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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
ABANDONO DE INCAPAZ E EXPOSIÇÃO OU ABANDONO DE
RECÉM-NASCIDO
Por: ANNA LUCIA BARBOSA VARGAS
Orientador
Prof. Francis Rajzman
Rio de Janeiro
2012
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
ABANDONO DE INCAPAZ E EXPOSIÇÃO OU ABANDONO DE
RECÉM-NASCIDO
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Penal e Processo Penal.
Por: Anna Lucia Barbosa Vargas.
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AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, meus
pais Vargas e Lucia, a grande amiga
Mônica e principalmente aos mestres
do curso de Dr. Penal da AVM.
4
DEDICATÓRIA
Dedico com todo carinho ao meu querido
pai Vargas e minha mãe Lucia, por me
darem força e incentivo aos estudos
sempre.
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RESUMO
Trata-se de estudo referente à estrutura jurídica do crime de abandono
de incapaz e exposição ou abandono de recém-nascido previsto nos artigos
133 e 134 do Código Penal em vigor. Em meio às persistentes divergências,
inclui-se o dolo eventual em sua moldura típica, juntamente com o dolo direto;
indicam-se o pai, a mãe ou responsável como sujeitos ativos; registra-se a
inevitável dose de subjetividade na identificação do sujeito passivo; em
paralelo com o crime de infanticídio, descarta-se a tipicidade na hipótese de
exposição ou abandono sob a influência do estado puerperal, logo após o
parto. Por fim, numa visão crítico-metodológico, lembra-se que o importante
não é apontar a resposta dogmaticamente correta. O importante é observar a
analisar a realidade, procurar compreendê-la e, de alguma forma, sem fugir do
debate, sublinhar a figura do intérprete no processo histórico de construção
artesanal do direito.
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METODOLOGIA
O trabalho foi realizado uma análise teórico-dogmática do crime de
abandono de incapaz e exposição ou abandono de recém-nascido. Ambos
previstos respectivamente nos artigos 133 e 134 do Código Penal em vigor.
Esses artigos do Código Penal pertencem ao Capítulo III – Da periclitação da
vida e da saúde, visam à proteção específica da vida e da saúde daqueles que
não tem como se defender.
Como este trabalho tem cunho investigativo, mediante estudo teórico-
conceitual e prático, contou entre outras formas, com a realização de uma
pesquisa de campo que objetivou colher dados referentes à prática desses
crimes. Como também, visou traçar uma visão mais acertada das demandas
provenientes nas delegacias, tendo em vista a mais importante (Delegacia
Especial de Proteção da Criança e do Adolescente). Para tanto, buscou
levantar dados sobre as condutas de abandono de incapaz e de exposição ou
abandono recém-nascido, proeminentes a partir disso, construir uma visão
crítica do contexto.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - Conceito. 09
1.1 - Abandono de incapaz definição conforme lei. 1.2 - Abandono ou exposição do recém-nascido. CAPÍTULO II - Estrutura jurídica. 11
CAPITULO III - Breve comparação com Infanticídio. 12 CAPÍTULO IV – Pesquisa de Campo: Visão acerca 24
dos crimes de abandono de incapazes e ou
exposição de recém- nascidos.
CONCLUSÃO 29
ANEXO 30
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 33
ÍNDICE 33
8
INTRODUÇÃO
A sociedade brasileira tem se defrontado cada vez mais com casos
diversos que preenchem a descrição das condutas de “abandono de incapaz e
de exposição ou abandono de recém- nascido”, previstas respectivamente nos
artigos 133 e 134 do Código Penal Brasileiro.
Podemos analisar três tipos de abandono de incapaz: o intelectual, no
qual os pais privam o filho de ir a escola (de acordo com a legislação brasileira,
é obrigatório que a criança curse até o Ensino Fundamental); o moral, que é
quando o pai reconhece seu filho, mas ignora sua existência inclusive no
sentido afetivo (o mesmo vale na relação entre filhos e pais, para idosos); e o
material, caracterizado quando o considerado "incapaz" não tem condições
materiais de subsistência.
Dessa forma, nada mais conveniente fazer uma abordagem acerca
dessa realidade, buscando perceber a repercussão dessas condutas no
contexto social,
O trabalho se proporá a investigar a tipificação penal da conduta de
Abandono de Incapaz praticada pelos indivíduos nas duas modalidades
presentes no Código Penal (CP). Abordar-se-á, para tanto, as características
peculiares de cada tipo penal mencionado, analisando a construção dessas
condutas, tendo em vista as concepções dadas pela Legislação Penal Pátria.
De forma simplificada, descreverá ainda o contexto da reprovação da conduta,
bem como a reação do próprio Sistema Penal diante do delito
9
CAPÍTULO I
ABANDONO DE INCAPAZ E ABANDONO OU
EXPOSIÇÃO DE RECÉM-NASCIDO
FORMA LEGAL
1. 1 – Abandono de incapaz definição conforme lei de incapaz
Eis o teor do texto legal:
Art. 133. Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda,
vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos
riscos resultantes do abandono:
Pena — detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos.
§1º Se do abandono resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena: — reclusão, de 1(um) a 5 (cinco) anos.
§ 2º Se resulta a morte:
Pena: — reclusão de 4 (quatro) a 12(doze) anos.
§ 3º As penas cominadas neste artigo aumentam-se de um terço:
I — se o abandono ocorre em lugar ermo;
II — se o agente é ascendente ou descendente, cônjuge, irmão, tutor
ou curador da vítima.
III — se a vítima é maior de 60 (sessenta) anos ( inciso introduzido
pela Lei n° 10.161, de 1° de outubro de 2003)
No abandono de incapaz, constitui o primeiro dos delitos de perigo
individual que comportam, no tipo, uma forma básica ou simples (caput) e duas
formas qualificadas, correspondentes à ocorrência de lesão grave (§1º) e
morte (§2º). Sobre elas, indistintamente, cabe aumento de pena de um terço,
nas hipóteses especificamente delineadas (§3º).
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Visível, pois, a importância da matéria, em face da necessidade de se
apontar as características e peculiaridades que o distinguem de outros crimes
de perigo e, mesmo, de dano: homicídio e lesões corporais, notadamente.
2 – Abandono ou exposição de recém-nascido.
Apresentando bastante semelhança com o delito de abandono de
incapaz, previsto no art. 133, o crime de exposição ou abandono de recém-
nascido, tipificado no art. 134, é considerado até uma forma privilegiada do art.
133.
Sua história chega a se confundir com a história do abandono de
incapaz. As civilizações antigas não chegavam a reprimir o comportamento de
abandonar recém-nascido de forma veemente, e até mesmo era permitido, se
o bebê apresentasse deformidades e não servisse para o serviço militar, no
caso dos meninos, e em qualquer hipótese de o bebê ser do sexo feminino,
com exceção da primogênita. Foi somente com o Direito Canônico que se
passou a ter uma preocupação maior, censurando o comportamento das mães
que abandonassem seus filhos, fossem eles recém-nascidos ou não.
No Brasil, a tipificação, tal como hoje a entendemos, só veio surgir com
o advento do Decreto-Lei nº 2.848/40, nosso atual Código Penal.
A especialista em Direito Penal Carla Rahal Benedetti lembra, no
entanto, a necessidade de avaliar cada caso em suas particularidades. "Cada
situação deve ser analisada de forma objetiva, isto é, se faz necessária a
avaliação ponderada do caso para que a falta ou ausência de cuidados por
instantes não seja entendida como uma conduta passível de penalização
criminal", diz. Em qualquer caso, ainda de acordo com Carla, a lei exige a
intenção do agente causador em abandonar a pessoa que está sob seus
cuidados e que não pode se defender.
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CAPÍTULO II
EXPOSIÇÃO OU ABANDONO DE RECÉM-NASCIDO
ABANDONO DE INCAPAZ
ESTRUTURA JURÍDICA
1. ESTRUTURA JURIDICA
Trata-se de crime próprio, no sentido de infração que exige qualidades
especiais do agente. No caso, em razão de seus vínculos com a vítima. Assim,
a vítima é pessoa que se encontra sob cuidado, guarda, vigilância ou
autoridade do sujeito ativo; daquele que, em tais condições, dela se afasta
fisicamente, abandonando-a.
2.1 - Exposição ou Abandono de Recém-Nascido.
I) Conceito: Consiste em expor ou abandonar recém nascido para ocultar
desonra própria, a idéia de expor remete-se a idéia de expor o recém nascido
a um perigo, a idéia de o agente se afastar da vitima deixando-a em situação
de risco, ou pelo fato do abandono em si, ou em razão da subseqüente
separação física.
II) Objeto Jurídico: Proteção da vida e da saúde do recém nascido.
III) Objeto material: É o recém-nascido.
IV) Sujeitos: Alguns doutrinadores entendem que trata-se de crime próprio,
sendo que o sujeito ativo apenas poderia ser a mãe, dado o termo desonra
própria utilizado pelo legislador que tem aplicação limitada à mulher, bem como
pelo fato de ser ilícita a concepção. No entanto, outros doutrinadores
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entendem que o pai também poderá figurar como sujeito ativo deste crime com
o propósito de encobrir uma possível infidelidade conjugal. E o sujeito passivo
será o recém nascido.
V) Forma Culposa: Este delito não admitiu forma culposa.
VI) Consumação e Tentativa: A consumação só se configurará se ocorrer à
efetiva exposição ou abandono que ofereça risco concreto para a saúde ou
vida do recém-nascido. O crime admite tentativa, pois a conduta é fracionada
em vários atos, sendo admitida também a tentativa de forma comissiva, ou
seja, naqueles casos em que o sujeito é surpreendido no momento da
execução do ato.
VII) Causa especial de aumento ou de diminuição de pena: Não possui causa
especial de aumento de pena. Só terá diminuição da pena quando praticado
de forma privilegiada.
VIII) Forma privilegiada e qualificada: A doutrina não está pacificada ainda
neste sentido, para alguns doutrinadores a forma privilegiada ocorreria
somente para o abandono feito pela mãe pelo motivo de ocultação de desonra
ou nos casos em que a mãe esteja sob influência de estado puerperal. Ele
será qualificado se resultar de uma lesão grave ou a morte do recém-nascido.
IX) Pena: Se o crime for cometido em sua forma simples à pena será de
detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, se do fato resulta lesão corporal
de natureza grave a pena será de detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos e se
resulta a morte do recém-nascido a pena será de detenção, de 2 (dois) a 6
(seis) anos.
X) Ação penal: Ação penal pública incondicionada.
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2.2 – Abando de Incapaz
I) Conceito: Trata-se de uma infração que exige qualidades especiais do
agente, ou seja, seu vinculo com a vítima, que este constitui o primeiro delito
de perigo individual. Esse delito ocorre quando aquele que possui a guarda (o
dever de cuidar) do incapaz se afasta dele, colocando em risco sua vida ou
saúde, de modo a deixa - lá indefesa em situação perigosa, ainda que por um
breve instante.
II) Objeto jurídico: Protege a sua segurança física, protege a segurança da
pessoa humana, por essa não poder por si mesma defender-se.
III) Objeto material: Não há objeto material.
IV) Sujeitos: O sujeito ativo é aquele que exerce a guarda, vigilância do
incapaz, é aquele que possui o dever de zelar por sua segurança. Já o sujeito
passivo é o próprio incapaz.
V) Forma culposa: Não ocorre na forma culposa, só de forma dolosa.
VI) Consumação e Tentativa: A consumação ocorre com o abandono, desde
que resulte em perigo concreto. A tentativa é admissível na forma comissiva,
sendo sempre inadmissível na omissiva.
VII) Causa especial de aumento ou de diminuição de pena: O parágrafo 3º já
traz os casos específicos em que haverá aumento da pena, sendo eles:
quando o abandono ocorrer em lugar ermo, se o agente é ascendente ou
descendente, cônjuge, irmão, tutor ou curador da vítima.
VIII) Forma privilegiada e qualificada: O parágrafo 1º e 2º trata de
qualificadoras preterdolosas, será aumentada a pena havendo a intenção de
provocar o resultado mais grave, ou, caso o agente tenha assumido o risco de
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produzi-lo, responderá por lesões corporais graves ou por homicídio. Não
haverá forma privilegiada nesse caso.
IX) Pena: Para o abandono a pena será de detenção 6 (seis) meses a 3 (três)
anos. Se dessa resultar lesão grave a pena será de reclusão de 1 (um) a 5
(cinco) anos, se dessa resultar a morte a pena será de reclusão de 4 (quatro) a
12 (doze) anos, e se qualquer uma dessas for concomitante com o parágrafo
3º a pena será aumentada em 1/3.
X) Ação penal: A ação penal é publica incondicionada.
1. ESTRUTURA JURIDICA-DOUTRINARIA
Vejamos, em detalhes, à luz da doutrina, o sentido e alcance das
expressões normativas. Por certo que haverá divergências. Mas elas fazem
parte do cenário natural de uma atividade em si mesmo contraditória, por força
da própria linguagem da lei e do jogo personalizado de valorações e
sensibilidades.
O crime pode ser praticado por ação (ex.: levar a vítima em um certo
local e ali deixá-la) ou por omissão (ex.: deixar de prestar a assistência que a
vítima necessita ao se afastar da residência em que moram), desde que, da
conduta, resulte perigo concreto, efetivo, para a vítima.
- a lei não se refere apenas às pessoas menores de idade, mas
também aos adultos que não possam se defender por si próprios, abrangendo,
ainda, a incapacidade temporária (doentes físicos ou mentais, paralíticos,
cegos, idosos, pessoa embriagada etc.).
- não havendo a relação de assistência entre as partes, o crime poderá
eventualmente ser o do artigo 135 (“omissão de socorro”).
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- se a intenção do agente for a de ocultar desonra própria e a vítima for
um recém-nascido o crime será o previsto no artigo 134 (“exposição ou
abandono de recém-nascido”).
Denominasse relação jurídica de cuidado quando alguém tem o
encargo de zelar, nas circunstâncias, pela saúde e integridade física de
outrem; de guarda, quando a obrigação for mais envolvente, diante da
incapacidade natural ou relativa da outra parte; de vigilância, quando a
obrigação se restringe a um compromisso ocasional de observação e proteção
acautelatória; de autoridade, na hipótese de um poder-dever de mando e
orientação, vinculado a normas de direito público ou direito privado.
Basta qualquer uma dessas relações para que ocorra o delito. O pai,
por exemplo, quanto ao filho menor, com quem sai a passeio, mantém sobre
ele deveres de cuidado, vigilância, guarda e autoridade. Os médicos em face
de seu paciente assumem deveres de cuidado. O diretor da penitenciária tem a
guarda (custódia) dos presos e sobre eles exerce autoridade, nos termos e
limites da lei. O guia turístico de uma expedição arriscada deve conservar sua
proteção (vigilância) até o final de seu trabalho.
Quem da carona em seu carro a pessoa inválida assume compromisso
de guarda e vigilância: não pode deixá-la em lugar perigoso, do qual se afaste
voluntariamente. O conceito de guarda, por sua "inquestionável flexibilidade no
campo penal", inclui igualmente as hipóteses de "qualquer situação fática
devidamente demonstrada", como lembra Silva Franco (Tortura: breves
anotações sobre a Lei 9.455/97, Revista Brasileira de Ciências Criminais, n°
19, jul./dez. 1997, p. 61, São Paulo: RT).
A preexistência de um vínculo jurídico — imposto por lei, por contrato
ou derivado de uma conduta unilateral do agente — a caracterizar a defesa
dos interesses de quem viria a sofrer os "riscos resultantes do abandono".
Quase sempre a vítima é um menor, de quem se livram os familiares, todavia
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nada impede, que adultos mesmo saudáveis se enquadrem nessa situação.
Basta que sofram efetivamente uma condição de perigo para a vida ou saúde
provocado por quem tinha o dever prévio de garantir-lhes a incolumidade
pessoal.
A materialidade do delito, que é de perigo concreto, reside no ato de
afastar-se da vítima, colocando-lhe em risco a vida ou a saúde. "A ação
consiste — ensina Custódio da Silveira — em abandonar, quer dizer, afastar-
se da vítima, de modo a deixá-la indefesa e em situação perigosa, ainda que
por breve instante" (Direito penal: crimes contra a pessoa, 2ª ed. São Paulo:
RT, 1973, p. 183).
Exige-se, portanto, haja vista a gravidade da conduta, o distanciamento
físico entre réu e ofendido. O sujeito ativo se aparta da pessoa da vítima, que
permanece onde de hábito se encontrava (sozinha em sua casa, por exemplo),
ou a leva propositadamente para outro local, em que é exposta a perigo por
força do conseqüente abandono. É a lição de Nélson Hungria (Comentários ao
código penal, v. 5. Rio de Janeiro: Forense, 1942, p. 384), seguida dentre
outros por Damásio de Jesus (Direito penal, v. 2, 13ª ed. São Paulo: Saraiva,
1991, p. 145), Paulo José da Costa Jr. (Comentários ao código penal, v. 2. São
Paulo: Saraiva, 1988, p. 58), Celso Delmanto (Código penal comentado, 2ª ed.
Rio de Janeiro: Renovar, 1988, p. 254), Fabbrini Mirabete (Manual de direito
penal, v. 2, 9ª ed. São Paulo: Atlas, 1995, p. 130) e José Frederico Marques
(Tratado de direito penal, v. 4. São Paulo: Saraiva, 1961, p. 314).
Mas o próprio Custódio da Silveira, mais adiante, parece aumentar o
campo de incidência da norma: "Consubstancia-se o abandono em toda e
qualquer ação ou omissão contrastante com a obrigação de assistir, cuidar ou
custodiar" (p. 184/185). Haveria agora uma interpretação extensiva, desde que
se dispensasse o afastamento físico ou material.
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Esclarecemos que tal interpretação extensiva não decorre do fato de o
art. 133 mencionar apenas o ato de abandonar, diferentemente do que se
passa com o art. 134, que fala em expor ou abandonar. Afinal, é
compreensível que o abandono, por si só, abranja a exposição, termo que se
prende à idéia de colocar em perigo. Todavia, parece-nos duvidoso que o
legislador, além da hipótese de exposição, incluída no ato de abandonar, tenha
majorado ainda mais em seu "espírito" o significado e abrangência do delito.
Heleno Fragoso, no entanto, adota a mencionada exegese extensiva,
em prejuízo do réu. Para justificar essa "conceituação mais ampla ao
abandono", compatível com a "omissão de custódia e cuidado", ainda que
inexistente a "separação material", ele se socorre da "doutrina moderna":
Manzini e Maggiore, na Itália; Paul Logoz, na Suíça; e, na Alemanha, Schönke-
Schröder e Maurach (Lições de direito penal: parte especial, v. 1, 7ª ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1983, p. 153/154).
Também Aníbal Bruno: o afastamento da vítima "não é de todo
necessário. Basta que (o agente) não lhe dê o socorro ou a assistência, como
devia e lhe era possível fazer, criando por esse meio o perigo. É o que realiza
o enfermeiro que está presente, mas deliberadamente e com o dolo necessário
não presta ao doente grave a seu cargo, os cuidados devidos, configurando-
se, porém, o crime não pela falta ao cumprimento do dever, mas por abandono
de pessoa, com os riscos que daí decorrem" (Direito penal, v. 4. Rio de
Janeiro: Forense, 1966, nota de rodapé n° 4, p. 241/242).
Autores mais recentes abonam a assertiva: Cezar Roberto Bitencourt,
Manual de direito penal, v. 2, São Paulo: Saraiva, 2001, p. 275; Flávio Augusto
Monteiro de Barros, Crimes contra a pessoa. São Paulo: Saraiva, 1997, p.
133/134; Wiliam Wanderley Jorge, Curso de direito penal, v. 2. Rio de Janeiro:
Forense, 1989, p. 190.
Para Ney Moura Teles existe o crime se o agente, mesmo quando se
mantém próximo da vítima, "simplesmente deixa de realizar as ações
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necessárias à sua proteção" (Direito penal: parte especial, v. 2. São Paulo:
Atlas, 2004, p. 234).
Ora, além de adotar-se uma exegese que de modo algum deflui do
texto legal, descreve-se uma conduta tipicamente omissiva, prevista no art.
136, caput (privação de cuidados indispensáveis), cuja pena é menos grave,
de 2 (dois) meses a 1 (um) ano de detenção, ou multa. Data venia, deve-se
pois preferir a velha modernidade do nullum crimen sine praevia lege, de nível
constitucional (CF, art. 5°, XXXIX), superior à norma de equivalência
preconizada por Sebastián Soler, na Argentina, e avalizada por Heleno
Fragoso: abandono sem separação no espaço que "equivalha a tal separação"
(p. 154). Essa equivalência, por justa que pareça, não provém do sistema
normativo. Não cabe, no Brasil, analogia in malam partem. Sobretudo se a
hipótese se enquadra, à perfeição, em outro dispositivo legal, menos gravoso.
Note-se que todo e qualquer dolo de perigo em verdade corresponde à
culpa de dano (culpa consciente), quando ocorre dano. Em havendo morte, no
caso dos arts. 133 e 136, a resposta punitiva é severíssima: reclusão de 4
(quatro) a 12 (doze) anos, equiparada à pena da lesão corporal seguida de
morte (art. 129, § 3°). Assim, ou o enfermeiro quer matar ou assume o risco de
matar e, cruzando os braços, assiste ao desenlace (homicídio doloso); ou
apenas se omite com dolo de perigo, incidindo nas penas do art. 136, § 2°.
Não se cogita aqui de omissão de socorro (art. 135, parágrafo único) em razão
do vínculo jurídico prévio do enfermeiro (CP, art. 13, § 2º, b), que o torna
diretamente responsável pelo resultado: homicídio doloso, culposo ou
preterdoloso, em sentido amplo (neste último caso, desde que tenha havido
abandono — art. 133 — ou maus-tratos — art. 136).
O abandono realizado "de corpo presente" lembra, como vimos,
raciocínio analógico, inconfundível com exegese extensiva. Esse tipo de
"abandono" já tem nome no Código Penal: perigo para a vida ou saúde de
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outrem (art. 132); omissão de socorro (art. 135); maus-tratos (art. 136). O réu,
portanto, não ficaria impune.
O enquadramento típico no art. 133 só se justifica se o enfermeiro, por
exemplo, arrisca ir ao cinema, tendo consciência — e nada mais do que isso —
de que o paciente, que não está morrendo, pode precisar seriamente de sua
assistência. Aí, sim, existe abandono, e não é dos piores, pois está previsto o
retorno às atividades. O abandono por excelência se passa com ânimo
definitivo, ânimo de afastamento duradouro, e ainda com o significado de uma
obrigatória situação de perigo dele decorrente. Quer dizer: em regra, é o
afastamento físico, a separação, o abandono, que provoca o resultado de
perigo. O texto é explícito: riscos resultantes do abandono. Este é que
materializa o evento (o perigo) que a lei desde logo quer evitar, sob ameaça de
pena.
Qual delito comete o pai que, em seu lar, sabendo das crises alérgicas
do filho pequeno, e notando naquela noite os primeiros sintomas, permite que
os companheiros, durante horas e horas, prossigam no enfumaçado jogo de
cartas? Pode-se falar no "abandono" do art. 133? Não. Em princípio, ele
pratica o delito do art. 136, caput. A privação de cuidados indispensáveis
(omissão) se torna ainda mais nítida com a continuidade da conduta perigosa
dos demais, que aumenta a necessidade de uma assistência persistentemente
negada.
Mais: se o menor se encontra gravemente enfermo e o pai,
dolosamente, deixa de socorrê-lo, prevalece uma outra figura delituosa, de
abandono material (CP, art. 244, in fine). Esse detalhe constitui outro indício de
que o art. 133 tem como característica própria o fato de um afastamento físico
precedente de que resulta a situação de perigo preconizada em lei. Já o delito
do art. 244 pode ser cometido independentemente de qualquer proximidade ou
afastamento corporal entre réu e vítima. É suficiente que o réu tome
20
conhecimento da gravidade da doença e da possibilidade e necessidade de
sua intervenção pessoal. Diante desse quadro, deixa de socorrer o menor.
E se a criança morre, no quadro há pouco descrito (art. 244)?
Descartado o dolo de homicídio, só se pode cogitar do art. 121, § 3°, por força
dos princípios da subsidiariedade implícita e da consunção. Com muito
exagero, mas aparentemente sem base jurídico-dogmática: concurso formal de
crimes (arts. 121, § 3°, e 244, c/c art. 70). Reconhecida, porém, desde o início,
a figura do art. 133 (apesar da regra especial do art. 244), ter-se-ia o absurdo
de uma punição bem mais severa, haja vista o disposto nos parágrafos 2° e 3°,
inciso II.
Veja-se também o delito subseqüente (art. 134). Trata-se de um tipo
privilegiado do art. 133. O fim de "ocultar desonra própria" não deixa a menor
dúvida sobre o único sentido de "expor ou abandonar": o voluntário
afastamento físico do recém-nascido, detalhe que se torna ainda mais nítido
quando se toma conhecimento da forma qualificada concernente ao lugar ermo
(art. 133, § 3°, I).
Há, pois, outra maneira de interpretação do tipo legal. Vários penalistas
já foram expressamente mencionados, no início. Mas é bom e útil perceber, na
atualidade, autores que endossam a tese há pouco defendida. Para Edilson
Mougenot Bonfim, por exemplo, "o abandono deve ser real, i. é, traduz-se pela
separação física, distanciamento entre o protetor e o protegido" (Direito Penal
2, São Paulo: RT, 2005, p. 53). Dentre outros, de modo semelhante: Rogério
Greco (Curso de direito penal: parte especial. Niterói: Ímpetus, 2005, p. 389);
Rogério Sanches Cunha (Direito penal: parte especial. São Paulo: RT, v. 2,
2006, p. 108).
Qual a lição que se pode colher dessa divergência? Afinal de contas,
ela existe desde a vigência do Código, em 1942; atravessa o século 20; e
alcança os nossos dias, em 2007.
21
CAPÍTULO III
BREVE COMPARAÇÃO COM INFANTICÍDIO
Mães que abandonam seus filhos logo após o parto vêm sendo notícia
que tem feito parte do cotidiano midiático. Infelizmente isso é uma realidade,
por diversos motivos e sempre causam complexidade para a sociedade.
É notório que hoje há um aumento em relação a esses
comportamentos, pois o mesmo sempre existiu, tanto que o legislador inseriu-o
em nosso ordenamento jurídico, atribuindo a ele tipos penais diversos,
dependendo da finalidade e motivos do abandono
Nelson Hungria deixa claro que: “Cuidado significa a assistência a
pessoas que, de regra, são capazes de valer a si mesmas, mas que,
acidentalmente, venham a perder essa capacidade (ex.: o marido é obrigado a
cuidar da esposa enferma, e vice-versa). Guarda é a assistência a pessoas
que não prescindem dela, e compreende necessariamente a vigilância. Esta
importa em zelo pela segurança pessoal, mas sem o rigor que caracteriza a
guarda, a que pode ser alheia (ex.: o guia alpino vigia pela segurança de seus
companheiros de ascensão, mas não os tem sob sua guarda)”. (HUNGRIA,
1955: p. 418-419).
Nesse tipo legal, levando em consideração o abandono de filho recém-
nascido, fica evidente que a conduta da mãe é de perigo concreto e não de
dano, por isso que os danos (lesão corporal e morte resultante do abandono)
qualificam o crime. Assim, conscientemente, a genitora da vítima a expõe a
situação perigosa, mesmo quando a abandona ao poder de terceiros. Quanto a
esse sentido já manifestou nossos Tribunais: “A acusada deixou a filha, com
menos de quatro anos de idade, na casa de pessoas desconhecidas e foi
embora, expondo a criança a perigo concreto como exige o tipo penal. O fato
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de serem pessoas idosas não significou qualquer garantia à vítima de que não
seria maltratada, molestada ou, também, abandonada. Assustada, a criança
fugiu, indo em busca da mãe, e atravessou a cidade sozinha, até chegar à
casa da avó materna. Dolo de abandono configurado. Condenação
imperativa”. (TJRS, AC 70016308835, 2ª Câm. Crim., Relª. Desª. Lúcia de
Fátima Cerveira, DJ 18/03/2009).
Há ainda uma figura, o crime de infanticídio, tipificada no artigo 123 do
Código Penal. Esse dispositivo trás uma modalidade especial de homicídio, ele
pune a conduta de matar alguém. Diferenciam-se a medida que o infanticídio
trás em seu tipo, ou seja, há nele sujeitos ativo e passivo especiais, momento
especial, espaço de tempo especial e estado psíquico especial, características
que, uma vez completas, levará à pena de detenção de 2 (dois) a 6 (seis)
anos; repressão mais branda que o homicídio simples que recebe pena de
reclusão de 6(seis) a 20(anos).
Conforme nos ensina Rogério Greco, o delito de infanticídio possui
traços marcantes e inafastáveis. (GRECO, 2010: 256). É crime que pode ser
cometido somente pela mãe contra o próprio filho recém-nascido ou o feto que
está nascendo com vida, estando ela sob a influência do estado puerperal
durante o parto ou pelo menos, logo após.
Segundo orienta Damásio de Jesus (2010: 209) a exposição ou
abandono de recém-nascido é crime privilegiado em relação ao crime de
abandono de incapaz. Não obstante a conduta ser a mesma em ambos os
delitos, no abandono de recém-nascido existe elementos especializantes que
dizem respeito à qualidade do sujeito passivo e ao motivo da preservação da
honra. Se a mãe joga o filho em um rio ou em uma lata de lixo, por exemplo,
responderá pelo crime de homicídio (consumado ou tentado) já que esta
conduta resultará certamente a morte do filho (caso não haja intervenção de
terceiro), reproduzindo a vontade da mãe em alcançar esse resultado. Se a
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conduta se der durante ou logo após o parto, somada ao estado puerperal que
a mãe se encontra, o crime será o de infanticídio.
24
CAPÍTULO IV
PESQUISA DE CAMPO
DPCA
3 - PESQUISA DE CAMPO: Visão acerca dos crimes de abandono de
incapaz e ou exposição de recém-nascidos.
A pesquisa realizada em demonstrar a realidade vivida, no tocante aos
crimes de abandono de incapaz e ou exposição de recém-nascido. Para tanto,
buscou-se a partir da via jurídica nos órgãos judiciais de delegacias
informações, relatos e descrição mais freqüentes em seus cotidianos.
Sabe-seque nos casos mais freqüentes do crime de abandono de
incapaz (art.133 do CP), ocorridos na sociedade brasileira, os sujeitos passivos
são em sua maioria crianças e recém-nascidos. Por isso, um órgão foi
priorizado nesse trabalho, a saber: a Delegacia de Polícia Especializada de
Proteção à Criança e ao Adolescente - DPCA. A partir da entrevista, pudemos
entender o contexto social e jurídico vivenciados na realidade, descrita na
abordagem seguinte.
3.1. Visão na Delegacia de Polícia Especializada de Proteção à Criança e ao
Adolescente (DPCA)
Na Delegacia de Polícia Especializada de Proteção à Criança e ao
Adolescente (DPCA), no Centro de Proteção à Criança e ao Adolescente
(CPCA), fomos recepcionados pela assistente social Fernanda Frazão, que
nos forneceu informações sobre o trabalho prestado na instituição, relatou-nos
a importância da existência dessa função de assistência social dentro de uma
delegacia para atribuir um olhar mais crítico e social do contexto em que os
25
crimes são cometidos. Na verdade é uma atividade para além no texto da lei
penal.
Tanto é importante este órgão dentro da sociedade, que a própria
Carta Constitucional de 1988 prevê como bem demonstra o dispositivo a
seguir:
Art.203 A assistência social será prestada a quem dela necessitar,
independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à
velhice;
IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência
e a promoção de sua integração à vida comunitária;
A assistente social entrevistada nos relatou ainda que os casos mais
freqüentes chegados naquela delegacia são de maus tratos, negligência e de
abandono propriamente dito. Acerca deste último, para nossa surpresa disse
ela, que não está vinculado somente à questão financeira, isto é, diversos são
os motivos que levam a alguém que é responsável por um incapaz , a
abandoná-lo. Mas que, todavia, somente um estudo de caso, em sua
especificidade relataria de forma precisa os verdadeiros motivos.
Relatou-nos que os procedimentos adotados ao se depararem com
um caso concreto de abandono de incapaz, iniciam-se por meio de denúncia
anônima ou por Boletim de Ocorrência – BO, posteriormente se aciona o
Conselho Tutelar mais próximo da região a fim de averiguar pessoalmente o
ocorrido, se a denúncia realmente procede ou não. Ao chegarem no local é
feito uma análise geral do local, conversam com vizinhos sobre o cotidiano da
família, e em alguns casos, localizam os parentes mais próximos. Após
constatadas, as informações são levadas para o conhecimento da assistente
26
social, incumbida de analisar as informações fornecidas, e as encaminhará
para o delegado se for o caso. Ressalta-se que em ocorrências de menor
potencial ofensivo, basta somente o termo circunstancial de ocorrência – TCO
para descrevê-lo, porém em casos de maior gravidade será instaurado o
inquérito e o rito processual criminal se segue.
A sua opinião sobre o cárcere privado como melhor solução no que
tange o crime de abandono de incapaz, versa criticamente no ponto de que o
Sistema Penal é falho, não dá garantia para uma ressocialização, ninguém
garante que o agente ativo do delito ao sair do cárcere não cometerá
novamente tal ato. Nesse pensamento, podemos corroborar como os
doutrinadores Andrade (2003) e Baratta (2002), que questionam a ineficácia do
sistema penal, assim no tocante a ressocialização pregada no sistema penal,
permanece-se somente na teoria, pois, na prática, no cárcere não há
condições do indivíduo ser ressocializado. Entretanto a culpa não está no
indivíduo, e sim no sistema penal.
Ao ser questionado sobre uma estatística mais precisa acerca das
ocorrências do delito de abandono de incapaz e/ou exposição de recém-
nascido, informou-nos que não tinha essas informações arquivadas no setor de
informação da delegacia. Explicou-nos que anteriormente, essas informações
eram computadas dentro da delegacia, mas que a Secretaria de Segurança
Pública - (SSP), mandou retirar esse setor. E que podemos ter acesso a estas
informações, somente no Centro Integrado de Operações de Segurança -
CIOPS com solicitação de requerimentos e outras burocracias.
Para termos uma visão jurídica na prática, no que tange o delito
abandono de incapaz e exposição de abando de incapaz, foi de suma
relevância conversar com a Dra. Margareth Moura, Delegada Adjunta na
DPCA. Esta nos deu um posicionamento mais prático quanto aos
procedimentos adotados na proteção da criança e do adolescente, no tangente
27
às condutas de “abandono de incapazes e exposição ou abandono de recém-
nascido”.
A delegada nos relatou que são poucos os casos que chegam até a
delegacia, porque é preciso que as pessoas se direcionem até a delegacia e
registrem o Boletim de Ocorrência – BO, salvo em hipóteses de ligação
anônima. Todavia, não são todas as famílias que procuram a polícia em casos
de abandono de incapazes ou de recém-nascidos, se compararmos com o
crime de abuso serão mínimos os casos encontrados. Quando perquirida
acerca da faixa etária das vítimas, a delegada respondeu que na maioria dos
casos registrados eles estão na faixa etária de 5 (cinco) até 10 (dez) anos.
Corroborando as palavras da Assistente Social, Fernanda Frazão, a
delegada detalhou que os casos chegam à delegacia, de forma anônima, por
meio do disque *100, ou outras formas, também por requisição do Ministério
Público, Conselho Tutelar, ou pessoalmente, alguém que não quer se
identificar. Neste último caso, toma-se nota das informações, e o delegado faz
a ordem de missão para os policiais, nesse documento exporá os fatos, o
endereço, o suspeito, a vítima, para então se deslocar até o local para ver a
veracidade dos fatos. Em alguns casos se prefere acionar o Conselho Tutelar
mais próximo do bairro, para que este órgão averigue e colha os dados e
encaminhe-os para a delegacia ou para o promotor.
Ao chegarem ao conhecimento do delegado, ele averiguará de acordo
com o que a pessoa está narrando, em qual tipo penal que vamos enquadrar,
então dependendo do tipo necessitará ou não de pesquisa no ECA. O caso
deve ser analisado segundo a sua exigência, deve-se formalizar o inquérito
policial quando se referir a crime de médio e maior potencial ofensivo, se não
for flagrante deve-se abrir portaria. Posteriormente ouvi-se a pessoa que
comunicou o fato na delegacia, chama-se o suspeito e se junta às
documentações pertinentes como, por exemplo, “depoimentos de testemunha
e da vítima se possível”, e enfim formalizar o inquérito, cujo prazo se diferencia
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se o suspeito estiver “solto” (em liberdade), pois o prazo é de 30 dias previsto
no CPP se estiver em liberdade e de 10 (dez) dias, se estiver preso.
Acerca de o cárcere ser a forma mais adequada para a penalização,
relatou-nos que deve ser analisado de forma relativa. Segundo a delegada, ao
se iniciar o inquérito, escutam-se as partes, aprofundando-se no caso
concreto, se for constatado requinte de crueldade, frieza, em alguns casos até
mesmo se percebe quando a pessoa não tem noção de paternidade ou
maternidade compromissada e responsável, é cabível a aplicação de uma
pena mais rígida. No entanto, “existem casos em que se percebe que foi
mesmo uma fatalidade, que não deixa de ser por negligência por parte dos
pais, mas que não se consegue perceber a essência do dolo”. Aos últimos,
deveria a pena ser mais branda, oferecendo-lhes, por exemplo, meios
alternativos que não o cárcere.
29
CONCLUSÃO
Nesse sentido, nada mais conveniente construir uma abordagem
acerca dessa realidade, recortando o cenário vivido no Brasil, buscando
perceber a repercussão dessas condutas no contexto social das cidades.
Dessa forma, o presente trabalho se proporá a investigar a tipificação
penal da conduta de Abandono de Incapaz praticada pelos indivíduos nas duas
modalidades presentes no Código Penal (CP), específicos e respectivamente
nos artigos 133 e 134 dessa legislação. Abordar-se-á, para tanto, as
características peculiares de cada tipo penal mencionado, analisando a
construção dessas condutas ao longo do tempo, tendo em vista as concepções
dadas pela Legislação Penal Pátria. De forma bem simplificada, descreverá
ainda o contexto da reprovação da conduta, bem como a reação do próprio
Sistema Penal diante do delito
Foi, sobretudo, com a ampliação desse rol de proteção que as
crianças, adolescentes e também os idosos dentre outros, tiveram seus
direitos protegidos de forma mais “efetiva”, ao menos teoricamente. Sobretudo
foi percebida na pesquisa a existência de uma corrente de proteção formada
entre outros pela Delegacia, Conselho Tutelar e Assistência Social, tendo em
vista que a proteção das crianças, adolescente e também dos idosos, não é
somente uma questão policial, mas social e psicológica.
Acerca da pesquisa de campo, compreendeu-se a partir dos dados
estatísticos, que na maioria das vezes, os casos não são levados às
autoridades competentes não sendo registrados por este motivo.
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ANEXO
ENTREVISTA
G1 – Portal de Notícias do Globo 15/08//2008 – Quem pode ser vítima do crime de abandono de incapaz? Sujeito passivo Ricardo de Moraes Cabezón - O crime de abandono de incapaz é aplicado a quem está incapaz, de forma absoluta, considerando acidentados, por exemplo, ou, em um critério de idade, crianças e adolescentes até os 16 anos. A determinação de incapacidade em situações específicas, como o acidente ou qualquer outra circunstância do tipo, será analisada caso a caso pelo juiz. Qual é a pena para o crime de abandono de incapaz? Cabezón - A pena pode variar de caso a caso porque existem agravantes que podem aumentar a pena em até um terço. Em linhas gerais, a pena vai de seis meses a três anos de detenção. Se houver lesão corporal, por exemplo, a pena é de um a cinco anos de reclusão. Se houver falecimento, a pena de reclusão varia de quatro a 12 anos. Deixar a criança trancada dentro do carro, com o vidro semi-aberto, em um estacionamento é crime? Cabezón - Isso também depende muito de cada situação e da intenção dos pais da criança. Se a criança sofrer algum ferimento ou lesão, os pais certamente serão responsabilizados. Mas caso esteja chovendo, por exemplo, e o pai sair do carro sozinho para abrir o portão de casa, o bom senso pode definir que não houve crime. Qual é o tipo de crime de abandono de incapaz mais praticado pelos pais? Carla Rahal Benedetti - O tipo mais comum de abandono é deixar o incapaz em casa e sair para trabalhar. Entretanto, nestes casos, e dependendo das circunstâncias, pode haver a caracterização do crime de maus-tratos, previsto no artigo 136 , também do Código Penal . No caso de pais separados, se um dos lados fica anos sem ver o filho, pode ser considerado abandono de incapaz? Cabezón - Não há como a lei obrigar um pai a ter carinho pelo seu filho. Nesse caso, pode-se considerar abandono de incapaz no caráter moral e o filho pode pedir indenização, por exemplo, pelas vezes em que sofreu com a ausência do pai. Para idosos são válidos os mesmos critérios e há o dever de os filhos cuidarem dos pais. Vale destacar que mesmo em caso de filhos que decidem colocar os
31
pais em um asilo é preciso que o idoso concorde. Ainda na esfera da indenização, o idoso pode pedir a deserdação do filho em caso de abandono. Se o responsável sair de casa por pouco tempo, apenas para comprar pão, por exemplo, e neste período a criança sofrer algum acidente, isto constitui crime de abandono de incapaz? Cabezón - Não existe um tempo específico que seja permitido que o filho fique sozinho. Mais uma vez afirmo que vale o bom senso e a análise de cada caso em sua particularidade. Ainda assim, no geral, quem está com a guarda da criança deve responder pelo que acontece com ela. A partir de que idade a lei permite que a criança fique sozinha? Cabezón - De acordo com a lei, apenas aos 16 anos a pessoa é capaz de praticar por conta própria alguns atos da vida civil. Nessa fase se inicia uma minoração de alguns deveres que recaem sobre os pais. Carla - É considerada capaz, pela lei, a pessoa de 18 anos e, relativamente capaz, no aspecto cível, a partir dos 16 anos. Se os pais deixam o filho aos cuidados de uma pessoa (uma babá ou avó, por exemplo), e esta pessoa deixa a criança sozinha, os pais podem ser responsabilizados? Cabezón - Se a pessoa, ou instituição, que está com a criança for encarada como guardiã, ela deverá ser responsabilizada por qualquer acidente. É importante destacar, no entanto, que os pais podem responder por eleger mal a pessoa que vai cuidar da criança ou do idoso. No caso de uma avó, ela é responsável pela criança a não ser que os pais saibam de sua falta de condições para cuidar da criança e assim mesmo a escolham para ficar com o filho. Fonte:www.g1.com.br
32
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
BRASIL. Código Penal e Constituição Federal. 17ª ed., São Paulo: Saraiva,
2012.
GREGO, Rogério. Código Penal Comentado. 9ª ed., Niterói, RJ: Impetus,
2010.
HUMGRIA, Nélson. Comentários ao Código Penal. 3ª ed., Rio de Janeiro:
Forense, 1955. v. V.
JESUS, Damásio E. de. Direito Penal, 2º volume: parte especial. 30º ed., São
Paulo: Saraiva, 2012.
ANDRADE, Vera Regina Pereira de.Sistema Penal Máximo X Cidadania
Mínima.Porto Alegre:Editora Livraria do Advogado, 1 ed. 2003.
BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal. Rio de
Janeiro:Editora Revan: Instituto Carioca de Criminologia, 3 ed. 2002.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte especial, dos
crimes contra a pessoa. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2012. 2 v.
FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal: parte especial. 3 ed. São
Paulo: José Bushatsky, 1976.
GRECO, Rogério. Código Penal Comentado. 9 ed. Rio de Janeiro: Impetus,
2010.
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Especial. 9 ed. Niterói, RJ:
Impetus, 2010.2 v.
JESUS, Damásio. Direito Penal: parte especial. 28 ed. ver. e atual. São Paulo:
Saraiva, 2007. 2 v.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Código Penal Interpretado. 5 ed. São Paulo: Atlas
S.A, 2005.
PRADO, Luís Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro: parte especial. rev.
atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. 9 ed.
33
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
DEFINIÇÃO CONFORME LEI 9
CAPITULO II
1.1 – Estrutura Jurídica Doutrinária 11
1.2 – O prazer de pesquisar
CAPITULO III
2.1 - Breve Comparação com Infanticídio 12
CAPITULO IV
3.1 - Pesquisa de Campo 24
CONCLUSÃO 29
ANEXOS 30
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 32
ÍNDICE 33
34