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PLANEJAMENTO TERRITORIAL PARTICIPATIVO (PTP) NO ESTADO DO PARÁ:
a experiência dos conselheiros do município de Belém como agentes do controle
social1
Thaize de Sousa Medeiros2
RESUMO: Esse artigo faz uma abordagem sobre a experiência dos conselheiros do município de Belém como agentes do controle social no Planejamento Territorial Participativo (PTP), implementado pelo governo do estado do Pará enquanto uma ferramenta política, visando uma gestão democrática e participativa no que concerne a proposição, deliberação e fiscalização de políticas públicas planejadas a nível territorial, conjuntamente, entre a sociedade civil e o Governo do estado. Palavras-chave:Planejamento Territorial Participativo, Políticas Públicas, Controle Social.
ABSTRACT: This article elaborates on the experience of the directors of the city of Bethlehem as agents of social control in Participatory Territorial Planning (PTP), implemented by the state the Pará government as a political tool, aiming at a democratic and participative management with regard to proposition, counsel and monitoring of public policies designed at local, jointly between civil society and the state government. KEYWORDS: Participatory Territorial Planning, Public Policy, Social Control.
1. INTRODUÇÃO
A atual conjuntura direciona os governos e a sociedade civil a buscarem a
organização de novos espaços para a discussão de políticas públicas locais,
11 Este trabalho é resultado do Projeto de Pesquisa intitulado: Planejamento Territorial Participativo: desafios e possibilidades para a gestão democrática do estado do Pará, financiado pelo CNPq. 22 EEssttuuddaannttee.. UUnniivveerrssiiddaaddee FFeeddeerraall ddoo PPaarráá –– UUFFPPAA.. tthhaaiizzee22000077@@yyaahhoooo..ccoomm..bbrr
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considerando a construção, execução e avaliação dessas políticas, assim como a
fiscalização sobre as ações do Governo, de forma a encontrar meios adequados e
capazes de conduzir a melhoria da qualidade de vida da população.
Neste sentido, foi implantado no estado do Pará o Planejamento Territorial
Participativo (PTP), como uma experiência nova para o modelo democrático vigente,
pois ampliou, mesmo que de forma insipiente, os limites da democracia liberal
representativa à participativa, na medida em que os mais variados atores sociais
tiveram a possibilidade de participar do processo de construção e execução de
políticas públicas de interesse dos cidadãos dos diversos municípios paraenses.
Desta maneira, para um melhor entendimento sobre a temática aqui
trabalhada, este artigo será apresentado em três partes, são elas: O controle social e
seus desafios; O Planejamento Territorial Participativo; e O papel dos conselheiros do
município de Belém no PTP. Esses elementos serão destacados de forma a subsidiar
este trabalho com o objetivo de publicizar informações acerca do PTP enquanto
ferramenta de uma gestão democrática e participativa no estado do Pará.
2. O CONTROLE SOCIAL E SEUS DESAFIOS
A Carta Constitucional de 1988 é considerada um marco para o processo de
democratização e reconhecimento dos direitos sociais no Brasil, pois deu abertura
para ampliar o projeto de democracia no país, reconhecendo a participação social ou
popular como elemento fundamental no campo das políticas públicas, haja vista que a
participação da sociedade passa a ser entendida enquanto um instrumento essencial
para o debate e deliberação dessas políticas a partir de um modelo de gestão
democrático e participativo.
Sendo que, essa demanda pela participação social nos processos decisórios
no campo das políticas públicas abre também espaço para que a sociedade civil
organizada possa exercer a fiscalização sobre as ações estatais, ou seja, é o
chamado controle social, o qual de acordo com Francisco Carlos da Cruz Silva, é
originário da França, e foi inserido no Direito Brasileiro em 1941, por meio da
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monografia de Seabra Fagundes, intitulada o Controle dos Atos Administrativos pelo
Poder Judiciário.
Segundo Silva (2002), o controle social tem uma função muito importante, pois
sem ele as metas previstas, dentro de uma determinada gestão, poderão não ser
alcançadas e corrigidas, os objetivos principais podem ser deixados para segundo
plano, e principalmente poderá haver desperdício no uso de recursos públicos.
Portanto, é preciso que esses recursos e as pessoas (gestores e a sociedade) estejam
articulados nas políticas gerais, promovendo uma melhor combinação de esforços.
Neste sentido, para que esse controle social seja exercido, os cidadãos
representantes da sociedade deverão atuar de forma consciente e organizada3, isto é,
possuir conhecimentos mínimos sobre quais são os seus direitos e como defendê-los,
buscando ultrapassar os obstáculos ao exercício de sua cidadania, haja vista que uma
sociedade desmobilizada não será capaz de assegurar a responsabilidade da máquina
estatal, assim como a transparência da administração pública, fato este que se
apresenta como um dos maiores desafios para o exercício do controle social.
Tendo em vista esse discurso sobre o controle social dar-se-á destaque neste
momento à participação da sociedade civil através dos conselhos para o exercício
deste controle. De acordo com Carlos Simões, o controle social através desses
espaços, é o meio:
[...], exercido pela sociedade civil, para a garantia dos direitos sociais, superando os mecanismos tradicionais de controle técnico-burocrático. Os espaços democráticos de deliberação e de fiscalização da eficácia das políticas públicas, aliados a uma representação forte dos interesses gerais da sociedade, constituem a lógica do constituinte no controle popular das políticas públicas (SIMÕES, 2008, p. 111).
Os conselhos, conforme o autor são instituições representantes da população,
nas quais a sociedade está melhor organizada para exercer o seu papel de
fiscalizador e deliberador das políticas públicas, haja vista que os conselhos devem
zelar pela descentralização político – administrativa, participação popular e exercício
da cidadania. Daí ser constituído como um forte instrumento de controle social sobre a
33Trata-se da sociedade civil, a qual é entendida por Bobbio (2000), como o espaço em que são formados grupos que lutam pela participação e emancipação do poder político. Estes grupos são definidos pelo autor como: Contra – poderes. Isto é, contra o poder do Estado.
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máquina estatal, principalmente a nível municipal da administração pública, onde esta
pode ser fiscalizada de perto, por isso tem como objetivo principal a busca pela
construção de uma agenda comum que beneficie a população a partir de uma
influência na agenda governamental, experiência que foi implantada no estado do
Pará por meio do Planejamento Territorial Participativo (PTP), destacado a seguir.
3. O PLANEJAMENTO TERRITORIAL PARTICIPATIVO (PTP) NO ESTADO DO
PARÁ
O Planejamento Territorial Participativo (PTP) foi implantado no estado do Pará
no período de 2007 a 2010, pela ex-governadora Ana Júlia Carepa, a qual tinha como
objetivo criar um instrumento para gerir o governo do estado descentralizadamente, de
tal forma que representantes da sociedade civil (por meio dos conselhos) tivessem a
possibilidade de participar desse processo programando e planejando, juntamente
com o governo do estado, eixos estratégicos para as 12 Regiões de Integração do
estado do Pará (Metropolitana, Xingu, Marajó, Tocantins, Baixo Amazonas, Guamá,
Rio Caetés, Rio Capim, Araguaia, Carajás, Lago do Tucuruí e Tapajós).
Essa divisão entre regiões foi realizada para facilitar e dinamizar as ações do
PTP, as quais foram votadas e eleitas em Plenárias e Assembléias com o objetivo de
construir um Plano Plurianual4 (PPA), definindo o plano de ação do governo do estado,
o que permitiria a execução das demandas e dinamizaria o processo de
descentralização e participação popular na gestão pública.
É importante ressaltar que, o objetivo do PTP está vinculado ao do Orçamento
Participativo (OP) que surgiu nos anos 80, a partir de experiências de participação
popular nas gestões de algumas cidades brasileiras, sendo a mais bem sucedida a de
Porto Alegre iniciada em 1989. A partir dessa experiência em Porto Alegre, no ano de
1997 o então prefeito do município de Belém Edmilson Rodrigues aderiu em sua
44Com vigência de 2008-2011 o PPA é uma lei de iniciativa do Poder Executivo que estabelece estratégias, objetivos e metas da administração pública estadual para as despesas de capital e outras dela decorrente, se constitui também como um plano de médio prazo que contém ações governamentais para um período de (quatro) 4 anos.
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gestão ao OP como instrumento de democratização e participação popular,
demarcando o início de uma experiência inovadora à administração pública na cidade
de Belém, visto que a população passou a participar do processo decisório das ações
políticas.
A metodologia utilizada para a implantação do PTP, foi sistematizada para
ocorrer em 3 etapas. A primeira delas ocorreu entre abril e maio de 2007 com a
realização de Plenárias Públicas Regionais (PPRs) nas 12 regiões de integração do
estado, com o objetivo de apontar os principais desafios para o desenvolvimento das
regiões e eleger as principais demandas para a ação governamental que fariam parte
do PPA.
A 2ª etapa ocorreu em julho de 2007 com a realização de 143 Assembléias
Públicas Municipais (APMs) com o objetivo de definir as três prioridades que os
municípios encaminhariam aos Conselhos Regionais do PTP, assim como eleger os
(as) conselheiros (as) que iriam representar a sociedade civil dos municípios através
desses conselhos. Já a 3ª e última etapa foi realizada em agosto de 2007 com a
instalação e reuniões dos Conselhos Regionais e do Conselho Estadual do PTP.
Sobre os Conselhos Regionais do PTP, estes de acordo com o Governo do
estado foram definidos como órgãos de participação popular, instalados nas 12
regiões de integração, com o objetivo de deliberar acerca das necessidades dos
municípios, além de seus representantes terem o papel de contribuir na elaboração do
Plano de Desenvolvimento Regional e no Plano de Desenvolvimento do Estado. Os
membros que compunham estes conselhos eram os prefeitos ou seus representantes
(considerados conselheiros natos), representantes das Câmaras Municipais da região
e os membros da sociedade civil organizada, os quais foram eleitos nas APMs.
No que se refere ao Conselho Estadual do PTP, este considerado o órgão de
proposição das políticas públicas, tinha como função contribuir na formulação do Plano
de Desenvolvimento do Estado, assim como definir as prioridades, dentre as ações
eleitas nos Conselhos Regionais. Além de seus representantes debaterem sobre as
diretrizes básicas do planejamento das Regiões de Integração e acompanharem a
implementação do Plano de Desenvolvimento do Estado. Este conselho tinha como
representantes a ex-governadora do estado Ana Júlia Carepa; 1 representante da
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Assembléia Legislativa, 18 representantes do Governo do estado que foram definidos
pela então governadora; 3 representantes de entidades da sociedade civil; e 84
conselheiros eleitos nos Conselhos Regionais.
4. BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A EXPERIÊNCIA DOS CONSELHEIROS
DO MUNICÍPIO DE BELÉM NO PTP
No que diz respeito a atuação desses conselheiros, a proposta do Governo do
estado do Pará foi, primeiramente, a de criar um Programa de Formação Continuada
com o objetivo de capacitar os representantes dos Conselhos, visando uma ampla
participação popular, assim como o controle social sobre o desenvolvimento das ações
do governo.
Essa formação foi planejada para capacitar os 3.983 conselheiros eleitos em
todo o território paraense, sendo que para a região metropolitana (Belém, Ananindeua,
Marituba, Santa Bárbara e Benevides) foram eleitos 233 representantes que fariam
parte dos Conselhos Regionais, destes 140 foram eleitos para representar o município
de Belém, dentre titulares e suplentes. Para o Conselho Estadual foram definidos mais
de 100 membros, tendo em vista que para a região metropolitana foram eleitos 12
representantes.
Deve-se destacar nesse processo o aspecto da formação para os conselheiros,
os quais participaram de atividades que contemplaram cursos, seminários e encontros,
de forma a discutirem sobre o trabalho desenvolvido pelo PTP e para capacitar esses
representantes da sociedade civil com o intuito de efetuarem o monitoramento das
ações do governo. Além dessas atividades de formação, os conselheiros participaram
de reuniões para organização e discussão das ações que estavam sendo
desenvolvidas ao longo do processo e seus encaminhamentos.
Sendo que, o monitoramento dessas ações, por parte dos conselheiros era
feito através de visitas às obras que foram executadas ou pelo Sistema de Informação
E-CAR5, a partir do qual os conselheiros podiam fazer o acompanhamento via internet
55 Sistema de informação desenvolvido para facilitar o processo de monitoramento e fiscalização, on-line, das políticas públicas e programas prioritários eleitos nas APMs do PTP, nos 143 municípios do estado do Pará.
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dos resultados obtidos através do trabalho que estava sendo desenvolvido. Entretanto,
de acordo com depoimentos cedidos pelos conselheiros entrevistados, estes tiveram
dificuldades em acessar essas informações, visto que não havia um acompanhamento
periódico por parte do próprio governo para a renovação dos dados dispostos no site
do PTP e, ainda, havia uma dificuldade interna entre os conselheiros em trocar as
informações que eles obtinham devido a divergências políticas, e pelo fato do governo
não ter dado condições físicas e estruturais necessárias (como transporte) para que os
conselheiros pudessem visitar as obras que estavam sendo executadas.
No que concerne a atuação dos conselheiros do município de Belém, no PTP,
a partir da aplicação de questionários e entrevistas, verificou-se que a metodologia
utilizada no processo de implantação do PTP não possibilitou que eles tivessem uma
efetiva liberdade para decidir as políticas ou obras de seus municípios. Pois, de acordo
com um dos conselheiros entrevistados P. N., nenhum conselheiro teve validado o seu
poder decisório, o que dificultou a discussão e condução do PTP, na medida em que
houve uma participação popular considerada mínima em todo o processo.
Outro conselheiro entrevistado, M. P. considera que o PTP foi criado como uma
ferramenta política, perdendo a sua identidade inicial que era a de construir uma
gestão democrática e descentralizada, pois o governo do estado não ofereceu as
condições necessárias aos representantes da sociedade civil organizada para que
estes pudessem exercer seu papel de fiscalizadores e de atuantes nas decisões do
governo acerca das necessidades da população.
Segundo outro conselheiro, que preferiu não ser identificado, o PTP desvirtuou
o caminho da metodologia proposta para sua implementação no momento em que
priorizou um grupo político, isto é, houve prevalência a determinados grupos,
demonstrando, desta maneira, um desrespeito a diversidade política presente nesse
espaço. Conforme este conselheiro, “quando a participação passa por um único grupo
político não se tem mais a participação da população”, portanto em sua opinião, o PTP
não foi aplicado como um instrumento democrático e participativo.
Em entrevista com a ex-coordenadora do PTP Edilza Fontes que atuou no
período de 2007 a junho de 2009, esta relatou que o PTP “terminou enquanto proposta
de uma gestão descentralizada e participativa no estado do Pará, pois os
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conselheiros, após a implantação, não participaram mais da formulação das políticas
públicas”, além de não exercerem mais o papel de fiscalizadores, passaram a
mobilizadores do governo para a promoção de campanhas políticas. A ex-
coordenadora relatou ainda que houve uma “quebra” na metodologia do PTP devido a
má aplicação dos recursos , pois em tese, havia recursos para a realização das obras,
porém faltou eficácia técnica e política para sua aplicabilidade.
Entretanto, em entrevista, Milene Risuenho Lauande, coordenadora do PTP, no
período de 2009 a 2010, enfatizou que o PTP cumpriu, pelo menos em parte, seu
objetivo, ou seja, o de agregar a sociedade civil ao Estado para que estes pudessem
trabalhar em conjunto atendendo aos interesses da população. Segundo Milene, o
PTP foi um misto, sendo sociedade civil e Estado os agentes que tomavam as
decisões: a população decidia juntamente com o governo e acompanhava as ações
deste, e o Governo do estado executava essas ações.
A partir dos relatos desses conselheiros e dos gestores do PTP pode ser
observado o descontentamento por parte dos representantes da sociedade civil, na
medida em que a participação dos conselheiros não foi respeitada, pois algumas
situações foram impostas e não decididas em conjunto (sociedade e governo) como se
propôs o PTP, uma vez que houve centralização de poder como relataram alguns
conselheiros, acarretando, desta maneira, no esvaziamento do processo.
5. CONCLUSÃO
Diante da necessidade vivenciada, atualmente, pela sociedade de se efetivar a
participação popular nas decisões de interesse público, o processo participativo
durante o planejamento apresenta-se como um requisito de extrema importância, pois
é participando dele que o indivíduo, através de grupos com objetivos definidos, passa
a tomar decisões que influenciarão no desenvolvimento humano e social de todos. Por
isso, a sociedade deve procurar meios que garantam o pleno e consciente
comprometimento da participação popular nesse processo.
Neste sentido, o Planejamento Territorial Participativo do governo do estado do
Pará, apesar das dificuldades, apresentou-se como exemplo de necessidade e
importância de incorporar a participação popular nos processos de tomada de decisão
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de interesse público, pois desta forma, estará se mantendo um diálogo permanente
entre a sociedade e o Estado, visando construir espaços que corroborem a ação
organizada dos atores sociais no processo de construção de uma gestão
descentralizada e participativa.
REFERÊNCIAS
Caderno para reflexões. Superintendência Estadual do Planejamento Territorial Participativo do Pará – SEPLAN, Belém, SEPOF, 2007. Caderno para reflexões. Superintendência Estadual do Planejamento Territorial Participativo do Pará – SEPLAN, Belém, SEPOF, 2008. OLIVEIRA, Arildo da Silva. Controle social: perspectivas para a fiscalização popular da administração pública no brasil. Prêmio Serzedello Corrêa 2001: Monografias Vencedoras: Perspectivas para o controle social e a transparência administração pública/ Tribunal de Contas da União. – Brasília: TCU, Instituto Serzedello Corrêa 2002, p. 143 – 207. PATEMAN, Carole. Participação e teoria democrática. Tradução de Luiz Paulo Rouanet. – Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. SILVA, Francisco Carlos da Cruz. Controle social: reformando a administração para a sociedade. Prêmio Serzedello Corrêa 2001: Monografias Vencedoras: Perspectivas para o controle social e a transparência administração pública/ Tribunal de Contas da União. – Brasília: TCU, Instituto Serzedello Corrêa 2002, p. 21 – 72. SIMÕES, Carlos. Curso de direito do serviço social. 2. ed. Ver. E atual. – São Paulo: Cortez, 2008.