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MARCELO MEDALHA MOLLICONE
RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL: MODISMO, CIVISMO OU DEMANDA DE MERCADO?
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado Profissional em Administração da Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia, para a obtenção do título de Mestre em Administração.
Orientador: Prof. Dr. Amilcar Baiardi
Salvador, Bahia.
2003
M726 Mollicone, Marcelo Medalha. Responsabilidade social empresarial: modismo, civismo ou demanda de mercado?/ Marcelo Medalha Mollicone.- Salvador: M.M. Mollicone, 2003. 96 f. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal da Bahia, Escola de Administração, 2003. Mestrado profissional. Orientador: Amilcar Baiardi 1.Responsabilidade social da empresa. 2.Marketing social. I. Título. 658.408 CDD 20.ed.
MARCELO MEDALHA MOLLICONE
RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL:
MODISMO, CIVISMO OU DEMANDA DE MERCADO?
Dissertação para obtenção do grau de Mestre em Administração.
Salvador, Setembro de 2003.
Banca Examinadora:
Prof. Dr. Amilcar Baiardi ____________________________________________
Universidade Federal da Bahia
Prof. Dr. Carlos Roberto Sanchez Milani ________________________________
Universidade Federal da Bahia
Profa Dra Ruthy Nadia Laniado _______________________________________
Universidade Federal da Bahia
Dedico este trabalho à sociedade, mãe e madrasta de todos nós.
AGRADECIMENTOS
À minha mãe, por eu ser o que sou e ela ser o que ela é.
Ao meu pai (in memorian) por ser um exemplo para o mundo mostrando que tudo é possível com esforço, trabalho e apoio daqueles que o amam.
À Flávia pelo carinho, apoio e pela compreensão nas diversas noites e finais de semanas em que a
troquei por um computador.
À minha irmã que amo muito, mãe de meus sobrinhos, por ser um exemplo vivo de que o sucesso não acontece por acaso.
Às minhas avós, em cujos olhos sempre enxerguei amor e orgulho, que sempre me jogaram para
frente e para cima.
Aos meus amigos-sócios, que entenderam o processo e aceitaram a minha ausência, relativamente freqüente, e a presença de uma nova biblioteca no escritório.
À minha família e amigos, que me apoiaram e me forneceram um serviço de clipping amador. Saibam
que utilizei muita coisa que vocês enviaram.
Ao amigo André Coelho, por ter me ajudado na pesquisa de campo e na revisão do texto, tarefas desagradáveis e demoradas. São provas mais que suficientes de uma verdadeira amizade.
À amiga Andréa que, além da amizade, das discussões sobre o tema e dos livros enviados, me abriu
as portas para a pesquisa em O BOTICÁRIO.
Aos amigos Rubens e Aélio, que sempre acreditaram que valores e números andam juntos e apoiaram minha participação no MPA, tanto como chefes, quanto como amigos.
Ao Professor Baiardi pela sabedoria com que orientou meus passos e pela paciência com um
orientando rebelde e, muitas vezes, indisciplinado.
À UFBA e a seus professores que mantêm um programa que abre a mente dos alunos, fazendo um engenheiro eletricista como eu se interessar por Responsabilidade Social.
Aos amigos de O BOTICÁRIO, em especial à Andréa Mota e Márcia Vaz, que me forneceram livros,
relatórios e, principalmente, o apoio e acesso ao público para a pesquisa do mercado interno.
À empresa Elevadores OTIS do Brasil, que financiou parte significativa dos custos do MPA. Sem vocês não teria chegado até aqui.
A Deus por tudo e, principalmente, por ter me dado a vida e minha família.
There are times when all the world's asleep, the
questions run too deep for such a simple man.
Won't you please, please tell me what we've learned
I know it sounds absurd but please tell me who I am.
Supertramp. The Logical Song
RESUMO
Esta dissertação tem como tema a prática da Responsabilidade Social
Empresarial, destacando três objetivos principais: (i) a definição e compreensão da RSE que visa possibilitar uma mais nítida diferenciação entre quem a pratica e quem essencialmente faz marketing; (ii) uma melhor compreensão dos retornos advindos dessa prática como forma de ajudar a disseminá-la; e, por fim, (iii) um entendimento da importância do Marketing Social, tendo em vista a necessidade de ele ser bem pensado e executado para servir à sociedade e à empresa praticante da RSE. Neste caso, entende-se que tal marketing não deve figurar como um elemento gerador de controvérsias a seu respeito. O objeto de estudo que informou este tema refere-se a duas pesquisas de campo, de caráter exploratório: a primeira com consumidores e a segunda com funcionários da empresa O Boticário. Em ambas as pesquisas as variáveis de estudo foram selecionadas de modo a verificar a existência de uma relação entre níveis de civismo e as percepções do público externo (consumidores) e interno (funcionários) com relação à prática de RSE. Entre os resultados deste trabalho, destaca-se o entendimento de que o envolvimento da empresa em ações sociais não deve prescindir de uma atitude voltada para a assunção das responsabilidades sugeridas pela pirâmide de responsabilidades: Responsabilidade Econômica, Responsabilidade Legal, Responsabilidade Ética e Filantropia Empresarial. Praticar RSE pode, de uma forma ampla, influenciar positivamente na sustentabilidade no tocante aos seus três aspectos: social, econômico e ambiental. Além disso, foram identificados retornos tanto de curto como de médio e longo prazos, todos eles afetados, em maior ou menor grau, pelo civismo. Por fim, perceberam-se alguns problemas relativos à prática do marketing social, principalmente no que diz respeito à escolha da mídia onde será feita a publicidade relativa a esse marketing, o que gera diversas conseqüências, dentre as quais a severidade com que as classes menos favorecidas são penalizadas ao realizar uma compra consciente.
Palavras Chaves: Responsabilidade Social; Sustentabilidade; Civismo; Ética.
ABSTRACT
The theme of this dissertation is firms and Social Responsibility practices
(RSE). This work has three main objectives: (i) to define and further the understanding of the concept of RSE with the goal of distinguishing those who practice RSE from those who are simply marketing; (ii) to provide for the better comprehension of the benefits of RSE to further their dissemination; and, finally, (iii) to understand the importance of social marketing, keeping in mind that it must be well thought out and executed in order to best serve society and those who engage in RSE. In this case, one understands that this marketing should not generate controversies. Two field studies of an exploratory nature inform this dissertation: the first was with consumers and the second with the staff of O Boticário company. In both studies the variables were selected to try to verify the existence of a relationship between levels of civism and the perceptions of both the external (consumers) and the internal (staff) public relating to the practice of RSE. Included in the results of this work are the following key points. Firm involvement in social actions should be preceded by the assumption of the following responsibilities suggested by the pyramid of responsibilities: Economic Responsibility, Legal Responsibility, Ethical Responsibility and Business Philanthropy. RSE can, broadly speaking, positively influence sustainability in its three bottom lines: social, economic, and environmental. Beyond that, short, medium and long term returns were identified; all of them affected in smaller and greater degrees by civism. Finally, some problems related to the practice of social marketing were found, principally from the choice of the media used for the publicity of social marketing, with diverse consequences, including the penalization of the least favored classes upon carrying out a socially conscious purchases.
Keywords: Social Responsability; Sustainability; Civism, Ethics.
Sumário
Lista de Tabelas................................................................................. XI
Lista de Figuras ................................................................................ XII
Lista de Abreviaturas e Siglas........................................................ XIII
1. Introdução:........................................................................................1
1.1. - Definição do problema: ...................................................................................... 3
1.2. - Justificativa:.......................................................................................................... 4
1.3. - Objetivos:.............................................................................................................. 6
2. Referencial teórico............................................................................7
2.1. - Civismo, Capital Social e Deserção – a visão de Robert Putnam. ............. 7
2.2. - Processo decisório empresarial...................................................................... 10
2.2.1. - Teoria dos Jogos ........................................................................................ 12
2.3. - Gestão por Stakeholders. ................................................................................ 15
2.4. - Custos de Transação ....................................................................................... 16
2.5. - Oferta e Demanda............................................................................................. 17
2.6. - Conceitos de Marketing. .................................................................................. 20
2.7. - Ética..................................................................................................................... 21
2.7.1. - Definindo Ética ............................................................................................ 22
2.7.2. - Ética nos Negócios..................................................................................... 27
2.7.3. - Códigos de Ética......................................................................................... 29
2.7.4. - Dilemas Éticos e a Responsabilidade Social......................................... 30
2.7.4.1. - Pra que fazer se posso lucrar mais não fazendo? ............................ 33
2.7.4.2. - Tirando dos pobres para dar aos pobres ............................................ 34
2.8. - Idealismo Pragmático ....................................................................................... 37
2.9. - A empresa virtuosa ........................................................................................... 41
2.9.1. - A Fé, a Esperança e a Caridade:............................................................. 43
2.10. - Responsabilidade Social.................................................................................. 45
2.10.1. - Pirâmide de Responsabilidade Social Empresarial .............................. 46
3. Metodologia ....................................................................................50
4. Retornos .........................................................................................54
4.1 - Mercado Consumidor e Mercado Interno .................................................... 55
4.1.1 Simpatia do Cliente ....................................................................................... 56
4.1.2 Problemas de percepção do mercado consumidor.................................. 58
4.1.3 A percepção do cliente interno - Caso O Boticário. ................................. 59
4.2 Redução dos Custos Transacionais ............................................................... 60
4.3 Sustentabilidade................................................................................................. 62
4.3.1 Pobreza ........................................................................................................... 67
4.3.2 Educação ........................................................................................................ 68
4.3.3 Demais questões de Sustentabilidade ....................................................... 69
4.4 Fatores maximizadores e redutores de retornos .......................................... 70
4.4.1 Influência do Civismo e Deserção............................................................... 70
4.4.2 Coordenação estratégica ............................................................................. 75
4.4.3 Consumo consciente ..................................................................................... 76
4.4.4 Divulgar para disseminar:............................................................................. 77
5. Mercado ou Estado ........................................................................78
6. Considerações Finais .....................................................................82
7. Bibliografia......................................................................................86
Anexo A - Formulário de Pesquisa Consumidores ........................93
Anexo B - Formulário de Pesquisa Funcionários...........................96
XI
Lista de Tabelas
TABELA 01 – DILEMA DOS PRISIONEIROS ............................................................. 14
TABELA 02 – PRA QUE FAZER SE LUCRO MAIS NÃO FAZENDO?................................ 34
TABELA 03 – TIRANDO DOS POBRES PARA DAR AOS POBRES.................................. 35
TABELA 04 – GASTANDO MAIS PARA FALAR QUE PARA FAZER.................................. 37
TABELA 05 - QUALIFICAÇÃO DOS ENTREVISTADOS (PESQUISA CONSUMIDORES) ...... 51
TABELA 06 - QUALIFICAÇÃO DOS ENTREVISTADOS (PESQUISA FUNCIONÁRIOS)........ 51
XII
Lista de Figuras
FIGURA 01 – CIVISMO NA ITÁLIA........................................................................... 10
FIGURA 02 – VARIAÇÃO DO PONTO DE EQUILÍBRIO DE MERCADO. ........................... 18
FIGURA 03 – CURVA DE RECEITA X CUSTO . ........................................................ 20
FIGURA 04 – PIRÂMIDE DE RESPONSABILIDADES................................................... 47
FIGURA 05 – NÍVEIS DE CIVISMO ENCONTRADOS .................................................. 53
FIGURA 06 – RADAR DA EMPRESA (SETOR DE SEGUROS)....................................... 65
FIGURA 07 – MATRIZ DE AMBIENTE DE NEGÓCIOS PARA A SUSTENTABILIDADE.......... 66
FIGURA 08 – SOLIDARIEDADE X CIVISMO E DEMAIS FATORES................................. 72
FIGURA 09 – PERCEPÇÃO PROBLEMAS X CIVISMO E DEMAIS FATORES ................... 73
FIGURA 10 – PAGARIA MAIS X CIVISMO E DEMAIS FATORES ................................... 74
FIGURA 11 – INTERAÇÃO ENTRE OS SETORES ....................................................... 81
XIII
Lista de Abreviaturas e Siglas
ETC - Economia dos Custos de Transação CONAR - Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária LBV - Legião da Boa Vontade MPA - Mestrado Profissional em Administração ONG - Organização Não Governamental RSE - Responsabilidade Social Empresarial UTC - United Tecnologies Corporation
1
1. Introdução:
Há muito tempo o lucro vem sendo discutido fervorosamente, principalmente
no que tange aos meios utilizados para a sua obtenção. Não se discute, entretanto,
que este é e deve ser um dos objetivos das empresas, bem como um fator de
sobrevivência e, ainda, algumas vezes, a razão de sua existência. No fundo, o que
se discute é se este fim ainda justifica os meios e, principalmente, quais os fins que
devem ser agregados ao lucro para compor o novo papel das empresas perante o
grupo social. Este papel aumenta na razão direta do crescimento relativo do
segundo setor (privado) quando comparado com o primeiro (público), sendo o setor
privado o mais afetado, mais interessado e o que tem maior potencial para a
resolução de boa parte dos problemas sociais através de parcerias com o Terceiro
Setor (sociedade civil).
Esta realidade se refere a um contexto de retração do papel do Estado –
anteriormente concebido como elemento capaz de administrar conflitos, voltado para
uma política de pleno emprego e de redistribuição de riqueza –, profundamente
afetado pelas transformações ocorridas num âmbito mundial, em um contexto de
reestruturação produtiva e globalização da economia. A produção capitalista passou
a se orientar para condições globalizadas de produção, retraindo os incentivos à
interferência do Estado nas produções nacionais e deslocando seu campo de ação
para a dimensão transnacional da economia. Aliado a isso se tem uma crise de
ordem fiscal do Estado que se refere, principalmente, a um desequilíbrio entre
gastos e receita que afeta as políticas sociais, dando forma a um Estado mínimo no
tratamento dessas questões (CASTEL, 1998; IVO, 2001).
É certo que uma sociedade desigual e deficiente em bem estar pode causar
interferências na obtenção do lucro, como será mostrado no Capítulo 4. A isso se
agrega, também, a crescente consciência da limitação dos recursos naturais, que
coloca na pauta dos objetivos empresariais, ainda que não de forma totalmente
voluntária1, a preservação do meio ambiente, "Com iniciativas desse tipo”, de 1 IPEA, texto para discussão n° 863, "Regulação, mercado ou pressão social? Os determinantes do investimento ambiental na indústria", Cláudio Ferraz, Ronaldo Seroa da Motta, Rio de Janeiro, março de 2002.
2
responsabilidade social, "a empresa revela sua crença no preceito de que só uma
sociedade saudável pode gerar empresas saudáveis"2.
Além disto, o agravamento da distribuição de renda e a globalização de
informações e imagens trouxeram os efeitos e o mal estar das mazelas da
desigualdade para camadas sociais antes ilesas, onde se encontram os gerentes e
diretores das empresas, bem como os seus mais rentáveis consumidores. Sobre
isso, José Ribeiro Soares Guimarães considera o seguinte:
Diante desse quadro, trata-se de redirecionar o debate acerca da
pobreza e desigualdade no Brasil. Nesse contexto, um importante ponto a ser destacado é que a própria elite brasileira vem (ainda que lentamente) internalizando o sentimento e a necessidade de remediar a pobreza brasileira. Transpondo o limiar do discurso eleitoral, da pseudo-responsabilidade social e da filantropia voltada para fins fiscais e/ou para menções honrosas nas colunas sociais, a elite nacional, de fato, passou a dedicar maior importância à temática da miséria brasileira. Com raríssimas exceções, não se trata de um repentino choque de indignação, conscientização social ou solidariedade cidadã e muito menos um sentimento de vergonha por compactuar para a construção do país mais desigual do mundo. Dando seguimento à sua trajetória na história desse país, a preocupação da elite guarda relação direta com os seus próprios interesses imediatos. No entanto, assume uma conotação diferente. Essa elite vem percebendo que a pobreza assumiu uma dimensão de tal modo alarmante que passou a inviabilizar seu próprio welfare state. (GUIMARÃES, 2002, p. 23).
Tem-se visto no mercado de capitais o crescimento da demanda por valores
como ética, transparência, responsabilidade social, governança corporativa, etc.,
motivado principalmente, mas não exclusivamente, pelos recentes escândalos de
mega corporações como a Enron e a WorldCom. E também porque há uma
percepção de que empresas que detêm esses valores são mais rentáveis que
aquelas dos índices tradicionalmente utilizados como Dow Jones, SP500, tidos como
referências de rentabilidade de empresas convencionais.
Entretanto, muito embora o crescimento do Terceiro Setor - e as discussões,
leis, prêmios e incentivos com relação a comportamentos socialmente responsáveis
- pareça indicar que, pelo menos, uma parte da sociedade esteja consciente, atuante
e que já tenha agregado a responsabilidade social e a ética não tanto como um fim,
mas principalmente como um meio, ainda parece arriscado dizer que a sociedade
como um todo, e o empresariado em particular, tenha percebido uniformemente esta
realidade. Este é um ponto a ser refletido neste trabalho. 2 Vide site: www.ethos.org.br.
3
1.1. - Definição do problema:
Apesar de existir uma demanda da sociedade em agregar ao papel da
empresa a Responsabilidade Social, é o empresariado que estabelece seu próprio
papel e determina os objetivos de suas empresas de acordo com suas próprias
percepções. Isto ocorre, muitas vezes, sem a observação das demandas sociais,
levando em conta apenas à estrutura de mercado em que a empresa está inserida e,
até bem pouco tempo, somente os interesses dos acionistas majoritários.
Até hoje, boa parte das empresas ainda não percebeu nem mesmo a
importância de seus stakeholders e, portanto, elas não têm dado a devida atenção a
seus interesses. Estas sofrem de uma miopia que muitas vezes pode até vir a
comprometer sua sustentabilidade e, deste modo, é provável que nem sempre o
papel demandado pela sociedade seja absorvido pelo empresariado como um todo.
Recentes pesquisas mostram uma crescente busca por uma atuação
responsável (IPEA, 2001), revelando altos percentuais de empresas que praticam
responsabilidade social (67% no Sudeste, 55% no Nordeste e 46% no Sul), sendo
que no Estado da Bahia o percentual alcança 70%. Estes resultados com
percentuais significativos parecem indicar que a Responsabilidade Social está sendo
amplamente absorvida, porém há a necessidade de uma maior precisão na análise
dos mesmos: não basta diferenciar o fazer nada do fazer qualquer coisa de qualquer
jeito, há de se ressaltar a qualidade da ação empreendida em termos da assunção
de obrigações diversas.
Tais considerações levam a que se considere uma primeira pergunta: como
definir Responsabilidade Social de uma forma ampla?
Por outro lado, sabe-se que mesmo as empresas mais avançadas, que levam
amplamente em consideração seus stakeholders, têm uma responsabilidade com
seus stockholders. Portanto, para investir em Responsabilidade Social, necessitam
justificar este investimento. Em resposta a esta necessidade, artigos em jornais e
revistas afirmam, com duvidosa certeza, o porquê das empresas deverem investir
em Responsabilidade Empresarial, inferindo que tal investimento traz retornos ou é
importante para a sua própria sobrevivência, - seja por escolha ou exclusão pelo
consumidor - mostrando que a Responsabilidade Social é uma necessidade de
Marketing.
4
Não se duvida totalmente deste caminho, embora se considere que ele traz
incertezas. Acredita-se, também, que os retornos sejam mais amplos do que os
vislumbrados no curto prazo. Daí sugere-se a segunda pergunta: quais os retornos
que existem para a empresa ao investir de uma forma ampla em Responsabilidade
Social? Ou ainda, que retornos existiriam se todas (utopicamente) investissem? De
acordo com esta última interrogativa o retorno de Marketing praticamente
desapareceria, neste momento ele não seria mais uma justificativa necessária.
A terceira pergunta se origina de múltiplos elementos: na percepção do
crescimento do Marketing Social; na criação de agências de publicidade
especializadas; em campanhas longas, ricas em conteúdo e tempo de exposição e
em custo. Mas os custos destas campanhas muitas vezes ultrapassam os valores
dos investimentos sociais da empresa. Ademais, a empresa que investe de uma
forma ética e responsável se vê forçada a anunciar para não perder market share
para um concorrente que se auto-intitule uma empresa responsável. Enfim, no fato
de permitir que “o lobo se vista em pele de cordeiro”. Feitas estas considerações,
pode-se formular a terceira pergunta da seguinte maneira: a forma como vem se
apresentando o marketing social garante que a população possa diferenciar quem
investe de quem apenas faz marketing ou, pelo contrário, cria maiores distorções da
realidade? Dito de outra forma: como garantir que a população diferencie a empresa
que investe de fato em RSE? Estes são questionamentos aos quais não se tem a
pretensão de responder agora, entretanto, tentar-se-á aqui percorrer o caminho que
possa levar a algumas respostas.
1.2. - Justificativa:
Concorda-se plenamente com Khalil e Villela (2002), no artigo intitulado
“Processo decisório e responsabilidade social nas microempresas – análise das
microempresas da cidade de Rio Bonito – RJ”, no trecho apresentado a seguir:
Em qualquer lugar do mundo, pode-se afirmar, que o homem, nasce,
se educa, trabalha e se relaciona diariamente com organizações e, estas, por sua vez, formam uma grande rede de socialização, comunicação e inter-relação social. Assim, o mundo em que vivemos, constitui uma imensa sociedade de organizações e, é possível dizer, por exemplo, que o desenvolvimento organizacional, como, a pesquisa em novos produtos, a
5
busca na melhoria da qualidade de vida no trabalho e a necessidade de melhor atender àqueles que com estas organizações se relacionam, vem afetar diretamente o desenvolvimento da humanidade. Com isto, observa-se então que, as decisões tomadas pelas grandes organizações, assim como, pelas médias, pequenas e microempresas, vem ao encontro dos anseios, desejos, necessidades e conquistas da sociedade de um modo geral. (KHALIL; VILLELA, 2002, p. 1).
Dizem também que:
Uma decisão organizacional de grande importância trata da implantação e gestão da prática de ações de responsabilidade social nas organizações, prática esta, que busca não só melhorar os níveis de qualidade no trabalho e relacionamento entre o público interno, como também, a melhoria da imagem da organização junto à comunidade. (KHALIL; VILLELA, 2002, p. 1).
O tema Responsabilidade Social Empresarial (RSE) é de extrema importância
para todos, por vários motivos. Um deles refere-se ao fato dele constituir uma peça
fundamental para o desenvolvimento sustentável, tanto nos âmbitos social,
econômico e ambiental - tendo em vista que engaja o Segundo Setor nos interesses
públicos fortalecendo a atuação do Terceiro Setor (como origem de recursos) e
aliviando os custos do Primeiro - como para diminuir os efeitos de uma distribuição
de renda ineficiente.
Além disso, a proliferação da atuação responsável acaba por fortalecer as
relações de confiança nos sistemas de valor, tendendo a elevar, por fim, o Capital
Social.3 Mas, para que isso ocorra de fato, é preciso mais ação do que palavras, ou
seja, a ética e a responsabilidade devem sair dos discursos organizacionais para
adentrar no terreno da prática executiva.
É neste ponto que se compreende a importância deste trabalho, cujos
objetivos principais são: compreender os mecanismos que movem o crescimento da
ação responsável; verificar se eles são sustentáveis; e se, de alguma forma, devem
ser mais bem orientados. As motivações para o estudo do tema vão desde a
necessidade de uma compreensão mais profunda do mesmo (um interesse pessoal),
bem como o aprofundamento do conhecimento acerca de percepções e desejos do
mercado interno e externo, da lógica de decisão empresarial, além da estratégia e
ética que são interesses profissionais de escopo mais amplo. 3 O conceito de Capital Social será tratado no item 2.1.
6
1.3. - Objetivos:
• Compreender os mecanismos que movem o crescimento da ação
responsável;
• Aprofundar o conhecimento acerca de percepções e desejos de mercado
interno e externo às empresas e da lógica de decisão empresarial;
• Ajudar, de alguma forma, a tornar a Responsabilidade Social e a atuação
das ONGs sustentáveis;
• Contribuir para levar o equilíbrio de Nash para Pareto; hoje não investir
quando os outros investem pode ser lucrativo chegando a ponto de
ninguém investir (Nash). Tentar encontrar mecanismos (como por
exemplo, o consumo cidadão) que tornem a deserção um problema, desta
forma ajudando a chegar ao todo (maioria) investindo.4
• Tentar mostrar que o marketing social, quando feito de uma forma
irresponsável ou aética, pode vir a afetar a credibilidade dos conceitos de
Responsabilidade Social Empresarial, complicando assim a
sustentabilidade do Terceiro Setor.
4 Vide item 2.7.4.1.
7
2. Referencial teórico
Para discutir a responsabilidade social e seus retornos, faz-se necessário
abordar diversas outros aspectos que compõem o quadro geral para a análise do
tema.
É preciso primeiramente entender que praticar ou não Responsabilidade
Social é uma decisão empresarial e, como tal, é afetada eminentemente pelos jogos
e as relações entre os jogadores. Estas relações são fundamentalmente
influenciadas pelo civismo das partes envolvidas, e tal elemento pode alterar
significativamente o resultado dos jogos, diferença esta que é chamada de Capital
Social. O civismo pode também influenciar as relações no sistema de valor e na
estrutura de mercado, interferindo nas empresas e na responsabilidade social. A
ética, vista neste trabalho como parte integrante da prática de responsabilidade
social, tem sua origem na percepção do outro e é também intrinsecamente afetada
pelo civismo do indivíduo.
Outros fatores também devem ser abordados, como a gestão por
Stakeholders, considerada um passo importante, bem como as discussões sobre
custos de transação, curvas de oferta e demanda, marketing e mercado que são
uma forma objetiva de avaliar retornos do comportamento ético e responsável. Por
fim os conceitos de Empresas Viruosas e do Idealismo pragmático ajudam a
entender porque algumas empresas praticam a Responsabilidade Social sem que
haja uma justificativa instrumental para isto.
2.1. - Civismo, Capital Social e Deserção – a visão de Robert Putnam.
Neste item, procura-se discutir o civismo e sua importância para a tomada de
decisão dos indivíduos de uma sociedade. São as decisões destes indivíduos,
membros tanto do empresariado quanto do mercado consumidor, que serão
determinantes para uma atuação socialmente responsável, bem como para o
sucesso desta estratégia. Sobre isto, Robert Putnam (2000) constata, em um de
seus livros, o equivalente a uma doença: a falta de civismo gerando baixos níveis de
confiança, causando prejuízos para todos os envolvidos e alimentando a própria
8
doença, num ciclo vicioso que afeta o desenvolvimento, a tomada de decisão e a
própria Responsabilidade Social.
O autor dá o nome de Capital Social aos efeitos gerados pelo nível de
confiança entre os membros da sociedade; em sociedades com pouco Capital Social
a deserção se torna uma atitude lógica e racional (Putnam, 2000). Nestas, ouve-se
freqüentemente frases do tipo: “Por que não chamar os dois elevadores ao mesmo
tempo? O vizinho de baixo faz isso...”; ou quem sabe: “Para que economizar gás e
água no apartamento? Outros desperdiçam”; ou ainda: “Para que pagar impostos?
Eles são mal aplicados”. Ou seja, justificativas racionais de deserção, tornando o
errado racionalmente certo, reduzindo ainda mais os níveis cívicos e éticos de uma
sociedade.5 O que mantém os bons cidadãos com o civismo e a ética em alta é o
coração, o caráter e uma “santa teimosia”. Numa sociedade com pouco Capital
Social, além da baixa colaboração entre os jogadores, vê-se contratos pesados,
stress dobrado, jogos de soma zero, equilíbrios de Nash, altos custos de transação,
alto custo financeiro e riscos absurdos.6
Tudo isso ocorre porque civismo significa também “um reconhecimento e uma
busca perseverante do bem público à custa de todo interesse individual e particular”
(SKINER, s.r. apud PUTNAM, 2000, p. 101). Buscar verdadeiramente o bem público
e coletivo implica em comportamentos éticos mais profundos, aumentando os níveis
de confiança e as práticas de responsabilidade social. Elevados níveis de civismo
seriam suficientes para garantir tanto a prática quanto o consumo da
responsabilidade social.
Muito embora a expectativa por um civismo elevado na sociedade brasileira, e
no empresariado em particular, possa ser considerada vã, é razoável acreditar na
existência de pessoas e empresas com maior e menor nível de civismo. Também é
igualmente razoável esperar que estes níveis influenciem positivamente nas
percepções e práticas dos stakeholders, interferindo, portanto, no cenário de
atuação de uma empresa. Considera-se altamente interessante avaliar esta questão.
Também é importante frisar que:
Pode muito bem haver exagero na dicotomia entre interesse próprio
e altruísmo, pois nenhum mortal e nenhuma sociedade bem-sucedida podem prescindir do poderoso estímulo do interesse próprio. Os cidadãos da
5 Vide Teoria dos Jogos, item 2.2.1. 6 Vide Teoria dos Jogos, item 2.2.1 e Custos de Transação 2.4.
9
comunidade cívica não têm que ser altruístas, eles buscam o que Tocqueville chama de “interesse próprio corretamente entendido”, isto é, o interesse próprio que é “esclarecido” e não “míope”, o interesse próprio que é sensível ao interesse dos outros (PUTNAM, 2000, p. 102).
Putnam avaliou os níveis de civismo das diversas regiões da Itália através de
um índice de civismo que levava em consideração diversos aspectos que são
sintomáticos de ações cívicas: uma composição do número de associações
existentes, da freqüência de leitura de jornais e das formas de voto. A importância
das associações vai desde a articulação de interesses até o desenvolvimento de
hábitos como cooperação, solidariedade e espírito público. Esta influência
independe do tipo da associação, é inerente à prática associativa. Ele avaliou as
sociedades como um todo, através do número de associações existentes em cada
região. No tocante mais particularmente à leitura de jornais como índice de civismo,
o autor considera que ela permite maior acesso à informação, possibilitando uma
superior participação nas deliberações cívicas, além de ser o meio que reserva
maior espaço às questões comunitárias. Portanto, denota um maior interesse dos
cidadãos pelos assuntos comunitários.
Convém notar que existem diferenças significativas entre as regiões
enfocadas pelo autor (Fig. 01). Tais variações foram consideradas como um fator
altamente significativo no entendimento do desenvolvimento social e econômico
diferenciado das diferentes sociedades italianas.
Embora não se possa fazer um paralelo entre Itália e Brasil, inspirando-se no
estudo de Putnam podem-se considerar variações significativas de civismo entre as
regiões brasileiras. Intuitivamente, no caso brasileiro, pode-se dizer que os mais
altos níveis de civismo seriam encontrados no Sul (notadamente no Rio Grande do
Sul) enquanto os níveis mais baixos estariam no Nordeste. Corroborando a
suposição, Baiardi (1995) apresenta uma explicação baseada na proveniência dos
imigrantes formadores das diversas regiões brasileiras.
10
FIGURA 01 – CIVISMO NA ITÁLIA
Fonte: Putnam (2000, p. 111).
2.2. - Processo decisório empresarial.
A importância do processo decisório para este estudo se configura pelo fato
de se entender a Responsabilidade Social como uma mudança dos objetivos da
empresa, podendo ela ocorrer de diversas formas, seguindo diferentes processos
decisórios.
Seria interessante abordar, neste momento, o processo decisório racional
apresentado por Zadek, Pruzan e Evans (1997) – muito semelhante à motivação de
objetivos de Gasson (1973)7 - que explicita os três principais motivos que levam à
tomada da decisão com relação a mudanças de objetivos. São eles:
• Instrumental – verifica-se que a mudança trará retornos para a empresa,
seja por vantagens competitivas no mercado, seja por ganhos de 7 Vide site da Embrapa, www.cnpgc.embrapa.br/publicacoes.
11
produtividade e satisfação interna, ou ainda por ganhos nos custos
financeiros;
• Pressão Externa – demandas sociais fortes tornam as mudanças
necessárias à sobrevivência da empresa, seja por legislações, seja por
exclusão de marcas irresponsáveis;
• Mudança de Valores – modificações profundas na sociedade (civismo
dentre outros) fazem com que a empresa (parte da sociedade) reveja sua
atuação, neste caso traduzindo-se em um maior civismo empresarial.
Portanto, para que a responsabilidade social entre definitivamente no hall dos
objetivos empresariais, seja como meio ou como fim, seria necessária a existência
de pelo menos um dos três motivos acima, mesmo que numa expectativa futura.
Sobre esta questão, com relação ao Brasil, podem-se acrescentar fatores
fortes, quer sejam:
• Modismos de gestão - fazer pura e simplesmente porque outros estão
fazendo, até que surja uma nova onda;
• Desconhecimento – as decisões são tomadas de forma empírica ou
aleatória, sem fazer uso de nenhuma ferramenta de gestão adequada.
Estes últimos motivos, apesar de gerar um fluxo de decisões em uma dada
direção, não são capazes de gerar uma mudança sustentável nos objetivos
empresariais. Daí surge uma pergunta: o crescimento do investimento socialmente
responsável no Brasil se traduz mais por modismo, civismo ou demandas de
mercado atuais ou futuras?
Para responder a esta questão vale observar algumas pesquisas publicadas
que parecem indicar as possíveis razões. Por exemplo, a pesquisa do IPEA (2001),
mostra que muitas empresas que praticam RSE o fazem por razões cívicas e a
maioria nem divulga estas ações (91% no Sudeste, 86% no Nordeste e 93% no Sul).
Sobre isto, entende-se que a divulgação não seja fator comum, pois, na maioria das
vezes, divulgar as ações custa mais caro do que a própria ação em si. Isto parece
indicar que as empresas preferem reverter o dinheiro que seria gasto com marketing
em atuação social ou, até mesmo, uma percepção de que gastos excessivos em
marketing comprometeriam a legitimidade das ações em si.
12
É importante colocar que o resultado destas pesquisas precisa ser
considerado com certas ressalvas, visto que a sociedade brasileira formadora do
empresariado e do mercado, como demonstra a literatura a esse respeito, sofre de
uma séria doença, a falta de civismo8. Sendo assim, causa surpresa o percentual de
empresas que informam como motivos de sua atuação a ética e o civismo - e mais
ainda, que um mercado pouco “civilizado”, desertor e desconfiado, exclua ou escolha
empresas baseadas em ações que são pouco divulgadas.
Baiardi & Laniado (1999) verificam elevados níveis de engajamento cívico
tanto da empresa quanto do empresariado como pessoas físicas, parecendo
contrariar as expectativas com relação ao empresário brasileiro e ao baiano em
particular9. Mesmo constatando isto, não se pode esquecer que o capitalista se
move com a visão hedonista de maior resultado com o menor esforço e, atualmente,
no menor prazo possível. Desta forma, acredita-se que o fator instrumental continue
sendo de grande importância para explicar a motivação da empresa em adotar a
Responsabilidade Social. Infelizmente, as pressões da sociedade ainda são
pequenas para incentivar a motivação que leva à RSE, o que reduz os próprios
cálculos instrumentais.
No presente estudo, trata-se a visão cívica do empresariado como um caso
particular, o das pessoas e empresas virtuosas. A visão menos imediatista e o
paradoxo hedonista serão tratados no tópico 2.8: Idealismo Pragmático; o fator
instrumental no Capítulo 4: Retornos.
2.2.1. - Teoria dos Jogos
A teoria dos jogos é um ferramental para explicar tanto decisões estratégicas,
quanto dilemas éticos complexos, daí sua relevância para o estudo da ética e da
responsabilidade social.
Pode-se dizer que a lógica de decisão empresarial segue o raciocínio
hedonista de maximizar os ganhos individuais com o mínimo de esforço envolvido e,
também, que qualquer decisão de uma empresa afeta e gera reações por parte de
seus concorrentes que poderão, em maior ou menor grau, afetar o sucesso de suas 8 Vide item 2.1. 9 Ver item 2.1.
13
decisões. A tentativa de previsão das reações dos concorrentes pode ser
considerada uma forma eficiente de administração estratégica. Esta dinâmica de
ação, previsão e reação pode levar a equilíbrios previsíveis.
A teoria dos jogos é um instrumental da teoria econômica que busca
determinar a melhor estratégia de ação de um agente econômico, em uma situação onde outros agentes interagem e se comportam racionalmente, objetivando maximizar seus ganhos. (CARRERA-FERNANDES, 2001, p. 365).
Os participantes dos jogos são chamados de players (jogadores) e, para que
exista um jogo, faz-se necessário a presença de pelo menos dois participantes. O
conjunto de ações e reações (estratégias) dos participantes e seus respectivos
resultados combinados (payoff) formam um jogo interpretável pela matriz de payoffs.
Os jogos podem ser classificados como cooperativos, quando os players
podem “negociar entre si e planejar estratégias consensuais conjuntas” (CARRERA
FERNANDEZ, 2001, p. 366), ou não cooperativos, quando não é possível a
negociação entre os players, de modo que as estratégias sejam individuais. Sendo
assim, a diferença entre os jogos cooperativos e os não cooperativos está na
possibilidade ou não de realização de acordos ou contratos entre as partes.
Com relação às estratégias, alguns tipos particulares podem ser definidos. O
primeiro tipo é formado pela estratégia de Nash, que é a reação do player que traz
melhor retorno para uma dada ação do oponente. Outro tipo é composto pela
estratégia dominante, aquela que traz o melhor retorno independente das ações do
oponente. Por fim, a estratégia dominada, que traz o pior retorno independente das
ações do oponente.
Com relação ao ponto de equilíbrio do jogo pode-se definir pelo menos dois:
(i) o equilíbrio de Nash ocorre onde nenhum dos jogadores obtém ganho com uma
mudança isolada de estratégia; (ii) o equilíbrio de Pareto é o ponto de maior ganho
coletivo, para que ele ocorra é necessário que ambos os jogadores abram mão de
suas estratégias de Nash. Vale ressaltar que os jogos podem ter vários jogadores e
vários movimentos em seqüência; os jogos aqui analisados terão apenas 2
jogadores e 1 movimento.
A forma mais conhecida de análise em teoria dos jogos é o dilema dos
prisioneiros. “Embora seja um exemplo simples e até certo ponto ingênuo, o dilema
dos prisioneiros revela a essência da teoria dos jogos e pode ser estendido para
14
qualquer situação que envolva a interação entre dois agentes econômicos”
(CARRERA-FERNANDEZ, 2001, p. 366).
Nesta formulação, duas pessoas acusadas do mesmo crime são colocadas
em celas separadas, sem possibilidades de haver comunicação entre elas (jogo não
cooperativo). No intuito de apressar a confissão, foi estabelecida a seguinte proposta
(individualmente): se ambos confessarem, a pena para cada um é de cinco anos; se
nenhum dos dois confessar, a pena é de dois anos para cada; ou ainda, se um
confessar e o outro não confessar a pena seria de um ano e dez anos
respectivamente. Como se trata de uma penalidade utilizam-se aqui sinais negativos
para os retornos, configurando a seguinte matriz de payoffs:
Tabela 01 – DILEMA DOS PRISIONEIROS
Prisioneiro B
Não Confessa Confessa
Não Confessa (-2 ; -2) Pareto (-10 , -1) Prisioneiro A Confessa (-1 ; -10) (-5 , -5)Nash
Fonte: Autoria própria
Note-se que confessar é uma estratégia de Nash para ambas as opções do
oponente, configurando uma estratégia dominante confessar e dominada não
confessar. O equilíbrio ocorre em Nash quando ambos confessam, muito embora
seja mais interessante para o conjunto não confessar (equilíbrio de Pareto). Por isto
o dilema: agir fora da melhor forma, pois o risco de agir corretamente traz prejuízos
pela ação do oponente.
Putnam (2000) também analisou diversos jogos à luz dos níveis de confiança
entre os jogadores, mostrando que esses níveis podem alterar significativamente o
resultado dos mesmos. A mudança do ponto de equilíbrio de Nash para Pareto é um
dos casos em que se depende de elevados níveis de confiança entre as partes.10
.
10 Serão avaliados aqui alguns jogos no item sobre dilemas éticos.
15
2.3. - Gestão por Stakeholders.
A gestão por stakeholders é importante para o estudo, pois nasce do
reconhecimento da existência de diversos grupos de interesse na atuação da
empresa, inclusive os acionistas (stockholders) que são diretamente afetados por
ela, positiva ou negativamente. O reconhecimento destes grupos (stakeholders),
compostos principalmente pelos acionistas, fornecedores, funcionários, clientes,
governo e comunidades - afetados pela empresa - é determinante para o sucesso ou
fracasso dos negócios. Reconhecer é também um passo importante em direção à
Responsabilidade Social.
Certamente a gestão por stakeholders não é simples, afinal "as expectativas
de uns stakeholders podem ser diametralmente opostas às de outros, forçando as
empresas a escolher entre um grupo ou outro”. (GRAYSON; HODGES, 2002, p. 89).
A primeira escolha entre grupos, e talvez a mais óbvia, é entre stockholders X
demais stakeholders. Em parte, conflitos intrínsecos começam a ser resolvidos
quando se escolhe a gestão por stakeholders, ou seja, quando se reconhece que, de
uma forma ou de outra, atender aos interesses dos últimos leva, em longo prazo, ao
atendimento dos interesses dos primeiros, um exemplo de Idealismo Pragmático11.
Isto não significa que a gestão de interesses se torne fácil, nem mesmo óbvia, pois
certamente muitos dilemas sérios (alguns deles éticos) se formarão nesta esfera
onde, talvez na maioria das vezes, os escolhidos serão os stockholders mesmo na
gestão por stakeholders.
Porém, existem escolhas não tão claras que, às vezes, envolvem sub-grupos,
a exemplo do que ocorreu com a Sara Lee (multinacional de alimentos). Esta, "criou
prêmios para homenagear mulheres que tiveram papel importante na sociedade e
inspiraram outras. Há quatro categorias: artes, negócios, governo e humanidades.
Uma entidade sem fins lucrativos e dedicada aos interesses das mulheres recebe
um subsídio de US$ 50mil em nome de cada vencedora." (GRAYSON; HODGES,
2002, p. 89).
O grupo Mulheres contra o controle de armas (WAGC) conclamou
seus membros e quem apóia o porte de armas a participar de um boicote mundial contra os produtos Sara Lee. É um protesto contra a entrega do prêmio [na categoria] Humanidades, em novembro de 1997, a Sarah Brady,
11 Vide item 2.7.1.
16
ativista pró-controle de armas, e também contra a doação dos US$ 50mil ao centro de prevenção da Violência com armas. O WAGC protesta contra esta instituição porque ela defende a proibição do porte de armas defensivas. O WAGC acredita que a proibição seja contrária à constituição e deixe os cidadãos que respeitam as leis à mercê dos criminosos. (GRAYSON; HODGES, 2002, p. 89).
Ora, tentar agradar a maior parte de seu mercado é um paradigma de
marketing. Porém, aqui não está relacionado aos produtos que se desenvolveram
cuidadosamente ao longo de determinado tempo, buscando agradar determinado
público. Aqui está se buscando o atendimento de uma demanda que, muitas vezes,
não é clara, nem uniforme, e que se acredita ser variável de acordo com classes
sociais, níveis de instrução, civismo e outros. Para otimizar esta questão dá-se
crédito à utilização de pesquisas semelhantes àquelas utilizadas no marketing de
produto, por mais polêmica que esta opção se revele.
Portanto, a gestão por Stakeholders é uma tarefa árdua, mas, certamente,
com recompensas satisfatórias.
2.4. - Custos de Transação
É evidente que os custos operacionais não são os únicos aos quais uma
empresa está sujeita. Não tão imediata, porém, é a definição, identificação e gestão
de um tipo de custo a que todas as relações ou transações estão sujeitas: os custos
de transação. Neste trabalho, será feita uma breve discussão a esse respeito, pois a
redução desses custos é um importante retorno motivador da prática da ética e da
responsabilidade social.12
A definição dos custos de transação parte da percepção de que o
funcionamento do sistema econômico, composto eminentemente de relações e
transações, não é isento de custos. Estes surgem e, freqüentemente, estas relações
e transações (traduzidas em atividades) podem não funcionar perfeitamente -
existindo também dificuldades para controlá-las. Sendo assim, pode-se dizer que:
Uma transação freqüentemente sujeita as partes ao risco de que
elementos acordados entre elas não se efetivem. As partes, ademais, não observam esse risco passivamente. Criam mecanismos e estruturas de
12 A maior parte da discussão presente é inspirada no livro de Farina; Azevedo e Saes, (1997), capítulos 2 e 3, e permeada por citações do mesmo.
17
governança que têm por objetivo último a redução de tais riscos e suas conseqüências (FARINA; AZEVEDO; SAES, 1997, p. 71).
Deste entendimento surgem as atividades voltadas a gerir as relações e
transações existentes na empresa, tais como elaboração e negociação dos
contratos, mensuração e fiscalização de direitos de propriedade, monitoramento de
desempenho, organização de atividades, etc. Estas atividades são uma parte
importante dos custos de transação. Além disto:
Mudanças no meio ambiente não antecipadas pelos agentes
[responsividade] vão implicar modificações das transações existentes, revisão de contratos e mesmo modificação da forma organizacional. A reestruturação das transações existentes implica custos de transação. (FARINA; AZEVEDO; SAES, 1997, p. 58).
Por fim, modificações no sistema econômico podem gerar oportunidades e
riscos em que as menos prejudicadas e as mais beneficiadas são aquelas empresas
que mais rapidamente se adaptarem a estas mudanças. Portanto "deficiências de
adaptação [...] se traduzem em custos, na medida em que implicam perda de
oportunidades de lucro. Estes custos de uma adaptação ineficiente são custos de
transação" (FARINA; AZEVEDO; SAES, 1997, p. 58). Logo, os custos de transação
são compostos pelos riscos envolvidos nas transações, pelas atividades de gestão
das transações, bem como pelos custos de reestruturação baseados nas mudanças
do meio ambiente e de adaptações ineficientes às mudanças do sistema econômico.
O que dizer então das transações que não ocorrem, pois os níveis de Capital
Social não o permitem? Será que estes níveis não representam custos de transação
para as empresas inseridas numa sociedade com baixo Capital Social? Esta
discussão ultrapassa os limites propostos por este trabalho, mas acredita-se que
seja altamente relevante.
2.5. - Oferta e Demanda
Os conceitos de oferta, demanda e equilíbrio de mercado têm grande
importância na verificação de retornos possíveis advindos da sustentabilidade da
sociedade onde a empresa está inserida, por isso faz-se necessário apresentar aqui
um pequeno resumo deste tema.
18
Em primeiro lugar é preciso entender o conceito de função de demanda, que
pode ser definido pelo "lugar geométrico de todas as quantidades demandadas de
um bem ou serviço Xd, reveladas pelos múltiplos consumidores de forma unívoca,
ao variar-se o preço p deste bem ou serviço desde seu nível mais baixo até seu nível
mais alto" (CARRERA-FERNANDEZ, 2001, p. 9). Esta função tem inclinação
negativa visto que, quanto mais baixo o preço mais indivíduos estão dispostos a
comprar.
Outro ponto importante a ser definido é a função de oferta, "o lugar
geométrico de todas as quantidades ofertadas de um bem ou serviço Xs, reveladas
pelos múltiplos produtores de forma unívoca, ao variar-se o preço p desse bem ou
serviço desde o seu nível mais baixo até o seu nível mais alto" (CARRERA-
FERNANDEZ, 2001, p. 10). Esta curva tem inclinação positiva, pois quanto mais alto
o preço mais as empresas estão dispostas a ofertar.
Por fim, o equilíbrio de mercado pode ser definido como "o estado resultante
de um mecanismo de ajuste no qual a quantidade demandada xd é exatamente igual
à quantidade ofertada” (CARRERA-FERNANDEZ, 2001, p. 11).
Certamente a função de demanda varia com o tamanho do mercado em
questão, com a riqueza que a sociedade possui e com a forma como ela está
distribuída. Quanto maior a riqueza, quanto melhor distribuída e quanto mais
pessoas fizerem parte deste mercado maior o p máximo e a quantidade para p
mínimo - claro que estes efeitos são complexos e não tão imediatos, mas eles
existem. Veja-se, por exemplo, a curva de Engel (CARRERA-FERNANDEZ, 2001).
Para as mesmas curvas de oferta, maior o p e a quantidade no equilíbrio de
mercado, portanto maior o lucro.
A Figura 02 mostra o efeito desta variação. No gráfico uma variação de 10%
no tamanho do mercado e de 10% no máximo preço pago fez variar 15% na
quantidade de equilíbrio e 8% no preço de equilíbrio. O faturamento cresceria na
ordem de 24%. Mesmo considerando que o custo marginal para cada unidade a
mais produzida seja constante (o que não é verdade levando em consideração
economias de escala) seria um elevado acréscimo no lucro operacional.
19
FIGURA 02 – VARIAÇÃO DO PONTO DE EQUILÍBRIO DE MERCADO.
Equlíbrio de Mercado
0200400600800
10001200
0 200 400 600 800 1000
Quantidade
Preç
o
Demanda 1Oferta 1Demanda 2
Fonte: Autoria própria
Isto sem falar em aumentos de produtividade e outras reduções de custos
advindos da sustentabilidade, seja pela educação, saúde, meio-ambiente ou ainda
pelo desenvolvimento econômico (situação 2 na Figura 03). Note-se que, de acordo
com esta figura, o preço final é um pouco mais baixo, mas o lucro por unidade é
maior, assim como o número de unidades comercializadas.
Certamente são poucos os elementos disponíveis para afirmar que a
competitividade de alguns setores esteja afetada pela sustentabilidade da
sociedade, até porque tal análise deve ser realizada para cada empresa. Porém,
esta análise mostra que os fatores de sustentabilidade afetam o equilíbrio micro-
econômico, sendo, portanto, importantes para a competitividade das empresas.
20
FIGURA 03 – CURVA DE RECEITA X CUSTO
Receita X Custo
0.00
100.00
200.00
300.00
400.00
500.00
600.00
700.00
0 200 400 600 800 1000
DemandaRMCM 1CM 2
Lucro por unidade na situação 1
Lucro por unidade na situação 2
QUANTIDADE
PREÇ
O
Fonte: Autoria própria
2.6. - Conceitos de Marketing.
Alguns conceitos de marketing são importantes para a discussão,
notadamente aqueles de diferenciação e de preço prêmio. Estes conceitos são de
ampla difusão, não havendo necessidade de aprofundá-los aqui. Por outro lado,
acredita-se que seja importante discutir um pouco sobre a evolução dos mercados e
o movimento consumerista americano da década de 60.
No início do século XX, os americanos viram o apogeu da produção em
massa, representada principalmente pela Ford e seu modelo T, único modelo, única
cor. Neste momento os consumidores não tinham escolha, poucos podiam comprar
um carro. O sonho de Ford (um modelo T para cada garagem) aproximava-se da
realidade enquanto a GM, percebendo os desejos do mercado, tomava a liderança
oferecendo diversos modelos, buscando a diferenciação, sendo seguida
posteriormente até mesmo pela Ford.
Este ciclo ocorreu de uma forma ou de outra em diversos setores até que, na
década de 60, o mercado consumidor americano, com suas necessidades satisfeitas
por uma ampla gama de produtos que seu poder de compra alcançava, passou a
21
exigir das empresas, através de suas decisões de consumo, a observação de outros
critérios envolvendo principalmente questões ligadas ao meio ambiente, excluindo
empresas e pagando mais caro por produtos de outras. A este movimento deu-se o
nome de Consumerismo.
Hoje, 40 anos depois do consumerismo americano, não se pode dizer que o
mercado brasileiro está com as suas necessidades satisfeitas, pelo contrário, o
mercado daqui está bem mais atrasado que o mercado americano da década de 60.
As curvas de renda que comparam os dois países mostram uma realidade
assustadora. A pergunta é: “como vender para os pobres?” (Ícaro, 2003, p. 31;
Exame, 2003, p. 33-48). A busca de uma resposta a esta questão parece ter sido
esquecida pelas empresas há décadas.
Opções de modelos, marcas, cores, consumo consciente, etc, são um luxo
que a maior parte da população brasileira não tem condição de pagar; estes seriam
consumidores pelo menor preço, e muitos nem se dão conta disso. Mas há o outro
lado da questão, o Brasil é também, em parte, uma Bélgica, cujo consumo vai além
das opções nacionais, há consumidores por marcas e opções. Mesmos que alguns
destes consumidores não consigam satisfazer plenamente suas necessidades de
consumo, acredita-se que, em termos de satisfação, estão mais avançados que os
consumeristas de 1960. Neste ponto, seria elucidativo inferir que estes
consumidores estariam mais sensíveis às questões sociais e ambientais e que,
portanto, empresas com tais públicos teriam na Responsabilidade Social uma boa
estratégia de marketing.
2.7. - Ética
A ética tem grande importância no mundo empresarial, muito embora alguns
afirmem que estratégia e ética não andam juntas. Em 1971, no prefácio da edição
brasileira do livro Ética em Negócios, M. Levy diz que:
Existem observadores que insistem em afirmar que não se deve
esperar comportamento ético no mundo dos negócios. Outros acreditam que, quando os homens de negócios se conduzem eticamente, nada mais estão fazendo que pregando um recurso útil para o sempre desejado fim que é o lucro. Certamente existe diferença entre uma decisão tomada por motivos de
22
consciência e outra tomada exclusivamente por causa dos lucros que daí resultam. (LEVY apud BAUMHART, 1971, p. 9).
Pela sua importância na empresa de um modo geral, o entendimento da ética
é fundamental para o estudo da Responsabilidade Social Empresarial; apontada por
alguns, até mesmo, como passo anterior a ela13.
Valores e princípios éticos formam a base da cultura de uma
empresa, orientando sua conduta e fundamentando sua missão social. A noção de responsabilidade social empresarial decorre da compreensão de que a ação das empresas deve, necessariamente, buscar trazer benefícios para a sociedade, propiciar a realização profissional dos empregados, promover benefícios para os parceiros e para o meio ambiente e trazer retorno para os investidores. A adoção de uma postura clara e transparente no que diz respeito aos objetivos e compromissos éticos da empresa fortalece a legitimidade social de suas atividades, refletindo-se positivamente no conjunto de suas relações. (www.ethos.org.br).
Ressaltada a sua importância faz-se necessário saber: (i) como definir ética
de forma adequada para a análise do presente estudo?; (ii) como ela é entendida e
praticada no mundo dos negócios?; (iii) qual a importância dos Códigos de Ética?;
(iv) quais dilemas éticos se apresentam na Responsabilidade Social Empresarial, no
Marketing Social e na Publicidade? A estas perguntas procurar-se-á responder a
seguir:
2.7.1. - Definindo Ética
Certamente é difícil definir ética, devido à grande variedade de significados
atribuídos à palavra, bem como sua natureza abstrata e subjetiva.
O mini dicionário Aurélio define a ética como sendo: “1. Estudo dos juízos de
apreciação referentes à conduta humana, do ponto de vista do bem e do mal. 2. Conjunto de normas e princípios que norteiam a boa conduta do ser humano."
(HOLANDA, 2001, p. 300).
Ética é uma palavra grega, originada da palavra Ethos que significa caráter.
Segundo o livro A Companion to Ethics (SINGER, 1997) no capítulo 10 (Ethics in
Ancient Greece), na Grécia antiga, notadamente para Aristóteles, uma relevante 13 Vide pirâmide de responsabilidades, item 2.10.1.
23
dose de Ethos era considerada uma das virtudes (aretes) necessárias para viver
uma boa vida e atingir a felicidade (eudaimonia).
O Dicionário Oxford de Filosofia (BLACKBURN, 1997) traz diversos
significados interessantes para este estudo, que são transcritos abaixo:
Ética (do gr., ethos: caráter) Estudo dos conceitos envolvidos no
raciocínio prático: o bem, a ação correta, o dever, a obrigação, a virtude, a liberdade, a racionalidade, a escolha. É também o estudo de segunda ordem das características objetivas, subjetivas, relativas ou céticas que as afirmações feitas nesses termos possam apresentar.
Ética aplicada Disciplina que aplica a ética a problemas práticos reais, tais como o aborto, a eutanásia, o tratamento dos animais ou outros problemas legais, políticos, sociais e do meio ambiente.
Ética da gestão Ramo da ética aplicada que analisa os problemas e dilemas criados pelas práticas de gestão, como, por exemplo, as responsabilidades sociais da empresa, os limites adequados à competição aceitável, o equilíbrio entre as obrigações incompatíveis para com os acionistas e os clientes, e a extensão e limites da lealdade empresarial.
Ética deontológica A ética baseada na noção de dever, na retidão ou em direitos, contrastando com os sistemas éticos baseados na idéia de atingir um certo estado de coisas, ou nas qualidades de caráter necessárias para viver bem. O principal sistema deontológico é o de Kant. (BLACKBURN, 1997, p. 129-130)
Esta última se assemelha muito com o conceito de moral apresentado pelo
Dicionário Oxford:
Moral Embora a moral das pessoas e sua ética acabem por ser a
mesma coisa, há um uso do termo que restringe a moral aos sistemas como o de Kant, baseado em noções como o dever, a obrigação e princípios de conduta, reservando a ética para a perspectiva mais aristotélica do raciocínio prático, baseada na noção de virtude, e que de modo geral evita a separação das considerações "morais" de outras considerações práticas. Os problemas exégicos são mais complexos, uma vez que alguns comentadores apresentam um Kant mais aristotélico, e um Aristóteles mais interessado na esfera específica da responsabilidade e do dever, ao contrário do que sugere o simples contraste. (BLACKBURN, 1997, p. 256).
Por sua vez, Baumhart (1971) utilizou as seguintes definições:
• Ético: tudo o que está em conformidade com os princípios de conduta
humana; de acordo com o uso comum, os seguintes termos são mais ou menos sinônimos de ético: moral, bem, certo, justo, honesto.
• Padrões éticos: princípios ou ideais de conduta humana. • Ética: o estudo da moralidade das ações humanas; portanto, os modelos
para essas ações. • Moralidade: a propriedade de uma ação por meio da qual ela se harmoniza
com uma norma de conduta humana. (BAUMHART, 1971, p. 42).
24
Segundo Borger (2001) há várias abordagens possíveis, não havendo neste
estudo a pretensão de esgotar a análise, principalmente considerando que isso
demandaria uma pesquisa bibliográfica para além do escopo desta proposta. As
referências a estas abordagens são uma forma de apresentar os conceitos teóricos
relacionados com a responsabilidade social.
Mas afinal o que é ser ético? O que determina a boa conduta? Como
determinar o que é o certo? Estas perguntas se complicam ainda mais quando se
percebe que o Certo, o Bom e o Justo variam de sociedade para sociedade, de
pessoa para pessoa. Embora existam certos padrões aparentemente absolutos,
estes não são aceitos por todas as sociedades.
Resolvendo este problema, Eco e Martini (2000) constroem um conceito
avaliando se "existem [...] noções elementares comuns a toda a espécie humana
[...]. Problema não tão óbvio, no momento em que se sabe que muitas culturas não
reconhecem noções que para nós parecem evidentes [...]. Estou, no entanto,
convencido de que certamente existem noções comuns a todas as culturas [...]."
(ECO; MARTINI, 2000, p. 81). A partir daí encontram noções universais como o
constrangimento, o sofrimento da segregação, e outras, que dariam ao indivíduo
uma noção universal do que deseja para si.
Para chegar ao que deseja para si, o indivíduo necessita que façam com ele
certas coisas e que não façam outras. Pode-se dizer que, mesmo nas sociedades
mais primitivas, o “pagar na mesma moeda” é uma ação racional. Assim sendo, o
princípio seria o de fazer pelo outro o que se deseja para si próprio, conforme o
ditado popular: "Não faça com o outro o que não quer que façam a ti”. A esta regra e
a suas inúmeras variações dá-se o nome de regra de ouro. De uma forma ou de
outra ela aparece em todos os sistemas religiosos e éticos e já foi apontada por
alguns executivos como a pedra fundamental de sua filosofia administrativa
(BAUMHART, 1971, p. 40).
Esta é uma unanimidade que, à primeira vista, responde, em parte, a estas
perguntas, a percepção do outro e das relações interpessoais, como conclui Eco: "A
dimensão ética começa quando entra em cena o outro. Toda lei, moral ou jurídica,
regula relações interpessoais, inclusive aquelas com um Outro que a impõe." (ECO;
MARTINI, 2000, p. 83).
A ética, portanto, aparece como forma de satisfação de desejos pessoais e de
estabilidade social. Por mais nobres que sejam os interesses aparentemente pode-
25
se dizer que todo comportamento ético envolve interesses pessoais. Entende-se
que, mesmo percebendo haver um interesse qualquer envolvido na atuação ética, os
benefícios que esta atuação traz justificam ou tornam os interesses irrelevantes. Os
meios (atuação ética, gerando estabilidade social, etc.) justificam os fins (bem-estar
pessoal, etc.). Esta justificativa é válida, principalmente quando se leva em conta
que o nível de comportamento ético pode ser determinante até mesmo do
desenvolvimento econômico e institucional de uma sociedade através do Capital
Social (PUTNAM, 2000).
Porém, mesmo que seja útil em dilemas éticos simples, a regra de ouro não
parece apropriada para a maioria das decisões empresariais. Do que serve ela
quando "os outros" são duas ou mais partes cujos interesses se opõem? Em última
instância, estes são os problemas típicos dos negócios. "Por exemplo, quem merece
a preferência quando há um lugar vago para dois homens desempregados ou
quando se registra um conflito de interesses entre um homem e o resto do seu
departamento, ou entre acionistas e empregados?" (BAUMHART, 1971, p. 42).
Com vistas à resolução de algumas das questões acima sugeridas, pode-se
utilizar um outro conceito muito útil na tomada de decisões, o de Boa-Fé, ou seja,
agir de acordo com a própria consciência, com o bom senso, com o que é
considerado certo, "ou seja, a retidão da consciência, a boa vontade, a convicção de
fazer aquilo que se está convencido que deve ser feito por cada ser consciente"
(BAUMHART, 1971, p. 94). Embora muito útil este conceito não é muito prático
tendo em vista que o certo não obedece a um padrão fixo; isto causa problemas por
tratar-se de um conceito subjetivo demais.
Além disto, o conceito de Boa-Fé traz distorções como o entendimento, por
exemplo, de que "Ético é o homem que, de boa-fé, não ama; não-ético é o homem
que ama porque, apesar de sua convicção de não dever amar, quer evitar a
desaprovação social" (BAUMHART, 1971, p. 94). Ou, em outras palavras, quem faz
o que a sociedade desaprova, pois acredita que aquilo é correto, é mais ético do que
aquele que faz o que a sociedade aprova, não acreditando que aquilo seja ético.
Ético significa padrões aceitos em termos do nosso bem-estar
pessoal e do social [regra de ouro]; o que acreditamos estar certo [Boa-Fé]. Mas o que me confunde... é a possibilidade de que eu tenha sido mal orientado ou de que outros tenham sido mediocremente educados. Talvez cada um de nós julgue saber o que é ético, mas divergimos uns dos outros. Como será possível, então, afirmar quem está certo? (BAUMHART, 1971, p. 38)
26
Para resolver estes problemas e dilemas éticos de uma forma objetiva,
aplicável também para as empresas, é extremamente útil a existência de códigos de
ética formais, abrangendo a mais variada gama de situações. Ideal, mas talvez não
possível, seria a existência de um código universal de ética empresarial, a exemplo
daquele do CONAR e do Código do Conselho Federal de Administração. Neste
caso, é certo que, dada a natureza de qualquer código, deve-se ter em mente que
ele pode estar errado, que pode e deve ser aperfeiçoado ao longo do tempo, mas é
um padrão objetivamente aceito, inclusive "aquelas com um Outro que a impõe"
(ECO; MARTINI, 2000).
Claro que os códigos de ética de qualquer grupo, inclusive das empresas,
deverão fazer referência às leis da sociedade onde estão inseridos, tendo validade
apenas no que o código seja superior à lei e também onde a lei é omissa. Qualquer
código de ética que fira as leis deve ser corrigido tão logo se perceba isto. Nas
empresas transnacionais o código deve ser adaptado para não ofender as leis e a
ética de cada país onde estão inseridas.
Um código de ética formal é importante para o desenvolvimento da sociedade
que o criou, por isso é necessário estar de acordo independentemente dele estar
correto ou não.14 Comportamento ético, portanto, é agir seguindo o código, lutar para
corrigir o que estiver incorreto, agir de acordo com a regra de ouro e a Boa-Fé
apenas naquilo que está omisso.
Caso o indivíduo falhe na tentativa de mudança do que discorda no sistema,
só resta se submeter ou romper com ele. Quem age à margem do código de ética de
uma sociedade é um desertor e sua ação deve ser avaliada para decidir se cabe
punição ou modificação do código. Assim, os administradores do código não devem,
de modo algum, ficar omissos, pois a omissão estimula a proliferação da deserção.
Por fim, "é útil ter presente a distinção entre: (1) o que uma pessoa sabe ou
acredita ser ético (seus padrões, ideais ou códigos) e (2) o que uma pessoa faz (as
suas ações). Há, freqüentemente, uma disparidade entre os padrões de uma pessoa
e o seu comportamento; usualmente, os primeiros são superiores." (BAUMHART,
1971, p. 42). Muitas vezes em uma pesquisa "se os nossos depoentes parecem, por 14 Vide item 2.7.1
27
vezes, irrealistas, é possível de eles estarem falando sobre os seus padrões e o
leitor pensar que eles se referem à suas ações" (BAUMHART, 1971, p. 42).
Se esta diferença entre a retórica e a prática for aplicável à boa parte das
pesquisas sobre os motivos que levam ao investimento em responsabilidade social,
explicaria a surpresa demonstrada na Introdução deste trabalho com relação ao
percentual de empresas que afirmam atuarem apenas por ética e civismo, em um
mercado pouco civil, desertor e desconfiado que exclui ou escolhe empresas
baseadas em ações pouco divulgadas. Levou-se isto em consideração nas análises
das pesquisas realizadas para este trabalho, citadas ao longo do mesmo. Para
facilitar a referência a esta constatação ela foi chamada de Efeito da Auto-Visão.
Para este estudo utiliza-se o conceito de Ético, de Baumhart e as definições
de Ética, Ética de Gestão e Ética Deontológica do Dicionário Oxford de Filosofia
(BLACKBURN, 1997). As referências à Ética para discutir conceitos aplicados à
gestão limitam-se à Ética de Gestão.
2.7.2. - Ética nos Negócios
"A imagem popular do homem de negócios inclui a noção de que ele é
relativamente desprovido de ética." (BAUMHART, 1971, p. 44).
A frase acima, conclusão de uma pesquisa realizada em 1958, não diverge de
Aristóteles que distinguiu duas categorias de comércio existentes na época: o
eikonomikos ou pequeno comércio doméstico, que aprovava e considerava
fundamental para o funcionamento de qualquer sociedade; e o chrematisike ou
comércio com fim no lucro. Aristóteles declarou o chrematisike uma atividade
totalmente desprovida de virtude e chamou de parasitas os engajados nesta prática
que acreditava ser puramente egoísta. Apenas excluídos à margem da sociedade,
não os respeitáveis cidadãos, se engajavam na prática do chrematisike.
(SOLOMON, 1997).
"This, on a large historical canvas, is the history of business ethics - the
wholesale attack on business and its practices." (SOLOMON, 1997, p. 355). Por
longo tempo, esta tem sido a imagem que se relaciona à prática dos negócios.
Mas se já foi condenada pela filosofia e pela religião, a prática dos negócios
foi também exaltada por elas nos tempos modernos. "John Calvin and then the
28
English Puritans taugh the virtues of thrift and enterprise, and Adam Smith canonized
the new faith in 1776 his masterwork , The Wealth of Nations.[...] With Adam Simith's
classic work, chrematisike became the central institution and primary virtue of
modern society." (SOLOMON, 1997, p. 354).
Adam Smith, que já lecionou Filosofia da Moral em Glasgow (1760), não é um
defensor do burguês ou do homem de negócios, "mas desconfiado de seus motivos
e consciente das necessidades das grandes massas trabalhadoras. Mas não é sua
finalidade advogar os interesses de qualquer classe trabalhadora. Está preocupado
em promover a riqueza pela nação inteira” (HEILBRONER, 1996, p. 53). De certa
forma está preocupado com a Responsabilidade Econômica da empresa,
acreditando que seus efeitos positivos na economia e nas nações justificam a busca
pelo lucro. Em outras palavras, não importa se o burguês busca o lucro, pois no
caminho para a sua obtenção gera a riqueza das nações. O meio (gerar riqueza)
está justificando o fim (busca do lucro). Certamente pode-se notar em Riquezas das
Nações a percepção de Smith do oportunismo burguês, como no trecho seguinte:
Nossos comerciantes e donos de manufaturas reclamam muito dos
efeitos perniciosos dos altos salários, aumentando o preço das mercadorias, e assim diminuindo a venda de seus produtos tantos no país como no exterior. Nada dizem sobre os efeitos prejudiciais dos lucros altos. Silenciam sobre os efeitos danosos de seus próprios ganhos. Queixam-se somente dos ganhos dos outros. (SMITH, 1996, p. 146)
O fato é que, atualmente, os...
Lucros não são mais condenados juntos com a avareza nos sermões
morais, e as corporações não são mais consideradas monolitos sem rosto, sem alma e sem moral, [isoladas da sociedade onde se localiza]. A nova preocupação é justamente como o lucro deve ser pensado no contexto mais abrangente da produtividade e responsabilidade social, e como as empresas como comunidades complexas podem servir da melhor maneira os empregados e a comunidade ao redor.[...] Deixando bem claro, os negócios visam o lucro, mas o fazem apenas fornecendo bens e serviços de qualidade, gerando empregos e se ajustando à comunidade. [...] Lucros não são tanto um fim [...,]são um meio de construir o negócio e de recompensar funcionários, executivos e investidores. (SOLOMON, 1997, p. 354)
Para finalizar, Décio Zylbersztajn afirma que "se o comportamento ético desse
retorno financeiro, todos já o teriam adotado". (ZYLBERSZTAJN apud COHEN,
2003, p. 38). Complementarmente, entende-se que se (utopicamente) todos
29
adotassem a ética, e excluíssem quem não a adotou, o retorno financeiro seria
inimaginável.
2.7.3. - Códigos de Ética
Como dito anteriormente, os códigos de ética formais têm fundamental
importância na prática da ética e na resolução de conflitos e dilemas, sendo um
instrumento capaz tanto de avaliar objetivamente e de orientar o comportamento dos
componentes do grupo, como de dissolver dúvidas e dilemas. Ter um código de
ética formal, além de ser um passo importante na direção da ética de gestão, é um
importante sinalizador da intenção de ser realmente ético.
O código de ética ou de compromisso social é um instrumento de
realização da visão e da missão da empresa, orienta suas ações e explicita sua postura social a todos com quem mantêm relações. O código de ética e/ou de compromisso social e o comprometimento da alta gestão com sua disseminação e cumprimento são bases de sustentação da empresa socialmente responsável. A formalização dos compromissos éticos da empresa é importante para que ela possa se comunicar de forma consistente com todos os parceiros. Dado o dinamismo do contexto social é necessário criar mecanismos de atualização do código de ética e promover a participação de todos os envolvidos. (www.ethos.org.br)
Em Feitas para Durar, Collins & Porras (1995) fazem uma pergunta sobre as
declarações de valores que aqui se estende para os códigos de Ética: como se pode
ter certeza que o que está presente nos códigos de ética das empresas altamente
visionárias representam mais do que um bando de chavões que soam bem aos
ouvidos - palavras sem nenhum efeito, usadas simplesmente para apaziguar,
manipular ou confundir? Os mesmos oferecem duas respostas: em primeiro lugar,
"pesquisas em psicologia social apresentam fortes indícios de que, quando pessoas
adotam publicamente um ponto de vista, é muito mais provável que elas ajam de
forma coerente com ele mesmo que não tivessem este ponto de vista antes”.
(COLLINS; PORRAS, 1995, p. 112)15. Em outras palavras, o simples fato de
formalizar um código de Ética influencia o comportamento com respeito à coerência
deste código. 15 Collins & Porras, 1995, citando The Psycology of Attitude Change and Social Influence.
30
Em segundo lugar - e o mais importante - as empresas visionárias não
declaram simplesmente suas ideologias; elas tomam medidas para que estas
impregnem toda a organização e transcendam qualquer líder individual.
• Doutrinam os funcionários e criam culturas fortes em torno da
ideologia;
• Educam e selecionam os membros da alta gerência com base na
adaptação com a ideologia central;
• Possuem alinhamento coerente entra a ideologia e outros aspectos
como metas, estratégia, tática e projeto de organização.
2.7.4. - Dilemas Éticos e a Responsabilidade Social
Um dilema ético se configura quando cada uma das opções possíveis viola
um certo princípio ético importante (BLACKBURN, 1997) ou quando, existindo mais
de duas partes interessadas, cada uma das opções da primeira alternadamente
beneficia e prejudica a segunda e a terceira (BAUMHART, 1971). Acredita-se ser
indiscutivelmente correta a busca pelo lucro e pela remuneração dos acionistas (e,
portanto, ética), mas, conforme abordado na Introdução deste trabalho, os meios
para a obtenção destes lucros é que são discutíveis.
Uma ação que gere lucros, mas que não seja ética, compõe boa parte dos
dilemas vivenciados pelos gerentes e diretores na grande maioria das empresas. No
entanto, estes dilemas podem ser resolvidos de forma relativamente simples, ou até
mesmo diluídos através dos códigos de ética. Por exemplo, nas empresas que
compõem o grupo UTC (United Tecnologies Corporation) - dentre elas a OTIS16 - a
declaração de valores e o código de ética eram amplamente divulgados de forma a
se tornarem instrumentos de tomadas de decisão. Como dito no código da UTC,
adotado há bastante tempo: "É um dos objetivos básicos da UTC obter lucros de
forma ética, a fim de poder investir no futuro da Empresa e de proporcionar uma
rentabilidade superior aos investimentos dos nossos acionistas." (UTC, Código de
Ética, 199_.) 16 Empresa onde trabalhei.
31
Percebe-se que a busca pela maximização do lucro já não é um princípio
ético para a UTC, e sim buscar e maximizar o lucro de forma ética. Esta sutil
modificação do conceito do que é ético diluiu o dilema, ou seja, uma ação que gere
lucros, embora não seja ética, também já não é justificada pela obtenção do lucro.
Ademais, não realizá-la não fere a nenhum princípio ético da empresa, muito pelo
contrário, se torna a única opção aceitável. Se esta sutil diferença fosse adotada e praticada por todas as empresas a realidade seria significativamente diferente,
notadamente no que diz respeito à corrupção que afeta, de diversas formas, todas
as esferas da sociedade.
Convém notar, entretanto, que pelo fato de nem todas as empresas adotarem
um comportamento ético semelhante, uma parcela do lucro renunciado em nome da
ética será apropriada pelas empresas que não compartilham deste valor. Na OTIS,
por exemplo, freqüentemente havia pesquisas que questionavam se os funcionários
estavam preparados para perder uma negociação por levarem em consideração a
ética e se acreditavam que seus superiores também assim o fariam. Ou seja, apesar
dos benefícios de longo prazo, ser ético num mundo de desertores traz, de forma
mais imediata, uma certa perda de competitividade; para se manter ético faz-se
necessário estar preparado para conviver com a ética, e isto gera um dilema: ser
ético e dar prejuízo (ou menos lucro) ou dar lucro e não ser ético? A essa questão se
refere Jack Wesh (1991), em memorando a executivos da GE:
Números e valores. Nós não temos a resposta definitiva - pelo menos
eu não tenho. Aqueles que fazem os números e compartilham nossos valores progridem e sobem. Aqueles que erram nos números e compartilham nossos valores têm uma segunda chance. Aqueles que não têm valores nem números - nem preciso dizer. O problema é com aqueles que fazem os números, mas não compartilham os valores. [...] Nós tentamos persuadi-los; nós lutamos contra eles; nós sofremos com estas pessoas. (WELSH, 1991 apud COLLINS; PORRAS, 1995, p. 113)
Por outro lado, o comportamento ético facilita extremamente a negociação
entre as partes que reconhecem a ética mútua, possibilitando, inclusive, atingir
certos objetivos difíceis como a fidelização de clientes.
Outros dilemas, porém, são de resolução mais complexa, a exemplo da
própria Responsabilidade Social Empresarial. Investir no social (desde que a ação
tenha conseqüências positivas, questiona-se, por exemplo, assistencialismos),
32
certamente, é uma atitude correta do ponto de vista de valores e princípios, porém,
tais investimentos geram despesas sem retorno no exercício, despesas estas que,
como tal, reduzem o lucro. Ora, como já dito anteriormente, a empresa ética já tem
seu lucro limitado por só maximizá-lo no limite do ético e, por isso, acaba sendo
duplamente penalizada em um mundo de desertores. De certa forma isto gera o
seguinte dilema: não investir no social não é o correto, investir fere o princípio da
competitividade no curto prazo. Para solucioná-lo (de forma a não ferir nenhum dos
princípios) pode-se adotar uma perspectiva de limitação dos lucros futuros em
decorrência dos problemas sociais e econômicos da sociedade onde a empresa está
inserida, ou ainda, com perspectiva de retorno de médio a longo prazo, através de
melhorias na sociedade e suas relações. Sendo assim, uma estratégia de
maximização dos lucros legítima a longo prazo.17
Outro dilema está em legitimar ou não a divulgação das ações sociais das
empresas. Em primeiro lugar vem a discussão sobre o altruísmo e a filantropia. É
preciso levar em conta que o investimento em ações sociais visa beneficiar o
binômio sociedade e empresa. Caso a empresa considere melhor não divulgar suas
ações poderá ser prejudicada, principalmente frente a um concorrente que assim
proceda. Desta forma, entende-se que a não divulgação pode ferir o princípio de
atender, com tais ações, tanto a sociedade quanto a empresa. Dito de outra forma, o
objetivo de ser favorável a ambos não está sendo alcançado.
Além disto, tanto no caso da ética, quanto no caso da responsabilidade social,
em um parâmetro extremo, a depender do montante investido ou do lucro
renunciado - levando em consideração que as demais empresas não agem da
mesma forma - o retorno de longo prazo pode não chegar a tempo de manter a
empresa competitiva. Sendo assim, faz-se necessário, além do retorno de longo
prazo, um "fôlego" de prazo mais curto para perpetuar os investimentos em
responsabilidade social sem comprometer a competitividade e a lucratividade. Para
que isso seja possível deve-se considerar correto se capitalizar na ética e na
Responsabilidade Social Empresarial através de um marketing social ético e
legítimo. Desta forma, não se entende que a ética da divulgação das ações sociais
de uma empresa que legitimamente esteja investindo no social deva ser
questionada, muito embora esteja presente na consciência coletiva a idéia de que na 17 Vide item 2.8.
33
caridade ou na virtude "o que se faz com uma mão não se deve deixar nem que a
outra saiba".
Por outro lado, como será mostrado adiante, alguns acreditam que
responsabilidade social não seja caridade, nem virtude, nem ação para melhorar a
sociedade e aumentar a rentabilidade do mercado no futuro, nem mesmo uma
estratégia de médio e longo prazos. Seria, sim, uma ação estratégica de
diferenciação de curto prazo ou, até mesmo, uma ação exclusivamente de
marketing. Estes não estariam atuando de uma forma plenamente legítima, porém
compõem uma parte considerável dos recursos disponíveis para o Terceiro Setor.
Neste caso, têm-se os dois lados de uma mesma moeda: condenar ou proibir
a ação de marketing destas empresas imediatistas reduziria a oferta de capital para
o Terceiro Setor no curto prazo; aceitar estas ações tornaria difícil identificar quais
são as empresas que investem de fato, reduzindo sua competitividade. Segue-se a
discussão do tema dilemas éticos considerando ético divulgar as ações sociais de
qualquer dos tipos de empresa.
Ainda que o marketing social para a divulgação das ações das empresas seja
ético, surgem alguns dilemas no que tange à forma desta divulgação. Isto porque
ela, além de enganar alguns consumidores, prejudica as empresas responsáveis e
virtuosas, podendo vir a interferir na própria Responsabilidade Social Empresarial e,
em última instância, a atuação do Terceiro Setor.
A seguir, serão apresentados alguns exemplos destes dilemas de marketing e
Responsabilidade Social, uma parte deles será analisada à luz da teoria dos jogos.
2.7.4.1. - Pra que fazer se posso lucrar mais não fazendo?
Este dilema pode vir a comprometer o nível de sucesso da atuação com
relação à sustentabilidade. Por exemplo, o investimento de um grupo pequeno de
empresas em educação e saúde não terá o mesmo vulto e resultado se todas ou a
grande maioria das empresas investirem para resolver os mesmos problemas.
Quando se diz que: "A revolução dos Mercados demonstrou que a empresa é
a principal força de crescimento e desenvolvimento" (GRAYSON; HODGES, 2002, p.
43), está se pensando no conjunto de empresas, muito embora existam
organizações que individualmente concentram mais riquezas que muitos países.
34
Como exemplo tomam-se duas empresas do mesmo setor, localizadas no
estado de São Paulo, que sejam capazes de investir $10mi/ano cada uma em um
problema social do Estado; considere-se que para cada $10mi/ano aplicados na
educação, seja gerado no setor um ganho de produtividade que represente
$11mi/ano. Se ambas as empresas investissem (seriam $20mi/ano), o retorno seria
de $22mi/ano, o que, abatido o investimento, produziria um retorno de $1mi/ano
para cada. Caso somente uma das empresas "A" ou a "B" resolvesse investir, o
retorno seria de $5,5 mi/ano para cada, visto que são do mesmo setor e afetadas da
mesma forma pelo ganho na educação. Abatido o investimento realizado pela
empresa resta a ela $-4,5 mi/ano. Caso nenhuma delas investisse o ganho seria
zero. Isso configura a seguinte matriz de pay-offs.
Tabela 02 – PRA QUE FAZER SE LUCRO MAIS NÃO FAZENDO?
Empresa B
OP_A OP_B
OP_A (1 ; 1) Pareto (-4,5 , 5,5) Empresa
A OP_B (5,5 ; -4,5) (0 , 0)Nash
Fonte: Autoria própria
Nota-se que o equilíbrio de Nash ocorrerá em ambos não investindo. O
equilíbrio de Pareto (ambos investindo) além de benéfico para as empresas também
o é para a população. Apesar da ética de qualquer das empresas envolvidas, a
única forma capaz de possibilitar a resolução deste dilema, e levar o equilíbrio do
jogo para Pareto, seria garantir outras formas de retorno como a simpatia pela
marca, a produtividade por motivação de trabalhar em uma empresa.
2.7.4.2. - Tirando dos pobres para dar aos pobres
Numa publicidade em massa a empresa divulga suas ações esperando uma
diferenciação e, por conseqüência, a cobrança de um preço prêmio. O público
atingido varia em termos de classe social e nível cultural. Como se entende que o
35
conceito de solidariedade atinja a todos esses níveis, acredita-se também que a
compra motivada por este conceito abranja, sem restrições, a todos. Desta forma,
todos estariam pagando o mesmo preço prêmio por uma compra solidária; todos
poderiam, em maior e menor grau, ser influenciados a comprar por solidariedade,
independentemente do seu poder aquisitivo e das condições para pagar o preço
prêmio cobrado.
Proporcionalmente falando, a diferença de preço entre a marca usualmente
comprada e esta escolha solidária pesa muito mais no bolso das classes C, D e E do
que no das classes A1, A2 e B. Portanto, as classes que fazem mais esforço
econômico para a compra solidária são justamente aquelas que têm menores
condições financeiras para realizar este esforço. São também as que menos têm
capacidade de discernir sobre a sua falta de condições financeiras para comprar.
Logo, não se acredita ser ético este tipo de ação em mídia de massa, como no caso
da TV aberta, por exemplo.
Por outro lado, se os competidores estão utilizando responsabilidade social na
mídia de massa, aquele que compete com ele e que não a utiliza perderá em
competitividade, visto que esta mídia atinge a um número maior de pessoas, mesmo
as das classes A1, A2 e B. Se ambos utilizarem tal mídia o ganho será menor do
que se nenhum investisse em mídia de massa, pois o custo é mais alto. Numa
avaliação em teoria dos jogos, sendo OP_A publicidade com mídia de massa e
OP_B publicidade sem mídia de massa, tem-se o seguinte:
Tabela 03 – TIRANDO DOS POBRES PARA DAR AOS POBRES
Empresa B
OP_A OP_B
OP_A (Ganho Peq., Ganho Peq.) Nash (Ganha Alto,Perde) Empresa
A OP_B (Perde, Ganha Alto) (Ganho Med., Ganho Med.)Pareto
Fonte: Autoria própria
36
Logo, o equilíbrio de Nash ocorre com ambos investindo em mídia de massa.
O equilíbrio de Pareto (ambos não investindo), além de benéfico para as empresas
também o é para a população. Apesar da ética de qualquer das empresas
envolvidas, a única forma de possibilitar a resolução deste dilema e levar o equilíbrio
do jogo para Pareto seria formalizar que não se deve fazer publicidade sobre
responsabilidade social nas mídias de massa uniforme como a TV aberta; isto seria
possível com uma alteração no código do CONAR. Opções interessantes seriam TV
por assinatura, Internet, alguns jornais e revistas.
2.7.4.3 – Gastando mais para falar do que para fazer
Quanto seria uma verba de publicidade ética para divulgar as ações sociais
das empresas? 10% do investido? 100% do investido? 500% do investido? Segundo
o IPEA (2001) diversas empresas decidem até hoje não divulgar. Porém, algumas já
estão cedendo nesta decisão.
Conforme explicado no item anterior, se os competidores X estão utilizando o
conceito de responsabilidade social de forma maciça na mídia e seu concorrente Y
não a utilizar, este perde uma fatia do mercado (share), visto que a publicidade que
utiliza responsabilidade social atinge seus consumidores com um valor ao qual ele é
sensível. De outra forma, se ambos a utilizarem o ganho é menor do que se nenhum
investisse em publicidade de forma maciça, pois além do consumidor ter dificuldades
de distinguir entre uma marca ou a outra, chega-se a um ponto onde "orçamentos
muito amplos não podem gerar muitas repostas adicionais porque o mercado-alvo se
torna muito familiar com a marca" bem como a existência de "um limite para a
demanda potencial total de qualquer produto” (KOTLER, 1998, p. 686).
Numa avaliação em teoria dos jogos, sendo OP_C publicidade maciça e
OP_D publicidade leve:
37
Tabela 04 – GASTANDO MAIS PARA FALAR QUE PARA FAZER
Empresa Y
OP_C OP_D
OP_C (Ganho Peq., Ganho Peq.)Nash (Ganha Alto,Perde) Empresa
X OP_D (Perde, Ganha Alto) (Ganho Med., Ganho Med.)Pareto
Fonte: Autoria própria
Logo, o equilíbrio de Nash ocorre com ambos investindo maciçamente em
publicidade. 18 O equilíbrio de Pareto (ambos não investindo), além de benéfico para
as empresas, também é benéfico para o Terceiro Setor, pois o valor investido em
publicidade poderia ser revertido em investimento.
Apesar da ética de qualquer das empresas envolvidas, a única possibilidade
de resolução deste dilema e de levar o equilíbrio do jogo para Pareto seria formalizar
que não se deve fazer publicidade maciça sobre responsabilidade social; isto seria
possível também com uma alteração no código do CONAR. Ademais, outras opções
válidas seriam: a utilização de selo social nas embalagens e assinando as
campanhas publicitárias da empresa; patrocínio na divulgação de ONGs com
assinatura da empresa (desta forma, além do nome ser associado à ação, a
divulgação da ONG fomentaria o investimento na mesma ONG ou na causa);
campanhas regionais; informação do que é realizado pela empresa nas embalagens
dos produtos da mesma.
2.8. - Idealismo Pragmático
O teste para uma inteligência fora do comum é a capacidade de ter
duas idéias opostas em mente ao mesmo tempo e ainda assim ser capaz de funcionar. (F. SCOTT FITZGERALD, s. r., apud COLLINS; PORRAS, 1995, p. 76)
18 Marcos Alban, no Mestrado Profissional em Administração, apresentou o modelo de Stakelberg com uma matriz de Pay-offs muito semelhante, porém sem chegar a um equilíbrio, onde cada nova rodada do jogo cada player aumentava o investimento de publicidade, alternando a liderança e perdendo em relação a não entrar neste jogo.
38
Uma questão que sempre está associada à responsabilidade social é sua
relação (ou não) com o conceito de filantropia empresarial. O que se faz é feito
desinteressada e voluntariamente, pautado em valores? Ou nestas intenções é
também recorrente o interesse pelo lucro? Estas alternativas, a princípio
antagônicas, aparentemente podem conviver de forma pacífica em certas empresas.
A essa aparente ambigüidade, Collins & Porras (1995) dão o nome Idealismo
Pragmático.
Para entender o conceito do Idealismo Pragmático, proposto por Collins &
Porras (1995) no livro Feitas para Durar como sendo um dos fatores presentes nas
empresas visionárias e, de certa forma, presente nas Empresas Virtuosas, cita-se o
caso da Merk, também exposto no livro. A Merck optou por desenvolver e distribuir o
Mectizan, um remédio para curar a "oncocercíase", uma doença que contagiou mais
de um milhão de pessoas no Terceiro Mundo (atuais países periféricos). Mesmo
sabendo que o projeto não teria grande retorno, a Merck foi adiante e, na falta de
compradores governamentais, distribuiu o produto gratuitamente, participando
diretamente dos esforços de distribuição para garantir que o remédio realmente
chegasse aos milhões de pessoas em risco por causa da doença.
Em 1991, no relatório anual, as declarações do diretor-executivo da Merck, P
Roy Vagelos, aparentemente pareciam explicar o porquê desta ação sem fins
lucrativos. Declarou que: "Acima de tudo, temos que lembrar que nosso sucesso nos
negócios significa vencer as doenças e ajudar a humanidade”. (VAGELOS, 1991,
apud COLLINS; PORRAS, 1995, p. 78) Sua declaração estava em sintonia com
George Merck II que, 56 anos antes, declarou: "[Nós] somos trabalhadores
industriais genuinamente inspirados pelos ideais de progresso da ciência médica e
de prestação de serviços à humanidade." Vagelos também comentou sobre outras
ações aparentemente realizadas por ideais e não por lucro:
Há quinze anos, quando fui ao Japão pela primeira vez, empresários
japoneses me disseram que foi a Merck que levou a estreptomicina ao Japão depois da Segunda Guerra Mundial para acabar com a tuberculose que estava destruindo a sociedade. Nós fizemos isso. Nós não ganhamos dinheiro com isso. Mas não é por acaso que a Merck é hoje a maior empresa farmacêutica norte-americana instalada no Japão. As conseqüências de longo prazo de [tais ações] nem sempre são claras, mas de alguma forma eu acho que sempre acabam dando algum retorno. (VAGELOS, 1991, apud COLLINS; PORRAS, 1995, p. 79)
39
Será que foram exclusivamente os ideais da Merck que a levaram a tomar tais
decisões? Ou será que a Merck tomou esta decisão por questões pragmáticas -
bons negócios de longo prazo e boa prática de relações públicas?
Nossa resposta: as duas coisas. Os ideais da Merck tiveram um papel
muito importante na decisão e tudo indica que ela teria levado o projeto adiante mesmo que ele não trouxesse benefícios de longo prazo para a empresa. Mas também há indícios de que a Merck agiu supondo que estes atos de boa-fé, "de alguma forma... acabam dando algum retorno". (COLLINS; PORRAS, 1995, 79).
Ao longo de grande parte de sua história, a Merck mostrou ter ideais nobres e
interesse pragmático. Georg Merck II explicou este paradoxo em 1950:
Eu quero expressar os princípios que nós, na nossa empresa, nos
empenhamos para seguir [...]. Eles se resumem no seguinte: nós tentamos lembrar que os remédios são para o paciente. Tentamos não esquecer nunca que os remédios são para pessoas, não para trazer lucros. Os lucros são uma conseqüência, e se sempre nos lembramos disto, eles também nunca deixaram de vir. Quanto mais nos lembrávamos disto, maiores eram os lucros. (MERCK II, 1950, apud COLLINS; PORRAS, 1995, p. 79-80).
Esta concepção é muito semelhante com o paradoxo do hedonismo,
"segundo o qual os agentes que procuram deliberadamente maximizar seus próprios
prazeres têm maior probabilidade de não conseguirem fazê-lo do que aqueles que
se importam com outras coisas e com outras pessoas, para benefício destas."
(BLACKBURN, 1997, p. 285).
Collins & Porras (1995) levantam e reconhecem duas questões sobre o
Idealismo Pragmático da Merck, que poderiam impedir a generalização do conceito.
Em primeiro lugar, os autores reconhecem que, à primeira vista, é relativamente fácil
para uma empresa fabricante de remédios que salvam vidas seguir ideais
inspiradores. Em contraposição a isso, eles comparam a trajetória da Merck com a
da Pfizer, do mesmo setor (com outras características semelhantes), constatando
que a Merck trilhou um caminho mais ideológico. Adicionando a isso - observando a
tabela A 4 do anexo 3 do livro - vê-se que as empresas tabagistas, cujo produto é
acusado de causar mal à saúde (em contraposição aos remédios), também
apresentam o Idealismo Pragmático, em grau semelhante às empresas de diversos
setores, mesmo que a ideologia presente nas empresas tabagistas não seja tão
nobre como aquela presente na Merck.
40
Posteriormente, os autores inferem que uma empresa lucrativa como a Merck
tinha condições de bancar seus ideais nobres. Em 1925, quando George Merck II
assumiu a presidência depois de seu pai, a empresa já tinha uma trajetória de
sucesso nos negócios e um vultuoso fundo de reserva. Então, sugere-se a questão:
será que ter ideais nobres é um luxo para empresas como a Merk que são tão bem
sucedidas a ponto de ter condições de proclamar uma ideologia? Não. "Nós
descobrimos que ideais nobres - uma ideologia central - sempre existiram nas
empresas visionárias não só quando elas eram bem sucedidas, mas também
quando elas estavam lutando apenas para sobreviver” (COLLINS; PORRAS, 1995,
p. 81). Corroborando este argumento, citam o caso da Sony cujo fundador, Masaru
Ibuka, menos de 10 meses após a fundação, redigiu um "prospecto" que incluía
valores e ideais nobres, que objetivavam também o lucro, com os quais a Sony se
manteve fiel. Dentre outras coisas vale a pena citar o seguinte:
Se for possível criar condições em que as pessoas possam se unir
com um forte espírito de trabalho em equipe e exercer sua capacidade tecnológica do fundo do coração... Esta organização poderia proporcionar um prazer incalculável e trazer benefícios incalculáveis. ...Pessoas com formas de pensar parecidas naturalmente se unem para embarcar nestes ideais. (IBUKA, 1946, apud COLLINS; PORRAS, 1995, p. 82).
Outros exemplos de Idealismo Pragmático x Pragmatismo citados pelos
autores: Sony x Kenwood; HP x Texas Instruments; J&J x Bristol Meyers; Boeing x
McDonnell Douglas; Motorola x Zenith; Mariott x Howard Johnson; e, apesar da
imagem manchada de ambas e com um patamar um pouco inferior de nobreza da
ideologia, citam FORD x GM e Philip Morris x R.J. Reynolds.
Ao final, os autores concluem que não encontraram nenhum valor específico
que aparecesse de forma consistente na ideologia de todas as empresas visionárias.
Em suma, nós não encontramos um conteúdo ideológico específico
essencial para que uma empresa seja visionária. Nossas pesquisas indicam que a autenticidade da ideologia e a coerência da empresa com relação a esta ideologia contam mais do que o conteúdo da ideologia. [...] Nós chegamos à conclusão de que a questão crítica não é se a empresa tem a ideologia central "certa"ou "digna de estima", mas se ela tem uma ideologia central - que agrade ou não - para orientar e inspirar as pessoas que trabalham na empresa. (COLLINS; PORRAS, 1995, 107)
41
2.9. - A empresa virtuosa
Será que todos que investem em responsabilidade social estão pensando no
retorno financeiro para a empresa? A esta pergunta se pode responder
negativamente, pois se entende que existem os que o fazem por convicções
ideológicas. Trata-se de pessoas e empresas que têm, certamente, um papel
importante para este estudo e é sobre elas que se tratará neste item.
Mas, o que levaria uma pessoa a ser verdadeiramente menos imediatista, a
pensar no futuro, a fazer o certo e a construir uma história melhor e mais humana?
Esta não é uma pergunta fácil de ser respondida, assim como também é passível de
compreensão por parte dos mais variados campos da ciência, como a Filosofia, a
Psicologia, a Sociologia. Não cabe, no âmbito deste estudo, tentar respondê-la.
Entretanto, acredita-se na existência de pessoas e empresas que atuam com a visão
de um futuro melhor para a sociedade e, conseqüentemente, no caso das pessoas,
melhor para seus filhos e netos; no caso das empresas, melhor para a sobrevivência
delas mesmas, do meio ambiente, do mercado e até mesmo do capitalismo, em
suma, para a sustentabilidade em geral que afeta a sustentabilidade em particular.
Acredita-se, também, que existam pessoas e empresas que agem segundo
seus valores, por crer no correto, por entender que são responsáveis pela
construção e manutenção de suas relações interpessoais ou empresariais, como
demonstram as palavras de Eco: "Estou convencido também que existem não
poucas pessoas que agem com retidão, pelo menos nas circunstâncias ordinárias da
vida, sem fazer referência a um fundamento religioso da existência humana." (ECO;
MARTINI, 2000, p. 81). Desta forma, ajudam a construir um futuro melhor, mas para
que este futuro seja mais humano, existem traços de caráter que regem as ações
destas pessoas e empresas, elas pensam no outro.
Entende-se que estas pessoas ou empresas que conjugam tais perfis
descritos acima, embora não sejam muitas, tenham grande importância para a
sociedade, sejam prováveis participantes ativas do Terceiro Setor e prováveis
empresas verdadeiramente cidadãs, portanto, de grande relevância para o tema
Responsabilidade Social e, conseqüentemente, para este estudo.
Mas, o que caracteriza estas pessoas e empresas? Responder a mais esta
questão demandaria um estudo específico, entretanto, propõe-se uma classe de
pessoas e empresas que detenham as características enumeradas a seguir:
42
• Fé;
• Esperança;
• Caridade.
Trata-se de 3 virtudes teologais, que em um conceito aberto e não teologal
significam:
• Fé → Agir de acordo com seus compromissos;
• Esperança → Agir de acordo com o futuro;
• Caridade (Solidariedade) → Agir eticamente, pensar no outro.
Segue-se, aqui, um pouco da discussão filosófica entre Umberto Eco e o
Cardeal Carlo Maria Martini no livro Em que crêem os que não crêem (2000), porém
esta classificação não se resume ao livro.
Mas, porque virtudes? O que tem a ver virtudes com negócios? Uma das
definições que aparecem no Dicionário Oxford de Filosofia é a seguinte: "Uma
Virtude é um traço de caráter merecedor de admiração, tornando seu portador
melhor, quer seja do ponto de vista moral ou intelectual, quer na conduta de
matérias específicas." (BLACKBURN, 1997, p. 405).
Tem-se observado que estas pessoas e empresas virtuosas não buscam
prêmios e não fazem alarde do que estão fazendo, mas da necessidade de fazê-lo.
É claro que elas também são movidas pelo lucro, no mais nobre exemplo do
Idealismo Pragmático, mas pode-se dizer que as Empresas Virtuosas são as
empresas do futuro. É baseando-se nelas que se deve avaliar, a ética e a
responsabilidade das demais empresas, uma espécie de Benchmark de
Responsabilidade Social e ética. Afinal, como dito por Eco: "A força de uma ética
julga-se através do comportamento dos santos, não dos insipientes..." (ECO;
MARTINI, 2000, p. 81).
Assim, como se devem exaltar as empresas virtuosas, elas mesmas excluem
de suas relações comerciais empresas com níveis éticos inferiores. Pessoas
virtuosas, quando sabem de algo que denigre o caráter ou imagem de uma pessoa
ou empresa também as exclui de suas relações pessoais e comerciais. Cabe,
portanto, às outras empresas se espelharem e se mirarem nas Empresas Virtuosas
se quiserem fazer parte deste futuro, reforçando a idéia do Benchmark:
43
As repúblicas mantêm-se pela virtude. As monarquias e impérios podem confiar na força física, ou na sabedoria e bondade de um ou de poucos. As repúblicas são governadas por muitos e a virtude do povo é a vida da nação. (IRELAND, s.r. apud BAUMHART, 1971, p. 19)
O problema é que boa parte das empresas e pessoas são tão imediatistas
que não enxergam o futuro. Lucram e tiram vantagem o quanto podem.
2.9.1. - A Fé, a Esperança e a Caridade:
O mini dicionário Aurélio define Fé como sendo:
Fé sf 1. Crença religiosa. 2. Conjunto de dogmas e doutrinas que
constituem um culto. 3.Rel. A primeira das virtudes teologais: adesão e anuência pessoal a Deus. 4. Firmeza na execução duma promessa ou compromisso. 5. Crença, confiança. 6. Testemunho autêntico, escrito, de certos funcionários, que tem força em juízo. (HOLANDA, 2000, p. 316)
Os significados de 1 a 3 são teologais e o significado 6 é jurídico, não
interessam particularmente a este estudo. Note-se, porém que os significados 4 e 5
são altamente importantes na construção de um futuro. Firmeza na execução de
uma promessa ou compromisso pode ser entendida como confiabilidade, crença e
confiança, quando existentes, podem ser entendidas como confiar. Confiar e
confiabilidade são requisitos básicos para uma relação de baixo custo transacional -
uma relação de confiança mútua. Tais relações implicam em elevados níveis de
confiança entre as partes que, segundo Putnam (2000), são fator fundamental para
gerar ciclos virtuosos de desenvolvimento social, econômico e político. O nível de
confiança de uma sociedade, seja ele macro ou micro, é traduzido pelo nome de
Capital Social, conforme demonstrado abaixo:
Assim como outras formas de capital, o capital social é produtivo,
possibilitando a realização de certos objetivos que seriam inalcançáveis se ele não existisse [...]. Por exemplo, um grupo cujos membros demonstrem confiabilidade e que depositem ampla confiança uns nos outros é capaz de realizar muito mais do que outro grupo que careça de confiabilidade e confiança [...]. Numa comunidade rural [...] onde um agricultor ajuda o outro a enfardar o seu feno e onde os implementos agrícolas são reciprocamente emprestados, o capital social permite a cada agricultor realizar o seu trabalho com menos capital físico sob a forma de utensílios e equipamentos. (COLEMAN, s.r., apud PUTNAM, 2000, p. 177).
44
Os níveis de confiabilidade são altamente influenciados pelos níveis éticos
dos jogadores envolvidos, portanto, pessoas e empresas éticas se enquadram no
conceito de pessoas e empresas de Fé. Ora, algumas pessoas e empresas de Fé
não seriam o bastante para gerar Capital Social suficiente para reverter,
definitivamente, o ciclo vicioso que se acredita existir no Brasil. Porém, entende-se
que as pessoas e empresas de Fé tendem a se cercar por outras pessoas e
empresas de Fé. Conseguindo isto as empresas geram um sistema de valor
(PORTER, 1989) com elos muito mais fortes e com Capital Social suficiente para
ciclos virtuosos.
O Capital Social cria a possibilidade tanto de redução de custos financeiros e
transacionais, como de aumento das chances de formação e de sobrevivência de
parcerias, cooperações, inter-relações, join ventures, etc.; já entre pessoas cria a
possibilidade de cooperativas, consórcios, associações, etc.; em ambos os casos
permite benefícios para as empresas, pessoas e a própria sociedade. Além disso, a
Fé se traduz em comprometimento, por isso acredita-se que as ações sociais das
empresas de Fé sejam mais duradouras e perenes. Ademais, a Fé e os
relacionamentos com elevados níveis desta virtude são fundamentais para a
Responsabilidade Social e para a construção de um futuro melhor.
Além da Fé - que sozinha não move as empresas em direção à
Responsabilidade Social - duas outras virtudes têm importância chave para este
movimento. Uma delas é a Esperança, que pode ser traduzida em acreditar no
futuro, pois tê-la significa não ser conformista, desejar modificar o futuro por
acreditar que ele possa ser mudado. Esperança é, portanto, o motor de uma ação
responsável e sustentável; quem não acredita na possibilidade de um futuro melhor
nada faz nesta direção. Outra virtude é a Caridade, que se reúne às anteriores
fortalecendo o Idealismo Pragmático e significa agir pensando em melhorar não só o
próprio futuro, mas também o do outro. Age-se desta forma não simplesmente
porque isso interferirá no seu destino, mas principalmente pela preocupação com o
outro. Nesse tipo de ação, mesmo que não haja a certeza do lucro financeiro há o
lucro social. Acredita-se que esta seja a virtude mais difícil de se dissociar do
teologal, do idealismo, da virtude como traço de caráter. Caridade é a terceira
característica capaz de mover empresas virtuosas a liderar o processo de
Responsabilização do mercado, pois estas empresas líderes não necessitam da
certeza, investem mesmo existindo fortes dúvidas sobre o retorno.
45
2.10. - Responsabilidade Social
E isto, sobretudo, quando não estamos mais no território das leis civis ou penais, mas andamos além e entramos na esfera das relações interpessoais, das responsabilidades que cada um tem em relação a seu próximo mais além da lei escrita, na esfera da gratuidade e da solidariedade. (ECO; MARTINI, 2000, p. 71)
O que é a Responsabilidade Social? Seria um conceito novo? Ou uma nova
roupagem do velho papel dos negócios? Nesse ponto, acredita-se no conceito da
evolução dos papéis.
Milton Friedman, vencedor do Nobel de economia de 1976, escreveu no New
York Times em 1970 um artigo intitulado "A Responsabilidade Social dos negócios é
aumentar seus lucros”. Nele Friedman acusou de comunistas os que defendiam que
o papel dos negócios envolvia algum tipo de compromisso social e disse que "Dar
dinheiro à caridade ou outras causas sociais (a exceção das relações públicas
visando aumentar os negócios) e se envolver em projetos comunitários (que não
incrementem os negócios das empresas) é semelhante a roubar dos acionistas."
(FRIEDMAN, 1970, apud SOLOMON, 1997, p. 360)
Apesar destas declarações estarem aparentemente em desacordo com as
posturas de Responsabilidade Social, não ferem o conceito aqui proposto, afinal,
ninguém está recomendando que se façam ações e investimentos sociais sem
anuência dos acionistas, nem afirmando que todos os acionistas sejam desprovidos
de almas. Ademais, são também corretos os argumentos de que a principal
Responsabilidade Social da empresa é gerar empregos e renda, assim como é
correto dizer que é responsabilidade da empresa cumprir a lei, pagar os impostos,
fornecer produtos e serviços de qualidade, etc. Por fim, ainda é responsabilidade da
empresa agir de forma ética com seus stakeholders, além de atender os interesses
dos acionistas.
Mesmo os que concordam cegamente com Friedman não podem discordar
que “a empresa acarreta, para a sociedade, alguns custos decorrentes de suas
atividades, por isto mesmo, tem responsabilidade direta e condições de abordar
muitos problemas que atingem a sociedade”. (DAVIS, s. r., apud ASHLEY;
CARDOSO, 2003, p. 10). Estes custos são decorrentes do que em economia se
46
chama de externalidades negativas. Corrigir os problemas e custos gerados pela
própria atividade também é responsabilidade da empresa.
Porém a Responsabilidade Social não se limita a estas colocações anteriores.
Está se tornando cada vez mais atributo da empresa participar ativamente de ações
sociais e do financiamento do Terceiro Setor, observar deficiências da sociedade e
tentar corrigi-las, algo que muitos denominam Filantropia Empresarial e outros
resumem como Responsabilidade Social. Considera-se, entretanto, que nem toda
empresa que pratica filantropia pode ser considerada Socialmente Responsável,
nem que empresas que não praticam filantropia não sejam Socialmente
Responsáveis. Ou seja, Responsabilidade Social não se resume à Filantropia
Empresarial. Mesmo assim, há a necessidade de um conceito mais amplo.
É importante ressaltar que as empresas e os acionistas, por mais virtuosos,
não podem e não devem se desviar dos objetivos do lucro e da perpetuação da
empresa, nem negligenciar os custos de uma prática responsável. O que se propõe
aqui é a aplicação do Idealismo Pragmático e de uma postura de empresa virtuosa que lidere o processo de responsabilização do mercado, visto que os
retornos podem ser duvidosos e muitas vezes de prazo excessivamente longo.
O que se propõe é que as empresas atuem com Responsabilidade Social (de
acordo com a pirâmide de responsabilidades) 19, com fim nos lucros futuros, sem
comprometer em muito os lucros presentes, de uma forma compromissada, ética e
humana, de modo a garantir a sustentabilidade da sociedade onde está inserida.
Por fim, o conceito de Responsividade Social pode ser definido como uma
estratégia de resposta a demandas sociais, evitando que estas afetem a
sobrevivência da empresa (BORGER, 2001, p. 45; 2003, p. 22).
2.10.1. - Pirâmide de Responsabilidade Social Empresarial
Considera-se que o modelo conceitual mais adequado para expressar o
significado amplo de Responsabilidade Social Empresarial é o da Pirâmide de
Responsabilidade Social Corporativa, proposto por Caroll (1991 apud BORGER,
2001, p. 43), e apresentado na Fig. 04. 19 Vide item 2.10.1
47
FIGURA 04 – PIRÂMIDE DE RESPONSABILIDADES
Fonte: The Pyramid of Corporate Social Responsability SOURCE: Archie B. Carroll, "The Pyramid of
Corporate Social Responsability: Toward the Moral Management of Organizational Stakeholders,"
Business Horizons (July-August, 1991).20
A pirâmide engloba todos os aspectos discutidos anteriormente em um único
modelo, de fácil entendimento. Dividindo a Responsabilidade Social em quatro
dimensões - econômica, legal, ética e filantrópica -, figurando tais dimensões como
evoluções dos desejos da sociedade. 20 Conceito e Figura extraídos da tese de doutorado de Fernanda Gabriela Borger, 2001, "Responsabilidade Social: Efeitos da atuação social na dinâmica empresarial".
48
A Responsabilidade Econômica, diz respeito ao lucro e seus benefícios
econômicos. O lucro, além de ser "um incentivo e uma recompensa" pagos pela
sociedade "para sua eficiência e eficácia", é o motor do sistema capitalista. Qualquer
outro papel da empresa não deve ferir este pressuposto fundamental. A
Responsabilidade Social primordial de uma empresa é dar lucro.
A Responsabilidade Legal, as Leis representam as regras do Jogo, o desejo
de uma sociedade formalizado, por isso as empresas devem respeitar as leis. O não
cumprimento da lei por uma parcela das empresas prejudica as demais empresas e
a sociedade. O não pagamento de impostos, por exemplo, além de desfalcar o
governo e comprometer as políticas públicas, prejudica a competitividade das
demais pagadoras na medida do volume arrecadado.
Infelizmente, num tempo de discussões sobre ética e filantropia empresarial,
ainda não se pode dizer que no Brasil a Responsabilidade Legal seja respeitada.
Muito embora se reconheça que algumas leis são complicadas de serem cumpridas,
o prejuízo no descumprimento delas é, em boa parte, superior a qualquer benefício
ético ou filantrópico que venha a ser atingido pela empresa.
A Responsabilidade ética. "Responsabilidade ética representa o
comportamento e as normas éticas que a sociedade espera dos negócios, que tem
adquirido cada vez maior importância, principalmente porque os níveis de tolerância
da sociedade em relação a comportamentos antiéticos estão cada vez menores. O
que implica análise e reflexão ética e exige que a tomada de decisões seja feita
considerando as conseqüências, honrando o direito dos outros, cumprindo deveres e
evitando prejudicar os outros. Também significa procurar justiça e equilíbrio nos
interesses de vários grupos atuantes nas corporações: empregados, consumidores,
fornecedores e os residentes da comunidade na qual os negócios operam."
(BORGER, 2001, p. 41)
A Filantropia Empresarial. "A filantropia empresarial consiste nas ações
discricionárias tomadas pela gerência em reposta às expectativas sociais e
representam os papéis voluntários que os negócios assumem onde a sociedade não
provê uma expectativa clara e precisa como nos outros componentes. [...] Essas
atividades são guiadas pelo desejo dos negócios em se engajar em papéis sociais
49
não legalmente obrigatórios e que não são expectativas no senso ético, mas estão
se tornando cada vez mais estratégicas." (BORGER, 2001, p. 42)
Em última análise, todas as responsabilidades sociais atendem à
responsabilidade econômica. Afinal, agir de acordo com a lei contribui com a
estabilidade social e econômica, facilitando a análise de cenários futuros e de
movimentos de jogadores (desde é claro, que haja leis estáveis e bem aplicadas),
beneficiando assim a estratégia. Agir de uma forma ética aumenta o Capital Social e
fortalece relações com todos os Stakeholders, reduzindo o risco. A filantropia,
quando bem direcionada e acompanhada, pode contribuir fortemente na
sustentabilidade.
Melhor estratégia, menores riscos e maior sustentabilidade se revertem em
lucros no médio e longo prazo.
50
3. Metodologia
No presente trabalho adotou-se o método exploratório, "que é particularmente
indicado em pesquisas onde a literatura seja relativamente escassa, ou quando se
deseja clarificar conceitos ainda não devidamente tratados numa área de
conhecimento" (SELITIZ, 1976 apud RAMOS e SILVA, 1996, p. 5). Sendo assim,
foram adotados nesta pesquisa os seguintes procedimentos de aquisição de
conhecimento:
a) Revisão da literatura, relacionada com o objeto de estudo;
b) Utilização de dados secundários;
c) Pesquisa com consumidores: levantamento de campo com uso de
questionários presenciais;
d) Pesquisa com funcionários: pesquisa de campo, por meio do envio de
questionários via e-mail para O Boticário;
Com relação à natureza das pesquisas realizadas, ambas devem ser
consideradas exploratórias, dada sua baixa base amostral (120 consumidores e 36
funcionários de O Boticário). Tratam-se, em ambos os casos, de uma amostra não
probabilística: os consumidores foram abordados no interior do Shopping Iguatemi e
do Multiplex Iguatemi; os funcionários do Boticário receberam os questionários por e-
mail (~400 questionários enviados). É importante ressaltar que na pesquisa
presencial realizada com consumidores tomou-se o cuidado de não declarar para o
informante o tema da pesquisa – Responsabilidade Social Empresarial – o que
poderia levar a uma certa tendenciosidade das respostas. Sabe-se que vários
elementos podem influenciar a edição de uma resposta por parte do entrevistado e a
maioria deles diz respeito à interação entrevistador-entrevistado, mas não somente.
Também é recorrente acontecer do informante responder o que acha ser “desejado”
pela pesquisa e, por isso, a preocupação do entrevistador em não revelar o tema,
minimizando, assim, possíveis efeitos nas respostas.
Os questionários foram elaborados tomando-se por base as variáveis
encontradas nos estudos da literatura sobre o tema e, antes de sua aplicação, eles
foram submetidos a um pré-teste, com o objetivo de aprimorar o processo de
elaboração.
51
As variáveis de estudo foram selecionadas de modo a verificar a existência de
uma relação entre níveis de civismo (individuais) e simpatia do público interno e
externo à prática de RSE. As variáveis foram agrupadas da seguinte forma:
a) Variáveis socioeconômicas;
b) Variáveis culturais, relativas ao civismo, solidariedade e padrão de
consumo (a pesquisa do Boticário não incluía padrão de consumo);
c) Variáveis relacionadas à RSE.
As variáveis sócio-econômicas foram utilizadas para qualificar os
entrevistados com relação ao nível de renda e escolaridade, visando uma posterior
comparação de suas respostas com relação ao índice de civismo. Abaixo o
percentual de entrevistados qualificados por nível, para ambas as pesquisas.
Tabela 05 - QUALIFICAÇÃO DOS ENTREVISTADOS - PESQUISA CONSUMIDORES
Pesquisa no Iguatemi
(%)
IBGE 2001-Dados Salvador
(%)
IBGE 2001- Dados Brasil
(%) Gênero Masculino 52 47 49 Gênero Feminino 48 53 51 Escolaridade 1º Grau 6 56,5 70,5 Escolaridade 2º Grau 29 32,5 18,7 Escolaridade Superior 49 - - Escolaridade Pós Graduação 16 - - Renda Individual < 2 S.M.21 25 - - Renda Individual de 2 a 6 S.M. 30 - - Renda Individual de 6 a 16 S.M. 29 - - Renda Individual > 16 S.M. 16 - - Renda Familiar < 2 S.M. 5 60 50 Renda Familiar de 2 a 6 S.M. 15 22 24 Renda Familiar de 6 a 16 S.M. 42 - - Renda Familiar > 16 S.M. 38 - -
Fonte: Pesquisa de campo
21 Salário mínimo de 2003, R$ 240,00.
52
Tabela 06 – QUALIFICAÇÃO DOS ENTREVISTADOS – PESQUISA FUNCIONÁRIOS
Pesquisa em O
Boticário (%)
IBGE 2001- Dados Curitiba
(%)
IBGE 2001- Dados Brasil
(%) Gênero Masculino 50 50 49 Gênero Feminino 50 50 51 Escolaridade 1º Grau 0 61,20 70,50 Escolaridade 2º Grau 3 22,60 18,70 Escolaridade Superior 25 - - Escolaridade Pós Graduação 72 - - Renda Individual < 2 S.M. 3 - - Renda Individual de 2 a 6 S.M. 11 - - Renda Individual de 6 a 16 S.M. 42 - - Renda Individual > 16 S.M. 44 - - Renda Familiar < 2 S.M. 0 39 50 Renda Familiar de 2 a 6 S.M. 6 34 24 Renda Familiar de 6 a 16 S.M. 17 - - Renda Familiar > 16 S.M. 78 - -
Fonte: Pesquisa de campo
Note-se que, em termos de renda e níveis de educação, a amostra supera em
muito a realidade das regiões onde foram aplicadas, bem como a realidade do
Brasil, sendo os resultados da pesquisa, portanto, não generalizáveis para o
ambiente. Por outro lado, talvez a base de confrontação não deva ser a realidade do
Estado ou país e, sim, a realidade do mercado consumidor de cada setor. Sendo
assim, a pesquisa retrata, mesmo que superficialmente, a realidade de um público
consumidor com elevado poder de compra e decisão.
Além disto os dados são aceitáveis tendo em vista o objetivo desta pesquisa,
que foi identificar a existência de variação nas percepções e modos de consumo a
depender de renda, educação e seu confronto com a variação de percepções em
termos de civismo.
Para avaliar os níveis de civismo, utilizou-se como base o índice de civismo
criado por Putnam22, composto por freqüência de leitura de jornais, comparecimento
a pleitos e participação em associações.
Neste trabalho, a parcela relativa à leitura de jornais foi alterada para uma
composição da leitura de jornais (50%), com leitura de revistas de notícias (16,67%), 22 Vide item 2.1.
53
acompanhamento de tele-jornal (16,67%) e acesso e utilização da Internet (16,67%).
A média destes fatores contribui com 60% na formação do índice de civismo. A
Internet é um meio de acesso “livre” à informação, o seu uso e a exclusão digital,
bem como seus efeitos no civismo, comporiam, sozinhos, um estudo interessante.
No índice aqui apresentado não será avaliado o componente do
comparecimento a pleitos, visto que, no Brasil, o voto é obrigatório, portanto, este
fator seria distorcido. Além disto o valor encontrado se referiria ao Brasil ou Bahia
como um todo, quando são avaliadas variações individuais.
Por fim, os indivíduos entrevistados foram avaliados pela quantidade de
associações a que ele estava afiliado, sendo nenhuma valendo zero, de 2 a 8 para
número de associações entre 1 e 4 e 10 para 5 ou mais associações. O peso deste
aspecto será de 40%.
O índice de civismo que foi estimado mostra um percentual elevado de
pessoas com alto nível de civismo (Fig. 05), o que não é real, visto que as faixas de
corte de alto e baixo foram 2,5 e 4,5 e a média do índice foi de 3,6 e 4,1 (pesquisa
consumidores e funcionários respectivamente). Mesmo estas faixas não tendo sido
formadas de uma forma criteriosa, são suficientes para a análise, visto que estão
sendo utilizadas para perceber se existem modificações de comportamento
baseadas neste índice23.
FIGURA 05 – NÍVEIS DE CIVISMO ENCONTRADOS
Civismo Pesquisa ConsumidoresAlto31%
Médio44%
Baixo25%
Civismo Pesquisa Boticário
Alto42%
Médio47%
Baixo11%
Baixo Médio Alto
Fonte: Pesquisa de campo
23 Os dados das pesquisas serão analisados ao longo do próximo capítulo.
54
4. Retornos
Torna-se altamente necessário discutir os retornos dos investimentos na
Responsabilidade Social tento em vista que, mesmo que algumas empresas
invistam na Virtude (teologal ou não), boa parte delas ainda necessita convencer os
acionistas da importância da Responsabilidade Social e, para isso, precisam de
argumentos sólidos e embasados na lucratividade para conseguir fazê-lo. Afinal: "Se
mesmo aqueles que dispõem de argumentos fortes para um comportamento ético
têm dificuldades para agir em conformidade com eles, o que dizer daqueles que só
dispõem de argumentos fracos, incertos e vacilantes?" (MARTINI, 2000, p. 74).
Em primeiro lugar, é preciso reconhecer que os retornos em
Responsabilidade Social têm boa quantidade de incerteza envolvida, alguns deles
necessitando de altos investimentos individuais ou de investimentos simultâneos de
diversas empresas e do Estado. Acerca disso é necessária uma certa cautela ao
fazer inferências, pois as relações de causa e efeito apresentadas podem não ser
contundentes, principalmente porque os dados primários coletados para este
trabalho são voltados à característica da simpatia do cliente (interno e externo) e
referem-se a uma amostra muito pequena para ser estatisticamente significativa.
Tendo em vista a natureza incerta, fraca e vacilante de grande parte dos
argumentos e retornos apresentados na mídia, e até mesmo por parte da literatura,
tentar aprofundá-los foi uma tarefa árdua que se procurou realizar. Isto é
conseqüência do entendimento de que esta atitude abre uma possibilidade para a
Responsabilidade Social Empresarial entrar, definitivamente, no hall da estratégia
empresarial. Do mesmo modo, empresas e organismos que estimulam esta busca,
seja através de investimentos em organismos, seja através de premiações (como no
caso do ETHOS, por exemplo), contribuem de forma significativa para a
sustentabilidade da Responsabilidade Social e, por conseqüência, para a
sustentabilidade em geral. ”Como em qualquer atividade comercial, melhorar o
desempenho ambiental, social ou administrativo da empresa não dá nenhuma
garantia de sucesso." (CRIANDO VALOR, 2003, p. 4)
Em segundo lugar, é importante saber que existem questões sociais que
geram retornos em cascata, ou seja, o investimento em uma questão afeta
positivamente uma outra, um retorno aparentemente mais imediato afeta ou reforça
55
outros e, também, que há retornos que afetam o comportamento do consumidor,
tornando-o mais consciente. No rol destes últimos estão, por exemplo, as questões
de educação e exclusão digital. A última, além de afetar a primeira, traz para o
mundo globalizado uma parcela dos excluídos da informação. Entende-se que os
retornos dos investimentos nestas questões sejam particularmente mais difíceis de
mensurar, ainda que figurem como dos mais significativos.
Por último, coloca-se que não será enfatizada aqui a percepção de que as
empresas que praticam Responsabilidade Social são as mais lucrativas porque: (i)
"... os estudos realizados apresentam conclusões contraditórias"; (BORGER, 2001,
p. 24); (ii) entende-se que, no curto prazo, os retornos sejam até mesmo um pouco
menores, devido aos investimentos e às renúncias de lucros em nome da ética e da
responsabilidade; (iii) se os acionistas já acreditam nisto e já investem nas empresas
pensando nisto, certamente este argumento seria redundante.
4.1 - Mercado Consumidor e Mercado Interno
Apesar de ser um retorno aparentemente mais imediatista, o viés de
marketing e os recursos humanos da Responsabilidade Social têm sua relevância na
medida em que, sendo de curto prazo e alterando variáveis já conhecidas, facilitam a
justificativa do investimento em Responsabilidade Social.
Havendo estes retornos de curto prazo, mais empresas investem
naturalmente em Responsabilidade Social; o não investir torna-se uma opção menos
atrativa, pois, como citado em dilemas éticos, este retorno é o que levaria a situação
dos investimentos para Pareto, com todos investindo. Todos investindo e um
Terceiro Setor sustentável contribuiriam, fortemente, para a sustentabilidade social e
ambiental, o que, como será visto adiante, favorece a sustentabilidade econômica
que beneficia as empresas. Portanto, estes são retornos em cascata.
Dentre algumas formas importantes de se trabalhar este tipo de retorno estão
as campanhas de conscientização e informação realizadas pelos institutos ETHOS e
AKATU, criados pelas próprias empresas. Outra forma muito importante são os
investimentos em educação e inclusão digital, que torna o mercado mais consciente
e com maior acesso às informações.
56
Há de se questionar se estes retornos existem realmente, ou se eles se
configuram numa pressão social para a mudança estratégica ou, ainda, se
representam apenas uma simpatia com quem pratica responsabilidade social. E
mais, se o mercado sabe de fato o significado de Responsabilidade Social.
Para iniciar a resposta a estas questões, serão aqui apresentados alguns dos
resultados da pesquisa de campo realizada para este trabalho, em confronto com os
dados do IBGE, bem como os dados da pesquisa com os funcionários de O Boticário
e outras pesquisas.
4.1.1 Simpatia do Cliente
Não se tem dúvida de que apesar de todos os dados adversos em relação a
civismo, educação e renda, de uma forma ou de outra, o mercado percebe a
Responsabilidade Social como importante e é simpático às empresas que
verdadeiramente a praticam, aceitando pagar até mesmo um preço prêmio pelo
produto destas empresas. Mas, para que este valor seja visto como uma
diferenciação estratégica seria necessária uma distinção entre quem faz e quem não
faz.
Sobre isto, em pesquisa exploratória publicada em 1999, no artigo intitulado
"Selo Social como Instrumento de Marketing: uma Concepção Estratégica da
Filosofia Empresarial", Guimarães, Quintella e Pimentel (1999, p. 132) mostraram
que:
• 73% declararam-se altamente influenciados pelo vínculo social da
marca;
• 42% trocariam uma marca tradicional por outra com vínculo social;
• 39% se defrontaram com a opção de optar pelo vínculo social e,
destas, 96% optaram pela marca vinculada;
• 56% aceitariam pagar um preço mais elevado, sendo que 45%
pagariam até 5% mais e 41% pagariam até 10% mais.
Na pesquisa exploratória realizada para este trabalho os dados parecem
confirmar esses resultados bem como aqueles de outras pesquisas semelhantes.
57
• 75% já realizaram algum tipo de ação social, mostrando solidariedade;
• 7% acreditam que as empresas têm responsabilidade na resolução dos
problemas sociais, 42% que ela é do Estado e das empresas e 50%
que esta responsabilidade é exclusiva do Estado;
• 87% acreditam que as empresas deveriam investir mais no social;
• 28% afirmaram que vêm levando em consideração a Responsabilidade
Social das empresas;
• 63% afirmaram que pagariam mais caro por produtos com vínculo
social;
• 28% compraram produtos com vínculos sociais, sendo que, destes,
43% eram produtos ligados a promoções sociais ("parte será doada"),
2% deixaram de comprar (pela lista do Green-Peace).
Na pesquisa, foram identificadas diferenças no comportamento de
solidariedade e consumo solidário de acordo com renda, nível de escolaridade e
índice de civismo. Os valores acima se referem à média geral, as variações podem
ser vistas no item 4.4.1.
Os resultados das pesquisas são certamente significativos, pois parecem
indicar que realmente a Responsabilidade Social traz retorno e que tal simpatia
adicional advinda da mesma, além de servir como possível estratégia de
diferenciação, possivelmente reduz custos de marketing, pois uma possível redução
da resistência dos compradores e dos custos para atingi-los alteraria a função de
despesas de marketing.
Porém, existem certas dificuldades que devem ser levadas em consideração.
Primeiramente deve-se lembrar do efeito da auto-visão 24 (BAUMHART, 1971) e o
"efeito Campbell's"25 (GEHRINGER, 2003).
É de certa forma intuitivo que, ao responder uma pesquisa presencial, o
entrevistado se coloque numa posição desconfortável para admitir que tenha agido
em desacordo seus próprios valores. Durante a pesquisa, na qual 80% dos
questionários foram aplicados pelo pesquisador, percebeu-se que muitas respostas 24 "Há freqüentemente uma disparidade entre os padrões de uma pessoa e o seu comportamento; usualmente, os primeiros são superiores.", Baumhart, 1971, p. 42. 25 Embora não esteja cientificamente comprovado, entende-se, também, que “as pesquisas [...] sempre acabam, de uma forma ou de outra, mostrando a verdade que a empresa gostaria de escutar [...] por medo ou cortesia, conforme salienta Max Gehringer, set. 2003.
58
que revelavam um comportamento menos solidário e menos cidadão vinham
acompanhadas de expressões de vergonha ou embaraço. Em alguns casos, para
testar o efeito da auto-visão, após a aplicação do questionário, conversou-se com
alguns entrevistados sobre suas respostas. Ao longo de conversas mais informais,
muitos revelaram que não agiam de acordo com o que responderam, mas que
gostariam de agir assim.
Não exatamente o efeito Campbell's, mas um problema relativo a grupo
estatístico, com efeito semelhante, estão as respostas de pesquisas realizadas em
sites de Internet de institutos voltados ao tema de solidariedade e Responsabilidade
Social. É intuitivo também que o público destes sites esteja, de alguma forma,
interessado no tema.
Como não se sabe exatamente quão grande são os erros causados por estes
efeitos, não se pode precisar o tamanho do mercado de consumo consciente no
Brasil. Para isso seria preciso desenvolver formas de pesquisa para reduzir estes
efeitos de modo a se ter uma melhor idéia deste tipo de retorno. O que fazer frente a
esta dúvida? Se o mercado for realmente grande como mostram as pesquisas, não
investir é muito arriscado.
4.1.2 Problemas de percepção do mercado consumidor
Outros fatores que tornam os retornos por diferenciação social duvidosos são
a desconfiança e a falta de informação. Acredita se que hoje ocorre no mercado uma
confusão sobre os conceitos e sobre quem pratica ou não Responsabilidade Social,
bem como uma acentuada desconfiança do consumidor "para com o que é veiculado
pela empresa como postura socialmente responsável. Essa desconfiança é, muito
provavelmente,motivada por abusos não apenas históricos como também hoje
presentes (como falsificação de remédios)." (ROCHA, 1997 apud GUIMARÃES;
QUINTELLA; PIMENTEL,1999, p. 124).
Sobre isto, Rosa Maria Fisher, professora da Faculdade de Economia e
Administração da USP, diz que: "A evolução do discurso é um problema.[...] Se, por
um lado, propiciou que as empresas acordassem, de outro lado criou uma cortina de
fumaça que dificulta enxergar a prática real da responsabilidade." (FISHER, 2003,
apud COHEN, 2003, p. 37).
59
Na pesquisa de campo constatou-se que:
• 43% acertaram um conceito sobre Responsabilidade Social. Quando
categorizado este percentual se reduziu para 33% dos indivíduos com
renda até R$ 1000,00, 29% dos indivíduos com escolaridade até
segundo grau completo, 34% com índice de civismo menor que 4.5 e
12% nos indivíduos que reúnem as 3 características;
• 81% admitem ter problemas para identificar quais as empresas que
investem em Responsabilidade Social;
• 41% não acreditam em nada do que vêem nos comerciais e 56%
desconfiam deles, restando apenas 3 % que declaram que acreditam.
Isto deve ser trabalhado para que estes retornos se acentuem.
4.1.3 A percepção do cliente interno - Caso O Boticário.
Com relação ao público interno, se é tido como certo que é mais fácil
conscientizá-lo e capitalizar em produtividade e lealdade, é certo também que este
pode facilmente perceber a diferença entre retórica e prática. São estas as maiores
responsáveis pela crítica de ações oportunistas ou incoerentes com a ética vigente
na empresa. Ações oportunistas representam um risco para o negócio.
O objetivo aqui é mostrar que a responsabilidade e o marketing social devem
estar casados com uma postura e uma atuação ética dentro e fora da empresa,
tendo em vista que os funcionários percebem as incoerências de uma forma muito
mais aguçada que o mercado externo. E, também, que esta percepção pode vir a
afetar índices de satisfação e a produtividade de forma positiva ou negativa.
Para avaliar esta percepção fez-se uma pesquisa com os funcionários de O
Boticário, empresa citada por diversas vezes como referência da prática de RSE.
Suas ações mais conhecidas são as relacionadas com a Fundação O Boticário de
Proteção à Natureza, criada em 1990, que, dentre diversas outras atividades,
administra, desde 1993, a reserva florestal de Salto Morato, patrimônio natural da
humanidade (UNESCO, apud Boticário, 2002, s.p.).
60
Embora as ações de O Boticário sejam freqüentemente associadas apenas
ao meio ambiente, elas não se limitam a isto. Diversos outros projetos fazem parte
da gama de ações praticadas pela empresa nas áreas de: (i) Educação (4 projetos);
(ii) Comunidade (10); (iii) Qualidade de Vida (5); (iv) Cultura (2) e Outros (3). É
impressionante observar que o investimento social para realizar todos os projetos
apresentados no Relatório Corporativo 2002 e no livro Essência dos Sonhos (2002)
corresponde a menos de 0,8% da receita líquida (aproximadamente R$ 3mi).
O primeiro ponto avaliado foi se os funcionários entrevistados têm
conhecimento das ações realizadas pelo Boticário. Neste sentido, todos
responderam que sabiam que o Boticário realizava ações sociais, 97% citaram pelo
menos uma ação e 86% citaram duas.
Em seguida avaliou-se a percepção dos entrevistados com relação à RSE da
empresa. Do total de entrevistados, 97% se declararam satisfeitos em trabalhar no
Boticário, bem como 97% declararam ser importante o investimento em ações
sociais e 97% consideraram o Boticário coerente em suas ações sociais em relação
à Pirâmide de Responsabilidades. Dentre os entrevistados, 67% declararam que sua
satisfação é influenciada pela atuação cidadã do Boticário. Por fim, 64% declararam
que O Boticário deveria aumentar sua divulgação interna e 61% declararam que
deveria aumentar a divulgação externa.
Estes resultados parecem indicar que a atuação do Boticário é uma atuação
coerente e sólida, com apoio dos funcionários e com possíveis retornos de
produtividade.
4.2 Redução dos Custos Transacionais
Como visto anteriormente, os custos de transação são compostos
basicamente de três aspectos: (1) Gestão dos riscos das Transações; (2)
Reestruturação da gestão pelas mudanças do meio ambiente; e (3) Ineficiência de
adaptação às novas realidades sócio-econômicas. A redução dos custos de
transação advindas de um comportamento ético, responsável e até mesmo
responsivo, deve, portanto, ser analisada em relação a esses três aspectos.
Com relação ao primeiro, nas palavras de Kein & Shelanski (1994 apud
FARINA; AZEVEDO; SAES, 1997): "A ETC [Economia dos Custos de Transação]
61
estuda como parceiros em uma transação protegem-se dos riscos associados às
relações de troca". (KEIN & SHELANSKI, 1994 apud FARINA; AZEVEDO; SAES,
1997, p. 71) Sendo assim, “a redução dos riscos implica a redução de custos de
transação, sendo, diretamente por esse motivo, um elemento de eficiência na
concorrência entre empresas.” (FARINA; AZEVEDO; SAES, 1997, p. 71)
O comportamento ético das partes reduz significativamente estes riscos,
confiar e ser confiável são, portanto, fundamentais para esta redução. Logo, quanto
maior o Capital Social de uma sociedade, menor o risco. Tem-se que tomar cuidado,
entretanto, com uma desconfiança, pois ela, muitas vezes é o bastante para que o
risco volte a existir.
Dito isto, aponta-se três formas de reduzir o risco:
• Contratos e monitorações do risco, transferindo seu custo para estas
atividades de gestão. Além disto, dada a racionalidade limitada
(FARINA; AZEVEDO; SAES, 1997, p. 72 a 77), os contratos são
imperfeitos dando vazão ao oportunismo e ao comportamento aético;
• Mudanças da sociedade, elevando os níveis de Capital Social. Esta é
uma opção lenta e difícil, mas deve ser buscada independentemente
dos custos de transação;
• Construção de parcerias éticas entre pessoas e empresas, através da
identificação de profissionais e empresas com valores éticos elevados.
Dentre estas alternativas, considera-se a terceira a mais viável em termos de
redução de custos de transação. Uma outra forma de reduzir este custo é se
antecipar às mudanças. Reduziram-no, por exemplo, as empresas que trataram
seus efluentes antes da mudança da legislação, que seguiram normas de qualidade
e segurança acima do exigido. Ou seja, agir acima da lei em direções nas quais a lei
pode se mover é benéfico para reduzir estes custos.
Agrega-se também aqui a gestão por riscos e oportunidades de
sustentabilidade apresentada no item 4.3. Esta gestão aumenta, consideravelmente,
a eficiência na adaptação às novas realidades sociais, econômicas e ambientais.
Logo, quem age responsavelmente pode também ter retornos aqui.
62
4.3 Sustentabilidade
"Muitas oportunidades de negócios em mercados emergentes surgem de
ações que favorecem o desenvolvimento sustentável." Esta é a conclusão
apresentada no estudo "Criando Valor: o business case para sustentabilidade em
mercados emergentes." (CRIANDO VALOR, 2003, p. 6). Mas esta não é a única
fonte disponível sobre o assunto. O livro “Compromisso social e gestão empresarial”
também trata a sustentabilidade no âmbito dos riscos e oportunidades.
Sustentabilidade, portanto, não é mais um valor intangível e acessível apenas aos
ativistas sociais/ecológicos e ao movimento anti-davos, dentre outros. É um valor
que, crescentemente, vai fazer parte das decisões empresariais e que, além de
nobre, determina o lucro no longo prazo. Assim, "empresas que há três anos não se
consideravam atingidas por esses temas são afetadas atualmente, e as que hoje
não se sentem atingidas podem enfrentar uma situação muito diferente daqui a três
anos." (CRIANDO VALOR, 2003, p. 4).
Mas o que é sustentabilidade? Como ela pode afetar os negócios? A
sustentabilidade é definida como sendo “a forma de satisfazer as necessidades da
presente geração sem comprometer a capacidade das futuras gerações de
satisfazer as suas necessidades”. A sustentabilidade "tem três amplos componentes,
geralmente descritos como “as pessoas, os lucros e o planeta”, ou seja, os aspectos
“sociais, econômicos e ambientais” (CRIANDO VALOR, 2003, p. 7).
Como, além do lucro, um dos principais objetivos empresariais é a
perpetuação da empresa, não tem muito sentido pragmático se falar em gerações
futuras e, sim, no futuro da própria empresa; o raciocínio é diferente do que leva uma
pessoa a pensar em sustentabilidade. A sustentabilidade da sociedade onde a
empresa esta inserida afeta direta e fortemente o lucro futuro e a perpetuação do
negócio da própria empresa. Portanto, agir com Responsabilidade Social, pensando
na sustentabilidade da sociedade onde está inserida é uma alternativa racional e de
acordo com os objetivos básicos de qualquer empresa. Sendo assim, agir com
Responsabilidade Social pensando na sustentabilidade da sociedade seria a melhor
forma de satisfazer as necessidades da empresa hoje e no futuro.
Garantir a necessidade hoje? Grayson e Hodges (2002) dizem que dentre as
necessidades das empresas estão:
63
O crescimento econômico e estabilidade do mercado. O Centro de Recursos para a Dimensão Social da Empresa, dedicado à atividade empresarial em países onde a pobreza é problema importante, diz que elas precisam de: - Pessoal competente, confiável, saudável e eficiente para que a empresa possa ser produtiva; - Mercado em expansão e público consumidor para que a empresa prospere em ambiente competitivo; - Ambiente estável e seguro, para que a empresa possa atuar efetivamente no mercado mundial. (GRAYSON; HODGES, 2002, p. 41).
Dizem ainda que:
A globalização fez com que mais empresas atuassem em países com
recursos públicos escassos, infra-estrutura ruim e com problemas sociais significativos, o que impede o crescimento do negócio ou as obriga a tomar medidas corretivas. (GRAYSON; HODGES 2002, p. 41).
Ou seja, em países como o Brasil certos aspectos sociais comprometem o
atendimento das necessidades da empresa hoje. Portanto, no caso de países em
desenvolvimento, não se trata somente de pensar no futuro, faz parte do presente
momento da empresa corrigir as distorções para sobreviver. Em resposta a isso,
todos, aparentemente, parecem concordar que a receita para a solução deste
problema passa pela ação governamental de redução dos juros e de crescimento
econômico. Mesmo concordando com isso, tentar-se-á identificar a presença de
outros fatores, afinal, é complicado manter-se competitivo com elevados níveis de
pobreza e baixos níveis de saúde e educação. Ademais, apenas o desenvolvimento
econômico não é suficiente - ainda que ele só seja possível e sustentável tendo em
vista o triple bottom line (social, econômico e ambiental) -, pois os fatores sociais e
ambientais do Brasil estão, de certa forma, comprometidos. Permanecer assim é um
risco, melhorá-los uma oportunidade.
Além disso, é necessário perceber que para cada empresa de cada setor os
riscos e oportunidades podem ser eminentemente diferentes. É lógico que os riscos
e oportunidades envolvidos que levam aos investimentos em sustentabilidade
ambiental da Natura e de O Boticário, além de diferentes entre si, são mais
desiguais dos que os que levam a Ford e GM a pesquisar motores mais eficientes e
combustíveis alternativos. Ou seja, cada empresa deve fazer uma análise dos riscos
e oportunidades existentes em seu setor e, dentre eles, identificar quais os que as
afetam mais com o intuito de balizar seus investimentos em Responsabilidade
Social, de modo a maximizar o resultado da empresa no longo prazo. Cada
empresa, maximizando seus lucros desta forma, maximiza, também, o
64
desenvolvimento econômico.26 Em suma, o que se precisa ter em mente é que estes
riscos e oportunidades ambientais, sociais e humanos existem e devem ser
considerados nas análises estratégicas das empresas.
Para analisar estes riscos e oportunidades e englobá-los na estratégia,
Grayson e Hodges (2002) propõem a utilização da ferramenta dos Sete Passos
(envolvendo mapas, relatórios e outros). Dentre os mapas apresentados, destaca-se
aqui o radar que posiciona as questões sociais, éticas e ambientais. O radar divide
as questões sociais e ambientais em quadrantes do mapa e visualiza, pela
proximidade do centro, o nível relativo de importância da questão para o negócio
(Fig 06).
Na configuração do radar cada elemento é posicionado de acordo com a sua
importância e efeitos, ou seja, quanto mais sensível for o setor ou a empresa ao
elemento, mais próximo do centro ele está posicionado. A cor do elemento também
ajuda nesta distinção (mais escuro = mais distante).
O documento Criando Valor (2003), por sua vez, propõe a utilização da Matriz
de Evidências (Fig 07), um mapa que cruza fatores de sustentabilidade com fatores
de sucesso dos negócios.
Embora a utilização desse ferramental necessite de uma boa dose de visão
de longo prazo, em ambos os casos a ferramenta gráfica possibilita uma
visualização mais rápida e sistemática das questões que oferecem riscos ou
oportunidades. Porém, identificá-las é apenas um dos passos necessários.
Mesmo sabendo que existem diferenças entre os setores no tocante a
questões relativas à sustentabilidade, aparentemente, a pobreza e a educação
afetam a grande maioria das empresas, tanto limitando mercados, quanto limitando
produtividade, crescimento econômico e bem estar. Por isso dá-se especial
destaque a elas neste estudo.
26 Entende-se que este deve ser feito de forma coordenada, vide item 2.9.
65
FIGURA 06 – RADAR DA EMPRESA (SETOR DE SEGUROS)
Fonte: Grayson e Hodges (2002, p. 230).
66
FIGURA 07 – MATRIZ DE AMBIENTE DE NEGÓCIOS PARA A SUSTENTABILIDADE
Sendo:
Não há evidência de relação
Há alguma evidência de relação
Há forte evidência de relação
Fonte: Documento "Criando Valor" (2003, p. 31)
67
4.3.1 Pobreza
Com relação ao mercado e ao público consumidor, uma pesquisa recente
divulgada no Jornal da Globo, dia 04 de setembro de 2003, intitulada “Ganhou quem
fez a melhor escolha” apresentou uma relação com as 20 empresas que mais
lucraram e tantas outras que mais deram prejuízo na América Latina. O Brasil lidera
ambos os rankings. Conforme o responsável pela pesquisa, Fernando Excel:
O que chama atenção no levantamento feito pela consultoria é a
diferença no perfil do desempenho do Brasil e do seu principal concorrente, o México. Enquanto os lucros aqui ficaram para quem se voltou para o mercado internacional, lá ganhou quem atendeu aos consumidores mexicanos [...]. A mensagem é clara: o apetite do nosso mercado interno não tem sido capaz de gerar empresas de porte internacional como essas exportadoras brasileiras estão lá no topo das empresas latino-americanas. (EXCEL, 2003).
Há poucos anos, quando o mercado brasileiro foi aberto às importações,
havia um consumo reprimido que gerou grande volume de negócios e, dentre outras
coisas, sinalizou para o fato de o mercado consumidor brasileiro apresentar enormes
proporções e elevado potencial de consumo. Isso gerou diversas distorções de
metas, como a comercialização de linhas e telefones celulares para 50% dos
brasileiros, consumo interno de mais de 2 milhões de automóveis novos por ano e
diversas outras superestimações. Conseqüentemente, houve investimentos para
atender este mercado, com o estabelecimento de diversas empresas transnacionais
no Brasil.
Dissolvidas as distorções, vê-se, de fato, um enorme contingente
populacional, porém um mercado consumidor de proporções bem inferiores,
representado por um número elevadíssimo de excluídos que poderia, com algum
esforço conjunto entre setor privado e governo, passar a fazer parte do mercado
consumidor. Esta inclusão, se feita de uma forma ampla, poderia contribuir para
fazer com que algumas das estimativas superestimadas se tornasse realidade.
68
4.3.2 Educação
Não se têm dúvidas de que os níveis de escolaridade e de educação
familiares afetam, de forma positiva e determinante, a produtividade e a renda,
gerando crescimento econômico. Entretanto, alguns estudiosos salientam a
necessidade de um maior aprofundamento nos estudos sobre este tema. Um
exemplo está na análise de Guimarães:
O conjunto das abordagens e estudos que vêem na questão
educacional o elemento preponderante na determinação das desigualdades de renda – e, conseqüentemente, no do combate à pobreza – carece de credibilidade conceitual, ainda que desfrute de grande notoriedade nos segmentos da mídia, no meio tecnocrático governista e em alguns setores conservadores do meio acadêmico. (GUIMARÃES, 2002, p. 107).
Com relação à produtividade: "a questão educacional emerge lastreada na
aplicação de modelos econométricos que engendram um automatismo implícito
analítico da relação aumento de escolaridade – redução da pobreza, tão sofisticado
quanto hollywoodiano" que, como completa Mercadante, revelam "um
desconhecimento primário das condições, dinâmicas e tendências atuais da
economia real e, particularmente, do mercado de trabalho”. (MERCADANTE, 1999,
p. 4 apud GUIMARÃES, 2002, p. 107).
Afora as discussões sobre produtividade, existe no mercado a carência de
diversos tipos de profissionais. Assim como, "o nível populacional estagnado em
países industrializados pode ser uma ameaça ao crescimento econômico e provocar
escassez de mão-de-obra que, por sua vez, cria a necessidade de atrair força de
trabalho imigrante" (GRAYSON; HODGES, 2002, p. 44). Do mesmo modo, a falta de
recursos para educação causa falta de mão-de-obra qualificada.
Um país com população jovem [...] se existem controle inadequado de
freqüência na escola, alta incidência de pobreza e falta de oportunidades para os jovens serem integrados à sociedade, é provável que ocorra um aumento nos crimes juvenis. Por sua vez, esse aumento implica gastos mais altos com segurança para as empresas e perda de confiança de investidores potenciais. (GRAYSON; HODGES, 2002, p. 47).
Além disto, um mercado consumidor educado escolhe melhor os produtos e
as empresas, sendo positivo para quem investe em Responsabilidade Social. E mais
importante, a educação como formação de capital humano, é capaz de inserir os
69
indivíduos nas oportunidades de vida e, desta forma, fornecer elementos para o
incremento do capital social, importante tanto para o desenvolvimento econômico
quanto social (COLEMAN, 1988).
4.3.3 Demais questões de Sustentabilidade
Não só os níveis de educação e renda afetam o desempenho das empresas.
Outras questões de sustentabilidade podem ter influência significativa e, por isso,
merecem ser avaliadas com cuidado. Sobre esta questão, autores como Grayson e
Hodges (2002), por exemplo, ressaltam a influência dos problemas de saúde pública
nos níveis de produtividade e aprendizado dos funcionários, e também a queda de
produtividade dos funcionários e sua relação com problemas de saúde da sua
família. Sobre isso, Tadao Chino, presidente do Banco de Desenvolvimento da Ásia,
declarou o seguinte: “A melhoria na condição de saúde e nutrição individual sem
dúvida leva a maior produtividade; quanto aos estudantes, contribui para uma
freqüência às aulas mais regular e maior capacidade de aprender” (CHINO, 2000
apud GRAYSON; HODGES, 2002, p. 55). Ademais, problemas de saúde pública
elevam os gastos da empresa com assistência médica e abstenções causadas,
dentre outras coisas, por surtos de doenças como dengue, cólera, gripes, etc.
Outro aspecto importante diz respeito aos recursos naturais, como a água27 e
a energia elétrica, cuja racionalização da utilização produz efeitos mais visíveis e
generalizados. Algumas empresas que dependem da biodiversidade, como as
indústrias farmacêuticas e de cosméticos, entendem que protegê-la significa atender
a uma lógica racional. Um exemplo significativo está no caso O Boticário que criou
uma Fundação de proteção ambiental (Fundação Boticário de Proteção à Natureza).
Algumas empresas também se colocam à frente e, por exemplo, são
rigorosas no tratamento de efluentes. Trata-se de uma boa estratégia cujos retornos
poderão advir até mesmo da exclusão da concorrência, a depender dos custos de
transação envolvidos a uma adaptação ineficiente. Neste caso, algumas empresas
colocam-se à frente na sugestão e implementação de alternativas, como a DuPont,
por exemplo, que desenvolveu o processo clorídrico para a produção de dióxido de 27 Em muitos centros produtores a água industrial requer níveis de pureza mais elevados que os da água potável.
70
titânio com baixa emissão de efluentes (1951), antecipando-se à legislação
americana (1970). Além disto, o processo desenvolvido utilizava a ilmenita (mais
abundante na natureza) ao invés de rutila (cada vez mais rara). O efeito disto foi
dominar o mercado americano (KOWOKA, 1994).
Até hoje a Milenium - segunda maior produtora mundial – utiliza, na sua
produção, o processo tradicional com grande emissão de efluentes e altos custos de
tratamento. No licenciamento de 1999 da fábrica de Arembepe (Camaçari/BA), os
limites de emissão de sulfato ferroso foram reduzidos para 70t/h, este limite era
atendido com dificuldade, pois sulfato ferroso tem baixo valor comercial.
Recentemente, foi implantada uma nova unidade de beneficiamento de sulfato
ferroso, que o utiliza como matéria-prima para a fabricação de produtos para
tratamento de água potável (PIX e FERRIX). Esta ação reduz à metade as
necessidades de efluentes, além de trazer lucros.
Outro exemplo que ocorre na Bahia é o de produção de celulose solúvel
branqueada. Até pouco tempo atrás, a BACELL era uma das poucas unidades no
mundo com processo de branqueamento utilizando H2O2, processo livre de cloro.
Apesar de mais caros, os produtos da BACELL têm maior aceitação internacional.
4.4 Fatores maximizadores e redutores de retornos
Como já dito anteriormente, existem diversos fatores que dificultam ou
facilitam a ocorrência de retornos com a prática da Responsabilidade Social;
também outros elementos afetam as decisões que levam a essa prática. Neste
ponto, faz-se importante destacá-los.
4.4.1 Influência do Civismo e Deserção
Os níveis de civismo e confiança de uma sociedade e a deserção originada
pela escassez destes fatores são extremamente importantes para a prática da
Responsabilidade Social, como já dito anteriormente.
É por desconfiança que muitas empresas deixam de investir em
universidades, mesmo levando em conta os prováveis benefícios, considerando que
71
alguns poucos indivíduos aplicam mal a verba destinada a certos projetos.
Reconstruir a confiança após uma quebra é um trabalho delicado e, como resultado,
a maior parte das aplicações filantrópicas acabam por se concentrar em algumas
poucas ONGs de renome.
Entende-se que os níveis de civismo e confiança podem influenciar também a
forma de ver a prática da Responsabilidade Social e as empresas que investem,
bem como a escolha de produtos socialmente responsáveis. Sobre este assunto,
serão mostrados, a seguir, alguns resultados da pesquisa de campo com os níveis
alto, médio e baixo de civismo encontrados.
Um fator considerado de fundamental importância para o tema é o nível de
solidariedade, que foi medido nesta pesquisa pela participação do entrevistado em
ações sociais. Nenhuma participação foi considerada de nível baixo. Doações para o
Criança Esperança, LBV, etc, foram consideradas “doações passivas” e, portanto,
como solidariedade de nível médio. Ações de voluntariado e doações diversas foram
consideradas de nível alto. Note-se que, como observado anteriormente, um maior
civismo implica em uma maior preocupação com a coletividade, logo uma maior
solidariedade (Fig 08). Percebe-se que a variação com relação ao civismo é
significativamente diferente de renda e escolaridade, configurando-se, portanto, um
fator à parte.
72
FIGURA 08 – SOLIDARIEDADE X CIVISMO E DEMAIS FATORES
Solidariedade
(Média Geral)
Solidariedade com
Civismo Baixo
Solidariedade com
Civismo Médio
Solidariedade com
Civismo Alto
Média7%
Alta75%
Baixa18%
Baixa27%
Alta73%
Média8%
Alta69%
Baixa23%
Média11%
Baixa5%Alta
84%
Solidariedade
Renda < 2 SM
Solidariedade
Renda 2 a 6 SM
Solidariedade
Renda 6 a 16 SM
Solidariedade
Renda >16SM
Média17%
Alta33%
Baixa50%
Média11%
Baixa28%Alta
61%
Média8%Alta
78%
Baixa14%
Média2%
Baixa15%
Alta83%
Solidariedade
Escolaridade até
Primeiro Grau
Solidariedade
Escolaridade até
Segundo Grau
Solidariedade
Escolaridade até
Nível Superior
Solidariedade
Escolaridade até
Pós-Graduação
Alta43%
Baixa57%
Média6%
Baixa14%
Alta80%
Média10%Alta
73%
Baixa17%
Baixa16%
Alta84%
Baixo Médio Alto Fonte: Pesquisa de campo
Outra forma de variação prevista se dá com relação à percepção dos
problemas do país. Esta percepção é importante para a empresa quando ela for
utilizar a Responsabilidade Social como estratégia de marketing e na
responsividade. Note-se que, mesmo não havendo um padrão de mudança
crescente ou decrescente, existem variações significativas (Fig 09). Também a
relação entre percepção e civismo é diferente das relações entre percepção e renda
(preocupação decrescente com desemprego) e nível de escolaridade (decrescente
73
com desemprego e crescente com educação). Mais uma vez, o civismo se configura
como fator independente.
FIGURA 09 – PERCEPÇÃO PROBLEMAS X CIVISMO E DEMAIS FATORES
Percepção
(Média Geral)
Percepção com
Civismo Baixo
Percepção com
Civismo Médio
Percepção com
Civismo Alto
Educação18%
Outros18%
Desemprego31%
Fome17%
Miséria16%
Miséria17%
Fome26%
Desemprego20%Outros
17%
Educação20%
Fome15%
Miséria9%
Educação13%
Outros19%
Desemprego44%
Educação24%
Outros16%
Desemprego25%
Fome11%
Miséria24%
Percepção
Renda < 2 SM
Percepção
Renda 2 a 6 SM
Percepção
Renda 6 a 16 SM
Percepção
Renda >16SM
Fome17%
Miséria33%
Desemprego33%
Educação17%
Miséria11%
Fome22%
Outros22%
Desemprego45%
Miséria16%
Fome14%
Educação14%
Outros20%
Desemprego36%
Fome17%
Miséria15%
Desemprego23%Outros
15%
Educação30%
Percepção
Escolaridade até
Primeiro Grau
Percepção
Escolaridade até
Segundo Grau
Percepção
Escolaridade até
Nível Superior
Percepção
Escolaridade até
Pós-Graduação
Fome14%
Desemprego57%Outros
29%
Miséria11%Fome20% Educação
14%
Outros17%
Desemprego38%
Fome15%
Miséria17%
Educação20%
Outros14%
Desemprego34%
Fome16%
Miséria26%
Desemprego5%
Outros26%
Educação27%
Desemprego Educação FomeMiséria Outros
Fonte: Pesquisa de campo
74
Por fim, vê-se a manifestação do consumidor da aceitação da cobrança de
um valor maior para os produtos de empresas que praticam Responsabilidade
Social, conforme a Figura 10.
FIGURA 10 – PAGARIA MAIS X CIVISMO E DEMAIS FATORES
Pagaria mais
(Média Geral)
Pagaria mais
Civismo Baixo
Pagaria mais
Civismo Médio
Pagaria mais
Civismo Alto
Não19%
Sim63%
Talvez18%
Não28%
Talvez14%
Sim58%
Não19%
Sim62% Talvez
19%
Não11%
Talvez19%Sim
70%
Pagaria mais
Renda < 2 SM
Pagaria mais
Renda 2 a 6 SM
Pagaria mais
Renda 6 a 16
SM
Pagaria mais
Renda >16SM
Não33%
Sim67%
Não22%
Sim67%
Talvez11%
Não18%
Talvez24%
Sim58%
Não18%
Sim66%
Talvez16%
Pagaria mais
Escolaridade até
Primeiro Grau
Pagaria mais
Escolaridade até
Segundo Grau
Pagaria mais
Escolaridade até
Nível Superior
Pagaria mais
Escolaridade até
Pós-Graduação
Não43%Sim
57%
Não9% Talvez
11%
Sim80%
Não25%
Sim58%
Talvez17%
Não11%
Talvez37%
Sim52%
Não Talvez Sim
Fonte: Pesquisa de campo
Percebe-se que o civismo foi o fator com maior correlação com pagar um
preço prêmio. Note-se também que pessoas de baixa renda são tão ou mais
75
sensíveis à Responsabilidade Social que pessoas de alta renda.28 Como o civismo
está relacionado ao interesse por notícias, notas em jornais, matérias e publicidade
etc., publicidade nestes meios pode ser uma forma eficiente para garantir retornos.
Nota-se também que o civismo provavelmente determina, por exemplo, que
investir em ecologia pode ser fundamental para quem vende para consumidores do
Rio Grande do Sul e não fazer tanta diferença para consumidores do Acre. Além
disto, o civismo deve influenciar também no número de empresas virtuosas das
regiões e as decisões de um modo geral. Seu lado complicado refere-se a sua
característica predominantemente herdada, desenvolvida principalmente nas
famílias, sendo um fator de lenta modificação.
4.4.2 Coordenação estratégica
Para que a sustentabilidade efetivamente ocorra é preciso ter consciência que
a ação individual da empresa não é suficiente. A Responsabilidade Social com fins
de longo prazo deve ser disseminada para grande parte das empresas, além disso,
tal ação precisa ser, de alguma forma, coordenada estrategicamente para otimizar
atingir os objetivos comuns. Esta coordenação, além de evitar superposições
excessivas e improdutivas, faz com que esforços individuais para tomada de decisão
sejam reduzidos, pois a estratégia de investimento social seria feita em conjunto.
Um exemplo de coordenação estratégica de RSE é a Conferência de
Responsabilidade Social e Desenvolvimento Sustentável da Região Sul, que convida
"sua empresa, organização civil, universidade ou instituição para fazer parte deste
movimento de Responsabilidade Social, sustentável e democrático." A conferência
tem os seguintes objetivos:
1. "Aprofundar os compromissos dos realizadores e parceiros com a
responsabilidade social e o desenvolvimento sustentável na região Sul do
Brasil;"
2. "Fortalecer alianças e parcerias em projetos e programas sociais
prioritários para a região;" 28 Vide dilema Tirando dos pobres para dar aos pobres, item 2.7.4.2.
76
3. "Implementar um programa permanente de serviços voltados para
empresas, universidades, cidades e fóruns de desenvolvimento regionais
com base na responsabilidade social;"
4. "Desenvolver atividades de capacitação e apoio em projetos de
desenvolvimento sustentável e responsabilidade social e cidadã;"
5. "Organizar a AGENDA SOCIAL SUL como Fórum de empresas e
organizações associadas e signatárias da Carta Agenda Social Sul do
Brasil."29
4.4.3 Consumo consciente
O fomento do consumo consciente é uma forma importante para disseminar a
prática de Responsabilidade Social. Como já dito, ele é um dos responsáveis na
modificação da matriz de pay-offs, tornando pouco interessante não praticar a
Responsabilidade Social.
Fomentar implica desde informar a população do que é Responsabilidade
Social e da importância de sua prática, até conscientizar a população sobre
questões de sustentabilidade social, ambiental e econômica, bem como informar o
que vem sendo feito. Trata-se de um trabalho longo, delicado, que vem sendo
realizado por diversas organizações, dentre elas destaca-se o Instituto Akatu e as
Organizações Globo. O primeiro foi criado pelo Instituto Ethos (criado pelas
empresas) e tem como finalidade fomentar o consumo consciente, por meio de
palestras e pesquisas. Já as Organizações Globo realizam programas voltados
exclusivamente para a cidadania, como o Ação (Globo) e o extinto GNT Cidadania
(GNT), e ainda outros, que divulgam embora não sejam exclusivos sobre o tema,
como Via Brasil (Globo News).
29 http://www.cidadefutura.com.br/conferencia/objetivos.htm.
77
4.4.4 Divulgar para disseminar:
Outra forma importante para disseminar a prática é divulgar os retornos e a
importância da prática de RSE. As empresas que a praticam estão motivadas a
disseminar a prática, uma prova disto foi a criação e a manutenção o Instituto Ethos.
Assim, visando atingir tais objetivos diversas ações são necessárias, como criar
prêmios para o estudo do tema, como realizado pelo Instituto Ethos e, recentemente,
pela Souza Cruz. Estes prêmios, ao incentivar o estudo, ajudam a amadurecer os
argumentos necessários à prática, bem como incentivam profissionais a seguir esta
área.
Dentre outras ações estão promover e participar de palestras, seminários e
congressos empresariais, bem como divulgar estudos como o livro "Compromisso
Social e Gestão Empresarial" (Apoio do Ethos e patrocínio de O Boticário) e do
estudo "Criando Valor: O business case para sustentabilidade em mercados
emergentes" (divulgado amplamente pelo Ethos).
78
5. Mercado ou Estado
Em um contexto de redefinição do papel do Estado enquanto entidade capaz
de promover bem-estar e desenvolvimento econômico torna-se cada dia mais
freqüente a discussão sobre quem deve assumir tais atribuições, se o mercado ou o
Estado. Sobre isto, antes de qualquer coisa, é preciso esclarecer que neste trabalho
se parte do ponto de vista de que a maior forma de colaboração da empresa está no
provimento de recursos ao Terceiro Setor. Muito embora existam organizações deste
que são fundações com a marca de uma empresa associada, considera-se que a
empresa tenha viabilizado economicamente a referida fundação. Além do mais,
entende-se que, mesmo que o Terceiro Setor assuma responsabilidades em
complementação ao papel do Estado, a origem dos recursos deve vir,
preferencialmente, do setor privado. Este deve ter, pelo menos, uma participação
mais relevante do que tem hoje.
Considera-se, também, que o Estado é, sim, o principal responsável pela manutenção da sociedade, onde todos têm a obrigação do pagamento dos
impostos de forma a possibilitar o funcionamento do mesmo. Por outro lado, as
empresas são as maiores afetadas pelas distorções sociais e com maior potencial
financeiro para ajudar a solucioná-las. Não se têm dúvidas de que esta seja uma
discussão delicada, mas que deva ser um exemplo onde a "Genialidade do E" deva
prevalecer sobre a "Tirania do OU" (COLLINS; PORRAS, 1995, p. 74-76). Ou seja,
Estado, Empresas e Sociedade Civil devem se organizar para objetivos comuns. Em
primeiro lugar, é preciso ter consciência de que:
A revolução dos Mercados demonstrou que a empresa é a principal
força de crescimento e desenvolvimento. É, portanto, no claro interesse da própria empresa que se deve entender esse impacto no processo de desenvolvimento e levar em conta que a revolução na demografia e no desenvolvimento é um compromisso de todos. (GRAYSON; HODGES, 2002, p. 24).
Porém não se pode esquecer que o:
Dogma neoliberal ”oficial” também cria seu próprio
“contraparadigma”, incorporando um discurso altamente moral e ético, que se concentra no “desenvolvimento sustentável” e na “diminuição da pobreza”, ao mesmo tempo em que se distorcem e “disfarça” as
79
questões políticas referentes à pobreza, à proteção do meio ambiente e aos direitos sociais das mulheres. Essa “contra-ideologia” raramente desafia as prescrições da política neoliberal. Ela se desenvolve paralelamente e em harmonia com o dogma neoliberal oficial, e não em oposição a ele (CHOSSUDOVSKY, 2000, apud GUIMARÃES, 2002, p. 99).
Por sua vez, o liberalismo econômico parte da premissa de "que o mercado,
livre de intervenções e funcionando livremente em busca de sua eficiência máxima,
assegura o crescimento econômico que, por sua vez, tende a absorver a pobreza."
(GUIMARÃES, 2002, p. 100). Pode-se dizer que este ciclo virtuoso anunciado por
Adam Smith, criticado por Keynes e ressuscitado no neoliberalismo, tem suas doses
de miopia. Possivelmente, o liberalismo funciona bem em países onde a distribuição
de renda não é tão cruel como no Brasil - muito embora nestes países o Estado não
seja tão liberal quanto pregam. Mas, no caso brasileiro:
Em função da irresponsabilidade deste governo neoliberal, anti-
nacional e anti-popular promove-se um processo de desconstrução nacional e desestruturação produtiva que descarrega sobre os setores de menor capacidade econômica da sociedade o brutal custo social da crise. (MERCADANTE, 1999, p. 3).
Descontada uma parcela de parcialidade ideológica de Mercadante suscitada
no trecho anterior, certamente advinda da oposição ao governo FHC na época - e
uma possível nova postura do Estado de bem estar social a partir do governo Lula -
vê-se que, mesmo assim, a estrutura de Estado endividado vigente não é capaz de
alterar o quadro nem no médio prazo.
Faz parte da lógica do liberalismo, também, que a mão-invisível corrija as
distorções e busque a maximização do ganho, o mercado deve atender às
necessidades do próprio mercado. Desta forma, como visto, se a Responsabilidade
Social contribui para a sustentabilidade econômica, praticá-la não fere a lógica
liberal.
As empresas também têm a responsabilidade de gerar emprego e renda;
aliás, trata-se de sua primeira responsabilidade: a Responsabilidade Econômica.
Dentro da segunda, a Responsabilidade Legal, está o dever de pagar os impostos
com os quais o Estado provê educação, saúde, moradia e bem estar social. Este
bem estar deve ser tal de forma a gerar desenvolvimento social, ambiental e
econômico suficientes para que, dentre outras coisas, se atenda às necessidades
80
das empresas. Se isso funcionasse na prática, poder-se-ia obter um ciclo de
desenvolvimento sustentável.
Além disso, empresas exportadoras, mesmo as totalmente independentes do
mercado interno, ajudam nesta sustentabilidade de diversas formas: geram divisas
fortalecendo o governo e o mercado; seus produtos atendem a requisitos de
qualidade superiores aos praticados no mercado interno, requerendo investimentos
para melhorar o parque industrial instalado e sua mão-de-obra; cumprem exigências
de países de primeiro mundo no que diz respeito à sustentabilidade e ao meio
ambiente.
Com relação às transnacionais que aqui se instalaram, como Grayson e
Hodges colocaram:
A globalização fez com que mais empresas atuassem em países com
recursos públicos escassos, infra-estrutura ruim e com problemas sociais significativos, o que impede o crescimento do negócio ou as obriga a tomar medidas corretivas. (GRAYSON; HODGES, 2002, p. 41).
Tais empresas têm 4 opções: (i) ajudar a tornar o Brasil um país sustentável;
(ii) conviver com os problemas sem fazer nada e arriscar a ter grandes prejuízos se
a situação piorar; (iii) voltar ao país desenvolvido de origem, deste modo os custos
com mão-de-obra e demais exigências legais são superiores aos investimentos para
ajudar a tornar o Brasil um país sustentável; (iv) procurar um país onde seja ainda
mais barato produzir, como a Malásia, por exemplo.
Para as demais empresas, ajudar a tornar o Brasil um país sustentável é uma
alternativa interessante, pois serão beneficiadas no processo. Deste modo,
empresas, Governo e sociedade organizada, estariam trabalhando de forma
complementar (Fig. 11), para garantir "o desenvolvimento como um direito de todos
e não somente de uns poucos [...]. Os valores éticos da cidadania -- a participação, a
liberdade, a equidade, a diversidade, a solidariedade -- como referências
fundamentais de um modelo democrático de desenvolvimento”. (ROQUE, 1996, p.
1).
Mas, todos contam ainda com a alternativa do Easy-Rider: esperar enquanto
os outros fazem; lucrar sem investir. Tal alternativa deve ser considerada de forma
crítica pelo consumidor e pela sociedade.
81
FIGURA 11 – INTERAÇÃO ENTRE OS SETORES
Fonte: Grayson; Hodges (2002, p. 268).
82
6. Considerações Finais
A prática da Responsabilidade Social Empresarial tem se apresentado como
alternativa para a sociedade em um contexto de retração do papel do Estado como
grande provedor das demandas sociais. Porém, entende-se a necessidade de definir
e compreender a Responsabilidade Social de modo a possibilitar uma clara
diferenciação entre quem realmente a pratica e quem apenas se aproveita para se
"vestir em pele de cordeiro". Além disto, é preciso conhecer quais são os retornos
advindos dessa prática de forma a disseminá-la, pois são eles que justificam o
investimento de grande parte das empresas. Por fim, cabe uma melhor
compreensão da importância do Marketing Social, um instrumento que deve ser bem
pensado e executado para que sirva à sociedade e à empresa praticante da RSE,
para que não alimente uma "nuvem de fumaça" em torno do tema.
Com relação à definição, percebeu-se que não basta praticar ações sociais,
nem investir (mesmo que sistematicamente), nem mesmo incentivar o voluntariado
para a prática da RSE. Afinal, outras atividades da empresa podem ter efeitos tão
prejudiciais à sociedade que superem negativamente os benefícios gerados por esta
pseudo-prática. Assim, entende-se que o envolvimento da empresa em ações
sociais não deve prescindir de uma atitude voltada para a assunção das
responsabilidades anteriores, ou seja, daquelas sugeridas pela pirâmide de
responsabilidades: Responsabilidade Econômica, Responsabilidade Legal,
Responsabilidade Ética e Filantropia Empresarial. Desta forma, só quem pratica a
pirâmide pode verdadeiramente ser considerado socialmente responsável.
Praticar Responsabilidade Social Empresarial, de uma forma ampla, pode
influenciar positivamente na sustentabilidade no tocante aos seus três aspectos:
social, econômico e ambiental. A sustentabilidade de uma comunidade afeta
diretamente as empresas nela inserida, daí porque investir para manter ou melhorar
as condições sociais, econômicas e ambientais significa também lidar com os riscos
e oportunidades do próprio negócio da empresa no presente e no futuro. Isto é
verdadeiro tanto em países como EUA, França e Inglaterra, por exemplo, quanto o é
em países como o Brasil. Neste caso, de forma ainda mais severa devido aos
problemas sociais e aos recursos escassos, apontando para a necessidade de se
melhor trabalhar o presente. Sendo assim, investir em Responsabilidade Social seria
83
parte fundamental da estratégia de longo prazo de empresas menos imediatistas,
com preocupações que estão para além do lucro do exercício, portanto uma
preocupação das empresas cíveis, virtuosas ou idealistas pragmáticas.
O civismo, que pode ser traduzido como "interesse próprio sensível ao
interesse dos outros" (TOCQUEVILLE, s.r. apud PUTNAM, 2000, p. 102), é uma
mudança de postura que implica em uma mudança de comportamento. Ele
influencia diretamente as decisões individuais, levando o indivíduo a adotar um
comportamento mais ético, pois agir pensando no interesse do outro é basicamente
agir de acordo com a regra do ouro, um dos pilares da ética. Comportamentos éticos
corroboram um maior nível de confiança entre os indivíduos de uma comunidade
possibilitando, dentre outras coisas, a redução de custos transacionais. Além disso,
o nível de civismo de um grupo implica também na mudança da estratégia adotada
nos jogos: enquanto baixos níveis levam à deserção e o equilíbrio de Nash, altos
níveis de civismo aliados a altos níveis de confiança entre os jogadores podem levar
a um maior ganho coletivo (equilíbrio de Pareto). Estas mudanças de
comportamento trazem benefícios que não existiriam de outra forma possibilitando,
por exemplo, o desenvolvimento do Capital Social.
Acredita-se que as empresas cíveis pratiquem a RSE naturalmente e de
forma ampla e que as pessoas que as compõem, além do próprio mercado
consumidor, têm um papel fundamental para levá-las a tal prática. Neste caso, a
pesquisa de campo para este trabalho indicou que o nível de civismo influencia
fortemente neste aspecto, ou seja, o índice de civismo é importante para a análise
do comportamento de consumo consciente e das avaliações internas. Pela
composição do índice, ele é também um relevante instrumento de avaliação da
mídia onde será veiculada a publicidade voltada ao marketing social da empresa;
jornais, telejornais, revistas e Internet figuram como boas opções para a publicidade,
atingindo um público mais interessado e consciente do tema, demandando menores
investimentos.
No tocante à Virtude e ao Idealismo Pragmático, embora não sejam tão
determinantes quanto o Civismo, também levam à prática ampla e auto-justificada da
RSE da seguinte forma: a Virtude condiz com uma atitude comprometida de pessoas
e empresas que têm uma forte e positiva visão de futuro e que, também, pensam no
outro; o Idealismo Pragmático possibilita agir de acordo com convicções sem a
certeza do retorno. Como foi abordado ao longo deste trabalho, três grupos de
84
empresas (as cíveis, as virtuosas e as idealistas pragmáticas) são as líderes do
processo de atuação Socialmente Responsável. É instigante perceber, entretanto,
que diversas delas não tivessem, inicialmente, interesse em divulgar suas ações, e
que o fizessem por um dilema de prisioneiro.
É importante ressaltar que a prática de RSE traz benefícios coletivos que não
se restringem à empresa que investiu. Outrossim, a lógica de decisão privada,
hedonista e com os inúmeros dilemas de prisioneiros não contempla o investimento
individual para o benefício coletivo, havendo a necessidade de outros retornos,
como o gerado pelo consumo consciente e ganhos de produtividade internos de
forma a modificar a matriz de payoffs e estimular este tipo de investimento, ou, é
claro, uma postura cívil, virtuosa ou idealista pragmática por parte da empresa.
Conclui-se que estes retornos existem na Bahia e no Brasil, mesmo que alguns
ainda sejam duvidosos e que outros necessitem de fatores maximizadores. As duas
pesquisas de campo realizadas para este trabalho parecem indicar a existência, por
um lado, de um consumo consciente e, por outro, de uma forte simpatia à prática da
RSE em ambos os públicos pesquisados (interno – funcionários da empresa e
externo - consumidores), sugerindo haver ganhos internos de produtividade,
motivados por uma maior satisfação com a empresa empregadora e outros externos,
relativos a um possível aumento de participação de mercado. Não se pode
esquecer, entretanto, da distorção provavelmente causada pelo efeito da auto-visão,
a divergência entre a retórica e a prática. Estes retornos devem ser trabalhados
pelos três setores da sociedade, maximizando, assim, os investimentos num ciclo
virtuoso.
Percebeu-se, ainda, que a forma como vem se apresentando o marketing
social não garante que a população possa diferenciar quem investe de quem apenas
faz marketing e ainda cria maiores distorções da realidade, gerando o risco da
ocorrência de deserção por parte de empresas cíveis, virtuosas e idealistas
pragmáticas. Ademais, isto tem criado dilemas que dizem respeito a onde investir e
quanto investir em marketing social.
Finalmente, algumas sugestões podem ser aqui colocadas para trabalhos
posteriores. Primeiro, que procurem avaliar o índice de civismo em relação às
decisões empresariais afetando a prática da Responsabilidade Social e a criação de
um índice que seja ainda mais independente de fatores sociais, pois se acredita que
muito embora o brasileiro mais pobre não leia jornais e revistas e, talvez, tenha
85
menor participação em associações, isto não pode ser traduzido como um menor
interesse pelo outro, mas, sim, resulta de um menor acesso à informação. Segundo,
que se busque um método de pesquisa de campo menos influenciado pelo efeito de
auto-visão, visto que este é um tema que envolve valores pessoais e aprovação
social. Por último, que sejam abordadas, com maior profundidade, as questões
relacionadas ao marketing e à publicidade, aprofundando o estudo dos públicos por
mídia (Mídia Dados)30 incluindo o índice de civismo, além dos tradicionais estudos
de níveis sociais e educacionais.
30 O Mídia Dados é o relatório mais importante para as agências de publicidade. Reúne as informações sobre públicos por mídia e conteúdo, visando orientar as empresas com relação ao local/conteúdo onde sua propaganda deverá estar concentrada.
86
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93
Anexo A - Formulário de Pesquisa Consumidores Pesquisa Sócio-Econômico-Cultural
1 Informações Preliminares:
1.1 Gênero (MASC) (FEM) 1.2 Idade _____ 1.3 Tem responsabilidade no sustento da família? (SIM) (NÃO) 1.4 Quantas pessoas compõem sua família? ________
2 Qual sua renda individual? R Salários Mínimos Reais Resposta 1 Menor que 1 S.M. Menor que R$ 240,00 2 De 1 a 2 S.M. De R$240,00 a R$480,00 3 De 2 a 3 S.M. De R$480,00 a R$720,00 4 De 3 a 4 S.M. De R$720,00 a R$960,00 5 De 4 a 6 S.M. De R$960,00 a R$1.440,00 6 De 6 a 8 S.M. De R$1.440,00 a R$1.920,00 7 De 8 a 10 S.M. De R$1.920,00 a R$2.400,00 8 De 10 a 12 S.M. De R$2.400,00 a R$2.880,00 9 De 12 a 16 S.M. De R$2.880,00 a R$3.840,00 10 De 16 a 20 S.M. De R$3.840,00 a R$4.800,00 11 De 20 a 25 S.M. De R$4.800,00 a R$6.000,00 12 De 25 a 30 S.M. De R$6.000,00 a R$7.200,00 13 De 30 a 35 S.M. De R$7.200,00 a R$8.400,00 14 De 35 a 40 S.M. De R$8.400,00 a R$9.600,00 15 Maior que 40 S.M. Maior que R$9.600,00 3 Qual sua renda familiar? R Salários Mínimos Reais Resposta 1 Menor que 1 S.M. Menor que R$ 240,00 2 De 1 a 2 S.M. De R$240,00 a R$480,00 3 De 2 a 3 S.M. De R$480,00 a R$720,00 4 De 3 a 4 S.M. De R$720,00 a R$960,00 5 De 4 a 6 S.M. De R$960,00 a R$1.440,00 6 De 6 a 8 S.M. De R$1.440,00 a R$1.920,00 7 De 8 a 10 S.M. De R$1.920,00 a R$2.400,00 8 De 10 a 12 S.M. De R$2.400,00 a R$2.880,00 9 De 12 a 16 S.M. De R$2.880,00 a R$3.840,00 10 De 16 a 20 S.M. De R$3.840,00 a R$4.800,00 11 De 20 a 25 S.M. De R$4.800,00 a R$6.000,00 12 De 25 a 30 S.M. De R$6.000,00 a R$7.200,00 13 De 30 a 35 S.M. De R$7.200,00 a R$8.400,00 14 De 35 a 40 S.M. De R$8.400,00 a R$9.600,00 15 Maior que 40 S.M. Maior que R$9.600,00
94
4 Qual seu nível de escolaridade? R Escolaridade Resposta 1 Não sabe ler nem escrever 2 Primeiro Grau incompleto 3 Primeiro Grau completo 4 Segundo grau incompleto 5 Segundo Grau completo 6 Terceiro Grau Incompleto 7 Terceiro Grau Completo 8 Pós Graduação 9 Mestrado ou Mestrando 10 Doutorado ou Doutorando 5 Quantos jornais impressos lê? ________ 6 Quantas revistas lê? _________ 7 Das revistas quantas são de noticias sociais/políticas/econômicas/financeiras?______ 8 Quantos livros lê por ano? _______ 9 Assiste jornal na TV pelo menos 3x por semana? (SIM) (NÃO) 10 Quantas associações faz parte? _________ 10.1 Destas quantas são de classe ______ 10.2 Quantas de interesse comunitário______ 11 Já fez alguma doação ou ação solidária? (SIM)(NÃO) 11.1 Qual? __________ 12 Tem TV por assinatura? (SIM) (NÃO)
12.1 Qual? ______________ 13 – Acessa a Internet quantas horas por semana? _________ / Não tem acesso A questão 14 deve ser respondida com o grau de concordância da afirmação: 5 – Concordo Fortemente 4 – Concordo 3 - Concordo em parte 2 – Indiferente 1 – Discordo 0 -. Discordo Totalmente 14 Não tenho dinheiro para escolher marcas, compro pelo menor preço. _________ 15 Você sabia que as empresas realizam ações sociais? (SIM) (NÃO) 16 Como se chamam as ações sociais das empresas? __________________
95
17 Você sabe o que significa responsabilidade social empresarial? (SIM) (NÃO) 18 Qual para você é o maior problema social do país? ________________ As questões 19 a 23 devem ser respondidas com o grau de concordância das afirmações: 5 – Concordo Fortemente 4 – Concordo 3 -Concordo em parte 2 – Indiferente 1 – Discordo 0 - Discordo Totalmente 19 Eu acho importante que as empresas invistam em RS. _____ 20 Encontro dificuldades para identificar empresas socialmente responsáveis. ______ 21 Acredito que os problemas sociais são responsabilidade das empresas. ______ 22 Eu levo em consideração a RS ao comprar um produto. _______ 23 Pagaria até um pouco a mais pelo produto de uma empresa responsável. ________ 24 Você já comprou ou deixou de comprar um produto por levar em consideração a RS da empresa fabricante? (SIM) (NÃO LEMBRO) (NÃO)
24.1 Pode citar o produto? ____________________(NÃO) 25 Cite uma empresa que você saiba que pratica RSE: _______________ 26- Você trabalha para uma empresa? (SIM) (NÃO)
26.1 Sua empresa pratica responsabilidade social? (SIM) (NÃO SEI) (NÃO)
Anexo B - Formulário de Pesquisa Funcionários
Este questionário é composto de 21 perguntas e deve ser respondido sequencialmente, sem voltas para alteração de respostasResponda sempre na coluna I (em amarelo), observe a descrição da resposta de modo a garantir que suas respostas são válidas.Após responder favor salvar e enviar por e-mail para [email protected] sob o assunto "RespostaOBoticario".Dúvidas favor enviar por e-mail para [email protected] sob o assunto "DuvidasOBoticario".
1 Respostas Instuções Resposta1,1 Digite M ou F Falta Responder1,2 Idade em anos Falta Responder1,3 Digite S ou N Falta Responder1,4 Incluindo Você Falta Responder
2
Digite Nº de 1 a 4 Conforme Tabela de Renda na planilha Tabelas de Consulta Falta Responder
3
Digite Nº de 1 a 4 Conforme Tabela de Renda na planilha Tabelas de Consulta Falta Responder
4
Digite Nº de 1 a 5 Conforme Tabela de Escolaridade na planilha Tabelas de Consulta Falta Responder
5
Digite Nº de 1 a 4 Conforme Tabela de Hierarquia na planilha Tabelas de Consulta Falta Responder
Informações Preliminares:
Pesquisa O Boticário
Perguntas Sócio-Econômicas
Qual seu nível de escolaridade?
Qual seu nível hierárquico?
Qual sua renda individual?
Qual sua renda Familiar?
Gênero (MASC) (FEM)IdadeTem reponsabilidade no sustento da casa?Quantas pessoas compõem sua família?
96
Perguntas Culturais Respostas Instuções Descrição da Respost
6 Em média. Não lê = 0 (zero) Falta Responder
7 Em média. Não lê = 0 (zero) Falta Responder
7,1 Em média. Não lê = 0 (zero)
8 Digite S ou N Falta Responder
9 Não faz parte = 0 (zero) Falta Responder
9,1 Não faz parte = 0 (zero)
9,2 Não faz parte = 0 (zero)
10 Digite S ou N Falta Responder
10,1
11Em média. Não acessa = 0 (zero) Falta Responder
12 Digite S ou N Falta Responder
Exemplos: Citação K / não lembro
Você sabe o que significa responsabilidade social empresarial?
Quantas de interesse comunitário (associações de bairro, ONGs, OSCs, pastorais, etc)Já fez alguma doação ou ação solidária? Estão incluídas aqui deste doações para o Criança Esperança até serviços sociais voluntários.
Cite duas ações que praticou. (Cite as mais solidárias. Se não lembrar escreva não lembro. Separe por "/")
Acessa a internet quantas horas por semana?
Quantas das revistas são de noticias sociais ou políticas ou econômicas ou financeiras?
Assiste jornal na TV pelo menos 3x por semana?
Quantas associações faz parte? (Qualquer associação, incluindo até mesmo fã clubes e clubes sociais).
Quantas vezes por semana você lê jornais?
Destas quantas são de classe (sindicatos, cipa, etc)
Quantas revistas diferentes lê mensalmente? (4 vejas e 4 Contigo = 2 revistas diferentes)
97
Perguntas Finais Respostas Instuções Descrição da Resposta
13 Digite S ou N Falta Responder
13.1
14
15
Digite Nº de 0 a 5 Conforme Tabela de Concordância na planilha Tabelas de Consulta Falta Responder
16
Digite Nº de 0 a 5 Conforme Tabela de Concordância na planilha Tabelas de Consulta Falta Responder
17
Digite Nº de 0 a 5 Conforme Tabela de Concordância na planilha Tabelas de Consulta Falta Responder
18
Digite Nº de 0 a 5 Conforme Tabela de Concordância na planilha Tabelas de Consulta Falta Responder
19
Digite Nº de 0 a 5 Conforme Tabela de Concordância na planilha Tabelas de Consulta Falta Responder
20
Digite Nº de 0 a 5 Conforme Tabela de Concordância na planilha Tabelas de Consulta Falta Responder
21 Exemplo: Projeto y
Exemplos: Citação Z / não lembro
Exemplo: Problema XResponda de acordo com o grau de concordância: 5 – Concordo Fortemente 4 – Concordo 3 -Concordo em parte
As questões 15 a 20 devem ser respondidas com o grau de concordância das afirmações:
Estou satisfeito de trabalhar em O Boticário.
Cite 2 (duas) ações ou projetos (se não lembrar escreva "não lembro". Separe as ações por "/".
Qual para você é o maior problema social/Ambiental do país?
Considero que parte de minha satisfação em trabalhar aqui vem de considerar O Boticário uma empresa Cidadã
Cite uma ação ou projeto que você considera que seria importante que O Boticário apoiasse
Considero importante que O Boticário pratique Cidadania Empresarial
Considero que O Boticário devesse aumentar a divulgação externa sobre suas práticas de Cidadania EmpresarialConsidero que O Boticário é coerente em praticar Cidadania Empresarial, ou seja, que satisfaz as Responsabilidades Econômica, Legal e Ética
Considero que O Boticário devesse aumentar a divulgação interna sobre suas práticas de Cidadania Empresarial
Você sabia que o Boticário pratica Cidadania Empresarial?
98