universidade de lisboa faculdade de ciÊncias … · 2012. 1. 31. · uma palavra que significa...

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UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE CIÊNCIAS DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA ANIMAL ESTUDO COMPARATIVO DAS DEFESAS QUÍMICAS DO PAR PREDADORPRESA HYPSELODORIS CANTABRICA E DYSIDEA FRAGILIS DO ESTUÁRIO DO SADO E DA RIA FORMOSA JOÃO FILIPE CHAVEIRO LOPES DA CRUZ MESTRADO EM ECOLOGIA MARINHA 2009

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Page 1: UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE CIÊNCIAS … · 2012. 1. 31. · uma palavra que significa muito, Shalom: Cláudia, Carlos, Sérgio, Ana, Joe, Janito Pina, David, Tony, Cátia,

UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE CIÊNCIAS 

DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA ANIMAL

ESTUDO COMPARATIVO DAS DEFESAS QUÍMICAS DO PAR PREDADOR‐

PRESA HYPSELODORIS CANTABRICA E DYSIDEA FRAGILIS DO ESTUÁRIO DO 

SADO E DA RIA FORMOSA 

 

 

 

 

 

 

  

   

JOÃO FILIPE CHAVEIRO LOPES DA CRUZ  

MESTRADO EM ECOLOGIA MARINHA 2009 

 

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UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE CIÊNCIAS 

DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA ANIMAL

ESTUDO COMPARATIVO DAS DEFESAS QUÍMICAS DO PAR PREDADOR‐

PRESA HYPSELODORIS CANTABRICA E DYSIDEA FRAGILIS DO ESTUÁRIO DO 

SADO E DA RIA FORMOSA 

 

 

 

 

 

 

 

ORIENTADORES CIENTÍFICOS: 

PROF. DR. HENRIQUE CABRAL 

PROF. DR. GONÇALO CALADO  

JOÃO FILIPE CHAVEIRO LOPES DA CRUZ  

DISSERTAÇÃO PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE EM ECOLOGIA MARINHA 

2009 

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Índice 

 

 

Agradecimentos ............................................................................................................................ ii 

Resumo e palavras‐chave ............................................................................................................. iv 

Abstract and key‐words ................................................................................................................ v 

1.  Introdução ............................................................................................................................. 1 

2.  Materiais e métodos ........................................................................................................... 11 

2.1.  Recolha de exemplares ............................................................................................... 11 

2.2.  Extracção química ....................................................................................................... 12 

2.2.1.  Extracção dos químicos de Dysidea fragilis ......................................................... 12 

2.2.2.  Extracção dos químicos de Hypselodoris cantabrica .......................................... 12 

2.3.  Análise dos extractos .................................................................................................. 13 

2.4.  Testes de palatabilidade .............................................................................................. 14 

2.4.1.  Preparação das pellets ........................................................................................ 14 

2.4.2.  Realização dos testes de palatabilidade .............................................................. 14 

3.  Resultados ........................................................................................................................... 16 

3.1.  Concentrações naturais dos extractos brutos ............................................................. 16 

3.2.  Análise dos Extractos ................................................................................................... 16 

3.2.1.  TLC ....................................................................................................................... 16 

3.2.2.  1H‐NMR ................................................................................................................ 17 

3.2.3.  GC ........................................................................................................................ 18 

3.3.  Testes de palatabilidade .............................................................................................. 19 

4.  Discussão ............................................................................................................................. 21 

5.  Referências .......................................................................................................................... 26 

 

i  

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Agradecimentos 

 

Este trabalho foi realizado numa parceria entre o Instituto Português de Malacologia, o 

INETI e a Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, no âmbito do projecto FCT 

PTDC/MAR/65854/2006  “Testando  a  hipótese  de  Vermeij:  comparação  das  defesas  das 

comunidades litorais em ilhas oceânicas e continentes”. 

 

Em primeiro lugar quero agradecer às pessoas sem as quais esta tese seria impossível de 

se realizar. Assim, quero agradecer ao Prof. Dr. Gonçalo Calado, por ter acreditado e confiado 

no meu  trabalho e me  ter aberto novas portas no mundo da Ciência. Agradeço  também ao 

Prof.  Dr.  Henrique  Cabral,  que  teve  uma  paciência  infinda  para  aturar  um  orientando 

desnaturado  e  um  aluno  não muito  aplicado.  Deixo  também  o meu  agradecimento  à  Dra. 

Helena Gaspar, por  todo o apoio e orientação na  componente química do  trabalho. Menos 

envolvido na tese, mas porque me pôs em contacto com as pessoas certas e me foi, ao longo 

dos anos, mostrando o que é isto de ser cientista, tenho de deixar o meu agradecimento ao Dr. 

Bruno Jesus (ainda me deve umas cervejas, mas fora isso…). 

Parte desta tese foi realizada no  INETI e há várias pessoas a quem tenho de agradecer 

todo o tipo de auxílio no campo das químicas: Dra. Cristina Moiteiro, Dra. Maria  João Curto, 

Eng. Ana Isabel Rodrigues e Dra. Fátima Justino. Também os doutorandos João, Miguel, Ana e 

Maria João foram um apoio sempre presente, para além de óptima companhia para o almoço. 

Seria  injusto  deixar  de  fora  os  estagiários  do  curso  de  Técnico  de  Laboratório  que  me 

acompanharam  ao  longo  de  várias  semanas,  a  Vanda  e,  especialmente,  ao  “mano”  José,  a 

quem  devo  não  só  momentos  de  fortes  gargalhadas  como  também  o  apoio  directo  na 

extracção e análise química dos “librânquios”. 

Outra parte da tese foi realizada na Universidade Lusófona e tenho de agradecer a todas 

as pessoas que, entre arranjando‐me espaço e garrafas de mergulho, foram gozando com os 

camarões em copos do Burger King: Fred Almada, Stephane, Luís, Mónica, Pedro e Joana. 

Deixo também o meu agradecimento à Rita Coelho, doutoranda do IPM, que contribuiu 

não só nos mergulhos na Ria Formosa como também na recolha bibliográfica. 

Embora o  trabalho desta  tese  tenha  sido desenvolvido  fora da  FCUL,  foram  vários os 

professores desta casa que me foram apoiando e ensinando, especialmente nos últimos anos 

do  curso. Assim, entre muitos,  tenho de agradecer ao Prof. Ricardo Melo  (não estive muito 

atento nas aulas de Botânica Marinha, mas foi a primeira cadeira em que tive uma amostra do 

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que é fazer ciência), ao Prof. Francisco Petrucci‐Fonseca (um lado mais terrestre, mas nem por 

isso menos divertido, da Biologia), ao Prof. Carlos Assis  (sempre pronto para dois dedos de 

conversa e para o esclarecimento qualquer dúvida) e ao Prof. Francisco Andrade. 

Tenho também de agradecer aos meus colegas de curso, particularmente áquelas mais 

ou menos 20 pessoas e à única suazi que conheço, pelo apoio linguístico. Mais do que colegas, 

tenho que destacar os Pastores Tigaz, Mika, Fox e Johns, pela força e incentivo que sempre me 

deram,  mas  também  (e  especialmente)  pelas  futeboladas,  noites  de  copos,  guitarradas, 

palhaçadas, nhecus e teorias do comportamento de animais muito… peculiares. Não falar da 

meia‐leca da Vânia seria ridículo, portanto já está! 

Poderia ter feito o curso sem a Repro2000? Podia, mas não era a mesma coisa! Por isso, 

agradeço ao Zé Manel, à Paula e, claro, à Tia Mena, pelos pedidos fora de horas realizados em 

tempos  impossíveis, pelas horas de descontracção passadas à  conversa e por uma ou outra 

cerveja paga no Mocho. 

Fora da  faculdade, são muitas as pessoas que “estiveram  lá”, sempre. E porque esta é 

uma palavra que significa muito, Shalom: Cláudia, Carlos, Sérgio, Ana, Joe, Janito Pina, David, 

Tony, Cátia, Kinder, Zézinha, Fi, Lígia, Marta, João de SDR, Coelhinho e, claro, Vítor e Afonso. 

Ainda nesta listagem, tenho de agradecer ao Bugs, pelo apoio logístico “não‐oficial” do Burger 

King. 

A minha  família, a quem  roubei muito do pouco  tempo que  tínhamos, merece aquele 

agradecimento. Para além do suporte  financeiro, são o suporte humano. Sem vocês ao meu 

lado não seria quem sou hoje. Obrigado, muito obrigado, Mãe, Pai, Pedro e Nuno! Os meus 

avós, tios e primos, também têm de figurar nesta lista. E claro, os tios Nuno e Isabel, por terem 

contribuído de uma forma tão importante para o meu trabalho. 

 

E porque os últimos são os primeiros, esta tese, boa ou má, é dedicada a ti, Rita. 

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Resumo e palavras‐chave 

 

No  decurso  da  evolução  dos  opistobrânquios  houve  uma  progressiva  perda  da  concha  que 

obrigou  à  aquisição  de  novas  estratégias  defensivas,  entre  as  quais  o  recurso  a  defesas 

químicas.  A  maioria  dessas  estratégias  passa  pela  utilização  de  compostos  tóxicos  ou 

dissuasores, em muitos  casos obtidos  através da dieta, bastante específica. O nudibrânquio 

Hypselodoris  cantabrica  retém  e  acumula  metabolitos  secundários  dissuasores 

(furanosesquiterpenos)  existentes  na  sua  presa,  a  esponja  Dysidea  fragilis.  Neste  trabalho 

comparou‐se  as  defesas  químicas  deste  par  predador  presa  de  duas  regiões  portuguesas: 

Setúbal e Ria  Formosa. Para  tal,  recolheram‐se exemplares de esponjas e nudibrânquios de 

ambas as áreas, dos quais foram extraídos e analisados os compostos defensivos, tendo sido 

depois  realizados  testes  de  palatabilidade  com  os  extractos  obtidos.  Nas  duas  espécies 

observou‐se alguma variedade na concentração dos extractos brutos obtidos, tendo revelado 

os  nudibrânquios  uma  maior  concentração,  que  pode  ser  resultado  de  acumularem 

progressivamente  os  compostos  e/ou  da  esponja  ter  emitido  fluidos  com  compostos 

dissuasores  quando  recolhida.  Verificou‐se  que  os  furanosesquiterpenos  existentes  nos 

nudibrânquios  estavam  também  presentes  nas  esponjas,  o  que  comprovou  a  sua  origem 

alimentar. Concluiu‐se haver diferenças regionais nos compostos maioritários identificados nos 

nudibrânquios  e  nas  esponjas.  Os  exemplares  de  H.  cantabrica  provenientes  de  Setúbal 

apresentaram dois compostos maioritários e nos de D.  fragilis, apenas um estava em maior 

concentração,  inferindo‐se assim uma  retenção  selectiva dos  compostos pelo nudibrânquio. 

Os testes de palatabilidade não revelaram diferenças significativas na capacidade dissuasora, 

na comparação entre áreas geográficas, quer entre extractos de esponjas quer entre extractos 

de  nudibrânquios. Nas  comparações  predador‐presa,  os  testes  de  palatabilidade  revelaram 

uma  maior  actividade  dissuasora  dos  extractos  dos  nudibrânquios,  conseguindo  taxas  de 

rejeição significativas a concentrações  inferiores às necessárias para os extractos de esponja 

obterem o mesmo efeito. Assim conclui‐se que o predador está quimicamente mais protegido 

que a sua presa, da qual obtém as defesas. 

 

Palavras‐chave  –  Defesas  químicas,  dissuasão,  testes  de  palatabilidade,  Hypselodoris 

cantabrica, Dysidea fragilis. 

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Abstract and key‐words  

As they evolved, opistobranchs underwent progressive shell loss, which made it necessary for 

them  to acquire new defensive  strategies,  such as chemical defenses. The majority of  these 

strategies consist  in using  toxic or deterrent compounds, mostly obtained  through  their diet 

which  is  very  specific.  The  nudibranch  Hypselodoris  cantabrica  retains  and  accumulates 

deterrent  secondary metabolites  (furanosesquiterpenes) which  are  present  in  its  prey,  the 

sponge Dysidea fragilis. In this study, the chemical defenses of this predator and its prey were 

compared  in  two  Portuguese  regions:  Setúbal  and  Ria  Formosa.  Sponge  and  nudibranch 

specimens were  collected  from both areas. Their defensive  compounds were extracted and 

analyzed  and  then utilized  in palatability  tests.  Some  variability  in  the  concentration of  the 

obtained  brute  extracts  was  observed  in  both  species.  The  nudibranchs  revealed  a  larger 

concentration, which could be due to a progressive accumulation of the compounds and/or as 

a result of the sponges having expelled fluids containing deterrent compounds when collected. 

The  furanosesquiterpenes  in  the nudibranchs were also  found  to be present  in  the sponges, 

which  confirmed  their  dietary  origin.  There  were  regional  differences  between  the  main 

compounds  identified  in  the  nudibranchs  and  sponges.  The  H.  cantabrica  specimens  from 

Setúbal displayed  two main  compounds whilst  the D.  fragilis  specimens displayed only one, 

which could be  indicative of a selective retention of the compounds by the nudibranchs. The 

palatability  tests  did  not  reveal  significant  differences  in  the  deterrent  capacity  neither 

between  sponge  extracts  nor  between  nudibranch  extracts  from  different  regions.  In  the 

predator‐prey comparisons, the palatability tests revealed a more effective deterrent activity 

in  the  nudibranchs’  extracts,  having  obtained  significative  rejection  rates  at  lower 

concentrations  than necessary  for  the sponge extracts  to have  the same effect. Thus,  it was 

concluded that the predator is chemically better protected than its prey, from which it obtains 

its defenses. 

 

Key‐words: Chemical defenses, deterrence, palatability tests, Hypselodoris cantabrica, Dysidea 

fragilis. 

 

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1. Introdução 

 

A enorme  variedade de  formas de  vida encontrada na Natureza é, desde há muito, 

motivo de reflexão. Há 150 anos, Darwin abalou o mundo ao afirmar que tal variedade poderia 

ser explicada através de um processo evolutivo por ele denominado Selecção Natural  [1]. Se 

esta teoria abalou o mundo, revolucionou por completo a Biologia.  

Alguns  autores  consideram  a  relação  predador‐presa  como  um  dos  factores  mais 

importantes na Selecção Natural e, por conseguinte, na evolução das espécies. Vermeij, por 

exemplo, definiu esta  relação como uma arms  race  [2], uma dinâmica corrida ao armamento 

em que presas  e predadores  co‐evoluem,  surgindo novas  formas  (espécies) de presas mais 

protegidas e novas formas (espécies) de predadores mais armados. Esta corrida ao armamento 

é notória na evolução dos opistobrânquios. 

Ao  contrário  da  maioria  dos  gastrópodes,  na  generalidade  dos  opistobrânquios  a 

concha é  reduzida,  interna ou mesmo ausente  [3]. Tal  característica, associada à  lentidão de 

movimentos, deu às espécies desta sub‐classe  (calcula‐se que sejam entre 5000 e 6000  [3]) o 

nome de lesmas do mar. A perda da concha, que deverá ter ocorrido independentemente em 

diversas  linhagens  de  opistobrânquios  [4],  foi  um  passo  evolutivo  que  trouxe  diversas 

vantagens a estes animais: maior facilidade de locomoção [3, 5]; maior facilidade na exploração 

e procura de alimento em novos habitats  [3]; possibilidade de evolução de novas estruturas 

físicas, processos fisiológicos e comportamentos [3]; eliminação do custo energético necessário 

ao desenvolvimento da concha [5]. Contudo, há uma enorme, e óbvia, desvantagem associada à 

perda da concha: perda de defesas e consequente aumento provável da predação. Faulkner e 

Ghiselin  (1983)  analisaram  esta  situação  de  um  ponto  de  vista  económico,  em  termos  de 

perdas  e  ganhos,  e  concluíram  que  os  benefícios  do  desaparecimento  da  concha  seriam 

maximizados  se  se encontrassem  formas de defesa alternativas menos dispendiosas  [5]. Tais 

alternativas devem ter sido encontradas, já que são poucos os predadores de opistobrânquios 

conhecidos [6]. 

Assim,  desprovidos  de  concha  (em  parte  ou  na  totalidade),  os  opistobrânquios 

desenvolveram um variado  leque de estratégias defensivas para as quais Ros  (1977) propôs 

uma classificação  [7]. Contudo, o próprio autor  refere que esta divisão visa apenas  facilitar a 

compreensão  dos  diversos mecanismos  defensivos  porque,  como  se  verá,  os  animais  não 

utilizam apenas uma estratégia defensiva. As estratégias defensivas dos opistobrânquios foram 

então classificadas, por este autor, em: estruturais, comportamentais, cleptodefesas (do grego 

kleptos – roubar) e químicas [7].  

1  

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As  estratégias  estruturais  consideram  a  utilização  de  elementos  anatómicos  dos 

animais, como conchas vestigiais, existência de espículas calcárias dorsais, autotomatismo ou 

coloração (críptica ou de aviso)[7].  

As  estratégias  comportamentais  passam,  por  exemplo,  por  situações  de  fuga  ou 

evitamento de predadores, anacorese ou anacorese  trófica  (quando o animal se esconde no 

próprio  alimento),  comportamentos  deimáticos  (com  o  objectivo  de  assustar  potenciais 

predadores), exibição  individual  (normalmente de órgãos protegidos física ou quimicamente) 

ou defesa agressiva [7]. 

As cleptodefesas, como o nome indica, são defesas roubadas. É o caso das defesas de 

alguns  nudibrânquios  da  família Aeolidiidae,  que  adoptaram  uma  estratégia  única  entre  os 

animais  : o  armazenamento de  cnidócitos  funcionais, provenientes dos  cnidários de que  se 

alimentam [8]. Outros opistobrânquios adquirem pigmentos das suas presas, o que permite que 

se  camuflem  nelas  (homocromia).  Um  caso  que  vale  a  pena  referir  é  o  de  alguns 

opistobrânquios  da  ordem  Sacoglossa,  como  Elysia  chlorotica  que,  além  da  cor  ganham 

também os mecanismos de produção de energia da alga de que se alimentam, uma vez que 

retêm os cloroplastos, perfeitamente funcionais, no seu organismo [9]. 

As  defesas  químicas,  que  como  cerne  deste  trabalho  serão  apresentadas  em maior 

detalhe, são estudadas em opistobrânquios desde 1960, altura em que Thompson verificou a 

secreção de ácido sulfúrico e ácido clorídrico por alguns destes animais quando perturbados [10].  Contudo,  a maioria  dos  químicos  de  defesa  de  opistobrânquios  são  dissuasores  e/ou 

tóxicos  [11].  Os  compostos  tóxicos  “atacam”  directamente  os  predadores,  provocando mal‐

estar ou mesmo morte, ao passo que os compostos dissuasores  indicam que o animal é não‐

palatável,  isto é,  tem um  sabor desagradável. Claro que,  como  frisaram  Faulkner e Ghiselin 

(1983),  as  defesas  não  são  igualmente  eficientes  contra  todos  os  predadores  e  podem  ser 

sempre superadas por especialistas [5]. 

Existem dois  tipos de  testes para verificar a capacidade anti‐predatória dos químicos 

isolados  dos  opistobrânquios,  que  podem  ser  realizados  em  laboratório  ou  no  campo: 

ictiotoxicidade  e palatabilidade  [12]. Nos primeiros, os  compostos  são  lançados na  água, por 

vezes com um solvente orgânico (como a acetona), e observa‐se as consequências nos peixes. 

Os  segundos  consistem  normalmente  na  apresentação  a  potenciais  predadores  de  comidas 

preparadas  em  laboratório  com  ou  sem  compostos  extraídos  dos  organismos  em  estudo, 

tentando perceber se há diferenças na aceitação de controlos e tratamentos.   

As  defesas  químicas,  consideradas  como  a  força  motriz  da  evolução  dos 

opistobrânquios  [13], estão presentes em vários grupos de  lesmas do mar,  inclusivamente na 

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ordem Cephalaspidea  [14], cujas espécies mantêm uma concha  reduzida  (disco cefálico). Este 

facto parece  indicar que o desenvolvimento das defesas químicas foi pré‐adaptativo, ou seja, 

ter‐se‐á iniciado antes da perda da concha [5].  

Sabe‐se  que  grande  parte  dos  produtos  químicos  de  defesa  são  metabolitos 

secundários.  Estes  são  derivados  de  metabolitos  primários  e  não  estão  envolvidos  na 

manutenção  básica  do  indivíduo  [15].  Os metabolitos  secundários  podem  ser  divididos  em 

alomonas (quando em interacção com outras espécies beneficiam o produtor – metabolitos de 

defesa, por exemplo),  cairomonas  (pelo  contrário, beneficiam o  receptor – em  situações de 

mutualismo,  por  exemplo)  e  feromonas  (comunicação  inter‐específica  –  reprodução  e 

desenvolvimento)  [16].  Foi  Burreson,  em  1975,  o  primeiro  a  caracterizar  uma  alomona  num 

nudibrânquio, Phyllidia varicosa [17]. 

A maioria dos metabolitos secundários utilizados pelos opistobrânquios pertencem ao 

grupo dos terpenos e provêm da sua dieta [11], sendo que nalguns casos os compostos são bio‐

transformados,  o  que  acontece  no  nudibrânquio  Hypselodoris  orsini  [18].  Na  perspectiva 

económica de  Faulkner e Ghiselin  (1983), o uso de químicos provenientes da dieta permite 

uma protecção sem gastos na produção, com custos apenas no armazenamento e mobilização [5]. Os mesmos autores defendem que os metabolitos derivados da alimentação devem ser  : 

retidos  selectivamente,  com os  compostos mais eficientes a  serem acumulados e os menos 

válidos  descartados;  distribuídos  no  corpo  de  maneira  a  maximizar  o  efeito;  mobilizados 

quando  necessário  (por  exemplo,  excretados  quando  o  predador  ataca);  eficientes  perante 

predadores [5]. 

Menos  frequente  é  a  biossíntese  de  metabolitos  pelos  próprios  opistobrânquios 

(chamada biossíntese de novo), fenómeno provado por Cimino et al. (1983) ao estudarem um 

composto segregado pelo nudibrânquio Dendrodoris limbata [19]. 

Tendo isto em conta, Cimino e Ghiselin (2001) propuseram um “cenário de elaboração 

gradual de metabolitos” para os opistobrânquios [15]. Para se alimentarem de organismos com 

elevadas concentrações de alomonas, os opistobrânquios tiveram de desenvolver métodos de 

excreção ou destoxificação, visto que os metabolitos secundários provenientes da dieta seriam 

nocivos ao seu organismo, o que levou a uma especialização alimentar. O passo seguinte terá 

sido  então  utilizar  esses  compostos  para  defesa  (o  que  se  encaixa  numa  estratégia  de 

cleptodefesa). No entanto, a especialização alimentar e a necessidade dos compostos para fins 

defensivos levou a uma dependência de determinado tipo de presas. A solução evolutiva para 

este problema terá sido a biossíntese de metabolitos de novo  [15, 20]. Portanto, a evolução dos 

opistobrânquios  pode  ser  considerada  como  uma  radiação  adaptativa  [15]:  as  espécies 

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ancestrais alimentar‐se‐iam de um grupo estrito de presas com defesas químicas, que se  foi 

alargando  à  medida  que  os  opistobrânquios  se  diversificaram,  tornando‐se  predadores 

especializados [15]. Os nudibrânquios doridáceos são um óptimo exemplo disso mesmo. 

A  maioria  dos  doridáceos  são  espongívoros  [13,  21]  e,  para  além  de  alimento, 

encontraram  nas  suas  presas  uma  fonte  de metabolitos  defensivos  [5,  11,  13],  sendo  os mais 

abundantes os diterpenos e os  furanosesquiterpenos  [11], compostos que estão  relacionados 

com os químicos dissuasores encontrados em plantas para fazer face aos insectos [22]. 

É  importante  realçar  que  as  esponjas  têm  poucos  predadores  e  que,  em  águas 

temperadas,  os  mais  relevantes  são,  além  de  opistobrânquios,  equinodermes  e  alguns 

pequenos  crustáceos,  que  ainda  assim  não  influenciam  grandemente  a  estrutura  das 

comunidades  [23].  Essa  diminuta  predação  dever‐se‐á  em  grande  parte  às  capacidades 

defensivas  físicas  (espículas)  e  químicas  (metabolitos  secundários)  das  esponjas.  Segundo 

Faulkner e Ghiselin (1983), há uma relação directa entre a perda de espículas e o aumento de 

metabolitos  secundários  nos  Porífera  [5].  O  aparecimento  dos metabolitos  secundários  nas 

esponjas pode ter surgido inicialmente para impedir o estabelecimento de organismos epífitos 

e  parasitas,  acabando  por  revelar  um  também  um  papel  defensivo  [15].  Como  tal,  os 

opistobrânquios  que  se  alimentavam  de  esponjas  tiveram  de  se  adaptar,  arranjando  novas 

formas de contornar as defesas das suas presas [5]. Com base nisto, Faulkner e Ghiselin (1983) 

sugeriram que tenha existido uma evolução paralela entre esponjas e os opistobrânquios que 

exercem predação sobre elas, tendo as esponjas perdido as espículas e os opistobrânquios as 

conchas [5]. Assim teria havido uma alteração na corrida ao armamento, passando das defesas 

estruturais  para  as  defesas  químicas  [24].  Também  Cimino  e  Ghiselin  (1999)  destacaram  a 

relevância desta relação predador‐presa, considerando haver uma correlação entre a filogenia 

das esponjas e a dos nudibrânquios que delas se alimentam [13]. 

Os doridáceos (e as suas presas) têm sido, portanto, um grupo muito estudado no que 

respeita  às  suas  defesas  químicas  [24],  especialmente  os  pertencentes  à  família 

Chromodorididae. Thompson  (1960), dividiu os opistobrânquios entre os que  se esforçavam 

por passar despercebidos e os que pareciam não se preocupar com isso [6], que é o caso desta 

família que,  como o nome  indica,  se destaca pela  sua  coloração. Mesmo possuindo defesas 

químicas,  a maioria  dos  opistobrânquios  são  também  crípticos  [5]  e muitos  dos  que  pelos 

padrões  de  coloração  nos  parecem  conspícuos  estão,  no  seu meio,  em  homocromia  [7,  25]. 

Contudo,  há  opistobrânquios  que  são,  efectivamente,  conspícuos,  como  é  o  caso  destes 

nudibrânquios. Como é evidente, cores conspícuas despertam a atenção de predadores, o que 

só se torna uma vantagem se o predador associar as cores a algo que lhe desagrade [26]. A este 

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tipo de utilização de cores é dado o nome de aposematismo (do grego apo – afastar e semat –

sinal).  Nas  espécies  aposemática  as  defesas  tiveram  de  ser,  provavelmente,  desenvolvidas 

antes dos padrões conspícuos de cores [25], o que as coloca num ramo mais recente na filogenia 

dos  opistobrânquios.  De  acordo  com  Edmunds  (1987),  para  uma  espécie  ser  considerada 

aposemática terá de ser suficientemente nociva, ter cor conspícua, ser evitada por predadores 

e a sua coloração terá de conferir maior protecção ao  indivíduo ou aos seus genes que outra 

cor  (críptica)[4]. No entanto, para um predador evitar uma presa  terá de saber que ela  lhe é 

nociva ou desagradável, a não ser que o animal evite determinados padrões de cores de forma 

inata. Contudo, para tal acontecer é necessário um  longo processo evolutivo  [25] pelo que, na 

maioria  dos  casos,  o  predador  terá  de  aprender  a  evitar  as  presas.  Claro  que  esta 

aprendizagem poderá provocar danos graves ou mesmo morte dos  indivíduos predados. Por 

este  motivo,  a  evolução  do  aposematismo  nos  nudibrânquios  é  uma  questão  que  tem 

suscitado  o  interesse  de muitos  autores.  A  teoria mais  aceite  prende‐se  com  o  chamado 

mimetismo Mulleriano  [11,  25,  26]:  diferentes  espécies  não‐palatáveis  desenvolvem  aparências 

semelhantes, dividindo assim o custo relacionado com a aprendizagem dos predadores [27]. De 

entre os cromodorídeos que parecem apresentar este  tipo de mimetismo, estão as espécies 

atlânticas do género Hypselodoris, que constituem um círculo mimético de animais de cor azul 

com bordo do manto e manchas dorsais amarelas [7]. 

No Atlântico nordeste, é possível encontrar 6 espécies de Hypselodoris: H. bilineata, H. 

cantabrica,  H.  fontandraui,  H.  picta,  H.  tricolor  e  H.  villafranca.  A  figura  1 mostra  bem  a 

semelhança dos padrões de coloração destes animais. Contudo, não é apenas na cor que estes 

animais  se  assemelham,  também  recorrem  aos mesmos  químicos  defensivos  e  de maneira 

semelhante. 

 

Figura 1 – Hypselodoris do Atlântico Nordeste. A – H. bilineata*; B – H. cantabrica; C – H. fontandraui*; D – H. tricolor*; E – H. picta*; F – H. villafranca*. * ‐ fotografias obtidas em www.seaslugforum.net 

 

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Nos  Hypselodoris  spp.,  a  maioria  dos  metabolitos  secundários  existentes  são 

furanosesquiterpenos com capacidade dissuasora  [11, 15] que são, normalmente, armazenados 

em glândulas dérmicas distribuídas no bordo do manto a que se dá o nome de mantal dermal 

formations  (MDF)  [28,  29].  As MDF  (figura  2)  são  estruturas  globulares  de  tonalidade  branca 

opaca que estão embebidas no tecido conectivo subepidermal e são constituídas por células 

vacuolares largas [30].  

 

 

Figura 2 – MDF posteriores de H. cantabrica (indicados com a seta). Apesar de internos, estes órgãos 

são visíveis devido à transparência do manto. 

 

Uma  vez  que  as MDF  são  órgãos  internos  e  não  abrem  para  o manto  [29],  o  efeito 

dissuasor  das  substâncias  que  acumula  só  se  faz  sentir  quando  o  predador  morde  o 

nudibrânquio e  rompe as glândulas  [30]. A distribuição das MDF é, portanto, essencial para a 

sobrevivência dos Hypselodoris. Assim, as MDF estão posicionadas em  torno de áreas  vitais 

para o organismo na parte anterior (protegendo a cabeça e os rinóforos) e na parte posterior 

do  indivíduo  (salvaguardando  as  brânquias).  A  distribuição  e  o  número  de MDF  varia  de 

espécie  para  espécie  (estando  mesmo  ausentes  em  H.  fontandraui),  sendo  que  algumas 

apenas os possuem na região posterior do corpo  [29]. H. cantabrica Bouchet e Ortea, 1980, o 

predador do par estudado neste trabalho, possui 7 MDF na região posterior do corpo e entre 3 

e 4 na região anterior [30], conforme se pode ver na figura 3. A disposição das MDF no bordo do 

manto  e  a  cor  amarela  deste  não  são  coincidência  e  está  relacionada  com  o  aspecto 

aposemático. Em experiências com cromodorídeos de outro género, Glossodoris, cujo bordo 

do manto também se destaca do resto do corpo, concluiu‐se que os peixes apresentam mais 

atracção por um nudibrânquio sem bordo do manto do que por um com bordo do manto mas 

sem MDF [31]. 

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Figura  3  –  Esquema  representativo  da  distribuição  das MDF  em  H.  cantabrica.  a  –  rinóforos;  b  – brânquias; c – MDF. Adaptado de Garcia‐Gomez et al. (1990) [30]. 

 

Embora no manto destes nudibrânquios os furanosesquiterpenos só se encontrem nas 

MDF, Avila et al. (1991) identificaram‐nos também no muco segregado por Hypselodoris picta 

e  H.  villafranca  quando  perturbados  [32].  Assim,  se  apesar  da  sua  coloração  aposemática 

(primeira  linha de defesa  [33]) os predadores se aproximassem destes animais seria segregado 

um muco repelente (segunda  linha de defesa) e se ainda assim os predadores mordessem os 

indivíduos,  rebentariam  as MDF que  libertariam directamente na  sua boca  compostos não‐

palatáveis (terceira linha de defesa)[32].  

Os  compostos  dissuasores  utilizados  pelos  nudibrânquios  Hypselodoris  spp.  são 

provenientes das  suas presas, esponjas pertencentes ao género Dysidea, normalmente  ricas 

em furanosesquiterpenos  [11]. Contudo, em  laboratório, Fontana et al. (1994) verificaram que 

H. picta também se alimentava de esponjas Pleraplysilla spinifera, igualmente ricas no mesmo 

tipo  de  compostos.  Estes  dados  apoiam  a  hipótese  de  Cimino  e  Sodano  (1994),  de  que  a 

especialização alimentar dos nudibrânquios pode ser relativa e estar mais relacionada com a 

disponibilidade dos compostos necessários à sua defesa do que da existência de determinada 

espécie [12]. Porém, fora do laboratório, só se verificou o consumo de espécies de Dysidea sp., 

D.  avara  e D.  fragilis.  Esta  última  é  tida  como  a  presa  de H.  cantabrica  [11,  21]  e  é  um  dos 

objectos de estudo deste trabalho, merecendo por isso destaque. 

Dysidea  fragilis  (Montagu,  1818)  (figura  4)  é  uma  esponja  de  superfície  conulosa, 

coberta  por  uma  camada  fina  de  pinacócitos  e  que  possui  fibras  frágeis  de  espongina 

enroladas em torno de resíduos externos (como areia, por exemplo) [34].  

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Figura 4 – Dysidea fragilis 

 

Marin  et  al.  (1998),  verificaram  que  esta  esponja  emite  um  fluido  defensivo 

esbranquiçado  quando  perturbada,  que  é  composto maioritariamente  por  células  esféricas 

com numerosas vesículas  [34]. Estas células apresentam um complexo de Golgi e um  retículo 

endoplasmático  rugoso bastante desenvolvidos,  indicadores de produção  e  armazenamento 

de materiais para secreção. Estes autores confirmaram a existência de  furanosesquiterpenos 

unicamente  nessas  células,  sugerindo  estarem  aí  compartimentados,  e  testaram‐nos 

positivamente quanto à sua capacidade dissuasora [34]. 

Como noutras esponjas, existe uma  variação  geográfica dos  compostos químicos de 

Dysidea  fragilis,  sendo  que  esponjas  de  diferentes  zonas  apresentam  diferentes  tipos  de 

furanosesquiterpenos,  como  verificada  por  Molinski  (1988)  [35].  Como  tal,  é  natural  que 

também  consoante  a  área  em  que  se  encontram  haja  uma  variação  nos  compostos  dos 

nudibrânquios  que  as  sobre  elas  exercem  predação.  Fontana  et  al.  (1993)  verificaram  esse 

fenómeno em H. cantabrica de duas zonas do mar Cantábrico [36]. Do mesmo modo, diferentes 

espécies  de  Hypselodoris  que  se  alimentem  da  mesma  esponja  apresentam  os  mesmos 

compostos [32] embora os possam apresentar em proporções diferentes [36].  

Não é por mera  curiosidade  científica que  tem havido  tanto  interesse pelas defesas 

químicas dos nudibrânquios e das suas presas, mas pelas possíveis aplicações dos compostos 

químicos descobertos. Estima‐se que 80% dos fármacos actualmente utilizados são ou têm por 

base produtos naturais, a maioria deles de origem terrestre, já que, fruto do desenvolvimento 

tecnológico (especialmente no campo do mergulho) só na segunda metade do século XX houve 

capacidade para uma maior e melhor exploração do meio marinho [37]. Os produtos daí obtidos 

têm grandes potencialidades de aplicação no campo da medicina, mas também da cosmética [38] e da  indústria  (por exemplo, a actividade anti‐incrustante de compostos de Dysidea  spp. [39]). A revisão feita por Blunt et al. (2009) [40] permite perceber que desde a década de setenta 

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se  tem  registado  um  aumento  muito  significativo  na  descoberta  de  novos  compostos 

derivados de produtos marinhos (figura 5). 

 

.   

Figura 5 ‐ Média de compostos descobertos por ano entre 1965 e 2007. O período entre 1965 e 2005 

está agrupado de 5 em 5 anos. Adaptado de Blunt et al. 2009[40] 

 

Os mesmos  autores  indicaram  também que o Atlântico oriental  tem  sido das  zonas menos 

produtivas  no  que  concerne  à  identificação  de  novos  compostos  e  que  os  animais 

pertencentes  ao  filo Porífera  têm  sido  a maior  fonte de produtos naturais.  Já os moluscos, 

dentre os quais os opistobrânquios  são o grupo quimicamente mais estudado  [41],  são neste 

aspecto  menos  relevantes.  Contudo,  é  conveniente  referir  que  um  dos  mais  poderosos 

compostos  anti‐cancerígenos  conhecidos  é  a  dolastatina‐10,  composto  isolado  do 

opistobrânquio  Dolabella  auricularia,  muito  embora,  como  todos  os  outros  produtos  de 

origem marinha, ainda não tenha passado a fase de ensaios clínicos [42]. Nas esponjas da ordem 

Dysidea têm também sido encontrados compostos bioactivos com potencialidade terapêutica, 

como  o  furanosesquiterpeno  avarol  (proveniente  de  D.  avara)  que  tem  propriedades  anti‐

tumorais [43].  

As defesas químicas do par predador‐presa Hypselodoris cantabrica e Dysidea fragilis 

nunca  foram  comparadas.  Será  então  objectivo  deste  estudo  fazê‐lo,  usando  para  tal 

exemplares do estuário do Sado e da Ria Formosa, duas áreas da costa portuguesa. Procurar‐

se‐á perceber se há diferenças ao nível da capacidade dissuasora entre predador e presa e se 

esta é afectada por possíveis variações geográficas de  compostos defensivos.  Isto  será  feito 

testando  a  palatabilidade  dos  extractos  brutos,  sendo  que  em Hypselodoris  cantabrica,  até 

agora, só foram testados compostos puros [36]. 

Tendo em conta a literatura, exemplares de Hypselodoris cantabrica e Dysidea fragilis 

da costa portuguesa nunca foram analisados do ponto de vista químico. Assim, considerando‐

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se a variação geográfica dos compostos e a pouca exploração química do Atlântico Oriental, 

este  tipo  de  investigação,  mesmo  que  direccionada  para  a  ecologia,  poderá  abrir  novas 

perspectivas num futuro próximo.  

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2. Materiais e métodos 

 

2.1. Recolha de exemplares 

Para a realização deste estudo foram recolhidos exemplares do nudibrânquio Hypselodoris 

cantabrica  e  da  esponja  Dysidea  fragilis,  entre  os  5  e  os  9 metros  de  profundidade,  em 

mergulho com escafandro autónomo. 

As recolhas foram feitas entre Abril e Junho (época de reprodução e, consequentemente, 

de maior proliferação de nudibrânquios) de 2009, na embocadura da Ria Formosa, junto à Ilha 

do Farol (36°58’N 7°52’W), e na embocadura do estuário do Sado, na rampa da Secil (38°30’N 

8°55’W). Em ambas as áreas existe um  forte movimento de correntes, o que  faz delas zonas 

propícias a organismos filtradores, como as esponjas. 

Procurou‐se,  sempre  que  possível,  capturar  pares  predador‐presa  (ou  grupos  predador‐

presa,  quando  havia  mais  que  um  predador  a  alimentar‐se  da  mesma  presa),  ou  seja, 

nudibrânquios e as esponjas de que se estivessem a alimentar. Os animais  recolhidos  foram 

mantidos  em  água  do mar  até  serem  congelados  em  laboratório.  De modo  a  facilitar  os 

procedimentos de extracção, os exemplares de Hypselodoris cantabrica foram congelados em 

água do mar, evitando assim uma  reacção de  stress que  levaria não  só a uma  libertação de 

muco, possivelmente com químicos dissuasores como também a um enrolamento do animal. 

Na rampa da Secil (Fig. 6A) recolheram‐se 4 grupos predador‐presa, num total de 4 exemplares 

de Dysidea fragilis e 8 exemplares de Hypselodoris cantabrica. 

Na Ria Formosa foram recolhidos 11 grupos predador‐presa (Fig.6B), num total de 11 

exemplares  de  Dysidea  fragilis  e  14  exemplares  de  Hypselodoris  cantabrica.  Foram  ainda 

capturados 11 nudibrânquios sem esponja associada. 

 

 

Figura 6 – Pares predador‐presa H. cantabrica e D. fragilis de Setúbal (A) e da Ria Formosa (B). 

 

 

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2.2. Extracção química 

 

2.2.1. Extracção dos químicos de Dysidea fragilis 

Em  laboratório, mediu‐se a massa e volume de cada um dos exemplares de Dysidea 

fragilis, após se ter retirado os organismos epífitos existentes. 

Cada esponja foi depois cortada em pedaços e submersa em acetona, para ser exposta 

a ultra‐sons durante 10 minutos, sendo o extracto de acetona filtrado para um balão após este 

período de tempo. Este procedimento foi repetido 2 vezes para cada exemplar. 

A solução final obtida, o extracto de acetona de cada uma das esponjas, foi levada ao 

evaporador  rotativo,  a  uma  temperatura  de  30ºC,  até  ser  evaporada  toda  a  acetona  e  na 

solução restar apenas, para além dos químicos, a água existente na esponja. Uma vez que os 

compostos em estudo são muito voláteis e facilmente degradáveis, não era plausível evaporar 

a  água,  pelo  que  foi  então  adicionado  éter  etílico  para  extrair  os  compostos  químicos  em 

solução. Porque o éter etílico é  imiscível com a água, da sua adição  resultou a  formação de 

duas  fases  (a  fase  aquosa  e  a  fase  de  éter),  tendo  sido  estas  separadas  por  extracção 

líquido/líquido. De  seguida,  a  fase de  éter  foi  ainda  filtrada por uma pipeta  com  algodão e 

sulfato  de  magnésio  anidro,  para  garantir  a  remoção  da  água.  Após  este  procedimento, 

evaporou‐se  o  éter,  obtendo‐se  desta  forma  o  extracto  bruto  da  esponja,  cuja massa  foi 

medida, de forma a calcular‐se a concentração natural (massa/volume) do extracto. Através do 

teste  de Mann‐Whitney,  e  considerando‐se  um  nível  de  significância  de  0,05,  testou‐se  a 

existência  de  diferenças  significativas  nas  concentrações  naturais  obtidas  das  amostras  dos 

dois locais de estudo. 

 

2.2.2. Extracção dos químicos de Hypselodoris cantabrica 

Uma  vez  que  os  químicos  de  defesa  do  nudibrânquio  Hypselodoris  cantabrica  se 

encontram essencialmente no manto, destacou‐se este órgão dos animais congelados (figura 

7), tendo sido medido a sua massa e volume. 

Todo  o  procedimento  de  extracção  subsequente,  bem  como  os  cálculos  da 

concentração natural e a aferição de diferenças significativas, foi análogo ao realizado para os 

exemplares de Dysidea fragilis. 

 

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Figura 7 – Parte exterior (A) e interior (B) do manto de Hypselodoris cantabrica. 

 

2.3. Análise dos extractos 

Para todos os extractos obtidos, foram efectuadas cromatografias de camada fina (TLC 

–  thin  layer  chromatography)  e  cromatografias  gasosas  (GC  –  gasose  cromatography). 

Realizaram‐se ainda espectros de ressonância magnética nuclear de protão (1HNMR – nuclear 

magnetic resonance) para alguns extractos de D. fragilis e H. cantabrica. 

As  TLC  realizaram‐se  dissolvendo‐se  os  extractos  em  acetona  e  utilizando  como 

eluentes éter de petróleo  (menos polar) e uma mistura de éter de petróleo e éter etílico na 

razão de 1:1 (mais polar). Foram usadas placas de TLC de alumínio com sílica‐gel Merck 60 F254. 

Após a eluição, as placas de TLC  foram visualizadas por  irradiação de  luz U.V.  (λ=254 nm) e 

reveladas por pulverização de 4‐dimetilaminobenzaldaído em ácido clorídrico concentrado e 

etanol (reagente de Ehrlich)[44] seguida de aquecimento numa placa a 100 °C. Esta técnica de 

revelação  permite  identificar  a  presença  de  compostos  que  tenham  na  sua  estrutura  anéis 

furano pelo aparecimento nas placas de manchas de cor rosa e/ou azulada. 

Os  cromatogramas  de  GC  foram  obtidos  através  dum  aparelho  GC  Agilent 

Technologies  série 7683‐B  [68]. Os extractos  foram dissolvidos em n‐hexano e preparados a 

concentrações de 1 mgmL‐1 e 3 mgmL‐1. Foi utilizada uma coluna DB‐1 (30 m x 0,32 mm; 0,25 

µm de espessura de filme), com um fluxo de hélio de 1 mLmin‐1. O programa de temperatura 

do  forno  consistiu em 5 minutos a 70  °C,  subindo depois 5  °Cmin‐1 até aos 150  °C onde  se 

mantinha  5 minutos  antes  de  se  iniciar  nova  subida  (15  °Cmin‐1)  até  chegar  aos  320  °C, 

patamar em que  ficava durante 20 minutos. A  temperatura no detector e no  injector  foi de 

320 °C. 

Os espectros de  1H‐NMR  foram  registados num espectrofotómetro Bruker AMX 300, 

que opera a 300 MHz para protão. O solvente utilizado foi o benzeno e como padrão  interno 

utilizou‐se o tetrametilsilano. 

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2.4. Testes de palatabilidade 

2.4.1. Preparação das pellets 

Para  realizar  os  testes  de  palatabilidade  adaptou‐se  o  protocolo  de  Mollo  et  al. 

(2008)[45].  

Neste trabalho, as comidas de teste (pellets) foram preparadas utilizando‐se 10 mg de 

manto de  lula  liofilizado, 6 mg de alginato  (para gelificar a comida) e 6 mg de areia do mar 

purificada  com  tamanho  do  grão  entre  0,1 mm  e  0,3 mm  (para  que  a  pellet  não  flutuasse 

quando apresentada aos animais). A esta mistura era adicionado o extracto químico, dissolvido 

em acetona, na quantidade necessária para a concentração  final desejada. Esta mistura era, 

em  seguida,  levada a um exsicador, de modo a evaporar a acetona. Acrescentava‐se depois 

uma gota de corante alimentar vermelho (para facilitar a identificação do consumo das pellets) 

e  água  destilada  de  modo  a  perfazer  um  volume  final  de  0,2  mL.  A  solução  obtida  era 

homogeneizada e, seguidamente, colocada numa seringa de 1,0 mL. O conteúdo da seringa era 

então despejado, como um fio, para uma solução de cloreto de cálcio 0,25 M, na qual ficava 

banhado durante dois minutos, para enrijecer  (figura 8). Eram depois cortadas 10 pellets de 

aproximadamente 0,4 cm cada. 

A comida de controlo foi preparada do mesmo modo, mas colocando‐se acetona pura, 

em vez do extracto químico dos animais. 

 

 

Figura 8 – Preparação de pellets. A comida “fabricada” é despejada para uma solução de CaCl2 para 

enrijecer. 

 

2.4.2. Realização dos testes de palatabilidade 

Para a realização dos testes de palatabilidade, foram capturados camarões da espécie 

Palaemon  elegans,  na  zona  intermareal  do  Cabo  Raso  (38º42’31’’N  9º22’10’’W).  Estes 

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camarões foram mantidos em  laboratório,  individualizados em copos com 300mL de água do 

mar.  Para  se  habituarem  à  comida  artificial  (numa  tentativa  de  reduzir  enviesamentos  de 

resultados), após um dia de  jejum foi‐lhes apresentada, uma vez por dia durante 3 dias, uma 

pellet semelhante às utilizadas como controlo. Os testes foram realizados ao quarto dia. Para 

cada teste foram escolhidos aleatoriamente 10 camarões, que funcionaram como replicados, 

aos quais era apresentada uma pellet. Considerou‐se como aceitação do alimento o consumo 

total  da  pellet  ao  fim  de  um  período máximo  de  30 minutos  (figura  9).  As  diferenças  no 

consumo  das  pellets  nas  experiências  foram  avaliadas  através  do  teste  do  Qui‐quadrado, 

considerando‐se um nível de significância de 0,05. 

As concentrações dos extractos das esponjas utilizadas nos testes foram definidas em 

função das  concentrações naturais obtidas. Assim, para os  testes  realizados  com o extracto 

bruto dos exemplares de Dysidea  fragilis de  Setúbal,  foram utilizadas  concentrações de 0,5 

mgmL‐1, 2,0 mgmL‐1, 4,0 mgmL‐1, 6,0 mgmL‐1, 8,6 mgmL‐1 e 10,0 mgmL‐1, as mesmas utilizadas 

para  os  extractos  da  esponja  da  Ria  Formosa,  exceptuando  0,5 mgmL‐1.  Os  extractos  dos 

exemplares  de  Hypselodoris  cantabrica  da  Ria  Formosa  e  de  Setúbal  foram  testados  a 

concentrações de 0,3 mgmL‐1, 0,5 mgmL‐1, 1,0 mgmL‐1, 1,5 mgmL‐1 e 2,0 mgmL‐1. 

Com base nos resultados obtidos, foram construídas rectas de regressão para a relação 

entre  a  concentração  dos  extractos  e  a  taxa  de  rejeição  das  pellets,  tendo  sido  para  tal 

logaritmizados  os  valores  da  concentração,  utilizando  log10  (concentração+1).  As  diferenças 

entre  as  rectas  de  regressão  foram  testadas  com  recurso  ao  teste  t  de  Student  para 

comparação de declives de recta [46], com um nível de significância de 0,05. 

 

 

Figura 9 – Camarão que não consumiu (A) e que consumiu (B) a comida apresentada. A coloração das 

pellets possibilitou uma percepção mais simples de quais os animais que as ingeriam, pela cor 

vermelha na base do cefalotórax. 

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3. Resultados 

 

3.1. Concentrações naturais dos extractos brutos 

Os exemplares de Dysidea fragilis recolhidos em Setúbal apresentaram concentrações 

entre  os  0,48 mgmL‐1  e  os  8,60 mgmL‐1  e  uma média  de  3,86 mgmL‐1.  Já  para  as  esponjas 

algarvias  obtiveram‐se  valores  entre  1,45 mgmL‐1  e  6,10 mgmL‐1,  com  uma média  de  2,87 

mgmL‐1 (Fig. 10 A). 

Para  os  nudibrânquios,  a  amplitude  de  valores  de  concentração  foi  maior.  Os 

exemplares recolhidos na rampa da Secil apresentaram concentrações de extracto bruto entre 

os 9,50 mgmL‐1 e os 42,00 mgmL‐1, com uma média de 22,07 mgmL‐1, enquanto para os da Ria 

Formosa foram calculados valores entre os 8,70 mgmL‐1 e os 74,00 mgmL‐1, com uma média de 

34,28 mgmL‐1 (figura 10 B). 

Na comparação entre as concentrações naturais de extractos brutos das amostras de 

Setúbal e da Ria Formosa, não foram encontradas diferenças significativas quer entre as 

esponjas quer entre os nudibrânquios (U=16, p >0,05, U=66, p >0,05). 

 

Figura 10 – Boxplot das concentrações naturais dos extractos brutos das amostras de Dysidea fragilis (A) e Hypselodoris cantabrica (B). 

3.2.  Análise dos Extractos 

3.2.1. TLC 

A revelação das placas de TLC com reagente de Ehrlich, permitiu identificar a existência 

de compostos com anéis furano em todos os extractos de esponjas e nudibrânquios. 

 

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Nas  TLC  dos  extractos  dos  animais  eluídas  em  éter  de  petróleo,  as  esponjas 

apresentaram manchas inexistentes nos nudibrânquios (figura 11 A1, 11 B1). Em todas as TLC 

eluídas com a solução de éter de petróleo e éter etílico (1:1) (figura 11 A2, 11 B2), verificou‐se 

nas esponjas também um maior número de manchas que nos nudibrânquios, o que indica uma 

maior diversidade de compostos  furanosesquiterpenos. Com este eluente, mais polar,  foram 

também detectados compostos por irradiação de luz U.V., mas apenas nas esponjas. 

 

Figura 11 – TLC de extractos brutos de Dysidea fragilis e Hypselodoris cantabrica de Setúbal (A) e da 

Ria Formosa (B), reveladas com reagente de Ehrlich e eluídas em éter de petróleo (A1 e B1) e em éter 

de petróleo e éter etílico 1:1 (A2 e B2). Os tracejados indicam compostos visualizados por irradiação 

de luz U.V. (λ=240 nm). 

 

3.2.2. 1H‐NMR 

Foi possível  identificar, para os extractos químicos de D.  fragilis e H. cantabrica, um 

conjunto  de  sinais  no  espectro  de  ressonância  magnética  nuclear  entre  5,5  e  7,5  ppm, 

atribuíveis  a  diferentes  compostos  furanosesquiterpenos,  já  que  esta  zona  do  espectro  é 

característica dos protões de anéis furano. No entanto, não foi possível, com base na literatura 

identificar qualquer composto. Na figura 12 é possível observar‐se os espectros de 1HNMR de 

uma esponja (fig. 12 A) e de um nudibrânquio (fig. 12 B), ambos da Ria Formosa. 

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Figura 12 – Espectros de 1HNMR de Dysidea fragilis (A) e Hypselodoris cantabrica (B) da Ria Formosa. Os sinais entre 5,5 e 7,5 ppm são característicos de furanosesquiterpenos. 

 

3.2.3. GC 

A  realização  de  cromatografias  gasosas  permitiu  perceber  a  existência  de  vários 

compostos nas esponjas e nudibrânquios (identificados através de picos nos cromatogramas) 

correspondentes aos furanosesquiterpenos detectados nas TLC. 

Todos  os  exemplares  de  Dysidea  fragilis  da  rampa  da  Secil  apresentaram 

cromatogramas semelhantes  (figura 13 A1), estando o composto com tempo de retenção de 

≈28,4 minutos (composto A) presente em maior concentração (composto maioritário). 

No que concerne aos GC das esponjas da Ria Formosa, dois exemplares perderam os 

compostos ao  longo do processo de extracção e 3 exemplares apresentaram cromatogramas 

com  diferentes  compostos  maioritários.  Todos  os  outros  espécimes  apresentaram 

cromatogramas  semelhantes  e  com  o  composto  com  tempo  de  retenção  ≈27,0  minutos 

(composto B) como composto maioritário (Figura 13 B1). 

À excepção de um exemplar, os nudibrânquios  recolhidos em Setúbal apresentaram 

cromatogramas semelhantes, com dois compostos maioritários, o composto A e o composto B 

(Figura 13 A2). 

Dos  exemplares  de  Hypselodoris  cantabrica  da  Ria  Formosa  apenas  dois  não 

apresentaram cromatogramas com o composto B como composto maioritário, tendo todos os 

outros cromatogramas semelhantes (figura 13 B2). 

É relevante referir que, embora não maioritário, o composto A também foi encontrado 

nas esponjas e nudibrânquios da Ria Formosa. De igual modo, os extractos de Dysidea fragilis 

de Setúbal também continham o composto B. 

Na  análise  dos  cromatogramas  de  GC,  não  foram  encontrados  compostos  nos 

nudibrânquios  que  não  tivessem  correspondência  nas  esponjas.  Como  a  figura  13  permite 

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verificar,  nudibrânquios  e  esponjas  apresentaram  picos  no  GC  em  regiões  semelhantes 

(embora  com  intensidades  diferentes),  o  que  permite  perceber  a  existência  dos  mesmos 

compostos  furanosesquiterpenos  em  H.  cantabrica  e  D.  fragilis,  embora  em  diferentes 

percentagens relativas. 

 

 

Figura 13 – Cromatogramas de GC de Dysidea fragilis (A1 e B1) e de Hypselodoris cantabrica (A2 e B2) de Setúbal (A) e da Ria Formosa (B). 

 

3.3. Testes de palatabilidade 

Para  todos  os  extractos  testados,  a  um  aumento  da  sua  concentração  nas  pellets 

correspondeu um aumento da rejeição das mesmas por parte dos camarões. 

No que  concerne aos  testes efectuados  com o extracto bruto de Dysidea  fragilis de 

Setúbal,  registou‐se  uma  rejeição  significativa  para  concentrações  a  partir  dos  4  mgmL‐1 

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(χ2=0,0191,  p  <0,05),  sendo  que  foi  obtida  uma  taxa  de  rejeição  de  100%  para  uma 

concentração de 10 mgmL‐1. 

Nos  testes  realizados  com  o  extracto  bruto  de  esponjas  recolhidas  na  Ria  Formosa 

obteve‐se  resultados  significativos  para  concentrações  a  partir  dos  6 mgmL‐1  (χ2=0,0003,  p 

<0,05), sendo que com uma concentração de 8 mgmL‐1 se obteve uma rejeição total da comida 

de teste. 

Ao testar‐se os extractos provenientes dos nudibrânquios de Setúbal, obteve‐se taxas 

de rejeição significativas para concentrações desde 0,5 mgmL‐1 (χ2=0,0191, p <0,05), sendo que 

se obteve uma rejeição total com uma concentração de 2,0 mgmL‐1. 

O  teste  de  extractos brutos de H.  cantabrica  da Ria  Formosa  revelou  também uma 

rejeição  significativa  das  pellets  para  concentrações  a  partir  dos  0,5 mgmL‐1  (χ2=0,0062,  p 

<0,05),  obtendo‐se  uma  rejeição  total  ao  apresentar‐se  pellets  com  extracto  numa 

concentração de 1,5 mgmL‐1. 

As  curvas‐resposta  da  figura  14  traduzem  o  efeito  dissuasor  de  diferentes 

concentrações dos extractos de Dysidea fragilis e Hypselodoris cantabrica de ambas as regiões 

de recolha. 

 

Figura 14 ‐ Curva‐resposta do efeito dissuasor dos extractos brutos de D. fragilis (A) e H. cantabrica (B) de  Setúbal e da Ria  Formosa em Palaemon elegans. Dez  camarões aleatoriamente escolhidos foram testados para cada concentração. Diferenças entre o controlo (concentração do extracto = 0) e tratamentos foram testadas com recurso ao teste do Qui‐quadrado e estão assinaladas por pontos (• P < 0,05). 

 

Através  da  aplicação  do  teste  t  de  Student  para  identificar  diferenças  nos  declives  das 

rectas  de  regressão  dos  testes  de  palatabilidade,  concluiu‐se  não  existir  diferenças 

significativas nem entre esponjas nem entre nudibrânquios de Setúbal e da Ria Formosa  (t=‐

0,57, p> 0,05; t=‐1,43, p> 0,05). 

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4. Discussão 

 

Antes  de  se  avançar  na  discussão  deste  trabalho,  alguns  aspectos  metodológicos 

merecem ser considerados. 

O primeiro prende‐se com o tamanho da amostragem. O número de amostras das duas 

áreas foi muito díspar, tendo sido recolhidos mais exemplares de esponjas e, especialmente, 

de  nudibrânquios  no  Algarve  do  que  em  Setúbal.  Isso  deveu‐se,  em  parte,  à  grande 

abundância  de  D.  fragilis  e,  consequentemente,  do  seu  predador  H.  cantabrica,  na 

embocadura  da  Ria  Formosa.  Nos  mergulhos  aí  efectuados  não  foi  sequer  encontrada 

qualquer outra espécie de porífero.  Já em Setúbal, a abundância do par predador‐presa era 

muito  baixa,  tendo  sido  até  encontradas  outras  esponjas,  como  Cliona  celata.  Porém,  os 

exemplares de Hypselodoris de Setúbal eram maiores e a quantidade extracto bruto obtido era 

também maior.  Isto  está  de  acordo  com  Fontana  et  al.  (1993),  que  sugeriram  haver  uma 

relação directa entre a quantidade de metabolitos e o tamanho do animal [36], uma vez que o 

nudibrânquio vai progressivamente acumulando mais compostos. Assim, para se obter massa 

de extractos suficiente para o trabalho, foi necessário recolher‐se mais indivíduos do Algarve. 

Será também importante referir o porquê de se ter extraído o manto dos Hypselodoris. 

Extrair  a  totalidade  do  organismo  não  faria muito  sentido,  já  que  o manto  é  a  área mais 

exposta  aos  predadores  e  é  nele  que  se  encontram  os  furanosesquiterpenos  dissuasores. 

Contudo,  como  foi  referido na  introdução deste  trabalho, estes encontram‐se armazenados 

em  locais  específicos  no  bordo  do manto:  as MDF.  No  entanto,  destacar  de  Hypselodoris 

cantabrica  congelados  o bordo  do manto  ou  as MDF  sem  serem  danificados  e  sem  perder 

compostos é uma tarefa complicada, daí que se tenha optado por fazer a extracção de todo o 

manto, conservando‐se os compostos.  

No  que  concerne  à  análise  química,  convém  referir  que  os  resultados  não  foram 

inteiramente  homogéneos,  ou  seja,  nem  todos  os  extractos  apresentaram  os  mesmos 

compostos maioritários. Contudo, esses desvios foram muito pontuais e por  isso, e porque a 

massa  desses  extractos  era  bastante  reduzida,  não  foram  considerados  nos  testes  de 

palatabilidade. 

  Há  também  algumas  considerações  a  fazer  aos  testes  de  palatabilidade.  A 

metodologia  seguida neste projecto  foi uma  adaptação da utilizada por Mollo  et  al.  (2008) [45]que, por sua vez,  foi baseada no  trabalho de Pawlik et al.  (1995)  [47]. A principal alteração 

feita, fruto da aferição experimental prévia, foi no tempo de jejum dos camarões. Este teve de 

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ser  reduzido uma vez que, após os 3 dias de  jejum propostos por Mollo et al., os camarões 

tornavam‐se  bastante  vorazes,  comendo  imediatamente  todo  o  controlo.  Ora,  uma  das 

preocupações nestes testes era precisamente que houvesse alguma rejeição (baixa) da comida 

de  controlo.  Não  se  pretendia  que  a  comida  fosse  demasiado  boa  nem  que  os  camarões 

tivessem  demasiada  fome,  por  forma  a  que  o  potencial  efeito  dissuasor  dos  extractos  não 

fosse mascarado. 

Como complemento a estes  testes, poderiam  ter sido  realizados  testes no habitat dos 

organismos  em  estudo,  apresentando‐se  a  comida  tratada  a  predadores  (conhecidos  ou 

potenciais) dos animais. No entanto, este  tipo de experimentação exige mais  tempo e uma 

logística mais complexa, para além de que, no Atlântico Nordeste, não há muitos predadores 

de  nudibrânquios  e  esponjas  conhecidos  [6,  7,  23].  Embora  este  tipo  de  testes  não  seja 

necessariamente melhor que os testes de laboratório, poderão ser, contudo, um complemento 

no desenvolvimento futuro deste estudo. 

O predador utilizado nos testes, Palaemon elegans, é um predador generalista (que se 

sabe  poder  comer moluscos)  de  fácil  recolha  e manutenção  em  laboratório,  exigindo  uma 

logística mais simples que, por exemplo, peixes. Embora não haja relatos deste animal exercer 

predação sobre nudibrânquios, sabe‐se que os crustáceos são dos seus poucos predadores [48] 

e que, em águas temperadas, são também dos poucos animais a alimentarem‐se de esponjas [23]. De qualquer  forma, para este  trabalho não  interessava utilizar um  animal especializado 

nestes  nudibrânquios  ou  nas  esponjas,  uma  vez  que  conseguiria  contornar  as  suas  defesas 

químicas.    

Ainda  em  relação  aos  testes  de  palatabilidade,  é  importante  justificar  a  escolha  dos 

valores  de  concentração  para  os  testes  com  os  extractos  de  nudibrânquios.  Testes 

preliminares  com  as  concentrações  naturais mais  baixas  resultaram  em  rejeição  total  das 

pellets. Foi‐se testando concentrações cada vez mais reduzidas, de modo a conseguir obter‐se, 

nalgum ponto, alguma aceitação das pellets. Tal  só  foi alcançado com concentrações de 1,5 

mgmL‐1  para  os  extractos  de  H.  cantabrica  de  Setúbal  e  1 mgmL‐1  para  os  extractos  dos 

opistobrânquios  provenientes  da  Ria  Formosa,  que  representam  menos  de  20%  das 

concentrações mínimas naturais calculadas. 

 

No cerne deste  trabalho estava a comparação das defesas químicas do par predador‐

presa  Hypselodoris  cantabrica  e  Dysidea  fragilis.  A  análise  química  dos  extractos  destes 

animais  comprovou a existência de  compostos  furanosesquiterpenos, descritos na  literatura 

como os compostos dissuasores característicos destas espécies  [34, 36]. A análise por GC e TLC 

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confirmou  que  os  compostos  detectados  nos  extractos  dos  nudibrânquios  se  encontram 

presentes  também na  esponja, de onde  se  comprova  a proveniência  alimentar das defesas 

químicas  de  Hypselodoris  cantabrica,  conforme  referido  por  outros  autores  [11].  Estas 

metodologias  permitiram  também  detectar  uma  maior  diversidade  de  compostos  nas 

esponjas, o que parece sugerir uma retenção selectiva de compostos. 

Verificou‐se que os extractos brutos existiam em maior concentração nos nudibrânquios 

do que nas esponjas, o que parece ser um  indicador de uma maior capacidade defensiva dos 

predadores  que,  progressivamente,  acumulam  compostos  nas  MDF  à  medida  que  se 

alimentam de D. fragilis  [28, 30]. Contudo, de acordo com alguns autores, a esponja em estudo 

liberta  um  fluido  com  compostos  dissuasores  quando  perturbada  [34].  Assim,  durante  o 

processo de recolha das esponjas, é possível que tenha sido emitido algum  fluido, o que  iria 

diminuir  a  concentração  do  extracto  destes  animais.  Porém,  não  é  possível  aferir  em  que 

quantidade os químicos terão sido libertados, nem tão pouco se tal fenómeno ocorreu, já que 

tal  não  foi  evidente  nos mergulhos  de  recolha.  As  diferenças  na  concentração  do  extracto 

bruto têm por isso de ser consideradas com reserva quando utilizadas como indicador de uma 

maior capacidade dissuasora dos nudibrânquios. 

No  entanto,  os  testes  de  palatabilidade  confirmaram  que  os  extractos  dos 

nudibrânquios  são  mais  dissuasores  que  os  extractos  das  esponjas,  já  que  se  obtiveram 

rejeições  significativas  com  concentrações  bastante  inferiores.  Ora,  sendo  os 

furanosesquiterpenos detectados em H. cantabrica  idênticos (e provenientes) aos detectados 

em  D.  fragilis,  como  se  explica  esta maior  capacidade  dissuasora?  Provavelmente,  dada  a 

capacidade do nudibrânquio de  reter metabolitos  selectivamente, os compostos dissuasores 

maioritários estão em maior concentração em H. cantabrica do que em D. fragilis. Porém, para 

comprovar  esta  teoria  será necessário quantificar  os  compostos  existentes  nos  extractos.  É 

necessário ter também em conta o maior número de compostos existentes nas esponjas e a 

possibilidade de haver interacções entre eles que diminuam a capacidade dissuasora. 

Ecologicamente, o facto de H. cantabrica estar melhor protegido que D. fragilis deverá 

significar  uma  maior  pressão  predatória  sobre  os  nudibrânquios  (pelo  menos  nalgum 

momento  da  sua  história  evolutiva).  Estudos  com  esponjas  [49]  e  nudibrânquios  [50]  em  que 

foram testados alimentos de diferente valor energético com os mesmos químicos defensivos, 

parecem indicar que a baixa qualidade nutricional pode funcionar com um factor de dissuasão. 

Uriz et al. (1996), comparando duas esponjas simpátricas quimicamente defendidas, concluiu 

que a de maior valor energético estava mais protegida [51]. Assim, o menor valor nutricional de 

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D.  fragilis  pode  explicar  a  sua  menor  capacidade  defensiva,  quando  comparada  com  H. 

cantabrica, que possui o mesmo tipo de compostos dissuasores. 

A  comparação  inter‐geográfica  das  defesas  químicas  destes  animais  foi  outro  dos 

objectivos deste trabalho. No que respeita às concentrações dos extractos brutos, não foram 

encontradas diferenças significativas quer entre nudibrânquios quer entre esponjas de  locais 

distintos,  o  que  aponta  para  uma  capacidade  dissuasora  semelhante.  Os  testes  de 

palatabilidade confirmaram  isso mesmo, não tendo sido encontradas diferenças significativas 

na capacidade de dissuasão quer de nudibrânquios quer de esponjas de regiões distintas. No 

entanto,  a  análise  química  revelou  diferenças  nos  compostos  maioritários  entre  os  pares 

predador‐presa das duas áreas em estudo, o que era expectável, dada a variação geográfica 

existente nos compostos de esponjas e nudibrânquios  já referida por diversos autores  [35,  36]. 

Daqui  se  depreende  que,  em  termos  de  funções  defensivas,  os  compostos  maioritários 

identificados  (A e B) têm a mesma eficácia ecológica. Convém, contudo, particularizar o caso 

do par predador‐presa de Setúbal. Enquanto no par da Ria Formosa o composto existente em 

maior  concentração  na  esponja  (composto  B)  era  também  o  composto  maioritário  do 

nudibrânquio, em Setúbal H. cantabrica apresentou dois compostos maioritários  (A e B), ao 

passo que D. fragilis apresentou apenas o composto A em maior concentração. Uma vez que o 

composto  B  também  foi  identificado  nas  esponjas  de  Setúbal,  este  fenómeno  pode  ser 

atribuído à retenção selectiva de compostos por parte do nudibrânquio, que pode armazenar 

nas  MDF  o  composto  B  em  concentrações  diferentes  das  disponíveis  no  meio,  como  foi 

verificado  por  Fontana  et  al.  (1993)  [36].  No  entanto,  alguns  autores  sugerem  que  a 

especialização dos nudibrânquios não é necessariamente numa presa, mas no composto que 

ela produz [12]. Logo, não pode ser excluída a hipótese de H. cantabrica exercer predação, em 

Setúbal,  sobre  outra  esponja  em  que  o  composto  A  esteja  em  maior  concentração.  Esta 

hipótese  é  meramente  especulativa  e,  para  se  comprovar,  seria  necessário  não  só  fazer 

extracções  das  diversas  esponjas  encontradas  na mesma  área  como  também  observar  H. 

cantabrica  a  alimentar‐se  de  outro  organismo  que  não  D.  fragilis,  algo  que  nunca  foi 

observado  nos  vários  mergulhos  que  aí  se  têm  realizado  nos  últimos  anos  (comunicação 

pessoal de Gonçalo Calado). Se se tiver em conta que extractos de esponja com o composto A 

como maioritário foram tão dissuasores como extractos de esponja com o composto B, poder‐

se‐á  sugerir  que  esses  compostos  tenham  propriedades  defensivas  semelhantes.  Então, 

porque é que H.  cantabrica de Setúbal  reteve o  composto B numa  concentração  superior à 

existente  na  esponja?  É  possível  que  o  papel  deste  composto  vá  além  de  questões  de 

protecção uma vez que, como Cimino e Sodano (1994) referiram, os metabolitos secundários 

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provenientes  de  esponjas  podem  desempenhar  outras  funções  ecológicas  além  da  defesa, 

como a reprodução ou desenvolvimento [12]. Poderá também dar‐se o caso de o nudibrânquio 

ter, simplesmente, maior facilidade na retenção do composto B. É possível que no decurso da 

evolução  desta  espécie  o  composto  B  tenha  sido  a  principal  defesa  química  disponível  no 

meio, pelo que o nudibrânquio  teria desenvolvido  formas de o  captar melhor. No  entanto, 

alguns  autores  sugerem  que  as  MDF  teriam  surgido  como  forma  de  excretar  compostos 

nocivos ao organismo dos nudibrânquios  [28]. O composto B poderia então,  inicialmente,  ser 

um metabolito  da  esponja muito  tóxico  para  H.  cantabrica  que,  como  tal,  era  necessário 

excretar muito eficientemente. A sua utilização enquanto dissuasor poderia então ter sido um 

bycatch, como sugerido, o que vai ao encontro do que Cimino e Ghiselin (2001) sugeriram [15]. 

 

Embora as defesas químicas dos nudibrânquios tenham sido objecto de diversos estudos 

e a origem alimentar dos seus compostos dissuasores uma questão que tem sido amplamente 

debatida, a  verdade é que  foram poucos os que  compararam as defesas químicas de pares 

predador‐presa. Quando estudadas quanto à sua capacidade dissuasora, as defesas químicas 

têm sido, quase sempre, tratadas em termos de metabolitos isolados, como o fizeram Cimino 

et al. (1982) [52] e Fontana et al. (1993) [36], por exemplo. Contudo, duma perspectiva ecológica, 

faz sentido olhar a globalidade e perceber que, mais que o papel de determinado composto, o 

efeito total do extracto pode acabar por ser o mais relevante. Porém, de um ponto de vista de 

aplicabilidade de produtos naturais, é mais útil isolar e estudar compostos do que perceber o 

papel do todo no meio natural. 

 

As  perspectivas  futuras  que  poderão  ser  seguidas  no  decurso  deste  trabalho,  numa 

primeira  fase,  passarão  por  tentar  isolar  e  identificar  os  compostos  dissuasores  dos 

organismos  em  estudo.  Poderão  então  realizar‐se  testes  de  palatabilidade  apenas  com  os 

metabolitos, de modo a aferir a sua capacidade dissuasora. Posteriormente, estes compostos 

poderão  ser  testados  quanto  a  outras  actividades  biológicas,  tentando  perceber‐se  outras 

funções ecológicas mas, também, potenciais aplicações em áreas como a medicina. 

 

  As guerras químicas não são uma inovação recente nem um exclusivo do ser humano. 

Na natureza, a Selecção Natural, tem‐se encarregado de armar os organismos com tecnologia 

de  ponta  que  é  rapidamente  ultrapassada.  Numa  verdadeira  e  fascinante  corrida  ao 

armamento em que invertebrados sésseis e lesmas marinhas são os protagonistas, poderá ser 

possível continuar a descortinar, além dos mecanismos extraordinários da evolução, produtos 

úteis para o homem. 

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5. Referências 

 

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3.  Wagele, H.  and  A.  Klussmann‐Kolb, Opisthobranchia  (Mollusca, Gastropoda)  ‐ more than  just  slimy  slugs.  Shell  reduction  and  its  implications  on  defence  and  foraging. Frontiers in Zoology, 2005. 2(1): p. 3. 

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13.  Cimino, G. and M.T. Ghiselin, Chemical defense and evolutionary trends in biosynthetic capacity  among  dorid  nudibranchs  (Mollusca:  Gstopoda:  Opisthobranchia). Chemoecology, 1999. 9: p. 187‐207. 

14.  Cimino,  G.,  M.L.  Ciavatta,  A.  Fontana,  and  M.  Gavagnin,  Metabolites  of  Marine Opisthobranchs:  Chemistry  and  Biological  Activity,  in  Bioactive  Compounds  from Natural Sources, C. Tringali, Editor. 2001, Taylor & Francis. p. 579‐637. 

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