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ANNA CAROLINA LAFETÁ ELAINE SILVA JEAN LELIS TEORIA DOS NÚMEROS TRANSCENDENTES: DO TEOREMA DE LIOUVILLE À CONJECTURA DE SCHANUEL

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ANNA CAROLINA LAFETÁELAINE SILVAJEAN LELIS

TEORIA DOS NÚMEROSTRANSCENDENTES:

DO TEOREMA DE LIOUVILLE ÀCONJECTURA DE SCHANUEL

TEORIA DOS NÚMEROSTRANSCENDENTES:

DO TEOREMA DE LIOUVILLE ÀCONJECTURA DE SCHANUEL

1a edição2016

Rio de Janeiro

ANNA CAROLINA LAFETÁELAINE SILVAJEAN LELIS

TEORIA DOS NÚMEROSTRANSCENDENTES:

DO TEOREMA DE LIOUVILLE ÀCONJECTURA DE SCHANUEL

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Sumário

1 Números algébricos e transcendentes 31.1 Definições e exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31.2 Algumas propriedades dos números algébricos e dos números trans-

cendentes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41.3 Números de Liouville . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

1.3.1 Teorema de Liouville e a demonstração da transcendência 51.3.2 Algumas curiosidades e resultados recentes sobre os nú-

meros de Liouville . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

2 A transcendência de e 92.1 A série ex . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92.2 Prova da transcendência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 102.3 A constante e não é um número de Liouville . . . . . . . . . . . . 132.4 A Identidade de Euler . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16

3 A Conjectura de Schanuel e os teoremas clássicos 173.1 O Teorema de Hermite-Lindemann . . . . . . . . . . . . . . . . . 173.2 O Teorema de Gelfond-Schneider . . . . . . . . . . . . . . . . . 193.3 O Teorema de Baker . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 203.4 A Conjectura de Schanuel . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21

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Prefácio

Um número α é dito algébrico se é raiz de algum polinômio não nulo com co-eficientes inteiros. Caso contrário, dizemos que α é um número transcendente. Adefinição de número transcendente é do século XVIII e, segundo Euler, esses nú-meros são chamados transcendentes porque “transcendem"o poder das operaçõesalgébricas. Contudo, apenas um século depois, verificou-se sua existência, quando,em 1844, Liouville apresentou os primeiros exemplos. Para provar a existênciadesses números, Liouville teve a seguinte idéia: ele encontrou uma propriedadeque era satisfeita por todos os números algébricos (reais e irracionais) e assim umnúmero que não satisfizesse tal propriedade seria, necessariamente, transcendente.Tal resultado, chamado Teorema de Liouville, foi utilizado para provar a transcen-dência dos números que hoje são conhecidos como números de Liouville. Esse é oprimeiro grande resultado em Teoria dos Números Transcendentes e, sem dúvida,um grande avanço na área.

Alguns anos mais tarde, em 1874, Cantor provou a enumerabilidade do con-junto dos números algébricos, e isso tem como consequência não só a existênciade números transcendentes, como também a não enumerabilidade do conjunto queeles constituem. Intuitivamente falando, isso quer dizer que o conjunto dos nú-meros transcendentes é maior, em um certo ponto de vista, do que o conjunto dosnúmeros algébricos. Daí surge uma questão importante: Se o conjunto dos nú-meros transcendentes é tão grande, por que levou tanto tempo para se provar aexistência de tais números?.

Veremos que perguntas muito simples sobre transcendência podem se mostrarproblemas extremamente difíceis e muitos deles desafiam o intelecto de grandesmatemáticos até a atualidade.

Os números e e π são exemplos clássicos de números transcendentes. O pri-meiro teve sua transcendência provada em 1873, por Hermite, que fez uso da po-derosa série de Taylor da função ex. Alguns anos depois, em 1884, Lindemannestendeu o método de Hermite para provar que eα é transcendente, sempre que α éalgébrico não nulo. A consequência mais importante do Teorema de Lindemann éa transcendência de π, para tal conclusão Lindemann usou a belíssima identidadede Euler. Vale ressaltar que, apesar disso, ainda hoje não sabemos se e + π oueπ são transcendentes, dentre outros números cuja transcendência aparentam sernaturais.

Na verdade, conjectura-se que e e π são algebricamente independentes. Tal

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2 SUMÁRIO

conjectura implica a transcendência de ambos os números acima, porém acredita-se que vale um resultado muito mais forte, a Conjectura de Schanuel, enunciadaem [5], em 1966. A conjectura de Schanuel afirma que dados x1, . . . , xn númeroscomplexos linearmente independentes sobre Q, existem pelo menos n números al-gebricamente independentes dentre, x1, . . . , xn, e

x1 , . . . , exn . Como consequênciaimediata dessa conjectura, temos a independência algébrica de e e π, a transcen-dência de e + π, eπ, ee, ππ, πe, e também generalizações para os importantesteoremas de Hermite-Lindemann, Gelfond-Schneider e Baker.

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Capítulo 1

Números algébricos etranscendentes

Por: Elaine Cristine de Souza Silva.

Neste capítulo, definiremos números algébricos e números transcendentes, mos-traremos algumas propriedades desses números e dos conjuntos que eles consti-tuem, em particular, definiremos medida (de Lebesgue) nula e verificaremos que,nesse sentido, quase todo número real é transcendente. Além disso, apresenta-remos alguns exemplos de números algébricos e de números transcendentes, emespecial, definiremos Números de Liouville (que são exemplos de números trans-cendentes). Enunciaremos o Teorema de Liouville e utilizaremos esse teoremapara verificar que os números de Liouville são, de fato, transcendentes. Por fim,mostraremos algumas curiosidades e resultados recentes sobre os números de Li-ouville.

1.1 Definições e exemplos

Um número complexo α é chamado algébrico se é raiz de algum polinômionão nulo com coeficientes inteiros. O polinômio minimal de α é o polinômioprimitivo1 de menor grau que tem α como raiz. Nesse caso, o grau de α é definidocomo o grau do seu polinômio minimal.

Denotamos: Q = Conjunto dos números algébricos.Um número complexo α é chamado transcendente, se ele não é algébrico.A definição de números transcendentes é uma definição do século XV III e,

segundo Euler, esses números são chamados transcendentes porque transcendemo poder das operações algébricas. Contudo, apenas um século depois verificou-se a existência desses números, quando, em 1844, Liouville exibiu os primeirosexemplos.Números racionais são exemplos de números algébricos:

1Um polinômio em Z[x] é chamado primitivo se seus coeficientes são primos entre si.

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4 CAPÍTULO 1. NÚMEROS ALGÉBRICOS E TRANSCENDENTES

Exemplo 1.1.p

q∈ Q é raiz do polinômio P (x) = qx− p.

Existem também números irracionais que são algébricos:

Exemplo 1.2.√

2 é raiz do polinômio x2 − 2.

Além disso, existem números complexos não reais que são algébricos:

Exemplo 1.3. i é raiz do polinômio x2 + 1.

Na sessão 1.3, veremos os primeiros exemplos de números transcendentes, co-nhecidos como Números de Liouville.

1.2 Algumas propriedades dos números algébricos e dosnúmeros transcendentes

Na proposição a seguir, vemos algumas propriedades do conjunto dos númerosalgébricos.

Proposição 1.4. Dados a, b ∈ Q, temos:

1. a± b ∈ Q

2. a · b ∈ Q

3. Se a 6= 0, então a−1 ∈ Q

Demonstração: Ver [9, p. 70] �

Usando a proposição anterior, verifica-se que o conjunto dos números algébri-cos forma um corpo.

Ao longo deste livro, veremos alguns exemplos de números transcendentes.Entretanto, é possível verificar a existência desses números sem apresentar exem-plos explícitos, através da seguinte proposição.

Proposição 1.5. O conjunto dos números algébricos é enumerável 2.

Demonstração: Ver [9, p. 66] �

Um resultado conhecido é que R, o conjunto dos números reais, é não-enumerável.Observe que, com a proposição anterior, conseguimos concluir que existem nú-meros reais que são transcendentes e que existe uma quantidade não enumeráveldesses números, caso contrário, o conjunto dos números reais seria enumerável.

2Um conjunto é chamando enumerável se tem a mesma cardinalidade de N (conjunto dos núme-ros naturais). Ao leitor interessado em compreender melhor algumas propriedades sobre enumerabi-lidade, sugerimos [6].

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1.3. NÚMEROS DE LIOUVILLE 5

É interessante observar que, quando Liouville exibiu os primeiros exemplos denúmeros transcendentes, em 1844, ainda não existia esse conceito de enumerabi-lidade, uma vez que esse conceito deve-se a Cantor que nasceu em 1845, um anodepois que Liouville exibiu esses números.

A seguir, relembramos a definição de conjuntos de medida (de Lebesgue) nulaem R.

Definição 1.6. Um conjuntoA ⊂ R tem medida (de Lebesgue) nula, e escrevemosm(A) = 0 se, para todo ε > 0, existe uma quantidade enumerável de intervalos

abertos (In)n≥1 tais que A ⊂⋃n≥1

In e∞∑n=1|In| < ε.

Proposição 1.7. Se E ⊂ R é enumerável, então, E tem medida nula.

Demonstração. Ver [9, p. 67].�

Dizemos que uma condição é satisfeita por quase todos os números reais, se osubconjunto de R dos elementos que não satisfazem tal condição tem medida nula.

Proposição 1.8. Quase todo número real é transcendente.

Demonstração. Pela Proposição 1.5, segue que o conjunto dos números algébricosé enumerável, em particular, Q ∩ R é enumerável. Segue, da Proposição 1.7, queQ ∩ R tem medida nula. Com isso concluímos que quase todo número real étranscendente.

�Na proposição anterior vimos que quase todo número é transcendente. Con-

tudo, dado um número que acredita-se ser transcendente, é muito difícil confirmara transcendência (como veremos na demonstração da transcendência de e, no Ca-pítulo 2). Por exemplo, ainda hoje não sabemos se e+ π e eπ são transcendentes,dentre outros números cuja transcendência aparentam ser naturais.

Por outro lado, na Seção 1.3, veremos os primeiros exemplos de números trans-cendentes e poderemos observar que a demonstração da transcendência deles érelativamente simples, isso acontece porque os números de Liouville foram cons-truídos para serem transcendentes, através de uma ideia genial de Joseph Liouville,apresentada em uma comunicação verbal, em 13 de maio de 1844.

1.3 Números de Liouville

1.3.1 Teorema de Liouville e a demonstração da transcendência

Teorema 1.9 (Teorema de Liouville). Seja α ∈ R um número algébrico de graun ≥ 2. Então, existe uma constante A = A(α) > 0 tal que

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6 CAPÍTULO 1. NÚMEROS ALGÉBRICOS E TRANSCENDENTES

∣∣∣∣α− p

q

∣∣∣∣ > A

qn,

para todop

q∈ Q.

Demonstração: Ver [9, p. 82]. �

Um resultado conhecido é que o conjunto dos números racionais é denso3 emR. Logo, é possível aproximar qualquer número real por números racionais. Con-tudo, o Teorema de Liouville afirma que números algébricos (reais) não racionaisnão podem ser muito "bem aproximados" por racionais, no sentido em que qual-quer aproximação tem que respeitar esse comportamento. O que Liouville fezdepois foi construir números reais não racionais que podem ser muito "bem apro-ximados"por racionais e, portanto, não são algébricos.

Definição 1.10. Um número real ξ é chamado número de Liouville se existir uma

sequência infinita de racionais

(pjqj

)j≥1

tal que qj > 1 e

0 <∣∣∣∣∣ξ − pj

qj

∣∣∣∣∣ < 1qjj,

para todo j ≥ 1. Denotamos por L o conjunto dos números de Liouville.

Apresentaremos alguns lemas que serão utilizadas para garantir a transcendên-cia dos números de Liouville.

Lema 1.11. A sequência (qj)j≥1 é ilimitada.

Demonstração: Ver [9, p. 83]. �

Lema 1.12. Todo número de Liouville é irracional.

Demonstração: Ver [9, p. 84]. �

Teorema 1.13. Todo número de Liouville é transcendente.

Demonstração. Seja ξ um número de Liouville. Vamos supor, por absurdo, que ξé algébrico. Pelo Lema 1.12, ξ tem grau nmaior ou igual a 2. Assim, pelo Teorema

de Liouville, existe uma constante A > 0 tal que, para todop

q∈ Q,

∣∣∣∣ξ − p

q

∣∣∣∣ > A

qn.

Em particular,A

qnj<

∣∣∣∣∣ξ − pjqj

∣∣∣∣∣ < 1qjj, para todo j ≥ 1. Em vista disso, qj−nj < 1/A.

Isso contradiz o Lema 1.11.

3Lembramos que um conjunto é dito ser denso em R, se intersectar qualquer intervalo aberto deR.

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1.3. NÚMEROS DE LIOUVILLE 7

Exemplo 1.14. O número

` :=∞∑n=1

10−n! = 0.11000100 . . .

é um número de Liouville. Para provar isso, consideramos as sequências de intei-

ros pj =j∑

n=110j!−n! e qj = 10j!. Observe que,

(pjqj

)j≥1

é uma sequência infinita

de racionais. Além disso,∣∣∣∣∣`− pjqj

∣∣∣∣∣ =∞∑

n=j+110−n! =

∞∑n=1

10−(j+n)!

=∞∑n=1

10−(j+1)!

10(j+n)!−(j+1)! ≤∞∑n=0

10−(j+1)!

10n

= 109 · 10(j+1)! <

110(j+1)!−1 ≤

110j·j! = 1

qjj.

O número `, definido no exemplo anterior, é conhecido como a constante de

Liouville. É possível provar ainda que∞∑n=1

a−n! é um número de Liouville, para

cada inteiro a ≥ 2. Isso garante a existência de infinitos números de Liouville.

1.3.2 Algumas curiosidades e resultados recentes sobre os números deLiouville

Em 1962, Erdös [3] provou que todo número real pode ser representado comouma soma de dois números de Liouville. Esse resultado é bem interessante, umavez que é possível mostrar que o conjunto dos números de Liouville tem medidanula em R, ou seja, quase nenhum número real é de Liouville. Segundo Marques(Ver [9, p. 86]), podemos pensar então que, mesmo sendo um conjunto “invisível",os números de Liouville estão estrategicamente posicionados na reta real.

O resultado de Erdös pode ser reescrito como: para todo α ∈ R, existemnúmeros de Liouville σ e τ tais que f(σ, τ) = α, onde f(x, y) = x+ y. Em 1996,Burger [2] generalizou esse resultado para uma classe mais geral de funções. Emparticular, o resultado de Burger garante que, dado um número algébrico α, sobcertas condições, existem números de Liouville σ e τ , tais que στ = α.

Em 1906, Maillet [7] provou que funções racionais não contantes com coefici-entes racionais levam o conjunto dos números de Liouville nele mesmo, ou seja, aimagem de qualquer número de Liouville por esse tipo de função é um número deLiouville também. Funções racionais são exemplos de funções algébricas. Tendoem vista esse resultado, questiona-se sobre a existência de funções transcendentesque preservam o conjunto dos números de Liouville. Em 1984, Mahler [8] propôso seguinte problema:

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8 CAPÍTULO 1. NÚMEROS ALGÉBRICOS E TRANSCENDENTES

Existem funções inteiras transcendentes f(z) tais que se ξ é um número deLiouville qualquer, então f(ξ) também é?

Em [10], [11], [12] e [13], podem ser encontrados resultados recentes nessadireção. Entretanto, esse problema de Mahler ainda não foi resolvido.

Uma consequência interessante tanto do Teorema de Maillet, quanto do Teo-rema de Erdös, é a densidade do conjunto dos números de Liouville em R.

Tendo em vista que todo número de Liouville é transcendente, que existeminfinitos números de Liouville e que, além disso, o conjunto desses números édenso em R, surge um questionamento natural:

Todo número transcendente é de Liouville?

A resposta é não e isso decorre diretamente do fato de que o conjunto dosnúmeros de Liouville tem medida nula em R.

O número π e a Constante de Euler, e =∞∑n=1

1n! , são exemplos conhecidos de

números transcendentes, que não são de Liouville (ver [15, p.330]).4

No próximo capítulo apresentaremos a demonstração da transcendência de e ea famosa Identidade de Euler.

4Ao leitor interessado em conhecer outras propriedades dos números de Liouville, [16] apresentamais propriedades e resultados recentes relacionados a esses números e está disponível em:http://repositorio.unb.br/bitstream/10482/18477/1/2015_ElaineCristinedeSouzaSilva.pdf.

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Capítulo 2

A transcendência de e

Por: Anna Carolina Lafetá.

As primeiras referências à constante e foram publicadas em 1618 em um tra-balho sobre logaritmos de John Napier. Entretanto, esse trabalho não continhaa constante especificamente, mas simplesmente uma lista de logaritmos calcula-dos a partir de e. A primeira indicação da constante, propriamente dita, é credi-tada a Jacob Bernoulli, quando buscava encontrar um valor para o seguinte limite:

limn→∞

(1 + 1

n

)n, que é a própria constante e.

2.1 A série ex

Uma das característcas mais conhecidas da função exponencial ex é o fato de

qued

dxex = ex. Ou seja, a derivada da função exponencial é ela mesma.

Assim, a série de Taylor da função exponencial é dada por:

ex =∞∑n=0

xn

n! . (2.1)

Assim, podemos escrever o número e como

e =∞∑n=0

1n! = 1 + 1

1! + 12! + · · · (2.2)

Utilizando esse fato, podemos provar que e é um número irracional.

Teorema 2.1. O número e é irracional. 1

1Essa demonstração se encontra nas páginas 29 e 30 do livro “Números Irracionais e Transcen-dentes", Djairo Guedes de Figueiredo.

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10 CAPÍTULO 2. A TRANSCENDÊNCIA DE E

Demonstração. Suponha que e seja um número racional. Então, existem p, q ∈ Nprimos entre si tal que e = p

q.

De (2.2), temos que

p

q−(

1 + 11! + 1

2! + · · ·+ 1j!

)=

∞∑j=q+1

1j! . (2.3)

Agora, observe que o segundo membro de (2.3) pode ser escrito como

1q!

( 1q + 1 + 1

(q + 1)(q + 2) + · · ·)<

1q!

( 1q + 1 + 1

(q + 1)2 + · · ·). (2.4)

Note que a expressão entre parêntesis no último membro de (2.4) é uma série

geométrica cuja soma é1q

. Usando esse resultado em (2.4), obtemos

∞∑j=q+1

1j! <

1q!

1q. (2.5)

Agora, unindo as expressões (2.3) e (2.5), vemos que

0 < p

q−(

1 + 11! + 1

2! + · · ·+ 1j!

)<

1q!

1q, (2.6)

de onde obtemos que

0 < q!(p

q− 1− 1

1! −12! − · · · −

1j!

)<

1q

(2.7)

Observe agora que, em (2.7), o termo do meio é inteiro, pois q! cancela todosos denominadores das frações, no entanto 1/q ≤ 1, e como o termo do meio éestritamente maior do que 0, temos aí um absurdo. Esse absurdo acontece porcausa da suposição inicial, de que e é racional. Logo, e é irracional.

2.2 Prova da transcendência

Para provar a transcendência de e, precisaremos de alguns resultados auxiliares.Incialmente, considere a função

F (x) = P (x) + P ′(x) + · · ·+ P (r)(x), (2.8)

onde P (x) é um polinômio de grau r.

Lema 2.2. Temos qued

dx(e−xF (x)) = −e−xP (x). E, além disso, para algum

θk ∈ [0, 1] temos que

F (k)− ekF (0) = −kek(1−θk)P (kθk),

para todo k > 0.

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2.2. PROVA DA TRANSCENDÊNCIA 11

Demonstração. Para a primeira parte do lema, basta derivar a função e−xF (x)utilizando a regra do produto e usar a definição da função F .

Para a segunda afirmação do lema, utilize o Teorema do Valor Médio e a pri-meira afirmação do lema:

e−kF (k)− e0F (0)k

= −ekθkP (kθk),

o que implicaF (k)− ekF (0) = −kek(1−θk)P (kθk),

como queríamos.

Agora, tome o polinômio P (x) da função F , definida em (2.8) como:

P (x) = 1(p− 1)!x

p−1(1− x)p · · · (n− x)p, (2.9)

onde n ∈ N e p é um número primo maior do que n.Observe que podemos escrever P (x) como

P (x) = (n!)p

(p− 1)!xp−1 + b0

(p− 1)!xp + · · ·+ (−1)nxn(p+1)−1

(p− 1)! . (2.10)

Além disso, temos que:

• se i < p e k ∈ {1, . . . , n}, então P (i)(k) = 0;

• P (p−1)(0) = (n!)p e P (i)(0) = 0, se i < p− 1.

Se k = 1, 2 . . . , n, então, pela definição de F (x) e pelas considerações feitasacima, segue que

F (k) = P (p)(k) + P (p+1)(k) + · · ·+ P (np+p−1)(k) (2.11)

Escreva agora

P (x) = xp−1

(p− 1)!{(1− x) . . . (k − 1− x)(k + 1− x) . . . (n− x)}p(k − x)p

= A(x)(k − x)p,(2.12)

onde gr(A) = np− 1.Temos então que P ′(x) = A′(x)(k − x)p − pA(x)(k − x)p−1. Observe agora

que, ao derivarmos P ′, digamos, s vezes, obteremos

P (s+1)(x) = (A′(x)(k − x)p)(s) − (pA(x)(k − x)p−1)(s). (2.13)

É fácil ver que (pA(x)(k − x)p−1)(s) será sempre um múltiplo de p, enquantoque (A′(x)(k − x)p)(s) será separado em um termo múltiplo de p e outro igual a

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12 CAPÍTULO 2. A TRANSCENDÊNCIA DE E

A(s+1)(x)(k−x)p. Portanto, temos que P (r)(x) = A(r)(x)(k−x)p+pB(x), logoP (r)(k) = pB(k) é divisível por p. Dessa forma, F (k) = P (p)(k) + P (p+1)(k) +· · ·+ P (np+p−1)(k) é divisível por p.

Por outro lado, F (0) = P (p)(0) + P (p+1)(0) + · · · + P (np+p−1)(0), e pelaexpressão (2.10)

P (x) = (n!)p

(p− 1)!xp−1 + b0

(p− 1)!xp + b1

(p− 1)!xp+1 + · · ·+ (−1)nxn(p+1)−1

(p− 1)! ,

(2.14)se derivarmos o primeiro termo da soma acima p ou mais vezes, ele se anulará. A

partir do segundo termo, derivando P (x) i vezes, onde i = p + j, j ≥ 0, teremos

que P (p+j)(0) = bj(p+ j)!(p− 1)! . Então,

F (0) = (n!)p︸ ︷︷ ︸não divisível por p

+ p!b0(p− 1)! + (p+ 1)!b1

(p− 1)! + · · ·+(np+ n− 1)!b(n−1)p+n−1

(p− 1)!︸ ︷︷ ︸divisível por p

.

Logo, F (0) não é divisível por p, e isso demonstra o seguinte lema:

Lema 2.3. Se k = 1, 2, . . . , n, então F (k) é um inteiro divisível por p. Por outrolado, F (0) é um inteiro não divisível por p.

Agora, já temos as ferramentas necessárias para provar a transcendência de e:

Teorema 2.4. O número e é transcendente.

Demonstração. Suponha, por absurdo, que e seja algébrico. Então existem cons-tantes c0, c1, . . . cn (podemos tomar c0 > 0) tais que

cnen + · · ·+ c1e+ c0 = 0

Vamos mostrar que

c0F (0) + c1F (1) + · · ·+ cnF (n) = c1ε1 + · · ·+ cnεn,

onde εk = F (k)− ekF (0) = −kek(1−θk)P (kθk), como provado no Lema 2.2.De fato, por hipótese, temos que cnen + · · · + c1e + c0 = 0. Mas, isso é

equivalente a

c0 = −cnen − · · · − c1e⇔ c0F (0) = −cnenF (0)− · · · − c1eF (0)

Agora, observe que εk−F (k) = −ekF (0). Portanto, a equação acima se torna

c0F (0) = cn(εn − F (n)) + · · ·+ c1(ε1 − F (1)).

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2.3. A CONSTANTE E NÃO É UM NÚMERO DE LIOUVILLE 13

Mas isso é equivalente a

c0F (0) + c1F (1) + · · ·+ cnF (n) = c1ε1 + · · ·+ cnεn.

Agora, se os εk são calculados para o polinômio P (x), definido em (2.9), temosque

εk = −kek(1−θk) 1(p− 1)!(kθk)

p−1(1− kθk)p . . . (n− kθk)p.

e, obviamente

|εk| =∣∣∣∣−kek(1−θk) 1

(p− 1)!(kθk)p−1(1− kθk)p . . . (n− kθk)p

∣∣∣∣ .Utilizando o fato de que 0 < θk < 1 e que k ≤ n, obtemos

|εk| ≤∣∣∣∣npen(n!)p

(p− 1)!

∣∣∣∣ .Como,

limp→∞

npen(n!)p

(p− 1)! = 0,

segue que, para p suficientemente grande,

|c1ε1 + · · ·+ cnεn| < 1. (2.15)

Mas vimos que c0F (0) + c1F (1) + · · · + cnF (n) = c1ε1 + · · · + cnεn. Noentanto, c0F (0)+c1F (1)+· · ·+cnF (n), pelo Lema 2.3, é um inteiro não divisívelpor p, mas por (2.15), tem módulo menor que 1, logo deve ser 0, o que é absurdo.Tal absurdo vem da hipótese de que e é algébrico. Logo e é transcendente.

2.3 A constante e não é um número de Liouville

Para provar que e não é um número de Liouville, faremos uso de frações con-tínuas e algumas ferramentas analíticas.

Seja a/b uma fração irredutível. Podemos utilizar o algorítmo de Euclides paraobter as seguintes equações:

a = ba0 + r0, 0 < r0 < bb = r0a1 + r1, 0 < r1 < r0r0 = r1a2 + r2, 0 < r2 < r1

...rm−1 = rmam+1 + rm+1, 0 < rm < rm−1rm = rm+1am+2

(2.16)

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14 CAPÍTULO 2. A TRANSCENDÊNCIA DE E

Desse modo, podemos escrever a fração a/b como:

a0 + r0b

= a0 + 1br0

= a0 + 1a1 + r1

r0

= · · · = a0 + 1a1 + 1

a2+ 1. . .+ 1

am+2

.

Observe que ness caso, a fração contínua será finita e a denotaremos pora/b =< a0; a1, . . . , am+2 >.

Seja agora ξ um número irracional e seja [ξ] a parte inteira de ξ, i.e., o maiorinteiro menor que ξ, e {ξ} a parte fracionária de ξ, i.e., ξ − [ξ]. Assim, podemosescrever ξ como

ξ = [ξ] + {ξ} = [ξ] + 11{ξ}

.

Como 0 < {ξ} < 1, temos que1{ξ}

> 1 e podemos definir a parte fracionária de

1{ξ}

={ 1{ξ}

}:= r1 e sua parte inteira

[ 1{ξ}

]:= a1. Logo

ξ = [ξ] + 11{ξ}

= [ξ] + 1a1 + r1

= [ξ] + 1a1 + 1

1r1

Novamente, 0 < r1 < 1, logo1r1> 1 e podemos encontrar sua parte inteira e

fracionária. Repetindo o processo m+ 1 vezes, obtemos:

ξ = [ξ] + 1a1 + 1

a2+ 1. . .+am

,

e cada rm é número irracional menor do que 1, de modo que podemos tomar aparte inteira e fracionária de 1/rm. É fácil ver que esse processo nunca termina.

Denotando [ξ] por a0, podemos escrever a fração contínua de um número ξcomo ξ =< a0; a1, a2, a3, . . . >.

Definição 2.5. Seja ξ um número real e < a0; a1, a2, . . . > sua representação em

frações contínuas. Então, dizemos que a sequência{pnqn

}n≥0

é a sequência dos

convergentes da fração contínua de ξ se

pnqn

=< a0; a1, . . . , an > .

Um resultado bem conhecido na teoria de aproximações diofantinas é que osdenominadores qn que aparecem nos convergentes da fração contínua formam umasequência não decrescente, ou seja, qn+1 ≥ qn.

Com essas noções básicas de frações contínuas, podemos definir agora a me-dida de irracionalidade de um número x ∈ R como:

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2.3. A CONSTANTE E NÃO É UM NÚMERO DE LIOUVILLE 15

Definição 2.6. Seja x um número real, definimos sua medida de irracionalidadeµ(x) como sup{ν ∈ R+ : |x− p/q| < 1/qν tem infinitas soluções para p/q ∈ Q}.

Segue diretamente dessa definição que qualquer número de Liouville tem me-dida de irracionalidade igual a ∞. Afinal para qualquer ν, a desigualdade teminfinitas soluções.

Mostraremos então que a constante de Euler não tem medida de irracionalidadeinfinita, mais especificamente, mostraremos que e tem medida de irracionalidademenor ou igual a 2.

Sondow em [17] fornece uma fórmula para a função µ(s). Tal fórmula é dadapela seguinte expressão

µ(x) = 2 + lim supn→∞

log an+1log qn

, (2.17)

onde pn/qn são os convergentes da fração contínua de x e an+1 são os termos queaparecem na expressão x =< a0; a1, a2, . . . >

Com essas ferramentas, podemos mostrar que e não é número de Liouville.Como já foi visto e é irracional, logo sua fração contínua é infinita e é dada por[15, pag 294]

e =< 2; 1, 2, 1, 1, 4, 1, 1, 6, 1, 1, 8, . . . > .

Agora, suponha por absurdo que e seja um número de Liouville cujos conver-gentes da fração contínua são dados por: {pn/qn}. Então, temos que∣∣∣∣e− pn

qn

∣∣∣∣ < 1qnn. (2.18)

Como pn/qn são convergentes de uma fração contínua, vale que∣∣∣∣pnqn − pn+1qn+1

∣∣∣∣ = 1qnqn+1

. (2.19)

Assim,∣∣∣∣e− pnqn

+ e− pn+1qn+1

∣∣∣∣ ≤ ∣∣∣∣e− pnqn

∣∣∣∣+ ∣∣∣∣e− pn+1qn+1

∣∣∣∣ ≤ 1qnn

+ 1qn+1n+1≤ 2qnn

(2.20)

Isso implica que, para n suficientemente grande, temos que

qn+1 > qn−1n > qn−2

n . (2.21)

Repetindo o processo acima, chegamos à conclusão que

qn+1 > qn−2n > (qn−3

n−1)n−2 > · · · > 2(n−3)!. (2.22)

Usando isso e o fato de que na fração contínua de e, an+1 ≤ 2n, podemosutilizar a fórmula de Sondow para obter:

µ(e) = 2 + lim supn→∞

log an+1log qn

≤ 2 + lim supn→∞

log 2nlog 2(n−3)! = 2.

Logo e não é de Liouville.

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16 CAPÍTULO 2. A TRANSCENDÊNCIA DE E

2.4 A Identidade de Euler

Considere aqui, a seguinte função

f(x) = (cos(x)− isen (x))eix, (2.23)

onde i denota a unidade imaginária.Podemos utilizar a regra do produto para derivar a função f , e assim obter:

d

dxf(x) = i(cos(x)− isen (x))eix + (−sen (x)− i cos(x))eix) = 0 (2.24)

Isso implica que a função f é constante, e como f(0) = 1, segue que 1 =(cos(x) − isen (x))eix. Multiplicando ambos os lados da igualdade por cos(x) +isen (x), obtemos a seguinte relação, conhecida como Fórmula de Euler:

cos(x) + isen (x) = eix. (2.25)

Substituindo x por π em (2.25), obtemos a conhecida Identidade de Euler:

eiπ = −1. (2.26)

Essa famosa identidade será bastante utilizada nos capítulos subsequentes.

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Capítulo 3

A Conjectura de Schanuel e osteoremas clássicos

Por: Jean Lelis.

Nessa aula, enunciaremos e falaremos algumas aplicações de três teoremasclássicos em teoria dos números transcendentes, cujas demonstrações são longas enão triviais.

Falaremos também sobre a Conjectura de Schanuel, considerada atualmenteo problema em aberto mais importante em Teoria do Números Transcendentes.Mostraremos como essa conjectura pode ser utilizada para provar a transcendênciade alguns números como, por exemplo, e + π, eπ. Na verdade, veremos que elaimplica resultados ainda mais fortes.

Por fim, assumiremos a veracidade da Conjectura de Schanuel e mostraremosque, se a Conjectura de Schanuel for provada, as demonstrações desses teoremastão importantes se reduzem a poucas linhas. Essa aula foi preparada com base noLivro Teoria dos Números Transcendentes do Prof. Dr. Diego Marques [9].

3.1 O Teorema de Hermite-Lindemann

Como vimos na primeira aula, os primeiros números transcendentes foram exi-bidos por Liouville, no entanto tais exemplos eram um tanto "artificiais". Porém,com a demonstração de Cantor de que quase todos os números são transcendentes,parecia natural que as importantes constantes e e π seriam transcendentes e, defato, como vimos na aula passada e é um número transcendente, veremos nessaaula que π também é um número transcendente. Na verdade, a transcendência dee e π podem ser vistas como casos particulares do seguinte teorema

Teorema 3.1 (Hermite-Lindemann). Se α1, . . . , αm são números algébricos dis-tintos, então eα1 , . . . , eαm são linearmente independentes sobre o corpo dos nú-meros algébricos.

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18CAPÍTULO 3. A CONJECTURA DE SCHANUEL E OS TEOREMAS CLÁSSICOS

Quando m = 2, α1 = 0 e α2 = α ∈ Q, não nulo, nós obtemos o seguinte casoparticular que é conhecido com Teorema de Lindemann

Corolário 3.2. Se α é algébrico não nulo, então eα é transcendente.

Existe uma formulação equivalente ao Teorema de Hermite-Lindemann que échamado Teorema de Lindemann-Weierstrass

Teorema 3.3 (Lindemann-Weierstrass). Se α1, . . . , αn são números algébricos li-nearmente independentes sobre Q, então eα1 , . . . , eαn são algebricamente inde-pendentes.

Não apresentaremos aqui uma demonstração desse teorema, mas veremos queele pode ser facilmente deduzido via Conjectura de Schanuel, caso essa seja de-monstrada verdadeira. Vamos agora apresentar algumas consequências do Teo-rema de Hermite-Lindemann, em particular vamos mostrar a transcendência de π,veremos que a transcendência de e também segue de imediato

Proposição 3.4. Os seguintes números são transcendentes:

1. e;

2. sinα, cosα, tanα, sinhα, coshα, tanhα, para todo α ∈ Q∗;

3. π;

4. logα, arcsinα, e em geral as funções inversas do item (b), para todo α ∈ Q,α /∈ {0, 1}.

Demonstração. (a) Faça α = 1 no Teorema de Lindemann.(b) Note que,

2i(sinα)e0 + (−1)eiα + e−iα = 0,2(cosα) + (−1)eiα + (−1)e−iα = 0,

(i tanα− 1)eiα + (i tanα+ 1)e−iα = 0,2(sinhα)e0 + (−1)eα + e−α = 0,

2(coshα)e0 + (−1)eα + (−1)e−α = 0,(tanhα− 1)eα + (tanhα+ 1) = 0.

Supondoα 6= 0, então iα 6= 0. Portanto, pelo Teorema de Hermite-Lindemann,

sinα, cosα, tanα, sinhα, coshα, tanhα,

são números transcendentes.(c) Se π fosse algébrico, então iπ ∈ Q∗. Logo, eiπ é transcendente, mas

eiπ = −1. Portanto, π é transcendente.(d) Suponha que logα ∈ Q. Pelo Teorema de Lindemann elogα é transcen-

dente, mas elogα = α ∈ Q, essa contradição mostra que logα /∈ Q. De modoanálogo, usando o item (b), mostramos que as funções inversas das funções doitem (b) assumem valores transcendente em α ∈ Q− {0, 1}.

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3.2. O TEOREMA DE GELFOND-SCHNEIDER 19

3.2 O Teorema de Gelfond-Schneider

Em 1900, no Congresso Internacional de Matemática em Paris, o matemáticoalemão David Hilbert propôs uma lista de 23 problemas. Esses problemas se torna-ram muito influentes na matemática do século XX. O sétimo problema de Hilbertpergunta se o número αβ , onde α é algébrico (diferente de zero e um) e β é algé-brico (não racional), é transcendente. Essa questão foi resolvida em 1934 por A.O. Gelfond e independentemente em 1935 por T. Schneider.

Teorema 3.5 (Gelfond-Schneider). Seja α um algébrico diferente 0 e 1, e β umalgébrico irracional. Então αβ é transcendente.

Imediatamente, os números√

2√

2, ii,√

2√

3são transcendentes.

Corolário 3.6. eπ é transcendente.

Demonstração. Como eπi = −1, pela identidade de Euler, temos que (eπi)−i =(−1)−i, logo eπ = (−1)−i é transcendente pelo Teorema de Gelfond-Schneider.

O número eπ é chamado constante de Gelfond. Quanto aos números πe, ee, ππ

ainda não sabemos se são transcendentes. Um enunciado equivalente ao Teoremade Gelfond-Schneider é

Teorema 3.7. Dados α1, α2, β1, β2 ∈ Q∗, se logα1, logα2, são Q-L.I., então

β1 logα1 + β2 logα2 6= 0.

Vamos provar a equivalência, suponhamos o Teorema de Gelfond-Schneider esejam α1, α2, β1, β2 ∈ Q∗, com

β1 logα1 + β2 logα2 = 0

e logα1, logα2 são Q-L.I., então temos que (β1/β2) logα1 = − logα2, ou seja,α

((β1/β2))1 = α−1

2 ∈ Q, então por G.-S. temos que (β1/β2) ∈ Q, o que contraria ahipótese que logα1, logα2 são Q-L.I., logo

β1 logα1 + β2 logα2 6= 0.

Reciprocamente, suponha o Teorema 3.7 e sejam α ∈ Q−{0, 1} e β ∈ Q−Q,suponha que γ = αβ ∈ Q, então

log γ − β logα = 0,

logo β ∈ Q pelo Teorema 3.7, o que é uma contradição, pois supomos que β ∈Q−Q, logo αβ /∈ Q, o que completa a demonstração da equivalência.

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20CAPÍTULO 3. A CONJECTURA DE SCHANUEL E OS TEOREMAS CLÁSSICOS

3.3 O Teorema de Baker

Vimos na formulação equivalente ao Teorema de Gelfond-Schneider que paraα1, α2 números algébricos não nulos, sua independência linear sobre Q e Q sãoequivalentes. Foi conjecturado que esse resultado seria válido para uma quantidadearbitrária de logaritmos. Essa conjectura foi provada por A. Baker em 1966 (e lherendeu a medalha Fields em 1970).

Teorema 3.8 (Baker). Dados α1, . . . , αn números algébricos, não nulos, tais quelogα1, . . . , logαn são linearmente independentes sobre Q. Então 1, logα1, . . . ,logαn são linearmente independentes sobre Q.

É possível mostrar que o Teorema de Baker implica os teoremas de Lindemanne Gelfond-Schneider. Vamos agora apresentar uma das importantes consequênciasdo Teorema de Baker.

Teorema 3.9. Dados α1, . . . , αn números algébricos, não nulos, e β1, . . . , βn nú-meros algébricos tais que

γ = β1 logα1 + · · ·+ βn logαn 6= 0.

Então γ é um número transcendente.

Demonstração. Basta-nos mostrar que se α1, . . . , αn, β0, β1, . . . , βn são númerosalgébricos, com αj 6= 0, 1 ≤ j ≥ n e β0 6= 0, então

β0 + β1 logα1 + · · ·+ βn logαn 6= 0.

Procederemos por indução em n. O caso n = 1 segue do fato que logα étranscendente para α ∈ Q pelo Teorema de Lindemann. Assuma a validade paran < m, onde m ∈ Z; mostraremos então o resultado para n = m.

Se logα1, . . . , logαm são linearmente independentes sobre Q, o resultado segue-se do Teorema de Baker. Assim, suponha que existem ρ1, . . . , ρm ∈ Q, não todosnulos, e tais que

ρ1 logα1 + · · ·+ ρm logαm = 0.Sem perda de generalidade, suponha ρ1 6= 0. Entretanto, para α0 = 0, temos

que

ρ1

m∑k=0

βk logαk = ρ1(β0+)− βr(ρ1 logα1 + · · ·+ ρm logαm)

= β′0 + β′1 logα1 + · · ·+ β′m logαm,

onde β′0 = ρrβ0, β′j = ρrβj − ρjβr para 1 ≤ j ≥ m. Daí,

ρr(β0 +β1 logα1 + · · ·+βm logαm) = β′0 +β′1 logα1 + · · ·+β′m logαm. (3.1)

Note que β′0 6= 0 e β′r = 0, então, por hipótese de indução, o lado direito de3.1 é não nulo e como ρr 6= 0, segue-se que

β0 + β1 logα1 + · · ·+ βm logαm 6= 0.

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3.4. A CONJECTURA DE SCHANUEL 21

3.4 A Conjectura de Schanuel

Seja L |K uma extensão transcendente, isto é, [L : K] = ∞. Um conjuntoB ⊆ L é dito base de transcendência de L |K , se B é algebricamente independentesobre K e L |K(B) é uma extensão algébrica, ou equivalentemente B é o conjuntoalgebricamente independente (sobre K) maximal relativo à inclusão, cuja existên-cia é garantida via lema de Zorn. Pode-se provar que quaisquer duas bases detranscendência de uma extensão têm a mesma cardinalidade. Assim podemos de-finir o grau de transcendência de uma extensão L |K , como a cardinalidade deB. Denotamos por grtr(L |K) = grtrK(L) = #B. Se L |K é algébrico, entãogrtr(L |K) = 0.

Observação 3.10. É possível mostrar que um conjunto é algebricamente indepen-dente sobre Q se, e somente se, é algebricamente independente sobre Q.

Vamos agora, usando essa nomenclatura, apresentar a importante Conjecturade Schanuel que diz

Conjectura 3.11 (Schanuel). Se x1, . . . , xn ∈ C são linearmente independentessobre Q, então

grtr(Q(x1, . . . , xn, ex1 , . . . , exn) |Q) ≥ n.

A Conjectura de Schanuel é, sem dúvida, o grande resultado a ser provado emTeoria Transcendente. A motivação da Conjectura de Schanuel parece vir de algunsresultados já sabidos. Por exemplo, quando n = 1 temos que se α 6= 0, então, peloTeorema de Lindemann, pelo menos um dos números α e eα é transcendente, assimgrtr(Q(α, eα) |Q) ≥ 1. No caso de n arbitrário, essa conjectura está resolvidaapenas para {x1, . . . , xn} ⊂ Q, usando o Teorema de Lindemann-Weierstrass

Vamos agora apresentar algumas das implicações da Conjectura de Schanuel,em particular vamos ver que muitos dos números que acreditamos ser númerostranscendentes, mas ainda não sabemos provar, podem ter a transcendência obtidavia Conjectura de Schanuel, além disso vamos ver que os teoremas que enunciamospodem ser vistos como consequência dessa conjectura.

Teorema 3.12. Se a Conjectura de Schanuel for verdadeira, então e e π são alge-bricamente independentes sobre Q, em particular e + π e eπ são números trans-cendentes.

Demonstração. Suponha que a Conjectura de Schanuel é verdadeira, e considerex1 = 1 e x2 = iπ, temos que x1 e x2 são Q-L.I., esse fato segue diretamente datranscendência de π, logo

2 ≤ grtr(Q(1, iπ, e, eiπ))= grtr(Q(1, iπ, e,−1))= grtr(Q(π, e))≤ 2,

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22CAPÍTULO 3. A CONJECTURA DE SCHANUEL E OS TEOREMAS CLÁSSICOS

donde e, π são algebricamente independentes, ou seja p(e, π) /∈ Q para todop(x, y) ∈ Q[x, y] \ {0}, em particular eπ, e+ π são transcendentes.

Por fim vamos ver que a Conjectura de Schanuel implica os teoremas clássicosapresentados acima

(I) Conjectura de Schanuel⇒ Teorema de Lindemann-Weierstrass: Essaimplicação é imediata tomando x1 = α1, . . . , xn = αn. Note que, pela equivalên-cia, temos que a conjectura implica o Teorema de Hermite-Lindemann.

(II)Conjectura de Schanuel ⇒ Teorema de Gelfond-Schneider: Nós mos-tramos que o Teorema de Gelfond-Schneider é equivalente ao Teorema 3.7, quepor sua vez é uma consequência direta da Conjectura de Schanuel tomando x1 =logα1, x2 = logα2 que, por hipótese, são Q-L.I..

(III)Conjectura de Schanuel ⇒ Teorema de Baker: Aqui tomamos x1 =logα1, . . . , xn = logαn e o resultado também segue naturalmente.

Então podemos ver que os resultados clássicos, caso a Conjectura de Scha-nuel se mostre verdadeira, são corolários imediatos dela, o que justifica sua grandeimportância na Teoria dos Números Transcendentes. Mas é importante ressaltarque a Conjectura de Schanuel não é o passo final nessa teoria, mesmo com a de-monstração da conjectura, ainda existem muitos problemas em aberto, como porexemplo os números ζ(2n + 1), para n > 1. Com isso queremos deixar mais doque um pequeno histórico de uma teoria, mas um convite, um convite a essa teoriarelativamente recente, porém com grandes desafios.

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Referências Bibliográficas

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[2] BURGER, E., On Liouville decompositions in local fields, Proceedings of theAmerican Mathematical Society, 124 (1996), no. 11, 3305-3310.

[3] ERDÖS, P., Representations of real numbers as sums and products of Liou-ville numbers, Michigan Math. J., 9 (1962), 59-60.

[4] FIGUEIREDO, D. G., Números Irracionais e Transcendentes, 3 ed., Rio deJaneiro: SBM, 2011.

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24 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

[13] MARQUES, D.; SILVA, E. A note on transcendental power series mappingthe set of rational numbers into itself. To appear in Communications in Mathe-matics.

[14] POLLARD, Harry. The theory of algebraic numbers. Baltimore: The Mathe-matical Association of America, 1950. (The Carus Mathematical Mono-graphs; v.9).

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