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UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE CIÊNCIAS
DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA ANIMAL
ESTUDO COMPARATIVO DAS DEFESAS QUÍMICAS DO PAR PREDADOR‐
PRESA HYPSELODORIS CANTABRICA E DYSIDEA FRAGILIS DO ESTUÁRIO DO
SADO E DA RIA FORMOSA
JOÃO FILIPE CHAVEIRO LOPES DA CRUZ
MESTRADO EM ECOLOGIA MARINHA 2009
UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE CIÊNCIAS
DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA ANIMAL
ESTUDO COMPARATIVO DAS DEFESAS QUÍMICAS DO PAR PREDADOR‐
PRESA HYPSELODORIS CANTABRICA E DYSIDEA FRAGILIS DO ESTUÁRIO DO
SADO E DA RIA FORMOSA
ORIENTADORES CIENTÍFICOS:
PROF. DR. HENRIQUE CABRAL
PROF. DR. GONÇALO CALADO
JOÃO FILIPE CHAVEIRO LOPES DA CRUZ
DISSERTAÇÃO PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE EM ECOLOGIA MARINHA
2009
Índice
Agradecimentos ............................................................................................................................ ii
Resumo e palavras‐chave ............................................................................................................. iv
Abstract and key‐words ................................................................................................................ v
1. Introdução ............................................................................................................................. 1
2. Materiais e métodos ........................................................................................................... 11
2.1. Recolha de exemplares ............................................................................................... 11
2.2. Extracção química ....................................................................................................... 12
2.2.1. Extracção dos químicos de Dysidea fragilis ......................................................... 12
2.2.2. Extracção dos químicos de Hypselodoris cantabrica .......................................... 12
2.3. Análise dos extractos .................................................................................................. 13
2.4. Testes de palatabilidade .............................................................................................. 14
2.4.1. Preparação das pellets ........................................................................................ 14
2.4.2. Realização dos testes de palatabilidade .............................................................. 14
3. Resultados ........................................................................................................................... 16
3.1. Concentrações naturais dos extractos brutos ............................................................. 16
3.2. Análise dos Extractos ................................................................................................... 16
3.2.1. TLC ....................................................................................................................... 16
3.2.2. 1H‐NMR ................................................................................................................ 17
3.2.3. GC ........................................................................................................................ 18
3.3. Testes de palatabilidade .............................................................................................. 19
4. Discussão ............................................................................................................................. 21
5. Referências .......................................................................................................................... 26
i
Agradecimentos
Este trabalho foi realizado numa parceria entre o Instituto Português de Malacologia, o
INETI e a Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, no âmbito do projecto FCT
PTDC/MAR/65854/2006 “Testando a hipótese de Vermeij: comparação das defesas das
comunidades litorais em ilhas oceânicas e continentes”.
Em primeiro lugar quero agradecer às pessoas sem as quais esta tese seria impossível de
se realizar. Assim, quero agradecer ao Prof. Dr. Gonçalo Calado, por ter acreditado e confiado
no meu trabalho e me ter aberto novas portas no mundo da Ciência. Agradeço também ao
Prof. Dr. Henrique Cabral, que teve uma paciência infinda para aturar um orientando
desnaturado e um aluno não muito aplicado. Deixo também o meu agradecimento à Dra.
Helena Gaspar, por todo o apoio e orientação na componente química do trabalho. Menos
envolvido na tese, mas porque me pôs em contacto com as pessoas certas e me foi, ao longo
dos anos, mostrando o que é isto de ser cientista, tenho de deixar o meu agradecimento ao Dr.
Bruno Jesus (ainda me deve umas cervejas, mas fora isso…).
Parte desta tese foi realizada no INETI e há várias pessoas a quem tenho de agradecer
todo o tipo de auxílio no campo das químicas: Dra. Cristina Moiteiro, Dra. Maria João Curto,
Eng. Ana Isabel Rodrigues e Dra. Fátima Justino. Também os doutorandos João, Miguel, Ana e
Maria João foram um apoio sempre presente, para além de óptima companhia para o almoço.
Seria injusto deixar de fora os estagiários do curso de Técnico de Laboratório que me
acompanharam ao longo de várias semanas, a Vanda e, especialmente, ao “mano” José, a
quem devo não só momentos de fortes gargalhadas como também o apoio directo na
extracção e análise química dos “librânquios”.
Outra parte da tese foi realizada na Universidade Lusófona e tenho de agradecer a todas
as pessoas que, entre arranjando‐me espaço e garrafas de mergulho, foram gozando com os
camarões em copos do Burger King: Fred Almada, Stephane, Luís, Mónica, Pedro e Joana.
Deixo também o meu agradecimento à Rita Coelho, doutoranda do IPM, que contribuiu
não só nos mergulhos na Ria Formosa como também na recolha bibliográfica.
Embora o trabalho desta tese tenha sido desenvolvido fora da FCUL, foram vários os
professores desta casa que me foram apoiando e ensinando, especialmente nos últimos anos
do curso. Assim, entre muitos, tenho de agradecer ao Prof. Ricardo Melo (não estive muito
atento nas aulas de Botânica Marinha, mas foi a primeira cadeira em que tive uma amostra do
ii
que é fazer ciência), ao Prof. Francisco Petrucci‐Fonseca (um lado mais terrestre, mas nem por
isso menos divertido, da Biologia), ao Prof. Carlos Assis (sempre pronto para dois dedos de
conversa e para o esclarecimento qualquer dúvida) e ao Prof. Francisco Andrade.
Tenho também de agradecer aos meus colegas de curso, particularmente áquelas mais
ou menos 20 pessoas e à única suazi que conheço, pelo apoio linguístico. Mais do que colegas,
tenho que destacar os Pastores Tigaz, Mika, Fox e Johns, pela força e incentivo que sempre me
deram, mas também (e especialmente) pelas futeboladas, noites de copos, guitarradas,
palhaçadas, nhecus e teorias do comportamento de animais muito… peculiares. Não falar da
meia‐leca da Vânia seria ridículo, portanto já está!
Poderia ter feito o curso sem a Repro2000? Podia, mas não era a mesma coisa! Por isso,
agradeço ao Zé Manel, à Paula e, claro, à Tia Mena, pelos pedidos fora de horas realizados em
tempos impossíveis, pelas horas de descontracção passadas à conversa e por uma ou outra
cerveja paga no Mocho.
Fora da faculdade, são muitas as pessoas que “estiveram lá”, sempre. E porque esta é
uma palavra que significa muito, Shalom: Cláudia, Carlos, Sérgio, Ana, Joe, Janito Pina, David,
Tony, Cátia, Kinder, Zézinha, Fi, Lígia, Marta, João de SDR, Coelhinho e, claro, Vítor e Afonso.
Ainda nesta listagem, tenho de agradecer ao Bugs, pelo apoio logístico “não‐oficial” do Burger
King.
A minha família, a quem roubei muito do pouco tempo que tínhamos, merece aquele
agradecimento. Para além do suporte financeiro, são o suporte humano. Sem vocês ao meu
lado não seria quem sou hoje. Obrigado, muito obrigado, Mãe, Pai, Pedro e Nuno! Os meus
avós, tios e primos, também têm de figurar nesta lista. E claro, os tios Nuno e Isabel, por terem
contribuído de uma forma tão importante para o meu trabalho.
E porque os últimos são os primeiros, esta tese, boa ou má, é dedicada a ti, Rita.
iii
Resumo e palavras‐chave
No decurso da evolução dos opistobrânquios houve uma progressiva perda da concha que
obrigou à aquisição de novas estratégias defensivas, entre as quais o recurso a defesas
químicas. A maioria dessas estratégias passa pela utilização de compostos tóxicos ou
dissuasores, em muitos casos obtidos através da dieta, bastante específica. O nudibrânquio
Hypselodoris cantabrica retém e acumula metabolitos secundários dissuasores
(furanosesquiterpenos) existentes na sua presa, a esponja Dysidea fragilis. Neste trabalho
comparou‐se as defesas químicas deste par predador presa de duas regiões portuguesas:
Setúbal e Ria Formosa. Para tal, recolheram‐se exemplares de esponjas e nudibrânquios de
ambas as áreas, dos quais foram extraídos e analisados os compostos defensivos, tendo sido
depois realizados testes de palatabilidade com os extractos obtidos. Nas duas espécies
observou‐se alguma variedade na concentração dos extractos brutos obtidos, tendo revelado
os nudibrânquios uma maior concentração, que pode ser resultado de acumularem
progressivamente os compostos e/ou da esponja ter emitido fluidos com compostos
dissuasores quando recolhida. Verificou‐se que os furanosesquiterpenos existentes nos
nudibrânquios estavam também presentes nas esponjas, o que comprovou a sua origem
alimentar. Concluiu‐se haver diferenças regionais nos compostos maioritários identificados nos
nudibrânquios e nas esponjas. Os exemplares de H. cantabrica provenientes de Setúbal
apresentaram dois compostos maioritários e nos de D. fragilis, apenas um estava em maior
concentração, inferindo‐se assim uma retenção selectiva dos compostos pelo nudibrânquio.
Os testes de palatabilidade não revelaram diferenças significativas na capacidade dissuasora,
na comparação entre áreas geográficas, quer entre extractos de esponjas quer entre extractos
de nudibrânquios. Nas comparações predador‐presa, os testes de palatabilidade revelaram
uma maior actividade dissuasora dos extractos dos nudibrânquios, conseguindo taxas de
rejeição significativas a concentrações inferiores às necessárias para os extractos de esponja
obterem o mesmo efeito. Assim conclui‐se que o predador está quimicamente mais protegido
que a sua presa, da qual obtém as defesas.
Palavras‐chave – Defesas químicas, dissuasão, testes de palatabilidade, Hypselodoris
cantabrica, Dysidea fragilis.
iv
v
Abstract and key‐words
As they evolved, opistobranchs underwent progressive shell loss, which made it necessary for
them to acquire new defensive strategies, such as chemical defenses. The majority of these
strategies consist in using toxic or deterrent compounds, mostly obtained through their diet
which is very specific. The nudibranch Hypselodoris cantabrica retains and accumulates
deterrent secondary metabolites (furanosesquiterpenes) which are present in its prey, the
sponge Dysidea fragilis. In this study, the chemical defenses of this predator and its prey were
compared in two Portuguese regions: Setúbal and Ria Formosa. Sponge and nudibranch
specimens were collected from both areas. Their defensive compounds were extracted and
analyzed and then utilized in palatability tests. Some variability in the concentration of the
obtained brute extracts was observed in both species. The nudibranchs revealed a larger
concentration, which could be due to a progressive accumulation of the compounds and/or as
a result of the sponges having expelled fluids containing deterrent compounds when collected.
The furanosesquiterpenes in the nudibranchs were also found to be present in the sponges,
which confirmed their dietary origin. There were regional differences between the main
compounds identified in the nudibranchs and sponges. The H. cantabrica specimens from
Setúbal displayed two main compounds whilst the D. fragilis specimens displayed only one,
which could be indicative of a selective retention of the compounds by the nudibranchs. The
palatability tests did not reveal significant differences in the deterrent capacity neither
between sponge extracts nor between nudibranch extracts from different regions. In the
predator‐prey comparisons, the palatability tests revealed a more effective deterrent activity
in the nudibranchs’ extracts, having obtained significative rejection rates at lower
concentrations than necessary for the sponge extracts to have the same effect. Thus, it was
concluded that the predator is chemically better protected than its prey, from which it obtains
its defenses.
Key‐words: Chemical defenses, deterrence, palatability tests, Hypselodoris cantabrica, Dysidea
fragilis.
1. Introdução
A enorme variedade de formas de vida encontrada na Natureza é, desde há muito,
motivo de reflexão. Há 150 anos, Darwin abalou o mundo ao afirmar que tal variedade poderia
ser explicada através de um processo evolutivo por ele denominado Selecção Natural [1]. Se
esta teoria abalou o mundo, revolucionou por completo a Biologia.
Alguns autores consideram a relação predador‐presa como um dos factores mais
importantes na Selecção Natural e, por conseguinte, na evolução das espécies. Vermeij, por
exemplo, definiu esta relação como uma arms race [2], uma dinâmica corrida ao armamento
em que presas e predadores co‐evoluem, surgindo novas formas (espécies) de presas mais
protegidas e novas formas (espécies) de predadores mais armados. Esta corrida ao armamento
é notória na evolução dos opistobrânquios.
Ao contrário da maioria dos gastrópodes, na generalidade dos opistobrânquios a
concha é reduzida, interna ou mesmo ausente [3]. Tal característica, associada à lentidão de
movimentos, deu às espécies desta sub‐classe (calcula‐se que sejam entre 5000 e 6000 [3]) o
nome de lesmas do mar. A perda da concha, que deverá ter ocorrido independentemente em
diversas linhagens de opistobrânquios [4], foi um passo evolutivo que trouxe diversas
vantagens a estes animais: maior facilidade de locomoção [3, 5]; maior facilidade na exploração
e procura de alimento em novos habitats [3]; possibilidade de evolução de novas estruturas
físicas, processos fisiológicos e comportamentos [3]; eliminação do custo energético necessário
ao desenvolvimento da concha [5]. Contudo, há uma enorme, e óbvia, desvantagem associada à
perda da concha: perda de defesas e consequente aumento provável da predação. Faulkner e
Ghiselin (1983) analisaram esta situação de um ponto de vista económico, em termos de
perdas e ganhos, e concluíram que os benefícios do desaparecimento da concha seriam
maximizados se se encontrassem formas de defesa alternativas menos dispendiosas [5]. Tais
alternativas devem ter sido encontradas, já que são poucos os predadores de opistobrânquios
conhecidos [6].
Assim, desprovidos de concha (em parte ou na totalidade), os opistobrânquios
desenvolveram um variado leque de estratégias defensivas para as quais Ros (1977) propôs
uma classificação [7]. Contudo, o próprio autor refere que esta divisão visa apenas facilitar a
compreensão dos diversos mecanismos defensivos porque, como se verá, os animais não
utilizam apenas uma estratégia defensiva. As estratégias defensivas dos opistobrânquios foram
então classificadas, por este autor, em: estruturais, comportamentais, cleptodefesas (do grego
kleptos – roubar) e químicas [7].
1
As estratégias estruturais consideram a utilização de elementos anatómicos dos
animais, como conchas vestigiais, existência de espículas calcárias dorsais, autotomatismo ou
coloração (críptica ou de aviso)[7].
As estratégias comportamentais passam, por exemplo, por situações de fuga ou
evitamento de predadores, anacorese ou anacorese trófica (quando o animal se esconde no
próprio alimento), comportamentos deimáticos (com o objectivo de assustar potenciais
predadores), exibição individual (normalmente de órgãos protegidos física ou quimicamente)
ou defesa agressiva [7].
As cleptodefesas, como o nome indica, são defesas roubadas. É o caso das defesas de
alguns nudibrânquios da família Aeolidiidae, que adoptaram uma estratégia única entre os
animais : o armazenamento de cnidócitos funcionais, provenientes dos cnidários de que se
alimentam [8]. Outros opistobrânquios adquirem pigmentos das suas presas, o que permite que
se camuflem nelas (homocromia). Um caso que vale a pena referir é o de alguns
opistobrânquios da ordem Sacoglossa, como Elysia chlorotica que, além da cor ganham
também os mecanismos de produção de energia da alga de que se alimentam, uma vez que
retêm os cloroplastos, perfeitamente funcionais, no seu organismo [9].
As defesas químicas, que como cerne deste trabalho serão apresentadas em maior
detalhe, são estudadas em opistobrânquios desde 1960, altura em que Thompson verificou a
secreção de ácido sulfúrico e ácido clorídrico por alguns destes animais quando perturbados [10]. Contudo, a maioria dos químicos de defesa de opistobrânquios são dissuasores e/ou
tóxicos [11]. Os compostos tóxicos “atacam” directamente os predadores, provocando mal‐
estar ou mesmo morte, ao passo que os compostos dissuasores indicam que o animal é não‐
palatável, isto é, tem um sabor desagradável. Claro que, como frisaram Faulkner e Ghiselin
(1983), as defesas não são igualmente eficientes contra todos os predadores e podem ser
sempre superadas por especialistas [5].
Existem dois tipos de testes para verificar a capacidade anti‐predatória dos químicos
isolados dos opistobrânquios, que podem ser realizados em laboratório ou no campo:
ictiotoxicidade e palatabilidade [12]. Nos primeiros, os compostos são lançados na água, por
vezes com um solvente orgânico (como a acetona), e observa‐se as consequências nos peixes.
Os segundos consistem normalmente na apresentação a potenciais predadores de comidas
preparadas em laboratório com ou sem compostos extraídos dos organismos em estudo,
tentando perceber se há diferenças na aceitação de controlos e tratamentos.
As defesas químicas, consideradas como a força motriz da evolução dos
opistobrânquios [13], estão presentes em vários grupos de lesmas do mar, inclusivamente na
2
ordem Cephalaspidea [14], cujas espécies mantêm uma concha reduzida (disco cefálico). Este
facto parece indicar que o desenvolvimento das defesas químicas foi pré‐adaptativo, ou seja,
ter‐se‐á iniciado antes da perda da concha [5].
Sabe‐se que grande parte dos produtos químicos de defesa são metabolitos
secundários. Estes são derivados de metabolitos primários e não estão envolvidos na
manutenção básica do indivíduo [15]. Os metabolitos secundários podem ser divididos em
alomonas (quando em interacção com outras espécies beneficiam o produtor – metabolitos de
defesa, por exemplo), cairomonas (pelo contrário, beneficiam o receptor – em situações de
mutualismo, por exemplo) e feromonas (comunicação inter‐específica – reprodução e
desenvolvimento) [16]. Foi Burreson, em 1975, o primeiro a caracterizar uma alomona num
nudibrânquio, Phyllidia varicosa [17].
A maioria dos metabolitos secundários utilizados pelos opistobrânquios pertencem ao
grupo dos terpenos e provêm da sua dieta [11], sendo que nalguns casos os compostos são bio‐
transformados, o que acontece no nudibrânquio Hypselodoris orsini [18]. Na perspectiva
económica de Faulkner e Ghiselin (1983), o uso de químicos provenientes da dieta permite
uma protecção sem gastos na produção, com custos apenas no armazenamento e mobilização [5]. Os mesmos autores defendem que os metabolitos derivados da alimentação devem ser :
retidos selectivamente, com os compostos mais eficientes a serem acumulados e os menos
válidos descartados; distribuídos no corpo de maneira a maximizar o efeito; mobilizados
quando necessário (por exemplo, excretados quando o predador ataca); eficientes perante
predadores [5].
Menos frequente é a biossíntese de metabolitos pelos próprios opistobrânquios
(chamada biossíntese de novo), fenómeno provado por Cimino et al. (1983) ao estudarem um
composto segregado pelo nudibrânquio Dendrodoris limbata [19].
Tendo isto em conta, Cimino e Ghiselin (2001) propuseram um “cenário de elaboração
gradual de metabolitos” para os opistobrânquios [15]. Para se alimentarem de organismos com
elevadas concentrações de alomonas, os opistobrânquios tiveram de desenvolver métodos de
excreção ou destoxificação, visto que os metabolitos secundários provenientes da dieta seriam
nocivos ao seu organismo, o que levou a uma especialização alimentar. O passo seguinte terá
sido então utilizar esses compostos para defesa (o que se encaixa numa estratégia de
cleptodefesa). No entanto, a especialização alimentar e a necessidade dos compostos para fins
defensivos levou a uma dependência de determinado tipo de presas. A solução evolutiva para
este problema terá sido a biossíntese de metabolitos de novo [15, 20]. Portanto, a evolução dos
opistobrânquios pode ser considerada como uma radiação adaptativa [15]: as espécies
3
ancestrais alimentar‐se‐iam de um grupo estrito de presas com defesas químicas, que se foi
alargando à medida que os opistobrânquios se diversificaram, tornando‐se predadores
especializados [15]. Os nudibrânquios doridáceos são um óptimo exemplo disso mesmo.
A maioria dos doridáceos são espongívoros [13, 21] e, para além de alimento,
encontraram nas suas presas uma fonte de metabolitos defensivos [5, 11, 13], sendo os mais
abundantes os diterpenos e os furanosesquiterpenos [11], compostos que estão relacionados
com os químicos dissuasores encontrados em plantas para fazer face aos insectos [22].
É importante realçar que as esponjas têm poucos predadores e que, em águas
temperadas, os mais relevantes são, além de opistobrânquios, equinodermes e alguns
pequenos crustáceos, que ainda assim não influenciam grandemente a estrutura das
comunidades [23]. Essa diminuta predação dever‐se‐á em grande parte às capacidades
defensivas físicas (espículas) e químicas (metabolitos secundários) das esponjas. Segundo
Faulkner e Ghiselin (1983), há uma relação directa entre a perda de espículas e o aumento de
metabolitos secundários nos Porífera [5]. O aparecimento dos metabolitos secundários nas
esponjas pode ter surgido inicialmente para impedir o estabelecimento de organismos epífitos
e parasitas, acabando por revelar um também um papel defensivo [15]. Como tal, os
opistobrânquios que se alimentavam de esponjas tiveram de se adaptar, arranjando novas
formas de contornar as defesas das suas presas [5]. Com base nisto, Faulkner e Ghiselin (1983)
sugeriram que tenha existido uma evolução paralela entre esponjas e os opistobrânquios que
exercem predação sobre elas, tendo as esponjas perdido as espículas e os opistobrânquios as
conchas [5]. Assim teria havido uma alteração na corrida ao armamento, passando das defesas
estruturais para as defesas químicas [24]. Também Cimino e Ghiselin (1999) destacaram a
relevância desta relação predador‐presa, considerando haver uma correlação entre a filogenia
das esponjas e a dos nudibrânquios que delas se alimentam [13].
Os doridáceos (e as suas presas) têm sido, portanto, um grupo muito estudado no que
respeita às suas defesas químicas [24], especialmente os pertencentes à família
Chromodorididae. Thompson (1960), dividiu os opistobrânquios entre os que se esforçavam
por passar despercebidos e os que pareciam não se preocupar com isso [6], que é o caso desta
família que, como o nome indica, se destaca pela sua coloração. Mesmo possuindo defesas
químicas, a maioria dos opistobrânquios são também crípticos [5] e muitos dos que pelos
padrões de coloração nos parecem conspícuos estão, no seu meio, em homocromia [7, 25].
Contudo, há opistobrânquios que são, efectivamente, conspícuos, como é o caso destes
nudibrânquios. Como é evidente, cores conspícuas despertam a atenção de predadores, o que
só se torna uma vantagem se o predador associar as cores a algo que lhe desagrade [26]. A este
4
tipo de utilização de cores é dado o nome de aposematismo (do grego apo – afastar e semat –
sinal). Nas espécies aposemática as defesas tiveram de ser, provavelmente, desenvolvidas
antes dos padrões conspícuos de cores [25], o que as coloca num ramo mais recente na filogenia
dos opistobrânquios. De acordo com Edmunds (1987), para uma espécie ser considerada
aposemática terá de ser suficientemente nociva, ter cor conspícua, ser evitada por predadores
e a sua coloração terá de conferir maior protecção ao indivíduo ou aos seus genes que outra
cor (críptica)[4]. No entanto, para um predador evitar uma presa terá de saber que ela lhe é
nociva ou desagradável, a não ser que o animal evite determinados padrões de cores de forma
inata. Contudo, para tal acontecer é necessário um longo processo evolutivo [25] pelo que, na
maioria dos casos, o predador terá de aprender a evitar as presas. Claro que esta
aprendizagem poderá provocar danos graves ou mesmo morte dos indivíduos predados. Por
este motivo, a evolução do aposematismo nos nudibrânquios é uma questão que tem
suscitado o interesse de muitos autores. A teoria mais aceite prende‐se com o chamado
mimetismo Mulleriano [11, 25, 26]: diferentes espécies não‐palatáveis desenvolvem aparências
semelhantes, dividindo assim o custo relacionado com a aprendizagem dos predadores [27]. De
entre os cromodorídeos que parecem apresentar este tipo de mimetismo, estão as espécies
atlânticas do género Hypselodoris, que constituem um círculo mimético de animais de cor azul
com bordo do manto e manchas dorsais amarelas [7].
No Atlântico nordeste, é possível encontrar 6 espécies de Hypselodoris: H. bilineata, H.
cantabrica, H. fontandraui, H. picta, H. tricolor e H. villafranca. A figura 1 mostra bem a
semelhança dos padrões de coloração destes animais. Contudo, não é apenas na cor que estes
animais se assemelham, também recorrem aos mesmos químicos defensivos e de maneira
semelhante.
Figura 1 – Hypselodoris do Atlântico Nordeste. A – H. bilineata*; B – H. cantabrica; C – H. fontandraui*; D – H. tricolor*; E – H. picta*; F – H. villafranca*. * ‐ fotografias obtidas em www.seaslugforum.net
5
Nos Hypselodoris spp., a maioria dos metabolitos secundários existentes são
furanosesquiterpenos com capacidade dissuasora [11, 15] que são, normalmente, armazenados
em glândulas dérmicas distribuídas no bordo do manto a que se dá o nome de mantal dermal
formations (MDF) [28, 29]. As MDF (figura 2) são estruturas globulares de tonalidade branca
opaca que estão embebidas no tecido conectivo subepidermal e são constituídas por células
vacuolares largas [30].
Figura 2 – MDF posteriores de H. cantabrica (indicados com a seta). Apesar de internos, estes órgãos
são visíveis devido à transparência do manto.
Uma vez que as MDF são órgãos internos e não abrem para o manto [29], o efeito
dissuasor das substâncias que acumula só se faz sentir quando o predador morde o
nudibrânquio e rompe as glândulas [30]. A distribuição das MDF é, portanto, essencial para a
sobrevivência dos Hypselodoris. Assim, as MDF estão posicionadas em torno de áreas vitais
para o organismo na parte anterior (protegendo a cabeça e os rinóforos) e na parte posterior
do indivíduo (salvaguardando as brânquias). A distribuição e o número de MDF varia de
espécie para espécie (estando mesmo ausentes em H. fontandraui), sendo que algumas
apenas os possuem na região posterior do corpo [29]. H. cantabrica Bouchet e Ortea, 1980, o
predador do par estudado neste trabalho, possui 7 MDF na região posterior do corpo e entre 3
e 4 na região anterior [30], conforme se pode ver na figura 3. A disposição das MDF no bordo do
manto e a cor amarela deste não são coincidência e está relacionada com o aspecto
aposemático. Em experiências com cromodorídeos de outro género, Glossodoris, cujo bordo
do manto também se destaca do resto do corpo, concluiu‐se que os peixes apresentam mais
atracção por um nudibrânquio sem bordo do manto do que por um com bordo do manto mas
sem MDF [31].
6
Figura 3 – Esquema representativo da distribuição das MDF em H. cantabrica. a – rinóforos; b – brânquias; c – MDF. Adaptado de Garcia‐Gomez et al. (1990) [30].
Embora no manto destes nudibrânquios os furanosesquiterpenos só se encontrem nas
MDF, Avila et al. (1991) identificaram‐nos também no muco segregado por Hypselodoris picta
e H. villafranca quando perturbados [32]. Assim, se apesar da sua coloração aposemática
(primeira linha de defesa [33]) os predadores se aproximassem destes animais seria segregado
um muco repelente (segunda linha de defesa) e se ainda assim os predadores mordessem os
indivíduos, rebentariam as MDF que libertariam directamente na sua boca compostos não‐
palatáveis (terceira linha de defesa)[32].
Os compostos dissuasores utilizados pelos nudibrânquios Hypselodoris spp. são
provenientes das suas presas, esponjas pertencentes ao género Dysidea, normalmente ricas
em furanosesquiterpenos [11]. Contudo, em laboratório, Fontana et al. (1994) verificaram que
H. picta também se alimentava de esponjas Pleraplysilla spinifera, igualmente ricas no mesmo
tipo de compostos. Estes dados apoiam a hipótese de Cimino e Sodano (1994), de que a
especialização alimentar dos nudibrânquios pode ser relativa e estar mais relacionada com a
disponibilidade dos compostos necessários à sua defesa do que da existência de determinada
espécie [12]. Porém, fora do laboratório, só se verificou o consumo de espécies de Dysidea sp.,
D. avara e D. fragilis. Esta última é tida como a presa de H. cantabrica [11, 21] e é um dos
objectos de estudo deste trabalho, merecendo por isso destaque.
Dysidea fragilis (Montagu, 1818) (figura 4) é uma esponja de superfície conulosa,
coberta por uma camada fina de pinacócitos e que possui fibras frágeis de espongina
enroladas em torno de resíduos externos (como areia, por exemplo) [34].
7
Figura 4 – Dysidea fragilis
Marin et al. (1998), verificaram que esta esponja emite um fluido defensivo
esbranquiçado quando perturbada, que é composto maioritariamente por células esféricas
com numerosas vesículas [34]. Estas células apresentam um complexo de Golgi e um retículo
endoplasmático rugoso bastante desenvolvidos, indicadores de produção e armazenamento
de materiais para secreção. Estes autores confirmaram a existência de furanosesquiterpenos
unicamente nessas células, sugerindo estarem aí compartimentados, e testaram‐nos
positivamente quanto à sua capacidade dissuasora [34].
Como noutras esponjas, existe uma variação geográfica dos compostos químicos de
Dysidea fragilis, sendo que esponjas de diferentes zonas apresentam diferentes tipos de
furanosesquiterpenos, como verificada por Molinski (1988) [35]. Como tal, é natural que
também consoante a área em que se encontram haja uma variação nos compostos dos
nudibrânquios que as sobre elas exercem predação. Fontana et al. (1993) verificaram esse
fenómeno em H. cantabrica de duas zonas do mar Cantábrico [36]. Do mesmo modo, diferentes
espécies de Hypselodoris que se alimentem da mesma esponja apresentam os mesmos
compostos [32] embora os possam apresentar em proporções diferentes [36].
Não é por mera curiosidade científica que tem havido tanto interesse pelas defesas
químicas dos nudibrânquios e das suas presas, mas pelas possíveis aplicações dos compostos
químicos descobertos. Estima‐se que 80% dos fármacos actualmente utilizados são ou têm por
base produtos naturais, a maioria deles de origem terrestre, já que, fruto do desenvolvimento
tecnológico (especialmente no campo do mergulho) só na segunda metade do século XX houve
capacidade para uma maior e melhor exploração do meio marinho [37]. Os produtos daí obtidos
têm grandes potencialidades de aplicação no campo da medicina, mas também da cosmética [38] e da indústria (por exemplo, a actividade anti‐incrustante de compostos de Dysidea spp. [39]). A revisão feita por Blunt et al. (2009) [40] permite perceber que desde a década de setenta
8
se tem registado um aumento muito significativo na descoberta de novos compostos
derivados de produtos marinhos (figura 5).
.
Figura 5 ‐ Média de compostos descobertos por ano entre 1965 e 2007. O período entre 1965 e 2005
está agrupado de 5 em 5 anos. Adaptado de Blunt et al. 2009[40]
Os mesmos autores indicaram também que o Atlântico oriental tem sido das zonas menos
produtivas no que concerne à identificação de novos compostos e que os animais
pertencentes ao filo Porífera têm sido a maior fonte de produtos naturais. Já os moluscos,
dentre os quais os opistobrânquios são o grupo quimicamente mais estudado [41], são neste
aspecto menos relevantes. Contudo, é conveniente referir que um dos mais poderosos
compostos anti‐cancerígenos conhecidos é a dolastatina‐10, composto isolado do
opistobrânquio Dolabella auricularia, muito embora, como todos os outros produtos de
origem marinha, ainda não tenha passado a fase de ensaios clínicos [42]. Nas esponjas da ordem
Dysidea têm também sido encontrados compostos bioactivos com potencialidade terapêutica,
como o furanosesquiterpeno avarol (proveniente de D. avara) que tem propriedades anti‐
tumorais [43].
As defesas químicas do par predador‐presa Hypselodoris cantabrica e Dysidea fragilis
nunca foram comparadas. Será então objectivo deste estudo fazê‐lo, usando para tal
exemplares do estuário do Sado e da Ria Formosa, duas áreas da costa portuguesa. Procurar‐
se‐á perceber se há diferenças ao nível da capacidade dissuasora entre predador e presa e se
esta é afectada por possíveis variações geográficas de compostos defensivos. Isto será feito
testando a palatabilidade dos extractos brutos, sendo que em Hypselodoris cantabrica, até
agora, só foram testados compostos puros [36].
Tendo em conta a literatura, exemplares de Hypselodoris cantabrica e Dysidea fragilis
da costa portuguesa nunca foram analisados do ponto de vista químico. Assim, considerando‐
9
se a variação geográfica dos compostos e a pouca exploração química do Atlântico Oriental,
este tipo de investigação, mesmo que direccionada para a ecologia, poderá abrir novas
perspectivas num futuro próximo.
10
2. Materiais e métodos
2.1. Recolha de exemplares
Para a realização deste estudo foram recolhidos exemplares do nudibrânquio Hypselodoris
cantabrica e da esponja Dysidea fragilis, entre os 5 e os 9 metros de profundidade, em
mergulho com escafandro autónomo.
As recolhas foram feitas entre Abril e Junho (época de reprodução e, consequentemente,
de maior proliferação de nudibrânquios) de 2009, na embocadura da Ria Formosa, junto à Ilha
do Farol (36°58’N 7°52’W), e na embocadura do estuário do Sado, na rampa da Secil (38°30’N
8°55’W). Em ambas as áreas existe um forte movimento de correntes, o que faz delas zonas
propícias a organismos filtradores, como as esponjas.
Procurou‐se, sempre que possível, capturar pares predador‐presa (ou grupos predador‐
presa, quando havia mais que um predador a alimentar‐se da mesma presa), ou seja,
nudibrânquios e as esponjas de que se estivessem a alimentar. Os animais recolhidos foram
mantidos em água do mar até serem congelados em laboratório. De modo a facilitar os
procedimentos de extracção, os exemplares de Hypselodoris cantabrica foram congelados em
água do mar, evitando assim uma reacção de stress que levaria não só a uma libertação de
muco, possivelmente com químicos dissuasores como também a um enrolamento do animal.
Na rampa da Secil (Fig. 6A) recolheram‐se 4 grupos predador‐presa, num total de 4 exemplares
de Dysidea fragilis e 8 exemplares de Hypselodoris cantabrica.
Na Ria Formosa foram recolhidos 11 grupos predador‐presa (Fig.6B), num total de 11
exemplares de Dysidea fragilis e 14 exemplares de Hypselodoris cantabrica. Foram ainda
capturados 11 nudibrânquios sem esponja associada.
Figura 6 – Pares predador‐presa H. cantabrica e D. fragilis de Setúbal (A) e da Ria Formosa (B).
11
2.2. Extracção química
2.2.1. Extracção dos químicos de Dysidea fragilis
Em laboratório, mediu‐se a massa e volume de cada um dos exemplares de Dysidea
fragilis, após se ter retirado os organismos epífitos existentes.
Cada esponja foi depois cortada em pedaços e submersa em acetona, para ser exposta
a ultra‐sons durante 10 minutos, sendo o extracto de acetona filtrado para um balão após este
período de tempo. Este procedimento foi repetido 2 vezes para cada exemplar.
A solução final obtida, o extracto de acetona de cada uma das esponjas, foi levada ao
evaporador rotativo, a uma temperatura de 30ºC, até ser evaporada toda a acetona e na
solução restar apenas, para além dos químicos, a água existente na esponja. Uma vez que os
compostos em estudo são muito voláteis e facilmente degradáveis, não era plausível evaporar
a água, pelo que foi então adicionado éter etílico para extrair os compostos químicos em
solução. Porque o éter etílico é imiscível com a água, da sua adição resultou a formação de
duas fases (a fase aquosa e a fase de éter), tendo sido estas separadas por extracção
líquido/líquido. De seguida, a fase de éter foi ainda filtrada por uma pipeta com algodão e
sulfato de magnésio anidro, para garantir a remoção da água. Após este procedimento,
evaporou‐se o éter, obtendo‐se desta forma o extracto bruto da esponja, cuja massa foi
medida, de forma a calcular‐se a concentração natural (massa/volume) do extracto. Através do
teste de Mann‐Whitney, e considerando‐se um nível de significância de 0,05, testou‐se a
existência de diferenças significativas nas concentrações naturais obtidas das amostras dos
dois locais de estudo.
2.2.2. Extracção dos químicos de Hypselodoris cantabrica
Uma vez que os químicos de defesa do nudibrânquio Hypselodoris cantabrica se
encontram essencialmente no manto, destacou‐se este órgão dos animais congelados (figura
7), tendo sido medido a sua massa e volume.
Todo o procedimento de extracção subsequente, bem como os cálculos da
concentração natural e a aferição de diferenças significativas, foi análogo ao realizado para os
exemplares de Dysidea fragilis.
12
Figura 7 – Parte exterior (A) e interior (B) do manto de Hypselodoris cantabrica.
2.3. Análise dos extractos
Para todos os extractos obtidos, foram efectuadas cromatografias de camada fina (TLC
– thin layer chromatography) e cromatografias gasosas (GC – gasose cromatography).
Realizaram‐se ainda espectros de ressonância magnética nuclear de protão (1HNMR – nuclear
magnetic resonance) para alguns extractos de D. fragilis e H. cantabrica.
As TLC realizaram‐se dissolvendo‐se os extractos em acetona e utilizando como
eluentes éter de petróleo (menos polar) e uma mistura de éter de petróleo e éter etílico na
razão de 1:1 (mais polar). Foram usadas placas de TLC de alumínio com sílica‐gel Merck 60 F254.
Após a eluição, as placas de TLC foram visualizadas por irradiação de luz U.V. (λ=254 nm) e
reveladas por pulverização de 4‐dimetilaminobenzaldaído em ácido clorídrico concentrado e
etanol (reagente de Ehrlich)[44] seguida de aquecimento numa placa a 100 °C. Esta técnica de
revelação permite identificar a presença de compostos que tenham na sua estrutura anéis
furano pelo aparecimento nas placas de manchas de cor rosa e/ou azulada.
Os cromatogramas de GC foram obtidos através dum aparelho GC Agilent
Technologies série 7683‐B [68]. Os extractos foram dissolvidos em n‐hexano e preparados a
concentrações de 1 mgmL‐1 e 3 mgmL‐1. Foi utilizada uma coluna DB‐1 (30 m x 0,32 mm; 0,25
µm de espessura de filme), com um fluxo de hélio de 1 mLmin‐1. O programa de temperatura
do forno consistiu em 5 minutos a 70 °C, subindo depois 5 °Cmin‐1 até aos 150 °C onde se
mantinha 5 minutos antes de se iniciar nova subida (15 °Cmin‐1) até chegar aos 320 °C,
patamar em que ficava durante 20 minutos. A temperatura no detector e no injector foi de
320 °C.
Os espectros de 1H‐NMR foram registados num espectrofotómetro Bruker AMX 300,
que opera a 300 MHz para protão. O solvente utilizado foi o benzeno e como padrão interno
utilizou‐se o tetrametilsilano.
13
2.4. Testes de palatabilidade
2.4.1. Preparação das pellets
Para realizar os testes de palatabilidade adaptou‐se o protocolo de Mollo et al.
(2008)[45].
Neste trabalho, as comidas de teste (pellets) foram preparadas utilizando‐se 10 mg de
manto de lula liofilizado, 6 mg de alginato (para gelificar a comida) e 6 mg de areia do mar
purificada com tamanho do grão entre 0,1 mm e 0,3 mm (para que a pellet não flutuasse
quando apresentada aos animais). A esta mistura era adicionado o extracto químico, dissolvido
em acetona, na quantidade necessária para a concentração final desejada. Esta mistura era,
em seguida, levada a um exsicador, de modo a evaporar a acetona. Acrescentava‐se depois
uma gota de corante alimentar vermelho (para facilitar a identificação do consumo das pellets)
e água destilada de modo a perfazer um volume final de 0,2 mL. A solução obtida era
homogeneizada e, seguidamente, colocada numa seringa de 1,0 mL. O conteúdo da seringa era
então despejado, como um fio, para uma solução de cloreto de cálcio 0,25 M, na qual ficava
banhado durante dois minutos, para enrijecer (figura 8). Eram depois cortadas 10 pellets de
aproximadamente 0,4 cm cada.
A comida de controlo foi preparada do mesmo modo, mas colocando‐se acetona pura,
em vez do extracto químico dos animais.
Figura 8 – Preparação de pellets. A comida “fabricada” é despejada para uma solução de CaCl2 para
enrijecer.
2.4.2. Realização dos testes de palatabilidade
Para a realização dos testes de palatabilidade, foram capturados camarões da espécie
Palaemon elegans, na zona intermareal do Cabo Raso (38º42’31’’N 9º22’10’’W). Estes
14
camarões foram mantidos em laboratório, individualizados em copos com 300mL de água do
mar. Para se habituarem à comida artificial (numa tentativa de reduzir enviesamentos de
resultados), após um dia de jejum foi‐lhes apresentada, uma vez por dia durante 3 dias, uma
pellet semelhante às utilizadas como controlo. Os testes foram realizados ao quarto dia. Para
cada teste foram escolhidos aleatoriamente 10 camarões, que funcionaram como replicados,
aos quais era apresentada uma pellet. Considerou‐se como aceitação do alimento o consumo
total da pellet ao fim de um período máximo de 30 minutos (figura 9). As diferenças no
consumo das pellets nas experiências foram avaliadas através do teste do Qui‐quadrado,
considerando‐se um nível de significância de 0,05.
As concentrações dos extractos das esponjas utilizadas nos testes foram definidas em
função das concentrações naturais obtidas. Assim, para os testes realizados com o extracto
bruto dos exemplares de Dysidea fragilis de Setúbal, foram utilizadas concentrações de 0,5
mgmL‐1, 2,0 mgmL‐1, 4,0 mgmL‐1, 6,0 mgmL‐1, 8,6 mgmL‐1 e 10,0 mgmL‐1, as mesmas utilizadas
para os extractos da esponja da Ria Formosa, exceptuando 0,5 mgmL‐1. Os extractos dos
exemplares de Hypselodoris cantabrica da Ria Formosa e de Setúbal foram testados a
concentrações de 0,3 mgmL‐1, 0,5 mgmL‐1, 1,0 mgmL‐1, 1,5 mgmL‐1 e 2,0 mgmL‐1.
Com base nos resultados obtidos, foram construídas rectas de regressão para a relação
entre a concentração dos extractos e a taxa de rejeição das pellets, tendo sido para tal
logaritmizados os valores da concentração, utilizando log10 (concentração+1). As diferenças
entre as rectas de regressão foram testadas com recurso ao teste t de Student para
comparação de declives de recta [46], com um nível de significância de 0,05.
Figura 9 – Camarão que não consumiu (A) e que consumiu (B) a comida apresentada. A coloração das
pellets possibilitou uma percepção mais simples de quais os animais que as ingeriam, pela cor
vermelha na base do cefalotórax.
15
3. Resultados
3.1. Concentrações naturais dos extractos brutos
Os exemplares de Dysidea fragilis recolhidos em Setúbal apresentaram concentrações
entre os 0,48 mgmL‐1 e os 8,60 mgmL‐1 e uma média de 3,86 mgmL‐1. Já para as esponjas
algarvias obtiveram‐se valores entre 1,45 mgmL‐1 e 6,10 mgmL‐1, com uma média de 2,87
mgmL‐1 (Fig. 10 A).
Para os nudibrânquios, a amplitude de valores de concentração foi maior. Os
exemplares recolhidos na rampa da Secil apresentaram concentrações de extracto bruto entre
os 9,50 mgmL‐1 e os 42,00 mgmL‐1, com uma média de 22,07 mgmL‐1, enquanto para os da Ria
Formosa foram calculados valores entre os 8,70 mgmL‐1 e os 74,00 mgmL‐1, com uma média de
34,28 mgmL‐1 (figura 10 B).
Na comparação entre as concentrações naturais de extractos brutos das amostras de
Setúbal e da Ria Formosa, não foram encontradas diferenças significativas quer entre as
esponjas quer entre os nudibrânquios (U=16, p >0,05, U=66, p >0,05).
Figura 10 – Boxplot das concentrações naturais dos extractos brutos das amostras de Dysidea fragilis (A) e Hypselodoris cantabrica (B).
3.2. Análise dos Extractos
3.2.1. TLC
A revelação das placas de TLC com reagente de Ehrlich, permitiu identificar a existência
de compostos com anéis furano em todos os extractos de esponjas e nudibrânquios.
16
Nas TLC dos extractos dos animais eluídas em éter de petróleo, as esponjas
apresentaram manchas inexistentes nos nudibrânquios (figura 11 A1, 11 B1). Em todas as TLC
eluídas com a solução de éter de petróleo e éter etílico (1:1) (figura 11 A2, 11 B2), verificou‐se
nas esponjas também um maior número de manchas que nos nudibrânquios, o que indica uma
maior diversidade de compostos furanosesquiterpenos. Com este eluente, mais polar, foram
também detectados compostos por irradiação de luz U.V., mas apenas nas esponjas.
Figura 11 – TLC de extractos brutos de Dysidea fragilis e Hypselodoris cantabrica de Setúbal (A) e da
Ria Formosa (B), reveladas com reagente de Ehrlich e eluídas em éter de petróleo (A1 e B1) e em éter
de petróleo e éter etílico 1:1 (A2 e B2). Os tracejados indicam compostos visualizados por irradiação
de luz U.V. (λ=240 nm).
3.2.2. 1H‐NMR
Foi possível identificar, para os extractos químicos de D. fragilis e H. cantabrica, um
conjunto de sinais no espectro de ressonância magnética nuclear entre 5,5 e 7,5 ppm,
atribuíveis a diferentes compostos furanosesquiterpenos, já que esta zona do espectro é
característica dos protões de anéis furano. No entanto, não foi possível, com base na literatura
identificar qualquer composto. Na figura 12 é possível observar‐se os espectros de 1HNMR de
uma esponja (fig. 12 A) e de um nudibrânquio (fig. 12 B), ambos da Ria Formosa.
17
Figura 12 – Espectros de 1HNMR de Dysidea fragilis (A) e Hypselodoris cantabrica (B) da Ria Formosa. Os sinais entre 5,5 e 7,5 ppm são característicos de furanosesquiterpenos.
3.2.3. GC
A realização de cromatografias gasosas permitiu perceber a existência de vários
compostos nas esponjas e nudibrânquios (identificados através de picos nos cromatogramas)
correspondentes aos furanosesquiterpenos detectados nas TLC.
Todos os exemplares de Dysidea fragilis da rampa da Secil apresentaram
cromatogramas semelhantes (figura 13 A1), estando o composto com tempo de retenção de
≈28,4 minutos (composto A) presente em maior concentração (composto maioritário).
No que concerne aos GC das esponjas da Ria Formosa, dois exemplares perderam os
compostos ao longo do processo de extracção e 3 exemplares apresentaram cromatogramas
com diferentes compostos maioritários. Todos os outros espécimes apresentaram
cromatogramas semelhantes e com o composto com tempo de retenção ≈27,0 minutos
(composto B) como composto maioritário (Figura 13 B1).
À excepção de um exemplar, os nudibrânquios recolhidos em Setúbal apresentaram
cromatogramas semelhantes, com dois compostos maioritários, o composto A e o composto B
(Figura 13 A2).
Dos exemplares de Hypselodoris cantabrica da Ria Formosa apenas dois não
apresentaram cromatogramas com o composto B como composto maioritário, tendo todos os
outros cromatogramas semelhantes (figura 13 B2).
É relevante referir que, embora não maioritário, o composto A também foi encontrado
nas esponjas e nudibrânquios da Ria Formosa. De igual modo, os extractos de Dysidea fragilis
de Setúbal também continham o composto B.
Na análise dos cromatogramas de GC, não foram encontrados compostos nos
nudibrânquios que não tivessem correspondência nas esponjas. Como a figura 13 permite
18
verificar, nudibrânquios e esponjas apresentaram picos no GC em regiões semelhantes
(embora com intensidades diferentes), o que permite perceber a existência dos mesmos
compostos furanosesquiterpenos em H. cantabrica e D. fragilis, embora em diferentes
percentagens relativas.
Figura 13 – Cromatogramas de GC de Dysidea fragilis (A1 e B1) e de Hypselodoris cantabrica (A2 e B2) de Setúbal (A) e da Ria Formosa (B).
3.3. Testes de palatabilidade
Para todos os extractos testados, a um aumento da sua concentração nas pellets
correspondeu um aumento da rejeição das mesmas por parte dos camarões.
No que concerne aos testes efectuados com o extracto bruto de Dysidea fragilis de
Setúbal, registou‐se uma rejeição significativa para concentrações a partir dos 4 mgmL‐1
19
(χ2=0,0191, p <0,05), sendo que foi obtida uma taxa de rejeição de 100% para uma
concentração de 10 mgmL‐1.
Nos testes realizados com o extracto bruto de esponjas recolhidas na Ria Formosa
obteve‐se resultados significativos para concentrações a partir dos 6 mgmL‐1 (χ2=0,0003, p
<0,05), sendo que com uma concentração de 8 mgmL‐1 se obteve uma rejeição total da comida
de teste.
Ao testar‐se os extractos provenientes dos nudibrânquios de Setúbal, obteve‐se taxas
de rejeição significativas para concentrações desde 0,5 mgmL‐1 (χ2=0,0191, p <0,05), sendo que
se obteve uma rejeição total com uma concentração de 2,0 mgmL‐1.
O teste de extractos brutos de H. cantabrica da Ria Formosa revelou também uma
rejeição significativa das pellets para concentrações a partir dos 0,5 mgmL‐1 (χ2=0,0062, p
<0,05), obtendo‐se uma rejeição total ao apresentar‐se pellets com extracto numa
concentração de 1,5 mgmL‐1.
As curvas‐resposta da figura 14 traduzem o efeito dissuasor de diferentes
concentrações dos extractos de Dysidea fragilis e Hypselodoris cantabrica de ambas as regiões
de recolha.
Figura 14 ‐ Curva‐resposta do efeito dissuasor dos extractos brutos de D. fragilis (A) e H. cantabrica (B) de Setúbal e da Ria Formosa em Palaemon elegans. Dez camarões aleatoriamente escolhidos foram testados para cada concentração. Diferenças entre o controlo (concentração do extracto = 0) e tratamentos foram testadas com recurso ao teste do Qui‐quadrado e estão assinaladas por pontos (• P < 0,05).
Através da aplicação do teste t de Student para identificar diferenças nos declives das
rectas de regressão dos testes de palatabilidade, concluiu‐se não existir diferenças
significativas nem entre esponjas nem entre nudibrânquios de Setúbal e da Ria Formosa (t=‐
0,57, p> 0,05; t=‐1,43, p> 0,05).
20
4. Discussão
Antes de se avançar na discussão deste trabalho, alguns aspectos metodológicos
merecem ser considerados.
O primeiro prende‐se com o tamanho da amostragem. O número de amostras das duas
áreas foi muito díspar, tendo sido recolhidos mais exemplares de esponjas e, especialmente,
de nudibrânquios no Algarve do que em Setúbal. Isso deveu‐se, em parte, à grande
abundância de D. fragilis e, consequentemente, do seu predador H. cantabrica, na
embocadura da Ria Formosa. Nos mergulhos aí efectuados não foi sequer encontrada
qualquer outra espécie de porífero. Já em Setúbal, a abundância do par predador‐presa era
muito baixa, tendo sido até encontradas outras esponjas, como Cliona celata. Porém, os
exemplares de Hypselodoris de Setúbal eram maiores e a quantidade extracto bruto obtido era
também maior. Isto está de acordo com Fontana et al. (1993), que sugeriram haver uma
relação directa entre a quantidade de metabolitos e o tamanho do animal [36], uma vez que o
nudibrânquio vai progressivamente acumulando mais compostos. Assim, para se obter massa
de extractos suficiente para o trabalho, foi necessário recolher‐se mais indivíduos do Algarve.
Será também importante referir o porquê de se ter extraído o manto dos Hypselodoris.
Extrair a totalidade do organismo não faria muito sentido, já que o manto é a área mais
exposta aos predadores e é nele que se encontram os furanosesquiterpenos dissuasores.
Contudo, como foi referido na introdução deste trabalho, estes encontram‐se armazenados
em locais específicos no bordo do manto: as MDF. No entanto, destacar de Hypselodoris
cantabrica congelados o bordo do manto ou as MDF sem serem danificados e sem perder
compostos é uma tarefa complicada, daí que se tenha optado por fazer a extracção de todo o
manto, conservando‐se os compostos.
No que concerne à análise química, convém referir que os resultados não foram
inteiramente homogéneos, ou seja, nem todos os extractos apresentaram os mesmos
compostos maioritários. Contudo, esses desvios foram muito pontuais e por isso, e porque a
massa desses extractos era bastante reduzida, não foram considerados nos testes de
palatabilidade.
Há também algumas considerações a fazer aos testes de palatabilidade. A
metodologia seguida neste projecto foi uma adaptação da utilizada por Mollo et al. (2008) [45]que, por sua vez, foi baseada no trabalho de Pawlik et al. (1995) [47]. A principal alteração
feita, fruto da aferição experimental prévia, foi no tempo de jejum dos camarões. Este teve de
21
ser reduzido uma vez que, após os 3 dias de jejum propostos por Mollo et al., os camarões
tornavam‐se bastante vorazes, comendo imediatamente todo o controlo. Ora, uma das
preocupações nestes testes era precisamente que houvesse alguma rejeição (baixa) da comida
de controlo. Não se pretendia que a comida fosse demasiado boa nem que os camarões
tivessem demasiada fome, por forma a que o potencial efeito dissuasor dos extractos não
fosse mascarado.
Como complemento a estes testes, poderiam ter sido realizados testes no habitat dos
organismos em estudo, apresentando‐se a comida tratada a predadores (conhecidos ou
potenciais) dos animais. No entanto, este tipo de experimentação exige mais tempo e uma
logística mais complexa, para além de que, no Atlântico Nordeste, não há muitos predadores
de nudibrânquios e esponjas conhecidos [6, 7, 23]. Embora este tipo de testes não seja
necessariamente melhor que os testes de laboratório, poderão ser, contudo, um complemento
no desenvolvimento futuro deste estudo.
O predador utilizado nos testes, Palaemon elegans, é um predador generalista (que se
sabe poder comer moluscos) de fácil recolha e manutenção em laboratório, exigindo uma
logística mais simples que, por exemplo, peixes. Embora não haja relatos deste animal exercer
predação sobre nudibrânquios, sabe‐se que os crustáceos são dos seus poucos predadores [48]
e que, em águas temperadas, são também dos poucos animais a alimentarem‐se de esponjas [23]. De qualquer forma, para este trabalho não interessava utilizar um animal especializado
nestes nudibrânquios ou nas esponjas, uma vez que conseguiria contornar as suas defesas
químicas.
Ainda em relação aos testes de palatabilidade, é importante justificar a escolha dos
valores de concentração para os testes com os extractos de nudibrânquios. Testes
preliminares com as concentrações naturais mais baixas resultaram em rejeição total das
pellets. Foi‐se testando concentrações cada vez mais reduzidas, de modo a conseguir obter‐se,
nalgum ponto, alguma aceitação das pellets. Tal só foi alcançado com concentrações de 1,5
mgmL‐1 para os extractos de H. cantabrica de Setúbal e 1 mgmL‐1 para os extractos dos
opistobrânquios provenientes da Ria Formosa, que representam menos de 20% das
concentrações mínimas naturais calculadas.
No cerne deste trabalho estava a comparação das defesas químicas do par predador‐
presa Hypselodoris cantabrica e Dysidea fragilis. A análise química dos extractos destes
animais comprovou a existência de compostos furanosesquiterpenos, descritos na literatura
como os compostos dissuasores característicos destas espécies [34, 36]. A análise por GC e TLC
22
confirmou que os compostos detectados nos extractos dos nudibrânquios se encontram
presentes também na esponja, de onde se comprova a proveniência alimentar das defesas
químicas de Hypselodoris cantabrica, conforme referido por outros autores [11]. Estas
metodologias permitiram também detectar uma maior diversidade de compostos nas
esponjas, o que parece sugerir uma retenção selectiva de compostos.
Verificou‐se que os extractos brutos existiam em maior concentração nos nudibrânquios
do que nas esponjas, o que parece ser um indicador de uma maior capacidade defensiva dos
predadores que, progressivamente, acumulam compostos nas MDF à medida que se
alimentam de D. fragilis [28, 30]. Contudo, de acordo com alguns autores, a esponja em estudo
liberta um fluido com compostos dissuasores quando perturbada [34]. Assim, durante o
processo de recolha das esponjas, é possível que tenha sido emitido algum fluido, o que iria
diminuir a concentração do extracto destes animais. Porém, não é possível aferir em que
quantidade os químicos terão sido libertados, nem tão pouco se tal fenómeno ocorreu, já que
tal não foi evidente nos mergulhos de recolha. As diferenças na concentração do extracto
bruto têm por isso de ser consideradas com reserva quando utilizadas como indicador de uma
maior capacidade dissuasora dos nudibrânquios.
No entanto, os testes de palatabilidade confirmaram que os extractos dos
nudibrânquios são mais dissuasores que os extractos das esponjas, já que se obtiveram
rejeições significativas com concentrações bastante inferiores. Ora, sendo os
furanosesquiterpenos detectados em H. cantabrica idênticos (e provenientes) aos detectados
em D. fragilis, como se explica esta maior capacidade dissuasora? Provavelmente, dada a
capacidade do nudibrânquio de reter metabolitos selectivamente, os compostos dissuasores
maioritários estão em maior concentração em H. cantabrica do que em D. fragilis. Porém, para
comprovar esta teoria será necessário quantificar os compostos existentes nos extractos. É
necessário ter também em conta o maior número de compostos existentes nas esponjas e a
possibilidade de haver interacções entre eles que diminuam a capacidade dissuasora.
Ecologicamente, o facto de H. cantabrica estar melhor protegido que D. fragilis deverá
significar uma maior pressão predatória sobre os nudibrânquios (pelo menos nalgum
momento da sua história evolutiva). Estudos com esponjas [49] e nudibrânquios [50] em que
foram testados alimentos de diferente valor energético com os mesmos químicos defensivos,
parecem indicar que a baixa qualidade nutricional pode funcionar com um factor de dissuasão.
Uriz et al. (1996), comparando duas esponjas simpátricas quimicamente defendidas, concluiu
que a de maior valor energético estava mais protegida [51]. Assim, o menor valor nutricional de
23
D. fragilis pode explicar a sua menor capacidade defensiva, quando comparada com H.
cantabrica, que possui o mesmo tipo de compostos dissuasores.
A comparação inter‐geográfica das defesas químicas destes animais foi outro dos
objectivos deste trabalho. No que respeita às concentrações dos extractos brutos, não foram
encontradas diferenças significativas quer entre nudibrânquios quer entre esponjas de locais
distintos, o que aponta para uma capacidade dissuasora semelhante. Os testes de
palatabilidade confirmaram isso mesmo, não tendo sido encontradas diferenças significativas
na capacidade de dissuasão quer de nudibrânquios quer de esponjas de regiões distintas. No
entanto, a análise química revelou diferenças nos compostos maioritários entre os pares
predador‐presa das duas áreas em estudo, o que era expectável, dada a variação geográfica
existente nos compostos de esponjas e nudibrânquios já referida por diversos autores [35, 36].
Daqui se depreende que, em termos de funções defensivas, os compostos maioritários
identificados (A e B) têm a mesma eficácia ecológica. Convém, contudo, particularizar o caso
do par predador‐presa de Setúbal. Enquanto no par da Ria Formosa o composto existente em
maior concentração na esponja (composto B) era também o composto maioritário do
nudibrânquio, em Setúbal H. cantabrica apresentou dois compostos maioritários (A e B), ao
passo que D. fragilis apresentou apenas o composto A em maior concentração. Uma vez que o
composto B também foi identificado nas esponjas de Setúbal, este fenómeno pode ser
atribuído à retenção selectiva de compostos por parte do nudibrânquio, que pode armazenar
nas MDF o composto B em concentrações diferentes das disponíveis no meio, como foi
verificado por Fontana et al. (1993) [36]. No entanto, alguns autores sugerem que a
especialização dos nudibrânquios não é necessariamente numa presa, mas no composto que
ela produz [12]. Logo, não pode ser excluída a hipótese de H. cantabrica exercer predação, em
Setúbal, sobre outra esponja em que o composto A esteja em maior concentração. Esta
hipótese é meramente especulativa e, para se comprovar, seria necessário não só fazer
extracções das diversas esponjas encontradas na mesma área como também observar H.
cantabrica a alimentar‐se de outro organismo que não D. fragilis, algo que nunca foi
observado nos vários mergulhos que aí se têm realizado nos últimos anos (comunicação
pessoal de Gonçalo Calado). Se se tiver em conta que extractos de esponja com o composto A
como maioritário foram tão dissuasores como extractos de esponja com o composto B, poder‐
se‐á sugerir que esses compostos tenham propriedades defensivas semelhantes. Então,
porque é que H. cantabrica de Setúbal reteve o composto B numa concentração superior à
existente na esponja? É possível que o papel deste composto vá além de questões de
protecção uma vez que, como Cimino e Sodano (1994) referiram, os metabolitos secundários
24
provenientes de esponjas podem desempenhar outras funções ecológicas além da defesa,
como a reprodução ou desenvolvimento [12]. Poderá também dar‐se o caso de o nudibrânquio
ter, simplesmente, maior facilidade na retenção do composto B. É possível que no decurso da
evolução desta espécie o composto B tenha sido a principal defesa química disponível no
meio, pelo que o nudibrânquio teria desenvolvido formas de o captar melhor. No entanto,
alguns autores sugerem que as MDF teriam surgido como forma de excretar compostos
nocivos ao organismo dos nudibrânquios [28]. O composto B poderia então, inicialmente, ser
um metabolito da esponja muito tóxico para H. cantabrica que, como tal, era necessário
excretar muito eficientemente. A sua utilização enquanto dissuasor poderia então ter sido um
bycatch, como sugerido, o que vai ao encontro do que Cimino e Ghiselin (2001) sugeriram [15].
Embora as defesas químicas dos nudibrânquios tenham sido objecto de diversos estudos
e a origem alimentar dos seus compostos dissuasores uma questão que tem sido amplamente
debatida, a verdade é que foram poucos os que compararam as defesas químicas de pares
predador‐presa. Quando estudadas quanto à sua capacidade dissuasora, as defesas químicas
têm sido, quase sempre, tratadas em termos de metabolitos isolados, como o fizeram Cimino
et al. (1982) [52] e Fontana et al. (1993) [36], por exemplo. Contudo, duma perspectiva ecológica,
faz sentido olhar a globalidade e perceber que, mais que o papel de determinado composto, o
efeito total do extracto pode acabar por ser o mais relevante. Porém, de um ponto de vista de
aplicabilidade de produtos naturais, é mais útil isolar e estudar compostos do que perceber o
papel do todo no meio natural.
As perspectivas futuras que poderão ser seguidas no decurso deste trabalho, numa
primeira fase, passarão por tentar isolar e identificar os compostos dissuasores dos
organismos em estudo. Poderão então realizar‐se testes de palatabilidade apenas com os
metabolitos, de modo a aferir a sua capacidade dissuasora. Posteriormente, estes compostos
poderão ser testados quanto a outras actividades biológicas, tentando perceber‐se outras
funções ecológicas mas, também, potenciais aplicações em áreas como a medicina.
As guerras químicas não são uma inovação recente nem um exclusivo do ser humano.
Na natureza, a Selecção Natural, tem‐se encarregado de armar os organismos com tecnologia
de ponta que é rapidamente ultrapassada. Numa verdadeira e fascinante corrida ao
armamento em que invertebrados sésseis e lesmas marinhas são os protagonistas, poderá ser
possível continuar a descortinar, além dos mecanismos extraordinários da evolução, produtos
úteis para o homem.
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