para uma metacrítica da organização escolar · previsão e dominação, o que acabará por...
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Laplage em Revista (Sorocaba), vol.4, n.1, jan.-abr. 2018, p.202-214 ISSN:2446-6220
Para uma metacrítica da organização escolar For a metacrítica of school organization
Para una metacrítica de la organización escolar
Maria João Carvalho
Universidade Trás-os –Montes e Alto Douro [UTAD] – Pt.
José Viegas Brás
Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias [ULUSÓFONA] – Pt.
Maria Neves Gonçalves
Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias [ULUSÓFONA] – Pt.
RESUMO Este artigo centra-se na problematização do modo de organização das escolas e da sua relação com a racionalidade instrumental, que o Estado adota na sua tomada de decisão, na tentativa de evidenciarmos os fenómenos que expressam uma suposta neutralidade e uma naturalização que as ideologias neoliberais preconizam. O objectivo deste trabalho é proceder a uma Crítica do pensamento crítico à qualidade da Organização Escolar. Nesta abordagem fizemos da Teoria Crítica uma categoria teórica para a análise das organizações escolares. Elegemos a Escola de Frankfurt, para discutir e refletir sobre outros modos, ou outras lógicas de representar e perspetivar, no caso, a organização escolar. Como conclusão podemos destacar o contributo da Teoria Crítica para a reinvenção da organização escolar.
Palavras-chave: Educação. Escola. Políticas educacionais. Políticas públicas.
ABSTRACT This work focuses on questioning the way of organization of schools and their relationship with the
instrumental rationality, the State adopts in its decision-making, to show the phenomena that express a supposed neutrality and a naturalization that neoliberal ideologies advocate. The aim of this work is to carry out a review of critical thought to the quality of school organization. This approach made the critical theory a theoretical category to the analysis of school organizations. We elected to the Frankfurt School, to discuss and reflect on other modes, or other logic to represent a school organization. As a conclusion we can highlight the contribution of critical theory to the reinvention of the school organization.
Keywords: Education. School. Educational policies. Public policies.
RESUMEN Este trabajo se centra en cuestionar la forma de organización de escuelas y de su relación con la racionalidad instrumental, que el Estado adopta en su toma de decisiones, en un intento de evidenciar los fenómenos que expresan una supuesta neutralidad y una naturalización que las ideologías neoliberales defienden. El objetivo de este trabajo es realizar una revisión del pensamiento crítico para la calidad de la organización escolar. Este enfoque hizo de la teoría crítica una categoría teórica para el análisis de organizaciones de la escuela. Se eligió a la escuela de Frankfurt, para debatir y reflexionar sobre otros modos, también otros representan lógica y dan perspectiva, en este caso, a la organización de la escuela.
Como conclusión podemos destacar la contribución de la teoría crítica a la reinvención de la organización de la escuela.
Palabras-clave: Educación. Escuela. Políticas educativas. Políticas públicas.
DOI: https://doi.org/10.24115/S2446-6220201841400p.202-214
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Introdução
escola de hoje mergulha numa crise de confiança. Passou-se da crença de que a escola tudo podia fazer para a incapacidade da escola nada poder fazer. À medida
que temos vindo a aumentar o tempo de escolarização obrigatória, parece ter correspondido de forma proporcional a um igual aumento de desconfiança. O
descontentamento é hoje uma realidade atingindo de forma brutal a escola e os seus
profissionais. A imagem social dos professores está em declínio e a escola é apontada como a grande produtora do mal-estar. Em Portugal, autores como, por exemplo, Teodoro (1990),
Nóvoa (1989), Jesus (s.d), Esteve (1992), têm vindo a denunciar esta situação. A nível internacional uma série de autores também têm vindo a contribuir para um pensamento
educacional crítico. Entre eles destacamos Giroux (1986), Popkewitz (2000), McLaren (1995),
Paulo Freire (1987), Young (2014), Bernstein (2000), entre outros e sem esquecer o forte
contributo da denominada Escola de Frankfurt.
Tem-se vindo a colocar em ênfase que a crise não é só económica, laboral, de estatuto, mas também simbólica. As organizações escolares são dispositivos que ajudam e põem em marcha
todo um processo de fragmentação. E a “cultura organizacional é composta por elemtos vários, que condicionam tanto a sua configuração interna, como o estilo de interacções que estabelece
com a comunidade” (NÓVOA, 1992, p.30). As tensões vividas actualmente na organização
escolar amplificam ainda mais esta situação de mal-estar. O esvaziamento da instituição escolar e o papel do educador torna-se cada vez mais evidente. Os trabalhos de Bourdieu e Passeron
(s.d.) puseram em evidência a relação entre as variáveis sociais e culturais e o sucesso dos alunos. A escola é apontada como a grande fábrica de desigualdades sociais e um dos elementos
essenciais da reprodução social.
O poder de violência simbólica que a escola exerce, faz com que as significações que ela faz produzir, sejam percepcionadas como legítimas e naturais. Toda a acção pedagógica (inculcação
de habitus de classe) que é exercida na organização escolar expressa um poder de violência simbólica. O sistema de ensino realiza-se através da auto-reprodução (BOURDIEU, 1989). Neste
sentido importa fazer um trabalho crítico sobre a organização escolar. Refletir sobre o papel da
Teoria Crítica para a compreensão da organização escolar obriga reflectir sobre alguns conceitos que se revelam como orientadores de toda uma construção teórica que culminou com a
hegemonia da racionalidade instrumental sobre todas as outras formas de racionalidade, ou seja, sobre outros modos, ou outras lógicas de representar e perspetivar, no caso, a organização
escolar. Com efeito é importante dar espaço a discursos que sirvam como instrumento de desobstrução do caminho da emancipação pela possibilidade de identificação das práticas
opressoras, da descoberta dos constrangimentos à comunicação e das causas da submissão do
indivíduo.
Se são as escolas que de modo mais direto contribuem para a transformação da sociedade que
se quer mais justa e mais solidária, então é necessário refletir sobre o cidadão que a escola pretende formar e que tipo de valores devem operar nessa organização. Na perspetiva de uma
conceção crítica de educação urge abandonar o objetivo a que a educação tem vindo a
materializar, desvinculando-a da subordinação à esfera económica (GIROUX, 1986). Só o entendimento da escola como espaço de comunicação permite a construção de uma linguagem
crítica sobre a realidade escolar como reação às contradições e limitações do modelo capitalista. É, por isso, necessário que os discursos sejam a expressão de uma consciência que se vai
constituindo através dos problemas da sociedade e da humanidade em geral, enformados por valores que respeitem a condição humana impedindo que a expressão livre e autónoma seja
absorvida pelas tecnologias das diversas reconfigurações do poder.
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Transformar as situações de opressão no interior dos espaços escolares de modo a abrir caminho à emancipação implica que os atores educativos aprendam a agir e a pensar
criticamente, a partir das relações que emergem das situações concretas e de ações que se materializam em sentimentos que impedem a naturalização, a universalização dos interesses
administrativos e a hegemonia da racionalidade instrumental que a modernidade ajudou a
construir.
Nada do trabalho que é realizado nas escolas é feito fora da esfera política. Por muito que se
queira “naturalizar” ou neutralizar a escola com a frieza descomprometida da sua regulação “científica” (racionalidade instrumental), nada é indiferente ou neutro. A parcialidade dos
discursos produzidos, acerca do significado do que a escola produz, estão relacionados com o
lugar de enunciação. Não olhamos para a escola como se ela flutuasse no mar educativo, indiferente a qualquer rumo que possa tomar. A escola está politicamente comprometida. Neste
sentido, o objectivo deste trabalho é proceder a uma Crítica do pensamento crítico à qualidade
da Organização Escolar.
Nesta abordagem fizemos da Teoria Crítica uma categoria teórica para a análise das organizações escolares, de forma a podermos encontrar (questionar) uma nova qualidade. Sair
do estado actual exige uma prática intelectual que não se deixe arrastar por uma racionalidade
técnica que silencia a importância e a necessidade do trabalho crítico e axiológico. Este posicionamento teórico revela-se fundamental para a inovação e emancipação. Devemos
sublinhar que a questão da emancipação foi considerada a bandeira que dava sentido à educação. Neste debate esteve empenhada a Educação Crítica, na qual se insere a Escola de
Frankfurt. A Ligação entre Educação e Teoria Crítica é, pois, uma abordagem necessária no
sentido de ser apreendida a relação que se estabelece na organização escolar. A crítica da Teoria Crítica é, portanto, o ponto fundamental da nossa abordagem metodológica.
Em rutura com a modernidade: a Escola de Frankfurt
Marcuse (s.d), Adorno (2001), Horkheimer e Adorno (1998) e Habermas (2013) têm em comum a recusa de uma razão e, consequentemente, de um conhecimento que se desenvolveram de
forma unidimensional, a saber, no sentido dos meios que se exigem cada vez mais perfeitos,
visando alcançar fins legitimados pelo sistema político-económico que tudo submete aos seus interesses. A instrumentalização dos indivíduos tem encontrado justificação na construção de
uma sociedade que se quer mais justa, acolitada pelo aumento de produtividade e eficiência. Seguiram a mesma linha iniciada por Marx e empreenderam uma crítica à sociedade pós-
industrial e ao conceito de racionalidade por si ocasionada, permitindo-lhes constatar o fracasso
do plano iluminista.
Este grupo de teóricos deu forma a um movimento denominado Escola de Frankfurt, o qual
reclama uma nova forma de racionalidade. Apelam ao conhecimento das práticas sociais como modo de perscrutar tanto a natureza da razão como o seu alcance e limites, ao mesmo tempo
que pensam o sujeito provido de interesses e condicionado situacionalmente por ser social. O carácter de egocêntrico, dominador e possessivo que levou a atitudes de exclusão, dominação
e repressão pelo diferente, próprio do sujeito dito racional, foi a causa da adulteração do
racionalismo moderno. Daí que o seu propósito era “reconstruir nociones de subjectividad y autonomia consistentes tanto com la dimensión social de la identidad individual como com el
carácter situado de la acción social” (McCARTHY, 1992, p.59).
A pretensão da Escola de Frankfurt não é a aniquilação da ilustração, antes a sua reformulação,
“reanimar assim o desafio duma razão ‘encurralada’ pela racionalidade técnica”. O ideal da
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ilustração mantém-se em toda a sua força, mas agora admitindo a existência de uma razão penetrada pelos domínios afetivo e instintivo. Ampliando a própria razão, permitindo sondar o
mais profundo da realidade, recuperando-a como origem de verdade e perfeição que a ilustração tinha votado ao esquecimento, como votou ao esquecimento o homem
contemplativo, transformando-o num conhecedor de variados saberes, condição necessária à
previsão e dominação, o que acabará por fundamentar a sua situação de objeto em prol de um
conhecimento tecnicista.
Se a tecnociência é, por um lado, instrumento eficaz de domínio do homem sobre a natureza, por outro, possibilita um crescente domínio sobre o próprio homem. Para Cantista (1984), este
propósito não teve visibilidade prática ao considerar que o citado movimento não foi capaz de
regenerar a praxis, libertando-a de toda a ideologia. O futuro como momento imprevisível não encontra, aqui, lugar cativo, à semelhança do indeterminismo do homem e do mundo. A
ausência de crítica concorreu para o crescente aparecimento de males, tornando-se cúmplice, ao ter pactuado com práticas postas ao serviço de interesses particulares e de poderes, deste
mal-estar social. O aspeto prático vai adquirir primazia relativamente ao teórico, fruto de uma
conceção de conhecimento entendido como produto social.
Nas condições da sociedade vigente não se encontra objetivada a sociedade racional a que
todos os homens aspiram. No entanto, esta finalidade não deixa de estar no horizonte do sujeito, porque “los seres humanos, todavia mantienem una voluntad y lucham por una
organización de la sociedad ‘racional’” (THERBORN, 1972, p.30). Toda a atividade da Modernidade se enraíza numa atitude que não dispõe a inteligência a discernir e a escolher
sobre o que convém na vida, o que, à partida, poderia evitar consequências menos positivas.
Prevenir situações desagradáveis parece não ter sido uma preocupação da Modernidade, o que é motivo para se afirmar que a atuação sábia não fez parte integrante da conduta do ilustrado.
O projeto de uma boa vida foi anulando o ideal de uma vida boa, esta subordinada à justiça, em suma, ao bem. A ética deixou de estar no horizonte do domínio público. O intuito da Escola de Frankfurt passa pela transformação do sujeito como criador da história e, forçosamente, pela transformação da sociedade que se quer outra, na qual a individualidade e universalidade se
harmonizem.
Afinal para que serve a educação? Moldar? Domesticar? Adaptar? Transmitir o saber como coisa morta? A educação ganha sentido, particularmente na democracia, quando produz uma
consciência verdadeira. Isto amplifica o significado político conferido à educação. Uma democracia que se preze só pode considerar-se realizada se conseguir produzir homens
emancipados. É paradoxal que uma escola democrática funcione e promova a antidemocracia.
Significa dizer que se trata de realizar um trabalho de desalienação e não de alienação. O sujeito em formação no sentido da sua emancipação deve ser preparado para exercer vigilância em
relação às experiências de interiorização da realidade como sendo uma verdade. Sabemos hoje, diz-nos Maar (1995, p.63) que a verdade “não é só condicionada temporalmente, mas também
racionalmente, ou seja: conforme um determinado modo da racionalidade, que é social.” A
razão tem potencialidades e limitações. Neste sentido, a experiência formativa não pode limitar-se a uma relação de conhecimento baseado na lógica do método das ciências naturais.
Transformar o sujeito implica um “trajecto de estranhamento e reapropriação” entre o sujeito e a realidade (o subjectivo e o objectivo). Na Fenomenologia do Espírito (1992 [1807] de Hegel
encontramos este caminho de busca necessária à formação do sujeito que se quer emancipado.
Neste ponto importa realçar, à imagem de Foucault (2000), Barthes (1997), Bakhtin (2010)
ideia de autoria. Historicamente, somos autores, ou melhor, tornamo-nos autores. Interessa
aqui destacar a necessidade do sujeito como criador da história, mas não no sentido de
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identificar o transgressor (exaltação do indivíduo) para ser punido, tal como era prática habitual em tempos remotos, mas antes no sentido da necessidade de transgredir a realidade para se
poder inovar. Chartier (1999) faz esta alusão – os primeiros movimentos para estabelecer a figura de autor emergiram na Idade Média. As autoridades religiosas identificavam o trangressor
(autor) para os condenar. Agora trata-se de uma necessidade inversa. Não se trata de identificar
os heréticos para os eliminar, mas da necessidade de execermos a autoria para rompermos com a realidade que bloqueia o desenvolvimento da organização escolar. Aqui não é para fazer,
utilizando a expressão de Foucault (2000), o papel do morto, ou expressar a singularidade da sua ausência, mas de exercer o poder criativo da crítica. Não é identificar o autor do anonimato
para o criminalizar e melhor se controlar a ordem dominante, mas apelar à capacidade criativa
de cada um para romper com a ordem dominante.
O problema da autoria pode também ter um outro ângulo de análise. Olhando de outro modo
podemos também dizer que a dominação está presente na organização escolar. Este é um ponto nevrálgico no fenómeno das organizações, tanto mais que se tratam de instituições que têm
por traço constitutivo a promoção da educação das pessoas, o que torna o questionamento da
emancipação um ponto nuclear da reflexão.
Qualquer análise sobre a organização escolar não pode ficar “indiferente” a dois processos
contraditórios que podem estar acoplados no funcionamento da organização escolar – opressão-sujeição; liberdade-empowerment. A organização escolar está comprometida com relações de
poder e este pode promover a autonomia ou a sujeição, a libertação ou a dependência. Quer dizer que o emporwerment organizacional é susceptível de refrear ou incentivar os processos
de autonomia. Segundo Baquero (2012) o empowerment organizacional é o empoderamento
gerado na e pela organização. Cabe aqui a análise dos processos de trabalho que efectivamente objectiva, da delegação dos processos de decisão, dos graus de autonomia que promove, da
mobilização participativa, da maneira como acolhe, envolve e incentiva os professores, alunos, funcionários, pais... O empoderamento organizacional tem grandes implicações no
emporwerment individual pelo tipo de interacções que estabelece e promove. O desenvolvimento individual não se faz fora do contacto com os outros, pelo contrário, ele resulta
do relacional (psicossocial). Por isso, a percepção que cada um vai construindo a partir das suas
vivências com os outros, o ganho de auto-estima e auto-confiança, a preocupação com o auto-aperfeiçoamento, podem contribuir para amplificar a sua compreensão e auxiliar a auto-
emancipação.
Horkheimer, Adorno, Marcuse e Habermas – em rutura com a racionalidade instrumental
Horkheimer (1973), elemento de relevo no contexto deste movimento, considera que a alteração da conjuntura terá como ponto de partida o verdadeiro conhecimento do ser humano
e da sociedade, condição nuclear para se fundar uma vida social racional que harmonize os
interesses individuais e sociais, como se fossem interesses singulares, destruindo a contraditória separação destas duas esferas fomentada ao longo dos tempos. A luta económica é o sintoma
do domínio do capital e de um grupo minoritário de homens sobre os restantes indivíduos, situação que na ótica do autor não nos permite vislumbrar este mundo como sendo o da razão,
pois esta situação não pode ser sua obra.
Mas se a sua preocupação é a sociedade tal como ela é, a sociedade capitalista, o intuito é a
sua transformação, suportada por um juízo que reconhece ao sujeito a capacidade de mudar
as coisas, sugerindo que, se as coisas são assim, nada invalida que possam ser de outro modo.
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É bem possível que se possa superar o economismo, que o vota à condição de dominado. Este modo de existencia justifica-se, na ótica de Mardones, porque “El individuo esta sometido a la
estructura y al contenido de la ‘razón subjectiva’ que vicia todo el desarrollo del pensamiento y
de la sociedad moderna” (1979, p.60).
O que movia Adorno e Horkheimer “[…] era nada menos que comprender por qué la humanidad,
en lugar de entrar en un Estado verdaderamente humano, desembocó en un nuevo género de barbarie” (1971, p.1), cabendo ao espírito essa tarefa. Preocupação que a guerra e o pós-guerra
vieram fortalecer, estando no cerne das preocupações a destruição da humanidade, objetivo de toda a reflexão. É na tentativa de derrubar a racionalidade dita instrumental, sem preocupação
de justificar os próprios fins, legitimando-os se se apresentarem como convenientes para a
autopreservação económica de determinados grupos, que Horkheimer lhe opõe uma racionalidade compreensiva, que reconheça a razoabilidade de uma qualquer ação: “Es la razón
contra la razón para salvar a la razón” (1973, p.195), como se de uma terapia se tratasse. Será da tensão entre ambas que se fará a recuperação da razão autónoma, emancipadora, através
da dialética negativa a qual consistirá na negação e na rutura com os sistemas. Diz o autor:
La negación es un arma de doble filo, es negación de las pretensiones absolutas de la ideología dominante y de las pretensiones insolentes de la realidad. [...] En la medida en que sujeto, objeto palabra y cosa, no pueden unificarse en las circunstancias actuales, nos vemos impulsionados por el principio de la negación a intentar la salvación de verdades relativas de entre los escombros de falsos valores absolutos (HORKHEIMER, 1973, p.190).
A vida social vê-se plasmada ao mesmo esquema de organização e planificação da gestão de uma qualquer fábrica. Tudo está impregnado da mesma racionalidade técnica. Há como que
uma uniformização das coisas levando a que partilhem de uma certa familiaridade entre si, conferindo-lhes uma forma padronizada quanto padronizadas estão as respostas às nossas
necessidades, as quais, frequentemente, são construídas e alicerçadas a um incompreensível
sem sentido. Por isso diz Adorno:
A abundância do que indiscriminadamente se consome torna-se funesta. Impossibilita orientar-se nela, e assim como nos monstruosos armazéns há que buscar um guia, também a população, afogada em ofertas, espera o seu” (2001, p.120).
É esta forma de produção que contribui para a denominada cultura de massa, consequência da
economia vigente que submete à seriação, padronização e divisão do trabalho a maior parte dos objetos, motivo que votará a cultura à condição de mercadoria, ficando ausente da sua
forma qualquer vestígio crítico ou qualquer desígnio de uma experiência sentida. Perverso é
que “La industria cultural há realizado malignamente al hombre como ser genérico” (HORKHEIMER, ADORNO, 1998, p.190) A singularidade própria do homem, a sua marca
diferenciadora deixa de fazer sentido na medida em que tudo pode ser substituível, porque tudo se pode converter num outro, idêntico àquele que sirva a economia. Anula-se qualquer aspeto
identificador do sujeito, porque o que importa são as características genéricas do comprador
tipo, do consumidor tipo. Daí que “La adquisición de status, y el consumo como ostentación e identificación, se instauran como los fines de la existencia y sus prácticas cotidianas” (MUÑOZ,
2000, 183).
Tudo concorre para o entendimento enganoso que o indivíduo passará a ter sobre a liberdade,
“Porque si antes la coacción era más directa, no por ello somos ahora más libres. Solo que
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ahora no se nos presiona como individuos, ahora se presiona colectivamente a una sociedad cuyas preferencias consumistas son cuidadosamente programadas. El que no se doblega queda
aislado” (GIRÓN, 2001, p.130).
É inevitável que a vida não seja experienciada em toda a sua plenitude por parte deste sujeito
que a ilustração criou, devido ao Estado de adormecimento em que se encontra,
impossibilitando-o de reconhecer o belo e os prazeres que a vida proporciona. Desprovido de autonomia, encontra-se também desprovido da capacidade de pensar que a própria sociedade
lhe retirou, tornando-o dócil a tudo o que foi ocorrendo, obrigando-o a uma racionalidade
manipuladora.
É necessário, por isso mesmo, que a razão deixe de se reduzir à condição de meio com a
particular preocupação de dominar a natureza. Imperativo é que a razão se liberte e se recuse a estar subordinada aos ditames e interesses económicos, pertença de uma minoria. Indelével
é a figura de Marcuse (s.d) no panorama da Escola de Frankfurt. Na mesma linha dos anteriores, é de opinião que a ânsia desenfreada de instrumentalização das coisas terá a consequência
perversa de instrumentalizar o próprio homem. Um mundo assim experienciado é objeto de
várias críticas.
Na tentativa de pôr a descoberto as formas de dominação política transfiguradas numa
racionalidade que concebe o mundo regulado em paralelo pela tecnologia e pela ciência, vai revelar a racionalidade que aí tem origem, expressa pelo modo de organização social que vota
o homem à condição de dominado ao invés de o emancipar. Tudo ficou reduzido a uma visão unidimensional. Identificou-se discurso e pensamento à custa da racionalidade instrumental,
fazendo “[...] acordarem-se a coisa e a sua função, a realidade e a aparência, a essência e a
aparência, a essência e a existência” (MATTELARD, MATTELARD, 1997, 69).
Não há lugar para a crítica nesta sociedade unidimensional, em que a rentabilidade se impõe
como lógica dominante, que é em si mesma opressora. Daqui resulta uma situação com consequências trágicas para o indivíduo, pois este passará a avaliar-se e a reconhecer-se nas
suas mercadorias, e transportará o seu ser para o seu ter, exteriorizando-se, desta feita, nas coisas, símbolos da abundância e do consumismo. E nisto encontra o autor justificação para
dizer que os homens “[...] encontram a sua alma no seu automóvel, no seu aparelho de alta-
fidelidade, na sua casa duplex, no seu equipamento de cozinha” (MARCUSE, s.d., p.29).
A subjugação não existe de forma consciente ou pensada no indivíduo, a liberdade é
percecionada, e confundida, dirá o autor, como a escolha individual que se caracteriza por visar um maior bem-estar que estará em conexão com a infindável capacidade de consumo, de uma
ideologia de abundância e de progresso que domestica, que tudo submete à sua tirania. É esta
ideologia que esconde a miséria e o medo e bane, subtilmente, a oposição e a consciência crítica que poderiam ser utilizadas em benefício da própria técnica, ou seja, não a recusando
mas melhorando os resultados obtidos até então, de forma a contribuir para a humanização e emancipação do ser humano, escopo perseguido pelo ideal iluminista, e que não teve, ainda,
repercussões práticas na existência concreta. É assim a sociedade industrial, paradoxal em si
mesma. Se por um lado dispõe de meios que ajudariam à construção de uma melhor sociedade, por outro eles tornam-se violentos quando concorrem para a impossibilidade de o ser humano
determinar livremente a sua forma de existência.
Habermas (2013) inscreve-se na segunda geração da Escola de Frankfurt e, tal como os
anteriores, lança uma crítica feroz à racionalidade instrumental que liga ao interesse imediato do existir. O homem moderno rompeu com a preocupação fundamental dos antigos, cujo
objetivo seria encontrar a melhor forma de viver harmoniosamente com a natureza, obedecendo
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à sua ordem. A sua primordial inquietação recai sobre o modo como dominar as formas naturais que intimidam o ser humano, o que nos remete para um problema que é essencialmente
técnico. Este deixou de se sentir protegido no mundo dos factos, que por sua vez deixou de lhe revelar o motivo da sua existência, deixou de lhe fornecer uma finalidade, e o sujeito como que
desaprendeu a situar-se no mundo e em primeira instância na sociedade.
É um imperativo categórico a descoberta de uma nova racionalidade, de âmbito mais alargado, que não se feche na permissão do que é previsível na realidade, mas que englobe o aspeto
intercomunicativo da ação, ao mesmo tempo que determine as regras da ação social livre, sem vínculos a nada que a reprima, e tendo por base uma moral universal que será consequência
de um discurso onde os indivíduos se reconhecem pela linguagem, pelo diálogo sujeito a um
sistema de regras que é necessário dominar. Em suma, Habermas apresenta uma racionalidade fundamentada no modo predicativo, e não substancial, da razão. A racionalidade deve admitir
o falível e estabelecer uma relação com o mundo dos factos para julgar com objetividade. A crítica e a justificação passam a incorporar o ser da racionalidade, que ora se guia por valores
pragmáticos, ora tem no objetivo de encontrar consensos a sua orientação.
A sua teoria crítica radica nas relações de intercomunicação dos sujeitos, das quais resultará
uma opinião pública esclarecida, neste aspeto muito próximo de Popper porque também este
vê na racionalidade “a atitude de estar disposto a corrigir as próprias crenças. Na sua forma intelectualmente mais desenvolvida, corresponde ao estar disposto a discutir as próprias crenças
de uma forma crítica e a corrigi-las à luz da discussão crítica com outras pessoas” (POPPER,
1996, p.219).
Teoria crítica e organização escolar
O centralismo burocrático, configurado na tomada de decisão, que permeia a organização
escolar, configura a sua estrutura como a expressão de um processo patriarcal, onde os planos de estudos, os planos curriculares, o cumprimento de horários e de outras decisões
organizacionais se dão num quadro de uma total obediência dos educadores e educandos que se veem invadidos por um sentimento de impotência e, por isso, s convertem em meros
observadores passivos da realidade.
À luz da teoria crítica, esta lógica de organização e administração está contaminada pelos princípios do controlo científico dos sistemas de produção caros ao pensamento positivista. O
pensamento dos atores educativos fica enclausurado à ideia falaciosa de que a partir dos meios técnicos e de métodos de programação rígida e mecânica se possam produzir formas científicas
de processos de trabalho, o que se acabará por traduzir em inibição de formas de expressão livres e criadores de resolver os próprios problemas. As tomadas de decisão fora do alcance da
realidade e da participação dos sujeitos, que todos os dias fazem a dinâmica da organização, e
que os normativos e restante legislação com vista à uniformização, ao controlo e à hierarquização, configuram-se enquanto conformismo e passividade na medida em que obriga
a que os sujeitos fiquem reduzidos a simples objetos do sistema administrativo.
Esta forma de administrar a partir de norma prescritas por instâncias exteriores à própria escola
resulta, necessariamente, no distanciamento entre os sujeitos e a própria realidade. Situação
que corresponde ao facto de a organização escolar se encontrar permeada por uma estrutura industrial, capitalista e burocrática que valoriza a expressão material das relações sociais através
da razão experimental como forma de intensificar as relações de poder. A este nível a escola fica sob o domínio de uma racionalidade que se faz representar por uma ação pedagógica que
se define através da seriação do saber, do sistema de avaliação, no predomínio dos
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procedimentos empírico/experimentais, na organização dos currículos que privilegiam os
enfoques positivistas, à semelhança do próprio conteúdo.
Ao termos comportamentos que no interior da organização escolar estão subjugados à racionalidade instrumental estes acabam por reproduzir o modelo social vigente. Esta situação
não permite a emergência da consciência do indivíduo pela anulação da sua capacidade
autonómica, e consequente responsabilização, a partir da qual orientaria a sua ação o que é uma forma de mascarar a pretensa neutralidade que se apregoa ao nível da educação
(PRESTES, 1995).
Assim, ao analisarmos a organização da escola à luz da Teoria Crítica podemos depreender que
fica impedida de experienciar a dimensão formativa para a qual está legitimada, mas ficando
atrelada a considerações afirmativas, de auto conservação do modelo social dominante. Reprodução que ultrapassa o domínio do currículo uma vez que os próprios procedimentos
internos da escola a tornam visível (PRESTES, 1995). É no seio destes processos que se constituem os interesses particulares à custa da substituição de uma consciência moral que se
vê substituída por uma autoridade externa e exterior à escola, o que aumenta a sua
disponibilidade relativamente ao poder.
Apple (1999) convoca o modelo de educação americana para mostrar como os interesses se
vão constituindo em torno da educação e da escola à medida que a sociedade altera o seu modelo social e político. O condicionalmente a que a educação fica votada em relação à política
do Estado expressa-se na frequente alteração dos objetivos educacionais. É de opinião de a educação tem incorporado um conjunto de princípios e de compromissos ideológicos,
nomeadamente os de cariz mais economicista, que influenciam, grandemente, estes objetivos.
Ao “afastar as políticas educacionais do debate público” (APPLE, 1999, p.186), propósito das políticas neoliberais, concorre-se para a legitimação “das consequências involuntárias” e para a
naturalização da redução da política à economia e a uma ética de escolha e consumismo.
A este nível caberá à Teoria Crítica converter os interesses em reforço dos direitos das pessoas
em relação às políticas e práticas de escolarização, ampliando-as, experimentando a prática democrática através da discussão pública, do debate e da negociação. (APPLE, 1999). É nesta
linha que se coloca a ênfase no conhecimento que se associa à argumentação sobre os sistemas
de currículos e avaliação, enquanto instrumentos que encontram a sua própria justificação na difusão de diferenças de classes e raça e que definem quem detém a liberdade de escolha no
novo mercado educacional (APPLE, 2000).
Deste modo, os interesses particulares podem ser opacizados através de procedimentos
organizacionais que naturalizam a lógica do conhecimento, mas igualmente a reprodução de
uma cultura única e uniforme e a sua associação à lógica economicista através da “mão invisível” do mercado. Os interesses instalados procuram proporcionar condições educacionais que se
acreditam necessárias para aumentar a competitividade, o lucro e a disciplina.
A escola não fica, por isso, imune à naturalização da ordem dominante uma vez que o sujeito,
esvaziado de uma consciência crítica acerca da realidade, ajusta-se a uma visão distorcida das
suas dinâmicas. Mecanismos de dominação que são travestidos de pseudoparticipação, de uma pretensa autonomia que, instituída por decretos, cria no sujeito uma falsa perceção de
atividade, mas que só servem para que o próprio se afunde em processos mecânicos e estáticos que os abstrai de uma reflexão crítica da realidade. Cria a ilusão de uma efetiva participação na
tomada de decisão quando, na verdade, ela já está orientada para uma decisão previamente
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definida que se encontra escondida em normativos, decretos, ofícios e outros processos que
apelam para procedimentos burocráticos e não para intervenção.
Este processo de naturalização das políticas económicas inclusas no sistema educativo é de tal forma extenso que os educadores são incapazes de perceber a força dominante a que a escola
está sujeita. São levados a crer, pelos mecanismos de dominação que imperam sobre a
realidade, acabando por a reforçar, legitimando a ideologia dominante que na sua essência de formação está ligada “à criação, estabilização e regularização de relações de poder e
autoridade” (APPLE, 2000, p.94).
O Estado, através das suas políticas de controlo, forma-se para se proteger a si próprio e aos
interesses democráticos por ele proclamados, sendo que a “democracia se torna um conceito
económico em vez de político e na qual a ideia de bem público balança nas suas raízes” (APPLE, 2000, p.74). O incentivo às determinações estabelecidas pelo Estado e a naturalização dos
fenómenos de subordinação e passividade ganham terrenos em detrimento das experiências de debate e análise das condições que podem favorecer situações de verdadeira autonomia e
responsabilização.
Os processos de centralização e desconcentração das relações de poder acabam por alienar os
sujeitos da sua realidade escolar e revelam-se meios propícios para a adoção de atitudes, e
crenças ajudando a manutenção e o reforço da legitimidade do poder. A ausência dos atores educativos da esfera decisória, o que se consubstancia numa forma de regulação das políticas
educativas à distância, reduz de forma significativa a possibilidade da existência de um diálogo
apostado na crítica e na democracia com vista à transformação da sociedade.
Considerações finais
O contributo da Teoria Crítica para a organização escolar perspetiva-se enquanto possibilidade
de uma consciencialização que entre em rutura com uma escola que se caraterize por dinâmicas padronizadas, e por um conjunto de princípios que têm como objetivo perpetuar as relações
culturais e sociais dominantes. A consolidação de uma racionalidade emancipatória permitirá questionar a escola inscrita num modelo racional/legal que reúne um conjunto de técnicas e
métodos de ação cada vez mais desfasadas da realidade ao mesmo tempo que descobre os
interesses que estão naturalizados. Sendo que a escola encontra-se acoplada a uma racionalidade instrumental, que existe ao serviço do Estado, da autoridade económica do poder
elevada a agir de forma tutelar sobre os comportamentos, preservando essa mesma ordem
social.
A Teoria Crítica poderá denunciar formas de gestão que aclamam valores que se afastam da autonomia, da criatividade pondo em causa um processo de administração onde o controlo vai
no sentido da eficiência. Como refere Silva (2016, p.19) “O desenvolvimento do pensamento
crítico, enquanto empreendimento interdisciplinar, passa necessariamente pela incorporação de contributos provenientes de diversas disciplinas, e a epistemologia, entendida como reflexão
crítica sobre a ciência, é uma área de estudos particularmente relevante para a promoção do
pensamento crítico.
A Teoria Crítica tem esta capacidade de denunciar formas de controle social que são exercidas
a partir das organizações escolares. A formação de um habitus que é accionado pelos procedimentos de inculcação da organização escolar são contrários à ideia de uma educação
emancipadora. A organização escolar, como nos diz (OLIVEIRA, 1995, p.134) acaba por ser sede reforçadora do mal-pensar, acaba por promover hábitos de mal-pensar que se constroem
em torno da alienação. É preciso fazer um trabalho de desalienação.
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À Teoria Crítica cabe-lhe este papel de resgatar o poder constitutivo do sujeito na construção do mundo. A razão instrumental tem vindo a ofuscar a dimensão emancipatória, constituindo-
se ela própria um novo poder de dominação. A razão instrumental não pensa o pensamento, coisifica-se em processo técnico, suspende a reflexão e desvincula-se das preocupações da
dimensão emancipatória. A razão instrumental (racionalidade técnica) que o positivismo
apresentou como instrumento operacional, produto exclusivo do conhecimento científico, veio apagar a imaginação e a travar a crítica e toda a subjectividade. A positivação da razão
instrumentalizou a educação, fez da racionalidade técnica um novo exercício de dominação e
alienação.
A organização escolar precisa de integrar e de promover através das suas práticas educativas
o conceito de “Aufkaerung”, dado por Kant e que tanta importância teve na escola de Frankfurt. Significa assumir a responsabilidade pelo esclarecimento, quer dizer, resgatar a razão para o
concomitante uso do bem-pensar, de tal modo que sirva a libertação. É necessária uma formação cultural crítica que afecte o funcionamento da organização escolar, o modo de
intervenção pedagógica dos professores e tenha, obrigatoriamente, implicações na formação
crítica do sujeito educativo. A escola precisa de um novo código cultural.
A Teoria Crítica revelou-se com potencialidades capazes de denunciar formas de gestão
(controle social exercido a partir das organizações escolares) que entram em rutura com a conscientização, criatividade e a emancipação do sujeito educativo, pondo em causa os valores
que devem marcar o todo o processo formativo. Ao modelo de dominação da organização escolar marcada por razão instrumental (racionalidade técnica) precisamos contrapor o domínio
de uma racionalidade emancipatória.
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PhD- Ciências da Educação – História da Educação - Universidade Lusófona de Humanidades e
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Recebido em 10/12/2017
Aprovado em 10/01/2018