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1 A história de Rute Cerca de 900 anos antes de Rute nascer. Um homem triste olha para uma formação de salitre que lembra um corpo feminino caído. Onde havia uma imensa campina, bosques verdejantes de beleza ímpar, agora se estendia um imenso mar. Às margens daquele mar estranho, ainda exalando vapores de ocre odor, com o corpo coberto de fina camada de sal trazido pelo vento inconstante, um homem chora a perda de sua esposa. Ele toca na formação de sal, que parece uma mulher caída, tremendo se levanta e caminha sem direção. Ainda tremia do estrondo e do clarão que transformou as cidades de sua moradia em lenda, em conto, em agouro, numa ruína de perdição, de ruas cobertas a quatrocentos

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A história de Rute

Cerca de 900 anos antes de Rute nascer.

Um homem triste olha para uma formação de salitre que

lembra um corpo feminino caído. Onde havia uma imensa campina, bosques verdejantes de beleza ímpar, agora se

estendia um imenso mar. Às margens daquele mar estranho, ainda exalando vapores de ocre odor, com o corpo coberto de

fina camada de sal trazido pelo vento inconstante, um homem chora a perda de sua esposa. Ele toca na formação de sal, que

parece uma mulher caída, tremendo se levanta e caminha sem direção. Ainda tremia do estrondo e do clarão que transformou

as cidades de sua moradia em lenda, em conto, em agouro,

numa ruína de perdição, de ruas cobertas a quatrocentos

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metros abaixo de onde os olhos avistavam a superfície do mar

morto.

Ele, caldeu, lembra da cidade de Ur, das cadeiras e mesas das

salas de aula, das danças e festividades de sua terra natal. Da

cidade dos mil deuses, que há tanto tempo deixara para trás. Desde que saíra tudo aconteceu de errado. Seguiu com seu tio

que disse ter tido visões com um Deus desconhecido que o chamava para uma terra prometida, com a qual também

desejou sonhar. E lembra que desobedeceu a ordem do Deus estranho, que só havia chamado a seu tio àquela estranha

aventura. Ele não foi convidado. Por vinte anos ele vagueou sem rumo, porque simplesmente não tinha direção. Nenhuma

direção.

Ló chegou as campinas de Moabe junto com suas duas filhas, poucos dias depois da hecatombe que sinistrou a Sodoma e

Gomorra. Desiludido com os homens, dos quais ele, infelizmente, conheceu o lado pior, decidiu habitar os montes

e as cavernas. Suas filhas sabiam que não se casariam,

naquele ermo lugar, que só viria possuir cidades centenas de anos após a solitária peregrinação de Ló.

Numa noite sinistra, quando após alguns anos elas perderam a esperança de voltar a viver perto de alguma civilização,

tomadas do horror de se transformarem em duas velhas desamparadas, como bruxas morando no interior de cavernas

e temendo que após décadas de solidão, lobos as encontrassem já sem forças para se defender, elas decidem

que devem gerar filhos, mesmo que seja a custa de seu

próprio pai. Nessa noite perdida entre as noites de antigos povos, elas

embebedam seu pai, e na madrugada envoltas na escuridão, sem nenhum pudor se deitam com ele. Sem ter plena

consciência do que faz, ele as engravida. Um dos filhos desta noite sinistra se chamou Moabe.

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Cerca de 430 anos antes de Rute nascer:

Um imenso grupo de gente, incontável multidão se aproximava lentamente da antiga planície. Ali habitavam os

descendentes da noite que se perdeu na história.

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Os descendentes viram ao longe por semanas uma tocha de

fogo que se elevava aos céus, como um redemoinho em chamas que anunciava que os que tinham destruído o Egito,

agora se aproximavam. Quando amanheceu os reis do recém fundado reino de Moabe receberam a delegação dos

forasteiros que solicitaram passagem por suas terras. Ao longe a multidão, agora guarnecida de uma imensa nuvem que

como coluna de fumaça se elevava a frente de uma estranha tenda, uma enorme tenda que sobressaia sobre as outras,

aguardava a resposta.

Os reis num misto de inveja e terror, disseram não. Não lhes

importava as crianças, os idosos ou o quanto iriam ganhar de tempo. Não permitiriam que aqueles deuses estranhos, nem

sua coluna de fogo, nem a tal coluna de nuvem, passassem pela terra dos seus ancestrais.

Os antigos reis observam quando o ancião com o cajado perto

da imensa tenda recebe a notícia de que não poderiam passar.

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A massa imensa de gente levou dias para se por em marcha. E levaria meses para chegar aonde pretendiam. Mas, isso não

era da conta dos soberanos de Moabe.

Muitas noites com insônia se passaram. Depois de muitos dias

a tal coluna de fogo e a tal coluna de nuvem reapareceram e com elas aquela inumerável multidão.

Os reis de Moabe e de outras terras chamadas Mídia em terror

incalculável resolveram convocar o poder das trevas para impedir que aquela marcha insana continuasse. De boca em

boca foi passada a torpe mensagem:

- Convoquem a Balaão.

Na densa escuridão da noite, durante o período que os trovões levam, antes do próximo relampejar, trepidavam patas

ferradas dos corcéis negros, ferrando as poças da lama ocre

no caminho lamacento até a lendário castelo do feiticeiro mais poderoso da terra. O alvo dos olhos dos animais resplandecia,

junto a sua escura crina a cada raio que os iluminava. Montado sobre o negro animal, os mensageiros e das terras

distantes de Moabe, com suas indumentárias escuras e encharcadas, gritam para os guardas à frente dos gigantescos

portais da antiga fortaleza, na qual Balaão habitava. As imensas portas são abaixadas, enquanto eles ainda chicoteiam

os alazões, ao sonido agora ocre, do trote nas pedras lavradas, recobertas de liquens acinzentados, do pátio

castelar. Da sacada superior, uma sombria figura observa a

chegada dos mensageiros midianitas e moabitas. Deixando para trás suas cansadas montarias, caminham como

arrastassem a si mesmos, até o grande salão de pórfiro e

granito, enquanto um sombrio ajudante vai murmurando algum aviso para aquele que se assenta sobre uma gigantesca

cadeira adornada de púrpura e de madeira ricamente trabalhada. Quase um trono. O mensageiro entra solene pelas

portas palacianas, subindo até o lugar do grande salão rodeado de colunas de rosacrocita. Eles param subitamente e

se ajoelham, enquanto as abas de suas vestimentas molhadas enchem como um vestido o lugar onde se abaixam. Na

verdade, usam todos capas. Negras. Aquele que está sentado não se vira para cumprimentá-los. De costas ainda, levanta

uma das mãos esqueléticas fazendo um gesto com a ponta dos dedos, sob o olhar malévolo e olhos semicerrados do sombrio

homem ao seu lado direito. Os mensageiros se levantam e caminham, enquanto suas sombras se projetam na cortinada

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das colunas, através da luz das lamparinas acesas com óleo de

baleia albina. O ruído de suas botas de couro molhadas sobressai agora no silencioso salão, reverberando a cada

passo sobre o pórfiro impecavelmente polido. Próximo ao

homem assentado, quando se achegam, ajoelham novamente em reverência. Fala então um dos mensageiros de Moabe:

— Ó! poderoso feiticeiro. Nossos guerreiros dalém, nas terras

distantes, que batalham já a longo tempo, necessitam dos préstimos de tuas maldições. Os reis de Moabe e de Mídia me

enviaram a ti para que, encontrando mercê diante de ti, dignasses a conceder-nos teus dons sobrenaturais contra um

terrível povo que vem do oriente.

Quebrava-se o silêncio sepulcral através do murmúrio do vento soprando entre as frestas das pedras nas paredes.

Soando tal som como fosse um antigo órgão tubular. O olhar do sombrio homem ao lado do feiticeiro, semicerrou-se ainda

mais.

Finalmente o antigo feiticeiro se levantou. Arrastou a estranha roupa cheia de cangas e cordas com ossos partidos e dentes

em quantidade que batiam uns nos outros, enquanto se apoiava ao bordão que possuía uma pequena caveira na

extremidade, completamente enegrecida. Em suas mãos um colar de conchas e pedras, dando diversas voltas em suas

mãos cadavéricas. Ele aperta as conchas com suas velhas mãos enquanto estica o indicador com horrenda unha em

direção ao mensageiro.

— Que queres, tu de Balaão? Sabes que sobre quem lançar minha maldição, maldito será por toda a eternidade. Irão

secar as fontes e corredeiras de sua terra, seus filhos morrerão ainda jovens de peste e as virgens já não gerará

mais. Virá fome sobre as cidades, sequidão sobre as

pastagens, doença no gado e nos homens. Não ficarão fracas e inúteis as mãos dos hábeis arqueiros? Não semearia eu terror

sobre toda a terra? Que queres de Balaão, servo de ninguém?

- O rei meu senhor pede teus serviços. E te recompensará regiamente.

Balaão se arrasta sobre o pórfiro com uma risada aterradora.

Encurvado se dirige a mesa e tomando de um líquido viscoso e cor de sangue, derrama a taça de prata enquanto gotas do

líquido vermelho se derramam pelo chão. Ele se volta ao mensageiro, enquanto o barulho do bordão ressoa em todo o

salão a cada passo de sua perna coxa. Então fala:

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E que povo morto é este, quem serão os coitados e miseráveis sobre os quais se abaterá a palavra da maldição, que se farão

como fantasmas e cujas vidas separadas para o desespero

serão, que nação é essa que desaparecerá de sobre a face da terra, essa que eu terei o infortúnio de maldizer?

Os mensageiros se calam.

Balaão olha curioso. E grita:

- Respondam-me para que não morram, ainda de pé,

mensageiros tolos!

Os céus relampejaram neste instante, tornando o olhar de Balaão ainda mais assustador

- É o povo d’além mar, cujos deuses destruíram a terra do

Egito, aquele que de noite vai a frente a coluna de fogo e que

ao amanhecer é precedido pela coluna de nuvem.

A taça cai da mão de Balaão. Rapidamente ele expulsa os mensageiros, dizendo que depois dará uma resposta.

Na noite misteriosa e chuvosa, relampeja quando os dois ajudantes misturam junto com o velho bruxo as poções,

repetindo as preces e invocações de sacerdotes da antiguidade, de escritos de línguas mortas, e ritos que já não

existiam. Deixando de lado os deuses de Mídia e Moabe, esquecendo-se

das divindades dos heteus e jebuseus, Balaão invoca a divindade protetora do povo além do mar. E invoca aquele que

conhece por El Shadai, El Elion e Senhor. Escolhe chamar-lhe por Senhor.

Quando o invoca, Ele sente uma estranha presença. Uma

poderosa presença. É ele. Senhor havia chegado.

Senhor se apresenta ao feiticeiro. Balaão conhece pouco a Senhor. Não exigia sacrifícios humanos. Não falava ou agia

como os outros espíritos com tratava. Na madrugada, claramente Balaão ouviu uma voz. E sabia quem falava com

ele. Era Senhor.

- Quem são estes homens que estão contigo?

Tremendo Balaão responde: Balaque, rei dos moabitas os enviou para amaldiçoar o povo que saiu do Egito.

Senhor responde:

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- Você não o fará. Eles são benditos.

E então se cala. A voz nada mais falou. Um feiticeiro só

amaldiçoa um povo, se obter acordo com os espíritos que guardam tal povo. Ele os invocaria e veria o que eles pediriam

para atender a Balaão. Mas não havia acordo com Senhor. Ele não negociava. Jamais.

Contrariado ele despede aos mensageiros.

- Vão embora, mensageiros de ninguém. O espírito que guarda

ao estranho povo impediu-me de amaldiçoar ao estranho povo. Vão. Vão e não voltem mais.

Quando os mensageiros chegam ao amanhecer, ainda chovia

sobre as planícies de Moabe. Balaque se desespera. Envia seus mais nobres príncipes com riqueza e recompensa como nunca

antes um feiticeiro na terra, jamais fora agraciado. Eles

chegam com ovelhas em multidão, bois, cabras e camelos. Trazem especiarias, azeite e mel, passas e damascos, vinho e

leite. Mantas púrpuras e carmesim, vestidos bordados de azul e ouro.

Seus olhos faíscam com a avareza. Riqueza inimaginável. Ele finge não se interessar. Porém ao ver tamanha riqueza,

Balaão decide tentar negociar com Senhor. Mais uma vez.

Ele insiste permissão, ao menos para ir com eles. Mas, dentro de si maquina um plano. Ele invocará outros deuses e

certamente haverá mais poderosos que Senhor. Ele só precisa ir.

- Vá com eles. Ao amanhecer. Mas só farás o que eu te disser.

Balaão concorda. Mentindo. Ele se ajoelha, como se pudesse enganar sua verdadeira intenção.

Ainda de madrugada, antes que amanhecesse, inquieto, preparou sua velha montaria. A mula. A velha mula. Rico. Rico,

ele pensava. Mas, Senhor escutava seu coração.

Na subida dos montes em direção as fronteiras de Moabe uma velha mula se assusta. O velho animal empaca ao sentir o

poder espiritual e a luz que só ela, a mula, enxerga. As crinas no pescoço acinzentado do velho animal se arrepiam ao ver a

estranha criatura. E seus olhos se fixam nas mãos do anjo que carregam uma espada incendiada. Na região montanhosa Ela,

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a mula, quase esmaga a perna de seu dono. Ele espanca a

coitada e continua a íngreme subida. Outra vez o ser aparece. E só ela, a mula, consegue enxergá-lo. Desta vez Balaão é

empurrado contra a encosta rochosa. Descendo furioso do

animal, ele o chicoteia sem misericórdia. Em meio aos gritos da mula, um assombro. Ela se vira para Balaão e dotada de

repentina inteligência, deixando de lado os zurros, contra tudo que poderia se esperar de tal animal, ela fala.

- Porque me espancas assim? Já fiz algo contigo assim, nos

muitos anos que sou tua montaria?

Balaão era um feiticeiro. Adivinhava pelas nuvens. Orava para árvores sagradas. Acostumado aos ruídos estranhos e as

bruxuleantes manifestações de todas sortes de espíritos, das divindades em formas de animais, não estranha o

acontecimento. Os animais em seus sonhos falavam. Ele simplesmente responde como se fosse natural conversar com

um animal.

- Maldito animal, por duas vezes você quase me esmagou a

perna!

Então seus olhos são abertos. Vê o que só sua mula via. O ser com uma espada incandescente. Ele cai de joelhos enquanto

ouve agora, não mais a voz da mula, mas a voz do ser que se interpunha em seu caminho:

- Se teu animal não tivesse impedido, tu agora estarias morto.

Foi essa a ordem que foi te dada?

- Não.

- Espera o amanhecer e vai com aqueles que eu ordenei.

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A visão se desfaz. Balaão entende que nada pode esconder

diante daquele, que tudo vê.

O feiticeiro volta para casa e ao amanhecer sobe até as montanhas, acompanhado de comitiva real dos moabitas.

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Então chega ao cume dos montes ao entardecer, no momento

em que a nuvem branca que se eleva da terra a frente da multidão, próxima a grande tenda, tornár-se em chamas e

incandescer. A face de Balaão e as terras de Moabe se

iluminam com as chamas da coluna que se ergue na frente da tenda do santuário, do Deus do povo d´além do mar. Balaão

sabe que nada poderá fazer. Invoca suas divindades e faz seus ritos, mas não são os espíritos ancestrais que vão ao seu

encontro. É ele. O protetor daquele povo. Senhor. El Shaddai. Tomado de um poder que arrebata suas entranhas e que lhe

enche de palavras, profere:

De Arã, me mandou trazer Balaque, rei dos moabitas, das montanhas do oriente, dizendo: Vem, amaldiçoa-me a Jacó; e

vem, denuncia a Israel.

Como amaldiçoarei o que Deus não amaldiçoa? E como denunciarei, quando o SENHOR não denuncia?

Porque do cume das penhas o vejo, e dos outeiros o contemplo; eis que este povo habitará só, e entre as nações

não será contado.

Quem contará o pó de Jacó e o número da quarta parte de Israel? Que a minha alma morra da morte dos justos, e seja o

meu fim como o seu.

Balaão sabia que ao pronunciar aquilo, perdia todas as riquezas prometidas. Mas nada podia fazer. Era o Senhor que

falava através dele. Quando descem do monte naquela noite, ele ainda almeja a

riqueza que lhe escapou. Ainda anseia pelo ouro que lhe foi

ofertado. Então sua alma de feiticeiro fala mais forte, do que o dia em

que se tornou profeta. Ele olha para Balaque e diz:

- A única chance de Moabe, é que eles se afastem do Senhor.

Usem suas mulheres mais belas. Seus ritos mais torpes. Mexam com o desejo humano. Tornem os filhos deste povo,

adoradores de deuses desta terra. Contaminem sua herança. E então, vencereis...

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Monte de Pisga, montanha mais alta de Moabe, onde Moisés

contemplou a terra prometida pela última vez. Por onde Balaão tentou fugir

Os conselhos de Balaâo são seguidos a risca. Milhares de mulheres moabitas e midianitas são convocadas para

festividades que durariam semanas, concedidas as mais

nefastas e torpes divindades de Canaã. E os ritos que misturavam prazer e vinho; incenso e orgias, contaminou de

modo profundo a Israel. Até que veio a praga. E milhares morreram enfermos.

Meses se passaram quando outra comitiva convocou o mesmo Balaão. Agora para uma guerra. Israel, tendo Moisés como

comandante viria contra as forças de Balaque e Moabe.

Os exércitos se aproximam numa multidão considerável. Ao longe se destaca a figura torpe do bruxo dos bruxos.

Segurando seu bastão enegrecido e invocando suas

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divindades, qual um sacerdote de poderes negros, ele

amaldiçoa ao exército inimigo. Ele amaldiçoa a Moisés.

O profeta olha para o imenso exército e experiente exército.

Olha para os doze mil separados contra a superioridade inimiga.

E de longe, encara a Balaão. O cajado negro levantado sobre o

monte o denuncia.

Um segundo bastão é levantado. O cajado de Moisés. E Israel parte para a batalha sangrenta.

O exército do mago contra o exército do profeta. Não. Contra o exército de Senhor.

Naquele entardecer um exército inteiro morre, junto ao seu

feiticeiro.

Os moabitas foram proibidos de sequer se aproximar da tenda

da congregação. Nenhuma geração jamais teria o direito de adorar ao Deus de Israel nem na tenda da congregação, nem

no templo que um dia se ergueria em israel.

Nenhuma geração...

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430 anos após a morte de Balaão.

A história de Rute

Capital de Moabe –

Kir Moabe

A crise econômica tomou o oriente médio de surpresa. Meses de estiagem deixaram os pastos israelitas secos. Antigas

fazendas, um dia célebres por seus produtos, agora eram sítios abandonados. Cada manhã as cidades israelitas

acordavam com o monótono som das moedeiras que desde cedo batiam em seus pilões de cedro os grãos colhidos no dia

anterior. Agora, em muitas cidades israelitas o que ouvia era o silencio.

Nessa época de crise, cerca de 1100 anos antes de Cristo, uma família judaica emigra para um país chamado Moabe em busca

de melhores condições de vida. A família é composta de um casal e seus dois filhos. Sai então de Belém de Efrata na região

chamada Judéia, descendentes de uma das doze tribos, a tribo de Judá. Noemi, seu esposo Elimeleque, e seus dois filhos,

Maalom e Quelion.

Noemi: - Querido, temos que ir mesmo? Não há outra solução, é uma terra estranha, de deuses estranhos. Os costumes dos

moabitas são distintos dos nossos...

Elimeleque: - Noemi, tu sabes que os pastos secaram. Nossas economias se dissipam rapidamente. Vendemos as terras que

pertenceram aos nossos pais. Devemos ter esperança, quem

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sabe Deus não se mostra propício para que encontremos

famílias que nos acolham, uma terra para semear e colher.

Campinas de Moabe

Mas a sorte não lhes favorece. Em Moabe veio a falecer

Elimeleque, deixando Noemi viúva com seus dois filhos.

Pouco após a morte de Elimeleque, uma grande festa é dada

por uma nobre família moabita. Duas irmãs festejevam a paixão e a alegria de se casarem na mesma época. As pétalas

de flores são jogadas abundantemente no caminho das jovens enfeitadas no dia de seu casamento. Noemi ainda pesarosa da

morte de seu esposo encontra consolo na chegada de duas meninas e um novo início em sua vida.

Seus filhos casaram-se em Moabe, com duas jovens chamadas

Órfã e Rute. Por alguns meses tudo melhorava. Foi quando a notícia do

campo chegou. Um acidente acontecera. Um boi ainda não amansado ferira gravemente ao filho mais velho. Maalon não

resistiu à gravidade dos ferimentos e então morreu.

Rute perdera seu esposo e chorava desconsolada abraçada com sua irmã, Órfã.

Seis meses se passam. Um grupo de nômades tenta assaltar

as ovelhas da fazenda de seus sogros. Quilioon os enfrenta bravamente. Os afugenta, mas se fere gravemente no

combate, vindo também a falecer.

Órfã agora enviuvava também, e era ela que agora chorava

sobre os braços de sua irmã.

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Noemi havia perdido a tudo que possuía. Terras, familiares e

mesmo a esperança. Desamparada em terra estrangeira, chegam notícias a Noemi que os pastos reverdeciam e que a

economia de Israel estava crescendo novamente.

Ela se preparou para partir de Moabe, mas suas noras

quiseram acompanhá-la. Ela insistiu para que não fizessem isso, para que voltassem para casa de seus pais, porque

mesmo voltando para sua terra, não possuía mais nenhuma possessão, que vendera para financiar sua estadia em Moabe.

Voltava para a cidade natal sem perspectivas, com um futuro incerto. Diz que está velha demais para ter novos filhos para

que elas possam desposar. Noemi abençoa suas noras, lembra de como foi bem tratada na sua estada em Moabe e deseja que

elas tenham paz, abundancia e possam casar-se novamente.

Órfã, diante de tantos argumentos, chora e desiste de acompanhá-la, voltando para casa de seus pais. Rute

permanece impassível, mesmo diante de um futuro tão pouco promissor, mesmo diante da insistência de Noemi para que ela

retorne para o conforto da casa de seus pais. Rute simplesmente diz:

- Onde quer que você for, eu vou te seguir. Tua nação será a minha. Teu Deus será o meu Deus. Onde você for enterrada, aí

serei eu. Nada se não a própria morte poderá impedir que eu te acompanhe.

E assim foi com Noemi naquela viagem insólita, para um

destino sem amanhã.

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Despedindo-se de seus pais, ela acompanha a desafortunada

Noemi. Quando alguns dias depois elas chegam na cidade, as notícias

sob sua vinda já lhe antecediam. E todos estavam admirados

tanto pela tragédia que se abatera sobre sua família, como pelo fato do tremendo amor que Rute demonstrara a uma

israelita.

Por séculos Moabe e Israel tiveram sérias crises, guerras, desavenças e preconceitos, em virtude de terríveis fatos entre

a história dos dois povos no passado. Os moabitas, foram proibidos de ADORAREM a Deus na tenda da Congregação, não

poderiam realizar sacrifícios ao Deus de Israel, tamanha era a diferença que existia entre os dois povos.

Reis moabitas impediram em tempos idos que o povo de Israel

sob a direção de Moisés transitasse em suas terras, em direção a terra prometida, o que fez com que milhares de

mulheres e crianças por cerca de 40 dias ou mais

enfrentassem o deserto numa difícil caminhada. Certa feita, reis moabitas contratam um feiticeiro para amaldiçoar a

Israel.

Noutra aceitam os conselhos para cativarem os israelitas para cultos onde havia orgias e prostituição cultual, onde milhares

de adolescentes ‘se entregavam’ para cativar o coração dos israelitas à certas divindades imorais dos Moabitas. Durante

séculos os moabitas roubaram as fazendas, fizeram coalizão com outros povos para destruição de cidades israelitas. Além

dos problemas políticos, das guerras, havia uma questão da origem dos Moabitas. Eles eram vistos como “o povo que

descendeu de um incesto” por herança do nascimento de Moabe, pai de todos os moabitas.

Depois de escapar da destruição de Sodoma e Gomorra, Ló, sobrinho de Abraão, desiludido com a vida em sociedade,

torna-se um ermitão, morando em cavernas das regiões montanhosas. Lá suas filhas, após alguns semanas de

afastamento das cidades e impedidas de se casarem pelas circunstancias, engendram um plano, embebedam seu pai por

duas noites e ambas se deitam com ele, engravidando ambas e dando luz a dois filhos: Amom e Moabe.

O avô e pai de Moabe, Ló, por sua vez também têm uma

história de desilusões e erros. Morou em duas das mais corruptas cidades que já existiram, perdeu sua esposa junto

ao mar morto por causa do Juízo divino sobre essas cidades; perdeu seus bens; certa feita fora aprisionado e seqüestrado

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pelos reis que um dia iriam originar a Babilônia; Ló saiu de Ur

dos caldeus junto com Abraaão, quando Deus chamou SOMENTE a Abraão para ir ao lugar onde todas essas coisas

lhe ocorreram. Ele seguiu junto a um homem que fora

chamado por Deus para realização de algo, contra a ordem dada a esse mesmo homem: “Sai da casa de teus parentes,

deixa para trás teus parentes”. Ló era parente de Abraão. Entende-se então o espanto dos habitantes de Belém pela

chegada e postura daquela estrangeira. E apesar de um passado amaldiçoado, de saber que seria uma pária,

estrangeira, sem direitos civis, sem direitos religiosos, Rute vai assim mesmo, sem saber o que lhe aguarda. A recepção

de velhos conhecidos é dramática, porque Noemi voltava de uma tremenda jornada, despojada de bens, sem uma

descendência, sem seu esposo e sem os filhos. Noemi procurou uma associação de RESPIGADEIRAS, uma

classe de pessoas que possuía diante das leis de Israel o direito de catar o milho, cereais, trigo, ou uvas que caíssem

das sacolas ou do colo das trabalhadoras das fazendas, como

auxílio aos mais desafortunados. Essa classe de pessoa vivia do resto, do que sobrava, do que porventura não fosse

colhido, dependia da sorte de encontrar donos de fazendas que exercessem misericórdia e generosidade, pois os

fazendeiros avarentos enchiam suas fazendas de coletores de cereais ou revezavam os grupos que voltariam para colher o

que havia sobrado, não deixando quase nada que pudesse ser colhido. Outra prática é que os moços das fazendas escolhiam

as mais bonitas e deixavam cair propositalmente parte do que colhessem em troca de “pequenos favores’ principalmente de

origem sexual. Ou mesmo por aquelas pelas quais se apaixonavam, realmente.

Rute era estrangeira e a lei de israel, apesar de retirar dela muitos direitos em virtude de sua nacionalidade, concedia a

ela o direito de catar trigo ou centeio como todas as outras.

Era o primeiro dia e Noemi lhe orienta a respigar cevada junto de uma das fazendas da região. Rute era belíssima. Era jovem

e de feições completamente diferente dos israelitas. Ela era mais alva e mais alta do que as outras jovens, dada sua

ascendência e possuía os olhos claros também. Era quase uma alemã em meio a um grupo descendência árabe. Ruiva, com os

cabelos avermelhados (observando como será um de seus descendentes – Davi- e também a descrição de um dos filhos

de Davi - Absalão).

De onde vem a menina dos cabelos vermelhos?

A menina de cabelos cor-de-fogo pediu permissão a um dos capatazes do grupo de colhedores e este concedeu que ela e

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outro grupo de jovens seguissem após, por dentro das

fazendas por onde trabalhavam.

E assim se passou o dia inteiro. Ao entardecer um dos donos

de uma das fazendas se aproximou e ao avistar a jovem perguntou quem ela era. O capataz contou que ela estava ali

desde o amanhecer, e que trabalhara atrás deles por até aquele momento, parando para descansar somente ao meio-

dia. Boaz era um antigo parente. Um homem nobre, descendente da tribo de judá, que conhecera Noemi muitos

anos atrás. E já sabia da história e quem era aquela jovem. Só queria ter certeza de que ela era Rute. Ele a convidou e lhe

disse que ela poderia ficar respigando em sua fazenda, sempre atrás daquele grupo que lhe era de confiança, ofereceu-lhe

segurança de não ser molestada por outros segadores, assim como um abrigo para descansar, água para dessedentar-se.

Rute fica espantada com tamanha acolhida. A gentileza do

fazendeiro era demasiada e ela se curva em reverencia agradecendo.

Seus olhos faíscam com admiração e ternura.

-Porque és tão gracioso comigo? Você bem sabe a que povo

pertenço. Sou uma estrangeira, porque me favoreces assim?

Boaz fixa seus olhos em Rute. Seus olhos também brilham. De

afeto. Como a muitos anos não acontecia. Ele sorri e com a voz mansa responde a Rute:

- Eu sei quem você é. Eu sei de onde você vem. E que deixou a

casa de seus pais; E que deixou o conforto de sua família. E

que é viúva, assim como a mulher, que um dia também foi estrangeira na sua terra. Da qual você tem cuidado tão bem.

Você deixou tudo para cuidar de Noemi. Eu te quero perto de mim. Nos meus campos. Junto aos meus segadores. E nessa

noite quero que jante comigo.

Rute se ajoelha e agradece. A muito ela não tem uma boa refeição.

A jovem de cabelos vermelhos destoa na multidão das

serviçais e trabalhadores assentados entre imensos feixes de trigo colhidos. Os olhares de todos se voltam para Boaz que

pessoalmente serve a bela jovem. Ele é que parte o queijo e a coloca nas mãos da esfomeada Rute. Ele busca a jarra de leite,

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o pão e o mel. Ele sorri ao ver como ela se lambuza comendo o

os bolos de centeio untados com mel. Boaz oferece uma toalha e ela desajeitadamente limpa a face, agardecendo.

Rute come esfomeada, há dias, talvez meses, não comia com tanta abundancia.

Ela quase não consegue se levantar de tanto que come.

Ainda sobra para que ela possa levar para Noemi.

Quando ela volta para seu abrigo naquele dia, o faz carregada

de cevada.

Após colher as espigas, no final da tarde Rute as bateu com

um pilão e dos grãos recolheu quase trinta quilos. Volta

recurvada para casa sob o peso de um saco cheio de cevada. Mais do que todas as outras colhedoras.

Boaz por sua vez dá ordem expressa para seus colhedores que

deixem cair de modo proposital uma quantidade maior de cereal, onde quer que Rute se encontrasse colhendo.

Na fazenda um único comentário é o motivo das conversas de

todos. Boaz está enamorado.

Noemi ao retorno de Rute pergunta desconfiada:

- Filha, onde você esteve?

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Rute conta o que aconteceu. Noemi reconhece a Boaz como

parente e se alegra. Percebe o que esta acontecendo. E percebe que pode ser o esposo que Rute poderia alcançar,

assim como um nome e ter condições de sustento. Mesmo uma

descendência. Mais do que isso...

Noemi balbucia: ...O sapato... Calçar o sapato..

Rute: O quê? Calçar o que? Eu já estou calçada...

Boaz como parente próximo poderia resgatar as terras que um

dia pertenceram a Elimeleque, seu esposo, e que seria direito de seus filhos, também mortos. Rute era esposa de um de

seus filhos, mas pelo fato das terras já não pertencerem mais a sua família, não poderia ter direito as terras hereditárias. A

cada quarenta e nove anos uma festa acontecia em que os

terrenos voltavam aos seus antigos possuidores, conforme a lei judaica. Mesmo que a pobreza ocorresse numa geração, a

próxima deveria devolver aos antigos herdeiros as antigas propriedades. Mas, seus filhos e marido estavam mortos, e na

época da devolução, não haveria herdeiros para reivindicá-las. A lei do resgate não favorecia a esposa do falecido.

Noemi corre até seus parcos pertences e procura entre os

objetos algo que lhe tem especial valor. Então retira uma pra de sandálias gastos, feitas de couro

rudimentar que um dia pertenceram a Elimeleque. Levantas-as em direção a Rute e exclama novamente:

- Calçar os sapatos...

Havia uma possibilidade. Era chamada LEI do LEVIRATO, em

que um primo, tio ou irmão, casava-se com a esposa do seu parente falecido, e invocava para ela e o direito da herança

hereditária. Quando tivesse, porém, filhos com a viúva, o sobrenome dos filhos não seria o seu. Seria o do falecido, ou o

nome da viúva. Como se o parente NÃO TIVESSE MORRIDO. Os filhos que tivesse eram como se não fossem somente seus,

e sim TAMBÉM da pessoa que morreu. O nome do irmão ou parente próximo continuaria a existir e no tempo do RESGATE,

as terras continuariam na família dos filhos de sua esposa.

Desde que a cerimônia de calçar o sapato fosse realizada.

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Noemi agirá então como casamenteira. Ordena que Rute se adorne, se banhe, se perfume e volte à fazenda de Boaz, mas

com o manto sobre sua cabeça, de tal modo que ele não a

reconheça. Noemi pede que ela seja ousada, que verifique qual o local da fazenda ele estará dormindo e que

sorrateiramente se aproxime e se deite aos seus pés. E diz que Boaz falará depois com ela, sobre o que deverá fazer.

O plano prossegue e ao anoitecer ela se aproxima da

estalagem, passa por entre os capatazes, e descobrindo onde Boaz está dormindo, se aproxima e deita-se aos seus pés.

Perto da meia-noite Boaz estica-se e seus pés tocam em Rute.

Ele se assusta e pergunta quem está aos seus pés. Rute responde que é ela e de modo impensado, ELA é que faz para

Boaz um pedido:

- Meus senhor, estende teu manto em minha direção..

DESPOSA-ME! Casa comigo! Resgata as terras de Noemi!

Perto da meia noite um homem espantado observa as madeixas vermelhas e os olhos da jovem por que já sente

grande afeição, aos pés de sua cama... lhe pedindo em casamento..

Apesar da ousadia, da quebra de protocolos, Boaz admira-se

da coragem inaudita de Rute, e sendo já um “cinquentão”, recebendo no meio da noite a queima-roupa uma proposta de

casamento de uma adolescente, já tendo o coração balançado desde a primeira vez que a viu, concorda imediatamente.

- É claro que aceito...

Ele pede a Rute que aguarde o amanhecer.

Ele quer invocar a lei que poderá devolver os bens a linhagem de Noemi. Mas existe um primo, que é mais próximo do que

ele. Para que possa desposar a Rute, este outro terá que dar para ele este direito.

Para que ele possa calçar o sapato, outro terá que descalçar-

se.

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É manhã e nas portas da cidade o tumulto começou.

Os anciãos se assentam no tribunal recém criado as portas de

Belém, onde Boaz solicitará o direito de desposar a menina de

cabelos vermelhos.

Terá início a cerimônia de calçar sapatos.

Diante dos anciãos ele aponta para o único que possui diante da Lei maior direito a mão de Rute do que ele. O caráter da

jovem era conhecido por toda a cidade. Quando Boaz solicita a contragosto ao primo de Noemi que despose a Rute para que

possa cumprir a lei, imediatamente este se levanta e diz que irá desposá-la. Boaz entende bem o motivo do primo

mesquinho.

Então deixa bem claro, que em nenhum momento as terras de

Noemi seriam suas. Que os filhos que teria, não levariam seu nome. Que ainda, essas crianças herdariam como filhos, mas

não levariam seu nome à posteridade. Os verdadeiros motivos que levaram o primo a aceitar tão

depressa o casamento arranjado caem por terra.

- Eu declino. Não quero perder minhas terras para filhos que sequer terão meu sobrenome.

Boaz:

- Então tira teu sapato.

O primo descalça as sandálias, as quais Boaz ergue na frente

da multidão:

- Eu assumo o direito que o outro não quer exercer. Ele tirou

as sandálias, descalço está!

Eu assumo os deveres de dar continuidade a linhagem de Noemi.

Diante da aturdida multidão, Boaz se abaixa, retira suas sandálias e calça as que seu primo retirou.

Quando fica de pé seus olhos brilham.

- Eu assumo Rute como minha esposa.

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A cidade festejou por mais de sete dias.

60 anos depois de Rute nascer:

Uma criança sardenta de cabelos ruivos corre atrás das ovelhas de seu pai.

Sua avó o observa, rindo de suas peraltices.

- Davi! Vem comer teu guisado! Para de correr atrás das

ovelhas! Vem logo e obedece tua avó!!!

Um milênio depois de Rute nascer:

Uma menina de nome Maria e seu esposo José procuram uma

estalagem na antiga cidade de Belém de Efrata. Maria está grávida e dará luz a uma criança especial. Ela e seu esposo

descendem de uma antiga linhagem real. São descendentes de Davi. Do famoso rei Davi, pai de Salomão, herdeiro ao trono da

tribo de judá.

Naquela noite anjos anunciaram a um grupo de pastores que o Rei dos Reis havia nascido.

Jesus, descendente de Davi.

Descendente de uma Moabita.

De nome Rute.

Welington José Ferreira

www.welingtoncorp.xpg.com.br

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A leste de Canaã e a oeste das montanhas de Moabe, num dos

terrenos mais ásperos do deserto da Judéia, vê-se um profundo canal no centro do qual existe um lago com uma

área aproximada de 930 km2. Esse corpo d'agua é chamado,

em hebraico, "Inhame Hamelah", que significa "o mar Salgado".

São 77 km de comprimento (norte-sul) e cerca de 16 km, na

maior largura. A profundidade máxima do lago é de cerca de 400 m, estando sua superfície a pouco mais de 400 metros

abaixo do nível do mar. Trata-se do local mais baixo da terra.

Por milhares de anos, as águas do Jordão, ricas em minerais, abasteceram o lago. A elevada evaporação provocada pelo

clima do deserto aumentou a salinidade para índices próximos a 30% ( nos demais mares, 3% a 6% ), o que favoreceu a

formação de cristais na superfície. A composição mineral do lago é de: 67% de cloro, 17% de magnésio e 10% de sódio;

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além de outros sais em menor percentual. A presença do

enxofre é de 0,2%.

Belíssimas formações de sal cristalizado, na superfície do Mar Morto.

Antigos escritos judeus identificam esse corpo d'água como

"Inhame S'dom" - "o mar de Sodoma" -, nome da cidade destruída por Deus e que era localizada em suas margens

meridionais (Gn 19).

Alguns peregrinos, em tempos antigos, chamaram-no de "o Mar do Diabo" ao mentalizarem o diabo centelhando, ao tomar

banho nas águas do lago". Os filósofos gregos Aristóteles e Strabo escreveram sobre o

lugar e chamamdo-o de "Lacus Asphaltis", ou "Lago de Asfalto".

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Mas, para os gregos antigos, a desolação da área e a convicção que nenhuma vida poderia sobreviver nela, foi

inspiração para um nome novo: "o Mar Morto".

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