trabalho estado novo (andresa gromicho)

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Testemunho sobre viver no Estado Novo 1932-1968

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Page 1: Trabalho estado novo (andresa gromicho)

Testemunho sobre viver no

Estado Novo

1932-1968

Page 2: Trabalho estado novo (andresa gromicho)

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ÍNDICE

Índice…………………………………………………………………………………………………………………..2

Introdução……………………………………………………………………………………………………………3

Estrutura das questões…………………………………………………………………………………………4

Primeiro Testemunho…………………………………………………………………………………………..5

Page 3: Trabalho estado novo (andresa gromicho)

3

Introdução

Como é do conhecimento geral, o Estado Novo foi um

regime conservador, autoritário, nacionalista, repressivo,

colonialista e corporativo, liderado por António de Oliveira

Salazar nos anos de 1932-1968.

Deste Estado instaurado por Salazar, foram criados 4

Organismos de Defesa do Estado, como é o caso da PIDE

(Polícia Internacional de Defesa do Estado), da Legião

Portuguesa (Organização paramilitar – camisas castanhas),

da Mocidade Portuguesa (idêntica aos exemplos alemão e

italiano, preparava os jovens para o “engrandecimento da

nação”) e a Censura (exercida sobre publicações nacionais e

estrangeiras, protegendo a doutrina, a ideologia, a moral e

os bons costumes do Estado Novo.

Este trabalho estrutura-se como sendo uma entrevista que

pretende contar alguns dos muitos testemunhos de

pessoas que vivenciaram algumas das acções realizadas

durante o regime salazarista.

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Estrutura das questões

1. Posso saber o seu nome, em que ano nasceu e que

idade tinha na altura do Regime de Salazar?

2. Presumo que tenha vivenciado experiências durante o

Estado Novo. Como foi a sua infância?

3. Como era o seu dia-a-dia?

4. Como era o seu relacionamento com os professores e

pais?

5. Qual era a matéria que era leccionada nesse tempo?

6. E quando havia mau comportamento, qual era o

castigo?

7. Em geral como caracteriza a juventude daquele tempo?

8. Que actividades lúdicas existiam na altura? Praticava-

as?

9. Quando começou a trabalhar?

10. E em ralação à raparigas, quais eram as liberdade e

proibições a que estavam sujeitas?

11. Como deve saber, naquela altura existiam alguns

Órgãos de Defesa do Estado, com a PIDE, a Legião e

Mocidade Portuguesa. Fazia parte de algum deles?

12. Teve alguma vida a nível militar? Se sim, onde esteve?

Como era vida nas colónias? Como era estar longe de

casa? E como foi regressar? Se não, como via a guerra?

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Esta é a estrutura inicial das questões que pretendia fazer

às testemunhas, mas como era de esperar no meio de tanta

conversa, foram surgindo outras tantas, e as questões

deixaram de ser as mesmas. Por esse mesmo motivo, no

que corresponde aos testemunhos escritos neste trabalho,

mostro então as questões realmente feitas.

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Primeiro testemunho

A conversa com esta senhora, apesar

de muito interessante, foi também

comovente.

Durante toda a entrevista, a senhora

recordava-se constantemente, e com

algumas lágrimas, da falta que lhe

fazia a mãe e o facto de ter sido

criada pelos avós.

Mas começámos muito bem. De

inicio, comecei por perguntar à senhora se lhe podia fazer algumas

perguntas acerca do Regime de Salazar, e com toda a simpatia, lá

me disse que aceitava.

Com base no inquérito acima apresentado, descrevo agora a

nossa conversa:

Muito prestável, apresentou-se: “Chamo-me Maria Albertina

Gomes Serqueira, nasci em 1919 e naquela altura tinha, portanto,

19 anos. Fiz apenas a 4ª classe que terminei com 13 anos, e

fiquei a ajudar a minha avó. A minha professora não nos dava

castigos quando não sabíamos a matéria sobre gramática,

português ou matemática, como acontecia com outros alunos,

apenas repreendia-nos. Não eram muitas as vezes que falávamos

de Salazar, não dávamos muita importância a esses assuntos.

Quando terminei os estudos comecei a trabalhar com a minha

avó, ajudando-a nas costuras. Nós as raparigas podíamos sair ao

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jardim juntas, íamos à missa, a minha avó, por exemplo, era dona

de casa e guardava-me sempre o meu melhor vestido para ir à

missa.”.

No meio deste inicio de conversa, dei pela senhora a comover-

se e perguntei se se sentia à vontade para continuar, e que se

não se sentisse à vontade, não havia mal nenhum em parar. Mas

explicou-me que comove-se muito facilmente e que recordar-se

daquela altura, é recordar-se da sua mãe, que perdeu ainda

muito nova e que por isso foi criada, juntamente com os seus

irmão, pelos seus avós que fizeram tudo por eles. Disse-me que

naquela altura o respeito era muito maior pelos pais e pelos

outros.

“Fiz parte da Legião Portuguesa e não é muito diferente dos

escuteiros de hoje, saíamos para o jardim, íamos à missa, o

normal, não tínhamos aquela noção de Defesa do Estado

Nacional.”

Entretanto perguntei à senhora se tinha vivenciado alguma

experiência da PIDE e se achava que a mesma agia

correctamente, “Vivia em frente à fortaleza, então era frequente

ver alguns tropas, e não acho que agissem muito bem, mas

também era muito nova não tinha essa noção. Entretanto também

me casei e o meu marido trabalhava em Lisboa e trabalhava na

cozinha da Guarda Republicana.”

“No 25 de Abril ouvi pela rádio que estava a acontecer uma

revolução e vi os tropas a chegar ao forte.”

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Maria Albertina Gomes Serqueira e a sua sobrinha, que foi entrevistada pela minha colega

Susana.

“Não achei que tivesse sido uma época muito má, era calma,

vivíamos bem.”

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Segundo

testemunho

Este é um testemunho

de um Piloto e da sua

família que na época do

Estado Novo, já mais

próxima de 1974, que

emigrou para África.

O senhor é meu avô e

disponibilizou-se, cheio de vontade, para colaborar neste trabalho,

assim como a minha avó e a sua irmã, minha tia.

Já íamos em longas conversas sobre este tema, quando decidi dar

inicio ao questionário “Chamo-me Altino Aníbal Gromicho e nasci a

10 de Fevereiro de 1929. Ainda vivi alguns anos em Portugal

durante o regime de Salazar, e eram dias normais. Fiz apenas o

7ºano – actual 11ºano.” No meio deste inicio de entrevista, foram

surgindo intervenções dos presentes. “A juventude daquela altura

tinha mais noção de família, respeito pela família o que não há

hoje.” “Nem todos os jovens podem ser assim, mas aqueles que se

vêm hoje em dia, são.”. Comento a senhora Maria Emília, minha avó.

“Em relação à raparigas, a sua roupa era mais comprida e escura.

Não podiam conviver com os rapazes como hoje fazem, as escolas

eram também separadas.” Entretanto a senhora Maria Emília e a

senhora Maria Adelina disseram que os seus pais comentavam em

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casa o que os jovens faziam na rua, dando deste modo exemplo do

que era errado aos filhos, “íamos acompanhadas pelos nossos pais

ao bailes e matines. Tínhamos saias a 70 centímetros do chão,

vestidos de seda para os bailes e os rapazes tinham roupa normal.

Namorava-se à janela, do primeiro andar. No meu caso namorámos

junto à casa de uma prima minha, na rua, para que os nossos pais

não soubessem, mas entretanto descobriram e lá permitiram que

namorássemos em nossa casa, sempre vigiados. Só levou a mal que

não tivesse existido um pedido de namoro formal.”

Pretendi então saber se o senhor teria feito parte de alguns dos

Órgãos de Defesa do Estado, “Fiz parte da Mocidade Portuguesa,

que era obrigatório. Entrei com 7 anos, e fazíamos desporto,

jogávamos basquete mas não tínhamos aquela ideia de defender o

Estado português. Eram muito idênticos aos escuteiros de hoje.

Existiam várias etapas de idades, os Cadetes e depois o Quadrantes

de Falange.” “Ocupávamos os tempos-livres com a bola, os patins e

quando chegávamos a casa ralhavam-nos porque tínhamos de

estudar. Também frequentávamos cafés.”

“Comecei a trabalhar, tinha eu 17 anos, num armazém em Lisboa

ajudante de guarda-livros.” Entretanto passei à mudança de país

deles, “Fui para África em Dezembro de 1958 e a minha mulher em

1959. Tive na Força aérea e quando passei à disponibilidade, ou

seja, saí da tropa e a guerra tinha começado nessa altura, por isso

fiquei livre. Quando fui para África, mais propriamente para Cabo

Verde, ainda não havia guerra nas colónias (Angola, Moçambique,

Cabo Verde, Guiné, Luanda e S. Tomé), só em 1961.Depois de Cabo

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Verde fomos para S. Tomé e mais tarde para Angola e foi nessa

altura que começou a guerra. Era terrível saber que estava ali perto

de onde morávamos, perto da igreja da Sagrada Família. Nessa

altura o MPLA (Movimento Pela Libertação de Angola) tinha ganho as

eleições e nós tínhamos a figura do outro partido à porta de casa e

ao vermos a tropa passar, retirámos logo tudo.”

Em relação ao meio de comunicação daquela altura, pelo qual

tínham informações sobre a revolução, “Ficámos na expectativa,

porque tinha havido uma tentativa antes e nunca mais se ouvia falar

em mais nada. Mas soubemos pela rádio naquele dia. Soubemos

que a Igreja ordenou que rebentassem com o motor da Rádio

Renascença, para que não fosse tomada pelos revolucionários. Não

estávamos muito de acordo com o sistema de Salazar, mas não

passámos fome nem falta de outros mantimentos.”

“Tarrafal era a prisão dos políticos, em Cabo Verde. Muitos deles

morriam sufocados, 60 pessoas num pequeno cubículo.

“O Mário Soares foi castigado por dizer mal do governo e foi

enviado para S. Tomé. E eu fazia viagens frequentemente a Angola e

trazia sempre Lagostas para comer com os meus amigos num café.

E um dia estava o Mário Soares nesse mesmo café e eu chamei-o

para a nossa mesa. O que aconteceu foi que no dia seguinte lá

estava eu no quartel da PIDE, para justificar o meu convívio com

Mário Soares, e eu respondi-lhes muito directamente dizendo que

se não queriam que convivêssemos, não o tivessem levado para lá.

Portanto aquela ideia de que eles iam para prisões em África, era

mentira. Um dia o pai do Mário Soares faleceu, isto ainda estava ele

preso em África, e foi lhe concedido o direito de vir ao funeral do

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pai. E então estava em Angola e o governador pergunta-me, isto

eram 8h da noite, de quantas horas precisava para estar em Luanda

à meia-noite para depois seguir para Lisboa. E eu respondi-lhe que

precisava de 7 horas. Ele não dar a ideia de que estávamos a levar o

Mário Soares de propósito para Portugal e por isso perguntou-me

se eu não teria uns amigos que quisessem viajar, e eu enchi logo o

avião de gente. Assim que estava a chegar a Luanda reparei que

estava 10 minutos adiantado, e então disse para o co-piloto para

sobrevoarmos as nuvens até fazer-se tempo para aterrar, pois não

convinha que Mário Soares chegasse mais cedo, tendo à sua espera

à hora de aterragem, tropas da PIDE para o levarem para Lisboa.

Depois do funeral, Mário Soares aproveitou a oportunidade e fugiu

para França.

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