rebecca winters - raios de sol

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Raios de Sol Doorstep Twins Rebecca Winters Gabi Turner está na ilha grega de Milos para encontrar Andreas Simonides... o pai do bebês de sua falecida irmã. Andreas, um poderoso presidente-executivo, se sente mais confortável alugando um iate do que empurrando um carrinho. Sobretudo quando sabe que os meninos são filhos de seu irmão! Enquanto espera a chegada do pai dos pequenos, ele logo se vê trocando babadores e cantando músicas de ninar. Andreas acha que ele e Gabi formam uma boa equipe, mas o que os manterá juntos quando a verdade sobre os pais dos gêmeos vier à tona?

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Gabi Turner está na ilha grega de Milos para encontrar Andreas Simonides... o pai do bebês de sua falecida irmã. Andreas, um poderoso presidente-executivo, se sente mais confortável alugando um iate do que empurrando um carrinho. Sobretudo quando sabe que os meninos são filhos de seu irmão! Enquanto espera a chegada do pai dos pequenos, ele logo se vê trocando babadores e cantando músicas de ninar. Andreas acha que ele e Gabi formam uma boa equipe, mas o que os manterá juntos quando a verdade sobre os pais dos gêmeos vier à tona?

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Raios de SolDoorstep Twins

Rebecca Winters

Gabi Turner está na ilha grega de Milos para encontrar Andreas Simonides... o pai do bebês de sua falecida irmã. Andreas, um poderoso presidente-executivo, se sente mais confortável alugando um iate do que empurrando um carrinho. Sobretudo quando sabe que os meninos são filhos de seu irmão! Enquanto espera a chegada do pai dos pequenos, ele logo se vê trocando babadores e cantando músicas de ninar. Andreas acha que ele e Gabi formam uma boa equipe, mas o que os manterá juntos quando a verdade sobre os pais dos gêmeos vier à tona?

Digitalização e Revisão:

Rebecca Winters - Raios de Sol (Special 30)

Tradução Rodrigo Peixoto

HARLEQUINB O O K S

2010

PUBLICADO SOB ACORDO COM HARLEQUIN ENTERPRISES II B.V./S.à.r.l.Todos os direitos reservados. Proibidos a reprodução, o armazenamento ou a

transmissão, no todo ou em parte.

Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas é mera coincidência.

Título original: DOORSTEP TWINSCopyright © 2010 by Rebecca Winters

Originalmente publicado em 2010 por Mills & Boon Romance

Arte-final de capa: núcleo i designers associadosEditoração Eletrônica: ABREU'S SYSTEMTel.: (55 XX 21) 2220-3654 / 2524-8037

Impressão:RR DONNELLEY

Tel.: (55 XX 11) 2148-3500www.rrdonnelley.com.br

Distribuição exclusiva para bancas de jornais e revistas de todo o Brasil:Fernando Chinaglia Distribuidora S/A

Rua Teodoro da Silva, 907Grajaú, Rio de Janeiro, RJ — 20563-900

Para solicitar edições antigas, entre em contato com oDISKBANCAS: (55XX 11)2195-3186/2195-3185/2195-3182

Editora HR Ltda.Rua Argentina, 171,4o andar

São Cristóvão, Rio de Janeiro, RJ — 20921-380

Correspondência para:Caixa Postal 8516

Rio de Janeiro, RJ — 20220-971Aos cuidados de Virgínia Rivera

[email protected]

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CAPÍTULO UM

— Sinto muito, srta. Turner, mas kyrie Simonides não poderá atendê-la hoje. Se puder vir na próxima terça-feira, às três da tarde...

Gabi agarrou firme a alça da bolsa.

— Não estarei em Atenas.

Na verdade, o resultado daquela visita determinaria quanto tempo ela ainda ficaria na Grécia... isso caso fosse atendida naquele momento.

Lutou para não perder a compostura diante da secretária que parecia a ponto de aposentar-se, mulher que provavelmente ganhava um bom dinheiro para não perder a própria compostura.

— Já esperei três horas para ser atendida. Ele com certeza poderá me receber por cinco minutos.

A mulher, dona de vários fios de cabelo prateados, fez que não com a cabeça.

— Estamos no fim de semana. Ele já deveria ter saído de Atenas há uma hora.

Às seis e vinte da tarde de uma quente sexta-feira, Gabi acreditava no que acabara de ouvir, mas não viera de tão longe para ser ignorada. Havia muita coisa em jogo. Após respirar fundo, disse:

— Não queria ser obrigada a dizer isso a você, mas ele me deixou sem escolha. Por favor, diga que é questão de vida ou morte.

Era verdade, e seus olhos não piscaram, causando uma alteração sutil na expressão da secretária.

— Se isso for uma brincadeira, seu tiro sairá pela culatra.

— Não é nenhuma brincadeira: — respondeu Gabi, levantando-se, em seu terninho limão pálido. Já passara por um controle de segurança ao entrar no prédio, então a secretária sabia que não seria uma ameaça.

Após um momento de hesitação, a secretária, mais alta que Gabi, mas claramente sem saber o que fazer, levantou-se de sua mesa e caminhou decidida em direção à sala do chefe. Era um progresso.

Enquanto vários homens de negócios entravam e saíam daquela cobertura de um edifício do centro de Atenas, ela até então era ignorada. Se tivesse dito isso desde o início, talvez não houvesse perdido boa parte do dia em tentativas frustradas, mas queria protegê-lo.

Gabi só sabia três coisas sobre Andreas Simonides, de 33 anos. A primeira: era o reputado novo diretor da internacionalmente conhecida Simonides Corporation, que comandava indústrias metalúrgicas, incluindo alumínio, cobre e plástico.

Uma fonte confirmara que sua vasta fortuna, acumulada ao longo de várias décadas, incluía oitenta empresas. Com mais de 12 mil funcionários, a família Simonides comandava um império que se estendia muito além da Grécia.

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Segunda coisa: se a foto do jornal não mentira, era um homem excepcionalmente atraente.

O terceiro detalhe não era de conhecimento público. Na verdade, ninguém sabia o que Gabi sabia... nem mesmo ele. Mas, logo que tivessem conversado, sua vida mudaria para sempre, não importando se Andreas gostava ou não.

Ali, de pé, esperando por seu primeiro encontro, ouviu os passos da secretária:

— Kyrie Simonides lhe dará dois minutos, nada mais.

— Eu aceito!

— Siga pelo corredor e entre pelas portas duplas.

— Muito obrigada. — E Gabi correu, balançando seus cachos dourados. Ao entrar no escritório elegante, não viu ninguém.

— Você disse vida ou morte? — perguntou uma voz masculina, que vinha de trás dela. Uma voz profunda, mas vibrante.

Gabi se virou e viu um homem alto, vestindo um caríssimo terno cinza, impecável, como se tivesse acabado de ser tirado do armário. Os músculos de seus braços e ombros, que podiam ser vistos por baixo da camisa branca, comprovavam que ele não passava todo o tempo confinado num escritório. Incapaz de fazer qualquer outra coisa, ela olhou para o tecido de sua calça, que revelava coxas poderosas.

— Estou esperando, srta. Turner.

Gabi sentiu um calor nas faces ao perceber que ele notava sua reação. Levantou a cabeça, mas ficou sem voz ao encarar aqueles olhos cinzentos, um tanto velados por longos cílios negros que lhe emprestavam um ar misterioso.

Seus cabelos negros não eram muito curtos nem muito compridos, e sua cabeça tinha um formato perfeito. Seu aspecto grego a deixou fascinada. A foto que vira não registrara a cicatriz em sua sobrancelha esquerda, ou as linhas de expressão visíveis ao redor dos olhos e da boca masculina. Sinais que revelavam uma vida repleta de emoções.

— Você é um homem quase inalcançável.

Após fechar a porta do closet, Andreas caminhou em direção ao seu elevador privativo.

— Estou saindo. Mas como você se recusou a voltar terça-feira, diga o que quer antes que eu vá embora — disse, já com um pé dentro do elevador, preparado pára apertar o botão.

Sem dúvida, havia um helicóptero no telhado esperando para levá-lo a algum local exótico, onde passaria o fim de semana.

Ali, ao seu lado, Gabi nunca se sentira tão diminuída. Mesmo sem um encontro marcado, a reação dele era exagerada. Mas talvez não tivesse outra oportunidade de aproximar-se de Simonides, então evitou qualquer reação.

Sem perder tempo, abriu a bolsa e tirou um envelope. Como ele não fez sinal de que o apanharia, ela mesma o abriu e revelou seu conteúdo.

Além do resultado de um teste de DNA, estava a primeira página de um jornal grego, exemplar de um ano antes, que estampava uma foto dele no iate dos Simonides, cercado por várias pessoas numa festa. A meia-irmã mais velha de Gabi, Théa, cuja beleza morena grega se destacava entreis outras mulheres, se achava entre as retratadas. A manchete dizia: "Festa para o novo diretor geral da Simonides."

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Junto a tudo isso, uma fotografia recente de dois meninos vestindo camiseta e fralda. Gabi ampliara a foto num estúdio.

Levantou tudo aquilo para que Andreas visse claramente os dois gêmeos idênticos, com seus cabelos negros encaracolados e a linda pele dourada, como a dele e a de Théa. Andréas tinha o cabelo mais curto que no momento da foto na festa.

De perto, Gabi notou vários outros pontos em comum, incluindo suas bochechas e cílios super compridos. Mas as semelhanças, tão grandes, não paravam por aí. Ela logo notou seu queixo firme e sua boca grande. Seguiu observando, notando seus corpos robustos e seus dedos gordos e quadrados. Mas, em seu rosto, nada indicava que ele se impressionava com a foto.

— Não a vejo na fotografia, srta. Turner. Sinto muito que esteja em uma posição tão desesperadora, mas bater na minha porta pedindo esmola não vai resolver o seu problema.

Gabi trincou os dentes.

— Você não é o primeiro homem a ignorar crianças que pôs no mundo.

Ele franziu a testa.

— E que tipo de mãe envia alguém numa missão como essa? De alguma maneira, Gabi conseguiu livrar-se do nó na garganta para dizer:

— Gostaria que minha irmã pudesse ter vindo, mas ela está morta.

Quando tais palavras escaparam de sua boca, ela notou o corpo de Andreas tremer.

— Que tragédia. Mas agora, se me permite...

Andreas Simonides era um homem de sangue-frio. Não havia maneira de assustá-lo. Ele moveu a mão cm direção aos botões do elevador, avisando que a conversa acabara, mas Gabi se adiantou.

— Você está dizendo que nunca viu esta mulher na vida? — Gabi apontou para o rosto de Théa na foto do jornal. — Talvez isto ajude. — Colocou tudo aquilo debaixo do braço enquanto buscava o passaporte grego de Théa. — Veja.

Para sua surpresa, ele pegou a foto e olhou-a bem.

— Théa Paulos, 24 anos, Atenas. Expedido há cinco anos — Andreas leu, franzindo a testa, e a encarou: — É a sua irmã?

— Meia-irmã. A primeira esposa do meu pai era grega. Após a morte dela, ele se casou com uma americana. E eu nasci desse casamento. Este foi o último passaporte tirado por Théa antes do seu divórcio. — Gabi mordeu o lábio. — Ela... celebrou o divórcio com amigos a bordo do seu iate.

Andreas lhe devolveu o passaporte.

— Sinto muito pela sua perda, mas não posso ajudá-la.

Ela sentiu uma pontada de dor.

— Sinto muito pelos gêmeos — Gabi murmurou. — Perder a mãe foi muito trágico, não há palavras para descrever o horror. Porém, quando eles tiverem idade suficiente e perguntarem se o pai está vivo... o que será uma bobagem, pois o pai nunca ligou para eles... isso sim será uma tragédia fatal.

As portas do elevador se fecharam, encerrando definitivamente aquela conversa. Gabi virou-se, furiosa e com o coração na boca. Quis deixar as provas com a secretária,

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para que ela tirasse suas próprias conclusões.

Mas criar um escândalo com o império Simonides era a última coisa que queria fazer, pois poderia causar problemas para sua própria família, sobretudo para o seu pai, cuja posição de diplomata no consulado de Creta poderia ser comprometida. Ele se relacionava com VIPs gregos, homens de negócios e políticos. Não queria que sua presença ali causasse danos à sua reputação.

Ninguém lhe pedira que fosse até lá. E, exceto o sr. Simonides, ninguém conhecia a razão de sua visita, muito menos seus pais. Desde que Théa morrera no parto, por problemas de coração decorrentes da gravidez, Gabi tomara a responsabilidade pelos bebês. Todas as crianças merecem estar ao lado dos pais biológicos, mas nem todas têm tanta sorte.

— Missão cumprida — ela murmurou, na sala deserta. Seu coração parecia uma âncora presa a fantasmas do passado, escondidos nas profundezas mais escuras do Mediterrâneo.

Ao colocar tudo de volta no envelope e guardá-lo na bolsa, saiu do escritório. A venerável secretária fez um sinal com a cabeça antes que Gabi desaparecesse no hall. Em poucos minutos estava na portaria do edifício e correu para pegar um táxi que a levasse de volta ao hotel.

Para a sua surpresa, o chofer de uma limusine estacionada logo em frente aproximou-se e perguntou:

— Srta. Turner?

— Sim. — Ela piscou.

— Kyrie Simonides disse que a senhorita o esperou por muito tempo para vê-lo. Tenho instruções para levá-la aonde quiser.

Sua adrenalina subiu às alturas, fazendo disparar sua pulsação. Isso significaria que o pai dos gêmeos não era o bloco de gelo que parecia ser? Mas quem não se assustaria ao ver fotos de criaturas do seu próprio sangue? Se a foto dos meninos não o convencera completamente, o resultado do teste de DNA seria uma prova infalível.

Ao enviar uma limusine para Gabi, ele talvez estivesse querendo dizer que planejava um segundo encontro, mas tinha de manter-se discreto. Com todo o seu dinheiro e poder, sem falar em suas aparências, decerto fora obrigado a aprender a manter suas relações como assuntos privado.

— Obrigada. Se não se importar em me levar ao Amazon Hotel...

Hotel que Gabi escolheu por estar próximo ao edifício Simonides, no coração de Plaka.

Ele fez que sim e ajudou-a a subir no carro.

Ao montar seu plano de encontrar-se com o senhor Simonides naquele dia, Gabi disse aos pais que uma de suas colegas de trabalho dos Estados Unidos estava em Atenas, a passeio, e que marcaram de sair juntas para dar uma volta. Gabi não gostava de mentir para eles, mas não poderia contar-lhes o que realmente pretendia fazer.

Até o quinto mês de gravidez de Théa, quando ela desenvolveu sérios problemas de coração e foi hospitalizada, Gabi não sabia o nome do pai dos bebês. Mas quando o final se aproximou e ficou aparente que Théa não sobreviveria, ela disse a Gabi que buscasse um envelope que escondera em sua caixinha de jóias.

Gabi levou-o ao hospital. Théa pediu que o abrisse. Ela deu uma olhada e ficou

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pálida ao descobrir quem era o pai.

— É tudo o que tenho dele. Como todos no barco, nós dois bebemos demais — Théa murmurou. — Éramos uma espécie de estranhos na noite...

Sua confissão arrancou um gemido de Gabi.

— Não significou nada para ele, que nem sabe o meu nome. Sinto vergonha pelo que aconteceu, e esse homem não deve pagar por um erro que foi tanto meu quanto dele. Gostaria que o visse para saber que tipo de genes as crianças vão herdar. Mas prometa que se esquecerá de tudo isso.

Gabi entendeu como Théa se sentia e quis honrar seu desejo. Além do mais, sabia que qualquer ligação com a família Simonides chamaria a atenção e poderia ser mal explorada. Como recentemente seu pai perdera a filha do primeiro casamento, Gabi queria evitar mais um problema para ele e sua mãe.

Estava ali, sentada, perdida em seus pensamentos, quando a porta traseira da limusine se abriu. Ficou surpresa ao ver que já tinham chegado ao hotel, e disse:

— Por favor, agradeça ao seu chefe por mim.

— Claro.

Quando o motorista se foi, ela correu para dentro, louca para comer algo no bar antes de subir ao quarto. Fosse lá qual fosse a intenção do sr. Simonides, ele estava no comando e marcaria o próximo encontro. Caso acontecesse...

Esperava que até a manhã seguinte fizesse algum contato, pois voltaria para Heraklion, em Creta, para encontrar-se com a família, que cuidava dos dois bebês nascidos prematuros de seis meses.

Quando Théa parecia estar em apuros, Gabi pediu uma licença sem vencimentos em sua agência de publicidade no estado de Virgínia, nos Estados Unidos, e voou para Heraklion. Desde então tomava conta dos bebês, pois a posição diplomática dos pais não lhes deixava com muito tempo livre para cuidar deles.

Isso aconteceu quatro meses antes, e o cargo de relações-públicas de Gabi foi temporariamente coberto por outra pessoa na Hewitt and Wilson. Mas chegara o momento de um decisão vital. Caso Simonides quisesse ficar com os filhos, ela voltaria ao trabalho nos Estados Unidos.

Seu chefe imediato fora nomeado diretor regional para a Costa Oeste e conseguira uma importante promoção para Gabi. Mas ela teria de voltar para casa se quisesse abraçar essa oportunidade. Outro caminho seria cuidar dos filhos de Théa, transformando-se em sua mãe. Mas, caso escolhesse esse caminho, teria de abandonar sua vida de publicitária até que eles chegassem à idade escolar.

Tendo acabado um relacionamento com Rand McCallister, fazendeiro e petroleiro texano, cinco anos atrás, Gabi não tinha intenção de casar-se ou ter filhos, mas, se o pai dos gêmeos não os quisesse, assumiria a responsabilidade de criá-los, pois eram sua família. Como tal, teria de voltar a Virgínia, onde poderia criá-los em um ambiente familiar.

Sua casa em Alexandria era perfeita, num condomínio fechado onde viviam outras famílias de diplomatas, algumas delas com crianças pequenas. Gabi vivera ali com os pais quando eles não estavam na Grécia. E como o seu pai era dono da casa, ela não precisaria se preocupar em pagar hipoteca.

Caso reunisse suas economias e a ajuda oferecida pelo pai, poderia ficar em casa cuidando dos bebês até que eles fossem para a escola, quando retomaria sua carreira profissional. Tudo daria certo. E Gabi conseguiria, pois já amava os gêmeos como se

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fossem seus filhos.

Tudo indicava que o sr. Simonides não se interessaria pelos bebês, e que ela teria de voltar para o local de onde viera. Voaria com os gêmeos a Alexandria na semana seguinte.

Após comer algo rápido, subiu para o quarto, que estava no quarto andar, pensando que sua mãe a ajudaria até que se resolvesse com os bebês nos Estados Unidos, depois voltaria a Creta. O consulado não era local para duas crianças. Seus pais nunca admitiriam, mas a situação estava fora de controle.

Quando entrou no quarto, abrindo a porta com seu cartão magnético, viu que a luz vermelha do telefone piscava. Sua mãe poderia ter deixado uma mensagem na secretária eletrônica, sem antes ligar para o seu celular. Mais uma vez...

Curiosa e nervosa ao mesmo tempo, aproximou-se para ouvir o recado.

“Outra limusine está esperando na frente do seu hotel, srta. Turner. Ela permanecerá estacionada até as oito e meia." O seu relógio marcava oito e dez. "Caso não apareça com a sua bagagem, entenderei que, no final das contas, não se trata de um assunto de vida ou morte. Sua conta no hotel já foi fechada." Gabi se sentiu parte de um filme policial, aquilo não tinha nada a ver com a vida real. O fabulosamente rico kyrie Simonides vivia em um mundo repleto de segredos e guarda-costas, tudo montado para preservar sua segurança e também sua intimidade.

Ela imaginou que os paparazzi deveriam ser um pesadelo constante em sua vida, ainda mais quando uma mulher desconhecida como Gabi estava em jogo. Sua aparição o fizera lembrar que poderiam haver conseqüências após uma noite de prazer, algo do que talvez não se lembrasse, pois todos naquele barco estavam muito bêbados.

Théa disse que ele era um grego perfeitamente talhado. E ao contrário de Gabi, que herdara as poucas curvas do corpo da mãe, Théa era alta e magra. Poderia ter qualquer homem que quisesse.

Sempre estava acompanhada, até mesmo do playboy solteiro Andreas Simonides, que driblava a imprensa e era a cabeça coroada do império Simonides. Quando ele a escolheu entre todas as outras presentes no barco e fez amor com ela numa das cabines, Théa sucumbiu em um momento de extrema fraqueza.

O trágico foi que, exatamente no momento de seu divórcio, ficou grávida, e como conseqüência da gravidez acabou morrendo...

Gabi não conseguia visualizar o sr. Simonides esquecendo-se de sua irmã. Mas, caso ele fosse como Rand, deveria haver muitas mulheres lindas na sua vida. Como as duas irmãs aprenderam bem, elas faziam parte de um harém. Que choque deve ter sido descobrir que era pai de gêmeos parecidíssimos com os dois.

Gabi tinha apenas alguns minutos para se arrumar e pegar suas coisas antes de sair correndo para o hall. Carregava pouca coisa, pois não pensava ficar em Atenas mais do que uma noite, e só trouxera mais uma muda de roupa.

Pelas portas do hotel, espiou a limusine com vidros opacos, mas o motorista que se aproximou era outro. Imaginou que seria levada a um local desconhecido, onde o sr. Simonides a esperava.

— Boa noite, srta. Turner. — Ele lhe abriu a porta traseira da limusine e ajudou-a com a bagagem. — Vou levá-la até kyrie Simonides.

— Obrigada.

E logo atravessaram o tráfego pesado do antigo bairro turco de Atenas. Mais uma

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vez, ela se sentia dentro de um filme, mas a sensação era diferente, pois se aproximaria de um completo estranho, um homem muito poderoso.

O céu escurecia, dando lugar à noite. Caso Gabi desaparecesse, sua família não teria a menor idéia do que teria acontecido. Melhor nem pensar na dor que causaria a eles. Tinha tanta vontade de unir o pai vivo dos gêmeos às crianças que fechara os olhos a todos os riscos envolvidos. Porém, era tarde demais para sair de uma situação que poderia ser perigosa, mas que fora criada por ela.

Naquele momento, não sabia muito bem o que queria conseguir. A menos que um solteiro que vivia em festas e na cama de várias mulheres estivesse disposto a abandonar esse estilo, Andreas não seria um bom pai. Porém, pelo bem dos gêmeos, que mereciam algo melhor, ela não poderia voltar aos Estados Unidos e criá-los sem antes tentar dizer ao pai das crianças que os filhos eram seus. Será que ele gostaria de ter alguma participação na vida dos bebês?

Gabi queria que ele fosse um homem de verdade e assumisse seus filhos, levando-os para casa e para a sua vida... ficando ao lado deles para sempre. Dando-lhes o seu nome e selando seu legado.

Mas claro que coisas assim não acontecem todos os dias, e Gabi não vivia de ilusões. Sem dúvida, Simonides pensava que seu objetivo era aproximar-se para conseguir dinheiro, e depois voltar aos Estados Unidos e ao seu querido trabalho.

Antes de sua morte, Théa pediu a Gabi que pusesse os bebês à adoção para um bom casal grego. Queria que crescessem sendo gregos. As duas irmãs sabiam que seria uma responsabilidade impossível para seus pais assumirem o papel de criá-los. Para o bem deles, Gabi jurou isso à irmã. Porém, após a sua morte, percebeu que não seria capaz de cumprir tal promessa. Em primeiro lugar, porque o pai dos gêmeos estava vivo. Legalmente, ninguém poderia adotá-los sem a sua permissão.

E, em segundo lugar, nos últimos três meses Gabi aprendera a amar os meninos. Construíra um laço com eles. Podia não ser grega, mas, por ter aprendido a língua desde o berço, Gabi era bilíngüe, e poderia usar seus conhecimentos com os meninos. Ao seu lado, teriam um bom lar. Somente o pai das crianças poderia afastá-la deles dois naquele momento.

De repente, a porta se abriu.

— Srta. Turner? — disse o motorista. — Tenha a bondade de me seguir.

Deixando de lado seus pensamentos, ela saiu da limusine, sem perceber que estavam no porto de Piraeus. O motorista levou sua maleta e acompanhou-a à luxuosa cabine de um iate.

Um membro da tripulação, de meia-idade, pegou sua bagagem e a ajudou a subir.

— Meu nome é Stravos. Vou levá-la a kyrie Simonides, que está esperando no cockpit. Por aqui, srta. Turner.

Mais uma vez, ela seguia em direção a um estranho, pisando no chão de um salão cujo teto estava aberto às estrelas. Seu anfitrião de cabelos escuros a esperava de pé, olhando pela enorme janela aberta ao mar, observando suas águas iluminadas pelos vários barcos que se movimentavam pelo porto. Aquele iate era um obra de arte.

Andreas se livrara da gravata e do paletó que usara em seu primeiro encontro com ele, e as mangas da camisa estavam arregaçadas até os cotovelos. Théa estava certa. Aquele era um homem espetacular.

Gabi entendeu quando o marinheiro anunciou ao seu anfitrião que a mulher norte-

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americana chegara. Ele se virou. As luzes que se refletiam nas águas iluminaram suas feições bem marcadas.

— Venha até aqui e sente-se, srta. Turner. Stavros lhe trará qualquer coisa que queira beber ou comer.

— Não quero nada, obrigada. Acabei de me alimentar. Após ouvir isso, Stavros saiu, e ela aproveitou para pegar o envelope da bolsa e deixá-lo na cadeira, ao seu lado, imaginando que Andreas gostaria de dar uma segunda e melhor olhada em tudo aquilo. Ele se aproximou, mas não fez nenhum movimento em direção ao envelope. Em vez disso, seu olhar enigmático a estudava.

Gabi tinha um rosto oval, mas sua boca era muito grande, e seu cabelo, muito encaracolado para o seu gosto. Em vez de bronzeada, sua pele tinha uma cor creme indescritível. Certa vez, seu pai lhe disse que tinha olhos violeta amadeirados. Ela nunca vira violetas amadeiradas, mas ele dissera isso com amor, e Gabi sempre encarou seus olhos como algo único.

— Meu nome é Andreas — ele se apresentou, surpreendendo-a. — E o seu?

— Gabi.

— Minhas fontes dizem que foi batizada como Gabriella. Mas gosto dessa versão mais curta. — Inesperadamente, ele passou a destilar um charme viril capaz de virar a cabeça de qualquer mulher.

Théa não deve ter tido escolha.

Gabi sabia o que era o tal poder masculino e todo o dinheiro que vinha junto com ele. Certa vez, amara Rand, Era só substituir as empresas desse grego pelos sete mil acres de uma fazenda texana, com poços de petróleo incluídos, e pronto: dois homens iguais. Felizmente, para Gabi, bastou uma oportunidade para que aprendesse a lição. Théa também aprendera, mas à custa de sua própria vida.

Uma sobrancelha se ergueu no rosto dele quando perguntou:

— Onde estão esses gêmeos? Na sua casa em Virgínia ou mais perto, na residência consular de seus pais, em Heraklion?

Com um simples telefonema, ele podia contatar gente nos mais altos postos e conseguir qualquer informação, por mais sigilosa que fosse, em menos de uma hora. E foi o que fez. Gabi sentiu vontade de dizer-lhe que, como já sabia de tudo, não seria necessário responder à sua pergunta, mas não podia fazer isso. Ainda mais porque ela o procurara.

— Estão em Creta.

— Quero vê-los.

Aquela firmação a aturdiu. Então ele admitia que os meninos poderiam ser seus filhos Que bom saber que Andreas estava curioso sobre as crianças. Gabi sentiu uma pontada de respeito ao constatar que ele considerava a possibilidade de que seu re-lacionamento com Théa, mesmo muito curto, poderia ter produzido os meninos.

— Quando pretende voltar a Heraklion?

— Ao partir, esta manhã, falei aos meus pais que encontraria uma colega de trabalho dos Estados Unidos em Atenas, e que retornaria amanhã.

— Eles mandarão um carro buscá-la?

— Não. Eu disse que não sabia exatamente a hora da volta, e que por isso pegaria

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um táxi.

— Quando eu a deixar em Heraklion, um táxi estará esperando para levá-la a casa. Stavros está preparando uma cabine para você. Uma pergunta: tem problemas com o mal de mer?

Eles viajariam por mar?

— Não.

— Ótimo. Imagino que seus pais ainda não saibam nada sobre o pai das crianças, ou você não teria mentido para eles.

— Théa não queria que eles soubessem de nada.

Na verdade, não queria que ninguém soubesse, muito menos o seu ex-marido, Dimitri. Pois grande parte do tempo que passaram juntos fora duro, e Théa não desejava que ele soubesse o que ela fizera no dia em que conseguiu o divórcio. Dimitri não hesitaria em expor a indiscrição de sua ex-mulher, por pura vingança.

— Mas ela confiou em você.

— Só quando soube que poderia morrer. Théa não queria envolver ninguém naquela história.

— Embora minha irmã admitisse ter cometido um erro do qual se arrependia, queria que seus filhos não fossem uma responsabilidade a mais para os meus pais. Eu vim até aqui, dessa maneira, para evitar colocar você ou eles sob os holofotes.

— No entanto, não tem pena da minha carteira — Andreas disse, numa voz perigosamente suave,

— Você tem todo o direito de pensar assim, sr. Simonides.

— Andreas — ele a corrigiu.

Gabi respirou fundo.

— Não vim por dinheiro. E você não precisa se preocupar, pois o seu nome não consta da certidão de nascimento deles, Théa se recusou a dar nome ao pai. Porém, ainda que eu tenha prometido que encontraria uma boa família de adoção, não posso fazer isso.

— Por que não?

— Porque você está vivo. Dei uma olhada na legislação. Ninguém poderá adotá-los, a menos que você abra mão de seus direitos de pai. Na verdade, Théa não queria que você ficasse sabendo de nada.

Ele deu de ombros.

— Se não está aqui por dinheiro, então por que não os despachou, esquecendo-se das formalidades?

Gabi o encarou.

— Porque pretendo adotá-los, mas antes queria ter certeza de que você não os quer, pois os levarei comigo para Virgínia. No final das contas, o tal direito paterno é seu. — Respirou fundo. — Sou apenas a tia.

Seus olhos ficaram marejados, mas Gabi não permitiu que as lágrimas rolassem.

— Quanto aos gêmeos, eles têm o mesmo direito de estar com o pai, caso você os queira. E, se houver alguma chance de que isso aconteça, terei de aceitar. Por isso fui ao seu escritório hoje. Se quiser ficar com eles, contarei tudo aos meus pais e

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recomeçaremos do zero.

O ar em volta deles parecia tomado de eletricidade.

— Caso esteja sendo sincera, você é uma espécie em extinção.

Aquela constatação cínica revelou muita coisa. Andreas não tinha meias palavras no momento de usar as mulheres. Nisso, ele e Rand tinham muito em comum. Mas Gabi suspeitava que o sr. Simonides não gostava tanto assim das mulheres.

— Eu não serei capaz de olhá-los nos olhos, quando eles forem grandes o suficiente para entender, se desde o princípio não tiver feito o possível para aproximá-los de você.

Os olhos de Andreas estavam muito escuros ao procurar os dela, num momento muito tenso.

— O que irá fazer em Virgínia se os seus pais estão aqui na Grécia?

— A minha vida está lá, sr. Simonides. Como você, eu tenho uma carreira importante, algo que amo. Hoje, a responsabilidade dos meus pais está em Creta. Papai sempre teve conexões com o governo grego. Sempre que é transferido eu o visito, mas vivo na propriedade da nossa família, em Virgínia.

— Há quanto tempo está aqui?

— Cheguei um mês antes do nascimento dos gêmeos. Eles estão com três meses.

E são adoráveis, você não pode imaginar o quanto.

— Qual é a sua rotina com eles? Gabi imaginou entender a pergunta, e disse:

— Entre sono e sono, eu os levo para passear no carrinho.

— Onde?

— Em muito lugares, sempre por perto. Tem um pequeno parque com chafariz e bancos na esquina do consulado. Algumas vezes vou lá com eles.

— Vamos nos encontrar nesse lugar amanhã, às três. Se não for possível, ligue para o meu celular e combinamos outro horário.

— Tudo bem. — Ótimo. — Andreas escreveu um número no seu cartão comercial e o deu a ela. Depois respirou fundo e tirou o celular do bolso da calça, pedindo a Stavros que aparecesse.

O homem chegou em meio minuto, e disse:

— Venha comigo, srta. Turner, vou mostrar-lhe sua cabine.

— Obrigada.

Quando Gabi se levantou, deveria ter levado junto o envelope, mas Andreas foi mais rápido.

— Devolverei isto mais tarde. Espero que durma bem. O mar está calmo hoje.

Ela parou à porta e o estudou-o a distância.

— Obrigada pelos dois minutos que me deu. Quando insisti com a sua secretária, ela me disse que você estava saindo atrasado para o fim de semana. Lamento se interrompi seus planos para esta tarde.

Ele balançou a cabeça.

— Uma situação de vida ou morte não pode esperar. Vá para a cama com a

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Rebecca Winters - Raios de Sol (Special 30)

consciência tranqüila, kalinihta Gabi Turner.

Sua voz profunda e atraente ecoava na cabeça de Gabi: "Kalinihta.'"

Andreas pegou o celular para ligar para Irena pela segunda vez naquela tarde.

— Meu amor? — ela atendeu ao segundo toque. — Estava esperando sua ligação.

— Sinto muito sobre ontem à noite — ele disse, sem rodeios. — Como já lhe falei, surgiu uma emergência e foi impossível ir à festa familiar em Milos.

— Mas agora você está livre. Pensa em vir? Ele agarrou o telefone com força.

— Não posso.

— Isso parece sério. Algo vai mal, certo?

— Certo — ele respondeu, seco. Em poucas horas, seu estado de choque transformou-se em agonia.

— Não quer falar comigo a respeito?

— Falarei quando chegar a hora. — Andreas cerrou os olhos com força.

Não há hora certa. Não para esse tipo de coisa.

— Isso significa que você quer conversar antes com Leon. O que foi que ela disse?

— Julgando pelo seu silêncio, imagino que falei demais. Perdoe-me. Desde que começamos a namorar, notei que você sempre o procura antes de fazer qualquer coisa. Mas isso é uma simples constatação, não uma crítica.

Ela só dissera a verdade. Discutiriam isso mais tarde, pois naquele momento Andreas não tinha tempo para analisar nada.

— Não precisa pedir desculpa, Irena. Ligo para você amanhã.

— Seja lá qual for o seu problema, não se esqueça de que estou aqui.

— Como se eu pudesse me esquecer.

— S'agapo, Andreas.

Nos seis meses que passaram juntos, ele aprendera a amá-la.

Antes que Gabi Turner aparecesse em seu escritório, pensou em pedir Irena em casamento. Já era hora de se assentar. Pretendera anunciar o pedido na festa em Milos.

— S 'agapo — ele murmurou, antes de desligar.

CAPITULO DOIS

Na tarde seguinte, a mãe de Gabi a ajudou a acomodar os bebês no carrinho duplo.

— Está fazendo calor lá fora.

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Rebecca Winters - Raios de Sol (Special 30)

— É um típico dia de verão. — Gabi já colocara as mamadeiras dos gêmeos na parte de trás do carrinho. — E eles estão usando suas roupinhas mais leves. No parque tem algumas sombras. Vamos nos divertir muito, certo?

Ela não pôde resistir e deu um beijo nas bochechas dos meninos. Sentira muita falta deles, ao passar a noite anterior fora. E naquele momento, bem acordados, seus bracinhos e pernas se moviam freneticamente.

— Ah, Gabi... eles são lindos, e se parecem muito com Théa.

— Eu sei.

Mas também se pareciam com alguém mais. Por isso eram tão lindos. Gabi segurou os ombros da mãe, dizendo:

— Graças a eles, Théa estará sempre conosco.

— Seu pai está louco por eles. Não sei se agüentaria que você os levasse para Alexandria. Eu não agüentaria. Por favor, prometa que pensará melhor.

— Já conversamos muitas vezes sobre isso, mamãe. Papai não pode fazer o seu trabalho como deve. Será melhor para vocês dois e suas agendas apertadas. Em casa, terei os amigos por perto, além de outras mães. E vamos nos ver muitas vezes. Você sabe disso!

Naquele momento, Gabi tinha um nó na garganta só de pensar que se encontraria com Andreas, e não podia se concentrar em nada mais. Despediu-se da mãe:

— Nós nos vemos mais tarde.

Certificando-se de que os gêmeos estavam confortáveis, empurrou o carrinho para longe da casa estilo veneziano que sediava o consulado, onde viviam seus pais. De seu ponto de vista privilegiado, podia ver o porto de Heraklion, na ponta norte de Creta, uma ilha imersa entre as histórias romana e otomana.

Gabi costumava sonhar com o passado em seus passeios com as crianças, mas naquela tarde seus olhos estavam grudados no porto. Em algum lugar lá embaixo, achava-se o barco que a trouxera de Piraeus.

A viagem fora doce, o mar parecia um poço de calmaria. Devia ter dormido pesado durante toda a travessia, mas não parou de se remexer na cama por grande parte de viagem.

Isso porque o homem que antes considerava insensível e frio já não cabia em tais qualificações. Na verdade, classificá-lo era complicado, e esta era mais uma causa de sua insônia.

Como resultado, dormiu tarde e foi acordada por Stavros, que levou um maravilhoso café da manhã à sua elegante cabine. Ela agradeceu-lhe muito. Depois tomou um banho e lavou os cabelos. Após secá-los, vestiu uma calça branca e ampla e uma camiseta marinheiro de listras azuis e brancas.

Com a bolsa pronta, passou batom nos lábios, depois foi ao compartimento principal antes de descer as escadas, calçando sandálias. Esperava encontrar Andreas para que pudesse agradecer por tudo, mas ele não estava por perto. Sentiu-se desapon-tada, o que não fazia sentido.

Quando Stravros avisou que o táxi a esperava, Gabi não teve outra opção além de deixar o barco. Stavros levou sua bagagem ao táxi e despediu-se. Após agradecer mais uma vez, ela se meteu pela cidade de quase 140 mil habitantes. Após subir uma colina, o carro chegou à propriedade do consulado, passando pelos seus pesados portões.

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Rebecca Winters - Raios de Sol (Special 30)

Gabi falou rápido com os pais sobre o dia incrível que passou em Atenas, mas sentia muita falta das crianças, queria vê-las. Os bebês também pareceram contentes quando a viram, e seu coração esteve a ponto de fundir-se de emoção.

Já próxima ao parque, sentiu o pulso acelerar. Imaginou que o calor tivesse alguma coisa a ver com isso, mas havia outra razão. E se Andreas os visse e resolvesse ficar com os meninos? Mesmo querendo que isso acontecesse, Gabi não pensou no que seria ter de abrir mão deles.

O parque estava repleto de crianças, algumas com as suas mães. Outras pessoas sentavam-se nos bancos. Vários turistas de bicicleta, que paravam um pouco para recuperar o fôlego antes de seguir em frente. Era uma cena agradável, até o momento em que notou um homem estranho sentado embaixo de uma palmeira, lendo um jornal.

Ele exalava sofisticação. Era um homem no controle do seu mundo. Um dos mais poderosos homens da Grécia, na verdade. A todos os lugares que ia, seus guarda-costas o precediam, mas Gabi nunca saberia onde estavam escondidos.

Naquele momento, usava uma camisa azul de seda e calça cor de creme,Tratava-se de uma imagem de força e beleza rude, masculinas, algo que era complicado pôr em palavras.

Olhou para os gêmeos. Eles não sabiam, mas estavam fitando o seu pai, um homem diferente de todos os outros, a poucos metros de distância.

Os olhos inteligentes de Andreas, donos de cílios muito escuros, passaram do jornal para eles, antes de deixar de lado as páginas que lia e levantar-se,

Gabi se aproximou com o carrinho, chegando bem perto. Já sem fôlego, tocou a cabeça de um dos meninos.

— Este é Kris, ou seja, Kristopher. E este... — acariciou a outra cabecinha cheia de cachos negros — ... é Nikos.

Andreas se abaixou na frente deles. Como se olhasse para um tesouro raro, seus olhos mudaram de cor, ganhando um tom cinza-prateado ao inspecionar cada centímetro, de seus lindos rostos à ponta de seus dedos descalços.

Acariciou seus queixos, como se quisesse memorizar suas feições, depois deixou que agarrassem seus dedos com as mãozinhas. Logo depois, levaram os dedos de Andreas às bocas.

Gabi começou a rir. Não pôde evitar.

— Gostam do dedo dele? Vocês devem estar famintos, hein? — disse, oferecendo Nikos ao pai. — Sente-se no banco para alimentá-lo.

Imediatamente, pôs um pano no ombro de Andreas e ofereceu-lhe uma mamadeira.

— Caso nunca tenha feito isso antes, não se preocupe. Os meninos se resolvem sozinhos. Deixe que tomem um pouco, depois dê uma batidinha nas costas da mamadeira para livrá-la das bolhas de ar. Eu cuido de Kris.

Nos minutos seguintes, ela ficou atenta aos bebês, que faziam os sons costumeiros ao mamar. Depois trocaram de bebês, para que Andreas tivesse Kris nos braços.

De vez em quando, os sons eram seguidos por vários arrotinhos que faziam Andreas sorrir. Antes de Gabi aparecer no seu escritório, na véspera, ele nunca imaginou que seria capaz de fazer aquilo.

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Porém, qualquer dúvida que ela tivesse sobre sua aptidão desapareceu ao vê-lo com os meninos. Essa imagem ficaria na sua memória para sempre. Théa, onde estivesse, ficaria feliz ao ver que seus filhos já não eram estranhos ao pai, mesmo que ele nunca mais a tivesse procurado.

Gabi não sabia o que viria pela frente, mas o encontro era promissor.

— Vamos ter de ser rápidos, pois não quero ficar muito tempo com eles aqui fora. — Ela deu uma olhadela para Andreas. — Da próxima vez... quero dizer, se você quiser estar com eles de novo... poderá levá-los para passear sozinho.

Andreas não respondeu. Ela não sabia o que pensar. Outros cinco minutos se passaram antes que Gabi dissesse:

— Olha só, parecem dois gatos gordos agora.

E mais uma vez Andreas sorriu.

Juntos, recolocaram os meninos no carrinho. O braço de Gabi roçou o de Andreas, e ela ficou mais atenta à sua presença. Ao se levantarem, seus olhares se encontraram.

— Tenho de ir — ela disse. Talvez estivesse enganada, mas imaginou ter visto os olhos de Andreas perdendo o brilho. — Se quiser vê-los novamente, ligue para o meu celular.

Ele pegou o seu aparelho.

— Diga o seu número, vou gravá-lo agora mesmo.

Talvez fosse um bom sinal. Mas talvez não, como sempre. Um arrepio desceu por sua espinha, pois temia que ele ligasse de novo dizendo que os meninos eram lindos, mas que já estava assinando os papéis deixando a custódia nas suas mãos.

Após anotar o número do telefone, ele empurrou um pouco o carrinho até o caminho principal, que levava à saída do parque. Uma senhora viu a cena e gritou algo, dizendo que tinham filhos lindos.

— Efharisto! — gritou Andreas de volta, agradecendo, como se aquela fosse uma cena corriqueira.

Gabi não queria se desesperar, mas sua mãe ficaria preocupada caso não voltasse logo, e perguntaria a razão do atraso,

— Preciso mesmo ir embora.

— Eu sei — disse ele, em tom rude, antes de dar um beijo nas testas dos meninos. — Entrarei em contato.

E, poderoso, deixou o parque em direção contrária, enquanto ela seguiu empurrando o carrinho. Quanto mais distante ficavam, mais medo ela sentia.

Andreas não ficara indiferente aos meninos. Gabi sabia disso. Sentira e vira isso. Mas ter um encontro com os filhos não significava querer assumir uma vida inteira de responsabilidades. Entre o trabalho e as garotas, ele não teria muito tempo para cuidar dos gêmeos.

Ela já dissera que na semana seguinte partiria para Virgínia. Caso Andreas não quisesse ficar com os meninos, Gabi teria de arranjar tudo rapidamente.

Talvez ele se comprometesse de alguma forma. Ela cuidaria dos meninos e Andreas seria um desses pais que aparecem de vez em quando. Para o bem dos bebês, Gabi não queria nem pensar nisso, mas ter um pai de vez em quando, mesmo que esse pai tivesse de voar da Grécia aos Estados Unidos para vê-los, seria melhor do que não ter

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nenhum, certo? Gabi amava demais o seu próprio pai, e não poderia pensar em viver longe dele.

Mas a única coisa a fazer, naquele momento, era esperar uma ligação de Andreas.

Acompanhado de seus guarda-costas, Andreas seguiu em direção ao helicóptero que o esperava no aeroporto de Heraklion. Uma vez lá dentro, disse ao piloto que o levasse à villa dos Simonides, em Milos, onde toda a família se reunia para o fim de semana.

Na noite anterior, houve uma festa para festejar o aniversário de 30 anos de sua irmã, mas ele não pôde aparecer por conta de um assunto de vida ou morte. Gabi Turner tinha razão.

Ainda que sua irmã tenha sido simpática ao telefone, Andreas sabia que a magoara com a desculpa de que um imprevisto o detivera em Atenas. Prometeu que apareceria por lá, mas aquele tipo de reunião, com toda a família, só acontecia uma vez ao ano. E o momento passara.

Sim, ele lamentava, mas tinha algo muito mais importante na cabeça e não podia pensar em nada mais. Durante todo o voo, não deixou de sentir o toque daquelas mãozinhas em seu dedo. Toque que o fez sentir algo diferente, especial.

Mesmo tendo dez sobrinhos e sobrinhas, nunca envolveu-se tanto com eles. O mais próximo que chegara fora pegá-los nos braços em rodas familiares, após voltarem da maternidade.

Entretanto, algo diferente acontecera naquele dia. Era como se as barreiras tivessem sido derrubadas, embora nem sequer soubesse que os meninos existiam até Gabi aparecer. Kris e Nikos não eram simples bebês. Aqueles corpos agitados e seus olhinhos e rostos brilhantes pertenciam a dois meninos que um dia se transformariam em grandes garotos. Garotos que teriam marcas do pai por todos os lados.

Logo que entrou na villa, buscou sua mãe, uma mulher muito viva, que estava na cozinha supervisionando os preparativos do jantar junto à cozinheira, Tina.

— Você chegou, querido! — disse, assim que o viu, Andreas beijou a mãe, antecipando seu seguinte comentário.

— Minha ausência foi inevitável. Ela arqueou as sobrancelhas negras.

— Um assunto delicado?

— Incrivelmente delicado — ele murmurou. Não conseguia parar de pensar em Nikos e Kris nos seus braços, tomando suas mamadeiras.

— Você parece o seu pai. Fico feliz que ele tenha se aposentado e que você tenha tomado o seu lugar. Ele é outro homem. Esperemos que, quando você se casar, e que não demore muito para que isso aconteça, sua esposa tenha influência suficiente para tirá-lo do trabalho de vez em quando. Já está trabalhando demais, filho, e por isso perdeu o aniversário de Melina.

Sua mãe não fazia idéia do que acontecera. Andreas tornou a abraçá-la.

— Onde está todo o mundo? — perguntou, sabendo qual seria a resposta, mas não queria soar como se algo estranho estivesse acontecendo.

— Ainda passeando de esqui aquático. Seus avós estão lá fora, no pátio, observando seu pai e o tio Vasio brincarem com as crianças menores. Dentro de uma hora, almoçaremos à beira da piscina.

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— Então tenho tempo suficiente para fazer um pouco de exercício. — E Andreas roubou um canapê de um prato que estava sendo preparado por Tina.

Depois deu uma beliscada carinhosa na face da mãe para selar seu pecado e seguiu para as suas acomodações, em uma casa separada, próxima à praia particular.

A enorme propriedade da família — várias villas brancas ao melhor estilo das ilhas Cíclades — fora o refugio dos Simonides por muitas gerações. Por conta do trabalho, Andreas não saía tanto quanto gostaria de sua cobertura na cidade, e estava louco por passar um tempo com a família.

Quem diria que, antes de fechar a porta do trabalho, uma mulher loira, com ar inocente, entraria em seu escritório como uma brisa das Cíclades, trazendo um cheiro doce, para depois soltar sua bomba?

Ainda cheio de adrenalina, Andreas vestiu sua roupa de banho e correu para a praia, onde seus familiares brincavam com os esquis aquáticos.

— Olhe o tio Andreas! — gritou uma de suas sobrinhas, que esperava sua vez de andar no esqui e correu para abraçá-lo.

Depois veio o irmão da menina.

— Já que você chegou, por que não brinca com a gente, titio? A vovó ainda não veio nos chamar.

Os filhos de sua irmã Leila eram os mais novos, 7 e 8 anos.

— Claro! Suba no meu esqui. Vamos mostrar do que somos capazes! Agarre firme na sua irmã, Jason.

— Certo!

Aquele caos feliz durou mais meia hora, depois todos saíram da praia, pois o jantar fora anunciado. Andreas levou seu barco ao píer privado. Nada poderia ter sido melhor do que encontrar seu irmão Leon, o último a vir amarrar seu barco. Sua esposa, Deline, já subira com os demais, deixando-os sozinhos.

— Que tal a festa ontem à noite?— perguntou Andreas, atando o barco para o irmão.

Leon o encarou.

— Tudo bem, mas papai não ficou muito feliz ao saber que você não viria. Estava esperando ver você e Irena.

Irena Liapis era muito querida pela família, filha de um dos grandes amigos do seu pai, dono do principal jornal da Grécia. O mesmo que estampou a foto de Théa no iate familiar.

Todos esperavam pelo anúncio do casamento. Seus quatro irmãos estavam casados, e seus pais aguardavam pela oficialização do compromisso a qualquer momento.

Andreas grunhiu. Nunca se apaixonara por ninguém antes. Talvez a paixão não existisse, e ele estivesse apenas se enganando, pois fora solteiro por tanto tempo. Mas seus sentimentos por Irena aumentavam mais e mais. Ela era bonita, inteligente e doce. E ele queria um casamento que desse certo, e sabia que poderia dar certo com ela. Porém, na véspera, a explosão de Gabi Turner em sua vida deixou tudo fora de lugar. Seu mundo virou de pernas para o ar, já não conseguia pensar em Irena nem em nada mais.

Andreas sabia que não seria justo manter segredo para a mulher com a qual

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pretendia casar-se, mas, como ele mesmo acabara de constataria vida não era justa... Pelo menos para os gêmeos que perderam sua mãe ou para Gabi, que assumira a enorme responsabilidade de criar os filhos de sua meia-irmã.

De comum acordo, ele e o irmão subiram em direção à piscina. Leon pegou suas sandálias no chão, dizendo:

— Foi um choque você não ter aparecido. Normalmente papai o desculpa.

— O que acontece é que ele tem uma preferência por Melina.

— Ela era a filha mais nova.

— Caso use o seu refinamento canadense, acho que poderá ser perdoado.

Andreas franziu a testa.

— Talvez não. Não sei se valerá a pena.

— O que quer dizer? Deve estar brincando.

— De jeito nenhum, isso pode ser um problema bem grande. — Encarou o irmão. — Falando de problema, precisamos conversar a sós.

— Caso esteja falando sobre a compra dessa mineradora em...

— Não, Leon, essa compra foi brilhante. Refiro-me a algo que não tem nada a ver com os negócios. Depois de comer, venha à minha villa sozinho. Não faça alarde. Quero lhe mostrar uma coisa.

Leon deixou escapar uma risada.

— Que misterioso... O que aconteceu?

— Você já vai descobrir.

Por uma hora, Andreas ficou com a família e entregou a Melina o presente que encontrou em uma viagem aos Bálcãs. Eram bonecas, e foram um sucesso. Quando a sobremesa foi servida, Andreas se dirigiu a seus aposentos, acenando para uma das empregadas que estava no caminho. Logo depois, Leon apareceu.

— Feche a porta, não quero ser incomodado. Leon o olhou assustado e foi até a sala.

— O que está acontecendo? Na última vez em que o vi assim foi quando papai teve um ataque do coração, no ano passado.

E naquele momento Andreas ainda se recuperava do ataque que a srta. Turner lhe proporcionara. Sem perder tempo, mostrou o recorte de jornal a Leon, que o estudou por um momento antes de erguer a cabeça.

— Por que está me mostrando uma foto sua? Não entendo. — Devolveu o jornal ao irmão.

— Olhe bem a data, vai fazer um ano. Quando essa foto foi tirada, eu estava nos Estados Unidos com o nosso irmão mais velho. Como sempre, o fotógrafo nos confundiu. Foi no tempo em que você e Deline estavam separados. Essa mulher alta e bonita que o está olhando foi a tal, certo?

Só então Andreas percebeu que Théa se parecia com Deline e Irena. Certas vezes ele se surpreendia ao notar que tinha os mesmos gostos do irmão, não apenas em comida e esportes, mas também quanto às mulheres. Eram todas lindas morenas.

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— Sim — murmurou Leon. — E se eu não tivesse contado tudo a Deline meu casamento poderia ter ido para o buraco. Ainda não entendo que ela tenha me perdoado e me dado uma segunda chance.

Na mesma hora, Leon pegou o papel das mãos do irmão e o amassou.

— Por que está relembrando disso? Veja bem, Andreas... — Suas faces estavam incrivelmente vermelhas, com uma raiva que não era comum em Leon.

— Calma. Eu amo você e Deline, e por isso, nas últimas 24 horas, fiz o que pude para protegê-los e manter as novidades em segredo.

— Sobre o que está falando?

— Imagino que gostaria de saber o nome da mulher que passou a noite com você no iate. Ela se chama Théa Paulos, filha divorciada de Richard Turner, do consulado americano em Creta. Seu ex-marido, Dimitri Paulos, é filho de Ari Paulos, dono da Paulos Metal Exports, uma das empresas subsidiárias que compramos há alguns anos.

Leon permanecia de pé, engolindo em seco. Então, Andreas pegou a foto dos gêmeos e o resultado do teste de DNA do envelope, e ofereceu tudo a ele.

Em silêncio, assustado, Leon sentou-se no sofá para fitar os meninos, que, sem saber, fizera vir ao mundo. Ainda que Andreas estivesse sentindo uma dor no coração pelo problema do irmão, ao mesmo tempo o enxergava como o homem mais sortudo do mundo, pois era pai de dois filhos tão bonitos.

— Eles têm o nosso DNA misturado ao dela. Ganho na certa.

O rosto de Leon ficou branco.

— Eu conheci os meninos — confessou Andreas. — Graças a Gabi, que cuida deles, foi uma experiência inesquecível.

Leon jogou a cabeça para trás.

— Você viu os... — Ele parecia não acreditar.

— Sim, Leon. Eles têm três meses.

— Três meses? Como essa Théa entrou em contato com você?

— Ela não entrou em contato comigo. Tragicamente para os bebês, Théa morreu no parto.

— Ela está morta?! — perguntou Leon, repetindo tudo o que Andreas lhe dizia, como se estivesse em transe.

— Foi sua meia-irmã, Gabi Turner, quem apareceu no meu escritório ontem. E arrumou tudo para que eu visse os bebês em um parque próximo ao consultado hoje.

Leon pulou do sofá, parecendo um animal acuado, pronto a atacar.

— Calma, Leon. Sei o que está pensando, mas as coisas não são assim. Em primeiro lugar, ela acha que eu sou o pai.

Leon começou a caminhar pela sala.

— E você não disse que o homem nesta foto na verdade sou eu?

— Não.

Leon arregalou os olhos.

— Quanto dinheiro ela pediu para manter a boca fechada? Era uma questão válida, pois Andreas também pensou nisso ao ver as fotos pela primeira vez.

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— Esqueça, Gabi não está a fim de subornar ninguém. Não tem nada a ver com isso.

— E você acreditou nela?! — gritou Leon, agarrando os ombros do irmão.

Andreas chegou a imaginar que Gabi poderia estar mentindo. Se estivesse...

Mas logo retomou a razão.

— Juro pela minha vida que ela só quis me encontrar para ter certeza de que eu sabia da existência dos meninos antes de deixar a Grécia.

— E por que ela faria isso?

Andreas segurou a respiração por um momento, depois disse:

— Porque sabe que os bebês merecem estar ao lado do seu verdadeiro pai, caso isso seja possível.

Os olhos de Leon ficaram embaçados por um momento, antes de encarar Andreas e dizer:

— Pode ser uma jogada. Para onde a moça falou que estava indo?

— Alexandria, Virgínia.

Para a casa dela, para a vida dela, como a própria Gabi dissera.

— Seu pai começou a vida diplomática por lá. Eu tenho isso confirmado.

Leon ficou parado, sem saber o que dizer.

O celular de Andreas tocou. Ele verificou quem era e atendeu:

— Mãe?

— Onde você está?

— Na minha villa — informou, olhando para o irmão. — Leon está aqui comigo.

— E vocês não podem deixar de falar de negócios por uma noite?

— Certo. Já vamos.

— Ótimo. Todos estão perguntando por você. Deline já buscou em todos os cantos. Vamos começar a ver alguns vídeos de família..

— Diga a ela que estamos indo — disse Leon, alto o suficiente para que sua mãe escutasse antes que Andreas desligasse o aparelho.

Andreas foi ao escritório e trancou os documentos na gaveta da escrivaninha.

— Como Gabi pensa que eu sou o pai, melhor deixarmos assim por enquanto.

Quando Leon lhe entregou o jornal amassado que tinha nas mãos, Andreas o queimou na lixeira ao lado da mesa. Já livre daquela prova, fitou-o.

— Antes de tomar uma decisão, você deveria ver os bebês, Leon.

Um som estranho escapou da garganta do irmão.

— Vou ligar para Gabi e ver se podemos nos encontrar segunda-feira. Daremos uma desculpa à família, dizer algo sobre um negócio de emergência. E não demoraremos para voltar.

Leon escondeu o rosto entre as mãos.

— Como poderei agir como se tudo estivesse normal até segunda-feira?

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Andreas sentiu um arrepio tomando conta de seu corpo.

— Nós dois teremos de conseguir. Leon jogou a cabeça para trás.

— Quando Deline descobrir... Juro que fiz tudo o que pude para o nosso casamento funcionar. Só aconteceu aquela vez, Andreas. Não acontecerá de novo. Eu amo Deline. — O tremor em sua voz era real.

— Eu acredito.

— Você sabe por que nos separamos aqueles dois meses. Brigávamos porque eu trabalhava muito. Deline ficava com aquela ladainha, dizendo que eu me casara com você, e não com ela. Disse estar cansada de ser negligenciada e que por isso não engravidava. Quando falou que queria a separação, pois precisava de um tempo para pensar, fiquei muito mal. Após semanas tentando conversar, ela me disse que estava pensando em pedir o divórcio. Fiquei péssimo, e acabei naquele iate. Alguns amigos apareceram, e trouxeram mulheres. Bebemos muito. Eu não queria perder a cabeça.

Andreas já ouvira essa história. Sabia que seu irmão estava angustiado na época, mas as novidades emprestaram um tom mais duro ao cenário.

Após caminhar pela sala, Leon parou e ficou olhando para Andreas.

— Sei que isso não é desculpa para eu ter cometido o pior erro da minha vida. E sinto muito por você estar envolvido nessa confusão. Não é problema seu. É meu, mas ainda não sei o que fazer com tudo isso.

Pelo menos Leon admitia sua responsabilidade.

— Quando você conhecer os bebês, tudo ficará mais claro. — Mas Andreas falara da boca para fora, pois não poderia saber como seu irmão reagiria após conhecê-los. — Precisamos concordar que, por enquanto, não há nada a ser feito. Volte e fique ao lado de Deline. Eu estarei lá em poucos minutos.

Mesmo tendo dito à sua mãe que não demoraria, Andreas sabia que não poderia esperar até o dia seguinte para ligar para Gabi. Ficou surpreso ao ver que estava louco de vontade de falar com ela outra vez.

Gabi acabava de trocar a última fralda da noite quando ouviu seu telefone tocar. Deixara o aparelho no bolso da calça jeans para não perder uma possível ligação de Andreas.

Deu uma olhada no visor e ficou feliz ao constatar que era ele. Como seus pais tinham saído para jantar, ela poderia atender sem problemas.

— Andreas?

— Boa noite — ele respondeu, baixo.

Gabi gostou do tom que ouvia. Théa, obviamente, também acharia muito atraente. Mas só de pensar que a irmã se relacionara intimamente com aquele homem Gabi ficava sentindo-se culpada por pensar essas coisas.

— Estou ligando na hora errada?

— Não. — Ela saiu do quarto dos meninos e fechou a porta. — É um ótimo momento.

Gabi era a única pessoa que lhe poderia falar sobre os meninos, e ele estava louco para tornar a vê-los.

— Eles dormirão até a mamadeira das três. Graças a Deus!

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— Então você vai se arrumar para dormir, não vou demorar.

Ela não respondeu. Andreas só queria falar sobre os seus filhos, que pareciam preocupá-lo cada vez mais. Exatamente como Gabi queria. Recostando-se contra a parede do hall, ela perguntou:

— Já decidiu se vai querer vê-los outra vez?

— Sim. Podemos nos encontrar no parque segunda-feira? A pulsação de Gabi se acelerou.

— Claro. A que horas? De manhã ou de tarde? Por mim tanto faz.

— De manhã estaria ótimo para mim.

— Então nos vemos às dez. Já estarão alimentados e de banho tomado, e eu costumo dar um passeio com eles quando não faz muito calor.

— Estou muito ansioso para revê-los.

Esse sim,era um sinal excelente.

— As crianças adoram toda atenção que recebem. Combinado para segunda, então.

— Gabi?

Uma mudança sutil na entonação dele a deixou em alerta.

— Sim? Andreas respirou fundo.

— Obrigado por cuidar deles.

Ela ainda não sabia o que pensar do futuro. Após sua visita de segunda-feira, para ver os filhos, poderia não haver outra. Tinha de estar preparada para essa possibilidade.

— Não precisa me agradecer. É o mínimo que posso fazer.

— Já notei que você não é de aceitar elogios, então vou dizer de outra maneira. Nem todo o mundo faria o que você está fazendo. Seja por um irmão ou qualquer outra pessoa.

— Antes de me dar muito crédito, não se esqueça de que eu vi os meninos nascerem. Foi uma experiência que mudou minha vida.

— Não tenho dúvida disso. Ta Leme.

Ela conhecia bem essa expressão.

Gabi desligou, querendo que Andreas aparecesse no dia seguinte, e não na segunda-feira. Desejava saber os planos que tinha, pois viajaria com os meninos na semana seguinte. Não seria bom ficar mais tempo na Grécia. De uma maneira ou outra, ela precisava voltar à sua vida, e seus pais tinham de seguir com a deles.

Durante o passeio matinal de Gabi com os gêmeos, Kris dormiu. Na noite anterior, ele brincara muito após comer. Nikos, por sua vez, estava bem desperto.

Quando chegou ao parque, caminhando pela sombra, pegou Nikos no colo. Ele se aproximou do seu corpo quando ela lhe mostrou o chafariz. O som da água caindo chamou sua atenção. Gabi deu uma olhada para ver se Kris estava bem. E, como da outra vez, ficou sem fôlego ao ver Andreas de pé, ao lado do carrinho, olhando para ele.

Sempre que via o pai dos meninos, experimentava uma excitação incontrolável. Ele vestia um terno de trabalho azul-claro, com uma camisa da mesma cor, em tom mais

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escuro, e não usava gravata. Era a personificação do esplendor masculino, bem na sua frente. A mesma imagem um dia vista por Théa.

Por um tempo, Gabi imaginou que nenhum homem poderia se comparar a Rand naquelas botas de caubói. Em uma viagem de verão com Rachel McCallister, uma amiga da faculdade, ela se apaixonou profundamente pelo seu primo, dono de um irresistível charme texano. Foram duas semanas de relacionamento intenso, e Gabi pensou que seria assim para sempre.

Já era tarde demais quando notou não haver nada além daquele sorriso fascinante e daqueles olhos azuis. Rand a deixou voltar para Alexandria sem ao menos dizer que gostaria de revê-la. Quando Rachel lhe contou que se casaria com uma antiga namorada, o coração de Gabi se partiu.

Desde então, conheceu e saiu com alguns homem atraentes e bem-sucedidos, tanto do seu trabalho quanto do meio consular, mas nenhum relacionamento foi tão sério. Sua carreira era a prioridade número um, a base de sua vida.

Mas essa história a fez aprender uma lição bem antes de conhecer o lendário Andreas Simonides. Mesmo que não houvesse homem que fosse páreo para sua inteligência e incrível sex-appeal, ela não cairia no mesmo erro outra vez. Uma experiência fora suficiente.

Caminhou ao seu encontro, levando Nikos.

— Bom dia.

— Kalimera. — Sua voz tinha um tom altamente sedutor, relaxado.

Ela sentia o olhar de Andreas sobre o seu rosto, depois sobre Nikos. Mais uma vez, ele levantou os olhos.

— Lembra de mim? — Andreas perguntou, beijando a bochecha do bebê.

Os olhos de Nikos se moveram. Ele era uma gracinha.

— Gabi? — Andreas parecia ansioso. — Trouxe uma pessoa que gostaria que conhecesse.

Quem seria?

Talvez alguma mulher com a qual estivesse pensando cm se casar, já que dirigia as empresas Simonides. Gabi lutou para manter-se calma. Claro que a mulher estaria apaixonada por ele. Mas seria capaz de aceitar e amar as crianças que Andreas teve com outra mulher?

De um momento para outro, Gabi sentiu-se muito possessiva. Nenhuma outra mulher poderia cuidar tão bem dos meninos. Porém, não poderia fazer nada, pois Andreas tinha o direito de pai.

Ele pôs suas mãos no ombro de Gabi e murmurou:

— Não se preocupe, eu confio cegamente nele.

Nele?

Gabi estava com o coração na boca quando Andreas se afastou um pouco, voltando dois segundos mais tarde. Naquele momento, Gabi imaginou que seus olhos lhe pregavam uma peça, pois parecia estar vendo dois Andreas ao mesmo tempo.

Piscou, assustada, mas nada parecia resolver o problema de sua visão dupla. Eles se aproximaram, lentamente, e ela notou que estava tudo bem com os seus olhos. Caminhando em sua direção, estavam Andreas e seu clone, vestindo terno cor de creme

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e camisa em outro tom, mas sem a cicatriz de Andreas e com o cabelo exatamente igual ao estampado na foto do jornal.

Gabi ficou olhando para Andreas, surpresa.

— Você tem um irmão gêmeo?

— Pois é. Gabriela Turner, quero que conheça meu melhor amigo e irmão mais velho, por ter nascido cinco minutos antes, Leonides Simonides.

— Olá, sr. Simonides. — Ela lhe estendeu a mão.

— Leon, diga olá a seus filhos.

CAPÍTULO TRÊS

Então Théa esteve com Leonides Simonides, não com Andreas?

— Srta. Turner, não sei o que dizer. — Leon parecia tão estupefato quanto ela. Na verdade, ele mal pôde dizer essas palavras, pois seu olhar estava pregado nos meninos, e parecia não acreditar no que via.

— Gabi está com Nikos nos braços — disse Andreas, preenchendo o vazio do silêncio. — Aqui está Kris, que parece acabar de acordar de uma soneca.

Num movimento tão veloz quando a luz, Andreas virou-se para Gabi e piscou um olho. Ela sentiu uma onda de calor pelo corpo ao sorrir de volta para ele, lembrando-se do comentário que fizera no sábado sobre as crianças parecerem gatos gordos.

Mas não conseguia esquecer-se da presença de Leon. Mesmo que Andreas já tivesse lhe contado sobre os meninos, aquele não deveria ser o melhor momento de sua vida. Ela não ficou surpresa ao vê-lo sentar-se num banco, estupefato.

— Quer segurar Nikos? — ela perguntou.

— Não saberei o que fazer, caso ele chore — murmurou Leon, com o rosto pálido.

— Não vai chorar. — Gabi colocou o bebê nos braços dele. Naquele momento, Andreas já estava com Kris, beijando seu pescocinho.

Para deixá-los a sós, Gabi se afastou um pouco e sentou-se para terminar de ler a biografia sobre a vida da cozinheira francesa Julia Child.

Fazia muito tempo que não gostava tanto de um livro. Assim como Julia, Gabi adorava comida. Mas isso só aconteceu quando seu pai foi transferido a Creta, onde provou seu primeiro pastitsio, que gerou uma paixão instantânea pela culinária grega.

Gabi passou meses treinando na cozinha do consulado, pois estava determinada a criar os meninos com comidas gregas, em homenagem aos seus pais. E já era capaz de preparar um spa-nakopita muito bom.

Ao notar que lia a mesma página várias vezes, fechou o livro e olhou para eles. Os bebês já estavam no carrinho, e os dois homens permaneciam por perto. Andreas parecia falar mais, mas Gabi não sabia sobre o que conversavam.

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Não queria interromper, então esperou até o momento em que Andreas começou a caminhar, levando o carrinho em sua direção, com uma expressão grave em seu lindo rosto. Colocou o livro de volta na bolsa e levantou-se, notando que Leon se afastava, seguindo em direção à rua.

— Sinto muito por meu irmão — desculpou-se Andreas, sem rodeios.

— Não precisa. Nem todos os dias ficamos frente a frente com filhos que não sabíamos existir, muito menos de gêmeos. — A alegria que ela sentira antes, ao ver Andreas perto dos meninos, desaparecera. Ela não poderia imaginar, nem em seus sonhos mais loucos, que o verdadeiro pai dos gêmeos poderia ser o próprio irmão, também gêmeo, de Andreas.

Andreas olhou-a, com uma expressão solene.

— Ainda mais quando ele está casado há três anos.

Gabi teve de engolir um soluço. Théa sabia que ele era casado, ou será que, no calor do momento, tal detalhe não tivesse importado a nenhum dos dois?

— Obviamente, Leon vai precisar de um tempo — ela murmurou.

— É uma mulher muito compreensiva, Gabi. Quando ele cair em si, tenho certeza de que vai querer conversar com você.

Gabi pensava exatamente o contrário, sobretudo porque Andreas já deveria ter dito ao irmão que ela voltaria aos Estados Unidos, onde planejava criar as crianças. Mas não disse nada.

— Obrigado por tomar possível o encontro de hoje, Gabi.

Soou como um comentário de despedida. Leon provavelmente lhe dissera que não seria capaz de lidar com a situação. E que homem seria? Uma noite nos braços de uma estranha não deveria terminar assim. E ele não seria o primeiro pai a fugir de suas responsabilidades.

Gabi sentia pena de Andreas, que sem dúvida amava o irmão e faria qualquer coisa para apoiá-lo.

— Claro. Fui eu que o procurei, lembra? Graças a você, não vou ser obrigada a mentir para as crianças. — E, respirando fundo, disse: — Quando voltar a Virgínia, vou estar mais uma vez com o meu telefone, e deixarei meu número numa mensagem de voz para você. Assim, caso o seu irmão queira me contatar algum dia, passe meus números a ele. Ah, mais uma coisa: por favor, diga a Leon que nunca tentarei entrar em contato, seja pelo motivo que for.

O olhar de Andreas endureceu, tanto quanto a expressão em seu rosto.

— Quando vai embora? — perguntou, em tom grave.

— Depois de amanhã. — Gabi estendeu-lhe a mão, sem querer prolongar o inevitável. — Adeus, sr. Simonides.

Na terça à tarde o celular de Gabi avisou a chegada de uma mensagem de texto enquanto ela arrumava as últimas roupinhas dos bebês na grande mala. Seus pais brincavam com os meninos, pois aquela seria a última noite juntos durante um bom tempo. E logo seria hora de dormir. Seu pai queria colocá-los na cama.

Desde a véspera, quando Gabi seguiu o caminho contrário de Andreas e Leon, tentou esquecer-se de tudo aquilo. Imaginou estar fazendo um bom trabalho ao esconder

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seus sentimentos dos pais. Eles já sofreriam muito com a partida, no dia seguinte.

Não tinham idéia de que ela se encontrara com o pai dos meninos. E, para a sua surpresa, Leon não fazia nada para evitar à saída dos meninos do país, da sua vida.

Gabi sofria pelos seus filhos.

Uma dor tão grande que não poderia ser vencida, mas precisaria lidar com ela, pois fora o seu acordo com Andreas. E o honraria, mesmo sofrendo muito. Com um olhar muito triste, observou o telefone, que soava um alarme em cima da cômoda. Deveria ser sua melhor amiga, Jasmine, que sabia que estava voltando a casa e provavelmente perguntava pelo número do voo e horário. Mas, quando viu de quem era a mensagem, sua adrenalina foi ao céu.

Acabei de chegar a Heraklion. Quando colocar os gêmeos no berço, encontre-me no parque. Esperarei até de manhã, se for preciso, pois temos de conversar. A.

Ela teve de vencer sua vontade de chorar. A mensagem deveria significar que Leon pensara bem sobre deixar os meninos irem embora, e queria vê-los de novo. Significava que voltaria a ver Andreas. Gabi não gostou nada de constatar que sua pul-sação se acelerava só de pensar nisso.

Após fechar a mala, correu ao seu quarto para trocar de roupa. Tirou a camiseta e o jeans, e buscou uma calça cor de carne e uma camiseta de algodão verde, que deixara do lado de fora para vestir no avião, no dia seguinte.

Já com os cabelos penteados e tendo passado batom nos lábios, espiou o quarto dos bebês. Seus pais estavam absorvidos pelas crianças, muito ocupados para se preocuparem com ela.

— Vou sair uns minutos para comprar alguma coisas.

— Não demore — disse o pai, ninando Nikos. Aquela cena arrasou seu coração.

— Não.

Um minuto mais tarde, acenou para o guarda que tomava conta da entrada da casa e seguiu para o parque. Com o reflexo da água, o crepúsculo sempre revelava toda a beleza das ilhas gregas, mas nunca como aquele dia. Era culpa de Andreas. Só de saber que ele a esperava o mundo parecia mágico.

Talvez Théa tivesse se sentido assim quando encontrou Leon naquele iate, como se os céus se aproximassem por alguns instantes, e um dos deuses gêmeos do Olimpo se aproximasse dos humanos, para tocá-los.

Ele se aproximou bastante, tanto que lhe semeou dois gêmeos, dois pequenos mortais, e agora seu irmão gêmeo, o poderoso deus Andreas, estava por lá, para selar um acordo entre os dois mundos. Quando Gabi pensou nele sob aquela luz, esqueceu-se dos sonhos e voltou à realidade.

Naquela ocasião, hão estava vestido como um deus. Observou-o perto do chafariz, usando uma camiseta esporte cor de creme e calça caqui. Não havia ninguém por perto. Em vez dos costumeiros sapatos caríssimos, usava sandálias, como todos os que caminhavam à beira-mar.

Andreas observava sua chegada, mas não fez nenhum movimento na sua direção.

— Yassou, Gabi.

— Oi! — Mantenha a distância, disse a si mesma. — Vim logo que recebi sua mensagem, pois eu e mamãe temos um vôo amanhã logo cedo a Atenas.

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— Eu sei — ele disse, parado, com as mãos na cintura, emanando completa virilidade. — Antes que vá, queria conversar com você sobre uma coisa.

Ela piscou.

— Por que Leon não veio?

Andreas ficou olhando para ela por um instante.

— Acho que você sabe a resposta a essa pergunta. Gabi sabia, mas a presença de Andreas a deixava confusa.

— Não entendo por que está aqui.

— Estou aqui porque não quero que vá embora da Grécia.

Ela lutou para não soltar um gemido. De tudo o que imaginou que ele poderia dizer, nunca pensou que chegaria a tanto. Era como se Rand tivesse dito: "Não quero que vá embora de Austin..." Mas o texano não disse nada. Porém, em se tratando de Andreas, ela sabia que o pedido não poderia ser pessoal.

— Não entendo.

Ele respirou fundo.

— Leon está em pânico, mas em dois ou três dias vai entender melhor. E quando isso acontecer as crianças terão de estar por aqui, e não do outro lado do Atlântico.

Gabi também estava entrando em pânico e sacudiu a cabeça.

— Não posso ficar em Creta.

E ele, assustado, perguntou:

— Por que não?

— Por... porque meus país precisam ter sua vida de volta. E os meninos e eu necessitamos de uma casa.

Ele deu um passo à frente, na direção dela.

— Você teve uma casa aqui por vários meses. Imagino que seus pais sofrerão ao se afastar dos netos. Além dos mais, essa não pode ser a única razão para que queira ir embora tão rápido. Existe alguém em Alexandria a sua espera?

— Na verdade, sim, mas isso não é problema de ninguém. — Ao responder, Gabi observava um casal que caminhava pelo parque aos beijos.

— É mentira. Se fosse verdade, ele teria vindo aqui e levado você e as crianças de volta para a Virgínia há muito tempo.

O comentário soou como um beijo doce. Andreas seria um terrível adversário caso fosse preciso.

Ela desviou o olhar do casal de namorados.

— Se quer saber, eu quero ficar com as crianças.

— E assim eles pensarão que você é a mãe deles — deduziu Andreas. — Faz todo o sentido, mas não precisa ir à Virgínia para isso.

Gabi prendeu a respiração.

— Não tenho como ganhar a vida aqui, e a casa de papai em Alexandria é própria. Com minhas economias e sua ajuda financeira, eu me resolverei ate que os meninos estejam na escola e eu possa voltar ao trabalho.

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Ele sacudiu a cabeça.

— Já sei o bastante sobre o seu pai, mas garanto que ele poderá ajudá-la a conseguir uma casa aqui em Creta, onde você e os meninos estariam por perto, ainda que em lugar independente. Por que não me diz a verdade? O que está acontecendo?

Andreas já vira muita coisa na vida.

— Ainda há muito a ser dito sobre a paternidade dos meninos. Meus pais não sabem de nada. Se abrirmos o caso de seu irmão e Théa as duas famílias sofrerão, e você sabe disso. Por isso quero levar os dois comigo.

— O que os olhos não vêem o coração não sente, é o que você quer dizer.

— Sim.

Ele coçou a nuca.

— Isso pode funcionar por um tempo, mas é inevitável que um dia o segredo aflore. Sempre acontece. E nesse momento os danos serão maiores, não apenas para as famílias envolvidas, mas para os próprios gêmeos.

— Sim, mas agora não sei mais o que fazer. E...

Ela hesitou, mas Andreas queria recuperar o fio do que Gabi dizia:

— O que você ia dizer?

— Na... nada.

— Vamos, fale! — ele pediu. Tremendo, ela afirmou:

— Nunca deveria ter ido ao seu escritório.

— Não era isso o que estava a ponto de dizer.

Andreas tinha um radar. Gabi não teria outra escolha além de contar-lhe tudo. Não tudo, mas o suficiente para deixá-lo satisfeito.

Caminhou um pouco e sentou-se num banco. Ele a seguiu, e sentou-se próximo, apoiando o braço no encosto.

— O ex-marido de Théa vai atazanar a nossa família. Ele é capaz de qualquer coisa para deixar a situação de Leon insustentável.

— Refere-se a Dimitri Paulos. Gabi se levantou de um salto.

— Como sabe?!

Os olhos de Andreas passearam por Gabi.

— Fiz o dever de casa. E o passaporte de Théa dizia que era casada. Ele a ameaçou pessoalmente, Gabi?

Ela trincou os dentes.

— Não, mas basta dizer que ficou furioso quando Théa pediu o divórcio, Se não fosse pela imunidade diplomática do papai, nem sei o que poderia ter acontecido com ela. Dimitri a considerava sua propriedade. Théa estava convencida de que ele contratara homens para vigiá-la em todos os lugares.

Andreas ergueu uma sobrancelha, sardônico.

— Eu e meu pai temos negócios com o pai de Dimitri, em Atenas. Conheço bem os métodos ardilosos do filho dele.

Tal informação não deveria ter surpreendido Gabi. Andreas sempre sabia de tudo.

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— O problema é que, antes de morrer, Théa me disse que ele queria saber exatamente quem era o pai. Caso saiba que é o seu irmão, fará qualquer coisa para levar tal história aos jornais, de propósito.

— Ele pode tentar — murmurou Andreas, demonstrando altivez. E após um silêncio, disse: — Mas agora, como os seus pais devem estar a sua espera, vou acompanhá-la de volta a casa.

Gabi fez que não.

— Não precisa.

— Eu insisto.

Ele franziu a testa e começaram a caminhar. Com medo de que a tocasse, ela se afastou logo que chegaram à rua.

Quando Gabi acenou para o guarda, imaginou que Andreas diria boa noite. Mas ele seguiu em direção ao jardim à frente da residência.

Ela parou.

— Não precisa me levar até a porta.

— Mas o farei. Quero falar com os seus pais.

O quê? Ela tremeu, defensiva.

— Não, Andreas! Eles não sabem nada sobre isso, e quero que continue assim. Se Leon decidir ficar com as crianças, eu contarei tudo a eles. E se vamos discutir sobre isso, a discussão terá de ser com Leon.

Andreas baixou a cabeça.

— Num mundo ideal funcionaria assim, mas Leon ainda não está pronto.

Isso era óbvio.

Aproximando-se, Andreas segurou os braços de Gabi, gentilmente. Ela não queria, pois as sensações em seu corpo foram várias e perturbadoras. Sentia-se assustada ao lado de Andreas.

— Tenho um plano para resolver nosso problema imediato, Gabi, mas você tem de confiar em mim.

Os olhos dela se encheram de lágrimas.

— Théa confiava em mim, e veja o que aconteceu só porque quebrei a promessa que fiz a ela. Após seu terrível divórcio e morte, meus pais sofreram muito — disse, com voz trêmula. — Por favor, vá embora — pediu, afastando-se dele.

Andreas trincou a mandíbula.

— Não posso, ainda não resolvemos nada. Você sabe o que dizem sobre deixar as coisas no ar... Se as duas famílias soubessem a verdade, e se unissem, nada nos abalaria. Não acha?

Sim. Ela sabia, e sabia que não poderia vencer Andreas nesse sentido. Ele não era o cabeça da Simonides Corporation à toa. Gabi só poderia culpar a si mesma. Ele pedia apenas um voto de confiança. E, até um minuto antes, ela imaginou que seria capaz. Mas seguir em frente seria uma viagem às cegas.

— Eu... não sei se ainda estão acordados — disse Gabi, com voz trêmula.

— Então ligue do seu celular e diga que trouxe alguém para uma visita.

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Ela baixou a cabeça.

— Não posso fazer isso.

— Então faço eu, pois eles merecem saber o que está acontecendo.

Um tremor invadiu o corpo de Gabi. Andreas acabava de colocar o dedo na mais dura ferida. Ela odiava o fato de estar fazendo isso sem o conhecimento dos pais. Vencida pela lógica de Andreas e por sua própria culpa, abriu a bolsa e pegou o telefone. Quando ligou, sua mãe atendeu na segunda chamada.

— Oi, querida. Como você está? Imaginei que voltaria antes. Ela virou as costas para Andreas.

— Quando saí, na verdade era para me encontrar com um homem que conheci em Atenas. Ele está comigo e quer falar com você e com o papai. Sei que isso soa estranho.

O silêncio do outro lado da linha dizia tudo.

— Nós o conhecemos? Gabi engoliu em seco.

— Não, mas conhecem sua reputação. — Vocês e toda a Grécia.

— Como ele se chama?

— Andreas Simonides.

— Meu Deus!

Quando o iate dos Simonides chegava ao porto de Heraklion, todos sabiam.

Gabi fechou os olhos por um momento.

— Sei que está ficando tarde, mas isso é muito importante. Prepare o papai, certo?

— Claro. Os bebês estão dormindo. Vamos esperar na sala.

— Obrigada, mamãe, você é única.

Andreas a observou voltando a pôr o aparelho na bolsa.

— Se estiver procurando trabalho, eu a contrato como minha secretária particular apenas por sua integridade e discrição.

Gabi acabara de receber um grande elogio dele, mas a última coisa que queria era ser sua secretária pessoal ou qualquer coisa que os deixassem próximos, mesmo que por motivo de trabalho. Ela não se martirizaria assim.

— Vamos? — ela perguntou, abrindo caminho em direção à porta da frente.

A sala estava à direita do saguão principal, onde Gabi encontrou seus pais. Loiros e magros, para Gabi seus pais eram o tipo de pessoa mais bonito que existia, e Andreas gostou imediatamente dos seus modos.

Após as apresentações iniciais, ele sentou-se em uma das cadeiras opostas ao sofá onde se acomodavam os pais de Gabi, que por sua vez sentou-se em uma cadeira ao lado da dele, sabendo que seus pais estavam morrendo de curiosidade.

— Notei que estão olhando para mim — disse Andreas, sem preâmbulos. — Sem dúvida notaram que seus netos se parecem comigo. Isso porque o pai deles, Leonides, é meu irmão. Somos gêmeos idênticos, sim. Os gêmeos são comuns na família.

Enquanto os pais de Gabi digeriam tal informação, ele prosseguiu:

— Nikos e Kris têm mais um tio, Gus, e duas tias, Melina e Leila. Até Gabi vir ao meu escritório, na sexta-feira à tarde, os meus pais tinham dez netos. Mas, após nossa

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conversa, percebi que na verdade têm doze.

— Isso é incrível! — explodiu a mãe de Gabi.

Na verdade, ela parecia aliviada ao olhar para o marido, cujo rosto carrancudo se abrira em um sorriso, a última reação que Gabi poderia esperar dos seus pais.

Andreas olhou satisfeito para Gabi.

— Mais tarde, Gabi explicará o que motivou o nosso primeiro encontro. O importante agora é que, sábado, Leon encontrou os meninos no parque. Infelizmente, ele ainda não está preparado para assumi-los. Sua esposa, Deline, sabe que Leon teve um relacionamento de uma noite com a sua filha Théa enquanto estavam separados. Cheio de remorso, ele mesmo contou tudo à mulher no dia seguinte. Após muita reclamação e choro, ela acabou o perdoando, pois também tinha seus pecados. Porém, isso foi há um ano, e Deline não sabe que meu irmão tem dois filhos. Enquanto estamos aqui conversando, ele não sabe o que fazer.

Os pais de Gabi se deram as mãos.

— Quando Leon contar a Deline sobre os filhos, o casamento deles poderá acabar, possivelmente para sempre. A ironia é que estão tentando ter um filho desde que se casaram. E essa foi uma das causas da separação anterior. Ela dizia que meu irmão trabalhava muito, que não ficava tempo suficiente em casa para formar uma família.

Tal revelação deixou Gabi um pouco mais doída. Já havia muito sofrimento por ali.

— Eles estiveram separados um tempo, e foi então que meu irmão e Théa se encontraram no iate. Ela apareceu com um grande grupo de amigas, mas Leon não as conhecia. Seus amigos arrumaram o encontro, queriam fazer uma festa para animá-lo. Sua esposa, Deline, já lhe dissera que queria o divórcio. Ele reagiu muito mal. O que não é desculpa para o que fez, mas explica sua ações naquela noite.

O pai de Gabi ajeitou-se na cadeira.

— Acho que minha filha foi tão irresponsável quanto ele. Seu casamento nunca funcionou. Ela conseguiu o divórcio após uma longa batalha, e tomou uma decisão errada aquela noite.

Andreas franziu a testa, suas sobrancelhas negras arqueadas sobre os olhos cinzentos.

— Mesmo separado da esposa na época, meu irmão estava mal, pois ficou com vergonha de ter feito amor com uma desconhecida, ainda casado. Agora sua vergonha é ainda pior, pois ele sabe que Théa morreu, deixando dois bebês lindos, que são seus. Acredite em mim, meu irmão está muito angustiado.

— Deveria — murmurou o pai.

— Leon é meu melhor amigo, sr. Turner. Eu o conheço bem.

Gabi baixou a cabeça. Notou todo o amor e carinho no tom de voz de Andreas. Ele era realmente um homem maravilhoso.

— Em um ou dois dias, quando encontrar coragem de contar à esposa, Leon vai querer ver os meninos outra vez, e encontrar-se com vocês. Espero que então possa tomar alguma decisão.

— Não invejo a posição dele — comentou a mãe de Gabi.

Nem Gabi, mas ela só pensava em Andreas. Ele não era um homem comum. A profundidade de seu caráter a assombrava cada vez mais. Poucos dias antes, imaginava

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tratar-se de um homem de gelo.

— Vim aqui hoje para pedir a Gabi que ainda não volte para Virgínia. Acho que, se ela ficar na Grécia por mais uma semana, onde as crianças estão mais acessíveis, algo de bom poderá acontecer. Mas ela me contou que tem medo do ex-marido de Théa, Dimitri Paulos. Eu conheço Dimitri e sua família por conta de nossos negócios. Aparentemente, foi hostil quando sua filha pediu o divórcio. Ele é assim. Gabi está preocupada que venha a fazer algo, caso descubra quem é o pai dos filhos de Théa. Tem medo de que exponha Leon à imprensa.

A mãe concordou.

— Ele faria isso, sem pensar duas vezes.

Naquele momento, o pai de Gabi estava de pé.

— Dimitri se virou contra mim quando minha filha conseguiu o divórcio.

— Essas coisas acontecem. Quando meu irmão assumir a situação, já não será um choque para ninguém. Por enquanto, sugiro que Gabi e as crianças sejam levadas a um lugar seguro, mas ainda assim próximo o suficiente para que Leon tenha acesso.

Gabi piscou e perguntou:

— Onde?

Andreas a olhou profundamente.

— Conheço o local ideal — disse, com autoridade, levantando-se. — Já é tarde. Vamos saindo e eu lhe explico.

Os próximos minutos foram confusos, com os pais de Gabi agradecendo pela franqueza de Andreas e lidando com a situação de cabeça erguida. Antes que Andreas levasse Gabi à porta da frente, eles se abraçaram, dando as boas-vindas à família ao tio dos gêmeos. Andreas tinha o charme dos deuses.

Gabi saiu de casa com ele. O ar noturno parecia deixar aquele momento ainda mais íntimo. Quando Andreas a olhou, ela sentiu um arrepio diferente, como havia muito não sentia.

Isso não poderia acontecer outra vez, não mesmo!

Na semiescuridão, ela intuiu o olhar de Andreas sobre si.

— Gabi, você continuará confiando em mim?

Ela tinha dificuldade para engolir a saliva.

— Desde de que o conheci, sempre confiei em você. Os seus pais já sabem alguma coisa?

— Não. Leon quer contar quanto estiver preparado.

— Então você continuará mantendo segredo.

— Eu não me importo.

Não mesmo, e ela sabia o tipo de homem que ele era.

— Você já tem muito peso nas costas.

— Você também. Na verdade, herdou os gêmeos, Gabi. Eu quero ajudá-la nessa tarefa. Afinal de contas, eles também têm a minha carne e o meu sangue.

— Andreas, você também é casado? — Antes de qualquer coisa, ela precisava saber disso. — Não vejo nenhuma aliança, mas sei que alguns homens não as usam.

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No silêncio que se seguiu, ela notou uma certa tensão.

— Ainda sou solteiro. Não se preocupe, não estou mantendo segredos de mulher nenhuma nem negligenciando-a pelo bem de Leon.

Solteiro. A resposta de Andreas a assustou, pois ela já não confiava em si mesma ao lado dele. Quando prometeu que nunca seria envolvida por um homem novamente, Andreas apareceu na sua vida,

— Então... onde fica o tal lugar seguro? — ela quis saber.

— Em Milos, num vilarejo chamado Apollonia. Sei que você está pensando em ir embora amanhã de manhã, mas espero que pense seriamente na minha proposta. Seja como for, aguardarei por uma ligação sua ainda hoje, mais tarde. Durma bem, despinis.

CAPITULO QUATRO

Andreas tinha duas ligações por fazer. A primeira se anunciava desde a chegada da Gabi ao seu escritório, veio junto com aqueles cabelos loiros encaracolados.

Assim como a Vênus de Milo, que desceu à terra na antiga cidade de Milos, onde ele costumava passear quando garoto, a forma feminina de Gabi despertava os seus sentidos. Com seu 1,95m de altura ele nunca abrira espaço na sua vida para mulheres baixas ou loiras até aquele momento, o que o deixou surpreso. A honestidade total daquela mulher associada à sua intensidade o deixaram intrigado. Se tivesse de admitir tudo o que lhe pareceu fascinante e terno desde que a vira com os gêmeos a lista seria infinita.

Algo fora do normal acontecera com ele, que já se sentia um homem diferente. Certo ou errado, seu desejo de estar com Gabi era muito profundo, e soube que teria de terminar o relacionamento com Irena.

Sentir-se assim em relação a outra mulher não era justo com ela Andreas não buscou nada disso, mas aconteceu... Talvez os sentimentos de Andreas por Gabi morressem rápido, mas até então ele seria obrigado a explorá-los, pois nunca experimentara tanta atração por uma mulher antes. No fundo, sabia que tais sentimentos não eram exclusividade sua. Gabi não perguntaria se era casado se não estivesse pelo menos um pouco envolvida.

Naquela noite, na porta do consulado, teve de controlar-se para não pegá-la nos braços e beijá-la com ardor.

Após tomar banho, pôs uma toalha na cintura e buscou o celular, que tocou até a voz de Irena saltar na secretária eletrônica. Ficou frustrado, pois não queria fazer isso por telefone, e o seu nervosismo aumentou quando ela atendeu:

— Andreas... não desligue. Eu estava no outro quarto, e já pensava que você não ligaria hoje. Senti sua falta.

Ele foi tomado por um sentimento de culpa. Tinham conversado pela última vez na sexta-feira. Já era terça à noite. E naquele espaço de tempo Andreas não sentira

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saudade. Outra mulher preenchera seus pensamentos, sem deixar espaço para mais nada. Como isso poderia estar acontecendo?

— Irena? Quero que me perdoe.

— Você sabe que eu o perdôo.

Sim, ele sabia.

— Algo está errado, querido. Você está diferente. Sim, o mundo de Andreas ficara de cabeça para baixo.

— Não sei muito bem como dizer isso, mas acho que devo ser direto, pois você merece a minha total honestidade. Até sexta-feira, você era a única, mulher na minha vida.

E seguiu-se uma longa pausa.

— Está querendo me dizer que existe outra pessoa?

Ele baixou a cabeça.

— Não, vamos dizer que conheci alguém.

Andreas não acreditava que estava admitindo isso à mulher que amava e com quem pretendia casar-se. Isso só poderia significar que Gabi o envolvera muito mais do que ele imaginava.

Mais silêncio.

— Ela sente o mesmo? — murmurou Irena.

Eles nunca tinham brigado antes. Ela não era desse tipo. Andreas teria preferido que alterasse a voz. Mas o que ouvia era uma mansidão que só salientava sua dor.

— Sinto que ela não é indiferente a mim, mas eu ainda não lhe falei nada sobre os meus sentimentos.

— Mas você quer fazer isso?

Ele respirou fundo e expirou com força.

— Eu nunca faria mal a você sem necessidade, Irena, mas, até saber o que está acontecendo comigo, não seria justo permanecer ao seu lado. Por isso estou ligando.

Mais uma pausa.

— Poderia pelo menos ter vindo aqui para conversarmos.

— Vou fazer isso quando estiver em Atenas.

— Onde você está?

Ele agarrou o telefone com força.

— Em Creta, e não posso sair daqui. — Estava em um hotel, imaginado como se controlaria até a manhã seguinte, quando finalmente voltaria a ver Gabi.

— Ela sabe sobre nós?

Não havia nós. Aquilo se acabara.

— Não.

— Quem é ela? Irena merecia saber.

— Uma norte-americana que veio ao meu escritório por conta de uma situação de vida ou morte. Tinha algo a tratar comigo, coisas que ninguém .mais poderia resolver.

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Ainda a estou ajudando a resolver seu sério problema antes que retorne aos Estados Unidos.

— Sei — Irena sussurrou.

Não, ela não sabia de nada. Como poderia? Andreas queria contar-lhe tudo, mas não seria possível até saber o que Leon iria resolver. Irena era grande amiga de Deline. A situação era mais complicada do que parecia.

Ele agarrou ainda mais forte o telefone.

— Sei que a estou magoando, Irena, mas ser menos do que honesto com você neste momento seria inadmissível.

— Seu pai me disse que sua coragem é um de seus melhores traços. Após esta conversa, tenho de concordar com ele. Eu te amo, Andreas. E sei que você me amava, à sua maneira. Mas nunca esteve apaixonado por mim ou... — Ela hesitou.

Ele sabia que Irena estava a ponto de dizer: caso me amasse, já teríamos nos casado há meses.

— Vou desligar agora. — E Irena desligou.

Mesmo sentindo-se péssimo por ferir seus sentimentos, Andreas experimentou grande alívio ao saber que já não mentiria para ela nem para Gabi.

Tinha de fazer uma segunda chamada imediatamente: para Leon, que passaria as duas semanas seguintes de férias em Milos, com Deline e o resto da família. Com Gabi em Apollonia, na ponta norte da ilha, a nove quilômetros da villa Simonides, o momento e a proximidade não poderiam ser melhores.

Com medo de que ela não aceitasse o seu plano, resolveu tudo com antecedência. Não havia nada mais a fazer além de avisar o irmão, que já esperava a chamada de Andreas.

Nunca notara Leon tão chateado. Ele ainda não tinha dito nada a Deline, mas sabia que deveria fazê-lo.

Após encorajá-lo a não perder mais tempo, Andreas desligou, esperando pela chamada de Gabi. Caso ela resolvesse voltar aos Estados Unidos no dia seguinte de manhã, ele a levaria, junto com os gêmeos, no avião particular dos Simonides.

O pai de Gabi caminhava ao lado da cama, olhando-a solenemente.

— Quando Théa lhe contou sobre Leon Simonides?

Ao ouvir tal pergunta, ela percebeu que a noite seria longa.

— Pouco antes de morrer. Mas Théa imaginava ter feito amor com Andreas. Por isso fui ao seu escritório.

Seus pais ouviam tudo com atenção, cada detalhe do que acontecera com Théa.

— Ela me pediu que jurasse manter segredo, e eu pretendia honrar sua vontade. Mas, após sua morte, fiquei com os bebês e imaginei que seria terrível para eles não saberem quem era o seu pai. Não queria viver com esse segredo.

— Claro. — O pai a acariciou. — Eu te amo mais do que nunca por ter feito o que fez.

— Eu também — disse a mãe. — Você demonstrou muita coragem, querida.

— Sinto muito por ter mentido sobre a razão de minha viagem a Atenas sexta-feira,

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mas não sabia se poderia me encontrar com Andreas.

— Felizmente, conseguiu. E vê-lo entrar nesta sala foi como ver os meninos crescidos.

Seu pai balançou a cabeça.

— Ainda estou estupefato. Andreas é um homem de muita categoria. Um bom homem. Por isso está à frente do império Simonides.

— Você precisava vê-lo com os meninos, papai. A forma corno se relaciona com eles, como se fosse o pai.

Sua mãe aproximou-se e tocou seu braço, perguntando:

— E Leon, como é?

— Ainda não posso dizer. Estava em choque no sábado e mal pôde falar, mas o fato de ter aparecido diz muito dele.

— Ver esses dois irmãos juntos deve ser uma experiência e tanto. E Kris e Nikos serão assim.

Gabi concordou com a mãe.

— Théa era muito bonita, e eles também são. Quando crescerem e se tornarem homens, serão tão espetaculares quanto Andreas... Quero dizer, Leon.

— Ele sabe que Kris terá de fazer uma série de cirurgias no futuro?

— Ainda não, mãe.

— Por que não lhe disse nada?

— Porque eu sabia que Leon estava aturdido. Ao me colocar em seu lugar, percebi que seria duro contar tudo isso à sua esposa. Acho que não queria assustá-lo ainda mais, fazendo-o pensar que estava atrás do seu dinheiro para pagar os custos dos médicos.

O pai de Gabi acariciou seu braço.

— Conte a Andreas. Ele saberá como dizer ao irmão.

— Tem razão, papai. Farei isso.

— E os pais dele, já sabem?

— Não.

— Então, onde fica o tal lugar seguro de que Andreas falou?

Ela se levantou da cama, muito nervosa para permanecer sentada.

— Em Milos.

— Claro. A família deles tem uma propriedade nessa ilha que é mais bem vigiada que a Casa Branca.

— Na verdade, papai, ele falou que eu poderia ficar num povoado chamado Apollonia, mas não sei de nada mais. Disse que eu devia deixar tudo nas suas mãos, mas preciso me certificar de que e a coisa certa a ser feita. Falei que teria de pensar. Andreas está esperando uma resposta ainda esta noite.

Seu pai pigarreou.

— Acho que eu e sua mãe não deveríamos lhe dizer que seria maravilhoso ter você e os meninos por perto enquanto Leon se decide. Claro que eu preferia que você ficasse aqui e...

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— Não, papai. Nem sei como você foi capaz de trabalhar até agora, mas está na hora de concentrar-se no que tem a fazer. Sempre tem muita gente indo e vindo, nós somos muita distração por aqui.

— Você e os meninos não são uma distração, Gabi.

— Sabe o que quero dizer. Sua vida não é convencional. E você tem de voltar a ela. Andreas me disse que pensasse nisso como umas férias.

A mãe a olhou, pensativa.

— Se Leon decidir assumir as crianças, você terá de admitir que Andreas está oferecendo uma solução temporária que é boa para todos. Em uma semana tudo estará resolvido. Mas a decisão é sua.

Era isso o que a assustava. Nenhuma decisão parecia ser a certa.

Se Leon quisesse assumir os filhos e criá-los, Gabi estaria livre para voltar à sua vida de sempre nos Estados Unidos. Mas seu mundo mudara tanto desde sua chegada a Creta, quatro meses antes, que já nem se conhecia muito bem.

Os gêmeos eram tudo para ela. E para Andreas..... que esperava sua resposta.

Parou na porta do quarto, lutando contra vontades conflituosas.

— Andreas está fazendo tudo o que, pode para reunir o irmão e os bebês. Eu comecei tudo isso e preciso ir até o fim. Vou dizer que sim. Nós nos vemos amanhã de manhã.

Já fora do quarto, correu para fazer a ligação. Andreas atendeu no segundo toque.

— Gabi... Já conversou com seus pais?

— Sim — ela respondeu, lutando para manter-se calma. — As crianças precisam do pai. Se a minha ida para Milos vai acelerar o processo, eu aceito.

— Ótimo. Então escute o que eu gostaria que fizesse. Siga exatamente os planos que você e seus pais tinham para amanhã de manhã. Mas, quando chegar ao aeroporto, diga ao motorista que a leve ao heliporto, onde o meu helicóptero estará esperando. Estarei por lá para ajudá-la com os bebês.

— Tudo bem. Olhe, Andreas... tenho de dizer tuna coisa. Já deveria ter dito antes, mas tinha medo.

— O quê?

— Não queria dizer porque você poderia continuar pensando que eu só queria o seu dinheiro.

— Vá em frente.

— Tem a ver com Kris.

— De que se trata?

— Ele nasceu com um defeito na válvula aórtica, no coração. Ninguém sabe a causa. Não foi nada herdado de Théa. Ela não teve nenhum problema de coração até ficar grávida. Chamam seu problema de estenose.

— Notei que ele é um pouco menor.

A maior parte das pessoas não viam diferença alguma entre os gêmeos, mas nada passaria despercebido a Andreas.

— De acordo com o seu pediatra aqui de Heraklion, Kris terá de fazer sua primeira

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operação no mês que vem. Eu planejava levá-lo ao medico cm Alexandria, alguém muito bem recomendado, um especialista.

— Vamos encontrar o melhor tratamento aqui em Atenas — murmurou Andreas, parecendo distante. — Quantos procedimentos serão necessários?

— Talvez mais um, além desse. O doutor disse que a maior parte das válvulas terá de ser substituída a cada dois ou três anos, mas que na medida em que for crescendo o intervalo será cada vez maior, até não precisar mais trocar. É o que esperamos, e rezamos para que aconteça.

— Eu também.

Ela levou a mão à nuca.

— Quando pensa em contar ao seu irmão?

— Hoje à noite. Ele precisa saber de tudo antes de sua chegada a Milos. Nas próximas semanas, vamos começar a doar sangue para a operação de Kris.

— Nossa família também pretende doar alguma coisa. Olhando para ele, não parece haver nada de errado. Ele é precioso.

— Nunca escondi nada dos meus irmãos.

— Sei o que quer dizer. E Kris e Nikos são presentes de Deus, crianças perfeitas.

— É verdade. Durma bem e aproveite o que resta da noite, Gabi. Amanhã será um novo dia para todos nós.

— Andreas...

— Sim?

— Só queria dizer que Leon tem muita sorte por ter um irmão como você. Espero que os gêmeos se amem tanto como vocês dois. Boa noite.

— Estamos chegando ao primeiro vilarejo pesqueiro de Apollonia, chamado Apollo — informou Andreas, que mostrava tudo a Gabi, fazendo um tour pelas Cíclades enquanto copilotava o helicóptero.

Ela nunca fora a Milos. Enquanto o piloto rodeava a linda ilha, brilhante entre o azul do mar Egeu, Gabi perdeu o fôlego. Já chegara a Mikonos e Kea de Ferry, mas nunca pelo ar. Ver todas aquelas formações vulcânicas e praias coloridas do alto a deixou sem palavras.

Durante a viagem, vindos de Heraklion, seus olhares se cruzaram várias vezes. Talvez fosse um truque de luz, por estarem tão alto, num céu sem nuvens, mas quando ele a olhava suas íris cinzentas pareciam se transformar em algo cristalino, como um fogo cintilante.

Gabi deixou os gêmeos ao seu lado, para cuidar deles o tempo todo. Permaneceram acordados durante o voo, que foi perfeitamente tranqüilo.

— Isso aí embaixo, ao lado da baía, é Apollonia? — perguntou Gabi, ao se aproximarem.

— Não. Essa é a casa do clã Simonides. Apollonia fica logo atrás.

Gabi estava extasiada. Olhou para os gêmeos. Eles não tinham idéia da linhagem de que procediam, não sabiam que incluía o reino mais mágico que ela já vira na vida. Mas, em vez das torres e pontes levadiças dos contos de fada, aquela era uma

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propriedade branca, cúbica, incrustada ao lado das águas mais azul-turquesa daquela parte do mundo.

Mais adiante se achava a pitoresca cidadezinha onde ela ficaria. Construída nos típicos tons azuis e brancos gregos, junto a uma praia de areia branca, do tipo que se vê em vídeos e cartões-postais. Antes mesmo de o helicóptero pousar, ela já sabia que adoraria aquele lugar.

Observou os barcos no píer do vilarejo. Parecia haver várias lojinhas e restaurantes próximos, deveria ser um lugar de férias idílico. Logo que pousaram e os motores pararam de girar, Andreas a ajudou a levar os bebês para um carro que os esperava ao lado.

O chofer guardou sua bagagem e o carrinho na mala. Era bastante coisa. Ela pôs a cabeça para fora da janela.

— Obrigada, Andreas! Viajando com bebês, não podemos pensar em bagagem leve.

Os dois homens sorriram antes de Andreas tomar o assento à í frente do volante e ligar o motor. Sentada atrás daquele corpo musculoso, Gabi sentia uma excitação forte, algo que não tinha nada a ver com o motivo que a levara àquele local.

Andreas passou por bares e tabernas, mostrando um supermercado e uma padaria onde ela poderia comprar tudo o que precisasse. Em minutos, chegaram a uma estrada particular escondida entre árvores, que terminava em uma charmosa casa azul e branca, com seus jardins e caminhos de pedra.

Gabi deixou escapar um gemido de prazer.

— Que lugar mais adorável, Andreas!

— Fico feliz que tenha gostado. Aportada frente dá direto na praia. A casa tem ar-condicionado em todos os cômodos, mais uma razão por que a escolhi.

— Os meninos vão ficar muito bem por aqui. Ele a olhou de forma curiosa.

— Acha que eles estão gostando?

— Não tenho a menor idéia — ela respondeu, abrindo um sorriso. — Mas poderia apostar que sim.

Ele a seguiu com o olhar ao descer do carro para abrir a porta do banco de trás. Naquele momento os gêmeos estavam bem acordados, prontos para sair do seu confinamento. Ela pegou Kris, e Andreas, Nikos. Caminharam até a porta, onde uma linda mulher de cabelos castanhos, que parecia ter 20 e poucos anos, deu-lhes as boas-vindas.

— Kalimera, kyrie Simonides.

— Kalimera, Lena. Esta é Gabi Turner.

As duas mulheres sorriram uma para a outra.

— Lena e seu marido cuidam deste resort. Eles têm um filho, Basil, de 5 anos.

— Ah, eu adoraria conhecê-lo...

— Está com o meu marido agora, mas vou trazê-lo ao jardim mais tarde. Quanto tempo têm as suas crianças?

— Três meses.

— São lindas. — Lena fitou Andreas, sem dúvida notando que se pareciam muito com ele, não com Gabi. — Temos serviço de quarto. Caso precise de qualquer coisa,

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pegue o telefone e nós responderemos.

— Obrigada. Este lugar é maravilhoso.

— É verdade. Espero que tenha uma boa estada.

Quando ela foi embora, os dois entraram na sala, cujo interior estava decorado com móveis de madeira escura e acessórios em azul.

— Que casa mais charmosa!

— Fico feliz que tenha gostado. — Andreas parecia realmente contente, enquanto ela o seguia pelos quartos, onde tinham sido montados dois berços e cômodas. Tudo impecavelmente limpo.

Andreas ajudou-a com os bebês e deitou-os nos berços.

— Vou trazer as suas coisas.

— Ótimo. — Gabi deu um beijo em Kris. — Os bebês estão acordados há muito tempo, impacientes para almoçar, mas primeiro tenho de trocar as fraldas.

— Depois eu ajudo a alimentá-los.

— Não precisa.

— E se eu quiser?

Sua brincadeira não a desestabilizou.

— Já fez mais do que deveria, Andreas. Fico imaginando sua fantástica secretária pensando em que lugar você está.

Ela o observou dar um beijo em Nikos.

— Eu já disse que estou de férias, certo? Toda a minha família ficará por aqui nas próximas duas semanas.

Nesse momento, ela sentiu um vazio no coração.

— Pelo que me lembro, você queria me atender ontem à tarde, às três.

— Mas se você se lembra bem — ele murmurou, aproximando-se dela, com todo o seu calor e cheiro supermasculino —, uma situação de vida ou morte alterou o esquema de nossas vidas.

Gabi notou o que ele disse: nossas vidas. Quando foi ao seu escritório de Atenas, na sexta-feira, nunca imaginou que alguns dias mais tarde estaria com ele a sós em Milos. Isso ultrapassava seus sonhos mais loucos. Mas ali estava ela...

— Agora, minha prioridade número um é oferecer apoio moral a Leon. — E Andreas saiu do quarto.

Sozinha, Gabi se lembrou do motivo que a levou temporariamente àquele pedaço do paraíso. Leon tinha muita sorte ao contar com o apoio do irmão. Como o seu pai dissera, Andreas era um bom homem. Quem não tivesse acompanhado sua história desde a sexta-feira anterior nunca saberia o quanto.

Em poucos minutos ele voltou com a bolsa de fraldas, e mamadeiras já preparadas. Trocaram os bebês antes de ir à sala de estar para dar-lhes de comer. Ele estava tão envolvido quanto qualquer pai. Não importava se Leon os assumiria ou não, Andreas já era tio daqueles meninos. Gabi notou que seria parte integrante da vida deles dali em diante.

Ao colocarem os bebês para dormir, Andreas disse que seguiria para a sua villa.

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— Volto com comida antes que eles acordem — disse, olhando-a fixamente antes de deixar a casa.

Ao tirar roupas da mala para dependurar nos cabides, Gabi ouviu um barulho de carro partindo. Ele tinha dito que a propriedade dos Simonides estava a menos de dez minutos de distância de automóvel, mas já sentia sua falta. Para manter-se ocupada, deu uma olhada no resto da casa.

Uma cozinha americana ligada à sala, pequena, mas perfeita, tinha lanches e uma geladeira repleta de bebidas. Do outro lado da casa, um banheiro separava os dois quartos. O seu tinha uma espaçosa varanda, com poltronas e uma mesa, de frente para o mar de águas translúcidas. Os vasos de flores e uma buganvília fúcsia emprestavam um cheiro maravilhoso àquele espaço.

Gabi passou os braços em volta do próprio corpo; não conseguia conter a euforia que a invadia. Achava-se naquele estado perigoso, quando as linhas são apagadas e começamos a imaginar coisas diferentes, fora da realidade da situação. A praia a chamava, e, sabendo que Lena daria uma olhada no bebês, vestiu seu biquíni azul-claro. Um mês atrás, passeando em uma loja de Heraklion, comprou o biquíni mais discreto que encontrou, mas ainda assim revelava mais do que ela gostaria. Um bronzeado poderia ajudar, mas aquele verão não fora exatamente relaxante.

Após passar protetor solar, pegou uma toalha grande e saiu para a praia, atravessando a varanda. Para chegar ao mar, bastavam alguns passos, nada mais. Deixou a toalha na areia e correu, perdendo-se nas águas calmas e com ótima temperatura.

Gabi nadou um pouco, depois ficou flutuando um tempo de costas, observando vários barcos e algumas balsas a distância. Havia um pouco mais de gente na praia, mas estavam longe, então era como se areia fosse praticamente sua. Nadou sob as águas para ver o fundo do mar antes de voltar à praia e deitar-se na toalha.

Deitada ali, imaginando estar no paraíso, ouviu o barulho de um motor indicando a aproximação de um barco. Quando o som parou, ela levantou a cabeça e notou que um jet ski estacionara na areia.

E então, mais uma vez avistou dois deuses gregos em sungas pretas descendo do jet ski com a agilidade que todo homem sonha ter. Caminhavam na sua direção.

— Andreas... — disse, sentando-se e envolvendo-se com a toalha, protegendo-se um pouco dos olhares. E lembrou-se de manter a compostura, cumprimentando o irmão dele: — Como vai, Leon?

Um sorriso tímido tomou conta dos seus lábios.

— Melhor do que poucas noites atrás. Sinto muito por meu comportamento rude.

Ela balançou a cabeça.

— Não se preocupe.

— Claro que me preocupo — ele insistiu, como faria o seu irmão, Andreas. — Eu deveria perguntar como você está. Sei que esteve tomando conta dos meus filhos todo esse tempo.

Gabi sorriu.

— São meus sobrinhos, e isso não é nenhum sacrifício, acredite em mim.

— Posso entrar para vê-los?

Ele estava fazendo um esforço, mas óbvio que Gabi permitiria.

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— Lógico. Se eles começarem a se mexer, a mamadeira está na geladeira. É só esquentar em um pouco de água quente. Andreas, por que não entra com Leon enquanto eu dou mais um mergulho? Caso eles acordem, vão adorar ver o pai.

O sorriso branco de Andreas teve um efeito dominó, atingindo todas as partes do seu corpo.

— Quando voltar mais uma vez à superfície, suba as escadinhas do barco que eu a levo para um passeio. Enquanto Leon estiver com eles, podemos comer alguma coisa a bordo.

— Ótima idéia. Estou ficando com fome.

Já eram quase três e meia da tarde, ela estava perdida no tempo.

— Eu também. — E seu tom de voz rude causou mais um efeito estranho no corpo de Gabi.

Quando os dois desapareceram pela porta da frente, ela correu para o quarto, passando pela varanda, e pegou um vestido de verão bem soltinho que costumava usar como saída de praia.

Suas vozes masculinas desapareceram enquanto ela voltava à areia. Após sacudir a toalha, entrou na água c colocou suas coisas na parte de trás do barco antes de subir. Quando Andréas saiu da casa, ela estava apresentável, sentindo-se confortável para estar ao seu lado, já com o vestidinho.

Ele correu na sua direção, empurrando o barco de volta à água, depois subiu por um dos lados, sem grande esforço. Olhou-a de relance antes de ligar o motor.

— Vamos para Kimolos. — Andreas fez sinal em direção a uma ilha que não estava nada longe. — Só a visão do pequeno povoado de Psathi valeria a viagem.

No meio do caminho, desligou o motor e aproximou-se dela para comer alguma coisa. Tinham refrigerante, frutas e gyros feitos em casa. Gabi nunca comera algo tão bom. Nem precisava pensar muito para saber o que causava tal sensação.

— Obrigada por essa comida maravilhosa. Na verdade, obrigada pelo passeio.

Andreas ficou olhando para ela enquanto mordia uma maçã.

— Obrigado por não desistir enquanto tentava me ver, no escritório.

Gabi sabia o que ele queria dizer. Sua boca se abriu num meio sorriso.

— Precisamos agradecer à sua secretária. Sem a ajuda dela, teria sido impossível. — Gabi franziu a testa. — Na verdade, talvez tivesse sido melhor caso ela não tivesse demonstrado tanta compaixão.

Ele endureceu a expressão.

— Nunca diga isso. Eu não quero nem pensar em tal coisa.

Nem ela. Um mundo sem Andreas seria incompreensível para Gabi. Terminou de beber seu refrigerante.

— O que o seu irmão estará sentindo agora?

Ele fechou os olhos e encostou-se no banco do barco, deixando seu corpo ser banhado pelo sol por um momento. Definitivamente, aquele corpo musculoso, aqueles pelos negros e aquele perfil cinzelado eram demais para Gabi, que virou o rosto, olhando para qualquer outro lugar.

— Se Leon não tivesse ficado com os gêmeos gravados na memória logo no

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primeiro dia, eu não a teria trazido aqui. Quando lhe disse que Kris seria operado dentro de um mês, acho que mergulhou de vez na realidade da situação. Mas está horrorizado, pois ama Deline e tem medo de perdê-la quando lhe contar a verdade.

— Não sei o que faria caso estivesse no seu lugar.

Após um silêncio, ele disse:

— Se você fosse Deline, acha que poderia agüentar tal situação?

Essa pergunta a deixou sem resposta. Ficaram se entreolhando por um tempo.

— Honestamente, não sei. Ela já o perdoou pelo que aconteceu há um ano, mas agora estão em jogo os filhos de outra mulher. — Baixou a cabeça. — Caso eu o amasse loucamente, talvez aceitasse. Leon não sabia que minha irmã estava grávida; mas eu não sou Deline. Eles se amam o suficiente para lidar com isso?

Andreas se sentou melhor e apoiou os pés no convés do barco.

— Quando Leon contar toda a verdade, eles talvez descubram o quanto seu casamento é sólido.

— Ele precisa fazer isso já. A cada dia que passar, mais se tornará complicado para ela acreditar em Leon.

— Foi o que eu disse na noite em que ele conheceu os filhos no parque.

— Andreas... eu adoraria ficar mais tempo passeando com você e deixar Leon com os meninos, mas acho que deveríamos voltar. Você deve dizer ao seu irmão que, caso espere mais um dia, poderá ser tarde demais para convencer Deline de qualquer coisa.

— Certo.

— A confiança é o mais importante. Se Leon quer provar o seu amor, deve contar a verdade imediatamente.

Andreas concordou.

— E não apenas isso, a cada dia que estiver longe dos filhos, mais perderá tempo com eles. — Levantou-se. — Vamos.

Com o mar tão plácido, eles retornaram muito rápido, mas Gabi não sentia o mesmo que sentira na ida. Ao chegarem, desceu logo do barco e caminhou em direção à porta de entrada, na frente de Andreas.

Para a sua surpresa, Leon levara os filhos à sala. Era lindo ver aquela cena, os três ali, juntos. Nikos estava deitado próximo ao pai, que segurava Kris no ar, beijando sua barriga e fazendo com que o filho abrisse um sorriso.

Os olhos de Andreas se arregalaram ao ver que Gabi presenciava aquela cena tão expressiva. Ela deu um passo atrás, não querendo interromper, e nesse momento Leon levantou Nikos no ar.

Depois ficou de pé com Kris dependurado no ombro.

— Não posso acreditar que são meus filhos — disse, colado aos cabelos negros e sedosos de Kris.

Ele parecia muito à vontade com os meninos naquele momento.

— Ouso dizer que você produziu os filhos mais bonitos de todo o clã Simonides.

Leon olhou para, o irmão, esperançoso.

— Sabe, tenho de conversar com Deline hoje. Venha comigo, Andreas.

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Tudo o que Gabi desejara estava acontecendo, mas ao mesmo tempo sentia uma porta se fechando à possibilidade de adotar os sobrinhos. Era como se o seu coração estivesse sendo arrancado do peito.

CAPITULO CINCO

— Gabi? — chamou Leon. — Não sei muito bem quando vou voltar. Você poderia tomar conta dos meninos um pouco mais? Sabe o que eu quero dizer, não é?

Sim. Ela sabia muito bem, mas por algum milagre conseguiu não sucumbir ao impulso e ficar histérica.

— Eu adoro tomar conta dos meus sobrinhos, e quero ajudar o máximo que puder. Por que não coloca os dois de volta no berço? Assim eu poderia trocar suas fraldas — disse, com o tom mais amigável que pôde empregar.

Quando chegaram ao quarto, Gabi notou o olhar de Andreas sobre si, mas conseguiu evitar o contato visual. Ele podia enxergar dentro de sua alma. Caso cometesse o erro de encará-lo, sua compostura se dissolveria. Era um momento primordial para Leon. Uma recaída de sua parte poderia arruinar tudo.

Saíram do quarto e Gabi finalmente escutou o barulho do motor do barco mais uma vez. Trocou as fraldas dos meninos e colocou-os no carrinho para dar uma volta pelo vilarejo. Ao lado da padaria, encontrou uma delicatessen onde comprou um pouco de comida pronta.

Já de banho tomado e vestindo uma saia e camisa sem manga azuis, saiu pela porta dos fundos. Lena passeava com o filho.

As duas conversaram e foram ao vilarejo juntas. Gabi gostou da companhia de Lena. Assim não ficou pensando na perda que se aproximava. Para ser honesta, não perderia apenas os meninos...

Três horas mais tarde, colocava os bebês para dormir quando ouviu seu celular tocar. Ao ver o nome de Andreas no visor sentiu um vazio no estômago.

— Alô? — ela atendeu, sabendo que sua voz pareceria ansiosa.

— Liguei logo que pude, Gabi.

— Não precisa se desculpar o tempo todo. E... e Leon? Conversou com a esposa?

— Sim.

O silêncio de Andreas fez com que ela segurasse o fone com muita força.

— Foi ruim?

— Não vou mentir para você. Foi bem pior que isso. Gabi ficou com um nó na garganta.

— Sinto muito.

— Eu também. Deline ameaçou pedir o divórcio e voltou para Atenas no

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helicóptero. Levei Leon ao aeroporto para que pudesse tomar um avião e encontrar-se com ela.

Uma nova ferida se abrira entre eles.

Quando Théa divorciou-se de Dimitri, Gabi ficou muito feliz, mas essa situação era completamente diferente. Pelo que tudo indicava, Deline era uma mulher adorável que não merecia nada disso. E os bebês também não mereciam, Mas o fato era que o erro cometido por Leon e Théa causara danos por todos os lados.

— Sua família sabe por que ele foi embora de Milos?

— Ainda não, mas será questão de tempo — respondeu Andreas.

Ela mordeu o lábio, nervosa.

— O que seu irmão quer que eu faça?

— Que fique aqui. Vou trazer o carro amanhã às oito e meia. Iremos até o píer, onde o iate estará a nossa espera. Preciso desconectar um pouco, e assim aproveito para lhe mostrar os pontos mais bonitos da ilha. Leve comida para os bebês, para o caso de resolvermos passar a noite em outro porto. Stavros cuidará do resto.

Gabi sentiu um arrepio.

Um convite para passar a noite no iate de Simonides fora uma tentação muito grande para Théa. E para Gabi não era diferente. O desejo de estar um longo tempo com o tio dos gêmeos em um barco a deixou cheia de expectativa e com o coração saindo pela boca.

Imaginou que nunca encontraria um homem que mexesse tanto com ela quanto Andreas. Em poucos dias, Leon teria os planos definitivos para os bebês, e Gabi deixaria a Grécia.

Então por que não aproveitar aquele tempo com Andreas? Ela sabia tratar-se de um solteiro não interessado em relacionamentos fixos, do mesmo modo que ela, que já aprendera a lição com Rand.

No futuro, viria visitar os sobrinhos e a família de vez em quando, mas tinha uma carreira esperando por ela na Virgínia.

Os meninos tinham de estar ao lado do pai. Precisariam se acostumar à babá que Leon contraria para cuidar deles.

Gabi não poderia ficar ali ou nada daria certo, então, aquele tempo em Apollonia era tudo o que teria ao lado de Andreas. Como disse à recepcionista na sexta-feira: "Vou aproveitar!"

— Ótimo, às oito e meia. Nós três estaremos prontos. Boa noite, Andreas. — E desligou antes que traísse a si mesma, pois queria manter a ligação ativa, nem que fosse apenas para ouvir sua voz profunda.

Com os bebês dormindo até a seguinte hora de comer, Andreas disse a Stavros que levasse o barco ao ponto mais próximo possível da entrada da cova. Uma olhadela revelou que uma sereia loira se juntaria a ele. Estava no trampolim, pronta para mergulhar.

Seu modesto biquíni de duas peças parecia aumentar o poder de atração de seu corpo bem proporcionado. Comparada às mulheres bronzeadas que via em várias praias durante o dia, vestindo biquínis sumários ou nada, a feminilidade deliciosa de Gabi e sua

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pele macia — não acostumada a tomar muito sol — o atraíam.

— Tem certeza de que quer fazer isso, Gabi? Já nadamos muito hoje. Se estiver cansada, podemos explorar esta área amanhã.

Ela abriu um sorriso que fez o coração de Andreas pular do peito.

— Após a propaganda sobre nadar na sua praia favorita? De jeito nenhum!

E, sem avisar, ela mergulhou no mar e entrou na cova que levava à praia de Papafragas, numa velocidade incrível.

Andreas não se divertia tanto havia anos, e seguiu-a pelas águas frias. Além da abertura, existia uma piscina natural, enorme, cercada por muros de pedras brancas. Ele ouviu o grito maravilhado de Gabi.

— Isso é fabuloso, Andreas! — disse, criando um eco com a voz.

Ele a alcançou e os dois nadaram juntos.

— Aqui é possível ver as cavernas profundas, onde os piratas se escondiam.

— Assim como os piratas de hoje, os irmãos Simonides, eu imagino — disse, virando-se para olhar as formações rochosas. — É hora da verdade, Andreas. Entre você e Leon, quantas mulheres já trouxeram aqui numa tarde como esta, sempre fingindo sermos as únicas?

Mais alguns metros à frente estava a praia de areia branca, ainda aquecida pelo sol, mesmo que os raios já não a alcançassem. Gabi chegou primeiro e sentou-se na areia, olhando para o céu.

— Ah... isso é tão bom, não quero sair daqui nunca mais.

— Ficamos por aqui, então. — Andreas se deitou ao lado dela. Ele não se lembrava da última vez em que se sentira tão vivo.

Um sorriso se abriu no canto da boca de Gabi.

— Temos de ir embora, nem que seja pelos gêmeos.

— Eles estão sendo bem tratados. Por enquanto, queria me esquecer de tudo e de todos, concentrando-me unicamente em você. — Andreas arqueou uma sobrancelha. — Você sabe o que eu quero fazer.

A pulsação no pescoço de Gabi estava fora de controle.

— Sim — ela murmurou, com um fiapo de voz.

Ele soltou um gemido, vindo do fundo de sua garganta. Acabara de escutar exatamente o que queria antes de colar sua boca de Gabi. Precisava de um beijo dela tanto quanto do ar para respirar. Ao sentir seu gosto, seu corpo tremeu por inteiro. Penetrou em sua boca. Deram um beijo desesperado, até tudo se transformar numa corrente de desejo que não podiam controlar.

Sem ligar para a areia fina que os cobria, ele rolou em cima dela, tomando seu corpo perfeito entre os braços, sentindo seu cheiro.

— Você é tão bonita, Gabi — sussurrou, na altura da sua nuca. — Será que tem idéia do quanto eu a quero?

— Andreas... — O tremor na voz de Gabi indicava que eles dois estavam entrando num mundo onde não existia nada além do desejo que sentiam um pelo outro.

— O quê? — E beijou mais uma vez aquela boca incrível.

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— Sinto como se eu estivesse fora de controle — ela admitiu, contra os seus lábios.

Ele ajeitou o corpo de Gabi contra o seu com urgência.

— Isso é exatamente o que deveria sentir. Eu sinto como se nunca fosse capaz de me cansar de você — disse, depois beijou-a mais uma vez, e terminaram devorando um ao outro.

Sem nunca antes ter experimentado nada igual, ele não estava preparado para o momento em que ela, de repente, afastou-se dos seus lábios e do seu corpo.

— O que foi? — Andreas se sentou. — Não estamos apostando corrida.

— Talvez não, mas eu estou sem ar e preciso reduzir a velocidade antes de recomeçarmos.

Ele beijou o ombro de Gabi.

— Caso esteja muito cansada quando estivermos prontos para partir, eu a ajudo.

— Você quer dizer que me levaria embora daqui usando as antigas técnicas de salva-vidas? Até onde chegaríamos? — ela brincou.

E virou o rosto, encarando-o. A cor dos olhos de Andreas mudara. Naquele momento, pareciam ter tomado emprestado o azul-cinzento da água.

— Nas minhas condições e da maneira como estou me sentindo agora, não, mas em pouco tempo poderia melhorar.

— Disso eu não tenho dúvida — disse Gabi, com um sorriso nos lábios,um sorriso muito brilhante.

Andreas franziu os olhos ao ver o movimento sexy de sua boca. Ela poderia fingir tudo o que quisesse, mas nos braços um do outro eles eram levados por uma força que só cresceria em intensidade.

— Algumas vezes, penso que você deve ser um semideus. Você resolve tudo. Parece magia.

— Gostaria de poder ter essa tal magia para reorganizar o mundo do meu irmão. — Eu também gostaria de poder fazer isso.

Ela se levantou da areia e caminhou até a água, para tomar um banho. Estar com Gabi naquele lugar era algo que não saíra da cabeça de Andreas desde a noite anterior. Pena que teriam de ir embora, por conta dos bebês.

Ainda que tivesse deixado Gabi pensar o contrário, nunca levara nenhuma mulher ali antes, nem mesmo Irena, que gostava de dar uns mergulhos na piscina, mas não era aventureira como Gabi, que pulou no mar sem pensar duas vezes.

Até aquele dia, ele poderia dizer a Irena que tudo o que fez para ajudar o irmão fora inevitável, e seria verdade. Mas ter estado ali com Gabi seria algo impossível de explicar. Mais do que nunca, estava feliz por ter terminado tudo com Irena.

Irena poderia alegar que a tia dos gêmeos já estava vivendo em um lugar paradisíaco, que não precisava da assistência de Andreas. Ele não teria desculpa para passar o resto do dia e da noite no barco ao lado de Gabi. Nenhuma desculpa para chegar tão perto de fazer amor com ela.

Enquanto Gabi se secava, ele deixou a cabeça cair para trás e olhou para o céu, que escurecia, desejando que aquela noite nunca chegasse ao fim.

— Melhor irmos embora, Gabi — disse, embora as palavras lutassem para não sair

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de sua boca, soando duras aos seus ouvidos. — Estamos prontos?

— Imaginei que você não estivesse, e que eu teria de salvá-lo. — E ela saiu correndo para o mar, deixando o rastro do seu sorriso, algo que lhe pareceu irresistível.

Gabi agarrou as cordas da escada para subir ao barco. Após tomar uma ducha no chuveiro do convés, envolveu-se numa toalha e seguiu para o compartimento do piloto, onde Andreas conversava com Stavros. Sorriu para ele.

— Imagine se nunca voltássemos e você tivesse de lidar com dois bebês famintos no meio da noite.

Stavros piscou e disse:

— Daríamos um jeito.

— Eles se comportaram bem?

— Como anjinhos.

— Fico feliz. — Gabi se pôs na ponta dos pés para dar um beijo em sua face. — Obrigada por ser uma ótima babá.

Gabi ainda tentava recuperar o fôlego, tanto de tentar distanciar-se de Andreas no nado, o que era impossível, quanto de estar sozinha com ele.

Houve um momento, na areia, quando ela adoraria ser possuída por ele, e quase se entregou. Mas já aprendera muito bem com os erros do passado.

Não tinha dúvida de que Andreas a desejava. Ele dera todos os indícios, e o desejo entre os dois chegara quase ao ponto de explosão. Os beijos na praia foram inevitáveis, mas ela foi esperta o suficiente para não ler nada além. Por isso nadou de volta ao barco, para não esquecer-se da promessa feita a si mesma de que focaria suas forças unicamente na carreira.

Olhou para o seu anfitrião e disse:

— Quando eu estiver de volta ao trabalho, com muito o que fazer, vou me lembrar deste dia glorioso. Obrigada.

— Vamos ver mais coisas amanhã, antes de voltar a Apollonia — disse Andreas.

Gabi sabia o que ele queria dizer. Sua pulsação acelerou.

— Não vejo a hora — afirmou, corajosa. — Boa noite.

Sem ousar encará-lo, desceu as escadas em direção à sua cabine. Aliviada ao ver que os meninos dormiam em seus berços, tomou mais um banho rápido e lavou o cabelo antes de cair na cama.

Ela sabia que a cabine de Andreas estava do outro lado da parede. O que também aprendera com Stavros. Aquele barco era uma casa para Andreas, que sempre o buscava quando queria estar sozinho.

A informação dada por Stravros fez Gabi notar que era uma pessoa privilegiada, mas ela poderia dizer a Stavros que, sem os bebês, nunca teria entrado no mundo de Andreas.

Praticamente uma semana atrás fora ao seu escritório. Desde então, passou um tempo ao lado dele, mas ainda não sabia nada sobre sua vida pessoal. Ele só dava informações soltas. Ela só fora convidada àquele barco graças ao amor que Andreas sentia pelo irmão.

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Com tudo nas mãos, ele fez o que seria natural, e beijou-a, pois a atração entre os dois era mútua. O mesmo aconteceu com Rand. Ficara hospedada em sua fazenda, e aproveitou ao máximo todo o tempo que esteve por ali, e nada mais.

Deveria lembrar-se disso enquanto estivesse com Andreas, antes de voltar a Alexandria.

Já eram três da manhã quando pensou nisso. Ao lembrar-se dele deitado ao seu lado na areia da praia, recordando o sabor dos seus lábios contra os seus, Gabi fechou os olhos, com medo de nunca mais poder dormir. Mas, para a sua surpresa, os bebês só começaram a chorar às sete e meia da manhã. Talvez por conta do ar marinho ou do doce balanço do barco. Não importava; a verdade era que tinham dormido toda a noite!

Após dar banho e alimentá-los, Gabi vestiu um short e uma camiseta antes de levá-los ao convés, um de cada vez. O sol já estava quente. Stavros tinha o café preparado esperando por ela na mesa desmontável, outra maravilhosa invenção daquele barco.

— Nossa, parece delicioso. Bom dia, Stavros. Como vai?

— Melhor que nunca.

— Que bom. Andreas está dormindo?

— Não — respondeu uma voz familiar, vinda de trás. Gabi girou o corpo e lá estava Andreas, de pé, vestindo uma camisa polo verde e short branco. Não poderia haver homem mais atraente em todas as ilhas Cíclades. Seus olhos se encontraram com os dela.

— Estava esperando por você e os bebês. Vamos comer. Estou faminto.

— Eu também. Deve ser culpa desse ar maravilhoso.

Andreas sentou-se ao seu lado. Gabi tentou agir naturalmente mas após seus sonhos com ele era impossível. Andreas estudou-a por um momento.

— Dormiu bem? Aquele deus grego também era vidente?

— Acredita que esses dois não choraram até as sete e meia da manhã? Foi a primeira vez que não tive de acordar no meio da noite. O pediatra disse que um dia isso aconteceria. Mas não é estranho que tenha sido assim com os dois ao mesmo tempo?

A boca de Andreas esboçou um sorriso.

— Minha mãe pode lhe contar inúmeras histórias sobre gêmeos.

— Sem dúvida. — Gabi adoraria conhecer a mãe desse homem maravilhoso, mas não disse nada.

Já no final do café da manhã, Andreas se aproximou de Nikos, que abriu um bocejo. Pegou os dois de seus carrinhos. Com eles nos braços, foi até a janela.

— O que acham dessa vista, meninos?

Gabi, muito concentrada em Andreas, poderia dizer que vê-lo ali, de pé, com os meninos nos braços, era a coisa mais espetacular de toda a Grécia. Ficou horrorizada ao notar o quanto estava emocionalmente envolvida com ele. E sabia que teria de lutar para não deixar transparecer nada.

Quando enfim conseguiu desviar o olhar, notou que o barco ancorava próximo a lindas formações rochosas em tons brancos contra um mar azul brilhante. Levantou-se e uniu-se a eles.

— Que lugar é esse?

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— Sarakiniko, um mundo árabe.

— Parece a lua.

— É famoso por isso. Quando éramos crianças, eu e Leon vínhamos aqui brincar de alienígenas com nossos amigos.

Ela sorriu.

— Parece muito mais divertido que brincar no parque perto de casa. — Ainda que o jardim de Andreas fosse melhor que qualquer outro. — Cada lugar que me mostra é o mais lindo do mundo. Nunca poderei agradecer-lhe por esse passeio. Sou uma pessoa de muita sorte.

Ele a olhou de relance.

— Ver tudo isso através dos seus olhos me fez voltar no tempo, a dias mais felizes. Então, eu também te devo algo. Vamos dizer que estamos quites.

Mais uma vez, ela notou que ele estava taciturno. Caso soubesse algo sobre Leon, teria dito. Mas sua mudança de comportamento só poderia ter algo a ver com o irmão.

Gabi sabia que qualquer homem na posição de Andreas a teria deixado sozinha, esperando por uma decisão do irmão. Mas Andreas não. Ele deixou suas necessidades de lado. Mas ela não permitiria que tudo aquilo voltasse a acontecer.

Nos minutos seguintes, descansaram no deque e brincaram com as crianças. Para convencê-lo de que ela não estava sozinha no mundo, telefonou para a sua mãe para avisar que estava bem, e as crianças também. Agindo assim, esperava que ele não notasse o seu corpo em chamas.

Sua mãe ficou feliz ao saber que os meninos dormiram toda a noite. Na frente de Andreas, elogiou o passeio que fizeram e sua delicadeza, e prometeu ligar novamente caso soubesse algo dos planos de Leon.

Quando desligou, eles chegavam ao porto de Apollonia. Como Andreas ainda se divertia com os bebês, Gabi aproveitou para descer e arrumar suas coisas. Encontrou Stravos e agradeceu-lhe.

Meia hora mais tarde, Andreas os levou de volta a casa. Enquanto a ajudava a levar tudo para dentro, ela notou certa preocupação. Quando ele trazia a última mala, encontrou-o na porta.

— Pare agora mesmo. Você já fez o suficiente — disse, pegando a mala de suas mãos. — Eu me diverti como nunca. Agora vá embora. Sei que virá quando tiver notícias.

Gabi sentiu o olhar de Andreas sobre si, deixando seu corpo em brasa. Ele parecia relutante em ir embora.

— Promete que me ligará se precisar de algo?

Ao ouvir o tom decidido de Andreas, suas pernas fraquejaram.

— Você sabe que sim. Agora preciso cuidar dos meninos.

— Antes eu preciso fazer uma coisa.

E tomou-a nos braços, beijando-a de novo. Pega de surpresa, ela não pôde detê-lo. Gabi estava louca por sentir seu toque mais uma vez, desde a noite anterior. Sem pensar duas vezes, deslizou as mãos pelo peito de Andreas, chegando ao seu pescoço. Precisava estar mais perto.

Era um homem maravilhoso. A cada carícia, ela perdia a cabeça. O calor que ele criava fazia ferver o seu sangue. Mais um minuto e pediria que ficasse ali. Mas, com toda

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a força de vontade, conseguiu afastar-se, respirando com dificuldade.

— Eu voltarei. Sinta a minha falta, nem que seja só um pouquinho. — E, com outro beijo profundo, despediu-se.

Ela fechou a porta e ficou com as costas pegadas à madeira, ouvindo o carro de Andreas se afastando.

Quando já não podia ouvir o motor, preparou comidinha para os meninos, depois colocou-os no carrinho e saiu para um longo passeio. Era como se sua vida dependesse disso, não poderia ficar naquela, casa nem mais um segundo, pelo menos enquanto estivesse sentindo tudo aquilo. Não voltaria a casa até terminar de ver todas as lojas do vilarejo, o que decerto refrescaria sua cabeça.

No dia seguinte, ao meio-dia, Gabi saiu mais uma vez de casa com os meninos, pois queria almoçar num delicioso e aconchegante restaurante que vira na véspera. Felizmente, Andreas não voltara.

Gabi enrubesceu ao se lembrar de sua reação ao beijo dele. Por duas vezes, brincara com fogo, mas só se queimaria caso continuasse a baixar a guarda quando ele se aproximasse.

Durante o almoço delicioso, os bebês foram a sensação entre clientes e empregados do restaurante. Ao saírem, vários turistas perguntaram se poderiam tirar uma foto deles, pois eram angelicais.

Gabi imaginou que não haveria problema, pelo menos enquanto ninguém soubesse que eram filhos de Leon Simonides. Nesse caso, suas fotos apareceriam nos jornais e na televisão.

Chegou a casa. Quando estava a ponto de abrir a porta, uma voz feminina a chamou. Virou-se e viu que a gerente do hotel corria na sua direção.

— Que bom que voltou. Tem uma visita a sua espera há um tempo. Está no escritório.

— Quem é?

— A sra. Simonides.

Seu coração ameaçou saltar pela boca. Deline? Seria possível? Onde estava Leon? Ou talvez fosse a mãe de Andreas. Será que ele a teria deixado ali, para buscá-la mais tarde? Mal podia respirar, só de pensar.

— Enquanto eu levo os meninos para dentro, peça que ela venha até aqui, por favor, Lena.

— Claro.

Gabi olhou para as crianças.

— Vamos, queridos. Alguém veio vê-los, quero que estejam lindos.

Após levá-los para dentro de casa, pegou um tapete e colocou-o no chão da sala, onde os meninos poderiam ficar brincando enquanto trocava suas fraldas. Vestiu-os com seus macacões amarelos e brancos. Depois beijou-os no pescoço, dizendo: — Hum, que cheirinho bom!

Quando ouviu as batidas na porta, levantou-se correndo e foi abrir. Uma mulher linda, alta e morena surgiu na sua frente. Não deveria ser muito mais velha que Gabi, que tinha 25 anos. Usava maquiagem, o que não apagava os sinais de dor no seu rosto. Gabi

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notou que a maquiagem nos olhos estava um pouco borrada de choro.

— Você deve ser Deline. — Gabi se compadeceu da mulher que fora até ali para pelo menos ver os meninos.

— Sim, e você, a meia-irmã de Théa Paulos, Gabriella.

— Certo. Por favor, entre. — Gabi tinha várias perguntas na cabeça, mas não fez nenhuma, pois aquele era um momento muito significativo na agonia de Deline.

Levou-a à sala, onde os gêmeos estavam deitados, fazendo sons infantis. Seus corpos compactos em movimento constante. Gabi mal podia respirar, esperando uma reação da esposa de Leon. E não demorou a notar.

Um grito de dor escapou de seus lábios, e ela se sentou no sofá, pois suas pernas já não podiam agüentar. Lágrimas rolaram em seu rosto.

— Parecem-se muito com ele, mas tinham de ser nossos filhos — disse, num murmúrio dolorido.

Naquele momento, a maquiagem borrou o rosto de Deline completamente.

— Sinto muito, Deline. Eu não a culparei caso me odeie por ter entrado em contato com Andreas. Quando fui ao seu escritório, imaginei que ele fosse o pai.

— Andreas me contou tudo. — Deline balançou a cabeça. — Mas uma situação assim nunca aconteceria com ele. Ao contrário de Leon, meu cunhado não perde a cabeça quando algo dá errado. Por isso foi nomeado chefe das empresas após o ataque de coração do pai.

— Eu não sabia.

— Quando Andreas se casar, sua esposa poderá confiar eternamente nele.

— E ele vai se casar? — perguntou Gabi, com o sangue quente nas veias.

— Irena está esperando há algum tempo. É sua namorada, minha melhor amiga. Sua família é dona de um dos maiores jornais da Grécia. Ela é chefe do caderno de viagem.

Gabi procurou a cadeira mais próxima e sentou-se. Engolindo em seco, perguntou:

— E vai se casar logo?

— É o que Irena espera. Eles estão em Atenas este fim de semana.

Gabi teve de lutar para não ficar histérica. Ao que tudo indicava, Andreas e Leon tinham mais coisas em comum do que imaginava Deline.

Na noite anterior, Andreas a beijou, deixando-a sem sentidos. Se Gabi não tivesse se afastado, teria cometido o mesmo erro que Théa. Quando ele disse que não tinha esposa, ela imaginou que não estivesse envolvido com ninguém. Que boba!

Mas nada disso importava ao ver o sofrimento de Deline. Gabi estava sendo muito egoísta ao pensar em si mesma naquele momento.

— Como posso ajudá-la, Deline? Eu gostaria...

Ela olhou para os meninos.

— Você não pode fazer nada. Sempre amei Leon, e queria um filho seu, mas isso nunca aconteceu. Agora vou me divorciar dele, e tal possibilidade desaparecerá para sempre. A vida é muito injusta — disse, soluçando.

O coração de Gabi não parava de acelerar.

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— Concordo. Meu pai perdeu uma filha muito cedo, e Théa não viveu o suficiente para cuidar dos filhos. Estou convencida de que, se não tivesse tido aquele problema no coração, ela nunca me contaria nada, e isso não estaria acontecendo.

— Mas aconteceu. E Leon quer os filhos, o que é natural. Ele já falou para a família, é essa a situação atual. — Ficou de pé. — Esta manhã, ele foi à casa dos meus pais e implorou que eu viesse até aqui para ver os meninos, antes de fazer qualquer outra coisa. Sei o que Leon está esperando, mas ele não entende. Mesmo que eu quisesse ficar com ele, seria dar mais uma chance ao nosso casamento, e não sei se estou pronta para isso. — Sua voz falhou. — Acho que sempre veria Théa entre nós, e o ressentimento permaneceria, mesmo que eles não tenham tido culpa alguma.

Gabi levantou-se e abraçou Deline.

— Eu a admiro por sua honestidade. Não poderia dizer o quanto isso me dói.

Deline relaxou e abraçou Gabi. Quando se afastaram, Deline perguntou:

— E agora, o que vai fazer?

— Quando Leon vier buscar as crianças, volto para Creta, depois para os Estados Unidos. Meu trabalho me espera.

— O que você faz?

— Sou gerente em uma agência de publicidade. É um trabalho fascinante, eu adoro. — Para o bem dos bebês, mudou de assunto. Caso caísse em prantos, talvez não conseguisse voltar a si novamente. — E você, trabalha?

— Ainda não, mas uma amiga me ofereceu emprego na loja de presentes de um hotel. Acho que vou aceitar ou enlouqueceria.

Deline não era apenas uma mulher maravilhosa, mas também forte.

— Desejo o melhor para você. Espero que saiba o que quero dizer.

Enquanto conversavam, Kris começou a chorar. Gabi o pegou no colo para consolá-lo.

Deline ficou olhando-o por um momento, limpando as lágrimas do rosto.

— Eu estava preparada para não gostar de você, mas, agora que a conheço, sei que isso é impossível.

Os olhos de Gabi se encheram de lágrimas outra vez. Leon estava perdendo uma mulher fascinante, Que pena que um dia ele tenha encontrado Théa. Por conta dessa gravidez, ela estava morta. Porém, se não tivessem feito amor, os bebês não existiriam. E ela nunca conheceria Andreas. Mesmo muito machucada, Gabi continuava gostando de todos eles.

Acompanhou Deline à porta.

— Você veio de avião até aqui?

— De helicóptero, com Leon. Ele foi para a villa. Quando eu deixar a ilha, tudo estará acabado.

Os acontecimentos se desenrolavam rápido.

— Espero que tenha uma boa viagem.

Antes que Deline pudesse responder, o bebê fez um barulho, distraindo-a. E ela o observou, perguntando: — Quem é este?

— Kris.

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— O que tem o problema no coração?

— Sim.

— Ele parece estar bem.

— Eu sei, mas se cansa mais facilmente que Nikos. E também é um pouquinho menor. Quando crescerem, é provável que seja mais baixo que o irmão. Mas o doutor disse que a primeira operação já vai fazer uma boa diferença.

— Ele... é lindo — elogiou Deline, com voz trêmula e de fôrma abrupta, reação que Gabi entendeu bem. — Preciso ir.

— Cuide-se — disse Gabi, quando ela já se afastava, apressada.

Pobre Deline...

CAPITULO SEIS

Com o coração apertado, Gabi fechou a porta. Após alimentar os bebês, deitou-os para uma soneca antes de olhar o relógio. Eram duas e dez da tarde. Ligou para a mãe, mas caiu na secretária. Gabi deixou uma mensagem, dizendo que voltaria a Heraklion sem os meninos.

Enquanto esperava Leon aparecer para levá-los, checou os horários de aviões e balsas para Creta. Outro voo, só no dia seguinte, mas sairia uma balsa para Kimolos, que deixaria o píer às cinco e meia. De lá, poderia tomar outra a Heraklion.

Precisava de mais um dia para estar com os pais e preparar as malas. Depois voaria para Atenas, onde tomaria outro avião a Washington D.C. Sem ter de cuidar dos bebês, ela precisava colocar um oceano de distância entre sua vida e a de Andreas.

Uma batida na porta interrompeu sua concentração,

— Gabi? Está aí?

Era a voz de Leon. Ela correu para atender. Ele parecia pior que Deline, como se não dormisse havia dias,

— Entre. Sua esposa disse que você viria. Ele a seguiu até a sala.

— Em pouco tempo, já não terei esposa.

Não havia nada que pudesse dizer para consolá-lo. E ele sabia que não deveria perguntar nada sobre a conversa de Gabi com Deline, por respeito à esposa.

— Mas você tem dois lindos bebês que precisam de um pai. Quais são os seus planos?

— Por enquanto, ficarão aqui, na minha villa, comigo. Estelle, a governanta, vai ser a babá dos meninos até eu encontrar alguém permanente. Minha mãe ajudará. Minha família está por aqui, e estão transformando um dos quartos para receber os bebês. Todos estão ansiosos por ajudar. Nem preciso dizer que meus pais estão loucos para conhecer e amar seus novos netos.

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— Tenho certeza de que sim.

— Gabi... Sei o quanto você e seus pais amam essas crianças. Vai ser um momento difícil para você.

— É verdade. Não vou mentir, mas você é o pai. Eles precisam mais de você do que eu e minha família precisamos deles. Quanto antes os levar, mais rápido serão seus, de corpo e alma.

— Você sabe que a minha casa estará sempre aberta.

— Eu sei. Em dois meses, planejo voltar a Creta para ver meus pais por uma semana. Até lá, Kris já estará operado e recuperado para nos encontrarmos.

— Não vejo a hora. Vamos fazer uma festa de família aqui, com todos reunidos.

Gabi ficou pensando em como seria sua vida até ver os bebês e Andréas outra vez.

— Quando estiver com seu irmão, por favor, diga que agradeço por tudo o que fez. Foram férias ótimas para mim.

— Andreas é o melhor amigo do mundo. Eu sei.

Juntos, arrumaram as coisas dos bebês e colocaram tudo no carro de Leon, que já instalara duas cadeirinhas de criança no banco traseiro. Até que chegou o momento de tirá-las de casa.

Durante todo o processo eles dormiam, sem ter idéia de onde acordariam. Estariam na casa do seu pai, para sempre. E Andreas seria seu maravilhoso tio...

Que vidas fantásticas teriam sendo filhos de um Simonides!

Gabi estava feliz por eles. Mas morria por dentro, eram muitas perdas em um só dia. Não se desespere, Gabi. Lembre-se de que foi você quem procurou Andreas.

Leon aproximou-se e abraçou-a forte.

— Você foi um anjo da guarda todo esse tempo. Nunca me esquecerei. Vamos trocar os números dos nossos celulares. Acho que vou ligar muitas vezes até entender bem o que é ser pai. Os meninos vão esperar por você o tempo todo.

— Por um dia ou dois, talvez.

Gabi voltou a casa para pegar o telefone. Em poucos minutos os dois estavam prontos e não havia nada mais a ser feito. Leon colocou-se ao volante. Gabi fechou a porta. Leon apertou sua mão uma última vez antes de ligar o motor.

Vá embora já, antes que os meus lindos meninos voltem a abrir os olhos.

Ela ficou dando adeus até o carro desaparecer no horizonte.

No momento em que o helicóptero tocou o chão do heliporto atrás da villa de Milos, Andreas desceu. Acabara de vir da casa de Irena, e lhe contou tudo. Ela merecia saber sobre os bebês e as estranhas circunstâncias que puseram Gabi no seu caminho. Mesmo magoada, Irena demonstrou gentileza ao despedir-se. Mas naquele momento ele estava louco para rever o irmão. Imaginou que todos estivessem fora, jantando ao lado da piscina. Após comer, desapareceria com Leon.

Ao aproximar-se, notou que a família conversava. Pareciam mais animados que o normal. Ele não agüentou e foi espiar o que acontecia. Ao descer os últimos degraus encontrou todos reunidos com Leon e seus pais, que seguravam os Kris e Nikos, mas os

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bebês não pareciam muito contentes.

O coração de Andreas pulou do peito. Buscou Gabi. Era como se não a visse havia semanas, mas não encontrou nenhum sinal dela.

Leon viu o irmão e caminhou na sua direção, levando Andreas para o muro, onde poderiam conversar a sós.

— Como você pode ver, o segredo foi revelado. A família já sabe de tudo.

Andreas tinha de admitir que estava aliviado, pois já não teria de carregar o segredo sozinho.

— Deline viu os meninos?

— Esta tarde. Depois voltou a Atenas. Em pouco tempo chegarão os papéis do divórcio.

Andreas já imaginava isso, infelizmente.

— Onde está Gabi?

— No caminho de volta para casa.

Andreas parecia sentir falta dela, e de ninguém mais.

— Do resort, você quer dizer.

— Não. Dos Estados Unidos. Mas disse que em dois meses voltará para ver os meninos, junto com seus pais. E eu planejo reunir as duas famílias.

Dois meses?!

— Você quer dizer que ela já foi embora de Milos?

Leon olhou para o irmão, surpreso.

— Pelo que eu sei, sim.

— E não a deteve?! Leon piscou.

— Calma, Andreas. Por que eu faria isso?

— Por que não faria? Gabi foi mãe deles por três meses. Deve estar arrasada.

— Claro que sim, mas nós dois concordamos que, quanto antes fizéssemos isso, mais rápido eu estreitaria os laços com os meus filhos, E seria preciso uma ruptura total, para que os bebês me enxergassem como pai.

Andreas não poderia lutar contra essa lógica, mas, após o momento de intimidade que passaram juntos, saber que Gabi deixava a Grécia o fez sentir-se perdido no meio de um mundo vazio.

— Ela pediu que eu lhe agradecesse pelo ótimo período de férias em Apollonia.

Andreas coçou a nuca, tentando entender todo aquilo. Pensou na reação dela na praia, na porta... Aquilo não significara nada para Gabi?

— Meu irmão — murmurou Leon —, você ouviu o que eu disse?

Sim, Andreas o escutara, mas não podia conversar mais.

— Leon? Quero que me faça um favor, peça desculpas a todos, mas vou entrar um momento. Volto já.

Leon ficou parado, perplexo, e Andreas subiu as escadas correndo. Quando já estava, fora da vista de todos, ligou para o resort.

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— Gostaria de falar com Lena. Sou Andreas Simonides.

— Um momento, por favor.

Andreas ficou andando pela sala até ouvir do outro lado da linha:

— Kyrie Simonides? Em que posso ajudá-lo?

— Sei que a sita. Turner fez o check-out hoje, mas pergunto se você pediu um carro para levá-la ao aeroporto.

— Ao aeroporto, não. Ela foi ao píer, pegar uma balsa. Aquela balsa só viajaria até Kimolos.

Sua adrenalina subiu.

— Obrigado. Isso é tudo o que eu precisava saber. — E desligou.

Gabi teria de passar a noite em Kimolos, onde, no dia seguinte, sairia uma balsa para Atenas. Ele teria tempo para se planejar.

Com a pulsação acelerada, Andreas se reuniu à família. Dois bebês tristes eram passados de mão em mão. Buscavam por uma mulher linda, um anjo dourado, que não fazia parte da família Simonides.

Ninguém conseguia acalmá-los. Nem sua mãe, nem suas irmãs. Leon os pegou no colo, mas nem assim ficaram completamente tranqüilos. Andreas sabia que Gabi teria feito melhor. Sua mãe o olhou, um olhar curioso.

— Aonde você foi? Por que Irena não está com você?

Não era hora de falar sobre a separação nem sobre o motivo por trás dela.

— Ela não pôde vir. E eu tinha uma ligação importante a fazer.

— Já comeu?

— Não tenho fome.

Ela fez que não com a cabeça.

— Seu irmão nos contou sobre a saga dos meninos, e também sobre o papel primordial que você e Gabriella Turner assumiram. Você é um filho maravilhoso, Andreas. Adorei saber de sua fidelidade a eles.

— Deline está arrasada outra vez. Sua mãe concordou.

— Não sei se conseguirá lidar com os bebês, ainda mais querendo tanto ter um filho. — Seus olhos se encheram de lágrimas. — Mas os meninos são adoráveis. É incrível como se parecem com você e Leon quando crianças.

— Eles se parecem com a mãe também. Vi fotos dela no consulado.

— A família Turner deve estar devastada com a sua perda. Eu e seu pai queríamos conhecê-los.

— Vou organizar um encontro. — Assim que encontrar Gabi.

O rosto e os olhos que enxergou no espelho do hotel fizeram Gabi estremecer. Só esperava que, quando entrasse na balsa para Heraklion, mais tarde naquele mesmo dia, todos os traços daqueles momentos terríveis já tivessem desaparecido.

Terminou de vestir um jeans e uma camiseta branca sem manga. Seus cabelos, ainda úmidos, ganhavam cachos. O calor os secaria rápido. Após passar um batom

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alaranjado sentia-se um pouco mais apresentável.

Tendo entregado os bebês a Leon na véspera, tinha apenas a sua maleta para carregar ao píer, repleto de barcos de pesca e outras embarcações. Pequenos grupos de turistas tomavam a mesma balsa.

Havia um bom tempo não ia a lugar nenhum sem os meninos, e por isso sentia um vazio. Será que eles também sentiam falta dela? Seus pais, por sua vez, sentiriam menos, pois tinham um ao outro. Mas ela não tinha nada, exceto os sonhos com aquele deus que, no final das contas, demonstrou ser um homem normal. Mais do que nunca, Gabi estava louca para voltar ao trabalho.

— Gabi?

Ela pensou estar imaginando coisas e continuou andando, Mas seu nome foi dito mais uma vez, então diminuiu o passo e virou-se. Era tarde demais para evitar o grito preso na garganta, e deixou sua maleta cair no chão.

Andreas olhava para ela, com rosto sério,

— Como eu imaginava — ele disse.

A boca de Gabi ficou seca ao vê-lo. Ele parecia lindíssimo naquela calça cargo e camisa azul, com as mangas dobradas até os cotovelos.

— Se há algo de errado com os meninos por que Leon não me ligou? Ele tem o meu celular.

Andreas ficou olhando para ela por um momento.

— O que houve com as boas maneiras? Não dizemos oi? Como você está? Que dia mais bonito?

Ela sentiu suas faces corarem, mas não desviou o olhar.

— Um homem com as suas responsabilidades não aparece assim, num obscuro porto longe de tudo, a menos que seja uma emergência.

— Nem sempre. Você está sempre me julgando. O que mudou desde que nos vimos pela primeira vez?

Para ele, nada. Mas Andreas tinha uma namorada firme, era o típico playboy rico, no final das contas. Mas o que ele não sabia é que Gabi já aprendera a lição com Rand.

— Absolutamente nada. Na semana passada eu disse que, caso Leon ficasse com as crianças, voltaria ao meu trabalho.

Ele coçou o queixo.

— Fui eu quem trouxe você a Milos. Por que não esperou para que eu mesmo resolvesse sua volta a Creta?

Ela sorriu.

— Andreas... sou uma mulher de negócios, lembra? Sou capaz de cuidar de mim mesma.

Ele endureceu ainda mais a expressão.

— E não pensou que eu gostaria de fazer isso por você?

O fato de ter aparecido ali provava que estava disposto a recomeçar de onde pararam, lá na praia. Se a sua namorada sabia sobre as outras mulheres com as quais saía, ela devia ter um nível inacreditável de tolerância. Gabi não se comportaria assim.

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— Não, mas a verdade é que você deve ser a pessoa mais generosa que conheço. E também é o chefe da sua família. Agora que Leon já está com os filhos, nós temos outras coisas para resolver, cada um do seu lado. Estou a ponto de ser promovida, e assim que chegar a Alexandria isso deve acontecer. Então não me resta outra opção além de pegar o próximo avião.

Ele colou seus olhos nos dela.

— Será que um dia a mais destruiria tudo isso?

Sim, especialmente considerando o turbilhão que tomara conta de sua vida naquele momento.

— Meu chefe está me esperando, então creio que sim. Agora, se me dá licença, o embarque na balsa está começando.

— O meu barco a levará aonde você quiser.

Gabi manteve o olhar erguido, sem piscar. Andreas insistiria em levá-la até a casa dos seus pais, não poderia lutar contra isso. Caso mantivesse o controle, poderia passar mais algumas horas com ele. Poderia brincar um pouco mais.

— Certo. Eu desisto. Oi, Andreas. Que ótimo vê-lo outra vez. O que o traz aqui nesta linda manhã de verão?

Ele sorriu.

— Bem melhor assim.

— Que bom. — O carisma daquele homem tinha o poder de fazer subir a temperatura, — Meu plano é voltar a Heraklion. Preciso arrumar minhas coisas antes de voltar a casa.

Ele pegou a maleta de Gabi.

— Venha comigo e chegaremos a Creta antes dessa balsa. Andreas levou-a cm outra direção, aproximando-se de um barco ali ancorado. A família Simonides tinha vários, um para cada ocasião. Ainda que evitasse, Gabi não poderia conter o agito que tomou conta do seu corpo ao estar mais uma vez com ele. Ela só poderia ser uma espécie de masoquista.

Após ajudá-la a subir, Andreas ofereceu-lhe um colete salva-vidas e disse que o vestisse. Depois tomou seu lugar ao timão. Antes de ligar o motor, ela ofereceu a ele um colete salva-vidas.

— O que é bom para um... conhece esse ditado?

— Conheço outro melhor. Nunca discuta com uma mulher que tem uma arma — disse, olhando-a divertido, antes de pegar o colete e vestir sobre o seu corpo musculoso.

Gabi se sentiu aliviada ao saber que, caso algo acontecesse no caminho a Creta, ele também estaria usando um colete salva-vidas.

A cabeça fria e implacável do chefe do império Simonides, que conheceu no seu escritório, estava a anos-luz do homem tranqüilo que conduzia o barco. Era complicado relacionar os dois. Antes que ela notasse, já estavam avançando no mar, a grande velocidade, como um torpedo.

— Por quanto tempo vai me manter sem saber o que o trouxe aqui esta manhã?

Andreas fingia não entender.

— Logo saberá.

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Rebecca Winters - Raios de Sol (Special 30)

Gabi deveria ficar feliz com essa resposta. Ele estava feliz, embora não soubesse o significado da palavra fidelidade. Gabi adoraria não ligar para isso e lançar-se ao seu desejo, sem preocupar-se com as conseqüências.

Deline era uma mulher muito melhor que Gabi. Perdoou Leon por sua noite com Théa. Até descobrir os gêmeos...

Resignada com o seu destino — pelo menos até chegarem a Heraklion —, Gabi deitou a cabeça para trás para sentir o sol no rosto. De tempo em tempos, o barco levantava um pouco de água, fazendo respingar gotinhas em sua pele. Ela manteve os olhos fechados, tentando controlar a excitação.

O problema era que se apaixonara loucamente por Andreas, o tipo de paixão profunda que nunca se dissolve. Mas estava decidida a não contar nada a ele. Nunca diria que era o amor de sua vida.

— Quero que seja honesta, Gabi. Está mesmo querendo voltar ao seu trabalho?

Aquela pergunta a trouxe de volta ao mundo real. Ela sentou-se, observando-o com a mão na testa, para evitar os raios de sol.

— Muito. Além de ser um trabalho estimulante, me oferece a possibilidade de uma vida confortável, com grandes promessas para o futuro. Por quê?

Ele parou o motor do barco, criando um silêncio imediato, exceto pelo barulho da água contra o casco. Rapidamente, afastou o seu assento e pegou refrigerantes numa geladeira pequena. Após oferecer-lhe uma, sentou-se, com o seu lindo e bronzeado corpo de frente para ela.

— Obrigada. Nem sabia que estava com sede, até você me oferecer isso.

Seus olhos, de um cinza metálico, encontraram os dela enquanto bebia no gargalo.

— Sei o que você quer dizer.

E uma nuance na voz de Andreas a fez imaginar que poderia estar se referindo a outra coisa. As imagens deles dois na praia, tão conectados, não saía de sua cabeça. Tremendo, ela olhou ao longe.

— Você se lembra da minha secretária?

Era uma pergunta estranha, e Gabi imaginou não ter escutado bem, mas Andreas nunca falava nem fazia nada sem razão.

— Sim, é uma mulher dura, mas justa... e até mesmo amável, a sua maneira.

— Que descrição excelente — ele murmurou. — Anna vai fazer 70 anos. Trabalhou para o meu pai por 45 anos, e nunca se casou.

— Eles deveriam se entender muito bem para trabalharem juntos tantos anos. — Gabi imaginou a mulher completamente apaixonada pelo sr. Simonides. Caso ele fosse como o filho, tudo estaria explicado.

— Quando ele se aposentou, eu a mantive com a intenção de que treinasse uma nova secretária. Mas, após um dia de trabalho com ela, percebi que era uma jóia, e não quis ninguém mais.

Gabi tomou o que restava de sua bebida.

— Se não fosse por ela, os bebês seguiriam sem pai. Só por isso, eu gosto muito dela, mesmo sem a conhecê-la a fundo. — Gabi ouviu a respiração pesada de Andreas.

— Ser secretária é uma das ocupações de Anna. Na verdade, ela é uma faz-tudo. Sabe o que eu quero dizer?

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— Acho que sim. Ela é um exemplo das virtudes que você mais admira.

Ele fez que sim, sério.

— Mas precisa se aposentar e resolver a substituição que adia sempre.

— Eu notei que ela manca.

— Cada dia mais. O problema é que eu tinha desistido de encontrar alguém igual a ela. Até encontrar você — disse, e ficou olhando para Gabi, lembrando-a de algo que lhe dissera uma semana atrás.

Se estiver procurando trabalho, eu a contrato como minha secretária particular apenas por sua integridade e discrição.

Caíra sobre Gabi o seu pior pesadelo. Ela sabia muito bem aonde essa conversa terminaria, e balançou a cabeça.

— Antes que responda "não" imediatamente, só estou dizendo que gostaria de ter a sua ajuda enquanto procuro na própria empresa alguém capaz de substituí-la. Mas isso poderia demorar meses. Você ficaria com um apartamento mobiliado no andar logo abaixo do meu escritório. Temos um restaurante também, para os funcionários.

— Andreas... O que isso significa de fato?

— Não quero que você vá embora da Grécia até sabermos o resultado da operação de Kris. Caso haja complicações, gostaria que estivesse aqui.

Ela não queria nem pensar nessa possibilidade.

— Estou rezando para que tudo dê certo, mas, se algo acontecer, volto imediatamente.

— Isso não é suficiente.

O que estava acontecendo com ele? Ela sabia que seu pedido não poderia ser pessoal. Além de sua namorada, deveria haver uma legião de mulheres que adorariam flertar com ele.

— Porquê?

Andreas parecia fascinado pela veia que pulsava no pescoço de Gabi.

— Acabei de vir da casa da minha família. Os meninos estão descontrolados. E nós dois sabemos o que eles querem: você.

Será?

— Vamos ser honestos, Gabi. Com a operação se aproximando, Leon vai precisar da sua ajuda. E você sabe muito bem disso.

Gabi baixou a cabeça.

— Em poucos dias os meninos vão superar a separação e estarão mais próximos do pai.

— Não acredito nisso, nem você. — Andreas chegou mais perto. — Isso leva tempo. Eu sei o quanto você gosta deles. Admita que está morrendo por dentro por ter entregado os gêmeos.

— Claro que estou. — Gabi tinha lágrimas nos olhos. Era tarde para cobrir o rosto com as mãos.

— Gabi... — Andreas murmurou, triste.

— Quando Théa me pediu que encontrasse um casal para adotar os meninos, isso

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me deixou péssima, pois eu queria tomar conta deles. Ela não sabia que eu estava pronta a abrir mão da minha carreira pelos bebês. Mas a lei me obrigou a procurá-lo.

— Ainda bem! — Andreas a abraçou.

Num primeiro momento, ela ficou paralisada, mas seu toque gentil destruiu todas as fortalezas, e Gabi terminou soluçando contra o seu ombro musculoso.

— Sei o quanto você gosta deles, Gabi. Por isso não quero que vá embora. Fique e trabalhe comigo até Kris se recuperar completamente da operação. Nós vamos poder visitar os meninos após o trabalho alguns dias. Assim todos ficarão felizes e não vamos interferir no laço entre eles e o pai.

Ao notar que gostaria de estar entre os braços de Andreas para sempre, Gabi se afastou e enxugou os olhos com as palmas das mãos.

Depois olhou para ele, e percebeu que era dono dos olhos cinzentos mais quentes que já vira. Seu amor pelos gêmeos deixava seus olhos assim.

— Quando você diz isso, desaparecem todos os problemas. Só mesmo Andreas Simonides é capaz de fazer tudo soar tão simples e razoável, mesmo não sendo.

— Isso era tudo o que eu queria ouvir. O problema acabou. Não, nada disso.

— Nada está resolvido. Primeiro, tenho de conversar com o meu chefe e perguntar se a tal promoção seguirá de pé, esperando por mim, caso eu demore a voltar.

— Mesmo conhecendo você há apenas uma semana, posso garantir que ele moverá montanhas para resolver esse inconveniente.

Andreas diria o que fosse preciso para alcançar o seu objetivo. Por isso era o chefe dos negócios da família. Só tinha um problema: Gabi não entendia qual era o seu objetivo. Sabia que amava os gêmeos, mas deveria haver algo mais.

— Por que não me conta a razão de estar me oferecendo um trabalho temporário ao seu lado? Pela sua resposta, saberei se está ou não me dizendo a verdade.

— Você não é uma pessoa qualquer. É a tia dos gêmeos. E não há razão para ficar longe deles. É complicado estar do outro lado do oceano. — Abriu um lindo sorriso. — Quero ajudá-la.

Andreas...

— Opção errada — disse Gabi.

— É a única que tenho — ele respondeu, com uma calma invejável.

— É a única que quer me oferecer, é o que você está querendo dizer. Sem saber a verdade, não poderei ficar na Grécia, mesmo que meu chefe diga que tudo bem.

O sorriso de Andreas desapareceu.

— Não conheço mais nenhuma verdade a ser dita, além de que isso tudo é culpa minha.

— Culpa sua? — ela perguntou, piscando. Ele a observou intensamente.

— Sim, culpa minha. É minha culpa que o casamento do meu irmão esteja mal outra vez. Caso eu tivesse me esquecido de tudo quando você saiu do escritório, eles não estariam a ponto de divorciar-se e os gêmeos estariam em Virgínia, perfeitamente felizes ao seu lado.

— Mas eu não poderia adotá-los.

— Ainda assim seriam seus, Gabi.

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— E quando crescessem, e quando me perguntassem sobre o pai, e aí? Caso eu admitisse saber o nome do pai deles, talvez nunca me perdoassem.

Um som estranho saiu da boca de Andreas.

— Você acaba de pôr o dedo na minha maior ferida. Caso eu mantivesse o segredo por anos, sabendo que Leon e sua esposa nunca poderiam ter um bebê, talvez nunca me perdoasse por bancar o deus com a vida do meu irmão.

Foi a vez de Gabi deixar escapar um som da garganta. Ele aproximou-se e tomou suas mãos.

— A verdade é que estamos juntos nisso, até o último fio de cabelo. Leon precisa de nossa ajuda por mais um tempo.

— Mas você não precisa de uma secretária.

— Na verdade, preciso. Anna vai ter de operar o joelho imediatamente.

— Poderia contratar qualquer secretária de sua empresa para substituí-la.

— Sim, mas imaginei que uma das razões que a levam a sair de Creta era finalmente permitir que seus pais voltassem à vida que tinham antes da doença de Théa.

— Isso é verdade — ela confessou, num sussurro.

— Quando você deixar o posto, vou contratar alguém permanente. — Andreas beijou-lhe as mãos e logo as deixou livres.

Uma sensação estranha tomou conta do corpo de Gabi, que a acompanhou até a chegada a Heraklion.

CAPITULO SETE

A seção de doação de sangue do hospital em Atenas estava congestionada. Gabi olhou para Andreas. Os dois, deitados lado a lado, doavam sangue. Tinham tirado o dia de folga. O que foi uma boa idéia, pois tiveram de esperar mais de uma hora antes de entrar.

Preparando-se para a doação, Gabi tomou um bom café da manhã. Antes de levá-la ao hospital onde Kris seria operado, Andreas disse ao motorista da limusine que os deixassem em um maravilhoso restaurante de Plaka para almoçar. Porém, em vez de pedir a especialidade da casa, comeram espinafre, rico em ferro, e lombo.

Andreas era incrível. Em pouco tempo Gabi estava trabalhando para ele, e notou que, quando Andreas quer algo, ele sempre consegue. Ela o adorava. Mas, caso Kris não estivesse a ponto de ser operado, ele nunca teria pedido que ficasse na Grécia e nada disso teria acontecido.

— Isso é mais ou menos como estar deitado na praia em Papafragas.

Que ele, do nada, mencionasse a tal noite quando Gabi quase se abandonou em seus braços foi uma surpresa.

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— Não está tão quente — ela murmurou.

— Não, e não estamos sozinhos. O lado positivo é que não vamos ter de nadar tanto ao sair daqui. Não devemos fazer nenhuma atividade cansativa até o final do dia. Eu não poderia salvá-la.

Mesmo com aquela lembrança agridoce na memória, ela foi capaz de sorrir.

— Então, o que vamos fazer?

— Pedir ao motorista que nos leve de volta ao escritório, e podemos ficar vendo televisão no seu apartamento até nos recuperarmos.

— Caso fique tonto, o sofá grande será seu — ela disse, mas logo que as palavras saíram de sua boca ela se arrependeu. Desde o dia em que lhe mostrara o apartamento, Gabi nunca o convidou a entrar novamente. Para disfarçar, indagou: —Você costuma ver televisão?

— Todo o tempo.

— Está brincando...

— Eu e Leon somos loucos por esporte.

— Disso eu sei, mas a que hora encontra tempo para ver televisão?

— No meu iPhone. Tenho banda larga em todos os lugares, e esse aparelho toca quase tudo o que foi inventado pelo homem.

— Ah! Quer dizer que, entre telefonemas importantes e encontros, você fica vendo partidas de futebol?

— Ou de basquete.

— E as corridas de carro?

— Adoro!

Ela franziu a testa.

— E eu pensando que você era diferente...

Ele sorriu, um sorriso franco.

— E você, a que assiste?

— Quando estou nos Estados Unidos e tenho tempo, vejo History Channel e programas de culinária, além de comédias inglesas e séries de mistério. Também gosto de rodeios.

— Rodeios?

— Quando eu estava na faculdade, uma amiga me levou a Austin, por duas semanas, nas férias, Conhecemos alguns caubóis e marcamos de ver um rodeio. Eu adorei.

Andreas ficou olhando para Gabi, parecia tentar desvendar sua verdadeira alma.

— Havia algo mais?

— Por um tempo sim — ela respondeu, sendo honesta. — Mas passou.

— Doeu?

— O quê?

— A separação.

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— Um pouco. — Gabi não queria falar sobre velhos namorados. O homem sentado ao seu lado fazia todos os outros parecerem insignificantes. — Aliás, falando de dores, o que o cirurgião de Kris disse a Leon ontem, na consulta? Você foi com ele, e parecia diferente ao voltar ao escritório.

— Parecia?

— Você sabe que sim. Por favor, não tente me enganar.

De repente, a cortina foi aberta e as enfermeiras apareceram para terminar o trabalho.

— Terminamos com vocês.

Os dois se levantaram, apoiando as pernas no chão.

— Podem ir com calma. Temos lanche na recepção do hospital.

Quando ficaram a sós mais uma vez, Gabi aproximou-se e disse:

— Estou esperando uma resposta.

Andreas já baixara as mangas da camisa e estava de pé.

— O doutor não pode garantir que a operação será livre de riscos.

— Claro que não. Nenhuma operação é livre de riscos.

— Meu irmão está lidando com muitas emoções ultimamente.

Todos eles estavam. Ela notava que Andreas, no fundo, se encontrava aflito, mas disfarçava muito bem.

— Além da dor de Leon, cuidar dos meninos exige muito esforço físico, mesmo que eles sejam dóceis.

— Precisamos de um tempo livre de nossas preocupações. E, como por enquanto não podemos fazer nada, vamos para casa descansar.

Gabi observou Andreas vestindo o casaco. Ele parecia querer dizer que voltariam ao escritório para relaxar, juntos, mas isso não estava em questão. Andreas tinha o poder de baixar a guarda de Gabi às vezes, mas, desde que Deline lhe contou que tinha uma namorada séria, Gabi parou de aceitar suas brincadeiras.

Após tomarem um pouco de suco e biscoitos, a limusine os levou de volta ao escritório. Pegaram o elevador privado para o andar de Gabi, cujo coração ameaçava saltar pela boca ao cruzarem o saguão que levava ao seu apartamento.

Ela abriu a porta e virou-se para ele.

— Obrigada por me acompanhar até aqui, pois eu poderia ter desmaiado, mas, como você mesmo pode ver, estou bem. Se estiver um pouco tonto, tem um ótimo sofá para deitar-se na recepção do seu escritório. — Esboçou um sorriso torto. — Eu sei disso, pois passei metade de um dia esperando sentada nele, antes de nos encontrarmos.

— Sinto muito se a fiz esperar tanto — disse Andreas, com a respiração pesada.

— Não. Assim pude ver Anna trabalhando. Naquele dia, quem diria que eu terminaria ocupando temporariamente o seu lugar? Andreas não fez nenhum sinal de que sairia, então ela disse:

— Obrigada por doar sangue comigo, Andreas. Fico feliz por não ter ido sozinha. Vemo-nos de manhã, para planejar a grande festa que você quer dar na empresa após a cirurgia de Anna.

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Antes que a fraqueza invadisse o seu corpo, antes que fosse obrigada a pedir que não se aproximasse mais, ela deu um passo para trás e começou a fechar a porta.

— Já? — Andreas colocou um pé à frente, impedindo que a fechasse completamente. Depois, num gesto rápido, deu mais um passo e entrou no apartamento.

O coração de Gabi batia acelerado. Ela ficou com medo que Andreas pudesse ouvir.

— O que foi?

— O que acha? — ele perguntou, em tom aveludado. Gabi se afastou.

— Eu... eu não sei — ela murmurou. Ele se aproximou mais.

— Quando a deixei naquele resort de Apollonia, após nossa noite em Papafragas, você parecia estar ao meu lado. Mas pisquei e você desapareceu da ilha. Quando a encontrei, estava diferente. Estou esperando que a velha Gabi volte à tona, mas ainda não voltou. Quero saber por quê.

Ela pousou as mãos nos quadris, um gesto que foi acompanhado pelos olhos de Andreas. Enquanto isso, Gabi tentava formular uma resposta. Nada além da verdade o satisfaria, mas não poderia revelá-la.

Como o silêncio continuou, seu lindo rosto se fechou.

— No hospital você admitiu não haver outro homem na sua vida; ou isso foi uma mentira, e na verdade está apaixonada pelo seu chefe?

Gabi não acreditava que poderia ter ferido o orgulho de Andreas ao dizer aquilo, pois aquela pergunta só poderia ser fruto de um orgulho ferido.

— Não. Assim como você, não tenho ninguém importante a esconder — disse, de propósito, para ver qual seria a reação de Andreas. Chegara a hora de ele admitir seu envolvimento com a mulher sobre a qual falara Deline, mas nada acontecia.

— Se isso é verdade, por que foge de mim sempre que termina o horário de trabalho? Por que nunca comemos juntos, como em Milos, enquanto cuidávamos dos bebês? — Andreas olhava fixo, para a boca de Gabi. — De uma hora para outra, eu me tornei uma pessoa repulsiva para você?

— Não vou responder a essa pergunta absurda.

Caso alguém estivesse escutando, pensaria tratar-se de uma briga de marido e mulher.

— Então prove. Eu já disse que gostaria de passar o resto da tarde com você. Pode ser aqui ou na minha cobertura.

Ele não desistia. Ela mordeu o lábio.

— Bem, como está aqui, eu...

— Exatamente como eu pensei. — Andreas tirou o casaco e deixou-o no espaldar de uma cadeira. — Quando ficarmos com fome, pediremos alguma coisa ao restaurante.

— Um momento, por favor.

— Todo o tempo que for preciso. Não irei a lugar nenhum.

Era exatamente o que ela temia ao sair da sala. Vendo-se refletida no espelho do banheiro, ficou nervosa ao notar que suas faces estavam vermelhas. Seu corpo a traía, talvez por ter doado sangue.

Quando voltou à sala, alguns minutos mais tarde, encontrou Andreas deitado no

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sofá, com os olhos fechados. A televisão estava ligada num filme grego feito para a televisão.

Ele era maravilhoso. Ela não se moveu nem fez nenhum som, para que pudesse ficar olhando-o por um momento. Cada parte de seu rosto era perfeita, masculina. De seus cabelos negros ao seu corpo musculoso era um homem soberbo. Mas, por baixo de tudo isso, estava a essência de todos os seres do sexo masculino.

Talvez o sono de Andreas fosse resultado da mistura da doação de sangue com as muitas horas de trabalho a que ele se obrigava todos os dias, para que pudessem ver os meninos. Pela respiração pesada, ela notou que fora vencido pelo sono.

Ele nunca saberia o quanto ela gostaria de envolver-se nos seus braços, para sempre. Também cansada, deitou-se no sofá menor, olhando para ele, observando-o dormir.

O filme seguia, mas Gabi não tinha idéia do que acontecia na trama. Seus olhos pesavam. Quando voltou a acordar, Andreas trazia uma bandeja de sanduíches e café.

Surpresa ao ver como dormira profundamente, ela precisou de um minuto para sentar-se. O relógio marcava cinco para as seis! Olhou para Andreas.

— Há quanto tempo está acordado?

— Uns vinte minutos. Acho que nós dois precisávamos de um descanso.

— Eu nunca durmo de tarde!

— Mas hoje dormiu.

Gabi sentiu-se mal. Teria roncado?

— O que prefiro tomar como um elogio, como se ao meu lado você se sentisse bem.

— Em outras palavras, foi a prova que você precisava para saber que não o considero repulsivo?

— Algo assim — respondeu, seco. — Eu já comi. Tome um pouco de café. — Ele lhe ofereceu uma xícara.

— Obrigada. — Gabi tomou um bom gole antes de comer um sanduíche. — Está muito bom.

Andreas ficou de pé, trocando os canais na televisão até encontrar mais um filme. Antes que ela pudesse dizer qualquer coisa, sentou-se ao seu lado e passou o braço por trás dela.

— Era isso o que eu queria fazer antes.

Andreas era muito rápido para o seu gosto. Gabi já não podia resistir àquela boca masculina tão próxima à sua, quase fazendo parar sua respiração. Ah... aquela boca era tão gostosa, tão boa. O corpo de Gabi tremia ao lembrar o que já tinham feito juntos.

Sem pensar duas vezes, girou o corpo e passou os braços em volta do pescoço dele, deixando seus lábios muito próximos ao rosto de Andreas. Estava louca de vontade de beijá-lo. Passou uma das mãos pelos seus lindos cabelos.

Com um gemido, ele a abraçou mais forte, e tomou sua boca mais uma vez. Gabi imaginou que morreria de prazer ao seu lado.

— Eu a quero, Gabi. Quero fazer amor com você.

Ela também, mais do que qualquer outra coisa, mas dar alguns beijos e dividir a

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cama eram coisas muito diferentes. Gabi recusou-se, pois sabia que não era a única mulher em sua vida.

Namorada ou esposa, havia alguém mais. Ela precisava se controlar antes que perdesse a cabeça. Assim teria menos arrependimento quando voltasse ao trabalho, nos Estados Unidos. Quando ele se afastou um pouco, Gabi levantou-se.

— Por mais que eu queira, acho que não deveríamos ultrapassar essa linha. Lembre-se de que somos tios dos gêmeos, e vamos nos ver algumas vezes durante nossas vidas. Já me disseram que você gosta de manter distância de possíveis clientes, separando o pessoal do profissional. Acho que isso também funcionaria bem no nosso caso.

Após sua chegada a Milos, Andreas foi até a villa em busca de Leon. Estelle lhe disse que estava colocando os bebês para dormir. Quando aproximou-se do quarto dos meninos, viu Leon fechando a porta.

Os dois se entreolharam.

— Obrigado por vir, Andreas. Vamos ao meu quarto.

— Sinto muito não ter podido vir antes para ajudar com eles. Mas tinha um encontro importante.

Pedira a Gabi que anotasse os recados e deixasse tudo na mesa antes de sair para Milos. Desde a noite em que ela colocara um ponto final, ele ligara o piloto-automático, parecia um robô. Gabi mantinha a distância, e Andreas estava determinado a afastar-se, mesmo que lhe custasse muito.

Leon fechou a porta.

— Você está aqui agora, e isso é o que interessa.

Andreas ficou olhando para o irmão, que perdera peso e parecia cansado, o que era normal em um pai de primeira viagem. Porém, a ansiedade em seus olhos demonstrava haver algo mais, despertando a curiosidade de Andreas.

— O que foi? Você já me disse que Kris está bem, após o check up.

— Está mesmo.

— Não me diga que eles ainda sentem falta de Gabi.

— Não tanto. Nos primeiros dias não paravam de chorar, mas foram se acostumando comigo. Agora, ao me verem, vêm na minha direção e não querem ficar com ninguém mais, exceto com Gabi, quando ela vem aqui. É uma sensação incrível.

— Imagino. — Andreas queria sentir a mesma coisa, mas somente em circunstâncias ideais. — Então, qual o problema?

— Talvez seja melhor você se sentar.

O que poderia ser? Andreas permaneceu de pé.

— Vamos, diga.

— Você não vai acreditar. Deline me ligou hoje à tarde. Ela está grávida.

A novidade fez Andreas balançar. Era realmente incrível. Ficou olhando para o irmão gêmeo. Leon seria pai de uma terceira criança.

— O médico confirmou, seis semanas de gravidez. E, antes de desligar, ela disse que o divórcio segue avante, mas queria que eu soubesse que o bebê nascerá na

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próxima primavera.

— Seja lá como for, eu lhe dou os parabéns. — Andreas abraçou o irmão.

Leon parecia chocado.

— E irônico, não? Eu tenho os filhos de Théa, Deline está carregando outro na barriga, mas nenhum de nós estará junto.

E deixara Gabi de coração partido, mesmo com o direito de estar quando quisesse com as crianças. Porém, uma coisa era evidente. Após tudo isso, Leon aprendera o quanto amava Deline. Andreas não poderia fazer outra coisa além de consolá-lo.

— Não se desespere. Com o tempo tudo ficará bem, exatamente como você quer. Enquanto estou por aqui, por que não aproveita para ir a Atenas, para conversar com ela? Eu cuido deles até você voltar. Se precisar de alguns dias, não se preocupe.

— Você faria isso? — Leon arregalou os olhos. Ele estava magoado, precisava de ajuda.

— O que acha? — Após a reunião daquele dia, Andreas não teria nada de importante para o dia seguinte. Caso aparecesse no apartamento de Gabi, ela não o deixaria entrar. — Eu adoro os meus sobrinhos e quero passar um tempo com eles.

Leon engoliu em seco, depois disse:

— Obrigado. Tenho muito a agradecer. Não apareço no trabalho há semanas. Você está sobrecarregado.

— Você não se lembra de que está de licença paternidade? Como disse Gabi, cada um na sua...

Enquanto Leon mudava de roupa, olhou para Andreas, curioso.

— Como Gabi está se saindo no trabalho?

— Melhor do que eu poderia imaginar.

— Sob tais circunstâncias, foi inteligente da sua parte terminar tudo com Irena antes. Todos na família já sabem, mas preciso dizer que para Deline foi um choque. Andreas fez que sim com a cabeça.

— Elas duas ficaram muito amigas quando comecei a sair com Irena.

— Deline disse que Irena vai para a Itália, para umas férias longas. Mas antes queria conhecer os meninos, então não se espante caso ela apareça. Sinto muito.

— Eu não me importo. E se acontecer algo com os meninos, eu aviso.

Logo que Leon saiu da villa, Andreas deitou-se na cama do irmão e pegou o telefone no bolso. Franziu a testa ao notar que Gabi não atenderia à sua chamada e deixou uma mensagem de voz:

— Gabi? Aconteceu um imprevisto, e Leon precisa de minha ajuda. Quero que, logo cedo, reorganize minhas reuniões para os próximos dois dias, depois, que venha a Milos. O helicóptero estará esperando. Eu a espero a tempo de tomar café com os meninos.

Ela nunca viajaria para vê-lo, mas seria uma oportunidade de estar com os sobrinhos mais uma vez.

O apartamento no edifício Simonides era mais fabuloso que um hotel cinco estrelas. Sempre que Gabi saía do chuveiro, sentia-se uma princesa encantada, pois

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passava as horas que estava trabalhando ao lado de Andreas.

Se havia um lado ruim, era o final do dia. Quando Andreas deixava o escritório e dizia até amanhã, o encantamento desaparecia com ele. Exceto por aquela noite, quando disse que não deveriam cruzar a linha, nunca mais o viu fora do escritório.

Desde que fora trabalhar ali, passava as noites mais solitárias de sua vida. Para evitar o pior de tudo isso, gastava horas organizando os arquivos no computador e memorizando os nomes dos clientes mais importantes.

Certa ocasião, encontrou o nome da Paulos Metal Experts. Para a sua surpresa, viu que Dimitri levara várias vezes, e sem razão, a Simonides à justiça.

Andreas representou o pai na corte, e rebateu todas as reclamações. Ali estavam fotocópias de todos os processos. Ela não disse nada a Andreas, mas ao ler tudo aquilo ficou com ainda mais nojo do ex-marido de Théa.

Naquela noite, quando Andreas saiu do escritório, Gabi notou que ele tinha pressa. Naturalmente, imaginou que planejava passar a noite com a namorada, o que era uma possibilidade muito triste para Gabi, mesmo em pensamento.

Com o coração na boca, pegou o celular para ver se tinha alguma mensagem dos pais ou de Jasmine. Para a sua surpresa, a única mensagem que tinha era de Andreas, que ligara enquanto ela tomava banho.

Sempre aproveitou as oportunidades de ir a Milos ver os meninos, e desta vez planejava uma visita rápida, para tirar algumas fotos e voltar ao helicóptero, partindo para Heraklion para mostrar as fotos aos pais, numa visita surpresa. Eles adorariam ver como os meninos estavam crescidos.

Como Gabi precisava estar um tempo longe de Andreas, seria uma ótima saída. Em poucos dias, Kris seria operado. Após sua recuperação, ela deixaria o trabalho e voltaria para Virgínia.

Deixando Andreas livre para fazer o que quisesse, pois ela iria embora para sempre.

Doze horas mais tarde, Gabi subia no helicóptero, no topo do edifício, com sua maleta na mão, No caminho para Milos, disse ao piloto que só ficaria um momento por lá. Depois queria ir a Heraklion.

Com os planos a postos, chegou à villa Simonides, onde encontrou Andreas no heliporto, lindo em uma camisa de linho branca e short de banho. Estava acostumada a vê-lo em roupa de trabalho, e o seu coração quase saltou pela boca.

Quando ele se aproximou pára ajudá-la a descer, os olhos penetrantes de Andreas pareciam tomar conta de seu corpo, revirando suas entranhas. Ela vestia uma saia curta e uma blusa sem manga, em tons terra, e nos pés usava sandálias brancas de corda. Ele nunca a vira vestida assim.

— Fico feliz, que tenha vindo. Você cheira tão bem e está linda hoje.

— Obrigada. — Gabi não estava preparada para receber tal elogio. Seu estômago se revirou. — Comprei um xampu novo, de manga. Seu piloto disse a mesma coisa. E vai comprar para a esposa.

O sorriso de Andreas era cativante, deixando-a sem ar.

— Sei que não vê a hora de encontrar-se com os meninos. Eles estão no pátio. Venha.

Ela conhecia o caminho, e desceram vários degraus margeados de canteiros de

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flores, depois passaram pela piscina retangular, de um azul límpido.

A propriedade dos Simonides era maravilhosa, ultrapassava o que Gabi vira do ar, na primeira vez que estivera ali. Cada villa tinha sua varanda com flores, uma após a outra, descendo para o mar, onde a areia branca se misturava à água turquesa. Ela parou num dos degraus e deu uma olhada em volta.

— Ah, Andreas... Sei que digo isso todas as vezes, mas este lugar é esplêndido. Não posso acreditar que seja real. — Na verdade, não acreditava que ele fosse real. — Com um pai tão devoto quanto Leon, esses meninos são as crianças mais sortudas da face da terra.

— O milagre maior é que tenham passado os primeiros dias de vida com você e os seus pais. Eles estão a sua espera.

— Estou louca para vê-los — disse, seguindo:o pelos degraus, entrando no quarto. De soslaio, viu os berços, um ao lado do outro, sendo balançados ao som de uma cantiga de ninar.

Correu em direção aos meninos, mas diminuiu o ritmo para não assustá-los. Estavam vestidos com roupas idênticas, azuis. Sem sapatos nem meias, pois fazia muito calor.

— Como eles cresceram!

Andreas pegou Kris no colo e ofereceu-o a Gabi.

— Olhe quem está aqui.

— Ah, que menino lindo! — Gabi o tomou nos braços, incapaz de parar de beijar suas bochechas e seu pescoço.

Enquanto Gabi afagava Kris, Andreas pegou Nikos e colocou-o contra o ombro.

— Senti sua falta — afirmou Gabi, olhando para o bebê, depois afastou a cabeça para olhá-lo nos olhos. — Lembra-se de mim?

Ele piscou.

— Acho que ele não me reconhece, Andreas.

— Espere minuto. O sol está forte. Venha cá. — Ele pegou Kris em um dos braços e ofereceu Nikos para ela.

— Como você pode ser tão lindo? — Gabi beijou a barriga de Nikos. — Toma pílulas de beleza? — E ergueu-o acima de sua cabeça.

O riso feliz de Andreas tomou conta do ar.

— Kris reconhece a sua voz. Está vendo? Está girando a cabeça para olhá-la.

— Será? — ela perguntou, louca de felicidade.

E Nikos foi ficando feliz, soltando seus gritinhos infantis.

— Acho que sim... — disse Gabi, beijando suas bochechas, fazendo-o sorrir.

— Eu também sorriria assim caso você me beijasse tantas vezes — disse Andreas, provocando, mas fingindo ser um comentário de brincadeira.

Gabi ignorou suas palavras, mas sentiu as faces corarem.

— Não sei se seria boa idéia.

— Mas ninguém vai a lugar nenhum agora. Estelle virá com as mamadeiras em poucos minutos. Nós os alimentaremos antes que ela os coloque para tirar uma soneca.

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Rebecca Winters - Raios de Sol (Special 30)

— Talvez seja melhor vocês dois fazerem isso. Não quero que minha presença atrapalhe o progresso alcançado por Leon.

E colocou Nikos no berço, para tirar fotos. Como tinha uma desculpa para fotografar Andreas, tirou várias fotos dele com Kris nos braços.

— Será bom para os meninos verem-na com freqüência — ele murmurou, espantando a preocupação de Gabi. — Eles se sentirão mais seguros psicologicamente sabendo que você não desapareceu de suas vidas.

— Está falando com base cm algum estudo científico?

— Não. Mas sei que você precisa estar perto deles. Eu te amo, Andreas Simonides.

Gabi encontrou uma cadeira e pôs Nikos no colo, para observá-lo bem. Andreas pegou outra cadeira e sentou-se ao seu lado, com Kris. Segurando as mãos dos meninos, começaram a brincar juntos. Gabi caiu na risada. Andreas também.

— Olhe, Estelle, acho que não deveríamos interromper. Eles estão se divertindo muito.

Gabi ouviu uma voz feminina que não conhecia e olhou para trás. Viu duas mulheres carregando as mamadeiras. A mais velha usava uniforme. A mais nova, um vestido moderníssimo, de tirar o fôlego. Era uma linda grega de cabelos negros, que faria ótimo par com Andreas.

— Irena... — disse Andreas.

Gabi não queria vê-la. Desde que soubera de sua existência por Deline, ficou imaginando onde se esconderia. Porém, quando apareceu, foi muito mais duro do que imaginava. Agarrou Nikos contra o seu corpo.

No fundo, queria apagar a visão daquela mulher maravilhosa da mente. Seus olhos castanhos pareciam de veludo. Tomando a iniciativa, Gabi afirmou:

— Você não interrompeu nada. Sou Gabi Turner, tia dos gêmeos.

— Como vai?

— Acabei de chegar, e bem a tempo de ajudar Andreas a dar comida aos meninos. Mas não posso ficar muito mais. Meus pais me esperam em Creta.

Levantou-se e disse a Irena que se sentasse, oferecendo-lhe Nikos. Os olhos de Andreas seguiram seus movimentos. Por sua expressão enigmática, Gabi não tinha idéia do que ele pensava. Estelle ofereceu-lhe a mamadeira.

Gabi deu um beijo em Nikos antes de virar-se para Andreas e dizer:

— Quando o piloto me trouxe aqui, esta manhã, imaginei que não teria problema em pedir que me levasse a Heraklion algumas horas depois.

— Claro que não — ele respondeu, baixo.

Gabi não ligava se tinha ou não falado sobre isso antes. Precisava escapar dali. E o helicóptero seria um ótima saída. Deu outro beijo na bochecha de Kris.

— Nós nos veremos no hospital, meu querido. Agora tenho de ir.

Ao sair, dando passos largos, ouviu o choro de Kris. Poucos segundos mais tarde, Nikos o acompanhou. Aquele choro a deixou triste e alegre ao mesmo tempo. Em poucos minutos parariam de chorar e aproveitariam a companhia de Andreas e sua namorada.

Gabi, por sua vez, nunca superaria. Seu pranto era o mais desesperado de todos,

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mas iria sufocá-lo até chegar a Heraklion.

Quando Andreas ouviu o helicóptero levando Gabi embora, os bebês já estavam calmos, terminando de tomar suas mamadeiras. Irena deu palmadinhas nas costas de Nikos para que arrotasse, antes de colocá-lo no berço. Olhou para Andreas.

— Peço perdão por interromper você e Gabi, Andreas. Não sabia que estariam aqui esta manhã.

— Não precisa se desculpar. Leon avisou que você viria ver os bebês.

Ela fez que sim.

— Deline tinha razão. Os filhos de Leon são lindos. Que situação mais trágica!

Andreas deu um beijo na testa de Kris.

— É um tempo duro para todos os envolvidos. Inclusive para você, Irena. Juro que não queria magoá-la.

— Vou ficar bem.

Ele precisava acreditar nisso.

— Sei que irá para a Itália.

— Sim, mas fico feliz por ter vindo aqui antes e visto você, que mudou muito desde o mês passado. Não o conheço mais. Ao vê-lo aqui com ela, senti uma energia radiante. Era como se você estivesse em chamas por dentro. Vê-lo com Gabi explica muitas coisas que eu não entendia, e me faz querer buscar um amor assim para a minha vida.

Ele se levantou.

— Não conheço mulher mais educada que você. Merece a felicidade completa, Irena. Quanto tempo vai ficar na Itália?

— Por que quer saber?

— Porque me preocupo com você.

— Não se preocupe. Sua coragem ao terminar tudo abriu meus olhos para certas coisas sobre mim que eu não queria ou não tinha vontade de ver. Para responder à sua pergunta, ficarei na Itália o tempo que for preciso.

— Irena? — Ele ficou surpreso com aquela resposta enigmática.

— Não diga nada mais. Já conversamos tudo o que precisávamos conversar. Por favor, não me acompanhe ao carro. Fique com os seus sobrinhos. Adio, Andreas.

— Adio.

De alguma maneira, embora ele não soubesse como, ela também estava diferente. Algo acontecia... Andreas ficou observando até Irena desaparecer, depois olhou para os meninos. Chegara a hora de tirá-los daquele lugar tão quente. Pegou os dois nos braços e levou-os de volta à villa de Leon. Outra mudança de fraldas e estariam prontos para dormir um pouco.

Quando os bebês adormeceram, Andreas encontrou Estelle e disse que daria umas braçadas na piscina. A energia a que se referira Irena o estava matando. Precisava extravasá-la com alguma atividade física ou perderia a cabeça.

Na décima-volta, ouviu o som de um helicóptero se aproximando. Seu coração

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Rebecca Winters - Raios de Sol (Special 30)

saltou ao pensar que poderia ser Gabi. Que bobagem! Ela voltara correndo para a vida anterior, da mesma forma como fugira dele na praia de Papafragas, e depois no apartamento. O que ele não entendia era por quê.

Os motores pararam. Qualquer membro da família poderia estar chegando de Atenas, algo que acontecia com freqüência durante o verão. Provavelmente alguma de suas irmãs com os filhos.

Mas, para sua surpresa, quem apareceu foi Leon, mergulhando imediatamente na piscina. E nadou como um peixe para alcançar Andreas. Assim que viu o rosto de Leon, notou que acontecera o pior.

— Obrigado por tomar conta dos bebês para mim. Mas foi tempo perdido. Deline não mudou de idéia. Mesmo com o nosso bebê a caminho, o divórcio está de pé.

— Isso porque a dor dela está falando mais alto.

Leon abriu os braços e recostou-se contra a borda da piscina.

— Ao que tudo indica, ela e Irena estiveram conversando sobre nós dois. Antes que eu deixasse Atenas, ela disse: "Parece que o seu irmão também não entende nada sobre fidelidade. Talvez seja mais um sintoma dessa coisa de gêmeos."

— Não entendo. — Andreas franziu a testa.

— Quando Deline visitou Gabi e os gêmeos em Apollonia, ela não sabia que você e Irena estavam separados.

— Você quer dizer que... — Andreas ficou sem palavras.

— Quero dizer que ela deve ter dito a Gabi que a família estava esperando o anúncio do seu casamento com Irena.

Andreas deu um grito e se ergueu acima da água.

— O que foi, meu irmão? — perguntou Leon.

— É por isso que Gabi está resistindo. Naquele momento, tudo fez sentido.

— Ah... — Leon suspirou. — Gostaria tanto que meus problemas fossem tão simples quanto esse!

Andreas também. Sendo gêmeos, eles se entendiam muito bem.

— Sei o quanto você está sofrendo por Deline. Não desista dela.

Leon abriu um sorriso amarelo.

— Eu não poderia, mesmo que quisesse, pois ela é a mulher da minha vida. Por enquanto, mantenho a saúde mental graças aos meninos.

— Gabi esteve aqui há poucas horas. Os meninos começaram a chorar quando ela se foi. Felizmente, acabaram se acalmando sem muito problema.

— Estou pensando em roubá-la de você — admitiu Leon. — Preciso de ajuda. Os bebês a adoram, e isso não vai mudar nunca, pois ela sempre será tia deles. Devemos encarar esse fato. Estelle já está velha para essas coisas. Em três semanas, ficou cansadíssima. Não é justo.

— Estou completamente de acordo.

— Se nada mudar entre mim e Deline, terei de contratar uma babá. Mas, enquanto isso, Gabi poderia ocupar o posto, sobretudo agora, quando está chegando a hora da operação de Kris.

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— Ligue para ela, então! — gritou Andreas, animado. Só de pensar nisso sua adrenalina foi a mil.

Leon o olhou, esperançoso.

— Está falando sério?

— Ligue já! Ela pode ficar numa das villas de hóspedes. Diga que já conversou comigo e Gabi virá imediatamente. Diga que está enviando um helicóptero para buscá-la.

Leon olhou para o irmão, curioso.

— E quem o ajudará no escritório?

— Christine.

— A secretária particular de Gus? Ele fez que sim.

— Gosto dela. É tão disciplinada quanto Anna.

— Então será a escolha perfeita para substituí-la.

— Vou conversar com o nosso irmão. Ele vai entender, e vou poder cuidar da promoção dela. Quando conversar com Gabi, diga que isso está resolvido, e ela não terá nenhuma razão para deixar de vir.

— Quem ligou?

Confusa pela conversa, Gabi desligou o telefone e virou-se para a mãe. Estavam almoçando na cozinha, e a mãe olhava as fotos dos meninos, tiradas com o celular.

— Leon Simonides. Você acredita que a esposa dele está grávida?

— Não brinque...

— E o pior é que ela, ainda assim, continua pedindo o divórcio. Ele está arrasado. A mãe de Leon tem de cuidar do marido, e Leon está preocupado porque Estelle é muito velha para agüentar o ritmo dos bebês. Assim, ele pediu que eu fosse até lá, ajudá-lo com os meninos até a operação de Kris.

— Eu não queria estar no lugar dele.

— Nem eu. Leon está tão triste, mãe — disse Gabi, com o olhar perdido. — Caso eu aceite, enviará um helicóptero para me buscar amanhã de manhã. Tudo o que devo fazer é dizer que sim, e ele mesmo se encarregará de levar as minhas coisas do apartamento no edifício do escritório para uma suíte de hóspedes em Milos. Após a operação, gostaria que eu o ajudasse a entrevistar candidatas ao posto de babá.

— Isso faz todo o sentido, mas como fica o seu trabalho com Andreas?

— Leon disse que não me preocupasse. A secretária do irmão mais velho deles dois será promovida a secretária de Andreas.

Ele ja resolveu tudo.

Gabi parecia uma batata quente... tão quente que Andreas a deixaria ir embora sem nem falar com ela. O que era horrível.

Sua mãe deu a volta na mesa e abraçou-a.

— Sei que está inclinada a aceitar, pois assim estará mais perto dos meninos, mas pense bem. Caso decida fazer esse favor a Leon, ficar em Milos facilitará tudo.

— Facilitará? — Gabi a encarou.

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— Ah, querida... Assim que Andreas entrou aqui em casa, eu notei que você estava apaixonada por ele. Mas, sabendo que tem uma namorada, imagino que estar ao seu lado no escritório deve ter sido muito doloroso.

Gabi enterrou o rosto entre as mãos.

— Dava para notar?

— Só seu pai e eu notamos.

Após respirar fundo, Gabi baixou as mãos.

— Vou ligar para Leon e aceitar. Com a operação de Kris se aproximando, ele precisa de todo o apoio possível.

E assim não terei de ficar olhando para Andreas por oito horas, todos os dias.

CAPITULO OITO

Gabi começou o seu quinto dia em Milos com a mesma rotina: banho nos bebês, seguido de comida e brincadeiras na piscina. Como fazia todas as manhãs, Leon voou para Atenas para trabalhar um pouco. Sempre voltava às quatro da tarde para dar uma folga a Gabi. Ela não tivera notícias de Andreas, o que não foi uma surpresa.

Enquanto dava uma volta com Kris pela piscina, Estelle apareceu. Os meninos se comportavam muito bem. Gabi tomava conta enquanto estavam acordados, e a governanta, enquanto dormiam.

— Leonides acaba de ligar. Ele quer que você e os meninos estejam prontos para um passeio no barco, de Andreas.

— Você ouviu isso? — Gabi deu um beijo na bochecha de Kris. — Seu pai está voltando para casa!

A cirurgia de Kris estava marcada para dali a dois dias. Ela não conseguia deixar de pensar nisso, e adorou a possibilidade de um momento de diversão, que mudasse um pouco a rotina.

— As empregadas vão empacotar tudo e levar ao píer. Enquanto você se prepara, eu fico com os meninos. Já preparei a comidinha deles.

Gabi enrolou Kris numa toalha e passou-o a Estelle.

— Volto já.

Gabi desceu os degraus em direção à villa de hóspedes para pegar sua saída de praia e vesti-la sobre o biquíni. Numa bolsa, colocou uma muda de roupa, além de uma toalha e outras coisas de que poderia precisar. Quando voltou à piscina para pegar os bebês, Estelle disse que já estavam no píer. Leon deveria ter chegado de helicóptero enquanto ela arrumava seus pertences.

— Vemo-nos mais tarde, então. — E Gabi desceu correndo em direção à praia, passando pelo deque privado, cheio de jet skis e barcos da família. Chegando ao iate de

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Andreas, franziu a testa ao notar que não havia nenhum sinal de Leon nem dos meninos.

— Oi? Tem alguém aí? — gritou.

— Estamos no compartimento principal.

Ela deu um salto ao escutar a voz de Andreas, e virou-se. Ao vê-lo, com seu corpo tão bem definido, ficou sem fôlego. Ele estava de pé, alto como sempre, na entrada do barco, vestindo um calção de banho e nada mais. Além de seus cabelos mais escuros que a noite, ali estavam seus olhos prateados. Ela ficou em chamas.

— O que faz aqui? Eu... quero dizer, não deveria estar no trabalho?

— No último momento, Leon resolveu procurar Deline para ver se finalmente poderiam conversar. Agora que soube que vai ser pai outra vez, está louco de vontade de vê-la e saber o que está fazendo. Eu disse que não se preocupasse com os meninos e voei para cá o mais rápido que pude.

Gabi não sabia o que dizer, ainda tentava se recuperar da visão de Andreas, tão inesperada.

Ele sorriu, fazendo com que Gabi concentrasse suas atenções naquela boca sensual.

— Que tal começarmos outra vez? Como você está, Gabi? Parece que já se passaram meses desde que nos vimos pela última vez. Eu estou bem, mas, ainda que Christine seja eficiente, devo admitir que sinto falta de minha secretária norte-americana, que era tão charmosa com todos os que vinham ou telefonavam ao escritório.

Andreas...

Ele deu uma olhada em volta.

— Está um lindo dia, não acha?

— Stavros está cuidando dos meninos? — ela perguntou, com dificuldade.

— Não. Hoje eles serão nossos. Não me diga isso.

Assustada com os sentimentos que Andreas despertava nela, passou ao lado dele e desceu as escadas, correndo, para ver os sobrinhos. Encontrou-os deitados num tapete que Andreas colocara no chão do espaçoso salão. Estavam dormindo de costas, com os braços esticados ao lado dos seus corpinhos, e as mãos fechadas em punhos. Como seria a sensação de poder fazer isso?

Andreas a seguiu e ficou perto o suficiente para que Gabi sentisse seu calor.

— Como será poder dormir sem preocupações de qualquer natureza? Nada além de sonhos doces, até a próxima hora de comer.

Ele leu seus pensamentos.

— Vamos ao convés — Andreas convidou.

E Gabi sentiu sua respiração na nuca, lançando tremores deliciosos por todo o seu corpo.

— Já liguei a babá eletrônica aqui embaixo. Caso eles mudem o ritmo de respiração, vamos escutar.

Ela não precisava de nenhuma desculpa para afastar-se de Andreas, mas subiu rapidamente as escadas à sua frente. Seu vestido de verão era um pouco apertado, mostrava mais do que deveria.

Ele a seguiu.

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Rebecca Winters - Raios de Sol (Special 30)

— Fique à vontade enquanto eu desato as amarras. Depois vamos dar um passeio por recantos da ilha que você ainda não conhece.

Gabi sentou-se perto da cadeira do capitão. Estar ali, com o teto solar aberto, era uma experiência incrível.

— O que você acha? — ele perguntou, após sentar-se.

O braço e a coxa de Andreas a tocaram, aumentando sua sensibilidade.

— Tipo: eu sou mestre de tudo o que quiser?

Um sorriso escapou da boca de Andreas, que brincou:

— Algo assim.

Depois ligou o motor do iate e se afastaram da baía, em direção ao mar aberto.

— Quando eu e Leon éramos pequenos, ele queria ter um iate enorme, para convidar todos os seus amigos e navegar os sete mares, como Ulisses. Eu, no entanto, preferia ter um como este, para explorar sozinho.

— Claro. — Gabi sorria.

Andreas sempre dirigia muito bem a sua vida, mesmo tendo um irmão gêmeo.

— Um pirata deve saber manobrar, entrar e sair de cavernas e despistar os inimigos rápido. Agora que realizou todos os seus sonhos, é a vez dos nossos sobrinhos, que estão aqui embaixo, começarem a sonhar.

Andreas a olhou de relance.

— Você acha que realizei todos os meus sonhos?

— É uma maneira de falar.

— Para a sua informação, ainda nem comecei a realizá-los. Ele só poderia estar falando sobre o futuro com Irena, ela pensou.

— E você, Gabi?

Estavam chegando a um ponto complicado e doloroso. A única verdade que interessava era o que Deline lhe dissera sobre Andreas ter ido a Atenas para passar um tempo ao lado da namorada.

— Realizei uns poucos.

— Quais?

— Entrei para o clube do Pingüim ainda no colégio.

— E isso foi muito importante?

— Claro. Para entrar no clube é preciso saber esquiar muito bem.

— Bravo! — disse Andreas, fazendo com que ela sorrisse. — E o que mais?

— Já no ginásio, tentei fazer parte do conselho de alunos. Fui escolhida no último ano.

— E que tal?

— Nada de mais. Perdi muitas aulas indo a reuniões, e meu parceiro me deixava louca.

— Era homem ou mulher?

— Homem.

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Rebecca Winters - Raios de Sol (Special 30)

— Ele não deve ter sofrido tanto quanto você.

— Não, os sofrimentos vieram mais tarde.

— Você já se apaixonou, Gabi? Estou falando do tipo de amor que nos faz vender a alma, algo que não acreditávamos ser possível. O tipo que só acontece uma vez na vida.

Ele acabara de descrever tudo o que ela sentia.

— Sim. — Gabi se levantou. — Desculpe, mas vou ver os meninos.

— Ainda não ouvimos nada.

— Talvez, mas eles devem estar acordando, pois não sabem onde estão nem por que seu pai não está aqui. Não quero que se sintam sozinhos.

— Eles têm um ao outro. Garanto que essa é a maior vantagem de ser gêmeo.

Os dois se entreolharam.

— Num primeiro momento, foi complicado dividir Leon com Deline?

Um silêncio se instaurou entre eles.

— Sabe que você é a primeira pessoa que me pergunta isso? Que tato... —Andreas tirou os óculos escuros de um bolso e os colocou no rosto. — Para ser sincero, sim. O que ajudou foi que eu e Leon trabalhamos juntos. Infelizmente, quem mais sofreu foi Deline, por ter de dividi-lo comigo. Eles brigavam por conta disso na noite em que Leon convidou amigos ao iate, e conheceu Théa.

Gabi fez um som baixinho, no fundo da garganta.

— Quando os gêmeos nasceram, comprei alguns livros para estudar o assunto. Uma das coisas que aprendi foi que os gêmeos devem ser vestidos com roupas diferentes, tratados de forma diferente. Devemos ajudá-los a desenvolver sua individualidade. Mas os livros também falam sobre uma conexão entre eles, como um radar interno que deve ser ativado.

— Isso é verdade.

— Acha que, caso se case um dia, também será complicado para Leon?

— Sim, pois ele não está acostumado a ter alguém entre nós dois.

Gabi também não gostava de ser posta cm segundo plano. Segurando a respiração, desceu correndo as escadas.

Após aprender os meandros do mundo dos negócios com o pai e o avô, Andreas sabia por instinto quando era ou não um bom momento para um movimento crucial. Aquela não era a hora de dizer a Gabi que estava solteiro. Ela se encontrava muito preo-cupada com Kris e sua cirurgia iminente.

Quando chegasse o momento, queria toda sua atenção, para notar qual seria sua reação à notícia de que era um homem livre. Até que o sobrinho se recuperasse, Andreas teria de manter-se calado, mas não via a hora de chegar o momento da operação.

— Você não sabia que Kris estava acordado, deitado e emitindo sons baixinhos? — ela perguntou, voltando ao convés com o bebê de olhos arregalados no colo.

Ao ver a cena, Andreas passou a mão nos cabelos. Gabi e o menino eram uma imagem muito mais viva que a pitoresca vila a distância.

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— Olhe que lindo, meu querido!

Andreas teve de desviar o olhar para conduzir o barco. Estavam entrando em uma baía.

— Onde estamos?

— Em Adamantas, o centro social de Milos. Essa parte da ilha é um porto natural. Todos preferem este lado, pois está abrigado dos ventos do norte.

— Tenho certeza de que seu tio conhece cada centímetro desse paraíso — disse Gabi ao bebê, beijando suas bochechas.

Por um segundo, Andreas fechou os olhos, esperando poder sentir aqueles lábios contra a sua pele, o seu queixo, a sua boca.

— Assim como ele e o seu pai, chegará o dia em que você explorará tudo isso com seu irmão. E o seu coração será tão forte quanto o de Nikos.

A luz do sol fez suas lágrimas não derramadas brilharem, tão azuis quanto as águas do mar. Ao notar isso, Andreas ficou com um nó no peito.

— Vai terminar tudo bem, Gabi.

Para a saúde mental de Leon, tinha de terminar bem.

— Eu sei — ela disse, mas suas palavras soaram abafadas, pois Gabi enfiara o rosto no pescoço de Kris. — Ele não tem idéia de que amanhã irá ao hospital para ser operado.

— Estaremos todos com ele. Imagino que já tenha dito aos seus pais que eles poderão ficar no apartamento do edifício Simonides com você.

Ela levantou a cabeça.

— Sim. E estão muito gratos por tudo.

— Já pedi que busquem seus pais de helicóptero em Heraklion.

— Eu sei, mas não esperavam por tudo isso. Não será necessário.

— A minha família insiste. Nossas irmãs já estão planejando o tempo que cada uma ficará na casa dos meus pais, tomando conta de Nikos, não há razão para se preocupar com isso.

— Acho que nunca houve no mundo dois bebês tão amados, mas isso deve ser muito duro para o seu irmão.

Como Leon era seu irmão gêmeo, Andreas deveria sentir muito profundamente sua angústia.

— Ele precisa confortar a esposa, que foi dolorosamente magoada. Isso é uma tragédia.

— Claro que sim — disse Gabi, em tom suave. — Leon deve estar sofrendo ainda mais agora, que sabe que ela carrega seu filho no ventre. Eu faria qualquer coisa para ajudá-los.

— Gabi — disse Andreas, seco —, você não sabe que está salvando a vida dele neste momento?

Os olhos marejados de Gabi encontraram os dele.

— Você também. Mas quem está ajudando Deline? Andreas adorava a compaixão de Gabi.

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— Ela tem uma família grande, que lhe dará muito apoio.

— Fico feliz por isso.

E Andreas observou Gabi apertando Kris contra o peito. A expressão em seu rosto o deixou perdido. Sentindo-se mal com toda aquela dor, ouviu Nikos começar a chorar.

— Vou pegá-lo. — Andreas desligou o motor e levantou-se. — Quando eu voltar, trago as mamadeiras e os moisés. Devo trazer o carrinho também? Podemos descer em Adamantas e almoçar por lá.

Gabi ficou olhando para ele.

— Você está com fome?

— Não — ele afirmou, sendo honesto.

— Eu também não. Importa-se se voltarmos? Este lugar é lindo, mas quando Leon chegar vai querer ter os bebês por perto.

Andreas se espantou ao ver como seu pensamento tantas vezes coincidia com o de Gabi. De certa maneira, era algo parecido com sua conexão com Leon, mas muito mais forte.

Antes da cirurgia, os dois pares de avós entraram no quarto do hospital, beijaram e abraçaram o neto. O pai de Gabi estava visivelmente abalado, pois lembrava-se todo o tempo de Théa. Com sua morte tão recente, seus olhos estava marejados.

Leon não saía do lado da mãe. Era uma cena comovente. Andreas e seu irmão mais velho, Gus, junto à sua esposa, apoiavam o pai, que também parecia um tanto abalado. Um ano antes, sofrera um ataque do coração, e naquele momento voltava a pensar em sua condição de mortal.

Gabi observava a impressionante e super morena família Simonides. Eram altos, todos muito bonitos. De repente, Andreas deu uma olhada em volta e a encontrou. Olhou-a sem abrir um sorriso, penetrando em sua alma.

Para Gabi, era como se Andreas estivesse se lembrando do primeiro encontro deles dois, no escritório, quando se achava a ponto de fechar a porta do elevador na cara dela. Mas a foto do jornal e a dos bebês mudou várias vidas. Não apenas as dos fa-miliares ali presentes, mas também a de Deline.

Gabi consultou o relógio. Eram 6h45 da manhã. Kris seria o primeiro paciente do cirurgião cardíaco daquela manhã. Ao que ela agradecia, pois havia muito tempo esperavam por aquele dia.

O doutor dissera a Leon que a mais nova tecnologia médica deixara o procedimento bem mais rápido. Em uma hora a operação estaria terminada. Logo a vida voltaria ao normal, mas não para Gabi, pois Andreas não estaria ao seu lado.

Você tem de se acostumar com isso, ouviu seu coração dizer. Os passeios de barco com os gêmeos acabariam, como o que fizeram na véspera, a Adamantas. Enquanto ela ajudava Leon no processo de reconhecer sua nova família, Andreas esteve sempre por perto. Mas aqueles dias estavam contados, e ela nunca voltaria a experimentar tamanha felicidade.

Enfim, desfez o contato visual com Andreas e abraçou sua mãe, que conhecia o seu segredo. Gabi precisava de força.

Quando a porta se abriu, viu a enfermeira, que falava com Leon. Disse que

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chegara a hora de preparar o bebê, de administrar-lhe anestesia.

— Ternos uma sala de espera no final do corredor. Peço que se dirijam até lá, por favor.

Gabi ficou com um nó na garganta ao ver lágrimas correndo pelas faces pálidas de Leon, que beijava o filho pela última vez. Ele sentia tanta dor que Gabi ficou assustada com a sua compostura. Andreas estava por perto, para segurar o irmão, quando a enfermeira desapareceu do quarto com o bebê que Gabi viu nascer. Era como se uma parte do seu coração estivesse sendo arrancada.

O pai de Gabi agarrou sua mão e apertou-a. Lentamente, todos se dirigiram à sala de espera. O tempo é algo relativo. Quando estava com Andreas, sorrindo e brincando com os meninos, uma hora era um momento, passava voando. Mas aquela hora demoraria muito para passar, disso Gabi não tinha dúvida.

Não ficou surpresa ao ver que Andreas fora o responsável por levar bebidas e lanche para todos. Antes disso, chegou seu cunhado, e as mulheres da família começaram a conversar. A esposa de Gus, Beril, sentou-se ao lado de Gabi. Não poderia ter sido mais agradável. As duas conversaram baixinho sobre Leon.

— Desde que se tomou pai, ele mudou para melhor, Gabi. Mas assumir, tal responsabilidade custou o seu casamento. Conversei com Deline ontem. Isso é tão triste.

— Ainda que a minha irmã tenha bebido demais, eu posso prometer que ela não teria feito o que fez caso soubesse que Leon estava casado. Théa nem sabia que Andreas tinha um irmão gêmeo, mas agora é tarde demais para pensar em tudo isso.

Beril passou o braço ao redor dos ombros de Gabi. Andreas notou o gesto e se aproximou, interrompendo uma conversa com os irmãos. Ao notar sua aproximação, a pulsação de Gabi se acelerou.

— Você parece cansado.

— Estamos todos cansados, Beril, mas Leon é quem se encontra à beira da exaustão.

— Ainda não consegui conversar com ele. Desculpe, Gabi, volto em um minuto.

Quando Beril se afastou, Andreas sentou-se no seu lugar. Ele exalava um cheiro maravilhoso. O terno cor de terra cobria o seu corpo como uma luva. Gabi ficou sem fôlego. As pernas de Andreas roçaram contra as suas ao virar o rosto para ela.

— Você está bem? — perguntou, com voz de veludo, que ressoou nas entranhas de Gabi.

— Vou ficar bem quando o médico aparecer por aqui. Já passou mais de uma hora e meia. E você, como está?

— Ouviu o que disse Beril. O que posso fazer por você?

Ela o encarou. Andreas escondia muito bem as suas emoções. Num impulso, Gabi disse:

— Quem deveria perguntar isso era eu. Você esteve ajudando a todos.

— É melhor manter-se ocupado.

Quando Gabi concordava com a cabeça, um dos médicos que fizeram a cirurgia apareceu. Como todos, Andreas ficou de pé, e olhando para Leon.

— Sr. Simonides? A operação do seu filho foi um sucesso, mas ele está com um pequeno problema para se recuperar da anestesia.

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Rebecca Winters - Raios de Sol (Special 30)

Sem pensar, Gabi agarrou o braço de Andreas.

— Venha comigo. Ele está na UTI infantil. A angústia de Leon era palpável.

— Venha junto, Andreas — pediu Leon.

Andreas enviou uma mensagem silenciosa a Gabi, dizendo que voltaria, mas que naquele momento iria com Leon. Sem o seu apoio, Gabi correu para junto dos pais. O pai a abraçou por um bom tempo.

— Não acredito que isso esteja acontecendo, papai. Leon já sofreu tanto, e agora isso... Pobre Kris. Ele precisa sair dessa.

— E sairá, querida.

Quando o pai afrouxou-o abraço, sua mãe estava pronta para abraçá-la outra vez.

— Precisamos ter fé: tudo terminará bem.

Enquanto todos na sala estavam agoniados, Gabi viu algo com um canto do olho. Uma mulher morena entrava na sala. E Deline! E todos a viram.

— O que houve? Onde está Leon? — indagou, assustada.

A mãe de Andreas correu para perto dela, para explicar a situação.

— Quer dizer quer Kris talvez não agüente? — Deline empalidecera.

— Ninguém pensa assim por aqui.

— Mas Leon, sim — disse Deline, e a sua voz soava como a de uma esposa que conhece o marido melhor do que ninguém.

Ela ainda o amava, Gabi sentia isso.

— Onde fica a UTI infantil?

— Venha, Deline. — Gabi se adiantou, antes que qualquer pessoa dissesse algo. — Eu a ajudo a encontrar.

Juntas, deixaram a sala de espera e seguiram em direção à sala das enfermeiras.

— Esta é a sra. Simonides. Ela chegou tarde, seu marido está na UTI infantil com Kris, que acabou de ser operado. Será que ela pode entrar?

— Claro. Os bebês precisam das mães em momentos como este.

Nenhuma das duas quis corrigir a enfermeira.

— Vou pegar um avental e uma máscara para você.

Quando Deline estava pronta, a enfermeira a conduziu, com Gabi seguindo-as.

As duas correram por outro corredor, onde viram Andreas de pé, do lado de fora de uma porta. Com as cortinas baixadas, era impossível ver o que acontecia lá dentro.

O semblante de Andreas era duro, fazendo-o parecer ter mais do que os seus 35 anos. Quando viu que as duas se aproximavam, ele abriu os olhos, surpreso.

A enfermeira abriu a porta para Deline, que entrou imediatamente, depois voltou a fechá-la e desapareceu.

No mesmo instante, Andreas agarrou o antebraço de Gabi. Ele estava tão tomado pelas emoções que nem notou a força que fazia.

— O que está acontecendo? Gabi balançou a cabeça.

— Não sei, não sei mesmo. Deline chegou procurando por Leon. Sua mãe disse

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Rebecca Winters - Raios de Sol (Special 30)

que Kris estava com problemas. Imaginei que Deline fosse passar mal na sala de espera, então disse que viesse comigo, que encontraríamos vocês.

Andreas não sabia o que dizer. Abraçou Gabi apertado. Ela entendeu o gesto e não fez uma interpretação equivocada.

Toda aquela experiência, desde o primeiro dia em que Andreas soube da existência dos gêmeos, fora muito emocional, e Andreas já não sabia o que fazer com tantas sensações. Nem Gabi, naquele momento colada a ele, dessa vez sem preocupar-se com Irena, que no final das contas não estava dividindo essa situação de vida ou morte com eles.

— Deline não teria vindo caso não amasse mais Leon — ele murmurou entre os cabelos de Gabi. — Ela sabia da cirurgia desde o primeiro momento. Que tenha vindo hoje significa alguma coisa, não acha?

Gabi nunca ouvira Andreas tão vulnerável. Era uma revelação.

— Sim, eu acho que sim.

— Ah, Gabi, se eu soubesse...

— Que não se divorciariam? — ela completou o pensamento de Andreas.

— Sim. — Ele beijou-lhe a testa e as faces.

— Como minha mãe disse, precisamos ter fé. — Gabi enterrou o rosto no pescoço dele. — Kris tem de superar essa. Ou nada mais fará sentido.

Ela perdeu a noção do tempo enquanto estiveram abraçados. Aquele homem maravilhoso estava apoiado nela, como se a sua vida dependesse de sua ajuda. Suas mãos acariciavam as costas de Gabi. Seus dedos se enrolavam em seus cachos, enviando raios de prazer por todo o seu corpo. Gabi aproximou-se ainda mais dele, pois adorava aquela sensação de segurança e conforto. Nunca vivera nada assim antes.

Quando outra enfermeira saiu da UTI, Gabi teve de se forçar a afastar-se dele, mas não estava preparada para tão súbita separação. Porém, a interrupção chegou na hora certa, ou ela permaneceria na mesma posição e Andreas teria entendido o que estava acontecendo.

— Melhor eu voltar à sala de espera e avisar que ainda não temos notícias de Kris.

Nervosa por ter demonstrado sua terrível fraqueza por ele, Gabi olhou para o fundo do corredor.

— Vamos os dois. Não sabemos quanto tempo Deline e Leon vão ficar aí dentro. Mesmo com tudo o que está acontecendo com Kris, meu irmão tem a pessoa que ama ao seu lado. Neste momento, estamos todos bem acompanhados.

Na sala de espera, todos os rostos se viraram quando eles chegaram. Andreas disse:

— Ainda não temos notícias de Kris.

— Deline está com ele? — perguntou sua mãe, ansiosa.

— Sim.

Gabi ouvia todas aquelas perguntas, mas não tinha voz para responder.

— A enfermeira deu um avental e uma máscara a ela, para que entrasse com Leon — informou Gabi, e notou olhares sendo trocados.

Andreas também notou.

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— Sabemos de uma coisa sobre Deline. Ela não viria até aqui para magoar Leon. A situação deve ser a oposta, na verdade.

Tudo o que Andreas dizia e fazia deixava Gabi ainda mais apaixonada por ele.

Enquanto ele conversava com a família, Gabi esteve por perto, querendo mais daquele mesmo abraço.

Outra meia hora se passou, e ainda não sabiam nada sobre Kris. Não era bom sinal. Gabi olhou para a expressão dos seus pais, e notou que pensavam o mesmo. A sala ficou em silêncio. Assim como Gabi, que lutava para não desabar, todos faziam suas preces.

Mergulhada em pensamentos, ouviu a voz de Leon:

— Tenho boas notícias!

E Gabi notou que os olhos cinzentos de Andreas ganharam nova tonalidade.

— Kris acordou e já respira sozinho. Vai ficar bem. — E sua voz falhou.

Gabi viu Andreas dirigir-se à entrada da sala para dar um grande abraço no irmão.

— Graças a Deus! — E Gabi começou a chorar no ombro do pai. Nesse momento, toda a sala mudou de humor.

— Ele vai ficar aqui até amanhã, depois o levarei para casa. Deline ficará comigo para me ajudar — disse Leon, sendo vencido pela emoção. — Obrigado por estarem aqui. Eu não agüentaria sem o apoio de vocês.

Após abraçar a todos, correu para fora da sala, levando Andreas consigo. Queria conversar a sós, sem dúvida.

O coração de Gabi ficou pequeno ao vê-lo desaparecer. Morrendo por dentro, disse à mãe:

— Você se importa se formos embora? Podemos voltar ao apartamento e arrumar as malas. Eu gostaria de retornar ainda hoje a Heraklion, mas de avião. Mesmo que Andreas tenha deixado o helicóptero a nossa disposição, não quero tirar proveito, agora que Leon já não precisa de minha ajuda.

— Parece uma idéia muito sensata. — A mãe entendera tudo. — Vamos.

Do lado de fora do hospital, tomaram um táxi até o edifício Simonides. Gabi digitou o código para subirem ao seu apartamento. Estavam todos aliviados por Kris, mas Gabi sofria ao ter de deixar Andreas.

Teria de fazer uma limpeza geral.

Fora o que fizera ao se separar dos meninos, um mês antes, e teria de repetir o gesto. Desligou o celular.

Seus pais viajavam muito, então não lhes custaria nada arrumar as malas rápido e partir para o aeroporto num táxi. Já no aeroporto de Atenas, esperando pelo voo, Gabi reservou passagem para Washington D.C. para o dia seguinte.

No final da tarde, chegaram ao consulado. Após um rápido jantar, Gabi tomou um banho e vestiu uma blusa folgada e uma calça de linho de listras coloridas. Com muita energia para conseguir ficar parada, começou a preparar a bagagem. Levara muita roupa à Grécia, cinco meses antes, e comprara muitas mais. O suficiente para encher duas

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malas e uma maleta de mão.

Saíra de casa no inverno e voltaria no verão, num calor horrível, que a faria sonhar com aquele mar azul, ainda por cima sem um par de brilhantes olhos cinzentos, que a acompanhavam a toda parte.

Gabi mal conseguia respirar pensando em tudo aquilo. Naquele dia, seu corpo revivera o calor do corpo de Andreas num abraço, do lado de fora da UTT. Ela sabia que seria a última vez. Por isso não foi capaz de resistir.

— Gabi? — Seu pai entrou no quarto. — Acho que você não me ouviu. Tem um homem no hall a sua espera. Ele se chama Stravos.

Ela sentiu um tremor. Por que Andreas o enviaria? Seu coração quase saltou pela boca.

— O que foi, querida? Você está pálida. Quem é ele?

— Trabalha para Andreas. Gosto muito dele.

— Então melhor não o deixar esperando.

— Tem razão.

A necessidade de descer as escadas correndo foram temperadas pelo medo de que Stavros notasse sua agitação. Mas isso era bobagem, pois ele era observador o bastante para saber que Gabi estava completamente apaixonada por Andreas. Ele a vira junto ao seu chefe. E Gabi duvidava de que não tivesse notado.

— Que bom vê-lo outra vez, Stavros. Ele sorriu.

— Eu também fico feliz. Trouxe o barco de kyrie Simonides de Milos. Uma reunião de família o deixou preso em Atenas mais tempo do que esperava. Mas o seu helicóptero aterrissará a qualquer momento. Para ganhar tempo, ele pediu que a levasse a bordo para um jantar de despedida.

Nunca ouvira Stavros falar tanto, mas a sua resposta seria "não". Tudo se acabara. Não queria vê-lo outra vez.

— Que coisa boa. Agradeça a ele, mas diga que volto aos Estados Unidos amanhã de manhã e tenho muito o que fazer.

— Eu digo ele respondeu, e começou a andar, depois parou. — Acho que não deveria estragar a surpresa, mas Nikos está com ele.

Nikos.

Assustada com o que acabara de ouvir, ela demorou a reagir.

— Espere! — gritou, pois o táxi que o levara até lá estava a ponto de partir. — Eu vou. Só um minuto e pego a minha bolsa.

Ela subiu. Ao voltar, seus pais conversavam com Stavros.

— Nós ouvimos — disse sua mãe. — Dê um beijo no Nikos por nós.

Cinco minutos mais tarde, o táxi os deixou no píer, onde Gabi pôde ver o barco ancorado. Quando pôs os pés no convés, Andreas apareceu, com Nikos no colo.

Gabi soltou um gemido, pois os dois estavam lindos juntos, mas estava tudo errado. Num mundo perfeito, Nikos seria filho de Andreas... e dela.

Ele abriu um daqueles sorrisos lindos.

— Estamos felizes por ter vindo, certo rapaz? — Andreas virou o rosto do bebê

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para que a visse.

Nikos levantou os olhos. Parecia muito feliz ao ver Gabi, que sorriu e tomou-o nos braços.

— Como o meu menino cresceu! — Após beijá-lo, levou-o ao cockpit, onde ficou olhando para Andreas, lindíssimo em uma camisa preta e jeans.

— Que surpresa mais incrível. Obrigada.

— Eu sabia que você sentiria falta dele. Parece que hoje foi um dia de surpresas para nós dois, começando com a sua volta a Heraklion.

De repente, Gabi começou a sentir-se mal.

— Não vou perguntar por que você não pegou o helicóptero ou não ficou no apartamento, para que eu pudesse convidar os três para um jantar.

Ela abraçou Nikos, bem forte.

— Teria sido maravilhoso, mas Leon precisava de você, que também deveria cuidar de sua família.

— E?

— Eu não ia dizer nada mais.

— Ia sim — ele afirmou, mais agressivo. Virou Nikos de lado e deu-lhe alguns beijos. — Você ia incluir o nome de Irena na lista.

Reunindo coragem, Gabi quis saber:

— Por que ela não foi ao hospital com você?

— Porque não convidei.

— Andreas... Você não é assim. Ele arqueou uma sobrancelha.

— Observação interessante. Demonstra que você conhece algo sobre mim. Gosto disso.

Gabi agarrou-se ao bebê, mais nervosa a cada segundo.

— Eu não deveria ter dito nada.

— Você pode me dizer o que quiser. Nervosa, ela gritou:

— E isso o que estou tentando dizer! Costuma ser tão gentil com todos. Você e Irena brigaram? Que outro motivo ela teria para não acompanhá-lo numa... numa...

— Numa situação de vida ou morte?

— Algo assim... — Agitada, ela levou Nikos até a janela, olhando para o porto. — Tenho certeza de que ela ficou chateada desde que soube da história dos meninos. Mas Irena já não precisa se preocupar. Os bebês estão com o pai e eu vou embora amanhã, então...

— Gabi, você precisa saber de uma coisa.

— O quê? — ela perguntou, lutando por fôlego.

— Uma semana atrás, eu soube por Leon que Deline foi visitar você e os meninos em Apollonia. Imagino que ela tenha mencionado minha ida a Atenas para ver minha namorada, Irena Liapis, a mulher que seria a minha esposa. Certo?

— Sim...

Ele a observava.

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— Pena que Deline não conhecesse a realidade do momento.

— Que realidade? — ela murmurou.

— Que eu já não estava com Irena. Embora seja verdade que ela foi minha namorada.

Foi? O coração de Gabi deu um salto.

— Mas Deline disse que a sua família estava esperando pelo casamento.

— Até você aparecer no meu escritório, era essa a minha intenção. Nem preciso dizer que o meu mundo virou de pernas para o ar no momento em que vi a foto dos gêmeos. Para lidar com as ramificações de sua visita inesperada, foi forçado a suspender todos os meus planos.

Andreas...

--- Mas foi bom. O tempo que passei longe dela me fez ver que, caso eu a amasse como um homem deve amar uma mulher, já teríamos nos casado meses atrás.

— Como pode dizer isso?! Eu vi o olhar no rosto de Irena quando ela veio à villa e nos viu juntos, com os meninos.

— O que você viu foi um olhar de surpresa, por ter encontrado nós dois, e não Leon. Ela é muito amiga de Deline, e veio ver os famosos gêmeos Simonides antes de seguir para a Itália, de férias.

Andreas sentou-se confortavelmente num banco de couro, com os braços estendidos e as pernas esticadas à frente.

— Agora que Kris está fora de perigo, imaginei que poderíamos relaxar, jantar e conversar.

— Não temos nada a conversar.

— Já resolveu ir embora, então? Ela franziu a testa.

— Você sabe que sim.

— Importa-se de adiar a partida por mais um dia?

Sim, ela se importaria. Morreria caso ficasse mais um minuto por ali.

— Não posso. Após voltar para casa com os meus pais, liguei para o meu chefe na agência de publicidade. Ele está me esperando depois de amanhã, para discutirmos minha promoção.

— Que pena que vai viajar tão rápido... Eu e Nikos ficaremos desapontados. Adoraríamos ter a sua companhia por mais um dia.

Um dia mais é tudo o que ele quer, Gabi. Não uma vida inteira. Ela beijou a testa do bebê.

— Por que não deixou Nikos com as suas irmãs?

— Estamos nos revezando para cuidar com ele. Agora é a minha vez. Se tudo der certo, Leon levará Kris para casa amanhã. Ele e Deline vão precisar de um tempo juntos, sozinhos, então só levarei Nikos de volta depois de amanhã, e você poderia me ajudar. Nossos sobrinhos adoram o mar. O que melhor do que sair em cruzeiro por partes da ilha que você ainda não conhece, amanhã?

Andreas sentou-se na beira do banco, olhando para ela de forma perturbadora, deixando-a ainda mais nervosa.

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— Se você não tivesse desligado o celular, eu não teria vindo tão longe para pedir sua ajuda.

As faces de Gabi ficaram quentes.

— Gostaria de pensar que podemos devolvê-lo a Leon em perfeito estado. Mas claro que se um dia a mais longe de Virgínia for terminar com suas esperanças de promoção, chamo um táxi para levá-la ao consulado. A decisão é sua.

Outras 24 horas com Andreas... Ao contrário de Leon a Théa, Andreas não lhe propusera uma noite de amor e depois caminhos separados. Ou não teria levado o bebê consigo.

Para vergonha de Gabi, era ela a não confiável naquela situação. Andreas pedira sua ajuda para cuidar de Nikos como um favor para o seu irmão, nada mais. Seus olhos ficaram cheios de lágrimas. Gabi amava Andreas desesperadamente, mas ele não a amava.

Apertou ainda mais Nikos contra o peito. Isso revelava que Andreas era uma pessoa realmente muito forte, mais do que a maioria dos seres humanos. Ele sabia que Gabi teria adotado os meninos caso tudo tivesse dado errado. Essas últimas 24 horas eram um presente antes de deixá-la partir para o local de onde viera.

Respirando fundo, ela disse:

— Não trouxe nada além da minha bolsa.

— Isso não é problema. Na sua cabine encontrará tudo de que precisa, além de um robe e roupa de banho para hóspedes. É tudo de que necessitará.

Ela usava calça e blusa de linho. Como eles não fariam nada além de estar no barco, Gabi pensou que Andreas tinha mesmo razão e sentiu-se fraca. Odiava sua fraqueza.

— Tenho de ligar para os meus pais e para o meu chefe. — Além disso, também teria de mudar sua passagem.

Andreas pegou o menino.

— Enquanto você faz isso, vou dar de comer a este rapazinho. Já passa das sete. Ele está começando a buscar a mamadeira.

Gabi esperou que Andreas fosse embora para ligar para casa. Após três chamadas, sua mãe atendeu. Gabi explicou que ainda estava com Andreas, mas a mãe pareceu aborrecida ao ouvir seus planos.

— Querida, você é uma mulher capaz de tomar as próprias decisões, mas não acho que seja uma boa ideia. Tem de cuidar de si mesma. Vai acabar voltando para casa com o coração partido. Acha mesmo interessante adiar o inevitável?

— Não.

— Sei que gostaria de ter mais tempo ao lado de Nikos, mas Andreas não precisa de sua ajuda com o bebê.

— Eu sei.

— Acho que já falei demais. Perdoe-me, sim? Tudo o que quero é a sua felicidade, e não a vi muito feliz desde que veio à Grécia no momento da doença de Théa.

Ela agarrou o fone.

— Você não disse nada que eu não tenha dito a mim mesma desde que o encontrei pela primeira vez. Obrigada por ser minha mãe. — Sua voz falhou. — Quando

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eu desligar, vou dar um beijo em Nikos e ir para casa. Nós nos veremos logo.

CAPITULO NOVE

Gabi se sentiu um pouco melhor após pentear seus cachos e passar um batom nos lábios. Ta dizer adeus a Andreas. No meio do caminho, pôde ouvir o som da bossa-nova tocando calmamente como música de fundo.

Antes de pisar no compartimento principal do barco, um murmúrio escapou de sua garganta ao ver a mesa elegante decorada com velas e rosas recém-compradas. O aroma das flores tomava conta do ambiente.

Ao dar uma olhada em volta, notou Andreas entrando com dois pratos de comida. Seu coração quase pulou do peito.

— Onde está Nikos?

Andreas pôs os pratos na mesa.

— Boa noite, Gabriella Turner. Fico feliz que tenha vindo. Nikos dormiu após tomar sua mamadeira, esperando por você. Eu o deixei na minha cabine, mas com a porta aberta, para o caso de ele acordar. — Puxou uma cadeira para Gabi. — Por favor, sente-se, e vamos aproveitar esta maravilhosa refeição brasileira que Stavros preparou para nós. É uma especialidade que aprendeu com a parte brasileira de sua família. Ele passou das medidas hoje.

Ninguém no mundo tinha o charme de Andreas. Naquele momento, mais do que nunca, ela precisava manter-se firme. O ambiente romântico era um perigo.

— Concordo que tudo isso é maravilhoso, mas...

— Sem mas... ou o magoará. Stavros ficou muito ligado a você e aos meninos. Eu também. Desde que veio pela primeira vez ao meu escritório, fazendo todo aquele sacrifício por mim e por Leon, sem falar na sua própria família... Chegou a hora de receber algo em troca. Por favor, aceite este jantar como um gesto de gratidão do clã Simonides.

Gratidão?

Com outra estocada no coração, Gabi sentou-se à frente dele. Quando o jantar terminasse, agradeceria a Andreas e a Stavros. Depois deixaria o barco sem nem passar pelo quarto para dar um beijo em Nikos.

O esplêndido churrasco fora uma boa opção à comida grega que comia havia quatro meses, mas teve de forçar-se a engolir. Perdera o apetite ao saber que não voltaria a ver Andreas. E ele notou, claro.

Levantou sua taça de vinho e tomou um gole, sempre olhando para cia. A luz das velas se refletia em seus olhos, deixando-os ainda mais brilhantes.

— Quem diria, quando você apareceu no meu escritório, que as coisas terminariam assim?

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Ela limpou o canto da boca com um guardanapo.

— Espero que a decisão de Deline de voltar para Leon seja definitiva.

Andreas respirou fundo.

— Meu irmão é um novo homem. Quando o terceiro bebê nascer, será um pai com experiência. E isso vai ser servir para alguma coisa.

Gabi notou preocupação em sua voz e quis ajudar de alguma maneira.

— Como Théa não está viva, prefiro pensar que será mais fácil para Deline amar os bebês, ainda mais tendo um dela.

— Melhor pensar assim. Mais vinho? Gabi fez que não.

— Nem terminei este ainda. — E olhou para a sua taça cheia. Notou o líquido se movendo, e percebeu que o motor do barco fazia barulho. Estavam deslizando nas águas plácidas a toda velocidade!

Tudo o que ela sentia eram algumas vibrações. Estivera tão perdida pensando em Deline e Leon que nem notara.

— Nós deixamos o porto!

Andreas assentiu, sem demonstrar nenhuma perturbação.

— Por que está tão surpresa? Gabi pôs a mão na testa, nervosa.

— Porque eu tinha decidido voltar para casa após o jantar. Você não precisa de mim para tomar conta de Nikos. Percebi que só fez isso para deixar que eu passe um tempo a mais com meu sobrinho, mas não é necessário.

Ele não se moveu, mas Gabi notou algo de emoção em seus olhos, naquele momento mais escuros.

— Estamos no meio do caminho para Milos, mas, se quiser que Stavros dê a volta, eu aviso.

— Não... — Gabi notava que uma dor de cabeça estava a caminho. — Já que estamos tão longe, não vou pedir que mude os planos agora.

Que boba fora!

— Você está pálida. O que houve?

— Nada que um passeio pelo deque não cure. Por favor, me desculpe. O jantar estava maravilhoso. Vou agradecer a Stavros.

Ela se afastou da mesa e subiu as escadas correndo. Quando chegou ao cockpit, ainda ouvia a música brasileira. Seus batimentos aumentaram de intensidade. A vontade de dançar nos braços de Andreas era enorme.

Lá fora, sob as águas, o visual era maravilhosos: Outra isca? branca que levaria para casa, para assombrá-la.

— Está se sentindo melhor?

Ela não notara a chegada de Andreas, que se movia de forma elegante, como um leopardo. Engolindo em seco, Gabi respondeu:

— Muito melhor, obrigada.

— Dei uma olhada em Nikos. Está dormindo profundamente.

— Que bom.

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Andreas estava muito perto dela, que caminhou até ò banco mais próximo e sentou-se, olhando pelas janelas.

— Mesmo sentindo falta dos seus pais e dos meninos, você ainda quer voltar aos Estados Unidos?

— Quero — Gabi mentiu. — Eu adoro o meu trabalho.

— Eles são uns felizardos por terem-na de volta. Caso um dia precise de uma referência, eu poderia oferecer as melhores possíveis.

— Obrigada. — Incapaz de manter-se sentada, voltou a se levantar. — Se me desculpa, vou para a cama.

— Não é tão tarde. A lua vai surgir de um modo como não se vê todos os dias.

— Não duvido. — Gabi juntou as mãos. — Mas acho que não poderei ficar de pé. Foi um dia longo, e o vinho me deixou com sono.

— Mas você só bebeu a metade da taça. — Andreas passou o polegar pelo lábio inferior,

Nada escapava àquele homem.

— Eu não preciso de muito para que surta efeito. Boa noite.

Quando estava na metade do caminho, Andreas chamou por ela. Gabi se virou para ele, que seguia sem estampar suas emoções nos olhos.

— O quê?

— Queria lhe perguntar uma coisa. Você pode comparar como é trabalhar para mim e para o seu chefe?

Gabi não entendia a pergunta.

— Os dois trabalhos são desafiadores. — Caso ela ficasse mais um minuto por ali, não agüentaria e acabaria revelando toda a verdade. Queria desaparecer da frente dele, meter-se em um buraco. — Onde vamos atracar amanhã?

— Por quê? Gostaria que atracássemos na villa, para que pudesse tomar o helicóptero de volta a Heraklion?

— Se isso não o deixar chateado...

— Por que me chatearia?

O humor de Andreas mudara. Gabi ficou nervosa, mesmo não querendo.

— Acho que você também está cansado. A cirurgia de Kris nos atingiu a todos. Durma bem, Andreas. Vemo-nos amanhã de manhã.

Sem esperar por resposta, Gabi desceu à cabine.

Após ver que estava tudo bem com o bebê, tomou um banho e foi para a cama usando o roupão de hóspedes, que estava dependurado na porta do banheiro.

Para a sua surpresa, dormiu até Nikos acordá-la, pedindo a mamadeira, às seis da manhã.

Com a mesma roupa da véspera, tirou a fralda do bebê e deu banho nele, que adorava água e queria brincar. Depois o vestiu e colocou-o no moisés. No caminho para o cockpit, tirou a ma-madeira da geladeira e o levou ao deque, para alimentá-lo.

Para a sua surpresa, o barco estava ancorado em um píer, ao lado de uma praia que nunca vira antes. Como amanhecia, as montanhas logo após a faixa de areia

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reluziam, púrpura.

No topo da primeira montanha, uma pequena igreja com arquitetura típica do local recortava sua silhueta contra o céu. Tanta beleza foi um colírio para os seus olhos. Parecia estar olhando para algo que não era deste mundo. Seria uma imagem do Olimpo?

— Esse é o meu lugar favorito em Milos pela manhã — disse a voz masculina tão familiar, que ela adorava. — Antes que voltasse para casa, queria mostrá-lo a você.

Ela o olhou de relance.

— Entendo perfeitamente. Seria impossível descrever este lugar com palavras. Trata-se de algo que deve ser visto com os próprios olhos.

Andreas mirou a igreja.

— Eu era um menino quando meus pais me trouxeram aqui pela primeira vez. Imaginei que devia ser o lar dos deuses.

— Acredita que eu pensei a mesma coisa quando subi?

Os olhos de Andreas encontraram os dela. Pareciam perguntar-lhe algo.

— Quer ir até lá? É uma boa subida, mas nada difícil, e rápida. Stavros poderia tomar conta de Nikos.

Todos os alarmes diziam que não aceitasse, mas ela notou que seria algo importante para Andreas. E queria conhecer o lugar que significava tanto para ele. Sabia que não mostrava esse lado privado de sua vida a muita gente.

Gabi se sentiu honrada. Mesmo se nunca pudesse ter o amor daquele homem, guardaria o seu respeito, o que por si só era importante,

— Boa idéia.

Andreas pegou o celular e disse a Stavros que desceriam do barco por um tempo. Em poucos segundos, o homem mais velho apareceu no cockpit, com um sorriso.

— Vou cuidar bem do rapazinho.

Gabi lhe agradeceu pelo esplêndido jantar e por sua bondade ao cuidar de Nikos.

— Não demoraremos muito — ela disse.

— Vamos? — perguntou Andreas, saindo do barco e pisando no píer.

Ele vestia calça branca e uma camisa esporte azul de seda. Gabi não conseguia tirar os olhos dele.

Ao vê-lo caminhar, pôde imaginar como seria quando criança. E suspirou ao pensar que o conhecia havia tão pouco tempo. Quantos anos perdidos...

Uma dor profunda tomou conta dela. Teve de parar no meio do caminho para recuperar as forças e seguir em frente. Por fim, chegaram ao topo. Daquele ponto de vista, a baía do Egeu, logo abaixo, era ainda mais espetacular.

Andreas virou o corpo e lhe perguntou, com olhar penetrante:

— Que tal?

— Nem precisa perguntar.

Um sorriso se abriu no rosto dele, um sorriso lindo, que a deixou sem fôlego.

— Anos atrás, casais subiam, vindos do vilarejo, para casar-se aqui, mas a

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tradição se perdeu, pois os convidados já não querem subir.

Ela sorriu, ainda sem fôlego.

— Hoje, devem ser raros os casais que... — O resto da frase não foi dita.

Por que falar isso? Levar Gabi ali fora um ato cruel. Ela sabia que não era a sua intenção, mas não agüentaria mais.

— Eu... acho que deveríamos voltar para junto de Nikos.

— Acabamos de chegar. — E o semblante calmo de Andreas a estava deixando irritada. Ele se aproximou. — Quero levar você lá dentro. O padre veio antes e abriu a porta para nós. Está ansioso por conhecê-la.

— Não estou entendendo... — Gabi piscou, nervosa.

— Talvez isto ajude. — E Andreas a tomou nos braços imediatamente, dando-lhe um beijo intenso, que revelava todo o seu desejo, lançando chamas em seu corpo. Um beijo cada vez mais profundo, emocionante, que a deixou com as pernas bambas. — De todo o meu coração, Gabi Turner, quero dizer uma coisa: eu te amo. Eu te quero como minha esposa, e já pedi ao padre que nos case. Está tudo resolvido.

— Mas pensei...

— Você pensa demais. Eu sempre quis fazer isso, desde o momento em que você apareceu na minha vida.

O seu tom e o fogo nos seus olhos a fizeram tremer. Ouvia o que Andreas dizia, mas não acreditava no que estava acontecendo.

— O que eu não sabia era que, no momento em que Kris se recuperasse da operação, você. tentaria desaparecer da minha vida. Você me ama, certo? Diga que sim... eu estou louco para ouvir isso, admita.

— Queria ter tido isso há semanas! — ela gritou, passando os braços pelo pescoço de Andreas, para cobrir seu rosto de beijos. — Estou apaixonada por você, meu querido. Não sei se estou sonhando, ou se estamos sonhando os dois, mas isso não importa, pois é tudo o que quero.

A boca de Andreas tomou mais uma vez a sua, depois ele segurou seu rosto entre as mãos.

— Diga que sou eu o homem que você estava procurando — ele pediu, selvagem. — Admita!

— Você sabe que é — ela admitiu, com o coração aos pulos e os olhos brilhantes sob a luz do dia. — Eu te amo tanto que você nem acreditaria, Andreas.

Agora que a beijara outra vez, ela ficou viciada na boca de Andreas, buscando-a sem parar, num desejo terrível, que não parava de crescer.

Por fim, ele se afastou e respirou fundo.

— Nunca a deixarei escapar. Estou apaixonado por você, Gabi. Jamais imaginei que isso fosse acontecer comigo. Eu te amo muito, temos de nos casar imediatamente.

Gabi não precisaria ser convencida. Ele agarrou sua mão e levou-a para dentro da igreja do século XVII, pequenina, a mesma que Andreas visitara ainda criança. O padre esperava por eles. Para ela, era como se fosse um sonho, mas tudo parecia bem real ao ouvi-lo declarando-os marido e mulher.

Andreas olhou para Gabi, trêmulo de felicidade.

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— Vamos, sra. Simonides.

Como crianças saindo felizes do colégio, eles desceram o caminho até o barco. Quando chegaram ao final, Andreas tomou-a nos braços.

— Esperei semanas para fazer isso.

— Parabéns pelo casamento — disse Stavros, enquanto Andreas a beijava sem parar. — Não se preocupem com Nikos. Ele está comigo, aprendendo tudo sobre as cordas.

* * *

— Então, já cansou de mim? — ele murmurou ao ouvido dela.

Ainda era bem cedo. Mas permaneciam abraçados, pois não queriam afastar-se um do outro.

Gabi o encarou e respondeu:

— Sinto admitir que isso não vai acontecer nunca, pois eu sempre estive apaixonada por você.

— Naquela tarde que ficou parada na porta do elevador, lutando por nossos sobrinhos, eu entendi o que é o amor verdadeiro. E tal sensação me atingiu em cheio, acho que nunca mais voltarei a ser o mesmo homem.

— E eu notei o quanto te amava ao ver como interagia com os bebês. O carinho que você demonstrou por eles e por Nikos deixou claro que se tratava de um homem diferente dos demais, e que a mulher que tivesse o seu amor seria a mais feliz do mundo. — Acariciou-lhe o queixo. — E eu sou essa mulher, Andreas. Você me faz tão feliz que estou assustada.

— Eu também. Mas a verdade e que a felicidade-realmente existe para algumas pessoas. Temos de manter essa chama acesa em nossas vidas, agape mou.

Ela fez que sim, beijando-o, sentindo seu cheiro e sabor, que adorava.

— E uma pena que Théa nunca tenha encontrado a felicidade.

— E meu irmão esteve a ponto de perdê-la. Mas juro que vou te amar pelo resto da minha vida — disse, colocando-a em cima do seu corpo.

No momento em que sua boca desejosa tomou a dela mais uma vez, Gabi olhou-o, querendo ser possuída pelo marido. Que pena ter vivido tantos anos sem ele. O tempo parecia não existir enquanto se amavam.

— Ah, não... — ela murmurou em seu ouvido, alguns minutos mais tarde. — Acho que estou ouvindo a queixa de alguém que está sendo ignorado há algum tempo.

— Vou pegá-lo. — Andreas mordiscou-lhe a orelha.

Em meio minuto, estava de volta com o bebê na cama. Deitou-o no seu peito.

— Ah, Andreas... ele não é o bebê mais bonito que você já viu na vida?

— Théa e Leon fizeram um bom trabalho, certo?

— É verdade — ela admitiu, sorrindo.

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Rebecca Winters - Raios de Sol (Special 30)

— Eu também poderia fazer algo parecido — Andreas brincou.

— Eu sei...

— Você ficará triste se o nosso primeiro bebê não for gêmeo? Sei que planejava adotar esses dois.

— Era o meu plano original. — Beijou o ombro de Andreas. — Mas quando vi Leon com eles dois, em Apollonia, o ardor por eles foi substituído por outro. Descobri que queria ter meus próprios filhos, com você.

— Gabi...

Beijaram-se outra vez, mas Nikos não gostou, pois ficou imprensado entre os dois.

— Tudo bem, rapazinho. — Andreas o ergueu no ar e mordeu seu pé. — Estelle vai tomar conta de você hoje à noite. — Colocou-o no moisés e vestiu-o.

Gabi sentou-se na cama, cobrindo-se com o lençol.

— Vai mesmo?

— Como estamos em lua de mel, ela insiste. Quando voltarmos, pela manhã, voaremos a Atenas com Nikos para contar a notícia a todos, depois seguiremos para Creta. Mas, por enquanto, gostaria que ficasse nesta cama, esperando por mim. Não demoro.

— Melhor não demorar mesmo, pois já estou sentindo a sua falta.

Ele a olhou, um olhar profundo.

— Você não sabe de nada... mas vai saber logo. Gabi se arrepiou. Amava-o muito.

Quando Andreas desapareceu com seu querido Nikos, ela saiu da cama e vestiu o roupão. Sua bolsa estava na cabine. Foi até lá, pois queria ligar para os pais, que ficaram muito felizes com a notícia.

— Certo, nos veremos amanhã então, querida — disse seu pai, emocionado. — Diga a Andreas que é ele muito bem-vindo à família.

Gabi já lhe dissera isso... de formas que a deixariam corada por anos seguidos.

— Direi. Vemo-nos amanhã. Eu amo vocês.

Caso não tivesse desligado o telefone, eles teriam escutado Andreas chamando por ela.

— Estou na minha cabine! — Gabi respondeu.

— O que está fazendo aqui? — ele perguntou, já na porta, sem fôlego.

— Estava contando aos meus pais a novidade. Eles adoraram!

— Eu também adoro a nossa novidade — ele murmurou, levando-a à cama. — Disse a Stravos que siga em direção à praia Papafragas. Caso não tenha ninguém por perto, gostaria de fazer amor com você por lá. E assim realizar uma das minhas fantasias, algo que não sai da minha cabeça desde que você entrou na minha vida.

Ela beijou seus olhos e o nariz.

— Você não se cansa de repetir que "entrei na sua vida".

— Porque você surgiu como uma brisa deliciosa, me enchendo de desejos e necessidades que não consigo explicar.

— Eu te amo tanto que chega a doer, Andreas.

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Rebecca Winters - Raios de Sol (Special 30)

— Eu também, e planejo fazer algo contra isso imediatamente. Podemos nadar, como já fizemos antes, ou ir até a areia, do outro lado, seguindo um atalho.

— Um atalho?

Ele sorriu, um sorriso profundo.

— Acho que já te cansei, sim.

— Não, isso nunca! Mas queria reservar minha energia para te amar. Quanto tempo demoraríamos para chegar lá?

Andreas desfez o laço que prendia o roupão de Gabi.

— O suficiente, meu amor.

CAPITULO DEZ

Após fazer amor várias vezes, deitaram-se na areia até que o calor que emanava de seus corpos se dissipasse. No meio da noite, Andreas estendeu um lençol em cima deles.

— Olhe essas estrelas, querida. Com as paredes de pedra à nossa volta, é como ver o céu de um telescópio.

— Estou olhando. Mas as estrelas estão em seus olhos.

Ele não acreditava, mas abraçava sua esposa, sua mulher, sua melhor amiga, sua vida.

Ela abriu um daqueles sorrisos que aqueciam sua alma. Precisava fazer amor com Gabi mais uma vez.

— Quando trouxermos nossos filhos aqui um dia, nunca vamos poder contar... bem, você sabe.

Gabi podia ser direta num momento, e tímida logo a seguir. Andreas tinha muito o que aprender sobre ela. E graças a Deus aquilo era só o início.

— Você quer dizer que nunca poderemos revelar a eles como este lugar é sagrado para nós? — ele murmurou, colado à seu pescoço.

— Exatamente.

— Eu já cheguei muito perto de ter você aqui, nesta mesma areia.

— E eu estive muito perto de me deixar levar... — ela confessou. — Você nunca saberá o quanto o desejei aquele dia.

Andreas suspirou.

— Eu não tinha muita certeza naquele momento. Mas Irena me disse que, quando nos viu juntos, sentiu uma energia irradiando como fogo.

— Andreas... — Ela o abraçou forte. — Estou aqui com você... por inteiro... e te quero por inteiro... Talvez algo esteja errado comigo por te amar tanto.

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Rebecca Winters - Raios de Sol (Special 30)

Ele beijou seus lábios trêmulos.

— Se isso for verdade, não quero que fique boa nunca.

— Essa é uma noite encantada. Gostaria de poder evitar o amanhecer, que vai chegar a qualquer momento.

— A próxima manhã também será encantada, Gabi. Isso porque, não importa onde estivermos, sempre acordaremos um ao lado do outro.

— Quero que me prometa isso — ela pediu, com urgência. Sua adorável esposa o amava tanto quanto ele a amava.

Antes que tamanha alegria o fizesse ter um ataque do coração, Andreas resolveu convencê-la de que aquilo era apenas o começo.

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Rebecca Winters - Raios de Sol (Special 30)

HARLEQUIN

Próximo Lançamento

EMOÇÃO NO DESERTO

Donna Young

Anna o havia deixado. E seu irmão morrera.

Cuidadosamente, ela movia os pés adiante, procurando os becos com os dedos do pé. Anna parou, estabilizando-se. O vento virou, enviando uma brisa leve que deslizava entre seus tornozelos. Uma neblina, mais névoa do que luz, rastejou através de seu caminho.

Apertando os olhos com dificuldade, forçou sua visão a adaptar-se à semi-escuridão, e então usou o suave vento para guiá-la.

Na base da pedra, com não mais de 30 x 60 centímetros, havia um orifício. A abertura estava bloqueada por uma grade de ferro moldado.

Anna escorou suas costas na parede e deslizou para baixo, ignorando a queimadura da pedra de areia em seus ombros desnudos.

— Não se preocupe, Rashid. Nós vamos conseguir. Ou morrer tentando —, Anna acrescentou em silêncio. Ela olhou para o bebê, usando seu calor para acalmar os nós em seu estômago.

Com a mão que estava livre, ela puxou a grade.

— Parece que eles prenderam com cimento — ela murmurou. Depois de sentar-se em sua panturrilha, aninhou a criança entre as pernas.

— Vou precisar das duas mãos, meu lindo, então temos que deixá-lo confortável.

Do lado de fora, arbustos cercavam a fenda, mas nada bloqueava o buraco cm si. Anna expirou sem perceber que, ate então, ela segurava a respiração.

Ela puxou a faca de Alma da cintura, percebendo como o ferro frio parecia estranho entre seus dedos.

— Aqui vamos nós. — Depois de esticar-se sobre Rashid, Anna posicionou seus ombros e começou a raspai- entre o ferro e o cimento. Seus movimentos eram esquisitos e lentos, à medida que tentava manter o bebê protegido dos pedaços de argamassa. — Se tivermos sorte, esses troços já estarão apodrecidos. — Ela passou a faca em volta das quatro extremidades, colocando pressão até que seus braços tremessem e seus músculos começassem a doer.

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Rebecca Winters - Raios de Sol (Special 30)

Como filha do presidente dos Estados Unidos, Anna convivera com política a vida inteira. Aos 27 anos, ela entendeu que a mesquinhez havia enfraquecido as investidas dos rebeldes contra a família real. Al Asheera cairia. Ela precisava acreditar nisso.

Mas não antes que centenas de pessoas morressem.

A cada passada, ela enterrava a faca mais fundo, retirando o entulho e abrindo caminho, tentando separar a grade do cimento. O vento soprou, secando a transpiração e formando uma máscara dura, fazendo com que sua pele ardesse.

Um bloco de cimento caiu do topo da grade. Com um pequeno grunhido, ela derrubou a faca, enfiou os dedos entre o metal e a parede, sem ligar quando suas unhas quebraram. Ela puxou o metal até que, silenciosamente, a grade saiu em suas mãos.

Tremendo, ela lançou a grade para o lado.

— Tudo bem, docinho. Hora de correr.

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