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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Rose Mary de Abreu Martins
Teatro Dirigido à Criança: análise da recepção de
crianças à performance de atores, com base na
aplicação da técnica de Microatuação
DOUTORADO EM FONOAUDIOLOGIA
São Paulo
2016
Rose Mary de Abreu Martins
Teatro Dirigido à Criança: análise da recepção de
crianças à performance de atores, com base na
aplicação da técnica de Microatuação
DOUTORADO EM FONOAUDIOLOGIA
Tese apresentada à Banca
Examinadora como exigência parcial
para obtenção do título de DOUTOR
em Fonoaudiologia, pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo,
sob a orientação da Profª Drª Léslie
Piccolotto Ferreira.
São Paulo
2016
3
Banca Examinadora
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Tentem perceber nas palavras o sentido que elas
podem ter quando (e como) soem como vocês
imaginam que devem soar (porque sem imaginar
o som não há DESEJO de som. E sem desejo, o
que de fato se consiga realizar será mera
casualidade) 1.
Silvia Davini2.
1 Fragmento de uma exposição didática escrita para a disciplina Voz e Movimento CEN/UnB, 2004. 2 Foi cantora, atriz, diretora, Doutora em Teatro pela Universidade de Londres, Professora do Departamento de Artes Cênicas da UnB da área de Voz e Performance e Pesquisadora na área de novas vocalidades em performance de 1990 a 2011.
5
À Silvia Davini (in memoriam) e João Denys Araújo Leite por me ensinarem a amar o
teatro e entendê-lo como sacerdócio. À minha mãe Leopoldina pela vida e todos os meus
renascimentos, a minha mais sincera gratidão!
7
À minha orientadora Profa. Dra. Léslie Piccolotto Ferreira, pelo amoroso
acolhimento, generosidade e exemplo de profissionalismo. A oportunidade de tê-la como
orientadora fez sentir-me, nos momentos mais difíceis, uma privilegiada. Sou muito grata
pela oportunidade.
Aos meus maiores incentivadores e parceiros desde o início dessa jornada: Profª
Silvia Davini, minha mãe Leopoldina, Sulian Vieira, Cesar Lignelli, Elthon Gomes, Nadja
Souza e Malu Gurgel.
Às mais talentosas artistas, doces e generosas mulheres nordestinas, Lúcia
Machado, Nadja Souza e Zulina Lira, que cruzaram meu caminho, me acolheram e que
embora tenham, como eu, “tocado um dobrado”, merecidamente conseguiram imprimir
suas marcas na terra da garoa, meu mais profundo reconhecimento e agradecimento.
Aos colegas de pesquisa do Grupo Voz e Cena da Universidade de Brasília, em
especial aos Profºs Dra. Sulian Vieira e Dr. Cesar Lignelli e Estela Lignelli, pela
assessoria com a técnica da Microatuação, pela escuta, amizade e apoio carinhoso nos
momentos cruciais.
Um especial agradecimento a todos os professores participantes das minhas
bancas de qualificação, em especial à Profª Dra Luciana Lyra da UNESP, grande
colaboradora nas primeiras encruzilhadas dessa estrada.
A todos os componentes e ex-componentes do Grupo da Quinta e do Laboratório
de Artes Cênicas – LAC da UFPE, em especial à Silvana Lyra, parceira de todas as
horas.
A todo o corpo artístico do Grupo da Quinta, que vem construindo essa história
desde 2003 por ocasião dos meus estudos de mestrado: João Denys, Marcondes Lima,
Wellington Júnior, Vinícius Vieira, Matheus Mota, Paulo Carvalho, Boás Ribeiro, André
Sales, Flávia Reny, Albertina Sulliano, João Pedro Leite e Hana Luzia Leite. E mais a
Pablo Araújo, Pedro Henrique, Marina Amaral, Flávio Fernando Oliveira, João dos Anjos
e todos que possibilitaram a montagem do espetáculo A Viagem de um Barquinho, de
Sylvia Orthof.
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Aos Projetos Sociais Pró-Criança, regente Otávio Góes, e Orquestra Criança
Cidadã de Ipojuca, regente Márcio Pereira, pela disponibilidade e parceria pedagógica.
A Matheus Mota, pela parceria estética (trilha sonora e direção musical) do
espetáculo A Viagem de um Barquinho de Sylvia Orthof.
À Claudia São Bento e ao Projeto Pirueta (minhas primeiras inspirações e
estímulo para a escolha do objeto desse estudo), pelos laços amorosos e manutenção de
uma frutífera parceria.
À Gárgula Produções Artística, pela parceria na montagem A Viagem de um
Barquinho.
À Dra. Marígia Viana, que me vem acompanhando como “coorientadora” e
conselheira, parceira e incentivadora desde o mestrado com sua enorme generosidade e
contribuição acadêmica.
Ao pesquisador Leidson Ferraz por toda a disponibilidade do seu acervo de
registros e publicações.
Às Profas. Dras. Claudia Cunha, Suzana Maia e Beatriz Caiuby Novaes, por
possibilitarem os mais prazerosos momentos pedagógicos dentro da Área de Linguagem
do PEPG em Fonoaudiologia da PUC-SP e pelo exemplo de docência e profissionalismo.
À Profa Dra. Marta Assumpção, pelo amor e garra com que ajuda a conduzir a
Área de Voz do PEPG em Fonoaudiologia da PUC-SP.
A todos os professores do PEPG em Fonoaudiologia da PUC-SP, em especial à
Profa. Laura Watz, pelo olhar amoroso possibilitando reflexões e novos rumos da
pesquisa e pelo disponibilidade docente e profissionalismo. Serei eternamente grata!
Aos amigos do Laborvox e companheiros das disciplinas, em especial aos
imigrantes na terra da garoa Elthon Gomes, Nadja Souza, Michele do Carmo, Rodrigo
Dornelas, Bruna Andrade, Aline Brito e João Lopes, pela cumplicidade, sessões
terapêuticas de risos e “aquecimento” nas madrugadas frias dos aeroportos, albergues e
ladeiras de Perdizes-SP. Agradeço também à Maria Fernanda Bittencourt, Andrea Paz,
Andrea Mi, Vera Cecília Gelardi, pela linda amizade, disponibilidade humana, senso
crítico, comprometimento profissional e bom humor.
A todos os colegas do PEPG de Fonoaudiologia – PUC-SP, que vivenciaram
comigo momentos de trocas humanas e de conhecimento.
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À Virgínia Rita Pini, pela compreensão e auxílio administrativo nos processos
burocráticos. Obrigada pela compreensão.
À Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, pelo apoio.
Ao Departamento de Teoria da Arte e Expressão Artística da Universidade
Federal de Pernambuco, pelo incentivo nesse processo de doutoramento, em especial a
todos os meus colegas professores, pela compreensão e apoio.
Aos funcionários do Departamento de Teoria da Arte e Expressão Artística da
Universidade Federal de Pernambuco – do Centro de Artes e Comunicação – CAC e, em
especial, aos do Setor de Extensão – Unidade Benfica – Ivanilza Tavares (Dª Zizi) e um
agradecimento mais que especial a Roberto Soares, pelo incentivo e apoio incondicional.
O meu mais profundo agradecimento à equipe de vigilantes, porteiros e de
serviços gerais do Centro Cultural Benfica.
A todos os que fazem do Teatro Joaquim Cardozo do Centro Cultural Benfica da
UFPE um pequeno oásis – palco de uma das mais honestas produções dirigidas à
criança – e, em especial, à Verônica Barkokebas e Maria Creuza, pela sensibilidade e
estímulo.
Ao Centro Brasileiro de Teatro para a Infância e Juventude – CBTIJ, pelo acesso
ao seu banco de texto.
A Gê Orthof e Associação Brasileira de Artes e Música – ABRAMUS, pela
liberação do texto A Viagem de um Barquinho, de Sylvia Orthof.
A André Salles, pelo auxílio na análise estatística dos dados.
A Marcos e Leopoldina Abreu, Vilani de Pádua, Dalila Meirelles, Geórgia Marques,
Michele Carmo e Michele Abreu, pelas escutas e constantes revisões.
À Hana Luzia Leite, pelo amor, paciência, parceria acadêmica e trabalho de
diagramação e infografia.
Às lindas e sensíveis crianças Estela Lignellie, Sofia e Dora Corrêa de Abreu,
pelas primeiras escutas e impressões sobre a leitura do texto A Viagem de um
Barquinho.
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À família Sulliano, em especial a Dª Ivone, Sr. José Brito e Albertina Sulliano, lá
da Terra do Pe. Cícero e do Sr. Lunga, pelo caloroso acolhimento na sua residência do
Recife no período da coleta de dados.
À minha turma de 1976 da ETFPE, que proporcionou “meu despertar para a
primavera” e que, após 40 anos, retoma uma convivência que nos faz entender que os
laços mais profundos de amizade jamais serão rompidos.
À minha mãe Leopoldina, meu maior exemplo de garra e superação.
À toda a minha família, obrigada pela compreensão, carinho e escuta. Em
especial aos meus filhos Hana Luzia e João Pedro Leite, João Denys, meus irmãos
Marcos Abreu e família, Zaqueu Abreu, a minha mãe, sem ela nada seria possível, e a
Patrícia Santos, pela irmandade e apoio que vem possibilitando há 19 anos a
concretização de árduas e prazerosas lutas.
Ao povo brasileiro, que, através da CAPES, prestou-me auxílio financeiro.
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Introdução: as produções teatrais contemporâneas recifenses vêm exigindo, na
formação e preparação dos atores, propostas com definições de abordagens
metodológicas que possibilitem avanços nas questões referentes à palavra e à voz em
cena. Busca-se atualizar conhecimentos oriundos das técnicas corporais, de canto da
tradição ocidental e da pragmática, a exemplo da Microatuação, desenvolvida por
Silvia Davini. Essa técnica considera a influência das novas tecnologias de
reprodução de som e imagem sobre os padrões de percepção humana, como
também a configuração das novas noções de corpo e de sujeito, que motivam, por sua
vez, novas noções de personagem. Objetivo: implementar a Microatuação e analisar
seus efeitos com base na performance de atores submetida a um público de crianças.
Método: para tal surgem três estudos. Estudo 1 – propõe um estudo sobre a evolução
das tecnologias de comunicação e sua relação com a configuração de novos padrões de
vocalidade com foco na Microatuação. Estudo 2 – descreve o processo de
implementação na técnica de Microatuação na composição de cena do texto teatral A
Viagem de um Barquinho, de Sylvia Orthof, junto a um elenco de atores e cujo resultado
(o espetáculo) é submetido a um público de crianças. Estudo 3 – analisa os resultados
da aplicabilidade da técnica de Microatuação no processo de composição de cena de A
Viagem de um Barquinho, com base na opinião dos atores da receptividade do público de
crianças. Resultados: as análises mostraram que os resultados da pesquisa
responderam ao objetivo da tese. Do total de 33 questões de múltipla escolha submetidas
ao público (N=50), (33,3%) contemplaram indagações sobre à encenação (espetáculo),
voz (performance dos atores) e história (texto). Os dados das duas fases foram
analisados de forma descritiva, permitindo reflexões sobre abordagens focadas nos
avanços da produção de voz e palavra em cena, além de revelar algumas bases teóricas
para os estudos da vocalidade teatral, visando a produção na cidade do Recife.
Considerações Finais: a contribuição deste estudo deve-se ao destaque dado ao
reconhecimento da natureza da vocalidade teatral e da adequada concepção do trabalho
de treinamento vocal através de procedimentos metodológicos adequados à natureza de
cada espetáculo, que propiciam um avanço quanto à performance vocal dos atores, a
exemplo da Microatuação. Conclui-se ainda que se faz urgente aliar pesquisa e formação
artística. Ampliando-as, sistematizando-as e reconhecendo-as em suas especificidades.
Palavras-Chave: voz, técnica, teatro, microatuação.
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Introduction: The contemporary theater productions from Recife have been demanding
proposals with methodological definitions at the training and preparation of actors. These
proposals must enable advances about the word and the voice at the scene. The aim is to
update knowledge from the body and singing techniques from Western tradition and
pragmatic, like the Microacting. This technique developed by Silvia Davini considers the
influence of new reproduction technologies of sound and image on the patterns of human
perception. It also considers the configuration of new notions of body and subject that
motivate, in turn, new character ideas. Objective: to implement the Microacting and
analyze its effects based on the performance of actors submitted to an audience of
children. Method: for this arise three studies. Study 1 – proposes a study on the evolution
of communication technologies and its relation to the setting of new standards for voicing,
focused on Microacting. Study 2 – describes the Microacting technique implementation
process in the scene composition of the theatrical text A Viagem de um Barquinho,
by Sylvia Orthof, along with a cast of actors. The result (the spectacle) is presented to a
children audience. Study 3 – analyzes the applicability results of the Microacting
technique in the scene composition process of A Viagem de um Barquinho, based on
the actors’ opinion about the receptivity of the children audience. Results: The analysis
showed that the search results responded to the aim of the thesis. Of the total of 33
multiple choice questions submitted to the public (N = 50), (33.3%) included questions
about the staging (spectacle), voice (actors' performance) and history (text). The data
from the two phases were analyzed descriptively, allowing reflections on approaches
focused on advances in the production of voice and word in the scene. It also reveals
some theoretical basis for studies of theatrical vocality, focusing on production in the city
of Recife. Final Thoughts: the contribution of this study is due to the emphasis given to
the recognition of the nature of theatrical vocality. Also the adequate conception of vocal
training work through methodological procedures appropriate to the nature of each
spectacle. It provides a breakthrough in vocal performance of the actors, such as the
Microacting. It is concluded that it is urgent to combine artistic and training research.
Expanding them, systematize them and recognizing them in their specificities.
Keywords: voice, technique, theatre, microacting.
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LISTA DE FIGURAS 15
LISTA DE QUADROS 16
1. APRESENTAÇÃO 17
2. INTRODUÇÃO 22
2.1 Objetivo geral 27
3. ESTUDO 1 29
4. ESTUDO 2 40
5. ESTUDO 3 62
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS 79
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 83
ANEXOS 87
Anexo 1 | Parecer Comitê de Ética 87
Anexo 2 | Declaração Teoria da Arte para uso do Atelier 1 91
Anexo 3 | Termo de Consentimento Livre e Esclarecido 93
Anexo 4 | Questionário dirigido aos atores – Sondagem 97
Anexo 5 | Imagens e vídeos do processo de aplicação da Microatuação 99
Anexo 6 | Processo de aplicação da técnica da Microatuação –
Orientações: memorização Cenas-chave ou Falas-chave
103
Anexo 7 | Questionário (Q1) dirigido aos atores antes da apresentação
do espetáculo – A Viagem de um Barquinho
106
Anexo 8 | Questionário (Q2) dirigido aos atores depois da apresentação
do espetáculo – A Viagem de um Barquinho
108
14
Anexo 9 | Questionário (Q3) de recepção do público de crianças entre
10-12 anos – A Viagem de um Barquinho
110
Anexo 10 | Imagens das apresentações do espetáculo A Viagem de um
Barquinho
118
Anexo 11 | Trilha sonora piloto composta para o espetáculo A Viagem de
um Barquinho por Matheus Mota
122
Anexo 12 | Projeto de Montagem | Funcultura/PE 124
15
Figura 1 Resultados do questionário aplicado às crianças após o
espetáculo A Viagem de um Barquinho.
72
16
Quadro 1 Caracterização dos Atores quanto a sexo, idade, formação e
personagens representados.
65
Quadro 2 Resultado do questionário submetido aos atores antes da
segunda apresentação do espetáculo A Viagem de um
Barquinho.
67
Quadro 3 Resultado do questionário submetido aos atores após as duas
apresentações do espetáculo A Viagem de um Barquinho. 69
17
A minha trajetória como instrumentista, cantora, atriz, arte-educadora (professora
de música e de teatro) passa a ser registrada a partir da infância na Igreja Evangélica
Batista, onde iniciei minha iniciação musical, voz cantada e falada (canto e dramatizações
religiosas).
Em 1976, na minha adolescência, além do canto coral, iniciei meus estudos de
profissionalização em música, aliando estudo teórico musical e estudo instrumental
(flauta transversa e flauta doce).
Surge aí a oportunidade de vivenciar trabalhos sociais, que despertaram uma
consciência mais dialética sobre a vida. Um modo de ver uma formação menos
especializada do indivíduo, principalmente no tocante ao ensino das artes. Dentre esses
trabalhos, vale destacar os que desenvolvi, enquanto aluna de Extensão em Música da
Universidade Federal de Pernambuco - UFPE junto à Arquidiocese de Olinda e
Recife, sob a coordenação do arcebispo Dom Hélder Câmara, Padre Lourenço
Rosembaum (da Ordem Franciscana - Oblatas) e do educador popular João Francisco de
Souza. Esses trabalhos consistiam em ensino de arte e musicalização para crianças,
adolescentes e adultos aliados ao processo de alfabetização pelo método Paulo Freire.
As ações foram realizadas nas escolas comunitárias de Recife e Olinda, assim como no
Projeto Social Suzuki, que utiliza da metodologia de ensino de instrumentos de corda
para orquestra no Alto do Céu, bairro da periferia da cidade do Recife.
Na fase adulta, ampliei a minha participação como corista de diversos grupos
vocais, atuando também como instrumentista em grupos musicais de pesquisa com
música medieval, renascentista e barroca, a exemplo dos grupos Madrigal Revivis e
Camerata Ad Libitum, além de grupos de música para rituais: casamentos, missas e
demais eventos.
Entre as décadas de 80 e 90, como cantora solista e flautista nos grupos
supracitados e professora substituta das cadeiras de arte e de voz junto à UFPE e
Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE, acumulei inquietações a partir da
necessidade de atualização referente a minha formação enquanto licenciada em música
18
e bacharel em canto lírico, no que diz respeito à ampliação das minhas habilidades
interpretativas. Desse modo, resolvi investir na formação em Artes Cênicas, passando a
cursar teatro em nível médio (1988) e pós-graduação lato sensu (1989). No entanto, foi
vivenciando processos de feitura teatral, como aluna de teatro, que pude observar que
também existiam lacunas sobre as questões referentes à voz na cena e foi nesse
entrelugar que decidi abraçar a causa em prol da pesquisa da vocalidade em cena.
Nesse período, ainda como aluna de teatro, iniciei meu trabalho como
preparadora vocal de atores, tendo oportunidade de desenvolver uma parceria com um
dos homens mais comprometidos com o teatro e, portanto, reconhecido dentro e fora do
eixo teatral da cidade do Recife. Vem atuando desde a década de 70 na cena e na
formação dessa arte, o professor, ator, diretor e dramaturgo João Denys, que também é
mestre em Teoria da Literatura com especialidade na obra do poeta e dramaturgo
pernambucano Joaquim Cardozo.
Passei a fazer parte dos seus processos de montagem teatral, inicialmente como
cantora, atriz e produtora cultural; em seguida, como preparadora vocal e, por fim, como
assistente de direção. A referida parceria tornou possível a continuidade e avanço de
minhas pesquisas sobre vocalidade devido ao extenso repertório de criações
dramatúrgicas e suas respectivas montagens.
Na minha prática, não conseguia conceber uma formação compartimentada
(música ou artes visuais ou teatro ou dança), mas uma educação em arte, educação
estética, preparação enquanto público apreciador, ou seja, uma formação cidadã não
apenas artística. Portanto, busquei uma formação artística multidisciplinar mais
abrangente do ator, cantor, instrumentista, que desenvolva não apenas a aptidão
específica, mas também outras formas de expressão que não sejam decorrentes de uma
formação tecnicista, descontextualizada, que leve à reprodução de estilos e que estimule
a criatividade.
Os procedimentos pedagógicos adotados por mim para o ensino da voz na cena,
seja para o ator como para o cantor, sempre focaram a importância da propriocepção –
autoconhecimento, reflexão. Meu encontro com o teatro veio reforçar meus conceitos de
formação multidisciplinar, por ser o teatro uma linguagem que permite aglutinar todas as
outras linguagens artísticas, por possibilitar e promover o encontro, o diálogo a
convivência e, consequentemente, o crescimento pessoal.
19
Minha efetivação, em 1997, como docente da área de voz dos Cursos de Teatro
e de Comunicação Social da UFPE, ofereceu-me a oportunidade de realizar, de forma
interdisciplinar, trabalhos com o professor João Denys junto às disciplinas da área de
interpretação teatral ministradas por ele. Para tal, escolhíamos os mesmos repertórios de
texto teatral para que os alunos pudessem ser acompanhados e orientados em suas
disciplinas.
Em 2001, por ocasião dos meus estudos de mestrado junto ao Programa de Pós-
graduação em Artes Cênicas – PPGAC - UFBA, passei a ter contato com os trabalhos de
pesquisa da Drª Silvia Davini, minha orientadora no projeto de estudo, que resultou em
uma publicação em abril de 2004 com o título: A Voz e a Palavra na Cena do Recife Hoje.
A pesquisa desenvolvida no mestrado focava a produção teatral dirigida à criança
na cidade do Recife. Desse modo, foi possível observar que poucas montagens
utilizavam textos teatrais do repertório universal nas suas versões originais, os quais
eram sistematicamente adaptados, ou serviam de base para diversas releituras. Essas
produções realçavam muito mais a dimensão visual do espaço cênico, ao tempo em que
a dimensão acústica, na maioria das vezes, permanecia ignorada.
Portanto, meu encontro com os conceitos desenvolvidos por Davini veio elucidar
algumas indagações e também acrescentar novas inquietações relativas a conceitos e
procedimentos metodológicos sobre a vocalidade na cena. Entender, por exemplo, que
era necessário acessar, desenvolver procedimentos metodológicos que permitissem um
mergulho mais profundo do que uma mera reprodução mecanizada de exercícios
contidos em manuais e cartilhas, de enfoque eminentemente prático, de modo a
conseguir propiciar e estimular o trabalho criativo com a voz em altas intensidades.
Tal aproximação, especialmente minha integração em 2003 ao grupo de pesquisa
criado e coordenado por Davini, denominado Grupo de Pesquisa Vocalidade e Cena, e,
consequentemente, sua produção artística, conceitual e técnica, possibilitou dirigir meu
foco à técnica denominada de Microatuação, que defende, em sua essência, a produção
de sentido com base na dimensão acústica da cena, considerando a abordagem de
textos teatrais ou outros materiais textuais para a performance.
Ainda por ocasião dos meus estudos de mestrado, iniciei o grupo de pesquisa e
de extensão denominado Grupo da Quinta, vinculado ao Grupo de Pesquisa Vocalidade
e Cena e ao Laboratório de Artes Cênicas do Curso de Licenciatura em Teatro da UFPE.
20
O Grupo da Quinta é um conjunto cênico, vocal instrumental de pesquisa artística
multidisciplinar.
Desse modo, neste estudo de doutoramento, decidi reforçar um compromisso que
venho perseguindo desde 2001 com a formação e a produção artística dirigida para
criança no Recife, através da abordagem e apresentação da técnica da Microatuação,
enquanto procedimento metodológico que visa possibilitar avanços nas questões
referentes à palavra em cena. Assim, propus planejar e colocar em prática a
aplicabilidade de um processo de composição de cena, com base nessa referida técnica.
Após o falecimento prematuro da pesquisadora Silvia Davini em 2011, a
possibilidade de prosseguimento dessa proposta de estudo esteve ameaçada devido à
dificuldade de interlocução junto a alguns programas de doutoramento. Entre esses, os
quais me vinculei como aluna especial, estão os programas de pós-graduação em
Educação, Sociologia da Arte e Linguística da UFPE.
No entanto, foi um vínculo iniciado em 2007 com o Projeto MAIS, desenvolvido no
âmbito do Hospital das Clínicas da UFPE, e mais a oportunidade de aproximação em
2012 com o Departamento de Fonoaudiologia, que de fato me estimularam na busca de
um programa de pós-graduação em saúde que comungasse com um despertar sobre a
importância de um projeto de pesquisa que pudesse ser interdisciplinar.
O Projeto MAIS – Manifestações de Arte Integradas à Saúde – vem atuando na
busca de promover, através da arte, a humanização da assistência à saúde, envolvendo
dois centros importantes da UFPE: Centro de Artes e Comunicação e Centro de Saúde.
Diante do exposto, a escolha por um programa de pós-graduação em saúde
poderia aprofundar um diálogo entre arte e saúde e, principalmente, colaborar com um
desafio que vem sendo encarado pelo Projeto MAIS, desde o seu início, que é o de
buscar maneiras de medir cientificamente seus resultados, tais como a diminuição dos
índices de estresse dos pacientes internados, diminuição da ansiedade nas salas de
espera, diminuição do nível de estresse nos profissionais de saúde e melhoria das
condições de trabalho e de atendimento.
Embora esses resultados sejam reconhecidos, especialmente através dos
depoimentos de uma grande maioria da comunidade assistida pelo Hospital das Clínicas
e comunidade acadêmica, uma forma precisa de aferir ainda representa um desafio
21
dentro da equipe e de educadores, médicos, agentes de saúde e alunos integrantes do
projeto.
Daí surge a oportunidade de acolhimento no Programa de Estudos Pós-
Graduados em Fonoaudiologia – PEPG, da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, que possui uma política apoiada em conceitos coerentes amplamente defendidos
pelos discursos acadêmicos brasileiros sobre a importância e necessidade de um diálogo
entre as instituições e seus programas de graduação e de pós-graduação.
O diálogo entre os programas de pós-graduação se legitima a partir do momento
que aproxima e permite um maior trânsito de discentes, docentes e principalmente de
ideias e debates, propiciando, assim, o aparecimento de pesquisas importantes entre
áreas que jamais deveriam ser consideradas distintas. Desse modo, contribuindo de
forma efetiva com o debate que busca integrar e relacionar conceitos da área artística e
de humanas às pesquisas científicas.
Temos aqui, neste estudo de doutoramento, um diálogo traçado entre a arte e a
saúde, mais especificamente entre o Teatro e a Fonoaudiologia. Trabalhar no viés dessa
interdisciplinaridade e, principalmente, respeitar as diferenças e adversidades não foi o
caminho mais fácil, porém proporcionou uma experiência enriquecedora.
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As inúmeras vivências com as produções artísticas na cena recifense,
envolvendo a voz com o teatro/música/dança, vêm instigando os profissionais da
voz a buscarem respostas sobre processos em que a voz associada à palavra, à
música e a ambientes acústicos sejam executados ao vivo, amplificados, filtrados
ou reproduzidos mecanicamente, especificamente no teatro dirigida à criança.
Lignelli (2007), em sua pesquisa de mestrado, certifica que esses
questionamentos revelam ainda uma escassez de discursos, seja sobre a formação
teatral ou mesmo musical, que possam sinalizar o valor atribuído a questões
cruciais desse fazer artístico, a saber: discurso quanto às esferas acústicas
nesses panoramas culturais; as relações entre as dimensões acústicas e visuais
da cena que, por sua vez, inclui a palavra, a música, o uso da tecnologia na
produção de sentido em performance; e o fenômeno da eficácia do corpo dos
atores ou mesmo do bailarino em performance na produção de palavra nos
diferentes estilos de atuação quando indagado se esse deve ou não ser atrelado
apenas à questão da técnica corporal.
Desse modo, pode-se afirmar que o interesse deste estudo tem foco nos
processos de composição de personagens e da encenação, além do estudo
sobre a recepção, devido à sua importância na configuração de sentido em
performance.
No entanto, além da importância do entendimento da magnitude desses
conceitos, é necessário também a amplitude dos conceitos básicos referentes à arte
e sua importância na formação humana, como destaca Paglia (2015), que defende a
importância ao acesso e ao ensino da arte como recurso para uma formação cidadã
e, consequentemente, para uma melhor percepção e compreensão da vida.
Cabe destacar ainda o que afirma Pavis (2010): o campo das
investigações sobre o conceito de teatro não se restringe ao estudo do texto
dramático, mas principalmente ao das práticas que podem intervir na cena e no
trabalho do ator, quer dizer, das artes e técnicas disponíveis numa época dada e
suas relações com os contextos culturais dos mesmos.
23
Desse modo, dentre os conceitos fundamentais para o urdimento do teatro,
recebem destaque no decorrer deste trabalho de pesquisa, o como dizer na cena sua
oralidade; mas especialmente a importância da ampliação dos conceitos sobre a relação
espaço/tempo/acústica/visual e ainda, sobre as escolhas no processo de composição do
espetáculo a partir da análise pragmática do texto, da ideia, que impõe necessariamente
que se pense o texto na cena e não apenas seu significado ou sua dimensão acústica ou
visual. Ou seja, que considere a escuta desse texto; que o visualize enquanto
performance; que a visualidade seja conectada – apareça dialogando com a questão
acústica no trabalho junto aos atores.
Cabe esclarecer que embora este estudo não tenha a pretensão de responder a
todas as questões aqui elencadas e essenciais às pesquisas referentes ao fazer teatral,
entende a importância de se indagar sobre suas funções essenciais como: o teatro hoje
tem conseguido cumprir seu papel não apenas enquanto formador no âmbito da
recepção, especialmente das crianças? O teatro tem conseguido desempenhar as
funções de oferecer acesso ao conhecimento, à diversão e à formação cidadã? Qual a
imagem social que se tem de criança e de infância? Qual o interesse hoje? Como o teatro
coloca essa criança? Estudiosos ligados ao teatro, em sua maioria, entendem que não
cabe ao teatro assumir o papel de único agente responsável pela formação do indivíduo
cidadão. Como exemplo, pode-se tomar a posição de Pupo (1991), quando mostra
preocupação quanto a essa função didática do teatro, por entender que no seu urdimento
deve-se rejeitar uma conotação meramente instrumentalizada com fins “moralizante” e de
“transferidor de valores”. Desse modo, a relação do teatro com o didático precisa manter
a qualidade dos resultados dos seus processos, de forma a não perder sua função de
obra artística.
Enquanto isso, Bettelheim (2002) destaca que o teatro precisa ser capaz de
proporcionar o intercâmbio de ideias a partir da análise e interpretação de diferentes
fontes e linguagens (imagem, texto, objeto, música e outros), através da prática do
diálogo, pela troca de conhecimentos e experiências e na construção de relações entre o
presente e o passado assim como no estudo das representações.
A partir dessa compreensão, Tadeu (2011) acrescenta que esse teatro precisa
respeitar o tempo da infância, que é de fantasia, mas não de abstração; de crueldade e
de singeleza; de afeto e de intriga; de inquietude e de algazarra. Nesse sentido, entende
que deveria tocar em temas da vida, pois na infância existe o momento da dor que deve
ser enfrentado. Baseado nessa ideia, acredita que o teatro para a infância possui muito
24
mais do que apenas a capacidade de ensinar, possui sim, muito mais a de insinuar,
deixar brechas para a criança preencher, interpretar, realizar suas próprias leituras a
partir do que vê.
Assim, cabe reforçar aqui os conceitos de teatro definidos por Nazareth (2006),
uma trama de linguagens diversas que reunidas formam um tecido – o espetáculo teatral.
Nesse universo estão presentes: a palavra, o gesto, a música, o cenário, o figurino, além
de outras linguagens, como: do teatro de formas animadas, do teatro de sombra, a
linguagem do clown e a coreografia. Desse modo, considerando que no teatro como um
todo a estética necessita estar ligada à ética, no teatro dirigido à criança este pressuposto
cobra um novo valor, exigindo um conhecimento sólido.
Transitando pelos mais variados gêneros teatrais consolidados (comédia, comédia
musical, drama, ou farsa) pode-se afirmar que o teatro dirigido para a infância exige dos
atores uma efetiva competência e muita flexibilidade, lançando mão, frequentemente, de
recursos tecnológicos nem sempre com boa qualidade e precisão técnica (por exemplo, a
amplificação das vozes dos atores por meio do uso de microfones) para suprir as
carências no desempenho vocal, porém sem um preparo que lhes permitam lidar com a
enorme interferência que esses dispositivos operam no corpo e no resultado.
Quanto à audiência, qual seria então a função desse público, que hoje se coloca
como plateia ativa, exigindo dos atores um despertar crítico sobre as suas atuações? A
sinceridade é marcante na criança, dificilmente assistem a um espetáculo teatral com
ideias preconcebidas, teorias, ideias fixas. São mais disponíveis, permitem-se envolver
por completo no jogo estabelecido na cena, como também, não havendo interesse,
conseguem demonstrá-lo sem o menor constrangimento, fato que, sem dúvida, aumenta
em muito a responsabilidade de quem o produz (SOSA,1978).
Assim, pode-se concluir que a reflexão sobre o teatro dirigido à criança passa
primeiramente pelo lugar que a criança ocupa na nossa sociedade. Portanto, para
Camarotti (2002), não basta mudar a denominação "teatro infantil" para "teatro para a
criança" para resolver a questão do tom pejorativo e minimizador que o adjetivo "infantil"
apresenta em nossa cultura. Para o autor, seria mais relevante precisar o que deve ser
oferecido à criança e como esse material deve ser apresentado no desejo de conquistar,
consequentemente, um lugar de legitimidade e respeito.
Quando se fala em história do teatro dirigido à criança, é essencial abordá-lo
inicialmente a partir das bases teóricas do trabalho de Campos (1998), cuja obra mais
25
relevante é a pesquisa sobre o teatro de Maria Clara Machado e do Grupo O Tablado,
direcionados para criança, entendendo que esse teatro no Brasil nasceu junto com o
teatro brasileiro moderno, num momento em que tudo se concentrava na necessidade de
ampliação e formação de plateia.
Para Campos, o teatro brasileiro dirigido para criança acontece no final da década
de 40, a partir do espetáculo O casaco encantado, de Lúcia Benedetti, em 1948.
Segundo Joel Pontes – fundador do Teatro Popular do Nordeste - TPN,
pesquisador, crítico, encenador, dramaturgo e professor da Antiga Escola de Belas Artes
da Universidade do Recife, hoje, UFPE –, o panorama histórico do teatro para criança em
Pernambuco registra que existia desde 1948, no Recife, um teatro desenvolvido no
Departamento de Extensão Cultural e Artística do Governo do Estado - DECA,
reconhecido como grupo de teatro amador da cidade do Recife, por desenvolver
atividades em teatro e dança com e para crianças, adolescentes e professores da rede
estadual de ensino (PONTES, 1966).
O citado grupo DECA foi dirigido por nomes de destaque na história do teatro e da
educação em Pernambuco, como Maria José Campos Lima, atriz, diretora, preparadora
vocal e professora do Curso de Formação do Ator da antiga Escola de Belas Artes de
Pernambuco, no período de 1948 a 1977, hoje, Curso de Licenciatura em Teatro da
Universidade Federal de Pernambuco.
Maria José Campos Lima desenvolveu um trabalho pioneiro na formação do
ator no Recife, no qual tanto a voz do ator quanto o público e as crianças eram elementos
protagônicos. No entanto, para a consolidação do teatro para a infância em Pernambuco,
considera-se, ainda, algumas produções do Teatro Popular do Nordeste - TPN, fundado
por Hermilo Borba Filho e Ariano Suassuna, além das companhias Teatro da Criança
do Recife e Clube de Teatro Infantil de Pernambuco, surgidas na década de 1960 e
atuantes até os anos 1970 (CAMAROTTI, 2002).
É, portanto, nos cursos de Interpretação e Direção Teatral da Escola de Belas
Artes de Pernambuco, da então Universidade do Recife, hoje Universidade Federal de
Pernambuco, que se oferece pela primeira vez na cidade do Recife a disciplina Técnica
Vocal, dirigida à preparação da voz do ator.
Uma disciplina que foi estruturada e implantada por essa que foi a primeira
preparadora vocal de atores do Recife no período compreendido entre 1958 e 1974.
Segundo depoimento de ex-alunos, já adotava em sala de aula a utilização da
26
indumentária de dança e ballet para os alunos de voz e que segundo depoimento desses
não era uma tarefa de fácil aceitação. Portanto, o pioneirismo de Maria José Campos
Lima fica evidente nas suas atividades pedagógicas e artísticas. Além de professora
Campos Lima, atuava como atriz, cantora, bailarina, encenadora, arte-educadora, foniatra
e crítica de teatro (MARTINS, 2013)
Nos anos 1970, o teatro para criança em Pernambuco, como no restante do país,
foi descoberto como filão comercial, o que possibilitou o surgimento de um maior número
de novos autores, diretores e produtores dedicados exclusivamente a esse repertório. O
arte-educador e pesquisador Camarotti (2002) afirma que, embora as produções dirigidas
para crianças tenham-se tornado numerosas, entre os períodos de 1970 a 2002, apenas
uma parcela minoritária apresentava qualidades do ponto de vista artístico-pedagógico.
Na cena recifense contemporânea, a grande demanda pelo teatro para a infância
costuma ainda propiciar produções que, quase sempre, mantém-se em cartaz em
temporadas prolongadas. Cabe notar também que a renovação dos títulos é constante
nos palcos do Recife. Durante essas longas temporadas, os elencos se veem obrigados
a apresentar em um ritmo muito mais intenso do que em qualquer outro tipo de produção
teatral, alternando, frequentemente, o espaço teatral convencional com espaços
alternativos, tais como praças, espaços de eventos, parques e escolas.
Desse modo, no que diz respeito ao eixo de discussão sobre o urdimento desse
teatro direcionado para a criança, destacam-se algumas questões relevantes: a falta de
autonomia desses elencos em relação aos esquemas de produção que os gerenciam; o
produtor, que exerce as funções de captador de recurso e ao mesmo tempo de produtor
executivo, muitas vezes definindo sozinho o texto teatral, a direção, o elenco e toda a
equipe técnica.
Em um processo de composição dessa natureza, não existe a autonomia da
equipe de criação. Sem autonomia, como definir "o que se quer dizer", "para quem se
quer dizer" e "como se quer dizer"? A autonomia vem a ser o ponto crucial para que os
atores e toda a equipe de um processo de composição em uma montagem teatral
possam ser eficientes e, consequentemente, ter a liberdade da escolha do que
dizer no palco e a consciência para reconhecer a importância do público como um dos
elementos pertencentes à tríade essencial para que ocorra o fenômeno teatral (texto, ator
e público).
27
Outra questão fundamental diz respeito à necessidade de uma discussão sobre o
papel do profissional da voz, foco que muito interessa a esse estudo, que visa a
relevantes resultados estéticos dessa voz nos processos de composição em cena, seja o
próprio ator ou o preparador de voz. A formação e a postura desses profissionais, por sua
vez, define toda uma ideologia desse fazer, que poderá ou não sinalizar para uma
realização artística de qualidade.
No que tange à formação do ator, existe uma grande demanda nas áreas da
atuação, direção, crítica, produção executiva e de gestão cultural, além de uma demanda
ainda maior nas áreas das dimensões acústicas e visuais do espetáculo (sonoplastia,
iluminação, cenografia, figurino, maquiagem e outros). As parcas iniciativas públicas e
privadas mostram que hoje existe uma falta de interesse e diálogo da sociedade e seus
representantes quanto a um maior investimento e incentivo, aliados a uma revisão das
ações de ocupação dos teatros públicos e privados e à ausência de uma crítica
especializada, como a que houve no Recife em outras épocas.
Desse modo, decidiu-se nessa pesquisa focar no teatro dirigido à criança, não por
se entender que o teatro dirigido para adultos não compartilha dessas mesmas
dificuldades, mas principalmente por entender que esse público, que se encontra em
formação, diferentemente do público adulto, ainda não possui todos os “filtros” (as bases)
necessários para se posicionar do ponto de vista ético e estético.
Portanto, este estudo espera contribuir para além da ampliação da bibliografia
sobre a voz e a palavra na performance teatral contemporânea. Deseja também
conseguir comprovar um resultado eficaz desta pesquisa com base na técnica da
Microatuação enquanto tecnologia de treinamento e controle de ensaio, e, pela
primeira vez, focada em uma produção dirigida à criança e analisada a partir desse
público.
2.1. OBJETIVO GERAL
A presente pesquisa propôs, como objetivo geral, implementar a técnica de
Microatuação e analisar seus efeitos com base na performance de atores submetida a
um público de crianças.
Para responder a esse objetivo, três estudos sequenciais foram realizados:
Estudo 1 – Estudo sobre a evolução das tecnologias de comunicação: sua relação com a
28
configuração de novos padrões de vocalidade com foco na Microatuação; Estudo 2 –
Estudo sobre uma nova abordagem metodológica: Implementação da Microatuação,
quando descreve o processo de composição de cena do texto teatral A Viagem de um
Barquinho, de Sylvia Orthof, junto a um elenco de atores e cujo resultado (o espetáculo) é
submetido a um público de crianças; Estudo 3 – Implementação da técnica de
Microatuação: análise a discussão dos resultados do processo de implementação a partir
da opinião dos atores envolvidos e da receptividade de um público de crianças
29
Estudo sobre a evolução das tecnologias de comunicação: sua relação com a
configuração de novos padrões de vocalidade.
INTRODUÇÃO
Com a finalidade de definir procedimentos para investigar questões vinculadas à
implementação da Técnica de Microatuação junto ao texto dirigido à criança: A Viagem
de um Barquinho, de Sylvia Orthof, dentro do estudo de doutoramento intitulado: “Teatro
dirigido à criança: análise da recepção de crianças à performance de atores, com base na
aplicação da técnica de Microatuação”, este estudo pretende gerar bases teóricas para
os estudos da vocalidade teatral, sobretudo no que concerne à produção de voz e
palavra no contexto da cultura do século XXI na cidade do Recife.
No entanto, antes de imergir na definição e detalhamento da Microatuação,
propõe-se, inicialmente, discutir os conceitos e as diferenças de voz e vocalidade do ator,
investir na busca de uma visão mais ampla do que seja o texto teatral e a composição de
palavras que sua encenação implica. Rosenfeld (1976) defende que a encenação precisa
se caracterizar enquanto espetáculo, sendo assim, ela não pode limitar-se à dramaturgia
literária. Logo, é importante ainda um debruçar sobre teorias que possam também
alicerçar esse estudo sobre a vocalidade, tais como da área da Linguística e da
Psicologia.
Desse modo, será de grande ajuda para os resultados desta pesquisa uma
aproximação com as teorias da Linguagem, uma vez que trata da interação entre ator e
técnica (intervenção, aplicabilidade); ator e ator (processo de criação e atuação); ator e
público (fenômeno teatral). Portanto, ao revisar as concepções de Koch (2007), ficou
claro que uma questão relevante para diversos linguistas trata da relação da Linguística
com o mundo. Notadamente, nessa questão se inclui também a relação entre as palavras
e as coisas, como ainda a relação da linguagem com uma realidade discursiva. A autora
defende que comunicar-se é interagir e cooperar, semelhante a um jogo que necessita de
regras.
Ainda nesse contexto, Koch (2007) informa que, de acordo com a semântica, a
construção do sentido do texto dialoga também com o fenômeno, o dado e o novo, dos
30
quais as dimensões exibidas intervêm na construção do sentido. Para a autora, a
informação dada encontra-se na consciência dos interlocutores e servirá de ponto de
apoio para a introdução de uma nova informação.
O interesse pela autoconfrontação, objeto da Psicologia do Trabalho, pode ser
explicado, ainda, devido o mesmo se constituir em procedimento metodológico e
interventivo que, de acordo com Clot (2006), analisa a atividade profissional, ou seja,
trata-se de um instrumento de transformação do trabalho pelo próprio trabalhador, com
apoio do especialista ou pesquisador, de modo a favorecer a instalação de um
movimento dialético de análise e produção de saberes sobre o trabalho.
Tais ideias corroboram de forma relevante para a compreensão e implementação
da técnica denominada Microatuação, sistematizada e proposta por Silvia Davini, que,
por sua vez, define que o trabalho com o texto teatral e a qualidade da performance
depende da conscientização do ator quanto à importância da atualização do material
textual e produção estética.
Segundo Vieira (2013), a noção de Microatuação foi primeiramente mencionada
em publicação por Davini no artigo O Jogo da Palavra (1998). No artigo Vocalidade e
Cena: tecnologias de treinamento e controle de ensaio (2002), a autora explicita as fases
de desenvolvimento da definida Técnica de Microatuação, sem descrevê-las
extensamente. No vídeo didático Microatuação (2009), de responsabilidade de Davini e
Vieira, são expostas e exemplificadas algumas fases da técnica. A descrição da técnica,
como também a exposição de seu componente conceitual realizada nesse estudo, têm
referência tanto nos artigos e vídeos citados, quanto na experiência com a aplicabilidade
dessa técnica junto aos seis atores em performance com o texto A Viagem de um
Barquinho.
Desse modo, buscou-se nessa intervenção, uma conscientização por parte dos
atores, no sentido deles entenderem a importância de se disporem a criar dialogicamente
com autores e diretores, logo, passar a não considerar a atuação como representação,
interpretação ou reprodução, mas como atualização e produção, como defende Davini
(2002).
Assim, a partir do trabalho de Lignelli (2007), tenta-se também resgatar, nesse
estudo, as inquietações de Davini, quando, segundo ele, busca justificar e definir
vocalidade ocidental, partindo de três grandes rupturas: a primeira, que ocorre pelos
embates entre filósofos e sofistas, resultando na formulação de retóricas e poéticas; a
segunda, pela consolidação dos modos de representação (alfabético) e reprodução
31
(imprensa de tipos móveis) da palavra; e a terceira, pelo desenvolvimento dos meios
audiovisuais.
Lignelli (2007), ao revisar Davini, defende que, quanto aos embates entre
filósofos e sofistas, que resultaram na formulação de retóricas e poéticas, cabe
ressaltar a distinção, proposta por ela, entre retórica e vocalidade. Para os filósofos, a
retórica configurava-se em uma técnica e a poética como produção de voz e palavra
em condições específicas. Para Davini, nessa perspectiva, quando se aborda a
palavra não se está falando em retórica, mas falando em vocalidade.
No que se refere à segunda ruptura – consolidação dos modos de
representação (alfabético) e reprodução (imprensa de tipos móveis) da palavra – a
pesquisadora entende que essa gera como resultado a racionalização do
pensamento, percepção e memória, ou seja, a popularização e consolidação da
escrita de tipos gráficos. Assim, a imprensa transforma a relação do autor com o
público e com o texto ao problematizar a noção de autoria. Para ela, o poeta que, até a
Idade Média, era o próprio performer, com o advento da imprensa ficou separado e
distante de sua audiência (LIGNELLI, 2007).
Lignelli (2007) identifica que Davini, em seu discurso, defende que a
performance do poeta estava até então em sua voz, daí, com a imprensa, essa
performance é desincorporada da poesia. (ZUMTHOR, 2007) afirma que essa ruptura
ainda se encontra intimamente vinculada à consolidação de padrões racionais de
pensamento e ao desenvolvimento das tecnologias de comunicação e de reprodução
no respectivo momento histórico.
Por fim, segundo ela, a terceira ruptura ocorre pelo desenvolvimento dos
meios audiovisuais, que resultaram num impacto nas noções de tempo, espaço,
sujeito, corpo e percepção humana. Explica que a cultura da letra (consolidação do
alfabeto) e a imprensa de tipos móveis, como tecnologias da palavra, foram
ferramentas-chave na consolidação do universo das literaturas ocidentais,
penetrando inclusive em espaços que não lhes eram próprios.
No seu entendimento, ocorre um processo histórico de confusão entre a letra e
a poesia oral, na Idade Média, e entre a literatura e o teatro, no século XX, confusão
ainda presente quando os instrumentos dos estudos teatrais são decorridos da
análise literária e quando muitos diretores e atores veem a palavra como letra, não
como ato (DAVINI, 2007).
32
Portanto, para se entender a vocalidade, necessita-se escavar na palavra, no seu
sentido não apenas fonético, e além de sua representação gráfica, reconhecer essa
palavra no corpo, um corpo outro daquele biológico, aberto a inúmeros significados
(MARTINS, 2004).
Em relação a tais buscas, é pertinente o conceito de corpo elaborado por Guattari
(1996) e Deleuze (1997) e revisado por Davini (2002), referendado no discurso sobre
“corpo sem órgãos” elaborado por Artaud (1995): um corpo não é definido apenas pela
forma que o determina, nem como uma determinada substância ou assunto, e nem
apenas pelos órgãos que possui ou as funções que desempenha. A partir dessa
perspectiva conceitual, superam-se as visões dicotômicas (que o definem apenas como
forma de algum conteúdo, ou como um complexo orgânico hierárquico, ou como pura
materialidade) como também as visões instrumentais do corpo.
Provavelmente seja a voz a produção corporal que mais extrapole esse corpo
individual. Sendo assim, pode-se definir voz como produção corporal capaz de produzir
sentidos complexos, controláveis na cena (Davini, 2007), enquanto que vocalidade é
entendida como a produção de voz e de palavra por parte de um grupo dado, em um
momento e lugar determinado (ZUMTHOR, 2007).
Deste modo, a cena teatral necessita rever a palavra viciada, desgastada, a
palavra-centro, limitada e limitante na encenação, convencional na atuação: a palavra
que não produz novos sentidos. Na cena, a palavra ou o encadeamento das palavras, o
tema e o seu desenvolvimento fundam um teatro de largas possibilidades e amplos
significantes; mas é na palavra, mais precisamente na palavra teatral, que essa cadeia
simbólica se funda. É essa palavra que confere ao texto teatral o caráter de porta-voz,
tanto no teatro antigo quanto no teatro contemporâneo (MARTINS, 2004).
Em síntese, torna-se inviável abordar a dimensão acústica da cena, sem
considerar a relação entre a letra e a performance dos atores, sem entender que a
representação da palavra influencia diretamente no desempenho dos mesmos.
Davini (2007) acredita que a produção de voz e palavra na cena contemporânea,
no geral, ainda tem funcionado como uma máquina de reproduzir estilos, não
conseguindo ampliar o treinamento técnico do ator de modo que possa habilitá-lo para a
execução satisfatória de diferentes estilos de performance.
Na compreensão de Davini, voz e movimento constituem-se em produções
corporais da mesma categoria, aptas para organizar discursos complexos e para
33
estabelecer parâmetros de controle de desempenho. Porém, segundo a autora, a
verbalidade confere à vocalidade uma complexidade e uma definição muito maiores que
aquelas alcançadas pelo movimento (DAVINI, 2002). Dessa forma, define o gestus como
materialização das atitudes tomadas pelos personagens entre si, tais como registro físico
manifesto no tom de voz, expressão facial, olhar ou ações determinadas que
caracterizam o universo das relações entre os personagens, enfim, o sistema da ação
cênica. O gestus se torna o material básico de construção da fábula teatral (DAVINI,
1996).
Nessa concepção, o trabalho de voz pode ser definido como um processo de
preparação do corpo para lidar com o mais abrangente leque de possibilidades de
produções de significados, emissão de voz e palavra em performance.
Ter voz quer dizer ter vez. Significa também investir numa voz de alta e nova
qualidade humana, equiparada aos avanços técnicos da atualidade. A voz, portanto, no
teatro e na vida precisa ser descoberta para potencializar sentidos que revolucionem o
teatro e a sociedade que o produz.
Vargens (2014) aborda um conceito de voz que exige do ator uma capacidade
criativa no seu trabalho vocal, independentemente do estilo e da linguagem do
espetáculo, de modo que seja expandida possibilitando uma sintonia com o todo de uma
obra, de um personagem, da ação enraizada nas propostas de linguagem de uma obra,
na possibilidade do ato vivo do teatro, ao vivo, de verdade, na cena de mentira.
Vargens, no trabalho supracitado, define ainda três princípios para o trabalho
vocal: 1. Voz é resultado – acredita que a voz resulta de uma série de circunstâncias
sociais e culturais, além de ser extremamente suscetível às condições relacionais do
momento: com quem se fala; 2. Voz e fala têm endereço – é tarefa do ator adivinhar,
descobrir, escolher e definir a quem se dirige e; 3. Formam-se artistas – firmando
compromisso pedagógico com a formação de um artista, ou seja, “proporcionar ao ator a
oportunidade de acessar-se, desvendar-se, humanizar-se, socializar-se, comunicar-se,
escolher, elaborar, responder por suas escolhas”; tendo como horizonte uma perspectiva
artística, para além da técnica e da terapêutica (VARGENS, 2014).
A despeito da proposta pedagógica – técnica de Microatuação – essa vem sendo
aplicada, até então, pelos participantes do Grupo de Pesquisa Voz e Cena, coordenado
pelos pesquisadores Sulian Vieira e Cesár Lignelli, junto às disciplinas de voz no Curso
de Teatro da Universidade de Brasília – UnB, como também em alguns processos de
34
produções artísticas. Tais experiências resultam em publicações e participações em
eventos nacionais e internacionais que abordam a vocalidade em cena.
A Microatuação se constitui tecnologia de treinamento e controle de ensaio
que atualiza conhecimentos dos campos da ciência, das técnicas corporais, das
técnicas de canto da tradição ocidental e da pragmática. Para essa tecnologia de
treinamento é de suma importância a influência das novas tecnologias de
reprodução de som e imagem sobre os padrões de percepção humana, como
também a configuração das novas noções de corpo e de sujeito, que motivam, por sua
vez, novas noções de personagem (DAVINI, 2002).
O Princípio Dinâmico dos Três Apoios, coeficiente comum à produção e controle
de altas intensidades vocais, orienta o treinamento de atores e cantores para ativar
coordenadamente as três regiões de apoio como: do corpo sobre uma superfície de
sustento, do ar sobre a região pélvica e das vogais sobre a região da epiglote com a
finalidade de implementar uma série de referências que funcionem como controladores
da produção vocal. Davini (2002) considera que esse delimita uma diferença em relação
às técnicas vocais tradicionais, que se restringem a apenas dois desses apoios: o do ar
sobre a região pélvica e o das vogais sobre a região da epiglote. O valor dado somente a
esses dois pontos de apoio ignora o papel do trabalho postural e cinético na produção
vocal em altas intensidades (DAVINI, 2002).
O processo de treinamento que Davini propõe centra-se na dimensão técnica que
objetiva a flexibilização do material do ator (seu próprio corpo). Assim a passagem para
os universos imaginário e simbólico dá-se em outro momento quando se inicia a definição
do perfil estético para a cena, por meio da implementação de procedimentos, que se
constituem em modos de aproximar os recursos técnicos dos atores às demandas
estéticas propostas pelo autor e pela direção (DAVINI, 2002).
A técnica para produção de voz em altas intensidades, como qualquer técnica
implementada no corpo humano, visa, em um âmbito individual: ”tornar voluntários
comportamentos corporais involuntários (respiratórios, fonatórios e posturais), com a
finalidade de estabelecer mecanismos de controle dos parâmetros acústicos (intensidade,
altura e timbre) e articulatórios da voz” (DAVINI, 2002). Com essa proposta de
treinamento de atores seria possível a abertura de novos espaços entre os estilos
históricos e os novos gêneros em performance, entre o campo da arte e os saberes da
época, entre o corpo e a máquina, que encontram na voz e na palavra em performance
uma substância para infinitas linhas de pesquisa (DAVINI, 2002).
35
Pesquisas que tiveram como objetivo a prática com a Microatuação apontaram
resultados nos quais a dimensão acústica da cena foi constituída pelas esferas da
palavra, da música e do entorno acústico (LIGNELLI, 2007). Como exemplo, serão
abordados de forma sucinta os processos de composição de Santa Croce e de O
Naufrágio. Tais processos de composição foram desenvolvidos entre os anos de 2004
e 2006 na Universidade de Brasília, ainda sob a orientação da Dra. Silvia Davini.
De acordo com Lignelli (2007), um dos participantes desses processos de
composição, a grande hipótese era o fato da dimensão acústica da cena ser
considerada como ponto de partida para a produção de sentido em performance de
modo que oferecesse também instâncias de controle dessas produções. Afirma que
tais produções conseguiram criar redes complexas de sentido configuradas a partir
das dimensões acústica e visual da cena.
Informa que nos dois processos de composição os textos foram pensados a
partir de diferentes autores. Em Santa Croce: sete contos de Luigi Pirandello (1837-
1936), ensaísta, crítico, poeta, romancista e dramaturgo italiano, foram modulados
pelo grupo de criadores, da forma narrativa para a forma dramática, além do desenho
de cena, execução e criação musical que utilizou equipamento de reprodução: quatro
sistemas estereofônicos.
Em O Naufrágio, o drama estático, O Marinheiro, de Fernando Pessoa, e
trechos de A Tempestade, de William Shakespeare, constituem o roteiro dramático
da performance, na qual contava com a reprodução mecânica das vozes de alguns
personagens, pela gravação, que soam espacialmente por um sistema de
reprodução controlados por um computador.
O conceito de dimensão acústica da cena formulado por Davini se constitui
numa ampla rede de relações entre as esferas da palavra, da música e do desenho
do ambiente acústico em performance desse modo, a autora exemplifica afirmando
que através de uma superfície de 360° formada por planos fixos e móveis, os
domínios da voz e da palavra, do desenho acústico e da música em performance
estabelecem um complexo de relações que reconhecemos como a dimensão
acústica da cena. Nesse contexto, o corpo em performance torna-se o ‘palco’
primeiro; lugar de intersecção entre as dimensões visual e acústica da cena. (DAVINI,
2002).
36
Portanto, nesse discurso, defende que optar por priorizar o acústico nas
abordagens da cena implica em perceber muito mais as características e
materialidade do som. Como dito, é comum entender que o conceito de material de
cena encontra-se mais atrelado ao que se pode ver, enquanto que os recursos
sonoros, como a percepção em 360º em diversos planos e seu poder de afetar atores
e público pouco são explorados (DAVINI, 2002).
Dessa forma, vale sempre retomar os conceitos defendidos por Davini, ao
longo dessas investigações, e reforçar o discurso referente à ‘palavra’ proferida,
como pragmática, e à palavra escrita, como ‘letra’, ou seja, literatura. Nessa
perspectiva, a palavra se encontra diretamente ligada à vocalidade ou à
performatividade da língua, diferenciando-se da letra entendida como símbolo gráfico,
que representa a palavra. Se a letra remete a ritmos, sons e intenções ela representa
um fenômeno anterior a ela: a palavra proferida. No entanto, a representação da
palavra na letra é restrita e imprecisa se comparada às possibilidades acústicas da
palavra em performance (DAVINI, 2007).
Lignelli (2007), apoiado nas afirmativas de Silvia Davini e definindo notação
musical enquanto representação gráfica da música, iguala essa notação musical à
letra na medida em que também é uma representação de um evento acústico anterior.
Porém, chama atenção para o fato de que, mesmo que a partitura musical permita uma
leitura horizontal e vertical, defina ritmos, alturas e harmonias com relativa precisão, o
campo da notação musical busca constante reformulação em prol de uma maior
consistência entre as partituras e o fenômeno musical que elas representam.
Enquanto que, ao comparar a letra à notação musical, por considerá-las
representações de eventos acústicos, teria que se considerar o argumento de que a
letra oferece escasso rigor com relação aos parâmetros do som, devido à evidência
de pouca reformulação no campo da representação visual da palavra e à aceitação
plena dos limites impostos pelos modelos gráficos vigentes.
Nos registros de Santa Croce e de O Naufrágio foram reconhecidas diferentes
etapas dos processos de composição e de produção. O de Santa Croce começou na
esfera da palavra, com a modulação de um número de contos de Pirandello para o
modo cênico. Da finalização do roteiro até a sua performance foi aplicado o processo
de treinamento e de ensaio formulados por Davini, a Microatuação (LIGNELLI, 2007).
Lignelli (2007) informa que as esferas da música e do entorno acústico foram
produzidas e editadas a partir de meios digitais, enquanto que o desenho acústico
37
dessas esferas foi realizado em cena analogicamente por meio de quatro sistemas
estereofônicos. Logo após a leitura extensa da obra literária de Pirandello, por parte
desse grupo de atores, ocorreu uma primeira seleção, quando foram separados 20
contos; após uma segunda seleção, restaram 12 contos. Dos contos à cena, o grupo
passou pelas etapas de modulação, treinamento, ensaio e montagem. Cada ator
passou por todas as etapas, com exceção da produção das esferas da música e do
entorno acústico e do respectivo desenho dessas esferas.
Em O Naufrágio, o drama estático, O Marinheiro, de Fernando Pessoa, e
trechos de A Tempestade, de William Shakespeare, constituem-se nos fundamentos
do roteiro da performance.
Seu processo inclui, na primeira etapa, todo um investimento para a produção em
vídeo do texto O Marinheiro. Para viabilizar os ensaios, foi realizada uma
diagramação específica desse texto, objetivando que fossem contempladas as
demandas específicas da produção do vídeo para a cena além de intervenções ao
vivo.
Como em Santa Croce, em O Naufrágio as esferas da música e do entorno
acústico foram produzidas e editadas digitalmente. A reprodução digital da palavra,
da música e do entorno acústico em O Naufrágio foi espacializada digitalmente por
meio de um sistema de reprodução de som que, junto com a reprodução das imagens
em vídeo, foi comandada por um único computador.
Em O Naufrágio, instalação cênica que integra a obra O Marinheiro e trechos de
A Tempestade, a noção de personagem como indivíduo foi substituída pela noção de
personagem como um modo de fala, noção mais fluida, uma vez que considera que a
própria atividade fonatória já integra a gestualidade da cena, sendo uma das
dimensões na produção do sentido em performance. A noção de ação amplia-se para
além da noção de deslocamento e da dimensão espacial visual, para a dimensão
espacial visual acústica da cena, que incorpora a palavra como ato em sua
gestualidade.
No material de entrevista produzido por Lignelli (2007) com Sulian Vieira,
única atriz de O Naufrágio, ela comenta que em seus primeiros contatos como
diretora da obra O Marinheiro, de Fernando Pessoa, nos anos de 1995, quando
desenvolveu seu projeto de diplomação do curso de Bacharelado em Artes Cênicas,
na Universidade de Brasília, e 2000, em uma segunda montagem fora da
38
universidade, observou grande dificuldade em conduzir o trabalho de atuação das
atrizes. A princípio, muitos referenciais eficientes na abordagem de outras obras não
resolveram os problemas de atuação na abordagem de O Marinheiro e suscitaram
reflexões a respeito das noções de personagem e de ação, como também sobre a
dimensão acústica da cena.
A atriz considera as características e as qualidades da obra como ainda
pontua os temas e o valor da mesma – não somente no contexto de sua criação mas
também na contemporaneidade, ressalta o desafio e a dificuldade em atualizar um
texto em que a ação está situada na palavra poética. O que os personagens fazem
pragmaticamente é conversar. Frequentemente, observava que as atrizes tinham
dificuldades de confiar na eficácia da palavra em si, demonstrando ansiedade por se
deslocarem pelo espaço da cena, ao invés de simplesmente falar. Acrescenta, também,
que, muitas vezes, para superar o desconforto gerado pela imobilidade cinética
proposta pela obra e por sua direção, surgia uma gestualidade vocal e cinética,
ilustrativa.
Além dos aspectos relacionados à palavra em cena, no que diz respeito às
noções de ação e de personagem, para a montagem de O Naufrágio em 2006,
também foi trabalhada a dimensão acústica da cena em suas diversas esferas.
Também pode não finalizar com afirmações e sim apresentando as questões
finais, como perguntas mesmo. Como algo que ainda não tem resposta clara, pois parece
que esse é o estado da abordagem teórica da Microatuação na vocalidade, não apenas
em Recife mas no ocidente.
Como expresso anteriormente, o que de fato interessa é defender, nesse estudo,
a importância da investigação de novas metodologias para a produção de voz e palavra
na cena. Entender a importância de se indagar – mesmo que ainda não se consigam
respostas claras sobre a abordagem teórica da Microatuação na vocalidade na cena
recifense – se os principais eixos da discussão desses problemas ainda estão centrados,
notadamente, em causas como: dificuldade do reconhecimento da importância e da
natureza da vocalidade teatral; e da dificuldade de produção de sentido em performance,
decorrente da falta de uma adequada concepção do trabalho de treinamento vocal.
Existe, de fato, uma ausência de sistematização, publicação e divulgação de
procedimentos metodológicos que correspondam à natureza de cada espetáculo, que
propiciem uma adequada performance vocal do ator.
39
Como entender ainda situações comuns e relevantes no tocante à esfera da
palavra, a exemplo do que afirma Vieira (2013), citando experiências com docentes e
preparadores vocais no Brasil, a exemplo da cidade do Recife, em que se constata,
referente a trabalho com o texto teatral, que, na maioria das vezes, recorre-se a
recortes, em que cenas muito extensas são evitadas privilegiando momentos de ação
baseada na noção de deslocamento do corpo dos atores no espaço cênico e/ou de
intriga. De acordo com a percepção de Vieira (2013), tal situação pode indicar uma
falta de estratégia para abordar os problemas estabelecidos no contato com os textos
teatrais. Por outro lado, tentativas de atualizar a palavra em cena por vezes inclinam-
se à ilustração e/ou à fragmentação do sentido do texto.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao evidenciar a importância e necessidade de abordagens que proporcionem
avanços na produção vocal e da palavra em cena, foi possível refletir sobre a base
teórica que constituiu os estudos da vocalidade teatral, sobretudo no que refere à
produção de voz e palavra no contexto da cultura contemporânea da cidade do Recife.
Contudo, foi imprescindível realizar uma imersão que facilitasse a definição e o
detalhamento da Microatuação enquanto tecnologia de treinamento e controle de ensaio,
como ainda discutir os conceitos e as diferenças de voz e vocalidade do ator, na busca
de um conceito mais ampliado do que seja o texto teatral e a composição de palavras
que sua encenação sugere.
40
Nova Abordagem Metodológica: implementação da Microatuação.
INTRODUÇÃO
Este estudo tem como objetivo descrever o processo de composição da cena,
subsidiada pela proposta da técnica de Microatuação com o texto teatral A Viagem de
Um Barquinho, de Sylvia Orthof, junto a seis atores integrantes do Grupo da Quinta,
conjunto vocal e instrumental, que vem, desde 2003, desenvolvendo uma pesquisa
artística multidisciplinar visando a uma formação mais abrangente do intérprete, ator,
cantor e instrumentista, vinculado ao Laboratório de Artes Cênicas da Universidade
Federal de Pernambuco. Os atores foram submetidos a um processo que incluiu quatro
etapas interdependentes: Zoom, Intervenção, Decomposição e Ensaio e Performance.
De acordo com a pesquisadora e sistematizadora dessa técnica, Silvia Davini, a
Microatuação compreende as nuances do olhar, gestos mínimos que não são
diretamente percebidos pela plateia, podendo ser definitivos para a eficácia da cena em
suas sutilezas cinéticas e acústicas. Desse modo, observa que na produção da voz e da
palavra, o corpo, por necessitar atualizar um total de acontecimentos (a exemplo das
atividades articulatória e respiratória), acaba gerando uma atividade (gestual, cinética)
involuntária que interfere nos processos de significação da cena (DAVINI, 2002).
Como citado, para Davini (2002), a Microatuação se constitui como tecnologia de
treinamento e controle de ensaio que atualiza conhecimento dos campos da ciência, das
técnicas corporais, das técnicas de canto da tradição ocidental e da pragmática. Essa
tecnologia de treinamento considera a influência de novas tecnologias de reprodução de
som e imagem sobre os padrões de percepção humana, como também a configuração
das novas noções de corpo e de sujeito, que motivam, por sua vez, novas noções de
personagem.
DESCRIÇÃO
Após a aprovação da proposta pelo Comitê de Ética da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo - PUC-SP, sob o número CAEE: 34662614.6.0000.5482, uma
média de 10 a 15 sujeitos, entre alunos das disciplinas de Voz e de Interpretação e
41
integrantes e ex-integrantes do Grupo da Quinta – expressaram interesse em participar
desta pesquisa. No primeiro encontro, os sujeitos foram informados dos objetivos da
pesquisa e procedimentos que seriam utilizados no processo, como também a carga
horária composta de 20 encontros semanais de 4 horas cada (total de 80 horas). No
entanto, apenas seis integrantes do Grupo da Quinta se engajaram ao projeto.
A referida amostra de informantes foi composta por seis sujeitos (dois atores com
formação em teatro, dois cantores líricos com formação em música e pouca experiência
em teatro e dois estudantes iniciantes sem experiência em teatro). A faixa etária da
amostra variou entre 17 e 37 anos, sendo duas do sexo feminino e quatro do sexo
masculino.
Para coleta de dados referentes à intervenção com a Microatuação, foi
selecionado o texto A Viagem de um Barquinho, de Sylvia Orthof (1975). Uma
dramaturgia que inclui 12 personagens (Lavadeira, Menino, Sol, Cavaleiro Azul, Cavaleiro
Verde, Sonho do Barquinho, Sapo, Pirilampo, Barco, Fada Princesa, Patinete Matilde e
Manequinho).
Para viabilizar o trabalho com o texto, foi necessário contatar os responsáveis
pela liberação do mesmo, que, por sua vez, foi autorizado para 12 apresentações sem
cobrança de ingressos.
Os critérios utilizados para a escolha desse texto foram: possibilitar ao público
infanto-juvenil o contato com a dramaturgia de uma importante autora, Sylvia Orthof; ser
relativamente curto; possuir elementos adequados para a faixa etária de 10 a 12 anos e
favorecer a realização da intervenção com a Microatuação direcionada para o trabalho
com seis atores considerando a variedade de personagens, diálogos e estrutura de textos
favoráveis, que permitiram uma aproximação da pragmática e um distanciamento da
literatura, diferenciando a ‘palavra’, como palavra proferida, e a palavra escrita, como
‘letra’.
As etapas da aplicação da Microatuação foram desenvolvidas no Ateliê 1, do
Departamento de Teoria da Arte e Expressão Artística, no qual estão lotados, entre
outros, os cursos superiores de Teatro e de Artes Visuais da UFPE. O Ateliê e o Teatro
Joaquim Cardozo ficam situados no Centro Cultural Benfica, espaço administrado pela
Pró-Reitoria de Extensão.
Esse processo de implementação da técnica de Microatuação com os atores
aconteceu entre janeiro de 2015, quando o elenco se reuniu pela primeira vez, e junho do
42
mesmo ano, completando, assim, um total de 20 encontros semanais de 4 horas cada
(totalizando 80 horas). Todos esses encontros foram registrados em áudio e vídeo,
gravados simultaneamente, além do registro escrito de aspectos considerados
importantes para o detalhamento do processo diário de pesquisa. Além da carga horária
de 80 horas, referentes ao processo de implementação da Microatuação, o elenco
cumpriu uma carga horária de 90 horas referentes ao processo de criação e execução
dos elementos visuais do espetáculo, somando-se, assim, uma carga horária total de 170
horas computadas para todo o processo (aplicação da técnica de Microatuação e
montagem teatral).
No primeiro encontro, os sujeitos foram entrevistados individualmente com base
em um roteiro de perguntas previamente elaborado (Anexo 4). Tal roteiro foi produzido
com a finalidade de caracterizar o perfil dos atores quanto a sua formação geral,
formação artística, experiências anteriores de trabalho com texto teatral, leitura
dramática, análise de texto e a participação em processos de montagem teatral
principalmente dirigida à criança.
Reafirmando, após a definição desses participantes, os mesmos leram e
assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - TCLE, no qual é explicado
em detalhes os objetivos do trabalho, seus riscos e benefícios. A responsável pela
pesquisa também assinou o mesmo termo, assumindo o compromisso de guardar em
sigilo os nomes dos participantes, que poderiam retirar-se a qualquer momento da
pesquisa sem acarretar prejuízo para si.
Após a definição do perfil dos sujeitos e a partir do segundo encontro, iniciou-se
uma série de exposições e debates a respeito da vida e obra da autora do texto,
explanação sobre os conceitos de análise literária, interação, autoconfrontação e sobre
as etapas interdependentes que compõem a Microatuação: Zoom; Decomposição;
Intervenção; Ensaio e Performance, e, principalmente, sobre os conceitos de voz,
vocalidade, com base nas teorias sobre análise pragmática, defendidas por Sulian Vieira
(2013), em seus estudos de doutoramento, além das primeiras discussões sobre os
possíveis processos de concepção estética do espetáculo (resultado da aplicação da
Microatuação), incluindo seus elementos visuais e sonoros (trilha musical).
Como dito anteriormente, os sujeitos da pesquisa, além de participarem na função
de atores no processo da Microatuação junto ao texto A Viagem de um Barquinho,
disponibilizaram-se a atuar coletivamente nos processos de concepção, planejamento e
execução dos elementos visuais do espetáculo (figurinos, adereços e cenário). Essa
43
disponibilidade faz parte de suas práticas junto às demandas dos processos de criação
do Grupo da Quinta. Tal atitude mostra que os corpos desses atores estão disponíveis
em jogo para além da cena, revelando ainda uma consciência da essência do teatro
enquanto fazer coletivo.
Para a descrição desse processo de composição com a Microatuação, foi
importante identificar algumas diferentes abordagens nas arquiteturas concebidas por
Davini (2007), Vieira (2013) e pela autora desta pesquisa.
No entanto, vale iniciar apresentando as bases conceituais da técnica concebidas
por Davini e que, de acordo com ela, inicia-se após a definição das cenas-chave, bloco
de sentido e palavras-chave, a próxima instância de trabalho é a memorização do texto
por parte dos atores, que constitui um marcante diferencial desta proposta de
abordagem. Ou seja, o modo como um ator aprende um texto pode já determinar o
material cênico que ele vai apresentar para quem o dirigir, que poderá deixá-lo mais ou
menos flexível para as modificações que forem necessárias em prol da proposta estética.
Na visão de Davini (1998), considerando que a Microatuação baseia-se na relação
de quem atua com o trânsito da letra à palavra em cena, resolve dialogar com Paul
Zumthor por ele evidenciar a diferença de materialidades entre a letra e a palavra,
fundamental para as bases dos procedimentos de memorização do texto teatral e sempre
privilegiando a ação de dizer em cena:
Determinado texto destina-se ao consumo visual (em princípio solitário e silencioso pela leitura); outro se destina à audição (e, portanto a percepção de efeitos sonoros está por isso aberta ao consumo coletivo). O primeiro apresenta-se como um objeto – folha de papel, livro – o segundo, como uma ação vocal. (ZUMTHOR, 1985, p. 06).
Na interpretação de Davini (2002), se consideradas as questões que abrangem a
ação de memorização de um texto teatral, como ainda a importância dessas para o
processo de ensaio e para a cena, será imprescindível agir de forma que os atores
busquem utilizar recursos que estejam sempre apoiados na produção do som. Nesse
sentido, ele deve ser tomado como ponto de partida, seja na forma de produção da
própria fala ou da escuta da fala. Portanto, constata-se que um contato direto com o texto
impresso, ou seja, com a letra, costuma associar a performance do ator à pontuação
gráfica ou à distribuição visual do texto impresso, atribuindo certas fixações e acentos
indesejados ao material memorizado. Em síntese, atores que memorizam um texto
exclusivamente de forma silenciosa ou escrevendo repetidamente, têm dificuldades em
44
dizer suas falas em voz alta, pois as memorizaram em uma situação distanciada de tal
demanda.
Portanto, considerando a importância da etapa de memorização, cabe apresentar
as quatro etapas interdependentes da técnica de Microatuação:
• Zoom: através de análise pragmática, definição das cenas-chave e memorização
e flexibilização do texto;
• Intervenção: dissociação de instâncias do momento verbal com auxílio de
equipamentos de reprodução de som e de imagem;
• Decomposição: análise da dissociação de instâncias do momento verbal
registrada em vídeo;
• Ensaio e performance: implementação de procedimentos para a cena.
A etapa nomeada como Zoom se inicia com a definição das cenas-chave, aquelas
em que um personagem determinado se manifesta em toda sua magnitude ou opera uma
transformação drástica em relação ao que havia sido definido anteriormente a seu
respeito.
Para identificar as cenas-chave é preciso que o ator considere o texto teatral
completo e a personagem que ele irá interpretar como um todo no contexto desse texto,
contribuindo, igualmente, para aproximá-lo da dinâmica proposta pelo autor do texto
escolhido. Como explicitado, nessa abordagem os personagens são pensadas em sua
forma mais fluida, acontecem em cena não tanto pelo que dizem mas por ‘como’ dizem o
que dizem. Após definida a materialidade do personagem, a partir da contextualização
dos dados surgidos dos frequentes trânsitos pelas cenas-chave no tempo da cena, o ator
constrói o mapa do seu personagem (DAVINI, 2002).
Davini (2002) chama atenção ainda para o conceito de cena-chave, afirmando que
a mesma está vinculada à noção de tempo cênico. De acordo com ela, a cena-chave é
aproximada ou distanciada pelas cenas que moderam as intensidades entre uma e outra
cena-chave, as cenas-ponte. Assim, as cenas-chave constituem-se em material
estruturante do personagem e do texto teatral, e todo o restante, como cenas-pontes
entre as cenas-chave. Ambos os tipos de cena são extremamente importantes, pois é a
dinâmica do trânsito entre elas que delineia parcialmente o tempo cênico.
45
Após a identificação das cenas-chave do texto teatral, é necessário o
reconhecimento dos blocos de sentido que irão definir as mudanças de sentido e/ou
atitudes dos personagens e consequentemente explicitar/mapear os planos acústicos que
irão embasar a criação das falas dos personagens de acordo com as atitudes e
intenções, elementos esses que definem o sentido em cena por meio do jogo de
contrastes entre as dinâmicas, timbres, intensidades e frequências, diretamente
relacionado ao tônus corporal de quem atua e sua gestualidade cinética (DAVINI, 2002).
Dessa forma, cada bloco de sentido orienta os atores na busca das palavras-
chave, essas que por sua vez, norteiam o sentido do texto para que o mesmo possa
capturar o interesse da plateia. Na cena, interessam mais as ideias do que cada palavra
isoladamente. A partir daí, serão reconhecidas como palavras-chave, “grupos de
palavras” ao invés de palavras isoladas (DAVINI, 2002).
Definidas as cenas-chave, blocos de sentido e palavras-chave, a próxima fase do
trabalho é a memorização do texto pelos atores, marcando assim o diferencial desta
proposta de abordagem. Fica claro na proposta que a forma como o texto é trabalhado
pelo intérprete irá interferir ou mesmo definir o resultado na cena, pois possibilita que o
ator ofereça flexibilidade necessária em função da proposta estética.
Na sequência dessa fase, segue-se o momento de flexibilização desse material,
que implica no exercício de técnica vocal associada à cena-chave, memorizada pelos
atores. Deste modo, na fase seguinte, os atores poderão se concentrar exclusivamente
no processo de análise dos blocos de sentido e palavras-chave.
A partir da próxima etapa, definida como Intervenção, constitui-se a dissociação
de instâncias do momento verbal com auxílio de equipamentos de reprodução de som e
de imagem, que ocorre por meio de uma abordagem intensa das cenas-chave que se
inicia quando algumas instâncias da atuação com a palavra, a saber, Microatuação e
atividade fonatória, são dissociadas com o auxílio dos recursos de áudio e vídeo. A
autora denomina de atividade fonatória o total de acontecimentos que o corpo atualiza ao
produzir voz e palavra. Afirma ainda que entre esses, deve-se inicialmente considerar, as
atividades articulatória e respiratória, cuja potente mecânica arrasta uma atividade
gestual e cinética involuntária que interfere nos processos de significação da cena. A
atividade fonatória, somada à atualização de clichês, bloqueia a manifestação de uma
gestualidade sutil e do olhar como articuladores da palavra em cena (DAVINI, 2002).
46
A Microatuação compreende as nuances do olhar, gestos mínimos que não são
diretamente percebidos pela plateia, mas que podem ser definitivos para a eficácia da
cena em suas sutilizas cinéticas e acústicas (Davini, 1998).
Por meio da etapa seguinte, Decomposição, realiza-se a análise dessa referida
dissociação e, por fim, na última etapa, Ensaio e Performance, ocorrem os
procedimentos para a encenação.
No Grupo Vocalidade e Cena, coordenado por Silvia Davini até 2010, os
pesquisadores que juntos a ela dividiram a coordenação de algumas produções
artísticas, imprimiram e continuam imprimindo inovações à referida técnica a partir de
suas experiências.
Portanto, cabe pontuar entre essas arquiteturas alguns diferenciais. Na arquitetura
de Silvia Davini, ela costumava trabalhar com cenas-chave de trechos de textos
clássicos; já na arquitetura de Sulian Vieira, ela sempre faz opção pelos textos modernos,
trabalhados em sua plenitude (completos). No processo de implementação da
Microatuação, aqui descrito, a opção foi feita também por um texto completo e, pela
primeira vez, por um texto dirigido à criança: A Viagem de um Barquinho, de Sylvia
Orthof.
Entre os processos de composição de Sulian Vieira e desta pesquisadora, existe
também uma forma diferenciada relacionada às etapas Zoom e Decomposição. Sulian
Vieira também acrescentou a etapa que denomina de Mapeamento de Cena, que se
realiza logo após a etapa Zoom e que também foi utilizada no processo com A Viagem
de um Barquinho. As diferenças relativas a esse processo de composição poderão ser
melhor visualizadas a partir do detalhamento desse.
As diferenças entre as arquiteturas estão relacionadas ao contexto cultural
(região, cidade, características dos indivíduos participantes) que, naturalmente, impõe
diferentes desafios que precisam ser considerados e encarados.
O primeiro desafio enfrentado nesse processo, durante a etapa Zoom, foi o fato
dos atores só poderem, inicialmente, ter acesso ao texto em sua versão literária. O
processo começou na primeira quinzena de janeiro e só a partir do início de fevereiro o
texto teatral foi localizado através do Centro Brasileiro de Teatro para a Infância e
Juventude – CBTIJ, que, gentilmente, disponibilizou uma cópia do único exemplar desse
texto, que se encontra esgotado há muitos anos.
47
Todavia, mesmo diante da dificuldade de acesso ao texto em sua versão teatral,
tentou-se aproveitar para que através dos estudos sobre os conceitos e diferenças entre
análise literária e análise pragmática os textos fossem confrontados enquanto gêneros.
Segundo Vieira (2013), os conceitos de análise pragmática embasam a técnica de
Microatuação e defendem o foco nos efeitos do texto no palco, de modo que tais efeitos
extrapolem o entendimento do significado e das ideias, mas também objetivem o
resultado da performance. As propostas de exercícios sugeridas por essa autora foram
adaptadas, experimentadas e discutidas para serem cumpridas com e pelo elenco dentro
e extra-carga horária dos encontros de treinamento, como: ler o texto em voz alta;
garimpar no texto palavras, ideias que eles julgassem indispensáveis ao entendimento de
sentidos com foco em uma construção criativa e, portanto, ideias que não pudessem
passar despercebidas.
Os estudos realizados com todo o grupo, foram importantes para fomentar e
defender também o conceito de teatro em sua essência enquanto processo de criação
coletiva. Assim, todo o elenco participou ativamente, indagando, avaliando e sugerindo.
Segundo eles, uma prática não comum nos seus processos fora do âmbito do Grupo da
Quinta.
No entanto, o mais importante nesse momento foi, sem dúvida, saber identificar a
diferença entre a análise do significado e a análise do efeito do texto no palco. A análise
pragmática visa não se prender apenas à análise do significado e das ideias, buscando
também a composição – definir o arranjo do material textual no tempo e no espaço.
Contudo, ficou claro para os atores que esse era o “nó” da questão e por isso não
aconteceu de forma fácil. Os mesmos ficaram inicialmente travados diante dos novos
conceitos sobre memorização, análise e criação de sentido do texto diante de um
processo de composição para cena.
Também foi importante, nessa fase, deixar claro que a Microatuação não deveria
ser abordada de forma singular, mas de forma plural. Davini (2007) traduz como uma
percepção sobre uma qualidade corporal que busca a dimensão sutil da voz, nuances do
olhar, da voz, gestos mínimos que irão definir a qualidade do resultado, geralmente uma
qualidade suprimida quando se utiliza a voz em altas intensidades, por requerer um tipo
de esforço diferente do uso da voz cotidiana, esforço esse que trava o corpo do ator
prejudicando a capacidade de ressonância.
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Após o acesso ao texto em sua versão teatral, deu-se continuidade ao trabalho de
análise pragmática e assim, como estruturado por Davini (2002), um trabalho que se
iniciou identificando as cenas-chave, as cenas-ponte e os blocos de sentido, que
orientam os atores na busca das palavras-chave, que norteiam o sentido do texto por
meio dos grupos de palavras e, assim, conseguem impactar e prender o interesse do
público.
A Microatuação defende que, para a cena, as ideias têm mais valor que as
palavras isoladas, que não formam sentido. Portanto, é fundamental que sejam
reconhecidas essas palavras-chave, ‘grupos de palavras’ ao invés de palavras isoladas.
Em seguida, os atores trabalharam exaustivamente para que as ideias contidas no texto,
nas palavras, fossem não apenas ouvidas, mas, principalmente, percebidas em seus
sentidos, a exemplo de palavras como: livre arbítrio; crescimento; posse; viagem;
liberdade; libertação; mudança; passado; loucura; racionalidade; poder, tempo e outras.
Coube, ainda, uma atenção sobre questões levantadas pelos atores relativas ao
texto, como exemplo: O que faz uma história ser contada por muito tempo (50 anos) e
ainda interessar e conseguir capturar a atenção do público? Por que os seres humanos
se incomodam tanto com as diferenças entre eles? Para o ser humano, existe alguma
coisa mais importante do que a liberdade? Afinal, o que é o tempo?
Ainda nessa etapa Zoom, para a identificação das cenas-chave, pelos atores, foi
preciso que lessem incessantemente o texto A Viagem de um Barquinho, de tal modo
que fossem capazes de entendê-lo de forma poética, de modo a acreditar na
disponibilidade que todos temos de nos abrir para novas experiências da vida, como diz
os personagens Lavadeira: “ir e voltar sem tempo de chegar”, “só gente sem imaginação
é que não pode voltar”, “as nuvens ultimamente andam muito sem responsabilidade”;
“vamos temperar o rio para que o mesmo fique do gosto do Barquinho”, e Sonho do
Barquinho: “como você pode amar uma pessoa e querer que ela seja sua?”; “você vai
cometer a infelicidade de ser feliz para sempre?"
Esse momento de imersão profunda no texto também foi primordial para que os
intérpretes conseguissem analisar os personagens como um todo na conjuntura desse
texto, de forma a facilitar que esses se aproximassem mais da dinâmica do texto criada
pela autora Sylvia Orthof.
A pesquisadora Sulian Vieira vem observando na sua trajetória que a considerada
“tensão entre o texto teatral e a cena” corresponde a valores agregados a ambos a partir
49
do pensamento que promove a associação do texto teatral à dimensão eminentemente
verbal da cena, ignorando o caráter representativo do texto em relação à cena. Pois
apesar dessa cena ter seus aspectos verbais privilegiados, pode ser admitida enquanto
ação sobre os eixos de tempo e espaço. Logo, importa ressaltar que a mesma entende o
texto teatral como forma de representação da cena, com ênfase, contudo, na letra Vieira
(2013).
Com base no texto, os atores foram conduzidos a identificar os blocos de sentido
que, por sua vez, permitiriam-lhes definir as mudanças de sentido e/ou atitudes dos
personagens. Assim, poderiam embasar suas criações de acordo com as atitudes e
intenções em cena por meio do jogo de contrastes entre as dinâmicas, timbres,
intensidades e frequências. Tudo isso relacionado ao tônus corporal e à gestualidade
cinética desses atores. E esse foi um dos diferenciais percebidos de imediato por eles
dentro do processo de treinamento junto à Microatuação.
Tais diferenciais provocaram comparações e depoimentos desses referentes às
suas experiências em processos anteriores de montagens teatrais. Segundo eles, o mais
comum era ocorrer, após uma breve leitura do texto, uma distribuição imediata dos
personagens, seguida de uma marcação de cena no palco.
Na opinião desses atores, na maioria dos processos de montagens que estiveram
envolvidos, o processo de memorização do texto se dava ao longo de todo o processo e
atrelado à escuta da “deixa” – palavra do texto que indicava a inserção da fala do seu
personagem à cena. O ator ficava dependente e vulnerável, caso a deixa não
acontecesse, e provavelmente teria apenas uma chance, a de improvisar.
Em seus depoimentos, os atores explicavam que não era comum existir sequer
uma análise literária do texto nos seus processos de montagem. Ocorria algumas vezes
uma pequena leitura no primeiro contato com o texto. Entendiam que a imersão no texto
dependia exclusivamente do interesse da cada ator em seus processos individuais de
criação.
Os atores afirmaram, ainda, que, além de não existir uma participação coletiva
nesses processos de criação, eles ocorriam apenas durante a fase de marcação de cena
e, geralmente nessa, só participavam o diretor, o ator ou poucos atores envolvidos. Em
síntese, não é comum a participação do elenco em todos os processos. O elenco não é
convocado, estimulado ou conscientizado para a importância dele ter dimensão do texto
50
como um todo e não apenas se restringir a algumas referências desse texto e das cenas
que envolvem seu personagem.
De acordo com os depoimentos desse elenco em questão, tal mecanismo
promove geralmente uma postura viciada e acomodada do ator. Comunga-se, assim,
com a visão de Vieira (2013), quando afirma que muitas vezes o ator lança mão da
substituição de palavras e até de sentenças inteiras do texto original alterando
completamente as ideias do autor.
Em seus depoimentos, os atores mostravam perceber que os procedimentos
vivenciados anteriormente a essa experiência com a Microatuação esbarravam nos
conceitos da análise pragmática do texto. De modo que os impediam entender que a
forma como o texto é trabalhado poderá interferir ou mesmo definir o resultado na cena,
permitindo experimentar possibilidades em função da proposta estética. No entanto,
somente se esse ator entender que o trânsito da letra à palavra na cena (processo de
composição do texto para a cena) é muito mais complexo do que aparenta (ZUMTHOR,
2007).
Nessa fase, procurou-se seguir o recomendado pela técnica, que foi trabalhar em
grupos, duplas, para que fosse treinada a emissão em alta ou média intensidade, de
preferência com foco na própria escuta. À medida que um dos atores lia os trechos que
necessitavam ser memorizados, o outro deveria se concentrar para escutar e repetir.
O texto foi desmembrado em pequenos trechos, de forma que não obedecesse à
pontuação gráfica, indicando a finalização das frases ou pausas. Logo que cada trecho ia
sendo memorizado pela repetição, a ele ia se adicionando o trecho anterior. Foi
recomendado que eles repetissem primeiro os trechos novos e fossem agregando, de um
a um, os trechos anteriores até que se agregasse o primeiro trecho e, finalmente, se
repetisse todo o texto até aquele trecho memorizado mais recentemente. Assim, apostou-
se que os atores pudessem dizer o texto a partir de qualquer ponto fluidamente, sem
interrupções, pois, assim, estariam prontos para ensaiar a cena ou flexibilizá-la.
Para os atores que não puderam oferecer muita disponibilidade de tempo e
disposição para as atividades desenvolvidas em conjunto, ofereceu-se a opção do
registro em áudio do texto teatral para ser memorizado. Para produzir esse registro, foi
orientada uma leitura com poucas variações de frequência, de timbre e mantendo uma
duração média das palavras. Com o registro em áudio finalizado, foram indicadas as
mesmas orientações para a memorização descritas anteriormente. Tal recurso aproximou
51
mais os atores às demandas técnicas e materiais para a cena do que a escrita ou o
contato visual direto com o material impresso, pois a forma de recepção do texto a ser
memorizado iria ser a escuta.
Nessa etapa de ação, em grupo e individual, vários repertórios de exercícios de
técnica vocal foram trabalhados e retrabalhados sempre com a intenção de reforço. Os
mesmos foram abordados de forma associada com as cenas-chave que estavam sendo
memorizadas a partir do texto A Viagem de um Barquinho, visando sua flexibilização, de
modo que pudesse permitir uma melhor apropriação desse.
Tais exercícios buscavam acentuar a linha vocálica ou a articulação consonantal,
associando-as a diversas dinâmicas com timbres, alturas, intensidades e duração.
Exercícios que abordavam, ainda: controle fono-respiratório, tônus muscular, fraseado,
alinhamento corporal, equilíbrio (pisar, andar), projeção vocal, precisão articulatória
(vogais e consoantes), direção do som, extensão da voz, tonalidades e intensidade.
Portanto, alguns exercícios foram experimentados: leitura em grupo do texto, de
modo que, em um momento, todas as consoantes fossem suprimidas do texto e, noutro,
todas as vogais suprimidas; acréscimo de vogais entre cada sílaba da palavra; leitura de
cada palavra do texto lida de trás para frente; leitura ininterrupta em um único fôlego e
iniciando por uma frase, ampliando até chegar ao máximo do que se é capaz de ler sem
respirar, exercícios de leitura labial do texto e outros.
Foram adotados também, de acordo com a visão de Lignelli (2007), estudos e
implementações de uma série de atividades, com os objetivos de explorar a dimensão
acústica da cena; considerar as esferas da dimensão acústica da cena como instâncias
de configuração de sentido; detectar possíveis padrões de movimento implícitos no texto
e; abordar a gestualidade vocal e cinética como ponto de partida para a geração de
sentido em performance.
Segundo a compreensão de Lignelli (2007), nesse contexto, vários conteúdos
foram abordados na referida implementação a partir de exercícios como: os direcionados
para percepção auditiva com foco nos parâmetros do som (altura, intensidade, volume,
tom, andamento, timbre e outros); com foco no espaço e sua direcionalidade; exercícios
práticos e debates sobre os conceitos de tempo e intervalo; sobre paisagem sonora; e
com foco nas esferas da sonoplastia (o desenho do som, todo som concebido para a
cena seja ao vivo ou gravado) e da música.
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Foi nessa fase de estudos e experimentos com o universo acústico com A Viagem
de um Barquinho que surgiu a ideia de criar uma trilha especial para o processo de
composição do texto na cena. A mesma foi elaborada por Matheus Mota, compositor
pernambucano, que sugeriu a proposta: introdução 1 e introdução 2; música para a
Lavadeira; Sol1; Sol Dedo-Duro; Sol2; Vitrolinha; Matilde reclamando; Cavaleiros;
Marcha; Rap do Sapo; Cantiga do Sonho; Tempero; Sol 3 e Final.
Matheus Mota apresentou ao elenco uma proposta justificando que defendia um
viés de criação menos padronizado, sem harmonias e elementos facilitados, tais como as
músicas de roda. Propôs um mergulho no lúdico, fortificado com melodias ora acessíveis
ora também desafiadoras. Defendeu uma escrita sobre os trechos originais do texto, de
forma que as crianças fossem convidadas de forma natural a emergir em desafios
questionadores que o próprio texto impõe. Desse modo, foi unânime o entendimento da
necessidade de composição de músicas direcionadas para a construção dos
personagens e ambientação das cenas.
Interessa-nos ressaltar que as dificuldades ou resistências dos atores neste
processo de memorização e flexibilização não foram facilmente superadas. De modo
geral, alguns não conseguiram observar que poderiam ter adquirido grande agilidade
neste processo de memorização, uma vez que deveriam ter trabalhado com foco nas
demandas técnicas da cena, evitando previsíveis problemas nos processos de ensaio.
Se a cena-chave estivesse memorizada e flexibilizada iniciaria-se o exercício de
atualização dos blocos de sentido e das palavras-chave previamente definidos. Os atores
seriam orientados a obter um esboço aproximado do que seria desenvolvido na cena,
levando-os a alcançar considerável atenção às diferentes atitudes e intenções que
pontuariam a intensidade de cada bloco de sentido. Quanto mais fossem definidas as
atitudes e intenções de cada bloco de sentido, mais seriam percebidos os contrastes
entre um bloco e outro em diferentes planos acústicos, como também na gestualidade
cinética, sobretudo no olhar.
A Microatuação também sugere que, paralelamente, os atores apoiem-se nas
palavras-chave definidas, direcionando a elas o impulso vocal e definindo a duração das
falas que desenham acusticamente no espaço cênico entre uma palavra-chave e outra de
acordo com a atitude e intenção. Assim, define-se o gesto vocal como o ‘modo’ de fluir
entre uma palavra-chave e outra, que, em simultaneidade absoluta com a gestualidade
cinética, produzem a gestualidade da cena.
53
Nesta fase de flexibilização, viu-se que ainda era necessário reforçar o trabalho
com as palavras do texto por meio da realização de exercícios que acentuassem a
articulação de vogais e consoantes, associando-as a diversas dinâmicas em que
parâmetros de timbre, altura, intensidade e duração fossem experimentados. Dessa
forma, as linhas vocálicas e articulações consonantais de cada cena-chave precisavam
tornar-se familiares aos corpos dos atores e, na medida em que concluíam esta fase, não
era preciso mais dividir suas atenções no esforço de se lembrarem das palavras, pois
elas eram evocadas na memória corporal com grande facilidade.
Como visto, Davini (2002) defende ainda na etapa Zoom, relativa à fase de
memorização, que não se deve hierarquizar ideias e significados, que no processo de
memorização do texto não devem manter contato direto com o texto teatral impresso ou
que tentem memorizá-lo silenciosamente ou escrevendo-o repetidamente. A autora
propõe ainda que os atores memorizem o texto de modo que sejam estimulados a
estarem ativos, ou seja, de pé, sentados ou em deslocamento, e que disponham de
alguma intensidade vocal nesse processo. Sugere que evitem realizar esse processo
deitados, em estado de repouso, com o tônus corporal muito baixo ou dizendo o texto
sem produzir som.
No entanto, a prática junto ao processo com A Viagem de um Barquinho enfrentou
aqui, nessa etapa de memorização, o seu segundo desafio. Isso porque se tentou seguir
todas as orientações sugeridas para essa etapa, e o resultado, especialmente com os
atores mais veteranos, não acontecia. A resistência desses atores era notável,
apresentavam uma dificuldade enorme. Observou-se que eles ficavam divididos entre
adotar as formas preexistentes e as novas orientações para o trabalho de memorização
do texto. De fato, foram eles que, na etapa seguinte de mapeamento de cena, também
ofereceram maior dificuldade de se desprender da análise literária, do significado e das
ideias do texto, pois não conseguiam equilibrar entendimento do significado do texto e
das ideias do texto e focar nos efeitos do texto na cena, ou seja, trabalhar o material
textual no tempo e no espaço.
No elenco, os atores iniciantes e os cantores líricos conseguiam avançar um
pouco mais, devido a uma menor resistência. No entanto, vale lembrar que não foi
possível trabalhar a fase de memorização como primeira atividade realizada junto ao
texto, antes mesmo de qualquer contato do ator com sua análise, conforme orienta a
técnica implementada. A orientação indica que o texto deve ser memorizado a partir das
palavras isoladas, destituídas do sentido das mesmas. Isso faz bastante sentido, uma vez
54
que as ideias do texto é que levam o ator a optar pela substituição das palavras por seus
sinônimos ou pela ideia mais próxima, quando essas não estão memorizadas.
Portanto, isso que ocorreu afetou todo o elenco nesse processo junto ao texto A
Viagem de um Barquinho. Isto é, quando os atores iniciaram o processo de memorização
do texto e do mapeamento de cena, as ideias desse estavam bastante interiorizadas
devido ao fato citado anteriormente. A dificuldade de acesso ao texto em sua versão
teatral, o acesso primeiro a sua versão literária mais, e especialmente, o estudo de
análise antes do processo de memorização, consequentemente, levaram à necessidade
de revisão do referido processo por diversas vezes no percurso da implementação da
Microatuação.
Por isso, na tentativa de minimizar tais dificuldades enfrentadas, especialmente
pelos atores mais experientes, que mostravam nitidamente uma sensação de desânimo,
optou-se por experimentar iniciar a 2ª etapa Mapeamento de Cenas, considerando- se
que o processo de implementação precisava avançar.
Seria impossível desconsiderar o alto grau de dificuldade enfrentado pelo elenco
na etapa Zoom (memorização e flexibilização do texto). No entanto, coube também
ponderar que essa tentativa de passagem, mesmo que prematura, dessa para a etapa
seguinte, Mapeamento de Cenas, serviu como estratégia para reanimar o elenco,
diminuir a ansiedade sem deixar de discutir e conscientizá-los da importância do
treinamento da etapa anterior para o processo dessa nova etapa.
Desse modo, os atores foram requisitados para tentar responder parte da
pergunta “o que precisa acontecer nessa cena em relação à percepção da plateia?"
Assim, considerar o público dentro de um processo de composição de cena é, no mínimo,
considerá-lo como parte da tríade (texto, ator, público) que apoia o teatro enquanto
fenômeno. Daí se define, a partir da experimentação, as atitudes referentes aos blocos
de sentido do texto (definido neste estudo) (VIEIRA, 2013).
De acordo com a visão de Vieira (2013), para se entender o conceito de
Mapeamento de Cenas, é fundamental a compreensão do esquema que define os pilares
da Microatuação. Tal esquema inclui uma dinâmica que parte diretamente do desejo de
fala contido na construção de sentido do texto literário (da letra). Em síntese, a partir da
análise pragmática do texto literário, chega se à composição da palavra em cena. Essa
depende do impulso respiratório que, por sua vez, estimula o gesto.
55
Com base no que vem sendo discutido ao longo deste estudo sobre a
implementação da Microatuação no treinamento de atores, entende-se que o que Davini
(2007) costuma definir por atuar, representar no palco de forma falsa ou verdadeira, deve
ser revisto, entendido e redefinido como estar ou não presente em cena.
Todavia, durante a etapa de Mapeamento de Cena, ocorreu também um
descompasso devido ao desnivelamento natural decorrente da heterogeneidade do
elenco. Os atores com formação e com maior experiência, embora apresentassem mais
intimidade com o palco, apresentaram maior nível de dificuldade nas etapas como um
todo e, em especial, na etapa Zoom – memorização e flexibilização do texto. Os iniciantes
sempre respondiam melhor, apresentavam menos resistência, racionalizavam menos e
se mostravam muito mais disponíveis.
Embora nas situações de dificuldades de realização do que era solicitado durante
as etapas dos procedimentos com a Microatuação (que exigiram alguns retornos às
etapas anteriores), além das resistências às mudanças relacionadas aos antigos
procedimentos, os atores conseguiam superar e expressar interesse, estímulo pelos
novos conhecimentos. A necessidade de um tempo maior para a superação das
dificuldades, embora gerasse muita ansiedade, promovia também uma maior carga de
ânimo e autoconfiança, indispensáveis para uma imersão.
A partir disso, muitas ações foram criadas com a intenção de ampliar a carga
horária normal prevista no cronograma de encontros desse processo de implementação
da Microatuação, mas também comprovar um diferencial dos procedimentos adotados
por Silvia Davini e Sulian Vieira em suas práticas com a referida técnica.
Entre as referidas ações se inclui um vasto repertório de exercícios direcionados
à flexibilização do texto, que foram experimentados e encaminhados para serem
executados e incluídos na rotina diária de estudos de cada ator, objetivando contemplar
necessidades básicas e urgentes para o seguimento do trabalho.
Nesse repertório foram incluídos exercícios para: a) expansão longitudinal e
transversal das cavidades por onde circulam o ar, dando lugar a sua circulação e
garantindo o aumento da pressão de ar subglótica; b) adequação do tônus do corpo à
demanda de produção de voz em altas intensidades; c) desenvolvimento do trabalho de
apoio, sustentação e extensão; d) exercícios de variação da duração; e) variação da
frequência; f) variação da intensidade; g) variação do timbre (Anexo 6).
56
Foi solicitado, ainda, dos atores nessas rotinas diárias ouvir, o máximo possível,
as gravações em áudio de suas falas e da leitura completa do texto realizada pelo elenco,
e assim, criar uma intimidade com as falas de todas os personagens e com a ideia do
todo, de preferência buscando fazer relações dialéticas.
Se na etapa anterior (2ª etapa – Mapeamento de Cena) ficou clara a necessidade
de um retorno do elenco ao processo de memorização, nessa 3ª etapa – Intervenção,
dissociação de instâncias do momento verbal com auxílio de equipamentos de
reprodução de som e de imagem, os atores também não foram capazes de retornar
completamente à cena os textos previamente gravados por eles, que seriam
reproduzidos em áudio. Assim, a presença da Microatuação, que deveria se potencializar
de forma a conseguir atuar sem produzir som, permitindo evidenciar aquelas sutilezas da
atuação, foi frustrada para o elenco pelas dificuldades, igualmente, não superadas na
etapa anterior.
Com a intenção de testar melhor tais retornos, optou-se por acrescentar, ao que é
sugerido pela Microatuação, exercícios que denunciassem mais ainda essas dificuldades.
Por exemplo, foram trabalhados, a partir do texto, diálogos entre dois atores, em que um
dos interlocutores apenas ouvia e acompanhava a fala da outra personagem e, na hora
da sua fala (sua resposta), apenas realizava em pensamento, expressando as ideias,
sentimentos, porém sem emitir sons. Isso exigia que o ator tivesse memorizado todo o
diálogo, não apenas as falas de sua personagem, inclusive porque a outra precisava
dessa interlocução.
Nessa etapa, de acordo com o que sugere a Microatuação, foi necessário chamar
a atenção do elenco, que precisou se concentrar exclusivamente na atualização dos
blocos de sentido e palavras-chave, como dito, o que define as mudanças de sentido e/ou
atitudes dos personagens, explicitando/mapeando os planos acústicos na criação das
falas dos personagens de acordo com as atitudes e intenções. Logo, quanto mais
definidas as atitudes e intenções de cada bloco de sentido, mais poderiam ser percebidos
os contrastes entre um bloco de sentido e outro em diferentes planos acústicos –
parâmetros sonoros (produção e reprodução do som), como também na gestualidade
cinética, sobretudo no olhar.
Contudo, entendeu-se que seria estratégico retornar mais uma vez ao processo
de memorização da 1ª etapa – Zoom – devido a dois dos atores, os que possuíam maior
texto, por serem os personagens principais, e apresentarem maiores dificuldades nesse
momento dos trabalhos.
57
Os personagens principais (a Lavadeira e o Menino) eram representados por uma
atriz veterana e um ator iniciante que vinha respondendo muito bem até meados do
processo. Contudo, devido à imaturidade e inexperiência, acabou reduzindo seu
rendimento diante das dificuldades apresentadas pela atriz, que mostrou tais problemas
desde o início dos treinamentos. O ator iniciante não conseguia avançar e, diante das
dificuldades de contracenar, passou a assumir ambos os papéis, em uma tentativa de
feedback.
Desse modo, após o retorno ao processo de memorização e flexibilização do
texto teatral, tentou-se novamente vivenciar a 2ª etapa – Intervenção – e seguir as
orientações da Microatuação, ou seja, priorizar a ação de dizer em cena.
Assim, foi necessário reforçar o que vinha sendo discutido com o elenco desde o
início do processo: os conceitos básicos que defendem a diferença de materialidades
existente entre a letra e a palavra. Ou seja, entender que existe texto que se destina ao
consumo visual (em princípio solitário e silencioso pela leitura) e texto que se apresenta
como um objeto (folha de papel, livro) além de outros que se destinam à audição e,
portanto, que se destinam à percepção de efeitos sonoros por estarem, assim, mais
abertos ao consumo coletivo, isto é, aqueles que se apresentam como uma ação vocal
(ZUMTHOR, 2007).
Desta forma, foi possível seguir para a etapa seguinte: a 4ª etapa –
Decomposição, constituída por uma análise da dissociação de instâncias de momentos
verbais do texto registrados em vídeo. Essa etapa foi realizada com auxílio de
equipamentos de reprodução de som e de imagem. Tal processo representou o momento
mais impactante do processo individual de cada ator. Representou, ao mesmo tempo, um
grande desafio e em seguida uma injeção de ânimo, aumentando, e muito, o estímulo do
elenco. Os mesmos expressavam um grande interesse durante essa etapa,
independentemente da presença ou não dos outros membros do elenco. Seus sentidos
foram aguçados.
Nessa fase, o foco dos atores foi retomado. Foram capazes, conforme citado
anteriormente, de retornar à cena os textos, previamente gravados por esses intérpretes,
de modo a serem reproduzidos em áudio. Assim puderam atuar mais uma vez a mesma
cena, no entanto, sem produzir voz ou palavra. A orientação exigia que seus gestos
fossem reservados ao absolutamente necessário, de forma que a gestualidade cinética, o
olhar ou qualquer resposta muscular atualizada (sentido de atuação) fossem aquelas
inevitáveis. Finalmente, a técnica de Microatuação pôde ser efetivada e, assim, os atores
58
conseguiram atuar e, mesmo sem produzir som, permitiram que fossem evidenciadas as
sutilezas da atuação, que havia sido frustrada pelas dificuldades não superadas na fase
de memorização.
Cabe lembrar que a 5ª e última etapa se constituiu dos Ensaios e Performances
das cenas propriamente ditas. Importa observar que nos procedimentos de ensaio
buscou-se, como sugere Davini (2002), constituir um ‘caminho de mão dupla’, entre as
demandas estéticas e as possibilidades técnicas dos atores.
No entanto, é de fundamental importância concluir, a partir dessa experiência,
que, como diz Davini (2002), na fase de ensaios é necessário continuar privilegiando a
situação de performance, tendo como referência a experiência e a análise de todas as
etapas anteriores. Na prática, isso não foi nada fácil para os atores e exigiu muita labuta
e, principalmente, disponibilidade afetiva, desejo.
Ao final do processo, o gratificante foi a possibilidade de se constatar que alguns
atores do elenco, que antes se posicionavam, muitas vezes, de forma arredia,
questionadora e criticamente exacerbada, sem muita credibilidade, devido principalmente
as suas inseguranças, mostraram-se mais seguros, mais conscientes do que foi
vivenciado, continuando críticos, porém mais disponíveis e cooperativos.
Durante essa etapa do processo de montagem alguns profissionais foram
inseridos, como: uma produtora cultural; um compositor; dois professores da UFPE,
responsáveis pelas disciplinas das áreas visuais do espetáculo (figurino, maquiagem,
cenário e iluminação); e uma designer, para tecerem coletivamente um projeto de
montagem teatral do texto A Viagem de um Barquinho. O projeto foi submetido a uma lei
de incentivo cultural FUNCULTURA, da Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de
Pernambuco – FUNDARPE, e aprovado, para ser oferecido gratuitamente ao público em
2016 (Anexo 12).
Para a apresentação final do processo de implementação da Microatuação – o
espetáculo teatral – o elenco teve que, com recursos próprios, muita disposição e
criatividade, produzir todos os elementos visuais, mesmo que o acesso ao espaço cênico
tenha sido bastante limitado no que diz respeito à pauta para ensaios, principalmente
ensaios técnicos para montagens de luz, cenário, ensaios para teste com figurino,
maquiagem e iluminação.
Diante do fato, o elenco expressava em seu discurso uma consciência de que
todas as tarefas importantes e planejadas deveriam ser realizadas e que os elementos
59
visuais seriam importantes para somar, uma vez que os mesmos fizeram parte dos
processos de criação de cada ator. Dispensá-los justamente no momento de
concretização (apresentação ao público escolhido) certamente causaria bastante impacto
em seus corpos e consequentemente iria afetar negativamente os resultados de suas
performances.
Para eles, a criação dos elementos visuais aliada ao trabalho com a Microatuação
reforçaram os conceitos de abordagem pragmática que os embasaram em todo o
processo de criação de sentido do texto trabalhado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A experiência descrita neste estudo tem por base a arquitetura projetada por Silvia
Davini para a técnica de Microatuação, que, segundo conclusão dessa pesquisa, não
deve ser abordada de forma singular, mas de forma plural.
Além disso, o contexto sociocultural que envolveu essa nova experiência descrita
neste estudo acabou por propiciar o urdimento de uma outra versão, que implicou
também em alterações das etapas que constituem a técnica abordada.
A arquitetura original sistematizada por Silvia Davini (2002) era trabalhada por
meio de cenas-chave ou trechos de textos clássicos. A versão de Sulian Vieira utiliza-se
de textos modernos trabalhados em sua plenitude, e o processo de composição aqui
implementado e descrito fez opção por um texto em sua íntegra e, pela primeira vez,
dirigido à criança: A Viagem de um Barquinho, de Sylvia Orthof.
Conclui-se ainda que, sem dúvida, um dos maiores desafios do elenco e
especialmente dos atores mais experientes, com formação em teatro e evolvidos nesse
experimento, foi o confronto e resistência a novos procedimentos em especial o relativo
ao processo de memorização do texto.
Coube nesse estudo, discutir quando Davini (2002) afirma que, nessa etapa, é
fundamental, inicialmente, não se hierarquizar ideias e significados, nem manter contato
direto com o texto teatral impresso. No entanto, tal questão não foi de fácil compreensão
pelo o elenco. Segundo os atores, dominar as ideias e construções do sentido do texto, já
significava um grande desafio e avanço, considerando que a maioria das práticas das
produções no Recife revela que esse domínio do texto, embasado na análise pragmática,
não é usual.
60
Para esses atores, o domínio do texto nessa perspectiva da Microatuação permite
que, mais facilmente, o ator tenha capacidade de improvisar de forma consciente,
substituindo palavras do texto por sinônimos, quando essas não lhes vêm à memória. No
entanto, o que de fato defende a Microatuação é a conscientização e domínio do texto
tanto de suas ideias e palavras mas, principalmente, de sua forma pragmática, ou seja,
como é construída, posta na cena, no palco, não apenas como é dita, mesmo que seja
destituída da criação de sentido.
Contudo, levando em conta que no experimento com a Microatuação ocorreram
inúmeras necessidades de retorno ao processo de memorização, pode-se constatar que
os atores, em sua maioria, não tiveram facilidade para perceber e realizar toda a
dimensão do que se estava acrescentando a partir da técnica de treinamento –
Microatuação. Logo, surgiu a questão que não pôde ser testada e respondida: não teria
sido mais eficaz se antes de ler e analisar o texto, tivesse sido iniciado o treinamento dos
atores com os exercícios de memorização tal como sugere a técnica aplicada?
Considerando que o objetivo desse estudo era descrever o passo a passo da
implementação da técnica de Microatuação no processo de composição da cena do texto
teatral A Viagem de um Barquinho, pode-se afirmar que o mesmo foi contemplado.
Embora, muitos desafios o elenco teve que enfrentar ao longo de todo o processo
de implementação, e esses mostraram-se complicadores, sobretudo no momento final,
hora de oferecer o espetáculo para o público. Surgem, aí, os limites técnicos do próprio
teatro (parcos recursos de luz e de som), além de uma série de dificuldades com o
número reduzido de ensaios de ajustes técnicos, essenciais para a realização de um
trabalho de qualidade.
Dentre as dificuldades, destaca-se uma das mais importantes, relacionada às
rotinas desses sujeitos enquanto indivíduos sociais, a de locomoção, uma vez que
apenas dois atores possuíam transporte particular e os quatro restantes moravam em
bairros distantes, de difícil acesso, dependendo de transporte coletivo. Ademais, no
semestre em que ocorreu a pesquisa de dados, a cidade do Recife enfrentou um dos
maiores índices de paralisações de advertência e de greves no setor dos transportes
públicos.
Sem dúvida, muitas questões aqui avaliadas interferiram negativamente nos
desempenhos desses atores em cena. No entanto, seus discursos expressavam
constantemente a consciência da importância do cumprimento de todas as tarefas
61
importantes e planejadas. E assim, o elenco mostrou estímulo, disposição, criatividade e
coragem para se lançar em uma nova experiência metodológica e que ainda se
disponibilizou para produzir todos os elementos visuais referentes ao trabalho final,
resultado do processo com a Microatuação – o espetáculo que foi submetido e avaliado
por um público-alvo de crianças.
Desse modo, os resultados obtidos a partir das expectativas dos atores, sinalizam
que o sentimento de responsabilidade e de compromisso com o trabalho desenvolvido
conseguiu superar as adversidades enfrentadas.
62
Implementação da técnica de Microatuação: análise a partir da opinião dos atores
envolvidos e da receptividade de crianças.
INTRODUÇÃO
Nesse estudo, ao longo desta pesquisa, buscou-se discorrer sobre a produção de
voz e palavra, ou seja, sobre a vocalidade e a criação de sentido com base no texto
teatral, mas dentro de um cenário específico, que é a cidade do Recife; num tempo bem
definido, que é a atualidade; num ambiente particularizador, que é o teatro para criança.
Este conjunto de conceitos apurou o foco com determinação sobre o objeto do estudo e,
na mesma medida, transcendeu-o e o integrou a um contexto mais amplo.
Tal objeto foi a "implementação da técnica de Microatuação" numa circunstância
específica: a montagem do espetáculo A Viagem de um Barquinho.
Ao centralizar a pesquisa sobre o processo criativo, de composição na cena (visto
a partir da maneira como se lida com a questão da vocalidade) do ator na elaboração do
espetáculo para crianças na cidade do Recife, desejou-se iluminar problemas que afetam
a cena e também profissionais de teatro em todo o país, independentemente de ser a
produção destinada ao público de criança, juvenil ou adulto.
Quando se examinou o objeto a partir do exame à bibliográfica circulante
(resultado da sistematização e publicação dessas produções), revelou-se o todo,
chegando-se ao âmago da questão, que é a real necessidade de técnicas de corpo/voz
para o ator desenvolver com alguma possibilidade de êxito o seu trabalho estético. Aliás,
antes da importância de técnicas, é fundamental a discussão, o debate. Nesse sentido,
vale ressaltar o que defende Sebastião Milaré no prefácio de Martins (2004):
Talvez o que esteja errado, em face disso, é o modo como se encara o aprendizado do teatro em nosso país, a pouca importância que é dada à técnica, ao estudo continuado e sempre aprofundado da natureza da arte, à disciplina do corpo e do espírito. Parece, na verdade, que quanto mais se fala em "pesquisa", mais se cristalizam estereótipos e os meios estereotipados, que se apoiam em técnicas primitivas ou em arremedos de técnica. (MARTINS, 2004, p. 10)
Ao se debruçar sobre a produção de teatro destinado à criança na cidade do
Recife, desvela-se uma realidade mais ampla do teatro nacional: o teatro para criança
63
urdido, assim, pode vir a representar um desserviço, afastando o público potencial do
futuro. A obra de boa qualidade estética destinada à criança não é comum, a despeito da
imensa quantidade de produções que se realizam em toda parte.
No entanto, o crescimento dos programas de pós-graduação nas universidades
brasileiras, nas duas últimas décadas, vem resultando em pesquisas de aspectos
específicos da arte, das tendências e dos movimentos artísticos, que certamente
contribuem para novos saltos qualitativos do teatro no Brasil. Este estudo pretende
colaborar e ser mais um bom exemplo disso. Embora focado na realidade do teatro
recifense, ele abre perspectivas para o entendimento do próprio teatro brasileiro. Poderá
prestar contribuição para a reflexão sobre a matéria e a busca de novos caminhos para a
prática da arte dramática em nosso país.
Nos resultados desta pesquisa vale ainda defender a importância da existência,
em rede, de sites nacionais pertencentes a centros voltados para essa temática. Entre
esses, estão dois de referência: o do Centro de Pesquisa e Estudos do Teatro Infantil –
CEPETIN (CEPETIN, 2015), e o do Centro Brasileiro de Teatro para a Infância e
Juventude – CBTIJ (CBTIJ, 2015), criados por profissionais da área de teatro para
crianças.
Nessa perspectiva, confere-se que, desde a década de 90, tais centros vêm
buscando promover a socialização deste debate, envolvendo pais e professores, a classe
artística e todos os segmentos envolvidos no processo, a começar da criação até a
difusão do espetáculo teatral para crianças, a formação de plateia, capacitação de
professores, publicações, discussão e aperfeiçoamento da dramaturgia do teatro para
criança, difusão de textos e espetáculos. Contudo, entre as reflexões voltadas para o
teatro enquanto linguagem artística é praticamente inexistente uma bibliografia sobre
teatro dirigido à criança que aborde a voz e a palavra, ou seja, a vocalidade.
Do material circulante voltado para o teatro dirigido para criança que alimenta os
referidos sites, a maioria é fruto de festivais e seminários, a exemplo do I Seminário de
Teatro Infantil de Blumenau, que vem sendo realizado desde 1975, em Santa Catarina.
No entanto, como exposto, essa produção possui maior foco no teatro-educação,
enquanto que apenas alguns poucos teóricos da área, abordam o teatro como linguagem
artística. Dentre esses, nenhum material que aborde vocalidade na cena do teatro para
criança foi encontrado. Sobressaem-se publicações como as da dramaturga e ensaísta
Maria Helena Kühner, que, em suas obras, costuma, a exemplo de A coragem de fazer
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teatro infantil (KÜHNER, 1975), fazer uma síntese de suas conclusões e sugestões
relativas aos textos teatrais, aos processos de montagens e em relação à infraestrutura.
A autora também promove a discussão sobre para que criança falamos, levando em
conta a relação criança-mundo atual. Uma realidade que, segundo ela, confronta-nos
com seus desafios. Assim posto, questiona ela, o que o teatro feito para a criança e a
juventude pode aí representar? Outros autores podem ser citados, como Ortiz (2006),
que, em seu artigo A função do teatro na vida da criança, destaca o teatro como
ferramenta importante na educação; Duncan (1999), atriz e arte-educadora, diretora e
produtora, que escreve sobre a preparação do ator e no seu artigo A preparação do ator:
uma frase esquecida dentro do teatro infantil? expõe sua preocupação sobre a
necessidade de uma maior disciplina no preparo do ator, para que, assim, evite-se que o
público do teatro migre para o cinema e outras linguagens; e o pesquisador e jornalista
Ferraz (2015), que realiza a publicação mais recente, partindo do registro fotográfico e
ficha técnica da produção de teatro para criança nos períodos de 2000 a 2010.
Portanto, a partir dessa compreensão, entende-se que existe, de fato, uma
demanda, uma necessidade de ampliação do debate sobre a produção voltada para a
criança, de preferência que promova também a reflexão sobre voz, palavra e vocalidade.
Assim, com base no exposto, ter-se-á relatada, aqui, a análise e a avaliação do
processo de implementação da técnica de Microatuação que resultou no espetáculo A
Viagem de um Barquinho, de Sylvia Orthof, dirigido à criança.
Para tal análise, questionários foram elaborados a partir das variáveis texto
escolhido, performance dos atores e recepção pelo público de crianças, com foco
em dois grupos de juízes: primeiramente, os atores que participaram da montagem; em
seguida, um público de crianças, avaliado após assistirem ao espetáculo.
Dessa forma, o objetivo deste estudo é analisar o processo e o resultado final de
uma proposta de implementação da técnica de Microatuação, a partir da opinião dos
atores envolvidos e da receptividade de crianças.
MÉTODO
Após a aprovação da proposta pelo Comitê de Ética da PUC-SP, sob o número
CAEE 783980, foram definidas duas fases para avaliação da proposta apresentada no
Estudo 2, a saber, a Fase 1, que contou com os atores participantes da montagem, e a
Fase 2, com crianças que assistiram ao espetáculo.
65
Fase 1
Os seis atores que participaram da montagem do espetáculo, na qual se utilizou a
técnica de Microatuação, foram submetidos a um questionário, denominado Q1 (Anexo
7), elaborado com a intenção de identificar suas expectativas em relação à recepção do
público e aplicado antes da primeira apresentação do espetáculo.
Um segundo questionário, denominado Q2 (Anexo 8) foi aplicado aos atores após
a apresentação do espetáculo, ao final do processo, com algumas alterações quando
comparado ao Q1, uma vez que deixou de lado a expectativa para analisar a percepção
dos atores ao final da implementação.
A caracterização dos atores e respectivos personagens encontram-se no Quadro
1.
Quadro 1: Caracterização dos Atores quanto a sexo, idade, formação e personagens
representados.
As perguntas apresentadas no questionário Q1 foram: 1. O que o texto A Viagem
de um Barquinho pode gerar no público?; 2. O que o seu trabalho de ator,
desenvolvido com base na Microatuação, pode gerar no público? e; 3. O que a Microatuação pode gerar no público?.
66
No Q2 foram: 1. O que o texto A Viagem de um Barquinho gerou no público?;
2. O que o seu trabalho de ator, desenvolvido com base na Microatuação, gerou no público? e; 3. O que a Microatuação gerou no público?.
Os resultados foram tabulados e apresentados de forma descritiva considerando
cada sujeito (ator) e cada momento (pré e pós-apresentação do espetáculo).
Fase 2
Fizeram parte desta etapa, 50 crianças entre 10 e 12 anos, que assistiram ao
espetáculo e responderam, por meio de questionário denominado Q3 (Anexo 9), as 33
questões de múltipla escolha, as quais abordavam as características gerais da
encenação, cenografia, iluminação, objetos de cena, adereços, figurinos, maquiagens e
performance dos atores. Cabe destacar que, conforme exposto anteriormente, alguns
fatores observados no resultado obtido junto aos atores antes da apresentação do
espetáculo foram fundamentais para a construção do instrumento de avaliação da
recepção do espetáculo pelo público–alvo (crianças). Dentre esses fatores, é importante
destacar as expectativas criadas por eles, relativas às variáveis: compreensão e
identificação do texto teatral selecionado; o nível de domínio e de consciência da
realização de suas performances; o entendimento do conceito e posicionamentos críticos
sobre as mudanças; e evoluções e consciência dos ganhos a partir do treinamento com a
técnica de Microatuação. Do total de perguntas, de forma similar (33,3%), foram
contempladas questões referentes à encenação (espetáculo), voz (performance dos
atores) e história (texto). O questionário foi distribuído após a apresentação do
espetáculo às crianças-público e as instruções de como respondê-lo foram fornecidas de
forma objetiva nesse momento.
Os dados foram tabulados e analisados de forma descritiva. Em especial, no caso de
algumas crianças, inadvertidamente foi assinalado mais de um item por questão, o que
não era o proposto. Para não eliminar o questionário inteiro, foi feita uma reclassificação
dentre as respostas fornecidas para aquela questão, visto que todas deveriam ter apenas
uma resposta (amostra de 50 respostas por questões igualitariamente), usando-se o
critério da pior resposta dentre aquelas dadas como sendo a resposta considerada e
aceita. Esse fato ocorreu em cerca de 10% dos questionários, sendo assim, a
reclassificação foi considerada não impactante em termos de validade estatística do
universo avaliado.
67
RESULTADOS
Fase 1
Os dados da Fase 1 encontram-se apresentados no Quadro 2.
Quadro 2: Resultado do questionário submetido aos atores antes da segunda apresentação do
espetáculo A Viagem de um Barquinho.,
Nas expectativas da A1 e A3, formados em teatro e mais experientes em
produções dirigidas à criança, o texto não iria agradar a faixa etária do público-alvo,
opinião contrária quando comparada às expectativas dos demais, sem formação em
teatro e menos experientes em produções teatrais. Esses alegaram que o texto iria
agradar a faixa etária do público-alvo por ser inteligente e divertido. Pôde ser observado,
ao longo do processo, que as posturas e colocações dos atores sofriam interferências
dos níveis de experiências desses.
68
Os atores com formação em teatro se colocavam com mais desenvoltura em
questões relativas a: análise literária do texto (a análise pragmática foi também para eles
o grande diferencial no processo); intimidade com a cena (movimentação, marcação de
cena, diálogo e lida com os elementos visuais da cena); facilidade de improviso; criação;
manejo vocal e; projeção da voz. No entanto, carregavam vícios e convicções que
atrapalhavam muito a experiência com base em novos paradigmas. Muito mais
resistência aos novos experimentos quando comparados ao restante do elenco menos
experiente.
Na questão O que o seu trabalho de ator, desenvolvido com base na
Microatuação, gerou no público?, quanto às expectativas dos atores com formação em
teatro, a A1 acredita que o processo de criação a partir da Microatuação irá resultar em
uma excelente performance e o A3 afirma que não gostaria mais de deixar de trabalhar
dentro dos conceitos da Microatuação, pois a técnica, com certeza, marcou um grande
diferencial na sua formação.
Quanto aos dois atores iniciantes e aspirantes ao curso superior de teatro, A2
afirma que se sente privilegiado com a oportunidade e entende que o resultado final do
processo será muito satisfatório. A6, apesar de ter tido apenas um pouco de experiência
com vídeo, entende que a chance foi muito importante, sente que cresceu bastante com
a oportunidade de experimentar e defende que o resultado será o melhor que realizou.
Na opinião dos cantores líricos com pouca experiência em teatro, A4 afirma que, sem
dúvida, é sua primeira grande experiência de crescimento como cantor e ator, e A5
acredita que o resultado será bem aceito, pois se sente modificado enquanto intérprete e
mais seguro das suas aptidões.
Desse modo, fica claro que, embora o elenco tenha sido heterogêneo, o
experimento com a técnica de Microatuação impactou a todos, ao ponto de estimulá-los a
continuar trabalhando e aprofundando cada vez mais suas pesquisas com base nos
diferentes modos de inovações voltadas para a vocalidade teatral.
Referente à questão O que a Microatuação gerou no público?, o elenco foi
unânime em afirmar que o bom resultado desse procedimento (o espetáculo teatral) é
que irá ser percebido pelo público e não o processo de implementação da técnica de
Microatuação em si. Considerando a unanimidade das afirmativas do elenco, fica
evidente suas expectativas quanto ao resultado final do processo, o que vem também
justificar suas angústias diante das dificuldades enfrentadas por eles no período final do
69
processo, referente ao espaço da encenação, por ocasião dos ensaios gerais para
ajustes técnicos do espetáculo.
O Quadro 3 apresenta os dados referentes ao segundo momento, ou seja, a
opinião dos atores após a segunda apresentação do espetáculo.
Quadro 3: Resultado do questionário submetido aos atores após as duas apresentações de A
Viagem de um Barquinho.
Diante da questão O que o texto A Viagem de um Barquinho gerou no
público?, para todos o texto foi bem recebido, bem compreendido, agradou e prendeu a
atenção do público-alvo (10 a 12 anos) e ainda os adultos que os acompanhavam.
Para a questão: O que o seu trabalho de ator, desenvolvido com base na
Microatuação, gerou no público?, A1 e A3, formados em teatro e mais experientes com
teatro dirigido à criança, afirmaram que a experiência com a Microatuação foi positiva,
uma grande oportunidade de formação e excelente chance de afirmação profissional
diante do público. A2 e A6, não formados e menos experientes consideraram suas
atuações como missão cumprida devido, segundo eles, a uma grande oportunidade de
formação para qualquer ator. A6 entendeu que foi uma grande oportunidade não apenas
de formação de atriz, assim como A4, que considerou o processo vivenciado como uma
70
grande contribuição que marcou uma diferença para a sua performance. A5 considerou
como uma oportunidade ímpar que, segundo ele, fez diferença no seu desempenho final.
Cabe lembrar, contudo, que, independentemente dos atores serem formados em
teatro ou em música ou não serem formados, todos enfrentaram dificuldades diante da
técnica por problemas distintos, em consequência de suas expectativas e desejos
também serem diferenciados.
Os atores formados em teatro apresentaram mais intimidade com o código teatral,
mais desenvoltura na etapa Mapeamento de Cenas, contudo mostraram mais resistência
aos novos procedimentos, em especial aos exercícios referentes à etapa Memorização e
flexibilização do texto, pois traziam em suas bagagens um modelo preestabelecido, uma
forma cristalizada, uma certeza de algo dominado.
Os cantores líricos se colocavam com mais foco, mais disciplina na condução do
processo, com maior poder de concentração e de capacidade de escuta e, ao mesmo
tempo, eram extremamente questionadores, curiosos e racionais. Mesmo assim,
conseguiam traçar com mais facilidade as relações dialéticas entre os conhecimentos
adquiridos com as diferentes linguagens artísticas envolvidas no processo.
Enquanto isso, os dois iniciantes, não formados em teatro nem em música, eram
menos questionadores, menos racionais, porém mais acessíveis, mais disponíveis, mais
jovens e, assim, acabavam respondendo com maior rapidez que os atores e os cantores.
Tais observações vieram suscitar uma indagação sobre a existência entre intimidade com
o código da linguagem artística e aptidão ou bom desempenho. Devido à experiência
aqui relatada, poder-se-ia arriscar a afirmar que essa intimidade com a linguagem
artística pode ser considerada até prejudicial. A intimidade do ator com a cena deve ser
fruto de experiências mais sólidas, embasadas e atualizadas a partir de estudos
sistemáticos, ou seja, a tal intimidade com a cena por si não se basta, pode vir acarretar
acomodação por parte do intérprete, muitas vezes até de forma inconsciente, como
observado nesse experimento.
Para a questão O que a Microatuação gerou no público?, tanto A1 quanto A3
confirmam o que haviam previsto antes da apresentação do espetáculo, ou seja, que a
percepção do público aconteceria através do bom ou do mau resultado do conjunto do
trabalho. O público não identificaria a técnica e sim o bom resultado final do processo. A2
e A6, não formados e menos experientes, também confirmaram que a eficácia da técnica
foi comprovada através da grande aceitação do resultado. Para A6, o que o público
71
identificou foi o bom resultado, para A4 ficou clara a aceitação do resultado pelo público-
alvo e para A5 aconteceu uma empatia grande entre o público e o resultado final do
processo.
Fase 2
A Figura 1 registra a porcentagem de respostas dadas pelas crianças (n=50) a
cada uma das perguntas.
72
Figura 1: Resultados do questionário aplicado às crianças após o espetáculo A Viagem de um
Barquinho.
Partindo do exposto e com base na leitura e compreensão dos dados obtidos, é
imprescindível que se destaque os prós e contras, os resultados mais e menos
esperados. Assim, procurando partir sempre de variáveis representativas como se vem
expondo e debatendo ao longo da pesquisa, a saber: escolhas da encenação, resultados
significativos da pesquisa com a voz (a performance dos atores) e mais ainda o lastro
principal – a história ou mesmo, o trabalho com o texto enquanto base para todo o
urdimento da criação de sentido na cena.
Ao selecionar as variáveis: encenação, voz e história, foi possível obter-se um
desmembramento de cada uma delas, necessário e capaz de revelar na análise minúcias
do olhar crítico da recepção. A exemplo disso, a variável encenação permitiu observar
questões relativas à potencialidade de análise do público diante de itens como:
performance dos atores (interpretação, expressividade com o texto falado e cantado,
movimentação no palco, uso dos objetos de cena); espetáculo (se gostou, do que gostou,
73
por que gostou); direção artística (cenário, figurino, adereços, maquiagem, iluminação,
sonoplastia); e música (se identificou a trilha sonora original do espetáculo a partir dos
personagens e da ambientação sonora das cenas).
Quanto à variável voz, identificam-se, nesse estudo, resultados decorrentes das
análises sobre a capacidade de percepção do universo sonoro do espetáculo pelo público
de crianças quanto à criação e uso da voz pelos atores, seja na performance vocal com
os personagens cantando, falando, ou no processo de construção mais amplo da
sonoridade das cenas.
Apoiado nessa concepção, observa-se que a variável história (a ideia, o texto)
veio, a partir da forma de urdimento das questões submetidas ao público, embasar o
processo de análise quanto a nível de compreensão das crianças. Essa variável
conseguiu ainda evidenciar as correlações existentes entre as outras variáveis
selecionadas a partir do desejo de discutir, compreender e comprovar se, de fato, o
objetivo foi alcançado nesse estudo. Assim posto, cabe elencar algumas questões que
indagaram sobre a essência da história, como: os desejos dos personagens Menino e
Barco; as relações afetivas entres os personagens; as relações entre liberdade e poder; o
sentido de real e de fantasia; o nível de entendimento e a forma de abordagem de
questões polêmicas da vida pela autora, além de outras.
Nessa compreensão, a análise geral dos dados apurados aqui acena para a
evidência de que, segundo a opinião do público, o espetáculo foi divertido, o texto
agradou e a performance dos atores conseguiu prender suas atenções. No entanto,
aprofundar a discussão dos resultados sempre é uma forma de reforçá-los e garantir
confirmações desejadas pela pesquisa.
DISCUSSÃO
A partir do exposto, elegeu-se buscar apoio em uma análise mais contundente
deste estudo, logo, embasar seus resultados em teorias de análise do espetáculo
desenvolvidas por teóricos, como Pavis (2010), por defender que, para se desenvolver
uma análise de espetáculo, é fundamental examinar criticamente todo o seu processo de
feitura, ou seja, sua lógica de criação, tudo que pode defini-lo enquanto obra de arte,
como: seus ajuntamentos, dados e a sua própria estrutura. Posto isso, analisá-lo
enquanto fenômeno, de modo que possa identificar: o que é o espetáculo? quem o faz?
quem assiste? Portanto, para atender o que defende Pavis (2010), foram escolhidas para
essa pesquisa variáveis (elementos) como o texto (a história), os elementos visuais e
74
sonoros (encenação), a performance dos atores (técnica de Microatuação) e o público-
alvo (a recepção).
Acredita-se que o objeto desse estudo pode apresentar formas e conteúdos
diferenciados, em outros processos de criação de cidades brasileiras convertidas em
polos de teatro profissional e amador, mesmo as dos grandes centros produtores, como
São Paulo e Rio de Janeiro, até os que apresentam crescente volume de produção, como
Porto Alegre, Belo Horizonte, Curitiba, Recife e Fortaleza, ou os que contam ainda com
poucos núcleos profissionais.
Contudo, os resultados dessa pesquisa permitiu ainda que se tomasse por base
uma das características significativas, relativas ao elenco de atores envolvidos, a sua
heterogeneidade, e, desse modo, perceber que essa consegue carrear uma infinidade de
novas variáveis importantes capazes de definir ou não a eficácia de um experimento,
especialmente um que investiga novas tecnologias de composição para a cena.
De acordo com a visão de Pavis (2010) sobre teorias do fenômeno teatral, o que
de fato tem valor na análise de um espetáculo é o processo de interação, ou seja, o
resultado final oferecido ao público, a experiência pessoal que cada receptor obteve, sua
relação com a representação. Desse modo, o que mais importa é saber que a relação
com o espetáculo se dá a partir da vivência presencial com o assunto (o efêmero) e não
apenas por meio de reconstituição do espetáculo em documentos e registros, como
filmes, fotografias e entrevistas. Portanto, embora todo esse processo de intervenção
tenha sido registrado em imagens em vídeo e foto, foram os registros diários, escritos,
além de discussões e debates que deram suporte a esta tese.
Coube ainda nesse processo de análise tratar sobre a recepção e, para tanto,
valeu revisar Pavis (2010), quando elenca duas questões que julga essenciais para uma
análise desse receptor as abordagens psicológica, psicanalítica e sociológica,
importantes para compreender: a recepção desse espectador enquanto indivíduo inserido
no público.
O público foi o referencial escolhido por esse objeto de estudo para avaliar o
resultado da performance de atores treinados por meio da técnica de Microatuação com
texto teatral A Viagem de Um Barquinho, de Sylvia Orthof. Entretanto, entende-se quando
Pavis (2010) defende que é necessário ter consciência de que o público, diante da
representação, vivencia duas situações, dois mundos: um proposto pela ficção e outro o
qual ele vive. É fundamental perceber que, nesse momento do ato, ocorre uma ilusão
75
mimética que leva esse receptor oscilar entre esses dois espaços. Por conta disso, o
autor alerta que, no fazer artístico, não cabe reflexos do cotidiano. Essa é também a
concepção oriental da arte, um artifício, uma releitura desse cotidiano, uma estilização
desse real.
A partir dessa compreensão, o teatro se faz ao vivo, é efêmero, feito por gente e
difícil de ser avaliado. Assim, como poderia existir um método correto de análise de
espetáculo? Como não considerar que assistir a uma apresentação teatral trata-se de
uma experiência única? Como, também, relatá-lo de forma correta, ideal? Contudo, vale
ressaltar a sua eficácia. No entanto, vale reconhecer a importância da análise de cada
enfoque e elementos que compõem um espetáculo a exemplo de alguns gestos, olhares
e ações presentes na atuação, mesmo que de difícil descrição, por serem, geralmente,
de difícil percepção (PAVIS, 2010).
Portanto, como já vem sendo exposto ao longo desse estudo, a pesquisa lançou
mão de questionários que pudessem levar a identificar as características gerais da
encenação, cenografia, sistema de iluminação, objetos, figurinos, maquiagens, máscaras,
performance dos atores, função da música, texto, espectador. Dentre esses, considerou-
se como elementos materiais da representação o figurino, a maquiagem, adereços, a
iluminação e a cenografia, que, juntamente com o ator, podem preencher e constituir o
espaço da cena.
Apoiado no roteiro de análise de espetáculos sugerido pela pesquisadora Betti
(2005), algumas questões foram destacadas nesta análise, como: o perfil do público-alvo
(no caso deste estudo 50 crianças com faixa etária entre 10 e 12 anos); e a natureza do
espaço físico da encenação (Teatro Joaquim Cardozo – teatro convencional à italiana
que possui separação usual entre palco e plateia), que exigiu atenção quanto às relações
construídas entre o plano da encenação e esse público.
Dessa forma, resultou em uma encenação concebida no palco da seguinte forma:
apenas três entradas de personagens ocorreram pela plateia (como estratégia para
solução do espaço limitado das coxias do teatro); como também, uma das cenas (viagem
da Lavadeira e do Menino à procura do Barco) possibilitou uma interação mais física
entre atores e público, ao mesmo tempo serviu como estratégia para solucionar
tecnicamente a dificuldade de tempo necessário para a mudança de figurino de duos
personagens.
76
Com base na pragmática, a concepção cênica deste trabalho buscou
incessantemente a construção de sentidos. Assim, incluiu no contexto visual um
cenário simbólico, concebido de modo a figurar metaforicamente a atmosfera necessária
à peça. A concepção sugeriu um lugar constituído com a predominância da cor branca:
um linóleo branco no piso e múltiplos varais com lençóis, criando um campo visual
abstrato, remetendo a uma folha de papel em branco. Os drapeados dos lençóis
deveriam sugerir as ondas do mar. Objetos de cena foram utilizados pela personagem
Lavadeira – bacia de lavar roupa e prendedores de roupa. O espaço cênico sugeriu
diferentes localizações espaciais.
O tempo ao qual a narrativa da peça remetia é específico e cronológico, e, assim,
a iluminação cênica desempenhou funções na recriação cênica do espaço (delimitando
áreas espaciais diferenciadas) ou do tempo (diferenciando, por exemplo, o tempo do
passado e o do presente), operando transformações cromáticas e delimitações de
espaços.
A iluminação cênica defendeu, ainda, um faz-de-conta, como tudo que envolve a
trama da peça, pretendendo ser um suplemento poético texto/encenação, ou seja, diante
de uma folha de papel em branco a luz derramava-se como água sobre o cenário e os
atores. Seguindo a estrutura das pinturas muito diluídas (aguadas), as luzes mancham as
cenas com predominância de azul e verde com pinceladas de laranja, ouro e prata.
O figurino possui caráter simbólico, lúdico, optando por uma variedade de cores,
de modo que sugira terem sido elaborados por crianças ou brincantes (artistas populares
do nordeste). As cores utilizadas e os modelos sugerem características específicas dos
personagens. Foram concebidos e combinados a partir de uma proposta reciclável, de
aproveitamento de roupas usadas, como ocorre com a tendência dos jovens no Japão.
Também trouxe influência das tradições e folguedos populares, das manifestações
populares, como reisado, maracatu, caboclinhos e outros.
O universo ou contexto sonoro incluiu uma trilha musical original com a função,
dentro da narrativa da trama, de um mergulho no suposto mundo adulto da criança sem a
unanimidade das velhas cantigas de roda com harmonias e elementos facilitados. Um
mergulho no lúdico, embora com melodias ora facilitadas e ora desafiadoras.
O texto foi resultado do trabalho individual de Sylvia Orthof, possui uma narrativa
baseada no desenvolvimento de uma linha de ação, ou seja, em ações praticadas pelos
personagens. A estrutura formal do enredo sugere uma estética dramatúrgica
77
predominante expressionista. Entre os personagens existem indivíduos dotados de uma
psicologia particularizada e outras figuras de caráter genérico. A representação delas é
desenvolvida de forma estilizada, o que permite que sejam mais atraentes para a criança.
Procurou-se não reproduzir padrões tradicionais e optar por constituir uma nova
leitura do texto por meio da sua atualização e contextualização da realidade dos
indivíduos envolvidos no processo (atores e público), promovendo uma maior
identificação e consequentemente maior interação. Elegeu-se fazer uma releitura
motivada por um tema bastante contemporâneo e presente no texto, a saber: a liberdade,
o direito de ir e vir, o direito de escolhas e as responsabilidades decorrentes dessas.
O processo de composição estética do texto optou por realçar alguns elementos
da crítica social que considera urgente a ser encarado, como a importância pelo respeito
às diferenças individuais, à liberdade de escolha dos indivíduos que se encontram
presentes na encenação. Exemplificando, temos a concepção dos elementos visuais
como um todo (figurinos, adereços, cenários), que fogem completamente de uma forma
tradicional, dialogando com a natureza do texto, quando define, por exemplo, o sol cor-
de-rosa e não amarelo ou laranja ou dourado.
A recepção do espetáculo por parte da crítica do público de crianças ressaltou que
o espetáculo foi engraçado, divertido, inteligente, colorido e bom de assistir. Ressaltaram,
especialmente, uma afinidade com os personagens: Menino, Lavadeira, Sol, Barco e
Fada Princesa.
Com base nos dados obtidos, da aplicabilidade da técnica de Microatuação no
processo de treinamento de atores, foi possível avaliar e identificar resultados
significativos da pesquisa. Nessa compreensão, vale ressaltar ainda que as avaliações
derivaram-se dos processos vivenciados com os atores e, de maneira especial, da
recepção do público diante do resultado final: o espetáculo A Viagem de um
Barquinho, de Sylvia Orthof.
Diante disso e abalizada pelas três variáveis (texto; performance dos atores e
técnica de Microatuação), foi possível evidenciar os saldos da pesquisa obtidos através
dos atores e público antes, durante e após a apresentação do espetáculo para o grupo de
crianças.
Com base nos depoimentos dos atores, ficou evidenciado que o treinamento com
a Microatuação proporcionou uma evolução em suas performances, segundo eles,
representando mais uma oportunidade para se testarem e afirmarem suas aptidões
78
profissionais. Além disso, concluíram que a Microatuação pode sim ser percebida pelo
público através da qualidade das performances dos atores na cena.
Entretanto, foi imprescindível, na avaliação, levar em consideração também a
compreensão dos atores no que diz respeito à primazia do texto selecionado e trabalhado
por eles. Posto dessa forma, coube considerar que o elenco se impressionou com o fato
do texto conseguir surpreender não só o público de criança mas também o público adulto
de acompanhantes e responsáveis pelas crianças.
No entanto, testemunhou-se um fato envolvendo o texto selecionado e alguns
atores: esses não apostavam na capacidade do texto prender a atenção e ser bem aceito
por um público com faixa etária entre 10 e 12 anos. Diante disso, vale informar que os
citados atores descrentes eram os que tinham formação em teatro e, mais ainda,
experiência com arte-educação e em produções dirigidas à infância. Contudo, ao serem
indagados, tiveram dificuldade de sugerir uma faixa etária que julgassem mais adequada
ao texto.
A partir do exposto, foi discutida e concluída dentro do grupo a evidência que
mostra que o nível de apreensão do texto por parte do público não dependeu tanto da
adequação à faixa etária mas, notadamente, esteve muito mais vinculado às escolhas
estéticas e éticas da sua composição na cena.
Portanto, diante do proposto “analisar os resultados da aplicabilidade de uma
nova técnica (Microatuação) em um processo de composição de cena, com base na
opinião dos atores e da receptividade de um público de crianças” e com base nas
análises dos resultados da pesquisa, o estudo respondeu ao seu objetivo.
79
A partir do objetivo proposto nesta tese, compete, aqui, expor os resultados
desses estudos a fim de confirmar se seus resultados conseguiram responder ao
pretendido.
No Estudo 1, ao se buscar refletir sobre novas abordagens em prol de avanços da
produção de voz e palavra em cena, conseguiu-se proporcionar bases teóricas para os
estudos da vocalidade teatral, visando, de maneira especial, à produção na cidade do
Recife, foco de estudo desde 2001.
A escolha pela Microatuação foi plenamente justificada devido ao fato dessa
técnica ter permitido discutir e ampliar conceitos fundamentais sobre voz e vocalidade do
ator, sobretudo uma ampliação do que se entendia por texto teatral e composição de
palavras em performance na cena.
Ao promover abordar as instâncias da performance elucidou ainda a diferença
entre análise literária e análise pragmática e, sobretudo, mostrou a importância da
pragmática na composição da cena.
Tais conhecimentos permitiram compreender o que defende Sulian Vieira,
quando afirma que a Microatuação não deve ser abordada de forma singular, mas de
forma plural, exigindo, assim, uma percepção sobre qualidade corporal que busca a
dimensão sutil – nuances do olhar, da voz, gestos mínimos – que irá definir a qualidade
do resultado, geralmente suprimida quando se utiliza a voz em altas intensidades, por
requerer um tipo de esforço diferente do uso da voz cotidiana.
Davini (2007) identificou que o trabalho de pesquisa também permitiu alertar que,
no imaginário do teatro, geralmente motivado muito mais pelos diretores, essa qualidade
corporal, capaz de propiciar uma dimensão sutil, é desconsiderada, priorizando-se mais a
projeção da voz em detrimento da ressonância. Assim, o esforço físico em excesso
(crispação) e sem controle, travam o corpo do ator, suprime sutilezas, qualidades tônicas,
trabalho respiratório e a qualidade prosódica.
O Estudo 2 contribuiu ao descrever o relato detalhado da implementação da
técnica de Microatuação no processo de composição de cena além de justificar o
80
conceito estético dessa composição. Nesse momento, foi importante e necessário
oferecer oportunidade de discutir questões essenciais relativas aos atores. Baseado
nessa ideia, incluiu os desafios enfrentados com o elenco de atores, experientes ou
iniciantes. Dentre os desafios, suas resistências aos novos procedimentos, como também
suas superações devido à geração de estímulos decorrentes da ampliação da carga
horária, essencial para suprir a necessidade de um reforço técnico básico, que acabou
sendo convertido em uma carga extra de ânimo, autoconfiança, indispensável para a
imersão na técnica aplicada.
A partir dessa compreensão, pode-se afirmar que a pesquisa foi importante e
fundamental por responder a uma demanda legítima e oferecer novos procedimentos
para o trabalho com a vocalidade. Entende-se que foi dado mais um passo no sentido de
ampliar pesquisas que se comprometam com o processo de composição de voz e
palavra na cena e, especialmente, ampliar o estímulo às discussões conceituais sobre
vocalidade.
Por fim, o Estudo 3. Com base no que defende os pesquisadores e teóricos sobre
a importância e qualidade de instrumentos de crítica, optou-se, neste estudo de análise
de resultados, tentar não generalizar e lançar mão, como instrumentos de análise, além
de questionários, descrição verbal, tomada de notas e documentos anexos, que incluem
registros em áudio, vídeo e fotografias de todo o processo de implementação da técnica
de Microatuação e montagem do espetáculo A Viagem de um Barquinho, de Sylvia
Orthof.
Daí, expôs a análise dos resultados da aplicabilidade da técnica em questão,
tomando por base as variáveis: texto (história, ideia); encenação (inclui os elementos
visuais e sonoros; performance do ator) e público (recepção). Tais variáveis se
desmembram e possuem uma correlação. Assim, pode-se considerar e classificá-las
também como: história (texto, ideia); voz (performance do ator); recepção (público);
encenação (texto, performance, público, elementos visuais e sonoro).
Nessa abrangência, considerando as referidas variáveis, pode-se contar como
ganho o redimensionamento dos conceitos sobre texto teatral e, sobretudo, o
entendimento de que esse texto não se trata apenas de um registro escrito das falas dos
personagens de uma peça, mas do que esse texto diz em cena até dar origem à ação.
Os resultado deste estudo evidenciaram que nos enfoques da linguagem teatral:
dramaturgia (texto) e espetáculo (encenação), a análise pragmática do texto A Viagem de
81
um Barquinho sugeriu inúmeras interpretações, estabelecidas pela
encenação/atores/criadores (figurinos, cenários, desenho de luz, maquiagem e trilha
sonora) no ato do processo de montagem. A análise pragmática do texto ainda implicou
em uma análise menos presa ao significado desse, mais focada nos efeitos desse
quando levado à cena.
Do mesmo modo, neste estudo, os resultados decorrentes da análise do
espetáculo pelo público de crianças, foram observados e comentados. Nessa análise
foram consideradas as seguintes variáveis: dados concretos do espaço cênico onde se
realizou a encenação; forma de concepção cênica; elementos constitutivos da peça
apresentada; opções da direção e balanço geral das impressões suscitadas pelo
espetáculo, ou seja, foi observado, analisado e discutido o processo de construção de
ideias relacionadas ao tema da peça levando em consideração a montagem oferecida e
assistida pelo público selecionado.
É imprescindível levar em consideração que as avaliações resultaram dos
processos dos atores e da recepção do público diante do espetáculo com base nas três
variáveis: texto (história); encenação (performance dos atores – técnica de Microatuação
e elementos visuais e sonoros) e público (recepção). Por meio das tabulações e análises
dos dados, conclui-se que, na grande maioria dos resultados, houve uma correlação
entre as opiniões dos atores e do público. Assim posto, para ambos o texto foi bem
aceito, agradou por ser divertido e inteligente e prendeu a atenção do público.
Com base nas opiniões dos atores, o treinamento proporcionou uma evolução em
suas performances, representando uma das maiores oportunidades para se testarem e
afirmarem suas aptidões profissionais. Entenderam ainda que a técnica de Microatuação
pode sim ser percebida pelo público através da qualidade das performances dos atores
na cena.
Por fim, conclui-se que ficou claro que o teatro se faz ao vivo, trata-se de uma
experiência única, pois é efêmero, feito por gente e difícil de ser avaliado.
Portanto, diante desse contexto, vale informar que os resultados desta pesquisa
foram tratados muito mais no intuito de instaurar a reflexão, despertar uma
conscientização que resulte em mudanças e de preferência que não esteja atrelada a
ajuizamento com base de em conceitos impostos e ditados de forma simplória como certo
ou errado, bom ou mau; ao contrário disso, que considere a teoria da complexidade que
inclui o certo e o errado, o bom e também o mau.
82
No entanto, apoiado nos pareceres citados existentes até o momento, poder-se-ia
considerá-los suficientes para uma conclusão final e positiva desse estudo, já que os
dados indicam que as opiniões coletivas e individuais dos atores e da recepção do
público definem uma eficácia do procedimento de aplicação da Microatuação. No entanto,
ao se entender que as expectativas criadas pelos atores, estão diretamente relacionadas
ao contexto histórico, social, ético e estético de cada sujeito – ator e criança – público
desta pesquisa, é inadmissível desconsiderar a complexidade inerente a essa análise.
83
ARTAUD, A. Linguagem e vida. (Org.) J. Guinsburg, Sílvia Fernandes e Antônio
Mercado. São Paulo: Perspectiva, 1995.
BETTELHEIM, B. A psicanálise dos contos de fadas. Rio de Janeiro: Ed. 16, Paz e
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94
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Convidamos você a participar da pesquisa: “Teatro dirigido à criança: análise
da recepção de crianças à performance de atores, com base na aplicação da
técnica de Microatuação”, a ser realizada por Rose Mary de Abreu Martins sob a
orientação da Profa. Dra. Léslie Piccolotto Ferreira.
A presente pesquisa se propõe como objetivo geral, implementar a técnica de
Microatuação e analisar seus efeitos com base na performance de atores submetida a
um público de crianças.na cidade do Recife.
Para responder a esse objetivo, três estudos serão realizados:
Estudo 1 – Estudo sobre a evolução das tecnologias de comunicação: sua
relação com a configuração de novos padrões de vocalidade.
Estudo 2 – Descrever o processo de implementação da técnica de Microatuação
junto a um grupo de seis atores, a partir do texto teatral A Viagem de um Barquinho de
Sylvia Orthof dirigido à um público de criança entre as faixas etárias de 10 – 12 anos. Na
primeira apresentação será submetido a um Grupo Piloto – cinco crianças e em uma
segunda apresentação para um público de 50 crianças da mesma faixa etária do Grupo
Piloto (teste).
Estudo 3 – Analisar os resultados da recepção do público (selecionado entre as
faixas etárias de 10 – 12 anos), referentes às performances apresentadas pelo grupo de
atores em cena com base no texto teatral selecionado e dirigido para criança.
Será desenvolvida nos espaços físicos do Departamento de Teoria da Arte e
Expressão Artística do Centro de Artes e Comunicação, situados em anexo ao Centro
Cultural Benfica da Universidade Federal de Pernambuco. Esses espaços contêm
equipamentos e ambiente favorável ao desenvolvimento do trabalho proposto.
Farão parte atores recifenses pertencentes ao Grupo da Quinta, que participarão
do processo de composição em cena de um texto dirigido à criança. A escolha desses
sujeitos se dará por conveniência, a partir do contato da pesquisadora com esse grupo,
uma vez que a mesma organizou e vem coordenando o referido grupo, desde o período
em que desenvolveu seu mestrado em 2001.
A análise dos dados se dará da seguinte forma: cada um dos encontros será
registrado, tanto em áudio quanto em vídeo, por meio de equipamento que apresente alta
95
definição. Simultaneamente um diário referente à pesquisa será organizado pela
pesquisadora, momento em que registrará os aspectos que julgar importante para o
detalhamento do processo.
Farão parte dos instrumentos de avaliação e análise o público (selecionado entre
as faixas etárias de 10 – 12 anos) além de: cópia do texto teatral, material de registro em
vídeo da atuação do elencos e da plateia de crianças durante a observação da atuação
com base na Microatuação.
N o Estudo 1 Os atores terão oportunidade de desenvolver estudo sobre a
evolução das tecnologias de comunicação: sua relação com a configuração de novos
padrões de vocalidade e o mais importante, ser introduzido aos estudos da análise
pragamática.
Estudo 2, Propõe descrever o processo de implementação da técnica de
Microatuação com um elenco de seis atores a partir do texto teatral A Viagem de um
Barquinho.
No Estudo 3 – Propõe análise e discussão dos resultados do processo de
implementação da técnica de Microatuação a partir dos atores e da recepção do público
Nos procedimentos se incluem as etapas de leitura dramática e montagem do
espetáculo: da Proposta de intervenção com base na MICRO-ATUAÇÃO que será
trabalhada num total de 20 encontros semanais de quatro horas cada (total de 80 horas)
e contará com a colaboração do grupo de pesquisa denominado Vocalidade e Cena.
No entanto, vale ressaltar que a proposta envolve o risco de constrangimento por
parte dos atores, durante os exercícios de treinamentos. Como forma de minimização
deste risco, será guardado ao participante o direito ao sigilo de suas informações como
também será respeitada a privacidade dos participantes diante de pessoas que não
estejam envolvidas no processo e, além disso, os exercícios de treinamento corporais e
vocais serão esclarecidos e demonstrados pela pesquisadora, guardando ao participante
o direito de não participação das atividades em que não se sentir à vontade.
O(a) participante terá o direito de fazer perguntas e também de desistir de
participar em qualquer momento da pesquisa sem nenhum prejuízo para si. Também não
haverá custos do(a) participante.
Serão divulgados dados de identificação pessoal dos voluntários envolvidos neste
trabalho e não teremos o compromisso com o sigilo quanto a esta identificação. A
96
pesquisadora responsável compromete-se em suspender a pesquisa em caso de riscos
ou danos para a pessoa que está participando.
Em caso de dúvidas, entre em contato com Rose Mary de Abreu Martins (tel:
9304-8328 através do endereço: Rua Dr. Raul Lafayette n°113, Boa Viagem – Recife/PE,
CEP 50021-220; Léslie Piccolotto Ferreira (tel: (11) 3670-8512 através do endereço Rua
Monte Alegre, 984, Perdizes – São Paulo/SP, CEP 0514-901 e o Comitê de Ética em
Pesquisa (tel.:) (11) 3670-8000 no endereço: Rua Monte Alegre, 984, Perdizes, São
Paulo-SP, pois estaremos à sua disposição.
Eu, ____________________________________________________________
RG: ______________ li e entendi o que foi escrito acima.
Recife, ........ de ............................... de 20.......
________________________________________________________
Assinatura do(a) voluntário(a)
Pesquisador _____________________________________________________
TESTEMUNHAS: ________________________________
________________________________
98
Projeto Doutoramento: “Teatro Dirigido à Criança: análise da recepção de crianças à
performance de atores, com base na aplicação da técnica de Microatuação”
Processo de aplicação – Metodologia Microatuação
No Texto Teatral A Viagem de Um Barquinho de Sylvia Orthof
QUESTIONÁRIO DIRIGIDO AOS ATORES – SONDAGEM – NO PRIMEIRO
ENCONTRO PROCESSO DE INTERVENÇÃO COM A MICROATUAÇÃO
Nome:
Personagens:
1. Fale sobre a sua formação artística.
2. Quais as suas principais experiências como ator em montagem teatral?
3. Fale sobre o conceito de voz e palavra na cena?
4. Fale sobre o conceito de criação vocal do personagem.
101
Criação e execução dos elementos visuais do espetáculo
Teatro Joaquim Cardozo | Centro Cultural Benfica
102
Ilustração de Matheus Mota
REGISTROS EM VÍDEO:
https://www.dropbox.com/sh/70gmhx74gzwpmke/AABQi4uu16733Gl0b0YyR8Mxa?dl=0
103
Processo de aplicação da técnica da Microatuação
Orientações: Memorização Cenas-Chave ou Falas-Chave
Janeiro de 2015
104
Projeto Doutoramento: “Teatro Dirigido à Criança: análise da recepção de crianças à
performance de atores, com base na aplicação da técnica de Microatuação”
Processo de aplicação - Técnica Microatuação
No Texto Teatral A Viagem de Um Barquinho de Sylvia Orthof
Orientações: Memorização Cenas-Chave ou Falas-Chave.
Tentem memorizar o trecho indicado por meio da audição, evitando, o quanto puderem o
contato visual com o texto escrito, bem como a escrita. Algumas opções que podem
ajudá-los neste trabalho:
1) Em duplas ou grupos, um participante lê trechos da fala-chave para que seja repetida em voz alta até decorarem;
• Dividam a fala-chave em trechos. Repitam trecho 1 até decorarem. Repitam o
trecho 2 até decorarem. Repitam os trechos 1 e 2. Decorem outro pequeno
fragmento (trecho 3). Repitam os trechos 2 e 3 e depois, trechos 1, 2 e 3.
Decorem o trecho 4, repitam os trechos 3 e 4 e depois, trechos 2, 3 e 4. Em
seguida repitam os trechos 1, 2, 3 e 4, e assim em diante, até o fim do texto.
• Somente incorporem um novo trecho quando conseguirem repetir os anteriores
sem interrupções. Sempre repitam os trechos novos primeiro, incorporando, a
seguir, os trechos precedentes até chegar ao trecho 1.
• Quando vocês puderem dizer o texto a partir de qualquer ponto fluidamente, sem
interrupções, estarão prontos para ensaiar a cena.
Obs 1: O fato de decorarmos o texto já com certa intensidade vocal nos aproxima
corporalmente da situação da cena, colocando o texto no tempo e no espaço da cena.
Obs 2: Aprendemos, neste caso, o texto por repetirmos vocalmente e por escutá-lo.
Obs 3: É muito importante que os estudantes se coloquem com atitude corporal ativa: de
preferência em pé ou sentados. Precisamos sempre tentar aproximar o nosso corpo da
situação da cena, onde devemos estar ativos e não langorosos ou desanimados.
105
Obs 4: É importante evitar que o final de cada trecho (trechos 1, 2, 3, etc.) coincida com
os sinais de pontuação que, mesmo corretos gramaticalmente, nem sempre condizem
com a articulação da frase falada.
2) Registrem o texto em áudio para reproduzi-lo tantas vezes quanto for necessário.
• Para fazer o registro: tentem realizar uma leitura com poucas variações de
frequência e pausas. Não é necessário neste caso respeitar a pontuação do
texto. O que precisamos agora é que vocês aprendam a sequência de palavras.
• Depois de gravado o texto: podem realizar a mesma sequência proposta no item 1
destas Orientações.
106
Questionário (Q1) dirigido aos atores antes da apresentação do espetáculo – A Viagem de um Barquinho
107
Projeto Doutoramento: “Teatro Dirigido à Criança: análise da recepção de crianças à
performance de atores, com base na aplicação da técnica de Microatuação”
Processo de aplicação – Metodologia Microatuação
No Texto Teatral A Viagem de Um Barquinho de Sylvia Orthof
QUESTIONÁRIO DIRIGIDO AOS ATORES ANTES DA APRESENTAÇÃO DO
ESPETÁCULO – A VIAGEM de um BARQUINHO
Ator:
Personagens:
1. Qual a sua expectativa em relação à reação do público no que diz respeito ao texto selecionado – A Viagem de um Barquinho de Sylvia Orthof?
2. Qual a sua expectativa em relação à reação do público no que diz respeito à sua
performance como ator junto ao texto selecionado – A Viagem de um Barquinho de
Sylvia Orthof?
3. Qual a sua expectativa em relação à reação do público no que diz respeito à
metodologia Microatuação?
108
Questionário (Q2) dirigido aos atores depois da apresentação do espetáculo – A Viagem de um Barquinho
109
Projeto Doutoramento: “Teatro Dirigido à Criança: análise da recepção de crianças à
performance de atores, com base na aplicação da técnica de Microatuação”
Processo de aplicação – Metodologia Microatuação
No Texto Teatral A Viagem de Um Barquinho de Sylvia Orthof
QUESTIONÁRIO DIRIGIDO AOS ATORES APÓS APRESENTAÇÃO DO ESPETÁCULO
– A VIAGEM de um BARQUINHO
Nome:
Personagens:
1. O que o texto A Viagem de um Barquinho gerou no público?
2. O que o seu trabalho de ator, desenvolvido com base na Microatuação, gerou no
público?
3. O que a Microatuação gerou no público?
110
Questionário (Q3) de recepção do público de crianças entre 10-12 anos – A Viagem de um Barquinho
111
Projeto Doutoramento: “Teatro Dirigido à Criança: análise da recepção de crianças à
performance de atores, com base na aplicação da técnica de Microatuação”
Processo de aplicação – Metodologia Microatuação
No Texto Teatral A Viagem de Um Barquinho de Sylvia Orthof
QUESTIONÁRIO DE RECEPÇÃO DO PÚBLICO DE CRIANÇAS ENTRE 10-12 ANOS –
ESPETÁCULO A VIAGEM DE UM BARQUINHO
Nome:________________________________________________________
Idade: ____
Instituição:______________________________________________________
1. Você gostou do espetáculo? Para você o espetáculo foi:
( ) Muito Bom.
( ) Bom.
( ) Regular.
( ) Ruim.
2. Enumere nessa questão de 1 a 7 em ordem crescente, sendo 1 a opção que mais você
mais gostou. Os números de 1 a 7 não significam uma nota, mostram o que você mais
gostou.
O que você mais gostou no espetáculo foi:
( ) Texto/história
( ) Cenário do espetáculo
( ) Figurino
112
( ) Maquiagem
( ) luz
( ) Música
( ) Atores/personagens.
3. O que você achou da história:
( ) Muito boa.
( ) Boa.
( ) Regular.
( ) Ruim.
4. Você acha que pela voz da Lavadeira ela:
( ) É carinhosa e amiga do Menino.
( ) É brava e pouco amiga do Menino.
( ) Às vezes, carinhosa, às vezes brava.
5. Você acha que pela voz do Barco ele é:
( ) Engraçado.
( ) Alegre.
( ) Chato e exigente.
6. O que você acha que o Menino mais deseja no final da história:
( ) Encontrar o Barco que fugiu e que ele nunca saia de perto dele.
( ) Que o Barco seja feliz e siga seu desejo de conhecer o mundo.
113
7. Para você o que era mais importante para o Barco:
( ) Ter liberdade e viajar o mundo.
( ) Ficar sempre do lado do menino.
8. Você acha que o Pirilampo é amigo da Lavadeira e do Menino?
( )Sim.
( ) Não.
9. O que você mais gostou nos atores foi:
( ) Gesto dos personagens.
( ) Voz dos personagens.
10.Você entendeu o que os atores falavam na peça:
( ) Muito bem.
( ) Às vezes.
( ) Pouco
11. Como os atores falavam na peça:
( ) Dava para ouvir bem o que os atores falavam.
( ) Não dava para ouvir bem o que alguns atores falavam.
( ) Dava para ouvir bem o que poucos atores falava.
114
12. Qual a voz dos personagens que você mais gostou?
( ) Lavadeira.
( ) Menino.
( ) Sol.
( ) Patinete.
( ) Cavaleiro Azul.
( ) Cavaleiro Verde.
( ) Sonho do Barco.
( ) Sapo.
( ) Pirilampo.
( ) Barco.
( ) Fada Princesa.
13. Você gostou dos sons que o Sapo fazia?
( ) Sim.
( ) Não.
( ) Não lembro.
14. Você gostou dos sons que o Pirilampo fazia?
( ) Sim.
( ) Não.
( ) Não Lembro.
115
15. Enumere cada questão de 1 a 5 em ordem crescente, sendo 1 a opção que mais
você mais gostou. Os números de 1 a 5 não significam uma nota, mostram o que causou
um maior impacto em você.
16. O que mais impressionou nesse espetáculo foi:
( ) a história/ enredo/ texto.
( ) o espetáculo/ a encenação ( luz, cenário, maquiagem, figurino).
( ) a movimentação cênica dos atores (gestos dos atores).
( ) a sonoridade do espetáculo (músicas, barulhos e vozes dos atores).
( ) A forma correta (bem clara), alta, forte e interessante dos atores falarem.
17. Os personagens são importantes no espetáculo, pois:
( ) Os personagens contam a história de Sylvia Orthof de forma engraçada e divertida.
( ) Os personagens são muito interessantes, inteligentes e prendem a atenção do público.
( ) Os personagens falam muito bem as palavras; consegui entender bem a história.
( ) Os personagens me fizeram prestar a máxima atenção através de suas formas de
falar, de se movimentar e de entrar repentinamente no palco.
( ) Falam muito, mas não são chatos e cansativos de se ouvir.
18. Quanto ao texto – e o tema central da história – o que você mais gostou foi:
( ) da peça ser divertida ( a história divertida).
( ) a forma de tratar os problemas (conflitos) dos personagens.
( ) não decidir e dizer para o público o que é certo ou errado na história.
( ) tratar sobre a liberdade, a amizade, o amor.
116
( ) tratar de assuntos importantes para qualquer ser humano (crianças ou adultos de
qualquer lugar do mundo)
19. A encenação não naturalista (diferente das novelas e dos filmes) causou impacto
porque:
( ) não é uma história de começo, meio e fim.
( ) na história tudo é possível ( como no desenho animado – cheia de fantasia – de faz de
conta, tudo é de brinquedo)
( ) a interpretação dos atores é exagerada como no circo (diferente do cinema e da
novela) e prende muito a atenção do público.
( ) a interpretação dos atores é muito boa, prende muito a atenção de quem assiste a
peça.
( ) o cenário, o figurino e a maquiagem são estilizados (diferentes, criativos, cheios de
fantasias).
20. O que mais impressionou na movimentação dos atores foi:
( ) o ritmo dos atores é dinâmico (hora rápido, hora devagar).
( ) a forma divertida e segura de se movimentar no palco.
( ) as formas diferentes dos os atores usarem os espaços do palco.
( ) as diferentes saídas e entradas dos atores no palco.
( ) os diferentes objetos e a forma como os atores usam tais objetos no espetáculo.
21. Quanto à sonoridade do espetáculo, o que você mais gostou foi:
( ) a forma engraçada e bem correta de falar as palavras.
( ) a música cantada pelos atores “ao vivo” com e sem acompanhamento de instrumentos
musicais e eletrônicos.
117
( ) as músicas divertidas de cada personagem do espetáculo.
( ) os sons de cada personagem criados e feitos com as vozes pelos atores no
espetáculo.
( ) os barulhos dos personagens ao pisarem no chão em suas cenas, entradas e saídas
do palco.
122
Trilha Sonora piloto composta para o espetáculo
A Viagem de um Barquinho por Matheus Mota
Junho de 2015
123
01. Introdução
https://www.dropbox.com/s/2j4n7rrkdt51jkv/01-%20introdu%C3%A7%C3%A3o%20.wav?dl=0
02. Lava, lava, lava
https://www.dropbox.com/s/g7mdzzq73rmowxt/lava%2C%20lava%2C%20lava%20%28com%20voz%29.mp3?
dl=0
03. Introdução 2
https://www.dropbox.com/s/0s5n9fn8zpk21ts/03-introdu%C3%A7%C3%A3o%202.wav?dl=0
04. Vitrolinha
https://www.dropbox.com/s/3qigd9auv6mtwcx/06-vitrolinha.wav?dl=0
05. Sol – Entrada
https://www.dropbox.com/s/4mnlhsximfaik0i/o%20sol%20%28com%20voz%29.mp3?dl=0
06. Sol – Dedo duro https://www.dropbox.com/s/wchzykh7tnktps4/sol-dedo-duro-com-voz.mp3.mp3?dl=0
07. Sol – Saída https://www.dropbox.com/s/ylyu2tguw28rbz3/09-o%20sol2.wav?dl=0
08. Matilde – Que gente chata https://www.dropbox.com/s/qdeyqdiorf74qko/10-matilde%20-%20que%20gente%20chata.wav?dl=0
09. Cavaleiros – Entrada https://www.dropbox.com/s/edoai0k62ekh8pn/11-cavaleiros.wav?dl=0
10. Matilde – Que lindo cavalo https://www.dropbox.com/s/toc86691xbi6vto/12-matilde%20-
%20que%20lindo%20cavalo%20.wav?dl=0
11. Matilde – Eu quero viajar https://www.dropbox.com/s/ul5mbotl1tkkmvs/13-matilde%20-%20eu%20quero%20viajar.wav?dl=0
12. Marcha https://www.dropbox.com/s/w0zealvv40kbixi/14-marcha.wav?dl=0
13. Matilde – Ó como eu sou feliz! https://www.dropbox.com/s/60tnnx0fxbcpvw0/15-matilde%20-
%20%C3%B3%20como%20sou%20feliz.wav?dl=0
14. Rap do Sapo https://www.dropbox.com/s/x25t5vuvjpix7f4/16-rap%20do%20sapo.wav?dl=0
15. Cantiga de Sonho https://www.dropbox.com/s/sdpde52w58qtoa3/18-cantiga%20de%20sonho.wav?dl=0
16. Tempero https://www.dropbox.com/s/0mb9pzxi9i567mg/tempero.mp3?dl=0
17. Sol – Saída https://www.dropbox.com/s/ylyu2tguw28rbz3/09-o%20sol2.wav?dl=0
18. Final https://www.dropbox.com/s/yqwadp3f8yly96r/final.mp3?dl=0