.23 Ao invés disso, a variedade das
compreensões a seu respeito sim, é reconhecida por todos os autores a que tivemos
oportunidade de consultar.
Em relação especialmente ao conceito de serviço Público, observa-se uma grande
variedade de entendimentos. Isso ocorre em virtude do seu caráter dinâmico, isto é, em função
de ser mutável segundo as necessidades da conjuntura política e do interesse público,
apresentando diversas significações conforme a época e a localidade escolhida para a análise.
teórica. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 11. ed. rev. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 656-657.22 Serviço: [Do lat. servitiu, ‘a escravidão’, ‘os escravos’.] Substantivo masculino. 1. Ato ou efeito de servir. 2. Exercício de cargos ou funções obrigatórias. 3.Duração desse exercício. 4. Desempenho de qualquer trabalho, emprego ou comissão. 5.Duração desse desempenho. 6. Celebração de atos religiosos. 7.Estado de quem serve por salário. 8 .Serventia (2). 9.Obséquio, favor. [...] FERREIRA, 2004.23 [...] El concepto de Service Public, como eje central del Derecho administrativo, es una construcción típicamente francesa y del Derecho francés fue importada en España por nuestra doctrina científica, legislación y jurisprudencia. Ahora bien, en el momento actual tiene sus rasgos propios, que son la consecuencia, en primer lugar, de que el Derecho administrativo español, a diferencia del francés, no es una construcción doctrinal cerrada en su propio ordenamiento jurídico-positivo (por el contrario, aparte la francesa, las influencias de las doctrinas italiana y alemana son notorias); en segundo lugar, porque las propias exigencias de nuestro ordenamiento positivo han determinado un uso del concepto que, en algunos aspectos, difiere bastante del francés. (GARRIDO FALLA, Fernando. El Concepto de Servicio Publico en Derecho Español. Revista de Administración Pública, Universidad Complutense, Madrid, n. 135, Set./Dez., 1994).
Realmente, conforme observa o professor Hely Lopes de MEIRELLES24, “o
conceito de serviço público é variável e flutua ao sabor das necessidades e contingências
políticas, econômicas, sociais e culturais de cada comunidade, em cada momento
histórico[...]”
Nesse contexto, convém registrarmos enunciados que bem demonstram a
variedade de concepções ofertada pela mais tradicional doutrina pátria.
Maria Sylvia Zanella DI PIETRO25, conceitua:
Toda atividade de material que a lei atribui ao Estado para que a exerça diretamente ou por meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente de direito público.
Por seu turno, José dos Santos CARVALHO FILHO26, “de forma simples e objetiva” (em
suas próprias palavras), conceitua serviço público como:
Toda atividade prestada pelo Estado ou por seus delegados, basicamente sob regime de direito público, com vista à satisfação de necessidades essenciais e secundárias da coletividade.
Celso Antônio BANDEIRA DE MELLO27 define:
Serviço público é toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Público – portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais - instituído em favor dos interesses definidos como públicos no sistema normativo.
24Direito Administrativo Brasileiro. 23. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1998. p. 28525Direito Administrativo. 11. ed. São Paulo: Atlas, 1999. p. 9826Manual de Direito Administrativo. 15. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 26727 2007, p. 656
Mais uma vez Hely Lopes MEIRELLES28 sintetiza:
Serviço público é todo aquele prestado pela Administração ou por seus delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade, ou simples conveniências do Estado.
Como se depreende de tais dicções, apesar de a doutrina formular variados conceitos, tem-
se como uma intersecção o reconhecimento de três critérios básicos como ponto de partida
para definição do que vem a ser serviço público: os elementos objetivo, subjetivo e formal;
três óticas distintas, as quais, entretanto, não podem ser consideras isoladamente.
A primeira considera que a idéia de serviço público está diretamente vinculada à natureza
do cometimento, considerando-o público se essencial à manutenção da sociedade, ou seja,
pela sua relevância, aquela atividade seria enquadrada como serviço público. Porém esta
definição não é satisfatória, pois ignora a existência de serviços que embora não sejam
indispensáveis não perdem a característica publicística que os informa, como é o caso dos
jogos controlados pela Administração (Loteria Federal, por exemplo.)
O prisma subjetivo considera a presença do Estado na execução da atividade, tendo por
pública aquela efetivada por ente estatal. Hodiernamente, sobretudo, não pode ser tida por
suficiente, uma vez que não se coaduna com as tendências descentralizantes da prestação
do serviço público, o que é tradicional em matéria de transporte, que não perde o caráter
público quando da sua execução por particulares, mediante delegação.
Por fim, o critério formal leva em consideração o regime de normas jurídicas de regência
sobre o serviço, considerando público ou privado em função de ser regido por normas de
28 1998, p. 285.
Direito Público ou Direito Privado, respectivamente. Também não basta, se considerado
isoladamente, pois, em o sendo, considerar-se-ia privado o serviço indispensável que sofre
qualquer influxo de normas do regime privado.
Por oportuno, conforme observa Horácio Augusto Mendes de SOUZA, merece
também destaque o critério apontado por Diogo Figueiredo MOREIRA NETO, fundado nos
princípios regentes da prestação dos serviços públicos, com um nítido objetivo finalístico de
segurança aos cidadãos, alicerçado, portanto, “en los pincipios rectores del servicio público
[...] constuido sobre su necesaria generelidad, continuidad y modicidad, que es, em sintesis,
la seguridad”.29
Nesse sentido, considerando-se a grande mutabilidade do conceito em estudo,
bem como a impossibilidade de caracterizar-se um serviço como público em função da
natureza da atividade, ou da sua essencialidade, e ainda, não sendo suficiente a identificação
do sujeito que a realiza, tem-se na doutrina brasileira uma grande relevância à definição
normativa, de modo que é considerado serviço público aquela atividade que a Lei ou a
Constituição assim identificá-la. Ora, em sendo a manifestação maior do pensamento de uma
sociedade, o ordenamento jurídico é a forma legítima de expressão das “necessidades e
contingências políticas, econômicas, sociais e culturais de cada comunidade, em cada
momento histórico” que, consoante o professor MEIRELLES, são os fatores determinantes da
mutante noção de serviço público.
Não obstante, independentemente de controvérsias e divergências doutrinárias a
respeito da noção em comento, deve-se atentar que dentre os Fundamento da República
Federativa do Brasil, está a “livre iniciativa”, de modo a fazer com que o Estado deva atuar
apenas subsidiariamente, isto é, apenas como garantidor do “bem comum”, não podendo,
aleatoriamente, definir uma atividade como serviço público, se esta poder ser
satisfatoriamente suprida pela própria sociedade.
Nesse sentido, em síntese do que foi comentado a respeito da noção em estudo,
parafraseando o magistério de Horácio Augusto Mendes de SOUZA30, que congrega bem
29 MOREIRA NETO, Diogo Figueiredo. Mito y Realidad del Servicio Público. Universidade de Complutense – Espanha, mar. 2000. apud. SOUZA, Horácio Augusto Mendes de. Regulação Jurídica do Transporte Rodoviário de Passageiros. Rio de Janeiro: 2003, Editora Lúmen Júris, p.15. 30 2003, p. 19.
todas as considerações acima defendidas, adotamos a seguinte definição de serviço público:
prestação positiva (aspecto objetivo) que o ordenamento jurídico (critério formal) define
como de titularidade do Estado (aspecto subjetivo), cuja competência para instituição é
atribuída pela Constituição aos Entes Federativos – para que executem-na centralizada ou
descentralizadamente (critério subjetivo mitigado) – sob a disciplina predominante do Direito
Público, em consonância com os princípios administrativos e da livre iniciativa, e com a
finalidade de atender a interesses da coletividade como um todo (critério teleológico).
2.1.2 Princípios
Após comentarmos a respeito do conceito de serviço público, convém dedicarmos
especial atenção aos princípios que orientam a sua execução e/ou gestão, sobretudo
reconhecendo-se que são também critérios segundos os quais se pode definir uma atividade
como tal.
Em verdade, para BANDEIRA DE MELLO31, os princípios do serviço público
“se constituem no aspecto formal do conceito e compõem, portanto, seu regime jurídico”.
Com efeito, em função da matéria em torno da qual gira determinada atividade,
dos interesses a que se pretende atender com a sua execução, e dos sujeitos envolvidos (em
ambos os pólos), define-se a que princípios se submete tal cometimento.
A exemplo do que ocorre às definições, não há unicidade na doutrina a respeito
dos princípios: há variações em número, classificação e nomenclatura. No entanto, convém
detalharmos apenas aspectos que consideramos de maior relevo sobre o assunto.32
31 2007, p. 662.32 A este respeito, BANDEIRA DE MELLO é bastante didático, apresentando, nada menos que dez princípios, e citando desde a literatura francesa mais tradicional aos publicistas brasileiros Hely Lopes de MEIRELLES e Maria Sylvia DI PIETRO, (Ibdem, p. 661-662).
2.1.2.1 Princípios Administrativos Gerais
Reconhecendo-se que o serviço público é sempre atrelado à Administração,
independentemente da posição assumida pelo Estado frente a seu implemento, tem-se por
certa a regência dos Princípios Administrativos, referidos no art. 37 da Constituição Federal:
da Legalidade, da Impessoalidade, da Moralidade, da Publicidade e da Eficiência33.
Trata-se dos princípios doutrinariamente ditos “expressos” – por estarem
manifestadamente referidos na Carta Magna – em relação aos quais, pode-se afirmar que não
há qualquer instituto do Direito Administrativo que por eles não seja informado.
Por outro lado, não se pode olvidar a regência de Princípios que, embora não
sejam expressamente referidos na Letra Maior, são consensualmente “reconhecidos” pelos
publicistas. Dentre eles destacamos o Princípio da Supremacia do Interesse Público, o
Princípio da Indisponibilidade e o Princípio da Continuidade dos Serviços Públicos.
2.1.2.1.1 Princípio da Supremacia do Interesse Público
Em verdade, trata-se este de um dos “superprincípios” que regem o sistema
jurídico-administrativo brasileiro, do qual decorrem vários outros preceitos normativos. No
dizer de José CRETELLA JUNIOR34 “é o grande princípio informativo do Direito Público”.
Tal princípio consiste no reconhecimento de que o interesse público, isto é, da
coletividade, sempre deverá prevalecer sobre o interesse particular. Com efeito, coaduna-se
com a idéia de Estado de Direito, no seio do qual seria por demais afrontoso à lógica
democrática admitir-se que o interesse de um ou de um grupo possa sobrepujar o interesse
de todos.
33 Em homenagem à objetividade, não estenderemos maiores comentários acerca dos Princípios Constitucionais que orientam a atividade Administrativa de forma geral, atendo-nos apenas aos que guardam maior vínculo com a prestação de Serviços Públicos.34 1972, p. 39 apud GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 13. ed. rev. atual. São Paulo, 2008. p. 20.
Para BANDEIRA DE MELLO35 este princípio gera uma posição privilegiada e
de supremacia sobre os particulares. Essa é a vantagem da Administração em relação ao
particular conferida pela ordem jurídica para que desempenhe suas funções em prol da
sociedade.
Nesse sentido, convém destacar que tal supremacia guarda também íntima
relação com a finalidade da atuação estatal. De fato, é a própria finalidade – satisfação do
interesse público – que confere tal atributo (preeminência) a determinado ato administrativo.
É em decorrência de tal princípio que se justifica toda a relação de império da
Administração sobre os particulares, pois apenas em função do “bem comum”, isto é, da
salvaguarda da coletividade, se pode admitir a limitação de direitos (poder de polícia), ou a
criação e extinção de relações e obrigações com estes de forma unilateral. Nesse sentido
assevera DI PIETRO36: “se a lei dá à Administração os poderes de desapropriar, de
requisitar, de intervir, de policiar, de punir, é porque tem em vista atender ao interesse geral,
que não pode ceder diante do interesse individual”.
Tal princípio, entretanto, não significa o total desrespeito ao interesse privado;
há previsão, inclusive Constitucional, de hipóteses em que aquele deve ser mitigado: se faz
necessário, caso a caso, sopesar-se o interesse a ser privilegiado.
De fato, consoante prescreve a Carta Magna, em seu art. 5º, XXXVI, a
Administração deve obediência ao direito adquirido, à coisa julgada e ao ato jurídico
perfeito, de sorte que os interesses patrimoniais afetados pela prevalência do interesse
público devem ser indenizados cabalmente.
2.1.2.1.2 Princípio da Indisponibilidade
A indisponibilidade dos interesses, e por conseqüência, dos serviços públicos, está
35 2007, p. 67.36 1999, p. 70.
também, intimamente ligada à Supremacia acima comentada, conforme lembra DI PIETRO37,
que cita BANDEIRA DE MELLO: “as pessoas administrativas não têm, portanto,
disponibilidade sobre os interesses públicos confiados à sua guarda e realização”. A publicista
arremata:
Precisamente por não poder dispor dos interesses públicos cuja guarda lhes é atribuída por lei, os poderes atribuídos à Administração têm o caráter de poder-dever; são poderes que ela não pode deixar de exercer, sob pena de responder pela omissão. Assim, a autoridade não pode renunciar ao exercício das competências que lhe são outorgadas por lei; [...].
Decorrência deste pensamento tem-se na lição deste doutrinador o “dever
inescusável” do Estado de promover a prestação do serviço ao qual atribui o caráter de
público.
Consoante, ainda que seja possível a delegação do serviço, não se admite a
alienação da atividade, isto é, da respectiva competência, mas apenas da sua execução.
Assim, o Estado nunca desonera-se da responsabilidade pela satisfação das necessidades dos
administrados, pois, o interesse público a que determinado serviço dirige-se não pode ficar a
cargo de mãos particulares.
Nesse sentido, ressalte-se que, se o Estado omitir-se na realização de serviços
considerados públicos, cabe ação de responsabilidade por danos, por força do artigo 37, §6º
da Constituição Federal, uma vez que tal atividade não se trata de mera prerrogativa, mas de
um poder-dever.
A propósito, em respeito a esta expressão, oportuno se faz repetir o que observa
BANDEIRA DE MELLO38:
Tendo em vista este caráter de assujeitamento do poder a uma finalidade instituída no interesses de todos – e não da pessoa exercente do poder -, as prerrogativas da Administração não devem ser vistas ou denominadas como "poderes" ou como
37 Ibidem, p. 70.38 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Privatização e Serviços Públicos. Revista Trimestral de Direito Público. São Paulo: Malheiros. n. 22. 1998. p. 32.
"poderes-deveres ", antes se qualificam melhor se designam como "deveres-poderes", pois nisto se ressalta sua índole própria e se atrai atenção para o aspecto subordinado do poder em relação ao dever, sobressaindo, então, o aspecto finalístico que as informa, do que decorrerão suas inerentes limitações.
A este princípio liga-se também a concepção de Serviço Público como res extra
commercium: tendo-se determinada atividade como de interesse da coletividade, não se pode
concebê-la como disponível à livre especulação de particulares, não se lhe permite ser
desempenhada exclusivamente pelo setor privado.
Isto porque as atividades que consubstanciam os serviços públicos são bens
retirados da especulação particular e entregues ao setor público para que o mesmo as
desempenhe. O Estado retira do mercado as atividades que considera atinente a interesses
ligados à sua esfera de ação e transfere para o setor público transformando a mesma em uma
atividade pública, destarte, fora da ação livre dos particulares, portanto, fora do mercado.39
2.1.2.1.3 Princípio da Continuidade dos Serviços Públicos
É certo, e lógico, que os interesses e anseios da coletividade como um todo não
são temporários; ao contrário, os administrados necessitam continuamente de prestações do
Estado. Desta forma, então, também não podem ser interrompidos os esforços despendidos
pela Administração para o seu atendimento. Eis, pois a idéia central do Princípio da
Continuidade da Atividade Administrativa.
Embora não diga respeito apenas aos Serviços Público, mas a toda atividade
essencial do Estado – como a prestação da tutela jurisdicional, por exemplo – é nesse âmbito
que se observa com mais nitidez o quanto imprescindível é a atuação em caráter contínuo.
Deve-se observar que tal preceito guarda estreita relação com o da finalidade,
pois, reconhecendo-se que dentre os objetivos ou fundamentos do Estado está a satisfação das
39 MELLO. 1998. p. 173.
necessidades dos cidadãos, há que se admitir que o Estado, ao paralisar quaisquer
cometimentos tendentes a este fim, está-se desviando daquilo que o legitima.
Por tal motivo, não se admite que o Estado permita que a população fique
desatendida por atividades estratégicas e imprescindíveis à ordem e ao desenvolvimento da
comunidade, como os serviços de saúde e segurança públicas, de combate a incêndios e de
transporte.
Nesse sentido, em decorrência deste princípio tem-se, conforme enumera DI
PIETRO40:
1. a proibição de greve nos serviços públicos; [...]2. necessidade de institutos como a suplência, a delegação e a substituição para
preencher as funções públicas temporariamente vagas;3. a impossibilidade de quem contrata com a Administração, de invocar a exceptio
non adimpleti contractus nos contratos que tenham por objeto a execução de serviço público;
4. a faculdade que se reconhece à Administração de utilizar os equipamentos e instalações da empresa que com ela contrata, para assegurar a continuidade do serviço;
5. com o mesmo objetivo, a possibilidade de encampação da concessão de serviço público.
Inobstante, tal princípio nem sempre significa que a atividade deva ser totalmente livre de
intermitências; alguns serviços não requerem tal continuidade, sendo suficiente que sejam
regulares. Tem-se como exemplos, desde a coleta de lixo até os serviços eleitorais, que
pelas suas naturezas, não são ofertados ininterruptamente.
2.1.2.2 Princípios Previstos na Lei de Concessão de Serviços Públicos
40 1999, p. 74
Como é cediço, o constituinte, no artigo 37 da Carta Magna, ergueu os pilares do
sistema jurídico-administrativo brasileiro, bem como, no art. 175, dispondo a respeito do seu
regime jurídico, determinou que o Poder Público detém a titularidade da prestação dos
serviços públicos, mas pode transferir sua execução a terceiros – delegatários – que se
submeterão a regime especial definido em lei; que a delegação da execução do serviço
(prestação indireta) pode se formalizar somente mediante concessão ou permissão; e que a
licitação pública prévia é condição de validade e legitimidade da delegação da prestação do
serviço a particulares.
A Lei 8.666/93, que regulamentou o art. 37, inciso XXI, da Constituição,
instituindo normas gerais sobre licitações e contratos da Administração Pública, definiu
"serviço público" como sendo "toda atividade destinada a obter determinada utilidade de
interesse para a Administração, tais como: demolição, conserto, instalação, montagem,
operação, conservação, reparação, adaptação, manutenção, transporte, locação de bens, [...]"
(art. 6º, inc. II).
Por sua vez, a lei 8.987/95 disciplinou o regime jurídico da concessão e permissão
da prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da Carta Magna, dispondo sobre os
direitos e obrigações dos usuários, instituindo regras de política tarifária, definindo a
obrigação do serviço adequado, impondo regras especiais de licitação e regulamentando o
caráter especial do contrato celebrado com as empresas concessionárias e permissionárias de
serviços públicos.
Em seu art. 6º, a Lei de Concessão de Serviços Públicos (8.987/95), descreve os princípios
a que se submetem os serviços públicos e institui o conceito “serviço público adequado”.
Define que o serviço público, para ser adequado, deve satisfazer os princípios da
regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua
prestação e modicidade das tarifas.
A esse respeito, Marçal JUSTEN FILHO41 ensina que o conceito de serviço
adequado é indeterminado:
41 Teoria Geral das Concessões de Serviço Público. São Paulo: Dialética, 2005. p. 302.
Serviço adequado é um conceito indeterminado (determinável, na terminologia de Eros Grau), o que retrata uma específica opção de disciplina jurídica. O conceito indeterminado configura-se como ausência de regulação jurídica totalmente exaustiva em nível legislativo, mas com a recusa do Ordenamento Jurídico de atribuir a solução dos casos práticos a critérios subjetivos do aplicador do Direito. Sua utilização deriva do reconhecimento da impossibilidade de formular, antecipadamente e no corpo da lei, a solução completa para certas situações, mas acompanhada do intento de vincular o aplicador à observância de certos conceitos cuja determinação dependerá da avaliação concreta de circunstância. Nesses casos, o aplicador do Direito não é livre para adotar a decisão que melhor lhe pareça e deverá deduzi-la da conjunção entre os princípios jurídicos, a satisfação do interesse público e da concretização do conteúdo dos conceitos indeterminados.
A lição do autor42 vai além, define que adequado é o serviço que atende às
expectativas pelas quais foi instituído: “a atividade em que materializa o serviço público é um
meio-causa que deve conduzir a um fim-conseqüência. Não será adequado o serviço que não
for apto a satisfazer, do ponto de vista técnico, a necessidade que motivou sua instituição.”
Como visto, além da adequação, a Lei em comento descreve princípios
característicos dos serviços públicos. Vejamos-lhes então:
2.1.2.2.1 Regularidade
Conforme o Princípio da Regularidade, o serviço deve ter sua prestação planejada
e executada a partir de uma pré-determinação estabelecida pela Administração que objetive
satisfazer sua finalidade, não podendo o operador do serviço prestar da forma que deseja.
Para JUSTEN FILHO43, “Regularidade significa manutenção da prestação do serviço segundo
padrões qualitativos e quantitativos uniformes.”
Especificamente no caso do transporte público de passageiros, implica que não
pode a operadora mudar o itinerário de linhas, os horários, os pontos de embarque e
desembarque de acordo com sua vontade. Diferentemente do que ocorre no livre mercado, no
transporte público toda sua definição é pré-estabelecida pela Administração.
42 JUSTEN FILHO, 2005, p. 305.43 Op cit., p. 306.
2.1.2.2.2 Continuidade
O Princípio da Continuidade determina que o serviço público não pode ser
suspenso ou interrompido. Nas palavras de JUSTEN FILHO,44 “Continuidade é a ausência de
interrupção, segundo a natureza da atividade desenvolvida e do interesse a ser atendido.”
Em consonância com tal princípio, a omissão de cautelas como a manutenção
preventiva da frota ou a aquisição de veículos suficientes, bem como a perda da capacidade
financeira da operadora, ou qualquer outro evento que coloque em risco a continuidade da
prestação do serviço, provoca o poder-dever da Administração de intervir, em razão de sua
inafastável responsabilidade pelo o escorreito cumprimento do serviço público.45
2.1.2.2.3 Eficiência
O princípio da eficiência, também previsto no art. 37 da Carta Magna, determina
que o serviço público deve ser prestado de forma a atender as demandas de seus usuários,
utilizando os meios apropriados para garantir um serviço adequado.
Por ser “dever constitucional da Administração, que não poderá desrespeitá-lo,
sob pena de serem responsabilizados os agentes que derem causa à violação”46, a eficiência,
como princípio, confere aos administrados os meios de exigir contra as falhas na execução
dos serviços públicos.
44 2005, p. 306.45 A esse respeito ver o comentário sobre o Princípio da Indisponibilidade (Item 2.1.2.1.2)46 CARVALHO FILHO, 2006, p. 22.
Uma operadora de transporte coletivo cuja frota de veículos esteja ultrapassada,
ou cuja tripulação seja mal capacitada, de modo a prejudicar a execução do serviço, ofende a
tal princípio. E é direito dos usuários o saneamento das irregularidades.
2.1.2.2.4 Segurança
Aduz este princípio que a Administração ou a operadora delegada de um serviço
público deve seguir todos os devidos procedimentos estabelecidos em lei, por agências
reguladoras e demais entidades oficiais, com vistas a minimizar todos os fatores de risco
presentes na atividade, para garantir a integridade de todos que são, de alguma forma,
atingidos por este serviço.
A esse respeito, JUSTEN FILHO47 enuncia:
Segurança é o desenvolvimento da atividade sem pôr em risco a integridade física e emocional de quem quer que seja (usuários e não-usuários). (...) Segurança, significa, no caso, a adoção das técnicas conhecidas e de todas as providências possíveis para reduzir o risco de danos, ainda que assumindo ser isso insuficiente para impedir totalmente sua concretização.
Assim, é em atendimento a tal princípio que uma empresa de transporte deve submeter sua
frota a manutenção preventiva, e sua tripulação a qualificação técnica, tendo em vista
evitar riscos aos usuários, pedestres, funcionários e demais condutores.
2.1.2.2.5 Atualidade
47 2005, p. 306.
Atualidade guarda estreita ralação com a eficiência, sendo-lhe conceito
complementar, na medida em que a esta reclama que o Poder Público se atualize com os
novos processos tecnológicos, de modo que a execução seja mais proveitosa com o menor
dispêndio.
Consiste na adoção, na prestação do serviço, de técnicas, tecnologias e equipamentos modernos, além periódicos melhoramentos e ampliações da capacidade de atendimento, visando a acompanhar a demanda. A Lei 8.987 conceitua em seu art. 6º, §2º: “A atualidade compreende a modernidade das técnicas, do equipamento e das instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e expansão do serviço”.
Sobre o tópico JUSTEN FILHO48 continua a expor:
O progresso tecnológico produz redução de custos e de tempo e ampliação de utilidades ofertáveis ao público. Mais ainda, gera novas necessidades. A disponibilidade de tecnologia tem efeito generativo de novas necessidades. Portanto, não adotar novas técnicas significa desatender às necessidades a ela relacionadas. Essa questão fica muito clara a propósito da transmissão de dados à distância.
Conforme o princípio da atualidade, o serviço deve expandir de acordo com o
crescimento da demanda, quantitativa e qualitativamente.
Com efeito, independentemente de haver concorrência na atividade, os serviços
públicos não devem ser ofertados em condições inferiores aos disponíveis no mercado. Isso
“significa que a Administração deve recorrer à moderna tecnologia e aos métodos hoje
adotados para obter a qualidade total da excussão das atividades a seu cargo [...]”, conforme
observa José dos Santos CARVALHO FILHO49, referindo-se ao princípio da eficiência.
2.1.2.2.6 Generalidade
48 2005, p. 307.49 2006, p. 23.
Pelo princípio da generalidade, o serviço público deve ser disponível e ser
ofertado igualmente a todos os usuários que satisfaçam às condições legais, sem qualquer
discriminação ou privilégio. O serviço público deve ser estendido ao maior número possível
de interessados, sendo que todos devem ser tratados igualmente, ou seja, isonomicamente.
Observa-se estreita relação com os princípios da “Universalidade” e da
“Impessoalidade” a que se refere BANDEIRA DE MELLO50: por força daquele, “o serviço é
indistintamente aberto à generalidade do público”; deste, “decorre a inadmissibilidade de
discriminações entre os usuários”.
O serviço público não comporta seja a sua execução direcionada a este ou aquele
grupo de usuários. O que não se confunde com possibilidade de determinação dos
beneficiários.
Assim, o serviço deve ser ofertado indistintamente à coletividade, mas não é
necessário que a contrapartida (remuneração), se for o caso, seja exigida de forma
indeterminada da coletividade.
Tomado por exemplo o serviço de transporte: é ofertado indistintamente à
coletividade, no entanto, apenas aqueles que efetivamente usufruem arcam com a
remuneração.
2.1.2.2.7 Cortesia na sua Prestação
Cortesia na sua prestação impõe que o serviço seja ofertado de modo a atender os
usuários com respeito e urbanidade. Considerando que o serviço público busca a satisfação de
necessidades concretas dos usuários, seria um absurdo tratá-los de forma incivilizada.
Com efeito, o destinatário do serviço público deve ser tratado com cortesia, visto
que o serviço que lhe é ofertado não é um favor. Trata-se da consecução de um dever do
Poder Público, ou de quem lhe faça as vezes, pago de forma direta ou indireta pelo usuário,
50 2007, p. 663.
que tem o direito ao serviço. Tratamento urbano, educado, além de um dever moral, e de
exigência do bom convívio em sociedade, é um dever legal do prestador do serviço público.
2.1.2.2.8 Modicidade das Tarifas
Conforme este princípio, os serviços públicos devem ser ofertados a preços
módicos, razoáveis, que devem ser estabelecidos de acordo com a capacidade econômica do
usuário e com as exigências do mercado, evitando que a remuneração seja motivo para que
qualquer usuário seja excluído do universo de beneficiários do serviço público.
Para ser módica, a remuneração de um serviço deve custar o mínimo suficiente
para custear a operação, sem comprometer a sua viabilidade e qualidade.
O serviço público deve estar à disposição de todos, não apenas formalmente como
materialmente, não podendo a tarifa de um serviço excluir àqueles que necessitam dele.
Sobre este princípio BANDEIRA DE MELLO51 observa:
Deveras, se o Estado atribui tão assinalado relevo à atividade a que conferiu tal qualificação, por considerá-lo importante para o conjunto de membros do corpo social, seria rematado dislate que os integrantes desta coletividade a que se destinam devessem, para desfrutá-lo, pagar importâncias que o onerassem excessivamente e, pior que isto, que os marginalizassem.Dessarte, em um país como o Brasil, no qual a esmagadora maioria do povo vive em estado de pobreza ou miserabilidade, é óbvio que o serviço público, para cumprir sua função jurídica natural, terá de ser remunerado por valores baixos, muitas vezes subsidiados. Tal circunstância – que não ocorre em países desenvolvidos – dificulta ou impossibilita a obtenção de resultados bem sucedidos com o impropriamente chamado movimento das “privatizações”, isto é, da concessão de tais serviços a terceiros para que os explorem com evidentes e naturais objetivos de lucro.
51 2007, p. 663.
Nesta questão tão essencial, é gritante o antagonismo entre os interesses dos usuários com
os interesses das concessionárias privadas, no qual esses desejam um serviço adequado e
aqueles a maximização dos lucros.
2.1.3 Da Classificação dos Serviços Públicos
Após os comentários acima expendidos acerca do conceito de serviços público e
dos princípios que orientam sua criação, planejamento e execução, convém passarmos à
análise de tema que lhe é lógica decorrência, qual seja a sua classificação.
Assim com ocorre à conceituação, variado também é o repertório de classificações
formulado pelos estudiosos dos serviços públicos.
Hely Lopes MEIRELLES52, em classificação seguida por boa parte da doutrina
nacional, rotula os serviços públicos em: (a) públicos e de utilidade pública; (b) próprios e
impróprios do Estado; (c) administrativos e industriais; e (d) "uti universi" e "uti singuli",
como veremos a seguir.
2.1.3.1 Classificação Quanto à Essencialidade
Em primeiro plano, o publicista diferencia os serviços públicos quanto à essencialidade,
distinguindo os serviços “públicos propriamente ditos” dos “de utilidade pública”. Nas
palavras do próprio professor53:
52 1998, p. 286.53 Ibidem, p. 286.
Serviços públicos: propriamente ditos são os que a Administração presta diretamente à comunidade, por reconhecer sua essencialidade e necessidade para a sobrevivência do grupo social e do próprio Estado. Por isso mesmo, tais serviços são considerados privativos do Poder Público, no sentido de que só a Administração deve prestá-los, sem delegação a terceiros, mesmo porque geralmente exigem atos de império e medidas compulsórias em relação aos administrados. Exemplos desses serviços são os de defesa nacional, os de polícia, os de preservação da saúde pública.
Serviços de utilidade pública: são os que a Administração, reconhecendo sua conveniência (não essencialidade, nem necessidade) para os membros da coletividade, presta-os diretamente ou aquiesce em que sejam prestados por terceiros (concessionários, permissionários ou autorizatários), nas condições regulamentadas e sob seu controle, mas por conta e risco dos prestadores, mediante remuneração dos usuários. São exemplos dessa modalidade os serviços de transporte coletivo, energia elétrica, gás, telefone. (grifamos)
Embora a clareza da lição dispense quaisquer comentários, salientamos que tal
classificação importa o reconhecimento de que há serviços que embora sejam considerados
públicos, não são, por si próprios, essenciais, isto é, não são indispensáveis à coletividade,
sendo, tão somente, úteis, na medida em que tornam a vida dos usuários mais cômoda.
Conforme complementa o próprio MEIRELLES, que pode-se denominar aos
primeiros (públicos propriamente ditos) também serviços “pró-comunidade”, uma vez que
dirigem-se à realização bem comum, para a coletividade como um todo; enquanto aos
segundos (de utilidade pública) pode-se denominar “pró-cidadão”, pois “embora
reflexamente interessem a toda a comunidade, atendem precipuamente às
conveniências de seus membros individualmente considerados”.
Além da essencialidade e generalidade (que estão presentes apenas nos serviços
públicos) outra nota distintiva entre as categorias consiste exatamente em uma das
conseqüências de tais atributos: a possibilidade de limitação de direitos de individuais e
utilização de meios coercitivos em sua realização.
Ora, consoante o princípio da supremacia do interesse público, é lícito preterir-se
interesses individuais, e.g., limitando-se o exercício de direitos individuais e impondo
medidas compulsórias. Entretanto, apenas o Estado pode adotar tais providências, pois
monopoliza o Poder de Polícia.
Dessa feita, os serviços públicos propriamente ditos, como os de polícia, de
combate a incêndios, de saúde pública, e de defesa nacional, não podem ficar ao encargo de
particulares, sendo, portanto, indelegáveis.
Por fim, faz-se mister observarmos que, embora o critério que distingue o serviço
público do de utilidade pública seja a essencialidade, a legislação comumente reputa
“essenciais” serviços que consistem em oferecimento de utilidade, que, inclusive, são
explorados mediante delegação por particulares. Assim, pode-se concluir que será “essencial”,
o serviço que o ordenamento assim o considerar, quer encerre um cometimento indispensável
ou meramente útil.
Nesse sentido, nota-se que, na lição transcrita o administrativista considera o
transporte coletivo um serviço de utilidade pública, embora a Constituição Federal,
expressamente o considere um serviço essencial.
Tal discrepância é bastante notória em se tratando do serviço de transporte
coletivo de passageiros, que no próprio texto Constitucional (art. 30, V)54 é declarado
“essencial” embora seja prevista a possibilidade de exploração indireta, “sob regime de
concessão ou permissão”.
2.1.3.2 Classificação Quanto à Adequação ou “Natureza”
A segunda classificação que merece destaque divide os serviços públicos em
serviços “próprios do Estado” e serviços “impróprios do Estado”, como aponta
MEIRELLES55:
54 Art. 30. Compete aos Municípios: [...] V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;. (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Diário Oficial [da] União, Brasília, DF, 05 out. 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 07 jun. 2009).55 1998, p. 287.
Serviços próprios do Estado: são aqueles que se relacionam intimamente com as atribuições do Poder Público (segurança, polícia, higiene e saúde públicas etc.) e para a execução dos quais a Administração usa da sua supremacia sobre os administrados. Por esta razão, só devem ser prestados por órgãos ou entidades públicas, sem delegação a particulares.Tais serviços, por sua essencialidade, geralmente são gratuitos ou de baixa remuneração, para que fiquem ao alcance de todos os membros da coletividade.
Serviços impróprios do Estado: são os que não afetam substancialmente as necessidades da comunidade, mas satisfazem interesses comuns de seus membros, e, por isso, a Administração os presta remuneradamente, por seus órgãos ou entidades descentralizadas (autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações governamentais), ou delega sua prestação a concessionários, permissionários ou autorizatários. Esses serviços, normalmente, são rentáveis e podem ser realizados com ou sem privilégio (não confundir com monopólio), mas sempre sob regulamentação e controle do Poder Público competente.
Trata-se verdadeiramente de uma distinção baseada na natureza do cometimento:
percebe-se, na dicção do publicista, que os serviços próprios do Estado são aqueles em que,
dada sua natureza essencial, o Estado manifesta a sua supremacia, seu poder de império; ao
passo que os serviços impróprios, em tese, não requerem necessariamente a presença do
Estado, senão como controlador, pois não é necessária a manifestação daqueles seus atributos
Estado privativos.
Em verdade, pode-se dizer que os serviços próprios do Estado são também
essenciais. Assim, os serviços próprios do Estado, enquanto essenciais, gerais, indelegáveis, e
envolvidos com o poder de império estatal, encaixam-se também na concepção de serviços
públicos propriamente ditos.
2.1.3.3 Classificação Quanto à Finalidade
Outra classificação observada na doutrina pátria leva em consideração a finalidade
almejada na execução do serviço considerado público, distinguindo-os em administrativos e
industriais.
Segundo MEIRELLES56:
56 1998, p. 287.
Serviços administrativos são os que a Administração executa para atender a suas necessidades internas ou preparar outros serviços que serão prestados ao público, tais como os da imprensa oficial, das estações experimentais e outros dessa natureza.
Serviços industriais são os que produzem renda para quem os presta, mediante a remuneração da utilidade usada ou consumida, remuneração, esta, que, tecnicamente, se denomina tarifa ou preço público, por ser sempre fixada pelo Poder Público, quer quando o serviço é prestado por seus órgãos ou entidades, quer quando por concessionários, permissionários ou autorizatários. Os serviços industriais são impróprios do Estado, por consubstanciarem atividade econômica que só poderá ser explorada diretamente pelo Poder Público quando "necessária aos imperativos da segurança nacional ou ao relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei" (CF, art. 173).
2.1.3.4 Classificação Quanto aos Destinatários
A última das distinções estabelecidas por MEIRELLES leva em consideração os
destinatários da atividade desempenhada pelo Estado. Denomina "uti universi ou gerais”,
aqueles que a Administração presta universalmente a toda a coletividade, isto é, sem ter
usuários determinados.
Tais serviços são também indivisíveis, isto é, não mensuráveis na sua utilização.
Nesse sentido, por exemplo, não há como se “medir” o quanto do serviço policial está sendo
utilizado por determinado cidadão, uma vez que, ainda que não o acione diretamente, a
segurança diretamente relacionada é por todos aproveitada indistintamente.
Ademais, conforme observa o mencionado publicista, é por tal motivo
“normalmente, os serviços uti universi devem ser mantidos por imposto (tributo geral), e não
por taxa ou tarifa, que é remuneração mensurável e proporcional ao uso individual do
serviço.”
Em contra partida, serviços “uti singuli” ou de fruição individual “são os que têm
usuários determinados e utilização particular e mensurável para cada destinatário”.
Nas palavras de MEIRELLES, “são sempre serviços de utilização individual,
facultativa e mensurável, pelo quê devem ser remunerados por taxa (tributo) ou tarifa (preço
público), e não por imposto.”
São exemplos de tais serviços, o transporte de passageiros, o fornecimento de
água e da energia elétrica domiciliares, bem como os serviços telefônicos.
Uma questão relevante a respeito desses serviços refere-se à possibilidade de
suspensão do fornecimento quando do inadimplemento pelo usuário da pertinente
remuneração. Sobre o tema novamente recorremos à explicação daquela doutrina57:
Há que se distinguir entre o serviço obrigatório e o facultativo. Naquele a suspensão do fornecimento é ilegal, pois, se a Administração o considera essencial, impondo-o coercitivamente ao usuário (como é a ligação domiciliar À rede de esgoto e água e a limpeza urbana), não pode suprimi-lo por falta de pagamento; neste, é legítima, porque sendo livre sua fruição, entende-se não essencial, e, portanto, suprimível quando o usuário deixa de remunerá-lo, sendo, entretanto, indispensável o aviso prévio.
Afora a classificação acima descrita, merece também destaque aquela proposta por
BANDEIRA DE MELLO, a qual, consideramos também bastante didática e especialmente
adequada ao estudo a que pretendemos. Vejamo-la então:
2.1.3.4 Classificação Segundo CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO
O publicista da PUC, em primeiro plano, considera que “são obrigatoriamente
públicos os serviços que a Lei Magna declarou competirem ao Poder Público”, o que implica
que tais atividades, ainda que delegáveis, sempre serão exigíveis do Estado.
57 MEIRELLES. 1998, p. 288.
Não obstante, o autor reconhece que a titularidade do serviço não se confunde
com a titularidade da prestação do serviço:
O fato do Estado (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) ser titular de serviços públicos, ou seja, de ser o sujeito que detém “senhoria” sobre eles (a qual, de resto, é, antes de tudo um dever em relação aos serviços que a Constituição ou as leis puseram ou venham a por seu cargo) não significa que deva obrigatoriamente prestá-los por si ou por criatura sua quando detenha a titularidade exclusiva do serviço.58
Seguindo esse raciocínio, subdivide os serviços, de acordo com a disciplina constitucional,
em: (a) serviços de prestação obrigatória e exclusiva do Estado; (b) Serviços que o Estado
tem obrigação de prestar, mas sem exclusividade (c) Serviços de prestação obrigatória do
Estado e em que é também obrigatório outorgar em concessão a terceiros, (d) serviços que
o Estado é obrigado a promover, mas não obrigado a prestar, caso em que deverá dá-los em
concessão a terceiros.
2.1.3.4.1 Serviços de Prestação Obrigatória e Exclusiva do Estado
Consoante leciona BANDEIRA DE MELLO59, há duas espécies de serviços que só podem
ser prestados pelo próprio Estado, isto é, que não podem ser prestados por concessão,
permissão ou autorização. São eles os serviços postais e correio aéreo nacional, como
resulta do artigo 21, X.
58 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Serviço Público e Sua Feição Constitucional no Brasil. Disponível em: <http://www.bibliojuridica.org/libros/4/1626/5.pdf>. Acesso em: 15 mai. 2009.59 op. cit.
Isto porque, ao arrolar artigo 21 competências da União quanto à prestação de serviços públicos, menciona, nos incisos XI e XII (letras “a” a “f”) diversos serviços. A respeito deles esclarece que a União os explorará diretamente “ou mediante autorização, concessão ou permissão”. Diversamente, ao referir, no inciso X, o serviço postal e o correio aéreo nacional, não concedeu tal franquia. Assim, é visível que não quis dar o mesmo tratamento aos vários serviços que considerou.
2.1.3.4.2 Serviços que o Estado Tem Obrigação de Prestar, Mas Sem Exclusividade (Serviços
“de Titularidade Não Exclusiva do Estado”)
O publicista reconhece cinco serviços que serão públicos quando prestados pelo
Estado, mas que concernem a atividades em relação às quais a Constituição não lhe conferiu
exclusividade, pois, conquanto as tenha colocado a seu cargo, simultaneamente deixou-as
liberadas à iniciativa privada.
Assim, são “de titularidade não exclusiva do Estado”, os serviços de saúde, de
educação, de previdência social e de assistência social, porque, embora a Lei Magna os
declare um “dever do Estado”60, também ou afirma que “são livres à atividade privada”61, ou
contempla expressamente a presença de particulares no setor, independentemente de
concessão ou permissão,62 ou, ainda, pressupõe uma atuação “complementar” da iniciativa
privada.63
A respeito destes, assevera: “é óbvio que nos casos em que o Poder Público não
detém a exclusividade do serviço, não caberá imaginar esta outorga, pois quem o desempenhe
prescinde dela para o exercício da atividade em questão”.64
60 Cf. Constituição Federal: arts. 196 e 197 para a saúde, 205, 208, 211 e 213 para a educação, 201 e 202 para a previdência social e 203 e 204 para a assistência social. (BRASIL. 05 out. 1988.).61 Cf. Constituição Federal: art. 199 para a saúde, 209 para a educação. (BRASIL. 05 out. 1988.).62 Cf. art. 204, I, e II, para a assistência social. (BRASIL. 05 out. 1988.).63 Cf. art. 202 para a previdência social. (BRASIL. 05 out. 1988.).64 MEIRELLES. Serviço Público e Sua Feição Constitucional no Brasil.
Não obstante, o embora Estado não seja titular exclusivo de tais serviços, não
pode permitir que sejam prestados exclusivamente por terceiros, seja a título de atividade
privada livre, seja a título de concessão, autorização ou permissão.
2.1.3.4.3 Serviços que o Estado Tem Obrigação de Prestar e Obrigação de Conceder
Em verdade, trata-se de atividade com peculiar disciplina constitucional: o Estado,
conquanto obrigado a prestar por si ou por criatura sua, é também obrigado a oferecer em
concessão, permissão ou autorização: são os serviços de radiodifusão sonora (rádio) ou de
sons e imagens (televisão). Isto porque o artigo 232 determina que, na matéria, seja
observado o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal. Se
esta complementaridade deve ser observada, o Estado não pode se ausentar de atuação
direta em tal campo, nem pode deixar de concedê-los, sob pena de faltar um dos elementos
do trinômio constitucionalmente mencionado.
2.1.3.4.4 Serviços que o Estado é Obrigado a Promover, Mas Não Obrigado a Prestar, Caso
em que Deverá Dá-los em Concessão a Terceiros.
Trata-se da classe mais abrangente, que, segundo o autor, engloba todos os demais
serviços públicos, notadamente os arrolados no artigo 21, XI da Constituição, o Estado pode
prestar por si mesmo (mediante administração direta ou indireta) ou transferindo seu
desempenho a entidade privada (mediante concessão, permissão ou autorização).
Por fim, impende ressaltar que tal classificação não é estanque e não contempla
todos os serviços públicos, pois se refere apenas à disciplina expressa na Constituição. Deste
modo, os serviços então referidos não são os únicos que se enquadram em cada uma das
categorias. Exemplo disso, é que os serviços considerados por Hely Lopes de MEIRELLES
como “Serviços próprios do Estado” podem também ser enquadrados como “Serviços de
Prestação Obrigatória e Exclusiva do Estado”.
2.1.4 Da Execução dos Serviços Públicos
Conforme mencionado quando tratamos das noções de serviço público, a
identificação do agente que realiza a atividade não é suficiente para identificarmos seu caráter
estatal, uma vez que, a titularidade do serviço não se resume à titularidade da sua execução, a
qual, como visto, pode ser transferida pelo Estado para outros agentes.
Cumpre-nos, então, observar que, o serviço público pode ser prestado de forma
centralizada, descentralizada ou desconcentrada.
2.1.4.1 Desconcentração, Desconcentração e Descentralização
A prestação de serviço centralizada é quando a execução do serviço realiza-se
diretamente pela pessoa política prevista constitucionalmente, sem delegação a outras
pessoas. Diz-se que a atividade do Estado é centralizada quando ele atua diretamente.
A prestação do serviço de forma desconcentrada se dá quando a Administração
executa o serviço centralizadamente, mas o distribui entre vários órgãos da mesma entidade,
para facilitar sua realização e obtenção pelos usuários. Isto é, consiste num mecanismo de
fracionamento interno das atribuições entre os próprios órgãos e setores de uma mesma
entidade.
Por sua vez, a prestação de serviço ocorre de forma descentralizada quando se dá
a transferência da titularidade do serviço ou da execução do serviço para outra pessoa, quer
seja de direito público (Autarquias e Fundações Públicas) ou de direito privado (Empresas
Particulares).65
Essa transferência de titularidade do serviço ou da sua execução, que na forma
descentralizada, pode ser realizada de duas formas: através da outorga ou da delegação.
Podemos identificar a ocorrência da Outorga quando a Administração Pública
cria uma nova entidade e a ela transfere, por lei específica, determinado serviço público ou de
utilidade pública. É sempre feita por lei e somente por outra lei pode ser alterada ou retirada,
e.g. quando a União cria uma autarquia e transfere para esta a titularidade de um serviço
público, não transfere apenas a sua execução.
E podemos observar que se dá a Delegação quando a Administração Pública
transfere, por contrato (concessão ou permissão) ou por ato unilateral (autorização),
unicamente a execução do serviço, para que o delegado o preste ao público em seu nome e
por sua conta e risco, nas condições regulamentares e sob o controle estatal, e.g. quando o
Estado dá permissão a uma empresa de transporte para realizar o deslocamento de pessoas e
bagagem nas rotas interestaduais.
2.1.4.2 Outorga e Delegação
Existe ainda no meio jurídico uma pequena confusão na distinção de quando se dá
a ocorrência da delegação ou da outorga. Façamos, então um parâmetro com algumas
diferenças de ambas para que possamos melhor diferenciá-las.
Podemos identificar no instituto da Outorga:
65 A descentralização, mesmo que seja para entidades particulares, não retira o caráter público do serviço, apenas transfere a execução.
a) A Administração Pública cria a entidade quem vai receber a
outorga;
b) O serviço é transferido por lei;
c) Transfere-se a titularidade e execução do serviço; e
d) Tem presunção de definitividade.
Já no instituto da Delegação podem ser identificados os seguintes elementos:
a) O particular é quem cria a entidade que vai receber a delegação;
b) O serviço é transferido por contrato (concessão) ou por ato
unilateral (permissão);
c) Transfere-se a execução do serviço e não a sus titularidade; e
d) Tem caráter de transitoriedade.
Como o nosso estudo tem o foco principal no serviço de transporte, vamos nos
ater a decupar, mais profundamente, a delegação, uma vez que os transportes públicos são
executados por particulares através deste instituto.
A Constituição Federal é clara em aduzir, em seu art. 175: “incumbe ao Poder
Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre
através de licitação, a prestação de serviços públicos.”
A Lei 8.987/95, que dispõe sobre o regime de concessões e permissões da
prestação de serviço público, obedecendo ao comando da norma constitucional supra,
determinando, inequívoca e expressamente, que “a União, os Estados, o Distrito Federal, e os
Municípios promoverão a revisão e as adaptações necessárias de sua legislação às prescrições
desta lei”66.
Nestes termos, a lição doutrinária é no sentido de que a Lei 8.987/95 tem âmbito
nacional e às suas prescrições deverão adaptar-se não somente ao sistema Federal, como aos
Estados, Municípios e Distrito Federal.
66 Cf. Art. 1º, § único. (BRASIL. Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. Dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal, e dá outras providências. Diário Oficial [da] União, Brasília, DF, 14 fev. 2005. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/Leis/L8987cons.htm>. Acesso em: 05 jun. 2009.)
A obrigatoriedade da licitação prévia também consta da própria Lei Maior (art.
37, inc. XXI e art.175, caput), razão pela qual constitui condição de validade e legitimidade
da concessão ou permissão, não podendo o Administrador, em hipótese alguma, delegar a
prestação de atividade considerada pública por outro modo que não seja o processo seletivo
de licitação.
Convém ressaltar que, além da expressa exigência constitucional, a
obrigatoriedade de observância do processo licitatório para todas as contratações públicas e,
especialmente, para a prestação de serviços públicos, mediante concessão ou permissão, é
expressamente reiterada pela legislação infraconstitucional (Lei nº 8.987/95).
2.1.4.3 Execução Direta e Execução Indireta
Superada a distinção entre os serviços centralizados, descentralizados ou
desconcentrados, convém observar que, independentemente desta classificação, admitem
ainda execução direta ou indireta: tal distinção diz respeito a sua implantação e operação, e
não a quem tem a responsabilidade pela sua execução.
Execução direta do serviço é a realizada pelos próprios meios da pessoa
responsável pela sua prestação ao público, quer seja essa pessoa a titular, delegada ou
outorgada, quer seja esta pessoa estatal, autárquica, paraestatal, empresa privada ou particular.
Considera-se serviço em execução direta sempre que o encarregado de seu
oferecimento ao público o realiza pessoalmente, ou por seus órgãos, ou por seus prepostos,
mas não mediante a contratação de terceiros.
Execução indireta do serviço é a que o responsável pela sua prestação contrata
terceiros para realizá-lo nas condições regulamentares. Assim, serviço próprio, delegado ou
outorgado, quando feito por outrem, é execução indireta. Comumente se denomina tal arranjo
por “terceirização”.
Portanto, quer a Administração direta, quer a Administração indireta ou as
empresas privadas e particulares que receberem serviços públicos, podem, em certos casos,
executá-los indiretamente, contratando-os com terceiros. Ressalte-se, porém, que esta
contratação não configura-se como sub-delegação, pois a responsabilidade e recursos
envolvidos continuam sendo do encarregado (titular, outorgado ou delegado).
Impende observar, por oportuno, que execução indireta depende da natureza do
serviço, pois existem alguns que não admitem substituição do executor, como, por exemplo,
os de polícia, e para outros a própria outorga ou delegação proíbe o traspasse da execução.
Por fim, é essencial destacar: descentralização e desconcentração de serviço, não
se confundem com execução indireta, pois se referem à forma de prestação desse mesmo
serviço, enquanto esta é apenas um meio de sua execução.
2.2 O ESTADO E A REGULAMENTAÇÃO DE ATIVIDADES PRIVADAS
Não há dúvida quanto a serem os serviços públicos atividades de interesse geral,
pois a lei assim os considera em função de constituírem verdadeiras necessidades ou
utilidades comuns a toda a coletividade. Com efeito, é em função da importância de tais
atividades para a sociedade que se impõe a sua disciplina pelo regime jurídico de Direito
Público, caracterizado pela regência dos princípios anteriormente descritos nesse trabalho
(item 2.1.2.): universalidade, continuidade, modicidade de tarifas, etc.
Entretanto, não se pode olvidar que a constituição de determinada atividade como
serviço público decorre da opção legal, sendo, portanto, uma escolha jurídica, que também
envolve uma grande carga política.
Não obstante, independentemente de controvérsias e divergências doutrinárias a
respeito da noção em comento, tem-se que uma atividade, por mais útil ou necessária que seja
à coletividade, permanecerá no âmbito das relações privadas até que o ordenamento a eleve à
categoria de serviço público. Sua titularidade permanecerá nas mãos dos particulares até que a
Lei defina que pertence ao Estado.
Tal realidade deve-se ao comando do princípio da “Livre Iniciativa” –
fundamento da República Federativa do Brasil, conforme art. 1º (inc. IV) da Constituição
Federal – segundo o qual o Estado deve atuar apenas subsidiariamente, isto é, apenas como
garantidor do “Bem Comum”, não podendo, aleatoriamente, definir uma atividade como
serviço público, se esta poder ser satisfatoriamente suprida pela própria sociedade.
Desta forma, há que se reconhecer a existência de serviços prestados à
coletividade, que, apesar de serem de interesse geral, são titularizados pela iniciativa privada.
São as chamadas atividades privadas de interesse público ou atividades privadas
regulamentadas.
Assim, atividades privadas regulamentadas são aquelas atividades oriundas da
iniciativa privada para as quais a lei, face à sua relação com o bem estar da coletividade e/ou
por exigirem certas condições de técnica ou segurança aos usuários, impõe a sua contínua
sujeição à regulação do Poder Público, sem, contudo, inseri-las no rol do serviços públicos.
Em resumo, são aquelas prestadas pelos particulares por direito próprio, mas que
o Estado as sujeita a um controle constante. Por não se tratar de atividades assumidas pelo
Estado como próprias, pertencentes ao seu campo específico, não são considerados serviços
públicos.
Temos como exemplos destas atividades os serviços anteriormente referidos como
“de titularidade não exclusiva do Estado” – educação, saúde, previdência social e assistência
social67 – pois enquanto titularizados pelo Estado são Serviços Públicos, mas quando
titularizados por particulares são meramente atividades econômicas regulamentadas.
Nesse sentido, convém reproduzirmos a lição de JUSTEM FILHO:68
São atividades relacionadas com a produção, circulação e prestação de bens econômicos e de utilidades economicamente avaliáveis, a partir da livre organização dos fatores de produção e da apropriação privada dos resultados. [...] Não se incluem
67 Conforme anteriormente comentado, a prestação do serviço público de educação é uma obrigação constitucional da Administração (Art. 205), mas também “é livre à iniciativa privada” (Art. 209) sob várias condições. O mesmo ocorre com a Saúde (Arts. 196 e 199). O sistema geral da Previdência Social é de obrigação da Administração e de filiação compulsória (Art. 201) enquanto que a previdência privada é complementar e voluntária (Art. 202). Quanto à assistência social há a compulsoriedade da ação da Administração, mas é aberto a entidades privadas que também a exerçam.68 Concessões de Serviços Públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p. 57.
no conceito de atividade econômica em sentido estreito certas atividades que a constituição qualificou como serviço público – mesmo que tais atividades tenham cunho “econômico” ou sejam propriamente lucrativas. A intervenção estatal faz-se, quando “as atividades econômicas em sentido estrito, pela regulamentação do seu exercício”. O estado não pode tomar pra si o desempenho direto de atividades econômicas, senão quando presentes os pressupostos constitucionais para tanto.
Ainda conforme este raciocínio, tem-se que as atividades econômicas podem ser
desenvolvidas em regime de liberdade, o que não quer dizer que não estejam sujeitas a
condicionamentos da ordem do Poder de Polícia do Estado. Tal condicionamento, entretanto,
resume-se a prevenir e corrigir “disfunções” que a liberdade econômica ilimitada poderia
ensejar.
Os distintos reflexos do princípio da Legalidade na atuação da Administração e na
atuação da Iniciativa Privada ilustram perfeitamente a distinção do modus operandi em ambos
os contextos: o mesmo princípio, para esta implica que podem fazer tudo aquilo que a lei não
vedar, enquanto, para aquela, impõe ampla vinculação, no sentido de poderem agir apenas
conforme a lei autoriza.
Não obstante, deve-se frisar o caráter público atribuído a um determinado serviço
não impede que se configure como atividade lucrativa, pois há serviços públicos de cunho
econômico. Estes, na lição de MEIRELLES, são os serviços públicos industriais, que, em
função do já mencionado caráter subsidiário da atuação estatal, só podem ser explorados
diretamente pelo Poder Público quando necessário “aos imperativos da segurança nacional ou
a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei”, nos termos do art. 173 da Carta
Magna.
Tais serviços, entretanto, não se confundem com atividades econômicas privadas
sob regulamentação estatal, na medida em que não se sujeitam às regras de mercado, não são
explorados em regime de liberdade, sendo-lhes, pelo contrário, aplicada a mesma disciplina
dos demais serviços públicos.
Em resumo, tem-se que, embora serviços públicos e atividades privadas
regulamentadas pelo Estado faça parte do gênero “serviços de interesse geral”, dada a sua
utilidade ou essencialidade, apenas aqueles são de titularidade do ente estatal, conforme
definidos em lei, e tão somente aí se justifica a sua presença, salvo se necessário “aos
imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo”.
CAPÍTULO 3 - MODALIDADES DE TRANSPORTE
No presente capítulo traçaremos noções básicas a respeito das diversas
modalidades em que o serviço de transporte pode ser apresentado, tendo em vista que, em
conseqüência de tais distinções, também diverso deve ser o tratamento normativo sobre a
atividade.
Embora o Contrato de Transporte seja definido no Novo Código Civil, com
apenas duas subdivisões (transporte de pessoas e transporte de coisas), a doutrina traz mais
classificações em função de vários aspectos atinentes ao tema.
O Contrato de Transporte pode apresentar diversas formas, uma vez que a
atividade pode ser desempenhada em diversos “modais”, ou modalidades, que se distinguem
em função do objeto transportado, do meio em que se realiza, do tipo de relação jurídica
envolvida ou do tratamento jurídico que a disciplina.
Vale lembrar ainda, que dado o caráter interdisciplinar da matéria, aludido no
início desse estudo, também se pode reconhecer que o transporte ora se apresenta como
serviço público, ora como atividade privada, cumprindo-nos que características do serviço
importam para situá-lo nesta ou naquela categoria.
Vejamos, então, alguns pontos dessa classificação didática trazida pela doutrina especializada.
3.1 CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO OBJETO DO TRANSPORTE
O próprio Código Civil aduz que o transporte a ser realizado pode ser de coisas ou pessoas, porém a doutrina afirma que há uma terceira modalidade quando ao objeto transportado, qual seja o transporte de notícia, que não é pessoa nem coisa. Veremos cada uma dessas modalidades, a seguir.
3.1.1 Transporte de Coisas
No Contrato de Transporte de Coisas, o condutor se obriga a locomover de um
lugar a outro, mediante remuneração, coisas inanimadas, ou não, mas que, necessariamente,
devem ser lícitas.
Esta modalidade de Transporte é regulada no Código Civil de 2002, em Seção
própria, nos arts. 743 a 756.
Fazem parte deste contrato o remetente, que é quem expede a mercadoria a ser
transportada, e o transportador, que é, como já visto, a pessoa responsável pelo transporte e
zelo da carga. Há ainda a figura do destinatário, ou consignatário, que é a pessoa que recebe a
mercadoria no seu destino final.
Devendo-se ressaltar que este, via de regra, não é sujeito da relação contratual, mas apenas a pessoa indicada a receber a coisa. No entanto, pode confundir-se com o próprio remetente, como, por exemplo, na realização de uma mudança, em que uma empresa é contratada para fazer o transporte dos bens pessoais da pessoa, a qual remete os bens, na antiga morada, e que, chegando antes, também se faz presente no ponto de chegada para receber os bens, como destinatário.
A doutrina69 ainda aponta um quarto interveniente: o comissário de transporte, que
é quem faz a intermediação entre o remetente e a empresa transportadora, assumindo a
obrigação de que a mercadoria será transportada, mas “pelas mãos” de outras pessoas, no caso
a empresa transportadora.
Conforme lembra RIZZARDO70, o Decreto n.º 51.813/63, que regulamenta, ainda,
alguns pontos do transporte de coisa, traz de forma esparsa em sua letra, várias espécies de
cargas que podem vir a ser transportadas. Vejamos algumas:
a) - Animais – que podem ser transportados, mas em compartimentos
especiais, com totais condições de segurança e higiene;
b) - Bagagens – podem ser os objetos de uso pessoal que o passageiro
conduz, com visto em tópico anterior;
c) - Encomendas – são transportadas, muitas vezes no mesmo
transporte de passageiros, sob tarifa específica;
d) - Mercadorias – são remetidas de uma forma comum, sem qualquer
modo especial, como os demais; e
69 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 80870 Ibidem. p. 808
e) - Valores, jóias, dinheiro, ações, objetos valiosos, em geral – são
transportados, geralmente junto ao condutor, muitas vezes em
cofres, por conta de serem cargas valiosas.
O transporte de coisas é comprovado através do “conhecimento de carga”, que é
um documento emitido pelo transportador quando o mesmo recebe a mercadoria, que deve ser
entregue ao destinatário.
Ainda dentro do Transporte de Coisas, a doutrina71 ainda traz outras divisões
quanto à forma do transporte, vejamos a seguir.
3.1.1.1 Transporte de Coisas sob a Forma Modal
É o mais simples de todos: é aquele em que o transporte é realizado por apenas
um meio de transporte, desde o seu embarque até o destino final.
3.1.1.2 Transporte de Coisas sob a Forma Segmentada
A coisa é conduzida por mais de um meio de transporte, sendo cada um desses
veículos contratado separadamente, podendo ser utilizada mais de uma modalidade de
transporte, por via aérea, terrestre ou aquaviária.
3.1.1.3 Transporte de Coisas sob a Forma Sucessiva
71 DINIZ, Maria Helena. Tratado Teórico e Prático dos Contratos. 4. ed. ampl. atual. São Paulo: Saraiva, 2002. 4 v. p. 332.
O transporte é feito por vários veículos de mesma modalidade (terrestres, aéreos
ou aquaviários), mas que, para a realização da condução da carga, é realizado apenas um
contrato, abrangendo toda s essa naves utilizadas para fazer chegar a mercadoria ao seu
destino final.
3.1.1.4 Transporte de Coisas sob a Forma Intermodal
Nesta modalidade, a coisa é transportada por vários meios, sendo que esses meios
podem ser de várias modalidades diferentes, terrestre e marítima, por exemplo; porém essas
naves transportadoras são regidas sob o mesmo contrato, que abrange a expedição até o
destino final da carga.
3.1.2 Transporte de Pessoas
O transporte de pessoas é regulado pelo Código Civil em seção própria do
Capítulo que trata sobre o Contrato de Transporte. Tal modalidade teve a sua normatização
acolhida entre os arts. 734 e 742 da referida Lei.
Nesta forma contratual, conforme aduz o art. 730 do Código Civil, o transportador
“se obriga, mediante retribuição, a transportar, de um lugar para outro, pessoas”, assim como
também sua bagagem (neste caso, o transporte de coisas se torna acessório do transporte de
pessoas).
Desta modalidade de Contrato de Transporte são pólos apenas o transportador e o
passageiro, não havendo, portanto a figura do consignatário, ou destinatário. De onde
podemos concluir que se trata da modalidade mais simplificada do contrato de transporte, em
que está obrigado o transportador a deslocar a pessoa, e sua bagagem, de um local a outro na
forma do art. 734 do Novo Código Civil72, enquanto está obrigado o passageiro apenas a
adimplir o preço da passagem.
O início do Contrato de Transporte de Pessoas se dá, em geral com o embarque do passageiro e sua bagagem, uma vez que a sua formalização (a compra do bilhete) pode se dar em diversos momentos. Peguemos por exemplo o transporte de passageiros aéreos, em que o passageiro pode comprar o bilhete com meses de antecedência do embarque, de sua própria residência, onde o transportador não tem qualquer área de atuação quanto a responsabilização por eventuais acidentes, uma vez que o deslocamento do passageiro ainda não aconteceu, embora o contrato de transporte já esteja formalizado para uma data futura.
Em suma, nesta modalidade contratual só se dá o seu termo inicial quando o
passageiro e sua bagagem se inserirem na área de responsabilização do condutor. Vejamos as
brilhantes palavras que o civilista Carlos Roberto GONÇALVES73 nos traz acerca do assunto:
A responsabilidade pela integridade da pessoa do passageiro só se inicia, porém, a partir do momento em que esse mesmo passageiro incide na esfera de direção do transportador. Segue-se que o próprio ato de o passageiro galgar o veículo já o faz entrar na esfera da obrigação de garantia.
Qualquer passageiro tem direito também a levar consigo seus objetos pessoais,
que fazem parte da sua bagagem, a qual deve ser transportada juntamente com ele sem a
cobrança de novo preço pelo transporte. Mas, lembrando que, para que não seja cobrado novo
preço de deslocamento pela bagagem, a mesma deve obedecer às especificações de peso,
tamanho e tipo de carga, previamente estabelecidas pelo condutor, pois do contrário o
transportador pode sim se recusar a conduzir a bagagem, ou mesmo cobrar novo preço para
transportá-la.
Ao transportador cabe, também, a responsabilização por eventuais danos causados
à bagagem do passageiro durante o tempo de duração da viagem, na mesma forma74 em que se
responsabiliza pelo transporte das pessoas detentoras das bagagens, pois o transporte desta
carga advém do próprio contrato de transporte das pessoas, de forma acessória.
O regulamento referente à bagagem ainda é o do Decreto n.º 51.813 de 8 de março
de 1963. Vejamos o que nos diz tal norma acerca do assunto:
72 Art. 734. O transportador responde pelos danos causados às pessoas transportadas e suas bagagens, salvo motivo de força maior, sendo nula qualquer cláusula excludente da responsabilidade. (BRASIL, 11 jan. 2002).73 2007, p. 460.74 O já mencionado art. 734 (BRASIL, 11 jan. 2002).
Art. 298. Como bagagem são consideradas as coisas de uso pessoal do passageiro, destinadas a prover as necessidades e objetivos imediatos da viagem e que, normalmente, devem seguir no mesmo trem ou veículo automotor, a saber: [...]. Parágrafo único. Para o despacho de bagagem, as emprêsas adotarão tarifas e condições convenientes tendo em vista a categoria do trem ou veículo que a deva conduzir. Art. 299. Cada passageiro poderá levar consigo, gratuitamente e sem despacho, sob sua exclusiva responsabilidade, volumes de bagagens com dimensões e pêso global máximo estipulados nas tarifas, desde que:[...]
Observando que, mesmo a norma do Decreto tratando, basicamente, do transporte
em trens, esta ainda é aplicada nos dias de hoje no que tange à bagagem do passageiro
transportada.
A modalidade de transporte de pessoas pode também ser dividida em transporte
individual ou coletivo.
Convém adiantar, embora o assunto seja melhor abordado em tópico específico,
tal distinção é de extrema importância para a definição do caráter público ou privado do
serviço. Com efeito, tal classificação refere-se diretamente ao número de pessoas
transportadas, mas as reflete na relevância que a atividade assume perante a sociedade.
3.1.2.1 Transporte Individual e Transporte Coletivo
Nesta espécie contratual, uma única pessoa (passageiro) contrata um transportador
para fazer o seu deslocamento de um lugar a outro, mediante retribuição; sendo que esta
contratação obedece, em tudo, às regras já analisadas do contrato de transporte, de uma forma
geral.
O transporte individual de passageiros, por muitos doutrinadores75 é considerado
um verdadeiro contrato de prestação de serviços, uma vez que “o condutor fica sob sua
direção quanto ao destino, itinerário e até à marcha do veículo [...].”76
75 Dentre os quais podemos citar os civilistas Arnaldo Rizzardo e Orlando Gomes.76 GOMES, Orlando. 2000, apud RIZZARDO, 2005, p. 795.
Para esta modalidade de transporte, o exemplo mais comum o “táxi”, e mais
recentemente o “moto-taxi”, em que uma maior flexibilidade de acerto entre transportado e
transportador, pois, como mencionado, pode-se escolher horário, destino, trajeto, velocidade,
podendo-se inclusive subdividir o percurso ou negociar o retorno. Não há, nesta modalidade,
itinerário ou horários pré-estabelecidos, o preço não é previamente estipulado, (tão somente a
tarifa o é) sendo calculado e função do trajeto percorrido e do tempo decorrido, e não é
cobrado de cada passageiro, individualmente, mas do grupo como um todo.
Vale observar que, embora, à primeira vista, possa soar estranho denominar
“individual” o transporte em que locomovem-se até quatro passageiros, tal denominação não é
imprópria, pois, nesses casos, embora mais de uma pessoa sejam transportadas ao mesmo
tempo, apenas um contrato de transporte é celebrado.
Ocorre que, conforme a natureza desse transporte, quando duas ou mais pessoas
dividem o táxi, o serviço é contratado não individualmente, mas para todo o grupo, de modo
que o valor da remuneração não é devido individualmente por cada um dos passageiros, e sim
pela dupla. Nessa situação, embora os passageiros possam livremente ratear o custo da
viagem, tal negociação é alheia à relação estabelecida como transportador; neste caso, os
passageiros relacionam-se ao transportador como se apenas uma pessoa.
A bem da verdade, devemos ressalvar que a relação acima descrita é a que
tradicionalmente estabelece-se no contrato de transporte por táxi, é a que define o serviço
como individual, podendo o serviço de táxi ser disciplinado de forma diversa, de acordo com
a legislação que o rege. Existem localidades em que o serviço é executado de forma distinta,
admitindo-se, por exemplo, a prática popularmente chamada “lotação”, em que em uma
mesma viagem, são transportados passageiros com destinos distintos, sem qualquer inter-
relação.
Em resumo, o transporte individual é aquele em que o passageiro contrata o
transportador, com opção de escolha das condições da viagem, horário, destino, e itinerário a
ser percorrido.
Em função de tal flexibilidade, a doutrina reconhece que, nesta modalidade, isto é,
quando o transporte individual é realizado sem ares de essencialidade, mas apenas como
atividade destinada a fornecimento de comodidade, não sendo considerado um serviço
público.77
No Transporte Coletivo de Pessoas, em contraponto ao transporte individual,
várias pessoas contratam um mesmo serviço, embora não tenham relação entre si, razão pela
qual, a relação estabelecida entre elas e o transportador é individual, e não de forma conjunta.
Assim, o valor da remuneração é devido particularmente por cada passageiro.
No transporte coletivo, um conjunto de pessoas, contrata um mesmo meio de
transporte para realizar a sua locomoção de um lugar a outro; entretanto, esta locomoção
segue itinerário e horários pré-definidos, que não podem ser alterado pelos contratantes.
Resta, portanto, aos passageiros adequarem suas viagens às condições em que o serviço é
ofertado.
Trata-se da modalidade mais comum, segundo a qual via de regra é executado o
serviço público de transporte.
Em função do grande volume de passageiros transportados, tal modalidade torna-
se estrategicamente importante para a sociedade, e, em função dessa essencialidade, vários
ordenamentos jurídicos atribuem-na o caráter de serviço público.
Em assim sendo, o transporte coletivo é executado como serviço Regular78, sob a
disciplina específica do regime jurídico público, isto é, sob a orientação dos Princípios
Administrativos, em especial aqueles mencionados na Lei de Concessões de Serviços
Públicos (Lei 8.987/95): da regularidade, da continuidade, da eficiência, da segurança, da
atualidade, da generalidade, da cortesia na sua prestação e da modicidade das tarifas.
3.1.2.2 Transporte Regular e Transporte por Fretamento
77 Sobre este aspecto, cf. comentário a respeito de Transporte Público e Transporte Privado (item 3.4.4).78 Sobre esta classificação cf. item 3.4.1.2.2
Outra classificação, que guarda íntima relação com as modalidades anteriormente
referidas (“transporte individual” e “transporte coletivo”), reparte o transporte de passageiros
entre Serviço Regular e Serviço por Fretamento.
Tal classificação é bastante difundida entre doutrina especializada e costuma ser
empregada pelo ordenamento jurídico infraconstitucional, embora não haja qualquer previsão
na Constituição.
Entende-se por Transporte Regular aquele posto a disposição da coletividade
indistintamente – isto é ofertado ao público e não a indivíduos determinados – sendo
executado em atendimento a “linhas”, que nada mais são do que condições de operação pré-
determinadas: origem, destino, itinerário e seccionamentos, bem como horários e tarifas pré
estabelecidos. É marcado pelo dever de regularidade, continuidade e generalidade.
Em verdade, os conceitos de Transporte Regular e Transporte Coletivo são
constantemente utilizados como sinônimos pela doutrina, pois, além de o binômio regular-
coletivo ser a modalidade mais difundida, praticamente não se tem notícia de veículos de
baixa capacidade operando conforme aquelas condições já mencionadas, uma vez que seria
economicamente inviável.
Nessa modalidade de transporte, os veículos circulam pelo trajeto pré-
determinado nos horários também pré-fixados, de modo a possibilitar um atendimento
previsível e uniforme. Assim, os passageiros, já cientes das condições adaptam seus destinos à
rotas disponíveis.
Apenas nessa modalidade é admissível o embarque e desembarque de passageiros
ao longo do itinerário, pois, como é característico, os contratantes não têm um liame
subjetivo, não realizam viagens com origens e destinos coincidentes, de modo que a apenas
adequar seus interesses ao serviço ofertado.
Tais características do serviço regular decorrem de ser um serviço público,
conforme trataremos a seguir, destinado ao atendimento das necessidades de locomoção da
coletividade, não apenas de determinados grupos de indivíduos.
Desta forma, em sendo um serviço público, a sua execução por particulares segue
normas mais rígidas do que a mera regulação de atividade econômica, sendo delegada através
de Concessão ou Permissão.
Por outro lado, o transporte por fretamento consiste em uma modalidade de
serviço na qual o contratante tem total liberdade de escolha em relação às condições da
viagem: os pontos de origem e destino, bem como os horários, e inclusive o valor da
remuneração são definidos por negociação direta entre os contratantes.
Trata-se, pois, de um serviço de comodidade, caracteristicamente regido pelos
princípios da livre iniciativa. Configura-se como uma atividade econômica.
Diferentemente do que ocorre com o transporte regular, que apenas se viabiliza
quando executado na modalidade coletiva, o transporte por fretamento pode perfeitamente ser
contatado por apenas um indivíduo, dependendo da capacidade do veículo, obviamente.
Nesse sentido, impende adiantarmos assunto que será tratado a seguir, qual seja a
disciplina da legislação estadual do Ceará sobre tal matéria: o Decreto 29.687/2009,
Regulamento do Serviço de Transporte Rodoviário de Passageiros do Estado do Ceará, no seu
art. 102 traz as definições de Fretamento Eventual e Fretamento Contínuo:
I - Serviço de fretamento contínuo: serviço de transporte rodoviário de passageiros prestado à pessoa jurídica, mediante contrato escrito, para um determinado número de viagens ou por um período predeterminado, não superior a 12 (doze) meses, com horários fixos, destinado ao transporte de usuários definidos, que se qualificam por manterem vínculo específico com a contratante para desempenho de sua atividade, mediante prévia autorização do poder concedente. II - Serviço de fretamento eventual: serviço de transporte rodoviário de passageiros prestado a uma pessoa ou a um grupo de pessoas, em circuito fechado, para uma viagem com fins culturais ou recreativos, mediante prévia autorização do poder concedente. (grifos nossos)
Na dicção da referida norma, percebe-se que tal modalidade pode ser contratada
com ar de continuidade, ou apenas eventualmente, para uma única viagem, sendo-lhe
característico, além de possibilidade de negociação de condições de operação (horários, locais
de partida e destino, e remuneração), o fato de não disponível ao público alheio ao contrato,
isto é, não ser vinculado ao atendimento da sociedade, mas tão somente dos sujeitos
diretamente obrigados pelo contrato.
Outrossim, impende observar que via de regra, sua execução é regulamentada
pelo Estado, que na função de guardião do Bem Comum, estipula parâmetros de operação no
que pertine a segurança, conforto e higiene, sem, contudo, interferir na natureza negocial do
serviço.
Por tal motivo, essa modalidade de transporte geralmente requer Autorização
estatal, ao passo que não se trata de um serviço público, delegável por concessão ou
autorização.
3.2 CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO MEIO EM QUE É EXECUTADO
Mais uma divisão didática aplicada aos transportes é a que diz respeito ao meio
em que ocorre o deslocamento das pessoas ou das coisas, que podem ser por via aérea, via
hidroviária ou via terrestre.
3.2.1 Transporte Aéreo
Transporte aéreo é considerado aquele realizado, mediante remuneração, por meio
de aeronaves, em espaço aéreo. Sob esta modalidade podem ser transportadas pessoas ou
cargas, sendo bastante usuais nas duas formas.
Esta forma de condução é regida por normas próprias, sujeitas aos dispositivos da
Legislação Civil79, e que trazem diversas distinções quanto à responsabilidade do
transportador, em relação às demais modalidades de transporte.
O transporte pode ser doméstico ou internacional. No primeiro, a toda a rota se
encontra dentro do espaço aéreo nacional80; enquanto no segundo, ao contrário, é considerado
internacional pelo fato de o ponto de partida e o destino se situarem em países diferentes.
Tomemos conhecimento de algumas normas que também regulamentam o transporte aéreo:
a) Lei n.º 7.565, de 19 de dezembro de 1986, que institui o Código
Brasileiro de Aeronáutica;
b) Decreto n.º 20.704, de 24 de novembro de 1931, que ratificou a
Convenção de Varsóvia, de outubro de 1929;
c) Decreto n.º 56.463, de 15 de junho de 1965, que ratificou o
Protocolo de Haia de 28 de setembro de 1955, que trouxe
modificações à já ratificada Convenção de Varsóvia;
d) Decreto nº 60.967, de 07 de julho de 1967, que ratificou a
Convenção de Guadalajara; e etc.
3.2.2 Transporte Aquaviário
É aquele em que o deslocamento de pessoas ou coisas se dá por rotas aquáticas, podendo ser no mar, em rios ou em lagos, realizados por barcos, navios ou balsas.
Hoje, esta forma de transporte abrange principalmente as mercadorias, tais como o petróleo e seus derivados, os minerais, os cereais, etc. O transporte de pessoas realizado pelo meio hidroviário, afora pequenas travessias, é feito, na maioria das vezes, na forma de cruzeiro, que tem uma regulamentação especial, uma vez que este contrato abrange também a hospedagem do passageiro.
Esta forma de transporte possui uma autarquia federal especial para exercer-lhe a
Regulação Estatal, é a Agência Nacional de Transportes Aquaviários81 (ANTAQ), que é
diretamente vinculada ao Ministério dos Transportes.
79 Art. 732. Aos contratos de transporte, em geral, são aplicáveis, quando couber, desde que não contrariem as disposições deste Código, os preceitos constantes da legislação especial e de tratados e convenções internacionais. (BRASIL, 11 jan. 2002)80 Art. 215. Considera-se doméstico e é regido por este Código, todo transporte em que os pontos de partida, intermediários e de destino estejam situados em Território Nacional. (BRASIL. Lei nº 7.565, de 19 de dezembro de 1986. Código Brasileiro de Aeronáutica. (Substitui o Código Brasileiro do Ar). Diário Oficial [da] União, Brasília, DF, 20 dez. 1986. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/LEIS/L7565.htm>. Acesso em: 05 jun. 2009)81 Criada em 5 de junho de 2001 pela Lei 10.233.
3.2.3 Transporte Terrestre
O transporte terrestre é aquele realizado para fazer o deslocamento de pessoas ou
cargas, mediante retribuição, por via terrestre.
Mais usualmente, os doutrinadores subdividem o transporte terrestre em apenas
duas categorias: rodoviário (por estradas) e ferroviário (por via férrea); porém, existe uma
outra categoria, geralmente olvidada por muitos, que é o transporte dutoviário (realizado
através de dutos), do qual trataremos mais adiante.
O transporte terrestre possui também uma autarquia federal que realiza a
regulação e a fiscalização de todas as formas de transporte realizado em terra, no Brasil: a
Agencia Nacional de Transportes Terrestres – ANTT. Tal autarquia foi criada em 05 de junho
de 2001, através da Lei n.º 10.233, que trata do Sistema Nacional de Viação e das respectivas
Agências Reguladoras.
3.2.3.1 Transporte Ferroviário
É aquele realizado por comboios, aí inclusos os trens de carga ou de passageiros,
os metrôs, ou outros veículos semelhantes, por via férrea, para o transporte de passageiros ou
cargas, mediante retribuição. É considerado o mais seguro dos transportes terrestres.
No Brasil de hoje, é mais utilizado para o transporte de cargas, por conta do seu
baixo custo-benefício, uma vez que é ideal para o deslocamento de grande quantidade de
mercadorias por grandes distâncias, em contraponto à baixa flexibilidade (empecilho ao
transporte de passageiros)
É mais usualmente utilizado para o transporte de cargas de baixo valor agregado,
como produtos agrícolas, fertilizantes, siderúrgicos, minérios, etc.
Sua expansão não é maior por conta da baixa flexibilidade de destinos, e do alto
custo para sua implantação.
A gênesis do transporte ferroviário data do Séc. VI a.C, sendo desenvolvido ao
longo dos séculos, de acordo com as necessidades da sociedade; sendo um dos principais
meios de transportes de passageiros, antes da evolução do transporte rodoviário, que tomou
para si tal preferência.
3.2.3.2 Transporte Rodoviário
É aquele realizado por veículos automotores, em estradas, rodovias ou ruas, que
podem ser pavimentadas, ou não, para o deslocamento de pessoas ou coisas, mediante
remuneração. É o principal sistema do transportes do país; e também o mais poluente.
Esta modalidade é predominante entre os transportes terrestres, principalmente
quando tratamos do transporte de passageiros, que, no Brasil, representa cerca de 96%;
enquanto que o de cargas representa uma fatia de 56%, contra 21% do ferroviário e 18% do
hidroviário.82
O transporte rodoviário de cargas é a forma de deslocamento de mercadorias mais
importante no país, por conta de sua maior flexibilidade quanto aos destinos. No Brasil,
movimenta, anualmente cerca de R$ 40 bilhões de reais, locomovendo cerca de 2/3 de toda
a carga do país.
3.2.4 Transporte Dutoviário
82 MELLO, José Carlos. Transporte Rodoviário. Disponível em: <http://www2.mre.gov.br/cdbrasil/itamaraty/web/port/economia/transp/rodo/index.htm>. Acesso em 15 de maio de 2009.
É aquele em que são transportadas cargas, de um lugar a outro, mediante
remuneração, através de tubulações. Sendo que, através desta modalidade, só podem ser
transportadas mercadorias.
No Brasil o transporte dutoviário é mais conhecido como gasodutos (quando a
carga transportada se tratar de gás natural) ou oleodutos (quando são transportados petróleos e
seus derivados). Mas também podem ser usados para locomover outros tipos de produtos,
como os minérios e suco de laranja.
A sua implantação é bem dispendiosa e a flexibilidade de destinos também é
pequena, mas depois de implantado, se torna um meio mais econômico de transporte de
líquidos para longas distâncias, assim como também é um meio muito seguro e não poluidor,
pois os riscos de vazamentos são remotos.
3.3 CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO ÂMBITO DE TERRITORIAL (COMPETÊNCIA
FEDERATIVA)
O transporte de passageiro ou cargas também é classificado quanto ao âmbito
territorial em que é executado, podendo ser urbano, interurbano, interestadual ou
internacional.
Tal classificação relaciona-se intimamente à divisão de competências realizada
pela Constituição, que se refere aos interesses de cada um dos Entes Federativos, uma vez que
o critério adotado na Carta Magna é territorial. Por tal motivo, retomaremos o assunto em
tópico específico, quando analisaremos a disposição constitucional de competências.
3.3.1 Transporte Urbano (ou Municipal)
Transporte urbano é aquele realizado dentro dos limites territoriais de um único
Município.
Vale ressaltar que, muito embora essa modalidade seja denominada de transporte
urbano, o serviço também pode vir a se estender por áreas rurais daquele Município, uma vez
que a denominação leva em consideração o âmbito de Autonomia do Poder Público a que se
relaciona, e não o grau de urbanização da área em que é executado.
Assim, independentemente de ser realizado dentro do perímetro urbano ou na
zona rural, o serviço será denominado urbano se origem e destino estiverem compreendidas
nos limites territoriais municipais.
Esse deslocamento pode se dar por meios rodoviários, ferroviários, aquaviários ou
aéreos, sendo os mais comuns os dois primeiros, uma vez que são os ideais para cobrir
extensões não muito grandes.
É nesse âmbito que ocorrem as mais complexas formas de transporte, uma vez
que é onde há a maior circulação de pessoas, mercadorias e serviços. Por tal motivo são
também aí observadas mais modalidades da atividade, as quais vão desde o transporte
individual em veículos não-motorizados, até o transporte massivo por meio ferroviário,
passando por modais específicos como o táxi.
O transporte urbano mais comumente realizado é o coletivo através de ônibus. Em
algumas cidades, há toda uma estrutura diferenciada voltada a priorizar este modal, como a
criação de corredores exclusivos e a integração por meio de terminais, que possibilita ao
passageiro pagar somente uma passagem e ser transportado por mais de um condutor, de
forma sucessiva. Podemos ver este exemplo na própria cidade de Fortaleza, que é interligada
por seis terminais de ônibus.
Outra forma muito utilizada no sistema de transporte coletivo urbano é o metrô,
por conta de sua rapidez e eficiência, muito embora tenha um gasto inicial muito alto.
Há ainda o transporte por veículos de baixa capacidade, denominados “táxis”, que
merecem especial atenção, dada a controversa caracterização. Tal modalidade merecerá
abordagem mais detalhada, em tópico específico, porém, convém observar que trata-se, em
muitos municípios, da única modalidade disponível do serviço de transporte.
Por fim, ressaltamos que independentemente do meio utilizado, quando abrange o
território de uma única municipalidade, o transporte é de competência do Poder Municipal a
sua fiscalização e regulamentação.
3.3.2 Transporte Interurbano (ou Intermunicipal)
No transporte interurbano, o deslocamento de pessoas ou cargas é feito entre
Municípios de um mesmo Estado. Podendo ser realizado por meios terrestres, hidroviários e
aéreos.
No Brasil, embora na região Norte, especificamente, observe-se uma grande
relevância do modal hidroviário, nas demais regiões tem-se como predominante a realização
de deslocamentos através do modal terrestre, principalmente o rodoviário.
Nesta modalidade, o sistema de transporte de passageiros predominante é operado
por ônibus, integrado através de terminais rodoviários, que podem ser administrados pelos
respectivos Municípios ou por particulares mediante concessão.
Por ser de interesse de vários Municípios, a regulamentação do Transporte
Interurbano não pode caber ao Poder Municipal, mas sim ao Estadual, que, no caso do Ceará,
é realizado pelo Núcleo de Transportes do Departamento Estadual de Trânsito.
3.3.3 Transporte Interestadual
O transporte interestadual é aquele realizado para o deslocamento de pessoas e
coisas, entre os vários Estados do território nacional. O serviço de condução pode ser
realizado por meios terrestres, aquáticos ou aéreos, sendo as três formas muito comuns, uma
vez que estamos tratando de extensões de pequeno (fronteiras de Estados), médio
(deslocamento entre Estado vizinhos) e grande (deslocamento entre Regiões) porte, posto que
o nosso país possui dimensões continentais.
Por se tratar de interesses de diferentes Estado Federativos, quem tem a
competência para fazer a regulamentação e a fiscalização desta modalidade de Transporte é o
Poder Público Federal, através das suas autarquias.
Quando realizado através de ônibus, o sistema é interligado através dos mesmos
terminais rodoviários que interligam o sistema intermunicipal, porém sob regulação da
ANTT. Quando realizado por via aérea (vôos domésticos), o sistema é interligado por
aeroportos, que são administrados pela INFRAERO – Empresa Brasileira de Infra-estrutra
Aeroportuária – uma empresa pública federal de administração indireta83 vinculada ao
Ministério da Defesa.
3.3.4 Transporte Internacional
Seguindo a linha de raciocínio das modalidades acima, o transporte internacional
é realizado entre países, que possuem pacto de circulação. A forma mais comumente utilizada
para realizar este tipo de transporte é por via aérea, já que é a maneira mais rápida e segura de
percorrer grandes extensões. O sistema terrestre só é utilizado quando o aéreo torna-se
excessivamente oneroso (como, por exemplo, no transporte de cargas) ou para percorrer
pequenas extensões entre os países (regiões fronteiriças).
Por corresponder a interesse de países diversos, que detêm sua própria legislação
sobre transporte e sua soberania, a regulamentação dessa forma de deslocamento é realizada
através de acordos e tratados internacionais, cabendo o seu controle, no Brasil, à esfera
Federal.
83 Com a expressão empresa estatal ou governamental designamos todas as sociedades, civis ou comerciais, de que o Estado tenha o controle acionário, abrangendo a empresa pública, a sociedade de economia mista e outras empresas que não tenham essa natureza e às quais a Constituição faz referência, em vários dispositivos, como categoria à parte (arts. 71, II, 165, § 5º, III, 173, § 1º). (DIPIETRO, 1999, p. 328)
Assim como no sistema de transporte aéreo interestadual, o internacional também
é interligado por aeroportos, mas sendo que estes devem ter capacidade para operar vôos
internacionais.
3.4 CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO REGIME JURÍDICO
O serviço de transporte pode ser classificado como Serviço público e como
Serviço Privado, sendo esta uma das distinções mais relevantes e, igualmente, de maior
complexidade. Conforme anteriormente comentado, ainda que seja uma atividade de interesse
coletivo, a natureza de serviço público muitas vezes atribuída ao transporte não retira a sua
índole contratual.
Desta forma, a distinção em comento importa, na verdade, em identificar-se que
tipo de relação jurídica é predominante na atividade em apreço, e qual o regime jurídico
predominante na sua execução. Ou seja, identificar se o transporte é público ou privado é
identificar se se trata de um serviço de titularidade do estado ou de uma atividade privada.
Muitas vezes tal diferenciação torna-se bastante complexa, e não raro, torna-se
necessário acionar o Judiciário, para que, interpretando o ordenamento jurídico e o substrato
fático do caso concreto declare a natureza da atividade.
A decisão de tais questões, isto é, a identificação de um serviço como público,
como vimos, depende da sua previsão legal, pois, em função do princípio da livre iniciativa,
todas as atividades econômicas permanecem na esfera privada até que o ordenamento jurídico
as titularize como públicas.
Afora tal disposição normativa, o regime de exploração diferencia o transporte
público do transporte privado: aquele é executado segundo os preceitos do regime jurídico de
direito público, com primado de princípios anteriormente descritos (cf. item 2.1.2),
especialmente com ânimo de regularidade, generalidade, e modicidade de tarifas;
enquanto este, via de regra, é explorado conforme normas de mercado, em regime de
liberdade.
Não obstante, tendo em vista se tratar de atividade privada com sensível
relevância à sociedade, muitas vezes a liberdade característica do setor particular é mitigada.
Trata-se das situações em que ocorre a Regulação Estatal. No entanto, em não havendo
disposição legal definindo tal atividade como serviço de transporte público, a mera regulação
pelo Estado não o retira da iniciativa privada.
Dessa forma, temos os que são transporte público, os serviços que a Lei assim titularizar,
sendo os demais, modalidades de transporte privado.
3.4.1 Transporte Público
Eliminando qualquer possibilidade de discussão, diversos dispositivos da Carta
Magna brasileira classificam o transporte como serviço público (por exemplo, os arts. 21, 22 e
30, V). Cuida-se, pois, daquilo que a doutrina denomina "serviço público por inerência" ou
"serviço público essencial por definição constitucional", eis que definido como tal pela
própria Constituição Federal.
Analisando as disposições constitucionais, observa-se que, reconhecendo a maior
relevância, e até o caráter de essencialidade do modal coletivo de transporte, a Constituição
Federal atribui sua titularidade ao Estado; senão vejamos:
Art. 30. Compete aos Municípios:(...)V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial; (grifo nosso)
Como se pode observar, a Carta Magna, no seu art. 30, inciso V, ao tratar da
competência dos municípios, no que tange à sua organização político-administrativa, define
como serviço público apenas o transporte coletivo, atribuindo ao mesmo, inclusive, caráter
essencial.
Seguindo as diretrizes da Lei Fundamental, o legislador infraconstitucional
também se referiu expressamente ao transporte coletivo como serviço público de caráter
essencial. Assim determina expressamente a lei 7.783/89 de 28 de junho de 1989:
Art. 10 São considerados serviços ou atividades essenciais:I - tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis;II - assistência médica e hospitalar;III - distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos;IV - funerários;V - transporte coletivo;VI - captação e tratamento de esgoto e lixo;VII - telecomunicações;VIII - guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares;IX - processamento de dados ligados a serviços essenciais;X - controle de tráfego aéreo;XI compensação bancária.(grifamos)
Outrossim, afora a disciplina legal, devemos observar que o transporte público,
como cometimento estatal, é orientado pelos princípios que regem a Administração,
especialmente, os descritos na Lei de Concessões de Serviços Públicos (Lei 8.987/95). Assim,
quando público o serviço de transporte, o mesmo é executado com dever de regularidade, de
continuidade, de eficiência, de segurança, de atualidade, de generalidade, de cortesia na sua
prestação e de modicidade das tarifas.
Nesse sentido, é necessário relacionar as categorias Transporte Público à
anteriormente mencionadas, Transporte Coletivo e Transporte Regular. Com efeito, por força
da disciplina ora comentada, o transporte que se considera público é aquele executado
conforme o Serviço Regular, tradicionalmente referido nos Regulamentos da atividade.
Nesse sentido, impende registrar que, em sendo serviço de titularidade do estado,
a transferência de sua execução a particulares opera-se, conforme anteriormente descrito,
através de delegação, isto é, concessão ou permissão.
3.4.2 Transporte Privado
Em contraponto ao que se depreende da disciplina acima referida, devemos
perceber que, consoante o princípio segundo o qual não há palavra inútil na Lei, por exclusão,
o transporte individual não é serviço público.
Com efeito, quisesse o legislador constituinte definir o transporte individual de
passageiros como serviço público, certamente o teria elencado a par do transporte coletivo no
inciso V do art. 30 da CF. Se não o fez, a lógica está a indicar que não compreende como
serviço público e essencial à coletividade. Certamente que a intenção do constituinte foi
elevar à condição de serviço público e essencial, no caso, unicamente o transporte coletivo.
Dessa forma, tendo-se por certo que o transporte individual não é de titularidade
do Estado, é forçoso perceber que estamos diante do transporte privado.
Assim, remetendo aos comentários anteriormente expendidos a respeito do modal
individual, e do serviço regular, temos uma atividade econômica regida pelos princípios da
livre iniciativa, a qual em função do interesse coletivo que a envolve, é objeto da regulação
estatal.
Tal regulação, entretanto, não retira da atividade o seu caráter privado, sendo tão
somente a forma de atuação do Estado com vistas a salvaguardar condições de segurança,
higiene e conforto, bem como de solução à falhas de mercado.
Seguindo tal raciocínio, o serviço privado é condicionado a autorização do poder
público.
3.5 O SERVIÇO DE TÁXI
A palavra “táxi” denomina uma das mais populares, antigas e difundidas
modalidades de transporte, bem como o veículo utilizado na sua prestação. Tal expressão
deriva de “taxímetro” que é um aparelho de medida, mecânico ou eletrônico, semelhante a
um odómetro, que em função da distância percorrida e em relação ao tempo passado desde o
início da viagem, calcula o valor do serviço com base de uma tarifa pré-estabelecida.
Assim, em emprego correto da expressão apenas se pode referir aos veículos
equipados com tal equipamento ou ao serviço em que ele é utilizado. Não obstante, costuma-
se popularmente empregar tal denominação a outras modalidades, por mera semelhança.84
Pela descrição do equipamento que o caracteriza, pode-se perceber que se trata de
um serviço prestado com características de serviço público, mas também com aspectos de
atividade econômica particular: embora o valor da remuneração seja calculado em função de
uma tarifa predeterminada pelo Estado, a exemplo do transporte regular executado por
ônibus; as demais condições da viagem, diferentemente, são definidas pelo contratante, com
total poder de escolha de horários, locais de partida e destino, o que é característico de
modalidades privadas de transporte.
Convém observar, por oportuno, que a execução do serviço também é
caracterizada pelo emprego de veículos de pequeno porte, uma vez que destina-se à realização
de pequenos deslocamentos, geralmente no âmbito de um centro urbano, e objetivando
atender a necessidades individuais, e eventuais, de locomoção, com flexibilidade e
comodidade.
Por tal motivo, segundo essa concepção tradicional da atividade, podemos definir
o táxi como um serviço de transporte por fretamento eventual individual, que destina-se ao
atendimento de interesses locais.
Afora tal caracterização, é forçoso também reconhecermos que se trata do serviço
largamente utilizado, quer como modalidade alternativa – por que procura maior comodidade
– quer como modalidade supletiva – onde o serviço público regular não é suficiente. E, em
assim sendo, não se pode olvidar que a sua disponibilidade interessa bastante à toda
coletividade, configurando-o como um serviço de interesse geral.
84 É o caso, por exemplo, do fretamento de aviões de pequeno porte, denominado “táxi-aéreo”.
Como é cediço, nestas hipótese em que uma atividade econômica privada assume
papel de especial relevo para toda a sociedade, cabe ao Estado, cumprindo a sua função de
salvaguarda do interesse coletivo, zelar para que seja ofertada com segurança, conforto e
salubridade. Cabe ao ente estatal, portanto, regulamentar o exercício da atividade tendo em
vista evitar, inclusive, possíveis falhas de mercado, como escassez ou oferta excessiva, que
influem diretamente na disponibilidade do serviço.
Uma das manifestações dessa regulamentação consiste na determinação pelo
Estado de tarifas a serem praticadas na execução da atividade, retirando do transportador boa
parcela de sua autonomia negocial, e mitigando o caráter privado do serviço.
Ainda em relação a esta regulamentação, observamos que, via de regra, a sua
execução condiciona-se à expedição de autorização: ato unilateral, a título precário,
personalíssimo pelo qual o Poder Público torna possível ao pretendente a realização de certa
atividade, serviço, ou a utilização de determinados bens particulares ou públicos, de seu
exclusivo ou predominante interesse, que a lei condiciona aquiescência.
Nesse sentido, não se pode olvidar que, em sendo uma atividade de interesse
preponderantemente local, como acima comentamos, cabe à municipalidade exercer tal
controle, consoante a distribuição de competências normativa85, estabelecida no art. 30, inciso
I, da Constituição Federal.86
85 A respeito desse assunto (distribuição de competência) vide capítulo específico (Capítulo 4.).86 Art. 30. Compete aos Municípios:
I - legislar sobre assuntos de interesse local; [...] (BRASIL, 05 out. 1988).
CAPÍTULO 4 - DA COMPETÊNCIA FEDERATIVA DO SERVIÇO PÚBLICO DE TRANSPORTE
4.1 COMPETÊNCIA: NOÇÕES GERAIS
O Brasil, por ser um Estado que adotou a Federação como seu sistema organizacional, é
constituído por Entes Federados (União, Estados, Municípios e Distrito Federal), os quais
enquanto entes de Direito Público Interno, não possuem hierarquia entre si. Desta forma,
para que não haja choques quanto à legislação e à administração de matérias de interesse
dos referidos Entes, a Constituição traz uma divisão de competências entre eles.
Para uma melhor visualização acerca do tema, vejamos os ensinamentos do
professor José Afonso da SILVA87:
[...] competência é a faculdade juridicamente atribuída a uma entidade, ou a um órgão, ou ainda a um agente do poder público para emitir decisões. Competências são as diversas modalidades de poder de que servem os órgãos ou entidades estatais para realizar suas funções.
Sobre o tema, leciona também Celso Antônio Bandeira de MELLO88:
[...] o “poder” expressado nas competências não é senão a face reversa do dever de bem satisfazer interesses públicos, a competência pode ser conceituada como o círculo compreensivo de um plexo de deveres públicos a serem satisfeitos mediante o exercício de correlatos e demarcados poderes instrumentais, legalmente conferidos para a satisfação de interesses públicos.
87 Curso de Direito Constitucional Positivo. 9 ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 41988 2007, p. 134.
Vale ressaltar que, como não existe hierarquia entre os Entes, a distribuição de
competências se dá através do Princípio da Predominância do Interesse, segundo o qual,
havendo conflitos de competências entre eles, será atribuída a faculdade àquele que possuir o
interesse predominante ao do outro, e.g. quando uma situação a ser administrada é de
interesse da União, então este irá se sobrepor ao dos demais entes federativos; quando o
interesse é local, a competência é do Município.
4.2 COMPETÊNCIA: CLASSIFICAÇÃO
As competências estão definidas na Carta Magna de 1988, as quais estão
classificadas da seguinte forma:
4.2.1 Competência Exclusiva
É aquela executada com a exclusão das outras formas de competência, ou seja, ao
Ente que lhe for atribuída, compete a ele e somente ele o seu exercício. Vale ressaltar que esta
forma de competência é indelegável e irrenunciável.
Na Constituição Brasileira é atribuída a competência exclusiva somente à União,
no seu art. 2189 e incisos, lembrando que tal atribuição versa somente acerca de questões
materiais e não legislativas.
4.2.2 Competência Privativa
É aquela que, sendo dada especificamente a um Ente, pode ser delegada a outro,
ou até mesmo ser suplementada por este.
89 Art. 21. Compete à União: [...] (BRASIL, 05 out. 1988).
A Constituição também trouxe a Competência Privativa somente à União, que
versa somente sobre matéria legislativa e está elencada em seu art. 2290 e incisos.
Esta competência legislativa atribuída à União pode ser delegada, por meio de
Lei Complementar91, aos Estado e ao Distrito Federal, assim como também pode ser
suplementada pelos Estados, Municípios e Distrito Federal, quando ainda não exercida pela
União ou Estados, desde que se limite a atender o interesse local ou regional.
4.2.3 Competência Concorrente
É aquela em que se estabelecem normas gerais ou específicas, acerca de um tema
específico. Sendo que estas normas gerais devem ser estabelecidas pela União (Art. 24, §1º,
da CF/88) 92.
Sob esta forma de competência, mais de um Ente pode dispor sobre determinada
matéria, mas ressaltando que a União tem primazia em relação aos outros, ou seja, se a União
legislar de forma concorrente sobre um tema (normas gerais), os demais Entes também podem
legislar sobre ele (normas específicas), desde que não desobedeçam às normas já traçadas pela
União (Art. 24, §2º, da CF/88)93.
Esta legislação sobre Norma Geral pode se dar tanto por Lei Complementar
quanto por Lei Ordinária.
A matéria pertinente a esta forma de competência está elencada no art. 24 e seus
incisos94, da Constituição Federal e é atribuída à União, aos Estados e ao Distrito Federal.
Mas se acontecer o caso de a União ainda não ter se manifestado sobre um
determinado assunto, os demais Entes Federativos passam a possuir competência concorrente 90 Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: [...] (BRASIL, 05 out. 1988)91 Na forma do § único do art. 22, CF/88, que aduz: “Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo.” (BRASIL, 05 out. 1988)92§ 1º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais. (BRASIL, 05 out. 1988)93 § 2º A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados. (BRASIL, 05 out. 1988)94 Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: [...] (BRASIL, 05 out. 1988)
plena (Art. 24, §3º, da CF/88)95, de forma suplementar. Em suma, a omissão na competência
concorrente gera a suplementar.
Mas um ponto importante que deve ser ressaltado é que, no caso de ter havido
omissão da União em traçar normas gerais sobre determinado tema, e um dos Entes tiver
traçado tais normais, de forma suplementar, a competência concorrente da União não
desaparece, podendo, inclusive, ela traçar as normas que dantes foram omissas, fazendo com
que a norma geral do Ente que a legislou de forma plena fique suspensa (Art. 24, §4º, da
CF/88)96.
4.2.4 Competência Suplementar
Tal competência deriva da concorrente. Através desta, os demais Entes podem
desdobrar as normas gerais traçadas pela União, levando em consideração o interesse regional
ou local. Através dela, também podem os Entes concorrentes legislar normas gerais, na
ausência ou omissão delas por parte da União, como vimos anteriormente.
4.2.5 Competência Comum
É aquela que pode ser exercida, simultaneamente, por quaisquer dos Entes
Federativos, desde que respeitados os limites presentes na Constituição.
Esta forma de competência tem a sua matéria elencada no art. 23 e seus incisos97,
da Lei Maior, e trata, basicamente, de assuntos administrativos. Mas vale ressaltar que há
matéria de competência comum fora deste dispositivo constitucional, sendo que este assunto é
95 §3º Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades. (BRASIL, 05 out. 1988)96 §4º A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário; (BRASIL, 05 out. 1988).97 Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: [...] (BRASIL, 05 out. 1988)
de cunho legislativo; trata-se do art. 145, II98, que trata sobre a instituição de taxas, que pode
ser instituída por quaisquer dos Entes da Federação.
4.2.6 Competência Cumulativa
É aquela em que a Constituição autoriza um Ente a adicionar para si uma
competência que, originariamente, é de outro Ente, claro que dentro dos limites
constitucionais.
Podemos visualizar melhor a situação se pegarmos como exemplo o Distrito
Federal, que tem natureza híbrida (Estadual e Municipal), podendo possuir competências que
são inerentes aos Estados, assim como as competências dos Municípios.
O art. 14799 da Carta Maior atribui aos Territórios Federais e ao Distrito Federal a
possibilidade de cumular competências, mas pela inexistência, hoje, de tais daqueles
territórios, somente o Distrito Federal possui tal atribuição.
4.2.7 Competência Residual
É aquela que depende de fato futuro para acontecer. Ou seja, uma determinada
matéria que tenha sido exaustivamente atribuída a todos os Entes Federativos, na ocorrência
de um fato novo, superveniente, a competência para legislar sobre este assunto novo será
atribuída exclusivamente a um dos Entes, de forma residual.
Na ocorrência de uma situação dessas, a Constituição já atribuiu à União a sua
competência para legislar residualmente.
98 Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: [...]II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços
públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição; (BRASIL, 05 out. 1988).99 Art. 147. Competem à União, em Território Federal, os impostos estaduais e, se o Território não for dividido em Municípios, cumulativamente, os impostos municipais; ao Distrito Federal cabem os impostos municipais. (BRASIL, 05 out. 1988).
Um exemplo clássico para demonstrar a ocorrência da competência residual se
encontra do art. 154, I, da Constituição Federal, que diz:
Art. 154. A União poderá instituir:I - mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição.
4.2.8 Competência Remanescente
É aquela que teve a sua atribuição omissa, não sendo concedida, de forma
expressa, a nenhum dos Entes Federados.
Quem possui explicitamente esta competência são os Estados, na forma do art. 25,
§1º, da CF/88, que diz:
Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição.§ 1º - São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição.
4.3 COMPETÊNCIA SOBRE OS SERVIÇOS PÚBLICOS
A repartição de competência, para regular a matéria de serviços públicos, foi
realizada entres todos os Entes Federativos (União, Estados, Municípios e Distrito Federal).
Esta distribuição foi feita seguindo diversos critérios, entre eles, o do interesse do
Ente e a sua capacidade para executar aquele serviço de forma que seja satisfatória tanto para
a administração como para a coletividade; assim como também a natureza e a extensão do
serviço.
A Constituição Federal trouxe a competência para a prestação dos serviços nos
arts. 21 (de forma exclusiva da União) e 23 (de forma comum a todos os Entes).
Dentre serviços de competência exclusiva da União, cabe destacar: o serviço
postal e o correio aéreo nacional (Art. 21, X); os serviços de telecomunicações (Art. 21, XI);
radiodifusão sonora, e de sons e imagens (Art. 21, XII, “a”); serviços e instalações de energia
elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água (Art. 21, XII, “b”); a navegação
aérea, aeroespacial e a infra-estrutura aeroportuária (Art. 21, XII, “c”); serviços de transporte
ferroviário e aquaviário entre portos brasileiros e fronteiras nacionais, ou que transponham os
limites de Estado ou Território (Art. 21, XII, “d”); serviços de transporte rodoviário
interestadual e internacional de passageiros (Art.21, XII, “e”) e os portos marítimos, fluviais e
lacustres (Art. 21, XII, “f”).
Podemos também citar alguns dos serviços públicos de competência comum, que
são: saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência
(Art. 23, II); proteção de documentos, obras e outros bens de valor histórico, artístico e
cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos (Art. 23,
III); impedimento à evasão, destruição e descaracterização de obras de arte e de outros bens
de valor histórico, artístico ou cultural (Art. 23, IV); proporção de meios de acesso à cultura, à
educação e à ciência (Art. 23, V); proteção do meio ambiente e combate a poluição em
qualquer de suas formas (Art. 23, VI); preservação de florestas, fauna e flora (Art. 23, VII);
fomento da produção agropecuária e organização do abastecimento alimentar (Art. 23, VIII);
promoção de programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e
de saneamento básico (Art. 23, IX); combate das causas da pobreza e os fatores de
marginalização, promovendo a integração social dos setores desfavorecidos (Art. 23, X);
registro, acompanhamento e fiscalização de concessões de direitos de pesquisa e exploração
de recursos hídricos e minerais em seus territórios (Art. 23, XI); saúde (Art. 196); assistência
social (Art. 203); educação (Art. 205 e 208); entre outros.
A competência do Estado-Membro para a prestação de serviços públicos não está
elencada na Constituição, concluindo-se que a mesma encontra-se na forma remanescente
(art. 25, §1º), com exceção da prestação do serviço de exploração e distribuição de gás
canalizado (art. 25, § 2º), que acaba por afastar a competência do Município para a sua
execução.
Dessa forma, se torna dificultoso a enumeração exaustiva dos serviços que são de
competência dos Estados, uma vez que diferentes são as necessidades populacionais e a
capacidade do Governo. O que se pode afirmar é que os serviços públicos de competência do
Estado são definidos por exclusão, ou seja, são todos aqueles que não foram atribuídos à
União ou aos Municípios, conforme o interesse local.
Mas, mesmo diante da dificuldade de sua enumeração, podemos citar como um
serviço de competência Estadual: o transporte de passageiros ou cargas realizados em rotas
intermunicipais.
Quanto à competência Municipal pra a prestação de serviços público, o
administrativista, Hely Lopes de MEIRELES100, é enfático ao afirmar:
A competência do Município para organizar e manter serviços públicos locais está reconhecida constitucionalmente como um dos princípios asseguradores de sua autonomia administrativa (art. 30). A única restrição é a de que tais serviços sejam de seu interesse local101.[...]Concluindo, podemos afirmar que serviços da competência municipal são todos aqueles que se enquadrem na atividade social reconhecida ao Município, segundo o critério da predominância de seu interesse em relação às outras entidades estatais.
Como algumas das prestações de serviço como sendo de competência municipal,
podemos elencar os seguintes: organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou
permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem
caráter essencial (art. 30, V); manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do
Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental (art. 30, VI); prestar, com a
cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da
população (art. 30, VII); promover, no que couber, adequado ordenamento territorial,
mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano (art.
30, VII); promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e
a ação fiscalizadora federal e estadual (art. 30, IX), entre outros.
100 1998, p. 294-295101 Pode ser caracterizado como sendo um interesse predominante do Município, se comparado aos interesses estaduais e federais, acerca de determinado assunto.
4.4 COMPETÊNCIA SOBRE O SERVIÇO DE TRANSPORTE
Tendo por base a explanação supra, analisemos as competências constitucionais
atribuídas aos Entes Federados, acerca da matéria de transportes, que é o ponto norteador do
nosso estudo.
Como visto em capítulo anterior, o transporte pode ser classificado no tocante
âmbito territorial da sua execução, podendo ser urbano, interurbano, interestadual ou
internacional. Cabe a cada um dos Entes Federados a competência para a sua regulação de
acordo com esta divisão.
Em relação ao transporte interestadual e internacional, isto é, aqueles estes em
que os pontos de origem e destino encontram-se em unidades federativas distintas, ou mesmo
fora do país, têm sua competência atribuída, privativamente, à União, na forma do art. 21,
XII, ex vi:
Art. 21. Compete à União:(...)XII - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão.(...) d) os serviços de transporte ferroviário e aquaviário entre portos brasileiros e fronteiras nacionais, ou que transponham os limites de Estado ou Território;e) os serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros; (grifos nossos)
Quanto ao transportes urbanos, isto é, aquele em cuja execução não se
ultrapassa os limites territoriais da municipalidade, cabe a regulação de sua matéria pelos
Municípios, uma vez que há, nesta situação, a predominância do interesse local sobre o
interesse da União ou dos Estados, na forma do art. 30, V:
Art. 30. Compete aos Municípios(...)V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial; (grifos nossos)
No tocante aos transportes interurbanos, a sua competência, tida por
remanescente, é atribuída aos Estados-Membros, regulando, assim os transportes que
executados ultrapassando-se os limites municipais, mas que ainda permanecem dentro do
perímetro do Estado.
De fato, aos Estados-Membros a Carta Magna atribuiu a instituição dos serviços
públicos remanescentes, isto é, dos serviços públicos não reservados constitucionalmente à
União e nem atribuídos aos Municípios pelo critério do interesse local.
Nesse sentido, corrobora a doutrina102:
Por exclusão, [...] cabem ao Estado os serviços e obras que ultrapassem as divisas de um município ou afetam interesses regionais. Pela mesma razão, compete ao Estado-membro a realização de serviços de interesse geral, ou de grupos ou categorias de habitantes disseminados pelo seu território, e em relação aos quais não haja predominância do interesse local sobre o estadual.
Podemos tomar como exemplo o objeto do nosso estudo, a regulamentação feita
pelo Estado do Ceará, através de sua Constituição Estadual, que diz em seus artigos 14 e 303:
Art. 14. O Estado do Ceará, pessoa jurídica de direito público interno, exerce em seu território as competências que, explícita ou implicitamente, não lhe sejam vedadas pela Constituição Federal, observados os seguintes princípios:[...]XVIII - exploração, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão através de concorrência pública, dos serviços de transporte rodoviário intermunicipal de passageiros que não transponham os limites do Estado;
Art. 303. Compete ao Estado o controle dos serviços de transportes intermunicipais de passageiros, incluindo-se o estabelecimento de linhas, concessões, tarifas e fiscalização do nível de serviço apresentado. (grifamos)
102 MEIRELLES, 1998, p. 293.
A este respeito, é mister esclarecermos ainda que, ao repartir as competências, a
Constituição Federal atribuiu à União o poder-dever de editar normas gerais, reservando aos
Estados e Municípios a legislação complementar, supletiva, “a legislação dos pormenores que
preenchem as lacunas ou desenvolvem os princípios gerais da legislação federal”.103
Como é cediço, ficou na competência da União editar normas gerais sobre trânsito
e transporte (art. 22, inc. XI), sobre diretrizes da Política Nacional de Transportes (art. 22, inc.
IX), ex vi:
Art.22. Compete privativamente à União legislar sobre: [...]IX- diretrizes da política nacional de transportes; [...]XI- trânsito e transporte;
No entanto, tal competência não exclui a competência suplementar dos Estados,
referida do §2º do art. 24 da Lei Maior.104 Tal dispositivo permite concluir que essa
suplementação é apenas complementar, no sentido de adaptar a legislação federal às
peculiaridades ou realidades de cada Ente Estadual. Em outras palavras, a competência
suplementar permite dispor sobre hipóteses irreguladas, preenchendo lacunas da legislação
federal, sobretudo quanto às condições locais.
Ora, como os meios de transporte interessam a todo o país, as diretrizes da
Política Nacional de Transportes são editadas pela União, a quem a Lei Maior atribuiu a
competência legislativa para disciplinar matéria. Porém, respeitadas as normas gerais da
legislação federal, resta aos Estados disciplinar as questões regionais relativas ao transporte
intermunicipal de passageiros.
103 SILVA, 1999, p. 412.104 §2º A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados. (BRASIL, 05 out. 1988).
5. O FRETAMENTO INDIVIDUAL COMO MODALIDADE ALTERNATIVA NO
SISTEMA DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO INTERMUNICIPAL DE
PASSAGEIROS DO ESTADO DO CEARÁ
No estudo realizado até o presente momento, abordamos desde a definição de
“transporte” como serviço, até a repartição constitucional de competências relativa à matéria,
passando pela sua caracterização como serviço público e pela diferenciação das diversas
modalidades conforme pode ser executado. No presente capítulo, partindo das conclusões
parciais proporcionadas pelo exame dos referidos temas, analisaremos, sob o ponto de vista
jurídico, a problemática da realização do serviço de transporte por fretamento na modalidade
individual no contexto do Sistema de Transporte Rodoviário Intermunicipal do Estado do
Ceará.
Com este objetivo, inicialmente, analisaremos a disciplina normativa do serviço
de Transporte, descrevendo desde a sua previsão na Carta Magna, até regramentos
estabelecidos na legislação estadual, para, em seguida, relacionando-a aos conceitos estudados
nos Capítulos anteriores, identificarmos qual deve ser a postura do Poder Público estadual em
relação à exploração do transporte individual entre municípios do Estado do Ceará, por
particulares autorizados pelo Poder Público Municipal para o serviço de Táxi.
5.1 A DISCIPLINA CONSTITUCIONAL DO SERVIÇO DE TRANSPORTE
A Constituição Federal de 1998 discorre sobre os vários serviços de titularidade
do estado, que, objetivamente, serão serviços público, determinando desde a sua criação, até a
sua execução, estabelecendo, inclusive, a divisão de competência entre os Entes Federativos.
Sobre o mesmo BANDEIRA DE MELLO105 observa:
1051
2007, p. 656.
A Carta Magna do País já indica, expressamente, alguns serviços antecipadamente propostos como da alçada do Poder Público federal. Serão, pois, obrigatoriamente serviços públicos (obviamente quando volvidos à satisfação da coletividade em geral) os arrolados como de competência das entidades públicas.
Não obstante, serviços outros, que não estejam contemplados na Constituição,
mas que configurem-se como prestação de utilidade ou comodidade material, sob
subordinação ao regime de Direito Público, notadamente caracterizados pela inafastabilidade
da obrigação da administração em prestá-lo e a indeterminação de usuários, também serão
considerados serviços públicos, se assim previr outra norma.
O Serviço de Transporte Coletivo de passageiros é determinado como serviço
público pela Constituição nas alíneas “d” e “e” do Art. 21, XII e pelo inciso V do Art. 30 com
a seguinte redação:
Art. 21. Compete à União:[...]XII - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão.[...] d) os serviços de transporte ferroviário e aquaviário entre portos brasileiros e fronteiras nacionais, ou que transponham os limites de Estado ou Território;e) os serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros;[...]
Art. 30. Compete aos Municípios:[...] V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;(sem reticências ou negrito no original)
Como se observa, no texto da Constituição Federal, o serviço de transporte
coletivo de passageiros, não está disciplinado em sua modalidade intermunicipal, mas tão
somente os serviços “que transponham os limites do Estado ou Território”, isto é,
interestadual, o e internacional, de titularidade da União; e o de “interesse local”, que,
respectivamente compete ao Município.
Entretanto, tal omissão não descaracteriza aquele modal como serviço público,
pois se destina à satisfação da coletividade em geral, e está na esfera de competência do
Estado-Membro, uma vez que este ente Federado é detentor da chamada competência
residual, não estado expressas no texto constitucional as suas atribuições, como dispõe o art.
25, §1º:
Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição.§ 1º - São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição.
Nesse sentido, na maioria das Constituições Estaduais encontra-se desenvolvida
essa competência remanecente atribuída pela Norma Maior, sendo transporte intermunicipal
de passageiros, então disciplinado segundo o poder constituinte derivado, por não ser matéria
de competência da União, nem tampouco de interesse local, posto que o serviço envolve a
transposição dos limites territoriais do Municípios.
Seguindo esta tradição, a Constituição do Estado do Ceará, dispõe sobre a matéria
de transportes, reconhecendo-o como atribuição estadual:
Art. 14. O Estado do Ceará, pessoa jurídica de direito público interno, exerce em seu território as competências que, explícita ou implicitamente, não lhe sejam vedadas pela Constituição Federal, observados os seguintes princípios:[...]XVIII - exploração, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão através de concorrência pública, dos serviços de transporte rodoviário intermunicipal de passageiros que não transponham os limites do Estado;[...]
Art. 303. Compete ao Estado o controle dos serviços de transportes intermunicipais de passageiros, incluindo-se o estabelecimento de linhas, concessões, tarifas e fiscalização do nível de serviço apresentado. (sem reticências ou negrito no original)
Assim, a partir das disposições Constitucionais acima delineadas, não resta dúvida
de que o compete ao Estado Ceará a titularidade do serviço público de transporte rodoviário
intermunicipal de passageiros executado nos limites do seu território.
5.2. O MARCO REGULATÓRIO DO SERVIÇO DE TRANSPORTES RODOVIÁRIO
INTERMUNICIPAL DE PASSAGEIROS DO ESTADO DO CEARÁ
Como visto, nos termos da Constituição do Estado do Ceará, o transporte
rodoviário intermunicipal de passageiros é um serviço público de titularidade do Estado
Ceará, cabendo a este ente federado executá-lo diretamente ou controlar a sua execução
indireta, mediante concessão, delegação ou autorização.
Nesse sentido, historicamente, a prestação desse serviço tem sido delegada à
iniciativa privada desde seus primórdios, por não se tratar de um monopólio natural e por
demandar baixos investimentos de capital, dado que a infra-estrutura viária e de terminais é
disponibilizada pelo Poder Público.
Não obstante, embora delegando a operação do serviço, o Estado continua
centralizando as funções de gestor e de regulador dos serviços.
5.2.1 Gestão e Regulação do Sistema de Transportes
No que tange à organização administrativa do Estado, tínhamos até o final do ano
de 2007 o Departamento de Edificações Rodovias e Transportes – DERT, como órgão gestor
do Sistema de Transportes. Entretanto, por discricionariedade político-adminitrativa, em 17
de dezembro daquele ano foi editada a Lei Estadual nº 14.024, que transferiu ao
Departamento Estadual de Trânsito – DETRAN as atribuições relacionadas à matéria. Dentre
as alterações advindas da mencionada norma, a nova redação do inciso IX do art. 78, da Lei
nº 13.875/2007, outorgou a esta Autarquia as atribuições alusivas às atividades de
planejamento, controle e fiscalização dos transportes intermunicipais de passageiros, dantes
atribuições do então DERT, senão vejamos:
Art. 78 [...]IX – O Departamento Estadual de Trânsito – DETRAN, tem por finalidade coordenar, realizar, fiscalizar e controlar o processo de formação, aperfeiçoamento, reciclagem e suspensão de condutores; expedir e cassar licença de aprendizagem, permissão para Dirigir e Carteira Nacional de Habilitação, comunicando ao Departamento Nacional de Trânsito – DENATRAN, todas as ações desta natureza; credenciar Órgãos ou Entidades para a execução de atividades previstas na legislação de trânsito, na forma estabelecida Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN; coordenar, vistoriar e executar ações de inspeção quanto ás condições de segurança veicular; registrar, emplacar, selar a placa, licenciar veículos, expedindo o Certificado de Registro de Veículo e p Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo, mediante delegação do Órgão federal competente; Coordenar e exercer as atividades de policiamento, fiscalização, correição julgamento de infrações e de recursos, aplicação de penalidades, medidas administrativas, inclusive nas rodovias estaduais do Ceará; (... ) criar, permitir, modificar e disciplinar, regulamentar, fiscalizar e controlar as linhas de transporte rodoviário intermunicipal de passageiros do Estado do Ceará; promover as licitações e para as concessões e permissões de de linhas de transporte rodoviário intermunicipal de passageiros do Estado do Ceará; disciplinar, regulamentar e controlar os serviços de passageiros do Estado do Ceará; manter, explorar, administrar e conservar terminais rodoviários do sistema de transporte rodoviário intermunicipal de passageiros do Estado do Ceará. (sem reticências ou negrito no original)
Ainda no que diz respeito aos órgãos do Sistema de Transportes do Ceará, é
oportuno destacarmos o papel da Agencia Reguladora de Serviços Delegados do Estado do
Ceará – ARCE106: ao passo que coube ao DETRAN a função de órgão Gestor do STRIP, cabe
à ARCE o papel de Órgão Regulador, com as seguintes atribuições:107
I - Fiscalizar indiretamente os órgãos e entidades privadas e públicas envolvidas na prestação do serviço, através de auditagem técnica de dados fornecidos por estes ou coletados pela Arce;II - Atender e dar provimento às reclamações dos usuários do serviço, decidindo inclusive sobre indenizações ou reparações a serem pagas pelas transportadoras, independentemente de outras sanções a estasaplicáveis;III - Expedir normas regulamentares sobre a prestação do serviço;IV - Responder a consultas de órgãos e entidades públicas e privadas sobre a prestação do serviço;V - Encaminhar ao órgão ou entidade responsável pela aplicação de penalidades a constatação, através de decisão definitiva proferida pela Arce, de infração cometida
1061
Instituída pela Lei nº 12.786, de 30 de dezembro de 1997, é vinculada à Secretaria da Justiça e Cidadania, nos termos do disposto no art.6º, inciso II, da Lei nº 13.297, de 7 de março de 2003.107 Lei Estadual nº 13.094/ 2001, art. 63, § 1º, incisos I ao V
por transportadora, caso não tenha sido delegada à Arce tal aplicação.
Identificados os órgãos componentes do STRIP, passemos à analise do seu
arcabouço normativo.
5.2.2 Da Disciplina Normativa do STRIP-CE
Nos mesmos parâmetros que a Lei de Concessões (Lei nº 8.987 de 1995), a Lei
Estadual nº 12.788/97, dentro da competência do Estado, institui normas para concessão e
permissão no âmbito da Administração Pública Estadual.
Seguindo esta linha de Regulamentação, a Lei Estadual nº. 13.094 de 12 de
janeiro de 2001, dispõe sobre o Sistema de Transporte Rodoviário Intermunicipal de
Passageiros do Estado do Ceará – STRIP-CE.
Regulamentando tal norma, foram inicialmente editados os Decretos Estaduais nº
26.103/2001 e 26.803/2002, os quais foram recentemente revogados pelo Decreto Estadual nº
29.687 de março de 2009, o atual Regulamento do STRIP-CE.
Identificado o arcabouço legal que disciplina o serviço no Estado, convém
analisarmos os aspectos mais relevantes de tais normas para o estudo da viabilidade jurídica
do Fretamento Individual de âmbito intermunicipal.
5.2.2.1 Serviço Regular de Transporte e Serviço de Transporte por Fretamento
Em primeiro plano, convém observarmos que a da Lei 13.094/2001 – nos termos
do seu art. 1º, e conforme definição do art. 3º, LXII do seu Regulamento (Decreto nº
29.687/2009), rege o conjunto de todos os Serviços de Transporte Rodoviário
Intermunicipal de Passageiros, nas diversas espécies previstas neste Regulamento, e os
Terminais Rodoviários, no âmbito do Estado do Ceará. Nota-se pois o caráter de completude
daquela norma, que pretende disciplinar todas as modalidades de transporte no seu âmbito de
vigência.
Como ponto principal da referida disciplina, destacamos que trata do serviço de
transporte classificando-o em Serviço Regular de Transporte e Serviço de Transporte por
Fretamento:
Art. 3º O Serviço de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros fica classificado em Serviços Regulares de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros e Serviços de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros por Fretamento.
A partir de tal classificação, tem-se que toda a disciplina da atividade confere
tratamento diferenciado a cada uma das modalidades: a Lei 13.094/2001, dedica os seus
capítulos II, III, IV e V ao Serviço Regular de Transporte; enquanto a disciplina do Serviço de
Transporte por Fretamento resume-se ao Capítulo VII. Nessa esteira, o Regulamento de
Transportes, por sua vez, dedica o seu Título II ao Serviço Regular; enquanto no Título III
disciplina o Serviço de Transporte por Fretamento.
Nesse sentido, relembramos que, conforme comentado no item 3.1.2.2 deste
Trabalho, a principal distinção entre o Serviço Regular e o Serviço de Transporte por
Fretamento consiste nas formas de execução e de remuneração de tais modalidades, que no
primeiro caso apresenta-se como serviço público – que tem dever de adequação, sendo
vinculado aos princípios da regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade,
generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas – enquanto no segundo,
apresenta-se como atividade econômica privada sob regulamentação estatal. Em termos
práticos, tal diferenciação implica que o Serviço Regular seja posto a disposição da
coletividade indistintamente – isto é ofertado ao público e não a indivíduos determinados –
sendo executado em atendimento a “linhas” (que nada mais são do que condições de operação
pré-determinadas: origem, destino, itinerário e seccionamentos, bem como horários e tarifa
pré estabelecidos) e sob remuneração com base em tarifa predeterminada pelo Poder Público;
enquanto, o Serviço por Fretamento seja executado sem tais características, isto é, segundo o
princípio de livre iniciativa, em regime de liberdade, no qual escolha das condições da viagem
(os pontos de origem e destino, bem como os horários) e a remuneração são definidos por
negociação direta entre os contratantes.
Em demonstração de tal distinção, transcrevemos os dispositivos da legislação
que positivam tais características: o estabelecimento, pelo Poder Público, das condições de
viagem e de remuneração do Serviço Regular podem ser observados, respectivamente, nos
artigos 24 a 29 e no art. 43 da Lei 13.094/2001, os quais não encontram equivalente no que
tange ao Transporte por Fretamento;
Art. 24. As viagens serão executadas de acordo com o padrão técnico-operacional estabelecido pelo Poder Concedente com relação às classificações de serviços, observados os horários, ponto inicial e final, itinerários, pontos de parada e os seccionamentos determinados.[...]
Art. 26. Os pontos terminais de parada e de escala só poderão ser utilizados pelas transportadoras após devidamente homologados pelo Poder Concedente.
Art. 27. O Poder Concedente fixará o tempo de duração da viagem e de suas etapas, observados os critérios técnicos.[...]
Art. 29. Os horários serão fixados em função da demanda de passageiros e características de cada linha, objetivando a satisfação do usuário, a segurança de tráfego e a rentabilidade das viagens, evitadas sempre que possível, as superposições de horários.
Art. 43. A remuneração dos Serviços Regulares de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros realizar-se-á através do pagamento de tarifa pelos usuários e por outras fontes alternativas de receitas estabelecidas no contrato de concessão ou termo de permissão. § 1° Compete ao DETRAN/CE, de ofício ou a pedido do interessado, promover o reajuste e a revisão extraordinária das tarifas referentes aos Serviços Regulares de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros, nos termos das normas regulamentares e pactuadas pertinentes.§ 2º Compete à ARCE/CE promover a revisão ordinária das tarifas referentes aos Serviços Regulares de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros, bem como homologar o reajuste e a revisão extraordinária praticados pelo DETRAN/CE, nos termos das normas regulamentares e pactuadas pertinentes.(no original, sem reticências ou negrito)
O Decreto Estadual 29.687/2009, em seus artigos 4º e 5º, no mesmo sentido,
dispõe explicitamente:
Art. 4º Os Serviços de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros são divididos nos seguintes gêneros:[...]II - Serviços de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros por Fretamento: transporte de pessoas sem as características do serviço regular, mediante o aluguel global do veículo, podendo ser contínuo ou eventual.
Art. 5º A prestação dos serviços regulares de transporte rodoviário intermunicipal de passageiros poderá ser organizada por linhas108 isoladas ou por áreas de operação, segundo discricionariedade técnica do poder público que garanta a eficiência, a qualidade dos serviços e modicidade das tarifas.(no original, sem reticências ou negrito)
Outrossim, como conseqüência da natureza diversa das referidas modalidades,
temos que também são distintos os atos administrativos que a possibilitam a sua execução por
particular. Nesse sentido é o disposto nos art. 4º e no art. 55 da Lei em comento, que
determinam que a execução do Serviço Regular por particulares ocorrerá mediante
concessão ou permissão, sempre precedidas de licitação (como é característicos do
serviços públicos delegados); enquanto o Serviço de Transporte por Fretamento será
executado mediante autorização do Poder Público (como ocorre às atividades econômicas
privadas sob regulamentação do Estado:
Art. 4º Compete ao Estado do Ceará explorar diretamente ou mediante concessão ou permissão os Serviços Regulares de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros, no âmbito de sua jurisdição, sempre através de licitação, nos termos desta Lei, da Lei Federal nº. 8.987/95 e demais normas legais e regulamentares pertinentes.[...]§ 2º A concessão de Serviço Regular de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros será formalizada mediante contrato administrativo, precedido de licitação na modalidade de concorrência, observado o disposto no inciso II do art. 2º da Lei Federal n. 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, e demais normas legais, regulamentares e pactuadas.109
§ 3º A permissão de Serviço Regular de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros será formalizada mediante termo de permissão, precedido de licitação,
108 A respeito de tal conceito, define o Decreto 29.687/2001, em seu art. 3º, inc. XXXII - Linha regular: linha utilizada na prestação de serviço regular de transporte rodoviário intermunicipal de passageiro, com características operacionais definidas pelo Poder Concedente;109 Pare efeito dessa Legislação, define o Decreto 29.687/2001, em seu art. 3º, inc. VIII - Concessão de Serviço: a delegação de sua prestação, feita pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência, à pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado;
observadas as normas legais, regulamentares e pactuadas.110
Art. 55. Os Serviços de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros por Fretamento serão executados mediante autorização expedida pelo Poder Concedente, conforme as condições e requisitos estabelecidos na regulamentação desta Lei. 111
5.2.2.2 Modalidades de Transporte por Fretamento
É oportuno que observemos que o Transporte por Fretamento pode ser realizado
segundo duas modalidades distintas: o Fretamento Contínuo, que é contratado por um número
determinado de viagens, ou por um determinado período de tempo, e o Fretamento Eventual,
que é contratado para um única viagem. O art. 102 do Regulamento de Transportes define as
duas as modalidades:
Art.102 Os Serviços de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros por Fretamento classificam-se em:I - Serviço de fretamento contínuo: serviço de transporte rodoviário de passageiros prestado à pessoa jurídica, mediante contrato escrito, para um determinado número de viagens ou por um período predeterminado, não superior a 12 (doze) meses, com horários fixos, destinado ao transporte de usuários definidos, que se qualificam por manterem vínculo específico com a contratante para desempenho de sua atividade, mediante prévia autorização do poder concedente. II - Serviço de fretamento eventual: serviço de transporte rodoviário de passageiros prestado a uma pessoa ou a um grupo de pessoas, em circuito fechado, para uma viagem com fins culturais ou recreativos, mediante prévia autorização do poder concedente.
5.2.2.3 Da Fiscalização
Superada a disciplina legal da distinção entre o Serviço Regular de Transporte e o 110 A este respeito, define o Decreto 29.687/2001, em seu art. 3º, inc. XLVII - Permissão de serviço: a delegação, mediante licitação, da prestação de serviços públicos, feita pelo poder concedente à pessoa física ou jurídica que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco.111Autorização, conforme define o art. 3ª, IV, do Decreto 29.687/2001, é ato unilateral pelo qual o Estado do Ceará, através do órgão ou entidade competente, discricionariamente, faculta o exercício de atividade, em caráter precário;
Serviço de Transporte por Fretamento, convém analisarmos aspectos da legislação de
transportes que aplicam-se igualmente a ambas as modalidades. Trata-se dos dispositivos que
disciplinam a atividade fiscalizatória e regulatória do Estado, no exercício do seu Poder de
Polícia.
Com efeito, o art. 62 da Lei em comento aduz que todas as modalidades do
Serviço de Transporte executadas no âmbito de competência do Estado do Ceará, sujeitam-se
à fiscalização do Poder Público Estadual, no que tange à segurança, conforto e cumprimento
da legislação pertinente:
Art. 62. A fiscalização dos Serviços de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros, em tudo quanto diga respeito a segurança da viagem, conforto do passageiro e ao cumprimento da legislação de trânsito e de tráfego rodoviário intermunicipal, inclusive desta Lei, será exercida pelo Poder Concedente através dos órgãos e entidades competentes, visando ao cumprimento das normas legais, regulamentares e pactuadas pertinentes.Parágrafo único. Os órgãos ou entidades competentes para realizar a fiscalização dos Serviços de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros serão definidos conforme a regulamentação desta Lei. (grifamos)
No mesmo sentido, o art. 63 dispõe a respeito da Regulação da atividade
delegada, determinando a sujeição de todas as entidades que executam o Serviço Regular de
Transporte, ao poder regulatório da Agência Reguladora de Serviços Público Delegados do
Estado do Ceará – ARCE.
Art. 63. Além da fiscalização de que trata o artigo anterior, as prestadoras de Serviços de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros no Estado do Ceará submeter-se-ão ao poder regulatório da Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados do Estado do Ceará - ARCE.§ 1º O poder regulatório da ARCE será exercido nos termos desta Lei e da Lei Estadual nº.12.788, de 30 de dezembro de 1997, e demais normas legais, regulamentares e pactuadas pertinentes, cabendo à ARCE, com relação aos Serviços de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros, sem prejuízo de outras atribuições:I - fiscalizar indiretamente os órgãos e entidades privadas e públicas envolvidos na prestação do serviço, através de auditagem técnica de dados fornecidos por estes ou coletados pela ARCE;II - atender e dar provimento às reclamações dos usuários do serviço, decidindo inclusive sobre indenizações ou reparações a serem pagas pelas transportadoras, independentemente de outras sanções a estas aplicáveis;III - expedir normas regulamentares sobre a prestação do serviço;
IV - responder a consultas de órgãos e entidades públicas e privadas sobre a prestação do serviço;V - encaminhar ao órgão ou entidade responsável pela aplicação de penalidades a constatação, através de decisão definitiva proferida pela ARCE, de infração cometida por transportadora, caso não tenha sido delegada à ARCE tal aplicação.§ 2º No desempenho do poder regulatório, incluindo as competências atribuídas neste artigo, a ARCE usufruirá de todas as prerrogativas asseguradas através da Lei Estadual nº. 12.786, de 30 de dezembro de 1997, e outras normas legais e regulamentares pertinentes.§ 3º As prestadoras de Serviço de Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros, qualquer que seja a modalidade de serviço prestado, tornam-se entidades reguladas pela ARCE por força desta Lei, estando submetidas à competência regulatória desta, nos termos da Lei Estadual nº. 12.786/97 e demais normas legais e regulamentares pertinentes. (grifamos)
Ainda nesse sentido, convém atentarmos para o que determina o parágrafo único
do art. 55 acima mencionado: “A autorização a que se refere o caput deste artigo poderá ser
cassada, a critério do Poder Concedente, em caso de concorrência com Serviço Regular de
Transporte Rodoviário Intermunicipal de Passageiros existente”.
Tal previsão demonstra a preocupação do Poder público em evitar que
particulares autorizados unicamente ao desempenho do serviço na modalidade Fretamento,
distorcendo as normas do Sistema, executem o serviço de transporte na modalidade Regular,
um serviço público que apenas pose ser delegado mediante concessão ou permissão, sempre
precedida de licitação.
Nos termos da legislação de transportes, o serviço realizado sem a regular
titularidade, configura-se como “Clandestino”112, e sujeita-se às penalidades definidas no
Capítulo IX da Lei 13.094/2001. Nesse contexto, vale observar que, em sendo necessário
concessão ou permissão para a execução na modalidade Regular, de forma alguma pode-se
considerar legitimado à sua exploração o titular de autorização para a modalidade Fretamento.
5.2.2.4 Da Apreensão de Veículos Utilizados em Serviço Clandestino de Transporte
1121
Conforme definição do art. 3º, LXVII, do Decreto 29.687/2009, Transporte clandestino é a exploração do serviço de transporte rodoviário intermunicipal de passageiros sem outorga do poder concedente ou sem observância deste regulamento;
No contexto da atividade fiscalizatória do Estado, especificamente no que pertine
à repressão do chamado “transporte clandestino”, merece destaque o mandamento do art. 73
da Lei 13.094/2001:
Art. 73. A penalidade de apreensão do veículo será aplicada sem prejuízo da multa cabível, quando a transportadora ou qualquer pessoa física ou jurídica estiver operando o serviço sem regular concessão, permissão ou autorização do Poder Concedente. (grifamos)
Como se observa, o dispositivo acima transcrito impõe a penalidade de apreensão
de veículos em decorrência de execução de serviço clandestino de transporte. Em termos mais
precisos, por força do art. 73, a penalidade de apreensão do veículo será aplicada quando a
transportadora ou qualquer pessoa física ou jurídica estiver operando o serviço sem regular
concessão, permissão ou autorização do Poder Concedente.
5.2.2.5 Dos Veículos Utilizáveis para Serviço de Transporte
O Decreto 29.683/2009, nos seus artigos 66 e 114, seguindo os preceitos da Lei de
Transportes, lista tipos de veículos que podem ser utilizados, respectivamente, na execução do
Serviço Regular de Transporte e do Serviço de Transporte por Fretamento. Entretanto, apesar
de serem mencionados em dispositivos distintos, temos a previsão de exatamente os mesmas
categorias, quais sejam:
a) ônibus interurbano convencional;
b) ônibus interurbano executivo;
c) ônibus interurbano leito;
d) ônibus metropolitano convencional;
e) ônibus metropolitano executivo;
f) microônibus;
g) miniônibus;
h) veículo utilitário de passageiros; e
i) veículo utilitário misto;
A este respeito, considerando que se trata de classificação técnicas aplicável
apenas à legislação de transportes estadual, convém reproduzirmos as definições apresentadas
pelo texto do próprio Regulamento:
Ônibus interurbano: veículo automotor de transporte coletivo de passageiros que apresente saídas de emergência, e uma única porta de entrada e saída, além das condições exigidas pelo Código de Trânsito Brasileiro e demais normas pertinentes;113
Ônibus urbano/metropolitano: veículo automotor de transporte coletivo de passageiros que apresente, no mínimo, duas portas e saídas de emergência, com mecanismo embarcado de controle de demanda, além das condições exigidas pelo Código de Trânsito Brasileiro e demais normas pertinentes;114
Microônibus: veículo automotor de transporte coletivo e capacidade de até 20 (vinte) passageiros; 115
Miniônibus: veículo automotor de transporte coletivo com corredor central e capacidade superior a 20 (vinte) e até 28 (vinte e oito) passageiros.116
Veículo utilitário misto: veículo automotor destinado ao transporte simultâneo de carga e passageiro; 117
Veículo utilitário de passageiro: veículo fechado do tipo microônibus, com ou sem corredor central, e com capacidade mínima de 07 (sete) passageiros sentados e máxima de 19 (dezenove) passageiros sentados, mais a tripulação;118
A partir de tal disciplina, devemos observar que, para efeito da legislação que rege
o Sistema de Transportes Rodoviário Intermunicipal de Passageiros do Estado do Ceará, na
prestação do Serviço, em qualquer das modalidades, apenas se admite a utilização de veículo
que se enquadrem nas categorias acima descritas, isto é, apenas Ônibus, Miniônibus,
Microônibus e Veículos Utilitários.
Por fim, atentando para as definições enumeradas no art. 3º do Decreto Estadual
113 cf. art. 3º, inciso XXXIX do Decreto Estadual 29.687/2001114 cf. art. 3º, inciso XXXVIII do Decreto Estadual 29.687/2001115 cf. art. 3º, inciso XXXV do Decreto Estadual 29.687/2001116 cf. art. 3º, inciso XXXVI do Decreto Estadual 29.687/2001117 cf. art. 3º, inciso LXXII do Decreto Estadual 29.687/2001118 cf. art. 3º, inciso LXXIV do Decreto Estadual 29.687/2001
29.687/2001, importa notar que apenas veículos com capacidade mínima de 7 passageiros
sentados podem ser considerados para a execução de qualquer das modalidades do Serviço de
Transporte.
5.3 A PROBLEMÁTICA DA UTILIZAÇÃO DO TÁXI COMO TRANSPORTE
INTERMUNICIPAL DE PASSAGEIROS
Em agosto de 2008, o Governo do Estado do Ceará, incorporou ao quadro
funcional do Departamento Estadual de Trânsito - DETRAN, cerca de 70 servidores públicos
(entre integrantes do quadro de funcionários do antigo Departamento de Edificações Rodovias
e Transporte – DERT e novos servidores, aprovados em concurso público), reforçando o
contingente operacional do recém criado Núcleo de Fiscalização de Transportes desta
Autarquia.
Com tal medida, e a conseqüente intensificação da atividade fiscalizatória
exercida pelo Estado sobre o Sistema de Transporte Rodoviário Intermunicipal de
Passageiros, práticas que anteriormente não eram suficientemente fiscalizadas passaram a ser
rigidamente controladas.
Nesse contexto merece destaque a repressão ao Transporte Clandestino,
desempenhada nos termos do art. 73 da Lei 13.094/2001, isto é, a apreensão de veículos de
particulares ou empresas privadas de que exploram sem regular concessão, permissão, ou
autorização do Poder Público Estadual os serviços de Transporte Regular ou de Transporte
por Fretamento.
Tal atuação, pela sua natureza repressiva, inicialmente gerou bastante polêmica
nos diversos setores da sociedade, uma vez que combate a atuação daqueles que executam o
transporte clandestino como principal atividade econômica, até, indiretamente, frustra
expectativas de atendimento da população que habitualmente lançava mão desse serviço.
De fato, uma grande parcela da população desconhece completamente o papel do
Estado no controle do Serviço de Transporte. Tal desinformação, conseqüentemente, gera a
falsa impressão de que não há necessidade de anuência do Poder Público Estadual na prática
da atividade transportista, o que não raro tem ocasionado situações constrangedoras aos
usuários de serviços nessa condição.
Nesse contexto, merece destaque a utilização de Táxi como modalidade de
Transporte Intermunicipal, pois tem sido objeto de polêmica, inclusive entre segmentos do
Poder Público: os debates envolvendo a aplicação da legislação estadual de transporte foram
objeto de Audiência Pública promovida pela Assembléia Legislativa do Estado do Ceará, à
qual compareceram representantes do Sindicato dos Taxistas do Estado do Ceará,
Representantes do DETRAN e de autoridades municipais ligadas à gestão do referido serviço.
De um lado, os representantes da classe fiscalizada protestam no sentido da
abusividade das medidas punitivas aplicadas pelo DETRAN, argumentando que a autorização
conferida pelas autoridades Municipais lhes confere o direito de explorar a atividade sem
restrição, desde que a origem do serviço seja o município a que são vinculados. Em sentido
oposto, a Autarquia Estadual responsável pela Gestão do Serviço de Transporte
Intermunicipal, sustenta que, em cumprimento à legislação que rege a atividade, cumpre-lhe
coibir qualquer conduta que enquadre-se na descrição de Transporte Clandestino.
Com efeito, tal questão envolve aspectos jurídicos e políticos que requerem
análise atenta, sobretudo no que diz respeito à caracterização do serviço de Táxi como
modalidade de Transporte Individual, à viabilidade jurídica do e à competência do Estado do
Ceará e dos Municípios sobre a o controle de tal atividade.
5.4 A VIABILIDADE JURÍDICA DO FRETAMENTO INDIVIDUAL COMO MODALIDADE ALTERNATIVA NO SISTEMA DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO INTERMUNICIPAL DE PASSAGEIROS DO ESTADO DO CEARÁ
Em primeiro lugar, cumpre-nos neste tópico final recapitularmos a análise a
respeito do Serviço de Táxi realizada no item 3.5 deste trabalho, tendo em vista
identificarmos qual o verdadeiro papel do Estado de Ceará quanto ao controle de tal atividade.
Segundo a concepção tradicional da atividade, podemos definir o táxi como um
serviço de transporte por fretamento eventual individual, que destina-se ao atendimento de
interesses locais.
Afora tal caracterização, é forçoso também reconhecermos que se trata do serviço
largamente utilizado, quer como modalidade alternativa – por que procura maior comodidade
– que como modalidade supletiva – onde o serviço público regular não pe suficiente. E, em
assim sendo, não se pode olvidar que a sua disponibilidade interessa bastante à toda
coletividade, configurando-o como um serviço de interesse geral.
Como é cediço, nestas hipótese em que uma atividade econômica privada assume
papel de especial relevo para toda a sociedade, cabe ao Estado, cumprindo a sua função de
salvaguarda do interesse coletivo, zelar para que seja ofertada com segurança, conforto e
salubridade. Cabe ao ente estatal, portanto, regulamentar o exercício da atividade tendo em
vista evitar, inclusive, possíveis falhas de mercado, como escassez ou oferta excessiva, que
influem diretamente na disponibilidade do serviço.
Uma das manifestações dessa regulamentação consiste na determinação pelo
Estado de tarifas a serem praticadas na execução da atividade, retirando do transportador boa
parcela de sua autonomia negocial, e mitigando o caráter privado do serviço.
Ainda em relação a esta regulamentação, observamos que via de regra, a sua
execução condiciona-se à expedição de autorização: ato unilateral, a título precário,
personalíssimo pelo qual o Poder Público torna possível ao pretendente a realização de certa
atividade, serviço, ou a utilização de determinados bens particulares ou públicos, de seu
exclusivo ou predominante interesse, que a lei condiciona aquiescência .
Nesse sentido, não se pode olvidar que, em sendo uma atividade de interesse
preponderantemente local, como acima comentamos, cabe à municipalidade exercer tal
controle, consoante a distribuição de competências normativa119, estabelecida no art. 30,
inciso I, da Constituição Federal.120
1191
A respeito desse assunto (distribuição de competência) vide capítulo específico (Capítulo 4.).120 Art. 30. Compete aos Municípios:
I - legislar sobre assuntos de interesse local; [...] (BRASIL, 05 out. 1988)
Assim, a “Autorização” ou “Alvará” que tradicionalmente confere ao “taxista’ o
direito de executar o referido serviço tem seu âmbito de validade limitado ao território da
Autoridade que o expedira, isto é, limita-se a autorizar o serviço “urbano” de transporte por
fretamento, sendo insuficiente quando a execução do serviço envolver a ultrapassagem dos
limites territoriais da municipalidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do estudo realizado nos tópicos iniciais deste trabalho verifica-se que
referimos por Transprote um serviço que em primeiro plano estabelece um vículo de cunho
particular, configurando-se como um contrato, segundo o qual alguém se obriga a levar algo
ou alguém de um lugar a outro, mediante remuneração.
Persebe-se também que apesar desta natureza inicialmente privada, a relevância
assumida pela atividade com o aumento da necessidade de circulalção de bem e pessoas, faz
com que o Estado, enquanto garantidor do bem comum, tenha o dever-poder de disciplinar a
sua execução, quer avocando para si a titularidade sobre o serviço, quer editando regras para a
sua prestação por particulares, mitigando a liberdade característica do regime de mercado.
Nesse contexto, foram descritos os princípios gerais que orientam os serviços
públicos e demonstrado-se que as suas principais características são a subordinação ao regime
de Direito Público, a inafastabilidade da obrigação da administração em prestá-lo, a dedicação
de utilidade ou comodidade para satisfação de necessidades concretas e a indeterminação de
usuários.
Foi compreendido que as regras gerais sobre o serviço público se aplicam ao
serviço transporte coletivo de passageiros, sendo este um serviço determinado
constitucionalmente, de competência federativa territorial, essencial, cuja remuneração se dá
por taxa ou preço público.
No contexto da distinção entre Transporte Público e Transporte Privado, foram
caracterizadas as várias modalidades conforme as quais o serviço costuma ser ofertado à
sociedade. Dentre as tais, vê-se como essencial distinção Serviço Regular de Transprote e o
Serviço de Transporte por Fretamento. Em relação a esta modalidade, concluimos que se trata
do gênero no qual se enquadra o serviço de Táxi, sendo este um serviço primordialmente
individual, tradicionalmente executado mediante autorização, cuja competência federativa
para expedição é da autoridade Municipal, tendo em vista ser de interesse precipuamente
local.
No que tange à problemática da utilização do serviço de táxi como modalidade de
transporte intermunicipal, observamos que, pelas características intrinsecas a tal atividade
(transporte urbano), em especial por se tratar de matéria de competência municipal, o título
que autorisa a sua execução restrige-se apenas ao âmbito da municipalidade que o expedira,
sendo insuficiente para a realização do serviço quando o trajeto a ser percorrido ultrapassa os
limites territoriais do município de origem. Nessa situação, faz-se necessário atentar para
disciplina do poder Público Estadual.
Após análise da disciplina do Sistema de Transporte Rodoviário Intermunicipal de
Passagerios do Estado do Ceará, em especial do respectivo Regulameto (Decreto
29.687/2009), obsevamos que o Serviço de Transporte por Fretamento apenas pode ser
executado por veículos com capacidade mínima de 7 passageiros (sentados).
Por tal motivo, isto é, em função desta limitação de órdem técnica, não é viável,
do ponto de vista legal, a realziação de transporte intermunicipal de passagerios utilizando-se
os veículos tradicionalmente empregados na exporação de serviço de táxi (tarnsporte urbano),
pois, via de regra, são automóveis com capacidade para apenas 4 passageiros.
Ao final, em solução ao impasse descrito, tendo em vista a relevância da atividade
em comento e a sua habitual utilização pela população como modalidade de transporte
dinâmico e flexível, e considerando que não implicaria concorrencia com o Serviço Regular
(delegado mediante licitação), sugerimos a alteração do Marco Regulatório do Transporte
Rodoviário do Estado do Ceará, com o objetivo de admitir-se a expedição de “Autorização-
Complementar”, sob o controle do DETRAN-CE, possibilitanda atividade de Fretamento
Individual Intermunicipal aos operadores do serviço de Táxi devidamente regularizados nos
respectivos municípios.
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