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Programa de Governo Luciana Genro

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Expediente• Coordenação de programa: Maurício Costa de Carvalho

• Comissão de programa: Juliano Medeiros, Rogério Ferreira, Silvia Santos

• Coordenação de campanha: André Ferrari, Fernando Silva, Francisvaldo Mendes, Israel Dutra, JulianoMedeiros, Laura Cymbalista, Leandro Martins Costa, Luiz Araújo, Mariana Riscali, Rodolfo Mohr, Ro-gério Ferreira, Sandino Patriota, Silvia Santos

• Arte da capa: Adria Meira

• Diagramação: Tiago Madeira

• Revisão: Raquel Maldonado

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SUMÁRIO 5

Sumário

Apresentação: Um programa para além das eleições 7

Diretrizes Gerais para Programa de Governo nas Eleições de 2014 9Eixo 1 – Política Econômica e Modelo de Desenvolvimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10Eixo 2 – Sistema Político e Democracia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12Eixo 3 – Mais e Melhores Direitos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

1 Economia 16

2 Trabalho, emprego e renda 22

3 Sistema previdenciário e aposentadorias 24

4 Educação 26

5 Ciência e tecnologia 30

6 Saúde 31

7 Meio Ambiente 34

8 Energia 37

9 Reforma agrária 40

10 Habitação e Reforma Urbana 44

11 Mobilidade e Transportes 47

12 Segurança Pública 50

13 Reforma Política 54

14 Relações exteriores 57

15 Direitos Humanos 59

16 LGBT 62

17 Mulheres 65

18 Comunicação 70

19 Cultura 73

20 Esporte e atividade física 76

Contribuição do movimento negro 80Educação e mobilização para o combate ao racismo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80Sobre a violência racista . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81Política Internacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82

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6 SUMÁRIO

Contribuição da juventude 83Educação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 84Juventude e Trabalho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 87Violência e Desmilitarização da Polícia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 87Direito à Cidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88Democratização da Comunicação, da Informação e da Cultura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90Direitos Democráticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92

A luta das mulheres . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92Negras e Negros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93Direitos LGBTs . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93Política de Drogas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 94Memória, Justiça e Verdade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95

Por uma reforma política radical . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95

Agradecimentos 97

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APRESENTAÇÃO 7

Um programa para além das eleiçõesEm uma das inúmeras conversas que Luciana Genro teve com colaboradores para a elaboração deste pro-grama de governo, fomos lembrados por um importante apoiador, figura proeminente do pensamento críticobrasileiro, de uma impecável fábula do escritor francês Phillippe Sollers:

“Dois e dois são seis, diz o tirano. Dois e dois são cinco, diz o tirano moderado. O cidadão corajoso que, mesmoexpondo-se a todos os riscos, lembra que dois e dois são quatro, ouve dos policiais a seguinte advertência: ‘vocêquer que voltemos aos tempos em que dois e dois eram seis?’”

Não poderia haver retrato melhor das atuais eleições presidenciais. Marcada por diferenças apenas pon-tuais entre os partidos da ordem, a política brasileira está estruturada como um sistema viciado onde os ne-gócios das grandes empresas determinam as ações dos políticos e governantes. Neste sistema não importaquem ganhe, desde que os interesses dos bancos, das empreiteiras, das multinacionais, dos grandes gruposde comunicação e das elites estejam preservados. Financiados por esses grupos de poder, os políticos, por suavez, contratam a peso de ouro os melhores marqueteiros para tentar mostrar que tudo isso é “natural” e paradizer ao povo que seus interesses são iguais aos interesses desses grupos, isto é, dizer que dois mais dois sãocinco. Ou seis. Ou algo entre cinco e seis.

É justamente essa velha política que está sendo questionada pelos milhares de protestos que se seguiramàs grandes manifestações de junho de 2013. De formas muitas vezes não tradicionais, sem elaborações estraté-gicas, espontâneas, desorganizadas ou voluntaristas, as jornadas de junho tiveram o grande mérito de rompero dique que continha a indignação de milhões de brasileiros que voltaram a fazer das ruas um espaço privi-legiado da política verdadeira, da luta por direitos, da criatividade e do protagonismo popular na construçãode um novo futuro. Representaram a denúncia desse sistema falido e a negação das velhas formas sem que asnovas ainda tivessem ganhado corpo e substância para tomar seu devido lugar.

Contudo, após mais de um ano daquelas grandes manifestações, nenhuma das promessas de mudançasestruturais com as quais os governos de plantão se comprometeram para tentar estancar os protestos foi defato adiante. A situação da economia, que já apresentava sinais de esgotamento de modelo, se agravou e temlevado os candidatos do sistema a defender nestas eleições – mais ou menos abertamente, de acordo com ointeresse de seus financiadores – a cantilena neoliberal de que a principal tarefa de quem presidir o país no anoque vem será a promoção de “ajustes”, o que na prática significa que para defender os interesses do grandecapital é preciso, em contrapartida, promover “medidas impopulares” como arrocho salarial, desemprego ecortes de recursos dos serviços públicos.

Nosso programa tem o compromisso de ser fiel ao sentimento de mudanças profundas que emergiu daslutas ano passado. Como tem reafirmado Luciana Genro, ser fiel a junho não significa que queremos nos apro-priar ou representar aquelas bandeiras. Mas, sabendo que não precisamos de novos gerentes para o velhoprojeto, nos dispomos a elaborar e organizar conjuntamente um novo projeto de país livre, soberano, iguali-tário e verdadeiramente justo. Nesse sentido, entendemos que é preciso dar um passo adiante avançando nanecessidade de organizar essa plataforma de reivindicações em torno de um debate estratégico, pavimentandoos caminhos para esta “utopia concreta”, para então transformar aquelas demandas em realidade.

Este é o sentido deste programa.Para confeccioná-lo, tivemos como ponto de partida a atuação permanente e engajada do PSOL nas mais

diversas lutas — nos movimentos sociais, nas universidades e escolas, nos sindicatos e no parlamento — ondetivemos contato e incorporamos às nossas elaborações o que de melhor e mais atual se produz pelo movimentovivo da sociedade por mudanças efetivas para o país. Ao mesmo tempo, incorporamos aportes de intelectuais,quadros técnicos e militantes das mais diversas áreas, que encontraram na candidatura de Luciana Genroum megafone para expor formulações que, na maioria das vezes, não encontram eco no deserto de ideias dapolítica brasileira.

Mais do que denunciar este programa tem, portanto, o objetivo de ser um anúncio. Na contramão à lógicadas promessas demagógicas que são regra nas eleições mas nunca se efetivam porque não são compatíveiscom os interesses das classes dominantes e do poder econômico, aqui reunimos demandas reais e apontamos

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8 APRESENTAÇÃO

os caminhos necessários para que se efetivem. Essas demandas estão organizadas em um sistema de propostasconcretas divididas em 20 áreas diferentes, além das contribuições realizadas por movimentos de juventude ede negros e negras que incorporamos de bom grado, tais quais foram redigidas e apresentadas a nós.

Por fim, dois destaques são necessários. Em primeiro lugar, é sabido que este programa parte do princípiode que para governar para a maioria é preciso contrariar interesses de uma minoria privilegiada. Não é possí-vel concretizar as propostas que o povo reclama sem contrariar interesses do capital financeiro, dos negóciosimobiliários, do agronegócio e dos grandes latifundiários, dos monopólios e oligopólios da comunicação, dasoligarquias regionais e dos poucos milionários que sustentam seus lucros exorbitantes a partir da manutençãoda desigualdade social e das condições degradantes de acesso aos serviços públicos da maioria da população.Cientes de que esta proposta enfrenta uma oposição minoritária na sociedade, mas extremamente poderosapolítica e economicamente, propomos uma inversão de prioridades, colocando quem mais precisa como centrodas políticas públicas e fazendo com que paguem a conta os que mais se aproveitaram dessa situação.

Em segundo lugar, sabemos que as propostas concretas aqui apresentadas são perfeitamente possíveis eencontram amparo em experiências realizadas em muitos países no mundo, mas justamente por enfrentar in-teresses poderosos das elites tiveram que ser alvo de mobilização permanente e de muita luta organizada dapopulação. Esse programa é assim, um guia para a ação de governo e, ao mesmo tempo, um desafio ao povoque lutou e venceu em junho de 2013: continuar nas ruas por mais direitos. Nelas encontrou-se o verdadeirocaminho das mudanças. Independentemente dos resultados dessas eleições, executar um programa que trans-forme o Brasil em uma democracia real dependerá sempre de que os maiores interessados busquem tomar asrédeas do próprio destino.

Maurício Costa de CarvalhoCoordenação de programa Luciana Genro Presidenta

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DIRETRIZES GERAIS 9

Diretrizes Gerais para Programa de Governonas Eleições de 2014Apresentação

O Brasil vive um momento singular em sua histó-ria recente. Passados vinte e cinco anos desde a pro-mulgação da Constituição Federal de 1988 e do ForaCollor vemos uma importante retomada das mobi-lizações populares, que coloca em xeque os limitesdo atual modelo político e econômico, um modeloconstruído para preservar a dominação da maioriapor uma minoria de privilegiados. Em junho de 2013nosso país viveu um novo despertar das manifesta-ções de rua, as maiores desde a chegada do projetopetista ao governo federal.

As manifestações que tiveram como ponto departida a luta contra o aumento das tarifas expres-saram um descontentamento mais amplo do povocontra as péssimas condições de vida nos grandescentros urbanos brasileiros e insatisfação com a su-bordinação do interesse público aos negócios priva-dos. A revolta popular que teve início em junho nãofoi apenas contra um sistema de transporte caro, su-cateado e ineficiente: foi também contra a exclusãodesta maioria que vive nas cidades sem acesso a ser-viços públicos de qualidade na saúde, educação, se-gurança pública, habitação, cultura e lazer.

O fato novo, inaugurado desde então, é que opaís ingressou numa nova conjuntura, mais favorá-vel às lutas sociais e à defesa de um programa demudanças estruturais, voltado para o combate à de-sigualdade social, à garantia de direitos, à ampliaçãoda democracia direta e à defesa de um projeto polí-tico e econômico que garanta mobilidade urbana, osdireitos dos trabalhadores, serviços públicos de qua-lidade e preservação do meio ambiente e dos benscomuns que devem servir ao interesse da maioria dopovo.

Os ventos da mudança deram maior ânimo paraa luta de vários setores sociais. Foi o que vimos namobilização dos povos indígenas, nas manifestaçõescontra os abusos da Copa do Mundo, nas ocupaçõesdo movimento sem teto, e na luta de diversas catego-rias profissionais que retomaram a greve como ins-trumento legítimo e, em alguns casos, independentedas estruturas sindicais.

Frente à pressão das ruas, o governo Dilma e suamaioria no Congresso Nacional não realizaram qual-quer mudança de rota, mantendo intactos o atualmodelo de desenvolvimento e a política econômicaem curso que beneficia o grande capital. O que seconstata claramente é um processo de desindustri-alização, maior dependência tecnológica, crescentevulnerabilidade externa, reprimarização da econo-mia, maior concentração de capital e crescente do-minação financeira. Além disso, continuam as pri-vatizações das estradas, portos e aeroportos; as arti-culações para ampliar o repasse de recursos públicospara os planos de saúde privados por meio de finan-ciamento do BNDES, aprofundando o subfinancia-mento e o sucateamento do Sistema Único de Saúde(SUS); bloqueio ao aumento do gasto público em po-líticas sociais e na valorização do funcionalismo pú-blico; e a privatização de 60% do Campo de Libra, dopré-sal, a maior reserva de petróleo já descoberta nopaís, bem como a aprovação de um Plano Nacionalde Educação que não assegura os 10% do PIB paraa educação pública, como reivindicado pelo movi-mento educacional.

Em relação à política econômica, as taxas de ju-ros brasileiras voltaram a liderar o ranking das mai-ores taxas do mundo. Além disso, o governo temoferecido vantagens especiais ao grande empresari-ado, através de generosos empréstimos subsidiadospelo BNDES. Entretanto, o investimento do BNDESem áreas de interesses públicos estratégicos é muitobaixo.

Enquanto o governo sonha com o aumento do in-vestimento privado, mais de 4O% do orçamento daunião em 2013 (900 bilhões de reais) foram drenadospara o pagamento dos serviços da dívida pública, in-cluindo juros e amortizações, mantendo intacta a fa-ceta financista da política econômica.

Do ponto de vista da democratização da proprie-dade da terra houve retrocessos, e a aliança do go-verno com o agronegócio está mais firme do quenunca na tentativa de ampliar a fronteira agrope-cuária, com amplo financiamento público – fonte da

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10 DIRETRIZES GERAIS

concentração da propriedade rural e dos conflitosagrários no país.

A governabilidade do governo Dilma está sus-tentada numa aliança conservadora, que envolve se-tores fisiológicos e da direita tradicional. Neste con-texto, a bancada federal do PSOL tem sido a expres-são dos insatisfeitos com o atual modelo. A comba-tividade da bancada esteve expressa em várias lutasfundamentais, onde nossos parlamentares souberamdistinguir com clareza o que é inegociável para a de-fesa dos interesses populares. Nosso partido, nasruas e no parlamento, tem enfrentado os interessesruralistas, rentistas, monopolistas e conservadores.

A maior contradição deste novo cenário polí-tico, porém, é que o anseio de mudanças da maioriada população, indicado pelas pesquisas de opinião,ainda não encontrou uma alternativa no terreno po-lítico e eleitoral. A velha opção da direita, represen-tada agora por Aécio Neves, assim como a aliançapragmática igualmente conservadora entre o PSB eMarina Silva, não tem capacidade de ocupar o es-paço de mudança.

Diante deste cenário, o PSOL buscará apresentarao povo brasileiro um programa de esquerda queenfrente os problemas histórico do país, centradoem três eixos: superação da atual política econô-mica e do modelo de desenvolvimento, que depredao meio-ambiente e nossas riquezas naturais; trans-formação profunda do sistema político, aumentandoa participação popular, a transparência e o controlepúblico sobre a política; e ampliação radical dos di-reitos e das liberdades dos trabalhadores e trabalha-doras, bem como dos setores socialmente mais vul-neráveis e oprimidos.

Não aceitaremos nem o continuísmo represen-tado pelo PT e aliados, nem o retrocesso simbolizadopor PSDB e aliados. Tampouco aceitamos aquelescomo o PSB que estão entre os dois projetos. Nossopartido luta por uma real alternativa de esquerdapara o Brasil, dizendo em alto e bom tom que nãoaceitaremos estes projetos a serviço da burguesia,seremos a oposição de esquerda nas ruas e na dis-puta eleitoral. Por isso, apresentamos ao povo brasi-leiro uma candidata à Presidência da República queestá à altura desses desafios: a companheira Luci-ana Genro, histórica lutadora das causas popularesem nosso país, ex-Deputada Federal, fundadora denosso partido e atual presidente da Fundação LauroCampos. Estamos seguros de que Luciana será ca-paz de encarnar o desejo de mudança que tomou asruas no ano passado e traduzir em propostas concre-tas o Brasil que queremos construir: justo, soberanoe democrático, enfim, um Brasil socialista.

Tomando por base as resoluções aprovadas nosquatro Congressos Nacionais do PSOL, bem comoo acúmulo de nossas setoriais e as discussões pro-movidas pela Executiva Nacional nos Seminário dePrograma de Governo no primeiro semestre de 2014,apresentamos ao povo brasileiro as diretrizes geraisdo Programa de Governo do PSOL às eleições desteano. Este documento está construído em três eixosprincipais, a partir dos quais, estruturaremos nossaspropostas. Entendemos que este não é um processoconclusivo, razão pela qual, seguiremos colhendocontribuições ao longo de todo o processo eleitoralatravés do portal Plataforma 50, criado para ser umcanal interativo de diálogo entre o PSOL e seus sim-patizantes.

Eixo 1 – Política Econômica e Modelo de Desenvolvimento

Um governo do PSOL promoverá mudanças es-truturais na economia do país. O Brasil e o mundovivem uma crise socioambiental que está vinculadaao modo como se organiza a economia capitalista.A destruição da natureza e a degradação do meioambiente são diretamente proporcionais à crueldadedo capitalismo em relação aos oprimidos e explora-dos por este sistema. Nossa proposta é ecossocia-lista, pois não pode haver uma defesa consequentedo meio ambiente sem que se aponte para a supera-ção das leis do capital, que necessita sugar os recur-sos naturais e explorar o ser humano para garantira acumulação em benefício de 1% da população, en-

quanto 99% sofrem as consequências nefastas destemodelo econômico.

O Brasil precisa conquistar sua verdadeira sobe-rania. Hoje a situação é de submissão aos interessesdo capital financeiro e monopolista. Entre abril de2013 e abril de 2014, o governo Dilma aumentou ataxa básica de juros nove vezes, passando de 7,5%para 11%. Com isso, voltamos a liderar o rankingdas maiores taxas do mundo. Ao mesmo tempo, ogoverno prometeu contingenciar R$ 40 bilhões naexecução orçamentária deste ano para garantir umsuperávit primário de 1,9% do PIB. Com isso, o prin-cipal componente do desequilíbrio financeiro do Es-

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DIRETRIZES GERAIS 11

tado brasileiro é, de longe, a conta de juros, que temconsumido entre 5% e 7% do PIB. É um recorde. Amédia mundial de comprometimento das finançaspúblicas com juros gira em torno de 1% do PIB, che-gando a 2% em casos excepcionais. O Brasil gasta,na conta de juros, praticamente a mesma quantidadede recursos investidos no seu sistema de SeguridadeSocial! Grande parte da dívida interna brasileira estánas mãos de 20 mil credores, enquanto o sistema deseguridade atende cerca de 130 milhões de pessoas.

Demonstração clara desta submissão é a recusado governo federal em cumprir o acordo, já bastanteinsuficiente, feito com governadores para renegociaros contratos das dívidas estaduais, devido às “tur-bulências do mercado”. Isto acontece porque o mo-delo econômico brasileiro está ancorado na financei-rização da economia, que se baseia no “Sistema daDívida Pública”, levando a ampliação do endivida-mento pela obrigação de amortizar o capital e pagaros juros. Somente uma auditoria independente podedemonstrar o quão lesivo é este processo. Neste sen-tido, o exemplo do Equador é eloquente, pois con-quistou uma redução de 75% no montante da dívidado país.

A Auditoria deve resultar na devida suspensãodo pagamento dos juros e amortizações da dívidapública, garantindo o direito dos pequenos poupa-dores e da aposentadoria dos trabalhadores que par-ticipam de fundos de pensão, dado o fato deles invi-abilizarem a capacidade do Estado em investir, porexemplo, nos direitos sociais – saúde, educação, ha-bitação, mobilidade urbana, saneamento, etc. Estasmedidas devem resguardar os pequenos e médiosdetentores dos títulos da dívida pública, que não se-rão prejudicados.

Nossa luta imediata será para que a economia doBrasil não siga amarrada aos interesses do grandecapital financeiro. Enquanto Dilma, Aécio e Ma-rina disputam o posto de fiadores do ajuste fiscal edo cumprimento das metas de superávit primário,nosso programa parte da definição de que os recur-sos hoje destinados ao pagamento da dívida para ascinco mil famílias mais ricas serão destinados aos in-vestimentos públicos, à saúde, educação, transportee demais gastos sociais. Daremos fim à desregu-lamentação da economia e da abertura financeira ecomercial irresponsável, bem como implantaremosum rígido controle de capitais para inibir a especu-lação. Ao mesmo tempo, nosso governo não conce-derá autonomia ao Banco Central, transformando-onum instrumento da retomada da soberania nacio-

nal frente ao imperialismo.Além disso, terá lugar central em nosso pro-

grama o combate à concentração de renda e às de-sigualdades. No mundo, 85 fortunas acumulam amesma riqueza que 3,5 bilhões de pessoas. No Brasilnão é diferente. As cinco mil famílias mais ricas con-centram a maior parte da riqueza produzida e aindarecebem dinheiro do governo, através dos juros dadívida pública. Este processo será estancado com oenfrentamento do problema da dívida, mas para serrevertido, é preciso avançar numa reforma tributáriaprofunda.

Várias medidas vão nesta direção. A primeira émudar a estrutura tributária, de regressiva para pro-gressiva. A modificação substantiva do sistema dealíquotas é fundamental, de forma que os ricos pa-guem proporcionalmente mais impostos do que aclasse média e os pobres. É inadmissível que sobreos rendimentos do trabalho da classe média incidaa mesma alíquota que incide sobre os rendimentosdo trabalho dos ricos. É necessária a desoneraçãotributária que incide diretamente sobre a renda dospobres e da classe média. A segunda consiste em eli-minar boa parte das medidas de desoneração, sejada folha de pagamento, seja a redução de IPI, prin-cipalmente de setores de bens de consumo duráveise dos setores em que há baixa concorrência. A ter-ceira consiste em fazer com que a tributação sobre osrendimentos do capital seja maior que a tributaçãosobre os rendimentos do trabalho. A quarta envolvea maior taxação do estoque de riqueza dos ricos. Aquinta trata de eliminar subsídios em financiamen-tos para projetos de investimento de grandes empre-sas e grupos econômicos. A sexta é acabar com o fi-nanciamento, com recursos públicos para empresasestrangeiras que operam no país. Por fim, a sétimamedida requer maior tributação do setor primário,inclusive, com impostos específicos sobre a exporta-ção.

O Imposto sobre as Grandes Fortunas – uma me-dida que consta na Constituição desde 1988 e atéhoje não foi regulamentada – deve ser uma fontede recursos e de justiça. Vamos inverter a lógicado atual sistema tributário, aumentando a tributaçãosobre a riqueza e a propriedade. Dessa forma po-deremos baixar os impostos sobre o salário e o con-sumo, beneficiando os mais pobres, os trabalhado-res, os pequenos comerciantes, os profissionais libe-rais, enfim, os que hoje sustentam o parasitismo depoucos.

Medidas como o Bolsa-Família devem ser trans-

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12 DIRETRIZES GERAIS

formadas em políticas efetivas de transferência derenda, tratadas como política de Estado e acompa-nhadas por transformações estruturais, pois isoladassão meramente paliativas e insuficientes para asse-gurar a vida digna que todos merecem. É sabidoque os aumentos reais do salário mínimo, ainda queabaixo do salário mínimo necessário apontado peloDIEESE, foram mais eficientes para a redução da po-breza do que programas de transferência de renda.Garantir emprego de melhor qualidade e salário dig-nos é fundamental. Neste sentido, também é impor-tante voltar a vincular o reajuste dos aposentados aodo salário mínimo, pôr fim ao fator previdenciário eanular a reforma da previdência de 2003.

Nosso programa também deve ser taxativo nadefesa da soberania nacional e, portanto, do controlepúblico das áreas estratégicas, como a energia, que éum fator crítico da soberania e do desenvolvimentode qualquer país. Há um potencial conflito de inte-resses geopolíticos inerente a uma gigantesca reservapetrolífera como a do Brasil. A política energética doPSDB e do PT, embora diferentes, têm sido um de-sastre para o Brasil, transitando de um sistema pú-blico, planejado e cooperativo, para um sistema pri-vado, mercantil, concorrencial, caro, ineficiente e de-vastador do meio-ambiente.

Outro ponto importante é a defesa de uma mu-dança na política de financiamento do BNDES. Nãopodem mais ser concedidos empréstimos para gran-

des empreiteiras e multinacionais, que têm capitalpróprio ou acesso a empréstimos internacionais, ouempresas que usam os recursos públicos para au-mentar a concentração e os monopólios. A priori-dade tem que ser estabelecida de acordo com os in-teresses da maioria do povo e não de um punhadode empresas privadas. Daremos fim e reverteremosas privatizações fortalecendo o Estado e seus instru-mentos de planejamento estratégico, qualificando epagando bem os servidores públicos, para prestarserviços de qualidade. Além disso, faremos uma au-ditoria nas obras públicas para identificar desvios derecursos, desperdícios e abusos.

Por fim, cabe destacar como elemento de cons-trução de um novo modelo econômico e de desen-volvimento, a necessidade de uma profunda revi-são do sistema agrário brasileiro. Além de uma re-forma agrária, que desmonte o latifúndio e desapro-prie propriedades que possam ser utilizadas parafins produtivos – sobretudo a produção de alimen-tos – será papel do Estado incentivar atividades quegerem empregos, desenvolvam de forma sustentávela economia no campo e fortaleçam a soberania naci-onal. Setores unicamente voltados à exportação decommodities não contarão com incentivo público eserão objeto de rigoroso controle por parte da socie-dade, com a reversão do processo de monopolizaçãono campo.

Eixo 2 – Sistema Político e Democracia

Compreendemos que as instituições da democra-cia brasileira não têm respondido aos interesses damaioria do povo. São instituições capturadas pelopoder econômico, corroídas pela corrupção e pelaimpunidade e distanciadas de uma representação le-gítima da população. Os processos eleitorais, instru-mento de legitimação dos governantes, constituem-se em grandes espetáculos de marketing, de enga-nação e falsas promessas. O poder econômico é de-terminante, o que deixa pequenas brechas por ondeeventualmente a genuína vontade popular conseguese expressar.

As mobilizações de junho de 2013 demonstrarama crise de representação da política tradicional e suasinstituições, especialmente para as novas gerações.O PSOL quer se apresentar como o partido que nadisputa institucional defende a ideia de que o podervem das ruas e para isso defenderá uma profunda

democratização do poder.

Por isso, em nosso governo, iremos refundar asinstituições apodrecidas e vazias de representativi-dade, para que correspondam à vontade popular.Criaremos mecanismos de democracia direta, quepermitam ao povo tomar a política e a economia emsuas próprias mãos, para colocá-las a serviço dos in-teresses da maioria. Da mesma forma, a revogabili-dade dos mandatos dos políticos, a exemplo do refe-rendo revogatório existente na Venezuela, é um ins-trumento fundamental na construção de uma viva eparticipativa democracia.

Uma reforma política real precisa interferir na-quilo que tem feito da política um grande negócio:o financiamento das campanhas por empresas pri-vadas. Trabalharemos para que sejam aprovadasleis que coíbam a influência do poder econômico so-bre os processos eleitorais, tal como sugere a Co-

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DIRETRIZES GERAIS 13

alizão Democrática por Eleições Limpas e a Plata-forma dos Movimentos Sociais pela Reforma Polí-tica. Na mesma medida, incentivaremos e garantire-mos a participação dos setores historicamente alija-dos da vida política, como mulheres, negros e outrossetores sociais hoje sub-representados.

Neste processo, precisaremos promover mudan-ças legais que permitam maior controle social sobreas instituições e os agentes políticos, com o fim daimpunidade aos criminosos do colarinho branco (en-quanto os presídios estão abarrotados de pobres) e

de seus privilégios, ampliação dos instrumentos defiscalização e controle, com um combate sistemáticoe implacável à corrupção.

Além disso, fundaremos uma nova governabili-dade: acabaremos com o eterno “toma-lá-dá-cá” noCongresso Nacional. Nossa relação com os parla-mentares se dará com base na vontade popular e asmudanças virão não por acordos espúrios, mas pelapressão das ruas. Essa é a verdadeira “nova polí-tica”.

Eixo 3 – Mais e Melhores Direitos

As manifestações de junho de 2013 trouxeramà tona um conjunto de problemas sociais que sãoo resultado do modelo econômico excludente, con-centrador e baseado na superexploração do traba-lho. Não foi por acaso que o estopim das mani-festações de junho foi o aumento das passagens deônibus. A questão do direito à cidade, em especialo problema da mobilidade urbana e o descaso dosgovernos com o transporte coletivo faz do desloca-mento diário uma verdadeira via-crúcis para o povo.Mas como foi dito nas manifestações “não era só porvinte centavos, era por direitos”. As demandas so-ciais são múltiplas, como a saúde, educação, fim daviolência, transparência, participação. . . Por isso as-sumimos o compromisso de implantar a Tarifa Zeronos principais centros urbanos, usando os recursoshoje destinados ao superávit primário para investirem transporte público, saúde, educação e cultura, in-clusive melhorando os salários dos servidores públi-cos, agentes fundamentais na melhoria dos serviçosoferecidos à população.

Nos últimos meses, graças às ocupações urbanaspromovidas principalmente pelo MTST, o tema damoradia popular tem ganhado destaque nacional.O programa Minha Casa Minha Vida tem sido umamina de ouro para as construtoras e o problema damoradia para as famílias pobres está longe de ser re-solvido. Vamos modificar totalmente este programa,retirando-o do controle das empreiteiras e compar-tilhando sua gestão com as entidades de luta pelamoradia. Além disso, vamos propor uma legislaçãoque estabeleça um rígido controle sobre os reajustesdos aluguéis, combatendo a especulação imobiliáriae taxando ainda mais os imóveis vazios. Como pro-põe o MTST, é preciso congelar os aluguéis enquantose formula uma nova lei do inquilinato no país.

A Reforma Agrária também é de vital importân-cia. Para o povo do campo é um modelo que podeassegurar o desenvolvimento regional. No caso dascidades, pode significar a garantia de alimentos maisbaratos e de melhor qualidade na mesa. Junto comos movimentos do campo, dentre eles o MST, busca-remos implementar um programa de reforma agrá-ria que parta da necessidade de democratização dapropriedade da terra, fixando limites, propondo areorganização da produção agrícola e priorizando aprodução de alimentos sem venenos.

No campo dos diretos básicos, em primeiro lu-gar não aceitaremos retrocessos como a flexibiliza-ção dos direitos trabalhistas, o cerceamento do di-reito à greve ou demissões arbitrárias, a exemplodos metroviários de São Paulo. O PSOL apoia aluta dos trabalhadores e buscaremos avanços, comoa jornada de 40 horas semanais e aumento dos sa-lários. Ampliaremos radicalmente os investimentospúblicos em saúde e educação. No SUS, efetuare-mos uma retomada global de suas funções originais,garantindo atendimento integral a todos de formagratuita e com qualidade. Na educação, assegura-remos a ampliação gradual dos investimentos públi-cos, coibindo o repasse para as instituições privadasde modo a universalizar o acesso a todos os níveis deeducação de forma gratuita através de instituiçõespúblicas.

No campo dos direitos humanos e das liberda-des civis são vários os temas que buscaremos en-frentar. O combate à homofobia, por exemplo, temgrande importância. Os ataques homofóbicos têmsido cada vez mais frequentes e a luta por direitos,como o casamento civil igualitário, ganha força prin-cipalmente junto à juventude.

O combate ao racismo também se fortaleceu nos

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14 DIRETRIZES GERAIS

últimos anos. O racismo que existe nas relações dasociedade brasileira vai além dos episódios mais gri-tantes que hora ou outra chamam atenção da opi-nião pública. Ele está presente no cotidiano da po-pulação. A sociedade brasileira é composta na suamaioria por negras e negros nos impondo o desafiourgente de combater o racismo, erradicar as diferen-ças e a apartação existentes que levam um segmentotão amplo da sociedade a ser excluído de boa partedos direitos.

A violência contra as mulheres, seus direitos se-xuais e reprodutivos, as mortes absurdas fruto dacriminalização do aborto e a desigualdade de gênerono mercado de trabalho também devem ser temascentrais em nosso governo. Por isso, a campanhado PSOL será porta-voz da luta contra os retroces-sos conservadores que almejam aprovar o Estatutodo Nascituro e dificultar o atendimento às vítimasde violência sexual. Devemos defender a legaliza-ção do aborto, a exemplo do que foi feito no Uruguai,o que diminuiu radicalmente os casos de morte dasmulheres em decorrência do aborto clandestino.

Um governo do PSOL teria a coragem que ou-tros não tiveram de avançar na democratização dosmeios de comunicação. A quebra dos oligopóliosmidiáticos e sua política de voz única terá atençãoespecial, com ênfase para o fim da propriedade cru-zada dos meios de comunicação. Nosso incentivoserá para instrumentos de comunicação alternativos,como rádios e TVs comunitárias, e aos meios públi-cos de mídia. Além disso, daremos ênfase para ocontrole social da mídia, com instrumentos de parti-cipação popular.

Quanto à segurança pública, iremos promoveruma mudança radical no atual sistema brasileiro, as-segurando outro papel para a polícia que não a de re-pressão aos mais pobres, preparando os trabalhado-res da segurança para coibir os crimes promovidospor quadrilhas especializadas. Além disso, batalharpor uma efetiva valorização dos policiais, bombei-ros e demais profissionais, tal como algumas propo-sições previstas nas Propostas de Emenda Constitu-cional 51 e 300. E também garantir o direito à sindi-calização e à greve.

A segurança deve ser entendida como um direitosocial fundamental. Não é possível pensar em demo-cratizar nossa sociedade sem golpear um dos aspec-tos mais brutais da política do aparelho de Estado:

a utilização de polícias militares como instrumentode genocídio contra a população pobre e de crimina-lização de suas lutas sociais, para manutenção dosinteresses das elites. Por isso, o PSOL defende a des-militarização e a unificação das polícias.

Devemos lembrar que o Brasil é o quarto paísdo mundo em população carcerária, atrás apenasdos EUA, Rússia e China. Levantamento feito peloInstituto Avante Brasil, com dados do InfoPen, doMinistério da Justiça, apontou um crescimento de508,8% na população carcerária brasileira no períodode 1990 a 2012. E quem são estes presos? No ano de2012 os pardos e negros eram ampla maioria. Tam-bém era maioria os que têm o Ensino FundamentalIncompleto. Os jovens também eram maioria: quase30% tinha entre 18 e 24 anos e 25,3%, entre 25 e 29anos. Neste contexto, o comércio ilícito de entorpe-centes aparece em segundo lugar de incidência (atrásdos crimes patrimoniais) atingindo 24,43% da popu-lação carcerária em geral, e no que diz respeito à po-pulação carcerária feminina, é a principal causa deencarceramento, atingido 49,65% das presas.

Nos presídios, lugar reservado aos indivíduosconsiderados “descartáveis” pelo Estado até hoje,reina a barbárie, como vimos de forma mais agudano Maranhão. A sociedade se chocou com a violên-cia em Pedrinhas, mas é hora de refletir por que sechegou a este extremo. É hora de parar o clamor porencarceramento e aumentar o clamor por direitos.

Neste sentido, apresentamos um conjunto depropostas que começa apontando para o fim da cha-mada guerra às drogas. Esta guerra é hoje o maispoderoso instrumento de criminalização da pobrezae de instigação ao racismo. A morte de Amarildo,Cláudia e DG, dentre tantos outros, também é resul-tado da guerra às drogas. Ela legitima a violênciae as violações aos direitos humanos cometidas pelopróprio Estado contra os pobres. Muito embora in-suficiente do ponto de vista da desestruturação dotráfico e de todas as suas consequências, a descri-minalização da maconha é um inegável passo adi-ante. O Uruguai é o primeiro país da América La-tina a legalizar o uso, plantio e venda da maconha.O consumo já não era mais crime há muitos anos e aprincipal preocupação do governo foi impedir o nar-cotráfico de seguir dominando o mercado. Este é ocaminho que queremos seguir.

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DIRETRIZES GERAIS 15

Agradecimentos

Este documento não teria sido possível sem as elaborações de Reinaldo Gonçalves, César Benjamin, MariaLúcia Fatorelli, Chico Alencar e Guilherme Estrella. A eles, os sinceros agradecimentos do Partido Socialismoe Liberdade.

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16 ECONOMIA

1 EconomiaA política macroeconômica define as princi-

pais variáveis de uma economia e é determinantepara pensar qualquer política de desenvolvimento.Subordiná-las a outros preceitos que não os do mer-cado é imperativo para uma política de desenvolvi-mento alternativa, voltada para as necessidades daclasse trabalhadora e do povo e não do grande capi-tal como tem sido a regra dos últimos anos no Brasil.

A atual política econômica demonstra como é pa-tente que o Brasil não tem mais condições de le-var adiante nos mesmos moldes o ciclo de cresci-mento prometido pelo lulismo. O aquecimento daeconomia por meio da oligopolização crescente dossetores-chaves e da continuação da política de priva-tizações nas suas mais diversas modalidades mostrasuas grandes fragilidades por não ter dado conta decombater a total falta de prioridade, planejamentoe investimento em políticas públicas fundamentaiscomo as de saúde, educação, transporte e habitação.

O que precisamos agora é de um ciclo de políticasde combate à desigualdade. Tal ciclo não será base-ado na transferência direta de renda, mas na constru-ção de sistemas de serviços públicos em educação,saúde e transporte. Esta é uma maneira de fortalecera capacidade de compra dos salários através da limi-tação de gastos das famílias. Ele será baseado tam-bém na limitação da disparidade salarial. A políticamacroeconômica do nosso governo estará a serviçodisso.

Prioridades:

a) Mudar a política econômica reduzindo juros,terminando com a política antipovo dos supe-rávits primários no orçamento da União e al-terando a sobrevalorização cambial e a irres-ponsável liberalização da conta de capitais (au-sência de controles soberanos sobre entrada esaída de moeda estrangeira do país).

b) Enfrentar o sistema da dívida, fazendo umaauditoria que impulsione o fim da entrega dosrecursos públicos para os rentistas e especula-dores e liberando o recurso público para inves-tir nas necessidades da população.

c) Fazer uma revolução tributária, invertendoa estrutura desigual e regressiva que tributaprincipalmente os assalariados para outra que

tribute principalmente a grande propriedade.Instituir o imposto sobre as grandes fortunas,com alíquota de 5% ao ano sobre patrimôniosa partir de 50 milhões de reais.

d) Mudar profundamente o modelo produtivoque atualmente privilegia os bancos, o agrone-gócio, as empreiteiras e as grandes empresasexportadoras para buscar um modelo social-mente justo e ecologicamente sustentável emque a prioridade seja a produção de alimen-tos saudáveis e de bens e serviços com maiorincorporação de conhecimento e tecnologias,sempre que voltados para as necessidades damaioria.

e) Combater a vulnerabilidade externa estruturalda economia brasileira, enfrentando o capitalfinanceiro, a lógica determinista do mercado ea aceitação do papel subordinado do Brasil nadivisão internacional do trabalho como produ-tor de matérias-primas e importador de tecno-logia. Utilizar o BNDES e outros bancos públi-cos para apoiar tecnologias alternativas e nãopara financiar oligopólios, empreiteiras e gran-des empresas do atual modelo agromineiro ex-portador.

f) Priorizar obras de infraestrutura que atendamao interesses públicos e não se justifiquem ape-nas pelos interesses do grande capital.

Propostas de ação:

1. Combater a inflação reduzindo as taxasde juros

O chamado “Regime de Metas de Inflação” é umdos itens do chamado “tripé macroeconômico”. Eleé defendido por todos os 3 candidatos dos grandespartidos, como se fosse algo “natural” e “virtuoso”para o controle dos preços. Porém, este regime foiinstituído em 1999 a mando do FMI, e não tem sidoeficaz no combate à inflação, pois se baseia na teorianeoliberal de que o aumento de preços seria resul-tado de uma suposta demanda exagerada por pro-dutos e serviços, sendo então necessário manter altastaxas de juros para reduzir a atividade econômica e,assim, controlar os preços.

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ECONOMIA 17

Porém, nos últimos 12 meses terminados emagosto de 2014, a maior parte da inflação (de 6,51%,conforme o IPCA) decorreu da alta dos preços dosalimentos – que subiram 7,53%, principalmente de-vido a problemas climáticos – e dos preços controla-dos pelo próprio governo, como energia elétrica (quesubiu 13,58%), planos de saúde (9,27%), e educaçãoprivada (8,87%).

Ou seja: as taxas de juros nada têm a ver com pro-blemas climáticos ou com a decisão do próprio go-verno em aumentar preços das tarifas públicas. Narealidade, a manutenção de altas taxas de juros favo-rece somente ao capital financeiro, ou seja, os bancose grandes investidores, que ganham com a dívidapública às custas do povo. Portanto, é plenamentepossível reduzir a taxa de juros sem provocar infla-ção. Aliás, a redução nas taxas propicia o aumentodo investimento, o que aumenta a oferta futura deprodutos e serviços, reduzindo-se assim a inflação.

Para realmente combater a inflação de alimen-tos é necessário executar uma política séria de segu-rança alimentar, fortalecendo a agricultura familiarcom uma reforma agrária de verdade, infraestruturapara as famílias assentadas, e apoio governamentalpara a comercialização direta da produção via feiraslivres e pontos de comercialização alternativos.

No que se refere aos preços administrados pelogoverno (como combustíveis, energia elétrica, trans-porte público, plano de saúde, educação privada, te-lecomunicações), eles tiveram um aumento de nadamenos que 568% de julho de 1994 a fevereiro de 2014,enquanto o índice geral de inflação (IPCA) foi de351% no período. Portanto, não é verdade que astarifas públicas tenham de ser ainda mais aumenta-das, conforme defendem os teóricos neoliberais e os3 candidatos dos grandes partidos. Na realidade, de-veria haver uma forte redução em tais preços, dadosos enormes lucros das empresas privatizadas nas úl-timas décadas.

2. Abaixo à política do “superávit primá-rio”: auditoria da dívida já!

Outra política defendida pelos 3 candidatos dosgrandes partidos - e que também integra o chamado“tripé” - é a manutenção de altos “superávits primá-rios”, ou seja, o corte de gastos sociais para o paga-mento da dívida pública. Esta política também nãotem nada de “natural” ou “virtuosa”, e também foiimposta ao país pelo FMI em 1999 e mantida até hoje.A tal “meta” de superávit faz com que parte signi-

ficativa das chamadas “receitas primárias” (ou seja,principalmente os tributos arrecadados) sejam desti-nados para o pagamento da dívida. Além disso, tal“meta” faz com que outras receitas, de centenas debilhões de reais por ano (tais como os novos emprés-timos, os eventuais lucros do Banco Central, os ren-dimentos da Conta Única do Tesouro, os recebimen-tos de juros e amortizações das dívidas dos estados emunicípios com a União, etc) também tenham de serdestinadas principalmente ao pagamento da dívida,pois se fossem destinadas a gastos sociais, a “meta”seria ameaçada.

Desta forma, ao influenciar todo o orçamento pú-blico, tal “meta” de superávit primário impõe que ogoverno federal destine mais de 40% de seus recur-sos para o pagamento de uma questionável dívida,repleta de indícios de ilegalidades, tais como:

• Boa parte da dívida atual decorre da obscurae questionável dívida da ditadura (ou seja, umgoverno ilegítimo), com cláusulas ilegais e semdocumentação;

• Utilização de juros flutuantes, ilegais segundoo Direito Internacional;

• A aplicação de juros sobre juros (“anatocismo”,vedado pela Súmula 121 do STF);

• O pagamento antecipado de parcelas da dívidaexterna com ágio de até 70%;

• A realização, pelo Banco Central, de reuniõestrimestrais com representantes de bancos e ou-tros rentistas, para estimar variáveis como ju-ros e inflação, que depois são utilizadas peloCOPOM para a definição das taxas de juros (ouseja, é “colocar a raposa para tomar conta dogalinheiro”);

• Ausência de contratos e documentos; ausênciade conciliação de cifras;

• A grande destinação dos recursos orçamentá-rios para o pagamento da dívida viola os direi-tos humanos e sociais.

As atuais dívidas de estados e municípios com aUnião também possuem sérios indícios de ilegalida-des e fazem parte do mesmo sistema, dado que osjuros e amortizações pagas pelos entes federados àUnião são destinados por esta última para o paga-mento da também questionável dívida federal. Con-siderando que os entes federados já pagaram esta dí-vida várias vezes (ao mesmo tempo em que o saldo

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18 ECONOMIA

das dívidas explodiu), é necessário que o governo fe-deral finalmente pare de atuar como um agiota dosestados e municípios e anule esta dívida, permitindoque os entes federados possam utilizar estes recur-sos para investimentos em área sociais importantes,como saúde, educação e transporte público.

Portanto, é necessário fazer uma ampla e pro-funda auditoria sobre todas estas dívidas (federais,estaduais e municipais). A auditoria da dívida estáprevista na Constituição de 1988, porém, jamais foirealizada. Ela deve resultar na devida suspensão dopagamento dos juros e amortizações da dívida pú-blica, garantindo o direito dos pequenos poupado-res e da aposentadoria dos trabalhadores que parti-cipam de fundos de pensão. Estas medidas devemresguardar os pequenos e médios detentores dos tí-tulos da dívida pública, que não serão prejudicados.

Enfrentar o problema da dívida é fundamentalpara o crescimento significativo dos gastos sociais epara que estados e municípios disponham de recur-sos para atender suas crescentes responsabilidadescomo saúde, educação e transporte público.

3. Controle sobre o fluxo de capitais

O chamado “câmbio flutuante” é o terceiro com-ponente do “tripé” da atual política econômica epode ser traduzido, em bom português, na livreentrada e saída de capitais internacionais, o quetambém foi imposto pelo FMI nas últimas décadas.Nesta política liberalizante, quando há entrada dedólares no país, o preço do dólar cai (ou seja, o realse valoriza), e quando há saída de dólares, o preçodo dólar sobe (o real se desvaloriza).

Dentro dessa orientação neoliberal, o grande ca-pital nacional e internacional pode retaliar imediata-mente o governo - por meio da fuga de capitais – emresposta a qualquer medida que considerem preju-dicial a seus interesses, tal como a significativa redu-ção dos juros, a auditoria da dívida, a tributação dasgrandes fortunas, etc. Assim, o câmbio se torna uminstrumento de chantagem do capital contra a popu-lação.

Diante disso, muitos países (como a Malásia eChina) adotaram mecanismos de controles sobre osfluxos de capitais, como, por exemplo, o estabeleci-mento de prazos mínimos de permanência ou condi-ções prévias para sua entrada (investimento em de-terminados setores, contrapartidas sociais, etc). Inte-ressante ressaltar que tais mecanismos são aplicadosinclusive por países capitalistas e são defendidos até

mesmo por economistas que estão no governo do PT.Atualmente, o governo alega que não tem de se

preocupar com isso, pois o Brasil possui cerca deUS$ 380 bilhões em reservas internacionais e o BancoCentral poderia ofertar dólares na economia paracompensar uma eventual fuga de capitais. Porém,estas reservas não seriam suficientes para defender oBrasil caso fossem adotadas medidas realmente con-trárias aos interesses do capital. Além do mais, é im-portante ressaltar que tais reservas foram obtidas àscustas de mais dívida interna, que paga juros altíssi-mos.

Tais reservas começaram a aumentar significati-vamente a partir da segunda metade da década de2000, quando aumentou a entrada de dólares no Bra-sil, devido a diversos fatores: (a) novo ciclo de in-vestimentos internacionais, após uma leva de cri-ses financeiras; (b) aumento do preço das commo-dities, aumentando as receitas em dólares de expor-tações brasileiras; (c) isenção de Imposto de Rendasobre os ganhos dos estrangeiros com os juros da dí-vida interna, iniciada em 2006; (d) altas taxas de ju-ros brasileiras, em comparação às taxas vigentes nospaíses do Norte; (d) a recente política dos EUA eUnião Europeia de injetar trilhões de dólares e eu-ros na economia para salvar bancos falidos, gerandouma “tsunami” (palavra usada pela própria Presi-denta Dilma) de dólares para o Brasil, que paga jurosmuito atraentes.

Para tentar evitar uma desvalorização aindamaior da moeda norte-americana, o Banco Centralcompra estes dólares que chegam ao Brasil, ofer-tando em troca títulos da dívida interna, sem limitealgum para esta operação, o que representa um es-candaloso e ilegítimo mecanismo de enriquecimentodo capital às custas do povo. Devido às altíssimas ta-xas de juros estabelecidas no país e à liberdade totalde movimentação de capitais, o dólar fica abundantee se desvaloriza (seu preço em reais cai), razão pelaqual a taxa de câmbio média em 2013 foi de apenasR$ 2,16.

Desta forma, enquanto os preços dos produtosbrasileiros aumentaram em média 110% no período,o preço dos importados caiu, gerando uma invasãode produtos estrangeiros, desindustrializando o paíse causando desemprego na industria. É verdade quetemos de descontar destes 110% a inflação ocorridanos EUA, porém, esta foi de apenas 29,5% no pe-ríodo.

Logicamente, a saída para este problema é o con-trole sobre o fluxo de capitais e a redução dos juros,

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ECONOMIA 19

porém, o governo tenta aliviar essa situação desone-rando as empresas de tributos, tais como a contri-buição previdenciária patronal, prejudicando os tra-balhadores.

4. Revolução Tributária

Atualmente, o sistema tributário brasileiro émuito injusto, pois penaliza os trabalhadores e con-sumidores de produtos essenciais à sobrevivência,enquanto privilegia os detentores de grandes rendas,o capital financeiro, os latifúndios e fortunas.

É necessário, por exemplo:

• Regulamentar o Imposto sobre Grandes Fortu-nas;

• Acabar com a chamada “dedução de juros so-bre capital próprio”, ou seja, a permissão paraque empresas deduzam de seus lucros – redu-zindo, portanto, a base de cálculo do IRPJ eCSLL – o montante de juros que teriam pagocaso todo o seu capital tivesse sido tomado em-prestado;

• Acabar com a isenção de Imposto de Renda so-bre a distribuição de lucros e dividendos;

• Revisar a Lei Kandir, que isenta de ICMS pro-dutos primários e semi-elaborados destinadosà exportação;

• Restabelecer a alíquota de 30% da CSLL do se-tor financeiro;

• Acabar com a isenção de Imposto de Renda so-bre os ganhos dos estrangeiros com a dívidainterna;

• Corrigir a tabela do IRPF e reformular as faixase alíquotas, de modo a poupar a classe média epenalizar os muito ricos;

• Acabar com a DRU (Desvinculação das Re-ceitas da União), que permite que o governopossa gastar como quiser 20% das receitas quedeveriam ir para despesas legal ou constituci-onalmente vinculadas, como a saúde e previ-dência;

• Reformular o Imposto Territorial Rural;

• Desonerar a Cesta Básica, que ainda inclui tri-butos com o ICMS;

• Rever os incentivos concedidos recentemente,como a redução de IPI para veículos individu-ais e extinção da contribuição previdenciáriapatronal.

5. Lei de Responsabilidade Social

Alterando drasticamente o modelo de desenvol-vimento econômico até então vigente no país e se-guindo fielmente os ditames internacionais nos anos90, as elites brasileiras empreendera, através de seusrepresentantes eleitos, uma profunda reforma nasestruturas do Estado. Além das privatizações e dapolítica econômica baseada no tripé juros-superávit-câmbio, outras medidas foram tomadas para estran-gular os investimentos públicos em favor do paga-mento da dívida pública para os agiotas internacio-nais.

Remodelando com esmero o Estado brasileiro, noque fosse possível, o neoliberalismo alterar profun-damente boa parte do corpo normativo brasileiro.Dentre as principais medidas aprovadas no começoda década passada está a Lei de ResponsabilidadeFiscal – LRF. Se por um lado, a LRF impediu a gas-tança irresponsável de políticos oportunistas na es-fera municipal e estadual, por outro, serviu para su-focar os investimentos públicos e justificar o ajustefiscal implementado desde os anos 90.

A LRF resultou na manutenção e nos agrava-mento dos índices sociais, bem como na perda dacapacidade estatal de responder rápido e eficiente-mente a situações de crises e reivindicações soci-ais. Ela está inserida numa política macro e micro-econômica de disciplina monetária, austeridade fis-cal, corte dos gastos públicos, reformas administrati-vas, previdenciárias e fiscais, desoneração do capital,abertura e, consequente, exposição do parque indus-trial nacional à concorrência estrangeira e, principal-mente, superação do modelo de desenvolvimentonacional até então adotado, o que significava des-regulamentar os mercados financeiros, flexibilizar omundo do trabalho e privatizar empresas e serviçospúblicos.

O PSOL defende que, mais que uma Lei de Res-ponsabilidade Fiscal, o país precisa de uma Lei deResponsabilidade Social, que obrigue os governosem todas as esferas - municipal, estadual e nacional -a retomar os investimentos públicos em direitos, ser-viços e infraestrutura. Como tem sido proposto pordiversos setores organizados, intelectuais e ativistaspolíticos, uma Lei de Responsabilidade Social teria

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20 ECONOMIA

como objetivo o pagamento da dívida social do Es-tado para com a população, a publicização das açõespúblicas; o empoderamento social e a construção deum sistema de Governança Social, onde os gover-nos deveriam cumprir indicadores sociais mínimosde investimento em serviços e infraestrutura. Comisso, A Lei de Responsabilidade Social apresenta ino-vações como a garantia de recursos orçamentários eo não contigenciamento de recursos destinados a es-ses serviços; a fixação de metas macrossociais e a ins-tituição do Índice Nacional de Responsabilidade So-cial, como forma de orientar os programas e as açõesgovernamentais na destinação de recursos orçamen-tários e integrar os instrumentos de planejamento eorçamento.

6. Combate à desindustrialização e à repri-marização da economia

O modelo econômico aprofundado por DilmaRoussef produziu o fenômeno que tem sido cha-mado de “desindustrialização”. A chamada desin-dustrialização não é exclusivamente resultado doserros de política econômica, mas produto do proteci-onismo dos países centrais, da imensa força da revo-lução científico-técnica que ali se verifica e da eleva-ção dos preços das matérias primas e produtos agrí-colas. O exemplo mais significativo é o preço da soja- que tanto enriqueceu quanto fortaleceu o latifúndiono país - mas não é, certamente, o único produto. Emrelação a 2005, o aumento dos preços acumulados atéabril de 2008 para o conjunto dos produtos básicosno mercado internacional foi aproximadamente de65%, indica estudo recente. Na mesma direção, ospreços dos metais cresceram 81% e os combustíveis79%. O período corresponde precisamente ao iníciodo segundo mandado do presidente Lula, e a ten-dência favorável aos preços destes produtos aindanão sofreu um abalo significativo, mesmo após se-tembro de 2008. Os efeitos para o Brasil são mais queevidentes, já que a origem dos sucessivos superávitscomerciais revela um segredo que poucos estão dis-postos a tratar: entre 1980 e 2007, a participação dosetor industrial no valor adicionado total da econo-mia brasileira recuou 6,2 pontos percentuais. Estatendência foi acentuada no período recente, pós se-tembro de 2008, como indicam outros estudos. Noque se refere ao balanço de pagamentos, há muitotempo se sabe que a origem do “superávit comer-cial” se produz a partir da exportação de produtosagrícolas e minerais, amargando imenso déficit na

área de eletroeletrônico, fármacos, química, equipa-mentos mecânicos, etc.

Um alerta sobre este problema foi feito peloIPEA, instituição de pesquisa do governo brasileiro.Um estudo preliminar indica que os vultuosos recur-sos do BNDES (aliás, com reforço do Tesouro Naci-onal) estão sendo utilizados para fortalecer ou for-mar grandes grupos empresariais privados na áreade alimentos e recursos naturais. Ademais, o esforçoda política industrial nacional, especialmente a par-tir de 2003, não rendeu resultados na direção de su-perar saldos comerciais negativos originados a par-tir de produtos de média e alta tecnologia; ao con-trário, são precisamente os setores responsáveis peladrástica diminuição dos outrora mega-superávits co-merciais. A expansão das empresas brasileiras nomercado mundial, ainda baseia-se nos setores inten-sivos em recursos naturais e commodities. Os recur-sos do BNDES também foram utilizados para salvargrupos econômicos nacionais de suas aventuras nafesta mundial da especulação. Grupos econômicoscomo Sadia, Votorantin, Aracruz, entre outros, sofre-ram perdas importantes nos negócios arriscados emque se envolveram e, como sempre, levaram a contapara o Estado pagar.

Luciana Genro buscará estimular a industrializa-ção do país, retomando a capacidade produtiva deparques industriais estratégicos, revendo privatiza-ções de setor fundamentais para o desenvolvimento,investindo em produção de ciência e tecnologia, di-minuindo a dependência externa, taxando as expor-tações de commodities, alterando as prioridades deinvestimento do BNDES e mudando a política desubsídios e renúncia fiscal hoje em vigor.

7. Financiamento com juros baixos para aspessoas e o setor produtivo

Conforme mostram os dados do Banco Central,atualmente a taxa média dos empréstimos dos ban-cos para pessoas físicas é de 43,2% ao ano, e parapessoas jurídicas, de 23,1% ao ano, taxas estas aindasuperiores à taxa Selic, atualmente em 11% ao ano.Isto significa que os bancos se interessam em em-prestar a pessoas e empresas apenas a juros altíssi-mos, pois possuem rendimentos garantidos empres-tando ao governo.

Com a revisão da política de endividamento pú-blico, os bancos se verão na obrigação de emprestarao setor produtivo e às pessoas a juros baixos. En-tendemos que é necessário estimular esses setores,

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especialmente no que se refere às micro, pequenas emédias empresas, agricultura familiar, ciência e tec-nologia, serviços e empreendimentos cooperativos,combatendo a tendência de monopolização e oligo-polização presente em nossa economia.

8. Revisão das Privatizações

É necessário fazer uma ampla auditoria do pro-cesso de privatizações, que foi feito a partir dos anos90 sob a justificativa de que o governo não tinha di-nheiro para investir nas estatais, e que por isso elasdeveriam ser vendidas para se obter dinheiro parapagar a dívida pública. Outros argumentos larga-mente utilizados foram que as empresas públicas de-veriam ser transferidas ao controle privado para quehouvesse uma melhoria na produtividade, para queos preços dos serviços públicos caíssem, e que a qua-lidade destes serviços fosse melhorada.

Na prática, as privatizações foram financiadaspelo BNDES (banco estatal), a dívida pública explo-diu, os preços das tarifas também, e a qualidade dosserviços (principalmente da telefonia) deixa muito adesejar. Além do mais, houveram sérias ilegalidadesno processo de privatizações.

Por esta razão, as privatizações devem ser revis-tas, e empresas devem ser reestatizadas. É claro queanalistas neoliberais poderiam argumentar que istoseria “quebra de contrato”, porém, nos casos em queas promessas das privatizações não se confirmaram,é plenamente justificável e legítimo a retomada detais empresas pelo Estado.

Além disso, deve ser revista a atual política degestão das empresas estatais, que estão visando lu-cro, cobrando caro da população (tarifas bancárias,juros altos, combustíveis caros), e sacrificando os tra-balhadores. É preciso revogar a Lei 9.530/1997, se-gundo a qual todos os lucros das estatais distribuí-dos ao governo federal devem ser destinados para opagamento da dívida pública.

9. Retomar a capacidade de planejamentodo Estado

O planejamento estatal já teve papel central nodesenvolvimento do Brasil. Porém, a onda neolibe-ral que varreu o país a partir dos anos 90 acabou comisso. Com as sucessivas crises internacionais, o Es-tado perdeu a capacidade de planejar, respondendo

pelas demandas mais emergentes do mercado e daeconomia. Nem a criação dos Planos de Aceleraçãodo Crescimento (PACs), nem o debate em torno doorçamento público – uma queda de braço entre os di-versos interesses do capital - serviram para respon-der às necessidade de retomada do planejamento.

No governo do PSOL, com as mudanças quepromoveremos, a atividade de planejamento esta-tal também deverá ser reformulada. O planeja-mento não pode ser nem concebido nem executadode forma externa e coercitiva aos diversos setores so-ciais diretamente atingidos pelas medidas estatais.Além disso, com a multiplicação e a complexidadedos problemas econômicos, houve uma tendênciageral de se pulverizar o planejamento como algo queprecede, condiciona e orienta a ação pública. Issoaconteceu também no Brasil, sobretudo na década de1990. O governo de Luciana Genro terá como metasno campo do planejamento: i) a inserção internacio-nal soberana; ii) a macroeconomia para o desenvol-vimento e fim das desigualdades; iii) infraestruturaeconômica, social e urbana; iv) estrutura tecnopro-dutiva avançada e regionalmente articulada; v) sus-tentabilidade ambiental; vi) proteção social, garantiade direitos e geração de oportunidades; e vii) fortale-cimento do Estado, das instituições e da democracia.

10. Aumentar a renda dos brasileiros e re-verter a bolha de endividamento das famí-lias

Contrariamente ao discurso oficial, nos últi-mos anos não ocorreu um aumento significativona renda dos trabalhadores. Conforme mostra aPNAD/IBGE, o rendimento médio mensal real dostrabalhadores em 2012, de R$ 1.507, foi apenas11% superior ao valor observado em 1996 , de R$1.358 (todos estes valores atualizados monetaria-mente para set/2012). Ou seja, em 16 anos, os traba-lhadores aumentaram em apenas 11% o seu salário,daí os problemas atuais relativos ao superendivida-mento das famílias.

É preciso condicionar a redução de tributos so-bre o consumo à redução dos preços e ao aumentosignificativo dos salários. Para tanto, é preciso fazerfuncionar os instrumentos de defesa da concorrên-cia, para que segmentos oligopolizados não possamse apropriar dos ganhos decorrentes da redução dostributos incidentes sobre o consumo de produtos.

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22 TRABALHO, EMPREGO E RENDA

2 Trabalho, emprego e rendaO papel de um governo efetivamente de es-

querda é gerenciar a macroeconomia com o obje-tivo de assegurar a melhora da qualidade de vida dopovo pobre, dos trabalhadores do campo e da cidadee das classes médias. Os grandes partidos defendema atual política, que limita o aumento do salário mí-nimo ao aumento do PIB, o que é extremamente pre-judicial, principalmente em uma conjuntura de re-cessão. Desta forma, serão necessárias várias déca-das para que o salário mínimo atual atinja o patamarexigido pela Constituição.

A eterna justificativa oficial para este aumentopífio é que a Previdência Social não teria recursospara aumentar as aposentadorias, porém, a Previ-dência está inserida na Seguridade Social (na qualestão também as áreas de saúde e assistência), queapresenta superávits gigantescos, de mais de R$ 70bilhões por ano. O problema é que o governo uti-liza a maior parte do orçamento federal para pagar aquestionável dívida pública.

É necessário alterar esta política, garantindo queo salário mínimo atinja em poucos anos o mínimoexigido pela Constituição, que os servidores públi-cos tenham suas perdas repostas e lhes seja assegu-rado plano de carreira, assim como que a jornada detrabalho seja reduzida para assegurar mais empre-gos e melhores condições de vida.

O PSOL e Luciana Genro têm propostas para me-lhoras a qualidade de vida e a capacidade de con-sumo das trabalhadoras e trabalhadores brasileiros.Veja:

1. Salário Mínimo que garanta a sobrevi-vência dos trabalhadores

O atual salário mínimo (R$ 724) é quatro vezesinferior ao que deveria ser, conforme a Constituição(R$ 2.915,07, conforme o DIEESE), ou seja, o valorcapaz de atender às necessidades vitais básicas dostrabalhadores e às de sua família com moradia, ali-mentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene,transporte e previdência social.

2. Salário Máximo

Nenhuma empresa pública ou privada poderáter salários maiores do que 30 vezes o menor salá-rio por ela oferecido. A limitação de salários serve

para impedir, entre outras coisas, a degradação sala-rial das camadas mais pobres da população.

3. Concursos Públicos

Ampliação dos concursos públicos, com vistas adiminuir a dependência de diversos setores do ser-viço público dos chamados “cargos de confiança” egarantir efetiva garantia de funcionamento dos ser-viços públicos a toda população, com profissionaistreinados e bem remunerados.

4. Precarização e Terceirizações

Combate à precarização do trabalho e desestí-mulo à terceirização no serviço público. Contra aaprovação do PL 4330 e garantia da promoção depolíticas efetivas de formalização do trabalho e ga-rantia da negociação coletiva para todas as trabalha-doras e trabalhadores.

5. Plano de carreira para todas as ativida-des do serviço público

Dialogar com as diversas carreiras do serviço pú-blico federal que ainda não possuem Plano de Car-gos, Carreiras e Salários, com vistas a estender essedireito a todos os trabalhadores e trabalhadoras doserviço público.

6. Combate ao assédio moral

Ampliar a legislação para coibir casos de assédiomoral no ambiente de trabalho, garantindo ao traba-lhador o direito de denúncia e de proteção.

7. Democratização do sindicalismo

Defendemos a plena liberdade de organizaçãosindical, com uma mudança da estrutura sindical.Fim da intervenção do Estado sobre a organizaçãodos trabalhadores/as. Fim da unicidade, da investi-dura e do imposto sindical. Fim do poder normativoda justiça do trabalho.

8. Reposição das perdas dos servidores pú-blicos

Ao contrário do que é falado pela grande im-prensa, os gastos com servidores públicos caíram

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TRABALHO, EMPREGO E RENDA 23

drasticamente nas últimas décadas. Em 1995, pri-meiro ano do governo FHC, os gastos com servido-res equivaliam a 54,5% da Receita Corrente Líquidado Governo Federal. Quase vinte anos depois, estepercentual caiu para 31,1% (Fonte: Boletim Estatís-tico de Pessoal do Ministério do Planejamento, junhode 2014, pág 38). Nas últimas décadas, os servidorespúblicos foram prejudicados por vários anos segui-dos sem reajuste, e com a negativa do governo emrealizar negociações respeitosas com as diversas ca-tegorias. Foram diversos os casos de corte de ponto eoutras formas de ameaças feitas pelo governo, tendosido necessário uma grande greve para que os ser-vidores tivessem um reajuste de 5% por ano nes-tes 3 anos, o que não cobre sequer a inflação. En-quanto isso, os rentistas da dívida pública não pre-cisam fazer nada para conseguir uma taxa de remu-neração de 11% sobre seus títulos públicos, às custas

do povo.

9. Redução da Jornada de Trabalho para 40horas semanais

Adoção da Convenção 158 da OIT e o fim da ro-tatividade no emprego. Redução da jornada de tra-balho para 40 horas semanais sem redução de salá-rio com vistas a ampliar o emprego, limitando aomesmo tempo a realização de jornada de trabalhoextraordinária.

10. Garantia do direito de Organização porLocal de Trabalho

Garantia da negociação coletiva e do respeito eextensão das conquistas para todos, inclusive tercei-rizados, prestadores de serviço e outras formas decontratação precárias da força de trabalho.

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24 SISTEMA PREVIDENCIÁRIO E APOSENTADORIAS

3 Sistema previdenciário e aposentadoriasNosso programa sobre a Previdência Social e

aposentadorias baseia-se no acúmulo geral dos mo-vimentos sociais do setor, bem como nas lutas quetravamos contra a retirada de direitos. Esta luta temum significado político especial para nós: a luta con-tra a Reforma da Previdência, realizada no primeiromandato de Lula, culminou com a expulsão ou pu-nição de vários setores do PT que vieram a fundar econstruir o PSOL. Por isso, reafirmamos em nossoprograma o compromisso que temos com as gera-ções passadas, atuais e futuras na defesa de um Re-gime Previdenciário público e que ofereça aposenta-dorias e pensões dignas e compatíveis com a enormecontribuição dada pelos trabalhadores ao nosso país.

Como já sabemos, a Previdência Pública faz parteda Seguridade Social, que é o conjunto de ações des-tinadas a assegurar os direitos à saúde, à previdên-cia e à assistência social (doença, invalidez, morte,idade avançada, proteção à maternidade, à gestante,ao trabalhador em situação de desemprego involun-tário, salário-família, auxílio-reclusão e pensão pormorte).

A Seguridade Social é fundamental para a popu-lação e seu objetivo central não é o lucro, mas o bemestar social. Ela é financiada pela sociedade, com re-cursos da União, Estados, Distrito Federal, Municí-pios, contribuições do empregador, dos trabalhado-res e trabalhadoras, das receitas de concursos de lo-teria, dentre outros.

O final do século XX e o início do século XXI têmsido caracterizados por variados ataques aos siste-mas previdenciários em todo o mundo. No Brasilnão foi diferente. Os governos de FHC (1995-2002)e os governos do PT (2003-) realizaram sucessivosataques aos direitos previdenciários dos trabalhado-res. Cada vez mais coloca-se a necessidade de inten-sificar a luta dos ativos, aposentados e aposentadasfrente aos ataques brutais e permanentes aos direitossociais, muitos dos quais se julgava consolidados noBrasil e no mundo.

Além disso, é cada vez menor o valor das aposen-tadorias e pensões. Além dos reajustes irrisórios, namaioria das vezes abaixo da inflação acumulada, osgovernos utilizam vários mecanismos para torná-lasainda menores.

A luta por salários, aposentadorias e pensões dig-nas é uma luta permanente dos movimentos soci-

ais. Luta por uma política justa e permanente de va-lorização das aposentadorias e pensões, não só dequem ganha um salário mínimo, mas de quem ga-nha acima deste valor também.

Enquanto isso, os recursos públicos são drenadospara o setor privado através do superávit primário,para pagamento de juros e amortizações da dívida,e através de diversas outras formas, como o SIM-PLES, que privilegia, com isenções de tributos, en-tidades filantrópicas, empresas exportadoras rurais(agronegócio), empresas de tecnologia da informa-ção e de comunicação. Se já não bastasse todos es-ses problemas, o Governo Dilma vem modificandoprogressivamente a forma de contribuição patronalao Sistema Previdenciário, mudando a cobrança dafolha de pagamentos (20% do seu total) para o fatu-ramento (de 01 a 02% do faturamento a depender dosetor). Análises técnicas comprovam que esta açãotende a dar mais instabilidade ao regime, já que de-pende dos ciclos da economia brasileira, oscilandoentre baixo crescimento e estagnação nas últimas dé-cadas.

Torna-se cada vez mais difícil preencher os cri-térios para a aposentadoria. E quando se atinge aidade e o tempo de contribuição para aposentadoria,muitas vezes o trabalhador permanece anos na ativa,pois a concessão da aposentadoria significa tambémo corte substancial nos salários.

Deste modo, os trabalhadores e trabalhadoras,mesmo aqueles/aquelas que começam a trabalharna adolescência, só conseguem a aposentadoriaquando idosos/idosas. E, portanto, gozam poucodos benefícios da Previdência Social, não só pelaidade avançada, mas pelos valores das mesmas quetêm sido reduzidas de forma vergonhosa nos últi-mos anos. E a violência dos últimos governos (PSDBe PT) contra os aposentados/aposentadas não parapor aí. Quanto mais aumenta a expectativa de vida,mais o Governo cria mecanismos para dificultar aaposentadoria.

Estima-se que até 2020 o Brasil terá 40 milhões depessoas acima de 60 anos, passando a ser o 6o paíscom mais idosos/idosas no mundo. E se dependerdos partidos e candidatos do sistema, a grande mai-oria estará em condições de vida precárias, com apo-sentadorias cada vez mais insignificantes frente aoaumento das despesas típicas da idade.

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SISTEMA PREVIDENCIÁRIO E APOSENTADORIAS 25

Além disso, o país não está preparado para aten-der a esta população, que necessita de cuidados es-peciais em todos os setores da vida: saúde, segu-rança, mobilidade, lazer, etc. É grande o descaso dosgovernos com as políticas públicas, inclusive, coma não valorização dos profissionais da área e com aprivatização da saúde e previdência públicas.

Assim, em diálogo com a luta dos movimentossociais, o PSOL assume os seguintes compromissos:

1. Reverter o arrocho das aposentadorias epensões, reconstituindo o seu poder aquisi-tivo;

2. Adoção da integralidade, da paridade en-tre ativos e aposentados e da solidariedadeentre gerações;

3. Vinculação do reajuste das aposentado-rias ao reajuste do salário e recuperação dasperdas;

4. Fim da cobrança dos inativos;

5. Recompor quadro de pessoal da Previ-dência Pública, visando garantir ampliaçãoe melhoria do atendimento à população;

6. Combate à corrupção e sonegação naPrevidência Social promovida pelas gran-des empresas;

7. Reverter, nos setores beneficiados, a Con-tribuição Previdenciária Patronal (CPP) so-bre o faturamento e retomar a CPP sobre afolha de pagamento;

8. Fim do fator previdenciário e de outrasfórmulas que tenham o mesmo objetivo;

9. Reversão do FUNPRESP e fortalecimentodo Regime Próprio de Previdência do Servi-dor Público;

10. Ampliação do benefício do salário-maternidade por dois anos.

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26 EDUCAÇÃO

4 EducaçãoNo governo do PSOL, educação será um dos ei-

xos do desenvolvimento nacional e para isso será ne-cessário alterar profundamente a lógica e o funciona-mento das políticas públicas educacionais.

É fundamental que se constitua efetivamente umSistema Nacional de Educação, que articule todos osentes federados, garantindo recursos e políticas pú-blicas que permitam uma ação ampla para enfrentaros principais desafios da educação brasileira, contor-nando a fragmentação e sobreposição de responsa-bilidades existentes. A maior parte das responsabi-lidades educacionais recai hoje sobre os ombros dosestados e municípios, mas cabe à União exercer pa-pel redistributivo e supletivo, conforme estabelece aConstituição.

É preciso assumir o papel do Estado na garantiado direito à educação, rompendo com o modelo pri-vatista, que transformou a educação nacional, em es-pecial o Ensino Superior, num grande mercado e queexpandiu o acesso através de programas que tercei-rizaram para o setor privado o atendimento, abrindomão da qualidade. É preciso reverter o quadro atualno qual a expansão da educação infantil, do ensinosuperior e técnico vem ocorrendo apenas pela tercei-rização de recursos para instituições privadas, sejapor meio de programas de bolsas, seja por convêniosde atendimento.

O recente Plano Nacional de Educação (PNE) so-mente se tornará realidade se houver uma ação polí-tica que realmente priorize a superação da atual es-trutura educacional brasileira, implementando me-didas e tendo uma postura que vai além do que estáprevisto no próprio PNE.

Prioridades:

a) Promover a construção de um Sistema Nacio-nal de Educação, articulado e solidário, atravésde um amplo processo de mobilização da soci-edade civil, em conjunto com os gestores esta-duais, municipais e setor privado. O SistemaNacional de Educação deve buscar a articula-ção e integração das políticas públicas educaci-onais da União, estados e municípios, levandoa um efetivo regime de colaboração entre eles;

b) Garantia do direito à educação pública, esta-tal, gratuita e de qualidade para todos, o que

implica em uma atuação efetiva da União emtodos os níveis e modalidades, assumindo seupapel redistributivo e suplementar, conformeestabelece a Constituição Federal. Em médioprazo os recursos públicos devem ser destina-dos exclusivamente para a educação pública;

c) Inverter prioridades, rompendo com o modeloque privilegia o pagamento de juros e encargosda dívida, consumindo mais de 40% do orça-mento da União, e destinar recursos para edu-cação e saúde. Garantir que as riquezas gera-das pela exploração do petróleo efetivamentesejam destinadas para a educação e saúde enão apenas uma parte dos lucros, como pro-posto atualmente;

d) Enfrentar os graves problemas de qualidade daeducação nacional, superando o modelo me-ritocrático, que tenta alcançar qualidade pelacompetitividade e que reduz a questão da qua-lidade ao desempenho em provinhas e pro-vões, sem no entanto atuar sobre as questõesestruturais que afetam as redes de ensino. Épreciso atuar para melhorar a valorização domagistério, o financiamento da educação, aformação de docentes, as condições de traba-lho, a infraestrutura e o modelo de atendi-mento nas redes de ensino para avançarmos naqualidade da educação da escola pública.

Propostas de ação:

1. 10% do PIB apenas para a educação pú-blica

A União aumentará sua participação financeirano montante de recursos educacionais destinados àescola pública, conforme a meta 20 do PNE, e enca-minhará ao Congresso Nacional proposta de supres-são do parágrafo quinto do artigo quinto, que per-mite usar subvenções para instituições privadas noalcance dos 10% do PIB, exclusivamente para a edu-cação pública.

2. Estabelecimento do Custo Aluno-Qualidade

Um dos grandes desafios da educação nacional

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EDUCAÇÃO 27

é a garantia de uma educação pública de qualidadepara todos. Ocorre que os governos sempre toma-ram como principio utilizar os recursos disponíveis,dentro dos limites mínimos obrigatórios impostospela Constituição, sem se preocupar com o padrãode qualidade necessário e qual a destinação de re-cursos necessária para alcançá-lo. Ou seja, se fazo cálculo de cima para baixo: reserva-se o mínimoconstitucional para a educação e condicionam-se sa-lários, estruturas, materiais e tudo o mais a esse mí-nimo disponível.

Para que se alcance um padrão aceitável de quali-dade em todas as redes de ensino públicas é precisoter um conjunto básico de insumos que devem sergarantidos para todas as escolas, exigindo a garan-tia de recursos financeiros para isso. Esse padrão dequalidade associado aos insumos necessários é de-nominado de Custo Aluno-Qualidade (CAQ). Comoponto de partida para atingir um padrão mínimo dequalidade, que deveria ser assegurado a todas as es-colas do país inicialmente, deve-se utilizar o CustoAluno-Qualidade Inicial (CAQi).

Em nosso governo o CAQi será implementadoem no máximo dois anos, negociando com os entesfederados para que esta definição se efetive num pe-ríodo curto de tempo. Para isso, a União aportarárecursos para complementar o valor do CAQi na-queles estados e municípios em que a utilização dosrecursos obrigatórios não seja suficiente. O CAQideve evoluir gradativa e sistematicamente até queo país alcance o Custo Aluno- Qualidade ideal, quesupere os padrões mínimos e permita uma educaçãopública de qualidade em todas as redes de ensino.

3. Piso Nacional estipulado pelo DIEESE evalorização do magistério

Os profissionais da educação das redes públi-cas, via de regra, viram seus salários e as condiçõesde trabalho sucateadas pelos sucessivos governosque aplicaram o modelo neoliberal, tornando a car-reira docente extremamente desvalorizada em todoo país.

Inverter a lógica que procura jogar sobre os om-bros de professores e alunos a responsabilidade pelasuperação dos problemas estruturais enfrentadospela educação nacional é urgente e um dos primeirospassos é tomar medidas efetivas para a valorizaçãodas carreiras do magistério.

A aprovação da Lei do Piso Nacional do Magis-tério foi importante, mas até aqui ele não se efetivou

em todos os estados e municípios, principalmentepela falta de uma ação efetiva da União.

O governo do PSOL não repassará recursos vo-luntários para entes federados que não estejam pa-gando o piso salarial nacional do magistério e cum-prirá a sua obrigação de auxiliar aqueles que efeti-vamente não possuam condições de fazê-lo. O PSOLagirá da mesma maneira em relação à jornada esti-pulada na Lei, que destina no mínimo 1/3 da jor-nada docente para atividades extraclasse. Sabemosque parte do exercício da função docente se dá ematividades de planejamento, discussão, formação,avaliação e preparo de atividades ligadas ao projetopolítico pedagógico. Assim, o cumprimento da Leinesse quesito não é para nós questão menor.

A valorização da profissão, necessária inclusivepara motivar a juventude em seguir a carreira do-cente, passa necessariamente pela valorização sa-larial. Portanto, estabeleceremos como piso naci-onal do magistério o valor estipulado pelo DIE-ESE (Departamento Intersindical de Estatísticas e Es-tudos Socioeconômicos), o que representaria hojeR$2.979,25 por uma jornada de 20h semanais.

Pactuaremos regras nacionais para a carreira do-cente, buscando uma efetiva valorização do magis-tério, com melhoria das condições e elevação dos sa-lários, visando o cumprimento da meta 17 do PNE.

4. Direito ao acesso e permanência à edu-cação pública de qualidade em todos os ní-veis

A ação do governo federal, seja de forma redis-tributiva, supletiva ou direta, será com a elevação dacobertura escolar na creche, aumento das matrículasno ensino profissionalizante (cursos de média dura-ção), garantia da meta do PNE com educação inte-gral e na expansão do ensino superior.

Enviaremos ao Congresso Nacional legislação re-gulatória do setor privado e buscaremos aumentaras exigências de qualidade na prestação dos serviçospor essas instituições.

Não extinguiremos os programas universitáriosde bolsas e de crédito estudantil, mas estes passa-rão a ser suplementares. A lógica da ação gover-namental será expandir a rede pública, seja a fede-ral, seja ajudando estados e municípios, a melhoraras suas redes, de forma que em médio prazo nãoseja mais necessária a política de bolsas ou conve-niamento com instituições privadas.

Simultaneamente à expansão da rede pública,

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28 EDUCAÇÃO

nosso governo prezará por elevar a qualidade do en-sino. Nas últimas décadas os governos apostaramem sistemas de avaliação em massa, supondo quea qualidade pudesse ser alcançada pela competição,e que resumiram a ação governamental à divulga-ção de rankings e a cobrança por resultados, sematuar efetivamente na garantia de condições e na so-lução dos problemas que afetam a educação nacio-nal. Esse sistema meritocrático pouco contribui paraa qualidade da educação e desconsidera completa-mente as diferenças regionais e a diversidade nacio-nal. Apostaremos na autonomia político-pedagógicae no envolvimento da comunidade educacional nofazer cotidiano de cada escola. Caberá como umadas medidas para impulsionar a melhora na qua-lidade da educação, a garantia de recursos físicos,humanos e financeiros para que os projetos educa-cionais sejam concretizados. Mais do que induzira unificação de um currículo e do cotidiano escolara partir de provas nacionais, cabe ao Estado outrasmedidas, como investimento em estrutura física ematerial, formação inicial e continuada, valorizaçãoprofissional, gestão democrática e garantia de boascondições de ensino e aprendizagem (como o esta-belecimento de um número máximo de alunos porturma/professor, por exemplo).

5. Superação do analfabetismo em 4 anos

O analfabetismo absoluto de uma parcela muitogrande da população brasileira persiste década apósdécada, resultado do pouco interesse e investimentodos governos. Esse desafio já foi vencido por váriospaíses, alguns da América Latina, e existem experi-ências concretas que mostram ser possível a supera-ção do analfabetismo em um prazo de poucos anos.Para isso é preciso investimentos consistentes e umaprioridade política.

O governo federal deverá destinar recursos e pro-mover ações articuladas com estados e municípios,voltadas ao cumprimento da meta 9 do PNE, atu-ando de forma mais sistemática e superando as açõespontuais existentes atualmente.

Também será necessário envolver a sociedade ci-vil, através dos movimentos sociais e entidades dosmais diversos setores, em um esforço nacional pelaalfabetização de jovens e adultos, ultrapassando oslimites das redes de ensino nesse desafio.

A garantia do acesso ao ensino público, desde aeducação infantil, e o combate sistemático a evasãoescolar, também são aspectos importantes para que

se reduza o analfabetismo funcional entre os jovens.A melhora na qualidade do ensino público e açõesespecíficas devem se reverter na redução drástica doanalfabetismo funcional, exigindo do governo fede-ral a promoção de ações junto a estados e municípiosque permitam a melhoria nas condições de atendi-mento, na formação dos profissionais, nas carreirasdo magistério e na infraestrutura das escolas.

6. Recursos da exploração do petróleo paraa saúde e a educação

Rever imediatamente a legislação dos royaltiesgarantindo que os valores referentes a contratos an-tigos e vigentes sejam também direcionados à edu-cação e saúde. Apoiaremos uma partilha mais equâ-nime dos recursos dos royalties e usaremos a parteda União para diminuir as desigualdades regionais.

7. Educação contra as opressões

É fundamental que a educação contribua para ocombate a todo tipo de opressão e discriminação, su-perando visões conservadoras que levaram à supres-são de metas relacionadas às questões de direitoshumanos e diversidades no PNE recém-aprovado.Uma educação de qualidade na atual sociedade es-tará voltada para a superação das desigualdades,que combata o racismo, o sexismo, a homofobia, alesbofobia e demais discriminações.

Assim, em nosso governo, nos comprometemosa desenvolver, garantir e ampliar a oferta de progra-mas de formação inicial e continuada de profissio-nais do magistério que pautem e combatam todas asdiscriminações. Criaremos e ampliaremos progra-mas nacionais que apoiem e incentivem ações nasescolas de educação básica, voltadas à construção deuma cultura de cidadania e valorização da diversi-dade, reduzindo as manifestações de discriminaçãode todas as naturezas, tendo como foco a educaçãoem Direitos Humanos, a equidade e a justiça sociale a valorização das diferentes culturas, entendendo-as como um processo de construção histórica e so-cial. O governo federal deverá atuar para instituira Educação em Direitos Humanos em todas as redesde ensino e implementar ações educacionais, nos ter-mos do Programa Nacional de Direitos Humanos –PNDH-3 e do Plano Nacional de Educação em Direi-tos Humanos, assegurando-se a implementação dasdiretrizes curriculares nacionais por meio de açõescolaborativas com os Fóruns de Educação, Conse-lhos Escolares, equipes pedagógicas e a sociedade ci-

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EDUCAÇÃO 29

vil.

8. Conferências Nacionais de Educação de-liberativas e gestão democrática da educa-ção

Reformular o papel e a composição do FórumNacional de Educação e do Conselho Nacional deEducação, estabelecendo mecanismos transparentese participativos que permitam maior representativi-dade em suas composições e maior efetividade emsua atuação. As Conferencias Nacionais de Educa-ção e todas as suas etapas estaduais e municipaisdevem ganhar caráter deliberativo e serem efetiva-mente um espaço para a definição das diretrizes paraa política educacional e não eventos meramente con-sultivos como foram até aqui. As CONAE e o FNEdevem ter uma atuação efetiva no acompanhamentoe avaliação da implantação do novo PNE.

A União deverá tomar medidas que incentivem einduzam estados e municípios a fortalecerem os es-paços de gestão democrática das escolas, em espe-cial os conselhos escolares, buscando criar condiçõesreais para que as escolas estabeleçam de forma autô-noma seus projetos político pedagógicos. Incentivarque as redes de ensino estabeleçam a eleição comoforma de escolha do diretor da escola.

Garantir a eleição direta para reitores em todasas universidades públicas, com participação de todaa comunidade acadêmica, bem como a representa-ção de gestores, profissionais e estudantes nos con-selhos gestores dessas instituições. Garantir que nasinstituições privadas seja obrigatória a constituiçãode conselhos gestores com a representação de profis-sionais e estudantes e com caráter deliberativo.

9. Expansão das universidades públicasbuscando o fim do vestibular e a universali-zação do acesso ao ensino superior

A União deverá expandir a oferta de ensino supe-rior através da criação de novas universidades públi-cas e da expansão de vagas e cursos nas que já exis-

tem, revertendo o processo que ocorreu nas últimasdécadas de oferta de vagas e expansão das institui-ções privadas. Reverter, gradativamente, os recursosque hoje são aplicados nos programas de bolsas eminstituições privadas, para as instituições públicas.Investir na ampliação do ensino superior público vi-sando, em longo prazo, a garantia de acesso à uni-versidade a todos os jovens que saírem do EnsinoMédio.

10. Educação Inclusiva como direito

Para garantia da equidade educacional, deveráser considerado o atendimento às necessidades es-pecíficas da Educação Especial, assegurando um sis-tema inclusivo em todos os níveis, etapas e modali-dades de ensino. Além da necessária e urgente uni-versalização do atendimento da educação básica, énecessário garantir as condições políticas, pedagógi-cas e financeiras para assegurar o acesso e a perma-nência com aprendizagem aos estudantes com de-ficiência, transtornos globais do desenvolvimento ealtas habilidades/superdotação, tanto na educaçãobásica, no ensino superior e nas diferentes modali-dades de ensino (eja, educação profissional, educa-ção do campo, quilombola e indígena).

Compreendemos que para garantir essas condi-ções precisamos, além de investimento financeirona área, assegurar formação inicial e continuadaaos profissionais de educação conteúdos referentes àeducação inclusiva, garantir repasse de recursos deacessibilidade em todas as unidades escolares, bemcomo recursos humanos e materiais que promovama inclusão dos estudantes com necessidades educa-cionais especiais.

Nesses casos, mais do que em outros, tambémé fundamental a articulação entre diferentes áreas,como a saúde e a assistência social, criando uma redede apoio ao sistema educacional, às famílias e ao es-tudante. A atuação em nosso governo irá nesse sen-tido, no qual a União envidará esforços em conjuntocom estados e municípios para uma política educa-cional inclusiva.

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30 CIÊNCIA E TECNOLOGIA

5 Ciência e tecnologiaNa área de ciência e tecnologia, o maior desafio

no Brasil é a elaboração e a implementação de umapolítica de longo prazo que permita ao desenvolvi-mento científico e tecnológico alcançar a populaçãoe que efetivamente tenha um impacto determinantena melhoria das condições de vida da sociedade.Para isso, é necessário contrariar interesses, enfren-tar o monopólio do conhecimento e colocar o desen-volvimento científico e tecnológico a serviço de umprojeto de país.

Eleger ciência, tecnologia e inovação como umaescolha estratégica para o desenvolvimento do paísimplica priorizar investimentos nesse setor, para re-cuperar seu atraso e avançar aceleradamente na ge-ração e na difusão de conhecimentos e inovações,em especial quanto à sua incorporação na produção.Significa também advogar em prol da importânciada ciência e tecnologia como fator de integração dasdemais políticas de desenvolvimento do Estado.

Pelas dimensões do país e pela dificuldade de seelaborar e, principalmente, implantar políticas na-cionais que também atendam às necessidades re-gionais, o desenvolvimento científico e tecnológicoproduzido modifica de forma ainda lenta as desi-gualdades sociais experimentadas em certas regiões.Dessa forma, os problemas enfrentados pelo Brasilnos campos da ciência e da tecnologia são comple-xos e de difícil solução a curto prazo.

O país tem capacidade material e intelectual ins-talada, capaz de promover avanços significativosnas políticas nacionais de ciência e tecnologia e demeio ambiente. Falta um governo capaz de priorizareste setor e superar o modelo de desenvolvimentoque privilegia o agronegócio e a especulação finan-ceira. Por isso, são propostas do PSOL:

1. Ampliação do financiamento à pesquisa,especialmente as realizadas em áreas estra-tégicas para o desenvolvimento nacional epara a redução das desigualdades sociais;

2. Fim da ingerência do capital privado empesquisas do setor público, como em uni-versidades. Financiamento exclusivamente

público da pesquisa pública;

3. Estímulo ao desenvolvimento de tec-nologias que quebrem a dependência ex-terna, estimulando a agricultura sustentá-vel e proibindo gradualmente o uso de se-mentes transgênicas;

4. Revisão da Lei de Patentes para ampliar ocontrole sobre as riquezas nacionais e da Leide Inovação Tecnológica para coibir a apro-priação privada do conhecimento;

5. Investimento de 2% do PIB em Ciência,Tecnologia e Inovação;

6. Propor uma nova regulamentaçãoque permita amplamente a pesquisa comcélulas-tronco;

7. Duplicar os investimentos no Programa“Ciência Sem Fronteiras”, incluindo os es-tudantes das áreas de ciências humanas ehumanas aplicadas;

8. Utilização de Software livre em todosos níveis do serviço público federal, ex-tinguindo gradativamente as dependênciasdas licenças das empresas privadas;

9. Gestão democrática e controle social dosrecursos destinados à pesquisa e inovação;

10. Envio de Lei ao Congresso que re-componha os recursos do Fundo Nacionalde Desenvolvimento Científico e Tecnoló-gico (FNDCT). Garantia de novos recursospara cada novo programa ou projeto de pes-quisa, de forma a não prejudicar os já emandamento.

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6 SaúdeO Brasil tem um sistema de saúde universal elo-

giado por especialistas. No entanto, a promessado SUS (Sistema Único de Saúde) nunca se cum-priu. Um dos principais motivos é a falta de recur-sos. O Brasil gasta apenas 4,1% do PIB com o SUS -quando a média dos países da OCDE (Organizaçãopara Cooperação e Desenvolvimento Econômico) é8,3%. Para agravar o quadro, outros 4,8% do PIBsão gastos privados, que incluem desde gastos deempresas até o que os brasileiros pobres pagam pormedicamentos que deveriam ser fornecidos gratui-tamente. Os propalados aumentos nos gastos comsaúde são apenas em termos nominais, pois em ter-mos relativos eles estão estagnados.

Outro grande entrave ao aumento de recursospara a saúde pública são os subsídios e renúncias di-versas de recursos públicos para o setor privado. Deacordo com o IPEA, em 2011, R$ 15,8 bilhões foramdestinados a subsídios ao setor privado da saúde, oque equivaleu a 22,5% do orçamento do Ministérioda Saúde naquele ano.

Nossa orientação para a saúde é, em primeiro lu-gar, combater o subfinanciamento do setor público,iniciando um processo de desprivatização que per-mita ao SUS se realizar como sistema que universa-lize de fato o direito à saúde no país.

Prioridades:

a) Aumento e qualificação do financiamento dasaúde pública;

b) Expandir com qualidade a assistência farma-cêutica pública;

c) Qualificar e ampliar a rede de serviços do SUS,garantir dignidade para os trabalhadores desaúde e formação destes de acordo com as ne-cessidades da população;

d) Combater a concepção de saúde como merca-doria, regulando e apurando com rigor todasas denúncias contra os planos de saúde;

e) Promover a desprivatização da saúde no Bra-sil.

Propostas de ação:

1. Elevar para 10% da Receita CorrenteBruta da União os gastos com saúde pú-blica

Entre 1995 e 2001, uma média de 8,4% das Re-ceitas Correntes Brutas da União foram alocadas nasaúde; entre 2002 e 2009, este patamar caiu para7,1%. Para agravar o quadro, o governo federal im-pediu que a lei 141/2012 elevasse este patamar para10% das RCB, bandeira antiga do movimento sanitá-rio. Isto permitiria, à época, acrescer R$ 32,5 bilhõesao orçamento do Ministério da Saúde.

2. Aumentar a proporção dos gastos pú-blicos em relação ao privado para que trêsquartos dos gastos nacionais em saúde se-jam destinados ao SUS ao fim 4 anos

Para tanto, além de elevar a 10% da receita osgastos com saúde pública, devemos ter uma série demedidas vinculadas ao fim dos subsídios diretos eindiretos às empresas de saúde, tais como:

• Fim imediato da dedução do IRPJ e progres-sivo em 4 anos da dedução do IRPF para gastoscom planos e seguros de saúde;

• Fim dos empréstimos a juros diferenciados erenegociação de dívidas com setor privado;

• Iniciar imediatamente debate com movimentosindical com proposta de transição dos planosde saúde para o SUS.

3. Reverter a privatização da saúde no Bra-sil

O sistema de atenção à saúde no Brasil é pre-dominantemente privado desde suas origens. Hoje,70% dos hospitais no Brasil são privados, e, mesmoque alguns destes prestem serviços ao SUS, parte de-les só atende quem pode pagar. A maior parte dosequipamentos de alta e média complexidade (comolaboratórios de análises clínicas e hemodiálise) tam-bém pertence a entes privados, o que ajuda a expli-car as dificuldades de acesso do povo a estes ser-viços. Para agravar o cenário, desde a década de

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32 SAÚDE

1990 os serviços de saúde públicos vêm sendo cedi-dos a entidades privadas como Organizações Soci-ais e Fundações, que aplicam a lógica produtivista elucrativa, precarizando as condições de trabalho e aqualidade do serviço, como mostrou estudo do Tri-bunal de Contas de São Paulo em 2011. Para defen-der o caráter público do SUS, promoveremos:

• Auditoria imediata nos contratos de gestão pri-vada no SUS realizados por Organizações Soci-ais (OSs), Organizações da Sociedade Civil deInteresse Público (OSCIPs), Fundações de Di-reito Privado e ONGs, e punição imediata dasirregularidades;

• Defender e encaminhar ao Congresso revoga-ção das leis das Organizações Sociais (OSs), Or-ganizações da Sociedade Civil de Interesse Pú-blico (OSCIPs), Fundações Estatais de DireitoPrivado (FEDPs), bem como extinguir a Em-presa Brasileira de Serviços Hospitalares (EB-SERH) e devolver os Hospitais Universitáriosàs universidades federais;

• Garantir aos trabalhadores terceirizados poresses modelos uma carreira transitória no ser-viço público que permita a manutenção doatendimento e dos postos de trabalho;

• Reincorporar os serviços (estatizar) progressi-vamente ao longo do mandato e promover am-plo debate público para construir as bases deuma nova política estatal de gestão públicapara o SUS, que garanta transparência, con-trole social, amplo acesso aos serviços e digni-dade para quem trabalha na saúde, eliminandoos intermediários privados.

4. Regulação dos planos de saúde com po-lítica de controle de tarifas, fim da indica-ção de empresários do setor para a ANS egarantia, em 2 anos, do ressarcimento totalaos cofres dos gastos dos beneficiários deplanos de saúde que acessaram o SUS, con-forme previsto na lei Lei no 9.656/1998

Os planos de saúde privados no Brasil têm co-metido vários abusos contra os direitos dos usuá-rios, liderando por vários anos consecutivos o ran-king de reclamações nos órgãos de defesa dos con-sumidores. Dentre as principais denúncias estão: anão autorização de procedimentos médicos e labo-ratoriais, o descredenciamento unilateral de médi-

cos, a baixa remuneração dos profissionais da saúde,além do aumento do valor dos serviços para os usuá-rios. Para 77% dos usuários, ocorreram problemasem algum dos serviços do plano de saúde, princi-palmente na demora para agendamento de consul-tas médicas e pronto socorros lotados (Pesquisa daAPM/Datafolha 2013).

Para piorar, a Agência Nacional de Saúde Suple-mentar (ANS), órgão que deveria justamente fiscali-zar os planos de saúde, tem sido presidida por em-presários do setor, desde sua criação em 2000. Poroutro lado, de acordo com estudos acadêmicos re-centes, a cada eleição cresce o financiamento de cam-panha por parte das grandes empresas de saúde. Em2010, as operadoras ajudaram na eleição de 38 depu-tados federais, três senadores, além de quatro gover-nadores e da própria presidente da República. Daempresa que doou legalmente R$ 1 milhão para acampanha de Dilma Rousseff, saiu o nome que pre-sidiu a ANS até 2012.

Saúde não é mercadoria. Além de promover umaampla investigação de todas as irregularidades nosplanos de saúde – como tem feito o deputado IvanValente (PSOL-SP) – é preciso estabelecer uma rigo-rosa regulação do setor.

5. Rever a Lei de Patentes para fortalecer asaúde pública e utilizar, sempre que neces-sário, ferramentas de licença compulsóriapara produção ou compra de medicamen-tos

O governo brasileiro fez uso do expediente delicenciamento compulsório apenas em 2007, para oEfavirenz (combate a AIDS). Em muitos outros ca-sos essa prática também se demonstra necessária. Deacordo com o Grupo de Trabalho em Propriedade In-telectual (GTPI), a Linezolida para o tratamento detuberculose custa R$ 82 a unidade, quando a versãogenérica poderia custar R$ 2,50. E o Rituximab parao tratamento de câncer, custa R$ 1.239 por unidade,enquanto que o genérico custaria apenas 65 centa-vos.

6. Criação de política industrial específicapara o setor farmacêutico que contemple agratuidade (fim do co-pagamento) no Pro-grama Farmácia Popular e substituição em4 anos deste programa por uma rede pú-blica de farmácias vinculada a rede de pos-tos de saúde, para garantir o fornecimentoregular de medicamentos

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SAÚDE 33

Essa política deve ser orientada pelas necessida-des do povo e baseada em centros públicos de pes-quisa e desenvolvimento, para impulsionar a produ-ção pública de medicamentos, com vistas à autossu-ficiência.

7. Humanização no tratamento aos ci-dadãos com sofrimento mental, inclusivecausado por uso de drogas

O PSOL se soma ao movimento da ReformaPsiquiátrica e da luta antimanicomial, que tem so-frido enormes ataques nos últimos anos, como com-provam a proliferação de comunidades terapêuticasapoiadas por governos de todos os partidos da or-dem.

Defendemos a ampliação e consolidação da redeque substitua os obsoletos manicômios e comunida-des terapêuticas, ampliando equipamentos como osCentros de Atenção Psicossocial (incluindo os infan-tis e álcool/drogas) e os Centros de Convivência, ar-ticulando com a rede de atenção primária à saúde.Lutaremos pela ampliação da política de redução dedanos para usuários de drogas e em defesa da legali-zação da maconha, uma vez que o uso problemáticode drogas deve ser entendido como uma questão desaúde e não de polícia.

8. Ampliar as equipes de Saúde da Famíliapara cobrir 80% da população em 4 anos

São nestas unidades de saúde que deve ser o pri-meiro e principal lugar de atendimento, prevençãoe promoção à saúde. Nelas estariam as equipes deSaúde da Família, que seriam responsáveis por nomáximo 2 mil pessoas (hoje a média nacional é de 4mil) e compostas por médico, enfermeiros e técnicosde enfermagem, profissionais de saúde bucal e agen-tes de saúde. De acordo com as necessidades locais,outros profissionais (nutricionistas, psicólogos, fisio-terapeutas, etc.) poderiam ser incluídos nessas equi-pes ou estariam presente como apoiadores. Assim,

80% das necessidades de saúde das pessoas seriamatendidas sem precisar ser acionado outro nível deatenção à saúde.

9. Promover a carreira pública no SUS paratodas as profissões, generalizando servido-res contratados por concurso público comjornada máxima de 30 horas para todas ascategorias da saúde

Condenamos que programas como o Mais Mé-dicos paguem os trabalhadores com bolsas, sem ga-rantias de direitos trabalhistas, o que aprofunda aprecarização do trabalho em saúde. Trabalharemospelo fim das terceirizações no SUS. Nesse sentido,nos comprometemos também a garantir o piso sala-rial dos Agentes Comunitários de Saúde com a cor-reção do valor, que foi vetada por Dilma Rousseff emjunho passado.

10. Por uma formação em saúde baseadana interdisciplinaridade e orientada pelasnecessidades do SUS e da população

A saúde tratada como negócio produz tambéma formação de profissionais a partir das necessida-des do mercado e não do conjunto da população,criando-se uma verdadeira “indústria da doença”,onde o objetivo passa a ser a obtenção de lucro apartir do adoecimento das pessoas. Embora as ne-cessidades para o atendimento ao SUS contradigamessa lógica, a concepção de saúde que prevalece se-gue sendo a da lógica privada do mercado. Nessemesmo sentido, não se vê uma constituição de equi-pes multiprofissionais e interdisciplinares, sendo he-gemônica a produção de profissionais que atuamprimordialmente com práticas fragmentadas e isola-das, reflexo da falta de integração na formação. Mu-dar essa lógica é fundamental, combinada à necessá-ria democratização do acesso às universidades pú-blicas.

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34 MEIO AMBIENTE

7 Meio AmbienteO desenvolvimento desenfreado do capitalismo

no Brasil tem promovido uma grande destruiçãoambiental. A poluição das águas, ar e solo são provadisso. Em nosso país mais de 750.000 km2 da florestaAmazônica (uma área equivalente a 3 vezes o tama-nho do Estado de São Paulo) já foi desmatada, sendoa agropecuária responsável por 70% desse desmata-mento, que é seguido pela exploração ilegal da ma-deira e mineração. O meio ambiente é um bem de to-dos e por esse motivo seus recursos naturais devemser geridos de forma a beneficiar toda a sociedade,garantindo o equilíbrio entre as atividades humanase sua preservação.

Nesse sentido, não é difícil notar que as con-sequências negativas da degradação ambiental sãoconcentradas, sistematicamente, sobre as popula-ções mais pobres e despossuídas de poder de deci-são nas esferas públicas. As áreas destinadas às po-pulações pobres não por coincidência são as mesmasconsideradas de “risco ambiental”, seja pela ameaçade deslizamentos, enchentes ou por estarem próxi-mas de fontes de poluição, como aterros sanitários,indústrias, esgotos, etc. A segregação social é tam-bém ambiental.

Precisamos construir uma nova cultura de de-senvolvimento, que preze pela justiça ambiental emoposição à generalização das práticas ambiental-mente insustentáveis, ao ecologismo de mercado eao “capitalismo verde” que se expressam através demedidas que consolidam o consumismo, fortalecemo capital imobiliário, o transporte privado, o cresci-mento de uma matriz energética indesejável, a de-gradação de espaços verdes, a apropriação privadados espaços públicos e a propagação e reproduçãode conflitos ambientais.

O Brasil, país rico em recursos ambientais e hu-manos pode e deve, a partir de uma concepção ecos-socialista, construir políticas de transição para umnovo modelo de desenvolvimento, em benefício deseu povo e do meio ambiente. Por essa visão integra-dora, embora tenhamos destaque aqui para pontos-chave do nosso programa ambiental, as questõesecológicas também estão presentes transversalmenteem outros eixos de governo como Mobilidade, Re-forma Agrária e Energia.

Prioridades:

a) Combater o desmatamento decorrente das ati-vidades agropecuárias e extrativistas, regula-mentando as atividades humanas em equilí-brio com os recursos naturais e estimulandoa conscientização, preservação e conservaçãoambiental.

b) Livrar o Brasil de agrotóxicos e transgênicos.O Brasil é hoje o maior consumidor mundialde agrotóxicos e um dos maiores produtoresmundiais de transgênicos, o que tem acarre-tado em danos ao meio ambiente e à saúde dosbrasileiros.

c) Entender a água como um bem essencial à vidae que, portanto, não deve ser tratada comomercadoria. O Estado deve ter o controle so-bre a política de águas visando os interesses dasociedade, não das empresas.

d) Estimular políticas para os Grandes Biomas(Amazônia, Mata Atlântica, Caatinga, Cer-rado, Pantanal, Pampa e Zona Costeira), res-peitando suas especificidades.

Propostas de ação:

1. Criar o Ministério da Ecologia e JustiçaSocioambiental

O Ministério da Ecologia e da Justiça Socioambi-ental tem por função integrar em uma visão globalde desenvolvimento e produção as políticas públi-cas que não podem estar separadas de uma visão dejustiça ambiental e social.

Para tanto, a pasta incorporará ao que hoje já éatribuição do Ministério do Meio Ambiente – espe-cialmente as atividades de comando e controle (li-cenciamento e fiscalização) e conservação ambien-tal (áreas protegidas) – algumas das funções desen-volvidas por outros ministérios já existentes, comoo de Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Agri-cultura, Transportes e Pesca, fazendo com que as po-líticas públicas ligadas à infraestrutura, mineração,indústria, pecuária, energia, pesca, etc. estariam su-bordinadas a uma visão estratégica ecológica e soci-oambientalista.

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MEIO AMBIENTE 35

2. Revogação de todos os decretos e atosnormativos que estimulam o uso de agro-tóxicos

A contaminação das águas, dos solos e o com-prometimento da saúde de agricultores e consumi-dores são algumas das consequências da utilizaçãode venenos na agricultura. Desde 2008, o Brasil é omaior consumidor de agrotóxicos do mundo, o quetem causado diversos impactos aos ecossistemas e àsaúde humana, pois estão ligados a diferentes tiposde cânceres e doenças associadas.

Esse fato está diretamente relacionado com a po-lítica de incentivos fiscais para os venenos e coma liberalidade para os transgênicos. Nesse sen-tido, revogaremos todos os decretos e atos nor-mativos (Convênio 199/97 do CONFAZ e Decretos5.630/2005 e 7.660/2011) que concedem incentivo,abatimento ou isenção de tributos como o ICMS, oIPI, o PIS/PASEP e o COFINS para os agrotóxicosem nosso país. Da mesma forma, implementaremosmedidas que desestimulem a utilização de agrotó-xicos e permitam a utilização de meios sustentáveispara o aumento da produtividade.

3. Suspensão da liberação de organismosgeneticamente modificados e incentivo àpermacultura como ferramenta de sobera-nia

A utilização de organismos geneticamente modi-ficados é uma ameaça, pois inviabiliza a existênciae reprodução de espécies nativas da flora, compro-mete a soberania alimentar e autonomia dos agri-cultores, além de gerar insegurança à saúde de con-sumidores e agricultores, uma vez que não há se-gurança nenhuma de que os alimentos modificadosingeridos não causarão malefícios à saúde. Alémdisso, fortalece a monopolização das técnicas de cul-tivo, já que as sementes transgênicas estão nas mãosde algumas poucas multinacionais, contra as quais,nós enfrentaremos. Já existem estudos que relacio-nam alguns transgênicos a diferentes casos de cân-ceres. Nesse sentido, propomos a suspensão da li-beração de organismos geneticamente modificados(OGMs) e revisão da Lei de Biossegurança e da com-posição da Comissão Técnica Nacional de Biossegu-rança.

Pro outro lado, a educação ambiental à luz dapermacultura é um caminho a ser trilhado para ocuidado com as pessoas e com a natureza, pois estaé a sua proposta ética. A permacultura permite com-

preender, observar e aproveitar os recursos funda-mentais de uma cidade como a água, o solo, o clima eas plantas numa perspectiva realmente sustentável.Propomos, neste governo, a criação de uma escolafederal de permacultura, tendo na sua grade curri-cular a educação biocêntrica, a agroecologia, a bio-construção, a captação e aproveitamento eficiente daágua, a utilização de energias renováveis como a so-lar e eólica, a meliponicultura (abelha nativa sem fer-rão), agrofloresta, quintais produtivos, horta man-dala e tantas outras ferramentas que reduzem os im-pactos no meio ambiente e melhoram a saúde daspessoas com atividades na natureza e produção dealimentação saudável.

4. Desmatamento Zero

O atual modelo de produção brasileiro, centradono latifúndio, monocultura e exportação, é o princi-pal responsável pelo desmatamento das florestas edo cerrado. Estudos recentes apontam que, com ouso das áreas já abertas e um melhor manejo de pas-tagens, o país poderia dobrar sua produção de ali-mentos sem desmatar mais nenhum hectare de flo-resta. Precisamos mudar o modo como funciona umdos eixos centrais da economia brasileira – a produ-ção e exportação de commodities agrícolas ancoradana expansão e conversão sobre áreas florestais. Asflorestas devem ser adequadamente mapeadas e es-tudadas e seus biomas preservados a fim de desen-volver as atividades humanas em equilíbrio com osrecursos naturais. É necessário desenvolver Planosde Combate ao Desmatamento na Amazônia e noCerrado em sua totalidade.

5. Viabilização do Plano de Ação Nacionalde Combate à Desertificação (PAN-Brasil)

O processo de desertificação que ocorre no Semi-Árido é responsável pela redução da biodiversidade,alterações no clima local e deterioração do solo,sendo resultado da degradação ambiental devido aouso inadequado do solo pelo homem e das mudan-ças climáticas. Nesse sentido, propomos a viabiliza-ção do Plano de Ação Nacional de Combate à Deser-tificação (PAN-Brasil) a partir de um diálogo com osmovimentos sociais do Semi-Árido, apoiando o pro-jeto de 1 milhão de cisternas de placa e a revisão dosgrandes projetos de irrigação que favorecem o agro-negócio.

6. Redução da vulnerabilidade às secas

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36 MEIO AMBIENTE

As secas são fenômenos naturais e, portanto, nãose pode pensar em combatê-las, mas em convivercom elas. Teremos como compromisso fundamentalo aumento da garantia associada ao abastecimento,uma vez que os racionamentos de água trazem con-sigo sérios impactos para a saúde e para a econo-mia da sociedade. Para reduzir essa vulnerabilidadeé preciso investir na gestão das águas para o en-frentamento da variabilidade das chuvas, como porexemplo em sistemas de armazenamento da águadas chuvas em todo o país, centrando os esforços go-vernamentais na prevenção ao invés de recuperação.

7. Universalização do acesso aos serviçosde saneamento

Estima-se que nas cem maiores cidades brasilei-ras sejam produzidos cerca de 5,1 bilhões de m3 deesgoto, dos quais 3,2 bilhões de m3 não receberamtratamento. Isso sem contar os municípios menores,que muitas vezes não possuem recursos para a coletae tratamento de esgoto. Nesse cenário, propomoscomo prioridade a ampliação das políticas públicasvoltadas à implantação de sistemas de saneamentoem todo o território, além de pesquisas voltadas àsolução do problema de falta de saneamento públicouniversal no país e na reutilização dos esgotos trata-dos para diversos usos.

8. Gestão democrática das águas

Água não deve ser tratada como mercadoria, masum direito fundamental à vida, portanto, o controlesobre a política de águas deve ser público, da socie-dade e do Estado. Defendemos a estatização dos sis-temas de abastecimento de águas de forma a garan-tir a qualidade e a quantidade da água distribuída àpopulação em contrapartida à atual política que pri-vilegia e incentiva a exploração dos recursos hídricospor empresas que visam o lucro acima da qualidadee garantia de distribuição.

Propomos aumentar o investimento em sistemasde distribuição, reduzindo desperdício de água pe-los encanamentos das cidades; fortalecer e imple-mentar os Comitês de Bacias Hidrográficas em todoo território nacional; organizar o sistema de outorgaa fim de controlar problemas decorrentes do con-sumo individual ou exploração comercial por gran-des corporações; elaboração do Plano Nacional deProteção das Áreas de Mananciais das grandes cida-

des brasileiras, com o objetivo de auxiliar estados emunicípios a conservar as florestas e matas funda-mentais para garantir a produção de água visando oabastecimento da população.

9. Conservação ambiental e Programa Ci-ência da Floresta

A recuperação de áreas degradadas, a recompo-sição das matas ciliares para proteção dos rios, o re-florestamento mediante espécies nativas se colocamcomo medidas inadiáveis. Também é preciso garan-tir a preservação e conservação de biomas ameaça-dos pelos interesses do agronegócio e mineradoras,criando novas Unidades de Conservação, especial-mente nos locais que foram identificados como pri-oritários para a conservação da biodiversidade, in-cluindo a ampliação em 2,5 milhões de hectares dasunidades localizadas no Cerrado.

Defendemos a criação do Programa Ciência naFloresta, visando promover a pesquisa e o uso denovas tecnologias para o setor madeireiro com o ob-jetivo de tornar o país líder na exploração sustentá-vel das florestas tropicais, a realização de um zonea-mento ecológico econômico para a produção madei-reira na Amazônia, por meio do qual serão definidasas áreas de maior importância para a atividade, osinvestimentos para a exploração responsável e sus-tentável e a elaboração de plano de capacitação e in-vestimentos consistentes no manejo florestal comu-nitário.

10. Revisão do Código Florestal Brasileiro

Nossa bancada deu um duro combate contra asmedidas aprovadas pelo atual governo em conjuntocom a bancada ruralista no Código Florestal Brasi-leiro. As mudanças prevêem uma série de retro-cessos que ameaçam as florestas brasileiras e bene-ficiam o agronegócio, e não os pequenos produtores,como propagandeado pelo governo. Por isso, envi-aremos proposta de Lei que revise profundamente oatual Código Florestal, reintegrando ao texto, medi-das de proteção retiradas pela pressão dos interes-ses do mercado. Para isso, convocaremos movimen-tos sociais e organizações da área de meio ambientepara proporem as mudanças necessárias, coaduna-das com o modelo de desenvolvimento do governodo PSOL.

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8 EnergiaAo longo da última década houve um aumento

significativo na produção e no consumo de energiaelétrica no Brasil, impulsionado pelos setores des-tinados à produção de commodities (indústria doferro gusa e aço, ferro ligas, de papel e celulose, docimento, indústria química, setor de mineração e pe-lotagem e o setor de metais não ferrosos), cujo con-sumo no ano de 2013 foi de 24,32% do total de ener-gia consumida no país, maior do que o consumo re-sidencial no mesmo ano.

A resposta ao aumento da demanda energética sedeu via uma combinação do resgate de projetos degrandes barragens hidrelétricas (como Belo Monte)com o uso maciço de energia termelétrica (continui-dade de um programa de incentivo do governo deFHC) através de unidades a carvão, óleo e gás. Alémdisso, a frota automobilística cresceu exponencial-mente nos últimos anos, com preços pouco competi-tivos para o etanol, levando a um consumo extrema-mente elevado de derivados de petróleo (gasolina eóleo diesel). Ademais, deve-se frisar a realização deuma série de leilões de petróleo, gás e carvão, repas-sando para corporações privadas a possibilidade deexploração dessas reservas fósseis em território bra-sileiro.

As hidrelétricas são utilizadas como fonte ener-gética prioritária para suprir o consumo doméstico ea atividade produtiva. Os governos insistem em des-considerar as constantes variações pluviométricas eas recorrentes secas e seguem concentrando esforçosem uma fonte altamente dependente dos níveis daságuas dos rios e que, além disso, produz danos am-bientais e humanos, como remoções forçadas de po-pulações de seus territórios tradicionais ou da invia-bilização da reprodução do seu modo de vida devidoà degradação ambiental que promovem.

Nesse sentido, as políticas voltadas para o setorenergético devem estar atreladas às políticas de con-servação do meio ambiente, justiça ambiental e mu-danças climáticas, o que vem sendo desconsideradocom o processo de privatização e internacionalizaçãodo setor elétrico iniciado no governo de FernandoHenrique Cardoso e mantido nos governos de Lulae Dilma.

Prioridades:

Reformulação das matrizes energéticas brasileiras,inibindo a produção a partir de fontes fósseis e in-centivando a utilização de energias limpas e reno-váveis, buscando diversificar as matrizes energéticasbrasileiras.

a) Elaborar um programa de energias renová-veis democraticamente construído e social-mente justo, com a descentralização da produ-ção energética e subsídio à instalação de pai-néis fotovoltaicos para as famílias pobres e ha-bitações populares;

b) Estatização da geração e distribuição de ener-gia, visando garantir os interesses e as necessi-dades da população, em equilíbrio com os re-cursos naturais e o meio ambiente, em detri-mento do lucro de grandes empresas;

c) Reduzir o desperdício de energia e aumentar opotencial energético das usinas existentes, evi-tando a construção desnecessária de novas usi-nas.

Propostas de ação:

1. Revogar subsídios e apoios às termelé-tricas

As termelétricas são responsáveis pela emissãode grandes quantidades de CO2, gás poluidor res-ponsável pela intensificação do efeito estufa. Vi-sando desestimular essa prática danosa à saúde e aomeio ambiente, defendemos o fim de quaisquer sub-sídios e apoios às termelétricas, que terão um crono-grama para sua desativação.

2. Diminuir a dependência de energia apartir de fontes fósseis

Defendemos a diminuição drástica da dependên-cia de energia a partir de fontes fósseis, tanto emusinas quanto nos sistemas de transporte. Isso deveser feito de forma progressiva, a partir do estabeleci-mento de metas e prazos para redução das emissõesde gases de efeito estufa.

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38 ENERGIA

3. Realizar um programa de energias reno-váveis democraticamente construído e so-cialmente justo

A mudança na produção de energia deve ocorrerde forma democrática, visando garantir os interessese as necessidades da população em equilíbrio com osrecursos naturais e o meio ambiente, buscando defi-nir a matriz energética que melhor se adapte a essasnecessidades e características naturais locais e regio-nais, além de oferecer menores impactos ambientais,sociais e humanos.

4. Incentivo ao desenvolvimento e utiliza-ção de fontes de energia limpas, renová-veis e de baixo impacto ambiental

Para que as fontes fósseis sejam substituídas porcompleto é necessário estimular o desenvolvimento,aprimoramento e utilização de fontes de energia lim-pas, renováveis e socialmente justas. Dentre as me-didas que devem ser tomadas para esse fim, destaca-se a criação de incentivos fiscais às energias reno-váveis, envolvendo tributos federais (II, IPI e PIS-COFINS); ampliação da participação de novas ener-gias renováveis na matriz elétrica por meio da reali-zação de leilões por fonte de energia; e geração anualde 13 GW de eólica, 14 GW de biomassa e 3 GW desolar até 2018.

5. Solarização de 1 milhão de casas em 4anos

Os equipamentos do sistema solar fotovoltaicoainda possuem custo elevado, sendo esse um dosfatores que contribui negativamente para sua poucautilização residencial. Nesse sentido, defendemos:criação de incentivos fiscais às energias renováveis,que levaria a uma redução de 20% do preço de equi-pamentos do sistema solar fotovoltaico; articulaçãojunto ao Conselho Nacional de Política Fazendária(ConFaz) para garantir que a energia injetada narede por mini e microgeneradores de energia tenhao mesmo valor que a consumida da rede; tratamentodiferenciado ao PIS-COFINS incidente sobre o con-sumo de energia, que pode ser garantido via decreto,com vistas também a garantir que a energia injetadana rede por mini e microgeneradores de energia te-nha o mesmo valor que a consumida da rede; e cri-ação de linhas de crédito com juros baixos e prazoacima de 10 anos para financiamento da compra dosistema fotovoltaico pelos bancos oficiais de crédito,

para que cada brasileiro possa gerar energia a partirdo telhado de sua casa.

6. Redução do desperdício de Energia

Segundo estudo da Associação Brasileira dasEmpresas de Serviços de Conservação de Energia(Abesco), cerca de 10% dos 430 terawatt-hora (TWh)consumidos no país a cada ano são desperdiçados.Esse volume é superior ao consumido pelo total dapopulação do estado do Rio de Janeiro, sendo osprincipais responsáveis por esse desperdício os pro-cessos industriais obsoletos e sistemas de refrigera-ção, aquecimento e iluminação inadequados, semsistemas de automação que permitam, por exemplo,o desligamento automático quando não há pessoaspresentes no local.

Para que o Brasil atinja um nível de eficiênciaenergética com patamares comparáveis aos de paí-ses avançados nesse tema, como Japão e Alemanha,é preciso incentivar os grandes empreendimentos in-dustriais e comerciais a modernizarem seus sistemasde utilização de energia para reduzir os desperdíciosestruturais.

7. Repotenciação de usinas

O Brasil tem 160 usinas hidrelétricas. Cerca de70 delas têm mais de 20 anos de operação, que como tempo perdem eficiência e necessitam de moder-nização. A pesquisa do Instituto de Eletrotécnica eEnergia da USP aponta um potencial adicional de8% na capacidade instalada de geração de energiacom esta medida, sem a necessidade de construçãode uma nova usina. Para isso é preciso alterar a le-gislação atual que não permite a paralisação de umausina para processos de modernização, criando ummecanismo de autorização compartilhada por diver-sos órgãos, com participação de usuários.

8. Controle estatal sobre a geração e distri-buição de energia

Entre 1996 e 2006, os reajustes das tarifas de ener-gia elétrica ficaram bem acima da inflação no pe-ríodo. As tarifas médias subiram 350%, enquanto ainflação medida pelo índice IPCA registrou variaçãode 196%. Em termos reais (descontando-se a infla-ção) o aumento na conta de luz atingiu 77%, con-sequência direta da privatização do setor energético.É preciso acabar com o favorecimento de oligopóliosdo capital financeiros pelo Estado, impedindo, por

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ENERGIA 39

exemplo, manobras contábeis em balanços para fal-sificar e criar prejuízos e, com isso, obter autorizaçãopara aumentos ilegais de tarifas e justificar os baixosinvestimentos das empresas no setor. Defendemos ofim da Indústria do Apagão.

9. Amplo debate sobre a exploração doPré-Sal

A exploração comercial da área do Pré-sal de-manda respostas a desafios técnicos e logísticos deextrema complexidade, como a profundidade dasreservas e a plasticidade do sal, que dificultam aperfuração e a extração do combustível. Um vaza-mento em águas profundas resultaria na poluiçãodas marés e profunda alteração dos ecossistemas,com grande impacto na costa. Portanto, a exploração

do Pré-Sal deve ser feita a partir de um amplo debateque envolva os impactos ambientais, sociais e traba-lhistas. Ao mesmo tempo, defendemos a exploração100% estatal e a revogação do leilão do Campo deLibra, revertendo seus dividendos em serviços pú-blicos como saúde e educação.

10. Criação de um plano de contingencia-mento em caso de acidentes nas operaçõesde petróleo

No Brasil não há um plano de contingenciamentoem caso de acidentes nas operações de petróleo, ape-sar de existir uma proposta desde 2000. Segundo oTCU, a ANP verifica apenas 4% dos acidentes ocor-ridos.

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40 REFORMA AGRÁRIA

9 Reforma agráriaO ano de 2014 ficará marcado na história dos lu-

tadores por um Brasil mais justo, democrático e igua-litário pela morte de uma grande referência: Plíniode Arruda Sampaio. Durante sua trajetória, Plíniofoi um gigante na defesa de uma verdadeira demo-cracia social, no combate à exploração capitalista ena luta pela Reforma Agrária, sua grande bandeirade luta em vida. Presidente de honra da Associa-ção Brasileira de Reforma Agrária (ABRA), fundadaem 1967, Plínio foi o relator do projeto de ReformaAgrária do governo João Goulart e, por anos, atuoudesenvolvendo trabalhos para a causa na Organiza-ção para Agricultura e Alimentação das Nações Uni-das (FAO/ONU). Posteriormente, com a chegada deLula ao poder, Plínio foi responsável por elaborar oPlano Nacional de Reforma Agrária, que nunca foitirado do papel pelo governo. Já no PSOL, Plínio foicandidato a governador do estado de São Paulo e àPresidente da República, mantendo a coerência comos ideais socialistas e libertários e com a luta pela Re-forma Agrária.

Embora Plínio tenha partido, suas ideias e seuexemplo permanecem em cada passo dos brasileirosem direção a um país onde vigore a verdadeira jus-tiça. Por isso, em nosso Programa para a ReformaAgrária resgatamos as atuais e urgentes contribui-ções que Plínio desenvolveu ao lado dos movimen-tos sociais ao longo de sua efervescente vida política.Como abertura deste ponto colocamos também umexcerto de uma importante contribuição do nossoquerido Plínio de Arruda Sampaio, que esteja sem-pre presente!

“Se há uma “questão agrária”, só há um meio deresolvê-la: alterando essa estrutura mediante uma reformaagrária. Isto consiste fundamentalmente na destruiçãodo poder das forças que hoje dominam o mundo rural eimpõem uma dinâmica agrícola perversa; e em sua subs-tituição por outras forças aptas a imprimir uma dinâ-mica econômica e ambientalmente mais equilibrada e so-cialmente mais justa. Substituir os poderes existentes nocampo por novos poderes constitui a essência mesma dosprocessos de reforma agrária. Dado que atualmente o po-der maior no campo está em mãos das agroindústrias quecontrolam a provisão de insumos e o escoamento da pro-dução, poder-se-ia questionar a necessidade de uma re-forma agrária, já que esta consiste essencialmente na dis-tribuição entre a população rural de terras concentradas

em mãos de um reduzido número de grandes empresasagrícolas. Não é assim. Não há como eliminar o domí-nio hegemônico dessas duas facções sobre a vida rural semalterar substancialmente o atual perfil de distribuição dapropriedade da terra. Está na base do sistema de domi-nação cuja cúpula são as grandes agroindústrias. É essaextraordinária concentração da propriedade da terra quegera uma população destituída de qualquer possibilidadede sobrevivência sem depender dos favores dos que têmmuita terra. Dessa dependência da população rural dospoucos que podem fornecer trabalho ou terra para cultivosurgiram historicamente, e se mantêm até hoje, relaçõeseconômicas, sociais e políticas perversas, que abrangemnão somente as relações econômicas, sociais e políticas per-versas, que abrangem não somente a relação entre a grandeempresa agrícola e o habitante rural sem terra, mas englo-bam as relações entre todos segmentos de classe do meiorural. Essas relações geraram uma inércia que bloqueiatodo e qualquer esforço de melhorar o padrão de vida dessapopulação e de aproveitar todas as possibilidades de cria-ção de riqueza que o desenvolvimento das forças produti-vas no campo já permite. Para desbloquear essa situaçãoindesejável, é preciso vencer a dominação da grande em-presa agrícola sobre a população do campo; para venceresta dominação, é preciso quebrar sua espinha dorsal: aconcentração da propriedade da terra. Se a maior parteda população rural tiver acesso à terra, as relações sociaisperversas não terão como se sustentar e o caminho estaráaberto, após um período de adaptação, para um grande de-senvolvimento da produção. Daí a necessidade de umareforma agrária, ou seja, de uma intervenção direta e pla-nejada do Estado, com o apoio decidido da massa rural,para, em um curto período, desapropriar uma quantidadesuficientemente grande de terras, de modo a quebrar o po-der econômico, social e político dos segmentos das classesdominantes que hegemonizam atualmente o meio rural.”

Prioridades:

a) Impedir a concentração da propriedade pri-vada da terra, das florestas e da água, e fa-zer uma ampla distribuição das maiores fazen-das, instituindo um limite de tamanho máximoda propriedade de bens da natureza e restrin-gindo a propriedades de empresas transnacio-nais;

b) Implementar um programa agrícola e hídrico

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REFORMA AGRÁRIA 41

que priorize a soberania alimentar de nossopaís, com estímulo à produção de alimentos sa-dios, à diversificação da agricultura, à ReformaAgrária com ampla democratização da propri-edade da terra, à distribuição de renda e à fixa-ção das pessoas no meio rural brasileiro;

c) Assegurar que a agricultura brasileira seja con-trolada pelos brasileiros e tenha como base aprodução de alimentos sadios e a organizaçãode agroindústrias na forma de cooperativas emtodos os municípios do país;

d) Incentivar a produção diversificada, na formade policultura, priorizando a produção campo-nesa.

Propostas de ação:

1. Reorientação das políticas públicas comprioridade à agricultura familiar

Nos últimos anos, o governo tem dado priori-dade total ao agronegócio de larga escala. Nossaprioridade será a agricultura familiar com vistas aassegurar a soberania alimentar, a justa e equitativadistribuição das terras produtivas e a geração de em-pregos no campo. Além disso, há inúmeros estudosque mostram que a agricultura familiar tem tido de-sempenho mais produtivo do que as grandes pro-priedades vinculadas ao agronegócio, tanto no quese refere à eficiência produtiva e ao aproveitamentoda terra, quanto ao retorno econômico do país comtaxa superior de geração de emprego, distribuiçãode renda e aproveitamento de recursos e financia-mentos públicos.

Visando estimular a agricultura familiar e a de-mocratização do acesso e produtividade na terra, va-mos ter como eixos gerais:

• prioridade para a produção de alimentos parao mercado interno;

• estabelecer preços rentáveis aos pequenos agri-cultores, garantindo a compra pela Conab;

• implantar uma nova política de crédito rural,em especial, para investimento nos pequenos emédios estabelecimentos agrícolas;

• defender que a política de pesquisa da Em-brapa seja definida a partir das necessidadesdos camponeses e da produção de alimentos;

• garantir a adequação da legislação sanitária daprodução agroindustrial às condições da agri-cultura camponesa e das pequenas agroindús-trias, ampliando as possibilidades de produçãode alimentos;

• implementar políticas públicas para a agricul-tura direcionadas e adequadas às realidadesregionais;

• Aumentar os recursos do Pronaf e os créditosiniciais de instalação;

• Destinar recursos para os estados e municípioscolocarem equipes de Saúde da Família nosprojetos de assentamentos;

• Rediscutir o PNAE (Programa Nacional de Ali-mentação Escolar);

• Definir critério para produção de oleaginosapara a produção de Biodiesel nos assentamen-tos de utilização máxima 25% de cada parcela,proibindo o arrendamento para Usinas;

• Aumentar os valores para o PNHR (ProgramaNacional de Habitação Rural) para que as ca-sas sejam construídas com, no mínimo, 60m2,incluindo kits de fossa biodigestoras (desen-volvidas pela Embrapa - São Carlos), coletoressolares (desenvolvidos pela Unicamp) e cister-nas de placas desenvolvidas pela Articulaçãodo Sem Árido (ASA);

• Definir um Plano Nacional de Assistência Téc-nica Rural;

• Apoiar prefeituras e estados na reconstruçãodas Escolas do Campo;

• Ampliar os recursos para o Pronera e rediscutiro manual com vistas à sua desburocratização;

• Aumentar os valores do custo por famíliaspara os pagamentos de TDA’s;

• Destinar todas as terras arrecadadas por ór-gãos públicos para a Reforma Agrária;

• Revogação da Medida Provisória 2.183-56(Agosto 2001) que proíbe terras ocupadas deserem desapropriadas.

2. Estruturação de um sistema nacionalpara a Justiça Agrária

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42 REFORMA AGRÁRIA

Na atrasada estrutura fundiária brasileira aindapredomina, por um lado, os grandes latifúndios im-produtivos ou com produção que não atende às de-mandas internas da população e, por outro, umcenário de conflito e violência no campo onde háuma grande quantidade de trabalhadores campone-ses sem terra. Esse conflito é agravado pela imensaquantidade de grilagem, de ocupação de terras indí-genas e quilombolas, de desrespeito ao meio ambi-ente e aos ribeirinhos. Tudo amparado em uma jus-tiça de classe onde prevalece as frias estatísticas demortes de camponeses e ativistas de direitos huma-nos no campo. Reestruturar o judiciário no campopara constituir uma Justiça do Campo nos moldes daJustiça do Trabalho é um grande desafio. Para issopropomos medidas como a criação de varas e pro-motorias agrárias – à semelhança do que já aconteceem alguns estados – em todo o país como transiçãopara um sistema organizado com tribunais específi-cos. Ao mesmo tempo, é preciso promover de ime-diato a estatização dos cartórios de terras, focos dalegalização da grilagem de terras.

3. Adotar técnicas de produção que bus-quem o aumento da produtividade do tra-balho e da terra, respeitando o meio ambi-ente e a agroecologia

Para desestimular o avanço do desmatamento énecessário aumentar a produtividade do trabalho eda terra, porém respeitando o meio ambiente. Nessesentido, a agroecologia se faz necessária para redu-zir os impactos no meio ambiente e melhorar a saúdedas pessoas com atividades na natureza e produçãode alimentação saudável, combatendo o uso de agro-tóxicos, que contaminam os alimentos e a natureza.

4. Preservar, difundir e multiplicar as se-mentes nativas e melhoradas

Defendemos a proibição da atuação de empre-sas estrangeiras no controle da produção de alimen-tos e no comércio de sementes, uma vez que co-loca em risco a autonomia da produção de alimen-tos. Visamos preservar, difundir e multiplicar as se-mentes nativas e melhoradas de acordo com nossoclima e biomas, para que todos os agricultores te-nham acesso a elas, estimulando a produção, a distri-buição e o controle das sementes, bem como a diver-sidade genética vegetal e animal por parte dos pró-prios agricultores e agricultoras.

5. Proibir a aquisição de terras brasileiraspor empresas transnacionais e “seus laran-jas”

As empresas transnacionais, em conjunto comfalsas entidades ambientalistas, vêm se apropriandodas terras brasileiras para transformá-las em simplesmercadorias como, por exemplo, por meio da uti-lização de créditos de carbono negociáveis nas bol-sas, que isenta empresas poluidoras do Norte e geraoportunidades de lucro para empresas do Sul, man-tendo as agressões feitas ao meio ambiente pelo ca-pital.

6. Desapropriar as terras de empresas es-trangeiras, bancos, indústria e comércio,empresas construtoras e igrejas que não te-nham na agricultura sua atividade fim

A produção de alimentos saudáveis e o respeitoao meio ambiente são nossas prioridades. Nesse sen-tido, é preciso impedir a privatização dos recursosnaturais por grandes empresas, como Nestlé, Coca-Cola, Suez, e geração de energia para agronegócio eo hidronegócio, que destrói e polui o meio ambiente,privilegia os grandes consumidores eletrointensivose entrega o controle da energia às grandes corpora-ções multinacionais. Defendemos a desapropriaçãodas terras de empresas estrangeiras, bancos, indús-tria e comércio, empresas construtoras e igrejas quenão tenham na agricultura sua atividade fim, alémda destinação dessas terras para a meta de assenta-mento de 1 milhão de famílias.

7. Desapropriar as terras públicas e priva-das que não cumpram sua função social

A função social da terra, garantida na Constitui-ção Federal, estipula que ela não deve ser tratadacomo uma mercadoria qualquer,. Ela deve servir àsociedade e manter-se produtiva. Por esse motivo,defendemos a desapropriação das terras públicas eprivadas que não cumpram sua função social deter-minada pela produtividade, de acordo com o poten-cial de cada região, bem como o respeito ao meio-ambiente e às leis trabalhistas, aprovando a lei quedetermina a expropriação de toda fazenda com tra-balho escravo.

8. Regularizar todas as terras quilombolasdo país

A expansão do agronegócio e as disputas terri-

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REFORMA AGRÁRIA 43

toriais colocam em risco o acesso à terra e o reco-nhecimento de direitos quilombolas. Para garantir amanutenção de territórios ocupados por essa popu-lação, defendemos a regularização de todas as terrasquilombolas do país.

9. Demarcar imediatamente todas as áreasindígenas e promover a retirada de todosos fazendeiros invasores

Desde a colonização do Brasil, os povos indíge-nas vêm sofrendo com a perda de seu território. Nasúltimas décadas, o agronegócio e a extração de ma-deira tem sido as principais ameaças para a manu-tenção desses povos e de suas culturas. A demar-

cação de todas as terras indígenas, em especial nasáreas dos guaranis, no Mato Grosso do Sul, se faznecessária para garantir a manutenção de seus espa-ços de reprodução cultural, social e econômica.

10. Assegurar a educação no campo

Defendemos a implementação de um amplo pro-grama de escolarização no meio rural, adequado àrealidade de cada região, que busque elevar o nívelde consciência social dos camponeses, universalizaro acesso dos jovens a todos os níveis de escolarizaçãoe, em especial, aos ensinos médio e superior, além dedesenvolver uma campanha massiva de alfabetiza-ção de todos os adultos.

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44 HABITAÇÃO E REFORMA URBANA

10 Habitação e Reforma UrbanaO modelo brasileiro de desenvolvimento favore-

ceu a especulação imobiliária nas grandes cidades,expulsando com isso a população mais pobre parazonas distantes e aumentando ao mesmo tempo oscustos de infraestrutura e de transportes. O combateà segregação urbana em nossas metrópoles passapelo fim da aceitação de que imóveis são ativos deinvestimento. Imóveis são bens sociais e devemcumprir a função social da propriedade. O programahabitacional que defendemos é um eixo norteadorde um grande Plano Nacional de DesenvolvimentoUrbano que esteja articulado à necessidade impera-tiva do direito à cidade para quem nela habita, ouseja, que as cidades sejam planejadas e construídasde acordo com os interesses e as necessidades damaioria de sua população.

Prioridades:

a) Criar um sistema nacional de desenvolvimentourbano estruturado que garanta a plena hierarquiade competências dos entes federativos e a execuçãode instrumentos de democratização do direito à ci-dade, desde os pequenos núcleos às grandes me-trópoles; b) Zerar o déficit habitacional nas cidadesmédias e grandes; c) Retomar a capacidade do Es-tado em planejar, intervir e gerenciar a produção doespaço urbano com atuação direta do governo fe-deral; d) Assegurar a participação popular no pla-nejamento e execução do desenvolvimento urbano,a partir da obrigatoriedade de mecanismos de con-trole social, especialmente sobre o orçamento; e) Ur-banizar e regularizar favelas em todo o país.

Propostas de ação:

1. Estabelecer um Plano Nacional de De-senvolvimento Urbano que rediscuta a ad-ministração do território urbano e torne re-alidade a utilização dos instrumentos pre-sentes no Estatuto das Cidades

A realização de uma efetiva e necessária ReformaUrbana passa em primeiro lugar por garantir a efe-tividade de medidas de democratização do acesso àterra urbanizada, combatendo a especulação imobi-liária e exigindo o cumprimento da função social da

propriedade. Instrumentos como o IPTU progres-sivo no tempo, o parcelamento compulsório de imó-veis que não cumprem sua função social e as Zo-nas Especiais de Interesse Social que garantem mo-radia digna no planejamento urbano são formas deampliar o direito à cidade e combater a segregaçãourbana. Embora esses dispositivos estejam previs-tos desde 2001 no Estatuto das Cidades, raramentesão implantados. Custa caro à sociedade que finan-cia o Estado manter a infraestrutura urbana em áreasque só atendem à especulação. A implantação destese de muitos dos instrumentos assegurados no Esta-tuto das Cidades não se efetiva por conta da inca-pacidade da União de intervir nas questões urbanasfundamentais.

Elaboraremos, em conjunto com os movimentossociais e a sociedade civil, um Plano Nacional deDesenvolvimento Urbano que enfrente o desafio depensar o planejamento urbano em longo prazo a par-tir das diferentes demandas das diversas cidades dopaís, desde as pequenas às grandes metrópoles. Paratanto é fundamental reestruturar o pacto federativoassegurando clara hierarquização das competênciasdos entes e controle social para garantir a plena exe-cução dos dispositivos de democratização das cida-des. Tudo isso requer que o governo federal seja oprincipal responsável por assegurar a implantaçãodeste plano nos estados e municípios.

2. Planejamento e Orçamentos Participa-tivos obrigatórios em todos os municípiosdo país

Um problema central do panorama urbano bra-sileiro é a completa ausência de mecanismos efeti-vos de participação popular e democracia direta noplanejamento das cidades. Nesse cenário, os negó-cios de todo o tipo – e especialmente os financeiros eimobiliários nas grandes metrópoles – são os princi-pais planejadores das cidades. Ou seja, o desenvolvi-mento urbano atende prioritariamente aos interessesdo grande capital em prejuízo das demandas maissentidas pelo povo.

Reverter tal quadro é um imperativo para ter ci-dades justas e viáveis nos aspectos social, econômicoe ambiental. Em nosso governo o planejamento e oorçamento urbanos de todas as cidades do país, apartir de regulamentação própria que preveja a di-

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HABITAÇÃO E REFORMA URBANA 45

versidade de realidades, deverão contar obrigatoria-mente com plena e ativa participação popular, sendocondição para que os estados e municípios recebamtransferências de recursos e investimentos do go-verno federal.

3. Nova Lei do Inquilinato

Nos últimos anos as ocupações de terras e pré-dios urbanos se multiplicaram em função da alta as-tronômica dos preços dos aluguéis que chegaram aser reajustados muitas vezes acima das taxas de in-flação. Esses reajustes abusivos criam sérios proble-mas na infraestrutura urbana, alargando o déficit ha-bitacional com a expansão de habitações precárias eem áreas de risco e aumentando a pressão por equi-pamentos e serviços públicos nas áreas periféricas.Combater a especulação imobiliária é o principal ob-jetivo da elaboração de uma nova lei do inquilinatoque estabeleça limites aos reajustes dos aluguéis, ga-rantindo que esses não estejam acima da inflação.

4. Implantação de política federal de desa-propriação de terrenos ociosos e destinaçãode terrenos da União (SPU) para habitaçãopopular

A lei de desapropriações no país premia o espe-culador. Uma área ociosa, que não cumpre funçãosocial, pode ser desapropriada pelo Estado, mas osgovernos são obrigados a pagar em valor de mer-cado e à vista e, por conta disso, há proprietáriosque festejam a desapropriação e fazem até conluiospara que elas ocorram. Quem especula com a terra– urbana ou rural – precisa ser punido e não premi-ado pela lei. Como proposta mínima para uma polí-tica federal de desapropriação, se a terra está sendousada para especulação, deve ser objeto de desa-propriação compulsória, pelo valor venal e com pa-gamento em títulos da dívida pública. Ao mesmotempo é fundamental garantir que haja um bancopúblico de terras para não deixar que os terrenos ur-banos sejam monopólio do mercado imobiliário. Osterrenos da União não utilizados devem ser alvo depolíticas de desapropriação que tenham como prio-ridade a resolução do déficit habitacional.

5. Política de combate a despejos forçados,criando Secretaria específica no Ministériodas Cidades

Como se viu durante todo o período de prepara-

ção do país para a Copa do Mundo, os despejos for-çados são a regra na execução do planejamento ur-bano brasileiro, controlado pela avidez do mercadoimobiliário em consórcio com os políticos que se ele-gem em função do financiamento de empreiteiras econstrutoras. Combater os despejos forçados é umanecessidade que demanda a criação de uma Secre-taria específica no Ministério das Cidades. Ela deveser a mediadora dessas situações.

6. Ampla reformulação do Programa Mi-nha Casa Minha Vida (MCMV)

Gestado como política industrial para ampliaros negócios imobiliários vinculados às grandes em-presas da construção civil e ao capital financeiro, oMCMV precisa de mudanças profundas para produ-zir, de fato, moradia digna para aqueles que maisprecisam. Medidas emergenciais:

• fortalecimento da gestão direta dos projetose obras pelos futuros moradores, destinando100% dos novos projetos à modalidade MCMVEntidades;

• focar o programa nas famílias com renda me-nor que três salários mínimos, que represen-tam 70% do déficit habitacional brasileiro;

• associar o programa a uma política nacio-nal de desapropriações, possibilitando assimuma melhor localização urbana dos empreen-dimentos populares;

• reduzir a margem abusiva de lucro das cons-trutoras no programa, com o aumento dasexigências de qualidade e tamanho mínimodas moradias construídas, garantindo que ne-nhuma habitação tenha tamanho inferior a55m2;

• aumentar os recursos destinados ao programa.

7. Limitação para a aquisição de imóveis

A dinâmica da concentração de poder e de ri-queza no Brasil está associada à concentração pro-porcional de propriedades e de imóveis que, emgrande parte dos casos, sequer cumprem sua funçãosocial, servindo apenas especulação. Em nossa pro-posta, para combater o déficit habitacional e contri-buir efetivamente para a desconcentração de riquezae renda ninguém poderá ter mais do que 5 imóveis

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46 HABITAÇÃO E REFORMA URBANA

em uma cidade, a não ser em casos excepcionais.Com isto, visamos também quebrar o ciclo de espe-culação que faz os preços dos imóveis explodirem.

8. Lei da Casa Vazia

A quantidade de domicílios vazios nas grandescidades é imensa e capaz de resolver grande partedo déficit habitacional que as metrópoles acumula-ram ao longo de anos. Boa parte desses domicíliosestá localizado em áreas centrais das cidades, abas-tecidas amplamente por sistemas de transportes pú-blicos e por infraestrutura urbana. Portanto, asso-ciada a outras políticas habitacionais, a Lei da CasaVazia estabelece que imóveis desocupados por maisde dois anos, que estejam comprovadamente a ser-viço da especulação, com dívidas com o poder pú-blico e em áreas onde há grande déficit habitacional,devem ser desapropriados a fim de transformá-losem habitação popular.

9. Política federal de Aluguel Social emáreas centrais

As políticas de aluguel social no Brasil servem,na melhor das hipóteses, como atenuantes para fa-mílias que sofrem com desastres ou remoções força-

das. Ao contrário, deveriam significar instrumentosde combate à favelização e à periferização a partir deprogramas que forneçam subsídios para que quemtenha menos recursos possa morar dignamente emáreas providas de infraestrutura urbana.

10. Urbanização e regularização de favelas

O processo de expansão das periferias urbanas ede favelização é uma regra geral nas grandes cida-des brasileiras. Essas habitações são as que os ne-gócios imobiliários deixam disponíveis para quemtem pouca renda, em geral em áreas onde o mercadoformal não pode ou não quer investir. Entretanto,na imensa maioria das vezes as favelas, vilas e ou-tras denominações de habitações chamadas “irregu-lares”, sofrem um processo pesado de segregação ur-bana por parte do poder público que as condiciona auma situação de “não-cidade”. Integrar as favelas àcidade com investimentos de vulto em urbanizaçãoe iniciativas concretas para a regularização fundiá-ria, administrativa e patrimonial dessas habitações éuma prioridade e a melhor alternativa para respon-der ao passivo socioambiental das cidades, preser-vando empregos, laços territoriais e acesso a equipa-mentos públicos.

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11 Mobilidade e TransportesA questão dos transportes foi a principal catalisa-

dora das jornadas de junho, que levaram milhares debrasileiros às ruas, rompendo o dique da indignaçãopopular. O PSOL sabe que não é por acaso. A lutacontra o aumento das tarifas sempre foi uma priori-dade nossa porque o transporte público e de quali-dade é uma necessidade estruturante de justiça so-cial e direito à cidade, devendo ser entendido comoum direito universal e um dever do Estado assegu-rado na Constituição.

Por isso, garantir políticas efetivas de mobili-dade que desonerem os trabalhadores e a juven-tude ao máximo – com a perspectiva da tarifa zero– ao mesmo tempo em que incluam outros modais– como a bicicleta, transporte sobre trilhos, sobre aágua e o transporte por veículos elétricos (trólebuse bondes) – em uma visão integrada de desenvolvi-mento das cidades é uma prioridade do nosso pro-grama. Ao mesmo tempo é necessário reorientartanto a rede urbana quanto a rede de transporte decargas para alternativas mais racionais ambiental eeconomicamente.

Prioridades:

a) Garantir transporte público como direito socialconstitucional;

b) Reduzir e até zerar as tarifas e, ao mesmotempo, expandir a oferta e avançar na quali-dade do serviço;

c) Aumentar a destinação de verbas públicas àmobilidade urbana;

d) Integrar transportes urbanos em um Plano In-tegrado de Mobilidade, abarcando diversosmodais (bicicleta, carro, transporte coletivo edeslocamento a pé) dentro das estruturas deplanejamento urbano;

e) Para transporte de cargas, substituir progres-sivamente o modal rodoviário pelos aquaviá-rio e ferroviário, com frete mais barato e menorconsumo de energia;

f) Garantir condições dignas de salário e trabalhoaos profissionais de transportes.

Propostas de ação:

1. Estabelecer o transporte público comodireito social nos termos do artigo sexto daConstituição Federal

A PEC 74 do Senado, que já tem todos pareceresfavoráveis, versa sobre o tema e só precisa ser postaem votação. Como já foi aprovada a PEC 90 da Câ-mara, com o mesmo objetivo, aprovada a PEC 74 estácompletada a inscrição na Constituição. Garantir otransporte público como direito social constitucio-nal significa avançar para a obrigatoriedade de seuoferecimento pelo Estado bem como a qualidade e agratuidade.

2. Destinação de ao menos 2,1% do PIBpara mobilidade urbana

Destinaremos, conforme proposto pelo IPEA,pelo menos 2,1% do PIB para mobilidade urbanadando prioridade absoluta ao transporte público.A política de amplos subsídios estatais às grandesmontadoras e ao transporte individual motorizadocomo prática dos governos Lula e Dilma, além dereforçar a desigualdade social diminuindo a capaci-dade de arrecadação do Estado, reforça a lógica demobilidade crítica e segregação nas grandes metró-poles com os problemas crônicos de trânsito e as de-ficiências profundas no transporte público.

O dado mais alarmante dessa política falida é acrescente quantidade das mortes em acidentes detrânsito: em 2012 foram 46 mil mortes desse tipo, nú-mero que se aproxima cada vez mais das mortes porhomicídio. O fortalecimento do transporte público –garantido como direito e financiado pelo Estado – ar-ticulado com outros modais não motorizados, comoa bicicleta, é fundamental para garantir a todos o di-reito a cidades mais humanas, ambientalmente jus-tas e economicamente viáveis.

3. Estabelecimento de um Código Nacionalde Desempenho dos Transportes ColetivosUrbanos e Metropolitanos

Como desdobramento das diretrizes da LEI No

12.587, DE 3 DE JANEIRO DE 2012, denominada Leida Mobilidade, propõe-se a edição de um Código

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48 MOBILIDADE E TRANSPORTES

Nacional do Desempenho dos Transportes ColetivosUrbanos e Metropolitanos que torne efetivas as dire-trizes gerais contidas na citada lei. Diferentementede Planos de Mobilidade ali previstos, o Código pro-posto tem força de operacionalizar de imediato ascaracterísticas do desempenho dos transportes cole-tivos urbanos e metropolitanos. Um país não podeprescindir de tais especificações, tal como existe naaviação civil e no trânsito, por exemplo.

Esse Código determinará, por exemplo, que:

• será de cinco o número máximo de passageirospor metro quadrado em qualquer horário;

• o tempo máximo de espera nos pontos de pa-rada será de 4 minutos;

• será obrigatório o uso de ar condicionado nosveículos;

• será proibido o uso de veículos encarroçadossobre chassis de caminhões;

• será obrigatório o uso de câmbio automático;

• os polos geradores de passageiros, sejam deorigem residencial, comercial ou de serviços,deverão prover obrigatoriamente serviços detransportes tipo “shuttle”, entre o polo geradore terminais de transportes coletivos;

• será obrigatório (conforme decreto 5.296 DE 2DE DEZEMBRO DE 2004) a todos os ônibus agarantia de plena acessibilidade para deficien-tes;

• será proibido o acúmulo de tarefas dos profis-sionais dos transportes coletivos.

4. Criação do Fundo Nacional de Financi-amento das Tarifas de Transportes Coleti-vos Urbanos e Metropolitanos

Com recursos provenientes de uma reforma tri-butária, com ênfase nos impostos diretos e sobregrandes fortunas, além da transformação do Vale-Transportes em Taxa Transportes proporcional aonúmero de trabalhadores das empresas. Tal fundoajudará no subsídio das tarifas, em complemento aossubsídios de origem municipal e estadual. Só acessa-rão o Fundo os municípios e estados que observaremo Código de Desempenho.

5. Criação do Programa Ônibus Sustentá-vel

Estimulando a inovação, fomento e incentivo àfabricação nacional e uso de ônibus movidos a ener-gia elétrica segundo os padrões recentes que pres-cindem do uso de alavancas captadoras de energiae usam sistema de recarregamento de baterias pormodos de indução eletromagnética nos pontos deparada. O mercado brasileiro de ônibus urbanos éde cerca de 100.000 veículos. Os municípios e esta-dos que usarem esse tipo de veículos nos corredorese nas linhas comuns, terão um adicional do Fundode Financiamento das Tarifas. Paralelamente, con-dicionado à gratuidade das tarifas, haverá incenti-vos e financiamento por parte do governo federal apequenos e médios municípios a comprarem frotaspróprias de ônibus.

6. Estabelecimento de padrões de eficiênciapara a produção de carros brasileiros

Os fabricantes de veículos automotores deverãoalcançar metas mínimas de eficiência energética vei-cular, que serão progressivamente introduzidas de2018 a 2021, até atingir a meta de 1,22 Mj/Km (me-gajoules por quilômetro). Se tal eficiência for alcan-çada, além dos benefícios ambientais, a populaçãobrasileira economizaria R$ 287 bilhões em combustí-vel.

7. Integração prioritária e obrigatória dabicicleta aos planos de mobilidade com es-tímulo ao uso de modais não motorizadoscomo parte da mudança do padrão de des-locamentos urbanos

É necessário incentivar a busca por alternativasde transportes menos impactantes na rede viária, de-sestimular o uso excessivo do automóvel e ainda re-organizar a utilização do espaço urbano de forma agarantir que deslocamentos, quando necessários, se-jam realizados da forma mais racional possível. Aintegração entre diferentes modais de transporte –com prioridade aos coletivos e aos não motorizados– deve ter tratamento preferencial, em detrimento deintervenções específicas de expansão da infraestru-tura existente.

A bicicleta, absolutamente viável para pequenase médias distâncias, quando integrada a outros mo-dais de transporte permite atingir vários destinos,além de ser um vetor de melhoria ambiental e desaúde. O trajeto por bicicleta multiplica por 15 azona de influência de uma parada de transporte pú-blico. Em estudo da Comissão Europeia, constatou-

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MOBILIDADE E TRANSPORTES 49

se que o ciclista pode ganhar um quarto de hora emrelação ao ônibus, no seu deslocamento para alcan-çar uma estação de integração. Para nós, aliada à ex-pansão e prioridade ao transporte público coletivo,o compromisso com a mobilidade ciclística será cen-tral. Para tanto, incorporaremos propostas dos mo-vimentos ciclísticos para o desenvolvimento de umprograma nacional de mobilidade ciclística que en-volva, como sugerido pela União de Ciclistas do Bra-sil:

• Criar um sistema de pesquisa, monitoramentoe avaliação das políticas públicas, da infraes-trutura cicloviária e da participação da bici-cleta nos deslocamentos, assim como incluir abicicleta no censo e nas pesquisas domiciliaresdo IBGE, de modo a subsidiar a elaboração deplanejamento para o setor;

• Criar rubrica específica no Orçamento Geral daUnião, por meio do Plano Plurianual, para cus-teio e investimentos em mobilidade ciclística,bem como linhas de financiamento aos municí-pios brasileiros para infraestrutura cicloviária,em montante crescente a cada ano;

• Estabelecer metas claras de aumento da par-ticipação da bicicleta na mobilidade urbana erural, envolvendo todos os setores da adminis-tração pública federal, bem como aplicar a bi-cicleta nas políticas públicas sociais tais comode trabalho, geração de renda, erradicação dapobreza, defesa civil, educação, saúde e mora-dia;

• Instalar bicicletários adequados em todos osprédios públicos federais, de todas as cidadesbrasileiras, quando houver espaço disponível,suprimindo, se necessário, vagas de estaciona-mento de automóveis;

8. Transferência modal do transporte decargas: de rodoviário para aquaviário e fer-roviário

Os modais ferroviário e aquaviário são mais efi-cientes economicamente e menos poluentes para o

transporte de carga. O custo do frete ferroviário é,segundo o DNIT, 50% menor do que o rodoviário,que continua sendo usado pela pressão histórica dasgrandes empresas automobilísticas. Em nenhum ou-tro país com dimensões continentais como o Brasil(como EUA e Rússia) existe a utilização desse pa-drão.

9. Integração do Planejamento e Logísticade Transportes nacional às realidades de es-tados, regiões metropolitanas e municípios

Por meio de investimentos em capacitação téc-nica, humana e financeira de setores do governo,como a Empresa de Planejamento e Logística (EPL),deve-se prover estados e municípios de apoios dire-tos ao aperfeiçoamento e criação de planos de mo-bilidade onde estes não existam e integrá-los a umplano comum nacional com otimização dos investi-mentos e resultados.

10. Estabelecimento e criação, através de le-gislação pertinente, de ferramentas de de-mocracia direta no planejamento, progra-mação e controle das linhas de transportescoletivos urbanos e metropolitanos

A mobilidade urbana é um dos serviços públi-cos que mais se presta e exige a democracia diretano estabelecimento de suas políticas, planejamento,programação e controle. A população usuária detémum conhecimento só permitido pela vivência propi-ciada pelo uso diário dos transportes coletivos.

Cabe ressaltar que das reivindicações das Jorna-das de junho de 2013, a questão da mobilidade e dastarifas dos transportes coletivos foi a que menos foicontemplada, na prática, por medidas inovadoras econcretas. O máximo que aconteceu foi a aprovaçãodo REITUP, que desonera as empresas de impostos,contribuições e taxas, supondo que tais renúncias fis-cais chegarão ao bolso do usuário pela redução dastarifas. Assim mesmo, poderão reduzir as tarifas embaixos percentuais.

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50 SEGURANÇA PÚBLICA

12 Segurança PúblicaVivemos no Brasil uma dramática situação de vi-

olência e criminalidade generalizadas. As grandescidades em especial vivem sob a escalada do númerode homicídios e roubos, e as respostas-padrão dadaspelos governos – aumento da repressão, violência doEstado e encarceramento – se demonstraram um fra-casso de grandes proporções. Essa escalada da vio-lência é complementada pela organização cada vezmaior e mais eficiente das organizações criminosas,como as milícias e os traficantes de armas e drogasque seguem tendo domínio de importantes partes doterritório, da produção à circulação de suas merca-dorias. A postura do governo federal nas últimas dé-cadas tem sido a de total refém dessa situação de in-segurança, não tendo tomado nenhuma medida quecombatesse isso de maneira expressiva.

Entendemos que é preciso enfrentar a situação dainsegurança de frente, acompanhando os inúmerosexemplos que demonstram a necessidade de enten-der a segurança pública em sua múltipla dimensão.Isso significa que se deve combater as causas e nãoapenas os efeitos da criminalidade. Não é nenhumanovidade que países onde os índices de distribuiçãode renda e os serviços públicos de educação, cultura,saúde, lazer, esportes e atividade física, habitação eurbanidade são melhores, têm também indicadoresde segurança muito melhores.

Ao mesmo tempo, não se trata de transferir paraas outras áreas o que é tarefa dos organismos de se-gurança pública: é preciso que o sistema seja refor-mulado para ser eficiente, combatendo a estruturacorrupta que se perpetua nas polícias, enfrentandoa impunidade das ações do Estado, garantindo me-canismos mais inteligentes e efetivos de combate aofinanciamento e comando das organizações crimino-sas e tendo a clara necessidade de transformar a se-gurança em compromisso civil, revertendo a políticade encarceramento e a doutrina militar que são he-ranças do regime ditatorial do Brasil.

Prioridades:

a) Reduzir drasticamente a situação que coloca oBrasil como um dos primeiros países nos ran-kings de homicídios no mundo, levando emconsideração a necessária combinação de po-líticas públicas de prevenção nas mais diversasáreas sociais e políticas de ação baseadas em

planejamento e inteligência;

b) Reformar o modelo policial integrando as po-lícias em um sistema único e desmilitarizadoque construa um novo pacto federativo e va-lorize o trabalhador e o plano de carreira dosservidores da segurança pública, permitindo aesses todos os direitos civis de organização esindicalização;

c) Revisar as políticas criminais e penitenciáriasbaseadas na falida lógica do encarceramentoem massa e na morosidade da resolução doscrimes;

d) Revisar a política de drogas, descriminali-zando e regulamentando o uso da maconha epondo fim à política de guerra às drogas que,na prática, se transformou em uma verdadeiraguerra aos pobres.

1. Plano Nacional de Redução de Homicí-dios

O Brasil está em 12o lugar no ranking de homicí-dios, com 29 mortes a cada 100 mil habitantes. Os jo-vens são as maiores vítimas dos homicídios no país,grande parte por auto de resistência, elevando esseíndice a 53,4 mortos a cada 100 mil habitantes, nafaixa etária entre 15 e 24 anos. A vitimização negratambém tem aumentado vertiginosamente: cerca de100% entre 2002 e 2012, enquanto a branca vem di-minuindo, dado que revela a importância da elabo-ração de políticas públicas de combate ao racismosocial e institucional, assim como foco por parte dapolítica de segurança.

A partir da elaboração de uma agenda prioritáriaem segurança pública, realizada por importantes en-tidades e especialistas na área, nossas propostas paraa redução de homicídios são:

• Criar e implantar o Plano Nacional de Reduçãode Homicídios;

• Priorizar a investigação policial nos crimes dehomicídio (garantindo a investigação em casosde autos de resistência e resistências seguidasde morte);

• Investir na perícia criminal;

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SEGURANÇA PÚBLICA 51

• Fortalecer e ampliar a política nacional de con-trole de armas e munições;

• Financiar programas de prevenção com focona juventude, principalmente, na juventudenegra;

• Trabalhar um plano de estímulo em conjunto aoutras áreas fundamentais no combate às cau-sas da criminalidade, como educação, saúde,habitação, esportes e atividade física, cultura eassistência social.

2. Desmilitarização da Polícia

Lutaremos pela aprovação da PEC 51/2013, quealtera a estrutura institucional da segurança pú-blica, para desmilitarizar as PMs. Elas deixariam deexistir como tais, porque perderiam o caráter mili-tar dado pelo vínculo orgânico com o Exército (en-quanto força reserva) e pelo espelhamento organi-zacional. A PEC também prevê o ordenamento dainstituição policial em carreira única, a realização dociclo completo do trabalho policial (preventivo, os-tensivo, investigativo) e expansão das responsabili-dades da União, que assume a atribuição de super-visionar e regulamentar a formação policial, respei-tando diferenças institucionais, regionais e de espe-cialidades, mas garantindo uma base comum e afi-nada com as finalidades afirmadas na Constituição.A PEC propõe também avanços no controle externoe na participação da sociedade, além de garantir orespeito aos direitos trabalhistas dos profissionais dasegurança.

3. Combate à letalidade policial

Além de um processo de reforma do modelo po-licial atual, é necessário apresentar propostas no sen-tido de reduzir imediatamente a letalidade policial.Segundo o 5o Relatório Nacional sobre os DireitosHumanos no Brasil do Núcleo de Estudos da Vio-lência da USP, entre 1993 e 2011 ao menos 22,5 milpessoas foram mortas em confronto somente com aspolícias paulista e carioca. Para isso, incorporamosoutras propostas apresentadas pela Agenda Priori-tária de Segurança Pública:

• Extinguir a categoria “resistência seguida demorte” e substituí-la por homicídio/morte de-corrente de intervenção policial;

• Estimular a atuação das corregedorias e ouvi-dorias, garantindo os devidos recursos e o fi-nanciamento permanente adequado;

• Estabelecer política de incentivo pela reduçãode letalidade policial com estabelecimento demetas/bônus para redução;

• Desenvolver e disseminar protoco-los/procedimentos de uso da força em todosos níveis;

• Fortalecer o controle externo da polícia peloMinistério Público.

4. Revisão da Política Criminal e Peniten-ciária e combate à lógica do encarceramentoem massa

O Brasil tem a 3a maior população carcerária domundo (CNJ/2014). As altas taxas de criminalidadebrasileiras confirmam que essa política de encarce-ramento em massa não contribui para a redução dacriminalidade. Apesar do aumento da populaçãocarcerária, há também um crescimento das taxas dehomicídio no Brasil (Mapa da Violência/2014). Deacordo com estes dados, apresentados e sistematiza-dos pela Rede Justiça Criminal, “prender mais geraum sistema mais violento e violador de direitos, au-mentando ainda mais os custos para um Estado quesequer provê serviços básicos, como saúde e educa-ção.”

Na contramão da descabida política de reduçãoda maioridade penal que não diminuiu a violênciaem nenhum dos países onde foi adotada, é urgenteum novo modelo penal, que priorize penas alterna-tivas e a progressão de regime. A privação da liber-dade só deve ser aplicada contra quem oferece pe-rigo real à sociedade. Por isso, a primeira iniciativaserá buscar um efetivo engajamento do governo fe-deral para garantir que a Lei de execução penal sejacumprida. Por outro lado é necessário incentivar aagilização dos demais procedimentos judiciais a fimde reduzir o número de detidos à espera de julga-mento, acabar com as revistas vexatórias e promo-ver programas de educação, treinamento profissio-nal e trabalho para reinserção. Defendemos um efe-tivo Sistema Nacional de Alternativas Penais com aaplicação de penas alternativas para delitos de me-nor potencial ofensivo e formas diferentes de reso-lução de conflitos, sempre com o objetivo de reparar

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52 SEGURANÇA PÚBLICA

os danos causados pelas condutas criminais, de res-ponsabilizar seus perpetradores. Tudo isso visandoum gradual esvaziamento das prisões.

5. Descriminalização e Regulamentaçãodo uso da Maconha

Um conjunto de estudos internacionais já com-provam que as políticas de criminalização e a“guerra às drogas” em todo o mundo apenas refor-çaram o poder das redes das organizações crimino-sas, visto que estas se valem dos lucros extraordiná-rios que obtêm para montar esquemas de corrupçãode agentes públicos e atuar livremente em diversosterritórios. As drogas que hoje são ilegais estão naprática “liberadas”, visto que elas são vendidas coti-dianamente em todas as cidades e têm sua comerci-alização regulada pelo Estado de maneira informal,através da corrupção das polícias e outros agentes dosistema. Por outro lado, a repressão policial só atingeos jovens que trabalham na ponta desse lucrativo co-mércio, isto é, no varejo de drogas, tendo como víti-mas, em sua maioria negros, pobres e favelados. Daídecorre que a guerra às drogas se transformou numaguerra aos pobres e não terminou com o narcotrá-fico, tornando-se um dos grandes alimentadores dosistema carcerário brasileiro, mas sem combater, defato, os grandes traficantes que seguem com seus ne-gócios inabalados.

Legalizar a maconha e acabar com a guerra àsdrogas, então, não é somente uma questão de liber-dades individuais. É, também, uma questão de se-gurança pública e de direitos humanos: a guerra àsdrogas está dizimando a juventude mais pobre dasperiferias, que morre vítima das lutas de facções, darepressão ao tráfico, da violência policial e das milí-cias, ou é encarcerada pelo comércio ilegal de drogasou, em muitos casos, pelo uso delas — já que, depen-dendo da cor e da classe social, a mesma quantidadede substância pode ser considerada para uso ou paratráfico — e é enviada a presídios superlotados quesão verdadeiros infernos e escolas do crime.

Por isso, defendermos a aprovação do projeto delei 7270/2014 do deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ),que regulamenta a produção, comercialização e con-sumo da maconha e propõe uma série de mudan-ças na política de drogas do Brasil. A legalização damaconha, além de garantir as liberdades individu-ais dos usuários, será uma ferramenta fundamentalpara reduzir a violência, deixar de encher nossas pri-sões e acabar com uma guerra que já matou gente

demais.

6. Investimento em inteligência: aperfei-çoar a difusão e gestão de dados

Um estudo recente organizado pelo o Ministé-rio da Justiça aponta que no Brasil apenas 8% doscasos de homicídios são efetivamente esclarecidos.Quem mais sofre com essa incapacidade do Estadona elucidação dos crimes é exatamente a populaçãomais pobre que não tem acesso a recursos suficien-tes para enfrentar a ineficiência do judiciário. Taldado somente reforça a imensa impunidade, especi-almente se forem crimes cometidos pelas polícias oupelo Estado. Investir em inteligência, prevenção eaperfeiçoamento da difusão e gestão de dados é umdos meios de democratizar a justiça no país, evitar esolucionar a situação generalizada da criminalidadeque impera no Brasil.

7. Sistema Único de Segurança Pública

Uma das grandes tarefas nacionais é desenvolverum Sistema Único da Segurança Pública que consigaconstruir uma arranjo institucional que repactue ascompetências e responsabilidades de cada ente fe-derativo para que haja a possibilidade de planejar eexecutar ações comuns e dinamizar as políticas pú-blicas, além de garantir maior controle social, trans-parência e comprometimento das autoridades comsuas ações.

8. Combate à prática de tortura nas delega-cias e penitenciárias brasileiras

O fim do regime militar no Brasil não levou con-sigo uma das práticas mais perversas da ditadura: atortura. É lugar comum nas delegacias e penitenciá-rias do país o flagrante desrespeito aos mais básicosdireitos humanos e o descumprimento das leis na-cionais e estaduais contra a tortura, bem como doProtocolo Facultativo à Convenção contra Tortura eOutros Tratamentos ou Penais Cruéis, Desumanosou Degradantes da Organização das Nações Unidas(ONU) de 2007. Apesar de haver instrumentos legaisque tornam possível a investigação ou a penalizaçãoda prática da tortura, ela ainda é aprovada e/ou tole-rada por agentes públicos que se escoram em delega-cias e penitenciárias que mantêm pessoas sob o totalcontrole sem qualquer acompanhamento e fiscaliza-ção públicos. Lá a tortura é executada apenas comoforma de investigação e castigo, mas também como

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SEGURANÇA PÚBLICA 53

forma de controle e intimidação. É preciso garan-tir o devido marco legal para a instalação de meca-nismos externos e independentes de monitoramentodos espaços de privação de liberdade, assegurandoa transparência das ações e diminuindo as oportuni-dades de ocorrência das práticas de tortura.

9. Ampliação do controle de fronteiras

Parte da insegurança nacional está relacionada àtotal incapacidade do Estado em controlar as fron-teiras de um país com dimensões continentais comoo Brasil. O tráfico de drogas e armas, bem comode automóveis, equipamentos eletrônicos, mas tam-bém a mineração clandestina e os contrabandos dosmais diversos tipos são exemplos do quanto a ausên-cia de controle fronteiriço tem impacto na segurançainterna do país. Ao lado de uma reestruturação dosistema de segurança, com o estabelecimento de umnovo pacto federativo, vamos ampliar substancial-mente os investimentos em políticas de inteligênciae tecnologia para o controle das fronteiras nacionais.

10. Valorização dos trabalhadores da segu-rança pública e direito à organização, livre

expressão e sindicalização

Os profissionais de segurança pública são tam-bém vítimas desse sistema militarizado de polícianos mais diversos aspectos. O primeiro deles é terque se submeter a uma lógica corporativa militar re-acionária que transforma o servidor da segurançaem inimigo da sociedade, especialmente da socie-dade que se mobiliza em torno de seus direitos. Emsegundo lugar, apesar da submissão à ideologia dacorporação e dos imensos riscos aos quais são sub-metidos em situações de violência e enfrentamento àcriminalidade, os profissionais de baixa patente sãotratados com profundo desrespeito, com péssimascondições de trabalho e salário e sem ter direito àsindicalização e livre expressão, que é permitida atodos os civis. Parte das transformações que defen-demos envolve a extinção da justiça militar e o livredireito civil de associação, organização e expressãodos policiais, o direito de greve e também a sua de-vida valorização como profissionais que devem serparte do cumprimento de tarefas importantes para asociedade civil – especialmente a mais pobre e seusmovimentos organizados – e não estar contra ela.

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54 REFORMA POLÍTICA

13 Reforma PolíticaOs milhões de brasileiros que saem às ruas cons-

tantemente desde junho de 2013 por mais direitosreconheceram na prática que somente mecanismosmais diretos de organização e pressão podem fazercom que qualquer mudança real aconteça no país.As velhas instituições do Estado brasileiro estão ab-solutamente desacreditadas, encasteladas em posi-ções que reproduzem um sistema político viciado elonge das demandas populares. É urgente uma pro-funda democratização do acesso ao poder que façado povo o real condutor das políticas do país.

Por isso, mais do que uma mera reforma eleitoral,que redividirá as fatias do bolo do mercado eleitoralde acordo com o interesse das elites, nossa propostade Reforma Política é de mecanismos diretos e par-ticipativos de alargamento da democracia para umaverdadeira refundação democrática das instituiçõesnacionais. Sabemos que, para isso, as vozes de junhodevem estar sempre presentes empurrando a mobi-lização permanente do povo em defesa de seus di-reitos. Aqui, apresentamos algumas de nossas ban-deiras para essa luta.

Prioridades:

a) Combater a corrupção fortalecendo a Demo-cracia Direta e a Democracia Participativa coma instituição de plebiscitos, referendos, conse-lhos deliberativos e mecanismos de iniciativapopular;

b) Coibir a influência do poder econômico nasesferas de poder e especialmente no processoeleitoral, assegurando espaços democráticospara a pluralidade de opiniões.

Propostas de ação:

1. Combate implacável à corrupção

Um dos problemas mais sentidos pela populaçãoé a nítida transformação do Estado brasileiro em umbalcão de negócios infestado por práticas corruptasdos mais diversos tipos. Contudo, para além dascríticas moralistas a esse tipo nefasto de ação gene-ralizada no país, é preciso tomar medidas concretasque combatam e desmontem a corrupção que já é es-trutural nas relações comerciais, econômicas e políti-

cas. Somando-se ao financiamento público de cam-panhas que detalhamos mais à frente, propomos:

• Organização de comitês ou conselhos de con-trole social voltados para acompanhar a reali-zação das despesas de órgãos públicos especí-ficos;

• Articular a aprovação de projetos de leis de-finidores de uma radical profissionalizaçãoda Administração Pública com a redução ex-trema dos espaços ocupados por agentes não-detentores de cargos efetivos;

• Articular a aprovação de emenda constitucio-nal definidora de profundas restrições na dis-cricionariedade da execução orçamentária porparte do Poder Executivo (“orçamento imposi-tivo”);

• Organizar a efetiva aplicação da Lei n. 12.846,de 2013, voltada para a responsabilização obje-tiva, administrativa e civil, de pessoas jurídicaspela prática de atos contra a administração pú-blica;

• Alterar a Lei de Licitações e Contratos Admi-nistrativos, com o objetivo de construir meca-nismos de prevenção e combate aos atos decorrupção nessa seara. Fim do Regime Dife-renciado de Contratações;

• Fim do Foro Privilegiado e da imunidade par-lamentar, a não ser em casos de opinião ouameaça à integridade física do acusado;

• Abertura dos sigilos bancários de todos os po-líticos (eleitos ou nomeados);

• Rigorosa fiscalização dos recursos públicosrepassados às entidades não-governamentais,independentemente de sua personalidade jurí-dica.

2. Assembleia Nacional Constituinte: Po-pular, soberana e com deputados consti-tuintes eleitos exclusivamente para tal fim.

O momento político de completa falta de credibi-lidade e representatividade real das instituições do

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REFORMA POLÍTICA 55

Estado brasileiro exige uma refundação democrá-tica. A verdadeira mudança que indiscutivelmenteo povo exige não poderá ser resolvida por represen-tantes eleitos por um sistema político viciado, cor-rompido pelo poder econômico e oposto às necessi-dades reais que levaram milhões às ruas em junhode 2013.

Por isso propomos a instalação de uma inéditaAssembleia Constituinte soberana e exclusiva, istoé, onde os representantes eleitos estarão mandata-dos exclusivamente para exercer o poder soberanode definir politicamente as mudanças que o Estadonecessita. Por meio dessa Assembleia, o povo sobe-ranamente poderá decidir os novos rumos do país.

3. Financiamento das campanhas eleito-rais exclusivamente público e limitado

No Brasil as eleições se tornaram um imensomercado, com campanhas milionárias, onde candi-datos sem apoio dos grandes grupos econômicostêm poucas condições de disputa. Quase sempreisso resulta na eleição daqueles que tiveram mais di-nheiro para fazer campanha e não necessariamenteos melhores candidatos.

Ainda que não seja a única solução para que aseleições sejam justas e democráticas, o fim do finan-ciamento privado de campanha diminui a influênciadas grandes empresas nas eleições e as torna maisjustas e equilibradas, contrapondo a corrupção da-queles que, financiados por recursos privados, terãoque “pagar a conta” quando chegam ao poder. Aomesmo tempo, o financiamento público exclusivo fa-vorece a participação política e a representação desegmentos sociais que dificilmente são protagonis-tas das eleições como mulheres, negros e negras ejovens.

Defendemos que os recursos destinados aos par-tidos políticos para constituição do fundo de financi-amento de campanhas sejam exclusivamente públi-cos, proibindo as doações de pessoas físicas e jurídi-cas e sujeitando doadores e receptores à punição. Damesma forma serão proibidos recursos advindos defiliados e do fundo partidário.

4. Garantir a divisão equitativa do tempodestinado à propaganda eleitoral gratuita,tanto nos processos eleitorais quanto naspropagandas institucionais dos partidospolíticos

Uma das formas de rebaixar o debate político é

impedir que as diferentes posições políticas tenhamespaços iguais de exposição e debate de propostas.Ao mesmo tempo, no sistema atual, a avidez dospartidos da ordem por acúmulo de tempo na TV e norádio conduz diretamente à pressão por alianças semprincípios e negociatas que distorcem ainda mais o jápobre debate eleitoral.

5. Instituir a revogabilidade de mandatospor parte dos eleitores

A representação não pode ser um cheque embranco que permite ao representante após eleitoatuar da forma que lhe convier e até, como é fre-quente no sistema político brasileiro, de contrariarcompletamente as ideias que o elegeram. Defende-mos o direito da população de revogar mandatos deautoridades públicas por meio de referendos e con-sultas públicas. Tal instrumento diminui o poder dorepresentante e aumenta o poder direto e a capaci-dade de fiscalização do representado.

6. Votação proporcional em lista partidá-ria pré-ordenada e flexível, fortalecendo ospartidos e seus candidatos

Os partidos, em sua maioria, tornaram-se legen-das esvaziadas de conteúdo ideológico e programá-tico, reduzindo-se a meros instrumentos de negócioseleitorais. O PSOL defende o fortalecimento de par-tidos ideológicos, assegurando a mais ampla parti-cipação de seus militantes, filiados e aderentes. Porisso defenderemos o voto proporcional em lista par-tidária pré-ordenada. O voto proporcional é - ao con-trário do voto distrital, que estimula o caciquismo, olocalismo e a exclusão da pluralidade e das mino-rias – uma defesa da democracia participativa emum país de dimensões continentais e marcado portantas desigualdades sociais e regionais como é onosso. É necessário, entretanto, corrigir distorçõespara garantir a proporcionalidade do voto. Um par-tido que receba um percentual dos votos deverá ocu-par o mesmo percentual das cadeiras, preservando,com a máxima fidelidade, a composição política doeleitorado, terminando com as coligações proporci-onais. O mecanismo adequado ao voto proporci-onal é a lista partidária pré-ordenada e flexível naqual é o partido quem escolhe a nominata de candi-datos. No atual modelo eleitoral a orientação ideo-lógica das candidaturas e dos partidos fica diluídapelo personalismo e com a lista pré-ordenada o focopassa ser no programa partidário. Ao mesmo tempo

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56 REFORMA POLÍTICA

defendemos ainda que a lista seja flexível. A ordemdos candidatos, na relação apresentada pelos parti-dos, poderia ser alterada de acordo com a vontadedo eleitor.

7. Fim dos mecanismos que restringem alivre organização partidária

Frequentemente surgem no Congresso propostasdos mais diversos tipos para enfraquecer as repre-sentações dos partidos ideológicos que não são fi-nanciadas pelo poder econômico. Porém, já exis-tem hoje medidas que restringem a livre organiza-ção partidária – que não é o mesmo que o direito decriar partidos. Essas medidas utilizam a quantidadede votos nacionais, de parlamentares, etc., para ex-cluir ou limitar determinados partidos aos direitosao tempo de TV, à participação nos debates eleito-rais, à estrutura de liderança na Câmara dos Depu-tados, participação no fundo partidário, etc. Emboratal expediente seja utilizado com a justificativa deconter os partidos de aluguel, na prática representauma definição previa e arbitraria de um recorte queé ao mesmo tempo uma exclusão de possibilidadese oportunidades de partidos iniciantes ou com me-nor expressão eleitoral de acessar em nível de igual-dade o conjunto da população e, por outro lado, umacontenção de partidos marcadamente ideológicos deesquerda que não aceitam o vale-tudo eleitoral e aadaptação à lógica viciada de submissão ao podereconômico das máquinas eleitorais.

8. Introduzir o referendo e o plebiscitocomo forma de participação e controle doseleitores sobre o processo político, comregulamentação do preceito constitucionalque os institui

É patente a falência do modelo de democracia re-presentativa com o qual convivemos hoje no Brasil.Sem que haja uma combinação entre a representa-ção e a participação popular permanente através demanifestações frequentes, plebiscitos, referendos e apresença em conselhos, a democracia tende a ser não

mais que um jogo de cartas marcadas. Por isso, de-fendemos que é preciso garantir institucionalmentemecanismos mais diretos de democracia que, se porsi mesmos não resolvem absolutamente os proble-mas de representatividade e garantem uma demo-cracia real, representarão conquistas efetivas na li-mitação das ações e do poder da velha política.

9. Facilitar a apresentação de projetos deleis de iniciativa popular

Hoje, na prática, embora regulamentados os pro-jetos de iniciativa popular são quase impossíveis deserem submetidos à votação e aprovação. O projetode iniciativa popular sobre o Fundo Nacional de Ha-bitação Popular, por exemplo, levou 13 anos para seraprovado. Por isso defendemos a simplificação doprocesso, com utilização de urnas eletrônicas e pre-cedência na tramitação da votação no Legislativo,implicando no trancamento da pauta e votação emcaráter de urgência.

10. Proibição da veiculação de pesquisaseleitorais por todos os meios de comuni-cação durante o período eleitoral, inclusivena Internet, e tipificação como grave crimeeleitoral para o descumprimento desse dis-positivo

A divulgação de pesquisas eleitorais tem repre-sentado um instrumento de manipulação de opi-niões e distorção do debate eleitoral. Não raro apa-recem também denúncias dos mais diversos tipossobre práticas viciadas de consultas, manipulaçãodos resultados e entrevistas incompletas. Ao mesmotempo, resultados de pesquisas de boca de urna têmse demonstrado absolutamente equivocados, distan-tes da realidade dos votos quando os resultados dasurnas são apurados. Por fim, a sugestão das pesqui-sas eleitorais inverte a lógica do bom debate político:ao invés de permitir ao eleitor a escolha das melho-res propostas, faz com que os partidos moldem suaspropostas ao sabor do suposto ânimo do eleitorado.

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14 Relações exterioresA ideia de que o Brasil mudou seu lugar no

mundo tornou-se corrente, mas é só parcialmenteverdadeira. Essa suposição é uma ideologia que,como tal, possui certa correspondência com a reali-dade objetiva. De fato existem condições para queela se estabeleça entre nós: em última instância e pormais contraditório que pareça, a suposta “nova po-sição” do Brasil no mundo é produto do aprofunda-mento da dependência e do subdesenvolvimento, acaracterística principal de nossa formação social.

A sensação de maior relevância no cenário inter-nacional – estimulada, sobretudo, nos dois governosde Lula – é consequência necessária da última ondaexpansiva da economia mundial que consagrou o lu-gar de países como o Brasil no sistema capitalista.Mas é preciso deixar claro: a despeito das aparên-cias, o lugar reservado para o Brasil é aquele que tra-dicionalmente nos reservam os mais poderosos dahumanidade: a periferia do sistema.

A economia mundial cresceu de maneira vertigi-nosa até setembro de 2008, momento em que o sis-tema bancário faliu e importantes multinacionais dosetor produtivo foram à bancarrota nos Estados Uni-dos e também na Europa. Antes desta data, a ex-pansão da acumulação mundial favoreceu enorme-mente a acumulação de capital das economias pe-riféricas, especialmente em alguns países que pos-suem abundantes recursos naturais e que haviam lo-grado certa especialização na produção de alimen-tos - o Brasil entre eles. Porém, com a retomada docrescimento das economias centrais, vemos o prota-gonismo da diplomacia brasileira diminuir vertigi-nosamente. Essa é uma das marcas do governo deDilma Roussef.

Além disso, há que se notar que o ativismo di-plomático do governo brasileiro na África, o pro-tagonismo no Haiti (Caribe) e Honduras (AméricaCentral), como também o interesse pela integraçãoeconômica latino-americana (América do Sul) estãoem consonância com as iniciativas de empresas bra-sileiras que exploram as oportunidades abertas pelaexpansão conjuntural da economia mundial e o re-forço da posição do Brasil na clássica divisão inter-nacional de trabalho. Porém, as forças que geraram oalinhamento automático da diplomacia brasileira àsdiretrizes de Washington anos atrás não foram supri-midas. Por isso, observar neste movimento uma in-

dependência quase completa é simplesmente refor-çar a apologia de setores da classe dominante sobreas possibilidades do Brasil no mundo.

Entendemos que a política externa do governobrasileiro deve estar em consonância com um novomodelo de desenvolvimento interno. A mudança ra-dical de prioridades deve se refletir na diplomaciabrasileira. A participação do Brasil no sistema inter-nacional deve ocorrer de forma soberana e solidária.A independência nacional significa a conquista daliberdade política, econômica e social por parte dopovo brasileiro. Além disso, o PSOL defende que oBrasil pode exercer uma política externa construídanão apenas pelo governo, nos gabinetes dos Minis-térios e do Planalto, mas também diretamente pelopovo, titular do poder político. Por isso, as propos-tas do PSOL tem como eixos norteadores:

• A defesa da autodeterminação dos povos e orompimento de relações diplomáticas com paí-ses que violem as leis internacionais e o direitoà independência e à liberdade;

• A busca de uma integração regional que dimi-nui a dependência dos países capitalistas cen-trais, com bases solidárias e cooperativas;

• O combate ao Imperialismo em todas as suasmanifestações;

• A ampliação da participação da sociedade civilnas definições das políticas de relações exteri-ores.

Entendemos que o imperialismo (principalmentenorte-americano) e as elites nacionais associadas, viacapital financeiro, aos interesses do capitalismo cen-tral, são os grandes inimigos da independência na-cional e da integração entre os povos. Considerarparceiro estratégico um país que historicamente vi-ola nossa independência nacional, intervindo diretaou indiretamente em nosso país e agora, que com-provadamente espiona para favorecer suas empre-sas, é violar a Constituição. As parcerias estratégi-cas devem ser construídas a partir do princípio dademocracia, da paz, da não-intervenção e da auto-determinação dos povos. Este é o compromisso deLuciana Genro e do PSOL. Veja abaixo nossas pro-postas para a Política Externa:

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58 RELAÇÕES EXTERIORES

1. Fortalecimento da integração regio-nal latino-americana nos níveis econômico,político, social e cultural, buscando su-perar os limites dos organismos multila-terais atualmente existentes, com vistas acolocá-los a serviço da integração dos po-vos e da luta pela independência das na-ções sul-americanas, enfrentando conjunta-mente males comuns, como o flagelo da dí-vida externa e interna.

2. Defesa incondicional da autodetermina-ção dos povos, com apoio à formação de es-tados nacionais autônomos, à secessão e àintegração de territórios, desde que produtoda vontade livre e soberana dos povos; so-lidariedade aos povos em luta contra o im-perialismo.

3. Busca da solução pacífica dos conflitos,respeitando o princípio da não-intervenção,com fim da participação brasileira em qual-quer operação militar intervencionista e ofim de exercícios militares conjuntos compaíses que não respeitem este principio;

4. Retirada das tropas brasileiras no Haitie substituição por um Corpo Permanente dePaz e Solidariedade composto por médicos,professores, engenheiros e outros profissio-nais;

5. Rompimento de relações diplomáticascom todos os Estados que promovam a vi-olência e agridam o direito à autodetermi-nação dos povos, com imediata revogação

dos acordos de cooperação militar com es-ses países, como é o caso do Estado de Is-rael;

6. Concessão de asilo aos perseguidos po-líticos de qualquer nacionalidade, com des-taque para a concessão imediata de asilopara Edward Snowden;

7. Criação do Conselho Nacional de Polí-tica Externa, de caráter consultivo e não re-munerado, com participação de setores dasociedade nas decisões do Ministério dasRelações Exteriores;

8. Suspensão e revisão da Iniciativa para aIntegração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA) junto aos países signa-tários do acordo, com o objetivo de avaliaros impactos de sua implantação no meio-ambiente e as violações aos direitos consa-grados na Convenção 169 da OIT;

9. Combate ao terrorismo, seja ele promo-vido por Estados e outros entes governa-mentais, seja ele praticado por organizaçõespolíticas, paramilitares ou religiosas. Rejei-ção, em nível internacional, da política de“guerra ao terror” como justificativa paracombater as lutas dos povos do mundo.

10. Democratização dos organismos in-ternacionais e combate às medidas promo-vidas unilateralmente, como no caso doembargo econômico imposto pelos EUA aCuba.

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59

15 Direitos HumanosAcreditamos que as políticas de direitos huma-

nos são determinantes para que o Brasil seja umpaís efetivamente democrático. Infelizmente o ce-nário atual demonstra que ainda estamos distantesde cumprir com essa missão. A gritante desigual-dade social, com concentração de poder e renda namão das elites econômicas, aliada a uma estruturade Estado antidemocrática e impermeável às deman-das populares mais sentidas, desdobra-se concreta-mente no desrespeito generalizado aos direitos maisfundamentais da população, especialmente do povopobre. O PSOL tem tido uma atuação de defesa in-transigente dos direitos humanos nas ruas e no par-lamento onde, infelizmente, propostas progressistascomo muitas que estavam contidas no PNDH 3 (Pro-grama Nacional de Direitos Humanos 3) do governoLula, foram escamoteadas em função dos interessesdas bancadas mais reacionárias e conservadoras.

Neste documento, apresentamos propostas espe-cíficas de Luciana Genro para construir um Brasilonde todos os direitos sejam respeitados, qualquerque seja sua condição. Pela amplitude da pauta dedireitos, vários temas que compõem a defesa dosdireitos humanos (como direitos dos negros e ne-gras, defesa dos direitos da mulher, direitos da ju-ventude, direitos da comunidade LGBT, mudançada lógica das políticas de segurança pública, den-tre outros) estão contemplados em outros tópicos doprograma de governo de Luciana Genro, alguns dosquais com documentos específicos produzidos pelossetores mais próximos a essas lutas.

Prioridades:

a) Assegurar papel fundamental das políticas pú-blicas de direitos humanos na condução de to-das as ações do Estado;

b) Fortalecer as organizações de direitos huma-nos dos governos em todas as esferas, pro-pondo que tenham papel coordenador e inte-grador das demais políticas públicas.

Propostas de ação:

1. Assegurar o livre direito à expressão e àmanifestação

Neste último ano, na esteira da realização daCopa do Mundo de Futebol no Brasil, assistimos auma onda de intensificação de repressão a manifes-tações e manifestantes e criminalização dos movi-mentos sociais e de sindicatos que historicamenteforam fundamentais na luta e conquista de direitossociais. Em todo o Brasil foram abertos inquéritoscompletamente irregulares, realizadas prisões desca-bidas e arbitrárias e assistimos nas TVs e redes soci-ais a atuações condenáveis da polícia. A tentativade intimidar manifestantes e coibir legítimas reivin-dicações encontrou apoio em grande parte de umamídia corporativa comprometida em não permitirque estes movimentos alcançassem a dimensão po-lítica necessária para seguir com a organização e asconquistas sociais que os protestos de junho de 2013pautaram na agenda do país. Este mesmo discurso,que já foi utilizado em outros momentos da histó-ria para violar direitos e suprimir a participação dopovo na vida política do país, serviu para que nesteano víssemos dezenas de projetos de leis propostosno sentido de impedir o pleno exercício da liberdadede expressão e manifestação e redução da já precáriademocracia nacional.

Contrariando esta tese, nossa orientação de go-verno será propor legislação que amplie os direitos,proibindo todo tipo de cerceamento das liberdadespolíticas. Ao mesmo tempo, entendemos como fun-damental proibir as medidas repressivas do Estadocontra as diversas formas de manifestação cidadã,assegurando pleno direito de protesto, greve e ocu-pação por parte dos movimentos sociais.

2. Em defesa dos Direitos Indígenas

Associaremos à necessária e imediata demarca-ção de todas as terras indígenas do país – com prio-ridade ao combate à PEC 215 e outras medidas quedificultam a demarcação de terras indígenas – comogarantia dos diversos povos ao direito fundamen-tal de autonomia territorial, à implantação de polí-ticas de proteção e promoção dos direitos indígenas,em substituição às políticas assimilacionistas e assis-tencialistas. Para tanto é fundamental o aprofunda-mento das ações afirmativas voltadas às comunida-des indígenas em todas as esferas do poder público eo fortalecimento das organizações de defesa dos di-reitos indígenas. Ao mesmo deve-se garantir que ne-

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60 DIREITOS HUMANOS

nhuma intervenção seja feita em território indígenasem que o povo autorize ou qualquer mudança le-gislativa que trate de suas questões sem que eles se-jam devidamente ouvidos, conforme a Convenção169 da OIT.

3. Fortalecimento da Secretaria Nacionalde Direitos Humanos

O flagrante e corriqueiro desrespeito aos direi-tos humanos no Brasil está diretamente relacionadoà incapacidade de atuação dos órgãos governamen-tais vinculado à sua defesa. A Secretaria Nacional deDireitos Humanos é constantemente desrespeitada edesautorizada, inclusive, por outros órgãos governa-mentais que gozam de mais autoridade e maiores re-cursos, sendo, portanto, vistos como mais importan-tes. Assim, direitos são negociados, projetos são en-gavetados e o conhecido fisiologismo se sobrepõe apolíticas públicas verdadeiramente necessárias à po-pulação. Nossa proposta é transformar a luta pelosDireitos Humanos em toda sua amplitude como eixonorteador do governo, dando aos órgãos governa-mentais, como a Secretaria Nacional, o status de co-ordenação geral e mediação fundamental do desen-volvimento das demais políticas.

4. Plano Nacional de Acessibilidade emdefesa dos direitos das pessoas com defici-ência

É preciso que os direitos das pessoas com defici-ência sejam parte da elaboração de todos os setores,ministérios e secretarias do governo federal. Comisso queremos elaborar um plano nacional de acessi-bilidade que tenha como desdobramentos mais con-cretos a ampliação dos investimentos e a integraçãodesse tema ao planejamento de todos os entes fede-rativos nacionais que devem englobar de início as se-guintes questões-chave:

• Criação de equipes multidisciplinares nas es-colas para atendimento adequado das pessoascom deficiência

• Garantia real acessibilidade em prédios e espa-ços públicos

• Criação da profissão do cuidador, para a pes-soa com deficiência e para o idoso

• Ampliação do número de núcleos para atendi-mento de reabilitação (núcleos integrados de

reabilitação e problemas auditivos), distribui-ção de órteses, próteses e aparelhos auxiliares

• Ampliação dos locais para exames de mamo-grafia, papanicolau, entre outros, para mulhe-res com deficiência

• Realização estudos em todas as grandes e mé-dias cidades para entender a real necessidadeda pessoa com deficiência e mobilidade redu-zida.

• Garantia de médicos para atendimento do-miciliar caso das pessoas que não podemlocomover-se

• Ônibus circulares para levar ao posto de saúdefacilitando o acesso

• Comissão de fiscalização do transporte, ma-nuseio e funcionamento dos elevadores, trei-namento dos funcionários responsáveis e ade-quação de pessoal fisicamente para os trans-portes adaptados

• Regularização e legalização, de direito e defato, do trabalho dos camelôs com deficiência

• Garantia que em todo projeto ou programa ha-bitacional da cidade de São Paulo seja respei-tado a legislação de reservas de cotas e de aces-sibilidade

5. Garantia dos direitos dos imigrantes

No Brasil os estrangeiros ainda não são vistoscomo cidadãos que devem gozar de todos os direi-tos humanos e sociais garantidos pelas leis brasi-leiras. A organização legal da imigração é arcaicae não atende à multiplicidade de culturas e às ne-cessidades que os estrangeiros residentes em nossopaís têm. O desdobramento disso é a ocorrência fre-quente de situações de exclusão, exploração e pre-conceito. É preciso reformular a Lei dos Estrangei-ros, através do projeto de lei 1813/91, que regula asituação jurídica do estrangeiro no Brasil, para asse-gurar, em primeiro lugar, que todas as pessoas sejamreconhecidas como iguais perante a lei e a partir daíampliar direitos como: participação na escolha deseus representantes políticos; educação baseada nainterculturalidade e no combate ao desconhecimentoe à xenofobia; saúde que reconheça as especificida-des dos imigrantes, como no caso da garantia de ca-sas de parto humanizado para mulheres imigrantes

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DIREITOS HUMANOS 61

no sistema de saúde que não concordam com o partovia cesariana comum no Brasil; direito à conta e ser-viços bancários e comerciais; etc.

6. Erradicação do Trabalho Escravo

Fortalecer os mecanismos para fiscalizar e coibiro trabalho forçado, com confisco de terras e imóveis,conforme prevê a PEC 438. Reconhecer a definiçãode “trabalho análogo ao de escravo” presente no ar-tigo 149 do Código Penal, bem como desestimularos empreendimentos de empresas que tenham utili-zado – direta ou indiretamente – o trabalho escravo,além de apoiar a “lista suja” do Ministério do Traba-lho e Emprego.

7. Garantia do Estado Laico

A defesa do Estado laico supõe a imparcialidadereligiosa do Estado, que não deve ter religião oficiale nem tratar de modo diferenciado ou privilegiadouma religião em detrimento das outras. A educa-ção pública deve ser laica e as políticas públicas nãopodem se submeter a nenhum dogma religioso, de-vendo garantir os direitos de todos por igual, tantodos que professam uma fé, seja qual for, como da-queles que não têm religião. Colocaremos fim àsisenções fiscais de que atualmente desfrutam as igre-jas, já que as crenças devem ser respeitadas e tersua liberdade religiosa garantida pelo Estado, po-rém, sem privilégios econômicos e com a devida fis-calização e tributação a que qualquer outra entidadeda sociedade civil deve se adequar.

8. Direitos das Crianças e Adolescentes

Incentivar a reorganização das instituições pri-vativas de liberdade para menores infratores até 18anos, com prioridade na implementação das demaismedidas sócio-educativas previstas no ECA e com-bater frontalmente a ideia de redução da maioridadepenal legal ou indireta, com a transformação de fun-dações e organizações teoricamente socioeducativasem centros de encarceramento de jovens. Por ou-tro lado, é preciso dar prioridade nas políticas pú-

blicas voltadas à proteção de crianças e adolescentese à prevenção da exploração sexual, do abuso sexualinfantil e da violência de gênero, tanto por meio deprogramas específicos, como mediante a manuten-ção e ampliação dos programas de inclusão socialque comprovadamente têm sido fundamentais parareduzir a prática da exploração sexual de adolescen-tes em situação de vulnerabilidade nas regiões maispobres do país.

9. Direitos dos Idosos

Generalizar a concessão de passe livre e prece-dência de acesso aos idosos em todos os sistemas detransporte público urbanos. Criar, fortalecer e des-centralizar programas de assistência aos idosos, deforma a contribuir para sua integração com a famíliae com a sociedade, além de incentivar o seu aten-dimento no seu próprio ambiente, especialmente noatendimento de saúde público ou privado. É pre-ciso, assim como previsto em nosso programa so-bre a questão da previdência, ampliar os direitos dosaposentados, também colocando fim ao fator previ-denciário.

10. Memória e Verdade

Defendemos, conforme projeto de lei formuladopelo juristas Fábio Konder Comparato e apresentadopor Luciana Genro no Congresso Nacional, a revisãoda Lei de Anistia, a partir dos trabalhos da Comis-são Nacional da Verdade, e a punição aos torturado-res da Ditadura Militar, considerando a tortura comocrime imprescritível de lesa-humanidade. O atualformato da Lei de Anistia está colocado frontalmentecontra os princípios internacionais de direitos huma-nos, especialmente, contra a Corte Interamericana deDireitos Humanos que não admite, em diversas ju-risprudências consolidadas, a autoanistia de tortu-radores e assassinos que se autoperdoam, baseadosem leis de anistia que foram revogadas em diversospaíses que subscrevem acordos e tratados internaci-onais, como a Convenção Americana de Direitos Hu-manos.

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62 LGBT

16 LGBTJunho de 2013 não surpreendeu lésbicas, gays,

bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros(LGBT). No começo do ano passado, elas já haviamtomado as ruas para protestar contra o fato do fun-damentalista Marco Feliciano ocupar a presidênciada Comissão de Direitos Humanos da Câmara. Naverdade, todos os anos milhões de LGBTs brasileirasocupam o espaço público com paradas do orgulhoLGBT para celebrar o levante de Stonewall e reivin-dicar direitos negados no resto do ano. E o PSOL temparticipado da construção de todos esses momentos.Com Luciana presidenta, os direitos humanos dasLGBTs serão eixo estruturador das políticas públi-cas e não moeda de troca com conservadores. Nossocompromisso com a defesa dos direitos da popula-ção LGBT é inegociável.

Prioridades:

a) Combate a todas as formas de preconceito pororientação sexual e/ou identidade ou expres-são de gênero.

b) Garantia de igualdade jurídica para a popula-ção LGBT em todos os âmbitos.

c) Elaboração participativa através do diálogopermanente com os movimentos sociais e acomunidade, sem dirigismos partidários, depolíticas públicas visando combater o precon-ceito, garantir a igualdade e promover a inclu-são social da população LGBT, entendendo queessas políticas devam estar presentes em todasas áreas de governo.

Propostas de ação:

1. Criminalização da discriminação contraLGBT e implantação de políticas concre-tas de combate sistêmico à homofobia e àtransfobia

Com relação à criminalização da homofobia, dagayfobia, da lesbofobia, da bifobia e da transfobia, oPSOL é a favor da equiparação dessas formas de dis-criminação ao racismo. Contudo, o PSOL defendeuma política integral de combate a todas as formasde preconceito que não se limite à legislação penal

e não aumente o estado penal, que vitima principal-mente os mais pobres, os negros e os moradores dasperiferias. Por isso, somos a favor de uma forma decriminalização que diferencie a homofobia “dura”,que se traduz em crimes violentos (homicídio, le-sões, etc.) motivados por qualquer tipo de precon-ceito e que devem ter suas penas agravadas, dos cri-mes de injúria e outros, que produzem dano morale devem ter penas socioeducativas, sem privação daliberdade. Consideramos que isso deve vir acompa-nhado de uma legislação integral que acabe com to-das as formas de discriminação, de políticas públicasnas áreas de educação, saúde, cultura e promoçãoda igualdade social que incluam a diversidade, alémde campanhas massivas de conscientização que vi-sem acabar com o preconceito e deem um basta àsalianças políticas dos governos com o fundamenta-lismo. A homofobia deve ser combatida sistemica-mente, dando ênfase às ações capazes de produzirmudanças culturais e reduzir o poder dos principaisimpulsionadores do ódio e do preconceito.

2. Criação de um observatório para moni-toramento da violência homofóbica

As crescentes denúncias de violências físicas epsíquicas contra a população LGBT mostram umcenário de assassinatos diários e agressões homo-fóbicas generalizadas e impunes, com número des-proporcional de vítimas travestis e transexuais. OGrupo Gay da Bahia tem realizado, ao longo dosanos, um trabalho importantíssimo de identificaçãoe mapeamento dos crimes de ódio, mas essa tarefaé responsabilidade do Estado e deve fazer parte daspolíticas de segurança pública. O Disque 100 do go-verno federal não recebe bem as denúncias de viola-ção a direitos humanos nem garante sua resolução.Tal cenário exige políticas concretas para mapear etomar providências no sentido de coibir e garantirapuração e punição para os casos de homofobia. Nomesmo sentido, a criação deste observatório permi-tirá a formulação de políticas públicas mais eficien-tes para prevenção e treinamento de servidores pú-blicos para lidar com esses casos.

3. Constitucionalização da proteção àsLGBTs e a todas as formas de família

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LGBT 63

Defendemos todas as formas de família que exis-tem em nossa sociedade, por isso somos a favor doacesso igualitário à adoção e à reprodução humanaassistida, sem qualquer forma de discriminação aoscasais do mesmo sexo ou às pessoas solteiras, sejaqual for a sua orientação sexual e/ou identidade degênero. Da mesma forma, o reconhecimento des-sas famílias permite que não sejam marginalizadasde programas sociais do governo federal. Comopresidenta, Luciana apresentará uma proposta deemenda à Constituição, a fim de incluir a proteçãocontra discriminação por orientação sexual e identi-dade de gênero e proteger todas as formas de famí-lia.

4. Alteração o Código Civil para assegurara conquista do casamento civil igualitário

O casamento civil igualitário foi regulamentadoem maio de 2013 pelo Conselho Nacional da Jus-tiça (CNJ) após uma representação do PSOL, redi-gida pelo advogado e ativista gay Paulo Iotti e assi-nada pelo partido junto com a ARPEN-RJ, por inici-ativa do mandato do deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ), que dois anos antes tinha lançado uma campa-nha nacional em favor desse direito. Desde a de-cisão do CNJ, provocada pelo PSOL, os casais domesmo sexo já podem se casar em qualquer cartóriodo Brasil, mas esse direito precisa ser garantido parasempre por lei, pois o Congresso não pode se omitirnuma questão fundamental de direitos humanos. Oprojeto de lei 5120/2013, também do deputado JeanWyllys, propõe alterar o Código Civil para que o ca-samento civil entre pessoas do mesmo sexo seja lega-lizado. A Luciana e o PSOL também defendem essaproposta.

5. Garantia do direito à autodefinição daidentidade de gênero

O PSOL também defende uma lei de identidadede gênero que garanta às pessoas trans – travestis,transexuais e transgênero – o direito ao nome pró-prio e à livre determinação sobre seus corpos.

A política do “nome social”, defendida timida-mente por alguns órgãos governamentais durante ogoverno do PT, embora constitua um avanço, é aomesmo tempo prova de uma grande hipocrisia: oEstado reconhece que a identidade social dessas pes-soas não é a que consta nos seus documentos, porém,em vez de garantir o direito a mudar os documentos,promove uma identidade dupla, com um nome legal

e outro “social”, que tem pouco valor jurídico.O governo da Luciana trabalhará para aprovar o

projeto de lei 5002/2013 (lei “João Nery”), do depu-tado Jean Wyllys (PSOL-RJ), que garante o direito àmudança de nome e de sexo na documentação pes-soal mediante um trâmite simples no cartório, sem anecessidade de laudo médico (quer dizer, sem pato-logizar as identidades trans) e sem intervenção judi-cial.

6. Garantia do direito de travestis e transe-xuais à saúde integral

O Estado brasileiro ainda vê travestis e transe-xuais como doentes e não respeita o direito funda-mental ao atendimento integral a sua saúde. Elesainda precisam arriscar a saúde e a vida para ade-quar seus corpos a sua identidade de gênero comnão-profissionais. Atualmente, a hormonioterapia eoutros procedimentos são oferecidos precariamentee pouquíssimas operações trangenitalizadoras sãorealizadas. São apenas quatro hospitais públicos, oque aumenta muito as filas de espera.

O PSOL defende a despatologização da traves-tilidade e da transexualidade e reconhece o direitoda população trans à autodefinição da identidadede gênero, o que será garantido pela Lei João Nery.Além disso, investiremos mais recursos na formaçãode profissionais da saúde para assegurar os trata-mentos e procedimentos reivindicados por travestise transexuais.

7. Revisão de políticas públicas de combateao HIV e DSTs com conscientização e aten-dimento das LGBTs

No mundo todo, os casos de HIV/Aids diminuí-ram. No Brasil, no entanto, houve aumento de 11%entre 2005 e 2013. A falta de políticas públicas deprevenção e apoio aos grupos mais vulneráveis é de-cisiva para esse resultado. Apesar disso, o governoDilma, pressionado por fundamentalistas, suspen-deu a veiculação na televisão de campanha publici-tária de prevenção a DST/Aids voltada para jovensgays.

A população LGBT é uma das principais vítimasdo HIV/Aids e de DSTs. O medo gerado pela discri-minação faz com que muitos jovens não procurem osserviços públicos de saúde. Faltam iniciativas paraprevenir, sobra preconceito para condenar. Comba-ter a homofobia é parte indispensável da luta con-tra a contaminação por HIV. No mesmo sentido, a

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generalização do discurso preconceituoso de que asDSTs são doenças de homens gays submetem, espe-cialmente as mulheres, a uma maior vulnerabilidadeque deve ser combatida com disponibilização de ma-teriais de prevenção e políticas específicas de consci-entização.

8. Implementação do kit “Escola sem Ho-mofobia” e revisão dos materiais já existen-tes

O cancelamento do programa “Escola sem Ho-mofobia” durante o governo Dilma foi um retrocessoimperdoável. No governo da Luciana, a luta con-tra o assédio moral e a homo/lesbo/bi/transfobia(da mesma forma que a luta contra o racismo, o ma-chismo e outras formas de opressão) fará parte dosconteúdos do Plano Nacional de Educação e será en-tendida como conteúdo transversal em todos os ní-veis de ensino, com materiais didáticos adequadosà idade e maturidade dos alunos e alunas. Vamoseducar as próximas gerações sem preconceitos, paraconstruir a sociedade do futuro: sem racismo, semmachismo e sem discriminação contra as LGBTs.

9. Qualificação dos servidores públicos

para o atendimento à população LGBT

O preconceito se institucionaliza a partir da au-sência de iniciativas por parte do governo fede-ral para preparar profissionais e servidores públi-cos para atender e lidar com a diversidade da po-pulação LGBT. O respeito à livre orientação sexuale em especial à identidade de gênero deve ser umaexigência que começa no serviço oferecido pelo Es-tado. Quando se trata de profissionais que têm con-tato com LGBTs em situação de maior vulnerabili-dade, como assistentes sociais, funcionários de ca-sas de acolhimento e trabalhadores do judiciário, umtreinamento especializado é ainda mais urgente e ne-cessário.

10. Fortalecimento da participação diretadas LGBTs

Nos últimos anos, o governo federal realizouconferências nacionais LGBT, mas as propostas deseus participantes não foram incorporadas pelo Es-tado. Como presidenta, Luciana realizará as confe-rências de forma mais periódica e democrática e commais estrutura, bem como abraçará de fato as pro-postas apresentadas pela população LGBT.

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17 MulheresNo Brasil, com uma população de 195,2 milhões

de habitantes, cerca de 100,5 milhões de habitantes– ou 51,5% - são mulheres de acordo com a PNAD2011, representando 5,8 milhões a mais que os ho-mens. Entretanto, embora as mulheres sejam maio-ria numérica em um país que teve a conquista sim-bólica de eleger uma mulher presidenta do país, já épossível fazer um balanço de que no governo Dilmao aprofundamento dos diretos das mulheres deixoumuito a desejar.

Diferentemente do atual, no governo de LucianaGenro - que sempre se comprometeu e fortaleceu aluta das mulheres - o compromisso em defesa dosdireitos das mulheres será inegociável. Em seu pro-grama de governo, a candidata do PSOL amplificaráas demandas das ruas levantadas historicamente pe-las mulheres que, com especial protagonismo nosprotestos de junho de 2013, levantaram as principaisbandeiras de transformação social do país.

Prioridades:

a) Combate a todas as formas de machismo e se-xismo,

b) Compromisso em defesa e ampliação dos di-reitos das mulheres,

c) Construção participativa de políticas públicasvisando combater o machismo por meio dodiálogo permanente com os movimentos soci-ais e entidades buscando elaboração.

Propostas de ação:

1. Combate à violência contra a mulher

A violência permanece uma das mais graves vi-olações dos direitos das mulheres e um dos maioresdesafios no que se refere à construção de políticaspúblicas. Os índices ainda são altos em todo o país.Contudo, em relação ao quadro de execução orça-mentária de 2013, de acordo com o CFEMEA, paracombate à violência contra a mulher – que abrange,de forma mais ampla, os programas e ações do Pro-moção da Autonomia e Enfrentamento à Violência,Promoção dos Direitos de Crianças e Adolescentes e

Segurança Pública com Cidadania – o cenário é crí-tico. Dos R$ 695 milhões previstos, só foram empe-nhados efetivamente R$ 123 milhões (o que repre-senta 17,7%) e pagos R$ 28,5 milhões, apenas 4,1%. Adeficiência de investimentos é reflexo direto da faltade prioridade que o governo federal delega aos di-reitos das mulheres. Com os recorrentes cortes orça-mentários não há programa de enfrentamento à vio-lência que se sustente no país.

Além disto, os programas de enfrentamento àviolência contra a mulher seguem intimamente li-gados às secretarias de segurança pública, determi-nando novos problemas de concepção nessa política.A falta de treinamento adequado aos policiais mili-tares e o machismo da corporação são fatores rele-vantes no momento em que as vítimas de violênciaencontram-se mais fragilizadas e precisando de su-porte para romper com o ciclo de violência e denun-ciar o agressor. Por outro lado, as políticas de com-bate à violência que priorizam o encarceramento,sem o acompanhamento do agressor e sem medidaspreventivas, deixam claro o descompromisso do po-der público em romper radicalmente com a violênciaendêmica contra as mulheres. Por isso, nos compro-metemos a dotar as condições orçamentárias neces-sárias para:

• Promover a prevenção da violência contra amulher por meio de campanhas socioeduca-tivas nos meios de comunicação de massa,nas escolas e nos serviços públicos em geral(saúde, segurança etc.);

• Promover a assistência integral às mulheresque sofrem de violência doméstica e sexual,ampliando e estruturando serviços especializa-dos: Centros de Referência, Casa Abrigo, Uni-dades referência em Saúde, Contracepção deemergência e a profilaxia de infecção pelo HIV;

• Formar e capacitar os servidores públicos, emparticular na área de saúde e segurança, parao atendimento adequado das mulheres vítimasde violência;

• Expandir Delegacias da Mulher com funcio-namento 24 horas e atendimento psicossocial,cujos funcionários tenham treinamento ade-

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quado para lidar com casos de violência ma-chista.

2. Aumento da oferta de vagas na educaçãoinfantil

O Brasil precisa de mais creches (como são maisconhecidas as escolas infantis). Segundo a PNAD de2011, 37,4% dos lares brasileiros são chefiados pormulheres e dentre elas há muitas que criam seus fi-lhos sozinhas. A realidade de grande parte das mu-lheres trabalhadoras é ter que deixar seus filhos comvizinhos ou crianças um pouco maiores. Mesmo emlares com pai e mãe, muitas vezes ambos precisamtrabalhar fora de casa. Essas crianças ficam sem as-sistência qualificada e expostas a riscos. Além disso,toda criança tem direito à educação escolar desde aprimeira infância. Portanto, a exigência de creches epré-escolas gratuitas vem preencher uma lacuna fre-quente nas residências brasileiras, especialmente asmais carentes.

Defender a educação infantil como obrigatóriados zero aos seis anos é defender as crianças eseu direito a uma oportunidade de desenvolvimentopleno, visto que é nesta fase da vida que se formamas bases para o aprendizado futuro. É por isso, in-clusive, que a concepção de creches como um localde assistência social foi substituída pela concepçãode educação infantil, um local de aprendizado e de-senvolvimento das crianças.

Nos comprometemos em nosso plano de governoa atender toda a demanda por creches manifesta nosmunicípios em quatro anos, contados a partir do iní-cio do governo. Para isso, o financiamento precisa edeve ser aumentado. Atualmente o orçamento pre-visto pelo FUNDEB é insuficiente para atender a de-manda com qualidade. Nos comprometemos com:

• A consolidação de políticas, diretrizes e açõesdestinadas à ampliação do acesso à educaçãoinfantil, visando a garantia do direito à educa-ção de qualidade às crianças de 0 a 6 anos deidade, atendendo toda a demanda manifestadapelos municípios em quatro anos;

• Aumentar o financiamento para atender ademanda, proporcionando uma educação dequalidade, de acordo com o Custo Aluno-Qualidade (CAQ), indicado pelo Conselho Na-cional de Educação;

• Ampliação da oferta de educação infantil pelopoder público, extinguindo progressivamente

o atendimento por meio de instituições con-veniadas. Visando a qualidade e a melhoriadas condições de trabalho dos profissionais daeducação infantil.

3. Pela vida das mulheres, legalizar oaborto

O direito das mulheres a não morrerem em abor-tos clandestinos é um direito democrático básico. Oaborto é uma realidade no Brasil e no mundo e mi-lhares de abortos são praticados a cada ano de formaclandestina. Enquanto as mulheres que têm dinheiropodem praticá-lo em clínicas privadas com absolutasegurança, as mulheres pobres recorrem a métodosprecários que colocam em risco sua saúde e sua vida.Nos países em que o aborto foi legalizado, a quanti-dade de abortos diminuiu e o número de mulheresque morrem por complicações na prática do abortofoi reduzido a zero.

Não se trata de conceber o aborto como métodocontraceptivo, mas de entender que as mulheres de-vem ter o direito de escolha com relação à continui-dade ou interrupção da gravidez, seja quando ela éproduto da violência sexual, quando pode colocarem perigo sua saúde ou sua vida, ou quando se tratade uma gravidez indesejada por qualquer outro mo-tivo. Por isso, junto com a legalização do aborto, oEstado deve garantir, através de políticas públicas, aeducação sexual integral (sobretudo das meninas eadolescentes, que muitas vezes engravidam ou con-traem DSTs por falta de conhecimento sobre o sexoseguro) e garantir a todas o acesso gratuito aos méto-dos contraceptivos. Defendemos a educação sexualpara prevenir, contraceptivo para não engravidar eaborto legal e seguro, garantido pelo SUS, para evi-tar a morte de mulheres em decorrência de abortosclandestinos. Defendemos:

• A possibilidade de interrupção voluntária dagravidez até a 12a semana de gestação, comosua escolha exclusiva, enquanto para casoscomo estupros até a 14a semana de gestação;

• Obrigação dos governos federal, estadual emunicipal, por meio do Sistema Único deSaúde ou ainda com as unidades conveniadas,de realizar o procedimento de aborto gratuito,legal e seguro obedecendo os termos da lei;

• Amplo programa de conscientização sobrea maternidade e paternidade, sobre planeja-

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mento familiar e sobre os métodos contracep-tivos.

4. Em defesa do parto humanizado e contraa violência obstétrica

O PSOL defende o projeto de lei 7633/2014 dodeputado Jean Wyllys, que garante à gestante o di-reito ao parto humanizado, conforme sua vontade,à mínima interferência médica, acompanhamento,correta informação sobre procedimentos e direitos, eao abortamento seguro nas formas da lei. Tambémestabelece como direitos do neonato o nascimentodigno e seguro, o contato com a mãe logo no pri-meiro momento de vida quando não houver impe-dimento médico, entre outros.

5. Pela equidade salarial

Implantaremos políticas de equidade de gêneropara a igualdade plena de homens e mulheres e polí-ticas afirmativas que façam um contrapeso a séculosde opressão da mulher. Neste sentido, é fundamen-tal o desenvolvimento de ações para incluir ou igua-lar as mulheres no mercado de trabalho por meio dapromoção da sua autonomia econômica. Defende-mos o PL 7016/10, de autoria da Luciana Genro, queprevê punição e mecanismos de fiscalização contra adesigualdade salarial entre homens e mulheres. Aomesmo tempo, encaminharemos a redução da jor-nada de trabalho e a socialização dos trabalhos do-mésticos com a implantação de espaços públicos dereprodução da vida comunitários, como lavanderias,cozinhas, refeitórios e creches.

6. Aumento do tempo de licença-maternidade e paternidade

O tema da licença-maternidade/paternidadedeve ser discutido na perspectiva da responsabi-lização igualitária de homens e mulheres no cui-dado das crianças. A maternidade deve ser umaescolha (de casais heterossexuais ou homoafetivos)e não imposição. A ampliação da licença- materni-dade/paternidade é importante pelo vínculo emoci-onal construído entre os pais e a criança, o que com-provadamente contribui para maior estimulo nas co-nexões do cérebro do bebê, desenvolvimento físico,emocional e intelectual a curto e longo prazos. Aampliação da licença-paternidade, em especial, alémde fortalecer o vínculo do pai com o bebê, é centralpara a desmistificação dos papeis sociais de “pai” e

“mãe” e garantia de um maior envolvimento do ho-mem com a criação dos filhos, permitindo à mulhermaior autonomia e liberdade na tomada de decisões.Propomos licença-maternidade de um ano para asmães e de um mês para os pais, visando progressi-vamente tempos de licença iguais.

7. Por uma reforma política que fortaleça aparticipação das mulheres

A construção social dos papeis de gênero é algotão naturalizado que passa despercebido no nossocotidiano. Nunca é demais lembrar que mulheres ehomens têm internalizado durante muitos anos quedeterminadas atitudes e comportamentos são pró-prios de cada gênero (feminino e masculino) – porexemplo: ocupar espaços públicos para homens eprivados para mulheres.

Como consequência, hoje as mulheres ocupam9% dos mandatos na Câmara de Deputados e 12%no Senado, colocando Brasil em 106o lugar no itemde “igualdade de gênero na política”. Neste sentido,defendemos uma reforma política, que promova aparticipação da mulher, envolvendo mecanismos de-mocráticos, tais como:

• Defesa do sistema de votação proporcional emlista partidária pré-ordenada, com paridade degênero;

• Democratização radical dos espaços de defini-ção de políticas públicas de forma que estimulea participação das mulheres;

• Garantia da realização de Conferências de Polí-ticas Públicas para Mulheres com ampla divul-gação, não só entre o movimento de mulheres,mas na sociedade como um todo, chamandotodas as cidadãs a participarem deste processo;

• Criar Secretarias de Políticas Públicas paraMulheres nos locais onde esta não existe, alémde garantir recursos financeiros e humanos eautonomia para seu funcionamento;

• Prezar pela laicidade do Estado.

8. Por uma educação não-sexista

A educação é um espaço privilegiado para o en-frentamento às opressões. É na escola onde o ma-chismo se reproduz diariamente. Nossa escolha éconstruir relações igualitárias na escola, por meio

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da efetivação de ações e programas de educaçãonão-sexistas e que combata todas as discriminações,como o racismo, sexismo, homofobia, lesbofobia etransfobia. Por isso é fundamental a inserção noscurrículos escolares de conteúdos que promovamuma educação inclusiva, não discriminatória, queaborde de forma progressista questões de gênero, et-nia, orientação sexual e identidade de gênero.

9. Mulheres negras

Para as mulheres negras o direito à vida própria(autonomia) até o direito à própria vida (no enfrenta-mento à violência) são batalhas constantes. Isso, ape-sar do espaço conquistado por meio das lutas histó-ricas das mulheres em geral, e das negras em parti-cular. Lutas que conseguiram se traduzir em políti-cas públicas de enfrentamento à violência, de acessoa trabalho e renda, à educação e saúde e de empode-ramento político.

O racismo, aliado ao sexismo, constitui a basereal da subjugação das mulheres negras no Brasil. Asestatísticas apontam o que é ser mulher e negra numpaís em que a estrutura socioeconômica e político-cultural foi construída e embasada em práticas racis-tas e sexistas. As mulheres negras e jovens são a mai-oria das vítimas de violência doméstica, além de es-tarem mais constantemente expostas à violência se-xual e policial. De acordo com o Instituto de Pes-quisa Econômica Aplicada (IPEA), mais de 60% dasmulheres assassinadas no Brasil entre 2001 e 2011eram negras. A mulher negra aparece nos dados es-tatísticos associada a baixos índices de escolaridade,a trabalho degradante e rendimentos inferiores, es-tando posicionada na parcela mais pauperizada dasociedade brasileira, constituindo um dos segmen-tos mais vulneráveis, fazendo com que a pobrezabrasileira tenha um rosto feminino e negro. Para mu-dar este cenário, propomos:

• Incentivo a medidas que possam transformaresta realidade, garantindo a estas mulheres oacesso à cidadania, além de incentivo em con-selhos de participação popular;

• Criação de políticas públicas e de ações afirma-tivas se coloca como uma das estratégias paraa superação destas desigualdades e disparida-des existentes entre o homem e a mulher, entreos negros e brancos, entre as mulheres brancase as mulheres negras;

• Formação, educação permanente e atenção es-

pecial dos servidores da saúde para a saúde in-tegral das mulheres negras, com atenção espe-cial nos casos de hipertensão, diabetes e ane-mia falciforme.

10. Combate à lesbofobia e à transfobia

Merece atenção especial a condição de opressãoa que estão submetidas hoje as mulheres não hete-rossexuais (lésbicas e bissexuais) no Brasil. O cará-ter “invisível” da mulher lésbica se reflete na formacomo ela é discriminada: geralmente (mas não ex-clusivamente), os atos discriminatórios contra elasocorrem em ambientes privados. Isso torna maisdifícil, mas não impossível, o combate à lesbofobia.Para isso, é preciso recolocar no espaço público a im-portância do respeito à mulher lésbica e bissexual.O Estado é o responsável por isso e deve contribuirpara que as lésbicas, assim como todas as mulheres,saiam da situação de invisibilidade e sejam reconhe-cidas como sujeitos políticos ativos na sociedade.

A população trans também sofre com a invisibi-lidade e o preconceito. Dados da ANTRA – Associa-ção Nacional de Travestis e Transexuais – dão contaque 90% dessa população está se prostituindo, esseé um número estarrecedor e que não deveria ser tra-tado como uma questão menor ou algo secundário.É preciso urgentemente de políticas públicas naci-onais que visem incluir a população de travestis etransexuais dentro do mercado de trabalho.

Além dos casos de violência psicológica e física,que chegam a matar, também há infinitos relatos detravestis e transexuais que foram agredidas por re-presentantes do Estado, como policiais e demais fun-cionários públicos. O preconceito não está somentena sociedade, ele se reflete no poder público, pormeio da violência institucional. Para acabar comisso, defendemos:

• Formação e educação permanente dos servido-res da saúde para a saúde integral das mulhe-res lésbicas, bissexuais e transexuais, principal-mente sobre prevenção de DSTs, AIDS, câncerde colo de útero e de mama;

• Campanha de combate ao HIV entre mulhereslésbicas, bissexuais e transexuais;

• Estímulo à produção e difusão de conheci-mento e sensibilização dos profissionais dasaúde para a atenção às mulheres lésbicas, bis-sexuais e transexuais sobre direitos humanos;

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• Instalação de ouvidorias, como canal de comu-nicação entre mulheres lésbicas, bissexuais etransexuais e as instituições públicas;

• Garantia de representatividade das mulhereslésbicas, bissexuais e transexuais em conselhosde participação popular;

• Casas de acolhimento e preparação para o tra-balho para LGBTs em situação de risco;

• Pelo reconhecimento de identidade de gênerodas mulheres trans a partir da defesa da apro-vação da Lei João Nery;

• Pela despatologização e reconhecimento dasidentidades sexuais;

• Atendimento humanizado no acompanha-mento à população trans no processo de re-adequação dos corpos, em centros ambulato-riais com atendimento psicoassistencial e hor-monal, bem como a qualificação dos profissio-nais do setor de saúde para atendimento a tra-vestis e transexuais;

• Ampliação do atendimento das delegacias damulher para as mulheres trans.

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18 ComunicaçãoA “era da informação”, cantada e decantada

como nova etapa do desenvolvimento das forçasprodutivas mundiais, no Brasil chegou para poucos.O imenso abismo que segue separando ricos e po-bres em nosso país é sustentando por um sistema decomunicações quase que exclusivamente privado eagravado pela ação de grupos empresariais que con-formam verdadeiros monopólios e oligopólios con-troladores de Tvs, rádios, mídia impressa e Internet.Esse sistema tem uma íntima ligação ao sistema po-lítico, sustentando-se a partir de relações perversasde um círculo viciado entre os interesses dos gruposempresariais que controlam as comunicações e seusapadrinhados políticos. Por isso, conforme demons-traram as manifestações de junho do ano passado,é fundamental que se estabeleça um sistema efetiva-mente público, que tenha como princípio a liberdadede expressão real e a defesa dos direitos humanos eestabeleça um equilíbrio entre o estatal e o privadona produção da comunicação do país.

Prioridades:

a) O direito à comunicação é um direito humanofundamental e sua democratização, com a con-solidação de um sistema verdadeiramente pú-blico, deve ser, portanto, um dever do Estado.

b) O sistema público deve ter autonomia em re-lação aos governos, com garantia de financia-mento.

c) Os meios de comunicação que dependem deconcessão pública devem ser distribuídos comequilíbrio de espaço e de alcance entre os siste-mas público, privado e estatal.

d) Garantir pluralidade nos conteúdos, formatos,abordagens e gêneros da produção das emisso-ras de rádio e TV que reflita a diversidade cul-tural (especialmente étnico-racial, de gênero eregional) presente na sociedade brasileira, con-forme previsto no artigo 221 da Constituição.Além de garantir a pluralidade de ideias naprodução de conteúdo, também é essencial as-segurar a distribuição dos mesmos pelo terri-tório nacional.

e) Assegurar a Internet como serviço fundamen-tal, a ser prestado em regime público com ga-

rantia de universalização e metas de quali-dade.

Propostas de ação:

1. Cancelar licenças de rádio e TV de sena-dores e deputados

Conforme a Arguição por Descumprimento dePreceito Fundamental (ADPF) protocolada peloPSOL no Supremo Tribunal Federal, nosso programaé contra a outorga e renovação de concessões, per-missões e autorizações de radiodifusão a empresasque possuam políticos titulares de mandato eletivocomo sócios ou associados. O controle de emissorasde rádio e TV por políticos é inconstitucional e violadireitos fundamentais como o acesso à informação, aliberdade de expressão, o pluralismo político e a re-alização de eleições livres, além do princípio da iso-nomia, da isenção e independência do membros doPoder Legislativo.

2. Reservar espaços iguais para os sistemaspúblico, privado e estatal no rádio e na TVe criar um sistema público gerido por umConselho Nacional de Comunicação comparticipação da sociedade civil e indepen-dência de governos

O sistema de comunicações no Brasil foi histo-ricamente forjado com a predominância do sistemaprivado, descumprindo o artigo 223 da ConstituiçãoFederal. Por isso, como primeiro passo buscaremosimplantar uma quantidade equilibrada de canais en-tre os sistemas privado, público e estatal.

O Conselho Nacional de Comunicação ainda teráo papel de definir a Política Nacional de Comuni-cações, envolvendo a gestão do sistema público, eelaborar políticas para emissoras privadas com finslucrativos, devendo estabelecer, entre outras ques-tões, critérios para outorga, utilização das verbas doFundo de Comunicação Pública e orientações geraispara garantir pluralidade e diversidade na progra-mação das emissoras. Será formado por represen-tantes da sociedade civil (com eleição direta pelospares), das emissoras públicas (com indicação de en-tidade representativa ou eleição pelos pares) e doGoverno Federal (por meio de indicação de repre-

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COMUNICAÇÃO 71

sentantes de órgãos responsáveis por Comunicações,Educação, Cultura, Ciência e Tecnologia e Casa Ci-vil).

3. Criar o Fundo de Comunicação Públicacomo principal ferramenta de um sistemade financiamento público independente dosgovernos para comunicação pública e co-munitária

Para garantir um sistema verdadeiramente pú-blico de comunicação com produção independente ede qualidade, que faça frente às emissoras comerci-ais, é necessário autonomia no financiamento. Assimele se manterá autônomo, tanto da ingerência estatalquanto do mercado. Para tanto, o Fundo de Comu-nicação Pública – tal como proposto na campanhaPara Expressar a Liberdade - será composto priori-tariamente por: receitas previamente vinculadas dosorçamentos públicos em âmbito federal e estadual;recursos da taxação da publicidade veiculada nos ca-nais comerciais e pelo pagamento de uso do espectropor parte dessas emissoras, garantindo que a expan-são do sistema privado esteja sempre vinculada aopúblico; impostos progressivos embutidos no preçode venda dos aparelhos de rádio e televisão, comisenção para aparelhos de TV com menos de 20”, etaxação progressiva especialmente para equipamen-tos superiores à 29”; doações de pessoas físicas e ju-rídicas.

4. Fortalecer as emissoras comunitárias

É preciso interromper o processo de criminaliza-ção dos radialistas comunitários em curso. As emis-soras comunitárias são um importante ator na demo-cratização da comunicação. Para tanto, ao contrá-rio das restrições, haverá o fortalecimento das rádioscomunitárias, sem restrição de potência (tal comoacontece com as emissoras comerciais), aumento decanais comunitários por município, garantia de fi-nanciamento e autonomia e a inclusão das TVs co-munitárias no processo de regulamentação pública.

5. Definir a internet como serviço fun-damental, colocando a prestação do ser-viço em regime público para universalizaro acesso e estabelecer metas de qualidade

Embora a Internet seja uma ferramenta cada vezmais presente e necessária para o desenvolvimentoprofissional, pessoal e econômico dos brasileiros, sua

difusão praticamente não é alvo de políticas públi-cas. Definir a Internet como serviço fundamentalexigirá dos governos em todos os âmbitos providen-ciar políticas de universalização do acesso para fazerchegar esse serviço especialmente nas regiões onde omercado não chega. Junto à política de expansão, énecessário promover uma política de inclusão e edu-cação digital, que forme usuários capazes de enten-der como a rede funciona e como usar criptografia.

6. Elaboração de regulamentação do MarcoCivil da Internet de maneira a garantir aneutralidade da rede e proteger a privaci-dade dos usuários de Internet

Para que a Internet possa ser usada de forma aaumentar a pluralidade na comunicação e não comomecanismo de controle social, é necessário que seususuários sejam protegidos contra políticas de vigi-lância, como as denunciadas pelo ex-agente da NSA,Edward Snowden. Os provedores de Internet nãodevem guardar registros de acesso em massa (semordem judicial) e tal prática deve ser criminalizada.Além disso, a rede deve ser neutra, isso é, não deveser permitido que os provedores priorizem o tráfegode determinados pacotes em detrimento de outros.

7. Regular a propriedade cruzada e verticaldos meios para impedir o monopólio dascomunicações

Democracia pressupõe a existência de plurali-dade. A existência de pluralidade pressupõe o livrefluxo de informações. E o livre fluxo de informaçõespressupõe a multiplicidade de fontes, algo que só épossível com uma regulamentação capaz de coibira concentração de propriedade que, infelizmente, ébastante comum na comunicação social. Por isso,como já ocorre na Europa e nos EUA, propomos aregulação econômica do setor de comunicação so-cial eletrônica. Entre as propostas, está a limitaçãode controle por um mesmo grupo empresarial de di-ferentes veículos, tais como canais de TV, de rádiose mídia impressa de grande circulação (propriedadecruzada). A regulação da propriedade cruzada deveser combinada com o limite à concentração à pro-priedade vertical, impedindo que um único grupoeconômico controle várias etapas da cadeia produ-tiva de comunicação como produção, programação,empacotamento e distribuição, por exemplo.

8. Garantia de cotas de produções nacional,

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regional e independente na TV e no rádio

A pluralidade de ideias só se produz a partir dadiversidade na autoria. Por isso, é essencial definirregras para a inserção mínima de conteúdos nacio-nal, regional e independente. Essa política tambémvisa reduzir as desigualdades econômicas regionaise desconcentrar a produção do eixo Rio/São Paulo,de forma a estimular a igualdade de oportunidadesem todo o país.

9. Regulamentação do direito de resposta,incluindo direitos difusos e coletivos

O direito de resposta é um importante instru-mento de liberdade de expressão e de garantia dedireitos fundamentais. Além disso, é essencial paraa garantia do acesso à informação e para estimular

o pluralismo de ideias. O direito de resposta deveser um direito não apenas individual, mas tambémdifuso e coletivo, de maneira a abarcar a representa-ção da diversidade cultural, social e política da socie-dade e as políticas públicas de Estado que garantama participação e representação dos diversos grupos.

10. Direito de antena

Tal como praticado em países como Portugal,Alemanha, França e Espanha, o direito de antena éum instrumento de democratização do acesso aosmeios de comunicação, a partir da garantia à livremanifestação nos espaços de comunicação de massaa movimentos sociais, organizações sindicais, profis-sionais e representativas de atividades econômicas,de acordo com sua relevância e representatividade eseguindo critérios objetivos previamente definidos.

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19 CulturaA última década foi a primeira vez na história

brasileira em que um ciclo de crescimento econô-mico não foi acompanhado de um ciclo de explosãocriativa da Cultura nacional. Uma das razões paratanto é a financeirização da Cultura, que transfor-mou departamentos de marketing de grandes em-presas em órgãos decisórios das políticas públicas deCultura, assim como a ausência de investimentos emformação.

Prioridades:

a) Assegurar a construção de uma rede públicade Cultura que conte com o planejamento, in-centivo e investimento do governo federal emtodas as esferas públicas e que estejam articu-ladas nos três âmbitos federativos;

b) Garantir um financiamento público adequadopara a ampliação e qualificação das produçõesculturais, bem como a sua distribuição regionalequitativa, combatendo a financeirização atualda Cultura;

c) Promover a pluralidade, a multiculturalidadee o potencial transformador e independente daarte.

Propostas de ação:

1. Criação de Escolas Federais de Artes

A falta de importância dada à Cultura no Bra-sil pode ser verificada pela inexistência de um sis-tema federal de escolas de arte. Propomos a rever-são deste quadro com a criação de Escolas Federaisde Arte que atendam à diversidade regional e terri-torial do país e contem com cursos de longa duraçãode literatura, música, teatro, cinema, vídeo, dança eartes visuais nas periferias das grandes cidades bra-sileiras.

2. Criação de um sistema de bolsas paraartistas iniciantes

A produção artística brasileira encontra-se entrea penúria dos profissionais ou sua sujeição às nor-mas e necessidades do mercado. Tal situação, queacontece por falta de incentivo e acompanhamento

do Estado, é um ataque à potência criativa e à capa-cidade de produção de uma Cultura independentee transformadora. Propomos que os artistas inici-antes possam desenvolver sua produção em auto-nomia diante do mercado a partir de um programaestruturado de bolsas concedidas pelo governo fede-ral.

3. Construção de bibliotecas públicas fe-derais

O Brasil tem índices tragicamente insuficientesna relação entre o número de bibliotecas e a quanti-dade de habitantes, estando atrás de países com me-nores índices econômicos e produtivos. Ao mesmotempo, as bibliotecas do país são marcadas pela ina-dequação do acervo que não atende à demanda, pordificuldades de acesso e utilização e pela extrema-mente precária capacitação profissional. Quandotratamos desses dados observando as disparidadesregionais, os números são ainda mais alarmantes,com claro prejuízo para as populações do Norte,Nordeste e Centro-Oeste. Tratar dessas disparida-des – tanto da relação biblioteca-habitante quantoda relação biblioteca-região – deve ser uma priori-dade para que o escasso acesso ao hábito da lei-tura no Brasil seja combatido. Além da obrigatori-edade da construção desses equipamentos nos mu-nicípios, como trataremos em outra proposta, orien-taremos em todas as cidades com população acimade 150.000 habitantes a construção de equipamentosno modelo das bibliotecas-parque, com incentivosdo governo federal, e equipamentos públicos mul-tifuncionais em áreas de risco e com acesso imediatoe fácil à informação.

4. Ampliar para 2% do PIB as verbas daCultura e promover amplas políticas de fi-nanciamento com equidade da distribuiçãoregional de verbas

Defendemos a vinculação de orçamento para aCultura com a meta da destinação de 2% do PIB paragarantir de fato à área independência e consistênciano planejamento e intervenção estatais. Além disso,promoveremos a reformulação do Programa de Fo-mento e Incentivo à Cultura (PROCULTURA) comampliação dos editais públicos de seleção de proje-

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74 CULTURA

tos culturais e incentivo à ação política cultural inde-pendente. O aumento do financiamento da Culturadeve estar sempre vinculado ao atendimento de cri-térios transparentes de distribuição regional de ver-bas para que as regiões historicamente menos favo-recidas pelas políticas culturais estejam à altura deter produções com o mesmo nível de investimentodas regiões que historicamente recebem mais recur-sos.

5. Assegurar a incorporação dos preceitosda Convenção sobre a Proteção e a Promo-ção da Diversidade das Expressões Cultu-rais da UNESCO

Conforme o documento da Convenção sobre aProteção e a Promoção da Diversidade de Expres-sões Culturais da UNESCO, “a diversidade culturalse manifesta não apenas nas variadas formas pelasquais se expressa, se enriquece e se transmite o pa-trimônio cultural da humanidade mediante a vari-edade das expressões culturais, mas também atra-vés dos diversos modos de criação, produção, difu-são, distribuição e fruição das expressões culturais,quaisquer que sejam os meios e tecnologias empre-gados.” No Brasil é ainda mais gritante a necessi-dade de incorporar esse e outros princípios que reco-nhecem a pluralidade e o multiculturalismo no pla-nejamento e gestão de políticas públicas.

6. Atualização permanente dos ParâmetrosCurriculares Nacionais (PCNs) do ensinode arte-educação e da música

A formação em arte-educação, bem como a for-mação do profissional da Cultura, dos ensinos bá-sicos ao superior, requer uma constante atualizaçãoe qualificação, de acordo com as transformações nasdiferentes linguagens artísticas, na educação, na pro-dução e gestão de políticas culturais, na área de edu-cação patrimonial e no incentivo ao livro e à leitura.Nesse contexto, deve-se sempre observar a garantiaao acesso e acessibilidade à produção cultural, comcapacitação profissional, recursos próprios e aquisi-ção de livros e equipamentos destinados ao atendi-mento de pessoas com deficiência.

7. Rede integrada de equipamentos cultu-rais e obrigatoriedade de bibliotecas, espa-ços de memória e centros culturais em cadamunicípio

Tidos como elementos secundários nos planeja-mentos de obras dos municípios, os equipamentosculturais devem ser entendidos como meios de de-senvolvimento humano e, inclusive, econômico decada município, devendo ser tratados como instru-mentos norteadores dentro das estratégias de políti-cas públicas municipais e estaduais. Para tanto, alémde promover uma rede nacional de equipamentosculturais integrada, que leve em conta os instrumen-tos públicos federais, estaduais ou municipais e tam-bém os controlados pela iniciativa privada, devemoscondicionar a criação de novos municípios à exis-tência de equipamentos culturais básicos tais como:biblioteca, espaço de memória e centro cultural deuso múltiplo. Paralelamente deve-se estabelecer umprazo para adequação dos municípios já existentesdentro de uma relação razoável entre cada equipa-mento e o número de habitantes.

8. Direito à cidade é direito à Cultura

É preciso que os programas habitacionais e de in-tervenções urbanas entendam que o déficit habitaci-onal é também e fundamentalmente um déficit de ci-dade. Isso significa que a produção da cidade é tam-bém uma produção da sociedade, devendo contem-plar toda a diversidade e possibilidades de desen-volvimento cultural. Assim, nada mais fundamentaldo que assegurar, na implantação de conjuntos ha-bitacionais, planos de moradia e intervenções urba-nas, a obrigatoriedade de construção de equipamen-tos culturais básicos (biblioteca, telecentro e centrocultural de uso múltiplo). Isso é especialmente im-portante quando se refere às periferias das grandescidades.

9. Elaborar, aprovar e executar os planos deCultura e planos setoriais de Cultura nostrês âmbitos federativos, a partir das pro-postas aprovadas em suas respectivas con-ferências

Democratizar a Cultura passa também por de-mocratizar as decisões a respeito de como ela seráplanejada e gerida. As conferências de Cultura sãoum importante espaço de discussão e elaboração,mas também precisam ser espaços com poder de de-liberação e ação, comprometendo o poder públicocom os desejos e as necessidades públicas, em todosos âmbitos e passando por todos os entes federati-vos.

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CULTURA 75

10. Mapa da Cultura

Há uma diversidade de iniciativas culturais quenão passam pelas políticas públicas, mas nem porisso devem estar isoladas, fora do mapa das ações

culturais. É necessário implantar um sistema de in-formações que seja um mapeamento dessas açõesmas, por outro lado, conte com informações e in-dicadores culturais em cada uma das linguagensartístico-culturais.

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76 ESPORTE E ATIVIDADE FÍSICA

20 Esporte e atividade físicaA derrota histórica da seleção brasileira de fute-

bol na final da Copa do Mundo deste ano foi reve-ladora não só dos grandes problemas que nosso fu-tebol enfrenta. Ela explicitou o quanto as estruturasdo esporte nacional estão corroídas pela total faltade capacidade de planejamento, intervenção e atua-ção do poder público e da sociedade. As verdadei-ras ditaduras instaladas na CBF e no COB – só paracitar os exemplos mais chamativos – contaram coma conivência e parceria do poder público, como te-mos visto na vergonhosa ação do Ministério dos Es-portes nos últimos governos. Incrivelmente, apesarde todo apelo social e do momento político propíciopara mudanças por conta da ação de movimentosinéditos e extremamente progressivos como o BomSenso FC, os candidatos do sistema sequer têm pro-postas de revisão do atual estado de coisas.

De nossa parte, procuramos apresentar aqui umasíntese inicial a partir das pautas de reivindicaçõesdesses movimentos, de contribuições de especialis-tas da área e também utilizando uma preciosa pro-posta elaborada por atletas como contribuição aoplano de governo de Lula em 2002, mas abandonadapelo presidente, que preferiu estar ao lado das má-fias encasteladas na direção da CBF e do COB e deseus negócios associados aos megaeventos.

Partimos da premissa de que o esporte é um im-portante fator de desenvolvimento humano, deter-minante para políticas de educação e também desaúde. Apesar disso, e de que comprovadamentea inatividade física representa um grande prejuízopara os cofres públicos, atualmente o acesso ao es-porte e à atividade física acontece de forma fragmen-tada, sem apoio em um sistema organizado nacio-nalmente, sem objetivos claros e sem capacidade deavaliação de resultados. A prática esportiva acabasendo sempre secundarizada, como uma atividadesem importância e dispensável.

Uma população que pratica esportes é uma po-pulação mais saudável, mais integrada, mais prepa-rada para enfrentar os problemas cotidianos. A ativi-dade física representa, para os indivíduos em forma-ção, uma verdadeira escola prática na composição dapersonalidade em que são aprendidos valores sobrecooperação, competição, desenvolvimento de capa-cidades cognitivas de elaborar táticas e estratégias,a relação do homem com a natureza de forma sa-

dia, superação de limites, organização coletiva, dis-ciplina e respeito com o próximo.

Prioridades:

a) Democratizar o acesso ao Esporte e à Ativi-dade Física;

b) Construir o Sistema Público Nacional do Es-porte e da Atividade Física que seja defini-dor da plena hierarquia das competências dosentes federativos, bem como da relação deatribuições entre educação, saúde e esporte.Tendo como objetivo prioritário a universali-zação das práticas esportivas como direito hu-mano fundamental à toda população, esse Sis-tema Público tem também a função de regulare normatizar as organizações esportivas, sejamelas estatais, públicas, comunitárias, de inte-resse público ou privadas, estando elas vincu-ladas ou não aos esportes de alto rendimento;

c) Construir um país saudável, que invista no es-porte como fator de prevenção de doenças, so-cialização e educação, tripé que reduz a violên-cia e estimula a cidadania;

d) Estruturar uma legislação que moralize o es-porte de alto rendimento e lhe dê os instru-mentos para caminhar em consonância com osinteresses prioritários do país. A transparên-cia, a democratização dos regimes internos deorganizações esportivas e o fim da impunidadeno esporte brasileiro certamente trarão grandeavanço no nível de consciência popular sobreas mudanças de que o Brasil necessita.

Propostas de ação:

1. Sistema Nacional Público do Esporte eAtividade Física

A partir da adoção do Diagnóstico do Esportecomo política permanente, organizaremos um Sis-tema Nacional Público do Esporte e Atividade Fí-sica que defina objetivamente as atribuições, direitose deveres de entes federativos e organizações soci-ais, estabelecendo conceitos, definindo prioridades

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ESPORTE E ATIVIDADE FÍSICA 77

na aplicação dos recursos disponíveis e integrando oesporte com outras políticas públicas.

O Estado deverá partir da definição de que o es-porte e a atividade física são políticas vinculadas àeducação e à saúde públicas, priorizando a univer-salização do acesso à prática esportiva para todos osbrasileiros. Para tanto, é fundamental assegurar es-paços de participação das comunidades e de suas di-versas associações esportivas por meio do desenvol-vimento de comitês esportivos comunitários com as-sistência técnica e financeira do poder público. Para-lelamente, deverá estruturar também políticas parao esporte de alto nível com avaliação permanente eregulamentação das entidades esportivas dos setorespúblico e privado, de acordo com legislação própria.

Espera-se com isso expandir e fortalecer o es-porte nacional em todas as suas dimensões: de pla-nejamento e gestão, técnica, científica, acadêmica; deampliação e melhora da infraestrutura; de moderni-zação do equipamento existente; de uso de inovaçãotecnológica e medicina aplicada aos esportes; e dacriação de uma nova cultura de organização e gestãodos recursos vinculados ao fomento das atividadesesportivas.

2. Reforma Política e Estatuto do Esporte eda Atividade Física

O gargalo do desenvolvimento da prática espor-tiva no Brasil – em especial a de alto rendimento –é sem dúvida a estrutura de poder arcaica, antide-mocrática e corrupta que se cristalizou nas entidadesesportivas. Concomitantemente, sob um aparato le-gal débil que naturaliza as fraudes e descumprimen-tos de obrigações fiscais e trabalhistas, os clubes, asfederações, as confederações e organizações de di-reito privado adotam uma prática extremamente le-siva ao desenvolvimento de uma verdadeira políticapública de esportes.

Recentemente, a ação de movimentos proponen-tes da democratização dos esportes conseguiu aaprovação da lei 12.868/2013 que estabelece regrasde gestão para as entidades que recebem recursospúblicos ou gozam de isenção fiscal. Embora essalei seja uma importante conquista há ainda muito aser feito nesse sentido. Por exemplo, um dos pon-tos fundamentais dessas regras ainda não foi regula-mentado, justamente aquele que obriga essas orga-nizações a assegurar a participação dos atletas naseleições dos dirigentes das entidades que adminis-tram o esporte.

Entendemos que a consolidação de um SistemaNacional Público do Esporte e da Atividade Físicapassa também pela consolidação de um Estatuto doEsporte e da Atividade Física que, a partir das ne-cessidades e prioridades discutidas e decididas pelasociedade, haja uma regulamentação das obrigaçõesdemocráticas, das normas de transparência e desem-penho das entidades esportivas. É fundamental umaverdadeira reforma política que estabeleça partici-pação ampla da comunidade esportiva no planeja-mento, na gestão e na eleição dos dirigentes; limiteseus mandatos e proíba as reeleições infinitas; esta-beleça um sistema de referendos e mandatos revo-gáveis; preserve os direitos trabalhistas dos atletas;defina punições claras e severas para quem desres-peitar as regras; respeite os torcedores; etc. Nessesentido, compreendemos que as autonomias assegu-radas pela Constituição às entidades não impedema imposição neste estatuto de regras rígidas que coí-bam abusos e punam violações.

3. Plano Nacional de Democratização doacesso ao Esporte e à Atividade Física

Garantir a democratização e a universalização doacesso ao esporte e à atividade física terá como pontocentral a mobilização social para a participação e autilização plena de todos os instrumentos políticose equipamentos disponíveis. Para tanto, o ponto departida é a construção de um plano nacional que ga-ranta ampla participação, discussão, definição da so-ciedade civil desde a elaboração das ações voltadasàs metas, como também em sua fase de execução eavaliação.

O acesso democrático ao esporte deverá respei-tar o modelo do Sistema Público Nacional do Es-porte e da Atividade Física para todo o País, conside-rando as especificidades e as diversidades regionais.O ponto fundamental é que os programas deverãovalorizar o profissional de educação física e esportecomo figura central e obrigatória.

Em todas as escolas haverá esporte e atividadefísica para crianças e para os pais e professores (nosfins de semana e horários ociosos dos dias úteis) deforma organizada e permanente. Como eventos esti-muladores e referenciais, teremos os jogos colegiaisnos seus mais diferentes níveis e o esporte comunitá-rio. Por outro lado, é tarefa deste plano criar as con-dições para o acesso permanente dos idosos à práticaesportiva, assim como dos portadores de deficiênciafísica, com a utilização de todos os espaços públicos

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possíveis e também com a obrigação de cessão de es-paços ociosos particulares.

4. Lei de Responsabilidade Social do Es-porte

Diversos estudos recentes têm comprovado queos investimentos no esporte social têm capacidadede geração de emprego, formação educacional e pre-venção de doenças muitas vezes maior do que no es-porte de alto rendimento. Ainda assim, as políticaspúblicas esportivas giram em torno deste último, emfunção das pressões do enorme mercado e dos vulto-sos negócios que aí se estabelecem. Disso decorremtambém práticas viciadas de gestão e concessões pú-blicas, incentivos e renúncia fiscal, impunidade e au-sência de fiscalização.

A proposta de Lei de Responsabilidade Social doEsporte visa à construção de instrumentos de fiscali-zação e garantia de compensações do esporte de altorendimento ao esporte social, prioridade do nossogoverno. Desse modo, pretendemos fazer com queempresas públicas e privadas e universidades, esti-muladas pelas potencialidades resultantes de um ar-cabouço político e fiscal favoráveis, participem dire-tamente do desenvolvimento do esporte como ativi-dade econômica pública e meio de formação de basede atletas como cidadãos.

5. Fundo Nacional para o Desenvolvi-mento do Esporte, a Atividade Física e aEducação Física

O financiamento esportivo deve ter em vista oatendimento do artigo 217 da Constituição Federalque diz que o esporte é dever do Estado e direito decada um. Por isso defendemos, em primeiro lugar,uma criteriosa redistribuição do orçamento federalentre os ministérios que possibilite ter especial aten-ção ao investimento preferencial no esporte educaci-onal. Ao mesmo tempo, a política esportiva deve es-tabelecer um Fundo Nacional constituído pelas con-tribuições realizadas pelas empresas e organizaçõespúblicas ou privadas. Este fundo será utilizado parao financiamento de planos, projetos e programas dedesenvolvimento e fomento à atividade física e aoesporte, o atendimento integral e a segurança socialdos atletas.

6. Articulação Interministerial do Esporte

Nos dias de hoje a área esportiva é relegada ao se-

gundo plano das políticas públicas, tendo que estarsubmetida a elaborações isoladas das outras áreas,com baixo financiamento e pequena capacidade deexecutar mudanças efetivas. Ao contrário, acredita-mos que essa área deve estimular uma visão mais in-tegrada, que envolva ao menos a articulação de pro-gramas e projetos voltados a atribuições que hoje sãodos ministérios do Planejamento, Educação, Saúdee Cidades. Por isso, também entendemos que a lo-cução “Atividade Física” deve ser adicionada à doMinistério dos Esportes.

7. Centros Esportivos de Excelência nasUniversidades Públicas e fomento ao de-senvolvimento da ciência esportiva em es-pectro nacional

Uma visão integradora dos esportes pressupõeque sejam pensadas cientificamente e de maneira ar-ticulada as diversas áreas do conhecimento comoNutrição, Fisioterapia, Fisiologia, Educação Física,Ciências Sociais, História, Geografia, etc. Nesse sen-tido é preciso construir em cada região do país cen-tros esportivos de excelência que se proponham apensar a democratização do acesso ao esporte e à ati-vidades físicas ao mesmo tempo em que sejam es-paços onde será possível trabalhar com os futurosatletas das seleções brasileiras nas diversas moda-lidades, permitindo que o alto rendimento tambémtenha como contrapartida o desenvolvimento da ci-ência esportiva do Brasil.

Pensar uma distribuição regional desta políticade maneira que não reforce as desigualdades emnosso país deve ser um princípio, garantindo quedesde a formação inicial de professores nas Univer-sidades Públicas até a qualificação dos profissionaisa partir de cursos de pós-graduação strictu e latusenso seja pensada nacionalmente. Com isso visa-mos o combate à atual concentração dos cursos depós graduação em educação física do país nos esta-dos do sul e do sudeste enquanto há apenas três pro-gramas no nordeste e nenhum na região norte.

8. Fomento ao esporte comunitário a partirdo estímulo à criação de secretarias estadu-ais e municipais exclusivas para o trato doesporte e compostas por técnicos concursa-dos

Os municípios brasileiros raramente dão a aten-ção devida à institucionalização do planejamento es-portivo. Por isso, via governo federal, é preciso um

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ESPORTE E ATIVIDADE FÍSICA 79

estímulo concreto para a criação de secretarias esta-duais e municipais de esportes e atividade física. OMinistério terá o dever de garantir reserva orçamen-tária para o repasse de recursos diretos aos entes fe-derativos que possuírem tais secretarias, de maneiraa viabilizar o desenvolvimento de projetos na áreado esporte e garantir seu acompanhamento e inte-gração ao Sistema Público Nacional.

9. Fomento ao esporte feminino

Historicamente, há uma grande disparidade en-tre o incentivo ao esporte feminino e masculino. Ca-beria ao Ministério do Esporte e Atividade Física fi-nanciar a criação e manutenção de ligas de esportee de bolsas específicas para atletas do sexo femininocomo política permanente de fomento, assim como acriação de um programa específico para a manuten-ção de seleções femininas em modalidades coletivase individuais.

10. Caravanas “esporte bairro adentro”

Resgataremos o projeto “Caravanas do Esporte”com o intuito de massificar a prática esportiva, aeducação física e recreação nas regiões mais caren-tes do país, onde não chegam ações sociais e não hásequer equipamentos públicos nos bairros e favelas.

As caravanas acontecerão o ano todo e em três fa-ses. Em um primeiro momento as caravanas se insta-lam estimulando atividades esportivas e outras dasmais diversas como dança, ginástica, skate, natação,atividades lúdicas para crianças, preparação física nagravidez, capoeira, etc. De preferência contarão comatletas de renome nacional e regional para ajudar naconvocação. Em um segundo momento vamos ela-borar um plano de ação para a generalização da prá-tica esportiva e das atividades físicas na região. Emum terceiro momento haverá a implantação de açõesconcretas de financiamento e execução de programaspermanentes por parte dos entes federativos.

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80 CARTA-COMPROMISSO DE LUCIANA GENRO COM O MOVIMENTO NEGRO

Contribuição: Carta-compromisso de Luci-ana Genro com o Movimento Negro

É inegável a dívida histórica deste país com a po-pulação negra que foi açoitada por mais de três sé-culos e no pós-abolição foi excluída do projeto de na-ção, produzindo um verdadeiro abismo econômico,social e cultural entre negros e não negros.

As marcas deste abismo se traduzem em nossocotidiano por meio da prática do racismo que estru-tura as relações de poder no Brasil. Os Amarildos,Cláudias, Douglas, Terezinhas são exemplos dessecotidiano violento que marca a vida da populaçãonegra, onde o Estado Democrático de Direito aindaé direito a ser conquistado.

O modelo de expansão do capitalismo por meiodos grandes centros tem produzido um verdadeiroprocesso de limpeza étnica e social que se consolidacada vez mais como uma bomba-relógio, pois é tam-bém incapaz de responder de fato aos anseios de par-cela significativa da população. Com a maioria po-pulação vivendo cada vez mais distante dos centrosurbanos, com baixa infraestrutura, com transportepúblico precário, com poucos equipamentos públi-cos, combinado com a queda na capacidade de con-sumo, há diretamente como consequência o aguça-mento da violência.

Enquanto o modelo de desenvolvimento das ci-dades e do país estiver a serviço dos interesses dasgrandes corporações em detrimento de um desen-volvimento sustentável e cidadão, que regule os ter-ritórios, que taxe as grandes fortunas e garanta, defato, uma distribuição de renda eficiente, a popu-lação permanecerá vulnerável e sujeita a viver deforma precária.

O atual modelo de segurança pública intensi-fica o processo de criminalização da pobreza, produ-zindo um discurso do medo, além de tentar esconderas contradições e os problemas sociais latentes. Ocombate à violência está longe de ser um problemade polícia. É sim um problema estruturante da soci-edade brasileira. Por isso, precisamos de mudançase ações imediatas.

Acreditamos que a superação do racismo, bemcomo das maiores mazelas que atinge o povo bra-sileiro, depende também do rompimento com os in-teresses do grande capital privado e de sua lógica deoperação do Estado. Não será por pequenas refor-

mas ou políticas compensatórias que alcançaremosmudanças estruturais capazes de eliminar as desi-gualdades. Mas é preciso dar respostas possíveis econcretas aos problemas do agora. E para isso pro-pomos:

1 – A população Negra, maioria do povo bra-sileiro, é também quantidade muito significativados responsáveis pela produção e pelo consumo emnossa sociedade. A riqueza e a sustentação da na-ção brasileira passam por suas mãos. Não é justoque essa população continue vivendo a margem dasoportunidades e exposta a violências tão profundas.É papel do Estado promover um permanente incen-tivo à cultura da diversidade, do respeito e de valo-rização aos direitos humanos. É necessário agir.

2 – O Estado é, na relação com a população, oprimeiro promotor do racismo. Seja através dos ser-viços de saúde pública, precários como são; atravésdos serviços educacionais, degradados e segregató-rios como estão e são; ou através da segurança pú-blica e sua força repressiva, seletiva, violenta e letal,como sabemos. O enfrentamento ao racismo estrutu-ral e institucional é o primeiro passo para a constru-ção de um imaginário e uma cultura de respeito àsdiferenças, valorização da diversidade cultural, reli-giosa, política e aos valores dos direitos humanos.

Educação e mobilização para o combate aoracismo

• Ação emergencial de práticas de Educação Po-pular para o combate ao racismo e o fomentoda diversidade e dos direitos humanos emtodo país através do fortalecimento de orga-nizações negras que desenvolvem projetos nocampo educacional. Também é fundamentalfomentar a ampliação e massificação de inici-ativas governamentais tais como os programasJustiça Comunitária e Casa de Direitos (Planode Enfrentamento à Violência nas Periferias Urba-nas), Pontos de Cultura, Casas de Cultura, en-tre outros.

• Criação do Fundo para Reparação Histórica eHumanitária para os Descendentes de Escra-

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CARTA-COMPROMISSO DE LUCIANA GENRO COM O MOVIMENTO NEGRO 81

vizados e Indígenas (Previsto pela Declaraçãode Durban – África – 2001)

• Campanha Nacional de Mobilização pelaPrática da Lei 10639 nas escolas públicas dopaís; Criação de instrumentos de acompanha-mento e cobrança da execução da Lei anteas administrações Públicas; Ampliação para10% do PIB para Educação – Ação em conjuntocom movimento negro;

• Criação da Comissão Nacional da Verdade,Memória e Justiça para os Crimes da Escra-vidão e Crimes de hoje por parte do Estado– Que reúna pesquisadores, historiadores, an-tropólogos, economistas, religiosos, artistas emovimento negro para recontar a história e re-construir a memória nacional a partir da escra-vidão negro-indígena;

• Transformação do Plano Juventude Viva emPROGRAMA, para que avance para além deum apanhado de políticas pré-existentes, comdestinação de recursos equivalentes à gravi-dade do problema que se dispõe a enfrentar egarantia de autonomia de ação;

• Titulação de todos os territórios quilombo-las e indígenas e emergencial retomada dareforma agrária – Casos emblemáticos: Qui-lombo do Rio dos Macacos Salvador/BA ePovo Guarani Kaiowas – MS;

• Promoção de espaços de diálogo, audiências econsultas públicas permanentes, abertas e li-vres, por parte do governo no que diz respeitoà temática do combate ao racismo;

• Mudança na Lei de Cotas Federal: que o per-centual de negras/os por estado incida sobre100% das vagas;

• Politica de Permanência estudantil para alunoscotistas e cotas na pós-graduação;

• Pronunciamento em rede nacional - sobre oproblema do racismo enquanto estruturantedas desigualdades e herança cultural a sercombatida; Divulgação da agenda de ações an-tirracistas;

• Força tarefa de todos os ministérios no sentidode, de maneira articulada, assumir o genocí-dio da juventude negra como uma realidadee a co-responsabilidade do Estado. A partir

daí, construir espaços de elaboração de açõesinterministeriais de enfrentamento ao genocí-dio; Estipular data para apresentação de metase resultados das ações. Isso deve ser tratadocom prioridade de governo.

Sobre a violência racista

• Regulamentação do artigo 5o. da Constitui-ção brasileira que define o racismo como crimeinafiançável e imprescritível; Tornar Racismocomo Crime de Lesa Humanidade;

• Desmilitarização das polícias e imediato de-bate público sobre um novo modelo de segu-rança pública – comunitária, humanizada e an-tirracista;

• Não aprovação de leis “anti-terror” que cri-minalizem movimentos sociais e determinadosperfis de grupos;

• Pela revogação imediata da Portaria Norma-tiva 3461/13, publicada pelo Ministério da De-fesa, que disciplina a atuação das Forças Arma-das em ações de segurança pública e que insti-tui o Manual de Garantia da Lei e da Ordem(GLO), que atribui poder de polícia às três For-ças Armadas, mediante ordem da presidenteda República;

• Aprovação do PL 4471 que prevê o fim dos“autos de resistência” em todo país;

• Fim da revista vexatória;

• Federalização dos crimes cometidos por poli-ciais civis e militares – Caso emblemáticos doscrimes de maio de 2006 em São Paulo;

• Formulação de um projeto que prevê a res-ponsabilização penal de racismo e assassinatospromovidos por policiais;

• Política de apoio psicossocial para familiaresde vítimas do Estado;

• Indenização para familiares de vítimas do Es-tado;

• Imediato mutirão do Judiciário para revisão depenas dos presos;

• Chega de prisões! Pelo fim da política do en-carceramento em massa;

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82 CARTA-COMPROMISSO DE LUCIANA GENRO COM O MOVIMENTO NEGRO

• Pelo direito democrático às manifestações li-vres e autônomas, sem necessidade de tutela,acordo ou aviso prévio a instituições repressi-vas do Estado. Pelo direito à LIVRE manifesta-ção, sempre garantido o pressuposto da digni-dade humana;

Política Internacional

• É obrigação do Estado Brasileiro acolher e in-tegrar o povo Haitiano, bem como todo o povodas Américas e da África, que vierem ao paísna condição de refugiados;

• Pela retirada das Tropas Brasileiras do Haiti,por uma saída política, soberana da crise dopovo Haitiano e a garantia de ajuda humani-tária.

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CONTRIBUIÇÃO DA JUVENTUDE 83

Contribuição da JuventudeApós a atividade “Bate Papo das Juventudes com Luciana Genro” os movimentos organizaram a construção deuma síntese das reivindicações da Juventude. O texto abaixo representa essa contribuição, que foi incorporadacomo tal ao programa de governo, pela Coordenação de Campanha.

O que eu consigo ver é só um terço do problemaÉ o Sistema que tem que mudar

Não se pode parar de lutarSenão não muda

A Juventude tem que estar a fimTem que se unir

O abuso do trabalho infantil, a ignorânciaSó faz destruir a esperança

Na TV o que eles falam sobre o jovem não é sérioDeixa ele viver! É o que liga!

(Charlie Brown Jr.)

Apresentação

Em diferentes momentos da história, o Brasil semprepôde contar com a mobilização da juventude para al-cançar vitórias. A força e a coragem dos jovens brasi-leiros foram e são fundamentais para concretizar asmudanças no país.

Segundo a ONU, existem atualmente 1,8 bilhãode pessoas no mundo com idade entre 10 e 24 anos,constituindo a maior população de jovens da histó-ria. No Brasil, segundo o Censo 2010 do IBGE, temos51,3 milhões de jovens, o que corresponde a 26,1%do total da população brasileira. Destes, mais de80% vive nas zonas urbanas.

As contradições que afetam a vida da juventudetem servido como substância para o questionamentodas velhas estruturas políticas e econômicas. No anode 2011, foram muitos os exemplos de mobilizaçõesjuvenis. No Chile, os jovens conhecidos como “pin-guins” foram às ruas para protestar contra a mercan-tilização da educação universitária. Na Europa e nosEstados Unidos, os jovens “indignados” reagiram àcrise do sistema capitalista que retira direitos da ju-ventude e eleva as taxas de desemprego. No mundoárabe, a juventude foi parte dos milhões que derru-baram as ditaduras nesta região. E em junho de 2013,chegou a vez do Brasil. Com o protagonismo dos jo-vens, o país vivenciou um dos maiores levantes desua história recente. A pressão popular emparedougovernos e derrubou o aumento das tarifas do trans-porte coletivo. Com as Jornadas de Junho, o Brasilentrava para a rota dos jovens indignados mundiais.

Estas mobilizações têm em comum a indignaçãocom a ausência de uma perspectiva de futuro paraos jovens. Os diplomas escolares não dão mais a cer-teza de emprego. A desigualdade social é gritante.Segundo a OIT (Organização Internacional do Tra-balho), cerca de 1% da população acumula tanta ri-queza quanto os 3,5 bilhões de pessoas mais pobresdo planeta. E em um mundo com tamanha injustiça,a juventude está tomando as rédeas para a constru-ção de mudanças que apontam para um novo futuro.

Segundo pesquisa da Secretaria Nacional de Ju-ventude, quando questionados sobre se é possívelmudar o mundo, nove em cada dez jovens brasi-leiros responderam que sim. Dentre estes dez, seteacreditam que podem mudar muito. O caminhoeleito pela maioria (45%) da juventude para mudaras coisas no Brasil é “a participação e mobilizaçãonas ruas e ações diretas”. Em seguida, a opção é pela“atuação em associações ou coletivos que se organi-zam por alguma causa (44%)”. A pesquisa mostrouainda que a maioria valoriza a política, 83% acha queela é muito ou mais ou menos importante, contraapenas 16% que acha que ela não é importante.

A coleta de dados dessa pesquisa foi feita de abrila maio de 2013, antes das Jornadas de Junho, masaqui as grandes mobilizações servem como a provaconcreta de que a juventude tomou para si a tarefa delutar pelos seus direitos. Isso pode ser visto nos 55%de jovens que revelam terem tirado título de eleitorantes da idade obrigatória (18 anos). Ocupar a polí-tica é uma escolha daqueles que já não se sentem re-presentados neste âmbito. A pesquisa ainda revela

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84 CONTRIBUIÇÃO DA JUVENTUDE

que seis em cada sete jovens declararam que partici-pam, já participaram ou gostariam de participar decoletivos e movimentos sociais.

A juventude brasileira não é homogênea, e, sim,diversa e com grande desigualdade, seja na esferasocial, econômica ou cultural. Seria melhor usarmoso termo ’juventudes’, já que a vida juvenil é com-posta por uma pluralidade de elementos que se des-dobram em múltiplas trajetórias, estéticas e sonhos.Nesse mesmo sentido, os jovens enquanto “sujeitosde direitos”, demandam políticas públicas específi-cas. Além disso, têm como sua maior preocupação aviolência (43%) e o emprego (34%). A preocupaçãocom saúde e educação afetam 26% e 23%, respecti-vamente.

Quando questionados sobre o que o Governo de-veria fazer para melhorar a situação da educação,da saúde e enfrentar a violência, as respostas foram:“investir nos professores” (55%), “contratação de no-vos profissionais” para a saúde (60%) e “combate àcorrupção e à má conduta de policiais” (51%).

Nesse novo momento que se abriu na política na-cional, não podemos repetir as fórmulas e os velhosbordões. A juventude pede novas respostas e ou-sadia nas ações. Os jovens vêm construindo novase criativas formas de atuar, de participar do debatepolítico e de interferir diretamente no rumo do país.Disposição não falta e o recado é claro: acordamospara lutar por mais direitos.

Dessa forma, a plataforma apresentada abaixo éuma expressão das bandeiras das Jornadas de Junhode 2013. A força das ruas renovou e ampliou diver-sas bandeiras. Sistematizamos nossas reivindicaçõesem 7 grandes pontos.

Educação

Segundo dados da pesquisa da Secretaria Nacionalde Juventude, a desigualdade social existente na so-ciedade se reflete também no nível de formação eacesso ao ensino formal no Brasil. Entre classes debaixa renda, cerca de 43% foram apenas até o ensinofundamental, 54% até o médio e 4% até o superior.Nas classes de renda média, os números já se dife-renciam, são 23%, 64% e 13%, respectivamente. En-quanto, na classe alta, os números são 10% até o en-sino fundamental, 53% até o ensino médio e 37% atéo ensino superior. Segundo a PNAD (Pesquisa Na-cional por Amostra de Domicílios) de 2012, o Bra-sil tem 13,2 milhões de analfabetos com 15 anos oumais. A erradicação do analfabetismo continua a ser

um grande desafio.Se na geração de nossos pais apenas 25% tinham

alcançado o Ensino Médio, este número atualmentecresceu para 59% . Discute-se muito que o EnsinoMédio deve ser reformado, isso porque não é se-gredo para ninguém que ele não cumpre as duasprincipais funções que se propõe: não prepara paraa continuação dos estudos do ensino superior (nocaso do Ensino Médio regular) e nem para o mercadode trabalho (no caso no Ensino Técnico profissiona-lizante).

Porém, reformas como o Politécnico no RioGrande do Sul tem contribuído para um maior su-cateamento da educação, fazendo subir artificial-mente as notas do ensino no Estado por meio deuma mudança no sistema de atribuição de concei-tos. Além disso, tem sido implantado de cima parabaixo, sem consulta a alunos e professores. Emmolde semelhante, tem sido implantado o ETIM nasETECs, que agora integra o médio ao técnico, di-minuindo a carga de matérias essenciais para a for-mação acadêmica como História, Geografia e Portu-guês, e substituindo-as por matérias do Técnico, oque resolve parcialmente um dos problemas, o daprofissionalização, mas agrava outros: dificulta oacesso ao ensino Superior e debilita a formação hu-mana e crítica.

Muitos governos vão ainda mais longe: abrema escola para a iniciativa privada e a transformamem vitrine para a venda de cursos pagos de gruposcomo o SENAC, Fundação Roberto Marinho, Oi, etc.Achamos que a educação brasileira precisa de muitomais, e isso tem de ser construído por meio de umprocesso que escute educador, demais funcionáriosda rede de ensino, aluno e comunidade. E estes pos-sam opinar e formular um novo Sistema Educacio-nal. A escola pública deve ser mais antenada, demo-crática, inclusiva e aberta para a comunidade, conec-tada com as novas ferramentas tecnológicas e capazde preparar o jovem para uma inserção ativa e críticana realidade social do país e do mundo.

Em 2003, apenas 6% dos jovens de 15 a 24 anos ti-nham Ensino Superior, número que hoje está na casados 10%. Mesmo que as taxas de ingresso ao EnsinoSuperior tenham aumentado nos últimos 10 anos, eleainda é restrito e desigual. O vestibular funcionacomo um funil, através do qual se revelam as dife-renças entre o ensino público regular e o ensino pri-vado, de alto custo e padrão. A falta de investimentoadequado em educação coloca as escolas públicasem situações precárias e dificultam o acesso do jo-

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CONTRIBUIÇÃO DA JUVENTUDE 85

vem de baixa renda à universidade pública. Assim,por vezes ele ingressa em uma universidade privadade qualidade inferior e tem de começar a trabalharpara pagar mensalidades caríssimas.

Essa realidade precisa mudar. Defendemos a am-pliação do investimento em educação pública para10% do PIB, imediatamente. E precisamos avançarna discussão da universalização do ensino superiorpúblico. Devemos garantir, assim como em váriosoutros países, o livre acesso a uma universidade,sem o vestibular.

O atual contexto da educação brasileira revelao fortalecimento da educação privada, em especial,com a expansão desenfreada de vagas no ensino su-perior privado, representando mais de 70% do to-tal das matrículas. A partir dos incentivos dos últi-mos governos, com recursos públicos e isenções fis-cais, aprofundou-se um processo de financeirizaçãoda educação superior com formação de megaempre-sas do ramo. Enquanto isso, o ensino público emseus diversos níveis sofre com a falta de investimen-tos, estrutura, corpo técnico e docente. Ganha cen-tralidade, assim, o debate sobre o financiamento pú-blico da educação. Em 2013, o Brasil investiu cercade 6,4% de seu PIB na área. Não é de hoje que osmovimentos de educação exigem o investimento de10% das riquezas produzidas no país em educaçãopública, como forma de garantir qualidade, estru-tura, expansão, permanência e acesso.

Nos últimos anos, a principal arena de disputafoi o debate em torno do novo Plano Nacional deEducação (PNE), documento que rege a educaçãobrasileira em um período de 10 anos. Após anosde tramitação no Congresso, em que os movimen-tos de educação fizeram dura luta em diversos pon-tos, em especial na parte do financiamento, o textoaprovado é altamente contraditório, abrindo brechaspara o maior fortalecimento da educação privada,principalmente no ensino superior. Da parte do go-verno federal, revela-se um apoio acrítico a progra-mas como o Prouni e Pronatec. Estes programas sãocontraditórios em sua essência, uma vez que, se têmo mérito de integrar milhares de jovens ao ensinosuperior e ao técnico, têm igualmente a função degarantir altas taxas de lucro aos tubarões do ensinoprivado, às custas do dinheiro público. Eles devemser vistos apenas como emergenciais, não podendoser considerados políticas de Estado, cabendo ao go-verno ter como meta que esses estudantes estejam noensino público, tornando possível a universalizaçãodo acesso.

Ao mesmo tempo, o texto do PNE avança em di-versos pontos, como as metas de universalização daeducação básica, implementação da gestão democrá-tica nas escolas, erradicação do analfabetismo infan-til, estabelecimento de um padrão mínimo de quali-dade (com o Custo Aluno-Qualidade), entre outros.

Nosso compromisso é com o fortalecimento daeducação pública. Em um governo do PSOL, lutare-mos para conquistar a universalização da educaçãoem todos os níveis, com qualidade, laicidade e comgarantia de retorno para a sociedade.

Para garantir uma formação emancipatória, pre-cisamos de uma revolução pedagógica em todos osníveis de ensino, com ampliação das políticas de as-sistência estudantil e de democracia e participação.

Financiamento e Metas da Educação

• Garantia de 10% do PIB para educação pública;

• Erradicação do analfabetismo e do analfabe-tismo funcional;

• Por uma política de expansão de vagas no en-sino superior público, com garantia de inves-timentos suficientes para termos qualidade noensino e estrutura adequada nas IFEs, a fim dese atingir a universalidade no acesso e o fim dovestibular.

Ensino Fundamental e médio

• Por uma reforma no ensino médio, fruto deamplo debate democrático;

• Por uma educação laica;

• Gestão democrática das escolas: eleições di-retas com voto paritário para diretor, funcio-namento democrático dos conselhos escolarescom direito a voz dos estudantes; livre orga-nização nos grêmios estudantis, sem interven-ções do corpo de direção e coordenação;

• Formação continuada dos professores e funci-onários de rede educacional;

• Infraestrutura: cadeiras, mesas e lousa são ob-jetos básicos que ainda não existem em muitasescolas! Por mais bibliotecas, refeitórios, labo-ratórios equipados;

• Incentivo à produção cultural e à prática espor-tiva com infraestrutura adequada;

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86 CONTRIBUIÇÃO DA JUVENTUDE

• Reformulação da grade curricular buscando ainterdisciplinaridade;

• Levar o debate da orientação sexual e da iden-tidade de gênero, fortalecendo assim uma edu-cação humanista e não sexista/lgbtfóbica;

• Em defesa da autonomia pedagógica;

Ensino Técnico

• Melhor infraestrutura com laboratórios e ma-quinários de ponta, e frequente manutenção;

• Professores valorizados com plano de carreiraem dia, o que deve acontecer em todos os ní-veis do ensino;

• Assistência estudantil para permanência dosestudantes nas escolas;

• Bandejão estruturado para todas as escolas emtempo integral, a preços acessíveis e comida dequalidade;

• Ensino Técnico sensível às especificidades decada região.

Democracia nas universidades

• Eleições diretas e paritárias para reitores;

• Fim das listas tríplices! Em defesa da autono-mia universitária;

• Paridade nos conselhos departamentais e ge-rais;

• Liberdade de organização e manifestação polí-tica.

Universidades particulares

• Gestões democráticas que garantam a partici-pação estudantil;

• Pela liberdade de organização do movimentoestudantil;

• Congelamento das mensalidades, contra o au-mento;

• Regulamentação do Ensino Superior Privado;

• Contra a mercantilização do ensino! Fim da fi-nanceirização das Universidades;

• Pela regulamentação da Assistência Estudantilnas instituições privadas! Que as universida-des privadas tenham bibliotecas, restaurantesuniversitários, moradia e bolsas.

Universidades públicas

• Financiamento destinado para a conclusão dasobras inacabadas do REUNI;

• Valorização de docentes e trabalhadores técni-cos administrativos;

• Contratação de mais docentes com dedicaçãoexclusiva;

• Em defesa dos Hospitais Universitários 100%públicos! Contra a EBSERH;

Assistência estudantil

• Fortalecimento da Assistência Estudantil coma valorização do PNAES! Queremos R$2,5 bi-lhões com uma política de reajuste anual.

• Ampliação das políticas de permanência emtodos os campi, incluindo construção de mo-radias, transporte gratuito, circular interno eônibus intercampi, restaurantes universitários,creches e bolsas de estudos;

• Pela criação de Pró-reitorias de Acesso e Per-manência, com dotação orçamentária própria,vinculada ao orçamento das universidades, ge-rida por um conselho paritário como forma degarantir uma política institucional de perma-nência estudantil democrática e isonômica en-tre os diversos campi;

• Que os critérios de concessão de bolsas sejamsocioeconômicos, não meritocráticos;

• Gestão democrática das moradias através deConselhos Paritários;

• Gratuidade de todo o material didático neces-sário. Disponibilização dos textos exigidos nasBibliotecas e pela internet;

• Direito à licença-maternidade e paternidadepara as alunas e alunos com bolsas; extensãodos horários e prazos para entregas de traba-lhos e provas;

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CONTRIBUIÇÃO DA JUVENTUDE 87

Acessibilidade

• Adaptação dos ambientes (rampas, barras deapoio, corrimãos, pisos, sinalização tátil e ele-vadores) com planejamento adequado;

• Disponibilização de livros em Braille nas bibli-otecas;

• Aquisição de computadores com interface deacessibilidade, impressora braille, lupa eletrô-nica e outros materiais didáticos e pedagógi-cos;

• Intérpretes habilitados com as libras.

Cotas JÁ!

• Consolidação da reserva de vagas para negrose estudantes oriundos de escola pública;

• Que haja desvinculação das cotas raciais e so-ciais;

• Expansão de vagas em cursos noturnos, comgarantia de financiamento e aumento de políti-cas de permanência estudantil.

Juventude e Trabalho

O emprego é uma das principais preocupações dajuventude brasileira. A pressão para a entrada nomercado de trabalho é muito grande sobre os jovens.Seja para complementar a renda da família, garantirsua autonomia financeira ou financiar seu estudos.A ampla maioria dos jovens tem sua primeira inser-ção no mundo do trabalho mesmo antes de comple-tar 18 anos de idade (65%). No campo, 47% dos jo-vens entram no mercado de trabalho antes dos 15anos.

No mundo, metade da força de trabalho jovemestá desempregada ou subempregada, de acordocom dados da ONU. O fato é que a entrada dos jo-vens no mercado de trabalho é fortemente marcadapelas desigualdades sociais. O trabalho é mais des-gastante entre os jovens das famílias mais pobres.São eles os mais afetados pelo desemprego e pelaspiores condições de trabalho.

Alguns dados da OIT são reveladores dessa rea-lidade: nas classes com renda alta, 65% dos jovensestão ou já estiveram em empregos formais e 16%apenas em informais. Nas classes de renda baixa,22% ocupa ou ocupou postos formais e 32% são em-pregados informais. Sem contar que os jovens de cor

branca têm 30% mais chances de ter emprego formaldo que jovens negros. E os homens jovens possuem25% mais chances de ter uma ocupação formal doque as mulheres jovens.

Na juventude, são poucas as vezes em que o tra-balho é exercido nas condições protegidas pela Leide Aprendizagem. Muitas vezes, o que há é um tipode exploração do trabalho infantil e adolescente. Deacordo com dados do Ministério do Trabalho, 45 milpessoas foram resgatadas de condições degradantesde trabalho desde 1995. A OIT estima que em 2012,cerca de 20,9 milhões de pessoas foram vítimas detrabalho forçado no mundo, número que inclui asvítimas de tráfico de seres humanos para exploraçãolaboral e sexual. No Brasil, segundo a Divisão de Fis-calização para Erradicação do Trabalho Escravo (De-trae), órgão do Ministério do Trabalho e Emprego(MTE), 2.750 trabalhadores foram encontrados emcondições análogas à escravidão no ano de 2012.

Por isso propomos:

• Políticas que estimulem o ingresso dos jovensno mercado de trabalho, assegurando proteçãoda legislação trabalhista e previdenciária;

• Fiscalização do cumprimento da Lei de Apren-dizagem, contra os empregos precários e ex-ploratórios;

• Por uma maior fiscalização do cumprimentoda Lei do Estágio para jovens estudantes;

• Criação de empregos com igualdade de opor-tunidades entre homens e mulheres;

• Pela remuneração dos jovens que trabalhemnos megaeventos, contra o trabalho voluntário.

Violência e Desmilitarização da Polícia

Como revelamos acima, quando os jovens são ques-tionados sobre o que mais lhes preocupam, a mai-oria (43%) mencionou a violência. Tal dado é re-velador de uma realidade cruel em nosso país. Aviolência hoje é, infelizmente, a marca de uma ge-ração. Ela atinge todos os brasileiros e brasileiras,de todas as idades e classes sociais, em todo o ter-ritório do país. Porém, a vítima mais recorrente daviolência, segundo os números oficiais, tem perfilmuito bem definido: jovem, negro e pobre. É ab-solutamente impossível pensar qualquer política desegurança para o Brasil sem tratar dessa parcela dapopulação que sofre com o racismo cotidiano e insti-tucional por parte da polícia.

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De 1980 para 2011, o índice de morte de jovensnegros cresceu na ordem de 207,9% no Brasil. Dadosdo Ministério da Saúde mostram que mais da me-tade (53,3%) dos 49.932 mortos por homicídios em2012 eram jovens. Desses, 76,6% negros (pretos epardos) e 91,3% do sexo masculino. O programa Ju-ventude Viva do Governo Federal revelou que, em2012, 142 municípios brasileiros, distribuídos em 26estados e no Distrito Federal, incluindo todas as ca-pitais, concentravam 70% dos homicídios contra jo-vens negros.

É possível afirmar que os homicídios são hoje aprincipal causa de morte de jovens de 15 a 29 anosno Brasil e atingem especialmente os jovens negrosdo sexo masculino, moradores das periferias e áreasmetropolitanas dos grandes centros urbanos. Paraesses, a polícia é sinônimo de medo e insegurança.

Pesquisa da Fundação Getúlio Vargas, no se-gundo semestre de 2013, apontou que 70% das pes-soas não confiam no trabalho da polícia. Tal dadose soma ao de uma pesquisa recente da Anistia In-ternacional: cerca de 80% dos brasileiros temem sertorturados pela polícia caso sejam presos. A brutalrepressão às manifestações desde junho do ano pas-sado e as mortes de Amarildo, DG, Claúdia, entreoutros, trouxeram à tona o debate sobre a reformado modelo policial vigente e a necessária desmilita-rização da polícia.

A solução para a violência no Brasil não é pren-der mais, não é endurecer o sistema penal. O Brasiljá prende muito, somos o terceiro país no rankingmundial que mais encarcera, ficamos atrás apenasda China e dos Estado Unidos. Hoje temos um to-tal de 712 mil presos, são 358 presos para cada 100mil habitantes. Dados do IPEA revelam que, em2008, os indivíduos entre 18 a 29 anos constituíam59,6% do total de presos do país. Os casos como o dePedrinhas, no Maranhão, e do Presídio Central dePorto Alegre demonstram que a política de encarce-ramento no país é insustentável.

Em todas as situações acima descritas os jovensnegros são os mais penalizados. É latente a neces-sidade de combater com veemência o genocídio dajuventude negra e pobre no Brasil.

Por isso propomos:

• Fim dos Autos de Resistência e extinçãoda categoria “resistência seguida de morte”,substituindo-a por homicídio/morte decor-rente de intervenção policial;

• Contra a Redução da Maioridade Penal;

• Desmilitarização da polícia: alterar a naturezada atividade policial; extinguir a justiça mili-tar para as polícias militares; revisar regimen-tos, códigos disciplinares e normas que regu-lamentem as polícias (civil, militar, federal),adequando-os efetivamente à Constituição Fe-deral de 1988; unificação das polícias estaduaisem único caráter de polícia civil, conforme pre-visto na PEC 51/2013;

• O direito à organização política dos trabalha-dores da Segurança Pública;

• Por um ciclo completo do trabalho policial(preventivo, ostensivo, investigativo) pautadopelos direitos humanos;

• Pela presença do Estado nas periferias atravésda garantia dos direitos. Contra a militarizaçãodas cidades;

• Contra a privatização das prisões.

Direito à Cidade

Um dos mais graves problemas sociais do Brasil é afalta de moradia. O Brasil está entre os países commaior déficit habitacional do mundo, ao lado da Ín-dia e África do Sul. O último estudo feito pela Fun-dação João Pinheiro mostra que o déficit habitacio-nal quantitativo no Brasil é de 6.940.691 famílias, oque representa cerca de 22 milhões de pessoas. Ossem-teto são, portanto, mais de 10% da populaçãodo país. O problema também se completa com ochamado déficit habitacional qualitativo, que se re-fere à inadequação das condições básicas para umavida digna. Este número é maior que o anterior: são15.597.624 famílias nesta situação, isto é, cerca de 48milhões de pessoas.

Mas ao contrário do que parece, não faltam casasno Brasil. Existem 6.052.000 imóveis vazios no país,85% deles teriam condições de serem ocupados pormoradores. Ou seja, há tanta casa sem gente quantogente sem casa.

Ainda, muitas vezes a juventude da periferia éobrigada pela especulação imobiliária a ocupar re-giões da cidade com grande vulnerabilidade ambi-ental, como encostas de morros, margens de rios eáreas de manaciais, colocando em risco suas pró-prias vidas e também o meio ambiente. Nesse sen-tido, é de extrema importância que essas áreas demaior vulnerabilidade ambiental tenham um plano

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CONTRIBUIÇÃO DA JUVENTUDE 89

de manejo adequado e que também leve em consi-deração as necessidades da população que habitamessas regiões, sendo elaborado de forma participa-tiva e visando o equilíbrio entre a ocupação humanae a preservação do meio ambiente.

Existe grande deficiência do poder público emgarantir condições mínimas de infraestrutura, comocoleta de lixo, coleta e tratamento correto de esgotoe a água tratada, o que contribui para a degradaçãodo meio ambiente – contaminando o solo, as águas eo ar – e acarretando em graves problemas de saúdedevido à falta de saneamento básico. No Brasil, porexemplo, apenas 61,76% dos brasileiros são atendi-dos por rede coletora de esgoto (que não necessari-amente é tratado) e 45% possuem acesso à água deforma satisfatória, segundo a Agência Nacional deÁguas. É preciso ampliar o acesso ao saneamentobásico para melhorar a qualidade de vida dos bra-sileiros e impedir a contaminação do meio ambientedevido ao descarte incorreto.

É nessa cidade desigual e opressora que vive amaioria da juventude brasileira. Para eles, a cidade écomo um grande palco de possibilidades, de encon-tros, desencontros e descobertas. Grafitar muros, an-dar de skate, praticar esportes, se encontrar em pra-ças e bares são formas de conquistar o espaços e deir definindo suas múltiplas identidades.

As cidades devem possibilitar aos jovens o acessoà educação, ao trabalho, ao transporte público, à cul-tura e ao lazer de forma descentralizada, criando no-vas rotas e possibilidades que façam o espaço urbanorealmente democrático, saudável e diverso. Mas ofato é que no sistema capitalista isso vai acontecendode maneira bastante desigual. Uma boa parte da ju-ventude vive em espaços públicos precários e vio-lentos. E a distância por vezes torna outros espaçosinacessíveis.

As tantas mobilizações pelo país em junho de2013 evidenciaram o problema do transporte nasprincipais cidades, em geral muito caro, de péssimaqualidade e superlotado. É sabido que o transportecoletivo é um filão bastante lucrativo para o empre-sariado. Em muitas cidades, existem verdadeirasmáfias dos transportes. São cartéis que controlamos preços e nivelam por baixo o oferecimento do ser-viço.

Em várias cidades do Brasil, após muita luta dosjovens, existe o meio-passe estudantil, que na prá-tica é o desconto de 50% no preço da tarifa para osestudantes. Mas há duas limitações desse projetoque precisam ser modificadas. A primeira delas é

que precisamos de uma meia passagem de verdade,que permita ao jovem estudante utilizar em todosos dias da semana, inclusive feriados. Hoje em al-gumas cidades só é permitido usá-lo de segunda asexta. Não é porque não tem aula que deixamos deser alunos. Os estudantes devem poder usufruir domeio-passe também para atividades culturais e delazer. A segunda é que os jovens estudantes de cur-sinhos pré-universitários ou pré-vestibulares devemtambém ter acesso ao beneficio, afinal, também sãoestudantes.

Outro grave problema do sistema de transportepúblico do país é a ausência de transporte coletivo24 horas. Tal fato compromete não só a mobilidadee a segurança dos jovens que circulam pela cidade,mas também as mais diferentes categorias que tra-balham no turno da madrugada.

Por fim, também precisamos ampliar propostasque incentivem o uso da bicicleta, que além de serum meio de transporte excelente para pequenas emédias distâncias, não polui, não emite gases, éeconômica. Para incentivar o uso, as ciclovias sãofundamentais. Nossa vereadora do Juntos em PortoAlegre, Fernanda Melchionna, elaborou projeto queobriga as empresas de transporte coletivo de PortoAlegre a disponibilizarem bike racks (suporte insta-lado na parte dianteira dos coletivos) nos ônibus, fa-cilitando a locomoção para pessoas que percorremgrandes distâncias e uma segurança em caso de im-previstos. Ela também é autora de outro projeto queautoriza a colocação de bicicletários nos estabeleci-mentos comerciais. Iniciativas como essas são im-portantes para incentivar o uso de bicicletas.

Por isso propomos:

• Tarifa zero no transporte público;

• Garantia de meia passagem estudantil todos osdias da semana, inclusive feriados. E garantiade meia passagem para os estudantes de cursi-nho pré- universitários;

• Transporte Público 24 horas;

• Investimento massivo na construção de malhaferroviária, recuperação de trechos abandona-dos de trens e incentivo à criação e expansãode trechos de metrôs nas grandes e médias ci-dades;

• Desenvolver e manter uma boa infraestruturapara locomoção de pedestres e pessoas com de-ficiências, com calçadas e travessias adequa-das;

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90 CONTRIBUIÇÃO DA JUVENTUDE

• Por um plano de mobilidade urbana que leveem consideração a bicicleta enquanto um meiode transporte através, por exemplo, da criaçãode ciclovias seguras, com funcionamento diá-rio e que alcancem todas as zonas das cidades,além da integração da bicicleta com outros mo-dais de transporte público;

• Pela Reforma Urbana! Desapropriação dosimóveis ociosos e dos ocupados nos centros ur-banos por movimentos de luta por moradia,como MTST e a Frente de Resistência Urbana.Não às remoções e demais violações dos Direi-tos Humanos;

• Contra a privatização dos espaços públicos e ocercamento de praças e parques;

• Incentivar e assegurar a participação popularno debate sobre planejamento urbano;

• Elaboração participativa de planos de manejoque visem o uso sustentável dos recursos na-turais e atender às necessidades da população;

• Ampliação ao acesso a saneamento básico comdestinação adequada de resíduos sólidos;

• Ampliação nos sistemas de captação e distri-buição de água tratada.

Democratização da Comunicação, da In-formação e da Cultura

Segundo a pesquisa da Secretaria Nacional de Ju-ventude, 83% dos jovens usam a televisão abertacomo meio de informação, 56% a Internet, 23% osjornais impressos, 21% as rádios comerciais e 17% aTV paga. Computador e Internet são usados por 75%dos jovens e 89% têm celular. Enquanto a TV aberta éo principal canal de informação dos jovens de baixarenda (91%), a Internet é o meio de informação maisacessado entre os mais ricos (73%).

Mesmo dentro das diferenças sociais de acesso àInternet, há um crescimento expressivo do seu uso.A cada dia estamos mais conectados, seja pelas re-des socias, pelos smartphones etc. Baixamos músi-cas, filmes, séries e criamos nossas próprias formasde nos expressar e de compartilhar conteúdos e co-nhecimentos. Tudo é muito mais dinâmico. Comuma câmera digital, celular ou tablet na mão, os jo-vens vão reinventando as formas de se comunicar emuitas ideias novas surgem.

A juventude é, sem dúvida, quem mais utilizaas novas formas de comunicação no mundo. Dessaforma, um dos grandes desafios políticos para a soci-edade brasileira é o de democratizar o acesso a essesinstrumentos, tornando-os acessíveis a toda a popu-lação. Afinal, o direito à informação e à comunicaçãoestá garantido na Constituição Federal.

Mas não é apenas o acesso às informações produ-zidas pelos mais diferentes meios e suportes de co-municação que precisa ser democratizado, é precisotambém criar políticas que incentivem a criação denovos meios e instrumentos de comunicação capa-zes de garantir a expressão da pluralidade de vozes.

Todos os coletivos e indivíduos podem fazer suaparte na democratização das informações. Ferra-mentas como blogs, vídeos e as redes sociais sãomuito importantes na produção de ideias e opiniõeslivres, pois fortalecem a produção independente e asdiversidades regionais. A liberdade de informação ecomunicação passa pela livre produção de ideias.

Algumas das pautas que a juventude junto a ou-tros movimentos vem construindo vão da digitaliza-ção dos ambientes educacionais, o incentivo às no-vas ferramentas de comunicação comunitária de Rá-dio e TV, mídias livres, cultura digital, até o incentivoao desenvolvimento e utilização de softwares livres.

A defesa da liberdade da Internet, da privacidadeàs informações do cidadão e da máxima transparên-cia dos governos devem ser bandeiras permanentesdos jovens. Na era da informação digital e do mundoconectado em rede, essas postulações nunca foramtão importantes. Essa é a chave entre as lutas da ju-ventude indignada no mundo e no Brasil com ati-vistas como Edward Snowden, Chelsea Manning eJulian Assange.

No sentido de promover liberdade e privacidadena Internet, a aprovação do Marco Civil trouxe avan-ços. A defesa do princípio da neutralidade na redeé fundamental. Porém, algumas ressalvas são im-portantes. A versão do projeto sancionado pela pre-sidenta Dilma foi uma mediação com as empresasde telecomunicação e abre brechas para violações doprincípio da neutralidade por parte das empresas.No artigo 15, o projeto aprovado regulamenta que asempresas podem ter a guarda dos registros de acessoa aplicações da Internet por 6 meses, constituindouma séria violação de privacidade. Tal fato foi cri-ticado por vários ativistas que participaram do pro-cesso de criação do Marco Civil. Houve uma cam-panha pelo veto do artigo que não foi atendida pelapresidenta Dilma.

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Além disso sempre foi comum o choque entra arealidade e a versão midiática dos fatos, em espe-cial quando se trata da cobertura de manifestações.Nas Jornadas de Junho de 2013 ouviu-se novamenteo grito “A verdade é dura, a Rede Globo apoiou a di-tadura!”. Com esse grito os manifestantes queriamanular a suposta neutralidade de informações apre-sentada pela Globo. As grandes emissoras, em suamaioria, sempre foram um editorial a serviço dos in-teresses da classe dominante e dos governos destepaís. A grande mídia faz de tudo para favorecer ahegemonia dos donos do poder, reproduzindo este-reótipos e preconceitos.

Por outro lado, na periferia, os chamados gruposculturais funcionam como antídotos à dita “discri-minação por CEP”. Frequentemente estigmatizados,a cultura periférica raramente é divulgadas atravésdos grandes veículos de comunicação. A existên-cia de coletivos e grupos culturais amplia os espa-ços de experimentação, de criação estética, e vãoconstruindo laços de pertencimento que (re)afirmamidentidades. O Funk e o Hip-Hop, por exemplo, sur-gem como movimentos de resistência, de comunica-ção e de identidade. Fala-se da sua realidade paraela mesma. E constituíram-se como movimentos cul-turais importantes no processo de conscientizaçãoe mobilização desses jovens por direitos, seja ele osimples direito de existir.

Edi Rock, rapper e compositor brasileiro, chamaa atenção que para lutar contra o genocídio da pe-riferia deve-se prestar mais atenção aos coletivos decultura que ali se constituem. Neles se traduzem arealidade vivida por estes jovens. São eles os pro-tagonistas da vida real contando a sua própria re-alidade. As músicas, por exemplo, são o meio decomunicação encontrado por jovens para expressarde alguma forma aquilo que pensam, sentem e co-nhecem. É por isso que é tão importante estimular aprodução cultural que empodera seu povo. As polí-ticas públicas da cultura devem estar voltadas paraa criação de mecanismos que garantam a produçãoindependente (regional e nacional), para a garantiada veiculação nas tevês, rádios, Internet e cinemas,além de incentivos governamentais a sua produção.

A lei que reconhece o funk como cultura, apro-vada em 2009 no estado do Rio de Janeiro, foi umavanço. Mas, logo depois, a prefeitura do Rio deupoderes à PM para proibir os bailes funk na cidade.No início, a desculpa é que os bailes eram locais deação de traficantes, mas mesmo em comunidadeshoje “pacificadas”, os bailes continuam proibidos.

Por isso propomos:

• Fim do monopólio e do oligopólio nos meiosde comunicação;

• Por um novo marco regulatório para as comu-nicações no país;

• Regulamentação da publicidade estatal;

• Criação e garantia de instrumentos de partici-pação popular e controle social da mídia, in-clusive, da produção de conteúdo;

• Asilo para Snowden no Brasil. Asilar Snow-den no Brasil é dar uma demonstração de forçada cidadania e dos povos unidos pelos DireitosHumanos;

• Incentivo à lan-houses públicas nas cidades;

• Garantia da neutralidade na rede, direito à pri-vacidade, contra a guarda de registros por em-presas e governos;

• Universalizar a Internet no Brasil. Disponi-bilizar conexões velozes em todos os lugares,a qualquer momento, por preços razoáveis aoconsumidor e wi-fi livre e gratuito nos espaçospúblicos das cidades, nas escolas e nas univer-sidades;

• Ensino de computação/criptografia nas esco-las visando a segurança digital, inclusão digi-tal com software livre;

• Uso exclusivo de software livre nos órgãos go-vernamentais;

• Apoio à comunicação comunitária e popular,com garantia de recursos via publicidade go-vernamental. Contra a criminalização das rá-dios comunitárias e os veículos de mídia inde-pendentes e populares;

• Garantia da implementação do Marco Civil daInternet;

• Apoio à campanha Para Expressar a Liberdadee à aprovação do Projeto de Lei da Mídia De-mocrática, uma nova lei geral das comunica-ções;

• Pela criação de espaços de cultura e lazeraos jovens, como bibliotecas, praças, pistas deskate e ginásios esportivos, sobretudo para ajuventude das periferias;

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• Fomento a Planos Nacionais de incentivo à lei-tura;

• Fomento a estúdios públicos de gravação; rá-dios e TVs comunitárias: criação de estúdiospúblicos municipais, Rádios, WebRadios, TVse WebTVs, espaços para produções autônomaspara os movimentos de periferia poderem ca-nalizar o seu trabalho de forma independente;

• Presença dos movimentos culturais de perife-ria na programação dos centros culturais e ca-sas populares de cultura;

• Pela destinação de 2% do PIB para a Cultura.Em 2013 foram gastos 0,05% do PIB apenas;

• Meia-entrada é um direito da juventude! Pelofim da restrição de 40% da bilheteria para ameia entrada, aprovada pelo Estatuto da Ju-ventude.

Direitos Democráticos

A luta das mulheres

A luta das mulheres se potencializou no cenário polí-tico brasileiro, mesmo antes de junho de 2013. A na-cionalização das Marchas das Vadias - desde 2011 -colocou as pautas do feminismo de volta às manche-tes. As jornadas de junho, enfim, fortaleceram aindamais a luta das vadias. Nas grandes manifestaçõesdo ano passado, as mulheres, sobretudo as jovens,foram protagonistas e parte expressiva das mobili-zações.

Hoje podemos fazer um balanço mais completodo que significou o governo Dilma para as mulhe-res: a conquista simbólica de uma mulher ser a pri-meira presidenta do país deixou muito a desejar parao aprofundamento dos diretos das mulheres.

A questão da violência contra a mulher é emble-mática neste sentido. No Brasil, nos primeiros 4 me-ses de 2014, foram quase 1,7 mil denúncias de abusosexual contra crianças e adolescentes pelo Disque100. Sendo que cerca de 70% dos estupros aconte-cem em ambientes domésticos. Este é um problemasério, em que a maioria das vítimas são do gênerofeminino, mas que deve ser tratado como um pro-blema global. A campanha “não mereço ser estu-prada” tomou as redes para conscientizar a socie-dade, com grande adesão da juventude. É necessárioo fortalecimento de mecanismos, como a Lei Mariada Penha, que combatem à violência doméstica. Pre-cisamos também rechaçar projetos como o “Estatuto

do Nascituro”, que torna a gravidez, até em casos deestupros, obrigatória. E dá ao estuprador o status depai.

Nas universidades a precariedade das políticasde permanência estudantil atinge as mulheres demaneira muito especial, já que somos nós que sofre-mos com a dupla ou tripla jornada de trabalho, queinclui o estudo, o cuidado com a casa e, em muitoscasos, o emprego. O alto índice de evasão dos cur-sos pelas mulheres se dá principalmente pelo fato denão contarem com uma estrutura que dê conta des-sas demandas, o que faz com que, além de dificultaruma formação de qualidade, provoque um distanci-amento dos espaços de articulação política. A lutapor mais bolsas de estudos, maior número de vagasnas moradias e nas creches, dentre outras reivindi-cações do movimento estudantil por permanência,também devem levar em conta o recorte de gênerona perspectiva de superação dessa discriminação.

Além disso, muitas jovens mulheres, ao se tor-narem mães, têm dificuldades de manter os seus es-tudos por falta de políticas que garantam sua per-manência nas escolas e universidades. Para as mãesjovens e trabalhadoras também há a dificuldade degarantir vaga para seus filhos em creches públicas.

Por isso propomos:

• Salário igual para trabalho igual;

• Por restaurantes, lavanderias públicas e cre-ches em período integral nos locais de traba-lho, moradia e estudo;

• Por mais creches públicas;

• Licença-maternidade de seis meses para asmães, e de um mês para os pais;

• Pela humanização do parto;

• Acesso universal a um programa de saúde pú-blica para todas as fases da vida da mulher;

• Distribuição de contraceptivos gratuitos;

• Legalização do aborto realizado pelo Estado nosistema público de saúde;

• Acesso universal à educação em todos os seusníveis, de qualidade e não sexista;

• Por Casas-Abrigo, Delegacias da Mulher, eHospitais/ambulatórios para mulheres víti-mas de violência sexual com funcionamento 24horas;

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• Fim da revista vexatória às mulheres parentesde detentos.

Negras e Negros

Segundo dados do IBGE de 2012, a população negraabarca 50,7% da sociedade. Na pesquisa do Perfil daJuventude Brasileira, realizada pela Secretaria Naci-onal de Juventude, 60% dos entrevistados se decla-raram de cor preta ou parda. Tais dados revelam umaumento dos negros que assumem sua negritude.Revelam também que a autoafirmação de identidadecresce proporcionalmente. A juventude negra tem selevantado contra o racismo apropriando-se da cul-tura, ocupando espaços públicos como o das univer-sidades, e assumindo cada vez mais a identidade na-tural de seus cabelos e corpos. Mostrando que ado-tar a identidade negra não se trata apenas de um atoestético, mas também político.

A afirmação da identidade negra é uma luta deextrema importância. A estética branca (seja no pa-drão de beleza, no cabelo liso ou mesmo no tipo dearte mais ligada aos europeus) se impõe, desde àépoca das colônias, sobre a estética e a cultura ne-gra. Por isso é tão importante os movimentos de cul-tura da periferia. Fortalecer o rap, o funk, as rodasde samba, as religiões de matizes africanas é reacen-der a chama da cultura que veio da África. O cabeloblack power, a não aceitação dos padrões europeusde beleza, tudo isso faz parte de um processo de re-afirmação da cultura do povo negro. É preciso fazermais pela cultura: é preciso mostrar a história quetentaram apagar. O batuque, os gostos, a roupa e ocabelo dos negros são parte da cultura e da identi-dade brasileira.

Um país cuja população negra é maioria tem anecessidade de políticas públicas que combatam oracismo. Mais de 70% da população em situação deextrema pobreza são de negros e negras. Para com-bater o preconceito e a discriminação na perspectivade reduzir a vulnerabilidade desse sujeito, precisa-mos de investimentos e da articulação de políticassociais nos campos da educação, do trabalho, da cul-tura, do esporte, da saúde e do acesso à justiça. Porisso, defendemos as ações afirmativas como medidasimediatas de ampliação do acesso aos direitos.

Desde o início de nossa história os negros são tra-tados com inferioridade, sem direitos e relegados auma vida indigna e desumana. Ainda hoje, os po-vos negros têm dificuldade em mostrar o seu va-lor, de serem sujeitos históricos de suas realidades

na arte, na cultura, na mídia, na política... na socie-dade. Apesar da discriminação, da exclusão – indi-ferença – existem expressões fortes da cultura afro,que resistem e persistem no seio das manifestaçõessociais do Brasil. O debate sobre a temática racialno Brasil deve ser realizado amplamente e apesar doabismo existente entre negros e brancos temos con-quistas, principalmente no campo das políticas deidentidade e de reconhecimento. O estabelecimentodo 20 de novembro como Dia Nacional da Consci-ência Negra e o reconhecimento de Zumbi dos Pal-mares como herói nacional são um exemplo. Hátambém a Lei no 10.639/2003, que inclui, no currí-culo escolar, o ensino da história afro-brasileira, bemcomo a valorização da estética e da cultura negra.Ampliou-se o diálogo com o Estado na luta por direi-tos, incluindo na agenda nacional o reconhecimentoe o combate às profundas desigualdades sociais en-tre negros e brancos, com a adoção das políticas deações afirmativas.

Mas os desafios ainda são grandes.Por isso propomos:

• Defesa das ações afirmativas: cotas na Gradua-ção, Pós- Graduação e nos Concursos Públicos;

• Pelo fim das desigualdades econômicas e soci-ais entre negros e brancos;

• Pelo respeito e incentivo à cultura negra noBrasil

Direitos LGBTs

Apesar de alguns avanços nos últimos anos, a lutada comunidade LGBT por direitos permanece neces-sária. No ano que marca os 40 anos da Revolta deStonewall, momento histórico do movimento LGBT,ainda vivemos em um mundo em que milhares dejovens são mortos em crimes de ódio por sua orien-tação sexual ou identidade de gênero. A luta contraa LGBTfobia deve ser diária.

A homofobia, a transfobia ou lesbofobia se ma-nifestam de diversas formas. Se às vezes permane-cem apenas na violência verbal e simbólica – comoatravés de piadas e do bulling – nos casos mais ex-tremos se manifestam em agressões físicas que le-vam muitas vezes à morte. No Brasil, um LGBT éassassinado a cada 26 horas. O Grupo Gay Bahiacontabiliza um aumento de 27% nos homicídioshomo/lesbo/transfóbicos no Brasil em relação aoano passado: 266 pessoas mortas por amarem pes-

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soas do mesmo sexo ou não se identificarem com ogênero que lhes é imposto.

Em nosso país o avanço da plena cidadania LGBTé impedido pelo governo do PT que, em nome deuma pretensa “governabilidade”, alia-se ao funda-mentalismo religioso e aos setores mais conservado-res da nossa sociedade. Em 2011, o governo Dilmavetou o Kit Escola Sem Homofobia, destinado a ensi-nar as crianças o respeito pela diversidade, alegandoque seu governo não fazia “propaganda de opção se-xual”. Queremos que o Kit Escola Sem Homofobiaseja aprovado e adaptado para combater a transfo-bia também. Precisamos avançar mais na conquistados nossos direitos!

Foi com muita mobilização, nas ruas e nas redes,que o projeto de Lei da “cura gay” foi arquivado, eé com essa força que todo o conjunto do movimentoLGBT no país deve firmar suas posições em defesado Estado laico, articulando suas ações com os po-deres públicos no sentido de combater a violênciahomo/lesbo/transfóbica e todas as formas de discri-minação legal que a legitimam.

Por isso propomos:

• Defesa do Projeto de Lei João Nery de identi-dades de gênero e nome social;

• Defesa da aprovação pelo Congresso Nacionaldo casamento civil igualitário;

• Defesa da Educação para a Diversidade. Proje-tos pedagógicos nas escolas que ensinem sobrea diversidade sexual, afim de estimular a tole-rância e acabar com o preconceito;

• Defesa da aprovação do Kit Escola Sem Homo-fobia com adaptação para o combate à transfo-bia;

• Pela criminalização da homofobia, da lesbofo-bia e da transfobia.

Política de Drogas

A política proibicionista hoje vigente no Brasil cobraum alto preço em vidas humanas e recursos públi-cos desperdiçados. Nos últimos anos, as Marchas daMaconha pelo Brasil ganharam força e voz. Atravésdelas, milhares levantaram a bandeira da legaliza-ção do uso e da produção de maconha. Após a deci-são do governo uruguaio, o debate estampou capasde jornais e revistas, ganhou as redes sociais e che-gou ao Congresso Nacional, com o PL de autoria dodeputado Jean Wyllys, do PSOL do Rio de Janeiro.

Despindo-se de tabus, é preciso discutir o tema comprofundidade.

O primeiro ponto é o tráfico de drogas. Segundoa ONU, temos a terceira maior população carceráriado mundo. No caso do Brasil, mais da metade da po-pulação carcerária é devido ao tráfico de drogas. Em40% dessas prisões houve apreensão de quantidadespequenas, sem envolvimento com organizações cri-minosas. Quase 80% eram jovens e mais de 50% dototal eram negros. Os jovens e negros têm sido osprincipais alvos desta guerra.

Dados do DEPEN revelam que, entre 2005 e2012, a população prisional cresceu 52%, enquantoos presos por tráfico cresceram 194% no mesmo pe-ríodo. Isso é insustentável! O projeto de Jean Wyllysnão pretende “liberar” o comércio da maconha, masregulá-lo. É incontestável que a legislação existenteé ineficaz. Precisamos retirar o controle das mãos dotráfico e repassar para as mãos do Estado.

O segundo tema é o da saúde pública. Drogas lí-citas ou ilícitas causam danos à saúde, por isso, é pre-ciso perguntar-se: como reduzir esses danos? A po-lítica de proibição tem sido ineficaz para diminuir oconsumo. E, neste caso, o problema tem sido tratadona esfera da segurança pública e não como um pro-blema de saúde. O comércio ilegal de droga empregamão-de-obra barata disponível nas favelas, vendesubstâncias misturadas, que prejudicam ainda maisa saúde e são a porta de entrada para drogas maisbaratas e letais, como o crack. Tudo para financiar otráfico de armas e a corrupção.

O fato é que a política de drogas no país está com-pletamente falida. Seja porque a guerra às drogasserve mais como justificativa para a violência do Es-tado nas periferias, ou porque o tema não tem sidoefetivamente tratado como um problema de saúdepública. Sendo assim, os jovens seguem morrendomuito pelas mãos da polícia e do tráfico, e tambémacometidos muitas vezes pelo vício. No primeirocaso, o Estado é diretamente responsável e no se-gundo, é omisso.

Por isso propomos:

• Legalização da Maconha;

• Regular a pesquisa, uso medicinal da Canna-bis;

• Implementar uma política de prevenção douso problemático e de redução de danos viaSistema Único de Saúde.

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Memória, Justiça e Verdade

Neste ano, completam-se 50 anos do Golpe Militar.Ainda temos muito o que avançar para consolidarnossa democracia. A ditadura militar produziu se-quelas que até hoje são sentidas no dia a dia pelopovo brasileiro, sobretudo pelos pobres, negros emoradores de periferias urbanas, em quem recai a re-pressão cotidiana de uma das polícias mais violentasdo mundo. Estudos da psicanalista Maria Rita Kehlapontam que a polícia militar brasileira é a única daAmérica Latina que comete mais homicídios e cri-mes de tortura na atualidade do que durante o pe-ríodo da ditadura militar. Ivo Herzog, filho do jorna-lista Vladimir Herzog, comparou o caso do pedreiroAmarildo ao assassinato de seu pai nas dependên-cias do DOI-Codi em São Paulo durante a ditaduramilitar.

Se há um traço que distingue a ditadura brasi-leira das demais ocorridas na América Latina, não éa “brandura” afirmada pela Folha de São Paulo, massim a ausência de uma justiça de transição e a totalimpunidade dos responsáveis pelos crimes bárbarosaqui cometidos. O Brasil é o único país da regiãoonde os torturadores nunca foram julgados. NossoExército jamais reconheceu os crimes cometidos noregime militar e dirigentes das Forças Armadas che-gam ao cúmulo de taxar de “ressentidos” aquelesque lutam pela memória e reparação dos crimes daDitadura!

A instalação da Comissão Nacional da Verdadeem maio de 2012 foi um passo importante para queo povo brasileiro tenha acesso a informações que osmilitares golpistas e seus aliados políticos gostariamde manter escondidas. Entretanto, os trabalhos daComissão sofrem uma séria limitação: a recusa doGoverno Dilma em propor revisão à Lei da Anistia(Lei no 6.683/1979), a qual impede a punição dostorturadores e assassinos da Ditadura. Pressionadopelas forças militares, o Governo quer apenas uma“justiça parcial”, que na prática significa manter ainjustiça e a impunidade.

É fundamental que seja intensificada a pressãopopular pela revisão da Lei da Anistia, de modo apermitir que os criminosos da Ditadura sejam res-ponsabilizados por seus atos. Devemos seguir oexemplo dos nossos vizinhos argentinos, chilenos euruguaios, que colocaram na cadeia os seus ditado-res. Precisamos enterrar práticas do passado que de-finitivamente não devem se repetir no presente!

Por isso propomos:

• A revisão da Lei de Anistia, exigindo o julga-mento e possível punição para os torturadores;

• Nenhuma homenagem aos torturadores: subs-tituição de toda referência aos ditadores e seusaliados nos logradouros e instituições públicas;

• Fortalecimento da Comissão da Verdade e suaatualização em “Comissão da Verdade, Justiçae Memória”: ampliação da verba destinada eacesso irrestrito aos documentos.

Por uma reforma política radical

As antigas formas de participação política não noscontemplam mais. Queremos interferir diretamenteem como se organizar nossa escola e nossa universi-dade, em como são tomadas as decisões em nossascidades, queremos tomar as principais decisões polí-ticas em nosso país. Não nos basta votar de dois emdois anos, precisamos participar e intervir, discutir edecidir.

As mobilizações de junho de 2013 mostraram queo atual sistema político não representa nosso povo eé incapaz de traduzir nossos anseios. É necessárioavançar na radicalização da democracia. Para isso,é necessária a realização de uma Assembleia Cons-tituinte Exclusiva e Soberana responsável por umaprofunda reforma política, que retire os privilégiosdos poderosos em favor do povo, com mais meca-nismos de representação e participação popular. Osjovens podem mudar o futuro do país e o caminhoeleito por eles é “a participação e mobilização nasruas e ações diretas”, como diz a pesquisa divulgadaacima. Seguiremos firmes nas ruas emparedandogovernos, lutando por nossos direitos e alcançandovitórias. E a reforma política deve ser parte funda-mental desse processo, onde se busca revolucionar omodo que se faz política no país.

Por isso propomos:

• Financiamento das campanhas eleitorais ex-clusivamente público, pela igualdade entre to-dos na realização de campanhas;

• Proibição de cabos eleitorais pagos, sendo talprática crime eleitoral. Que a política seja feitapor ideias e não por dinheiro;

• Instituição da revogabilidade de mandatos porparte dos eleitores. Quem não cumpre o quepromete deve perder o mandato;

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• Facilitação para apresentação de projetos deleis de iniciativa popular. Que os jovens pos-sam legislar;

• Radicalização da democracia por meio de re-ferendos e plebiscitos,. Que os jovens possam

opinar;

• Garantia de candidaturas avulsas, sem neces-sidade de filiação partidária. Que a juventudeescolha seus representantes.

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AGRADECIMENTOS 97

AgradecimentosAndreia Bianchi, Áquilas Mendes, Atletas pelo Brasil, Bom Senso FC, Bruna Ballarotti, Bruno Mandelli, BrunoZaidan, CONATRAE, CSP-Conlutas, Camila Souza Menezes, Camila Souza Ramos, Carla Ferreira, CoalizãoDemocrática por Eleições Limpas, Coletivo Curupira, Deusdedith Pereira, Eduardo Amaral, Felipe Corneau,Felipe Monte, Felipe Oliva, Fórum Nacional de Democratização da Comunicação, Gabriel França, Gabriel Lin-denbach, Giulia Tadini, Greenpeace, IPEA, Instituto Sou da Paz, Intersindical, Intervozes, Ivone Pitta, JoséAfonso da Silva, José Ibiapino, João Alfredo, Juca Kfouri, Juninho, Kauê Batista Scarim, Laura Cymbalista, Le-onel Camasão, Linnesh Ramos, Lucio Gregori, Luiz Araújo, Lujan Miranda, Maia Fortes, Mandato DeputadoEstadual Marcelo Freixo (PSOL/RJ), Mandato Deputado Federal Chico Alencar (PSOL/RJ), Mandato Depu-tado Federal Ivan Valente (PSOL/SP), Mandato Deputado Federal Jean Wyllys (PSOL/RJ), Mandato VereadorToninho Vespoli (PSOL/SP), Maria Lucia Fatorelli, Mathias Luce, Movimento Terra Livre, Movimento dosTrabalhadores Sem Terra (MST), Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Nathalie Drumond, Nilsonde Souza, Nós da Sul, Partido da Cultura, Pastoral da Terra, Pedro Ekman, Plataforma dos Movimentos So-ciais pela Reforma Política, Plínio de Arruda Sampaio, Rede Justiça Criminal, Repórter Brasil, Rodrigo Ávila,Samara Castro, Setorial Ecossocialista do PSOL, Setorial LGBT do PSOL, Setorial de Comunicação do PSOL,Setorial de Direitos Humanos do PSOL, Setorial de Mobilidade do PSOL, Setorial de Mulheres do PSOL, Seto-rial de Saúde do PSOL, Silvie Klein, Tiago Madeira, UNESCO, União dos Ciclistas do Brasil, Vladimir Safatle,Zelito Silva

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