universidade de sÃo paulo faculdade de ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os...

335
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE LETRAS CLÁSSICAS E VERNÁCULAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LITERATURA PORTUGUESA RODRIGO GOMES DE OLIVEIRA PINTO Doutrina do misto e anatomia do monstro: usos da retórica de Hermógenes entre os séculos XVI e XVIII São Paulo 2015

Upload: others

Post on 02-Nov-2020

5 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras

UNIVERSIDADE DE SAtildeO PAULO

FACULDADE DE FILOSOFIA LETRAS E CIEcircNCIAS HUMANAS

DEPARTAMENTO DE LETRAS CLAacuteSSICAS E VERNAacuteCULAS

PROGRAMA DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM LITERATURA PORTUGUESA

RODRIGO GOMES DE OLIVEIRA PINTO

Doutrina do misto e anatomia do monstro

usos da retoacuterica de Hermoacutegenes entre os seacuteculos XVI e XVIII

Satildeo Paulo

2015

2

UNIVERSIDADE DE SAtildeO PAULO

FACULDADE DE FILOSOFIA LETRAS E CIEcircNCIAS HUMANAS

DEPARTAMENTO DE LETRAS CLAacuteSSICAS E VERNAacuteCULAS

PROGRAMA DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM LITERATURA PORTUGUESA

Doutrina do misto e anatomia do monstro

usos da retoacuterica de Hermoacutegenes entre os seacuteculos XVI e XVIII

Rodrigo Gomes de Oliveira Pinto

Tese apresentada ao Departamento de

Letras Claacutessicas e Vernaacuteculas da

Faculdade de Filosofia Letras e Ciecircncias

Humanas da Universidade de Satildeo Paulo

para a obtenccedilatildeo do tiacutetulo de doutor

Orientadora Profordf Drordf Adma Fadul Muhana

Satildeo Paulo

2015

3

RESUMO

A presenccedila preceptiva da doutrina retoacuterica das ideai de estilo tal como reguladas pelo

retor grego Hermoacutegenes registra-se em terras italianas portuguesas e espanholas entre

os seacuteculos XVI e XVIII Ora increve-se nos debates que opotildeem detratores e defensores

do gecircnero de poema misto Entre os autores presentes nestes debates estaacute Manuel de

Galhegos cujo proacutelogo epidiacutetico agrave Ulyssea ou Lisboa Edificada elogia a elocuccedilatildeo do

poema heroico de Gabriel Pereira de Castro com base no Peri ideōn e permite que se

discutam os diferentes usos de Hermoacutegenes entre tradutores comentadores e glosadores

desde tratado desde Jorge de Trebizonda Ademais Francisco Joseacute Freire conhecido

como Cacircndido Lusitano na Arte poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de

todas as suas especies principaes tratadas com juizo critico censura a tragicomeacutedia

como misto vicioso nem traacutegico nem cocircmico sem proporccedilatildeo e sem unidade Essa

censura da tragicomeacutedia atualiza argumentos atinentes agrave controveacutersia doutrinaacuteria que

remonta aos fins do seacuteculo XVI e iniacutecios do seacuteculo XVII a qual opotildee eruditos como

Giasone Denores e Giovanni Battista Guarini autor de Il Pastor Fido poema considerado

exemplar no gecircnero e legitimado pela doutrina atribuiacuteda a Hermoacutegenes

PALAVRAS-CHAVE Hermoacutegenes retoacuterica retores gregos e latinos poeacutetica gecircneros

de discurso

E-MAIL rodrigopinto75yahoocombr

4

ABSTRACT

The Hermogenesrsquo rhetorical theory of stylistic ideai became evident in Italy Portugal and

Spain during the 16th and 18th centuries This doctrine is related to debates among critics

and apologists for the mixed genres Among the authors involved in theses debates is

Manuel de Galhegos whose epideictic preface to Ulyssea ou Lisboa Edificada praises

this Gabriel Pereira de Castrorsquos heroic poem based on Peri ideōn and enable this thesis

to discuss the different uses of Hermogenes by translators commentators and glossers

since George of Trebizond Besides Francisco Joseacute Freire also known as Cacircndido

Lusitano on the Arte poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as

suas especies principaes tratadas com juizo critico blames tragicomedy as a vicious

mixture neither tragic nor comic without proportion or unity This blame reaffirms

arguments concerning to poetic controversies of the late sixteenth and early seventeenth

centuries which opposes scholars like Giasone Denores and Giovanni Battista Guarini

author of the Pastor Fido a poem that is known as an example in terms of Hermogenesrsquo

theory of a misture of ideai

5

AGRADECIMENTOS

Agrave Profordf Drordf Adma Fadul Muhana pela confianccedila pelo exemplo e pela lucidez

ante os desvarios

Ao Prof Dr Leon Kossovitch e ao Prof Dr Adriano Machado Ribeiro pelas

sugestotildees que desconfortam e pelas contribuiccedilotildees no Exame de Qualificaccedilatildeo

Ao Prof Dr Joatildeo Adolfo Hansen pela saacutetira e pelo engenho

Ao Prof Dr Adriano Scatolin pelas leituras de Ciacutecero

Agrave Fundaccedilatildeo Coordenaccedilatildeo de Aperfeiccediloamento de Pessoal de Niacutevel Superior

(CAPES) pela concessatildeo da bolsa de estudos que permitiu principiar esta tese

Aos meus pais

Agrave Priscila

6

Ao Francisco e ao Henrique

menino mais velho e menino mais novohellip

Ao Abel in memoriam

parceiro de grandes e pequenas histoacuterias

7

O Hermoacutegenes tinha voz que natildeo era fanhosa nem rouca mas assim

desgovernada desigual voz que se safava Assim ndash fantasia de dizer ndash o ser de

um irara com seu cheiro fedorendo

JOAtildeO GUIMARAtildeES ROSA

Grande Sertatildeo Veredas

8

IacuteNDICE DE FIGURAS

Figura 1 Frontispiacutecio de Ulyssea ou Lisboa Edificada (1636) 18

Figura 2 ldquoHermogenesrsquo Types and Subtypes of stylerdquo 43

Figura 3 ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo 44

Figura 4 LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia (1606) 45

Figura 5 Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene (1594) 46

Figura 6 ldquoDiscoro di M Giulio Camillo sopra Hermogenerdquo (1560) 47

Figura 7 Tabulae institutionum rhetoricarum Petri Johannis Nunnesii Valentini (1588)

61

Figura 8 Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices

(1569) 63

Figura 9 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima (1614) 65

Figura 10 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima (1614) 66

Figura 11 Dellrsquo Arte di predicar bene (1627) 68

Figura 12 LrsquoEthica drsquoAristotele (1550) 297

9

SUMAacuteRIO

PROacuteLOGO 10

DOUTRINA DO MISTO 16

ANATOMIA DO MONSTRO 201

EPIacuteLOGO 313

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 315

10

PROacuteLOGO

Vale principiar pela anedota Eacute lugar de benevolecircncia eacute ldquoficccedilatildeo de origemrdquo1

Cabe aqui mencionar o jovem Hermogenes natural de Tarso na Cilicia

que vivia no governo de M Antonio o qual teve a curiosidade de ir

ouvil-o na idade de 15 annos explicar os preceitos da rhetorica de um

modo digno dos maiores mestres aos 18 annos segundo se diz

publicou elle a sua rhetorica uma das melhores daquelles tempos

improvisava publicamente discursos que attrahiam aacute Tarso uma

multidatildeo de estrangeiros compocircz muitos tractados sobre a arte oratoria

porem seu genio prematuro desappareceu repentinamente perdendo

completamente a memoria aos 24 annos cahiu em uma inteira

imbecilidade e neste estado vivecircu longos annos cercado de

soffrimentos e opprimido da miseria 2

Eacute liccedilatildeo introdutoacuteria da Nova Rhetorica Brasileira de Antocircnio Marciano da Silva

Pontes (1836-1901) compecircndio impresso no Rio de Janeiro em 1860 sob os auspiacutecios

de D Pedro II para uso nas classes de Eloquecircncia Poeacutetica e Literatura Nacional no

Imperial Coleacutegio Fosse a vida de Antocircnio Vieira religioso de Santo Inaacutecio ensinaria natildeo

a desmemoacuteria a necedade e a ineacutepcia mas a iluminaccedilatildeo do estalo e a eloquecircncia da Graccedila

Avessos no epidiacutetico Lugares do gecircnero A vida de Hermoacutegenes de Tarso Antocircnio

Marciano da Silva conta-a em conformidade sobretudo com a Vida dos sofistas de

Filoacutestrato o Velho (ca seacutec II-III dC) Conta desaparecer o gecircnio do retor e desertar-lhe

os conhecimentos da arte diz o bioacutegrafo grego natildeo diz a Nova Rhetorica Brasileira

como palavras aladas tais as de Homero feito o prodiacutegio latinamente ldquointer pueros

1 Cf CASSIN B Jacques el sofista Lacan logos y psicoanaacutelisis Traduccioacuten de Irene Miriam Agoff

Buenos Aires Ediciones Manancial 2013 p 25 2 Nova Rhetorica Brasileira por Antonio Marciano da Silva Pontes secretaacuterio do governo da proviacutencia de

Minas-Geraes ex-membro do Conselho Diretor da Instruccedilatildeo Primaria e Secundaria do Municipio da Cocircrte

antigo professor de Eloquencia Poeacutetica e Litteratura Nacional nos Colegios ndash Marinho e Tautphoeus ndash etc

etc Obra aprovada pelo Conselho Director e adoptada para o Imperial Collegio de Pedro II Rio de Janeiro

aacute venda em Casa de E amp H Laemmert Rua da Quitanda 77 1860 p 4

11

senex amp inter senes puerrdquo ldquoentre crianccedilas velho amp entre velhos crianccedilardquo3

Eacute ficto muito proximamente o relato de Jerocircnimo Soares Barbosa (1737-1816)

professor de Eloquecircncia e Poesia da Universidade de Coimbra Nas Instituiccedilotildees oratorias

de M Fabio Quintiliano impressas em dois tomos datados de 1788 e de 1790 4 itera-se

menos a natureza e o pendor mais a arte natildeo a que abandona o haacutebil orador Hermoacutegenes

de Tarso senatildeo que a tratadiacutestica monumentum de que Filoacutestrato o Velho natildeo daacute notiacutecia

Hermogenes natural de Tarso na Cilicia vivia no governo de M Antonio

o qual teve a curiosidade de hir ouvir este moccedilo que na idade de 15

annos explicava os preceitos de Rhetorica de hum modo digno dos

maiores mestres De idade de 18 compoz a sua Rhetorica que he a

dizer a verdade a quinta essencia do bom senso Ella consta de hum

livro sobre os Estados e quatro da Invenccedilaotilde no I dos quaes trata dos

Exordios no 2 da narraccedilatildeo no 3 da Prova e no 4 do Ornato Alem

destes compoz mais dois livros sobre as differentes Idecircas ou Caracteres

do discurso5

Jerocircnimo Soares Barbosa atribui a Hermoacutegenes trecircs tratados de retoacuterica o

primeiro contempla ldquohum livro sobre os Estadosrdquo o segundo ldquoquatro [livros] da

Invenccedilaotilderdquo e o terceiro ldquodois livros sobre as differentes Idecircasrdquo Sabe-se faz-se menccedilatildeo

em primeiro lugar ao Peri staseōn obra de preceituaccedilatildeo das estases dos estados de causa

em segundo lugar ao Peri heureseōs de mateacuteria discriminada isto seja a regulaccedilatildeo dos

proecircmios da narraccedilatildeo da argumentaccedilatildeo das figuras e em terceiro lugar ao Peri ideōn

de doutrina das ideai ditas ldquoformas de estilordquo tomadas no sentido de ldquoCaracteres do

3 De acordo com Filoacutestrato o Velho trata-se de burla atribuiacuteda ao sofista Antiacuteoco cf Flavii Philostrati de

Vitis Sophistarum Libri duo Antonio Bomfino interprete Cum gratia et priuilegio Imperiali ad sex ennium Ex Aedibus Schvrerianis Mense Martio Anno a restituta salute MDXVI [1516] sp 4 Sabe-se Jerocircnimo Soares Barbosa posto que trabalhasse na traduccedilatildeo de Quintiliano jaacute nos anos 1760 soacute

o editou posteriormente cf TEIXEIRA I ldquoArtifiacutecio persuasatildeo e sociedade em Olavo Bilacrdquo Revista USP

nordm 54 ago 2002 p 103 5 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Primeiro Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXVIII Com licenccedila da Real

Meza da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e

sessenta reis em papel p 46

12

discursordquo6 O nome de Hermoacutegenes amiuacutede classifica aleacutem dessas duas outras obras

assim denominadas os Progymnasmata de preceituaccedilatildeo de exerciacutecios preparatoacuterios e o

Peri methodou deinotētos de modos de composiccedilatildeo dos discursos de pensamentos

graves7

Aceitam hoje os helenistas que essas atribuiccedilotildees sejam afirmadamente incertas

Embora com frequecircncia se tome o corpo como de Hermoacutegenes de Tarso o Sofista supotildee

Michel Patillon que tenha se constituiacutedo espuriamente e que para o conjunto de textos

confluam distintos costumes retoacutericos que remontam aos seacuteculos II ou III de maneira tal

que apenas dois desses tratados o Peri staseōn e o Peri ideōn sejam considerados de

autoria daquele que o estudioso e tradutor francecircs chama Hermoacutegenes o Retor8 A fim de

se esquivar do sofista de Tarso Michel Patillon esforccedila-se por contruir um nome e

evidenciar que unidade natildeo haacute no corpo de Hermoacutegenes 9 A hipoacutetese pois que lhe

atravessa as pesquisas lida tanto em La theacuteorie du discours chez Hermogegravene le rheacuteteur

essai sur les structures linguistiques de la rheacutetorique ancienne quanto em Lrsquoart

rheacutetorique compreende que remonte aos seacuteculos V ou VI e que tenha se dado em torno

dos dois textos que se creem autecircnticos a constituiccedilatildeo do corpus retoacuterico de Hermoacutegenes

tal como se conhece desde Hugo Rabe o filoacutelogo alematildeo responsaacutevel por editar em 1913

o volume Hermogenis Opera da Bibliotheca Scriptorum Graecorum et Romanorum

Teubneriana reimpresso em 1969 e por estabelecer criticamente a liccedilatildeo textual em que

se baseiam as traduccedilotildees do Peri ideōn de Cecil W Wooten10 de Antonio Sancho Royo11

de Consuelo Ruiz Montero e de Michel Patillon

6 Neste trabalho daqui em diante ao operar a transliteraccedilatildeo do leacutexico da liacutengua grega optamos por natildeo

acentuar as palavras transliteradas (por ex eacute kallos) e por distinguir as vogais breves e longas (εη

e οω) as longas ldquoηrdquo e ldquoωrdquo transliteram-se como ldquoērdquo e ldquoōrdquo (por ex ἔρως eacute erōs ao passo que ἥρως eacute

hērōs) 7 HERMOGENE Lrsquoart rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon

Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 pp 35-40 HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz Montero Madrid Editorial Gredos 1993 pp 24-5 PATILLON M La

theacuteorie du discours chez Hermogegravene le rheacuteteur essai sur les structures linguistiques de la rheacutetorique

ancienne Paris Les Belles Lettres 1988 pp 8-12 8 Itera-o a tambeacutem tradutora Consuelo Ruiz Montero cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo

Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz Montero Madrid Editorial Gredos 1993 pp 24-26 9 PATILLON M La theacuteorie du discours chez Hermogegravene le rheacuteteur essai sur les structures linguistiques de

la rheacutetorique ancienne Paris Les Belles Lettres 1988 pp 13-17 10 Cf HERMOGENES Hermogenesrsquo on types of style Translated by Cecil W Wooten Chapel Hill University

of North Carolina Press 1987 11 Cf SANCHO ROYO A Hermoacutegenes Sobre los tipos de estilo y Sobre el meacutetodo del tipo Fueza

Introduccioacuten traduccioacuten y notas Sevilla Secretariado de Publicaciones de la Universidad 1991

13

Entende este estudioso francecircs que ao Peri staseōn e ao Peri ideōn teriam sido

reunidos os demais tratados os Progymnasmata que passaram a circular na versatildeo latina

de Prisciano a partir do seacuteculo VI e que se veem substituiacutedos bastante frequentemente

segundo o estudioso pelos exerciacutecios de Aftocircnio na vertente manuscrita do corpus o Peri

heureseōs datado de princiacutepios do seacuteculo III que se imagina incorporado aos demais em

substituiccedilatildeo a outro de mesma mateacuteria perdido citado no proecircmio do Peri staseōn e por

fim o chamado o Peri methodou deinotētos que se supotildee espuacuterio tambeacutem a ocupar o

lugar de texto que natildeo se sabe se perdido ou natildeo escrito referido no Peri ideōn (cf HERM

380 2)12

Acatadas ou natildeo as hipoacuteteses de Michel Patillon afirmam e reafirmam aqueles

que se dedicam agrave retoacuterica de Hermoacutegenes que da tratadiacutestica referida apenas os

Progymnasmata na versatildeo de Prisciano circularam no dito medievo latino13 O restante

do corpo difundiu-se ao que se conhece pelas matildeos de letrados como Jorge de

Trebizonda Demeacutetrio Ducas Marco Musuro Antocircnio Bonfine Francisco Porto Natale

Conti Johannes Sturm Giulio Camillo Delminio e Gaspar Laurent desde o seacuteculo XV

Ao primeiro eacute dado o primado da difusatildeo ocidental de Hermoacutegenes Eacute sabido as

afirmaccedilotildees de primazia servem bem agraves histoacuterias dos contributos vincadas pelo epidiacutetico

no louvor dos auctores14 Uma vez que eacute escusado dizer que as praacuteticas discursivas natildeo

se fazem de progressos de Jorge de Trebizonda ao germacircnico Hugo Rabe conveacutem natildeo

positivar essas afirmaccedilotildees e interessa pensar a recepccedilatildeo possiacutevel do corpo retoacuterico

atribuiacutedo a Hermoacutegenes mais particularmente da doutrina das ideai normatizada no Peri

ideōn segundo diferentes vertentes de circulaccedilatildeo que espraiam usos itere-se desde o

seacuteculo XV15

12 PATILLON M La theacuteorie du discours chez Hermogegravene le rheacuteteur essai sur les structures linguistiques

de la rheacutetorique ancienne Paris Les Belles Lettres 1988 pp 8-18 HERMOGENE Lrsquoart rheacutetorique

Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 pp

39-40 124 13 Recorda nesse sentido Luiza Loacutepez Grigera a praacutetica da ekphrasis preceitudada nos exerciacutecios

retoacutericos ldquoCuando leemos algunos de esos retratos medievales femeninos como el de la reina de las Amazonas en el Libro de Alexandre o el de la ldquoduentildeardquo ideal en el Buen Amor el de Melibea en La

Celestina o qualquiera de los retratos de raigambre petrarquesca en que se presenta la belleza femenina

descendentemente desde el pelo hacia abajo estamos leyendo un fruto de los meacutetodos propuestos por esos

tratados de ejercitacionesrdquo cf LOacutePEZ GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Salamanca

Universidad de Salamanca 1994 pp 72-73 14 Remete-se agraves aulas de ldquoEsteacuteticardquo (FLF 5083) ministradas pelo professor Leon Kossovitch entre 11 de

agosto de 2006 e 2 de novembro de 2006 15 Luiza Loacutepez Grigera faz consideraccedilotildees a esse respeito bastante interessantes ldquo[] na Ruacutessia ndash como me

dizia um antigo colega da Universidade de Michigan o professor Stanislav Matejka ndash o ensino de retoacuterica

bizantina continuou sendo ministrado no seacuteculo XX isto eacute continuaram sendo lidos ininterruptamente os

textos natildeo soacute de Aristoacuteteles mas de Demeacutetrio Dioniacutesio de Halicarnasso Hermoacutegenes e seus comentaristas

14

Para fazecirc-lo persegue-se a hipoacutetese de que a defesa do gecircnero misto do discurso

ou a defesa do gecircnero de poema misto no uso do discurso de feiccedilatildeo vaacuteria supotildee a

presenccedila doutrinaacuteria de retores gregos como Hermoacutegenes (ou Demeacutetrio ou Dioniacutesio de

Halicarnasso) cujos tratados ganharam legibilidade em terras italianas espanholas e

portuguesas e assim se mantiveram ateacute se verem romanticamente em desuso visto que

inexpressivas julgadas precinto aristocraacutetico de antigo regime bizantinice ou recurso

artificioso de poeta afetado e passadista Como se sabe

De modo a pensar essa hipoacutetese o primeiro passo da tese intitulado ldquoDoutrina do

mistordquo parte do ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos (1597-1665) proacutelogo de

matiz demonstrativo agrave Ulyssea ou Lisboa Edificada poema heroico de Gabriel Pereira

de Castro (1636) 16 e percorre usos possiacuteveis da retoacuterica de Hermoacutegenes e do Peri ideōn

entre tradutores comentadores e glosadores do tratado desde Jorge de Trebizonda ateacute

Jerocircnimo Soares Barbosa inteacuterprete setecentista de Quintiliano Como conveacutem a tese

potildee agrave vista usos em liacutengua portuguesa e se alastra por autores ibeacutericos e itaacutelicos mirando

a movecircncia dos termos da doutrina de Hermoacutegenes no latim e nos vernaacuteculos Manuel

de Galhegos eacute pretexto para que se avente a pluralidade dos usos histoacutericos do corpo

retoacuterico em questatildeo

O segundo passo denominado ldquoAnatomia do monstrordquo dedica-se por uma parte

ao vitupeacuterio da tragicomeacutedia e de Il Pastor Fido poema dramaacutetico de Giovanni Battista

Guarini (1538-1612) cuja primeira impressatildeo veio a puacuteblico em Veneza em 159017 tal

como proposto na Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral e de todas as

suas especies principaes tratadas com juizo critico (1759) de Francisco Joseacute Freire em

conformidade com o Discorso di Iason Denores intorno a quersquo Principii Causae et

Accrescimenti che la Commedia la Tragedia et il Poema Heroico Ricevono dalla

Filosofia Morale amp Ciuile amp darsquo Gouernatori delle Republiche (1587) de Giason

Denores professor da Universidade de Paacutedua Dedica-se por outra parte ao elogio do

considerando-os justamente os melhores coacutedigos de produccedilatildeo artiacutestica A Europa por outro lado perdera

todos esses textos desde fins do seacuteculo XVIIIrdquo cf LOacutePEZ GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo

de oro Salamanca Universidad de Salamanca 1994 p 74 cf BURKE P As fortunas drsquoO Cortesatildeo Satildeo

Paulo Editora da Unesp 1995 pp 14-15 16 Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de Castro

Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do Reyno de

Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor del Rey

1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro 17 Il Pastor Fido Tragicomedia Pastorale di Battista Gvarini Dedicata al SerMO D Carlo Emanvele Dvca

di Savoia ampc Nelle Reali Nozze di SA con la serma Infante D Caterina dAvstria Con privilegi In Venetia

Presso Gio Battista Bonfadino [1590]

15

gecircnero tragicocircmico composto em resposta pelo poeta Giovanni Battista Guarini em 1588

sob o tiacutetulo de Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra

le tragicomedie e le pastorali in un suo discorso di poesia Interessam na anaacutelise

apresentada o confronto de autoridades que firmam o vitupeacuterio e o elogio e sobretudo

a defesa da tragicomeacutedia amparada nas liccedilotildees de retores gregos como Hermoacutegenes

Isto seja natildeo se lecirc a Ulyssea ou Lisboa Edificada de Gabriel Pereira de Castro

nem Il Pastor Fido de Giovanni Battista Guarini Tomam-se esses poemas como exempla

Lecirc-se o que letrados como os referidos escreveram sobre ambos a fim de que se

vasculhe a presenccedila em terras italianas portuguesas ou espanholas entre fins do seacuteculo

XV e meados do XVIII da preceptiva retoacuterica que Hermoacutegenes propotildee no Peri ideōn

16

DOUTRINA DO MISTO

In Venice Tassorsquos echoes are no more

And silent rows the songless gondolier

Her palaces are crumbling to the shore

And music meets not always now the ear

Those days are gone [hellip]

GEORGE GORDON BYRON

Childe Harolds Pilgrimage18

Il est en litteacuterature des genres de meacuterite deacutelicieux mais qui ne peuvent pas

durer plus de trois ou quatre siegravecles Lucien est ennuyeux aujourdrsquohui comme

Candide le sera peut-ecirctre en lrsquoanneacute 2200

STENDHAL

Rome Naples et Florence19

Estampado postumamente em Lisboa em 1636 por Lourenccedilo Crasbeeck

impressor reacutegio e dedicado a D Felipe IV de Castela rei de Espanha e de Portugal o

poema Ulyssea ou Lisboa Edificada de Gabriel Pereira de Castro (1571-1632) publicou-

se precedido em sua primeira ediccedilatildeo do ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos

(1597-1665)20 Agrave guisa de prefaacutecio como soacutei ocorrer o discurso incorporado a ediccedilotildees

posteriores do poema 21 mas excluiacutedo da mais recente preparada por Joseacute Antoacutenio

18 Childe Harolds Pilgrimage Canto The Fourth By Lord Byron London John Murray Albemarle-

Street 1818 p 4 Na traduccedilatildeo oitocentista de Francisco Joseacute Pinheiro Guimaratildees publicada no Rio de

Janeiro em 1863 os versos assim satildeo traduzidos ldquoJaacute natildeo se ouve em Veneza o echo do Tasso Sem cantar

mudo rema o gondoleiro Sobre a praia os palacios seus desabatildeo Mais natildeo se escuta a musica incessante

Esses tempos laacute vatildeo []rdquo cf Traducccedilotildees Poeticas de F J Pinheiro Guimaratildees Bacharel em Sciencias

Sociais e Juridicas Childe Harold e Sardanapalo de Lord Byron o Roubo da Madeixa de Pope Hernani

de Victor Hugo Rio de Janeiro Typographia Universal de Laemmert Rua dos Invalidos 61 B 1863 p 69 19 ldquoHaacute em literatura gecircneros de meacuteritos deliciosos mas que natildeo podem durar mais do que trecircs ou quatro

seacuteculos Luciano eacute tedioso hoje como Cacircndido [de Voltaire] talvez o seja no ano 2200rdquo cf STENDHAL

Rome Naples et Florence Paris Michel Leacutevy Fregraveres Libraires-Eacutediteurs 1854 p 98 Traduccedilatildeo nossa 20 Daqui em diante seraacute citada a editio princeps da obra Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico

Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp

nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila

em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de

liuro 21 Foram consultadas cinco ediccedilotildees da obra em versotildees digitalizadas Ao que parece o ldquoDiscurso Poeacuteticordquo

de Manuel de Galhegos natildeo foi incorporado apenas agrave 2ordf ediccedilatildeo datada incertamente de 1642 e publicada

como se crecirc em Amsterdatilde O ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos consta das demais ediccedilotildees isto

17

Segurado e Campos 22 e tornado hoje tatildeo obsoleto quanto a narrativa das accedilotildees do

astucioso Ulisses fundador fabular de Lisboa eacute juiacutezo encomiaacutestico que busca enaltecer

a engenhosidade do poeta e salientar-lhe o domiacutenio artiacutestico por meio da avaliaccedilatildeo

elogiosa da obra

Como uso que se faz da escrita o juiacutezo instaura os criteacuterios de adequaccedilatildeo

ldquoconformes agraves significaccedilotildees dominantesrdquo diriam Gilles Deleuze e Claire Parnet de justa

recepccedilatildeo do poema23 Julgar bem nesses termos eacute estabelecer padrotildees para fazecirc-lo eacute

operaccedilatildeo de criacutetica como arte de julgar de apreciaccedilatildeo autorizada que se constitui

precipuamente por meio da observaccedilatildeo de ldquoexcelecircncias que devem deleitar um leitor

sensatordquo24 Isto o que ensina o poeta inglecircs John Dryden (1631-1700) em ldquoThe Authorrsquos

Apology for Heroic Poetry and Poetic Licencerdquo discurso de matiz epidiacutetico de 1677 que

prefacia The state of innocence and fall of man adaptaccedilatildeo para os palcos em verso

heroico do Paradise Lost poema eacutepico de John Milton (1667)

Sabe o leitor de Gabriel Pereira de Castro desde o rosto da ediccedilatildeo de 1636 que a

Ulyssea ou Lisboa Edificada eacute poema heroico pois circunscreve-se a obra a este gecircnero

de poemas

eacute das de 1745 1826 e 1827 Aleacutem da editio princeps consultaram-se as seguintes ediccedilotildees (2ordf ed) Ulyssea

ov Lisboa Edificada Poema heroico de Gabriel Pereira de Castro do Conselho de El Rey noszligo senhor

[Sl sn 1642] (3ordf ed) Ulyssea ou Lisboa Edificada Poema heroico composto pelo insigne doutor

Gabriel Pereira de Castro corregedor que foy do Crime da Corte e nomeado por Sua Magestade para

Chanceller moacuter do Reyno de Portugal Offerecido a El Rey D Joam V Nosso Senhor Lisboa Na Officina

de Miguel Rodrigues Impressor do Senh Card Patriarc M DCC XLV [1745] Com as licenccedilas

necessarias (4ordf ed) Ulysseacutea ou Lisboa Edificada Poema heroico de Gabriel Pereira de Castro Quarta

ediccedilatildeo Lisboa na Typographia Rollandiana 1826 Com Licenccedila da Mesa do Desembargo do Paccedilo (5ordf ed)

Ulysseacutea ou Lisboa Edificada Poema heroico de Gabriel Pereira de Castro Quarta ediccedilatildeo Lisboa na

Typographia Rollandiana 1827 Com Licenccedila Vende-se em casa de Rolland Rua Nova dos Martyres N

10 abaixo do Theatro de S Carlos 22 CASTRO G P DE Ulisseia ou Lisboa edificada Texto estabelecido e comentado por J A

Segurado e Campos Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 2000 23 Cf DELEUZE G PARNET C Diaacutelogos Traduccedilatildeo de Joseacute Gabriel Cunha Lisboa Reloacutegio DrsquoAacutegua

Editores 2004 p 34 24 Leia-se ldquoCriticism as it was first instituted by Aristotle was meant a standard of judging well the

chiefest part of which is to observe those excellencies which should delight a reasonable readerrdquo cf

DRYDEN J Drydenrsquos Essays Introduction by W H Hudson London New York J M DENT amp SONS

LTD 1954 p 108 Raphael Bluteau assim define o substantivo ldquocriacuteticardquo ldquoCRITICA Critica A arte de

julgar dos escritos dos Antigos ampc De scriptis veterum judicandi ars tis Fem Alguns escritores modernos

dizem Critice es Quintiliano no cap 14 do livro 5 acha que he melhor usar a palavra Grega Namque illi

homines (diz este Author fallando nos Criticos) docti amp inter doctos verum quaerentes minutius amp scrupulosius scrutantur omnia amp ad liquidum confessumque perducunt ut qui sibi inveniendi amp judicandi

partes quarum alteram alteram vocantrdquo cf BLUTEAU R Vocabulario portuguez amp

latino aulico anatomico architectonico Coimbra Collegio das Artes da Companhia de Jesu 1728

volume II p 615

18

Figura 1 Frontispiacutecio de Ulyssea ou Lisboa Edificada (1636)25

Trata-se isso parece claro natildeo apenas de afirmar que a Ulyssea ou Lisboa

Edificada eacute poema e de inscrever-lhe no regime aristoteacutelico da mimēsis como obra de

artiacutefice da palavra que natildeo se confunde com as obras de filoacutesofos historiadores ou

oradores porque poeacutetica senatildeo tambeacutem mais particularmente de definir-lhe o traccedilo

especiacutefico e indicar que este poema de Gabriel Pereira de Castro natildeo eacute trageacutedia natildeo eacute

comeacutedia natildeo eacute soneto natildeo eacute saacutetira natildeo eacute elegia natildeo eacute epigrama natildeo eacute silva natildeo eacute

25 Trata-se de frontispiacutecio de exemplar do acervo da Biblioteca Nacional de Portugal Este exemplar

pertenceu agrave Ordem dos Eremitas Descalccedilos de Santo Agostinho ao Convento de Nossa Senhora da

Conceiccedilatildeo do Monte Olivete em Lisboa Disponiacutevel em lthttppurlpt12170gt Acesso em 3 de dezembro

2014

19

epitalacircmio e natildeo eacute no mais tudo o que natildeo seja heroico

Para Manuel de Galhegos auctoritas cujo nome daacute anuecircncia de erudiccedilatildeo e de

discriccedilatildeo agrave Ulyssea ou Lisboa Edificada e para o destinataacuterio nela inscrito tipo

semelhantemente discreto nas palavras de Joatildeo Adolfo Hansen capaz de ldquoajuizar a

teacutecnica da forma poeacuteticardquo porque conhecedor e reconhecedor das regras da arte que a

instituem eacute evidente que a distinccedilatildeo geneacuterica e a diferenciaccedilatildeo especiacutefica efetivadas pelo

aposto ao tiacutetulo ndash ldquopoema heroicordquo ndash operam-se na constituiccedilatildeo dos protocolos de

recepccedilatildeo da obra de maneira a indiciar o ato empiacuterico de leitura visto que implicam os

coacutedigos discursivos manejados pelo poeta e partilhados com o tipo discreto a que ela se

destina26 Essa distinccedilatildeo aristotelicamente implica que a Ulyssea ou Lisboa Edificada

entenda-se como poema tecnicamente composto no domiacutenio do gecircnero heroico segundo

preceitos artiacutesticos que agenciam conveniecircncias e verossimilhanccedilas de invenccedilatildeo de

disposiccedilatildeo e de elocuccedilatildeo sempre particulares em concordacircncia com os usos

estabelecidos e com as autoridades consideradas exemplares no gecircnero do poema Essas

autoridades satildeo Homero Virgiacutelio Luiacutes de Camotildees e Torquato Tasso de acordo com

costume repetidiacutessimo no discurso letrado do tempo de Gabriel Pereira de Castro e de

Manuel de Galhegos

O Proacutelogo drsquoEl Macabeo poema heroico do portuguecircs Miguel de Silveira (ca

1576) impresso em Naacutepoles em 1638 em tom epidiacutetico o explicita

Tuuierotilde los Griegos a Homero honor de su patria por cuya naturaleza

litigarotilde tatildetas Ciudades Los Latinos despues a Virgilio que solo cotilde su

imitaccedilotilde ha conseguido inmortal renombre fauorecio a los modernos

nuestra edad con el Tasso gloria de Italia y emulacion de los antiguos

y con Camoins lustre de Lusitania que excedio a muchos en el spiritu

y siendo estos Varones tan insignes apenas hatilde alcanzado la perfecion

dela Epopeia como se ve en las objeciones que les ponen los que han

escrito poeticas27

26 Alexander Pope (1688-1744) escreve em seu An essay on criticism (1711) ldquoA perfect Judge will read

each work of Wit With the same Spirit that its author Writrdquo (ldquoUm perfeito Juiz leraacute cada obra de Engenho

Com o mesmo espiacuterito com que seu autor escreveurdquo) cf POPE Alexander Poemas Satildeo Paulo Nova

Alexandria 1994 p 40 Traduccedilatildeo nossa 27El Macabeo Poema heroico de Migvel de Silveira En Napoles por Egidio Longo Stampador Real Antildeo

1638 sp Ademais tambeacutem elogioso e natildeo poderia evidentemente deixar de secirc-lo eacute o soneto de Francisco

Lopez a Camotildees que se lecirc nas Rhythmas de Lvis de Camoes divididas em cinco partes Dirigidas ao muito

illustre senhor D Gonccedilalo Coutinho Impressas com licenccedila do supremo Conselho da geral Inquisiccedilatildeo amp

Ordinario Em Lisboa por Manvel de Lyra Anno de M D LXXXXV [1595] A custa de Esteuatildeo Lopez

20

Tiveram os Gregos a Homero honra de sua paacutetria por cuja natureza

litigaram tantas Cidades Os Latinos depois a Virgiacutelio que somente

com sua imitaccedilatildeo conseguiu imortal renome favoreceu aos modernos

nossa idade com o Tasso gloacuteria da Itaacutelia e emulaccedilatildeo dos antigos e com

Camotildees lustre da Lusitacircnia que excedeu a muitos no espiacuterito e sendo

estes Varotildees tatildeo insignes apenas alcanccedilaram a perfeiccedilatildeo da Epopeia

como se vecirc nas objeccedilotildees que lhes potildeem os que escreveram poeacuteticas 28

Esses preceitos as liccedilotildees poeacuteticas retoacutericas e gramaticais regulam nesse tempo

os usos discursivos da poesia e ademais instituem e referendam por convenccedilatildeo os usos

considerados exemplares Para Manuel de Galhegos fornecem motivaccedilotildees e argumentos

pois que a afirmaccedilatildeo das excelecircncias de Gabriel Pereira de Castro fundamenta-se na

defesa da adequaccedilatildeo do poema a esses preceitos agraves liccedilotildees relativas ao gecircnero em que o

poeta compotildee O gecircnero o ldquoDiscurso Poeacuteticordquo assim o define

O poema heroico he hũa poesia leuantada q tem por fim celebrar das

acccediloẽs do heroe valeroso a q foi mais digna de memoria29

Breves os termos da definiccedilatildeo supotildeem coacutedigos partilhados e pode-se considerar

usos endoxais O adjetivo ldquoheroicordquo eacute helenismo do grego hēroikos ( e registra-

se no Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum de Antocircnio de

Nebrija (1441-1522) em duas acepccedilotildees latinas concordes segundo as ediccedilotildees de

Antueacuterpia de Jan Steels de 1560 e de 157030 Quais sejam ldquoHeroicus a um id est res

mercador de libros sp ldquoEstagrave o pintor famoso attento amp mudo Pintando amp recebendo mil louuores Pelo

que retratou de varias cores Com engenho sutil viuo amp agudo Quem he este que fala amp pinta tudo

O ceo a terra o mar o catildepo as flores Aues amp animais Nymphas amp pastores Co diuino pincel do grande

estudo O Principe seragrave do gran Parnaso Ou o Grego excellente amp soberano Ou Torcato tambem q

em verso canta Ese natildeo he Virgilio Homero ou Tasso E he como parece Lusitano He Luis de Camotildees

q o mundo espatildetardquo 28 Traduccedilatildeo nossa 29 Cf Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de

Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro sp 30 Cf Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum Aelio Antonio Nebrissensi

interprete nunc denuo ingenti vocum accessione locupletatum pristinoque nitori sublata mendarum

colluuie restitutum Ad haec Dictionarium propriorum nominum ex probatiszligimis Graecaelig amp Latinaelig linguaelig

autoribus addita ad calcem neoterica locorum appellatione concinnatum Antuerpiae In AEligdib Ioannis

Steelij M D LX [1560] Cum Priuilegio Regis E tambeacutem cf Dictionarium Latino hispanicum et vice

versa Hispanico latinum Aelio Antonio Nebrissensi interprete nunc denuo ingenti vocum accessione

locupletatum pristinoq nitori sublata mendarum colluuie restitutum Ad haec Dictionarium propriorum

21

ad heroas pertinensrdquo e ldquoHeroicum carmem appellatur quod est Hexametrumrdquo31 donde

ldquoheroicordquo seja o que eacute atinente ao heroacutei (no latim ldquoherosrdquo) ldquoaquele que de homem mortal

fez-se deusrdquo (ldquoqui ex homine mortali factus est deusrdquo) e ldquocanto heroicordquo seja canto

composto em verso hexacircmetro32 Carmen inis precisa Antocircnio de Nebrija emprega-se

ou ldquopor el cantar o cancion o cantordquo ou ldquopor la obra compuesta en versordquo ou ldquopor vn

solo verso y a vezes por dosrdquo donde ldquocarmen rerum heroicarumrdquo (ldquocanto de casos

heroicosrdquo) designe-se por ldquoEposrdquo donde ldquoEpicusrdquo na ediccedilatildeo madrilenha do dicionaacuterio

estampada em 1638 defina-se como ldquoHeroicusrdquo e ldquoEpicus Poetardquo por desdobramento

defina-se como ldquoPoeta de verso heroicordquo Nesta ediccedilatildeo de Madri o verbete latino

ldquoHerosrdquo ganha complemento e ldquoheroacuteirdquo eacute tambeacutem ldquoSentildeor que tiene excelente virtud

Varon noble cauallero ilustrerdquo33

Essas duas acepccedilotildees do adjetivo ldquoheroicordquo recolhidas em latim e em espanhol nas

ediccedilotildees do Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum de Antocircnio

de Nebrija registram-se semelhantemente no tratado dialoacutegico Philosophia antigua

poetica (1596) de Alonso Loacutepez Pinciano (ca 1547-1627) Na epiacutestola undeacutecima que

integra a obra dedicada agrave poesia heroica o autor afirma a Fradique e a Ugo seus

interlocutores saber natildeo soacute que ldquose dixo epica y epopeya del metro heroyco con q se haze

la imitacionrdquo ou seja que ldquose disse eacutepica e epopeia do metro heroico com que se faz a

imitaccedilatildeordquo no gecircnero mas tambeacutem que ldquoheroyca [] se dize porq es imitacion de Heroes

y personas grauissimasrdquo ou seja que ldquoheroica [] se diz [a poesia] porque eacute imitaccedilatildeo

de Heroacuteis e pessoas graviacutessimasrdquo34

Nota-se as acepccedilotildees do adjetivo satildeo retoacuterica gramaacutetica e poeticamente legiacuteveis

Viu-se conforme Antocircnio de Nebrija heroico pode ser o caso ldquores ad heroas pertinensrdquo

nominum ex probatiszligimis Graecaelig amp Latinaelig linguaelig autoribus addita ad calcem neoterica locorum

appellatione concinnatum Antuerpiae In AEligdibus viduaelig amp haeligredum Ioannis Steelij M D LXX [1570]

Cum Priuilegio Regis 31 Segundo as ediccedilotildees citadas do Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum haacute

sinocircnimo ldquoHeroum siue heroicum carmen ab heroibus dictumrdquo 32 Segundo as ediccedilotildees citadas do Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum o hexacircmetro assim eacute definido ldquoHexametrum carmem quod sex pedibus constatrdquo isto eacute ldquocanto hexacircmetro

o que consta de seis peacutesrdquo 33 Dictionarium Aelii Antonii Nebrissensis grammatici chronographi regii imo recens accessio facta ad

quadruplex eiusdem antiqui dictionarij supplementum [hellip] Antildeo 1638 Cvm Priuilegio Regis Matriti Ex

Typographia Regia Expensis Gabrielis agrave Leon Bibliopolaelig 34 Cf Philosophia antigua poetica del doctor Alonso Lopez Pinciano Medico Cesareo Dirigida al Conde

Ihoanes Keuehiler de Aichelberg hellip En Madrid Por Thomas Junti M D XCVI [1596] p 453 O passo de

Alonso Loacutepez Pinciano eacute o seguinte ldquo[hellip] se que se dixo epica y epopeya del metro heroico con q se haze

la imitacion y q heroyca tambien se dize porq es imitacion de Heroes y personas grauissimasrdquo Em traduccedilatildeo

nossa ldquo[hellip] sei que se disse eacutepica e epopeia do metro heroico com que se faz a imitaccedilatildeo e que heroica

tambeacutem se diz porque eacute imitaccedilatildeo de Heroacuteis e pessoas graviacutessimasrdquo

22

heroica pode ser a mateacuteria de invenccedilatildeo de poema como a Ulyssea ou Lisboa Edificada

que tematiza os feitos notaacuteveis e a fama do heroacutei Tal como nas referidas ediccedilotildees de

Antueacuterpia do Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum na editio

princeps de 1611 do Tesoro de la Lengua Castellana o Espantildeola do licenciado D

Sebastiaacuten de Covarrubias Orozco (1539-1613) o adjetivo ldquoheroicordquo conforma-se ao

homem mortal como que divinizado Para o licenciado

EROICO como hecho heroico vale ilustre grande dixose de la

palabra heros heroi que cerca de los antiguos significaua tanto como

hombres que no embargante fuessen mortales eran sus hazantildeas tan

grandiosas que parecia tener en si alguna diuindad35

HEROICO como feito heroico equivale a ilustre grande diz-se da

palavra ldquoherosrdquo heroacutei que entre os antigos significava o mesmo que

homens que embora fossem mortais eram suas faccedilanhas tatildeo

grandiosas que pareciam ter em si alguma divindade 36

Trata-se de doutrina condizente com a liccedilatildeo exposta no princiacutepio do livro VII da

Eacutetica a Nicocircmaco De acordo com Aristoacuteteles esse ldquohomem divinordquo (σεῖος ἀνήρ em que

o adjetivo ldquoσεῖοςrdquo eacute variante de ldquoθεῖοςrdquo) os homens que se ldquotornam deusesrdquo

(ldquoγίνονται θεοὶrdquo) assim se fazem pelo excesso de virtude (ldquoδι᾽ἀρετῆς ὑπερβολήνrdquo) e

agrave maneira de Heitor personagem da Iliacuteada homeacuterica satildeo dotados de virtude ldquoheroica e

divinardquo que estaacute ldquoaleacutem de noacutesrdquo (ldquoὑπὲρ ἡμᾶςrdquo) e cujo avesso eacute a brutalidade a

bestialidade (ldquoθηριότηςrdquo)37 Trata-se de doutrina condizente tambeacutem com a Poeacutetica Eacute

sabido que para Aristoacuteteles a epopeia e a trageacutedia assemelham-se pela mateacuteria de

imitaccedilatildeo 38 de modo que segundo o decoro em que se inscrevem esses gecircneros de

poemas sejam imitados ldquoagentesrdquo (ldquoπράττονταςrdquo)39 ldquohomens em accedilatildeordquo na traduccedilatildeo

35 Tesoro de la Lengva Castellana o Espantildeola Compvesto por el licenciado D Sebastian de Cobarruuias

Orozco Capelan de su Magestade Mastrescuela y Canonigo de santa Iglesia de Cuenca y consultor del

santo Oficio de la Inquisicion Dirigido a la Magestad Catolica del Rey Don Felipe III nestro sentildeor Con

Privilegio En Madrid por Luis Sanchez impressor del Rey N S Antildeo del Sentildeor M DC XI [1611] p 360r-

v 36 Traduccedilatildeo nossa 37 Cf ARIST Nic Eth 1145 18-20 23-4 29 38 Cf ARIST Poet 1447 a 14-18 39 Cf ARIST Poet 1448 a 1

23

de Eudoro de Souza ldquomelhores do que noacutesrdquo 40 cujos caracteres se distingam pela

virtude 41 Aristotelicamente na arte da poesia assim faz Homero que imita ldquoos

melhoresrdquo (ldquoβελτίουςrdquo)42 assim tambeacutem faz na arte da pintura Polignoto ldquopintor de

caracteresrdquo (ldquoἠθογράφοςrdquo) de ldquohomens superioresrdquo 43

De acordo com Sebastiaacuten de Covarrubias Orozco a excelecircncia do heroacutei

virtuosiacutessimo decorre da grandiosidade de suas faccedilanhas (ldquoeran sus hazantildeas tan

grandiosas que parecia tener en si alguna diuindadrdquo) as quais fazem dele figura

ldquogranderdquo ldquoilustrerdquo e tambeacutem ldquoSentildeor que tiene excelente virtud Varon noble cauallero

ilustrerdquo segundo a periacutefrase que se apresenta no Dictionarium Aelii Antonii Nebrissensis

de 1638 Note-se que para Antocircnio de Nebrija o termo ldquoillustrisrdquo em latim designa

ldquocosa esclarecida o famosa en bienrdquo 44 e para Sebastiaacuten de Covarrubias Orozco

ldquoillustrerdquo alude ademais a ldquoel hombre noble de alto linaje y de gratilde renombre y famardquo45

digno de memoacuteria cujas accedilotildees gloriosas cantam versos heroicos tais quais os de Gabriel

Pereira de Castro Nos termos da Poeacutetica pode-se supor decorrer a excelecircncia do heroacutei

da gravidade de seus feitos eacute de primazia das accedilotildees ante os caracteres visto penderem

estes daquelas46 visto fazer-se das faccedilanhas o heroacutei segundo a preceituaccedilatildeo aristoteacutelica

do gecircnero O poeta assim agrave maneira do etoacutegrafo Polignoto forja neste gecircnero de poemas

elevado feiccedilatildeo bastante bem definida o ēthos de tipo ilustre47 Nos termos da liccedilatildeo que

Torquato Tasso apresenta em seu Discorsi dellrsquoarte poetica ed in particolare sopra il

poema eroico estampado em 1587 trata-se do tipo que se notabiliza exemplarmente pela

suma virtude Eneias notabiliza-se pela piedade Aquiles pela fortaleza em combate

40 Cf ARIST Poet 1448 a 4 Deve chamar a atenccedilatildeo que na Eacutetica a Nicocircmaco a afirmaccedilatildeo da virtude desse homem mortal como que divinizado estaacute amparada em sua condiccedilatildeo de superioridade eacutetica em relaccedilatildeo aos

demais ou melhor condiccedilatildeo de quem estaacute ldquoaleacutem de noacutesrdquo (ὑπὲρ ἡμᾶς) ao passo que na Poeacutetica a

caracterizaccedilatildeo decorosa desses agentes dignos de imitaccedilatildeo na epopeia prescreve que sejam ldquomelhores do

que noacutesrdquo (καθ᾽ἡμᾶς) 41 Apontam os helenistas trata-se de interpolaccedilatildeo ao texto cf ARIST Poet 1448 a 4 42 Cf ARIST Poet 1448 a 11-12 43 Cf ARIST Poet 1450 a 27 44 Equivalem as trecircs ediccedilotildees consultadas cf Dictionarium Aelii Antonii Nebrissensis grammatici

chronographi regii imo recens accessio facta ad quadruplex eiusdem antiqui dictionarij supplementum

[hellip] Antildeo 1638 Cvm Priuilegio Regis Matriti Ex Typographia Regia Expensis Gabrielis agrave Leon

Bibliopolaelig p 100v 45 Tesoro de la Lengva Castellana o Espantildeola Compvesto por el licenciado D Sebastian de Cobarruuias

Orozco Capelan de su Magestade Mastrescuela y Canonigo de santa Iglesia de Cuenca y consultor del

santo Oficio de la Inquisicion Dirigido a la Magestad Catolica del Rey Don Felipe III nestro sentildeor Con

Privilegio En Madrid por Luis Sanchez impressor del Rey N S Antildeo del Sentildeor M DC XI [1611] p 500v 46 Cf MUHANA A A Epopeacuteia em Prosa Seiscentista uma definiccedilatildeo de gecircnero Satildeo Paulo Editora da Unesp

1997 p111 47 Cf MARTINS P ldquoVt Pictura Rhetoricardquo Revista USP Satildeo Paulo n91 setnov 2011 p 106

24

Ulisses pela prudecircncia Amadis de Gaula 48 pela lealdade e Bradamante 49 pela

constacircncia50

Conforme Antocircnio de Nebrija viu-se tambeacutem heroico natildeo eacute soacute o caso de invenccedilatildeo

poeacutetica pode tambeacutem ser o carmen Assim especifica-se pela natureza da mateacuteria que

se canta o canto a obra em verso hexacircmetro ou o verso nessa medida donde se usem

segundo os passos autorizados pelo nome de Antocircnio de Nebrija os termos ldquocanto

heroicordquo e ldquoeposrdquo para o canto adequado a esse caso A liccedilatildeo no mais concordante com

a descriccedilatildeo que Sebastiaacuten de Covarrubias Orozco no Tesoro de la Lengua Castellana o

Espantildeola faz dos usos do adjetivo espanhol ldquoepicordquo51 eacute condizente com a doutrina do

gramaacutetico latino Diomedes (seacutec IV dC) cuja Arte gramatical define o epos como

ldquoinclusatildeo das accedilotildees divinas heroicas e humanas no canto hexacircmetrordquo (ldquoEpos dicitur

Graeligce carmine hexametro divinarum rerum et heroicarum humanarumque

comprehensiordquo) e assimila o termo grego ldquoeposrdquo natildeo soacute ao latim ldquocarmenrdquo (ldquoLatine paulo

communis Carmen auditurrdquo isto eacute ldquoEm latim ouve-se dizer pouco mais comumente

lsquocantorsquordquo) mas tambeacutem ao metro hexacircmetro (ldquoPraeligcipue uero hexameter uersus Epos

diciturrdquo isto eacute ldquoNa verdade o verso hexacircmetro se diz precipuamente eposrdquo) de modo a

assimilar a espeacutecie de poema composto agrave espeacutecie meacutetrica empregada52

Ressalte-se as prescriccedilotildees de Antocircnio de Nebrija e de Sebastiaacuten de Covarrubias

Orozco de Alonso Loacutepez Pinciano e de Manuel Pires de Almeida satildeo tambeacutem

48 Lido no seacuteculo XVI em Garci Rodriacuteguez de Montalvo (1440-1504) 49 Heroiacutena de Orlando Innamorato de Matteo Maria Boiardo (1441-1494) e de Orlando Furioso de

Ludovico Ariosto (1474-1533) 50 Discorsi del Signor Torquato Tasso DellrsquoArte Poetica et in particolare del Poema Heroico Et insieme

il Primo Libro delle Lettere scritte agrave diuersi suoi amici lequali oltra la famigliaritagrave sono ripiene di molti

concetti amp auertimenti poetici agrave dichiaratione drsquoalcuni luoghi della sua Gierusalemme liberata Gli uni e

lrsquoaltre scritte nel tempo chrsquoegli compose detto suo Poema Non piu stampati Con Privilegi In Venetia

MDLXXXVII [1587] Ad instanza di Giulio Vassalini Libraro agrave Ferrara p 7r 51 Cf Tesoro de la Lengva Castellana o Espantildeola Compvesto por el licenciado D Sebastian de Cobarruuias Orozco Capelan de su Magestade Mastrescuela y Canonigo de santa Iglesia de Cuenca y

consultor del santo Oficio de la Inquisicion Dirigido a la Magestad Catolica del Rey Don Felipe III nestro

sentildeor Con Privilegio En Madrid por Luis Sanchez impressor del Rey N S Antildeo del Sentildeor M DC XI

[1611] p 358r ldquoEPICO Poeta el que escriue versos Heroicos contando hazantildeas de varones ilustres

verdaderas o fabulosas nombre Griego ἐπικός adiectiuũ agrave Graeco nomine ἔπς quod carmẽ significat amp

propriegrave hexametrumrdquo (ldquoEacutePICO Poeta o que escreve versos Heroicos contando faccedilanhas de varotildees ilustres

verdadeiras ou fabulosas nome Grego ἐπικός adjetivo pelo nome Greco ἔπς que significa canto amp

propriamente hexacircmetrordquo) 52 As traduccedilotildees citadas satildeo de Izabella Lombardi Garbellini GARBELLINI I L ldquoDos poemas (Diomedes Arte gramatical 3)rdquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2005 v 9 p 233 Ademais eacute espeacutecie de poema do gecircnero

comum ou misto (ldquoaut commune aut mixtum quod Graeligci aut appellantrdquo) como a Iliacuteada e

a Odisseia gecircnero caracterizado pelas interlocuccedilotildees do poeta e dos personagens (ldquopoeta ipse loquitur et

personae loquentes introducunturrdquo)

25

condizentes com os coacutedigos da Poeacutetica aristoteacutelica Aristoacuteteles afirma ser adequado agrave

epopeia o metro heroico (cf ARISTOT Poet 24 1459 b 32 ldquoμέτρον τὸ ἡρωικὸνrdquo) isto

eacute o hexacircmetro considerado pelo tratadista o mais imponente e o mais elevado dos metros

(cf ARISTOT Poet 24 1459 b 34-35 ldquoἡρωικὸν στασιμώτατον καὶ ὀγκωδέστατον

τῶν μέτρων ἐστίνrdquo) na medida em que se afasta da conversa (cf ARISTOT Poet 4 1449

a 28 ldquoδιάλεκτοςrdquo) habitualmente iacircmbica Na vulgarizaccedilatildeo que propotildee Ludovico

Castelvetro (ca 1501-1571) desse passo da Poeacutetica o verso proacuteprio da epopeia diz-se

ldquoverso misurato cio elrsquo heroicordquo (ldquoverso mesurado53 isto eacute o heroicordquo)54

Deve-se natildeo esquecer todavia liccedilatildeo que distancia da Poeacutetica de Aristoacuteteles a

codificaccedilatildeo quinhentista e seiscentista do gecircnero heroico empreendida por preceptistas

como Francesco Patrizi Alonso Loacutepez Pinciano ou Manuel Pires de Almeida a saber a

possibilidade de que se fizessem poemas em prosa de que natildeo se compusessem em verso

hexacircmetro ou hendecassiacutelabo as epopeias55 O verso e a prosa ensina o Livro V do tratado

Della Poetica de Francesco Patrizi (1529-1597) cujo tiacutetulo eacute ldquoSE POESIA SI POSSA fare in

prosardquo satildeo duas ldquomaniere generali del fauellare e di esprimere con parole i suoi

concettirdquo (maneiras gerais de fabular e de exprimir com palavras os seus conceitos)56 isto

eacute meios distintos de imitaccedilatildeo como costumeiramente referidas as categorias da mimēsis

A eleiccedilatildeo do verso ou da prosa nesse caso segundo Manuel Pires de Almeida trata-se de

diferenccedila apenas acidental e natildeo essencial da espeacutecie heroica de poemas donde no

ldquoDiscurso sobre o poema heroicordquo o preceptista portuguecircs defina o gecircnero como

ldquoimitaccedilatildeo comum de accedilotildees graves feita em linguagem ou metrordquoEvidentemente o

interesse do ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos no acircmbito do poema heroico eacute

outro no entanto vislumbra-se aqui o gecircnero misto Disse alhures Leon Kossovitch em

vista dos estudos de Adma Muhana sobre a epopeia em prosa ldquoo mais misto dos gecircnerosrdquo

Preceitua Manuel Pires de Almeida que como acidental o emprego do verso ou

da prosa da ldquolinguagemrdquo o poema heroico especifica-se natildeo porque seja imitaccedilatildeo visto

53 Isto eacute grave 54 Poetica drsquoAristotele uulgarizzata et sposta per Ludovico Castelvetro Stampata in Vienna dAustria per

Gaspar Stainhofer lanno del Signore MD LXX [1570] p 293v 55 O emprego da prosa ou do verso na construccedilatildeo do poema heroico discutiu-o pormenorizadamente Adma

Muhana no estudo A Epopeia em Prosa Seiscentista uma Definiccedilatildeo de Gecircnero Eacute extenso o debate e de

longa duraccedilatildeo 56 Cf Della Poetica di Francesco Patrici La Deca Disputata Nella quale e per istoria e per ragioni e

per autoritagrave dersquo grandi antichi si mostra la falsita et vi egrave aggiunto il trimerone del medesimo in riposta

alle oppositioni fatte dal signor Torquato Tasso al parer suo scritto in diffesa dellrsquoAriosto In Ferrara

Per Vittorio Baldini Stampator Ducale 1586 Con licenza de i Superiori p 94

26

artiacutesticos e mimeacuteticos os poemas todos no regime poeacutetico de costume aristoteacutelico senatildeo

porque seja comum isto eacute conforme o gramaacutetico latino Diomedes nem dramaacutetico

(drammatikon) como a trageacutedia ou a comeacutedia nem narrativo (exēgētikon) como a poesia

didaacutetica as Geoacutergicas de Virgiacutelio a Arte de amar de Oviacutedio e o Da natureza das coisas

de Lucreacutecio por exemplo mas misto (mikton) feito da construccedilatildeo combinada da locuccedilatildeo

imediata de personagens ao modo do drama e da intervenccedilatildeo mediata do poeta ao modo

da narraccedilatildeo (DIOM Art Gramm III 482 14-25) 57 senatildeo tambeacutem porque seja grave isto eacute

composto como figuraccedilatildeo de mateacuteria memoraacutevel por sua gravidade jaacute se sabe de

faccedilanhas grandiosas de heroacutei ilustre e virtuoso58

Nestes termos vale recordar que o poema heroico eacute de acordo com Manuel de

Galhegos ldquopoesia leuantada q tem por fim celebrar das acccediloẽs do heroe valeroso a q foi

mais digna de memoriardquo59 O particiacutepio ldquoleuantadordquo embora nesta acepccedilatildeo soe arcaizante

aos gostos e aos manuais de hoje natildeo deveria causar espeacutecie ao destinataacuterio inscrito na

obra Registra-se em liacutengua portuguesa no volume V do Vocabulario Portuguez amp

Latino de Raphael Bluteau (1638-1734) impresso em 1728 em emprego corrente nas

artes retoacutericas e poeacuteticas do tempo conforme as preceptivas dos genera dicendi

Levantado Sublime Altiloco Estilo levantado Grandis oratio ou

elatio amp altitudo orationis Cic Grande amp magnificum ou sublime

dicendi genus Discurso levantado Alta amp exaggerata oratio oratio

grandis splendida illustris Cic Esta cadencia que os Dactylos daotilde

aos versos hexametros he mais propria para o estilo leuantado Ille

Dactylicus numerus hexametrorum magniloquentiae est accommoda-

tior Cic Em outro lugar diz Homeri magni loquentia O levantado o

sublime estilo de Homero Fallar em estilo mais levantado Excelsius

57 Cf HASEGAWA A P Os limites do gecircnero bucoacutelico em Vergiacutelio um estudo das eacuteclogas dramaacuteticas Satildeo

Paulo Humanitas 2012 pp 56-7 58 Manuel Pires de Almeida faz anaacutelise da definiccedilatildeo Leia-se ldquoImitaccedilatildeo se potildee em lugar de gecircnero porque todos os poemas satildeo imitaccedilotildees comum por diferenccedila porque por tal se distingue do traacutegico cocircmico e

ditiracircmbico que satildeo poemas ativos e este narrativo e por grave das mais espeacutecies da poeacutetica menores

Feita em linguagem ou metro porque natildeo eacute da essecircncia da poeacutetica fazer-se em verso ou prosa o Filoacutesofo

falou aqui disjuntivo assim o tecircm todos seus comentadores e Scaliacutegero e Pinciano Muitos poemas temos

em prosa perfeitiacutessimos quais satildeo Heliodoro Leucipe e Clitofonte e outrosrdquo cf MUHANA A ldquoDiscurso

sobre o poema heroico Comentaacuteriordquo REEL Revista Eletrocircnica de Estudos Literaacuterios Vitoacuteria a 2 v 2

2006 p 2 59 Apud Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de

Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro sp

27

dicere60

Isto eacute sabe-se desde a Rhetorica ad Herennium (ca seacutec I aC) satildeo trecircs os genera

aos quais os discursos se reduzem ldquoet grave et mediocre et attenuatumrdquo a saber grave

mediacuteocre e atenuado (Rhet Her IV 11 16) No jargatildeo latino empregado por Ciacutecero apoacutes

as liccedilotildees do anocircnimo aponta Marcos Martinho dos Santos lendo o De oratore o Orator

o Brutus e o De optimo genere oratorum dos trecircs gecircneros um eacute ldquograve ou pleno ou

sublime ou amplo ou grandiacuteloquo ou veemente ou copiosordquo outro eacute ldquosutil ou tecircnue ou

atenuado ou compresso ou remisso ou humilderdquo outro enfim eacute ldquomeacutedio ou mediacuteocre ou

temperado ou moacutedico ou intermediaacuteriordquo61 Ora Manuel de Galhegos conhecedor das

doutrinas retoacutericas e poeacuteticas ao definir como ldquopoesia leuantadardquo o gecircnero de poema

heroico e por consequecircncia a Ulyssea ou Lisboa Edificada inscreve-os na codificaccedilatildeo

dos genera dicendi segundo o decoro que faz obedecer a elocuccedilatildeo poeacutetica agrave invenccedilatildeo No

trato da mateacuteria heroica a imitaccedilatildeo congruente ensinam os letrados quinhentistas e

seiscentistas do gecircnero agrave luz de preceptistas gregos e latinos supotildee elocuccedilatildeo ldquoentre a

gravidade simples do gecircnero traacutegico e a beleza florida do liacutericordquo ensina Joatildeo Adolfo

Hansen62

Em uso semelhante agrave guisa de exemplo tendo-se em vista autores ibeacutericos

anteriores a Raphael Bluteau e contemporacircneos de Gabriel Pereira de Castro o particiacutepio

ldquoleuantadordquo eacute lido em Francisco de Quevedo (1580-1645) No soneto amoroso agrave musa

Euterpe escreve ldquoPetrarca celebrograve su Laura bella Con ingenio y estilo leuantadordquo63

Eacute lido tambeacutem em Diego de Saavedra Fajardo (1584-1648) Na epiacutestola ao leitor que abre

a versatildeo valenciana de 1675 do tratado de educaccedilatildeo de priacutencipes Idea de un Principe

politico Christiano representada en cien Empresas cuja primeira ediccedilatildeo foi estampada

em Mocircnaco em 1640 afirma-se assim

60 BLUTEAU Raphael Vocabulario portuguez amp latino aulico anatomico architectonico Coimbra

Collegio das Artes da Companhia de Jesu 1728 volume V p 93 61 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

235 62 Cf HANSEN J A ldquoNotas sobre o gecircnero eacutepicordquo in Teixeira I (Org) Eacutepicos Satildeo Paulo Edusp

Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo 2008 p 78 63 Leia-se ldquoPetrarca celebroacute su Laura bella Con ingenio y estilo levantado E hizo al mundo eterno su

cuidado Y la rara belleza que vioacute en ella Viven hoy envidiosas muchas de ella Porque es digno de ser

muy envidiado Un ien tan alto y tandichoso estado Que nunca pueda el tiempo contra ella Yo solo aacute

tiacute gallarda Silvia hermosa A quien diacute el corazon en sacrificio Querria dejarte dela misma suerte Que

esta alma en adorarte venturosa Solo puede hacer este servicio Que no te ofenda el tiempo ni la muerterdquo

cf Las tres musas ultimas castellanas de Don Francisco de Quevedo Villegas Cavallero de la Orden de

Santiago Sentildeor de la Villa de la Torre de Juan-Abad M DC LXXI [1671] p 13

28

Con estudio particular he procurado que el estilo sea levantado sin

afectacioacuten y breve sin escuridad empressa que a Oracio pareciograve

dificultosa y que no la he visto intentada en nuestra lengua

Castellana64

Com estudo particular procurei que o estilo fosse levantado sem

afetaccedilatildeo e breve sem obscuridade empresa que a Horaacutecio pareceu

dificultosa e que natildeo vi tentada em nossa liacutengua Castelhana 65

Explicita-se Diego de Saavedra Fajardo aduz preceitos conhecidos da Epistula ad

Pisones de Horaacutecio (seacutec I aC) ao mirar estilo que seja ldquolevantado sin afectacioacutenrdquo e

tambeacutem ldquobreve sin escuridadrdquo Codifica a epiacutestola arrisca-se incongruentemente agrave

afetaccedilatildeo mala affectatio (cf QUINT VIII 3 56-58) 66 quem busca efetuar na elocuccedilatildeo

o estilo levantado sublime altiacuteloquo e arrisca-se agrave obscuridade quem busca a concisatildeo67

64 Cf Idea de un Principe politico Christiano representada en cien Empresas Dedicada al Principe de Las

Espantildeas nuestro Sentildeor por Don Diego Saavedra Fajardo En Monaco en la emprenta de Nicolao Eurico

1640 sp 65 Traduccedilatildeo nossa 66 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 pp 312 372 67 O passo da Epistula ad Pisones que interessa abarca os vv 14-31 Na ediccedilatildeo portuguesa de Joatildeo da Costa

das Obras de Horacio principe dos poetas latinos lyricos com o entendimento litteral amp construiccedilam

Portuguesa ornadas de hum index copioso das historias amp fabulas contiudas nelas Emendadas nesta

vltima Impressam Lisboa Na Officina de Ioam da Costa M DC LVVIII [1668] Com as licenccedilas

neceszligarias pp 426-7 lecirc-se ldquoPlerumque muitas vezes Inceptis nas empresas gravibus de importacircncia amp professis amp que promettem magna cousas grandes Assuitur se coze unus amp alter pannus hum amp outro

panno Purpureus encarnado se soem entrefachar digressotildees de fabulas que parece adornatildeo amp antes afeatildeo

a obra cugravem como quatildedo trattando de outra mateacuteria describitur se descreve lucus o bosque amp Ara amp o

Altar Dianaelig da Deosa Diana Et ambitus E o rodeio aquaelig properantis da agua que corre com furia agros

amœnos pelos campos verdes amp floridos Aut flumen Rhenum ou o rio Rheno n I aut arcus pluvius ou arco

da chuva ou o arco da velha tudo isto algũas vezes he muito bom Sed nunc mas agora nesta conjunccedilatildeo

non erat locus natildeo havia lugar his para estas cousas amp fortasse amp por vẽtura Scis simulare natildeo sabeis mais

que pintar cupressum hũ cipreste como o outro pintou amp quereis dar a entender que sabeis muito Quid

hoc para que pintais isto si qui pingitur se aquele que haacute de ser pintado aeligre dato tendovos dado o dinheiro

de antematildeo fractis Navibus quebradas as embarcaccedilotildees enanat nada exspes sem esperanccedila de se salvar quer

dizer que havia de pintar hũ naufragio amp ele pintalhe hum cipreste foacutera de proposito Cœpit comeccedilou institui a lavrarse pelo oleiro amphora hũa grande quarta cur porque razatildeo currente rota correndo a roda

donde se faz exit sae urceus hũ piqueno pucaro Hũns promettem muito amp saem com pouco Denique

finalmente quod vis o que quereis trattar dumtaxat sit seja sogravemente simplex sem mistura amp unum amp hũa soacute

cousa Pater ograve pay Pisaotilde amp juvenes amp vosotros mancebos digni dignos de ter filhos patre de tal pay

Maxima pars mayor parte uatum dos poetas Decipimur somos enganados specie com a apparencia recti de

ser hũa cousa boa laboro se procuro eszlige brevis ser breve fio me faccedilo Obscurus escuro sectantem ao que

segue leuia cousas faceis nerui as forccedilas animique amp os animos Deficiunt lhe faltatildeo professus o que

prende cotildepor grandes cousas grandia se incha turget amp esvaece tutus nimium amp o q procura ir mui seguro

timidusque amp estagrave temeroso procellae da adversidade amp inveja Serpit vai de gatinhas humi pelo chatildeo Qui

cuput aquelle que deseja uariare variar rem unam algũa cousa prodigialiter foacutera do costume amp feacute humana

appingit pinta Delphinum hum golfinho syluis nos bosques aprum hum javali fluctibus nas ondas Fuga

29

Em Diego de Saavedra Fajardo como conveacutem aos discursos exordiais na composiccedilatildeo

eacutetica do sujeito de enunciaccedilatildeo referir o passo de Horaacutecio eacute liccedilatildeo decorosa de humildade

de tipo discreto que em vista da captatio beneuolentiae do destinataacuterio afirma flertar

com os viacutecios do gecircnero de discurso grave

Mais poeta Manuel de Galhegos publicou em Lisboa em 1626 uma deacutecada

antes da estampa da Ulyssea ou Lisboa Edificada de Gabriel Pereira de Castro pelas

matildeos do editor flamenco Pedro Crasbeeck o poema heroico Gigantomachia Na epiacutestola

ldquoAo Letorrdquo que lhe serve de prefaacutecio lecirc-se o seguinte

Lloraua Alexandro porque le parecian que eran tantos los hechos con

que su padre se hazia celebre enel mundo y tan grande el numero de

los pueblos que vencia que no dexaua al animo de su pecho hazantildeas

con que merecieszlige honroso notildebre ni prouincias que vitorioso

sujetasse al jugo de su imperio Assi mi musa (o erudito Letor) llora

porque conoce que es tan leuantado el estilo tanta la erudicion tan

nueuos tan gallardos los pensamientos y tan de Virgilio la energia con

que don Luis de Gongora canta de su Polifemo que no puede auer

pluma que tan felice describa la persona de vn gigante ni el magraves sutil

entendimiento del mundo podragrave dezir magraves agudezas68

Chorava Alexandre [o Grande] porque lhe parecia que eram tantos os

feitos com que seu pai [sc Filipe rei da Macedocircnia] se fizera ceacutelebre

no mundo e tatildeo grande o nuacutemero de povos que vencia que natildeo deixava

ao acircnimo de seu peito faccedilanhas com que merecesse honroso nome nem

proviacutencias que vitorioso sujeitasse ao jugo de seu impeacuterio Assim

minha musa (oacute erudito Leitor) chora porque conhece que eacute tatildeo

levantado o estilo tanta a erudiccedilatildeo tatildeo novos tatildeo galhardos os

pensamentos e tatildeo de Virgiacutelio a energia com que D Luiacutes de Goacutengora

canta de seu Polifemo que natildeo pode haver pluma que tatildeo feliz descreva

a pessoa de um gigante nem o mais sutil entendimento do mundo

poderaacute dizer mais agudezas69

culpaelig o fugir de hum erro inducit faz cair In uitium em outro mayor si caret arte se o que isto procura

carece de arterdquo 68 Cf Gigantomachia de Manuel de Gallegos a don Antonio de Meneses en Lisboa por Pedro Crasbeck

an 1626 sp 69 Traduccedilatildeo nossa

30

Infere-se assim como Diego de Saavedra Fajardo afirma buscar o estilo

levantado no espelho de priacutencipe assim tambeacutem Manuel de Galhegos na poesia assim

como Francesco Petrarca eacute autoridade no uso congruente do estilo elevado no gecircnero de

poema amoroso conforme Francisco de Quevedo assim tambeacutem o eacute D Luiacutes de Goacutengora

(1561-1627) na faacutebula gecircnero de poema liacuterico em registro grave conforme Manuel de

Galhegos Os estudos das obras de Gregoacuterio de Matos e Guerra e de Antocircnio Vieira desde

os fins dos anos 1980 jaacute o mostraram70 nomes como esses natildeo atribuem unidade

psicoloacutegica aos fazeres poeacuteticos e letrados sabe-se ldquoo estilo natildeo eacute o homemrdquo71 senatildeo

classificam procedimentos retoacutericos de elocuccedilatildeo cuja composiccedilatildeo codificada eacute

referendada pela autoridade dos usos validados pelo costume usos artificiais nunca

naturais nunca expressivos cujos efeitos satildeo produzidos em adequaccedilatildeo agraves conveniecircncias

de gecircnero de modo que natildeo seja grave o soneto petrarquista como a fabula gongoacuterica

nem seja grave o espelho de priacutencipe de Diego de Saavedra Fajardo como o poema

heroico de Manuel de Galhegos ou de Gabriel Pereira de Castro Isso significa ainda que

esses diferentes gecircneros de poemas visitem o mesmo gecircnero de discurso e compartilhem

do estilo levantado ainda assim modulam-se diferentemente por serem muacuteltiplas as

formas poeacuteticas da gravidade muacuteltiplas as gravidades ao cabo72

Ora de acordo com Manuel de Galhegos Gabriel Pereira de Castro eacute primaz no

gecircnero de poema heroico na composiccedilatildeo de ldquopoesia leuantadardquo Esta afirmaccedilatildeo de

primazia da Ulyssea ou Lisboa Edificada eacute da ordem do discurso preambular73 eacute lugar-

70 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 (1ordf ed 1989) MENDES M V A

oratoacuteria barroca de Vieira Lisboa Editorial Caminho 1989 MUHANA A Os Recursos retoacutericos na obra

especulativa do padre Antocircnio Vieira e outros escritos Dissertaccedilatildeo de Mestrado em Literatura Brasileira

USP-Serviccedilo de Apoio Didaacutetico 1989 PEacuteCORA A Teatro do sacramento A unidade teoloacutegico-retoacuterico-

poliacutetica dos sermotildees de Antocircnio Vieira Satildeo Paulo Edusp Campinas Editora da Unicamp 1994 71 Diria Jacques Lacan em seus Escritos (1966) mirando Georges-Louis Leclerc Conde de Buffon (1707-

1788) ldquoLe style crsquoest lrsquohomme en rallierons-nous la formule agrave seulement la rallonger lrsquohomme agrave qui lon

sadresserdquo [O estilo eacute o homem acrescentariacuteamos agrave foacutermula somente para alongaacute-la o homem a quem

nos dirigimos] Lacan J Eacutecrits Paris Eacuteditions du Seuil 1966 p 9 Fazendo uso do passo pode-se supor

Joatildeo Adolfo Hansen escreveu ldquoO estilo natildeo eacute o homem mas o destinataacuterio ou seja o ouvido do autorrdquo HANSEN J A ldquoRepresentaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo na literatura de Machado de Assisrdquo Ciecircncia Hoje nordm 253 out

2008 p 37 Umberto Eco acrescenta ou matiza a leitura algo psicologizante do Conde de Buffon ldquoateacute

mesmo o dito de Buffon lsquoo estilo eacute o homemrsquo ainda natildeo eacute entendido no sentido individual mas especiacutefico

o estilo eacute virtude humanardquo Entenda-se assim ldquoo estilo eacute um modo de agir segundo regras em geral bastante

prescritivas e fazia-se acompanhar da ideia de preceito de imitaccedilatildeo de aderecircncia aos modelosrdquo cf ECO

U ldquoSobre o estilordquo in Sobre a literatura Traduccedilatildeo de Elena Aguiar 2ordf ed Rio de Janeiro Record 2003

p 151 72 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

227 73 A que os estudos de Maria do Socorro Fernandes de Carvalho sobre os livros seiscentistas circulantes no

Brasil e em Portugal tecircm se dedicado

31

comum exordial cujo agenciamento porque seja da ordem do epidiacutetico eacute de conveniecircncia

na instituiccedilatildeo tanto dos protocolos de leitura do poema como da jurisprudecircncia de seu

ajuizamento A primazia da Ulyssea ou Lisboa Edificada depreende-se do ldquoDiscurso

Poeacuteticordquo afirma-se como decorrecircncia da engenhosidade do poeta no trato com os

preceitos de construccedilatildeo da epopeia em vista das dificuldades do gecircnero Nos termos de

Manuel de Galhegos entende-se que como difiacutecil o poema heroico eacute de rara

conformaccedilatildeo e como difiacutecil e raro caso seja composto exemplarmente em consonacircncia

com as convenccedilotildees do gecircnero como obra de emulaccedilatildeo eacute produto loacutegico de engenho

excelente Na defesa e no louvor que se enuncia esse eacute o caso do poeta Gabriel Pereira

de Castro cujas excelecircncias elocutivas o ldquoDiscurso Poeacuteticordquo busca assim explicitar

Sobre todas as excellencias a de mayor asombro amp q mais reputaccedilaotilde

adquiriragrave a esta peregrina obra he o poetico resplandor que nos versos

reuerbera A claridade ou a enargia (q he a euidencia no dizer) obserua

tudo quanto Hermogenes admoesta na palavra Saphinia A grandeza do

estilo (a q Quintiliano chama Adron) estagrave aqui tanto In suo eszlige Que

natildeo poacutede auer no fallar humano locuccedilatildeo mais sublime A fermosura ou

a galhardia das vozes Em qual dos escritos q a Fama soleniza se

acharaacute cotilde tanta superioridade A bella Aurora Que quatildedo ri nos ceos

nos catildepos chora Versos foraotilde estes de q Fr Lope Felix74 de V C se

pagou tatildeto q todas as vezes q na Corte nos viamos os repetia

recreatildedose na graccedila amp artificio delles A breuidade no explicar a

sentẽccedila he soberana tarda muito pouco em dar forma ao conceito q he

o que encomenda Hermogenes na palavra Gorgotis Que val o mesmo

que Preccedila As matildeos fẽdidas acha a testa armada O q este verso insinugravea

natildeo se podia dizer com menor ambito Na imitaccedilaotilde dos costumes ha

maravilhoso caracter No sentencioso tem hũa verdade continua

fundada natildeo somente sobre a razaotilde mas sobre tudo o q dixeraotilde os

Doutos do mundo No graue no triste no alegre no feroz no severo

no florido amp em todas as mais foacutermas de oraccedilaotilde mostrou grande fineza

74 Isto eacute Lope Feacutelix de Vega Carpio (1562-1635) o poeta Lope de Vega de quem se lecirc na referida ediccedilatildeo

o soneto apologeacutetico a seguir tambeacutem impresso postumamente em louvor a Gabriel Pereira de Castro

ldquoLisboa por el Griego edificada Ya de ser Fenix inmortal presuma Pues deue magraves a tu divina pluma

(Docto Gabriel) que a su famosa espada Voraz el tiempo con la diestra ayrada No hay Imperio mortal

que no consuma Peroacute la vida de tu heroyca suma Es alma ilustremente reseruada Mas ay que cuando

magraves enriqueciste Tu Patria que su Artiacutefice te llama Por la segunda vida que le diste Cipreacutes funesto tu

Laurel enrrama Si bien ganaste en lo q maacutes perdiste Pues cuando mueres tu nacio tu famardquo

32

amp grande juizo em escolher o tempo amp o lugar Nas metaforas tem

moderaccedilaotilde amp propriedade porq saotilde poucas vsadas em seu lugar amp

todas fundadas na circunstancia mais vista amp mais notoria dos sujeitos

O q he taotilde deficultoso q obseruando Arist o inaccessiuel da poesia diz

q somente os homens de engenho preclaro sabem vsar da metafora com

perfeiccedilaotilde75

O longo passo entre os passos finais de Manuel de Galhegos compotildee figuraccedilatildeo

encomiaacutestica de Gabriel Pereira de Castro pensada como subgecircnero do discurso epidiacutetico

(ἐπιδεικτικόν) conveniente para ostentar ao destinataacuterio as virtudes da obra do poeta

Assim Aristoacuteteles o ensina O ldquoDiscurso Poeacuteticordquo como tal segue o costume observado

em Hermoacutegenes para quem Homero eacute artiacutefice exemplar o melhor dos poetas o melhor

dos oradores e tambeacutem o melhor dos logoacutegrafos (cf HERM 389 21-26) e a poesia eacute

discurso de mateacuteria panegiacuterica e o mais panegiacuterico dos discursos (cf HERM 389 7-9)

Ou ldquoPANEGIRICA IN METROrdquo conforme o letrado italiano Giulio Camillo Delminio

(1480-1544) no breve ldquoDiscorso di Giulio Camillo sopra Hermogenerdquo76 impresso em

Veneza em 156077

Assim em mateacuteria de elocuccedilatildeo Manuel de Galhegos faz da Ulyssea ou Lisboa

Edificada poema heroico cujo elogio esteja assentado de modo particular na autoridade

da Institutio oratoria do retor latino Quintiliano (seacutec I dC) e na do corpo de doutrina

que o nome do grego Hermoacutegenes (seacutec II dC) autoriza composto do que ensinam dois

tratados a ele atribuiacutedos expliacutecita e implicitamente citados o Peri heureseōs (referido

como ldquoPerieureseonrdquo) e o Peri ideōn Sobretudo consoante as liccedilotildees do Peri ideōn e da

Institutio oratoria fazendo uso de leacutexico no vernaacuteculo e no grego transliterado Manuel

de Galhegos agencia a doutrina que propotildee corroborar os usos elocutivos do poeta no

gecircnero No ldquoDiscurso Poeacuteticordquo a exemplaridade da Ulyssea ou Lisboa Edificada afirma-

se em razatildeo das excelecircncias de Gabriel Pereira de Castro no emprego congruente de

variadas ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo cujos efeitos itere-se comprendem a ldquoclaridaderdquo a

75 Apud Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de

Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro sp 76 Tambeacutem referido como ldquoDiscorso sopra lrsquoIdee di Hermogenerdquo 77 Cf Il secondo tomo dellrsquoopere di M di Giulio Camillo Delminio cioegrave La Topica ouero dellrsquoElocutione

Discorso sopra lrsquoIdee di Hermogene La Grammatica Espositione sopra il primo amp secondo Sonetto del

Petrarca Nvovamente dato in lvce Con privilegio In Venegia apresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLX

[1560] p 82

33

ldquoenargiardquo a ldquoeuidencia no dizerrdquo a ldquoSaphiniardquo a ldquograndeza do estilordquo o ldquoAdronrdquo o

ldquosublimerdquo a ldquofermosurardquo a ldquogalhardiardquo a ldquobreuidaderdquo a ldquoGorgotisrdquo a ldquoPreccedilardquo o

ldquomaravilhoso caracterrdquo a ldquoverdade continuardquo E mais o ldquograuerdquo o ldquotristerdquo o ldquoalegrerdquo o

ldquoferozrdquo o ldquoseverordquo e o ldquofloridordquo A variedade de uso dessas ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo julga-se

e elogia-se como excelecircncia compositiva do poeta Gabriel Pereira de Castro em

adequaccedilatildeo aos coacutedigos que definem como ldquopoesia leuantadardquo o gecircnero de poema heroico

Repare-se que Manuel de Galhegos pouco recorre agraves provas Basta o apelo algo

sentencioso e amplificado que diz a conformaccedilatildeo da Ulyssea ou Lisboa Edificada agrave voz

das convenccedilotildees ldquoA claridade ou a enargia [] obserua tudo quanto Hermogenes

admoesta na palavra Saphiniardquo ou ldquoA grandeza do estilo [] estagrave aqui tanto [] Que natildeo

poacutede auer no fallar humano locuccedilatildeo mais sublimerdquo ou ldquoA fermosura ou a galhardia das

vozes Em qual dos escritos [] se acharaacute cotilde tanta superioridaderdquo ou ldquoA breuidade no

explicar a sentẽccedila he soberanardquo ou ldquoNa imitaccedilaotilde dos costumes ha maravilhoso caracterrdquo

ou ldquoNo sentencioso tem hũa verdade continuardquo etc Assim composto o passo referido do

ldquoDiscurso Poeacuteticordquo parece valer menos pelo que mostra do poema e mais pelo que diz

dos criteacuterios de razatildeo da boa poesia agenciados pelo apologista

Hermoacutegenes eacute nome privilegiado neste agenciamento pois que eacute precisamente em

suas liccedilotildees de retoacuterica que Manuel de Galhegos vai buscar os substantivos ldquoclaridaderdquo

(ou ldquoSaphiniardquo) ldquograndezardquo ldquofermosurardquo (ou ldquogalhardiardquo) ldquoPreccedilardquo (ou ldquoGorgotisrdquo)

ldquocostumerdquo (ou ldquocaracterrdquo) e ldquoverdaderdquo os quais respectivamente traduzem para a liacutengua

portuguesa os termos gregos (i) saphēneia (ή) (ii) megethos () (iii)

kallos () (iv) gorgotēs () (v) ēthos () e (vi) alētheia ()

que consistem em seis das sete ideai tou logou () prescritas pelo retor

por assim dizer as ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo preceituadas nos dois livros que integram o Peri

ideōn Como se veraacute a idea que encerra o preceito nominada (vii) deinotēs ()

no tratado de Hermoacutegenes pode abarcaacute-la semanticamente o ldquoDiscurso Poeacuteticordquo por meio

dos termos ldquograuerdquo e ldquoferozrdquo ainda que essa a idea pareccedila apartada da liccedilatildeo de Manuel

de Galhegos

Deve-se considerar que seja possiacutevel que o Peri ideōn tenha sido fonte direta das

liccedilotildees de retoacuterica referidas no passo citado do ldquoDiscurso Poeacuteticordquo Pode depender

diretamente da ciecircncia do texto grego de Hermoacutegenes a eleiccedilatildeo em liacutengua portuguesa de

ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo para verter o sintagma grego ideai tou logou e dos substantivos

ldquoclaridaderdquo ldquograndezardquo ldquoformosurardquo (ou ldquogalhardiardquo) ldquoPreccedilardquo ldquocostumerdquo (ou

34

ldquocaracterrdquo) e ldquoverdaderdquo para designar as referidas ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo Afinal no iniacutecio

do seacuteculo XVI agrave exceccedilatildeo do Peri hypsous atribuiacutedo a Longino os tratados de retores

gregos como Aftocircnio Hermoacutegenes Aristoacuteteles Dioniacutesio de Halicarnasso Demeacutetrio

Menandro Eacutelio Teatildeo Aristides ou Apsines circulavam impressos desde Veneza depois

de estampados em conjunto in-foacutelio por Aldo Manuzio em dois volumes intitulados

Rhetores graeci cujas datas de publicaccedilatildeo satildeo 1508 e 150978 A preparaccedilatildeo dessa ediccedilatildeo

coube ao emigrado cretense Demeacutetrio Ducas reconhecido como o primeiro catedraacutetico

de grego da Universidade de Alcalaacute de Henares na Espanha79

Sabe-se poreacutem que a despeito do trabalho do prelo de Aldo Manuzio o Peri

ideōn eacute obra de fortuna prodigiosa em manuscritura O filoacutelogo alematildeo Hugo Rabe

compulsa e elenca mais de uma centena de manuscritos do corpo retoacuterico de

Hermoacutegenes80 cujas dataccedilotildees vatildeo do seacuteculo X ao seacuteculo XVI E natildeo se furta o helenista

George Alexander Kennedy a afirmar que existam outros81 Diga-se a quase totalidade

dos manuscritos coligidos na recensio empreendida por Hugo Rabe traz liccedilotildees do Peri

78 O volume primeiro em que se leem as preceptivas de Hermoacutegenes (pp 19-160) eacute o seguinte Rhetores

in hoc volvmine habentvr hi Aphthonii Sophistaelig Progymnasmata Hermogenis ars Rhetorica Aristotelis

Rhetoricorum ad Theodecten libri tres Eiusdem Rhetorice ad Alexandrum Eiusdem ars Poetica Sopatri

Rhetoris quaeligstiones de compone[n]dis declamationibus in causis praecipuaelig iudicialibus Cyri Sophistaelig

differentiaelig statuum Dionysii Alicarnasĕi ars Rhetorica Demetrii Phalerĕi de interpretatione Alexandri

Sophistaelig de figuris sensus amp dictionis Adnotationes innominati de figuris Rhetoricis Menandri Rhetoris

diuisio causarum in genere demonstratiuo Aristeidis de ciuili oratione Eiusdem de simplici oratione

Apsini de arte Rhetorica praeligcepta Venetiis 1508 Eacute possiacutevel ter acesso ao exemplar digitalizado da

Thuumlringer Universitaumlts und Landesbibliothek Jena Disponiacutevel em lthttparchivethulbuni-

jenadehisbestreceiveHisBest_cbu_00004269gt Acesso em 15 julho 2014 Cf PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New Jersey Princeton University Press

1970 p 219 RENOUARD A A Annales de limprimerie des Alde ou Histoire des trois Manuce et de leurs

eacuteditions Paris 1803 pp 127-9 GEANAKOPLOS D J Constantinople and the West Essays on the Late

Byzantine (Palaeologan) and Italian Renaissances and the Byzantine and Roman Churches Madison

Wisconsin University of Wisconsin Press 1989 p 45 GEANAKOPLOS D J Greek scholars in Venice

studies in the dissemination of Greek learning from Byzantium to Western Europe Cambridge

Massachusetts Harvard University Press p 227 79 Cf RENOUARD A A Annales de limprimerie des Alde ou Histoire des trois Manuce et de leurs eacuteditions

pp 127-9 LOacutePEZ GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Salamanca Universidad de

Salamanca 1994 p 56 75-7 Destaca Geanakoplos Demeacutetrio Ducas redigiu agrave guisa de prefaacutecio no

volume primeiro dos Rhetores graeci uma epiacutestola destinada a Marco Musuro entatildeo professor da Universidade de Paacutedua Nela vai o seguinte conselho que Musuro incluiacutesse em suas leituras ao lado da

tratadiacutestica de Hermoacutegenes a Retoacuterica de Aristoacuteteles a quem o elogio soaria desnecessaacuterio cf

GEANAKOPLOS D J Constantinople and the West Essays on the Late Byzantine (Palaeologan) and Italian

Renaissances and the Byzantine and Roman Churches Madison Wisconsin University of Wisconsin Press

1989 p 45 80 Cf RABE H Hermogenis Opera Leipzig Teubner 1913 pp xiii-xxviii Pode-se ter acesso ao exemplar

digitalizado da Bibliothegraveque nationale de France Disponiacutevel em

lthttpgallicabnffrark12148bpt6k25183cf2imager=Hugo20RabelangPTgt Acesso em 12 maio

2010 81 Cf KENNEDY G A Greek Rhetoric under Christian Emperors Eugene Oregon Wipf and Stock

Publishers 2008 p 74

35

ideōn82 Trata-se portanto eacute possiacutevel aventar de obra exitosa bastantemente copiada e

por certo lida Isso natildeo se avalia apenas pelo nuacutemero avantajado de coacutepias manuscritas

mas tambeacutem pela variedade de impressos que lhe fizeram circular a tratadiacutestica em grego

em latim e em italiano

Deve-se recordar portanto que aos Rhetores graeci considerados a editio

princeps de Hermoacutegenes seguiram outras ediccedilotildees do Peri ideōn nos seacuteculos XVI e XVII

Satildeo elas Aphthonii sophistae praeligludia Hermogenis Rhetorica ediccedilatildeo florentina de

Filippo Giunta de 1515 em grego83 Hermogenis De formis orationum tomi duo ediccedilatildeo

parisiense em grego estampada na oficina do impressor Christian Wechel (ca 1485-

1554) em 153184 Hermogenis ars oratoria absolutissima ediccedilatildeo em grego de Jacob

82 Cf RABE H Hermogenis Opera pp xv-xix Alguns desses manuscritos podem ser conhecidos por meios

digitais e estatildeo virtualmente disponiacuteveis aos helenistas A Bibliothegraveque nationale de France daacute a conhecer os manuscritos Parisinus gr 2929 Parisinus gr 2971 Parisinus gr 2983 e Parisinus gr 3032 O primeiro

datado do seacuteculo XVI reuacutene obras gregas diversas de mateacuteria gramatical entre as quais estatildeo os

Progymnasmata de Hermoacutegenes e a epiacutetome de Mateus Camariota agrave retoacuterica de Hermoacutegenes Disponiacutevel

em lthttpgallicabnffrark12148btv1b520004673r=hermogenelangPTgt Acesso em 15 julho 2014

O segundo tambeacutem datado do seacuteculo XVI tambeacutem traz os Progymnasmata Disponiacutevel em

lthttpgallicabnffrark12148btv1b520009547r=hermogenelangPTgt Acesso em 15 julho 2014 O

terceiro datado do seacuteculo XI reuacutene em meio a obras gregas de mateacuteria retoacuterica e gramatical quatro dos

tratados atribuiacutedos a Hermoacutegenes a saber o Peri heureseōs o Peri methodou deinotētos o Peri staseōn e

o Peri ideōn par a par com os Progymnasmata de Aftocircnio Disponiacutevel em

lthttpgallicabnffrark12148btv1b8470444jr=hermogenelangPTgt Acesso em 15 julho 2014 O

quarto manuscrito tambeacutem datado do seacuteculo XI traz aleacutem de scholia a Hermoacutegenes os Progymnasmata o Peri staseōn e o Peri methodou deinotētos

A British Library daacute a conhecer os manuscritos Arundel MS 541 Add MS 10060 e Royal MS 16 D XII O

primeiro datado do seacuteculo XV traz os Progymnasmata de Aftocircnio o Peri heureseōs o Peri methodou

deinotētos o Peri staseōn e o Peri ideōn atribuiacutedos a Hermoacutegenes aleacutem de sinopse das figuras

mencionadas no Peri staseōn de prefaacutecio ao Peri staseōn de prefaacutecio versificado do gramaacutetico Joatildeo

Tzetzes ao Peri heureseōs de sinopse dos temas Peri heureseōs e de prefaacutecio ao Peri ideōn Disponiacutevel

em lthttpwwwblukmanuscriptsFullDisplayaspxref=Arundel_MS_541gt Acesso em 15 julho 2014

O segundo datado do seacuteculo XVI traz entre obras de gramaacutetica e retoacuterica os Progymnasmata de Aftocircnio

e a epiacutetome de Mateus Camariota agrave retoacuterica de Hermoacutegenes Disponiacutevel em

lthttpwwwblukmanuscriptsFullDisplayaspxref=Add_MS_10060gt Acesso em 15 julho 2014 O

terceiro tambeacutem datado do seacuteculo XVI traz comentaacuterios ao Peri methodou deinotētos Disponiacutevel em lthttpwwwblukmanuscriptsFullDisplayaspxindex=7ampref=Royal_MS_16_D_XIIgt Acesso em 15

julho 2014 83 Ωάῥά In hoc volumine haec continentur Ausonii [ie Aphtonii] sophistaelig praeligludia

Hermogenis Rhetorica In aeligdibus Philippi Iuntaelig 1515 Pode-se ter acesso digital ao exemplar da

Bayerische Staatsbibliothek (Biblioteca Estadual da Baviera) Disponiacutevel em lthttpreaderdigitale-

sammlungenderesolvedisplaybsb10169596htmlgt Acesso em 16 julho 2014 Cf MACDONALD K M

ldquoSelling Lives the Publisher Bernardo di Giunta (fl 1518-1550) Imitation and the Utility of Intellectual

Biographyrdquo Renaissance and Reformation 25 (2001) pp 5-24 cf LAURENS P ldquoPrefacerdquo in

HERMOGEgraveNE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon

Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 10 O Cataacutelogo Geral da Biblioteca Nacional de Espantildea registra um exemplar desta ediccedilatildeo no acervo da BN de Madrid cf BIBLIOTECA NACIONAL DE ESPANtildeA Cataacutelogo

General de la BNE Disponiacutevel em lthttpcatalogobneesgt Acesso em 16 julho 2014 84 Ω Hermogenis De formis orationum tomi duo Parisiis

Excudebat Christianus Wechelus sub scuto Basilensi in via Iacobea anno 1531 Pode-se ter acesso digital

36

Bogardus de 1544 tambeacutem parisiense85 Hermogenis De formis orationum tomi duo

ediccedilatildeo em grego de Johannes Sturm (1507-1589) estampada em 1555 em Estrasburgo86

Aphtonius Hermogenes amp Dionisius Longinus praestatissimi artis Rhetorices magistri

ediccedilatildeo em grego do cretense Francisco Porto (1511-1581) impressa em Genebra em

1569 e reimpressa em 157087 De dicendi generibus sive formis orationum ediccedilatildeo de

ao exemplar da Bayerische Staatsbibliothek Disponiacutevel em lthttpreaderdigitale-

sammlungenderesolvedisplaybsb10150668htmlgt Acesso em 15 julho 2014 Ver PATTERSON A M

Idem ibidem A Biblioteca Nacional de Portugal registra um exemplar desta ediccedilatildeo em seu acervo Entre

os antigos possuidores do volume indicam-se Diogo Mendes de Vasconcelos (1523-1599) e o Convento de

Santa Maria de Scala Coeli da Ordem da Cartuxa em Eacutevora Sabe-se Diogo Mendes de Vasconcelos foi

fidalgo cocircnego da Seacute de Eacutevora e editor em 1593 do De antiquitatibus lusitanae (As antiguidades da

Lusitacircnia) de Andreacute de Resende (1500-1573) cf RESENDE Andreacute de As antiguidades da Lusitacircnia Introduccedilatildeo traduccedilatildeo e comentaacuterio de Rauacutel Miguel Rosado Fernandes Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1996 BIBLIOTECA NACIONAL DE PORTUGAL Cataacutelogo Geral Disponiacutevel em

lthttpcatalogobnportugalptgt Acesso em 15 julho 2014

A Biblioteca Nacional de Portugal registra dois exemplares de outros dois tratados atribuiacutedos ao reacutetor grego

Satildeo eles (i) Hermogenis Ars Rhetorica

Absolutissima Parisiis Excudebat Christianus Wechelus sub scuto Basilensi in via Iacobea anno 1530

ediccedilatildeo do Perigrave staseos de Hermoacutegenes em que se preceituam os estados de causa e (ii)

Ω Hermogenis De inuentione tomo

qvatuor Parisiis Christianus Wechel sub scuto Basilensi in via Iacobea anno 1530 Entre os antigos

possuidores dos exemplares existentes na BNP tambeacutem estatildeo Diogo Mendes de Vasconcelos e o Convento

de Santa Maria de Scala Coeli Pode-se conhecer o exemplar da Hermogenis Ars Rhetorica Absolutissima

pertencente agrave Bayerische Staatsbibliothek Disponiacutevel em lthttpreaderdigitale-

sammlungendedefs1objectdisplaybsb10150777_00001htmlgt Acesso em 15 julho 2014 Esta ediccedilatildeo

de Hermoacutegenes foi reimpressa por Christian Wechel em Paris oitos anos depois

Hermogenis Ars Rhetorica Absolutissima

Parisiis In officina Christiani Wecheli sub scuto Basilensi in vico Iacobeo Anno MDXXXVIII [1538] A

Biblioteca Nacional de Espantildea registra um exemplar desta ediccedilatildeo em seu acervo cf BIBLIOTECA

NACIONAL DE ESPANtildeA Cataacutelogo General de la BNE Disponiacutevel em lthttpcatalogobneesgt Acesso

em 16 julho 2014 Pode-se conhecer a versatildeo digital do exemplar de 1538 pertencente ao acervo da

Oumlsterreichische Nationalbibliothek (Biblioteca Nacional da Aacuteustria) Disponiacutevel em

lthttpdigitalonbacatOnbViewerviewerfacesdoc=ABO_2BZ167077000gt Acesso em 16 julho

2014 Quanto ao tratado Hermogenis De inuentione tomo qvatuor Pode-se ter acesso ao exemplar

digitalizado da Bayerische Staatsbibliothek Disponiacutevel em lthttpreaderdigitale-

sammlungenderesolvedisplaybsb10314557htmlgt Acesso em 16 julho 2014 85 Hermogenis Ars Rhetorica Abolutissima

Parisiis Apud Iacobum Bogardum sub insigne D Christophori egrave regione gymnasij Cameracensium 1544

Pode-se ter acesso ao volume da Bayerische Staatsbibliothek lthttpreaderdigitale-

sammlungenderesolvedisplaybsb10150714htmlgt Acesso em 15 julho 2014 Vide PATTERSON A M

Idem ibidem O exemplar digital consultado todavia natildeo consta de liccedilatildeo do 86 Ω Hermogenis De formis orationum tomi duo

Argentorati apud haeredes Vuendelini Rihelij Anno 1555 Pode-se ter acesso ao exemplar da Bayerische

Staatsbibliothek em versatildeo digitalizada Disponiacutevel em lthttpdatendigitale-

sammlungende~db0003bsb00034945imagesindexhtmlid=00034945ampfip=1931749830ampno=ampseit

e=2gt Acesso em 15 julho 2014 Ver PATTERSON A M Idem ibidem 87Aph-

tonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices magistri Francisci Porti Cretensis

opera industriaacuteque illustrati atque expoliti Genevaelig apvd I Crispinvm MDLXIX [1569] Pode-se ter

acesso ao exemplar da Oumlsterreichische Nationalbibliothek Disponiacutevel em

lthttpdigitalonbacatOnbViewerviewerfacesdoc=ABO_2BZ178244507gt Acesso em 15 julho

2014 Vide PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New

Jersey Princeton University Press 1970 p 219

37

Johannes Sturm biliacutengue em grego e em latim impressa em Estrasburgo em 157188 e

por fim Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima ediccedilatildeo biliacutengue de Garpar Laurent

(1556-1636) com comentaacuterios em latim estampada em Genebra em 161489

Eacute oportuno natildeo ignorar todavia que mesmo sendo admissiacutevel a consulta de

ediccedilotildees em grego as escolhas lexicais de Manuel de Galhegos e de letrados como ele

ibeacutericos nos seacuteculos XVI e XVII talvez natildeo possam prescindir das glosas paraacutefrases

comentaacuterios ou interpretaccedilotildees nas liacutenguas neolatinas do Peri ideōnou das traduccedilotildees

latinas que ganhou o tratado desde o seacuteculo XV Deve-se considerar portanto o

Rhetoricorum libri V de Jorge de Trebizonda a quem se atribui o primado da difusatildeo

latina no Ocidente desde a Peniacutensula Itaacutelica das doutrinas do Peri ideōne mais

amplamente do corpo retoacuterico que carrega o nome de Hermoacutegenes90 publicado entre

1433 e 1434 em Veneza e republicado inuacutemeras vezes Sabe-se que reeditado em Milatildeo

em 1493 por Leonard Pachel91 em Alcalaacute de Henares na Espanha por Arnao Guilleacuten de

88Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II Latinitate

donati amp scholis explicati atque illustrati A Ioan Stvrmio Cum Gratia amp Priuilegio Caeligsareo ad anno

octo Excudebat Iosias Rihelius MDLXXI [1571] Pode-se ter acesso digital ao exemplar da Bibliothegraveque

nationale de France lthttpgallicabnffrark12148bpt6k6257060hr=langESgt Acesso em 15 julho

2014 Cf PATTERSON A M Idem ibidem A Biblioteca Nacional de Espantildea registra um exemplar desta

ediccedilatildeo em acervo cf BIBLIOTECA NACIONAL DE ESPANtildeA Cataacutelogo General de la BNE Disponiacutevel

em lthttpcatalogobneesgt Acesso em 16 julho 2014 89 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima

Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii

Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno MDCXIV [1614] Pode-se ter acesso ao exemplar

digitalizado no acervo da Oumlsterreichische Nationalbibliothek Disponiacutevel em

lthttpdigitalonbacatOnbViewerviewerfacesdoc=ABO_2BZ180877503gt Acesso em 15 julho 2014 Vide PATTERSON A M Idem ibidem O Cataacutelogo Geral da Biblioteca Nacional de Espantildea registra

cinco exemplares desta ediccedilatildeo em acervo cf BIBLIOTECA NACIONAL DE ESPANtildeA Cataacutelogo General

de la BNE Disponiacutevel em lthttpcatalogobneesgt Acesso em 16 julho 2014 90 Mostram os estudos de John Monfasani Trebizonda emigrou para Veneza em 1416 a fim de trabalhar

na biblioteca de Francesco Barbaro (1398ndash1454) Em Veneza por volta de 1420 compocircs uma sinopse das

intitulada De generibus dicendi dedicada a Vittorino da Feltre professor de retoacuterica latina Em fins

de 1426 escreveu a Girolamo Bragadino seu aluno filho da nobreza local a epiacutestola conhecida como De

suauitate dicendi em que abordou a construccedilatildeo discursiva da Por fim vieram a puacuteblico os

Rhetoricorum libri V os quais efetivamente se fizeram um dos mais significativos veiacuteculos de circulaccedilatildeo da retoacuterica atribuiacuteda a Hermoacutegenes ao longo do seacuteculo XV Dos mais significativos deve-se ressaltar visto

que a publicaccedilatildeo que viria a ser considerada a editio princeps do corpo hermogeniano e que ademais fez

circular a obra do reacutetor em liacutengua grega os Rhetores graeci de Aldo Manuzio como se sabe soacute foram

estampados em 1508 cf MONFASANI J George of Trebizond A Biography and a Study of his Rhetoric

and Logic Leiden Brill 1976 pp 13 17-8 21 255-61 262-89 cf LAURENS P ldquoPrefacerdquo in

HERMOGENE LArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon

Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 8 91 Georgii Trapesuntii viri doctissimi atque eloquentissimi Rhetoricorum liber primus In libraria Leonardi

Pachel officina 1493 Pode-se ter acesso ao exemplar da Bayerische Staatsbibliothek Disponiacutevel em

lthttpdfg-viewerdeshowset5Bmets5D=http3A2F2Fdatendigitale-

ammlungende2F~db2Fmets2Fbsb00067294_metsxmlgt Acesso em 19 julho 2014

38

Brocar em 1511 com aditamentos de Hernando Alonso de Herrera92 em Paris por volta

de 1520 por Gilles de Gourmont93 na Basileia em 152294 em Veneza em 152395 em

Paris outra vez em 1532 por Christian Wechel96 em 1538 novamente por Wechel97 e

tambeacutem por Jean de Roigny98 e enfim em Estrasburgo em 1547 por Sebastiatildeo Grifo99

O Rhetoricorum libri V de Jorge de Trebizonda natildeo deixa de iterar Pierre Laurens

no prefaacutecio agrave ediccedilatildeo ldquoLrsquoAcircge drsquoHommerdquo de Hermoacutegenes fez-se dos mais significativos

veiacuteculos de difusatildeo da tratadiacutestica atribuiacuteda ao grego na Itaacutelia ao longo do seacuteculo XV100

92 Opus absolutissimum Rhetoricorum Georgii Trapezuntii cum additionibus Herrariensis [Compluti]

Impressum est in cocircplutensi academi in officina Arnaldi Guillelmi de Brocario 1511 A Biblioteca da

Universidade de Salamanca daacute a conhecer exemplar digital da obra O texto do tratado todavia impresso

em letras goacuteticas tal como digitalizado eacute quase que ilegiacutevel A despeito disso vale observaacute-lo Disponiacutevel

em lthttpgredosusalesjspuihandle1036619519gt Acesso em 14 agosto 2014 93 Giorgii trapezuntii qui suis temporibus sopitam amp tantum non mortua Eloquentiam suscitauit Ars

Rhetorica nunc in gallia impressa Et oratoribus nostri maacutexime accommotada Parisiis apud Aegidium

gourmontium qui in utraque liacutengua libros fidelissime imprimendos curat Natildeo haacute data na folha de rosto da

ediccedilatildeo Entende-se que tenha sido impressa por Gilles (ou Egidius) de Gourmont (1499-1540) entre 1519

e 1520 Pode-se ter acesso ao exemplar digital da Bayerische Staatsbibliothek Disponiacutevel em

lthttpreaderdigitale-sammlungenderesolvedisplaybsb10869453htmlgt Acesso em 19 julho 2014 94 Georgii Trapezuntii Rhetoricorum libri in quibus quid recens praestitum proxima facie indicabit

liminaris epistola In Inclyta Basilea 1522 Pode-se ter acesso ao exemplar digital da Bayerische

Staatsbibliothek Disponiacutevel lthttpreaderdigitale-sammlungenderesolvedisplaybsb10163827htmlgt

Acesso em 19 julho 2014 95 Trata-se de volume como o tiacutetulo jaacute o indica em que Trebizonda imprime-se conjuntamente com

Fortunaciano Aacutequila Romano Rutiacutelio Lupo Aristoacuteteles Prisciano Aftocircnio e Hermoacutegenes parafraseado

por Hilaacuterio de Veneza cf Continentur hoc volumine Georgii Trapezuntii Rhetoricorum libri V Consulti

Chirii Fortunatiani libri III Aquilae Romani de figuris sententiarum amp elocutionis liber P Rutilii Lupi

earundem figurarum e Gorgia liber Artistotelis rhetoricorum ad Theodecten Georgio Trapezuntio

interprete libri III Eiusdem rhetorices ad Alexandrum a Francisco Philelpho in Latinum uersae liber

Paraphrasis rhetoricae Hermogenis ex Hilarionis monachi Veronensis traductione Priscianus de

rhetoricae praeexercitamentis ex Hermogene Aphthonii declamatoris rhetorica progymnasmata Io Maria Catanaeo tralatore Venetiis in aedibus Aldi et Andreae Asulani soceri 1523 Pode-se ter acesso digital

ao exemplar da Bibliothegraveque nationale de France Disponiacutevel em

lthttpgallicabnffrark12148bpt6k990533qr=trapezuntiolangPTgt Acesso em 18 agosto 2014 96 Georgii Trapezuntii Rhetoricorum libri quinque ad manu scriptum exemplar diligentissimegrave repurgati

Parisiis excudebat Christianus Wechelus sub scuto Basiliensi in uico Iacobeo Anno M D XXXII [1532]

Pode-se ter acesso ao exemplar da Oumlsterreichische Nationalbibliothek Disponiacutevel em

lthttpbooksgooglecombrbooksid=05JXAAAAcAAJampprintsec=frontcoveramphl=pt-

BRv=onepageampqampf=false gt Acesso em 19 julho 2014 97 Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani Wecheli

M D XXXVIII [1538] Pode-se ter acesso ao exemplar da Bayerische Staatsbibliothek Disponiacutevel em

lthttpreaderdigitale-sammlungenderesolvedisplaybsb10313963htmlgt Acesso em 19 julho 2014 98 Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia ad D

Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] Pode-se ter acesso ao exemplar

digitalizado que integra o acervo da Bibliothegraveque nationale de France Disponiacutevel em

lthttpgallicabnffrark12148bpt6k64796zr=Georges+de+TrC3A9bizondelangPTgt Acesso em

19 julho 2014 99 Georgii Trapezuntii Rhetoricorum libri quinque Indicem capitum ac rerum in hoc opere contentatum

in calcem operis reiecimus Lvgdvni apvd Seb[astianum] Gryphivm 1547 Pode-se ter acesso ao exemplar

digital da Bayerische Staatsbibliothek Disponiacutevel em lthttpreaderdigitale-

sammlungenderesolvedisplaybsb10184351htmlgt Acesso em 19 julho 2014 100 Cf LAURENS P ldquoPrefacerdquo in HERMOGEgraveNE LArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale

introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 8

39

E desde entatildeo Considere-se o nuacutemero de estampas posteriores do tratado de Jorge de

Trebizonda saiacutedas de prelos os mais vaacuterios de diversas cidades europeias ateacute meados

do seacuteculo XVI Dessa obra aleacutem dos impressos elencados conhecem-se hoje 21

manuscritos incunaacutebulos de Veneza de 1472 e de Milatildeo de 1493101 Na Espanha sabe-

se conservar um desses manuscritos na Biblioteca da Academia de Histoacuteria102 e destaca-

se em territoacuterio espanhol ademais a atividade letrada de disciacutepulos de Jorge de

Trebizonda Eacute conhecida a atuaccedilatildeo mostra-o Luisa Loacutepez Grigera de Alfonso de

Palencia (1423-1492) de quem foi conservada parte da correspondecircncia trocada com o

mestre e de Hernando Alonso de Herrera (ca 1460-1527) amigo de Palencia e

catedraacutetico da Universidade de Alcalaacute de Henares responsaacutevel por mandar imprimir em

1511 o jaacute mencionado Opus absolutissimum Rhetoricorum Georgii Trapezuntii anotado

para uso escolar Supotildee-se que o prestiacutegio em Alcalaacute de Henares do Rhetoricorum libri

V soacute tenha sido abalado com a chegada agrave Universidade em 1513 de Antocircnio de Nebrija

(1441-1522) e a publicaccedilatildeo em 1515 de sua Artis rhetoricae compendiosa coaptatio ex

Aristotele Cicerone et Quintiliano103 Defende Luisa Loacutepez Grigera que Antocircnio de

Nebrija de quem Andreacute de Resende (1498-1573) foi disciacutepulo 104 tenha intentado

sobrepujar a autoridade de Jorge de Trebizonda105

De Portugal da recepccedilatildeo do Rhetoricorum libri V daacute indiacutecios Belmiro Fernandes

Pereira em artigo sobre a Rhetorica de Joachim Ringelberg

Em Portugal a julgar pelo nuacutemero de espeacutecies remanescentes nas

nossas bibliotecas natildeo teraacute sido despicienda a fortuna do mestre

bizantino No rol da livraria de Aquiles Estaccedilo figuram tanto os

Rhetoricorum libri V como os comentaacuterios de Trebizonda agraves oraccedilotildees de

Ciacutecero texto que tambeacutem se regista no inventaacuterio da biblioteca de D

Fernando Martins Mascarenhas saqueada no final do seacutec XVI pelos

101 Cf MONFASANI J George of Trebizond A Biography and a Study of his Rhetoric and Logic Leiden

Brill 1976 pp 13 17-8 21 255-61 262-89 LAURENS P ldquoPrefacerdquo in HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique

Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p

8 102 Cf LOacutePEZ GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Salamanca Universidad de

Salamanca 1994 p 77 103 Idem pp 56 75-7 104 Cf CASTRO A P de Retoacuterica e teorizaccedilatildeo literaacuteria em Portugal Do Humanismo ao Neoclassicismo

Coimbra Centro de Estudos Romacircnicos 1973 p 18 105 Cf LOacutePEZ GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Salamanca Universidad de

Salamanca 1994 p 77

40

ingleses Mas a melhor prova da aceitaccedilatildeo que teve entre noacutes a obra de

Trebizonda reside no facto de ter sido ele o autor escolhido quando foi

necessaacuterio dotar os alunos do Coleacutegio das Artes de um compecircndio para

o estudo da dialeacutectica Natildeo foi por acaso portanto que saiu em 1551

dos prelos conimbricenses de Joatildeo de Barreira a Georgii Trapezontii

Dialectica acompanhada das anotaccedilotildees de Diogo de Contreiras um

antigo escolar do coleacutegio de Santa Baacuterbara 106

Esses indiacutecios ao que parece natildeo se limitam agrave biblioteca de Aquiles Estaccedilo

Anibal Pinto de Castro entende natildeo haver duacutevida de que as liccedilotildees de Jorge de Trebizonda

tenham sido determinantes na composiccedilatildeo das doutrinas que expotildeem a Collectanea

Rhetorices de Joatildeo Vaseu (ca 1550) professor de retoacuterica no Coleacutegio Satildeo Paulo em

Braga107 A coletacircnea foi estampada em Salamanca em 1538108 Nominalmente fazendo

apelo agrave autoridade Joatildeo Vaseu cita mesmo sem referir a doutrina das ideai tou logou

natildeo apenas Jorge de Trebizonda mas tambeacutem Hermoacutegenes Siriano Filoxeno (seacutec V) e

Soacutepatro (seacutec IV) dito ldquoZopaterrdquo na Collectanea Rhetorices ambos comentadores de

Hermoacutegenes109

Par a par o Rhetoricorum libri V pode-se natildeo esquecer ademais de obras quais o

Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta

106 PEREIRA B F ldquoA ediccedilatildeo conimbricense da Rhetorica de Joachim Ringelbergrdquo Peniacutensula Revista de

Estudos Ibeacutericos n 1 (2004) pp 211-2 O exemplar da Georgii Trapezontii Dialectica citado por Belmiro

Fernandes Pereira integra hoje o acervo da Biblioteca Nacional de Portugal e antes pertenceu segundo os

registros da instituiccedilatildeo agrave Ordem de Satildeo Jerocircnimo ao Convento de Santa Maria de Beleacutem em Lisboa

Trata-se de Georgij Trapezontij Dialectica octo tractatus continens Et hos omnes cum scholijs Iacobi agrave

Contreiras Eborensis Conimbricae Apud Ioannem Barrerium amp Ioanne[m] Aluarum M D LI [1551]

Pode-se ter acesso ao exemplar Disponiacutevel em lthttppurlpt23345gt Acesso em 03 janeiro de 2015 107 Sobre Vaseu escreve Belmiro Pereira ldquoO flamengo Was (Vasaeus na forma latina) depois de estudar

as liacutenguas sacras na Universidade de Lovaina vem em 1531 por indicaccedilatildeo de Andreacute de Resende para a

Peniacutensula Ibeacuterica a pretexto de organizar a biblioteca de Fernando Colombo a futura Colombina de Sevilha

Em outubro de 1534 visita Clenardo em Eacutevora e este o convence a estabelecer-se em Salamanca Aqui continuando os seus estudos de Direito ensina Latim Grego e Retoacuterica sempre com extraordinaacuterio

sucesso Depois do magisteacuterio bracarense de 1538 a 1541 vai dirigir em Eacutevora a escola de humanidades

criada pelo cardeal-infante D Afonso Em 1550 regressa agrave universidade de Salamanca onde dois anos

volvidos eacute nomeado titular da cadeira de Prima de Gramaacuteticardquo PEREIRA B F ldquoA ediccedilatildeo conimbricense

da Rhetorica de Joachim Ringelbergrdquo pp 205-6 108 CASTRO A P DE Retoacuterica e teorizaccedilatildeo literaacuteria em Portugal Do Humanismo ao Neoclassicismo

Coimbra Centro de Estudos Romacircnicos 1973 p 18 109 Cf Ioannis Vasaei Brugensis Collectanea Rhetorices In gratiam eorum qui grauioribus occupati

disciplinis prolixiores ueterum cotildementarios euoluere non possunt [Salmanticae Gonzalo de Castantildeeda]

Anno M D XXXVIII [1538] Jorge de Trebizonda eacute nominalmente referido como autoridade na p 3v

Hermoacutegenes nas pp 12v 13r-v Soacutepatro na p 12v e Siriano nas pp 13v 14v

41

versatildeo latina de Antocircnio Bonfine impressa em Lion em 1538110 e em Veneza em

1539111 e o Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica

praecepta traduccedilatildeo para o latim de Natale Conti (ca 1520-1582) impresso na Basileia

em 1550 112 E por fim de versotildees quais Le Idee ouero Forme della oratione da

Hermogene de Giulio Camillo Delminio estampado em Uacutedine em 1594113 e LrsquoIdee

ouero Forme dellarsquoeloquentia de Filiberto Campanile estampado em Naacutepoles em

1606114

O texto grego de Hermoacutegenes divide as ideai tou logou e subdivide-as em gecircneros

e espeacutecies de modo a construir um corpo de doutrina que abarque no ofiacutecio da elocuccedilatildeo

os discursos oratoacuterios e poeacuteticos segundo os seus efeitos Satildeo sete os gecircneros referidos

Em traduccedilotildees recentes e talvez as mais acessiacuteveis 115 da iacutentegra do tratado de

Hermoacutegenes satildeo assim vertidos esses gecircneros (i) clarity (ii) grandeur (iii) beauty (iv)

rapidity (v) character (vi) sincerity e (vii) force na versatildeo inglesa de Cecil W Wooten

110 Cf Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii

item Sophistaelig Praeligexercitamenta Antonio Bonfine asculano interprete Apud Seb Gryphivm Lvgdvni

1538 Pode-se ter acesso ao exemplar da Oumlsterreichische Nationalbibliothek Disponiacutevel em

lthttpdigitalonbacatOnbViewerviewerfacesdoc=ABO_2BZ178223309gt Acesso em 15 julho

2014 cf PATTERSON A M Idem ibidem O Cataacutelogo Geral da Biblioteca Nacional de Espantildea registra um

exemplar desta ediccedilatildeo em acervo cf BIBLIOTECA NACIONAL DE ESPANtildeA Cataacutelogo General de la

BNE Disponiacutevel em lthttpcatalogobneesgt Acesso em 16 julho 2014 111 Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta De inuentione

libri quatuor De formis orationis tomi duo De methodo grauitatis siue virtutis commode dicendi

Aphtonii clarissimi Rhetoris praeexercitamenta Antonio Bonfine Asculano interprete Venetiis per Ioan

Anto de Nicolinis de Sabio sumptu vero amp requisitione D Melchioris sessae 1539 Pode-se ter acesso

parcial ao exemplar digitalizado da Biblioteca Nazionale Centrale di Firenze Disponiacutevel em lthttpiccu01ecaspuritmsinternetCulturalephpid=oai3Abncffirenzesbnit3A213AFI00983A

Magliabechi3ABVEE004124gt Acesso em 15 julho 2014 112 Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] Pode-se ter acesso ao exemplar da Bayerische Staatsbibliothek Disponiacutevel em

lthttpreaderdigitale-sammlungenderesolvedisplaybsb10170282htmlgt Acesso em 15 julho 2014 113 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini Pode-se ter acesso ao exemplar da Biblioteca Nazionale Centrale di Roma Disponiacutevel em

lthttpsarchiveorgdetailsbub_gb_VIaRx0R0sOoCgt Acesso em 15 julho 2014 114 LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina drsquoHermogene

e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con Licenza dersquo

Superiori 115 Sabe-se por via indireta que em 2012 foi publicada a obra completa de Hermoacutegenes em polonecircs

traduzida do grego por Henryk Podbielski do Instituto de Estudos Claacutessicos da Universidade Catoacutelica de

Lublin (KUL) cf LICHAŃSKI J Z ldquoThe Polish Translation of Hermogenes of Tarsusrdquo Forum Artis

Rhetoricae 2 33 (abr-jun 2013) p 82-84 Sobre a circulaccedilatildeo de Hermoacutegenes na Polocircnia ver CONLEY T

ldquoSome Renaissance Polish Commentaries on Aristotlersquos Rhetoric and Hermogenesrsquo On Ideasrdquo

Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 12 No 3 (Summer 1994) pp 265-292

42

(1987) 116 (i) claridad (ii) grandeza (iii) belleza (iv) rapidez (v) caraacutecter (vi)

sinceridad e (vii) fuerza na versatildeo espanhola de Antonio Sancho Royo (1991)117 (i)

claridad (ii) grandeza (iii) belleza (iv) viveza (v) caraacutecter (vi) sinceridad e (vii)

habilidad na versatildeo espanhola de Consuelo Ruiz Montero (1993)118 e (i) clarteacute (ii)

grandeur (iii) beauteacute (iv) vivaciteacute (v) eacutethos (vi) sinceacuteriteacute e (vii) habiliteacute na versatildeo

francesa de Michel Patillon (1997)119

De alguns desses gecircneros de quatro deles pendem treze espeacutecies de modo que o

retor grego assim preveja entre gecircneros e espeacutecies vinte diferentes ideai assim

discriminadas (i) saphēneia(construiacuteda mediante katharotēs e eukrineia 120 ) (ii)

megethos(construiacuteda mediante semnotēs trakhytēs sphodrotēs lamprotēs akmēe

peribolē 121) (iii) kallos (iv) gorgotēs (v) ēthos(construiacuteda mediante apheleia glykytēs

drimytēse epieikeia122 )(vi) alētheia(construiacuteda mediante barytēs123 ) e (vii) deinotēs

Em forma esquemaacutetica as ideai podem ser assim representadas

116 Cf HERMOGENES Hermogenesrsquo on types of style Translated by Cecil W Wooten Chapel Hill University of North Carolina Press 1987 117 Cf SANCHO ROYO A Hermoacutegenes Sobre los tipos de estilo y Sobre el meacutetodo del tipo Fueza

Introduccioacuten traduccioacuten y notas Sevilla Secretariado de Publicaciones de la Universidad 1991 Trata-se

de ediccedilatildeo que natildeo foi consultada para a elaboraccedilatildeo deste trabalho Baseio-me em artigo do tradutor

SANCHO ROYO A ldquoLa teoriacutea de los estilos de Hermoacutegenes y el discurso Sobre la corona de Demoacutestenesrdquo

Habis 33 (2002) p 273-299 118 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 119 Cf HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel

Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 120 purity pureza pureza pureteacute) e distinctness distincioacuten nitidez netteteacute) 121 (solemnity solemnidad solemnidad noblesse) (asperity aspereza aspereza

rudesse) (vehemence vehemencia vehemencia veacuteheacutemence) (brilliance

brillantez brillantez eacuteclat) (florecence florecimiento vigor vigueur) e (abundance

abundancia abundancia complication) 122 (simplicity sencillez simplicidade naiumlviteacute) (sweetness dulzura dulzura saveur)

(subtlety sutileza ingenio piquant) e (modesty modestia equidad moderation) 123 (indignation indignacioacuten severidade seacuteveacuteriteacute)

43

Figura 2 ldquoHermogenesrsquo Types and Subtypes of stylerdquo124

O esquema eacute parte integrante da introduccedilatildeo do helenista Cecil W Wooten ao

volume Hermogenesrsquo on types of style Traz o vocabulaacuterio grego de Hermoacutegenes

transliterado e o leacutexico inglecircs escolhido para traduzi-lo Representaccedilatildeo muito semelhante

haacute no artigo ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo com os termos gregos empregados no Peri ideōn e os

correspondentes latinos emprestados ao Rhetoricorum libri V de Jorge de Trebizonda125

124 Cf HERMOGENES Hermogenesrsquo on types of style Translated by Cecil W Wooten Chapel Hill

University of North Carolina Press 1987 p xii 125 Cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) p

147

44

Figura 3 ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo

Satildeo muito semelhantes os esquemas pois Cecil W Wooten e Lucia Calboli

Montefusco a despeito das diferenccedilas no leacutexico de ambos organizam graficamente a

doutrina das ideai natildeo soacute dando visualidade aos viacutenculos de gecircnero e espeacutecie construiacutedos

no Peri ideōn senatildeo tambeacutem subsumindo-as as ideai agrave deinotēs definida por

Hermoacutegenes como a idea que regula ldquoo emprego correto de todas as espeacutecies discursivasrdquo

(cf HERM 368 25-369 2 no passo em uso como comumente ocorre o sintagma

ldquordquo em vez de ldquordquo) Peca apenas por deslize talvez o

esquema da pesquisadora italiana pelo apagamento da idea de sphodrotēs ()

acrimonia segundo traduz Jorge de Trebizonda a terceira entre as seis espeacutecies que

constituem em termos de discurso o megethos a magnitudo126

Guardadas as diferenccedilas serve-se Filiberto Campanile no tratado LrsquoIdee overo

Forme dellarsquoeloquentia (1606) de pressuposto equivalente de organizaccedilatildeo ao pensar a

primazia da deinotēs na praacutetica discursiva destrinccedilada no corpo de doutrina a que se

dedica

126 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia

ad D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] pp 546-9

45

Figura 4 LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia (1606)127

Filiberto Campanile condensa os preceitos e ornamenta a obra por meio de

dispositivo que metaforiza o aspecto de uma aacutervore Eacute para ser evidente o tronco avanccedila

verticalmente como eixo de idee drsquoeloquentia (ou forme dellrsquoEloquentia del parlare ou

genere del parlare128) as ideai as mais geneacutericas ordenadas da base agrave copa e numeradas

de 1 a 7 em consonacircncia com a disposiccedilatildeo das liccedilotildees de Hermoacutegenes do princiacutepio ao

fim do Peri ideōn Na base a chiarezza na copa a grauitagrave Entre elas as demais idee

drsquoeloquentia as mais especiacuteficas subdivididas como ramos desde o tronco sempre

subsidiaacuterias arranjadas e numeradas tambeacutem conforme as liccedilotildees do Peri ideōn Note-se

que o leacutexico aiacute empregado para verter ao italiano a preceptiva grega e dar legibilidade no

127 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 116 128 Idem pp 5-6

46

vernaacuteculo agraves ideai tem antecedente em obra quase que homocircnima o Le Idee ouero

Forme della oratione da Hermogene e no esforccedilo de Giulio Camillo Delminio tradutor

do Peri ideōn em fins do seacuteculo XVI esforccedilo de especializaccedilatildeo dos termos para que

doutrinariamente natildeo se confundam A interpretaccedilatildeo de Giulio Camillo Delminio em

destaque discrimina sete idee ou forme della oratione e segue de perto o texto grego

Figura 5 Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene (1594)129

O exame comparativo de ambas as obras uma estampada em 1606 outra em 1594

uma de Filiberto Campanile outra de Giulio Camillo Delminio explicita filiaccedilatildeo de

leacutexico chiarezza grandezza belleza prestezza veritagrave (ou veritate) e grauitagrave (ou

gravitate) satildeo termos comuns Satildeo semelhantes as interpretaccedilotildees do mesmo Giulio

Camillo Delminio no ldquoDiscorso di M Giulio Camillo sopra Hermogenerdquo que integra Il

secondo tomo dellrsquoopere di M Giulio Camillo Delminio volume impresso postumamente

em Veneza em 1560 Neste caso poreacutem diferem os usos e as escolhas lexicais Giulio

Camillo Delminio e de Filiberto Campanile

129 Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini

47

Figura 6 ldquoDiscoro di M Giulio Camillo sopra Hermogenerdquo (1560)130

Note-se tal como o ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos o ldquoDiscorso di

M Giulio Camillo sopra Hermogenerdquo agrave diferenccedila das obras supracitadas tabula as

ldquoforme di Hermogenerdquo sem mencionar a deinotēs (ou grauitagrave ou grauitate) Mais no

cotejo com o tratado seiscentista LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia prefere seueritagrave

a dignitagrave ao verter semnotēs prefere o grego (peribolē) a qualquer traduccedilatildeo a

de Filiberto Campanile eacute circuitione prefere acrimonia a acutezza ao verter drimytēsEm

Manuel de Galhegos como se viu essas ideai parecem proliferar e a afirmaccedilatildeo das

excelecircncias da Ulyssea ou Lisboa Edificada compreende categorias que natildeo se

reconhecem nos esquemas de Cecil W Wooten de Lucia Calboli de Filiberto Campanile

ou de Giulio Camillo Delminio que natildeo se reconhecem como pendentes dos usos

linguiacutesticos e retoacutericos do Peri ideōn Assim ainda que se entendam operatoacuterias as ideai

no ldquoDiscurso Poeacuteticordquo pois que sejam referidas como ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo (i) ldquoclaridaderdquo

(ou ldquoSaphiniardquo) (ii) ldquograndezardquo (iii) ldquofermosurardquo (ou ldquogalhardiardquo) (iv) ldquoPreccedilardquo (ou

ldquoGorgotisrdquo) (v) ldquocostumerdquo (ou ldquocaracterrdquo) e (vi) ldquoverdaderdquo em referecircncia a Hermoacutegenes

ainda que se possa assumir que ldquograuerdquo e ldquoferozrdquo sejam traduccedilotildees possiacuteveis para o

adjetivo grego deinos de modo a envolver a ideia de (vii) deinotēs em referecircncia

130 Cf Il secondo tomo dellrsquoopere di M di Giulio Camillo Delminio cioegrave La Topica ouero dellrsquoElocutione

Discorso sopra lrsquoIdee di Hermogene La Grammatica Espositione sopra il primo amp secondo Sonetto del

Petrarca Nvovamente dato in lvce Con privilegio In Venegia apresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLX

[1560] p 116

48

plausiacutevel a Hermoacutegenes o que apartaria Manuel de Galhegos de Giulio Camillo

Delminio ainda assim escapam ao Peri ideōn o que eacute da ordem do ldquotristerdquo do ldquoalegrerdquo e

do ldquofloridordquo Eacute evidente Manuel de Galhegos natildeo redige um tratado natildeo deve conforme

o decoro o leitor esperar dele a acribia do tratadista todavia eacute oportuno discutir que

intercessotildees haacute aqui Para fazecirc-lo eacute proveitoso atentar que no ldquoDiscurso Poeacuteticordquo

coadunam-se agraves de Hermoacutegenes as liccedilotildees de Quintiliano Satildeo conhecidos os passos da

Institutio oratoria de que pendem a afirmaccedilatildeo de Manuel de Galhegos ldquoA grandeza do

estilo (a q Quintiliano chama Adron) estagrave aqui tantordquo

Altera est divisio quae in tris partis et ipsa discedit qua discerni posse

etiam recta dicendi genera inter se videntur Namque unum subtile

quod ischnon vocant alterum grande atque robustum quod hadron

dicunt constituunt tertium alii medium ex duobus alii floridum

(namque id antheron appellant) addiderunt (QUINT XII 10 58)

Existe uma outra divisatildeo que tambeacutem se divide ela mesma em trecircs

partes na qual ainda parecem poder distinguir-se um dos outros os

corretos gecircneros do discurso Com efeito um eacute o sutil que chamam

iskhnoacutes outro o grandioso e robusto que dizem hadroacutes o terceiro uns

o estabelecem no meio dos dois outros o deram como florido (pois o

nomeiam antheroacutes)131

Diga-se ldquoAltera est divisiordquo haacute outra divisatildeo porque antes Quintiliano discrimina

trecircs genera dicendi a saber os gecircneros aacutetico (Atticus) roacutedio (Rhodius) e asiano (Asianus)

O primeiro compresso e iacutentegro nada supeacuterfluo o derradeiro inflado e inane carente de

131 A traduccedilatildeo eacute de Thaiacutes Morgado Martin cf MARTIN T M ldquoDos gecircneros de discurso (QUINT XII 1058-

80)rdquo Letras claacutessicas Satildeo Paulo 2005 v 9 p 225-226 Na traduccedilatildeo de Jerocircnimo Soares Barbosa (ca 1737-1816) ldquoHa outra divisatildeo dos Estilos repartidos tambem em tres especies pelas quais se podem

outrosim distinguir entre si os diferentes caracteres de Eloquencia Hum he о Subtil chamado em Grego

Ischnos o segundo o Grande e Robusto chamado pelos Gregos Adros Acrescentaraotilde alguns hum terceiro

a que huns chamaotilde Mediocre por ser composto dos dois e outros Florido traduzindo deste modo o termo

Grego Antherosrdquo cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros

traduzidas em linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que

aprendem Ajuntaotilde-se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas

Instituiccediloens por Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade

de Coimbra Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila

da Real Meza da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a

novecentos e sessenta reis em papel p 415-6

49

juiacutezo e tambeacutem de moderaccedilatildeo132 o intermeacutedio misto nem compresso como o aacutetico nem

abundante como o asiano133 Ressalte-se na liccedilatildeo de Quintiliano natildeo se questiona que o

aacutetico seja o melhor dos gecircneros134 Jaacute a triparticcedilatildeo dos genera dicendi em subtile ou

iskhnon (ἰσχνόν)135 em grande e robustum ou hadron (ἁδρόν) em medium ou floridum

ou antheron (ἀνθηρόν) prevecirc que o primeiro tenha como ofiacutecio ensinar o segundo

comover e o terceiro deleitar ou conciliar de modo que se pareccedilam exigir a agudeza

(acumen) para o ensinamento a brandura (lenitas) para a conciliaccedilatildeo e o vigor (vis) para

a comoccedilatildeo Empregue-se assim mirando-se o ensinamento de acordo com Quintiliano

o gecircnero sutil nas narraccedilotildees e nas provas (cf QUINT XII 10 59)136 o gecircnero meacutedio

distintamente para deleitar haacute de ser mais frequente nas traslaccedilotildees mais apraziacutevel nas

figuras mais ameno nas digressotildees adequado na composiccedilatildeo doce nas sentenccedilas (cf

QUINT XII 10 60)137 e por fim o gecircnero grande e robusto cujo efeito deva ser a

comoccedilatildeo e o arrebatamento se elevaraacute por meio de amplificaccedilotildees e de superlaccedilotildees (cf

QUINT XII 10 62)138

Quintiliano assim como Secircneca nas Epiacutestolas morais a Luciacutelio jaacute o mostrou

Marcos Martinho dos Santos opera doutrina de gecircneros tripartite ao modo da Rhetorica

ad Herennium e de Ciacutecero Logo satildeo esses os genera dicendi para Quintiliano como satildeo

as figurae para o Anocircnimo ldquograuerdquo ldquomediocrerdquo e ldquoattenuatumrdquo como o satildeo os genera

para Ciacutecero ldquograve ou pleno ou sublime ou amplo ou grandiacuteloquo ou veemente ou

copiosordquo ldquosutil ou tecircnue ou atenuado ou compresso ou remisso ou humilderdquo e ao cabo

ldquomeacutedio ou mediacuteocre ou temperado ou moacutedico ou intermediaacuteriordquo no elenco de

Martinho139 Recorde-se grave pleno sublime amplo grandiacuteloquo veemente copioso

132 QUINT XII 10 16 ldquocum Attici pressi et integri contra Asiani inflati et inanes haberentur in his nihil

superflueret illis iudicium maxime ac modus deessetrdquo Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica

de Horaacuteciordquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2000 v 4 p 237 133 QUINT XII 10 18 ldquotertium mox qui haec dividebant adiecerunt genus Rhodium quod velut medium

esse atque ex utroque mixtum volunt neque enim Attice pressi neque Asiane sunt abundantesrdquo 134 QUINT XII 10 18 ldquoNemo igitur dubitaverit longe esse optimum genus Atticorumrdquo 135 Aponta-se aqui o adjetivo neutro grego (ἰσχνόν) em concordacircncia com o substantivo ldquogenusrdquo A

traduccedilatildeo de Thaiacutes Morgato Martiacuten translitera a forma masculina do adjetivo (ischnoacutes ἰσχνό) 136 QUINT XII 10 59 ldquoquorum tamen ea fere ratio est ut primum docendi secundum movendi tertium

illud utrocumque est nomine delectandi sire ut alii dicunt conciliandi praestare videatur officium in

docendo autem acumen in conciliando lenitas in movendo vis exigi videatur itaque illo subtili praecipue

ratio narrandi probandique consistet sed saepe id etiam detractis ceteris virtutibus suo genere plenumrdquo 137 QUINT XII 10 60 ldquomedius hic modus et translationibus crebrior et figuris erit iucundior

egressionibus amoenus compositione aptus sententiis dulcis lenior tamen ut amnis lucidus quidem sed

uirentibus utrinque ripis inumbratusrdquo 138 QUINT XII 10 62 ldquoHic et amplificationibus extollet orationem et in superlationem quoque erigeturrdquo 139 Cf SANTOS M M ldquoArte dialoacutegica e epistolar segundo as Epiacutestolas morais a Luciacuteliordquo Letras Claacutessicas

Satildeo Paulo 1999 v 3 p 51

50

grande ou robusto eacute o gecircnero ldquoAdronrdquo (ou hadron ou ἁδρόν) cujos meios e cujos fins

Manuel de Galhegos particularmente refere a partir das liccedilotildees da Institutio oratoria ao

elencar a variedade de ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo em uso na Ulyssea ou Lisboa Edificada de

Gabriel Pereira de Castro Note-se o termo latino ldquoformardquo eacute empregado na liccedilatildeo de

Quintiliano

[66] Sed neque his tribus quasi formis inclusa eloquentia est Nam ut

inter gracile validumque tertium aliquid constitutum est ita horum

inter se intervalla sunt atque inter haec ipsa mixture quiddam ex

duobus medium est eorum [67] nam et subtili plenius aliquid atque

subtilius et vehementi remissius atque vehementius invenitur ut illud

lene aut ascendit ad fortiora aut ad tenuiora summittitur Ac sic prope

innumerabiles species reperiuntur quae utique aliquo momento inter se

differant sicut quattuor ventos generaliter a totidem mundi cardinibus

accepimus flare cum interim plurimi medii et eorum varia nomina et

quidam etiam regionum ac fluminum proprii deprehenduntur

[68] Eademque musicis ratio est qui cum in cithara quinque

constituerunt sonos plurima deinde varietate complent spatia illa

nervorum atque his quos interposuerunt inserunt alios ut pauci illi

transitus multos gradus habeant

[69] Plures igitur etiam eloquentiae faces sed stultissimum quaerere

ad quam se recturus sit orator cum omnis species quae modo recta est

habeat usum atque id ipsum non sit oratoris quod vulgo genus dicendi

vocant Utetur enim ut res exiget omnibus nec pro causa modo sed

pro partibus causae

[70] Nam ut non eodem modo pro reo capitis et in certamine hereditatis

et de interdictis ac sponsionibus et de certa credita dicet sententiarum

quoque in senatu et contionum et privatorum consiliorum servabit

discrimina multa ex differentia personarum locorum temporumque

mutabit ita in eadem oratione aliter concitabit aliter conciliabit non

ex iisdem haustibus iram et misericordiam petet alias ad docendum

alias ad movendum adhibebit artes

[71] Non unus color prooemii narrationis argumentorum egressionis

perorationis servabitur Dicet idem graviter severe acriter vehementer

51

concitate copiose amare comiter remisse subtiliter blande leniter

dulciter breviter urbane non ubique similis sed ubique par sibi

[72] sic fiet cum id propter quod maxime repertus est usus orationis ut

dicat utiliter et ad efficiendum quod intendit potenter tum laudem

quoque nec doctorum modo sed etiam vulgi consequatur (QUINT XII

10 66-72)

[66] Mas a eloquecircncia natildeo estaacute encerrada nessas trecircs ndash digamos ndash

formas Pois assim como entre o gracioso e o vigoroso se estabeleceu

um terceiro assim tambeacutem existem intervalos desses e entre esses

mesmos [intervalos] existe certo intermediaacuterio misturado dos dois [67]

jaacute que tanto se encontra algo mais pleno e mais sutil que o sutil quanto

[algo] mais remisso e mais veemente que o veemente assim como o

brando ou ascende ateacute o mais forte ou se submete ao mais tecircnue E assim

se descobrem espeacutecies quase inumeraacuteveis que de qualquer modo

diferem entre si por alguma circunstacircncia assim como aceitamos que

de modo geral quatro ventos sopram de outros tantos pontos cardeais

do mundo quando todavia se compreendem muito mais intermediaacuterios

e variados nomes deles e alguns ainda proacuteprios de regiotildees e tambeacutem de

rios

[68] E o mesmo raciociacutenio haacute para os muacutesicos que apoacutes ter instituiacutedo

na ciacutetara cinco sons logo completam aqueles espaccedilos das cordas com

muito mais numerosa variedade [de sons] e ainda entre aqueles [sons]

que inserem interpotildeem outros de modo que aquelas poucas transiccedilotildees

tenham muitos graus

[69] Ainda mais faces da eloquecircncia portanto existem mas seria a

coisa mais tola indagar para qual o orador haacute de dirigir-se uma vez que

toda espeacutecie que de algum modo eacute correta tem utilidade e aquilo

mesmo que vulgarmente chamam gecircnero de discurso natildeo eacute proacuteprio do

orador pois ele utilizaraacute conforme exija o caso de todas e natildeo soacute de

acordo com a causa mas de acordo com as partes da causa

[70] Com efeito assim como natildeo com um mesmo modo discursaraacute a

favor do reacuteu de uma [causa] capital e em uma contestaccedilatildeo de heranccedila e

a respeito de interdiccedilotildees e tambeacutem fianccedilas e empreacutestimo certificado

preservaraacute as distinccedilotildees das sentenccedilas no senado e assembleacuteias e dos

conselhos privados mudaraacute muitas coisas de acordo com a diferenccedila de

52

pessoas locais e tempos assim tambeacutem em um mesmo discurso de

um modo incitaraacute de outro conciliaraacute natildeo de um mesmo hausto

alcanccedilaraacute a ira e a misericoacuterdia admitiraacute umas artes para ensinar outras

para mover

[71] Natildeo seraacute preservada a mesma a cor do proecircmio da narraccedilatildeo das

argumentaccedilotildees da digressatildeo e da peroraccedilatildeo Discursaraacute acerca da

mesma coisa de forma grave severa acerba veemente raacutepida copiosa

amarga acerca da mesma coisa de forma afaacutevel remissa sutil

agradaacutevel branda doce breve elegante natildeo em toda parte semelhante

mas em toda parte agrave altura de si mesmo

[72] Assim se faraacute quando aquilo por que o uso do discurso foi

inventado sobretudo ndash [isto eacute] ndash que discurse com utilidade e poder para

perfazer o que pretende ndash entatildeo consiga tambeacutem o elogio natildeo soacute dos

doutos mas ainda do vulgo 140

Ora deixa evidente o longo passo os genera dicendi satildeo ldquoquasi formaerdquo como

que formas (QUINT XII 10 66l) A eloquecircncia todavia de poetas e de oradores as liccedilotildees

de Quintiliano satildeo bastantemente expliacutecitas natildeo se prescreve encerrada aos trecircs gecircneros

como se fossem pensados agrave maneira de uma teacutecnica elocutiva de hiperuniformizaccedilatildeo dos

usos mas compotildee-se na distacircncia entre eles treslendo-se Roland Barthes nas malhas

intervalares da elocuccedilatildeo141 de fatura mista sempre mista Entre os gecircneros os trecircs o

repertoacuterio de leacutexico e de sintaxe eacute de ldquoespeacutecies quase inumeraacuteveisrdquo (cf QUINT XII 10

67 prope innumerabiles species) segundo gradaccedilotildees sucessivas previstas numa relaccedilatildeo

de diferenccedila do mais sutil ao mais veemente em que se abarquem observando-se bem de

perto o preceito da Institutio oratoria categorias como o grave o severo o acerbo o

veemente o raacutepido o copioso o amargo E mais o afaacutevel o remisso o sutil o agradaacutevel

o brando o doce o breve o elegante Ou se talvez quisermos pensar com Manuel de

Galhegos E mais o ldquograuerdquo o ldquotristerdquo o ldquoalegrerdquo o ldquoferozrdquo o ldquoseverordquo e o ldquofloridordquo

Todas satildeo formae que fazem proliferar a variaccedilatildeo especiacutefica entre os genera dicendi

cujos usos conveacutem isso reter do preceito devam ser balizados pelo aptum de cada

140 Cf MARTIN T M ldquoDos gecircneros de discurso (QUINT XII 1058-80)rdquo Letras claacutessicas Satildeo Paulo 2005

v 9 pp 226-227 141 Por ldquomalhardquo entende-se o francecircs ldquoreacuteseaurdquo cf BARTHES R ldquoLancienne rheacutetorique [Aide-meacutemoire]rdquo

In Communications 16 1970 Recherches rheacutetoriques p 218

53

enunciado em cada situaccedilatildeo de discurso (situation de discours) 142 Disso resulta a

eloquecircncia a elocuccedilatildeo eacute sempre o outro ldquoaquilo mesmo que vulgarmente chamam

gecircnero de discurso natildeo eacute proacuteprio do oradorrdquo (cf QUINT XII 10 69 id ipsum non sit

oratoris quod vulgo genus dicendi vocant) 143 E sempre outra

A assimiliccedilatildeo das formae dos genera dicendi de Quintiliano agraves ideai de

Hermoacutegenes pensada por Manuel de Galhegos e operada no juiacutezo encomiaacutestico agrave

Ulyssea ou Lisboa Edificada conhece-se ademais da traduccedilatildeo setecentista que

Jerocircnimo Soares Barbosa elaborou da parte final do mesmo excerto (QUINT XII 10 71-

72) exposta nas Instituiccedilotildees oratorias de M Fabio Quintiliano (1788 e 1790) Essa liccedilatildeo

repotildee a muacutesica nos planos da retoacuterica juntas se sabem ainda que sejam cientes da

especificidade de seus artifiacutecios e supotildee que entre as trecircs formae de Quintiliano ou quasi

formae interpretadas como ldquotres foacutermas geraes de estylordquo existam ldquoDifferentes tons e

Gradaccedilotildees dos tres Estilosrdquo assim pensados

A estas gradaccedilotildees e degradaccedilotildees do mesmo estilo chamavaotilde os Latinos

Colores e os Francezes com hum termo muito proprio Nuances du

Stile e noacutes lhe podemos chamar Matizes tirada a metaphora da

augmentacaotilde e diminuiccedilaotilde insensivel de huma mesma cor com que

por graos passa ou do escuro ao claro ou do claro ao escuro Os

mesmos Latinos Ihes chamavaoacute tambem Voces e noacutes lhe podemos dar

o nome de Tons do estilo aacute maneira dos da Musica que sendo sete

principaes em cada outava estes mesmos admittem tantas gradaccedilotildees e

degradaccedilotildees que hum ouvido exercitado pode distinguir em cada

outava 43 differentes e ainda entre cada hum destes ha muitos outros

intermeacutedios que o ouvido do homem poacutede sentir mas naotilde distinguir

Assim cada hum dos tres estilos principaes pode sem sahir do seu

genero subir gradualmente ateacute o maacuteximo e descer do mesmo modo ateacute

o minimo O Sublime pode ser mais ou menos sublime o Simples mais

ou menos simples O Medio da mesma sorte pode participar mais ou

menos do sublime aacute proporccedilaotilde que sobe e mais ou menos do simples aacute

medida que desce No mais ou menos haacute infinitas gradaccedilotildees cujos

142 Cf DUCROT O TODOROV T Dicionaacuterio Enciclopeacutedico das Ciecircncias da Linguagem 3ordf ediccedilatildeo Satildeo

Paulo Perspectiva 2007 pp 297-300 143 Cf HANSEN J A ldquoRepresentaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo na literatura de Machado de Assisrdquo Ciecircncia Hoje nordm 253

out 2008 p 37

54

limites nam se podem assignar poreacutem que nem por isso deixaotilde de ser

menos reaes e que hum escriptor exacto e de hum gosto fino e delicado

sabe guardar amoldando o seu estilo a cada genero a cada causa a cada

parte da oraccedilaotilde e a cada pensamento sob pena de naotilde merecer o nome

de Orador ou de Poeta que tem144

O rodapeacute muito explicitamente atualiza o que parece consabido na longuiacutessima

vigecircncia da retoacuterica como instituiccedilatildeo de codificaccedilatildeo das praacuteticas discursivas preceito que

antes neste trabalho se fez pender de Diego de Saavedra Fajardo de Manuel de Galhegos

de Francesco Petrarca de D Luiacutes de Goacutengora segundo o qual haacute sublimidades haacute

medianidades haacute simplicidades No plural Prescreve o letrado luso nos termos desses

preceitos serem quatro os tons operados como gradaccedilotildees dos genera discursivos a

saber (i) ldquoTom do Generordquo devem ser diferentes por conveniecircncia os estilos do

deliberativo do judicial e do demonstrativo da epopeia da trageacutedia e da comeacutedia (ii)

ldquoTom da Causardquo devem ser mais ornadas certas causas que outras no mesmo gecircnero

tratadas num tom as causas capitais noutro as particulares num estilo as suasoacuterias diante

do Senado noutro as diante do povo noutro ainda as diante de um uacutenico homem

semelhantemente podem ser mais ou menos traacutegicas e mais ou menos cocircmicas a Trageacutedia

e a Comeacutedia (iii) ldquoTom das partesrdquo deve ser distinto em estilo o discurso ou o poema em

suas partes em conformidade com o fim de instruir de deleitar ou de mover de modo

que variem exoacuterdio narraccedilatildeo prova ou peroraccedilatildeo assim tambeacutem na trageacutedia haacute cenas

mais ou menos vigorosas e na epopeia episoacutedios mais ou menos sublimes na trageacutedia

o estilo elevado abate-se na expressatildeo da dor e na excitaccedilatildeo da compaixatildeo e na comeacutedia

o estilo simples irmana-se do tom elevado na indignaccedilatildeo e por fim (iv) ldquoTom de cada

pensamento e de cada idegraveiardquo eacute imperioso que se mantenham os caracteres das partes do

discurso (ou poema) por mais breves que sejam como faz Ciacutecero no discurso Pro

Balbo145

144 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel pp 426-427 145 Idem p 427

55

Eacute evidente as Instituiccedilotildees oratorias de M Fabio Quintiliano natildeo satildeo a Institutio

oratoria Jerocircnimo Soares Barbosa lecirc Quintiliano e desfia a noccedilatildeo de tom e os modos de

regulaacute-lo com decoro conforme o verbete homocircnimo apresentado no tomo 16 de 1765

o derradeiro da Encyclopeacutedie ou dictionnaire raisonneacute des sciences des arts et des

meacutetiers editada por Denis Diderot (1713-1784) e Jean le Rond drsquoAlembert (1717-1783)

TON (Prose amp Poeacutesie) couleurs nuances du style langage qui

appartient agrave chaque ouvrage

Il y a 1deg le ton du genre crsquoest par exemple du comique ou du tragique

2deg le ton du sujet dans le genre le sujet peut ecirctre comique plus ou

moins 3deg le ton des parties chaque partie du sujet a outre le ton

geacuteneacuteral son ton particulier une scegravene est plus fiere amp plus vigoureuse

qursquoune autre celle-ci est plus molle plus douce 4deg le ton de chaque

penseacutee de chaque ideacutee toutes les parties quelque petites qursquoelles

soient ont un caractere de proprieacuteteacute qursquoil faut leur donner amp crsquoest ce

qui fait le poeumlte sans cela cur ego poeumlta salutor On bat souvent des

mains quand dans une comeacutedie on voit un vers tragique ou un lyrique

dans une trageacutedie Crsquoest un beau vers mais il nrsquoest point ougrave il devroit

ecirctre

Il est vrai que la comeacutedie eacuteleve quelquefois le ton amp que la trageacutedie

lrsquoabaisse mais il faut observer que quelque essor que prenne la

comeacutedie elle ne devient jamais heacuteroiumlque On nrsquoen verra point

drsquoexemple dans Moliere Il y a toujours quelque nuance du genre qui

lrsquompecircche drsquoecirctre tragique De mecircme quand la trageacutedie srsquoabaisse elle ne

descend pas jusqursquoau comique Qursquoon lise la belle scegravene ougrave Phedre

paroicirct deacutesoleacutee le style est rompu abattu si jrsquoose mrsquoexprimer ainsi

crsquoest toujours une reine qui geacutemit

Ce que nous venons de dire du ton en poeacutesie srsquoapplique eacutegalement agrave la

prose Il y a chez elle le ton simple ou familier le ton meacutediocre amp

le ton soutenu selon le genre de lrsquoouvrage le sujet dans le genre amp les

parties du sujet Enfin le ton ou le langage drsquoun conte drsquoune lettre

drsquoune histoire drsquoune oraison funebre doivent ecirctre bien

diffeacuterens Voy STYLE (D J) 146

146 Cf Encyclopeacutedie ou dictionnaire raisonneacute des sciences des arts et des meacutetiers par une socieacuteteacute de gens

de lettres Mis en ordre et publieacute par M Tome seizieme TEA-VENERIE A Neufchastel chez Samuel

56

TOM (Prosa amp Poesia) cores nuanccedilas do estilo linguagem que eacute

proacutepria a cada obra

Haacute 1deg o tom do gecircnero eacute por exemplo do cocircmico ou do traacutegico 2deg

o tom da mateacuteria no gecircnero a mateacuteria pode ser mais ou menos cocircmica

3deg o tom das partes cada parte da mateacuteria tem aleacutem do tom geral seu

tom particular uma cena eacute mais altiva amp mais vigorosa que outra esta

eacute mais deacutebil mais doce 4deg o tom de cada pensamento de cada ideia

todas as partes por menores que elas sejam constam de um caraacuteter de

propriedade que lhe seja preciso conferir e eacute o que faz o poeta sem isso

cur ego poeumlta salutor147 Aplaude-se amiuacutede quando em uma comeacutedia

vecirc-se um verso traacutegico ou um liacuterico em uma trageacutedia Eacute um belo verso

mas natildeo estaacute onde deveria estar

Eacute verdade que a comeacutedia eleva por vezes o tom amp que a trageacutedia o

abaixa mas eacute preciso observar que nenhum voo que tome a comeacutedia

deve jamais tornaacute-la heroica Natildeo se veraacute exemplo disso em Moliegravere

Haacute sempre uma nuanccedila do gecircnero que o impede de ser traacutegico Assim

tambeacutem quando a trageacutedia se abaixa ela natildeo desce ateacute o cocircmico

Quando se lecirc a bela cena em que Fedra parece desolada rompe-se

abate-se o estilo se ouso assim exprimir-me eacute sempre uma rainha que

se lamenta

O que acabamos de dizer do tom na poesia aplica-se igualmente agrave prosa

Haacute nela o tom simples ou familiar o tom mediacuteocre amp o tom

sustentado148 segundo o gecircnero da obra a mateacuteria no gecircnero e as partes

da mateacuteria Enfim o tom ou a linguagem de um conto de uma carta de

uma histoacuteria de uma oraccedilatildeo fuacutenebre devem ser bastante diferentes

Ver ESTILO (D J)149

Faulche amp Compagnie Libraires amp Imprimeurs [1765] p 403 A liccedilatildeo se repete em francecircs quase que

literalmente no Dictionnaire de Litteacuterature do Abade Antoine Sabatier de Castres estampado em 1770

Variam apenas os exemplos selecionados pelo autor cf Dictionnaire de Litteacuterature Dans lequel on traite

de tout ce qui a rapport agrave lEloquence agrave la Poeumlsie amp aux Belles-Lettres amp dans lequel on enseigne la

Marche amp les Reacutegles quon doit observer dans tous les Ouvrages desprit Par M LrsquoAbbeacute Antoine Sabatier

de Castres Tome Troiseme A Paris chez Vincent Imprimeur- Libraire rue Saint Severin MDCCLXX

[1770] Avec Approbation amp Privileacutege du Roi p 18 147 Trata-se de passo de verso de Horaacutecio da Epistula ad Pisones ldquocur ego si nequeo ignoroque poeumlta

salutorrdquo [por que eu se natildeo posso e ignoro sou aclamado poeta] (HOR AP 87) 148 Isso seja um estilo mantido nas alturas 149 Traduccedilatildeo nossa

57

Jerocircnimo Soares Barbosa manteacutem agrave vista o enciclopedista Louis de Jaucourt

(1704-1779) o redator do verbete mas a Encyclopeacutedie natildeo ilustra novidades organiza o

conhecido150 a bem dizer como se veraacute a metaforizaccedilatildeo das gradaccedilotildees das formae

estiliacutesticas como tons de intensidades variadas eacute longeva e tem antecedentes vernaculares

e latinos satildeo ldquotuonirdquo eacute liccedilatildeo do poeta Giovanni Battista Guarini (1538-1612) no discurso

Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le tragicomedie

e le pastorali in un suo discorso di poesia datado de 1588151 satildeo ldquosonirdquo eacute liccedilatildeo de Jorge

de Trebizonda no Rhetoricorum libri V 152 segundo Ciacutecero no De optimo genere

oratorum (cf CIC Opt I1)153 Por exemplo154

150 O ldquoMr drsquoAlembertrdquo e a ldquoEncyclopediardquo satildeo citados por Jerocircnimo Soares Barbosa cf Instituiccediloens

oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em linguagem e illustradas

com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-se no fim as Peccedilas

originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por Jeronymo Soares

Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra Tomo Primeiro Em

Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza da Commissatildeo

Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta reis em papel

p 10 Cf TEIXEIRA I ldquoArtifiacutecio persuasatildeo e sociedade em Olavo Bilacrdquo Revista USP nordm 54 ago 2002 p 103 151 Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le tragicomedie e le pastorali

in un suo discorso di poesia Con privilegio In Ferrara Ad Instanza di Alfonso Caraffa 1588 Con licenza

de Superiori pp 37r-37v 152 Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia ad

D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] pp 494-495 153 CIC Opt I 1 ldquoOratorum genera esse dicuntur tamquam poetarum id secus est nam alterum est

multiplex Poematis enim tragici comici epici melici etiam ac dithyrambici quo magis est tractatum a

Latinis suum cuiusque est diversum a reliquis Itaque et in tragoedia comicum vitiosum est et in comoedia

turpe tragicum et in ceteris suus est cuique certus sonus et quaedam intellegentibus nota voxrdquo [Dizem

existir gecircneros tanto de oradores como de poetas natildeo eacute assim pois num caso se trata de unicidade noutro

se tem multiplicidade Do poema traacutegico do cocircmico do eacutepico do liacuterico e ateacute do ditiracircmbico como foi praticado pelos gregos realmente existe de cada um o gecircnero proacuteprio diverso dos demais assim tanto o

cocircmico eacute vicioso na trageacutedia como o traacutegico eacute torpe na comeacutedia e nos outros gecircneros existe para cada um

determinado tom proacuteprio e um acento noto para conhecedores] cf ALONSO JUacuteNIOR C O melhor gecircnero de

oradores I-IV V 15-16 VI 16-17 Letras claacutessicas Satildeo Paulo 2000 v 4 p 343 154 Diga-se trata-se de liccedilatildeo que se itera enquanto vige a retoacuterica como instituiccedilatildeo que regula as praacuteticas

discursivas Depreende-se assim do Compedio de rhetorica e poetica de Manoel da Costa Honorato cuja

quarta ediccedilatildeo foi dada agrave impressatildeo no Rio de Janeiro em 1879 adaptada ao programa curricular da cadeira

de Retoacuterica Poeacutetica e Literatura Nacional disciplina ministrada no Imperial Coleacutegio Pedro II ldquoConveacutem

advertir que cada uma destas especies de estylos eacute susceptivel de gradaccedilotildees porque o tenue ora seraacute mais

ora menos subtil o sublime mais ou menos robusto e temperado subiraacute ao sublime ou desceraacute ao singelo

Ha portanto em um mesmo genero ou especie uma infinidade de variaccedilotildees que mostrando sempre alguma differenccedila ainda que diminuta comtudo eacute difficil de classificar deve pois o orador prestar attenccedilatildeo agrave

conveniencia afim de accomodar linguagem ao assumpto de que se occupa ndash A conversaccedilatildeo familiar e as

cartas requerem estylo tenue e singelo os commentarios as memorias os dialogos e o discurso didactico

em prosa tambeacutem exigem estylo simples e natural A historia demanda estylo temperado e quando nella

entratildeo descripccedilotildees de paizes e logares a linguagem deve ser mais amena e florida poreacutem sempre natural

No discurso oratorio o estylo varia segundo o genero de eloquencia assumpto e partes do mesmo discurso

na eloquencia judicial o estylo deve ser ora temperado ora subtil os discursos da tribuna e do pulpito

devem ser expostos com o estylo sublime e robusto Ao exordio estaacute bem o tenue o estylo da narraccedilatildeo deve

ser facil e rapido e o da confirmaccedilatildeo nobre e sublime [] Resumindo [] cada um dos generos de

composiccedilatildeo e cada pensamento exige um tom e um estylo particular no mesmo assumpto poacutedem se

misturar ou suceder as diferentes especies de estylo sem comtudo confundir-se o estylo deve sempre estar

58

Ora na doutrina das Instituiccedilotildees oratorias de M Fabio Quintiliano as

ldquoDifferentes Ideasrdquo satildeo portanto ldquomodificaccedilotildees dos tres Estylosrdquo Disso pode-se

aventar reteacutem o leitor oitocentista no horizonte lusoacutefono de destinaccedilatildeo histoacuterica do

tratado a conformaccedilatildeo dos preceitos de Quintiliano aos de Hermoacutegenes Eacute este que

permite a visada daquele pois que neste passo para esquadrinhar o retor latino Jerocircnimo

Soares Barbosa lecirc a Institutio oratoria agrave luz do que ensina o Peri ideōn lecirc as ideai e tece

liames de doutrina

Hermogenes entre outros tratados concernentes aacute Eloquencia compoz

dois livros Das Idegraveas ou differentes formas e qualidades

dos estilos que todos assentatildeo naotilde serem outra couza senaotilde as varias

modificaccedilotildees e virtudes de que saotilde susceptiveis os tres estilos

principaes e que he preciso observar para saber variar о estilo conforme

a materia o pedir 155

Isto seja de acordo com as Instituiccedilotildees oratorias de M Fabio Quintiliano as

formas satildeo Idegraveas Jerocircnimo Soares Barbosa tomando-as como ldquoqualidades dos estilosrdquo

as aretai aristoteacutelicas como ldquoas varias modificaccedilotildees e virtudes de que saotilde susceptiveis

os tres estilos principaesrdquo ndash o ldquoSublimerdquo o ldquoSimplesrdquo o ldquoMediordquo ndash inscreve-as enquanto

gradaccedilotildees nos intervalos da elocuccedilatildeo mista Essas gradaccedilotildees nos Discorsi del poema

heroico de Torquato Tasso (1544-1595) entendem-se subsumidas agrave triparticcedilatildeo dos

genera dicendi tal como conhecida de Ciacutecero de Quintiliano ou do Anocircnimo ad

Herennium

[] il sublime e lrsquoalto genere hauragrave come sue spetie la grande la

bella la splendida la graue forma che egrave quella chrsquoegrave piena di dignitagrave

e lrsquoaspra lrsquoaffettuosa e la vehemente il mediocre la gratiosa la

em harmonia com o pensamento ou senrimento que exprimirrdquo cf Compendio de rhetorica e poetica (4ordf

ediccedilatildeo consideravelmente augmentada) Adaptado ao programma do Imperial Collegio Pedro II pelo

Conego Manuel da Costa Honorato Rio de Janeiro Typ Cosmopolita rua do Regente 31 1879 pp

107-108 155 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel p 430

59

soaue la dolce la piaceuole lrsquoornata e la fiorita lrsquohumile la chiara

ograve ver la facile la semplice lrsquoacuta la sottile la motteggeuole o ver

quella che muove agrave riso amp altre simiglianti []156

[] o sublime e o alto gecircnero teraacute como suas espeacutecies a grande a bela

a esplecircndida a grave forma que eacute aquela que eacute cheia de dignidade e a

aacutespera a afetuosa e a veemente o mediacuteocre a graciosa a suave a doce

a apraziacutevel a ornada e a florida a humilde a clara ou a faacutecil a simples

a aguda a sutil a ou aquela que move ao riso amp outras semelhantes

[]157

Em termos gregos compotildeem o gecircnero sublime o megethos (ldquola granderdquo) o kallos

(ldquola belardquo) a lamprotēs (ldquola splendidardquo) a semnotēs (ldquola graue formardquo ldquopiena di

dignitagraverdquo) a trakhytēs (ldquolrsquoasprardquo) e a sphodrotēs (ldquola vehementerdquo) Compotildeem o gecircnero

mediocre o glaphyros (ldquola gratiosardquo ldquola piaceuolerdquo ldquolrsquoornatardquo) (cf DEMETR 186-7)158

a glykytēs (ldquola soaue la dolcerdquo) e o antheros (la fiorita) (QUINT XII 10 58) Por fim

compotildeem o humile a saphēneia(ldquo la chiarardquo) a eukrineia (ldquola facilerdquo) a apheleia (ldquola

semplicerdquo) e a deinotēs (ldquolrsquoacuta la sottile la motteggeuole o ver quella che muove agrave

risordquo) A articulaccedilatildeo das liccedilotildees de Hermoacutegenes de Demeacutetrio e de Quintiliano isso eacute claro

expotildee procedimento de leitura que se observaraacute recorrente e bastante produtivo o da

acomodaccedilatildeo da doutrina normatizada pelo Peri ideōn ao leacutexico e agraves categorias

consabidas no mais das vezes pelas liccedilotildees de retoacuterica latina159 Indica-o Pierre Laurens

desde Jorge de Trebizonda costuma-se analisar as ideai de Hermoacutegenes como um

refinamento os tuoni que nuanccedila os trecircs genera dicendi e que torna possiacutevel a

composiccedilatildeo de ldquomodulaccedilotildees extremamente complexasrdquo desses genera160 Isso parece

estar no caacutelculo de Manuel de Galhegos

Ora mesmo que simpaacuteticas as idee de Torquato Tasso natildeo satildeo as Idegraveas de

Jerocircnimo Soares Barbosa eacute o que explicitam os passos arrolados O autor setecentista

156 Cf Discorsi del poema heroico del S Torquato Tasso Allrsquoillustrissmo e reverendissmo Signor Cardinale

Aldo Brandino Nella Stamparia dello Stigliola In Napoli Ad instantia di Paolo Venturino [1594] p 120 157 Traduccedilatildeo nossa 158 Escreve Torquato Tasso posteriormente que o grego eacute equivalente a ldquovenustordquo e a ldquoparlar

ornato e gratiosordquo cf Idem p 146 159 Cf LAURENS P ldquoPrefacerdquo in HERMOGEgraveNE LArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale

introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 pp 15-16 160 Idem p 12

60

define-as as discrimina todavia se lecirc Hermoacutegenes em fonte grega relecirc-o de maneira a

reorganizar-lhe as categorias prescritivas

As Idegraveas de Hermogenes sam 6 a saber o estilo Claro Grande Bello

Morato Arrebatado e a [] que he o bom uzo de todas estas

formas Em cada huma destas idegraveas afim de as caracterizar bem

considera Hermogenes 8 couzas a faber os Pensamentos as suas

Figuras as Palabras as suas Figuras o Talho das phrases a Junctura

as Clausulas e o Rhythmo as quaes todas se podem reduzir a quatro

Pensamentos Palabras Figura e Composiccedilaotilde Subdivide depoes o

ou Grande em sinco ideas particulares das quaes aacute proporccedilaotilde

que o Grande participa mais ou menos tanto he maior ou menor Ellas

sam a Gravidade a Aspereza a

Vehemencia o Splendor e a Amplificaccedilatildeo Da

oraccedilatildeo Morata () faz tambem seis partes a saber

Simplicidade Suavidade Acrimonia

Moderaccedilaotilde Verdade ampc Muitas destas idegraveas de Hermogenes

sam as mesmas de Quintiliano []161

Jerocircnimo Soares Barbosa refere as Idegraveas as mais gerais tambeacutem as ancilares e ao

fazecirc-lo abarca quase que integralmente a nomenclatura preceptiva de Hermoacutegenes No

passo deixam de ser referidas as duas espeacutecies por meio das quais se faz claro o discurso

katharotēs ()e eukrineia () 162 exclui-se uma das formas

subsidiaacuterias de megethos akmē ()163 pois Hermoacutegenes afirma serem seis essas

espeacutecies e natildeo cinco como se observa e talvez seja entendida com o etceacutetera a idea que

o grego denomina barythēs ()164 mediante a qual a alētheia eacute efetuada O cotejo

161 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel p 430 162 Leia-se purity pureza pureteacute) e distinctness nitidez netteteacute) 163 Leia-se (florecence florecimiento vigor vigueur) 164 Leia-se (indignation severidade seacuteveacuteriteacute)

61

das liccedilotildees das Instituiccedilotildees oratorias de M Fabio Quintiliano e do Peri ideōn ademais

aponta ao cabo algo discordante na medida em que como Manuel de Galhegos parece

fazer Jerocircnimo Soares Barbosa reduz a seis as sete ideai prevalecentes de Hermoacutegenes

as Idegraveas satildeo os estilos (i) ldquoClarordquo (ii) ldquoGranderdquo (iii) ldquoBellordquo (iv) ldquoMoratordquo (v)

ldquoArrebatadordquo e (vi) ldquoa rdquo sabe-se bem em equivalecircncia a (i) saphēneia (ii)

megethos (iii) kallos (iv) gorgotēs (v) ēthos e (vi) deinotēs Nota-se logo a reduccedilatildeo de

Jerocircnimo Soares Barbosa altera o lugar da ldquoVerdaderdquo a qual em vez de gecircnero eacute feita

espeacutecie da ldquooraccedilatildeo Moratardquo do ēthos dito latinamente ldquooratio moratardquo ou ldquoaffectiordquo

desde Jorge de Trebizonda165 Essa reduccedilatildeo entenda-se embora natildeo seja equivalente agrave

que Manuel de Galhegos opera tampouco eacute estranha aos inteacuterpretes de Hermoacutegenes O

valenciano Pedro Juan Nuntildeez (1522-1602) nas Tabulae institutionum rhetoricarum

impressas em Barcelona em 1578 e reimpressas em 1588 propotildee166

Figura 7 Tabulae institutionum rhetoricarum Petri Johannis Nunnesii Valentini

(1588)167

165 De acordo com Jorge de Trebizonda affectio traduzindo assim se define ldquoAffectio est qua sic

componitur oratio ut qualitatem animi ostendere amp insitos ei mores aperire uidetur Hanc moratam etiam

orationem appellare licetrdquo cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud

Ioannem Roigny uia ad D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] p 497 166 Sobre o autor La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Salamanca Universidad de Salamanca 1994

pp 81-2 167 Cf Tabulae institutionum rhetoricarum Petri Johannis Nunnesii Valentini Altera editio multo

accuratior priori Galenus in arte parua Methodus diuidendi quanto inferior est ea quae sit per

resolutionem dignitate amp methodo tanto superiorem inferior est ea quae sit per resolutionem dignitate amp

methodo tanto superiorem illam comperiemus ad compendium totius amp memoriam singulorum

62

O mesmo tratadista na obra cujas liccedilotildees a tabula esquematiza o Institutionum

rhetoricarum libri quinque de 1578 em ediccedilatildeo de 1593 assim justifica a exclusatildeo

operada na liccedilatildeo de Hermoacutegenes

sunt autem sex genera idearum ab Hermogene inuenta magnitudo

scilicet orationis perspicuitas venutas velocitas morata oratio atque

grauitas nam veritas quae hoc loco ab eodem additur subiecta est

orationi moratae vt idem postea testabitur 168

Ora satildeo seis os gecircneros de ideias inventados por Hermoacutegenes a saber

a grandeza do discurso a clareza a beleza a ligeireza o discurso

morato e a gravidade pois a verdade que o proacuteprio [Hermoacutegenes]

acrescenta a este passo foi subordinada ao discurso morato como se

testemunharaacute adiante169

A despeito das diferenccedilas vocabulares entre as Instituiccedilotildees oratorias de M Fabio

Quintiliano e os Institutionum rhetoricarum libri quinque uma obra setecentista outra

obra quinhentista os preceitos algo discordantes satildeo apropriaccedilotildees possiacuteveis do mesmo

corpo tratadiacutestico pois que ldquo[estilo] Arrebatadordquo e ldquovelocitasrdquo vertem ambos gorgotēs

ao passo que ldquogravidaderdquo eacute semnotēs em Jerocircnimo Soares Barbosa e ldquograuitasrdquo eacute

deinotēs em Pedro Juan Nuntildeez termo que o letrado portuguecircs prefere manter em grego

Haacute de se notar que natildeo satildeo as uacutenicas quando se julga a recepccedilatildeo do Peri ideōn Agrave guisa

de exemplo tomem-se as tabulae das ideai tou logou apensas ao volume Aphtonius

Hermogenes amp Dionisius Longinus praestatissimi artis Rhetorices preparado para

publicaccedilatildeo por Francisco Porto em estampa de Genebra de 1569 e ao Hermogenis Ars

Oratoria Absolutissima de Gaspar Laurent (1556-1636) impresso na mesma cidade em

1614

Barcinone excudebat Iacobus Cendrat Anno Domini 1588 sp Deve ficar evidente que Pedro Juan Nuntildeez

reduz os oito stoikheia (partes) a sete Eacute questatildeo a discutir posteriormente 168 Cf Pet Iohan Nunnesii valentini Institutionum rhetoricarum libri quinque Editio tertia ceteris multo

correctior et locupletior exemplis Barcinone ex typographia Sebastiani agrave Cormellas An 1593 pp 299

Menciona-se no tiacutetulo da primeira ediccedilatildeo do tratado o nome de Hermoacutegenes Institutiones rhetoricae ex

progymnasmatis potissimum Aphtonii atque ex Hermogenis arte dictatae agrave Petro Ioanne Nunnesio

Valentino Barcinone ex officina Petri Mali 1578 169 Traduccedilatildeo nossa

63

Figura 8 Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices

(1569)170

Observe-se que embora o volume preparado por Francisco Porto natildeo apresente

traduccedilotildees traz o latim ldquoformae orationisrdquo como Manuel de Galhegos trazia ldquofoacutermas de

oraccedilaotilderdquo em equivalecircncia ao grego ldquoideai tou logourdquo171 Essas ideai ou formae como em

170Cf Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices magistri Francisci

Porti Cretensis opera industriaacuteque illustrati atque expoliti Genevaelig apvd I Crispinvm MDLXIX [1569]

p 442 171 Como o tiacutetulo da obra torna evidente Francisco Porto publica os textos gregos do Progymnasmata (pp

1-45) de Aftocircnio do Peri staseōn (pp 49-99) do Peri heureseōs (pp 100-209) do Peri ideōn (pp 208-

404) do Peri methodou deinotētos (pp 405-441) todos atribuiacutedos a Hermoacutegenes e por fim do Peri

Hypsous (pp 1-69) de Dioniacutesio Longino cuja autenticidade aqui natildeo estaacute em questatildeo Pospostos ao Peri

methodou deinotecirctos estatildeo o esquema referido (p 442) uma epiacutestola ao leitor (p 443) e um iacutendice temaacutetico

e onomaacutestico em latim (sem paginaccedilatildeo) cf Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi

64

discriminaccedilotildees mencionadas antes satildeo vinte (lecirc-se na epiacutestola ao leitor ldquosunt enim XX ut

ex earum descriptione planum sitrdquo ou seja ldquosatildeo pois XX como eacute claro a partir da

descriccedilatildeo delasrdquo) organizadas em sete gecircneros e treze espeacutecies 172 Natildeo obstante a

repeticcedilatildeo do consabido acerca da doutrina do Peri ideōn manifesta-se que Francisco

Porto propotildee interpretaccedilatildeo discordante daquela que se conhece por Cecil W Wooten e

por Lucia Calboli Montefusco ao coordenar as sete ideai primaacuterias natildeo pensando a

deinotēs em posiccedilatildeo radial e ao tornar a alētheia idea sem espeacutecie isto eacute o ldquoendiathetos

kai alēthēs kai hoion empsykhos logosrdquo o discurso espontacircneo verdadeiro e como que

animado como que saiacutedo da alma (cf HERM 352 16)173 Manifesta-se tambeacutem que

propotildee interpretaccedilatildeo discordante daquela de Jerocircnimo Soares Barbosa e de Pedro Juan

Nuntildeez em vez de submeter a alētheia ao ēthos como ambos ao ēthos submete-lhe a

uacutenica espeacutecie

Ora a barytēs a obiurgatio (isto seja repreensatildeo exprobraccedilatildeo)174 na versatildeo de

Jorge de Trebizonda a espeacutecie mediante a qual a alētheia se compotildee segundo a liccedilatildeo de

Hermoacutegenes eacute deslocada no esquema e feita parte submetida ao ēthos No Peri ideōn

trata-se de especificaccedilatildeo da alētheia que tem em vista a reprovaccedilatildeo do que se considera

indigno em outrem e que para isso pressupotildee o locutor injuriado severo e exprobatoacuterio

Como espeacutecie de alētheia evidentemente trata-se de fazer parecer verdadeiramente

sentido o que eacute ficto e estrategicamente efetuado Eacute sinceridade afetada 175 O

deslocamento promovido por Francisco Porto na ediccedilatildeo genebrina de 1569 na condiccedilatildeo

de aceitas as anaacutelises de Michel Patillon a respeito das ideai entende-se porque ēthos e

alētheia satildeo rubricas que recobrem categorias discursivas afins176 Semelhante a essa

esquematizaccedilatildeo talvez dela dependente eacute a que Gaspar Laurent traz no princiacutepio do

seacuteculo XVII A primeira delas eacute intitulada ldquoἀνακεφαλαίωσις Formarum orationisrdquo ou

artis Rhetorices magistri Francisci Porti Cretensis opera industriaacuteque illustrati atque expoliti Genevaelig

apvd I Crispinvm MDLXIX [1569] 172Idem p 443 173 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 p 253 174 Destaca o Lewis amp Short que obiurgatio eacute termo que Quintiliano (cf QUINT XI 3 49) emprega em

oposiccedilatildeo a laudatio 175 Entende-se eacute proceder discursivo apropriado agrave saacutetira e agrave poesia que o nome de Gregoacuterio de Matos e

Guerra faz circular em que o enunciador a persona satiacuterica natildeo raro agrave maneira do costume latino de

Juvenal eacute indignada e repreende o vicio produzindo aristotelicamente sabe-se muito bem do riso

horrorizado cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo

XVII 2ordf ed rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 pp 228-9 pp 460-3 176 Cf HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel

Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 113

65

seja eacute sumaacuterio (anakephalaiōsis) das formas do discurso que repete os termos gregos

sabidos organizados de sorte a fazer pender do ēthos a barytēs e ganha acabamento com

a traduccedilatildeo latina de cada uma das vinte ideai ou formae orationis

Figura 9 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima (1614)177

A segunda tabula na mesma ediccedilatildeo ldquoSynopsis posita ad finem Lib de Formis

orationis huc refertur cuius vocabula Graeligca ibi amp in textordquo (Sinopse posta ao fim

Refere-se aqui ao livro De formis orationis cujos vocaacutebulos Gregos estatildeo neste passo amp

no texto) abdica dos termos gregos e traz sinocircnimos de termos latinos jaacute referidos

177 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 568

66

Figura 10 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima (1614)178

Salta aos olhos que o elenco tradutoacuterio arrolado em liacutengua latina por Gaspar

Laurent natildeo se confunda com a terminologia abonada desde os iniacutecios do seacuteculo XV por

Jorge de Trebizonda Veja-se

i) saphēneia claritas (Trebizonda) perspicuitas (Laurent)

a) katharotēs purus sermo ou puritas (Trebizonda) puritas (Laurent)

b) eukrineia elegantia (Trebizonda) dilucidus sermo ou dilucidum

(Laurent)

ii) megethos magnitudo (Trebizonda) granditas ou magnitudo ou

sublimitas ou gratildediloquẽtia (Laurent)

178 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 189

67

a) semnotēs dignitas (Trebizonda) graue decorum ou grauitas (De

Laurentis)

b) trakhytēs asperitas (Trebizonda) asperitas (Laurent)

c) sphodrotēs acrimonia (Trebizonda) vehementia (Laurent)

d) lamprotēs ilustris oratio ac splendida (Trebizonda) splendor

(Laurent)

e) akmē vehementia (Trebizonda) vigor (Laurent)

f) peribolē circunductio (Trebizonda) circunductio ou amplitudo

(Laurent)

iii) kallos venustas ou pulchritudo (Trebizonda) elegantia ou

pulchritudo ou venustas (Laurent)

iv) gorgotēs celeritas (Trebizonda) concitatus sermo (Laurent)

v) ēthos affectio ou morata oratio (Trebizonda) morata oratio

(Laurent)

a) apheleia tenuitas ou infinitas (Trebizonda) simplicitas (Laurent)

b) glykytēs iucunda oratio (Trebizonda) suauitas (Laurent)

c) drimytēs acutus sermo (Trebizonda) acumen amp acrimonia ou

acrimonia (Laurent)

d) epieikeia modestus sermo (Trebizonda) moderata oratio ou

moderatio (Laurent)

e) barytēs obiurgatio (Trebizonda) Grauis onerosa ou onerosum

genus (Laurent)179

vi) alētheia ueritas (Trebizonda) natiua sincera oratio ou sinceritas

(Laurent)

vii) deinotēs grauitas (Trebizonda) solers amp apta eloquentia ou

appositum genus (Laurent)180

A movecircncia do vocabulaacuterio latino entre gecircneros e espeacutecies o emprego distinto

dos termos por distintos tradutores Gaspar Laurent e Jorge de Trebizonda evidencia

superposiccedilotildees descompassos interseccedilotildees dos usos que entrecortam as ideai tou logou

as formae orationis Isso se vecirc no leacutexico isso se vecirc na tabulaccedilatildeo e no arranjo ou no

rearranjo dos preceitos a despeito das variantes em todos os tratados referidos

179 Sigo o esquema de Gaspar Laurent sabendo que diferentemente Jorge Trebizonda preceitua

como forma especiacutefica de 180 Isto eacute gecircnero apropriado gecircnero conveniente

68

autorizados pelo nome de Hermoacutegenes Derradeiro exemplo fundado na leitura do Peri

ideōn que subsume a barytēs ao ēthos figura no tratado DellrsquoArte di Predicar Bene do

eclesiaacutestico Paolo Aresi (1574-1644) em impressatildeo milanesa de 1627

Figura 11 Dellrsquo Arte di predicar bene (1627)181

A tabula de Paolo Aresi por suas escolhas lexicais dista tanto das de Filiberto

Campanile como das de Giulio Camillo Delminio Dista sobretudo sabe-se por deslocar

181 Cf DellrsquoArte di predicar bene diuisa in due parti Nella quale oltre agraversquo precetti dersquo retori agrave questo

proposito applicati di danno nuoue regole per tesserordinatamente vna predica con vn trattato della

memoria amp vnrsquoaltro della imitatione e con alcune osseruationi retoriche sopra vna predica in lode di S

Tomaso dAquino DI MONSIG PAOLO ARESI PARTE SECONDAhellip In MIL Per Gio Batt Bidelli

1627 p 196

69

a barytēs traduzida como atrocitagrave e assim definida ldquoegrave lrsquoAtrocitagrave chiamata da alcuni

Aggrauamento amp egrave vna forma di lamentarasi сotilde isdegno e rimproueramento dersquo

beneficij fattirdquo (eacute a Atrocidade chamada por alguns Agravamento e eacute uma forma de

lamentar-se com desdeacutem e reprovaccedilatildeo dos benefiacutecios feitos)182 Ora Paolo Aresi faz ver

como em meio agrave tratadiacutestica italiana quinhentista e seiscentista natildeo mais soacute em latim

mas tambeacutem em toscano nos vernaacuteculos haacute variantes no uso retoacuterico das liccedilotildees de

Hermoacutegenes Nisso os letrados lusos Manuel de Galhegos no seacuteculo XVII e Jerocircnimo

Soares Barbosa no seacuteculo XVIII natildeo satildeo exceccedilatildeo

Parece claro que ambos coadunam Hermoacutegenes com Quintiliano De fato

Jerocircnimo Soares Barbosa acorre ao Peri ideōn para minuciar a Institutio oratoria Do que

propotildee o letrado luso conveacutem natildeo perder que as ldquoIdegraveasrdquo enquanto colores enquanto tons

que trazem modificaccedilotildees agrave triparticcedilatildeo estiliacutestica satildeo pensadas nas Instituiccedilotildees oratorias

de M Fabio Quintiliano como variantes subsumidas aos gecircneros parte ao ldquoestilo

Granderdquo parte ao ldquoestilo Mediocre e Subtilrdquo183 Assim tomando de perto a afirmaccedilatildeo

segundo a qual o orador (e o poeta) pode fazer enunciaccedilotildees distintamente isto eacute ora ldquode

forma grave severa acerba veemente raacutepida copiosa amargardquo (graviter severe acriter

vehementer concitate copiose amare) ora ldquode forma afaacutevel remissa sutil agradaacutevel

branda doce breve eleganterdquo (comiter remisse subtiliter blande leniter dulciter

breviter urbane) (cf QUINT XII 10 71) Jerocircnimo Soares Barbosa supotildee o

pertencimento dessas formas ora ao ldquoestilo Granderdquo ao ldquoestilo Mediocre e Subtilrdquo

Essa interpenetraccedilatildeo de categorias retoacutericas e poeacuteticas que faz das formas das

Idegraveas variaccedilatildeo dos ldquotres Estylosrdquo dos genera dicendi tem antecedentes em Jorge de

Trebizonda Leitor de Hermoacutegenes afirma no Rhetoricorum libri V que a elocutio

compotildee-se de duas partes uma a das figurae orationis outra a das dicendi formae Tal

como preceituadas as dicendi formae latinizam as ideai tou logou ao passo que as figurae

orationis satildeo detalhadas na seguinte triparticcedilatildeo (i) sublimis ou grauis ou grandis (ii)

182 Idem p 199 183 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel p 430

70

attenuata ou infima (iii) mediocris184 Ora talvez natildeo seja preciso iterar a triparticcedilatildeo

que se conhece de Quintiliano de Ciacutecero e da anocircnima Rhetorica ad Herennium que

reconhece Jerocircnimo Soares Barbosa eacute alheia agrave preceituaccedilatildeo de Hermoacutegenes Eacute Ciacutecero

sobretudo o tratadista a quem recorre Jorge de Trebizonda ao regular as trecircs figurae

orationis

Sabe-se no livro terceiro do De oratore Crasso alude agrave doutrina dos orationis

genera e emprega como sinocircnimos os substantivos ldquogenusrdquo e ldquofigurardquo (cf CIC De or

III 199 212)185 Os oradores conforme Crasso ora satildeo graues ora subtiles ora mantecircm

a moderaccedilatildeo que os afasta de um e outro gecircnero (cf CIC De or III 177) Poreacutem na voz

da personagem Ciacutecero natildeo define quais sejam esses genera nem busca compendiaacute-los ao

modo das artes sobretudo potildee em operaccedilatildeo essa doutrina porque em termos de decoro

ao diaacutelogo assim talvez convenha186 Trata-se do mesmo procedimento que se pocircde ler no

ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos Ora doutrina exaustiva e definiccedilatildeo metoacutedica

do jargatildeo retoacuterico Jorge de Trebizonda entatildeo imita de outra obra que eacute para ele eacute bom

que se diga ciceroniana187 a Rhetorica ad Herennium No quarto livro ad Herennium

satildeo prescritos os gecircneros da elocuccedilatildeo oratoacuteria os quais se distinguem da seguinte

maneira

Sunt igitur tria genera quae genera nos figuras appellamus in quibus

omnis oratio non uitiosa consumitur unam grauem alteram

mediocrem tertiam extenuatam uocamus Grauis est quae constat ex

uerborum gravium leui et ornata constructione Mediocris est quae

constat ex humiliore neque tamen ex infima et peruulgatissima

uerborum dignitate Attenuata est quae demissa est usque ad

usitatissimam puri consuetudinem sermonis (Rhet Her IV 11)

Haacute trecircs gecircneros que denominamos figuras aos quais todo discurso natildeo

vicioso se reduz um chamado grave outro meacutedio e o terceiro tecircnue O

184 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia

ad D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] p 457 185 MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean influences on George of Trebizonds Rhetoricorum

Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric vol 26 No 2 Spring 2008 p 143 186 LEEMAN A D Orationis ratio The stylistic theory and practices os the Roman orators and

philosophers Vol 1 Amsterdam Adolf Hakkert 1963 p 121 FANTHAM E ldquoOn the Use of Genus-

Terminology in Cicerorsquos Rhetorical Worksrdquo Hermes Band Heft 4 1979 p 444 187 MONFASANI J George of Trebizond A Biography and a Study of his Rhetoric and Logic Leiden Brill

1976 p 300

71

grave eacute composto de palavras graves em construccedilatildeo leve e ornada O

meacutedio constitui-se de uma categoria de palavras mais humilde todavia

natildeo absolutamente baixa e comum O atenuado desce ao costume mais

usual da simples conversa

Jorge de Trebizonda lecirc a Rhetorica ad Herennium e reteacutem do Anocircnimo e de Ciacutecero

a identidade entre figura e genus de modo a conformar a primeira parte da elocutio A

segunda parte que abarca as dicendi formae entende filiaccedilatildeo comum agraves leituras de

Jerocircnimo Soares Barbosa a saber que formas sejam ideai que o latim forma bem traduza

o grego idea Ora jaacute o mostrou Lucia Calboli Montefusco Ciacutecero eacute autoridade

indispensaacutevel para que se entendam as escolhas de Jorge de Trebizonda na latinizaccedilatildeo

que o Rhetoricorum libri V empreende da doutrina de Hermoacutegenes 188 Ciacutecero eacute a

autoridade a mais antiga que fia o substantivo ldquoformardquo como traduccedilatildeo de idea e cuja

mediaccedilatildeo na acomodaccedilatildeo latina do termo grego empregue-se ou natildeo o jargatildeo filosoacutefico

de Platatildeo soa incontornaacutevel Recorde-se que no princiacutepio do Orator tatildeo logo indagado

por Bruto sobre o ldquogecircnero de eloquecircnciardquo (genus eloquentiae) mais excelente e perfeito

(cf CIC Or I 3) Ciacutecero figura ao responder orador nunca havido o summo orator

como perfeito como nunca visto nunca ouvido nunca percebido por qualquer sentido

tatildeo-somente compreendido pelo pensamento e pela mente 189 (cf CIC Or II 8) e

arremata

Vt igitur in formis et figuris est aliquid perfectum et excellens cuius ad

cogitatam speciem imitando referuntur eaque sub oculos ipsa [non]

cadit sic perfectae eloquentiae speciem animo videmus effigiem

auribus quaerimus Has rerum formas appellat ideas ille non

intellegendi solum sed etiam dicendi gravissimus auctor et magister

Plato (CIC Or II 9-10)

188MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos Rhetoricorum

Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) p 142 189 Cic Or II 7-8 ldquoAtque ego in summo oratore fingendo talem informabo qualis fortasse nemo fuit Non

enim quaero quis fuerit sed quid sit illud quo nihil esse possit praestantius quod in perpetuitate dicendi

non saepe atque haud scio an numquam in aliqua autem parte eluceat aliquando idem apud alios densius

apud alios fortasse rarius Sed ego sic statuo nihil esse in ullo genere tam pulchrum quo non pulchrius

id sit unde illud ut ex ore aliquo quasi imago exprimatur quod neque oculis neque auribus neque ullo

sensu percipi potest cogitatione tantum et mente complectimurrdquo

72

Portanto assim como nas formas e figuras existe algo de perfeito e

excelente e de acordo com a imagem que dele concebemos

reproduzem-se por imitaccedilatildeo as coisas que natildeo estatildeo sob os nossos

olhos em espiacuterito vemos a imagem da eloquecircncia perfeita buscamos

com os ouvidos a sua efiacutegie A essas formas dos seres chama ldquoideiasrdquo o

ceacutelebre Platatildeo a fonte primeira e o mestre mais abalizado natildeo soacute da

reflexatildeo como tambeacutem do estilo190

Trata-se da defesa programaacutetica a do Orator amparada em Platatildeo da imitaccedilatildeo

de autores exemplares como praacutetica da arte oratoacuteria Trata-se ademais do

estabelecimento de um vocabulaacuterio platocircnico em latim cujo emprego seja legitimado por

Ciacutecero Conhecedor dos passos do romano Jorge de Trebizonda escreve serem as formaes

dicendi denominadas ideai em gregocf ldquode dicendi formis quae Graeligcegrave

uocamusrdquo escreve tambeacutem definirem-se da seguinte maneira ldquoForma eacute o gecircnero de

discurso adequado ao pensamento ao meacutetodo agraves palavras agrave composiccedilatildeo agraves mateacuterias

expostas e agraves pessoasrdquo cf ldquoForma est genus orationis sententia methodo uerbis

compositione rebus subiectis amp personis idoneumrdquo191

Na eleiccedilatildeo do termo a reduzir ldquoideardquo pouco dista dos Rhetoricorum libri V a liccedilatildeo

latina do De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II recorde-se ediccedilatildeo biliacutengue

de Hermoacutegenes conforme Johannes Sturm estampada em 1571 trata-se de ldquoformardquo As

ideai tou logou entendem-se como ldquoformae dicendirdquo (formas de dizer) ou ldquoformae

orationumrdquo (formas dos discursos) 192 em que os genitivos latinos ldquodicendirdquo e

ldquoorationumrdquo o primeiro geruacutendio que serve de flexatildeo ao infinitivo ldquodicererdquo e verte-se

ao portuguecircs ldquode dizerrdquo e o segundo substantivo plural que flexiona o nominativo

ldquooratiordquo e verte-se ao portuguecircs ldquodos discursosrdquo satildeo formas distintas e possiacuteveis de

traduzir o grego ldquotou logourdquo (ldquordquo no plural ldquordquo)

Ora ldquoforma orationisrdquo eacute escolha de traduccedilatildeo lida nas estampas latinas de

190 A traduccedilatildeo eacute Paulo Seacutergio de Vasconcelos apud LICHTENSTEIN J (Org) A pintura vol 4 o belo

Coordenaccedilatildeo de traduccedilatildeo Magnoacutelia Costa Satildeo Paulo Editora 34 2004 p 25 191 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] pp 493 496 192 Cf Praeligfatio Ad Lectoremrdquo in Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue

formis orationum Libri II Latinitate donati amp scholis explicati atque illustrati A Ioan Stvrmio Cum

Gratia amp Priuilegio Caeligsareo ad anno octo Excudebat Iosias Rihelius MDLXXI [1571] A partir de

agora De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II (1571) [p 5]

73

Hermoacutegenes compostas por Antocircnio Bonfine (1538) 193 e tambeacutem por Natale Conti

(1550)194 tradutor milanecircs da ediccedilatildeo da Basileia de Hermoacutegenes impressa sob o tiacutetulo

Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta195

No ldquoPrefaacutecio ao leitorrdquo pertencente ao De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri

II Johannes Sturm tradutor e comentador agrave luz de Juacutelio Cesar Escaliacutegero (1484-1558)

acentua tratar-se ldquoideardquo de termo platocircnico que eacute na doutrina de Hermoacutegenes equivalente

ao que Aristoacuteteles chama de ldquoespeacutecierdquo e ldquovirtuderdquo e outros ateacute de ldquolugarrdquo e ldquofigurardquo (cf

ldquoAb Aristotele ἀρετα ab alijs verograve apellanturrdquo)196

Pouco dista tambeacutem nesse aspecto prefaacutecio anterior de Johannes Sturm a epiacutestola ao

impressor Josias Richel (1525-1597) que abre o volume Hermogenis De formis

orationum tomi duo editado em 1555 em que o letrado afirma ser forma dicendi

equivalente aos vocaacutebulos ldquoideardquo empregado por Platatildeo e ldquoeidērdquo por Aristoacuteteles197 E

equivalente demais aos vocaacutebulos latinos modus genus e habitus dicendi empregados

por Ciacutecero e aos gregos kharaktēr () skhēma () e tropos ()198

Conforme Johannes Sturm a conclusatildeo eacute esta posto modificadas as palavras mantidas

as mesmas razotildees (cf ldquouerbis mutatis ratione eadem retentardquo) 199

Viu-se concordes ao traduzir o substantivo ldquoideardquopelo latim ldquoformardquo Antocircnio

Bonfine Natale Conti Johannes Sturm e Gaspar Laurent tecircm como antecedente no

seacuteculo XV Jorge de Trebizonda Semelhantemente da traduccedilatildeo e dos comentaacuterios de

Garpar Laurent pospostos ao texto que integra a ediccedilatildeo genebrina de Hermoacutegenes datada

de 1614 depreende-se que ldquoformardquo natildeo soacute traduz o grego idea como tambeacutem agrave maneira

193 Cf Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii

item Sophistaelig Praeligexercitamenta Antonio Bonfine asculano interprete Apud Seb Gryphivm Lvgdvni 1538 pp 149ss 194 Cf Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] pp 155ss 195 No ldquoDiscurso sobre o poema heroicordquo Manuel Pires de Almeida menciona-o agrave maneira latina como

Natali Comiti em alusatildeo a outro tiacutetulo de sua autoria o Mythologiae siue Explicationis Fabularum (1581)

cf MUHANA A ldquoDiscurso sobre o poema heroico Comentaacuteriordquo REEL Revista Eletrocircnica de Estudos

Literaacuterios Vitoacuteria a 2 v 2 2006 pp 7 22 Mythologiae sive Explicationis Fabularum editou-se em

Frankfurt por Andreas Wechel filho de Christian Wechel editor de Hermoacutegenes cf KILLY W et alii

Dictionary of German Biography Volume 10 Thibaut - Zycha Muumlnchen De Gruyter 2006 p 381 196 De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II (1571) [p 5] 197 Cf Ω Hermogenis De formis orationum tomi duo

Argentorati apud haeredes Vuendelini Rihelij Anno 1555 [pp 3-4] 198 Idem ibidem 199 Idem [p 4]

74

de Jerocircnimo Soares Barbosa eacute tomado como sinocircnimo do helenismo ldquoideardquo200 no sentido

de ldquokharaktērrdquo de modo tal que sejam nessa liccedilatildeo traduccedilotildees possiacuteveis para ldquoidea tou

logourdquo os sintagmas latinos forma orationis (forma do discurso) Eloquentiae forma

(forma da eloquecircncia) ldea Eloquentiae (ideia da eloquecircncia) Idea sermonis (ideia do

discurso) ou genus dicendi (gecircnero do dizer)201 Gaspar Laurent o explicita

Constituitur autẽ Elocutio per 7 formas quas ipse vocat Ideas []

Vocatildetur autem Ideae sermonis notilde Platonicae sed sunt dicendi genera

characteres vel formae siue exẽplaria qualitatis orationis quae

vocatildetur ab Aristotele ἀρεταῖ virtutes ornamẽta Lumina

orationis []202

Ora constitui-se a Elocuccedilatildeo de 7 formas as quais ele [sc Hermoacutegenes]

denomina Ideias [] Ora satildeo denominadas Ideias do discurso [sc

sermo logos] natildeo satildeo platocircnicas mas gecircneros do dizer caracteres ou

formas ou exemplares da qualidade do discurso [sc oratio] os quais

satildeo denominados por Aristoacuteteles aretai tōn logōn [sc virtudes dos

discursos] virtudes ornamentos Lumes do discurso [sc oratio] []

Note-se que a liccedilatildeo propotildee o latim formae orationis como Manuel de Galhegos

propunha ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo em equivalecircncia ao grego ideai tou logou Os comentaacuterios

do tradutor circunscrevendo o ensino latinizado das ideai ao acircmbito da elocuccedilatildeo

indiciam a movecircncia do leacutexico que traduz a preceptiva grega e ademais afirmam a grade

de equivalecircncias que sopesa o ensinamento as Ideae sermonis dizem-se natildeo soacute dicendi

genera characteres ou formae como jaacute referido mas tambeacutem aretai tōn logōn (ldquoἀρεταῖ

rdquo amiuacutede ditas ἀρεταῖ isto eacute virtudes da elocuccedilatildeo203) donde

200 Cf ldquoFuerunt nimirum haelig formaelig vel Idea propositaelig Perspicuitas Magnitudo Pulchritudo Celeritas

Moratum genus Verax Aptitudordquo ldquoIn Hermogenis tractatvm de ideis sive de formis eloqventiaelig Gasparis

Laurentij commentariusrdquo in Hermogenis

Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu Graeci amp

Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno MDCXIV [1614] 201 Cf ldquoIn Hermogenis tractatvm de ideis sive de formis eloqventiaelig Gasparis Laurentij commentariusrdquo in

Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 120 202 Idem p 122 203 Cf LAUSBERG H Elementos de Retoacuterica Literaria Traduccedilatildeo prefaacutecio e aditamentos de R M Rosado

Fernandes 5ordf ediccedilatildeo Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 2004 p 119

75

as assimilaccedilotildees doutrinaacuterias filiem Hermoacutegenes a Aristoacuteteles e natildeo a Platatildeo Isto Gaspar

Laurent supotildee mesmo que o vocaacutebulo grego ldquoideardquo seja reconhecidamente caro a Platatildeo

e a seus seguidores natildeo eacute platocircnico o uso que dele faz Hermoacutegenes Itere-se o sermo

empregado para acomodar no latim e nos vernaacuteculos os preceitos retoacutericos do Peri ideōn

natildeo pendem de Platatildeo embora seja liacutecito supor que Platatildeo lido latinamente por Ciacutecero e

por Secircneca ou latinamente loquaz desde Ciacutecero no acircmbito da doutrina das ideias natildeo se

cala Natildeo se cala tanto porque eacute autoridade prestigiada e vigente como porque num certo

sentido falar de ideai eacute falar de Platatildeo mesmo que nem sempre seja falar com Platatildeo

Brevemente noutro sentido as aretai as liccedilotildees de poeacutetica e de retoacuterica gregas e

latinas o ensinam prescrevem-se como virtudes (virtutes forma plural de virtus) que

regulam o emprego artiacutestico dos efeitos elocutivos Conforme o capiacutetulo XXII da Poeacutetica

eacute virtude da lexis que seja clara (σαφ) sem que seja chatilde que seja peregrina sem que

seja enigmaacutetica ou mesmo baacuterbara Satildeo pois aristotelicamente normatizadas as variaccedilotildees

vocabulares que compensem com o emprego dos termos correntes os expedientes de lexis

rara A clareza portanto como liccedilatildeo de moderaccedilatildeo produz-se por meio de variaccedilotildees

controladas dos recursos lexicais e sintaacuteticos de composiccedilatildeo da elocuccedilatildeo poeacutetica Na

Poetica drsquoAristotele uulgarizzata de Ludovico Castelvetro impressa em Viena em 1570

pelo editor Gaspar Stainhofer mais precisamente na exposiccedilatildeo adjunta agrave referida liccedilatildeo

lembra bem o tradutor e comentador que a clareza pensa-se com Aristoacuteteles como

virtude proporcionada ao gecircnero de poema composto204 Ademais eacute virtude da lexis ser

adequada (τὸ ) A liccedilatildeo da Poeacutetica prevecirc que empregar adequadamente

(πρεπόντως) os vocaacutebulos peregrinos sobretudo as metaacuteforas eacute sinal de pendor do

poeta (cf ARISTOT Poet 22 1459 a 6) Empregaacute-los inadequadamente (ἀπρεπῶς) em

contrapartida de acordo com Aristoacuteteles se constitui como deformaccedilatildeo ridiacutecula (cf

ARISTOT Poet 22 1458 b 11 14 ldquoγελοῖονrdquo ldquoγελοῖαrdquo) cujo efeito pode-se depreender

das liccedilotildees da Retoacuterica eacute a lexisfriacutegida (ψυχρά) contrafaccedilatildeo viciosa da nobreza e da

ornamentaccedilatildeo do discurso (cf ARISTOT Rhet III 3 1)

Ora a filiaccedilatildeo que se estabelece entre formas e ideias comum ao ldquoDiscurso

Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos natildeo eacute estranha aos usos do portuguecircs letrado entre os

seacuteculos XVI e XVIII embora os registros de ambos os termos em fontes lexicograacuteficas

204 Cf Poetica dAristotele uulgarizzata et sposta per Ludovico Castelvetro Stampata in Vienna dAustria

per Gaspar Stainhofer lanno del Signore MD LXX [1570] p 260r

76

do tempo nem sempre a apontem no acircmbito das praacuteticas do discurso Jerocircnimo Cardoso

(1508-1569) no Dictionarium ex lusitanico in latinum sermonem de 1562 natildeo registra

o termo ldquoideardquo ou equivalentes em liacutengua portuguesa e avaliza o latinismo ldquoForma

Forma aeligrdquo205 O mesmo autor no Dictionarium latino lusitanicum amp vice versa lusitanico

latinu[m] ediccedilatildeo biliacutengue de Coimbra de 1570 elenca duas entradas para o latim forma

(i) ldquoForma aelig A figura ou forma de ccedilapateyrordquo e (ii) ldquoForma aelig A fermosurardquo206 e uma

para o correspondente vernaacutecular ldquoForma Forma aeligrdquo 207 tal como na estampa anterior

A ediccedilatildeo abona o latim ldquoIdea aelig A figura original da cousardquo 208 em registro platocircnico e

natildeo entende o helenismo ldquoideardquo ou equivalentes em liacutengua portuguesa A ediccedilatildeo lisboeta

de 1592 do Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum no que aqui

interessa reitera a de 1570209 As ediccedilotildees de 1601 de 1613 de 1619 de 1630 de 1643

de 1677 e de 1694 tambeacutem o fazem210

205 Hieronymi Cardosi Lamacensis Dictionarium ex Lusitanico in latinum sermonem Ulissypone ex

officina Ioannis Aluari 1562 p 61 206 Dictionarium latino lusitanicum amp vice versa lusitanico latinu[m] cum adagiorum fereacute omnium iuxta

seriem alphabeticam perutili expositione ecclesiasticorum etiam vocabulorum interpretatione noueacute

omnia per Hieronymu[m] Cardosum Lusitanum congesta recognita vero omnia per Sebast Stockhamerum

Germanum Qui libellum etiam de propriis nominibus regionu[m] populorum illustrium virorum adiecit

Conimbricae excussit Joan Barrerius 1570 p 74 207 Idem p 59 [sic] [p 49] Note-se que apoacutes a p 172 do Dictionarium latino lusitanicum amp vice versa

lusitanico latinu[m] a numeraccedilatildeo de paacutegina eacute reiniciada A indicaccedilatildeo aqui portanto considera o que se

pode compreender como segunda parte da obra em que o vocabulaacuterio eacute portuguecircs-latim 208 Idem p 85 209 Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum adagiorum fereacute omnium iuxta

seriem alphabeticam perutili expositione per Hieronymum Cardosum Lusitanum congesta recognita

vero omnia per Sebast Stokhamerum Germanum Qui libellum etiam de propriis nominibus regionum populorum illustrium virorum adiecit Adhuc noui huic ultimae impressioni adjuncti sunt varij loquendi

modi ex praecipuis auctoribus decerpti praesertim ex Marco Tullio Cicerone Olyssipone excussit

Alexander de Syqueira expensis Simonis Lopezij bybliopolae 1592 pp 72 82 49 210 Cf Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum adagiorum fere omnium iuxta

seriem alphabeticam perutili expositione Ecclesiasticarum vocabulorum interpretatione item de monetis

ponderibus et mensuris ad presentem usum accommodatis per Hieronymum Cardosum lusitanum

congesta recognita vero per Sebastianum Stokhamerum germanum Qui libellum etiam de propijs

nominibus regionum populorum illustrium virorum fluviorum montium ac aliorum complurium

nominum et rerum scitu dignarum historijs et fabulis poeticis refertum in usum et gratiam lusitanicae

pubis concinnavit et ex integro adiecit Adhuc noui huic ultimae impressioni adiuncti sunt varij loquendi

modi ex praecipuis authoribus decerpti praesertim ex Marco Tullio Cicerone Olyssipone excussit Antonius Alvares typographus 1601 pp 72 82 49 Repete-se a ediccedilatildeo anterior Cf Dictionarium latino

lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum adagiorum feregrave omnium juxta seriem alphabeticam

perutili expositione Ecclesiasticarum [sic] vocabulorum interpretatione item de monetis ponderibus et

mensuris ad presentem usum accommodatis per Hieronymum Cardosum lusitanum congesta recognita

vero omnia per Sebastianum Stokhamerum germanum Qui libellum etiam de proprijs nominibus regionum

populorum illustrium virorum fluviorum historijs amp fabulis poeticis refertum in usum amp gratiam

lusitanicae pubis concinnavit amp ex integro adiecit Adhuc novi huic ultimae impressioni adjuncti sunt varij

loquendi modi ex praecipuis auctoribus decerpti praesertim ex Marco Tullio Cicerone nunc denuo

amendarum colluvie qua scatebat diligenti lucubratione defaecatum Ulyssipone ex officina Petri

Crasbeeck 1613 pp 72 82 Cf Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum

adagiorum feregrave omnium iuxta seriem alphabeticam perutili expositione amp Ecclesiasticorum vocabulorum

77

Agostinho Barbosa (ca 1590-1649) no Dictionarium Lusitanico Latinum

estampado em Braga em 1611 itera Jerocircnimo Cardoso semelhantemente natildeo registra

ldquoideardquo ou equivalentes no vernaacuteculo e admite ldquoformardquo na seguinte acepccedilatildeo ldquoForma

Forma aelig Vt [sc como] formaelig sutorum formas de ccedilapateyro Horat 1 Serm Saty

3rdquo211 Bem se observa repete-se o exemplo o do sapateiro das ediccedilotildees biliacutengues de

interpretatione item de monetis ponderibus amp mensuris ad praesentem usum accomodatis per

Hieronymum Cardosum lusitanum congesta recognita vero omnia per Sebastianum Stokhamerum

germanum Qui libellum etiam de proprijs nominibus regionum populorum illustrium virorum fluviorum montium ac aliorum complurium nominum amp rerum scitu dignarum historijs amp fabulis poeticis refertum

in usum amp gratiam lusitanicae pubis concinnavit amp ex integro adiecit Cui hac ultima editione praeter

caetera hactenus alijs contenta in singulis nominibus et verbis suae inflexiones appositae sunt in

Dictionario lusitanico in latinum sermonem converso multa singulari studio et diligentia addita cum varijs

loquendi modis ex praecipuis auctoribus collectis aliaque ab innumeris pene erroribus non sine labore et

studio vindicata Ulyssipone Ex officina Petri Crasbeeck 1619 pp 72 82 301 Cf Dictionarium latino

lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum adagiorum fereacute omnium iuxta seriem alphabeticam

perutili expositione amp Ecclesiasticarum vocabulorum interpretatione item de monetis ponderibus amp

mensuris ad praesentem usum accomodatis Hieronymum Cardosum lusitanum congesta recognita vero

omnia per Sebastianum Stokhamerum germanum Qui libellum etiam de proprijs nominibus regionum

populorum illustrium virorum fluviorum montium ac aliorum complurium nominum amp rerum scitu dignatum historijs amp fabulis poeticis refertum in usum amp gratiam lusitanicae pubis concinnavit amp ex

integro adiecit Cui hac ultima editione praeter caetera hactenus alijs contenta in singulis nominibus amp

verbis suae inflexiones appositae sunt ac in Dictionario lusitanico in latinum sermonem converso multa

singulari studio amp diligentia addita cum varijs loquendi modis ex praecipuis auctoribus collectis aliaque

ab innumeris pene erroribus non sine labore amp studio vindicata Ulyssipone ex officina Petri Craesbeeck

1630 pp 72 82 301 Cf Dictionarium latino lusitanicum et lusitanico latinum cum aliquorum

adagiorum et humaniorum historiarum et fabularun perutile expositione item de Vocibus Ecclesiasticis

de ponderibus et mensuris et aliquibus loquendi modis pueris accommodatis per Hieronymum Cardozum

lusitanum Quod in hac ultima editione multis nominibus auctum et aacute pluribus erroribus ijsque turpissimis

quibus vel typographum incuriacirc vel correctorum maximacirc negligentiacirc abundabat expurgatum in lucem

damus Ulyssipone ex officina Laurentij de Anveres a custa de Domingos Carneiro mercador de livros

1643 pp 72 82 305 Cf Dictionarium latino lusitanicum et lusitanico latinum cum aliquorum Adagiorum et humaniorum historiarum et fabularum perutili exposition item de Vocibus Ecclesiasticis

de Ponderibus et mensuris et aliquibus loquendi modis pueris accomodatis per Hieronimum Cardozum

lusitanum Quod in hac ultima editione multis nominibus auctum et agrave pluribus erroribus ijsque turpissimis

quibus vel typographum incuriacirc vel correctorum maximaacute negligentiagrave abundabat expurgatum in lucem

damus Ulyssipone ex officina amp sumptibus Antonij Craesbeeck agrave Mello serenissimi principi typographi

1677 pp 142 163 608 Cf Hieronymi Cardosi Dictionarium latino-lusitanicum et lusitanico-latinum

quanta maxima fide ac diligentiagrave accuratissimegrave expurgatum adjectis Dictionariolis de vocibus

ecclesiasticis de ponderibus numismatis amp mensuris cunctis accesserunt etiam concinni loquendi modi

phrases amp adagia ex optimis authoribus decerpta item magna sylva nominum propriorum amp

appellativorum humaniorum historiarum populorum marium fluviorum montium urbium ventorum

syderum deorum etc Editio novissima in quagrave est itidem appositus Catalogus dictionariorum authorumque plurimorum qui tam de linguacirc latina quagravem de studiosis notitijs pertractarunt omnibus

grammatices professoribus perutilissimus Reverendissimo Domino D Georgio Cornelio archiepiscopo

Rhodiensi Ulyssipone typis amp sumptibus Dominici Carneiro trium Ordinum Militarium typographi

1694 p 90 103 88 Observe-se as ediccedilotildees de Jerocircnimo Cardoso estampadas na oficina de Pedro

Craesbeeck (ca 1552-1632) pai de Lourenccedilo impressor da Ulyssea ou Lisboa Edificada a saber as

ediccedilotildees do dicionaacuterio de 1613 1619 e 1630 contecircm nas paacuteginas de rosto gravura com trigrama da

Companhia de Jesus (IHS) 211 O verso de Horaacutecio eacute HOR S II 3 106 ldquosi scalpra et formas non sutor nautica velardquo

Dictionarium Lusitanico Latinum juxta seriem alphabeticam optimis probatisq doctissimorum auctorum

testimonijs perutili quadam expositione locupletatum cum Latini sermonis indice nec non libello uno

aliquarum regionum civitatum oppidorum fluviorum montium amp locorum quibus veteres uti solebant

78

Cardoso e explicita-se tratar-se de uso do poeta latino Horaacutecio Jaacute no Thesouro da lingoa

portuguesa do padre inaciano Bento Pereira (1606-1681) publicado em Lisboa em

1647 indica-se ldquoforma forma ae Modus i Habitus usrdquo ldquoforma de ccedilapateiro

Mustricola ae Forma aerdquo e tambeacutem ldquoIdea Forma ae Idea aerdquo212 Note-se o que

ressalta mais do que as semelhanccedilas com os verbetes referidos e o desdobramento

semacircntico do substantivo ldquoformardquo eacute o registro do helenismo ldquoideardquo ausente do

acolhimento de Jerocircnimo Cardoso Mais Bento Pereira fornece definiccedilotildees destes

vocaacutebulos em outra obra o Prosodia in vocabularium trilingue Latinum Lusitanicum

amp Hispanicum digesta213 Em estampa de 1653 o latim ldquoforma aerdquo define-se como ldquoA

figura ou formosurardquo e ldquoidea aerdquo platonicamente como ldquoA figura original da cousardquo o

que repotildee muito de perto Jerocircnimo Cardoso conforme as ediccedilotildees elencadas acima214 Em

estampa biliacutengue de 1723 muito distinta da anterior intitulada Prosodia in vocabularium

bilingue Latinum et Lusitanum digesta os verbetes em portuguecircs nada distam do que se

leu no Thesouro da lingoa portuguesa ldquoForma Forma ae Modus i Habitus ucircsrdquo

ldquoForma de ccedilapateiro Mustricola ae Forma aerdquo e mais ldquoIdecirca Forma ae Idea aerdquo Os

verbetes em latim mais detalhados nas definiccedilotildees que trazem satildeo estes ldquoForma ae f g

A forma figura fermosura forma ou cincho do queijo ou forma de ccedilapateiro regra

modo delineaccedilam cano de agua publica item papas de milho com mel Virg AElign 8rdquo e

ldquoIdea ae f g A idea primeira face forma das cousas forma do edificio figura original

ou mental exemplar ampc 1 l Cicrdquo215

O padre Carlos Folqman (ca 1704) contemporacircneo de Jerocircnimo Soares Barbosa

no Diccionario portuguez e latino impresso em Lisboa em 1755 propotildee natildeo soacute

ldquoFOacuteRMA f (figura) Forma ae Species eirdquo donde o substantivo ganha especificaccedilatildeo

omnia in studiosae inventutis gratiam amp usum collecta per Augustinum Barbosam Lusitanum Bracharae

typis amp expensis Fructuosi Laurentij de Basto 1611 p 553 212 Thesouro da lingoa portuguesa composto pelo Padre D Bento Pereyra da Companhia de Iesu

Portugues Borbano Lente que foy da primeira classe de Rhetorica em a Vniversidade de Euora amp hoje o

he da sagrada Theologia em a mesma Vniversidade Em Lisboa Com licenccedila da S Inquisiccedilam Ordinario amp del Rey Na officina de Paulo Craesbeeck amp agrave sua custa Anno de 1647 pp 54f 58v 213 Trata-se de obra impressa pela primeira vez em 1634 e seguidamente reimpressa A Biblioteca Nacional

de Portugal guarda exemplares de ediccedilotildees de 1653 1661 1674 1683 1697 1711 1723 1741 e 1750 A

ediccedilatildeo priacutencipe Prosodia in vocabularium trilingue Latinum Lusitanicum amp Hispanicum digesta

authore Benedicto Pereyra fecit sumptus Dominicus Pereyra da Sylva Eborae apud Emmanuelem

Carvalho 1634 214 Prosodia in vocabularium trilingue Latinum Lusitanicum amp Castellanicum digesta authore Doctore

P Benedicto Pereyra Societatis Iesu Cum facultate Inquisitorum Ordinarij amp Regis Vlissipone Ex

officina amp sumptibus Pauli Craesbeeck Anno Domini MDCLIII [1653] pp 105 112 215 Prosodia in vocabularium bilingue Latinum et Lusitanum digesta nona editio Eborae cum facultacircte

Superiocircrum ex Typographiacutea Acadeacutemiae Anno Doacutemini M DCC XXIII [1723] pp 82 89 359 422

79

de sentido no caso de ldquoFOacuteRMA (modo) A foacuterma do governo Administrandaelig Reipublicaelig

ratio oacutenis frdquo senatildeo tambeacutem ldquoFORMA f Focircrma (de sapateiro) Forma aelig f de

impressor Forma typographicardquo216 Ademais Carlos Folqman registra no vernaacuteculo

ldquoIDEA f Idea ae f Graec Cicrdquo 217 o que abona o verbete de Bento Pereira e eacute por ele

legitimado Essas definiccedilotildees a paacutegina de rosto do Diccionario portuguez e latino o

explicita dependem do trabalho de Raphael Bluteau (1638-1734) que fornece entre os

verbetes pesquisados os mais extensos No Vocabulario Portuguez amp Latino impresso

em Coimbra em 1728 o termo ldquoformardquo assim eacute definido

FORMA (Termo Philosophico) A forma essencial he o segundo

principio que unido com a materia compoem todos os corpos naturaes

Forma ae Fem

Foacuterma Figura Forma ae Fem Species ei Fem Figura ae Fem Cic

Tomar a forma ou figura de alguem Capere formam alicujus Plaut

Ter forma de homem Humana specie amp figura esse

Foacuterma (Termo Logico) Como quando se diz Pocircr hum argumento em

foacuterma Syllogismum ex dialecticae regulis ou praeceptis conficere

Argumentar em foacuterma Ex dialectices regulis argumentari

Foacuterma Modo de obrar em materias de engenho moraes amp politicas A

foacuterma do governo Administrandae Reipublicae ratio onis Fem ou

genus eris Neut Cicero diz Forma rerum publicarum Mudouse na

cidade a forma do governo Immutata est urbis facies Caesar Quando

Deos deu Forma ao governo do mundo Vieira Tom 1 477 Reduzir

Hespanha em Forma de Provincia Marinho Apologet discurs 23

Forma Disposiccedilaotilde amp compostura de partes a figura que se daacute a huma

cousa Forma ae Fem Formamentum i Neut Lucret Formatura ae

Fem He do Poeta Lucilio que diz Formaturaque abrorum parte

figurat Se chegar a receber alguma Forma o livro que tenho ideado

Vieira Tom 1 Epist ao Leytor pag 2

216 Note-se Carlos Folqman como Jerocircnimo Cardoso e Bento Pereira refere a ldquofocircrma de sapateirordquo Eacute

interessante o emprego dos acentos agudo e circunflexo que marcam graficamente a heterofonia entre

ldquofoacutermardquo x ldquofocircrmardquo 217 Diccionario portuguez e latino no qual as dicccedilotildees e frazes da lingua portugueza e as suas variantes

significaccedilotildees genuinas e metaforicas se achatildeo clara e distinctamente vertidas na latina e authorizadas

com exemplos dos authores classicos compilado do vocabulario do reverendo padre D Rafael Bluteau e

dos melhores diccionarios de varias linguas Por Carlos Folqman Lisboa na Officina de Miguel

Manescal da Costa Impressor do Santo Officio 1755 p 225

80

Forma Idea Imagem ampc Vid nos seus lugares A Forma da

Temperanccedila em El-Rey D Manoel o unico Varella Num Vocal pag

443

Foacuterma ou formalidade Certas regras estabelecidas pelas leys ou pelo

costume Faltar agraves formas Naotilde guardar as formas Formulacirc cadere ou

excidere Senec Epist 48 amp lib 2 de Clement cap 3 Testamento feito

com as divicircdas formas Justum testamentum Ulpian Vid Formula

Foacuterma (como quando se diz) sem mais outra forma de processo id est

com violencia amp sem proceder com os termos da justiccedila Ser cotildedenado

sem mais outra forma de processo Causacirc indictacirc damnari Sem outra

Forma de processo que a confissaotilde publica amp c Duart Rib na vida da

Princ Theodora Nullacirc aliacirc de causacirc quagravem propter publicam

confessionem ampc

Forma Modo de obrar de viver Guardar sempre a mesma forma de

vida Eandem semper vivendi rationem obtinere ou tenere Cic

Forma pela qual o sapateiro corta amp coze os sapatos Forma ae Fem

Assi lhe chama Horacio na 3 Satira do livro 2 vers 106 Si scalpra amp

formas non sutor ampc Tambem a forma de hum chapeo se pode chamar

Forma ae Fem

Forma como quando se diz Fazer alguma cousa pro forma ou propter

formam id est por ceremonia por comprimento Pozse de joelhos pro

forma amp pediolhe perdaotilde Ad speciem usurpatae formulae posuit

genua veniamque rogavit supplex

Forma (Termo de Impressor) He huma taboa em que se compoem a

letra conforma a ordem que se quer amp se impoem em huma rama de

ferro com suas guarniccediloens de paacuteo ao redor amp cunhos para apertar amp

sobre ella carrega o quadro Forma typographica ae Fem

Letra de forma Os moldes de que usa o impressor para exprimir no

papel as letras Litterarum typi orum Masc Plur Forma litterarum

que he de Quintiliano naotilde quer dizer isto (que no tempo deste Orador

ainda naotilde havia impressaotilde) mas quer dizer Forma amp figura das letras

81

Forma (Termo de engenho de assucar) Vaso de barro furado por baxo

no qual o assucar se purifica Vas argilaceum inferiori parte

perforatum in quo Saccharum expurgatur 218

Ora Raphael Bluteau maneja concordantemente o leacutexico o verbete repotildee e

esmiuacuteccedila definiccedilotildees referidas No campo das artes penetra-se a ldquoFormardquo segundo as

acepccedilotildees do Vocabulario Portuguez amp Latino em mediaccedilotildees aristoteacutelicas e platocircnicas

Em outras palavras ldquoformardquo eacute eidos como ldquoTermo Philosophicordquo que se emprega em

referecircncia a uma das quatro causas () do que haacute na doutrina de Aristoacuteteles a causa

formal (cf ARIST Phys 194b 16-195a 26 Met I 3 983a 25-32) Lendo o estagirita

ensina Secircneca a Luciacutelio nas epiacutestolas morais que ldquoidosrdquoeacute forma que se impotildee agrave

obra (cf SEN Ep 65 4 quae unicuique operi imponitur) tal qual na arte da escultura a

forma eacute imposta ao bronze fazendo da mateacuteria bruta prima estaacutetua donde escreva o

estoico ldquouma estaacutetua natildeo poderia ser rotulada de lsquodoryphorosrsquo ou de lsquodiadumenosrsquo se

natildeo apresentasse expressamente as respectivas caracteriacutesticasrdquo Ou seja se a primeira

estaacutetua natildeo figurasse ldquohomem segurando lanccedilardquo e a segunda ldquocabeccedila cingida por uma

fita ou diademardquo219

218 Vocabulario portuguez e latino aulico anatomico architectonico bellico botanico brasilico comico

critico chimico dogmatico dialectico dendrologico ecclesiastico etymologico economico florifero

forense fructifero autorizado com exemplos dos melhores escritores portugueses e latinos pelo padre

D Raphael Bluteau Coimbra no Real Collegio das Artes da Companhia de Jesu Com todas as Licenccedilas

necessaacuterias Anno Domini MDCCXIII [1713] pp 172-3 219 Cf SEacuteNECA L A Cartas a Luciacutelio Traduccedilatildeo prefaacutecio e notas de Joseacute Antoacutenio Segurado e Campos

Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 2004 pp 229-30 SEN Ep 65 3-6 ldquoToda a arte eacute imitaccedilatildeo da

natureza pelo que se pode aplicar o que eu disse em sentido geneacuterico agraves actividades proacuteprias do homem

Uma estaacutetua implica que haja uma mateacuteria agrave disposiccedilatildeo do artista mas exige tambeacutem um artista que decirc

forma a essa mateacuteria Numa estaacutetua portanto a mateacuteria eacute o bronze a causa eacute o escultor Todas as outras

coisas satildeo regidas pela mesma condiccedilatildeo todas exigem algo capaz de tomar uma forma e algueacutem capaz de

produzir essa forma Os estoicos satildeo de opiniatildeo que a causa eacute apenas uma o agente Aristoacuteteles entende que a causa se pode considerar de trecircs pontos de vista Diz ele lsquoA primeira causa eacute a proacutepria mateacuteria sem

a qual nada pode ser produzido a segunda eacute o artiacutefice a terceira eacute a forma imposta a cada objeto por

exemplo a uma estaacutetuarsquo A esta uacuteltima chama Aristoacuteteles ndash lsquoMas a estasrsquo ndash continua ele ndash lsquohaacute que

acrescentar uma quarta que eacute a finalidade da obra acabadarsquo Jaacute te vou explicar o que isto significa O bronze eacute a primeira causa da estaacutetua pois esta nunca poderia ter sido produzida se natildeo existisse algo capaz

de ser fundido e moldado A segunda causa eacute o artista [artifex] porquanto o bronze nunca tomaria a forma

de estaacutetua sem ser trabalhado por matildeos haacutebeis A terceira causa eacute a forma jaacute que uma estaacutetua natildeo poderia

ser rotulada de lsquodoryphorosrsquo ou de lsquodiadumenosrsquo se natildeo apresentasse expressamente as respectivas

caracteriacutesticas A quarta causa eacute a finalidade com que a estaacutetua foi feita se natildeo houvesse uma finalidade

natildeo haveria estaacutetua E o que se entende por finalidade Eacute o propoacutesito que moveu o artista o fim que ele

procurou atingir pode ser o dinheiro se fez a estaacutetua para a vender a gloacuteria se trabalhou para obter fama

o sentimento religioso se a fez para a doar a um templo Entre as causas de uma obra deve portanto figurar

aquilo que a motivou a menos que se entenda que natildeo eacute causa da obra aquele elemento sem o qual ela

nunca teria sido feitardquo [Omnis ars naturae imitatio est itaque quod de universo dicebam ad haec transfer

quae ab homine facienda sunt Statua et materiam habuit quae pateretur artificem et artificem qui materiae

82

Aristotelicamente a arte (τέχνη) eacute irredutiacutevel agrave mateacuteria (ὕλη) Afinal conforme

a Metafiacutesica o bronze natildeo faz a estaacutetua (ἀνδριάς) (cf ARIST Met I 3 984a 24) eacute uma

de suas causas a causa material a estaacutetua natildeo eacute a pedra (λίθος) eacute senatildeo de pedra

(λίθινος) (cf ARIST Met VII 7 1033a 7) A arte ndash as artes melhor seria ndash eacute irredutiacutevel

pois que eacute assim pensada teacutecnica de conformaccedilatildeo da mateacuteria a partir da qual se gera o

que haacute na alma como eidos Nesse caso no acircnimo o eidos eacute essecircncia eacute quididade220 (ldquoτὸ

τί ἦν εἶναιrdquo) das coisas todas e substacircncia primeira (ldquoπρώτην οὐσίανrdquo) (cf ARIST Met

VII 7 1032b 1-2)221 as quais se digam poiēsis pois que sejam artiacutesticas artificiais (cf

ARIST Met VII 7 1032b 17) O escultor andriantopoios como causa eficiente e motor

da transformaccedilatildeo ao conformar a mateacuteria (cf ARIST Met V 2 1013b 36) transfere a ela

o que guarda na alma222 Eacute nesses termos que se entende com Raphael Bluteau ldquoformardquo

como ldquoforma essencialrdquo

O escultor o artiacutefice enfim bem se veraacute ao informar a mateacuteria mira a adequada

ldquoDisposiccedilaotilde amp compostura de partesrdquo segundo os usos abonados por Raphael Bluteau

Comentador de Luiacutes de Camotildees decerto leitor de liccedilotildees concordes Manuel de Faria e

Souza (1590-1649) anos antes na ediccedilatildeo lisbonense poacutestuma das suas Rimas varias de

Luis de Camoens de 1685 articula os termos ldquoformardquo e ldquoformosurardquo conformemente

aos preceitos aduzidos semelhantemente ao verbete do Vocabulario Portuguez amp Latino

ao verbete do Dictionarium latino lusitanicum amp vice versa lusitanico latinu[m] de

Jerocircnimo Cardoso (1570)

daret faciem ergo in statua materia aes fuit causa opifex Eadem condicio rerum omnium est ex eo constant quod fit et ex eo quod facit Stoicis placet unam causam esse id quod facit Aristoteles putat

causam tribus modis dici lsquoprimarsquo inquit lsquocausa est ipsa materia sine qua nihil potest effici secunda opifex

tertia est forma quae unicuique operi imponitur tamquam statuaersquo Nam hanc Aristoteles idos vocat

lsquoQuarta quoquersquo inquit lsquohis accedit propositum totius operisrsquo Quid sit hoc aperiam Aes prima statuae

causa est numquam enim facta esset nisi fuisset id ex quo funderetur ducereturve Secunda causa artifex

est non potuisset enim aes illud in habitum statuae figurari nisi accessissent peritae manus Tertia causa

est forma neque enim statua ista lsquodoryphorosrsquo aut lsquodiadumenosrsquo vocaretur nisi haec illi esset impressa

facies Quarta causa est faciendi propositum nam nisi hoc fuisset facta non esset Quid est propositum

quod invitavit artificem quod ille secutus fecit vel pecunia est haec si venditurus fabricavit vel gloria si

laboravit in nomen vel religio si donum templo paravit Ergo et haec causa est propter quam fit an non

putas inter causas facti operis esse numerandum quo remoto factum non esset] 219 Cf ARIST Phys 194b 30-35 220 Considera-se que Santo Tomaacutes de Aquino verteu ao latim na Suma Teoloacutegica o grego ldquoτὸ τί ἦν εἶναιrdquo

por quidditas ou seja ldquonatura in materia corporali existensrdquo [natureza existente na mateacuteria corporal] (cf

Summa Theologiae i quaest 84 art 7) 221 Cf ARIST Met VII 7 1032 b 1-2 ldquoεἶδος δὲ λέγω τὸ τί ἦν εἶναι ἑκάστου καὶ τὴν πρώτην οὐσίανrdquo 222 Cf PANOFSKY E Idea a evoluccedilatildeo do conceito de belo 2ordf ediccedilatildeo 2ordf tiragem Traduccedilatildeo de Paulo Neves

Satildeo Paulo Martins Fontes 2013 p 23

83

La proporcion de la forma es el fundamento de toda hermosura puede

una muger tener buen rostro y ser tan mal formada que no se pueda

llamar hermosa y al contrario hermosa se podraacute llamar siendo de

forma agradable aunque de rostro no lo sea tanto Esto sucede en todas

las fabricas no basta que una joya sea de oro y diamantes para ser

hermosa el modo con que esta labrada la haze estimable no basta que

un edificio sea de maacutermol alabastro diaspro oacute poacuterfido para ser

vistoso el ayre con que fue trazado es quien le ha de hazer mirar con

admiracioacuten y faltando este es todo nada223

A proporccedilatildeo da forma eacute o fundamento de toda formosura pode uma

mulher ter bom rosto e ser tatildeo mal formada que natildeo se possa chamar

formosa e ao contraacuterio formosa se poderaacute chamar sendo de forma

agradaacutevel ainda que de rosto natildeo o seja tanto224 Isto sucede em todas

as faacutebricas225 natildeo basta que uma joia seja de ouro e diamantes para ser

formosa o modo com que estaacute lavrada a faz estimaacutevel natildeo basta que

um edifiacutecio seja de maacutermore alabastro diaspro ou poacuterfido para ser

vistoso o ar com que foi traccedilado eacute o que lhe haacute de fazer mirar com

admiraccedilatildeo e faltando este [ar] eacute completo nada 226

A mateacuteria daacute valor agrave obra mas eacute o lavor da forma que a configura compotildee

formosuras e angaria estimas227 A bem dizer de acordo com Secircneca imposto o ldquoidos in

223 Rimas varias de Luis de Camoens priacutencipe de los poetas heroycos y liricos de Espantildea Ofrecidas al

muy ilustre sentildeor D Ivan da Sylva Marquez de Gouvea presidente del Dezembargo do Paccedilo y mayordomo

mayor de la Casa Real ampc Comentadas por Manuel de Faria Y Sousa Cavallero de la Orden de Christo

Tomo I y II Que contienen la primera segunda y la terceira Centuria de los Sonetos Lisboa Con

Privilegio Real En la Imprenta de Theotonio Damaso de Mello Impressor de la Casa Real Con todas las

licencias necessarias Antildeo de 1685 p 198 224 O exemplo faz pensar nos versos iniciais da Epistula ad Pisones discutidos no seguimento deste trabalho

ldquoHumano capiti ceruicem pictor equinam Jungere si uelit amp uarias inducere plumas Undique collatis

membris ut turpiter atrum Desinat in piscem mulier formosa superne Spectatum admissi risum teneatis

amicirdquo (HOR AP 1-4) 225 Isto eacute arte artifiacutecio lavor feitio 226 Traduccedilatildeo nossa 227 Leonardo (1452-1519) no paragone que contrapesa os meacuteritos e os demeacuteritos da escultura frente agrave

pintura ao afirmar ser a escultura de menor engenho que a pintura opera no vitupeacuterio argumento

amparado nestes mesmos termos que supotildeem a irredutibilidade da arte agrave mateacuteria ldquoRispondesi allo scultore

che dice che la sua scienza egrave piuacute permanente che la pittura che tal permanenza egrave virtuacute della materia sculta

e non dello scultore e in questa parte lo scultore non se lo deve attribuire a sua gloria ma lasciarla alla

natura creatrice di tale materiardquo [Se tu respondesses ao escultor que disse que a sua ciecircncia eacute mais

permanente que a pintura que tal permanecircncia eacute virtude da mateacuteria esculpida e natildeo do escultor e nesta

parte o escultor natildeo deve isso atribuir agrave sua gloria mas deixa-la agrave natureza criadora de tal mateacuteria] cf

Trattato della pittura di Lionardo da Vinci Tratto da un codice della Biblioteca Vaticana e dedicato alla

84

opere estrdquo isto eacute o idos ()estaacute na obra dela natildeo se arranca senatildeo que por abstraccedilatildeo

donde talvez possa em concordacircncia com Aristoacuteteles haver no acircnimo do artiacutefice (cf

ARIST Met VII 7 1032b 1-2) ao passo que por diferenccedila exterior agrave obra e anterior a

ela eacute a idea ldquoidea extra opus nec tantum extra opus sed ante opusrdquo (cf SEN Ep 58 21)

Essa distinccedilatildeo Secircneca assim desbasta imaginando compor retrato (imago) de Luciacutelio

afirma que o destinataacuterio ausente de suas liccedilotildees seja exemplar (exemplar) da pintura

(pictura) de quem extraia por observaccedilatildeo feiccedilatildeo (habitus) que se imponha agrave obra A

feiccedilatildeo eacute faacutecie (facies) eacute ideia (idea) que ensina e provecirc a imitaccedilatildeo (imitatio) do pintor

do artiacutefice (cf SEN Ep 58 19) Faz agrave mesma maneira eacute doutrina de Secircneca o pintor que

figure o poeta Virgiacutelio a feiccedilatildeo (facies) de Virgiacutelio eacute ideia (idea) eacute exemplar (exemplar)

de que o artiacutefice extrai o idos imposto agrave obra daiacute advinda (cf SEN Ep 58 20) Dessarte

para Secircneca como o idos a forma eacute causa do que haacute a idea tambeacutem o eacute228 Nesses

termos assentado em pressupostos semelhantes Raphael Bluteau define ldquoIdeardquo como

ldquoExemplar ou modello que alguem haacute de imitarrdquo

Deste modo pensada como incorpoacuterea e preexistente tambeacutem como imortal

imutaacutevel e inviolaacutevel (cf SEN Ep 58 19) a ideia penetra a forma no verbete ldquoForma

Idea Imagemrdquo Esta acepccedilatildeo pode-se pormenorizar e alastrar agrave luz do que traz o

Vocabulario Portuguez amp Latino em ldquoIDEA

maestagrave di Luigi XVIII Re di Francia e di Navarra Roma MDCCCXVIII [1817] Nella Stamperia de

Romanis Con licenza dersquo Superiori p 40 cf LICHTENSTEIN J The Blind Spot An Essay on the Relations

between Painting and Sculpture in the Modern Translation by Chris Miller Los Angeles Getty Research

Institute 2008 p 5 228 A iacutentegra do passo de Secircneca traz o seguinte (SEN Ep 58 19-20) ldquoQuid sit hoc idos attendas oportet

et Platoni imputes non mihi hanc rerum difficultatem nulla est autem sine difficultate subtilitas Paulo

ante pictoris imagine utebar Ille cum reddere Vergilium coloribus vellet ipsum intuebatur Idea erat

Vergilii facies futuri operis exemplar ex hac quod artifex trahit et operi suo imposuit idos est Quid intersit

quaeris Alterum exemplar est alterum forma ab exemplari sumpta et operi imposita alteram artifex

imitatur alteram facit Habet aliquam faciem statua haec est idos Habet aliquam faciem exemplar ipsum

quod intuens opifex statuam figuravit haec idea est Etiam nunc si aliam desideras distinctionem idos in opere est idea extra opus nec tantum extra opus est sed ante opusrdquo [Atenta com cuidado o que seja o

eidos e se a coisa te parecer difiacutecil de entender zanga-te com Platatildeo e natildeo comigo De resto qualquer

pensamento abstrato tem sempre a sua dificuldade Utilizei haacute pouco o exemplo do pintor Se este quisesse

representar Vergiacutelio numa pintura olharia para o proacuteprio Vergiacutelio A ldquoideiardquo era o rosto de Vergiacutelio o

modelo do futuro quadro a forma que dela o artista extrai e impotildee ao seu trabalho seraacute o eidos Natildeo

entendes qual eacute a diferenccedila A ideia eacute o modelo o eidos eacute a forma deduzida do modelo e imposta ao quadro

a ideia eacute aquilo que o artista imita o eidos aquilo que ele faz O proacuteprio modelo que o artista olhando-o

imprime agrave estaacutetua tem tambeacutem uma determinada forma eacute a sua ideia Se preferes uma outra explanaccedilatildeo

dir-te-ei que o eidos estaacute na proacutepria obra enquanto a ideia eacute exterior agrave obra e natildeo apenas exterior mas

ainda preacute-existente agrave obra] cf SEacuteNECA L A Cartas a Luciacutelio Traduccedilatildeo prefaacutecio e notas de Joseacute Antoacutenio

Segurado e Campos Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 2004 p 204

85

IDEA Ideacutea Derivase do Grego Eidos quer dizer Figura imagem

exemplar Idea Divina He a foacuterma amp o original (que os Theologos

admittem em Deos) ao qual o mundo na sua criaccedilaotilde foy como treslado

amp copia Mais clara amp diretamente Alguns dizem que as Ideas Diuinas

saotilde as creaturas que Deos fez em tempo em quanto desde a Eternidade

precedem na mente Divina naotilde formal mas objectivamente Outros

que saotilde a mesma Essencia Divina conhecida como participavel da

criatura Outros que segue o P Suares dizem que he o mesmo Verbo

Divino ou formal conceito essencial que Deos tem das criaturas como

possiveis porque (diz elle) Ideacutea naotilde he outra cousa senaotilde o exemplar

do artifice ao qual faz sua obra cotildeforme V G [sc ldquoverbi gratiardquo ldquopor

exemplordquo] quer hum Architecto formar hum edificio primeiro na sua

mente foacuterma hum conceito delle amp segundo este conceito ou imagem

vai architectando a obra exterior amp agrave quelle cotildeceito que dentro de si

formou chamamos Ideacutea este conceito em noacutes he distincto de noacutes mas

em Deos he indestincto de Deos porque Deos naotilde veacute foacutera de si cousa

alguma a cuja imitaccedilaotilde ou exemplarisaccedilaotilde haja de obrar mas em si tem

toda a razaotilde de obrar exemplar ou productiva

Suprema Idea Deos

O que vendo Garcia com feacute ardente

Assi fallou com a Suprema Idea

Piedoso Pay senhor omnipotente

Malaca conquist Livro 2 oit 87

Ideas de Plataotilde Segundo Alcino lib De doctrina Platonis he a

imagem exẽplar amp Prototypo eterno de todas as cousas criadas ampobras

da natureza ou a eterna amp perfeitissima intellecccedilaotilde divina He verdade

que Tertulliano chama agraves Ideacuteas de Plataotilde Misterios hereticos haeretica

idearum sacramenta amp conclue dizendo que as ditas ideas foraotilde a

sementeira dos erros dos Gnosticos In ideis Platonicis Gnosticorum

haeretica semina relucere Porem he certo que os primeiros Padres da

Igreja foraotilde Platonicos tanto assi que no livro settimo das suas

confissoens affirma S Agustinho que com os dogmas da Philosophia

Platonica se facilitara muyto a intelligencia das verdades Evangelicas

amp jaacute antes disso S Justino Martyr amp Clemente Alexandrino tinhaotilde

ditto que Plataotilde tivera alguma luz do mysterio da Santissima Trindade

Finalmente com mais clareza que todos os Philosophos que o

86

precederaotilde assentou amp provou Plataotilde que Deos naotilde obra acaso mas

conforme a idea que se propoem amp a Platonica especulaccedilaotilde desta idea

deu nome ao que propriamente chamamos ideas de Plataotilde Platonis

ideae

Idea Imagem de qualquer objecto exterior que por meyo de algum dos

cinco sentidos se representa no entendimento humano Idea ae Fem

Insita in animo rerum informatio onis Fem Species amp forma rerum

impressa amp quasi signata in animo Cic

Formar idea de alguma cousa Animo effingere aliquid Cic

Nem por conjectura pode o homem formar idea da divindade Deum ne

conjecturacirc quidem informare possumus Cic Neste lugar Cicero como

Gentio diz Deos em lugar de Deum

De todas as cousas formaotilde os homens no principio huma grosseira idea

Principio homines rerum quasi ad umbratas intelligentias animo ac

mente concipiunt Primacirc inchoatacirc amp rudi quandam intelligentiacirc res

quasque initio homines comprehendunt

Idea tambem se diz da imagem que o artifice foacuterma no entendimento

para a pocircr em obra Imago inis Fem Species ei Fem Em primeiro

lugar foacuterma o Architecto na sua imaginaccedilaotilde idea de hũ bizarro edificio

amp com ella dirige as operaccediloens da sua arte Architecti in mente primugravem

insidet species extruendi praeclari aedificij quaedam quam deinde

intuens in eaque defixus ad illius similitudinem artem manumque

dirigit Ou Exstruendi aedificij speciem universam primugravem architectus

in animo designat amp ex eacirc deinde specie totum opus exstruit Foacuterma o

Pintor Idea Vieira Tom I pag 390229

Idea Exemplar ou modello que alguem haacute de imitar Exemplar ou

exemplum alicui propositum ad imitandum

Formar dentro de si idea de hũ perfeito orador Perfecti oratoris

speciem amp formam adumbrare figurare animo effingere effigiem in

229 Raphael Bluteau neste passo refere o Orator de Ciacutecero em que o pintor Fiacutedias eacute exemplo da doutrina

e natildeo o arquiteto ldquoNec vero ille artifex cum faceret Iovis formam aut Minervae contemplabatur aliquem e

quo similitudinem duceret sed ipsius in mente insidebat species pulchritudinis eximia quaedam quam

intuens in eaque defixus ad illius similitudinem artem et manum dirigebatrdquo [E na verdade o ceacutelebre artista

ao dar forma a Juacutepiter ou Minerva natildeo contemplava ningueacutem que lhe servisse de modelo mas em sua

mente estava gravada uma espeacutecie de imagem de beleza ideal contemplando-a e nela fixado dirigia sua

arte e sua matildeo de acordo com aquele modelo] (CIC Or II 8-9) A traduccedilatildeo eacute Paulo Seacutergio de Vasconcelos

apud LICHTENSTEIN J (Org) A pintura vol 4 o belo Coordenaccedilatildeo de traduccedilatildeo Magnoacutelia Costa Satildeo

Paulo Editora 34 2004 p 25

87

animo designare informare imaginem ideam describere exprimere

simulachrum

Quereis formar idea de hum homem honrado olhai para vosso irmaotilde

Ornatissimi hominis designandi formam cupis fratris tui exemplo petas

oportet S Paulo Pregador das gentes deve ser a Idea dos pregadores

O Bispo do Porto Carta Pastoral do Porto230

Note-se o verbete abarca acepccedilotildees fundantes bastantemente entrelaccediladas Datildeo

lastro na cristandade ao Vocabulario de Raphael Bluteau as autoridades tanto de Santo

Agostinho (seacutec IV-V dC) leitor de Ciacutecero e de Platatildeo ciceroneamente interpretado

quanto de Satildeo Tomaacutes de Aquino (ca 1225-1274) comentador do bispo de Hipona Com

Santo Agostinho na Questatildeo 46 do De diversis quaestionibus octoginta tribos conhecida

como ldquoDe ideisrdquo aprende-se que as ideas nomeadas por Platatildeo (cf De ideis 1 ldquoIdeas

Plato primus appellasse perhibeturrdquo) e latinamente ditas formas ou species (cf De ideis

2 ldquoIdeas igitur latine possumus vel formas vel species dicererdquo) conforme o Orator (cf

CIC Or II 8-III 10) 231 sejam ldquocertas formas ou razotildees principais das coisas estaacuteveis e

imutaacuteveis que natildeo satildeo formadas e por isso satildeo eternas e se mantecircm sempre do mesmo

modo contidas na inteligecircncia divinardquo (cf De ideis 2 ldquoSunt namque ideae principales

quaedam formae vel rationes rerum stabiles atque incommutabiles quae ipsae formatae

non sunt ac per hoc aeternae ac semper eodem modo sese habentes quae divina

intellegentia continenturrdquo) 232 Satildeo Tomaacutes de Aquino na Questatildeo 15 da Primeira Parte da

Summa Theologica indaga (i) se haacute ideias (ii) se satildeo vaacuterias ou apenas uma e (iii) se haacute

230 Vocabulario portuguez e latino aulico anatomico architectonico bellico botanico brasilico comico

critico chimico dogmatico dialectico dendrologico ecclesiastico etymologico economico florifero forense fructifero autorizado com exemplos dos melhores escritores portugueses e latinos pelo padre

D Raphael Bluteau Coimbra no Real Collegio das Artes da Companhia de Jesu Com todas as Licenccedilas

necessaacuterias Anno Domini MDCCXIII [1713] pp 28-9 231 Cf Vocabulaire Europeacuteen des Philosophies Dictionnaire des Intraduisibles Sous la direction de

Barbara Cassin Paris Eacuteditions du Seuil Dictionnaires Le Robert 2004 p 1200 ldquoCrsquoest dans le texte de

lrsquoOrator (II 8-III-10) qursquoon trouve le premier teacutemoignage de lrsquousage de species pour eacutevoquer les formes

intelligibles Species (de mecircme famille que le gr skeptomai [σκέπτομαι] lsquoregarderrsquo) est employeacute avec la

signification preacutecise de lsquomodegravelersquo de lsquovisionrsquo perceptible seulement par la penseacutee cogitata species que

nous voyons par lrsquoesprit specimen animo uidemus Crsquoest le contexte qui lui donne son sens species est la

Forme du beau qui habite Phidias Avec species reacutepeacuteteacute troi fois Cicero preacutepare sans doute au moyen drsquoun

terme latin plus parlant la traduction technique de lrsquoidea platonicienne par forma Associeacute agrave forma le mot

species deacutesigne pour finir ce qui permet de garantir la proceacutedure dialectique le reacutefeacuterent intelligiblerdquo 232 Cf AGOSTINHO DE HIPONA ldquoAs ideias (de ideis)rdquo Discurso n 40 (2010) pp 379-380 A traduccedilatildeo eacute de

Moacyr Neves a partir da seguinte liccedilatildeo do texto latino AUGUSTINUS De diversis quaestionibus octoginta

tribus (q XLVI) A Mutzenbecher (ed) Corpus Christianorum Series Latina (CCSL) 44A

88

ideias de tudo o que eacute conhecido por Deus233 Agrave primeira questatildeo agrave luz de passo de

Agostinho234 responde que ideias haacute inscritas no intelecto divino apartando-se da liccedilatildeo

platocircnica segundo a qual as ideias existem por si 235 e afirma que idea em grego

equivalha agrave forma em latim de modo que seja forma de algo para aleacutem da proacutepria coisa

existente (ldquoforma autem alicuius rei praeter ipsam existensrdquo) seja como exemplar o

termo eacute caro agrave Epiacutestola 58 de Secircneca desconforme com os usos do Orator seja como

princiacutepio de cogniccedilatildeo das proacuteprias formas (ldquoprincipium cognitionis ipsiusrdquo)236 Entenda-

se que eacute exemplo privilegiado de Satildeo Tomaacutes de Aquino o construtor (aedificator) como

anaacutelogo de Deus que confere evidecircncia agrave ortodoxia da liccedilatildeo Deve o artiacutefice da casa

(artifex) concebecirc-la o todo e a parte como forma mentada (in mente aedificatoris) como

ideia preexistente agrave construccedilatildeo de maneira que tencione na mateacuteria (materia) a

semelhanccedila com a ideia (idea domus)237 Eacute exemplo que se lecirc em Raphael Bluteau muito

proximamente da Summa Theologica238

Nota-se ademais as liccedilotildees platocircnicas ou autorizadas como platocircnicas em

Raphael Bluteau tecircm mediaccedilatildeo do tratado De doctrina Platonis versatildeo latina

quatrocentista de Marsiacutelio Ficino (1433-1499) do Didaskalikos de Alcino (ca seacutec II

dC) inteacuterprete de Platatildeo Na traduccedilatildeo que fez o florentino do capiacutetulo IX da obra (Caput

IX De ideis amp de causa efficiente) conforme a ediccedilatildeo aldina de 1516 impressa em

Veneza Alcino precisa a idea relativamente a deus (ldquoad deumrdquo) como intelecto de deus

(ldquointellectio deirdquo) relativamente ao mundo sensiacutevel (ldquoad mundum uero sensibilẽrdquo) como

exemplar (ldquoexemplarrdquo) e relativamente a si mesma (ldquoad se ipsamrdquo) como essecircncia

(ldquoessentiardquo) de modo que daiacute defina a Idea como exemplar eterno das coisas feitas

233 Cf TOMAacuteS DE AQUINO ldquoSuma Teoloacutegica Primeira Parte Questatildeo 15 Sobre as Ideiasrdquo Discurso n 40

(2010) p 311 234 Passo em que Agostinho afirma (cf De ideis a) ldquotanta in eis vis constituitur ut nisi his intellectis sapiens

esse nemo possitrdquo isto eacute ldquosatildeo tatildeo importantes que ningueacutem pode ser saacutebio sem delas ter inteligecircnciardquo cf

AGOSTINHO DE HIPONA ldquoAs ideias (de ideis)rdquo Discurso n 40 (2010) p 379 235 Cf TOMAacuteS DE AQUINO ldquoSuma Teoloacutegica Primeira Parte Questatildeo 15 Sobre as Ideiasrdquo Discurso n 40

(2010) pp 312-313 cf OLIVEIRA C E deldquo ldquoIdeias formas rationes e species A Quaestio de ideis de Tomaacutes de Aquinordquo Discurso n 40 (2010) p 97 cf Cf Vocabulaire Europeacuteen des Philosophies

Dictionnaire des Intraduisibles Sous la direction de Barbara Cassin Paris Eacuteditions du Seuil Dictionnaires

Le Robert 2004 p 1202 236 Cf TOMAacuteS DE AQUINO ldquoSuma Teoloacutegica Primeira Parte Questatildeo 15 Sobre as Ideiasrdquo Discurso n 40

(2010) p 321 237 Idem pp 312 314 315 316 318 238 Cf Vocabulario portuguez e latino aulico anatomico architectonico bellico botanico brasilico

comico critico chimico dogmatico dialectico dendrologico ecclesiastico etymologico economico

florifero forense fructifero autorizado com exemplos dos melhores escritores portugueses e latinos

pelo padre D Raphael Bluteau Coimbra no Real Collegio das Artes da Companhia de Jesu Com todas

as Licenccedilas necessaacuterias Anno Domini MDCCXIII [1713] pp 28-29

89

segundo a natureza (ldquoDifiniũt autẽ Ideam exemplar aeternũ eorum quae secũdum

naturam fiuntrdquo) 239 Essa definiccedilatildeo observe-se verte ao latim o texto grego do

Didaskalikos ldquoHorizontai de tēn idean paradeigma tōn kata physin aiōnionrdquo

()240 A versatildeo de

Marsiacutelio Ficino eacute calcada na letra de Alcino A bem dizer todavia trata-se de Platatildeo lido

por Secircneca ldquoIdea est eorum quae natura fiunt exemplar aeternumrdquo isto eacute ldquoIdeia eacute

exemplar eterno das coisas feitas pela naturezardquo (cf SEN Ep 58 19)

A autoridade de Alcino e a definiccedilatildeo de idea trazida na versatildeo de Marsiacutelio Ficino

natildeo satildeo estranhas aos leitores de Francisco de Holanda (1517-1584) Referem-se no Da

pintura antiga obra que se sabe acabada na Quaresma de 1548 conhecida de manuscrito

de 1790 e publicada pela primeira vez tatildeo-somente em 1849 em francecircs241 Vale reter-lhe

a liccedilatildeo porque entrelaccedila semanticamente o termo ldquoideiardquo na exemplaridade da intelecccedilatildeo

divina eacute Ideia de Deus o que ideia o artiacutefice o pintor

A ideia na pintura eacute uma imagem que haacute-de ver o entendimento do

pintor com olhos interiores em grandiacutessimo silecircncio e segredo qual haacute-

de imaginar e escolher a mais rara e excelente que sua imaginaccedilatildeo e

prudecircncia puder alcanccedilar como um exemplo sonhado ou visto em o

ceacuteu ou outra parte o qual haacute-se de seguir e querer depois arremedar e

mostrar fora com a obra de suas matildeos propriamente como o concebeu

e viu dentro em seu entendimento

Esta ideia eacute maravilhosa nos grandes entendimentos e engenhos e agraves

vezes eacute tal que natildeo haacute matildeo nem saber que possa imitar nem igualar-se

com ela Dizem os filoacutesofos que o sumo inventor e imortal Deus

quando fez as suas obras tais como ele soacute entende e conhece que

239 O passo eacute o seguinte ldquoEst autem idea ad deum quidẽ intellectio dei Ad mundum uero sensibilẽ exemplar

ad se ipsam essentia Quicquid enim intelligẽtia fit ad aliquid referri necesse est quod quidem operis

exemplar erit quemadmodũ si aliquid ad aliquo fiat ut agrave me mei ipsius imago Etsi exemplar haud omnino sit ab agente seorsum ut quisq artifex in se ipso artificiorũ exẽpla concipiens horum deinde formas in

materiam explicat Difiniũt autẽ Ideam exemplar aeternũ eorum quae secũdum naturam fiuntrdquo cf De

Mysteriis Aegyptiorum Chaldaeorum Afsyriorum Proclus in Platonicum Alcibiadem de anima atque

daemone Proclus de sacrificio et magia Porphyrius de divinis adque daemonibus Synesius Platonicus

de somniis Psellus de daemonibus Expositio Prisciani et Marsilii in Theophrastum de sensu phantasia

et intellecta Alcinoi Platonici philosophi liber de doctrina Platonis Venetiis Aldi 1516 p 78 240 Cf SUMMERELL O F (Ed) et al Alkinoos Didaskalikos Lehrbuch der Grundsaumltze Platons Einleitung

Text Uumlbersetzung und Anmerkungen Sammlung wissentschaftlicher Kommentaumlre Berlin and New

York Walter de Gruyter 2007 pp 24-25 241 Cf NASCIMENTO C ldquoDa pintura antiga de Francisco de Holanda o encocircmio como gecircnero da prescriccedilatildeo

e da arterdquo Floema Caderno de Teoria e Histoacuteria Literaacuteria Nordm 1 (2005) pp 37-8

90

primeiro no seu altiacutessimo entendimento fez e teve os exemplos e ideias

das obras que depois fez e as viu antes de serem tatildeo perfeitos como

depois vieram a ser A este altiacutessimo pintor e capitatildeo nos preceitos

conveacutem seguir os pintores mais que alguns outros estudiosos e fazer o

mesmo exemplo e ideias no entendimento daquilo que desejamos que

venha a ser

Assim que a ideia eacute a mais altiacutessima coisa na pintura que se pode

imaginar dos entendimentos porque como eacute obra do entendimento e

do espiacuterito conveacutem-lhe que seja muito conforme a si mesma e como

isto se tiver ir-se-aacute alevantando cada vez mais e fazenso-se espiacuterito e

ir-se-aacute miszclar com a fonte e exemplar das primeiras ideias que eacute

Deus

E das ideias diz Alcinous filoacutesofo da doutrina de Platatildeo lsquoest autem

idea ad Deum quidem intelectio Dei ad Mundum vero sensibilem

exemplar ad se ipsam essentia quid enim intelligentia fit ad aliquid

referre necesse est quod quidem operis exemplar erit quem admodum

si aliquid ad aliquo fiat ut a me mei ipsius imago Et si exemplar haud

omnino sit ab agente seorsum ut quisque artifex in se ipso artificiorum

exempla concipiens horum deinde formas in materiam explicat

Difiniunt autem ideam exemplar aeternum eorum quae secundum

naturam fiunt 242

Firmada a autoridade platocircnica o que o corpo lexicograacutefico vernacular

brevemente compilado talvez indicie desde o seacuteculo XVI eacute o processo de incorporaccedilatildeo

ao sermo culto e letrado portuguecircs do helenismo ldquoideardquo O Grande Dicionaacuterio Houaiss

registra o termo em liacutengua portuguesa em 1543 Jaacute o etimoacutelogo Antocircnio Geraldo da

242 HOLANDA F de Da pintura antiga Introduccedilatildeo notas e comentaacuterios de Joseacute da Felicidade Alves

Lisboa Livros Horizonte 1984 pp 43-4 Nesta ediccedilatildeo agrave pagina 102 sugere-se traduccedilatildeo ao passo em latim

ldquoA ideia eacute em relaccedilatildeo a Deus intelecccedilatildeo de Deus em relaccedilatildeo ao mundo sensiacutevel eacute modelo em relaccedilatildeo a si-mesma eacute a sua proacutepria essecircncia Efetivamente qualquer que seja a operaccedilatildeo intelectual forccediloso eacute que

tenha relaccedilatildeo com algo eacute esse o modelo da obra paradigma de como alguma coisa eacute feita por algueacutem tal

como a imagem de mim-proacuteprio eacute feita por mim E se eacute modelo natildeo seraacute totalmente distinto do sujeito que

o faz tal como sucede com qualquer artiacutefice ao conceber em si-mesmo os modelos das obras a realizar

para logo projectar na mateacuteria as formas das tais obras Define-se pois a ideia eacute o modelo eterno das coisas

que satildeo feitas de harmonia com a naturezardquo

Ora propocircs Cristiane Nascimento na medida em que o Da pintura antiga eacute obra de prescriccedilatildeo visto assim

ser a tratadiacutestica em que se regula a arte da pintura deve-se supor que natildeo soacute o trato de mateacuteria metafiacutesica

mas tambeacutem as referecircncias desta ordem de ldquofiloacutesofo da doutrina de Platatildeordquo operam-se como lugar de

autoridade que datildeo lastro ao que se prescreve cf ldquoDa pintura antiga de Francisco de Holanda o encocircmio

como gecircnero da prescriccedilatildeo e da arterdquo Floema Caderno de Teoria e Histoacuteria Literaacuteria Nordm 1 (2005) p 39

91

Cunha registra-o em 1572243 NrsquoOs Lusiacuteadas pode-se supor Evidentemente interessa

menos a primazia do que o uso No poema eacutepico de Luiacutes de Camotildees o Diccionario da

lingua portugueza de Antocircnio de Moraes Silva (1755-1823) impresso em 1789 jaacute o

aponta lecirc-se (Os Lusiacuteadas X 7)244

Com doce voz estaacute subindo ao ceo

Altos varotildees que estao por vir ao mundo

Cujas claras Ideas vio Protheo

Num globo vatildeo diaacutefano rotundo245

Ora as ideias que viu Proteu claras satildeo platocircnicas Ao menos de acordo com os

comentaacuterios de Manuel de Faria e Sousa (1590-1649) a esses versos ldquoEs Idea lo mismo

que la primera imagẽ o modelo de qualquier obra i Protheo esso quiere dezir

mateacuteriardquo246 Ou se generalizadas as consideraccedilotildees da Micrologia de Joatildeo Franco Barreto

(ca 1600-1674) de 1672 acerca do mesmo termo ainda que empregado em outro passo

do poema de Luiacutes de Camotildees 247

Mas para bem se entender que cousa seja Idea se deve saber que

Platam potildee tres principios de todas as cousas universaes a saber um

Deus a materia e as Ideas [] As Ideas sam formas e exemplares das

cousas essenciaes em a divina mente nela existentes ainda antes que

as cousas fossem criadas as quaes destas ideas trazem o seu ser e

243 Cf CUNHA A G da Dicionaacuterio Etimoloacutegico da Liacutengua Portuguesa 4ordf ediccedilatildeo revista e ampliada Rio

de Janeiro Lexikon 2010 p 347 244 Cf Diccionario da lingua portugueza composto pelo padre D Rafael Bluteau reformado e

acrescentado por Antonio de Moraes Silva natural do Rio de Janeiro Tomo primeiro A-K Lisboa Na

Officina de Simatildeo Thadeo Ferreira Anno M DCC LXXXIX [1789] Com licenccedila da Real Meza da

Comissatildeo Geral sobre o Exame e Censura dos Livros Vende-se na loja de Borel Borel e Companhia

quase defronte da Igreja nova da Nossa Senhora dos Martyres na esquina p 690 245 Cf Os Lusiadas de Luis de Camotildees Com Privilegio Real Impressos em Lisboa com licenccedila da Sancta Inquisiccedilatildeo e do Ordinario em casa de Antonio Gotildeccedilaluez Impressor 1572 p 162 246 Lusiadas de Luis de Camoens principe de los poetas de Espantildea Al Rey N S Felipe IV El grande

Comentadas por Manuel de Faria i Sousa Cavallero de la Orden de Christo i de la Casa Real Tomos

terceiro i quarto Antildeo 1639 Com privilegio En Madrid Por Iuan Sanchez Impressor A costa de Pedro

Coello mercador de libros p 309 247 BARRETO J F Micrologia camoniana Prefaacutecio de Aniacutebal Pinto de Castro leitura e integraccedilatildeo do texto

de Luiacutes Fernando de Carvalho Dias e Fernando F Portugal Lisboa Imprensa Nacional-Casa da Moeda

1982 pp 428-9 Joatildeo Franco Barreto comenta os versos seguintes (II 35) ldquoE por mais namorar o soberano

Padre de quem foy sempre amada amp cara Se lha presenta aszligi como ao Troyano Na selva Idea jaacute se

apresentagraverardquo cf Os Lusiadas de Luis de Camotildees Com Privilegio Real Impressos em Lisboa com licenccedila

da Sancta Inquisiccedilatildeo e do Ordinario em casa de Antonio Gotildeccedilaluez Impressor 1572 p 25

92

particular impressatildeo como a cera do seu sinete248

Os usos platocircnicos de modo concordante com os passos Manuel de Faria e Sousa

e de Joatildeo Franco Barreto desdobram-se no Vocabulario Portuguez amp Latino pois que

Raphael Bluteau ao propor que ldquoIdeacutea naotilde he outra cousa senaotilde o exemplar do artifice

ao qual faz sua obra cotildeformerdquo busca o Architecto como exemplo249 e faz agrave maneira de

Marsiacutelio Ficino como pode explicitar epiacutestola de data incerta do tradutor de Alcino

enderaccedilada ao poeta Giovanni Cavalcanti (1444-1509) cuja mateacuteria assim se resume

ldquoChe lrsquoIdee (secondo Platone) siano nella mente diuinardquo ou seja ldquoQue as Ideias

(segundo Platatildeo) estatildeo na mente divinardquo Lecirc-se o passo da epiacutestola tal como impressa em

1563 em traduccedilatildeo toscana de Felice Figliucci (1525-1590)

Il nostro Platone nel suo Timeo immitando Timeo Pithagorico e

approvando la sua opinione afferma il mondo esser generato da Iddio

e di questa generatione tre cagione adduce cioegrave la causa efficiente il

fine e lrsquoesemplare Peroche egli uuole che il mondo sia stato fatto dalla

Potenza di Iddio per cagione della sua bontagrave secondo lrsquoesemplare della

diuina sapiẽza Et cosi come in uno Architettore sono glrsquoesemplari

cosi di tutto lrsquoedificio come de le sue parti similmente in una diuina

intelligenza che egrave sopra al mondo uuole che siano gli esemplari di

tutto questo mondo amp delle sue parti e quella chiama intelligibile e

eterno e questo temporale e sensibile Gli esemplari di questo che in

quello sono le chiama Idee e le simiglianze di quello che in questo si

truouano le domanda imagini e ombre250

O nosso Platatildeo em seu Timeu imitando o Timeu pitagoacuterico e

248 Idem ibidem 249 Eacute exemplo que se lecirc tambeacutem na ediccedilatildeo oitocentista do Dictionarium Hispanum Latinegrave Versum de

Antocircnio de Nebrija ldquoUn arquitecto primero forma en su imaginacioacuten la idea de un excelente edificio por la qual despues gobierna su arte y operacioacuten Architecti in mente primugravem insidet species extruendi

praeclari aedificii quaedam quam deinde intuens in eaque defixus ad illius similitudinem artem

manumque dirigit Exstruendi aedificii speciem universam primugravem architectus in animo designat amp ex eacirc

deinde specie totum opus exstruitrdquo cf Antonii Nebrissensis VCL grammatici et regii chronograaphi

Dictionarium redivivum novissimegrave emendatum ac novis subinde accessionibus auctum locupletatum hellip

Opera et studio R P Fatr Ildephonsi Lopez de Rubinotildes Regii ac Militaris Ordinis Beatae Mariae de

Mercede Redemptionis Captiuorum Superiorum permissu Matriri apud Michaelem Escribano

Typographum Anno MDCCLXXVIII [1778] Sumptibus Regiae Societatis p 194 250 Cf Tomo I Delle diuine lettere del Gran Marsilio Ficino tradotte per M Felice Figliucci Senese

Nuovamente ristampate con due tauole la prima de i nome amp materie delle lettere amp lrsquoaltra delle cose piu

notabili Con privilegio In Venegia appresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLXIII [1563] p 36r-37v

93

aprovando a sua opiniatildeo afirma ser o mundo gerado por Deus e desta

geraccedilatildeo aduz trecircs razotildees a saber a causa eficiente a final e a exemplar

Porque ele quer que o mundo tenha sido feito da Potecircncia de Deus em

razatildeo da sua bondade segundo o exemplar da divina sabedoria E assim

como em um Arquiteto estatildeo os exemplares natildeo soacute de todo o edifiacutecio

mas tambeacutem de suas partes semelhantemente em uma divina

inteligecircncia que haacute sobre o mundo quer que estejam os exemplares de

todo este mundo e de suas partes e aquela se chama inteligiacutevel e eterna

e este temporal e sensiacutevel Os exemplares deste que naquela estatildeo

denomina-os Ideias e as semelhanccedilas daquele que neste se encontram

as denomina imagens e sombras 251

Os usos o explicitam o exemplo ilustra a noccedilatildeo de idea como teorizada em Platatildeo

ainda que cristatildemente interpretada no passo de Marsiacutelio Ficino Por analogia de proporccedilatildeo

sabe-se bem na mente divina haacute exemplares do mundo criado assim como na mente do

arquiteto haacute exemplares do edifiacutecio do todo e de suas partes inteligiacuteveis e eternas as

ideai as Idee como entes incorpoacutereos e inexistentes na natureza sensiacuteveis e temporais

as coisas mundanas geradas de Deus252 Eacute liccedilatildeo que se conhece em termos semelhantes

da Summa Theologica de Satildeo Tomaacutes de Aquino

O exemplo do arquiteto do artiacutefice de arte mecacircnica recurso de evidentia uacutetil a

filoacutesofos e a teoacutelogos da cristandade penetra a preceptiva de Hermoacutegenes na versatildeo

toscana de Filiberto Campanile e faz-se semelhantemente uacutetil ao retor alheio agrave doutrina

platocircnica poreacutem

Se nellrsquoa arti mechaniche non potragrave qualsiuoglia gran maestro dar

principio ad opera alcuna se prima notilde hauragrave cotilde pẽsieri fabbricatosi

nella mente lrsquoIdea o forma di quella perche nelle liberali non diremo

il medesimo auuenire a colui chrsquooratione o poema oacute altro che che sia

formar voglia senza reger lo stile secondo alcuna forma collocatasi

nella mente che srsquoa caso volesse andar ponendo insieme parole amp

ornamenti oratorij senza dubbio ignorante e stolto si dimostrerebbe

Fia dunque per tal cagion necessario lrsquohauere a conoscere quali e

251 Traduccedilatildeo nossa 252 Cf SANTOS M M ldquoArte dialoacutegica e epistolar segundo as Epiacutestolas morais a Luciacuteliordquo Letras Claacutessicas

Satildeo Paulo 1999 v 3 p 59

94

quante siano le forme dellrsquoEloquentia al che volendo noi dar principio

diremo lrsquoIdea ouer forma del parlare non esser altro chersquol genere di

quello atto e conueniente di sentenza di metodo di parole e di

compositione alle cose sottoposte amp alle persone cioegrave che la forma o

genere del parlare sia corrispondente e si conuenga per tutte le parte

predette alle cose sottoposte e alle persone delle quali si dee

ragione253

Se nas artes mecacircnicas natildeo poderaacute qualquer grande mestre dar iniacutecio a

obra alguma se natildeo tiver primeiro com pensamentos fabricado na

mente a Ideia ou forma desta [obra] por que nas liberais natildeo diremos

ocorrer o mesmo com aquele que discurso ou poema ou outro queira

formar sem reger o estilo segundo alguma [Ideia ou forma] colocada na

mente Porque se acaso quisesse andar pondo mesmas palavras amp

ornamentos oratoacuterios sem duacutevida ignorante e tolo se demonstraria

Donde seja por tal razatildeo necessaacuterio ter de conhecer quais e quantas

satildeo as formas da Eloquecircncia ao que querendo dar iniacutecio diremos ser

a Ideia ou forma do dizer senatildeo que o gecircnero deste apto e conveniente

de pensamento de meacutetodo de palavras e de composiccedilatildeo das coisas

referidas e das pessoas isto eacute que a forma ou gecircnero do dizer seja

correspondente e convenha por todas as partes preditas agraves coisas

referidas e agraves pessoas sobre as quais se deva abordar254

Filiberto Campanile manifesta no tratado LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia

a interseccedilatildeo semacircntica que expande no Hermoacutegenes toscano o sentido de ldquoIdeardquo de

ldquoformardquo empregam-se os substantivos como sinocircnimos ora respeitantes ao que se

configura mentalmente ora respeitantes ao que se forja no estilo como ldquoIdea ouer forma

del parlarerdquo ou no plural como ldquoforme dellrsquoEloquentiardquo entrelaccedilados ambos os termos

o helenismo e o latinismo na praacutetica compositiva e nos fazeres de oradores e poetas que

fazem pender a forma discursiva da forma mentada Sem a mediaccedilatildeo sem a regecircncia da

conformaccedilatildeo mental o uso da palavra na escritura beira a ignoracircncia e a parvoiacutece de quem

desconhece as conveniecircncias do preceito

253 LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina drsquoHermogene

e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con Licenza dersquo

Superiori pp 5-6 254 Traduccedilatildeo nossa

95

Recorde-se tradutora da ediccedilatildeo do Peri ideōn que integra a Biblioteca Claacutesica

Gredos cujo tiacutetulo eacute o jaacute citado Sobre las formas de estilo Consuelo Ruiz Montero busca

discriminar as acepccedilotildees do substantivo grego ideano leacutexico de Hermoacutegenes Das

acepccedilotildees acolhidas a mais habitual na obra a estudiosa verte como ldquoforma de estilordquo e

observam os estudos introdutoacuterios agrave ediccedilatildeo supotildee semanticamente equivalente a

kharaktēr tal como preceituado por Dioniacutesio de Halicarnasso255 Eacute ademais acepccedilatildeo que

o A Greek-English Lexicon de Lidell-Scott registra como ldquoquality of style

(eg σαφήνεια γοργότης etc)rdquo256 Nesse sentido aponta Consuelo Ruiz Montero

vale-se tambeacutem Hermoacutegenes dos substantivos eidos ()e typos (ος) tomados os

trecircs termos idea eidos e typos de modo intercambiaacutevel como sinocircnimos257 Noutra

acepccedilatildeo Consuelo Ruiz Montero define natildeo sem imprimir acentuado personalismo agrave

preceptiva retoacuterica idea como ldquolsquoestilorsquo individual de un autorrdquo agrave maneira de ldquoestilo de

Platoacutenrdquo de ldquoestilo de Demoacutestenesrdquo Eacute acepccedilatildeo que se registra no A Greek-English

Lexicon como ldquostylerdquo O exemplo dos lexicoacutegrafos britacircnicos recolhido dos comentaacuterios

de Siriano Filoxeno agrave obra de Hermoacutegenes natildeo difere daquele que apresenta a estudiosa

eacute ldquoΠλατωνική Δημοσθενικὴ ἰrdquo (cf SYRIAN In Hermog 1112 R) isto eacute ldquoestilo

platocircnico demostecircnicordquo se aceitos os termos do verbete ldquordquo de Lidell-Scott No Peri

ideōn haacute exemplos como este ldquooti nyn estin ēmin peri tēs Platōnos ē Dēmosthenous ē

tou deinos ideas o logosrdquo (

) (cf HERM 214 24-215-1) as traduccedilotildees as mais recentes

natildeo distam na eleiccedilatildeo do vocaacutebulo a reduzir o genitivo plural ldquotēs ideasrdquo ()

Cecil W Wooten opta por ldquoour discussion will not be concerned with the style peculiar

to Plato or Demosthenes or any other writerrdquo Consuelo Ruiz Montero por ldquonuestra

exposicioacuten no va a tratar ahora del estilo de Platoacuten Demoacutestenes o cualquier outro autorrdquo

e ao cabo Michel Patillon por ldquonous ne parlons pas pour lrsquoinstant du style de Platon ou

de Deacutemosthegravene ou de tel autrerdquo Ou seja idea eacute para esses tradutores nesses casos ou

255 Aplica-se o substantivo idea nesta acepccedilatildeo ora com o genitivo grego ldquotou logourdquo ora com o dativo

ldquologoirdquo cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Monterto Madrid Editorial Gredos 1993 p 37 256 Isto eacute ldquoqualidade de estilordquo (por ex saphecircneia gorgotecircs etc) 257 Consuelo Ruiz Montero a partir do trabalho Studies in Hermogenes and Eustathios The Theory of Ideas

and Its Application in the Commentaries of Eustathios on the Epics of Homer (1977) de Gertrud Lindberg

contabiliza emprega-se no Peri ideōn na acepccedilatildeo a mais corriqueira idea 96 vezes eidos 63 vezes e typos

7 vezes cf Idem ibidem p 37 A obra de Gertrud Lindberg natildeo foi consultada para a elaboraccedilatildeo deste

trabalho

96

style ou estilo ou style Diga-se nessa acepccedilatildeo como na primeira Hermoacutegenes emprega

os substantivos eidosetypos como sinocircnimos Consuelo Ruiz Montero entende tambeacutem

idea e eidos como ldquotipo de estilordquo nos casos em que esses substantivos sejam

determinados por um genitivo ldquologourdquo antecedido ou natildeo de artigo ldquotourdquo A tradutora

abre-se agrave leitura de que logos compreenda-se como discurso embora afirme preferir o

termo ldquoestilordquo por assumir logos em casos assim como equivalente a lexis hermēneia

e kharaktēr Por fim Consuelo Ruiz Montero lecirc idea como espeacutecie ou gecircnero Eacute o que

observa em ldquoperi tēs ideas ekeinēs logourdquo () isto eacute

ldquosobre estes gecircneros de discursordquo (cf HERM 409 8) Destaca a tradutora ao castelhano

emprego semelhante lecirc-se ademais com o substantivo eidos assim como em ldquoto toiouton

tōn panēgyrikōn eidos logōnrdquo ()(cf

HERM 407 19-20) isto eacute ldquoen tal especie de discurso panegiacutericordquo ldquoin a certain kind of

panegyric speechrdquo ou ldquodans ce genre de discours paneacutegyriquesrdquo conforme Consuelo

Ruiz Montero Cecil W Wooten e Michel Patillon respectivamente Isto seja acatem-se

ou natildeo as diversas escolhas tradutoacuterias do Sobre las formas de estilo parece expliacutecito que

natildeo haacute no texto de Hermoacutegenes nem idea como exemplar suprassensiacutevel nem idea como

forma mental258

Esta derradeira acepccedilatildeo poreacutem ganha legibilidade nos usos que se fazem do Peri

ideōn desde o Quinhentos e o Seiscentos mostra-o bem Filiberto Campanile Mas natildeo

apenas Na medida em que se afirma que artiacutefices de artes mecacircnicas e liberais operam

por homologia exemplo bastante interessante encontra-se nos comentaacuterios a Vitruacutevio de

Daniele Barbaro (1513-1570) assim como propostos no tratado I Dieci libri

dellrsquoArchitettura di M Vitruvio estampado em segunda ediccedilatildeo em Veneza no ano de

1567 Nos comentaacuterios a normatizaccedilatildeo retoacuterica de Hermoacutegenes incide na regulaccedilatildeo

arquitetocircnica de Vitruacutevio259

Come le maniere del parlare che si chiamano idee sono qualitagrave

dellrsquooratione conueniente alle cose amp alle persone cosi le maniere

degli edificij sono qualitagrave dellrsquoarte conueniente alle cose amp alle

258 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 pp 35-39 259 A primeira ediccedilatildeo da obra data de 1556 Segundo Manfredo Tafuri eacute por volta de 1547 que Daniele

Barbaro inicia os estudos do tratado de Vitruacutevio cf TAFURI M Venice and the Renaissance Translated

by Jessica Levine Cambridge Massachusetts MIT Press 1995 p 96

97

persone260

Como as maneiras do dizer que se chamam ideas satildeo qualidades do

discurso convenientes agraves coisas amp agraves pessoas tambeacutem as maneiras dos

edifiacutecios satildeo qualidades da arte convenientes agraves coisas amp agraves pessoas261

Filiberto Campanile e Daniele Barbaro operam definiccedilotildees de idea semelhantes A

saber as idee para aquele satildeo maniere ldquogenere di quello atto e conveniente di sentenza

di metodo di parole e di compositione alle cose sottoposte amp alle personerdquo 262 para este

satildeo ldquoqualitagrave dellrsquooratione conueniente alle cose amp alle personerdquo 263 Itere-se maniera

natildeo eacute categoria estranha a Filiberto Campanile referindo-se agrave lucidezza (eukrineia)

emprega ldquomaniera di direrdquo agrave aspprezza (trakhytēs) ldquomanierardquo ao splendore (lamprotēs)

ldquomaniera di parlarrdquo agrave circuitione (peribolē) ldquomaniera di parlarerdquo por exemplo264 As

cose para um e para outro traduzem os oito stoikheia como prescritos no Peri ideōn (cf

HERM 218 18-26) Esses stoikheia genericamente ditos em italiano esquematizam-se

no tratado de Filiberto Campanile

260 Cf I Dieci libri dellrsquoArchitettura di M Vitruvio Tradotti amp commentati da Mons Daniel Barbaro eletto

Patriarca drsquoAquileia da lui riueduti amp ampliati amp hora in piu commoda forma ridutta In Venetia Appresso Francesco dersquoFranceschi Senese amp Giouanni Chrieger Alemano Compagni MDLXVII [1567]

p 36 261 Traduccedilatildeo nossa 262 Idem p 5 263 Cf I Dieci libri dellrsquoArchitettura di M Vitruvio Tradotti amp commentati da Mons Daniel Barbaro eletto

Patriarca drsquoAquileia da lui riueduti amp ampliati amp hora in piu commoda forma ridutta In Venetia

Appresso Francesco dersquo Franceschi Senese amp Giouanni Chrieger Alemano Compagni MDLXVII [1567]

p 36 264 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori pp 22 46 52

98

Figura 4 LrsquoIdee ouero Forme dellarsquoeloquentia (1606) 265

Vale lembrar poreacutem que natildeo pende do Peri ideōn a definiccedilatildeo de idea O tratado

codifica as ideai tou logou mas natildeo as define266 Leitor privilegiado de Hermoacutegenes

Jorge de Trebizonda no Rhetoricorum libri V escreve serem as ideai em grego o que

latinamente se diz formae dicendicf ldquode dicendi formis quae Graeligcegrave uocamusrdquo

267 e as define ldquoForma est genus orationis sententia methodo uerbis compositione

rebus subiectis amp personis idoneumrdquo268 isto eacute ldquoForma eacute gecircnero do discurso adequado

ao pensamento ao meacutetodo agraves palavras agrave composiccedilatildeo agraves mateacuterias expostas e agraves

pessoasrdquo 269 Mostra-o Lucia Calboli Montefusco Siriano Filoxeno comentador de

Hermoacutegenes eacute autoridade de quem parece pender a definiccedilatildeo de idea ou de forma

265 Idem p 13 266 Cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) p

146 267 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia

ad D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] p 493 268 Idem p 496 269 Traduccedilatildeo nossa

99

apresentada na liccedilatildeo de Jorge de Trebizonda e partir daiacute na de Daniele Barbaro no seacuteculo

XVI ou na de Filiberto Campanile no seacuteculo XVII Nas palavras de Siriano Filoxeno

idea eacute poiotēs logou eacute qualidade do discurso concordante () com o personagem

() e com a mateacuteria (πρᾶγμα) relativamente ao pensamento () agrave

dicccedilatildeo () a todo entrelaccedilamento (διαπλοκή) da harmonia () (cf Syrian I

2 16-19 Rabe) 270

Assim definidas as ideai saphēneia a primeira delas chiarezza na versatildeo italiana

de Filiberto Campanile eacute fundante no preceito porque afirma o retor grego natildeo haacute

discurso que natildeo precise ser claro (cf HERM 226 8-11) Deve-se ressaltar que o tratado

LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia neste passo conduz agrave letra o preceito Leitores

seiscentistas de Hermoacutegenes poreacutem nem sempre acatam a disposiccedilatildeo da doutrina tal

como preceituada mesmo que natildeo a desabonem O valenciano Pedro Juan Nuntildeez (1522-

1602) leitor minucioso de Hermoacutegenes no tratado Institutionum rhetoricarum libri

quinque impresso e reimpresso em Barcelona em 1578 1585 e 1593 defende que seja

conveniente prescrever antes das demais ideai a magnitudo (sabe-se megethos) para que

se torne mais faacutecil o aprendizado da doutrina acrescenta apesar de o grego abordar

primeiro a perspicuitas termo que interpreta saphēneia por entendecirc-la necessaacuteria a todo

discurso (em latim ldquoquia ea in omni oratione est necessariardquo)271

Por um lado afirmar-se necessaacuteria a saphēneia significa supor que a

inteligibilidade do discurso eacute condiccedilatildeo de sua realizaccedilatildeo eficiente Entende-se que ldquosoacute o

que eacute compreendido pode ser criacutevelrdquo272 Por outro lado isso natildeo significa fazer da falta

de saphēneia a asapheia (ldquordquo oscuritagrave em Filiberto Campanile) um viacutecio uma

vez que por insuficiecircncia natildeo se peca quando se miram pretericcedilotildees subentendidos

ambiguidades imprecisotildees ou silecircncios convenientemente efetuados por meios artiacutesticos

Sabem bem oradores e poetas como satildeo por vezes bem-vindos nos discursos os usos de

formas alusivas (as ldquoἐμφάσειςrdquo enfasi em Giulio Camillo Delminio) e de questotildees

270 Apud MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) p

149 ldquordquo 271 Cf Pet Iohan Nunnesii valentini Institutionum rhetoricarum libri quinque Editio tertia ceteris multo

correctior et locupletior exemplis Barcinone Cum licentia Ex typographia Sebastiani agrave Cormellas An

1593 p 303 272 Cf MARTINS P ldquoO paacuterodo de Fedra e a retoacutericardquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 1999 v 3 p 201

100

figuradas (ldquordquo questione figurate em italiano273) (cf

HERM 240 24-241 5)274 As afirmaccedilotildees do Peri hermēneias atribuiacutedo a Demeacutetrio de

Falero satildeo taxativas nesse sentido e avalizam o preceito ldquoE ndash pelos deuses ndash ateacute mesmo

a falta de clareza em muitas ocasiotildees eacute veementerdquo (cf DEMETR 254

ldquoΚαὶ νὴ τοὺς θεοὺς σχεδὸν ἂν καὶ ἡ Πολλαχοῦ δεινότης ἐστίrdquo na traduccedilatildeo

seiscentista de Pietro Vettori ldquoEt per deos ferme vtique amp obscuritas multis locis grauitas

estrdquo275 )276 Enfim conforme os coacutedigos da obra retoacuterica de Hermoacutegenes eacute possiacutevel

presumir que a saphēneia eacute sim necessaacuteria como condiccedilatildeo para a recepccedilatildeo do discurso

trate-se de poesia ou natildeo277 no entanto concede-se que a asapheia seja efeito muitas

vezes decoroso e assim parecem sempre esclarecedoras as liccedilotildees do Peri hermēneias

frente ao tirano eunuco nunca eacute prudente enunciar clara e diretamente a palavra

ldquomutilaccedilatildeordquo (cf DEMETR 293) Essa concessatildeo Manuel Pires de Almeida no ldquoDiscurso

sobre o poema heroicordquo explicita distinguindo quatro sortes de obscuridade

ldquoobscuridade boardquo ldquoobscuridade louvadardquo ldquoobscuridade viciosardquo e ldquoobscuridade

alegoacuterica e prezadardquo

Acabo este discurso com advertir que haacute quatro obscuridades trecircs que

satildeo mui artificiosas e virtuosas e dignas de que se pratiquem sem as

quais natildeo pode haver boa poesia a 3ordf que eacute indigna desta arte

273 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 8 274 Cf PATILLON M La theacuteorie du discours chez Hermogegravene le rheacuteteur essai sur les structures

linguistiques de la rheacutetorique ancienne Paris Les Belles Lettres 1988 pp 215-219 A oposiccedilatildeo entre

ήe lecirc-se assim traduzidas por Giulio Camillo Delminio ldquoDiremo adunque prima della

Chiarezza laquale prima habbiamo posta percioche tutto il parlare di questo trattato hagrave trattato bisogno

di chiarezza agrave cui egrave contraria la oscuritate amp alla quale sotto entrano queste due cioegrave cioegrave

puritate amp cioegrave cioegrave lucidezzardquo (cf HERM 226 8-12) Le Idee ouero Forme della oratione da

Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M Giulio Camillo Delminio Friulano A queste

saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal detto M Giulio Camillo Opere novamente

mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo

Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini pp 4-5 275 Cf Petri Victorii commentarii in librum Demetrii Phalerei de elocutione Positis ante singulas

declarationes Graecis vocibus Auctoris ijsdemque ad verbum Latine expressis Additus est rerum et

verborum memorabilium index copiosus Cum P II IIII Pont Max Cosmi Medicis Florentianorum

Senensiumq Ducis ampAlphonsi Ferrariensium Ducis privilegijs ampliszlig per decennium Florentiae In

officina Iuntarum Bernardi F MDLXII p 221 276 Cf FREITAS G A DE Sobre o Estilo de Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega

(Traduccedilatildeo e estudo introdutoacuterio do tratado) Belo Horizonte [FL-UFMG] 2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado]

p LV 277 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 p 321

101

vituperada dos saacutebios e seguida soacute dos ignorantes A primeira artificiosa

eacute a que nasce ou da alteza do conceito ou da induacutestria do poeta por

algum particular que repreende desta usaram muitos latinos e quase

todos os satiacutericos e em esta obscuridade e agudeza tiveram [] a

galantaria e sal Horaacutecio Marcial Juvenal Peacutersio e outros A segunda

obscuridade se origina da muita liccedilatildeo na qual natildeo tem culpa antes

merece grandes louvores e fl 635v excelecircncias e mui poucos o leitor

que por falto dela deixa de entender os poemas de Homero Virgiacutelio

Estaacutecio Lucano Claudiano e enfim os mais latinos e gregos usaram

desta obscuridade e satildeo claros aos homens doutos e lidos A terceira eacute a

viciosa e condenada que se produz da falta de invenccedilatildeo de confusatildeo

de engenho de ruim colocaccedilatildeo de conceitos intricados e dificultosos

da disposiccedilatildeo das palavras dos tropos das figuras da eleiccedilatildeo das coisas

et sic de coeteris Outra obscuridade haacute bem artificiosa e eacute a que se

inclui na alegoria mui frequentada na eacutepica e de grande louvor e

excelecircncia e primor nela e comum aos livros sagrados por donde

consegue o primeiro lugar Dixi 278

Como se observa ao modo das liccedilotildees do Peri ideōn e do Peri hermēneias o

ldquoDiscurso sobre o poema heroicordquo discrimina maneiras reguladas como conformes e

desconformes de efetuaccedilatildeo discursiva da obscuridade as ldquomui artificiosas e virtuosas e

dignas de que se pratiquemrdquo de um lado a ldquoque eacute indigna desta arte vituperada dos

saacutebios e seguida soacute dos ignorantesrdquo de outro Ora para falar com Leon Kossovitch natildeo

se trata de desfazer ldquoo primado da clareza sobre a obscuridaderdquo279 senatildeo de assentir no

gecircnero de poema heroico o bem fazer da obscuridade decorrente do conceito elevado e

do domiacutenio haacutebil e engenhoso da arte da poesia uacutetil ao vitupeacuterio que natildeo diz e natildeo pode

dizer agraves claras uacutetil aos satiristas como Horaacutecio Marcial Juvenal ou Peacutersio280 senatildeo

278 Cf MUHANA A ldquoDiscurso sobre o poema heroico Comentaacuteriordquo REEL Revista Eletrocircnica de

Estudos Literaacuterios Vitoacuteria a 2 v 2 2006 pp 11-12 279 KOSSOVITCH L Condillac luacutecido e transluacutecido Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial 2011 p 197 280 Evidentemente o vitupeacuterio natildeo eacute do ofiacutecio do poema heroico Citem-se as palavras de Francisco de

Cascales ldquoAl fin el Heroico que si bien en la grauedad y en la copia de los cotildeceptos tiene el primer lugar

y mayor excelẽcia con todo eso esparze pocas veces en su Poema cosas de moralidad porque no siẽdo su

oficio reprehender ni vituperar y no induziendo tampoco recitantes con porfiacuteas y contiendas antes siendo

su obligaciotilde nafrar hechos ilustres dignos de memoriardquo cf Tablas poeticas del licenciado Francisco

Cascales Dirigidas al Excelentiacutessimo Sentildeor D Francisco de Castro Conde de Castro Duque de

Taurisano Virrey y Capitaacuten general del Reyno de Sicilia Con privilegio En Murcia por Luis Beroacutes Antildeo

de 1617 p 142

102

tambeacutem de assentir o fazer bem da obscuridade estudiosa de poetas como Homero

Virgiacutelio Estaacutecio Lucano ou Claudiano que prescreve a discriccedilatildeo de ldquohomens doutos e

lidosrdquo como atributo de recepccedilatildeo conveniente e que proscreve como proacutepria de homens

vulgares e neacutescios incultos a falta do letramento que constroacutei a inteligibilidade desses

poetas e de seus poemas senatildeo ainda de assentir a obscuridade como efeito do uso da

alegoria procedimento conhecido dos livros eacutepicos e dos sagrados Por conseguinte

trata-se de natildeo tolerar a obscuridade que se afirma pendente da falta de domiacutenio artiacutestico

na composiccedilatildeo poeacutetica Itere-se ldquoque se produz da falta de invenccedilatildeo de confusatildeo de

engenho de ruim colocaccedilatildeo de conceitos intricados e dificultosos da disposiccedilatildeo das

palavras dos tropos das figuras da eleiccedilatildeo das coisas et sic de coeterisrdquo 281 donde resulte

que no dizer de Manuel Pires de Almeida a ldquoobscuridade viciosardquo seja intoleraacutevel por

sua ininteligibilidade e reconheccedila-se no ldquoestilo dificultoso o dos Cultos drsquooje condenado

por viciosordquo282

haacute alguns poetas que afetam tanto a obscuridade que querem qualificaacute-

la por verdadeira poesia e soacute usam do estilo dificultoso oraccedilotildees

desatadas palavras esquisitas translaccedilotildees nunca vistas locuccedilotildees

peregrinas tropos duplicados figuras e metaacuteforas mui continuadas e

sobretudo a colocaccedilatildeo das coisas e disposiccedilatildeo do argumento intricado

sem ordem nem arte nem claridade confesso que natildeo achei ateacute agora

autor saacutebio em esta arte que aprovasse doutrina tatildeo falsa e mal-fundada

antes muitos que condenam dos antigos e dos modernos infinitos

sisudos e mui doutos que se queixam e maldizem os primeiros

inventores desta seita a que vulgarmente chamam Cultos por ironia e

sendo assim que este modo de poetar dificultoso eacute o mais faacutecil de todos

porque soacute se anda agrave caccedila de palavras e figuras sem outras disposiccedilotildees e

advertecircncia283

Agrave guisa de exemplo entre os antecedentes da controveacutersia encerrada no ldquoDiscurso

sobre o poema heroicordquo vale rememorar que em missiva de 1613 da qual a Biblioteca

281 Cf MUHANA A ldquoDiscurso sobre o poema heroico Comentaacuteriordquo REEL Revista Eletrocircnica de Estudos

Literaacuterios Vitoacuteria a 2 v 2 2006 p 12 282 Indica-o Adma Muhana o presente de enunciaccedilatildeo do ldquoDiscurso sobre o poema heroicordquo situa-se entre

os anos de 1630 e 1640 cf Idem p 13 283 Idem p 11

103

Nacional de Espantildea guarda duas variantes autoacutegrafas uma delas datada de 30 de junho

expedida de Madri a D Luis de Goacutengora o letrado Pedro de Valencia (1555-1620)

escreve-lhe em censura da Faacutebula de Polifemo y Galatea e das Soledades em resposta agrave

carta de 11 de maio de 1613 hoje perdida na qual o poeta cordovecircs demandava o juiacutezo

criacutetico destas obras remetidas apensas ao letrado na correspondecircncia 284 Pedro de

Valencia repreende-lhe os poemas fundamentando-se em obras de retoacuterica como o Peri

hypsous do Pseudo-Longino o Peri hermēneias do Pseudo-Demeacutetrio de Falero e o Peri

syntheseōs onomaton de Dioniacutesio de Halicarnasso 285 pela demasiada confianccedila no

ingenio em detrimento da arte286 e pela ldquoafectacioacuten contraria a su [ingenio] naturalrdquo de

sorte que287

por huir y alejarse mucho del antiguo estilo claro liso y gracioso de

que vuesa merced soliacutea usar con excelencia en las materias menores

huye tambieacuten de las virtudes y gracias que le son proprias y no menos

284 Em 1989 Blanca Perintildeaacuten hispanista da Universitagrave di Pisa editou as duas liccedilotildees manuscritas da missiva

Natildeo satildeo poucas as variaccedilotildees Por conveniecircncia atenho-me apenas agrave versatildeo sem data a que informa a

estudiosa encontra-se na Biblioteca Nacional de Madri no ms 5585 (fls 165r-168v) Trata-se Texto A por

convenccedilatildeo O Texto B datado lecirc-se no ms 3906 (fls 64r-67r) Eacute como que uma minuta afirma Perintildeaacuten

cf PERINtildeAacuteN B ldquoUna vez maacutes la carta de Pedro de Valenciardquo in PERINtildeAacuteN B GUAZZELLI F (Org)

Symbolae pisanae Studi in onore di Guido Mancini Pisa Giardini 1989 vol II pp 447-467 285 Cf ACCORSI F ldquoPedro de Valencia y el Pseudo Longino sobre la recepcioacuten espantildeola del Peri hupsousrdquo

CRITICOacuteN 113 2011 p 66 286 Em Pedro de Valecircncia lecirc-se ldquoCon este recato religioso y con el amor y respeto que tengo a vuesa

merced digo que de tres cosas que deciacutean los estoicos que han de concurrir en un artiacutefice para que las

obras salgan perfetas que son 1 ingenio 2 arte 3 haacutebito o uso y experiencia la primera que es la naturaleza es la fundamental y principal y en la poesiacutea es casi el todo [hellip] A vuesa merced le pertenece

principalmente el loor del ingenio sobre todos los modernos y muchos de los antiguos y tambieacuten tiene en

grado muy aventajado la facilidad del uso y no niego a vuesa merced el arte ayudada de discrecioacuten y

prudencia natural que suple mucho por el arte y hace buena eleccioacuten Pero aconteacutecele a vuesa merced lo

que de ordinario a los que hallan en siacute muchas fuerzas naturales que confiados en ellas y llevados de su

iacutempetu con soltura descuidada no se dejan atar con preceptos ni encerrar con definiciones o aforismos

del arte ni aun con advertencias de los amigosrdquo [Com este recato religioso e com este amor e respeito que

tenho por Vossa Mercecirc digo que de trecircs coisas que diziam os estoicos que tecircm de concorrer em um artiacutefice

para que as obras saiam perfeitas que satildeo 1 engenho 2 arte 3 haacutebito ou uso e experiecircncia a primeira

que eacute a natureza eacute fundamental e principal e em poesia eacute quase o todo Agrave Vossa Mercecirc cabe o louvor do

engenho sobre todos os modernos e muitos dos antigos tambeacutem tem em grau muito avantajado a facilidade do uso e natildeo nego a Vossa Mercecirc a arte ajudada pela discriccedilatildeo e pelo engenho natural que supre muito da

arte e faz boa eleiccedilatildeo Poreacutem acontece a Vossa Mercecirc o que de ordinaacuterio aos que acham em si muitas forccedilas

naturais que confiados nelas e elevados por seu iacutempeto com soltura descuidada natildeo se deixam atar com

preceitos nem encerrar com definiccedilotildees ou aforismos da arte ou ainda com advertecircncias dos amigos]

Traduccedilatildeo nossa 287 A apologia da arte eacute lugar-comum Francisco de Cascales escreve no ldquoProacutelogordquo de suas Tablas poeticas

ldquosegũ Aristoteles el arte es aquella que da preceptos y ensentildea los caminos para no errar en aquello que

professamos Si esto es assi q les mueue a pensar q sin arte caminaragraven mejor que con ellardquo cf Tablas

poeticas del licenciado Francisco Cascales Dirigidas al Excelentiacutessimo Sentildeor D Francisco de Castro

Conde de Castro Duque de Taurisano Virrey y Capitaacuten general del Reyno de Sicilia Con privilegio En

Murcia por Luis Beroacutes Antildeo de 1617 sp

104

convenientes para las poesiacuteas maacutes graves Huye la claridad y

escureacutecese tanto que espanta de su leccioacuten no solamente al vulgo

profano sino a los que maacutes presumen de sabidos en su aldea 288

por fugir e afastar-se do antigo estilo claro liso e gracioso o qual Vossa

Mercecirc soiacutea usar com excelecircncia nas mateacuterias menores foge tambeacutem

das virtudes e graccedilas que lhe satildeo proacuteprias e natildeo menos convenientes

para as poesias mais graves Foge a clareza e escurece-se tanto que

espanta com sua eleiccedilatildeo natildeo soacute o vulgo profano senatildeo os que mais se

gabam de saacutebios em sua aldeia289

Os criteacuterios de Manuel Pires de Almeida no ldquoDiscurso sobre o poema heroicordquo e

de Pedro de Valencia na epiacutestola ao poeta satildeo afins Compreende-se a Faacutebula de

Polifemo y Galatea e as Soledades leem-se para o segundo nos termos do primeiro como

obras de poesia de ldquoobscuridade viciosardquo A resposta de D Luis de Goacutengora a este passo

de Pedro de Valencia datada de 30 de setembro de 1613 eacute conhecida e bastante citada

en dos maneras considero me ha sido honrosa esta poesiacutea si entendida

para los doctos causarme ha autoridad siendo lance forzoso venerar

que nuestra lengua a costa de mi trabajo haya llegado a la perfeccioacuten

y alteza de la latina a quien no he quitado los artiacuteculos como parece

a vuesa merced y esos sentildeores sino excusaacutedolos donde no eran

necesarios Y asiacute gustar[iacute]a me dijese en doacutende faltan o queacute razoacuten

dellas no estaacute corriente en lenguaje heroico (que ha de ser diferente del

de la prosa y digno de personas capaces de entenderlo) que holgareacute

de construiacuterselo aunque niego no poder ligar el romance a esas

declinaciones y no doy aquiacute la razoacuten coacutemo porque espero convencer

la pregunta que en esto vuesa merced me hiciere Demaacutes que honra me

ha causado hacerme obscuro a los ignorantes que esa es la distincioacuten

de los hombres doctos hablar de manera que a ellos les parezca griego

pues no se han de dar las perlas preciosas a animales de cerda290

288 Cf GOacuteNGORA Y ARGOTE L DE Obras completas edicioacuten de Juan Milleacute y Gimeacutenez Isabel Milleacute y

Gimeacutenez Madrid Aguillar 1967 p 1085 289 Traduccedilatildeo nossa 290 Cf ARANCOacuteN A M La Batalla en torno a Goacutengora seleccioacuten de textos Barcelona Antoniacute Bosch

1978 p 43

105

de duas maneiras considero me foi honrosa esta poesia [as Soledades]

se entendida pelos doutos ser-me-aacute motivo de autoridade sendo lance

forccediloso venerar que nossa liacutengua agrave custa de meu trabalho tenha

chegado agrave perfeiccedilatildeo e alteza da latina da qual natildeo retirei os artigos

como parece a Vossa Mercecirc e a esses senhores senatildeo dispensei-lhes

donde natildeo eram necessaacuterios E assim gostaria me dissesse onde faltam

ou que arrozoado delas natildeo estaacute corrente em linguagem heroica (que haacute

de ser diferente da da prosa e digna de pessoas capazes de entendecirc-la)

que folgarei em construiacute-la embora negue natildeo poder ligar o romance a

estas declinaccedilotildees e natildeo dou aqui a razatildeo como porque espero refutar a

pergunta que disso Vossa Mercecirc me fizer Demais que honra me causou

fazer-me obscuro aos ignorantes que esta eacute a distinccedilatildeo dos homens

doutos falar de maneira que a eles lhes pareccedila grego pois natildeo se haacute de

dar as peroacutelas preciosas a animais de pecirclo 291

No passo em questatildeo conforme a defesa de D Luis de Goacutengora o latinismo de

sintaxe da elipse de artigo sujeito discutido na epiacutestola e o da elipse de conjunccedilatildeo

integrante292 procedimento aiacute operado (ldquoconsidero me ha sidordquo ldquogustar[iacute]a me dijeserdquo)

pode-se aventar colaboram como recursos de uso linguiacutestico do lavor do poeta para

fazer a liacutengua de Castela rivalizar com o latim em ldquoperfeccioacuten y altezardquo293 e ademais

atravessam a conformaccedilatildeo da elocuccedilatildeo poeacutetica de lenguaje heroico feita de laconismos

e de obscuridades no gecircnero liacuterico das Soledades compostas sabe-se bem em registro

misto Recordem-se ainda os versos iniciais da Faacutebula de Polifemo y Galatea que

preceituam o estilo culto em poema de mateacuteria pastoril ldquoEstas que me dictoacute rimas

sonoras culta siacute aunque bucoacutelica Taliacutea []rdquo294 No mais mostra-o Joatildeo Adolfo

291 Traduccedilatildeo nossa 292 D Luis de Goacutengora afirma tendo as elipses em conta ldquoY no seacute en queacute fuerzas fiado me escribe una

carta maacutes que ingeniosa atrevida pues queriendo cumular mil fragmentos de disparates (como de diferentes duentildeos de donde infiero los tiene el papel) no supo organizarlos pues estaacuten maacutes faltos de

artiacuteculos y conjunciones copulativas que carta de vizcaiacutenordquo 293 A questatildeo da alteza e da perfeiccedilatildeo do castelhano volta agrave discussatildeo em outra missiva endereccedilada a D

Luis de Goacutengora Respuesta a las cartas de Luis de Goacutengora y Antonio de las Infantas y Mendoza de 16

de janeiro de 1614 294 Cf GOacuteNGORA Y ARGOTE L DE Faacutebula de Polifemo y Galatea 10ordf ed de Alexander A Parker Madrid

Catedra 2007 p 133 Joseacute Pellicer de Ossau Salas y Tovar comentador de D Luis de Goacutengora assim

define o adjetivo ldquoCultardquo ldquolimata perfeta de modo que aunque manege acciones rusticas las frases estegraven

colocadas com aseordquo Ao que acrescenta ldquoaunque Hesiodo Teocrito y Virgilio trataron de materias rudas

y del campo el estilo fue limado y culto que es lo mismo que cultiuado con decoro y propiedad Oy el

idiotismo de Espantildea toma esta voz culto para notar al que habla con metaforas desviaacutendose delo vulgar y

106

Hansen na apresentaccedilatildeo que abre Poesia Seiscentista volume que colhe da Fecircnix

renascida e do Postilhatildeo de Apolo parte da poesia de agudeza que essas coletacircneas

recolhem D Luis de Goacutengora emulando elocutivamente poetas latinos neoteacutericos como

Catulo na chave dos poetas alexandrinos por eles emulados opera ldquouma linguagem de

signos indiretos substituindo pela formulaccedilatildeo metafoacuterica periacutefrases e antiacuteteses

hermeacuteticas sublimes as formas diretas e claras do estilo humilderdquo em que as ldquoimagens

tendem para a siacutentese do epigrama pois satildeo simultaneamente sensoriais com efeitos

visualizantes e sentenciosas com o sentido equivocado em significaccedilotildees opostasrdquo 295

Do que resulta a obscuridad nesses termos seleciona doctos e ignorantes agrave recepccedilatildeo

adequada da obra poeacutetica Ora eacute conhecidiacutessima a sentenccedila de D Luis de Goacutengora

ldquoDeseo hacer algo no para los muchosrdquo296

Vale rememorar em outro estudo Joatildeo Adolfo Hansen diz dedicando-se agrave

compreensatildeo dos criteacuterios por meios dos quais a Epistula ad Pisones de Horaacutecio (seacutec I

aC) 297 regula o decoro de estilo que o par clarezaobscuridade revisto nos passos de

Hermoacutegenes mediante os termos gregos saphēneiaasapheia deva ser pensado como

paracircmetro diferencial e relativo de composiccedilatildeo e de recepccedilatildeo Disso reteacutem-se que clareza

e obscuridade se inscrevem entre as diferenccedilas elocutivas de gecircneros os mais variados e

satildeo relativas ao horizonte de destinaccedilatildeo das obras realizadas e aos modos de sua

circulaccedilatildeo se oralizado ou escrito se privado ou puacuteblico de modo que arbitrem modos

variaacuteveis de avaliaccedilatildeo das composiccedilotildees oratoacuterias e poeacuteticas298

Na fortuna de Hermoacutegenes variam os termos mormente latinos empregados por

para escarnecelle le llama cultordquo cf Lecciones solemnes a las obras de Don Luis de Gongora y Argote

Pindaro Andaluz Principe de los poeta liricos de Espantildea Escrivialas Don Ioseph Pellicer de Salas y

Tovar Sentildeor de la Casa de Pellicer y Chronista de los Reinos de Castilla Dedicadas al Serenissimo Sentildeor

Cardenal Infante Don Fernando de Austria MDCXXX [1630] Con Priuilegio en Madrid En la Imprenta

del Reino A costa de Pedro Coello Mercader de Libros p 9 295 Cf HANSEN J A ldquoFecircnix renascida amp Postilhatildeo de Apolo uma introduccedilatildeordquo in PEacuteCORA A (org) Poesia

seiscentista Fecircnix renascida amp Postilhatildeo de Apolo Satildeo Paulo Hedra 2002 p 40 296 Cf GOacuteNGORA Y ARGOTE L DE Obras completas edicioacuten de Juan Milleacute y Gimeacutenez Isabel Milleacute y Gimeacutenez Madrid Aguillar 1967 p 1224 297 Sabe-se a doutrina horaciana do ut pictura poesis expotildee-se entre os versos 361 e 365 da Epistula ad

Pisones Cito-os acompanhados de traduccedilatildeo de Marcos Marinho dos Santos ldquout pictura poesis erit quae

si propius stes te capiat magis et quaedam si longius abstes haec amat obscurum uolet haec sub luce

uideri iudicis argutum quae non formidat acumen haec placuit semel haec deciens repetita placebitrdquo

[ldquoComo a pintura a poesia Existiraacute a que se mais perto de ateacutens mais te cative e alguma se mais longe

te manteacutens esta ama o escuro sob a luz quer ser vista aquela que a agudeza arguta do juiz natildeo intimida

uma aprouve uma vez outra dez vezes repetida aprazeraacuterdquo] SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica

de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p 208 298 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 pp 321 323

107

tradutores e comentadores para interpretar saphēneia A soluccedilatildeo tradutoacuteria de Pedro Juan

Nuntildeez que faz uso do substantivo perspicuitas eacute uma entre tantas No Rhetoricorum libri

V de Jorge de Trebizonda eacute claritas definida como forma que faz puro e perspiacutecuo o

discurso (cf ldquoClaritas est quae facit puram amp perspicua orationemrdquo) 299 Puritas e

perspicuitas categorias anunciadas pelos adjetivos ldquopurusrdquo e ldquoperspicuusrdquo referem-se a

katharotēs e a eukrineia300 Na versatildeo latina de Antocircnio Bonfine (1538) os termos

escolhidos satildeo estes saphēneia interpreta-se como diluciditas ao passo que katharotēs

agrave maneira do que se lecirc no Rhetoricorum libri V verte-se como puritas e eukrineia como

elegantia 301 Eacute interessante notar o dicionaacuterio latino Le Grand Gaffiot na ediccedilatildeo

aumentada do ano 2000 registra uma uacutenica entrada do substantivo ldquodiluciditasrdquo em

sentido de ldquoclarteacuterdquo ldquoeacutevidencerdquo colhido em Boeacutecio (seacutec VI dC) (cf BOET Top Arist

8 2) Aventa-se portanto natildeo eacute vocaacutebulo que Antocircnio Bonfine tenha ido buscar na

autoridade do latim antigo A escolha pode constituir-se todavia por via da Rhetorica ad

Herennium no Anocircnimo o adjetivo ldquodilucidusrdquo emprega-se para referir um dos trecircs

atributos da narraccedilatildeo (Cf Rhet Her I 14 ldquoTres res conuenit habere narrationem ut

breuis ut dilucida ut ueri similis sitrdquo) A narraccedilatildeo natildeo eacute mateacuteria exclusiva do Peri ideōn

mas este passo indica ao inteacuterprete um equivalente latino possiacutevel de saphēs Na mesma

obra aprende-se que a elocuccedilatildeo deva conter elegantia e a ldquoElegantia est quae facit ut

locus unus quisque pure et aperte dici videaturrdquo (ldquoElegacircncia eacute o que faz com que certa

passagem pareccedila ser dita de forma pura e clarardquo)302 O Anocircnimo entende a elegantia no

domiacutenio da ornamentaccedilatildeo e do deleite como efeito elocutivo que se realiza mediante o

acordo entre a Latinitas pensada como propriedade de conformaccedilatildeo com os usos

abonados da liacutengua latina (o sermo) que a manteacutem pura livre de solecismos e

barbarismos303 e a explanatio pensada como figura de construccedilatildeo de oratio aperta e

299 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 497 300 Isto eacute purity pureza pureteacute) e distinctness nitidez netteteacute) 301 Cf Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii item Sophistaelig Praeligexercitamenta Antonio Bonfine asculano interprete Apud Seb Gryphivm Lvgdvni

1538 p 158 302 Traduccedilatildeo de Faria amp Seabra 303 A Grammatica da lingua Portuguesa de Joatildeo de Barros assim define barbarismo e solecismo ldquoNam

soacutemẽte temos ẽ acotildestruiccedilatilde das partes da noacuteszliga grammaacutetica as ręgras que atraacutes uimos mas ainda algũas

figuras e uiccedilios que assy na faacutela como na escritura cometemos Figura (segũdo definiccedilatilde de Quintiliano) ę

hũa foacuterma de dizer per algũa arte noacuteua Estas figuras se diuidẽ ẽ dous gecircneros de que depẽdẽ muitas

especcedilias Ao primeiro uiccedilo chamamos Baacuterbarismo e o segũdo Solaeligccedilismo Baacuterbarismo ę uicio que se

comęte na escritura de cada hũa das partes ou na ᵱnũciaccedilatilde E ẽ nenhuatilde paacuterte da tęrra se comęte mais esta

figura da ᵱnũciaccedilam q nestes reinos por causa das muitas naccedilotildees q trouxęmos a iugo de noacutesso seruiccedilo

Por q bem como os gregos e Roma auiatilde por baacuterbaras todalas outras naccedilotildees estranhas aelles por natildem

108

dilucida discurso inteligiacutevel e liacutempido na traduccedilatildeo de Faria amp Seabra resultante do

emprego de vocabulaacuterio corrente e proacuteprio (cf Rhet Her IV 12 17)

Ora dadas as concordacircncias eacute possiacutevel que desses passos da Rhetorica ad

Herennium provenham as escolhas de vocabulaacuterio de Antocircnio Bonfine que fazem divergir

do Rhetoricorum libri V de Jorge de Trebizonda as liccedilotildees do Hermogenis Tarsensis

Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii item Sophistaelig

Praeligexercitamenta As divergecircncias natildeo se limitam a essas ediccedilotildees todavia Vale arrolaacute-

las Na ediccedilatildeo de Natale Conti (1550) saphēneia eacute perspicuitas katharotēs eacute puritas e

eukrineia eacute distinctio Na ediccedilatildeo de Estrasburgo de Hermoacutegenes (1555) em grego a

epiacutestola de Johannes Sturm ao impressor Josias Rihel articula o adjetivo ldquoapertumrdquo ao

substantivo saphēneia304 Na estampa biliacutengue de 1571 do mesmo impressor Johannes

Sturm adota soluccedilotildees equivalentes agraves de Jorge de Trebizonda e emprega claritas ou oratio

aperta no sentido de saphēneia puritas no de katharotēs e perspicuitas no de

eukrineia 305 Por fim Garpar Laurent em 1614 como se viu proacuteximo de Antocircnio

Bonfine sem acatar-lhe as escolhas verte saphēneia como perspicuitas katharotēs como

puritas ou sermo purus e eukrineia como dilucidus sermo ou dilucidum genus306

Ora o exame comparativo destas versotildees mostra que saphēneia pode interpretar-

se como claritas ou diluciditas ou perspicuitas ou oratio aperta ou dilucidus sermo ou

dilucidum genus ao passo que por consenso katharotēs interpreta-se como puritas e

eukrineia como perspicuitas ou elegantia ou distinctio Neste conjunto de ediccedilotildees de

tradutores diversos redigidas e impressas entre princiacutepio do seacuteculo XV e princiacutepio do

seacuteculo XVII nem sempre Hermoacutegenes fala o mesmo latim Natildeo se espera que falasse

nem a movecircncia do leacutexico tradutoacuterio deve obliterar a koinē retoacuterica compartilhada pelos

inteacuterpretes do Peri ideōn O que se opera eacute a latinizaccedilatildeo do corpo teoacuterico de Hermoacutegenes

poderẽ formaacuter uma linguaacutegẽ assy noacutes podemos dizer que as naccedilotildees de Africa Guine Asia Brasil

baacuterbarizam quando quęrẽ imitaacuter a noacutessa E leixatildedo as figuras e uiccedilios poeticos trataremos soacutemẽte

daqueles per que mais comũmente falaacutemos ẽ oacuteraccedilatilde soluta por que como iaacute disse quando tratey do accedilẽto

as cousas q cotildepętem aos poetas ficaratilde pera quando for restituido a este reino o uso das troacuteuas Ao presente ueiamos as especcedilias do noacutesso barbarismo os uocaacutebulos das quaacutees ainda ainda que seiam gregos

tomaacuteremos como tomaacuteram os latinos leuatildedo a sua oacuterdemrdquo cf Grammatica da lingua Portuguesa

Olyssippone Apud Lodiuicum Rotorigiũ Typographum M D XL [1540] pp 34-35 304 Cf Hermogenis De formis orationum tomi duo Argentorati apud haeredes Vuendelini Rihelij Anno

1555 sp 305 Cf Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II

Latinitate donati amp scholis explicati atque illustrati A Ioan Stvrmio Cum Gratia amp Priuilegio Caeligsareo

ad anno octo Excudebat Iosias Rihelius MDLXXI [1571] p 27 306 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 255

109

mediante o emprego de vocabulaacuterio abonado pelo uso de autoridades latinas como

Quintiliano ou Ciacutecero Deve-se considerar ateacute a Rhetorica ad Herennium ainda que hoje

se enfatize que o letrado Raffaele Regio (1440-1520) tenha lhe questionado a autoria em

1492 no opuacutesculo Quaestio utrum ars rhetorica ad Herennium falso Ciceroni inscribatur

ainda assim eacute largamente tomada como tratado de Ciacutecero e circula como tal307 O

vocabulaacuterio dos inteacuterpretes daacute lastro agraves versotildees de Hermoacutegenes ao circunscrever os

preceitos do Peri ideōn ao jargatildeo de retores latino Nesse sentido natildeo haacute Hermoacutegenes em

latim a despeito da retoacuterica latina conhecida e reconhecida por letrados quinhentistas

seiscentistas e setecentistas

Ora Manuel de Galhegos funda-se em pormenor em liccedilotildees consabidas ao

afirmar ldquoA claridade ou a enargia (q he a euidencia no dizer) obserua tudo quanto

Hermogenes admoesta na palavra Saphiniardquo Os termos ldquoclaridaderdquo e ldquoSaphiniardquo tecircm o

assentimento dos usos arrolados a conjunccedilatildeo de ldquoclaridaderdquo e ldquoenargiardquo de que pende

este passo poreacutem lecirc-se natildeo nos tratados Peri heureseōs e Peri ideōn nominalmente

mencionados no ldquoDiscurso Poeacuteticordquo mas nos Progymnasmata atribuiacutedos ao retor Ensina

a obra satildeo virtudes () da ekphrasis a saphēneia e a enargeia ()308 ou

seja a clareza e a enargia ou enargueia como escreveraacute em liacutengua portuguesa Jerocircnimo

Soares Barbosa em fins do seacuteculo XVIII referindo-se ao efeito plasmado na hermēneia

() o estilo segundo a traduccedilatildeo a mais comum do termo de presentaccedilatildeo oacuteptica

e viacutevida das coisas como que mostradas agrave vista (cf HERM 23 9-14)309 Pouco distam

nesse aspecto os exerciacutecios preparatoacuterios de Eacutelio Teatildeo segundo os quais deve ser a

hermēneia e natildeo particularmente a ekphrasis como em Hermoacutegenes clara (ή) e

viacutevida (ή) Na ediccedilatildeo de Eacutelio Teatildeo (ca I dC) estampada na Basileia em 1541

vertida ao latim por Joachim Camerarius (1500-1574) lecirc-se ldquoPraeligterea elocutio amp plana

307 Cf Raphaelis Regii ducenta problemata in totidem institutionis oratoriae Quintiliani deprauationes

Eiusdem quaestio utrum ars rhetorica ad Herennium falso Ciceroni inscribatur Eiusdem de laudibus

eloquentiae panegyricus [Venecia Bonetus Locatellus] impens Octaviani Scoti 1492 MURPHY J J WINTERBOTTOM M ldquoRaffaele Regiorsquos 1492 Quaestio doubting Cicerorsquos authorship of the Rhetorica ad

Herennium Introduction and Textrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 17 No 1 (Winter

1999) pp 77-87 SKINNER Q Razatildeo e retoacuterica na filosofia de Hobbes Satildeo Paulo Editora Unesp 1999

p 54-55 308 O passo de Hermoacutegenes eacute conhecido de Pedro Joseacute da Fonseca na segunda metade do seacuteculo XVIII

ldquoHe a Poesia na opiniatildeo de Simonides huma pintura com fala a qual consiste na viva reprefentaccedilatildeo de

quaesquer objetos em que se poacutede empregar a imitaccedilatildeo poeacutetica A isto he que se daacute o nome de energia ou

evidencia que segundo Hermogenes he o mais distincto dote de que a Poezia se poacutede jactarrdquo Cf

Elementos de Poetica tirados de Aristoteles de Horacio e dos mais celebres modernos Lisboa na Offic

de Miguel Manescal da Costa Anno 1765 Com as licenccedilas necessaacuterias p 22 309 Vol II 1790 p 105

110

erit amp euidensrdquo (Ademais a elocuccedilatildeo seraacute natildeo soacute clara como evidente)310 O mesmo

passo de Eacutelio Teatildeo na traduccedilatildeo de Estrasburgo de Daniel Hensius (1580-1655) de 1626

traz versatildeo que pouco varia em termos de escolha lexical ldquoSed amp plana esse amp evidens

debet elocutiordquo (Ora a elocuccedilatildeo deve ser natildeo soacute clara como evidente)311 No mais sabem

os leitores das Academica de Ciacutecero que nada eacute mais claro que a enargeia nominada

perspicuitas ou enargeia pelos latinos (cf CIC Ac 2 6 17 ldquoquod nihil esset clarius

enargeia ut Graeci perspicuitatem aut euidentiam nos si placet nominemos

fabriquemurquerdquo)

O sevilhano Fernando de Herrera (ca 1534-1597) autor das anotaccedilotildees agrave poesia

de Garcilaso de la Vega (1501-1536) ao comentar o soneto XIII do poeta ldquoA Dafne

ya los braccedilos le crecianrdquo itera a conjunccedilatildeo de perspicuitas e euidentia proposta por

Manuel de Galhegos embora natildeo o faccedila no acircmbito do ajuizamento do gecircnero de poema

heroico e mal-avalia a preferecircncia de Jorge de Trebizonda por claritas ao verter o grego

saphēneia

Trapezuncio llamograve pero no bien claridad la que Quintiliano

perspicuidad i M Tulio evidencia esta perspicuidad es facilidad de la

oracion para entendimiento de las cosas que se tratan en ella [hellip]312

Trebizonda denominou mas natildeo bem clareza a que Quintiliano

perspicuidade e M Tuacutelio [Ciacutecero] evidecircncia Esta perspicuidade eacute

facilidade do discurso para entendimento das coisas que se tratam nele

[hellip]313

310 ΩTheonis sophistae primae apud rhetorem

exercitationes innumeris quibus scatebant antea mendis Joachimi Camerarii Pabergensis opera purgatae

amp in sermonem latinum conversae Adiectus est quoq rerum amp uerborum in ijsdem memorabilium

locupletiszlig Index Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo amp Regis Galliae ad serptenium annos octo Basileae

[1541] pp 20 251 311 ΩTheonis Sophistae Progymnasmata accurate

emendata ac recensita In usum Scholarum HolandiaeWest-Frisiaeque Ex decreto Ilustriss DD Ordinum

eiusdem Provinciae Accedit interpretatio Latina ita hac editione emendata ut sit Nova Lvgdvni

Batavorvm Ex Officina Bonaventurae amp Abrahanmi Elzevir Academ Typograph MDCXXVI [1626] p

26 312 Cf Obras de Garcilasso de la Vega con anotaciones de Fernand o de Herrera Al ilutrissimo i

ecelentissimo Sentildeor Don Antonio de Guzman Marques de Ayamonte Governador del Estado de Milan i

Capitan General de Italia Com licencia de los SS del Consejo Real En Sevilla por Alonso de la Barrera

Antildeo de 1580 p 138 313 Traduccedilatildeo nossa

111

O passo daacute noccedilatildeo mesmo que rarefeita da presenccedila empiacuterica das liccedilotildees do

Rhetoricorum libri V de Jorge de Trebizonda no seacuteculo XVI espanhol da circulaccedilatildeo em

latim do conjunto doutrinaacuterio atribuiacutedo a Hermoacutegenes e da operaccedilatildeo de latinizaccedilatildeo da

preceituaccedilatildeo retoacuterica grega medida em conformidade com os usos linguiacutesticos de

avalistas como Quintiliano ou Ciacutecero No mais Fernando de Herrera na ediccedilatildeo das

Anotaciones de 1580 aponta termo ldquoperspicuidadrdquo que revela simpatia pela seleccedilatildeo

lexical de Pedro Juan Nuntildeez (tratadista de impressotildees sucessivas em 1578 1585 e 1593)

e de Natale Conti (1550) ao passo que por assim dizer revela antipatia pela de Jorge de

Trebizonda (1433-1434) de Antocircnio Bonfine (1538) e de Johannes Sturm (1555 e 1571)

Bem recorda Luisa Loacutepez Grigera Fernando de Herrera foi acusado de plagiaacuterio de Juacutelio

Cesar Escaliacutegero (1484-1558) Muitiacutessimo em decorrecircncia dos estudos da pesquisadora

reunidos na coletacircnea La Retoacuterica en la Espantildea del Siglo de Oro de 1994 acusaccedilotildees

dessa ordem tornaram-se gastas pela desistorizaccedilatildeo e pela desvalia dos criteacuterios de

anaacutelise314 De fato Fernando de Herrera lecirc proximamente Juacutelio Cesar Escaliacutegero e o verte

ao espanhol ensina o tratado Poetices libri septem postumamente impresso em Lyon em

1561 que

ή Trapezuntius Claritatem vocat non maleacute Perspicuitatem

Quintilianus sicut amp Cicero atque Euidẽtia315

A saphēneia Trebizonda denominou natildeo mal Clareza Quintiliano

perspicuidade assim como Ciacutecero natildeo soacute enargeia senatildeo tambeacutem

evidecircncia 316

Eacute expliacutecito os comentaacuterios de Fernando de Herrera pendem de Juacutelio Cesar

Escaliacutegero Dista poreacutem o sevilhano da autoridade italiana tanto por excluir de suas

afirmaccedilotildees os acusativos gregos ldquosaphēneianrdquo (ή) e ldquoenargeianrdquo ()

quanto por modificar a apreciaccedilatildeo da escolha lexical feita por Jorge de Trebizonda

ldquollamograve pero no bienrdquo natildeo diz o mesmo que ldquovocat non maleacuterdquo As implicaccedilotildees dessa

314 Cf LOacutePEZ GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Salamanca Universidad de

Salamanca 1994 p 83 315 Cf Iuli Caesaris Scaligeri uiri Poetices libri septem Ad Syluium Filium [Lyon] Apud Antonium

Vincentium 1561 p 176 316 Traduccedilatildeo nossa

112

diferenccedila e suas razotildees interessam aos estudos da recepccedilatildeo do tratado Poetices libri

septem e aos das fontes preceptivas dos comentaacuterios a Garcilaso de la Vega No mesmo

tratado na mesma paacutegina aprende-se que ldquoPerspicuitas est facilitas orationis ad rem

intelligendamrdquo317 Ou seja a definiccedilatildeo de perspicuidad fornecida em castelhano nos

comentaacuterios autoriza-se tambeacutem pelos preceitos do Poetices libri septem Ademais

aprende-se que ldquoClaritas est quae facit puram amp perspicua orationemrdquo318 Ora trata-se

de definiccedilatildeo referida lida em Jorge de Trebizonda Natildeo eacute improvaacutevel que Fernando de

Herrera conheccedila Jorge de Trebizonda pela pena de Juacutelio Cesar Escaliacutegero

No Peri ideōn conforme os preceitos aduzidos para que sejam compostas com

correccedilatildeo as ideai a saphēneia entre tantas devem ser orquestrados com semelhante

retidatildeo e conveniecircncia os seguintes stoikheia () elementos que as constituem

ennoia () methodos () lexis () skhēmata () kōla

() synthēkē () ou synthesis () anapausis () e

rhythmos () (cf HERM 222 19-223-4) Recorde-se que o retor apresenta esses

elementos ora assim listados ora arrolados numa triparticcedilatildeo que se ramifica

contemplando os oito stoikheia ennoiamethodos e lexis a qual por sua vez se

subdivide em skhēmatakōla synthēkē ou synthesis anapausis e rhythmos (cf HERM

218 18-26)319

A composiccedilatildeo de cada idea ao fim pensa-se como efeito da praacutetica do discurso e

da mestria no trato da escrita com arte conforme as conveniecircncias A saphēneia efetua-

se por meio de duas formas que lhe satildeo subordinadas katharotēs e eukrineia A primeira

dessas espeacutecies jaacute se sabe latiniza-se consensualmente como puritas ou puritagrave em

preceptistas italianos leitores de Hermoacutegenes como Gabriele Zinano (ca 1557-1634)

em cujo Sommarii di varie retoriche greche latine et volgari (1590) se conhece o

seguinte ldquodella puritagraverdquo

317 Cf Iuli Caesaris Scaligeri uiri Poetices libri septem Ad Syluium Filium [Lyon] Apud Antonium

Vincentium 1561 p 176 HERRERA F de Anotaciones a la poesia de Garcilaso Edicioacuten de Inoria Pepe y

Joseacute Mariacutea Reyes Madrid Caacutetedra 2001 p 58 318 Cf Iuli Caesaris Scaligeri uiri Poetices libri septem Ad Syluium Filium [Lyon] Apud Antonium

Vincentium 1561 p 176 cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In

Officina Christiani Wecheli M D XXXVIII [1538] p 497 319 Lucia Calboli Montefusco sintetiza bem as diferenccedilas cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and

Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the

History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) p 157

113

Il concetto puro deue esser comune amp aperto amp che niente niente habbi

de non inteso amp sia senza profonditagrave

Le parole comuni vsate amp proprie ne sieno aspere ne trasportate

La cotildepositione sia semplice amp notilde esquisita

I membri denno esser breui amp che per se stessi terminato il concetto

senza interpositione di periodo

Il modo puro egrave il dir le cose schiette nude senza pigliar cosa alcuna di

fuori

La figura sia retta

Il finimento sia di parole non longhe amp mediocremente risuonino

Il numero chrsquoalla puritagrave si conuiene saragrave il giambo amp il suono

basso320

O conceito puro deve ser comum amp claro amp que nada nada tenha de

natildeo compreendido amp seja sem profundidade

As palavras comuns usuais amp proacuteprias nem sendo aacutesperas nem

translatas

A composiccedilatildeo seja simples amp natildeo refinada

Os membros devem ser breves amp que seja por si mesmo terminado o

conceito sem interposiccedilatildeo de periacuteodo

O modo puro eacute o dizer as coisas simples nuas sem tomar coisa alguma

de fora

A figura seja reta

O acabamento seja de palavras natildeo longas amp que mediocremente

ressoem

O ritmo que agrave pureza conveacutem seraacute o iambo e o som baixo [grave]321

Nas palavras de Hermoacutegenes a katharotēs compotildee-se mediante pensamentos (no

singular )comuns a todos que ocorrem ou parecem ocorrer a todos porque claros

e compreensiacuteveis nada profundos nada meditados (cf HERM 227 3-5) Conveacutem

recordar que no Peri ideōn a ennoia natildeo se define Menciona poreacutem o retor que no

discurso possa haver um ou vaacuterios pensamentos (cf HERM 218 18) Latinamente eacute

320 Cf Sommarii di varie retoriche greche latine et volgari Distintamente ordinati in uno da Gabriele

Zinano In Reggio Apresso Hercoliano Bartholi 1590 p 198 321 Traduccedilatildeo nossa

114

sententia de acordo com Jorge de Trebizonda e como tal trata-se de ldquores inuenta uerbis

expolienda sine qua uerba in numerum ornategrave construere furiosum uerbis explicaturrdquo

(mateacuteria fornecida pela invenccedilatildeo que se deve polir por meio de palavras sem a qual eacute

insensato cadenciaacute-las ordenadamente) 322 Consoante Filiberto Campanile eacute ademais

ldquosensordquo ldquosentenzardquo ldquoconcettordquo ou ldquoimagine della cosa intesa e pensata nellrsquoanimo

nostrordquo (imagem da coisa entendida e pensada em nossa mente) 323 As ennoiai

consideradas katharai puras por Hermoacutegenes conforme a versatildeo seiscentista de Giulio

Camillo Delminio satildeo assim exemplificadas ldquoSannio egrave vno cotale ammaestrante li chori

tragicirdquo (Sacircnio eacute um certo instrutor dos coros traacutegicos) ou ldquotrenta Tiranni presero ad

imprestanza danari da Lacedemoni contra quelli che erano nel Pireordquo (Os Trinta Tiranos

tomaram de empreacutestimo dinheiro dos Lacedemocircnios contra aqueles que estavam no

Pireu) (cf HERM 227 6-8)324 Filiberto Campanile para ilustrar o mesmo preceito entre

os exemplos citados busca no soneto LXV de Francesco Petrarca (1304-1374) os

seguintes versos

Io haurograve sempre in odio la fenestra

Onde Amor mrsquoauentograve giagrave mille strali

Perchrsquoalchanti di lor non fur mortali 325

Eu sempre terei oacutedio da janela

Donde Amor jaacute me lanccedilou mil setas

Porque algumas delas natildeo foram mortais326

322 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 497 323 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste srsquoaggiunge lrsquoArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 13 324 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste srsquoaggiunge lrsquoArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 8 325 Apud LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] p 15 326 Traduccedilatildeo nossa Poeticamente mais interessante eacute a recente versatildeo de Joseacute Clemente Pozenato que

assim traduz os mesmos versos ldquoTeraacute meu oacutedio sempre essa janela de onde Amor disparou setas fatais

por natildeo terem sido todas mortaisrdquo cf PETRARCA F Cancioneiro Traduccedilatildeo de Joseacute Clemente Pozenato

Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2014 p 169

115

E os comenta

Oue conosciuto il soggetto essere chersquol Petrarca si muoua a sdegno

contra quella finestra nella quale la prima volta vidde la sua donna

per cui Amore gli auentograve gli strali al cuore desiando che alquanti di

quelli fossero stati mortali perche lrsquohauesser tolto di tanto affanno

conosceragrave la sentenza esser pura Ma se per finestra hauragrave voluto

intendere (come altri volse) gli occhi della sua donna e per gli strali

gli sguardi chrsquoindi vsciti li ferirono il cuore il senso non si potragrave

chiamar puro 327

Se eacute sabido ser a mateacuteria [dos versos] que Petrarca se indigna contra

aquela janela na qual pela primeira vez viu a sua dama por cujo Amor

lhe lanccedilou as setas no coraccedilatildeo desejando que algumas delas fossem

mortais porque as tivessem livrado de tanta afliccedilatildeo conheceraacute ser puro

o pensamento Mas se por janela ele tenha querido entender (como

outros quiseram) os olhos de sua dama e pelas setas os olhares daiacute

vindos que lhe feriram o coraccedilatildeo o sentido natildeo poderaacute ser chamado

puro 328

Ora dizer puri os trecircs versos do soneto de modo a pensaacute-los na efetuaccedilatildeo da

chiarezza no vocabulaacuterio italiano ou negar que sejam puri e por hipoacutetese enquadraacute-

los agrave luz de seus efeitos em outra categoria retoacuterica igualmente pendente da leitura de

Hermoacutegenes eacute regular os criteacuterios de interpretaccedilatildeo de Francesco Petrarca Filiberto

Campanile o faz conforme a abertura ou o fechamento semacircntico do enunciado para

recordar termos de Joatildeo Adolfo Hansen referidos em relaccedilatildeo a Sor Juana Ineacutes de la

Cruz329 e prevecirc que a metaforizaccedilatildeo dos termos ldquofenestrardquo (ou ldquofinestrardquo) e ldquostralirdquo pois

que pressuponha a discriccedilatildeo da destinaccedilatildeo tenha implicaccedilotildees de pensamento ou de

concetto que natildeo convecircm agrave puritagrave na composiccedilatildeo de um poema que se diga claro embora

possa ao que parece convir ao soneto

327 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori pp 15-16 328 Traduccedilatildeo nossa 329 Cf HANSEN J A MOREIRA M (Org) Para que todos entendais Poesia atribuiacuteda a Gregoacuterio de Matos

e Guerra Letrados manuscritura retoacuterica autoria obra e puacuteblico na Bahia dos seacuteculos XVII e XVIII

Volume 5 1ordf ed Belo Horizonte Autecircntica Editora 2013 p 373

116

O Peri ideōn prevecirc ademais para a efetuaccedilatildeo da katharotēs a regulaccedilatildeo do

methodos Designa-se por este termo a figura de pensamento (cf HERM 222 20) Para

Jorge de Trebizonda eacute methodus ou artificium e define-se como ldquouia amp modus quo

sententia uerbis explicaturrdquo (meio amp modo pelo qual o pensamento expotildee-se em

palavras)330 ao qual os ornamentos devem se subordinar Filiberto Campanile verte a

liccedilatildeo em latim ao italiano e pouco altera ldquoegrave la via ersquol modo drsquohauere ad esplicar le

sentẽze mediatildeti le parolerdquo (eacute o meio e o modo de expocircr os pensamentos mediante as

palavras) 331 Conveacutem assim esta eacute a prescriccedilatildeo do Peri ideōn que a katharotēs

componha-se por meio da narraccedilatildeo Para formular o procedimento o retor utiliza o

substantivo grego aphēgēsis (cf HERM 228 24 229 2 4 ldquordquo narraccedilatildeo) e mais

vocaacutebulos de mesma raiz tais quais a forma verbal aphēgētai (cf HERM 227 20-21

ldquordquo narra) e o adveacuterbio aphēgēmatikōs (cf HERM 228 24 ldquordquo

de modo narrativo) Como aponta Ruth Webb o adjetivo aphēgēmatikos

() Nicolau o Sofista emprega-o em vez do costumeiro periēgēmatikos

() em seus exerciacutecios preparatoacuterios de retoacuterica ao definir a praacutetica da

ekphrasis e com ele reteacutem do sentido primeiro do verbo aphēgeomai () a

acepccedilatildeo de ldquoconduzirrdquo332

Assim pode-se aventar o methodos que daacute forma pura ao discurso ao construir-

se a aphēgēsis como que narra e conduz Deve o artiacutefice portanto expor a accedilatildeo

() que relata de modo nu () ou principiar pelas coisas relatadas sem nada

acrescer-lhes de exterior Isso significa natildeo apensar o gecircnero agrave espeacutecie o todo agrave parte o

indefinido ao definido e ademais natildeo adicionar julgamentos qualidades e diferenccedilas ou

acumular circunstancialmente o lugar () o tempo ) a personagem

() o modo () e a causa () agrave accedilatildeo pura e simples (cf HERM

227 19-228 3)333 Eacute pertinente pois consoante Hermoacutegenes fugir aos enredamentos que

330 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 497 331 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 13 332 Cf WEBB R Ekphrasis Imagination and Persuasion in Ancient Rhetorical Theory and Practice

London Ashgate 2009 pp 55 58 333 Sobre as circunstacircncias KENNEDY G A Invention and Method Two Rhetorical Treatises from the

Hermogenic Corpus Translated with introductions and notes by George A Kennedy Atlanta SBL 2005

pp 86-7

117

discursivamente enformem a peribolē de modo que se configure o que Filiberto

Campanile classifica como meacutetodo ldquodi puritagrave verardquo334

Pensa-se no mais a katharotēs no acircmbito da lexis Como compositio Jorge de

Trebizonda define a lexis ldquoest quaelig elementorum syllabarum dictionum dictioniacutesque

consequentium inter se positione conficiturrdquo (eacute o que resulta da disposiccedilatildeo das letras

siacutelabas palavras e sequecircncia de palavras)335 Para Filiberto Campanile como parole no

plural ldquosono le voci e vocabuli accomodati alla cosa ritrouatardquo (satildeo as vozes e os

vocaacutebulos acomodados agrave coisa achada)336 Assim prescreve-se ser conveniente com

vistas agrave katharotēs a lexis de uso corrente (koinē) nem translata que demande

esclarecimento e eleve o discurso nem foneticamente dura (σκληρός) que apresente

como esmiuacuteccedila Michel Patillon a aspereza do encontro consonantal perceptiacutevel por

exemplo em ldquordquo (atarpos) ldquordquo (emarpten) ldquordquo (egnapse)

ldquordquo (perikoptōn) e ldquordquo (ekneneurismenoi) (cf HERM 229

10-16 258 14-15) Perceptiacutevel tambeacutem nos infinitivos italianos ldquoSbranarerdquo (dilacerar)

ldquostirparerdquo (extirpar) e ldquoschiantarerdquo (romper destroccedilar) elenca Filiberto Campanile337

No acircmbito das figuras os skhēmata satildeo para o retor grego como se sabe

constituintes proacuteprios agrave lexis preceitua-se o uso da construccedilatildeo direta (ldquoorationis rectitudordquo

338 ldquoRettitudine del parlarerdquo 339) (cf HERM 229 19) Jorge de Trebizonda contempla-as

sob a rubrica dos ornamentos as exornationes que satildeo ldquouerborum quaeligdam expolitiones

amp modius tanquagravem colorato amictu rem amp uestimus amp decoramusrdquo (polimentos e mesuras

das palavras com os quais como que com um manto colorido vestimos e enfeitamos a

mateacuteria)340 A metaacutefora Filiberto Campanile manteacutem-na ldquoLe figure sono le vesti e gli

ornamenti con cui vestiamo amp orniamo la cosardquo (As figuras satildeo as vestes e os

334 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 17 335 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 497 336 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 13 337 Idem p 46 338 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 498 339 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 13 340 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 498

118

ornamentos com os quais vestimos e ornamos a coisa)341 Como regra ensina o Peri ideōn

que deve o artiacutefice evitar a obliquidade pois que a construccedilatildeo obliacutequa encadeia

pensamentos e eacute proacutepria agrave peribolē idea oposta agrave katharotēs Para ilustrar o procedimento

Filiberto Campanile propotildee o seguinte contraste a partir de passo do Decameratildeo de

Giovanni Boccaccio (1313-1375) ldquoIschia egrave una Isola assai vicina di Napolirdquo (Ischia eacute

uma ilha bastante proacutexima de Naacutepoles) e ldquoTancredi Principe di Salerno fu Signore assai

humano e di benigno aspettordquo (Tancredo Priacutencipe de Salerno foi senhor bastante

humano e de benigno aspecto) satildeo construccedilotildees diretas agrave proporccedilatildeo que ldquoEssendo Ischia

unrsquoIsola assai vicina di Napolirdquo (Sendo Ischia uma ilha bastante proacutexima de Naacutepoles) e

ldquoEssendo Tancredi Principe di Salerno Signore assai humano e di benigno aspettordquo

(Sendo Tancredo Priacutencipe de Salerno senhor bastante humano e de benigno aspecto) satildeo

construccedilotildees obliacutequas Supotildee o preceito italiano em conformidade com as liccedilotildees

gramaticais antigas que as oraccedilotildees reduzidas obliacutequas porque compostas em grego e em

latim sem o emprego do caso nominativo deixam em suspenso o sentido do enunciado e

demandam associaccedilatildeo de pensamento ao pensamento que enunciam

Do uso da obliquidade em particular na composiccedilatildeo da propositio do poema eacutepico

haacute notiacutecia pendente de Hermoacutegenes e de Demeacutetrio no tratado Elementos de Poetica

tirados de Aristoteles de Horacio e dos mais celebres modernos de Pedro Joseacute da

Fonseca (1737-1816) impresso em Lisboa em 1765 e posteriormente reeditado em 1781

e em 1804 Trata-se de acordo com Ivan Teixeira de letrado partiacutecipe da reforma de

ensino promovida por Sebastiatildeo Joseacute de Carvalho e Melo o Marquecircs de Pombal342 Sobre

a proposiccedilatildeo eacutepica Pedro Joseacute da Fonseca assevera que deva ser feita de simplicidade e

acrescenta

Poreacutem esta simplicidade deve ser de algum modo magestosa e esta he

a razatildeo como observa Demetrio e Hermogenes por que os melhores

Poemas para comeccedilarem mais magestosamente formaacuteratildeo os principios

de seus poemas de hum caso obliquo isto he de hum acusativo pois

341 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 13 342 Cf TEIXEIRA I Mecenato Pombalino e Poesia Neoclaacutessica Basiacutelio da Gama e a Poeacutetica do Encocircmio

Satildeo Paulo Edusp 1999 p 293

119

como a obliquidade se aparta da ordem reta e natural causa por este

motivo gravidade ao discurso343

Sabe-se dos retores e dos tratados mencionados por Pedro Joseacute da Fonseca do

Peri hermēneias de Demeacutetrio indicam-se agrave margem ldquoI Cap 29 et 117rdquo e do Peri ideōn

de Hermoacutegenes ldquoDe form l 3 c Irdquo Do primeiro haacute indicaccedilotildees que coincidem com a

ldquoparticella vigesina nonardquo e a ldquocentessima decima sestardquo e natildeo centeacutesima deacutecima seacutetima

do texto segundo a traduccedilatildeo latina jaacute referida de Pietro Vettori tal como parafraseada e

comentada pelo padre franciscano Francesco Panigarola (1548-1594) em Il predicatore

ouero parafrase commento e discorsi intorno al libro dell Elocutione di Demetrio

Falereo obra poacutestuma de 1609 No capiacutetulo 29 afirma-se ser magniacutefico

(μεγαλοπρεπής) o torneio sintaacutetico do periacuteodo (cf DEMETR 45 ldquoΜεγαλοπρεπὲς δὲ

καὶ τὸ ἐκ περιαγωγῆς τῇ συνθέσει λέγεινrdquo) 344 do que propotildee Francesco Panigarola agrave

luz de exemplo colhido em Tuciacutedides que ldquoil parlare periodico maggiore magnificenza

dia allrsquoorationerdquo (o falar perioacutedico maior magnificecircncia decirc ao discurso) No capiacutetulo 116

Demeacutetrio retoma o exemplo de Tuciacutedides (cf DEMETR 206) natildeo sem antes prescrever

que na composiccedilatildeo do discurso tecircnue iskhnos principiando-se o relato ou pelo caso

nominativo ou pelo acusativo evita-se certa obscuridade (cf DEMETR 201)345 Do

343 Cf Elementos de Poetica tirados de Aristoteles de Horacio e dos mais celebres modernos Lisboa na

Offic de Miguel Manescal da Costa Anno 1765 Com as licenccedilas necessaacuterias pp 281-282 344 DEMETR 45 ldquoEacute ainda grandioso empregar ao dizer um rodeio na composiccedilatildeo como o faz Tuciacutedides

Pois o rio Aqueloo correndo do monte Pindo atraveacutes da Dolopia terra dos agriatildees e dos anfiloacutequios do

alto junto da cidade de Estrato ao desembocar no mar junto de Eniacuteadas no inverno e fazer da cidade

deles um pacircntano torna impraticaacutevel com suas aacuteguas qualquer accedilatildeo militar Toda essa grandeza proveacutem

com efeito do movimento circular e da dificuldade de tanto ele quanto seu ouvinte fazerem uma pausardquo

cf FREITAS G A DE Sobre o Estilo de Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo

e estudo introdutoacuterio do tratado) Satildeo Paulo [UFMG] 2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p XII 345 Cf DEMETR 201 ldquoἘν δὲ τοῖς διηγήμασιν ἤτοι ἀπὸ τῆς ὀρθῆς ἀρκτέον ῾Ἐπίδαμνός ἐστι πόλις᾿ ἢ ἀπὸ τῆς αἰτιατικῆς ὡς τὸ ῾λέγεται Ἐπίδαμνον τὴν πόλιν᾿ αἱ δὲ ἄλλαι πτώσεις ἀσάφειάν τινα παρέξουσι καὶ βάσανον τῷ τε λέγοντι αὐτῷ καὶ τῷ ἀκούοντιrdquo [ldquoNas narrativas deve-se comeccedilar ou

pelo caso reto Ἐπίδαμνός ἐστι πόλις (Epidamno eacute uma cidade) ou pelo acusativo ltltλέγεται Ἐπίδαμνον τὴν πόλιν (Fala-se que a cidade de Epidamno)gtgt Os outros casos iratildeo trazer certa obscuridade e pocircr agrave

prova tanto o orador quanto o ouvinterdquo] cf FREITAS G A DE Sobre o Estilo de Demeacutetrio Um olhar

criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo e estudo introdutoacuterio do tratado) Satildeo Paulo [UFMG] 2011

[dissertaccedilatildeo de mestrado] p XLV Observe-se Il Predicatore di F Francesco Panigarola ouero Parafrase

commento e discorsi intorno al libro dellelocutione di Demetrio Falereo oue vengono i precetti e gli

essempi del dire che giagrave furono dati a Greci ridotti chiaramente alla prattica del ben parlare in prose

italiane e la vana elocutione de gli autori profani accommodata alla sacra eloquenza de nostri dicitori e

scrittori ecclesiastici Con due tauole vna delle questioni e laltra delle cose piugrave notabili Venetia

Bernardo Giunti Gio Battista Ciotti amp Compagni 1609 pp 53 673-675 685-687 cf Petri Victorii

commentarii in librum Demetrii Phalerei de elocutione Positis ante singulas declarationes Graecis vocibus

Auctoris ijsdemque ad verbum Latine expressis Additus est rerum et verborum memorabilium index

copiosus Cum P II IIII Pont Max Cosmi Medicis Florentianorum Senensiumq Ducis ampAlphonsi

120

segundo retor grego citado no passo do tratado Elementos de Poetica tirados de

Aristoteles de Horacio e dos mais celebres modernos Hermoacutegenes a indicaccedilatildeo eacute algo

imprecisa pela incerteza da ediccedilatildeo referida Como visto preceitos concordes com os do

Peri hermēneias abarcam no Peri ideōn os skhēmata atinentes agrave katharotēs e agrave peribolē

como ideai opostas que enformam aquela a clareza esta a abundacircncia Como se veraacute

o arrevesamento da sintaxe produz natildeo apenas abundacircncia senatildeo tambeacutem resplendor

(lamprotēs) (cf HERM 267 17-268 20)

Ademais contemporacircneo de Pedro Joseacute da Fonseca Francisco Joseacute Freire ensina

que a proposiccedilatildeo define-se como parte necessaacuteria do poema eacutepico par a par o tiacutetulo a

invocaccedilatildeo e a narraccedilatildeo especificada pela exposiccedilatildeo breve da accedilatildeo a ser narrada346 Agrave

vista do tratadista a preceituaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo do acusativo nos versos de abertura

assenta-se em razotildees semelhantes

os casos obliacutequos como se apartaotilde da retidaotilde natural e da pureza do

dizer causaotilde mais gravidade e escuridade e entre os obliacutequos me

parece que o accusativo he o mais aspero e por consequencia o mais

grandioso347

Deve-se rememorar propotildee Marcos Martinho dos Santos que a eleiccedilatildeo do

acusativo do objeto direto em termos sintaacuteticos para abrir a proposiccedilatildeo do poema

reporta-se a Homero Ajuda a compreender a liccedilatildeo a primeira oitava da Ulyssea ou

Lisboa Edificada de Gabriel Pereira de Castro em que o objeto direto ldquoAs Armas amp o

Varatildeordquo antepotildee-se por hipeacuterbato ao verbo cujo significado complementa ldquocantordquo Eacute

Ferrariensium Ducis privilegijs ampliszlig per decennium Florentiae In officina Iuntarum Bernardi F

MDLXII [1562] pp 46 181-183 346 Manuel Pires de Almeida assim define a proposiccedilatildeo ldquoProposiccedilatildeo eacute o lugar primeiro da obra em que

propotildee o poeta o que intenta cantar nela esta seja breve e clara possiacutevel e em a qual natildeo se ponha o nome

proacuteprio do priacutencipe ou heroacutei senatildeo usando-se de periacutefrase em tudo o mais dela natildeo haja circuncisatildeo nem rodeio algum senatildeo que o poeta em breviacutessimas razotildees diga o que pretende cantar compreendendo na

proposiccedilatildeo toda a accedilatildeo da faacutebula e captando atenccedilatildeo com prometer coisas dignas de serem escutadas isto

com estilo natildeo tuacutemido nem inchado de maneira que vaacute decrescendordquo cf MUHANA A ldquoDiscurso sobre o

poema heroico Comentaacuteriordquo REEL Revista Eletrocircnica de Estudos Literaacuterios Vitoacuteria a 2 v 2 2006 p

8 347 Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes

tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip

Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens

ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo

ferat error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX

Com as licenccedilas necessarias p 198

121

procedimento de sintaxe que busca a alteza do enunciado

As Armas amp o Varatildeo que os malseguros348

Campos cortou do Egeo amp do Oceano

Que por perigos amp trabalhos duros

Eternizou seu nome soberano

A graotilde Lisboa amp seus primeiros muros

(De Europa amp largo Impeacuterio Lusitano

Alta cabeccedila) se eu pudesse tanto

A Paacutetria ao mundo agrave Eternidade canto349

Sabe-se Gabriel Pereira de Castro imita a proposiccedilatildeo de Luiacutes de Camotildees

As armas amp os barotildees aszliginalados350

Que da Occidental praya Lusitana

Por mares nunca dantes navegados

Passaram ainda aleacutem da Taprobana

Em perigos amp guerras esforccedilados

Mais do que prometia a forccedila humana

E entre gente remota edificaratildeo

Nouo Reino que tanto sublimaratildeo

348 Quando natildeo se eacute Miguel do Couto Guerreiro ou Antocircnio Feliciano de Castilho sabe-se que o primeiro

verso da Ulyssea ou Lisboa Edificada eacute hendecassiacutelado como se viu tambeacutem chamado verso heroico ou

verso italiano no tempo em que escreve Gabriel Pereira de Castro As Ar mas amp o Va raotilde || que os

mal se gu ros Nota-se a contagem de onze siacutelabas implica a ditongaccedilatildeo em dois momentos (ldquoamp ordquo

ldquoque osrdquo) sublinhados Nota-se tambeacutem satildeo fortes por natureza as siacutelabas 2ordf 6ordf 8ordf e 10ordf todas em negrito

acima Trata-se de verso grave paroxiacutetono Como ensina Manuel Said Ali para compor-se o primeiro

hemistiacutequio deve-se antepor o anfiacutebraco (siacutelaba aacutetona + tocircnica + aacutetona) ao anapesto (siacutelaba aacutetona + aacutetona

+ tocircnica) Supotildee-se breve pausa apoacutes o anfiacutebraco a fim de se evitar a colisatildeo da siacutelaba aacutetona que o encerra

(ldquomasrdquo) com as sequentes aacutetonas (ldquoamp o Vardquo) Feita a cesura apoacutes a sexta siacutelaba meacutetrica compotildee-se o segundo hemistiacutequio de cinco siacutelabas em alternacircncia binaacuteria (siacutelaba aacutetona + tocircnica) o movimento aiacute eacute dito

iacircmbico porque iniciado pela siacutelaba fraca e seguido pela forte 349 Cf Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de

Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro fol 1 350 Vale ressaltar o primeiro verso da Ulyssea ou Lisboa Edificada emula em termos de metro o primeiro

verso drsquoOs Lusiacuteadas composto segundo o mesmo esquema riacutetmico As Ar mas amp os ba roẽs|| A

szligi na la dos Nota-se trata-se de um hendecassiacutelabo heroico grave Satildeo fortes por natureza as siacutelabas

2ordf 6ordf e 10ordf e por posiccedilatildeo a 8ordf (ldquoszligirdquo) como que acentuada porque entre duas aacutetonas Feita a ressalva

prevista natildeo se distinguem ritmicamente os versos de Gabriel Pereira de Castro e de Luiacutes de Camotildees

122

E tambem as memorias gloriosas

Daquelles Reis que foram dilatando

A Fee o Imperio amp as terras viciosas

De Affrica amp de Asia andaratildeo deuastando

E aquelles que por obras valerosas

Se vatildeo da ley da Morte libertando

Cantando espalharey por toda parte

Se a tanto me ajudar o engenho amp arte 351

Conveacutem notar que conforme o juiacutezo de Francisco Joseacute Freire tanto Luiacutes de

Camotildees quanto Gabriel Pereira de Castro embora principiem pelo caso obliacutequo devam

ser advertidos do defeito de dilatar em demasia verbo e complemento diferentemente do

ocorre em Virgiacutelio e Homero No primeiro poeta mais precisamente no primeiro

hemistiacutequio do primeiro verso da propositio da Eneida lecirc-se ldquoArma uirumque canordquo (As

armas e o varatildeo canto)352 No segundo poeta na proposiccedilatildeo da Odisseia lecirc-se ldquoO varatildeo

reconta-me Musa multiversaacutetil que muito errou depois que depredou o capitoacutelio

sagrado de Troiardquo353 (cf HOM Od I 1-2 ἄνδρα μοι ἔννεπε μοῦσα πολύτροπον ὃς

μάλα πολλὰ πλάγχθη ἐπεὶ Τροίης ἱερὸν πτολίεθρον ἔπερσενrdquo) Diga-se poreacutem

que enunciado como forccediloso por Francisco Joseacute Freire e partiacutecipe do jogo de imitaccedilatildeo e

emulaccedilatildeo no gecircnero de poema heroico consoante a autoridade homeacuterica a anteposiccedilatildeo

do acusativo natildeo se aplica em Torquato Tasso cuja Gerusalemme liberata em grafia

quinhentista assim se propotildee

351 Cf Os Lusiadas de Luis de Camotildees Com Privilegio Real Impressos em Lisboa com licenccedila da Sancta

Inquisiccedilatildeo e do Ordinario em casa de Antonio Gotildeccedilaluez Impressor 1572 p 1 352 O primeiro verso de Camotildees talvez seja demasiado repetitivo recordar emula Virgiacutelio em termos de

metro Lecirc-se assim na Eneida Ār mă uĭ rūm quĕ că nō || Trōi āe qūi prī mŭs ăb ō rīs (As armas

e o varatildeo canto De Troia quem primeiro) Nota-se o verso eacute hexacircmetro heroico hexacircmetro dactiacutelico pois consta de seis peacutes seis unidades meacutetricas o daacutetilo (siacutelaba longa + breve + breve) Ensina Quintiliano que

por convenccedilatildeo a siacutelaba longa equivale a duas breves dura dois tempos ao passo que a siacutelaba breve dura

um uacutenico tempo (ldquoLongam esse duorum temporum brevem unius etiam pueri sciuntrdquo ldquoA [siacutelaba] longa

valer dois tempos e a breve um uacutenico ateacute as crianccedilas o sabemrdquo cf Inst orat 9 4 47) logo o daacutectilo pode

ser substituiacutedo pelo espondeu (siacutelaba longa + longa) como mostram terceiro e o quarto peacute do verso Via de

regra eacute indiferente se os primeiros quatro peacutes fazem-se de daacutectilos ou de espondeus O quinto peacute deve ser

daacutectilo o sexto pode ser espondeu (siacutelaba longa + longa) ou troqueu (siacutelaba longa + breve) pois a siacutelaba

final do verso eacute anciacutepite ou seja tanto pode ser longa como breve 353 A traduccedilatildeo citada eacute de Marcos Martinho dos Santos cf Cf SANTOS M M ldquoDa disposiccedilatildeo da Eneida

ou Do gecircnero da Eneida segundo as espeacutecies da Iliacuteada e Odisseiardquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2001 v

5 p 169

123

CANTO lrsquoArme pietose ersquol Capitano

Chersquol gran Sepolcro liberograve di CHRISTO

Molto egli oprograve col senno e con la mano

Molto soffrigrave nel glorioso acquisto

E in van lrsquoInferno vi srsquooppose e in vano

Srsquoarmograve drsquoAsia e di Libia il popol misto

Irsquol Ciel gli diegrave favore e sotto agrave i santi

Segni ridusse i suoi compagni erranti 354

CANTO as Armas piedosas e o Capitatildeo

Que o gratildeo Sepulcro libertou de CRISTO

Muito ele obrou com senso e com a matildeo

Muito sofreu na gloriosa conquista

E em vatildeo o Inferno se lhe opocircs e em vatildeo

Se armou de Aacutesia e de Liacutebia o povo misto

E o Ceacuteu lhe deu favores e sob os santos

Sinais agrupou os seus soacutecios errantes355

Interessa que Torquato Tasso confira pureza (katharotēs) ao primeiro verso da

proposiccedilatildeo da Gerusalemme liberata apartando-se dos exempla de Homero de Virgiacutelio

e de Luiacutes de Camotildees no gecircnero de poema heroico Supondo-se com Demeacutetrio que a

narraccedilatildeo em vista da tenuidade de kharaktēr possa ser iniciada ou pelo nominativo ou

pelo acusativo a fim de se evitarem usos obscuros (cf DEMETR 201) supondo-se

ademais que o gecircnero de poema visite variegadas formas de dizer na enformaccedilatildeo

estiliacutestica do misto de feiccedilatildeo elevada nada deve estranhar no que a oitava citada daacute a ler

354 Cf Gierusalemme liberata poema heroico del Sig Torquato Tasso Al Sereniss Signore il Signor

Donno Alfonso H DrsquoEste Duc adi Ferrara ampc Tratta del vero Originale Con aggiunta di quanto manca

nellrsquoaltre Edittioni amp con lrsquoAllegoria dello stesso Autore Con Priuilegio di S Santitagrave delle Maestagrave

Christianissima amp Catholica della Sereniss Signoria di Venetia del Sereniss Sig DVCA di Ferrara amp drsquoaltri Principi In Ferrara 1581 p 1 Em epiacutestola datada do ano de 1575 endereccedilada a Scipione Gonzaga

Torquato Tasso apresenta variante dos versos iniciais da Gerusalemme liberata em que o acusativo abre o

poema ldquoLrsquoarme pietose e i Cavalieri i canto Che de la croce si segnar di Cristo Quantrsquooperar sotto

Goffredo e quanto Seco soffrir nel glorioso acquistordquo cf Discorsi del Signor Torquato Tasso DellrsquoArte

Poetica et in particolare del Poema Heroico Et insieme il Primo Libro delle Lettere scritte agrave diuersi suoi

amici lequali oltra la famigliaritagrave sono ripiene di molti concetti amp auertimenti poetici agrave dichiaratione

drsquoalcuni luoghi della sua Gierusalemme liberata Gli uni e lrsquoaltre scritte nel tempo chrsquoegli compose detto

suo Poema Non piu stampati Con Privilegi In Venetia MDLXXXVII [1587] Ad instanza di Giulio

Vassalini Libraro agrave Ferrara pp 34r-34v 355 Traduccedilatildeo nossa Verto a oitava de Torquato Tasso mirando apenas a sintaxe e o iniacutecio direto que abdica

do acusativo

124

Eacute sabido que nos Discorsi del poema heroico Torquato Tasso afirma da propositio da

Eneida que ldquoVirgilio accoppiograve lrsquoalto stile e lrsquoillustre nella propositionerdquo (Virgiacutelio

conjugou o estilo alto e o ilustre na proposiccedilatildeo) e mais que ldquosimili sono i seguenti versi

e sempre haurebbe continuato nella medesima altezza e nel medesimo splendore

srsquoalcuna volta non hauesse voluto variar le forme del parlarerdquo (semelhantes satildeo os

seguintes versos e continuaria sempre na mesma alteza e no mesmo esplendor se natildeo

quisesse por vezes variar as formas do dizer)356 Assim conforme o Peri ideōn Virgiacutelio

mira com ldquoArma uirumque canordquo a altezza (megethos) e o splendore (lamprotēs) 357 a

altezza da lexis respeitante agrave mateacuteria beacutelica e heroica e o splendore da construccedilatildeo obliacutequa

como que avesso tal como a peribolē agrave pureza (cf HERM 267 17-268 20) Todavia

deve-se natildeo renunciar agrave variaccedilatildeo como Virgiacutelio natildeo segue sem ldquovariar le forme del

parlarerdquo tambeacutem Torquato Tasso

Lo stile Heroico egrave in mezo quasi fragrave la semplice grauitagrave del Tragico e

la fiorita uaghezza del Lirico amp auanza lrsquouna e lrsquoaltra nello splendore

drsquouna merauigliosa maestagrave ma la maestagrave sua di questa egrave meno ornata

[] 358

O estilo Heroico estaacute como que no meio entre a simples gravidade do

Traacutegico e a florida vagueza do Liacuterico amp avanccedila uma e outra no

resplendor de uma maravilhosa majestade mas a sua majestade eacute

menos ornada do que daquela []359

Por fim a liccedilatildeo de Torquato Tasso eacute manifesta depois de pormenorizadas as

distinccedilotildees estiliacutesticas entre o heroico o eacutepico o liacuterico e apontadas as vizinhanccedilas da

ordem da forma e da ideia entre esses gecircneros de poema ldquoQuesta uarietagrave di stili deue

essere usata ma non si che si muti lo stile non mutandosi le materie che saria

356 Cf Discorsi del poema heroico del S Torquato Tasso Allrsquoillustrissmo e reverendissmo Signor Cardinale

Aldo Brandino Nella Stamparia dello Stigliola In Napoli Ad instantia di Paolo Venturino [1594] p 107 357 Note-se ldquoaltezzardquo eacute termo que se pode aplicar como equivalente ao latim sublimis ao grego ὕψος (hypsos) cf Dionigi Longino Retore DellrsquoAltezza del dire tradotto dal greco da D Niccolo Pinelli In

Padoua per Giulio Criuellari 1639 Con Licenza dersquo Superiori 358 Cf Discorsi del Signor Torquato Tasso DellrsquoArte Poetica et in particolare del Poema Heroico Et

insieme il Primo Libro delle Lettere scritte agrave diuersi suoi amici lequali oltra la famigliaritagrave sono ripiene

di molti concetti amp auertimenti poetici agrave dichiaratione drsquoalcuni luoghi della sua Gierusalemme liberata

Gli uni e lrsquoaltre scritte nel tempo chrsquoegli compose detto suo Poema Non piu stampati Con Privilegi In

Venetia MDLXXXVII [1587] Ad instanza di Giulio Vassalini Libraro agrave Ferrara p 25 359 Traduccedilatildeo nossa

125

imperfetione gratildedissimardquo isto eacute ldquoEsta variedade de estilos deve ser usada mas natildeo tanto

que se mude o estilo sem que se mudem as mateacuterias o que seria imperfeiccedilatildeo

grandiacutessimardquo360

No mais Hermoacutegenes prescreve a fim de efetuar a katharotēs o emprego de kōla

breves agrave maneira de kommata (cf HERM 232 4-6) Itere-se dos kōla natildeo haacute definiccedilatildeo

no Peri ideōn Satildeo poreacutem bem determinados em outro tratado atribuiacutedo a Hermoacutegenes

o Peri heureseōs Nele o retor aborda o pneuma o ldquosoprordquo que nos kōlaou nos kommata

abarca a completude de um pensamento ( Por komma no singular entende a

porccedilatildeo de texto cuja medida varia de quatro a seis siacutelabas tal qual o epodo Por kōlon

tambeacutem no singular a porccedilatildeo que varia de sete a doze siacutelabas como o triacutemetro iacircmbico

ateacute mesmo prolongadamente agraves dezessete siacutelabas do hexacircmetro (cf HERM 183 10)361

360 Idem p 26 361 De acordo com Heinrich Lausberg eacute noccedilatildeo de vaacuterias liccedilotildees Lecirc-se em Aristoacuteteles (cf ARIST

Rhet III 9 5) colon em Caio Juacutelio Victor (cf VICT 22 p 439 20) e membrum no Anocircnimo (cf Rhet Her

4 19) em Ciacutecero (cf CIC Or 62 211) e em Quintiliano (cf QUINT 9 4 22) Eacute termo por que Aristoacuteteles

designa parte do periacuteodo () (cf ARIST Rhet III 9 5) embora tambeacutem seja empregado para referir

oraccedilotildees completas seja uacutenicas e independentes seja concatenadas numa seacuterie de oraccedilotildees de mesma

natureza como mostra o adveacuterbio latino membratim [ldquode membro em membrordquo ldquoem frases curtasrdquo]

derivado do substantivo membrum (cf QUINT 9 4 126 127 CIC Or 66 222 67 224) Acentua Lausberg

que como parte do periacuteodo o pode abarcar toda uma oraccedilatildeo ou apenas um grupo de palavras e

obviamente como parte natildeo enuncia pensamento sintaticamente de todo independente

Segundo o Peri hermēneias em termos semacircnticos o deve encerrar ldquoum pensamento

inteira e completamente seja ele todo seja toda uma parte delerdquo (DEMETR 1-3) cf Cf FREITAS G A DE

Sobre o Estilo de Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo e estudo introdutoacuterio do

tratado) Satildeo Paulo [UFMG] 2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p I Esse tratado traz um exemplo da

Anabase de Xenofonte Cito-o jaacute na traduccedilatildeo de Gustavo de Freitas ldquoDario e Parisaacutetide tiveram dois filhos

o mais velho Artaxerxes o mais novo Cirordquo (XEN Anab 11) O trecho eacute assim compreendido 1ordm membro

[Dario e Parisaacutetide tiveram dois filhos] 2ordm membro [o mais velho Artaxerxes o mais novo Ciro] Como assevera Freitas citando George M A Grube natildeo se trata de trecircs membros como se poderia em princiacutepio

supor porque ldquoo mais velho Artaxerxesrdquo e ldquoo mais novo Cirordquo satildeo passos enredados numa relaccedilatildeo os

quais isolados natildeo teriam autonomia de sentido (cf FREITAS G A DE Op Cit p LXVII cf sect 930)

Ademais segundo Lausberg consoante o que se lecirc em Hermoacutegenes informa que os podem

ser longos ou breves Quando breves dizem-se cf sectsect 928-934) Em analogia com a versificaccedilatildeo

poeacutetica o estudioso recorda Ciacutecero (CIC Or 66 222) e indica que o membro estaacute para o verso assim como

o inciso estaacute para a fraccedilatildeo de verso separada por cesura e o periacuteodo para a estrofe LAUSBERG H Manual

de Retoacuterica Literaria Fundamentos de una Ciencia de la Literatura Versioacuten espantildeola de Joseacute Peacuterez Riesco

Madrid Editorial Gredos 1967 3 tomos tomo II pp 310-6 Em liacutengua portuguesa komma e kōlon satildeo categorias gramaticais definidas na Grammatica da

lingua Portuguesa de Joatildeo de Barros (1496-1570) impressa em Lisboa em 1540 e na Orthographia da

lingoa portuguesa de Duarte Nunes de Leatildeo (ca 1530-1608) impressa em 1576 Joatildeo de Barros escreve

ldquoCotildema ę uocaacutebulo grego aque podemos chamaacuter cortadura por que aly se coacuterta a clausula ẽ duas partes

Estas duas partes se coacutertam em uirgulas que sam hũas distinccedilotildees das paacutertes da clausula Coacutelo ę o termo

ou maacuterco em que se acaacuteba a claacuteusula As figuras de cada ponto destes sam as seguintes Dous a este modo

se chamam cotildema Este soacute se chama coacutelo As uergas sam estas zeburas ao modo dos gregos Na cotildema parece

que descansa a voacutez mas nam fica o intendimẽto satisfeito por que se deseia a outra paacuterte com a oacuteraccedilaacutem

fica perfeita e remataacuteda com este ponto coacutelo Estam entre as cortaduras que sam estes dous pontos hũas

zeburas assy aque chamaacutemos distinccedilotildees das paacutertes da clausula Este soacute potildeto (como iaacute disse) se chama coacutelo

As palaacuteuras que iaacutezęm entre dous coacutelos se chamam clausula ao noacutesso modo e segundo os gregos periodo

126

Dessa liccedilatildeo ao que se pode supor decorre sistematizaccedilatildeo em latim que ensina

Jorge de Trebizonda no seacuteculo XV Para ele o kōlondiz-se ldquomẽbrumrdquo e assim eacute definido

est uno spiritu prolata oratio quaelig tamen sententiam uel partem eius

breuiter absque interuallo absoluit Membrorum uerograve quaelig breuiora

sunt ut puta quaelig duodecim syllabarũ numerum non excedũt

id est incisiones Graeligco uocabulo nominentur quaelig longiora sunt

membra nuncupentur 362

eacute discurso proferido num soacute sopro que brevemente encerra todo o

pensamento ou parte dele sem pausa Na verdade a respeito dos

membros aqueles que satildeo mais breves por exemplo que natildeo excedem

o nuacutemero de doze siacutelabas satildeo chamados em liacutengua grega kommata

isto eacute incisos os que satildeo mais longos satildeo designados membros 363

Filiberto Campanile como amiuacutede faz segue Jorge de Trebizonda de perto

Membro egrave quel parlare fatto quasi ad vn fiato il quale dichiara o tutta

la sentenza ouero vna parte di quella e quando sia piu breue si

chiameragrave inciso ouer tronco quando piu lungo ritiene il suo nome di

membro 364

Membro eacute aquele discurso feito num sopro que declara ou todo o

pensamento ou parte dele e quando eacute mais breve se chama inciso ou

tronco quando mais longo conserva o nome de membro 365

aque os latinos chamam termo Os dous aacutercos que fazem estas palauras (como ia diszlige) usam os latinos

quando comętem hũa figura aque chamam Entreposiccedilam e os gregos parẽtesis daqual tratamos na

construiacuteccedilamrdquo cf Grammatica da lingua Portuguesa Olyssippone Apud Lodiuicum Rotorigiũ Typographum M D XL [1540] p 50 cf Orthographia da lingoa portuguesa obra vtil amp necessaria assi

pera bem screuer a lingoa Hespanhol como a Latina amp quaesquer outras que da Latina teem origem Item

hum tractado dos pontos das clausulas pelo licenciado Duarte Nunez do Liatildeo Em Lisboa per Ioatildeo de

Barreira M D LXXVI [1576] p 74r-76v 362 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 498 363 Traduccedilatildeo nossa 364 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 13 365 Traduccedilatildeo nossa

127

Hermoacutegenes acrescenta tornam puras as ideai os arranjos sintaacuteticos soltos e os

ritmos de mesma espeacutecie que deles decorrem (cf HERM 229 11-13) Na liccedilatildeo grega tal

como jaacute referido ora diz-se synthesis(cf HERM 218 23)ora diz-se synthēkē(cf HERM

219 14) Consoante a latinizaccedilatildeo proposta por Jorge de Trebizonda eacute collocatio e dessa

maneira trata-se de ldquodictionũ numerosa compositiordquo (composiccedilatildeo riacutetmica de palavras)

Na versatildeo de Filiberto Campanile eacute compositione e assim eacute constituinte por meio do

qual pode o orador ou o poeta ldquocollocare amp ordinare delle parole col suo numerordquo

(colocar amp ordenar as palavras com seu ritmo)366 De acordo com o tratadista a pureza

de sintaxe eacute simples e consente o hiato intervocaacutelico porque o preceito de evitaacute-lo

manifesta diligecircncia mais afeita agrave ornamentaccedilatildeo que agrave katharotēs e recomenda o texto

prosaico em que sobressaia a prosoacutedia iacircmbica ou trocaica em mescla com diferentes peacutes

como o daacutectilo e o espondeu de modo que natildeo se estabeleccedila a regularidade do verso mas

a meacutetrica de feiccedilatildeo corrente que dissimule o artifiacutecio O ritmo que o arranjo puro e a pausa

(anapausis) produzem conveacutem que esteja entre o metro ausente e o metro por natureza

da liacutengua grega (cf HERM 232 8-233-2) Note-se trata-se do iambo de acordo com

Aristoacuteteles e Demeacutetrio (cf ARIST Poet 4 1449 a DEMETR 42) Satildeo semelhantes as

colocaccedilotildees de Ciacutecero em relaccedilatildeo ao latim (cf CIC Or 56 189 57 191) Gabriele Zinano

o itera como referido no Sommarii di varie retoriche greche latine et volgari 367

Acrescente-se Hermoacutegenes pondera que embora synthesis (ou synthēkē)

anapausis e rhythmos concorram agrave efetuaccedilatildeo da pureza satildeo de contribuiccedilatildeo restrita Natildeo

haacute exemplos em Filiberto Campanile que avancem a interpretaccedilatildeo da liccedilatildeo grega Vale

rememorar que o grego anapausis verte-o Jorge de Trebizonda por clausula e assim

define ldquoClausula est uniuscuiusq orationis aut etiatilde membri numerosa dispositiordquo

(Claacuteusula eacute disposiccedilatildeo riacutetmica de cada discurso ou ateacute mesmo dos membros)368 Filiberto

Campanile propotildee ldquoIl Posamento saragrave la chiusa o termine numeroso di ciascun parlarerdquo

(A pausa seraacute o remate ou o termo riacutetmico de cada discurso)369 Jaacute rhythmos eacute o derradeiro

366 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 13 367 Cf Sommarii di varie retoriche greche latine et volgari Distintamente ordinati in uno da Gabriele

Zinano In Reggio Apresso Hercoliano Bartholi 1590 p 198 368 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 498 369 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 13

128

elemento de que se faz a lexisEacute constituinte que o latim numerus designa e assim Jorge

de Trebizonda define ldquoNumerus est quaelig ex obseruatione collocationis atque clausulaelig

pedum conficitur orationis sonoritas atque modulatiordquo (Ritmo eacute sonoridade e modulaccedilatildeo

do discurso que se elabora a partir da observaccedilatildeo da colocaccedilatildeo e dos peacutes da claacuteusula)370

Em italiano decalca-se o latim e define Filiberto Campanile numero como ldquoquel suono

che nasce dalla compositione amp ordine tanto delle parole sillabe amp elementi quanto

dersquo membri conueniente perograve alla sentenza di ciascuna cosardquo (aquele som que nasce da

composiccedilatildeo e da ordenaccedilatildeo tanto das palavras siacutelabas e letras quanto dos membros

conveniente poreacutem ao pensamento de cada coisa)371

Sabe-se bem efetua-se a saphēneia mediante duas ideai que lhe satildeo subordinadas

katharotēs e eukrineia No que concerne agrave eukrineia espeacutecie restante espeacutecie auxiliar o

Peri ideōn o aponta haacute sobretudo operaccedilatildeo de methodos (cf HERM 226 17-18 235 8-

9) constituiacutedo nas liccedilotildees de Hermoacutegenes como ldquomodo de apresentaccedilatildeo dos

pensamentosrdquo 372 o que significa na anaacutelise de Michel Patillon ldquoorganizar os

pensamentos segundo um plano claro e dar a ver claramente o plano segundo o qual se

sucedem os elementos do discursordquo373 Concede Hermoacutegenes a bem dizer agrave luz de

exemplos recolhidos em Demoacutestenes que seja possiacutevel engenhosamente desrespeitar o

plano anunciado sem comprometer a clareza do methodos (cf HERM 235 14-17)

Recorde-se trata-se tambeacutem da constituiccedilatildeo de enunciado artificial e convencionalmente

kata physin ou seja ldquoconforme a naturezardquo (cf HERM 237 20) o que pressupotildee na

praacutetica do relato a ordenaccedilatildeo cronoloacutegica das accedilotildees narradas e no seio das provas antes

as objeccedilotildees que as refutaccedilotildees (cf HERM 238 11) Ademais as ennoiai proacuteprias da

eukrineia satildeo ditas metaloacutegicas por Michel Patillon374 visto que preceitua Hermoacutegenes

devam operar pelo anuacutencio dos propoacutesitos da enunciaccedilatildeo pela conduccedilatildeo do discurso a

um ponto de partida (cf HERM 236 16-17) 375 pela apresentaccedilatildeo do que se enunciaraacute e

dos modos como isso se faraacute (cf HERM 236 21-22) pelas recapituaccedilotildees (cf HERM 237

370 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 498 371 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori pp 13-4 372 Cf HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel

Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 340 373 Idem ibidem 374 Cf HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel

Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 343 375 Idem ibidem Segue-se de perto Michel Patillon aqui

129

8) No que se refere agrave lexis nada haacute no Peri ideōn para a enformaccedilatildeo da saphēneia aleacutem

dos preceitos de composiccedilatildeo da katharotēs O mesmo vale para os kōla a synthesis (ou

synthēkē) a anapausis e o rhythmos O uso de figuras (skhēmata) distintamente ganha

aditamentos normativos Isso significa convecircm para os devidos efeitos a definiccedilatildeo por

agrupamento (cf HERM 238 17-18 ldquoto katrsquoatroisin hōrismenonrdquo ldquodeacutefini par

regroupementrdquo 376 ldquodefinicioacuten por agrupamientordquo377) a distribuiccedilatildeo (cf HERM 238 22

ldquomerismosrdquo ldquodistributionrdquo 378 ldquodistribucioacutenrdquo379 ) a enumeraccedilatildeo (cf HERM 238 22

ldquoaparithmēsisrdquo ldquoeacutenumeacuterationrdquo380 ldquoeacutenumeacuteracioacutenrdquo381) a assim chamada pergunta retoacuterica

(cf HERM 239 7-14) e a repeticcedilatildeo (cf HERM 239 14 ldquoepanalēpsisrdquo ldquoreprisesrdquo382

ldquorepeticionesrdquo383)384

376 Idem ibidem 377 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 p 121 378 Cf HERMOGENE Lrsquoart rheacutetorique p 344 379 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo p 121 380 Cf HERMOGENE Lrsquoart rheacutetorique p 344 381 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo 1993 p 121 382 Cf HERMOGENE Lrsquoart rheacutetorique p 344 383 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo p 122 384 Dando versatildeo italiana ao preceito Gabriele Zinano no jaacute referido Sommarii di varie retoriche greche

latine et volgari emprega o substantivo ldquofacilitagraverdquo para traduzir eukrineia Note-se eacute eleiccedilatildeo que dista da

escolha de seus contemporacircneos Giulio Camillo Delminio e Filiberto Campanile para quem eukrineia eacute

lucidezza Resume-se assim a facilitagrave

ldquoIn questa forma le parole i membri la compositione il finimento amp il numero sono simili agrave quelli della

puritagrave

I concetti non si contentano drsquoesser agrave i puri perche hanno un non sograve che di piugrave come il ridurre al principio

Demostene Ma egrave necessario ograve Ateniensi chrsquoio ui riduca memoria amp altri si fatti

I modi sono quelli corsquo quali srsquovsa la cosa secondo la sua natura amp pongono le cose prime in prima amp le seconde secondariamente amp prima le oppositioni fanno amp poi le solutioni

La figura deue hauer vna certa repetitione che con questo essempio di Demostene si manifestaragrave

Certamente il mostrar le forze di Filippo amp con tale ragionamento esortar uoi agrave far quello che ui si

conuiene non mi par che stia bene Per qual cagione perche tutto quello che si dicesse di questa materia

crederei che fosse per portare honore agrave lui agrave noi piugrave tosto qualche biasmo perche quanto piugrave hagrave fatto cose

sopra il grado suo tanto piugrave egrave merauglioso agrave gli huomini uoi quanto peggio che non doueuate uisete

gouernati tanto maggior uergogna hauete riceuuto Queste cose adunque permetterograve io Cosi dicendo

Demostene ci manifesta figuratamente il suo pensiero amp tanto piu soggiongendo Perograve che se seueramente

si uorragrave considerare ograve Ateniesi si uedragrave che costui notilde egrave diuenuto gratildede da se stesso ma fatto da uoi ampc Si

conuiene ancora agrave questa figura la interrogatione amp la risposta Lrsquoordinatione del parlare che hagrave di

necessitagrave quelche cosa come Costui notilde solo le discordie ciuili acquetograve ma le guerre esterne felicemente estinse La diuisione amp distribuitione come Si lrsquoingegno de gli eloquenti se i fauore de gli amici se

lrsquoautoritagrave de i giudici valessero Cornelio hauria vinta la causa Ma non piugrave di questa figurardquo cf Sommarii

di varie retoriche greche latine et volgari Distintamente ordinati in uno da Gabriele Zinano In Reggio

Apresso Hercoliano Bartholi 1590 pp 198-201 cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto

Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile

MDCVI Con licenza dersquo superiori p 22 cf Il secondo tomo dellrsquoopere di M di Giulio Camillo Delminio

cioegrave La Topica ouero dellrsquoElocutione Discorso sopra lrsquoIdee di Hermogene La Grammatica Espositione

sopra il primo amp secondo Sonetto del Petrarca Nvovamente dato in lvce Con privilegio In Venegia

apresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLX [1560] p 116 cf Le Idee ouero Forme della oratione da

Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M Giulio Camillo Delminio Friulano A queste

srsquoaggiunge lrsquoArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal detto M Giulio Camillo Opere novamente

130

Itere-se a saphēneia eacute retoricamente necessaacuteria mas natildeo basta Isso significa a

elaboraccedilatildeo decorosa dos discursos mistos supotildee a visita agraves demais ideai Nisso o Peri

ideōn eacute repetitivo Essa visita tomem-se como exemplo outras ideai primaacuterias a saber

megethos kallos gorgotēs ēthos e alētheia eacute da ordem da necessidade da utilidade da

adequaccedilatildeo Sabe-se bem no ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos atualiza-se o

preceito pela afirmaccedilatildeo de que a Ulyssea ou Lisboa Edificada aleacutem da ldquoclaridaderdquo da

ldquoenargiardquo da ldquoeuidencia no dizerrdquo da ldquoSaphiniardquo compotildee-se como obra mista da

ldquograndeza do estilordquo da ldquofermosurardquo da ldquobreuidaderdquo e das demais formas discursivas

referidas pelo apologista de Gabriel Pereira de Castro agrave luz de Hermoacutegenes Essa visita

agraves demais ideai o tratado grego assim a codifica na medida em que pode o discurso

vergar-se ao vulgar ldquoto eutelēsrdquo (ldquo εὐτελήςrdquo) e ao rasteiro ldquotapeinonrdquo (ldquoταπεινόνrdquo)

quando demasiadamente claro conveacutem acrescentar agrave saphēneia algo que lhe decirc grandeza

(megethos) majestade (axiōma) amplitude (onkos) Precisamente Hermoacutegenes entende

haver relaccedilatildeo de oposiccedilatildeo entre eutelēs e megethos (cf HERM 241 11-15) 385 A

interpretaccedilatildeo de Filiberto Campanille mostra-o explicitamente

[] perche la troppa chiarezza potrebbe rendere humile e vile il parlare

hauragrave tal volta bisogno drsquovn certo peso chrsquoegrave propriamente la

grandezza []386

[] porque a excessiva clareza poderia tornar humilde e vil o discurso

haveraacute desta vez necessidade de um certo peso que eacute propriamente a

mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C

XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 4 385 Giulio Camillo Delminio assim escreve ldquoDopporsquol trattato della Chiarezza [ή]

conseguentemente parlaremo della Grandezza [] della oratione perche eacute forza [ἀναγκαῖόν ἐστι]

che al parlare di chiarezza sia senza dubbio Grandezza amp per cosigrave dire vno cotal tumore [ὄγκος] amp

dignitate [ἀξίωμα] percioche ad vn parlare fuor di modo chiaro farebbe aggiunta imperfetionne che egrave

contraria alla Grandezzardquo Diga-se a ldquoimperfetionne che egrave contraria alla Grandezzardquo na liccedilatildeo grega do

texto faz referecircncia a ldquo εὐτελήςrdquo cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate

amp ridotte in questa lingua per M Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della

Bucolica di Virgilio spiegato dal detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio

Domenico Salomoni Al Sigr Andrea Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave

Catholico amp con pena di scommunica Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso

Gio Battista Natolini p 8 386 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori pp 5r-

v

131

grandeza [] 387

Itere-se a ideia de megethos no Peri ideōn compotildee-se de formas discursivas

ancilares a saber semnotēs trakhytēs sphodrotēs lamprotēs akmē e peribolē (cf HERM

242 4-5) Operaacute-las no corpo do preceito eacute esquivar-se ao vulgar e ao rasteiro natildeo

apenas em termos elocutivos Acentua o entendimento do preceito Francisco Porto na

epiacutestola biliacutengue destinada ao editor protestante Jean Crespin (1520-1572) que abre a

ediccedilatildeo Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices

magistri Francisci Porti Cretensis opera industriaque illustrati atque expoliti (1569)

pois que se afirma em nota agrave margem ldquodebet autem oratio esse perspicua amp non humilisrdquo

ou seja ldquoora deve o discurso ser claro amp natildeo humilderdquo 388 O comentaacuterio recorda

textualmente em grego passo do livro terceiro da Retoacuterica de Aristoacuteteles ldquodei saphē kai

mē tapeinēn einairdquo (ARIST Rhet 3 12 1414 a 20 ldquoδεῖ σαφῆ καὶ μὴ ταπεινὴν εἶναιrdquo)

em traduccedilatildeo lusa de Manuel Alexandre Juacutenior Paulo Farmhouse Alberto e Abel do

Nascimento Pena ldquoeacute forccediloso ser claro e natildeo rasteirordquo de modo que se faccedila penetrar na

leitura do Peri ideōn a saphēneia tal como pensada por Aristoacuteteles

Eacute preciso lembrar que com a Poeacutetica e a Retoacuterica aristoteacutelicas letrados como

Francisco Porto que operam a permeabilidade dos preceitos de Hermoacutegenes e de

Aristoacuteteles aprenderam que peregrino (γλῶττα) eacute o vocaacutebulo estrangeiro (ξενικν) o

metafoacuterico (μεταφορά) e o alongado (ἐπεκτεταμένον) (cf ARISTOT Poet 22 1458 a

20-23) ou seja que peregrino eacute todo vocaacutebulo que se desvia do uso corrente (κύριον) e

cujo emprego afasta a poesia do vulgar do banal do comum da elocuccedilatildeo (τ ἰδιτικν)

como que do grau zero da lexis e a faz nobre (σεμν) e a ornamenta (cf ARISTOT Poet

22 1458 a 21 ARISTOT Rhet 3 2 1404 b 9-10) Recorde-se que o adjetivo ldquosemnosrdquo

empregado por Aristoacuteteles emprega-o Hermoacutegenes no campo semacircntico da semnotēs em

referecircncia a uma categoria estiliacutestica de circunscriccedilatildeo precisa cujo efeito seja a elevaccedilatildeo

retoacuterica do discurso

Reitere-se que conforme o Aristoacuteteles recuperado por Francisco Porto eacute virtude

da lexis ser clara (σαφ) sem ser chatilde rasteira (ταπειν) ser peregrina sem ser

387 Traduccedilatildeo nossa 388Cf Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices magistri Francisci

Porti Cretensis opera industriaacuteque illustrati atque expoliti Genevaelig apvd I Crispinvm MDLXIX [1569]

sp

132

enigmaacutetica nem baacuterbara pois que no enigma (αἴνιγμα) predominam as metaacuteforas e no

barbarismo (βαρβαρισμός) os vocaacutebulos estrangeiros (cf ARISTOT Poet 22 1458 a 17-

33) de modo que para Aristoacuteteles convecircm as misturas vocabulares que equilibrem os

termos correntes com os peregrinos 389 A liccedilatildeo da Poeacutetica prevecirc que empregar

adequadamente (πρεπόντως) os vocaacutebulos peregrinos sobretudo as metaacuteforas eacute sinal

de pendor do poeta (εὐφα) (cf ARISTOT Poet 22 1459 a 6) Empregaacute-los

inadequadamente (ἀπρεπῶς) em contrapartida de acordo com Aristoacuteteles se constitui

como deformaccedilatildeo ridiacutecula (cf ARISTOT Poet 22 1458 b 11 14 ldquoγελοῖονrdquo ldquoγελοῖαrdquo)

cujo efeito pode-se depreender das liccedilotildees da Retoacuterica eacute a lexisfriacutegida (ψυχρά)

contrafaccedilatildeo viciosa da nobreza e da ornamentaccedilatildeo do discurso (cf ARISTOT Rhet 3 3

1)

Esses passos da Poeacutetica que regulam as virtudes da lexis refere-os Francisco de

Quevedo (1580-1645) na epiacutestola a Gaspar de Guzmaacuten o Conde-Duque de Olivares

epiacutestola ldquoAl Excelentiacutessimo sentildeor Conde Duque Gran Canciller mi sentildeorrdquo390 que

introduz as Obras propias y traducciones latinas griegas y Italianas de Fray Luis de

Leoacuten (ca 1527-1591) estampadas em Madri em 1631 A liccedilatildeo apresenta-se em latim

em concordacircncia com a ediccedilatildeo biliacutengue de Aristoacuteteles greco-latina elaborada por

Alessandro Pazzi em ediccedilatildeo primeira de 1536391

Dictionis autem virtus amp perspicua sit non tamen humilis quaelig igitur

ex proprijs nominibus constabit maximegrave perspicua erit humilis tamen

exemplum sit Cleophontis Stheneli quaelig poesis illa veneranda amp omne

389 Cf ARIST Poet 22 1458 a 30-4 ldquoεῖ ἄρα κεκρᾶσθαί πως τούτοις τὸ μὲν γὰρ τὸ μὴ ἰδιωτικὸν

ποιήσει μηδὲ ταπεινόν οἷον ἡ γλῶττα καὶ ἡ μεταφορὰ καὶ ὁ κόσμος καὶτἆλλα τὰ εἰρημένα εἴδη τὸ δὲ κύριον τὴν σαφήνειανrdquo [Necessaacuteria seraacute portanto como que a mistura de toda espeacutecie de vocaacutebulos

Palavras estrangeiras metaacuteforas ornatos e todos os outros nomes de que falamos elevam a linguagem acima

do vulgar e do uso comum enquanto os termos correntes lhe conferem a clareza] cf ARISTOacuteTELES Poeacutetica

Traduccedilatildeo de Eudoro de Souza 2ordf ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ars Poetica 1993 p 115 390 Cf ELLIOTT J H ldquoQuevedo and the Count-Duke of Olivaresrdquo in IFFLAND J (Org) Quevedo in Perspective Newark Delaware Juan de la Cuesta 1982 pp 227-50 391 Em Alessandro Pazzi lecirc-se ldquoDictionis aũt uirtus ut perspicua sit non tamen humilis quaelig igitur ex

proprijs nominibus constabit maxime perspicua erit humilis tamen exemplum sit Cleophontis Stheneliq

quaelig poesis illa ueneranda amp omne prorsus plebeium excludens quaelig peregrinis utetur uocabulis

Peregrinum uoco uarietatem linguarum translationem extensionem tam quodcumque agrave proprio alienum

estrdquo A despeito da pontuaccedilatildeo haacute uma uacutenica variante entre a liccedilatildeo de Alessandro Pazzi e a de Francisco de

Quevedo o adveacuterbio ldquoprorsusrdquo (inteiramente) que modifica o sentido de ldquoexcludensrdquo fazendo-lhe intenso

vigoroso ldquoProrsusrdquo eacute presente no primeiro ausente no segundo em Pazzi lecirc-se ldquoque exclui inteiramente

tudo o que eacute plebeurdquo (omne plebeium excludens) ao passo que em Quevedo lecirc-se ldquoque exclui tudo o que

eacute plebeurdquo (omne prorsus plebeium excludens) cf Aristotelis poetica per Alexandrum Paccium patritium

Florẽtinum in Latinum conversa Basileaelig M D XXXVII [1537] p 48

133

plebeium excludens quaelig peregrinis utetur vocabulis peregrinum voco

varietatem linguarum translationem extensionem tam quodcumque aacute

proprio alienum est392

E tambeacutem em espanhol

La virtud de la diccion ha de ser perspicua no humilde la que constare

de nombres propios seraacute perspicua sea exemplo de la humilde la

Poesia de Cleofonte y de Stenelo aquella es venerable y excluye todo

lo que es plebeyo que usa de vocablos peregrinos peregrino llamo la

variedad de lenguas translacion extension y todo lo que es ageno de

lo propio393

A virtude da dicccedilatildeo haacute de ser perspiacutecua natildeo humilde A que constar de

nomes proacuteprios seraacute perspiacutecua seja exemplo da humilde a poesia de

Cleofonte e de Esteacutenelo aquela eacute veneraacutevel e exclui tudo o que eacute plebeu

que usa de vocaacutebulos peregrinos peregrino chamo a variedade de

linguas a translaccedilatildeo a extensatildeo e tudo o que eacute alheio ao proacuteprio394

Ora para Francisco de Quevedo assim como para Francisco Porto trata-se de

asseverar a clareza a perspicuitas a perspicuidade como lexeōs de aretē (ldquoέξεως δέ

αρετήrdquo) ou seja como ldquovirtud de la diccionrdquo395 O preceito inscrito na dedicatoacuteria agraves

392 Alessandro Pazzi traduz o seguinte passo da Poeacutetica (cf ARISTOT Poet 22 1458 a 18-23) ldquoλέξεως δὲ ἀρετὴ σαφῆ καὶ μὴ ταπεινὴν εἶναι σαφεστάτη μὲν οὖν ἐστιν ἡ ἐκ τῶν κυρίων ὀνομάτων ἀλλὰ ταπεινή παράδειγμα δὲ ἡ Κλεοφῶντος ποίησις καὶ ἡ Σθενέλου σεμνὴ δὲ καὶ ἐξαλλάττουσα τὸ ἰδιωτικὸν ἡ τοῖς ξενικοῖς κεχρημένη ξενικὸν δὲ λέγω γλῶτταν καὶ μεταφορὰν καὶ ἐπέκτασιν καὶ πᾶν τὸ παρὰ τὸ κύριονrdquo Assim Eudoro de Souza o traduz ldquoQualidade essencial da elocuccedilatildeo eacute a clareza sem

baixeza Clariacutessima mas baixa eacute a linguagem constituiacuteda por vocaacutebulos correntes como as composiccedilotildees

de Cleofonte e Estecircnelo Pelo contraacuterio eacute elevada a poesia que usa de vocaacutebulos peregrinos e se afasta da

linguagem vulgar Por vocaacutebulos lsquoperegrinosrsquo entendo as palavras estrangeiras metafoacutericas alongadas e

em geral todas as que natildeo sejam de uso correnterdquo 393 Cf Obras propias y traducciones latinas griegas y Italianas Con la parafrasi de algunos Psalmos y

Capitulos de lob Sacadas de la libreriacutea de don Manuel Sarmiento de Mendoccedila Canonigo de la Magistral

de la santa Iglesia de Sevilla Dalas a la Impression don Francisco de Quebedo (sic) Villegas Imp del

Reyno (Viuda de Luis Saacutenchez) A costa de Domingo Gonccedilalez Madrid 1631 p 2 394 Traduccedilatildeo nossa 395 Liccedilatildeo assemelhada lecirc-se em Joseacute Antonio Gonzaacutelez de Salas (1588-1654) ldquo[Aristoacuteteles] Dice en el

principio de el Cap 22 Es pues la Virtud (por Excelencia como la maior sentildeala esta) de la Locucion que

sea perspicua i clara pero no por esso ha de ser humilde Mostrando assi que ha de ser valiente i alta Lo

mismo observa aun para su Orador dilatadamente el doctissimo Hermogenes en el Libro primero de sus

Ideas Dice pues en uno de muchos lugares Que es sin duda mui necessario que a la Perspicuidad

acompantildee la grande i elevada Alteccedila de la Oracion Pero nueva entiendo que ha de ser esta doctrina para

134

Obras propias y traducciones latinas griegas y Italianas de Fray Luis de Leoacuten prepara-

lhe a recepccedilatildeo e faz delas das obras que o volume recolhe elogiosamente exemplo de

virtude O procedimento natildeo dista do que faz Manuel de Galhegos ao ler Gabriel Pereira

de Castro ou do que faz Fernando de Herrera ao ler Garcilaso de la Vega Na epiacutestola

desde logo se afirma

la diccion es grande propia y hermosa con facilidad de tal casta que

ni se desautoriccedila con lo vulgar ni se haze peregrina con lo impropio

todo su estilo cotilde magestad estudiada es decente a lo magniacutefico de la

sentencia q ni ambiciosa se descubre fuera del cuerpo de la oraciotilde ni

tenebrosa se esconde mejor direacute q se pierde en la cotildefusioacuten afectada de

figuras y en la inũdacioacuten de palabras forasteras 396

a dicccedilatildeo eacute grande propria e bela com facilidade de tal espeacutecie que nem

se desautoriza com o vulgar nem se faz peregrina com o improprio

Todo seu estilo com majestade estudada eacute decente ao magniacutefico da

sentenccedila que nem ambiciosa se descobre fora do corpo da oraccedilatildeo nem

tenebrosa se esconde melhor direi que se perde na confusatildeo afetada de

figuras e na inundaccedilatildeo de palavras estrangeiras397

Isto seja eacute asserccedilatildeo do comedimento como propriedade da lexis como virtude

preciacutepua da dicccedilatildeo de poeta agrave maneira de Fray Luis de Leoacuten no juiacutezo de Francisco de

Quevedo apto a permanecer na exata medida que afasta o vulgar e o peregrino da

construccedilatildeo do ldquoestilo cotilde magestad estudiadardquo Inepto em contrapartida porque

considerado afetado nos termos da epiacutestola aduzida eacute o artiacutefice que se enleva no

desmedido da vulgaridade e da rareza em razatildeo do emprego enigmaacutetico de metaacuteforas ou

baacuterbaro de estrangeirismos Satildeo exemplos de ineacutepcia no passo de Aristoacuteteles relido por

aquellos miseros que torpemente profanos enturbian i obscurecen las fuentes puras i limpias de las Musas

por no ver en ellas representada su ignoratildecia Dos extremos oppuestos juzgaraacuten que aqui Aristoteles junta

Que fea Alto el character de el Stilo i juntamente Claro porque (como tambieacuten en el mismo lugar ensentildea

Hermogenes) Peligra mucho en ser debil la oracion que Clara es i Perspicuardquo cf Nueva ideia de la

tragedia antigua o Ilustracion ultima al libro singular De poetica de Aristoteles Estagirita por Don Iusepe

Antonio Gonccedilalez de Salas En Madrid Lo imprimio Franc Martinez Antildeo MDCXXXIII [1633] pp 83-84 396 Cf Obras propias y traducciones latinas griegas y Italianas Con la parafrasi de algunos Psalmos y

Capitulos de lob Sacadas de la libreriacutea de don Manuel Sarmiento de Mendoccedila Canonigo de la Magistral

de la santa Iglesia de Sevilla Dalas a la Impression don Francisco de Quebedo (sic) Villegas Imp del

Reyno (Viuda de Luis Saacutenchez) A costa de Domingo Gonccedilalez Madrid 1631 pp 2-3 397 Traduccedilatildeo nossa

135

Francisco de Quevedo Cleofonte e Esteacutenelo poetas traacutegicos gregos tidos por ineptos pelo

desmedido da lexis chatilde em gecircnero de poema a trageacutedia elevado Cleofonte refere-o

ademais Aristoacuteteles na Retoacuterica como exemplo de desproporccedilatildeo no emprego da lexis em

decorrecircncia da falta de conformidade (πρέπον) com a mateacuteria (πρᾶγμα) inventada visto

o poeta em vez da altiloquecircncia produzir o registro cocircmico por enunciar algo como

ldquopotnia sykērdquo (πότνια συκῆ) ou melhor ldquoveneraacutevel figueirardquo (cf ARISTOT Rhet 3 7

1408 a 12-16)

Pode-se supor o exemplo eacute paroacutedico como paroacutedicos satildeo os exemplos lidos no

opuacutesculo La cvlta latiniparla de Francisco de Quevedo Sabe-se o autor sob o

pseudocircnimo chistoso de ldquoAldrobando Anathema Cantacuceno graduado em trevas douto

em obscuras natural das soledades de baixordquo398 publicou em Valecircncia depois em

Zaragoza e entatildeo em Madri nos anos de 1629 1630 e 1631 posteriormente ao

falecimento de D Luiacutes de Goacutengora versotildees distintas do opuacutesculo que se consagraria

como La cvlta latiniparla cathecismo de vocablos para instruir agrave las mugeres Cultas y

Hembrilatinas399 saacutetira veemente e feroz ao emprego de palavras peregrinas na poesia de

imitaccedilatildeo gongoacuterica de damas cultas da corte espanhola pejorativamente referidas no

opuacutesculo como ldquoDamas gerigonccedilas que parlan el Alcoran Macarronicordquo

Ora conforme o Tesoro de la Lengua Castellana o Espantildeola de Sebastiaacuten de

Covarrubias Orozco por ldquogerigonzardquo ou ldquogerigonccedilardquo entende-se

vn cierto lenguaje particular de que vsan los ciegos cotilde que se entienden

entre si Lo mesmo tienen los Gitanos y tambien forman lengua los

rufianes y los ladrones que llaman Germania Dixose gerigonccedila quasi

gregigonccedila porque en tiempos passados era tan peregrina la lengua

Griega que aun pocos de los que professauan facultades la entendian

y assi deziatilde hablar Griego el que no se dexaua entender [hellip]400

398 Sobre as diferentes versotildees impressas do texto JAURALDE POU Pablo ldquoTexto fecha y circunstancias

de La Culta Latiniparla de Quevedordquo In Bulletin Hispanique Tome 83 ndeg 1-2 1981 pp 131-143 399 Hembralatino eacute adjetivo formado por composiccedilatildeo hembra (substantivo ldquofecircmeardquo) + latino (adjetivo)

Em portuguecircs trata-se de algo como ldquofemilatinordquo 400 Cf Tesoro de la Lengva Castellana o Espantildeola Compvesto por el licenciado D Sebastian de

Cobarruuias Orozco Capelan de su Magestade Mastrescuela y Canonigo de santa Iglesia de Cuenca y

consultor del santo Oficio de la Inquisicion Dirigido a la Magestad Catolica del Rey Don Felipe III nestro

sentildeor Con Privilegio En Madrid por Luis Sanchez impressor del Rey N S Antildeo del Sentildeor M DC XI

[1611] p 434v

136

uma certa linguagem particular que usam os cegos com que se

entendem entre si Isso tecircm os Ciganos e tambeacutem formam liacutengua os

rufiotildees e os ladrotildees que a chamam germania401 Disse-se gerinccedilonccedila

quase greguingonga porque em tempos passados era tatildeo peregrina a

liacutengua Grega que mesmo os poucos que professavam faculdades a

entendiam e assim diziam falar Grego aquele que natildeo se deixava

entender [hellip]402

Diga-se como equivalente semacircntico de ldquogermaniardquo ldquogerigonccedilardquo eacute acolhe

Sebastiaacuten de Covarrubias Orozco ldquoel lenguage de la rufianesca dicho assi o por q no

los entẽdemos o por la hermatildedad q entre si tienẽrdquo 403 (a linguagem da rufianesca dito

assim ou porque natildeo os entendemos ou pela irmandade que entre si tecircm) Entende-se

ldquogerigonccedilardquo eacute o falar difiacutecil de compreender eacute o jargatildeo eacute o calatildeo nas acepccedilotildees do Tesoro

de la Lengua Castellana o Espantildeola cujo emprego irmana no vitupeacuterio as vozes de

ciganos rufiotildees e ladrotildees plebeus em sociedade de corte de linguajar considerado

incompreensiacutevel por este noacutes majestaacutetico e normativo que desautoriza como viciosas e

vulgares as formas linguiacutesticas pensadas nos termos da Institutio oratoria de Quintiliano

(seacutec I dC) como desvios do costume isto eacute do consenso dos eruditos (QUINT Inst or

I 6 45 ldquoErgo consuetudinem sermonis uocabo consensum eruditorumrdquo) Para Francisco

de Quevedo entre estas vozes desviantes na inteligibilidade e na impropriedade da

convenccedilatildeo como viacutecio vulgar estaacute a das damas cultas de praacutetica de poesia gongoacuterica

cujas letras enunciam-se no opuacutesculo La cvlta latiniparla como ldquoAlcoran Macarronicordquo

Identificadas ao Alcoratildeo consoante a ortodoxia catoacutelica contrarreformista atualizada no

preceito em terras ibeacutericas no seacuteculo XVII essas letras supotildeem-se ldquomaldito librordquo assim

eacute definido o coacutedigo sagrado dos muccedilulmanos em Sebastiaacuten de Covarrubias Orozco404

supotildeem-se ldquoheresia poeacuteticardquo405 construiacuteda em ldquocerto lenguage compuesto de varias

lenguasrdquo (certa linguagem composta de vaacuterias liacutenguas) 406 como babeacutelica como

401 Entenda-se por ldquogermaniardquo em liacutengua portuguesa o calatildeo 402 Traduccedilatildeo nossa 403 Cf Tesoro de la Lengva Castellana o Espantildeola Compvesto por el licenciado D Sebastian de

Cobarruuias Orozco Capelan de su Magestade Mastrescuela y Canonigo de santa Iglesia de Cuenca y

consultor del santo Oficio de la Inquisicion Dirigido a la Magestad Catolica del Rey Don Felipe III nestro

sentildeor Con Privilegio En Madrid por Luis Sanchez impressor del Rey N S Antildeo del Sentildeor M DC XI

[1611] p 42v 404 Idem p 39r 405 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII p 335 406 Idem p 530r

137

monstruosa porque qualificado o alcoratildeo como macarrocircnico Recorde-se para Francisco

Cascales (1563-1642) D Luis de Goacutengora eacute ldquoMahoma de la poesiacutea espantildeolardquo (Maomeacute

da poesia espanhola)407

De modo que sejam vituperadas as damas de letras discretas e cultas como

vulgares obscuras ineptas e hereacuteticas Francisco de Quevedo sempre em chave de

desqualificaccedilatildeo emprega sintagmas como ldquomugeres Cultas y Hembrilatinasrdquo ou ldquobuena

culteranardquo Aiacute como em ldquocvlta latiniparlardquo trata-se de neologismo408 Ainda que se leiam

registrados os termos ldquoculteranismordquo ldquoculteranordquo ldquoculteriardquo ldquoculterordquo ldquocultiparlarrdquo e

ldquocultiparlistardquo no tomo II do Diccionario de autoridades editado em 1739 pela Real

Academia Espantildeola como eacute possiacutevel notar por dois desses exemplos

CULTERANO NA adj Lo que pertenece al hablar culto afectadamente

Es voz inventada y jocoacutesa Lat Affectati sermonis putidum studium

QUEV Cult Latinip Considerando con el pujo que los enamorados de

romance deletrean lo culterano de las damas que ahora hablan nublado

Ninguna culteraacutena de todos quatro vocablos ha de llamar al coche соche

CULTERANO NA Adj O que pertence ao falar culto afetadamente Eacute

voz inventada e jocosa Lat Affectati sermonis putidum studium QUEV

Cult Latinip Considerando com o desejo que os apaixonados do

romance soletram o culterano das damas que agora falam nublado

Nenhuma culterana de todos os quatro vocaacutebulos haacute de chamar agrave

carruagem carruagem 409

E tambeacutem

407 Cf MEDRANO J de E Apologeacutetico en favor de Don Luis de Goacutengora Edicioacuten anotada de Luis Jaime Cisneros Lima Universidad de San Martiacuten de Porres 2005 p 67 408 Diga-se os juiacutezos de letrados como Francisco de Quevedo tecircm usos que avanccedilam muito o tempo em

que se enunciam Almeida Garrett (1799-1854) no tratado Da educaccedilatildeo publicado em Londres em 1829

interessado na eleiccedilatildeo das leituras de jovens estudantes portugueses escreve que natildeo se deviam dar a eles

textos na liacutengua portuguesa de Gil Vicente nem ldquonrsquoestoutra algaravia de tarelos que natildeo eacute mais Portuguez

tampouco gafa de barbarismos e solecismos gallici-parla de cartazes de theatro de columnas de gazeta

ou de sermatildeo de preacutegador de fama na qual pelo comum eacute hoje escripto o mais do que em Portuguez se

escreverdquo (grifo meu) Nas notas de rodapeacute da ediccedilatildeo afirma-se que gallici-parla eacute termo cunhado por ldquoF

Man do Nascimentordquo por imitaccedilatildeo de Francisco de Quevedo Cf GARRETT A Da educaccedilatildeo Londres

Sustenance e Stretch 1829 pp 132-133 409 Traduccedilatildeo nossa

138

CULTIPARLAR v n Lo mismo que Hablar culto con afectacioacuten Es

voz festiva e inventada410

CULTIPARLAR v n O mesmo que Falar culto com afetaccedilatildeo Eacute voz

festiva e inventada 411

Ainda assim em princiacutepio do seacuteculo XVII esses termos em conformidade com

as categorias rememoradas por Joatildeo Adolfo Hansen ao expor doutrinariamente a poesia

de agudeza satildeo ldquoParole Finterdquo palavras fictas fingidas das quais Francisco de Quevedo

avesso agrave autoridade de D Luiacutes de Goacutengora da Faacutebula de Polifemo y Galatea (1612) das

Soledades (1613) faz uso para satirizar-lhe a obra poeacutetica culta e atacaacute-lo como poeta

obscuro e incongruente indigno de imitaccedilatildeo e emulaccedilatildeo412 Essas ldquoParole Finterdquo Il

Cannocchiale Aristotelico do conde Emanuele Tesauro (1592-1675) prescreve como

ldquointeramente fabricate dal nostro ingegno amp perciograve piugrave pellegrine che le Composite

benche piugrave barbarerdquo (inteiramente fabricadas por nosso engenho amp por isso mais

peregrinas que as Compostas ainda que mais baacuterbaras)413 No caso de Francisco de

Quevedo pois ldquohembrilatinordquo eacute adjetivo composto pela aglutinaccedilatildeo de hembra

(substantivo ldquofecircmeardquo) e latino (adjetivo) e culterano embora seja sabido que como

ldquoculteranismordquo se trate de termo que remonta aos usos de Lope de Vega (1562-1635)

semelhantemente eacute adjetivo composto pela aglutinaccedilatildeo de culto (adjetivo) e luterano

(adjetivo) No opuacutesculo satiacuterico este processo de aglutinaccedilatildeo mira jocosa e

pejorativamente condensar as criacuteticas ao uso poeacutetico de termos peregrinos estrangeiros

jaacute que o que dele decorre de acordo com Francisco de Quevedo eacute essa cvlta latiniparla

o ldquolenguage hermafroditordquo misto descomposto monstruoso afetado e ridiacuteculo em

410 Cf Diccionario de la lengua castellana en que se explica el verdadero sentido de las voces su

naturaleza y calidad con las phrases o modos de hablar los proverbios o refranes y otras cosas

convenientes al uso de la lengua [] Compuesto por la Real Academia Espantildeola Tomo primero Que contiene las letras AB Madrid Imprenta de Francisco del Hierro 1729 411 Traduccedilatildeo nossa 412 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 pp 328 334 413 Il cannocchiale aristotelico orsquo sia Idea dellrsquoarguta et ingeniosa elocutione che serue agrave tutta lrsquoarte

oratoria lapidaria et simbolica esaminata corsquo principii del diuino Aristotele dal conte D Emanuele

Tesauro Cavalier Gran Croce dersquo Santi Mauritio et Lazaro Quarta impressione Accresciuta dallrsquo Autore

Trattati cioegrave Dersquo Concetti Predicabili et Degli Emblemi con un nuouo Indice Alfabetico oltre agrave quello

delle materie Dedicato al Reuerendiss Padre Gio Paolo Oliva Vicario Generale della Compagnia di

Giesu In Roma agrave Spese di Guglielmo Halleacute Libraro nella Piazza di Pasquino M DC LXIV [1664] Con

licenza dersquo Superiori E Priuilegio p 312

139

decorrecircncia dos pressupostos excessos em castelhano do emprego de leacutexico raro

emprestado ao latim

Sabe-se o vitupeacuterio satiricamente construiacutedo mira a agudeza e o estilo gongoacuterico

dito culterano para aludir luterano poesia que ldquosoacute eacute clara quando queimadardquo propotildee

Francisco de Quevedo e assim hereacutetica numa analogia agraves praacuteticas inquisitoacuterias414 O

vitupeacuterio intenta mostrar na poesia gongoacuterica e em suas imitaccedilotildees o viacutecio porque a

considera aristotelicamente excessiva e por isso adoxal e afetada termo jaacute conhecido e

particularmente empregado na Arte poeacutetica de Francisco Joseacute Freire num capiacutetulo assim

denominado ldquoExtremos viciosos dos estilos contrapostos equiacutevocos paranomaacutesias

alusotildees e outras pestes condenadasrdquo415 A analogia agraves praacuteticas do Santo Ofiacutecio talvez

sem semelhanccedila para os leitores de hoje parece lugar-comum nesses tempos jaacute distantes

visto operar em termos afins num comentaacuterio de Manuel de Faria e Sousa ao soneto de

Camotildees ldquoAlma minha gentil que te partisterdquo O comentador mirando um passo do soneto

e referindo Garcilaso escreve

Y otros dizen que no saben que ay que comentar en Garcilasso porque

no se hallan clausulas endemoniadas quales las de Gongora y sus

imitadores como si en el hablar claro no se escondiesse misterio

ciencia y erudicion [hellip]416

E outros dizem que natildeo sabem que haacute o que comentar em Garcilaso

porque natildeo se acham claacuteusulas endemoniadas tais quais as de Goacutengora

414 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 p 335 HANSEN J A ldquoFecircnix

renascida amp Postilhatildeo de Apolo uma introduccedilatildeordquo pp 22-4 40 415 Recorde-se breve passagem da Arte poeacutetica de Francisco Joseacute Freire ldquoJusto o seraacute que depois de termos

tratado dos dous estilos poeacuteticos passemos a notar os extremos e viacutecios em que estaacute colocada a beleza

deles Pode pecar o estilo florido por parte do muito e o maduro por parte do pouco Ao primeiro viacutecio

chamamos afetaccedilatildeo de que jaacute tratamos ao segundo damos o nome de secura Um eacute excesso outro eacute falta

daquela maravilha e novidade da Mateacuteria ou do Artifiacutecio em que consiste a beleza poeacutetica Facilmente cai no primeiro defeito quem quer dizer tudo com substancial brevidade e agudeza espalhando em tudo

flores e aromas ou se empenha a discorrer com engenhosa escuridade para que os seus conceitos natildeo

sejam logo entendidos ou tambeacutem para que quem lecirc imagine neles o que natildeo haacute ou muito mais do que

haacuterdquo FREIRE F J Arte poeacutetica ou Regras da verdadeira poesia em geral e de todas as suas espeacutecies

principais tratadas com juizo critico Lisboa Na Officina de Francisco Luiz Ameno 1758 pp 162-3 416 Rimas varias de Luis de Camoens priacutencipe de los poetas heroycos y liricos de Espantildea Ofrecidas al

muy ilustre sentildeor D Ivan da Sylva Marquez de Gouvea presidente del Dezembargo do Paccedilo y mayordomo

mayor de la Casa Real ampc Comentadas por Manuel de Faria Y Sousa Cavallero de la Orden de Christo

Tomo I y II Que contienen la primera segunda y la terceira Centuria de los Sonetos Lisboa Con

Privilegio Real En la Imprenta de Theotonio Damaso de Mello Impressor de la Casa Real Con todas las

licencias necessarias Antildeo de 1685 p 55

140

e seus imitadores como se no falar claro natildeo se escondesse misteacuterio

ciecircncia e erudiccedilotildea [hellip]417

As gongoacutericas ldquoclausulas endemoniadasrdquo do comentarista satildeo causa do que soacute o

fogo contra o hereacuteticos aclara e expurga eacute o que o cruzamento das censuras propotildee

Sabe-se natildeo param aiacute as controveacutersias em torno da poesia de D Luis de Goacutengora418

Poreacutem naquilo que cabe ora mencionar pode ser relevante recuperar um breve trecho do

De ratione dicendi de Juan Luis Vives que Luiza Loacutepez Grigera recorda ao pensar a

recepccedilatildeo espanhola do corpo retoacuterico de Hermoacutegenes

Vetustissimae sunt periodi quae fiunt uel ex antithesis de quibus mox

loquemur uel acutegrave concluso argumento atque adeograve sunt quidam qui

acutegrave concinnata argumenta amp breviter conclusa amp contorte vibrata

eas demum veras periodos esse censeant ut Hermogenes419

Beliacutessimos satildeo os periacuteodos que se fazem ou de antiacuteteses dos quais logo

falaremos ou de argumentos agudamente arrematados E ademais haacute

alguns como Hermoacutegenes que julgam ser propriamente verdadeiros

periacuteodos os argumentos arranjados com agudeza e arrematados com

brevidade e tortuosamente movimentados420

Ora nem tudo eacute vitupeacuterio no ajuizamento de D Luis de Goacutengora Pode-se assim

dizer a ldquocvlta latiniparlardquo o ldquolenguage hermafroditordquo satildeo antes termos de figuraccedilatildeo do

eacutethos discursivo de Francisco de Quevedo que o estilo de D Luis de Goacutengora e seus

imitadores eacute antes a asserccedilatildeo do viacutecio de elocuccedilatildeo pela autoridade do nome Francisco de

Quevedo conforme o consensus eruditorum instituinte dos bons usos retoacutericos e poeacuteticos

eacute antes ficccedilatildeo de uma liacutengua como fictas as palavras satiacuterica proacutepria agraves censuras no

opuacutesculo La cvlta latiniparla de monstruosidade que se faz evidente sempre em chave

417 Traduccedilatildeo nossa 418 HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII p 336 419 VIVES J L Ioannis Ludouici Vivis Rhetoricae siue de recte dicendi ratione libri tres Eiusdem De

Consultatione liber I Basilea Balthasarem Lasiu[m] amp Thomam Platteru[m] 1536 p 48 LOacutePEZ

GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro p 77 VIVES J L El arte retoacuterica (De ratione

dicendi) Estudio introductorio de Emilio Hidalgo-Serna Edicioacuten traduccioacuten y notas de Ana Isabel

Camacho Barcelona Anthropos Editorial 1988 pp 58-9 420 Traduccedilatildeo nossa

141

de vitupeacuterio mediante exemplos tais quais os que seguem endereccedilados agraves damas cultas

aos poetas agrave maneira gongoacuterica por este tambeacutem fictiacutecio Aldrobando Anathema

Cantacuceno

A su marido por el hastio que causa el tal nombre le llamaragrave

mi Quotidie mi siempre y agrave egravel se le dexa su sempiterna agrave salvo para

quando nombre su muger

Si se ofreciere dezir que despavilen las velas diragrave suena catarro

luciente excita esplendores pantildeiccediluela de corte

Quando llamare agrave las criadas no diga ola Gomez ola Sanchez

sino unda Gomez unda Sanchez que unda y ola son lo propio y ellas

aunque no lo entienden en Latin lo obedecen en Romance pues lo

unden todo

Si huviere de mandar que la compren un capon ograve que se le asen ograve que

se le embien que es lo mas possible no le nombre por escusar la

compassion de lo que le acuerda llamele desgallo ograve tiple de pluma

Para dezir caldo substancial diragrave Licor quiditativo

A las revanadas de pan llamaragrave planicies

Y porque la palabra gota es muy facinorosa y para los oyentes abunda

de cosquillas si se ofreciere dezir deme una gota de agua ograve deme dos

gotas de vino diga Denme una podagra de agua oacute denme dos

podagras de vino

Al ntildeudo ciego llamaragrave ntildeudo rezante

Al queso ceciza de leche

Al escudero llamaragrave manipulo421

A seu marido pelo fastio que causa tal nome o chamaraacute

ldquomeu quotidierdquo422 ldquomeu semprerdquo e a ele deixa-lhe sua sempiterna a

salvo para quando nomear sua mulher

Se se dispuser a dizer que ldquoapaguem as velasrdquo diraacute ldquoassoe o catarro

luzenterdquo ldquoexcite esplendoresrdquo ldquolencinho de corterdquo

421 Cf Obras de D Francisco de Quevedo Villegas Cavallero de la Orden de Santiago Sentildeor de la Villa

de la Torre de Juan Abad Dedicadas a la muy ilustre Academia de los Deconfiados da la Excelentissima

Ciudad de Barcelona Parte Primera Barcelona Por Jaime Suriagrave 1702 pp 206-207 422 Eacute adverbio latino de tempo ldquotodos os diasrdquo ldquocada diardquo ldquoquotidianamenterdquo

142

Quando chamar as criadas natildeo diga ldquoOla Gomezrdquo ldquoOla Sanchezrdquo

mas ldquoUnda Gomezrdquo ldquoUnda Sanchezrdquo porque ldquoundardquo e ldquoolardquo satildeo o

proacuteprio e elas ainda que natildeo tenham conhecimento de latim obedecem

em Romance pois ondeam todos

Se tiver de mandar que comprem um capatildeo423 ou que o assem ou que

lhe enviem um que eacute o mais possiacutevel natildeo o nomeie por escusar a

compaixatildeo do que lhe acorda chame-o ldquodesgalordquo 424 ou ldquotiple de

plumardquo425

Para dizer caldo substancial diraacute ldquoLicor quiditativordquo

Agraves fatias de patildeo chamaraacute ldquoplaniacuteciesrdquo

E porque a palavra ldquogotardquo eacute muito facinorosa e para os ouvintes

abunda em coacutecegas se se dispuser a dizer ldquoDecirc-me uma gota de aacuteguardquo

ou Decirc-me duas gotas de vinhordquo diga ldquoDecirc-me uma podagra de aacuteguardquo ou

ldquoDecirc-me duas podagras de vinhordquo426

Ao noacute cego chamaraacute ldquonoacute rezanterdquo

Ao queijo ldquocharque de leiterdquo

Ao escudeiro chamaraacute ldquomaniacutepulordquo427

Francisco de Quevedo faz troccedila de procedimentos que tratados de retoacuterica de

poeacutetica e de gramaacutetica classificam como viciosos pelo julgamento da inadequaccedilatildeo da

afetaccedilatildeo e do disparate no uso do estrangeirismo (ldquomeu quotidierdquo ldquoUnda Gomezrdquo

ldquoUnda Sanchezrdquo ldquomaniacutepulordquo ou ldquopodragardquo) do neologismo (ldquodesgalordquo) e da metaacutefora

(ldquomeu semprerdquo ldquoassoe o catarro luzenterdquo ldquoexcite esplendoresrdquo ldquopantildeiccediluela de corterdquo

ldquotiple de plumardquo ldquoLicor quiditativordquo ldquoplaniacuteciesrdquo ldquonoacute rezanterdquo ou ldquocharque de leiterdquo)

Reitere-se a citada epiacutestola do poeta a Gaspar de Guzmaacuten que abre as Obras propias y

traducciones latinas griegas y Italianas de Fray Luis de Leoacuten configura-se como

discurso de autoridade428 Francisco de Quevedo para configuraacute-la apela par a par a

423 Isto eacute um frango capado e abatido para alimentaccedilatildeo 424 Francisco de Quevedo constroacutei um neologismo e para isso apotildee o prefixo des- em sentido de negaccedilatildeo

ou de falta ao substantivo ldquogallordquo donde ldquodesgallordquo e em portuguecircs ldquodesgalordquo como construccedilatildeo

motivada do signo linguiacutestico em referecircncia ao frango capado 425 ldquoTiplerdquo eacute a voz mais aguda a voz soprano Escolho ldquoplumardquo e natildeo ldquopenardquo por manter a repeticcedilatildeo do

grupo consonantal pl e por optar pelo mais raro dos termos 426 ldquoPodagrardquo eacute gota que ataca os peacutes em latim podagra em grego ά 427 Traduccedilatildeo nossa 428 Cf Obras propias y traducciones latinas griegas y Italianas Con la parafrasi de algunos Psalmos y

Capitulos de lob Sacadas de la libreriacutea de don Manuel Sarmiento de Mendoccedila Canonigo de la Magistral

de la santa Iglesia de Sevilla Dalas a la Impression don Francisco de Quebedo (sic) Villegas Imp del

Reyno (Viuda de Luis Saacutenchez) A costa de Domingo Gonccedilalez Madrid 1631 p 2

143

Aristoacuteteles ao Pseudo-Demeacutetrio de Falero referido em versatildeo latina de Stanislaus Ilovius

estampada em 1557429 a Horaacutecio acrescido da traduccedilatildeo espanhola de Vicente Espinel 430

429 O passo do Peri hermēneias eacute citado por Francisco de Quevedo em latim e depois em castelhano Leia-

se ldquoDictionem autem in hac figura orationis exquisitam et immutatam nec nimis vulgarem oportet esse

sic enim amplitudinem et dignitatem habebit Propria autem et usitata dictio dilucida quidem semper est

verum hoc ipso facile contemnitur Primum igitur translationibus est utendum (hae enim vel maxime et

voluptatem et amplitudinem conferunt orationibus) non tamen crebris et frequentibus alioquin

dithirambos loco orationis scribemus neque longe petitis sed ex ipsa re et ex simile sumptis lsquoConviene

que sea la diccioacuten en esta figura de oracioacuten exquisita inmutable y no demasiadamente vulgar asiacute tendraacute

amplitud y dignidad Pero la diccioacuten propia y usada siempre es diluacutecida pero por eso se desprecia

faacutecilmente Lo primero se ha de usar de translaciones porque estas dan autoridad y ser a la oracioacuten mas no han de ser frecuentes de otra suerte en lugar de oracioacuten haremos ditirambos Y no se han de buscar de

cosas remotas sino de las propincuas y semejantesrsquordquo

Eacute interesante notar que a traduccedilatildeo latina do texto natildeo eacute a de Pietro Vettori Francisco de Quevedo segundo

Antonio Azaustre Galiana lecirc a versatildeo para o latim da Basileia de 1557 de Stanislaus Ilovius Demetrii

Phalerei De elocvtione liber a Francisco Maslovio Polono in latinum conuersus amp ab eodem obscuriorum

locorum explicationibus illustratus cf GALIANA A A ldquoCuestiones de poeacutetica y retoacuterica en los

preliminares de Quevedo a las poesiacuteas de fray Luis de Leoacutenrdquo La Perinola 7 (2003) p 73 Natildeo pude

consultar esta ediccedilatildeo A liccedilatildeo de Pietro Vettori do mesmo passo eacute a seguinte ldquoLocutionem autem in nota

hac eximiam esse oportet amp immutatam amp extra consuetudinem magis sic enim habebit tumorem propria

autem amp ex consuetudine locutio plana quidem semper erit amp hac de causa abiecta Primum igitur

translationibus vtendum est hae nanque maxime et voluptatem adportant orationi amp magnitudinem non tamen crebris quia dithyrambum pro oratione scribimus neque tamen translatis sed ex se amp ex similisrdquo

cf Petri Victorii commentarii in librum Demetrii Phalerei de elocutione Positis ante singulas declarationes

Graecis vocibus Auctoris ijsdemque ad verbum Latine expressis Additus est rerum et verborum

memorabilium index copiosus Cum P II IIII Pont Max Cosmi Medicis Florentianorum Senensiumq Ducis

ampAlphonsi Ferrariensium Ducis privilegijs ampliszlig per decennium Florentiae In officina Iuntarum

Bernardi F MDLXII [1562] pp 75-5

Em grego lecirc-se o seguinte ldquoΤὴν δὲ λέξιν ἐν τῷ χαρακτῆρι τούτῳ περιττὴν εἶναι δεῖ καὶ ἐξηλλαγμένην καὶ ἀσυνήθη μᾶλλον οὕτω γὰρ ἕξει τὸν ὄγκον ἡ δὲ κυρία καὶ συνήθης σαφὴς μέν λειτὴ δὲ καὶ εὐκαταφρόνητος Πρῶτα μὲν οὖν μεταφοραῖς χρηστέον αὗται γὰρ μάλιστα καὶ ἡδονὴν συμβάλλονται τοῖς λόγοις καὶ μέγεθος μὴ μέντοι πυκναῖς ἐπεί τοι διθύραμβον ἀντὶ λόγου γράφομεν μήτε μὴν πόρρωθεν μετενηνεγμέναις ἀλλ αὐτόθεν καὶ ἐκ τοῦ ὁμοίου []rdquo (cf DEMETR 2

77-8) Observe-se a traduccedilatildeo do passo em versatildeo em liacutengua portuguesa ldquoPor fim o vocabulaacuterio para esse

tipo de estilo deve ser raro com termos que fogem ao sentido habitual e ao costume pois desse modo

teraacute volume Se o vocabulaacuterio proacuteprio com o qual se estaacute acostumado eacute sempre claro em compensaccedilatildeo eacute

tambeacutem modesto Primeiramente entatildeo deve-se fazer uso das metaacuteforas pois as mesmas contribuem

sobretudo para dar prazer e a grandeza ao discurso No entanto natildeo se deve usaacute-las com frequumlecircncia uma vez que ao inveacutes de um discurso estaremos escrevendo um ditirambo Nem se deve forccedilaacute-las partindo de

uma relaccedilatildeo muito distante pelo contraacuterio elas devem ser espontacircneas e partir de uma semelhanccedilardquo cf

FREITAS G A DE Sobre o Estilo de Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo e

estudo introdutoacuterio do tratado) Satildeo Paulo [UFMG] 2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p XIX-XX 430 ldquoVir bonus et prudens uersus reprehendet inertis culpabit duros incomptis adlinet atrum transuorso

calamo signum ambitiosa recidet ornamenta parum claris lucem dare cogetrdquo (HOR AP 445-8)

Francisco de Quevedo acrescenta ao texto latino a seguinte versatildeo ldquoEl varon bueno y de prudente pecho

Los versos duros libremente culpa Los que carecen de arte reprehende A los mal adornados con a

pluma Vna negra sentildeal los pone encima La demasia de ornamento corta Los poco claros manda que

se aclarenrdquo cf Diuersas rimas de Vicente Espinel con el Arte Poetica y algunas Odas de Oracio

traduzidas en verso Castellano Madrid Por Luis Sanchez 1591 p 165-6

144

a Quintiliano431 e a Antocircnio Lulio432 leitor de Hermoacutegenes de modo a referendar o juiacutezo

criacutetico que natildeo apenas elogia e defende o saber-fazer poeacutetico de Fray Luis de Leoacuten mas

tambeacutem vitupera e condena a poesia culta agrave maneira gongoacuterica

Conforme Hermoacutegenes metaacuteforas desse feitio compotildeem-se para aleacutem dos limites

da moderaccedilatildeo Entenda-se o Peri ideōn inscreve o emprego das tropikai lexeis (cf HERM

248 9-10 ldquordquo) isto eacute das palavras metafoacutericas ldquole parole riuolterdquo na

traduccedilatildeo de Giulio Camillo Delminio433 entre os expedientes que perfazem a semnotēs

que concorrem para a composiccedilatildeo do megethos no discurso Alerta Hermoacutegenes no

entanto que o artiacutefice mirando matizar a saphēneia por intermeacutedio da lexis pode incorrer

em desmesuras que fazem aacutespero o logos (cf HERM 248 16-17) Note-se por ldquofazer

aacutesperordquo compreende-se o verbo trakhynō (τραχύνω) eacute membro de famiacutelia lexical que

abarca o substantivo ldquotrakhytēsrdquo (aspereza) e o adjetivo ldquotrakhysrdquo (aacutespero)

Propotildee o retor grego como exemplo de metaacutefora bem-medida um passo de

Demoacutestenes ldquotēn agathēn proballomenous elpidardquo (DEM Cor 18 97

431 Francisco de Quevedo menciona Quintiliano em dois passos (i) ldquoDe todo esto se asegura quien ama la

propiedad y la luz y la escribe y las razona Severo censor es Quintiliano y en el libro 8 de sus Instituciones

capiacutetulo 3 alaba en Virgilio lo que un mal culto usurpador deste buen renombre arrojara por bajo y

asqueroso Virgilio en la Geoacutergica libro 4 Saepe exiguus mus lsquoMuchas veces el pequentildeo ratoacutenrsquo Pondera

el severo Fabio Nam epitheton exiguus aptum proprium efficit ne plus expectaremus et casus singularis

magis decuit et clausula ipsa unius sylabae non usitata addit gratiam Imitatus est utrumque Horatius

Nascetur ridiculus mus lsquoPorque el epiacuteteto pequentildeo acomodado y propio previene para que no esperemos

maacutes y el caso singular fue maacutes conveniente y la claacuteusula de una siacutelaba antildeadioacute gracia Las dos cosas imitoacute Horacio Naceraacute el ridiacuteculo ratoacutenrsquordquo [cf QUINT 8 3 20] (ii) ldquoHoy sentildeor por no decir lo que sin asco ni

escruacutepulo es liacutecito hay algunos que dicen lo que es torpe y abominable Quintiliano lo ensentildea Obscena

vitabimus et sordida et humilia [cf QUINT 8 2 2] Y en el propio libro 8 capiacutetulo 2 acusa a estos que ni

saben dejar ni escoger Nec video quare clarus orator duratos muria pisces nitidius esse crediderit quam

ipsum id quod vitabat lsquoNi veo por queacute el claro creyoacute era mejor decir los peces con la muria que lo mismo

que queriacutea decirrsquordquo [cf QUINT 8 2 3] 432 De Antonio Lulio dito Lullio Francisco de Quevedo cita o seguinte passo seguido de versatildeo castelhana

ldquoAc de claritate quidem principio dicendum videtur quae prima semper et maxima virtus existimata est

orationis Hanc alii puritate et castimonia quadam dictionis assequntur alii explanatione seu distinctione

et elegantia alii demun evidentia et subjectione eorum ab oculos quae dicuntur lsquoLo primero diremos de

la claridad que siempre es la primera y la mayor virtud de la oracioacuten Eacutesta unos la alcanzan con cierta pureza y castidad de las dicciones otros con la explicacioacuten distincioacuten y elegancia otros finalmente con

la evidencia y poniendo delante de los ojos lo que dicenrsquordquo Lecirc-se o capiacutetulo 2 do libro VI dos Antonii Lulli

Balearis de Oratione Libri Septem Quibus non modograve Hermogenes ipse totus uerumetiam quicquid feregrave agrave

reliquis Graecis ac Latinis de Arte dicendi tratactũ est suis locis aptissimagrave explicatur Accessit etiam

locupletiss Rerum amp uerborum toto hoc Opere memorabilium Index Basileae [ex officina Ioannis

Oporini impensis Henrici Petri] [Anno Salutis humanae 1558] p 426 433 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 10v

145

ldquoτὴν ἀγαθὴν προβαλλομένους ἐλπίδαrdquo434) ldquoproponendosi vna buona speranzardquo para

Giulio Camillo Delminio 435 ldquoprojecting good hopesrdquo para Cecil W Wooten 436

ldquoArrojando buenas esperanzasrdquo para Consuelo Ruiz Montero437 ldquogardant devant les yeux

espeacuterance du succegravesrdquo para Michel Patillon 438 Na avaliaccedilatildeo de Hermoacutegenes eacute tatildeo

mesurada a metaacutefora que pouco se nota a translaccedilatildeo no sentido do particiacutepio

ldquoproballomenousrdquo (cf HERM 248 14-15) Prevecirc o preceito que seja trakhys o discurso

em vez de semnos se desmedido O exemplo tambeacutem proveacutem de Demoacutestenes ldquohai de

poleis enosounrdquo (DEM Cor 18 45 ldquoαἱ δὲ πόλεις ἐνόσουνrdquo) ldquole cittagrave erano infermerdquo

para Giulio Camillo Delminio439 ldquothe cities were sickrdquo para Cecil W Wooten 440 ldquoLas

ciudades estaban enfermasrdquo para Consuelo Ruiz Montero441 ldquomais les Etats eacutetaient

maladesrdquo para Michel Patillon442 Segundo Hermoacutegenes trata-se de metaacutefora que carece

de explicaccedilatildeo e a explicaccedilatildeo lecirc-se no seguimento do discurso de Demoacutestenes

Evidentemente o retor natildeo rechaccedila a aspereza da metaacutefora ou as metaacuteforas

convencionadas como aacutesperas mas na regulaccedilatildeo da efetuaccedilatildeo da semnotēs marca limites

na construccedilatildeo da dicccedilatildeo metafoacuterica para aleacutem dos quais os efeitos satildeo outros

Eacute pressuposto de Hermoacutegenes que tanto mais desmedidas as metaacuteforas mais

cerradas tanto mais duro () o logos (cf HERM 248 21-22) Haacute riscos de

434 Na traduccedilatildeo portuguesa novecentista de Joseacute Maria Latino Coelho ldquoanimados pela esperanccedilardquo cf

DEMOSTHENES A oraccedilatildeo da coroa Versatildeo no original grego precedida de um estudo sobre a civilisaccedilatildeo

da Grecia por J M Latino Coelho Segunda ediccedilatildeo da Academia Real das Sciencias de Lisboa Lisboa

Typographia da Academia 1880 p 32 435 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 10v 436 Cf HERMOGENES Hermogenesrsquo on types of style Translated by Cecil W Wooten Chapel Hill

University of North Carolina Press 1987 p 22 437 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 p 134 438 Cf HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel

Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 352 439 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 10v 440 Cf HERMOGENES Hermogenesrsquo on types of style Translated by Cecil W Wooten Chapel Hill

University of North Carolina Press 1987 p 22 441 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 p 134 442 Cf HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel

Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 352

146

que se torne mais espesso mais pesado (cf HERM 248 24 ldquoπαχύτερονrdquo) e mais vulgar

(cf HERM 248 25 ldquoεὐτελrdquo) Conforme o Peri ideōn assim acontece com os

sofistas a quem se atribui afirmar que os ldquoabutresrdquo (ldquoVoltoirdquo em Giulio Camillo

Delminio) sejam ldquosepulcros animadosrdquo (ldquosepolchri animatirdquo 443) (cf HERM 249 2)444 O

mesmo exemplo sabe-se eacute lido no Peri hypsous do Pseudo-Longino atribuiacutedo a Goacutergias

de Leontinos (cf LONGIN 3 2 ldquoγῦπες ἔμψυχοι τάφοιrdquo) Na avaliaccedilatildeo de Hermoacutegenes

a metaacutefora eacute fria445 e compreende-se como desvio na composiccedilatildeo elocutiva da grandeza

No Peri heureseōs a liccedilatildeo que se julga de Hermoacutegenes preceitua a semnotēs como

atributo de pensamento e de estilo (aqui e natildeo ) necessaacuterio ao discurso

que se estenda sobre mateacuteria de natureza divina e assemelhada tal como ilustra o exemplo

proveniente de Platatildeo ldquoZeus o guia supremo abre marcha no ceacuteu com seu carro aladordquo

(cf PLAT Phaedr 246 e)446 Tambeacutem eacute atributo do discurso cuja torpeza de pensamento

(cf HERM 201 1-2 ldquoτὸ νοούμενον αἰσχρῶrdquo) seja enobrecida pela elocuccedilatildeo isto eacute

mediante ldquoreferecircncias difusasrdquo os termos satildeo de Michel Patillon447 decorrentes do uso

de vocaacutebulos semnoi em vez de vulgares de alusotildees ou de omissotildees por meio das quais

o artiacutefice possa fazer natildeo parecer torpe a mateacuteria torpe (cf HERM 201 14-202 2)

Ademais semnos eacute o verso heroico de acordo com o Peri hermēneias Ensina o

corpo doutrinaacuterio atribuiacutedo a Demeacutetrio de Falero que a mateacuteria grandiosa ()

oferece ocasiatildeo (καιρός) para a composiccedilatildeo do colo () longo sabe-se bem para o

alongamento dos membros que compotildeem os periacuteodos pois que explica-se elevam-se os

discursos com a amplitude dos colos Em razatildeo disso explicita o tratadista em traduccedilatildeo

recente ldquotambeacutem o hexacircmetro por sua extensatildeo eacute denominado heroico e conveacutem aos

heroacuteisrdquo (διὰ τοῦτο καὶ ἑξάμετρον ἡρῷόν τε ὀνομάζεται ὑπὸ τοῦ μήκους καὶ πρέπον

ἥρωσιν) donde ldquoconvenientementerdquo (πρεπόντως) Homero natildeo tenha escrito a Iliacuteada

443 Cf HERM 249 2 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in

questa lingua per M Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di

Virgilio spiegato dal detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico

Salomoni Al Sigr Andrea Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico

amp con pena di scommunica Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio

Battista Natolini p 11r 444 Cf HERM 249 2 ldquoτάφουἐμψχου το γῦπς rdquo 445 O verbo grego eacute ψυχρεύομαι (cf HERM 249 3-4) 446 Cf A liccedilatildeo do Fedro eacute a seguinte ldquoὁ μὲν δὴ μέγας ἡγεμὼν ἐν οὐρανῷ Ζεύς ἐλαύνων πτηνὸν ἅρμαrdquo

A traduccedilatildeo do grego eacute de Carlos Alberto Nunes PLATAtildeO Fedro Φαῖδρος 3ordf ed revisada e biliacutengue

Beleacutem edufpa 2011 p 211 447 Cf HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel

Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 309

147

com os versos breves de um Arquiacuteloco ou de um Anacreonte (cf DEMETR 5) Entenda-

se o ritmo heroacuteico eacute ldquonobre e natildeo prosaico mas sonorordquo

(ldquoσεμνὸς καὶ οὐ λογικός ἀλλrsquo ἠχώδηςrdquo cf DEMETR 42 cf tambeacutem ARISTOT Rhet III

8 4 1408b 35) e mais o hexacircmetro deve-se evitaacute-lo quando se mira a composiccedilatildeo do

kharaktēr discursivo dito iskhnos isto eacute tenuis consoante a glosa em latim do

comentador florentino Pietro Vettori (1499-1585) 448 porque acrescenta o Pseudo-

Demeacutetrio toda extensatildeo eacute ldquograndiosardquo (μεγαλοπρεπής) (cf DEMETR 204) Em vulgar

sabe-se preceitua-se como equivalente do hexacircmetro o chamado verso italiano o

hendecassiacutelabo449 Eacute o metro da Ulyssea ou Lisboa Edificada de Gabriel Pereira de

448 Petri Victorii commentarii in librum Demetrii Phalerei de elocutione Positis ante singulas

declarationes Graecis vocibus Auctoris ijsdemque ad verbum Latine expressis Additus est rerum et

verborum memorabilium index copiosus Cum P II IIII Pont Max Cosmi Medicis Florentianorum

Senensiumq Ducis ampAlphonsi Ferrariensium Ducis privilegijs ampliszlig per decennium Florentiae In

officina Iuntarum Bernardi F MDLXII p 181 449 A questatildeo eacute interessantiacutessima por isso insiste-se na nota digressiva natildeo haacute duacutevida de que nos seacuteculos

XVI e XVII o verso heroico eacute hendecassiacutelabo Sabe-se bem data dos seacuteculos XVIII e XIX a preceituaccedilatildeo

em liacutengua portuguesa da praacutetica de versificaccedilatildeo hoje ensinada nas escolas que desconsidera as siacutelabas aacutetonas pospostas agrave uacuteltima siacutelaba tocircnica do verso Para recordar essa preceituaccedilatildeo haacute dois tratados a

observar

(i) Em Lisboa em 1784 publicou-se o Tratado da versificaccedilaotilde portugueza de Miguel do Couto Guerreiro

(1720-1793) Este tratado metrificado em muitos de seus passos no que aqui se considera ensina na regra

IX de metrificaccedilatildeo ldquoContando ateacute o acento dominante (Que basta para o Verso ser constante) Dez

syllabas o Heroico inteiro tem A sexta muito aguda lhe convemrdquo (p 6) Ou seja Miguel do Couto

Guerreiro ensina a contagem de siacutelabas poeacuteticas ateacute a uacuteltima siacutelaba tocircnica do verso e natildeo ateacute a uacuteltima siacutelaba

do verso donde se faccedila a afirmaccedilatildeo de que ldquoDez syllabas o Heroico inteiro temrdquo Agrave guisa de exemplo

Miguel do Couto Guerreiro cita Camotildees ldquoAs Armas e os Varoẽs assinaladosrdquo e conclui tratar-se de um

heroico inteiro grave isto eacute de um verso que termina em palavra paroxiacutetona e que se conta apenas ateacute a

paroxiacutetona por isso decassiacutelabo cf Tratado da versificaccedilaotilde portugueza dividido em tres partes A

primeira conteacutem hum brevissimo Compendio das regras mais praticaveis da Metrificaccedilaotilde a segunda hum amplissimo Diccionario de consoantes e a terceira Instrucccedilotildees para a perfeita Poetica Offerecido ao

Exmo Ermo Senhor D Domingos Joseph de Assis Mascarenhas Principal da Santa Igreja Patriarcal de

Lisboa do Conselho de sua Magestade ampc ampc ampc Por seu author Miguel do Couto Guerreiro Lisboa

Na Of Patr de Francisco Luiz Ameno MDCCLXXXIV [1784] Com licenccedila da Real Mesa Censoria

(ii) Anos depois em 1851 Antocircnio Feliciano de Castilho (1800-1875) publicou o Tratado de metrificaccedilatildeo

portugueza em que referenda a praacutetica de Miguel do Couto Guerreiro e afirma ldquo[] advertimos que noacutes

contamos por syllabas de um metro as que nelle se proferem ateacute aacute ultima aguda ou pausa e nenhum caso

fazemos da uma ou das duas que ainda se possam seguir pois chegado accento predominante jacirc se acha

preenchida obrigaccedilatildeo nisto nos desviamos da pratica geral que eacute designar o metro contando lhe mais uma

syllaba para aleacutem da pausa donde veio chamarem endecassyllabo ou de onze syllabas ao heroico a que noacutes

chamamos decassyllabo ou de dez syllabasrdquo Antocircnio Feliciano de Castilho cita o verso de Camotildees citado por Miguel do Couto Guerreiro e faz anaacutelise semelhante cf Tratado de metrificaccedilatildeo portugueza para em

pouco tempo e ate sem mestre se aprenderem a fazer versos de todas as medidas e composiccedilotildees obra

aprovada pelo Conselho de Instrucccedilatildeo Publica do Reino para uso das escolas Auctor A F de Castilho

Presidente Honoraacuterio da Sociedade dos Amigos das Lettras e Artes em S Miguel Fundador das escolas de

Leitura repentina na mesma ilha etc etc etc Lisboa 1851 p 18-9 36-7

O cocircnego Joaquim Caetano Fernandes Pinheiro (1825-1876) professor de retoacuterica poeacutetica e literatura

nacional no Imperial Coleacutegio Pedro II no Rio de Janeiro no ano em que publicou o opuacutesculo ldquoFormaccedilatildeo

da Literatura Brasileirardquo (1862) publicou tambeacutem o Curso Elementar de Literatura Nacional Nesta obra

a despeito das liccedilotildees de Miguel do Couto Guerreiro ou de Antocircnio Feliciano de Castilho versos de Manuel

Inaacutecio da Silva Alvarenga (1749-1814) como ldquoDriacuteade tu que habitas amorosardquo satildeo ditos hendecassiacutelabos

como o satildeo segundo o cocircnego os versos de Joseacute Basiacutelio da Gama (1740-1795) nrsquoO Uraguai (1769) cf

148

Castro drsquoOs Lusiacuteadas de Luiacutes de Camotildees e da Gerusalemme liberata de Torquato

Tasso

Relativamente agrave eleiccedilatildeo do termo a verter ldquosemnotēsrdquo haacute divergecircncias entre as

traduccedilotildees quinhentistas e seiscentistas de Hermoacutegenes Paolo Aresi no DellrsquoArte di

Predicar Bene o explicita

La terza [idea del dire] in greco egrave chiamata amp egrave variamente

tradotta Antonio Buonfine tradusse Venustagrave Giulio Camillo Grauitaacute

e Seueritagrave il proprio egrave Grauitagrave e Maestagrave degna di Veneratione onde

non male altri tradussero dignitagrave amp egrave lrsquoistessa che la Nota Magnifica

appresso Demetrio amp egrave la prima specie della grandezza 450

A terceira [ideia] em grego eacute chamada semnotēs amp eacute variamente

traduzida Antocircnio Bonfine traduziu por Venustagrave Giulio Camillo por

Gravitaacute e Severitagrave Ela propria eacute Gravitagrave e Maestagrave digna de veneraccedilatildeo

donde natildeo mal outros traduziram por dignitagrave amp eacute a mesma que a Nota

Magniacutefica em Demeacutetrio amp eacute a primeira espeacutecie de Grandeza451

Ora eacute maestagrave ou dignitagrave em Filiberto Campanile452 O substantivo ldquograuitasrdquo e

o adjetivo ldquograuisrdquo interpretam em latim os vocaacutebulos ldquosemnotēsrdquo e ldquosemnosrdquo no De

PINHEIRO Joaquim Caetano Fernandes Historiografia da Literatura Brasileira textos inaugurais Organizaccedilatildeo apresentaccedilatildeo e notas por Roberto Aciacutezelo de Souza Rio de Janeiro EdUERJ 2007 p 115

128

Nesse sentido vale ressaltar na praacutetica de metrificaccedilatildeo natildeo distam os usos de Domingos

Joseacute Gonccedilalves de Magalhatildees (1811-1882) conforme a ldquoAdvertecircnciardquo agrave ediccedilatildeo de 1864 drsquoA Confederaccedilatildeo

dos Tamoyos (1856) Aiacute se lecirc ldquoO poema epico encerrando em siacute todos os generos de poesia e sendo a

composiccedilatildeo mais longa e difficil do espirito humano exaltado pela inspiraccedilatildeo devera talvez adoptar todas

as foacutermas poeticas para melhor exprimir a parte heroica a lyrica a tragica a didactica a discriptiva e a

dialogica mas prevalecendo em quasi todas as Naccedilotildees de origem latina o emprego exclusivo do

hendecasyllabo na epopeacutea como o mais energico e o mais susceptivel de variar de cadencia sem ser preciso

alterar a simplicidade da foacuterma para que submettel-o ao compasso uniforme de periodos iguaes e ligal-o

com essa barbara toada das ultimas syllabas consoantes [] Aacute majestade da epopeacutea como aacute seriedade da tragedia soacute convecircm o hendecasyllabo livre da facecia da rima e do compasso monoacutetono de periodos iguaes

[]rdquo MAGALHAtildeES Domingos Joseacute Gonccedilalves de drsquoA Confederaccedilatildeo dos Tamoyos Rio de Janeiro

Livraria de B L Garnier 1864 p xiv xv 450 Cf DellrsquoArte di predicar bene diuisa in due parti Nella quale oltre agraversquo precetti dersquo retori agrave questo

proposito applicati di danno nuoue regole per tesserordinatamente vna predica con vn trattato della

memoria amp vnrsquoaltro della imitatione e con alcune osseruationi retoriche sopra vna predica in lode di S

Tomaso dAquino DI MONSIG PAOLO ARESI PARTE SECONDAhellip In MIL Per Gio Batt Bidelli

1627 p 197 451 Traduccedilatildeo nossa 452 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 31

149

dicendi generibus sive formis orationum de Johannes Sturm (1571) 453 Eleiccedilatildeo vocabular

semelhante embora controversa em italiano faz Giulio Camillo Delminio no tratado de

Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene (1594) trata-se de grauitate ou de

seueritate 454 Eleiccedilatildeo controversa porque na mesma obra grauitate verte tambeacutem

deinotēs455 Em fins do seacuteculo XVIII Jerocircnimo Soares Barbosa (1737-1816) professor

de Eloquecircncia e Poesia da Universidade de Coimbra nas Instituiccedilotildees oratorias de M

Fabio Quintiliano (1788 e 1790) ao referir a preceituaccedilatildeo de Hermoacutegenes define a

em caracteres gregos como ldquoGravidaderdquo456 Como se veraacute o latim ldquograuitasrdquo

e as formas vernaculares posteriores que lhe sejam etimologicamente familiares como

ldquogravidaderdquo desde Jorge de Trebizonda soem traduzir natildeo semnotēs mas deinotēs

Avizinha-se disso o leacutexico das traduccedilotildees de Gaspar Laurent e de Natale Conti O

primeiro tradutor na Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima (1614) aponta como

equivalente a ldquosemnos logosrdquo a alternativa ldquooratio decorardquo ou ldquograuisrdquo 457 Deve-se

considerar que o adjetivo latino ldquodecorus a umrdquo pode abarcar os semas decoroso

digno nobre elegante ou belo O segundo tradutor no Hermogenis Tarsensis

philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta (1550) emprega o latim

uenustas para verter o grego semnotēs Afirma-o Joatildeo Angelo Oliva Neto ldquouenustas tem

em si Vecircnus e por Vecircnus entenda-se mais que o verbete lsquodeusa do amorrsquo a totalidade da

experiecircncia amorosa em qualquer domiacutenio eacute o que encanta em pessoas e objetosrdquo458

donde signifique assim o registram os dicionaacuterios Le Grand Gaffiot o Lewis amp Short e

453 Cf Hermogenis Tarsensis rhetoris acutissimi De dicendi generibus siue formis orationum libri II

Latinitate donati amp scholis explicati atque illustrati a Ioan Sturmio Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo

ad annos octo Excudebat Iosias Rihelis MDLXXI pp 56-57 454 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 8v 455 Idem p 44v 456 Jerocircnimo Soares Barbosa escreve ldquo1ordm A Gravidade (oratio grauis) he a primeira qualidade

do estilo Grande que consiste nos pensamentos graves quaes sam os que tem por objecto as couzas

Divinas Naturaes Politicas e Morais nas palavras e figuras simplices e na collocaccedilaotilde magestosa sim

mas naotilde estudada V Cicero discurrendo da Providencia na Miloniana Cap 3 e do Universo no Sonho de

Scipiaotilde Taacutecito nos seus Annaes he modelo neste generordquo 457 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 322 458 Cf CATULO O livro de Catulo Traduccedilatildeo introduccedilatildeo e notas de Joatildeo Angelo Oliva Neto Satildeo Paulo

Edusp 1996 p 46

150

o escolar de Ernesto Faria ldquobelezardquo ldquoformosurardquo ldquoencantordquo ldquoelegacircnciardquo ldquograccedilardquo

ldquocharmerdquo ou mesmo ldquoamabilidaderdquo

Ora ao traduzir o substantivo ldquosemnotēsrdquo Natale Conti faz uso do latim uenustas

e propotildee agrave margem da paacutegina do tratado De formis orationis em nota ldquoPlus

significat quam uenustas quasi enim grauem venustatem dixerimrdquo 459 isto eacute ldquoSemnotēs

significa mais que uenustas como se dissesse sim lsquograve uenustasrsquordquo460 Do comentaacuterio

que precisa a escolha tradutoacuteria depreende-se certa grave elegacircncia certa grave

formosura cujo avesso eacute o que se veraacute na chave do desalinho da deselegacircncia da

desgraciosidade e da vulgaridade Manuel Pires de Almeida prevecirc como viacutecio do qual se

deva apartar o poeta na composiccedilatildeo do gecircnero misto461 Vale a digressatildeo

Contemporacircneo de Manuel de Galhegos Manuel Pires de Almeida brevemente

afirma no tratado Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia datado de 1633

Sete quer Hermoacutegenes que sejam as espeacutecies ou formas ou ideias de

dizer a saber clara grande formosa ligeira afetuosa grave e

verdadeira []462

Notaacutevel sim eacute que embora o nome de Hermoacutegenes seja autoridade comum aos

usos de Manuel de Galhegos e de Manuel Pires de Almeida empregam um e outro leacutexico

nem sempre coincidente ainda que nunca propriamente discordante em liacutengua

portuguesa ao traduzir as liccedilotildees de retoacuterica que prescrevem quais sejam as diferentes

ideai tou logou No ldquoDiscurso Poeacuteticordquo satildeo ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo no tratado Poesia e

Pintura ou Pintura e Poesia satildeo ldquoespeacutecies ou formas ou ideias de dizerrdquo Assim se a

eleiccedilatildeo do substantivo ldquoformardquo os aproxima porque esta eacute a escolha de Manuel de

459 Cf Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] p 181 460 Trata-se de variedade da pulchritudo [beleza] afirma Ciacutecero no De officiis ldquoCum autem pulchritudinis

duo genera sint quorum in altero venustas sit in altero dignitas venustatem muliebrem ducere debemus

dignitatem virilemrdquo (CIC Off I 130) Pode-se ler o passo em traduccedilatildeo portuguesa quatrocentista do Infante

D Pedro ldquoE como assi seja na fremosura haacute hi duas maneiras hũa sta em aquello que se chama

lsquovenust[a]srsquo e outra em dignidade Venustas devemos de dizer a aquella fremosura que perteece aas

molheres y dignydade aos homẽesrdquo cf Livro dos oficios de Marco Tullio Ciceram o qual tornou em

linguagem o Infante D Pedro duque de Coimbra Ediccedilatildeo critica segundo o MS de Madrid prefaciada

anotada e acompanhada de glossaacuterio por Joseph M Piel Coimbra 1948 p 76 461 Cf MUHANA A Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia Tratado Seiscentista de Manuel Pires de

Almeida Satildeo Paulo Edusp pp 109-10 462 Idem p 108

151

Galhegos e uma das escolhas de Manuel Pires de Almeida para transpor o grego ldquoideardquo

() a traduccedilatildeo direta ou indireta do genitivo singular ldquotou logourdquo () por

ldquode dizerrdquo num caso e por ldquode oraccedilaotilderdquo noutro caso os afasta Afasta-os tambeacutem a

enumeraccedilatildeo em Pires de Almeida dos vocaacutebulos que tecircm relaccedilatildeo de sinoniacutemia com

ldquoformardquo a saber ldquoespeacutecierdquo e ldquoideiardquo pendentes eacute de se supor do tratamento instrutivo

do Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia Observa Adma Muhana haacute quatro apariccedilotildees

do termo ldquoideardquo neste tratado Em todas elas o sentido eacute de ldquoformardquo463

Na discriminaccedilatildeo dessas ideai assim como operam ambos os letrados haacute

coincidecircncias haacute aproximaccedilotildees haacute tambeacutem sutis afastamentos como se sabe Manuel de

Galhegos faz uso dos substantivos ldquoclaridaderdquo ldquograndezardquo ldquofermosurardquo ldquoPreccedilardquo

ldquocaracterrdquo e ldquoverdaderdquo ao passo que Manuel Pires de Almeida como se sabe tambeacutem se

vale dos adjetivos ldquoclarordquo ldquogranderdquo ldquoformosordquo ldquoligeirordquo ldquoafetuosordquo ldquograverdquo e

ldquoverdadeirordquo464 de modo que sejam idecircnticas as escolhas dos dois autores nos pares

ldquoclaridaderdquo e ldquoclarordquo ldquograndezardquo e ldquogranderdquo ldquofermosurardquo e rdquoformosordquo e ldquoverdaderdquo e

ldquoverdadeirordquo sejam semelhantes em ldquoPreccedilardquo e ldquoligeirordquo e natildeo coincidam em ldquocaracterrdquo e

ldquoafetuosordquo como designaccedilatildeo das categorias significadas pelo substantivos gregos

ldquogorgotēsrdquo e ldquoēthosrdquo Interessaraacute adiante o termo ldquograverdquo no tratado de Manuel Pires de

Almeida vertendo natildeo o substantivo ldquodeinotēsrdquo senatildeo que o adjetivo ldquodeinosrdquo vale por

ldquograuerdquo e ldquoferozrdquo no ldquoDiscurso Poeacuteticordquo Itere-se a eleiccedilatildeo de diferentes vocaacutebulos da

liacutengua portuguesa para traduzir os termos gregos eacute evidecircncia da construccedilatildeo de um corpo

lexical movente relativo agrave preceptiva retoacuterica atribuiacuteda a Hermoacutegenes e pode ser

indicaccedilatildeo de vertentes distintas de circulaccedilatildeo dessa preceptiva Manuel Pires de Almeida

isso eacute certo lecirc o volume Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte

Rhetorica praecepta impresso na Basileia em 1550 e compartilha as categorias que

apresenta com os Discorsi del poema heroico de Torquato Tasso em que as idee satildeo ldquola

chiara la grande la bella la veloce lrsquoaffettuosa la grave e la verardquo465

Manuel Pires de Almeida pensa a analogia dos fazeres do pintor e do poeta estatildeo

o rascunho (ou contorno ou desenho) a composiccedilatildeo e a cor para a pintura como a

invenccedilatildeo a disposiccedilatildeo e a locuccedilatildeo para a poesia ou melhor a inuentio a dispositio e a

463 MUHANA A Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia Tratado Seiscentista de Manuel Pires de Almeida

Satildeo Paulo Edusp pp 14-15 464 Idem p 108 465 Cf Discorsi del poema heroico del S Torquato Tasso Allrsquoillustrissmo e reverendissmo Signor Cardinale

Aldo Brandino Nella Stamparia dello Stigliola In Napoli Ad instantia di Paolo Venturino [1594] p 119

152

elocutio tal como consumados os termos nas artes retoacutericas latinas Invenccedilatildeo disposiccedilatildeo

e locuccedilatildeo trecircs partes da poesia definem-se respectivamente para o tratadista como

concepccedilatildeo de ldquoideias e formas de todas as coisas que se podem imaginarrdquo 466 como

ldquoelegante colocaccedilatildeo e perfeita ordem das coisas inventadasrdquo 467 e como ldquopropriedade e

resplandor das palavras bem escolhidas e ornadas de algumas graves e breves sentenccedilas

e luzidas com pensamentos e conceitos nobresrdquo 468 Eacute preceito do tratado que natildeo baste

rascunho sem cor invenccedilatildeo de faacutebula poeacutetica sem locuccedilatildeo mesmo que possiacuteveis Isto

seja natildeo haacute boa poesia que prescinda do regrado trabalho elocutivo Mais precisamente

na fundamentaccedilatildeo doutrinaacuteria de Manuel Pires de Almeida natildeo haacute boa poesia que

prescinda da variedade locutiva pois que avessa agrave monotonia tal como a pintura a

poesia faz-se da variedade de efabulaccedilatildeo Ora supotildee o tratadista que natildeo haja coisa das

mateacuterias ldquovis e humildesrdquo agraves ldquograndes e excelentesrdquo que natildeo se possa imaginar e

representar poeticamente de sorte que seja conveniente variar os estilos porque variam

as mateacuterias ou variar os estilos agrave proporccedilatildeo que variam as mateacuterias469 Eacute liccedilatildeo de decoro

Eacute liccedilatildeo de elegacircncia Essa liccedilatildeo metaforiza-se como vestimenta que deve se ajustar aos

usuaacuterios

As palavras e o que delas se forma natildeo satildeo mais que um vestido dos

conceitos do nosso acircnimo e por isso assim como os vestidos devem

sempre apropriar-se agrave condiccedilatildeo de quem os traja assim a locuccedilatildeo e as

palavras devem ter proporccedilatildeo e correspondecircncia com as coisas que

tratam Donde erraria quem vestisse uma senhora com fatos de moccedila ou

uma menina com trajo grave e quem a um sujeito levantado aplicasse

palavras demasiadas e frouxas ou a um sujeito humilde locuccedilotildees altivas

e compendiosas Conforme a qualidade que o poeta quer dar ao estilo

scilicet de gravidade ou de humildade de doccedilura ou de aspereza assim

lhe deve dar as palavras conformes pela semelhanccedila das letras

mudando ou alterando as que lhe pareccedilam desconvir ou justamente

misturas outras como faz o pintor que querendo imitar a semelhanccedila

de alguma imagem lhe ajunta ora uma ora outra cor ora as muda e

altera e talvez juntas mistura a muitas segundo a imagem se haacute de

466 Idem p 93 467 Idem ibidem 468 Idem p 94 469 Cf Idem pp 93 105 106 108 109

153

representar melhor Conte fls 147149 470

Eacute lugar-comum que se conhece de Ciacutecero e de Quintiliano o da elocuccedilatildeo que

veste e orna os pensamentos retoricamente inventados (cf CIC de Or I 142 Brut 247

QUINT VIII pr 20) que se conhece de Filiberto Campanile para quem as figuras satildeo as

vestes e os ornamentos com os quais satildeo vestidas e ornadas as coisas471 Manuel Pires de

Almeida natildeo supotildee decente a nudez Supotildee muito menos tatildeo-soacute no registro cocircmico

pode-se aventar adequada a ldquosenhora com fatos de moccedilardquo ou a ldquomenina com trajo graverdquo

ou o ldquosujeito levantadordquo ndash note-se o particiacutepio empregado por Manuel de Galhegos no

ldquoDiscurso Poeacuteticordquo para definir o poema heroico ndash de ldquopalavras demasiadas e frouxasrdquo

ou o ldquosujeito humilderdquo de ldquolocuccedilotildees altivas e compendiosasrdquo considerados exemplos da

desproporccedilatildeo entre o que se enuncia (res) e as formas lexicais empregadas para fazecirc-lo

(uerba) Supotildee senatildeo que os usos linguiacutesticos devam acomodar-se agraves qualidades de estilo

cujas espeacutecies dado o scilicet (gravidade humildade doccedilura ou aspereza) datildeo a entender

que o tratadista as toma essas qualidades como ldquoespeacutecies ou formas ou ideias de dizerrdquo

dignas de variaccedilatildeo ou de combinaccedilatildeo ou de mistura conforme a mateacuteria poeacutetica 472

Acrescente-se que no juiacutezo de Manuel de Galhegos a Ulyssea ou Lisboa Edificada de

Gabriel Pereira de Castro estima-se obra exemplar no trato variado da elocuccedilatildeo que

compotildee o gecircnero de poema heroico

No passo de Manuel Pires de Almeida confere autoridade a este preceito o nome

do tradutor milanecircs da versatildeo latina da Basileia da obra retoacuterica atribuiacuteda a Hermoacutegenes

Natale Conti ou Conte como citado473 O volume Hermogenis Tarsensis philosophi ac

rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta na jaacute referida estampa de 1550 traz o

seguinte474 (i) Hermogenis Tarsensis rhetoris acutissimmi liber de statibus (pp 1-53)

470 Idem pp 109-10 471 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 13 472 Como se veraacute adiante essa derradeira suposiccedilatildeo que superpotildee categorias como qualidade espeacutecie

forma ou ideia de dizer pende de leituras mais antigas da doutrina retoacuterica de Hermoacutegenes 473 No ldquoDiscurso sobre o poema heroicordquo Manuel Pires de Almeida menciona-o agrave maneira latina como

Natali Comiti em alusatildeo a outro tiacutetulo de sua autoria o Mythologiae siue Explicationis Fabularum (1581)

cf MUHANA A ldquoDiscurso sobre o poema heroico Comentaacuteriordquo REEL Revista Eletrocircnica de Estudos

Literaacuterios Vitoacuteria a 2 v 2 2006 pp 7 22 Mythologiae sive Explicationis Fabularum editou-se em

Frankfurt por Andreas Wechel filho de Christian Wechel editor de Hermoacutegenes cf KILLY W et alii

Dictionary of German Biography Volume 10 Thibaut - Zycha Muumlnchen De Gruyter 2006 p 381 474 Cf Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] Diga-se de (i) a (viii) repete-se o genitivo ldquoHermogenis Tarsensis philosophi ac

154

(ii) De inuentione liber primus (pp 54-67) (iii) De inuentione liber secundus (pp 68-

83) (iv) De inuentione liber tertius (pp 84-121) (v) De inuentione liber quartus (pp

121-154) (vi) De formis orationis liber primus (pp 155-242) (vii) De formis orationis

liber secundusrdquo (pp 243-334) (viii) De methodo gravitatem (pp 337-366) (ix) Aphtonii

sophistae praeligxercitamenta (pp 372-414)475

Manuel Pires de Almeida escreve ldquoConte fls 147 149rdquo Como o sumaacuterio da

ediccedilatildeo o indica natildeo satildeo paacuteginas do tratado De formis orationis as que se referem mas do

De inuentione como latinamente conhecido o Peri heureseōs de capiacutetulo intitulado ldquoDe

mala imitationerdquo na versatildeo de Natale Conti Vale consideraacute-lo O termo grego

correspondente agrave mala imitatio em Hermoacutegenes no Pseudo-Hermoacutegenes como prefere

Michel Patillon por entender espuacuteria a obra eacute kakozēlon () A liccedilatildeo do Peri

heureseōs par a par a traduccedilatildeo de Natale Conti aponta o kakozēlon como viacutecio de

invenccedilatildeo que se produz mediante o impossiacutevel ( ldquoid quod esse nequitrdquo ou

ldquoo que natildeo pode serrdquo) o inconsequente ( ldquonon consequiturrdquo ou ldquoo que

natildeo eacute consequenterdquo ldquoo que natildeo tem sequecircnciardquo) o torpe ( ldquoturperdquo) o iacutempio

( ldquoimpiumrdquo) o injusto ( ldquoiniustumrdquo) ou o hostil agrave natureza

(ldquordquo ldquonaturaelig repugnansrdquo) os quais fazem o narrado (

ldquonarrativordquo) nos termos da doutrina avesso ao verossiacutemil (ldquordquo) A liccedilatildeo aponta

ademais o kakozēlon como viacutecio de elocuccedilatildeo que se produz mediante o uso inepto de

vocaacutebulos metafoacutericos a tropikecirc lexis ( ldquodictio conversardquo) e mediante a

vulgarizaccedilatildeo o inconveniente aviltamento ( ldquosimplicitasrdquo) da semnotēs

(ldquovenustasrdquo) (cf HERM 202 4-204 15) 476 Recorde-se que muito proximamente o Peri

ideōn itera o emprego das tropikai lexeis na conformaccedilatildeo da semnotēs (cf HERM 248 9-

10)

Sabe-se a eleiccedilatildeo do substantivo latino ldquouenustasrdquo no mais comum a Antocircnio

Bonfine como daacute a ler o volume em latim Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris

rhetoris acutissimirdquo Para evitar repeticcedilatildeo natildeo o refiro Apenas em (ii) lecirc-se ldquoacutissimmirdquo em vez de

ldquoacutissimirdquo Mantenho o genitivo em (ix) porque se altera o autor 475 Note-se na ediccedilatildeo de Natale Conti os Progymnaacutesmata (em latim Praexercitamenta) os exerciacutecios

preparatoacuterios atribuiacutedos a Hermoacutegenes substituem-se pelos de Aftocircnio 476 Cf Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] pp 147-9

155

acutissimi de Arte Rhetorica precepta estampado em 1538477 guarda antes a elegacircncia

a formosura mesmo que grave de acordo com Natale Conti do que a nobreza a

solenidade e tem viacutenculos os mais interessantes na tratadiacutestica com a normatizaccedilatildeo da

mala affectatio na poesia Eacute oportuno lembrar que conforme o Peri hermēneias o

kakozēlonentende-se como contrafaccedilatildeo da polidez da elegacircncia do que se diz glaphyros

(cf DEMETR 186-7 ) composto mediante pensamentos palavras ou

conceitos desproporcionalmente operados Pietro Vettori nos seus Commentarii in librum

Demetrii Phalerei de elocutione mais de uma deacutecada depois de Natali Conte verte

ldquoglaphyrosrdquo por ldquoelegansrdquo (cf DEMETR 128 ldquoὉ γλαφυρὸς λόγοςrdquo entende-se como

ldquoElegans oratiordquo) e natildeo traduz o neutro grego kakozēlon translitera-o ao modo do neutro

latino ldquocacozelumrdquo478 Em Pietro Vettori venustas traduz kharis (cf DEMETR 29 156

χάρις) e venustum o neutro ldquoto eukharirdquo (cf DEMETR 156 τὸ εὔχαρι)479 Francesco

Panigarola fazendo glosa da versatildeo do tradutor em Il predicatore ouero parafrase

commento e discorsi intorno al libro dell Elocutione di Demetrio Falereo acrescenta que

ldquoElegans oratiordquo seja equivalente a ldquoVenusta amp elegante nota di direrdquo 480 e opta no

italiano pela forma ldquocacozelordquo explicando-a

Di maniera che si come opposto alla magnificenza egrave il vitio col quale

siamo virtuosamente e souerchiamente magnifici che frigido si

chiamaua Cosigrave opposto alla nota venusta egrave quel vitioso modo di dire

477 Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii item

Sophistaelig Praeligexercitamenta Antonio Bonfine asculano interprete Apud Seb Gryphivm Lvgdvni 1538 pp

137-138 172-180 478 Cf Petri Victorii commentarii in librum Demetrii Phalerei de elocutione Positis ante singulas

declarationes Graecis vocibus Auctoris ijsdemque ad verbum Latine expressis Additus est rerum et

verborum memorabilium index copiosus Cum P II IIII Pont Max Cosmi Medicis Florentianorum

Senensiumq Ducis ampAlphonsi Ferrariensium Ducis privilegijs ampliszlig per decennium Florentiae In officina Iuntarum Bernardi F MDLXII [1562] pp 118 165-6 479 Idem pp 29 140 145 Gustavo Arauacutejo de Freitas tradutor de Demeacutetrio em recente dissertaccedilatildeo de

mestrado afirma com base nos Elementos de retoacuterica literaacuteria de Heinrich Lausberg ldquoNo que concerne

aos estudos de retoacuterica a χάρις eacute em geral tratada como uma das qualidades do ornatus que pode

considerar-se como variante dos genera dicendi Como um ltltornato suavegtgt visaria a oferecer um

resultado sem esforccedilo do belo e corresponde a uma variante do genus medium designando-se como gratia

ou suavitas (iuncunditas dulcitudo dulcedo )rdquo cf Cf FREITAS G A DE Sobre o Estilo de

Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo e estudo introdutoacuterio do tratado) Satildeo

Paulo [UFMG] 2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p 66 480 Il Predicatore di F Francesco Panigarola ouero Parafrase commento e discorsi intorno al libro

dellelocutione di Demetrio Falereo oue vengono i precetti e gli essempi del dire che giagrave furono dati a

Greci ridotti chiaramente alla prattica del ben parlare in prose italiane e la vana elocutione de gli autori

profani accommodata alla sacra eloquenza de nostri dicitori e scrittori ecclesiastici Con due tauole vna

delle questioni e laltra delle cose piugrave notabili Venetia Bernardo Giunti Gio Battista Ciotti amp Compagni

1609 p 413

156

col quale troppo venusti riusciamo amp affettati e questo lo domandano

i Retori Cacozelo Si bene inuero tirando il nome del genere alla

specie percioche significando Сacozelo inepta imitatione cosigrave imita

male chi per essere magnifico egrave troppo magnifico chi per essere tenue

egrave troppo tenue e chi per eszligere aspro egrave troppo aspro come chi per

volere esser venusto egrave troppo venusto e pero dice Quintiliano nel libro

ottauo al capitolo 3 che idest mala affectatio per omne

dicendi genus peccet amp 481 vocatur quidquid est vltra

virtutem quotie[n]s ingenium iudicio caret amp specie boni fallitur

omnium in eloquentia vitiorum pessimum

Tuttauia cosigrave hanno vsato i Retori drsquoappropriare queso generico поте

di Cacozelo agrave questa vitiosa nota che alla venustagrave si oppone e cosigrave

seguiremo ancor noi Auuertendo che si come due sorti di venustagrave

dicemmo di sopra che si trouauano le piugrave nobili e le meno nobili cosigrave

in ciasciuna di queste venustagrave puograve nascere Cacozelo Nelle prime

quando altri volendo eszliger gratioso dagrave nellrsquoafettato e nelle seconde

quando altri per voler far vdire dagrave nel buffone magro e dissipito482

De maneira que assim como oposto agrave magnificecircncia eacute o viacutecio com que

somos virtuosa e excessivamente magniacuteficos que frio se chamava

assim tambeacutem oposto agrave marca elegante eacute aquele vicioso modo de dizer

com que demasiado elegantes nos mostramos e afetados amp este

denominam os retores Cacozelo Se bem assevero tirando o nome do

gecircnero agrave espeacutecie porque significando Сacozelo inepta imitaccedilatildeo assim

imita mal quem para ser magniacutefico eacute demasiado magniacutefico quem para

ser tecircnue eacute demasiado tecircnue e quem para ser aacutespero eacute demasiado

aacutespero tal como quem por querer ser elegante eacute demasiado elegante

Ora disse Quintiliano no livro oitavo capiacutetulo 3 [da Institutio

oratoria] que ldquokakozēlon isto eacute maacute afetaccedilatildeo peque em todo gecircnero

481 Em Francesco Panigarola nesta segunda ocorrecircncia na ediccedilatildeo indicada lecirc-se ldquordquo em vez de

ldquordquo Tendo em vista a intelecccedilatildeo do termo e as liccedilotildees modernas de Quintiliano (cf QUINT VIII

3 56) entendo tratar-se de gralha 482 Il Predicatore di F Francesco Panigarola ouero Parafrase commento e discorsi intorno al libro

dellelocutione di Demetrio Falereo oue vengono i precetti e gli essempi del dire che giagrave furono dati a

Greci ridotti chiaramente alla prattica del ben parlare in prose italiane e la vana elocutione de gli autori

profani accommodata alla sacra eloquenza de nostri dicitori e scrittori ecclesiastici Con due tauole vna

delle questioni e laltra delle cose piugrave notabili Venetia Bernardo Giunti Gio Battista Ciotti amp

Compagni 1609 p 596

157

de discursordquo amp ldquokakozēlondenomina-se tudo o que estaacute para aleacutem da

virtude todas as vezes que o engenho carece de juiacutezo amp eacute enganado

pela boa aparecircncia o pior de todos os viacutecios na eloquecircnciardquo

Todavia muito se acostumaram os retores a acomodarem este geneacuterico

nome de Cacozelo a esta viciosa marca que se opotildee agrave elegante e desse

modo tambeacutem seguiremos noacutes advertindo que assim como enunciamos

acima duas maneiras de elegacircncia que se encontravam a mais nobre e

a menos nobre assim tambeacutem em cada uma dessas elegacircncias pode

nascer o Cacozelo Na primeira quando algueacutem querendo ser gracioso

daacute no afetado e na segunda quando algueacutem por querer se fazer ouvir

daacute no bufatildeo magro e insiacutepido483

Longos os comentaacuterios de Francesco Panigarola agrave versatildeo de Pietro Vettori para o

Peri hermēneias expotildeem usos distintos do termo ldquokakozēlonrdquo De um lado o Pseudo-

Demeacutetrio de outro Quintiliano Resumidamente para o primeiro trata-se de falta que se

avizinha do kharaktēr que o grego denomina glaphyros (cf DEMETR 186) no italiano

como ldquocacozelordquo eacute ldquovitioso modo di direrdquo oposto agrave ldquonota venustardquo agrave ldquovenustagraverdquo Para o

segundo trata-se de mala adfectatio a que pode incorrer poeta ou orador em qualquer

dicendi genus

Κακόζηλον id est mala adfectatio per omne dicendi genus peccat

Nam et tumida et pusilla et praedulcia et abundantia et arcessita et

exultantia sub idem nomen cadunt Denique κακόζηλον vocatur

quidquid est ultra virtutem quotiens ingenium iudicio caret et specie

boni fallitur omnium in eloquentia vitiorum pessimum (QUINT 8 3

56-58)484

Kakozēlon isto eacute maacute afetaccedilatildeo peca em todo gecircnero de discurso pois

com o mesmo termo compreendem-se as coisas tuacutemidas as deacutebeis as

muito doces as abundantes as rebuscadas e as difusas Numa palavra

denomina-se kakozēlontudo o que estaacute para aleacutem da virtude todas as

vezes que o engenho carece de juiacutezo e eacute enganado pela aparecircncia das

483 Traduccedilatildeo nossa 484 Para o texto latino QUINTILIAN With An English Translation Harold Edgeworth Butler Cambridge

Mass Harvard University Press London William Heinemann Ltd 1922 vol iii

158

coisas boas o pior de todos os viacutecios na eloquecircncia485

Eacute evidente como geneacuterica a definiccedilatildeo da Institutio oratoria abraccedila a do Peri

hermēneias De acordo com Quintiliano os adjetivos ldquotumidardquo ldquopusillardquo ldquopraedulciardquo

ldquoabundantiardquo ldquoarcessitardquo e ldquoexultantiardquo especificam maneiras diversas de os discursos

elocutivamente incorrerem no falso do kakozēlon 486 O primeiro deles ldquotumidusrdquo

emprega-se em referecircncia ao viacutecio que contrafaz o gecircnero grave agrave maneira de Horaacutecio

na Epistula ad Pisones que contrapotildee ldquograndisrdquo e ldquoturgeordquo ou seja ldquograndiosordquo e

ldquointumescerrdquo (HOR AP 24-28)487 Jerocircnimo Soares Barbosa no segundo volume das

Instituiccedilotildees oratorias de M Fabio Quintiliano (1790) propotildee em nota de rodapeacute

definiccedilatildeo que esclarece nos termos da regulaccedilatildeo retoacuterica da elocuccedilatildeo o uso lexical latino

relativamente ao viacutecio assim encerrado (cf Rhet Her IV 15)488

he o Inchado assim chamado porque he huma grandeza falsa e

aparente como a dos hydropicos Elle consiste nos pensamentos e

cousas que por si nada tem de grande e sublime e que hum espirito

falso e pequeno se esforccedila por fazer parecer grandes ou pelas palavras

empoladas ou pelas expressotildees exageradas e hyperbolicas ou pelas

figuras e collocaccedilaotilde magnifica489

485 Traduccedilatildeo nossa Na versatildeo quinhentista de Oratio Toscanella o passo traduz-se assim ldquoΚακόζηλον

cioegrave MALA AFFETATIONE pecca per ogni maniera di dir Percio che sotto questo nome cadono le parole

GONFIE amp DEBOLI amp STRADOLCI amp ABONDATI amp MENDICATI amp BORIOSE Vltimamente Cacozelon si chiamma tutto quello che eccedi i termini della uirtugrave amp questo interuiene ogni uolta che lrsquoingegno manca

di giudicio et che dallrsquoapparenza di cosa buona ingannar si lascia Questo uitio nella eloquenza egrave il peszligimo

di tutti i uitijrdquo Em nota acrescenta-se ldquoCACOZELON srsquointerpreta mala affetatione onde diciamo huommo

affettato amp stilo affettatordquo cf Lrsquoinstitutioni oratorie di Marco Fabio Quintiliano retore famosissimo

tradotte da Oratio Toscanella della famiglia di maestro Luca Fiorentino et arricchite dal medesimo della

dichiaratione de i luochi piugrave difficili in margine Di quattro Tauole che seruono a tutta lrsquoopera della vita

dello autore et drsquoannotationi in lettere grandicelle delle cose piugrave importanti Con privilegio In Venetia

appresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLXVI [1566] p 410 486 Observe-se QUINT 8 3 58 487 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4

pp 227-228 488 A definiccedilatildeo de Jerocircnimo Soares Barbosa eacute conforme a da Retoacuterica a Herecircnio ldquoEst autem cauendum ne

dum haec genera consectemur in finituma et propinqua uitia ueniamus Nam graui figurae quae laudanda

est propinqua est ea quae fugienda quae recte uidebitur appellari si sufflata nominabitur Nam ita ut

corporis bonam habitudinem tumor imitatur saepe item grauis oratio saepe inperitis uidetur ea quae turget

et inflata estrdquo ou seja em versatildeo de Marcos Martinho dos Santos ldquoEacute poreacutem para acautelar-se de enquanto

perseguimos esses gecircneros virmos aos viacutecios confinantes e proacuteximos [destes] Pois agrave figura grave que eacute

para louvar estaacute proacutexima aquela de que eacute para fugir a qual pareceraacute corretamente nomeada se a chamarmos

de inchada Pois assim como a boa constituiccedilatildeo do corpo eacute amiuacutede imitada pelo tumor assim a oraccedilatildeo

grave amiuacutede parece aos imperitos aquela que eacute tuacutergida e inchadardquo (Rhet Her IV 15) Cf SANTOS M M

ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 pp 255-256 489 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

159

Jaacute ldquopusillusrdquo eacute habitual na acepccedilatildeo de ldquopequenordquo ldquomuito pequenordquo

ldquoinsignificanterdquo ou ldquodeacutebilrdquo o que pode apontar para a vulgaridade e a chaneza do discurso

que buscando evitar a obscuridade apela agrave clareza em demasia Estampas quinhentistas

de Quintiliano todavia soem oferecer liccedilatildeo distinta do mesmo passo em vez de

ldquopusillardquo conforme a ediccedilatildeo de Harold Edgeworth Butler para a coleccedilatildeo Loeb Classical

Library ldquoexiliardquo 490 O adjetivo ldquoexilisrdquo ndash a forma ldquoexiliardquo eacute neutro plural no caso

nominativo ndash eacute comumente empregado na acepccedilatildeo de ldquomagrordquo ldquodelgadordquo ldquofracordquo e

ldquodeacutebilrdquo donde se leia referecircncia agraves coisas deacutebeis ldquoDEBOLIrdquo como mostra a versatildeo em

italiano da Institutio oratoria elaborada por Orazio Toscanella impressa em Veneza em

1566 De fato eacute uso em sentido muito proacuteximo de ldquopusillardquo491 Jerocircnimo Soares Barbosa

em fins do seacuteculo XVIII lendo Quintiliano afirma que o orador ldquotemendo os precipicios

do sublime apega-se a hum estilo simples e chatildeo e vem a recahir no ldquoBaixo e Seco

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel p 435 490 Cf Quintilianus cum commento [Raphael Regius] Venetiis per Bonetum Locatellum 1506 sp cf

Marci Fabii Quintiliani Orationum Institutionum Libri Duodecim diligenter emendati 1518 p 193r cf

M Fabii Quintiliani Rhetoris clarissimi de Institutione Oratoria ad Marcellum Victorium libri XII Pariis

Ex Officina Michaeumllis Vascosani in uia quae est ad D Iacobum sub fontis insigni M D XXII [1527] pp

183v-184r cf M Fabii Quintiliani oratoriarum institutionum libri duodecim Summa diligentia tum

iudicio ad uenustiszligimorum quorũq exemplariorum fidem recogniti additis simul eiusdem declamationib amp eruditiszligimis amp stylo sui periculum facturis utiliszligimis Eucharius Ceruicornus excudebat ANNO M D

XXII [1527] mense avg p 154 cf M Fabii Quintiliani oratoris eloquentissimi Instituonum oratoriarum

Libri XII incredibili cum studio tum iudicio ad fibem uenustissimi exemplaris recens iam recogniti

Eiusdem Declamationum Liber Basileae ex aedibus Ioannis Bebelii Mense Augusto M D XXIX [1529] p

121v cf Marci Fabii Quintiliani Instituonum oratoriarum Libri XII Declamationum Liber eiusdem

Lvgdvni Apud Seb Gryphivm 1536 p 369 cf Marci Fabii Quintiliani Instituonum oratoriarum Libri XII

Declamationum Liber eiusdem Lvgdvni Apud Seb Gryphivm 1540 p 369 cf M Fabii Quintiliani

Instituonum oratoriarum libri duodecim Declamationum Liber eiusdem Summa diligentia ad finem

uenustiszligimorum codicum recogniti ac restituti Cum rerum uerborumq Indice locupletiszligimum Lvgdvni

Apud Seb Gryphivm 1555 p 468 491 Eacute o caso da versatildeo quinhentista em italiano da Institutio oratoria elaborada por Orazio Toscanella e estampada em Veneza em 1566 ldquoΚακόζηλον cioegrave MALA AFFETATIONE pecca per ogni maniera di dir

Percio che sotto questo nome cadono le parole GONFIE amp DEBOLI amp STRADOLCI amp ABONDATI amp

MENDICATI amp BORIOSE Vltimamente Cacozelon si chiamma tutto quello che eccedi i termini della uirtugrave

amp questo interuiene ogni uolta che lrsquoingegno manca di giudicio et che dallrsquoapparenza di cosa buona

ingannar si lascia Questo uitio nella eloquenza egrave il peszligimo di tutti i uitijrdquo Em nota acrescenta-se

ldquoCACOZELON srsquointerpreta mala affetatione onde diciamo huommo affettato amp stilo affettatordquo cf

Lrsquoinstitutioni oratorie di Marco Fabio Quintiliano retore famosissimo tradotte da Oratio Toscanella della

famiglia di maestro Luca Fiorentino et arricchite dal medesimo della dichiaratione de i luochi piugrave difficili

in margine Di quattro Tauole che seruono a tutta lrsquoopera della vita dello autore et drsquoannotationi in lettere

grandicelle delle cose piugrave importanti Con privilegio In Venetia appresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari

MDLXVI [1566] p 410

160

(exilia)rdquo 492

Emprega-se ademais na Institutio oratoria em referecircncia agraves espeacutecies de

kakozēlon ldquopraedulcisrdquo a saber o que seja doce aleacutem da conta Consoante os

comentaacuterios de Jerocircnimo Soares Barbosa (cf QUINT 2 5 22)

Quint chama a este estilo praedulce dicendi genus porque he a mesma

doccedilura do estilo dos Sophistas (de que fallamos assima pag 434 n 7)

quando he demasiada ou intempestiva Elle consiste na affectaccedilaotilde

pueril das flores e enfeites miudos e mais brilhantes da Rhetorica493

Note-se com ldquoestilo dos Sophistas (de que fallamos assima pag 434 n 7)rdquo

Jerocircnimo Soares Barbosa alude aos preceitos do Peri ideōn de modo a asseverar que as

praedulcia de Quintiliano o tal praedulce dicendi genus gecircnero de discurso muito doce

seja o avesso faltoso e contrafeito da glykytēs a ldquoDoccedilurardquo apresentada como ldquosegunda

espeacutecie de oraccedilaotilde Morata de Hermoacutegenesrdquo nos comentaacuterios do letrado setecentista

portuguecircs494 Por ldquooraccedilaotilde Moratardquo entenda-se o ēthos como idea Leitor de Ciacutecero

492 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel pp 434-435 440 Pendendo por certo da leitura de Jerocircnimo Soares Barbosa dramatiza-se em Camilo Castelo Branco (1825-1890) no romance A queda drsquoum anjo (1866) o passo em questatildeo

ldquoO presidente Lembro ao nobre deputado que a camara natildeo eacute aula de rhetorica

O orador Assim devo presumil-o vendo que todos a professam com dignidade exceptuado eu

que me natildeo desdoiro em confessar que sou o discipulo uacutenico e maacuteo de tantos mestres Eu direi a v exa

qual eloquencia considero necessaria nrsquoesta casa da naccedilatildeo eacute a eloquecircncia que a naccedilatildeo entenda A arte de

bem fallar ars beacutene dicendi eacute o estudo da clareza no exprimir a ideacutea Os affectos as galas da linguagem

que lhe tolhem o mostrar-se e dar-se a conhecer dos rudos natildeo eacute arte eacute tramoya natildeo eacute luz eacute escuridade

Os meus constituintes mandaram-me aqui fallar das necessidades drsquoelles em termos taes que por elles v

exa e a camara lhas conheccedilam ponderem e remedeiem

Sou da velha clientela de Quintiliano sr presidente Com elle entendo que por demais se enganam aquelles

que alcunham de popular o estylo vicioso e corrupto qual eacute o saltitante o agudo o inchado e o pueril que o mestre denomina praeligdulce dicendi genus todo affectaccedilatildeo menineira de florinhas broslados de

pechisbeque recamos de fitas como em bandeirolas de arraialrdquo cf CASTELO BRANCO CAMILO A queda

drsquoum anjo romance Lisboa Livraria de Campos Junior 1866 pp 131-132 493 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel p 436 494 Idem p 434

161

Jerocircnimo Soares Barbosa articula as categorias artiacutesticas do Peri ideōn com as do Orator

e assume que o sofista vituperado pela dicccedilatildeo dita praedulcis discursa com o propoacutesito

natildeo de abalar os acircnimos (ldquoperturbare acircnimosrdquo) mas de ser apraziacutevel (ldquoplacarerdquo) natildeo

tanto de persuadir (ldquopersuadererdquo) quanto de deleitar (ldquodelectarerdquo) mediante pensamentos

antes agradaacuteveis que provaacuteveis (ldquoconcinnas magis sententias exquirunt quam

probabilisrdquo) afastamentos digressivos do caso (ldquoa re saepe disceduntrsquo) entrelaccedilamentos

fabulares (ldquointexunt fabulasrdquo) e no ofiacutecio elocutivo mediante metaacuteforas manifestas

dispostas como cores variadas do pintor (ldquoverba apertius transferunt eaque ita disponunt

ut pictores varietatem colorumrdquo) paralelismos (ldquoparia paribus referuntrdquo) antiacuteteses

(ldquoadversa contrariisrdquo) e homeoteleutos (ldquosaepissimeque similiter extrema definiuntrdquo) (cf

CIC Or XIX 65) 495

O que Jerocircnimo Soares Barbosa considera ser demasiado intempestivo na

figuraccedilatildeo da glykytēs pensa-se como viacutecio cujo exemplo estaacute no sofista Para

Hermoacutegenes o discurso que tenha clareza majestade e amplitude em grego saphēneia

axiōma e onkos caso lhe falte beleza e harmonia isto eacute kallos e eurythmia seraacute algo

acerbo ldquoagleukēsrdquo (ldquoἀγλευκήςrdquo) carente de doccedilura de suavidade (cf HERM 296 5-14)

Vale rememorar ainda que de maneira breve agrave luz dos stoikheia definidos no Peri ideōn

glykytēs eacute categoria ancilar de conformaccedilatildeo eacutetica cujas ennoiai sejam efetuadas mediante

os relatos miacuteticos tal os de Fedro os relatos vizinhos dos miacuteticos tal os da Guerra de

Troia os passos fabulares de relatos de credibilidade tal os de Heroacutedoto os enunciados

agradaacuteveis aos sentidos os encocircmios e enfim as personificaccedilotildees (cf HERM 330 1-335

23) Os methodoi proacuteprios agrave glykytēs satildeo equivalentes aos que compotildeem a katharotēs e a

apheleia os que narrem accedilotildees de modo nu sem enredamentos (cf HERM 227 19-228

3 327 24-328 15 335 24-25) A lexis que compete a essa idea compartilha

procedimentos elocutivos com as duas espeacutecies supracitadas ou seja o vocabulaacuterio

corrente nem metafoacuterico nem duro vale-se ademais do registro poeacutetico ndash do dialeto

jocircnico itere-se uma vez tido por mais apraziacutevel ndash e aplica-se por adjetivos e por dicccedilatildeo

engenhosa a saber atinente agrave idea de drimytēs (cf HERM 328 16-329 4) Entre os

495 Idem ibidem Cf CIC Or 19 65 ldquoSophistarum de quibus supra dixi magis distinguenda similitudo

videtur qui omnes eosdem volunt flores quos adhibet orator in causis persequi Sed hoc differunt quod

cum sit his propositum non perturbare animos sed placare potius nec tam persuadere quam delectare et

apertius id faciunt quam nos et crebrius concinnas magis sententias exquirunt quam probabilis a re saepe

discedunt intexunt fabulas verba apertius transferunt eaque ita disponunt ut pictores varietatem colorum

paria paribus referunt adversa contrariis saepissimeque similiter extrema definiuntrdquo Observe-se M T

Ciceronis ad Marcum Brutum Orator cum Victoris Pisani Patritij Veneti commentario Lvgdvni Apud Seb

Gryphivm 1536 p 21

162

skhēmata a glykytēs opera-se pela construccedilatildeo direta pelo desuso do hipeacuterbato e pelo uso

do ornato que confere ao discurso beleza o kallos (cf HERM 229 19-232 7 299 8-306

22 329 5-6 339 3-5)496 A synthēkē deve ser agradaacutevel e aproximar do verso a prosa de

modo a fazer-se predominante no discurso dotado de doccedilura de suavidade o peacute solene

(semnos) pouco atento ao hiato no mais dactiacutelico anapeacutestico ou peocircnico por vezes

iacircmbico frequentemente espondaico (cf HERM 251 21-253 11) As anapauseis

conveacutem que sejam tambeacutem solenes e o rhythmos estaacutevel (cf HERM 339 11-13)

Acrescente-se consoante os comentaacuterios aduzidos nas Instituiccedilotildees oratorias de

M Fabio Quintiliano os demais termos empregados para referir o kakozēlon em suas

espeacutecies satildeo ldquoabundantiardquo ldquoarcessitardquo e ldquoexultantiardquo articulados como viacutecios elocutivos

decorrentes do uso desmedido da copiosidade que evita o baixo o vulgar o chatildeo

Affecta riqueza de ornatos e abundancia de expressaotilde Cahe no estilo

verboso e Asiatico (abundantia) Se quer affectar hum estilo novo e

extraordinaacuterio cahe nas expressotildees exquisitas arrastadas e foacutera do

natural (arcessita) Em fim querendo dar ao seo discurso huma

collocaccedilaotilde suave e harmoniosa passa os limites e daacute-lha molle e

effeminada similhante aacute marcha e compasso das danccedilas lascivas

(exultantia)497

Vale referir agrave guisa de exemplo pensando as faltas decorrentes do uso concebido

como descurado dos genera dicendi pelo excesso ldquodaquella maravilha e novidade da

Materia ou do Artificio em que consiste a belleza poeticardquo 498 em conformidade com a

Institutio oratoria ou mais precisamente pensando os ldquoExtremos viciosos dos estylos

496 Hermoacutegenes elenca conjunto de figuras que faccedilam belo o discurso parisose epanaacutefora antiacutestrofe

epanaacutestrofe paralelismo hipeacuterbato afirmaccedilotildees mediante negaccedilotildees e poliacuteptoton kallos (cf HERM 299 8-

306) 497 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel p 101 498 Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes

tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip

Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens

ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo

ferat error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX

Com as licenccedilas necessarias p 199

163

contrapostos equivocos alusotildees e outras pestes condemnadasrdquo 499 Francisco Joseacute Freire

(1719-1773) na Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral e de todas as

suas especies principaes tratadas com juizo critico escreve jaacute bastante distante da

visada apologeacutetica de Manuel de Galhegos

Quem ler o Virginidos de Barbuda o Ulyssipo de Macedo o Macabeo

de Sylveira o Condestable de Lobo e a Ulyssea de Gabriel Pereira ha

de achar muitas destas argucias conceitos falsos antithesis

paranomasias equivocos de vozes ampc Seria materia infinita se para

exemplos allegassemos versos destes Poetas e baste que os eruditos

saibaotilde que fallamos verdade no que dizemos500

Isso posto buscam esmiuacuteccedilar os comentaacuterios de Jerocircnimo Soares Barbosa

horacianamente que os viacutecios reunidos sob a rubrica ldquokakozēlonrdquo pendem da falta de arte

(cf HOR AP 25-31)501 isto seja da falta de mestria no trabalho elocutivo com todos os

gecircneros do discurso (cf QUINT 8 3 56) Nisso jaacute se sabe dista a leitura do letrado luso

em fins do seacuteculo XVIII daquela seiscentista de Francesco Panigarola comentador

minucioso do Peri hermēneias na versatildeo do florentino Pietro Vettori (1562) O que

interessa niacutetidos os usos vocabulares diferenccedilados em Il predicatore ouero parafrase

499 Idem ibidem 500 Idem p 204 Aleacutem da Ulyssea ou Lisboa Edificada de Gabriel Pereira de Castro os poetas e os poemas citados por Francisco Joseacute Freire satildeo (i) Manuel Mendes de Barbuda (1607-1670) Virginidos ou Vida da

Virgem Senhora Nossa Poema Heroico dedicado a Magestade da Rainha Dona Luiza Nossa Senhora por

Manuel Mendes de Barbuda amp Vasconcellos Lisboa Na Officina de Diogo Soares de Bulhoens 1667

Com todas as licenccedilas necessarias (ii) Antocircnio de Sousa de Macedo (1606-1682) Vlyssipo Poema

heroico De Antonio de Sousa de Macedo Com as licenccedilas necessarias Em Lisboa Por Antonio Aluarez

Anno de 1640 (iii) Miguel da Silveira (ca 1576-1636) El Macabeo Poema heroico de Migvel de Silveira

En Napoles por Egidio Longo Stampador Real Antildeo 1638 (iv) Francisco Rodrigues Lobo (ca 1580-1622)

O Condestabre de Portugal D Nuno Alvres Pereira de Francisco Rodrigues Lobo oferecido ao Duque

dom Theodosio segundo deste nome Em Lisboa Com todas as licenccedilas necessarias por Pedro

Crasbeeck 16010 [ie 1610] 501 Itero os vv 25-31 da Epistula ad Pisones citados na nota 56 na traduccedilatildeo seiscentista impressa por Joatildeo da Costa ldquolaboro se procuro eszlige brevis ser breve fio me faccedilo Obscurus escuro sectantem ao que segue

leuia cousas faceis nerui as forccedilas animique amp os animos Deficiunt lhe faltatildeo professus o que prende

cotildepor grandes cousas grandia se incha turget amp esvaece tutus nimium amp o q procura ir mui seguro

timidusque amp estagrave temeroso procellae da adversidade amp inveja Serpit vai de gatinhas humi pelo chatildeo Qui

cuput aquelle que deseja uariare variar rem unam algũa cousa prodigialiter foacutera do costume amp feacute humana

appingit pinta Delphinum hum golfinho syluis nos bosques aprum hum javali fluctibus nas ondas Fuga

culpaelig o fugir de hum erro inducit faz cair In uitium em outro mayor si caret arte se o que isto procura

carece de arterdquo cf Obras de Horacio principe dos poetas latinos lyricos com o entendimento litteral amp

construiccedilam Portuguesa ornadas de hum index copioso das historias amp fabulas contiudas nelas

Emendadas nesta vltima Impressam Lisboa Na Officina de Ioam da Costa m dc lvviii [1668] Com as

licenccedilas neceszligarias p 427

164

commento e discorsi intorno al libro dell Elocutione di Demetrio Falereo e assim

afastada autoridade de Quintiliano eacute que se note que Francesco Panigarola opera os

avessos a virtude da venustagrave e o viacutecio do Cacozelo traduzindo jaacute se sabe glaphyros e

kakozēlon (cf DEMETR 128-189)

Ora essa oposiccedilatildeo embora natildeo mais confrontadas mas acomodadas agraves

autoridades do Peri hermēneias e da Institutio oratoria eacute conhecida da tratadiacutestica do

poeta Torquato Tasso natildeo soacute ensinam os Discorsi del poema heroico que ldquovenustordquo

traduza ao latim o grego ldquoγλαφυρόςrdquo ou seja o que se denomina ldquoparlar ornato e

gratiosordquo502 senatildeo tambeacutem que

Demetrio crsquoinsegna chersquol parlar freddo egrave vicino al magnifico il

cacozelo che noi seguendo Quintiliano possiam dire male affettato al

venusto o gratioso lrsquoasciutto al tenue lrsquoinuenusto orsquol disgraziato al

graue503

Demeacutetrio nos ensina que o falar frio se avizinha ao magnifiacuteco o

cacozelo que noacutes seguindo Quintiliano possamos dizer mal afetado

ao elegante ou gracioso o enxuto ao tecircnue o deselegante ou o sem

graccedila ao grave504

No mais sabe-se tambeacutem emprega-se a oposiccedilatildeo entre uenustas e mala imitatio

no De inuentione recolhido no volume Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris

acutissimi De Arte Rhetorica praecepta em versatildeo quinhentista de Natale Conti A

destacar-se no entanto que o vocabulaacuterio da liccedilatildeo grega do tratado atribuiacutedo a

Hermoacutegenes traz semnotēs e kakozēlon natildeo glaphyros e kakozēlon Disso eacute possiacutevel

aventar resulta da versatildeo de Natale Conti e isso vale para a ediccedilatildeo vecircneta de Antocircnio

Bonfine (1538) a conciliaccedilatildeo mediante a afinaccedilatildeo do vocabulaacuterio em uso em latim das

categorias discursivas que no De inuentione e no Peri hermēneias normatizam o que

seja ou natildeo kakozēlon ou mala adfectatio Por assim dizer Natale Conti e Antocircnio

Bonfine fazem com que as obras gregas estabeleccedilam preceitos afins legitimados segundo

502 Cf Discorsi del poema heroico del S Torquato Tasso Allrsquoillustrissmo e reverendissmo Signor Cardinale

Aldo Brandino Nella Stamparia dello Stigliola In Napoli Ad instantia di Paolo Venturino [1594] p 146 503 Idem pp 169-170 504 Traduccedilatildeo nossa

165

o costume bem definido do Pseudo-Demeacutetrio Recorde-se a liccedilatildeo latina de Natale Conti

eacute a liccedilatildeo do texto de Hermoacutegenes citada por Manuel Pires de Almeida no Poesia e Pintura

ou Pintura e Poesia505

Ora Filiberto Campanile na leitura que faz da semnotēs em princiacutepio do seacuteculo

XVII itera os preceitos conhecidos do Peri ideōn e adverte ser necessaacuterio no uso dos

ldquovoci traslate di Grandeza e maestagraverdquo 506 isto eacute dos vocaacutebulos translatos que operam o

megethos e a semnotēs natildeo apenas afastar-se de toda ldquoDisagguaglianzardquo (disparidade)

ou ldquoDissimilitudinerdquo (dissimilitude) senatildeo tambeacutem em contrapartida observar-se a ldquola

proportione e conuenienza che deuranno hauer fra loro la cosa onde se piglia il traslato

e quella oue si recardquo (a proporccedilatildeo e a conveniecircncia que deveraacute haver entre a coisa donde

se toma a translaccedilatildeo e aquela aonde se conduz) 507 Exemplo de ldquoproportionerdquo e

ldquoconuenienzardquo lecirc-se em verso de Francesco Petrarca (Soneto CCCXXXV v 12) ldquoO

belle amp alte e lucide fenestrerdquo (Oacute belas amp altas amp luacutecidas janelas) 508 As razotildees de

Filiberto Campanile retecircm a afirmaccedilatildeo da proporccedilatildeo dos termos que fazem a metaacutefora de

Francesco Petrarca na voz do preceptista trata-se de boa metaacutefora por ser bem-

proporcionada

come lrsquohabitator drsquovna casa per mezzo dele finestre puograve veder le cose

che sono di fuori cosigrave lrsquoanima nostra per mezzo de gli occhi de corpo

vede gli oggeti che di fuori si le presentano 509

como o habitante de uma casa por meio das janelas pode ver as coisas

que estatildeo fora assim tambeacutem a nossa alma por meios dos olhos do

corpo vecirc os objetos que de fora se apresentam a eles 510

Natildeo eacute demais rememorar que Filiberto Campanile ao prescrever os pensamentos

os concetti puri traz exemplo do uso do substantivo ldquofenestrardquoldquofinestrardquo em versos do

505 Cf MUHANA A Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia Tratado Seiscentista de Manuel Pires de

Almeida Satildeo Paulo Edusp pp 109-110 506 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 36 507 Idem ibidem 508 Idem ibidem Traduccedilatildeo nossa Na versatildeo de Joseacute Clemente Pozenato ldquoOh belas altas luacutecidas janelasrdquo

cf PETRARCA F Cancioneiro Traduccedilatildeo de Joseacute Clemente Pozenato Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial

Campinas Editora da Unicamp 2014 p 485 509 Idem pp 36-37 510 Idem ibidem

166

soneto LXV de Francesco Petrarca a fenestra donde Amor lanccedilou mil setas contra o

indignado sujeito de enunciaccedilatildeo e postula que o deslocamento semacircntico produzido pela

metaforizaccedilatildeo do substantivo eleve o discurso para aleacutem dos efeitos da puritagrave511 Nos

termos do mesmo preceito elevaccedilatildeo eacute o que as ldquobelle amp alte e lucide fenestrerdquo compotildeem

O Hermoacutegenes lido por Filiberto Campanile ensina que a semnotēs (no italiano maestagrave

ou dignitagrave) efetua-se discursivamente por meio de pensamentos ennoiai que digam

respeito (i) aos deuses como ilustra o Timeu de Platatildeo (ii) agraves coisas divinas tal a

natureza e suas causas como ilustram Heroacutedoto e o Timeu (iii) agraves coisas divinas atinentes

aos homens que pesem a imortalidade da alma a justiccedila a temperanccedila as leis e questotildees

afins como ilustra Demoacutestenes e enfim (iv) agraves coisas humanas preeminentes e

endoxais quais as batalhas de Salamina e Maratona como ilustra Heroacutedoto (cf HERM

242 22-3 244 20-246 9)512 Ora se as ldquofenestrerdquoldquofinestrerdquo satildeo conceitualmente alma

agrave luz do Peri ideōn o que os versos de Francesco Petrarca enunciam satildeo ldquocoisas divinas

atinentes aos homensrdquo

Adverte ademais Filiberto Campanile ldquoOltre a ciograve si deuragrave mirar bene nel

formar dersquo traslati che non si piglino molto di lontanordquo (Aleacutem disso se deveraacute atentar

bem para o formar dos translatos que natildeo se tomem de muito distante) 513 Desatento ao

cuidado aponta o tratado Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia eacute Dante Alighieri (1265-

1321) na Commedia ao metaforizar ldquoaacuteguardquo como ldquospecchio di Narcissordquo (espelho de

Narciso) Nos comentaacuterios quatrocentistas de Cristoforo Landino (1424-1498) ao passo

do ldquoInfernordquo tal como impressos em Veneza em 1578 o ldquospecchio di Narcissordquo explica-

se como ldquoun limpido e chiaro fonte che Sinon per lrsquoardente febre non hauria uoluto

molte ad inuitar a leccarlordquo (uma liacutempida e clara fonte que Sinon pela ardente febre

natildeo quisera convidar muitos a lamber) 514 Filiberto Campanile pondera que melhor seria

511 Apud LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] p 15 512 Pontua Hermoacutegenes que o trato das coisas divinas se alegoriza as humanas agrave maneira poeacutetica faz mais

para o prazer e o deleite (hēdonē ἡδονή) e para a doccedilura e a suavidade (glykytēs ) do que para

a semnotēs do enunciado (cf HERM 242 22-243 5)512 e tambeacutem que o trato das coisas da natureza se

lhes indaga as causas como quando se buscam as razotildees dos movimentos da terra e do mar por exemplo

faz semnos o discurso mas natildeo poliacutetico (cf HERM 243 22-244 3) A indagaccedilatildeo causal da physis

depreende-se do preceito do Peri ideōn parece instaurar limiares aleacutem dos quais o discurso poliacutetico ainda

que partiacutecipe da semnotēs porque circunstancial natildeo avanccedila 513 Idem p 37 Traduccedilatildeo nossa 514 Cf Dante con le espositioni di Christoforo Landino et Alessandro Vellutello Sopra le sua Comedia

dellrsquoInferno del Purgatorio amp del Paradiso Con Tauole Argomenti Allegorie amp riformato riueduto amp

ridotto alla sua uera Lettura con Francesco Sansovino Fiorentino In Venetia Apresso Giambattista

Marchio Sessa amp Fratelli 1578 p 147v Os versos provecircm da Commedia Inferno XXX 128

167

se Dante tivesse eleito ao compor a translaccedilatildeo ldquoaltro nome di cosa piu conosciutardquo (outro

nome de coisa mais conhecida) como em sua avaliaccedilatildeo fez Francesco Petrarca no

soneto ldquoIl cantar novo ersquol pianger delli augellirdquo ao fazer uso da metaacutefora ldquoliquidi

cristallirdquo (cristais liacutequidos) uma vez que nas palavras do preceptista ldquogli occhi di nostra

mente con piu faciltagrave corrono a considerar le cose chrsquoaltre volte habbiamo veduto che

non quelle che solamente sentimmo raccontarerdquo (os olhos de nossa mente com mais

facilidade correm a considerar as coisas que outras vezes vimos que natildeo aquelas que

apenas ouvimos contar) 515

O pecado de Dante Alighieri pensa-se em termos aristoteacutelicos Conforme a

Poeacutetica sabe-se bem a metaacutefora por analogia de proporccedilatildeo (cf ARISTOT Poet 21 1457

b 9 ldquoκατὰ τὸ ἀνάλογονrdquo) concebe-se como transferecircncia de sentido entre quatro termos

postos em relaccedilatildeo de sorte que nas palavras de Aristoacuteteles em traduccedilatildeo de Eudoro de

Souza ldquoo segundo termo estaacute para o primeiro na igual relaccedilatildeo em que estaacute o quarto para

o terceiro porque nesse caso o quarto poderaacute substituir o segundo e o segundo o quartordquo

(cf ARISTOT Poet 21 1457 b 16-19 ldquoτὸ δὲ ἀνάλογον λέγω ὅταν ὁμοίως ἔχῃ τὸ

δεύτερον πρὸς τὸ πρῶτον καὶ τὸ τέταρτον πρὸς τὸ τρίτον ἐρεῖ γὰρ ἀντὶ τοῦ

δευτέρου τὸ τέταρτον ἢ ἀντὶ τοῦ τετάρτου τὸ δεύτερονrdquo) Assim de acordo com o

exemplo conhecidiacutessimo fornecido por Aristoacuteteles estaacute a taccedila (φιάλη) para Dioniso (ou

Baco) como o escudo (ἀσπίς) para Ares (ou Marte) de maneira que por relaccedilatildeo de

semelhanccedila a taccedila seja ldquoo escudo de Dionisordquo e o escudo seja ldquoa taccedila de Aresrdquo (cf

ARISTOT Poet 21 1457 b 20-22 ldquoλέγω δὲ οἷον ὁμοίως ἔχει φιάλη πρὸς Διόνυσον καὶ

ἀσπὶς πρὸς Ἄρη ἐρεῖ τοίνυν τὴν φιάλην ἀσπίδα Διονύσου καὶ τὴν ἀσπίδα φιάλην

Ἄρεωςrdquo) Concede a Poeacutetica que ainda que falte um dos quatro termos da relaccedilatildeo de

proporccedilatildeo ainda assim a metaacutefora pode se construir (cf ARISTOT Poet 21 1457 b 25-

26) Entende-se esse eacute o caso do exemplo colhido por Filiberto Campanile na Commedia

aacutegua Narciso espelho Oslash donde se enuncie que a aacutegua eacute o ldquospecchio di Narcissordquo

Sabe-se o preceptista condena Dante Alighieri senatildeo que pela distacircncia semacircntica dos

termos operados516

Mais a preceituaccedilatildeo aristoteacutelica prevecirc a construccedilatildeo da metaacutefora por analogia de

proporccedilatildeo por via da negaccedilatildeo de qualidades proacuteprias do termo metafoacuterico Por exemplo

o escudo em vez de ser dito ldquoa taccedila de Aresrdquo pode ser dito ldquoa taccedila sem vinhordquo (cf ARIST

515 Idem ibidem 516 Cf CARVALHO M DO S F DE Poesia de agudeza Satildeo Paulo Humanitas Edusp Fapesp 2007 p 86

168

Poet 21 1457 b 30-33) e a taccedila (ldquoTazzardquo) na leitura do conde Emanuele Tesauro pode

ser ldquoSCUDO NON DI MARTErdquo 517 Ensina Il Cannocchiale Aristotelico metaacuteforas dessa

derradeira espeacutecie ldquoformino vn composito monstruoso che per la nouitagrave generi

marauiglia amp questa il dilettordquo (formam um composto monstruoso que pela novidade

gere meravilha amp esta o deleite)518 ou pela conjugaccedilatildeo de um positivo (ldquoSCUDOrdquo) com

um negativo (ldquoNON DI MARTErdquo) ou pela conjugaccedilatildeo de positivos incompatiacuteveis De um

procedimento e de outro resultam ldquoEnimmi argutissimi amp marauigliosirdquo (Enigmas

argutiacutessimos amp maravilhosos)519

O exemplo referido por Emanuele Tesauro para elucidar a construccedilatildeo da metaacutefora

por analogia de proporccedilatildeo mediante a conjugaccedilatildeo de positivos incompatiacuteveis eacute relevante

ldquoCosigrave le limpide acque si chiaman LIQVIDI CRISTALLI amp per contrario il Poeta chiamograve il

Cristallo ACQUE CONGELATErdquo (Assim como as aacuteguas liacutempidas satildeo chamadas CRISTAIS

LIQUIDOS tambeacutem contrariamente o poeta chamou o Cristal AacuteGUAS CONGELADAS)520

Ora a fim de ilustrar a composiccedilatildeo da elocuccedilatildeo metafoacuterica Emanuele Tesauro como

Filiberto Campanile recorre a uso autorizado por Francesco Petrarca Nos termos de

Aristoacuteteles supotildee-se que os conceitos aacutegua e cristal embora dessemelhantes pois que

relativos a coisas dessemelhantes em substacircncia possam ser assemelhados por um

atributo comum a limpidez de modo que se diga por comparaccedilatildeo que ldquoa aacutegua eacute

liacutempida como o cristalrdquo e por condensaccedilatildeo da comparaccedilatildeo que ldquoa aacutegua eacute cristalrdquo521 Natildeo

eacute essa a metaacutefora todavia Francesco Petrarca modifica o sentido do substantivo ldquocristalrdquo

por meio do adjetivo ldquoliacutequidordquo e alcanccedila o efeito de estranhamento pela

incompatibilidade na doxa da conjugaccedilatildeo dos conceitos liquidez e cristal Ora se a

afirmaccedilatildeo ldquoa aacutegua eacute liacutequidardquo eacute definiccedilatildeo do elemento por uma qualidade como o eacute ldquoa

aacutegua eacute liacutempidardquo e ldquoa aacutegua eacute cristalrdquo eacute definiccedilatildeo da substacircncia mediante a metaacutefora por

analogia de atribuiccedilatildeo ldquoa aacutegua eacute cristal liacutequidordquo eacute metaacutefora engenhosa construiacuteda na

mesma regulaccedilatildeo de atribuiccedilatildeo sob conceitos paradoxais mas avizinhados Ora pode-se

517 Il cannocchiale aristotelico orsquo sia Idea dellarguta et ingeniosa elocutione che serue agrave tutta lrsquoarte

oratoria lapidaria et simbolica esaminata co principii del diuino Aristotele dal conte D Emanuele

Tesauro Cavalier Gran Croce dersquo Santi Mauritio et Lazaro Quarta impressione Accresciuta dallrsquo Autore

Trattati cioegrave Dersquo Concetti Predicabili et Degli Emblemi con un nuouo Indice Alfabetico oltre agrave quello

delle materie Dedicato al Reuerendiss Padre Gio Paolo Oliva Vicario Generale della Compagnia di

Giesu In Roma agrave Spese di Guglielmo Halleacute Libraro nella Piazza di Pasquino M DC LXIV [1664] Con

licenza dersquo Superiori E Priuilegio p 346 518 Idem ibidem 519 Idem ibidem 520 Idem ibidem 521 Cf HANSEN J A ldquoRetoacuterica da agudezardquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 pp 319-321

169

aventar trata-se de procedimento exemplar conforme Filiberto Campanile na

constituiccedilatildeo da maestagravesemnotēs

Isso posto para conceber ldquoEnimmi argutissimi amp marauigliosirdquo ou seja para

operar conceitos distantes522 Emanuele Tesauro reaplica o procedimento teacutecnico aos

termos colhidos de Francesco Petrarca ldquoLIQVIDI CRISTALLIrdquo e figura o que se pode

entender como metaacutefora da metaacutefora Assim na medida em que se aceite como verossiacutemil

a analogia de atribuiccedilatildeo entre esses termos eacute conveniente a seguinte relaccedilatildeo de

proporccedilatildeo liquidez aacutegua solidez cristal donde se possa afirmar natildeo soacute que ldquoa aacutegua

eacute cristal liquefeitordquo senatildeo tambeacutem por oposiccedilatildeo que ldquoo cristal eacute aacutegua solidificadardquo ou

por desdobramento semacircntico que ldquoo cristal eacute aacutegua congeladardquo Mediante a aplicaccedilatildeo do

mesmo procedimento entendem-se os ldquojaspes liacutequidosrdquo para conceituar mar referidos

no verso 210 da Soledad I de D Luis de Goacutengora523 Agrave letra dos preceitos de Filiberto

Campanile a metaforizaccedilatildeo enigmaacutetica ensinada por Emanuele Tesauro parece arriscar-

se agrave desmedida Conforme Manuel de Galhegos dessa desmedida afasta-se a Ulyssea ou

Lisboa Edificada de Gabriel Pereira de Castro Recorde-se

Nas metaforas tem moderaccedilaotilde amp propriedade porq saotilde poucas vsadas

em seu lugar amp todas fundadas na circunstancia mais vista amp mais

notoria dos sujeitos O q he taotilde deficultoso q obseruando Arist o

inaccessiuel da poesia diz q somente os homens de engenho preclaro

sabem vsar da metafora com perfeiccedilaotilde524

No ldquoDiscurso sobre o poema heroicordquo de Manuel Pires de Almeida a moderaccedilatildeo

e a propriedade natildeo apenas no uso das metaacuteforas operam-se como praacutetica distintiva dos

poetas que sejam dignos de elogio em contraste com os chamados poetas cultos

considerados dificultosos e viciosos pela aplicaccedilatildeo teacutecnica da elocuccedilatildeo rara feita

enumera o tratadista de ldquooraccedilotildees desatadas palavras esquisitas translaccedilotildees nunca vistas

522 Idem p 330 523 Cf Lecciones solemnes a las obras de Don Luis de Gongora y Argote Pindaro Andaluz Principe de

los poeta liricos de Espantildea Escrivialas Don Ioseph Pellicer de Salas y Tovar Sentildeor de la Casa de Pellicer

y Chronista de los Reinos de Castilla Dedicadas al Serenissimo Sentildeor Cardenal Infante Don Fernando de

Austria MDCXXX [1630] Con Priuilegio en Madrid En la Imprenta del Reino A costa de Pedro Coello

Mercader de Libros p 406 524 Apud Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de

Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro sp

170

locuccedilotildees peregrinas tropos duplicados figuras e metaacuteforas mui continuadas e sobretudo

a colocaccedilatildeo das coisas e disposiccedilatildeo do argumento intricado sem ordem nem arte nem

claridaderdquo525 Eacute liccedilatildeo que se conhece de Francisco de Quevedo e de passos anteriores

Leitor privilegiado de Gabriel Pereira de Castro ndash indica-o Adma Muhana o tratado

Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia datado de 1633 cita versos da Ulyssea ou Lisboa

Edificada estampado em 1636 526 ndash Manuel Pires de Almeida batendo-se contra o

ldquoIuizio del poemardquo de Manuel de Faria e Souza (1590-1649) acerca drsquoOs Lusiacuteadas527

permite que se desdobre em termos de facilidade ou de dificuldade a regulaccedilatildeo

normativa da elocuccedilatildeo agrave doutrina das formas ou ideias discursivas na ldquoResposta ao Juiacutezo

do Poema dos Lusiacuteadas de Luiacutes de Camotildees em que se mostra natildeo ter as perfeiccedilotildees que

lhe atribui e ter outras conformes a sua invenccedilatildeo e sua mateacuteriardquo peccedila de controveacutersia em

que sob a rubrica ldquoDa sexta perfeiccedilatildeo do poema heroicordquo se assevera

Eacute decreto que o estilo heroacuteico seja elegante e sublime e que com a alteza

se natildeo aparte da facilidade e doccedilura E assi o tem o nosso adversaacuterio

bem por extenso mas natildeo o provou com exemplos de Camotildees tendo

ele muitos para cada figura E teria eu por mais acerto governar-se por

Hermoacutegenes e Demeacutetrio Faleacuterio que tratam das ideias ou formas da

eloquecircncia como fez Escaliacutegero lib 4 Torquato Tasso Disc Her lib

5 e Felisberto Campanile que se aproveitaram das Retoacutericas de

Aristoacuteteles e Ciacutecero e das flores dos mais excelentes poetas heroacuteicos

que seguir o modo confuso com que se cansa muito e ensina pouco Se

se guiara pelos escritores referidos vira que a grandeza consta de

dignidade aspereza veemecircncia resplandor vigor e circuiccedilatildeo e que

daqui nasce o estilo sublime e ficara escusado de incorrer na culpa que

Apoio lanccedilou em rosto a Alexandre Vellutelo (como tem Bocalino cent

1 dos seus Ragguagli Rag 35) dizendo-lhe que o seu comentaacuterio sobre

o Cancioneiro de Petrarca tinha necessidade de mostrar as cores os [sic]

figuras e as mais formosuras poeacuteticas que havia no poeta florentino e

525 Cf MUHANA A ldquoDiscurso sobre o poema heroico Comentaacuteriordquo REEL Revista Eletrocircnica de

Estudos Literaacuterios Vitoacuteria a 2 v 2 2006 p 11 526 Cf MUHANA A Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia Tratado Seiscentista de Manuel Pires de

Almeida Satildeo Paulo Edusp p 71 527 Cf Lusiadas de Luis de Camoens priacutencipe de los poetas de Espantildea Al Rey N Sentildeor Felipe Quarto El

Grande comentadas por Manuel de Faria i Sousa Cavallero de la Orden de Christo i de la Casa Real hellip

Primero i Segundo Tomo Antildeo 1639 En Madrid Por Iuan Sanchez A costa de Pedro Coello Mercador de

libros pp 59-100

171

que o mais natildeo necessitava de notaccedilotildees e neste particular se unira ao

divino Fernando Herrera sobre Garcilaso que efeitua o que Apoio deseja

no Vellutelo [] Com estas consideraccedilotildees manifestara a elegacircncia e

alteza do estilo que haacute nos Lusiacuteadas com prova e com as mesmas

ensinara sua muita suavidade e clareza pois nele haacute tudo com mais

ventage do que pode encarecer a pena528

Ora Manuel Pires de Almeida avalia os juiacutezos de Manuel de Faria e Souza

considerado inepto para mostrar e demonstrar a operaccedilatildeo do misto de ldquoideias ou formas

da eloquecircnciardquo no estilo heroico Diga-se inepto conforme os pressupostos assumidos

pelo agenciamento equivocado dos discursos de autoridade em vez de ldquogovernar-serdquo por

Alessandro Vellutello comentador quinhentista de Francesco Petrarca 529 a fim de

evidenciar que no gecircnero de poema em debate o heroico ldquoalteza se natildeo aparte da

facilidade e doccedilurardquo melhor seria que Manuel de Faria e Souza recorresse a Hermoacutegenes

e a Demeacutetrio (ou Pseudo-Demeacutetrio de Falero) como fizeram Juacutelio Cesar Escaliacutegero

Torquato Tasso e Filiberto Campanile (dito Felisberto) Esses satildeo nomes de letrados que

tanto afianccedilam a resposta ao ldquoIuizio del poemardquo pela legitimidade e pela exemplaridade

do que escreveram quanto servem de fonte indireta dos preceitos retoacutericos de

Hermoacutegenes e de Demeacutetrio Defesa do misto da doutrina do misto que os referidos

retores normatizam e da autoridade desses gregos na composiccedilatildeo e no ajuizamento das

obras de poesia o passo de Manuel Pires de Almeida eacute tambeacutem mostra breve mas

relevante dos usos vernaculares de Hermoacutegenes pois que deixam observar que o lusitano

lecirc o Peri ideōn natildeo apenas segundo a latinizaccedilatildeo empreendida por Natale Conti como eacute

sabido pelo tratado Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia (1633) senatildeo tambeacutem segundo

glosas paraacutefrases e versotildees de Juacutelio Cesar Escaliacutegero de Torquato Tasso e de Filiberto

Campanile

Note-se os termos ldquodignidaderdquo ldquoasperezardquo ldquoveemecircnciardquo ldquoresplandorrdquo ldquovigorrdquo

e ldquocircuiccedilatildeordquo vertem respectivamente semnotēs trakhytēs sphodrotēs lamprotēs

akmēe peribolē espeacutecies de composiccedilatildeo do megethos referido como ldquoestilo sublimerdquo

O que natildeo se aparta e natildeo se deve apartar da alteza do sublime diz-se ldquofacilidaderdquo e

528 Apud PIRES M L G A criacutetica camoniana no seacuteculo XVII Lisboa Instituto de Cultura e Liacutengua

Portuguesa 1982 p 81-2 529 Cf Le volgari opere del Petrarcha con la espositione di Alessandro Vellutello da Luca [Vinegia]

MDXXV [1525]

172

ldquodoccedilurardquo Sabe-se ldquofacilidaderdquo verte eukrineia ao passo que ldquodoccedilurardquo glykytēs A

eleiccedilatildeo dos termos aiacute empregados em liacutengua portuguesa tem viacutenculos bastantemente

precisos com Filiberto Campanile no italiano isso eacute sabido lecirc-se dignitagrave asprezza

vehemẽza esplendore vigore e circuitione E tambeacutem dolcezza Jaacute o substantivo latino

facilitas e o italiano facilitagrave leem-se nas interpretaccedilotildees de perspicuitas (saphēneia)

trazidas entre os tratadistas de retoacuterica e de poeacutetica jaacute assinalados por Juacutelio Cesar

Escaliacutegero e por Gabriele Zinano respectivamente530 donde se possa compreender o

denominado ldquoestilo dificultosordquo ou as afirmadas dificuldades elocutivas para o

destinataacuterio da poesia culta pelo avesso da facilidade pela carecircncia da nitidez e da

clareza na chave da eukrineia de Hermoacutegenes como qualidades discursivas no

estabelecimento e na mistura apropriada das ideias que fazem o poema

Eacute oportuno trazer agrave lembranccedila que Manuel Pires de Almeida responde a Manuel

de Faria e Souza e ao fazecirc-lo centra-se na pressuposiccedilatildeo da ineacutepcia desse comentador

de Luiacutes de Camotildees para a invenccedilatildeo de provas que manifestem a conveniente variedade

de conformaccedilatildeo estiliacutestica drsquoOs Lusiacuteadas Lembraacute-lo eacute observar que o vocabulaacuterio de

contestaccedilatildeo empregado por Manuel Pires de Almeida pende de Manuel de Faria e Souza

natildeo somente lhe responde No ldquoIuizio del poemardquo prescreve-se

que o estilo sea elegatildete i sublime i que con la sublimidad no se aparte

de lo faacutecil i dulce cosa en que halla oy nadie igualoacute a Virgilio si a caso

nuestro Poeta no lo hizo necessario es discurrir un poco porq de alguacuten

modo se atreve a deslucir esta perfeciacuteotilde en egravel la senda que muchos de

los modernos han con notable engantildeo si ya no es con gran necesidad

haciendo della virtud [hellip] Porque aviendo hallado que el mezclar lo

suave i lo dulce i lo facil con lo grave i lo alto i lo sublime es muy

difiacutecil i lo cansa mucho i es menester tiẽpo para poco escrito de que

resultoacute detenerse Tucidides 27 antildeos en su historia i Virgilio casi la

mitad en su Poema sin dexarle acabado i Sanazaro 21 en el suyo i

Guarino otros tantos en su Pastor Fido hizieronse el embeacutes de los

grandes hombres que fue hazerse dificiles por locuciones i palabras

por no cansarse sin darseles de lo que cansan a quien los lee para no

530 Cf Iuli Caesaris Scaligeri uiri Poetices libri septem Ad Syluium Filium [Lyon] Apud Antonium

Vincentium 1561 p 176 Sommarii di varie retoriche greche latine et volgari Distintamente ordinati in

uno da Gabriele Zinano In Reggio Apresso Hercoliano Bartholi 1590 pp 198-201

173

volverlos a leer maacutes con que se quedan parecidos a tapizes del embegraves

que con el enredo de la hilaccedila apenas dexa ver forma alguna i

essotros al propio tapiz del derecho que cotilde agradable desassombro

alegra la vista con los colores i el entendimiento con las acciones de

figuras distintas que son los conceptos de la pintura Agora empieccedilo

yo No se persuada que puede agradar ni ser durable ni hazerse traer

en manos de todos ni aun ser leiacutedo una vez entera el Autor que en

qualquier genero de estudio escriviere con perpetua dificultad 531

que o estilo seja elegante e sublime e que com a sublimidade natildeo se

aparte do faacutecil e doce coisa em que observa-se hoje ningueacutem igualou

a Virgiacutelio se acaso nosso Poeta [sc Luiacutes de Camotildees] natildeo o fez

Necessaacuterio eacute discorrer um pouco porque de algum modo se atreve a

desluzir esta perfeiccedilatildeo nele a senda que muitos dos modernos seguem

com notaacutevel engano se jaacute natildeo eacute com grande necessidade fazendo dela

virtude [hellip] Porque observando-se que misturar o suave o doce e o

faacutecil com o grave o alto e o sublime eacute muito difiacutecil e cansa bastante e

[que] eacute mister tempo para pouco escrito do que resultou deter-se

Tuciacutedides 27 anos em sua Histoacuteria [da Guerra do Peloponeso] Virgiacutelio

quase a metade em seu Poema [sc a Eneida] sem deixaacute-lo acabado

Sannazzaro 21 no seu532 e Guarini outros tantos em seu Pastor Fido

[muitos dos modernos] fizeram-se o avesso dos grandes homens que

foi fazerem-se difiacuteceis por locuccedilotildees e palavras por natildeo se cansarem

sem que considerassem que cansam a quem os lecirc para natildeo voltar a lecirc-

los mais com o que se tornam parecidos com tapetes do avesso que

com o enredamento dos fios apenas deixa ver forma alguma e esses

outros [se tornam parecidos] com o proacuteprio tapete do direito que com

agradaacutevel desassombro alegra a vista com as cores e o entendimento

com as accedilotildees de figuras distintas que satildeo os conceitos da pintura Agora

principio eu Natildeo se persuada de que possa agradar nem ser duraacutevel

nem fazer-se trazer nas matildeos de todos nem ainda ser lido uma vez o

531 Cf Lusiadas de Luis de Camoens priacutencipe de los poetas de Espantildea Al Rey N Sentildeor Felipe Quarto El

Grande comentadas por Manuel de Faria i Sousa Cavallero de la Orden de Christo i de la Casa Real hellip

Primero i Segundo Tomo Antildeo 1639 En Madrid Por Iuan Sanchez A costa de Pedro Coello Mercador de

libros p 64 532 Isto eacute Jacopo Sannazzaro (1458-1530) Eacute verossiacutemil que Manuel de Faria e Souza faccedila referecircncia ao

poema bucoacutelico Arcadia

174

Autor que em qualquer gecircnero de estudo escreve com perpeacutetua

dificuldade 533

Ora para Manuel de Faria e Souza Homero Virgiacutelio Oviacutedio Lucano Dante

Petrarca Sannazzaro Ariosto Ronsard Garcilaso Camotildees e Tasso cujos nomes satildeo

arrolados adiante no ldquoIuizio del poemardquo estatildeo ldquoen las manos de todosrdquo534 Evidentemente

todos natildeo vislumbra nem mesmo virtualmente a totalidade do corpo social e poliacutetico

ibeacuterico no seacuteculo XVII senatildeo faz referecircncia a letrados da espeacutecie de Manuel de Faria e

Souza E pode ser lido como determinante que subentende o destinataacuterio impliacutecito dos

comentaacuterios e dos poemas de que se fala de sorte a definir o reverso insultuoso no

vitupeacuterio na invectiva em chave semelhantemente determinada Assim por exemplo

mesmo distante do poema heroico o padre Antocircnio Vieira censura o estilo culto de

pregaccedilatildeo no ldquoSermatildeo da Sexageacutesimardquo asseverando-o improacuteprio e desmedido ldquoO estylo

culto naotilde he escuro he negro amp negro boccedilal amp muyto cerradordquo535 Assim tambeacutem o faz

bem eacute sabido Francisco de Quevedo ao desaprovar a poesia culta de lenguaje heroico agrave

maneira de D Luis de Goacutengora dizendo-a hembrilatina de lenguaje hermafrodito

culterana ou Alcoran Macarronicordquo 536

Logo regrando-se a arte da poesia enfeixam-se os lugares que coroam a virtude

ou que condenam o viacutecio Pender de um passo a outro eacute risco a que se sujeita agrave luz do

ldquoIuizio del poemardquo o autor que se lance sobre a efetuaccedilatildeo da variaccedilatildeo de estilo no poema

heroico sem considerar as dificuldades de conjugaccedilatildeo do elegante e do sublime do faacutecil

e do doce e das mais ideias ou formas do dizer nas partes de maneira que o corpo do

poema como todo se faccedila condizente com o decoro de gecircnero pronto a estar ldquoen las

manos de todosrdquo e natildeo a fazer-se ldquono para los muchosrdquo 537 conforme D Luis de Goacutengora

Em Manuel de Faria e Souza eacute de se notar como o poema o tapete no avesso informes

no direito conformes e tambeacutem formosos Os poemas ldquodificiles por locuciones i

533 Traduccedilatildeo nossa 534 Cf Lusiadas de Luis de Camoens priacutencipe de los poetas de Espantildea Al Rey N Sentildeor Felipe Quarto El

Grande comentadas por Manuel de Faria i Sousa Cavallero de la Orden de Christo i de la Casa Real hellip

Primero i Segundo Tomo Antildeo 1639 En Madrid Por Iuan Sanchez A costa de Pedro Coello Mercador de

libros p 64 535 Cf Sermoens do P Antonio Vieira da Companhia de Iesu Preacutegador de Sua Alteza Primeyra Parte

Dedicada ao Principe N S Em Lisboa Na Officina de Ioam da Costa M DC LXXIX Com todas as

licenccedilas amp Privilegio Real pp 42-43 536 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 p 225 537 Cf GOacuteNGORA Y ARGOTE L DE Obras completas edicioacuten de Juan Milleacute y Gimeacutenez Isabel Milleacute y

Gimeacutenez Madrid Aguillar 1967 p 1224

175

palabrasrdquo afirmam-se disformes agrave semelhanccedila do avesso da tapeccedilaria donde se entenda

que sejam pensados pelo comentador de Luiacutes de Camotildees como obras de apreensatildeo

inadequada pois que o reverso do tapete embora decirc a ver os tramados da tessitura natildeo

mostra as formas nele bordadas lavradas e vecirc-las na face contraacuteria eacute natildeo vecirc-las como

conveacutem Nesses termos de doutrina os poema cansativos que enfadam os leitores e natildeo

se abrem pois a novas leituras porque dificultosos na obscuridade de seus efeitos

ajuiacutezam-se por comparaccedilatildeo natildeo se deixam admirar a contento

Recorde-se agrave luz de Horaacutecio podem ser lidas as consideraccedilotildees de Manuel de Faria

e Souza se penetradas pela prescriccedilatildeo do ut pictura poesis como destrinccedilada nos vv 361-

365 da Epistula ad Pisones conforme a liccedilatildeo latina do texto e a traduccedilatildeo de Marcos

Martinho dos Santos

ut pictura poesis erit quae si propius stes

te capiat magis et quaedam si longius abstes

haec amat obscurum uolet haec sub luce uideri

iudicis argutum quae non formidat acumen

haec placuit semel haec deciens repetita placebit

Como a pintura a poesia Existiraacute a que se mais perto te ateacutens

mais te cative e alguma se mais longe te manteacutens

esta ama o escuro sob a luz quer ser vista aquela

que a agudeza arguta do juiz natildeo intimida

uma aprouve uma vez outra dez vezes repetida aprazeraacute538

Ou conforme a versatildeo anocircnima portuguesa estampada em 1639 ano de publicaccedilatildeo

do ldquoIuizio del poemardquo de Manuel de Faria e Souza e reestampada em 1657 em 1668 e

em 1681 Eacute versatildeo feita letra a letra

Poeumlsis A Poesia erit seragrave Vt pictura como hũa imagem pintada quaelig a

538 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4

p 208 Em traduccedilatildeo em versos de D Rita Clara Freyre de Andrade impressa em 1781 lecirc-se ldquoAacute Poesia e

Pintura tem por certo Huns pedaccedilos que agradaotilde mais deperto E outros que de longes saotilde melhores

Naotilde receia dos olhos julgadores A aguda perspicacia quem conhece Que esta ser vista aacutes claras apetece

E que pequena lux aacute aquella assista Huma agrada huma vez somente vista Mas outra agradaraacute vista

dez vezesrdquo cf Arte poetica de Q Horacio Flaco traduzida em verso rimado e dedicada a memoria do

Grande Augusto por D Ritta Clara Freyre de Andrade hellip Coimbra Na Regia Officina da Universidade

M DCCLXXXI [1781] Com licenccedila da Real Meza Censoria p 36

176

qual Te capiat magis vos agradaragrave mais si stes se estiuerdes propiugraves

mais perto amp quaeligdam amp outra vos pareceragrave bem si longiugraves abstes se

estiuerdes de longe afastado Haec esta amat quer obscurum que se

veja com pouca luz haec aquella uolet quereragrave uideri ser vista sub luce

agraves claras quaelig a qual non formidat naotilde recea nem tem medo acumen da

agudeza da vista argutum delicada Iudicis do que a ve Haec esta placuit

semel contentou quando muito hũa vez haec aquella placebit

contentaragrave deciens repetita quatildetas vezes for vista 539

Isto seja fundado no paralelismo entre a poesia e a pintura Horaacutecio regula o estilo

das obras ou poeacuteticas ou pictoacutericas agrave luz de sua destinaccedilatildeo adequada Mais precisamente

atento tanto aos preceitos de produccedilatildeo da poesia e da pintura quantos aos protocolos de

justa recepccedilatildeo das obras dessas artes regula a destinaccedilatildeo adequada conforme o estilo

ideado e enformado pelos artiacutefices540 Esmiuacuteccedila-o Marcos Martinho dos Santos no artigo

ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacuteciordquo um eacute o poema breve visto sob a luz ldquocuja

elocuccedilatildeo o poeta burila para que seja luzidiardquo outro o longo visto com pouca luz ldquocuja

disposiccedilatildeo o poeta planeja para que seja coerenterdquo um porque breve ldquoexige do poeta

que lapide uma a uma as palavras isto eacute que labore na elocuccedilatildeo mas porque carece de

partes dispensa-o da disposiccedilatildeordquo outro porque longo ldquoexige do poeta que encadeie tiras

inteiras de palavras isto eacute que labore na disposiccedilatildeo mas porque transcende a

singularidade das palavras permite-lhe que cochile na elocuccedilatildeordquo enfim um porque

breve ldquoeacute composiccedilatildeo mais minuciosa cujas palavras se devem inspecionarrdquo outro

539 Cito a ediccedilatildeo de 1668 Obras de Horacio principe dos poetas latinos lyricos com o entendimento litteral

amp construiccedilam Portuguesa ornadas de hum index copioso das historias amp fabulas contiudas nelas

Emendadas nesta vltima Impressam Lisboa Na Officina de Ioam da Costa M DC LXVIII [1668] Com

as licenccedilas neceszligarias p 448 Cf Obras de Horacio principe dos poetas latinos lyricos com o

entendimento litteral amp construiccedilatildeo Portuguesa ornadas de hum index copioso das historias amp fabulas

conteudas nellas Emendadas nesta ultima Impressatildeo Lisboa Na Officina de Miguel Manescal amp agrave sua custa M DC LXXXI [1681] Com as licenccedilas neceszligarias p 448 540 No comentaacuterio de D Gastatildeo Fausto da Cacircmara Coutinho (1772-1852) aos vv 361-365 de Horaacutecio lecirc-

se apreciaccedilatildeo distinta com base no Abade Charles Batteux (1713-1780) ldquo(361) Ut pictura poeumlsis erit etc

= Aqui natildeo se-trata das Artes comparadas entre si mas sim das obras como diz o Abbade Batteux Bem

como na ha Pintura ha o claro que eacute a parte do painel aonde fere a claridade Picturaelig Lumen assim tambem

na Poesia ha o escuro umbra que eacute a parte do painel da luz e eacute por isto que se-deve olhar para a toda em

harmonia e natildeo desmembradamente por parte pois que tanto na Pintura como na e Escultura se-potildee em

uso a oacutepticardquo cf Paraphrase da Epistola aos Pisotildees commumente denominada Arte Poetica de Quinto

Horacio Flacco com annotaccedilotildees sobre muitos lugares por D Gastatildeo Fausto da Camara Coutinho

Bibliothecario da Bibliotheca da Marinha Lisboa Na Typographia de Joseacute Baptista Morando rua do

Moinho de Vento nordm 59 1853 p 150

177

porque longo ldquoeacute composiccedilatildeo mais difusa cujo todo se deve contemplarrdquo 541 Esses

pressupostos vincam os comentaacuterios de Manuel de Faria e Souza a Os Lusiacuteadas e lhe

fundamentam os juiacutezos no passo supracitado

Assim visto que programaticamente seja efetuada a poesia como a pintura ou a

pintura como a poesia o tradutor e comentador castelhano da epiacutestola Juan Villen de

Biedma autor do volume Q Horacio Flacco poeta lyrico latino Sus obras con la

declaracion magistral en lengua castellana impresso em Granada em 1599 faz de

Ticiano exemplo de pintor cuja obra se deva admirar agrave maneira do poema longo ldquoEn

nuestros tiempos la pintura de Ticiano tuuo esto q quiso por mirada de lexos y ay otras

q tienẽ toda su perfeccion de cerca porq la distincion de sus partes sufre mayor examenrdquo

ou seja ldquoEm nossos tempos a pintura de Ticiano teve isto que quis por mirada de longe

e haacute outras que tecircm toda sua perfeiccedilatildeo de perto porque a distinccedilatildeo de suas partes sofre

541 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacuteciordquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2000 v 4 p 208 Ora leitor da Epistula ad Pisones Emanuele Tesauro no panegiacuterico Il giudicio discorso academico

sopra il talento di due predicatori lrsquoAlbrici amp lrsquoOrimbelli lido em ediccedilatildeo de Milatildeo de 1660 fundamentado

nos vv 361-365 de Horaacutecio que doutrinam o ut pictura poesis discrimina semelhantemente eloquentes

duas maniere de compor ldquoHor come nellrsquoArte della Pittura srsquoinsegnano due maniere ambe dignissime di

gloria vguale benche diuersissime di talento lrsquovna di imaginar Corpi con tratti gagliardi e grosso colorito

che vicini paiono vnrsquoimbratto di tele ma lontani han forza e vita lrsquoaltra di finir con delizadezza ogni

coserella agrave punta di penello come le miniature che chiamam lrsquoocchio vicino cosigrave due sono i Generi

principali del fauelare lrsquovno si proportiona aglirsquontelleti di acuta veduta lrsquoaltro agrave quersquo del Popolo chi

veggiono debilmente amp come di lontano Quanto maior populus sit dice il mio Maestro tanto longius

spectat Il primo Genere si chiamograve dal medesimo ESQVISITO il secondo CONCERTATIVO quello arsquo

libri questo alla viua voce si adatta quello allrsquoEpica questo alla Scenica si paragona quello egrave come le

saette sottile e pungente questo come le bombarde strepitoso amp infiammato questo fugrave propio di Vlisse questo di Neacutestore quello in Tucidide e Quintiliano questo in Demostene e Cicerone risplende quello egrave

Attico e salso questo Asiatico e dolce quello nelle Academiche declamationi questo nelle Forensi

ringhieri marauigliosamente trionfa Quinci vn di queste due Generi portato nell Teatro dellrsquoatro Genere

non hagrave piu gratiardquo [Ora como na arte da pintura se ensinam duas maneiras ambas digniacutessimas de gloacuteria

igual ainda que diversiacutessimas de talento uma de imaginar corpos com traccedilos galhardos e grosso colorido

que vizinhos parecem um emaranhado de teias mas distantes tecircm forccedila e vida outra de arrematar com

delicadeza toda coisinha agrave ponta de pincel como as miniaturas que chamam olho para perto assim satildeo os

dois gecircneros principais do pregar um eacute proporcionado aos intelectos de aguda vista outro ao intelecto do

povo que vecirc debilmente e como que de longe ldquoQuanto maior populus sitrdquo diz meu mestre ldquotanto longius

spectatrdquo O primeiro gecircnero foi chamado pelo mesmo de peregrino o segundo de concertativo aquele aos

livros este agrave viva voz se adapta aquele agrave eacutepica este ao teatro se compara aquele eacute como as setas sutil e pungente este como as bombardas estrepitoso e inflamado aquele foi proacuteprio de Ulisses este de Nestor

aquele de Tuciacutedides e Quintiliano este em Demoacutestenes e Ciacutecero resplandece aquele aacutetico e salgado este

asiaacutetico e doce Aquele nas acadecircmicas declamaccedilotildees este nas causas forenses maravilhosamente triunfa

Daiacute que um desses dois gecircneros levado ao teatro do outro natildeo mais tem graccedila] cf Panegirici et

ragionamenti del Conte D Emanuele Tesauro Caualier Gran Croce dersquo SS Mauritio e Lazaro Dedicati

alla Regale Altezza di Madama Christiana di Franchia Duchessa di Savoia Reina di Cipri Gloria del

Nostro Secolo Volume Terzo In Torino MDCLX [1660] Appresso Bartolomeo Zauatta Con licenza dersquo

Superiori Et Priuilegio pp 82-83 TESAURO E ldquoO Juiacutezo (Panegiacuterico Acadecircmico)rdquo Traduccedilatildeo de Joatildeo

Adolfo Hansen in CANIATO B MINEacute E (Org) Abrindo Caminhos Homenagem a Maria Aparecida

Santilli Satildeo Paulo Aacuterea de Poacutes-Graduaccedilatildeo de Estudos Comparados de Literaturas de Liacutengua Portuguesa-

FFLCH 2002 pp 167-8

178

maior examerdquo542 Horacianamente poreacutem para Manuel de Faria e Souza nada disso haacute

na ldquosenda que muchos de los modernos han con notable engantildeordquo o ldquoAutor que em

qualquer gecircnero de estudo escreve com perpeacutetua dificuldade543rdquo ao mirar imiscuir com

ineacutepcia kharaktēres ou ideai estiliacutesticos consoante os preceitos retoacutericos de Demeacutetrio e

de Hermoacutegenes natildeo se leraacute dez vezes como o poeta de poema breve sequer uma como

o poeta de poema longo seraacute inadvertidamente lido como artiacutefice de obra disforme tal o

avesso do tapete pouco admiraacutevel porque nele nada haacute do que haacute nas pinturas de Ticiano

a levar-se a semelhanccedila adiante

Para Manuel Pires de Almeida interessam menos os conselhos e as deliberaccedilotildees

do comentador de Luiacutes de Camotildees mais a defesa do desgoverno do comentaacuterio tomado

por cego agraves ldquoideias ou formas da eloquecircnciardquo na enformaccedilatildeo do estilo misto nrsquoOs

Lusiacuteadas por carecer o ldquoIuizio del poemardquo do agenciamento das liccedilotildees ou do Peri

hermēneias ou do Peri ideōn Na preceptiva de Hermoacutegenes afirma-se de fato ser difiacutecil

(δυσχερής) a mistura () das ideai a katharotēs com a peribolē jaacute postas em

542 O passo de Juan Villen de Biedma na iacutentegra eacute o seguinte ldquoPoesis erit vt pictura la poesia sera como

la pintura quae te capiat magis que te quadrara mas si stes propius si estes mas cerca amp quaedatilde y

ay otra q te parecera bien si longius abstes si estas de lexos En nuestros tiempos la pintura de Ticiano

tuuo esto q quiso por mirada de lexos y ay otras q tienẽ toda su perfeccion de cerca porq la distincion de

sus partes sufre mayor examen haec amat obscurum la vna requiere los lexos para sus sotildebras porque

assi parece mejor y no es porq tenga faltas que encubrir sino porque esta hecha con tal artificio que

resplandece de lexos volet haec sub luce videri y esta otra que es para de cerca quiere ser vista a la

luz quaelig non formidat que no tiene miedo ni rihuye iudicis argutum acumen al ingenio agudo de juez

que la mira porque quatildeto mas a lo claro se vee tatildeto mejor parece y lo obscuro su hermosura amortigua

haec placuit semel esta segunda basto mirarla vna vez haec deciens repetita placebit esta otra a lo clato muchas vezes vista agradara Assi de la misma manera ay poesias que son para de lexo miradas de

relaacutempago como no se pueda reparar en ellas no porque tengan el artificio que a pintura de lexos sino

porque son para ser oydas y no consideradasrdquo [Poesis erit vt pictura a poesia seraacute como a pintura

quae te capiat magis que te satisfaraacute mais si stes propius si estiverdes mais perto amp quaedatilde e haacute

outra que te parecera bem si longius abstes si estiverdes de longe Em nossos tempos a pintura de

Ticiano teve isto que quis por mirada de longe e haacute outras que tecircm toda sua perfeiccedilatildeo de perto porque a

distinccedilatildeo de suas partes sofre maior exame haec amat obscurum uma requer los lexos para suas sombras

porque assim parece melhor e natildeo eacute porque tenha faltas que encobrir senatildeo porque estaacute feita com tal

artifiacutecio que resplandece de longe volet haec sub luce videri e esta outra que eacute para de perto quer ser

vista agrave luz quaelig non formidat que natildeo tem medo nem rihuye iudicis argutum acumen o ingenho agudo

do juiz que a mira porque quanto mais ao claro se vecirc tanto melhor parece e o obscuro sua formosura amortigua haec placuit semel esta segunda bastou vecirc-la uma vez haec deciens repetita placebit esta

otra a lo clato muitas vezes vista agradaraacute Assim da mesma maneira haacute poesias que satildeo para de longe

miradas de relacircmpago como no se pueda reparar en ellas natildeo porque tenham o artifiacutecio que a pintura de

longe senatildeo porque satildeo para serem ouvidas e natildeo consideradas] cf Cf Q Horacio Flacco poeta lyrico

latino Sus obras con la declaracion magistral en lengua castellana por el Doctor Villen de Biedma Con

Privilegio En Granada Por Sebastian de Mena Antildeo de 1599 A costa de Iuan Diez mercader de libros p

320 543 Cf Lusiadas de Luis de Camoens priacutencipe de los poetas de Espantildea Al Rey N Sentildeor Felipe Quarto El

Grande comentadas por Manuel de Faria i Sousa Cavallero de la Orden de Christo i de la Casa Real hellip

Primero i Segundo Tomo Antildeo 1639 En Madrid Por Iuan Sanchez A costa de Pedro Coello Mercador de

libros p 64

179

confronto uma que confere primazia agrave nitidez da disposiccedilatildeo outra que apela agrave

abundacircncia do discurso a saphēneia com o peritton (o exuberante o incomum o

redundante) e o meston (o saturado o cheio) ambos pensados como graus amplificados

da peribolē que faceam os meios de clareza e evitam a vulgaridade 544 a semnotēs com

o lepton (o pequeno o deacutebil o leve) espeacutecies cujos atributos efetuam matizes em termos

de res et verba entre a solenidade e a sutileza a kharis (graccedila) com o diērmenos (elevado)

o megethos aquela recobrendo este de seduccedilatildeo545 a apheleia com a sphodrotēs uma de

constituintes que se avizinham do vulgar outra de forma veemente por vezes violenta

nada doce nada moderada a hēdonē (prazer) com a trakhytēs fazendo concorrer deleite

e aspereza donde entenda Hermoacutegenes que seja preciso audaacutecia aquela de Homero

aquela de Demoacutestenes (cf HERM 279 24-26) para fazer as mesclas (cf HERM 279 24-

280 12) Todavia destaca o tratadista natildeo se devem compreender as espeacutecies discursivas

(ldquo εἴδη rdquo) ldquole forme della orationerdquo segundo Giulio Camillo Delminio

como contraacuterias como o satildeo o quente e o frio a morte e a vida ou a noite e o dia pois

que elas podem coexistir e mais admiraacutevel se faraacute o discurso em que coexistam em

decorrecircncia da mistura adequada (cf HERM 279 17-23) Pode-se aventar o Peri ideōn

itera um modo regrado de variedade no emprego discursivo das ideai O regramento

opera-o como se veraacute depois de vislumbrado o monstrum a derradeira idea preceituada

no tratado a deinotēs

Nessa pragmaacutetica a consecuccedilatildeo da mistura eacute lugar de audaacutecia e de excelecircncia

poeacutetica Este eacute o lugar de Gabriel Pereira de Castro segundo Manuel de Galhegos

solidaacuterio com os princiacutepios artiacutesticos de Manuel Pires de Almeida Da dificuldade do

poema heroico da rareza de sua composiccedilatildeo da engenhosidade do poeta sabe-se haacute

muito porque lhe encarece o aparato epidiacutetico porque o enuncia o ldquoDiscurso Poeacuteticordquo

explicitamente Eacute conveniente aos discursos prologais Itere-se deve-se portanto

entender como amplificaccedilatildeo de efeito demonstrativo porque evidecircncia de aptidatildeo de

juiacutezo de soleacutercia e de eloquecircncia a afirmaccedilatildeo apologeacutetica de que a Ulyssea ou Lisboa

Edificada conjuga traccedilos de elocuccedilatildeo tatildeo variados como a clareza a enargia a grandeza

a formosura a brevidade a maravilha a verdade a gravidade a tristeza a alegria a

ferocidade a severidade e a elegacircncia

544 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 p 47 545 CHIRON P ldquoAs ambiguidades da lsquograccedilarsquo (kharis) no tratado Do estilo de Demeacutetrio (Ps-Demeacutetrio de

Falero) Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2003 v 7 p 202

180

Natildeo parece preciso reiterar dados os lugares de censura agenciados no ldquoIuizio del

poemardquo de Manuel de Faria e Souza dados os preceitos contrapostos na ldquoResposta ao

Juiacutezo do Poema dos Lusiacuteadas de Luiacutes de Camotildees em que se mostra natildeo ter as perfeiccedilotildees

que lhe atribui e ter outras conformes a sua invenccedilatildeo e sua mateacuteriardquo de Manuel Pires de

Almeida que essa minuciosa classificaccedilatildeo das ideai e essa hiperdeterminaccedilatildeo de seus

efeitos providas pelo Peri ideōn pressupotildeem que para a mestria do poeta componha na

fatura heroica ou natildeo consoante a pragmaacutetica do misto aiacute teorizada e normatizada natildeo

basta a saphēneia e tampouco basta o contrapeso dos matizes decorrentes do uso

discursivo das formas de grandiosidade o megethos e suas espeacutecies Conveacutem ademais

visitar a epimeleia (ἐπιμέλεια) e o kallos () Parafraseando Ciacutecero para quem

entre os officia do orador ldquoProbare necessitatis est delectare suavitatis flectere

victoriaerdquo ldquoProvar eacute da necessidade deleitar eacute da suavidade mover eacute da vitoacuteriardquo (CIC

Or XI 69) Johannes Sturm afirma que o emprego da forma aperta (saphēneia) eacute da

necessidade (ldquonecessitatis estrdquo) da forma magna (megethos) eacute da dignidade (ldquodignitatisrdquo)

e da forma pulchram (kallos) eacute do contentamento (ldquoiucunditatisrdquo)546 A versatildeo seiscentista

de Giulio Camillo Delminio o ensina

Doppo il parlare della Chiarezza amp della Dignitate secondo la

Grandezza conseguente cosa egrave hauer ragionamento della Diligenza amp

Bellezza che alla oratione si richiede Perche fagrave bisogno alla oratione

chiara amp gonfia amp di dignitate ripiena del tutto alcuna belleza amp

melodiacutea se non vogliamo che ella si mostri come acerba amp egrave

manifestoacute che agrave cosigrave fatta oratione egrave contraria la negletta amp priua di

numero amp simplice di construttione547

Apoacutes falar da Clareza amp da Dignidade segundo a Grandeza

consequente coisa eacute discorrer sobre a Diligecircncia amp Beleza que ao

546 Cf ldquoIoannis Sturmii Scholae in Librum II De formis orationum seu dicendi generibusrdquo in Hermogenis

Tarsensis rhetoris acutissimi De dicendi generibus siue formis orationum libri II Latinitate donati amp

scholis explicati atque illustrati a Ioan Sturmio Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo ad annos octo

Excudebat Iosias Rihelis MDLXXI p 266 Eacute lugar que se itera em Gerard Joannes Vossius cf Gerardo

Ioannis Vossi Commentariorum rhetoricorum sive oratoriarum institutionum Pars altera Lugduni

Batavorum Ex officina Ioannis Maire MDCXLIII [1643] p 504 547 Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Gerard Joannes Vossius (1577-1649)Domenico Salomoni Al Sigr Andrea Sasso

svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica Con

Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini pp 24r-v

181

discurso se reivindica porque se faz necessaacuteria ao discurso claro amp

cheio amp de todo repleto de dignidade alguma beleza amp melodia se natildeo

queremos que ele se mostre algo acerbo E eacute manifesto que ao discurso

assim feito eacute contraacuterio o negligente amp privado de ritmo amp vulgar de

construccedilatildeo548

Os termos empregados por Giulio Camillo Delminio Chiarezza Dignitate

Grandezza Diligenza e Bellezza vertem respectivamente os substantivos gregos

saphēneia semnotēs megethos epimeleia e kallos (cf HERM 296 5-14) Os derradeiros

recobrem categoria uacutenica e satildeo no ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos

interpretados pelas ideias de fermosura de galhardia549 Em Jorge de Trebizonda kallos

eacute ou venustas ou pulchritudo 550 Em Antocircnio Bonfine diferentemente epimeleia eacute

diligentia e kallos eacute decora551 Recorde-se o adjetivo ldquodecorusrdquo eacute lido no Hermogenis

Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta traduzido por

Gaspar Laurent para verter semnotēs e pode significar ldquodecorosordquo ldquodignordquo ldquonobrerdquo

ldquoeleganterdquo ou ldquobelordquo Em Natale Conti lecirc-se diligentia e pulchritudo552 Em Francisco

Porto natildeo haacute traduccedilatildeo da prescriccedilatildeo de Hermoacutegenes mas o iacutendice do volume em latim

traz pulchritudo orationis em referecircncia a kallos553 Em Johannes Sturm epimeleia eacute

accurata dicendi forma e kallos eacute pulchra forma554 Em Pedro Juan Nuntildeez kallos eacute

venustas555 Em Filiberto Campanile os termos toscanos agrave maneira de Giulio Camillo

548 Traduccedilatildeo nossa 549 Apud Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de

Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro sp 550 Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia ad

D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] p 496 551 Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii item

Sophistaelig Praeligexercitamenta Antonio Bonfine asculano interprete Apud Seb Gryphivm Lvgdvni 1538 p 216 552 Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] p 228 553 Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices magistri Francisci Porti

Cretensis opera industriaacuteque illustrati atque expoliti Genevaelig apvd I Crispinvm MDLXIX [1569] sp 554 Cf Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II

Latinitate donati amp scholis explicati atque illustrati A Ioan Stvrmio Cum Gratia amp Priuilegio Caeligsareo

ad anno octo Excudebat Iosias Rihelius MDLXXI [1571] p 163 555 Cf Pet Iohan Nunnesii valentini Institutionum rhetoricarum libri quinque Editio tertia ceteris multo

correctior et locupletior exemplis Barcinone ex typographia Sebastiani agrave Cormellas An 1593 p 337

182

Delminio satildeo diligenza e bellezza556 Em Gabriele Zinano kallos eacute belleza557 Em Gaspar

Laurent iteram-se as eleiccedilotildees de Johannes Sturm558 Em Manuel Pires de Almeida kallos

eacute ou espeacutecie ou forma ou ideia de dizer formosa559 Em Jerocircnimo Soares Barbosa eacute estilo

Bello560 Assim epimeleia eacute ou diligentia ou accurata dicendi forma ou diligenza e kallos

eacute ou venustas ou pulchritudo ou decora ou pulchra forma ou bellezza ou fermosura ou

galhardia ou ideia de dizer formosa ou estilo Bello o que conjuga numa mesma e uacutenica

categoria de conformaccedilatildeo discursiva entre as liccedilotildees latinas e vernaacuteculas que traduzem ou

glosam o Peri ideōn ou dele pendem distintos usos Gaspar Laurent nos comentaacuterios ao

passo da doutrina assim fixa os termos

Adhibenda est in toto genere orationis ἐπιμέλεια amp accurata

ratio vt oratio sit grata elegans concinna amp studium ostendat

aduersus incuriam neglectum amp aduersus rusticitatem amp agreste

genus dicendi amp dissolutum561

Deve-se empregar em todo gecircnero de discurso epimeleia amp kallos

arrazoado acurado para que o discurso seja agradaacutevel elegante

harmonioso amp ostente o estudo contra a falta de cuidado a negligecircncia

amp contra a rusticidade amp o gecircnero de dizer agreste amp dissoluto562

Entende-se pois a eleiccedilatildeo de diligentia accurata dicendi forma ou diligenza

556 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 75 557 Cf Sommarii di varie retoriche greche latine et volgari Distintamente ordinati in uno da Gabriele

Zinano In Reggio Apresso Hercoliano Bartholi 1590 pp 207-208 558 Cf Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione

contextu Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 350 559 Cf MUHANA A A Epopeacuteia em Prosa Seiscentista uma definiccedilatildeo de gecircnero Satildeo Paulo Editora da

Unesp 1997 p111 560 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel p 430 561 Cf ldquoIn Hermogenis tractatvm de ideis sive de formis eloqventiaelig Gasparis Laurentij commentariusrdquo

in Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 153 562 Traduccedilatildeo nossa

183

pelos inteacuterpretes referidos Acentua Michel Patillon em nota agrave ediccedilatildeo francesa do texto

que epimeleia termo por ele vertido como ldquoeacuteleacutegancerdquo eacute categoria que tal como

compreendida por Hermoacutegenes encerra a noccedilatildeo de estudo563 de modo que se oponha

como se lecirc na traduccedilatildeo de Giulio Camillo Delminio agrave forma ldquoneglettardquo (ἀμελής) ldquopriua

di numerordquo (ἄρρυθμος) e ldquosimplice di construttionerdquo (εὐτελής) ou seja negligente

privada de ritmo e vulgar de construccedilatildeo Recorde-se que em Hermoacutegenes eutelēs pensa-

se em contraposiccedilatildeo a megethos (cf HERM 241 11-15) Nas Scholae de Johannes Sturm

sobre o Peri ideōn pelas quais Gaspar Laurent tem simpatia desdobra-se semanticamente

o preceito de que o retor grego faz uso564

Hanc formam Graeci nominant quia pulchritudo ista debet

esse coniuncta cum honestate non debet esse cerussa aut fuco

meretricio accersita sed agrave natura accepta studio amp diligentia

conservata virtutibus autem ornata amp hinc propter diligentiam in

conservando ἐπιμέλεια vocatur Tametsi enim pulchritudinem nobis

natura largiatur tamen cura atque diligentia conservatur 565

Esta forma os gregos denominam kallos porque tal beleza deve estar

conjugada com a honestidade natildeo deve ser afetada pela cerusa ou pela

puacuterpura da meretriz mas aceita pela natureza conservada pelo estudo

amp diligecircncia ornada poreacutem pelas virtudes daiacute que a epimeleia seja

chamada a conservar proximamente a diligecircncia Ainda que de fato a

natureza nos conceda a beleza ainda assim eacute conservada pelo cuidado

e pela diligecircncia 566

O leacutexico de Johannes Sturm pode ser observado agrave distacircncia mais curta Sem

diligentia sem cura orna-se viciosamente o discurso A meretriz o letrado potildee agrave vista

como figura que metaforiza a pulchritudo sem honestas a beleza feita dos descuidos da

563 Patillon uso o termo ldquorechercherdquo cf HERMOGEgraveNE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale

introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 397 564 Cf PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New Jersey

Princeton University Press 1970 pp 53-54 565 ldquoIoannis Sturmii Scholae in Librum I De formis orationum seu dicendi generibusrdquo in Hermogenis

Tarsensis rhetoris acutissimi De dicendi generibus siue formis orationum libri II Latinitate donati amp

scholis explicati atque illustrati a Ioan Sturmio Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo ad annos octo

Excudebat Iosias Rihelis MDLXXI p 244 566 Traduccedilatildeo nossa

184

natureza que as cores tornam desmedida a que o orador e o poeta devem evitar Para

evitaacute-lo o imperativo eacute breve o kallos natildeo deve buscar nem a cerussa nem o fucus Satildeo

termos sabidos da Naturalis historia de Pliacutenio o Velho (sec I dC) ambos referem cores

o primeiro cor austera de pigmento branco extraiacutedo da escoacuteria do chumbo (cf PLIN NH

XXXIV 70 XXXV 12) 567 o segundo planta marinha o fuco de que se extrai tintura

vermelha e por metoniacutemia a proacutepria cor (cf PLIN NH XXVI 103 QUINT XII 10 75)

O branco da cerusa e o puacuterpura do fuco datildeo cor agrave face da meretriz no exemplum por

semelhanccedila dizem o ornamento que ostenta a ineacutepcia o descuido a desonestidade e a

vulgaridade da obra e do artiacutefice Conforme o De oratore Antocircnio o ensina trata-se ao

cabo de facear os preceitos da arte e regulaacute-los com moderaccedilatildeo mediante a virtude das

virtudes a diligecircncia (CIC De or II 147-150)

Na versatildeo de Jorge de Trebizonda a mais antiga em latim venustas ou

pulchritudo define-se como ldquoomniũ quibus oratio cotildeficitur cotildeueniẽtia quaeligdam amp

modus qua cum succus quidam amp qualitas tanquam color orationis elucetrdquo ou seja

ldquoproporccedilatildeo de todas as coisas por meio das quais se constroacutei um discurso amp justa medida

com as quais certa vitalidade e a qualidade do discurso como uma cor resplandecerdquo 568

Consoante os preceitos de Hermoacutegenes note-se bem esta idea compreende-se tanto

como symmetria (συμμετρία) dos stoikheia constituintes das ideai operadas num

discurso donde convenientia na liccedilatildeo latina proporccedilatildeo quanto como poiotēs ēthous

(ἤθους) do todo e da parte qualidade de caraacuteter donde qualitas orationis

qualidade do discurso e por comparaccedilatildeo khrōma (χρῶμα) donde color cor do corpo

de belas cores de bela compleiccedilatildeo (εὔχροια) (cf HERM 296 24-297-9)

Reluz ensinam os Rhetoricorum libri V natildeo apenas a beleza da cor ou a cor da

beleza senatildeo tambeacutem a ldquovitalidaderdquo do discurso Isto seja certo ldquosuccusrdquo que lhe

conforma Variante de ldquosucusrdquo registra o Lewis amp Short eacute termo que na acepccedilatildeo de

ldquovigor of a discourserdquo emprega-se por Quintiliano na Institutio oratoria em ldquoHistoria

quoque alere orationem quodam uberi jucundoque suco potestrdquo (QUINT X 1 31) ou

seja ldquoA histoacuteria pode igualmente nutrir o orador de uma vitalidade fedunda e agradaacutevelrdquo

567 Recorde-se Pliacutenio o Velho distingue as cores em austeras e floridas (ldquoSunt autem colores austeri aut

floridirdquo) em nascidas e feitas (ldquoalii nascuntur alii fiuntrdquo) (cf PLIN NH XXXV 6 12) cf PLINE LrsquoANCIEN

Histoire naturelle Livre XXXV La Peinture Traduit par J-M Croisille Introduction et notes de P-E

Dauzat Paris Les Belles Lettres 2002 p 182 568 Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia ad

D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] pp 496-497

185

e por Ciacutecero no De oratore na voz de Antocircnio que afirma ldquoomnes [] retinebant illum

Pericli sucumrdquo (CIC De or II 93) ou seja ldquo[Criacutetias Teramenes e Liacutesias] todos retinham

aquela vitalidade de Peacutericlesrdquo e tambeacutem na de Crasso cuja orientaccedilatildeo Jorge de

Trebizonda atualiza para que Hermoacutegenes latinamente fale Diz a personagem

Ornatur igitur oratio genere primum et quasi colore quodam et suco

suo nam ut gravis ut suavis ut erudita sit ut liberalis ut admirabilis

ut polita ut sensus ut doloris habeat quantum opus sit non est

singulorum articulorum in toto spectantur haec corpore Vt porro

conspersa sit quasi verborum sententiarumque floribus id non debet

esse fusum aequabiliter per omnem orationem sed ita distinctum ut

sint quasi in ornatu disposita quaedam insignia et lumina Genus igitur

dicendi est eligendum quod maxime teneat eos qui audiant et quod

non solum delectet sed etiam sine satietate delectet (CIC De or III

96-97)

O discurso eacute adornado entatildeo em primeiro lugar por seu caraacuteter geral

bem como por sua cor por assim dizer e vitalidade De fato ser grave

encantador culto nobre admiraacutevel refinado apresentar tanto

sentimento e dor quanto eacute necessaacuterio natildeo dizem respeito a membros

isolados essas qualidades se observam no corpo inteiro Para que

continuando ele seja salpicado pelas flores por assim dizer das

palavras e dos pensamentos isso natildeo deve estar espalhado

uniformemente por todo o discurso mas distinguido de tal maneira que

haja certos sinais e luzes dispostos por assim dizer no ornato569

Ora porque difusas desigualmente pelo todo as cores satildeo ornamentos que

promovem a variedade do discurso O avesso investe-lhe de monotonia Eacute doutrina que

se conhece de Quintiliano doutrina da qual se apropriam Manuel de Galhegos no

ldquoDiscurso Poeacuteticordquo e Jerocircnimo Soares Barbosa nas Instituiccedilotildees oratorias de M Fabio

Quintiliano para ler o Peri ideōn no discurso do orador natildeo deve ser uma e a mesma a

cor do proecircmio da narraccedilatildeo das argumentaccedilotildees da digressatildeo e da peroraccedilatildeo (QUINT

XII 10 71) Jorge de Trebizonda como se veraacute costumeiro lecirc Hermoacutegenes ciente de

569 Apud SCATOLIN A A invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23

Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 2009 [tese de doutorado] p 281

186

Ciacutecero de modo a acomodar-lhes as liccedilotildees e a fazer concordarem-lhes os ensinamentos

O De oratore eacute autoridade entre as primazes nessa praacutetica

Hermoacutegenes o esmiuacuteccedila a beleza da compleiccedilatildeo a noccedilatildeo de kallos como definida

eacute pendente de Platatildeo do Fedro Afirma o retor Soacutecrates no diaacutelogo diz ser conveniente

que todo discurso todo arrazoado (λόγος) tenha cabeccedila (κεφαλή) extremos (ἄκρα) e

meio (μέσα) decorosos adequados um relativamente a outro e relativamente ao corpo

(σῶμα) como um todo visto que natildeo se possa formar belo discurso de partes mal-

dispostas mesmo que belas (cf HERM 297 9-14)570 Sabe-se o alvo das palavras de

Soacutecrates eacute Liacutesias De fato mostra-o Marcos Martinho dos Santos desse passo do Fedro

platocircnico dependem os versos do proacutelogo (HOR AP 1-13) da Epistula ad Pisones de

Horaacutecio nos quais se pinta o monstrum de cabeccedila humana cerviz equina tronco plumado

membros vaacuterios e cauda piacutescea pois que escreve o latinista ldquotanto Horaacutecio como

Soacutecrates tratam a ordenaccedilatildeo das partes do arrazoado comparando-as ademais a cabeccedila

e peacute de ser viventerdquo571 Hermoacutegenes pois mira a formosura infensa agrave deformidade dos

monstros572

570 O passo de Platatildeo lido por Hermoacutegenes muito proximamente eacute este ldquoΣωκράτης ἀλλὰ τόδε γε οἶμαί σε φάναι ἄν δεῖν πάντα λόγον ὥσπερ ζῷον συνεστάναι σῶμά τι ἔχοντα αὐτὸν αὑτοῦ ὥστε μήτε ἀκέφαλον εἶναι μήτε ἄπουν ἀλλὰ μέσα τε ἔχειν καὶ ἄκρα πρέποντα ἀλλήλοις καὶ τῷ ὅλῳ γεγραμμέναrdquo (PLAT Phaedr 264 c) [SOacuteCRATES Mas penso que isto ao menos tu declararias que todo

arrazoado deve constituir-se como vivente tendo algum corpo que seja o dele de modo que nem sem cabeccedila seja nem sem peacutes mas tenha meio e cume estando escritos com decoro para um e outro e para o todo]

Apud SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

198 Carlos Alberto Nunes assim traduz o mesmo passo ldquoSOacuteCRATES Poreacutem uma coisa quero crer teraacutes

de admitir que todo discurso precisa ser precisa ser construiacutedo como um organismo vivo com um corpo

que lhe seja proacuteprio de forma que natildeo se apresente sem cabeccedila nem peacutes poreacutem com uma parte mediana e

extremidades bem relacionadas entre si e com o todordquo cf PLATAtildeO Fedro Φαῖδρος 3ordf ed revisada e

biliacutengue Beleacutem edufpa 2011 p 155 571 SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

199 572 Leia-se o que registra o verbete de Raphael Bluteau ldquoFERMOSURA ou Formosuacutera Belleza He huma

excellencia que resulta da Symmetria ou bem ordenada proporccedilaotilde das partes as quaes realmente saotilde ou

mentalmente se suppoem ser o cotildestitutivo de huma cousa na esphera da sua propria natureza Vamos

explicando por partes esta definiccedilaotilde para que todos claramente entendaotilde I A fermosura he excellencia

como tal he chamada Dom de Deos esplendor celeste privilegio da natureza attractivo dos olhos prisaotilde

dos sentidos idolo das vontades preccedilo amp estimaccedilaotilde de tudo porque todas as cousas soacute em quanto fermosas saotilde prezadas 2 A fermosura he excellencia que resulta da Symmetria amp proporccedilatildeo das partes

Naotilde porque tambem as partes naotilde tenhaotilde sua fermosura particular mas porque fallamos da fermosura de

hum todo perfeytto no qual termo naotilde soacute se comprehendem as cousas corporeas mas tambem as

incorporeas amp espirituaes porque ateacute a virtude que he toda espintual tambem tem sua proporccedilaotilde

comparaccedilatildeo amp commensuraccedilaotilde com as cousas que o entendimento reconhece proprias da sua natureza

amp o mesmo Deos que he puro espirito tem com todas as mais perfeiccediloens a da fermosura porque ainda

que Ente simplicissimo amp livre de toda a materia naotilde exclue a composiccedilaotilde Symmetrica de razaotilde mas

admite varios conceitos ou imagens intellectuaes que postas em boa ordem representaotilde objetivamente a

sua summa fermosura a qual he a da proacutepria virtude porque na essencia Divina tem a virtude a sua

primeyra amp verdadeira origem Finalmente consiste a excellencia da fermosura na proporccedilaotilde das partes

que realmente ou mentalmente cotildestituem huma cousa na esphera da sua propria natureza porque o que

187

Ora eacute preceito que normatiza o Peri ideōn basta tampouco bem acomodar-se o

discurso ao misto de saphēneia megethos epimeleia e kallos ou seja fazer-se claro

grande diligente e belo uma vez que eacute de bom tom fazecirc-lo tambeacutem notaacutevel pela gorgotēs

(cf HERM 312 3-8)

IN CHE maniera si faccia la oratione bella insieme con Tumore e

Dignitate amp ancho come chiara egrave detto sopra ma perche alla oratione

fa bisogno anchora la Celeritate accioche essa non habbia solamente

Grandezza tarda amp chiara ouero sola Bellezza ma ancho habbia

Velocitate allaquale egrave contraria la rimessa amp bassa oratione

parleremo ora di essa573

DE QUE maneira se faccedila o discurso belo conjugado com a Amplitude e

a Dignidade amp tambeacutem claro diz-se antes mas porque ao discurso eacute

necessaacuterio ainda a Celeridade a fim de que natildeo tenha somente

Grandeza tarda amp clara ou soacute Belleza mas tambeacutem tenha Velocidade

agrave qual eacute contraacuterio o discurso recolhido amp baixo falaremos desta

agora574

num objecto he deformidade em outro objecto he fermosura amp pelo contrario amp assi a tromba do

Elephante que no rosto humano seria monstruosidade no focinho do Elephante he formosura porque he

parte conveniente propria amp constitutiva do corpo do dito animal amp daqui nace que as feiccediloens de

algumas naccediloens que agrave primeyra vista nos parecem feas bem confideradas saotilde fermosas porque saotilde

proprias dos rostos com que o Author das armonias da natureza os quiz distinguir dos nossos Neste mundo sublunar naotilde haacute fermosura perfeita tanto assi que aquelle que quiz representar hum corpo perfeitemente

fermoso foy obrigado a tomar cem corpos differentes por modello De sorte que he providencia de Deos

que naotilde haja fermofa sem senaotilde porque as faltas que os olhos descobrem suspendem adoraccediloens que se

haviaotilde de tributar amp se com a fermosura de huma boa cara ser hum bem taotilde caduco amp hum mal taotilde certo

se vẽdo os homens que o tempo que a perfeiccediloa a estraga que attrahindo a si os olhos os cega amp que

senhoreando as vontades as tyranniza finalmente se no meyo das suas inevitaveis crueldades amp perfidias

tem tantos adoradores que idolatrias naotilde causaria no mundo huma fermosura igualmente benefica que

perfeita Pulchritudo inis FemSpeciesei Fem Forma ae Cic Bellezardquo cf Vocabulario portuguez e

latino aulico anatomico architectonico bellico botanico brasilico comico critico chimico dogmatico

dialectico dendrologico ecclesiastico etymologico economico florifero forense fructifero autorizado

com exemplos dos melhores escritores portugueses e latinos pelo padre D Raphael Bluteau Coimbra no Real Collegio das Artes da Companhia de Jesu Com todas as Licenccedilas necessaacuterias Anno Domini

MDCCXIII [1713] pp 82-3 Natildeo se pode deixar de notar que a formosura e a deformidade assim

reguladas compotildeem-se personificadas no conte ldquoLa belle et la becircterdquo (A bela e a fera) de Gabrielle Suzanne

Barbot (1695-1755) a Madame de Villeneuve impresso em 1740 Evidentemente logo que americanizada

a faacutebula outros satildeo os valores de uso e de troca 573 Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 28v 574 Traduccedilatildeo nossa

188

Vale rememorar que a gorgotēs eacute mencionada no ldquoDiscurso poeacuteticordquo de Manuel

de Galhegos nos seguintes termos ldquoA breuidade no explicar a sentẽccedila he soberana tarda

muito pouco em dar forma ao conceito q he o que encomenda Hermogenes na palavra

Gorgotis Que val o mesmo que Preccedilardquo575

Eacute proposta dos tradutores Cecil W Wooten e Antonio Sancho Royo que gorgotēs

eacute idea que confere rapity e rapidez ao discurso Trata-se diferentemente conforme

Consuelo Ruiz Montero e Michel Patillon de modo de conformaccedilatildeo de viveza e de

vivaciteacute Ou rapity ou rapidez ou viveza ou vivaciteacute eacute categoria pensada no avesso do

relaxado e do lacircnguido (cf HERM 312 7-8 ldquoτὸ ἀνειμένον καὶ ὕπτιονrdquo) como forma de

composiccedilatildeo discursiva mediante methodoi que se faccedilam de respostas raacutepidas de reacuteplicas

breves de apoacutestrofes os apelativos assim exemplificados pelo retor ldquoAlojavam-se em

tua casa oacute Eacutesquines e tu eras seu protetor oficialrdquo (cf DEM Cor 18 82 ldquoπαρὰ σοὶ

κατέλυον Αἰσχίνη καὶ σὺ προὐξένεις αὐτῶνrdquo) Ao cabo para a construccedilatildeo da gorgotēs

propotildee-se o uso de methodos que seja produzido por meio do que o retor grego denomina

como tipo segmentado (cf HERM 312 16 τμητικός) o que se compreende aponta-o

Consuelo Ruiz Montero segundo os comentaacuterios de Siriano Filoxeno a este passo como

tipo de estilo que parece promover a seccedilatildeo do arrazoado pela brevidade de seus membros

e tambeacutem pela rapidez de seus pensamentos576 Mais opera-se sobretudo mediante

skhēmata cujos efeitos sejam ou a segmentaccedilatildeo a que o comentador faz referecircncia ou a

revogaccedilatildeo da languidez do discurso (cf HERM 314 6-10) Mediante kōla breves (cf

HERM 319 14-15) synthēkē que evite o hiato intervocaacutelico (cf HERM 319 16-17) e

rhythmos feito do predomiacutenio do troqueu (τροχαῖος) pois com peacutes troqueus compostos

de uma siacutelaba longa seguida de uma breve ensina o Peri ideōn por analogia que motiva

o signo linguiacutestico ldquoo ritmo correrdquo (ldquoτρέχειrdquo) (HERM 319 19-320 1) Note-se para

Hermoacutegenes tanto a lexis pouco faz na enformaccedilatildeo da gorgotēs como natildeo haacute ennoiai

que lhe sejam proacuteprios embora concede o tratadista seja possiacutevel que assim sejam ditas

as finezas de pensamento (ldquoτὰ ὀξέα τῶν νοημάτωνrdquo) (cf HERM 312 9-11) ldquoli sensi

575 Apud Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de

Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro sp 576 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 p 210

189

della Acutezzardquo diria Giulio Camillo Delminio577

Agrave luz das anaacutelises de Michel Patillon deve-se entender a gorgotēs como

procedimento retoacuterico que se produz por transiccedilatildeo (μετάβασις578) raacutepida de elementos

contrastados breves sobretudo de sorte a dar mobilidade (κινεῖν) ao discurso e fazer dele

algo vivo (γοργόν) (cf HERM 314 1-3) Um dos exemplos de Metodo com esta feiccedilatildeo

colhidos por Filiberto Campanile jaacute acomodada a doutrina ao vernaacuteculo proveacutem de

Francesco Petrarca e ilustra a conjugaccedilatildeo de raacutepida transiccedilatildeo com a brevidade dos

enunciados interrogativos

Srsquoamor non egrave chrsquoegrave dunque quel chrsquoio sento

Ma srsquoegli egrave amor per Dio che cosa e quale

Se buona ondrsquoegrave lrsquoeffecto aspro e mortale

Se ria ondrsquoegrave si dolce ogni tormento579

577 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 29 578 Cf QUINT IX 3 25 579 Apud Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina

drsquoHermogene e drsquo altri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo

superiori p 88 Integralmente o soneto eacute o seguinte com a grafia atualizada e liccedilatildeo variante ldquoSrsquoamor non

egrave che dunque egrave quel chrsquoio sento Ma srsquoegli egrave amor per Dio che cosa e quale Se bona onde lrsquoeffecto

aspro mortale Se ria ondrsquoegrave siacute dolce ogni tormento Srsquoa mia voglia ardo onde lsquol pianto e lamento

Srsquoa mal mio grado il lamentar che vale O viva morte o dilettoso male come puoi tanto in me srsquoio no lsquol consento Et srsquoio lsquol consento a gran torto mi doglio Fra siacute contrari vegraventi in frale barca mi trovo in

alto mar senza governo siacute lieve di saver drsquoerror siacute carca chrsquoirsquo medesmo non so quel chrsquoio mi voglio e

tremo a mezza state ardendo il vernordquo [ldquoSe amor natildeo eacute qual eacute o meu sentimento Mas se ele eacute amor por

Deus que coisa eacute e qual Se boa de onde lhe vem a accedilatildeo mortal Se maacute por que eacute tatildeo doce o meu

tormento Se eu ardo por querer por que lamento Se a meu mau grado lamentar que val Oacute viva

morte oacute deleitoso mal tanto em mim podes sem consentimento E se eu consinto sem razatildeo pranteio

Em tatildeo contraacuterio vento em fraacutegil barca me encontro em alto mar e sem governo vazia de saber de

erro ela se arca tanto que natildeo sei bem o que anseio e tremo no veratildeo e ardo no inversordquo] cf PETRARCA

F Cancioneiro Traduccedilatildeo de Joseacute Clemente Pozenato Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da

Unicamp 2014 pp 238-239 Note-se agrave guisa de exemplo trata-se de procedimento elocutivo de

interpelaccedilatildeo interrogativa tambeacutem empregado por Luiacutes de Camotildees neste soneto ldquoAh minha Dinamene assi deixaste Quem nunca deixar pode de quererte Que ja Ninfa gentil natildeo posso ver-te Que tatildeo

veloz a vida desprezaste Como por tempo eterno te apartaste De quem taotilde longe andava de perderte

Puderaotilde essas agoas defenderte Que naotilde visses quem tanto magoaste Nem soacutemente falarte a dura Morte

Me deixou que apressada o negro manto Lanccedilar sobre os teus olhos consentiste Oh mar oacute ceacuteu oacute

minha escura sorte Qual vida perderey que valha tanto Se inda tenho por pouco o viver tristerdquo cf

Rimas varias de Luis de Camoens priacutencipe de los poetas heroycos y liricos de Espantildea Ofrecidas al muy

ilustre sentildeor D Ivan da Sylva Marquez de Gouvea presidente del Dezembargo do Paccedilo y mayordomo

mayor de la Casa Real ampc Comentadas por Manuel de Faria Y Sousa Cavallero de la Orden de Christo

Tomo I y II Que contienen la primera segunda y la terceira Centuria de los Sonetos Lisboa Con

Privilegio Real En la Imprenta de Theotonio Damaso de Mello Impressor de la Casa Real Con todas las

licencias necessarias Antildeo de 1685 p 278

190

Se amor natildeo eacute que eacute entatildeo o que eu sinto

Mas se eacute amor por Deus que coisa eacute e qual

Se boa donde eacute o efeito aacutespero e mortal

Se maacute por que eacute tatildeo doce cada tormento580

O ldquoSermatildeo pelo bom sucesso das armas de Portugal contra as de Holandardquo do

Padre Antocircnio Vieira eacute proacutedigo nesse procedimento de interpelaccedilatildeo interrogativa

Parece-vos bem Senhor parece-vos bem isto Que a mim que sou

vosso servo me opprimais amp aflijais E aos impios aos inimigos

vossos os favoreccedilais amp ajudeis Parece-vos bem que sejaotilde eles os

prosperados amp assistidos de vossa Providecircncia amp noacutes os deixados de

vossa matildeo noacutes os esquecidos de vossa memoacuteria noacutes o exemplo de

vossos rigores noacutes o despojo de vossa ira Taotilde pouco he desterrarnos

por voacutes amp deixar tudo Taotilde pouco he padecer trabalhos pobrezas amp

os desprezos que ellas trazem comsigo por vosso amor Jaacute a Feacute naotilde

tem merecimento Jaacute a Piedade natildeo tem valor Jaacute a perseveranccedila natildeo

vos agrada Pois se ha tanta differenccedila entre noacutes ainda que maacuteos amp

aquelles perfidos por que os ajudais a eles amp nos desfavoreceis a noacutes

Nunquid bonum tibi videtur a voacutes que sois a mesma bondade parece-

vos bem isto581

Na interpretaccedilatildeo de Hermoacutegenes proposta por Jorge de Trebizonda gorgotēs diz-

se latinamente ldquovelocitasrdquo ou ldquoceleritasrdquo e define-se tanto como ldquocompositionis

acceleratio qua uiua amp mobilis oratio videtur ou seja ldquoaceleraccedilatildeo da composiccedilatildeo por

meio da qual o discurso parece vivo e moacutevelrdquo 582 o que guarda efeitos esmiuccedilados pelas

anaacutelises de Michel Patillon quanto como ldquodicendi vis quaelig mobilem orationem redditrdquo

ou seja ldquovigor do dizer que torna moacutevel o discursordquo583 o que faz recordar Horaacutecio e

Ciacutecero Sabe-se conforme as liccedilotildees de ambos eacute distintiva dos gecircneros de discurso a vis

580 Traduccedilatildeo nossa 581 Cf Sermoens do Padre Antonio Vieira da Companhia de Iesu Preacutegador de Sua Magestade Em Lisboa

Na officina de Miguel Deslandes A custa de Antonio Leyte Pereyra Mercador de Livros M DC LXXXIII

[1683] Com todas as licenccedilas amp Privilegio Real p 478 582 Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia ad

D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] p 497 583 Idem p 576

191

diga-se o vigor de oradores e de poetas de artiacutefices da palavras de sorte que seja suma

no grave e deacutebil no tecircnue584

A eleiccedilatildeo do substantivo ldquovelocitasrdquo eacute controversa consoante o uacutenico estudo

extensamente consagrado a Jorge de Trebizonda sabe-se George of Trebizond A

Biography and a Study of his Rhetoric and Logic de John Monfasani pois que eacute

considerada equivocada ldquoTrebizond made an egregious error (probably misled by the

meaning of the word in medieval Greek)rdquo 585 Eacute opiniatildeo compartilhada por Luiza Loacutepez

Grigera586 todavia ressalta que as razotildees do estudioso obliquamente reafirmem um

renascimento positivado ao crer o erro no grego medieval e estejam evidentemente

assentadas na positividade desses pressupostos Haacute algo aleacutem de erro nas liccedilotildees latinas e

vernaculares do Peri ideōn

Ao verter gorgotēs por ldquovelocitasrdquo Jorge de Trebizonda elege substantivo latino

conhecido dos leitores de Quintiliano como traccedilo elocutivo da prosa do historiador

romano Saluacutestio (seacutec I aC) (cf QUINT X 1 102) e fazem escolhas afins tradutores e

comentadores quinhentistas e seiscentistas de Hermoacutegenes Antocircnio Bonfine emprega

584 Cf Hermogenis De formis orationum tomi duo Argentorati apud haeredes Vuendelini Rihelij Anno

1555 sp cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002

v 4 p 228 585 Cf MONFASANI J George of Trebizond A Biography and a Study of his Rhetoric and Logic Leiden

Brill 1976 pp 323-324 ldquoThe difficulty is that Hermogenes did not teach a stylistic form of lsquospeedrsquo

that Trebizond made an egregious error (probably misled by the meaning of the word in medieval Greek)

and that this error is readily apparent to anyone who reads the pertinent section unprejudiced by

Trebizondrsquos interpretation Hermogenes meant vitality liveliness vigor [hellip] Rapidity is far from being an

always desirable quality in expression but vigor certainly is This is why at the start of his explanation of the form Hermogenes called for the regular presence of gorgoacutetes next to brightness clarity grandeur and

beauty and contrasted it to listlessness and flatness His recommendation for sharp remarks choppiness

and curtness short antitheses quick exchanges and apostrophes do not make a speech move quickly

indeed the contrary is true but they certainly give it vigor and life A humorous result of this

misunderstanding is that when later students of Hermogenes tried to apply his doctrine of lsquospeedrsquo they felt

it necessary to correct the master In the teeth of his injunction to use short sharp words they had to defend

their use of polysyllabic words as equally if not more effective in creating a sensation of speedrdquo Entenda-

se ldquoA dificuldade eacute que Hermoacutegenes natildeo ensina uma forma estiliacutestica da lsquovelocidadersquo que Trebizonda

cometeu um erro notaacutevel (provavelmente enganado pelo sentido da palavra no grego medieval) e que esse

erro eacute prontamente manifesto a quem leia o passo pertinente sem os preconceitos da interpretaccedilatildeo de

Trebizonda Hermoacutegenes significou lsquovitalidadersquo lsquovivacidadersquo lsquovigorrsquo [hellip] Rapidez estaacute longe de ser uma qualidade sempre desejaacutevel na expressatildeo mas vigor certamente eacute Por isso eacute que no iniacutecio da explanaccedilatildeo

da forma Hermoacutegenes demandou a presenccedila regular da gorgoacutetes proacutexima ao brilho agrave clareza agrave grandeza

e agrave beleza e contrastou-a agrave lacircnguidez e agrave chaneza Sua recomendaccedilatildeo por observaccedilotildees agudas

movimentaccedilatildeo e concisatildeo breves antiacuteteses mudanccedilas raacutepidas e apoacutestrofes natildeo faz um discurso mover-se

rapidamente decerto o contraacuterio eacute verdadeiro mas eles certamente conferem-lhe vigor e vida Um resultado

cocircmico desse engano eacute que quando posteriores estudantes de Hermoacutegenes tentaram aplicar sua doutrina

da lsquovelocidadersquo eles sentiram a necessidade de corrigir o mestre Em oposiccedilatildeo a esta injunccedilatildeo ao uso de

palavras breves agudas eles tiveram de defender de maneira semelhante o uso de palavras polissilaacutebicas

talvez mais efetivas na criaccedilatildeo de uma sensaccedilatildeo de velocidaderdquo 586 Cf LOacutePEZ GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Salamanca Universidad de

Salamanca 1994 p 80

192

ldquoceleritasrdquo ldquovelocitasrdquo e os adjetivos ldquocelerrdquo e ldquoveloxrdquo relativamente agrave forma e seus

constituintes (1538)587 Natale Conti emprega ldquoceleritasrdquo ldquocelerrdquo e ldquoveloxrdquo (1550)588

Johannes Sturm emprega natildeo apenas ldquoveloxrdquo (1551) 589 senatildeo tambeacutem ldquoceleritasrdquo

ldquovelocitasrdquo e ldquoforma veloxrdquo (1571)590 Pedro Juan Nuntildeez ldquovelocitasrdquo (1578)591 Giulio

Camillo Delminio em toscano emprega ldquoprestezzardquo (1560) 592 e ldquoCeleritaterdquo e

ldquoVelocitaterdquo (1590) 593 Gabriele Zinano ldquoVelocitagraverdquo (1590)594 e Filiberto Campanile

ldquoPrestezzardquo e ldquoCeleritagraverdquo (1606)595 Dessa liccedilatildeo pendem natildeo soacute o uso de Manuel Pires de

Almeida o adjetivo ldquoligeirordquo (1633) 596 como o de Manuel de Galhegos ldquoPreccedilardquo

(1636)597

Ademais conveacutem destacar que Johannes Sturm na epiacutestola exordial ao volume

Hermogenis De formis orationum tomi duo toma ldquoveloxrdquo como genus dicendi que torna

587 Cf Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii

item Sophistaelig Praeligexercitamenta Antonio Bonfine asculano interprete Apud Seb Gryphivm Lvgdvni

1538 pp 229 230 232 235 588 Cf Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] pp 188 236 243 249 250 311 589Cf Hermogenis De formis orationum tomi duo Argentorati apud haeredes Vuendelini Rihelij Anno

1555 sp 590 ldquoIoannis Sturmii Scholae in Librum II De formis orationum seu dicendi generibusrdquo in Hermogenis

Tarsensis rhetoris acutissimi De dicendi generibus siue formis orationum libri II Latinitate donati amp

scholis explicati atque illustrati a Ioan Sturmio Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo ad annos octo

Excudebat Iosias Rihelis MDLXXI p 268 591 Cf Pet Iohan Nunnesii valentini Institutionum rhetoricarum libri quinque Editio tertia ceteris multo

correctior et locupletior exemplis Barcinone ex typographia Sebastiani agrave Cormellas An 1593 pp 299

Menciona-se no tiacutetulo da primeira ediccedilatildeo do tratado o nome de Hermoacutegenes Institutiones rhetoricae ex progymnasmatis potissimum Aphtonii atque ex Hermogenis arte dictatae agrave Petro Ioanne Nunnesio

Valentino Barcinone ex officina Petri Mali 1578 592 Cf Il secondo tomo dellrsquoopere di M di Giulio Camillo Delminio cioegrave La Topica ouero dellrsquoElocutione

Discorso sopra lrsquoIdee di Hermogene La Grammatica Espositione sopra il primo amp secondo Sonetto del

Petrarca Nvovamente dato in lvce Con privilegio In Venegia apresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLX

[1560] p 80 593 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste srsquoaggiunge lrsquoArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 28v 29r 594 Cf Sommarii di varie retoriche greche latine et volgari Distintamente ordinati in uno da Gabriele

Zinano In Reggio Apresso Hercoliano Bartholi 1590 p 198 595 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 88 596 Cf MUHANA A Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia Tratado Seiscentista de Manuel Pires de

Almeida Satildeo Paulo Edusp p 108 597 Apud Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de

Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro sp

193

o discurso (oratio) cadenciado (tracta) impetuoso (contorta) e fluente (fluens)598 Os

termos satildeo parafraseados de Ciacutecero para quem este eacute ensinamento do Orator a historia

em sua feiccedilatildeo elocutiva deva ser limiacutetrofe dos discursos dos sofistas e estar afastada dos

dos oradores judiciaacuterios o historiador enquanto narra ou descreve regiatildeo ou combate

que o faccedila ldquoornaterdquo com adornos e caso interponha arengas e exortaccedilotildees que o faccedila por

meio da oratio ldquotractardquo e ldquofluensrdquo a de aparato dos sofistas e natildeo por meio da ldquocontortardquo

e ldquoacrisrdquo (pungente) a dos foacuteros (CIC Or XX 66)599 Conforme o De oratore em

preceitos semelhantes conveacutem que a ratio verborum da historia se faccedila do ldquogecircnero de

discurso profuso cadenciado e uniformemente fluente com certa suavidade sem a

aspereza judicial e sem os aguilhotildees forenses de pensamentordquo (cf CIC De or II 64

ldquogenus orationis fusum atque tractum et cum lenitate quadam aequabiliter profluens sine

hac iudiciali asperitate et sine sententiarum forensibus aculeisrdquo) Ora Johannes Sturm se

apropria dos usos de Ciacutecero e conjuga a cadecircncia e a fluecircncia do sofista com a

impetuosidade do orador forense natildeo mais para pensar a regulaccedilatildeo do estilo da historia

senatildeo que para fazer significar a categoria da gorgotēs sob os auspiacutecios da auctoritas do

do Orator (e do De oratore) na preceptiva retoacuterica

Destoa Gaspar Laurent todavia que emprega no corpo da traduccedilatildeo do Peri ideōn

ldquoconcitatum genus dicendirdquo e daacute ciecircncia nos comentaacuterios do texto dos usos de ldquoceleritasrdquo

e de ldquovelocitasrdquo (1614)600 O adjetivo latino ldquoconcitatus a umrdquo no Dictionarium Latino

hispanicum et vice versa Hispanico latinum de Antocircnio de Nebrija registra-se como

ldquoCosa mouidardquo 601 Semelhantemente no Dictionarium latino lusitanicum et vice versa

lusitanico latinum de Jerocircnimo Cardoso em ediccedilatildeo de 1613 como ldquocousa mouidardquo602

598Cf Hermogenis De formis orationum tomi duo Argentorati apud haeredes Vuendelini Rihelij Anno

1555 sp 599 Cf AMBROSIO R De rationibus exordiendi os princiacutepios da histoacuteria em Roma Satildeo Paulo Humanitas

Fapesp 2005 pp 34-35 O passo integral de Ciacutecero eacute ldquoHuic generi historia finitima est In qua et narratur

ornate et regio saepe aut pugna describitur interponuntur etiam contiones et hortationes Sed in his tracta

quaedam et fluens expetitur non haec contorta et acris oratiordquo (cf CIC Or XX 66) 600 Cf ldquoIn Hermogenis tractatvm de ideis sive de formis eloqventiaelig Gasparis Laurentij commentariusrdquo in Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] 168 601 Cf Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum Aelio Antonio Nebrissensi

interprete nunc denuo ingenti vocum accessione locupletatum pristinoq nitori sublata mendarum colluuie

restitutum Ad haec Dictionarium propriorum nominum ex probatiszligimis Graecaelig amp Latinaelig linguaelig

autoribus addita ad calcem neoterica locorum appellatione concinnatum Antuerpiae In AEligdibus viduaelig amp

haeligredum Ioannis Steelij M D LXX [1570] Cum Priuilegio Regis 602 Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum adagiorum feregrave omnium juxta

seriem alphabeticam perutili expositione Ecclesiasticarum [sic] vocabulorum interpretatione item de

monetis ponderibus et mensuris ad presentem usum accommodatis per Hieronymum Cardosum lusitanum

194

De acordo com o Lewis amp Short trata-se de termo utilizado no sentido de ldquoViolently

moved i e rapid swift quickrdquo (ldquoViolentamente movido i e raacutepido vivo velozrdquo) e

frequentemente em Quintiliano no de ldquoRoused up excited vehement ardentrdquo

(ldquoAcometido excitado veemente ardenterdquo) Ora eacute por meio dessa vertente de

interpretaccedilatildeo do Peri ideōn de Hermoacutegenes que se deve compreender o estilo

ldquoArrebatadordquo de Jerocircnimo Soares (1790) tambeacutem dito ldquoardenterdquo ldquoconcitatumrdquo

ldquopatheticordquo e ldquoinflammadordquo arrebatado ldquopelos incisos e membros e pelas figuras

fortesrdquo603 Conveacutem notar que por vezes distanciados os adjetivos latinos ldquocelerrdquo e

ldquoconcitatusrdquo ldquovelozrdquo e ldquoarrebatadordquo na traduccedilatildeo de Adriano Scatolin combinam-se no

De oratore de Ciacutecero na voz de Antocircnio como qualificativos do discurso abundante do

jovem orador Sulpiacutecio (cf CIC De or II 88)604

A eleiccedilatildeo vocabular de Gaspar Laurent embora se perceba divergente de todas as

demais arroladas quinhentistas sobretudo tem antecedentes nos Commentariorum

rhetoricorum sive oratoriarum institutionum libri VI de Gerard Joannes Vossius (1577-

1649) estampados em 1606 e citados adiante pela quarta ediccedilatildeo de Lion de 1643 que

instam contra o que se entende como a imprecisatildeo de ldquovelocitasrdquo e de ldquoceleritasrdquo

quam rectiugraves incitatum sive concitatum aut praeligceps

dicendi genus appellabimus quagravem celeritatem cugravem non ἅπλῶς

velocitatem notet sed quandam quasi fulmineam celeritatem605

GORGOTĒS a qual chamaremos incitado ou concitado ou gecircnero de

congesta recognita vero omnia per Sebastianum Stokhamerum germanum Qui libellum etiam de proprijs

nominibus regionum populorum illustrium virorum fluviorum historijs amp fabulis poeticis refertum in

usum amp gratiam lusitanicae pubis concinnavit amp ex integro adiecit Adhuc novi huic ultimae impressioni

adjuncti sunt varij loquendi modi ex praecipuis auctoribus decerpti praesertim ex Marco Tullio Cicerone

nunc denuo amendarum colluvie qua scatebat diligenti lucubratione defaecatum Ulyssipone ex officina

Petri Crasbeeck 1613 p 40 603 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel pp 88 430 604 Cf SCATOLIN A A invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23 Satildeo

Paulo [FFLCH-USP] 2009 [tese de doutorado] p 211 605 Cf Gerardi Ioannis Vossi Commentariorum rhetoricorum sive oratoriarum institutionum Pars altera

Lugduni Batavorum Ex officina Ioannis Maire MDCXLIII [1643] p 504 Cf HERMOGENE LrsquoArt

rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme

1997 p 15

195

dizer preciacutepite mais corretamente do que celeridade porque designa

natildeo haplōs [simplesmente] velocidade mas como que certa celeridade

fulminante606

O tradutor e o tratadista dependem agrave mesma maneira de autoridade comum a

saber das leituras dos Poetices libri septem (1561) de Juacutelio Ceacutesar Escaliacutegero em que se

propotildee a muacutetua adequaccedilatildeo dos adjetivos latinos ldquoincitatumrdquo ldquoconcitatumrdquo e ldquopraeligcepsrdquo

em substituiccedilatildeo aos usos linguiacutesticos que vertem de Jorge de Trebizonda nestes termos

ldquoNos genus hoc dicendi vel incitatũ vel concitatũ atq etiatilde iterdũ praeligceps appellabimusrdquo

(ldquoNoacutes chamaremos este gecircnero de dizer ou incitado ou concitado e ateacute mesmo por vezes

preciacutepiterdquo) 607

Avizinha-se obra contemporacircnea o De poeta de Antocircnio Sebastiano Minturno

(1500-1574) estampado em Veneza em 1559 em cujas paacuteginas se interpreta idea como

genus dicendi gorgotēs se traduz pelos neutros latinos ldquoIncitatũrdquo e ldquouolubilerdquo incitado e

voluacutevel e eacute ilustrada a operaccedilatildeo elocutiva de constituiccedilatildeo desses efeitos por passos da

Eneida de Virgiacutelio Mas natildeo apenas afirma-se a celeritas como modo de fazer fluir o

ritmo de versos que resultem convenientes a esse genus dicendi608 Estes preceitos tecircm

versatildeo toscana um tanto mais extensa na explicitaccedilatildeo do meios de composiccedilatildeo de 1564

elaborados pelo proacuteprio autor no tratado LrsquoArte poetica del Sig Antonio Minturno donde

vem que genus dicendi seja lido como ldquoforma del direrdquo que essa forma seja ldquoVolubile e

prestardquo e que possam ser aplicados entre mais procedimentos discursivos como os

exemplos colhidos de Francesco Petrarca em vez de Virgiacutelio o mostram ldquole uoci correnti

amp i uersi di pochi accenti ograve pure di numeri presti e uelocirdquo (ldquoas palavras correntes e os

versos de poucos acentos ou puros de ritmos ligeiros e velozesrdquo)609

606 Traduccedilatildeo nossa 607 Cf Iuli Caesaris Scaligeri uiri Poetices libri septem Ad Syluium Filium [Lyon] Apud Antonium

Vincentium 1561 p 182 608 Antonii Sebastianii Minturni De poeta ad Hectorem Pignatellum Vibonensium Ducem Libri Sex Cum

Priuilegijs Venetiis Ann MDLIX [1559] pp 554-555 609 LrsquoArte poetica del Sig Antonio Minturno nella quale si contengono i precetti Heroici Tragici Comici

Satyrici e drsquoogni altra Poesia Con la dottrina dersquo Sonetti canzoni et ogni sorte de Rime Thoscane dove

srsquoinsegna il modo che tenne il Petrarca nelle sue opere Et si dichiara arsquo suoi luoghi tutto quel che da

Aristotele Horatio et altri autori Greci e Latini egrave stato scritto per ammaestramento di Poeti Con le

postille del dottor Valvassori non meno chiare che breui et due tavole lrsquouna dersquo capi principali lrsquoaltra

di tutte le cose memorabile Con Privilegio Per Gio Andrea Valvassori del MDLXIII [1563] p 437

Vide MESTRES B M ldquoProblemas de Garcilaso la epiacutestola a Boscaacuten (versos 5 y 6)rdquo In GUIRAO D N

POU P J REYES A (Coord) La edicioacuten de textos Actas del I Congreso Internacional de Hispanistas del

Siglo de Oro London Tamesis 1990 pp 353-360

196

Antocircnio Sebastiano Minturno com o adjetivo latino ldquoincitatumrdquo parece

privilegiar vocabulaacuterio que se observa compartilhado em fins de seacuteculo XVI e iniacutecios de

seacuteculo XVII com as versotildees que lhe satildeo posteriores de Gaspar Laurent de Gerard

Joannes Vossius e de Juacutelio Ceacutesar Escaliacutegero embora com o substantivo ldquoceleritasrdquo e com

os adjetivos ldquovolubilerdquo e ldquoprestordquo tambeacutem incorpore de modo complementar ao De

poeta e ao LrsquoArte poetica del Sig Antonio Minturno escolhas direta ou indiretamente

procedentes dos Rhetoricorum Libri V de Jorge de Trebizonda Natildeo haacute dicotomias

todavia natildeo haacute influecircncias610 haacute autoridades dos costumes retoacutericos haacute usos linguiacutesticos

em intersecccedilatildeo os quais datildeo a saber a liccedilatildeo grega de Hermoacutegenes por variantes de

distintos matizes semacircnticos na leitura de gorgotēs e de gorgos como ldquovelocitasrdquo

ldquoceleritasrdquo ldquocelerrdquo ldquoprestezzardquo ldquoCeleritaterdquo ldquoVelocitaterdquo ldquoVelocitagraverdquo ldquoCeleritagraverdquo

ldquoligeirordquo ldquoPreccedilardquo ldquoveloxrdquo ldquoconcitatumrdquo ldquoArrebatadordquo ldquoincitatumrdquo ldquopraeligcepsrdquo

ldquouolubilerdquo ldquoprestordquo e ldquouelocerdquo Evidentemente essas variantes natildeo se anulam na

indistinccedilatildeo do inventaacuterio porque mesmo que sejam pensadas quando aplicadas num

mesmo ponto de doutrina supotildeem no trato preceptivo da instituiccedilatildeo retoacuterica horizontes

enunciativos muacuteltiplos linhas de forccedila cuja pluralidade o nome proacuteprio do retor grego

natildeo invalida611 As variantes como escolhas lexicais umas por outras como comutaccedilotildees

possiacuteveis de sentido na tratadiacutestica nem sempre dizem o mesmo corpo doutrinaacuterio nem

sempre fazem falar no latim ou no vernaacuteculo o mesmo Hermoacutegenes e assim sujeitas agrave

controveacutersia Gerard Joannes Vossius daacute um exemplo indiciam vertentes plurais de

circulaccedilatildeo das doutrinas recolhidas no Peri ideōn Mapeaacute-las eacute mapear em autores

quinhentistas seiscentintas e setecentistas a normatizaccedilatildeo das praacuteticas de escrita e os

valores de usos das artes do discurso gregas entre latinos gregas latinamente lidas e

legiacuteveis ainda que sejam redigidas nos idiomas vernaacuteculos

Deve-se entender poreacutem que na regulaccedilatildeo estiliacutestica preceituada por

Hermoacutegenes isso natildeo basta visto que a variedade do misto eacute criteacuterio de virtude

DA NOI si egrave dimostro giagrave come si faccia la oratione chiara di dignitate

bella amp presta segue agrave quelle necessariamente il trattato della forma

610 Como mostra Peter Burke eacute ldquotermo originalmente astroloacutegico que com frequecircncia tem sido empregado

de forma bastante acriacutetica pelos historiadores intelectuaisrdquo cf BURKE P As fortunas drsquoO Cortesatildeo Satildeo

Paulo Editora da Unesp 1995 p 13 611 Cf KOSSOVITCH L ldquoPrefaacuteciordquo in HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e

a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 p

19

197

che di Costume tiene il nome perche egrave vtilissima cosa sopra tutte le

altre anche conoscere in che maniera si faccia la specie morale della

oratione []612

POR NOacuteS jaacute se manifestou como se faz o discurso claro de dignidade

belo amp ligeiro Segue agravequele necessariamente o tratamento da forma

que tem o nome de Costume porque eacute utiliacutessima coisa sobre todas

tambeacutem conhecer de que maneira se faccedila a espeacutecie moral do discurso

[]613

Por ldquoCostumerdquo sabe-se Giulio Camillo Delminio lecirc o grego ldquoēthosrdquo Eacute termo que

se define com Hermoacutegenes como espeacutecie que natildeo soacute conforma o discurso em sua iacutentegra

agrave maneira da compleiccedilatildeo da cor do corpo khrōma (χρῶμα) produzida pela adequaccedilatildeo

das palavras agraves personagens que as enunciam e aos ēthikoi (ἠθικοί) os caracteres (glutotildees

covardes avarentos) senatildeo tambeacutem que se mescla no discurso agraves demais ideai como

as liccedilotildees do retor iteram na enformaccedilatildeo do misto retoacuterico (cf HERM 320 20-321 18) O

ēthos como preceituado por Hermoacutegenes discrimina-se em quatro diferentes espeacutecies a

saber apheleia glykytēs drimytēs ou natildeo raro no Peri ideon ldquodrimytēs kai oxysrdquo cujos

sentidos se poderatildeo visitar e epieikeia Dessas espeacutecies a primeira delas estaacute vinculada

agrave composiccedilatildeo de personagens cocircmicas e interessa ao misto tragicocircmico os exemplos

colhidos do retor o evidenciam glutotildees covardes avarentos

Talvez soe repetitivo iterar que entre os leitores de Hermoacutegenes Jorge de

Trebizonda ao dizer ēthos diz em latim ou ldquooratio moratardquo ou ldquoaffectiordquo cujas espeacutecies

respectivamente para ele satildeo tenuitas iucunda oratio (ou iucunditas) acutum genus (ou

acuitas) e modestum genus dicendi 614 Da variaccedilatildeo dessas espeacutecies em diferentes

tratadistas desde os Rhetoricorum libri V e da revisatildeo dos modos de classificaccedilatildeo dos

efeitos da alētheiae da barytēs feitas espeacutecies eacuteticas jaacute se disse algo O ēthos e suas

quatro formas em Antocircnio Bonfine no Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris

612 Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 31r 613 Traduccedilatildeo nossa 614 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia

ad D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] pp 579-594

198

acutissimi de Arte Rhetorica precepta satildeo mos simplicitas suauitas subtilitas e argutia

(ou acuitas) de modo a abarcar a conjugaccedilatildeo dos termos drimytēs e oxys e por fim

aequalitas (ou humilitas ou moderata oratio)615 Na ediccedilatildeo de Natale Conti empregam-

se os termos ldquomosrdquo ldquosimplicitasrdquo ldquodulcedordquo ldquoacrimoniardquo e ldquoacumenrdquo ldquomansuetudordquo616

No Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis

orationum Libri II de Johannes Sturm ēthos eacute oratio morata apheleia eacute simplicitas

glykytēs eacute suauitas drimytēs e oxys satildeo acrimonia (ou oratio acris) e oratio acuta (ou

acutum genus dicendi) epieikeia eacute ou modesta ou aequa ou morata oratio Em Gaspar

Laurent lecirc-se para o gecircnero oratio morata (no sentido de ldquoorationis characterrdquo ldquooratio

Morata vel affectardquo617 ) e para as espeacutecies simplicitas (ou simplex genus dicendi)

acrimonia (ou oratio acris) e oratio acuta (ou acutum genus dicendi) oratio moderata

ou morata ou aequa618 Na traduccedilatildeo de Giulio Camillo Delminio os termos satildeo Costume

Semplicitate Dolcezza Acrimonia e Acuitate Mansuetidine619 Em Filiberto Campanile

empregam-se ldquoCostumerdquo ldquoSemplicitaterdquo (ou ldquoBassezardquo) Dolcezza (ou ldquoDilettordquo)

ldquoAcutezzardquo (ou ldquoSottigliezzardquo) no sentido de drimytēs ldquoMansuetudinerdquo (ou

ldquoModestiardquo)620

Eacute evidente devem ser eticamente entendidas essas categorias o par drimytēs oxys

entre elas diga-se acutum genus dicendi acuitas subtilitas argutia acrimonia acumen

oratio acris e oratio acuta em latim ou Acrimonia Acuitate Acutezza e Sottigliezza em

italiano como os letrados arrolados deixam ler Ou mesmo fineza como Manuel de

615 Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii item

Sophistaelig Praeligexercitamenta Antonio Bonfine asculano interprete Apud Seb Gryphivm Lvgdvni 1538 pp

236- 616 Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] pp 250-278 617 Cf ldquoIn Hermogenis tractatvm de ideis sive de formis eloqventiaelig Gasparis Laurentij commentariusrdquo in

Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 163 618 Cf Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione

contextu Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] pp 385-427 619 Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini pp 31r-39v 620 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori pp 97-

125

199

Galhegos referindo-se ao uso de todas as ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo na Ulyssea ou Lisboa

Edificada de Gabriel Pereira de Castro621 lsquoNa enformaccedilatildeo do ēthos do enunciador a

drimytēs e a oxys mostra-o Michel Patillon opera-se em consonacircncia com os preceitos

aduzidos mediante pensamentos superficialmente profundos isto seja a enunciaccedilatildeo de

pensamentos sutis por meio de enunciados simples e laxos de modo que natildeo pareccedila

meditado o que eacute demasiado meditado (cf HERM 339 16-25) Eacute questatildeo de methodos

de haacutebil e engenhosa instituiccedilatildeo pela dissimulaccedilatildeo do artifiacutecio do que Hermoacutegenes

entende como profundidade superficial (cf HERM 339 19-20 328 9 epipolaios

bathytēs) Opera-se ademais mediante lexis cujo sentido natildeo corresponda propriamente

agrave ennoia que se enuncia (cf HERM 339 25-341 24) Na leitura que faz Jorge de

Trebizonda do preceito e na vulgarizaccedilatildeo proposta por Filiberto Campanile

conseguintemente potildee-se em destaque tratar-se de efeito decorrente do emprego de

leacutexico em desconformidade com o uso com o costume (cf HERM 341 15)622 Acresce o

retor ser procedimento que demanda cuidados pois que tambeacutem uacutetil agraves composiccedilotildees

cocircmicas ridiacuteculas (to geloion) e que se arrisca agrave frieza (cf HERM 339 16-25) Mediante

a lexis ainda as semelhanccedilas de vocabulaacuterio a paronomaacutesia e as metaacuteforas miram efeitos

de mesma ordem (cf HERM 341 24-344-12) Note-se Hermoacutegenes entende que drimytēs

e a oxys partilham recursos linguiacutesticos e efeitos com categorias discursivas de prazer e

deleite (hēdonē) de doccedilura e suavidade (glykytēs) (cf HERM 344 13-345 2) Eacute

pressuposto natildeo eacute possiacutevel segui-lo que parece compartilhado por Matteo Peregrini (ca

1595-1652) no tratado Delle acutezze (1639)623

Na oacuteptica dos preceitos retoacutericos que baseiam o ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de

Galhegos para a formaccedilatildeo de poema digno de louvor no signo da variedade do misto

autorizado por Hermoacutegenes o agenciamento desses procedimentos desses e dos demais

vinculados agraves ideai tou logou agraves formae dicendi quaisquer que sejam quantas sejam elas

621 Cf Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro sp 622 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia

ad D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] p 590 cf LrsquoIdee overo Forme

dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi

In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con Licenza dersquo Superiori p 117 623 Delle Acutezze che altrimenti spiriti vivezze e concetti volgarmente si appellano trattato del Sig

Matteo Peregrini Bolognese di Teologia Filosofia e dellrsquouna e lrsquoaltra Legge Dottore In questa seconda

Impressione dallrsquoAutore riuiste e migliorate Allrsquo Illlustrissim Sig Galleazzo Polti In Genoua amp in

Bologna Presso Clemente Ferroni M DC XXXIX [1639] Con Licenza dersquo Superiori

200

regula-se por idea derradeira no Peri ideōn a deinotēs Mais natildeo haacute das liccedilotildees minuciosas

do tratadista grego embora por certo natildeo bastem para dizer o que diz Manuel de

Galhegos Vale vislumbrar o avesso o assombro monstruoso

201

ANATOMIA DO MONSTRO

Pois eu garanto que Os Sertotildees satildeo um livro falso A desgraccedila climaacutetica do

Nordeste natildeo se descreve Carece ver o que ela eacute Eacute medonha O livro de

Euclides da Cunha eacute uma boniteza genial poreacutem uma falsificaccedilatildeo hedionda

Repugnante [hellip] Euclides da Cunha transformou em brilho de frase sonora e

imagens chiques o que eacute cegueira insuportaacutevel deste solatildeo transformou em

heroiacutesmo o que eacute miseacuteria pura em epopeia

MAacuteRIO DE ANDRADE

O Turista Aprendiz

Monstrosum poema est cuius partes in unam certam formam non congruunt

uti naturalia monstra sunt quorum corpora ex aliis diversisque ab eorum

natura partibus coaluere

GIAMBATTISTA VICO

Note allrsquoArte poetica di Orazio

O juiacutezo pretende-se certeiro arrazoado de justeza e de justiccedila segundo o qual a

tragicomeacutedia porque gecircnero misto eacute gecircnero de obra que resulta da falta de arte da

ineacutepcia teacutecnica do poeta cujo poema tragicocircmico figura-se mal composto como rival de

Centauros e Quimeras Isso quer dizer que a tragicomeacutedia sempre desconforme com a

arte pois gecircnero de insciecircncia produz-se como perversatildeo dos preceitos poeacuteticos que

deveriam instituiacute-la como monstruosidade agrave qual a condena o artiacutefice incapaz de fazer o

que pode a arte aperfeiccediloar a natureza visto que na desrazatildeo estaacute ele sujeito apenas a

imperfeiccediloaacute-la e a compor monstro sem igual cuja anomalia eacute tamanha que faz parecerem

bem formados Centauros e Quimeras

O certo he que a Tragicomedia he hum monstro na Poesia taotilde enorme

e contrafeito que poacutedem os Centauros e as Chimeras parecer huns

partos perfeitos da natureza He hum composto poetico que formaacuteraotilde

alguns Atuthores para desprezo da Poesia ordenado todo de cousas

entre si discordes inimigas e incompativeis624

624 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

202

Nota-se o juiacutezo eacute demonstrativo opera-se amparado na vividez da metaacutefora

monstruosa e condensa o vitupeacuterio de Francisco Joseacute Freire agrave tragicomeacutedia tal como

doutrinado no tomo segundo de sua Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral

e de todas as suas especies principaes tratadas com juizo critico Assim como a

Bibliotheca Lusitana do Abade Diogo Barbosa Machado noticia Freire publicou esse

tratado em 1748 em dois tomos625 Passados onze anos uma segunda ediccedilatildeo seguiu-se

a esta dedicada a Sebastiatildeo Joseacute de Carvalho e Melo futuro Marquecircs de Pombal de

quem Francisco Joseacute Freire buscara proteccedilatildeo sob o nome de Cacircndido Lusitano em 1758

na dedicatoacuteria da Arte poetica de Q Horacio Flacco jaacute referida versatildeo portuguesa da

epiacutestola latina626

Na Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral referida conforme a

ediccedilatildeo de 1759 arrola-se conjunto de preceitos que intentam abarcar os mais variados

gecircneros poeacuteticos a saber a trageacutedia a comeacutedia a miacutemica a tragicomeacutedia o poema eacutepico

a eacutecloga a saacutetira a liacuterica e suas vaacuterias espeacutecies a elegia o epigrama a silva o epitaacutefio

o emblema e por fim a empresa Os capiacutetulos XXVIII e XXIX do tratado vistos de perto

satildeo assim denominados ldquoDa Tragicomedia mostrase como he Poesia monstruosardquo e

ldquoJuizo sobre a Tragicomedia de Guarini intitulada Il Pastor Fidordquo Nesses capiacutetulos

afirmando-se contraacuterio aos apologistas que defendem que ldquonaotilde repugna agrave Poetica a Poesia

Tragicomicardquo627 Francisco Joseacute Freire mira o gecircnero e Il Pastor Fido tragicomeacutedia

pastoral de Giovanni Battista Guarini que foi impressa em Veneza em 1590628 embora

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellipFungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias p 150 625 Cf Bibliotheca Lusitana Historica Critica e Chronologica na qual se comprehende a noticia dos

authores Portuguezes e das Obras que compozeraotilde desde o tempo da promulgaccedilaotilde da Ley da Graccedila ateacute

o tempo prezente offerecida agrave Augusta Magestade de D Joaotilde V Nosso Senhor por Diogo Barbosa Machado

Ulyssiponense Abbade da Parochial Igreja de Santo Adriatildeo de Sever e Academico do Numero da

Academia Real Tomo I Lisboa Occidental Na Officina de Antonio Isidoro da Fonseca Anno de M DCC

XXXXI Com todas as licenccedilas necessarias 626 A esse respeito TEIXEIRA I Mecenato Pombalino e Poesia Neoclaacutessica Basiacutelio da Gama e a Poeacutetica

do Encocircmio Satildeo Paulo Edusp 1999 pp 77 ss 627 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellipFungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias p 149 628 Cf Il Pastor Fido Tragicomedia Pastorale di Battista Gvarini Dedicata al SerMO D Carlo Emanvele

Dvca di Savoia ampc Nelle Reali Nozze di SA con la serma Infante D Caterina dAvstria Con privilegi In

Venetia Presso Gio Battista Bonfadino [1590]

203

seja sabido que jaacute circulasse em coacutepias manuscritas em anos anteriores Em liacutengua

portuguesa sabe-se da traduccedilatildeo setecentista de Tomeacute Joaquim Gonzaga Neves intitulada

O Pastor Fiel Tragi-comedia Pastoril do Cavalheiro Guarini e impressa em Lisboa em

1789 anos apoacutes morte de Francisco Joseacute Freire Marginalmente talvez interesse acrescer

que haacute notiacutecia segundo o volume sexto do Ensaio biographico-critico sobre os melhores

poetas portuguezes de Joseacute Mariacutea da Costa e Silva de 1853 de que Tomeacute Joaquim

Gonzaga Neves seja natural do Rio de Janeiro nascido em 1728 e primo de Tomaacutes

Antocircnio Gonzaga629 Sabe-se tambeacutem da versatildeo castelhana preparada pela portuguesa D

Isabel Correcirca e impressa em Amberes nos Paiacuteses Baixos em 1694 cujo tiacutetulo eacute El Pastor

Fido Poeumlma de Baptista Guarino630

Ao tratadista Francisco Joseacute Freire interessa pocircr em causa a legitimidade da

tragicomeacutedia e vituperar a obra de Giovanni Battista Guarini de modo tanto a reafirmar

a ortodoxia de um costume poeacutetico que desterra esse gecircnero quanto a destituir Il Pastor

Fido do papel de exemplum privilegiado Diga-se bem Il Pastor Fido assim eacute considerado

porque para Francisco Joseacute Freire ldquoda Tragicomedia naotilde ha Escritor algum Grego ou

Latino e soacute em Itaacutelia se fez taotilde celebre com similhante composiccedilaotilde Joaotilde Bautista

Guarinirdquo631 Evidentemente o letrado lusitano natildeo o afirma sem antes ponderar a respeito

do Anfitriatildeo de Plauto (seacutec III-II aC) Concede que no proacutelogo desta obra Mercuacuterio

o deus defina-a como tragicomoedia

Nunc quam rem oratum huc ueni primum proloquar

post argumentum huius eloquar tragoediae

Quid Contraxistis frontem Quia tragoediam

dixi futuram hanc Deus sum commutauero

eandem hanc si voltis faciam ex tragoedia

629 Cf O Pastor Fiel Tragi-comedia Pastoril do Cavalheiro Guarini Traduzida do italiano por Thome

Joaquim Gonzaga Lisboa Na Regia Officina Typografica Anno M DCC LXXXIX Com a licenccedila da Real Meza da Comissatildeo Geral sobre o Exame e Censura dos Livros 630 Cf El Pastor Fido Poeumlma de Baptista Guarino Traducido de Italiano en Metro Espantildeol y Ilustrado

con Reflexiones por Dontildea Isabel Correa Dedicado agrave Don Manuel de Belmonte Baron de Belmonte Conde

Palatino y regente de Sua Magestad Catholica En Amberez Por Henrico y Cornelio Verdussen

Mercadores de Libros Antildeo M DC XCIV 631 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellipFungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias p 155

204

comoedia ut sit omnibus isdem uorsibus

utrum sit an non voltis Sed ego stultior

quasi nesciam uos uelle qui diuus siem

Teneo quid animi uostri super hac re siet

faciam ut commixta sit ltsitgt tragicomoedia

nam me perpetuo facere ut sit comoedia

reges quo veniant et di non par arbitror

Quid igitur quoniam hic seruos quoque partes habet

faciam sit proinde ut dixi tragico[co]moedia (PL Amp 50-63)

Agora eu vou dizer primeiro para que vim falar aqui

depois vou falar sobre o assunto desta trageacutedia

O que eacute isso Vocecircs franziram a testa Porque eu disse

que ia ser uma trageacutedia Sou um deus e posso mudaacute-la

se vocecircs quiserem farei da trageacutedia uma comeacutedia

com os mesmos versos todos eles

Querem que seja assim ou natildeo Mas que bobo que eu sou

Como se eu natildeo soubesse o que vocecircs querem eu que sou um deus

Sei o que existe na cabeccedila de vocecircs a respeito disso

Vou fazer com que seja uma peccedila mista com que seja uma tragicomeacutedia

porque natildeo acho certo que seja uma comeacutedia

uma peccedila em que aparecem reis e deuses

O que vou fazer entatildeo Como tambeacutem um escravo toma parte nela

farei que seja como jaacute disse uma traacutegico-comeacutedia632

A Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral defende ser jocoso este

uso e efetivamente cocircmico e natildeo tragicocircmico o Anfitriatildeo633 Assim Francisco Joseacute

Freire entende que como exemplum no gecircnero tragicocircmico Il Pastor Fido fornece razatildeo

632 A traduccedilatildeo eacute de Zelia de Almeida Cardoso Apud Cardoso Z de A ldquoO Anfitriatildeo de Plauto uma

tragicomeacutediardquo Itineraacuterios Araraquara n 26 2008 p 18 COSTA L N DA Mesclas geneacutericas da

tragicomeacutedia Anfitriatildeo de Plauto Campinas [IEL-Unicamp] 2010 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p 66 633 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellipFungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias p 150

205

segundo a qual deva operar o poeta propenso a imitar o poema e ambicioso de emulaacute-lo

Sabe demais que se trata de razatildeo de semelhanccedila na exata medida em que satildeo

pressupostos da praacutetica da imitatio o exame prudente e a eleiccedilatildeo ajuizada da parte a qual

porque excelente se deva compor num todo poeacutetico harmocircnico A demonstraccedilatildeo da

monstruosidade do gecircnero nesses termos eacute explicitaccedilatildeo de desarmonia do todo e de

incongruecircncia da parte afinal a tragicomeacutedia de acordo com Francisco Joseacute Freire

contraveacutem com os protocolos da boa poesia porque eacute descomposiccedilatildeo artiacutestica porque eacute

composiccedilatildeo que se faz de trageacutedia e de comeacutedia porque eacute gecircnero de feiccedilatildeo mista e eacute

repugnante porque misto

Jaacute examinaacutemos as qualidades da Tragedia e da Comedia e differindo

estas entre si em cinco cousas como he a materia as pessoas a dicccedilatildeo

os affectos e o fim [] Veja-se como estas differenccedilas entre si

contrarias e incompativeis se poderaotilde unir para formar hum sujeito

poetico Na Tragedia quasi tudo saotilde choros e lamentos na Comedia

tudo alegrias e graciosidades e eu naotilde sey como se possaotilde unir estas

contrariedades

Em razatildeo disso assevera o tratadista portuguecircs

Naotilde posso penetrar como de dous contrarios e de dous extremos venha

a compocircrse hum mixto perfeito nem darse hum meyo perfeito sendo

participante de contrariedade e extremidade de cousas v g da audacia

e do temor naotilde poacutede resultar a fortaleza porque naotilde he possiacutevel que

de dous vicios nasccedila a virtude e ainda que se aponte algum exemplo v

g que de dous animaes diversos nasce hum terceiro de outra especie

responde-se que este exemplo naotilde serve para o caso porque entre a

Tragedia e a Comedia naotilde ha simpathia nem analogia alguma para

que a arte possa unir comsigo hum terceiro parto poetico e quando se

conceda este absurdo ficaraacute a Tragicomedia sendo hum monstro da arte

porque he foacuterma contra as regras que nella se prescreveraotilde do mesmo

modo que os monstros da natureza saotilde aquelles que se affastaotilde da

geraccedilaotilde natural e da ordem que ella mesma lhe deu

206

Consoante a liccedilatildeo de Francisco Joseacute Freire a desproporccedilatildeo do gecircnero tragicocircmico

eacute verossimilmente enunciada porque a prescreve analogia de proporccedilatildeo que vincula

natureza e arte Esse viacutenculo por ordem de semelhanccedila estabelece equivalecircncias que

permitem o tracircnsito de categorias de um membro a outro da proporccedilatildeo de maneira que o

vitupeacuterio de Freire penda da natureza ou talvez mais precisamente dos discursos que a

enformam e que por conseguinte instauram leis que o monstro como anomalia prodiacutegio

ou raridade por natureza ou contra naturam transgride Trata-se evidentemente do que

se considera natural e do que se considera antinatural do que se enuncia como natureza

e como natureza dos seres

Deve-se aventar ademais que natildeo haacute monstruosidade se natildeo haacute sistema que a

preveja que institua paracircmetros de conformaccedilatildeo dos desvios de observaccedilatildeo das

analogias para deduccedilatildeo das anomalias Nesta linha a monstruosidade bastante

precisamente entende-se e itera-se como mistura de formas Eacute o que ensina o curso sobre

os anormais pronunciado por Michel Foucault no Collegravege de France entre janeiro e

marccedilo de 1975 Assim mostra Foucault o monstrum eacute misto segundo ldquouma histoacuteria

natural essencialmente centrada na distinccedilatildeo absoluta e insuperaacutevel das espeacutecies gecircneros

reinos etcrdquo Nessa matriz que se sabe aristoteacutelica portanto o monstrum eacute misto de reinos

o animal e o humano como o Centauro de cabeccedila torso e braccedilos de homem garupa e

pernas de cavalo misto de espeacutecies como a Quimera de cabeccedila de leatildeo corpo de cabra

e cauda de dragatildeo634 misto de indiviacuteduos como o Ceacuterbero de latido triacuteplice635 ou a

tricecircfala Trindade636 misto de sexos como o Hermafrodita que em si reuacutene o masculino

634 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacuteciordquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2000 v 4

p 194 635 Cf OVID Met 4 450 636 Sabe-se trata-se de efiacutegie em que a Trindade compotildee-se como uma personagem de trecircs rostos feita

como que da triplicaccedilatildeo da face do Cristo canocircnico num uacutenico corpo Segundo Marta Fajardo de Rueda

essa efiacutegie foi chamada em ciacuterculos protestantes ldquoCancerbero catoacutelicordquo o que aproxima no vitupeacuterio os

exemplos referidos A histoacuteria da figuraccedilatildeo da Trindade nesses moldes tricecircfala eacute interessantiacutessima Duas

das vertentes da controversa recepccedilatildeo da figura podem ser conhecidas a seguir Primeiro leia-se passo da

ldquoInformacion en favor de Manuel Faria y Souzardquo apenso aos Lusiacuteadas em ediccedilatildeo de 1639 pp 11-12 ldquoDe la Santissima Trinidad se vegrave frequentemente la pintura de una Cabeccedila con tres rostros la tiene la devocion

Catolica por buena imagẽ dela SS Trinidad Esto si se ha de tomar por lo que solo se dexa ver

exteriormente magraves es Motildestro que imagen de Dios pero tomado interior i espiritualmente maacutes es Imagen

de Dios que Monstro Porque esto Porque la humana devocion i Feacute quiere explicarse i no tiene facultad

para hazerlo de otra manera i hazelo como puede i con esso anda segura Los dias atras vimos en la

Iglesia de la SS Trinidad de Madrid una Imagen de tres Hombres cuyos cuerpos se unian en uno con tres

cabeccedilas divididas i todas de un parecer i todo esto se via incluso en un Triangulo No ay duda que en los

terminos mortales es muy buena imagen aquella de la SS Trinidad i que Dios la aprueva en la Fegrave de los

Catolicos por magraves que quanto a la vista corporea parece Monstro porque a la del Alma es imagen de

Dios verdadero expressado assi como se puede ya que no se pueda assi como realmente es Luego

virtuosa liacutecita i catolica es essa Monstrosidad Claro estagraverdquo Em seguida leia-se passo de El Museo

207

e o feminino637

A fauna eacute muitiacutessimo vasta inclui Esfinges Harpias Goacutergones Sereias

Minotauros Tritotildees Hidras Cilas Saacutetiros e tantos outros espeacutecimes hiacutebridos cuja

hibridez em concordacircncia com a anaacutelise de Michel Foucault eacute transgressiva Como eacute

transgressiva a tragicomeacutedia para Francisco Joseacute Freire porque inscrita na arte da poesia

arte entre artes como bizarria que infringe traccedilos distintivos que satildeo para ele por assim

dizer incontornaacuteveis e transgressiva na avaliaccedilatildeo de Francisco de Quevedo a poesia

culta de imitaccedilatildeo de D Luis de Goacutengora dita ldquoculteranardquo ldquohembrilatinardquo de ldquolenguaje

hermafroditordquo Diga-se nas artes como na natureza eacute representaccedilatildeo de virtude a unidade

do corpo638 nas artes natildeo haacute gecircnero alheio ao sistema que o prescreve639

Instituem-se assim pode-se aventar os contornos da doxa em que estaacute assentado

o juiacutezo de vitupeacuterio de Francisco Joseacute Freire Nesse esforccedilo de deslegitimaccedilatildeo da

tragicomeacutedia como gecircnero de poema e de menoscabo da obra de Giovanni Battista

Guarini como exemplar no gecircnero Freire trabalha com operaccedilotildees regradas isto eacute opera

topos de censura pendente da Epistula ad Pisones de Horaacutecio (seacutec I aC) A

tragicomeacutedia portanto para Francisco Joseacute Freire enforma-se como gecircnero misto ao

modo do monstrum enunciado nos versos horacianos em adequaccedilatildeo ao aparato

demonstrativo do proacutelogo da epiacutestola

Humano capiti ceruicem pictor equinam

Jungere si uelit amp uarias inducere plumas

Pictoacuterico y Escala Oacuteptica de Antonio Palomino de Castro y Velasco impresso em 1715 ldquoTambieacuten he visto

yo varias veces otra efigie no menos monstruosa de la Trinidad sacrosanta de que hace mencion el autor

citado y es una sola cabeza con tres narices y bocas en el rostro y los ojos correspondientes para figurar

tres semblantes en uno la qual tiene los mismos absurdos que pe la antecedente y como tales deben ser

borradas prohibidas y refutadas por el Tribunal santiacutesimo de la fe como disonantes hereacuteticas y

monstruosasrdquo apud RUEDA M F de ldquoEl siacutembolo de la Trinidadrdquo in TONIQUA C (Org) El ofiacutecio del

pintor nuevas miradas a la obra de Gregorio Vaacutesquez Bogotaacute Ministeacuterio de Cultura 2008 pp 86-7

Maria Cecilia Alvarez White tambeacutem estudiosa do assunto em outro artigo da publicaccedilatildeo indica que

disposiccedilatildeo do Conciacutelio Provincial de Santafeacute atual Bogotaacute de 27 de maio de 1774 assim sancionou a mateacuteria ldquo[] prohibimos expressamente la pintura o pinturas de las trecircs personas de Santiacutesima Trinidad

Padre Hijo y Espiacuteritu Santo estando esta tercera en figura corporal de hombre y no de paloma y del mismo

modo las imaacutegenes de escultura e impresas en la forma referidardquo apud WHITE M C A ldquoUn repinte con

historia la Trinidad de Gregorio Vaacutesquezrdquo p 91 637 FOUCAULT M Os anormais Curso no Collegravege de France (1974-1975) Ediccedilatildeo estabelecida sob a

direccedilatildeo de Franccedilos Ewald e Alessandro Fontana por Valerio Marchetti e Antonella Salomoni Traduccedilatildeo de

Eduardo Brandatildeo Satildeo Paulo Martins Fones 2011 p 54 638 Cf HANSEN J A ldquoEu nos faltaraacute semprerdquo in BECKETT S o inominaacutevel Traduccedilatildeo Ana Helena Souza

Satildeo Paulo Globo 2009 p 13 639 Cf ADAM J-M HEIDMANN U O texto literaacuterio por uma abordagem interdisciplinar Satildeo Paulo Cortez

2011 p 25

208

Undique collatis membris ut turpiter atrum

Desinat in piscem mulier formosa supernegrave

Spectatum admissi risum teneatis amici

Credite Pisones isti tabulaelig fore librum

Persimilem cujus uelut aeliggri somnia uanaelig

Fingentur species ut nec pes nec caput uni

Reddatur formaelig Pictoribus atque Poeumltis

Quidlibet audendi semper fuit aeligqua potestas

Scimus amp hanc ueniam petimusque damusque uicissim

Sed non ut placidis coeumlant immitia non ut

Serpentes auibus geminentur tigribus agni (HOR AP 1-13)640

Se hum Pintor a cabeccedila humana unisse

Pescoccedilo de cavallo e de diversas

Penas vestisse o corpo organizado

De membros de animaes de toda a especie

De sorte que mulher de bello aspecto

Em torpe e negro peixe rematasse

Voacutes chamados a ver esta pintura

O riso soffrerieis Pois comvosco

Assentay ograve Pisotildees que a hum quadro destes

Seraacute muy semelhante aquelle livro

No qual ideacuteas vatildes se representem

(Quaes os sonhos do enfermo) de tal modo

Que nem peacutes nem cabeccedila a huma soacute foacuterma

Convenha De fingir ampla licenccedila

Ao Poeta e Pintor sempre foy dada

Assim he e entre noacutes tal liberdade

Pedimos mutuamente e concedemos

Mas naotilde haacute de ser tanta que se ajunte

640 Cito a liccedilatildeo que se pode ler em Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez

por Candido Lusitano Lisboa Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as

licenccedilas necessaacuterias Vendese na logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde

tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D Henrique pelo mesmo Author pp 2-9 Essa eacute a liccedilatildeo que Francisco

Joseacute Freire traduz

209

Agreste com suave e queira unirse

Ave a serpente cordeirinho a tigre641

Esses versos vertidos os hexacircmetros latinos em hendecassiacutelabos soltos e graves

segundo a praxe do tempo abrem a Arte Poetica de Q Horacio Flacco na traduccedilatildeo ao

portuguecircs feita pelo proacuteprio Francisco Joseacute Freire sob o pseudocircnimo de Cacircndido

Lusitano Evidencia o passo citado Horaacutecio diz conceder-se ao poeta e ao pintor

semelhantemente ldquolicenccedilardquo (ldquoueniamrdquo) para fingir ldquopara forjar alguma parte

extravaganterdquo propotildee Marcos Martinho dos Santos642 todavia adverte aos Pisotildees o

preceptista que natildeo se forjem ldquoideacuteas vatildesrdquo (ldquouanae fingentur speciesrdquo) tais quais ldquoeste

quadrordquo (ldquoisti tabulaerdquo) monstruoso tais quais ldquosonhos do enfermordquo (ldquoaegri somniardquo)

em que a extravagante parte se justapotildee ldquode modo incoerente agraves mais partes da obrardquo643

Nas glosas que marginalmente acompanham a traduccedilatildeo portuguesa Francisco

Joseacute Freire afirma depreender do caso agrave luz da autoridade de Vitruacutevio (seacutec I aC)

censura aos pintores ldquode grutesco em que a fantasia depravada pinta figuras humanas

rematando em folhagens serpentes em troncos e outras semelhantes extravaganciasrdquo (cf

VITR VII 5)644 pintores que em assim fazendo ldquofogem de pintar aquellas verdades

regulares e ideacuteas verosimeis para seguirem fantasias monstruosasrdquo (ou assim tambeacutem

porque ldquopessimamente aconselhados pela sua estragada imaginativardquo) 645 No mais

expotildee-se nas glosas de Francisco Joseacute Freire reprimenda aos poetas de mesma monta

visto que para o tratadista artiacutefices de artes imitativas poetas e pintores deveriam imitar

a natureza em suas razotildees ldquopara utilidade e para deleite dos homensrdquo646 Isso significa

nesses termos a imitaccedilatildeo feita a propoacutesito natildeo viola as premissas da natureza que bem

define e circunscreve os seres nem aleacutem disso desarranja a taxonomia que

convencionalmente os designa e classifica Todavia para Francisco Joseacute Freire pintores

e poetas dignos de censura em vez disso ldquoem lugar de pintarem o que herdquo ao modo do

historiador aristoteacutelico ldquoou verosimilmente poacutede serrdquo ao modo do aristoteacutelico poeta

641 Idem ibidem 642 SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

195 643 Idem ibidem 644 Idem ibidem 645 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa

Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na

logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D

Henrique pelo mesmo Author p 8 646 Idem p 25

210

ldquopassaotilde a abusar da sua arte occupando-se em pinturas incompatiacuteveis que destroem ou

a verdade ou a verosemelhanccedilardquo647

De acordo com as liccedilotildees de Horaacutecio glosadas por Francisco Joseacute Freire em

qualquer que seja a composiccedilatildeo pictoacuterica ou poeacutetica por mais extravagantes que se

mostrem suas partes e ao fim satildeo liacutecitas as extravagacircncias se operadas de modo artiacutestico

e racional648 natildeo conveacutem obra cujo todo por motivo dessas partes seja incongruente e

inverossiacutemil obra ldquoque naotilde constar de partes entre si proacuteprias accommodadas e

convenientes isto he que naotilde observar simplicidade e unidade no assumpto na

disposiccedilaotilde no ornato e no estylordquo649 A metaacutefora do monstrum nesse sentido eacute evidentia

persuasiva de ldquoquanto he desprezo a falta desta simplicidade e unidaderdquo650 ldquodesprezo da

Poesiardquo nos termos da Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral 651

Ora compartilham essa monstruosidade segundo os preceitos poeacuteticos aduzidos

obras que o leitor deve entender como ldquofieacuteis coacutepiasrdquo do quadro que figura o monstrum

obras que surgem como exemplos apensos agrave traduccedilatildeo de Horaacutecio exemplos a natildeo imitar

diga-se bem652 Satildeo elas Filis e Demofonte de Antocircnio da Fonseca Soares (1631-1682)

conhecido como Frei Antocircnio das Chagas 653 Viriato Traacutegico de Braacutes Garcia

Mascarenhas (1596-1656) estampado postumamente em 1699654 Fecircnix da Lusitacircnia

647 Idem p 8 648 SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

197 649 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa

Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D

Henrique pelo mesmo Author p 2 650 Idem ibidem 651 Manuel Pires de Almeida comenta os versos 9 e 10 da Epistula ad Pisones [ldquopictoribus atque

poetisquidlibet audendi semper fuit aequa potestasrdquo] ldquoEsta licenccedila eacute terminada na verissimilhanccedila natildeo

se haacute de fingir quanto a imaginaccedilatildeo pede Assim como o alvo do orador eacute persuadir imitar inventar e

representar as coisas que satildeo que podem ser ou que os antigos tiveram por verdadeiras fugindo-se sempre

de invenccedilotildees fantaacutesticas e malecircnconicas que carecem de correspondecircncia e semelham aos sonhos dos

freneacuteticos que cada um (como laacute dizem) vai para seu cabo Com ordem e medo se permite poetar e pintar

aborrecendo monstruosidades odiando impossiacuteveis como ajuntar aves e serpes tigres a cordeiros como

nota Entende-se a liberdade que correspondam sempre os membros a um corpo que com as perfeiccedilotildees da natureza fique bem composto guardando em tudo uma justa simetriardquo MUHANA A Poesia e Pintura ou

Pintura e Poesia Tratado Seiscentista de Manuel Pires de Almeida Satildeo Paulo Edusp p 98 652 Cf MUHANA A A Epopeacuteia em Prosa Seiscentista uma definiccedilatildeo de gecircnero Satildeo Paulo Editora da

Unesp 1997 pp 46-9 653 Cf Bibliotheca Lusitana Historica Critica e Chronologica na qual se comprehende a noticia dos

authores Portuguezes e das Obras que compozeraotilde desde o tempo da promulgaccedilaotilde da Ley da Graccedila ateacute

o tempo prezente offerecida agrave Augusta Magestade de D Joaotilde V Nosso Senhor por Diogo Barbosa Machado

Ulyssiponense Abbade da Parochial Igreja de Santo Adriatildeo de Sever e Academico do Numero da Academia

Real Tomo I Lisboa Occidental Na Officina de Antonio Isidoro da Fonseca Anno de M DCC XXXXI Com

todas as licenccedilas necessarias p 240 654 Cf Viriato tragico poema heroico em 20 cantos de Braz Garcia Mascarenhas em dois volumes vol I

211

publicado em 1649 e Insulana em 1635 ambos de Manuel Tomaacutes (1585-1665)655 Satildeo

todos poemas portugueses aos quais Francisco Joseacute Freire apotildee um et cetera (ldquoamprdquo) de

valor demonstrativo que parece agrave guisa de censura superlativar o alcance de praacutetica de

escrita que a doutrina entende desmedida No mais satildeo obras compostas no seacuteculo XVII

cujos tiacutetulos hoje ainda que soe insciente a generalizaccedilatildeo nada significam E talvez nada

signifiquem porque tenham sido naturalizadas as categorias de anaacutelise de eruditos como

Francisco Joseacute Freire e assim sejam condenados esses poemas agrave ilegibilidade como

exemplos de imperiacutecia poeacutetica e de maacute poesia ou classificados como poemas barrocos

depois de Heinrich Woumllfflin

Soma-se ademais a essas obras poema mais antigo e afamado composto por

Ludovico Ariosto (1474-1533) Orlando Furioso cuja primeira versatildeo data de 1516 O

tradutor Francisco Joseacute Freire negativamente o ajuiacuteza natildeo sem afirmar que na Itaacutelia

Horaacutecio se o pudesse ldquoacharia iguaes ou mayores monstruosidadesrdquo do que aquelas

encontradas em terras ibeacutericas O poema de Ariosto eacute vilipendiado em termos

bastantemente semelhantes por um contemporacircneo de Freire Francisco de Pina de Saacute e

de Mello (1695-1773) Ariosto eacute para Francisco de Pina e Mello como amiuacutede referido

poeta de ldquomuita extravaganciardquo Assim eacute qualificado o autor do Orlando Furioso pois

no ldquoProlegomeno para a boa intelligencia conhecimento do poema Primeira parterdquo que

prefacia o seu Triumpho da Religiaotilde Poema Epico-Polemico Francisco de Pina e Mello

bane o ldquoincrivelrdquo do gecircnero eacutepico e afirma que produz o ldquoridiculordquo e natildeo o ldquoadmiravelrdquo

o poeta que busca o ldquoextraordinariordquo mas natildeo se ateacutem aos ldquolimites da probabilidaderdquo 656

Francisco de Pina e Mello consoante esses pressupostos toma o Orlando Furioso

como exemplo de poema que excede o controle da verossimilhanccedila e faz-se monstruoso

O Poema de Ariosto estaacute fundado nestes delirios poeticos O

Hippogripho ou Cavallo de Rugero os gigantes e os monstros O anel

de Angelica que a fazia invisivel os combates de Marfisa Bradamante

Lisboa na Phenix beco de Santa Martha nordm 123 1846 pp vii-xiii 655 Cf Bibliotheca Lusitana Historica Critica e Chronologica na qual se comprehende a noticia dos

Authores Portuguezes e das Obras que compozeraotilde desde o tempo da promulgaccedilaotilde da Ley da Graccedila ateacute

o tempo presente por Diogo Barbosa Machado Ulyssiponense Abbade Reservatorio da Parochial Igreja

de Santo Adriatildeo de Sever e Academico do Numero da Academia Real Tomo III Lisboa Na Officina de

Ignacio Rodrigues Anno de MDCCLII Com todas as licenccedilas necessarias p 396 656 Triumpho da Religiaotilde Poema Epico-Polemico que a Santidade do Papa Benedicto XIV Dedica

Francisco de e de Mello Moccedilo Fidalgo da Casa de Sua Majestade Fidelissmo e Academico da Academia

Real da Historia Portuguesa Coimbra Na Officina de Antonio Simoens Ferreira impressor da

Universidade Anno de 1756 Com todas as licenccedilas necessarias p XVIII

212

e Oly[m]pia as visoens os encantamentos e outros successos deste

caracter saotilde como os sonhos de hum enfermo aonde naotilde ha

reprezentaccedilaotilde que naotilde seja monstruosidade657

Isso significa assim como os ldquoaegri somniardquo (ldquoos sonhos de hum enfermordquo) os

ldquodelirios poeticosrdquo como o pintor de bizarrias Ariosto como a pintura do monstro o

poema Orlando Furioso No discurso de vitupeacuterio a razatildeo de semelhanccedila Francisco de

Pina e Mello assenta isso eacute evidente na autoridade de Horaacutecio de quem pendem os

criteacuterios de julgamento de boa ou maacute invenccedilatildeo poeacutetica

Itere-se mesmo que Quintiliano (seacutec I dC) ao preceituar a ornamentaccedilatildeo do

discurso refira os versos iniciais da Epistula ad Pisones como ilustraccedilatildeo de viacutecio

elocutivo proacuteprio de quem mistura palavras sublimes e humildes (ldquosublimia humilibusrdquo)

arcaicas e novas (ldquouetera nouisrdquo) poeacuteticas e vulgares (ldquopoetica uulgaribusrdquo) (cf QUINT

VIII 3 61) eacute opiniatildeo corrente entre os comentadores de Horaacutecio discute Marcos

Martinho dos Santos que esses versos da epiacutestola ao construir-se por metaacutefora a

monstruosidade miram sobretudo a unidade da mateacuteria poeacutetica Eacute essa unidade como

se observou de acordo com o preceptista latino que se vecirc em risco se a variaccedilatildeo na obra

eacute prodigiosa658 pois que embora a variaccedilatildeo seja prescrita para evitar o teacutedio da invariaccedilatildeo

a unidade da obra pode-se solapar por incongruecircncia em casos tomados por excessivos659

657 Idem Ibidem 658 SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p 202 659 Para Montesquieu (1689-1755) coetacircneo de Francisco Joseacute Freire a variedade eacute motivo de prazer sem

ela ldquoa alma se abate as coisas que se parecem lhe surgem como se fossem uma soacute e se a parte de uma tela

que noacutes eacute mostrada fosse igual agrave outra que jaacute vimos esse objeto seria novo sem parececirc-lo e natildeo

proporcionaria prazer algum E como a beleza das obras de arte analogamente agrave das obras da natureza estaacute

nos prazeres que proporcionam eacute preciso capacitaacute-las tanto quanto possiacutevel a variar esses prazeres eacute

preciso mostrar agrave alma coisas que ela ainda natildeo viu eacute preciso que o sentimento que lhe eacute oferecido seja

diferente daquele que ela acabou de experimentarrdquo [ldquosans cela lrsquoacircme languit car les choses semblables lui

paraissent les mecircmes et si une partie drsquoun tableau quon nous deacutecouvre ressemblait agrave une autre que nous

aurions vue cet objet serait nouveau sans le paraicirctre et ne ferait aucun plaisir Et comme les beauteacutes des

ouvrages de lrsquoart semblables agrave celles de la nature ne consistent que dans les plaisirs qursquoelles nous font il faut les rendre propres le plus que lrsquoon peut agrave varier ces plaisirs il faut faire voir agrave lrsquoacircme des choses qursquoelle

nrsquoa pas vues il faut que le sentiment qursquoon lui donne soit diffeacuterent de celui quelle vient davoirrdquo] Nesses

termos a variedade torna-se maacutequina produtora de prazer e o prazer ansiosiacutessimo de novidade inventiva

e ainda elocutiva ldquoAs histoacuterias nos agradam pela variedade do que contam os romances pela variedade

dos prodiacutegios narrados as peccedilas de teatro pela variedade das paixotildees do mesmo modo aqueles que sabem

instruir modificam tanto quanto possiacutevel o tom uniforme da instruccedilatildeordquo [ldquoCrsquoest ainsi que les histoires nous

plaisent par la varieacuteteacute des reacutecits les romans par la varieacuteteacute des prodiges les piegraveces de theacuteacirctre par la varieacuteteacute

des passions et que ceux qui savent instruire modifient le plus qursquoils peuvent le ton uniforme de

lrsquoinstructionrdquo] Afinal ldquouma uniformidade prolongada torna tudo insuportaacutevel a ordem repetida dos

periacuteodos prolongada em excesso torna-se uma arenga acabrunhante a mesma meacutetrica e as mesma tocircnicas

causam teacutedio num poema longordquo [ldquoUne longue uniformiteacute rend tout insupportable le mecircme ordre des

213

Consoante essa siacutentese do estudioso que depende dos comentaacuterios de Porfiacuterio e Pseudo-

Acratildeo de Jerocircnimo o Santo e Sidocircnio Apolinar de Mateus de Vendocircme e Godofredo de

Vinsauf ainda que nem sempre concordantes pode-se ler a glosa de Francisco Joseacute Freire

que leitor setecentista de Porfiratildeo contesta aqueles que veem nesses versos liccedilatildeo sobre

a dispositio Escreve Francisco Joseacute Freire

Se o Poeta [Horaacutecio] tratasse aqui da disposiccedilaotilde monstruosa faria

consistir a monstruosidade em ter a figura v g a cabeccedila no lugar dos

peacutes e estes no lugar superior para deste modo mostrar huma disposiccedilaotilde

contraria agrave natureza Poreacutem o que Horacio daacute a entender claramente he

que soacute falla da invenccedilaotilde monstruosa em que os peacutes e a cabeccedila naotilde se

proporcionaotilde agrave foacuterma do corpo todo660

Nesse sentido para o tratadista portuguecircs em conformidade com a figura que

pinta Horaacutecio assim como o Orlando Furioso em particular a tragicomeacutedia afirma-se

gecircnero de poema trabalhado por poeta de ldquofantasia depravadardquo que prefere nos termos

de Vitruacutevio segundo a siacutentese teoacuterica construiacuteda por Marcos Martinho dos Santos a

ldquorazatildeo falsardquo e pretere a ldquorazatildeo da verdaderdquo661 ou como supotildeem Francisco Joseacute Freire e

Francisco de Pina de Saacute e de Mello seguindo a epiacutestola poeta que compotildee livro

assemelhado a ldquosonhos de enfermordquo Sabe-se desses ldquoaegri somniardquo Freire escreve

serem os sonhos ldquodepravados varios extravagantesrdquo e mais disparatados ainda os do

ldquoenfermordquo porque assim os fazem os ldquohumores perturbadosrdquo662 segundo os usos da

medicina de costume hipocraacutetico no diagnoacutestico da melancolia

A depravaccedilatildeo a prodigiosa variedade e a extravagacircncia desses ldquoaegri somniardquo jaacute

se viu tecircm como equivalente a vanidade das ideias do livro do mau poeta ou das

peacuteriodes long-temps continueacute accable dans une harangue les mecircmes nombres et les mecircmes chutes mettent

de lennui dans un long poeumlmerdquo] MONTESQUIEU Charles de Secondat Conde de O gosto Traduccedilatildeo e posfaacutecio de Teixeira Coelho Satildeo Paulo Iluminuras 2005 pp 27-28 660 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa

Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na

logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D

Henrique pelo mesmo Author p 6 661 SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

196 662 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa

Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na

logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D

Henrique pelo mesmo Author p 6

214

ldquospeciesrdquo conforme se lecirc na liccedilatildeo em latim Como ensina Marcos Martinho dos Santos

esse substantivo Horaacutecio emprega em referecircncia agrave ldquovisatildeo espetacularrdquo tal o deliacuterio do

enfermo ldquoque natildeo eacute produzida por nenhum ser verdadeirordquo Assim por exemplo na

horaciana ldquoSaacutetira II 3rdquo eacute figurado o maniacuteaco ldquofuriosusrdquo como Orlando que ldquoconcebe

espectros alheios agrave verdaderdquo (ldquospecies alias uerisrdquo) ou como glosa o tradutor Francisco

Joseacute Freire ldquocousas que naotilde se achaotilde na natureza e soacute se daotilde na cabeccedila dos enfermos

dos loucos e dos maacuteos Poetasrdquo663

Faz reverberar as ldquoideacuteas vatildesrdquo as ldquouanae speciesrdquo o Diccionario poetico de

Francisco Joseacute Freire Nele o termo ldquofantasiardquo eacute tomado ora em chave de elogio passiacutevel

de ser qualificado por adjetivos tais quais ldquopoeticardquo ldquosubtilrdquo ldquoagudardquo ldquoengenhosardquo

ldquodiscursivardquo ldquodiscretardquo ldquodelicadardquo ldquofelizrdquo ldquofertilrdquo ora em chave de vitupeacuterio passiacutevel

de ser qualificado por ldquodepravadardquo ldquoenfermardquo ldquoestragadardquo ldquoviciosardquo ldquoloucardquo ldquoinsanardquo

ldquofatuardquo ldquonesciardquo ldquodementerdquo ldquovaga ldquovagabundardquo ldquoconfusardquo como evidenciam os

exemplos que recolhe o Diccionario poetico ldquoDrsquoalma doces delirios gratos sonhosrdquo

ldquoPotencia forte drsquoalma sensitivardquo ldquoEngenhosas ficccedilotildees subtis ideacuteasrdquo ldquoVatildes imaginaccedilotildees

doces quimerasrdquo ldquoQue dos Vates inventa a mente insanardquo664 Trata-se nesses exemplos

e na Arte Poetica de Q Horacio Flacco de aplicaccedilatildeo do substantivo ldquoideardquo em acepccedilatildeo

lastreada pelo Vocabulario Portuguez amp Latino de Raphael Bluteau isto seja trata-se de

ldquoideardquo como ldquoimagem que o artifice foacuterma no entendimento para a pocircr em obra Imago

inis Fem Species ei Femrdquo (cf CIC Or II 8-9)665 Registre-se nesta acepccedilatildeo o termo

emprega-se na Nova Arte de Conceitos de Francisco Leitatildeo Ferreira (1667-1735)

impressa em dois tomos em Lisboa em 1718 e 1721666

663 Idem ibidem 664 Cf Diccionario poetico para o uso dos que principiaotilde a exercitarse na Poesia Portugueza Obra

igualmente util ao orador principiante Seu author Candido Lusitano floriferis ut apes in saltibus omnia

libant Omnia nos itidem depascimur aurea dicta Aurea perpetua semper dignissima vita Lucret 3 Tomo

I Lisboa Offic Patriarcal de Francisco Luiz Ameno MDCCLXV Com as licenccedilas necessarias Vende-se na

portaria da Casa de N Senhora das Necessidades e na logea de Francisco Tavares livreiro ao Senhor da

Boa Morte pp 268-9 665 Vocabulario portuguez e latino aulico anatomico architectonico bellico botanico brasilico comico

critico chimico dogmatico dialectico dendrologico ecclesiastico etymologico economico florifero

forense fructifero autorizado com exemplos dos melhores escritores portugueses e latinos pelo padre

D Raphael Bluteau Coimbra no Real Collegio das Artes da Companhia de Jesu Com todas as Licenccedilas

necessaacuterias Anno Domini MDCCXIII [1713] pp 28-9 666 Precisamente o nome de Hermoacutegenes elenca-se entre as autoridade referidas no tratado por Francisco

Leitatildeo Ferreira ldquoSeguirey as doutrinas do Conde Graotilde Cruz Manoel Tesauro estabelecidas sobre os

preceytos amp textos de Aristoteles natildeo desprezarey as ponderaccedilotildees de Gracian de Juglaris amp Masenio

consultarey as Crises Francezas de Bouhours Boileau amp Rapino verey as sabias Observaccedilotildees de Muratori

Pallavicino amp Garofalo sem me esquecer dos dictames de Longino das elegancias de Demetrio das ideas

de Hermogenes dos preceytos de Cicero amp das Instituiccedilotildees de Quintilianordquo cf Nova Arte de Conceitos

215

Faz reverberar as ldquoideacuteas vatildesrdquo tambeacutem a Arte Poetica ou Regras da Verdadeira

Poesia em geral Nele a explicaccedilatildeo do que seja a fantasia segue os seguintes passos

Todo o objeto que se representa aos olhos aos ouvidos e aos outros

sentidos lanccedila hum compendio huma imagem huma similhanccedila de si

mesmo a qual sendo recebida pelos sentidos passa pelos nervos e

orgatildeos corpoacutereos ateacute que chega a imprimirse em o nosso ceacuterebro A

potencia ou faculdade da alma que aprehende e conhece estes

objectos sensiveis ou para melhor dizer as suas imagens he a fantasia

ou imaginativa a qual porque estaacute (segundo o nosso modo de entender)

na parte inferior da alma lhe poderemos chamar aprehensiva inferior

Tem a nossa alma outra aprehensiva das cousas a que podemos dar o

nome de superior porque estaacute collocada na parte superior e racional

da alma e commummente lhe chamamos entendimento667

Sabe-se eacute definiccedilatildeo que se fundamenta em Aristoacuteteles Enuncia-a Francisco Joseacute

Freire agrave luz do tratado Della perfetta poesia italiana de Ludovico Antocircnio Muratori

(1672-1750) cuja primeira impressatildeo ocorreu em Modena na Itaacutelia em 1706 Freire de

fato verteu-o do italiano ao portuguecircs

Che qualunque oggetto si rappresenti a gli occhi a gli orecchi e agli

altri sensi trasmette un compendio unrsquoImmagine una simiglianza di

se stesso che ricevuta da i sensi passa per gli nervi ed organi corporei

infinchegrave giunge ad imprimersi nel nostro cervello La Potenza o Facoltagrave

dellrsquoanima che apprende e conosce questi oggetti sensibili o per

meglio dire le loro Immagini egrave la Fantasia o Immaginativa la quale

perchegrave egrave posta per nostro modo drsquointendere nella parte inferiore

que com o titulo de Licccedilotildees Academicas Na Publica Academia dos Anonymos de Lisboa dictava e explicava o Beneficiado Francisco Leytam Ferreyra Academico Anonymo Primeyra Parte dedicada ao

Senhor D Carlos de Noronha Primogenito do Excellentissimo Senhor Dom Miguel De Noronha Conde

de Valladares ampc Lisboa Occidental na Officina de Antoacutenio Pedrozo Galram Com todas as licenccedilas

necessaacuterias Anno de 1718 A custa de Miguel Rodriguez Mercador de Livros aacutes portas de Santa

Catharina pp 8-9 667 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellipFungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias pp 85-86

216

dellrsquoanima perciograve da noi convenevolmente puograve chiamarsi Apprensiva

inferiore Unrsquoaltra Apprensiva delle cose ha lrsquoAnima nostra che

superiore da noi srsquoappella perchegrave egrave situata nella parte superiore

ragionevole e divina dellrsquoanima e comunemente si chiama

Intelletto668

Que todo objeto [que] se represente aos olhos aos ouvidos e aos outros

sentidos transmite um compecircndio uma Imagem uma semelhanccedila de

si mesmo que recebida pelos sentidos passe pelos nervos e oacutergatildeos

corpoacutereos ateacute que chega a imprimir-se no nosso ceacuterebro A Potecircncia ou

Faculdade da alma que apreende e conhece estes objetos ou para

melhor dizer as suas Imagens eacute a Fantasia ou Imaginativa a qual

porque eacute colocada em nosso modo de entender na parte inferior da

alma para noacutes pode adequadamente chamar-se Apreensiva inferior

Outra Apreensiva das coisas tem nossa Alma que eacute por noacutes chamada

superior porque eacute situada na parte superior racional e divina669 da alma

e comumente se chama Intelecto670

E semelhantemente jaacute o havia feito Ignaacutecio de Luzaacuten (1702-1754) em versatildeo

castelhana em seu La Poetica o reglas de la poesia en general y de sus principales

especies de 1737

Todos los objetos sensibles por el conducto de los sentidos exteriores

introducen en nuestra alma una imagen ograve copia de si mismos la qual

imagen (como quiera que los Physicos expliquen esto que no es de

nuestro intẽto) se imprime y dibuxa en el celebro ugrave en otra parte donde

el alma vegrave y comprehende essas imaacutegenes Pero dividiendo para

mayor inteligencia la misma alma como en dos partes y

considerandola por dos diversos lados yagrave ocupada en essas imaacutegenes

sensibles yagrave en las cosas puramente intelectuales llamaremosla con

668 Cf Della perfetta poesia italiana spiegata e dimostrata con varie osservazioni da Lodovico Antonio

Muratori Tomo primo In Modena M DCCVI [1706] Nella Stampa di Bartolomeo Soliani Con Lic dersquo

Superiori p 153 669 Note-se o adjetivo ldquodivinordquo natildeo integra a versatildeo que Francisco Joseacute Freire elaborou da liccedilatildeo de Ludovico

Antocircnio Muratori 670 Traduccedilatildeo nossa

217

diversos nombres yagrave Phantasia ograve Aprehensiva inferior yagrave

entendimiento ugrave Aprehensiva superior671

Todos os objetos sensiacuteveis pela conduccedilatildeo dos sentidos exteriores

introduzem em nossa alma uma imagem ou coacutepia de si mesmos

imagem que (como quer que os Fiacutesicos expliquem isto o que natildeo eacute de

nosso intento) se imprime e desenha no ceacuterebro ou em outra parte donde

a alma vecirc e compreende essas imagens Poreacutem dividindo para maior

inteligencia a mesma alma como que em duas partes e considerando-a

por dois lados diversos ora ocupada nessas imagens sensiacuteveis ora nas

coisas puramente intelectuais a chamaremos com diversos nombres

ora Fantasia ou Apreensiva inferior ora entendimento ou Apreensiva

superior672

A doutrinaccedilatildeo da fantasia tal como proposta por Ludovico Antocircnio Muratori da

qual dependem por sua vez as liccedilotildees de Ignaacutecio de Luzaacuten e de Francisco Joseacute Freire

pressupotildee a teorizaccedilatildeo de Aristoacuteteles no terceiro capiacutetulo do De anima (cf ARIST III 3

427 a 17-428 b 30) Trata-se de iniacutecio de capiacutetulo das negativas que como bem entende

Maria Ceciacutelia Gomes dos Reis na versatildeo da obra em liacutengua portuguesa integra estrateacutegia

aristoteacutelica de comprovaccedilatildeo natildeo soacute de que noēsis (intelecccedilatildeo) e phronēsis (entendimento)

natildeo se circunscrevem agrave a aisthēsis (percepccedilatildeo) mas tambeacutem de que a phantasia vincula-

se agrave aisthēsise natildeo agrave construccedilatildeo da doxa (opiniatildeo)673

Mirando essa tese Aristoacuteteles afirma phantasia natildeo eacute aisthēsis a despeito do que

sustente Platatildeo (cf PLAT Thaet 152 c 1-3674 ) nem eacute dianoia (raciociacutenio) embora

aristotelicamente natildeo haja phantasia sem aisthēsis( cf ARIST An III 3 427 a 17 ss)

Natildeo eacute hypolēpsis (suposiccedilatildeo) nem noēsis porque eacute pathos (afecccedilatildeo) submisso agrave vontade

671 Cf La Poetica o reglas de la poesia en general y de sus principales especies Por Don Ignacio de

Luzan Claramunt de Suelves y Gurrea Entre los Academicos Ereinos de Palermo llamado Eligio

Mepalino Con Licencia En Zaragoza Por Francisco Revilla vive en la Calle de S Lorenzo Antildeo 1737

p 162 672 Traduccedilatildeo nossa 673 Cf ARISTOacuteTELES De anima Livros I II e III 2ordf ediccedilatildeo Apresentaccedilatildeo traduccedilatildeo e notas de Maria Ceciacutelia

Gomes dos Reis Satildeo Paulo Editora 34 2012 p 285 674 Cf VERNANT J-P ldquoNascimento de imagensrdquo in LIMA L C (Org) Miacutemesis e a reflexatildeo contemporacircnea

EdUERJ 2010 p 68 Propotildee Jacques Follon deve-se natildeo esquecer que Platatildeo identifica a

mas supotildee como substantivo deverbal de como ldquoapparitionrdquo natildeo como

designaccedilatildeo da faculdade da alma que interessa a Aristoacuteteles cf FOLLON J ldquoLa notion de phantasia chez

Platonrdquo in LORIES D RIZZERIO L (Org) De la phantasia agrave limagination Louvain Peeters 2003 p 5

218

humana distinta da hypolēpsis insubmissa da qual pendem emoccedilotildees que ela a phantasia

como fantasiada natildeo suscita (cf ARIST An III 3 427 b 16 ss) Eacute aquilo mediante o que

se faz o phantasma (apariccedilatildeo Natildeo eacute poreacutem dynamis (potecircncia) ou hexis (disposiccedilatildeo)

tais quais aisthēsis doxa noēsis e epistēmē (ciecircncia) (cf An III 3 427 b 27 ss) Natildeo eacute

aisthēsis (i) porque subsiste nos sonhos durante o sono enquanto natildeo atuam os sentidos

(ii) porque natildeo subsiste em todos os animais embora um dos sentidos em potecircncia ou

em atividade neles sempre se encontre (iii) porque pode ser falsa ao passo que os

sentidos jamais o satildeo se discernem com acuidade (iv) porque podem subsistir as imagens

mentais mesmo quando os olhos estatildeo fechados (cf ARIST An III 3 428 a 5 ss)

Tampouco eacute noēsis ou epistēmē porque pode ser falsa ao passo que estas disposiccedilotildees satildeo

sempre verdadeiras Mesmo admitindo o falso tambeacutem natildeo eacute doxa porque conforme

Aristoacuteteles opinar supotildee convicccedilatildeo e persuasatildeo pendentes da razatildeo que falta agraves feras

capazes de fantasiar E sequer decorre da combinaccedilatildeo de doxa e aisthēsis como afirma

Platatildeo (cf PL Soph 264 a 4-6 ss)675 porque eacute possiacutevel que sejam feitas suposiccedilotildees

verdadeiras concomitantes com imagens falsas afinal consoante o exemplo aristoteacutelico

eacute possiacutevel verdadeiramente crer que o sol seja maior que a terra habitada ainda que o

sentido da visatildeo mostre diminuto o astro (cf ARIST An III 3 427 b 16)

A phantasiano entanto afirma Aristoacuteteles apoacutes acumular essas negativas todas

ldquoaparenta serrdquo certa kinēsis ou seja certa moccedilatildeo aniacutemica decorrente da energeia

(atividade) da aisthēsis agrave qual a kinēsis eacute necessariamente semelhante e a partir da qual

para os seres humanos e para a maioria das feras aparecem as jaacute referidas imagens

mentais Essas imagens sabe-se na liccedilatildeo aristoteacutelica satildeo phantasmataapariccedilotildees plural

de phantasma)(cf ARIST An III 3 428 b 10-17) e podem ser como se pocircde notar falsas

ou verdadeiras676

Seguindo bastantemente de perto os passos de Ludovico Muratori de fato

vertendo-o agrave liacutengua portuguesa Francisco Joseacute Freire esmiuacuteccedila a doutrina agrave fantasia tal

como definida cabe a apreensatildeo das imagens das coisas sensiacuteveis natildeo a averiguaccedilatildeo de

sua verdade ou falsidade ofiacutecio da potecircncia que lhe eacute superior a porccedilatildeo racional da alma

o entendimento Diga-se entendimento em Freire traduz o que Ludovico Antocircnio

675 Cf VERNANT J-P ldquoNascimento de imagensrdquo in LIMA L C (Org) Miacutemesis e a reflexatildeo contemporacircnea

EdUERJ 2010 p 68 676 Cf Na paraacutefrase seguem-se de perto as notas de Maria Ceciacutelia Gomes dos Reis cf ARISTOacuteTELES De

anima Livros I II e III 2ordf ediccedilatildeo Apresentaccedilatildeo traduccedilatildeo e notas de Maria Ceciacutelia Gomes dos Reis Satildeo

Paulo Editora 34 2012 pp 289 ss

219

Muratori nomeia como intelletto ou giudizio677 o que Aristoacuteteles define como phronēsis

Consoante esse conjunto de preceitos natildeo se confundem demais fantasia e entendimento

e eacute do comeacutercio entre essas potecircncias aniacutemicas que de trecircs maneiras as imagens se

formam na alma Ora forma-as (i) o entendimento por si soacute ao abstrair imagem universal

de imagens particulares apreendidas pela fantasia Satildeo essas imagens consideradas

intelectuais ou engenhosas 678 Ora formam-nas (ii) a fantasia e o entendimento

conjuntamente este regula as operaccedilotildees daquela de modo que do ldquoimperio do

entendimentordquo679 decorram ou imagens de objetos percebidos pelos sentidos ou novas

imagens que delas pendam Satildeo essas imagens proacuteprias do poeta Ora forma-as por fim

(iii) tatildeo soacute a fantasia quando a alma por ela eacute dominada alheia aos juiacutezos do entendimento

Satildeo essas imagens comuns aos sonhos agraves febres agrave melancolia680 Entende Aristoacuteteles que

os homens que tecircm o intelecto obscurecido pela doenccedila ou pelo sono e as bestas que natildeo

677 Della perfetta poesia italiana spiegata e dimostrata con varie osservazioni da Lodovico Antonio

Muratori Tomo primo In Modena M DCCVI [1706] Nella Stampa di Bartolomeo Soliani Con Lic dersquo

Superiori p 153 Ludivico Muratori em outra obra dedicada exclusivamente agrave mateacuteria Della forza della

fantasia umana assim define o Intelletto ldquoNoi con questo nome intendiamo la Facoltagrave o Potenza che ha lAnima nostra di pensare cioegrave di apprendere le Idee delle cose di combinarle di dividerle di astraere di

giudicare di formar assiomi universali di raziocinare di far altre simili azioni delle quali egrave solamente

capace unrsquoEnte ed Agente reale spirituale ed egrave incapace la Materia per quanto si voglia organizzata e

sottilizzatardquo cf Della forza della fantasia umana Tratado di Ludovico Muratori Bibliotecario del

Serenissimo Signor Duca di Modena In Venezia MDCCXLV [1745] Presso Giambatista Pasquali Com

Licenza Dersquo Superiori pp 6-7 678 Por exemplo ldquoVecirc vg o nosso entendimento que a fantasia aprehendera e formara em si muitas imagens

de homens que faz Ajunta-as e de tantas imagens particulares que recolhera a aprehensiva inferior tira

elle e foacuterma huma imagem que antes naotilde havia concebendo Que todo o homem tem a potencia de rir

que os viciosos naotilde devem ser louvados que aquelle homem que presume que soacute elle he saacutebio deve ser

reputado por louco ampcrdquo cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense

Segunda ediccedilatildeo hellipFungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp

Officium nil scribens ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid

non quo virtus quo ferat error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz

Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas necessarias pp 86-87 679 Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes

tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda

ediccedilatildeo hellipFungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil

scribens ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus

quo ferat error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno

MDCCLIX Com as licenccedilas necessarias p 87 Recordem-se as primeiras palavras do ldquoProacutelogordquo do Don

Quijote de la Mancha de Miguel de Cervantes ldquoDesocupado lector sin juramento me podraacutes creer que quisiera que este libro como hijo del entendimiento fuera el maacutes hermoso el maacutes gallardo y maacutes discreto

que pudiera imaginarserdquo p 7 Nota-se O Quijote fantasia-se como ldquofilho do entendimentordquo poreacutem 680 Sobre os sonhos Aristoacuteteles afirma o seguinte ldquoQue a imaginaccedilatildeo natildeo eacute percepccedilatildeo sensiacutevel eacute evidente

a partir disto pois a percepccedilatildeo sensiacutevel eacute ou uma potecircncia () como a visatildeo ou uma atividade

() como o ato de ver mas algo pode aparecer para noacutes mesmo quando nenhuma delas subsiste ndash

como por exemplo as coisas em sonhosrdquo (cf ARIST An III 3 428 a 5 ss) cf ARISTOacuteTELES De anima

Livros I II e III 2ordf ediccedilatildeo Apresentaccedilatildeo traduccedilatildeo e notas de Maria Ceciacutelia Gomes dos Reis Satildeo Paulo

Editora 34 2012 p 111

220

o tecircm muito embora sejam todos dotados dos sentidos agem de acordo com a fantasia e

por ela satildeo conduzidos (cf ARIST An III 3 428 a 5 428 b 30) Essa accedilatildeo sem guias da

fantasia para um leitor aristoteacutelico como Ludovico Antocircnio Muratori eacute sobretudo um

indefensaacutevel desgoverno da razatildeo cujas razotildees residem na ineficaacutecia de ofiacutecio da fantasia

para a distinccedilatildeo de coisas ldquoVieri o Falsi Probabili o Improbabili moralmente Buoni o

Cattivirdquo681

Francisco Joseacute Freire pois sempre de acordo com Ludovico Antocircnio Muratori

preceitua que a fantasia poeacutetica nem engenhosa nem delirante mediante o senhorio do

entendimento produz imagens de trecircs espeacutecies de trecircs estatutos diferentes quais sejam

elas (i) imagens verdadeiras ou para a fantasia ou para o entendimento representaccedilotildees

de verdade apreendida pelos sentidos e assim reconhecidas682 (ii) imagens verossiacutemeis

para a fantasia e para o entendimento 683 (iii) imagens diretamente verdadeiras ou

verossiacutemeis para a fantasia mas apenas indiretamente para o entendimento visto seja

falso o sentido direto ou reto da imagem684 Nessa triparticcedilatildeo as duas primeiras espeacutecies

percebidas ou pendentes da apreensatildeo sensiacutevel satildeo entendidas pelo tratadista como

ldquosiacutemplicesrdquo e ldquonaturaisrdquo a terceira espeacutecie eacute a que se diz ldquoartificial fantaacutesticardquo685

Natildeo eacute demasiado forccediloso recordar que eacute fantaacutestica nos termos da doutrina

platocircnica uma das duas espeacutecies de mimēsis segundo o Estrangeiro dramatizado no

681 Cf Della forza della fantasia umana Tratado di Ludovico Muratori Bibliotecario del Serenissimo

Signor Duca di Modena In Venezia MDCCXLV [1745] Presso Giambatista Pasquali Com Licenza Dersquo

Superiori p 221 682 Por exemplo ldquoComo vg quem descreve vivamente e com palavras proprias o Arco Iris a batalha de

dous guerreiros hum generoso cavalo hum tigre feroz o movimento que faz na agoa de hum lago pequeno

huma pedrinha e outras cousas similhantesrdquo cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral

e de todas as suas especies principaes tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire

Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa

fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam

Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de

Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas necessarias p 88 683 Por exemplo ldquo[] como vg o imaginar a Scena funesta da ruina de Troya a chegada de Orestes a

Tauro a morte de Niaso e Eurialo e outras infinitas cousas imaginadas pela fantasia e as quaes parecem

possiveis e verosimeis tanto a ella como ao entendimentordquo cf Idem pp 88-9 684 O exemplo eacute elucidativo ldquoO voar vg he qualidade proacutepria e natural soacute do que he animado e tem azas

poreacutem a fantasia agitando as suas imagens e unindo a do voar com a da fama imagina que a fama voa

falla e opeacutera como se tivesse alma Igualmente o saudar he soacute proprio do homem com tudo a fantasia une

esta imagem com a de huma ave e imagina que os passarinhos saudaotilde com o seu canto o nascimento da

Aurora Disto se comprehende que esta casta de imagens saotilde propriamente produzidas pela fantasia que

vay imaginando cousas maravilhosas e novas que aliaacutes saotilde falsas a quem soacute vay buscar o sentido directo

Mas porque indirectamente fazem estas perceber alguma cousa que he verdadeira ou verosimil ao

entendimento por isso a elle lhe agradaotilde e na formaccedilaotilde dellas se une com a fantasia permittindo-lhe hum

taotilde bello deliacuterio e entregando-lhe aacutes vezes imagens intellectuaes para que ella as vista e orne com as suas

bellas e admiraveis cores se bem que mentirosasrdquo cf Idem p 90 685 Cf Idem pp 85-90 91-92

221

Sofista (cf PLAT Soph 266 a ss) Por um lado nesse diaacutelogo eacute eikastikē(icaacutestica) a

mimese que opera em conformidade com as grandezas do exemplo reproduzindo-lhe a

simetria visto respeitadas as proporccedilotildees (cf PLAT Soph 235 b-236 c 266 d)686 Para

Francisco Joseacute Freire subordinado agrave autoridade de Gian Vicenzo Gravina687 trata-se de

ldquoimitaccedilaotilde do particularrdquo que ldquotem por objecto todas as acccedilotildees e cousas que procedem

da natureza ou da Arte e naotilde menos da Historia que da invenccedilaotilde de alguemrdquo688 Por

outro lado eacute phantastikē(fantaacutestica)a mimese que distorce as grandezas do exemplo

para que distorcendo-as pareccedila o artiacutefice manter-lhe as proporccedilotildees tendo em vista a

distacircncia de apreensatildeo pressuposta e adequada entre as obras assim produzidas e a

recepccedilatildeo a que se destinam Ademais para Francisco Joseacute Freire trata-se de ldquoimitaccedilaotilde

do universalrdquo que ldquotem por objecto tudo o que naotilde existindo per si tem novo ser e vida

nascendo da fantasia do Poeta quando entra a inventar novas cousas ou acccedilotildees

similhantes aacutes historias que se bem nao succederaotilde podiaotilde succederrdquo689

Nesses mesmos termos para Francisco Joseacute Freire por um lado a particularidade

da mimese icaacutestica faz pender a poesia para a histoacuteria cujo lugar privilegiado nas

doutrinas poeacuteticas setecentistas jaacute se referiu Entre os autores portugueses de gecircnero eacutepico

no seacuteculo XVIII esse pendor de acordo com os estudos de Ivan Teixeira opera-se

pragmaticamente como glosa em verso de cronistas da histoacuteria lusa e pode-se

exemplificaacute-lo com poemas como Conquista de Goa (1759) de Francisco de Pina de Saacute

e de Mello Lisboa Reedificada (1780) de Miguel Mauriacutecio Ramalho Uraguay (1769)

de Basiacutelio da Gama ou Caramuru (1781) de Santa Rita Duratildeo690 Por outro lado a

universalidade da mimese fantaacutestica supotildee a imitaccedilatildeo de mateacuteria inexistente na natureza

mas inventada pela fantasia poeacutetica do artiacutefice Essa compreensatildeo do Sofista eacute de traccedilos

duradouros pois que discute Erwin Panofsky jaacute eacute lida em Gregorio Comanini no diaacutelogo

Il Figino overo del fine della pittura de 1591 em que a personagem Stefano Guazzo potildee

686 Cf Idem pp 195 252 SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo

Paulo 2002 v 4 pp 208-9 687 Cf Di Vicenzo Gravina giurisconsulto della ragion poetica libri due In Roma presso Francesco

Gonzaga MDCVIII Con Licenza dersquo Superiori 688 Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes

tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip

Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens

ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo

ferat error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX

Com as licenccedilas necessarias pp 35-9 689 Idem pp 35-9 690 TEIXEIRA I Mecenato Pombalino e Poesia Neoclaacutessica Basiacutelio da Gama e a Poeacutetica do Encocircmio Satildeo

Paulo Edusp 1999 p 249

222

a distinccedilatildeo nos seguintes termos a imitatione icastica ldquoegrave quella che imita le cose le quali

sonordquo (ldquoeacute aquela que imita as coisas que satildeordquo) ao passo que a imitatione fantastica ldquoegrave

quella che finge cose non essistentirdquo (ldquoeacute aquela que finge as coisas natildeo existentesrdquo) agrave

maneira da pintura de Giuseppe Arcimboldo691

Demais bem se nota satildeo manejados na anaacutelise dessas espeacutecies de imagem icaacutestica

e fantaacutestica como traccedilos distintivos o verdadeiro e o verossiacutemil Satildeo categorias que a

doutrina poeacutetica de Ludovico Antocircnio Muratori e de Francisco Joseacute Freire por

conseguinte reacomoda ao especificar o verdadeiro isso significa ldquoil vero della naturardquo

o ldquoverdadeiro da naturezardquo consoante distinccedilatildeo que supotildee por um lado ldquoquel vero che

in fatti egrave o pure egrave statordquo (ldquoaquelle verdadeiro que com effeito he ou foyrdquo) e por outro

lado ldquoquel vero che verisimilmente egrave stato o pur poteva o doveva essere secondo le force

della naturardquo (ldquoo outro he o que verosimilmente foy e tambem podia ou devia ser

segundo as forccedilas da naturezardquo) A doutrina o esmiuacuteccedila compete a primeira espeacutecie agrave

teologia agrave matemaacutetica agrave histoacuteria e agraves demais ciecircncias e decorre a ciecircncia da cogniccedilatildeo

do ldquovero necessario o evidente o moralmente certordquo (ldquoverdadeiro necessario ou

evidente ou moralmente certordquo) a segunda sobretudo compete agrave poesia e decorre a

opiniatildeo da cogniccedilatildeo do ldquovero possibile probabile e credibile che Verisimile poi

comunemente vien dettordquo (ldquoverdadeiro possivel provavel e crivel que vulgarmente se

diz verosimilrdquo)692

A exposiccedilatildeo que pende de Ludovico Antocircnio Muratori natildeo eacute insignificante No

que se pode avanccedilar eacute liccedilatildeo aristoteacutelica que entrelaccedila e relecirc mesmo ao reveacutes as liccedilotildees

da Poeacutetica de Aristoacuteteles relativas ao necessaacuterio () ao possiacutevel

() ao provaacutevel () ao sucedido () e ao criacutevel

() (cf ARIST Poet 9 25) de modo que de tal leitura decorra a asserccedilatildeo

da primazia da verdade e por que natildeo tendo em vista o que interessa a Aristoacuteteles nesse

691 Cf Il Figino overo del fine della pittura Dialogo del Rever Padre D Gregorio Comanini Canonico Regolare Lateranense Ove quistionandosi sersquol fine della pittura sia lrsquoutile overo il diletto si tratta

dellrsquouso di quella nel Christianesimo Et si mostra qual sia imitator piugrave perfetto amp che piugrave diletti il Pittore

ouero il Poeta In Mantova Per Francesco Osanna Stampator Ducale MDLXXXXI [1591] pp 28-30 692 Cf Della perfetta poesia italiana spiegata e dimostrata con varie osservazioni da Lodovico Antonio

Muratori Tomo primo In Modena M DCCVI [1706] Nella Stampa di Bartolomeo Soliani Con Lic dersquo

Superiori p 60 cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies

principaes tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda

ediccedilatildeo hellip Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium

nil scribens ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo

virtus quo ferat error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno

MDCCLIX Com as licenccedilas necessarias p 72

223

nono capiacutetulo do tratado e a despeito do que nele defende o filoacutesofo a primazia da

histoacuteria O que diga-se natildeo estranham os leitores da Poetica drsquoAristotele uulgarizzata

de Ludovico Castelvetro (ca 1505-1571) sabedores de que ldquoprima di natura fu la veritagrave

che la verisimilitudine amp prima di natura fu la cosa rappresentata [a histoacuteria] che la cosa

rappresentante [a poesia]rdquo693

Isso posto talvez crentes como Ludovico Castelvetro nas luzes da histoacuteria e da

verdade sem a qual ldquola poesia camina in oscurissimerdquo694 Ludovico Antocircnio Muratori e

Francisco Joseacute Freire ensinem quase que ipsis litteris

che sempre un qualche vero serve di fondamento alle invenzioni e alle

dicerie poetiche e che queste non possono esser belle quando non ci

fanno apprendere qualche veritagrave o evidente e certa o pur possibile e

verisimile [hellip] Mille pezzi di Storia di Geografia di Filosofigravea daltre

Scienze e Arti mille descrizioni di luoghi fiumi animali e altre cose

verissime ci fa tutto giorno veder la Poesia e la maggior parte de

sentimenti chella usa contiene la veritagrave evidente e reale Il resto delle

altre invenzioni e descrizioni de gli altri avvenimenti e sentimenti

chella ci fa vedere e udire e chella industriosamente finge contiene

o dee contenere il vero possibile credibili e probabile Ove o il primo

vero o il secondo non si ravvisa dallrsquointelletto nella nobile e seria

Poesia anzi in ciascuna parte della Poesia egli puograve tenersi per certo

che non ne sentiremo diletto e che non ci appariragrave bella tuttocheacute il

nuovo e il maraviglioso in lei si ravvisi troppo dispiacendoci il falso

lrsquoimpossibile lrsquoincredibile o sia linverisimile Il Poeta adunque nobile

e serio sempre ci rappresenta cose veramente avvenute certe ed

esistenti o pur ne finge colla sua fantasia di quelle che veramente

possono o potevano debbono o dovevano essere e accadere

generando nella mente nostra o scienza ovvero opinione

que sempre algum verdadeiro serve de fundamento aacutes invenccedilotildees

poeticas e que estas naotilde podem ser bellas quando naotilde nos fazem

aprehender alguma verdade ou certa ou tambeacutem possivel e verosimil

693 Poetica drsquoAristotele uulgarizzata et sposta per Ludovico Castelvetro Stampata in Vienna drsquoAustria

per Gaspar Stainhofer lrsquoanno del Signore MD LXX [1570] p 3r 694 Idem p 4

224

[hellip] Todos os dias nos mostra a Poesia mil pedaccedilos de Historia de

Geografia de Filosofia e outras Sciencias e Artes mil descripccedilotildees de

lugares de rios de animaes e de outras cousas saotilde verdadeiras antes

pela mayor parte os conceitos de que ella usa conteacutem a verdade

evidente e real695 O resto das outras invenccedilotildees e descripccedilotildees dos

outros successos e conceitos que ella nos faz ver e ouvir e que

industriosamente finge conteacutem ou deve conter o verdadeiro possivel

crivel e provavel Onde o entendimento naotilde descobrir na seria e nobre

Poesia e em qualquer de suas partes ou o primeiro verdadeiro ou o

segundo he certo que a tal composiccedilatildeo naotilde causaraacute deleite nem

pareceraacute bella ainda que se encontre o novo e o maravilhoso porque

nos ha de causar o falso hum grande desagrado como cousa impossivel

incrivel ou inverossimil Por isso o Poeta que he nobre e serio sempre

nos representa as cousas verdadeiramente succedidas certas e

existentes ou tambem finge com a sua fantasia as que verdadeiramente

poacutedem ou podiaotilde devem ou deviaotilde ter e succeder causando deste

modo ou sciencia ou opiniaotilde em o nosso entendimento696

Ora assentado nessas liccedilotildees cujos pressupostos em torno do verdadeiro e do

verossiacutemil seratildeo pormenorizados pode Francisco Joseacute Freire afirmar as ldquofantasias

monstruosasrdquo a ldquofantasia depravadardquo a ldquoestragada imaginativardquo das quais

intelectualmente natildeo decorrem nem ldquoscienciardquo nem ldquoopiniaotilderdquo a fim de por consequecircncia

assegurar no discurso de censura essa afecccedilatildeo viciosa que diz ser proacutepria de poetas

tragicocircmicos Agrave maneira dos furiosos dos melancoacutelicos consoante a Arte poetica ou

regras da verdadeira poesia em geral satildeo eles impotentes ou obscurecidos de

entendimento governados por fantasia desmedida que nada apreende de verdadeiro de

quem resulta senatildeo que espectros equivalentes nos termos do vitupeacuterio agrave tragicomeacutedia

695 Cf Raphael Bluteau ldquoCoisa realrdquo eacute a ldquoque existe e tem fer natildeo imaginariardquo Vocabulario portuguez e latino aulico anatomico architectonico bellico botanico brasilico comico critico chimico dogmatico

dialectico dendrologico ecclesiastico etymologico economico florifero forense fructifero autorizado

com exemplos dos melhores escritores portugueses e latinos pelo padre D Raphael Bluteau Coimbra

no Real Collegio das Artes da Companhia de Jesu Com todas as Licenccedilas necessaacuterias Anno Domini

MDCCXIII [1713] p 289 696 Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes

tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip

Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens

ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo

ferat error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX

Com as licenccedilas necessarias p 72

225

a qual o tratado figura desarrazoada como contrafaccedilatildeo de viciosa invenccedilatildeo gecircnero sem

proporccedilatildeo sem ordem e sem unidade resultante da conjunccedilatildeo de ldquocousas entre si

discordes inimigas e incompativeisrdquo ambicionando contra artem a virtude da unidade

e a unidade da virtude a despeito das diferenccedilas que segundo o preceito fazem da

trageacutedia e da comeacutedia gecircneros de poema forjados conforme coacutedigos poeticamente

antipaacuteticos e opostos

Ora trageacutedia e comeacutedia ensina Francisco Joseacute Freire satildeo espeacutecies de ldquoPoesia

Dramatica ou representativardquo Concordam pois ambas consoante pressupostos

aristoteacutelicos no modo como se constroacutei a imitaccedilatildeo pois o poeta ldquoimita occultando-se a

si e introduzindo pessoas a fallarrdquo Ademais devem ambos os gecircneros ldquoter justa grandeza

verosimilhanccedila accidentes maravilhosos enredo unidade tanto na acccedilaotilde como no

tempo e lugar e a soluccedilaotilde que for necessaria ou verosimilrdquo697 Todavia prescritas como

opostas e antipaacuteticas como ldquoaves e serpentesrdquo como ldquocordeirinhos e tigresrdquo fazem-se

incompatiacuteveis trageacutedia e comeacutedia Entrecruzadas pois as categorias distintivas elencadas

pelo preceptista ou seja ldquomateriardquo ldquopessoasrdquo ldquodicccedilaotilderdquo ldquoaffectosrdquo e ldquofimrdquo essas

incompatibilidades de gecircnero podem-se sintetizar da seguinte maneira a trageacutedia fabula

ldquomateriardquo amiuacutede deduzida da histoacuteria tratando ldquode acccedilotildees horrorosas e lastimosasrdquo

sucedidas a ldquopessoasrdquo ilustres afamadas tais quais ldquoReys Principes e Personagens de

grande qualidade e dignidade cujas decadencias mortes desgraccedilas e perigosrdquo movam

ldquoaffectosrdquo ou seja ldquoexcitem terror e compaixaotilde nos animos do auditorio e os curem e

purguem destas e outras paixotildees servindo de exemplo a todos mas especialmente aos

Reys e pessoas da mayor authoridade e poderrdquo segundo o ldquofimrdquo proacuteprio ao gecircnero ao

passo que a comeacutedia plasma ldquomateriardquo alheia agrave verdade ldquofingida ao arbitriordquo do poeta

ou seja eacute ldquoimitaccedilaotilde de hum facto particular e de pouca importanciardquo sucedido a ldquopessoasrdquo

cujos nomes natildeo satildeo verdadeiros de maneira que em termos de ldquoaffectosrdquo ldquomova o risordquo

ldquoacabe com fim alegre e se encaminhe a ser util divertindo ao auditorio e inspirando o

amor aacute virtude e aversaotilde ao viciordquo segundo o ldquofimrdquo proacuteprio ao gecircnero698

697 Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes

tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip

Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens

ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo

ferat error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX

Com as licenccedilas necessarias pp 2 122 698 Proveacutem o itaacutelico da ediccedilatildeo transcrita Idem pp 13 21 114 120 e ss

226

Enfim na trageacutedia nada de ldquogloacuterias interinasrdquo poderia afirmar outro melancoacutelico

o narrador Bento Santiago Na comeacutedia nada de reis priacutencipes imperadores ou ldquooutras

pessoas desta esfeacuterardquo afirma o preceptista Francisco Joseacute Freire embora natildeo deixe de

apontar que contra ldquoesta regra peccaraotilde quasi sempre os Hespanhoesrdquo699 Enfim nada

de tragicomeacutedia figurada pelo tratadista portuguecircs jaacute se sabe como misto imperfeito e

vicioso porque em suas palavras dos opostos preceituados meio-termo natildeo eacute possiacutevel

Essa impossibilidade por ora sintetiza-se na afirmada carecircncia de verossimilhanccedila e de

decoro subjacentes agrave encenaccedilatildeo de gecircnero tambeacutem dramaacutetico em que ldquopessoas Reaes e

plebeas tenhaotilde hum mesmo caracter e lugarrdquo em que ldquocaiba o estylo grave e o humilde

e que a graciosidade de ditos e factos se una com a veneraccedilaotilde das pessoas e com a

severidade dos costumesrdquo700 Nada enfim de ldquovestir hum Rey com os vestidos de algum

homem da plebe para elle deste modo se aliviar do pezo da severidade Realrdquo jaacute que

segundo a Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral assim fazer seria como

ldquoformar hum Poema da Bucolica e da Eneida e intitulallo Buccoleroicordquo701

Condizentes com as distinccedilotildees de invenccedilatildeo visto que delas dependentes operam-

se entre os gecircneros confrontados trageacutedia e comeacutedia distinccedilotildees de elocuccedilatildeo de ldquodicccedilaotilderdquo

como quer Francisco Joseacute Freire Assim ldquoo estylo da Tragedia como conteacutem grandes

personagens e affectos violentos deve ser sublime e ornado de figuras rhetoricas que

saotilde as que melhor explicaotilde as paixotildeesrdquo ao passo que o estilo da comeacutedia a ele ldquosoacute

pertence huma locuccedilaotilde commũa natural facil e pura porque as pessoas que devem

representar nella haotilde de ser ordinarias ou de mediana condiccedilaotilde aacutes quaes soacute conveacutem

similhante estylo pois seria inverosimil que em acccedilotildees e sujeitos humildes houvesse

conceitos e vozes improprias da sua esfeacuterardquo702

699 Idem p 117 A afirmaccedilatildeo de Francisco Joseacute Freire parece ecoar Ignacio de Luzaacuten ldquoNo faltan Poetas

que han dado agrave sus dramas el titulo de Tragicomedias y algunos creen que se deben llamar assi todos

aquellos dramas que participan de Tragedia y Comedia yaacute por la mezcla de sucessos serios y alegres yagrave

por la diversa condicion de las personas ilustres y plebeyas Y en este sentido la mayor parte de nuestras

Comedias serian Tragicomediasrdquo [italico meu] La Poetica o reglas de la poesia en general y de sus principales especies Por Don Ignacio de Luzan Claramunt de Suelves y Gurrea Entre los Academicos

Ereinos de Palermo llamado Eligio Mepalino Con Licencia En Zaragoza Por Francisco Revilla vive en

la Calle de S Lorenzo Antildeo 1737 p 424 700 Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes

tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip

Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens

ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo

ferat error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX

Com as licenccedilas necessarias p 152 701 Idem p 154 702 Idem p 13 21 114 121

227

Nos capiacutetulos XXVIII e XXIX da Arte poetica ou regras da verdadeira poesia

em geral insistentemente isso se nota a asserccedilatildeo da oposiccedilatildeo entre trageacutedia e comeacutedia

delimita preceitos antiteacuteticos e estabelece desvios Jaacute se conhece esses desvios afirmam-

se da ordem do discurso tragicocircmico e tecircm como exemplum privilegiado Il Pastor Fido

que deve evidenciar a particularidade dos viacutecios do gecircnero Satildeo desvios que enformam o

monstrum

[] naotilde he muito verosimil a diccaotilde taotilde culta e as sentenccedilas profundas

porque os que fallaotilde sempre saotilde pessoas do campo ainda que naquella

Corte rustica sejaotilde principaes algumas dellas703

Para Francisco Joseacute Freire muito embora essa ldquoCorte rusticardquo seja alvo de

concessatildeo ao fim ela natildeo autoriza a elocuccedilatildeo culta Eacute sobretudo evidecircncia de

inadequaccedilatildeo Satildeo conhecidas as objeccedilotildees de mesmo teor aos poemas em registro grave

de D Luiacutes de Goacutengora A censura tal como posta opera argumentos conformes agraves criacuteticas

do italiano Gian Vicenzo Gravina (1664-1718) De acordo com o tratado Della ragion

poetica estampado em Roma em 1708 seria toleraacutevel a ldquonovitagrave drsquoinvenzionerdquo que

enreda ldquonelle arti cittadine anche i genj pastoralirdquo para que se teccedila a trama em cena se

nos poemas assim retoricamente inventados ainda que se figurassem pastores e ninfas

bastante esplecircndidos e argutos houvesse sobretudo ldquosemplicitagraverdquo704 Para Gian Vicenzo

Gravina poreacutem como para Francisco Joseacute Freire natildeo eacute isso o que Il Pastor Fido encena

[Giovanni Battista Guarini] trasportograve nelle capanne anche le corti

applicando nel suo Pastor-fido a quei personaggi le passioni e costumi

703 Idem p 161 O passo encerra-se com asserccedilatildeo seguinte ldquoMenos defeituosa he nesta parte a Aminta de

Tasso e a Filli di Sciro do Conde Bonarelli segundo a opiniaoacute dos melhores criticos Italianosrdquo Essa

consideraccedilatildeo eacute conforme o que se pode ler em Di Vicenzo Gravina giurisconsulto della ragion poetica

libri due In Roma presso Francesco Gonzaga MDCVIII Con Licenza de Superiori pp 200-1 O discurso da inverossimilhanccedila tem face semelhante em outro passo do mesmo tratado naquele em que Francisco

Joseacute Freire censura as chamadas ldquocomeacutedias modernasrdquo de comedioacutegrafos espanhoacuteis ldquoNo que respeita aacutes

inverosimilhanccedilas seria preciso hum distincto volume soacute para tratar dos costumes mal conservados ou

pessimamente introduzidos pois a cada passo as Damas saotilde taotilde eruditamente discretas elegantes e

conceituosas que poderiaotilde orar no Senado Romano deixando pelo artificioso o que he natural Os Lacayos

e Lacayas poacutedem tambem dictar em huma Cadeira de Rhetorica naotilde sendo verosimil que similhantes

pessoas fallem com clausulas taotilde limadas e conceitos taotilde estudados muito mais sendo de repente e

familiarmente fallo das Damas e Galans porque nos Criados de qualquer modo que seja sempre he contra

todo o verosimilrdquo Idem pp 130-1 704 Cf Di Vicenzo Gravina giurisconsulto della ragion poetica libri due In Roma presso Francesco

Gonzaga MDCVIII Con Licenza de Superiori p 200

228

delle anticamere e le piugrave artifiziose trame de i gabinetti con ponere in

bocca de i pastori precetti da regolare il mondo politico e delle

amorose ninfe pensieri sigrave ricercati che pajono uscite dalle scuole de i

presenti declamatori ed epigrammisti [] Non niego perograve chel

Guarini avendo introdotta prole di semidei ed imitato il costume di

quelle etagrave nelle quali i pastori al governo pubblico ed al sacerdozio

ascendeano non avea da conservar la semplicitagrave e meno la rozzezza

de i pastori ignobili705

[Giovanni Battista Guarini] transportou para as cabanas tambeacutem as

cortes aplicando em seu Pastor Fiel a esses personagens [pastores e

ninfas] as paixotildees e costumes das antecacircmaras e as mais artificiosas

tramas dos gabinetes ao pocircr na boca dos pastores preceitos para regular

o mundo poliacutetico e das amorosas ninfas pensamentos tatildeo estudados

que parecem elas saiacutedas das escolas dos atuais declamadores e

epigramistas [] Natildeo nego todavia que Guarini havendo introduzido

prole de semideuses e imitado o costume daquele tempo no qual os

pastores ao governo puacuteblico e ao sacerdoacutecio ascenderam natildeo tinha de

conservar a simplicidade e muito menos a rustiquez dos pastores

ignoacutebeis706

Gian Vicenzo Gravina eacute verdade natildeo recusa abrandar a avaliaccedilatildeo e como se pode

ler sucede-lhe mesmo afirmar que o poeta natildeo havia de conservar a simplicidade ou a

rusticidade dos pastores no entanto a praacutetica compositiva essa ldquonovitagrave drsquoinvenzionerdquo

segundo afirma soa-lhe ldquoaffettata e puerilerdquo As censuras de Francisco Joseacute Freire vez

ou outra aparentam ser mais incisivas que as de Gian Vicenzo Gravina embora como se

pocircde e pode-se notar sejam-lhes semelhantes as estrateacutegias de argumentaccedilatildeo Ambos os

preceptistas o italiano e o portuguecircs intentam estabelecer protocolos de leitura de Il

Pastor Fido poreacutem ainda no seacuteculo XVIII a despeito da contenda eacute esta obra afamada

705 Idem pp 200-201 706 A esse respeito propotildee Joatildeo Adolfo Hansen ldquoGuarini inventou pastores dotados de caracteres de

cortesatildeos ndash agudeza elegacircncia dissimulaccedilatildeo prudecircncia ndash por isso capazes de discutir conceitos poliacuteticos

proacuteprios da ldquorazatildeo de Estadordquo e outros assuntos graves e galantes como o amor imitadiacutessimos Da mesma

maneira os discursos e accedilotildees de suas ninfas agudas e elegantes seriam tambeacutem referecircncia obrigatoacuteria para

a construccedilatildeo poeacutetica das Anardas Tisbes Siacutelvias Cloacuteris Clorindas Dorindas Marfidas Glauras Amariacutelis

e Mariacutelias de muita poesia conceituosa e preciosa no seacuteculo XVII e da poesia aacutercade no XVIIIrdquo HANSEN

J A ldquoAs liras de Gonzaga entre retoacuterica e valor de trocardquo Via Atlacircntica Satildeo Paulo 1997 v 1 p 42

229

e as criacuteticas a ela satildeo feitas como se fosse de bom tom natildeo esquececirc-lo nem desconsideraacute-

lo para que agravequeles que as fazem natildeo se imputasse a pecha da necedade707

Naotilde duvido que por muitas circunstancias [a tragicomeacutedia Il Pastor

Fido] se fizesse merecedora deste applauso708 poreacutem igualmente tem

outras que devem ser censuradas no tribunal de huma critica seveacutera O

que geralmente tem arrebatado os animos he o estylo desta Obra e a

mim me parece que he a primeira cousa que naotilde deve ser louvada

porque a frase deste Poeta nem he tragica nem comica nem

tragicomica mas toda lyrica porque he toda cheya de brincos e

perfumes amorosos tudo he mel e assucar tudo cores e luzes e tudo

naotilde artificios mas huns esforccedilos artificiaes buscados de proposito e

collocados em lugares que nao saotilde devicircdos e por isso contrarios ou ao

decoro da Obra ou ao costume das pessoas ou ao verosimil da imitaccedilaotilde

Pareceraacute em noacutes talvez demasiado este juizo poreacutem lea esta Fabula o

Leitor sabio e desapaixonado que certamente encontraraacute nella ser

quasi tudo huma enfiada de Madrigaes amorosos unidos

successivamente huns aos outros709

707 Idem p 201 Contraponto a opiniatildeo como essa ainda que natildeo mire a tragicomeacutedia pastoral

especificamente lecirc-se nas Reflexoens sobre a Ecloga (1764) de Luiacutes Jozeacute Correa de Franccedila e Amaral sob

o nome aacutercade de Melizeu Cylenio ldquoAinda que a vida Pastoral vulgarmente se chama rustica com tudo nam se deve tomar este epiteto no sentido comum a palavra rustica significa couza do campo e vale o

mesmo que dizer vida rustica vida campestre A mayor parte das gentes faltas de critica julgam as couzas

pasadas pelas prezentes como nam conhecem a inocencia daqueles felices tempos tem diante dos olhos as

grosarias dos Pastores do noso seculo natildeo admitem nas obras Bucolicas senam um discurso rasteiro cheyo

de rusticidades e soacutemente privativo para as cousas que se pasam no campo assim negando aacute Poesia Pastoral

os poeticos ornatos roubatildeo-lhe ao mesmo tempo a sua mesma esenciardquo apud VALLE R M ldquoA ordem dos

afetos A bucoacutelica de Claacuteudio Manuel da Costardquo Floema Caderno de Teoria e Histoacuteria Literaacuteria Vitoacuteria

da Conquista Ano I n 1 2005 p 73 708 Eacute referecircncia ao passo anterior do tratado em que Freire afirma que Il Pastor Fido ldquotem ouvido no mundo

literario os mayores elogios e entendo que a mayor parte das naccedilotildees cultas a tem traduzida nos seus

idiomasrdquo Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda

ediccedilatildeo hellip Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium

nil scribens ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo

virtus quo ferat error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno

MDCCLIX Com as licenccedilas necessarias p 155 709 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar

vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse

decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat

error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com

as licenccedilas necessarias p 155-6

230

O juiacutezo de Francisco Joseacute Freire soacute corrobora o que jaacute se leu visto que amplifica

a monstruosidade do poema agrave luz de bases doutrinaacuterias antes desenredadas O acuacutemulo

desproporcionado que delineia as incongruecircncias de Il Pastor Fido e torna o gecircnero

tragicocircmica caricatura poeacutetica ganha mateacuteria liacuterica como que plumas coloridas em corpo

de cabeccedila humana e pescoccedilo equino se conveacutem fazer ecoar o proacutelogo da Epistula ad

Pisones de Horaacutecio Nos termos de Francisco Joseacute Freire tudo satildeo brincos perfumes

cores luzes tudo satildeo artifiacutecios elocutivos de matiz liacuterica por isso deslocados que natildeo

somente concorrem para a monstruosidade imputada ao gecircnero pois pendentes de

invenccedilatildeo que opera temas amorosos lidos na chave da extravagacircncia e da variedade

proacutediga710 senatildeo tambeacutem que a dissimulam ou assim intentam em vista dos efeitos que

o tratadista diz o ldquoestylo desta Obrardquo suscitar ao arrebatar os acircnimos da recepccedilatildeo

O corpo tragicocircmico assemelhado a ldquohuma enfiada de Madrigaes amorososrdquo711

cuja sucessividade parece alheia a qualquer razatildeo de disposiccedilatildeo faz-se assim de acordo

com esse juiacutezo de censura deleitaacutevel em sua doccedilura amorosa e para que o engano natildeo

perpetue praacutetica que iteradamente se diz viciosa exige ldquoLeitor sabio e desapaixonadordquo

o qual numa sapiente apatia ao poema de Giovanni Battista Guarini atribua a

inadequaccedilatildeo e natildeo ao juiacutezo de vitupeacuterio que a Arte poetica ou regras da verdadeira

poesia em geral enuncia Esse juiacutezo embora dito severo manteacutem o tom de ponderaccedilatildeo

que insiste na impropriedade do estilo de Il Pastor Fido mas natildeo contesta o pendor do

poeta

Consoante Francisco Joseacute Freire esse deleite amoroso eacute de moral duvidosa pois

censuraacuteveis os costumes de personagens impudicas escandalosas entregues aos apetites

de amor e agraves loucas paixotildees os quais no juiacutezo do tratadista Giovanni Battista Guarini

dramatiza712 Todavia no passo que se lecirc o discurso da vulgaridade do desregramento

710 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

195 711 O madrigal eacute para o tratadista de acordo com Antonio Sebastiano Minturno correspondente possiacutevel

dos epigramas antigos Nesse ponto entrecruzam-se as liccedilotildees que vituperam o poema de Guarini Escreve Francisco Joseacute Freire em outro passo da Arte Poetica ldquoQuanto a mim mais se parecem os Epigrammas

Latinos principalmente os Gregos com os Madrigaes Redondilhas e ainda Decimas do que com o Soneto

e para que se naotilde diga que este juizo he unicamente meu lea-se a Poetica Vulgar de Antonio Minturno

tratando do Soneto em que prova que naotilde este mas o Madrigal he o que poacutede corresponder aos antigos

Epigrammas Com effeito assim o praticaraotilde os Poetas de melhor nota entre os Italianos como se poacutede vecircr

na excellente Collecccedilaotilde que delles fez o eruditissimordquo Idem p 282 712 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar

vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse

decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat

error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com

231

da seduccedilatildeo da depravaccedilatildeo natildeo desliza para a elocuccedilatildeo natildeo a metaforiza agrave maneira como

amiuacutede se afirmam as censuras de ornamentos estiliacutesticos considerados excessivos e

entatildeo viciosos asianistas gorgianos figuradas essas censuras como afirma Jacqueline

Lichtenstein por meio de ldquoleacutexico do corpo prostituiacutedo do enfeite indecente ou da

sexualidade corrompida das mulheresrdquo713 na medida em que para Francisco Joseacute Freire

a elocuccedilatildeo de Il Pastor Fido eacute improacutepria porque deslocada natildeo porque seja desmedido o

emprego do ornamento

[] este Poeta [Giovanni Battista Guarini] tem huma locuccedilaotilde

perfeitamente culta e pura que tem admiraveis sentenccedilas aacutes quaes naoacute

repugna a natureza e excellentes imagens poeticas sobre huma

metrificaccedilaotilde que facilmente naotilde teraacute igual pela sua natural doccedilura e

igualdade assim todos estes excellentes requisitos se empregassem em

outra Fabula que naotilde fosse pastoril [] 714

O preceito proscreve o misto tragicocircmico Nestes termos de fato bom seria natildeo

fosse Il Pastor Fido tragicomeacutedia pastoral seria bom natildeo fosse o que eacute De acordo com

o discurso de censura da Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral em se

tratando do gecircnero pode-se presumir natildeo haacute adequaccedilatildeo possiacutevel natildeo haacute definiccedilatildeo que o

abarque carente de ser na condiccedilatildeo de fantasiosa contrafaccedilatildeo nem haacute em razatildeo disso

preceitos que o regrem feito desvio traacutegico porque partiacutecipe do cocircmico feito desvio

cocircmico porque partiacutecipe do traacutegico feito desvio traacutegico e cocircmico porque partiacutecipe do

liacuterico etc Assim em conformidade com o monstrum os desvios se acumulam e podem

eruditos como Francisco Joseacute Freire amparados em interpretaccedilatildeo da letra de autores

como Aristoacuteteles e Horaacutecio fazer desse gecircnero figura da inadequaccedilatildeo a dar forma a obras

cujas partes embora natildeo repugnem compotildeem-se repugnantemente

No mais jaacute se viu para Francisco Joseacute Freire fantasiar imagens fantaacutesticas

ajuizadamente segundo a orientaccedilatildeo do entendimento eacute princiacutepio incontornaacutevel para o

as licenccedilas necessarias pp 156-8 713 Cf LICHTENSTEIN J A cor eloquente Traduccedilatildeo de Maria Elisabeth de Mello e Maria Helena de Mello

Rouanet Satildeo Paulo Siciliano 1994 p 108 714 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar

vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse

decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat

error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com

as licenccedilas necessarias p 161

232

artiacutefice que mire construir de obra de poesia bem formada Essas imagens interpretam-se

consoante Horaacutecio como vecircnia poeacutetica como extravagante parte que porque arrazoada

se integra a poema proporcionado e que embora possa ser falsa agrave primeira vista assim

deva ser considerada apenas agrave primeira vista pois que convenha ser lida como figura

moralizada715 Caso seja compreendida todavia a extravagacircncia por assim dizer como

licenciosa vecircnia supotildee o princiacutepio artiacutestico em discussatildeo que entendida como

ldquomonstruosardquo ldquodepravadardquo ldquoestragadardquo a fantasia na medida em que submetido o

entendimento aos seus caprichos e dela seja resultante constructo poeacutetico tal os

ldquoespectros alheios agrave verdaderdquo do furioso que a saacutetira de Horaacutecio forja como jaacute se sabe Il

Pastor Fido segundo a Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral fornece

exemplo vicioso dessa natureza

Muito pudeacuteramos dizer a respeito de algumas scenas que introduz

demasiadamente affectadas como v g de eccos respondendo este aacute

voz como se fossem animados ou de versos feitos com tal artificio

que huns naotilde tem mais palavras do que outros e parece que para se

dizerem era preciso que os representantes tivessem antes fallado entre

si e concordado no que haviaotilde de dizer poreacutem jaacute destes defeitos

fallamos largamente no principio desta Arte tratando do verosimil e

das imagens fantasticas e intellectuaes ampc716

Parece desnecessaacuterio iterar que Francisco Joseacute Freire natildeo autonomiza as praacuteticas

e as recrimina porque artificiais pois sabe que natildeo haacute poesia aqueacutem ou aleacutem do artifiacutecio

Francisco Joseacute Freire avaliza na mesma Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em

geral ldquoimagens fantasticas artificiaesrdquo717 como excelentes de Virgiacutelio e de Francesco

715 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 p 295 716 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar

vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse

decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat

error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com

as licenccedilas necessarias p 160 717 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar

vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse

decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat

error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com

as licenccedilas necessarias pp 107 ss

233

Petrarca De Virgiacutelio das Bucoacutelicas refere trecircs passos No primeiro da Eacutecloga I Melibeu

e Tiacutetiro ambos poetas e pastores dialogam Diz Melibeu que quando ausente Tiacutetiro

porque ausente uma vez ido a Roma invocavam-no tristes pinheiros (ldquopinusrdquo) fontes

(ldquofontesrdquo) e arbustos (ldquoarbustardquo)

Mel Mirabar quid maesta deos Amarylli vocares

cui pendere sua patereris in arbore poma

Tityrus hinc aberat ipsae te Tityre pinus

ipsi te fontes ipsa haec arbusta vocabant (Ecl 1 38-39)

Mel Os ceacuteos pasmava-me invocares triste

Nrsquoarvore as frutas Amaryllis teres

Guardadas para Tityro pendiam

Estes pinheiros Tityro estas fontes

Estes soutos umbrosos te chamavam (vv 40-44)718

Nos demais passos das Eacuteclogas V e X de Virgiacutelio (cf Ecl 10 13-15 Ecl 5 27-

28) leem-se e manejam-se recursos poeacuteticos equivalentes Referindo-os avaliza pois

Francisco Joseacute Freire a prosopopeia isto eacute as fictiones personarum719 bem apropriadas

agrave poesia pastoral as quais efetuam a suauitas a glykytēs segundo leitores de Hermoacutegenes

como Antocircnio Lulio720 descompotildee no entanto usos sempre particulares que entende

serem um risco agrave verossimilhanccedila do poema exatamente como no caso da versificaccedilatildeo

dita artificiosa 721 assim considerada pois que vista como resultante de fantasia

718 Cf VIRGIacuteLIO Bucoacutelicas Traduccedilatildeo e notas de Odorico Mendes Ediccedilatildeo anotada e comentada pelo Grupo

de Trabalho Odorico Mendes Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2008 pp 30-1 719 Antonii Lulli Balearis de Oratione Libri Septem Quibus non modograve Hermogenes ipse totus uerumetiam

quicquid feregrave agrave reliquis Graecis ac Latinis de Arte dicendi tratactũ est suis locis aptissimagrave explicatur

Accessit etiam locupletiss Rerum amp uerborum toto hoc Opere memorabilium Index Basileae [ex officina

Ioannis Oporini impensis Henrici Petri] [Anno Salutis humanae 1558] p 477 720 Cf PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New Jersey Princeton University Press 1970 p 61 721 A versificaccedilatildeo de Il Pastor Fido eacute tambeacutem alvo de Francisco de Pina de Saacute e de Mello embora num

certo sentido em chave oposta Observe-se ldquoPudera trazer hum innumeravel esquadraotilde de Poetas Italianos

[dignos de imitaccedilatildeo] poreacutem bastaraacute que ponha na fronte o Pastor Fido do Cavalheiro Guarini e de melhor

vontade o puzera se em lugar dos versos soltos se mettessem os rimados neste docissimo e engenhoso

Poemardquo Theatro da eloquencia ou Arte de rhetorica fundada nos preceitos dos melhores Oradores Gregos

e Latinos por Francisco de Pina de Saacute e de Mello Moccedilo Fidalgo da Casa de Sua Magestade Fidelissima

e Academico da Academia Real da Historia Portuguesa offerecida ao Reverendissimo Senhor

Desembargador Joachim Salter de Mendoccedila Prior da Collegiada de S Christovaotilde de Lisboa Juiz dos

Cazamentos e Chanceller do Patriarcado ampc ampc Por Antonio da Silva e Costa Lisboa Na officina de

Francisco Borges de Sousa Anno de MDCCLXVI p 219

234

desgovernada que o entendimento natildeo controla Semelhantemente o mesmo argumento

relativo aos versos repete-se entre os preceitos do capiacutetulo XIII do tratado Da Eacutecloga

sua origem definiccedilatildeo estylo virtudes e vicios Francisco Joseacute Freire aparenta tomar a

dissimulatio artis como pressuposto da boa imitaccedilatildeo poeacutetica e avalia afetada a

versificaccedilatildeo que exibe o artifiacutecio e assim arrisca a naturalidade forjada e o decoro do

gecircnero

Naotilde lhe he menos conveniente o Amabecirco722 principalmente se hum

Pastor responder a outro em versos e numeros iguaes e aacutes vezes com

vozes e sentenccedilas similhantes ou tambeacutem contrarias poreacutem nisso deve

haver grande cuidado em ordem a que a Eacutecloga naotilde saya taotilde artificiosa

que se perca a pintura do verosimil representando-se o que naotilde se poacutede

naturalmente esperar de homens camponezes naotilde menos a respeito de

conceitos refinados que de palavras graves e imagens sublimes por

alheyas da mateacuteria de que se trata e da fantasia e entendimento de

quem a trata723

Satildeo os discursos com estatuto de verdade que controlam as desproporccedilotildees e a

defesa do verossiacutemil natildeo soacute repreende as vozes pastoris consideradas artificiosas em

ambos os exemplos mesmo que proacuteprias ao gecircnero bucoacutelico724 senatildeo tambeacutem bane a

tragicomeacutedia do elenco das praacuteticas poeacuteticas dignas de execuccedilatildeo725 Para Francisco Joseacute

Freire conforme as liccedilotildees de Ludovico Antocircnio Muratori o verossiacutemil como espeacutecie de

verdade possiacutevel provaacutevel e criacutevel institui-se mais detalhadamente nos seguintes termos

Jaacute temos dito que a principal base em que se funda a belleza das

imagens intellectuaes he ou a verdade ou a verosimilhanccedila interna

722 Ou ldquocanto amebeurdquo Como sintetiza Joatildeo Angelo Oliva Neto trata-se de canto ldquoentoado em turnos alternados por dois cantores ou corosrdquo Nesse papel observam-se os pastores referidos Cf CATULO O livro

de Catulo Traduccedilatildeo introduccedilatildeo e notas de Joatildeo Angelo Oliva Neto Satildeo Paulo Edusp 1996 p 213 723 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar

vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse

decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat

error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com

as licenccedilas necessarias p 242 724 Cf HASEGAWA A P Os limites do gecircnero bucoacutelico em Vergiacutelio um estudo das eacuteclogas dramaacuteticas Satildeo

Paulo Humanitas 2012 p 220 725 Idem ibidem

235

poreacutem naotilde basta soacute isto para que as reflexotildees e conceitos sejaotilde

completamente belos He tambem necessario que estes contenhaotilde outra

especie de verosimil a que chamaremos relativo porque diz relaccedilaotilde a

quem falla Este pode-se considerar de dous modos ou como verosimil

que conveacutem aacute qualidade condiccedilatildeo e graacuteo da pessoa que falla ou como

verosimil que conveacutem ao affecto e paixotildees que haacute ou se suppoem em

quem falla726

Vale rememorar que o termo ldquoverossiacutemilrdquo em liacutengua portuguesa onipresente nas

censuras recolhidas eacute latinismo e como escreve Angeacutelica Chiappetta guarda liccedilatildeo da

Rhetorica ad Herennium que verteu ao latim ueri simile o aristoteacutelico eikos cf Rhet

Her I 13)727 Na Rhetorica ad Herennium ueri simile eacute qualificativo de virtude da

narratio a qual se entenderaacute assim se respeitados os postulados do costume (mos) da

opiniatildeo (opinio) e da natureza (natura) e conservadas as duraccedilotildees do tempo (spatia

temporum) as dignidades das personagens (personarum dignitates) as razotildees das

deliberaccedilotildees (consiliorum rationes) e as oportunidades dos lugares (locorum

oportunitates) (cf Rhet Her I 16)

Em Aristoacuteteles na Retoacuterica eikos designa o que no mais das vezes sucede no

acircmbito do que eacute de um modo e poderia ser de outro (cf ARIST Rhet I 215-17 1357 a

34 ) Nos Analiacuteticos Anteriores eikos semelhantementeeacute proposiccedilatildeo endoxal ou

seja eacute enunciado do que no mais das vezes sucede conforme a doxa partilhada de todos

da maioria ou dos mais saacutebios Assim por exemplo eacute eikos que se detestem os invejosos

ou que se tenha afeto pelos amados (cf ARIST Rhet II 27 70 a 2-5) Na Poeacutetica de

modo similar eikos eacute espeacutecie do possiacutevel () consentacircneo ao poeta eacute o que

como tal no poema pode suceder e no mais das vezes sucede sem que o sucesso por

isso decorra ou da necessidade ( do inevitaacutevel porque senatildeo seria de outra

726 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar

vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse

decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat

error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com

as licenccedilas necessarias p 175 Como em casos anteriores Francisco Joseacute Freire verte agrave liacutengua portuguesa

o tratado de Ludovico Antocircnio Muratori 727 Cf CHIAPPETTA A Ad animos faciendos comoccedilatildeo feacute e ficccedilatildeo nas Partitiones oratoriae e no De officiis

de Ciacutecero Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 1997 [tese de doutorado] pp 91 146-148

236

espeacutecie ou do acaso () porque assim seria inerte a obra improacutepria agraves razotildees da arte

(cf ARIST Poet 9 1451 a 36 ss)

Isto eacute para Aristoacuteteles o poeta diferencia-se do historiador pelo trato natildeo com o

sucedido (ldquordquo) mas com o possiacutevel e o necessaacuterio (ldquo

rdquo) (cf ARIST Poet 9 1451 a 38) ou seja ldquosecondo il verisimile o la

necessitardquo de acordo com a Poetica drsquoAristotele uulgarizzata de Ludovico Castelvetro

(1570) Essa interpretaccedilatildeo em vulgar de Castelvetro filia-se a leituras latinas de

Aristoacuteteles que a precederam a saber os comentaacuterios de Francesco Robortello (1548) e

a traduccedilatildeo de Alessandro Pazzi (1536) Consoante as glosas de Robortello ao passo tal

como traduzido por Pazzi o poeta ldquodebet confingere secundum possibile (sic enim libet

appellare ) aut necessarium aut probabile amp verosimilerdquo ou seja ldquodeve

fingir segundo o possiacutevel (pois acha-se por bem assim designar to dynaton) ou necessaacuterio

ou provaacutevel e verossiacutemilrdquo728 Esses derradeiros termos latinos os neutros ldquoprobabilerdquo e

ldquoverosimilerdquo vecirc-se bem traduzem o neutro grego ldquoto eikosrdquo segundo equivalecircncia que

remonta a Ciacutecero para quem provaacutevel e verossiacutemil superpotildeem-se ldquoprobabilia uel ueri

similiardquo (cf CIC Acad fr 19)

Haacute muito mereceu a atenccedilatildeo de Geacuterard Genette a noccedilatildeo de dever nos processos

de verossimilhanccedila construiacutedos tanto na tragicomeacutedia Le Cid de Pierre Corneille (1606-

1694) publicada em 1637 quanto na nouvelle La Princesse de Clegraveves de Madame de La

Fayette (1634-1693) datada de 1678729 Geacuterard Genette no artigo ldquoVraisemblance et

motivationrdquo recorda as Reacuteflexions sur la poeacutetique drsquoAristote et sur les ouvrages des

poegravetes anciens et modernes (1674) do jesuiacuteta Reneacute Rapin (1621-1687) e atenta para a

distinccedilatildeo proposta nesta obra entre verdade e verossimilhanccedila qual seja ldquola veacuteriteacute ne

fait les choses que comme elles sont amp la vray-semblance les fait comme elles doivent

estrerdquo (a verdade faz as coisas apenas como satildeo amp a verossimilhanccedila as faz como devem

ser) de forma que ldquoquase sempre defeituosardquo a verdade visto afastadas as coisas do

728 Alessandro Pazzi assim traduz o texto gregoldquoSanegrave constat ex supradictis non poeumltae esse facta ipsa

propria narrare sed quemadmodũ vel geri quiuerint vel verisimile vel omnino necessarium fueritrdquo cf

Aristotelis poetica per Alexandrum Paccium patritium Florẽtinum in Latinum conversa Basileaelig M D

XXXVII [1537] p 13v Na versatildeo anocircnima portuguesa de 1779 lecirc-se a seguinte paraacutefrase ldquoHe manifesto

pelo que jaacute fica dito que o Officio do Poeta natildeo he referir as cousas que realmente acontececircratildeo mas sim

as que poderiatildeo ou deveriatildeo acontecerrdquo visto que o ldquoPoeta deve seguir ou a verosemelhanccedila ou a

possibilidade das cousasrdquo cf A Poetica de Aristoteles traduzida do Grego em Portuguez Lisboa Na Regia

Officina Typografica Anno de MDCCLXXIX [1779] Com licenccedila da Real Meza Censoria p 39 729 GENETTE G ldquoVraisemblance et motivationrdquo In Communications 11 1968 Recherches

seacutemiologiques le vraisemblable pp 5-21

237

mundo das ideias de que pendem ao passo que fonte de originais e de modelos a

verossimilhanccedila 730 Refere-o Geacuterard Genette eacute liccedilatildeo do padre Reneacute Rapin que o

verossiacutemil exemplar em oposiccedilatildeo ao maravilhoso definido como ldquotout ce qui est contre

le cours ordinaire de la naturerdquo (tudo o que eacute contra o curso ordinaacuterio da natureza) seja

ldquotout ce qui est conforme agrave lrsquoopinion du publicrdquo (tudo o que eacute conforme agrave opiniatildeo do

puacuteblico) 731 de modo que se constitua como criteacuterio de conformidade com o dever ser da

opiniatildeo

Nesses termos que natildeo se afastam das liccedilotildees da Rhetorica ad Herennium compor

obra de poesia cuja invenccedilatildeo esteja em concordacircncia com a doxa a opiniatildeo eacute operar natildeo

soacute em conformidade com a verossimilhanccedila (ldquovraisemblancerdquo) senatildeo tambeacutem com a

conveniecircncia (ldquobienseacuteancerdquo) 732 enlaccediladas ambas verossimilhanccedila e conveniecircncia

segundo a leitura de Geacuterard Genette no dever ser da mateacuteria poeacutetica pela duplicidade de

sentido do verbo ldquodeverrdquo eacute dever como obrigaccedilatildeo (ldquoobligationrdquo) eacute dever como

probabilidade (ldquoprobabiliteacuterdquo) 733 Isso significa fingir segundo a verossimilhanccedila e por

conseguinte estar em concordacircncia com a opiniatildeo do puacuteblico supotildee natildeo o acordo

democraacutetico das opiniotildees e das vontades mas o uso o costume (consuetudo) o que no

acircmbito linguiacutestico Quintiliano entende como ldquoconsenso dos instruiacutedosrdquo (consensus

eruditorum) como fundamento letrado comum constituiacutedo segundo a auctoritas734

730 Escreve o padre Reneacute Rapin ldquoLa veriteacute est presque toucircjours deacutefectueuse par le meacutelange des conditions

singulieres qui la composent Il ne naist rien au monde qui ne srsquoeacuteloigne de la perfection de son ideacutee en y

naissant Il faut chercher des originaux amp des modeles dans la vray-semblance amp dans les principes

universels des choses ougrave il nrsquoentre rien de materiel amp de singulier qui les corromperdquo [A verdade eacute quase sempre defeituosa pela mistura das condiccedilotildees singulares que a compotildeem Nada nasce no mundo que natildeo

se distancie da perfeiccedilatildeo de sua ideia ao nascer Eacute preciso buscar os originais amp os modelos no verossiacutemil

amp nos princiacutepios universais das coisas em que natildeo concorre nada de material amp de singular que as

corrompa] cf Reacuteflexions sur la poeacutetique drsquoAristote et sur les ouvrages des poegravetes anciens et modernes A

Paris chez Franccedilois Muguet Imprimeur du Roy amp de M lrsquoArchevesque rueuml de la Harpe agrave lrsquoAdotation de

trois Rois MDCLXXIV [1674] Avec Priuilege du Roy pp 56-7 731 Idem p 53 732 Na traduccedilatildeo em liacutengua portuguesa do artigo de Ceacutelia Neves Dourado bienseacuteance traduz-se por

ldquodececircnciardquo Optei por manter no passo referido o campo semacircntico da retoacuterica com o substantivo

ldquoconveniecircnciardquo sem que o pressuposto de conformidade com coacutedigos de moralidade ou de eacutetica se

perdesse cf GENETTE G ldquoVerossiacutemil e motivaccedilatildeordquo In BARTHES R et alli Literatura e semiologia Petroacutepolis Vozes 1972 pp 8-9 733 GENETTE G ldquoVraisemblance et motivationrdquo In Communications 11 1968 Recherches

seacutemiologiques le vraisemblable pp 5-6 734 Quintiliano escreve ldquoResta pois o uso Com efeito seria quase ridiacuteculo preferir a linguagem com a

qual os homens falaram agravequela com a qual falam E seguramente que outra coisa eacute uma linguagem antiga

senatildeo uma velha forma de falar Mas eacute necessaacuterio que se observe com criteacuterio e se defina em primeiro

lugar aquilo que tratamos e chamamos de ldquousordquo Se se tomar o nome tendo em vista o que fazem muitos

oferecer-se-aacute um preceito por demais perigoso natildeo apenas para o discurso mas tambeacutem o que eacute mais grave

para a vida Ora onde residiraacute a vantagem de tomar por bom aquilo que agrada agrave maioria Portanto da

mesma forma que depilar-se cortar os cabelos em camadas e beber em excesso nos banhos por mais que

tais coisas tenham invadido a cidade natildeo constituem uso porque nenhuma delas estaacute livre de censura ndash ao

238

Ora defensor do verdadeiro como fundamento das invenccedilotildees poeacuteticas Francisco

Joseacute Freire sempre nos passos de Ludovico Antocircnio Muratori faz da verossimilhanccedila

da probabilidade criteacuterio de adequaccedilatildeo que evidentemente estaacute embasado nesses

pressupostos de autoridade Todavia o faz em consonacircncia com distinccedilotildees especiacuteficas

que Aristoacuteteles Ciacutecero ou o Anocircnimo desconhecem jaacute que a liccedilatildeo de Francisco Joseacute

Freire potildee-se em termos segundo os quais emparelhada com a verdade a verossimilhanccedila

seja ldquointernardquo ou ldquorelativardquo Da primeira espeacutecie pouco diz o tratadista Da segunda

espeacutecie concernente ao respeito agraves personarum dignitates (cf Rhet Her I 16) diz mais

Pelo que respeita aos conceitos verosimeis aacute condiccedilaotilde de quem falla

quem naotilde sabe que as reflexoacutees e imagens que viraacuteotilde ao entendimento

de hum Pastor sempre creado nos bosques e apartado das Cidades haotilde

de ser differentes das que conceberaacute ou poderaacute conceber hum Cidadaotilde

hum Guerreiro hum Heroe e hum Principe

E arremata

Saotilde neste particular bem solidos os versos de Horacio735 ensinando-nos

que diversamente ha de fallar o servo do senhor e o moccedilo do velho

contraacuterio noacutes nos lavamos cortamos os cabelos e fazemos juntos as refeiccedilotildees segundo um determinado

costume ndash assim tambeacutem no falar natildeo se tomaraacute por regra de linguagem algo de vicioso que muitos adotaram Com efeito para natildeo falar do modo como os incultos habitualmente se expressam sabemos que

muitas vezes os teatros inteiros e toda a multidatildeo do circo se expressam rudemente Logo chamarei de

ldquouso da linguagemrdquo o consenso dos instruiacutedos do mesmo modo que o consenso dos bons se chama ldquomodo

de viverrdquo Traduccedilatildeo de Marco Aureacutelio Pereira cf PEREIRA M A Quintiliano Gramaacutetico o papel do mestre

de gramaacutetica na Institutio oratoria 2ordf ed Satildeo Paulo Humanitas 2006 pp 159-160 Em Latim lecirc-se

(QUINT Inst or I 6 43-45) ldquoSuperest igitur consuetudo nam fuerit paene ridiculum malle sermonem quo

locuti sint homines quam quo loquantur Et sane quid est aliud uetus sermo quam uetus loquendi consuetudo

Sed huic ipsi necessarium est iudicium constituendumque in primis id ipsum quid sit quod consuetudinem

uocemus Quae si ex eo quod plures faciunt nomen accipiat periculosissimum dabit praeceptum non

orationi modo sed quod maius est uitae unde enim tantum boni ut pluribus quae recta sunt placeant

Igitur ut uelli et comam in gradus frangere et in balneis perpotare quamlibet haec inuaserint ciuitatem non erit consuetudo quia nihil horum caret reprensione (at lauamur et tondemur et conuiuimus ex

consuetudine) sic in loquendo non si quid uitiose multis insederit pro regula sermonis accipiendum erit

Nam ut transeam quem ad modum uulgo imperiti loquantur tota saepe theatra et omnem circi turbam

exclamasse barbare scimus Ergo consuetudinem sermonis uocabo consensum eruditorum sicut uiuendi

consensum bonorumrdquo 735 Em traduccedilatildeo de Francisco Joseacute Freire a liccedilatildeo de Horaacutecio pode-se assim sintetizar ldquoDemos a cada idade

o que lhe toca Ou como verdadeiro ou verosimil Senaotilde de velho e moccedilo home e menino Veremos

confundidos os costumesrdquo (cf HOR AP 176-78) cf Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e

Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC

LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo

dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D Henrique pelo mesmo Author p 115

239

Pelo que pertence ao verosimil que conveacutem aacutes paixotildees da pessoa que

falla todos igualmente sabem que as imagens que saotilde proprias a quem

falla sem paixaotilde alguma ficaraacuteotilde improprias a quem discorre movido de

algum affecto violento Humas devem ser as imagens para aquelle que

se introduz a fallar com pensamentos meditados e outras as que

conveacutem aacutequelle que se finge discorrer de repente e com discurso

continuado como succede na conversaccedilaotilde civil736

Esses postulados tal como propotildee Joatildeo Adolfo Hansen fornecem explicaccedilotildees ou

causas agrave mateacuteria narrada (ou dramatizada) e operam como princiacutepios de adequaccedilatildeo do

que ldquose considera natural habitual e normal que aconteccedila na realidade e como realidaderdquo

Nesses termos agrave luz dos passos tratadiacutesticos todos referidos nas palavras de Hansen em

concordacircncia com a reflexotildees citadas de Geacuterard Genette ldquoa verossimilhanccedila eacute uma

relaccedilatildeo de semelhanccedila entre discursosrdquo 737 e assim estabelecida estabelecidos os

pressupostos de semelhanccedila depreende-se que a ldquoficccedilatildeo eacute verossiacutemil quando o leitor

reconhece os coacutedigos que julga verdadeiros e que satildeo aplicados pelo autor para motivar

as accedilotildees da histoacuteriardquo738 Ou em chave inversa a ficccedilatildeo eacute inverossiacutemil caso esses coacutedigos

convencionalmente natildeo se reconheccedilam e desse modo eacute dita inacreditaacutevel Angeacutelica

Chiappetta lembra de maneira muito precisa que natildeo se contrapotildee o verossiacutemil ao

verdadeiro mas ao inacreditaacutevel ao incriacutevel (ldquordquo) incapaz como tal de

efetuar-se persuasivamente739

Ora as desrazotildees do monstrum satildeo particulares como particulares as razotildees que

o enunciam Agrave luz do conjunto de argumentos referidos desde o iniacutecio deste capiacutetulo

aparenta esforccedilar-se Francisco Joseacute Freire para declarar a impossibilidade de que a

tragicomeacutedia seja passiacutevel de significaccedilatildeo porque afirmando-a desarrazoada subtrai-lhe

as razotildees No mais as razotildees de Francisco Joseacute Freire mostram avanccedilar no seacuteculo XVIII

736 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar

vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse

decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat

error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com

as licenccedilas necessarias pp 175-6 737 Ver TODOROV T ldquoIntroduccedilatildeo ao verossiacutemilrdquo In Poeacutetica da prosa Traduccedilatildeo de Claudia Berliner Satildeo

Paulo Martins Fontes 2003 p 116 738 HANSEN J A ldquolsquoO imortalrsquo e a inverossimilhanccedilardquo Teresa revista de Literatura Brasileira 67 Satildeo

Paulo 2006 pp 71-72 739 Cf CHIAPPETTA A Ad animos faciendos comoccedilatildeo feacute e ficccedilatildeo nas Partitiones oratoriae e no De officiis

de Ciacutecero Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 1997 [tese de doutorado] p 149

240

em terras ibeacutericas debate de longa vigecircncia acerca da legitimidade da tragicomeacutedia

reverberando liccedilotildees que remontam aos fins do seacuteculo XVI anteriores mesmo agrave estampa

de Il Pastor Fido As censuras que Francisco Joseacute Freire propotildee asseveram-se em larga

medida amparadas na voz do cipriota Giason Denores (ca 1530-1590) ou Jason de Noris

como grafa o letrado portuguecircs professor da Universidade de Paacutedua e tambeacutem

comentador da Epistula ad Pisones740

Foi impresso em 1587 em Paacutedua o Discorso di Iason Denores intorno a quersquo

Principii Causae et Accrescimenti che la Commedia la Tragedia et il Poema Heroico

Ricevono dalla Filosofia Morale amp Ciuile amp darsquo Gouernatori delle Republiche Dele

depreendem-se doutrina da qual Freire eacute conhecedor e censura de que sua Arte Poetica

se mostra dependente Os argumentos satildeo conhecidos Supondo que o corpo da Poeacutetica

aristoteacutelica constitua-se da trageacutedia da comeacutedia e do poema heroico porque se proponha

o estagirita a tratar dessa sorte de gecircnero de poemas mesmo que outros refira 741 e

supondo que nem Aristoacuteteles nem outro ldquohonoratordquo tratadista antigo que lhe seja

conhecido trataram da tragicomeacutedia742 Giason Denores assevera a tragicomeacutedia como

ldquodisproportionato componimento misto di due contrarie attion amp qualitagrave di personerdquo

cuja faacutebula porque resultante de mistura de accedilotildees e de personagens traacutegicas e cocircmicas eacute

necessariamente dupla e oposta carente de unidade jaacute que a trageacutedia sabe-se bem fabula

ldquopersone illustrirdquo cujas accedilotildees arrematem ldquonellrsquoauuersa fortunardquo ao passo que a comeacutedia

fabula ldquopersone priuaterdquo particulares cujas accedilotildees arrematem ldquoin allegrezzardquo743

Assevera tambeacutem Giason Denores que no acircmbito do estilo a trageacutedia opera ldquoidea

del dir magnifica amp grauerdquo ao passo que a comeacutedia opera ldquoidea del dir tenue amp humilerdquo

740 Cf In Epistolam Q Horatii Flacci De Arte Poeumltica Iasonis de Nores Ciprij ex quotidianis Tryphonis

Cabrielij sermonibus interpretatio Parisiis Apud uiduam Mauricij agrave Porta in clauso Brunello sub signo

D Claudij 1554 741 ldquo[] Aristoteles quantunque nella sua poetica nominasse diuerse sorti di poesie non perograve propone di

trattar si non della comedia della tragedia amp del poema heroico amp con queste tre sole constituisce il

corpo dellarte poeticardquo [ldquoAristoacuteteles embora em sua Poeacutetica nomeasse diversos tipos de poesia natildeo se

propotildee a tratar poreacutem senatildeo que da comeacutedia da trageacutedia amp do poema heroico amp com estes trecircs somente constitui-se o corpo da arte poeacuteticardquo] Discorso di Iason Denores intorno a quersquo Principii Causae et

Accrescimenti che la Commedia la Tragedia et il Poema Heroico Ricevono dalla Filosofia Morale amp

Ciuile amp darsquo Gouernatori delle RepublicheAllrsquoIlustrissimo et Molto Reverendo Signor Abbate Galeazzo

Riario Con Priuilegio In Padova Apresso Paulo Meieto 1587 p 37v 742 Idem p 38v 743 Idem pp 38f 38v 39f 41v 42f Em siacutentese ldquoLa Tragedia egrave rappresentation di una atroce amp

misegraverabile attione di persone illuftri fra buone amp cattiue che per qualche errore humano cominciando da

allegrezza finisce in infelicitagrave nello spacio di un giro di Sole composta ograve con uerfi sciolti endecasillabi ograve

con uersi di sette syllabe ograve con ambidue mescolatamente con parole altiere amp graui per purgar gli

spettatori per mezzo del diletto dal terrore amp dalla misericordia amp per fargli abhorrir la uita de tiranni

amp de piu potentirdquo Idem p 36v

241

que lhes satildeo proacuteprias A mistura como se sabe diz-se proscrita ldquoper loro natura per

ragione per giudici di Demetrio fallereo non possono essere congiotildete in vno istesso

corpo ne in vna istessa compositionerdquo744 Desse modo para Giason Denores porque

indecorosa e inverossiacutemil como ldquocomposition mostruosardquo a tragicomeacutedia consoante

criteacuterios que o tiacutetulo do discurso enuncia ldquocontraria arsquo principi dersquo philosophi morali amp

civili amp dersquo gouernatori delle republiche tanto ben fondate a beneficio publicordquo745 Eacute

pressuposto que atravessa a argumentaccedilatildeo a sujeiccedilatildeo da poeacutetica e da retoacuterica agrave filosofia

moral norteadora do ofiacutecio do perfeito poeta que mira sempre interessado tornar

virtuosos os cidadatildeos e feliz a repuacuteblica746

O Discorso di Iason Denores assume a insujeiccedilatildeo filosoacutefica a contrariedade moral

da tragicomeacutedia declarando-a gecircnero que natildeo traz benefiacutecio algum a quem vive na cidade

nem tem fim que seja uacutetil a res publica pois que misto Afinal no entendimento de Giason

Denores se constituiacuteda a faacutebula pastoral em moldes traacutegicos da ventura agrave desventura

haveria um ldquotaacutecito conviterdquo a que os homens deixassem a cidade enamorados da vida no

campo Demais natildeo supotildee pastores ou camponeses entre ldquobuone amp cattiuerdquo entre ldquobons

e mausrdquo nem bem acomodados agraves accedilotildees traacutegicas nem bem acomodados agraves accedilotildees cocircmicas

constituintes como supotildee o tratadista do misto 747 Na trageacutedia deformam-se essas

personagens se tornadas capazes do terriacutevel e do miseraacutevel na comeacutedia se tornadas

capazes do ridiacuteculo e a elas natildeo conveacutem a faceacutecia mas a ldquoRusticitagraverdquo porque natildeo lhes

cabe a ldquoVrnabitagraverdquo isto eacute ldquoun tal abito di motteggiar e di star in giuocordquo (um certo haacutebito

de motejar e de dar ao jogo) afirma na Apologia Giason Denores 748

Todavia o Discorso di Iason Denores natildeo demorou a receber refutaccedilatildeo O

contendor Giovanni Battista Guarini anonimamente publicou no ano seguinte em 1588

em Ferrara Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le

tragicomedie e le pastorali in un suo discorso di poesia749 Trata-se de peccedila no gecircnero

744 Idem p 39v [ldquopela sua natureza pela razatildeo pelo juiacutezo de Demeacutetrio de Falero natildeo podem estar conjuntas

em um mesmo corpo nem em uma mesma composiccedilatildeordquo] 745 Idem pp 41v-42f [ldquocontraria aos princiacutepios dos filoacutesofos morais amp civis amp dos governadores das

repuacuteblicas tanto bem fundadas em benefiacutecio puacuteblicordquo] 746 Idem pp 2f 42f Teresa Chevrolet articula a contenda que opocircs Giason Denores a Giovanni Battista

Guarini ao que define como ldquocette massive marque morale [qui] restera longtemps imprimeacutee dans la

reacuteflexion poeacutetiquerdquo Os comentaacuterios averroiacutestas agrave Poeacutetica aristoteacutelica satildeo por assim dizer o ponto de partida

da reflexatildeo da estudiosa Cf Lideacutee de fable Theacuteories de la fiction poeacutetique agrave la Renaissance Genegraveve

Droz 2007 pp 337 e ss 747 Idem p 40f 748 Idem p 41f Apologia p 321 749 Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le tragicomedie e le pastorali

in un suo discorso di poesia Con privilegio In Ferrara Ad Instanza di Alfonso Caraffa 1588 Con licenza

242

dialoacutegico que dramatiza a controveacutersia e a integra por meio da qual sob a persona de

Verrato750 Giovanni Battista Guarini responde a Giason Denores e defende a fatura

tragicocircmica Houve resposta escrita ao poeta estampada em Paacutedua em 1590 sob o tiacutetulo

de Apologia contra lrsquoauttore del Verrato di Iason Denores di quanto ha egli detto in un

suo Discurso delle Tragicommedie e delle Pastorali O passo seguinte da dissensatildeo foi

dado por Giovanni Battista Guarini em 1593 quando impressa outra contestaccedilatildeo agraves

invectivas Il Verrato secondo ovvero replica dellAttizzato Accademico Ferrarese in

defesa del Pastor Fido contra la seconda scrittura di Messer Iason de Neres intitolata

Apologia Dessa vez natildeo houve resposta de Giason Denores falecido em 1590 ano em

que impresso Il Pastor Fido todavia a controveacutersia ainda motivou natildeo soacute mais ataques

os Discorsi poetici ne quali si discorreno le piu principali questioni de poesia amp si

dichiarano molt luoghi dubi amp difficili intorno allarte del poetare Secondo la mente de

Aristotile di Plantone e di altri buoni auttori (1600) de Faustino Summo e as

Considerationi di Giovanni Pietro Malacreta sopra Il Pastor Fido tragicomedia

pastorale del molto ilustre Sig Cavalier Battista Guarini (1600) de Giovanni Pietro

Malacreta como tambeacutem mais defesas a Risposta alle Considerationi o dubbi

dellEccmo Sig Dottor Malacreta sopra Il pastor fido con altre varie dvbitationi tanto

contra detti dubbi e considerationi quanto contra listesso Pastor fido (1600) de Paolo

Beni e a Difesa del Pastor Fido tragicommedia pastorale di Battista Guarini da quanto

gli egrave stato scritto contro da gli Ecc SS Faustin Summo e Gio Pietro Malacreta (1601)

de Orlando Pescetti751

Ora interessa a refutaccedilatildeo agrave tese de Giason Denores aos argumentos que Francisco

Joseacute Freire opera na medida em que no diaacutelogo Giovanni Battista Guarini defende a

legitimidade da tragicomeacutedia como gecircnero misto amparado natildeo apenas mas tambeacutem

nas prescriccedilotildees retoacutericas que ensinam o Peri hermēneias e o Peri ideōn752 Recorde-se Il

Verrato estrutura-se como diaacutelogo ou mais precisamente como exposiccedilatildeo intercalada de

de Superiori 750 Marvin Carlson afirma tratar-se de nome de um ator contemporacircneo de Guarini Cf CARLSON M

Teorias do teatro estudo histoacuterico-criacutetico dos gregos agrave atualidade Traduccedilatildeo de Gilson Ceacutesar Cardoso de

Souza Satildeo Paulo Editora da Unesp 1997 p 49 751 Cf CARLSON M Teorias do teatro estudo histoacuterico-criacutetico dos gregos agrave atualidade Traduccedilatildeo de

Gilson Ceacutesar Cardoso de Souza Satildeo Paulo Editora da Unesp 1997 p 49 ss Depois de finalizada a redaccedilatildeo

desta versatildeo do texto tive acesso a The critical fortune of Battista Guarinirsquos ldquoIl Pastor Fidordquo de Nicolas

J Perella obra de 1973 que esmiuacuteccedila a recepccedilatildeo histoacuterica da tragicomeacutedia Nesse sentido o passo da tese

poderaacute ser revisto e pormenorizado 752 Quanto a Hermoacutegenes PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style

Princeton New Jersey Princeton University Press 1970 pp 20 34-5

243

afirmaccedilotildees e contestaccedilotildees de perguntas e respostas atinentes ao caso em questatildeo ora na

voz da personagem Giason Denores cujos enunciados se compotildeem da transcriccedilatildeo do

Discorso di Iason Denores ora na voz de Verrato que procura natildeo soacute rebater o

aristotelismo estrito do contendor ou o que toma por equivocada interpretaccedilatildeo de

Aristoacuteteles senatildeo tambeacutem evidenciar passo a passo o despropoacutesito das censuras

arroladas

Ora o nome de Demeacutetrio leu-se jaacute no vitupeacuterio agrave tragicomeacutedia Para contestar a

interpretaccedilatildeo que dele o Discorso di Iason Denores faz Giovanni Battista Guarini

transcreve no diaacutelogo o passo que o apresenta

Den Oltreciograve inquanto ancho allelocutione la Comedia deue esser

scritta cotilde la idea del dir tenue amp humile conueniente alla qualitagrave delle

persone che in essa sono introdotte amp la Tragedia con la Idea del dir

magnifica amp grave Hor come eacute possibile adattar bene una

composition con idee di dir in tutto opposite amp contrarie che per loro

natura per ragione per giudicio di Demetrio Fallereo non possono

esser congionte in un istesso corpo ne in una istessa compositione753

Denores Ademais ainda quanto agrave elocuccedilatildeo a Comeacutedia deve ser escrita

com a ideia do dizer tecircnue amp humilde conveniente agrave qualidade das

pessoas que nela satildeo introduzidas amp a Trageacutedia com a ideia do dizer

magniacutefica amp grave Ora como eacute possiacutevel adaptar bem uma composiccedilatildeo

com ideias de dizer em tudo opostas amp contraacuterias que por sua natureza

por razatildeo por juiacutezo de Demeacutetrio de Falero natildeo podem ser reunidas em

um mesmo corpo nem em uma mesma composiccedilatildeo

Poderiam ser lidas no Discorso di Iason Denores as mesmas palavras Ali a

interrogaccedilatildeo que arremata a liccedilatildeo eacute recurso de progressatildeo argumentativa que soacute faz

enredar as censuras agrave tragicomeacutedia Aqui deslocada por Giovanni Battista Guarini a voz

de Denores a interrogaccedilatildeo ressignifica-se assume papel inquisitivo visto construir-se

interlocuccedilatildeo proacutepria do diaacutelogo e fica a deixa para a contraposiccedilatildeo de Verrato Essa

753 Idem p 35v Discorso di Iason Denores 1587 p 39v Manteacutem-se o itaacutelico do original que distingue

graficamente as vozes das personagens do diaacutelogo

244

contraposiccedilatildeo pesa a assertiva concernente agrave elocuccedilatildeo cocircmica segundo a qual ldquola

Comedia deue esser scritta cotilde la idea del dir tenue amp humilerdquo Adverte Verrato haver

entre a ldquoComedia vecchiardquo de Aristoacutefanes e a ldquoComedia nuouardquo de Menandro e Terecircncio

matizes de estilo que diversificam as ldquoidee del dir tenue amp humilerdquo haacute tenuidades haacute

humildades sempre em relaccedilatildeo pode-se presumir Como tambeacutem haacute magnificecircncias haacute

gravidades Dessa maneira plena de maledicecircncia e de riso eacute a ldquoComedia vecchiardquo mais

grave que ela e menos vulgar eacute a ldquoComedia nuouardquo todavia ainda assim eacute modesta

ante a gravidade do ldquostile piugrave nobilerdquo754

Embasando-se em Demeacutetrio Giovanni Battista Guarini maneja as armas do

adversaacuterio755 Como se lecirc e o diaacutelogo deixa ler eacute embate incessante entre interpretaccedilotildees

de autoridades retoacutericas e poeacuteticas que se encena Supotildee ademais o apologista comeacutedias

bem temperadas e ao fazecirc-lo desloca a iterada diferenccedila entre trageacutedia e comeacutedia que

atravessa as censuras de Giason Denores Desloca-a porque natildeo as subsume a ldquoComedia

vecchiardquo e a ldquoComedia nuouardquo agrave dicotomia estiliacutestica e subentende que a identidade de

gecircnero a qual faz concordes os poemas de Aristoacutefanes Menandro e Terecircncio natildeo anula

as diferenccedilas de estilo que lhes satildeo caracteriacutesticas ou em outra chave entende que as

diferenccedilas de estilo as quais tornam mais ou menos graves as comeacutedias natildeo se sujeitam

agraves diferenccedilas de gecircnero

A argumentaccedilatildeo de Giovanni Battista Guarini obviamente tem alvo preciso

Matizada a antinomia entre os gecircneros traacutegico e cocircmico desloca-se a tragicomeacutedia do

lugar imperfeito que o arrazoado de vitupeacuterio lhe impocircs Daiacute a afirmaccedilatildeo da virtude da

unidade como argumento de desfiguraccedilatildeo do monstrum tragicocircmico

Certamente haureste ragione se la Tragicomedia essendo comrsquoegrave nel

vero vna hauesse due stili tra loro oppositi amp repugnanti amp sella

fosse composta di Tragedia amp Comedia amp vsasse stili diuersi lerror

sarebbe nella fauola mal tessuta amp non ne gli stili variati Houui detto

amp vel replico che la Tragicomedia egrave vna amp ha vna forma sola da per

754 Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le tragicomedie e le pastorali

in un suo discorso di poesia Con privilegio In Ferrara Ad Instanza di Alfonso Caraffa 1588 Con licenza

de Superiori p 35v 755 Cf PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New Jersey

Princeton University Press 1970 p 35

245

se la quale per esser mista come di sopra vi segrave mostrato riceue

ancora vna Idea di dir mista756

Certamente teriacuteeis razatildeo se a Tragicomeacutedia sendo una como na

verdade o eacute tivesse dois estilos entre si opostos amp repugnantes amp se

ela fosse composta de Trageacutedia amp Comeacutedia amp usasse estilos diversos

o erro estaria na faacutebula mal tecida amp natildeo nos estilos variados Eu disse

amp repito que a Tragicomeacutedia eacute una amp tem por si mesma uma forma

apenas a qual por ser mista como acima vos foi mostrado recebe

entatildeo uma Ideia de dizer mista

Giovanni Battista Guarini natildeo desdiz a unidade como pressuposto de virtude

poeacutetica reafirma-a e concede que seria monstruosa e repugnante a fatura tragicocircmica e

mau poeta o artiacutefice que compotildee no gecircnero se resultasse a tragicomeacutedia de trabalho

artiacutestico tal qual supotildee Giason Denores tal qual supotildee Francisco Joseacute Freire a saber se

fosse ela ldquocomposta di Tragedia amp Comediardquo feito poema de ldquofauola mal tessutardquo de

faacutebula duacuteplice traacutegica e cocircmica repugnante em sua inadequaccedilatildeo Natildeo desdiz Giovanni

Battista Guarini a virtude da unidade assevera-a poreacutem em conformidade com

Hermoacutegenes ou Demeacutetrio de modo a tomar como alvo as razotildees fundamentais das

censuras agrave tragicomeacutedia

Pode-se aceitar nesses termos a afirmaccedilatildeo da unidade como pressuposto de

legitimaccedilatildeo da tragicomeacutedia Ricardo de Turia757 por exemplo no Apologeacutetico de las

comedias espantildeolas que serve de proacutelogo agrave recolha Norte de la Poesia Espantildeola de

Aurelio Mey impressa em Valecircncia de 1616 mais de duas deacutecadas apoacutes a contenda que

opocircs Giason Denores e Giovanni Battista Guarini afirma que o poema misto tragicocircmico

inclui

la mezcla de cosas tan distinctas y varias y la vnion dellas no en

forma de composicion (como algunos han pensado) sino de mixtura

756 Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le tragicomedie e le pastorali

in un suo discorso di poesia Con privilegio In Ferrara Ad Instanza di Alfonso Caraffa 1588 Con licenza

de Superiori p 36r 757 Finalizada a redaccedilatildeo deste capiacutetulo pude ler Il Compendio della poesia tragicomica de Giovanni

Battista Guarini impresso em 1601 Nele pude saber que os argumentos de Ricardo de Turia todos

retomam este resumo do poeta italiano posterior a Il Verrato

246

porque va mucho del vn termino al outro doctrina es del Philosopho

[Aristoacuteteles] en el primero de Generatione muy vulgar donde muestra

la diferencia que hay entre lo mixto y lo compuesto758

a mescla de coisas tatildeo distintas e varias e a uniatildeo delas natildeo em forma

de composiccedilatildeo (como alguns pensaram) senatildeo de mistura porque haacute

muito de um termo a outro doutrina eacute do Filoacutesofo [Aristoacuteteles] no

primeiro De Generatione muito conhecido onde mostra a diferenccedila

que haacute entre o misto e o composto759

Essa diferenccedila assim se argumenta

Porque en lo mixto las partes pierden su forma y hazen vna tercer

materia muy diferente y en lo compuesto cada parte se conserua ella

misma como antes era sin alterarse ni mudarse antes bien se

compone y junta y lo que nace desta composicion no es vn tercero

alterado debaxo de diferente forma pero son dos cuerpos que

trocaacutendose no se compadecen entre si y se quedan los mesmos que

eran antes assi en acto como en potencia Lo mixto podemos

comparar (porque exemplificando declararemos mejor nuestro

concepto) al fabuloso Hermofrodito este de hombre y muger formaua

vn tercero participante de la vna y otra naturaleza de tal manera mixto

que no se podia separar la vna de la outra Lo cotildepuesto es semejante

a vn hombre que se abraccedila con vna muger y desasidos cada vno buelue

en su ser porque sabida cosa es que el abraccedilarse no los confunde de

manera que assi el hombre como la muger dexen de ser el mismo

hombre y la muger misma que eran antes y qualquiera dellos no

guarde y reconosca entera su naturaleza su ser y su forma760

758 Apud Norte de la Poesia Espantildeola Illustrado del sol de doze Comedias (que formam segunda parte) de

Laureados Poetas Valencianos y de doze escogidas Loas y otras Rimas a varios sugetos Sacado a luz

aiustado con sus originales por Aurelio Mey Dirigido a Dontildea Blanca Ladron y Cardona hija primogenita

de Don Iayme Zeferino Ladron de Pallas Conde de Sinarcas Vizconde de Chelua Sentildeor de Beniarbech y

Beniomer y Sentildeor de Payporta Antildeo 1616 Con privilegio Impreso en Valencia En la Impresion de Felipe

Mey junto a S Iuan del Hospital A costa de Iusepe Ferrer Mercader de libros delante la Diputacion sp 759 Traduccedilatildeo nossa 760 Idem ibidem

247

Porque no misto as partes perdem sua forma e fazem uma terceira

mateacuteria muito diferente e no composto cada parte se conserva ela

mesma como antes era sem alterar-se nem mudar-se antes bem se

compotildee e junta e o que nasce desta composiccedilatildeo natildeo eacute um terceiro

alterado sob diferente forma mas satildeo dois corpos que trocando-se natildeo

se compadecem entre si e se manteacutem os mesmos que eram antes tanto

em ato como em potecircncia O misto podemos comparar (porque

exemplificando declararemos melhor nosso conceito) ao fabuloso

Hermafrodita este de homem e de mulher formava um terceiro

participante de uma e outra natureza de tal maneira misto que natildeo se

podia separar uma da outra O composto eacute semelhante a um homem que

se abraccedila com uma mulher e desasidos cada um volta ao seu ser

porque sabida coisa eacute que o abraccedilar-se natildeo os confunde de maneira que

tanto o homem como a mulher deixem de ser o mesmo homem e a

mulher mesma que eram antes e qualquer um deles natildeo guarde e

reconheccedila iacutentegra sua naturaleza seu ser e sua forma761

A autoridade aristoteacutelica consoante a liccedilatildeo do De Generatione et Corruptione

confere legitimidade agrave mistura762 Ricardo de Turia cita Giovanni Battista Guarini ou

Guarino como refere e propotildee no mesmo Apologeacutetico o Saacutetiro dramatizado em Il

Pastor Fido ldquoMezrsquohuomo e mezo capra e tutto bestiardquo (Past Fid 2 6)763 como

metaacutefora do discurso misto figura bestial personagem de qualidade humilde que em vez

do que assim lhe compete trata mateacuteria elevada e especulativa 764 No mais a

761 Traduccedilatildeo nossa 762 ARISTOacuteTELES Sobre a geraccedilatildeo e corrupccedilatildeo Traduccedilatildeo e notas de Francisco Choratildeo Revisatildeo cientiacutefica

de Alberto Bernabeacute Pajares Lisboa IN-CM 2009 p 47 763 Em italiano lecirc-se na voz da personagem Corisca (ato segundo cena VI) ldquoCo[risca] O uillano indiscreto

ed importuno Mezhuomo e mezo capra e tutto bestia Carogna fracidiszligima e difetto Di natura

nefando se tu credi Che Corisca non tami il uero credi Che uuoi tu chami in te quel tuo bel ceffo Quella succida barba quellorecchie Caprigne e quella putrida e bauosa Isdentata cavernardquo

[Corisca Oacute vilatildeo indiscreto e importuno Meio homem e meio cabra e todo besta Carniccedila corruptiacutessima

e defeito De natureza nefando se tu crecircs Que Corisca natildeo te ama a verdade crecircs Que queres tu que

ame em ti Essa tua bela fuccedila Essa barba suja Essa orelha Caprina E essa puacutetrida e babosa

Desdentada caverna] Traduccedilatildeo nossa Cf Il Pastor Fido Tragicomedia Pastorale di Battista Gvarini

Dedicata al SerMO D Carlo Emanvele Dvca di Savoia ampc Nelle Reali Nozze di SA con la serma Infante

D Caterina dAvstria Con privilegi In Venetia Presso Gio Battista Bonfadino [1590] sp 764 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 pp 291-2 HASEGAWA A P Os

limites do gecircnero bucoacutelico em Vergiacutelio um estudo das eacuteclogas dramaacuteticas Satildeo Paulo Humanitas 2012

pp 72-3

248

metaforizaccedilatildeo da tragicomeacutedia eacute conhecida lecirc-se referecircncia ao Hermafrodita em chave

oposta entre as reprimendas de Francisco Joseacute Freire765 Ricardo de Turia natildeo descompotildee

a natureza do ser nem refuta a monstruosa metaacutefora avalia-lhe as grandezas como

desproporccedilotildees proporcionadas proacuteprias ao riso porque efetuam o ridiculum Arrazoada

pois a tragicomeacutedia porque resultante de ldquomixturardquo natildeo de ldquocomposicionrdquo A distinccedilatildeo

mais do que minudecircncia lexical eacute presunccedilatildeo de unidade que o ldquocotildepuestordquo segundo a

taxonomia em operaccedilatildeo como acidental natildeo pode aspirar Eacute possiacutevel entatildeo depreender

do trecho lido segundo os criteacuterios do apologista asseverar com Giason Denores ou

Francisco Joseacute Freire que a tragicomeacutedia eacute ldquocomposto poeticordquo766 que busca conjugar as

antipatias dos gecircneros traacutegico e cocircmico nem eacute significar-lhe a natureza nem na justeza

dos termos eacute abarcar o ldquomixtordquo Essa distinccedilatildeo incide nos fundamentos de criacuteticas tais

quais as de ambos os preceptistas mira desautorizaacute-los e levar nos passos da

argumentaccedilatildeo o artiacutefice tragicocircmico do vitupeacuterio ao elogio

Nesses termos que vislumbram a virtude da unidade pode-se aventar para

Ricardo de Turia o ldquofabuloso Hermofroditordquo natildeo destoa do belo animal que Aristoacuteteles

figura na Poeacutetica de corpo bem ordenado e bem dimensionado antiacutepoda do monstrum

horaciano Natildeo destoa porque eacute de outra espeacutecie e metaforiza cada um convenientemente

um gecircnero de poemas diferente Recorde-se que para Aristoacuteteles deve ser bem ordenada

e bem dimensionada a trageacutedia cuja fabula eacute feita da mimese de accedilatildeo una e inteira cuja

unidade e cuja inteireza alheias ao acaso porque arrazoada a concatenaccedilatildeo dos episoacutedios

dramatizados sejam criteacuterios de distinccedilatildeo do poema verossiacutemil (cf ARIST Poet 7 1450b

21 ss)

Ora como ldquofabulosordquo como ser de faacutebula nem verdadeiro nem verossiacutemil

construiacutedo em discurso de vieacutes elogioso o Hermafrodita de Ricardo Turia afilia-se ao

Hipocentauro que Luciano de Samoacutesata (ca seacutec II dC) metaforiza num opuacutesculo

apologeacutetico cujo tiacutetulo eacute Contra quem disse tu eacutes um Prometeu em teus discursos (Pros

ton eiponta Promētheus ei em logois em latim segundo a versatildeo do inteacuterprete Jacob

Micyllus Contra eum qui dixerat Prometheus es in uerbis) Nele Luciano bate-se contra

765 Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes

tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip

Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens

ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo

ferat error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX

Com as licenccedilas necessarias p 160 766 Idem p 150

249

esse anocircnimo interlocutor que o compara a Prometeu O cerne da comparaccedilatildeo discute

Jacyntho Lins Brandatildeo767 reside na afirmativa de que Luciano ao modo do Titatilde ldquocomo

um primeiro fabricanterdquo () tenha arquitetado algo novo () sem

qualquer arqueacutetipo () (cf LUC Prom 3) Diga-se o novo da combinaccedilatildeo do

diaacutelogo com a comeacutedia Luciano adverte natildeo ser suficiente para a boa forma ()

da obra esse arranjo ( ainda que beliacutessimos os dois gecircneros caso careccedila de

harmonia e de simetria a mistura () de modo que prive a obra da beleza da parte que

a constitui e tatildeo-somente brilhe a novidade que provoca o riso ou o pavor768

Luciano conta anedota do egiacutepcio Ptolomeu que ilustra o caso Daacute a conhececirc-la

Franccedilois Rabelais (1490-1553) que a reconta no proacutelogo do Tiers liure des faictz et dictz

heroiques du noble Pantagruel (Terceiro livro dos feitos e ditos heroicos do nobre

Pantagruel) estampado em Paris em 1546 Em 1546 em Paris imprimiu-se o volume

Luciani Samosatensis Opera em que o apologeacutetico luciacircnico e por conseguinte a anedota

na versatildeo de Jacob Micyllus se lecirc Refere Rabelais

Me souuient toutesfois auoir leu que Ptoleme filz de Lagus quelque

jour entre autres despouilles amp butins de ses conquestes praesentant

aux Aegyptiens en plain theatre un chameau Batrian tout noir amp un

esclave biguarreacute tellement que de son corps lrsquoune part estoit noire

lrsquoautre blanche non en compartiment de latitude par le diaphragme

comme feut celle femme sacreacutee a Venus Indicque laquelle feut

recongnue du philosophe Tyanien entre le fleuve Hydaspes et le mont

Caucase mais en dimension perpendiculaire choses non encores

veues en Aegypte esperoit par offre de ces nouveaultez lrsquoamour du

peuple envers soy augmenter Qursquoen advient il A la production du

Chameau tous feurent effroyez amp indignez a la veue de lrsquohome biguarreacute

aulcuns se mocquerent autres le abhominerent comme monstre infame

creacuteeacute par erreur de nature Somme lrsquoesperance qursquoil avoit de complaire

a ses Aegyptiens amp par ce moyen extendre lrsquoaffection qursquoilz luy

pourtoient naturellement luy decoulla des mains Et entendit plus a

767 BRANDAtildeO J L A poeacutetica do Hipocentauro literatura sociedade e discurso ficcional em Luciano de

Samoacutesata Belo Horizonte UFMG 2001 pp 75 ss 768 Idem p 79

250

plaisir amp delices leurs estre choses belles eleguantes amp perfaictes que

ridicules amp monstrueuses769

Lembro-me todavia de ter lido que Ptolomeu filho de Lago certo dia

entre outros despojos amp butins de suas conquistas ao apresentar aos

egiacutepcios em pleno teatro um camelo bactriano todo negro amp um

escravo de tal sorte variegado que de seu corpo uma parte era negra e

outra branca natildeo em compartimento de latitude pelo diafragma como

foi aquela mulher sagrada agrave Vecircnus Iacutendica a qual foi reconhecida do

filoacutesofo Tianeu entre o rio Hidaspe e o monte Caacuteucaso mas em

dimensatildeo perpendicular coisas natildeo ainda vistas no Egito esperava770

ao oferecer essas novidades o amor do povo para consigo aumentar O

que adveio disso Agrave exibiccedilatildeo do camelo todos ficaram assustados amp

indignados agrave vista do homem variegado alguns debocharam outros o

abominaram como monstro infame criado por erro da natureza Em

suma a esperanccedila que ele tinha de comprazer aos egiacutepcios amp por esse

meio estender a afeiccedilatildeo que eles naturalmente lhe dedicavam escapou-

lhe das matildeos E entendeu mais prazerosas amp deliciosas serem as coisas

belas elegantes amp perfeitas que as ridiacuteculas amp monstruosas771

Estribado em Luciano de Samoacutesata Franccedilois Rabelais enuncia fazer-lhe o

exemplo pender entre a esperanccedila e o temor de variar772 O camelo negro e o homem

bicolor prodigiosos plasmam os riscos dos temperos poeacuteticos frente agrave destinaccedilatildeo a que

se preveem Conforme Luciano o temor pende do risco da disjunccedilatildeo e da dissimetria da

mistura que mal concertada priva a obra da beleza da parte que a forma (cf LUC Prom

3) Ora tal como satildeo ldquoinimigas e incompatiacuteveisrdquo a comeacutedia e a trageacutedia no vitupeacuterio de

Francisco Joseacute Freire assim tambeacutem a comeacutedia e o diaacutelogo no opuacutesculo de defesa de

769 Tiers liure des faictz et dictz heroiques du noble Pantagruel composez par M Franccedil Rabelais docteur en Medecine amp Calloier des Isles Hieres Lautheur susdict suplie les Lecteurs beneuoles soy reseruer a

rire au soixante amp dixhuictiesme liure Nouuellemente Imprimeacute agrave Paris Auec priuileige du Roy pour six

ans 1546 pp 15-16 770 Note-se que a forma verbal ldquoesperavardquo (esperoit) tem como sujeito sintaacutetico o substantivo proacuteprio

ldquoPtolomeurdquo (Ptoleme) disposto distantemente pela estrutura perioacutedica empregada no passo Procurei

mantecirc-la ao verter o texto ao portuguecircs 771 Traduccedilatildeo nossa 772 Tiers liure des faictz et dictz heroiques du noble Pantagruel composez par M Franccedil Rabelais docteur

en Medecine amp Calloier des Isles Hieres Lautheur susdict suplie les Lecteurs beneuoles soy reseruer a

rire au soixante amp dixhuictiesme liure Nouuellemente Imprimeacute agrave Paris Auec priuileige du Roy pour six

ans 1546 p 16

251

Luciano natildeo se dizem nem familiares (ldquordquo) ndash de ēthos comum aponta Jacyntho

Lins Brandatildeo ndash nem amigos (ldquordquo) ldquodesde o princiacutepiordquo (ldquo rdquo) jaacute que segundo

Luciano apartados esses gecircneros nos termos da muacutesica afastam-nos duas oitavas de

intervalo entre o mais grave e o mais agudo e personificados ambos conforme distinta

caracterizaccedilatildeo enquanto o diaacutelogo conservava-se em casa e passava o tempo em passeios

acompanhado de poucos a comeacutedia dada a Dioniso e ao teatro ria e fazia rir amiuacutede das

amizades do diaacutelogo (cf LUC Prom 6)773

Entretanto apesar dessas diferenccedilas entre a comeacutedia e o diaacutelogo ou em razatildeo

delas visto amplificarem o feito e o efeito de imiscuiacute-las escreve Luciano ter ousado

conciliar esses gecircneros harmoniosamente (cf LUC Prom 6) 774 pois crente na

possibilidade do arranjo seja extraordinaacuterio () o todo de belas partes tal

como o Hipocentauro figurado por pintores antes desmedido ndash ldquoos mais desmedidordquo

() ndash que amaacutevel seja muitiacutessimo prazeroso como a mistura que se faz de

vinho e de mel (cf LUC Prom 5) A metaacutefora do Hipocentauro diga-se aparenta ser

clariacutessima enquanto historicamente vigem os protocolos retoacutericos que a tornam

significativa Agrave margem da traduccedilatildeo do opuacutesculo de Luciano na ediccedilatildeo parisiense de

1546 glosa-se ldquoCotildepositio diversa amp uaria hippocẽtaurus uoceturrdquo (Composiccedilatildeo

diversa amp vaacuteria diz-se hipocentauro)775

O exemplo dos seres exoacuteticos de Ptolomeu em Rabelais e em Luciano pode-se

afirmar com Jacyntho Lins Brandatildeo proscreve programaticamente a ldquoreduccedilatildeo do valor

da obra agrave mera novidaderdquo776 Nisso insiste Jacyntho Eacute passo relevante porque jaacute se sabe

assenta-se em censura dessa natureza a recusa de Gian Vicenzo Gravina a Il Pastor Fido

de Giovanni Battista Guarini dito poema dramaacutetico de ldquonovitagrave dinvenzionerdquo que lhe

parece ldquoaffettata e puerilerdquo

Como exemplo o Hipocentauro ganha contornos poeacuteticos e pictoacutericos mais

tramados em outra obra de Luciano o seu Zecircuxis ou Antiacuteoco tambeacutem lido na ediccedilatildeo

luciacircnica de 1546 em traduccedilatildeo do germano Vicentius Opsopoeus Lembra Jacyntho Lins

773 BRANDAtildeO J L A poeacutetica do Hipocentauro literatura sociedade e discurso ficcional em Luciano de

Samoacutesata Belo Horizonte UFMG 2001 pp 78 774 Idem pp 76 79 775 Luciani Samosatensis Opera quae quidem extant omnia a graeco semoni in Latinum conuersa nunc

portremugravem multo diligentius amp melius quagravem antegrave ad Graecum exemplar correcta amp emendata Pariis Ex

Officina Michaelis Vascosani M D XLVI [1546] p 4 776 BRANDAtildeO J L A poeacutetica do Hipocentauro literatura sociedade e discurso ficcional em Luciano de

Samoacutesata Belo Horizonte UFMG 2001 p 83

252

Brandatildeo Luciano faz de Zecircuxis ldquoo mais excelente dos pintoresrdquo (ldquordquo)

artiacutefice afamado por natildeo pintar coisas vulgares (ldquordquo) e comuns (ldquordquo)

afeito a fazer coisas novas () e a conceber algo extraordinaacuterio

(ldquordquo) e estranho (ldquordquo) com a acribia (ldquordquo) de sua arte (cf LUC

Zeux 3) assim como nesse Zecircuxis ou Antiacuteoco o deve demonstrar o quadro da famiacutelia de

Hipocentauros que a eacutecfrase plasma777 Da fecircmea monstruosa tal como retratada Luciano

escreve

[] καὶ ἡ μῖξις δὲ καὶ ἡ ἁρμογὴ τῶν σωμάτων καθ᾽ ὃ συνάπτεται

καὶ συνδεῖται τῷ γυναικείῳ τὸ ἱππικόν ἠρέμα καὶ οὐκ ἀθρόως

μεταβαίνουσα καὶ ἐκ προσαγωγῆς τρεπομένη λανθάνει τὴν ὄψιν ἐκ

θατέρου εἰς τὸ ἕτερον ὑπαγομένη (LUC Zeux 6)

A mistura e a junccedilatildeo dos corpos naquilo em que se conjuga e se conecta

ao feminino o equino por ser feita natildeo de brusco mas lentamente

efetuando-se a mudanccedila por aproximaccedilatildeo deixa oculto agrave vista que se

avanccedila do diferente ao diferente778

Nos termos da versatildeo em liacutengua portuguesa de Jacyntho a tecircmpera ldquoavanccedila do

diferente ao diferenterdquo e eacute conveniente que assim o avance mediante a acribia do artiacutefice

pintor como Zecircuxis prosador como Luciano versificador como os mais poetas de vaacuteria

estirpe cuja obra mista em conformidade com a liccedilatildeo da anedota de Ptolomeu supotildee

destinaccedilatildeo semelhantemente arguta perspicaz para dela fruir agrave custa de se improacutepria

agir como os egiacutepcios frente ao camelo negro e ao homem bicolor de olhos voltados

apenas aos brilhos novidadeiros ou como os espectadores a quem no Zecircuxis ou Antiacuteoco

se destinam a pintura dos Hipocentauros conforme o relato incapazes de apreciaacute-la

incapazes na voz de Zecircuxis de elogiar a teacutecnica e a beleza do conjunto bem executado

por sua acribia e propensos tatildeo-soacute a notar a exatidatildeo da parte que estranha (cf LUC Zeux

7)779 Nesse sentido parece hipoacutetese coerente o outro a quem se escreve eacute sempre o

mesmo visto que o estranhamento da novidade soacute causa oportuna surpresa e admiraccedilatildeo

777 Idem ibidem 778 A traduccedilatildeo eacute de Jacyntho cf BRANDAtildeO J L A poeacutetica do Hipocentauro literatura sociedade e discurso

ficcional em Luciano de Samoacutesata Belo Horizonte UFMG 2001 p 84 779 Idem ibidem

253

no puacuteblico que sabe reconhecer o desconhecido Eacute evidente como pragmaacutetica a liccedilatildeo de

Luciano implica um conjunto de procedimentos retoacutericos e poeacuteticos que regulam quando

se enunciam e enquanto historicamente surtem efeitos a produccedilatildeo de discursos em

gecircneros os mais variados consoante variados decoros reconhecidos reconheciacuteveis e

calculados que formulam portanto a novidade como imprevisibilidade prevista

O passo faz ressoar ademais a virtude da unidade e daacute a compreender a chave

elogiosa por meio da qual se mostra o Hermafrodita no Apologeacutetico de las comedias

espantildeolas de Ricardo de Turia No mais de acordo com Luciano a incompatibilidade de

princiacutepio entre comeacutedia e diaacutelogo como a que se enuncia afastar trageacutedia e comeacutedia soacute

o eacute de princiacutepio porque as diferenccedilas entre os dispositivos discursivos que produzem num

e noutro gecircnero devem-se mitigar com arte com a acribia artiacutestica lenta nunca abrupta

do concerto harmocircnico Nas liccedilotildees retoacutericas tomadas por Giovanni Battista Guarini para

contradizer a investida vituperante de Giason Denores a harmonia do concerto poeacutetico

assenta-se em preceitos concordes Os desdobramentos desses pressupostos de produccedilatildeo

do misto na voz de Verrato de Giovanni Battista Guarini assim satildeo enunciados como

jaacute se sabe conforme Demeacutetrio

Et si come il vostro Demetrio Falereo dice bene che le due forme

chrsquoegli chiama cioegrave dimessa amp

magnifica non si possono mescolar insieme cosi afferma che laltre

due cioegrave la polita amp la graue il possono far

con lrsquovna amp con lrsquoaltra per modo che il facitore della Tragicomedia

quando pure vi concedessi che le due prime non mescolasse non mi

potreste negare che dellaltre due non hauesse agrave fare a suo modo780

E assim como o vosso Demeacutetrio de Falero disse bem que as duas

formas que ele chama iskhnos kai megaloprepēs isto eacute modesta amp

magniacutefica natildeo se podem misturar juntamente tambeacutem afirma que as

outras duas glaphyros kai deinos isto eacute a polida amp a grave podem-no

fazer com uma amp com outra de modo que o fazedor da Tragicomeacutedia

se bem vos concedesse que as duas primeiras natildeo misturasse voacutes natildeo

780 Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le tragicomedie e le pastorali

in un suo discorso di poesia Con privilegio In Ferrara Ad Instanza di Alfonso Caraffa 1588 Con licenza

de Superiori pp 36f-36v

254

me poderiacuteeis negar que das outras duas natildeo houvesse a fazer de seu

modo781

Giovanni Battista Guarini segue bastantemente de perto a liccedilatildeo do Peri

hermēneias Sabe-se o retor que o redigiu creia-se hoje Demeacutetrio creia-se Pseudo-

Demeacutetrio de Falero supotildee quatro kharaktēresde estilo Satildeo eles (i) iskhnos (modesto)

(ii) megaloprepēsgrandioso) (iii) glaphyros (elegante) e (iv) deinos (veemente) nos

termos gregos como se pocircde observar incorporados agrave resposta de Verrato ou no

vernaacuteculo como quatro forme assim interpretadas (i) ldquodimessardquo (ii) ldquomagnificardquo (iii)

ldquopolitardquo e (iv) ldquograuerdquo Os quatro kharaktēressatildeo haploisimplesqualifica Demeacutetrio

e assim sendo podem-se dobrar desdobrar e temperar em combinaccedilotildees que a doutrina

natildeo nomina ainda que preveja o ldquoeleganterdquo pode-se mesclar com o ldquomodestordquo ou o

ldquograndiosordquo semelhantemente com ambos pode-se misturar o ldquoveementerdquo (cf DEMETR

36)782 Poreacutem como glosa Giovanni Battista Guarini nem todas as misturas estiliacutesticas

satildeo admissiacuteveis pois o ldquomodestordquo e o ldquograndiosordquo como kharaktēresantiteacuteticos mantecircm

oposiccedilatildeo que natildeo os deixa combinar783

Dessa liccedilatildeo jaacute se sabe Giovanni Battista Guarini eacute devedor porque ela legitima-

lhe o misto tragicocircmico Com base nessa doutrina e nas possibilidades de o artiacutefice operaacute-

la logo que elencados os tipos de estilo Il Verrato deixa ler os seguintes preceitos como

protocolos que datildeo forma agrave tragicomeacutedia

La sua propria amp principale egrave la magnifica la quale accompagnata

con la graue diuenta idea della Tragedia ma mescolata con la polita

fa qnel [sic] temperamento che conuiene alla Tragicomedia perciocheacute

781 Traduccedilatildeo nossa 782 ldquo[36] Εἰσὶ δὲ τέτταρες οἱ ἁπλοῖ χαρακτῆρες ἰσχνός μεγαλοπρεπής γλαφυρός δεινός καὶ λοιπὸν οἱ ἐκ τούτων μιγνύμενοι Μίγνυνται δὲ οὐ πᾶς παντί ἀλλ ὁ γλαφυρὸς μὲνκαὶ τῷ ἰσχνῷ καὶ τῷ μεγαλοπρεπεῖ καὶ ὁ δεινὸς δὲ ὁμοίως ἀμφοτέροις μόνος δὲ ὁ μεγαλοπρεπὴς τῷ ἰσχνῷ οὐ μίγνυται ἀλλ ὥσπερ ἀνθέστατον καὶ ἀντίκεισθον ἐναντιωτάτωrdquo (DEMETR 36) cf FREITAS G A DE Sobre o

Estilo de Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo e estudo introdutoacuterio do tratado)

Belo Horizonte [FL-UFMG] 2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p x ldquo[36] Quatro satildeo os tipos elementares

o simples o grandioso o elegante e o veemente os demais satildeo formados a partir de uma mistura entre

esses Mas nem todos se misturam com todos O elegante se mistura tanto com o simples quanto com o

grandioso de igual modo com ambos se mistura o veemente Mas o grandioso apenas natildeo se mistura com o simples os dois se antepotildeem como contraacuterios em maacutexima oposiccedilatildeordquo 783 No passo em questatildeo (DEMETR 36) o verbo empregado para significar ldquomisturarrdquo ou ldquocombinarrdquo eacute

[ldquoeu misturordquo ldquoeu combinordquo] equivalente grego do latim misceocirc de acordo com o Le Grand

Bailly Dictionnaire Grec-Franccedilais

255

trattandosi in essa di persone grandi amp di heroi non conuiene favellar

humilmente amp percheacute nella medesima non si vuole il terribile amp

latroce anzi si fugge lasciando da parte il graue prendesi il dolce che

tempera quella grandezza amp sublimitagrave chrsquoegrave propria del puro

Tragico784

A sua [forma] proacutepria amp principal eacute a magniacutefica a qual acompanhada

da grave tornada ideia da Trageacutedia mas misturada com a polida faz

aquele temperamento que conveacutem agrave Tragicomeacutedia pois que tratando-

se nesta de pessoas magnacircnimas amp de heroacuteis natildeo conveacutem falar

humildemente amp porque nela mesma natildeo se quer o terriacutevel amp o atroz

antes foge-se deixando de lado o grave toma-se o doce que tempera

aquele grandeza amp sublimidade que eacute proacutepria do puro Traacutegico785

O temperamento proacuteprio agrave tragicomeacutedia matiza a grandiosidade caracteriacutestica da

trageacutedia com a polidez a elegacircncia de modo a produzir combinaccedilatildeo estiliacutestica que

conhecendo as restriccedilotildees poeacuteticas do Peri hermēneias e no mais tendo em vista a

qualidade das personagens dramatizadas afirma a inconveniecircncia da humildade e a

ineacutepcia da terribilidade consoante o decoro que a tecircmpera tragicocircmica pressupotildee Nesse

sentido natildeo se sustenta retoacuterica ou poeticamente consoante Giovanni Battista Guarini a

antinomia que seus contendores tanto iteram visto que natildeo se nega que haja kharaktēres

opostos e sequer sugere-se que os opostos se combinem apenas afirma-se serem

convenientes agrave tragicomeacutedia os recursos discursivos cujos efeitos sejam decorrentes de

mistura

A posiccedilatildeo de Giason Denores embora expliacutecita a preceituaccedilatildeo do Peri hermēneias

porque entrevecirc comeacutedia e trageacutedia vecirc sobretudo a oposiccedilatildeo que distancia a ldquoidea del dir

tenue amp humilerdquo da ldquoIdea del dir magnifica amp graverdquo e renega agrave imoderaccedilatildeo ou agrave

imperfeiccedilatildeo viciosa a linhagem do misto que propotildee o retor grego como se supusesse

tatildeo-somente os tipos ldquohaploirdquo ldquosimplesrdquo ldquopurosrdquo786 como o ldquopuro Traacutegicordquo citado por

Giovanni Battista Guarini e nada que assim natildeo fosse Giason Denores busca a autoridade

784 Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le tragicomedie e le pastorali

in un suo discorso di poesia Con privilegio In Ferrara Ad Instanza di Alfonso Caraffa 1588 Con licenza

dersquo Superiori pp 36f-36v 785 Traduccedilatildeo nossa 786 Idem p 116

256

de Demeacutetrio e opera em italiano leacutexico que faz ecoar os Petri Victorii commentarii in

librum Demetrii Phalerei de elocutione ediccedilatildeo biliacutengue comentada do Peri

hermēneiasem grego e em latim estampada em 1562 Para o comentador florentino

Pietro Vettori (1499-1585) os kharaktēres satildeo notae (marcas) satildeo formae e ao latim

assim satildeo vertidos (i) (kharaktēr) iskhnos eacute (nota ou forma) tenuis (ii) megaloprepēs

magnifica (iii) glaphyros ornata (iv) deinosgrauis787

Sabe-se o sintagma ldquoidea del dirrdquo lido e relido nas glosas de Giason Denores

conhecido de obra seiscentista jaacute referida o DellrsquoArte di Predicar Bene de Paolo Aresi788

natildeo se aplica no Peri hermēneias e pressupotildee as liccedilotildees de Hermoacutegenes pois verte ao

italiano o grego idea tou logou o que faz entrecruzar doutrinas de retores diferentes numa

mesma exposiccedilatildeo A bem dizer esse entrecruzamento itera-se no prefaacutecio de Johannes

Sturm ao Hermogenis De formis orationum tomi duo editado em 1555 789 Esse

entrecruzamento condiz com as categorias empregadas por Pietro Vettori em seus

commentarii

Hermogenes qui multis post Halicarnasseum saeculis extitit accuratus

ac subtilis magister dicendi dum artem hanc traderet siue plures ipsius

partes melioresq explicaret de formis amp ipse dicendi diligenter

differuit quas vocauit auxit autem ille valde numerum earum

longeq aliam viam in describendis illis secutus est quod tamen ipse

efficere voluit studiose tractauit nec sine laude multa ad exitum

perduxit vero formas has siue notas vt veteres illi

fecerant amp qui Hermogenem aeligtate antecesserunt Demetrius

appellauit vt enim (nam inde tractum nomen videtur) notaelig impressae

humeris equorum aliarumq pecudum (quaelig nomine illo agrave Grœcis

787 Petri Victorii commentarii in librum Demetrii Phalerei de elocutione Positis ante singulas declarationes

Graecis vocibus Auctoris ijsdemque ad verbum Latine expressis Additus est rerum et verborum

memorabilium index copiosus Cum P II IIII Pont Max Cosmi Medicis Florentianorum Senensiumq Ducis

ampAlphonsi Ferrariensium Ducis privilegijs ampliszlig per decennium Florentiae In officina Iuntarum

Bernardi F MDLXII pp 35-6 788 Cf DellrsquoArte di predicar bene diuisa in due parti Nella quale oltre agraversquo precetti dersquo retori agrave questo

proposito applicati di danno nuoue regole per tesserordinatamente vna predica con vn trattato della

memoria amp vnrsquoaltro della imitatione e con alcune osseruationi retoriche sopra vna predica in lode di S

Tomaso dAquino DI MONSIG PAOLO ARESI PARTE SECONDAhellip In MIL Per Gio Batt Bidelli

1627 p 197 789 Idem [p 4]

257

significantur) indicant cuius generis stirpisque illi sint ita haelig notaelig

testantur cuius sectaelig amp quasi nationis sit790

Hermoacutegenes que nasceu muitos seacuteculos apoacutes [Dioniacutesio de]

Halicarnasso mestre do discurso acurado e sutil enquanto transmitia

esta arte ou as vaacuterias e melhores partes dela desdobrou as formas do

discurso e tambeacutem diligentemente diferenciou-as as quais chamou

ideai Ele pois ampliou bastante o nuacutemero delas e longamente e

seguiu outro meacutetodo ao descrevecirc-las O que ele poreacutem quis perfazer

tratou com zelo e natildeo sem muito elogio levou ao cabo Satildeo os

kharaktēresverdadeiramente estas formas ou marcas como a ele os

antigos ofereceram e agravequeles que antecederam Hermoacutegenes em idade

Demeacutetrio recorreu assim como de fato (pois daiacute o termo parece

derivado) as marcas impressas nas espaacuteduas dos cavalos e de outros

animais (as quais por aquele nome satildeo significadas pelos gregos)

indicam de que gecircnero e estirpe eles satildeo assim tambeacutem estas marcas

atestam de que escola e por assim dizer naccedilatildeo sejam791

Pietro Vettori expotildee ao leitor liccedilatildeo que naquilo que ora conveacutem mais do que

latinizar o vocaacutebulo ldquokharaktērrdquo e atribuir-lhe etimologicamente antecedente conforme

ao uso constroacutei equivalecircncia entre as doutrinas retoacutericas atribuiacutedas a Demeacutetrio e a

Hermoacutegenes de modo tal a por semelhanccedila de proporccedilatildeo estabelecer o tracircnsito de

categorias que muacutetuas se recobrem e se acomodam Assim na medida em que os

kharaktēressatildeo formae satildeo notae e satildeo ideai faz-se possiacutevel que se proponham as ldquoidee

del dirrdquo de Demeacutetrio mesmo que esses termos como versotildees italianas do grego ldquoideai

tou logourdquo estritamente nele natildeo se leiam visto natildeo seja esse o leacutexico empregado no Peri

hermēneias Essa equivalecircncia deslizante leu-se no Discorso di Iason Denores seraacute lida

em Il Verrato e no mais persistiraacute por exemplo nas Instituiccediloens oratorias de M Fabio

Quintiliano de Jerocircnimo Soares Barbosa contemporacircneo de Francisco Joseacute Freire792

790 Idem [p 2] O mesmo passo e a mesma a epiacutestola ao leitor podem-se ler em Petri Victorii epistolarum

libri X Orationes XIIII Et liber de laudibus Ioannae Austricaelig Cum licentia privilegiis Florentiae Apud

Iunctas MDLXXXVI p 97 791 Traduccedilatildeo nossa 792 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

258

Ora a preceituaccedilatildeo dos kharaktēreselocutivos dos genera dicendi como

doutrinaacuteria opera leacutexico controlado natildeo raro em conformidade com usos e costumes

gramaticais e retoacutericos de longuiacutessima vigecircncia Por um lado no Discorso di Iason

Denores pode-se observar que em ldquoidea del dir tenue amp humilerdquo manteacutem-se o sentido

de iskhnos por meio dos adjetivos pleonaacutesticos ldquotenuerdquo e ldquohumilerdquo Ora pleonaacutesticos

sabe-se bem porque iskhnoseacute segundo a Institutio oratoria de Quintiliano um dos

genera dicendi o que os latinos dizem subtilis Eacute termo grego que tambeacutem se lecirc em Aulo

Geacutelio (seacutec II dC) como o genus dicendi ou o kharaktēr equivalente ao que se diz

latinamente gracilis (gracioso) dotado de uenustas (graccedila) e subtilitas (sutileza)

Segundo Fortunaciano (seacutec IV dC) eacute um dos characteres ou seja eacute genus orationis

tenuis ou subtilis Segundo Donato (seacutec IV dC) como um dos modi elocutionum ou um

dos kharaktēres iskhnos eacute tenuis equivalente no preceito ao character humilis de Seacutervio

Honorato (seacutec IV dC) ao genus humile de Filargiacuterio escoliasta de Vergiacutelio e demais

ao stilus humilis prescrito pela Rota Vergilii de Joatildeo de Garlacircndia (seacutec XII-XIII) do qual

as vergilianas Bucoacutelicas satildeo exemplares793

Por outro lado em ldquoIdea del dir magnifica amp graverdquo os adjetivos ldquomagnificardquo e

ldquograverdquo conforme a referida liccedilatildeo de Pietro Vettori guardam respectivamente os sentidos

de megaloprepēse de deinosSobra assim sem lugar no passo referido de Giason

Denores a polidez a elegacircncia cujo efeito retoricamente o adjetivo grego ldquoglaphyrosrdquo

classifica Parece o contendor de Giovanni Battista Guarini ainda que sob a autoridade

de Demeacutetrio conceber quadriparticcedilatildeo elocutiva que natildeo se explicita e assim abdicar desse

kharaktēra fim de amplificar a oposiccedilatildeo entre iskhnose megaloprepēs assumidos como

evidecircncia estiliacutestica da distacircncia extremada que afasta trageacutedia e comeacutedia de maneira a

construir protocolos de oposiccedilatildeo que deslegitimem a tragicomeacutedia e seu exemplum mais

afamado

Essa distacircncia fundamentada em Demeacutetrio eacute tambeacutem afirmada entre as jaacute

discutidas censuras da Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral a Il Pastor

Fido

Tomo Primeiro Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel p 46 793 Cf HASEGAWA A P Os limites do gecircnero bucoacutelico em Vergiacutelio um estudo das eacuteclogas dramaacuteticas Satildeo

Paulo Humanitas 2012 pp 56-57

259

[] Guarini ou naotilde soube ou desprezou na sua Tragicomedia este

dogma poetico que escreve Falereo a pag 149 e que tanto se deve

observar Risucircs artes amp lepograverum in Satyra amp Comœdiis in Tragœdia

autem ueneres quidem recipit in multis risucircs autem inimicus Tragœdia

neque enim cogitaret aliquis Tragœdiam ludentem quia Satyrum

scriberet pro Tragœdia794

Crecirc-se hipoacutetese coerente que Francisco Joseacute Freire e Giason Denores refiram a

mesma ediccedilatildeo do Peri hermēneias A indicaccedilatildeo da ldquopag 149rdquo no passo da Arte poetica

ou regras da verdadeira poesia em geral diz respeito agrave paginaccedilatildeo dos Petri Victorii

commentarii in librum Demetrii Phalerei de elocutione A autoridade de Demeacutetrio feita

enunciaccedilatildeo dogmaacutetica busca arrematar argumento conhecido a saber a afirmaccedilatildeo de

compor-se Il Pastor Fido ao modo de ldquohuma enfiada de Madrigaes amorososrdquo795 No

tratado do retor grego no passo ora citado estaacute em jogo como se pode depreender a

diferenccedila entre o ridiacuteculo e o gracioso entre ldquoto geloionrdquo (ldquoτὸ γελοῖονrdquo) e ldquoto eukharirdquo

(ldquoτὸ εὔχαριrdquo) o ridiculum e o uenustum especificaccedilatildeo teoacuterica que integra a doutrina do

glaphyros como kharatēr discursivo Essa diferenccedila constroacutei-se agrave luz de quatro criteacuterios

isto eacute (i) hylēmateria (ii) lexislocutio (iii) proairesisuoluntas (iv) toposlocus assim

depreendidos da ediccedilatildeo biliacutengue de Vettori796 Bastante sucintamente configuram-se as

distacircncias entre um e outro do seguinte modo 797 o ridiacuteculo figura personagens

794 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias pp 156-7 A versatildeo latina de Pietro Vettori traduz o seguinte passo do ldquo[169]

Καὶ ἐκ τόπου Ἔνθα μὲν γὰρ γέλωτος τέχναι καὶ χαρίτων ἐν σατύρῳ καὶ ἐν κωμῳδίαις Tραγῳδία δὲ χάριτας μὲν παραλαμβάνει ἐν ολλοῖς ὁ δὲ γέλως ἐχθρὸς τραγῳδίας οὐδὲ γὰρ ἐπινοήσειεν ἄν τις τραγῳδίαν παίζουσαν ἐπεὶ σάτυρονγράψει ἀντὶ τραγῳδίαςrdquo [ldquo169 E satildeo diferentes pelo lugar A

arte do riso e a da graccedila estatildeo no drama satiacuterico e nas comeacutedias Jaacute a trageacutedia muitas vezes lanccedila matildeo da

graccedila mas o riso eacute seu inimigo Afinal ningueacutem conceberia uma trageacutedia que brinca jaacute que acabaria escrevendo um drama satiacuterico ao inveacutes de uma trageacutediardquo] A traduccedilatildeo lecirc-se em FREITAS G A DE Sobre o

Estilo de Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo e estudo introdutoacuterio do tratado)

Satildeo Paulo [UFMG] 2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p XXXIX 795 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias p 156 796 Cf DEMETRIOS Du style Texte eacutetabli et traduit par Pierre Chiron Paris PUF 1993 p XC 797 Como jaacute referido segue-se esta traduccedilatildeo ao portuguecircs FREITAS G A DE Sobre o Estilo de Demeacutetrio

260

mendicantes sujos covardes feios impudentes798 tais quais Iro e Tersites personagens

da Odisseia e da Iliacuteada (DEMETR 163) por meio de vocabulaacuterio usual (DEMETR 165) a

fim de provocar o riso (DEMETR 168) como se observam no drama satiacuterico e nas

comeacutedias (DEMETR 169) ao passo que o gracioso figura mateacuteria de que natildeo se ri tais

quais as ninfas e os amores (DEMETR 163) por meio de adornos elocutivos e belas

palavras (DEMETR 164) a fim de encantar e efetuar elogios (DEMETR 168) como se

observam no drama satiacuterico nas comeacutedias e natildeo raro nas trageacutedias (DEMETR 169) A

adequaccedilatildeo do gracioso constroacutei-se ao cabo em qualquer desses gecircneros de poema

porque para Demeacutetrio demais a kharis (graccedila) pode-se figurar (i) elevada e nobre (ii)

comum mais cocircmica assemelhada aos escaacuternios (DEMETR 128) e tambeacutem (iii)

amedrontadora e aterrorizadora (DEMETR 130-1) conforme tipos (εἴδη) que natildeo se

confundem799

A diferenccedila entre o ridiacuteculo e o gracioso que interessa a Francisco Joseacute Freire eacute a

derradeira aquela que cita em latim Dela Freire reteacutem a inimizade entre o riso e a trageacutedia

o deslocamento do ridiacuteculo diante do traacutegico razatildeo pela qual dessa combinaccedilatildeo faz-se

drama satiacuterico em lugar de trageacutedia Para Demeacutetrio pode-se aventar afirmar ldquomas o riso

eacute inimigo da trageacutediardquo (ldquoὁ δὲ γέλως ἐχθρὸς τραγῳδίαςrdquo DEMETR 169) eacute como liccedilatildeo

de adequaccedilatildeo geneacuterica excluir dos efeitos traacutegicos o risiacutevel porque o riso natildeo enforma a

trageacutedia Para Francisco Joseacute Freire natildeo apenas afirmar ldquomas o riso eacute inimigo da trageacutediardquo

(ldquorisucircs autem inimicus Tragœdiardquo)800 eacute tambeacutem fazer do riso metoniacutemia da comeacutedia e

iterar que comeacutedia e trageacutedia natildeo combinam pois nesta conveacutem soacute o gracioso como

antiacutepoda estiliacutestico do riso cujos efeitos prescrevem-se de modo que pode o severo criacutetico

de Giovanni Battista Guarini repreender com o rigor da autoridade de Demeacutetrio a

tragicomeacutedia como composto de comeacutedia e trageacutedia

Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo e estudo introdutoacuterio do tratado) Satildeo Paulo [UFMG]

2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p XXXVIII-XXXIX 798 CHIRON P Un rheacuteteur meacuteconnu Deacutemeacutetrios (Ps-Deacutemeacutetrios de Phalegravere) Essai sur les mutations de la

theacuteorie du style agrave lrsquoeacutepoque helleacutenistique Paris Vrin 2001 p 115 799 Cf FREITAS G A DE Sobre o Estilo de Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo

e estudo introdutoacuterio do tratado) Satildeo Paulo [UFMG] 2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p XXXI-XXXII Para

Chiron trata-se de impropriedade no uso do termo Χάρις visto supor o helenista ser conveniente falar de

γελοῖον Cf Du style Texte eacutetabli et traduit par Pierre Chiron Paris PUF 1993 p LXXXIX 800 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias pp 156-7

261

Trata-se de abraccedilar o mesmo passo em grego ou latim para afirmar posiccedilotildees um

tanto diferentes No caso de Francisco Joseacute Freire a posiccedilatildeo eacute a que abdica da

fundamentaccedilatildeo retoacuterica do temperamento tragicocircmico No mais sobram murmuacuterios dos

usos mistos entre as reflexotildees do tratadista sobre as incorreccedilotildees e ldquoo costume pouco

louvavel de alguns Poetas Tragicosrdquo A posiccedilatildeo do portuguecircs mesmo que natildeo mire a

tragicomeacutedia eacute evidentiacutessima

Eu com esta doutrina naotilde pertendo desterrar absolutamente na Tragedia

os costumes amorosos porque he preciso seguir o genio dos tempos em

alguma parte que quer com sua razaotilde temperar a severidade da

Tragedia introduzindo-se a amenidade dos amores o que eu condemno

he que o uso naotilde seja moderado e que hoje sejaotilde as paixotildees amorosas

taotilde geraes na Tragedia como se fossem precisas Fazendo como diz

Boileau801 vicio amavel aos olhos dos seus leitores802

A figura do monstrum eacute assombrosa As paixotildees amorosas os costumes amorosos

se Francisco Joseacute Freire natildeo os desterra da trageacutedia como a entende carecer de razatildeo que

os faccedila necessaacuterios pois alheios aos preceitos do gecircnero devem estar sujeitos agrave

moderaccedilatildeo que limita as tecircmperas Francisco Joseacute Freire supotildee arrisca-se desfigurar a

trageacutedia como desuna irracional e incoerente se inconsequente a mistura se

desconformes severidade e amenidade como efeitos concorrentes num mesmo poema

dramaacutetico cujo propoacutesito mira caso aristotelicamente bem feito a evidecircncia da

desventura Eacute nesses termos pois o preceito da moderaccedilatildeo do temperamento moderado

soacute minoraccedilatildeo de males a fim de como que pressuposta a suspeiccedilatildeo do misto

controlando-se a desmesura tornar-se possiacutevel afastar da trageacutedia em vista dos fins a que

801 Francisco Joseacute Freire colhe o seguinte verso de Lrsquoart poeumltique de Nicolas Boileau-Despreacuteaux ldquoAux yeux

de leurs Lecteurs rendent le Vice aimablerdquo (Canto IV v 96) Cf Oeuvres de Nicolas Boileau Despreacuteaux

Avec des eacuteclaircissemens historiques donnez par lui-meme Nouvelle Edition revueuml corrigeacutee amp augmenteacutee

par de diverses Remarques Enrichie de figures graveacutees par Bernard Picart le Romain Tome Premier

Amsterdam chez David Mortier MDCCXVIII Avec privilege p 318 802 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias pp 108-9

262

se compotildee as impropriedades que a Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em

geral natildeo cansa de atribuir agrave tragicomeacutedia em sua praacutetica de escrita803

As glosas de Francisco Joseacute Freire agrave traduccedilatildeo portuguesa da Epistula ad Pisones

ademais iteram essas liccedilotildees Vale observaacute-las Sabe-se no trecho encerrado entre os vv

73 e 92 Horaacutecio aborda os versos e os ritmos adequados agraves diversas mateacuterias que

competem agrave poesia Assim aos feitos ilustres e agraves guerras tristes conveacutem o hexacircmetro

homeacuterico aos prantos e mesmo agraves alegrias o diacutestico de medida desigual elegiacuteaco feito

de hexacircmetro e pentacircmetro agrave raiva o iambo e tambeacutem aos socos cocircmicos e aos coturnos

traacutegicos verso proacuteprio aos discursos alternados dialoacutegicos aos deuses aos heroacuteis aos

vencedores dos certames aos cuidados amorosos juvenis e aos vinhos desregrados o

elegiacuteaco (vv 73-85)

De acordo com Horaacutecio o poeta para que seja saudado como tal deve conhecer

esses preceitos e guardaacute-los ou seja ldquoDescriptas seruare uices operumque coloresrdquo (v

86) ldquoConservar as vezes descritas e as cores das obrasrdquo ou ldquousar dos diferentes

Caracteres e estylos dos Poemasrdquo como quer o tradutor portuguecircs na Arte Poetica de Q

Horacio Flacco Os viacutecios que lhes satildeo correspondentes assim satildeo enunciados

Versibus exponi tragicis res comica non vult

Indignatur item priuatis ac propegrave socco

Dignis carminibus narrari caeligna Thyestaelig

Singula quaeligque locum teneant sortita decenter (HOR AP 89-92)

Os versos da Tragedia naotilde competem

A Comico argumento e o baixo metro

Quasi proprio do Socco faz aggravo

A narraccedilaotilde da cea de Thyestes

Decircse a cada Poema o seu decente

Lugar []804

803 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4

pp 191-202 804 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa

Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na

logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D

Henrique pelo mesmo Author pp 46-7

263

Enfim esta eacute a liccedilatildeo decenter ldquodecorosamenterdquo empreguem-se versos oportunos

agrave mateacuteria enformada ndash natildeo compete o cocircmico ao verso traacutegico nem o traacutegico ao verso

cocircmico ndash e mantenham-se os ldquolugares certosrdquo mantenham-se os gecircneros de poema805

Pode-se assim depreender que Demeacutetrio e Horaacutecio abonem o mesmo preceito assim

como aquele supunha topos adequado ao riso (DEMETR 169) assim tambeacutem este supotildee

locus apropriado a certo verso e a certo ritmo (HOR AP 92) Eacute topologia poeacutetica eacute

adequaccedilatildeo a gecircnero de poema

Consoante as glosas de Francisco Joseacute Freire a adequaccedilatildeo do verso e do ritmo a

cada caso trata-se de ldquoimportantissimo preceito de que quem quizer merecer o nome de

Poeta naotilde ha de confundir estes differentes caracteresrdquo806 isto seja

[] quem fizer huma Epopeia em estylo lyrico huma Elegia em tom

epico huma Ecloga com pensamentos de Epigrammas e derramar em

huma Ode que deve respirar majestade e doccedilura o fel que pertence agrave

satyra quem naotilde diraacute que he hum peacutessimo Poeta Convem pois saber

observar bem o caracter e assumpto proprio de cada Poema [hellip]807

Com o helenismo ldquocaracterrdquo aliaacutes com ldquocaracteresrdquo jaacute se pocircde notar Francisco

Joseacute Freire verte o latim ldquouicesrdquo ldquovezesrdquo vocaacutebulo que por assim dizer estabelece

prerrogativas de posiccedilatildeo de gecircnero de poema ao modo do ldquolocumrdquo que tenha o poeta de

manter com decoro ldquosegundo a differenccedila dos Poemasrdquo808 No corpo da traduccedilatildeo em

805 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4

pp 225-6 806 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa

Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na

logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D

Henrique pelo mesmo Author p 42 807 Idem ibidem Desse procedimento depreendem-se obviamente criteacuterios de juiacutezo criacutetico os quais

fundados nesse longuiacutessimo costume de produccedilatildeo poeacutetica que ademais sobreviveraacute mesmo aos

contemporacircneos de Freire norteiam a localizaccedilatildeo de virtudes e de viacutecios nas praacuteticas de escrita ldquoQuem

bem se fundar nesta infallivel regra se ler os nossos Poetas entaotilde pezaraacute bem o seu merecimento Veraacute que os pastores de Diogo Bernardes saotilde mais pastores que os de Luiz de Camotildees que Francisco Rodrigues

Lobo tem com justiccedila nome no seu pastoril mas que no Eacutepico naotilde merece ser lido que Antonio da Fonseca

na sua Filis desmerece tanto o nome de Eacutepico como merece o de bom Lyrico em outras obras segundo o

gosto que reinava no seu tempo Veraacute a differenccedila que ha entre hum Soneto de Bacellar do Conde de

Tarouca e de alguns outros e os de infinitos Poetas do seculo passado ultimamente veraacute que merecimento

he o dos nossos antigos e o dos modernos exceptuando hum ou outro que he bom porque estuda pelos

mestres da nossa idade de ouro que sabiaotilde em suas obrasrdquo Idem pp 42-3 808 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa

Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na

logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D

Henrique pelo mesmo Author pp 42-3

264

liacutengua portuguesa referida perde-se esse sentido topoloacutegico embora subsista

apropriadamente nas glosas como criteacuterio de adequaccedilatildeo Francisco Joseacute Freire como se

veraacute ao verter o v 86 da epiacutestola prefere aludir natildeo os gecircneros de poema mas os gecircneros

de discurso809 A adequaccedilatildeo destes gecircneros agravequeles gecircneros nas notas agrave traduccedilatildeo assim

se exemplifica

Entre a Comedia e a Tragedia corre huma grande differenccedila Os versos

desta pedem expressotildees e figuras nobres dignas da Acccedilaotilde que

representa e os daquella contentaotilde-se com vozes proacuteprias e com

expressotildees familiares porque a Tragedia imita huma Accaotilde illustre e a

Comedia huma popular Esta doutrina jaacute era de Aristoteles como se

poacutede ver na sua Poetica e naotilde menos de Cicero no seu poacutede Tratado de

Optim gen Orat dizendo In Trag[o]edia Comicum vitiosum est amp in

Comœdia turpe tragicum810

A afirmaccedilatildeo dessas diferenccedilas agrave luz das consideraccedilotildees de Francisco Joseacute Freire

eacute mateacuteria gasta Posto que jaacute se possam crer evidentes ora merecem referecircncia somente

porque iteradas em conformidade com as liccedilotildees de outra autoridade as de Ciacutecero no De

optimo genere oratorum segundo as quais ldquotanto o cocircmico eacute vicioso na trageacutedia como o

torpe na comeacutediardquo (CIC Opt I1)811 Nesse caso interessa observar que Demeacutetrio e Ciacutecero

abonam preceito concorde assim como aquele afirmava ser a trageacutedia topos inadequado

ao riso (DEMETR 169) assim tambeacutem este afirma deslocados o riso em mateacuteria traacutegica e

o traacutegico em mateacuteria cocircmica Pode-se aventar num e noutro caso itera-se que mal

colocados os topoi proacuteprios a cada gecircnero

Para Francisco Joseacute Freire que recorre a Demeacutetrio na Arte poetica ou regras da

verdadeira poesia em geral tratadas com juizo critico812 e a Ciacutecero nas glosas agrave Arte

809 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 pp 225-6 810 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa

Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na

logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D

Henrique pelo mesmo Author pp 42-3 811 ALONSO JUacuteNIOR C O melhor gecircnero de oradores I-IV V 15-16 VI 16-17 Letras Claacutessicas Satildeo Paulo

2000 v 4 p 343 812 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellipFungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

265

Poetica de Q Horacio Flacco813 tendo em conta as liccedilotildees da Epistula ad Pisones a figura

monstruosa motiva o riso da ineacutepcia e em sua evidencia garante o escarnecimento de

poeta cuja praacutetica eacute dita extravagante e cujas extravagacircncias porque excessivas ignoram

as diferenccedilas entre os gecircneros de poemas e miram efeitos deslocados

Isto supposto considere o leitor qual seraacute entre os intelligentes o

merecimento dos Poetas Drammaticos de Hespanha confundindo no

seu theatro o tragico com o comico do que resulta hum monstro que

causa tanto riso como causaria o de Horacio se o vissemos pintado

como elle o imagina no principio desta Arte814

Todavia essas liccedilotildees natildeo se enunciam sem contrastes afinal Horaacutecio prescreve

cessotildees estiliacutesticas que transitam de gecircnero a outro da comeacutedia agrave trageacutedia ou da trageacutedia

agrave comeacutedia porque eacute apropriado agrave convenccedilatildeo que assim se faccedila

Interdum tamen amp vocem comœdia tollit

Iratusque Chremes tumido delitigat ore

Et tragicus plerumque dolet sermone pedestri

Telephus amp Peleus cugravem pauper amp exul uterque

Projicit ampullas amp sesquipedalia verba (HOR AP 89-92)

Com tudo agraves vezes a Comedia

Levanta a voz e Chremes agastado

Toma tragico tom para enfadarse

A Tragedia outras vezes se lamenta

Em baixo estylo hum pobre desterrado

Como Peleo e Telepho querendo

Mover a compaixatildeo naotilde enche a boca

De longas vozes de empollados termos815

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias pp 156-7 813 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano

Lisboa Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias

Vendese na logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida

do Infante D Henrique pelo mesmo Author p 43 814 Idem p 44 815 Idem pp 46-7

266

Ensina Francisco Joseacute Freire agraves margens da traduccedilatildeo ser o velho Cremes

personagem cocircmica que frequenta as cenas do Heautontimorumenos de Terecircncio816 A

essa personagem concede-se ldquofala tuacutemidardquo (ldquotumido orerdquo) ldquotragico tomrdquo Peleu e Telefo

diz serem personagens traacutegicas de obras perdidas de Euriacutepedes A essas personagens

concede-se ldquoconversa pedestrerdquo (ldquosermone pedestrirdquo) lamentaccedilatildeo em ldquobaixo estylordquo em

lugar de ldquoempollados termosrdquo (ldquoampullasrdquo) e ldquolongas vozesrdquo (ldquosesquipedalia verbardquo) ou

ldquopalavras de peacute e meyordquo glosa o tradutor817

Estatildeo em jogo no trecho da epiacutestola como o artigo ldquoO monstrum da Arte poeacutetica

de Horaacuteciordquo elucida os genera dicendi visto que a voz que a comeacutedia eleva (ldquovocem

comœdia tollitrdquo) e a conversa pedestre com a qual a trageacutedia se condoacutei (ldquotragicus

plerumque dolet sermone pedestrirdquo) dizem respeito natildeo aos ldquogecircneros de poemasrdquo mas

aos ldquogecircneros de discursordquo A bem dizer propotildee Marcos Martinho dos Santos trata-se de

empreacutestimos assim escreve ldquoao gecircnero grave de um lado pertencem o termo tumidus

que aqui se empresta agrave comeacutedia e o termo ampullae que aqui se subtrai agrave trageacutedia ao

gecircnero tecircnue de outro pertence a expressatildeo sermo pedester senatildeo soacute sermo que aqui se

empresta agrave trageacutediardquo818

Esses empreacutestimos operam-se numa relaccedilatildeo de gecircnero e espeacutecie Como que mais

geneacutericos os gecircneros de discurso que os gecircneros de poema entende Marcos Martinho dos

Santos de tal modo que agravequeles estes se subordinem ora diferentes gecircneros de poemas

sujeitos a diferentes gecircneros de discurso ora diferentes gecircneros de poemas sujeitos a

mesmo gecircnero de discurso Desse modo sistematiza o latinista torna-se possiacutevel de

acordo com a Epistula ad Pisones ldquoque comeacutedia e trageacutedia gecircneros de poemas diferentes

se subordinem a mesmo gecircnero de discurso ou melhor que a comeacutedia visite o gecircnero

grave mais proacuteprio da trageacutedia e esta o tecircnue mais proacuteprio daquelardquo819

Os versos de Horaacutecio no mais tecircm longuiacutessima fortuna Na ldquoCarta XIIIrdquo que

redigiu a Cangrande della Scala senhor de Verona por volta de 1316 ou 1319 o poeta

florentino Dante Alighieri cita-os ao contrastar ldquocomoediardquo e ldquotragoediardquo Segundo

Dante Alighieri o tiacutetulo Comoedia proveacutem de ldquocomosrdquo ldquovillardquo e de ldquoodardquo cantusrdquo

donde seja a ldquocomoedia quasi villanus cantusrdquo isto eacute a ldquocomeacutedia [eacute] por assim dizer

816 Lecirc-se tambeacutem em outra comeacutedia do autor Andria 817 Esta derradeira eacute a escolha de traduccedilatildeo de Marcos Martinho dos Santos Cf SANTOS M M ldquoO

monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p 226 818 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4

pp 226-7 Considero par a par as traduccedilotildees e comentaacuterios de Marcos Martinho dos Santos 819 Idem ibidem

267

canto vilatildeordquo ruacutestico eacute ldquoum gecircnero de narraccedilatildeo poeacuteticardquo (ldquogenus quoddam poeticae

narrationisrdquo) que difere de todos os outros (ldquoab omnibus aliis differensrdquo) e em particular

da trageacutedia caracterizada como ldquoquasi cantus hircinusrdquo isto eacute ldquopor assim dizer canto

hircinordquo na medida em que escreve o poeta tragoedia eacute termo derivado de ldquotragosrdquo

ldquohircusrdquo bode de ldquoodardquo donde ldquocanto dos bodesrdquo Segundo Dante Alighieri diferem

ambas trageacutedia e comeacutedia em termos de mateacuteria visto que a trageacutedia eacute de iniacutecio

ldquoadmiraacutevel e calmardquo (ldquoadmirabilis et quietardquo) e ao fim ldquofeacutetida e horriacutevelrdquo (ldquofoetida et

horribilisrdquo) canto ldquofeacutetido agrave maneira dos bodesrdquo (ldquofoetidus ad modum hircirdquo) como o

ldquoInfernordquo ao passo que a comeacutedia principia algo aacutespera (ldquoinchoat asperitatem alicuius

reirdquo) e conclui-se prosperamente (ldquosed eius materia prospere terminaturrdquo) como o

ldquoParaiacutesordquo E diferem ademais quanto ao modo de falar (ldquoin modo loquendirdquo) ldquoelevada

e sublimementerdquo fala a trageacutedia (ldquoelate et sublime tragoediardquo) ao passo que ldquofrouxa e

humildementerdquo fala a comeacutedia (ldquocomoedia vero remisse et humiliterrdquo) cujo ldquomodo [de

falar] eacute frouxo e humilde porque a elocuccedilatildeo eacute vulgar em que ateacute mulherzinhas se

comunicamrdquo (ldquoremissus est modus et humilis quia loquutio vulgaris in qua et

mulierculae communicantrdquo) Segundo Dante Alighieri diga-se bem ldquosicut vult Horatius

in sua Poetria ubi licentiat aliquando comicos ut tragoedos loqui et sic e conversordquo ou

seja ldquoassim como quer Horaacutecio em sua Poetria [sc a Epistula ad Pisones] onde permite

vez ou outra que cocircmicos falem como traacutegicos e vice-versardquo Aliquando sabe Dante

Alighieri haacute licenccedila para empreacutestimos820

Isso posto em conformidade com os preceitos horacianos assim diagramados

parece ser possiacutevel reler a advertecircncia que faz Giovanni Battista Guarini na voz de

Verrato a Giason Denores por um lado a ldquoComedia vecchiardquo de Aristoacutefanes e a

ldquoComedia nuouardquo de Menandro e Terecircncio podem-se afirmar exemplares do mesmo

gecircnero de poema por outro lado sujeitam-se a diferentes gecircneros de discurso pois que

esta diferente daquela partilha da gravidade do ldquostile piugrave nobilerdquo sem com ele se

confundir todavia821 No mais na voz de Verrato essas diferenccedilas de estilo metaforizam-

se como variados ldquotuonirdquo segundo diferentes graus de intensidade Assim como mais ou

820 Nota-se as afirmaccedilotildees de Dante Alighieri satildeo concordes com os preceitos da Arte gramatical de

Diomedes (seacutec IV dC) 821 Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le tragicomedie e le pastorali

in un suo discorso di poesia Con privilegio In Ferrara Ad Instanza di Alfonso Caraffa 1588 Con licenza

de Superiori p 35v

268

menos graves e agudos melodicamente variam os tons assim tambeacutem estilisticamente os

discursos Sabe-se o interlocutor a quem se destinam as asserccedilotildees eacute Giason Denores

Hauete agrave sapere che si come la corda graue amp acuta nelle loro

maggiori amp minori intensioni van discorrendo per gradi che tuoni

sono chiamati cosi gli stili passano per alcune parti dellorazione che

riceuendo gli piugrave amp meno gli rendon tali Queste sono la sentenza il

metodo la figura la locutione la testura amp il numero Da queste parti

risultano gli stili in quella guisa che dalla fronte amp dagli occhi amp dalla

bocca amp dal manto amp dallrsquoaltre parti del volto humano risulta la

sembianza in altri virile amp grave in altri molle amp dimessa amp in alcuni

altri temperata delluno amp dellrsquoaltro822

Haveis de saber que assim como a corda grave amp a aguda percorrem

graus de maiores amp menores intensidades que satildeo chamados tons

assim tambeacutem os estilos passam por algumas partes do discurso que

recebendo-lhes mais amp menos tornam-lhes tais [como satildeo] Estas satildeo

a sentenccedila o meacutetodo a figura a elocuccedilatildeo a textura amp o ritmo Dessas

partes resultam os estilos da mesma maneira que da fronte dos olhos

da boca amp do queixo amp de outras partes do rosto humano resulta a

aparecircncia em uns viril amp grave em outros suave amp modesta amp em

outros ainda temperada por um amp por outro823

A Giason Denores mais precisamente apontam-se duas comparaccedilotildees A primeira

referida faz analogia dos fazeres e pela arte da muacutesica ilustra a doutrina retoacuterica do

temperamento estiliacutestico Eacute procedimento conhecido de asserccedilatildeo da composiccedilatildeo

822 Idem pp 37f-37v O mesmo passo de Guarini eacute alvo de Annabel M Patterson no livro Hermogenes

and the Renaissance Seven Ideas of Style Afirma a estudiosa ldquoIts important that in this part of Il Verrato

[] Guarini sets Hermogenes as an exponent of stylistic flexibility against his opponents authority Demetrius whose scheme is made to seem rigid by contrast but more significant still is the fact that he

chooses to support a point of practical criticism by bringing out the big guns and defending tragicomedy

in terms of the compromise status and precarious intellectual dignity of manrdquo [Eacute importante que neste

trecho de Il Verrato [hellip] Guarini proponha Hermoacutegenes como um expoente da flexibilidade estiliacutestica

contra Demeacutetrio a autoridade de seu oponente cujo esquema faz-se parecer por contraste riacutegido poreacutem

ainda mais significativo eacute o fato de que ele escolha sustentar um ponto de criacutetica praacutetica exibindo as armas

e defendendo a tragicomeacutedia em termos de posiccedilatildeo de conciliaccedilatildeo e de precaacuteria dignidade intelectual do

homem] cf PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New

Jersey Princeton University Press 1970 p 35 Pocircde-se observar a leitura aqui proposta natildeo corrobora a

compreensatildeo de Patterson 823 Traduccedilatildeo nossa

269

harmoniosa que resulta da variedade leu-se passo semelhante no apologeacutetico A quem

disse tu eacutes um Prometeu em teus discursos de Luciano de Samoacutesata A segunda faz da

aparecircncia humana o resultado da junccedilatildeo de partes ldquodagli occhi amp dalla bocca amp dal

manto amp dallrsquoaltre partirdquo que arranjadas conferem determinada feiccedilatildeo Eacute o que

Giovanni Battista Guarini mira em termos discursivos

Assim os tons musicais assim o aspecto humano assim tambeacutem o poema

tragicocircmico A unidade de composiccedilatildeo poeacutetica que lhe eacute asseverada resulta de trabalho

de escrita com as parti que a doutrina entende serem constituintes discursivos ou seja

sentenza metodo locutione figura testura e numero Como Giovanni Battista Guarini

natildeo deixaraacute de explicitar Il Verrato apresenta exposiccedilatildeo de aparato teoacuterico que decorre

das liccedilotildees do Peri ideōnde Hermoacutegenes para quem a fim de que se enformem os

discursos devem ser orquestrados os elementos que operativamente lhes forjem as ideai

as formas do discurso Como jaacute eacute sabido satildeo eles ennoia (pensamento) methodos

(meacutetodo) e lexis (elocuccedilatildeo) a qual por sua vez se faz de skhēmata (figuras) kōla

(membros) synthesis ou synthēkē (composiccedilatildeo) anapausis (claacuteusula) e rhythmos (ritmo)

Eacute verdade Il Verrato natildeo deixa ler exposiccedilatildeo exaustiva nem seria apropriado que

assim o fosse imperativo o decoro de gecircnero que nada tem da tratadiacutestica no entanto daacute

agrave vista que Giovanni Battista Guarini embora abone os preceitos de Hermoacutegenes e

traduza ennoia por sentenza methodos pormetodo lexis por locutione skhēmata

porfigure synthesis ou synthēkē por testura e rhytmos por numero subtrai a esse elenco

de constituintes mediante os quais o logos ganha forma dois de seus elementos ou seja

natildeo aponta equivalentes vernaculares que signifiquem kōla e anapausis membros e

claacuteusula Em razatildeo disso Giovanni Battista Guarini diverge de Hermoacutegenes Mas natildeo soacute

diverge tambeacutem de leitores italianos do retor grego que lhe satildeo contemporacircneos como

Giulio Camillo Delminio ou Filiberto Campanile

Recorde-se Giulio Camillo Delminio no Discorso di M Giulio Camillo sopra

Hermogene (1560) afirma que ldquociascuna forma si compone di otto coserdquo a saber

ldquosensordquo ldquomethodordquo ldquoparolerdquo ldquofigurerdquo ldquomembrirdquo ldquocompositionerdquo ldquofirmamentirdquo e

ldquonumerirdquo 824 Essas cose no Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene

824 Cf Il secondo tomo dellrsquoopere di M di Giulio Camillo Delminio cioegrave La Topica ouero dellrsquoElocutione

Discorso sopra lrsquoIdee di Hermogene La Grammatica Espositione sopra il primo amp secondo Sonetto del

Petrarca Nvovamente dato in lvce Con privilegio In Venegia apresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLX

[1560] p 86

270

considerate amp ridotte in questa lingua per M Giulio Camillo Delminio Friulano satildeo

ldquosensordquo ldquomethodordquo ldquoparlarerdquo ldquofigurardquo ldquomembrordquo ldquocompositionerdquo ldquoposamentordquo e

ldquonumerordquo (1594) 825 Jaacute em Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto

Campanile secondo l a dottrina drsquoHermogene e datri retori antichi (1606) leem-se

senso ou sentenza methodo parole figura membro compositione posamento ou

finimento e numero Filiberto Campanile amiuacutede traduz os Rhetoricorum Libri V

vertendo o latim ao italiano826 Em Jorge de Trebizonda os termos empregados satildeo

sententia methodus ou artificium e compositio a qual por sua vez se distingue em dictio

ou uerba exornatio collocatio clausula e numero827 Num e noutro caso satildeo oito os

constituintes A confrontaccedilatildeo dos empregos lexicais evidencia que natildeo haacute estrita

correspondecircncia entre Filiberto Campanile e Jorge de Trebizonda a despeito das

aproximaccedilotildees Isso vale para Giovanni Battista Guarini marcadas as divergecircncias entre

as liccedilotildees

De fato sobretudo elas eacute que ecoam Ampliadas agrave medida que citadas diferentes

glosas e comentaacuterios ao Peri ideōn diferentes tratados que o referem A glosa de Giovanni

Battista Guarini em particular pode ganhar compreensatildeo plausiacutevel se consideradas as

Institutiones Rhetoricae ex progymnasmatis potissimum Aphtonii atque ex Hermogenis

arte de Pedro Juan Nuntildeez editadas em Barcelona em 1578 De acordo com Nuntildeez

ensina Hermoacutegenes serem oito as partes de que se faz qualquer ideia

[] sunt autem hae sententiae methodus idest figura sententiae (sic

enim appellat hoc loco figuras sententiarum) dictio figura idest figura

dictionis vt per excellentiam nomine generis appelletur longitudo

membrorum aut incisorum compositio clausula amp rhytmus Tzetzes

tamen existimauit ultimatilde partem superuacaneam esse quod ex

numerorum collocatione amp clausula ita perficiatur vt omnino nihil

aliud sit rhytmus quatilde apta quaedam numerorum in membris amp incisis

825 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste srsquoaggiunge lrsquoArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 3r 826 Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene e

drsquo altri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI [1606] Con licenza dersquo superiori

p 13 827 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] p 497

271

collocatio cum clausula illis congruente nam si clausula non sit

consentiens ceteris numeris orationis vt docet Hermogenes aliud

genus rhytmi constituetur posset quidem Hermogenes ex ijs quae

nuper diximus contra Tzetzem defendi sed quia sententia Tzetzae

faciliorem reddit totam hanc disputationem eam quia satis probabilis

est sequemur vt septem ad summum partes singulis ideis tribuamus

[hellip]828

Ora satildeo estas [as partes] pensamentos meacutetodo isto eacute figura de

pensamento (pois assim neste passo [Hermoacutegenes] denomina as

figuras de pensamento) dicccedilatildeo figura isto eacute figura de dicccedilatildeo como

por excelecircncia eacute designada com nome geneacuterico extensatildeo dos membros

ou dos incisos composiccedilatildeo claacuteusula amp ritmo Tzetzes todavia julgou

ser supeacuterflua a uacuteltima parte porque ademais tanto a claacuteusula perfaz-se

do arranjo das cadecircncias quanto o ritmo natildeo eacute em absoluto senatildeo que

um certo arranjo adequado das cadecircncias nos membros amp nos incisos

com claacuteusula apropriada a elas De fato se a claacuteusula natildeo estiver de

acordo com as demais cadecircncias do discurso como ensina Hermoacutegenes

seraacute constituiacutedo outro gecircnero de ritmo Poderia certamente Hermoacutegenes

defender-se disso que afirmamos haacute pouco contra Tzetzes poreacutem logo

que o pensamento de Tzetzes torna mais faacutecil toda esta disputa noacutes o

seguiremos pois eacute bastante provaacutevel que atribuamos no maacuteximo sete

partes a cada uma das ideias [hellip]829

Trata-se de siacutentese da doutrina retoacuterica de Hermoacutegenes amparada na autoridade

do gramaacutetico bizantino Joatildeo Tzetzes (seacutec XII) Muito possivelmente seja esta alusatildeo ao

seu Epitomē rhētorikēs830 Interessam do passo de Pedro Juan Nuntildeez a asserccedilatildeo da

assimilaccedilatildeo do rhytmus agrave clausula no esquema das partes constitutivas do discurso e a

consequente anulaccedilatildeo da especificidade dessa categoria de enformaccedilatildeo do logos De fato

Joatildeo Tzetzes parece amparar-se em Hermoacutegenes que ensina que o ritmo produz-se da

conjugaccedilatildeo de determinada claacuteusula com determinada composiccedilatildeo (cf HERM 260 7)

828 Institutiones Rhetoricae ex progymnasmatis potissimum Aphtonii atque ex Hermogenis arte 1573 pp

302-3 829 Traduccedilatildeo nossa 830 Trata-se de obra natildeo consultada

272

poreacutem disso resulta a explicitaccedilatildeo das razotildees pelas quais o gramaacutetico e o tratadista

subtraem o ritmo ao elenco dos stoikheia tal como apresentado por Hermoacutegenes Pode-

se dessa maneira supor que assim como Joatildeo Tzetzes e Pedro Juan Nuntildeez reduzam esse

elenco de oito para sete constituintes por entenderem haver assimilaccedilatildeo de categorias

assim tambeacutem talvez o faccedila Giovanni Battista Guarini ao reter em Il Verrato tatildeo-

somente seis dos oito ou seja (i) sentenza (ii) metodo (iii) locutione (iv) figura (v)

testura e (vi) numero Consoante Hermoacutegenes os stoikheia subtraiacutedos agrave doutrina satildeo

constituintes proacuteprios agrave lexis Supotildee-se que Giovanni Battista Guarini imiscua as partes

do discurso e natildeo atribua aos kōla e agrave anapausis traccedilos que lhes sejam distintivos

enquanto categorias elementares no acircmbito da enformaccedilatildeo discursiva Natildeo desaparecem

obviamente da praacutetica de oradores e poetas apenas reduzem-se a outras rubricas no corpo

da doutrina que enfrenta Giason Denores

Diga-se os stoikheia as ldquoparti dogni formardquo satildeo como que operadores cuja

designaccedilatildeo ou delimitaccedilatildeo nem sempre eacute coincidente de tratadista para tratadista de

tratado para tratado Sob as divergecircncias e sobretudo a despeito delas haacute a autoridade

de Hermoacutegenes que na particularidade de cada enunciado natildeo as anula nem as desdiz

antes lhes daacute consentimento e deixa liccedilatildeo de como operar o misto cujo temperamento

produz o misto tragicocircmico de acordo com Giovanni Battista Guarini Vale ler longo

passo de Il Verrato em que isso se enuncia

Hor come fa il Tragicomico nel temperar il suo stile Certamente non

faragrave come voi accennate la sentenza ograve la figura della forma sublime

amp la locuzione el numero del dimesso ma moderando la grauitagrave della

sentenza con que modi che la sogliono far humile amp altresi

sostenendo lrsquohumiltagrave dalcuna ograve persona ograve soggetto di che egli tratti

con vn poco di quella nobiltagrave di favella chrsquoegrave propria della magnifica

va facendo una Idea secondo la soggetta materia ne tanto grande che

sormonti alla Tragica ne tanto humile che saccosti alla Comica amp

cosi discorrendo nellaltre parti andragrave con le contrarie qualitagrave

dolcemente temperando la sua testura831

831 Idem pp 37r-37v O mesmo passo de Guarini eacute alvo de Annabel M Patterson no livro Hermogenes

and the Renaissance Seven Ideas of Style Afirma a estudiosa ldquoIts important that in this part of Il Verrato

[] Guarini sets Hermogenes as an exponent of stylistic flexibility against his opponents authority

Demetrius whose scheme is made to seem rigid by contrast but more significant still is the fact that he

chooses to support a point of practical criticism by bringing out the big guns and defending tragicomedy

273

Ora como faz o Tragicocircmico no temperar o seu estilo Certamente natildeo

faraacute como voacutes acenais [manejando] a sentenccedila ou a figura da forma

sublime amp a elocuccedilatildeo e o ritmo do [estilo] modesto poreacutem moderando

a gravidade da sentenccedila com aqueles modos que soem fazecirc-la humilde

amp tambeacutem sustendo a humildade de alguma personagem ou assunto de

que ele trate com um pouco daquela nobreza de palavra que eacute proacutepria

da [forma] magniacutefica vai [o Tragicocircmico] compondo uma Ideia

segundo a mateacuteria exposta nem tatildeo grandiosa que se sobreponha agrave

Traacutegica nem tatildeo humilde que se aproxime da Cocircmica amp tambeacutem

percorrendo as outras partes andaraacute com as qualidades contraacuterias

docemente temperando a sua textura 832

Giovanni Battista Guarini figura na voz dramaacutetica de Verrato coacutedigos que

prescrevem aptidatildeo e inaptidatildeo no trato poeacutetico No trecho antepotildee-se o viacutecio agrave virtude

Por um lado consoante os termos da contenda fazer como Giason Denores o interlocutor

a quem o Verrato interpela eacute natildeo enformar o misto tragicocircmico sequer compor boa poesia

mas forjar poema por intermeacutedio da ldquosentenza ograve la figura della forma sublime amp la

locuzione ersquol numero del dimessordquo isto eacute pocircr em praacutetica a desfiguraccedilatildeo da unidade

poeacutetica A assertiva vituperante de Giovanni Battista Guarini assim enunciada mira

desqualificar o contendor e faz da proacutepria dissensatildeo obra de ineacutepcia de juiacutezo e de

desconhecimento da arte

Por outro lado o entrecruzamento de doutrinas retoacutericas ganha corpo o nome de

Hermoacutegenes apotildee-se ao de Demeacutetrio e o ladeia como autoridade de apreccedilo Nomeados

ambos o alvo aparenta ser um soacute a saber a assertiva de Denores antes referida de que

nenhum autor antigo de seu conhecimento tenha abordado a tragicomeacutedia833 Refutar essa

assertiva pois eacute pocircr em quem a afirma a tacha de inculto Sabe-se em verdade os dois

in terms of the compromise status and precarious intellectual dignity of manrdquo [Eacute importante que neste

trecho de Il Verrato [hellip] Guarini proponha Hermoacutegenes como um expoente da flexibilidade estiliacutestica contra Demeacutetrio a autoridade de seu oponente cujo esquema faz-se parecer por contraste riacutegido poreacutem

ainda mais significativo eacute o fato de que ele escolha sustentar um ponto de criacutetica praacutetica exibindo as armas

e defendendo a tragicomeacutedia em termos de posiccedilatildeo de conciliaccedilatildeo e de precaacuteria dignidade intelectual do

homem] PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New Jersey

Princeton University Press 1970 p 35 Pocircde-se observar a leitura aqui proposta natildeo corrobora a

compreensatildeo de Patterson 832 Traduccedilatildeo nossa 833 Discorso di Iason Denores intorno a quersquo Principii Causae et Accrescimenti che la Commedia la

Tragedia et il Poema Heroico Ricevono dalla Filosofia Morale amp Ciuile amp darsquo Gouernatori delle

RepublicheAllrsquoIlustrissimo et Molto Reverendo Signor Abbate Galeazzo Riario Con Priuilegio In

Padova Apresso Paulo Meieto 1587 p 38v

274

retores gregos natildeo prescreveram o gecircnero contudo subentende-se da leitura de Il Verrato

a analogia das praacuteticas poeacuteticas fazer tragicomeacutedia eacute fazer ao modo de ldquoDemostene amp

Senofonte amp Platonerdquo (cf HERM 224 21) porque opera-se doutrina que a prevecirc Ou ao

modo de Dante Alighieri (1265-1321) Francesco Petrarca (1304-1374) Giovanni

Boccacio (1313-1375) e Pietro Bembo (1470-1547) considerados os exemplos que

Filiberto Campanile recolhe Assim Hermoacutegenes e Demeacutetrio sustentam o passo de

doutrina em discussatildeo como agudamente o contendor o enuncia Sustecircm enfim a

desfiguraccedilatildeo do monstrum

Sabe-se Giovanni Battista Guarini assevera a mistura tragicocircmica e refere

Hermoacutegenes agrave luz das liccedilotildees do Peri ideōn Mais especificamente jaacute parece claro

legitima a obra do poeta dramaacutetico a liccedilatildeo de Hermoacutegenes Ela codifica a praacutetica do

temperamento e enforma sobretudo a variedade amparada no pormenor da doutrina

visto o discurso decomposto em partes de efeito compor-se segundo o retor como

siacutentese do diverso Efetua-se assim de acordo com esta praacutetica de matizes a nuanccedila que

afasta a uniformidade averso inaacutebil e confere unidade a todo discursivo como o poema

tragicocircmico cujas partes o preceito fragmenta a fim de que se possam mesclar mirando

o hibridismo caracteriacutestico do gecircnero A mistura eacute de stili As partes Giovanni Battista

Guarini natildeo as esmiuacuteccedila de maneira exaustiva por razotildees jaacute aventadas De fato como foi

possiacutevel ler expotildee trecircs instruccedilotildees bastantemente breves que condensam a praacutetica ensinada

para combatecirc-la do descreacutedito Vale tentar desdobrar os passos da prescriccedilatildeo subjacente

ao argumento e agraves instruccedilotildees do poeta conveacutem moderar ldquoa grauitagrave della sentenza con

quersquo modi che la sogliono far humilerdquo

Sabe-se ldquograuitagraverdquo eacute termo que comumente verte ao italiano o grego deinotēs

como decalque do latim ldquograuitasrdquo em conformidade com as liccedilotildees estabelecidas por

Jorge de Trebizonda Como interessaraacute ensinam os Rhetoricorum libri V que nesta

acepccedilatildeo no sentido estrito que ora conveacutem grauitas eacute ldquoquaeligdam orationis elatiordquo

(elevaccedilatildeo de qualquer discurso) ou seja como ldquouerbo grauitasrdquo (gravidade de palavra)

eacute forma dicendi cujas sententiae sejam ldquosubtiles mirabiles altaelig acutaeligrdquo (sutis

admiraacuteveis altas agudas) as quais se creiam pensadas senatildeo que por homens

ldquoprudentiacutessimosrdquo e tambeacutem que sejam proacuteprias da grandis oratio (discurso grandioso)

a qual por definiccedilatildeo excede os usos comuns ao estilo puro834 Afirma-se ldquograuitagraverdquo eacute

834 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] pp 496-7 603-4

275

comumente empregado em lugar de ldquodeinotēsrdquo entre autores italianos natildeo se deve

esquecer todavia que Giulio Camillo Delminio lecirc natildeo deinotēs mas semnotēs como

ldquograuitaterdquo ou ldquoseueritaterdquo 835

Filiberto Campanile em Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia repotildee a prescriccedilatildeo

das ldquosentenzerdquo que constituem a grauitagrave poreacutem em lugar de buscar exemplos em Ciacutecero

como Jorge de Trebizonda que cita o Pro Cluentio refere Francesco Petrarca e Pietro

Bembo agrave guisa de ilustraccedilatildeo De Francesco Petrarca busca apenas dois versos a saber

ldquoVn bel morir tutta la vita honorardquo (Um belo morrer toda a vida honra) e ldquoGran giustitia

a gli amanti egrave grave offesardquo (Grande justiccedila aos amantes eacute grave ofensa) o primeiro dos

Canzonieri o segundo dos Triumphi Satildeo ambos sentenciosos em sua gravidade De

Pietro Bembo busca dois trechos de Gli Asolani diaacutelogo que tematiza a natureza do amor

Um dos trechos eacute este que segue

Se cosigrave egrave[ disse alhotta il santo uomo] che la ragione sia de gli

huomini amp il senso delle fiere percioche dubbio non egrave che la ragione

piugrave perfetta cosa non sia chel senso quelli che amando la ragione

seguono ne loro amori la cosa piugrave perfetta seguendo fanno intanto

come uomini e quelli che seguono il senso dietro alla meno perfetta

mettendosi fanno come fiere836

Se assim eacute[ disse entatildeo o santo homem] que a razatildeo seja proacutepria dos

homens amp o sentido das feras porque natildeo haacute duacutevida de que a razatildeo

seja coisa mais perfeita que o sentido aqueles que amando seguem a

razatildeo seguindo no seu amor a coisa mais perfeita fazem entrementes

como homens e aqueles que seguem o sentido pondo-se atraacutes da menos

perfeita fazem como feras837

835 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 8v 836 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 136

Filiberto Campanile exclui do exemplo o trecho entre colchetes citado aqui segundo a ediccedilatildeo de Aldo

Manuacutecio Gli Asolani di Messer Pietro Bembo [Impressi in Venetia nelle case dAldo Romano 1505] p

117v 837 Traduccedilatildeo nossa Em versatildeo francesa de 1576 lecirc-se ldquoSil est ainsi[ motilde filz repliqua le sain amp hermite]

que la raisotilde soit propre aux hotildemes amp le sentimẽt aux bestes pource quil ny agrave point de doubte que ceste

partie diuine est plus parfaicte que les sens cotildemun ceulx qui en leurs amours suyuẽt la voye plus louable

276

Filiberto Campanile natildeo tece comentaacuterios aos exemplos Supotildeem-nos graves e

evidentemente graves visto ilustrarem forma de grauitagrave ldquoche amp egrave e dimostra essererdquo838

Ademais evidenciam a mencionada interseccedilatildeo das idee no corpo da doutrina os passos

em verso de Francesco Petrarca e em prosa de Pietro Bembo compotildeem-se de sentenze

que efetuam tanto a gravitagrave quanto a maestagrave ou dignitagrave (diga-se semnotēs) espeacutecie de

grandezza (cf HERM 242-54) ou seja pensam mateacuteria concernente ao homem e agrave vida

humana da ordem da imortalidade da alma da justiccedila da prudecircncia e do que a isso se

assemelhe839 Eacute conveniente notar que na medida em que as sentenze os pensamentos

que efetuam a deinotēs efetuam tambeacutem a semnotēs neste caso pouco faz que gravitagrave

diga uma ou outra idea

Para compor-se o poema tragicocircmico de acordo com a instruccedilatildeo de Giovanni

Battista Guarini eacute adequado que pensamentos dessa grandeza sejam moderados Isto eacute

que o enlevo e a altivez que lhes satildeo caracteriacutesticos convenientes agrave mateacuteria que enformam

temperem-se por intermeacutedio de ldquoquersquo modi che la sogliono far humilerdquo Esses modi natildeo

satildeo meios quaisquer Em Filiberto Campanile o adjetivo ldquohumilerdquo qualifica os

procedimentos retoacutericos e poeacuteticos adequados agrave construccedilatildeo da semplicitagrave tambeacutem dita

bassezza ou humiltagrave (apheleia) espeacutecie de ēthos (affectio costume) que por contraste

manobra pensamentos comuns a todos ndash a saber de acordo com Campanile ldquoproprie dersquo

fanciulli di Dotildene di lauoratori di pastori e finalmente dogni maniera di persone rozze

amp idiote 840 (proacuteprios das crianccedilas das Mulheres dos lavradores dos pastores e

finalmente de toda maneira de pessoas ruacutesticas amp iletradas) ndash nada sutis natildeo raro

ingecircnuos pueris ateacute (cf HERM 322 5) tais quais os que tratam em muitos casos

Anacreonte e Teacuteocrito segundo a liccedilatildeo de Hermoacutegenes (cf HERM 322 20) Virgiacutelio

segundo a de Jorge de Trebizonda841 e Teacuteocrito Virgiacutelio Giovanni Boccacio e Jacopo

Sannazaro segundo a de Filiberto Campanile842 Refere no entanto Giovanni Battista

sont office amp devoir dhommes amp ceulx qui se laissent transporter agrave sensualiteacute poursuyuant la chose moins

parfaicte sont vraies actes des bestes brutesrdquo Cf Les Azolains de Mon Seignevr Pierre Bembo de la nature Damour Traduictz ditalien em Franccedilois par Jean Martin Secretaire de Monseigneur le reverendiszligime

Cardinal de Lenoncourt A Paris pour Galiot du Preacute rueuml S Iacque agrave lenseigne de la Galere dOr 1576

pp 246-7 838 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 135 839 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 33 840 Idem p 99 841 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] p 580 842 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

277

Guarini natildeo esses pensamentos mas o que mais compete agrave humiltaacute isto eacute os constituintes

de estilo que tornam humile e tambeacutem puro o discurso que natildeo se ocupa de pensamentos

dessa ordem (cf HERM 328 1) Satildeo esses constituintes como prescreve Hermoacutegenes a

lexis os skhēmata e ldquoos demaisrdquo stoikheia (cf HERM 328 4-5) Diga-se na doutrina

prescrita por Hermoacutegenes apheleia (humiltaacute) e katharotēs (puritagrave) recobrem natildeo raro

os mesmos efeitos e efetuam-se mediante as mesmas estrateacutegias Isso ocorre com a

elocuccedilatildeo as figuras dessa espeacutecie e os restantes constituintes discursivos os quais podem

temperar a gravidade dos pensamentos ou construir matizes pendentes agrave simplicidade

Assim o que se esmiuacuteccedila eacute revisatildeo de doutrina jaacute vista

Dessa maneira no acircmbito da elocuccedilatildeo segundo o passo da doutrina conveacutem fazer

uso de vocaacutebulos propriamente simples como adelphizein (ldquochamar de

irmatildeordquo) lido em Isoacutecrates843 e klausigelōs (ldquoriso aos prantosrdquo) lido em

Xenofonte844 visto que para Hermoacutegenes satildeo esses exemplos de muita simplicidade e

uacuteteis agrave composiccedilatildeo eacutetica do discurso Reafirma Campanile o uso de ldquovoci nouerdquo (palavras

novas) como imparadisa845 que ldquoconduce per lo paradisordquo e impola846 que ldquosi gira

sopra il polordquo lidos em Dante Esses termos de acordo com as liccedilotildees que os citam

conferem dolcezza ou glykytēs certo sabor agrave simplicidade (cf HERM 328 19) 847

Tambeacutem eacute conveniente fazer uso de leacutexico puro e simples isto eacute de emprego corrente

como se sabe nem translato nem foneticamente duro (cf HERM 229 10-16 258 14-

15)848 No acircmbito das figuras para o temperamento preceitua-se o uso da construccedilatildeo

direta (ldquoorationis rectitudordquo ldquoRettitudine del parlarerdquo) (cf HERM 230 19) que aparte

do discurso os pensamentos encadeados proacuteprios em conformidade com os preceitos do

Peri ideōn agrave peribolē (circuitione) Os demais elementos enformadores do discurso

bem temperado aptos a humildar a gravidade de sentenze no leacutexico de Giovanni Battista

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 99 843 Cf ISOCR 19 30 Segundo o Liddell-Scott-Jones Greek-English Lexicon traduz-se este infinitivo por

ldquoadopt as a brother call brotherrdquo O tradutor francecircs Michel Patillon 844 Cf XEN Hell 7 2 9 Segundo o Liddell-Scott-Jones o substantivo referido por Hermoacutegenes significa

ldquosmiles mixed with tearsrdquo Sigo nesse sentido Patillon que compotildee o neologismo ldquorire-en-pleursrdquo Lecirc-se

tambeacutem em Demeacutetrio (DEMETR 28) 845 Cf DANTE ALIGHIERI Commedia Paradiso XXVIII 3 O verso eacute ldquoQuella che imparadisa la mia menterdquo

(Aquela que emparaiacutesa a minha mente) 846 Cf DANTE ALIGHIERI Commedia Paradiso XXII 67 O verso eacute ldquoPerche non egrave in loco e non srsquoimpolardquo

(Porque natildeo estaacute no espaccedilo nem se impola) 847 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori pp 103-

104 848 Idem p 46

278

Guarini como os restantes modi que soem fazecirc-lo podem ser o ldquometodordquo a ldquotesturardquo e

o ldquonumerordquo como jaacute eacute sabido interpretaccedilotildees vernaculares de methodos synthesis (ou

synthēkē) e rhythmos respectivamente

Hermoacutegenes ensina que tornam simples e tambeacutem puras as formas os arranjos

sintaacuteticos soltos e os ritmos de mesma espeacutecie que deles decorrem (cf HERM 229 11-

13) De acordo com o tratadista a simplicidade de sintaxe consente o hiato intervocaacutelico

porque o preceito de evitaacute-lo manifesta diligecircncia mais afeita agrave ornamentaccedilatildeo que agrave

pureza e recomenda o texto prosaico em que sobressaia a prosoacutedia iacircmbica ou trocaica

em mescla com diferentes peacutes como o daacutectilo e o espondeu de modo que natildeo se

estabeleccedila a regularidade do verso mas a meacutetrica de feiccedilatildeo corrente que dissimule o

artifiacutecio O ritmo que o arranjo puro e a pausa () produzem conveacutem que

esteja entre o metro ausente e o metro por natureza da liacutengua grega (cf HERM 232 8-

233-2) 849 Hermoacutegenes pondera que embora synthesis (ou synthēkē) rhythmos e

anapausis concorram agrave efetuaccedilatildeo da pureza satildeo de contribuiccedilatildeo restrita Natildeo haacute

exemplos em Campanile que avancem a interpretaccedilatildeo da liccedilatildeo grega Resta agrave luz das

categorias estiliacutesticas em operaccedilatildeo com vistas agrave pureza do discurso o preceito do metodo

Muito brevemente eacute assunto jaacute percorrido conveacutem de acordo com a normatizaccedilatildeo do

Peri ideōn a aphēgēsis (narraccedilatildeo) restrista agrave accedilatildeo sem enredamentos circunstanciais (cf

HERM 227 19-228 3 228 24 229 2 229 4)

As liccedilotildees dos Progymnasmata retoacutericos atribuiacutedos a Hermoacutegenes fazem avanccedilar

a compreensatildeo do procedimento Eacute sabido esses exerciacutecios instruem a praacutetica do diēgēma

ldquoexposiccedilatildeo das coisas sucedidas ou como sucedidasrdquo (cf HERM 4 6-7) Tanto o

Pseudo-Hermoacutegenes como Eacutelio Teatildeo (ca I dC) Aftocircnio (seacutec IV dC) e Nicolau o

Sofista (seacutec V dC) Marcos Martinho dos Santos minuciosamente o demonstra

contrastam diēgēsise diēgēmaao modo de poesis (poesia) e poiēma (poema) de sorte a

propor que assim como a Iliacuteada eacute poesia e o iliaacutedico episoacutedio das armas de Aquiles eacute

poema como todo e parte assim tambeacutem diēgēsis pende agrave integralidade e diēgēmaagrave

parcialidade como parte que se compotildee de mais partes para a constituiccedilatildeo do todo850

849 Trata-se do iambo de acordo com Aristoacuteteles e Demeacutetrio (cf ARIST Poet 1449 a DEMETR 42) Satildeo

semelhantes as colocaccedilotildees de Ciacutecero em relaccedilatildeo ao latim (cf CIC Or 56 189 57 191) 850 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

195 SANTOS M M ldquoAcerca das diferenccedilas doutrinais entre os Praeexercitamina de Prisciano e os

Progymnaacutesmata do Ps-Hermoacutegenesrdquo In ASSUNCcedilAtildeO T R FLORES-JUacuteNIOR O SANTOS M M (Org)

Ensaios de retoacuterica antiga Belo Horizonte Tessitura 2010 pp 270-4 283-7

279

Tradutor dos Progymnasmata Michel Patillon busca manter essa distinccedilatildeo

vertendo diēgēsis por ldquoœuvre narrativerdquo ou ldquonarrationrdquo e diēgēmapor ldquoreacutecitrdquo851 Em

posiccedilatildeo semelhante George A Kennedy opta respectivamente por ldquonarrationrdquo e

ldquonarrativerdquo852 Marcos Martinho ao analisar o caso no artigo citado em nota interpreta

diēgēsis como ldquonarraccedilatildeordquo e diēgēma como ldquonarrado 853 Essas escolhas em liacutengua

portuguesa satildeo condizentes com as de Jacyntho Lins Brandatildeo no estudo A invenccedilatildeo do

romance Propotildee Jacyntho que narraccedilatildeo designe ldquoo ato de narrarrdquo como diēgēsis que

narrado ldquoo produto da narraccedilatildeordquo como diēgēma que narrativa o gecircnero como

diēgēmatikē e que narrativo refira a narrativa ou a narraccedilatildeo como diēgēmatikon de

maneira a guardar as diferenccedilas que haacute como visto entre poesis (poesia)

poiēma(poema) poiētikē(poeacutetica a arte) e poiētikos(poeacutetico)854

Il Pastor Fido talvez seja supeacuterfluo afirmaacute-lo como obra de poesia natildeo eacute

estritamente narraccedilatildeo narrativa ou poema narrativo todavia de acordo com o Pseudo-

Hermoacutegenes eacute liacutecito que se valha Giovanni Battista Guarini do narrado o diēgēma para

enformaacute-lo Esse produto da narraccedilatildeo de acordo com o Pseudo-Hermoacutegenes enuncia-se

sob quatro diferentes espeacutecies O segundo tipo diz-se ldquofictiacuteciordquo ()ou

ldquodramaacuteticordquo () Como plasmatikon o relato dessa espeacutecie resulta da forja

do enunciador e expotildee o que Sexto Empiacuterico (seacutec II dC) designa como plasma

() a saber mateacuteria de ficccedilatildeo de comeacutedias e pantominas mateacuteria como sucedida

por isso verossiacutemil distante tanto da faacutebula () afeita ao natildeo sucedido e ao falso

mateacuteria das trageacutedias quanto da histoacuteria () afeita ao sucedido e ao verdadeiro855

Como drammatikon ademais o relato resulta da exposiccedilatildeo imediata de personagem em

accedilatildeo sem a intervenccedilatildeo enunciativa do poeta como eacute proacuteprio da trageacutedia Conveacutem

851 HERMOGEgraveNE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon

Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 131 852 KENNEDY G A Invention and Method Two Rhetorical Treatises from the Hermogenic Corpus Translated with introductions and notes by George A Kennedy Atlanta SBL 2005 p 75 853 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

195 SANTOS M M ldquoAcerca das diferenccedilas doutrinais entre os Praeexercitamina de Prisciano e os

Progymnaacutesmata do Ps-Hermoacutegenesrdquo In ASSUNCcedilAtildeO T R FLORES-JUacuteNIOR O SANTOS M M (Org)

Ensaios de retoacuterica antiga Belo Horizonte Tessitura 2010 pp 270-4 283-7 854 BRANDAtildeO J L A invenccedilatildeo do romance Narrativa e mimese no romance grego Brasiacutelia Editora UnB

2005 p 37 855 SANTOS M M ldquoAcerca das diferenccedilas doutrinais entre os Praeexercitamina de Prisciano e os

Progymnaacutesmata do Ps-Hermoacutegenesrdquo p 270 CASSIN B O efeito sofiacutestico sofiacutestica filosofia retoacuterica

literatura Traduccedilatildeo dos ensaios de Ana Luacutecia de Oliveira e Maria Cristina Franco Ferraz Traduccedilatildeo dos

documentos de Paulo Pinheiro Satildeo Paulo 34 pp 223-8

280

recordar nesse caso que como jaacute mencionado no princiacutepio deste trabalho drammatikon

abarca em Diomedes um dos trecircs genera poematos ou modi dicendi ou characteres

dicendi como propotildee Alexandre Hasegawa Escreve o gramaacutetico

Poematos genera sunt tria aut enim actiuum est uel imitatiuum quod

Graeci uel aut enarratiuum uel

enuntiatiuum quod Graeci uel dicunt

aut commune uel mixtum quod Graeci uel appellant

est uel actiuum in quo personae agunt solae sine poetae

interlocutione ut se habent tragicae et comicae fabulae []

est uel enarrativum in quo poeta ipse loquitur sine ullius

personae interlocutione [hellip] est uel commune in quo poeta

ipse loquitur et personae loquentes introducuntur [] (DIOM Art

Gramm III 482 14-25)

Trecircs satildeo os gecircneros de poemas pois ou eacute ativo e imitativo que os

gregos (chamam de) drammatikon e mimētikon ou narrativo e

enunciativo que os gregos chamam de exēgētikone apaggetikonou

comum e misto que os gregos nomeiam como koinon e mikton Eacute

drammatikon e ativo (o poema) em que agem soacute as personagens sem a

interlocuccedilatildeo do poeta como satildeo as faacutebulas856 traacutegicas e cocircmicas []

exēgētikon e narrativo (o poema) em que o proacuteprio poeta fala sem a

interlocuccedilatildeo de alguma personagem [hellip] koinon e comum (o poema)

em que o proacuteprio poeta fala e introduzem-se personagens que falam

[]857

Desse modo itera-se por meio da doutrina referida abonada por Seacutervio Honorato

e Probo conhecida de Joatildeo de Garlacircndia (seacutec XII-XIII dC) agrave luz da Repuacuteblica de

Platatildeo (cf 392 d-394 d) espeacutecie de diēgēma que se constitui como expediente narrativo

apropriado ao gecircnero de poema dramaacutetico 858 Essa conclusatildeo natildeo deve anular as

856 A traduccedilatildeo do estudioso traz ldquopoemasrdquo Altero pontualmente ldquopoemasrdquo por ldquofaacutebulas 857 Cf HASEGAWA A P Os limites do gecircnero bucoacutelico em Vergiacutelio um estudo das eacuteclogas dramaacuteticas Satildeo

Paulo Humanitas 2012 pp 56-7 858 Idem pp 54-8

281

diferenccedilas lexicais das liccedilotildees examinadas pois que Hermoacutegenes preceitua a praacutetica da

aphēgēsis narraccedilatildeo cujo produto pode-se supor seja dito aphēgēmanarrado e o

Pseudo-Hermoacutegenes a praacutetica da diēgēsisnarraccedilatildeo da qual resulta o diēgēmanarrado

no entanto talvez seja suposiccedilatildeo coerente que os atos e produtos designados pelos termos

gregos tenham-se confundido em versotildees latinas ou vernaacuteculas dessas liccedilotildees de retoacuterica

Leitor privilegiado de Hermoacutegenes Jorge de Trebizonda ao prescrever a pureza

de meacutetodo que interessa a Giovanni Battista Guarini conforme o Peri ideōn verte o

preceito ao latim e vale-se de enarro (ldquoenarrabimusrdquo explicaremos diremos em

detalhe859) para traduzir aphēgeomai Filiberto Campanile talvez estribado em Jorge de

Trebizonda faz uso do geruacutendio ldquonarrandordquo e do substantivo ldquonarrationerdquo860 Mas natildeo

soacute Johannes Sturm na interpretaccedilatildeo estampada em 1571 emprega ldquonarraturrdquo ldquoin

narrandordquo e ldquonarrandordquo 861 Na versatildeo de Garpard Laurent leem-se ldquonarratrdquo ldquoin

ldquonarrationib[us]rdquo ldquonarratiordquo ldquonarrationẽ rdquo ldquonarratiordquo e ldquoNarratiordquo862 Em todos esses

casos ainda que os exemplos natildeo sejam exaustivos a mesma famiacutelia lexical emprega-se

para encerrar a praacutetica da aphēgēsis Eacute famiacutelia latina e vernaacutecula que soe designar a esfera

de sentido da diēgēsis Na versatildeo do tratado do Pseudo-Hermoacutegenes elaborada pelo

gramaacutetico Prisciano (seacutec II dC) diēgēma eacute narratio e latinamente em estampa de 1544

define-se como ldquoexpositio rei factae uel quasi factaerdquo863

Natildeo eacute de todo ineficaz pois agraves estrateacutegias de produccedilatildeo do discurso misto que

instrui Giovanni Battista Guarini contra Giason Denores a doutrina de Hermoacutegenes ou

do Pseudo-Hermoacutegenes de acordo com distinccedilatildeo de autoria como histoacuterica que interessa

mais aos contemporacircneos deste trabalho do que aos contemporacircneos de Giovanni Battista

Guarini864 Eacute sobretudo indiacutecio essa doutrina de que a presenccedila em textos como os

analisados de retores gregos ldquoda decadecircnciardquo tal como diria ironicamente Machado de

859 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] p 502 860 Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori pp 17-8 861 Hermogenis Tarsensis rhetoris acutissimi De dicendi generibus siue formis orationum libri II Latinitate

donati amp scholis explicati atque illustrati a Ioan Sturmio Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo ad annos

octo Excudebat Iosias Rihelis MDLXXI pp 29 31 862 Hermogenis Ars Oratoria absolutissima et libri omnes Cum nova Versione Latina e regione Contextus

Graeci amp Comentariis Gaspariis Laurentii Coloniae Allobrogum Apud Petrum Aubertum Anno

MDCXIV pp 256-8 863 Hermogenis Rhetoris Ad Artem oratoriam praeexercitamenta Prisciano interprete Norimbergae

Petreius 1544 sp Cf SANTOS M M ldquoAcerca das diferenccedilas doutrinais entre os Praeexercitamina de

Prisciano e os Progymnaacutesmata do Ps-Hermoacutegenesrdquo pp 270-4 864 FOUCAULT M iquestQueacute es un autor Traduccioacuten de Silvio Mattoni Buenos Aires Ediciones literales 2010

282

Assis natildeo se potildee a despeito de outras teorias quer gregas mais antigas quer latinas ou

natildeo se potildee como ruptura crente em renascenccedilas visto que intersecccedilotildees aparentam ganhar

incessantemente as liccedilotildees de retoacuterica natildeo raro sem deixar vincos

Atente-se que segundo Giovanni Battista Guarini eacute conveniente a fim de

enformar temperadamente o poema tragicocircmico natildeo soacute moderar a gravidade das

sentenccedilas como se viu senatildeo tambeacutem suster ldquolrsquohumiltagrave drsquoalcuna ograve persona ograve soggetto

di che egli tratti con vn poco di quella nobiltagrave di favella chrsquoegrave propria della magnifica ldquoa

humildade de alguma personagem ou assunto de que ele trate com um pouco daquela

nobreza de palavra que eacute proacutepriardquo) 865 Supotildee-se Il Verrato reafirma a conveniecircncia dos

matizes que evitam a chaneza de personagens (persona) e de casos (soggetto) por meio

da elocuccedilatildeo que faz algo nobre o discurso tragicocircmico Eacute liccedilatildeo que se conhece de

Aristoacuteteles eacute liccedilatildeo que se conhece de Francisco Porto tradutor quinhentista de

Hermoacutegenes leitor da Retoacuterica aristoteacutelica ldquodebet autem oratio esse perspicua amp non

humilisrdquo 866 Natildeo se arremata Il Verrato no entanto sem que o poeta tragicocircmico italiano

explicite o que jaacute se crecirc expliacutecito

Ne questa egrave mia dottrina M Giasone ma di Hermogene famoso

artefice degli stili fauellando egli delle vaghe amp belle misture che

hanno fatto amp Demostene amp Senofonte amp Platone dice che gli stili si

mescolano insieme agrave guisa dei colori amp che si come dal bianco amp dal

nero che sono tanto contrari si forma un terzo colore chegli chiama

amp fosco diremo noi cosi dalle contrarie forme del dire nascono

i misti che vaga amp ragguardeuole rendono lorazione soggiugnendo

che non bisogna merauigliarsi se luna Idea communichi in qualche

parte con laltra amp com alcunaltra non si confaccia dandone esempio

delluomo il qual tuttorsquonsieme egrave molto diferente da tutti gli altri animali

ma nellesser mortale egrave perograve simile a molti amp nellhauer intelletto amp

ragione ha con gli Iddij alcuna cosa comune Voi intendete M Giasone

quella mistura che pare agrave voi mostruosa agrave due famosi retori greci par

leggiadrissima amp perograve contentateui di concederlo al facitore delle

Tragicomedie se per testimonio dErmogene lhan fatto le piugrave famose

865 Idem pp 37r-37v 866Cf Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices magistri Francisci

Porti Cretensis opera industriaacuteque illustrati atque expoliti Genevaelig apvd I Crispinvm MDLXIX [1569]

sp

283

lingue amp le piugrave scelte penne di tutta Grecia867

E natildeo eacute minha esta doutrina senhor Giasone mas de Hermoacutegenes

famoso artiacutefice dos estilos discorrendo ele sobre as vagas amp belas

misturas que fizeram Demoacutestenes amp Xenofonte amp Platatildeo disse que os

estilos se misturam juntamente agrave maneira das cores amp que assim como

do branco amp do preto que satildeo tatildeo contraacuterios se forma uma terceira cor

que ele chama phaione cinza diremos noacutes assim tambeacutem das formas

do dizer contraacuterias nascem os mistos que gracioso e distinto tornam o

discurso acrescentando que natildeo eacute preciso maravilhar-se caso uma Ideia

se comunique em qualquer parte [dele] com outra amp com alguma outra

natildeo se mostre conveniente dando-nos exemplo do homem o qual de

uma soacute vez eacute muito diferente de todos os outros animais mas em ser

mortal eacute todavia semelhante a muitos e em ter intelecto amp razatildeo tem

com os Deuses alguma coisa em comum Voacutes compreendeis senhor

Giasone aquela mistura que a voacutes parece monstruosa a dois famosos

retores gregos parece beliacutessima amp por isso satisfaccedila-vos de concedecirc-

la ao artiacutefice das Tragicomeacutedias se por testemunho de Hermoacutegenes a

fizeram as mais famosas liacutenguas amp as mais excelentes penas de toda

Greacutecia868

Ora Giovanni Battista Guarini como os demais leitores de Hermoacutegenes entre

eles Manuel de Galhegos tem clareza de que a excelecircncia no trato com as ideai e a defesa

poeacutetica da tragicomeacutedia e de Il Pastor Fido dependem da seacutetima entre as categorias

normatizadas no Peri ideōn a deinotēs Sabe-se este eacute vocaacutebulo que prolifera no tratado

Nos termos da preceptiva a deinotēs ou mais precisamente ldquoa deinotēs que efetivamente

867 Idem pp 37f-37v O mesmo passo de Guarini eacute alvo de Annabel M Patterson no livro Hermogenes

and the Renaissance Seven Ideas of Style Afirma a estudiosa ldquoIts important that in this part of Il Verrato

[] Guarini sets Hermogenes as an exponent of stylistic flexibility against his opponents authority Demetrius whose scheme is made to seem rigid by contrast but more significant still is the fact that he

chooses to support a point of practical criticism by bringing out the big guns and defending tragicomedy

in terms of the compromise status and precarious intellectual dignity of manrdquo [Eacute importante que neste

trecho de Il Verrato [hellip] Guarini proponha Hermoacutegenes como um expoente da flexibilidade estiliacutestica

contra Demeacutetrio a autoridade de seu oponente cujo esquema faz-se parecer por contraste riacutegido poreacutem

ainda mais significativo eacute o fato de que ele escolha sustentar um ponto de criacutetica praacutetica exibindo as armas

e defendendo a tragicomeacutedia em termos de posiccedilatildeo de conciliaccedilatildeo e de precaacuteria dignidade intelectual do

homem] PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New Jersey

Princeton University Press 1970 p 35 Pocircde-se observar a leitura aqui proposta natildeo corrobora a

compreensatildeo de Patterson 868 Traduccedilatildeo nossa

284

eacuterdquo (ldquordquo) eacute assim definida

HERM 368 25-369 2

A habilidade quanto ao discurso eacute de acordo com a minha

compreensatildeo senatildeo que o emprego correto de todas as formas do

discurso referidas e das contraacuterias a elas e ainda dos outros [elementos]

por meio dos quais o corpo de um discurso naturalmente se constitui869

Lecirc-se o substantivo grego ldquodeinotēsrdquo como ldquohabilidaderdquo Conveacutem ressaltar natildeo

se trata de leitura consensual nas ediccedilotildees do Peri ideōn hoje mais acessiacuteveis Na versatildeo

em inglecircs de Cecil W Wooten ldquodeinotēsrdquo eacute ldquoforcerdquo 870 na versatildeo espanhola de Consuelo

Ruiz Montero eacute ldquohabilidadrdquo871 na versatildeo francesa de Michel Patillon a mais recente eacute

ldquohabiliteacuterdquo872 Guardadas as diferenccedilas nota-se que Hermoacutegenes assenta indutivamente o

preceito nos usos dos antigos e para isso colhe dois versos de Teoacutecrito em que se lecirc que

Simocircnides de Coacutes eacute ldquodeinos aoidosrdquo (cf THEOC 16 44-5 ldquordquo) 873

Conforme o Peri ideōn assim eacute chamado o aedo porque conhece e eacute capaz de empregar

ldquoas formas proacuteprias da poeacuteticardquo (ldquordquo) e natildeo como se

poderia supor porque ao modo de muitos oradores empregue ou pensamentos ou

869 Traduccedilatildeo nossa 870 Cf HERMOGENES Hermogenesrsquo on types of style Translated by Cecil W Wooten Chapel Hill

University of North Carolina Press 1987 p 101 ldquoIn my opinion Force in a speech is nothing other than

the proper use of all kinds of style previously discussed and of their opposites and whatever other elements

are used to create the body of a speechrdquo 871 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 pp 271-272 ldquoLa Habilidad en el estilo no es en mi opinioacuten

otra cosa que el uso correcto de todas las especies estiliacutesticas antes expuestas y de sus contrarias y tambieacuten

de todos aquellos elementos que constituem el cuerpo del discursordquo 872 Cf HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 446 ldquoLrsquohabiliteacute dans le domaine du discours nrsquoest rien drsquoautre

agrave mon sens que lrsquoemploi correct de toutes les espegraveces stylistiques du discours preacutesenteacutees ci-dessus et des

espegraveces opposeacutees ainsi que des autres eacuteleacutements qui composent naturellementle corps drsquoun discoursrdquo 873 Hugo Rabe estudioso a quem se deve o estabelecimento do texto grego que serviu de base para as

traduccedilotildees de Patillon e Ruiz Montero aponta uma variante no verso de Teoacutecrito em vez de ldquordquo

ldquordquo em vez ldquohaacutebil aedordquo ldquoaquele aedordquo A variante como se veraacute natildeo invalida a argumentaccedilatildeo do

retor porque outros exemplos aprovam o uso do adjetivo em discussatildeo RABE H (ed) Hermogenis opera

Leipzig Teubner 1913 p 370

285

meacutetodos profundos ou meditados ou mesmo elocuccedilatildeo que tenha grandeza (ldquordquo)

(cf HERM 370 3-14)

Eacute evidente interessa ao tratadista delimitar o uso de ldquodeinosrdquo Polissecircmico o

adjetivo mostra Pierre Chiron abarca os ldquosemas de autoridade forccedila pavor e

habilidaderdquo874 Assim reitera o passo da doutrina em Teoacutecrito que se leia ldquohaacutebilrdquo e natildeo

ldquophoberosrdquo (assustador) ldquomegasrdquo (grande) ldquoiskhyrosrdquo (vigoroso) ou algo assim

Hermoacutegenes embasa em Homero a interpretaccedilatildeo dos versos idiacutelicos Lendo-o lecirc Teacuteocrito

e pode dessa maneira impor delimitaccedilotildees ao corpo da doutrina que expotildee Explicita o

retor se eacute possiacutevel asseverar que deinotēs guarda o sentido de ldquophoberosrdquo de ldquomegasrdquo e

de ldquoiskhyrosrdquo porque eacute Priacuteamo aos olhos de Helena ldquoaidoiosrdquo (veneraacutevel) e ldquodeinosrdquo

(terriacutevel) (HOM Il 3 172) porque eacute Goacutergone ldquodeinērdquo (terriacutevel) e ldquosmerdnērdquo (medonha)

(HOM Il 5 742) e porque eacute Helena aos olhos dos chefes troianos ldquoterrivelmenterdquo

() assemelhada agraves deusas imortais (HOM Il 3 158)875 conveacutem natildeo ignorar que

Odisseu eacute ldquohaacutebilrdquo que Homero o fez ldquodeinon rhētorardquoldquohaacutebil oradorrdquo Conveacutem ressaltar

que para o tratadista assim eacute Odisseu ldquopois empregou a grandeza a rudeza e a veemecircncia

para o que eacute preciso e conforme a ocasiatildeordquo (ldquo

rdquo)876 em epiacutefora contra Alexandro

(sc Paacuteris) e os troianos e tambeacutem porque eacute apto a falar com meliacutefluo respeito e a proferir

palavras coroadas de beleza enfim reiteradamente no tratado eacute haacutebil o heroacutei porque

capaz de ldquoempregar as formas do discurso para o que eacute preciso e conforme a ocasiatildeordquo

(ldquordquo) (cf HERM 370

15-371 25)

Assim evita o retor que o adjetivo ldquodeinosrdquo e o substantivo ldquodeinotēsrdquodenotem

o indesejado Circunscrevendo a prescriccedilatildeo Hermoacutegenes aparta da liccedilatildeo a terribilidade

e ao fazecirc-lo distancia o Peri ideōn de concepccedilotildees tais quais as que satildeo lidas no corpo

doutrinaacuterio atribuiacutedo a Demeacutetrio de Falero Recorde-se o Peri hermēneias prescreve

quatro kharaktēres discursivos quais sejam o magaloprepēs o glaphyros o iskhnose o

deinos e quatro viacutecios em que respectivamente pode incorrer o incauto orador ou o mal

874 CHIRON P ldquoAs ambiguidades da lsquograccedilarsquo (kharis) no tratado Do estilo de Demeacutetrio (Ps-Demeacutetrio de

Falero) Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2003 v 7 p 215 875 As liccedilotildees do texto homeacuterico que chegaram a noacutes como acentuam Patillon [p 467] e Montero [p 273]

transmitem outro adveacuterbio e deixam ler ldquordquo em lugar de ldquordquo 876 Recorde-se para Hermoacutegenes e satildeo espeacutecies de

286

poeta na instituiccedilatildeo de cada um desses caracteres a frieza a afetaccedilatildeo a sequidatildeo e a falta

de graccedila (cf DEMETR 36) Nessa regulaccedilatildeo a deinotēsnada reteacutem da ldquohabilidaderdquo eacute

preceituada como ldquoterribilidaderdquo E bem podera a esse respeito Michel Patillon agrave luz de

Zur Ideenlehre des Hermogenes de Dieter Hagedorn que a noccedilatildeo de deinosproposta no

Peri hermēneias guarda parentesco com liccedilotildees hermogenianas todavia constroacutei-se esse

parentesco natildeo pela ideia de deinotēs mas pelas de trakhytēs e de sphodrotēs duas das

espeacutecies jaacute citadas de megethos 877 Isso deixa agrave mostra como doutrinariamente

Hermoacutegenes abarca os efeitos de forccedila veemecircncia grandeza ou aspereza todos apartados

da esfera de significaccedilatildeo da deinotēs no Peri ideōn

Pode-se tambeacutem afirmar Hermoacutegenes deixa entrever que no tratado soacute eacute

grandioso rude ou veemente o orador se eacute haacutebil se habilmente (deinōs) orquestra o

discurso e nele produz a grandeza a rudeza e a veemecircncia como efeitos Eacute deinosdesse

modo atributo do orador ou do poeta que efetua deinōs o discurso dando a ele a feiccedilatildeo

oportuna ou que efetua o discurso em conformidade com a pragmaacutetica que supotildee a

habilidade como capacidade de orquestraccedilatildeo adequada das formas discursivas e tambeacutem

como efeito discursivo habilmente construiacutedo Ora na exposiccedilatildeo de Hermoacutegenes o ēthos

de Odisseu personifica a deinotēs como idea e a ficccedilatildeo do orador haacutebil daacute evidecircncia e

clareza agrave exposiccedilatildeo Natildeo eacute o heroacutei homeacuterico todavia o uacutenico exemplum Lecirc-se ainda no

tratado em discussatildeo o modelo de Demoacutestenes hipostasiado O Orador eacute como Odisseu

deinos ou seja tem saber (ldquordquo) e capacidade (ldquordquo) para tudo emprega

cada para o que eacute preciso ldquordquo) e ldquoatribuindo o que eacute preciso agraves causas agraves

ocasiotildees e agraves personagens eacute um nos [discursos] privados outro nos puacuteblicos

(ldquo

rdquo878 assim como eacute um nas

877 PATILLON M La theacuteorie du discours chez Hermogegravene le rheacuteteur essai sur les structures linguistiques

de la rheacutetorique ancienne Paris Les Belles Lettres 1988 pp 229 271-272 878 Parece que subjaz agrave doutrina de Hermoacutegenes a distinccedilatildeo aristoteacutelica entre a que eacute escrita

e a que eacute combativa Essa distinccedilatildeo assim Marcos Martinho dos Santos sintetiza ldquoDe fato

considerando que com cada gecircnero se harmoniza elocuccedilatildeo diferente (ARIST Rhet III 12 1 1413b 2-3) Aristoacuteteles distingue primeiro entre a elocuccedilatildeo escrita e a combativa na medida em que aquela eacute mais

precisa e esta mais teatral (id ib III 12 2 1413b 9-10) Daiacute observa que comparados os escritores

parecem estritos nos debates e os oradores que falam bem insignificantes na matildeo do leitor (id ib III 12

2 1413b 15-7 cf 125 1414a 15-7) Enfim de um lado atribui ao gecircnero popular [] a elocuccedilatildeo

combativa que se compara agrave pintura de sombra (cf id ib III 125 1414a 8 tēi skiagraphiacuteai) e atribui ao

judicial [] elocuccedilatildeo mais precisa Pois o gecircnero popular visa agrave turba e quanto mais numerosa esta

mais longe do orador estaacute a vista de maneira que a precisatildeo pareccedila entatildeo sobressalente e ruim o gecircnero

judicial poreacutem visa a juiz uacutenico de maneira que se entrevecirc mais o que eacute proacuteprio e o que eacute estranho ausenta-

287

Filiacutepicas outro nos discursos deliberativos mas sempre o mesmo sempre haacutebil (HERM

372 1-25) E tanto o eacute para Hermoacutegenes que ainda quando pareccedila natildeo ser haacutebil

Demoacutestenes eacute haacutebil

Nesses termos assenta-se a deinotēs na seguinte quadriparticcedilatildeo o discurso (i) eacute

haacutebil e parece secirc-lo (ldquordquo) (ii) eacute haacutebil e natildeo

parece secirc-lo (ldquordquo) (iii) natildeo eacute haacutebil e parece secirc-lo

(ldquordquo) e por fim (iv) natildeo eacute haacutebil e natildeo parece secirc-lo

HERM 372 20-3731 Escreve o retor eacute supeacuterfluo discorrer sobre o que natildeo eacute haacutebil nem

parece ser haacutebil Logo dicotomicamente eacute possiacutevel observar Hermoacutegenes afirma a

habilidade e nega a inabilidade de oradores e poetas ou noutros termos por um lado

prescreve a habilidade e a inabilidade como aparecircncias como efeitos discursivos

habilmente construiacutedos por matildeos haacutebeis por outro lado censura a aparecircncia de habilidade

dos discursos produzidos por matildeos inaacutebeis na medida em que a habilidade seja

manifesta seja dissimulada como dissimulatio artis travestida de inabilidade deve ser

atributo de oradores e poetas

Desse modo a deinotēs como tal pode-se plasmar discursivamente aparentando

ser haacutebil ou inaacutebil conforme a ocasiatildeo Essa a chave para a leitura do mecanismo que

opera no Peri ideōn e para a compreensatildeo do emprego das ideai enquanto formas

discursivas detalhamente normatizadas e prescritas Censurados e censuraacuteveis para

Hermoacutegenes sofistas como Menatildeo Polo Goacutergias e outros contemporacircneos deles a quem

satildeo imputadas praacuteticas que fingem a habilidade de aparecircncia que se intenta confundir

com a aparecircncia de habilidade e portanto induz ao erro

Ora tendo em vista que os Rhetoricorum libri V propotildeem a latinizaccedilatildeo das ideai

tou logou ditas formae dicendi como eacute sabido a deinotēs latinamente eacute proposta por

Jorge de Trebizonda nestes termos ldquoGrauitas est congrua omnibus circunstantijs oratio

uel quaeligdam orationis elatiordquo ou seja ldquoGravidade eacute o discurso congruente a todas as

circunstacircncias ou a elevaccedilatildeo de qualquer discursordquo 879 Eacute conveniente rememorar a

se o debate de maneira que o juiacutezo eacute mais puro (id ib III 125 1414a 8-15) De outro lado diz que ainda

mais precisa que a do gecircnero judicial eacute a elocuccedilatildeo do demonstrativo pois o ofiacutecio desta eacute a leitura (id ib

III 125 1414a 18-9)rdquo Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo

Paulo 2002 v 4 pp 209-10 879 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] p 497

288

prescriccedilatildeo do poema heroico Jorge de Trebizonda feita a definiccedilatildeo da grauitas assim a

distingue

Grauitatem in duas partes diuidimus quarum unam re ac veregrave

grauitatẽ alteram uerbo solugravem appellamus Prima est qua oratoris

iudicio personis rebus causis locis temporibus oratio accommodatur

quam singularem quandam ideam siue dicendi formam esse

arbitramur uerugravem cuncta quaelig in hac parte praeligcipiuntur ita complecti

putamus ut idẽ sit grauẽ oratorẽ amp omni laude accumulatũ appellare

Verbo grauitatem nominamus in qua sententijs uerbis caeligterisq quibus

oratio cotildeficitur sic utimur ut vulgograve graues videamur De hac grauitate

quam amp dicẽdi formatilde arbitramur priugraves dicẽdum est sed breuiter

deinde ad illatilde ueratilde qua tota eloquẽtia cotildetinetur reuertemur Triplicẽ

ergo hatildec esse cẽsemus Nam quũ sententijs et uerbis caeligterisq cotildestet

cotildeficitur ut aut grauis amp sit amp uideatur aut sit quidem minimegrave tamen

uideatur aut quamuigraves grauis non sit uideatur tamen quaelig nec grauis

quaelig est neque uidetur praeligcepitione nostra non indiget quaelig solugravem

uidetur uerbis maximegrave quaelig solugravem est methodo solugravem tertia omnibus

conficitur 880

Dividimos a gravidade em duas partes uma das quais nomeamos

verdadeiramente gravidade de coisa outra apenas de palavra A

primeira eacute aquela na qual pelo juiacutezo do orador o discurso acomoda-se

aos personagens aos casos agraves causas aos lugares aos tempos a qual

julgamos natildeo ser uma ideia particular ou forma do discurso mas na

verdade todas as coisas que satildeo ensinadas nesta parte de tal modo que

consideramos ter sido contemplado que seja o mesmo dizer que o

orador eacute grave e pleno de todo louvor Denominamos gravidade de

palavra aquela em que de tal sorte fazemos uso de sentenccedilas palavras

e demais [elementos] pelos quais um discurso eacute construiacutedo que

vulgarmente parecemos graves Dessa gravidade que tambeacutem

julgamos ser forma do discurso dissemos primeiro em seguida

retornaremos agravequela verdadeira que encerra toda a eloquecircncia

Estimamos entatildeo ser esta tripla visto que se constroacutei de sentenccedilas

880 Idem pp 603-604

289

palavras e demais [elementos] Por exemplo ou que seja grave e

tambeacutem o pareccedila ou que embora seja verdadeiramente grave pouco o

pareccedila ou que ainda que natildeo seja grave assim pareccedila Aquela que nem

eacute grave nem o parece natildeo necessita de nossa prescriccedilatildeo aquela que

apenas parece constroacutei-se sobretudo pelas palavras aquela que

apenas eacute apenas pelo meacutetodo a terceira por todos [os elementos]881

Pode-se compreender conveacutem a Jorge de Trebizonda decorosamente acomodar

os preceitos autorizados por Hermoacutegenes agrave latinidade partilhada pelos eruditos italianos

de meados do seacuteculo XV A liccedilatildeo dos Rhetoricorum libri V nesse sentido natildeo decalca a

exposiccedilatildeo apresentada no Peri ideōn e assume o latim grauitas em equivalecircncia ao grego

deinotēs Diferentemente de Hermoacutegenes poreacutem Trebizonda natildeo aparta do texto a

polissemia para ele lecirc-se a grauitas na chave da adequaccedilatildeo porque eacute ldquodiscurso adequado

a todas as circunstacircnciasrdquo (ldquocongrua omnibus circunstantijs oratiordquo) e tambeacutem na chave

da grandeza porque eacute ldquoa elevaccedilatildeo de qualquer discursordquo (ldquoquaeligdam orationis elatiordquo)

Nesses termos Trebizonda parece construir uma dicotomia que opera o par res et uerba

e especifica a noccedilatildeo de um lado a grauitas re ac veregrave de outro a grauitas uerbo solugravem

A primeira espeacutecie remete a ldquoē ontōs ousa deinotēsrdquo HERM 369 8-9e dependente da

compreensatildeo da deinotēs como capacidade de orquestraccedilatildeo das ideai tou logou supotildee o

oratoris iudicium atributo por meio do qual os discursos acomodam-se agraves circunstacircncias

a segunda eacute propriamente forma dicendi e dependente da compreensatildeo da deinotēs como

efeito discursivo contempla esses efeitos reinterpretados em sentido elevado

Os sentidos do adjetivo ldquograuisrdquo para a doutrina retoacuterica dos estilos jaacute se

discutiram Recorde-se emprega-se nos Rhetoricorum libri V para referir uma das trecircs

figurae ou characteres orationis em conformidade com a Rhetorica ad Herennium

aquele genus tambeacutem dito ldquosublimisrdquo ou ldquograndisrdquo ldquocomposto de palavras graves em

construccedilatildeo leve e ornadardquo (Rhet Her IV 11 ldquoGrauis est quae constat ex uerborum

gravium leui et ornata constructionerdquo)882 Lendo latinamente a preceituaccedilatildeo e tomando

deinotēs como grauitas Jorge de Trebizonda considera discerniacuteveis uma grauitas re ac

veregrave e outra uerbo solugravem Parece possiacutevel reler essa dicotomia agrave luz do diaacutelogo de Ciacutecero

em discussatildeo de iniacutecio agrave luz dos usos nesse texto do adjetivo grauis e do substantivo

881 Traduccedilatildeo nossa 882 Traduccedilatildeo de Faria amp Seabra

290

grauitas Desse modo eacute como termo que designa a espeacutecie elevada entre os tria genera

dicendi ou como qualificativo subsumido a essa triparticcedilatildeo elocutiva que se lecirc o adjetivo

E eacute como termo que indica o que eacute proacuteprio do gecircnero elevado ou como qualidade dos

procedimentos retoacutericos cujos efeitos satildeo graves que se lecirc o substantivo

Ora os preceitos estatildeo decorosamente dispersos ao longo do diaacutelogo e os passos

repotildeem mesmo que de modo pouco ou nada sistemaacutetico883 a jaacute referida doutrina dos

orationis genera na medida em que citam a construccedilatildeo da figura grauis ou

especificamente o emprego de recursos elocutivos proacuteprios agrave grauitas Para Trebizonda

essa grauitas eacute forma e eacute compreendida como orationis elatio e por isso como foi

exposto eacute adequada agrave amplificatio e agrave commiseratio Ademais eacute uerbo solugravem e nesse

sentido eacute resultado da orquestraccedilatildeo dos elementos dos quais se constituem os discursos

a saber (i) sententia (ii) methodus ou artificium (iii) compositio que se subdivide em

(1) dictio ou verba (2) exornatio (3) membrum (4) collocatio (5) clausula (6)

numerus 884 Ou seja satildeo esses latinizados os jaacute iterados e reiterados stoikheia

preceituados no Peri ideōn manipulando-os oradores e poetas podem produzir a

grauitas como forma da qual se compotildee a figura grauis visto as figurae fazerem-se da

permixtio das formae885

Tal como jaacute proposto a doutrina retoacuterica do Peri ideōn desconhece os tria genera

dicendi Desconhece tambeacutem natildeo poderia ser diferente essa liccedilatildeo que subsume as formae

agraves figurae Propotildee Montefusco discutindo as antecedecircncias doutrinaacuterias da liccedilatildeo que

talvez provenha de comentaacuterios agrave obra de Hermoacutegenes particularmente dos

Prolegomena ao Peri ideōn atribuiacutedos a Phoebammon e a Joatildeo de Siciacutelia nos quais se lecirc

que eacute conhecendo detalhadamente os stoikheia dos quais satildeo feitas as ideaique se

conhecem os kharaktēres886 A estudiosa recorda na anaacutelise em questatildeo a jaacute citada

missiva De suauitate dicendi Nela Trebizonda afirma

Nam multa esse [sc dicendi genera] omnes confitentur cum

Ciceronianus ille Lucius Crassus et Marcus Antonius uel ipso sole

883 Cf SCATOLIN A A invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23 Satildeo

Paulo [FFLCH-USP] 2009 [tese de doutorado] p 137 884 Como parece frequente Trebizonda natildeo decalca as liccedilotildees de Hermoacutegenes Montefusco esmiuacuteccedila as

diferenccedilas que abarcam esses preceitos cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences

on George of Trebizondrsquos Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26

No 2 (Spring 2008) pp 157-159) 885 Apud Idem p 143 886 Idem pp 152-153

291

ostendant clarius (TRAP De suau sect 2 apud MONTEFUSCO 2008 p

144)

De fato todos reconhecem ser muitos [os gecircneros do discurso] como o

famoso ciceroniano Luacutecio Crasso e Marco Antocircnio mostram mais

claramente que o proacuteprio Sol887

Ora o uso do substantivo ldquogenusrdquo subentendido no passo natildeo parece supor a

triparticcedilatildeo operatoacuteria em casos aqui referidos mas como afirma Crasso entre os gregos

a suauitas de Isoacutecrates a subtilitas de Liacutesias o acumen de Hipeacuterides o sonitus de

Eacutesquines a uis de Demoacutestenes e entre os latinos a lenitas de Leacutelio a asperitas de Galba

algo de profluens e canorus em Carbatildeo e a grauitas de Africano (CIC De or III 28) 888

Nesse sentido os preceitos podem-se desdobrar jaacute que alguns paraacutegrafos depois dessa

enumeraccedilatildeo de autoridades que supotildee a investigaccedilatildeo das diferentes naturezas de

diferentes oradores e o louvor do que notaacutevel em cada um e certamente digno de

imitaccedilatildeo Crasso diz

Ex qua mea disputatione forsitan occurrat illud si paene innumerabiles

sint quasi formae figuraeque dicendi specie dispares genere

laudabiles non posse ea quae inter se discrepant eisdem praeceptis

atque una institutione formari (CIC De or III 34-5)

A partir desta minha discussatildeo talvez se pense que se satildeo praticamente

inumeraacuteveis as formas por assim dizer e as figuras do discurso

diacutespares pela espeacutecie louvaacuteveis pelo gecircnero natildeo eacute possiacutevel que elas

que discrepam entre si sejam formadas pelos mesmos preceitos e pelo

mesmo tipo de educaccedilatildeo889

Jorge de Trebizonda ecoa afirmaccedilotildees como essa do diaacutelogo ciceroniano e sabe-

se para ele eacute conhecendo componentes discursivos discriminados e apreensiacuteveis que se

887 Traduccedilatildeo nossa 888 Cf FANTHAM E ldquoOn the Use of Genus-Terminology in Cicerorsquos Rhetorical Worksrdquo Hermes Band

Heft 4 1979 p 446 889 Apud SCATOLIN A A invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23

Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 2009 [tese de doutorado] p 270

292

domina o que pode parecer disperso inumeraacutevel e inapreensiacutevel Por conseguinte a

particularidade do estilo de cada orador tal como a grauitas de Africano articula-se agrave

doutrina das formae dicendi890 Ademais esse eacute um dos trecircs passos do De oratore em que

Ciacutecero emprega lado a lado o par formado pelos substantivos forma e figura Elaine

Fantham cita-o891 Lucia Calboli Montefusco tambeacutem e ainda recorda De or II 98892

poreacutem ocorre uma vez mais em De or III 179893 e lecirc-se em Orator II 9 Agrave luz dos usos

de Jorge de Trebizonda Lucia Calboli Montefusco rechaccedila qualquer dependecircncia em

relaccedilatildeo aos fragmentos do De oratore por ela referidos embora natildeo discorra sobre eles

O que se supotildee seja extensiacutevel aos demais casos Essa questatildeo escapa a este trabalho mas

talvez seja interessante natildeo perder de vista o par forma e figura em Ciacutecero visto que pode

estar aiacute um indiacutecio para a compreensatildeo da doutrina que embasa a biparticcedilatildeo da elocutio

em figurae orationis e dicendi formae que jaacute eacute sabido eacute sustentada nos Rhetoricorum

libri V e deles se espraia

Ora esses preceitos parecem relevantes para que se discuta a natureza da noccedilatildeo

de grauitas uerbo solugravem e os meios pelos quais foi acomodada latinamente por

Trebizonda a deinotēs que lida em chave elevada no acircmbito da figura grauis eacute operada

numa interseccedilatildeo entre as doutrinas retoacutericas autorizadas por Hermoacutegenes e por Ciacutecero Eacute

bastante claro Trebizonda considera a destinaccedilatildeo empiacuterica e particular dos Rhetoricorum

libri V e supotildee os propoacutesitos didaacuteticos da liccedilatildeo apresentada adequando-a agrave koinē retoacuterica

compartilhada pelos letrados vecircnetos de meados do seacuteculo XV Poreacutem esses preceitos

elocutivos natildeo satildeo suficientes para que se pense a chamada grauitas re ac veregrave Conveacutem

rememorar para Jorge de Trebizonda eacute assim compreendida a grauitas no acircmbito da

adequaccedilatildeo na medida em que est congrua omnibus circunstantijs oratio894 e est qua

890 Cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) pp

144 152-153 891 Cf FANTHAM E ldquoOn the Use of Genus-Terminology in Cicerorsquos Rhetorical Worksrdquo Hermes Band

Heft 4 1979 p 446 892 Cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) pp

143 893 Observe-se ldquo[] C Curio patre mea sententia vel eloquentissimo temporibus illis quemquam mihi

magno opere videtur imitari qui tamen verborum gravitate et elegantia et copia suam quandam expressit

quasi formam figuramque dicendi quod ego maxime iudicare potui in ea causa quam ille contra me apud

centumviros pro fratribus Cossis dixit in qua nihil illi defuit quod non modo copiosus sed etiam sapiens

orator habere deberetrdquo (CIC De or II 98) e ldquoReferte nunc animum ad hominum vel etiam ceterarum

animantium formam et figuram Nullam partem corporis sine aliqua necessitate adfictam totamque formam

quasi perfectam reperietis arte non casurdquo (CIC De or III 179) 894 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] p 497

293

oratoris iudicio personis rebus causis locis temporibus oratio accommodatur 895

Nesses termos percebe-se serem essas liccedilotildees dependentes de Hermoacutegenes porque

segundo a jaacute referida prescriccedilatildeo do Peri ideon eacute deinos o orador bem ao modo de

Demoacutestenes que faz uso correto e conveniente das ideai que opera as distinccedilotildees entre os

discursos poliacuteticos e privados e sabe nesses termos como conveacutem adequar-se agraves causas

agraves ocasiotildees e agraves personagens (HERM 372 1-25)

As liccedilotildees apresentadas por Jorge de Trebizonda a despeito dessa filiaccedilatildeo

novamente natildeo podem ser lidas sem que se pressuponha tambeacutem a autoridade de Ciacutecero

E na perspectiva de Lucia Calboli Montefusco eacute a virtude da adequaccedilatildeo que torna

possiacutevel esses viacutenculos doutrinaacuterios pois eacute o pressuposto na praacutetica do orador

digno de nome e nos procedimentos proacuteprios do que Hermoacutegenes diz ser ldquoa deinotēs que

efetivamente eacuterdquo (ldquoē ontōs ousa deinotēsrdquo)896 Para dar evidecircncia ao argumento no De

oratore haacute dois passos na voz de Crasso que merecem consideraccedilatildeo Primeiro assim se

lecirc

[] primum oratoris officium esse dicere ad persuadendum

accommodate deinde esse omnem orationem aut de infinitae rei

quaestione sine designatione personarum et temporum aut de re certis

in personis ac temporibus locata [] (CIC De or I 138)

[] o primeiro oficio do orador eacute discursar de maneira adequada para

atingir a persuasatildeo em seguida todo discurso diz respeito a uma

questatildeo de tema indefinido sem a designaccedilatildeo de pessoas ou

circunstacircncias ou de tema circunscrito a pessoas e circunstacircncias

determinadas []897

Aponta Adriano Scatolin no enunciado de Crasso leem-se periacutefrases que referem

theseis e hypotheseis898 Como se sabe eacute a precisatildeo circunstancial que as diferencia que

circunscreve as hypotheseis as quais vimos referidas em Hermoacutegenes e que eram em

895 Idem p 603 896 Cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) p

143 897 Apud SCATOLIN A A invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23

Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 2009 [tese de doutorado] pp 169-170 898 Idem pp 35-36

294

latim chamadas causae ensina o mesmo Crasso (CIC De or III 109 ss CIC Top 79-

80) e eacute a adequaccedilatildeo do discurso agraves circunstacircncias postulado de virtude como uma das

trecircs uirtutes dicendi (CIC De or III 144-5) e de persuasatildeo como oratoris officium No

tratado elaborado por Trebizonda tal como afirmado e reafirmado esse acircmbito de

congruecircncia discursiva eacute abarcado sob a rubrica da ldquograuitas re ac veregraverdquo

A prescriccedilatildeo que propotildee Crasso nesse trecho acerca da adequaccedilatildeo ganha outros

matizes jaacute avanccedilado o diaacutelogo de Ciacutecero Em De or III 210-1 a voz do mesmo

personagem de novo se apresenta e aleacutem da adequaccedilatildeo agraves causae afirma natildeo a

universalidade dos preceitos porque talvez pressuponha a sua insignificacircncia nesses

termos mas a conveniecircncia da acomodaccedilatildeo dos discursos ao puacuteblico ao qual satildeo

endereccedilados e agrave ocasiatildeo de enunciaccedilatildeo ao kairos enfim 899 Esse passo do livro III do

diaacutelogo eacute ainda mais relevante porque incorporado ao tratado de Trebizonda porque

citado ipsis litteris900 como se pode observar

Nam Cicero quidem quum multa de oratoria facultate nobis reliquerit

haeligc tament [sic] ita subticuit ut nil aliud nisi plura esse dicendi genera

in quibus necesse sit oratorem insudare nos commonuerit Idque quum

multis in libris tangat tum maximegrave in eo quem de oratore composuit

plurimis in locis horum dicendi generum mentionem facit Quaelig ut

autoritate eius plura esse pateant non grauabimur uerba quaeligdam de

Oratore sumpta huic sermoni inserere Quanquam inquit perspicuum

est non omni causaelig nec auditori nec personaelig nec tempori congruere

orationis unum genus Nam amp causaelig capitis alium quendam uerborum

sonum requirunt alium rerum priuatarum atque paruarum Aliud

dicendi genus deliberationes aliud laudationes aliud iudicia atque

sermones aliud consolatio aliud obiurgatio aliud disputatio aliud

historia desiderat Refert etiam qui audiant senatus an populus an

iudices frequentes an pauci an singuli an aeligquales ipsi quoque

oratores qua sint aeligtate honore auctoritate Debet hoc uideri tempus

pacis an belli festinationis an otij 901

899 Cf MONFASANI J George of Trebizond A Biography and a Study of his Rhetoric and Logic Leiden

Brill 1976 p 293 900 Cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) p

145 901 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

295

Pois de fato Ciacutecero embora nos tenha deixado muito sobre a

capacidade oratoacuteria tanto se calou acerca disso [sc as formas do

discurso] quanto nos fez recordar nada mais senatildeo que satildeo vaacuterios os

gecircneros do discurso diante dos quais o orador tem a obrigaccedilatildeo de suar

bastante E isso no que tange a muitos de seus livros principalmente

naquele que compocircs sobre o orador no qual menciona em passos

bastante numerosos esses gecircneros do discurso os quais tendo em vista

a autoridade dele mostram-se vaacuterios Natildeo recusaremos inserir neste

tratado quaisquer palavras adotadas no De oratore ldquoEmbora isso seja

algo evidenterdquo afirma ldquonem todo tipo de discurso eacute adequado a toda

causa ou ouvinte ou personagem ou circunstacircncia De fato natildeo apenas

as causas capitais requerem um tom de palavras diferentes do das

questotildees privadas e de pouca monta mas tambeacutem os louvores os

julgamentos a conversa a consolaccedilatildeo a repreensatildeo a discussatildeo e a

histoacuteria carecem de tons diferentes Importa tambeacutem quem satildeo os

ouvintes se o senado o povo ou juiacutezes se em grande nuacutemero pequeno

ou sozinhos e qual sua natureza os proacuteprios oradores devem parecer

ter idade honra autoridade se eacute tempo de paz ou de guerra de

prontidatildeo ou oacuteciordquo902

No tratado exibe-se a acomodaccedilatildeo como praacutetica discursiva na medida em que

Jorge de Trebizonda latiniza as liccedilotildees hermogenianas e opera a autoridade de Ciacutecero para

isso A concessatildeo que abre o fragmento justifica a exposiccedilatildeo de Trebizonda que prescreve

formae ditas natildeo prescritas e ao fim intenta imitar e emular Ciacutecero mas obviamente natildeo

minimiza essa autoridade superlativada pela longa citaccedilatildeo Ademais o trecho repotildee a

voz de Crasso segundo a qual em siacutentese dicere ad persuadendum accommodaterdquo eacute o

ldquoprimum oratoris officiumrdquo (cf CIC De or I 138) e produz uma interseccedilatildeo que garante

o encontro de decorum e grauitas de prepone deinotēs o qual em termos doutrinaacuterios

no leacutexico dos Rhetoricorum Libri V eacute proacutepria da grauitas re ac veregrave afinal como jaacute se

sabe eacute esta ldquoest congrua omnibus circunstantijs oratiordquo 903 E como tal a grauitas eacute

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] pp 494-495 902 Segue incorporada ao texto de Jorge de Trebizonda a traduccedilatildeo de Adriano Scatolin de CIC De or III

210-1 cf SCATOLIN A A invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23

Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 2009 [tese de doutorado] p 303 903 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] p 603

296

resultado do oratoris iudicium Ou seja tem a qualidade da grauitas re ac veregrave o orador

que considera a ldquopragmaacutetica do decorordquo 904 e o faz ajuizadamente na operaccedilatildeo elocutiva

do discurso considerada a elocutio bipartida em figurae orationis e formae dicendi

Nesses termos orientado o discurso pelo oratoris iudicium que eacute deliberativo e

deve escolher sempre o que eacute mais proveitoso agrave persuasatildeo o preceito de Jorge de

Trebizonda pode-se delimitar em contornos mais niacutetidos com a definiccedilatildeo da deinotēs que

apresenta a Eacutetica Nicomaqueia Conforme Aristoacuteteles

ἔστι δὴ δύναμις ἣν καλοῦσι δεινότητα αὕτη δ᾽ ἐστὶ τοιαύτη ὥστε τὰ

πρὸς τὸν ὑποτεθέντα σκοπὸν συντείνοντα δύνασθαι ταῦτα πράττειν

καὶ τυγχάνειν αὐτοῦ ἂν μὲν οὖν ὁ σκοπὸς ᾖ καλός ἐπαινετή ἐστιν ἐὰν

δὲ φαῦλος πανουργία διὸ καὶ τοὺς φρονίμους δεινοὺς καὶ πανούργους

φαμὲν εἶναι ἔστι δ ἡ φρόνησις οὐχ ἡ δύναμις ἀλλ οὐκ ἄνευ τῆς

δυνάμεως ταύτης ἡ δ ἕξις τῷ ὄμματι τούτῳ γίνεται τῆς ψυχῆς οὐκ

ἄνευ ἀρετῆς ὡς εἴρηταί τε καὶ ἔστι δῆλον (ARIST Nic Eth VI 13

1144a 23-29)

Haacute uma capacidade que chamam ldquodestrezardquo [deinotēs] Ela eacute tal que eacute

capaz de fazer as coisas que levam ao alvo pressuposto e capaz de o

atingir Assim se o alvo for belo ela eacute digna de elogio se for ruim ela

eacute esperteza Por isso chamamos tanto os sensatos como os espertos de

destros Ora a sensatez [phronēsis] natildeo eacute essa capacidade mas natildeo se

daacute sem essa capacidade Essa habilitaccedilatildeo desse olho da alma natildeo se

engendra sem a virtude como jaacute foi dito e eacute evidente905

Na versatildeo seiscentista de Bernardo Segni a liccedilatildeo aristoteacutelica eacute proposta tomando-se

deinotēs como ldquoHabilitagraverdquo agrave semelhanccedila do que se viu aplicado na interpretaccedilatildeo da

normatizaccedilatildeo do Peri ideōn

Egli egrave vna certa potenza nellrsquoAnima che Habilitagrave egrave chiamata la quale egrave di

questa natura chegrave ella puograve mettere in atto tutte quelle cose che tendono al

904 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 p 335 905 A traduccedilatildeo eacute de Lucas Angioni mantenho-a notando as variantes no leacutexico empregado a traduzir

phronēsis e deinotēs cf ANGIONI L ldquoEacutetica a Nicocircmaco Livro VIrdquo Dissertatio 34 2011 p 298

297

proposto segno amp puograve tutte cotildeseguirle Segrave il segno egrave adunche retto questa

Habilitagrave egrave lodeuole Segrave il segno egrave catiuuo ella fia detta vna Astutia Et diquigrave

nasce chegrave gli huomini prudenti sonrsquo chiamati anchorrsquo habili amp astuti Magrave la

Prudenza notilde egrave la facultagrave detta magrave ella notilde egrave anchora senza essa anzi questo

habito srsquoimprime in questo occhio dellrsquoanima amp di uirtugrave notilde manca sicome

io hograve detto amp come egrave manifesto906

Haacute uma certa potecircncia na Alma que se chama Habilidade a qual eacute de tal

natureza que pode pocircr em ato todas as coisas que tendem ao alvo proposto

amp pode tudo conseguir Entatildeo se o alvo eacute reto esta Habilidade eacute louvaacutevel

Se o alvo eacute mau ela eacute dita Astuacutecia E daqui nasce que os homens prudentes

sejam tambeacutem chamados haacutebeis amp astutos Mas a Prudecircncia natildeo eacute a dita

faculdade embora jaacute natildeo exista sem ela assim este haacutebito se imprime neste

olho da alma amp de virtude natildeo carece como eu disse amp como eacute manifesto907

O que se figura por Bernardo Segni da seguinte maneira

Figura 12 LrsquoEthica drsquoAristotele (1550)908

Ora como se observa aristotelicamente falando identidade natildeo haacute nem poderia

haver entre phronēsis e deinotēs entre Prudenza e Habilitagrave Aparta-as ao que se nota

certa ambivalecircncia que para Aristoacuteteles natildeo compete agrave virtude da prudecircncia porque

906 Cf LrsquoEthica drsquoAristotele tradotta in lingua vulgare fiorentina et commentata per Bernardo Segni In

Venegia MDL [1550] pp 320-321 907 Traduccedilatildeo nossa 908 Idem p 323

298

virtude e que parece proacutepria da deinotēs Fornece o criteacuterio eacutetico de qualificaccedilatildeo da

deinotēs entatildeo o skopos (ldquoil segnordquo) louvaacutevel ou natildeo como se pode notar Se indigno

eacute ela nada mais que panourgia (ldquoAstutiardquo) e pode-se supor agrave luz da liccedilatildeo aristoteacutelica eacute

desse acircmbito a deinotēs de sofistas como Menatildeo Polo e Goacutergias visto que nessa chave

doutrinaacuteria eacute viciosa aparecircncia que induz ao erro Se digno eacute certo que virtuoso reto e

assim bem deliberado e a deinotēs prudentemente orienta-se equilibrada no meio-termo

do qual natildeo pode pender para qualquer dos extremos ndash por falta ou por excesso ndash sem cair

em sua proacutepria desqualificaccedilatildeo

Com Aristoacuteletes o enunciado grauis pode-se matizar e ganha sentidos que a

grauitas uerbo solugravem natildeo compreende porque natildeo se confunde com o que a elocutio diz

sublimis ou grandis E desse modo ganha evidecircncia a polissemia segundo a qual Jorge

de Trebizonda entende a noccedilatildeo de grauitas em prescriccedilatildeo natildeo apenas elocutiva mas

tambeacutem eacutetica John Monfasani jaacute citado propotildee que o vocaacutebulo ldquograuitasrdquo ldquodoes

describe exactly what in Roman tradition would be considered the supreme and all

encompassing quality of the ideal paulordquo Note-se o pressuposto de anaacutelise conhece-se

das consideraccedilotildees atinentes ao uso nos Rhetoricorum libri V de ldquovelocitasrdquo para

interpretar gorgotēs Tanto laacute como aqui John Monfasani vecirc o erro

O propoacutesito argumentativo do estudioso eacute afirmar que o termo ldquograuitasrdquo estaacute

distante do substantivo ldquodeinotēsrdquo que crecirc seguindo outra vertente de circulaccedilatildeo das

ideai tou logou seria mais bem traduzido por ldquodecorumrdquo 909 Essa interpretaccedilatildeo

pressuporia uma superposiccedilatildeo de significado que a leitura de Jorge de Trebizonda pode

natildeo confirmar todavia se eacute pertinente a anaacutelise de John Monfasani acerca do que

romanamente seja ldquograuitasrdquo e se esse substantivo latino ndash e igualmente o adjetivo

ldquograuisrdquo ndash eacute assim significante e ainda assim significativo para a latinidade italiana do

seacuteculo XV eacute possiacutevel depreender que o emprego de Jorge de Trebizonda compartilha

certos usos ciceronianos no De oratore afinal pode ser essa a chave de entendimento dos

atributos do pai dos Graco segundo Ceacutevola ldquohomem prudente e severordquo (ldquohomo prudens

et gravisrdquo) (cf CIC De or I 38) de Platatildeo segundo Crasso ldquode longe o mais solene e

eloquente de todosrdquo (ldquolonge omnium in dicendo grauissimo et eloquentissimordquo) (cf CIC

909 Cf MONFASANI J George of Trebizond A Biography and a Study of his Rhetoric and Logic Leiden

Brill 1976 pp 322-323

299

De or I 47) e de Crasso segundo Cota ldquomais seacuterio dos homensrdquo (ldquohomine omnium

gravissimordquo) (cf CIC De or I 160)910

Para Jorge de Trebizonda entatildeo seria ldquograuitasrdquo ldquore ac veregraverdquo ou ldquouerbo solugravemrdquo

agrave luz de Ciacutecero do De oratore particularmente citado e da por assim dizer ciceroniana

Rhetorica ad Herennium um equivalente possiacutevel e significativo da deinotēs que natildeo se

deve ler pura e simplesmente como produto de um erro de traduccedilatildeo conclusatildeo a que tecircm

levado os comentaacuterios de John Monfasani911 mas como o resultado do esforccedilo de fixaccedilatildeo

em latim de uma doutrina retoacuterica sem equivalente latino exato que se constroacutei de

variaccedilotildees pendentes da accommodatio que parece preceituada pelo skopos louvaacutevel e

primeiro do tratado o docere Ora a escolha lexical de Trebizonda natildeo eacute despreziacutevel

visto que como aventado dessas liccedilotildees todas parece depender uma das vertentes de

circulaccedilatildeo desde meados do seacuteculo XV do corpo retoacuterico atribuiacutedo a Hermoacutegenes Essa

vertente eacute a que se pode perseguir a partir da leitura dos Rhetoricorum libri V e que

entende haver homologia entre deinotēse grauitas Serve de exemplo a breve passagem

de Filiberto Campanile em que a doutrina discutida em termos bastante semelhantes

ganha versatildeo toscana912

La Grauitagrave dellrsquoeloquentia saragrave di due maniere vna chrsquoegrave veramente e

propriamente grauitagrave amp vnrsquoaltra che ne tiene il solo nome o per dir

meglio lrsquovna quella che si puograve chiamare Grauitagrave di cose e lrsquoaltra

Grauitagrave di parole

La prima si faragrave quando lrsquoOratore anderagrave accomodando

giuditiosamente il suo parlare secondo le persone di cui si ragiona le

cose delle quali si tratta amp i luogui e le cagioni amp i tempi di quelle E

questa non diremo quigrave noi esser forma particulare ma vn dritto vso di

tutte lrsquoaltre forme insieme di modo tale che tanto sia il chiamar per

questa lrsquoOratore graue quanto colmo drsquoogni virtugrave degno drsquoogni lode

Quella chrsquoegrave solamente Grauitagrave di parole si faragrave ogni volta che noi

vseremo le sentenze le parole e tutte lrsquoaltre parti di cui si compone il

910 A discussatildeo poderia ainda se desdobrar visto que John Monfasani brevemente supotildee relaccedilotildees entre a

noccedilatildeo de grauitas re ac veregrave e o prefaacutecio do livro I do De oratore Idem ibidem 911 Cf MONFASANI J George of Trebizond A Biography and a Study of his Rhetoric and Logic Leiden

Brill 1976 pp 322-3 La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Salamanca Universidad de Salamanca

1994 p 80 912 Cf G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] pp 603-604

300

parlare in tal maniera chrsquoa ciascuno graui ci dimostriamo e di questa

per esser forma particulare habbiam proposto discorrere

primieramente

Egrave dunque questa Grauitagrave di tre manieire percioche alcuna volta si

compongono le cose in modo tale chersquol parlare saragrave e pariragrave graue

alcuna volta saragrave tale senza apparire amp altre volta appariragrave tale che

vi sia Quello poi che negrave egrave negrave appare essere non fa mestiere esser

trattato da noi913

A Gravidade da eloquecircncia seraacute de duas maneiras uma que eacute verdadeira

e propriamente gravidade e outra que tem apenas o nome ou para dizer

melhor uma eacute aquela que se pode chamar Gravidade de coisa e outra

de palavra

A primeira se faraacute quando o Orador acomodar judiciosamente o seu

discurso segundo as personagens das quais se arrazoa as coisas das

quais se trata os lugares as causas e os tempos dessas coisas E desta

aqui natildeo diremos noacutes ser forma particular mas uso reto de todas as

outras formas conjuntas de modo tal que tanto ocorra chamar por meio

dela o Orador grave como o aacutepice de cada virtude digno de todo elogio

Aquela que eacute apenas Gravidade de palavra se faraacute toda vez que noacutes

usarmos as sentenccedilas as palavras e todas as demais partes das quais se

compotildee o discurso de tal maneira que a cada um nos mostremos graves

e desta por ser forma particular propomos discorrer primeiramente

Eacute assim esta Gravidade de trecircs maneiras porque por vezes se

compotildeem as coisas de modo tal que o discurso seraacute e pareceraacute grave

por vezes assim seraacute sem parececirc-lo amp por vezes assim pareceraacute sem

que isto seja Aquele pois que natildeo eacute nem parece ser [grave] natildeo precisa

ser tratado por noacutes914

Aleacutem da obra de Filiberto Campanile que fez reverberar os Rhetoricorum libri V

antes no decurso do seacuteculo XVI outras de outros autores operaram de maneira

homoacuteloga e deixam observar escolha lexical que repotildee a latinizaccedilatildeo proposta por Jorge

913 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori pp

134-135 914 Traduccedilatildeo nossa

301

de Trebizonda Semelhantemente Antocircnio Bonfine no Hermogenis Tarsensis

Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta versatildeo latina de 1538

propocircs ldquograuitasrdquo915 Natale Conti na obra homocircnima de 1550 tambeacutem916 Antocircnio

Sebastiano Minturno no De poeta (1559) 917 e em LrsquoArte poetica del Sig Antonio

Minturno (1564) 918 aplica o latim ldquograuisrdquo e o italiano ldquograverdquo respectivamente Giulio

Camillo Delmiacutenio no Lrsquoidee ouero forme della oratione da Hermogene considerata de

1594 propocircs gravitate 919 Recorde-se eacute uso lexical jaacute aventado Manuel Pires de

Almeida que se sabe conhecedor da versatildeo de Natale Conti emprega ldquograverdquo no tratado

Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia (1633)920 ao passo que Manuel de Galhegos tanto

ldquograverdquo como ldquoferozrdquo natildeo soacute referendando a liccedilatildeo sustentada por Jorge de Trebizonda

senatildeo tambeacutem buscando contemplar em liacutengua portuguesa com esses adjetivos a

polissemia do grego ldquodeinosrdquo sem se afastar das liccedilotildees retoacuterica atribuiacutedas a Demeacutetrio de

Falero (cf DEMETR 36) como se afasta Hermoacutegenes (cf HERM 370 15-371 25)

Essa liccedilatildeo de traduccedilatildeo do substantivo ldquodeinotēsrdquo natildeo eacute consensual Eacute relevante

afirmar que o adjetivo ldquograuisrdquo natildeo se aparta do Hermogenis Tarsensis rhetoris

Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II (1571) de Johannes

Sturm e que aiacute haacute passos em que deinos e deinotēs natildeo se traduzem Por exemplo ldquoē

ontōs ousa deinotēsrdquo eacute ldquovera [] grauis dicendi figura rdquo (cf HERM 369 8-

915 Cf Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii

item Sophistaelig Praeligexercitamenta Antonio Bonfine asculano interprete Apud Seb Gryphivm Lvgdvni

1538 p 273 916 Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] p 294 917 Antonii Sebastianii Minturni De poeta ad Hectorem Pignatellum Vibonensium Ducem Libri Sex Cum

Priuilegijs Venetiis Ann MDLIX [1559] p 559 918 LrsquoArte poetica del Sig Antonio Minturno nella quale si contengono i precetti Heroici Tragici Comici

Satyrici e drsquoogni altra Poesia Con la dottrina dersquo Sonetti canzoni et ogni sorte de Rime Thoscane dove srsquoinsegna il modo che tenne il Petrarca nelle sue opere Et si dichiara arsquo suoi luoghi tutto quel che da

Aristotele Horatio et altri autori Greci e Latini egrave stato scritto per ammaestramento di Poeti Con le

postille del dottor Valvassori non meno chiare che breui et due tavole lrsquouna dersquo capi principali lrsquoaltra

di tutte le cose memorabile Con Privilegio Per Gio Andrea Valvassori del MDLXIII [1563] p 442 919 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 44v 920 MUHANA A Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia Tratado Seiscentista de Manuel Pires de Almeida

Satildeo Paulo Edusp p 108

302

9)921 ldquodeinosrdquo eacute ldquo grauiter amp aptegraverdquo (cf HERM 369 10)922 ldquorētōr [] deinosrdquo eacute

ldquoOrator [] rdquo (cf HERM 369 15) 923 Todavia observa-se outra vertente de

interpretaccedilatildeo do Peri ideōn em Johannes Sturm como se sabe erudito dos mais profiacutecuos

na fortuna de Hermoacutegenes No proacutelogo da ediccedilatildeo Hermogenis De formis orationum tomi

duo (1555) o tradutor prefere considerando idea como genus dicendi as periacutefrases ldquoaptũ

grauiter amp cotildegruenterrdquo (apto grave amp congruentemente) e ldquoaptũ atq congruũ dicendi

genusrdquo (gecircnero de discurso apto e congruente)924 Jaacute na traduccedilatildeo do preceito na obra de

1571 considerando idea como figura opta por ldquoapta dicendi figurardquo (figura apta de

discurso)925 Mediante as Scholae pospostas ao texto biliacutengue desta ediccedilatildeo entende-se

serem pendentes da autoridade do De oratore especificamente do trecho que segue os

preceitos que nesse caso conduzem a latinizaccedilatildeo de Hermoacutegenes926

Qui distincte qui explicate qui abundanter qui inluminate et rebus et

uerbis dicunt et in ipsa oratione quasi quendam numerum uersumque

conficiunt id est quod dico ornate Qui idem ita moderantur ut rerum

ut personarum dignitates ferunt ei sunt in eo genere laudandi laudis

quod ego aptum et congruens nomino Qui ita dicerent eos negavit

adhuc se uidisse Antonius et eis hoc nomen dixit eloquentiae solis esse

tribuendum (CIC De or III 53-4)

Agravequeles que discursam de maneira distinta desenvolvida abundante

brilhante tanto pelos temas quanto pelas palavras e que constrotildeem como

que uma espeacutecie de ritmo e verso ndash eacute isso que quero dizer por

ldquoornadamenterdquo Aqueles que tambeacutem se controlam de tal forma a

respeitar as dignidades das ocasiotildees e das personagens satildeo os que

921Cf Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II

Latinitate donati amp scholis explicati atque illustrati A Ioan Stvrmio Cum Gratia amp Priuilegio Caeligsareo

ad anno octo Excudebat Iosias Rihelius MDLXXI [1571] p 305 922 Idem ibidem 923 Idem p 307 924 Cf Hermogenis De formis orationum tomi duo Argentorati apud haeredes Vuendelini Rihelij Anno

1555 [pp 4-5] 925Cf Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II

Latinitate donati amp scholis explicati atque illustrati A Ioan Stvrmio Cum Gratia amp Priuilegio Caeligsareo

ad anno octo Excudebat Iosias Rihelius MDLXXI [1571] p 305 926 Cf ldquoIoannis Sturmii Scholae in Librum I De formis orationum seu dicendi generibusrdquo in Hermogenis

Tarsensis rhetoris acutissimi De dicendi generibus siue formis orationum libri II Latinitate donati amp

scholis explicati atque illustrati a Ioan Sturmio Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo ad annos octo

Excudebat Iosias Rihelis MDLXXI p 371

303

merecem louvor naquele tipo de qualidade que denomino ldquoadequadordquo

e ldquoconvenienterdquo Antocircnio afirmou que ainda natildeo viu quem discursasse

dessa forma e disse que apenas a tal pessoa deve-se atribuir a palavra

ldquoeloquecircnciardquo 927

Isto seja ldquoadequadordquo e ldquoconvenienterdquo na traduccedilatildeo de Adriano Scatolin ldquoaptum

et congruensrdquo no texto latino de Ciacutecero assim Crasso denomina o orador atento agraves

dignidades de ldquoresrdquo e de ldquopersonaerdquo de casos (ldquoocasiotildeesrdquo na traduccedilatildeo referida) e de

personagens928 No diaacutelogo sabe-se bem pelas palavras de Jorge de Trebizonda929 faz-se

evidente que um mesmo gecircnero de discurso natildeo seja congruente a toda causa a todo

auditoacuterio a qualquer personagem a qualquer ocasiatildeo (cf CIC De or III 210 ldquonon omni

causaelig nec auditori nec personaelig nec tempori congruere orationis unum genusrdquo) eacute liccedilatildeo

que se conhece de Quintiliano (cf QUINT XII 10 66-72) logo deve-se compreender

eloquente o orador que respeitante agraves especificidades enunciativas compotildee de modo

ldquoapto e congruenterdquo cujos discursos ademais sejam enunciados distinta desenvolvida

abundante e brilhantemente em termos de res et verba Na leitura de Johannes Sturm em

que de modo analiacutetico ldquodeinotēsrdquo eacute ou ldquoaptũ grauiter amp cotildegruenterrdquo ou ldquoaptũ atq

congruũ dicendi genusrdquo ou ldquoapta dicendi figurardquo a conformaccedilatildeo retoacuterica das ideai

subsume-se a esses preceitos e lecirc-se Hermoacutegenes conforme Ciacutecero o que parece validar

na anaacutelise do Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis

orationum Libri II as conclusotildees de Lucia Calboli Montefusco a respeito da latinizaccedilatildeo

da doutrina de Hermoacutegenes construiacuteda por Jorge de Trebizonda nos Rhetoricorum libri

V Ciacutecero eacute autoridade indispensaacutevel930

Os preceitos de Ciacutecero articulam-se doutrinariamente ao Peri ideōn se recordados

os termos que definem deinotēs como emprego () correto das ideai preceituadas

no tratado em conformidade com as conveniecircncias de causa (ὑπόθεσις) de ocasiatildeo

(καιρός) e de personagem (πρόσωπον) (cf HERM 368 25-369 2 372 1-25)

927 Apud SCATOLIN A A invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23

Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 2009 [tese de doutorado] p 273 928 Recorde-se o respeito agraves dignidades das personagens eacute forccediloso na construccedilatildeo de uma narraccedilatildeo

verossiacutemil ensina a Rhetorica ad Herennium (cf Rhet Her I 16) 929 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] pp 494-495 930 Cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) p

142

304

Semelhantemente recorde-se que em Siriano Filoxeno comentador de Hermoacutegenes

idea eacute qualidade discursiva concordante () com o personagem (πρόσωπον) e

com o caso ou mateacuteria (πρᾶγμα) (cf Syrian I 2 16-19 Rabe) 931 Na versatildeo de Johannes

Sturm a deinotēs torna-se no vabulaacuterio de Ciacutecero meio de regulaccedilatildeo dessas

conveniecircncias Assim tambeacutem o faz entenda-se Gaspar Laurent na traduccedilatildeo seiscentista

do Peri ideōn estampada no Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima de 1614 em que

perifrasticamente deinotēs de modo a repor as liccedilotildees de Ciacutecero enunciadas com as

palavras de Antocircnio o personagem do De oratore (CIC De or III 54) eacute categoria

compreendida como ldquoEloquentia vel solertia amp aptitudo oratoriardquo 932 (Eloquecircncia ou

soleacutercia amp aptidatildeo oratoacuteria) e assim definida ldquoEst igitur aptitudo iudicium amp

solertia oratoris hoc est ipsa Eloquẽtia appositegrave applicans in oratione omnes formas

dicendirdquo (ldquoEacute pois Deinotēs aptidatildeo juiacutezo e soleacutercia do orador isto eacute a proacutepria

Eloquecircncia sendo convenientemente aplicada no discurso a todas as formas de

dizerrdquo)933

No avesso que faz o vitupeacuterio conforme Johannes Sturm e Gaspar Laurent

ciceroneamente figura-se o orador inepto Para o primeiro

Ineptus autem dicitur qui nihil facit in loco nihil in tempore aut se

ostentat aut plura loquitur aut eorũ quibus cum versatur uel cotildemodi

uel dignitatis nullatilde rationẽ habet aut denique in aliqua re uel

inconcinnus uel multus est quẽ ἀπρεπῆ nominare notilde possumus

siquidẽ εὐπρέπεια est solugravem honestatis nec etiatilde ἀνάρμοστο rectegrave

dicitur quoniam εὐαρμοστία solũ ordinis est neq ἄτοπον dicere

debemus quia eius contrariũ non est ἔντοπος sed []934

De fato diz-se inepto quem nada compotildee no lugar certo nada compotildee

931 Idem p 149 932 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 451 933 Cf ldquoIn Hermogenis tractatvm de ideis sive de formis eloqventiaelig Gasparis Laurentij commentariusrdquo

in Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 180 934 Cf ldquoIoannis Sturmii Scholae in Librum I De formis orationum seu dicendi generibusrdquo in Hermogenis

Tarsensis rhetoris acutissimi De dicendi generibus siue formis orationum libri II Latinitate donati amp

scholis explicati atque illustrati a Ioan Sturmio Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo ad annos octo

Excudebat Iosias Rihelis MDLXXI p 371

305

no momento apropriado [quem] ldquoou se exiberdquo ldquoou fala demaisrdquo ldquoou

natildeo leva em nenhuma conta a comodidade ou a posiccedilatildeo daqueles com

quem se encontra ou enfim eacute em algum caso deselegante ou

exageradordquo Quem natildeo podemos denominar aprepēs [inconveniente]

se decerto euprepeia [conveniecircncia] eacute relativa apenas agrave honestidade

nem tambeacutem anarmostos [desproporcionado] se diz corretamente

porque euarmostia [justa proporccedilatildeo] eacute relativa apenas agrave ordenaccedilatildeo

Nem atopon [deslocado] devemos dizer porque o contraacuterio de inepto

natildeo eacute entopos [bem posto] mas deinos []935

Para o segundo

Ei qui dicitur solers aptus industrius opponitur a Cicerone

Ineptus is qui non videt quid tempus postulet aut eorum quibuscum

versatur rationem non habet qui denique vitio laborat Cacozelię

[]936

Agravequele que se diz Deinos solerte apto industrioso opotildee-se em

Ciacutecero o Inepto ldquoaquele que natildeo percebe o que exige a ocasiatildeordquo ou

935 Traduccedilatildeo nossa Os trechos entre aspas provecircm do De oratore (CIC De or II 17) Incorporo agrave minha

traduccedilatildeo dos comentaacuterios a versatildeo de Adriano Scatolin ao passo do diaacutelogo Haacute divergecircncias poucas no

texto latino porque a liccedilatildeo de Ciacutecero fornecida por Johannes Sturm difere pontualmente da liccedilatildeo do De

oratore que hoje se aceita Portanto fiz ajustes oportunos no texto de Scatolin Para comparaccedilotildees o trecho

do diaacutelogo de que provecircm as citaccedilotildees eacute este e seguem sem o itaacutelico os passos empregados pelo tradutor e

comentador seiscentista de Hermoacutegenes ldquoquem enim nos ineptum vocamus is mihi videtur ab hoc nomen

habere ductum quod non sit aptus idque in sermonis nostri consuetudine perlate patet nam qui aut tempus

quid postulet non videt aut plura loquitur aut se ostentat aut eorum quibuscum versatur vel dignitatis vel

commodi rationem non habet aut denique in aliquo genere aut inconcinnus aut multus est is ineptus esse

diciturrdquo Na traduccedilatildeo de Scatolin sem alteraccedilotildees lecirc-se ldquode fato aquele a quem chamamos de inoportuno parece-me receber essa denominaccedilatildeo do fato de natildeo ser oportuno e isso fica muito claro no uso da liacutengua

latina pois aquele que natildeo percebe o que exige a ocasiatildeo fala demais exibe-se natildeo leva em conta a posiccedilatildeo

ou a comodidade daqueles com quem se encontra ou enfim eacute em alguma situaccedilatildeo deselegante ou

exagerado a esse daacute-se o nome de inorportunordquo Note-se estatildeo em itaacutelico na versatildeo em liacutengua portuguesa

os passos citados Adriano Scatolin traduz ldquoaptusrdquo por ldquooportunordquo e ldquoineptusrdquo por ldquoinoportunordquo cf

SCATOLIN A A invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23 Satildeo Paulo

[FFLCH-USP] 2009 [tese de doutorado] p 198 936 Cf ldquoIn Hermogenis tractatvm de ideis sive de formis eloqventiaelig Gasparis Laurentij commentariusrdquo

in Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 180

306

ldquonatildeo leva em conta aqueles com quem se encontrardquo 937 que em suma

cultiva o viacutecio da Cacozelia []938

Concordes Johannes Sturm e Gaspar Laurent na definiccedilatildeo da ineacutepcia em acepccedilatildeo

cara ao De oratore como contraparte viciosa da deinotēs como uso desconforme das

ideai tou logou Agrave guisa de exemplo lidos com esses comentadores o ldquoDiscurso

Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason

Denores contra le tragicomedie e le pastorali in un suo discorso di poesia de Giovanni

Battista Guarini e o Discorso di Iason Denores intorno a quersquo Principii Causae et

Accrescimenti che la Commedia la Tragedia et il Poema Heroico Ricevono dalla

Filosofia Morale amp Ciuile amp darsquo Gouernatori delle Republiche de Giason Denores

compotildeem-se os dois primeiros para evidenciar a aptidatildeo o juiacutezo a soleacutercia a eloquecircncia

e a congruecircncia de Gabriel Pereira de Castro e de Giovanni Battista Guarini ao passo que

o derradeiro faz-se de modo a sustentar a ineacutepcia do poeta italiano A ineacutepcia que enforma

o monstro

Esta ineacutepcia Gaspar Laurent pensa-a em latim como Cacozelia Vale rememorar

que a noccedilatildeo jaacute vista e entrevista se cruza no Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima

com a definiccedilatildeo de kakozēlon tal como normatizada por Quintiliano na Institutio

oratoria eacute ldquomala adfectatio per omne dicendi genus peccatrdquo ou seja ldquomaacute afetaccedilatildeo peca

em todo gecircnero de discursordquo (QUINT VIII 3 56-58) Nesse sentido Gaspar Laurent natildeo

lecirc kakozēlon como Natale Conti agrave luz de Demeacutetrio Mais de Johannes Sturm pende o

que seja e o que natildeo seja deinos e ineptus o contraponto virtuoso e vicioso no trato com

as ideai Deve-se ressaltar que se nessa distinccedilatildeo o comentador busca discernir deinotēs

de euprepeia propondo natildeo ser aprepēs o ineptus por natildeo incorrer no viacutecio da

desonestidade isso natildeo supotildee afastar da deinotēs os valores semacircnticos do decorum 939

Eacute o que se aprende com as Scholae de Johannes Sturm agrave traduccedilatildeo para o latim do Peri

staseōn de 1570 segundo as quais ldquooportet omnia ista decore facere quod decorum

937 Como se pode aventar os passos satildeo citaccedilotildees do De oratore (CIC De or II 17) No primeiro caso

Gaspar Laurent propotildee ldquonon videt quid tempus postuletrdquo em vez de ldquotempus quid postulet non videtrdquo No segundo caso natildeo reordena as palavras mas recolhe um excerto da fala de Crasso cf SCATOLIN A A

invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23 Satildeo Paulo [FFLCH-USP]

2009 [tese de doutorado] p 198 938 Traduccedilatildeo nossa 939 Os termos ldquoεὐπρέπειαrdquo ldquoἀπρέπειαrdquo e ldquoἀπρεπήςrdquo emprega-os Platatildeo no Fedro em relaccedilatildeo agraves

conveniecircncias e inconveniecircncias da escrita (cf PLAT Phaedr 274 b) PLATAtildeO Fedro Φαῖδρος 3ordf ed

revisada e biliacutengue Beleacutem edufpa 2011 pp 180-181

307

uocatur rdquo ou seja ldquoconveacutem compocirc-las [sc as demais seis ideai] decorosamente

porque deinotēs denomina-se decorordquo940 Trata-se soluccedilatildeo tradutoacuteria iterada mais de

cinquenta anos depois no tratado DellrsquoArte di Predicar Bene de Paolo Aresi

[] il Decoro [] egrave chiamato da alcuni altri Grauitagrave in greco

che vuol dire ancora diligenza giudicio acutezza drsquoingegno

industria e si prende per la facoltagrave ouer arte del dire in somma

consiste questa in saper seruisi di tutte le passate forme secondo che

richiede la materia il tempo amp altre simili circonstanze che dichiamo

noi comunemente osseruarrsquo il decoro941

[] O Decoro [] eacute chamado por alguns outros Gravidade em grego

Deinotēs que quer dizer ainda diligecircncia juiacutezo agudeza de engenho

induacutestria e se vincula agrave faculdade ou arte de dizer em suma esta

consiste em saber servir-se de todas as referidas formas segundo o que

reivindica a mateacuteria o tempo e outras circunstacircncias similares que

dizemos noacutes comumente observar o decoro942

Antes de Johannes Sturm registra-se no De Oratione Libri Septem de Antocircnio

Lulio impresso na Basileia em 1558 escolha semelhante943 Mostra-o Pierre Laurens

Gerard Joannes Vossius diferentemente dos demais letrados afirma ser melhor

interpretar deinotēs como ldquodicendi visrdquo do que como ldquoapta gravitasrdquo escolha esta que

940 Cf Hermogenis Tarsensis rhetoris acutissimi Partitionum Rhetoricarum liber unus qui vulgograve de

Statibus inscribitur Latinitate donatus amp Scholis explicatus atque illustratus a Ioanne Sturmio Cum

Gratia amp Priuilegio Caesareo ad annos octo Excudebat Iosias Rihelis MDLXX p 99 Cf PATTERSON

A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New Jersey Princeton University

Press 1970 p 67 941 Cf DellrsquoArte di predicar bene diuisa in due parti Nella quale oltre agraversquo precetti dersquo retori agrave questo proposito applicati di danno nuoue regole per tesserordinatamente vna predica con vn trattato della

memoria amp vnrsquoaltro della imitatione e con alcune osseruationi retoriche sopra vna predica in lode di S

Tomaso dAquino DI MONSIG PAOLO ARESI PARTE SECONDAhellip In MIL Per Gio Batt Bidelli

1627 p 199 942 Traduccedilatildeo nossa 943 Cf Antonii Lulli Balearis de Oratione Libri Septem Quibus non modograve Hermogenes ipse totus

uerumetiam quicquid feregrave agrave reliquis Graecis ac Latinis de Arte dicendi tratactũ est suis locis aptissimagrave

explicatur Accessit etiam locupletiss Rerum amp uerborum toto hoc Opere memorabilium Index Basileae

[ex officina Ioannis Oporini impensis Henrici Petri] [Anno Salutis humanae 1558] p 424 O passo da

obra foi autonomizado do restante da doutrina e editado no opuacutesculo LULIO A Sobre el decoro de la poeacutetica

Introduccioacuten edicioacuten traduccioacuten y notas de Antonio Sancho Royo Madrid Edicines Clasicas 1994

308

muito proximamente se vecirc do que jaacute se leu944

Assim como os demais usos do Peri ideōn deixam aventar considere-se um ou

outro discurso de poesia o leacutexico empregado por Jorge de Trebizonda para quem

deinotēs eacute grauitas por Johannes Sturm para quem eacute decorum (e tambeacutem eacute ou ldquoaptũ

grauiter amp cotildegruenterrdquo ou ldquoaptũ atq congruũ dicendi genusrdquo ou ldquoapta dicendi figurardquo)

por Gaspar Laurent para quem eacute Eloquentia (ou ldquoaptitudo iudicium amp solertia oratorisrdquo)

ou por Gerard Joannes Vossius para que eacute dicendi vis (o que eacute preferiacutevel a ldquoapta

gravitasrdquo) confere valores semacircnticos distintos amiuacutede discordantes por vezes

excludentes ao mesmo corpo de doutrina e distintos valores de uso que natildeo se podem

pensar senatildeo que na particularidade dos discursos das artes retoacutericas em uso

Encerre-se com um exemplo que espera ver o poema heroico e natildeo ver o monstro

Na praacutetica compositiva do gecircnero pensado como ldquopoesia leuantadardquo o emprego da

saphēneia e do megethos tal como normatizados por Hermoacutegenes eacute debatido nas

Risposte del Sig Horatio Ariosto ad alcuni luoghi del Dialogo dellrsquoEpica Poesia del S

Camillo Pellegrino nersquoquali si riprendeua lrsquoOrlando Furioso dellrsquoAriosto editadas em

1585 e reeditadas em 1586 em Ferrara Horaacutecio Ariosto (ca 1555-1593) que no

proecircmio deste texto se diz sobrinho-neto do poeta Ludovico Ariosto (1474-1533)945

escreve

Ma agrave mio credere tutto quello che si diragrave della sẽtenza amp elocutione

del Tasso in paragone dellrsquoAriosto e della sentenza amp elocutione

dellrsquoAriosto in paragine del Taszligo seragrave in uano amp un andarsi

raggirando senza frutto poi che se male si puograve far paragone di questi

scrittori nel fatto della fauola per hauer essi tenute strade diuerse

peggio si potragrave fare in queste due parti che fondamento dello stile nel

quale stile essi sono andati uie non solamente diuerse ma quasi anco

contrarie hauendosi lrsquouno chrsquoegrave lrsquoAriosto proposto di usar nel suo

poema il charattere ouero lrsquoIdea dello stile chiamata da Hermogene

944 Cf Gerardi Ioannis Vossi Commentariorum rhetoricorum sive oratoriarum institutionum Pars altera

Lugduni Batavorum Ex officina Ioannis Maire MDCXLIII [1643] p 512 cf LAURENS P ldquoPrefacerdquo in

HERMOGEgraveNE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon

Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 14 945 Cf ldquoper esser egli stato fratello di mio Auo fugrave mi gran ziordquo Cf ldquoIn Hermogenis tractatvm de ideis sive

de formis eloqventiaelig Gasparis Laurentij commentariusrdquo in Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et

Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii

Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno MDCXIV [1614] p 201

309

Diluciditagrave doue lrsquoaltro cioegrave il Tasso ha hauuto mira di servare lrsquoIdea

ograve forma dello stile Magnifico le quai due forme essendo poco meno

che dirittamente opposte chi non uede chrsquoegli egrave vanitagrave il farne

paragone p[er] cavar da loro poi maggior lode piugrave dellrsquouno che

dellrsquoaltro scrittore Ma che sia uero che queste due Idee di stile siano

cosi disimili ueggiamo di quai semplici si farsquol cotildeposto dellrsquouna e di

quai si faccia quello dellrsquoaltra Lo stile Grande e Magnifico se

crediamo ad Hermogene agrave Demetrio amp ad Aristotile stesso richiede le

sentenze o concetti che voglia chiamargli alti illustri ricercati con

studio raggirati e quasi in vn certo modo violẽti vuole lrsquoelocuzione

figurata massimamente per traslazioni accompagnate da epiteti usa i

nomi formati di nuovo composti peregrini hagrave il numero non rimesso

o molle ma chrsquoa uista ha un poco dellrsquoaspretto usa sempre la

comprehẽsione chrsquoegrave quella pregnezza di parole e di concetti dalli quai

cose tutte auuiene che questa forma di stile appar simile agrave punto ad

uno che cammini per vna via selvaggia e che passo passo troui

qualche intoppo o qualche resistenza Lo stile Dilucido dallrsquoaltra parte

si serue di sentenze aperte e piu tosto communi e famigliari che

altramente alle quali notilde egrave niente di sotto inteso niente drsquooscuro quanto

allrsquoelocutione vsa nomi proprij per piu schiva gli ambigui e non egrave

molto esquisitamente artificiosa e sopra tutto non egrave aspra il suo

numero egrave aszligai semplice lrsquoordine e la disposition sua si delle cose

come delle parole egrave distinta e scoperta Questo egrave lo stile dellrsquoAriosto

per lo piu e lrsquoaltro giagrave detto egrave per lo piu quel del Tasso onde si puograve

uedere quanto difficile e poco fondamento si possa far paragone tra

loro Ma perchrsquoio habbia detto che lo stile dellrsquoAriosto sia piugrave tosto da

porsi sotto la forma della Diluciditagrave che della Magnificenza non

uorrei perograve chrsquoaltri pensasse chrsquoegli foszlige tale che disconuenisse agrave

materia heroica perchegrave oltre che nersquo luoghi opportuni molto ben sa

lrsquoAriosto uestir la Magnificenza e pigliar la grandezza come per

essempio in tutto lrsquoabbattimẽto di Parigi egli poi anco non egrave senza

quegli ornamenti i quali parte proprij e parte participatigli dalla Idea

della Venustagrave (perchegrave si possono meschiare piu Idee o forme insieme)

della Venustagrave dico chiamata Eleganza da Demetrio lo rendono tale

quale sagrave il mondo che agrave questrsquohora e spero il medesimo anco

nellrsquoauuenire da lui troppo dolcemente allettato se nrsquoegrave rimaso quasi

310

ebro e fuor di segrave stesso il qual miracoloso effetto nasce dallrsquohauer egli

saputo al par drsquoognrsquoaltro trouare e trouata usar quella maniera

drsquooratione che si puograve dir carrattere di tutti i caratteri amp idea di tutte

le idee tanto lodata da Aristotele e da lui chiamata Decora946

Mas a meu crer tudo aquilo que se diraacute do pensamento amp da elocuccedilatildeo

de Tasso em paragone com os de Ariosto e do pensamento amp da

elocuccedilatildeo de Ariosto em paragone com os de Tasso seraacute em vatildeo amp um

perambular sem fruto porque se pode mal fazer o paragone desses

escritores na questatildeo da faacutebula por haverem ambos seguido estradas

diversas pior se poderaacute fazer nessas duas partes que satildeo fundamento

do estilo Nestes estilos eles tomaram vias natildeo somente diversas senatildeo

quase que contraacuterias tendo um que eacute Ariosto se proposto a usar em

seu poema o caraacuteter ou Ideia do estilo chamada por Hermoacutegenes

Clareza ao passo que outro isto eacute Tasso teve vistas de conservar a

Ideia ou forma do estilo Magniacutefico as duas formas sendo pouco menos

que diretamente opostas quem natildeo vecirc que eacute vanidade fazer o paragone

para extrair por elas em seguida maior louvor de um do que de outro

escritor Mas que seja verdadeiro que essas duas Ideias de estilo sejam

coisas dessemelhantes vejamos de quais simples se faz o composto de

uma e de quais se faz o de outra O estilo Grande e Magniacutefico se cremos

em Hermoacutegenes em Demeacutetrio amp em Aristoacuteteles semelhantemente

reivindica as sentenccedilas ou conceitos que se queiram chamar altos

ilustres refinados com estudo abundantes e de certo modo quase

violentos Quer a elocuccedilatildeo figurada maximamente por translaccedilotildees

acompanhadas de epiacutetetos usa os nomes formados do novo compostos

peregrinos Tem o ritmo natildeo remisso ou deacutebil mas que agrave vista tem um

pouco do aacutespero Usa sempre o periacuteodo que eacute aquela prenhez de

palavras e de conceitos de que tudo adveacutem que esta forma de estilo

parece de tal modo assemelhar-se agravequele que caminha por uma via

selvagem e que passo a passo encontra algum obstaacuteculo ou alguma

resistecircncia O estilo Claro por outra parte se serve de sentenccedilas

946 Apud Apologia del S Torquato Tasso in difesa della sua Gierusalemme liberata agli Accademici della

Crusca Con le acuse amp difese dellrsquoOrlando Furioso dellrsquoAriosto Et alcune lettere pareri amp Discorsi di

diuersi Auttori nel medesimo genere Di nuouo corretta amp ristampata Aggiontoni la risposta dellrsquoistesso

Tasso al Discorso del Lombardelli intorno agrave i constrasti della sua Gierusalẽme I titoli si leggono

nellrsquoottaua carta In Ferrara Ad instatildeza di G Vasalini Con licenza de i Superiori 1586 p 224-226

311

evidentes e antes comuns e familiares do que de outra sorte as quais

nada tecircm de subentendido nada de obscuro quanto agrave elocuccedilatildeo usa no

mais nome proacuteprios esquiva-se dos ambiacuteguos e natildeo eacute muito

refinadamente artificiosa e sobretudo natildeo eacute aacutespera o seu ritmo eacute

bastante simples a ordem e a sua disposiccedilatildeo tanto das coisas como das

palavras eacute distinta e descoberta Este eacute no mais o estilo de Ariosto e o

outro jaacute dito eacute no mais o de Tasso donde se pode ver quatildeo difiacutecil e

pouco fundamentado seja fazer o paragone entre eles Mas porque eu

havia dito que o estilo de Ariosto seja antes para pocircr-se sob a forma da

Clareza que sob a da Magnificecircncia natildeo gostaria todavia que outros

pensassem que ele fosse tal que desconviesse agrave mateacuteria heroica porque

natildeo soacute nos lugares oportunos muito bem sabe Ariosto vestir a

Magnificecircncia e tomar a grandeza como por exemplo em todo o cerco

de Paris senatildeo ele tambeacutem natildeo carece daqueles ornamentos que em

parte proacuteprios em parte participantes da Ideia de Beleza (porque se

podem misturar mais Ideias ou mesmo formas) da Beleza digo

chamada Elegacircncia por Demeacutetrio o tornam tal como sabe o mundo que

a esta hora e espero o mesmo tambeacutem no futuro eacute por ele muito

docemente atraiacutedo se natildeo quase embriagado e fora de si Este

miraculoso efeito nasce de ter ele sabido tanto encontrar todas as outras

[ideias] como tendo-as encontrado usar aquela maneira de discurso

que se pode dizer caraacuteter de todos os caracteres tatildeo louvada por

Aristoacuteteles e por ele chamada Decoro947

De acordo com Horaacutecio Ariosto o paragone entre a Gerusalemme liberata e o

Orlando Furioso natildeo haacute Natildeo haacute nem pode haver porque como compostos ambos os

poemas segundo ldquodue formerdquo distintas devam ser lidos segundo criteacuterios de ajuizamento

semelhantemente distintos Trata-se de pressuposto defendido por Giovanni Battista

Guarini natildeo deve ler Giason Denores Il Pastor Fido agrave luz do que natildeo eacute Para o apologista

antes claro que grandioso o stile do poema de Ludovico Ariosto eacute decorrente do uso

ciente daquela ldquomaniera drsquooratione che si puograve dir carrattere di tutti i caratteri amp idea

di tutte le idee tanto lodata da Aristotele e da lui chiamata Decorardquo (ldquomaneira de

discurso que se pode dizer caraacuteter de todos os caracteres amp ideia de todas as ideias tanto

947 Traduccedilatildeo nossa

312

louvada por Aristoacutetetes e por ele chamada Decorordquo) Ou seja leitor da preceptiva de

Hermoacutegenes como Johannes Sturm Horaacutecio Ariosto entende deinotēs como decoro e

enaltece o Orlando Furioso pela harmoniosa mistura das ideai que fazem o todo Bem

acomodado agraves razotildees nas razotildees do elogio natildeo eacute figura monstruosa948

948 Cf PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New Jersey

Princeton University Press 1970 pp 180-182 cf LAURENS P ldquoPrefacerdquo in HERMOGEgraveNE LrsquoArt

rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme

1997 p 19

313

EPIacuteLOGO

Agrave semelhanccedila do que jaacute disse Joatildeo Adolfo Hansen de Aristoacuteteles Hermoacutegenes eacute

nome plural neste trabalho natildeo haacute Hermoacutegenes o Sofista natildeo haacute Hermoacutegenes o Retor

natildeo haacute Hermoacutegenes cujas ideias estejam deslocadas e sejam atopicamente improacuteprias aos

gostos nacionais como gregas entre vozes e escritos italianos espanhoacuteis ou portugueses

nem haacute ideias ubiacutequas universais porque Ideias haacute usos oportunos e discursivamente

circunstanciados de um corpo doutrinaacuterio autorizado pelo costume e atualizado por

letrados eruditos tratadistas e poetas entre os seacuteculos XV e XVIII Esses usos definidos

finitos particulares eacute que interessam quando interessam os coacutedigos que prescrevem a

poesia que desconhece a ldquoliteraturardquo o ldquorenascimentordquo e o ldquobarrocordquo usos que o

hexacircmetro mnemocircnico latino pode indagar ldquoQuis quid ubi quibus auxiliis cur

quomodo quandordquo949

Trata-se de indagaccedilatildeo que visa ao esboccedilo verossiacutemil das vertentes da recepccedilatildeo da

pluralidade dos agenciamentos do corpo retoacuterico atribuiacutedo a Hermoacutegenes que visa agrave

reconstituiccedilatildeo possiacutevel dos regimes que codificam as representaccedilotildees letradas entre os

seacuteculos XV e XVIII Supotildee-se que o estudo das leituras do Peri ideōn da circulaccedilatildeo da

doutrina das ideai de Hermoacutegenes e dos modos sempre no plural pelos quais se

atualizaram nos discursos como os tantos citados permita aprofundar a compreensatildeo dos

protocolos de produccedilatildeo e de destinaccedilatildeo da poesia produzida nesse tempo vernacular

latina latinizante helecircnica ou helenizante dramaacutetica narrativa ou mista eacutepica cocircmica

traacutegica etc Sobretudo mimeacutetica em termos aristoteacutelicos Permite pois pensar a

historicidade e a especificidade das praacuteticas de representaccedilatildeo e refratar compreensotildees

etapistas e substancialistas das artes No plural

O ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos e Il Verrato de Giovanni Battista

Guarini entre as obras e os autores referidos que preceituam o poema heroico ou a

tragicomeacutedia a partir de Hermoacutegenes natildeo apenas se enunciam em conformidade com a

autoridade do retor senatildeo tambeacutem encenam a movecircncia do leacutexico que interpreta a

949 Entenda-se Quem O quecirc Onde Por quais meios Por quecirc Como Quando cf DELEUZE G

Conversaccedilotildees Satildeo Paulo Editora 34 1992 p 37 Cf GOYET F Le sublime du ldquolieu communrdquo

Linvention rheacutetorique dans lrsquoAntiquiteacute et agrave la Renaissance Paris Honoreacute Champion 1996 pp 21-2

314

preceptiva grega e lhe reinstitui os efeitos e os sentidos agrave luz da doutrina retoacuterica em latim

fazendo falar as ideai com Ciacutecero com Quintiliano com a Retoacuterica a Herecircnio Ora em

consonacircncia com a tratadiacutestica de Hermoacutegenes devem-se ler Manuel de Galhegos e

Giovanni Battista Guarini como exempla das vigecircncias do Peri ideōn nas invenccedilotildees de

poesia quinhentista e seiscentista enfeixados com D Luiacutes de Goacutengora com Ludovico

Ariosto com Franccedilois Rabelais pode-se aventar com a numerosa porccedilatildeo de artiacutefices do

discurso misto construiacutedo em verso e em prosa mediante a complexidade das

modulaccedilotildees elocutivas das ideai dos matizes dos genera dicendi com vistas ao riso ou

natildeo segundo decoros especiacuteficos e habilmente calculados na variaccedilatildeo e na

copiosidade950

Ademais a movecircncia lexical deixa supor que natildeo haacute aleacutem do discurso epidiacutetico

a primazia de Jorge de Trebizonda na circulaccedilatildeo ocidental do corpo retoacuterico atribuiacutedo a

Hermoacutegenes visto que Hermoacutegenes natildeo haacute Haacute um nome que se faz que autoriza

doutrinas que distintos nomes gregos latinos e vernaacuteculos fizeram circular A circulaccedilatildeo

busca-se entrever por vertentes nunca rarefeitas nunca desbastadas mas pensadas em

aberturas muacuteltiplas ou seja com a ciecircncia das variaccedilotildees polissecircmicas parafraacutesticas

proliferantes das ideai conforme Johannes Sturm Francisco Porto Garpar Laurent

Antocircnio Bonfine Natale Conti Giulio Camillo Delminio Filiberto Campanile Antocircnio

Sebastiano Minturno Antocircnio Lulio Fernando de Herrera Juacutelio Cesar Escaliacutegero

Torquato Tasso Pedro Juan Nuntildeez Horaacutecio Ariosto Manuel de Galhegos Manuel Pires

de Almeida Jerocircnimo Soares Barbosa etc Logo mirando-se a presenccedila em terras

italianas portuguesas ou espanholas entre fins do seacuteculo XV e meados do XVIII da

preceptiva autorizada por Hermoacutegenes mira-se sobretudo a multiplidade dos valores de

uso da arte retoacuterica Multiplicidade dos mistos prescritos no Peri ideōn

950 Cf LAURENS P ldquoPrefacerdquo in HERMOGEgraveNE LArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale

introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 12

315

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS

Bibliografia primaacuteria

AGOSTINHO DE HIPONA ldquoAs ideias (de ideis)rdquo Discurso Satildeo Paulo n 40 pp 377-380 nov 2010

________ De diversis quaestionibus octoginta tribus (q XLVI) A Mutzenbecher (ed)

Corpus Christianorum Series Latina (CCSL) 44A

ALBERTI Leon Battista Da pintura Traduccedilatildeo Antonio da Silveira Mendonccedila Apresentaccedilatildeo Leon Kossovitch Campinas Editora da Unicamp 1992

APSINES Art rheacutetorique Problegravemes agrave faux-semblant Texte eacutetabli et traduit par M

Patillon Paris CUF 2002 AQUINO T de ldquoSuma Teoloacutegica Primeira Parte Questatildeo 15 Sobre as Ideiasrdquo Discurso

Satildeo Paulo n 40 pp 309-328 nov 2010

ARESI P DellrsquoArte di predicar bene diuisa in due parti Nella quale oltre agraversquo precetti dersquo retori agrave questo proposito applicati di danno nuoue regole per tesserordinatamente vna predica

con vn trattato della memoria amp vnrsquoaltro della imitatione e con alcune osseruationi retoriche

sopra vna predica in lode di S Tomaso dAquino DI MONSIG PAOLO ARESI PARTE

SECONDAhellip In MIL Per Gio Batt Bidelli 1627 ARISTOacuteTELES De anima Livros I II e III 2ordf ediccedilatildeo Apresentaccedilatildeo traduccedilatildeo e notas de

Maria Ceciacutelia Gomes dos Reis Satildeo Paulo Editora 34 2012

________ LrsquoEthica drsquoAristotele tradotta in lingua vulgare fiorentina et commentata per Bernardo Segni In Venegia MDL [1550]

________ Della Poetica di Francesco Patrici La Deca Disputata Nella quale e per

istoria e per ragioni e per autoritagrave dersquo grandi antichi si mostra la falsita et vi egrave aggiunto il

trimerone del medesimo in riposta alle oppositioni fatte dal signor Torquato Tasso al parer suo scritto in diffesa dellrsquoAriosto In Ferrara Per Vittorio Baldini Stampator Ducale 1586 Con

licenza de i Superiori

________ Poeacutetica Traduccedilatildeo de Eudoro de Souza 2ordf ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ars Poetica 1993 ________ Poetica drsquoAristotele uulgarizzata et sposta per Ludovico Castelvetro

Stampata in Vienna drsquoAustria per Gaspar Stainhofer lrsquoanno del Signore MD LXX [1570]

________ A Poetica de Aristoteles traduzida do Grego em Portuguez Lisboa Na Regia Officina Typografica Anno de MDCCLXXIX [1779] Com licenccedila da Real Meza Censoria

________ Retoacuterica Trad M Alexandre Juacutenior P F Alberto A N Pena Lisboa IN-

CM 1998

________ Rheacutetorique Texte eacutetabli et traduit par Meacutedeacuteric Dufour et Andreacute Wartelle Anotteacute par Andreacute Wartelle Paris Les Belles Lettres 1973

______ Sobre a geraccedilatildeo e corrupccedilatildeo Traduccedilatildeo e notas de Francisco Choratildeo Revisatildeo

cientiacutefica de Alberto Bernabeacute Pajares Lisboa IN-CM 2009 ASSIS M de Dom Casmurro Apresentaccedilatildeo de Paulo Franchetti Notas e comentaacuterios de

Leila Guenther Satildeo Paulo Ateliecirc 2010

BARBOSA A Dictionarium Lusitanico Latinum juxta seriem alphabeticam optimis

probatisq doctissimorum auctorum testimonijs perutili quadam expositione locupletatum cum Latini sermonis indice nec non libello uno aliquarum regionum civitatum oppidorum

fluviorum montium amp locorum quibus veteres uti solebant omnia in studiosae inventutis

gratiam amp usum collecta per Augustinum Barbosam Lusitanum Bracharae typis amp expensis Fructuosi Laurentij de Basto 1611

BARBUDA M M de Virginidos ou Vida da Virgem Senhora Nossa Poema Heroico

dedicado a Magestade da Rainha Dona Luiza Nossa Senhora por Manuel Mendes de Barbuda

316

amp Vasconcellos Lisboa Na Officina de Diogo Soares de Bulhoens 1667 Com todas as licenccedilas

necessaacuterias

BARRETO J F Micrologia camoniana Prefaacutecio de Aniacutebal Pinto de Castro leitura e integraccedilatildeo do texto de Luiacutes Fernando de Carvalho Dias e Fernando F Portugal Lisboa Imprensa

Nacional-Casa da Moeda 1982

BARROS J Grammatica da lingua Portuguesa Olyssippone Apud Lodiuicum Rotorigiũ

Typographum M D XL [1540] BEMBO P Gli Asolani di Messer Pietro Bembo [Impressi in Venetia nelle case dAldo

Romano 1505]

______ Les Azolains de Mon Seignevr Pierre Bembo de la nature Drsquoamour Traduictz ditalien en Franccedilois par Jean Martin Secretaire de Monseigneur le reverendiszligime Cardinal de

Lenoncourt A Paris pour Galiot du Preacute rueuml S Iacque agrave lrsquoenseigne de la Galere drsquoOr 1576

BOILEAU-DESPREAUX N Oeuvres de Nicolas Boileau Despreacuteaux Avec des

eacuteclaircissemens historiques donnez par lui-meme Nouvelle Edition revueuml corrigeacutee amp augmenteacutee par de diverses Remarques Enrichie de figures graveacutees par Bernard Picart le Romain Tome

Premier Amsterdam chez David Mortier MDCCXVIII Avec privilege

BLUTEAU R Vocabulario portuguez e latino aulico anatomico architectonico bellico botanico brasilico comico critico chimico dogmatico dialectico dendrologico ecclesiastico

etymologico economico florifero forense fructifero autorizado com exemplos dos melhores

escritores portugueses e latinos pelo padre D Raphael Bluteau Coimbra no Real Collegio das Artes da Companhia de Jesu Com todas as Licenccedilas necessaacuterias Anno Domini MDCCXIII

[1713]

BYRON G G Childe Harolds Pilgrimage Canto The Fourth By Lord Byron London

John Murray Albemarle-Street 1818 BYRON G G POPE A HUGO V Traducccedilotildees Poeticas de F J Pinheiro Guimaratildees

Bacharel em Sciencias Sociais e Juridicas Childe Harold e Sardanapalo de Lord Byron o Roubo

da Madeixa de Pope Hernani de Victor Hugo Rio de Janeiro Typographia Universal de Laemmert Rua dos Invalidos 61 B 1863

CAMOtildeES L Os Lusiadas de Luis de Camotildees Com Privilegio Real Impressos em Lisboa

com licenccedila da Sancta Inquisiccedilatildeo e do Ordinario em casa de Antonio Gotildeccedilaluez Impressor 1572 ______ Lusiadas de Luis de Camoens principe de los poetas de Espantildea Al Rey N S

Felipe IV El grande Comentadas por Manuel de Faria i Sousa Cavallero de la Orden de Christo

i de la Casa Real Tomos terceiro i quarto Antildeo 1639 Com privilegio En Madrid Por Iuan

Sanchez Impressor A costa de Pedro Coello mercador de libros ______ Rimas varias de Luis de Camoens priacutencipe de los poetas heroycos y liricos de

Espantildea Ofrecidas al muy ilustre sentildeor D Ivan da Sylva Marquez de Gouvea presidente del

Dezembargo do Paccedilo y mayordomo mayor de la Casa Real ampc Comentadas por Manuel de Faria Y Sousa Cavallero de la Orden de Christo Tomo I y II Que contienen la primera segunda

y la terceira Centuria de los Sonetos Lisboa Con Privilegio Real En la Imprenta de Theotonio

Damaso de Mello Impressor de la Casa Real Con todas las licencias necessarias Antildeo de 1685

______ Rhythmas de Lvis de Camoes divididas em cinco partes Dirigidas ao muito illustre senhor D Gonccedilalo Coutinho Impressas com licenccedila do supremo Conselho da geral

Inquisiccedilatildeo amp Ordinario Em Lisboa por Manvel de Lyra Anno de M D LXXXXV [1595] A custa

de Esteuatildeo Lopez mercador de libros CAMPANILE F LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile

secondo la Dotrina drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista

Sottile M DCVI [1606] Con Licenza dersquo Superiori CARDOSO J Dictionarium latino lusitanicum amp vice versa lusitanico latinu[m] cum

adagiorum fereacute omnium iuxta seriem alphabeticam perutili expositione ecclesiasticorum etiam

vocabulorum interpretatione noueacute omnia per Hieronymu[m] Cardosum Lusitanum congesta

recognita vero omnia per Sebast Stockhamerum Germanum Qui libellum etiam de propriis nominibus regionu[m] populorum illustrium virorum adiecit Conimbricae excussit Joan

Barrerius 1570

317

______ Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum adagiorum

fereacute omnium iuxta seriem alphabeticam perutili expositione per Hieronymum Cardosum

Lusitanum congesta recognita vero omnia per Sebast Stokhamerum Germanum Qui libellum etiam de propriis nominibus regionum populorum illustrium virorum adiecit Adhuc noui huic

ultimae impressioni adjuncti sunt varij loquendi modi ex praecipuis auctoribus decerpti

praesertim ex Marco Tullio Cicerone Olyssipone excussit Alexander de Syqueira expensis

Simonis Lopezij bybliopolae 1592 ______ Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum adagiorum

fere omnium iuxta seriem alphabeticam perutili expositione Ecclesiasticarum vocabulorum

interpretatione item de monetis ponderibus et mensuris ad presentem usum accommodatis per Hieronymum Cardosum lusitanum congesta recognita vero per Sebastianum Stokhamerum

germanum Qui libellum etiam de propijs nominibus regionum populorum illustrium virorum

fluviorum montium ac aliorum complurium nominum et rerum scitu dignarum historijs et

fabulis poeticis refertum in usum et gratiam lusitanicae pubis concinnavit et ex integro adiecit Adhuc noui huic ultimae impressioni adiuncti sunt varij loquendi modi ex praecipuis authoribus

decerpti praesertim ex Marco Tullio Cicerone Olyssipone excussit Antonius Alvares

typographus 1601 ______ Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum

adagiorum feregrave omnium juxta seriem alphabeticam perutili expositione Ecclesiasticarum [sic]

vocabulorum interpretatione item de monetis ponderibus et mensuris ad presentem usum accommodatis per Hieronymum Cardosum lusitanum congesta recognita vero omnia per

Sebastianum Stokhamerum germanum Qui libellum etiam de proprijs nominibus regionum

populorum illustrium virorum fluviorum historijs amp fabulis poeticis refertum in usum amp

gratiam lusitanicae pubis concinnavit amp ex integro adiecit Adhuc novi huic ultimae impressioni adjuncti sunt varij loquendi modi ex praecipuis auctoribus decerpti praesertim ex Marco Tullio

Cicerone nunc denuo amendarum colluvie qua scatebat diligenti lucubratione defaecatum

Ulyssipone ex officina Petri Crasbeeck 1613 ______ Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum adagiorum

feregrave omnium iuxta seriem alphabeticam perutili expositione amp Ecclesiasticorum vocabulorum

interpretatione item de monetis ponderibus amp mensuris ad praesentem usum accomodatis per Hieronymum Cardosum lusitanum congesta recognita vero omnia per Sebastianum

Stokhamerum germanum Qui libellum etiam de proprijs nominibus regionum populorum

illustrium virorum fluviorum montium ac aliorum complurium nominum amp rerum scitu

dignarum historijs amp fabulis poeticis refertum in usum amp gratiam lusitanicae pubis concinnavit amp ex integro adiecit Cui hac ultima editione praeter caetera hactenus alijs contenta in singulis

nominibus et verbis suae inflexiones appositae sunt in Dictionario lusitanico in latinum

sermonem converso multa singulari studio et diligentia addita cum varijs loquendi modis ex praecipuis auctoribus collectis aliaque ab innumeris pene erroribus non sine labore et studio

vindicata Ulyssipone Ex officina Petri Crasbeeck 1619

______ Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum

adagiorum fereacute omnium iuxta seriem alphabeticam perutili expositione amp Ecclesiasticarum vocabulorum interpretatione item de monetis ponderibus amp mensuris ad praesentem usum

accomodatis Hieronymum Cardosum lusitanum congesta recognita vero omnia per Sebastianum

Stokhamerum germanum Qui libellum etiam de proprijs nominibus regionum populorum illustrium virorum fluviorum montium ac aliorum complurium nominum amp rerum scitu

dignatum historijs amp fabulis poeticis refertum in usum amp gratiam lusitanicae pubis concinnavit

amp ex integro adiecit Cui hac ultima editione praeter caetera hactenus alijs contenta in singulis nominibus amp verbis suae inflexiones appositae sunt ac in Dictionario lusitanico in latinum

sermonem converso multa singulari studio amp diligentia addita cum varijs loquendi modis ex

praecipuis auctoribus collectis aliaque ab innumeris pene erroribus non sine labore amp studio

vindicata Ulyssipone ex officina Petri Craesbeeck 1630 ______ Dictionarium latino lusitanicum et lusitanico latinum cum aliquorum

adagiorum et humaniorum historiarum et fabularun perutile expositione item de Vocibus

Ecclesiasticis de ponderibus et mensuris et aliquibus loquendi modis pueris accommodatis per

318

Hieronymum Cardozum lusitanum Quod in hac ultima editione multis nominibus auctum et aacute

pluribus erroribus ijsque turpissimis quibus vel typographum incuriacirc vel correctorum maximacirc

negligentiacirc abundabat expurgatum in lucem damus Ulyssipone ex officina Laurentij de Anveres a custa de Domingos Carneiro mercador de livros 1643

______ Dictionarium latino lusitanicum et lusitanico latinum cum aliquorum

Adagiorum et humaniorum historiarum et fabularum perutili exposition item de Vocibus

Ecclesiasticis de Ponderibus et mensuris et aliquibus loquendi modis pueris accomodatis per Hieronimum Cardozum lusitanum Quod in hac ultima editione multis nominibus auctum et agrave

pluribus erroribus ijsque turpissimis quibus vel typographum incuriacirc vel correctorum maximaacute

negligentiagrave abundabat expurgatum in lucem damus Ulyssipone ex officina amp sumptibus Antonij Craesbeeck agrave Mello serenissimi principi typographi 1677

______ Hieronymi Cardosi Dictionarium latino-lusitanicum et lusitanico-latinum

quanta maxima fide ac diligentiagrave accuratissimegrave expurgatum adjectis Dictionariolis de vocibus

ecclesiasticis de ponderibus numismatis amp mensuris cunctis accesserunt etiam concinni loquendi modi phrases amp adagia ex optimis authoribus decerpta item magna sylva nominum

propriorum amp appellativorum humaniorum historiarum populorum marium fluviorum

montium urbium ventorum syderum deorum etc Editio novissima in quagrave est itidem appositus Catalogus dictionariorum authorumque plurimorum qui tam de linguacirc latina quagravem de studiosis

notitijs pertractarunt omnibus grammatices professoribus perutilissimus Reverendissimo

Domino D Georgio Cornelio archiepiscopo Rhodiensi Ulyssipone typis amp sumptibus Dominici Carneiro trium Ordinum Militarium typographi 1694

______ Hieronymi Cardosi Lamacensis Dictionarium ex Lusitanico in latinum sermonem

Ulissypone ex officina Ioannis Aluari 1562

CASCALAES F de Tablas poeticas del licenciado Francisco Cascales Dirigidas al Excelentiacutessimo Sentildeor D Francisco de Castro Conde de Castro Duque de Taurisano Virrey y

Capitaacuten general del Reyno de Sicilia Con privilegio En Murcia por Luis Beroacutes Antildeo de 1617

CASTELO BRANCO CAMILO A queda drsquoum anjo romance Lisboa Livraria de Campos Junior 1866

CASTILHO A F Tratado de metrificaccedilatildeo portugueza para em pouco tempo e ate sem

mestre se aprenderem a fazer versos de todas as medidas e composiccedilotildees obra aprovada pelo Conselho de Instrucccedilatildeo Publica do Reino para uso das escolas Auctor A F de Castilho

Presidente Honoraacuterio da Sociedade dos Amigos das Lettras e Artes em S Miguel Fundador das

escolas de Leitura repentina na mesma ilha etc etc etc Lisboa 1851

CASTRO G P Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S

Magestade pera Chanceler mograver do Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em

Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro

______ Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico de Gabriel Pereira de Castro do

Conselho de El Rey noszligo senhor [Sl sn 1642]

______ Ulyssea ou Lisboa Edificada Poema heroico composto pelo insigne doutor Gabriel Pereira de Castro corregedor que foy do Crime da Corte e nomeado por Sua Magestade

para Chanceller moacuter do Reyno de Portugal Offerecido a El Rey D Joam V Nosso Senhor Lisboa

Na Officina de Miguel Rodrigues Impressor do Senh Card Patriarc M DCC XLV [1745] Com as licenccedilas necessarias

______ Ulysseacutea ou Lisboa Edificada Poema heroico de Gabriel Pereira de Castro

Quarta ediccedilatildeo Lisboa na Typographia Rollandiana 1826 Com Licenccedila da Mesa do Desembargo do Paccedilo

______ Ulysseacutea ou Lisboa Edificada Poema heroico de Gabriel Pereira de Castro

Quarta ediccedilatildeo Lisboa na Typographia Rollandiana 1827 Com Licenccedila Vende-se em casa de

Rolland Rua Nova dos Martyres N 10 abaixo do Theatro de S Carlos ______ Ulisseia ou Lisboa edificada Texto estabelecido e comentado por J A

Segurado e Campos Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 2000

319

CATULO O livro de Catulo Traduccedilatildeo introduccedilatildeo e notas de Joatildeo Angelo Oliva Neto Satildeo

Paulo Edusp 1996

CICERO De lrsquoinvention Texte eacutetabli et traduit par Guy Achard Paris Les Belles Lettres 1994

________ De lrsquoorateur Livre III Texte eacutetabli par Henri Bornecque et traduit par Edmond

Courbaud Paris Les Belles Lettres 1930

________ De re publica De legibus Translated by Clinton Walker Keyes Cambridge Harvard University Press 1988

________ Em defesa do poeta Aacuterquias Introduccedilatildeo traduccedilatildeo e notas de Maria Isabel

Rebelo Gonccedilalves Lisboa Editorial Inqueacuterito 1986 ________ Livro dos oficios de Marco Tullio Ciceram o qual tornou em linguagem o

Infante D Pedro duque de Coimbra Ediccedilatildeo critica segundo o MS de Madrid prefaciada

anotada e acompanhada de glossaacuterio por Joseph M Piel Coimbra 1948

________ Lrsquoorateur Du meilleur genre drsquoorateur Texte eacutetabli et traduit par Albert Yon Paris Les Belles Lettres 1964

________ M T Ciceronis ad Marcum Brutum Orator cum Victoris Pisani Patritij Veneti

commentario Lvgdvni Apud Seb Gryphivm 1536 ________ Topica Edited with a translation introduction and commentary by Tobias

Reinhardt Oxford Oxford University Press 2005

COMANINI G Il Figino overo del fine della pittura Dialogo del Rever Padre D Gregorio Comanini Canonico Regolare Lateranense Ove quistionandosi sersquol fine della pittura

sia lrsquoutile overo il diletto si tratta dellrsquouso di quella nel Christianesimo Et si mostra qual sia

imitator piugrave perfetto amp che piugrave diletti il Pittore ouero il Poeta In Mantova Per Francesco

Osanna Stampator Ducale MDLXXXXI [1591] Continentur hoc volumine Georgii Trapezuntii Rhetoricorum libri V Consulti Chirii

Fortunatiani libri III Aquilae Romani de figuris sententiarum amp elocutionis liber P Rutilii Lupi

earundem figurarum e Gorgia liber Artistotelis rhetoricorum ad Theodecten Georgio Trapezuntio interprete libri III Eiusdem rhetorices ad Alexandrum a Francisco Philelpho in Latinum uersae

liber Paraphrasis rhetoricae Hermogenis ex Hilarionis monachi Veronensis traductione

Priscianus de rhetoricae praeexercitamentis ex Hermogene Aphthonii declamatoris rhetorica progymnasmata Io Maria Catanaeo tralatore Venetiis in aedibus Aldi et Andreae Asulani

soceri 1523

CONSULTI FORTUNATIANI Ars rhetorica Introduzione edizione critica traduzione

italiana e commento a cura di Lucia Calboli Montefusco Bologna Pagravetron Editore 1979 COVARRUBIAS OROZCO S Tesoro de la Lengva Castellana o Espantildeola Compvesto por

el licenciado D Sebastian de Cobarruuias Orozco Capelan de su Magestade Mastrescuela y

Canonigo de santa Iglesia de Cuenca y consultor del santo Oficio de la Inquisicion Dirigido a la Magestad Catolica del Rey Don Felipe III nestro sentildeor Con Privilegio En Madrid por Luis

Sanchez impressor del Rey N S Antildeo del Sentildeor M DC XI [1611]

DANTE ALIGHIERI Dante con le espositioni di Christoforo Landino et Alessandro

Vellutello Sopra le sua Comedia dellrsquoInferno del Purgatorio amp del Paradiso Con Tauole Argomenti Allegorie amp riformato riueduto amp ridotto alla sua uera Lettura con Francesco

Sansovino Fiorentino In Venetia Apresso Giambattista Marchio Sessa amp Fratelli 1578

DEacuteMEacuteTRIOS Du style Texte eacutetabli et traduit par Pierre Chiron Paris CUF 1993 DEacuteMEacuteTRIO Sobre el estilo lsquoLONGINOrsquo Sobre lo sublime Introduccioacuten traducioacuten y notas

de Joseacute Garciacutea Loacutepez Madrid Editorial Gredos 1979

DEMOSTHENES A oraccedilatildeo da coroa Versatildeo no original grego precedida de um estudo sobre a civilisaccedilatildeo da Grecia por J M Latino Coelho Segunda ediccedilatildeo da Academia Real das

Sciencias de Lisboa Lisboa Typographia da Academia 1880

DENORES G Discorso di Iason Denores intorno a quersquo Principii Causae et

Accrescimenti che la Commedia la Tragedia et il Poema Heroico Ricevono dalla Filosofia Morale amp Ciuile amp darsquo Gouernatori delle RepublicheAllIlustrissimo et Molto Reverendo

Signor Abbate Galeazzo Riario Con Priuilegio In Padova Apresso Paulo Meieto 1587

320

Diccionario de la lengua castellana en que se explica el verdadero sentido de las voces

su naturaleza y calidad con las phrases o modos de hablar los proverbios o refranes y otras

cosas convenientes al uso de la lengua [] Compuesto por la Real Academia Espantildeola Tomo primero Que contiene las letras AB Madrid Imprenta de Francisco del Hierro 1729

DIONIacuteSIO DE HALICARNASSO Tratado da imitaccedilatildeo Editado por Raul Miguel Rosado

Fernandes Lisboa IN-CM 1986

______ The critical essays With an English translation by Stephen Usher Cambridge Harvard University Press 1974 2 vols

DRYDEN J Drydenrsquos Essays Introduction by W H Hudson London New York J M

DENT amp SONS LTD 1954 Encyclopeacutedie ou dictionnaire raisonneacute des sciences des arts et des meacutetiers par une

socieacuteteacute de gens de lettres Mis en ordre et publieacute par M Tome seizieme TEA-VENERIE A

Neufchastel chez Samuel Faulche amp Compagnie Libraires amp Imprimeurs [1765]

ESCALIGERO J C Iuli Caesaris Scaligeri uiri Poetices libri septem Ad Syluium Filium [Lyon] Apud Antonium Vincentium 1561

FAJARDO D S Idea de un Principe politico Christiano representada en cien Empresas

Dedicada al Principe de Las Espantildeas nuestro Sentildeor por Don Diego Saavedra Fajardo En Monaco en la emprenta de Nicolao Eurico 1640

FERREIRA F L Nova Arte de Conceitos que com o titulo de Licccedilotildees Academicas Na

Publica Academia dos Anonymos de Lisboa dictava e explicava o Beneficiado Francisco Leytam Ferreyra Academico Anonymo Primeyra Parte dedicada ao Senhor D Carlos de Noronha

Primogenito do Excellentissimo Senhor Dom Miguel De Noronha Conde de Valladares ampc

Lisboa Occidental na Officina de Antoacutenio Pedrozo Galram Com todas as licenccedilas necessaacuterias

Anno de 1718 A custa de Miguel Rodriguez Mercador de Livros aacutes portas de Santa Catharina ______ Nova Arte de Conceitos que com o titulo de Licccedilotildees Academicas Na Publica

Academia dos Anonymos de Lisboa dictava e explicava o Beneficiado Francisco Leytam

Ferreyra Academico Anonymo Segunda Parte dedicada ao Senhor D Thomas de Almeyda Primeyro Patriarca de Lisboa Occidental Capelaotilde-mor DrsquoEl Rey N Senhor amp do seu Conselho

de Estado ampc Lisboa Occidental na Officina de Antoacutenio Pedrozo Galram Com todas as

licenccedilas necessaacuterias Anno de 1721 A custa de Miguel Rodrigues Mercador de Livros agraves portas de Santa Catharina

FOLQMAN C Diccionario portuguez e latino no qual as dicccedilotildees e frazes da lingua

portugueza e as suas variantes significaccedilotildees genuinas e metaforicas se achatildeo clara e

distinctamente vertidas na latina e authorizadas com exemplos dos authores classicos compilado do vocabulario do reverendo padre D Rafael Bluteau e dos melhores diccionarios de

varias linguas Por Carlos Folqman Lisboa na Officina de Miguel Manescal da Costa

Impressor do Santo Officio 1755 FONSECA P J da Elementos de Poetica tirados de Aristoteles de Horacio e dos mais

celebres modernos Lisboa na Offic de Miguel Manescal da Costa Anno 1765 Com as licenccedilas

necessaacuterias

FREIRE F J Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire

Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellipFungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors

ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat in Poetic Lisboa

Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas necessarias

______ Diccionario poetico para o uso dos que principiaotilde a exercitarse na Poesia Portugueza Obra igualmente util ao orador principiante Seu author Candido Lusitano floriferis

ut apes in saltibus omnia libant Omnia nos itidem depascimur aurea dicta Aurea perpetua

semper dignissima vita Lucret 3 Tomo I Lisboa Offic Patriarcal de Francisco Luiz Ameno

MDCCLXV Com as licenccedilas necessarias Vende-se na portaria da Casa de N Senhora das Necessidades e na logea de Francisco Tavares livreiro ao Senhor da Boa Morte

GALHEGOS M de Gigantomachia de Manuel de Gallegos a don Antonio de Meneses en

Lisboa por Pedro Crasbeck an 1626

321

GARRETT A Da educaccedilatildeo Londres Sustenance e Stretch 1829

GIULIO CAMILLO Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp

ridotte in questa lingua per M Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce

da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo

Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine

M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini ______ Il secondo tomo dellrsquoopere di M di Giulio Camillo Delminio cioegrave La Topica

ouero dellrsquoElocutione Discorso sopra lrsquoIdee di Hermogene La Grammatica Espositione sopra

il primo amp secondo Sonetto del Petrarca Nvovamente dato in lvce Con privilegio In Venegia apresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLX [1560]

GOacuteNGORA Y ARGOTE L DE Faacutebula de Polifemo y Galatea 10ordf ed de Alexander A

Parker Madrid Catedra 2007

______ Lecciones solemnes a las obras de Don Luis de Gongora y Argote Pindaro Andaluz Principe de los poeta liricos de Espantildea Escrivialas Don Ioseph Pellicer de Salas y

Tovar Sentildeor de la Casa de Pellicer y Chronista de los Reinos de Castilla Dedicadas al

Serenissimo Sentildeor Cardenal Infante Don Fernando de Austria MDCXXX [1630] Con Priuilegio en Madrid En la Imprenta del Reino A costa de Pedro Coello Mercader de Libros

______ Obras completas edicioacuten de Juan Milleacute y Gimeacutenez Isabel Milleacute y Gimeacutenez

Madrid Aguillar 1967 GOacuteRGIAS Elogio de Helena e Tratado do natildeo-ente traduccedilatildeo do grego com introduccedilatildeo e

notas de Maria Ceciacutelia de Miranda Nogueira Coelho in Cadernos de Traduccedilatildeo no 4 Satildeo Paulo

Departamento de Filosofia USP 1999

GUARINI G B Il Pastor Fido Tragicomedia Pastorale di Battista Gvarini Dedicata al SerMO D Carlo Emanvele Dvca di Savoia ampc Nelle Reali Nozze di SA con la serma Infante

D Caterina dAvstria Con privilegi In Venetia Presso Gio Battista Bonfadino [1590]

______ El Pastor Fido Poeumlma de Baptista Guarino Traducido de Italiano en Metro Espantildeol y Ilustrado con Reflexiones por Dontildea Isabel Correa Dedicado agrave Don Manuel de

Belmonte Baron de Belmonte Conde Palatino y regente de Sua Magestad Catholica En

Amberez Por Henrico y Cornelio Verdussen Mercadores de Libros Antildeo M DC XCIV ______ O Pastor Fiel Tragi-comedia Pastoril do Cavalheiro Guarini Traduzida do

italiano por Thome Joaquim Gonzaga Lisboa Na Regia Officina Typografica Anno M DCC

LXXXIX Com a licenccedila da Real Meza da Comissatildeo Geral sobre o Exame e Censura dos

Livros ______ Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le

tragicomedie e le pastorali in un suo discorso di poesia Con privilegio In Ferrara Ad Instanza

di Alfonso Caraffa 1588 Con licenza dersquo Superiori GUERREIRO M do C Tratado da versificaccedilaotilde portugueza dividido em tres partes A

primeira conteacutem hum brevissimo Compendio das regras mais praticaveis da Metrificaccedilaotilde a

segunda hum amplissimo Diccionario de consoantes e a terceira Instrucccedilotildees para a perfeita

Poetica Offerecido ao Exmo Ermo Senhor D Domingos Joseph de Assis Mascarenhas Principal da Santa Igreja Patriarcal de Lisboa do Conselho de sua Magestade ampc ampc ampc Por seu author

Miguel do Couto Guerreiro Lisboa Na Of Patr de Francisco Luiz Ameno MDCCLXXXIV

[1784] Com licenccedila da Real Mesa Censoria GRACIAacuteN Y MORALES B Agudeza y arte de ingenio Edicioacuten introduccioacuten y notas

Evaristo Correa Calderoacuten Madrid Editorial Castalia 1987

GRANADA Fr Luis de Los seis libros de la rhetoacuterica eclesiaacutestica o la manera de predicar Madrid 1793

GRAVINA V Di Vicenzo Gravina giurisconsulto della ragion poetica libri due In Roma

presso Francesco Gonzaga MDCVIII Con Licenza dersquo Superiori

HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAge drsquoHomme 1997

______ Hermogenesrsquo on types of style Translated by Cecil W Wooten Chapel Hill

University of North Carolina Press 1987

322

______ Ωάῥά In hoc volumine haec continentur Ausonii [ie

Aphtonii] sophistaelig praeligludia Hermogenis Rhetorica In aeligdibus Philippi Iuntaelig 1515

______ Ω Hermogenis

De inuentione tomo qvatuor Parisiis Christianus Wechel sub scuto Basilensi in via Iacobea anno 1530

______ Ω Hermogenis De formis

orationum tomi duo Parisiis Excudebat Christianus Wechelus sub scuto Basilensi in via

Iacobea anno 1531

______ Ω Hermogenis De formis

orationum tomi duo Argentorati apud haeredes Vuendelini Rihelij Anno 1555

______ Hermogenis Rhetoris Ad Artem oratoriam praeexercitamenta Prisciano

interprete Norimbergae Petreius 1544 ______ Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica

precepta De inuentione libri quatuor De formis orationis tomi duo De methodo grauitatis siue

virtutis commode dicendi Aphtonii clarissimi Rhetoris praeexercitamenta Antonio Bonfine Asculano interprete Venetiis per Ioan Anto de Nicolinis de Sabio sumptu vero amp requisitione

D Melchioris sessae 1539

______ Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica

praecepta Aphtonii item sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud Petrum Pernam [1550]

______ Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis

orationum Libri II Latinitate donati amp scholis explicati atque illustrati A Ioan Stvrmio Cum Gratia amp Priuilegio Caeligsareo ad anno octo Excudebat Iosias Rihelius MDLXXI [1571]

______ Hermogenis Ars

Rhetorica Absolutissima Parisiis Excudebat Christianus Wechelus sub scuto Basilensi in via

Iacobea anno 1530

______ Hermogenis Ars

Rhetorica Absolutissima Parisiis In officina Christiani Wecheli sub scuto Basilensi in vico

Iacobeo Anno MDXXXVIII [1538]

______ Hermogenis Ars

Rhetorica Abolutissima Parisiis Apud Iacobum Bogardum sub insigne D Christophori egrave

regione gymnasij Cameracensium 1544

______ Hermogenis Ars

Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614]

______ Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices

magistri Francisci Porti Cretensis opera industriaacuteque illustrati atque expoliti Genevaelig apvd I

Crispinvm MDLXIX [1569]

______ Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz Montero Madrid Editorial Gredos 1993

HERRERA F de Anotaciones a la poesia de Garcilaso Edicioacuten de Inoria Pepe y Joseacute

Mariacutea Reyes Madrid Caacutetedra

HOLANDA F de Da pintura antiga Introduccedilatildeo notas e comentaacuterios de Joseacute da Felicidade Alves Lisboa Livros Horizonte 1984

HONORATO M C Compendio de rhetorica e poetica (4ordf ediccedilatildeo consideravelmente

augmentada) Adaptado ao programma do Imperial Collegio Pedro II pelo Conego Manuel da Costa Honorato Rio de Janeiro Typ Cosmopolita rua do Regente 31 1879

HORAacuteCIO Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por

Candido Lusitano Lisboa Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com

323

as licenccedilas necessaacuterias Vendese na logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros

onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D Henrique pelo mesmo Author

______ Arte poetica de Q Horacio Flaco traduzida em verso rimado e dedicada a memoria do Grande Augusto por D Ritta Clara Freyre de Andrade hellip Coimbra Na Regia

Officina da Universidade M DCCLXXXI [1781] Com licenccedila da Real Meza Censoria

______ Diuersas rimas de Vicente Espinel con el Arte Poetica y algunas Odas de

Oracio traduzidas en verso Castellano Madrid Por Luis Sanchez 1591 ______ In Epistolam Q Horatii Flacci De Arte Poeumltica Iasonis de Nores Ciprij ex

quotidianis Tryphonis Cabrielij sermonibus interpretatio Parisiis Apud uiduam Mauricij agrave Porta

in clauso Brunello sub signo D Claudij 1554 ______ Obras de Horacio principe dos poetas latinos lyricos com o entendimento

litteral amp construiccedilam Portuguesa ornadas de hum index copioso das historias amp fabulas

contiudas nelas Emendadas nesta vltima Impressam Lisboa Na Officina de Ioam da Costa M

DC LVVIII [1668] Com as licenccedilas neceszligarias ______ Paraphrase da Epistola aos Pisotildees commumente denominada Arte Poetica de

Quinto Horacio Flacco com annotaccedilotildees sobre muitos lugares por D Gastatildeo Fausto da Camara

Coutinho Bibliothecario da Bibliotheca da Marinha Lisboa Na Typographia de Joseacute Baptista Morando rua do Moinho de Vento nordm 59 1853

______ Q Horacio Flacco poeta lyrico latino Sus obras con la declaracion magistral

en lengua castellana por el Doctor Villen de Biedma Con Privilegio En Granada Por Sebastian de Mena Antildeo de 1599 A costa de Iuan Diez mercader de libros

JOAtildeO VASEU Ioannis Vasaei Brugensis Collectanea Rhetorices In gratiam eorum qui

grauioribus occupati disciplinis prolixiores ueterum cotildementarios euoluere non possunt

[Salmanticae Gonzalo de Castantildeeda] Anno M D XXXVIII [1538] JORGE DE TREBIZONDA Georgii Trapesuntii viri doctissimi atque eloquentissimi

Rhetoricorum liber primus In libraria Leonardi Pachel officina 1493

_____ Georgii Trapesuntii viri doctissimi atque eloquentissimi Rhetoricorum liber primus In libraria Leonardi Pachel officina 1493

_____ Georgij Trapezontij Dialectica octo tractatus continens Et hos omnes cum

scholijs Iacobi agrave Contreiras Eborensis Conimbricae Apud Ioannem Barrerium amp Ioanne[m] Aluarum M D LI [1551]

______ Georgii Trapezuntii Rhetoricorum libri in quibus quid recens praestitum

proxima facie indicabit liminaris epistola In Inclyta Basilea 1522

______ Georgii Trapezuntii Rhetoricorum libri quinque Indicem capitum ac rerum in hoc opere contentatum in calcem operis reiecimus Lvgdvni apvd Seb[astianum] Gryphivm 1547

______ Giorgii trapezuntii qui suis temporibus sopitam amp tantum non mortua

Eloquentiam suscitauit Ars Rhetorica nunc in gallia impressa Et oratoribus nostri maacutexime accommotada Parisiis apud Aegidium gourmontium qui in utraque liacutengua libros fidelissime

imprimendos curat

______ Georgii Trapezuntii Rhetoricorum libri quinque ad manu scriptum exemplar

diligentissimegrave repurgati Parisiis excudebat Christianus Wechelus sub scuto Basiliensi in uico Iacobeo Anno M D XXXII [1532]

______ Opus absolutissimum Rhetoricorum Georgii Trapezuntii cum additionibus

Herrariensis [Compluti] Impressum est in cocircplutensi academi in officina Arnaldi Guillelmi de Brocario 1511

______ Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In

Officina Christiani Wecheli M D XXXVIII [1538] ______ Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud

Ioannem Roigny uia ad D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538]

LEONARDO DA VINCI Trattato della pittura di Lionardo da Vinci Tratto da un codice

della Biblioteca Vaticana e dedicato alla maestagrave di Luigi XVIII Re di Francia e di Navarra Roma MDCCCXVIII [1817] Nella Stamperia de Romanis Con licenza dersquo Superiori

324

LOBO F R O Condestabre de Portugal D Nuno Alvres Pereira de Francisco Rodrigues

Lobo oferecido ao Duque dom Theodosio segundo deste nome Em Lisboa Com todas as

licenccedilas necessarias por Pedro Crasbeeck 16010 [ie 1610] LONGINO Dionigi Longino Retore DellrsquoAltezza del dire tradotto dal greco da D Niccolo

Pinelli In Padoua per Giulio Criuellari 1639 Con Licenza dersquo Superiori

LULIO A Antonii Lulli Balearis de Oratione Libri Septem Quibus non modograve

Hermogenes ipse totus uerumetiam quicquid feregrave agrave reliquis Graecis ac Latinis de Arte dicendi tratactũ est suis locis aptissimagrave explicatur Accessit etiam locupletiss Rerum amp uerborum toto

hoc Opere memorabilium Index Basileae [ex officina Ioannis Oporini impensis Henrici Petri]

[Anno Salutis humanae 1558] ______ Sobre el decoro de la poeacutetica Introduccioacuten edicioacuten traduccioacuten y notas de

Antonio Sancho Royo Madrid Edicines Clasicas 1994

LUZAacuteN I de La Poetica o reglas de la poesia en general y de sus principales especies

Por Don Ignacio de Luzan Claramunt de Suelves y Gurrea Entre los Academicos Ereinos de Palermo llamado Eligio Mepalino Con Licencia En Zaragoza Por Francisco Revilla vive en

la Calle de S Lorenzo Antildeo 1737

MACEDO A S de Vlyssipo Poema heroico De Antonio de Sousa de Macedo Com as licenccedilas necessarias Em Lisboa Por Antonio Aluarez Anno de 1640

MACHADO D B Bibliotheca Lusitana Historica Critica e Chronologica na qual se

comprehende a noticia dos authores Portuguezes e das Obras que compozeraotilde desde o tempo da promulgaccedilaotilde da Ley da Graccedila ateacute o tempo prezente offerecida agrave Augusta Magestade de D

Joaotilde V Nosso Senhor por Diogo Barbosa Machado Ulyssiponense Abbade da Parochial Igreja

de Santo Adriatildeo de Sever e Academico do Numero da Academia Real Tomo I Lisboa Occidental

Na Officina de Antonio Isidoro da Fonseca Anno de M DCC XXXXI Com todas as licenccedilas necessarias

______ Bibliotheca Lusitana Historica Critica e Chronologica na qual se

comprehende a noticia dos Authores Portuguezes e das Obras que compozeraotilde desde o tempo da promulgaccedilaotilde da Ley da Graccedila ateacute o tempo presente por Diogo Barbosa Machado

Ulyssiponense Abbade Reservatorio da Parochial Igreja de Santo Adriatildeo de Sever e Academico

do Numero da Academia Real Tomo III Lisboa Na Officina de Ignacio Rodrigues Anno de MDCCLII Com todas as licenccedilas necessarias

______ Bibliotheca Lusitana Historica Critica e Chronologica na qual se

comprehende a noticia dos Authores Portuguezes e das Obras que compozeram desde o tempo

da promulgaccedilaotilde da Ley da Graccedila ateacute o tempo presente por Diogo Barboza Machado Ulyssiponense Abbade Reservatorio da Paroquial Igreja de Santo Adriatildeo de Sever e Academico

do Numero da Academia Real Tomo IV que consta de muitos authores novamente collocados na

Bibliotheca e de outros illustrados e emendados impressos nos tres Tomos precedentes Lisboa Na Officina Patriarcal de Francisco Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas necessarias

MASCARENHAS B G Viriato tragico poema heroico em 20 cantos de Braz Garcia

Mascarenhas em dois volumes Lisboa na Phenix beco de Santa Martha nordm 123 1846

MEDRANO J de E Apologeacutetico en favor de Don Luis de Goacutengora Edicioacuten anotada de Luis Jaime Cisneros Lima Universidad de San Martiacuten de Porres 2005

MELLO F de P de S de Arte poeacutetica Apresentaccedilatildeo de Aniacutebal Pinto de Castro Introduccedilatildeo

ediccedilatildeo e notas de Antoacutenio Manuel Esteves Joaquim Lisboa Imprensa Nacional-Casa da Moeda 2005

______ Theatro da eloquencia ou Arte de rhetorica fundada nos preceitos dos melhores

Oradores Gregos e Latinos por Francisco de Pina de Saacute e de Mello Moccedilo Fidalgo da Casa de Sua Magestade Fidelissima e Academico da Academia Real da Historia Portuguesa

offerecida ao Reverendissimo Senhor Desembargador Joachim Salter de Mendoccedila Prior da

Collegiada de S Christovaotilde de Lisboa Juiz dos Cazamentos e Chanceller do Patriarcado ampc

ampc Por Antonio da Silva e Costa Lisboa Na officina de Francisco Borges de Sousa Anno de MDCCLXVI

______ Triumpho da Religiaotilde Poema Epico-Polemico que a Santidade do Papa

Benedicto XIV Dedica Francisco de e de Mello Moccedilo Fidalgo da Casa de Sua Majestade

325

Fidelissmo e Academico da Academia Real da Historia Portuguesa Coimbra Na Officina de

Antonio Simoens Ferreira impressor da Universidade Anno de 1756 Com todas as licenccedilas

necessarias MENANDRO EL REacuteTOR Dos tratados de retoacuterica epidiacutectica Introduccioacuten de Fernando

Gascoacute Traducioacuten y notas de Manuel Garciacutea y Joaquiacuten Gutiacuteerrez Calderoacuten Madrid Editorial

Gredos 1996

MEY A Norte de la Poesia Espantildeola Illustrado del sol de doze Comedias (que formam segunda parte) de Laureados Poetas Valencianos y de doze escogidas Loas y otras Rimas a

varios sugetos Sacado a luz aiustado con sus originales por Aurelio Mey Dirigido a Dontildea

Blanca Ladron y Cardona hija primogenita de Don Iayme Zeferino Ladron de Pallas Conde de Sinarcas Vizconde de Chelua Sentildeor de Beniarbech y Beniomer y Sentildeor de Payporta Antildeo 1616

Con privilegio Impreso en Valencia En la Impresion de Felipe Mey junto a S Iuan del Hospital

A costa de Iusepe Ferrer Mercader de libros delante la Diputacion

MINTURNO A S Antonii Sebastianii Minturni De poeta ad Hectorem Pignatellum Vibonensium Ducem Libri Sex Cum Priuilegijs Venetiis Ann MDLIX [1559]

______ LrsquoArte poetica del Sig Antonio Minturno nella quale si contengono i precetti

Heroici Tragici Comici Satyrici e drsquoogni altra Poesia Con la dottrina dersquo Sonetti canzoni et ogni sorte de Rime Thoscane dove srsquoinsegna il modo che tenne il Petrarca nelle sue opere Et si

dichiara arsquo suoi luoghi tutto quel che da Aristotele Horatio et altri autori Greci e Latini egrave stato

scritto per ammaestramento di Poeti Con le postille del dottor Valvassori non meno chiare che breui et due tavole lrsquouna dersquo capi principali lrsquoaltra di tutte le cose memorabile Con Privilegio

Per Gio Andrea Valvassori del MDLXIII [1563]

MONTESQUIEU C de S Conde de O gosto Traduccedilatildeo e posfaacutecio de Teixeira Coelho

Satildeo Paulo Iluminuras 2005 MURATORI L A Della forza della fantasia umana Tratado di Ludovico Muratori

Bibliotecario del Serenissimo Signor Duca di Modena In Venezia MDCCXLV [1745] Presso

Giambatista Pasquali Com Licenza Dersquo Superiori p 221 ______ Della perfetta poesia italiana spiegata e dimostrata con varie osservazioni da

Lodovico Antonio Muratori Tomo primo In Modena M DCCVI [1706] Nella Stampa di

Bartolomeo Soliani Con Lic dersquo Superiori NEBRIJA A de Antonii Nebrissensis VCL grammatici et regii chronograaphi

Dictionarium redivivum novissimegrave emendatum ac novis subinde accessionibus auctum

locupletatum hellip Opera et studio R P Fatr Ildephonsi Lopez de Rubinotildes Regii ac Militaris

Ordinis Beatae Mariae de Mercede Redemptionis Captiuorum Superiorum permissu Matriri apud Michaelem Escribano Typographum Anno MDCCLXXVIII [1778] Sumptibus Regiae

Societatis

______ Dictionarium Aelii Antonii Nebrissensis grammatici chronographi regii imo recens accessio facta ad quadruplex eiusdem antiqui dictionarij supplementum [hellip] Antildeo 1638

Cvm Priuilegio Regis Matriti Ex Typographia Regia Expensis Gabrielis agrave Leon Bibliopolaelig

______ Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum Aelio Antonio

Nebrissensi interprete nunc denuo ingenti vocum accessione locupletatum pristinoque nitori sublata mendarum colluuie restitutum Ad haec Dictionarium propriorum nominum ex

probatiszligimis Graecaelig amp Latinaelig linguaelig autoribus addita ad calcem neoterica locorum

appellatione concinnatum Antuerpiae In AEligdib Ioannis Steelij M D LX [1560] Cum Priuilegio Regis

______ Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum Aelio Antonio

Nebrissensi interprete nunc denuo ingenti vocum accessione locupletatum pristinoq nitori sublata mendarum colluuie restitutum Ad haec Dictionarium propriorum nominum ex

probatiszligimis Graecaelig amp Latinaelig linguaelig autoribus addita ad calcem neoterica locorum

appellatione concinnatum Antuerpiae In AEligdibus viduaelig amp haeligredum Ioannis Steelij M D LXX

[1570] Cum Priuilegio Regis NUNtildeEZ P J Pet Iohan Nunnesii valentini Institutionum rhetoricarum libri quinque

Editio tertia ceteris multo correctior et locupletior exemplis Barcinone ex typographia

Sebastiani agrave Cormellas An 1593

326

______ Tabulae institutionum rhetoricarum Petri Johannis Nunnesii Valentini Altera

editio multo accuratior priori Galenus in arte parua Methodus diuidendi quanto inferior est ea

quae sit per resolutionem dignitate amp methodo tanto superiorem inferior est ea quae sit per resolutionem dignitate amp methodo tanto superiorem illam comperiemus ad compendium totius

amp memoriam singulorum Barcinone excudebat Iacobus Cendrat Anno Domini 1588

PANIGAROLA F Il Predicatore di F Francesco Panigarola ouero Parafrase commento

e discorsi intorno al libro dellelocutione di Demetrio Falereo oue vengono i precetti e gli essempi del dire che giagrave furono dati a Greci ridotti chiaramente alla prattica del ben parlare in

prose italiane e la vana elocutione de gli autori profani accommodata alla sacra eloquenza de

nostri dicitori e scrittori ecclesiastici Con due tauole vna delle questioni e laltra delle cose piugrave notabili Venetia Bernardo Giunti Gio Battista Ciotti amp Compagni 1609

PEREIRA B Prosodia in vocabularium trilingue Latinum Lusitanicum amp Hispanicum

digesta authore Benedicto Pereyra fecit sumptus Dominicus Pereyra da Sylva Eborae

apud Emmanuelem Carvalho 1634 ______ Prosodia in vocabularium trilingue Latinum Lusitanicum amp Castellanicum

digesta authore Doctore P Benedicto Pereyra Societatis Iesu Cum facultate Inquisitorum

Ordinarij amp Regis Vlissipone Ex officina amp sumptibus Pauli Craesbeeck Anno Domini MDCLIII [1653]

______ Prosodia in vocabularium bilingue Latinum et Lusitanum digesta nona editio

Eborae cum facultacircte Superiocircrum ex Typographiacutea Acadeacutemiae Anno Doacutemini M DCC XXIII [1723]

______ Thesouro da lingoa portuguesa composto pelo Padre D Bento Pereyra da

Companhia de Iesu Portugues Borbano Lente que foy da primeira classe de Rhetorica em a

Vniversidade de Euora amp hoje o he da sagrada Theologia em a mesma Vniversidade Em Lisboa Com licenccedila da S Inquisiccedilam Ordinario amp del Rey Na officina de Paulo Craesbeeck amp agrave sua

custa Anno de 1647

PEREGRINI M Delle Acutezze che altrimenti spiriti vivezze e concetti volgarmente si appellano trattato del Sig Matteo Peregrini Bolognese di Teologia Filosofia e dellrsquouna e lrsquoaltra

Legge Dottore In questa seconda Impressione dallrsquoAutore riuiste e migliorate Allrsquo Illlustrissim

Sig Galleazzo Polti In Genoua amp in Bologna Presso Clemente Ferroni M DC XXXIX [1639] Con Licenza dersquo Superiori

PETRARCA F Cancioneiro Traduccedilatildeo de Joseacute Clemente Pozenato Satildeo Paulo Ateliecirc

Editorial Campinas Editora da Unicamp 2014

______ Le volgari opere del Petrarcha con la espositione di Alessandro Vellutello da Luca [Vinegia] MDXXV [1525]

PINCIANO A L Philosophia antigua poetica del doctor Alonso Lopez Pinciano Medico

Cesareo Dirigida al Conde Ihoanes Keuehiler de Aichelberg hellip En Madrid Por Thomas Junti M D XCVI [1596]

PLATAtildeO Dialoacutegos (Protaacutegoras Goacutergias O banquete Fedatildeo) Traduccedilatildeo de Carlos

Alberto Nunes Beleacutem Universidade Federal do Paraacute 1980

______ Fedro Φαῖδρος 3ordf ed revisada e biliacutengue Beleacutem edufpa 2011

POPE A Poemas Satildeo Paulo Nova Alexandria 1994 QUEVEDO F de Las tres musas ultimas castellanas de Don Francisco de Quevedo

Villegas Cavallero de la Orden de Santiago Sentildeor de la Villa de la Torre de Juan-Abad M

DC LXXI [1671]

______ Obras de D Francisco de Quevedo Villegas Cavallero de la Orden de Santiago Sentildeor de la Villa de la Torre de Juan Abad Dedicadas a la muy ilustre Academia de los

Deconfiados da la Excelentissima Ciudad de Barcelona Parte Primera Barcelona Por Jaime

Suriagrave 1702 ______ Obras propias y traducciones latinas griegas y Italianas Con la parafrasi de

algunos Psalmos y Capitulos de lob Sacadas de la libreriacutea de don Manuel Sarmiento de

Mendoccedila Canonigo de la Magistral de la santa Iglesia de Sevilla Dalas a la Impression don Francisco de Quebedo (sic) Villegas Imp del Reyno (Viuda de Luis Saacutenchez) A costa de

Domingo Gonccedilalez Madrid 1631

327

QUINTILIAN Institutio oratoria With an English translation by H E Butler Cambridge

Harvard University Press 1996 4 vols

______ Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos

que aprendem Ajuntaotilde-se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no

corpo destas Instituiccediloens por Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e

Poezia da Universidade de Coimbra Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura

dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta reis em papel

______ Institution oratoire Texte eacutetabli et traduit par Jean Cousin Paris Les Belles Lettres 1975-1980 7 vols

______ Lrsquoinstitutioni oratorie di Marco Fabio Quintiliano retore famosissimo tradotte

da Oratio Toscanella della famiglia di maestro Luca Fiorentino et arricchite dal medesimo della

dichiaratione de i luochi piugrave difficili in margine Di quattro Tauole che seruono a tutta lrsquoopera della vita dello autore et drsquoannotationi in lettere grandicelle delle cose piugrave importanti Con

privilegio In Venetia appresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLXVI [1566]

______ Marci Fabii Quintiliani Orationum Institutionum Libri Duodecim diligenter emendati 1518

______ M Fabii Quintiliani Rhetoris clarissimi de Institutione Oratoria ad Marcellum

Victorium libri XII Pariis Ex Officina Michaeumllis Vascosani in uia quae est ad D Iacobum sub fontis insigni M D XXII [1527]

______ M Fabii Quintiliani oratoriarum institutionum libri duodecim Summa diligentia

tum iudicio ad uenustiszligimorum quorũq exemplariorum fidem recogniti additis simul eiusdem

declamationib amp eruditiszligimis amp stylo sui periculum facturis utiliszligimis Eucharius Ceruicornus excudebat ANNO M D XXII [1527] mense avg

______ M Fabii Quintiliani oratoris eloquentissimi Instituonum oratoriarum Libri XII

incredibili cum studio tum iudicio ad fibem uenustissimi exemplaris recens iam recogniti Eiusdem Declamationum Liber Basileae ex aedibus Ioannis Bebelii Mense Augusto M D XXIX

[1529]

______ Marci Fabii Quintiliani Instituonum oratoriarum Libri XII Declamationum Liber eiusdem Lvgdvni Apud Seb Gryphivm 1536

______ Marci Fabii Quintiliani Instituonum oratoriarum Libri XII Declamationum

Liber eiusdem Lvgdvni Apud Seb Gryphivm 1540

______ M Fabii Quintiliani Instituonum oratoriarum libri duodecim Declamationum Liber eiusdem Summa diligentia ad finem uenustiszligimorum codicum recogniti ac restituti Cum

rerum uerborumq Indice locupletiszligimum Lvgdvni Apud Seb Gryphivm 1555

______ Quintilianus cum commento [Raphael Regius] Venetiis per Bonetum Locatellum 1506

RABE H Hermogenis Opera Leipzig Teubner 1913

RABELAIS F Tiers liure des faictz et dictz heroiques du noble Pantagruel composez par

M Franccedil Rabelais docteur en Medecine amp Calloier des Isles Hieres Lautheur susdict suplie les Lecteurs beneuoles soy reseruer a rire au soixante amp dixhuictiesme liure Nouuellemente

Imprimeacute agrave Paris Auec priuileige du Roy pour six ans 1546

RESENDE Andreacute de As antiguidades da Lusitacircnia Introduccedilatildeo traduccedilatildeo e comentaacuterio de Rauacutel Miguel Rosado Fernandes Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 1996

Retoacuterica a Herecircnio Trad Adriana Seabra e Ana Paula Celestino Faria Satildeo Paulo Hedra

2005 Rhetores in hoc volvmine habentvr hi Aphthonii Sophistaelig Progymnasmata Hermogenis

ars Rhetorica Aristotelis Rhetoricorum ad Theodecten libri tres Eiusdem Rhetorice ad

Alexandrum Eiusdem ars Poetica Sopatri Rhetoris quaeligstiones de compone[n]dis

declamationibus in causis praecipuaelig iudicialibus Cyri Sophistaelig differentiaelig statuum Dionysii Alicarnasĕi ars Rhetorica Demetrii Phalerĕi de interpretatione Alexandri Sophistaelig de figuris

sensus amp dictionis Adnotationes innominati de figuris Rhetoricis Menandri Rhetoris diuisio

328

causarum in genere demonstratiuo Aristeidis de ciuili oratione Eiusdem de simplici oratione

Apsini de arte Rhetorica praeligcepta Venetiis 1508

Rhetores Latini Minoris Ex Codibus Maximam Partem Primum Adhibitis Emandabat Carolus Halm Leipzig Teubner 1863

SABATIER DE CASTRES A Dictionnaire de Litteacuterature Dans lequel on traite de tout ce

qui a rapport agrave lEloquence agrave la Poeumlsie amp aux Belles-Lettres amp dans lequel on enseigne la

Marche amp les Reacutegles quon doit observer dans tous les Ouvrages desprit Par M LrsquoAbbeacute Antoine Sabatier de Castres Tome Troiseme A Paris chez Vincent Imprimeur- Libraire rue Saint

Severin MDCCLXX [1770] Avec Approbation amp Privileacutege du Roi

SALAS J A G de Nueva ideia de la tragedia antigua o Ilustracion ultima al libro singular De poetica de Aristoteles Estagirita por Don Iusepe Antonio Gonccedilalez de Salas En

Madrid Lo imprimio Franc Martinez Antildeo MDCXXXIII [1633]

SALINAS M Rhetorica en lengua castellana en la qual se pone muy en breue lo

necessario para saber bien hablary escrevir y conoscer quien habla y escrive bien Juan de Brocar 1541

SANCHO ROYO A Hermoacutegenes Sobre los tipos de estilo y Sobre el meacutetodo del tipo

Fueza Introduccioacuten traduccioacuten y notas Sevilla Secretariado de Publicaciones de la Universidad 1991

SEacuteNECA L A Cartas a Luciacutelio Traduccedilatildeo prefaacutecio e notas de Joseacute Antoacutenio Segurado e

Campos Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 2004 SILVA A M Diccionario da lingua portugueza composto pelo padre D Rafael Bluteau

reformado e acrescentado por Antonio de Moraes Silva natural do Rio de Janeiro Tomo

primeiro A-K Lisboa Na Officina de Simatildeo Thadeo Ferreira Anno M DCC LXXXIX [1789]

Com licenccedila da Real Meza da Comissatildeo Geral sobre o Exame e Censura dos Livros Vende-se na loja de Borel Borel e Companhia quase defronte da Igreja nova da Nossa Senhora dos

Martyres na esquina

SILVEIRA M de El Macabeo Poema heroico de Migvel de Silveira En Napoles por Egidio Longo Stampador Real Antildeo 1638

STENDHAL Rome Naples et Florence Paris Michel Leacutevy Fregraveres Libraires-Eacutediteurs

1854 TASSO T Apologia del S Torquato Tasso in difesa della sua Gierusalemme liberata

agli Accademici della Crusca Con le acuse amp difese dellrsquoOrlando Furioso dellrsquoAriosto Et

alcune lettere pareri amp Discorsi di diuersi Auttori nel medesimo genere Di nuouo corretta amp

ristampata Aggiontoni la risposta dellrsquoistesso Tasso al Discorso del Lombardelli intorno agrave i constrasti della sua Gierusalẽme I titoli si leggono nellrsquoottaua carta In Ferrara Ad instatildeza di G

Vasalini Con licenza de i Superiori 1586

________ Discorsi del poema heroico del S Torquato Tasso Allrsquoillustrissmo e reverendissmo Signor Cardinale Aldo Brandino Nella Stamparia dello Stigliola In Napoli Ad

instantia di Paolo Venturino [1594]

________ Discorsi del Signor Torquato Tasso DellrsquoArte Poetica et in particolare del

Poema Heroico Et insieme il Primo Libro delle Lettere scritte agrave diuersi suoi amici lequali oltra la famigliaritagrave sono ripiene di molti concetti amp auertimenti poetici agrave dichiaratione drsquoalcuni

luoghi della sua Gierusalemme liberata Gli uni e lrsquoaltre scritte nel tempo chrsquoegli compose detto

suo Poema Non piu stampati Con Privilegi In Venetia MDLXXXVII [1587] Ad instanza di Giulio Vassalini Libraro agrave Ferrara

________ Gierusalemme liberata poema heroico del Sig Torquato Tasso Al Sereniss

Signore il Signor Donno Alfonso H DrsquoEste Duc adi Ferrara ampc Tratta del vero Originale Con aggiunta di quanto manca nellrsquoaltre Edittioni amp con lrsquoAllegoria dello stesso Autore Con

Priuilegio di S Santitagrave delle Maestagrave Christianissima amp Catholica della Sereniss Signoria di

Venetia del Sereniss Sig DVCA di Ferrara amp drsquoaltri Principi In Ferrara 1581

TESAURO E ldquoArguacutecias Humanasrdquo Traduccedilatildeo de Gabriela Cipollini e Joatildeo Adolfo Hansen in Revista do IFAC Ouro Preto IFAC-UFOP dez 1997 nordm 4

________ Il cannocchiale aristotelico orsquo sia Idea dellarguta et ingeniosa elocutione

che serue agrave tutta larte oratoria lapidaria et simbolica esaminata corsquo principii del diuino

329

Aristotele dal conte D Emanuele Tesauro Cavalier Gran Croce dersquo Santi Mauritio et Lazaro

Quarta impressione Accresciuta dallrsquo Autore Trattati cioegrave Dersquo Concetti Predicabili et Degli

Emblemi con un nuouo Indice Alfabetico oltre agrave quello delle materie Dedicato al Reuerendiss Padre Gio Paolo Oliva Vicario Generale della Compagnia di Giesu In Roma agrave Spese di

Guglielmo Halleacute Libraro nella Piazza di Pasquino M DC LXIV [1664] Con licenza dersquo

Superiori E Priuilegio

________ Cannocchiale Aristotelico esto es anteojo de larga vista o idea de la agudeza e ingeniosa locucion que sirve a toda arte oratoria lapidaria y simbolica examinada

del Divino Aristoteles Madrid 1741 2 vols

________ ldquoO juiacutezo (panegiacuterico acadecircmico)rdquo Traduccedilatildeo de Joatildeo Adolfo Hansen in CANIATO B MINEacute E (org) Abrindo Caminhos Homenagem a Maria Aparecida Santilli Satildeo

Paulo Aacuterea de Poacutes-Graduaccedilatildeo de Estudos Comparados de Literaturas de Liacutengua Portuguesa-

FFLCH 2002

________ Panegirici et ragionamenti del Conte D Emanuele Tesauro Caualier Gran Croce dersquo SS Mauritio e Lazaro Dedicati alla Regale Altezza di Madama Christiana di Franchia

Duchessa di Savoia Reina di Cipri Gloria del Nostro Secolo Volume Terzo In Torino MDCLX

[1660] Appresso Bartolomeo Zauatta Con licenza dersquo Superiori Et Priuilegio TEOacuteN HERMOGEacuteNES AFTONIO Ejercicios de retoacuterica Introduccioacuten traduccioacuten y notas

de Mordf Dolores Reche Martiacutenez Madrid Editorial Gredos 1991

EacuteLIO TEAtildeO ΩTheonis sophistae

primae apud rhetorem exercitationes innumeris quibus scatebant antea mendis Joachimi Camerarii Pabergensis opera purgatae amp in sermonem latinum conversae Adiectus est quoq

rerum amp uerborum in ijsdem memorabilium locupletiszlig Index Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo

amp Regis Galliae ad serptenium annos octo Basileae [1541]

________ ΩTheonis Sophistae Pro-

gymnasmata accurate emendata ac recensita In usum Scholarum Holandiae WestFrisiaeque Ex

decreto Ilustriss DD Ordinum eiusdem Provinciae Accedit interpretatio Latina ita hac editione

emendata ut sit Nova Lvgdvni Batavorvm Ex Officina Bonaventurae amp Abrahanmi Elzevir Academ Typograph MDCXXVI [1626]

VEGA G de la Obras de Garcilasso de la Vega con anotaciones de Fernand o de

Herrera Al ilutrissimo i ecelentissimo Sentildeor Don Antonio de Guzman Marques de Ayamonte Governador del Estado de Milan i Capitan General de Italia Com licencia de los SS del Consejo

Real En Sevilla por Alonso de la Barrera Antildeo de 1580

VALADEacuteS D Retoacuterica Cristiana Traduccedilatildeo de T H Zapieacuten 2ordf ed Meacutexico FCE 2003

VETTORI P Petri Victorii commentarii in librum Demetrii Phalerei de elocutione Positis ante singulas declarationes Graecis vocibus Auctoris ijsdemque ad verbum Latine expressis

Additus est rerum et verborum memorabilium index copiosus Cum P II IIII Pont Max Cosmi

Medicis Florentianorum Senensiumq Ducis ampAlphonsi Ferrariensium Ducis privilegijs ampliszlig per decennium Florentiae In officina Iuntarum Bernardi F MDLXII

VIEIRA A Sermoens do P Antonio Vieira da Companhia de Iesu Preacutegador de Sua

Alteza Primeyra Parte Dedicada ao Principe N S Em Lisboa Na Officina de Ioam da Costa M DC LXXIX [1679] Com todas as licenccedilas amp Privilegio Real

______ Sermoens do Padre Antonio Vieira da Companhia de Iesu Preacutegador de Sua

Magestade Em Lisboa Na officina de Miguel Deslandes A custa de Antonio Leyte Pereyra

Mercador de Livros M DC LXXXIII [1683] Com todas as licenccedilas amp Privilegio Real VIRGIacuteLIO Bucoacutelicas Traduccedilatildeo e notas de Odorico Mendes Ediccedilatildeo anotada e comentada

pelo Grupo de Trabalho Odorico Mendes Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da

Unicamp 2008 ______ Bucoacutelicas Ediccedilatildeo biliacutengue Traduccedilatildeo e comentaacuterio de Raimundo Carvalho Belo

Horizonte Crisaacutelida 2005

VITRUacuteVIO I Dieci libri dellrsquoArchitettura di M Vitruvio Tradotti amp commentati da Mons

Daniel Barbaro eletto Patriarca drsquoAquileia da lui riueduti amp ampliati amp hora in piu commoda forma ridutta In Venetia Appresso Francesco dersquoFranceschi Senese amp Giouanni Chrieger

330

Alemano Compagni MDLXVII [1567]

VIVES J L El arte retoacuterica (De ratione dicendi) Estudio introductorio de Emilio

Hidalgo-Serna Edicioacuten traduccioacuten y notas de Ana Isabel Camacho Barcelona Anthropos Editorial 1988

______ Ioannis Ludouici Vivis Rhetoricae siue de recte dicendi ratione libri tres

Eiusdem De Consultatione liber I Basilea Balthasarem Lasiu[m] amp Thomam Platteru[m] 1536

VOSSIUS G J Gerardo Ioannis Vossi Commentariorum rhetoricorum sive oratoriarum institutionum Pars altera Lugduni Batavorum Ex officina Ioannis Maire MDCXLIII [1643]

ZINANO G Sommarii di varie retoriche greche latine et volgari Distintamente ordinati

in uno da Gabriele Zinano In Reggio Apresso Hercoliano Bartholi 1590

Bibliografia secundaacuteria

ACCORSI F ldquoPedro de Valencia y el Pseudo Longino sobre la recepcioacuten espantildeola del Peri hupsousrdquo CRITICOacuteN 113 pp 63-83 2011

ADAM J-M HEIDMANN U O texto literaacuterio por uma abordagem interdisciplinar Satildeo

Paulo Cortez 2011 ALONSO JUacuteNIOR C O melhor gecircnero de oradores I-IV V 15-16 VI 16-17 Letras

Claacutessicas n 4 pp 343-346 2000

AMBROSIO R De rationibus exordiendi os princiacutepios da histoacuteria em Roma Satildeo Paulo

Humanitas Fapesp 2005 ANGIONI L ldquoEacutetica a Nicocircmaco Livro VIrdquo Dissertatio 34 2011 pp 285-300

ARANCOacuteN A M La Batalla en torno a Goacutengora seleccioacuten de textos Barcelona Antoniacute

Bosch 1978 ASSUNCcedilAtildeO T R FLORES-JUacuteNIOR O SANTOS M M (Org) Ensaios de retoacuterica antiga

Belo Horizonte Tessitura 2010

BARTHES R ldquoLrsquoancienne rheacutetoriquerdquo in Œuvres complegravetes Tome II 1966-1973

Edition eacutetablie et preacutesenteacutee par Eric Marty Paris Seuil 1994 pp 901-60 BAXANDALL M Giotto and the orators humanist observers of painting in Italy and the

discovery of pictorial composition 1350-1450 Oxford Clarendon Press 1971

BONNER S F ldquoDionysius of Halicarnassus and the Peripatetic Mean of Stylerdquo Classical Philology Vol 33 No 3 (Jul 1938) pp 257-266

BRANDAtildeO J L A invenccedilatildeo do romance Narrativa e mimese no romance grego Brasiacutelia

Editora UnB 2005 ________ A poeacutetica do Hipocentauro literatura sociedade e discurso ficcional em

Luciano de Samoacutesata Belo Horizonte UFMG 2001

BROWNING R ldquoByzantine Scholarshiprdquo Past amp Present No 28 (Jul 1964) pp 3-20

CARDOSO Z de A ldquoO Anfitriatildeo de Plauto uma tragicomeacutediardquo Itineraacuterios Araraquara n 26 pp 15-34 2008

CARVALHO M S F de Poesia de agudeza em Portugal Satildeo Paulo Humanitas Edusp

Fapesp 2007 CARLSON M Teorias do teatro estudo histoacuterico-criacutetico dos gregos agrave atualidade

Traduccedilatildeo de Gilson Ceacutesar Cardoso de Souza Satildeo Paulo Editora da Unesp 1997

CASSIN B O efeito sofiacutestico Traduccedilatildeo de Ana Luacutecia de Oliveira Maria Cristina Franco Ferraz e Paulo Pinheiro Satildeo Paulo Editora 34 2005

CASSIN B (Org) Vocabulaire Europeacuteen des Philosophies Dictionnaire des

Intraduisibles Sous la direction de Barbara Cassin Paris Eacuteditions du Seuil Dictionnaires Le

Robert 2004 CASTRO A P de Retoacuterica e teorizaccedilatildeo literaacuteria em Portugal Do Humanismo ao

Neoclassicismo Coimbra Centro de Estudos Romacircnicos 1973

CHEVROLET T Lideacutee de fable Theacuteories de la fiction poeacutetique agrave la Renaissance Genegraveve Droz 2007

331

CHIAPPETTA A Ad animos faciendos comoccedilatildeo feacute e ficccedilatildeo nas Partitiones Oratoriae e

no De Officiis de Ciacutecero Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 1997 [tese de doutorado]

CHIRON P ldquoAs ambiguidades da lsquograccedilarsquo (kharis) no tratado Do estilo de Demeacutetrio (Ps-Demeacutetrio de Falero) Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2003 v 7 pp 201-218

________ Un rheacuteteur meacuteconnu Deacutemeacutetrios (Ps-Deacutemeacutetrios de Phalegravere) Essai sur les

mutations de la theacuteorie du style agrave leacutepoque helleacutenistique Paris Vrin 2001

CLASSEN C J ldquoThe Rhetorical Works of George of Trebizond and Their Debt to Cicerordquo Journal of the Warburg and Courtauld Institutes Vol 56 (1993) pp 75-84

CONLEY T ldquoAristotlersquos Rhetoric in Byzantiumrdquo Rhetorica Vol 8 No 1 (Winter 1990)

pp 29-44 ________ ldquoByzantine Teaching on Figures and Tropes An Introductionrdquo Rhetorica

Vol 4 No 4 (Autumn 1986) pp 335-374

________ ldquoGreek Rhetorics after the Fall of Constantinople An Introductionrdquo

Rhetorica Vol 18 No 3 (Summer 2000) pp 265-294

________ ldquoRevisiting lsquoZonaiosrsquo More on the Byzantine Tradition περὶ σχημάτωνrdquo

Rhetorica Vol 22 No 3 (Summer 2004) pp 257-268

________ ldquoSome Renaissance Polish Commentaries on Aristotlersquos Rhetoric and

Hermogenesrsquo On Ideasrdquo Rhetorica Vol 12 No 3 (Summer 1994) pp 265-292 CUNHA A G da Dicionaacuterio Etimoloacutegico da Liacutengua Portuguesa 4ordf ediccedilatildeo revista e

ampliada Rio de Janeiro Lexikon 2010

CUTLER A ldquoFrom Loot to Scholarship Changing Modes in the Italian Response to

Byzantine Artifacts ca 1200-1750rdquo Dumbarton Oaks Papers Vol 49 Symposium on Byzantium and the Italians 13th-15th Centuries (1995) pp 237-267

DELEUZE G PARNET C Diaacutelogos Traduccedilatildeo de Joseacute Gabriel Cunha Lisboa Reloacutegio

DrsquoAacutegua Editores 2004 DOWNEY G ldquoByzantium and the Classical Traditionrdquo Phoenix Vol 12 No 3 (Autumn

1958) pp 125-129

DUCROT O TODOROV T Dicionaacuterio Enciclopeacutedico das Ciecircncias da Linguagem 3ordf

ediccedilatildeo Satildeo Paulo Perspectiva 2007 DUPONT F Lrsquoinvention de la litteacuterature Paris La Deacutecouverte 1994

ECO U Sobre a literatura Traduccedilatildeo de Elena Aguiar 2ordf ed Rio de Janeiro Record 2003

FOUCAULT M Os anormais Curso no Collegravege de France (1974-1975) Ediccedilatildeo estabelecida sob a direccedilatildeo de Franccedilos Ewald e Alessandro Fontana por Valerio Marchetti e

Antonella Salomoni Traduccedilatildeo de Eduardo Brandatildeo Satildeo Paulo Martins Fones 2011

________ As palavras e as coisas Trad de Salma Tannus Muchail 8ordf ed Satildeo Paulo Martins Fontes 2002

________ iquestQueacute es un autor Traduccioacuten de Silvio Mattoni Buenos Aires Ediciones

literales 2010

FREITAS G A DE Sobre o Estilo de Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo e estudo introdutoacuterio do tratado) Belo Horizonte [FL-UFMG] 2011

[dissertaccedilatildeo de mestrado]

GARBELLINI I L ldquoDos poemas (Diomedes Arte gramatical 3)rdquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2005 v 9 pp 231-243

GALIANA A A ldquoCuestiones de poeacutetica y retoacuterica en los preliminares de Quevedo a las

poesiacuteas de fray Luis de Leoacutenrdquo La Perinola 7 (2003) pp 61-102

GEANAKOPLOS D J Constantinople and the West Essays on the Late Byzantine (Palaeologan) and Italian Renaissances and the Byzantine and Roman Churches Madison

Wisconsin University of Wisconsin Press 1989

________ ldquoThe Discourse of Demetrius Chalcondyles on the Inauguration of Greek Studies at the University of Padua in 1463rdquo Studies in the Renaissance Vol 21 (1974) pp 118-

144

GENETTE G ldquoVerossiacutemil e motivaccedilatildeordquo In BARTHES R et alli Literatura e semiologia Petroacutepolis Vozes 1972 pp 8-9

332

________ ldquoVraisemblance et motivationrdquo In Communications 11 1968 Recherches

seacutemiologiques le vraisemblable pp 5-21

GEORGOPOULOU M ldquoLate Medieval Crete and Venice An Appropriation of Byzantine Heritagerdquo The Art Bulletin Vol 77 No 3 (Sep 1995) pp 479-496

GOYET F Le sublime du ldquolieu communrdquo Lrsquoinvention rheacutetorique dans lAntiquiteacute et agrave la

Renaissance Paris Honoreacute Champion 1996

GRAMMONT G de Ajeijadinho e o aeroplano o paraiacuteso barroco e a construccedilatildeo do heroacutei colonial Rio de Janeiro Civilizaccedilatildeo Brasileira 2008

GRUBE G M A ldquoThrasymachus Theophrastus and Dionysius of Halicarnassusrdquo The

American Journal of Philology Vol 73 No 3 (1952) pp 251-267 GUIRAO D N POU P J REYES A (Coord) La edicioacuten de textos Actas del I Congreso

Internacional de Hispanistas del Siglo de Oro London Tamesis 1990

HANSEN J A Alegoria Construccedilatildeo e interpretaccedilatildeo da metaacutefora Satildeo Paulo Hedra

Campinas Editora Unicamp 2006 ________ ldquoAs liras de Gonzaga entre retoacuterica e valor de trocardquo Via Atlacircntica Satildeo Paulo

1997 v 1 pp 40-52

________ ldquoBarroco neobarroco e outras ruiacutenasrdquo Teresa Revista de Literatura Brasileira 2 Satildeo Paulo 2001 pp 10-66

________ ldquoCategorias epidiacuteticas da ekphrasisrdquo Revista USP v 71 Satildeo Paulo 2006 pp

85-105 ________ ldquoEu nos faltaraacute semprerdquo in BECKETT S o inominaacutevel Traduccedilatildeo Ana Helena

Souza Satildeo Paulo Globo 2009 pp 7-25

________ ldquolsquoO imortalrsquo e a inverossimilhanccedilardquo Teresa revista de Literatura Brasileira

67 Satildeo Paulo 2006 pp 56-78 ________ ldquoNotas sobre o gecircnero eacutepicordquo in Teixeira I (Org) Eacutepicos Satildeo Paulo Edusp

Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo 2008

________ ldquoRepresentaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo na literatura de Machado de Assisrdquo Ciecircncia Hoje nordm 253 out 2008 pp 36-42

________ ldquoRetoacuterica da agudezardquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 pp 317-42

________ A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004

HANSEN J A MOREIRA M (Org) Para que todos entendais Poesia atribuiacuteda a

Gregoacuterio de Matos e Guerra Letrados manuscritura retoacuterica autoria obra e puacuteblico na Bahia

dos seacuteculos XVII e XVIII Volume 5 1ordf ed Belo Horizonte Autecircntica Editora HASEGAWA A P Os limites do gecircnero bucoacutelico em Vergiacutelio um estudo das eacuteclogas

dramaacuteticas Satildeo Paulo Humanitas 2012

HEATH M ldquoApsines and Pseudo-Apsinesrdquo The American Journal of Philology Vol 119 No 1 (Spring 1998) pp 89-111

________ ldquoThe Substructure of Stasis-Theory from Hermagoras to Hermogenesrdquo The

Classical Quarterly New Series Vol 44 No 1 (1994) pp 114-129

HENDRICKSON G L ldquoThe Origin and Meaning of the Ancient Characters of Stylerdquo The American Journal of Philology Vol 26 No 3 (1905) pp 249-290

________ ldquoThe Peripatetic Mean of Style and the Three Stylistic Charactersrdquo The

American Journal of Philology Vol 25 No 2 (1904) pp 125-146 IFFLAND J (Org) Quevedo in Perspective Newark Delaware Juan de la Cuesta 1982

JOHNSON F R ldquoTwo Renaissance Textbooks of Rhetoric Aphthoniusrsquo Progymnasmata

and Rainoldersquos A Booke Called the Foundacion of Rhetorikerdquo The Huntington Library Quarterly Vol 6 No 4 (Aug 1943) pp 427-444

JAURALDE POU P ldquoTexto fecha y circunstancias de La Culta Latiniparla de Quevedordquo

In Bulletin Hispanique Tome 83 ndeg 1-2 1981 pp 131-143

KENNEDY G A A new history of classical rhetoric Princeton Princeton University Press 1994

________ Classical rhetoric and its Christian and secular tradition from ancient to

modern times Chapel Hill University of North Carolina Press 1999

333

________ Greek Rhetoric under Christian Emperors Eugene Oregon Wipf and Stock

Publishers 2008

________ Invention and Method Two Rhetorical Treatises from the Hermogenic Corpus Translated with introductions and notes by George A Kennedy Atlanta Society of

Biblical Literature 2005

________ Progymnasmata Greek textbooks of prose composition and rhetoric

Translated with introductions and notes by George A Kennedy Atlanta Brill 2003 KILLY W et alii Dictionary of German Biography Volume 10 Thibaut - Zycha

Muumlnchen De Gruyter 2006

KOSSOVITCH L Condillac luacutecido e transluacutecido Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial 2011 ________ ldquoContra a ideacuteia de Renascimentordquo in NOVAES A (Org) Artepensamento

Satildeo Paulo Companhia das Letras 1994 pp 59-68

________ Signos e poderes em Nietzsche Rio de Janeiro Azougue 2004

________ ldquoTradiccedilatildeo claacutessicardquo Desiacutegnio v 5 (2006) pp 15-21 LACAN J Eacutecrits Paris Eacuteditions du Seuil 1966

LAUSBERG H Elementos de retoacuterica literaacuteria Trad R M Rosado Fernandes Lisboa

Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 1966 ________ Manual de Retoacuterica LiterariaFundamentos de una Ciencia de la Literatura

Versioacuten espantildeola de Joseacute Peacuterez Riesco Madrid Editorial Gredos 1967 3 tomos

LICHAŃSKI J Z ldquoThe Polish Translation of Hermogenes of Tarsusrdquo Forum Artis Rhetoricae 2 33 (abr-jun 2013) pp 82-84

LICHTENSTEIN J A cor eloquente Traduccedilatildeo de Maria Elisabeth de Mello e Maria Helena

de Mello Rouanet Satildeo Paulo Siciliano 1994

________ The Blind Spot An Essay on the Relations between Painting and Sculpture in the Modern Translation by Chris Miller Los Angeles Getty Research Institute 2008

LOOMIS L R ldquoThe Greek Renaissance in Italyrdquo The American Historical Review Vol

13 No 2 (Jan 1908) pp 246-258 LOacutePEZ GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Universidad de Salamanca

1994

________ Anotaccedilotildees de Quevedo agrave Retoacuterica de Aristoacuteteles Campinas SP Editora da Unicamp 2008

LORIES D RIZZERIO L (Org) De la phantasia agrave lrsquoimagination Louvain Peeters 2003

MACDONALD K M ldquoSelling Lives the Publisher Bernardo di Giunta (fl 1518-1550)

Imitation and the Utility of Intellectual Biographyrdquo Renaissance and Reformation 25 (2001) pp 5-24

MACK P ldquoVivesrsquos De ratione dicendi Structure Innovations Problemsrdquo Rhetorica

Vol 23 No 1 (Winter 2005) pp 65-92 MAGALHAtildeES Domingos Joseacute Gonccedilalves de A Confederaccedilatildeo dos Tamoyos Rio de

Janeiro Livraria de B L Garnier 1864

MARTIN T M ldquoDos gecircneros de discurso (QUINT XII 1058-80)rdquo Letras claacutessicas Satildeo

Paulo 2005 v 9 pp 225-230 MARTINS P ldquoO paacuterodo de Fedra e a retoacutericardquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 1999 v 3

pp 181-210

________ ldquoVt Pictura Rhetoricardquo Revista USP Satildeo Paulo n91 setnov 2011 pp 104-111

MENDES M V A oratoacuteria barroca de Vieira Lisboa Editorial Caminho 1989

MONFASANI J George of Trebizond A Biography and a Study of his Rhetoric and Logic Leiden Brill 1976

________ Language and learning in Renaissance Italy selected articles Brookfield

Vermont Variorum 1994

MONTEFUSCO L C ldquoDuctus and color the right way to compose a suitable speechrdquo Rhetorica Berkeley University of California Press vol XXI n 2 2003 113-31

MUHANA A ldquoDiscurso sobre o poema heroico Comentaacuteriordquo REEL Revista Eletrocircnica

de Estudos Literaacuterios Vitoacuteria a 2 v 2 2006

334

________ A Epopeacuteia em Prosa Seiscentista uma definiccedilatildeo de gecircnero Satildeo Paulo Editora

da Unesp 1997

________ Poesia e pintura ou pintura e poesia tratado seiscentista de Manuel Pires de Almeida Satildeo Paulo Edusp 2002

________ Os Recursos retoacutericos na obra especulativa do padre Antocircnio Vieira e outros

escritos Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 1989 [dissetaccedilatildeo de mestrado]

MURPHY J J WINTERBOTTOM M ldquoRaffaele Regiorsquos 1492 Quaestio doubting Cicerorsquos authorship of the Rhetorica ad Herennium Introduction and Textrdquo Rhetorica A Journal of the

History of Rhetoric Vol 17 No 1 (Winter 1999) pp 77-87

NASCIMENTO C ldquoDa pintura antiga de Francisco de Holanda o encocircmio como gecircnero da prescriccedilatildeo e da arterdquo Floema Caderno de Teoria e Histoacuteria Literaacuteria Nordm 1 (2005) pp 37-50

OLIVEIRA C E de ldquoIdeias formas rationes e species A Quaestio de ideis de Tomaacutes de

Aquinordquo Discurso Satildeo Paulo n 40 pp 95-122 nov 2010

PANAGIOTAKES N M ldquoThe Italian Background of Early Cretan Literaturerdquo Dumbarton Oaks Papers Vol 49 Symposium on Byzantium and the Italians 13th-15th Centuries (1995) pp

281-323

PANOFSKY E Idea a evoluccedilatildeo do conceito de belo 2ordf ediccedilatildeo 2ordf tiragem Traduccedilatildeo de Paulo Neves Satildeo Paulo Martins Fontes 2013

PATILLON M La theacuteorie du discours chez Hermogegravene le rheacuteteur essai sur les structures

linguistiques de la rheacutetorique ancienne Paris Les Belles Lettres 1988 PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Princeton Princeton University

Press 1970

________ ldquoTasso and Neoplatonism The Growth of his Epic Theoryrdquo Studies in the

Renaissance Vol 18 (1971) pp 105-133 PEacuteCORA A Maacutequina de gecircneros Satildeo Paulo Edusp 2001

________ (org) Poesia seiscentista Fecircnix renascida amp Postilhatildeo de Apolo Satildeo Paulo

Hedra 2002 ________ Teatro do sacramento A unidade teoloacutegico-retoacuterico-poliacutetica dos sermotildees de

Antocircnio Vieira Satildeo Paulo Edusp Campinas Editora da Unicamp 1994

PEREIRA B F ldquoA ediccedilatildeo conimbricense da Rhetorica de Joachim Ringelbergrdquo Peniacutensula Revista de Estudos Ibeacutericos n 1 (2004) pp 201-213

PEREIRA M A Quintiliano Gramaacutetico o papel do mestre de gramaacutetica na Institutio

oratoria 2ordf ed Satildeo Paulo Humanitas 2006

PEREIRA T A YAMUZA E R ldquoLas fuentes de la teoriacutea de los asystata en el Comentario de Grilio al De inuentione de Ciceroacuten Minuciano vs Hermoacutegenesrdquo Rhetorica Vol 21 No 4

(Autumn 2003) pp 255-284

PERINtildeAacuteN B GUAZZELLI F (Org) Symbolae pisanae Studi in onore di Guido Mancini Pisa Giardini 1989 vol II

PERNOT L La Rheacutetorique dans lrsquoAntiquiteacute Paris Librairie Geacuteneacuterale Franccedilaise 2000

PINEDA V La imitacioacuten como arte literario en el siglo XVI espantildeol Sevilla Diputacioacuten

Provincial de Sevilla 1994 PINHEIRO Joaquim Caetano Fernandes Historiografia da Literatura Brasileira textos

inaugurais Organizaccedilatildeo apresentaccedilatildeo e notas por Roberto Aciacutezelo de Souza Rio de Janeiro

EdUERJ 2007 PIRES M L G A criacutetica camoniana no seacuteculo XVII Lisboa Instituto de Cultura e Liacutengua

Portuguesa 1982

RENOUARD A A Annales de lrsquoimprimerie des Alde ou Histoire des trois Manuce et de leurs eacuteditions Paris 1803

ROBERTS W R ldquoThe Greek Words for lsquoStylersquo (With Special Reference to Demetrius

περὶ Ἑρμηνείας)rdquo The Classical Review Vol 15 No 5 (Jun 1901) pp 252-255

ROTHBERG I P ldquoCovarrubias Gracian and the Greek Anthologyrdquo Studies in Philology

Vol 53 No 4 (Oct 1956) pp 540-552 RUSSELL D A WINTERBOTTOM M Ancient literary criticism the principal texts in

new translations Oxford Oxford University Press 1972

335

RUTHERFORD I ldquoInverting the Canon Hermogenes on Literaturerdquo Harvard Studies in

Classical Philology Vol 94 (1992) pp 355-378

SANTOS M M Liccedilotildees sobre alegoria de gramaacuteticos e retores gregos e latinos Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 2002 [tese de doutorado]

________ ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacuteciordquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002

v 4 pp 191-265

SETTON K M ldquoThe Byzantine Background to the Italian Renaissancerdquo Proceedings of the American Philosophical Society Vol 100 No 1 (Feb 24 1956) pp 1-76

ŠEVČENKO I ldquoThe Decline of Byzantium Seen Through the Eyes of Its Intellectualsrdquo

Dumbarton Oaks Papers Vol 15 (1961) pp 167-186 SCHEVILL R ldquoErasmus and Spainrdquo Hispanic Review Vol 7 No 2 (Apr 1939) pp 93-

116CHOULER B ldquoLa classification des personnes et des faits chez Hermogegravene et ses

commentateursrdquo Rhetorica Vol 8 No 3 (Summer 1990) pp 229-254

SKINNER Q Razatildeo e retoacuterica na filosofia de Hobbes Satildeo Paulo Editora Unesp 1999 SUMMERELL O F (Ed) et al Alkinoos Didaskalikos Lehrbuch der Grundsaumltze Platons

Einleitung Text Uumlbersetzung und Anmerkungen Sammlung wissentschaftlicher Kommentaumlre

Berlin and New York Walter de Gruyter 2007 TAFURI M Venice and the Renaissance Translated by Jessica Levine Cambridge

Massachusetts MIT Press 1995

TEIXEIRA I ldquoArtifiacutecio persuasatildeo e sociedade em Olavo Bilacrdquo Revista USP nordm 54 ago 2002 pp 98-111

________ Mecenato Pombalino e Poesia Neoclaacutessica Basiacutelio da Gama e a Poeacutetica do

Encocircmio Satildeo Paulo Edusp 1999

TODOROV T ldquoIntroduccedilatildeo ao verossiacutemilrdquo In Poeacutetica da prosa Traduccedilatildeo de Claudia Berliner Satildeo Paulo Martins Fontes 2003 pp 113-23

TONIQUA C (Org) El ofiacutecio del pintor nuevas miradas a la obra de Gregorio Vaacutesquez

Bogota Ministeacuterio de Cultura 2008 TRIMPI W Ben Jonsonrsquos poems a study of the plain style Stanford Stanford University

Press 1962

________ ldquoHoracersquos ut pictura poesis The argument for stylistic decorumrdquo Traditio (Studies in ancient and medieval history thought and religion) New York Fordham University

Press 1978 vol XXXIV pp 29-73

VALLE R M ldquoA ordem dos afetos A bucoacutelica de Claacuteudio Manuel da Costardquo Floema

Caderno de Teoria e Histoacuteria Literaacuteria Vitoacuteria da Conquista Ano I n 1 p 71-88 2005 VERNANT J-P ldquoNascimento de imagensrdquo in LIMA L C (Org) Miacutemesis e a reflexatildeo

contemporacircnea EdUERJ 2010

WEBB R Ekphrasis Imagination and Persuasion in Ancient Rhetorical Theory and Practice London Ashgate 2009

  • Doutrina do misto e anatomia do monstrousos da retoacuterica de Hermoacutegenes entre os seacuteculos XVI e XVIII
    • RESUMO
    • ABSTRACT
    • SUMAacuteRIO
    • PROacuteLOGO
    • DOUTRINA DO MISTO
    • ANATOMIA DO MONSTRO
    • EPIacuteLOGO
    • REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
Page 2: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras

2

UNIVERSIDADE DE SAtildeO PAULO

FACULDADE DE FILOSOFIA LETRAS E CIEcircNCIAS HUMANAS

DEPARTAMENTO DE LETRAS CLAacuteSSICAS E VERNAacuteCULAS

PROGRAMA DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM LITERATURA PORTUGUESA

Doutrina do misto e anatomia do monstro

usos da retoacuterica de Hermoacutegenes entre os seacuteculos XVI e XVIII

Rodrigo Gomes de Oliveira Pinto

Tese apresentada ao Departamento de

Letras Claacutessicas e Vernaacuteculas da

Faculdade de Filosofia Letras e Ciecircncias

Humanas da Universidade de Satildeo Paulo

para a obtenccedilatildeo do tiacutetulo de doutor

Orientadora Profordf Drordf Adma Fadul Muhana

Satildeo Paulo

2015

3

RESUMO

A presenccedila preceptiva da doutrina retoacuterica das ideai de estilo tal como reguladas pelo

retor grego Hermoacutegenes registra-se em terras italianas portuguesas e espanholas entre

os seacuteculos XVI e XVIII Ora increve-se nos debates que opotildeem detratores e defensores

do gecircnero de poema misto Entre os autores presentes nestes debates estaacute Manuel de

Galhegos cujo proacutelogo epidiacutetico agrave Ulyssea ou Lisboa Edificada elogia a elocuccedilatildeo do

poema heroico de Gabriel Pereira de Castro com base no Peri ideōn e permite que se

discutam os diferentes usos de Hermoacutegenes entre tradutores comentadores e glosadores

desde tratado desde Jorge de Trebizonda Ademais Francisco Joseacute Freire conhecido

como Cacircndido Lusitano na Arte poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de

todas as suas especies principaes tratadas com juizo critico censura a tragicomeacutedia

como misto vicioso nem traacutegico nem cocircmico sem proporccedilatildeo e sem unidade Essa

censura da tragicomeacutedia atualiza argumentos atinentes agrave controveacutersia doutrinaacuteria que

remonta aos fins do seacuteculo XVI e iniacutecios do seacuteculo XVII a qual opotildee eruditos como

Giasone Denores e Giovanni Battista Guarini autor de Il Pastor Fido poema considerado

exemplar no gecircnero e legitimado pela doutrina atribuiacuteda a Hermoacutegenes

PALAVRAS-CHAVE Hermoacutegenes retoacuterica retores gregos e latinos poeacutetica gecircneros

de discurso

E-MAIL rodrigopinto75yahoocombr

4

ABSTRACT

The Hermogenesrsquo rhetorical theory of stylistic ideai became evident in Italy Portugal and

Spain during the 16th and 18th centuries This doctrine is related to debates among critics

and apologists for the mixed genres Among the authors involved in theses debates is

Manuel de Galhegos whose epideictic preface to Ulyssea ou Lisboa Edificada praises

this Gabriel Pereira de Castrorsquos heroic poem based on Peri ideōn and enable this thesis

to discuss the different uses of Hermogenes by translators commentators and glossers

since George of Trebizond Besides Francisco Joseacute Freire also known as Cacircndido

Lusitano on the Arte poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as

suas especies principaes tratadas com juizo critico blames tragicomedy as a vicious

mixture neither tragic nor comic without proportion or unity This blame reaffirms

arguments concerning to poetic controversies of the late sixteenth and early seventeenth

centuries which opposes scholars like Giasone Denores and Giovanni Battista Guarini

author of the Pastor Fido a poem that is known as an example in terms of Hermogenesrsquo

theory of a misture of ideai

5

AGRADECIMENTOS

Agrave Profordf Drordf Adma Fadul Muhana pela confianccedila pelo exemplo e pela lucidez

ante os desvarios

Ao Prof Dr Leon Kossovitch e ao Prof Dr Adriano Machado Ribeiro pelas

sugestotildees que desconfortam e pelas contribuiccedilotildees no Exame de Qualificaccedilatildeo

Ao Prof Dr Joatildeo Adolfo Hansen pela saacutetira e pelo engenho

Ao Prof Dr Adriano Scatolin pelas leituras de Ciacutecero

Agrave Fundaccedilatildeo Coordenaccedilatildeo de Aperfeiccediloamento de Pessoal de Niacutevel Superior

(CAPES) pela concessatildeo da bolsa de estudos que permitiu principiar esta tese

Aos meus pais

Agrave Priscila

6

Ao Francisco e ao Henrique

menino mais velho e menino mais novohellip

Ao Abel in memoriam

parceiro de grandes e pequenas histoacuterias

7

O Hermoacutegenes tinha voz que natildeo era fanhosa nem rouca mas assim

desgovernada desigual voz que se safava Assim ndash fantasia de dizer ndash o ser de

um irara com seu cheiro fedorendo

JOAtildeO GUIMARAtildeES ROSA

Grande Sertatildeo Veredas

8

IacuteNDICE DE FIGURAS

Figura 1 Frontispiacutecio de Ulyssea ou Lisboa Edificada (1636) 18

Figura 2 ldquoHermogenesrsquo Types and Subtypes of stylerdquo 43

Figura 3 ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo 44

Figura 4 LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia (1606) 45

Figura 5 Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene (1594) 46

Figura 6 ldquoDiscoro di M Giulio Camillo sopra Hermogenerdquo (1560) 47

Figura 7 Tabulae institutionum rhetoricarum Petri Johannis Nunnesii Valentini (1588)

61

Figura 8 Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices

(1569) 63

Figura 9 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima (1614) 65

Figura 10 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima (1614) 66

Figura 11 Dellrsquo Arte di predicar bene (1627) 68

Figura 12 LrsquoEthica drsquoAristotele (1550) 297

9

SUMAacuteRIO

PROacuteLOGO 10

DOUTRINA DO MISTO 16

ANATOMIA DO MONSTRO 201

EPIacuteLOGO 313

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 315

10

PROacuteLOGO

Vale principiar pela anedota Eacute lugar de benevolecircncia eacute ldquoficccedilatildeo de origemrdquo1

Cabe aqui mencionar o jovem Hermogenes natural de Tarso na Cilicia

que vivia no governo de M Antonio o qual teve a curiosidade de ir

ouvil-o na idade de 15 annos explicar os preceitos da rhetorica de um

modo digno dos maiores mestres aos 18 annos segundo se diz

publicou elle a sua rhetorica uma das melhores daquelles tempos

improvisava publicamente discursos que attrahiam aacute Tarso uma

multidatildeo de estrangeiros compocircz muitos tractados sobre a arte oratoria

porem seu genio prematuro desappareceu repentinamente perdendo

completamente a memoria aos 24 annos cahiu em uma inteira

imbecilidade e neste estado vivecircu longos annos cercado de

soffrimentos e opprimido da miseria 2

Eacute liccedilatildeo introdutoacuteria da Nova Rhetorica Brasileira de Antocircnio Marciano da Silva

Pontes (1836-1901) compecircndio impresso no Rio de Janeiro em 1860 sob os auspiacutecios

de D Pedro II para uso nas classes de Eloquecircncia Poeacutetica e Literatura Nacional no

Imperial Coleacutegio Fosse a vida de Antocircnio Vieira religioso de Santo Inaacutecio ensinaria natildeo

a desmemoacuteria a necedade e a ineacutepcia mas a iluminaccedilatildeo do estalo e a eloquecircncia da Graccedila

Avessos no epidiacutetico Lugares do gecircnero A vida de Hermoacutegenes de Tarso Antocircnio

Marciano da Silva conta-a em conformidade sobretudo com a Vida dos sofistas de

Filoacutestrato o Velho (ca seacutec II-III dC) Conta desaparecer o gecircnio do retor e desertar-lhe

os conhecimentos da arte diz o bioacutegrafo grego natildeo diz a Nova Rhetorica Brasileira

como palavras aladas tais as de Homero feito o prodiacutegio latinamente ldquointer pueros

1 Cf CASSIN B Jacques el sofista Lacan logos y psicoanaacutelisis Traduccioacuten de Irene Miriam Agoff

Buenos Aires Ediciones Manancial 2013 p 25 2 Nova Rhetorica Brasileira por Antonio Marciano da Silva Pontes secretaacuterio do governo da proviacutencia de

Minas-Geraes ex-membro do Conselho Diretor da Instruccedilatildeo Primaria e Secundaria do Municipio da Cocircrte

antigo professor de Eloquencia Poeacutetica e Litteratura Nacional nos Colegios ndash Marinho e Tautphoeus ndash etc

etc Obra aprovada pelo Conselho Director e adoptada para o Imperial Collegio de Pedro II Rio de Janeiro

aacute venda em Casa de E amp H Laemmert Rua da Quitanda 77 1860 p 4

11

senex amp inter senes puerrdquo ldquoentre crianccedilas velho amp entre velhos crianccedilardquo3

Eacute ficto muito proximamente o relato de Jerocircnimo Soares Barbosa (1737-1816)

professor de Eloquecircncia e Poesia da Universidade de Coimbra Nas Instituiccedilotildees oratorias

de M Fabio Quintiliano impressas em dois tomos datados de 1788 e de 1790 4 itera-se

menos a natureza e o pendor mais a arte natildeo a que abandona o haacutebil orador Hermoacutegenes

de Tarso senatildeo que a tratadiacutestica monumentum de que Filoacutestrato o Velho natildeo daacute notiacutecia

Hermogenes natural de Tarso na Cilicia vivia no governo de M Antonio

o qual teve a curiosidade de hir ouvir este moccedilo que na idade de 15

annos explicava os preceitos de Rhetorica de hum modo digno dos

maiores mestres De idade de 18 compoz a sua Rhetorica que he a

dizer a verdade a quinta essencia do bom senso Ella consta de hum

livro sobre os Estados e quatro da Invenccedilaotilde no I dos quaes trata dos

Exordios no 2 da narraccedilatildeo no 3 da Prova e no 4 do Ornato Alem

destes compoz mais dois livros sobre as differentes Idecircas ou Caracteres

do discurso5

Jerocircnimo Soares Barbosa atribui a Hermoacutegenes trecircs tratados de retoacuterica o

primeiro contempla ldquohum livro sobre os Estadosrdquo o segundo ldquoquatro [livros] da

Invenccedilaotilderdquo e o terceiro ldquodois livros sobre as differentes Idecircasrdquo Sabe-se faz-se menccedilatildeo

em primeiro lugar ao Peri staseōn obra de preceituaccedilatildeo das estases dos estados de causa

em segundo lugar ao Peri heureseōs de mateacuteria discriminada isto seja a regulaccedilatildeo dos

proecircmios da narraccedilatildeo da argumentaccedilatildeo das figuras e em terceiro lugar ao Peri ideōn

de doutrina das ideai ditas ldquoformas de estilordquo tomadas no sentido de ldquoCaracteres do

3 De acordo com Filoacutestrato o Velho trata-se de burla atribuiacuteda ao sofista Antiacuteoco cf Flavii Philostrati de

Vitis Sophistarum Libri duo Antonio Bomfino interprete Cum gratia et priuilegio Imperiali ad sex ennium Ex Aedibus Schvrerianis Mense Martio Anno a restituta salute MDXVI [1516] sp 4 Sabe-se Jerocircnimo Soares Barbosa posto que trabalhasse na traduccedilatildeo de Quintiliano jaacute nos anos 1760 soacute

o editou posteriormente cf TEIXEIRA I ldquoArtifiacutecio persuasatildeo e sociedade em Olavo Bilacrdquo Revista USP

nordm 54 ago 2002 p 103 5 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Primeiro Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXVIII Com licenccedila da Real

Meza da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e

sessenta reis em papel p 46

12

discursordquo6 O nome de Hermoacutegenes amiuacutede classifica aleacutem dessas duas outras obras

assim denominadas os Progymnasmata de preceituaccedilatildeo de exerciacutecios preparatoacuterios e o

Peri methodou deinotētos de modos de composiccedilatildeo dos discursos de pensamentos

graves7

Aceitam hoje os helenistas que essas atribuiccedilotildees sejam afirmadamente incertas

Embora com frequecircncia se tome o corpo como de Hermoacutegenes de Tarso o Sofista supotildee

Michel Patillon que tenha se constituiacutedo espuriamente e que para o conjunto de textos

confluam distintos costumes retoacutericos que remontam aos seacuteculos II ou III de maneira tal

que apenas dois desses tratados o Peri staseōn e o Peri ideōn sejam considerados de

autoria daquele que o estudioso e tradutor francecircs chama Hermoacutegenes o Retor8 A fim de

se esquivar do sofista de Tarso Michel Patillon esforccedila-se por contruir um nome e

evidenciar que unidade natildeo haacute no corpo de Hermoacutegenes 9 A hipoacutetese pois que lhe

atravessa as pesquisas lida tanto em La theacuteorie du discours chez Hermogegravene le rheacuteteur

essai sur les structures linguistiques de la rheacutetorique ancienne quanto em Lrsquoart

rheacutetorique compreende que remonte aos seacuteculos V ou VI e que tenha se dado em torno

dos dois textos que se creem autecircnticos a constituiccedilatildeo do corpus retoacuterico de Hermoacutegenes

tal como se conhece desde Hugo Rabe o filoacutelogo alematildeo responsaacutevel por editar em 1913

o volume Hermogenis Opera da Bibliotheca Scriptorum Graecorum et Romanorum

Teubneriana reimpresso em 1969 e por estabelecer criticamente a liccedilatildeo textual em que

se baseiam as traduccedilotildees do Peri ideōn de Cecil W Wooten10 de Antonio Sancho Royo11

de Consuelo Ruiz Montero e de Michel Patillon

6 Neste trabalho daqui em diante ao operar a transliteraccedilatildeo do leacutexico da liacutengua grega optamos por natildeo

acentuar as palavras transliteradas (por ex eacute kallos) e por distinguir as vogais breves e longas (εη

e οω) as longas ldquoηrdquo e ldquoωrdquo transliteram-se como ldquoērdquo e ldquoōrdquo (por ex ἔρως eacute erōs ao passo que ἥρως eacute

hērōs) 7 HERMOGENE Lrsquoart rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon

Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 pp 35-40 HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz Montero Madrid Editorial Gredos 1993 pp 24-5 PATILLON M La

theacuteorie du discours chez Hermogegravene le rheacuteteur essai sur les structures linguistiques de la rheacutetorique

ancienne Paris Les Belles Lettres 1988 pp 8-12 8 Itera-o a tambeacutem tradutora Consuelo Ruiz Montero cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo

Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz Montero Madrid Editorial Gredos 1993 pp 24-26 9 PATILLON M La theacuteorie du discours chez Hermogegravene le rheacuteteur essai sur les structures linguistiques de

la rheacutetorique ancienne Paris Les Belles Lettres 1988 pp 13-17 10 Cf HERMOGENES Hermogenesrsquo on types of style Translated by Cecil W Wooten Chapel Hill University

of North Carolina Press 1987 11 Cf SANCHO ROYO A Hermoacutegenes Sobre los tipos de estilo y Sobre el meacutetodo del tipo Fueza

Introduccioacuten traduccioacuten y notas Sevilla Secretariado de Publicaciones de la Universidad 1991

13

Entende este estudioso francecircs que ao Peri staseōn e ao Peri ideōn teriam sido

reunidos os demais tratados os Progymnasmata que passaram a circular na versatildeo latina

de Prisciano a partir do seacuteculo VI e que se veem substituiacutedos bastante frequentemente

segundo o estudioso pelos exerciacutecios de Aftocircnio na vertente manuscrita do corpus o Peri

heureseōs datado de princiacutepios do seacuteculo III que se imagina incorporado aos demais em

substituiccedilatildeo a outro de mesma mateacuteria perdido citado no proecircmio do Peri staseōn e por

fim o chamado o Peri methodou deinotētos que se supotildee espuacuterio tambeacutem a ocupar o

lugar de texto que natildeo se sabe se perdido ou natildeo escrito referido no Peri ideōn (cf HERM

380 2)12

Acatadas ou natildeo as hipoacuteteses de Michel Patillon afirmam e reafirmam aqueles

que se dedicam agrave retoacuterica de Hermoacutegenes que da tratadiacutestica referida apenas os

Progymnasmata na versatildeo de Prisciano circularam no dito medievo latino13 O restante

do corpo difundiu-se ao que se conhece pelas matildeos de letrados como Jorge de

Trebizonda Demeacutetrio Ducas Marco Musuro Antocircnio Bonfine Francisco Porto Natale

Conti Johannes Sturm Giulio Camillo Delminio e Gaspar Laurent desde o seacuteculo XV

Ao primeiro eacute dado o primado da difusatildeo ocidental de Hermoacutegenes Eacute sabido as

afirmaccedilotildees de primazia servem bem agraves histoacuterias dos contributos vincadas pelo epidiacutetico

no louvor dos auctores14 Uma vez que eacute escusado dizer que as praacuteticas discursivas natildeo

se fazem de progressos de Jorge de Trebizonda ao germacircnico Hugo Rabe conveacutem natildeo

positivar essas afirmaccedilotildees e interessa pensar a recepccedilatildeo possiacutevel do corpo retoacuterico

atribuiacutedo a Hermoacutegenes mais particularmente da doutrina das ideai normatizada no Peri

ideōn segundo diferentes vertentes de circulaccedilatildeo que espraiam usos itere-se desde o

seacuteculo XV15

12 PATILLON M La theacuteorie du discours chez Hermogegravene le rheacuteteur essai sur les structures linguistiques

de la rheacutetorique ancienne Paris Les Belles Lettres 1988 pp 8-18 HERMOGENE Lrsquoart rheacutetorique

Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 pp

39-40 124 13 Recorda nesse sentido Luiza Loacutepez Grigera a praacutetica da ekphrasis preceitudada nos exerciacutecios

retoacutericos ldquoCuando leemos algunos de esos retratos medievales femeninos como el de la reina de las Amazonas en el Libro de Alexandre o el de la ldquoduentildeardquo ideal en el Buen Amor el de Melibea en La

Celestina o qualquiera de los retratos de raigambre petrarquesca en que se presenta la belleza femenina

descendentemente desde el pelo hacia abajo estamos leyendo un fruto de los meacutetodos propuestos por esos

tratados de ejercitacionesrdquo cf LOacutePEZ GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Salamanca

Universidad de Salamanca 1994 pp 72-73 14 Remete-se agraves aulas de ldquoEsteacuteticardquo (FLF 5083) ministradas pelo professor Leon Kossovitch entre 11 de

agosto de 2006 e 2 de novembro de 2006 15 Luiza Loacutepez Grigera faz consideraccedilotildees a esse respeito bastante interessantes ldquo[] na Ruacutessia ndash como me

dizia um antigo colega da Universidade de Michigan o professor Stanislav Matejka ndash o ensino de retoacuterica

bizantina continuou sendo ministrado no seacuteculo XX isto eacute continuaram sendo lidos ininterruptamente os

textos natildeo soacute de Aristoacuteteles mas de Demeacutetrio Dioniacutesio de Halicarnasso Hermoacutegenes e seus comentaristas

14

Para fazecirc-lo persegue-se a hipoacutetese de que a defesa do gecircnero misto do discurso

ou a defesa do gecircnero de poema misto no uso do discurso de feiccedilatildeo vaacuteria supotildee a

presenccedila doutrinaacuteria de retores gregos como Hermoacutegenes (ou Demeacutetrio ou Dioniacutesio de

Halicarnasso) cujos tratados ganharam legibilidade em terras italianas espanholas e

portuguesas e assim se mantiveram ateacute se verem romanticamente em desuso visto que

inexpressivas julgadas precinto aristocraacutetico de antigo regime bizantinice ou recurso

artificioso de poeta afetado e passadista Como se sabe

De modo a pensar essa hipoacutetese o primeiro passo da tese intitulado ldquoDoutrina do

mistordquo parte do ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos (1597-1665) proacutelogo de

matiz demonstrativo agrave Ulyssea ou Lisboa Edificada poema heroico de Gabriel Pereira

de Castro (1636) 16 e percorre usos possiacuteveis da retoacuterica de Hermoacutegenes e do Peri ideōn

entre tradutores comentadores e glosadores do tratado desde Jorge de Trebizonda ateacute

Jerocircnimo Soares Barbosa inteacuterprete setecentista de Quintiliano Como conveacutem a tese

potildee agrave vista usos em liacutengua portuguesa e se alastra por autores ibeacutericos e itaacutelicos mirando

a movecircncia dos termos da doutrina de Hermoacutegenes no latim e nos vernaacuteculos Manuel

de Galhegos eacute pretexto para que se avente a pluralidade dos usos histoacutericos do corpo

retoacuterico em questatildeo

O segundo passo denominado ldquoAnatomia do monstrordquo dedica-se por uma parte

ao vitupeacuterio da tragicomeacutedia e de Il Pastor Fido poema dramaacutetico de Giovanni Battista

Guarini (1538-1612) cuja primeira impressatildeo veio a puacuteblico em Veneza em 159017 tal

como proposto na Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral e de todas as

suas especies principaes tratadas com juizo critico (1759) de Francisco Joseacute Freire em

conformidade com o Discorso di Iason Denores intorno a quersquo Principii Causae et

Accrescimenti che la Commedia la Tragedia et il Poema Heroico Ricevono dalla

Filosofia Morale amp Ciuile amp darsquo Gouernatori delle Republiche (1587) de Giason

Denores professor da Universidade de Paacutedua Dedica-se por outra parte ao elogio do

considerando-os justamente os melhores coacutedigos de produccedilatildeo artiacutestica A Europa por outro lado perdera

todos esses textos desde fins do seacuteculo XVIIIrdquo cf LOacutePEZ GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo

de oro Salamanca Universidad de Salamanca 1994 p 74 cf BURKE P As fortunas drsquoO Cortesatildeo Satildeo

Paulo Editora da Unesp 1995 pp 14-15 16 Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de Castro

Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do Reyno de

Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor del Rey

1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro 17 Il Pastor Fido Tragicomedia Pastorale di Battista Gvarini Dedicata al SerMO D Carlo Emanvele Dvca

di Savoia ampc Nelle Reali Nozze di SA con la serma Infante D Caterina dAvstria Con privilegi In Venetia

Presso Gio Battista Bonfadino [1590]

15

gecircnero tragicocircmico composto em resposta pelo poeta Giovanni Battista Guarini em 1588

sob o tiacutetulo de Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra

le tragicomedie e le pastorali in un suo discorso di poesia Interessam na anaacutelise

apresentada o confronto de autoridades que firmam o vitupeacuterio e o elogio e sobretudo

a defesa da tragicomeacutedia amparada nas liccedilotildees de retores gregos como Hermoacutegenes

Isto seja natildeo se lecirc a Ulyssea ou Lisboa Edificada de Gabriel Pereira de Castro

nem Il Pastor Fido de Giovanni Battista Guarini Tomam-se esses poemas como exempla

Lecirc-se o que letrados como os referidos escreveram sobre ambos a fim de que se

vasculhe a presenccedila em terras italianas portuguesas ou espanholas entre fins do seacuteculo

XV e meados do XVIII da preceptiva retoacuterica que Hermoacutegenes propotildee no Peri ideōn

16

DOUTRINA DO MISTO

In Venice Tassorsquos echoes are no more

And silent rows the songless gondolier

Her palaces are crumbling to the shore

And music meets not always now the ear

Those days are gone [hellip]

GEORGE GORDON BYRON

Childe Harolds Pilgrimage18

Il est en litteacuterature des genres de meacuterite deacutelicieux mais qui ne peuvent pas

durer plus de trois ou quatre siegravecles Lucien est ennuyeux aujourdrsquohui comme

Candide le sera peut-ecirctre en lrsquoanneacute 2200

STENDHAL

Rome Naples et Florence19

Estampado postumamente em Lisboa em 1636 por Lourenccedilo Crasbeeck

impressor reacutegio e dedicado a D Felipe IV de Castela rei de Espanha e de Portugal o

poema Ulyssea ou Lisboa Edificada de Gabriel Pereira de Castro (1571-1632) publicou-

se precedido em sua primeira ediccedilatildeo do ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos

(1597-1665)20 Agrave guisa de prefaacutecio como soacutei ocorrer o discurso incorporado a ediccedilotildees

posteriores do poema 21 mas excluiacutedo da mais recente preparada por Joseacute Antoacutenio

18 Childe Harolds Pilgrimage Canto The Fourth By Lord Byron London John Murray Albemarle-

Street 1818 p 4 Na traduccedilatildeo oitocentista de Francisco Joseacute Pinheiro Guimaratildees publicada no Rio de

Janeiro em 1863 os versos assim satildeo traduzidos ldquoJaacute natildeo se ouve em Veneza o echo do Tasso Sem cantar

mudo rema o gondoleiro Sobre a praia os palacios seus desabatildeo Mais natildeo se escuta a musica incessante

Esses tempos laacute vatildeo []rdquo cf Traducccedilotildees Poeticas de F J Pinheiro Guimaratildees Bacharel em Sciencias

Sociais e Juridicas Childe Harold e Sardanapalo de Lord Byron o Roubo da Madeixa de Pope Hernani

de Victor Hugo Rio de Janeiro Typographia Universal de Laemmert Rua dos Invalidos 61 B 1863 p 69 19 ldquoHaacute em literatura gecircneros de meacuteritos deliciosos mas que natildeo podem durar mais do que trecircs ou quatro

seacuteculos Luciano eacute tedioso hoje como Cacircndido [de Voltaire] talvez o seja no ano 2200rdquo cf STENDHAL

Rome Naples et Florence Paris Michel Leacutevy Fregraveres Libraires-Eacutediteurs 1854 p 98 Traduccedilatildeo nossa 20 Daqui em diante seraacute citada a editio princeps da obra Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico

Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp

nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila

em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de

liuro 21 Foram consultadas cinco ediccedilotildees da obra em versotildees digitalizadas Ao que parece o ldquoDiscurso Poeacuteticordquo

de Manuel de Galhegos natildeo foi incorporado apenas agrave 2ordf ediccedilatildeo datada incertamente de 1642 e publicada

como se crecirc em Amsterdatilde O ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos consta das demais ediccedilotildees isto

17

Segurado e Campos 22 e tornado hoje tatildeo obsoleto quanto a narrativa das accedilotildees do

astucioso Ulisses fundador fabular de Lisboa eacute juiacutezo encomiaacutestico que busca enaltecer

a engenhosidade do poeta e salientar-lhe o domiacutenio artiacutestico por meio da avaliaccedilatildeo

elogiosa da obra

Como uso que se faz da escrita o juiacutezo instaura os criteacuterios de adequaccedilatildeo

ldquoconformes agraves significaccedilotildees dominantesrdquo diriam Gilles Deleuze e Claire Parnet de justa

recepccedilatildeo do poema23 Julgar bem nesses termos eacute estabelecer padrotildees para fazecirc-lo eacute

operaccedilatildeo de criacutetica como arte de julgar de apreciaccedilatildeo autorizada que se constitui

precipuamente por meio da observaccedilatildeo de ldquoexcelecircncias que devem deleitar um leitor

sensatordquo24 Isto o que ensina o poeta inglecircs John Dryden (1631-1700) em ldquoThe Authorrsquos

Apology for Heroic Poetry and Poetic Licencerdquo discurso de matiz epidiacutetico de 1677 que

prefacia The state of innocence and fall of man adaptaccedilatildeo para os palcos em verso

heroico do Paradise Lost poema eacutepico de John Milton (1667)

Sabe o leitor de Gabriel Pereira de Castro desde o rosto da ediccedilatildeo de 1636 que a

Ulyssea ou Lisboa Edificada eacute poema heroico pois circunscreve-se a obra a este gecircnero

de poemas

eacute das de 1745 1826 e 1827 Aleacutem da editio princeps consultaram-se as seguintes ediccedilotildees (2ordf ed) Ulyssea

ov Lisboa Edificada Poema heroico de Gabriel Pereira de Castro do Conselho de El Rey noszligo senhor

[Sl sn 1642] (3ordf ed) Ulyssea ou Lisboa Edificada Poema heroico composto pelo insigne doutor

Gabriel Pereira de Castro corregedor que foy do Crime da Corte e nomeado por Sua Magestade para

Chanceller moacuter do Reyno de Portugal Offerecido a El Rey D Joam V Nosso Senhor Lisboa Na Officina

de Miguel Rodrigues Impressor do Senh Card Patriarc M DCC XLV [1745] Com as licenccedilas

necessarias (4ordf ed) Ulysseacutea ou Lisboa Edificada Poema heroico de Gabriel Pereira de Castro Quarta

ediccedilatildeo Lisboa na Typographia Rollandiana 1826 Com Licenccedila da Mesa do Desembargo do Paccedilo (5ordf ed)

Ulysseacutea ou Lisboa Edificada Poema heroico de Gabriel Pereira de Castro Quarta ediccedilatildeo Lisboa na

Typographia Rollandiana 1827 Com Licenccedila Vende-se em casa de Rolland Rua Nova dos Martyres N

10 abaixo do Theatro de S Carlos 22 CASTRO G P DE Ulisseia ou Lisboa edificada Texto estabelecido e comentado por J A

Segurado e Campos Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 2000 23 Cf DELEUZE G PARNET C Diaacutelogos Traduccedilatildeo de Joseacute Gabriel Cunha Lisboa Reloacutegio DrsquoAacutegua

Editores 2004 p 34 24 Leia-se ldquoCriticism as it was first instituted by Aristotle was meant a standard of judging well the

chiefest part of which is to observe those excellencies which should delight a reasonable readerrdquo cf

DRYDEN J Drydenrsquos Essays Introduction by W H Hudson London New York J M DENT amp SONS

LTD 1954 p 108 Raphael Bluteau assim define o substantivo ldquocriacuteticardquo ldquoCRITICA Critica A arte de

julgar dos escritos dos Antigos ampc De scriptis veterum judicandi ars tis Fem Alguns escritores modernos

dizem Critice es Quintiliano no cap 14 do livro 5 acha que he melhor usar a palavra Grega Namque illi

homines (diz este Author fallando nos Criticos) docti amp inter doctos verum quaerentes minutius amp scrupulosius scrutantur omnia amp ad liquidum confessumque perducunt ut qui sibi inveniendi amp judicandi

partes quarum alteram alteram vocantrdquo cf BLUTEAU R Vocabulario portuguez amp

latino aulico anatomico architectonico Coimbra Collegio das Artes da Companhia de Jesu 1728

volume II p 615

18

Figura 1 Frontispiacutecio de Ulyssea ou Lisboa Edificada (1636)25

Trata-se isso parece claro natildeo apenas de afirmar que a Ulyssea ou Lisboa

Edificada eacute poema e de inscrever-lhe no regime aristoteacutelico da mimēsis como obra de

artiacutefice da palavra que natildeo se confunde com as obras de filoacutesofos historiadores ou

oradores porque poeacutetica senatildeo tambeacutem mais particularmente de definir-lhe o traccedilo

especiacutefico e indicar que este poema de Gabriel Pereira de Castro natildeo eacute trageacutedia natildeo eacute

comeacutedia natildeo eacute soneto natildeo eacute saacutetira natildeo eacute elegia natildeo eacute epigrama natildeo eacute silva natildeo eacute

25 Trata-se de frontispiacutecio de exemplar do acervo da Biblioteca Nacional de Portugal Este exemplar

pertenceu agrave Ordem dos Eremitas Descalccedilos de Santo Agostinho ao Convento de Nossa Senhora da

Conceiccedilatildeo do Monte Olivete em Lisboa Disponiacutevel em lthttppurlpt12170gt Acesso em 3 de dezembro

2014

19

epitalacircmio e natildeo eacute no mais tudo o que natildeo seja heroico

Para Manuel de Galhegos auctoritas cujo nome daacute anuecircncia de erudiccedilatildeo e de

discriccedilatildeo agrave Ulyssea ou Lisboa Edificada e para o destinataacuterio nela inscrito tipo

semelhantemente discreto nas palavras de Joatildeo Adolfo Hansen capaz de ldquoajuizar a

teacutecnica da forma poeacuteticardquo porque conhecedor e reconhecedor das regras da arte que a

instituem eacute evidente que a distinccedilatildeo geneacuterica e a diferenciaccedilatildeo especiacutefica efetivadas pelo

aposto ao tiacutetulo ndash ldquopoema heroicordquo ndash operam-se na constituiccedilatildeo dos protocolos de

recepccedilatildeo da obra de maneira a indiciar o ato empiacuterico de leitura visto que implicam os

coacutedigos discursivos manejados pelo poeta e partilhados com o tipo discreto a que ela se

destina26 Essa distinccedilatildeo aristotelicamente implica que a Ulyssea ou Lisboa Edificada

entenda-se como poema tecnicamente composto no domiacutenio do gecircnero heroico segundo

preceitos artiacutesticos que agenciam conveniecircncias e verossimilhanccedilas de invenccedilatildeo de

disposiccedilatildeo e de elocuccedilatildeo sempre particulares em concordacircncia com os usos

estabelecidos e com as autoridades consideradas exemplares no gecircnero do poema Essas

autoridades satildeo Homero Virgiacutelio Luiacutes de Camotildees e Torquato Tasso de acordo com

costume repetidiacutessimo no discurso letrado do tempo de Gabriel Pereira de Castro e de

Manuel de Galhegos

O Proacutelogo drsquoEl Macabeo poema heroico do portuguecircs Miguel de Silveira (ca

1576) impresso em Naacutepoles em 1638 em tom epidiacutetico o explicita

Tuuierotilde los Griegos a Homero honor de su patria por cuya naturaleza

litigarotilde tatildetas Ciudades Los Latinos despues a Virgilio que solo cotilde su

imitaccedilotilde ha conseguido inmortal renombre fauorecio a los modernos

nuestra edad con el Tasso gloria de Italia y emulacion de los antiguos

y con Camoins lustre de Lusitania que excedio a muchos en el spiritu

y siendo estos Varones tan insignes apenas hatilde alcanzado la perfecion

dela Epopeia como se ve en las objeciones que les ponen los que han

escrito poeticas27

26 Alexander Pope (1688-1744) escreve em seu An essay on criticism (1711) ldquoA perfect Judge will read

each work of Wit With the same Spirit that its author Writrdquo (ldquoUm perfeito Juiz leraacute cada obra de Engenho

Com o mesmo espiacuterito com que seu autor escreveurdquo) cf POPE Alexander Poemas Satildeo Paulo Nova

Alexandria 1994 p 40 Traduccedilatildeo nossa 27El Macabeo Poema heroico de Migvel de Silveira En Napoles por Egidio Longo Stampador Real Antildeo

1638 sp Ademais tambeacutem elogioso e natildeo poderia evidentemente deixar de secirc-lo eacute o soneto de Francisco

Lopez a Camotildees que se lecirc nas Rhythmas de Lvis de Camoes divididas em cinco partes Dirigidas ao muito

illustre senhor D Gonccedilalo Coutinho Impressas com licenccedila do supremo Conselho da geral Inquisiccedilatildeo amp

Ordinario Em Lisboa por Manvel de Lyra Anno de M D LXXXXV [1595] A custa de Esteuatildeo Lopez

20

Tiveram os Gregos a Homero honra de sua paacutetria por cuja natureza

litigaram tantas Cidades Os Latinos depois a Virgiacutelio que somente

com sua imitaccedilatildeo conseguiu imortal renome favoreceu aos modernos

nossa idade com o Tasso gloacuteria da Itaacutelia e emulaccedilatildeo dos antigos e com

Camotildees lustre da Lusitacircnia que excedeu a muitos no espiacuterito e sendo

estes Varotildees tatildeo insignes apenas alcanccedilaram a perfeiccedilatildeo da Epopeia

como se vecirc nas objeccedilotildees que lhes potildeem os que escreveram poeacuteticas 28

Esses preceitos as liccedilotildees poeacuteticas retoacutericas e gramaticais regulam nesse tempo

os usos discursivos da poesia e ademais instituem e referendam por convenccedilatildeo os usos

considerados exemplares Para Manuel de Galhegos fornecem motivaccedilotildees e argumentos

pois que a afirmaccedilatildeo das excelecircncias de Gabriel Pereira de Castro fundamenta-se na

defesa da adequaccedilatildeo do poema a esses preceitos agraves liccedilotildees relativas ao gecircnero em que o

poeta compotildee O gecircnero o ldquoDiscurso Poeacuteticordquo assim o define

O poema heroico he hũa poesia leuantada q tem por fim celebrar das

acccediloẽs do heroe valeroso a q foi mais digna de memoria29

Breves os termos da definiccedilatildeo supotildeem coacutedigos partilhados e pode-se considerar

usos endoxais O adjetivo ldquoheroicordquo eacute helenismo do grego hēroikos ( e registra-

se no Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum de Antocircnio de

Nebrija (1441-1522) em duas acepccedilotildees latinas concordes segundo as ediccedilotildees de

Antueacuterpia de Jan Steels de 1560 e de 157030 Quais sejam ldquoHeroicus a um id est res

mercador de libros sp ldquoEstagrave o pintor famoso attento amp mudo Pintando amp recebendo mil louuores Pelo

que retratou de varias cores Com engenho sutil viuo amp agudo Quem he este que fala amp pinta tudo

O ceo a terra o mar o catildepo as flores Aues amp animais Nymphas amp pastores Co diuino pincel do grande

estudo O Principe seragrave do gran Parnaso Ou o Grego excellente amp soberano Ou Torcato tambem q

em verso canta Ese natildeo he Virgilio Homero ou Tasso E he como parece Lusitano He Luis de Camotildees

q o mundo espatildetardquo 28 Traduccedilatildeo nossa 29 Cf Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de

Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro sp 30 Cf Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum Aelio Antonio Nebrissensi

interprete nunc denuo ingenti vocum accessione locupletatum pristinoque nitori sublata mendarum

colluuie restitutum Ad haec Dictionarium propriorum nominum ex probatiszligimis Graecaelig amp Latinaelig linguaelig

autoribus addita ad calcem neoterica locorum appellatione concinnatum Antuerpiae In AEligdib Ioannis

Steelij M D LX [1560] Cum Priuilegio Regis E tambeacutem cf Dictionarium Latino hispanicum et vice

versa Hispanico latinum Aelio Antonio Nebrissensi interprete nunc denuo ingenti vocum accessione

locupletatum pristinoq nitori sublata mendarum colluuie restitutum Ad haec Dictionarium propriorum

21

ad heroas pertinensrdquo e ldquoHeroicum carmem appellatur quod est Hexametrumrdquo31 donde

ldquoheroicordquo seja o que eacute atinente ao heroacutei (no latim ldquoherosrdquo) ldquoaquele que de homem mortal

fez-se deusrdquo (ldquoqui ex homine mortali factus est deusrdquo) e ldquocanto heroicordquo seja canto

composto em verso hexacircmetro32 Carmen inis precisa Antocircnio de Nebrija emprega-se

ou ldquopor el cantar o cancion o cantordquo ou ldquopor la obra compuesta en versordquo ou ldquopor vn

solo verso y a vezes por dosrdquo donde ldquocarmen rerum heroicarumrdquo (ldquocanto de casos

heroicosrdquo) designe-se por ldquoEposrdquo donde ldquoEpicusrdquo na ediccedilatildeo madrilenha do dicionaacuterio

estampada em 1638 defina-se como ldquoHeroicusrdquo e ldquoEpicus Poetardquo por desdobramento

defina-se como ldquoPoeta de verso heroicordquo Nesta ediccedilatildeo de Madri o verbete latino

ldquoHerosrdquo ganha complemento e ldquoheroacuteirdquo eacute tambeacutem ldquoSentildeor que tiene excelente virtud

Varon noble cauallero ilustrerdquo33

Essas duas acepccedilotildees do adjetivo ldquoheroicordquo recolhidas em latim e em espanhol nas

ediccedilotildees do Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum de Antocircnio

de Nebrija registram-se semelhantemente no tratado dialoacutegico Philosophia antigua

poetica (1596) de Alonso Loacutepez Pinciano (ca 1547-1627) Na epiacutestola undeacutecima que

integra a obra dedicada agrave poesia heroica o autor afirma a Fradique e a Ugo seus

interlocutores saber natildeo soacute que ldquose dixo epica y epopeya del metro heroyco con q se haze

la imitacionrdquo ou seja que ldquose disse eacutepica e epopeia do metro heroico com que se faz a

imitaccedilatildeordquo no gecircnero mas tambeacutem que ldquoheroyca [] se dize porq es imitacion de Heroes

y personas grauissimasrdquo ou seja que ldquoheroica [] se diz [a poesia] porque eacute imitaccedilatildeo

de Heroacuteis e pessoas graviacutessimasrdquo34

Nota-se as acepccedilotildees do adjetivo satildeo retoacuterica gramaacutetica e poeticamente legiacuteveis

Viu-se conforme Antocircnio de Nebrija heroico pode ser o caso ldquores ad heroas pertinensrdquo

nominum ex probatiszligimis Graecaelig amp Latinaelig linguaelig autoribus addita ad calcem neoterica locorum

appellatione concinnatum Antuerpiae In AEligdibus viduaelig amp haeligredum Ioannis Steelij M D LXX [1570]

Cum Priuilegio Regis 31 Segundo as ediccedilotildees citadas do Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum haacute

sinocircnimo ldquoHeroum siue heroicum carmen ab heroibus dictumrdquo 32 Segundo as ediccedilotildees citadas do Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum o hexacircmetro assim eacute definido ldquoHexametrum carmem quod sex pedibus constatrdquo isto eacute ldquocanto hexacircmetro

o que consta de seis peacutesrdquo 33 Dictionarium Aelii Antonii Nebrissensis grammatici chronographi regii imo recens accessio facta ad

quadruplex eiusdem antiqui dictionarij supplementum [hellip] Antildeo 1638 Cvm Priuilegio Regis Matriti Ex

Typographia Regia Expensis Gabrielis agrave Leon Bibliopolaelig 34 Cf Philosophia antigua poetica del doctor Alonso Lopez Pinciano Medico Cesareo Dirigida al Conde

Ihoanes Keuehiler de Aichelberg hellip En Madrid Por Thomas Junti M D XCVI [1596] p 453 O passo de

Alonso Loacutepez Pinciano eacute o seguinte ldquo[hellip] se que se dixo epica y epopeya del metro heroico con q se haze

la imitacion y q heroyca tambien se dize porq es imitacion de Heroes y personas grauissimasrdquo Em traduccedilatildeo

nossa ldquo[hellip] sei que se disse eacutepica e epopeia do metro heroico com que se faz a imitaccedilatildeo e que heroica

tambeacutem se diz porque eacute imitaccedilatildeo de Heroacuteis e pessoas graviacutessimasrdquo

22

heroica pode ser a mateacuteria de invenccedilatildeo de poema como a Ulyssea ou Lisboa Edificada

que tematiza os feitos notaacuteveis e a fama do heroacutei Tal como nas referidas ediccedilotildees de

Antueacuterpia do Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum na editio

princeps de 1611 do Tesoro de la Lengua Castellana o Espantildeola do licenciado D

Sebastiaacuten de Covarrubias Orozco (1539-1613) o adjetivo ldquoheroicordquo conforma-se ao

homem mortal como que divinizado Para o licenciado

EROICO como hecho heroico vale ilustre grande dixose de la

palabra heros heroi que cerca de los antiguos significaua tanto como

hombres que no embargante fuessen mortales eran sus hazantildeas tan

grandiosas que parecia tener en si alguna diuindad35

HEROICO como feito heroico equivale a ilustre grande diz-se da

palavra ldquoherosrdquo heroacutei que entre os antigos significava o mesmo que

homens que embora fossem mortais eram suas faccedilanhas tatildeo

grandiosas que pareciam ter em si alguma divindade 36

Trata-se de doutrina condizente com a liccedilatildeo exposta no princiacutepio do livro VII da

Eacutetica a Nicocircmaco De acordo com Aristoacuteteles esse ldquohomem divinordquo (σεῖος ἀνήρ em que

o adjetivo ldquoσεῖοςrdquo eacute variante de ldquoθεῖοςrdquo) os homens que se ldquotornam deusesrdquo

(ldquoγίνονται θεοὶrdquo) assim se fazem pelo excesso de virtude (ldquoδι᾽ἀρετῆς ὑπερβολήνrdquo) e

agrave maneira de Heitor personagem da Iliacuteada homeacuterica satildeo dotados de virtude ldquoheroica e

divinardquo que estaacute ldquoaleacutem de noacutesrdquo (ldquoὑπὲρ ἡμᾶςrdquo) e cujo avesso eacute a brutalidade a

bestialidade (ldquoθηριότηςrdquo)37 Trata-se de doutrina condizente tambeacutem com a Poeacutetica Eacute

sabido que para Aristoacuteteles a epopeia e a trageacutedia assemelham-se pela mateacuteria de

imitaccedilatildeo 38 de modo que segundo o decoro em que se inscrevem esses gecircneros de

poemas sejam imitados ldquoagentesrdquo (ldquoπράττονταςrdquo)39 ldquohomens em accedilatildeordquo na traduccedilatildeo

35 Tesoro de la Lengva Castellana o Espantildeola Compvesto por el licenciado D Sebastian de Cobarruuias

Orozco Capelan de su Magestade Mastrescuela y Canonigo de santa Iglesia de Cuenca y consultor del

santo Oficio de la Inquisicion Dirigido a la Magestad Catolica del Rey Don Felipe III nestro sentildeor Con

Privilegio En Madrid por Luis Sanchez impressor del Rey N S Antildeo del Sentildeor M DC XI [1611] p 360r-

v 36 Traduccedilatildeo nossa 37 Cf ARIST Nic Eth 1145 18-20 23-4 29 38 Cf ARIST Poet 1447 a 14-18 39 Cf ARIST Poet 1448 a 1

23

de Eudoro de Souza ldquomelhores do que noacutesrdquo 40 cujos caracteres se distingam pela

virtude 41 Aristotelicamente na arte da poesia assim faz Homero que imita ldquoos

melhoresrdquo (ldquoβελτίουςrdquo)42 assim tambeacutem faz na arte da pintura Polignoto ldquopintor de

caracteresrdquo (ldquoἠθογράφοςrdquo) de ldquohomens superioresrdquo 43

De acordo com Sebastiaacuten de Covarrubias Orozco a excelecircncia do heroacutei

virtuosiacutessimo decorre da grandiosidade de suas faccedilanhas (ldquoeran sus hazantildeas tan

grandiosas que parecia tener en si alguna diuindadrdquo) as quais fazem dele figura

ldquogranderdquo ldquoilustrerdquo e tambeacutem ldquoSentildeor que tiene excelente virtud Varon noble cauallero

ilustrerdquo segundo a periacutefrase que se apresenta no Dictionarium Aelii Antonii Nebrissensis

de 1638 Note-se que para Antocircnio de Nebrija o termo ldquoillustrisrdquo em latim designa

ldquocosa esclarecida o famosa en bienrdquo 44 e para Sebastiaacuten de Covarrubias Orozco

ldquoillustrerdquo alude ademais a ldquoel hombre noble de alto linaje y de gratilde renombre y famardquo45

digno de memoacuteria cujas accedilotildees gloriosas cantam versos heroicos tais quais os de Gabriel

Pereira de Castro Nos termos da Poeacutetica pode-se supor decorrer a excelecircncia do heroacutei

da gravidade de seus feitos eacute de primazia das accedilotildees ante os caracteres visto penderem

estes daquelas46 visto fazer-se das faccedilanhas o heroacutei segundo a preceituaccedilatildeo aristoteacutelica

do gecircnero O poeta assim agrave maneira do etoacutegrafo Polignoto forja neste gecircnero de poemas

elevado feiccedilatildeo bastante bem definida o ēthos de tipo ilustre47 Nos termos da liccedilatildeo que

Torquato Tasso apresenta em seu Discorsi dellrsquoarte poetica ed in particolare sopra il

poema eroico estampado em 1587 trata-se do tipo que se notabiliza exemplarmente pela

suma virtude Eneias notabiliza-se pela piedade Aquiles pela fortaleza em combate

40 Cf ARIST Poet 1448 a 4 Deve chamar a atenccedilatildeo que na Eacutetica a Nicocircmaco a afirmaccedilatildeo da virtude desse homem mortal como que divinizado estaacute amparada em sua condiccedilatildeo de superioridade eacutetica em relaccedilatildeo aos

demais ou melhor condiccedilatildeo de quem estaacute ldquoaleacutem de noacutesrdquo (ὑπὲρ ἡμᾶς) ao passo que na Poeacutetica a

caracterizaccedilatildeo decorosa desses agentes dignos de imitaccedilatildeo na epopeia prescreve que sejam ldquomelhores do

que noacutesrdquo (καθ᾽ἡμᾶς) 41 Apontam os helenistas trata-se de interpolaccedilatildeo ao texto cf ARIST Poet 1448 a 4 42 Cf ARIST Poet 1448 a 11-12 43 Cf ARIST Poet 1450 a 27 44 Equivalem as trecircs ediccedilotildees consultadas cf Dictionarium Aelii Antonii Nebrissensis grammatici

chronographi regii imo recens accessio facta ad quadruplex eiusdem antiqui dictionarij supplementum

[hellip] Antildeo 1638 Cvm Priuilegio Regis Matriti Ex Typographia Regia Expensis Gabrielis agrave Leon

Bibliopolaelig p 100v 45 Tesoro de la Lengva Castellana o Espantildeola Compvesto por el licenciado D Sebastian de Cobarruuias

Orozco Capelan de su Magestade Mastrescuela y Canonigo de santa Iglesia de Cuenca y consultor del

santo Oficio de la Inquisicion Dirigido a la Magestad Catolica del Rey Don Felipe III nestro sentildeor Con

Privilegio En Madrid por Luis Sanchez impressor del Rey N S Antildeo del Sentildeor M DC XI [1611] p 500v 46 Cf MUHANA A A Epopeacuteia em Prosa Seiscentista uma definiccedilatildeo de gecircnero Satildeo Paulo Editora da Unesp

1997 p111 47 Cf MARTINS P ldquoVt Pictura Rhetoricardquo Revista USP Satildeo Paulo n91 setnov 2011 p 106

24

Ulisses pela prudecircncia Amadis de Gaula 48 pela lealdade e Bradamante 49 pela

constacircncia50

Conforme Antocircnio de Nebrija viu-se tambeacutem heroico natildeo eacute soacute o caso de invenccedilatildeo

poeacutetica pode tambeacutem ser o carmen Assim especifica-se pela natureza da mateacuteria que

se canta o canto a obra em verso hexacircmetro ou o verso nessa medida donde se usem

segundo os passos autorizados pelo nome de Antocircnio de Nebrija os termos ldquocanto

heroicordquo e ldquoeposrdquo para o canto adequado a esse caso A liccedilatildeo no mais concordante com

a descriccedilatildeo que Sebastiaacuten de Covarrubias Orozco no Tesoro de la Lengua Castellana o

Espantildeola faz dos usos do adjetivo espanhol ldquoepicordquo51 eacute condizente com a doutrina do

gramaacutetico latino Diomedes (seacutec IV dC) cuja Arte gramatical define o epos como

ldquoinclusatildeo das accedilotildees divinas heroicas e humanas no canto hexacircmetrordquo (ldquoEpos dicitur

Graeligce carmine hexametro divinarum rerum et heroicarum humanarumque

comprehensiordquo) e assimila o termo grego ldquoeposrdquo natildeo soacute ao latim ldquocarmenrdquo (ldquoLatine paulo

communis Carmen auditurrdquo isto eacute ldquoEm latim ouve-se dizer pouco mais comumente

lsquocantorsquordquo) mas tambeacutem ao metro hexacircmetro (ldquoPraeligcipue uero hexameter uersus Epos

diciturrdquo isto eacute ldquoNa verdade o verso hexacircmetro se diz precipuamente eposrdquo) de modo a

assimilar a espeacutecie de poema composto agrave espeacutecie meacutetrica empregada52

Ressalte-se as prescriccedilotildees de Antocircnio de Nebrija e de Sebastiaacuten de Covarrubias

Orozco de Alonso Loacutepez Pinciano e de Manuel Pires de Almeida satildeo tambeacutem

48 Lido no seacuteculo XVI em Garci Rodriacuteguez de Montalvo (1440-1504) 49 Heroiacutena de Orlando Innamorato de Matteo Maria Boiardo (1441-1494) e de Orlando Furioso de

Ludovico Ariosto (1474-1533) 50 Discorsi del Signor Torquato Tasso DellrsquoArte Poetica et in particolare del Poema Heroico Et insieme

il Primo Libro delle Lettere scritte agrave diuersi suoi amici lequali oltra la famigliaritagrave sono ripiene di molti

concetti amp auertimenti poetici agrave dichiaratione drsquoalcuni luoghi della sua Gierusalemme liberata Gli uni e

lrsquoaltre scritte nel tempo chrsquoegli compose detto suo Poema Non piu stampati Con Privilegi In Venetia

MDLXXXVII [1587] Ad instanza di Giulio Vassalini Libraro agrave Ferrara p 7r 51 Cf Tesoro de la Lengva Castellana o Espantildeola Compvesto por el licenciado D Sebastian de Cobarruuias Orozco Capelan de su Magestade Mastrescuela y Canonigo de santa Iglesia de Cuenca y

consultor del santo Oficio de la Inquisicion Dirigido a la Magestad Catolica del Rey Don Felipe III nestro

sentildeor Con Privilegio En Madrid por Luis Sanchez impressor del Rey N S Antildeo del Sentildeor M DC XI

[1611] p 358r ldquoEPICO Poeta el que escriue versos Heroicos contando hazantildeas de varones ilustres

verdaderas o fabulosas nombre Griego ἐπικός adiectiuũ agrave Graeco nomine ἔπς quod carmẽ significat amp

propriegrave hexametrumrdquo (ldquoEacutePICO Poeta o que escreve versos Heroicos contando faccedilanhas de varotildees ilustres

verdadeiras ou fabulosas nome Grego ἐπικός adjetivo pelo nome Greco ἔπς que significa canto amp

propriamente hexacircmetrordquo) 52 As traduccedilotildees citadas satildeo de Izabella Lombardi Garbellini GARBELLINI I L ldquoDos poemas (Diomedes Arte gramatical 3)rdquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2005 v 9 p 233 Ademais eacute espeacutecie de poema do gecircnero

comum ou misto (ldquoaut commune aut mixtum quod Graeligci aut appellantrdquo) como a Iliacuteada e

a Odisseia gecircnero caracterizado pelas interlocuccedilotildees do poeta e dos personagens (ldquopoeta ipse loquitur et

personae loquentes introducunturrdquo)

25

condizentes com os coacutedigos da Poeacutetica aristoteacutelica Aristoacuteteles afirma ser adequado agrave

epopeia o metro heroico (cf ARISTOT Poet 24 1459 b 32 ldquoμέτρον τὸ ἡρωικὸνrdquo) isto

eacute o hexacircmetro considerado pelo tratadista o mais imponente e o mais elevado dos metros

(cf ARISTOT Poet 24 1459 b 34-35 ldquoἡρωικὸν στασιμώτατον καὶ ὀγκωδέστατον

τῶν μέτρων ἐστίνrdquo) na medida em que se afasta da conversa (cf ARISTOT Poet 4 1449

a 28 ldquoδιάλεκτοςrdquo) habitualmente iacircmbica Na vulgarizaccedilatildeo que propotildee Ludovico

Castelvetro (ca 1501-1571) desse passo da Poeacutetica o verso proacuteprio da epopeia diz-se

ldquoverso misurato cio elrsquo heroicordquo (ldquoverso mesurado53 isto eacute o heroicordquo)54

Deve-se natildeo esquecer todavia liccedilatildeo que distancia da Poeacutetica de Aristoacuteteles a

codificaccedilatildeo quinhentista e seiscentista do gecircnero heroico empreendida por preceptistas

como Francesco Patrizi Alonso Loacutepez Pinciano ou Manuel Pires de Almeida a saber a

possibilidade de que se fizessem poemas em prosa de que natildeo se compusessem em verso

hexacircmetro ou hendecassiacutelabo as epopeias55 O verso e a prosa ensina o Livro V do tratado

Della Poetica de Francesco Patrizi (1529-1597) cujo tiacutetulo eacute ldquoSE POESIA SI POSSA fare in

prosardquo satildeo duas ldquomaniere generali del fauellare e di esprimere con parole i suoi

concettirdquo (maneiras gerais de fabular e de exprimir com palavras os seus conceitos)56 isto

eacute meios distintos de imitaccedilatildeo como costumeiramente referidas as categorias da mimēsis

A eleiccedilatildeo do verso ou da prosa nesse caso segundo Manuel Pires de Almeida trata-se de

diferenccedila apenas acidental e natildeo essencial da espeacutecie heroica de poemas donde no

ldquoDiscurso sobre o poema heroicordquo o preceptista portuguecircs defina o gecircnero como

ldquoimitaccedilatildeo comum de accedilotildees graves feita em linguagem ou metrordquoEvidentemente o

interesse do ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos no acircmbito do poema heroico eacute

outro no entanto vislumbra-se aqui o gecircnero misto Disse alhures Leon Kossovitch em

vista dos estudos de Adma Muhana sobre a epopeia em prosa ldquoo mais misto dos gecircnerosrdquo

Preceitua Manuel Pires de Almeida que como acidental o emprego do verso ou

da prosa da ldquolinguagemrdquo o poema heroico especifica-se natildeo porque seja imitaccedilatildeo visto

53 Isto eacute grave 54 Poetica drsquoAristotele uulgarizzata et sposta per Ludovico Castelvetro Stampata in Vienna dAustria per

Gaspar Stainhofer lanno del Signore MD LXX [1570] p 293v 55 O emprego da prosa ou do verso na construccedilatildeo do poema heroico discutiu-o pormenorizadamente Adma

Muhana no estudo A Epopeia em Prosa Seiscentista uma Definiccedilatildeo de Gecircnero Eacute extenso o debate e de

longa duraccedilatildeo 56 Cf Della Poetica di Francesco Patrici La Deca Disputata Nella quale e per istoria e per ragioni e

per autoritagrave dersquo grandi antichi si mostra la falsita et vi egrave aggiunto il trimerone del medesimo in riposta

alle oppositioni fatte dal signor Torquato Tasso al parer suo scritto in diffesa dellrsquoAriosto In Ferrara

Per Vittorio Baldini Stampator Ducale 1586 Con licenza de i Superiori p 94

26

artiacutesticos e mimeacuteticos os poemas todos no regime poeacutetico de costume aristoteacutelico senatildeo

porque seja comum isto eacute conforme o gramaacutetico latino Diomedes nem dramaacutetico

(drammatikon) como a trageacutedia ou a comeacutedia nem narrativo (exēgētikon) como a poesia

didaacutetica as Geoacutergicas de Virgiacutelio a Arte de amar de Oviacutedio e o Da natureza das coisas

de Lucreacutecio por exemplo mas misto (mikton) feito da construccedilatildeo combinada da locuccedilatildeo

imediata de personagens ao modo do drama e da intervenccedilatildeo mediata do poeta ao modo

da narraccedilatildeo (DIOM Art Gramm III 482 14-25) 57 senatildeo tambeacutem porque seja grave isto eacute

composto como figuraccedilatildeo de mateacuteria memoraacutevel por sua gravidade jaacute se sabe de

faccedilanhas grandiosas de heroacutei ilustre e virtuoso58

Nestes termos vale recordar que o poema heroico eacute de acordo com Manuel de

Galhegos ldquopoesia leuantada q tem por fim celebrar das acccediloẽs do heroe valeroso a q foi

mais digna de memoriardquo59 O particiacutepio ldquoleuantadordquo embora nesta acepccedilatildeo soe arcaizante

aos gostos e aos manuais de hoje natildeo deveria causar espeacutecie ao destinataacuterio inscrito na

obra Registra-se em liacutengua portuguesa no volume V do Vocabulario Portuguez amp

Latino de Raphael Bluteau (1638-1734) impresso em 1728 em emprego corrente nas

artes retoacutericas e poeacuteticas do tempo conforme as preceptivas dos genera dicendi

Levantado Sublime Altiloco Estilo levantado Grandis oratio ou

elatio amp altitudo orationis Cic Grande amp magnificum ou sublime

dicendi genus Discurso levantado Alta amp exaggerata oratio oratio

grandis splendida illustris Cic Esta cadencia que os Dactylos daotilde

aos versos hexametros he mais propria para o estilo leuantado Ille

Dactylicus numerus hexametrorum magniloquentiae est accommoda-

tior Cic Em outro lugar diz Homeri magni loquentia O levantado o

sublime estilo de Homero Fallar em estilo mais levantado Excelsius

57 Cf HASEGAWA A P Os limites do gecircnero bucoacutelico em Vergiacutelio um estudo das eacuteclogas dramaacuteticas Satildeo

Paulo Humanitas 2012 pp 56-7 58 Manuel Pires de Almeida faz anaacutelise da definiccedilatildeo Leia-se ldquoImitaccedilatildeo se potildee em lugar de gecircnero porque todos os poemas satildeo imitaccedilotildees comum por diferenccedila porque por tal se distingue do traacutegico cocircmico e

ditiracircmbico que satildeo poemas ativos e este narrativo e por grave das mais espeacutecies da poeacutetica menores

Feita em linguagem ou metro porque natildeo eacute da essecircncia da poeacutetica fazer-se em verso ou prosa o Filoacutesofo

falou aqui disjuntivo assim o tecircm todos seus comentadores e Scaliacutegero e Pinciano Muitos poemas temos

em prosa perfeitiacutessimos quais satildeo Heliodoro Leucipe e Clitofonte e outrosrdquo cf MUHANA A ldquoDiscurso

sobre o poema heroico Comentaacuteriordquo REEL Revista Eletrocircnica de Estudos Literaacuterios Vitoacuteria a 2 v 2

2006 p 2 59 Apud Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de

Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro sp

27

dicere60

Isto eacute sabe-se desde a Rhetorica ad Herennium (ca seacutec I aC) satildeo trecircs os genera

aos quais os discursos se reduzem ldquoet grave et mediocre et attenuatumrdquo a saber grave

mediacuteocre e atenuado (Rhet Her IV 11 16) No jargatildeo latino empregado por Ciacutecero apoacutes

as liccedilotildees do anocircnimo aponta Marcos Martinho dos Santos lendo o De oratore o Orator

o Brutus e o De optimo genere oratorum dos trecircs gecircneros um eacute ldquograve ou pleno ou

sublime ou amplo ou grandiacuteloquo ou veemente ou copiosordquo outro eacute ldquosutil ou tecircnue ou

atenuado ou compresso ou remisso ou humilderdquo outro enfim eacute ldquomeacutedio ou mediacuteocre ou

temperado ou moacutedico ou intermediaacuteriordquo61 Ora Manuel de Galhegos conhecedor das

doutrinas retoacutericas e poeacuteticas ao definir como ldquopoesia leuantadardquo o gecircnero de poema

heroico e por consequecircncia a Ulyssea ou Lisboa Edificada inscreve-os na codificaccedilatildeo

dos genera dicendi segundo o decoro que faz obedecer a elocuccedilatildeo poeacutetica agrave invenccedilatildeo No

trato da mateacuteria heroica a imitaccedilatildeo congruente ensinam os letrados quinhentistas e

seiscentistas do gecircnero agrave luz de preceptistas gregos e latinos supotildee elocuccedilatildeo ldquoentre a

gravidade simples do gecircnero traacutegico e a beleza florida do liacutericordquo ensina Joatildeo Adolfo

Hansen62

Em uso semelhante agrave guisa de exemplo tendo-se em vista autores ibeacutericos

anteriores a Raphael Bluteau e contemporacircneos de Gabriel Pereira de Castro o particiacutepio

ldquoleuantadordquo eacute lido em Francisco de Quevedo (1580-1645) No soneto amoroso agrave musa

Euterpe escreve ldquoPetrarca celebrograve su Laura bella Con ingenio y estilo leuantadordquo63

Eacute lido tambeacutem em Diego de Saavedra Fajardo (1584-1648) Na epiacutestola ao leitor que abre

a versatildeo valenciana de 1675 do tratado de educaccedilatildeo de priacutencipes Idea de un Principe

politico Christiano representada en cien Empresas cuja primeira ediccedilatildeo foi estampada

em Mocircnaco em 1640 afirma-se assim

60 BLUTEAU Raphael Vocabulario portuguez amp latino aulico anatomico architectonico Coimbra

Collegio das Artes da Companhia de Jesu 1728 volume V p 93 61 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

235 62 Cf HANSEN J A ldquoNotas sobre o gecircnero eacutepicordquo in Teixeira I (Org) Eacutepicos Satildeo Paulo Edusp

Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo 2008 p 78 63 Leia-se ldquoPetrarca celebroacute su Laura bella Con ingenio y estilo levantado E hizo al mundo eterno su

cuidado Y la rara belleza que vioacute en ella Viven hoy envidiosas muchas de ella Porque es digno de ser

muy envidiado Un ien tan alto y tandichoso estado Que nunca pueda el tiempo contra ella Yo solo aacute

tiacute gallarda Silvia hermosa A quien diacute el corazon en sacrificio Querria dejarte dela misma suerte Que

esta alma en adorarte venturosa Solo puede hacer este servicio Que no te ofenda el tiempo ni la muerterdquo

cf Las tres musas ultimas castellanas de Don Francisco de Quevedo Villegas Cavallero de la Orden de

Santiago Sentildeor de la Villa de la Torre de Juan-Abad M DC LXXI [1671] p 13

28

Con estudio particular he procurado que el estilo sea levantado sin

afectacioacuten y breve sin escuridad empressa que a Oracio pareciograve

dificultosa y que no la he visto intentada en nuestra lengua

Castellana64

Com estudo particular procurei que o estilo fosse levantado sem

afetaccedilatildeo e breve sem obscuridade empresa que a Horaacutecio pareceu

dificultosa e que natildeo vi tentada em nossa liacutengua Castelhana 65

Explicita-se Diego de Saavedra Fajardo aduz preceitos conhecidos da Epistula ad

Pisones de Horaacutecio (seacutec I aC) ao mirar estilo que seja ldquolevantado sin afectacioacutenrdquo e

tambeacutem ldquobreve sin escuridadrdquo Codifica a epiacutestola arrisca-se incongruentemente agrave

afetaccedilatildeo mala affectatio (cf QUINT VIII 3 56-58) 66 quem busca efetuar na elocuccedilatildeo

o estilo levantado sublime altiacuteloquo e arrisca-se agrave obscuridade quem busca a concisatildeo67

64 Cf Idea de un Principe politico Christiano representada en cien Empresas Dedicada al Principe de Las

Espantildeas nuestro Sentildeor por Don Diego Saavedra Fajardo En Monaco en la emprenta de Nicolao Eurico

1640 sp 65 Traduccedilatildeo nossa 66 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 pp 312 372 67 O passo da Epistula ad Pisones que interessa abarca os vv 14-31 Na ediccedilatildeo portuguesa de Joatildeo da Costa

das Obras de Horacio principe dos poetas latinos lyricos com o entendimento litteral amp construiccedilam

Portuguesa ornadas de hum index copioso das historias amp fabulas contiudas nelas Emendadas nesta

vltima Impressam Lisboa Na Officina de Ioam da Costa M DC LVVIII [1668] Com as licenccedilas

neceszligarias pp 426-7 lecirc-se ldquoPlerumque muitas vezes Inceptis nas empresas gravibus de importacircncia amp professis amp que promettem magna cousas grandes Assuitur se coze unus amp alter pannus hum amp outro

panno Purpureus encarnado se soem entrefachar digressotildees de fabulas que parece adornatildeo amp antes afeatildeo

a obra cugravem como quatildedo trattando de outra mateacuteria describitur se descreve lucus o bosque amp Ara amp o

Altar Dianaelig da Deosa Diana Et ambitus E o rodeio aquaelig properantis da agua que corre com furia agros

amœnos pelos campos verdes amp floridos Aut flumen Rhenum ou o rio Rheno n I aut arcus pluvius ou arco

da chuva ou o arco da velha tudo isto algũas vezes he muito bom Sed nunc mas agora nesta conjunccedilatildeo

non erat locus natildeo havia lugar his para estas cousas amp fortasse amp por vẽtura Scis simulare natildeo sabeis mais

que pintar cupressum hũ cipreste como o outro pintou amp quereis dar a entender que sabeis muito Quid

hoc para que pintais isto si qui pingitur se aquele que haacute de ser pintado aeligre dato tendovos dado o dinheiro

de antematildeo fractis Navibus quebradas as embarcaccedilotildees enanat nada exspes sem esperanccedila de se salvar quer

dizer que havia de pintar hũ naufragio amp ele pintalhe hum cipreste foacutera de proposito Cœpit comeccedilou institui a lavrarse pelo oleiro amphora hũa grande quarta cur porque razatildeo currente rota correndo a roda

donde se faz exit sae urceus hũ piqueno pucaro Hũns promettem muito amp saem com pouco Denique

finalmente quod vis o que quereis trattar dumtaxat sit seja sogravemente simplex sem mistura amp unum amp hũa soacute

cousa Pater ograve pay Pisaotilde amp juvenes amp vosotros mancebos digni dignos de ter filhos patre de tal pay

Maxima pars mayor parte uatum dos poetas Decipimur somos enganados specie com a apparencia recti de

ser hũa cousa boa laboro se procuro eszlige brevis ser breve fio me faccedilo Obscurus escuro sectantem ao que

segue leuia cousas faceis nerui as forccedilas animique amp os animos Deficiunt lhe faltatildeo professus o que

prende cotildepor grandes cousas grandia se incha turget amp esvaece tutus nimium amp o q procura ir mui seguro

timidusque amp estagrave temeroso procellae da adversidade amp inveja Serpit vai de gatinhas humi pelo chatildeo Qui

cuput aquelle que deseja uariare variar rem unam algũa cousa prodigialiter foacutera do costume amp feacute humana

appingit pinta Delphinum hum golfinho syluis nos bosques aprum hum javali fluctibus nas ondas Fuga

29

Em Diego de Saavedra Fajardo como conveacutem aos discursos exordiais na composiccedilatildeo

eacutetica do sujeito de enunciaccedilatildeo referir o passo de Horaacutecio eacute liccedilatildeo decorosa de humildade

de tipo discreto que em vista da captatio beneuolentiae do destinataacuterio afirma flertar

com os viacutecios do gecircnero de discurso grave

Mais poeta Manuel de Galhegos publicou em Lisboa em 1626 uma deacutecada

antes da estampa da Ulyssea ou Lisboa Edificada de Gabriel Pereira de Castro pelas

matildeos do editor flamenco Pedro Crasbeeck o poema heroico Gigantomachia Na epiacutestola

ldquoAo Letorrdquo que lhe serve de prefaacutecio lecirc-se o seguinte

Lloraua Alexandro porque le parecian que eran tantos los hechos con

que su padre se hazia celebre enel mundo y tan grande el numero de

los pueblos que vencia que no dexaua al animo de su pecho hazantildeas

con que merecieszlige honroso notildebre ni prouincias que vitorioso

sujetasse al jugo de su imperio Assi mi musa (o erudito Letor) llora

porque conoce que es tan leuantado el estilo tanta la erudicion tan

nueuos tan gallardos los pensamientos y tan de Virgilio la energia con

que don Luis de Gongora canta de su Polifemo que no puede auer

pluma que tan felice describa la persona de vn gigante ni el magraves sutil

entendimiento del mundo podragrave dezir magraves agudezas68

Chorava Alexandre [o Grande] porque lhe parecia que eram tantos os

feitos com que seu pai [sc Filipe rei da Macedocircnia] se fizera ceacutelebre

no mundo e tatildeo grande o nuacutemero de povos que vencia que natildeo deixava

ao acircnimo de seu peito faccedilanhas com que merecesse honroso nome nem

proviacutencias que vitorioso sujeitasse ao jugo de seu impeacuterio Assim

minha musa (oacute erudito Leitor) chora porque conhece que eacute tatildeo

levantado o estilo tanta a erudiccedilatildeo tatildeo novos tatildeo galhardos os

pensamentos e tatildeo de Virgiacutelio a energia com que D Luiacutes de Goacutengora

canta de seu Polifemo que natildeo pode haver pluma que tatildeo feliz descreva

a pessoa de um gigante nem o mais sutil entendimento do mundo

poderaacute dizer mais agudezas69

culpaelig o fugir de hum erro inducit faz cair In uitium em outro mayor si caret arte se o que isto procura

carece de arterdquo 68 Cf Gigantomachia de Manuel de Gallegos a don Antonio de Meneses en Lisboa por Pedro Crasbeck

an 1626 sp 69 Traduccedilatildeo nossa

30

Infere-se assim como Diego de Saavedra Fajardo afirma buscar o estilo

levantado no espelho de priacutencipe assim tambeacutem Manuel de Galhegos na poesia assim

como Francesco Petrarca eacute autoridade no uso congruente do estilo elevado no gecircnero de

poema amoroso conforme Francisco de Quevedo assim tambeacutem o eacute D Luiacutes de Goacutengora

(1561-1627) na faacutebula gecircnero de poema liacuterico em registro grave conforme Manuel de

Galhegos Os estudos das obras de Gregoacuterio de Matos e Guerra e de Antocircnio Vieira desde

os fins dos anos 1980 jaacute o mostraram70 nomes como esses natildeo atribuem unidade

psicoloacutegica aos fazeres poeacuteticos e letrados sabe-se ldquoo estilo natildeo eacute o homemrdquo71 senatildeo

classificam procedimentos retoacutericos de elocuccedilatildeo cuja composiccedilatildeo codificada eacute

referendada pela autoridade dos usos validados pelo costume usos artificiais nunca

naturais nunca expressivos cujos efeitos satildeo produzidos em adequaccedilatildeo agraves conveniecircncias

de gecircnero de modo que natildeo seja grave o soneto petrarquista como a fabula gongoacuterica

nem seja grave o espelho de priacutencipe de Diego de Saavedra Fajardo como o poema

heroico de Manuel de Galhegos ou de Gabriel Pereira de Castro Isso significa ainda que

esses diferentes gecircneros de poemas visitem o mesmo gecircnero de discurso e compartilhem

do estilo levantado ainda assim modulam-se diferentemente por serem muacuteltiplas as

formas poeacuteticas da gravidade muacuteltiplas as gravidades ao cabo72

Ora de acordo com Manuel de Galhegos Gabriel Pereira de Castro eacute primaz no

gecircnero de poema heroico na composiccedilatildeo de ldquopoesia leuantadardquo Esta afirmaccedilatildeo de

primazia da Ulyssea ou Lisboa Edificada eacute da ordem do discurso preambular73 eacute lugar-

70 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 (1ordf ed 1989) MENDES M V A

oratoacuteria barroca de Vieira Lisboa Editorial Caminho 1989 MUHANA A Os Recursos retoacutericos na obra

especulativa do padre Antocircnio Vieira e outros escritos Dissertaccedilatildeo de Mestrado em Literatura Brasileira

USP-Serviccedilo de Apoio Didaacutetico 1989 PEacuteCORA A Teatro do sacramento A unidade teoloacutegico-retoacuterico-

poliacutetica dos sermotildees de Antocircnio Vieira Satildeo Paulo Edusp Campinas Editora da Unicamp 1994 71 Diria Jacques Lacan em seus Escritos (1966) mirando Georges-Louis Leclerc Conde de Buffon (1707-

1788) ldquoLe style crsquoest lrsquohomme en rallierons-nous la formule agrave seulement la rallonger lrsquohomme agrave qui lon

sadresserdquo [O estilo eacute o homem acrescentariacuteamos agrave foacutermula somente para alongaacute-la o homem a quem

nos dirigimos] Lacan J Eacutecrits Paris Eacuteditions du Seuil 1966 p 9 Fazendo uso do passo pode-se supor

Joatildeo Adolfo Hansen escreveu ldquoO estilo natildeo eacute o homem mas o destinataacuterio ou seja o ouvido do autorrdquo HANSEN J A ldquoRepresentaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo na literatura de Machado de Assisrdquo Ciecircncia Hoje nordm 253 out

2008 p 37 Umberto Eco acrescenta ou matiza a leitura algo psicologizante do Conde de Buffon ldquoateacute

mesmo o dito de Buffon lsquoo estilo eacute o homemrsquo ainda natildeo eacute entendido no sentido individual mas especiacutefico

o estilo eacute virtude humanardquo Entenda-se assim ldquoo estilo eacute um modo de agir segundo regras em geral bastante

prescritivas e fazia-se acompanhar da ideia de preceito de imitaccedilatildeo de aderecircncia aos modelosrdquo cf ECO

U ldquoSobre o estilordquo in Sobre a literatura Traduccedilatildeo de Elena Aguiar 2ordf ed Rio de Janeiro Record 2003

p 151 72 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

227 73 A que os estudos de Maria do Socorro Fernandes de Carvalho sobre os livros seiscentistas circulantes no

Brasil e em Portugal tecircm se dedicado

31

comum exordial cujo agenciamento porque seja da ordem do epidiacutetico eacute de conveniecircncia

na instituiccedilatildeo tanto dos protocolos de leitura do poema como da jurisprudecircncia de seu

ajuizamento A primazia da Ulyssea ou Lisboa Edificada depreende-se do ldquoDiscurso

Poeacuteticordquo afirma-se como decorrecircncia da engenhosidade do poeta no trato com os

preceitos de construccedilatildeo da epopeia em vista das dificuldades do gecircnero Nos termos de

Manuel de Galhegos entende-se que como difiacutecil o poema heroico eacute de rara

conformaccedilatildeo e como difiacutecil e raro caso seja composto exemplarmente em consonacircncia

com as convenccedilotildees do gecircnero como obra de emulaccedilatildeo eacute produto loacutegico de engenho

excelente Na defesa e no louvor que se enuncia esse eacute o caso do poeta Gabriel Pereira

de Castro cujas excelecircncias elocutivas o ldquoDiscurso Poeacuteticordquo busca assim explicitar

Sobre todas as excellencias a de mayor asombro amp q mais reputaccedilaotilde

adquiriragrave a esta peregrina obra he o poetico resplandor que nos versos

reuerbera A claridade ou a enargia (q he a euidencia no dizer) obserua

tudo quanto Hermogenes admoesta na palavra Saphinia A grandeza do

estilo (a q Quintiliano chama Adron) estagrave aqui tanto In suo eszlige Que

natildeo poacutede auer no fallar humano locuccedilatildeo mais sublime A fermosura ou

a galhardia das vozes Em qual dos escritos q a Fama soleniza se

acharaacute cotilde tanta superioridade A bella Aurora Que quatildedo ri nos ceos

nos catildepos chora Versos foraotilde estes de q Fr Lope Felix74 de V C se

pagou tatildeto q todas as vezes q na Corte nos viamos os repetia

recreatildedose na graccedila amp artificio delles A breuidade no explicar a

sentẽccedila he soberana tarda muito pouco em dar forma ao conceito q he

o que encomenda Hermogenes na palavra Gorgotis Que val o mesmo

que Preccedila As matildeos fẽdidas acha a testa armada O q este verso insinugravea

natildeo se podia dizer com menor ambito Na imitaccedilaotilde dos costumes ha

maravilhoso caracter No sentencioso tem hũa verdade continua

fundada natildeo somente sobre a razaotilde mas sobre tudo o q dixeraotilde os

Doutos do mundo No graue no triste no alegre no feroz no severo

no florido amp em todas as mais foacutermas de oraccedilaotilde mostrou grande fineza

74 Isto eacute Lope Feacutelix de Vega Carpio (1562-1635) o poeta Lope de Vega de quem se lecirc na referida ediccedilatildeo

o soneto apologeacutetico a seguir tambeacutem impresso postumamente em louvor a Gabriel Pereira de Castro

ldquoLisboa por el Griego edificada Ya de ser Fenix inmortal presuma Pues deue magraves a tu divina pluma

(Docto Gabriel) que a su famosa espada Voraz el tiempo con la diestra ayrada No hay Imperio mortal

que no consuma Peroacute la vida de tu heroyca suma Es alma ilustremente reseruada Mas ay que cuando

magraves enriqueciste Tu Patria que su Artiacutefice te llama Por la segunda vida que le diste Cipreacutes funesto tu

Laurel enrrama Si bien ganaste en lo q maacutes perdiste Pues cuando mueres tu nacio tu famardquo

32

amp grande juizo em escolher o tempo amp o lugar Nas metaforas tem

moderaccedilaotilde amp propriedade porq saotilde poucas vsadas em seu lugar amp

todas fundadas na circunstancia mais vista amp mais notoria dos sujeitos

O q he taotilde deficultoso q obseruando Arist o inaccessiuel da poesia diz

q somente os homens de engenho preclaro sabem vsar da metafora com

perfeiccedilaotilde75

O longo passo entre os passos finais de Manuel de Galhegos compotildee figuraccedilatildeo

encomiaacutestica de Gabriel Pereira de Castro pensada como subgecircnero do discurso epidiacutetico

(ἐπιδεικτικόν) conveniente para ostentar ao destinataacuterio as virtudes da obra do poeta

Assim Aristoacuteteles o ensina O ldquoDiscurso Poeacuteticordquo como tal segue o costume observado

em Hermoacutegenes para quem Homero eacute artiacutefice exemplar o melhor dos poetas o melhor

dos oradores e tambeacutem o melhor dos logoacutegrafos (cf HERM 389 21-26) e a poesia eacute

discurso de mateacuteria panegiacuterica e o mais panegiacuterico dos discursos (cf HERM 389 7-9)

Ou ldquoPANEGIRICA IN METROrdquo conforme o letrado italiano Giulio Camillo Delminio

(1480-1544) no breve ldquoDiscorso di Giulio Camillo sopra Hermogenerdquo76 impresso em

Veneza em 156077

Assim em mateacuteria de elocuccedilatildeo Manuel de Galhegos faz da Ulyssea ou Lisboa

Edificada poema heroico cujo elogio esteja assentado de modo particular na autoridade

da Institutio oratoria do retor latino Quintiliano (seacutec I dC) e na do corpo de doutrina

que o nome do grego Hermoacutegenes (seacutec II dC) autoriza composto do que ensinam dois

tratados a ele atribuiacutedos expliacutecita e implicitamente citados o Peri heureseōs (referido

como ldquoPerieureseonrdquo) e o Peri ideōn Sobretudo consoante as liccedilotildees do Peri ideōn e da

Institutio oratoria fazendo uso de leacutexico no vernaacuteculo e no grego transliterado Manuel

de Galhegos agencia a doutrina que propotildee corroborar os usos elocutivos do poeta no

gecircnero No ldquoDiscurso Poeacuteticordquo a exemplaridade da Ulyssea ou Lisboa Edificada afirma-

se em razatildeo das excelecircncias de Gabriel Pereira de Castro no emprego congruente de

variadas ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo cujos efeitos itere-se comprendem a ldquoclaridaderdquo a

75 Apud Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de

Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro sp 76 Tambeacutem referido como ldquoDiscorso sopra lrsquoIdee di Hermogenerdquo 77 Cf Il secondo tomo dellrsquoopere di M di Giulio Camillo Delminio cioegrave La Topica ouero dellrsquoElocutione

Discorso sopra lrsquoIdee di Hermogene La Grammatica Espositione sopra il primo amp secondo Sonetto del

Petrarca Nvovamente dato in lvce Con privilegio In Venegia apresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLX

[1560] p 82

33

ldquoenargiardquo a ldquoeuidencia no dizerrdquo a ldquoSaphiniardquo a ldquograndeza do estilordquo o ldquoAdronrdquo o

ldquosublimerdquo a ldquofermosurardquo a ldquogalhardiardquo a ldquobreuidaderdquo a ldquoGorgotisrdquo a ldquoPreccedilardquo o

ldquomaravilhoso caracterrdquo a ldquoverdade continuardquo E mais o ldquograuerdquo o ldquotristerdquo o ldquoalegrerdquo o

ldquoferozrdquo o ldquoseverordquo e o ldquofloridordquo A variedade de uso dessas ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo julga-se

e elogia-se como excelecircncia compositiva do poeta Gabriel Pereira de Castro em

adequaccedilatildeo aos coacutedigos que definem como ldquopoesia leuantadardquo o gecircnero de poema heroico

Repare-se que Manuel de Galhegos pouco recorre agraves provas Basta o apelo algo

sentencioso e amplificado que diz a conformaccedilatildeo da Ulyssea ou Lisboa Edificada agrave voz

das convenccedilotildees ldquoA claridade ou a enargia [] obserua tudo quanto Hermogenes

admoesta na palavra Saphiniardquo ou ldquoA grandeza do estilo [] estagrave aqui tanto [] Que natildeo

poacutede auer no fallar humano locuccedilatildeo mais sublimerdquo ou ldquoA fermosura ou a galhardia das

vozes Em qual dos escritos [] se acharaacute cotilde tanta superioridaderdquo ou ldquoA breuidade no

explicar a sentẽccedila he soberanardquo ou ldquoNa imitaccedilaotilde dos costumes ha maravilhoso caracterrdquo

ou ldquoNo sentencioso tem hũa verdade continuardquo etc Assim composto o passo referido do

ldquoDiscurso Poeacuteticordquo parece valer menos pelo que mostra do poema e mais pelo que diz

dos criteacuterios de razatildeo da boa poesia agenciados pelo apologista

Hermoacutegenes eacute nome privilegiado neste agenciamento pois que eacute precisamente em

suas liccedilotildees de retoacuterica que Manuel de Galhegos vai buscar os substantivos ldquoclaridaderdquo

(ou ldquoSaphiniardquo) ldquograndezardquo ldquofermosurardquo (ou ldquogalhardiardquo) ldquoPreccedilardquo (ou ldquoGorgotisrdquo)

ldquocostumerdquo (ou ldquocaracterrdquo) e ldquoverdaderdquo os quais respectivamente traduzem para a liacutengua

portuguesa os termos gregos (i) saphēneia (ή) (ii) megethos () (iii)

kallos () (iv) gorgotēs () (v) ēthos () e (vi) alētheia ()

que consistem em seis das sete ideai tou logou () prescritas pelo retor

por assim dizer as ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo preceituadas nos dois livros que integram o Peri

ideōn Como se veraacute a idea que encerra o preceito nominada (vii) deinotēs ()

no tratado de Hermoacutegenes pode abarcaacute-la semanticamente o ldquoDiscurso Poeacuteticordquo por meio

dos termos ldquograuerdquo e ldquoferozrdquo ainda que essa a idea pareccedila apartada da liccedilatildeo de Manuel

de Galhegos

Deve-se considerar que seja possiacutevel que o Peri ideōn tenha sido fonte direta das

liccedilotildees de retoacuterica referidas no passo citado do ldquoDiscurso Poeacuteticordquo Pode depender

diretamente da ciecircncia do texto grego de Hermoacutegenes a eleiccedilatildeo em liacutengua portuguesa de

ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo para verter o sintagma grego ideai tou logou e dos substantivos

ldquoclaridaderdquo ldquograndezardquo ldquoformosurardquo (ou ldquogalhardiardquo) ldquoPreccedilardquo ldquocostumerdquo (ou

34

ldquocaracterrdquo) e ldquoverdaderdquo para designar as referidas ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo Afinal no iniacutecio

do seacuteculo XVI agrave exceccedilatildeo do Peri hypsous atribuiacutedo a Longino os tratados de retores

gregos como Aftocircnio Hermoacutegenes Aristoacuteteles Dioniacutesio de Halicarnasso Demeacutetrio

Menandro Eacutelio Teatildeo Aristides ou Apsines circulavam impressos desde Veneza depois

de estampados em conjunto in-foacutelio por Aldo Manuzio em dois volumes intitulados

Rhetores graeci cujas datas de publicaccedilatildeo satildeo 1508 e 150978 A preparaccedilatildeo dessa ediccedilatildeo

coube ao emigrado cretense Demeacutetrio Ducas reconhecido como o primeiro catedraacutetico

de grego da Universidade de Alcalaacute de Henares na Espanha79

Sabe-se poreacutem que a despeito do trabalho do prelo de Aldo Manuzio o Peri

ideōn eacute obra de fortuna prodigiosa em manuscritura O filoacutelogo alematildeo Hugo Rabe

compulsa e elenca mais de uma centena de manuscritos do corpo retoacuterico de

Hermoacutegenes80 cujas dataccedilotildees vatildeo do seacuteculo X ao seacuteculo XVI E natildeo se furta o helenista

George Alexander Kennedy a afirmar que existam outros81 Diga-se a quase totalidade

dos manuscritos coligidos na recensio empreendida por Hugo Rabe traz liccedilotildees do Peri

78 O volume primeiro em que se leem as preceptivas de Hermoacutegenes (pp 19-160) eacute o seguinte Rhetores

in hoc volvmine habentvr hi Aphthonii Sophistaelig Progymnasmata Hermogenis ars Rhetorica Aristotelis

Rhetoricorum ad Theodecten libri tres Eiusdem Rhetorice ad Alexandrum Eiusdem ars Poetica Sopatri

Rhetoris quaeligstiones de compone[n]dis declamationibus in causis praecipuaelig iudicialibus Cyri Sophistaelig

differentiaelig statuum Dionysii Alicarnasĕi ars Rhetorica Demetrii Phalerĕi de interpretatione Alexandri

Sophistaelig de figuris sensus amp dictionis Adnotationes innominati de figuris Rhetoricis Menandri Rhetoris

diuisio causarum in genere demonstratiuo Aristeidis de ciuili oratione Eiusdem de simplici oratione

Apsini de arte Rhetorica praeligcepta Venetiis 1508 Eacute possiacutevel ter acesso ao exemplar digitalizado da

Thuumlringer Universitaumlts und Landesbibliothek Jena Disponiacutevel em lthttparchivethulbuni-

jenadehisbestreceiveHisBest_cbu_00004269gt Acesso em 15 julho 2014 Cf PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New Jersey Princeton University Press

1970 p 219 RENOUARD A A Annales de limprimerie des Alde ou Histoire des trois Manuce et de leurs

eacuteditions Paris 1803 pp 127-9 GEANAKOPLOS D J Constantinople and the West Essays on the Late

Byzantine (Palaeologan) and Italian Renaissances and the Byzantine and Roman Churches Madison

Wisconsin University of Wisconsin Press 1989 p 45 GEANAKOPLOS D J Greek scholars in Venice

studies in the dissemination of Greek learning from Byzantium to Western Europe Cambridge

Massachusetts Harvard University Press p 227 79 Cf RENOUARD A A Annales de limprimerie des Alde ou Histoire des trois Manuce et de leurs eacuteditions

pp 127-9 LOacutePEZ GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Salamanca Universidad de

Salamanca 1994 p 56 75-7 Destaca Geanakoplos Demeacutetrio Ducas redigiu agrave guisa de prefaacutecio no

volume primeiro dos Rhetores graeci uma epiacutestola destinada a Marco Musuro entatildeo professor da Universidade de Paacutedua Nela vai o seguinte conselho que Musuro incluiacutesse em suas leituras ao lado da

tratadiacutestica de Hermoacutegenes a Retoacuterica de Aristoacuteteles a quem o elogio soaria desnecessaacuterio cf

GEANAKOPLOS D J Constantinople and the West Essays on the Late Byzantine (Palaeologan) and Italian

Renaissances and the Byzantine and Roman Churches Madison Wisconsin University of Wisconsin Press

1989 p 45 80 Cf RABE H Hermogenis Opera Leipzig Teubner 1913 pp xiii-xxviii Pode-se ter acesso ao exemplar

digitalizado da Bibliothegraveque nationale de France Disponiacutevel em

lthttpgallicabnffrark12148bpt6k25183cf2imager=Hugo20RabelangPTgt Acesso em 12 maio

2010 81 Cf KENNEDY G A Greek Rhetoric under Christian Emperors Eugene Oregon Wipf and Stock

Publishers 2008 p 74

35

ideōn82 Trata-se portanto eacute possiacutevel aventar de obra exitosa bastantemente copiada e

por certo lida Isso natildeo se avalia apenas pelo nuacutemero avantajado de coacutepias manuscritas

mas tambeacutem pela variedade de impressos que lhe fizeram circular a tratadiacutestica em grego

em latim e em italiano

Deve-se recordar portanto que aos Rhetores graeci considerados a editio

princeps de Hermoacutegenes seguiram outras ediccedilotildees do Peri ideōn nos seacuteculos XVI e XVII

Satildeo elas Aphthonii sophistae praeligludia Hermogenis Rhetorica ediccedilatildeo florentina de

Filippo Giunta de 1515 em grego83 Hermogenis De formis orationum tomi duo ediccedilatildeo

parisiense em grego estampada na oficina do impressor Christian Wechel (ca 1485-

1554) em 153184 Hermogenis ars oratoria absolutissima ediccedilatildeo em grego de Jacob

82 Cf RABE H Hermogenis Opera pp xv-xix Alguns desses manuscritos podem ser conhecidos por meios

digitais e estatildeo virtualmente disponiacuteveis aos helenistas A Bibliothegraveque nationale de France daacute a conhecer os manuscritos Parisinus gr 2929 Parisinus gr 2971 Parisinus gr 2983 e Parisinus gr 3032 O primeiro

datado do seacuteculo XVI reuacutene obras gregas diversas de mateacuteria gramatical entre as quais estatildeo os

Progymnasmata de Hermoacutegenes e a epiacutetome de Mateus Camariota agrave retoacuterica de Hermoacutegenes Disponiacutevel

em lthttpgallicabnffrark12148btv1b520004673r=hermogenelangPTgt Acesso em 15 julho 2014

O segundo tambeacutem datado do seacuteculo XVI tambeacutem traz os Progymnasmata Disponiacutevel em

lthttpgallicabnffrark12148btv1b520009547r=hermogenelangPTgt Acesso em 15 julho 2014 O

terceiro datado do seacuteculo XI reuacutene em meio a obras gregas de mateacuteria retoacuterica e gramatical quatro dos

tratados atribuiacutedos a Hermoacutegenes a saber o Peri heureseōs o Peri methodou deinotētos o Peri staseōn e

o Peri ideōn par a par com os Progymnasmata de Aftocircnio Disponiacutevel em

lthttpgallicabnffrark12148btv1b8470444jr=hermogenelangPTgt Acesso em 15 julho 2014 O

quarto manuscrito tambeacutem datado do seacuteculo XI traz aleacutem de scholia a Hermoacutegenes os Progymnasmata o Peri staseōn e o Peri methodou deinotētos

A British Library daacute a conhecer os manuscritos Arundel MS 541 Add MS 10060 e Royal MS 16 D XII O

primeiro datado do seacuteculo XV traz os Progymnasmata de Aftocircnio o Peri heureseōs o Peri methodou

deinotētos o Peri staseōn e o Peri ideōn atribuiacutedos a Hermoacutegenes aleacutem de sinopse das figuras

mencionadas no Peri staseōn de prefaacutecio ao Peri staseōn de prefaacutecio versificado do gramaacutetico Joatildeo

Tzetzes ao Peri heureseōs de sinopse dos temas Peri heureseōs e de prefaacutecio ao Peri ideōn Disponiacutevel

em lthttpwwwblukmanuscriptsFullDisplayaspxref=Arundel_MS_541gt Acesso em 15 julho 2014

O segundo datado do seacuteculo XVI traz entre obras de gramaacutetica e retoacuterica os Progymnasmata de Aftocircnio

e a epiacutetome de Mateus Camariota agrave retoacuterica de Hermoacutegenes Disponiacutevel em

lthttpwwwblukmanuscriptsFullDisplayaspxref=Add_MS_10060gt Acesso em 15 julho 2014 O

terceiro tambeacutem datado do seacuteculo XVI traz comentaacuterios ao Peri methodou deinotētos Disponiacutevel em lthttpwwwblukmanuscriptsFullDisplayaspxindex=7ampref=Royal_MS_16_D_XIIgt Acesso em 15

julho 2014 83 Ωάῥά In hoc volumine haec continentur Ausonii [ie Aphtonii] sophistaelig praeligludia

Hermogenis Rhetorica In aeligdibus Philippi Iuntaelig 1515 Pode-se ter acesso digital ao exemplar da

Bayerische Staatsbibliothek (Biblioteca Estadual da Baviera) Disponiacutevel em lthttpreaderdigitale-

sammlungenderesolvedisplaybsb10169596htmlgt Acesso em 16 julho 2014 Cf MACDONALD K M

ldquoSelling Lives the Publisher Bernardo di Giunta (fl 1518-1550) Imitation and the Utility of Intellectual

Biographyrdquo Renaissance and Reformation 25 (2001) pp 5-24 cf LAURENS P ldquoPrefacerdquo in

HERMOGEgraveNE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon

Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 10 O Cataacutelogo Geral da Biblioteca Nacional de Espantildea registra um exemplar desta ediccedilatildeo no acervo da BN de Madrid cf BIBLIOTECA NACIONAL DE ESPANtildeA Cataacutelogo

General de la BNE Disponiacutevel em lthttpcatalogobneesgt Acesso em 16 julho 2014 84 Ω Hermogenis De formis orationum tomi duo Parisiis

Excudebat Christianus Wechelus sub scuto Basilensi in via Iacobea anno 1531 Pode-se ter acesso digital

36

Bogardus de 1544 tambeacutem parisiense85 Hermogenis De formis orationum tomi duo

ediccedilatildeo em grego de Johannes Sturm (1507-1589) estampada em 1555 em Estrasburgo86

Aphtonius Hermogenes amp Dionisius Longinus praestatissimi artis Rhetorices magistri

ediccedilatildeo em grego do cretense Francisco Porto (1511-1581) impressa em Genebra em

1569 e reimpressa em 157087 De dicendi generibus sive formis orationum ediccedilatildeo de

ao exemplar da Bayerische Staatsbibliothek Disponiacutevel em lthttpreaderdigitale-

sammlungenderesolvedisplaybsb10150668htmlgt Acesso em 15 julho 2014 Ver PATTERSON A M

Idem ibidem A Biblioteca Nacional de Portugal registra um exemplar desta ediccedilatildeo em seu acervo Entre

os antigos possuidores do volume indicam-se Diogo Mendes de Vasconcelos (1523-1599) e o Convento de

Santa Maria de Scala Coeli da Ordem da Cartuxa em Eacutevora Sabe-se Diogo Mendes de Vasconcelos foi

fidalgo cocircnego da Seacute de Eacutevora e editor em 1593 do De antiquitatibus lusitanae (As antiguidades da

Lusitacircnia) de Andreacute de Resende (1500-1573) cf RESENDE Andreacute de As antiguidades da Lusitacircnia Introduccedilatildeo traduccedilatildeo e comentaacuterio de Rauacutel Miguel Rosado Fernandes Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1996 BIBLIOTECA NACIONAL DE PORTUGAL Cataacutelogo Geral Disponiacutevel em

lthttpcatalogobnportugalptgt Acesso em 15 julho 2014

A Biblioteca Nacional de Portugal registra dois exemplares de outros dois tratados atribuiacutedos ao reacutetor grego

Satildeo eles (i) Hermogenis Ars Rhetorica

Absolutissima Parisiis Excudebat Christianus Wechelus sub scuto Basilensi in via Iacobea anno 1530

ediccedilatildeo do Perigrave staseos de Hermoacutegenes em que se preceituam os estados de causa e (ii)

Ω Hermogenis De inuentione tomo

qvatuor Parisiis Christianus Wechel sub scuto Basilensi in via Iacobea anno 1530 Entre os antigos

possuidores dos exemplares existentes na BNP tambeacutem estatildeo Diogo Mendes de Vasconcelos e o Convento

de Santa Maria de Scala Coeli Pode-se conhecer o exemplar da Hermogenis Ars Rhetorica Absolutissima

pertencente agrave Bayerische Staatsbibliothek Disponiacutevel em lthttpreaderdigitale-

sammlungendedefs1objectdisplaybsb10150777_00001htmlgt Acesso em 15 julho 2014 Esta ediccedilatildeo

de Hermoacutegenes foi reimpressa por Christian Wechel em Paris oitos anos depois

Hermogenis Ars Rhetorica Absolutissima

Parisiis In officina Christiani Wecheli sub scuto Basilensi in vico Iacobeo Anno MDXXXVIII [1538] A

Biblioteca Nacional de Espantildea registra um exemplar desta ediccedilatildeo em seu acervo cf BIBLIOTECA

NACIONAL DE ESPANtildeA Cataacutelogo General de la BNE Disponiacutevel em lthttpcatalogobneesgt Acesso

em 16 julho 2014 Pode-se conhecer a versatildeo digital do exemplar de 1538 pertencente ao acervo da

Oumlsterreichische Nationalbibliothek (Biblioteca Nacional da Aacuteustria) Disponiacutevel em

lthttpdigitalonbacatOnbViewerviewerfacesdoc=ABO_2BZ167077000gt Acesso em 16 julho

2014 Quanto ao tratado Hermogenis De inuentione tomo qvatuor Pode-se ter acesso ao exemplar

digitalizado da Bayerische Staatsbibliothek Disponiacutevel em lthttpreaderdigitale-

sammlungenderesolvedisplaybsb10314557htmlgt Acesso em 16 julho 2014 85 Hermogenis Ars Rhetorica Abolutissima

Parisiis Apud Iacobum Bogardum sub insigne D Christophori egrave regione gymnasij Cameracensium 1544

Pode-se ter acesso ao volume da Bayerische Staatsbibliothek lthttpreaderdigitale-

sammlungenderesolvedisplaybsb10150714htmlgt Acesso em 15 julho 2014 Vide PATTERSON A M

Idem ibidem O exemplar digital consultado todavia natildeo consta de liccedilatildeo do 86 Ω Hermogenis De formis orationum tomi duo

Argentorati apud haeredes Vuendelini Rihelij Anno 1555 Pode-se ter acesso ao exemplar da Bayerische

Staatsbibliothek em versatildeo digitalizada Disponiacutevel em lthttpdatendigitale-

sammlungende~db0003bsb00034945imagesindexhtmlid=00034945ampfip=1931749830ampno=ampseit

e=2gt Acesso em 15 julho 2014 Ver PATTERSON A M Idem ibidem 87Aph-

tonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices magistri Francisci Porti Cretensis

opera industriaacuteque illustrati atque expoliti Genevaelig apvd I Crispinvm MDLXIX [1569] Pode-se ter

acesso ao exemplar da Oumlsterreichische Nationalbibliothek Disponiacutevel em

lthttpdigitalonbacatOnbViewerviewerfacesdoc=ABO_2BZ178244507gt Acesso em 15 julho

2014 Vide PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New

Jersey Princeton University Press 1970 p 219

37

Johannes Sturm biliacutengue em grego e em latim impressa em Estrasburgo em 157188 e

por fim Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima ediccedilatildeo biliacutengue de Garpar Laurent

(1556-1636) com comentaacuterios em latim estampada em Genebra em 161489

Eacute oportuno natildeo ignorar todavia que mesmo sendo admissiacutevel a consulta de

ediccedilotildees em grego as escolhas lexicais de Manuel de Galhegos e de letrados como ele

ibeacutericos nos seacuteculos XVI e XVII talvez natildeo possam prescindir das glosas paraacutefrases

comentaacuterios ou interpretaccedilotildees nas liacutenguas neolatinas do Peri ideōnou das traduccedilotildees

latinas que ganhou o tratado desde o seacuteculo XV Deve-se considerar portanto o

Rhetoricorum libri V de Jorge de Trebizonda a quem se atribui o primado da difusatildeo

latina no Ocidente desde a Peniacutensula Itaacutelica das doutrinas do Peri ideōne mais

amplamente do corpo retoacuterico que carrega o nome de Hermoacutegenes90 publicado entre

1433 e 1434 em Veneza e republicado inuacutemeras vezes Sabe-se que reeditado em Milatildeo

em 1493 por Leonard Pachel91 em Alcalaacute de Henares na Espanha por Arnao Guilleacuten de

88Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II Latinitate

donati amp scholis explicati atque illustrati A Ioan Stvrmio Cum Gratia amp Priuilegio Caeligsareo ad anno

octo Excudebat Iosias Rihelius MDLXXI [1571] Pode-se ter acesso digital ao exemplar da Bibliothegraveque

nationale de France lthttpgallicabnffrark12148bpt6k6257060hr=langESgt Acesso em 15 julho

2014 Cf PATTERSON A M Idem ibidem A Biblioteca Nacional de Espantildea registra um exemplar desta

ediccedilatildeo em acervo cf BIBLIOTECA NACIONAL DE ESPANtildeA Cataacutelogo General de la BNE Disponiacutevel

em lthttpcatalogobneesgt Acesso em 16 julho 2014 89 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima

Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii

Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno MDCXIV [1614] Pode-se ter acesso ao exemplar

digitalizado no acervo da Oumlsterreichische Nationalbibliothek Disponiacutevel em

lthttpdigitalonbacatOnbViewerviewerfacesdoc=ABO_2BZ180877503gt Acesso em 15 julho 2014 Vide PATTERSON A M Idem ibidem O Cataacutelogo Geral da Biblioteca Nacional de Espantildea registra

cinco exemplares desta ediccedilatildeo em acervo cf BIBLIOTECA NACIONAL DE ESPANtildeA Cataacutelogo General

de la BNE Disponiacutevel em lthttpcatalogobneesgt Acesso em 16 julho 2014 90 Mostram os estudos de John Monfasani Trebizonda emigrou para Veneza em 1416 a fim de trabalhar

na biblioteca de Francesco Barbaro (1398ndash1454) Em Veneza por volta de 1420 compocircs uma sinopse das

intitulada De generibus dicendi dedicada a Vittorino da Feltre professor de retoacuterica latina Em fins

de 1426 escreveu a Girolamo Bragadino seu aluno filho da nobreza local a epiacutestola conhecida como De

suauitate dicendi em que abordou a construccedilatildeo discursiva da Por fim vieram a puacuteblico os

Rhetoricorum libri V os quais efetivamente se fizeram um dos mais significativos veiacuteculos de circulaccedilatildeo da retoacuterica atribuiacuteda a Hermoacutegenes ao longo do seacuteculo XV Dos mais significativos deve-se ressaltar visto

que a publicaccedilatildeo que viria a ser considerada a editio princeps do corpo hermogeniano e que ademais fez

circular a obra do reacutetor em liacutengua grega os Rhetores graeci de Aldo Manuzio como se sabe soacute foram

estampados em 1508 cf MONFASANI J George of Trebizond A Biography and a Study of his Rhetoric

and Logic Leiden Brill 1976 pp 13 17-8 21 255-61 262-89 cf LAURENS P ldquoPrefacerdquo in

HERMOGENE LArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon

Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 8 91 Georgii Trapesuntii viri doctissimi atque eloquentissimi Rhetoricorum liber primus In libraria Leonardi

Pachel officina 1493 Pode-se ter acesso ao exemplar da Bayerische Staatsbibliothek Disponiacutevel em

lthttpdfg-viewerdeshowset5Bmets5D=http3A2F2Fdatendigitale-

ammlungende2F~db2Fmets2Fbsb00067294_metsxmlgt Acesso em 19 julho 2014

38

Brocar em 1511 com aditamentos de Hernando Alonso de Herrera92 em Paris por volta

de 1520 por Gilles de Gourmont93 na Basileia em 152294 em Veneza em 152395 em

Paris outra vez em 1532 por Christian Wechel96 em 1538 novamente por Wechel97 e

tambeacutem por Jean de Roigny98 e enfim em Estrasburgo em 1547 por Sebastiatildeo Grifo99

O Rhetoricorum libri V de Jorge de Trebizonda natildeo deixa de iterar Pierre Laurens

no prefaacutecio agrave ediccedilatildeo ldquoLrsquoAcircge drsquoHommerdquo de Hermoacutegenes fez-se dos mais significativos

veiacuteculos de difusatildeo da tratadiacutestica atribuiacuteda ao grego na Itaacutelia ao longo do seacuteculo XV100

92 Opus absolutissimum Rhetoricorum Georgii Trapezuntii cum additionibus Herrariensis [Compluti]

Impressum est in cocircplutensi academi in officina Arnaldi Guillelmi de Brocario 1511 A Biblioteca da

Universidade de Salamanca daacute a conhecer exemplar digital da obra O texto do tratado todavia impresso

em letras goacuteticas tal como digitalizado eacute quase que ilegiacutevel A despeito disso vale observaacute-lo Disponiacutevel

em lthttpgredosusalesjspuihandle1036619519gt Acesso em 14 agosto 2014 93 Giorgii trapezuntii qui suis temporibus sopitam amp tantum non mortua Eloquentiam suscitauit Ars

Rhetorica nunc in gallia impressa Et oratoribus nostri maacutexime accommotada Parisiis apud Aegidium

gourmontium qui in utraque liacutengua libros fidelissime imprimendos curat Natildeo haacute data na folha de rosto da

ediccedilatildeo Entende-se que tenha sido impressa por Gilles (ou Egidius) de Gourmont (1499-1540) entre 1519

e 1520 Pode-se ter acesso ao exemplar digital da Bayerische Staatsbibliothek Disponiacutevel em

lthttpreaderdigitale-sammlungenderesolvedisplaybsb10869453htmlgt Acesso em 19 julho 2014 94 Georgii Trapezuntii Rhetoricorum libri in quibus quid recens praestitum proxima facie indicabit

liminaris epistola In Inclyta Basilea 1522 Pode-se ter acesso ao exemplar digital da Bayerische

Staatsbibliothek Disponiacutevel lthttpreaderdigitale-sammlungenderesolvedisplaybsb10163827htmlgt

Acesso em 19 julho 2014 95 Trata-se de volume como o tiacutetulo jaacute o indica em que Trebizonda imprime-se conjuntamente com

Fortunaciano Aacutequila Romano Rutiacutelio Lupo Aristoacuteteles Prisciano Aftocircnio e Hermoacutegenes parafraseado

por Hilaacuterio de Veneza cf Continentur hoc volumine Georgii Trapezuntii Rhetoricorum libri V Consulti

Chirii Fortunatiani libri III Aquilae Romani de figuris sententiarum amp elocutionis liber P Rutilii Lupi

earundem figurarum e Gorgia liber Artistotelis rhetoricorum ad Theodecten Georgio Trapezuntio

interprete libri III Eiusdem rhetorices ad Alexandrum a Francisco Philelpho in Latinum uersae liber

Paraphrasis rhetoricae Hermogenis ex Hilarionis monachi Veronensis traductione Priscianus de

rhetoricae praeexercitamentis ex Hermogene Aphthonii declamatoris rhetorica progymnasmata Io Maria Catanaeo tralatore Venetiis in aedibus Aldi et Andreae Asulani soceri 1523 Pode-se ter acesso digital

ao exemplar da Bibliothegraveque nationale de France Disponiacutevel em

lthttpgallicabnffrark12148bpt6k990533qr=trapezuntiolangPTgt Acesso em 18 agosto 2014 96 Georgii Trapezuntii Rhetoricorum libri quinque ad manu scriptum exemplar diligentissimegrave repurgati

Parisiis excudebat Christianus Wechelus sub scuto Basiliensi in uico Iacobeo Anno M D XXXII [1532]

Pode-se ter acesso ao exemplar da Oumlsterreichische Nationalbibliothek Disponiacutevel em

lthttpbooksgooglecombrbooksid=05JXAAAAcAAJampprintsec=frontcoveramphl=pt-

BRv=onepageampqampf=false gt Acesso em 19 julho 2014 97 Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani Wecheli

M D XXXVIII [1538] Pode-se ter acesso ao exemplar da Bayerische Staatsbibliothek Disponiacutevel em

lthttpreaderdigitale-sammlungenderesolvedisplaybsb10313963htmlgt Acesso em 19 julho 2014 98 Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia ad D

Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] Pode-se ter acesso ao exemplar

digitalizado que integra o acervo da Bibliothegraveque nationale de France Disponiacutevel em

lthttpgallicabnffrark12148bpt6k64796zr=Georges+de+TrC3A9bizondelangPTgt Acesso em

19 julho 2014 99 Georgii Trapezuntii Rhetoricorum libri quinque Indicem capitum ac rerum in hoc opere contentatum

in calcem operis reiecimus Lvgdvni apvd Seb[astianum] Gryphivm 1547 Pode-se ter acesso ao exemplar

digital da Bayerische Staatsbibliothek Disponiacutevel em lthttpreaderdigitale-

sammlungenderesolvedisplaybsb10184351htmlgt Acesso em 19 julho 2014 100 Cf LAURENS P ldquoPrefacerdquo in HERMOGEgraveNE LArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale

introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 8

39

E desde entatildeo Considere-se o nuacutemero de estampas posteriores do tratado de Jorge de

Trebizonda saiacutedas de prelos os mais vaacuterios de diversas cidades europeias ateacute meados

do seacuteculo XVI Dessa obra aleacutem dos impressos elencados conhecem-se hoje 21

manuscritos incunaacutebulos de Veneza de 1472 e de Milatildeo de 1493101 Na Espanha sabe-

se conservar um desses manuscritos na Biblioteca da Academia de Histoacuteria102 e destaca-

se em territoacuterio espanhol ademais a atividade letrada de disciacutepulos de Jorge de

Trebizonda Eacute conhecida a atuaccedilatildeo mostra-o Luisa Loacutepez Grigera de Alfonso de

Palencia (1423-1492) de quem foi conservada parte da correspondecircncia trocada com o

mestre e de Hernando Alonso de Herrera (ca 1460-1527) amigo de Palencia e

catedraacutetico da Universidade de Alcalaacute de Henares responsaacutevel por mandar imprimir em

1511 o jaacute mencionado Opus absolutissimum Rhetoricorum Georgii Trapezuntii anotado

para uso escolar Supotildee-se que o prestiacutegio em Alcalaacute de Henares do Rhetoricorum libri

V soacute tenha sido abalado com a chegada agrave Universidade em 1513 de Antocircnio de Nebrija

(1441-1522) e a publicaccedilatildeo em 1515 de sua Artis rhetoricae compendiosa coaptatio ex

Aristotele Cicerone et Quintiliano103 Defende Luisa Loacutepez Grigera que Antocircnio de

Nebrija de quem Andreacute de Resende (1498-1573) foi disciacutepulo 104 tenha intentado

sobrepujar a autoridade de Jorge de Trebizonda105

De Portugal da recepccedilatildeo do Rhetoricorum libri V daacute indiacutecios Belmiro Fernandes

Pereira em artigo sobre a Rhetorica de Joachim Ringelberg

Em Portugal a julgar pelo nuacutemero de espeacutecies remanescentes nas

nossas bibliotecas natildeo teraacute sido despicienda a fortuna do mestre

bizantino No rol da livraria de Aquiles Estaccedilo figuram tanto os

Rhetoricorum libri V como os comentaacuterios de Trebizonda agraves oraccedilotildees de

Ciacutecero texto que tambeacutem se regista no inventaacuterio da biblioteca de D

Fernando Martins Mascarenhas saqueada no final do seacutec XVI pelos

101 Cf MONFASANI J George of Trebizond A Biography and a Study of his Rhetoric and Logic Leiden

Brill 1976 pp 13 17-8 21 255-61 262-89 LAURENS P ldquoPrefacerdquo in HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique

Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p

8 102 Cf LOacutePEZ GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Salamanca Universidad de

Salamanca 1994 p 77 103 Idem pp 56 75-7 104 Cf CASTRO A P de Retoacuterica e teorizaccedilatildeo literaacuteria em Portugal Do Humanismo ao Neoclassicismo

Coimbra Centro de Estudos Romacircnicos 1973 p 18 105 Cf LOacutePEZ GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Salamanca Universidad de

Salamanca 1994 p 77

40

ingleses Mas a melhor prova da aceitaccedilatildeo que teve entre noacutes a obra de

Trebizonda reside no facto de ter sido ele o autor escolhido quando foi

necessaacuterio dotar os alunos do Coleacutegio das Artes de um compecircndio para

o estudo da dialeacutectica Natildeo foi por acaso portanto que saiu em 1551

dos prelos conimbricenses de Joatildeo de Barreira a Georgii Trapezontii

Dialectica acompanhada das anotaccedilotildees de Diogo de Contreiras um

antigo escolar do coleacutegio de Santa Baacuterbara 106

Esses indiacutecios ao que parece natildeo se limitam agrave biblioteca de Aquiles Estaccedilo

Anibal Pinto de Castro entende natildeo haver duacutevida de que as liccedilotildees de Jorge de Trebizonda

tenham sido determinantes na composiccedilatildeo das doutrinas que expotildeem a Collectanea

Rhetorices de Joatildeo Vaseu (ca 1550) professor de retoacuterica no Coleacutegio Satildeo Paulo em

Braga107 A coletacircnea foi estampada em Salamanca em 1538108 Nominalmente fazendo

apelo agrave autoridade Joatildeo Vaseu cita mesmo sem referir a doutrina das ideai tou logou

natildeo apenas Jorge de Trebizonda mas tambeacutem Hermoacutegenes Siriano Filoxeno (seacutec V) e

Soacutepatro (seacutec IV) dito ldquoZopaterrdquo na Collectanea Rhetorices ambos comentadores de

Hermoacutegenes109

Par a par o Rhetoricorum libri V pode-se natildeo esquecer ademais de obras quais o

Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta

106 PEREIRA B F ldquoA ediccedilatildeo conimbricense da Rhetorica de Joachim Ringelbergrdquo Peniacutensula Revista de

Estudos Ibeacutericos n 1 (2004) pp 211-2 O exemplar da Georgii Trapezontii Dialectica citado por Belmiro

Fernandes Pereira integra hoje o acervo da Biblioteca Nacional de Portugal e antes pertenceu segundo os

registros da instituiccedilatildeo agrave Ordem de Satildeo Jerocircnimo ao Convento de Santa Maria de Beleacutem em Lisboa

Trata-se de Georgij Trapezontij Dialectica octo tractatus continens Et hos omnes cum scholijs Iacobi agrave

Contreiras Eborensis Conimbricae Apud Ioannem Barrerium amp Ioanne[m] Aluarum M D LI [1551]

Pode-se ter acesso ao exemplar Disponiacutevel em lthttppurlpt23345gt Acesso em 03 janeiro de 2015 107 Sobre Vaseu escreve Belmiro Pereira ldquoO flamengo Was (Vasaeus na forma latina) depois de estudar

as liacutenguas sacras na Universidade de Lovaina vem em 1531 por indicaccedilatildeo de Andreacute de Resende para a

Peniacutensula Ibeacuterica a pretexto de organizar a biblioteca de Fernando Colombo a futura Colombina de Sevilha

Em outubro de 1534 visita Clenardo em Eacutevora e este o convence a estabelecer-se em Salamanca Aqui continuando os seus estudos de Direito ensina Latim Grego e Retoacuterica sempre com extraordinaacuterio

sucesso Depois do magisteacuterio bracarense de 1538 a 1541 vai dirigir em Eacutevora a escola de humanidades

criada pelo cardeal-infante D Afonso Em 1550 regressa agrave universidade de Salamanca onde dois anos

volvidos eacute nomeado titular da cadeira de Prima de Gramaacuteticardquo PEREIRA B F ldquoA ediccedilatildeo conimbricense

da Rhetorica de Joachim Ringelbergrdquo pp 205-6 108 CASTRO A P DE Retoacuterica e teorizaccedilatildeo literaacuteria em Portugal Do Humanismo ao Neoclassicismo

Coimbra Centro de Estudos Romacircnicos 1973 p 18 109 Cf Ioannis Vasaei Brugensis Collectanea Rhetorices In gratiam eorum qui grauioribus occupati

disciplinis prolixiores ueterum cotildementarios euoluere non possunt [Salmanticae Gonzalo de Castantildeeda]

Anno M D XXXVIII [1538] Jorge de Trebizonda eacute nominalmente referido como autoridade na p 3v

Hermoacutegenes nas pp 12v 13r-v Soacutepatro na p 12v e Siriano nas pp 13v 14v

41

versatildeo latina de Antocircnio Bonfine impressa em Lion em 1538110 e em Veneza em

1539111 e o Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica

praecepta traduccedilatildeo para o latim de Natale Conti (ca 1520-1582) impresso na Basileia

em 1550 112 E por fim de versotildees quais Le Idee ouero Forme della oratione da

Hermogene de Giulio Camillo Delminio estampado em Uacutedine em 1594113 e LrsquoIdee

ouero Forme dellarsquoeloquentia de Filiberto Campanile estampado em Naacutepoles em

1606114

O texto grego de Hermoacutegenes divide as ideai tou logou e subdivide-as em gecircneros

e espeacutecies de modo a construir um corpo de doutrina que abarque no ofiacutecio da elocuccedilatildeo

os discursos oratoacuterios e poeacuteticos segundo os seus efeitos Satildeo sete os gecircneros referidos

Em traduccedilotildees recentes e talvez as mais acessiacuteveis 115 da iacutentegra do tratado de

Hermoacutegenes satildeo assim vertidos esses gecircneros (i) clarity (ii) grandeur (iii) beauty (iv)

rapidity (v) character (vi) sincerity e (vii) force na versatildeo inglesa de Cecil W Wooten

110 Cf Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii

item Sophistaelig Praeligexercitamenta Antonio Bonfine asculano interprete Apud Seb Gryphivm Lvgdvni

1538 Pode-se ter acesso ao exemplar da Oumlsterreichische Nationalbibliothek Disponiacutevel em

lthttpdigitalonbacatOnbViewerviewerfacesdoc=ABO_2BZ178223309gt Acesso em 15 julho

2014 cf PATTERSON A M Idem ibidem O Cataacutelogo Geral da Biblioteca Nacional de Espantildea registra um

exemplar desta ediccedilatildeo em acervo cf BIBLIOTECA NACIONAL DE ESPANtildeA Cataacutelogo General de la

BNE Disponiacutevel em lthttpcatalogobneesgt Acesso em 16 julho 2014 111 Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta De inuentione

libri quatuor De formis orationis tomi duo De methodo grauitatis siue virtutis commode dicendi

Aphtonii clarissimi Rhetoris praeexercitamenta Antonio Bonfine Asculano interprete Venetiis per Ioan

Anto de Nicolinis de Sabio sumptu vero amp requisitione D Melchioris sessae 1539 Pode-se ter acesso

parcial ao exemplar digitalizado da Biblioteca Nazionale Centrale di Firenze Disponiacutevel em lthttpiccu01ecaspuritmsinternetCulturalephpid=oai3Abncffirenzesbnit3A213AFI00983A

Magliabechi3ABVEE004124gt Acesso em 15 julho 2014 112 Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] Pode-se ter acesso ao exemplar da Bayerische Staatsbibliothek Disponiacutevel em

lthttpreaderdigitale-sammlungenderesolvedisplaybsb10170282htmlgt Acesso em 15 julho 2014 113 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini Pode-se ter acesso ao exemplar da Biblioteca Nazionale Centrale di Roma Disponiacutevel em

lthttpsarchiveorgdetailsbub_gb_VIaRx0R0sOoCgt Acesso em 15 julho 2014 114 LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina drsquoHermogene

e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con Licenza dersquo

Superiori 115 Sabe-se por via indireta que em 2012 foi publicada a obra completa de Hermoacutegenes em polonecircs

traduzida do grego por Henryk Podbielski do Instituto de Estudos Claacutessicos da Universidade Catoacutelica de

Lublin (KUL) cf LICHAŃSKI J Z ldquoThe Polish Translation of Hermogenes of Tarsusrdquo Forum Artis

Rhetoricae 2 33 (abr-jun 2013) p 82-84 Sobre a circulaccedilatildeo de Hermoacutegenes na Polocircnia ver CONLEY T

ldquoSome Renaissance Polish Commentaries on Aristotlersquos Rhetoric and Hermogenesrsquo On Ideasrdquo

Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 12 No 3 (Summer 1994) pp 265-292

42

(1987) 116 (i) claridad (ii) grandeza (iii) belleza (iv) rapidez (v) caraacutecter (vi)

sinceridad e (vii) fuerza na versatildeo espanhola de Antonio Sancho Royo (1991)117 (i)

claridad (ii) grandeza (iii) belleza (iv) viveza (v) caraacutecter (vi) sinceridad e (vii)

habilidad na versatildeo espanhola de Consuelo Ruiz Montero (1993)118 e (i) clarteacute (ii)

grandeur (iii) beauteacute (iv) vivaciteacute (v) eacutethos (vi) sinceacuteriteacute e (vii) habiliteacute na versatildeo

francesa de Michel Patillon (1997)119

De alguns desses gecircneros de quatro deles pendem treze espeacutecies de modo que o

retor grego assim preveja entre gecircneros e espeacutecies vinte diferentes ideai assim

discriminadas (i) saphēneia(construiacuteda mediante katharotēs e eukrineia 120 ) (ii)

megethos(construiacuteda mediante semnotēs trakhytēs sphodrotēs lamprotēs akmēe

peribolē 121) (iii) kallos (iv) gorgotēs (v) ēthos(construiacuteda mediante apheleia glykytēs

drimytēse epieikeia122 )(vi) alētheia(construiacuteda mediante barytēs123 ) e (vii) deinotēs

Em forma esquemaacutetica as ideai podem ser assim representadas

116 Cf HERMOGENES Hermogenesrsquo on types of style Translated by Cecil W Wooten Chapel Hill University of North Carolina Press 1987 117 Cf SANCHO ROYO A Hermoacutegenes Sobre los tipos de estilo y Sobre el meacutetodo del tipo Fueza

Introduccioacuten traduccioacuten y notas Sevilla Secretariado de Publicaciones de la Universidad 1991 Trata-se

de ediccedilatildeo que natildeo foi consultada para a elaboraccedilatildeo deste trabalho Baseio-me em artigo do tradutor

SANCHO ROYO A ldquoLa teoriacutea de los estilos de Hermoacutegenes y el discurso Sobre la corona de Demoacutestenesrdquo

Habis 33 (2002) p 273-299 118 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 119 Cf HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel

Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 120 purity pureza pureza pureteacute) e distinctness distincioacuten nitidez netteteacute) 121 (solemnity solemnidad solemnidad noblesse) (asperity aspereza aspereza

rudesse) (vehemence vehemencia vehemencia veacuteheacutemence) (brilliance

brillantez brillantez eacuteclat) (florecence florecimiento vigor vigueur) e (abundance

abundancia abundancia complication) 122 (simplicity sencillez simplicidade naiumlviteacute) (sweetness dulzura dulzura saveur)

(subtlety sutileza ingenio piquant) e (modesty modestia equidad moderation) 123 (indignation indignacioacuten severidade seacuteveacuteriteacute)

43

Figura 2 ldquoHermogenesrsquo Types and Subtypes of stylerdquo124

O esquema eacute parte integrante da introduccedilatildeo do helenista Cecil W Wooten ao

volume Hermogenesrsquo on types of style Traz o vocabulaacuterio grego de Hermoacutegenes

transliterado e o leacutexico inglecircs escolhido para traduzi-lo Representaccedilatildeo muito semelhante

haacute no artigo ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo com os termos gregos empregados no Peri ideōn e os

correspondentes latinos emprestados ao Rhetoricorum libri V de Jorge de Trebizonda125

124 Cf HERMOGENES Hermogenesrsquo on types of style Translated by Cecil W Wooten Chapel Hill

University of North Carolina Press 1987 p xii 125 Cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) p

147

44

Figura 3 ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo

Satildeo muito semelhantes os esquemas pois Cecil W Wooten e Lucia Calboli

Montefusco a despeito das diferenccedilas no leacutexico de ambos organizam graficamente a

doutrina das ideai natildeo soacute dando visualidade aos viacutenculos de gecircnero e espeacutecie construiacutedos

no Peri ideōn senatildeo tambeacutem subsumindo-as as ideai agrave deinotēs definida por

Hermoacutegenes como a idea que regula ldquoo emprego correto de todas as espeacutecies discursivasrdquo

(cf HERM 368 25-369 2 no passo em uso como comumente ocorre o sintagma

ldquordquo em vez de ldquordquo) Peca apenas por deslize talvez o

esquema da pesquisadora italiana pelo apagamento da idea de sphodrotēs ()

acrimonia segundo traduz Jorge de Trebizonda a terceira entre as seis espeacutecies que

constituem em termos de discurso o megethos a magnitudo126

Guardadas as diferenccedilas serve-se Filiberto Campanile no tratado LrsquoIdee overo

Forme dellarsquoeloquentia (1606) de pressuposto equivalente de organizaccedilatildeo ao pensar a

primazia da deinotēs na praacutetica discursiva destrinccedilada no corpo de doutrina a que se

dedica

126 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia

ad D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] pp 546-9

45

Figura 4 LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia (1606)127

Filiberto Campanile condensa os preceitos e ornamenta a obra por meio de

dispositivo que metaforiza o aspecto de uma aacutervore Eacute para ser evidente o tronco avanccedila

verticalmente como eixo de idee drsquoeloquentia (ou forme dellrsquoEloquentia del parlare ou

genere del parlare128) as ideai as mais geneacutericas ordenadas da base agrave copa e numeradas

de 1 a 7 em consonacircncia com a disposiccedilatildeo das liccedilotildees de Hermoacutegenes do princiacutepio ao

fim do Peri ideōn Na base a chiarezza na copa a grauitagrave Entre elas as demais idee

drsquoeloquentia as mais especiacuteficas subdivididas como ramos desde o tronco sempre

subsidiaacuterias arranjadas e numeradas tambeacutem conforme as liccedilotildees do Peri ideōn Note-se

que o leacutexico aiacute empregado para verter ao italiano a preceptiva grega e dar legibilidade no

127 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 116 128 Idem pp 5-6

46

vernaacuteculo agraves ideai tem antecedente em obra quase que homocircnima o Le Idee ouero

Forme della oratione da Hermogene e no esforccedilo de Giulio Camillo Delminio tradutor

do Peri ideōn em fins do seacuteculo XVI esforccedilo de especializaccedilatildeo dos termos para que

doutrinariamente natildeo se confundam A interpretaccedilatildeo de Giulio Camillo Delminio em

destaque discrimina sete idee ou forme della oratione e segue de perto o texto grego

Figura 5 Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene (1594)129

O exame comparativo de ambas as obras uma estampada em 1606 outra em 1594

uma de Filiberto Campanile outra de Giulio Camillo Delminio explicita filiaccedilatildeo de

leacutexico chiarezza grandezza belleza prestezza veritagrave (ou veritate) e grauitagrave (ou

gravitate) satildeo termos comuns Satildeo semelhantes as interpretaccedilotildees do mesmo Giulio

Camillo Delminio no ldquoDiscorso di M Giulio Camillo sopra Hermogenerdquo que integra Il

secondo tomo dellrsquoopere di M Giulio Camillo Delminio volume impresso postumamente

em Veneza em 1560 Neste caso poreacutem diferem os usos e as escolhas lexicais Giulio

Camillo Delminio e de Filiberto Campanile

129 Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini

47

Figura 6 ldquoDiscoro di M Giulio Camillo sopra Hermogenerdquo (1560)130

Note-se tal como o ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos o ldquoDiscorso di

M Giulio Camillo sopra Hermogenerdquo agrave diferenccedila das obras supracitadas tabula as

ldquoforme di Hermogenerdquo sem mencionar a deinotēs (ou grauitagrave ou grauitate) Mais no

cotejo com o tratado seiscentista LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia prefere seueritagrave

a dignitagrave ao verter semnotēs prefere o grego (peribolē) a qualquer traduccedilatildeo a

de Filiberto Campanile eacute circuitione prefere acrimonia a acutezza ao verter drimytēsEm

Manuel de Galhegos como se viu essas ideai parecem proliferar e a afirmaccedilatildeo das

excelecircncias da Ulyssea ou Lisboa Edificada compreende categorias que natildeo se

reconhecem nos esquemas de Cecil W Wooten de Lucia Calboli de Filiberto Campanile

ou de Giulio Camillo Delminio que natildeo se reconhecem como pendentes dos usos

linguiacutesticos e retoacutericos do Peri ideōn Assim ainda que se entendam operatoacuterias as ideai

no ldquoDiscurso Poeacuteticordquo pois que sejam referidas como ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo (i) ldquoclaridaderdquo

(ou ldquoSaphiniardquo) (ii) ldquograndezardquo (iii) ldquofermosurardquo (ou ldquogalhardiardquo) (iv) ldquoPreccedilardquo (ou

ldquoGorgotisrdquo) (v) ldquocostumerdquo (ou ldquocaracterrdquo) e (vi) ldquoverdaderdquo em referecircncia a Hermoacutegenes

ainda que se possa assumir que ldquograuerdquo e ldquoferozrdquo sejam traduccedilotildees possiacuteveis para o

adjetivo grego deinos de modo a envolver a ideia de (vii) deinotēs em referecircncia

130 Cf Il secondo tomo dellrsquoopere di M di Giulio Camillo Delminio cioegrave La Topica ouero dellrsquoElocutione

Discorso sopra lrsquoIdee di Hermogene La Grammatica Espositione sopra il primo amp secondo Sonetto del

Petrarca Nvovamente dato in lvce Con privilegio In Venegia apresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLX

[1560] p 116

48

plausiacutevel a Hermoacutegenes o que apartaria Manuel de Galhegos de Giulio Camillo

Delminio ainda assim escapam ao Peri ideōn o que eacute da ordem do ldquotristerdquo do ldquoalegrerdquo e

do ldquofloridordquo Eacute evidente Manuel de Galhegos natildeo redige um tratado natildeo deve conforme

o decoro o leitor esperar dele a acribia do tratadista todavia eacute oportuno discutir que

intercessotildees haacute aqui Para fazecirc-lo eacute proveitoso atentar que no ldquoDiscurso Poeacuteticordquo

coadunam-se agraves de Hermoacutegenes as liccedilotildees de Quintiliano Satildeo conhecidos os passos da

Institutio oratoria de que pendem a afirmaccedilatildeo de Manuel de Galhegos ldquoA grandeza do

estilo (a q Quintiliano chama Adron) estagrave aqui tantordquo

Altera est divisio quae in tris partis et ipsa discedit qua discerni posse

etiam recta dicendi genera inter se videntur Namque unum subtile

quod ischnon vocant alterum grande atque robustum quod hadron

dicunt constituunt tertium alii medium ex duobus alii floridum

(namque id antheron appellant) addiderunt (QUINT XII 10 58)

Existe uma outra divisatildeo que tambeacutem se divide ela mesma em trecircs

partes na qual ainda parecem poder distinguir-se um dos outros os

corretos gecircneros do discurso Com efeito um eacute o sutil que chamam

iskhnoacutes outro o grandioso e robusto que dizem hadroacutes o terceiro uns

o estabelecem no meio dos dois outros o deram como florido (pois o

nomeiam antheroacutes)131

Diga-se ldquoAltera est divisiordquo haacute outra divisatildeo porque antes Quintiliano discrimina

trecircs genera dicendi a saber os gecircneros aacutetico (Atticus) roacutedio (Rhodius) e asiano (Asianus)

O primeiro compresso e iacutentegro nada supeacuterfluo o derradeiro inflado e inane carente de

131 A traduccedilatildeo eacute de Thaiacutes Morgado Martin cf MARTIN T M ldquoDos gecircneros de discurso (QUINT XII 1058-

80)rdquo Letras claacutessicas Satildeo Paulo 2005 v 9 p 225-226 Na traduccedilatildeo de Jerocircnimo Soares Barbosa (ca 1737-1816) ldquoHa outra divisatildeo dos Estilos repartidos tambem em tres especies pelas quais se podem

outrosim distinguir entre si os diferentes caracteres de Eloquencia Hum he о Subtil chamado em Grego

Ischnos o segundo o Grande e Robusto chamado pelos Gregos Adros Acrescentaraotilde alguns hum terceiro

a que huns chamaotilde Mediocre por ser composto dos dois e outros Florido traduzindo deste modo o termo

Grego Antherosrdquo cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros

traduzidas em linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que

aprendem Ajuntaotilde-se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas

Instituiccediloens por Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade

de Coimbra Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila

da Real Meza da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a

novecentos e sessenta reis em papel p 415-6

49

juiacutezo e tambeacutem de moderaccedilatildeo132 o intermeacutedio misto nem compresso como o aacutetico nem

abundante como o asiano133 Ressalte-se na liccedilatildeo de Quintiliano natildeo se questiona que o

aacutetico seja o melhor dos gecircneros134 Jaacute a triparticcedilatildeo dos genera dicendi em subtile ou

iskhnon (ἰσχνόν)135 em grande e robustum ou hadron (ἁδρόν) em medium ou floridum

ou antheron (ἀνθηρόν) prevecirc que o primeiro tenha como ofiacutecio ensinar o segundo

comover e o terceiro deleitar ou conciliar de modo que se pareccedilam exigir a agudeza

(acumen) para o ensinamento a brandura (lenitas) para a conciliaccedilatildeo e o vigor (vis) para

a comoccedilatildeo Empregue-se assim mirando-se o ensinamento de acordo com Quintiliano

o gecircnero sutil nas narraccedilotildees e nas provas (cf QUINT XII 10 59)136 o gecircnero meacutedio

distintamente para deleitar haacute de ser mais frequente nas traslaccedilotildees mais apraziacutevel nas

figuras mais ameno nas digressotildees adequado na composiccedilatildeo doce nas sentenccedilas (cf

QUINT XII 10 60)137 e por fim o gecircnero grande e robusto cujo efeito deva ser a

comoccedilatildeo e o arrebatamento se elevaraacute por meio de amplificaccedilotildees e de superlaccedilotildees (cf

QUINT XII 10 62)138

Quintiliano assim como Secircneca nas Epiacutestolas morais a Luciacutelio jaacute o mostrou

Marcos Martinho dos Santos opera doutrina de gecircneros tripartite ao modo da Rhetorica

ad Herennium e de Ciacutecero Logo satildeo esses os genera dicendi para Quintiliano como satildeo

as figurae para o Anocircnimo ldquograuerdquo ldquomediocrerdquo e ldquoattenuatumrdquo como o satildeo os genera

para Ciacutecero ldquograve ou pleno ou sublime ou amplo ou grandiacuteloquo ou veemente ou

copiosordquo ldquosutil ou tecircnue ou atenuado ou compresso ou remisso ou humilderdquo e ao cabo

ldquomeacutedio ou mediacuteocre ou temperado ou moacutedico ou intermediaacuteriordquo no elenco de

Martinho139 Recorde-se grave pleno sublime amplo grandiacuteloquo veemente copioso

132 QUINT XII 10 16 ldquocum Attici pressi et integri contra Asiani inflati et inanes haberentur in his nihil

superflueret illis iudicium maxime ac modus deessetrdquo Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica

de Horaacuteciordquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2000 v 4 p 237 133 QUINT XII 10 18 ldquotertium mox qui haec dividebant adiecerunt genus Rhodium quod velut medium

esse atque ex utroque mixtum volunt neque enim Attice pressi neque Asiane sunt abundantesrdquo 134 QUINT XII 10 18 ldquoNemo igitur dubitaverit longe esse optimum genus Atticorumrdquo 135 Aponta-se aqui o adjetivo neutro grego (ἰσχνόν) em concordacircncia com o substantivo ldquogenusrdquo A

traduccedilatildeo de Thaiacutes Morgato Martiacuten translitera a forma masculina do adjetivo (ischnoacutes ἰσχνό) 136 QUINT XII 10 59 ldquoquorum tamen ea fere ratio est ut primum docendi secundum movendi tertium

illud utrocumque est nomine delectandi sire ut alii dicunt conciliandi praestare videatur officium in

docendo autem acumen in conciliando lenitas in movendo vis exigi videatur itaque illo subtili praecipue

ratio narrandi probandique consistet sed saepe id etiam detractis ceteris virtutibus suo genere plenumrdquo 137 QUINT XII 10 60 ldquomedius hic modus et translationibus crebrior et figuris erit iucundior

egressionibus amoenus compositione aptus sententiis dulcis lenior tamen ut amnis lucidus quidem sed

uirentibus utrinque ripis inumbratusrdquo 138 QUINT XII 10 62 ldquoHic et amplificationibus extollet orationem et in superlationem quoque erigeturrdquo 139 Cf SANTOS M M ldquoArte dialoacutegica e epistolar segundo as Epiacutestolas morais a Luciacuteliordquo Letras Claacutessicas

Satildeo Paulo 1999 v 3 p 51

50

grande ou robusto eacute o gecircnero ldquoAdronrdquo (ou hadron ou ἁδρόν) cujos meios e cujos fins

Manuel de Galhegos particularmente refere a partir das liccedilotildees da Institutio oratoria ao

elencar a variedade de ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo em uso na Ulyssea ou Lisboa Edificada de

Gabriel Pereira de Castro Note-se o termo latino ldquoformardquo eacute empregado na liccedilatildeo de

Quintiliano

[66] Sed neque his tribus quasi formis inclusa eloquentia est Nam ut

inter gracile validumque tertium aliquid constitutum est ita horum

inter se intervalla sunt atque inter haec ipsa mixture quiddam ex

duobus medium est eorum [67] nam et subtili plenius aliquid atque

subtilius et vehementi remissius atque vehementius invenitur ut illud

lene aut ascendit ad fortiora aut ad tenuiora summittitur Ac sic prope

innumerabiles species reperiuntur quae utique aliquo momento inter se

differant sicut quattuor ventos generaliter a totidem mundi cardinibus

accepimus flare cum interim plurimi medii et eorum varia nomina et

quidam etiam regionum ac fluminum proprii deprehenduntur

[68] Eademque musicis ratio est qui cum in cithara quinque

constituerunt sonos plurima deinde varietate complent spatia illa

nervorum atque his quos interposuerunt inserunt alios ut pauci illi

transitus multos gradus habeant

[69] Plures igitur etiam eloquentiae faces sed stultissimum quaerere

ad quam se recturus sit orator cum omnis species quae modo recta est

habeat usum atque id ipsum non sit oratoris quod vulgo genus dicendi

vocant Utetur enim ut res exiget omnibus nec pro causa modo sed

pro partibus causae

[70] Nam ut non eodem modo pro reo capitis et in certamine hereditatis

et de interdictis ac sponsionibus et de certa credita dicet sententiarum

quoque in senatu et contionum et privatorum consiliorum servabit

discrimina multa ex differentia personarum locorum temporumque

mutabit ita in eadem oratione aliter concitabit aliter conciliabit non

ex iisdem haustibus iram et misericordiam petet alias ad docendum

alias ad movendum adhibebit artes

[71] Non unus color prooemii narrationis argumentorum egressionis

perorationis servabitur Dicet idem graviter severe acriter vehementer

51

concitate copiose amare comiter remisse subtiliter blande leniter

dulciter breviter urbane non ubique similis sed ubique par sibi

[72] sic fiet cum id propter quod maxime repertus est usus orationis ut

dicat utiliter et ad efficiendum quod intendit potenter tum laudem

quoque nec doctorum modo sed etiam vulgi consequatur (QUINT XII

10 66-72)

[66] Mas a eloquecircncia natildeo estaacute encerrada nessas trecircs ndash digamos ndash

formas Pois assim como entre o gracioso e o vigoroso se estabeleceu

um terceiro assim tambeacutem existem intervalos desses e entre esses

mesmos [intervalos] existe certo intermediaacuterio misturado dos dois [67]

jaacute que tanto se encontra algo mais pleno e mais sutil que o sutil quanto

[algo] mais remisso e mais veemente que o veemente assim como o

brando ou ascende ateacute o mais forte ou se submete ao mais tecircnue E assim

se descobrem espeacutecies quase inumeraacuteveis que de qualquer modo

diferem entre si por alguma circunstacircncia assim como aceitamos que

de modo geral quatro ventos sopram de outros tantos pontos cardeais

do mundo quando todavia se compreendem muito mais intermediaacuterios

e variados nomes deles e alguns ainda proacuteprios de regiotildees e tambeacutem de

rios

[68] E o mesmo raciociacutenio haacute para os muacutesicos que apoacutes ter instituiacutedo

na ciacutetara cinco sons logo completam aqueles espaccedilos das cordas com

muito mais numerosa variedade [de sons] e ainda entre aqueles [sons]

que inserem interpotildeem outros de modo que aquelas poucas transiccedilotildees

tenham muitos graus

[69] Ainda mais faces da eloquecircncia portanto existem mas seria a

coisa mais tola indagar para qual o orador haacute de dirigir-se uma vez que

toda espeacutecie que de algum modo eacute correta tem utilidade e aquilo

mesmo que vulgarmente chamam gecircnero de discurso natildeo eacute proacuteprio do

orador pois ele utilizaraacute conforme exija o caso de todas e natildeo soacute de

acordo com a causa mas de acordo com as partes da causa

[70] Com efeito assim como natildeo com um mesmo modo discursaraacute a

favor do reacuteu de uma [causa] capital e em uma contestaccedilatildeo de heranccedila e

a respeito de interdiccedilotildees e tambeacutem fianccedilas e empreacutestimo certificado

preservaraacute as distinccedilotildees das sentenccedilas no senado e assembleacuteias e dos

conselhos privados mudaraacute muitas coisas de acordo com a diferenccedila de

52

pessoas locais e tempos assim tambeacutem em um mesmo discurso de

um modo incitaraacute de outro conciliaraacute natildeo de um mesmo hausto

alcanccedilaraacute a ira e a misericoacuterdia admitiraacute umas artes para ensinar outras

para mover

[71] Natildeo seraacute preservada a mesma a cor do proecircmio da narraccedilatildeo das

argumentaccedilotildees da digressatildeo e da peroraccedilatildeo Discursaraacute acerca da

mesma coisa de forma grave severa acerba veemente raacutepida copiosa

amarga acerca da mesma coisa de forma afaacutevel remissa sutil

agradaacutevel branda doce breve elegante natildeo em toda parte semelhante

mas em toda parte agrave altura de si mesmo

[72] Assim se faraacute quando aquilo por que o uso do discurso foi

inventado sobretudo ndash [isto eacute] ndash que discurse com utilidade e poder para

perfazer o que pretende ndash entatildeo consiga tambeacutem o elogio natildeo soacute dos

doutos mas ainda do vulgo 140

Ora deixa evidente o longo passo os genera dicendi satildeo ldquoquasi formaerdquo como

que formas (QUINT XII 10 66l) A eloquecircncia todavia de poetas e de oradores as liccedilotildees

de Quintiliano satildeo bastantemente expliacutecitas natildeo se prescreve encerrada aos trecircs gecircneros

como se fossem pensados agrave maneira de uma teacutecnica elocutiva de hiperuniformizaccedilatildeo dos

usos mas compotildee-se na distacircncia entre eles treslendo-se Roland Barthes nas malhas

intervalares da elocuccedilatildeo141 de fatura mista sempre mista Entre os gecircneros os trecircs o

repertoacuterio de leacutexico e de sintaxe eacute de ldquoespeacutecies quase inumeraacuteveisrdquo (cf QUINT XII 10

67 prope innumerabiles species) segundo gradaccedilotildees sucessivas previstas numa relaccedilatildeo

de diferenccedila do mais sutil ao mais veemente em que se abarquem observando-se bem de

perto o preceito da Institutio oratoria categorias como o grave o severo o acerbo o

veemente o raacutepido o copioso o amargo E mais o afaacutevel o remisso o sutil o agradaacutevel

o brando o doce o breve o elegante Ou se talvez quisermos pensar com Manuel de

Galhegos E mais o ldquograuerdquo o ldquotristerdquo o ldquoalegrerdquo o ldquoferozrdquo o ldquoseverordquo e o ldquofloridordquo

Todas satildeo formae que fazem proliferar a variaccedilatildeo especiacutefica entre os genera dicendi

cujos usos conveacutem isso reter do preceito devam ser balizados pelo aptum de cada

140 Cf MARTIN T M ldquoDos gecircneros de discurso (QUINT XII 1058-80)rdquo Letras claacutessicas Satildeo Paulo 2005

v 9 pp 226-227 141 Por ldquomalhardquo entende-se o francecircs ldquoreacuteseaurdquo cf BARTHES R ldquoLancienne rheacutetorique [Aide-meacutemoire]rdquo

In Communications 16 1970 Recherches rheacutetoriques p 218

53

enunciado em cada situaccedilatildeo de discurso (situation de discours) 142 Disso resulta a

eloquecircncia a elocuccedilatildeo eacute sempre o outro ldquoaquilo mesmo que vulgarmente chamam

gecircnero de discurso natildeo eacute proacuteprio do oradorrdquo (cf QUINT XII 10 69 id ipsum non sit

oratoris quod vulgo genus dicendi vocant) 143 E sempre outra

A assimiliccedilatildeo das formae dos genera dicendi de Quintiliano agraves ideai de

Hermoacutegenes pensada por Manuel de Galhegos e operada no juiacutezo encomiaacutestico agrave

Ulyssea ou Lisboa Edificada conhece-se ademais da traduccedilatildeo setecentista que

Jerocircnimo Soares Barbosa elaborou da parte final do mesmo excerto (QUINT XII 10 71-

72) exposta nas Instituiccedilotildees oratorias de M Fabio Quintiliano (1788 e 1790) Essa liccedilatildeo

repotildee a muacutesica nos planos da retoacuterica juntas se sabem ainda que sejam cientes da

especificidade de seus artifiacutecios e supotildee que entre as trecircs formae de Quintiliano ou quasi

formae interpretadas como ldquotres foacutermas geraes de estylordquo existam ldquoDifferentes tons e

Gradaccedilotildees dos tres Estilosrdquo assim pensados

A estas gradaccedilotildees e degradaccedilotildees do mesmo estilo chamavaotilde os Latinos

Colores e os Francezes com hum termo muito proprio Nuances du

Stile e noacutes lhe podemos chamar Matizes tirada a metaphora da

augmentacaotilde e diminuiccedilaotilde insensivel de huma mesma cor com que

por graos passa ou do escuro ao claro ou do claro ao escuro Os

mesmos Latinos Ihes chamavaoacute tambem Voces e noacutes lhe podemos dar

o nome de Tons do estilo aacute maneira dos da Musica que sendo sete

principaes em cada outava estes mesmos admittem tantas gradaccedilotildees e

degradaccedilotildees que hum ouvido exercitado pode distinguir em cada

outava 43 differentes e ainda entre cada hum destes ha muitos outros

intermeacutedios que o ouvido do homem poacutede sentir mas naotilde distinguir

Assim cada hum dos tres estilos principaes pode sem sahir do seu

genero subir gradualmente ateacute o maacuteximo e descer do mesmo modo ateacute

o minimo O Sublime pode ser mais ou menos sublime o Simples mais

ou menos simples O Medio da mesma sorte pode participar mais ou

menos do sublime aacute proporccedilaotilde que sobe e mais ou menos do simples aacute

medida que desce No mais ou menos haacute infinitas gradaccedilotildees cujos

142 Cf DUCROT O TODOROV T Dicionaacuterio Enciclopeacutedico das Ciecircncias da Linguagem 3ordf ediccedilatildeo Satildeo

Paulo Perspectiva 2007 pp 297-300 143 Cf HANSEN J A ldquoRepresentaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo na literatura de Machado de Assisrdquo Ciecircncia Hoje nordm 253

out 2008 p 37

54

limites nam se podem assignar poreacutem que nem por isso deixaotilde de ser

menos reaes e que hum escriptor exacto e de hum gosto fino e delicado

sabe guardar amoldando o seu estilo a cada genero a cada causa a cada

parte da oraccedilaotilde e a cada pensamento sob pena de naotilde merecer o nome

de Orador ou de Poeta que tem144

O rodapeacute muito explicitamente atualiza o que parece consabido na longuiacutessima

vigecircncia da retoacuterica como instituiccedilatildeo de codificaccedilatildeo das praacuteticas discursivas preceito que

antes neste trabalho se fez pender de Diego de Saavedra Fajardo de Manuel de Galhegos

de Francesco Petrarca de D Luiacutes de Goacutengora segundo o qual haacute sublimidades haacute

medianidades haacute simplicidades No plural Prescreve o letrado luso nos termos desses

preceitos serem quatro os tons operados como gradaccedilotildees dos genera discursivos a

saber (i) ldquoTom do Generordquo devem ser diferentes por conveniecircncia os estilos do

deliberativo do judicial e do demonstrativo da epopeia da trageacutedia e da comeacutedia (ii)

ldquoTom da Causardquo devem ser mais ornadas certas causas que outras no mesmo gecircnero

tratadas num tom as causas capitais noutro as particulares num estilo as suasoacuterias diante

do Senado noutro as diante do povo noutro ainda as diante de um uacutenico homem

semelhantemente podem ser mais ou menos traacutegicas e mais ou menos cocircmicas a Trageacutedia

e a Comeacutedia (iii) ldquoTom das partesrdquo deve ser distinto em estilo o discurso ou o poema em

suas partes em conformidade com o fim de instruir de deleitar ou de mover de modo

que variem exoacuterdio narraccedilatildeo prova ou peroraccedilatildeo assim tambeacutem na trageacutedia haacute cenas

mais ou menos vigorosas e na epopeia episoacutedios mais ou menos sublimes na trageacutedia

o estilo elevado abate-se na expressatildeo da dor e na excitaccedilatildeo da compaixatildeo e na comeacutedia

o estilo simples irmana-se do tom elevado na indignaccedilatildeo e por fim (iv) ldquoTom de cada

pensamento e de cada idegraveiardquo eacute imperioso que se mantenham os caracteres das partes do

discurso (ou poema) por mais breves que sejam como faz Ciacutecero no discurso Pro

Balbo145

144 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel pp 426-427 145 Idem p 427

55

Eacute evidente as Instituiccedilotildees oratorias de M Fabio Quintiliano natildeo satildeo a Institutio

oratoria Jerocircnimo Soares Barbosa lecirc Quintiliano e desfia a noccedilatildeo de tom e os modos de

regulaacute-lo com decoro conforme o verbete homocircnimo apresentado no tomo 16 de 1765

o derradeiro da Encyclopeacutedie ou dictionnaire raisonneacute des sciences des arts et des

meacutetiers editada por Denis Diderot (1713-1784) e Jean le Rond drsquoAlembert (1717-1783)

TON (Prose amp Poeacutesie) couleurs nuances du style langage qui

appartient agrave chaque ouvrage

Il y a 1deg le ton du genre crsquoest par exemple du comique ou du tragique

2deg le ton du sujet dans le genre le sujet peut ecirctre comique plus ou

moins 3deg le ton des parties chaque partie du sujet a outre le ton

geacuteneacuteral son ton particulier une scegravene est plus fiere amp plus vigoureuse

qursquoune autre celle-ci est plus molle plus douce 4deg le ton de chaque

penseacutee de chaque ideacutee toutes les parties quelque petites qursquoelles

soient ont un caractere de proprieacuteteacute qursquoil faut leur donner amp crsquoest ce

qui fait le poeumlte sans cela cur ego poeumlta salutor On bat souvent des

mains quand dans une comeacutedie on voit un vers tragique ou un lyrique

dans une trageacutedie Crsquoest un beau vers mais il nrsquoest point ougrave il devroit

ecirctre

Il est vrai que la comeacutedie eacuteleve quelquefois le ton amp que la trageacutedie

lrsquoabaisse mais il faut observer que quelque essor que prenne la

comeacutedie elle ne devient jamais heacuteroiumlque On nrsquoen verra point

drsquoexemple dans Moliere Il y a toujours quelque nuance du genre qui

lrsquompecircche drsquoecirctre tragique De mecircme quand la trageacutedie srsquoabaisse elle ne

descend pas jusqursquoau comique Qursquoon lise la belle scegravene ougrave Phedre

paroicirct deacutesoleacutee le style est rompu abattu si jrsquoose mrsquoexprimer ainsi

crsquoest toujours une reine qui geacutemit

Ce que nous venons de dire du ton en poeacutesie srsquoapplique eacutegalement agrave la

prose Il y a chez elle le ton simple ou familier le ton meacutediocre amp

le ton soutenu selon le genre de lrsquoouvrage le sujet dans le genre amp les

parties du sujet Enfin le ton ou le langage drsquoun conte drsquoune lettre

drsquoune histoire drsquoune oraison funebre doivent ecirctre bien

diffeacuterens Voy STYLE (D J) 146

146 Cf Encyclopeacutedie ou dictionnaire raisonneacute des sciences des arts et des meacutetiers par une socieacuteteacute de gens

de lettres Mis en ordre et publieacute par M Tome seizieme TEA-VENERIE A Neufchastel chez Samuel

56

TOM (Prosa amp Poesia) cores nuanccedilas do estilo linguagem que eacute

proacutepria a cada obra

Haacute 1deg o tom do gecircnero eacute por exemplo do cocircmico ou do traacutegico 2deg

o tom da mateacuteria no gecircnero a mateacuteria pode ser mais ou menos cocircmica

3deg o tom das partes cada parte da mateacuteria tem aleacutem do tom geral seu

tom particular uma cena eacute mais altiva amp mais vigorosa que outra esta

eacute mais deacutebil mais doce 4deg o tom de cada pensamento de cada ideia

todas as partes por menores que elas sejam constam de um caraacuteter de

propriedade que lhe seja preciso conferir e eacute o que faz o poeta sem isso

cur ego poeumlta salutor147 Aplaude-se amiuacutede quando em uma comeacutedia

vecirc-se um verso traacutegico ou um liacuterico em uma trageacutedia Eacute um belo verso

mas natildeo estaacute onde deveria estar

Eacute verdade que a comeacutedia eleva por vezes o tom amp que a trageacutedia o

abaixa mas eacute preciso observar que nenhum voo que tome a comeacutedia

deve jamais tornaacute-la heroica Natildeo se veraacute exemplo disso em Moliegravere

Haacute sempre uma nuanccedila do gecircnero que o impede de ser traacutegico Assim

tambeacutem quando a trageacutedia se abaixa ela natildeo desce ateacute o cocircmico

Quando se lecirc a bela cena em que Fedra parece desolada rompe-se

abate-se o estilo se ouso assim exprimir-me eacute sempre uma rainha que

se lamenta

O que acabamos de dizer do tom na poesia aplica-se igualmente agrave prosa

Haacute nela o tom simples ou familiar o tom mediacuteocre amp o tom

sustentado148 segundo o gecircnero da obra a mateacuteria no gecircnero e as partes

da mateacuteria Enfim o tom ou a linguagem de um conto de uma carta de

uma histoacuteria de uma oraccedilatildeo fuacutenebre devem ser bastante diferentes

Ver ESTILO (D J)149

Faulche amp Compagnie Libraires amp Imprimeurs [1765] p 403 A liccedilatildeo se repete em francecircs quase que

literalmente no Dictionnaire de Litteacuterature do Abade Antoine Sabatier de Castres estampado em 1770

Variam apenas os exemplos selecionados pelo autor cf Dictionnaire de Litteacuterature Dans lequel on traite

de tout ce qui a rapport agrave lEloquence agrave la Poeumlsie amp aux Belles-Lettres amp dans lequel on enseigne la

Marche amp les Reacutegles quon doit observer dans tous les Ouvrages desprit Par M LrsquoAbbeacute Antoine Sabatier

de Castres Tome Troiseme A Paris chez Vincent Imprimeur- Libraire rue Saint Severin MDCCLXX

[1770] Avec Approbation amp Privileacutege du Roi p 18 147 Trata-se de passo de verso de Horaacutecio da Epistula ad Pisones ldquocur ego si nequeo ignoroque poeumlta

salutorrdquo [por que eu se natildeo posso e ignoro sou aclamado poeta] (HOR AP 87) 148 Isso seja um estilo mantido nas alturas 149 Traduccedilatildeo nossa

57

Jerocircnimo Soares Barbosa manteacutem agrave vista o enciclopedista Louis de Jaucourt

(1704-1779) o redator do verbete mas a Encyclopeacutedie natildeo ilustra novidades organiza o

conhecido150 a bem dizer como se veraacute a metaforizaccedilatildeo das gradaccedilotildees das formae

estiliacutesticas como tons de intensidades variadas eacute longeva e tem antecedentes vernaculares

e latinos satildeo ldquotuonirdquo eacute liccedilatildeo do poeta Giovanni Battista Guarini (1538-1612) no discurso

Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le tragicomedie

e le pastorali in un suo discorso di poesia datado de 1588151 satildeo ldquosonirdquo eacute liccedilatildeo de Jorge

de Trebizonda no Rhetoricorum libri V 152 segundo Ciacutecero no De optimo genere

oratorum (cf CIC Opt I1)153 Por exemplo154

150 O ldquoMr drsquoAlembertrdquo e a ldquoEncyclopediardquo satildeo citados por Jerocircnimo Soares Barbosa cf Instituiccediloens

oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em linguagem e illustradas

com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-se no fim as Peccedilas

originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por Jeronymo Soares

Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra Tomo Primeiro Em

Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza da Commissatildeo

Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta reis em papel

p 10 Cf TEIXEIRA I ldquoArtifiacutecio persuasatildeo e sociedade em Olavo Bilacrdquo Revista USP nordm 54 ago 2002 p 103 151 Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le tragicomedie e le pastorali

in un suo discorso di poesia Con privilegio In Ferrara Ad Instanza di Alfonso Caraffa 1588 Con licenza

de Superiori pp 37r-37v 152 Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia ad

D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] pp 494-495 153 CIC Opt I 1 ldquoOratorum genera esse dicuntur tamquam poetarum id secus est nam alterum est

multiplex Poematis enim tragici comici epici melici etiam ac dithyrambici quo magis est tractatum a

Latinis suum cuiusque est diversum a reliquis Itaque et in tragoedia comicum vitiosum est et in comoedia

turpe tragicum et in ceteris suus est cuique certus sonus et quaedam intellegentibus nota voxrdquo [Dizem

existir gecircneros tanto de oradores como de poetas natildeo eacute assim pois num caso se trata de unicidade noutro

se tem multiplicidade Do poema traacutegico do cocircmico do eacutepico do liacuterico e ateacute do ditiracircmbico como foi praticado pelos gregos realmente existe de cada um o gecircnero proacuteprio diverso dos demais assim tanto o

cocircmico eacute vicioso na trageacutedia como o traacutegico eacute torpe na comeacutedia e nos outros gecircneros existe para cada um

determinado tom proacuteprio e um acento noto para conhecedores] cf ALONSO JUacuteNIOR C O melhor gecircnero de

oradores I-IV V 15-16 VI 16-17 Letras claacutessicas Satildeo Paulo 2000 v 4 p 343 154 Diga-se trata-se de liccedilatildeo que se itera enquanto vige a retoacuterica como instituiccedilatildeo que regula as praacuteticas

discursivas Depreende-se assim do Compedio de rhetorica e poetica de Manoel da Costa Honorato cuja

quarta ediccedilatildeo foi dada agrave impressatildeo no Rio de Janeiro em 1879 adaptada ao programa curricular da cadeira

de Retoacuterica Poeacutetica e Literatura Nacional disciplina ministrada no Imperial Coleacutegio Pedro II ldquoConveacutem

advertir que cada uma destas especies de estylos eacute susceptivel de gradaccedilotildees porque o tenue ora seraacute mais

ora menos subtil o sublime mais ou menos robusto e temperado subiraacute ao sublime ou desceraacute ao singelo

Ha portanto em um mesmo genero ou especie uma infinidade de variaccedilotildees que mostrando sempre alguma differenccedila ainda que diminuta comtudo eacute difficil de classificar deve pois o orador prestar attenccedilatildeo agrave

conveniencia afim de accomodar linguagem ao assumpto de que se occupa ndash A conversaccedilatildeo familiar e as

cartas requerem estylo tenue e singelo os commentarios as memorias os dialogos e o discurso didactico

em prosa tambeacutem exigem estylo simples e natural A historia demanda estylo temperado e quando nella

entratildeo descripccedilotildees de paizes e logares a linguagem deve ser mais amena e florida poreacutem sempre natural

No discurso oratorio o estylo varia segundo o genero de eloquencia assumpto e partes do mesmo discurso

na eloquencia judicial o estylo deve ser ora temperado ora subtil os discursos da tribuna e do pulpito

devem ser expostos com o estylo sublime e robusto Ao exordio estaacute bem o tenue o estylo da narraccedilatildeo deve

ser facil e rapido e o da confirmaccedilatildeo nobre e sublime [] Resumindo [] cada um dos generos de

composiccedilatildeo e cada pensamento exige um tom e um estylo particular no mesmo assumpto poacutedem se

misturar ou suceder as diferentes especies de estylo sem comtudo confundir-se o estylo deve sempre estar

58

Ora na doutrina das Instituiccedilotildees oratorias de M Fabio Quintiliano as

ldquoDifferentes Ideasrdquo satildeo portanto ldquomodificaccedilotildees dos tres Estylosrdquo Disso pode-se

aventar reteacutem o leitor oitocentista no horizonte lusoacutefono de destinaccedilatildeo histoacuterica do

tratado a conformaccedilatildeo dos preceitos de Quintiliano aos de Hermoacutegenes Eacute este que

permite a visada daquele pois que neste passo para esquadrinhar o retor latino Jerocircnimo

Soares Barbosa lecirc a Institutio oratoria agrave luz do que ensina o Peri ideōn lecirc as ideai e tece

liames de doutrina

Hermogenes entre outros tratados concernentes aacute Eloquencia compoz

dois livros Das Idegraveas ou differentes formas e qualidades

dos estilos que todos assentatildeo naotilde serem outra couza senaotilde as varias

modificaccedilotildees e virtudes de que saotilde susceptiveis os tres estilos

principaes e que he preciso observar para saber variar о estilo conforme

a materia o pedir 155

Isto seja de acordo com as Instituiccedilotildees oratorias de M Fabio Quintiliano as

formas satildeo Idegraveas Jerocircnimo Soares Barbosa tomando-as como ldquoqualidades dos estilosrdquo

as aretai aristoteacutelicas como ldquoas varias modificaccedilotildees e virtudes de que saotilde susceptiveis

os tres estilos principaesrdquo ndash o ldquoSublimerdquo o ldquoSimplesrdquo o ldquoMediordquo ndash inscreve-as enquanto

gradaccedilotildees nos intervalos da elocuccedilatildeo mista Essas gradaccedilotildees nos Discorsi del poema

heroico de Torquato Tasso (1544-1595) entendem-se subsumidas agrave triparticcedilatildeo dos

genera dicendi tal como conhecida de Ciacutecero de Quintiliano ou do Anocircnimo ad

Herennium

[] il sublime e lrsquoalto genere hauragrave come sue spetie la grande la

bella la splendida la graue forma che egrave quella chrsquoegrave piena di dignitagrave

e lrsquoaspra lrsquoaffettuosa e la vehemente il mediocre la gratiosa la

em harmonia com o pensamento ou senrimento que exprimirrdquo cf Compendio de rhetorica e poetica (4ordf

ediccedilatildeo consideravelmente augmentada) Adaptado ao programma do Imperial Collegio Pedro II pelo

Conego Manuel da Costa Honorato Rio de Janeiro Typ Cosmopolita rua do Regente 31 1879 pp

107-108 155 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel p 430

59

soaue la dolce la piaceuole lrsquoornata e la fiorita lrsquohumile la chiara

ograve ver la facile la semplice lrsquoacuta la sottile la motteggeuole o ver

quella che muove agrave riso amp altre simiglianti []156

[] o sublime e o alto gecircnero teraacute como suas espeacutecies a grande a bela

a esplecircndida a grave forma que eacute aquela que eacute cheia de dignidade e a

aacutespera a afetuosa e a veemente o mediacuteocre a graciosa a suave a doce

a apraziacutevel a ornada e a florida a humilde a clara ou a faacutecil a simples

a aguda a sutil a ou aquela que move ao riso amp outras semelhantes

[]157

Em termos gregos compotildeem o gecircnero sublime o megethos (ldquola granderdquo) o kallos

(ldquola belardquo) a lamprotēs (ldquola splendidardquo) a semnotēs (ldquola graue formardquo ldquopiena di

dignitagraverdquo) a trakhytēs (ldquolrsquoasprardquo) e a sphodrotēs (ldquola vehementerdquo) Compotildeem o gecircnero

mediocre o glaphyros (ldquola gratiosardquo ldquola piaceuolerdquo ldquolrsquoornatardquo) (cf DEMETR 186-7)158

a glykytēs (ldquola soaue la dolcerdquo) e o antheros (la fiorita) (QUINT XII 10 58) Por fim

compotildeem o humile a saphēneia(ldquo la chiarardquo) a eukrineia (ldquola facilerdquo) a apheleia (ldquola

semplicerdquo) e a deinotēs (ldquolrsquoacuta la sottile la motteggeuole o ver quella che muove agrave

risordquo) A articulaccedilatildeo das liccedilotildees de Hermoacutegenes de Demeacutetrio e de Quintiliano isso eacute claro

expotildee procedimento de leitura que se observaraacute recorrente e bastante produtivo o da

acomodaccedilatildeo da doutrina normatizada pelo Peri ideōn ao leacutexico e agraves categorias

consabidas no mais das vezes pelas liccedilotildees de retoacuterica latina159 Indica-o Pierre Laurens

desde Jorge de Trebizonda costuma-se analisar as ideai de Hermoacutegenes como um

refinamento os tuoni que nuanccedila os trecircs genera dicendi e que torna possiacutevel a

composiccedilatildeo de ldquomodulaccedilotildees extremamente complexasrdquo desses genera160 Isso parece

estar no caacutelculo de Manuel de Galhegos

Ora mesmo que simpaacuteticas as idee de Torquato Tasso natildeo satildeo as Idegraveas de

Jerocircnimo Soares Barbosa eacute o que explicitam os passos arrolados O autor setecentista

156 Cf Discorsi del poema heroico del S Torquato Tasso Allrsquoillustrissmo e reverendissmo Signor Cardinale

Aldo Brandino Nella Stamparia dello Stigliola In Napoli Ad instantia di Paolo Venturino [1594] p 120 157 Traduccedilatildeo nossa 158 Escreve Torquato Tasso posteriormente que o grego eacute equivalente a ldquovenustordquo e a ldquoparlar

ornato e gratiosordquo cf Idem p 146 159 Cf LAURENS P ldquoPrefacerdquo in HERMOGEgraveNE LArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale

introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 pp 15-16 160 Idem p 12

60

define-as as discrimina todavia se lecirc Hermoacutegenes em fonte grega relecirc-o de maneira a

reorganizar-lhe as categorias prescritivas

As Idegraveas de Hermogenes sam 6 a saber o estilo Claro Grande Bello

Morato Arrebatado e a [] que he o bom uzo de todas estas

formas Em cada huma destas idegraveas afim de as caracterizar bem

considera Hermogenes 8 couzas a faber os Pensamentos as suas

Figuras as Palabras as suas Figuras o Talho das phrases a Junctura

as Clausulas e o Rhythmo as quaes todas se podem reduzir a quatro

Pensamentos Palabras Figura e Composiccedilaotilde Subdivide depoes o

ou Grande em sinco ideas particulares das quaes aacute proporccedilaotilde

que o Grande participa mais ou menos tanto he maior ou menor Ellas

sam a Gravidade a Aspereza a

Vehemencia o Splendor e a Amplificaccedilatildeo Da

oraccedilatildeo Morata () faz tambem seis partes a saber

Simplicidade Suavidade Acrimonia

Moderaccedilaotilde Verdade ampc Muitas destas idegraveas de Hermogenes

sam as mesmas de Quintiliano []161

Jerocircnimo Soares Barbosa refere as Idegraveas as mais gerais tambeacutem as ancilares e ao

fazecirc-lo abarca quase que integralmente a nomenclatura preceptiva de Hermoacutegenes No

passo deixam de ser referidas as duas espeacutecies por meio das quais se faz claro o discurso

katharotēs ()e eukrineia () 162 exclui-se uma das formas

subsidiaacuterias de megethos akmē ()163 pois Hermoacutegenes afirma serem seis essas

espeacutecies e natildeo cinco como se observa e talvez seja entendida com o etceacutetera a idea que

o grego denomina barythēs ()164 mediante a qual a alētheia eacute efetuada O cotejo

161 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel p 430 162 Leia-se purity pureza pureteacute) e distinctness nitidez netteteacute) 163 Leia-se (florecence florecimiento vigor vigueur) 164 Leia-se (indignation severidade seacuteveacuteriteacute)

61

das liccedilotildees das Instituiccedilotildees oratorias de M Fabio Quintiliano e do Peri ideōn ademais

aponta ao cabo algo discordante na medida em que como Manuel de Galhegos parece

fazer Jerocircnimo Soares Barbosa reduz a seis as sete ideai prevalecentes de Hermoacutegenes

as Idegraveas satildeo os estilos (i) ldquoClarordquo (ii) ldquoGranderdquo (iii) ldquoBellordquo (iv) ldquoMoratordquo (v)

ldquoArrebatadordquo e (vi) ldquoa rdquo sabe-se bem em equivalecircncia a (i) saphēneia (ii)

megethos (iii) kallos (iv) gorgotēs (v) ēthos e (vi) deinotēs Nota-se logo a reduccedilatildeo de

Jerocircnimo Soares Barbosa altera o lugar da ldquoVerdaderdquo a qual em vez de gecircnero eacute feita

espeacutecie da ldquooraccedilatildeo Moratardquo do ēthos dito latinamente ldquooratio moratardquo ou ldquoaffectiordquo

desde Jorge de Trebizonda165 Essa reduccedilatildeo entenda-se embora natildeo seja equivalente agrave

que Manuel de Galhegos opera tampouco eacute estranha aos inteacuterpretes de Hermoacutegenes O

valenciano Pedro Juan Nuntildeez (1522-1602) nas Tabulae institutionum rhetoricarum

impressas em Barcelona em 1578 e reimpressas em 1588 propotildee166

Figura 7 Tabulae institutionum rhetoricarum Petri Johannis Nunnesii Valentini

(1588)167

165 De acordo com Jorge de Trebizonda affectio traduzindo assim se define ldquoAffectio est qua sic

componitur oratio ut qualitatem animi ostendere amp insitos ei mores aperire uidetur Hanc moratam etiam

orationem appellare licetrdquo cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud

Ioannem Roigny uia ad D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] p 497 166 Sobre o autor La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Salamanca Universidad de Salamanca 1994

pp 81-2 167 Cf Tabulae institutionum rhetoricarum Petri Johannis Nunnesii Valentini Altera editio multo

accuratior priori Galenus in arte parua Methodus diuidendi quanto inferior est ea quae sit per

resolutionem dignitate amp methodo tanto superiorem inferior est ea quae sit per resolutionem dignitate amp

methodo tanto superiorem illam comperiemus ad compendium totius amp memoriam singulorum

62

O mesmo tratadista na obra cujas liccedilotildees a tabula esquematiza o Institutionum

rhetoricarum libri quinque de 1578 em ediccedilatildeo de 1593 assim justifica a exclusatildeo

operada na liccedilatildeo de Hermoacutegenes

sunt autem sex genera idearum ab Hermogene inuenta magnitudo

scilicet orationis perspicuitas venutas velocitas morata oratio atque

grauitas nam veritas quae hoc loco ab eodem additur subiecta est

orationi moratae vt idem postea testabitur 168

Ora satildeo seis os gecircneros de ideias inventados por Hermoacutegenes a saber

a grandeza do discurso a clareza a beleza a ligeireza o discurso

morato e a gravidade pois a verdade que o proacuteprio [Hermoacutegenes]

acrescenta a este passo foi subordinada ao discurso morato como se

testemunharaacute adiante169

A despeito das diferenccedilas vocabulares entre as Instituiccedilotildees oratorias de M Fabio

Quintiliano e os Institutionum rhetoricarum libri quinque uma obra setecentista outra

obra quinhentista os preceitos algo discordantes satildeo apropriaccedilotildees possiacuteveis do mesmo

corpo tratadiacutestico pois que ldquo[estilo] Arrebatadordquo e ldquovelocitasrdquo vertem ambos gorgotēs

ao passo que ldquogravidaderdquo eacute semnotēs em Jerocircnimo Soares Barbosa e ldquograuitasrdquo eacute

deinotēs em Pedro Juan Nuntildeez termo que o letrado portuguecircs prefere manter em grego

Haacute de se notar que natildeo satildeo as uacutenicas quando se julga a recepccedilatildeo do Peri ideōn Agrave guisa

de exemplo tomem-se as tabulae das ideai tou logou apensas ao volume Aphtonius

Hermogenes amp Dionisius Longinus praestatissimi artis Rhetorices preparado para

publicaccedilatildeo por Francisco Porto em estampa de Genebra de 1569 e ao Hermogenis Ars

Oratoria Absolutissima de Gaspar Laurent (1556-1636) impresso na mesma cidade em

1614

Barcinone excudebat Iacobus Cendrat Anno Domini 1588 sp Deve ficar evidente que Pedro Juan Nuntildeez

reduz os oito stoikheia (partes) a sete Eacute questatildeo a discutir posteriormente 168 Cf Pet Iohan Nunnesii valentini Institutionum rhetoricarum libri quinque Editio tertia ceteris multo

correctior et locupletior exemplis Barcinone ex typographia Sebastiani agrave Cormellas An 1593 pp 299

Menciona-se no tiacutetulo da primeira ediccedilatildeo do tratado o nome de Hermoacutegenes Institutiones rhetoricae ex

progymnasmatis potissimum Aphtonii atque ex Hermogenis arte dictatae agrave Petro Ioanne Nunnesio

Valentino Barcinone ex officina Petri Mali 1578 169 Traduccedilatildeo nossa

63

Figura 8 Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices

(1569)170

Observe-se que embora o volume preparado por Francisco Porto natildeo apresente

traduccedilotildees traz o latim ldquoformae orationisrdquo como Manuel de Galhegos trazia ldquofoacutermas de

oraccedilaotilderdquo em equivalecircncia ao grego ldquoideai tou logourdquo171 Essas ideai ou formae como em

170Cf Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices magistri Francisci

Porti Cretensis opera industriaacuteque illustrati atque expoliti Genevaelig apvd I Crispinvm MDLXIX [1569]

p 442 171 Como o tiacutetulo da obra torna evidente Francisco Porto publica os textos gregos do Progymnasmata (pp

1-45) de Aftocircnio do Peri staseōn (pp 49-99) do Peri heureseōs (pp 100-209) do Peri ideōn (pp 208-

404) do Peri methodou deinotētos (pp 405-441) todos atribuiacutedos a Hermoacutegenes e por fim do Peri

Hypsous (pp 1-69) de Dioniacutesio Longino cuja autenticidade aqui natildeo estaacute em questatildeo Pospostos ao Peri

methodou deinotecirctos estatildeo o esquema referido (p 442) uma epiacutestola ao leitor (p 443) e um iacutendice temaacutetico

e onomaacutestico em latim (sem paginaccedilatildeo) cf Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi

64

discriminaccedilotildees mencionadas antes satildeo vinte (lecirc-se na epiacutestola ao leitor ldquosunt enim XX ut

ex earum descriptione planum sitrdquo ou seja ldquosatildeo pois XX como eacute claro a partir da

descriccedilatildeo delasrdquo) organizadas em sete gecircneros e treze espeacutecies 172 Natildeo obstante a

repeticcedilatildeo do consabido acerca da doutrina do Peri ideōn manifesta-se que Francisco

Porto propotildee interpretaccedilatildeo discordante daquela que se conhece por Cecil W Wooten e

por Lucia Calboli Montefusco ao coordenar as sete ideai primaacuterias natildeo pensando a

deinotēs em posiccedilatildeo radial e ao tornar a alētheia idea sem espeacutecie isto eacute o ldquoendiathetos

kai alēthēs kai hoion empsykhos logosrdquo o discurso espontacircneo verdadeiro e como que

animado como que saiacutedo da alma (cf HERM 352 16)173 Manifesta-se tambeacutem que

propotildee interpretaccedilatildeo discordante daquela de Jerocircnimo Soares Barbosa e de Pedro Juan

Nuntildeez em vez de submeter a alētheia ao ēthos como ambos ao ēthos submete-lhe a

uacutenica espeacutecie

Ora a barytēs a obiurgatio (isto seja repreensatildeo exprobraccedilatildeo)174 na versatildeo de

Jorge de Trebizonda a espeacutecie mediante a qual a alētheia se compotildee segundo a liccedilatildeo de

Hermoacutegenes eacute deslocada no esquema e feita parte submetida ao ēthos No Peri ideōn

trata-se de especificaccedilatildeo da alētheia que tem em vista a reprovaccedilatildeo do que se considera

indigno em outrem e que para isso pressupotildee o locutor injuriado severo e exprobatoacuterio

Como espeacutecie de alētheia evidentemente trata-se de fazer parecer verdadeiramente

sentido o que eacute ficto e estrategicamente efetuado Eacute sinceridade afetada 175 O

deslocamento promovido por Francisco Porto na ediccedilatildeo genebrina de 1569 na condiccedilatildeo

de aceitas as anaacutelises de Michel Patillon a respeito das ideai entende-se porque ēthos e

alētheia satildeo rubricas que recobrem categorias discursivas afins176 Semelhante a essa

esquematizaccedilatildeo talvez dela dependente eacute a que Gaspar Laurent traz no princiacutepio do

seacuteculo XVII A primeira delas eacute intitulada ldquoἀνακεφαλαίωσις Formarum orationisrdquo ou

artis Rhetorices magistri Francisci Porti Cretensis opera industriaacuteque illustrati atque expoliti Genevaelig

apvd I Crispinvm MDLXIX [1569] 172Idem p 443 173 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 p 253 174 Destaca o Lewis amp Short que obiurgatio eacute termo que Quintiliano (cf QUINT XI 3 49) emprega em

oposiccedilatildeo a laudatio 175 Entende-se eacute proceder discursivo apropriado agrave saacutetira e agrave poesia que o nome de Gregoacuterio de Matos e

Guerra faz circular em que o enunciador a persona satiacuterica natildeo raro agrave maneira do costume latino de

Juvenal eacute indignada e repreende o vicio produzindo aristotelicamente sabe-se muito bem do riso

horrorizado cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo

XVII 2ordf ed rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 pp 228-9 pp 460-3 176 Cf HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel

Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 113

65

seja eacute sumaacuterio (anakephalaiōsis) das formas do discurso que repete os termos gregos

sabidos organizados de sorte a fazer pender do ēthos a barytēs e ganha acabamento com

a traduccedilatildeo latina de cada uma das vinte ideai ou formae orationis

Figura 9 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima (1614)177

A segunda tabula na mesma ediccedilatildeo ldquoSynopsis posita ad finem Lib de Formis

orationis huc refertur cuius vocabula Graeligca ibi amp in textordquo (Sinopse posta ao fim

Refere-se aqui ao livro De formis orationis cujos vocaacutebulos Gregos estatildeo neste passo amp

no texto) abdica dos termos gregos e traz sinocircnimos de termos latinos jaacute referidos

177 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 568

66

Figura 10 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima (1614)178

Salta aos olhos que o elenco tradutoacuterio arrolado em liacutengua latina por Gaspar

Laurent natildeo se confunda com a terminologia abonada desde os iniacutecios do seacuteculo XV por

Jorge de Trebizonda Veja-se

i) saphēneia claritas (Trebizonda) perspicuitas (Laurent)

a) katharotēs purus sermo ou puritas (Trebizonda) puritas (Laurent)

b) eukrineia elegantia (Trebizonda) dilucidus sermo ou dilucidum

(Laurent)

ii) megethos magnitudo (Trebizonda) granditas ou magnitudo ou

sublimitas ou gratildediloquẽtia (Laurent)

178 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 189

67

a) semnotēs dignitas (Trebizonda) graue decorum ou grauitas (De

Laurentis)

b) trakhytēs asperitas (Trebizonda) asperitas (Laurent)

c) sphodrotēs acrimonia (Trebizonda) vehementia (Laurent)

d) lamprotēs ilustris oratio ac splendida (Trebizonda) splendor

(Laurent)

e) akmē vehementia (Trebizonda) vigor (Laurent)

f) peribolē circunductio (Trebizonda) circunductio ou amplitudo

(Laurent)

iii) kallos venustas ou pulchritudo (Trebizonda) elegantia ou

pulchritudo ou venustas (Laurent)

iv) gorgotēs celeritas (Trebizonda) concitatus sermo (Laurent)

v) ēthos affectio ou morata oratio (Trebizonda) morata oratio

(Laurent)

a) apheleia tenuitas ou infinitas (Trebizonda) simplicitas (Laurent)

b) glykytēs iucunda oratio (Trebizonda) suauitas (Laurent)

c) drimytēs acutus sermo (Trebizonda) acumen amp acrimonia ou

acrimonia (Laurent)

d) epieikeia modestus sermo (Trebizonda) moderata oratio ou

moderatio (Laurent)

e) barytēs obiurgatio (Trebizonda) Grauis onerosa ou onerosum

genus (Laurent)179

vi) alētheia ueritas (Trebizonda) natiua sincera oratio ou sinceritas

(Laurent)

vii) deinotēs grauitas (Trebizonda) solers amp apta eloquentia ou

appositum genus (Laurent)180

A movecircncia do vocabulaacuterio latino entre gecircneros e espeacutecies o emprego distinto

dos termos por distintos tradutores Gaspar Laurent e Jorge de Trebizonda evidencia

superposiccedilotildees descompassos interseccedilotildees dos usos que entrecortam as ideai tou logou

as formae orationis Isso se vecirc no leacutexico isso se vecirc na tabulaccedilatildeo e no arranjo ou no

rearranjo dos preceitos a despeito das variantes em todos os tratados referidos

179 Sigo o esquema de Gaspar Laurent sabendo que diferentemente Jorge Trebizonda preceitua

como forma especiacutefica de 180 Isto eacute gecircnero apropriado gecircnero conveniente

68

autorizados pelo nome de Hermoacutegenes Derradeiro exemplo fundado na leitura do Peri

ideōn que subsume a barytēs ao ēthos figura no tratado DellrsquoArte di Predicar Bene do

eclesiaacutestico Paolo Aresi (1574-1644) em impressatildeo milanesa de 1627

Figura 11 Dellrsquo Arte di predicar bene (1627)181

A tabula de Paolo Aresi por suas escolhas lexicais dista tanto das de Filiberto

Campanile como das de Giulio Camillo Delminio Dista sobretudo sabe-se por deslocar

181 Cf DellrsquoArte di predicar bene diuisa in due parti Nella quale oltre agraversquo precetti dersquo retori agrave questo

proposito applicati di danno nuoue regole per tesserordinatamente vna predica con vn trattato della

memoria amp vnrsquoaltro della imitatione e con alcune osseruationi retoriche sopra vna predica in lode di S

Tomaso dAquino DI MONSIG PAOLO ARESI PARTE SECONDAhellip In MIL Per Gio Batt Bidelli

1627 p 196

69

a barytēs traduzida como atrocitagrave e assim definida ldquoegrave lrsquoAtrocitagrave chiamata da alcuni

Aggrauamento amp egrave vna forma di lamentarasi сotilde isdegno e rimproueramento dersquo

beneficij fattirdquo (eacute a Atrocidade chamada por alguns Agravamento e eacute uma forma de

lamentar-se com desdeacutem e reprovaccedilatildeo dos benefiacutecios feitos)182 Ora Paolo Aresi faz ver

como em meio agrave tratadiacutestica italiana quinhentista e seiscentista natildeo mais soacute em latim

mas tambeacutem em toscano nos vernaacuteculos haacute variantes no uso retoacuterico das liccedilotildees de

Hermoacutegenes Nisso os letrados lusos Manuel de Galhegos no seacuteculo XVII e Jerocircnimo

Soares Barbosa no seacuteculo XVIII natildeo satildeo exceccedilatildeo

Parece claro que ambos coadunam Hermoacutegenes com Quintiliano De fato

Jerocircnimo Soares Barbosa acorre ao Peri ideōn para minuciar a Institutio oratoria Do que

propotildee o letrado luso conveacutem natildeo perder que as ldquoIdegraveasrdquo enquanto colores enquanto tons

que trazem modificaccedilotildees agrave triparticcedilatildeo estiliacutestica satildeo pensadas nas Instituiccedilotildees oratorias

de M Fabio Quintiliano como variantes subsumidas aos gecircneros parte ao ldquoestilo

Granderdquo parte ao ldquoestilo Mediocre e Subtilrdquo183 Assim tomando de perto a afirmaccedilatildeo

segundo a qual o orador (e o poeta) pode fazer enunciaccedilotildees distintamente isto eacute ora ldquode

forma grave severa acerba veemente raacutepida copiosa amargardquo (graviter severe acriter

vehementer concitate copiose amare) ora ldquode forma afaacutevel remissa sutil agradaacutevel

branda doce breve eleganterdquo (comiter remisse subtiliter blande leniter dulciter

breviter urbane) (cf QUINT XII 10 71) Jerocircnimo Soares Barbosa supotildee o

pertencimento dessas formas ora ao ldquoestilo Granderdquo ao ldquoestilo Mediocre e Subtilrdquo

Essa interpenetraccedilatildeo de categorias retoacutericas e poeacuteticas que faz das formas das

Idegraveas variaccedilatildeo dos ldquotres Estylosrdquo dos genera dicendi tem antecedentes em Jorge de

Trebizonda Leitor de Hermoacutegenes afirma no Rhetoricorum libri V que a elocutio

compotildee-se de duas partes uma a das figurae orationis outra a das dicendi formae Tal

como preceituadas as dicendi formae latinizam as ideai tou logou ao passo que as figurae

orationis satildeo detalhadas na seguinte triparticcedilatildeo (i) sublimis ou grauis ou grandis (ii)

182 Idem p 199 183 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel p 430

70

attenuata ou infima (iii) mediocris184 Ora talvez natildeo seja preciso iterar a triparticcedilatildeo

que se conhece de Quintiliano de Ciacutecero e da anocircnima Rhetorica ad Herennium que

reconhece Jerocircnimo Soares Barbosa eacute alheia agrave preceituaccedilatildeo de Hermoacutegenes Eacute Ciacutecero

sobretudo o tratadista a quem recorre Jorge de Trebizonda ao regular as trecircs figurae

orationis

Sabe-se no livro terceiro do De oratore Crasso alude agrave doutrina dos orationis

genera e emprega como sinocircnimos os substantivos ldquogenusrdquo e ldquofigurardquo (cf CIC De or

III 199 212)185 Os oradores conforme Crasso ora satildeo graues ora subtiles ora mantecircm

a moderaccedilatildeo que os afasta de um e outro gecircnero (cf CIC De or III 177) Poreacutem na voz

da personagem Ciacutecero natildeo define quais sejam esses genera nem busca compendiaacute-los ao

modo das artes sobretudo potildee em operaccedilatildeo essa doutrina porque em termos de decoro

ao diaacutelogo assim talvez convenha186 Trata-se do mesmo procedimento que se pocircde ler no

ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos Ora doutrina exaustiva e definiccedilatildeo metoacutedica

do jargatildeo retoacuterico Jorge de Trebizonda entatildeo imita de outra obra que eacute para ele eacute bom

que se diga ciceroniana187 a Rhetorica ad Herennium No quarto livro ad Herennium

satildeo prescritos os gecircneros da elocuccedilatildeo oratoacuteria os quais se distinguem da seguinte

maneira

Sunt igitur tria genera quae genera nos figuras appellamus in quibus

omnis oratio non uitiosa consumitur unam grauem alteram

mediocrem tertiam extenuatam uocamus Grauis est quae constat ex

uerborum gravium leui et ornata constructione Mediocris est quae

constat ex humiliore neque tamen ex infima et peruulgatissima

uerborum dignitate Attenuata est quae demissa est usque ad

usitatissimam puri consuetudinem sermonis (Rhet Her IV 11)

Haacute trecircs gecircneros que denominamos figuras aos quais todo discurso natildeo

vicioso se reduz um chamado grave outro meacutedio e o terceiro tecircnue O

184 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia

ad D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] p 457 185 MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean influences on George of Trebizonds Rhetoricorum

Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric vol 26 No 2 Spring 2008 p 143 186 LEEMAN A D Orationis ratio The stylistic theory and practices os the Roman orators and

philosophers Vol 1 Amsterdam Adolf Hakkert 1963 p 121 FANTHAM E ldquoOn the Use of Genus-

Terminology in Cicerorsquos Rhetorical Worksrdquo Hermes Band Heft 4 1979 p 444 187 MONFASANI J George of Trebizond A Biography and a Study of his Rhetoric and Logic Leiden Brill

1976 p 300

71

grave eacute composto de palavras graves em construccedilatildeo leve e ornada O

meacutedio constitui-se de uma categoria de palavras mais humilde todavia

natildeo absolutamente baixa e comum O atenuado desce ao costume mais

usual da simples conversa

Jorge de Trebizonda lecirc a Rhetorica ad Herennium e reteacutem do Anocircnimo e de Ciacutecero

a identidade entre figura e genus de modo a conformar a primeira parte da elocutio A

segunda parte que abarca as dicendi formae entende filiaccedilatildeo comum agraves leituras de

Jerocircnimo Soares Barbosa a saber que formas sejam ideai que o latim forma bem traduza

o grego idea Ora jaacute o mostrou Lucia Calboli Montefusco Ciacutecero eacute autoridade

indispensaacutevel para que se entendam as escolhas de Jorge de Trebizonda na latinizaccedilatildeo

que o Rhetoricorum libri V empreende da doutrina de Hermoacutegenes 188 Ciacutecero eacute a

autoridade a mais antiga que fia o substantivo ldquoformardquo como traduccedilatildeo de idea e cuja

mediaccedilatildeo na acomodaccedilatildeo latina do termo grego empregue-se ou natildeo o jargatildeo filosoacutefico

de Platatildeo soa incontornaacutevel Recorde-se que no princiacutepio do Orator tatildeo logo indagado

por Bruto sobre o ldquogecircnero de eloquecircnciardquo (genus eloquentiae) mais excelente e perfeito

(cf CIC Or I 3) Ciacutecero figura ao responder orador nunca havido o summo orator

como perfeito como nunca visto nunca ouvido nunca percebido por qualquer sentido

tatildeo-somente compreendido pelo pensamento e pela mente 189 (cf CIC Or II 8) e

arremata

Vt igitur in formis et figuris est aliquid perfectum et excellens cuius ad

cogitatam speciem imitando referuntur eaque sub oculos ipsa [non]

cadit sic perfectae eloquentiae speciem animo videmus effigiem

auribus quaerimus Has rerum formas appellat ideas ille non

intellegendi solum sed etiam dicendi gravissimus auctor et magister

Plato (CIC Or II 9-10)

188MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos Rhetoricorum

Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) p 142 189 Cic Or II 7-8 ldquoAtque ego in summo oratore fingendo talem informabo qualis fortasse nemo fuit Non

enim quaero quis fuerit sed quid sit illud quo nihil esse possit praestantius quod in perpetuitate dicendi

non saepe atque haud scio an numquam in aliqua autem parte eluceat aliquando idem apud alios densius

apud alios fortasse rarius Sed ego sic statuo nihil esse in ullo genere tam pulchrum quo non pulchrius

id sit unde illud ut ex ore aliquo quasi imago exprimatur quod neque oculis neque auribus neque ullo

sensu percipi potest cogitatione tantum et mente complectimurrdquo

72

Portanto assim como nas formas e figuras existe algo de perfeito e

excelente e de acordo com a imagem que dele concebemos

reproduzem-se por imitaccedilatildeo as coisas que natildeo estatildeo sob os nossos

olhos em espiacuterito vemos a imagem da eloquecircncia perfeita buscamos

com os ouvidos a sua efiacutegie A essas formas dos seres chama ldquoideiasrdquo o

ceacutelebre Platatildeo a fonte primeira e o mestre mais abalizado natildeo soacute da

reflexatildeo como tambeacutem do estilo190

Trata-se da defesa programaacutetica a do Orator amparada em Platatildeo da imitaccedilatildeo

de autores exemplares como praacutetica da arte oratoacuteria Trata-se ademais do

estabelecimento de um vocabulaacuterio platocircnico em latim cujo emprego seja legitimado por

Ciacutecero Conhecedor dos passos do romano Jorge de Trebizonda escreve serem as formaes

dicendi denominadas ideai em gregocf ldquode dicendi formis quae Graeligcegrave

uocamusrdquo escreve tambeacutem definirem-se da seguinte maneira ldquoForma eacute o gecircnero de

discurso adequado ao pensamento ao meacutetodo agraves palavras agrave composiccedilatildeo agraves mateacuterias

expostas e agraves pessoasrdquo cf ldquoForma est genus orationis sententia methodo uerbis

compositione rebus subiectis amp personis idoneumrdquo191

Na eleiccedilatildeo do termo a reduzir ldquoideardquo pouco dista dos Rhetoricorum libri V a liccedilatildeo

latina do De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II recorde-se ediccedilatildeo biliacutengue

de Hermoacutegenes conforme Johannes Sturm estampada em 1571 trata-se de ldquoformardquo As

ideai tou logou entendem-se como ldquoformae dicendirdquo (formas de dizer) ou ldquoformae

orationumrdquo (formas dos discursos) 192 em que os genitivos latinos ldquodicendirdquo e

ldquoorationumrdquo o primeiro geruacutendio que serve de flexatildeo ao infinitivo ldquodicererdquo e verte-se

ao portuguecircs ldquode dizerrdquo e o segundo substantivo plural que flexiona o nominativo

ldquooratiordquo e verte-se ao portuguecircs ldquodos discursosrdquo satildeo formas distintas e possiacuteveis de

traduzir o grego ldquotou logourdquo (ldquordquo no plural ldquordquo)

Ora ldquoforma orationisrdquo eacute escolha de traduccedilatildeo lida nas estampas latinas de

190 A traduccedilatildeo eacute Paulo Seacutergio de Vasconcelos apud LICHTENSTEIN J (Org) A pintura vol 4 o belo

Coordenaccedilatildeo de traduccedilatildeo Magnoacutelia Costa Satildeo Paulo Editora 34 2004 p 25 191 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] pp 493 496 192 Cf Praeligfatio Ad Lectoremrdquo in Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue

formis orationum Libri II Latinitate donati amp scholis explicati atque illustrati A Ioan Stvrmio Cum

Gratia amp Priuilegio Caeligsareo ad anno octo Excudebat Iosias Rihelius MDLXXI [1571] A partir de

agora De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II (1571) [p 5]

73

Hermoacutegenes compostas por Antocircnio Bonfine (1538) 193 e tambeacutem por Natale Conti

(1550)194 tradutor milanecircs da ediccedilatildeo da Basileia de Hermoacutegenes impressa sob o tiacutetulo

Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta195

No ldquoPrefaacutecio ao leitorrdquo pertencente ao De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri

II Johannes Sturm tradutor e comentador agrave luz de Juacutelio Cesar Escaliacutegero (1484-1558)

acentua tratar-se ldquoideardquo de termo platocircnico que eacute na doutrina de Hermoacutegenes equivalente

ao que Aristoacuteteles chama de ldquoespeacutecierdquo e ldquovirtuderdquo e outros ateacute de ldquolugarrdquo e ldquofigurardquo (cf

ldquoAb Aristotele ἀρετα ab alijs verograve apellanturrdquo)196

Pouco dista tambeacutem nesse aspecto prefaacutecio anterior de Johannes Sturm a epiacutestola ao

impressor Josias Richel (1525-1597) que abre o volume Hermogenis De formis

orationum tomi duo editado em 1555 em que o letrado afirma ser forma dicendi

equivalente aos vocaacutebulos ldquoideardquo empregado por Platatildeo e ldquoeidērdquo por Aristoacuteteles197 E

equivalente demais aos vocaacutebulos latinos modus genus e habitus dicendi empregados

por Ciacutecero e aos gregos kharaktēr () skhēma () e tropos ()198

Conforme Johannes Sturm a conclusatildeo eacute esta posto modificadas as palavras mantidas

as mesmas razotildees (cf ldquouerbis mutatis ratione eadem retentardquo) 199

Viu-se concordes ao traduzir o substantivo ldquoideardquopelo latim ldquoformardquo Antocircnio

Bonfine Natale Conti Johannes Sturm e Gaspar Laurent tecircm como antecedente no

seacuteculo XV Jorge de Trebizonda Semelhantemente da traduccedilatildeo e dos comentaacuterios de

Garpar Laurent pospostos ao texto que integra a ediccedilatildeo genebrina de Hermoacutegenes datada

de 1614 depreende-se que ldquoformardquo natildeo soacute traduz o grego idea como tambeacutem agrave maneira

193 Cf Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii

item Sophistaelig Praeligexercitamenta Antonio Bonfine asculano interprete Apud Seb Gryphivm Lvgdvni 1538 pp 149ss 194 Cf Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] pp 155ss 195 No ldquoDiscurso sobre o poema heroicordquo Manuel Pires de Almeida menciona-o agrave maneira latina como

Natali Comiti em alusatildeo a outro tiacutetulo de sua autoria o Mythologiae siue Explicationis Fabularum (1581)

cf MUHANA A ldquoDiscurso sobre o poema heroico Comentaacuteriordquo REEL Revista Eletrocircnica de Estudos

Literaacuterios Vitoacuteria a 2 v 2 2006 pp 7 22 Mythologiae sive Explicationis Fabularum editou-se em

Frankfurt por Andreas Wechel filho de Christian Wechel editor de Hermoacutegenes cf KILLY W et alii

Dictionary of German Biography Volume 10 Thibaut - Zycha Muumlnchen De Gruyter 2006 p 381 196 De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II (1571) [p 5] 197 Cf Ω Hermogenis De formis orationum tomi duo

Argentorati apud haeredes Vuendelini Rihelij Anno 1555 [pp 3-4] 198 Idem ibidem 199 Idem [p 4]

74

de Jerocircnimo Soares Barbosa eacute tomado como sinocircnimo do helenismo ldquoideardquo200 no sentido

de ldquokharaktērrdquo de modo tal que sejam nessa liccedilatildeo traduccedilotildees possiacuteveis para ldquoidea tou

logourdquo os sintagmas latinos forma orationis (forma do discurso) Eloquentiae forma

(forma da eloquecircncia) ldea Eloquentiae (ideia da eloquecircncia) Idea sermonis (ideia do

discurso) ou genus dicendi (gecircnero do dizer)201 Gaspar Laurent o explicita

Constituitur autẽ Elocutio per 7 formas quas ipse vocat Ideas []

Vocatildetur autem Ideae sermonis notilde Platonicae sed sunt dicendi genera

characteres vel formae siue exẽplaria qualitatis orationis quae

vocatildetur ab Aristotele ἀρεταῖ virtutes ornamẽta Lumina

orationis []202

Ora constitui-se a Elocuccedilatildeo de 7 formas as quais ele [sc Hermoacutegenes]

denomina Ideias [] Ora satildeo denominadas Ideias do discurso [sc

sermo logos] natildeo satildeo platocircnicas mas gecircneros do dizer caracteres ou

formas ou exemplares da qualidade do discurso [sc oratio] os quais

satildeo denominados por Aristoacuteteles aretai tōn logōn [sc virtudes dos

discursos] virtudes ornamentos Lumes do discurso [sc oratio] []

Note-se que a liccedilatildeo propotildee o latim formae orationis como Manuel de Galhegos

propunha ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo em equivalecircncia ao grego ideai tou logou Os comentaacuterios

do tradutor circunscrevendo o ensino latinizado das ideai ao acircmbito da elocuccedilatildeo

indiciam a movecircncia do leacutexico que traduz a preceptiva grega e ademais afirmam a grade

de equivalecircncias que sopesa o ensinamento as Ideae sermonis dizem-se natildeo soacute dicendi

genera characteres ou formae como jaacute referido mas tambeacutem aretai tōn logōn (ldquoἀρεταῖ

rdquo amiuacutede ditas ἀρεταῖ isto eacute virtudes da elocuccedilatildeo203) donde

200 Cf ldquoFuerunt nimirum haelig formaelig vel Idea propositaelig Perspicuitas Magnitudo Pulchritudo Celeritas

Moratum genus Verax Aptitudordquo ldquoIn Hermogenis tractatvm de ideis sive de formis eloqventiaelig Gasparis

Laurentij commentariusrdquo in Hermogenis

Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu Graeci amp

Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno MDCXIV [1614] 201 Cf ldquoIn Hermogenis tractatvm de ideis sive de formis eloqventiaelig Gasparis Laurentij commentariusrdquo in

Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 120 202 Idem p 122 203 Cf LAUSBERG H Elementos de Retoacuterica Literaria Traduccedilatildeo prefaacutecio e aditamentos de R M Rosado

Fernandes 5ordf ediccedilatildeo Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 2004 p 119

75

as assimilaccedilotildees doutrinaacuterias filiem Hermoacutegenes a Aristoacuteteles e natildeo a Platatildeo Isto Gaspar

Laurent supotildee mesmo que o vocaacutebulo grego ldquoideardquo seja reconhecidamente caro a Platatildeo

e a seus seguidores natildeo eacute platocircnico o uso que dele faz Hermoacutegenes Itere-se o sermo

empregado para acomodar no latim e nos vernaacuteculos os preceitos retoacutericos do Peri ideōn

natildeo pendem de Platatildeo embora seja liacutecito supor que Platatildeo lido latinamente por Ciacutecero e

por Secircneca ou latinamente loquaz desde Ciacutecero no acircmbito da doutrina das ideias natildeo se

cala Natildeo se cala tanto porque eacute autoridade prestigiada e vigente como porque num certo

sentido falar de ideai eacute falar de Platatildeo mesmo que nem sempre seja falar com Platatildeo

Brevemente noutro sentido as aretai as liccedilotildees de poeacutetica e de retoacuterica gregas e

latinas o ensinam prescrevem-se como virtudes (virtutes forma plural de virtus) que

regulam o emprego artiacutestico dos efeitos elocutivos Conforme o capiacutetulo XXII da Poeacutetica

eacute virtude da lexis que seja clara (σαφ) sem que seja chatilde que seja peregrina sem que

seja enigmaacutetica ou mesmo baacuterbara Satildeo pois aristotelicamente normatizadas as variaccedilotildees

vocabulares que compensem com o emprego dos termos correntes os expedientes de lexis

rara A clareza portanto como liccedilatildeo de moderaccedilatildeo produz-se por meio de variaccedilotildees

controladas dos recursos lexicais e sintaacuteticos de composiccedilatildeo da elocuccedilatildeo poeacutetica Na

Poetica drsquoAristotele uulgarizzata de Ludovico Castelvetro impressa em Viena em 1570

pelo editor Gaspar Stainhofer mais precisamente na exposiccedilatildeo adjunta agrave referida liccedilatildeo

lembra bem o tradutor e comentador que a clareza pensa-se com Aristoacuteteles como

virtude proporcionada ao gecircnero de poema composto204 Ademais eacute virtude da lexis ser

adequada (τὸ ) A liccedilatildeo da Poeacutetica prevecirc que empregar adequadamente

(πρεπόντως) os vocaacutebulos peregrinos sobretudo as metaacuteforas eacute sinal de pendor do

poeta (cf ARISTOT Poet 22 1459 a 6) Empregaacute-los inadequadamente (ἀπρεπῶς) em

contrapartida de acordo com Aristoacuteteles se constitui como deformaccedilatildeo ridiacutecula (cf

ARISTOT Poet 22 1458 b 11 14 ldquoγελοῖονrdquo ldquoγελοῖαrdquo) cujo efeito pode-se depreender

das liccedilotildees da Retoacuterica eacute a lexisfriacutegida (ψυχρά) contrafaccedilatildeo viciosa da nobreza e da

ornamentaccedilatildeo do discurso (cf ARISTOT Rhet III 3 1)

Ora a filiaccedilatildeo que se estabelece entre formas e ideias comum ao ldquoDiscurso

Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos natildeo eacute estranha aos usos do portuguecircs letrado entre os

seacuteculos XVI e XVIII embora os registros de ambos os termos em fontes lexicograacuteficas

204 Cf Poetica dAristotele uulgarizzata et sposta per Ludovico Castelvetro Stampata in Vienna dAustria

per Gaspar Stainhofer lanno del Signore MD LXX [1570] p 260r

76

do tempo nem sempre a apontem no acircmbito das praacuteticas do discurso Jerocircnimo Cardoso

(1508-1569) no Dictionarium ex lusitanico in latinum sermonem de 1562 natildeo registra

o termo ldquoideardquo ou equivalentes em liacutengua portuguesa e avaliza o latinismo ldquoForma

Forma aeligrdquo205 O mesmo autor no Dictionarium latino lusitanicum amp vice versa lusitanico

latinu[m] ediccedilatildeo biliacutengue de Coimbra de 1570 elenca duas entradas para o latim forma

(i) ldquoForma aelig A figura ou forma de ccedilapateyrordquo e (ii) ldquoForma aelig A fermosurardquo206 e uma

para o correspondente vernaacutecular ldquoForma Forma aeligrdquo 207 tal como na estampa anterior

A ediccedilatildeo abona o latim ldquoIdea aelig A figura original da cousardquo 208 em registro platocircnico e

natildeo entende o helenismo ldquoideardquo ou equivalentes em liacutengua portuguesa A ediccedilatildeo lisboeta

de 1592 do Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum no que aqui

interessa reitera a de 1570209 As ediccedilotildees de 1601 de 1613 de 1619 de 1630 de 1643

de 1677 e de 1694 tambeacutem o fazem210

205 Hieronymi Cardosi Lamacensis Dictionarium ex Lusitanico in latinum sermonem Ulissypone ex

officina Ioannis Aluari 1562 p 61 206 Dictionarium latino lusitanicum amp vice versa lusitanico latinu[m] cum adagiorum fereacute omnium iuxta

seriem alphabeticam perutili expositione ecclesiasticorum etiam vocabulorum interpretatione noueacute

omnia per Hieronymu[m] Cardosum Lusitanum congesta recognita vero omnia per Sebast Stockhamerum

Germanum Qui libellum etiam de propriis nominibus regionu[m] populorum illustrium virorum adiecit

Conimbricae excussit Joan Barrerius 1570 p 74 207 Idem p 59 [sic] [p 49] Note-se que apoacutes a p 172 do Dictionarium latino lusitanicum amp vice versa

lusitanico latinu[m] a numeraccedilatildeo de paacutegina eacute reiniciada A indicaccedilatildeo aqui portanto considera o que se

pode compreender como segunda parte da obra em que o vocabulaacuterio eacute portuguecircs-latim 208 Idem p 85 209 Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum adagiorum fereacute omnium iuxta

seriem alphabeticam perutili expositione per Hieronymum Cardosum Lusitanum congesta recognita

vero omnia per Sebast Stokhamerum Germanum Qui libellum etiam de propriis nominibus regionum populorum illustrium virorum adiecit Adhuc noui huic ultimae impressioni adjuncti sunt varij loquendi

modi ex praecipuis auctoribus decerpti praesertim ex Marco Tullio Cicerone Olyssipone excussit

Alexander de Syqueira expensis Simonis Lopezij bybliopolae 1592 pp 72 82 49 210 Cf Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum adagiorum fere omnium iuxta

seriem alphabeticam perutili expositione Ecclesiasticarum vocabulorum interpretatione item de monetis

ponderibus et mensuris ad presentem usum accommodatis per Hieronymum Cardosum lusitanum

congesta recognita vero per Sebastianum Stokhamerum germanum Qui libellum etiam de propijs

nominibus regionum populorum illustrium virorum fluviorum montium ac aliorum complurium

nominum et rerum scitu dignarum historijs et fabulis poeticis refertum in usum et gratiam lusitanicae

pubis concinnavit et ex integro adiecit Adhuc noui huic ultimae impressioni adiuncti sunt varij loquendi

modi ex praecipuis authoribus decerpti praesertim ex Marco Tullio Cicerone Olyssipone excussit Antonius Alvares typographus 1601 pp 72 82 49 Repete-se a ediccedilatildeo anterior Cf Dictionarium latino

lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum adagiorum feregrave omnium juxta seriem alphabeticam

perutili expositione Ecclesiasticarum [sic] vocabulorum interpretatione item de monetis ponderibus et

mensuris ad presentem usum accommodatis per Hieronymum Cardosum lusitanum congesta recognita

vero omnia per Sebastianum Stokhamerum germanum Qui libellum etiam de proprijs nominibus regionum

populorum illustrium virorum fluviorum historijs amp fabulis poeticis refertum in usum amp gratiam

lusitanicae pubis concinnavit amp ex integro adiecit Adhuc novi huic ultimae impressioni adjuncti sunt varij

loquendi modi ex praecipuis auctoribus decerpti praesertim ex Marco Tullio Cicerone nunc denuo

amendarum colluvie qua scatebat diligenti lucubratione defaecatum Ulyssipone ex officina Petri

Crasbeeck 1613 pp 72 82 Cf Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum

adagiorum feregrave omnium iuxta seriem alphabeticam perutili expositione amp Ecclesiasticorum vocabulorum

77

Agostinho Barbosa (ca 1590-1649) no Dictionarium Lusitanico Latinum

estampado em Braga em 1611 itera Jerocircnimo Cardoso semelhantemente natildeo registra

ldquoideardquo ou equivalentes no vernaacuteculo e admite ldquoformardquo na seguinte acepccedilatildeo ldquoForma

Forma aelig Vt [sc como] formaelig sutorum formas de ccedilapateyro Horat 1 Serm Saty

3rdquo211 Bem se observa repete-se o exemplo o do sapateiro das ediccedilotildees biliacutengues de

interpretatione item de monetis ponderibus amp mensuris ad praesentem usum accomodatis per

Hieronymum Cardosum lusitanum congesta recognita vero omnia per Sebastianum Stokhamerum

germanum Qui libellum etiam de proprijs nominibus regionum populorum illustrium virorum fluviorum montium ac aliorum complurium nominum amp rerum scitu dignarum historijs amp fabulis poeticis refertum

in usum amp gratiam lusitanicae pubis concinnavit amp ex integro adiecit Cui hac ultima editione praeter

caetera hactenus alijs contenta in singulis nominibus et verbis suae inflexiones appositae sunt in

Dictionario lusitanico in latinum sermonem converso multa singulari studio et diligentia addita cum varijs

loquendi modis ex praecipuis auctoribus collectis aliaque ab innumeris pene erroribus non sine labore et

studio vindicata Ulyssipone Ex officina Petri Crasbeeck 1619 pp 72 82 301 Cf Dictionarium latino

lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum adagiorum fereacute omnium iuxta seriem alphabeticam

perutili expositione amp Ecclesiasticarum vocabulorum interpretatione item de monetis ponderibus amp

mensuris ad praesentem usum accomodatis Hieronymum Cardosum lusitanum congesta recognita vero

omnia per Sebastianum Stokhamerum germanum Qui libellum etiam de proprijs nominibus regionum

populorum illustrium virorum fluviorum montium ac aliorum complurium nominum amp rerum scitu dignatum historijs amp fabulis poeticis refertum in usum amp gratiam lusitanicae pubis concinnavit amp ex

integro adiecit Cui hac ultima editione praeter caetera hactenus alijs contenta in singulis nominibus amp

verbis suae inflexiones appositae sunt ac in Dictionario lusitanico in latinum sermonem converso multa

singulari studio amp diligentia addita cum varijs loquendi modis ex praecipuis auctoribus collectis aliaque

ab innumeris pene erroribus non sine labore amp studio vindicata Ulyssipone ex officina Petri Craesbeeck

1630 pp 72 82 301 Cf Dictionarium latino lusitanicum et lusitanico latinum cum aliquorum

adagiorum et humaniorum historiarum et fabularun perutile expositione item de Vocibus Ecclesiasticis

de ponderibus et mensuris et aliquibus loquendi modis pueris accommodatis per Hieronymum Cardozum

lusitanum Quod in hac ultima editione multis nominibus auctum et aacute pluribus erroribus ijsque turpissimis

quibus vel typographum incuriacirc vel correctorum maximacirc negligentiacirc abundabat expurgatum in lucem

damus Ulyssipone ex officina Laurentij de Anveres a custa de Domingos Carneiro mercador de livros

1643 pp 72 82 305 Cf Dictionarium latino lusitanicum et lusitanico latinum cum aliquorum Adagiorum et humaniorum historiarum et fabularum perutili exposition item de Vocibus Ecclesiasticis

de Ponderibus et mensuris et aliquibus loquendi modis pueris accomodatis per Hieronimum Cardozum

lusitanum Quod in hac ultima editione multis nominibus auctum et agrave pluribus erroribus ijsque turpissimis

quibus vel typographum incuriacirc vel correctorum maximaacute negligentiagrave abundabat expurgatum in lucem

damus Ulyssipone ex officina amp sumptibus Antonij Craesbeeck agrave Mello serenissimi principi typographi

1677 pp 142 163 608 Cf Hieronymi Cardosi Dictionarium latino-lusitanicum et lusitanico-latinum

quanta maxima fide ac diligentiagrave accuratissimegrave expurgatum adjectis Dictionariolis de vocibus

ecclesiasticis de ponderibus numismatis amp mensuris cunctis accesserunt etiam concinni loquendi modi

phrases amp adagia ex optimis authoribus decerpta item magna sylva nominum propriorum amp

appellativorum humaniorum historiarum populorum marium fluviorum montium urbium ventorum

syderum deorum etc Editio novissima in quagrave est itidem appositus Catalogus dictionariorum authorumque plurimorum qui tam de linguacirc latina quagravem de studiosis notitijs pertractarunt omnibus

grammatices professoribus perutilissimus Reverendissimo Domino D Georgio Cornelio archiepiscopo

Rhodiensi Ulyssipone typis amp sumptibus Dominici Carneiro trium Ordinum Militarium typographi

1694 p 90 103 88 Observe-se as ediccedilotildees de Jerocircnimo Cardoso estampadas na oficina de Pedro

Craesbeeck (ca 1552-1632) pai de Lourenccedilo impressor da Ulyssea ou Lisboa Edificada a saber as

ediccedilotildees do dicionaacuterio de 1613 1619 e 1630 contecircm nas paacuteginas de rosto gravura com trigrama da

Companhia de Jesus (IHS) 211 O verso de Horaacutecio eacute HOR S II 3 106 ldquosi scalpra et formas non sutor nautica velardquo

Dictionarium Lusitanico Latinum juxta seriem alphabeticam optimis probatisq doctissimorum auctorum

testimonijs perutili quadam expositione locupletatum cum Latini sermonis indice nec non libello uno

aliquarum regionum civitatum oppidorum fluviorum montium amp locorum quibus veteres uti solebant

78

Cardoso e explicita-se tratar-se de uso do poeta latino Horaacutecio Jaacute no Thesouro da lingoa

portuguesa do padre inaciano Bento Pereira (1606-1681) publicado em Lisboa em

1647 indica-se ldquoforma forma ae Modus i Habitus usrdquo ldquoforma de ccedilapateiro

Mustricola ae Forma aerdquo e tambeacutem ldquoIdea Forma ae Idea aerdquo212 Note-se o que

ressalta mais do que as semelhanccedilas com os verbetes referidos e o desdobramento

semacircntico do substantivo ldquoformardquo eacute o registro do helenismo ldquoideardquo ausente do

acolhimento de Jerocircnimo Cardoso Mais Bento Pereira fornece definiccedilotildees destes

vocaacutebulos em outra obra o Prosodia in vocabularium trilingue Latinum Lusitanicum

amp Hispanicum digesta213 Em estampa de 1653 o latim ldquoforma aerdquo define-se como ldquoA

figura ou formosurardquo e ldquoidea aerdquo platonicamente como ldquoA figura original da cousardquo o

que repotildee muito de perto Jerocircnimo Cardoso conforme as ediccedilotildees elencadas acima214 Em

estampa biliacutengue de 1723 muito distinta da anterior intitulada Prosodia in vocabularium

bilingue Latinum et Lusitanum digesta os verbetes em portuguecircs nada distam do que se

leu no Thesouro da lingoa portuguesa ldquoForma Forma ae Modus i Habitus ucircsrdquo

ldquoForma de ccedilapateiro Mustricola ae Forma aerdquo e mais ldquoIdecirca Forma ae Idea aerdquo Os

verbetes em latim mais detalhados nas definiccedilotildees que trazem satildeo estes ldquoForma ae f g

A forma figura fermosura forma ou cincho do queijo ou forma de ccedilapateiro regra

modo delineaccedilam cano de agua publica item papas de milho com mel Virg AElign 8rdquo e

ldquoIdea ae f g A idea primeira face forma das cousas forma do edificio figura original

ou mental exemplar ampc 1 l Cicrdquo215

O padre Carlos Folqman (ca 1704) contemporacircneo de Jerocircnimo Soares Barbosa

no Diccionario portuguez e latino impresso em Lisboa em 1755 propotildee natildeo soacute

ldquoFOacuteRMA f (figura) Forma ae Species eirdquo donde o substantivo ganha especificaccedilatildeo

omnia in studiosae inventutis gratiam amp usum collecta per Augustinum Barbosam Lusitanum Bracharae

typis amp expensis Fructuosi Laurentij de Basto 1611 p 553 212 Thesouro da lingoa portuguesa composto pelo Padre D Bento Pereyra da Companhia de Iesu

Portugues Borbano Lente que foy da primeira classe de Rhetorica em a Vniversidade de Euora amp hoje o

he da sagrada Theologia em a mesma Vniversidade Em Lisboa Com licenccedila da S Inquisiccedilam Ordinario amp del Rey Na officina de Paulo Craesbeeck amp agrave sua custa Anno de 1647 pp 54f 58v 213 Trata-se de obra impressa pela primeira vez em 1634 e seguidamente reimpressa A Biblioteca Nacional

de Portugal guarda exemplares de ediccedilotildees de 1653 1661 1674 1683 1697 1711 1723 1741 e 1750 A

ediccedilatildeo priacutencipe Prosodia in vocabularium trilingue Latinum Lusitanicum amp Hispanicum digesta

authore Benedicto Pereyra fecit sumptus Dominicus Pereyra da Sylva Eborae apud Emmanuelem

Carvalho 1634 214 Prosodia in vocabularium trilingue Latinum Lusitanicum amp Castellanicum digesta authore Doctore

P Benedicto Pereyra Societatis Iesu Cum facultate Inquisitorum Ordinarij amp Regis Vlissipone Ex

officina amp sumptibus Pauli Craesbeeck Anno Domini MDCLIII [1653] pp 105 112 215 Prosodia in vocabularium bilingue Latinum et Lusitanum digesta nona editio Eborae cum facultacircte

Superiocircrum ex Typographiacutea Acadeacutemiae Anno Doacutemini M DCC XXIII [1723] pp 82 89 359 422

79

de sentido no caso de ldquoFOacuteRMA (modo) A foacuterma do governo Administrandaelig Reipublicaelig

ratio oacutenis frdquo senatildeo tambeacutem ldquoFORMA f Focircrma (de sapateiro) Forma aelig f de

impressor Forma typographicardquo216 Ademais Carlos Folqman registra no vernaacuteculo

ldquoIDEA f Idea ae f Graec Cicrdquo 217 o que abona o verbete de Bento Pereira e eacute por ele

legitimado Essas definiccedilotildees a paacutegina de rosto do Diccionario portuguez e latino o

explicita dependem do trabalho de Raphael Bluteau (1638-1734) que fornece entre os

verbetes pesquisados os mais extensos No Vocabulario Portuguez amp Latino impresso

em Coimbra em 1728 o termo ldquoformardquo assim eacute definido

FORMA (Termo Philosophico) A forma essencial he o segundo

principio que unido com a materia compoem todos os corpos naturaes

Forma ae Fem

Foacuterma Figura Forma ae Fem Species ei Fem Figura ae Fem Cic

Tomar a forma ou figura de alguem Capere formam alicujus Plaut

Ter forma de homem Humana specie amp figura esse

Foacuterma (Termo Logico) Como quando se diz Pocircr hum argumento em

foacuterma Syllogismum ex dialecticae regulis ou praeceptis conficere

Argumentar em foacuterma Ex dialectices regulis argumentari

Foacuterma Modo de obrar em materias de engenho moraes amp politicas A

foacuterma do governo Administrandae Reipublicae ratio onis Fem ou

genus eris Neut Cicero diz Forma rerum publicarum Mudouse na

cidade a forma do governo Immutata est urbis facies Caesar Quando

Deos deu Forma ao governo do mundo Vieira Tom 1 477 Reduzir

Hespanha em Forma de Provincia Marinho Apologet discurs 23

Forma Disposiccedilaotilde amp compostura de partes a figura que se daacute a huma

cousa Forma ae Fem Formamentum i Neut Lucret Formatura ae

Fem He do Poeta Lucilio que diz Formaturaque abrorum parte

figurat Se chegar a receber alguma Forma o livro que tenho ideado

Vieira Tom 1 Epist ao Leytor pag 2

216 Note-se Carlos Folqman como Jerocircnimo Cardoso e Bento Pereira refere a ldquofocircrma de sapateirordquo Eacute

interessante o emprego dos acentos agudo e circunflexo que marcam graficamente a heterofonia entre

ldquofoacutermardquo x ldquofocircrmardquo 217 Diccionario portuguez e latino no qual as dicccedilotildees e frazes da lingua portugueza e as suas variantes

significaccedilotildees genuinas e metaforicas se achatildeo clara e distinctamente vertidas na latina e authorizadas

com exemplos dos authores classicos compilado do vocabulario do reverendo padre D Rafael Bluteau e

dos melhores diccionarios de varias linguas Por Carlos Folqman Lisboa na Officina de Miguel

Manescal da Costa Impressor do Santo Officio 1755 p 225

80

Forma Idea Imagem ampc Vid nos seus lugares A Forma da

Temperanccedila em El-Rey D Manoel o unico Varella Num Vocal pag

443

Foacuterma ou formalidade Certas regras estabelecidas pelas leys ou pelo

costume Faltar agraves formas Naotilde guardar as formas Formulacirc cadere ou

excidere Senec Epist 48 amp lib 2 de Clement cap 3 Testamento feito

com as divicircdas formas Justum testamentum Ulpian Vid Formula

Foacuterma (como quando se diz) sem mais outra forma de processo id est

com violencia amp sem proceder com os termos da justiccedila Ser cotildedenado

sem mais outra forma de processo Causacirc indictacirc damnari Sem outra

Forma de processo que a confissaotilde publica amp c Duart Rib na vida da

Princ Theodora Nullacirc aliacirc de causacirc quagravem propter publicam

confessionem ampc

Forma Modo de obrar de viver Guardar sempre a mesma forma de

vida Eandem semper vivendi rationem obtinere ou tenere Cic

Forma pela qual o sapateiro corta amp coze os sapatos Forma ae Fem

Assi lhe chama Horacio na 3 Satira do livro 2 vers 106 Si scalpra amp

formas non sutor ampc Tambem a forma de hum chapeo se pode chamar

Forma ae Fem

Forma como quando se diz Fazer alguma cousa pro forma ou propter

formam id est por ceremonia por comprimento Pozse de joelhos pro

forma amp pediolhe perdaotilde Ad speciem usurpatae formulae posuit

genua veniamque rogavit supplex

Forma (Termo de Impressor) He huma taboa em que se compoem a

letra conforma a ordem que se quer amp se impoem em huma rama de

ferro com suas guarniccediloens de paacuteo ao redor amp cunhos para apertar amp

sobre ella carrega o quadro Forma typographica ae Fem

Letra de forma Os moldes de que usa o impressor para exprimir no

papel as letras Litterarum typi orum Masc Plur Forma litterarum

que he de Quintiliano naotilde quer dizer isto (que no tempo deste Orador

ainda naotilde havia impressaotilde) mas quer dizer Forma amp figura das letras

81

Forma (Termo de engenho de assucar) Vaso de barro furado por baxo

no qual o assucar se purifica Vas argilaceum inferiori parte

perforatum in quo Saccharum expurgatur 218

Ora Raphael Bluteau maneja concordantemente o leacutexico o verbete repotildee e

esmiuacuteccedila definiccedilotildees referidas No campo das artes penetra-se a ldquoFormardquo segundo as

acepccedilotildees do Vocabulario Portuguez amp Latino em mediaccedilotildees aristoteacutelicas e platocircnicas

Em outras palavras ldquoformardquo eacute eidos como ldquoTermo Philosophicordquo que se emprega em

referecircncia a uma das quatro causas () do que haacute na doutrina de Aristoacuteteles a causa

formal (cf ARIST Phys 194b 16-195a 26 Met I 3 983a 25-32) Lendo o estagirita

ensina Secircneca a Luciacutelio nas epiacutestolas morais que ldquoidosrdquoeacute forma que se impotildee agrave

obra (cf SEN Ep 65 4 quae unicuique operi imponitur) tal qual na arte da escultura a

forma eacute imposta ao bronze fazendo da mateacuteria bruta prima estaacutetua donde escreva o

estoico ldquouma estaacutetua natildeo poderia ser rotulada de lsquodoryphorosrsquo ou de lsquodiadumenosrsquo se

natildeo apresentasse expressamente as respectivas caracteriacutesticasrdquo Ou seja se a primeira

estaacutetua natildeo figurasse ldquohomem segurando lanccedilardquo e a segunda ldquocabeccedila cingida por uma

fita ou diademardquo219

218 Vocabulario portuguez e latino aulico anatomico architectonico bellico botanico brasilico comico

critico chimico dogmatico dialectico dendrologico ecclesiastico etymologico economico florifero

forense fructifero autorizado com exemplos dos melhores escritores portugueses e latinos pelo padre

D Raphael Bluteau Coimbra no Real Collegio das Artes da Companhia de Jesu Com todas as Licenccedilas

necessaacuterias Anno Domini MDCCXIII [1713] pp 172-3 219 Cf SEacuteNECA L A Cartas a Luciacutelio Traduccedilatildeo prefaacutecio e notas de Joseacute Antoacutenio Segurado e Campos

Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 2004 pp 229-30 SEN Ep 65 3-6 ldquoToda a arte eacute imitaccedilatildeo da

natureza pelo que se pode aplicar o que eu disse em sentido geneacuterico agraves actividades proacuteprias do homem

Uma estaacutetua implica que haja uma mateacuteria agrave disposiccedilatildeo do artista mas exige tambeacutem um artista que decirc

forma a essa mateacuteria Numa estaacutetua portanto a mateacuteria eacute o bronze a causa eacute o escultor Todas as outras

coisas satildeo regidas pela mesma condiccedilatildeo todas exigem algo capaz de tomar uma forma e algueacutem capaz de

produzir essa forma Os estoicos satildeo de opiniatildeo que a causa eacute apenas uma o agente Aristoacuteteles entende que a causa se pode considerar de trecircs pontos de vista Diz ele lsquoA primeira causa eacute a proacutepria mateacuteria sem

a qual nada pode ser produzido a segunda eacute o artiacutefice a terceira eacute a forma imposta a cada objeto por

exemplo a uma estaacutetuarsquo A esta uacuteltima chama Aristoacuteteles ndash lsquoMas a estasrsquo ndash continua ele ndash lsquohaacute que

acrescentar uma quarta que eacute a finalidade da obra acabadarsquo Jaacute te vou explicar o que isto significa O bronze eacute a primeira causa da estaacutetua pois esta nunca poderia ter sido produzida se natildeo existisse algo capaz

de ser fundido e moldado A segunda causa eacute o artista [artifex] porquanto o bronze nunca tomaria a forma

de estaacutetua sem ser trabalhado por matildeos haacutebeis A terceira causa eacute a forma jaacute que uma estaacutetua natildeo poderia

ser rotulada de lsquodoryphorosrsquo ou de lsquodiadumenosrsquo se natildeo apresentasse expressamente as respectivas

caracteriacutesticas A quarta causa eacute a finalidade com que a estaacutetua foi feita se natildeo houvesse uma finalidade

natildeo haveria estaacutetua E o que se entende por finalidade Eacute o propoacutesito que moveu o artista o fim que ele

procurou atingir pode ser o dinheiro se fez a estaacutetua para a vender a gloacuteria se trabalhou para obter fama

o sentimento religioso se a fez para a doar a um templo Entre as causas de uma obra deve portanto figurar

aquilo que a motivou a menos que se entenda que natildeo eacute causa da obra aquele elemento sem o qual ela

nunca teria sido feitardquo [Omnis ars naturae imitatio est itaque quod de universo dicebam ad haec transfer

quae ab homine facienda sunt Statua et materiam habuit quae pateretur artificem et artificem qui materiae

82

Aristotelicamente a arte (τέχνη) eacute irredutiacutevel agrave mateacuteria (ὕλη) Afinal conforme

a Metafiacutesica o bronze natildeo faz a estaacutetua (ἀνδριάς) (cf ARIST Met I 3 984a 24) eacute uma

de suas causas a causa material a estaacutetua natildeo eacute a pedra (λίθος) eacute senatildeo de pedra

(λίθινος) (cf ARIST Met VII 7 1033a 7) A arte ndash as artes melhor seria ndash eacute irredutiacutevel

pois que eacute assim pensada teacutecnica de conformaccedilatildeo da mateacuteria a partir da qual se gera o

que haacute na alma como eidos Nesse caso no acircnimo o eidos eacute essecircncia eacute quididade220 (ldquoτὸ

τί ἦν εἶναιrdquo) das coisas todas e substacircncia primeira (ldquoπρώτην οὐσίανrdquo) (cf ARIST Met

VII 7 1032b 1-2)221 as quais se digam poiēsis pois que sejam artiacutesticas artificiais (cf

ARIST Met VII 7 1032b 17) O escultor andriantopoios como causa eficiente e motor

da transformaccedilatildeo ao conformar a mateacuteria (cf ARIST Met V 2 1013b 36) transfere a ela

o que guarda na alma222 Eacute nesses termos que se entende com Raphael Bluteau ldquoformardquo

como ldquoforma essencialrdquo

O escultor o artiacutefice enfim bem se veraacute ao informar a mateacuteria mira a adequada

ldquoDisposiccedilaotilde amp compostura de partesrdquo segundo os usos abonados por Raphael Bluteau

Comentador de Luiacutes de Camotildees decerto leitor de liccedilotildees concordes Manuel de Faria e

Souza (1590-1649) anos antes na ediccedilatildeo lisbonense poacutestuma das suas Rimas varias de

Luis de Camoens de 1685 articula os termos ldquoformardquo e ldquoformosurardquo conformemente

aos preceitos aduzidos semelhantemente ao verbete do Vocabulario Portuguez amp Latino

ao verbete do Dictionarium latino lusitanicum amp vice versa lusitanico latinu[m] de

Jerocircnimo Cardoso (1570)

daret faciem ergo in statua materia aes fuit causa opifex Eadem condicio rerum omnium est ex eo constant quod fit et ex eo quod facit Stoicis placet unam causam esse id quod facit Aristoteles putat

causam tribus modis dici lsquoprimarsquo inquit lsquocausa est ipsa materia sine qua nihil potest effici secunda opifex

tertia est forma quae unicuique operi imponitur tamquam statuaersquo Nam hanc Aristoteles idos vocat

lsquoQuarta quoquersquo inquit lsquohis accedit propositum totius operisrsquo Quid sit hoc aperiam Aes prima statuae

causa est numquam enim facta esset nisi fuisset id ex quo funderetur ducereturve Secunda causa artifex

est non potuisset enim aes illud in habitum statuae figurari nisi accessissent peritae manus Tertia causa

est forma neque enim statua ista lsquodoryphorosrsquo aut lsquodiadumenosrsquo vocaretur nisi haec illi esset impressa

facies Quarta causa est faciendi propositum nam nisi hoc fuisset facta non esset Quid est propositum

quod invitavit artificem quod ille secutus fecit vel pecunia est haec si venditurus fabricavit vel gloria si

laboravit in nomen vel religio si donum templo paravit Ergo et haec causa est propter quam fit an non

putas inter causas facti operis esse numerandum quo remoto factum non esset] 219 Cf ARIST Phys 194b 30-35 220 Considera-se que Santo Tomaacutes de Aquino verteu ao latim na Suma Teoloacutegica o grego ldquoτὸ τί ἦν εἶναιrdquo

por quidditas ou seja ldquonatura in materia corporali existensrdquo [natureza existente na mateacuteria corporal] (cf

Summa Theologiae i quaest 84 art 7) 221 Cf ARIST Met VII 7 1032 b 1-2 ldquoεἶδος δὲ λέγω τὸ τί ἦν εἶναι ἑκάστου καὶ τὴν πρώτην οὐσίανrdquo 222 Cf PANOFSKY E Idea a evoluccedilatildeo do conceito de belo 2ordf ediccedilatildeo 2ordf tiragem Traduccedilatildeo de Paulo Neves

Satildeo Paulo Martins Fontes 2013 p 23

83

La proporcion de la forma es el fundamento de toda hermosura puede

una muger tener buen rostro y ser tan mal formada que no se pueda

llamar hermosa y al contrario hermosa se podraacute llamar siendo de

forma agradable aunque de rostro no lo sea tanto Esto sucede en todas

las fabricas no basta que una joya sea de oro y diamantes para ser

hermosa el modo con que esta labrada la haze estimable no basta que

un edificio sea de maacutermol alabastro diaspro oacute poacuterfido para ser

vistoso el ayre con que fue trazado es quien le ha de hazer mirar con

admiracioacuten y faltando este es todo nada223

A proporccedilatildeo da forma eacute o fundamento de toda formosura pode uma

mulher ter bom rosto e ser tatildeo mal formada que natildeo se possa chamar

formosa e ao contraacuterio formosa se poderaacute chamar sendo de forma

agradaacutevel ainda que de rosto natildeo o seja tanto224 Isto sucede em todas

as faacutebricas225 natildeo basta que uma joia seja de ouro e diamantes para ser

formosa o modo com que estaacute lavrada a faz estimaacutevel natildeo basta que

um edifiacutecio seja de maacutermore alabastro diaspro ou poacuterfido para ser

vistoso o ar com que foi traccedilado eacute o que lhe haacute de fazer mirar com

admiraccedilatildeo e faltando este [ar] eacute completo nada 226

A mateacuteria daacute valor agrave obra mas eacute o lavor da forma que a configura compotildee

formosuras e angaria estimas227 A bem dizer de acordo com Secircneca imposto o ldquoidos in

223 Rimas varias de Luis de Camoens priacutencipe de los poetas heroycos y liricos de Espantildea Ofrecidas al

muy ilustre sentildeor D Ivan da Sylva Marquez de Gouvea presidente del Dezembargo do Paccedilo y mayordomo

mayor de la Casa Real ampc Comentadas por Manuel de Faria Y Sousa Cavallero de la Orden de Christo

Tomo I y II Que contienen la primera segunda y la terceira Centuria de los Sonetos Lisboa Con

Privilegio Real En la Imprenta de Theotonio Damaso de Mello Impressor de la Casa Real Con todas las

licencias necessarias Antildeo de 1685 p 198 224 O exemplo faz pensar nos versos iniciais da Epistula ad Pisones discutidos no seguimento deste trabalho

ldquoHumano capiti ceruicem pictor equinam Jungere si uelit amp uarias inducere plumas Undique collatis

membris ut turpiter atrum Desinat in piscem mulier formosa superne Spectatum admissi risum teneatis

amicirdquo (HOR AP 1-4) 225 Isto eacute arte artifiacutecio lavor feitio 226 Traduccedilatildeo nossa 227 Leonardo (1452-1519) no paragone que contrapesa os meacuteritos e os demeacuteritos da escultura frente agrave

pintura ao afirmar ser a escultura de menor engenho que a pintura opera no vitupeacuterio argumento

amparado nestes mesmos termos que supotildeem a irredutibilidade da arte agrave mateacuteria ldquoRispondesi allo scultore

che dice che la sua scienza egrave piuacute permanente che la pittura che tal permanenza egrave virtuacute della materia sculta

e non dello scultore e in questa parte lo scultore non se lo deve attribuire a sua gloria ma lasciarla alla

natura creatrice di tale materiardquo [Se tu respondesses ao escultor que disse que a sua ciecircncia eacute mais

permanente que a pintura que tal permanecircncia eacute virtude da mateacuteria esculpida e natildeo do escultor e nesta

parte o escultor natildeo deve isso atribuir agrave sua gloria mas deixa-la agrave natureza criadora de tal mateacuteria] cf

Trattato della pittura di Lionardo da Vinci Tratto da un codice della Biblioteca Vaticana e dedicato alla

84

opere estrdquo isto eacute o idos ()estaacute na obra dela natildeo se arranca senatildeo que por abstraccedilatildeo

donde talvez possa em concordacircncia com Aristoacuteteles haver no acircnimo do artiacutefice (cf

ARIST Met VII 7 1032b 1-2) ao passo que por diferenccedila exterior agrave obra e anterior a

ela eacute a idea ldquoidea extra opus nec tantum extra opus sed ante opusrdquo (cf SEN Ep 58 21)

Essa distinccedilatildeo Secircneca assim desbasta imaginando compor retrato (imago) de Luciacutelio

afirma que o destinataacuterio ausente de suas liccedilotildees seja exemplar (exemplar) da pintura

(pictura) de quem extraia por observaccedilatildeo feiccedilatildeo (habitus) que se imponha agrave obra A

feiccedilatildeo eacute faacutecie (facies) eacute ideia (idea) que ensina e provecirc a imitaccedilatildeo (imitatio) do pintor

do artiacutefice (cf SEN Ep 58 19) Faz agrave mesma maneira eacute doutrina de Secircneca o pintor que

figure o poeta Virgiacutelio a feiccedilatildeo (facies) de Virgiacutelio eacute ideia (idea) eacute exemplar (exemplar)

de que o artiacutefice extrai o idos imposto agrave obra daiacute advinda (cf SEN Ep 58 20) Dessarte

para Secircneca como o idos a forma eacute causa do que haacute a idea tambeacutem o eacute228 Nesses

termos assentado em pressupostos semelhantes Raphael Bluteau define ldquoIdeardquo como

ldquoExemplar ou modello que alguem haacute de imitarrdquo

Deste modo pensada como incorpoacuterea e preexistente tambeacutem como imortal

imutaacutevel e inviolaacutevel (cf SEN Ep 58 19) a ideia penetra a forma no verbete ldquoForma

Idea Imagemrdquo Esta acepccedilatildeo pode-se pormenorizar e alastrar agrave luz do que traz o

Vocabulario Portuguez amp Latino em ldquoIDEA

maestagrave di Luigi XVIII Re di Francia e di Navarra Roma MDCCCXVIII [1817] Nella Stamperia de

Romanis Con licenza dersquo Superiori p 40 cf LICHTENSTEIN J The Blind Spot An Essay on the Relations

between Painting and Sculpture in the Modern Translation by Chris Miller Los Angeles Getty Research

Institute 2008 p 5 228 A iacutentegra do passo de Secircneca traz o seguinte (SEN Ep 58 19-20) ldquoQuid sit hoc idos attendas oportet

et Platoni imputes non mihi hanc rerum difficultatem nulla est autem sine difficultate subtilitas Paulo

ante pictoris imagine utebar Ille cum reddere Vergilium coloribus vellet ipsum intuebatur Idea erat

Vergilii facies futuri operis exemplar ex hac quod artifex trahit et operi suo imposuit idos est Quid intersit

quaeris Alterum exemplar est alterum forma ab exemplari sumpta et operi imposita alteram artifex

imitatur alteram facit Habet aliquam faciem statua haec est idos Habet aliquam faciem exemplar ipsum

quod intuens opifex statuam figuravit haec idea est Etiam nunc si aliam desideras distinctionem idos in opere est idea extra opus nec tantum extra opus est sed ante opusrdquo [Atenta com cuidado o que seja o

eidos e se a coisa te parecer difiacutecil de entender zanga-te com Platatildeo e natildeo comigo De resto qualquer

pensamento abstrato tem sempre a sua dificuldade Utilizei haacute pouco o exemplo do pintor Se este quisesse

representar Vergiacutelio numa pintura olharia para o proacuteprio Vergiacutelio A ldquoideiardquo era o rosto de Vergiacutelio o

modelo do futuro quadro a forma que dela o artista extrai e impotildee ao seu trabalho seraacute o eidos Natildeo

entendes qual eacute a diferenccedila A ideia eacute o modelo o eidos eacute a forma deduzida do modelo e imposta ao quadro

a ideia eacute aquilo que o artista imita o eidos aquilo que ele faz O proacuteprio modelo que o artista olhando-o

imprime agrave estaacutetua tem tambeacutem uma determinada forma eacute a sua ideia Se preferes uma outra explanaccedilatildeo

dir-te-ei que o eidos estaacute na proacutepria obra enquanto a ideia eacute exterior agrave obra e natildeo apenas exterior mas

ainda preacute-existente agrave obra] cf SEacuteNECA L A Cartas a Luciacutelio Traduccedilatildeo prefaacutecio e notas de Joseacute Antoacutenio

Segurado e Campos Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 2004 p 204

85

IDEA Ideacutea Derivase do Grego Eidos quer dizer Figura imagem

exemplar Idea Divina He a foacuterma amp o original (que os Theologos

admittem em Deos) ao qual o mundo na sua criaccedilaotilde foy como treslado

amp copia Mais clara amp diretamente Alguns dizem que as Ideas Diuinas

saotilde as creaturas que Deos fez em tempo em quanto desde a Eternidade

precedem na mente Divina naotilde formal mas objectivamente Outros

que saotilde a mesma Essencia Divina conhecida como participavel da

criatura Outros que segue o P Suares dizem que he o mesmo Verbo

Divino ou formal conceito essencial que Deos tem das criaturas como

possiveis porque (diz elle) Ideacutea naotilde he outra cousa senaotilde o exemplar

do artifice ao qual faz sua obra cotildeforme V G [sc ldquoverbi gratiardquo ldquopor

exemplordquo] quer hum Architecto formar hum edificio primeiro na sua

mente foacuterma hum conceito delle amp segundo este conceito ou imagem

vai architectando a obra exterior amp agrave quelle cotildeceito que dentro de si

formou chamamos Ideacutea este conceito em noacutes he distincto de noacutes mas

em Deos he indestincto de Deos porque Deos naotilde veacute foacutera de si cousa

alguma a cuja imitaccedilaotilde ou exemplarisaccedilaotilde haja de obrar mas em si tem

toda a razaotilde de obrar exemplar ou productiva

Suprema Idea Deos

O que vendo Garcia com feacute ardente

Assi fallou com a Suprema Idea

Piedoso Pay senhor omnipotente

Malaca conquist Livro 2 oit 87

Ideas de Plataotilde Segundo Alcino lib De doctrina Platonis he a

imagem exẽplar amp Prototypo eterno de todas as cousas criadas ampobras

da natureza ou a eterna amp perfeitissima intellecccedilaotilde divina He verdade

que Tertulliano chama agraves Ideacuteas de Plataotilde Misterios hereticos haeretica

idearum sacramenta amp conclue dizendo que as ditas ideas foraotilde a

sementeira dos erros dos Gnosticos In ideis Platonicis Gnosticorum

haeretica semina relucere Porem he certo que os primeiros Padres da

Igreja foraotilde Platonicos tanto assi que no livro settimo das suas

confissoens affirma S Agustinho que com os dogmas da Philosophia

Platonica se facilitara muyto a intelligencia das verdades Evangelicas

amp jaacute antes disso S Justino Martyr amp Clemente Alexandrino tinhaotilde

ditto que Plataotilde tivera alguma luz do mysterio da Santissima Trindade

Finalmente com mais clareza que todos os Philosophos que o

86

precederaotilde assentou amp provou Plataotilde que Deos naotilde obra acaso mas

conforme a idea que se propoem amp a Platonica especulaccedilaotilde desta idea

deu nome ao que propriamente chamamos ideas de Plataotilde Platonis

ideae

Idea Imagem de qualquer objecto exterior que por meyo de algum dos

cinco sentidos se representa no entendimento humano Idea ae Fem

Insita in animo rerum informatio onis Fem Species amp forma rerum

impressa amp quasi signata in animo Cic

Formar idea de alguma cousa Animo effingere aliquid Cic

Nem por conjectura pode o homem formar idea da divindade Deum ne

conjecturacirc quidem informare possumus Cic Neste lugar Cicero como

Gentio diz Deos em lugar de Deum

De todas as cousas formaotilde os homens no principio huma grosseira idea

Principio homines rerum quasi ad umbratas intelligentias animo ac

mente concipiunt Primacirc inchoatacirc amp rudi quandam intelligentiacirc res

quasque initio homines comprehendunt

Idea tambem se diz da imagem que o artifice foacuterma no entendimento

para a pocircr em obra Imago inis Fem Species ei Fem Em primeiro

lugar foacuterma o Architecto na sua imaginaccedilaotilde idea de hũ bizarro edificio

amp com ella dirige as operaccediloens da sua arte Architecti in mente primugravem

insidet species extruendi praeclari aedificij quaedam quam deinde

intuens in eaque defixus ad illius similitudinem artem manumque

dirigit Ou Exstruendi aedificij speciem universam primugravem architectus

in animo designat amp ex eacirc deinde specie totum opus exstruit Foacuterma o

Pintor Idea Vieira Tom I pag 390229

Idea Exemplar ou modello que alguem haacute de imitar Exemplar ou

exemplum alicui propositum ad imitandum

Formar dentro de si idea de hũ perfeito orador Perfecti oratoris

speciem amp formam adumbrare figurare animo effingere effigiem in

229 Raphael Bluteau neste passo refere o Orator de Ciacutecero em que o pintor Fiacutedias eacute exemplo da doutrina

e natildeo o arquiteto ldquoNec vero ille artifex cum faceret Iovis formam aut Minervae contemplabatur aliquem e

quo similitudinem duceret sed ipsius in mente insidebat species pulchritudinis eximia quaedam quam

intuens in eaque defixus ad illius similitudinem artem et manum dirigebatrdquo [E na verdade o ceacutelebre artista

ao dar forma a Juacutepiter ou Minerva natildeo contemplava ningueacutem que lhe servisse de modelo mas em sua

mente estava gravada uma espeacutecie de imagem de beleza ideal contemplando-a e nela fixado dirigia sua

arte e sua matildeo de acordo com aquele modelo] (CIC Or II 8-9) A traduccedilatildeo eacute Paulo Seacutergio de Vasconcelos

apud LICHTENSTEIN J (Org) A pintura vol 4 o belo Coordenaccedilatildeo de traduccedilatildeo Magnoacutelia Costa Satildeo

Paulo Editora 34 2004 p 25

87

animo designare informare imaginem ideam describere exprimere

simulachrum

Quereis formar idea de hum homem honrado olhai para vosso irmaotilde

Ornatissimi hominis designandi formam cupis fratris tui exemplo petas

oportet S Paulo Pregador das gentes deve ser a Idea dos pregadores

O Bispo do Porto Carta Pastoral do Porto230

Note-se o verbete abarca acepccedilotildees fundantes bastantemente entrelaccediladas Datildeo

lastro na cristandade ao Vocabulario de Raphael Bluteau as autoridades tanto de Santo

Agostinho (seacutec IV-V dC) leitor de Ciacutecero e de Platatildeo ciceroneamente interpretado

quanto de Satildeo Tomaacutes de Aquino (ca 1225-1274) comentador do bispo de Hipona Com

Santo Agostinho na Questatildeo 46 do De diversis quaestionibus octoginta tribos conhecida

como ldquoDe ideisrdquo aprende-se que as ideas nomeadas por Platatildeo (cf De ideis 1 ldquoIdeas

Plato primus appellasse perhibeturrdquo) e latinamente ditas formas ou species (cf De ideis

2 ldquoIdeas igitur latine possumus vel formas vel species dicererdquo) conforme o Orator (cf

CIC Or II 8-III 10) 231 sejam ldquocertas formas ou razotildees principais das coisas estaacuteveis e

imutaacuteveis que natildeo satildeo formadas e por isso satildeo eternas e se mantecircm sempre do mesmo

modo contidas na inteligecircncia divinardquo (cf De ideis 2 ldquoSunt namque ideae principales

quaedam formae vel rationes rerum stabiles atque incommutabiles quae ipsae formatae

non sunt ac per hoc aeternae ac semper eodem modo sese habentes quae divina

intellegentia continenturrdquo) 232 Satildeo Tomaacutes de Aquino na Questatildeo 15 da Primeira Parte da

Summa Theologica indaga (i) se haacute ideias (ii) se satildeo vaacuterias ou apenas uma e (iii) se haacute

230 Vocabulario portuguez e latino aulico anatomico architectonico bellico botanico brasilico comico

critico chimico dogmatico dialectico dendrologico ecclesiastico etymologico economico florifero forense fructifero autorizado com exemplos dos melhores escritores portugueses e latinos pelo padre

D Raphael Bluteau Coimbra no Real Collegio das Artes da Companhia de Jesu Com todas as Licenccedilas

necessaacuterias Anno Domini MDCCXIII [1713] pp 28-9 231 Cf Vocabulaire Europeacuteen des Philosophies Dictionnaire des Intraduisibles Sous la direction de

Barbara Cassin Paris Eacuteditions du Seuil Dictionnaires Le Robert 2004 p 1200 ldquoCrsquoest dans le texte de

lrsquoOrator (II 8-III-10) qursquoon trouve le premier teacutemoignage de lrsquousage de species pour eacutevoquer les formes

intelligibles Species (de mecircme famille que le gr skeptomai [σκέπτομαι] lsquoregarderrsquo) est employeacute avec la

signification preacutecise de lsquomodegravelersquo de lsquovisionrsquo perceptible seulement par la penseacutee cogitata species que

nous voyons par lrsquoesprit specimen animo uidemus Crsquoest le contexte qui lui donne son sens species est la

Forme du beau qui habite Phidias Avec species reacutepeacuteteacute troi fois Cicero preacutepare sans doute au moyen drsquoun

terme latin plus parlant la traduction technique de lrsquoidea platonicienne par forma Associeacute agrave forma le mot

species deacutesigne pour finir ce qui permet de garantir la proceacutedure dialectique le reacutefeacuterent intelligiblerdquo 232 Cf AGOSTINHO DE HIPONA ldquoAs ideias (de ideis)rdquo Discurso n 40 (2010) pp 379-380 A traduccedilatildeo eacute de

Moacyr Neves a partir da seguinte liccedilatildeo do texto latino AUGUSTINUS De diversis quaestionibus octoginta

tribus (q XLVI) A Mutzenbecher (ed) Corpus Christianorum Series Latina (CCSL) 44A

88

ideias de tudo o que eacute conhecido por Deus233 Agrave primeira questatildeo agrave luz de passo de

Agostinho234 responde que ideias haacute inscritas no intelecto divino apartando-se da liccedilatildeo

platocircnica segundo a qual as ideias existem por si 235 e afirma que idea em grego

equivalha agrave forma em latim de modo que seja forma de algo para aleacutem da proacutepria coisa

existente (ldquoforma autem alicuius rei praeter ipsam existensrdquo) seja como exemplar o

termo eacute caro agrave Epiacutestola 58 de Secircneca desconforme com os usos do Orator seja como

princiacutepio de cogniccedilatildeo das proacuteprias formas (ldquoprincipium cognitionis ipsiusrdquo)236 Entenda-

se que eacute exemplo privilegiado de Satildeo Tomaacutes de Aquino o construtor (aedificator) como

anaacutelogo de Deus que confere evidecircncia agrave ortodoxia da liccedilatildeo Deve o artiacutefice da casa

(artifex) concebecirc-la o todo e a parte como forma mentada (in mente aedificatoris) como

ideia preexistente agrave construccedilatildeo de maneira que tencione na mateacuteria (materia) a

semelhanccedila com a ideia (idea domus)237 Eacute exemplo que se lecirc em Raphael Bluteau muito

proximamente da Summa Theologica238

Nota-se ademais as liccedilotildees platocircnicas ou autorizadas como platocircnicas em

Raphael Bluteau tecircm mediaccedilatildeo do tratado De doctrina Platonis versatildeo latina

quatrocentista de Marsiacutelio Ficino (1433-1499) do Didaskalikos de Alcino (ca seacutec II

dC) inteacuterprete de Platatildeo Na traduccedilatildeo que fez o florentino do capiacutetulo IX da obra (Caput

IX De ideis amp de causa efficiente) conforme a ediccedilatildeo aldina de 1516 impressa em

Veneza Alcino precisa a idea relativamente a deus (ldquoad deumrdquo) como intelecto de deus

(ldquointellectio deirdquo) relativamente ao mundo sensiacutevel (ldquoad mundum uero sensibilẽrdquo) como

exemplar (ldquoexemplarrdquo) e relativamente a si mesma (ldquoad se ipsamrdquo) como essecircncia

(ldquoessentiardquo) de modo que daiacute defina a Idea como exemplar eterno das coisas feitas

233 Cf TOMAacuteS DE AQUINO ldquoSuma Teoloacutegica Primeira Parte Questatildeo 15 Sobre as Ideiasrdquo Discurso n 40

(2010) p 311 234 Passo em que Agostinho afirma (cf De ideis a) ldquotanta in eis vis constituitur ut nisi his intellectis sapiens

esse nemo possitrdquo isto eacute ldquosatildeo tatildeo importantes que ningueacutem pode ser saacutebio sem delas ter inteligecircnciardquo cf

AGOSTINHO DE HIPONA ldquoAs ideias (de ideis)rdquo Discurso n 40 (2010) p 379 235 Cf TOMAacuteS DE AQUINO ldquoSuma Teoloacutegica Primeira Parte Questatildeo 15 Sobre as Ideiasrdquo Discurso n 40

(2010) pp 312-313 cf OLIVEIRA C E deldquo ldquoIdeias formas rationes e species A Quaestio de ideis de Tomaacutes de Aquinordquo Discurso n 40 (2010) p 97 cf Cf Vocabulaire Europeacuteen des Philosophies

Dictionnaire des Intraduisibles Sous la direction de Barbara Cassin Paris Eacuteditions du Seuil Dictionnaires

Le Robert 2004 p 1202 236 Cf TOMAacuteS DE AQUINO ldquoSuma Teoloacutegica Primeira Parte Questatildeo 15 Sobre as Ideiasrdquo Discurso n 40

(2010) p 321 237 Idem pp 312 314 315 316 318 238 Cf Vocabulario portuguez e latino aulico anatomico architectonico bellico botanico brasilico

comico critico chimico dogmatico dialectico dendrologico ecclesiastico etymologico economico

florifero forense fructifero autorizado com exemplos dos melhores escritores portugueses e latinos

pelo padre D Raphael Bluteau Coimbra no Real Collegio das Artes da Companhia de Jesu Com todas

as Licenccedilas necessaacuterias Anno Domini MDCCXIII [1713] pp 28-29

89

segundo a natureza (ldquoDifiniũt autẽ Ideam exemplar aeternũ eorum quae secũdum

naturam fiuntrdquo) 239 Essa definiccedilatildeo observe-se verte ao latim o texto grego do

Didaskalikos ldquoHorizontai de tēn idean paradeigma tōn kata physin aiōnionrdquo

()240 A versatildeo de

Marsiacutelio Ficino eacute calcada na letra de Alcino A bem dizer todavia trata-se de Platatildeo lido

por Secircneca ldquoIdea est eorum quae natura fiunt exemplar aeternumrdquo isto eacute ldquoIdeia eacute

exemplar eterno das coisas feitas pela naturezardquo (cf SEN Ep 58 19)

A autoridade de Alcino e a definiccedilatildeo de idea trazida na versatildeo de Marsiacutelio Ficino

natildeo satildeo estranhas aos leitores de Francisco de Holanda (1517-1584) Referem-se no Da

pintura antiga obra que se sabe acabada na Quaresma de 1548 conhecida de manuscrito

de 1790 e publicada pela primeira vez tatildeo-somente em 1849 em francecircs241 Vale reter-lhe

a liccedilatildeo porque entrelaccedila semanticamente o termo ldquoideiardquo na exemplaridade da intelecccedilatildeo

divina eacute Ideia de Deus o que ideia o artiacutefice o pintor

A ideia na pintura eacute uma imagem que haacute-de ver o entendimento do

pintor com olhos interiores em grandiacutessimo silecircncio e segredo qual haacute-

de imaginar e escolher a mais rara e excelente que sua imaginaccedilatildeo e

prudecircncia puder alcanccedilar como um exemplo sonhado ou visto em o

ceacuteu ou outra parte o qual haacute-se de seguir e querer depois arremedar e

mostrar fora com a obra de suas matildeos propriamente como o concebeu

e viu dentro em seu entendimento

Esta ideia eacute maravilhosa nos grandes entendimentos e engenhos e agraves

vezes eacute tal que natildeo haacute matildeo nem saber que possa imitar nem igualar-se

com ela Dizem os filoacutesofos que o sumo inventor e imortal Deus

quando fez as suas obras tais como ele soacute entende e conhece que

239 O passo eacute o seguinte ldquoEst autem idea ad deum quidẽ intellectio dei Ad mundum uero sensibilẽ exemplar

ad se ipsam essentia Quicquid enim intelligẽtia fit ad aliquid referri necesse est quod quidem operis

exemplar erit quemadmodũ si aliquid ad aliquo fiat ut agrave me mei ipsius imago Etsi exemplar haud omnino sit ab agente seorsum ut quisq artifex in se ipso artificiorũ exẽpla concipiens horum deinde formas in

materiam explicat Difiniũt autẽ Ideam exemplar aeternũ eorum quae secũdum naturam fiuntrdquo cf De

Mysteriis Aegyptiorum Chaldaeorum Afsyriorum Proclus in Platonicum Alcibiadem de anima atque

daemone Proclus de sacrificio et magia Porphyrius de divinis adque daemonibus Synesius Platonicus

de somniis Psellus de daemonibus Expositio Prisciani et Marsilii in Theophrastum de sensu phantasia

et intellecta Alcinoi Platonici philosophi liber de doctrina Platonis Venetiis Aldi 1516 p 78 240 Cf SUMMERELL O F (Ed) et al Alkinoos Didaskalikos Lehrbuch der Grundsaumltze Platons Einleitung

Text Uumlbersetzung und Anmerkungen Sammlung wissentschaftlicher Kommentaumlre Berlin and New

York Walter de Gruyter 2007 pp 24-25 241 Cf NASCIMENTO C ldquoDa pintura antiga de Francisco de Holanda o encocircmio como gecircnero da prescriccedilatildeo

e da arterdquo Floema Caderno de Teoria e Histoacuteria Literaacuteria Nordm 1 (2005) pp 37-8

90

primeiro no seu altiacutessimo entendimento fez e teve os exemplos e ideias

das obras que depois fez e as viu antes de serem tatildeo perfeitos como

depois vieram a ser A este altiacutessimo pintor e capitatildeo nos preceitos

conveacutem seguir os pintores mais que alguns outros estudiosos e fazer o

mesmo exemplo e ideias no entendimento daquilo que desejamos que

venha a ser

Assim que a ideia eacute a mais altiacutessima coisa na pintura que se pode

imaginar dos entendimentos porque como eacute obra do entendimento e

do espiacuterito conveacutem-lhe que seja muito conforme a si mesma e como

isto se tiver ir-se-aacute alevantando cada vez mais e fazenso-se espiacuterito e

ir-se-aacute miszclar com a fonte e exemplar das primeiras ideias que eacute

Deus

E das ideias diz Alcinous filoacutesofo da doutrina de Platatildeo lsquoest autem

idea ad Deum quidem intelectio Dei ad Mundum vero sensibilem

exemplar ad se ipsam essentia quid enim intelligentia fit ad aliquid

referre necesse est quod quidem operis exemplar erit quem admodum

si aliquid ad aliquo fiat ut a me mei ipsius imago Et si exemplar haud

omnino sit ab agente seorsum ut quisque artifex in se ipso artificiorum

exempla concipiens horum deinde formas in materiam explicat

Difiniunt autem ideam exemplar aeternum eorum quae secundum

naturam fiunt 242

Firmada a autoridade platocircnica o que o corpo lexicograacutefico vernacular

brevemente compilado talvez indicie desde o seacuteculo XVI eacute o processo de incorporaccedilatildeo

ao sermo culto e letrado portuguecircs do helenismo ldquoideardquo O Grande Dicionaacuterio Houaiss

registra o termo em liacutengua portuguesa em 1543 Jaacute o etimoacutelogo Antocircnio Geraldo da

242 HOLANDA F de Da pintura antiga Introduccedilatildeo notas e comentaacuterios de Joseacute da Felicidade Alves

Lisboa Livros Horizonte 1984 pp 43-4 Nesta ediccedilatildeo agrave pagina 102 sugere-se traduccedilatildeo ao passo em latim

ldquoA ideia eacute em relaccedilatildeo a Deus intelecccedilatildeo de Deus em relaccedilatildeo ao mundo sensiacutevel eacute modelo em relaccedilatildeo a si-mesma eacute a sua proacutepria essecircncia Efetivamente qualquer que seja a operaccedilatildeo intelectual forccediloso eacute que

tenha relaccedilatildeo com algo eacute esse o modelo da obra paradigma de como alguma coisa eacute feita por algueacutem tal

como a imagem de mim-proacuteprio eacute feita por mim E se eacute modelo natildeo seraacute totalmente distinto do sujeito que

o faz tal como sucede com qualquer artiacutefice ao conceber em si-mesmo os modelos das obras a realizar

para logo projectar na mateacuteria as formas das tais obras Define-se pois a ideia eacute o modelo eterno das coisas

que satildeo feitas de harmonia com a naturezardquo

Ora propocircs Cristiane Nascimento na medida em que o Da pintura antiga eacute obra de prescriccedilatildeo visto assim

ser a tratadiacutestica em que se regula a arte da pintura deve-se supor que natildeo soacute o trato de mateacuteria metafiacutesica

mas tambeacutem as referecircncias desta ordem de ldquofiloacutesofo da doutrina de Platatildeordquo operam-se como lugar de

autoridade que datildeo lastro ao que se prescreve cf ldquoDa pintura antiga de Francisco de Holanda o encocircmio

como gecircnero da prescriccedilatildeo e da arterdquo Floema Caderno de Teoria e Histoacuteria Literaacuteria Nordm 1 (2005) p 39

91

Cunha registra-o em 1572243 NrsquoOs Lusiacuteadas pode-se supor Evidentemente interessa

menos a primazia do que o uso No poema eacutepico de Luiacutes de Camotildees o Diccionario da

lingua portugueza de Antocircnio de Moraes Silva (1755-1823) impresso em 1789 jaacute o

aponta lecirc-se (Os Lusiacuteadas X 7)244

Com doce voz estaacute subindo ao ceo

Altos varotildees que estao por vir ao mundo

Cujas claras Ideas vio Protheo

Num globo vatildeo diaacutefano rotundo245

Ora as ideias que viu Proteu claras satildeo platocircnicas Ao menos de acordo com os

comentaacuterios de Manuel de Faria e Sousa (1590-1649) a esses versos ldquoEs Idea lo mismo

que la primera imagẽ o modelo de qualquier obra i Protheo esso quiere dezir

mateacuteriardquo246 Ou se generalizadas as consideraccedilotildees da Micrologia de Joatildeo Franco Barreto

(ca 1600-1674) de 1672 acerca do mesmo termo ainda que empregado em outro passo

do poema de Luiacutes de Camotildees 247

Mas para bem se entender que cousa seja Idea se deve saber que

Platam potildee tres principios de todas as cousas universaes a saber um

Deus a materia e as Ideas [] As Ideas sam formas e exemplares das

cousas essenciaes em a divina mente nela existentes ainda antes que

as cousas fossem criadas as quaes destas ideas trazem o seu ser e

243 Cf CUNHA A G da Dicionaacuterio Etimoloacutegico da Liacutengua Portuguesa 4ordf ediccedilatildeo revista e ampliada Rio

de Janeiro Lexikon 2010 p 347 244 Cf Diccionario da lingua portugueza composto pelo padre D Rafael Bluteau reformado e

acrescentado por Antonio de Moraes Silva natural do Rio de Janeiro Tomo primeiro A-K Lisboa Na

Officina de Simatildeo Thadeo Ferreira Anno M DCC LXXXIX [1789] Com licenccedila da Real Meza da

Comissatildeo Geral sobre o Exame e Censura dos Livros Vende-se na loja de Borel Borel e Companhia

quase defronte da Igreja nova da Nossa Senhora dos Martyres na esquina p 690 245 Cf Os Lusiadas de Luis de Camotildees Com Privilegio Real Impressos em Lisboa com licenccedila da Sancta Inquisiccedilatildeo e do Ordinario em casa de Antonio Gotildeccedilaluez Impressor 1572 p 162 246 Lusiadas de Luis de Camoens principe de los poetas de Espantildea Al Rey N S Felipe IV El grande

Comentadas por Manuel de Faria i Sousa Cavallero de la Orden de Christo i de la Casa Real Tomos

terceiro i quarto Antildeo 1639 Com privilegio En Madrid Por Iuan Sanchez Impressor A costa de Pedro

Coello mercador de libros p 309 247 BARRETO J F Micrologia camoniana Prefaacutecio de Aniacutebal Pinto de Castro leitura e integraccedilatildeo do texto

de Luiacutes Fernando de Carvalho Dias e Fernando F Portugal Lisboa Imprensa Nacional-Casa da Moeda

1982 pp 428-9 Joatildeo Franco Barreto comenta os versos seguintes (II 35) ldquoE por mais namorar o soberano

Padre de quem foy sempre amada amp cara Se lha presenta aszligi como ao Troyano Na selva Idea jaacute se

apresentagraverardquo cf Os Lusiadas de Luis de Camotildees Com Privilegio Real Impressos em Lisboa com licenccedila

da Sancta Inquisiccedilatildeo e do Ordinario em casa de Antonio Gotildeccedilaluez Impressor 1572 p 25

92

particular impressatildeo como a cera do seu sinete248

Os usos platocircnicos de modo concordante com os passos Manuel de Faria e Sousa

e de Joatildeo Franco Barreto desdobram-se no Vocabulario Portuguez amp Latino pois que

Raphael Bluteau ao propor que ldquoIdeacutea naotilde he outra cousa senaotilde o exemplar do artifice

ao qual faz sua obra cotildeformerdquo busca o Architecto como exemplo249 e faz agrave maneira de

Marsiacutelio Ficino como pode explicitar epiacutestola de data incerta do tradutor de Alcino

enderaccedilada ao poeta Giovanni Cavalcanti (1444-1509) cuja mateacuteria assim se resume

ldquoChe lrsquoIdee (secondo Platone) siano nella mente diuinardquo ou seja ldquoQue as Ideias

(segundo Platatildeo) estatildeo na mente divinardquo Lecirc-se o passo da epiacutestola tal como impressa em

1563 em traduccedilatildeo toscana de Felice Figliucci (1525-1590)

Il nostro Platone nel suo Timeo immitando Timeo Pithagorico e

approvando la sua opinione afferma il mondo esser generato da Iddio

e di questa generatione tre cagione adduce cioegrave la causa efficiente il

fine e lrsquoesemplare Peroche egli uuole che il mondo sia stato fatto dalla

Potenza di Iddio per cagione della sua bontagrave secondo lrsquoesemplare della

diuina sapiẽza Et cosi come in uno Architettore sono glrsquoesemplari

cosi di tutto lrsquoedificio come de le sue parti similmente in una diuina

intelligenza che egrave sopra al mondo uuole che siano gli esemplari di

tutto questo mondo amp delle sue parti e quella chiama intelligibile e

eterno e questo temporale e sensibile Gli esemplari di questo che in

quello sono le chiama Idee e le simiglianze di quello che in questo si

truouano le domanda imagini e ombre250

O nosso Platatildeo em seu Timeu imitando o Timeu pitagoacuterico e

248 Idem ibidem 249 Eacute exemplo que se lecirc tambeacutem na ediccedilatildeo oitocentista do Dictionarium Hispanum Latinegrave Versum de

Antocircnio de Nebrija ldquoUn arquitecto primero forma en su imaginacioacuten la idea de un excelente edificio por la qual despues gobierna su arte y operacioacuten Architecti in mente primugravem insidet species extruendi

praeclari aedificii quaedam quam deinde intuens in eaque defixus ad illius similitudinem artem

manumque dirigit Exstruendi aedificii speciem universam primugravem architectus in animo designat amp ex eacirc

deinde specie totum opus exstruitrdquo cf Antonii Nebrissensis VCL grammatici et regii chronograaphi

Dictionarium redivivum novissimegrave emendatum ac novis subinde accessionibus auctum locupletatum hellip

Opera et studio R P Fatr Ildephonsi Lopez de Rubinotildes Regii ac Militaris Ordinis Beatae Mariae de

Mercede Redemptionis Captiuorum Superiorum permissu Matriri apud Michaelem Escribano

Typographum Anno MDCCLXXVIII [1778] Sumptibus Regiae Societatis p 194 250 Cf Tomo I Delle diuine lettere del Gran Marsilio Ficino tradotte per M Felice Figliucci Senese

Nuovamente ristampate con due tauole la prima de i nome amp materie delle lettere amp lrsquoaltra delle cose piu

notabili Con privilegio In Venegia appresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLXIII [1563] p 36r-37v

93

aprovando a sua opiniatildeo afirma ser o mundo gerado por Deus e desta

geraccedilatildeo aduz trecircs razotildees a saber a causa eficiente a final e a exemplar

Porque ele quer que o mundo tenha sido feito da Potecircncia de Deus em

razatildeo da sua bondade segundo o exemplar da divina sabedoria E assim

como em um Arquiteto estatildeo os exemplares natildeo soacute de todo o edifiacutecio

mas tambeacutem de suas partes semelhantemente em uma divina

inteligecircncia que haacute sobre o mundo quer que estejam os exemplares de

todo este mundo e de suas partes e aquela se chama inteligiacutevel e eterna

e este temporal e sensiacutevel Os exemplares deste que naquela estatildeo

denomina-os Ideias e as semelhanccedilas daquele que neste se encontram

as denomina imagens e sombras 251

Os usos o explicitam o exemplo ilustra a noccedilatildeo de idea como teorizada em Platatildeo

ainda que cristatildemente interpretada no passo de Marsiacutelio Ficino Por analogia de proporccedilatildeo

sabe-se bem na mente divina haacute exemplares do mundo criado assim como na mente do

arquiteto haacute exemplares do edifiacutecio do todo e de suas partes inteligiacuteveis e eternas as

ideai as Idee como entes incorpoacutereos e inexistentes na natureza sensiacuteveis e temporais

as coisas mundanas geradas de Deus252 Eacute liccedilatildeo que se conhece em termos semelhantes

da Summa Theologica de Satildeo Tomaacutes de Aquino

O exemplo do arquiteto do artiacutefice de arte mecacircnica recurso de evidentia uacutetil a

filoacutesofos e a teoacutelogos da cristandade penetra a preceptiva de Hermoacutegenes na versatildeo

toscana de Filiberto Campanile e faz-se semelhantemente uacutetil ao retor alheio agrave doutrina

platocircnica poreacutem

Se nellrsquoa arti mechaniche non potragrave qualsiuoglia gran maestro dar

principio ad opera alcuna se prima notilde hauragrave cotilde pẽsieri fabbricatosi

nella mente lrsquoIdea o forma di quella perche nelle liberali non diremo

il medesimo auuenire a colui chrsquooratione o poema oacute altro che che sia

formar voglia senza reger lo stile secondo alcuna forma collocatasi

nella mente che srsquoa caso volesse andar ponendo insieme parole amp

ornamenti oratorij senza dubbio ignorante e stolto si dimostrerebbe

Fia dunque per tal cagion necessario lrsquohauere a conoscere quali e

251 Traduccedilatildeo nossa 252 Cf SANTOS M M ldquoArte dialoacutegica e epistolar segundo as Epiacutestolas morais a Luciacuteliordquo Letras Claacutessicas

Satildeo Paulo 1999 v 3 p 59

94

quante siano le forme dellrsquoEloquentia al che volendo noi dar principio

diremo lrsquoIdea ouer forma del parlare non esser altro chersquol genere di

quello atto e conueniente di sentenza di metodo di parole e di

compositione alle cose sottoposte amp alle persone cioegrave che la forma o

genere del parlare sia corrispondente e si conuenga per tutte le parte

predette alle cose sottoposte e alle persone delle quali si dee

ragione253

Se nas artes mecacircnicas natildeo poderaacute qualquer grande mestre dar iniacutecio a

obra alguma se natildeo tiver primeiro com pensamentos fabricado na

mente a Ideia ou forma desta [obra] por que nas liberais natildeo diremos

ocorrer o mesmo com aquele que discurso ou poema ou outro queira

formar sem reger o estilo segundo alguma [Ideia ou forma] colocada na

mente Porque se acaso quisesse andar pondo mesmas palavras amp

ornamentos oratoacuterios sem duacutevida ignorante e tolo se demonstraria

Donde seja por tal razatildeo necessaacuterio ter de conhecer quais e quantas

satildeo as formas da Eloquecircncia ao que querendo dar iniacutecio diremos ser

a Ideia ou forma do dizer senatildeo que o gecircnero deste apto e conveniente

de pensamento de meacutetodo de palavras e de composiccedilatildeo das coisas

referidas e das pessoas isto eacute que a forma ou gecircnero do dizer seja

correspondente e convenha por todas as partes preditas agraves coisas

referidas e agraves pessoas sobre as quais se deva abordar254

Filiberto Campanile manifesta no tratado LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia

a interseccedilatildeo semacircntica que expande no Hermoacutegenes toscano o sentido de ldquoIdeardquo de

ldquoformardquo empregam-se os substantivos como sinocircnimos ora respeitantes ao que se

configura mentalmente ora respeitantes ao que se forja no estilo como ldquoIdea ouer forma

del parlarerdquo ou no plural como ldquoforme dellrsquoEloquentiardquo entrelaccedilados ambos os termos

o helenismo e o latinismo na praacutetica compositiva e nos fazeres de oradores e poetas que

fazem pender a forma discursiva da forma mentada Sem a mediaccedilatildeo sem a regecircncia da

conformaccedilatildeo mental o uso da palavra na escritura beira a ignoracircncia e a parvoiacutece de quem

desconhece as conveniecircncias do preceito

253 LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina drsquoHermogene

e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con Licenza dersquo

Superiori pp 5-6 254 Traduccedilatildeo nossa

95

Recorde-se tradutora da ediccedilatildeo do Peri ideōn que integra a Biblioteca Claacutesica

Gredos cujo tiacutetulo eacute o jaacute citado Sobre las formas de estilo Consuelo Ruiz Montero busca

discriminar as acepccedilotildees do substantivo grego ideano leacutexico de Hermoacutegenes Das

acepccedilotildees acolhidas a mais habitual na obra a estudiosa verte como ldquoforma de estilordquo e

observam os estudos introdutoacuterios agrave ediccedilatildeo supotildee semanticamente equivalente a

kharaktēr tal como preceituado por Dioniacutesio de Halicarnasso255 Eacute ademais acepccedilatildeo que

o A Greek-English Lexicon de Lidell-Scott registra como ldquoquality of style

(eg σαφήνεια γοργότης etc)rdquo256 Nesse sentido aponta Consuelo Ruiz Montero

vale-se tambeacutem Hermoacutegenes dos substantivos eidos ()e typos (ος) tomados os

trecircs termos idea eidos e typos de modo intercambiaacutevel como sinocircnimos257 Noutra

acepccedilatildeo Consuelo Ruiz Montero define natildeo sem imprimir acentuado personalismo agrave

preceptiva retoacuterica idea como ldquolsquoestilorsquo individual de un autorrdquo agrave maneira de ldquoestilo de

Platoacutenrdquo de ldquoestilo de Demoacutestenesrdquo Eacute acepccedilatildeo que se registra no A Greek-English

Lexicon como ldquostylerdquo O exemplo dos lexicoacutegrafos britacircnicos recolhido dos comentaacuterios

de Siriano Filoxeno agrave obra de Hermoacutegenes natildeo difere daquele que apresenta a estudiosa

eacute ldquoΠλατωνική Δημοσθενικὴ ἰrdquo (cf SYRIAN In Hermog 1112 R) isto eacute ldquoestilo

platocircnico demostecircnicordquo se aceitos os termos do verbete ldquordquo de Lidell-Scott No Peri

ideōn haacute exemplos como este ldquooti nyn estin ēmin peri tēs Platōnos ē Dēmosthenous ē

tou deinos ideas o logosrdquo (

) (cf HERM 214 24-215-1) as traduccedilotildees as mais recentes

natildeo distam na eleiccedilatildeo do vocaacutebulo a reduzir o genitivo plural ldquotēs ideasrdquo ()

Cecil W Wooten opta por ldquoour discussion will not be concerned with the style peculiar

to Plato or Demosthenes or any other writerrdquo Consuelo Ruiz Montero por ldquonuestra

exposicioacuten no va a tratar ahora del estilo de Platoacuten Demoacutestenes o cualquier outro autorrdquo

e ao cabo Michel Patillon por ldquonous ne parlons pas pour lrsquoinstant du style de Platon ou

de Deacutemosthegravene ou de tel autrerdquo Ou seja idea eacute para esses tradutores nesses casos ou

255 Aplica-se o substantivo idea nesta acepccedilatildeo ora com o genitivo grego ldquotou logourdquo ora com o dativo

ldquologoirdquo cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Monterto Madrid Editorial Gredos 1993 p 37 256 Isto eacute ldquoqualidade de estilordquo (por ex saphecircneia gorgotecircs etc) 257 Consuelo Ruiz Montero a partir do trabalho Studies in Hermogenes and Eustathios The Theory of Ideas

and Its Application in the Commentaries of Eustathios on the Epics of Homer (1977) de Gertrud Lindberg

contabiliza emprega-se no Peri ideōn na acepccedilatildeo a mais corriqueira idea 96 vezes eidos 63 vezes e typos

7 vezes cf Idem ibidem p 37 A obra de Gertrud Lindberg natildeo foi consultada para a elaboraccedilatildeo deste

trabalho

96

style ou estilo ou style Diga-se nessa acepccedilatildeo como na primeira Hermoacutegenes emprega

os substantivos eidosetypos como sinocircnimos Consuelo Ruiz Montero entende tambeacutem

idea e eidos como ldquotipo de estilordquo nos casos em que esses substantivos sejam

determinados por um genitivo ldquologourdquo antecedido ou natildeo de artigo ldquotourdquo A tradutora

abre-se agrave leitura de que logos compreenda-se como discurso embora afirme preferir o

termo ldquoestilordquo por assumir logos em casos assim como equivalente a lexis hermēneia

e kharaktēr Por fim Consuelo Ruiz Montero lecirc idea como espeacutecie ou gecircnero Eacute o que

observa em ldquoperi tēs ideas ekeinēs logourdquo () isto eacute

ldquosobre estes gecircneros de discursordquo (cf HERM 409 8) Destaca a tradutora ao castelhano

emprego semelhante lecirc-se ademais com o substantivo eidos assim como em ldquoto toiouton

tōn panēgyrikōn eidos logōnrdquo ()(cf

HERM 407 19-20) isto eacute ldquoen tal especie de discurso panegiacutericordquo ldquoin a certain kind of

panegyric speechrdquo ou ldquodans ce genre de discours paneacutegyriquesrdquo conforme Consuelo

Ruiz Montero Cecil W Wooten e Michel Patillon respectivamente Isto seja acatem-se

ou natildeo as diversas escolhas tradutoacuterias do Sobre las formas de estilo parece expliacutecito que

natildeo haacute no texto de Hermoacutegenes nem idea como exemplar suprassensiacutevel nem idea como

forma mental258

Esta derradeira acepccedilatildeo poreacutem ganha legibilidade nos usos que se fazem do Peri

ideōn desde o Quinhentos e o Seiscentos mostra-o bem Filiberto Campanile Mas natildeo

apenas Na medida em que se afirma que artiacutefices de artes mecacircnicas e liberais operam

por homologia exemplo bastante interessante encontra-se nos comentaacuterios a Vitruacutevio de

Daniele Barbaro (1513-1570) assim como propostos no tratado I Dieci libri

dellrsquoArchitettura di M Vitruvio estampado em segunda ediccedilatildeo em Veneza no ano de

1567 Nos comentaacuterios a normatizaccedilatildeo retoacuterica de Hermoacutegenes incide na regulaccedilatildeo

arquitetocircnica de Vitruacutevio259

Come le maniere del parlare che si chiamano idee sono qualitagrave

dellrsquooratione conueniente alle cose amp alle persone cosi le maniere

degli edificij sono qualitagrave dellrsquoarte conueniente alle cose amp alle

258 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 pp 35-39 259 A primeira ediccedilatildeo da obra data de 1556 Segundo Manfredo Tafuri eacute por volta de 1547 que Daniele

Barbaro inicia os estudos do tratado de Vitruacutevio cf TAFURI M Venice and the Renaissance Translated

by Jessica Levine Cambridge Massachusetts MIT Press 1995 p 96

97

persone260

Como as maneiras do dizer que se chamam ideas satildeo qualidades do

discurso convenientes agraves coisas amp agraves pessoas tambeacutem as maneiras dos

edifiacutecios satildeo qualidades da arte convenientes agraves coisas amp agraves pessoas261

Filiberto Campanile e Daniele Barbaro operam definiccedilotildees de idea semelhantes A

saber as idee para aquele satildeo maniere ldquogenere di quello atto e conveniente di sentenza

di metodo di parole e di compositione alle cose sottoposte amp alle personerdquo 262 para este

satildeo ldquoqualitagrave dellrsquooratione conueniente alle cose amp alle personerdquo 263 Itere-se maniera

natildeo eacute categoria estranha a Filiberto Campanile referindo-se agrave lucidezza (eukrineia)

emprega ldquomaniera di direrdquo agrave aspprezza (trakhytēs) ldquomanierardquo ao splendore (lamprotēs)

ldquomaniera di parlarrdquo agrave circuitione (peribolē) ldquomaniera di parlarerdquo por exemplo264 As

cose para um e para outro traduzem os oito stoikheia como prescritos no Peri ideōn (cf

HERM 218 18-26) Esses stoikheia genericamente ditos em italiano esquematizam-se

no tratado de Filiberto Campanile

260 Cf I Dieci libri dellrsquoArchitettura di M Vitruvio Tradotti amp commentati da Mons Daniel Barbaro eletto

Patriarca drsquoAquileia da lui riueduti amp ampliati amp hora in piu commoda forma ridutta In Venetia Appresso Francesco dersquoFranceschi Senese amp Giouanni Chrieger Alemano Compagni MDLXVII [1567]

p 36 261 Traduccedilatildeo nossa 262 Idem p 5 263 Cf I Dieci libri dellrsquoArchitettura di M Vitruvio Tradotti amp commentati da Mons Daniel Barbaro eletto

Patriarca drsquoAquileia da lui riueduti amp ampliati amp hora in piu commoda forma ridutta In Venetia

Appresso Francesco dersquo Franceschi Senese amp Giouanni Chrieger Alemano Compagni MDLXVII [1567]

p 36 264 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori pp 22 46 52

98

Figura 4 LrsquoIdee ouero Forme dellarsquoeloquentia (1606) 265

Vale lembrar poreacutem que natildeo pende do Peri ideōn a definiccedilatildeo de idea O tratado

codifica as ideai tou logou mas natildeo as define266 Leitor privilegiado de Hermoacutegenes

Jorge de Trebizonda no Rhetoricorum libri V escreve serem as ideai em grego o que

latinamente se diz formae dicendicf ldquode dicendi formis quae Graeligcegrave uocamusrdquo

267 e as define ldquoForma est genus orationis sententia methodo uerbis compositione

rebus subiectis amp personis idoneumrdquo268 isto eacute ldquoForma eacute gecircnero do discurso adequado

ao pensamento ao meacutetodo agraves palavras agrave composiccedilatildeo agraves mateacuterias expostas e agraves

pessoasrdquo 269 Mostra-o Lucia Calboli Montefusco Siriano Filoxeno comentador de

Hermoacutegenes eacute autoridade de quem parece pender a definiccedilatildeo de idea ou de forma

265 Idem p 13 266 Cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) p

146 267 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia

ad D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] p 493 268 Idem p 496 269 Traduccedilatildeo nossa

99

apresentada na liccedilatildeo de Jorge de Trebizonda e partir daiacute na de Daniele Barbaro no seacuteculo

XVI ou na de Filiberto Campanile no seacuteculo XVII Nas palavras de Siriano Filoxeno

idea eacute poiotēs logou eacute qualidade do discurso concordante () com o personagem

() e com a mateacuteria (πρᾶγμα) relativamente ao pensamento () agrave

dicccedilatildeo () a todo entrelaccedilamento (διαπλοκή) da harmonia () (cf Syrian I

2 16-19 Rabe) 270

Assim definidas as ideai saphēneia a primeira delas chiarezza na versatildeo italiana

de Filiberto Campanile eacute fundante no preceito porque afirma o retor grego natildeo haacute

discurso que natildeo precise ser claro (cf HERM 226 8-11) Deve-se ressaltar que o tratado

LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia neste passo conduz agrave letra o preceito Leitores

seiscentistas de Hermoacutegenes poreacutem nem sempre acatam a disposiccedilatildeo da doutrina tal

como preceituada mesmo que natildeo a desabonem O valenciano Pedro Juan Nuntildeez (1522-

1602) leitor minucioso de Hermoacutegenes no tratado Institutionum rhetoricarum libri

quinque impresso e reimpresso em Barcelona em 1578 1585 e 1593 defende que seja

conveniente prescrever antes das demais ideai a magnitudo (sabe-se megethos) para que

se torne mais faacutecil o aprendizado da doutrina acrescenta apesar de o grego abordar

primeiro a perspicuitas termo que interpreta saphēneia por entendecirc-la necessaacuteria a todo

discurso (em latim ldquoquia ea in omni oratione est necessariardquo)271

Por um lado afirmar-se necessaacuteria a saphēneia significa supor que a

inteligibilidade do discurso eacute condiccedilatildeo de sua realizaccedilatildeo eficiente Entende-se que ldquosoacute o

que eacute compreendido pode ser criacutevelrdquo272 Por outro lado isso natildeo significa fazer da falta

de saphēneia a asapheia (ldquordquo oscuritagrave em Filiberto Campanile) um viacutecio uma

vez que por insuficiecircncia natildeo se peca quando se miram pretericcedilotildees subentendidos

ambiguidades imprecisotildees ou silecircncios convenientemente efetuados por meios artiacutesticos

Sabem bem oradores e poetas como satildeo por vezes bem-vindos nos discursos os usos de

formas alusivas (as ldquoἐμφάσειςrdquo enfasi em Giulio Camillo Delminio) e de questotildees

270 Apud MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) p

149 ldquordquo 271 Cf Pet Iohan Nunnesii valentini Institutionum rhetoricarum libri quinque Editio tertia ceteris multo

correctior et locupletior exemplis Barcinone Cum licentia Ex typographia Sebastiani agrave Cormellas An

1593 p 303 272 Cf MARTINS P ldquoO paacuterodo de Fedra e a retoacutericardquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 1999 v 3 p 201

100

figuradas (ldquordquo questione figurate em italiano273) (cf

HERM 240 24-241 5)274 As afirmaccedilotildees do Peri hermēneias atribuiacutedo a Demeacutetrio de

Falero satildeo taxativas nesse sentido e avalizam o preceito ldquoE ndash pelos deuses ndash ateacute mesmo

a falta de clareza em muitas ocasiotildees eacute veementerdquo (cf DEMETR 254

ldquoΚαὶ νὴ τοὺς θεοὺς σχεδὸν ἂν καὶ ἡ Πολλαχοῦ δεινότης ἐστίrdquo na traduccedilatildeo

seiscentista de Pietro Vettori ldquoEt per deos ferme vtique amp obscuritas multis locis grauitas

estrdquo275 )276 Enfim conforme os coacutedigos da obra retoacuterica de Hermoacutegenes eacute possiacutevel

presumir que a saphēneia eacute sim necessaacuteria como condiccedilatildeo para a recepccedilatildeo do discurso

trate-se de poesia ou natildeo277 no entanto concede-se que a asapheia seja efeito muitas

vezes decoroso e assim parecem sempre esclarecedoras as liccedilotildees do Peri hermēneias

frente ao tirano eunuco nunca eacute prudente enunciar clara e diretamente a palavra

ldquomutilaccedilatildeordquo (cf DEMETR 293) Essa concessatildeo Manuel Pires de Almeida no ldquoDiscurso

sobre o poema heroicordquo explicita distinguindo quatro sortes de obscuridade

ldquoobscuridade boardquo ldquoobscuridade louvadardquo ldquoobscuridade viciosardquo e ldquoobscuridade

alegoacuterica e prezadardquo

Acabo este discurso com advertir que haacute quatro obscuridades trecircs que

satildeo mui artificiosas e virtuosas e dignas de que se pratiquem sem as

quais natildeo pode haver boa poesia a 3ordf que eacute indigna desta arte

273 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 8 274 Cf PATILLON M La theacuteorie du discours chez Hermogegravene le rheacuteteur essai sur les structures

linguistiques de la rheacutetorique ancienne Paris Les Belles Lettres 1988 pp 215-219 A oposiccedilatildeo entre

ήe lecirc-se assim traduzidas por Giulio Camillo Delminio ldquoDiremo adunque prima della

Chiarezza laquale prima habbiamo posta percioche tutto il parlare di questo trattato hagrave trattato bisogno

di chiarezza agrave cui egrave contraria la oscuritate amp alla quale sotto entrano queste due cioegrave cioegrave

puritate amp cioegrave cioegrave lucidezzardquo (cf HERM 226 8-12) Le Idee ouero Forme della oratione da

Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M Giulio Camillo Delminio Friulano A queste

saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal detto M Giulio Camillo Opere novamente

mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo

Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini pp 4-5 275 Cf Petri Victorii commentarii in librum Demetrii Phalerei de elocutione Positis ante singulas

declarationes Graecis vocibus Auctoris ijsdemque ad verbum Latine expressis Additus est rerum et

verborum memorabilium index copiosus Cum P II IIII Pont Max Cosmi Medicis Florentianorum

Senensiumq Ducis ampAlphonsi Ferrariensium Ducis privilegijs ampliszlig per decennium Florentiae In

officina Iuntarum Bernardi F MDLXII p 221 276 Cf FREITAS G A DE Sobre o Estilo de Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega

(Traduccedilatildeo e estudo introdutoacuterio do tratado) Belo Horizonte [FL-UFMG] 2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado]

p LV 277 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 p 321

101

vituperada dos saacutebios e seguida soacute dos ignorantes A primeira artificiosa

eacute a que nasce ou da alteza do conceito ou da induacutestria do poeta por

algum particular que repreende desta usaram muitos latinos e quase

todos os satiacutericos e em esta obscuridade e agudeza tiveram [] a

galantaria e sal Horaacutecio Marcial Juvenal Peacutersio e outros A segunda

obscuridade se origina da muita liccedilatildeo na qual natildeo tem culpa antes

merece grandes louvores e fl 635v excelecircncias e mui poucos o leitor

que por falto dela deixa de entender os poemas de Homero Virgiacutelio

Estaacutecio Lucano Claudiano e enfim os mais latinos e gregos usaram

desta obscuridade e satildeo claros aos homens doutos e lidos A terceira eacute a

viciosa e condenada que se produz da falta de invenccedilatildeo de confusatildeo

de engenho de ruim colocaccedilatildeo de conceitos intricados e dificultosos

da disposiccedilatildeo das palavras dos tropos das figuras da eleiccedilatildeo das coisas

et sic de coeteris Outra obscuridade haacute bem artificiosa e eacute a que se

inclui na alegoria mui frequentada na eacutepica e de grande louvor e

excelecircncia e primor nela e comum aos livros sagrados por donde

consegue o primeiro lugar Dixi 278

Como se observa ao modo das liccedilotildees do Peri ideōn e do Peri hermēneias o

ldquoDiscurso sobre o poema heroicordquo discrimina maneiras reguladas como conformes e

desconformes de efetuaccedilatildeo discursiva da obscuridade as ldquomui artificiosas e virtuosas e

dignas de que se pratiquemrdquo de um lado a ldquoque eacute indigna desta arte vituperada dos

saacutebios e seguida soacute dos ignorantesrdquo de outro Ora para falar com Leon Kossovitch natildeo

se trata de desfazer ldquoo primado da clareza sobre a obscuridaderdquo279 senatildeo de assentir no

gecircnero de poema heroico o bem fazer da obscuridade decorrente do conceito elevado e

do domiacutenio haacutebil e engenhoso da arte da poesia uacutetil ao vitupeacuterio que natildeo diz e natildeo pode

dizer agraves claras uacutetil aos satiristas como Horaacutecio Marcial Juvenal ou Peacutersio280 senatildeo

278 Cf MUHANA A ldquoDiscurso sobre o poema heroico Comentaacuteriordquo REEL Revista Eletrocircnica de

Estudos Literaacuterios Vitoacuteria a 2 v 2 2006 pp 11-12 279 KOSSOVITCH L Condillac luacutecido e transluacutecido Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial 2011 p 197 280 Evidentemente o vitupeacuterio natildeo eacute do ofiacutecio do poema heroico Citem-se as palavras de Francisco de

Cascales ldquoAl fin el Heroico que si bien en la grauedad y en la copia de los cotildeceptos tiene el primer lugar

y mayor excelẽcia con todo eso esparze pocas veces en su Poema cosas de moralidad porque no siẽdo su

oficio reprehender ni vituperar y no induziendo tampoco recitantes con porfiacuteas y contiendas antes siendo

su obligaciotilde nafrar hechos ilustres dignos de memoriardquo cf Tablas poeticas del licenciado Francisco

Cascales Dirigidas al Excelentiacutessimo Sentildeor D Francisco de Castro Conde de Castro Duque de

Taurisano Virrey y Capitaacuten general del Reyno de Sicilia Con privilegio En Murcia por Luis Beroacutes Antildeo

de 1617 p 142

102

tambeacutem de assentir o fazer bem da obscuridade estudiosa de poetas como Homero

Virgiacutelio Estaacutecio Lucano ou Claudiano que prescreve a discriccedilatildeo de ldquohomens doutos e

lidosrdquo como atributo de recepccedilatildeo conveniente e que proscreve como proacutepria de homens

vulgares e neacutescios incultos a falta do letramento que constroacutei a inteligibilidade desses

poetas e de seus poemas senatildeo ainda de assentir a obscuridade como efeito do uso da

alegoria procedimento conhecido dos livros eacutepicos e dos sagrados Por conseguinte

trata-se de natildeo tolerar a obscuridade que se afirma pendente da falta de domiacutenio artiacutestico

na composiccedilatildeo poeacutetica Itere-se ldquoque se produz da falta de invenccedilatildeo de confusatildeo de

engenho de ruim colocaccedilatildeo de conceitos intricados e dificultosos da disposiccedilatildeo das

palavras dos tropos das figuras da eleiccedilatildeo das coisas et sic de coeterisrdquo 281 donde resulte

que no dizer de Manuel Pires de Almeida a ldquoobscuridade viciosardquo seja intoleraacutevel por

sua ininteligibilidade e reconheccedila-se no ldquoestilo dificultoso o dos Cultos drsquooje condenado

por viciosordquo282

haacute alguns poetas que afetam tanto a obscuridade que querem qualificaacute-

la por verdadeira poesia e soacute usam do estilo dificultoso oraccedilotildees

desatadas palavras esquisitas translaccedilotildees nunca vistas locuccedilotildees

peregrinas tropos duplicados figuras e metaacuteforas mui continuadas e

sobretudo a colocaccedilatildeo das coisas e disposiccedilatildeo do argumento intricado

sem ordem nem arte nem claridade confesso que natildeo achei ateacute agora

autor saacutebio em esta arte que aprovasse doutrina tatildeo falsa e mal-fundada

antes muitos que condenam dos antigos e dos modernos infinitos

sisudos e mui doutos que se queixam e maldizem os primeiros

inventores desta seita a que vulgarmente chamam Cultos por ironia e

sendo assim que este modo de poetar dificultoso eacute o mais faacutecil de todos

porque soacute se anda agrave caccedila de palavras e figuras sem outras disposiccedilotildees e

advertecircncia283

Agrave guisa de exemplo entre os antecedentes da controveacutersia encerrada no ldquoDiscurso

sobre o poema heroicordquo vale rememorar que em missiva de 1613 da qual a Biblioteca

281 Cf MUHANA A ldquoDiscurso sobre o poema heroico Comentaacuteriordquo REEL Revista Eletrocircnica de Estudos

Literaacuterios Vitoacuteria a 2 v 2 2006 p 12 282 Indica-o Adma Muhana o presente de enunciaccedilatildeo do ldquoDiscurso sobre o poema heroicordquo situa-se entre

os anos de 1630 e 1640 cf Idem p 13 283 Idem p 11

103

Nacional de Espantildea guarda duas variantes autoacutegrafas uma delas datada de 30 de junho

expedida de Madri a D Luis de Goacutengora o letrado Pedro de Valencia (1555-1620)

escreve-lhe em censura da Faacutebula de Polifemo y Galatea e das Soledades em resposta agrave

carta de 11 de maio de 1613 hoje perdida na qual o poeta cordovecircs demandava o juiacutezo

criacutetico destas obras remetidas apensas ao letrado na correspondecircncia 284 Pedro de

Valencia repreende-lhe os poemas fundamentando-se em obras de retoacuterica como o Peri

hypsous do Pseudo-Longino o Peri hermēneias do Pseudo-Demeacutetrio de Falero e o Peri

syntheseōs onomaton de Dioniacutesio de Halicarnasso 285 pela demasiada confianccedila no

ingenio em detrimento da arte286 e pela ldquoafectacioacuten contraria a su [ingenio] naturalrdquo de

sorte que287

por huir y alejarse mucho del antiguo estilo claro liso y gracioso de

que vuesa merced soliacutea usar con excelencia en las materias menores

huye tambieacuten de las virtudes y gracias que le son proprias y no menos

284 Em 1989 Blanca Perintildeaacuten hispanista da Universitagrave di Pisa editou as duas liccedilotildees manuscritas da missiva

Natildeo satildeo poucas as variaccedilotildees Por conveniecircncia atenho-me apenas agrave versatildeo sem data a que informa a

estudiosa encontra-se na Biblioteca Nacional de Madri no ms 5585 (fls 165r-168v) Trata-se Texto A por

convenccedilatildeo O Texto B datado lecirc-se no ms 3906 (fls 64r-67r) Eacute como que uma minuta afirma Perintildeaacuten

cf PERINtildeAacuteN B ldquoUna vez maacutes la carta de Pedro de Valenciardquo in PERINtildeAacuteN B GUAZZELLI F (Org)

Symbolae pisanae Studi in onore di Guido Mancini Pisa Giardini 1989 vol II pp 447-467 285 Cf ACCORSI F ldquoPedro de Valencia y el Pseudo Longino sobre la recepcioacuten espantildeola del Peri hupsousrdquo

CRITICOacuteN 113 2011 p 66 286 Em Pedro de Valecircncia lecirc-se ldquoCon este recato religioso y con el amor y respeto que tengo a vuesa

merced digo que de tres cosas que deciacutean los estoicos que han de concurrir en un artiacutefice para que las

obras salgan perfetas que son 1 ingenio 2 arte 3 haacutebito o uso y experiencia la primera que es la naturaleza es la fundamental y principal y en la poesiacutea es casi el todo [hellip] A vuesa merced le pertenece

principalmente el loor del ingenio sobre todos los modernos y muchos de los antiguos y tambieacuten tiene en

grado muy aventajado la facilidad del uso y no niego a vuesa merced el arte ayudada de discrecioacuten y

prudencia natural que suple mucho por el arte y hace buena eleccioacuten Pero aconteacutecele a vuesa merced lo

que de ordinario a los que hallan en siacute muchas fuerzas naturales que confiados en ellas y llevados de su

iacutempetu con soltura descuidada no se dejan atar con preceptos ni encerrar con definiciones o aforismos

del arte ni aun con advertencias de los amigosrdquo [Com este recato religioso e com este amor e respeito que

tenho por Vossa Mercecirc digo que de trecircs coisas que diziam os estoicos que tecircm de concorrer em um artiacutefice

para que as obras saiam perfeitas que satildeo 1 engenho 2 arte 3 haacutebito ou uso e experiecircncia a primeira

que eacute a natureza eacute fundamental e principal e em poesia eacute quase o todo Agrave Vossa Mercecirc cabe o louvor do

engenho sobre todos os modernos e muitos dos antigos tambeacutem tem em grau muito avantajado a facilidade do uso e natildeo nego a Vossa Mercecirc a arte ajudada pela discriccedilatildeo e pelo engenho natural que supre muito da

arte e faz boa eleiccedilatildeo Poreacutem acontece a Vossa Mercecirc o que de ordinaacuterio aos que acham em si muitas forccedilas

naturais que confiados nelas e elevados por seu iacutempeto com soltura descuidada natildeo se deixam atar com

preceitos nem encerrar com definiccedilotildees ou aforismos da arte ou ainda com advertecircncias dos amigos]

Traduccedilatildeo nossa 287 A apologia da arte eacute lugar-comum Francisco de Cascales escreve no ldquoProacutelogordquo de suas Tablas poeticas

ldquosegũ Aristoteles el arte es aquella que da preceptos y ensentildea los caminos para no errar en aquello que

professamos Si esto es assi q les mueue a pensar q sin arte caminaragraven mejor que con ellardquo cf Tablas

poeticas del licenciado Francisco Cascales Dirigidas al Excelentiacutessimo Sentildeor D Francisco de Castro

Conde de Castro Duque de Taurisano Virrey y Capitaacuten general del Reyno de Sicilia Con privilegio En

Murcia por Luis Beroacutes Antildeo de 1617 sp

104

convenientes para las poesiacuteas maacutes graves Huye la claridad y

escureacutecese tanto que espanta de su leccioacuten no solamente al vulgo

profano sino a los que maacutes presumen de sabidos en su aldea 288

por fugir e afastar-se do antigo estilo claro liso e gracioso o qual Vossa

Mercecirc soiacutea usar com excelecircncia nas mateacuterias menores foge tambeacutem

das virtudes e graccedilas que lhe satildeo proacuteprias e natildeo menos convenientes

para as poesias mais graves Foge a clareza e escurece-se tanto que

espanta com sua eleiccedilatildeo natildeo soacute o vulgo profano senatildeo os que mais se

gabam de saacutebios em sua aldeia289

Os criteacuterios de Manuel Pires de Almeida no ldquoDiscurso sobre o poema heroicordquo e

de Pedro de Valencia na epiacutestola ao poeta satildeo afins Compreende-se a Faacutebula de

Polifemo y Galatea e as Soledades leem-se para o segundo nos termos do primeiro como

obras de poesia de ldquoobscuridade viciosardquo A resposta de D Luis de Goacutengora a este passo

de Pedro de Valencia datada de 30 de setembro de 1613 eacute conhecida e bastante citada

en dos maneras considero me ha sido honrosa esta poesiacutea si entendida

para los doctos causarme ha autoridad siendo lance forzoso venerar

que nuestra lengua a costa de mi trabajo haya llegado a la perfeccioacuten

y alteza de la latina a quien no he quitado los artiacuteculos como parece

a vuesa merced y esos sentildeores sino excusaacutedolos donde no eran

necesarios Y asiacute gustar[iacute]a me dijese en doacutende faltan o queacute razoacuten

dellas no estaacute corriente en lenguaje heroico (que ha de ser diferente del

de la prosa y digno de personas capaces de entenderlo) que holgareacute

de construiacuterselo aunque niego no poder ligar el romance a esas

declinaciones y no doy aquiacute la razoacuten coacutemo porque espero convencer

la pregunta que en esto vuesa merced me hiciere Demaacutes que honra me

ha causado hacerme obscuro a los ignorantes que esa es la distincioacuten

de los hombres doctos hablar de manera que a ellos les parezca griego

pues no se han de dar las perlas preciosas a animales de cerda290

288 Cf GOacuteNGORA Y ARGOTE L DE Obras completas edicioacuten de Juan Milleacute y Gimeacutenez Isabel Milleacute y

Gimeacutenez Madrid Aguillar 1967 p 1085 289 Traduccedilatildeo nossa 290 Cf ARANCOacuteN A M La Batalla en torno a Goacutengora seleccioacuten de textos Barcelona Antoniacute Bosch

1978 p 43

105

de duas maneiras considero me foi honrosa esta poesia [as Soledades]

se entendida pelos doutos ser-me-aacute motivo de autoridade sendo lance

forccediloso venerar que nossa liacutengua agrave custa de meu trabalho tenha

chegado agrave perfeiccedilatildeo e alteza da latina da qual natildeo retirei os artigos

como parece a Vossa Mercecirc e a esses senhores senatildeo dispensei-lhes

donde natildeo eram necessaacuterios E assim gostaria me dissesse onde faltam

ou que arrozoado delas natildeo estaacute corrente em linguagem heroica (que haacute

de ser diferente da da prosa e digna de pessoas capazes de entendecirc-la)

que folgarei em construiacute-la embora negue natildeo poder ligar o romance a

estas declinaccedilotildees e natildeo dou aqui a razatildeo como porque espero refutar a

pergunta que disso Vossa Mercecirc me fizer Demais que honra me causou

fazer-me obscuro aos ignorantes que esta eacute a distinccedilatildeo dos homens

doutos falar de maneira que a eles lhes pareccedila grego pois natildeo se haacute de

dar as peroacutelas preciosas a animais de pecirclo 291

No passo em questatildeo conforme a defesa de D Luis de Goacutengora o latinismo de

sintaxe da elipse de artigo sujeito discutido na epiacutestola e o da elipse de conjunccedilatildeo

integrante292 procedimento aiacute operado (ldquoconsidero me ha sidordquo ldquogustar[iacute]a me dijeserdquo)

pode-se aventar colaboram como recursos de uso linguiacutestico do lavor do poeta para

fazer a liacutengua de Castela rivalizar com o latim em ldquoperfeccioacuten y altezardquo293 e ademais

atravessam a conformaccedilatildeo da elocuccedilatildeo poeacutetica de lenguaje heroico feita de laconismos

e de obscuridades no gecircnero liacuterico das Soledades compostas sabe-se bem em registro

misto Recordem-se ainda os versos iniciais da Faacutebula de Polifemo y Galatea que

preceituam o estilo culto em poema de mateacuteria pastoril ldquoEstas que me dictoacute rimas

sonoras culta siacute aunque bucoacutelica Taliacutea []rdquo294 No mais mostra-o Joatildeo Adolfo

291 Traduccedilatildeo nossa 292 D Luis de Goacutengora afirma tendo as elipses em conta ldquoY no seacute en queacute fuerzas fiado me escribe una

carta maacutes que ingeniosa atrevida pues queriendo cumular mil fragmentos de disparates (como de diferentes duentildeos de donde infiero los tiene el papel) no supo organizarlos pues estaacuten maacutes faltos de

artiacuteculos y conjunciones copulativas que carta de vizcaiacutenordquo 293 A questatildeo da alteza e da perfeiccedilatildeo do castelhano volta agrave discussatildeo em outra missiva endereccedilada a D

Luis de Goacutengora Respuesta a las cartas de Luis de Goacutengora y Antonio de las Infantas y Mendoza de 16

de janeiro de 1614 294 Cf GOacuteNGORA Y ARGOTE L DE Faacutebula de Polifemo y Galatea 10ordf ed de Alexander A Parker Madrid

Catedra 2007 p 133 Joseacute Pellicer de Ossau Salas y Tovar comentador de D Luis de Goacutengora assim

define o adjetivo ldquoCultardquo ldquolimata perfeta de modo que aunque manege acciones rusticas las frases estegraven

colocadas com aseordquo Ao que acrescenta ldquoaunque Hesiodo Teocrito y Virgilio trataron de materias rudas

y del campo el estilo fue limado y culto que es lo mismo que cultiuado con decoro y propiedad Oy el

idiotismo de Espantildea toma esta voz culto para notar al que habla con metaforas desviaacutendose delo vulgar y

106

Hansen na apresentaccedilatildeo que abre Poesia Seiscentista volume que colhe da Fecircnix

renascida e do Postilhatildeo de Apolo parte da poesia de agudeza que essas coletacircneas

recolhem D Luis de Goacutengora emulando elocutivamente poetas latinos neoteacutericos como

Catulo na chave dos poetas alexandrinos por eles emulados opera ldquouma linguagem de

signos indiretos substituindo pela formulaccedilatildeo metafoacuterica periacutefrases e antiacuteteses

hermeacuteticas sublimes as formas diretas e claras do estilo humilderdquo em que as ldquoimagens

tendem para a siacutentese do epigrama pois satildeo simultaneamente sensoriais com efeitos

visualizantes e sentenciosas com o sentido equivocado em significaccedilotildees opostasrdquo 295

Do que resulta a obscuridad nesses termos seleciona doctos e ignorantes agrave recepccedilatildeo

adequada da obra poeacutetica Ora eacute conhecidiacutessima a sentenccedila de D Luis de Goacutengora

ldquoDeseo hacer algo no para los muchosrdquo296

Vale rememorar em outro estudo Joatildeo Adolfo Hansen diz dedicando-se agrave

compreensatildeo dos criteacuterios por meios dos quais a Epistula ad Pisones de Horaacutecio (seacutec I

aC) 297 regula o decoro de estilo que o par clarezaobscuridade revisto nos passos de

Hermoacutegenes mediante os termos gregos saphēneiaasapheia deva ser pensado como

paracircmetro diferencial e relativo de composiccedilatildeo e de recepccedilatildeo Disso reteacutem-se que clareza

e obscuridade se inscrevem entre as diferenccedilas elocutivas de gecircneros os mais variados e

satildeo relativas ao horizonte de destinaccedilatildeo das obras realizadas e aos modos de sua

circulaccedilatildeo se oralizado ou escrito se privado ou puacuteblico de modo que arbitrem modos

variaacuteveis de avaliaccedilatildeo das composiccedilotildees oratoacuterias e poeacuteticas298

Na fortuna de Hermoacutegenes variam os termos mormente latinos empregados por

para escarnecelle le llama cultordquo cf Lecciones solemnes a las obras de Don Luis de Gongora y Argote

Pindaro Andaluz Principe de los poeta liricos de Espantildea Escrivialas Don Ioseph Pellicer de Salas y

Tovar Sentildeor de la Casa de Pellicer y Chronista de los Reinos de Castilla Dedicadas al Serenissimo Sentildeor

Cardenal Infante Don Fernando de Austria MDCXXX [1630] Con Priuilegio en Madrid En la Imprenta

del Reino A costa de Pedro Coello Mercader de Libros p 9 295 Cf HANSEN J A ldquoFecircnix renascida amp Postilhatildeo de Apolo uma introduccedilatildeordquo in PEacuteCORA A (org) Poesia

seiscentista Fecircnix renascida amp Postilhatildeo de Apolo Satildeo Paulo Hedra 2002 p 40 296 Cf GOacuteNGORA Y ARGOTE L DE Obras completas edicioacuten de Juan Milleacute y Gimeacutenez Isabel Milleacute y Gimeacutenez Madrid Aguillar 1967 p 1224 297 Sabe-se a doutrina horaciana do ut pictura poesis expotildee-se entre os versos 361 e 365 da Epistula ad

Pisones Cito-os acompanhados de traduccedilatildeo de Marcos Marinho dos Santos ldquout pictura poesis erit quae

si propius stes te capiat magis et quaedam si longius abstes haec amat obscurum uolet haec sub luce

uideri iudicis argutum quae non formidat acumen haec placuit semel haec deciens repetita placebitrdquo

[ldquoComo a pintura a poesia Existiraacute a que se mais perto de ateacutens mais te cative e alguma se mais longe

te manteacutens esta ama o escuro sob a luz quer ser vista aquela que a agudeza arguta do juiz natildeo intimida

uma aprouve uma vez outra dez vezes repetida aprazeraacuterdquo] SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica

de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p 208 298 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 pp 321 323

107

tradutores e comentadores para interpretar saphēneia A soluccedilatildeo tradutoacuteria de Pedro Juan

Nuntildeez que faz uso do substantivo perspicuitas eacute uma entre tantas No Rhetoricorum libri

V de Jorge de Trebizonda eacute claritas definida como forma que faz puro e perspiacutecuo o

discurso (cf ldquoClaritas est quae facit puram amp perspicua orationemrdquo) 299 Puritas e

perspicuitas categorias anunciadas pelos adjetivos ldquopurusrdquo e ldquoperspicuusrdquo referem-se a

katharotēs e a eukrineia300 Na versatildeo latina de Antocircnio Bonfine (1538) os termos

escolhidos satildeo estes saphēneia interpreta-se como diluciditas ao passo que katharotēs

agrave maneira do que se lecirc no Rhetoricorum libri V verte-se como puritas e eukrineia como

elegantia 301 Eacute interessante notar o dicionaacuterio latino Le Grand Gaffiot na ediccedilatildeo

aumentada do ano 2000 registra uma uacutenica entrada do substantivo ldquodiluciditasrdquo em

sentido de ldquoclarteacuterdquo ldquoeacutevidencerdquo colhido em Boeacutecio (seacutec VI dC) (cf BOET Top Arist

8 2) Aventa-se portanto natildeo eacute vocaacutebulo que Antocircnio Bonfine tenha ido buscar na

autoridade do latim antigo A escolha pode constituir-se todavia por via da Rhetorica ad

Herennium no Anocircnimo o adjetivo ldquodilucidusrdquo emprega-se para referir um dos trecircs

atributos da narraccedilatildeo (Cf Rhet Her I 14 ldquoTres res conuenit habere narrationem ut

breuis ut dilucida ut ueri similis sitrdquo) A narraccedilatildeo natildeo eacute mateacuteria exclusiva do Peri ideōn

mas este passo indica ao inteacuterprete um equivalente latino possiacutevel de saphēs Na mesma

obra aprende-se que a elocuccedilatildeo deva conter elegantia e a ldquoElegantia est quae facit ut

locus unus quisque pure et aperte dici videaturrdquo (ldquoElegacircncia eacute o que faz com que certa

passagem pareccedila ser dita de forma pura e clarardquo)302 O Anocircnimo entende a elegantia no

domiacutenio da ornamentaccedilatildeo e do deleite como efeito elocutivo que se realiza mediante o

acordo entre a Latinitas pensada como propriedade de conformaccedilatildeo com os usos

abonados da liacutengua latina (o sermo) que a manteacutem pura livre de solecismos e

barbarismos303 e a explanatio pensada como figura de construccedilatildeo de oratio aperta e

299 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 497 300 Isto eacute purity pureza pureteacute) e distinctness nitidez netteteacute) 301 Cf Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii item Sophistaelig Praeligexercitamenta Antonio Bonfine asculano interprete Apud Seb Gryphivm Lvgdvni

1538 p 158 302 Traduccedilatildeo de Faria amp Seabra 303 A Grammatica da lingua Portuguesa de Joatildeo de Barros assim define barbarismo e solecismo ldquoNam

soacutemẽte temos ẽ acotildestruiccedilatilde das partes da noacuteszliga grammaacutetica as ręgras que atraacutes uimos mas ainda algũas

figuras e uiccedilios que assy na faacutela como na escritura cometemos Figura (segũdo definiccedilatilde de Quintiliano) ę

hũa foacuterma de dizer per algũa arte noacuteua Estas figuras se diuidẽ ẽ dous gecircneros de que depẽdẽ muitas

especcedilias Ao primeiro uiccedilo chamamos Baacuterbarismo e o segũdo Solaeligccedilismo Baacuterbarismo ę uicio que se

comęte na escritura de cada hũa das partes ou na ᵱnũciaccedilatilde E ẽ nenhuatilde paacuterte da tęrra se comęte mais esta

figura da ᵱnũciaccedilam q nestes reinos por causa das muitas naccedilotildees q trouxęmos a iugo de noacutesso seruiccedilo

Por q bem como os gregos e Roma auiatilde por baacuterbaras todalas outras naccedilotildees estranhas aelles por natildem

108

dilucida discurso inteligiacutevel e liacutempido na traduccedilatildeo de Faria amp Seabra resultante do

emprego de vocabulaacuterio corrente e proacuteprio (cf Rhet Her IV 12 17)

Ora dadas as concordacircncias eacute possiacutevel que desses passos da Rhetorica ad

Herennium provenham as escolhas de vocabulaacuterio de Antocircnio Bonfine que fazem divergir

do Rhetoricorum libri V de Jorge de Trebizonda as liccedilotildees do Hermogenis Tarsensis

Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii item Sophistaelig

Praeligexercitamenta As divergecircncias natildeo se limitam a essas ediccedilotildees todavia Vale arrolaacute-

las Na ediccedilatildeo de Natale Conti (1550) saphēneia eacute perspicuitas katharotēs eacute puritas e

eukrineia eacute distinctio Na ediccedilatildeo de Estrasburgo de Hermoacutegenes (1555) em grego a

epiacutestola de Johannes Sturm ao impressor Josias Rihel articula o adjetivo ldquoapertumrdquo ao

substantivo saphēneia304 Na estampa biliacutengue de 1571 do mesmo impressor Johannes

Sturm adota soluccedilotildees equivalentes agraves de Jorge de Trebizonda e emprega claritas ou oratio

aperta no sentido de saphēneia puritas no de katharotēs e perspicuitas no de

eukrineia 305 Por fim Garpar Laurent em 1614 como se viu proacuteximo de Antocircnio

Bonfine sem acatar-lhe as escolhas verte saphēneia como perspicuitas katharotēs como

puritas ou sermo purus e eukrineia como dilucidus sermo ou dilucidum genus306

Ora o exame comparativo destas versotildees mostra que saphēneia pode interpretar-

se como claritas ou diluciditas ou perspicuitas ou oratio aperta ou dilucidus sermo ou

dilucidum genus ao passo que por consenso katharotēs interpreta-se como puritas e

eukrineia como perspicuitas ou elegantia ou distinctio Neste conjunto de ediccedilotildees de

tradutores diversos redigidas e impressas entre princiacutepio do seacuteculo XV e princiacutepio do

seacuteculo XVII nem sempre Hermoacutegenes fala o mesmo latim Natildeo se espera que falasse

nem a movecircncia do leacutexico tradutoacuterio deve obliterar a koinē retoacuterica compartilhada pelos

inteacuterpretes do Peri ideōn O que se opera eacute a latinizaccedilatildeo do corpo teoacuterico de Hermoacutegenes

poderẽ formaacuter uma linguaacutegẽ assy noacutes podemos dizer que as naccedilotildees de Africa Guine Asia Brasil

baacuterbarizam quando quęrẽ imitaacuter a noacutessa E leixatildedo as figuras e uiccedilios poeticos trataremos soacutemẽte

daqueles per que mais comũmente falaacutemos ẽ oacuteraccedilatilde soluta por que como iaacute disse quando tratey do accedilẽto

as cousas q cotildepętem aos poetas ficaratilde pera quando for restituido a este reino o uso das troacuteuas Ao presente ueiamos as especcedilias do noacutesso barbarismo os uocaacutebulos das quaacutees ainda ainda que seiam gregos

tomaacuteremos como tomaacuteram os latinos leuatildedo a sua oacuterdemrdquo cf Grammatica da lingua Portuguesa

Olyssippone Apud Lodiuicum Rotorigiũ Typographum M D XL [1540] pp 34-35 304 Cf Hermogenis De formis orationum tomi duo Argentorati apud haeredes Vuendelini Rihelij Anno

1555 sp 305 Cf Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II

Latinitate donati amp scholis explicati atque illustrati A Ioan Stvrmio Cum Gratia amp Priuilegio Caeligsareo

ad anno octo Excudebat Iosias Rihelius MDLXXI [1571] p 27 306 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 255

109

mediante o emprego de vocabulaacuterio abonado pelo uso de autoridades latinas como

Quintiliano ou Ciacutecero Deve-se considerar ateacute a Rhetorica ad Herennium ainda que hoje

se enfatize que o letrado Raffaele Regio (1440-1520) tenha lhe questionado a autoria em

1492 no opuacutesculo Quaestio utrum ars rhetorica ad Herennium falso Ciceroni inscribatur

ainda assim eacute largamente tomada como tratado de Ciacutecero e circula como tal307 O

vocabulaacuterio dos inteacuterpretes daacute lastro agraves versotildees de Hermoacutegenes ao circunscrever os

preceitos do Peri ideōn ao jargatildeo de retores latino Nesse sentido natildeo haacute Hermoacutegenes em

latim a despeito da retoacuterica latina conhecida e reconhecida por letrados quinhentistas

seiscentistas e setecentistas

Ora Manuel de Galhegos funda-se em pormenor em liccedilotildees consabidas ao

afirmar ldquoA claridade ou a enargia (q he a euidencia no dizer) obserua tudo quanto

Hermogenes admoesta na palavra Saphiniardquo Os termos ldquoclaridaderdquo e ldquoSaphiniardquo tecircm o

assentimento dos usos arrolados a conjunccedilatildeo de ldquoclaridaderdquo e ldquoenargiardquo de que pende

este passo poreacutem lecirc-se natildeo nos tratados Peri heureseōs e Peri ideōn nominalmente

mencionados no ldquoDiscurso Poeacuteticordquo mas nos Progymnasmata atribuiacutedos ao retor Ensina

a obra satildeo virtudes () da ekphrasis a saphēneia e a enargeia ()308 ou

seja a clareza e a enargia ou enargueia como escreveraacute em liacutengua portuguesa Jerocircnimo

Soares Barbosa em fins do seacuteculo XVIII referindo-se ao efeito plasmado na hermēneia

() o estilo segundo a traduccedilatildeo a mais comum do termo de presentaccedilatildeo oacuteptica

e viacutevida das coisas como que mostradas agrave vista (cf HERM 23 9-14)309 Pouco distam

nesse aspecto os exerciacutecios preparatoacuterios de Eacutelio Teatildeo segundo os quais deve ser a

hermēneia e natildeo particularmente a ekphrasis como em Hermoacutegenes clara (ή) e

viacutevida (ή) Na ediccedilatildeo de Eacutelio Teatildeo (ca I dC) estampada na Basileia em 1541

vertida ao latim por Joachim Camerarius (1500-1574) lecirc-se ldquoPraeligterea elocutio amp plana

307 Cf Raphaelis Regii ducenta problemata in totidem institutionis oratoriae Quintiliani deprauationes

Eiusdem quaestio utrum ars rhetorica ad Herennium falso Ciceroni inscribatur Eiusdem de laudibus

eloquentiae panegyricus [Venecia Bonetus Locatellus] impens Octaviani Scoti 1492 MURPHY J J WINTERBOTTOM M ldquoRaffaele Regiorsquos 1492 Quaestio doubting Cicerorsquos authorship of the Rhetorica ad

Herennium Introduction and Textrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 17 No 1 (Winter

1999) pp 77-87 SKINNER Q Razatildeo e retoacuterica na filosofia de Hobbes Satildeo Paulo Editora Unesp 1999

p 54-55 308 O passo de Hermoacutegenes eacute conhecido de Pedro Joseacute da Fonseca na segunda metade do seacuteculo XVIII

ldquoHe a Poesia na opiniatildeo de Simonides huma pintura com fala a qual consiste na viva reprefentaccedilatildeo de

quaesquer objetos em que se poacutede empregar a imitaccedilatildeo poeacutetica A isto he que se daacute o nome de energia ou

evidencia que segundo Hermogenes he o mais distincto dote de que a Poezia se poacutede jactarrdquo Cf

Elementos de Poetica tirados de Aristoteles de Horacio e dos mais celebres modernos Lisboa na Offic

de Miguel Manescal da Costa Anno 1765 Com as licenccedilas necessaacuterias p 22 309 Vol II 1790 p 105

110

erit amp euidensrdquo (Ademais a elocuccedilatildeo seraacute natildeo soacute clara como evidente)310 O mesmo

passo de Eacutelio Teatildeo na traduccedilatildeo de Estrasburgo de Daniel Hensius (1580-1655) de 1626

traz versatildeo que pouco varia em termos de escolha lexical ldquoSed amp plana esse amp evidens

debet elocutiordquo (Ora a elocuccedilatildeo deve ser natildeo soacute clara como evidente)311 No mais sabem

os leitores das Academica de Ciacutecero que nada eacute mais claro que a enargeia nominada

perspicuitas ou enargeia pelos latinos (cf CIC Ac 2 6 17 ldquoquod nihil esset clarius

enargeia ut Graeci perspicuitatem aut euidentiam nos si placet nominemos

fabriquemurquerdquo)

O sevilhano Fernando de Herrera (ca 1534-1597) autor das anotaccedilotildees agrave poesia

de Garcilaso de la Vega (1501-1536) ao comentar o soneto XIII do poeta ldquoA Dafne

ya los braccedilos le crecianrdquo itera a conjunccedilatildeo de perspicuitas e euidentia proposta por

Manuel de Galhegos embora natildeo o faccedila no acircmbito do ajuizamento do gecircnero de poema

heroico e mal-avalia a preferecircncia de Jorge de Trebizonda por claritas ao verter o grego

saphēneia

Trapezuncio llamograve pero no bien claridad la que Quintiliano

perspicuidad i M Tulio evidencia esta perspicuidad es facilidad de la

oracion para entendimiento de las cosas que se tratan en ella [hellip]312

Trebizonda denominou mas natildeo bem clareza a que Quintiliano

perspicuidade e M Tuacutelio [Ciacutecero] evidecircncia Esta perspicuidade eacute

facilidade do discurso para entendimento das coisas que se tratam nele

[hellip]313

310 ΩTheonis sophistae primae apud rhetorem

exercitationes innumeris quibus scatebant antea mendis Joachimi Camerarii Pabergensis opera purgatae

amp in sermonem latinum conversae Adiectus est quoq rerum amp uerborum in ijsdem memorabilium

locupletiszlig Index Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo amp Regis Galliae ad serptenium annos octo Basileae

[1541] pp 20 251 311 ΩTheonis Sophistae Progymnasmata accurate

emendata ac recensita In usum Scholarum HolandiaeWest-Frisiaeque Ex decreto Ilustriss DD Ordinum

eiusdem Provinciae Accedit interpretatio Latina ita hac editione emendata ut sit Nova Lvgdvni

Batavorvm Ex Officina Bonaventurae amp Abrahanmi Elzevir Academ Typograph MDCXXVI [1626] p

26 312 Cf Obras de Garcilasso de la Vega con anotaciones de Fernand o de Herrera Al ilutrissimo i

ecelentissimo Sentildeor Don Antonio de Guzman Marques de Ayamonte Governador del Estado de Milan i

Capitan General de Italia Com licencia de los SS del Consejo Real En Sevilla por Alonso de la Barrera

Antildeo de 1580 p 138 313 Traduccedilatildeo nossa

111

O passo daacute noccedilatildeo mesmo que rarefeita da presenccedila empiacuterica das liccedilotildees do

Rhetoricorum libri V de Jorge de Trebizonda no seacuteculo XVI espanhol da circulaccedilatildeo em

latim do conjunto doutrinaacuterio atribuiacutedo a Hermoacutegenes e da operaccedilatildeo de latinizaccedilatildeo da

preceituaccedilatildeo retoacuterica grega medida em conformidade com os usos linguiacutesticos de

avalistas como Quintiliano ou Ciacutecero No mais Fernando de Herrera na ediccedilatildeo das

Anotaciones de 1580 aponta termo ldquoperspicuidadrdquo que revela simpatia pela seleccedilatildeo

lexical de Pedro Juan Nuntildeez (tratadista de impressotildees sucessivas em 1578 1585 e 1593)

e de Natale Conti (1550) ao passo que por assim dizer revela antipatia pela de Jorge de

Trebizonda (1433-1434) de Antocircnio Bonfine (1538) e de Johannes Sturm (1555 e 1571)

Bem recorda Luisa Loacutepez Grigera Fernando de Herrera foi acusado de plagiaacuterio de Juacutelio

Cesar Escaliacutegero (1484-1558) Muitiacutessimo em decorrecircncia dos estudos da pesquisadora

reunidos na coletacircnea La Retoacuterica en la Espantildea del Siglo de Oro de 1994 acusaccedilotildees

dessa ordem tornaram-se gastas pela desistorizaccedilatildeo e pela desvalia dos criteacuterios de

anaacutelise314 De fato Fernando de Herrera lecirc proximamente Juacutelio Cesar Escaliacutegero e o verte

ao espanhol ensina o tratado Poetices libri septem postumamente impresso em Lyon em

1561 que

ή Trapezuntius Claritatem vocat non maleacute Perspicuitatem

Quintilianus sicut amp Cicero atque Euidẽtia315

A saphēneia Trebizonda denominou natildeo mal Clareza Quintiliano

perspicuidade assim como Ciacutecero natildeo soacute enargeia senatildeo tambeacutem

evidecircncia 316

Eacute expliacutecito os comentaacuterios de Fernando de Herrera pendem de Juacutelio Cesar

Escaliacutegero Dista poreacutem o sevilhano da autoridade italiana tanto por excluir de suas

afirmaccedilotildees os acusativos gregos ldquosaphēneianrdquo (ή) e ldquoenargeianrdquo ()

quanto por modificar a apreciaccedilatildeo da escolha lexical feita por Jorge de Trebizonda

ldquollamograve pero no bienrdquo natildeo diz o mesmo que ldquovocat non maleacuterdquo As implicaccedilotildees dessa

314 Cf LOacutePEZ GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Salamanca Universidad de

Salamanca 1994 p 83 315 Cf Iuli Caesaris Scaligeri uiri Poetices libri septem Ad Syluium Filium [Lyon] Apud Antonium

Vincentium 1561 p 176 316 Traduccedilatildeo nossa

112

diferenccedila e suas razotildees interessam aos estudos da recepccedilatildeo do tratado Poetices libri

septem e aos das fontes preceptivas dos comentaacuterios a Garcilaso de la Vega No mesmo

tratado na mesma paacutegina aprende-se que ldquoPerspicuitas est facilitas orationis ad rem

intelligendamrdquo317 Ou seja a definiccedilatildeo de perspicuidad fornecida em castelhano nos

comentaacuterios autoriza-se tambeacutem pelos preceitos do Poetices libri septem Ademais

aprende-se que ldquoClaritas est quae facit puram amp perspicua orationemrdquo318 Ora trata-se

de definiccedilatildeo referida lida em Jorge de Trebizonda Natildeo eacute improvaacutevel que Fernando de

Herrera conheccedila Jorge de Trebizonda pela pena de Juacutelio Cesar Escaliacutegero

No Peri ideōn conforme os preceitos aduzidos para que sejam compostas com

correccedilatildeo as ideai a saphēneia entre tantas devem ser orquestrados com semelhante

retidatildeo e conveniecircncia os seguintes stoikheia () elementos que as constituem

ennoia () methodos () lexis () skhēmata () kōla

() synthēkē () ou synthesis () anapausis () e

rhythmos () (cf HERM 222 19-223-4) Recorde-se que o retor apresenta esses

elementos ora assim listados ora arrolados numa triparticcedilatildeo que se ramifica

contemplando os oito stoikheia ennoiamethodos e lexis a qual por sua vez se

subdivide em skhēmatakōla synthēkē ou synthesis anapausis e rhythmos (cf HERM

218 18-26)319

A composiccedilatildeo de cada idea ao fim pensa-se como efeito da praacutetica do discurso e

da mestria no trato da escrita com arte conforme as conveniecircncias A saphēneia efetua-

se por meio de duas formas que lhe satildeo subordinadas katharotēs e eukrineia A primeira

dessas espeacutecies jaacute se sabe latiniza-se consensualmente como puritas ou puritagrave em

preceptistas italianos leitores de Hermoacutegenes como Gabriele Zinano (ca 1557-1634)

em cujo Sommarii di varie retoriche greche latine et volgari (1590) se conhece o

seguinte ldquodella puritagraverdquo

317 Cf Iuli Caesaris Scaligeri uiri Poetices libri septem Ad Syluium Filium [Lyon] Apud Antonium

Vincentium 1561 p 176 HERRERA F de Anotaciones a la poesia de Garcilaso Edicioacuten de Inoria Pepe y

Joseacute Mariacutea Reyes Madrid Caacutetedra 2001 p 58 318 Cf Iuli Caesaris Scaligeri uiri Poetices libri septem Ad Syluium Filium [Lyon] Apud Antonium

Vincentium 1561 p 176 cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In

Officina Christiani Wecheli M D XXXVIII [1538] p 497 319 Lucia Calboli Montefusco sintetiza bem as diferenccedilas cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and

Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the

History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) p 157

113

Il concetto puro deue esser comune amp aperto amp che niente niente habbi

de non inteso amp sia senza profonditagrave

Le parole comuni vsate amp proprie ne sieno aspere ne trasportate

La cotildepositione sia semplice amp notilde esquisita

I membri denno esser breui amp che per se stessi terminato il concetto

senza interpositione di periodo

Il modo puro egrave il dir le cose schiette nude senza pigliar cosa alcuna di

fuori

La figura sia retta

Il finimento sia di parole non longhe amp mediocremente risuonino

Il numero chrsquoalla puritagrave si conuiene saragrave il giambo amp il suono

basso320

O conceito puro deve ser comum amp claro amp que nada nada tenha de

natildeo compreendido amp seja sem profundidade

As palavras comuns usuais amp proacuteprias nem sendo aacutesperas nem

translatas

A composiccedilatildeo seja simples amp natildeo refinada

Os membros devem ser breves amp que seja por si mesmo terminado o

conceito sem interposiccedilatildeo de periacuteodo

O modo puro eacute o dizer as coisas simples nuas sem tomar coisa alguma

de fora

A figura seja reta

O acabamento seja de palavras natildeo longas amp que mediocremente

ressoem

O ritmo que agrave pureza conveacutem seraacute o iambo e o som baixo [grave]321

Nas palavras de Hermoacutegenes a katharotēs compotildee-se mediante pensamentos (no

singular )comuns a todos que ocorrem ou parecem ocorrer a todos porque claros

e compreensiacuteveis nada profundos nada meditados (cf HERM 227 3-5) Conveacutem

recordar que no Peri ideōn a ennoia natildeo se define Menciona poreacutem o retor que no

discurso possa haver um ou vaacuterios pensamentos (cf HERM 218 18) Latinamente eacute

320 Cf Sommarii di varie retoriche greche latine et volgari Distintamente ordinati in uno da Gabriele

Zinano In Reggio Apresso Hercoliano Bartholi 1590 p 198 321 Traduccedilatildeo nossa

114

sententia de acordo com Jorge de Trebizonda e como tal trata-se de ldquores inuenta uerbis

expolienda sine qua uerba in numerum ornategrave construere furiosum uerbis explicaturrdquo

(mateacuteria fornecida pela invenccedilatildeo que se deve polir por meio de palavras sem a qual eacute

insensato cadenciaacute-las ordenadamente) 322 Consoante Filiberto Campanile eacute ademais

ldquosensordquo ldquosentenzardquo ldquoconcettordquo ou ldquoimagine della cosa intesa e pensata nellrsquoanimo

nostrordquo (imagem da coisa entendida e pensada em nossa mente) 323 As ennoiai

consideradas katharai puras por Hermoacutegenes conforme a versatildeo seiscentista de Giulio

Camillo Delminio satildeo assim exemplificadas ldquoSannio egrave vno cotale ammaestrante li chori

tragicirdquo (Sacircnio eacute um certo instrutor dos coros traacutegicos) ou ldquotrenta Tiranni presero ad

imprestanza danari da Lacedemoni contra quelli che erano nel Pireordquo (Os Trinta Tiranos

tomaram de empreacutestimo dinheiro dos Lacedemocircnios contra aqueles que estavam no

Pireu) (cf HERM 227 6-8)324 Filiberto Campanile para ilustrar o mesmo preceito entre

os exemplos citados busca no soneto LXV de Francesco Petrarca (1304-1374) os

seguintes versos

Io haurograve sempre in odio la fenestra

Onde Amor mrsquoauentograve giagrave mille strali

Perchrsquoalchanti di lor non fur mortali 325

Eu sempre terei oacutedio da janela

Donde Amor jaacute me lanccedilou mil setas

Porque algumas delas natildeo foram mortais326

322 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 497 323 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste srsquoaggiunge lrsquoArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 13 324 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste srsquoaggiunge lrsquoArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 8 325 Apud LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] p 15 326 Traduccedilatildeo nossa Poeticamente mais interessante eacute a recente versatildeo de Joseacute Clemente Pozenato que

assim traduz os mesmos versos ldquoTeraacute meu oacutedio sempre essa janela de onde Amor disparou setas fatais

por natildeo terem sido todas mortaisrdquo cf PETRARCA F Cancioneiro Traduccedilatildeo de Joseacute Clemente Pozenato

Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2014 p 169

115

E os comenta

Oue conosciuto il soggetto essere chersquol Petrarca si muoua a sdegno

contra quella finestra nella quale la prima volta vidde la sua donna

per cui Amore gli auentograve gli strali al cuore desiando che alquanti di

quelli fossero stati mortali perche lrsquohauesser tolto di tanto affanno

conosceragrave la sentenza esser pura Ma se per finestra hauragrave voluto

intendere (come altri volse) gli occhi della sua donna e per gli strali

gli sguardi chrsquoindi vsciti li ferirono il cuore il senso non si potragrave

chiamar puro 327

Se eacute sabido ser a mateacuteria [dos versos] que Petrarca se indigna contra

aquela janela na qual pela primeira vez viu a sua dama por cujo Amor

lhe lanccedilou as setas no coraccedilatildeo desejando que algumas delas fossem

mortais porque as tivessem livrado de tanta afliccedilatildeo conheceraacute ser puro

o pensamento Mas se por janela ele tenha querido entender (como

outros quiseram) os olhos de sua dama e pelas setas os olhares daiacute

vindos que lhe feriram o coraccedilatildeo o sentido natildeo poderaacute ser chamado

puro 328

Ora dizer puri os trecircs versos do soneto de modo a pensaacute-los na efetuaccedilatildeo da

chiarezza no vocabulaacuterio italiano ou negar que sejam puri e por hipoacutetese enquadraacute-

los agrave luz de seus efeitos em outra categoria retoacuterica igualmente pendente da leitura de

Hermoacutegenes eacute regular os criteacuterios de interpretaccedilatildeo de Francesco Petrarca Filiberto

Campanile o faz conforme a abertura ou o fechamento semacircntico do enunciado para

recordar termos de Joatildeo Adolfo Hansen referidos em relaccedilatildeo a Sor Juana Ineacutes de la

Cruz329 e prevecirc que a metaforizaccedilatildeo dos termos ldquofenestrardquo (ou ldquofinestrardquo) e ldquostralirdquo pois

que pressuponha a discriccedilatildeo da destinaccedilatildeo tenha implicaccedilotildees de pensamento ou de

concetto que natildeo convecircm agrave puritagrave na composiccedilatildeo de um poema que se diga claro embora

possa ao que parece convir ao soneto

327 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori pp 15-16 328 Traduccedilatildeo nossa 329 Cf HANSEN J A MOREIRA M (Org) Para que todos entendais Poesia atribuiacuteda a Gregoacuterio de Matos

e Guerra Letrados manuscritura retoacuterica autoria obra e puacuteblico na Bahia dos seacuteculos XVII e XVIII

Volume 5 1ordf ed Belo Horizonte Autecircntica Editora 2013 p 373

116

O Peri ideōn prevecirc ademais para a efetuaccedilatildeo da katharotēs a regulaccedilatildeo do

methodos Designa-se por este termo a figura de pensamento (cf HERM 222 20) Para

Jorge de Trebizonda eacute methodus ou artificium e define-se como ldquouia amp modus quo

sententia uerbis explicaturrdquo (meio amp modo pelo qual o pensamento expotildee-se em

palavras)330 ao qual os ornamentos devem se subordinar Filiberto Campanile verte a

liccedilatildeo em latim ao italiano e pouco altera ldquoegrave la via ersquol modo drsquohauere ad esplicar le

sentẽze mediatildeti le parolerdquo (eacute o meio e o modo de expocircr os pensamentos mediante as

palavras) 331 Conveacutem assim esta eacute a prescriccedilatildeo do Peri ideōn que a katharotēs

componha-se por meio da narraccedilatildeo Para formular o procedimento o retor utiliza o

substantivo grego aphēgēsis (cf HERM 228 24 229 2 4 ldquordquo narraccedilatildeo) e mais

vocaacutebulos de mesma raiz tais quais a forma verbal aphēgētai (cf HERM 227 20-21

ldquordquo narra) e o adveacuterbio aphēgēmatikōs (cf HERM 228 24 ldquordquo

de modo narrativo) Como aponta Ruth Webb o adjetivo aphēgēmatikos

() Nicolau o Sofista emprega-o em vez do costumeiro periēgēmatikos

() em seus exerciacutecios preparatoacuterios de retoacuterica ao definir a praacutetica da

ekphrasis e com ele reteacutem do sentido primeiro do verbo aphēgeomai () a

acepccedilatildeo de ldquoconduzirrdquo332

Assim pode-se aventar o methodos que daacute forma pura ao discurso ao construir-

se a aphēgēsis como que narra e conduz Deve o artiacutefice portanto expor a accedilatildeo

() que relata de modo nu () ou principiar pelas coisas relatadas sem nada

acrescer-lhes de exterior Isso significa natildeo apensar o gecircnero agrave espeacutecie o todo agrave parte o

indefinido ao definido e ademais natildeo adicionar julgamentos qualidades e diferenccedilas ou

acumular circunstancialmente o lugar () o tempo ) a personagem

() o modo () e a causa () agrave accedilatildeo pura e simples (cf HERM

227 19-228 3)333 Eacute pertinente pois consoante Hermoacutegenes fugir aos enredamentos que

330 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 497 331 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 13 332 Cf WEBB R Ekphrasis Imagination and Persuasion in Ancient Rhetorical Theory and Practice

London Ashgate 2009 pp 55 58 333 Sobre as circunstacircncias KENNEDY G A Invention and Method Two Rhetorical Treatises from the

Hermogenic Corpus Translated with introductions and notes by George A Kennedy Atlanta SBL 2005

pp 86-7

117

discursivamente enformem a peribolē de modo que se configure o que Filiberto

Campanile classifica como meacutetodo ldquodi puritagrave verardquo334

Pensa-se no mais a katharotēs no acircmbito da lexis Como compositio Jorge de

Trebizonda define a lexis ldquoest quaelig elementorum syllabarum dictionum dictioniacutesque

consequentium inter se positione conficiturrdquo (eacute o que resulta da disposiccedilatildeo das letras

siacutelabas palavras e sequecircncia de palavras)335 Para Filiberto Campanile como parole no

plural ldquosono le voci e vocabuli accomodati alla cosa ritrouatardquo (satildeo as vozes e os

vocaacutebulos acomodados agrave coisa achada)336 Assim prescreve-se ser conveniente com

vistas agrave katharotēs a lexis de uso corrente (koinē) nem translata que demande

esclarecimento e eleve o discurso nem foneticamente dura (σκληρός) que apresente

como esmiuacuteccedila Michel Patillon a aspereza do encontro consonantal perceptiacutevel por

exemplo em ldquordquo (atarpos) ldquordquo (emarpten) ldquordquo (egnapse)

ldquordquo (perikoptōn) e ldquordquo (ekneneurismenoi) (cf HERM 229

10-16 258 14-15) Perceptiacutevel tambeacutem nos infinitivos italianos ldquoSbranarerdquo (dilacerar)

ldquostirparerdquo (extirpar) e ldquoschiantarerdquo (romper destroccedilar) elenca Filiberto Campanile337

No acircmbito das figuras os skhēmata satildeo para o retor grego como se sabe

constituintes proacuteprios agrave lexis preceitua-se o uso da construccedilatildeo direta (ldquoorationis rectitudordquo

338 ldquoRettitudine del parlarerdquo 339) (cf HERM 229 19) Jorge de Trebizonda contempla-as

sob a rubrica dos ornamentos as exornationes que satildeo ldquouerborum quaeligdam expolitiones

amp modius tanquagravem colorato amictu rem amp uestimus amp decoramusrdquo (polimentos e mesuras

das palavras com os quais como que com um manto colorido vestimos e enfeitamos a

mateacuteria)340 A metaacutefora Filiberto Campanile manteacutem-na ldquoLe figure sono le vesti e gli

ornamenti con cui vestiamo amp orniamo la cosardquo (As figuras satildeo as vestes e os

334 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 17 335 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 497 336 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 13 337 Idem p 46 338 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 498 339 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 13 340 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 498

118

ornamentos com os quais vestimos e ornamos a coisa)341 Como regra ensina o Peri ideōn

que deve o artiacutefice evitar a obliquidade pois que a construccedilatildeo obliacutequa encadeia

pensamentos e eacute proacutepria agrave peribolē idea oposta agrave katharotēs Para ilustrar o procedimento

Filiberto Campanile propotildee o seguinte contraste a partir de passo do Decameratildeo de

Giovanni Boccaccio (1313-1375) ldquoIschia egrave una Isola assai vicina di Napolirdquo (Ischia eacute

uma ilha bastante proacutexima de Naacutepoles) e ldquoTancredi Principe di Salerno fu Signore assai

humano e di benigno aspettordquo (Tancredo Priacutencipe de Salerno foi senhor bastante

humano e de benigno aspecto) satildeo construccedilotildees diretas agrave proporccedilatildeo que ldquoEssendo Ischia

unrsquoIsola assai vicina di Napolirdquo (Sendo Ischia uma ilha bastante proacutexima de Naacutepoles) e

ldquoEssendo Tancredi Principe di Salerno Signore assai humano e di benigno aspettordquo

(Sendo Tancredo Priacutencipe de Salerno senhor bastante humano e de benigno aspecto) satildeo

construccedilotildees obliacutequas Supotildee o preceito italiano em conformidade com as liccedilotildees

gramaticais antigas que as oraccedilotildees reduzidas obliacutequas porque compostas em grego e em

latim sem o emprego do caso nominativo deixam em suspenso o sentido do enunciado e

demandam associaccedilatildeo de pensamento ao pensamento que enunciam

Do uso da obliquidade em particular na composiccedilatildeo da propositio do poema eacutepico

haacute notiacutecia pendente de Hermoacutegenes e de Demeacutetrio no tratado Elementos de Poetica

tirados de Aristoteles de Horacio e dos mais celebres modernos de Pedro Joseacute da

Fonseca (1737-1816) impresso em Lisboa em 1765 e posteriormente reeditado em 1781

e em 1804 Trata-se de acordo com Ivan Teixeira de letrado partiacutecipe da reforma de

ensino promovida por Sebastiatildeo Joseacute de Carvalho e Melo o Marquecircs de Pombal342 Sobre

a proposiccedilatildeo eacutepica Pedro Joseacute da Fonseca assevera que deva ser feita de simplicidade e

acrescenta

Poreacutem esta simplicidade deve ser de algum modo magestosa e esta he

a razatildeo como observa Demetrio e Hermogenes por que os melhores

Poemas para comeccedilarem mais magestosamente formaacuteratildeo os principios

de seus poemas de hum caso obliquo isto he de hum acusativo pois

341 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 13 342 Cf TEIXEIRA I Mecenato Pombalino e Poesia Neoclaacutessica Basiacutelio da Gama e a Poeacutetica do Encocircmio

Satildeo Paulo Edusp 1999 p 293

119

como a obliquidade se aparta da ordem reta e natural causa por este

motivo gravidade ao discurso343

Sabe-se dos retores e dos tratados mencionados por Pedro Joseacute da Fonseca do

Peri hermēneias de Demeacutetrio indicam-se agrave margem ldquoI Cap 29 et 117rdquo e do Peri ideōn

de Hermoacutegenes ldquoDe form l 3 c Irdquo Do primeiro haacute indicaccedilotildees que coincidem com a

ldquoparticella vigesina nonardquo e a ldquocentessima decima sestardquo e natildeo centeacutesima deacutecima seacutetima

do texto segundo a traduccedilatildeo latina jaacute referida de Pietro Vettori tal como parafraseada e

comentada pelo padre franciscano Francesco Panigarola (1548-1594) em Il predicatore

ouero parafrase commento e discorsi intorno al libro dell Elocutione di Demetrio

Falereo obra poacutestuma de 1609 No capiacutetulo 29 afirma-se ser magniacutefico

(μεγαλοπρεπής) o torneio sintaacutetico do periacuteodo (cf DEMETR 45 ldquoΜεγαλοπρεπὲς δὲ

καὶ τὸ ἐκ περιαγωγῆς τῇ συνθέσει λέγεινrdquo) 344 do que propotildee Francesco Panigarola agrave

luz de exemplo colhido em Tuciacutedides que ldquoil parlare periodico maggiore magnificenza

dia allrsquoorationerdquo (o falar perioacutedico maior magnificecircncia decirc ao discurso) No capiacutetulo 116

Demeacutetrio retoma o exemplo de Tuciacutedides (cf DEMETR 206) natildeo sem antes prescrever

que na composiccedilatildeo do discurso tecircnue iskhnos principiando-se o relato ou pelo caso

nominativo ou pelo acusativo evita-se certa obscuridade (cf DEMETR 201)345 Do

343 Cf Elementos de Poetica tirados de Aristoteles de Horacio e dos mais celebres modernos Lisboa na

Offic de Miguel Manescal da Costa Anno 1765 Com as licenccedilas necessaacuterias pp 281-282 344 DEMETR 45 ldquoEacute ainda grandioso empregar ao dizer um rodeio na composiccedilatildeo como o faz Tuciacutedides

Pois o rio Aqueloo correndo do monte Pindo atraveacutes da Dolopia terra dos agriatildees e dos anfiloacutequios do

alto junto da cidade de Estrato ao desembocar no mar junto de Eniacuteadas no inverno e fazer da cidade

deles um pacircntano torna impraticaacutevel com suas aacuteguas qualquer accedilatildeo militar Toda essa grandeza proveacutem

com efeito do movimento circular e da dificuldade de tanto ele quanto seu ouvinte fazerem uma pausardquo

cf FREITAS G A DE Sobre o Estilo de Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo

e estudo introdutoacuterio do tratado) Satildeo Paulo [UFMG] 2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p XII 345 Cf DEMETR 201 ldquoἘν δὲ τοῖς διηγήμασιν ἤτοι ἀπὸ τῆς ὀρθῆς ἀρκτέον ῾Ἐπίδαμνός ἐστι πόλις᾿ ἢ ἀπὸ τῆς αἰτιατικῆς ὡς τὸ ῾λέγεται Ἐπίδαμνον τὴν πόλιν᾿ αἱ δὲ ἄλλαι πτώσεις ἀσάφειάν τινα παρέξουσι καὶ βάσανον τῷ τε λέγοντι αὐτῷ καὶ τῷ ἀκούοντιrdquo [ldquoNas narrativas deve-se comeccedilar ou

pelo caso reto Ἐπίδαμνός ἐστι πόλις (Epidamno eacute uma cidade) ou pelo acusativo ltltλέγεται Ἐπίδαμνον τὴν πόλιν (Fala-se que a cidade de Epidamno)gtgt Os outros casos iratildeo trazer certa obscuridade e pocircr agrave

prova tanto o orador quanto o ouvinterdquo] cf FREITAS G A DE Sobre o Estilo de Demeacutetrio Um olhar

criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo e estudo introdutoacuterio do tratado) Satildeo Paulo [UFMG] 2011

[dissertaccedilatildeo de mestrado] p XLV Observe-se Il Predicatore di F Francesco Panigarola ouero Parafrase

commento e discorsi intorno al libro dellelocutione di Demetrio Falereo oue vengono i precetti e gli

essempi del dire che giagrave furono dati a Greci ridotti chiaramente alla prattica del ben parlare in prose

italiane e la vana elocutione de gli autori profani accommodata alla sacra eloquenza de nostri dicitori e

scrittori ecclesiastici Con due tauole vna delle questioni e laltra delle cose piugrave notabili Venetia

Bernardo Giunti Gio Battista Ciotti amp Compagni 1609 pp 53 673-675 685-687 cf Petri Victorii

commentarii in librum Demetrii Phalerei de elocutione Positis ante singulas declarationes Graecis vocibus

Auctoris ijsdemque ad verbum Latine expressis Additus est rerum et verborum memorabilium index

copiosus Cum P II IIII Pont Max Cosmi Medicis Florentianorum Senensiumq Ducis ampAlphonsi

120

segundo retor grego citado no passo do tratado Elementos de Poetica tirados de

Aristoteles de Horacio e dos mais celebres modernos Hermoacutegenes a indicaccedilatildeo eacute algo

imprecisa pela incerteza da ediccedilatildeo referida Como visto preceitos concordes com os do

Peri hermēneias abarcam no Peri ideōn os skhēmata atinentes agrave katharotēs e agrave peribolē

como ideai opostas que enformam aquela a clareza esta a abundacircncia Como se veraacute

o arrevesamento da sintaxe produz natildeo apenas abundacircncia senatildeo tambeacutem resplendor

(lamprotēs) (cf HERM 267 17-268 20)

Ademais contemporacircneo de Pedro Joseacute da Fonseca Francisco Joseacute Freire ensina

que a proposiccedilatildeo define-se como parte necessaacuteria do poema eacutepico par a par o tiacutetulo a

invocaccedilatildeo e a narraccedilatildeo especificada pela exposiccedilatildeo breve da accedilatildeo a ser narrada346 Agrave

vista do tratadista a preceituaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo do acusativo nos versos de abertura

assenta-se em razotildees semelhantes

os casos obliacutequos como se apartaotilde da retidaotilde natural e da pureza do

dizer causaotilde mais gravidade e escuridade e entre os obliacutequos me

parece que o accusativo he o mais aspero e por consequencia o mais

grandioso347

Deve-se rememorar propotildee Marcos Martinho dos Santos que a eleiccedilatildeo do

acusativo do objeto direto em termos sintaacuteticos para abrir a proposiccedilatildeo do poema

reporta-se a Homero Ajuda a compreender a liccedilatildeo a primeira oitava da Ulyssea ou

Lisboa Edificada de Gabriel Pereira de Castro em que o objeto direto ldquoAs Armas amp o

Varatildeordquo antepotildee-se por hipeacuterbato ao verbo cujo significado complementa ldquocantordquo Eacute

Ferrariensium Ducis privilegijs ampliszlig per decennium Florentiae In officina Iuntarum Bernardi F

MDLXII [1562] pp 46 181-183 346 Manuel Pires de Almeida assim define a proposiccedilatildeo ldquoProposiccedilatildeo eacute o lugar primeiro da obra em que

propotildee o poeta o que intenta cantar nela esta seja breve e clara possiacutevel e em a qual natildeo se ponha o nome

proacuteprio do priacutencipe ou heroacutei senatildeo usando-se de periacutefrase em tudo o mais dela natildeo haja circuncisatildeo nem rodeio algum senatildeo que o poeta em breviacutessimas razotildees diga o que pretende cantar compreendendo na

proposiccedilatildeo toda a accedilatildeo da faacutebula e captando atenccedilatildeo com prometer coisas dignas de serem escutadas isto

com estilo natildeo tuacutemido nem inchado de maneira que vaacute decrescendordquo cf MUHANA A ldquoDiscurso sobre o

poema heroico Comentaacuteriordquo REEL Revista Eletrocircnica de Estudos Literaacuterios Vitoacuteria a 2 v 2 2006 p

8 347 Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes

tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip

Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens

ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo

ferat error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX

Com as licenccedilas necessarias p 198

121

procedimento de sintaxe que busca a alteza do enunciado

As Armas amp o Varatildeo que os malseguros348

Campos cortou do Egeo amp do Oceano

Que por perigos amp trabalhos duros

Eternizou seu nome soberano

A graotilde Lisboa amp seus primeiros muros

(De Europa amp largo Impeacuterio Lusitano

Alta cabeccedila) se eu pudesse tanto

A Paacutetria ao mundo agrave Eternidade canto349

Sabe-se Gabriel Pereira de Castro imita a proposiccedilatildeo de Luiacutes de Camotildees

As armas amp os barotildees aszliginalados350

Que da Occidental praya Lusitana

Por mares nunca dantes navegados

Passaram ainda aleacutem da Taprobana

Em perigos amp guerras esforccedilados

Mais do que prometia a forccedila humana

E entre gente remota edificaratildeo

Nouo Reino que tanto sublimaratildeo

348 Quando natildeo se eacute Miguel do Couto Guerreiro ou Antocircnio Feliciano de Castilho sabe-se que o primeiro

verso da Ulyssea ou Lisboa Edificada eacute hendecassiacutelado como se viu tambeacutem chamado verso heroico ou

verso italiano no tempo em que escreve Gabriel Pereira de Castro As Ar mas amp o Va raotilde || que os

mal se gu ros Nota-se a contagem de onze siacutelabas implica a ditongaccedilatildeo em dois momentos (ldquoamp ordquo

ldquoque osrdquo) sublinhados Nota-se tambeacutem satildeo fortes por natureza as siacutelabas 2ordf 6ordf 8ordf e 10ordf todas em negrito

acima Trata-se de verso grave paroxiacutetono Como ensina Manuel Said Ali para compor-se o primeiro

hemistiacutequio deve-se antepor o anfiacutebraco (siacutelaba aacutetona + tocircnica + aacutetona) ao anapesto (siacutelaba aacutetona + aacutetona

+ tocircnica) Supotildee-se breve pausa apoacutes o anfiacutebraco a fim de se evitar a colisatildeo da siacutelaba aacutetona que o encerra

(ldquomasrdquo) com as sequentes aacutetonas (ldquoamp o Vardquo) Feita a cesura apoacutes a sexta siacutelaba meacutetrica compotildee-se o segundo hemistiacutequio de cinco siacutelabas em alternacircncia binaacuteria (siacutelaba aacutetona + tocircnica) o movimento aiacute eacute dito

iacircmbico porque iniciado pela siacutelaba fraca e seguido pela forte 349 Cf Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de

Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro fol 1 350 Vale ressaltar o primeiro verso da Ulyssea ou Lisboa Edificada emula em termos de metro o primeiro

verso drsquoOs Lusiacuteadas composto segundo o mesmo esquema riacutetmico As Ar mas amp os ba roẽs|| A

szligi na la dos Nota-se trata-se de um hendecassiacutelabo heroico grave Satildeo fortes por natureza as siacutelabas

2ordf 6ordf e 10ordf e por posiccedilatildeo a 8ordf (ldquoszligirdquo) como que acentuada porque entre duas aacutetonas Feita a ressalva

prevista natildeo se distinguem ritmicamente os versos de Gabriel Pereira de Castro e de Luiacutes de Camotildees

122

E tambem as memorias gloriosas

Daquelles Reis que foram dilatando

A Fee o Imperio amp as terras viciosas

De Affrica amp de Asia andaratildeo deuastando

E aquelles que por obras valerosas

Se vatildeo da ley da Morte libertando

Cantando espalharey por toda parte

Se a tanto me ajudar o engenho amp arte 351

Conveacutem notar que conforme o juiacutezo de Francisco Joseacute Freire tanto Luiacutes de

Camotildees quanto Gabriel Pereira de Castro embora principiem pelo caso obliacutequo devam

ser advertidos do defeito de dilatar em demasia verbo e complemento diferentemente do

ocorre em Virgiacutelio e Homero No primeiro poeta mais precisamente no primeiro

hemistiacutequio do primeiro verso da propositio da Eneida lecirc-se ldquoArma uirumque canordquo (As

armas e o varatildeo canto)352 No segundo poeta na proposiccedilatildeo da Odisseia lecirc-se ldquoO varatildeo

reconta-me Musa multiversaacutetil que muito errou depois que depredou o capitoacutelio

sagrado de Troiardquo353 (cf HOM Od I 1-2 ἄνδρα μοι ἔννεπε μοῦσα πολύτροπον ὃς

μάλα πολλὰ πλάγχθη ἐπεὶ Τροίης ἱερὸν πτολίεθρον ἔπερσενrdquo) Diga-se poreacutem

que enunciado como forccediloso por Francisco Joseacute Freire e partiacutecipe do jogo de imitaccedilatildeo e

emulaccedilatildeo no gecircnero de poema heroico consoante a autoridade homeacuterica a anteposiccedilatildeo

do acusativo natildeo se aplica em Torquato Tasso cuja Gerusalemme liberata em grafia

quinhentista assim se propotildee

351 Cf Os Lusiadas de Luis de Camotildees Com Privilegio Real Impressos em Lisboa com licenccedila da Sancta

Inquisiccedilatildeo e do Ordinario em casa de Antonio Gotildeccedilaluez Impressor 1572 p 1 352 O primeiro verso de Camotildees talvez seja demasiado repetitivo recordar emula Virgiacutelio em termos de

metro Lecirc-se assim na Eneida Ār mă uĭ rūm quĕ că nō || Trōi āe qūi prī mŭs ăb ō rīs (As armas

e o varatildeo canto De Troia quem primeiro) Nota-se o verso eacute hexacircmetro heroico hexacircmetro dactiacutelico pois consta de seis peacutes seis unidades meacutetricas o daacutetilo (siacutelaba longa + breve + breve) Ensina Quintiliano que

por convenccedilatildeo a siacutelaba longa equivale a duas breves dura dois tempos ao passo que a siacutelaba breve dura

um uacutenico tempo (ldquoLongam esse duorum temporum brevem unius etiam pueri sciuntrdquo ldquoA [siacutelaba] longa

valer dois tempos e a breve um uacutenico ateacute as crianccedilas o sabemrdquo cf Inst orat 9 4 47) logo o daacutectilo pode

ser substituiacutedo pelo espondeu (siacutelaba longa + longa) como mostram terceiro e o quarto peacute do verso Via de

regra eacute indiferente se os primeiros quatro peacutes fazem-se de daacutectilos ou de espondeus O quinto peacute deve ser

daacutectilo o sexto pode ser espondeu (siacutelaba longa + longa) ou troqueu (siacutelaba longa + breve) pois a siacutelaba

final do verso eacute anciacutepite ou seja tanto pode ser longa como breve 353 A traduccedilatildeo citada eacute de Marcos Martinho dos Santos cf Cf SANTOS M M ldquoDa disposiccedilatildeo da Eneida

ou Do gecircnero da Eneida segundo as espeacutecies da Iliacuteada e Odisseiardquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2001 v

5 p 169

123

CANTO lrsquoArme pietose ersquol Capitano

Chersquol gran Sepolcro liberograve di CHRISTO

Molto egli oprograve col senno e con la mano

Molto soffrigrave nel glorioso acquisto

E in van lrsquoInferno vi srsquooppose e in vano

Srsquoarmograve drsquoAsia e di Libia il popol misto

Irsquol Ciel gli diegrave favore e sotto agrave i santi

Segni ridusse i suoi compagni erranti 354

CANTO as Armas piedosas e o Capitatildeo

Que o gratildeo Sepulcro libertou de CRISTO

Muito ele obrou com senso e com a matildeo

Muito sofreu na gloriosa conquista

E em vatildeo o Inferno se lhe opocircs e em vatildeo

Se armou de Aacutesia e de Liacutebia o povo misto

E o Ceacuteu lhe deu favores e sob os santos

Sinais agrupou os seus soacutecios errantes355

Interessa que Torquato Tasso confira pureza (katharotēs) ao primeiro verso da

proposiccedilatildeo da Gerusalemme liberata apartando-se dos exempla de Homero de Virgiacutelio

e de Luiacutes de Camotildees no gecircnero de poema heroico Supondo-se com Demeacutetrio que a

narraccedilatildeo em vista da tenuidade de kharaktēr possa ser iniciada ou pelo nominativo ou

pelo acusativo a fim de se evitarem usos obscuros (cf DEMETR 201) supondo-se

ademais que o gecircnero de poema visite variegadas formas de dizer na enformaccedilatildeo

estiliacutestica do misto de feiccedilatildeo elevada nada deve estranhar no que a oitava citada daacute a ler

354 Cf Gierusalemme liberata poema heroico del Sig Torquato Tasso Al Sereniss Signore il Signor

Donno Alfonso H DrsquoEste Duc adi Ferrara ampc Tratta del vero Originale Con aggiunta di quanto manca

nellrsquoaltre Edittioni amp con lrsquoAllegoria dello stesso Autore Con Priuilegio di S Santitagrave delle Maestagrave

Christianissima amp Catholica della Sereniss Signoria di Venetia del Sereniss Sig DVCA di Ferrara amp drsquoaltri Principi In Ferrara 1581 p 1 Em epiacutestola datada do ano de 1575 endereccedilada a Scipione Gonzaga

Torquato Tasso apresenta variante dos versos iniciais da Gerusalemme liberata em que o acusativo abre o

poema ldquoLrsquoarme pietose e i Cavalieri i canto Che de la croce si segnar di Cristo Quantrsquooperar sotto

Goffredo e quanto Seco soffrir nel glorioso acquistordquo cf Discorsi del Signor Torquato Tasso DellrsquoArte

Poetica et in particolare del Poema Heroico Et insieme il Primo Libro delle Lettere scritte agrave diuersi suoi

amici lequali oltra la famigliaritagrave sono ripiene di molti concetti amp auertimenti poetici agrave dichiaratione

drsquoalcuni luoghi della sua Gierusalemme liberata Gli uni e lrsquoaltre scritte nel tempo chrsquoegli compose detto

suo Poema Non piu stampati Con Privilegi In Venetia MDLXXXVII [1587] Ad instanza di Giulio

Vassalini Libraro agrave Ferrara pp 34r-34v 355 Traduccedilatildeo nossa Verto a oitava de Torquato Tasso mirando apenas a sintaxe e o iniacutecio direto que abdica

do acusativo

124

Eacute sabido que nos Discorsi del poema heroico Torquato Tasso afirma da propositio da

Eneida que ldquoVirgilio accoppiograve lrsquoalto stile e lrsquoillustre nella propositionerdquo (Virgiacutelio

conjugou o estilo alto e o ilustre na proposiccedilatildeo) e mais que ldquosimili sono i seguenti versi

e sempre haurebbe continuato nella medesima altezza e nel medesimo splendore

srsquoalcuna volta non hauesse voluto variar le forme del parlarerdquo (semelhantes satildeo os

seguintes versos e continuaria sempre na mesma alteza e no mesmo esplendor se natildeo

quisesse por vezes variar as formas do dizer)356 Assim conforme o Peri ideōn Virgiacutelio

mira com ldquoArma uirumque canordquo a altezza (megethos) e o splendore (lamprotēs) 357 a

altezza da lexis respeitante agrave mateacuteria beacutelica e heroica e o splendore da construccedilatildeo obliacutequa

como que avesso tal como a peribolē agrave pureza (cf HERM 267 17-268 20) Todavia

deve-se natildeo renunciar agrave variaccedilatildeo como Virgiacutelio natildeo segue sem ldquovariar le forme del

parlarerdquo tambeacutem Torquato Tasso

Lo stile Heroico egrave in mezo quasi fragrave la semplice grauitagrave del Tragico e

la fiorita uaghezza del Lirico amp auanza lrsquouna e lrsquoaltra nello splendore

drsquouna merauigliosa maestagrave ma la maestagrave sua di questa egrave meno ornata

[] 358

O estilo Heroico estaacute como que no meio entre a simples gravidade do

Traacutegico e a florida vagueza do Liacuterico amp avanccedila uma e outra no

resplendor de uma maravilhosa majestade mas a sua majestade eacute

menos ornada do que daquela []359

Por fim a liccedilatildeo de Torquato Tasso eacute manifesta depois de pormenorizadas as

distinccedilotildees estiliacutesticas entre o heroico o eacutepico o liacuterico e apontadas as vizinhanccedilas da

ordem da forma e da ideia entre esses gecircneros de poema ldquoQuesta uarietagrave di stili deue

essere usata ma non si che si muti lo stile non mutandosi le materie che saria

356 Cf Discorsi del poema heroico del S Torquato Tasso Allrsquoillustrissmo e reverendissmo Signor Cardinale

Aldo Brandino Nella Stamparia dello Stigliola In Napoli Ad instantia di Paolo Venturino [1594] p 107 357 Note-se ldquoaltezzardquo eacute termo que se pode aplicar como equivalente ao latim sublimis ao grego ὕψος (hypsos) cf Dionigi Longino Retore DellrsquoAltezza del dire tradotto dal greco da D Niccolo Pinelli In

Padoua per Giulio Criuellari 1639 Con Licenza dersquo Superiori 358 Cf Discorsi del Signor Torquato Tasso DellrsquoArte Poetica et in particolare del Poema Heroico Et

insieme il Primo Libro delle Lettere scritte agrave diuersi suoi amici lequali oltra la famigliaritagrave sono ripiene

di molti concetti amp auertimenti poetici agrave dichiaratione drsquoalcuni luoghi della sua Gierusalemme liberata

Gli uni e lrsquoaltre scritte nel tempo chrsquoegli compose detto suo Poema Non piu stampati Con Privilegi In

Venetia MDLXXXVII [1587] Ad instanza di Giulio Vassalini Libraro agrave Ferrara p 25 359 Traduccedilatildeo nossa

125

imperfetione gratildedissimardquo isto eacute ldquoEsta variedade de estilos deve ser usada mas natildeo tanto

que se mude o estilo sem que se mudem as mateacuterias o que seria imperfeiccedilatildeo

grandiacutessimardquo360

No mais Hermoacutegenes prescreve a fim de efetuar a katharotēs o emprego de kōla

breves agrave maneira de kommata (cf HERM 232 4-6) Itere-se dos kōla natildeo haacute definiccedilatildeo

no Peri ideōn Satildeo poreacutem bem determinados em outro tratado atribuiacutedo a Hermoacutegenes

o Peri heureseōs Nele o retor aborda o pneuma o ldquosoprordquo que nos kōlaou nos kommata

abarca a completude de um pensamento ( Por komma no singular entende a

porccedilatildeo de texto cuja medida varia de quatro a seis siacutelabas tal qual o epodo Por kōlon

tambeacutem no singular a porccedilatildeo que varia de sete a doze siacutelabas como o triacutemetro iacircmbico

ateacute mesmo prolongadamente agraves dezessete siacutelabas do hexacircmetro (cf HERM 183 10)361

360 Idem p 26 361 De acordo com Heinrich Lausberg eacute noccedilatildeo de vaacuterias liccedilotildees Lecirc-se em Aristoacuteteles (cf ARIST

Rhet III 9 5) colon em Caio Juacutelio Victor (cf VICT 22 p 439 20) e membrum no Anocircnimo (cf Rhet Her

4 19) em Ciacutecero (cf CIC Or 62 211) e em Quintiliano (cf QUINT 9 4 22) Eacute termo por que Aristoacuteteles

designa parte do periacuteodo () (cf ARIST Rhet III 9 5) embora tambeacutem seja empregado para referir

oraccedilotildees completas seja uacutenicas e independentes seja concatenadas numa seacuterie de oraccedilotildees de mesma

natureza como mostra o adveacuterbio latino membratim [ldquode membro em membrordquo ldquoem frases curtasrdquo]

derivado do substantivo membrum (cf QUINT 9 4 126 127 CIC Or 66 222 67 224) Acentua Lausberg

que como parte do periacuteodo o pode abarcar toda uma oraccedilatildeo ou apenas um grupo de palavras e

obviamente como parte natildeo enuncia pensamento sintaticamente de todo independente

Segundo o Peri hermēneias em termos semacircnticos o deve encerrar ldquoum pensamento

inteira e completamente seja ele todo seja toda uma parte delerdquo (DEMETR 1-3) cf Cf FREITAS G A DE

Sobre o Estilo de Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo e estudo introdutoacuterio do

tratado) Satildeo Paulo [UFMG] 2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p I Esse tratado traz um exemplo da

Anabase de Xenofonte Cito-o jaacute na traduccedilatildeo de Gustavo de Freitas ldquoDario e Parisaacutetide tiveram dois filhos

o mais velho Artaxerxes o mais novo Cirordquo (XEN Anab 11) O trecho eacute assim compreendido 1ordm membro

[Dario e Parisaacutetide tiveram dois filhos] 2ordm membro [o mais velho Artaxerxes o mais novo Ciro] Como assevera Freitas citando George M A Grube natildeo se trata de trecircs membros como se poderia em princiacutepio

supor porque ldquoo mais velho Artaxerxesrdquo e ldquoo mais novo Cirordquo satildeo passos enredados numa relaccedilatildeo os

quais isolados natildeo teriam autonomia de sentido (cf FREITAS G A DE Op Cit p LXVII cf sect 930)

Ademais segundo Lausberg consoante o que se lecirc em Hermoacutegenes informa que os podem

ser longos ou breves Quando breves dizem-se cf sectsect 928-934) Em analogia com a versificaccedilatildeo

poeacutetica o estudioso recorda Ciacutecero (CIC Or 66 222) e indica que o membro estaacute para o verso assim como

o inciso estaacute para a fraccedilatildeo de verso separada por cesura e o periacuteodo para a estrofe LAUSBERG H Manual

de Retoacuterica Literaria Fundamentos de una Ciencia de la Literatura Versioacuten espantildeola de Joseacute Peacuterez Riesco

Madrid Editorial Gredos 1967 3 tomos tomo II pp 310-6 Em liacutengua portuguesa komma e kōlon satildeo categorias gramaticais definidas na Grammatica da

lingua Portuguesa de Joatildeo de Barros (1496-1570) impressa em Lisboa em 1540 e na Orthographia da

lingoa portuguesa de Duarte Nunes de Leatildeo (ca 1530-1608) impressa em 1576 Joatildeo de Barros escreve

ldquoCotildema ę uocaacutebulo grego aque podemos chamaacuter cortadura por que aly se coacuterta a clausula ẽ duas partes

Estas duas partes se coacutertam em uirgulas que sam hũas distinccedilotildees das paacutertes da clausula Coacutelo ę o termo

ou maacuterco em que se acaacuteba a claacuteusula As figuras de cada ponto destes sam as seguintes Dous a este modo

se chamam cotildema Este soacute se chama coacutelo As uergas sam estas zeburas ao modo dos gregos Na cotildema parece

que descansa a voacutez mas nam fica o intendimẽto satisfeito por que se deseia a outra paacuterte com a oacuteraccedilaacutem

fica perfeita e remataacuteda com este ponto coacutelo Estam entre as cortaduras que sam estes dous pontos hũas

zeburas assy aque chamaacutemos distinccedilotildees das paacutertes da clausula Este soacute potildeto (como iaacute disse) se chama coacutelo

As palaacuteuras que iaacutezęm entre dous coacutelos se chamam clausula ao noacutesso modo e segundo os gregos periodo

126

Dessa liccedilatildeo ao que se pode supor decorre sistematizaccedilatildeo em latim que ensina

Jorge de Trebizonda no seacuteculo XV Para ele o kōlondiz-se ldquomẽbrumrdquo e assim eacute definido

est uno spiritu prolata oratio quaelig tamen sententiam uel partem eius

breuiter absque interuallo absoluit Membrorum uerograve quaelig breuiora

sunt ut puta quaelig duodecim syllabarũ numerum non excedũt

id est incisiones Graeligco uocabulo nominentur quaelig longiora sunt

membra nuncupentur 362

eacute discurso proferido num soacute sopro que brevemente encerra todo o

pensamento ou parte dele sem pausa Na verdade a respeito dos

membros aqueles que satildeo mais breves por exemplo que natildeo excedem

o nuacutemero de doze siacutelabas satildeo chamados em liacutengua grega kommata

isto eacute incisos os que satildeo mais longos satildeo designados membros 363

Filiberto Campanile como amiuacutede faz segue Jorge de Trebizonda de perto

Membro egrave quel parlare fatto quasi ad vn fiato il quale dichiara o tutta

la sentenza ouero vna parte di quella e quando sia piu breue si

chiameragrave inciso ouer tronco quando piu lungo ritiene il suo nome di

membro 364

Membro eacute aquele discurso feito num sopro que declara ou todo o

pensamento ou parte dele e quando eacute mais breve se chama inciso ou

tronco quando mais longo conserva o nome de membro 365

aque os latinos chamam termo Os dous aacutercos que fazem estas palauras (como ia diszlige) usam os latinos

quando comętem hũa figura aque chamam Entreposiccedilam e os gregos parẽtesis daqual tratamos na

construiacuteccedilamrdquo cf Grammatica da lingua Portuguesa Olyssippone Apud Lodiuicum Rotorigiũ Typographum M D XL [1540] p 50 cf Orthographia da lingoa portuguesa obra vtil amp necessaria assi

pera bem screuer a lingoa Hespanhol como a Latina amp quaesquer outras que da Latina teem origem Item

hum tractado dos pontos das clausulas pelo licenciado Duarte Nunez do Liatildeo Em Lisboa per Ioatildeo de

Barreira M D LXXVI [1576] p 74r-76v 362 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 498 363 Traduccedilatildeo nossa 364 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 13 365 Traduccedilatildeo nossa

127

Hermoacutegenes acrescenta tornam puras as ideai os arranjos sintaacuteticos soltos e os

ritmos de mesma espeacutecie que deles decorrem (cf HERM 229 11-13) Na liccedilatildeo grega tal

como jaacute referido ora diz-se synthesis(cf HERM 218 23)ora diz-se synthēkē(cf HERM

219 14) Consoante a latinizaccedilatildeo proposta por Jorge de Trebizonda eacute collocatio e dessa

maneira trata-se de ldquodictionũ numerosa compositiordquo (composiccedilatildeo riacutetmica de palavras)

Na versatildeo de Filiberto Campanile eacute compositione e assim eacute constituinte por meio do

qual pode o orador ou o poeta ldquocollocare amp ordinare delle parole col suo numerordquo

(colocar amp ordenar as palavras com seu ritmo)366 De acordo com o tratadista a pureza

de sintaxe eacute simples e consente o hiato intervocaacutelico porque o preceito de evitaacute-lo

manifesta diligecircncia mais afeita agrave ornamentaccedilatildeo que agrave katharotēs e recomenda o texto

prosaico em que sobressaia a prosoacutedia iacircmbica ou trocaica em mescla com diferentes peacutes

como o daacutectilo e o espondeu de modo que natildeo se estabeleccedila a regularidade do verso mas

a meacutetrica de feiccedilatildeo corrente que dissimule o artifiacutecio O ritmo que o arranjo puro e a pausa

(anapausis) produzem conveacutem que esteja entre o metro ausente e o metro por natureza

da liacutengua grega (cf HERM 232 8-233-2) Note-se trata-se do iambo de acordo com

Aristoacuteteles e Demeacutetrio (cf ARIST Poet 4 1449 a DEMETR 42) Satildeo semelhantes as

colocaccedilotildees de Ciacutecero em relaccedilatildeo ao latim (cf CIC Or 56 189 57 191) Gabriele Zinano

o itera como referido no Sommarii di varie retoriche greche latine et volgari 367

Acrescente-se Hermoacutegenes pondera que embora synthesis (ou synthēkē)

anapausis e rhythmos concorram agrave efetuaccedilatildeo da pureza satildeo de contribuiccedilatildeo restrita Natildeo

haacute exemplos em Filiberto Campanile que avancem a interpretaccedilatildeo da liccedilatildeo grega Vale

rememorar que o grego anapausis verte-o Jorge de Trebizonda por clausula e assim

define ldquoClausula est uniuscuiusq orationis aut etiatilde membri numerosa dispositiordquo

(Claacuteusula eacute disposiccedilatildeo riacutetmica de cada discurso ou ateacute mesmo dos membros)368 Filiberto

Campanile propotildee ldquoIl Posamento saragrave la chiusa o termine numeroso di ciascun parlarerdquo

(A pausa seraacute o remate ou o termo riacutetmico de cada discurso)369 Jaacute rhythmos eacute o derradeiro

366 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 13 367 Cf Sommarii di varie retoriche greche latine et volgari Distintamente ordinati in uno da Gabriele

Zinano In Reggio Apresso Hercoliano Bartholi 1590 p 198 368 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 498 369 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 13

128

elemento de que se faz a lexisEacute constituinte que o latim numerus designa e assim Jorge

de Trebizonda define ldquoNumerus est quaelig ex obseruatione collocationis atque clausulaelig

pedum conficitur orationis sonoritas atque modulatiordquo (Ritmo eacute sonoridade e modulaccedilatildeo

do discurso que se elabora a partir da observaccedilatildeo da colocaccedilatildeo e dos peacutes da claacuteusula)370

Em italiano decalca-se o latim e define Filiberto Campanile numero como ldquoquel suono

che nasce dalla compositione amp ordine tanto delle parole sillabe amp elementi quanto

dersquo membri conueniente perograve alla sentenza di ciascuna cosardquo (aquele som que nasce da

composiccedilatildeo e da ordenaccedilatildeo tanto das palavras siacutelabas e letras quanto dos membros

conveniente poreacutem ao pensamento de cada coisa)371

Sabe-se bem efetua-se a saphēneia mediante duas ideai que lhe satildeo subordinadas

katharotēs e eukrineia No que concerne agrave eukrineia espeacutecie restante espeacutecie auxiliar o

Peri ideōn o aponta haacute sobretudo operaccedilatildeo de methodos (cf HERM 226 17-18 235 8-

9) constituiacutedo nas liccedilotildees de Hermoacutegenes como ldquomodo de apresentaccedilatildeo dos

pensamentosrdquo 372 o que significa na anaacutelise de Michel Patillon ldquoorganizar os

pensamentos segundo um plano claro e dar a ver claramente o plano segundo o qual se

sucedem os elementos do discursordquo373 Concede Hermoacutegenes a bem dizer agrave luz de

exemplos recolhidos em Demoacutestenes que seja possiacutevel engenhosamente desrespeitar o

plano anunciado sem comprometer a clareza do methodos (cf HERM 235 14-17)

Recorde-se trata-se tambeacutem da constituiccedilatildeo de enunciado artificial e convencionalmente

kata physin ou seja ldquoconforme a naturezardquo (cf HERM 237 20) o que pressupotildee na

praacutetica do relato a ordenaccedilatildeo cronoloacutegica das accedilotildees narradas e no seio das provas antes

as objeccedilotildees que as refutaccedilotildees (cf HERM 238 11) Ademais as ennoiai proacuteprias da

eukrineia satildeo ditas metaloacutegicas por Michel Patillon374 visto que preceitua Hermoacutegenes

devam operar pelo anuacutencio dos propoacutesitos da enunciaccedilatildeo pela conduccedilatildeo do discurso a

um ponto de partida (cf HERM 236 16-17) 375 pela apresentaccedilatildeo do que se enunciaraacute e

dos modos como isso se faraacute (cf HERM 236 21-22) pelas recapituaccedilotildees (cf HERM 237

370 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In Officina Christiani

Wecheli M D XXXVIII [1538] p 498 371 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori pp 13-4 372 Cf HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel

Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 340 373 Idem ibidem 374 Cf HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel

Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 343 375 Idem ibidem Segue-se de perto Michel Patillon aqui

129

8) No que se refere agrave lexis nada haacute no Peri ideōn para a enformaccedilatildeo da saphēneia aleacutem

dos preceitos de composiccedilatildeo da katharotēs O mesmo vale para os kōla a synthesis (ou

synthēkē) a anapausis e o rhythmos O uso de figuras (skhēmata) distintamente ganha

aditamentos normativos Isso significa convecircm para os devidos efeitos a definiccedilatildeo por

agrupamento (cf HERM 238 17-18 ldquoto katrsquoatroisin hōrismenonrdquo ldquodeacutefini par

regroupementrdquo 376 ldquodefinicioacuten por agrupamientordquo377) a distribuiccedilatildeo (cf HERM 238 22

ldquomerismosrdquo ldquodistributionrdquo 378 ldquodistribucioacutenrdquo379 ) a enumeraccedilatildeo (cf HERM 238 22

ldquoaparithmēsisrdquo ldquoeacutenumeacuterationrdquo380 ldquoeacutenumeacuteracioacutenrdquo381) a assim chamada pergunta retoacuterica

(cf HERM 239 7-14) e a repeticcedilatildeo (cf HERM 239 14 ldquoepanalēpsisrdquo ldquoreprisesrdquo382

ldquorepeticionesrdquo383)384

376 Idem ibidem 377 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 p 121 378 Cf HERMOGENE Lrsquoart rheacutetorique p 344 379 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo p 121 380 Cf HERMOGENE Lrsquoart rheacutetorique p 344 381 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo 1993 p 121 382 Cf HERMOGENE Lrsquoart rheacutetorique p 344 383 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo p 122 384 Dando versatildeo italiana ao preceito Gabriele Zinano no jaacute referido Sommarii di varie retoriche greche

latine et volgari emprega o substantivo ldquofacilitagraverdquo para traduzir eukrineia Note-se eacute eleiccedilatildeo que dista da

escolha de seus contemporacircneos Giulio Camillo Delminio e Filiberto Campanile para quem eukrineia eacute

lucidezza Resume-se assim a facilitagrave

ldquoIn questa forma le parole i membri la compositione il finimento amp il numero sono simili agrave quelli della

puritagrave

I concetti non si contentano drsquoesser agrave i puri perche hanno un non sograve che di piugrave come il ridurre al principio

Demostene Ma egrave necessario ograve Ateniensi chrsquoio ui riduca memoria amp altri si fatti

I modi sono quelli corsquo quali srsquovsa la cosa secondo la sua natura amp pongono le cose prime in prima amp le seconde secondariamente amp prima le oppositioni fanno amp poi le solutioni

La figura deue hauer vna certa repetitione che con questo essempio di Demostene si manifestaragrave

Certamente il mostrar le forze di Filippo amp con tale ragionamento esortar uoi agrave far quello che ui si

conuiene non mi par che stia bene Per qual cagione perche tutto quello che si dicesse di questa materia

crederei che fosse per portare honore agrave lui agrave noi piugrave tosto qualche biasmo perche quanto piugrave hagrave fatto cose

sopra il grado suo tanto piugrave egrave merauglioso agrave gli huomini uoi quanto peggio che non doueuate uisete

gouernati tanto maggior uergogna hauete riceuuto Queste cose adunque permetterograve io Cosi dicendo

Demostene ci manifesta figuratamente il suo pensiero amp tanto piu soggiongendo Perograve che se seueramente

si uorragrave considerare ograve Ateniesi si uedragrave che costui notilde egrave diuenuto gratildede da se stesso ma fatto da uoi ampc Si

conuiene ancora agrave questa figura la interrogatione amp la risposta Lrsquoordinatione del parlare che hagrave di

necessitagrave quelche cosa come Costui notilde solo le discordie ciuili acquetograve ma le guerre esterne felicemente estinse La diuisione amp distribuitione come Si lrsquoingegno de gli eloquenti se i fauore de gli amici se

lrsquoautoritagrave de i giudici valessero Cornelio hauria vinta la causa Ma non piugrave di questa figurardquo cf Sommarii

di varie retoriche greche latine et volgari Distintamente ordinati in uno da Gabriele Zinano In Reggio

Apresso Hercoliano Bartholi 1590 pp 198-201 cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto

Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile

MDCVI Con licenza dersquo superiori p 22 cf Il secondo tomo dellrsquoopere di M di Giulio Camillo Delminio

cioegrave La Topica ouero dellrsquoElocutione Discorso sopra lrsquoIdee di Hermogene La Grammatica Espositione

sopra il primo amp secondo Sonetto del Petrarca Nvovamente dato in lvce Con privilegio In Venegia

apresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLX [1560] p 116 cf Le Idee ouero Forme della oratione da

Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M Giulio Camillo Delminio Friulano A queste

srsquoaggiunge lrsquoArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal detto M Giulio Camillo Opere novamente

130

Itere-se a saphēneia eacute retoricamente necessaacuteria mas natildeo basta Isso significa a

elaboraccedilatildeo decorosa dos discursos mistos supotildee a visita agraves demais ideai Nisso o Peri

ideōn eacute repetitivo Essa visita tomem-se como exemplo outras ideai primaacuterias a saber

megethos kallos gorgotēs ēthos e alētheia eacute da ordem da necessidade da utilidade da

adequaccedilatildeo Sabe-se bem no ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos atualiza-se o

preceito pela afirmaccedilatildeo de que a Ulyssea ou Lisboa Edificada aleacutem da ldquoclaridaderdquo da

ldquoenargiardquo da ldquoeuidencia no dizerrdquo da ldquoSaphiniardquo compotildee-se como obra mista da

ldquograndeza do estilordquo da ldquofermosurardquo da ldquobreuidaderdquo e das demais formas discursivas

referidas pelo apologista de Gabriel Pereira de Castro agrave luz de Hermoacutegenes Essa visita

agraves demais ideai o tratado grego assim a codifica na medida em que pode o discurso

vergar-se ao vulgar ldquoto eutelēsrdquo (ldquo εὐτελήςrdquo) e ao rasteiro ldquotapeinonrdquo (ldquoταπεινόνrdquo)

quando demasiadamente claro conveacutem acrescentar agrave saphēneia algo que lhe decirc grandeza

(megethos) majestade (axiōma) amplitude (onkos) Precisamente Hermoacutegenes entende

haver relaccedilatildeo de oposiccedilatildeo entre eutelēs e megethos (cf HERM 241 11-15) 385 A

interpretaccedilatildeo de Filiberto Campanille mostra-o explicitamente

[] perche la troppa chiarezza potrebbe rendere humile e vile il parlare

hauragrave tal volta bisogno drsquovn certo peso chrsquoegrave propriamente la

grandezza []386

[] porque a excessiva clareza poderia tornar humilde e vil o discurso

haveraacute desta vez necessidade de um certo peso que eacute propriamente a

mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C

XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 4 385 Giulio Camillo Delminio assim escreve ldquoDopporsquol trattato della Chiarezza [ή]

conseguentemente parlaremo della Grandezza [] della oratione perche eacute forza [ἀναγκαῖόν ἐστι]

che al parlare di chiarezza sia senza dubbio Grandezza amp per cosigrave dire vno cotal tumore [ὄγκος] amp

dignitate [ἀξίωμα] percioche ad vn parlare fuor di modo chiaro farebbe aggiunta imperfetionne che egrave

contraria alla Grandezzardquo Diga-se a ldquoimperfetionne che egrave contraria alla Grandezzardquo na liccedilatildeo grega do

texto faz referecircncia a ldquo εὐτελήςrdquo cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate

amp ridotte in questa lingua per M Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della

Bucolica di Virgilio spiegato dal detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio

Domenico Salomoni Al Sigr Andrea Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave

Catholico amp con pena di scommunica Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso

Gio Battista Natolini p 8 386 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori pp 5r-

v

131

grandeza [] 387

Itere-se a ideia de megethos no Peri ideōn compotildee-se de formas discursivas

ancilares a saber semnotēs trakhytēs sphodrotēs lamprotēs akmē e peribolē (cf HERM

242 4-5) Operaacute-las no corpo do preceito eacute esquivar-se ao vulgar e ao rasteiro natildeo

apenas em termos elocutivos Acentua o entendimento do preceito Francisco Porto na

epiacutestola biliacutengue destinada ao editor protestante Jean Crespin (1520-1572) que abre a

ediccedilatildeo Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices

magistri Francisci Porti Cretensis opera industriaque illustrati atque expoliti (1569)

pois que se afirma em nota agrave margem ldquodebet autem oratio esse perspicua amp non humilisrdquo

ou seja ldquoora deve o discurso ser claro amp natildeo humilderdquo 388 O comentaacuterio recorda

textualmente em grego passo do livro terceiro da Retoacuterica de Aristoacuteteles ldquodei saphē kai

mē tapeinēn einairdquo (ARIST Rhet 3 12 1414 a 20 ldquoδεῖ σαφῆ καὶ μὴ ταπεινὴν εἶναιrdquo)

em traduccedilatildeo lusa de Manuel Alexandre Juacutenior Paulo Farmhouse Alberto e Abel do

Nascimento Pena ldquoeacute forccediloso ser claro e natildeo rasteirordquo de modo que se faccedila penetrar na

leitura do Peri ideōn a saphēneia tal como pensada por Aristoacuteteles

Eacute preciso lembrar que com a Poeacutetica e a Retoacuterica aristoteacutelicas letrados como

Francisco Porto que operam a permeabilidade dos preceitos de Hermoacutegenes e de

Aristoacuteteles aprenderam que peregrino (γλῶττα) eacute o vocaacutebulo estrangeiro (ξενικν) o

metafoacuterico (μεταφορά) e o alongado (ἐπεκτεταμένον) (cf ARISTOT Poet 22 1458 a

20-23) ou seja que peregrino eacute todo vocaacutebulo que se desvia do uso corrente (κύριον) e

cujo emprego afasta a poesia do vulgar do banal do comum da elocuccedilatildeo (τ ἰδιτικν)

como que do grau zero da lexis e a faz nobre (σεμν) e a ornamenta (cf ARISTOT Poet

22 1458 a 21 ARISTOT Rhet 3 2 1404 b 9-10) Recorde-se que o adjetivo ldquosemnosrdquo

empregado por Aristoacuteteles emprega-o Hermoacutegenes no campo semacircntico da semnotēs em

referecircncia a uma categoria estiliacutestica de circunscriccedilatildeo precisa cujo efeito seja a elevaccedilatildeo

retoacuterica do discurso

Reitere-se que conforme o Aristoacuteteles recuperado por Francisco Porto eacute virtude

da lexis ser clara (σαφ) sem ser chatilde rasteira (ταπειν) ser peregrina sem ser

387 Traduccedilatildeo nossa 388Cf Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices magistri Francisci

Porti Cretensis opera industriaacuteque illustrati atque expoliti Genevaelig apvd I Crispinvm MDLXIX [1569]

sp

132

enigmaacutetica nem baacuterbara pois que no enigma (αἴνιγμα) predominam as metaacuteforas e no

barbarismo (βαρβαρισμός) os vocaacutebulos estrangeiros (cf ARISTOT Poet 22 1458 a 17-

33) de modo que para Aristoacuteteles convecircm as misturas vocabulares que equilibrem os

termos correntes com os peregrinos 389 A liccedilatildeo da Poeacutetica prevecirc que empregar

adequadamente (πρεπόντως) os vocaacutebulos peregrinos sobretudo as metaacuteforas eacute sinal

de pendor do poeta (εὐφα) (cf ARISTOT Poet 22 1459 a 6) Empregaacute-los

inadequadamente (ἀπρεπῶς) em contrapartida de acordo com Aristoacuteteles se constitui

como deformaccedilatildeo ridiacutecula (cf ARISTOT Poet 22 1458 b 11 14 ldquoγελοῖονrdquo ldquoγελοῖαrdquo)

cujo efeito pode-se depreender das liccedilotildees da Retoacuterica eacute a lexisfriacutegida (ψυχρά)

contrafaccedilatildeo viciosa da nobreza e da ornamentaccedilatildeo do discurso (cf ARISTOT Rhet 3 3

1)

Esses passos da Poeacutetica que regulam as virtudes da lexis refere-os Francisco de

Quevedo (1580-1645) na epiacutestola a Gaspar de Guzmaacuten o Conde-Duque de Olivares

epiacutestola ldquoAl Excelentiacutessimo sentildeor Conde Duque Gran Canciller mi sentildeorrdquo390 que

introduz as Obras propias y traducciones latinas griegas y Italianas de Fray Luis de

Leoacuten (ca 1527-1591) estampadas em Madri em 1631 A liccedilatildeo apresenta-se em latim

em concordacircncia com a ediccedilatildeo biliacutengue de Aristoacuteteles greco-latina elaborada por

Alessandro Pazzi em ediccedilatildeo primeira de 1536391

Dictionis autem virtus amp perspicua sit non tamen humilis quaelig igitur

ex proprijs nominibus constabit maximegrave perspicua erit humilis tamen

exemplum sit Cleophontis Stheneli quaelig poesis illa veneranda amp omne

389 Cf ARIST Poet 22 1458 a 30-4 ldquoεῖ ἄρα κεκρᾶσθαί πως τούτοις τὸ μὲν γὰρ τὸ μὴ ἰδιωτικὸν

ποιήσει μηδὲ ταπεινόν οἷον ἡ γλῶττα καὶ ἡ μεταφορὰ καὶ ὁ κόσμος καὶτἆλλα τὰ εἰρημένα εἴδη τὸ δὲ κύριον τὴν σαφήνειανrdquo [Necessaacuteria seraacute portanto como que a mistura de toda espeacutecie de vocaacutebulos

Palavras estrangeiras metaacuteforas ornatos e todos os outros nomes de que falamos elevam a linguagem acima

do vulgar e do uso comum enquanto os termos correntes lhe conferem a clareza] cf ARISTOacuteTELES Poeacutetica

Traduccedilatildeo de Eudoro de Souza 2ordf ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ars Poetica 1993 p 115 390 Cf ELLIOTT J H ldquoQuevedo and the Count-Duke of Olivaresrdquo in IFFLAND J (Org) Quevedo in Perspective Newark Delaware Juan de la Cuesta 1982 pp 227-50 391 Em Alessandro Pazzi lecirc-se ldquoDictionis aũt uirtus ut perspicua sit non tamen humilis quaelig igitur ex

proprijs nominibus constabit maxime perspicua erit humilis tamen exemplum sit Cleophontis Stheneliq

quaelig poesis illa ueneranda amp omne prorsus plebeium excludens quaelig peregrinis utetur uocabulis

Peregrinum uoco uarietatem linguarum translationem extensionem tam quodcumque agrave proprio alienum

estrdquo A despeito da pontuaccedilatildeo haacute uma uacutenica variante entre a liccedilatildeo de Alessandro Pazzi e a de Francisco de

Quevedo o adveacuterbio ldquoprorsusrdquo (inteiramente) que modifica o sentido de ldquoexcludensrdquo fazendo-lhe intenso

vigoroso ldquoProrsusrdquo eacute presente no primeiro ausente no segundo em Pazzi lecirc-se ldquoque exclui inteiramente

tudo o que eacute plebeurdquo (omne plebeium excludens) ao passo que em Quevedo lecirc-se ldquoque exclui tudo o que

eacute plebeurdquo (omne prorsus plebeium excludens) cf Aristotelis poetica per Alexandrum Paccium patritium

Florẽtinum in Latinum conversa Basileaelig M D XXXVII [1537] p 48

133

plebeium excludens quaelig peregrinis utetur vocabulis peregrinum voco

varietatem linguarum translationem extensionem tam quodcumque aacute

proprio alienum est392

E tambeacutem em espanhol

La virtud de la diccion ha de ser perspicua no humilde la que constare

de nombres propios seraacute perspicua sea exemplo de la humilde la

Poesia de Cleofonte y de Stenelo aquella es venerable y excluye todo

lo que es plebeyo que usa de vocablos peregrinos peregrino llamo la

variedad de lenguas translacion extension y todo lo que es ageno de

lo propio393

A virtude da dicccedilatildeo haacute de ser perspiacutecua natildeo humilde A que constar de

nomes proacuteprios seraacute perspiacutecua seja exemplo da humilde a poesia de

Cleofonte e de Esteacutenelo aquela eacute veneraacutevel e exclui tudo o que eacute plebeu

que usa de vocaacutebulos peregrinos peregrino chamo a variedade de

linguas a translaccedilatildeo a extensatildeo e tudo o que eacute alheio ao proacuteprio394

Ora para Francisco de Quevedo assim como para Francisco Porto trata-se de

asseverar a clareza a perspicuitas a perspicuidade como lexeōs de aretē (ldquoέξεως δέ

αρετήrdquo) ou seja como ldquovirtud de la diccionrdquo395 O preceito inscrito na dedicatoacuteria agraves

392 Alessandro Pazzi traduz o seguinte passo da Poeacutetica (cf ARISTOT Poet 22 1458 a 18-23) ldquoλέξεως δὲ ἀρετὴ σαφῆ καὶ μὴ ταπεινὴν εἶναι σαφεστάτη μὲν οὖν ἐστιν ἡ ἐκ τῶν κυρίων ὀνομάτων ἀλλὰ ταπεινή παράδειγμα δὲ ἡ Κλεοφῶντος ποίησις καὶ ἡ Σθενέλου σεμνὴ δὲ καὶ ἐξαλλάττουσα τὸ ἰδιωτικὸν ἡ τοῖς ξενικοῖς κεχρημένη ξενικὸν δὲ λέγω γλῶτταν καὶ μεταφορὰν καὶ ἐπέκτασιν καὶ πᾶν τὸ παρὰ τὸ κύριονrdquo Assim Eudoro de Souza o traduz ldquoQualidade essencial da elocuccedilatildeo eacute a clareza sem

baixeza Clariacutessima mas baixa eacute a linguagem constituiacuteda por vocaacutebulos correntes como as composiccedilotildees

de Cleofonte e Estecircnelo Pelo contraacuterio eacute elevada a poesia que usa de vocaacutebulos peregrinos e se afasta da

linguagem vulgar Por vocaacutebulos lsquoperegrinosrsquo entendo as palavras estrangeiras metafoacutericas alongadas e

em geral todas as que natildeo sejam de uso correnterdquo 393 Cf Obras propias y traducciones latinas griegas y Italianas Con la parafrasi de algunos Psalmos y

Capitulos de lob Sacadas de la libreriacutea de don Manuel Sarmiento de Mendoccedila Canonigo de la Magistral

de la santa Iglesia de Sevilla Dalas a la Impression don Francisco de Quebedo (sic) Villegas Imp del

Reyno (Viuda de Luis Saacutenchez) A costa de Domingo Gonccedilalez Madrid 1631 p 2 394 Traduccedilatildeo nossa 395 Liccedilatildeo assemelhada lecirc-se em Joseacute Antonio Gonzaacutelez de Salas (1588-1654) ldquo[Aristoacuteteles] Dice en el

principio de el Cap 22 Es pues la Virtud (por Excelencia como la maior sentildeala esta) de la Locucion que

sea perspicua i clara pero no por esso ha de ser humilde Mostrando assi que ha de ser valiente i alta Lo

mismo observa aun para su Orador dilatadamente el doctissimo Hermogenes en el Libro primero de sus

Ideas Dice pues en uno de muchos lugares Que es sin duda mui necessario que a la Perspicuidad

acompantildee la grande i elevada Alteccedila de la Oracion Pero nueva entiendo que ha de ser esta doctrina para

134

Obras propias y traducciones latinas griegas y Italianas de Fray Luis de Leoacuten prepara-

lhe a recepccedilatildeo e faz delas das obras que o volume recolhe elogiosamente exemplo de

virtude O procedimento natildeo dista do que faz Manuel de Galhegos ao ler Gabriel Pereira

de Castro ou do que faz Fernando de Herrera ao ler Garcilaso de la Vega Na epiacutestola

desde logo se afirma

la diccion es grande propia y hermosa con facilidad de tal casta que

ni se desautoriccedila con lo vulgar ni se haze peregrina con lo impropio

todo su estilo cotilde magestad estudiada es decente a lo magniacutefico de la

sentencia q ni ambiciosa se descubre fuera del cuerpo de la oraciotilde ni

tenebrosa se esconde mejor direacute q se pierde en la cotildefusioacuten afectada de

figuras y en la inũdacioacuten de palabras forasteras 396

a dicccedilatildeo eacute grande propria e bela com facilidade de tal espeacutecie que nem

se desautoriza com o vulgar nem se faz peregrina com o improprio

Todo seu estilo com majestade estudada eacute decente ao magniacutefico da

sentenccedila que nem ambiciosa se descobre fora do corpo da oraccedilatildeo nem

tenebrosa se esconde melhor direi que se perde na confusatildeo afetada de

figuras e na inundaccedilatildeo de palavras estrangeiras397

Isto seja eacute asserccedilatildeo do comedimento como propriedade da lexis como virtude

preciacutepua da dicccedilatildeo de poeta agrave maneira de Fray Luis de Leoacuten no juiacutezo de Francisco de

Quevedo apto a permanecer na exata medida que afasta o vulgar e o peregrino da

construccedilatildeo do ldquoestilo cotilde magestad estudiadardquo Inepto em contrapartida porque

considerado afetado nos termos da epiacutestola aduzida eacute o artiacutefice que se enleva no

desmedido da vulgaridade e da rareza em razatildeo do emprego enigmaacutetico de metaacuteforas ou

baacuterbaro de estrangeirismos Satildeo exemplos de ineacutepcia no passo de Aristoacuteteles relido por

aquellos miseros que torpemente profanos enturbian i obscurecen las fuentes puras i limpias de las Musas

por no ver en ellas representada su ignoratildecia Dos extremos oppuestos juzgaraacuten que aqui Aristoteles junta

Que fea Alto el character de el Stilo i juntamente Claro porque (como tambieacuten en el mismo lugar ensentildea

Hermogenes) Peligra mucho en ser debil la oracion que Clara es i Perspicuardquo cf Nueva ideia de la

tragedia antigua o Ilustracion ultima al libro singular De poetica de Aristoteles Estagirita por Don Iusepe

Antonio Gonccedilalez de Salas En Madrid Lo imprimio Franc Martinez Antildeo MDCXXXIII [1633] pp 83-84 396 Cf Obras propias y traducciones latinas griegas y Italianas Con la parafrasi de algunos Psalmos y

Capitulos de lob Sacadas de la libreriacutea de don Manuel Sarmiento de Mendoccedila Canonigo de la Magistral

de la santa Iglesia de Sevilla Dalas a la Impression don Francisco de Quebedo (sic) Villegas Imp del

Reyno (Viuda de Luis Saacutenchez) A costa de Domingo Gonccedilalez Madrid 1631 pp 2-3 397 Traduccedilatildeo nossa

135

Francisco de Quevedo Cleofonte e Esteacutenelo poetas traacutegicos gregos tidos por ineptos pelo

desmedido da lexis chatilde em gecircnero de poema a trageacutedia elevado Cleofonte refere-o

ademais Aristoacuteteles na Retoacuterica como exemplo de desproporccedilatildeo no emprego da lexis em

decorrecircncia da falta de conformidade (πρέπον) com a mateacuteria (πρᾶγμα) inventada visto

o poeta em vez da altiloquecircncia produzir o registro cocircmico por enunciar algo como

ldquopotnia sykērdquo (πότνια συκῆ) ou melhor ldquoveneraacutevel figueirardquo (cf ARISTOT Rhet 3 7

1408 a 12-16)

Pode-se supor o exemplo eacute paroacutedico como paroacutedicos satildeo os exemplos lidos no

opuacutesculo La cvlta latiniparla de Francisco de Quevedo Sabe-se o autor sob o

pseudocircnimo chistoso de ldquoAldrobando Anathema Cantacuceno graduado em trevas douto

em obscuras natural das soledades de baixordquo398 publicou em Valecircncia depois em

Zaragoza e entatildeo em Madri nos anos de 1629 1630 e 1631 posteriormente ao

falecimento de D Luiacutes de Goacutengora versotildees distintas do opuacutesculo que se consagraria

como La cvlta latiniparla cathecismo de vocablos para instruir agrave las mugeres Cultas y

Hembrilatinas399 saacutetira veemente e feroz ao emprego de palavras peregrinas na poesia de

imitaccedilatildeo gongoacuterica de damas cultas da corte espanhola pejorativamente referidas no

opuacutesculo como ldquoDamas gerigonccedilas que parlan el Alcoran Macarronicordquo

Ora conforme o Tesoro de la Lengua Castellana o Espantildeola de Sebastiaacuten de

Covarrubias Orozco por ldquogerigonzardquo ou ldquogerigonccedilardquo entende-se

vn cierto lenguaje particular de que vsan los ciegos cotilde que se entienden

entre si Lo mesmo tienen los Gitanos y tambien forman lengua los

rufianes y los ladrones que llaman Germania Dixose gerigonccedila quasi

gregigonccedila porque en tiempos passados era tan peregrina la lengua

Griega que aun pocos de los que professauan facultades la entendian

y assi deziatilde hablar Griego el que no se dexaua entender [hellip]400

398 Sobre as diferentes versotildees impressas do texto JAURALDE POU Pablo ldquoTexto fecha y circunstancias

de La Culta Latiniparla de Quevedordquo In Bulletin Hispanique Tome 83 ndeg 1-2 1981 pp 131-143 399 Hembralatino eacute adjetivo formado por composiccedilatildeo hembra (substantivo ldquofecircmeardquo) + latino (adjetivo)

Em portuguecircs trata-se de algo como ldquofemilatinordquo 400 Cf Tesoro de la Lengva Castellana o Espantildeola Compvesto por el licenciado D Sebastian de

Cobarruuias Orozco Capelan de su Magestade Mastrescuela y Canonigo de santa Iglesia de Cuenca y

consultor del santo Oficio de la Inquisicion Dirigido a la Magestad Catolica del Rey Don Felipe III nestro

sentildeor Con Privilegio En Madrid por Luis Sanchez impressor del Rey N S Antildeo del Sentildeor M DC XI

[1611] p 434v

136

uma certa linguagem particular que usam os cegos com que se

entendem entre si Isso tecircm os Ciganos e tambeacutem formam liacutengua os

rufiotildees e os ladrotildees que a chamam germania401 Disse-se gerinccedilonccedila

quase greguingonga porque em tempos passados era tatildeo peregrina a

liacutengua Grega que mesmo os poucos que professavam faculdades a

entendiam e assim diziam falar Grego aquele que natildeo se deixava

entender [hellip]402

Diga-se como equivalente semacircntico de ldquogermaniardquo ldquogerigonccedilardquo eacute acolhe

Sebastiaacuten de Covarrubias Orozco ldquoel lenguage de la rufianesca dicho assi o por q no

los entẽdemos o por la hermatildedad q entre si tienẽrdquo 403 (a linguagem da rufianesca dito

assim ou porque natildeo os entendemos ou pela irmandade que entre si tecircm) Entende-se

ldquogerigonccedilardquo eacute o falar difiacutecil de compreender eacute o jargatildeo eacute o calatildeo nas acepccedilotildees do Tesoro

de la Lengua Castellana o Espantildeola cujo emprego irmana no vitupeacuterio as vozes de

ciganos rufiotildees e ladrotildees plebeus em sociedade de corte de linguajar considerado

incompreensiacutevel por este noacutes majestaacutetico e normativo que desautoriza como viciosas e

vulgares as formas linguiacutesticas pensadas nos termos da Institutio oratoria de Quintiliano

(seacutec I dC) como desvios do costume isto eacute do consenso dos eruditos (QUINT Inst or

I 6 45 ldquoErgo consuetudinem sermonis uocabo consensum eruditorumrdquo) Para Francisco

de Quevedo entre estas vozes desviantes na inteligibilidade e na impropriedade da

convenccedilatildeo como viacutecio vulgar estaacute a das damas cultas de praacutetica de poesia gongoacuterica

cujas letras enunciam-se no opuacutesculo La cvlta latiniparla como ldquoAlcoran Macarronicordquo

Identificadas ao Alcoratildeo consoante a ortodoxia catoacutelica contrarreformista atualizada no

preceito em terras ibeacutericas no seacuteculo XVII essas letras supotildeem-se ldquomaldito librordquo assim

eacute definido o coacutedigo sagrado dos muccedilulmanos em Sebastiaacuten de Covarrubias Orozco404

supotildeem-se ldquoheresia poeacuteticardquo405 construiacuteda em ldquocerto lenguage compuesto de varias

lenguasrdquo (certa linguagem composta de vaacuterias liacutenguas) 406 como babeacutelica como

401 Entenda-se por ldquogermaniardquo em liacutengua portuguesa o calatildeo 402 Traduccedilatildeo nossa 403 Cf Tesoro de la Lengva Castellana o Espantildeola Compvesto por el licenciado D Sebastian de

Cobarruuias Orozco Capelan de su Magestade Mastrescuela y Canonigo de santa Iglesia de Cuenca y

consultor del santo Oficio de la Inquisicion Dirigido a la Magestad Catolica del Rey Don Felipe III nestro

sentildeor Con Privilegio En Madrid por Luis Sanchez impressor del Rey N S Antildeo del Sentildeor M DC XI

[1611] p 42v 404 Idem p 39r 405 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII p 335 406 Idem p 530r

137

monstruosa porque qualificado o alcoratildeo como macarrocircnico Recorde-se para Francisco

Cascales (1563-1642) D Luis de Goacutengora eacute ldquoMahoma de la poesiacutea espantildeolardquo (Maomeacute

da poesia espanhola)407

De modo que sejam vituperadas as damas de letras discretas e cultas como

vulgares obscuras ineptas e hereacuteticas Francisco de Quevedo sempre em chave de

desqualificaccedilatildeo emprega sintagmas como ldquomugeres Cultas y Hembrilatinasrdquo ou ldquobuena

culteranardquo Aiacute como em ldquocvlta latiniparlardquo trata-se de neologismo408 Ainda que se leiam

registrados os termos ldquoculteranismordquo ldquoculteranordquo ldquoculteriardquo ldquoculterordquo ldquocultiparlarrdquo e

ldquocultiparlistardquo no tomo II do Diccionario de autoridades editado em 1739 pela Real

Academia Espantildeola como eacute possiacutevel notar por dois desses exemplos

CULTERANO NA adj Lo que pertenece al hablar culto afectadamente

Es voz inventada y jocoacutesa Lat Affectati sermonis putidum studium

QUEV Cult Latinip Considerando con el pujo que los enamorados de

romance deletrean lo culterano de las damas que ahora hablan nublado

Ninguna culteraacutena de todos quatro vocablos ha de llamar al coche соche

CULTERANO NA Adj O que pertence ao falar culto afetadamente Eacute

voz inventada e jocosa Lat Affectati sermonis putidum studium QUEV

Cult Latinip Considerando com o desejo que os apaixonados do

romance soletram o culterano das damas que agora falam nublado

Nenhuma culterana de todos os quatro vocaacutebulos haacute de chamar agrave

carruagem carruagem 409

E tambeacutem

407 Cf MEDRANO J de E Apologeacutetico en favor de Don Luis de Goacutengora Edicioacuten anotada de Luis Jaime Cisneros Lima Universidad de San Martiacuten de Porres 2005 p 67 408 Diga-se os juiacutezos de letrados como Francisco de Quevedo tecircm usos que avanccedilam muito o tempo em

que se enunciam Almeida Garrett (1799-1854) no tratado Da educaccedilatildeo publicado em Londres em 1829

interessado na eleiccedilatildeo das leituras de jovens estudantes portugueses escreve que natildeo se deviam dar a eles

textos na liacutengua portuguesa de Gil Vicente nem ldquonrsquoestoutra algaravia de tarelos que natildeo eacute mais Portuguez

tampouco gafa de barbarismos e solecismos gallici-parla de cartazes de theatro de columnas de gazeta

ou de sermatildeo de preacutegador de fama na qual pelo comum eacute hoje escripto o mais do que em Portuguez se

escreverdquo (grifo meu) Nas notas de rodapeacute da ediccedilatildeo afirma-se que gallici-parla eacute termo cunhado por ldquoF

Man do Nascimentordquo por imitaccedilatildeo de Francisco de Quevedo Cf GARRETT A Da educaccedilatildeo Londres

Sustenance e Stretch 1829 pp 132-133 409 Traduccedilatildeo nossa

138

CULTIPARLAR v n Lo mismo que Hablar culto con afectacioacuten Es

voz festiva e inventada410

CULTIPARLAR v n O mesmo que Falar culto com afetaccedilatildeo Eacute voz

festiva e inventada 411

Ainda assim em princiacutepio do seacuteculo XVII esses termos em conformidade com

as categorias rememoradas por Joatildeo Adolfo Hansen ao expor doutrinariamente a poesia

de agudeza satildeo ldquoParole Finterdquo palavras fictas fingidas das quais Francisco de Quevedo

avesso agrave autoridade de D Luiacutes de Goacutengora da Faacutebula de Polifemo y Galatea (1612) das

Soledades (1613) faz uso para satirizar-lhe a obra poeacutetica culta e atacaacute-lo como poeta

obscuro e incongruente indigno de imitaccedilatildeo e emulaccedilatildeo412 Essas ldquoParole Finterdquo Il

Cannocchiale Aristotelico do conde Emanuele Tesauro (1592-1675) prescreve como

ldquointeramente fabricate dal nostro ingegno amp perciograve piugrave pellegrine che le Composite

benche piugrave barbarerdquo (inteiramente fabricadas por nosso engenho amp por isso mais

peregrinas que as Compostas ainda que mais baacuterbaras)413 No caso de Francisco de

Quevedo pois ldquohembrilatinordquo eacute adjetivo composto pela aglutinaccedilatildeo de hembra

(substantivo ldquofecircmeardquo) e latino (adjetivo) e culterano embora seja sabido que como

ldquoculteranismordquo se trate de termo que remonta aos usos de Lope de Vega (1562-1635)

semelhantemente eacute adjetivo composto pela aglutinaccedilatildeo de culto (adjetivo) e luterano

(adjetivo) No opuacutesculo satiacuterico este processo de aglutinaccedilatildeo mira jocosa e

pejorativamente condensar as criacuteticas ao uso poeacutetico de termos peregrinos estrangeiros

jaacute que o que dele decorre de acordo com Francisco de Quevedo eacute essa cvlta latiniparla

o ldquolenguage hermafroditordquo misto descomposto monstruoso afetado e ridiacuteculo em

410 Cf Diccionario de la lengua castellana en que se explica el verdadero sentido de las voces su

naturaleza y calidad con las phrases o modos de hablar los proverbios o refranes y otras cosas

convenientes al uso de la lengua [] Compuesto por la Real Academia Espantildeola Tomo primero Que contiene las letras AB Madrid Imprenta de Francisco del Hierro 1729 411 Traduccedilatildeo nossa 412 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 pp 328 334 413 Il cannocchiale aristotelico orsquo sia Idea dellrsquoarguta et ingeniosa elocutione che serue agrave tutta lrsquoarte

oratoria lapidaria et simbolica esaminata corsquo principii del diuino Aristotele dal conte D Emanuele

Tesauro Cavalier Gran Croce dersquo Santi Mauritio et Lazaro Quarta impressione Accresciuta dallrsquo Autore

Trattati cioegrave Dersquo Concetti Predicabili et Degli Emblemi con un nuouo Indice Alfabetico oltre agrave quello

delle materie Dedicato al Reuerendiss Padre Gio Paolo Oliva Vicario Generale della Compagnia di

Giesu In Roma agrave Spese di Guglielmo Halleacute Libraro nella Piazza di Pasquino M DC LXIV [1664] Con

licenza dersquo Superiori E Priuilegio p 312

139

decorrecircncia dos pressupostos excessos em castelhano do emprego de leacutexico raro

emprestado ao latim

Sabe-se o vitupeacuterio satiricamente construiacutedo mira a agudeza e o estilo gongoacuterico

dito culterano para aludir luterano poesia que ldquosoacute eacute clara quando queimadardquo propotildee

Francisco de Quevedo e assim hereacutetica numa analogia agraves praacuteticas inquisitoacuterias414 O

vitupeacuterio intenta mostrar na poesia gongoacuterica e em suas imitaccedilotildees o viacutecio porque a

considera aristotelicamente excessiva e por isso adoxal e afetada termo jaacute conhecido e

particularmente empregado na Arte poeacutetica de Francisco Joseacute Freire num capiacutetulo assim

denominado ldquoExtremos viciosos dos estilos contrapostos equiacutevocos paranomaacutesias

alusotildees e outras pestes condenadasrdquo415 A analogia agraves praacuteticas do Santo Ofiacutecio talvez

sem semelhanccedila para os leitores de hoje parece lugar-comum nesses tempos jaacute distantes

visto operar em termos afins num comentaacuterio de Manuel de Faria e Sousa ao soneto de

Camotildees ldquoAlma minha gentil que te partisterdquo O comentador mirando um passo do soneto

e referindo Garcilaso escreve

Y otros dizen que no saben que ay que comentar en Garcilasso porque

no se hallan clausulas endemoniadas quales las de Gongora y sus

imitadores como si en el hablar claro no se escondiesse misterio

ciencia y erudicion [hellip]416

E outros dizem que natildeo sabem que haacute o que comentar em Garcilaso

porque natildeo se acham claacuteusulas endemoniadas tais quais as de Goacutengora

414 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 p 335 HANSEN J A ldquoFecircnix

renascida amp Postilhatildeo de Apolo uma introduccedilatildeordquo pp 22-4 40 415 Recorde-se breve passagem da Arte poeacutetica de Francisco Joseacute Freire ldquoJusto o seraacute que depois de termos

tratado dos dous estilos poeacuteticos passemos a notar os extremos e viacutecios em que estaacute colocada a beleza

deles Pode pecar o estilo florido por parte do muito e o maduro por parte do pouco Ao primeiro viacutecio

chamamos afetaccedilatildeo de que jaacute tratamos ao segundo damos o nome de secura Um eacute excesso outro eacute falta

daquela maravilha e novidade da Mateacuteria ou do Artifiacutecio em que consiste a beleza poeacutetica Facilmente cai no primeiro defeito quem quer dizer tudo com substancial brevidade e agudeza espalhando em tudo

flores e aromas ou se empenha a discorrer com engenhosa escuridade para que os seus conceitos natildeo

sejam logo entendidos ou tambeacutem para que quem lecirc imagine neles o que natildeo haacute ou muito mais do que

haacuterdquo FREIRE F J Arte poeacutetica ou Regras da verdadeira poesia em geral e de todas as suas espeacutecies

principais tratadas com juizo critico Lisboa Na Officina de Francisco Luiz Ameno 1758 pp 162-3 416 Rimas varias de Luis de Camoens priacutencipe de los poetas heroycos y liricos de Espantildea Ofrecidas al

muy ilustre sentildeor D Ivan da Sylva Marquez de Gouvea presidente del Dezembargo do Paccedilo y mayordomo

mayor de la Casa Real ampc Comentadas por Manuel de Faria Y Sousa Cavallero de la Orden de Christo

Tomo I y II Que contienen la primera segunda y la terceira Centuria de los Sonetos Lisboa Con

Privilegio Real En la Imprenta de Theotonio Damaso de Mello Impressor de la Casa Real Con todas las

licencias necessarias Antildeo de 1685 p 55

140

e seus imitadores como se no falar claro natildeo se escondesse misteacuterio

ciecircncia e erudiccedilotildea [hellip]417

As gongoacutericas ldquoclausulas endemoniadasrdquo do comentarista satildeo causa do que soacute o

fogo contra o hereacuteticos aclara e expurga eacute o que o cruzamento das censuras propotildee

Sabe-se natildeo param aiacute as controveacutersias em torno da poesia de D Luis de Goacutengora418

Poreacutem naquilo que cabe ora mencionar pode ser relevante recuperar um breve trecho do

De ratione dicendi de Juan Luis Vives que Luiza Loacutepez Grigera recorda ao pensar a

recepccedilatildeo espanhola do corpo retoacuterico de Hermoacutegenes

Vetustissimae sunt periodi quae fiunt uel ex antithesis de quibus mox

loquemur uel acutegrave concluso argumento atque adeograve sunt quidam qui

acutegrave concinnata argumenta amp breviter conclusa amp contorte vibrata

eas demum veras periodos esse censeant ut Hermogenes419

Beliacutessimos satildeo os periacuteodos que se fazem ou de antiacuteteses dos quais logo

falaremos ou de argumentos agudamente arrematados E ademais haacute

alguns como Hermoacutegenes que julgam ser propriamente verdadeiros

periacuteodos os argumentos arranjados com agudeza e arrematados com

brevidade e tortuosamente movimentados420

Ora nem tudo eacute vitupeacuterio no ajuizamento de D Luis de Goacutengora Pode-se assim

dizer a ldquocvlta latiniparlardquo o ldquolenguage hermafroditordquo satildeo antes termos de figuraccedilatildeo do

eacutethos discursivo de Francisco de Quevedo que o estilo de D Luis de Goacutengora e seus

imitadores eacute antes a asserccedilatildeo do viacutecio de elocuccedilatildeo pela autoridade do nome Francisco de

Quevedo conforme o consensus eruditorum instituinte dos bons usos retoacutericos e poeacuteticos

eacute antes ficccedilatildeo de uma liacutengua como fictas as palavras satiacuterica proacutepria agraves censuras no

opuacutesculo La cvlta latiniparla de monstruosidade que se faz evidente sempre em chave

417 Traduccedilatildeo nossa 418 HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII p 336 419 VIVES J L Ioannis Ludouici Vivis Rhetoricae siue de recte dicendi ratione libri tres Eiusdem De

Consultatione liber I Basilea Balthasarem Lasiu[m] amp Thomam Platteru[m] 1536 p 48 LOacutePEZ

GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro p 77 VIVES J L El arte retoacuterica (De ratione

dicendi) Estudio introductorio de Emilio Hidalgo-Serna Edicioacuten traduccioacuten y notas de Ana Isabel

Camacho Barcelona Anthropos Editorial 1988 pp 58-9 420 Traduccedilatildeo nossa

141

de vitupeacuterio mediante exemplos tais quais os que seguem endereccedilados agraves damas cultas

aos poetas agrave maneira gongoacuterica por este tambeacutem fictiacutecio Aldrobando Anathema

Cantacuceno

A su marido por el hastio que causa el tal nombre le llamaragrave

mi Quotidie mi siempre y agrave egravel se le dexa su sempiterna agrave salvo para

quando nombre su muger

Si se ofreciere dezir que despavilen las velas diragrave suena catarro

luciente excita esplendores pantildeiccediluela de corte

Quando llamare agrave las criadas no diga ola Gomez ola Sanchez

sino unda Gomez unda Sanchez que unda y ola son lo propio y ellas

aunque no lo entienden en Latin lo obedecen en Romance pues lo

unden todo

Si huviere de mandar que la compren un capon ograve que se le asen ograve que

se le embien que es lo mas possible no le nombre por escusar la

compassion de lo que le acuerda llamele desgallo ograve tiple de pluma

Para dezir caldo substancial diragrave Licor quiditativo

A las revanadas de pan llamaragrave planicies

Y porque la palabra gota es muy facinorosa y para los oyentes abunda

de cosquillas si se ofreciere dezir deme una gota de agua ograve deme dos

gotas de vino diga Denme una podagra de agua oacute denme dos

podagras de vino

Al ntildeudo ciego llamaragrave ntildeudo rezante

Al queso ceciza de leche

Al escudero llamaragrave manipulo421

A seu marido pelo fastio que causa tal nome o chamaraacute

ldquomeu quotidierdquo422 ldquomeu semprerdquo e a ele deixa-lhe sua sempiterna a

salvo para quando nomear sua mulher

Se se dispuser a dizer que ldquoapaguem as velasrdquo diraacute ldquoassoe o catarro

luzenterdquo ldquoexcite esplendoresrdquo ldquolencinho de corterdquo

421 Cf Obras de D Francisco de Quevedo Villegas Cavallero de la Orden de Santiago Sentildeor de la Villa

de la Torre de Juan Abad Dedicadas a la muy ilustre Academia de los Deconfiados da la Excelentissima

Ciudad de Barcelona Parte Primera Barcelona Por Jaime Suriagrave 1702 pp 206-207 422 Eacute adverbio latino de tempo ldquotodos os diasrdquo ldquocada diardquo ldquoquotidianamenterdquo

142

Quando chamar as criadas natildeo diga ldquoOla Gomezrdquo ldquoOla Sanchezrdquo

mas ldquoUnda Gomezrdquo ldquoUnda Sanchezrdquo porque ldquoundardquo e ldquoolardquo satildeo o

proacuteprio e elas ainda que natildeo tenham conhecimento de latim obedecem

em Romance pois ondeam todos

Se tiver de mandar que comprem um capatildeo423 ou que o assem ou que

lhe enviem um que eacute o mais possiacutevel natildeo o nomeie por escusar a

compaixatildeo do que lhe acorda chame-o ldquodesgalordquo 424 ou ldquotiple de

plumardquo425

Para dizer caldo substancial diraacute ldquoLicor quiditativordquo

Agraves fatias de patildeo chamaraacute ldquoplaniacuteciesrdquo

E porque a palavra ldquogotardquo eacute muito facinorosa e para os ouvintes

abunda em coacutecegas se se dispuser a dizer ldquoDecirc-me uma gota de aacuteguardquo

ou Decirc-me duas gotas de vinhordquo diga ldquoDecirc-me uma podagra de aacuteguardquo ou

ldquoDecirc-me duas podagras de vinhordquo426

Ao noacute cego chamaraacute ldquonoacute rezanterdquo

Ao queijo ldquocharque de leiterdquo

Ao escudeiro chamaraacute ldquomaniacutepulordquo427

Francisco de Quevedo faz troccedila de procedimentos que tratados de retoacuterica de

poeacutetica e de gramaacutetica classificam como viciosos pelo julgamento da inadequaccedilatildeo da

afetaccedilatildeo e do disparate no uso do estrangeirismo (ldquomeu quotidierdquo ldquoUnda Gomezrdquo

ldquoUnda Sanchezrdquo ldquomaniacutepulordquo ou ldquopodragardquo) do neologismo (ldquodesgalordquo) e da metaacutefora

(ldquomeu semprerdquo ldquoassoe o catarro luzenterdquo ldquoexcite esplendoresrdquo ldquopantildeiccediluela de corterdquo

ldquotiple de plumardquo ldquoLicor quiditativordquo ldquoplaniacuteciesrdquo ldquonoacute rezanterdquo ou ldquocharque de leiterdquo)

Reitere-se a citada epiacutestola do poeta a Gaspar de Guzmaacuten que abre as Obras propias y

traducciones latinas griegas y Italianas de Fray Luis de Leoacuten configura-se como

discurso de autoridade428 Francisco de Quevedo para configuraacute-la apela par a par a

423 Isto eacute um frango capado e abatido para alimentaccedilatildeo 424 Francisco de Quevedo constroacutei um neologismo e para isso apotildee o prefixo des- em sentido de negaccedilatildeo

ou de falta ao substantivo ldquogallordquo donde ldquodesgallordquo e em portuguecircs ldquodesgalordquo como construccedilatildeo

motivada do signo linguiacutestico em referecircncia ao frango capado 425 ldquoTiplerdquo eacute a voz mais aguda a voz soprano Escolho ldquoplumardquo e natildeo ldquopenardquo por manter a repeticcedilatildeo do

grupo consonantal pl e por optar pelo mais raro dos termos 426 ldquoPodagrardquo eacute gota que ataca os peacutes em latim podagra em grego ά 427 Traduccedilatildeo nossa 428 Cf Obras propias y traducciones latinas griegas y Italianas Con la parafrasi de algunos Psalmos y

Capitulos de lob Sacadas de la libreriacutea de don Manuel Sarmiento de Mendoccedila Canonigo de la Magistral

de la santa Iglesia de Sevilla Dalas a la Impression don Francisco de Quebedo (sic) Villegas Imp del

Reyno (Viuda de Luis Saacutenchez) A costa de Domingo Gonccedilalez Madrid 1631 p 2

143

Aristoacuteteles ao Pseudo-Demeacutetrio de Falero referido em versatildeo latina de Stanislaus Ilovius

estampada em 1557429 a Horaacutecio acrescido da traduccedilatildeo espanhola de Vicente Espinel 430

429 O passo do Peri hermēneias eacute citado por Francisco de Quevedo em latim e depois em castelhano Leia-

se ldquoDictionem autem in hac figura orationis exquisitam et immutatam nec nimis vulgarem oportet esse

sic enim amplitudinem et dignitatem habebit Propria autem et usitata dictio dilucida quidem semper est

verum hoc ipso facile contemnitur Primum igitur translationibus est utendum (hae enim vel maxime et

voluptatem et amplitudinem conferunt orationibus) non tamen crebris et frequentibus alioquin

dithirambos loco orationis scribemus neque longe petitis sed ex ipsa re et ex simile sumptis lsquoConviene

que sea la diccioacuten en esta figura de oracioacuten exquisita inmutable y no demasiadamente vulgar asiacute tendraacute

amplitud y dignidad Pero la diccioacuten propia y usada siempre es diluacutecida pero por eso se desprecia

faacutecilmente Lo primero se ha de usar de translaciones porque estas dan autoridad y ser a la oracioacuten mas no han de ser frecuentes de otra suerte en lugar de oracioacuten haremos ditirambos Y no se han de buscar de

cosas remotas sino de las propincuas y semejantesrsquordquo

Eacute interesante notar que a traduccedilatildeo latina do texto natildeo eacute a de Pietro Vettori Francisco de Quevedo segundo

Antonio Azaustre Galiana lecirc a versatildeo para o latim da Basileia de 1557 de Stanislaus Ilovius Demetrii

Phalerei De elocvtione liber a Francisco Maslovio Polono in latinum conuersus amp ab eodem obscuriorum

locorum explicationibus illustratus cf GALIANA A A ldquoCuestiones de poeacutetica y retoacuterica en los

preliminares de Quevedo a las poesiacuteas de fray Luis de Leoacutenrdquo La Perinola 7 (2003) p 73 Natildeo pude

consultar esta ediccedilatildeo A liccedilatildeo de Pietro Vettori do mesmo passo eacute a seguinte ldquoLocutionem autem in nota

hac eximiam esse oportet amp immutatam amp extra consuetudinem magis sic enim habebit tumorem propria

autem amp ex consuetudine locutio plana quidem semper erit amp hac de causa abiecta Primum igitur

translationibus vtendum est hae nanque maxime et voluptatem adportant orationi amp magnitudinem non tamen crebris quia dithyrambum pro oratione scribimus neque tamen translatis sed ex se amp ex similisrdquo

cf Petri Victorii commentarii in librum Demetrii Phalerei de elocutione Positis ante singulas declarationes

Graecis vocibus Auctoris ijsdemque ad verbum Latine expressis Additus est rerum et verborum

memorabilium index copiosus Cum P II IIII Pont Max Cosmi Medicis Florentianorum Senensiumq Ducis

ampAlphonsi Ferrariensium Ducis privilegijs ampliszlig per decennium Florentiae In officina Iuntarum

Bernardi F MDLXII [1562] pp 75-5

Em grego lecirc-se o seguinte ldquoΤὴν δὲ λέξιν ἐν τῷ χαρακτῆρι τούτῳ περιττὴν εἶναι δεῖ καὶ ἐξηλλαγμένην καὶ ἀσυνήθη μᾶλλον οὕτω γὰρ ἕξει τὸν ὄγκον ἡ δὲ κυρία καὶ συνήθης σαφὴς μέν λειτὴ δὲ καὶ εὐκαταφρόνητος Πρῶτα μὲν οὖν μεταφοραῖς χρηστέον αὗται γὰρ μάλιστα καὶ ἡδονὴν συμβάλλονται τοῖς λόγοις καὶ μέγεθος μὴ μέντοι πυκναῖς ἐπεί τοι διθύραμβον ἀντὶ λόγου γράφομεν μήτε μὴν πόρρωθεν μετενηνεγμέναις ἀλλ αὐτόθεν καὶ ἐκ τοῦ ὁμοίου []rdquo (cf DEMETR 2

77-8) Observe-se a traduccedilatildeo do passo em versatildeo em liacutengua portuguesa ldquoPor fim o vocabulaacuterio para esse

tipo de estilo deve ser raro com termos que fogem ao sentido habitual e ao costume pois desse modo

teraacute volume Se o vocabulaacuterio proacuteprio com o qual se estaacute acostumado eacute sempre claro em compensaccedilatildeo eacute

tambeacutem modesto Primeiramente entatildeo deve-se fazer uso das metaacuteforas pois as mesmas contribuem

sobretudo para dar prazer e a grandeza ao discurso No entanto natildeo se deve usaacute-las com frequumlecircncia uma vez que ao inveacutes de um discurso estaremos escrevendo um ditirambo Nem se deve forccedilaacute-las partindo de

uma relaccedilatildeo muito distante pelo contraacuterio elas devem ser espontacircneas e partir de uma semelhanccedilardquo cf

FREITAS G A DE Sobre o Estilo de Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo e

estudo introdutoacuterio do tratado) Satildeo Paulo [UFMG] 2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p XIX-XX 430 ldquoVir bonus et prudens uersus reprehendet inertis culpabit duros incomptis adlinet atrum transuorso

calamo signum ambitiosa recidet ornamenta parum claris lucem dare cogetrdquo (HOR AP 445-8)

Francisco de Quevedo acrescenta ao texto latino a seguinte versatildeo ldquoEl varon bueno y de prudente pecho

Los versos duros libremente culpa Los que carecen de arte reprehende A los mal adornados con a

pluma Vna negra sentildeal los pone encima La demasia de ornamento corta Los poco claros manda que

se aclarenrdquo cf Diuersas rimas de Vicente Espinel con el Arte Poetica y algunas Odas de Oracio

traduzidas en verso Castellano Madrid Por Luis Sanchez 1591 p 165-6

144

a Quintiliano431 e a Antocircnio Lulio432 leitor de Hermoacutegenes de modo a referendar o juiacutezo

criacutetico que natildeo apenas elogia e defende o saber-fazer poeacutetico de Fray Luis de Leoacuten mas

tambeacutem vitupera e condena a poesia culta agrave maneira gongoacuterica

Conforme Hermoacutegenes metaacuteforas desse feitio compotildeem-se para aleacutem dos limites

da moderaccedilatildeo Entenda-se o Peri ideōn inscreve o emprego das tropikai lexeis (cf HERM

248 9-10 ldquordquo) isto eacute das palavras metafoacutericas ldquole parole riuolterdquo na

traduccedilatildeo de Giulio Camillo Delminio433 entre os expedientes que perfazem a semnotēs

que concorrem para a composiccedilatildeo do megethos no discurso Alerta Hermoacutegenes no

entanto que o artiacutefice mirando matizar a saphēneia por intermeacutedio da lexis pode incorrer

em desmesuras que fazem aacutespero o logos (cf HERM 248 16-17) Note-se por ldquofazer

aacutesperordquo compreende-se o verbo trakhynō (τραχύνω) eacute membro de famiacutelia lexical que

abarca o substantivo ldquotrakhytēsrdquo (aspereza) e o adjetivo ldquotrakhysrdquo (aacutespero)

Propotildee o retor grego como exemplo de metaacutefora bem-medida um passo de

Demoacutestenes ldquotēn agathēn proballomenous elpidardquo (DEM Cor 18 97

431 Francisco de Quevedo menciona Quintiliano em dois passos (i) ldquoDe todo esto se asegura quien ama la

propiedad y la luz y la escribe y las razona Severo censor es Quintiliano y en el libro 8 de sus Instituciones

capiacutetulo 3 alaba en Virgilio lo que un mal culto usurpador deste buen renombre arrojara por bajo y

asqueroso Virgilio en la Geoacutergica libro 4 Saepe exiguus mus lsquoMuchas veces el pequentildeo ratoacutenrsquo Pondera

el severo Fabio Nam epitheton exiguus aptum proprium efficit ne plus expectaremus et casus singularis

magis decuit et clausula ipsa unius sylabae non usitata addit gratiam Imitatus est utrumque Horatius

Nascetur ridiculus mus lsquoPorque el epiacuteteto pequentildeo acomodado y propio previene para que no esperemos

maacutes y el caso singular fue maacutes conveniente y la claacuteusula de una siacutelaba antildeadioacute gracia Las dos cosas imitoacute Horacio Naceraacute el ridiacuteculo ratoacutenrsquordquo [cf QUINT 8 3 20] (ii) ldquoHoy sentildeor por no decir lo que sin asco ni

escruacutepulo es liacutecito hay algunos que dicen lo que es torpe y abominable Quintiliano lo ensentildea Obscena

vitabimus et sordida et humilia [cf QUINT 8 2 2] Y en el propio libro 8 capiacutetulo 2 acusa a estos que ni

saben dejar ni escoger Nec video quare clarus orator duratos muria pisces nitidius esse crediderit quam

ipsum id quod vitabat lsquoNi veo por queacute el claro creyoacute era mejor decir los peces con la muria que lo mismo

que queriacutea decirrsquordquo [cf QUINT 8 2 3] 432 De Antonio Lulio dito Lullio Francisco de Quevedo cita o seguinte passo seguido de versatildeo castelhana

ldquoAc de claritate quidem principio dicendum videtur quae prima semper et maxima virtus existimata est

orationis Hanc alii puritate et castimonia quadam dictionis assequntur alii explanatione seu distinctione

et elegantia alii demun evidentia et subjectione eorum ab oculos quae dicuntur lsquoLo primero diremos de

la claridad que siempre es la primera y la mayor virtud de la oracioacuten Eacutesta unos la alcanzan con cierta pureza y castidad de las dicciones otros con la explicacioacuten distincioacuten y elegancia otros finalmente con

la evidencia y poniendo delante de los ojos lo que dicenrsquordquo Lecirc-se o capiacutetulo 2 do libro VI dos Antonii Lulli

Balearis de Oratione Libri Septem Quibus non modograve Hermogenes ipse totus uerumetiam quicquid feregrave agrave

reliquis Graecis ac Latinis de Arte dicendi tratactũ est suis locis aptissimagrave explicatur Accessit etiam

locupletiss Rerum amp uerborum toto hoc Opere memorabilium Index Basileae [ex officina Ioannis

Oporini impensis Henrici Petri] [Anno Salutis humanae 1558] p 426 433 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 10v

145

ldquoτὴν ἀγαθὴν προβαλλομένους ἐλπίδαrdquo434) ldquoproponendosi vna buona speranzardquo para

Giulio Camillo Delminio 435 ldquoprojecting good hopesrdquo para Cecil W Wooten 436

ldquoArrojando buenas esperanzasrdquo para Consuelo Ruiz Montero437 ldquogardant devant les yeux

espeacuterance du succegravesrdquo para Michel Patillon 438 Na avaliaccedilatildeo de Hermoacutegenes eacute tatildeo

mesurada a metaacutefora que pouco se nota a translaccedilatildeo no sentido do particiacutepio

ldquoproballomenousrdquo (cf HERM 248 14-15) Prevecirc o preceito que seja trakhys o discurso

em vez de semnos se desmedido O exemplo tambeacutem proveacutem de Demoacutestenes ldquohai de

poleis enosounrdquo (DEM Cor 18 45 ldquoαἱ δὲ πόλεις ἐνόσουνrdquo) ldquole cittagrave erano infermerdquo

para Giulio Camillo Delminio439 ldquothe cities were sickrdquo para Cecil W Wooten 440 ldquoLas

ciudades estaban enfermasrdquo para Consuelo Ruiz Montero441 ldquomais les Etats eacutetaient

maladesrdquo para Michel Patillon442 Segundo Hermoacutegenes trata-se de metaacutefora que carece

de explicaccedilatildeo e a explicaccedilatildeo lecirc-se no seguimento do discurso de Demoacutestenes

Evidentemente o retor natildeo rechaccedila a aspereza da metaacutefora ou as metaacuteforas

convencionadas como aacutesperas mas na regulaccedilatildeo da efetuaccedilatildeo da semnotēs marca limites

na construccedilatildeo da dicccedilatildeo metafoacuterica para aleacutem dos quais os efeitos satildeo outros

Eacute pressuposto de Hermoacutegenes que tanto mais desmedidas as metaacuteforas mais

cerradas tanto mais duro () o logos (cf HERM 248 21-22) Haacute riscos de

434 Na traduccedilatildeo portuguesa novecentista de Joseacute Maria Latino Coelho ldquoanimados pela esperanccedilardquo cf

DEMOSTHENES A oraccedilatildeo da coroa Versatildeo no original grego precedida de um estudo sobre a civilisaccedilatildeo

da Grecia por J M Latino Coelho Segunda ediccedilatildeo da Academia Real das Sciencias de Lisboa Lisboa

Typographia da Academia 1880 p 32 435 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 10v 436 Cf HERMOGENES Hermogenesrsquo on types of style Translated by Cecil W Wooten Chapel Hill

University of North Carolina Press 1987 p 22 437 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 p 134 438 Cf HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel

Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 352 439 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 10v 440 Cf HERMOGENES Hermogenesrsquo on types of style Translated by Cecil W Wooten Chapel Hill

University of North Carolina Press 1987 p 22 441 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 p 134 442 Cf HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel

Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 352

146

que se torne mais espesso mais pesado (cf HERM 248 24 ldquoπαχύτερονrdquo) e mais vulgar

(cf HERM 248 25 ldquoεὐτελrdquo) Conforme o Peri ideōn assim acontece com os

sofistas a quem se atribui afirmar que os ldquoabutresrdquo (ldquoVoltoirdquo em Giulio Camillo

Delminio) sejam ldquosepulcros animadosrdquo (ldquosepolchri animatirdquo 443) (cf HERM 249 2)444 O

mesmo exemplo sabe-se eacute lido no Peri hypsous do Pseudo-Longino atribuiacutedo a Goacutergias

de Leontinos (cf LONGIN 3 2 ldquoγῦπες ἔμψυχοι τάφοιrdquo) Na avaliaccedilatildeo de Hermoacutegenes

a metaacutefora eacute fria445 e compreende-se como desvio na composiccedilatildeo elocutiva da grandeza

No Peri heureseōs a liccedilatildeo que se julga de Hermoacutegenes preceitua a semnotēs como

atributo de pensamento e de estilo (aqui e natildeo ) necessaacuterio ao discurso

que se estenda sobre mateacuteria de natureza divina e assemelhada tal como ilustra o exemplo

proveniente de Platatildeo ldquoZeus o guia supremo abre marcha no ceacuteu com seu carro aladordquo

(cf PLAT Phaedr 246 e)446 Tambeacutem eacute atributo do discurso cuja torpeza de pensamento

(cf HERM 201 1-2 ldquoτὸ νοούμενον αἰσχρῶrdquo) seja enobrecida pela elocuccedilatildeo isto eacute

mediante ldquoreferecircncias difusasrdquo os termos satildeo de Michel Patillon447 decorrentes do uso

de vocaacutebulos semnoi em vez de vulgares de alusotildees ou de omissotildees por meio das quais

o artiacutefice possa fazer natildeo parecer torpe a mateacuteria torpe (cf HERM 201 14-202 2)

Ademais semnos eacute o verso heroico de acordo com o Peri hermēneias Ensina o

corpo doutrinaacuterio atribuiacutedo a Demeacutetrio de Falero que a mateacuteria grandiosa ()

oferece ocasiatildeo (καιρός) para a composiccedilatildeo do colo () longo sabe-se bem para o

alongamento dos membros que compotildeem os periacuteodos pois que explica-se elevam-se os

discursos com a amplitude dos colos Em razatildeo disso explicita o tratadista em traduccedilatildeo

recente ldquotambeacutem o hexacircmetro por sua extensatildeo eacute denominado heroico e conveacutem aos

heroacuteisrdquo (διὰ τοῦτο καὶ ἑξάμετρον ἡρῷόν τε ὀνομάζεται ὑπὸ τοῦ μήκους καὶ πρέπον

ἥρωσιν) donde ldquoconvenientementerdquo (πρεπόντως) Homero natildeo tenha escrito a Iliacuteada

443 Cf HERM 249 2 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in

questa lingua per M Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di

Virgilio spiegato dal detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico

Salomoni Al Sigr Andrea Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico

amp con pena di scommunica Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio

Battista Natolini p 11r 444 Cf HERM 249 2 ldquoτάφουἐμψχου το γῦπς rdquo 445 O verbo grego eacute ψυχρεύομαι (cf HERM 249 3-4) 446 Cf A liccedilatildeo do Fedro eacute a seguinte ldquoὁ μὲν δὴ μέγας ἡγεμὼν ἐν οὐρανῷ Ζεύς ἐλαύνων πτηνὸν ἅρμαrdquo

A traduccedilatildeo do grego eacute de Carlos Alberto Nunes PLATAtildeO Fedro Φαῖδρος 3ordf ed revisada e biliacutengue

Beleacutem edufpa 2011 p 211 447 Cf HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel

Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 309

147

com os versos breves de um Arquiacuteloco ou de um Anacreonte (cf DEMETR 5) Entenda-

se o ritmo heroacuteico eacute ldquonobre e natildeo prosaico mas sonorordquo

(ldquoσεμνὸς καὶ οὐ λογικός ἀλλrsquo ἠχώδηςrdquo cf DEMETR 42 cf tambeacutem ARISTOT Rhet III

8 4 1408b 35) e mais o hexacircmetro deve-se evitaacute-lo quando se mira a composiccedilatildeo do

kharaktēr discursivo dito iskhnos isto eacute tenuis consoante a glosa em latim do

comentador florentino Pietro Vettori (1499-1585) 448 porque acrescenta o Pseudo-

Demeacutetrio toda extensatildeo eacute ldquograndiosardquo (μεγαλοπρεπής) (cf DEMETR 204) Em vulgar

sabe-se preceitua-se como equivalente do hexacircmetro o chamado verso italiano o

hendecassiacutelabo449 Eacute o metro da Ulyssea ou Lisboa Edificada de Gabriel Pereira de

448 Petri Victorii commentarii in librum Demetrii Phalerei de elocutione Positis ante singulas

declarationes Graecis vocibus Auctoris ijsdemque ad verbum Latine expressis Additus est rerum et

verborum memorabilium index copiosus Cum P II IIII Pont Max Cosmi Medicis Florentianorum

Senensiumq Ducis ampAlphonsi Ferrariensium Ducis privilegijs ampliszlig per decennium Florentiae In

officina Iuntarum Bernardi F MDLXII p 181 449 A questatildeo eacute interessantiacutessima por isso insiste-se na nota digressiva natildeo haacute duacutevida de que nos seacuteculos

XVI e XVII o verso heroico eacute hendecassiacutelabo Sabe-se bem data dos seacuteculos XVIII e XIX a preceituaccedilatildeo

em liacutengua portuguesa da praacutetica de versificaccedilatildeo hoje ensinada nas escolas que desconsidera as siacutelabas aacutetonas pospostas agrave uacuteltima siacutelaba tocircnica do verso Para recordar essa preceituaccedilatildeo haacute dois tratados a

observar

(i) Em Lisboa em 1784 publicou-se o Tratado da versificaccedilaotilde portugueza de Miguel do Couto Guerreiro

(1720-1793) Este tratado metrificado em muitos de seus passos no que aqui se considera ensina na regra

IX de metrificaccedilatildeo ldquoContando ateacute o acento dominante (Que basta para o Verso ser constante) Dez

syllabas o Heroico inteiro tem A sexta muito aguda lhe convemrdquo (p 6) Ou seja Miguel do Couto

Guerreiro ensina a contagem de siacutelabas poeacuteticas ateacute a uacuteltima siacutelaba tocircnica do verso e natildeo ateacute a uacuteltima siacutelaba

do verso donde se faccedila a afirmaccedilatildeo de que ldquoDez syllabas o Heroico inteiro temrdquo Agrave guisa de exemplo

Miguel do Couto Guerreiro cita Camotildees ldquoAs Armas e os Varoẽs assinaladosrdquo e conclui tratar-se de um

heroico inteiro grave isto eacute de um verso que termina em palavra paroxiacutetona e que se conta apenas ateacute a

paroxiacutetona por isso decassiacutelabo cf Tratado da versificaccedilaotilde portugueza dividido em tres partes A

primeira conteacutem hum brevissimo Compendio das regras mais praticaveis da Metrificaccedilaotilde a segunda hum amplissimo Diccionario de consoantes e a terceira Instrucccedilotildees para a perfeita Poetica Offerecido ao

Exmo Ermo Senhor D Domingos Joseph de Assis Mascarenhas Principal da Santa Igreja Patriarcal de

Lisboa do Conselho de sua Magestade ampc ampc ampc Por seu author Miguel do Couto Guerreiro Lisboa

Na Of Patr de Francisco Luiz Ameno MDCCLXXXIV [1784] Com licenccedila da Real Mesa Censoria

(ii) Anos depois em 1851 Antocircnio Feliciano de Castilho (1800-1875) publicou o Tratado de metrificaccedilatildeo

portugueza em que referenda a praacutetica de Miguel do Couto Guerreiro e afirma ldquo[] advertimos que noacutes

contamos por syllabas de um metro as que nelle se proferem ateacute aacute ultima aguda ou pausa e nenhum caso

fazemos da uma ou das duas que ainda se possam seguir pois chegado accento predominante jacirc se acha

preenchida obrigaccedilatildeo nisto nos desviamos da pratica geral que eacute designar o metro contando lhe mais uma

syllaba para aleacutem da pausa donde veio chamarem endecassyllabo ou de onze syllabas ao heroico a que noacutes

chamamos decassyllabo ou de dez syllabasrdquo Antocircnio Feliciano de Castilho cita o verso de Camotildees citado por Miguel do Couto Guerreiro e faz anaacutelise semelhante cf Tratado de metrificaccedilatildeo portugueza para em

pouco tempo e ate sem mestre se aprenderem a fazer versos de todas as medidas e composiccedilotildees obra

aprovada pelo Conselho de Instrucccedilatildeo Publica do Reino para uso das escolas Auctor A F de Castilho

Presidente Honoraacuterio da Sociedade dos Amigos das Lettras e Artes em S Miguel Fundador das escolas de

Leitura repentina na mesma ilha etc etc etc Lisboa 1851 p 18-9 36-7

O cocircnego Joaquim Caetano Fernandes Pinheiro (1825-1876) professor de retoacuterica poeacutetica e literatura

nacional no Imperial Coleacutegio Pedro II no Rio de Janeiro no ano em que publicou o opuacutesculo ldquoFormaccedilatildeo

da Literatura Brasileirardquo (1862) publicou tambeacutem o Curso Elementar de Literatura Nacional Nesta obra

a despeito das liccedilotildees de Miguel do Couto Guerreiro ou de Antocircnio Feliciano de Castilho versos de Manuel

Inaacutecio da Silva Alvarenga (1749-1814) como ldquoDriacuteade tu que habitas amorosardquo satildeo ditos hendecassiacutelabos

como o satildeo segundo o cocircnego os versos de Joseacute Basiacutelio da Gama (1740-1795) nrsquoO Uraguai (1769) cf

148

Castro drsquoOs Lusiacuteadas de Luiacutes de Camotildees e da Gerusalemme liberata de Torquato

Tasso

Relativamente agrave eleiccedilatildeo do termo a verter ldquosemnotēsrdquo haacute divergecircncias entre as

traduccedilotildees quinhentistas e seiscentistas de Hermoacutegenes Paolo Aresi no DellrsquoArte di

Predicar Bene o explicita

La terza [idea del dire] in greco egrave chiamata amp egrave variamente

tradotta Antonio Buonfine tradusse Venustagrave Giulio Camillo Grauitaacute

e Seueritagrave il proprio egrave Grauitagrave e Maestagrave degna di Veneratione onde

non male altri tradussero dignitagrave amp egrave lrsquoistessa che la Nota Magnifica

appresso Demetrio amp egrave la prima specie della grandezza 450

A terceira [ideia] em grego eacute chamada semnotēs amp eacute variamente

traduzida Antocircnio Bonfine traduziu por Venustagrave Giulio Camillo por

Gravitaacute e Severitagrave Ela propria eacute Gravitagrave e Maestagrave digna de veneraccedilatildeo

donde natildeo mal outros traduziram por dignitagrave amp eacute a mesma que a Nota

Magniacutefica em Demeacutetrio amp eacute a primeira espeacutecie de Grandeza451

Ora eacute maestagrave ou dignitagrave em Filiberto Campanile452 O substantivo ldquograuitasrdquo e

o adjetivo ldquograuisrdquo interpretam em latim os vocaacutebulos ldquosemnotēsrdquo e ldquosemnosrdquo no De

PINHEIRO Joaquim Caetano Fernandes Historiografia da Literatura Brasileira textos inaugurais Organizaccedilatildeo apresentaccedilatildeo e notas por Roberto Aciacutezelo de Souza Rio de Janeiro EdUERJ 2007 p 115

128

Nesse sentido vale ressaltar na praacutetica de metrificaccedilatildeo natildeo distam os usos de Domingos

Joseacute Gonccedilalves de Magalhatildees (1811-1882) conforme a ldquoAdvertecircnciardquo agrave ediccedilatildeo de 1864 drsquoA Confederaccedilatildeo

dos Tamoyos (1856) Aiacute se lecirc ldquoO poema epico encerrando em siacute todos os generos de poesia e sendo a

composiccedilatildeo mais longa e difficil do espirito humano exaltado pela inspiraccedilatildeo devera talvez adoptar todas

as foacutermas poeticas para melhor exprimir a parte heroica a lyrica a tragica a didactica a discriptiva e a

dialogica mas prevalecendo em quasi todas as Naccedilotildees de origem latina o emprego exclusivo do

hendecasyllabo na epopeacutea como o mais energico e o mais susceptivel de variar de cadencia sem ser preciso

alterar a simplicidade da foacuterma para que submettel-o ao compasso uniforme de periodos iguaes e ligal-o

com essa barbara toada das ultimas syllabas consoantes [] Aacute majestade da epopeacutea como aacute seriedade da tragedia soacute convecircm o hendecasyllabo livre da facecia da rima e do compasso monoacutetono de periodos iguaes

[]rdquo MAGALHAtildeES Domingos Joseacute Gonccedilalves de drsquoA Confederaccedilatildeo dos Tamoyos Rio de Janeiro

Livraria de B L Garnier 1864 p xiv xv 450 Cf DellrsquoArte di predicar bene diuisa in due parti Nella quale oltre agraversquo precetti dersquo retori agrave questo

proposito applicati di danno nuoue regole per tesserordinatamente vna predica con vn trattato della

memoria amp vnrsquoaltro della imitatione e con alcune osseruationi retoriche sopra vna predica in lode di S

Tomaso dAquino DI MONSIG PAOLO ARESI PARTE SECONDAhellip In MIL Per Gio Batt Bidelli

1627 p 197 451 Traduccedilatildeo nossa 452 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 31

149

dicendi generibus sive formis orationum de Johannes Sturm (1571) 453 Eleiccedilatildeo vocabular

semelhante embora controversa em italiano faz Giulio Camillo Delminio no tratado de

Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene (1594) trata-se de grauitate ou de

seueritate 454 Eleiccedilatildeo controversa porque na mesma obra grauitate verte tambeacutem

deinotēs455 Em fins do seacuteculo XVIII Jerocircnimo Soares Barbosa (1737-1816) professor

de Eloquecircncia e Poesia da Universidade de Coimbra nas Instituiccedilotildees oratorias de M

Fabio Quintiliano (1788 e 1790) ao referir a preceituaccedilatildeo de Hermoacutegenes define a

em caracteres gregos como ldquoGravidaderdquo456 Como se veraacute o latim ldquograuitasrdquo

e as formas vernaculares posteriores que lhe sejam etimologicamente familiares como

ldquogravidaderdquo desde Jorge de Trebizonda soem traduzir natildeo semnotēs mas deinotēs

Avizinha-se disso o leacutexico das traduccedilotildees de Gaspar Laurent e de Natale Conti O

primeiro tradutor na Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima (1614) aponta como

equivalente a ldquosemnos logosrdquo a alternativa ldquooratio decorardquo ou ldquograuisrdquo 457 Deve-se

considerar que o adjetivo latino ldquodecorus a umrdquo pode abarcar os semas decoroso

digno nobre elegante ou belo O segundo tradutor no Hermogenis Tarsensis

philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta (1550) emprega o latim

uenustas para verter o grego semnotēs Afirma-o Joatildeo Angelo Oliva Neto ldquouenustas tem

em si Vecircnus e por Vecircnus entenda-se mais que o verbete lsquodeusa do amorrsquo a totalidade da

experiecircncia amorosa em qualquer domiacutenio eacute o que encanta em pessoas e objetosrdquo458

donde signifique assim o registram os dicionaacuterios Le Grand Gaffiot o Lewis amp Short e

453 Cf Hermogenis Tarsensis rhetoris acutissimi De dicendi generibus siue formis orationum libri II

Latinitate donati amp scholis explicati atque illustrati a Ioan Sturmio Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo

ad annos octo Excudebat Iosias Rihelis MDLXXI pp 56-57 454 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 8v 455 Idem p 44v 456 Jerocircnimo Soares Barbosa escreve ldquo1ordm A Gravidade (oratio grauis) he a primeira qualidade

do estilo Grande que consiste nos pensamentos graves quaes sam os que tem por objecto as couzas

Divinas Naturaes Politicas e Morais nas palavras e figuras simplices e na collocaccedilaotilde magestosa sim

mas naotilde estudada V Cicero discurrendo da Providencia na Miloniana Cap 3 e do Universo no Sonho de

Scipiaotilde Taacutecito nos seus Annaes he modelo neste generordquo 457 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 322 458 Cf CATULO O livro de Catulo Traduccedilatildeo introduccedilatildeo e notas de Joatildeo Angelo Oliva Neto Satildeo Paulo

Edusp 1996 p 46

150

o escolar de Ernesto Faria ldquobelezardquo ldquoformosurardquo ldquoencantordquo ldquoelegacircnciardquo ldquograccedilardquo

ldquocharmerdquo ou mesmo ldquoamabilidaderdquo

Ora ao traduzir o substantivo ldquosemnotēsrdquo Natale Conti faz uso do latim uenustas

e propotildee agrave margem da paacutegina do tratado De formis orationis em nota ldquoPlus

significat quam uenustas quasi enim grauem venustatem dixerimrdquo 459 isto eacute ldquoSemnotēs

significa mais que uenustas como se dissesse sim lsquograve uenustasrsquordquo460 Do comentaacuterio

que precisa a escolha tradutoacuteria depreende-se certa grave elegacircncia certa grave

formosura cujo avesso eacute o que se veraacute na chave do desalinho da deselegacircncia da

desgraciosidade e da vulgaridade Manuel Pires de Almeida prevecirc como viacutecio do qual se

deva apartar o poeta na composiccedilatildeo do gecircnero misto461 Vale a digressatildeo

Contemporacircneo de Manuel de Galhegos Manuel Pires de Almeida brevemente

afirma no tratado Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia datado de 1633

Sete quer Hermoacutegenes que sejam as espeacutecies ou formas ou ideias de

dizer a saber clara grande formosa ligeira afetuosa grave e

verdadeira []462

Notaacutevel sim eacute que embora o nome de Hermoacutegenes seja autoridade comum aos

usos de Manuel de Galhegos e de Manuel Pires de Almeida empregam um e outro leacutexico

nem sempre coincidente ainda que nunca propriamente discordante em liacutengua

portuguesa ao traduzir as liccedilotildees de retoacuterica que prescrevem quais sejam as diferentes

ideai tou logou No ldquoDiscurso Poeacuteticordquo satildeo ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo no tratado Poesia e

Pintura ou Pintura e Poesia satildeo ldquoespeacutecies ou formas ou ideias de dizerrdquo Assim se a

eleiccedilatildeo do substantivo ldquoformardquo os aproxima porque esta eacute a escolha de Manuel de

459 Cf Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] p 181 460 Trata-se de variedade da pulchritudo [beleza] afirma Ciacutecero no De officiis ldquoCum autem pulchritudinis

duo genera sint quorum in altero venustas sit in altero dignitas venustatem muliebrem ducere debemus

dignitatem virilemrdquo (CIC Off I 130) Pode-se ler o passo em traduccedilatildeo portuguesa quatrocentista do Infante

D Pedro ldquoE como assi seja na fremosura haacute hi duas maneiras hũa sta em aquello que se chama

lsquovenust[a]srsquo e outra em dignidade Venustas devemos de dizer a aquella fremosura que perteece aas

molheres y dignydade aos homẽesrdquo cf Livro dos oficios de Marco Tullio Ciceram o qual tornou em

linguagem o Infante D Pedro duque de Coimbra Ediccedilatildeo critica segundo o MS de Madrid prefaciada

anotada e acompanhada de glossaacuterio por Joseph M Piel Coimbra 1948 p 76 461 Cf MUHANA A Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia Tratado Seiscentista de Manuel Pires de

Almeida Satildeo Paulo Edusp pp 109-10 462 Idem p 108

151

Galhegos e uma das escolhas de Manuel Pires de Almeida para transpor o grego ldquoideardquo

() a traduccedilatildeo direta ou indireta do genitivo singular ldquotou logourdquo () por

ldquode dizerrdquo num caso e por ldquode oraccedilaotilderdquo noutro caso os afasta Afasta-os tambeacutem a

enumeraccedilatildeo em Pires de Almeida dos vocaacutebulos que tecircm relaccedilatildeo de sinoniacutemia com

ldquoformardquo a saber ldquoespeacutecierdquo e ldquoideiardquo pendentes eacute de se supor do tratamento instrutivo

do Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia Observa Adma Muhana haacute quatro apariccedilotildees

do termo ldquoideardquo neste tratado Em todas elas o sentido eacute de ldquoformardquo463

Na discriminaccedilatildeo dessas ideai assim como operam ambos os letrados haacute

coincidecircncias haacute aproximaccedilotildees haacute tambeacutem sutis afastamentos como se sabe Manuel de

Galhegos faz uso dos substantivos ldquoclaridaderdquo ldquograndezardquo ldquofermosurardquo ldquoPreccedilardquo

ldquocaracterrdquo e ldquoverdaderdquo ao passo que Manuel Pires de Almeida como se sabe tambeacutem se

vale dos adjetivos ldquoclarordquo ldquogranderdquo ldquoformosordquo ldquoligeirordquo ldquoafetuosordquo ldquograverdquo e

ldquoverdadeirordquo464 de modo que sejam idecircnticas as escolhas dos dois autores nos pares

ldquoclaridaderdquo e ldquoclarordquo ldquograndezardquo e ldquogranderdquo ldquofermosurardquo e rdquoformosordquo e ldquoverdaderdquo e

ldquoverdadeirordquo sejam semelhantes em ldquoPreccedilardquo e ldquoligeirordquo e natildeo coincidam em ldquocaracterrdquo e

ldquoafetuosordquo como designaccedilatildeo das categorias significadas pelo substantivos gregos

ldquogorgotēsrdquo e ldquoēthosrdquo Interessaraacute adiante o termo ldquograverdquo no tratado de Manuel Pires de

Almeida vertendo natildeo o substantivo ldquodeinotēsrdquo senatildeo que o adjetivo ldquodeinosrdquo vale por

ldquograuerdquo e ldquoferozrdquo no ldquoDiscurso Poeacuteticordquo Itere-se a eleiccedilatildeo de diferentes vocaacutebulos da

liacutengua portuguesa para traduzir os termos gregos eacute evidecircncia da construccedilatildeo de um corpo

lexical movente relativo agrave preceptiva retoacuterica atribuiacuteda a Hermoacutegenes e pode ser

indicaccedilatildeo de vertentes distintas de circulaccedilatildeo dessa preceptiva Manuel Pires de Almeida

isso eacute certo lecirc o volume Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte

Rhetorica praecepta impresso na Basileia em 1550 e compartilha as categorias que

apresenta com os Discorsi del poema heroico de Torquato Tasso em que as idee satildeo ldquola

chiara la grande la bella la veloce lrsquoaffettuosa la grave e la verardquo465

Manuel Pires de Almeida pensa a analogia dos fazeres do pintor e do poeta estatildeo

o rascunho (ou contorno ou desenho) a composiccedilatildeo e a cor para a pintura como a

invenccedilatildeo a disposiccedilatildeo e a locuccedilatildeo para a poesia ou melhor a inuentio a dispositio e a

463 MUHANA A Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia Tratado Seiscentista de Manuel Pires de Almeida

Satildeo Paulo Edusp pp 14-15 464 Idem p 108 465 Cf Discorsi del poema heroico del S Torquato Tasso Allrsquoillustrissmo e reverendissmo Signor Cardinale

Aldo Brandino Nella Stamparia dello Stigliola In Napoli Ad instantia di Paolo Venturino [1594] p 119

152

elocutio tal como consumados os termos nas artes retoacutericas latinas Invenccedilatildeo disposiccedilatildeo

e locuccedilatildeo trecircs partes da poesia definem-se respectivamente para o tratadista como

concepccedilatildeo de ldquoideias e formas de todas as coisas que se podem imaginarrdquo 466 como

ldquoelegante colocaccedilatildeo e perfeita ordem das coisas inventadasrdquo 467 e como ldquopropriedade e

resplandor das palavras bem escolhidas e ornadas de algumas graves e breves sentenccedilas

e luzidas com pensamentos e conceitos nobresrdquo 468 Eacute preceito do tratado que natildeo baste

rascunho sem cor invenccedilatildeo de faacutebula poeacutetica sem locuccedilatildeo mesmo que possiacuteveis Isto

seja natildeo haacute boa poesia que prescinda do regrado trabalho elocutivo Mais precisamente

na fundamentaccedilatildeo doutrinaacuteria de Manuel Pires de Almeida natildeo haacute boa poesia que

prescinda da variedade locutiva pois que avessa agrave monotonia tal como a pintura a

poesia faz-se da variedade de efabulaccedilatildeo Ora supotildee o tratadista que natildeo haja coisa das

mateacuterias ldquovis e humildesrdquo agraves ldquograndes e excelentesrdquo que natildeo se possa imaginar e

representar poeticamente de sorte que seja conveniente variar os estilos porque variam

as mateacuterias ou variar os estilos agrave proporccedilatildeo que variam as mateacuterias469 Eacute liccedilatildeo de decoro

Eacute liccedilatildeo de elegacircncia Essa liccedilatildeo metaforiza-se como vestimenta que deve se ajustar aos

usuaacuterios

As palavras e o que delas se forma natildeo satildeo mais que um vestido dos

conceitos do nosso acircnimo e por isso assim como os vestidos devem

sempre apropriar-se agrave condiccedilatildeo de quem os traja assim a locuccedilatildeo e as

palavras devem ter proporccedilatildeo e correspondecircncia com as coisas que

tratam Donde erraria quem vestisse uma senhora com fatos de moccedila ou

uma menina com trajo grave e quem a um sujeito levantado aplicasse

palavras demasiadas e frouxas ou a um sujeito humilde locuccedilotildees altivas

e compendiosas Conforme a qualidade que o poeta quer dar ao estilo

scilicet de gravidade ou de humildade de doccedilura ou de aspereza assim

lhe deve dar as palavras conformes pela semelhanccedila das letras

mudando ou alterando as que lhe pareccedilam desconvir ou justamente

misturas outras como faz o pintor que querendo imitar a semelhanccedila

de alguma imagem lhe ajunta ora uma ora outra cor ora as muda e

altera e talvez juntas mistura a muitas segundo a imagem se haacute de

466 Idem p 93 467 Idem ibidem 468 Idem p 94 469 Cf Idem pp 93 105 106 108 109

153

representar melhor Conte fls 147149 470

Eacute lugar-comum que se conhece de Ciacutecero e de Quintiliano o da elocuccedilatildeo que

veste e orna os pensamentos retoricamente inventados (cf CIC de Or I 142 Brut 247

QUINT VIII pr 20) que se conhece de Filiberto Campanile para quem as figuras satildeo as

vestes e os ornamentos com os quais satildeo vestidas e ornadas as coisas471 Manuel Pires de

Almeida natildeo supotildee decente a nudez Supotildee muito menos tatildeo-soacute no registro cocircmico

pode-se aventar adequada a ldquosenhora com fatos de moccedilardquo ou a ldquomenina com trajo graverdquo

ou o ldquosujeito levantadordquo ndash note-se o particiacutepio empregado por Manuel de Galhegos no

ldquoDiscurso Poeacuteticordquo para definir o poema heroico ndash de ldquopalavras demasiadas e frouxasrdquo

ou o ldquosujeito humilderdquo de ldquolocuccedilotildees altivas e compendiosasrdquo considerados exemplos da

desproporccedilatildeo entre o que se enuncia (res) e as formas lexicais empregadas para fazecirc-lo

(uerba) Supotildee senatildeo que os usos linguiacutesticos devam acomodar-se agraves qualidades de estilo

cujas espeacutecies dado o scilicet (gravidade humildade doccedilura ou aspereza) datildeo a entender

que o tratadista as toma essas qualidades como ldquoespeacutecies ou formas ou ideias de dizerrdquo

dignas de variaccedilatildeo ou de combinaccedilatildeo ou de mistura conforme a mateacuteria poeacutetica 472

Acrescente-se que no juiacutezo de Manuel de Galhegos a Ulyssea ou Lisboa Edificada de

Gabriel Pereira de Castro estima-se obra exemplar no trato variado da elocuccedilatildeo que

compotildee o gecircnero de poema heroico

No passo de Manuel Pires de Almeida confere autoridade a este preceito o nome

do tradutor milanecircs da versatildeo latina da Basileia da obra retoacuterica atribuiacuteda a Hermoacutegenes

Natale Conti ou Conte como citado473 O volume Hermogenis Tarsensis philosophi ac

rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta na jaacute referida estampa de 1550 traz o

seguinte474 (i) Hermogenis Tarsensis rhetoris acutissimmi liber de statibus (pp 1-53)

470 Idem pp 109-10 471 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 13 472 Como se veraacute adiante essa derradeira suposiccedilatildeo que superpotildee categorias como qualidade espeacutecie

forma ou ideia de dizer pende de leituras mais antigas da doutrina retoacuterica de Hermoacutegenes 473 No ldquoDiscurso sobre o poema heroicordquo Manuel Pires de Almeida menciona-o agrave maneira latina como

Natali Comiti em alusatildeo a outro tiacutetulo de sua autoria o Mythologiae siue Explicationis Fabularum (1581)

cf MUHANA A ldquoDiscurso sobre o poema heroico Comentaacuteriordquo REEL Revista Eletrocircnica de Estudos

Literaacuterios Vitoacuteria a 2 v 2 2006 pp 7 22 Mythologiae sive Explicationis Fabularum editou-se em

Frankfurt por Andreas Wechel filho de Christian Wechel editor de Hermoacutegenes cf KILLY W et alii

Dictionary of German Biography Volume 10 Thibaut - Zycha Muumlnchen De Gruyter 2006 p 381 474 Cf Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] Diga-se de (i) a (viii) repete-se o genitivo ldquoHermogenis Tarsensis philosophi ac

154

(ii) De inuentione liber primus (pp 54-67) (iii) De inuentione liber secundus (pp 68-

83) (iv) De inuentione liber tertius (pp 84-121) (v) De inuentione liber quartus (pp

121-154) (vi) De formis orationis liber primus (pp 155-242) (vii) De formis orationis

liber secundusrdquo (pp 243-334) (viii) De methodo gravitatem (pp 337-366) (ix) Aphtonii

sophistae praeligxercitamenta (pp 372-414)475

Manuel Pires de Almeida escreve ldquoConte fls 147 149rdquo Como o sumaacuterio da

ediccedilatildeo o indica natildeo satildeo paacuteginas do tratado De formis orationis as que se referem mas do

De inuentione como latinamente conhecido o Peri heureseōs de capiacutetulo intitulado ldquoDe

mala imitationerdquo na versatildeo de Natale Conti Vale consideraacute-lo O termo grego

correspondente agrave mala imitatio em Hermoacutegenes no Pseudo-Hermoacutegenes como prefere

Michel Patillon por entender espuacuteria a obra eacute kakozēlon () A liccedilatildeo do Peri

heureseōs par a par a traduccedilatildeo de Natale Conti aponta o kakozēlon como viacutecio de

invenccedilatildeo que se produz mediante o impossiacutevel ( ldquoid quod esse nequitrdquo ou

ldquoo que natildeo pode serrdquo) o inconsequente ( ldquonon consequiturrdquo ou ldquoo que

natildeo eacute consequenterdquo ldquoo que natildeo tem sequecircnciardquo) o torpe ( ldquoturperdquo) o iacutempio

( ldquoimpiumrdquo) o injusto ( ldquoiniustumrdquo) ou o hostil agrave natureza

(ldquordquo ldquonaturaelig repugnansrdquo) os quais fazem o narrado (

ldquonarrativordquo) nos termos da doutrina avesso ao verossiacutemil (ldquordquo) A liccedilatildeo aponta

ademais o kakozēlon como viacutecio de elocuccedilatildeo que se produz mediante o uso inepto de

vocaacutebulos metafoacutericos a tropikecirc lexis ( ldquodictio conversardquo) e mediante a

vulgarizaccedilatildeo o inconveniente aviltamento ( ldquosimplicitasrdquo) da semnotēs

(ldquovenustasrdquo) (cf HERM 202 4-204 15) 476 Recorde-se que muito proximamente o Peri

ideōn itera o emprego das tropikai lexeis na conformaccedilatildeo da semnotēs (cf HERM 248 9-

10)

Sabe-se a eleiccedilatildeo do substantivo latino ldquouenustasrdquo no mais comum a Antocircnio

Bonfine como daacute a ler o volume em latim Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris

rhetoris acutissimirdquo Para evitar repeticcedilatildeo natildeo o refiro Apenas em (ii) lecirc-se ldquoacutissimmirdquo em vez de

ldquoacutissimirdquo Mantenho o genitivo em (ix) porque se altera o autor 475 Note-se na ediccedilatildeo de Natale Conti os Progymnaacutesmata (em latim Praexercitamenta) os exerciacutecios

preparatoacuterios atribuiacutedos a Hermoacutegenes substituem-se pelos de Aftocircnio 476 Cf Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] pp 147-9

155

acutissimi de Arte Rhetorica precepta estampado em 1538477 guarda antes a elegacircncia

a formosura mesmo que grave de acordo com Natale Conti do que a nobreza a

solenidade e tem viacutenculos os mais interessantes na tratadiacutestica com a normatizaccedilatildeo da

mala affectatio na poesia Eacute oportuno lembrar que conforme o Peri hermēneias o

kakozēlonentende-se como contrafaccedilatildeo da polidez da elegacircncia do que se diz glaphyros

(cf DEMETR 186-7 ) composto mediante pensamentos palavras ou

conceitos desproporcionalmente operados Pietro Vettori nos seus Commentarii in librum

Demetrii Phalerei de elocutione mais de uma deacutecada depois de Natali Conte verte

ldquoglaphyrosrdquo por ldquoelegansrdquo (cf DEMETR 128 ldquoὉ γλαφυρὸς λόγοςrdquo entende-se como

ldquoElegans oratiordquo) e natildeo traduz o neutro grego kakozēlon translitera-o ao modo do neutro

latino ldquocacozelumrdquo478 Em Pietro Vettori venustas traduz kharis (cf DEMETR 29 156

χάρις) e venustum o neutro ldquoto eukharirdquo (cf DEMETR 156 τὸ εὔχαρι)479 Francesco

Panigarola fazendo glosa da versatildeo do tradutor em Il predicatore ouero parafrase

commento e discorsi intorno al libro dell Elocutione di Demetrio Falereo acrescenta que

ldquoElegans oratiordquo seja equivalente a ldquoVenusta amp elegante nota di direrdquo 480 e opta no

italiano pela forma ldquocacozelordquo explicando-a

Di maniera che si come opposto alla magnificenza egrave il vitio col quale

siamo virtuosamente e souerchiamente magnifici che frigido si

chiamaua Cosigrave opposto alla nota venusta egrave quel vitioso modo di dire

477 Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii item

Sophistaelig Praeligexercitamenta Antonio Bonfine asculano interprete Apud Seb Gryphivm Lvgdvni 1538 pp

137-138 172-180 478 Cf Petri Victorii commentarii in librum Demetrii Phalerei de elocutione Positis ante singulas

declarationes Graecis vocibus Auctoris ijsdemque ad verbum Latine expressis Additus est rerum et

verborum memorabilium index copiosus Cum P II IIII Pont Max Cosmi Medicis Florentianorum

Senensiumq Ducis ampAlphonsi Ferrariensium Ducis privilegijs ampliszlig per decennium Florentiae In officina Iuntarum Bernardi F MDLXII [1562] pp 118 165-6 479 Idem pp 29 140 145 Gustavo Arauacutejo de Freitas tradutor de Demeacutetrio em recente dissertaccedilatildeo de

mestrado afirma com base nos Elementos de retoacuterica literaacuteria de Heinrich Lausberg ldquoNo que concerne

aos estudos de retoacuterica a χάρις eacute em geral tratada como uma das qualidades do ornatus que pode

considerar-se como variante dos genera dicendi Como um ltltornato suavegtgt visaria a oferecer um

resultado sem esforccedilo do belo e corresponde a uma variante do genus medium designando-se como gratia

ou suavitas (iuncunditas dulcitudo dulcedo )rdquo cf Cf FREITAS G A DE Sobre o Estilo de

Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo e estudo introdutoacuterio do tratado) Satildeo

Paulo [UFMG] 2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p 66 480 Il Predicatore di F Francesco Panigarola ouero Parafrase commento e discorsi intorno al libro

dellelocutione di Demetrio Falereo oue vengono i precetti e gli essempi del dire che giagrave furono dati a

Greci ridotti chiaramente alla prattica del ben parlare in prose italiane e la vana elocutione de gli autori

profani accommodata alla sacra eloquenza de nostri dicitori e scrittori ecclesiastici Con due tauole vna

delle questioni e laltra delle cose piugrave notabili Venetia Bernardo Giunti Gio Battista Ciotti amp Compagni

1609 p 413

156

col quale troppo venusti riusciamo amp affettati e questo lo domandano

i Retori Cacozelo Si bene inuero tirando il nome del genere alla

specie percioche significando Сacozelo inepta imitatione cosigrave imita

male chi per essere magnifico egrave troppo magnifico chi per essere tenue

egrave troppo tenue e chi per eszligere aspro egrave troppo aspro come chi per

volere esser venusto egrave troppo venusto e pero dice Quintiliano nel libro

ottauo al capitolo 3 che idest mala affectatio per omne

dicendi genus peccet amp 481 vocatur quidquid est vltra

virtutem quotie[n]s ingenium iudicio caret amp specie boni fallitur

omnium in eloquentia vitiorum pessimum

Tuttauia cosigrave hanno vsato i Retori drsquoappropriare queso generico поте

di Cacozelo agrave questa vitiosa nota che alla venustagrave si oppone e cosigrave

seguiremo ancor noi Auuertendo che si come due sorti di venustagrave

dicemmo di sopra che si trouauano le piugrave nobili e le meno nobili cosigrave

in ciasciuna di queste venustagrave puograve nascere Cacozelo Nelle prime

quando altri volendo eszliger gratioso dagrave nellrsquoafettato e nelle seconde

quando altri per voler far vdire dagrave nel buffone magro e dissipito482

De maneira que assim como oposto agrave magnificecircncia eacute o viacutecio com que

somos virtuosa e excessivamente magniacuteficos que frio se chamava

assim tambeacutem oposto agrave marca elegante eacute aquele vicioso modo de dizer

com que demasiado elegantes nos mostramos e afetados amp este

denominam os retores Cacozelo Se bem assevero tirando o nome do

gecircnero agrave espeacutecie porque significando Сacozelo inepta imitaccedilatildeo assim

imita mal quem para ser magniacutefico eacute demasiado magniacutefico quem para

ser tecircnue eacute demasiado tecircnue e quem para ser aacutespero eacute demasiado

aacutespero tal como quem por querer ser elegante eacute demasiado elegante

Ora disse Quintiliano no livro oitavo capiacutetulo 3 [da Institutio

oratoria] que ldquokakozēlon isto eacute maacute afetaccedilatildeo peque em todo gecircnero

481 Em Francesco Panigarola nesta segunda ocorrecircncia na ediccedilatildeo indicada lecirc-se ldquordquo em vez de

ldquordquo Tendo em vista a intelecccedilatildeo do termo e as liccedilotildees modernas de Quintiliano (cf QUINT VIII

3 56) entendo tratar-se de gralha 482 Il Predicatore di F Francesco Panigarola ouero Parafrase commento e discorsi intorno al libro

dellelocutione di Demetrio Falereo oue vengono i precetti e gli essempi del dire che giagrave furono dati a

Greci ridotti chiaramente alla prattica del ben parlare in prose italiane e la vana elocutione de gli autori

profani accommodata alla sacra eloquenza de nostri dicitori e scrittori ecclesiastici Con due tauole vna

delle questioni e laltra delle cose piugrave notabili Venetia Bernardo Giunti Gio Battista Ciotti amp

Compagni 1609 p 596

157

de discursordquo amp ldquokakozēlondenomina-se tudo o que estaacute para aleacutem da

virtude todas as vezes que o engenho carece de juiacutezo amp eacute enganado

pela boa aparecircncia o pior de todos os viacutecios na eloquecircnciardquo

Todavia muito se acostumaram os retores a acomodarem este geneacuterico

nome de Cacozelo a esta viciosa marca que se opotildee agrave elegante e desse

modo tambeacutem seguiremos noacutes advertindo que assim como enunciamos

acima duas maneiras de elegacircncia que se encontravam a mais nobre e

a menos nobre assim tambeacutem em cada uma dessas elegacircncias pode

nascer o Cacozelo Na primeira quando algueacutem querendo ser gracioso

daacute no afetado e na segunda quando algueacutem por querer se fazer ouvir

daacute no bufatildeo magro e insiacutepido483

Longos os comentaacuterios de Francesco Panigarola agrave versatildeo de Pietro Vettori para o

Peri hermēneias expotildeem usos distintos do termo ldquokakozēlonrdquo De um lado o Pseudo-

Demeacutetrio de outro Quintiliano Resumidamente para o primeiro trata-se de falta que se

avizinha do kharaktēr que o grego denomina glaphyros (cf DEMETR 186) no italiano

como ldquocacozelordquo eacute ldquovitioso modo di direrdquo oposto agrave ldquonota venustardquo agrave ldquovenustagraverdquo Para o

segundo trata-se de mala adfectatio a que pode incorrer poeta ou orador em qualquer

dicendi genus

Κακόζηλον id est mala adfectatio per omne dicendi genus peccat

Nam et tumida et pusilla et praedulcia et abundantia et arcessita et

exultantia sub idem nomen cadunt Denique κακόζηλον vocatur

quidquid est ultra virtutem quotiens ingenium iudicio caret et specie

boni fallitur omnium in eloquentia vitiorum pessimum (QUINT 8 3

56-58)484

Kakozēlon isto eacute maacute afetaccedilatildeo peca em todo gecircnero de discurso pois

com o mesmo termo compreendem-se as coisas tuacutemidas as deacutebeis as

muito doces as abundantes as rebuscadas e as difusas Numa palavra

denomina-se kakozēlontudo o que estaacute para aleacutem da virtude todas as

vezes que o engenho carece de juiacutezo e eacute enganado pela aparecircncia das

483 Traduccedilatildeo nossa 484 Para o texto latino QUINTILIAN With An English Translation Harold Edgeworth Butler Cambridge

Mass Harvard University Press London William Heinemann Ltd 1922 vol iii

158

coisas boas o pior de todos os viacutecios na eloquecircncia485

Eacute evidente como geneacuterica a definiccedilatildeo da Institutio oratoria abraccedila a do Peri

hermēneias De acordo com Quintiliano os adjetivos ldquotumidardquo ldquopusillardquo ldquopraedulciardquo

ldquoabundantiardquo ldquoarcessitardquo e ldquoexultantiardquo especificam maneiras diversas de os discursos

elocutivamente incorrerem no falso do kakozēlon 486 O primeiro deles ldquotumidusrdquo

emprega-se em referecircncia ao viacutecio que contrafaz o gecircnero grave agrave maneira de Horaacutecio

na Epistula ad Pisones que contrapotildee ldquograndisrdquo e ldquoturgeordquo ou seja ldquograndiosordquo e

ldquointumescerrdquo (HOR AP 24-28)487 Jerocircnimo Soares Barbosa no segundo volume das

Instituiccedilotildees oratorias de M Fabio Quintiliano (1790) propotildee em nota de rodapeacute

definiccedilatildeo que esclarece nos termos da regulaccedilatildeo retoacuterica da elocuccedilatildeo o uso lexical latino

relativamente ao viacutecio assim encerrado (cf Rhet Her IV 15)488

he o Inchado assim chamado porque he huma grandeza falsa e

aparente como a dos hydropicos Elle consiste nos pensamentos e

cousas que por si nada tem de grande e sublime e que hum espirito

falso e pequeno se esforccedila por fazer parecer grandes ou pelas palavras

empoladas ou pelas expressotildees exageradas e hyperbolicas ou pelas

figuras e collocaccedilaotilde magnifica489

485 Traduccedilatildeo nossa Na versatildeo quinhentista de Oratio Toscanella o passo traduz-se assim ldquoΚακόζηλον

cioegrave MALA AFFETATIONE pecca per ogni maniera di dir Percio che sotto questo nome cadono le parole

GONFIE amp DEBOLI amp STRADOLCI amp ABONDATI amp MENDICATI amp BORIOSE Vltimamente Cacozelon si chiamma tutto quello che eccedi i termini della uirtugrave amp questo interuiene ogni uolta che lrsquoingegno manca

di giudicio et che dallrsquoapparenza di cosa buona ingannar si lascia Questo uitio nella eloquenza egrave il peszligimo

di tutti i uitijrdquo Em nota acrescenta-se ldquoCACOZELON srsquointerpreta mala affetatione onde diciamo huommo

affettato amp stilo affettatordquo cf Lrsquoinstitutioni oratorie di Marco Fabio Quintiliano retore famosissimo

tradotte da Oratio Toscanella della famiglia di maestro Luca Fiorentino et arricchite dal medesimo della

dichiaratione de i luochi piugrave difficili in margine Di quattro Tauole che seruono a tutta lrsquoopera della vita

dello autore et drsquoannotationi in lettere grandicelle delle cose piugrave importanti Con privilegio In Venetia

appresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLXVI [1566] p 410 486 Observe-se QUINT 8 3 58 487 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4

pp 227-228 488 A definiccedilatildeo de Jerocircnimo Soares Barbosa eacute conforme a da Retoacuterica a Herecircnio ldquoEst autem cauendum ne

dum haec genera consectemur in finituma et propinqua uitia ueniamus Nam graui figurae quae laudanda

est propinqua est ea quae fugienda quae recte uidebitur appellari si sufflata nominabitur Nam ita ut

corporis bonam habitudinem tumor imitatur saepe item grauis oratio saepe inperitis uidetur ea quae turget

et inflata estrdquo ou seja em versatildeo de Marcos Martinho dos Santos ldquoEacute poreacutem para acautelar-se de enquanto

perseguimos esses gecircneros virmos aos viacutecios confinantes e proacuteximos [destes] Pois agrave figura grave que eacute

para louvar estaacute proacutexima aquela de que eacute para fugir a qual pareceraacute corretamente nomeada se a chamarmos

de inchada Pois assim como a boa constituiccedilatildeo do corpo eacute amiuacutede imitada pelo tumor assim a oraccedilatildeo

grave amiuacutede parece aos imperitos aquela que eacute tuacutergida e inchadardquo (Rhet Her IV 15) Cf SANTOS M M

ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 pp 255-256 489 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

159

Jaacute ldquopusillusrdquo eacute habitual na acepccedilatildeo de ldquopequenordquo ldquomuito pequenordquo

ldquoinsignificanterdquo ou ldquodeacutebilrdquo o que pode apontar para a vulgaridade e a chaneza do discurso

que buscando evitar a obscuridade apela agrave clareza em demasia Estampas quinhentistas

de Quintiliano todavia soem oferecer liccedilatildeo distinta do mesmo passo em vez de

ldquopusillardquo conforme a ediccedilatildeo de Harold Edgeworth Butler para a coleccedilatildeo Loeb Classical

Library ldquoexiliardquo 490 O adjetivo ldquoexilisrdquo ndash a forma ldquoexiliardquo eacute neutro plural no caso

nominativo ndash eacute comumente empregado na acepccedilatildeo de ldquomagrordquo ldquodelgadordquo ldquofracordquo e

ldquodeacutebilrdquo donde se leia referecircncia agraves coisas deacutebeis ldquoDEBOLIrdquo como mostra a versatildeo em

italiano da Institutio oratoria elaborada por Orazio Toscanella impressa em Veneza em

1566 De fato eacute uso em sentido muito proacuteximo de ldquopusillardquo491 Jerocircnimo Soares Barbosa

em fins do seacuteculo XVIII lendo Quintiliano afirma que o orador ldquotemendo os precipicios

do sublime apega-se a hum estilo simples e chatildeo e vem a recahir no ldquoBaixo e Seco

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel p 435 490 Cf Quintilianus cum commento [Raphael Regius] Venetiis per Bonetum Locatellum 1506 sp cf

Marci Fabii Quintiliani Orationum Institutionum Libri Duodecim diligenter emendati 1518 p 193r cf

M Fabii Quintiliani Rhetoris clarissimi de Institutione Oratoria ad Marcellum Victorium libri XII Pariis

Ex Officina Michaeumllis Vascosani in uia quae est ad D Iacobum sub fontis insigni M D XXII [1527] pp

183v-184r cf M Fabii Quintiliani oratoriarum institutionum libri duodecim Summa diligentia tum

iudicio ad uenustiszligimorum quorũq exemplariorum fidem recogniti additis simul eiusdem declamationib amp eruditiszligimis amp stylo sui periculum facturis utiliszligimis Eucharius Ceruicornus excudebat ANNO M D

XXII [1527] mense avg p 154 cf M Fabii Quintiliani oratoris eloquentissimi Instituonum oratoriarum

Libri XII incredibili cum studio tum iudicio ad fibem uenustissimi exemplaris recens iam recogniti

Eiusdem Declamationum Liber Basileae ex aedibus Ioannis Bebelii Mense Augusto M D XXIX [1529] p

121v cf Marci Fabii Quintiliani Instituonum oratoriarum Libri XII Declamationum Liber eiusdem

Lvgdvni Apud Seb Gryphivm 1536 p 369 cf Marci Fabii Quintiliani Instituonum oratoriarum Libri XII

Declamationum Liber eiusdem Lvgdvni Apud Seb Gryphivm 1540 p 369 cf M Fabii Quintiliani

Instituonum oratoriarum libri duodecim Declamationum Liber eiusdem Summa diligentia ad finem

uenustiszligimorum codicum recogniti ac restituti Cum rerum uerborumq Indice locupletiszligimum Lvgdvni

Apud Seb Gryphivm 1555 p 468 491 Eacute o caso da versatildeo quinhentista em italiano da Institutio oratoria elaborada por Orazio Toscanella e estampada em Veneza em 1566 ldquoΚακόζηλον cioegrave MALA AFFETATIONE pecca per ogni maniera di dir

Percio che sotto questo nome cadono le parole GONFIE amp DEBOLI amp STRADOLCI amp ABONDATI amp

MENDICATI amp BORIOSE Vltimamente Cacozelon si chiamma tutto quello che eccedi i termini della uirtugrave

amp questo interuiene ogni uolta che lrsquoingegno manca di giudicio et che dallrsquoapparenza di cosa buona

ingannar si lascia Questo uitio nella eloquenza egrave il peszligimo di tutti i uitijrdquo Em nota acrescenta-se

ldquoCACOZELON srsquointerpreta mala affetatione onde diciamo huommo affettato amp stilo affettatordquo cf

Lrsquoinstitutioni oratorie di Marco Fabio Quintiliano retore famosissimo tradotte da Oratio Toscanella della

famiglia di maestro Luca Fiorentino et arricchite dal medesimo della dichiaratione de i luochi piugrave difficili

in margine Di quattro Tauole che seruono a tutta lrsquoopera della vita dello autore et drsquoannotationi in lettere

grandicelle delle cose piugrave importanti Con privilegio In Venetia appresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari

MDLXVI [1566] p 410

160

(exilia)rdquo 492

Emprega-se ademais na Institutio oratoria em referecircncia agraves espeacutecies de

kakozēlon ldquopraedulcisrdquo a saber o que seja doce aleacutem da conta Consoante os

comentaacuterios de Jerocircnimo Soares Barbosa (cf QUINT 2 5 22)

Quint chama a este estilo praedulce dicendi genus porque he a mesma

doccedilura do estilo dos Sophistas (de que fallamos assima pag 434 n 7)

quando he demasiada ou intempestiva Elle consiste na affectaccedilaotilde

pueril das flores e enfeites miudos e mais brilhantes da Rhetorica493

Note-se com ldquoestilo dos Sophistas (de que fallamos assima pag 434 n 7)rdquo

Jerocircnimo Soares Barbosa alude aos preceitos do Peri ideōn de modo a asseverar que as

praedulcia de Quintiliano o tal praedulce dicendi genus gecircnero de discurso muito doce

seja o avesso faltoso e contrafeito da glykytēs a ldquoDoccedilurardquo apresentada como ldquosegunda

espeacutecie de oraccedilaotilde Morata de Hermoacutegenesrdquo nos comentaacuterios do letrado setecentista

portuguecircs494 Por ldquooraccedilaotilde Moratardquo entenda-se o ēthos como idea Leitor de Ciacutecero

492 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel pp 434-435 440 Pendendo por certo da leitura de Jerocircnimo Soares Barbosa dramatiza-se em Camilo Castelo Branco (1825-1890) no romance A queda drsquoum anjo (1866) o passo em questatildeo

ldquoO presidente Lembro ao nobre deputado que a camara natildeo eacute aula de rhetorica

O orador Assim devo presumil-o vendo que todos a professam com dignidade exceptuado eu

que me natildeo desdoiro em confessar que sou o discipulo uacutenico e maacuteo de tantos mestres Eu direi a v exa

qual eloquencia considero necessaria nrsquoesta casa da naccedilatildeo eacute a eloquecircncia que a naccedilatildeo entenda A arte de

bem fallar ars beacutene dicendi eacute o estudo da clareza no exprimir a ideacutea Os affectos as galas da linguagem

que lhe tolhem o mostrar-se e dar-se a conhecer dos rudos natildeo eacute arte eacute tramoya natildeo eacute luz eacute escuridade

Os meus constituintes mandaram-me aqui fallar das necessidades drsquoelles em termos taes que por elles v

exa e a camara lhas conheccedilam ponderem e remedeiem

Sou da velha clientela de Quintiliano sr presidente Com elle entendo que por demais se enganam aquelles

que alcunham de popular o estylo vicioso e corrupto qual eacute o saltitante o agudo o inchado e o pueril que o mestre denomina praeligdulce dicendi genus todo affectaccedilatildeo menineira de florinhas broslados de

pechisbeque recamos de fitas como em bandeirolas de arraialrdquo cf CASTELO BRANCO CAMILO A queda

drsquoum anjo romance Lisboa Livraria de Campos Junior 1866 pp 131-132 493 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel p 436 494 Idem p 434

161

Jerocircnimo Soares Barbosa articula as categorias artiacutesticas do Peri ideōn com as do Orator

e assume que o sofista vituperado pela dicccedilatildeo dita praedulcis discursa com o propoacutesito

natildeo de abalar os acircnimos (ldquoperturbare acircnimosrdquo) mas de ser apraziacutevel (ldquoplacarerdquo) natildeo

tanto de persuadir (ldquopersuadererdquo) quanto de deleitar (ldquodelectarerdquo) mediante pensamentos

antes agradaacuteveis que provaacuteveis (ldquoconcinnas magis sententias exquirunt quam

probabilisrdquo) afastamentos digressivos do caso (ldquoa re saepe disceduntrsquo) entrelaccedilamentos

fabulares (ldquointexunt fabulasrdquo) e no ofiacutecio elocutivo mediante metaacuteforas manifestas

dispostas como cores variadas do pintor (ldquoverba apertius transferunt eaque ita disponunt

ut pictores varietatem colorumrdquo) paralelismos (ldquoparia paribus referuntrdquo) antiacuteteses

(ldquoadversa contrariisrdquo) e homeoteleutos (ldquosaepissimeque similiter extrema definiuntrdquo) (cf

CIC Or XIX 65) 495

O que Jerocircnimo Soares Barbosa considera ser demasiado intempestivo na

figuraccedilatildeo da glykytēs pensa-se como viacutecio cujo exemplo estaacute no sofista Para

Hermoacutegenes o discurso que tenha clareza majestade e amplitude em grego saphēneia

axiōma e onkos caso lhe falte beleza e harmonia isto eacute kallos e eurythmia seraacute algo

acerbo ldquoagleukēsrdquo (ldquoἀγλευκήςrdquo) carente de doccedilura de suavidade (cf HERM 296 5-14)

Vale rememorar ainda que de maneira breve agrave luz dos stoikheia definidos no Peri ideōn

glykytēs eacute categoria ancilar de conformaccedilatildeo eacutetica cujas ennoiai sejam efetuadas mediante

os relatos miacuteticos tal os de Fedro os relatos vizinhos dos miacuteticos tal os da Guerra de

Troia os passos fabulares de relatos de credibilidade tal os de Heroacutedoto os enunciados

agradaacuteveis aos sentidos os encocircmios e enfim as personificaccedilotildees (cf HERM 330 1-335

23) Os methodoi proacuteprios agrave glykytēs satildeo equivalentes aos que compotildeem a katharotēs e a

apheleia os que narrem accedilotildees de modo nu sem enredamentos (cf HERM 227 19-228

3 327 24-328 15 335 24-25) A lexis que compete a essa idea compartilha

procedimentos elocutivos com as duas espeacutecies supracitadas ou seja o vocabulaacuterio

corrente nem metafoacuterico nem duro vale-se ademais do registro poeacutetico ndash do dialeto

jocircnico itere-se uma vez tido por mais apraziacutevel ndash e aplica-se por adjetivos e por dicccedilatildeo

engenhosa a saber atinente agrave idea de drimytēs (cf HERM 328 16-329 4) Entre os

495 Idem ibidem Cf CIC Or 19 65 ldquoSophistarum de quibus supra dixi magis distinguenda similitudo

videtur qui omnes eosdem volunt flores quos adhibet orator in causis persequi Sed hoc differunt quod

cum sit his propositum non perturbare animos sed placare potius nec tam persuadere quam delectare et

apertius id faciunt quam nos et crebrius concinnas magis sententias exquirunt quam probabilis a re saepe

discedunt intexunt fabulas verba apertius transferunt eaque ita disponunt ut pictores varietatem colorum

paria paribus referunt adversa contrariis saepissimeque similiter extrema definiuntrdquo Observe-se M T

Ciceronis ad Marcum Brutum Orator cum Victoris Pisani Patritij Veneti commentario Lvgdvni Apud Seb

Gryphivm 1536 p 21

162

skhēmata a glykytēs opera-se pela construccedilatildeo direta pelo desuso do hipeacuterbato e pelo uso

do ornato que confere ao discurso beleza o kallos (cf HERM 229 19-232 7 299 8-306

22 329 5-6 339 3-5)496 A synthēkē deve ser agradaacutevel e aproximar do verso a prosa de

modo a fazer-se predominante no discurso dotado de doccedilura de suavidade o peacute solene

(semnos) pouco atento ao hiato no mais dactiacutelico anapeacutestico ou peocircnico por vezes

iacircmbico frequentemente espondaico (cf HERM 251 21-253 11) As anapauseis

conveacutem que sejam tambeacutem solenes e o rhythmos estaacutevel (cf HERM 339 11-13)

Acrescente-se consoante os comentaacuterios aduzidos nas Instituiccedilotildees oratorias de

M Fabio Quintiliano os demais termos empregados para referir o kakozēlon em suas

espeacutecies satildeo ldquoabundantiardquo ldquoarcessitardquo e ldquoexultantiardquo articulados como viacutecios elocutivos

decorrentes do uso desmedido da copiosidade que evita o baixo o vulgar o chatildeo

Affecta riqueza de ornatos e abundancia de expressaotilde Cahe no estilo

verboso e Asiatico (abundantia) Se quer affectar hum estilo novo e

extraordinaacuterio cahe nas expressotildees exquisitas arrastadas e foacutera do

natural (arcessita) Em fim querendo dar ao seo discurso huma

collocaccedilaotilde suave e harmoniosa passa os limites e daacute-lha molle e

effeminada similhante aacute marcha e compasso das danccedilas lascivas

(exultantia)497

Vale referir agrave guisa de exemplo pensando as faltas decorrentes do uso concebido

como descurado dos genera dicendi pelo excesso ldquodaquella maravilha e novidade da

Materia ou do Artificio em que consiste a belleza poeticardquo 498 em conformidade com a

Institutio oratoria ou mais precisamente pensando os ldquoExtremos viciosos dos estylos

496 Hermoacutegenes elenca conjunto de figuras que faccedilam belo o discurso parisose epanaacutefora antiacutestrofe

epanaacutestrofe paralelismo hipeacuterbato afirmaccedilotildees mediante negaccedilotildees e poliacuteptoton kallos (cf HERM 299 8-

306) 497 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel p 101 498 Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes

tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip

Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens

ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo

ferat error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX

Com as licenccedilas necessarias p 199

163

contrapostos equivocos alusotildees e outras pestes condemnadasrdquo 499 Francisco Joseacute Freire

(1719-1773) na Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral e de todas as

suas especies principaes tratadas com juizo critico escreve jaacute bastante distante da

visada apologeacutetica de Manuel de Galhegos

Quem ler o Virginidos de Barbuda o Ulyssipo de Macedo o Macabeo

de Sylveira o Condestable de Lobo e a Ulyssea de Gabriel Pereira ha

de achar muitas destas argucias conceitos falsos antithesis

paranomasias equivocos de vozes ampc Seria materia infinita se para

exemplos allegassemos versos destes Poetas e baste que os eruditos

saibaotilde que fallamos verdade no que dizemos500

Isso posto buscam esmiuacuteccedilar os comentaacuterios de Jerocircnimo Soares Barbosa

horacianamente que os viacutecios reunidos sob a rubrica ldquokakozēlonrdquo pendem da falta de arte

(cf HOR AP 25-31)501 isto seja da falta de mestria no trabalho elocutivo com todos os

gecircneros do discurso (cf QUINT 8 3 56) Nisso jaacute se sabe dista a leitura do letrado luso

em fins do seacuteculo XVIII daquela seiscentista de Francesco Panigarola comentador

minucioso do Peri hermēneias na versatildeo do florentino Pietro Vettori (1562) O que

interessa niacutetidos os usos vocabulares diferenccedilados em Il predicatore ouero parafrase

499 Idem ibidem 500 Idem p 204 Aleacutem da Ulyssea ou Lisboa Edificada de Gabriel Pereira de Castro os poetas e os poemas citados por Francisco Joseacute Freire satildeo (i) Manuel Mendes de Barbuda (1607-1670) Virginidos ou Vida da

Virgem Senhora Nossa Poema Heroico dedicado a Magestade da Rainha Dona Luiza Nossa Senhora por

Manuel Mendes de Barbuda amp Vasconcellos Lisboa Na Officina de Diogo Soares de Bulhoens 1667

Com todas as licenccedilas necessarias (ii) Antocircnio de Sousa de Macedo (1606-1682) Vlyssipo Poema

heroico De Antonio de Sousa de Macedo Com as licenccedilas necessarias Em Lisboa Por Antonio Aluarez

Anno de 1640 (iii) Miguel da Silveira (ca 1576-1636) El Macabeo Poema heroico de Migvel de Silveira

En Napoles por Egidio Longo Stampador Real Antildeo 1638 (iv) Francisco Rodrigues Lobo (ca 1580-1622)

O Condestabre de Portugal D Nuno Alvres Pereira de Francisco Rodrigues Lobo oferecido ao Duque

dom Theodosio segundo deste nome Em Lisboa Com todas as licenccedilas necessarias por Pedro

Crasbeeck 16010 [ie 1610] 501 Itero os vv 25-31 da Epistula ad Pisones citados na nota 56 na traduccedilatildeo seiscentista impressa por Joatildeo da Costa ldquolaboro se procuro eszlige brevis ser breve fio me faccedilo Obscurus escuro sectantem ao que segue

leuia cousas faceis nerui as forccedilas animique amp os animos Deficiunt lhe faltatildeo professus o que prende

cotildepor grandes cousas grandia se incha turget amp esvaece tutus nimium amp o q procura ir mui seguro

timidusque amp estagrave temeroso procellae da adversidade amp inveja Serpit vai de gatinhas humi pelo chatildeo Qui

cuput aquelle que deseja uariare variar rem unam algũa cousa prodigialiter foacutera do costume amp feacute humana

appingit pinta Delphinum hum golfinho syluis nos bosques aprum hum javali fluctibus nas ondas Fuga

culpaelig o fugir de hum erro inducit faz cair In uitium em outro mayor si caret arte se o que isto procura

carece de arterdquo cf Obras de Horacio principe dos poetas latinos lyricos com o entendimento litteral amp

construiccedilam Portuguesa ornadas de hum index copioso das historias amp fabulas contiudas nelas

Emendadas nesta vltima Impressam Lisboa Na Officina de Ioam da Costa m dc lvviii [1668] Com as

licenccedilas neceszligarias p 427

164

commento e discorsi intorno al libro dell Elocutione di Demetrio Falereo e assim

afastada autoridade de Quintiliano eacute que se note que Francesco Panigarola opera os

avessos a virtude da venustagrave e o viacutecio do Cacozelo traduzindo jaacute se sabe glaphyros e

kakozēlon (cf DEMETR 128-189)

Ora essa oposiccedilatildeo embora natildeo mais confrontadas mas acomodadas agraves

autoridades do Peri hermēneias e da Institutio oratoria eacute conhecida da tratadiacutestica do

poeta Torquato Tasso natildeo soacute ensinam os Discorsi del poema heroico que ldquovenustordquo

traduza ao latim o grego ldquoγλαφυρόςrdquo ou seja o que se denomina ldquoparlar ornato e

gratiosordquo502 senatildeo tambeacutem que

Demetrio crsquoinsegna chersquol parlar freddo egrave vicino al magnifico il

cacozelo che noi seguendo Quintiliano possiam dire male affettato al

venusto o gratioso lrsquoasciutto al tenue lrsquoinuenusto orsquol disgraziato al

graue503

Demeacutetrio nos ensina que o falar frio se avizinha ao magnifiacuteco o

cacozelo que noacutes seguindo Quintiliano possamos dizer mal afetado

ao elegante ou gracioso o enxuto ao tecircnue o deselegante ou o sem

graccedila ao grave504

No mais sabe-se tambeacutem emprega-se a oposiccedilatildeo entre uenustas e mala imitatio

no De inuentione recolhido no volume Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris

acutissimi De Arte Rhetorica praecepta em versatildeo quinhentista de Natale Conti A

destacar-se no entanto que o vocabulaacuterio da liccedilatildeo grega do tratado atribuiacutedo a

Hermoacutegenes traz semnotēs e kakozēlon natildeo glaphyros e kakozēlon Disso eacute possiacutevel

aventar resulta da versatildeo de Natale Conti e isso vale para a ediccedilatildeo vecircneta de Antocircnio

Bonfine (1538) a conciliaccedilatildeo mediante a afinaccedilatildeo do vocabulaacuterio em uso em latim das

categorias discursivas que no De inuentione e no Peri hermēneias normatizam o que

seja ou natildeo kakozēlon ou mala adfectatio Por assim dizer Natale Conti e Antocircnio

Bonfine fazem com que as obras gregas estabeleccedilam preceitos afins legitimados segundo

502 Cf Discorsi del poema heroico del S Torquato Tasso Allrsquoillustrissmo e reverendissmo Signor Cardinale

Aldo Brandino Nella Stamparia dello Stigliola In Napoli Ad instantia di Paolo Venturino [1594] p 146 503 Idem pp 169-170 504 Traduccedilatildeo nossa

165

o costume bem definido do Pseudo-Demeacutetrio Recorde-se a liccedilatildeo latina de Natale Conti

eacute a liccedilatildeo do texto de Hermoacutegenes citada por Manuel Pires de Almeida no Poesia e Pintura

ou Pintura e Poesia505

Ora Filiberto Campanile na leitura que faz da semnotēs em princiacutepio do seacuteculo

XVII itera os preceitos conhecidos do Peri ideōn e adverte ser necessaacuterio no uso dos

ldquovoci traslate di Grandeza e maestagraverdquo 506 isto eacute dos vocaacutebulos translatos que operam o

megethos e a semnotēs natildeo apenas afastar-se de toda ldquoDisagguaglianzardquo (disparidade)

ou ldquoDissimilitudinerdquo (dissimilitude) senatildeo tambeacutem em contrapartida observar-se a ldquola

proportione e conuenienza che deuranno hauer fra loro la cosa onde se piglia il traslato

e quella oue si recardquo (a proporccedilatildeo e a conveniecircncia que deveraacute haver entre a coisa donde

se toma a translaccedilatildeo e aquela aonde se conduz) 507 Exemplo de ldquoproportionerdquo e

ldquoconuenienzardquo lecirc-se em verso de Francesco Petrarca (Soneto CCCXXXV v 12) ldquoO

belle amp alte e lucide fenestrerdquo (Oacute belas amp altas amp luacutecidas janelas) 508 As razotildees de

Filiberto Campanile retecircm a afirmaccedilatildeo da proporccedilatildeo dos termos que fazem a metaacutefora de

Francesco Petrarca na voz do preceptista trata-se de boa metaacutefora por ser bem-

proporcionada

come lrsquohabitator drsquovna casa per mezzo dele finestre puograve veder le cose

che sono di fuori cosigrave lrsquoanima nostra per mezzo de gli occhi de corpo

vede gli oggeti che di fuori si le presentano 509

como o habitante de uma casa por meio das janelas pode ver as coisas

que estatildeo fora assim tambeacutem a nossa alma por meios dos olhos do

corpo vecirc os objetos que de fora se apresentam a eles 510

Natildeo eacute demais rememorar que Filiberto Campanile ao prescrever os pensamentos

os concetti puri traz exemplo do uso do substantivo ldquofenestrardquoldquofinestrardquo em versos do

505 Cf MUHANA A Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia Tratado Seiscentista de Manuel Pires de

Almeida Satildeo Paulo Edusp pp 109-110 506 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 36 507 Idem ibidem 508 Idem ibidem Traduccedilatildeo nossa Na versatildeo de Joseacute Clemente Pozenato ldquoOh belas altas luacutecidas janelasrdquo

cf PETRARCA F Cancioneiro Traduccedilatildeo de Joseacute Clemente Pozenato Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial

Campinas Editora da Unicamp 2014 p 485 509 Idem pp 36-37 510 Idem ibidem

166

soneto LXV de Francesco Petrarca a fenestra donde Amor lanccedilou mil setas contra o

indignado sujeito de enunciaccedilatildeo e postula que o deslocamento semacircntico produzido pela

metaforizaccedilatildeo do substantivo eleve o discurso para aleacutem dos efeitos da puritagrave511 Nos

termos do mesmo preceito elevaccedilatildeo eacute o que as ldquobelle amp alte e lucide fenestrerdquo compotildeem

O Hermoacutegenes lido por Filiberto Campanile ensina que a semnotēs (no italiano maestagrave

ou dignitagrave) efetua-se discursivamente por meio de pensamentos ennoiai que digam

respeito (i) aos deuses como ilustra o Timeu de Platatildeo (ii) agraves coisas divinas tal a

natureza e suas causas como ilustram Heroacutedoto e o Timeu (iii) agraves coisas divinas atinentes

aos homens que pesem a imortalidade da alma a justiccedila a temperanccedila as leis e questotildees

afins como ilustra Demoacutestenes e enfim (iv) agraves coisas humanas preeminentes e

endoxais quais as batalhas de Salamina e Maratona como ilustra Heroacutedoto (cf HERM

242 22-3 244 20-246 9)512 Ora se as ldquofenestrerdquoldquofinestrerdquo satildeo conceitualmente alma

agrave luz do Peri ideōn o que os versos de Francesco Petrarca enunciam satildeo ldquocoisas divinas

atinentes aos homensrdquo

Adverte ademais Filiberto Campanile ldquoOltre a ciograve si deuragrave mirar bene nel

formar dersquo traslati che non si piglino molto di lontanordquo (Aleacutem disso se deveraacute atentar

bem para o formar dos translatos que natildeo se tomem de muito distante) 513 Desatento ao

cuidado aponta o tratado Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia eacute Dante Alighieri (1265-

1321) na Commedia ao metaforizar ldquoaacuteguardquo como ldquospecchio di Narcissordquo (espelho de

Narciso) Nos comentaacuterios quatrocentistas de Cristoforo Landino (1424-1498) ao passo

do ldquoInfernordquo tal como impressos em Veneza em 1578 o ldquospecchio di Narcissordquo explica-

se como ldquoun limpido e chiaro fonte che Sinon per lrsquoardente febre non hauria uoluto

molte ad inuitar a leccarlordquo (uma liacutempida e clara fonte que Sinon pela ardente febre

natildeo quisera convidar muitos a lamber) 514 Filiberto Campanile pondera que melhor seria

511 Apud LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] p 15 512 Pontua Hermoacutegenes que o trato das coisas divinas se alegoriza as humanas agrave maneira poeacutetica faz mais

para o prazer e o deleite (hēdonē ἡδονή) e para a doccedilura e a suavidade (glykytēs ) do que para

a semnotēs do enunciado (cf HERM 242 22-243 5)512 e tambeacutem que o trato das coisas da natureza se

lhes indaga as causas como quando se buscam as razotildees dos movimentos da terra e do mar por exemplo

faz semnos o discurso mas natildeo poliacutetico (cf HERM 243 22-244 3) A indagaccedilatildeo causal da physis

depreende-se do preceito do Peri ideōn parece instaurar limiares aleacutem dos quais o discurso poliacutetico ainda

que partiacutecipe da semnotēs porque circunstancial natildeo avanccedila 513 Idem p 37 Traduccedilatildeo nossa 514 Cf Dante con le espositioni di Christoforo Landino et Alessandro Vellutello Sopra le sua Comedia

dellrsquoInferno del Purgatorio amp del Paradiso Con Tauole Argomenti Allegorie amp riformato riueduto amp

ridotto alla sua uera Lettura con Francesco Sansovino Fiorentino In Venetia Apresso Giambattista

Marchio Sessa amp Fratelli 1578 p 147v Os versos provecircm da Commedia Inferno XXX 128

167

se Dante tivesse eleito ao compor a translaccedilatildeo ldquoaltro nome di cosa piu conosciutardquo (outro

nome de coisa mais conhecida) como em sua avaliaccedilatildeo fez Francesco Petrarca no

soneto ldquoIl cantar novo ersquol pianger delli augellirdquo ao fazer uso da metaacutefora ldquoliquidi

cristallirdquo (cristais liacutequidos) uma vez que nas palavras do preceptista ldquogli occhi di nostra

mente con piu faciltagrave corrono a considerar le cose chrsquoaltre volte habbiamo veduto che

non quelle che solamente sentimmo raccontarerdquo (os olhos de nossa mente com mais

facilidade correm a considerar as coisas que outras vezes vimos que natildeo aquelas que

apenas ouvimos contar) 515

O pecado de Dante Alighieri pensa-se em termos aristoteacutelicos Conforme a

Poeacutetica sabe-se bem a metaacutefora por analogia de proporccedilatildeo (cf ARISTOT Poet 21 1457

b 9 ldquoκατὰ τὸ ἀνάλογονrdquo) concebe-se como transferecircncia de sentido entre quatro termos

postos em relaccedilatildeo de sorte que nas palavras de Aristoacuteteles em traduccedilatildeo de Eudoro de

Souza ldquoo segundo termo estaacute para o primeiro na igual relaccedilatildeo em que estaacute o quarto para

o terceiro porque nesse caso o quarto poderaacute substituir o segundo e o segundo o quartordquo

(cf ARISTOT Poet 21 1457 b 16-19 ldquoτὸ δὲ ἀνάλογον λέγω ὅταν ὁμοίως ἔχῃ τὸ

δεύτερον πρὸς τὸ πρῶτον καὶ τὸ τέταρτον πρὸς τὸ τρίτον ἐρεῖ γὰρ ἀντὶ τοῦ

δευτέρου τὸ τέταρτον ἢ ἀντὶ τοῦ τετάρτου τὸ δεύτερονrdquo) Assim de acordo com o

exemplo conhecidiacutessimo fornecido por Aristoacuteteles estaacute a taccedila (φιάλη) para Dioniso (ou

Baco) como o escudo (ἀσπίς) para Ares (ou Marte) de maneira que por relaccedilatildeo de

semelhanccedila a taccedila seja ldquoo escudo de Dionisordquo e o escudo seja ldquoa taccedila de Aresrdquo (cf

ARISTOT Poet 21 1457 b 20-22 ldquoλέγω δὲ οἷον ὁμοίως ἔχει φιάλη πρὸς Διόνυσον καὶ

ἀσπὶς πρὸς Ἄρη ἐρεῖ τοίνυν τὴν φιάλην ἀσπίδα Διονύσου καὶ τὴν ἀσπίδα φιάλην

Ἄρεωςrdquo) Concede a Poeacutetica que ainda que falte um dos quatro termos da relaccedilatildeo de

proporccedilatildeo ainda assim a metaacutefora pode se construir (cf ARISTOT Poet 21 1457 b 25-

26) Entende-se esse eacute o caso do exemplo colhido por Filiberto Campanile na Commedia

aacutegua Narciso espelho Oslash donde se enuncie que a aacutegua eacute o ldquospecchio di Narcissordquo

Sabe-se o preceptista condena Dante Alighieri senatildeo que pela distacircncia semacircntica dos

termos operados516

Mais a preceituaccedilatildeo aristoteacutelica prevecirc a construccedilatildeo da metaacutefora por analogia de

proporccedilatildeo por via da negaccedilatildeo de qualidades proacuteprias do termo metafoacuterico Por exemplo

o escudo em vez de ser dito ldquoa taccedila de Aresrdquo pode ser dito ldquoa taccedila sem vinhordquo (cf ARIST

515 Idem ibidem 516 Cf CARVALHO M DO S F DE Poesia de agudeza Satildeo Paulo Humanitas Edusp Fapesp 2007 p 86

168

Poet 21 1457 b 30-33) e a taccedila (ldquoTazzardquo) na leitura do conde Emanuele Tesauro pode

ser ldquoSCUDO NON DI MARTErdquo 517 Ensina Il Cannocchiale Aristotelico metaacuteforas dessa

derradeira espeacutecie ldquoformino vn composito monstruoso che per la nouitagrave generi

marauiglia amp questa il dilettordquo (formam um composto monstruoso que pela novidade

gere meravilha amp esta o deleite)518 ou pela conjugaccedilatildeo de um positivo (ldquoSCUDOrdquo) com

um negativo (ldquoNON DI MARTErdquo) ou pela conjugaccedilatildeo de positivos incompatiacuteveis De um

procedimento e de outro resultam ldquoEnimmi argutissimi amp marauigliosirdquo (Enigmas

argutiacutessimos amp maravilhosos)519

O exemplo referido por Emanuele Tesauro para elucidar a construccedilatildeo da metaacutefora

por analogia de proporccedilatildeo mediante a conjugaccedilatildeo de positivos incompatiacuteveis eacute relevante

ldquoCosigrave le limpide acque si chiaman LIQVIDI CRISTALLI amp per contrario il Poeta chiamograve il

Cristallo ACQUE CONGELATErdquo (Assim como as aacuteguas liacutempidas satildeo chamadas CRISTAIS

LIQUIDOS tambeacutem contrariamente o poeta chamou o Cristal AacuteGUAS CONGELADAS)520

Ora a fim de ilustrar a composiccedilatildeo da elocuccedilatildeo metafoacuterica Emanuele Tesauro como

Filiberto Campanile recorre a uso autorizado por Francesco Petrarca Nos termos de

Aristoacuteteles supotildee-se que os conceitos aacutegua e cristal embora dessemelhantes pois que

relativos a coisas dessemelhantes em substacircncia possam ser assemelhados por um

atributo comum a limpidez de modo que se diga por comparaccedilatildeo que ldquoa aacutegua eacute

liacutempida como o cristalrdquo e por condensaccedilatildeo da comparaccedilatildeo que ldquoa aacutegua eacute cristalrdquo521 Natildeo

eacute essa a metaacutefora todavia Francesco Petrarca modifica o sentido do substantivo ldquocristalrdquo

por meio do adjetivo ldquoliacutequidordquo e alcanccedila o efeito de estranhamento pela

incompatibilidade na doxa da conjugaccedilatildeo dos conceitos liquidez e cristal Ora se a

afirmaccedilatildeo ldquoa aacutegua eacute liacutequidardquo eacute definiccedilatildeo do elemento por uma qualidade como o eacute ldquoa

aacutegua eacute liacutempidardquo e ldquoa aacutegua eacute cristalrdquo eacute definiccedilatildeo da substacircncia mediante a metaacutefora por

analogia de atribuiccedilatildeo ldquoa aacutegua eacute cristal liacutequidordquo eacute metaacutefora engenhosa construiacuteda na

mesma regulaccedilatildeo de atribuiccedilatildeo sob conceitos paradoxais mas avizinhados Ora pode-se

517 Il cannocchiale aristotelico orsquo sia Idea dellarguta et ingeniosa elocutione che serue agrave tutta lrsquoarte

oratoria lapidaria et simbolica esaminata co principii del diuino Aristotele dal conte D Emanuele

Tesauro Cavalier Gran Croce dersquo Santi Mauritio et Lazaro Quarta impressione Accresciuta dallrsquo Autore

Trattati cioegrave Dersquo Concetti Predicabili et Degli Emblemi con un nuouo Indice Alfabetico oltre agrave quello

delle materie Dedicato al Reuerendiss Padre Gio Paolo Oliva Vicario Generale della Compagnia di

Giesu In Roma agrave Spese di Guglielmo Halleacute Libraro nella Piazza di Pasquino M DC LXIV [1664] Con

licenza dersquo Superiori E Priuilegio p 346 518 Idem ibidem 519 Idem ibidem 520 Idem ibidem 521 Cf HANSEN J A ldquoRetoacuterica da agudezardquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 pp 319-321

169

aventar trata-se de procedimento exemplar conforme Filiberto Campanile na

constituiccedilatildeo da maestagravesemnotēs

Isso posto para conceber ldquoEnimmi argutissimi amp marauigliosirdquo ou seja para

operar conceitos distantes522 Emanuele Tesauro reaplica o procedimento teacutecnico aos

termos colhidos de Francesco Petrarca ldquoLIQVIDI CRISTALLIrdquo e figura o que se pode

entender como metaacutefora da metaacutefora Assim na medida em que se aceite como verossiacutemil

a analogia de atribuiccedilatildeo entre esses termos eacute conveniente a seguinte relaccedilatildeo de

proporccedilatildeo liquidez aacutegua solidez cristal donde se possa afirmar natildeo soacute que ldquoa aacutegua

eacute cristal liquefeitordquo senatildeo tambeacutem por oposiccedilatildeo que ldquoo cristal eacute aacutegua solidificadardquo ou

por desdobramento semacircntico que ldquoo cristal eacute aacutegua congeladardquo Mediante a aplicaccedilatildeo do

mesmo procedimento entendem-se os ldquojaspes liacutequidosrdquo para conceituar mar referidos

no verso 210 da Soledad I de D Luis de Goacutengora523 Agrave letra dos preceitos de Filiberto

Campanile a metaforizaccedilatildeo enigmaacutetica ensinada por Emanuele Tesauro parece arriscar-

se agrave desmedida Conforme Manuel de Galhegos dessa desmedida afasta-se a Ulyssea ou

Lisboa Edificada de Gabriel Pereira de Castro Recorde-se

Nas metaforas tem moderaccedilaotilde amp propriedade porq saotilde poucas vsadas

em seu lugar amp todas fundadas na circunstancia mais vista amp mais

notoria dos sujeitos O q he taotilde deficultoso q obseruando Arist o

inaccessiuel da poesia diz q somente os homens de engenho preclaro

sabem vsar da metafora com perfeiccedilaotilde524

No ldquoDiscurso sobre o poema heroicordquo de Manuel Pires de Almeida a moderaccedilatildeo

e a propriedade natildeo apenas no uso das metaacuteforas operam-se como praacutetica distintiva dos

poetas que sejam dignos de elogio em contraste com os chamados poetas cultos

considerados dificultosos e viciosos pela aplicaccedilatildeo teacutecnica da elocuccedilatildeo rara feita

enumera o tratadista de ldquooraccedilotildees desatadas palavras esquisitas translaccedilotildees nunca vistas

522 Idem p 330 523 Cf Lecciones solemnes a las obras de Don Luis de Gongora y Argote Pindaro Andaluz Principe de

los poeta liricos de Espantildea Escrivialas Don Ioseph Pellicer de Salas y Tovar Sentildeor de la Casa de Pellicer

y Chronista de los Reinos de Castilla Dedicadas al Serenissimo Sentildeor Cardenal Infante Don Fernando de

Austria MDCXXX [1630] Con Priuilegio en Madrid En la Imprenta del Reino A costa de Pedro Coello

Mercader de Libros p 406 524 Apud Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de

Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro sp

170

locuccedilotildees peregrinas tropos duplicados figuras e metaacuteforas mui continuadas e sobretudo

a colocaccedilatildeo das coisas e disposiccedilatildeo do argumento intricado sem ordem nem arte nem

claridaderdquo525 Eacute liccedilatildeo que se conhece de Francisco de Quevedo e de passos anteriores

Leitor privilegiado de Gabriel Pereira de Castro ndash indica-o Adma Muhana o tratado

Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia datado de 1633 cita versos da Ulyssea ou Lisboa

Edificada estampado em 1636 526 ndash Manuel Pires de Almeida batendo-se contra o

ldquoIuizio del poemardquo de Manuel de Faria e Souza (1590-1649) acerca drsquoOs Lusiacuteadas527

permite que se desdobre em termos de facilidade ou de dificuldade a regulaccedilatildeo

normativa da elocuccedilatildeo agrave doutrina das formas ou ideias discursivas na ldquoResposta ao Juiacutezo

do Poema dos Lusiacuteadas de Luiacutes de Camotildees em que se mostra natildeo ter as perfeiccedilotildees que

lhe atribui e ter outras conformes a sua invenccedilatildeo e sua mateacuteriardquo peccedila de controveacutersia em

que sob a rubrica ldquoDa sexta perfeiccedilatildeo do poema heroicordquo se assevera

Eacute decreto que o estilo heroacuteico seja elegante e sublime e que com a alteza

se natildeo aparte da facilidade e doccedilura E assi o tem o nosso adversaacuterio

bem por extenso mas natildeo o provou com exemplos de Camotildees tendo

ele muitos para cada figura E teria eu por mais acerto governar-se por

Hermoacutegenes e Demeacutetrio Faleacuterio que tratam das ideias ou formas da

eloquecircncia como fez Escaliacutegero lib 4 Torquato Tasso Disc Her lib

5 e Felisberto Campanile que se aproveitaram das Retoacutericas de

Aristoacuteteles e Ciacutecero e das flores dos mais excelentes poetas heroacuteicos

que seguir o modo confuso com que se cansa muito e ensina pouco Se

se guiara pelos escritores referidos vira que a grandeza consta de

dignidade aspereza veemecircncia resplandor vigor e circuiccedilatildeo e que

daqui nasce o estilo sublime e ficara escusado de incorrer na culpa que

Apoio lanccedilou em rosto a Alexandre Vellutelo (como tem Bocalino cent

1 dos seus Ragguagli Rag 35) dizendo-lhe que o seu comentaacuterio sobre

o Cancioneiro de Petrarca tinha necessidade de mostrar as cores os [sic]

figuras e as mais formosuras poeacuteticas que havia no poeta florentino e

525 Cf MUHANA A ldquoDiscurso sobre o poema heroico Comentaacuteriordquo REEL Revista Eletrocircnica de

Estudos Literaacuterios Vitoacuteria a 2 v 2 2006 p 11 526 Cf MUHANA A Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia Tratado Seiscentista de Manuel Pires de

Almeida Satildeo Paulo Edusp p 71 527 Cf Lusiadas de Luis de Camoens priacutencipe de los poetas de Espantildea Al Rey N Sentildeor Felipe Quarto El

Grande comentadas por Manuel de Faria i Sousa Cavallero de la Orden de Christo i de la Casa Real hellip

Primero i Segundo Tomo Antildeo 1639 En Madrid Por Iuan Sanchez A costa de Pedro Coello Mercador de

libros pp 59-100

171

que o mais natildeo necessitava de notaccedilotildees e neste particular se unira ao

divino Fernando Herrera sobre Garcilaso que efeitua o que Apoio deseja

no Vellutelo [] Com estas consideraccedilotildees manifestara a elegacircncia e

alteza do estilo que haacute nos Lusiacuteadas com prova e com as mesmas

ensinara sua muita suavidade e clareza pois nele haacute tudo com mais

ventage do que pode encarecer a pena528

Ora Manuel Pires de Almeida avalia os juiacutezos de Manuel de Faria e Souza

considerado inepto para mostrar e demonstrar a operaccedilatildeo do misto de ldquoideias ou formas

da eloquecircnciardquo no estilo heroico Diga-se inepto conforme os pressupostos assumidos

pelo agenciamento equivocado dos discursos de autoridade em vez de ldquogovernar-serdquo por

Alessandro Vellutello comentador quinhentista de Francesco Petrarca 529 a fim de

evidenciar que no gecircnero de poema em debate o heroico ldquoalteza se natildeo aparte da

facilidade e doccedilurardquo melhor seria que Manuel de Faria e Souza recorresse a Hermoacutegenes

e a Demeacutetrio (ou Pseudo-Demeacutetrio de Falero) como fizeram Juacutelio Cesar Escaliacutegero

Torquato Tasso e Filiberto Campanile (dito Felisberto) Esses satildeo nomes de letrados que

tanto afianccedilam a resposta ao ldquoIuizio del poemardquo pela legitimidade e pela exemplaridade

do que escreveram quanto servem de fonte indireta dos preceitos retoacutericos de

Hermoacutegenes e de Demeacutetrio Defesa do misto da doutrina do misto que os referidos

retores normatizam e da autoridade desses gregos na composiccedilatildeo e no ajuizamento das

obras de poesia o passo de Manuel Pires de Almeida eacute tambeacutem mostra breve mas

relevante dos usos vernaculares de Hermoacutegenes pois que deixam observar que o lusitano

lecirc o Peri ideōn natildeo apenas segundo a latinizaccedilatildeo empreendida por Natale Conti como eacute

sabido pelo tratado Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia (1633) senatildeo tambeacutem segundo

glosas paraacutefrases e versotildees de Juacutelio Cesar Escaliacutegero de Torquato Tasso e de Filiberto

Campanile

Note-se os termos ldquodignidaderdquo ldquoasperezardquo ldquoveemecircnciardquo ldquoresplandorrdquo ldquovigorrdquo

e ldquocircuiccedilatildeordquo vertem respectivamente semnotēs trakhytēs sphodrotēs lamprotēs

akmēe peribolē espeacutecies de composiccedilatildeo do megethos referido como ldquoestilo sublimerdquo

O que natildeo se aparta e natildeo se deve apartar da alteza do sublime diz-se ldquofacilidaderdquo e

528 Apud PIRES M L G A criacutetica camoniana no seacuteculo XVII Lisboa Instituto de Cultura e Liacutengua

Portuguesa 1982 p 81-2 529 Cf Le volgari opere del Petrarcha con la espositione di Alessandro Vellutello da Luca [Vinegia]

MDXXV [1525]

172

ldquodoccedilurardquo Sabe-se ldquofacilidaderdquo verte eukrineia ao passo que ldquodoccedilurardquo glykytēs A

eleiccedilatildeo dos termos aiacute empregados em liacutengua portuguesa tem viacutenculos bastantemente

precisos com Filiberto Campanile no italiano isso eacute sabido lecirc-se dignitagrave asprezza

vehemẽza esplendore vigore e circuitione E tambeacutem dolcezza Jaacute o substantivo latino

facilitas e o italiano facilitagrave leem-se nas interpretaccedilotildees de perspicuitas (saphēneia)

trazidas entre os tratadistas de retoacuterica e de poeacutetica jaacute assinalados por Juacutelio Cesar

Escaliacutegero e por Gabriele Zinano respectivamente530 donde se possa compreender o

denominado ldquoestilo dificultosordquo ou as afirmadas dificuldades elocutivas para o

destinataacuterio da poesia culta pelo avesso da facilidade pela carecircncia da nitidez e da

clareza na chave da eukrineia de Hermoacutegenes como qualidades discursivas no

estabelecimento e na mistura apropriada das ideias que fazem o poema

Eacute oportuno trazer agrave lembranccedila que Manuel Pires de Almeida responde a Manuel

de Faria e Souza e ao fazecirc-lo centra-se na pressuposiccedilatildeo da ineacutepcia desse comentador

de Luiacutes de Camotildees para a invenccedilatildeo de provas que manifestem a conveniente variedade

de conformaccedilatildeo estiliacutestica drsquoOs Lusiacuteadas Lembraacute-lo eacute observar que o vocabulaacuterio de

contestaccedilatildeo empregado por Manuel Pires de Almeida pende de Manuel de Faria e Souza

natildeo somente lhe responde No ldquoIuizio del poemardquo prescreve-se

que o estilo sea elegatildete i sublime i que con la sublimidad no se aparte

de lo faacutecil i dulce cosa en que halla oy nadie igualoacute a Virgilio si a caso

nuestro Poeta no lo hizo necessario es discurrir un poco porq de alguacuten

modo se atreve a deslucir esta perfeciacuteotilde en egravel la senda que muchos de

los modernos han con notable engantildeo si ya no es con gran necesidad

haciendo della virtud [hellip] Porque aviendo hallado que el mezclar lo

suave i lo dulce i lo facil con lo grave i lo alto i lo sublime es muy

difiacutecil i lo cansa mucho i es menester tiẽpo para poco escrito de que

resultoacute detenerse Tucidides 27 antildeos en su historia i Virgilio casi la

mitad en su Poema sin dexarle acabado i Sanazaro 21 en el suyo i

Guarino otros tantos en su Pastor Fido hizieronse el embeacutes de los

grandes hombres que fue hazerse dificiles por locuciones i palabras

por no cansarse sin darseles de lo que cansan a quien los lee para no

530 Cf Iuli Caesaris Scaligeri uiri Poetices libri septem Ad Syluium Filium [Lyon] Apud Antonium

Vincentium 1561 p 176 Sommarii di varie retoriche greche latine et volgari Distintamente ordinati in

uno da Gabriele Zinano In Reggio Apresso Hercoliano Bartholi 1590 pp 198-201

173

volverlos a leer maacutes con que se quedan parecidos a tapizes del embegraves

que con el enredo de la hilaccedila apenas dexa ver forma alguna i

essotros al propio tapiz del derecho que cotilde agradable desassombro

alegra la vista con los colores i el entendimiento con las acciones de

figuras distintas que son los conceptos de la pintura Agora empieccedilo

yo No se persuada que puede agradar ni ser durable ni hazerse traer

en manos de todos ni aun ser leiacutedo una vez entera el Autor que en

qualquier genero de estudio escriviere con perpetua dificultad 531

que o estilo seja elegante e sublime e que com a sublimidade natildeo se

aparte do faacutecil e doce coisa em que observa-se hoje ningueacutem igualou

a Virgiacutelio se acaso nosso Poeta [sc Luiacutes de Camotildees] natildeo o fez

Necessaacuterio eacute discorrer um pouco porque de algum modo se atreve a

desluzir esta perfeiccedilatildeo nele a senda que muitos dos modernos seguem

com notaacutevel engano se jaacute natildeo eacute com grande necessidade fazendo dela

virtude [hellip] Porque observando-se que misturar o suave o doce e o

faacutecil com o grave o alto e o sublime eacute muito difiacutecil e cansa bastante e

[que] eacute mister tempo para pouco escrito do que resultou deter-se

Tuciacutedides 27 anos em sua Histoacuteria [da Guerra do Peloponeso] Virgiacutelio

quase a metade em seu Poema [sc a Eneida] sem deixaacute-lo acabado

Sannazzaro 21 no seu532 e Guarini outros tantos em seu Pastor Fido

[muitos dos modernos] fizeram-se o avesso dos grandes homens que

foi fazerem-se difiacuteceis por locuccedilotildees e palavras por natildeo se cansarem

sem que considerassem que cansam a quem os lecirc para natildeo voltar a lecirc-

los mais com o que se tornam parecidos com tapetes do avesso que

com o enredamento dos fios apenas deixa ver forma alguma e esses

outros [se tornam parecidos] com o proacuteprio tapete do direito que com

agradaacutevel desassombro alegra a vista com as cores e o entendimento

com as accedilotildees de figuras distintas que satildeo os conceitos da pintura Agora

principio eu Natildeo se persuada de que possa agradar nem ser duraacutevel

nem fazer-se trazer nas matildeos de todos nem ainda ser lido uma vez o

531 Cf Lusiadas de Luis de Camoens priacutencipe de los poetas de Espantildea Al Rey N Sentildeor Felipe Quarto El

Grande comentadas por Manuel de Faria i Sousa Cavallero de la Orden de Christo i de la Casa Real hellip

Primero i Segundo Tomo Antildeo 1639 En Madrid Por Iuan Sanchez A costa de Pedro Coello Mercador de

libros p 64 532 Isto eacute Jacopo Sannazzaro (1458-1530) Eacute verossiacutemil que Manuel de Faria e Souza faccedila referecircncia ao

poema bucoacutelico Arcadia

174

Autor que em qualquer gecircnero de estudo escreve com perpeacutetua

dificuldade 533

Ora para Manuel de Faria e Souza Homero Virgiacutelio Oviacutedio Lucano Dante

Petrarca Sannazzaro Ariosto Ronsard Garcilaso Camotildees e Tasso cujos nomes satildeo

arrolados adiante no ldquoIuizio del poemardquo estatildeo ldquoen las manos de todosrdquo534 Evidentemente

todos natildeo vislumbra nem mesmo virtualmente a totalidade do corpo social e poliacutetico

ibeacuterico no seacuteculo XVII senatildeo faz referecircncia a letrados da espeacutecie de Manuel de Faria e

Souza E pode ser lido como determinante que subentende o destinataacuterio impliacutecito dos

comentaacuterios e dos poemas de que se fala de sorte a definir o reverso insultuoso no

vitupeacuterio na invectiva em chave semelhantemente determinada Assim por exemplo

mesmo distante do poema heroico o padre Antocircnio Vieira censura o estilo culto de

pregaccedilatildeo no ldquoSermatildeo da Sexageacutesimardquo asseverando-o improacuteprio e desmedido ldquoO estylo

culto naotilde he escuro he negro amp negro boccedilal amp muyto cerradordquo535 Assim tambeacutem o faz

bem eacute sabido Francisco de Quevedo ao desaprovar a poesia culta de lenguaje heroico agrave

maneira de D Luis de Goacutengora dizendo-a hembrilatina de lenguaje hermafrodito

culterana ou Alcoran Macarronicordquo 536

Logo regrando-se a arte da poesia enfeixam-se os lugares que coroam a virtude

ou que condenam o viacutecio Pender de um passo a outro eacute risco a que se sujeita agrave luz do

ldquoIuizio del poemardquo o autor que se lance sobre a efetuaccedilatildeo da variaccedilatildeo de estilo no poema

heroico sem considerar as dificuldades de conjugaccedilatildeo do elegante e do sublime do faacutecil

e do doce e das mais ideias ou formas do dizer nas partes de maneira que o corpo do

poema como todo se faccedila condizente com o decoro de gecircnero pronto a estar ldquoen las

manos de todosrdquo e natildeo a fazer-se ldquono para los muchosrdquo 537 conforme D Luis de Goacutengora

Em Manuel de Faria e Souza eacute de se notar como o poema o tapete no avesso informes

no direito conformes e tambeacutem formosos Os poemas ldquodificiles por locuciones i

533 Traduccedilatildeo nossa 534 Cf Lusiadas de Luis de Camoens priacutencipe de los poetas de Espantildea Al Rey N Sentildeor Felipe Quarto El

Grande comentadas por Manuel de Faria i Sousa Cavallero de la Orden de Christo i de la Casa Real hellip

Primero i Segundo Tomo Antildeo 1639 En Madrid Por Iuan Sanchez A costa de Pedro Coello Mercador de

libros p 64 535 Cf Sermoens do P Antonio Vieira da Companhia de Iesu Preacutegador de Sua Alteza Primeyra Parte

Dedicada ao Principe N S Em Lisboa Na Officina de Ioam da Costa M DC LXXIX Com todas as

licenccedilas amp Privilegio Real pp 42-43 536 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 p 225 537 Cf GOacuteNGORA Y ARGOTE L DE Obras completas edicioacuten de Juan Milleacute y Gimeacutenez Isabel Milleacute y

Gimeacutenez Madrid Aguillar 1967 p 1224

175

palabrasrdquo afirmam-se disformes agrave semelhanccedila do avesso da tapeccedilaria donde se entenda

que sejam pensados pelo comentador de Luiacutes de Camotildees como obras de apreensatildeo

inadequada pois que o reverso do tapete embora decirc a ver os tramados da tessitura natildeo

mostra as formas nele bordadas lavradas e vecirc-las na face contraacuteria eacute natildeo vecirc-las como

conveacutem Nesses termos de doutrina os poema cansativos que enfadam os leitores e natildeo

se abrem pois a novas leituras porque dificultosos na obscuridade de seus efeitos

ajuiacutezam-se por comparaccedilatildeo natildeo se deixam admirar a contento

Recorde-se agrave luz de Horaacutecio podem ser lidas as consideraccedilotildees de Manuel de Faria

e Souza se penetradas pela prescriccedilatildeo do ut pictura poesis como destrinccedilada nos vv 361-

365 da Epistula ad Pisones conforme a liccedilatildeo latina do texto e a traduccedilatildeo de Marcos

Martinho dos Santos

ut pictura poesis erit quae si propius stes

te capiat magis et quaedam si longius abstes

haec amat obscurum uolet haec sub luce uideri

iudicis argutum quae non formidat acumen

haec placuit semel haec deciens repetita placebit

Como a pintura a poesia Existiraacute a que se mais perto te ateacutens

mais te cative e alguma se mais longe te manteacutens

esta ama o escuro sob a luz quer ser vista aquela

que a agudeza arguta do juiz natildeo intimida

uma aprouve uma vez outra dez vezes repetida aprazeraacute538

Ou conforme a versatildeo anocircnima portuguesa estampada em 1639 ano de publicaccedilatildeo

do ldquoIuizio del poemardquo de Manuel de Faria e Souza e reestampada em 1657 em 1668 e

em 1681 Eacute versatildeo feita letra a letra

Poeumlsis A Poesia erit seragrave Vt pictura como hũa imagem pintada quaelig a

538 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4

p 208 Em traduccedilatildeo em versos de D Rita Clara Freyre de Andrade impressa em 1781 lecirc-se ldquoAacute Poesia e

Pintura tem por certo Huns pedaccedilos que agradaotilde mais deperto E outros que de longes saotilde melhores

Naotilde receia dos olhos julgadores A aguda perspicacia quem conhece Que esta ser vista aacutes claras apetece

E que pequena lux aacute aquella assista Huma agrada huma vez somente vista Mas outra agradaraacute vista

dez vezesrdquo cf Arte poetica de Q Horacio Flaco traduzida em verso rimado e dedicada a memoria do

Grande Augusto por D Ritta Clara Freyre de Andrade hellip Coimbra Na Regia Officina da Universidade

M DCCLXXXI [1781] Com licenccedila da Real Meza Censoria p 36

176

qual Te capiat magis vos agradaragrave mais si stes se estiuerdes propiugraves

mais perto amp quaeligdam amp outra vos pareceragrave bem si longiugraves abstes se

estiuerdes de longe afastado Haec esta amat quer obscurum que se

veja com pouca luz haec aquella uolet quereragrave uideri ser vista sub luce

agraves claras quaelig a qual non formidat naotilde recea nem tem medo acumen da

agudeza da vista argutum delicada Iudicis do que a ve Haec esta placuit

semel contentou quando muito hũa vez haec aquella placebit

contentaragrave deciens repetita quatildetas vezes for vista 539

Isto seja fundado no paralelismo entre a poesia e a pintura Horaacutecio regula o estilo

das obras ou poeacuteticas ou pictoacutericas agrave luz de sua destinaccedilatildeo adequada Mais precisamente

atento tanto aos preceitos de produccedilatildeo da poesia e da pintura quantos aos protocolos de

justa recepccedilatildeo das obras dessas artes regula a destinaccedilatildeo adequada conforme o estilo

ideado e enformado pelos artiacutefices540 Esmiuacuteccedila-o Marcos Martinho dos Santos no artigo

ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacuteciordquo um eacute o poema breve visto sob a luz ldquocuja

elocuccedilatildeo o poeta burila para que seja luzidiardquo outro o longo visto com pouca luz ldquocuja

disposiccedilatildeo o poeta planeja para que seja coerenterdquo um porque breve ldquoexige do poeta

que lapide uma a uma as palavras isto eacute que labore na elocuccedilatildeo mas porque carece de

partes dispensa-o da disposiccedilatildeordquo outro porque longo ldquoexige do poeta que encadeie tiras

inteiras de palavras isto eacute que labore na disposiccedilatildeo mas porque transcende a

singularidade das palavras permite-lhe que cochile na elocuccedilatildeordquo enfim um porque

breve ldquoeacute composiccedilatildeo mais minuciosa cujas palavras se devem inspecionarrdquo outro

539 Cito a ediccedilatildeo de 1668 Obras de Horacio principe dos poetas latinos lyricos com o entendimento litteral

amp construiccedilam Portuguesa ornadas de hum index copioso das historias amp fabulas contiudas nelas

Emendadas nesta vltima Impressam Lisboa Na Officina de Ioam da Costa M DC LXVIII [1668] Com

as licenccedilas neceszligarias p 448 Cf Obras de Horacio principe dos poetas latinos lyricos com o

entendimento litteral amp construiccedilatildeo Portuguesa ornadas de hum index copioso das historias amp fabulas

conteudas nellas Emendadas nesta ultima Impressatildeo Lisboa Na Officina de Miguel Manescal amp agrave sua custa M DC LXXXI [1681] Com as licenccedilas neceszligarias p 448 540 No comentaacuterio de D Gastatildeo Fausto da Cacircmara Coutinho (1772-1852) aos vv 361-365 de Horaacutecio lecirc-

se apreciaccedilatildeo distinta com base no Abade Charles Batteux (1713-1780) ldquo(361) Ut pictura poeumlsis erit etc

= Aqui natildeo se-trata das Artes comparadas entre si mas sim das obras como diz o Abbade Batteux Bem

como na ha Pintura ha o claro que eacute a parte do painel aonde fere a claridade Picturaelig Lumen assim tambem

na Poesia ha o escuro umbra que eacute a parte do painel da luz e eacute por isto que se-deve olhar para a toda em

harmonia e natildeo desmembradamente por parte pois que tanto na Pintura como na e Escultura se-potildee em

uso a oacutepticardquo cf Paraphrase da Epistola aos Pisotildees commumente denominada Arte Poetica de Quinto

Horacio Flacco com annotaccedilotildees sobre muitos lugares por D Gastatildeo Fausto da Camara Coutinho

Bibliothecario da Bibliotheca da Marinha Lisboa Na Typographia de Joseacute Baptista Morando rua do

Moinho de Vento nordm 59 1853 p 150

177

porque longo ldquoeacute composiccedilatildeo mais difusa cujo todo se deve contemplarrdquo 541 Esses

pressupostos vincam os comentaacuterios de Manuel de Faria e Souza a Os Lusiacuteadas e lhe

fundamentam os juiacutezos no passo supracitado

Assim visto que programaticamente seja efetuada a poesia como a pintura ou a

pintura como a poesia o tradutor e comentador castelhano da epiacutestola Juan Villen de

Biedma autor do volume Q Horacio Flacco poeta lyrico latino Sus obras con la

declaracion magistral en lengua castellana impresso em Granada em 1599 faz de

Ticiano exemplo de pintor cuja obra se deva admirar agrave maneira do poema longo ldquoEn

nuestros tiempos la pintura de Ticiano tuuo esto q quiso por mirada de lexos y ay otras

q tienẽ toda su perfeccion de cerca porq la distincion de sus partes sufre mayor examenrdquo

ou seja ldquoEm nossos tempos a pintura de Ticiano teve isto que quis por mirada de longe

e haacute outras que tecircm toda sua perfeiccedilatildeo de perto porque a distinccedilatildeo de suas partes sofre

541 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacuteciordquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2000 v 4 p 208 Ora leitor da Epistula ad Pisones Emanuele Tesauro no panegiacuterico Il giudicio discorso academico

sopra il talento di due predicatori lrsquoAlbrici amp lrsquoOrimbelli lido em ediccedilatildeo de Milatildeo de 1660 fundamentado

nos vv 361-365 de Horaacutecio que doutrinam o ut pictura poesis discrimina semelhantemente eloquentes

duas maniere de compor ldquoHor come nellrsquoArte della Pittura srsquoinsegnano due maniere ambe dignissime di

gloria vguale benche diuersissime di talento lrsquovna di imaginar Corpi con tratti gagliardi e grosso colorito

che vicini paiono vnrsquoimbratto di tele ma lontani han forza e vita lrsquoaltra di finir con delizadezza ogni

coserella agrave punta di penello come le miniature che chiamam lrsquoocchio vicino cosigrave due sono i Generi

principali del fauelare lrsquovno si proportiona aglirsquontelleti di acuta veduta lrsquoaltro agrave quersquo del Popolo chi

veggiono debilmente amp come di lontano Quanto maior populus sit dice il mio Maestro tanto longius

spectat Il primo Genere si chiamograve dal medesimo ESQVISITO il secondo CONCERTATIVO quello arsquo

libri questo alla viua voce si adatta quello allrsquoEpica questo alla Scenica si paragona quello egrave come le

saette sottile e pungente questo come le bombarde strepitoso amp infiammato questo fugrave propio di Vlisse questo di Neacutestore quello in Tucidide e Quintiliano questo in Demostene e Cicerone risplende quello egrave

Attico e salso questo Asiatico e dolce quello nelle Academiche declamationi questo nelle Forensi

ringhieri marauigliosamente trionfa Quinci vn di queste due Generi portato nell Teatro dellrsquoatro Genere

non hagrave piu gratiardquo [Ora como na arte da pintura se ensinam duas maneiras ambas digniacutessimas de gloacuteria

igual ainda que diversiacutessimas de talento uma de imaginar corpos com traccedilos galhardos e grosso colorido

que vizinhos parecem um emaranhado de teias mas distantes tecircm forccedila e vida outra de arrematar com

delicadeza toda coisinha agrave ponta de pincel como as miniaturas que chamam olho para perto assim satildeo os

dois gecircneros principais do pregar um eacute proporcionado aos intelectos de aguda vista outro ao intelecto do

povo que vecirc debilmente e como que de longe ldquoQuanto maior populus sitrdquo diz meu mestre ldquotanto longius

spectatrdquo O primeiro gecircnero foi chamado pelo mesmo de peregrino o segundo de concertativo aquele aos

livros este agrave viva voz se adapta aquele agrave eacutepica este ao teatro se compara aquele eacute como as setas sutil e pungente este como as bombardas estrepitoso e inflamado aquele foi proacuteprio de Ulisses este de Nestor

aquele de Tuciacutedides e Quintiliano este em Demoacutestenes e Ciacutecero resplandece aquele aacutetico e salgado este

asiaacutetico e doce Aquele nas acadecircmicas declamaccedilotildees este nas causas forenses maravilhosamente triunfa

Daiacute que um desses dois gecircneros levado ao teatro do outro natildeo mais tem graccedila] cf Panegirici et

ragionamenti del Conte D Emanuele Tesauro Caualier Gran Croce dersquo SS Mauritio e Lazaro Dedicati

alla Regale Altezza di Madama Christiana di Franchia Duchessa di Savoia Reina di Cipri Gloria del

Nostro Secolo Volume Terzo In Torino MDCLX [1660] Appresso Bartolomeo Zauatta Con licenza dersquo

Superiori Et Priuilegio pp 82-83 TESAURO E ldquoO Juiacutezo (Panegiacuterico Acadecircmico)rdquo Traduccedilatildeo de Joatildeo

Adolfo Hansen in CANIATO B MINEacute E (Org) Abrindo Caminhos Homenagem a Maria Aparecida

Santilli Satildeo Paulo Aacuterea de Poacutes-Graduaccedilatildeo de Estudos Comparados de Literaturas de Liacutengua Portuguesa-

FFLCH 2002 pp 167-8

178

maior examerdquo542 Horacianamente poreacutem para Manuel de Faria e Souza nada disso haacute

na ldquosenda que muchos de los modernos han con notable engantildeordquo o ldquoAutor que em

qualquer gecircnero de estudo escreve com perpeacutetua dificuldade543rdquo ao mirar imiscuir com

ineacutepcia kharaktēres ou ideai estiliacutesticos consoante os preceitos retoacutericos de Demeacutetrio e

de Hermoacutegenes natildeo se leraacute dez vezes como o poeta de poema breve sequer uma como

o poeta de poema longo seraacute inadvertidamente lido como artiacutefice de obra disforme tal o

avesso do tapete pouco admiraacutevel porque nele nada haacute do que haacute nas pinturas de Ticiano

a levar-se a semelhanccedila adiante

Para Manuel Pires de Almeida interessam menos os conselhos e as deliberaccedilotildees

do comentador de Luiacutes de Camotildees mais a defesa do desgoverno do comentaacuterio tomado

por cego agraves ldquoideias ou formas da eloquecircnciardquo na enformaccedilatildeo do estilo misto nrsquoOs

Lusiacuteadas por carecer o ldquoIuizio del poemardquo do agenciamento das liccedilotildees ou do Peri

hermēneias ou do Peri ideōn Na preceptiva de Hermoacutegenes afirma-se de fato ser difiacutecil

(δυσχερής) a mistura () das ideai a katharotēs com a peribolē jaacute postas em

542 O passo de Juan Villen de Biedma na iacutentegra eacute o seguinte ldquoPoesis erit vt pictura la poesia sera como

la pintura quae te capiat magis que te quadrara mas si stes propius si estes mas cerca amp quaedatilde y

ay otra q te parecera bien si longius abstes si estas de lexos En nuestros tiempos la pintura de Ticiano

tuuo esto q quiso por mirada de lexos y ay otras q tienẽ toda su perfeccion de cerca porq la distincion de

sus partes sufre mayor examen haec amat obscurum la vna requiere los lexos para sus sotildebras porque

assi parece mejor y no es porq tenga faltas que encubrir sino porque esta hecha con tal artificio que

resplandece de lexos volet haec sub luce videri y esta otra que es para de cerca quiere ser vista a la

luz quaelig non formidat que no tiene miedo ni rihuye iudicis argutum acumen al ingenio agudo de juez

que la mira porque quatildeto mas a lo claro se vee tatildeto mejor parece y lo obscuro su hermosura amortigua

haec placuit semel esta segunda basto mirarla vna vez haec deciens repetita placebit esta otra a lo clato muchas vezes vista agradara Assi de la misma manera ay poesias que son para de lexo miradas de

relaacutempago como no se pueda reparar en ellas no porque tengan el artificio que a pintura de lexos sino

porque son para ser oydas y no consideradasrdquo [Poesis erit vt pictura a poesia seraacute como a pintura

quae te capiat magis que te satisfaraacute mais si stes propius si estiverdes mais perto amp quaedatilde e haacute

outra que te parecera bem si longius abstes si estiverdes de longe Em nossos tempos a pintura de

Ticiano teve isto que quis por mirada de longe e haacute outras que tecircm toda sua perfeiccedilatildeo de perto porque a

distinccedilatildeo de suas partes sofre maior exame haec amat obscurum uma requer los lexos para suas sombras

porque assim parece melhor e natildeo eacute porque tenha faltas que encobrir senatildeo porque estaacute feita com tal

artifiacutecio que resplandece de longe volet haec sub luce videri e esta outra que eacute para de perto quer ser

vista agrave luz quaelig non formidat que natildeo tem medo nem rihuye iudicis argutum acumen o ingenho agudo

do juiz que a mira porque quanto mais ao claro se vecirc tanto melhor parece e o obscuro sua formosura amortigua haec placuit semel esta segunda bastou vecirc-la uma vez haec deciens repetita placebit esta

otra a lo clato muitas vezes vista agradaraacute Assim da mesma maneira haacute poesias que satildeo para de longe

miradas de relacircmpago como no se pueda reparar en ellas natildeo porque tenham o artifiacutecio que a pintura de

longe senatildeo porque satildeo para serem ouvidas e natildeo consideradas] cf Cf Q Horacio Flacco poeta lyrico

latino Sus obras con la declaracion magistral en lengua castellana por el Doctor Villen de Biedma Con

Privilegio En Granada Por Sebastian de Mena Antildeo de 1599 A costa de Iuan Diez mercader de libros p

320 543 Cf Lusiadas de Luis de Camoens priacutencipe de los poetas de Espantildea Al Rey N Sentildeor Felipe Quarto El

Grande comentadas por Manuel de Faria i Sousa Cavallero de la Orden de Christo i de la Casa Real hellip

Primero i Segundo Tomo Antildeo 1639 En Madrid Por Iuan Sanchez A costa de Pedro Coello Mercador de

libros p 64

179

confronto uma que confere primazia agrave nitidez da disposiccedilatildeo outra que apela agrave

abundacircncia do discurso a saphēneia com o peritton (o exuberante o incomum o

redundante) e o meston (o saturado o cheio) ambos pensados como graus amplificados

da peribolē que faceam os meios de clareza e evitam a vulgaridade 544 a semnotēs com

o lepton (o pequeno o deacutebil o leve) espeacutecies cujos atributos efetuam matizes em termos

de res et verba entre a solenidade e a sutileza a kharis (graccedila) com o diērmenos (elevado)

o megethos aquela recobrendo este de seduccedilatildeo545 a apheleia com a sphodrotēs uma de

constituintes que se avizinham do vulgar outra de forma veemente por vezes violenta

nada doce nada moderada a hēdonē (prazer) com a trakhytēs fazendo concorrer deleite

e aspereza donde entenda Hermoacutegenes que seja preciso audaacutecia aquela de Homero

aquela de Demoacutestenes (cf HERM 279 24-26) para fazer as mesclas (cf HERM 279 24-

280 12) Todavia destaca o tratadista natildeo se devem compreender as espeacutecies discursivas

(ldquo εἴδη rdquo) ldquole forme della orationerdquo segundo Giulio Camillo Delminio

como contraacuterias como o satildeo o quente e o frio a morte e a vida ou a noite e o dia pois

que elas podem coexistir e mais admiraacutevel se faraacute o discurso em que coexistam em

decorrecircncia da mistura adequada (cf HERM 279 17-23) Pode-se aventar o Peri ideōn

itera um modo regrado de variedade no emprego discursivo das ideai O regramento

opera-o como se veraacute depois de vislumbrado o monstrum a derradeira idea preceituada

no tratado a deinotēs

Nessa pragmaacutetica a consecuccedilatildeo da mistura eacute lugar de audaacutecia e de excelecircncia

poeacutetica Este eacute o lugar de Gabriel Pereira de Castro segundo Manuel de Galhegos

solidaacuterio com os princiacutepios artiacutesticos de Manuel Pires de Almeida Da dificuldade do

poema heroico da rareza de sua composiccedilatildeo da engenhosidade do poeta sabe-se haacute

muito porque lhe encarece o aparato epidiacutetico porque o enuncia o ldquoDiscurso Poeacuteticordquo

explicitamente Eacute conveniente aos discursos prologais Itere-se deve-se portanto

entender como amplificaccedilatildeo de efeito demonstrativo porque evidecircncia de aptidatildeo de

juiacutezo de soleacutercia e de eloquecircncia a afirmaccedilatildeo apologeacutetica de que a Ulyssea ou Lisboa

Edificada conjuga traccedilos de elocuccedilatildeo tatildeo variados como a clareza a enargia a grandeza

a formosura a brevidade a maravilha a verdade a gravidade a tristeza a alegria a

ferocidade a severidade e a elegacircncia

544 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 p 47 545 CHIRON P ldquoAs ambiguidades da lsquograccedilarsquo (kharis) no tratado Do estilo de Demeacutetrio (Ps-Demeacutetrio de

Falero) Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2003 v 7 p 202

180

Natildeo parece preciso reiterar dados os lugares de censura agenciados no ldquoIuizio del

poemardquo de Manuel de Faria e Souza dados os preceitos contrapostos na ldquoResposta ao

Juiacutezo do Poema dos Lusiacuteadas de Luiacutes de Camotildees em que se mostra natildeo ter as perfeiccedilotildees

que lhe atribui e ter outras conformes a sua invenccedilatildeo e sua mateacuteriardquo de Manuel Pires de

Almeida que essa minuciosa classificaccedilatildeo das ideai e essa hiperdeterminaccedilatildeo de seus

efeitos providas pelo Peri ideōn pressupotildeem que para a mestria do poeta componha na

fatura heroica ou natildeo consoante a pragmaacutetica do misto aiacute teorizada e normatizada natildeo

basta a saphēneia e tampouco basta o contrapeso dos matizes decorrentes do uso

discursivo das formas de grandiosidade o megethos e suas espeacutecies Conveacutem ademais

visitar a epimeleia (ἐπιμέλεια) e o kallos () Parafraseando Ciacutecero para quem

entre os officia do orador ldquoProbare necessitatis est delectare suavitatis flectere

victoriaerdquo ldquoProvar eacute da necessidade deleitar eacute da suavidade mover eacute da vitoacuteriardquo (CIC

Or XI 69) Johannes Sturm afirma que o emprego da forma aperta (saphēneia) eacute da

necessidade (ldquonecessitatis estrdquo) da forma magna (megethos) eacute da dignidade (ldquodignitatisrdquo)

e da forma pulchram (kallos) eacute do contentamento (ldquoiucunditatisrdquo)546 A versatildeo seiscentista

de Giulio Camillo Delminio o ensina

Doppo il parlare della Chiarezza amp della Dignitate secondo la

Grandezza conseguente cosa egrave hauer ragionamento della Diligenza amp

Bellezza che alla oratione si richiede Perche fagrave bisogno alla oratione

chiara amp gonfia amp di dignitate ripiena del tutto alcuna belleza amp

melodiacutea se non vogliamo che ella si mostri come acerba amp egrave

manifestoacute che agrave cosigrave fatta oratione egrave contraria la negletta amp priua di

numero amp simplice di construttione547

Apoacutes falar da Clareza amp da Dignidade segundo a Grandeza

consequente coisa eacute discorrer sobre a Diligecircncia amp Beleza que ao

546 Cf ldquoIoannis Sturmii Scholae in Librum II De formis orationum seu dicendi generibusrdquo in Hermogenis

Tarsensis rhetoris acutissimi De dicendi generibus siue formis orationum libri II Latinitate donati amp

scholis explicati atque illustrati a Ioan Sturmio Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo ad annos octo

Excudebat Iosias Rihelis MDLXXI p 266 Eacute lugar que se itera em Gerard Joannes Vossius cf Gerardo

Ioannis Vossi Commentariorum rhetoricorum sive oratoriarum institutionum Pars altera Lugduni

Batavorum Ex officina Ioannis Maire MDCXLIII [1643] p 504 547 Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Gerard Joannes Vossius (1577-1649)Domenico Salomoni Al Sigr Andrea Sasso

svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica Con

Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini pp 24r-v

181

discurso se reivindica porque se faz necessaacuteria ao discurso claro amp

cheio amp de todo repleto de dignidade alguma beleza amp melodia se natildeo

queremos que ele se mostre algo acerbo E eacute manifesto que ao discurso

assim feito eacute contraacuterio o negligente amp privado de ritmo amp vulgar de

construccedilatildeo548

Os termos empregados por Giulio Camillo Delminio Chiarezza Dignitate

Grandezza Diligenza e Bellezza vertem respectivamente os substantivos gregos

saphēneia semnotēs megethos epimeleia e kallos (cf HERM 296 5-14) Os derradeiros

recobrem categoria uacutenica e satildeo no ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos

interpretados pelas ideias de fermosura de galhardia549 Em Jorge de Trebizonda kallos

eacute ou venustas ou pulchritudo 550 Em Antocircnio Bonfine diferentemente epimeleia eacute

diligentia e kallos eacute decora551 Recorde-se o adjetivo ldquodecorusrdquo eacute lido no Hermogenis

Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta traduzido por

Gaspar Laurent para verter semnotēs e pode significar ldquodecorosordquo ldquodignordquo ldquonobrerdquo

ldquoeleganterdquo ou ldquobelordquo Em Natale Conti lecirc-se diligentia e pulchritudo552 Em Francisco

Porto natildeo haacute traduccedilatildeo da prescriccedilatildeo de Hermoacutegenes mas o iacutendice do volume em latim

traz pulchritudo orationis em referecircncia a kallos553 Em Johannes Sturm epimeleia eacute

accurata dicendi forma e kallos eacute pulchra forma554 Em Pedro Juan Nuntildeez kallos eacute

venustas555 Em Filiberto Campanile os termos toscanos agrave maneira de Giulio Camillo

548 Traduccedilatildeo nossa 549 Apud Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de

Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro sp 550 Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia ad

D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] p 496 551 Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii item

Sophistaelig Praeligexercitamenta Antonio Bonfine asculano interprete Apud Seb Gryphivm Lvgdvni 1538 p 216 552 Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] p 228 553 Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices magistri Francisci Porti

Cretensis opera industriaacuteque illustrati atque expoliti Genevaelig apvd I Crispinvm MDLXIX [1569] sp 554 Cf Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II

Latinitate donati amp scholis explicati atque illustrati A Ioan Stvrmio Cum Gratia amp Priuilegio Caeligsareo

ad anno octo Excudebat Iosias Rihelius MDLXXI [1571] p 163 555 Cf Pet Iohan Nunnesii valentini Institutionum rhetoricarum libri quinque Editio tertia ceteris multo

correctior et locupletior exemplis Barcinone ex typographia Sebastiani agrave Cormellas An 1593 p 337

182

Delminio satildeo diligenza e bellezza556 Em Gabriele Zinano kallos eacute belleza557 Em Gaspar

Laurent iteram-se as eleiccedilotildees de Johannes Sturm558 Em Manuel Pires de Almeida kallos

eacute ou espeacutecie ou forma ou ideia de dizer formosa559 Em Jerocircnimo Soares Barbosa eacute estilo

Bello560 Assim epimeleia eacute ou diligentia ou accurata dicendi forma ou diligenza e kallos

eacute ou venustas ou pulchritudo ou decora ou pulchra forma ou bellezza ou fermosura ou

galhardia ou ideia de dizer formosa ou estilo Bello o que conjuga numa mesma e uacutenica

categoria de conformaccedilatildeo discursiva entre as liccedilotildees latinas e vernaacuteculas que traduzem ou

glosam o Peri ideōn ou dele pendem distintos usos Gaspar Laurent nos comentaacuterios ao

passo da doutrina assim fixa os termos

Adhibenda est in toto genere orationis ἐπιμέλεια amp accurata

ratio vt oratio sit grata elegans concinna amp studium ostendat

aduersus incuriam neglectum amp aduersus rusticitatem amp agreste

genus dicendi amp dissolutum561

Deve-se empregar em todo gecircnero de discurso epimeleia amp kallos

arrazoado acurado para que o discurso seja agradaacutevel elegante

harmonioso amp ostente o estudo contra a falta de cuidado a negligecircncia

amp contra a rusticidade amp o gecircnero de dizer agreste amp dissoluto562

Entende-se pois a eleiccedilatildeo de diligentia accurata dicendi forma ou diligenza

556 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 75 557 Cf Sommarii di varie retoriche greche latine et volgari Distintamente ordinati in uno da Gabriele

Zinano In Reggio Apresso Hercoliano Bartholi 1590 pp 207-208 558 Cf Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione

contextu Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 350 559 Cf MUHANA A A Epopeacuteia em Prosa Seiscentista uma definiccedilatildeo de gecircnero Satildeo Paulo Editora da

Unesp 1997 p111 560 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel p 430 561 Cf ldquoIn Hermogenis tractatvm de ideis sive de formis eloqventiaelig Gasparis Laurentij commentariusrdquo

in Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 153 562 Traduccedilatildeo nossa

183

pelos inteacuterpretes referidos Acentua Michel Patillon em nota agrave ediccedilatildeo francesa do texto

que epimeleia termo por ele vertido como ldquoeacuteleacutegancerdquo eacute categoria que tal como

compreendida por Hermoacutegenes encerra a noccedilatildeo de estudo563 de modo que se oponha

como se lecirc na traduccedilatildeo de Giulio Camillo Delminio agrave forma ldquoneglettardquo (ἀμελής) ldquopriua

di numerordquo (ἄρρυθμος) e ldquosimplice di construttionerdquo (εὐτελής) ou seja negligente

privada de ritmo e vulgar de construccedilatildeo Recorde-se que em Hermoacutegenes eutelēs pensa-

se em contraposiccedilatildeo a megethos (cf HERM 241 11-15) Nas Scholae de Johannes Sturm

sobre o Peri ideōn pelas quais Gaspar Laurent tem simpatia desdobra-se semanticamente

o preceito de que o retor grego faz uso564

Hanc formam Graeci nominant quia pulchritudo ista debet

esse coniuncta cum honestate non debet esse cerussa aut fuco

meretricio accersita sed agrave natura accepta studio amp diligentia

conservata virtutibus autem ornata amp hinc propter diligentiam in

conservando ἐπιμέλεια vocatur Tametsi enim pulchritudinem nobis

natura largiatur tamen cura atque diligentia conservatur 565

Esta forma os gregos denominam kallos porque tal beleza deve estar

conjugada com a honestidade natildeo deve ser afetada pela cerusa ou pela

puacuterpura da meretriz mas aceita pela natureza conservada pelo estudo

amp diligecircncia ornada poreacutem pelas virtudes daiacute que a epimeleia seja

chamada a conservar proximamente a diligecircncia Ainda que de fato a

natureza nos conceda a beleza ainda assim eacute conservada pelo cuidado

e pela diligecircncia 566

O leacutexico de Johannes Sturm pode ser observado agrave distacircncia mais curta Sem

diligentia sem cura orna-se viciosamente o discurso A meretriz o letrado potildee agrave vista

como figura que metaforiza a pulchritudo sem honestas a beleza feita dos descuidos da

563 Patillon uso o termo ldquorechercherdquo cf HERMOGEgraveNE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale

introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 397 564 Cf PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New Jersey

Princeton University Press 1970 pp 53-54 565 ldquoIoannis Sturmii Scholae in Librum I De formis orationum seu dicendi generibusrdquo in Hermogenis

Tarsensis rhetoris acutissimi De dicendi generibus siue formis orationum libri II Latinitate donati amp

scholis explicati atque illustrati a Ioan Sturmio Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo ad annos octo

Excudebat Iosias Rihelis MDLXXI p 244 566 Traduccedilatildeo nossa

184

natureza que as cores tornam desmedida a que o orador e o poeta devem evitar Para

evitaacute-lo o imperativo eacute breve o kallos natildeo deve buscar nem a cerussa nem o fucus Satildeo

termos sabidos da Naturalis historia de Pliacutenio o Velho (sec I dC) ambos referem cores

o primeiro cor austera de pigmento branco extraiacutedo da escoacuteria do chumbo (cf PLIN NH

XXXIV 70 XXXV 12) 567 o segundo planta marinha o fuco de que se extrai tintura

vermelha e por metoniacutemia a proacutepria cor (cf PLIN NH XXVI 103 QUINT XII 10 75)

O branco da cerusa e o puacuterpura do fuco datildeo cor agrave face da meretriz no exemplum por

semelhanccedila dizem o ornamento que ostenta a ineacutepcia o descuido a desonestidade e a

vulgaridade da obra e do artiacutefice Conforme o De oratore Antocircnio o ensina trata-se ao

cabo de facear os preceitos da arte e regulaacute-los com moderaccedilatildeo mediante a virtude das

virtudes a diligecircncia (CIC De or II 147-150)

Na versatildeo de Jorge de Trebizonda a mais antiga em latim venustas ou

pulchritudo define-se como ldquoomniũ quibus oratio cotildeficitur cotildeueniẽtia quaeligdam amp

modus qua cum succus quidam amp qualitas tanquam color orationis elucetrdquo ou seja

ldquoproporccedilatildeo de todas as coisas por meio das quais se constroacutei um discurso amp justa medida

com as quais certa vitalidade e a qualidade do discurso como uma cor resplandecerdquo 568

Consoante os preceitos de Hermoacutegenes note-se bem esta idea compreende-se tanto

como symmetria (συμμετρία) dos stoikheia constituintes das ideai operadas num

discurso donde convenientia na liccedilatildeo latina proporccedilatildeo quanto como poiotēs ēthous

(ἤθους) do todo e da parte qualidade de caraacuteter donde qualitas orationis

qualidade do discurso e por comparaccedilatildeo khrōma (χρῶμα) donde color cor do corpo

de belas cores de bela compleiccedilatildeo (εὔχροια) (cf HERM 296 24-297-9)

Reluz ensinam os Rhetoricorum libri V natildeo apenas a beleza da cor ou a cor da

beleza senatildeo tambeacutem a ldquovitalidaderdquo do discurso Isto seja certo ldquosuccusrdquo que lhe

conforma Variante de ldquosucusrdquo registra o Lewis amp Short eacute termo que na acepccedilatildeo de

ldquovigor of a discourserdquo emprega-se por Quintiliano na Institutio oratoria em ldquoHistoria

quoque alere orationem quodam uberi jucundoque suco potestrdquo (QUINT X 1 31) ou

seja ldquoA histoacuteria pode igualmente nutrir o orador de uma vitalidade fedunda e agradaacutevelrdquo

567 Recorde-se Pliacutenio o Velho distingue as cores em austeras e floridas (ldquoSunt autem colores austeri aut

floridirdquo) em nascidas e feitas (ldquoalii nascuntur alii fiuntrdquo) (cf PLIN NH XXXV 6 12) cf PLINE LrsquoANCIEN

Histoire naturelle Livre XXXV La Peinture Traduit par J-M Croisille Introduction et notes de P-E

Dauzat Paris Les Belles Lettres 2002 p 182 568 Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia ad

D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] pp 496-497

185

e por Ciacutecero no De oratore na voz de Antocircnio que afirma ldquoomnes [] retinebant illum

Pericli sucumrdquo (CIC De or II 93) ou seja ldquo[Criacutetias Teramenes e Liacutesias] todos retinham

aquela vitalidade de Peacutericlesrdquo e tambeacutem na de Crasso cuja orientaccedilatildeo Jorge de

Trebizonda atualiza para que Hermoacutegenes latinamente fale Diz a personagem

Ornatur igitur oratio genere primum et quasi colore quodam et suco

suo nam ut gravis ut suavis ut erudita sit ut liberalis ut admirabilis

ut polita ut sensus ut doloris habeat quantum opus sit non est

singulorum articulorum in toto spectantur haec corpore Vt porro

conspersa sit quasi verborum sententiarumque floribus id non debet

esse fusum aequabiliter per omnem orationem sed ita distinctum ut

sint quasi in ornatu disposita quaedam insignia et lumina Genus igitur

dicendi est eligendum quod maxime teneat eos qui audiant et quod

non solum delectet sed etiam sine satietate delectet (CIC De or III

96-97)

O discurso eacute adornado entatildeo em primeiro lugar por seu caraacuteter geral

bem como por sua cor por assim dizer e vitalidade De fato ser grave

encantador culto nobre admiraacutevel refinado apresentar tanto

sentimento e dor quanto eacute necessaacuterio natildeo dizem respeito a membros

isolados essas qualidades se observam no corpo inteiro Para que

continuando ele seja salpicado pelas flores por assim dizer das

palavras e dos pensamentos isso natildeo deve estar espalhado

uniformemente por todo o discurso mas distinguido de tal maneira que

haja certos sinais e luzes dispostos por assim dizer no ornato569

Ora porque difusas desigualmente pelo todo as cores satildeo ornamentos que

promovem a variedade do discurso O avesso investe-lhe de monotonia Eacute doutrina que

se conhece de Quintiliano doutrina da qual se apropriam Manuel de Galhegos no

ldquoDiscurso Poeacuteticordquo e Jerocircnimo Soares Barbosa nas Instituiccedilotildees oratorias de M Fabio

Quintiliano para ler o Peri ideōn no discurso do orador natildeo deve ser uma e a mesma a

cor do proecircmio da narraccedilatildeo das argumentaccedilotildees da digressatildeo e da peroraccedilatildeo (QUINT

XII 10 71) Jorge de Trebizonda como se veraacute costumeiro lecirc Hermoacutegenes ciente de

569 Apud SCATOLIN A A invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23

Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 2009 [tese de doutorado] p 281

186

Ciacutecero de modo a acomodar-lhes as liccedilotildees e a fazer concordarem-lhes os ensinamentos

O De oratore eacute autoridade entre as primazes nessa praacutetica

Hermoacutegenes o esmiuacuteccedila a beleza da compleiccedilatildeo a noccedilatildeo de kallos como definida

eacute pendente de Platatildeo do Fedro Afirma o retor Soacutecrates no diaacutelogo diz ser conveniente

que todo discurso todo arrazoado (λόγος) tenha cabeccedila (κεφαλή) extremos (ἄκρα) e

meio (μέσα) decorosos adequados um relativamente a outro e relativamente ao corpo

(σῶμα) como um todo visto que natildeo se possa formar belo discurso de partes mal-

dispostas mesmo que belas (cf HERM 297 9-14)570 Sabe-se o alvo das palavras de

Soacutecrates eacute Liacutesias De fato mostra-o Marcos Martinho dos Santos desse passo do Fedro

platocircnico dependem os versos do proacutelogo (HOR AP 1-13) da Epistula ad Pisones de

Horaacutecio nos quais se pinta o monstrum de cabeccedila humana cerviz equina tronco plumado

membros vaacuterios e cauda piacutescea pois que escreve o latinista ldquotanto Horaacutecio como

Soacutecrates tratam a ordenaccedilatildeo das partes do arrazoado comparando-as ademais a cabeccedila

e peacute de ser viventerdquo571 Hermoacutegenes pois mira a formosura infensa agrave deformidade dos

monstros572

570 O passo de Platatildeo lido por Hermoacutegenes muito proximamente eacute este ldquoΣωκράτης ἀλλὰ τόδε γε οἶμαί σε φάναι ἄν δεῖν πάντα λόγον ὥσπερ ζῷον συνεστάναι σῶμά τι ἔχοντα αὐτὸν αὑτοῦ ὥστε μήτε ἀκέφαλον εἶναι μήτε ἄπουν ἀλλὰ μέσα τε ἔχειν καὶ ἄκρα πρέποντα ἀλλήλοις καὶ τῷ ὅλῳ γεγραμμέναrdquo (PLAT Phaedr 264 c) [SOacuteCRATES Mas penso que isto ao menos tu declararias que todo

arrazoado deve constituir-se como vivente tendo algum corpo que seja o dele de modo que nem sem cabeccedila seja nem sem peacutes mas tenha meio e cume estando escritos com decoro para um e outro e para o todo]

Apud SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

198 Carlos Alberto Nunes assim traduz o mesmo passo ldquoSOacuteCRATES Poreacutem uma coisa quero crer teraacutes

de admitir que todo discurso precisa ser precisa ser construiacutedo como um organismo vivo com um corpo

que lhe seja proacuteprio de forma que natildeo se apresente sem cabeccedila nem peacutes poreacutem com uma parte mediana e

extremidades bem relacionadas entre si e com o todordquo cf PLATAtildeO Fedro Φαῖδρος 3ordf ed revisada e

biliacutengue Beleacutem edufpa 2011 p 155 571 SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

199 572 Leia-se o que registra o verbete de Raphael Bluteau ldquoFERMOSURA ou Formosuacutera Belleza He huma

excellencia que resulta da Symmetria ou bem ordenada proporccedilaotilde das partes as quaes realmente saotilde ou

mentalmente se suppoem ser o cotildestitutivo de huma cousa na esphera da sua propria natureza Vamos

explicando por partes esta definiccedilaotilde para que todos claramente entendaotilde I A fermosura he excellencia

como tal he chamada Dom de Deos esplendor celeste privilegio da natureza attractivo dos olhos prisaotilde

dos sentidos idolo das vontades preccedilo amp estimaccedilaotilde de tudo porque todas as cousas soacute em quanto fermosas saotilde prezadas 2 A fermosura he excellencia que resulta da Symmetria amp proporccedilatildeo das partes

Naotilde porque tambem as partes naotilde tenhaotilde sua fermosura particular mas porque fallamos da fermosura de

hum todo perfeytto no qual termo naotilde soacute se comprehendem as cousas corporeas mas tambem as

incorporeas amp espirituaes porque ateacute a virtude que he toda espintual tambem tem sua proporccedilaotilde

comparaccedilatildeo amp commensuraccedilaotilde com as cousas que o entendimento reconhece proprias da sua natureza

amp o mesmo Deos que he puro espirito tem com todas as mais perfeiccediloens a da fermosura porque ainda

que Ente simplicissimo amp livre de toda a materia naotilde exclue a composiccedilaotilde Symmetrica de razaotilde mas

admite varios conceitos ou imagens intellectuaes que postas em boa ordem representaotilde objetivamente a

sua summa fermosura a qual he a da proacutepria virtude porque na essencia Divina tem a virtude a sua

primeyra amp verdadeira origem Finalmente consiste a excellencia da fermosura na proporccedilaotilde das partes

que realmente ou mentalmente cotildestituem huma cousa na esphera da sua propria natureza porque o que

187

Ora eacute preceito que normatiza o Peri ideōn basta tampouco bem acomodar-se o

discurso ao misto de saphēneia megethos epimeleia e kallos ou seja fazer-se claro

grande diligente e belo uma vez que eacute de bom tom fazecirc-lo tambeacutem notaacutevel pela gorgotēs

(cf HERM 312 3-8)

IN CHE maniera si faccia la oratione bella insieme con Tumore e

Dignitate amp ancho come chiara egrave detto sopra ma perche alla oratione

fa bisogno anchora la Celeritate accioche essa non habbia solamente

Grandezza tarda amp chiara ouero sola Bellezza ma ancho habbia

Velocitate allaquale egrave contraria la rimessa amp bassa oratione

parleremo ora di essa573

DE QUE maneira se faccedila o discurso belo conjugado com a Amplitude e

a Dignidade amp tambeacutem claro diz-se antes mas porque ao discurso eacute

necessaacuterio ainda a Celeridade a fim de que natildeo tenha somente

Grandeza tarda amp clara ou soacute Belleza mas tambeacutem tenha Velocidade

agrave qual eacute contraacuterio o discurso recolhido amp baixo falaremos desta

agora574

num objecto he deformidade em outro objecto he fermosura amp pelo contrario amp assi a tromba do

Elephante que no rosto humano seria monstruosidade no focinho do Elephante he formosura porque he

parte conveniente propria amp constitutiva do corpo do dito animal amp daqui nace que as feiccediloens de

algumas naccediloens que agrave primeyra vista nos parecem feas bem confideradas saotilde fermosas porque saotilde

proprias dos rostos com que o Author das armonias da natureza os quiz distinguir dos nossos Neste mundo sublunar naotilde haacute fermosura perfeita tanto assi que aquelle que quiz representar hum corpo perfeitemente

fermoso foy obrigado a tomar cem corpos differentes por modello De sorte que he providencia de Deos

que naotilde haja fermofa sem senaotilde porque as faltas que os olhos descobrem suspendem adoraccediloens que se

haviaotilde de tributar amp se com a fermosura de huma boa cara ser hum bem taotilde caduco amp hum mal taotilde certo

se vẽdo os homens que o tempo que a perfeiccediloa a estraga que attrahindo a si os olhos os cega amp que

senhoreando as vontades as tyranniza finalmente se no meyo das suas inevitaveis crueldades amp perfidias

tem tantos adoradores que idolatrias naotilde causaria no mundo huma fermosura igualmente benefica que

perfeita Pulchritudo inis FemSpeciesei Fem Forma ae Cic Bellezardquo cf Vocabulario portuguez e

latino aulico anatomico architectonico bellico botanico brasilico comico critico chimico dogmatico

dialectico dendrologico ecclesiastico etymologico economico florifero forense fructifero autorizado

com exemplos dos melhores escritores portugueses e latinos pelo padre D Raphael Bluteau Coimbra no Real Collegio das Artes da Companhia de Jesu Com todas as Licenccedilas necessaacuterias Anno Domini

MDCCXIII [1713] pp 82-3 Natildeo se pode deixar de notar que a formosura e a deformidade assim

reguladas compotildeem-se personificadas no conte ldquoLa belle et la becircterdquo (A bela e a fera) de Gabrielle Suzanne

Barbot (1695-1755) a Madame de Villeneuve impresso em 1740 Evidentemente logo que americanizada

a faacutebula outros satildeo os valores de uso e de troca 573 Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 28v 574 Traduccedilatildeo nossa

188

Vale rememorar que a gorgotēs eacute mencionada no ldquoDiscurso poeacuteticordquo de Manuel

de Galhegos nos seguintes termos ldquoA breuidade no explicar a sentẽccedila he soberana tarda

muito pouco em dar forma ao conceito q he o que encomenda Hermogenes na palavra

Gorgotis Que val o mesmo que Preccedilardquo575

Eacute proposta dos tradutores Cecil W Wooten e Antonio Sancho Royo que gorgotēs

eacute idea que confere rapity e rapidez ao discurso Trata-se diferentemente conforme

Consuelo Ruiz Montero e Michel Patillon de modo de conformaccedilatildeo de viveza e de

vivaciteacute Ou rapity ou rapidez ou viveza ou vivaciteacute eacute categoria pensada no avesso do

relaxado e do lacircnguido (cf HERM 312 7-8 ldquoτὸ ἀνειμένον καὶ ὕπτιονrdquo) como forma de

composiccedilatildeo discursiva mediante methodoi que se faccedilam de respostas raacutepidas de reacuteplicas

breves de apoacutestrofes os apelativos assim exemplificados pelo retor ldquoAlojavam-se em

tua casa oacute Eacutesquines e tu eras seu protetor oficialrdquo (cf DEM Cor 18 82 ldquoπαρὰ σοὶ

κατέλυον Αἰσχίνη καὶ σὺ προὐξένεις αὐτῶνrdquo) Ao cabo para a construccedilatildeo da gorgotēs

propotildee-se o uso de methodos que seja produzido por meio do que o retor grego denomina

como tipo segmentado (cf HERM 312 16 τμητικός) o que se compreende aponta-o

Consuelo Ruiz Montero segundo os comentaacuterios de Siriano Filoxeno a este passo como

tipo de estilo que parece promover a seccedilatildeo do arrazoado pela brevidade de seus membros

e tambeacutem pela rapidez de seus pensamentos576 Mais opera-se sobretudo mediante

skhēmata cujos efeitos sejam ou a segmentaccedilatildeo a que o comentador faz referecircncia ou a

revogaccedilatildeo da languidez do discurso (cf HERM 314 6-10) Mediante kōla breves (cf

HERM 319 14-15) synthēkē que evite o hiato intervocaacutelico (cf HERM 319 16-17) e

rhythmos feito do predomiacutenio do troqueu (τροχαῖος) pois com peacutes troqueus compostos

de uma siacutelaba longa seguida de uma breve ensina o Peri ideōn por analogia que motiva

o signo linguiacutestico ldquoo ritmo correrdquo (ldquoτρέχειrdquo) (HERM 319 19-320 1) Note-se para

Hermoacutegenes tanto a lexis pouco faz na enformaccedilatildeo da gorgotēs como natildeo haacute ennoiai

que lhe sejam proacuteprios embora concede o tratadista seja possiacutevel que assim sejam ditas

as finezas de pensamento (ldquoτὰ ὀξέα τῶν νοημάτωνrdquo) (cf HERM 312 9-11) ldquoli sensi

575 Apud Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de

Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro sp 576 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 p 210

189

della Acutezzardquo diria Giulio Camillo Delminio577

Agrave luz das anaacutelises de Michel Patillon deve-se entender a gorgotēs como

procedimento retoacuterico que se produz por transiccedilatildeo (μετάβασις578) raacutepida de elementos

contrastados breves sobretudo de sorte a dar mobilidade (κινεῖν) ao discurso e fazer dele

algo vivo (γοργόν) (cf HERM 314 1-3) Um dos exemplos de Metodo com esta feiccedilatildeo

colhidos por Filiberto Campanile jaacute acomodada a doutrina ao vernaacuteculo proveacutem de

Francesco Petrarca e ilustra a conjugaccedilatildeo de raacutepida transiccedilatildeo com a brevidade dos

enunciados interrogativos

Srsquoamor non egrave chrsquoegrave dunque quel chrsquoio sento

Ma srsquoegli egrave amor per Dio che cosa e quale

Se buona ondrsquoegrave lrsquoeffecto aspro e mortale

Se ria ondrsquoegrave si dolce ogni tormento579

577 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 29 578 Cf QUINT IX 3 25 579 Apud Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina

drsquoHermogene e drsquo altri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo

superiori p 88 Integralmente o soneto eacute o seguinte com a grafia atualizada e liccedilatildeo variante ldquoSrsquoamor non

egrave che dunque egrave quel chrsquoio sento Ma srsquoegli egrave amor per Dio che cosa e quale Se bona onde lrsquoeffecto

aspro mortale Se ria ondrsquoegrave siacute dolce ogni tormento Srsquoa mia voglia ardo onde lsquol pianto e lamento

Srsquoa mal mio grado il lamentar che vale O viva morte o dilettoso male come puoi tanto in me srsquoio no lsquol consento Et srsquoio lsquol consento a gran torto mi doglio Fra siacute contrari vegraventi in frale barca mi trovo in

alto mar senza governo siacute lieve di saver drsquoerror siacute carca chrsquoirsquo medesmo non so quel chrsquoio mi voglio e

tremo a mezza state ardendo il vernordquo [ldquoSe amor natildeo eacute qual eacute o meu sentimento Mas se ele eacute amor por

Deus que coisa eacute e qual Se boa de onde lhe vem a accedilatildeo mortal Se maacute por que eacute tatildeo doce o meu

tormento Se eu ardo por querer por que lamento Se a meu mau grado lamentar que val Oacute viva

morte oacute deleitoso mal tanto em mim podes sem consentimento E se eu consinto sem razatildeo pranteio

Em tatildeo contraacuterio vento em fraacutegil barca me encontro em alto mar e sem governo vazia de saber de

erro ela se arca tanto que natildeo sei bem o que anseio e tremo no veratildeo e ardo no inversordquo] cf PETRARCA

F Cancioneiro Traduccedilatildeo de Joseacute Clemente Pozenato Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da

Unicamp 2014 pp 238-239 Note-se agrave guisa de exemplo trata-se de procedimento elocutivo de

interpelaccedilatildeo interrogativa tambeacutem empregado por Luiacutes de Camotildees neste soneto ldquoAh minha Dinamene assi deixaste Quem nunca deixar pode de quererte Que ja Ninfa gentil natildeo posso ver-te Que tatildeo

veloz a vida desprezaste Como por tempo eterno te apartaste De quem taotilde longe andava de perderte

Puderaotilde essas agoas defenderte Que naotilde visses quem tanto magoaste Nem soacutemente falarte a dura Morte

Me deixou que apressada o negro manto Lanccedilar sobre os teus olhos consentiste Oh mar oacute ceacuteu oacute

minha escura sorte Qual vida perderey que valha tanto Se inda tenho por pouco o viver tristerdquo cf

Rimas varias de Luis de Camoens priacutencipe de los poetas heroycos y liricos de Espantildea Ofrecidas al muy

ilustre sentildeor D Ivan da Sylva Marquez de Gouvea presidente del Dezembargo do Paccedilo y mayordomo

mayor de la Casa Real ampc Comentadas por Manuel de Faria Y Sousa Cavallero de la Orden de Christo

Tomo I y II Que contienen la primera segunda y la terceira Centuria de los Sonetos Lisboa Con

Privilegio Real En la Imprenta de Theotonio Damaso de Mello Impressor de la Casa Real Con todas las

licencias necessarias Antildeo de 1685 p 278

190

Se amor natildeo eacute que eacute entatildeo o que eu sinto

Mas se eacute amor por Deus que coisa eacute e qual

Se boa donde eacute o efeito aacutespero e mortal

Se maacute por que eacute tatildeo doce cada tormento580

O ldquoSermatildeo pelo bom sucesso das armas de Portugal contra as de Holandardquo do

Padre Antocircnio Vieira eacute proacutedigo nesse procedimento de interpelaccedilatildeo interrogativa

Parece-vos bem Senhor parece-vos bem isto Que a mim que sou

vosso servo me opprimais amp aflijais E aos impios aos inimigos

vossos os favoreccedilais amp ajudeis Parece-vos bem que sejaotilde eles os

prosperados amp assistidos de vossa Providecircncia amp noacutes os deixados de

vossa matildeo noacutes os esquecidos de vossa memoacuteria noacutes o exemplo de

vossos rigores noacutes o despojo de vossa ira Taotilde pouco he desterrarnos

por voacutes amp deixar tudo Taotilde pouco he padecer trabalhos pobrezas amp

os desprezos que ellas trazem comsigo por vosso amor Jaacute a Feacute naotilde

tem merecimento Jaacute a Piedade natildeo tem valor Jaacute a perseveranccedila natildeo

vos agrada Pois se ha tanta differenccedila entre noacutes ainda que maacuteos amp

aquelles perfidos por que os ajudais a eles amp nos desfavoreceis a noacutes

Nunquid bonum tibi videtur a voacutes que sois a mesma bondade parece-

vos bem isto581

Na interpretaccedilatildeo de Hermoacutegenes proposta por Jorge de Trebizonda gorgotēs diz-

se latinamente ldquovelocitasrdquo ou ldquoceleritasrdquo e define-se tanto como ldquocompositionis

acceleratio qua uiua amp mobilis oratio videtur ou seja ldquoaceleraccedilatildeo da composiccedilatildeo por

meio da qual o discurso parece vivo e moacutevelrdquo 582 o que guarda efeitos esmiuccedilados pelas

anaacutelises de Michel Patillon quanto como ldquodicendi vis quaelig mobilem orationem redditrdquo

ou seja ldquovigor do dizer que torna moacutevel o discursordquo583 o que faz recordar Horaacutecio e

Ciacutecero Sabe-se conforme as liccedilotildees de ambos eacute distintiva dos gecircneros de discurso a vis

580 Traduccedilatildeo nossa 581 Cf Sermoens do Padre Antonio Vieira da Companhia de Iesu Preacutegador de Sua Magestade Em Lisboa

Na officina de Miguel Deslandes A custa de Antonio Leyte Pereyra Mercador de Livros M DC LXXXIII

[1683] Com todas as licenccedilas amp Privilegio Real p 478 582 Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia ad

D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] p 497 583 Idem p 576

191

diga-se o vigor de oradores e de poetas de artiacutefices da palavras de sorte que seja suma

no grave e deacutebil no tecircnue584

A eleiccedilatildeo do substantivo ldquovelocitasrdquo eacute controversa consoante o uacutenico estudo

extensamente consagrado a Jorge de Trebizonda sabe-se George of Trebizond A

Biography and a Study of his Rhetoric and Logic de John Monfasani pois que eacute

considerada equivocada ldquoTrebizond made an egregious error (probably misled by the

meaning of the word in medieval Greek)rdquo 585 Eacute opiniatildeo compartilhada por Luiza Loacutepez

Grigera586 todavia ressalta que as razotildees do estudioso obliquamente reafirmem um

renascimento positivado ao crer o erro no grego medieval e estejam evidentemente

assentadas na positividade desses pressupostos Haacute algo aleacutem de erro nas liccedilotildees latinas e

vernaculares do Peri ideōn

Ao verter gorgotēs por ldquovelocitasrdquo Jorge de Trebizonda elege substantivo latino

conhecido dos leitores de Quintiliano como traccedilo elocutivo da prosa do historiador

romano Saluacutestio (seacutec I aC) (cf QUINT X 1 102) e fazem escolhas afins tradutores e

comentadores quinhentistas e seiscentistas de Hermoacutegenes Antocircnio Bonfine emprega

584 Cf Hermogenis De formis orationum tomi duo Argentorati apud haeredes Vuendelini Rihelij Anno

1555 sp cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002

v 4 p 228 585 Cf MONFASANI J George of Trebizond A Biography and a Study of his Rhetoric and Logic Leiden

Brill 1976 pp 323-324 ldquoThe difficulty is that Hermogenes did not teach a stylistic form of lsquospeedrsquo

that Trebizond made an egregious error (probably misled by the meaning of the word in medieval Greek)

and that this error is readily apparent to anyone who reads the pertinent section unprejudiced by

Trebizondrsquos interpretation Hermogenes meant vitality liveliness vigor [hellip] Rapidity is far from being an

always desirable quality in expression but vigor certainly is This is why at the start of his explanation of the form Hermogenes called for the regular presence of gorgoacutetes next to brightness clarity grandeur and

beauty and contrasted it to listlessness and flatness His recommendation for sharp remarks choppiness

and curtness short antitheses quick exchanges and apostrophes do not make a speech move quickly

indeed the contrary is true but they certainly give it vigor and life A humorous result of this

misunderstanding is that when later students of Hermogenes tried to apply his doctrine of lsquospeedrsquo they felt

it necessary to correct the master In the teeth of his injunction to use short sharp words they had to defend

their use of polysyllabic words as equally if not more effective in creating a sensation of speedrdquo Entenda-

se ldquoA dificuldade eacute que Hermoacutegenes natildeo ensina uma forma estiliacutestica da lsquovelocidadersquo que Trebizonda

cometeu um erro notaacutevel (provavelmente enganado pelo sentido da palavra no grego medieval) e que esse

erro eacute prontamente manifesto a quem leia o passo pertinente sem os preconceitos da interpretaccedilatildeo de

Trebizonda Hermoacutegenes significou lsquovitalidadersquo lsquovivacidadersquo lsquovigorrsquo [hellip] Rapidez estaacute longe de ser uma qualidade sempre desejaacutevel na expressatildeo mas vigor certamente eacute Por isso eacute que no iniacutecio da explanaccedilatildeo

da forma Hermoacutegenes demandou a presenccedila regular da gorgoacutetes proacutexima ao brilho agrave clareza agrave grandeza

e agrave beleza e contrastou-a agrave lacircnguidez e agrave chaneza Sua recomendaccedilatildeo por observaccedilotildees agudas

movimentaccedilatildeo e concisatildeo breves antiacuteteses mudanccedilas raacutepidas e apoacutestrofes natildeo faz um discurso mover-se

rapidamente decerto o contraacuterio eacute verdadeiro mas eles certamente conferem-lhe vigor e vida Um resultado

cocircmico desse engano eacute que quando posteriores estudantes de Hermoacutegenes tentaram aplicar sua doutrina

da lsquovelocidadersquo eles sentiram a necessidade de corrigir o mestre Em oposiccedilatildeo a esta injunccedilatildeo ao uso de

palavras breves agudas eles tiveram de defender de maneira semelhante o uso de palavras polissilaacutebicas

talvez mais efetivas na criaccedilatildeo de uma sensaccedilatildeo de velocidaderdquo 586 Cf LOacutePEZ GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Salamanca Universidad de

Salamanca 1994 p 80

192

ldquoceleritasrdquo ldquovelocitasrdquo e os adjetivos ldquocelerrdquo e ldquoveloxrdquo relativamente agrave forma e seus

constituintes (1538)587 Natale Conti emprega ldquoceleritasrdquo ldquocelerrdquo e ldquoveloxrdquo (1550)588

Johannes Sturm emprega natildeo apenas ldquoveloxrdquo (1551) 589 senatildeo tambeacutem ldquoceleritasrdquo

ldquovelocitasrdquo e ldquoforma veloxrdquo (1571)590 Pedro Juan Nuntildeez ldquovelocitasrdquo (1578)591 Giulio

Camillo Delminio em toscano emprega ldquoprestezzardquo (1560) 592 e ldquoCeleritaterdquo e

ldquoVelocitaterdquo (1590) 593 Gabriele Zinano ldquoVelocitagraverdquo (1590)594 e Filiberto Campanile

ldquoPrestezzardquo e ldquoCeleritagraverdquo (1606)595 Dessa liccedilatildeo pendem natildeo soacute o uso de Manuel Pires de

Almeida o adjetivo ldquoligeirordquo (1633) 596 como o de Manuel de Galhegos ldquoPreccedilardquo

(1636)597

Ademais conveacutem destacar que Johannes Sturm na epiacutestola exordial ao volume

Hermogenis De formis orationum tomi duo toma ldquoveloxrdquo como genus dicendi que torna

587 Cf Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii

item Sophistaelig Praeligexercitamenta Antonio Bonfine asculano interprete Apud Seb Gryphivm Lvgdvni

1538 pp 229 230 232 235 588 Cf Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] pp 188 236 243 249 250 311 589Cf Hermogenis De formis orationum tomi duo Argentorati apud haeredes Vuendelini Rihelij Anno

1555 sp 590 ldquoIoannis Sturmii Scholae in Librum II De formis orationum seu dicendi generibusrdquo in Hermogenis

Tarsensis rhetoris acutissimi De dicendi generibus siue formis orationum libri II Latinitate donati amp

scholis explicati atque illustrati a Ioan Sturmio Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo ad annos octo

Excudebat Iosias Rihelis MDLXXI p 268 591 Cf Pet Iohan Nunnesii valentini Institutionum rhetoricarum libri quinque Editio tertia ceteris multo

correctior et locupletior exemplis Barcinone ex typographia Sebastiani agrave Cormellas An 1593 pp 299

Menciona-se no tiacutetulo da primeira ediccedilatildeo do tratado o nome de Hermoacutegenes Institutiones rhetoricae ex progymnasmatis potissimum Aphtonii atque ex Hermogenis arte dictatae agrave Petro Ioanne Nunnesio

Valentino Barcinone ex officina Petri Mali 1578 592 Cf Il secondo tomo dellrsquoopere di M di Giulio Camillo Delminio cioegrave La Topica ouero dellrsquoElocutione

Discorso sopra lrsquoIdee di Hermogene La Grammatica Espositione sopra il primo amp secondo Sonetto del

Petrarca Nvovamente dato in lvce Con privilegio In Venegia apresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLX

[1560] p 80 593 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste srsquoaggiunge lrsquoArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 28v 29r 594 Cf Sommarii di varie retoriche greche latine et volgari Distintamente ordinati in uno da Gabriele

Zinano In Reggio Apresso Hercoliano Bartholi 1590 p 198 595 Cf LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina

drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con

Licenza dersquo Superiori p 88 596 Cf MUHANA A Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia Tratado Seiscentista de Manuel Pires de

Almeida Satildeo Paulo Edusp p 108 597 Apud Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de

Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro sp

193

o discurso (oratio) cadenciado (tracta) impetuoso (contorta) e fluente (fluens)598 Os

termos satildeo parafraseados de Ciacutecero para quem este eacute ensinamento do Orator a historia

em sua feiccedilatildeo elocutiva deva ser limiacutetrofe dos discursos dos sofistas e estar afastada dos

dos oradores judiciaacuterios o historiador enquanto narra ou descreve regiatildeo ou combate

que o faccedila ldquoornaterdquo com adornos e caso interponha arengas e exortaccedilotildees que o faccedila por

meio da oratio ldquotractardquo e ldquofluensrdquo a de aparato dos sofistas e natildeo por meio da ldquocontortardquo

e ldquoacrisrdquo (pungente) a dos foacuteros (CIC Or XX 66)599 Conforme o De oratore em

preceitos semelhantes conveacutem que a ratio verborum da historia se faccedila do ldquogecircnero de

discurso profuso cadenciado e uniformemente fluente com certa suavidade sem a

aspereza judicial e sem os aguilhotildees forenses de pensamentordquo (cf CIC De or II 64

ldquogenus orationis fusum atque tractum et cum lenitate quadam aequabiliter profluens sine

hac iudiciali asperitate et sine sententiarum forensibus aculeisrdquo) Ora Johannes Sturm se

apropria dos usos de Ciacutecero e conjuga a cadecircncia e a fluecircncia do sofista com a

impetuosidade do orador forense natildeo mais para pensar a regulaccedilatildeo do estilo da historia

senatildeo que para fazer significar a categoria da gorgotēs sob os auspiacutecios da auctoritas do

do Orator (e do De oratore) na preceptiva retoacuterica

Destoa Gaspar Laurent todavia que emprega no corpo da traduccedilatildeo do Peri ideōn

ldquoconcitatum genus dicendirdquo e daacute ciecircncia nos comentaacuterios do texto dos usos de ldquoceleritasrdquo

e de ldquovelocitasrdquo (1614)600 O adjetivo latino ldquoconcitatus a umrdquo no Dictionarium Latino

hispanicum et vice versa Hispanico latinum de Antocircnio de Nebrija registra-se como

ldquoCosa mouidardquo 601 Semelhantemente no Dictionarium latino lusitanicum et vice versa

lusitanico latinum de Jerocircnimo Cardoso em ediccedilatildeo de 1613 como ldquocousa mouidardquo602

598Cf Hermogenis De formis orationum tomi duo Argentorati apud haeredes Vuendelini Rihelij Anno

1555 sp 599 Cf AMBROSIO R De rationibus exordiendi os princiacutepios da histoacuteria em Roma Satildeo Paulo Humanitas

Fapesp 2005 pp 34-35 O passo integral de Ciacutecero eacute ldquoHuic generi historia finitima est In qua et narratur

ornate et regio saepe aut pugna describitur interponuntur etiam contiones et hortationes Sed in his tracta

quaedam et fluens expetitur non haec contorta et acris oratiordquo (cf CIC Or XX 66) 600 Cf ldquoIn Hermogenis tractatvm de ideis sive de formis eloqventiaelig Gasparis Laurentij commentariusrdquo in Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] 168 601 Cf Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum Aelio Antonio Nebrissensi

interprete nunc denuo ingenti vocum accessione locupletatum pristinoq nitori sublata mendarum colluuie

restitutum Ad haec Dictionarium propriorum nominum ex probatiszligimis Graecaelig amp Latinaelig linguaelig

autoribus addita ad calcem neoterica locorum appellatione concinnatum Antuerpiae In AEligdibus viduaelig amp

haeligredum Ioannis Steelij M D LXX [1570] Cum Priuilegio Regis 602 Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum adagiorum feregrave omnium juxta

seriem alphabeticam perutili expositione Ecclesiasticarum [sic] vocabulorum interpretatione item de

monetis ponderibus et mensuris ad presentem usum accommodatis per Hieronymum Cardosum lusitanum

194

De acordo com o Lewis amp Short trata-se de termo utilizado no sentido de ldquoViolently

moved i e rapid swift quickrdquo (ldquoViolentamente movido i e raacutepido vivo velozrdquo) e

frequentemente em Quintiliano no de ldquoRoused up excited vehement ardentrdquo

(ldquoAcometido excitado veemente ardenterdquo) Ora eacute por meio dessa vertente de

interpretaccedilatildeo do Peri ideōn de Hermoacutegenes que se deve compreender o estilo

ldquoArrebatadordquo de Jerocircnimo Soares (1790) tambeacutem dito ldquoardenterdquo ldquoconcitatumrdquo

ldquopatheticordquo e ldquoinflammadordquo arrebatado ldquopelos incisos e membros e pelas figuras

fortesrdquo603 Conveacutem notar que por vezes distanciados os adjetivos latinos ldquocelerrdquo e

ldquoconcitatusrdquo ldquovelozrdquo e ldquoarrebatadordquo na traduccedilatildeo de Adriano Scatolin combinam-se no

De oratore de Ciacutecero na voz de Antocircnio como qualificativos do discurso abundante do

jovem orador Sulpiacutecio (cf CIC De or II 88)604

A eleiccedilatildeo vocabular de Gaspar Laurent embora se perceba divergente de todas as

demais arroladas quinhentistas sobretudo tem antecedentes nos Commentariorum

rhetoricorum sive oratoriarum institutionum libri VI de Gerard Joannes Vossius (1577-

1649) estampados em 1606 e citados adiante pela quarta ediccedilatildeo de Lion de 1643 que

instam contra o que se entende como a imprecisatildeo de ldquovelocitasrdquo e de ldquoceleritasrdquo

quam rectiugraves incitatum sive concitatum aut praeligceps

dicendi genus appellabimus quagravem celeritatem cugravem non ἅπλῶς

velocitatem notet sed quandam quasi fulmineam celeritatem605

GORGOTĒS a qual chamaremos incitado ou concitado ou gecircnero de

congesta recognita vero omnia per Sebastianum Stokhamerum germanum Qui libellum etiam de proprijs

nominibus regionum populorum illustrium virorum fluviorum historijs amp fabulis poeticis refertum in

usum amp gratiam lusitanicae pubis concinnavit amp ex integro adiecit Adhuc novi huic ultimae impressioni

adjuncti sunt varij loquendi modi ex praecipuis auctoribus decerpti praesertim ex Marco Tullio Cicerone

nunc denuo amendarum colluvie qua scatebat diligenti lucubratione defaecatum Ulyssipone ex officina

Petri Crasbeeck 1613 p 40 603 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel pp 88 430 604 Cf SCATOLIN A A invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23 Satildeo

Paulo [FFLCH-USP] 2009 [tese de doutorado] p 211 605 Cf Gerardi Ioannis Vossi Commentariorum rhetoricorum sive oratoriarum institutionum Pars altera

Lugduni Batavorum Ex officina Ioannis Maire MDCXLIII [1643] p 504 Cf HERMOGENE LrsquoArt

rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme

1997 p 15

195

dizer preciacutepite mais corretamente do que celeridade porque designa

natildeo haplōs [simplesmente] velocidade mas como que certa celeridade

fulminante606

O tradutor e o tratadista dependem agrave mesma maneira de autoridade comum a

saber das leituras dos Poetices libri septem (1561) de Juacutelio Ceacutesar Escaliacutegero em que se

propotildee a muacutetua adequaccedilatildeo dos adjetivos latinos ldquoincitatumrdquo ldquoconcitatumrdquo e ldquopraeligcepsrdquo

em substituiccedilatildeo aos usos linguiacutesticos que vertem de Jorge de Trebizonda nestes termos

ldquoNos genus hoc dicendi vel incitatũ vel concitatũ atq etiatilde iterdũ praeligceps appellabimusrdquo

(ldquoNoacutes chamaremos este gecircnero de dizer ou incitado ou concitado e ateacute mesmo por vezes

preciacutepiterdquo) 607

Avizinha-se obra contemporacircnea o De poeta de Antocircnio Sebastiano Minturno

(1500-1574) estampado em Veneza em 1559 em cujas paacuteginas se interpreta idea como

genus dicendi gorgotēs se traduz pelos neutros latinos ldquoIncitatũrdquo e ldquouolubilerdquo incitado e

voluacutevel e eacute ilustrada a operaccedilatildeo elocutiva de constituiccedilatildeo desses efeitos por passos da

Eneida de Virgiacutelio Mas natildeo apenas afirma-se a celeritas como modo de fazer fluir o

ritmo de versos que resultem convenientes a esse genus dicendi608 Estes preceitos tecircm

versatildeo toscana um tanto mais extensa na explicitaccedilatildeo do meios de composiccedilatildeo de 1564

elaborados pelo proacuteprio autor no tratado LrsquoArte poetica del Sig Antonio Minturno donde

vem que genus dicendi seja lido como ldquoforma del direrdquo que essa forma seja ldquoVolubile e

prestardquo e que possam ser aplicados entre mais procedimentos discursivos como os

exemplos colhidos de Francesco Petrarca em vez de Virgiacutelio o mostram ldquole uoci correnti

amp i uersi di pochi accenti ograve pure di numeri presti e uelocirdquo (ldquoas palavras correntes e os

versos de poucos acentos ou puros de ritmos ligeiros e velozesrdquo)609

606 Traduccedilatildeo nossa 607 Cf Iuli Caesaris Scaligeri uiri Poetices libri septem Ad Syluium Filium [Lyon] Apud Antonium

Vincentium 1561 p 182 608 Antonii Sebastianii Minturni De poeta ad Hectorem Pignatellum Vibonensium Ducem Libri Sex Cum

Priuilegijs Venetiis Ann MDLIX [1559] pp 554-555 609 LrsquoArte poetica del Sig Antonio Minturno nella quale si contengono i precetti Heroici Tragici Comici

Satyrici e drsquoogni altra Poesia Con la dottrina dersquo Sonetti canzoni et ogni sorte de Rime Thoscane dove

srsquoinsegna il modo che tenne il Petrarca nelle sue opere Et si dichiara arsquo suoi luoghi tutto quel che da

Aristotele Horatio et altri autori Greci e Latini egrave stato scritto per ammaestramento di Poeti Con le

postille del dottor Valvassori non meno chiare che breui et due tavole lrsquouna dersquo capi principali lrsquoaltra

di tutte le cose memorabile Con Privilegio Per Gio Andrea Valvassori del MDLXIII [1563] p 437

Vide MESTRES B M ldquoProblemas de Garcilaso la epiacutestola a Boscaacuten (versos 5 y 6)rdquo In GUIRAO D N

POU P J REYES A (Coord) La edicioacuten de textos Actas del I Congreso Internacional de Hispanistas del

Siglo de Oro London Tamesis 1990 pp 353-360

196

Antocircnio Sebastiano Minturno com o adjetivo latino ldquoincitatumrdquo parece

privilegiar vocabulaacuterio que se observa compartilhado em fins de seacuteculo XVI e iniacutecios de

seacuteculo XVII com as versotildees que lhe satildeo posteriores de Gaspar Laurent de Gerard

Joannes Vossius e de Juacutelio Ceacutesar Escaliacutegero embora com o substantivo ldquoceleritasrdquo e com

os adjetivos ldquovolubilerdquo e ldquoprestordquo tambeacutem incorpore de modo complementar ao De

poeta e ao LrsquoArte poetica del Sig Antonio Minturno escolhas direta ou indiretamente

procedentes dos Rhetoricorum Libri V de Jorge de Trebizonda Natildeo haacute dicotomias

todavia natildeo haacute influecircncias610 haacute autoridades dos costumes retoacutericos haacute usos linguiacutesticos

em intersecccedilatildeo os quais datildeo a saber a liccedilatildeo grega de Hermoacutegenes por variantes de

distintos matizes semacircnticos na leitura de gorgotēs e de gorgos como ldquovelocitasrdquo

ldquoceleritasrdquo ldquocelerrdquo ldquoprestezzardquo ldquoCeleritaterdquo ldquoVelocitaterdquo ldquoVelocitagraverdquo ldquoCeleritagraverdquo

ldquoligeirordquo ldquoPreccedilardquo ldquoveloxrdquo ldquoconcitatumrdquo ldquoArrebatadordquo ldquoincitatumrdquo ldquopraeligcepsrdquo

ldquouolubilerdquo ldquoprestordquo e ldquouelocerdquo Evidentemente essas variantes natildeo se anulam na

indistinccedilatildeo do inventaacuterio porque mesmo que sejam pensadas quando aplicadas num

mesmo ponto de doutrina supotildeem no trato preceptivo da instituiccedilatildeo retoacuterica horizontes

enunciativos muacuteltiplos linhas de forccedila cuja pluralidade o nome proacuteprio do retor grego

natildeo invalida611 As variantes como escolhas lexicais umas por outras como comutaccedilotildees

possiacuteveis de sentido na tratadiacutestica nem sempre dizem o mesmo corpo doutrinaacuterio nem

sempre fazem falar no latim ou no vernaacuteculo o mesmo Hermoacutegenes e assim sujeitas agrave

controveacutersia Gerard Joannes Vossius daacute um exemplo indiciam vertentes plurais de

circulaccedilatildeo das doutrinas recolhidas no Peri ideōn Mapeaacute-las eacute mapear em autores

quinhentistas seiscentintas e setecentistas a normatizaccedilatildeo das praacuteticas de escrita e os

valores de usos das artes do discurso gregas entre latinos gregas latinamente lidas e

legiacuteveis ainda que sejam redigidas nos idiomas vernaacuteculos

Deve-se entender poreacutem que na regulaccedilatildeo estiliacutestica preceituada por

Hermoacutegenes isso natildeo basta visto que a variedade do misto eacute criteacuterio de virtude

DA NOI si egrave dimostro giagrave come si faccia la oratione chiara di dignitate

bella amp presta segue agrave quelle necessariamente il trattato della forma

610 Como mostra Peter Burke eacute ldquotermo originalmente astroloacutegico que com frequecircncia tem sido empregado

de forma bastante acriacutetica pelos historiadores intelectuaisrdquo cf BURKE P As fortunas drsquoO Cortesatildeo Satildeo

Paulo Editora da Unesp 1995 p 13 611 Cf KOSSOVITCH L ldquoPrefaacuteciordquo in HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e

a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 p

19

197

che di Costume tiene il nome perche egrave vtilissima cosa sopra tutte le

altre anche conoscere in che maniera si faccia la specie morale della

oratione []612

POR NOacuteS jaacute se manifestou como se faz o discurso claro de dignidade

belo amp ligeiro Segue agravequele necessariamente o tratamento da forma

que tem o nome de Costume porque eacute utiliacutessima coisa sobre todas

tambeacutem conhecer de que maneira se faccedila a espeacutecie moral do discurso

[]613

Por ldquoCostumerdquo sabe-se Giulio Camillo Delminio lecirc o grego ldquoēthosrdquo Eacute termo que

se define com Hermoacutegenes como espeacutecie que natildeo soacute conforma o discurso em sua iacutentegra

agrave maneira da compleiccedilatildeo da cor do corpo khrōma (χρῶμα) produzida pela adequaccedilatildeo

das palavras agraves personagens que as enunciam e aos ēthikoi (ἠθικοί) os caracteres (glutotildees

covardes avarentos) senatildeo tambeacutem que se mescla no discurso agraves demais ideai como

as liccedilotildees do retor iteram na enformaccedilatildeo do misto retoacuterico (cf HERM 320 20-321 18) O

ēthos como preceituado por Hermoacutegenes discrimina-se em quatro diferentes espeacutecies a

saber apheleia glykytēs drimytēs ou natildeo raro no Peri ideon ldquodrimytēs kai oxysrdquo cujos

sentidos se poderatildeo visitar e epieikeia Dessas espeacutecies a primeira delas estaacute vinculada

agrave composiccedilatildeo de personagens cocircmicas e interessa ao misto tragicocircmico os exemplos

colhidos do retor o evidenciam glutotildees covardes avarentos

Talvez soe repetitivo iterar que entre os leitores de Hermoacutegenes Jorge de

Trebizonda ao dizer ēthos diz em latim ou ldquooratio moratardquo ou ldquoaffectiordquo cujas espeacutecies

respectivamente para ele satildeo tenuitas iucunda oratio (ou iucunditas) acutum genus (ou

acuitas) e modestum genus dicendi 614 Da variaccedilatildeo dessas espeacutecies em diferentes

tratadistas desde os Rhetoricorum libri V e da revisatildeo dos modos de classificaccedilatildeo dos

efeitos da alētheiae da barytēs feitas espeacutecies eacuteticas jaacute se disse algo O ēthos e suas

quatro formas em Antocircnio Bonfine no Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris

612 Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 31r 613 Traduccedilatildeo nossa 614 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia

ad D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] pp 579-594

198

acutissimi de Arte Rhetorica precepta satildeo mos simplicitas suauitas subtilitas e argutia

(ou acuitas) de modo a abarcar a conjugaccedilatildeo dos termos drimytēs e oxys e por fim

aequalitas (ou humilitas ou moderata oratio)615 Na ediccedilatildeo de Natale Conti empregam-

se os termos ldquomosrdquo ldquosimplicitasrdquo ldquodulcedordquo ldquoacrimoniardquo e ldquoacumenrdquo ldquomansuetudordquo616

No Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis

orationum Libri II de Johannes Sturm ēthos eacute oratio morata apheleia eacute simplicitas

glykytēs eacute suauitas drimytēs e oxys satildeo acrimonia (ou oratio acris) e oratio acuta (ou

acutum genus dicendi) epieikeia eacute ou modesta ou aequa ou morata oratio Em Gaspar

Laurent lecirc-se para o gecircnero oratio morata (no sentido de ldquoorationis characterrdquo ldquooratio

Morata vel affectardquo617 ) e para as espeacutecies simplicitas (ou simplex genus dicendi)

acrimonia (ou oratio acris) e oratio acuta (ou acutum genus dicendi) oratio moderata

ou morata ou aequa618 Na traduccedilatildeo de Giulio Camillo Delminio os termos satildeo Costume

Semplicitate Dolcezza Acrimonia e Acuitate Mansuetidine619 Em Filiberto Campanile

empregam-se ldquoCostumerdquo ldquoSemplicitaterdquo (ou ldquoBassezardquo) Dolcezza (ou ldquoDilettordquo)

ldquoAcutezzardquo (ou ldquoSottigliezzardquo) no sentido de drimytēs ldquoMansuetudinerdquo (ou

ldquoModestiardquo)620

Eacute evidente devem ser eticamente entendidas essas categorias o par drimytēs oxys

entre elas diga-se acutum genus dicendi acuitas subtilitas argutia acrimonia acumen

oratio acris e oratio acuta em latim ou Acrimonia Acuitate Acutezza e Sottigliezza em

italiano como os letrados arrolados deixam ler Ou mesmo fineza como Manuel de

615 Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii item

Sophistaelig Praeligexercitamenta Antonio Bonfine asculano interprete Apud Seb Gryphivm Lvgdvni 1538 pp

236- 616 Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] pp 250-278 617 Cf ldquoIn Hermogenis tractatvm de ideis sive de formis eloqventiaelig Gasparis Laurentij commentariusrdquo in

Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 163 618 Cf Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione

contextu Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] pp 385-427 619 Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini pp 31r-39v 620 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori pp 97-

125

199

Galhegos referindo-se ao uso de todas as ldquofoacutermas de oraccedilaotilderdquo na Ulyssea ou Lisboa

Edificada de Gabriel Pereira de Castro621 lsquoNa enformaccedilatildeo do ēthos do enunciador a

drimytēs e a oxys mostra-o Michel Patillon opera-se em consonacircncia com os preceitos

aduzidos mediante pensamentos superficialmente profundos isto seja a enunciaccedilatildeo de

pensamentos sutis por meio de enunciados simples e laxos de modo que natildeo pareccedila

meditado o que eacute demasiado meditado (cf HERM 339 16-25) Eacute questatildeo de methodos

de haacutebil e engenhosa instituiccedilatildeo pela dissimulaccedilatildeo do artifiacutecio do que Hermoacutegenes

entende como profundidade superficial (cf HERM 339 19-20 328 9 epipolaios

bathytēs) Opera-se ademais mediante lexis cujo sentido natildeo corresponda propriamente

agrave ennoia que se enuncia (cf HERM 339 25-341 24) Na leitura que faz Jorge de

Trebizonda do preceito e na vulgarizaccedilatildeo proposta por Filiberto Campanile

conseguintemente potildee-se em destaque tratar-se de efeito decorrente do emprego de

leacutexico em desconformidade com o uso com o costume (cf HERM 341 15)622 Acresce o

retor ser procedimento que demanda cuidados pois que tambeacutem uacutetil agraves composiccedilotildees

cocircmicas ridiacuteculas (to geloion) e que se arrisca agrave frieza (cf HERM 339 16-25) Mediante

a lexis ainda as semelhanccedilas de vocabulaacuterio a paronomaacutesia e as metaacuteforas miram efeitos

de mesma ordem (cf HERM 341 24-344-12) Note-se Hermoacutegenes entende que drimytēs

e a oxys partilham recursos linguiacutesticos e efeitos com categorias discursivas de prazer e

deleite (hēdonē) de doccedilura e suavidade (glykytēs) (cf HERM 344 13-345 2) Eacute

pressuposto natildeo eacute possiacutevel segui-lo que parece compartilhado por Matteo Peregrini (ca

1595-1652) no tratado Delle acutezze (1639)623

Na oacuteptica dos preceitos retoacutericos que baseiam o ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de

Galhegos para a formaccedilatildeo de poema digno de louvor no signo da variedade do misto

autorizado por Hermoacutegenes o agenciamento desses procedimentos desses e dos demais

vinculados agraves ideai tou logou agraves formae dicendi quaisquer que sejam quantas sejam elas

621 Cf Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S Magestade pera Chanceler mograver do

Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor

del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro sp 622 Cf Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud Ioannem Roigny uia

ad D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538] p 590 cf LrsquoIdee overo Forme

dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la Dotrina drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi

In Napoli Apresso Gio Battista Sottile M DCVI [1606] Con Licenza dersquo Superiori p 117 623 Delle Acutezze che altrimenti spiriti vivezze e concetti volgarmente si appellano trattato del Sig

Matteo Peregrini Bolognese di Teologia Filosofia e dellrsquouna e lrsquoaltra Legge Dottore In questa seconda

Impressione dallrsquoAutore riuiste e migliorate Allrsquo Illlustrissim Sig Galleazzo Polti In Genoua amp in

Bologna Presso Clemente Ferroni M DC XXXIX [1639] Con Licenza dersquo Superiori

200

regula-se por idea derradeira no Peri ideōn a deinotēs Mais natildeo haacute das liccedilotildees minuciosas

do tratadista grego embora por certo natildeo bastem para dizer o que diz Manuel de

Galhegos Vale vislumbrar o avesso o assombro monstruoso

201

ANATOMIA DO MONSTRO

Pois eu garanto que Os Sertotildees satildeo um livro falso A desgraccedila climaacutetica do

Nordeste natildeo se descreve Carece ver o que ela eacute Eacute medonha O livro de

Euclides da Cunha eacute uma boniteza genial poreacutem uma falsificaccedilatildeo hedionda

Repugnante [hellip] Euclides da Cunha transformou em brilho de frase sonora e

imagens chiques o que eacute cegueira insuportaacutevel deste solatildeo transformou em

heroiacutesmo o que eacute miseacuteria pura em epopeia

MAacuteRIO DE ANDRADE

O Turista Aprendiz

Monstrosum poema est cuius partes in unam certam formam non congruunt

uti naturalia monstra sunt quorum corpora ex aliis diversisque ab eorum

natura partibus coaluere

GIAMBATTISTA VICO

Note allrsquoArte poetica di Orazio

O juiacutezo pretende-se certeiro arrazoado de justeza e de justiccedila segundo o qual a

tragicomeacutedia porque gecircnero misto eacute gecircnero de obra que resulta da falta de arte da

ineacutepcia teacutecnica do poeta cujo poema tragicocircmico figura-se mal composto como rival de

Centauros e Quimeras Isso quer dizer que a tragicomeacutedia sempre desconforme com a

arte pois gecircnero de insciecircncia produz-se como perversatildeo dos preceitos poeacuteticos que

deveriam instituiacute-la como monstruosidade agrave qual a condena o artiacutefice incapaz de fazer o

que pode a arte aperfeiccediloar a natureza visto que na desrazatildeo estaacute ele sujeito apenas a

imperfeiccediloaacute-la e a compor monstro sem igual cuja anomalia eacute tamanha que faz parecerem

bem formados Centauros e Quimeras

O certo he que a Tragicomedia he hum monstro na Poesia taotilde enorme

e contrafeito que poacutedem os Centauros e as Chimeras parecer huns

partos perfeitos da natureza He hum composto poetico que formaacuteraotilde

alguns Atuthores para desprezo da Poesia ordenado todo de cousas

entre si discordes inimigas e incompativeis624

624 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

202

Nota-se o juiacutezo eacute demonstrativo opera-se amparado na vividez da metaacutefora

monstruosa e condensa o vitupeacuterio de Francisco Joseacute Freire agrave tragicomeacutedia tal como

doutrinado no tomo segundo de sua Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral

e de todas as suas especies principaes tratadas com juizo critico Assim como a

Bibliotheca Lusitana do Abade Diogo Barbosa Machado noticia Freire publicou esse

tratado em 1748 em dois tomos625 Passados onze anos uma segunda ediccedilatildeo seguiu-se

a esta dedicada a Sebastiatildeo Joseacute de Carvalho e Melo futuro Marquecircs de Pombal de

quem Francisco Joseacute Freire buscara proteccedilatildeo sob o nome de Cacircndido Lusitano em 1758

na dedicatoacuteria da Arte poetica de Q Horacio Flacco jaacute referida versatildeo portuguesa da

epiacutestola latina626

Na Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral referida conforme a

ediccedilatildeo de 1759 arrola-se conjunto de preceitos que intentam abarcar os mais variados

gecircneros poeacuteticos a saber a trageacutedia a comeacutedia a miacutemica a tragicomeacutedia o poema eacutepico

a eacutecloga a saacutetira a liacuterica e suas vaacuterias espeacutecies a elegia o epigrama a silva o epitaacutefio

o emblema e por fim a empresa Os capiacutetulos XXVIII e XXIX do tratado vistos de perto

satildeo assim denominados ldquoDa Tragicomedia mostrase como he Poesia monstruosardquo e

ldquoJuizo sobre a Tragicomedia de Guarini intitulada Il Pastor Fidordquo Nesses capiacutetulos

afirmando-se contraacuterio aos apologistas que defendem que ldquonaotilde repugna agrave Poetica a Poesia

Tragicomicardquo627 Francisco Joseacute Freire mira o gecircnero e Il Pastor Fido tragicomeacutedia

pastoral de Giovanni Battista Guarini que foi impressa em Veneza em 1590628 embora

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellipFungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias p 150 625 Cf Bibliotheca Lusitana Historica Critica e Chronologica na qual se comprehende a noticia dos

authores Portuguezes e das Obras que compozeraotilde desde o tempo da promulgaccedilaotilde da Ley da Graccedila ateacute

o tempo prezente offerecida agrave Augusta Magestade de D Joaotilde V Nosso Senhor por Diogo Barbosa Machado

Ulyssiponense Abbade da Parochial Igreja de Santo Adriatildeo de Sever e Academico do Numero da

Academia Real Tomo I Lisboa Occidental Na Officina de Antonio Isidoro da Fonseca Anno de M DCC

XXXXI Com todas as licenccedilas necessarias 626 A esse respeito TEIXEIRA I Mecenato Pombalino e Poesia Neoclaacutessica Basiacutelio da Gama e a Poeacutetica

do Encocircmio Satildeo Paulo Edusp 1999 pp 77 ss 627 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellipFungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias p 149 628 Cf Il Pastor Fido Tragicomedia Pastorale di Battista Gvarini Dedicata al SerMO D Carlo Emanvele

Dvca di Savoia ampc Nelle Reali Nozze di SA con la serma Infante D Caterina dAvstria Con privilegi In

Venetia Presso Gio Battista Bonfadino [1590]

203

seja sabido que jaacute circulasse em coacutepias manuscritas em anos anteriores Em liacutengua

portuguesa sabe-se da traduccedilatildeo setecentista de Tomeacute Joaquim Gonzaga Neves intitulada

O Pastor Fiel Tragi-comedia Pastoril do Cavalheiro Guarini e impressa em Lisboa em

1789 anos apoacutes morte de Francisco Joseacute Freire Marginalmente talvez interesse acrescer

que haacute notiacutecia segundo o volume sexto do Ensaio biographico-critico sobre os melhores

poetas portuguezes de Joseacute Mariacutea da Costa e Silva de 1853 de que Tomeacute Joaquim

Gonzaga Neves seja natural do Rio de Janeiro nascido em 1728 e primo de Tomaacutes

Antocircnio Gonzaga629 Sabe-se tambeacutem da versatildeo castelhana preparada pela portuguesa D

Isabel Correcirca e impressa em Amberes nos Paiacuteses Baixos em 1694 cujo tiacutetulo eacute El Pastor

Fido Poeumlma de Baptista Guarino630

Ao tratadista Francisco Joseacute Freire interessa pocircr em causa a legitimidade da

tragicomeacutedia e vituperar a obra de Giovanni Battista Guarini de modo tanto a reafirmar

a ortodoxia de um costume poeacutetico que desterra esse gecircnero quanto a destituir Il Pastor

Fido do papel de exemplum privilegiado Diga-se bem Il Pastor Fido assim eacute considerado

porque para Francisco Joseacute Freire ldquoda Tragicomedia naotilde ha Escritor algum Grego ou

Latino e soacute em Itaacutelia se fez taotilde celebre com similhante composiccedilaotilde Joaotilde Bautista

Guarinirdquo631 Evidentemente o letrado lusitano natildeo o afirma sem antes ponderar a respeito

do Anfitriatildeo de Plauto (seacutec III-II aC) Concede que no proacutelogo desta obra Mercuacuterio

o deus defina-a como tragicomoedia

Nunc quam rem oratum huc ueni primum proloquar

post argumentum huius eloquar tragoediae

Quid Contraxistis frontem Quia tragoediam

dixi futuram hanc Deus sum commutauero

eandem hanc si voltis faciam ex tragoedia

629 Cf O Pastor Fiel Tragi-comedia Pastoril do Cavalheiro Guarini Traduzida do italiano por Thome

Joaquim Gonzaga Lisboa Na Regia Officina Typografica Anno M DCC LXXXIX Com a licenccedila da Real Meza da Comissatildeo Geral sobre o Exame e Censura dos Livros 630 Cf El Pastor Fido Poeumlma de Baptista Guarino Traducido de Italiano en Metro Espantildeol y Ilustrado

con Reflexiones por Dontildea Isabel Correa Dedicado agrave Don Manuel de Belmonte Baron de Belmonte Conde

Palatino y regente de Sua Magestad Catholica En Amberez Por Henrico y Cornelio Verdussen

Mercadores de Libros Antildeo M DC XCIV 631 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellipFungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias p 155

204

comoedia ut sit omnibus isdem uorsibus

utrum sit an non voltis Sed ego stultior

quasi nesciam uos uelle qui diuus siem

Teneo quid animi uostri super hac re siet

faciam ut commixta sit ltsitgt tragicomoedia

nam me perpetuo facere ut sit comoedia

reges quo veniant et di non par arbitror

Quid igitur quoniam hic seruos quoque partes habet

faciam sit proinde ut dixi tragico[co]moedia (PL Amp 50-63)

Agora eu vou dizer primeiro para que vim falar aqui

depois vou falar sobre o assunto desta trageacutedia

O que eacute isso Vocecircs franziram a testa Porque eu disse

que ia ser uma trageacutedia Sou um deus e posso mudaacute-la

se vocecircs quiserem farei da trageacutedia uma comeacutedia

com os mesmos versos todos eles

Querem que seja assim ou natildeo Mas que bobo que eu sou

Como se eu natildeo soubesse o que vocecircs querem eu que sou um deus

Sei o que existe na cabeccedila de vocecircs a respeito disso

Vou fazer com que seja uma peccedila mista com que seja uma tragicomeacutedia

porque natildeo acho certo que seja uma comeacutedia

uma peccedila em que aparecem reis e deuses

O que vou fazer entatildeo Como tambeacutem um escravo toma parte nela

farei que seja como jaacute disse uma traacutegico-comeacutedia632

A Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral defende ser jocoso este

uso e efetivamente cocircmico e natildeo tragicocircmico o Anfitriatildeo633 Assim Francisco Joseacute

Freire entende que como exemplum no gecircnero tragicocircmico Il Pastor Fido fornece razatildeo

632 A traduccedilatildeo eacute de Zelia de Almeida Cardoso Apud Cardoso Z de A ldquoO Anfitriatildeo de Plauto uma

tragicomeacutediardquo Itineraacuterios Araraquara n 26 2008 p 18 COSTA L N DA Mesclas geneacutericas da

tragicomeacutedia Anfitriatildeo de Plauto Campinas [IEL-Unicamp] 2010 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p 66 633 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellipFungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias p 150

205

segundo a qual deva operar o poeta propenso a imitar o poema e ambicioso de emulaacute-lo

Sabe demais que se trata de razatildeo de semelhanccedila na exata medida em que satildeo

pressupostos da praacutetica da imitatio o exame prudente e a eleiccedilatildeo ajuizada da parte a qual

porque excelente se deva compor num todo poeacutetico harmocircnico A demonstraccedilatildeo da

monstruosidade do gecircnero nesses termos eacute explicitaccedilatildeo de desarmonia do todo e de

incongruecircncia da parte afinal a tragicomeacutedia de acordo com Francisco Joseacute Freire

contraveacutem com os protocolos da boa poesia porque eacute descomposiccedilatildeo artiacutestica porque eacute

composiccedilatildeo que se faz de trageacutedia e de comeacutedia porque eacute gecircnero de feiccedilatildeo mista e eacute

repugnante porque misto

Jaacute examinaacutemos as qualidades da Tragedia e da Comedia e differindo

estas entre si em cinco cousas como he a materia as pessoas a dicccedilatildeo

os affectos e o fim [] Veja-se como estas differenccedilas entre si

contrarias e incompativeis se poderaotilde unir para formar hum sujeito

poetico Na Tragedia quasi tudo saotilde choros e lamentos na Comedia

tudo alegrias e graciosidades e eu naotilde sey como se possaotilde unir estas

contrariedades

Em razatildeo disso assevera o tratadista portuguecircs

Naotilde posso penetrar como de dous contrarios e de dous extremos venha

a compocircrse hum mixto perfeito nem darse hum meyo perfeito sendo

participante de contrariedade e extremidade de cousas v g da audacia

e do temor naotilde poacutede resultar a fortaleza porque naotilde he possiacutevel que

de dous vicios nasccedila a virtude e ainda que se aponte algum exemplo v

g que de dous animaes diversos nasce hum terceiro de outra especie

responde-se que este exemplo naotilde serve para o caso porque entre a

Tragedia e a Comedia naotilde ha simpathia nem analogia alguma para

que a arte possa unir comsigo hum terceiro parto poetico e quando se

conceda este absurdo ficaraacute a Tragicomedia sendo hum monstro da arte

porque he foacuterma contra as regras que nella se prescreveraotilde do mesmo

modo que os monstros da natureza saotilde aquelles que se affastaotilde da

geraccedilaotilde natural e da ordem que ella mesma lhe deu

206

Consoante a liccedilatildeo de Francisco Joseacute Freire a desproporccedilatildeo do gecircnero tragicocircmico

eacute verossimilmente enunciada porque a prescreve analogia de proporccedilatildeo que vincula

natureza e arte Esse viacutenculo por ordem de semelhanccedila estabelece equivalecircncias que

permitem o tracircnsito de categorias de um membro a outro da proporccedilatildeo de maneira que o

vitupeacuterio de Freire penda da natureza ou talvez mais precisamente dos discursos que a

enformam e que por conseguinte instauram leis que o monstro como anomalia prodiacutegio

ou raridade por natureza ou contra naturam transgride Trata-se evidentemente do que

se considera natural e do que se considera antinatural do que se enuncia como natureza

e como natureza dos seres

Deve-se aventar ademais que natildeo haacute monstruosidade se natildeo haacute sistema que a

preveja que institua paracircmetros de conformaccedilatildeo dos desvios de observaccedilatildeo das

analogias para deduccedilatildeo das anomalias Nesta linha a monstruosidade bastante

precisamente entende-se e itera-se como mistura de formas Eacute o que ensina o curso sobre

os anormais pronunciado por Michel Foucault no Collegravege de France entre janeiro e

marccedilo de 1975 Assim mostra Foucault o monstrum eacute misto segundo ldquouma histoacuteria

natural essencialmente centrada na distinccedilatildeo absoluta e insuperaacutevel das espeacutecies gecircneros

reinos etcrdquo Nessa matriz que se sabe aristoteacutelica portanto o monstrum eacute misto de reinos

o animal e o humano como o Centauro de cabeccedila torso e braccedilos de homem garupa e

pernas de cavalo misto de espeacutecies como a Quimera de cabeccedila de leatildeo corpo de cabra

e cauda de dragatildeo634 misto de indiviacuteduos como o Ceacuterbero de latido triacuteplice635 ou a

tricecircfala Trindade636 misto de sexos como o Hermafrodita que em si reuacutene o masculino

634 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacuteciordquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2000 v 4

p 194 635 Cf OVID Met 4 450 636 Sabe-se trata-se de efiacutegie em que a Trindade compotildee-se como uma personagem de trecircs rostos feita

como que da triplicaccedilatildeo da face do Cristo canocircnico num uacutenico corpo Segundo Marta Fajardo de Rueda

essa efiacutegie foi chamada em ciacuterculos protestantes ldquoCancerbero catoacutelicordquo o que aproxima no vitupeacuterio os

exemplos referidos A histoacuteria da figuraccedilatildeo da Trindade nesses moldes tricecircfala eacute interessantiacutessima Duas

das vertentes da controversa recepccedilatildeo da figura podem ser conhecidas a seguir Primeiro leia-se passo da

ldquoInformacion en favor de Manuel Faria y Souzardquo apenso aos Lusiacuteadas em ediccedilatildeo de 1639 pp 11-12 ldquoDe la Santissima Trinidad se vegrave frequentemente la pintura de una Cabeccedila con tres rostros la tiene la devocion

Catolica por buena imagẽ dela SS Trinidad Esto si se ha de tomar por lo que solo se dexa ver

exteriormente magraves es Motildestro que imagen de Dios pero tomado interior i espiritualmente maacutes es Imagen

de Dios que Monstro Porque esto Porque la humana devocion i Feacute quiere explicarse i no tiene facultad

para hazerlo de otra manera i hazelo como puede i con esso anda segura Los dias atras vimos en la

Iglesia de la SS Trinidad de Madrid una Imagen de tres Hombres cuyos cuerpos se unian en uno con tres

cabeccedilas divididas i todas de un parecer i todo esto se via incluso en un Triangulo No ay duda que en los

terminos mortales es muy buena imagen aquella de la SS Trinidad i que Dios la aprueva en la Fegrave de los

Catolicos por magraves que quanto a la vista corporea parece Monstro porque a la del Alma es imagen de

Dios verdadero expressado assi como se puede ya que no se pueda assi como realmente es Luego

virtuosa liacutecita i catolica es essa Monstrosidad Claro estagraverdquo Em seguida leia-se passo de El Museo

207

e o feminino637

A fauna eacute muitiacutessimo vasta inclui Esfinges Harpias Goacutergones Sereias

Minotauros Tritotildees Hidras Cilas Saacutetiros e tantos outros espeacutecimes hiacutebridos cuja

hibridez em concordacircncia com a anaacutelise de Michel Foucault eacute transgressiva Como eacute

transgressiva a tragicomeacutedia para Francisco Joseacute Freire porque inscrita na arte da poesia

arte entre artes como bizarria que infringe traccedilos distintivos que satildeo para ele por assim

dizer incontornaacuteveis e transgressiva na avaliaccedilatildeo de Francisco de Quevedo a poesia

culta de imitaccedilatildeo de D Luis de Goacutengora dita ldquoculteranardquo ldquohembrilatinardquo de ldquolenguaje

hermafroditordquo Diga-se nas artes como na natureza eacute representaccedilatildeo de virtude a unidade

do corpo638 nas artes natildeo haacute gecircnero alheio ao sistema que o prescreve639

Instituem-se assim pode-se aventar os contornos da doxa em que estaacute assentado

o juiacutezo de vitupeacuterio de Francisco Joseacute Freire Nesse esforccedilo de deslegitimaccedilatildeo da

tragicomeacutedia como gecircnero de poema e de menoscabo da obra de Giovanni Battista

Guarini como exemplar no gecircnero Freire trabalha com operaccedilotildees regradas isto eacute opera

topos de censura pendente da Epistula ad Pisones de Horaacutecio (seacutec I aC) A

tragicomeacutedia portanto para Francisco Joseacute Freire enforma-se como gecircnero misto ao

modo do monstrum enunciado nos versos horacianos em adequaccedilatildeo ao aparato

demonstrativo do proacutelogo da epiacutestola

Humano capiti ceruicem pictor equinam

Jungere si uelit amp uarias inducere plumas

Pictoacuterico y Escala Oacuteptica de Antonio Palomino de Castro y Velasco impresso em 1715 ldquoTambieacuten he visto

yo varias veces otra efigie no menos monstruosa de la Trinidad sacrosanta de que hace mencion el autor

citado y es una sola cabeza con tres narices y bocas en el rostro y los ojos correspondientes para figurar

tres semblantes en uno la qual tiene los mismos absurdos que pe la antecedente y como tales deben ser

borradas prohibidas y refutadas por el Tribunal santiacutesimo de la fe como disonantes hereacuteticas y

monstruosasrdquo apud RUEDA M F de ldquoEl siacutembolo de la Trinidadrdquo in TONIQUA C (Org) El ofiacutecio del

pintor nuevas miradas a la obra de Gregorio Vaacutesquez Bogotaacute Ministeacuterio de Cultura 2008 pp 86-7

Maria Cecilia Alvarez White tambeacutem estudiosa do assunto em outro artigo da publicaccedilatildeo indica que

disposiccedilatildeo do Conciacutelio Provincial de Santafeacute atual Bogotaacute de 27 de maio de 1774 assim sancionou a mateacuteria ldquo[] prohibimos expressamente la pintura o pinturas de las trecircs personas de Santiacutesima Trinidad

Padre Hijo y Espiacuteritu Santo estando esta tercera en figura corporal de hombre y no de paloma y del mismo

modo las imaacutegenes de escultura e impresas en la forma referidardquo apud WHITE M C A ldquoUn repinte con

historia la Trinidad de Gregorio Vaacutesquezrdquo p 91 637 FOUCAULT M Os anormais Curso no Collegravege de France (1974-1975) Ediccedilatildeo estabelecida sob a

direccedilatildeo de Franccedilos Ewald e Alessandro Fontana por Valerio Marchetti e Antonella Salomoni Traduccedilatildeo de

Eduardo Brandatildeo Satildeo Paulo Martins Fones 2011 p 54 638 Cf HANSEN J A ldquoEu nos faltaraacute semprerdquo in BECKETT S o inominaacutevel Traduccedilatildeo Ana Helena Souza

Satildeo Paulo Globo 2009 p 13 639 Cf ADAM J-M HEIDMANN U O texto literaacuterio por uma abordagem interdisciplinar Satildeo Paulo Cortez

2011 p 25

208

Undique collatis membris ut turpiter atrum

Desinat in piscem mulier formosa supernegrave

Spectatum admissi risum teneatis amici

Credite Pisones isti tabulaelig fore librum

Persimilem cujus uelut aeliggri somnia uanaelig

Fingentur species ut nec pes nec caput uni

Reddatur formaelig Pictoribus atque Poeumltis

Quidlibet audendi semper fuit aeligqua potestas

Scimus amp hanc ueniam petimusque damusque uicissim

Sed non ut placidis coeumlant immitia non ut

Serpentes auibus geminentur tigribus agni (HOR AP 1-13)640

Se hum Pintor a cabeccedila humana unisse

Pescoccedilo de cavallo e de diversas

Penas vestisse o corpo organizado

De membros de animaes de toda a especie

De sorte que mulher de bello aspecto

Em torpe e negro peixe rematasse

Voacutes chamados a ver esta pintura

O riso soffrerieis Pois comvosco

Assentay ograve Pisotildees que a hum quadro destes

Seraacute muy semelhante aquelle livro

No qual ideacuteas vatildes se representem

(Quaes os sonhos do enfermo) de tal modo

Que nem peacutes nem cabeccedila a huma soacute foacuterma

Convenha De fingir ampla licenccedila

Ao Poeta e Pintor sempre foy dada

Assim he e entre noacutes tal liberdade

Pedimos mutuamente e concedemos

Mas naotilde haacute de ser tanta que se ajunte

640 Cito a liccedilatildeo que se pode ler em Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez

por Candido Lusitano Lisboa Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as

licenccedilas necessaacuterias Vendese na logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde

tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D Henrique pelo mesmo Author pp 2-9 Essa eacute a liccedilatildeo que Francisco

Joseacute Freire traduz

209

Agreste com suave e queira unirse

Ave a serpente cordeirinho a tigre641

Esses versos vertidos os hexacircmetros latinos em hendecassiacutelabos soltos e graves

segundo a praxe do tempo abrem a Arte Poetica de Q Horacio Flacco na traduccedilatildeo ao

portuguecircs feita pelo proacuteprio Francisco Joseacute Freire sob o pseudocircnimo de Cacircndido

Lusitano Evidencia o passo citado Horaacutecio diz conceder-se ao poeta e ao pintor

semelhantemente ldquolicenccedilardquo (ldquoueniamrdquo) para fingir ldquopara forjar alguma parte

extravaganterdquo propotildee Marcos Martinho dos Santos642 todavia adverte aos Pisotildees o

preceptista que natildeo se forjem ldquoideacuteas vatildesrdquo (ldquouanae fingentur speciesrdquo) tais quais ldquoeste

quadrordquo (ldquoisti tabulaerdquo) monstruoso tais quais ldquosonhos do enfermordquo (ldquoaegri somniardquo)

em que a extravagante parte se justapotildee ldquode modo incoerente agraves mais partes da obrardquo643

Nas glosas que marginalmente acompanham a traduccedilatildeo portuguesa Francisco

Joseacute Freire afirma depreender do caso agrave luz da autoridade de Vitruacutevio (seacutec I aC)

censura aos pintores ldquode grutesco em que a fantasia depravada pinta figuras humanas

rematando em folhagens serpentes em troncos e outras semelhantes extravaganciasrdquo (cf

VITR VII 5)644 pintores que em assim fazendo ldquofogem de pintar aquellas verdades

regulares e ideacuteas verosimeis para seguirem fantasias monstruosasrdquo (ou assim tambeacutem

porque ldquopessimamente aconselhados pela sua estragada imaginativardquo) 645 No mais

expotildee-se nas glosas de Francisco Joseacute Freire reprimenda aos poetas de mesma monta

visto que para o tratadista artiacutefices de artes imitativas poetas e pintores deveriam imitar

a natureza em suas razotildees ldquopara utilidade e para deleite dos homensrdquo646 Isso significa

nesses termos a imitaccedilatildeo feita a propoacutesito natildeo viola as premissas da natureza que bem

define e circunscreve os seres nem aleacutem disso desarranja a taxonomia que

convencionalmente os designa e classifica Todavia para Francisco Joseacute Freire pintores

e poetas dignos de censura em vez disso ldquoem lugar de pintarem o que herdquo ao modo do

historiador aristoteacutelico ldquoou verosimilmente poacutede serrdquo ao modo do aristoteacutelico poeta

641 Idem ibidem 642 SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

195 643 Idem ibidem 644 Idem ibidem 645 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa

Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na

logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D

Henrique pelo mesmo Author p 8 646 Idem p 25

210

ldquopassaotilde a abusar da sua arte occupando-se em pinturas incompatiacuteveis que destroem ou

a verdade ou a verosemelhanccedilardquo647

De acordo com as liccedilotildees de Horaacutecio glosadas por Francisco Joseacute Freire em

qualquer que seja a composiccedilatildeo pictoacuterica ou poeacutetica por mais extravagantes que se

mostrem suas partes e ao fim satildeo liacutecitas as extravagacircncias se operadas de modo artiacutestico

e racional648 natildeo conveacutem obra cujo todo por motivo dessas partes seja incongruente e

inverossiacutemil obra ldquoque naotilde constar de partes entre si proacuteprias accommodadas e

convenientes isto he que naotilde observar simplicidade e unidade no assumpto na

disposiccedilaotilde no ornato e no estylordquo649 A metaacutefora do monstrum nesse sentido eacute evidentia

persuasiva de ldquoquanto he desprezo a falta desta simplicidade e unidaderdquo650 ldquodesprezo da

Poesiardquo nos termos da Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral 651

Ora compartilham essa monstruosidade segundo os preceitos poeacuteticos aduzidos

obras que o leitor deve entender como ldquofieacuteis coacutepiasrdquo do quadro que figura o monstrum

obras que surgem como exemplos apensos agrave traduccedilatildeo de Horaacutecio exemplos a natildeo imitar

diga-se bem652 Satildeo elas Filis e Demofonte de Antocircnio da Fonseca Soares (1631-1682)

conhecido como Frei Antocircnio das Chagas 653 Viriato Traacutegico de Braacutes Garcia

Mascarenhas (1596-1656) estampado postumamente em 1699654 Fecircnix da Lusitacircnia

647 Idem p 8 648 SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

197 649 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa

Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D

Henrique pelo mesmo Author p 2 650 Idem ibidem 651 Manuel Pires de Almeida comenta os versos 9 e 10 da Epistula ad Pisones [ldquopictoribus atque

poetisquidlibet audendi semper fuit aequa potestasrdquo] ldquoEsta licenccedila eacute terminada na verissimilhanccedila natildeo

se haacute de fingir quanto a imaginaccedilatildeo pede Assim como o alvo do orador eacute persuadir imitar inventar e

representar as coisas que satildeo que podem ser ou que os antigos tiveram por verdadeiras fugindo-se sempre

de invenccedilotildees fantaacutesticas e malecircnconicas que carecem de correspondecircncia e semelham aos sonhos dos

freneacuteticos que cada um (como laacute dizem) vai para seu cabo Com ordem e medo se permite poetar e pintar

aborrecendo monstruosidades odiando impossiacuteveis como ajuntar aves e serpes tigres a cordeiros como

nota Entende-se a liberdade que correspondam sempre os membros a um corpo que com as perfeiccedilotildees da natureza fique bem composto guardando em tudo uma justa simetriardquo MUHANA A Poesia e Pintura ou

Pintura e Poesia Tratado Seiscentista de Manuel Pires de Almeida Satildeo Paulo Edusp p 98 652 Cf MUHANA A A Epopeacuteia em Prosa Seiscentista uma definiccedilatildeo de gecircnero Satildeo Paulo Editora da

Unesp 1997 pp 46-9 653 Cf Bibliotheca Lusitana Historica Critica e Chronologica na qual se comprehende a noticia dos

authores Portuguezes e das Obras que compozeraotilde desde o tempo da promulgaccedilaotilde da Ley da Graccedila ateacute

o tempo prezente offerecida agrave Augusta Magestade de D Joaotilde V Nosso Senhor por Diogo Barbosa Machado

Ulyssiponense Abbade da Parochial Igreja de Santo Adriatildeo de Sever e Academico do Numero da Academia

Real Tomo I Lisboa Occidental Na Officina de Antonio Isidoro da Fonseca Anno de M DCC XXXXI Com

todas as licenccedilas necessarias p 240 654 Cf Viriato tragico poema heroico em 20 cantos de Braz Garcia Mascarenhas em dois volumes vol I

211

publicado em 1649 e Insulana em 1635 ambos de Manuel Tomaacutes (1585-1665)655 Satildeo

todos poemas portugueses aos quais Francisco Joseacute Freire apotildee um et cetera (ldquoamprdquo) de

valor demonstrativo que parece agrave guisa de censura superlativar o alcance de praacutetica de

escrita que a doutrina entende desmedida No mais satildeo obras compostas no seacuteculo XVII

cujos tiacutetulos hoje ainda que soe insciente a generalizaccedilatildeo nada significam E talvez nada

signifiquem porque tenham sido naturalizadas as categorias de anaacutelise de eruditos como

Francisco Joseacute Freire e assim sejam condenados esses poemas agrave ilegibilidade como

exemplos de imperiacutecia poeacutetica e de maacute poesia ou classificados como poemas barrocos

depois de Heinrich Woumllfflin

Soma-se ademais a essas obras poema mais antigo e afamado composto por

Ludovico Ariosto (1474-1533) Orlando Furioso cuja primeira versatildeo data de 1516 O

tradutor Francisco Joseacute Freire negativamente o ajuiacuteza natildeo sem afirmar que na Itaacutelia

Horaacutecio se o pudesse ldquoacharia iguaes ou mayores monstruosidadesrdquo do que aquelas

encontradas em terras ibeacutericas O poema de Ariosto eacute vilipendiado em termos

bastantemente semelhantes por um contemporacircneo de Freire Francisco de Pina de Saacute e

de Mello (1695-1773) Ariosto eacute para Francisco de Pina e Mello como amiuacutede referido

poeta de ldquomuita extravaganciardquo Assim eacute qualificado o autor do Orlando Furioso pois

no ldquoProlegomeno para a boa intelligencia conhecimento do poema Primeira parterdquo que

prefacia o seu Triumpho da Religiaotilde Poema Epico-Polemico Francisco de Pina e Mello

bane o ldquoincrivelrdquo do gecircnero eacutepico e afirma que produz o ldquoridiculordquo e natildeo o ldquoadmiravelrdquo

o poeta que busca o ldquoextraordinariordquo mas natildeo se ateacutem aos ldquolimites da probabilidaderdquo 656

Francisco de Pina e Mello consoante esses pressupostos toma o Orlando Furioso

como exemplo de poema que excede o controle da verossimilhanccedila e faz-se monstruoso

O Poema de Ariosto estaacute fundado nestes delirios poeticos O

Hippogripho ou Cavallo de Rugero os gigantes e os monstros O anel

de Angelica que a fazia invisivel os combates de Marfisa Bradamante

Lisboa na Phenix beco de Santa Martha nordm 123 1846 pp vii-xiii 655 Cf Bibliotheca Lusitana Historica Critica e Chronologica na qual se comprehende a noticia dos

Authores Portuguezes e das Obras que compozeraotilde desde o tempo da promulgaccedilaotilde da Ley da Graccedila ateacute

o tempo presente por Diogo Barbosa Machado Ulyssiponense Abbade Reservatorio da Parochial Igreja

de Santo Adriatildeo de Sever e Academico do Numero da Academia Real Tomo III Lisboa Na Officina de

Ignacio Rodrigues Anno de MDCCLII Com todas as licenccedilas necessarias p 396 656 Triumpho da Religiaotilde Poema Epico-Polemico que a Santidade do Papa Benedicto XIV Dedica

Francisco de e de Mello Moccedilo Fidalgo da Casa de Sua Majestade Fidelissmo e Academico da Academia

Real da Historia Portuguesa Coimbra Na Officina de Antonio Simoens Ferreira impressor da

Universidade Anno de 1756 Com todas as licenccedilas necessarias p XVIII

212

e Oly[m]pia as visoens os encantamentos e outros successos deste

caracter saotilde como os sonhos de hum enfermo aonde naotilde ha

reprezentaccedilaotilde que naotilde seja monstruosidade657

Isso significa assim como os ldquoaegri somniardquo (ldquoos sonhos de hum enfermordquo) os

ldquodelirios poeticosrdquo como o pintor de bizarrias Ariosto como a pintura do monstro o

poema Orlando Furioso No discurso de vitupeacuterio a razatildeo de semelhanccedila Francisco de

Pina e Mello assenta isso eacute evidente na autoridade de Horaacutecio de quem pendem os

criteacuterios de julgamento de boa ou maacute invenccedilatildeo poeacutetica

Itere-se mesmo que Quintiliano (seacutec I dC) ao preceituar a ornamentaccedilatildeo do

discurso refira os versos iniciais da Epistula ad Pisones como ilustraccedilatildeo de viacutecio

elocutivo proacuteprio de quem mistura palavras sublimes e humildes (ldquosublimia humilibusrdquo)

arcaicas e novas (ldquouetera nouisrdquo) poeacuteticas e vulgares (ldquopoetica uulgaribusrdquo) (cf QUINT

VIII 3 61) eacute opiniatildeo corrente entre os comentadores de Horaacutecio discute Marcos

Martinho dos Santos que esses versos da epiacutestola ao construir-se por metaacutefora a

monstruosidade miram sobretudo a unidade da mateacuteria poeacutetica Eacute essa unidade como

se observou de acordo com o preceptista latino que se vecirc em risco se a variaccedilatildeo na obra

eacute prodigiosa658 pois que embora a variaccedilatildeo seja prescrita para evitar o teacutedio da invariaccedilatildeo

a unidade da obra pode-se solapar por incongruecircncia em casos tomados por excessivos659

657 Idem Ibidem 658 SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p 202 659 Para Montesquieu (1689-1755) coetacircneo de Francisco Joseacute Freire a variedade eacute motivo de prazer sem

ela ldquoa alma se abate as coisas que se parecem lhe surgem como se fossem uma soacute e se a parte de uma tela

que noacutes eacute mostrada fosse igual agrave outra que jaacute vimos esse objeto seria novo sem parececirc-lo e natildeo

proporcionaria prazer algum E como a beleza das obras de arte analogamente agrave das obras da natureza estaacute

nos prazeres que proporcionam eacute preciso capacitaacute-las tanto quanto possiacutevel a variar esses prazeres eacute

preciso mostrar agrave alma coisas que ela ainda natildeo viu eacute preciso que o sentimento que lhe eacute oferecido seja

diferente daquele que ela acabou de experimentarrdquo [ldquosans cela lrsquoacircme languit car les choses semblables lui

paraissent les mecircmes et si une partie drsquoun tableau quon nous deacutecouvre ressemblait agrave une autre que nous

aurions vue cet objet serait nouveau sans le paraicirctre et ne ferait aucun plaisir Et comme les beauteacutes des

ouvrages de lrsquoart semblables agrave celles de la nature ne consistent que dans les plaisirs qursquoelles nous font il faut les rendre propres le plus que lrsquoon peut agrave varier ces plaisirs il faut faire voir agrave lrsquoacircme des choses qursquoelle

nrsquoa pas vues il faut que le sentiment qursquoon lui donne soit diffeacuterent de celui quelle vient davoirrdquo] Nesses

termos a variedade torna-se maacutequina produtora de prazer e o prazer ansiosiacutessimo de novidade inventiva

e ainda elocutiva ldquoAs histoacuterias nos agradam pela variedade do que contam os romances pela variedade

dos prodiacutegios narrados as peccedilas de teatro pela variedade das paixotildees do mesmo modo aqueles que sabem

instruir modificam tanto quanto possiacutevel o tom uniforme da instruccedilatildeordquo [ldquoCrsquoest ainsi que les histoires nous

plaisent par la varieacuteteacute des reacutecits les romans par la varieacuteteacute des prodiges les piegraveces de theacuteacirctre par la varieacuteteacute

des passions et que ceux qui savent instruire modifient le plus qursquoils peuvent le ton uniforme de

lrsquoinstructionrdquo] Afinal ldquouma uniformidade prolongada torna tudo insuportaacutevel a ordem repetida dos

periacuteodos prolongada em excesso torna-se uma arenga acabrunhante a mesma meacutetrica e as mesma tocircnicas

causam teacutedio num poema longordquo [ldquoUne longue uniformiteacute rend tout insupportable le mecircme ordre des

213

Consoante essa siacutentese do estudioso que depende dos comentaacuterios de Porfiacuterio e Pseudo-

Acratildeo de Jerocircnimo o Santo e Sidocircnio Apolinar de Mateus de Vendocircme e Godofredo de

Vinsauf ainda que nem sempre concordantes pode-se ler a glosa de Francisco Joseacute Freire

que leitor setecentista de Porfiratildeo contesta aqueles que veem nesses versos liccedilatildeo sobre

a dispositio Escreve Francisco Joseacute Freire

Se o Poeta [Horaacutecio] tratasse aqui da disposiccedilaotilde monstruosa faria

consistir a monstruosidade em ter a figura v g a cabeccedila no lugar dos

peacutes e estes no lugar superior para deste modo mostrar huma disposiccedilaotilde

contraria agrave natureza Poreacutem o que Horacio daacute a entender claramente he

que soacute falla da invenccedilaotilde monstruosa em que os peacutes e a cabeccedila naotilde se

proporcionaotilde agrave foacuterma do corpo todo660

Nesse sentido para o tratadista portuguecircs em conformidade com a figura que

pinta Horaacutecio assim como o Orlando Furioso em particular a tragicomeacutedia afirma-se

gecircnero de poema trabalhado por poeta de ldquofantasia depravadardquo que prefere nos termos

de Vitruacutevio segundo a siacutentese teoacuterica construiacuteda por Marcos Martinho dos Santos a

ldquorazatildeo falsardquo e pretere a ldquorazatildeo da verdaderdquo661 ou como supotildeem Francisco Joseacute Freire e

Francisco de Pina de Saacute e de Mello seguindo a epiacutestola poeta que compotildee livro

assemelhado a ldquosonhos de enfermordquo Sabe-se desses ldquoaegri somniardquo Freire escreve

serem os sonhos ldquodepravados varios extravagantesrdquo e mais disparatados ainda os do

ldquoenfermordquo porque assim os fazem os ldquohumores perturbadosrdquo662 segundo os usos da

medicina de costume hipocraacutetico no diagnoacutestico da melancolia

A depravaccedilatildeo a prodigiosa variedade e a extravagacircncia desses ldquoaegri somniardquo jaacute

se viu tecircm como equivalente a vanidade das ideias do livro do mau poeta ou das

peacuteriodes long-temps continueacute accable dans une harangue les mecircmes nombres et les mecircmes chutes mettent

de lennui dans un long poeumlmerdquo] MONTESQUIEU Charles de Secondat Conde de O gosto Traduccedilatildeo e posfaacutecio de Teixeira Coelho Satildeo Paulo Iluminuras 2005 pp 27-28 660 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa

Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na

logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D

Henrique pelo mesmo Author p 6 661 SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

196 662 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa

Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na

logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D

Henrique pelo mesmo Author p 6

214

ldquospeciesrdquo conforme se lecirc na liccedilatildeo em latim Como ensina Marcos Martinho dos Santos

esse substantivo Horaacutecio emprega em referecircncia agrave ldquovisatildeo espetacularrdquo tal o deliacuterio do

enfermo ldquoque natildeo eacute produzida por nenhum ser verdadeirordquo Assim por exemplo na

horaciana ldquoSaacutetira II 3rdquo eacute figurado o maniacuteaco ldquofuriosusrdquo como Orlando que ldquoconcebe

espectros alheios agrave verdaderdquo (ldquospecies alias uerisrdquo) ou como glosa o tradutor Francisco

Joseacute Freire ldquocousas que naotilde se achaotilde na natureza e soacute se daotilde na cabeccedila dos enfermos

dos loucos e dos maacuteos Poetasrdquo663

Faz reverberar as ldquoideacuteas vatildesrdquo as ldquouanae speciesrdquo o Diccionario poetico de

Francisco Joseacute Freire Nele o termo ldquofantasiardquo eacute tomado ora em chave de elogio passiacutevel

de ser qualificado por adjetivos tais quais ldquopoeticardquo ldquosubtilrdquo ldquoagudardquo ldquoengenhosardquo

ldquodiscursivardquo ldquodiscretardquo ldquodelicadardquo ldquofelizrdquo ldquofertilrdquo ora em chave de vitupeacuterio passiacutevel

de ser qualificado por ldquodepravadardquo ldquoenfermardquo ldquoestragadardquo ldquoviciosardquo ldquoloucardquo ldquoinsanardquo

ldquofatuardquo ldquonesciardquo ldquodementerdquo ldquovaga ldquovagabundardquo ldquoconfusardquo como evidenciam os

exemplos que recolhe o Diccionario poetico ldquoDrsquoalma doces delirios gratos sonhosrdquo

ldquoPotencia forte drsquoalma sensitivardquo ldquoEngenhosas ficccedilotildees subtis ideacuteasrdquo ldquoVatildes imaginaccedilotildees

doces quimerasrdquo ldquoQue dos Vates inventa a mente insanardquo664 Trata-se nesses exemplos

e na Arte Poetica de Q Horacio Flacco de aplicaccedilatildeo do substantivo ldquoideardquo em acepccedilatildeo

lastreada pelo Vocabulario Portuguez amp Latino de Raphael Bluteau isto seja trata-se de

ldquoideardquo como ldquoimagem que o artifice foacuterma no entendimento para a pocircr em obra Imago

inis Fem Species ei Femrdquo (cf CIC Or II 8-9)665 Registre-se nesta acepccedilatildeo o termo

emprega-se na Nova Arte de Conceitos de Francisco Leitatildeo Ferreira (1667-1735)

impressa em dois tomos em Lisboa em 1718 e 1721666

663 Idem ibidem 664 Cf Diccionario poetico para o uso dos que principiaotilde a exercitarse na Poesia Portugueza Obra

igualmente util ao orador principiante Seu author Candido Lusitano floriferis ut apes in saltibus omnia

libant Omnia nos itidem depascimur aurea dicta Aurea perpetua semper dignissima vita Lucret 3 Tomo

I Lisboa Offic Patriarcal de Francisco Luiz Ameno MDCCLXV Com as licenccedilas necessarias Vende-se na

portaria da Casa de N Senhora das Necessidades e na logea de Francisco Tavares livreiro ao Senhor da

Boa Morte pp 268-9 665 Vocabulario portuguez e latino aulico anatomico architectonico bellico botanico brasilico comico

critico chimico dogmatico dialectico dendrologico ecclesiastico etymologico economico florifero

forense fructifero autorizado com exemplos dos melhores escritores portugueses e latinos pelo padre

D Raphael Bluteau Coimbra no Real Collegio das Artes da Companhia de Jesu Com todas as Licenccedilas

necessaacuterias Anno Domini MDCCXIII [1713] pp 28-9 666 Precisamente o nome de Hermoacutegenes elenca-se entre as autoridade referidas no tratado por Francisco

Leitatildeo Ferreira ldquoSeguirey as doutrinas do Conde Graotilde Cruz Manoel Tesauro estabelecidas sobre os

preceytos amp textos de Aristoteles natildeo desprezarey as ponderaccedilotildees de Gracian de Juglaris amp Masenio

consultarey as Crises Francezas de Bouhours Boileau amp Rapino verey as sabias Observaccedilotildees de Muratori

Pallavicino amp Garofalo sem me esquecer dos dictames de Longino das elegancias de Demetrio das ideas

de Hermogenes dos preceytos de Cicero amp das Instituiccedilotildees de Quintilianordquo cf Nova Arte de Conceitos

215

Faz reverberar as ldquoideacuteas vatildesrdquo tambeacutem a Arte Poetica ou Regras da Verdadeira

Poesia em geral Nele a explicaccedilatildeo do que seja a fantasia segue os seguintes passos

Todo o objeto que se representa aos olhos aos ouvidos e aos outros

sentidos lanccedila hum compendio huma imagem huma similhanccedila de si

mesmo a qual sendo recebida pelos sentidos passa pelos nervos e

orgatildeos corpoacutereos ateacute que chega a imprimirse em o nosso ceacuterebro A

potencia ou faculdade da alma que aprehende e conhece estes

objectos sensiveis ou para melhor dizer as suas imagens he a fantasia

ou imaginativa a qual porque estaacute (segundo o nosso modo de entender)

na parte inferior da alma lhe poderemos chamar aprehensiva inferior

Tem a nossa alma outra aprehensiva das cousas a que podemos dar o

nome de superior porque estaacute collocada na parte superior e racional

da alma e commummente lhe chamamos entendimento667

Sabe-se eacute definiccedilatildeo que se fundamenta em Aristoacuteteles Enuncia-a Francisco Joseacute

Freire agrave luz do tratado Della perfetta poesia italiana de Ludovico Antocircnio Muratori

(1672-1750) cuja primeira impressatildeo ocorreu em Modena na Itaacutelia em 1706 Freire de

fato verteu-o do italiano ao portuguecircs

Che qualunque oggetto si rappresenti a gli occhi a gli orecchi e agli

altri sensi trasmette un compendio unrsquoImmagine una simiglianza di

se stesso che ricevuta da i sensi passa per gli nervi ed organi corporei

infinchegrave giunge ad imprimersi nel nostro cervello La Potenza o Facoltagrave

dellrsquoanima che apprende e conosce questi oggetti sensibili o per

meglio dire le loro Immagini egrave la Fantasia o Immaginativa la quale

perchegrave egrave posta per nostro modo drsquointendere nella parte inferiore

que com o titulo de Licccedilotildees Academicas Na Publica Academia dos Anonymos de Lisboa dictava e explicava o Beneficiado Francisco Leytam Ferreyra Academico Anonymo Primeyra Parte dedicada ao

Senhor D Carlos de Noronha Primogenito do Excellentissimo Senhor Dom Miguel De Noronha Conde

de Valladares ampc Lisboa Occidental na Officina de Antoacutenio Pedrozo Galram Com todas as licenccedilas

necessaacuterias Anno de 1718 A custa de Miguel Rodriguez Mercador de Livros aacutes portas de Santa

Catharina pp 8-9 667 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellipFungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias pp 85-86

216

dellrsquoanima perciograve da noi convenevolmente puograve chiamarsi Apprensiva

inferiore Unrsquoaltra Apprensiva delle cose ha lrsquoAnima nostra che

superiore da noi srsquoappella perchegrave egrave situata nella parte superiore

ragionevole e divina dellrsquoanima e comunemente si chiama

Intelletto668

Que todo objeto [que] se represente aos olhos aos ouvidos e aos outros

sentidos transmite um compecircndio uma Imagem uma semelhanccedila de

si mesmo que recebida pelos sentidos passe pelos nervos e oacutergatildeos

corpoacutereos ateacute que chega a imprimir-se no nosso ceacuterebro A Potecircncia ou

Faculdade da alma que apreende e conhece estes objetos ou para

melhor dizer as suas Imagens eacute a Fantasia ou Imaginativa a qual

porque eacute colocada em nosso modo de entender na parte inferior da

alma para noacutes pode adequadamente chamar-se Apreensiva inferior

Outra Apreensiva das coisas tem nossa Alma que eacute por noacutes chamada

superior porque eacute situada na parte superior racional e divina669 da alma

e comumente se chama Intelecto670

E semelhantemente jaacute o havia feito Ignaacutecio de Luzaacuten (1702-1754) em versatildeo

castelhana em seu La Poetica o reglas de la poesia en general y de sus principales

especies de 1737

Todos los objetos sensibles por el conducto de los sentidos exteriores

introducen en nuestra alma una imagen ograve copia de si mismos la qual

imagen (como quiera que los Physicos expliquen esto que no es de

nuestro intẽto) se imprime y dibuxa en el celebro ugrave en otra parte donde

el alma vegrave y comprehende essas imaacutegenes Pero dividiendo para

mayor inteligencia la misma alma como en dos partes y

considerandola por dos diversos lados yagrave ocupada en essas imaacutegenes

sensibles yagrave en las cosas puramente intelectuales llamaremosla con

668 Cf Della perfetta poesia italiana spiegata e dimostrata con varie osservazioni da Lodovico Antonio

Muratori Tomo primo In Modena M DCCVI [1706] Nella Stampa di Bartolomeo Soliani Con Lic dersquo

Superiori p 153 669 Note-se o adjetivo ldquodivinordquo natildeo integra a versatildeo que Francisco Joseacute Freire elaborou da liccedilatildeo de Ludovico

Antocircnio Muratori 670 Traduccedilatildeo nossa

217

diversos nombres yagrave Phantasia ograve Aprehensiva inferior yagrave

entendimiento ugrave Aprehensiva superior671

Todos os objetos sensiacuteveis pela conduccedilatildeo dos sentidos exteriores

introduzem em nossa alma uma imagem ou coacutepia de si mesmos

imagem que (como quer que os Fiacutesicos expliquem isto o que natildeo eacute de

nosso intento) se imprime e desenha no ceacuterebro ou em outra parte donde

a alma vecirc e compreende essas imagens Poreacutem dividindo para maior

inteligencia a mesma alma como que em duas partes e considerando-a

por dois lados diversos ora ocupada nessas imagens sensiacuteveis ora nas

coisas puramente intelectuais a chamaremos com diversos nombres

ora Fantasia ou Apreensiva inferior ora entendimento ou Apreensiva

superior672

A doutrinaccedilatildeo da fantasia tal como proposta por Ludovico Antocircnio Muratori da

qual dependem por sua vez as liccedilotildees de Ignaacutecio de Luzaacuten e de Francisco Joseacute Freire

pressupotildee a teorizaccedilatildeo de Aristoacuteteles no terceiro capiacutetulo do De anima (cf ARIST III 3

427 a 17-428 b 30) Trata-se de iniacutecio de capiacutetulo das negativas que como bem entende

Maria Ceciacutelia Gomes dos Reis na versatildeo da obra em liacutengua portuguesa integra estrateacutegia

aristoteacutelica de comprovaccedilatildeo natildeo soacute de que noēsis (intelecccedilatildeo) e phronēsis (entendimento)

natildeo se circunscrevem agrave a aisthēsis (percepccedilatildeo) mas tambeacutem de que a phantasia vincula-

se agrave aisthēsise natildeo agrave construccedilatildeo da doxa (opiniatildeo)673

Mirando essa tese Aristoacuteteles afirma phantasia natildeo eacute aisthēsis a despeito do que

sustente Platatildeo (cf PLAT Thaet 152 c 1-3674 ) nem eacute dianoia (raciociacutenio) embora

aristotelicamente natildeo haja phantasia sem aisthēsis( cf ARIST An III 3 427 a 17 ss)

Natildeo eacute hypolēpsis (suposiccedilatildeo) nem noēsis porque eacute pathos (afecccedilatildeo) submisso agrave vontade

671 Cf La Poetica o reglas de la poesia en general y de sus principales especies Por Don Ignacio de

Luzan Claramunt de Suelves y Gurrea Entre los Academicos Ereinos de Palermo llamado Eligio

Mepalino Con Licencia En Zaragoza Por Francisco Revilla vive en la Calle de S Lorenzo Antildeo 1737

p 162 672 Traduccedilatildeo nossa 673 Cf ARISTOacuteTELES De anima Livros I II e III 2ordf ediccedilatildeo Apresentaccedilatildeo traduccedilatildeo e notas de Maria Ceciacutelia

Gomes dos Reis Satildeo Paulo Editora 34 2012 p 285 674 Cf VERNANT J-P ldquoNascimento de imagensrdquo in LIMA L C (Org) Miacutemesis e a reflexatildeo contemporacircnea

EdUERJ 2010 p 68 Propotildee Jacques Follon deve-se natildeo esquecer que Platatildeo identifica a

mas supotildee como substantivo deverbal de como ldquoapparitionrdquo natildeo como

designaccedilatildeo da faculdade da alma que interessa a Aristoacuteteles cf FOLLON J ldquoLa notion de phantasia chez

Platonrdquo in LORIES D RIZZERIO L (Org) De la phantasia agrave limagination Louvain Peeters 2003 p 5

218

humana distinta da hypolēpsis insubmissa da qual pendem emoccedilotildees que ela a phantasia

como fantasiada natildeo suscita (cf ARIST An III 3 427 b 16 ss) Eacute aquilo mediante o que

se faz o phantasma (apariccedilatildeo Natildeo eacute poreacutem dynamis (potecircncia) ou hexis (disposiccedilatildeo)

tais quais aisthēsis doxa noēsis e epistēmē (ciecircncia) (cf An III 3 427 b 27 ss) Natildeo eacute

aisthēsis (i) porque subsiste nos sonhos durante o sono enquanto natildeo atuam os sentidos

(ii) porque natildeo subsiste em todos os animais embora um dos sentidos em potecircncia ou

em atividade neles sempre se encontre (iii) porque pode ser falsa ao passo que os

sentidos jamais o satildeo se discernem com acuidade (iv) porque podem subsistir as imagens

mentais mesmo quando os olhos estatildeo fechados (cf ARIST An III 3 428 a 5 ss)

Tampouco eacute noēsis ou epistēmē porque pode ser falsa ao passo que estas disposiccedilotildees satildeo

sempre verdadeiras Mesmo admitindo o falso tambeacutem natildeo eacute doxa porque conforme

Aristoacuteteles opinar supotildee convicccedilatildeo e persuasatildeo pendentes da razatildeo que falta agraves feras

capazes de fantasiar E sequer decorre da combinaccedilatildeo de doxa e aisthēsis como afirma

Platatildeo (cf PL Soph 264 a 4-6 ss)675 porque eacute possiacutevel que sejam feitas suposiccedilotildees

verdadeiras concomitantes com imagens falsas afinal consoante o exemplo aristoteacutelico

eacute possiacutevel verdadeiramente crer que o sol seja maior que a terra habitada ainda que o

sentido da visatildeo mostre diminuto o astro (cf ARIST An III 3 427 b 16)

A phantasiano entanto afirma Aristoacuteteles apoacutes acumular essas negativas todas

ldquoaparenta serrdquo certa kinēsis ou seja certa moccedilatildeo aniacutemica decorrente da energeia

(atividade) da aisthēsis agrave qual a kinēsis eacute necessariamente semelhante e a partir da qual

para os seres humanos e para a maioria das feras aparecem as jaacute referidas imagens

mentais Essas imagens sabe-se na liccedilatildeo aristoteacutelica satildeo phantasmataapariccedilotildees plural

de phantasma)(cf ARIST An III 3 428 b 10-17) e podem ser como se pocircde notar falsas

ou verdadeiras676

Seguindo bastantemente de perto os passos de Ludovico Muratori de fato

vertendo-o agrave liacutengua portuguesa Francisco Joseacute Freire esmiuacuteccedila a doutrina agrave fantasia tal

como definida cabe a apreensatildeo das imagens das coisas sensiacuteveis natildeo a averiguaccedilatildeo de

sua verdade ou falsidade ofiacutecio da potecircncia que lhe eacute superior a porccedilatildeo racional da alma

o entendimento Diga-se entendimento em Freire traduz o que Ludovico Antocircnio

675 Cf VERNANT J-P ldquoNascimento de imagensrdquo in LIMA L C (Org) Miacutemesis e a reflexatildeo contemporacircnea

EdUERJ 2010 p 68 676 Cf Na paraacutefrase seguem-se de perto as notas de Maria Ceciacutelia Gomes dos Reis cf ARISTOacuteTELES De

anima Livros I II e III 2ordf ediccedilatildeo Apresentaccedilatildeo traduccedilatildeo e notas de Maria Ceciacutelia Gomes dos Reis Satildeo

Paulo Editora 34 2012 pp 289 ss

219

Muratori nomeia como intelletto ou giudizio677 o que Aristoacuteteles define como phronēsis

Consoante esse conjunto de preceitos natildeo se confundem demais fantasia e entendimento

e eacute do comeacutercio entre essas potecircncias aniacutemicas que de trecircs maneiras as imagens se

formam na alma Ora forma-as (i) o entendimento por si soacute ao abstrair imagem universal

de imagens particulares apreendidas pela fantasia Satildeo essas imagens consideradas

intelectuais ou engenhosas 678 Ora formam-nas (ii) a fantasia e o entendimento

conjuntamente este regula as operaccedilotildees daquela de modo que do ldquoimperio do

entendimentordquo679 decorram ou imagens de objetos percebidos pelos sentidos ou novas

imagens que delas pendam Satildeo essas imagens proacuteprias do poeta Ora forma-as por fim

(iii) tatildeo soacute a fantasia quando a alma por ela eacute dominada alheia aos juiacutezos do entendimento

Satildeo essas imagens comuns aos sonhos agraves febres agrave melancolia680 Entende Aristoacuteteles que

os homens que tecircm o intelecto obscurecido pela doenccedila ou pelo sono e as bestas que natildeo

677 Della perfetta poesia italiana spiegata e dimostrata con varie osservazioni da Lodovico Antonio

Muratori Tomo primo In Modena M DCCVI [1706] Nella Stampa di Bartolomeo Soliani Con Lic dersquo

Superiori p 153 Ludivico Muratori em outra obra dedicada exclusivamente agrave mateacuteria Della forza della

fantasia umana assim define o Intelletto ldquoNoi con questo nome intendiamo la Facoltagrave o Potenza che ha lAnima nostra di pensare cioegrave di apprendere le Idee delle cose di combinarle di dividerle di astraere di

giudicare di formar assiomi universali di raziocinare di far altre simili azioni delle quali egrave solamente

capace unrsquoEnte ed Agente reale spirituale ed egrave incapace la Materia per quanto si voglia organizzata e

sottilizzatardquo cf Della forza della fantasia umana Tratado di Ludovico Muratori Bibliotecario del

Serenissimo Signor Duca di Modena In Venezia MDCCXLV [1745] Presso Giambatista Pasquali Com

Licenza Dersquo Superiori pp 6-7 678 Por exemplo ldquoVecirc vg o nosso entendimento que a fantasia aprehendera e formara em si muitas imagens

de homens que faz Ajunta-as e de tantas imagens particulares que recolhera a aprehensiva inferior tira

elle e foacuterma huma imagem que antes naotilde havia concebendo Que todo o homem tem a potencia de rir

que os viciosos naotilde devem ser louvados que aquelle homem que presume que soacute elle he saacutebio deve ser

reputado por louco ampcrdquo cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense

Segunda ediccedilatildeo hellipFungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp

Officium nil scribens ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid

non quo virtus quo ferat error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz

Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas necessarias pp 86-87 679 Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes

tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda

ediccedilatildeo hellipFungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil

scribens ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus

quo ferat error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno

MDCCLIX Com as licenccedilas necessarias p 87 Recordem-se as primeiras palavras do ldquoProacutelogordquo do Don

Quijote de la Mancha de Miguel de Cervantes ldquoDesocupado lector sin juramento me podraacutes creer que quisiera que este libro como hijo del entendimiento fuera el maacutes hermoso el maacutes gallardo y maacutes discreto

que pudiera imaginarserdquo p 7 Nota-se O Quijote fantasia-se como ldquofilho do entendimentordquo poreacutem 680 Sobre os sonhos Aristoacuteteles afirma o seguinte ldquoQue a imaginaccedilatildeo natildeo eacute percepccedilatildeo sensiacutevel eacute evidente

a partir disto pois a percepccedilatildeo sensiacutevel eacute ou uma potecircncia () como a visatildeo ou uma atividade

() como o ato de ver mas algo pode aparecer para noacutes mesmo quando nenhuma delas subsiste ndash

como por exemplo as coisas em sonhosrdquo (cf ARIST An III 3 428 a 5 ss) cf ARISTOacuteTELES De anima

Livros I II e III 2ordf ediccedilatildeo Apresentaccedilatildeo traduccedilatildeo e notas de Maria Ceciacutelia Gomes dos Reis Satildeo Paulo

Editora 34 2012 p 111

220

o tecircm muito embora sejam todos dotados dos sentidos agem de acordo com a fantasia e

por ela satildeo conduzidos (cf ARIST An III 3 428 a 5 428 b 30) Essa accedilatildeo sem guias da

fantasia para um leitor aristoteacutelico como Ludovico Antocircnio Muratori eacute sobretudo um

indefensaacutevel desgoverno da razatildeo cujas razotildees residem na ineficaacutecia de ofiacutecio da fantasia

para a distinccedilatildeo de coisas ldquoVieri o Falsi Probabili o Improbabili moralmente Buoni o

Cattivirdquo681

Francisco Joseacute Freire pois sempre de acordo com Ludovico Antocircnio Muratori

preceitua que a fantasia poeacutetica nem engenhosa nem delirante mediante o senhorio do

entendimento produz imagens de trecircs espeacutecies de trecircs estatutos diferentes quais sejam

elas (i) imagens verdadeiras ou para a fantasia ou para o entendimento representaccedilotildees

de verdade apreendida pelos sentidos e assim reconhecidas682 (ii) imagens verossiacutemeis

para a fantasia e para o entendimento 683 (iii) imagens diretamente verdadeiras ou

verossiacutemeis para a fantasia mas apenas indiretamente para o entendimento visto seja

falso o sentido direto ou reto da imagem684 Nessa triparticcedilatildeo as duas primeiras espeacutecies

percebidas ou pendentes da apreensatildeo sensiacutevel satildeo entendidas pelo tratadista como

ldquosiacutemplicesrdquo e ldquonaturaisrdquo a terceira espeacutecie eacute a que se diz ldquoartificial fantaacutesticardquo685

Natildeo eacute demasiado forccediloso recordar que eacute fantaacutestica nos termos da doutrina

platocircnica uma das duas espeacutecies de mimēsis segundo o Estrangeiro dramatizado no

681 Cf Della forza della fantasia umana Tratado di Ludovico Muratori Bibliotecario del Serenissimo

Signor Duca di Modena In Venezia MDCCXLV [1745] Presso Giambatista Pasquali Com Licenza Dersquo

Superiori p 221 682 Por exemplo ldquoComo vg quem descreve vivamente e com palavras proprias o Arco Iris a batalha de

dous guerreiros hum generoso cavalo hum tigre feroz o movimento que faz na agoa de hum lago pequeno

huma pedrinha e outras cousas similhantesrdquo cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral

e de todas as suas especies principaes tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire

Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa

fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam

Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de

Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas necessarias p 88 683 Por exemplo ldquo[] como vg o imaginar a Scena funesta da ruina de Troya a chegada de Orestes a

Tauro a morte de Niaso e Eurialo e outras infinitas cousas imaginadas pela fantasia e as quaes parecem

possiveis e verosimeis tanto a ella como ao entendimentordquo cf Idem pp 88-9 684 O exemplo eacute elucidativo ldquoO voar vg he qualidade proacutepria e natural soacute do que he animado e tem azas

poreacutem a fantasia agitando as suas imagens e unindo a do voar com a da fama imagina que a fama voa

falla e opeacutera como se tivesse alma Igualmente o saudar he soacute proprio do homem com tudo a fantasia une

esta imagem com a de huma ave e imagina que os passarinhos saudaotilde com o seu canto o nascimento da

Aurora Disto se comprehende que esta casta de imagens saotilde propriamente produzidas pela fantasia que

vay imaginando cousas maravilhosas e novas que aliaacutes saotilde falsas a quem soacute vay buscar o sentido directo

Mas porque indirectamente fazem estas perceber alguma cousa que he verdadeira ou verosimil ao

entendimento por isso a elle lhe agradaotilde e na formaccedilaotilde dellas se une com a fantasia permittindo-lhe hum

taotilde bello deliacuterio e entregando-lhe aacutes vezes imagens intellectuaes para que ella as vista e orne com as suas

bellas e admiraveis cores se bem que mentirosasrdquo cf Idem p 90 685 Cf Idem pp 85-90 91-92

221

Sofista (cf PLAT Soph 266 a ss) Por um lado nesse diaacutelogo eacute eikastikē(icaacutestica) a

mimese que opera em conformidade com as grandezas do exemplo reproduzindo-lhe a

simetria visto respeitadas as proporccedilotildees (cf PLAT Soph 235 b-236 c 266 d)686 Para

Francisco Joseacute Freire subordinado agrave autoridade de Gian Vicenzo Gravina687 trata-se de

ldquoimitaccedilaotilde do particularrdquo que ldquotem por objecto todas as acccedilotildees e cousas que procedem

da natureza ou da Arte e naotilde menos da Historia que da invenccedilaotilde de alguemrdquo688 Por

outro lado eacute phantastikē(fantaacutestica)a mimese que distorce as grandezas do exemplo

para que distorcendo-as pareccedila o artiacutefice manter-lhe as proporccedilotildees tendo em vista a

distacircncia de apreensatildeo pressuposta e adequada entre as obras assim produzidas e a

recepccedilatildeo a que se destinam Ademais para Francisco Joseacute Freire trata-se de ldquoimitaccedilaotilde

do universalrdquo que ldquotem por objecto tudo o que naotilde existindo per si tem novo ser e vida

nascendo da fantasia do Poeta quando entra a inventar novas cousas ou acccedilotildees

similhantes aacutes historias que se bem nao succederaotilde podiaotilde succederrdquo689

Nesses mesmos termos para Francisco Joseacute Freire por um lado a particularidade

da mimese icaacutestica faz pender a poesia para a histoacuteria cujo lugar privilegiado nas

doutrinas poeacuteticas setecentistas jaacute se referiu Entre os autores portugueses de gecircnero eacutepico

no seacuteculo XVIII esse pendor de acordo com os estudos de Ivan Teixeira opera-se

pragmaticamente como glosa em verso de cronistas da histoacuteria lusa e pode-se

exemplificaacute-lo com poemas como Conquista de Goa (1759) de Francisco de Pina de Saacute

e de Mello Lisboa Reedificada (1780) de Miguel Mauriacutecio Ramalho Uraguay (1769)

de Basiacutelio da Gama ou Caramuru (1781) de Santa Rita Duratildeo690 Por outro lado a

universalidade da mimese fantaacutestica supotildee a imitaccedilatildeo de mateacuteria inexistente na natureza

mas inventada pela fantasia poeacutetica do artiacutefice Essa compreensatildeo do Sofista eacute de traccedilos

duradouros pois que discute Erwin Panofsky jaacute eacute lida em Gregorio Comanini no diaacutelogo

Il Figino overo del fine della pittura de 1591 em que a personagem Stefano Guazzo potildee

686 Cf Idem pp 195 252 SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo

Paulo 2002 v 4 pp 208-9 687 Cf Di Vicenzo Gravina giurisconsulto della ragion poetica libri due In Roma presso Francesco

Gonzaga MDCVIII Con Licenza dersquo Superiori 688 Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes

tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip

Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens

ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo

ferat error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX

Com as licenccedilas necessarias pp 35-9 689 Idem pp 35-9 690 TEIXEIRA I Mecenato Pombalino e Poesia Neoclaacutessica Basiacutelio da Gama e a Poeacutetica do Encocircmio Satildeo

Paulo Edusp 1999 p 249

222

a distinccedilatildeo nos seguintes termos a imitatione icastica ldquoegrave quella che imita le cose le quali

sonordquo (ldquoeacute aquela que imita as coisas que satildeordquo) ao passo que a imitatione fantastica ldquoegrave

quella che finge cose non essistentirdquo (ldquoeacute aquela que finge as coisas natildeo existentesrdquo) agrave

maneira da pintura de Giuseppe Arcimboldo691

Demais bem se nota satildeo manejados na anaacutelise dessas espeacutecies de imagem icaacutestica

e fantaacutestica como traccedilos distintivos o verdadeiro e o verossiacutemil Satildeo categorias que a

doutrina poeacutetica de Ludovico Antocircnio Muratori e de Francisco Joseacute Freire por

conseguinte reacomoda ao especificar o verdadeiro isso significa ldquoil vero della naturardquo

o ldquoverdadeiro da naturezardquo consoante distinccedilatildeo que supotildee por um lado ldquoquel vero che

in fatti egrave o pure egrave statordquo (ldquoaquelle verdadeiro que com effeito he ou foyrdquo) e por outro

lado ldquoquel vero che verisimilmente egrave stato o pur poteva o doveva essere secondo le force

della naturardquo (ldquoo outro he o que verosimilmente foy e tambem podia ou devia ser

segundo as forccedilas da naturezardquo) A doutrina o esmiuacuteccedila compete a primeira espeacutecie agrave

teologia agrave matemaacutetica agrave histoacuteria e agraves demais ciecircncias e decorre a ciecircncia da cogniccedilatildeo

do ldquovero necessario o evidente o moralmente certordquo (ldquoverdadeiro necessario ou

evidente ou moralmente certordquo) a segunda sobretudo compete agrave poesia e decorre a

opiniatildeo da cogniccedilatildeo do ldquovero possibile probabile e credibile che Verisimile poi

comunemente vien dettordquo (ldquoverdadeiro possivel provavel e crivel que vulgarmente se

diz verosimilrdquo)692

A exposiccedilatildeo que pende de Ludovico Antocircnio Muratori natildeo eacute insignificante No

que se pode avanccedilar eacute liccedilatildeo aristoteacutelica que entrelaccedila e relecirc mesmo ao reveacutes as liccedilotildees

da Poeacutetica de Aristoacuteteles relativas ao necessaacuterio () ao possiacutevel

() ao provaacutevel () ao sucedido () e ao criacutevel

() (cf ARIST Poet 9 25) de modo que de tal leitura decorra a asserccedilatildeo

da primazia da verdade e por que natildeo tendo em vista o que interessa a Aristoacuteteles nesse

691 Cf Il Figino overo del fine della pittura Dialogo del Rever Padre D Gregorio Comanini Canonico Regolare Lateranense Ove quistionandosi sersquol fine della pittura sia lrsquoutile overo il diletto si tratta

dellrsquouso di quella nel Christianesimo Et si mostra qual sia imitator piugrave perfetto amp che piugrave diletti il Pittore

ouero il Poeta In Mantova Per Francesco Osanna Stampator Ducale MDLXXXXI [1591] pp 28-30 692 Cf Della perfetta poesia italiana spiegata e dimostrata con varie osservazioni da Lodovico Antonio

Muratori Tomo primo In Modena M DCCVI [1706] Nella Stampa di Bartolomeo Soliani Con Lic dersquo

Superiori p 60 cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies

principaes tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda

ediccedilatildeo hellip Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium

nil scribens ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo

virtus quo ferat error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno

MDCCLIX Com as licenccedilas necessarias p 72

223

nono capiacutetulo do tratado e a despeito do que nele defende o filoacutesofo a primazia da

histoacuteria O que diga-se natildeo estranham os leitores da Poetica drsquoAristotele uulgarizzata

de Ludovico Castelvetro (ca 1505-1571) sabedores de que ldquoprima di natura fu la veritagrave

che la verisimilitudine amp prima di natura fu la cosa rappresentata [a histoacuteria] che la cosa

rappresentante [a poesia]rdquo693

Isso posto talvez crentes como Ludovico Castelvetro nas luzes da histoacuteria e da

verdade sem a qual ldquola poesia camina in oscurissimerdquo694 Ludovico Antocircnio Muratori e

Francisco Joseacute Freire ensinem quase que ipsis litteris

che sempre un qualche vero serve di fondamento alle invenzioni e alle

dicerie poetiche e che queste non possono esser belle quando non ci

fanno apprendere qualche veritagrave o evidente e certa o pur possibile e

verisimile [hellip] Mille pezzi di Storia di Geografia di Filosofigravea daltre

Scienze e Arti mille descrizioni di luoghi fiumi animali e altre cose

verissime ci fa tutto giorno veder la Poesia e la maggior parte de

sentimenti chella usa contiene la veritagrave evidente e reale Il resto delle

altre invenzioni e descrizioni de gli altri avvenimenti e sentimenti

chella ci fa vedere e udire e chella industriosamente finge contiene

o dee contenere il vero possibile credibili e probabile Ove o il primo

vero o il secondo non si ravvisa dallrsquointelletto nella nobile e seria

Poesia anzi in ciascuna parte della Poesia egli puograve tenersi per certo

che non ne sentiremo diletto e che non ci appariragrave bella tuttocheacute il

nuovo e il maraviglioso in lei si ravvisi troppo dispiacendoci il falso

lrsquoimpossibile lrsquoincredibile o sia linverisimile Il Poeta adunque nobile

e serio sempre ci rappresenta cose veramente avvenute certe ed

esistenti o pur ne finge colla sua fantasia di quelle che veramente

possono o potevano debbono o dovevano essere e accadere

generando nella mente nostra o scienza ovvero opinione

que sempre algum verdadeiro serve de fundamento aacutes invenccedilotildees

poeticas e que estas naotilde podem ser bellas quando naotilde nos fazem

aprehender alguma verdade ou certa ou tambeacutem possivel e verosimil

693 Poetica drsquoAristotele uulgarizzata et sposta per Ludovico Castelvetro Stampata in Vienna drsquoAustria

per Gaspar Stainhofer lrsquoanno del Signore MD LXX [1570] p 3r 694 Idem p 4

224

[hellip] Todos os dias nos mostra a Poesia mil pedaccedilos de Historia de

Geografia de Filosofia e outras Sciencias e Artes mil descripccedilotildees de

lugares de rios de animaes e de outras cousas saotilde verdadeiras antes

pela mayor parte os conceitos de que ella usa conteacutem a verdade

evidente e real695 O resto das outras invenccedilotildees e descripccedilotildees dos

outros successos e conceitos que ella nos faz ver e ouvir e que

industriosamente finge conteacutem ou deve conter o verdadeiro possivel

crivel e provavel Onde o entendimento naotilde descobrir na seria e nobre

Poesia e em qualquer de suas partes ou o primeiro verdadeiro ou o

segundo he certo que a tal composiccedilatildeo naotilde causaraacute deleite nem

pareceraacute bella ainda que se encontre o novo e o maravilhoso porque

nos ha de causar o falso hum grande desagrado como cousa impossivel

incrivel ou inverossimil Por isso o Poeta que he nobre e serio sempre

nos representa as cousas verdadeiramente succedidas certas e

existentes ou tambem finge com a sua fantasia as que verdadeiramente

poacutedem ou podiaotilde devem ou deviaotilde ter e succeder causando deste

modo ou sciencia ou opiniaotilde em o nosso entendimento696

Ora assentado nessas liccedilotildees cujos pressupostos em torno do verdadeiro e do

verossiacutemil seratildeo pormenorizados pode Francisco Joseacute Freire afirmar as ldquofantasias

monstruosasrdquo a ldquofantasia depravadardquo a ldquoestragada imaginativardquo das quais

intelectualmente natildeo decorrem nem ldquoscienciardquo nem ldquoopiniaotilderdquo a fim de por consequecircncia

assegurar no discurso de censura essa afecccedilatildeo viciosa que diz ser proacutepria de poetas

tragicocircmicos Agrave maneira dos furiosos dos melancoacutelicos consoante a Arte poetica ou

regras da verdadeira poesia em geral satildeo eles impotentes ou obscurecidos de

entendimento governados por fantasia desmedida que nada apreende de verdadeiro de

quem resulta senatildeo que espectros equivalentes nos termos do vitupeacuterio agrave tragicomeacutedia

695 Cf Raphael Bluteau ldquoCoisa realrdquo eacute a ldquoque existe e tem fer natildeo imaginariardquo Vocabulario portuguez e latino aulico anatomico architectonico bellico botanico brasilico comico critico chimico dogmatico

dialectico dendrologico ecclesiastico etymologico economico florifero forense fructifero autorizado

com exemplos dos melhores escritores portugueses e latinos pelo padre D Raphael Bluteau Coimbra

no Real Collegio das Artes da Companhia de Jesu Com todas as Licenccedilas necessaacuterias Anno Domini

MDCCXIII [1713] p 289 696 Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes

tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip

Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens

ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo

ferat error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX

Com as licenccedilas necessarias p 72

225

a qual o tratado figura desarrazoada como contrafaccedilatildeo de viciosa invenccedilatildeo gecircnero sem

proporccedilatildeo sem ordem e sem unidade resultante da conjunccedilatildeo de ldquocousas entre si

discordes inimigas e incompativeisrdquo ambicionando contra artem a virtude da unidade

e a unidade da virtude a despeito das diferenccedilas que segundo o preceito fazem da

trageacutedia e da comeacutedia gecircneros de poema forjados conforme coacutedigos poeticamente

antipaacuteticos e opostos

Ora trageacutedia e comeacutedia ensina Francisco Joseacute Freire satildeo espeacutecies de ldquoPoesia

Dramatica ou representativardquo Concordam pois ambas consoante pressupostos

aristoteacutelicos no modo como se constroacutei a imitaccedilatildeo pois o poeta ldquoimita occultando-se a

si e introduzindo pessoas a fallarrdquo Ademais devem ambos os gecircneros ldquoter justa grandeza

verosimilhanccedila accidentes maravilhosos enredo unidade tanto na acccedilaotilde como no

tempo e lugar e a soluccedilaotilde que for necessaria ou verosimilrdquo697 Todavia prescritas como

opostas e antipaacuteticas como ldquoaves e serpentesrdquo como ldquocordeirinhos e tigresrdquo fazem-se

incompatiacuteveis trageacutedia e comeacutedia Entrecruzadas pois as categorias distintivas elencadas

pelo preceptista ou seja ldquomateriardquo ldquopessoasrdquo ldquodicccedilaotilderdquo ldquoaffectosrdquo e ldquofimrdquo essas

incompatibilidades de gecircnero podem-se sintetizar da seguinte maneira a trageacutedia fabula

ldquomateriardquo amiuacutede deduzida da histoacuteria tratando ldquode acccedilotildees horrorosas e lastimosasrdquo

sucedidas a ldquopessoasrdquo ilustres afamadas tais quais ldquoReys Principes e Personagens de

grande qualidade e dignidade cujas decadencias mortes desgraccedilas e perigosrdquo movam

ldquoaffectosrdquo ou seja ldquoexcitem terror e compaixaotilde nos animos do auditorio e os curem e

purguem destas e outras paixotildees servindo de exemplo a todos mas especialmente aos

Reys e pessoas da mayor authoridade e poderrdquo segundo o ldquofimrdquo proacuteprio ao gecircnero ao

passo que a comeacutedia plasma ldquomateriardquo alheia agrave verdade ldquofingida ao arbitriordquo do poeta

ou seja eacute ldquoimitaccedilaotilde de hum facto particular e de pouca importanciardquo sucedido a ldquopessoasrdquo

cujos nomes natildeo satildeo verdadeiros de maneira que em termos de ldquoaffectosrdquo ldquomova o risordquo

ldquoacabe com fim alegre e se encaminhe a ser util divertindo ao auditorio e inspirando o

amor aacute virtude e aversaotilde ao viciordquo segundo o ldquofimrdquo proacuteprio ao gecircnero698

697 Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes

tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip

Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens

ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo

ferat error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX

Com as licenccedilas necessarias pp 2 122 698 Proveacutem o itaacutelico da ediccedilatildeo transcrita Idem pp 13 21 114 120 e ss

226

Enfim na trageacutedia nada de ldquogloacuterias interinasrdquo poderia afirmar outro melancoacutelico

o narrador Bento Santiago Na comeacutedia nada de reis priacutencipes imperadores ou ldquooutras

pessoas desta esfeacuterardquo afirma o preceptista Francisco Joseacute Freire embora natildeo deixe de

apontar que contra ldquoesta regra peccaraotilde quasi sempre os Hespanhoesrdquo699 Enfim nada

de tragicomeacutedia figurada pelo tratadista portuguecircs jaacute se sabe como misto imperfeito e

vicioso porque em suas palavras dos opostos preceituados meio-termo natildeo eacute possiacutevel

Essa impossibilidade por ora sintetiza-se na afirmada carecircncia de verossimilhanccedila e de

decoro subjacentes agrave encenaccedilatildeo de gecircnero tambeacutem dramaacutetico em que ldquopessoas Reaes e

plebeas tenhaotilde hum mesmo caracter e lugarrdquo em que ldquocaiba o estylo grave e o humilde

e que a graciosidade de ditos e factos se una com a veneraccedilaotilde das pessoas e com a

severidade dos costumesrdquo700 Nada enfim de ldquovestir hum Rey com os vestidos de algum

homem da plebe para elle deste modo se aliviar do pezo da severidade Realrdquo jaacute que

segundo a Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral assim fazer seria como

ldquoformar hum Poema da Bucolica e da Eneida e intitulallo Buccoleroicordquo701

Condizentes com as distinccedilotildees de invenccedilatildeo visto que delas dependentes operam-

se entre os gecircneros confrontados trageacutedia e comeacutedia distinccedilotildees de elocuccedilatildeo de ldquodicccedilaotilderdquo

como quer Francisco Joseacute Freire Assim ldquoo estylo da Tragedia como conteacutem grandes

personagens e affectos violentos deve ser sublime e ornado de figuras rhetoricas que

saotilde as que melhor explicaotilde as paixotildeesrdquo ao passo que o estilo da comeacutedia a ele ldquosoacute

pertence huma locuccedilaotilde commũa natural facil e pura porque as pessoas que devem

representar nella haotilde de ser ordinarias ou de mediana condiccedilaotilde aacutes quaes soacute conveacutem

similhante estylo pois seria inverosimil que em acccedilotildees e sujeitos humildes houvesse

conceitos e vozes improprias da sua esfeacuterardquo702

699 Idem p 117 A afirmaccedilatildeo de Francisco Joseacute Freire parece ecoar Ignacio de Luzaacuten ldquoNo faltan Poetas

que han dado agrave sus dramas el titulo de Tragicomedias y algunos creen que se deben llamar assi todos

aquellos dramas que participan de Tragedia y Comedia yaacute por la mezcla de sucessos serios y alegres yagrave

por la diversa condicion de las personas ilustres y plebeyas Y en este sentido la mayor parte de nuestras

Comedias serian Tragicomediasrdquo [italico meu] La Poetica o reglas de la poesia en general y de sus principales especies Por Don Ignacio de Luzan Claramunt de Suelves y Gurrea Entre los Academicos

Ereinos de Palermo llamado Eligio Mepalino Con Licencia En Zaragoza Por Francisco Revilla vive en

la Calle de S Lorenzo Antildeo 1737 p 424 700 Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes

tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip

Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens

ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo

ferat error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX

Com as licenccedilas necessarias p 152 701 Idem p 154 702 Idem p 13 21 114 121

227

Nos capiacutetulos XXVIII e XXIX da Arte poetica ou regras da verdadeira poesia

em geral insistentemente isso se nota a asserccedilatildeo da oposiccedilatildeo entre trageacutedia e comeacutedia

delimita preceitos antiteacuteticos e estabelece desvios Jaacute se conhece esses desvios afirmam-

se da ordem do discurso tragicocircmico e tecircm como exemplum privilegiado Il Pastor Fido

que deve evidenciar a particularidade dos viacutecios do gecircnero Satildeo desvios que enformam o

monstrum

[] naotilde he muito verosimil a diccaotilde taotilde culta e as sentenccedilas profundas

porque os que fallaotilde sempre saotilde pessoas do campo ainda que naquella

Corte rustica sejaotilde principaes algumas dellas703

Para Francisco Joseacute Freire muito embora essa ldquoCorte rusticardquo seja alvo de

concessatildeo ao fim ela natildeo autoriza a elocuccedilatildeo culta Eacute sobretudo evidecircncia de

inadequaccedilatildeo Satildeo conhecidas as objeccedilotildees de mesmo teor aos poemas em registro grave

de D Luiacutes de Goacutengora A censura tal como posta opera argumentos conformes agraves criacuteticas

do italiano Gian Vicenzo Gravina (1664-1718) De acordo com o tratado Della ragion

poetica estampado em Roma em 1708 seria toleraacutevel a ldquonovitagrave drsquoinvenzionerdquo que

enreda ldquonelle arti cittadine anche i genj pastoralirdquo para que se teccedila a trama em cena se

nos poemas assim retoricamente inventados ainda que se figurassem pastores e ninfas

bastante esplecircndidos e argutos houvesse sobretudo ldquosemplicitagraverdquo704 Para Gian Vicenzo

Gravina poreacutem como para Francisco Joseacute Freire natildeo eacute isso o que Il Pastor Fido encena

[Giovanni Battista Guarini] trasportograve nelle capanne anche le corti

applicando nel suo Pastor-fido a quei personaggi le passioni e costumi

703 Idem p 161 O passo encerra-se com asserccedilatildeo seguinte ldquoMenos defeituosa he nesta parte a Aminta de

Tasso e a Filli di Sciro do Conde Bonarelli segundo a opiniaoacute dos melhores criticos Italianosrdquo Essa

consideraccedilatildeo eacute conforme o que se pode ler em Di Vicenzo Gravina giurisconsulto della ragion poetica

libri due In Roma presso Francesco Gonzaga MDCVIII Con Licenza de Superiori pp 200-1 O discurso da inverossimilhanccedila tem face semelhante em outro passo do mesmo tratado naquele em que Francisco

Joseacute Freire censura as chamadas ldquocomeacutedias modernasrdquo de comedioacutegrafos espanhoacuteis ldquoNo que respeita aacutes

inverosimilhanccedilas seria preciso hum distincto volume soacute para tratar dos costumes mal conservados ou

pessimamente introduzidos pois a cada passo as Damas saotilde taotilde eruditamente discretas elegantes e

conceituosas que poderiaotilde orar no Senado Romano deixando pelo artificioso o que he natural Os Lacayos

e Lacayas poacutedem tambem dictar em huma Cadeira de Rhetorica naotilde sendo verosimil que similhantes

pessoas fallem com clausulas taotilde limadas e conceitos taotilde estudados muito mais sendo de repente e

familiarmente fallo das Damas e Galans porque nos Criados de qualquer modo que seja sempre he contra

todo o verosimilrdquo Idem pp 130-1 704 Cf Di Vicenzo Gravina giurisconsulto della ragion poetica libri due In Roma presso Francesco

Gonzaga MDCVIII Con Licenza de Superiori p 200

228

delle anticamere e le piugrave artifiziose trame de i gabinetti con ponere in

bocca de i pastori precetti da regolare il mondo politico e delle

amorose ninfe pensieri sigrave ricercati che pajono uscite dalle scuole de i

presenti declamatori ed epigrammisti [] Non niego perograve chel

Guarini avendo introdotta prole di semidei ed imitato il costume di

quelle etagrave nelle quali i pastori al governo pubblico ed al sacerdozio

ascendeano non avea da conservar la semplicitagrave e meno la rozzezza

de i pastori ignobili705

[Giovanni Battista Guarini] transportou para as cabanas tambeacutem as

cortes aplicando em seu Pastor Fiel a esses personagens [pastores e

ninfas] as paixotildees e costumes das antecacircmaras e as mais artificiosas

tramas dos gabinetes ao pocircr na boca dos pastores preceitos para regular

o mundo poliacutetico e das amorosas ninfas pensamentos tatildeo estudados

que parecem elas saiacutedas das escolas dos atuais declamadores e

epigramistas [] Natildeo nego todavia que Guarini havendo introduzido

prole de semideuses e imitado o costume daquele tempo no qual os

pastores ao governo puacuteblico e ao sacerdoacutecio ascenderam natildeo tinha de

conservar a simplicidade e muito menos a rustiquez dos pastores

ignoacutebeis706

Gian Vicenzo Gravina eacute verdade natildeo recusa abrandar a avaliaccedilatildeo e como se pode

ler sucede-lhe mesmo afirmar que o poeta natildeo havia de conservar a simplicidade ou a

rusticidade dos pastores no entanto a praacutetica compositiva essa ldquonovitagrave drsquoinvenzionerdquo

segundo afirma soa-lhe ldquoaffettata e puerilerdquo As censuras de Francisco Joseacute Freire vez

ou outra aparentam ser mais incisivas que as de Gian Vicenzo Gravina embora como se

pocircde e pode-se notar sejam-lhes semelhantes as estrateacutegias de argumentaccedilatildeo Ambos os

preceptistas o italiano e o portuguecircs intentam estabelecer protocolos de leitura de Il

Pastor Fido poreacutem ainda no seacuteculo XVIII a despeito da contenda eacute esta obra afamada

705 Idem pp 200-201 706 A esse respeito propotildee Joatildeo Adolfo Hansen ldquoGuarini inventou pastores dotados de caracteres de

cortesatildeos ndash agudeza elegacircncia dissimulaccedilatildeo prudecircncia ndash por isso capazes de discutir conceitos poliacuteticos

proacuteprios da ldquorazatildeo de Estadordquo e outros assuntos graves e galantes como o amor imitadiacutessimos Da mesma

maneira os discursos e accedilotildees de suas ninfas agudas e elegantes seriam tambeacutem referecircncia obrigatoacuteria para

a construccedilatildeo poeacutetica das Anardas Tisbes Siacutelvias Cloacuteris Clorindas Dorindas Marfidas Glauras Amariacutelis

e Mariacutelias de muita poesia conceituosa e preciosa no seacuteculo XVII e da poesia aacutercade no XVIIIrdquo HANSEN

J A ldquoAs liras de Gonzaga entre retoacuterica e valor de trocardquo Via Atlacircntica Satildeo Paulo 1997 v 1 p 42

229

e as criacuteticas a ela satildeo feitas como se fosse de bom tom natildeo esquececirc-lo nem desconsideraacute-

lo para que agravequeles que as fazem natildeo se imputasse a pecha da necedade707

Naotilde duvido que por muitas circunstancias [a tragicomeacutedia Il Pastor

Fido] se fizesse merecedora deste applauso708 poreacutem igualmente tem

outras que devem ser censuradas no tribunal de huma critica seveacutera O

que geralmente tem arrebatado os animos he o estylo desta Obra e a

mim me parece que he a primeira cousa que naotilde deve ser louvada

porque a frase deste Poeta nem he tragica nem comica nem

tragicomica mas toda lyrica porque he toda cheya de brincos e

perfumes amorosos tudo he mel e assucar tudo cores e luzes e tudo

naotilde artificios mas huns esforccedilos artificiaes buscados de proposito e

collocados em lugares que nao saotilde devicircdos e por isso contrarios ou ao

decoro da Obra ou ao costume das pessoas ou ao verosimil da imitaccedilaotilde

Pareceraacute em noacutes talvez demasiado este juizo poreacutem lea esta Fabula o

Leitor sabio e desapaixonado que certamente encontraraacute nella ser

quasi tudo huma enfiada de Madrigaes amorosos unidos

successivamente huns aos outros709

707 Idem p 201 Contraponto a opiniatildeo como essa ainda que natildeo mire a tragicomeacutedia pastoral

especificamente lecirc-se nas Reflexoens sobre a Ecloga (1764) de Luiacutes Jozeacute Correa de Franccedila e Amaral sob

o nome aacutercade de Melizeu Cylenio ldquoAinda que a vida Pastoral vulgarmente se chama rustica com tudo nam se deve tomar este epiteto no sentido comum a palavra rustica significa couza do campo e vale o

mesmo que dizer vida rustica vida campestre A mayor parte das gentes faltas de critica julgam as couzas

pasadas pelas prezentes como nam conhecem a inocencia daqueles felices tempos tem diante dos olhos as

grosarias dos Pastores do noso seculo natildeo admitem nas obras Bucolicas senam um discurso rasteiro cheyo

de rusticidades e soacutemente privativo para as cousas que se pasam no campo assim negando aacute Poesia Pastoral

os poeticos ornatos roubatildeo-lhe ao mesmo tempo a sua mesma esenciardquo apud VALLE R M ldquoA ordem dos

afetos A bucoacutelica de Claacuteudio Manuel da Costardquo Floema Caderno de Teoria e Histoacuteria Literaacuteria Vitoacuteria

da Conquista Ano I n 1 2005 p 73 708 Eacute referecircncia ao passo anterior do tratado em que Freire afirma que Il Pastor Fido ldquotem ouvido no mundo

literario os mayores elogios e entendo que a mayor parte das naccedilotildees cultas a tem traduzida nos seus

idiomasrdquo Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda

ediccedilatildeo hellip Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium

nil scribens ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo

virtus quo ferat error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno

MDCCLIX Com as licenccedilas necessarias p 155 709 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar

vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse

decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat

error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com

as licenccedilas necessarias p 155-6

230

O juiacutezo de Francisco Joseacute Freire soacute corrobora o que jaacute se leu visto que amplifica

a monstruosidade do poema agrave luz de bases doutrinaacuterias antes desenredadas O acuacutemulo

desproporcionado que delineia as incongruecircncias de Il Pastor Fido e torna o gecircnero

tragicocircmica caricatura poeacutetica ganha mateacuteria liacuterica como que plumas coloridas em corpo

de cabeccedila humana e pescoccedilo equino se conveacutem fazer ecoar o proacutelogo da Epistula ad

Pisones de Horaacutecio Nos termos de Francisco Joseacute Freire tudo satildeo brincos perfumes

cores luzes tudo satildeo artifiacutecios elocutivos de matiz liacuterica por isso deslocados que natildeo

somente concorrem para a monstruosidade imputada ao gecircnero pois pendentes de

invenccedilatildeo que opera temas amorosos lidos na chave da extravagacircncia e da variedade

proacutediga710 senatildeo tambeacutem que a dissimulam ou assim intentam em vista dos efeitos que

o tratadista diz o ldquoestylo desta Obrardquo suscitar ao arrebatar os acircnimos da recepccedilatildeo

O corpo tragicocircmico assemelhado a ldquohuma enfiada de Madrigaes amorososrdquo711

cuja sucessividade parece alheia a qualquer razatildeo de disposiccedilatildeo faz-se assim de acordo

com esse juiacutezo de censura deleitaacutevel em sua doccedilura amorosa e para que o engano natildeo

perpetue praacutetica que iteradamente se diz viciosa exige ldquoLeitor sabio e desapaixonadordquo

o qual numa sapiente apatia ao poema de Giovanni Battista Guarini atribua a

inadequaccedilatildeo e natildeo ao juiacutezo de vitupeacuterio que a Arte poetica ou regras da verdadeira

poesia em geral enuncia Esse juiacutezo embora dito severo manteacutem o tom de ponderaccedilatildeo

que insiste na impropriedade do estilo de Il Pastor Fido mas natildeo contesta o pendor do

poeta

Consoante Francisco Joseacute Freire esse deleite amoroso eacute de moral duvidosa pois

censuraacuteveis os costumes de personagens impudicas escandalosas entregues aos apetites

de amor e agraves loucas paixotildees os quais no juiacutezo do tratadista Giovanni Battista Guarini

dramatiza712 Todavia no passo que se lecirc o discurso da vulgaridade do desregramento

710 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

195 711 O madrigal eacute para o tratadista de acordo com Antonio Sebastiano Minturno correspondente possiacutevel

dos epigramas antigos Nesse ponto entrecruzam-se as liccedilotildees que vituperam o poema de Guarini Escreve Francisco Joseacute Freire em outro passo da Arte Poetica ldquoQuanto a mim mais se parecem os Epigrammas

Latinos principalmente os Gregos com os Madrigaes Redondilhas e ainda Decimas do que com o Soneto

e para que se naotilde diga que este juizo he unicamente meu lea-se a Poetica Vulgar de Antonio Minturno

tratando do Soneto em que prova que naotilde este mas o Madrigal he o que poacutede corresponder aos antigos

Epigrammas Com effeito assim o praticaraotilde os Poetas de melhor nota entre os Italianos como se poacutede vecircr

na excellente Collecccedilaotilde que delles fez o eruditissimordquo Idem p 282 712 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar

vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse

decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat

error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com

231

da seduccedilatildeo da depravaccedilatildeo natildeo desliza para a elocuccedilatildeo natildeo a metaforiza agrave maneira como

amiuacutede se afirmam as censuras de ornamentos estiliacutesticos considerados excessivos e

entatildeo viciosos asianistas gorgianos figuradas essas censuras como afirma Jacqueline

Lichtenstein por meio de ldquoleacutexico do corpo prostituiacutedo do enfeite indecente ou da

sexualidade corrompida das mulheresrdquo713 na medida em que para Francisco Joseacute Freire

a elocuccedilatildeo de Il Pastor Fido eacute improacutepria porque deslocada natildeo porque seja desmedido o

emprego do ornamento

[] este Poeta [Giovanni Battista Guarini] tem huma locuccedilaotilde

perfeitamente culta e pura que tem admiraveis sentenccedilas aacutes quaes naoacute

repugna a natureza e excellentes imagens poeticas sobre huma

metrificaccedilaotilde que facilmente naotilde teraacute igual pela sua natural doccedilura e

igualdade assim todos estes excellentes requisitos se empregassem em

outra Fabula que naotilde fosse pastoril [] 714

O preceito proscreve o misto tragicocircmico Nestes termos de fato bom seria natildeo

fosse Il Pastor Fido tragicomeacutedia pastoral seria bom natildeo fosse o que eacute De acordo com

o discurso de censura da Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral em se

tratando do gecircnero pode-se presumir natildeo haacute adequaccedilatildeo possiacutevel natildeo haacute definiccedilatildeo que o

abarque carente de ser na condiccedilatildeo de fantasiosa contrafaccedilatildeo nem haacute em razatildeo disso

preceitos que o regrem feito desvio traacutegico porque partiacutecipe do cocircmico feito desvio

cocircmico porque partiacutecipe do traacutegico feito desvio traacutegico e cocircmico porque partiacutecipe do

liacuterico etc Assim em conformidade com o monstrum os desvios se acumulam e podem

eruditos como Francisco Joseacute Freire amparados em interpretaccedilatildeo da letra de autores

como Aristoacuteteles e Horaacutecio fazer desse gecircnero figura da inadequaccedilatildeo a dar forma a obras

cujas partes embora natildeo repugnem compotildeem-se repugnantemente

No mais jaacute se viu para Francisco Joseacute Freire fantasiar imagens fantaacutesticas

ajuizadamente segundo a orientaccedilatildeo do entendimento eacute princiacutepio incontornaacutevel para o

as licenccedilas necessarias pp 156-8 713 Cf LICHTENSTEIN J A cor eloquente Traduccedilatildeo de Maria Elisabeth de Mello e Maria Helena de Mello

Rouanet Satildeo Paulo Siciliano 1994 p 108 714 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar

vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse

decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat

error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com

as licenccedilas necessarias p 161

232

artiacutefice que mire construir de obra de poesia bem formada Essas imagens interpretam-se

consoante Horaacutecio como vecircnia poeacutetica como extravagante parte que porque arrazoada

se integra a poema proporcionado e que embora possa ser falsa agrave primeira vista assim

deva ser considerada apenas agrave primeira vista pois que convenha ser lida como figura

moralizada715 Caso seja compreendida todavia a extravagacircncia por assim dizer como

licenciosa vecircnia supotildee o princiacutepio artiacutestico em discussatildeo que entendida como

ldquomonstruosardquo ldquodepravadardquo ldquoestragadardquo a fantasia na medida em que submetido o

entendimento aos seus caprichos e dela seja resultante constructo poeacutetico tal os

ldquoespectros alheios agrave verdaderdquo do furioso que a saacutetira de Horaacutecio forja como jaacute se sabe Il

Pastor Fido segundo a Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral fornece

exemplo vicioso dessa natureza

Muito pudeacuteramos dizer a respeito de algumas scenas que introduz

demasiadamente affectadas como v g de eccos respondendo este aacute

voz como se fossem animados ou de versos feitos com tal artificio

que huns naotilde tem mais palavras do que outros e parece que para se

dizerem era preciso que os representantes tivessem antes fallado entre

si e concordado no que haviaotilde de dizer poreacutem jaacute destes defeitos

fallamos largamente no principio desta Arte tratando do verosimil e

das imagens fantasticas e intellectuaes ampc716

Parece desnecessaacuterio iterar que Francisco Joseacute Freire natildeo autonomiza as praacuteticas

e as recrimina porque artificiais pois sabe que natildeo haacute poesia aqueacutem ou aleacutem do artifiacutecio

Francisco Joseacute Freire avaliza na mesma Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em

geral ldquoimagens fantasticas artificiaesrdquo717 como excelentes de Virgiacutelio e de Francesco

715 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 p 295 716 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar

vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse

decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat

error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com

as licenccedilas necessarias p 160 717 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar

vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse

decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat

error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com

as licenccedilas necessarias pp 107 ss

233

Petrarca De Virgiacutelio das Bucoacutelicas refere trecircs passos No primeiro da Eacutecloga I Melibeu

e Tiacutetiro ambos poetas e pastores dialogam Diz Melibeu que quando ausente Tiacutetiro

porque ausente uma vez ido a Roma invocavam-no tristes pinheiros (ldquopinusrdquo) fontes

(ldquofontesrdquo) e arbustos (ldquoarbustardquo)

Mel Mirabar quid maesta deos Amarylli vocares

cui pendere sua patereris in arbore poma

Tityrus hinc aberat ipsae te Tityre pinus

ipsi te fontes ipsa haec arbusta vocabant (Ecl 1 38-39)

Mel Os ceacuteos pasmava-me invocares triste

Nrsquoarvore as frutas Amaryllis teres

Guardadas para Tityro pendiam

Estes pinheiros Tityro estas fontes

Estes soutos umbrosos te chamavam (vv 40-44)718

Nos demais passos das Eacuteclogas V e X de Virgiacutelio (cf Ecl 10 13-15 Ecl 5 27-

28) leem-se e manejam-se recursos poeacuteticos equivalentes Referindo-os avaliza pois

Francisco Joseacute Freire a prosopopeia isto eacute as fictiones personarum719 bem apropriadas

agrave poesia pastoral as quais efetuam a suauitas a glykytēs segundo leitores de Hermoacutegenes

como Antocircnio Lulio720 descompotildee no entanto usos sempre particulares que entende

serem um risco agrave verossimilhanccedila do poema exatamente como no caso da versificaccedilatildeo

dita artificiosa 721 assim considerada pois que vista como resultante de fantasia

718 Cf VIRGIacuteLIO Bucoacutelicas Traduccedilatildeo e notas de Odorico Mendes Ediccedilatildeo anotada e comentada pelo Grupo

de Trabalho Odorico Mendes Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2008 pp 30-1 719 Antonii Lulli Balearis de Oratione Libri Septem Quibus non modograve Hermogenes ipse totus uerumetiam

quicquid feregrave agrave reliquis Graecis ac Latinis de Arte dicendi tratactũ est suis locis aptissimagrave explicatur

Accessit etiam locupletiss Rerum amp uerborum toto hoc Opere memorabilium Index Basileae [ex officina

Ioannis Oporini impensis Henrici Petri] [Anno Salutis humanae 1558] p 477 720 Cf PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New Jersey Princeton University Press 1970 p 61 721 A versificaccedilatildeo de Il Pastor Fido eacute tambeacutem alvo de Francisco de Pina de Saacute e de Mello embora num

certo sentido em chave oposta Observe-se ldquoPudera trazer hum innumeravel esquadraotilde de Poetas Italianos

[dignos de imitaccedilatildeo] poreacutem bastaraacute que ponha na fronte o Pastor Fido do Cavalheiro Guarini e de melhor

vontade o puzera se em lugar dos versos soltos se mettessem os rimados neste docissimo e engenhoso

Poemardquo Theatro da eloquencia ou Arte de rhetorica fundada nos preceitos dos melhores Oradores Gregos

e Latinos por Francisco de Pina de Saacute e de Mello Moccedilo Fidalgo da Casa de Sua Magestade Fidelissima

e Academico da Academia Real da Historia Portuguesa offerecida ao Reverendissimo Senhor

Desembargador Joachim Salter de Mendoccedila Prior da Collegiada de S Christovaotilde de Lisboa Juiz dos

Cazamentos e Chanceller do Patriarcado ampc ampc Por Antonio da Silva e Costa Lisboa Na officina de

Francisco Borges de Sousa Anno de MDCCLXVI p 219

234

desgovernada que o entendimento natildeo controla Semelhantemente o mesmo argumento

relativo aos versos repete-se entre os preceitos do capiacutetulo XIII do tratado Da Eacutecloga

sua origem definiccedilatildeo estylo virtudes e vicios Francisco Joseacute Freire aparenta tomar a

dissimulatio artis como pressuposto da boa imitaccedilatildeo poeacutetica e avalia afetada a

versificaccedilatildeo que exibe o artifiacutecio e assim arrisca a naturalidade forjada e o decoro do

gecircnero

Naotilde lhe he menos conveniente o Amabecirco722 principalmente se hum

Pastor responder a outro em versos e numeros iguaes e aacutes vezes com

vozes e sentenccedilas similhantes ou tambeacutem contrarias poreacutem nisso deve

haver grande cuidado em ordem a que a Eacutecloga naotilde saya taotilde artificiosa

que se perca a pintura do verosimil representando-se o que naotilde se poacutede

naturalmente esperar de homens camponezes naotilde menos a respeito de

conceitos refinados que de palavras graves e imagens sublimes por

alheyas da mateacuteria de que se trata e da fantasia e entendimento de

quem a trata723

Satildeo os discursos com estatuto de verdade que controlam as desproporccedilotildees e a

defesa do verossiacutemil natildeo soacute repreende as vozes pastoris consideradas artificiosas em

ambos os exemplos mesmo que proacuteprias ao gecircnero bucoacutelico724 senatildeo tambeacutem bane a

tragicomeacutedia do elenco das praacuteticas poeacuteticas dignas de execuccedilatildeo725 Para Francisco Joseacute

Freire conforme as liccedilotildees de Ludovico Antocircnio Muratori o verossiacutemil como espeacutecie de

verdade possiacutevel provaacutevel e criacutevel institui-se mais detalhadamente nos seguintes termos

Jaacute temos dito que a principal base em que se funda a belleza das

imagens intellectuaes he ou a verdade ou a verosimilhanccedila interna

722 Ou ldquocanto amebeurdquo Como sintetiza Joatildeo Angelo Oliva Neto trata-se de canto ldquoentoado em turnos alternados por dois cantores ou corosrdquo Nesse papel observam-se os pastores referidos Cf CATULO O livro

de Catulo Traduccedilatildeo introduccedilatildeo e notas de Joatildeo Angelo Oliva Neto Satildeo Paulo Edusp 1996 p 213 723 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar

vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse

decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat

error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com

as licenccedilas necessarias p 242 724 Cf HASEGAWA A P Os limites do gecircnero bucoacutelico em Vergiacutelio um estudo das eacuteclogas dramaacuteticas Satildeo

Paulo Humanitas 2012 p 220 725 Idem ibidem

235

poreacutem naotilde basta soacute isto para que as reflexotildees e conceitos sejaotilde

completamente belos He tambem necessario que estes contenhaotilde outra

especie de verosimil a que chamaremos relativo porque diz relaccedilaotilde a

quem falla Este pode-se considerar de dous modos ou como verosimil

que conveacutem aacute qualidade condiccedilatildeo e graacuteo da pessoa que falla ou como

verosimil que conveacutem ao affecto e paixotildees que haacute ou se suppoem em

quem falla726

Vale rememorar que o termo ldquoverossiacutemilrdquo em liacutengua portuguesa onipresente nas

censuras recolhidas eacute latinismo e como escreve Angeacutelica Chiappetta guarda liccedilatildeo da

Rhetorica ad Herennium que verteu ao latim ueri simile o aristoteacutelico eikos cf Rhet

Her I 13)727 Na Rhetorica ad Herennium ueri simile eacute qualificativo de virtude da

narratio a qual se entenderaacute assim se respeitados os postulados do costume (mos) da

opiniatildeo (opinio) e da natureza (natura) e conservadas as duraccedilotildees do tempo (spatia

temporum) as dignidades das personagens (personarum dignitates) as razotildees das

deliberaccedilotildees (consiliorum rationes) e as oportunidades dos lugares (locorum

oportunitates) (cf Rhet Her I 16)

Em Aristoacuteteles na Retoacuterica eikos designa o que no mais das vezes sucede no

acircmbito do que eacute de um modo e poderia ser de outro (cf ARIST Rhet I 215-17 1357 a

34 ) Nos Analiacuteticos Anteriores eikos semelhantementeeacute proposiccedilatildeo endoxal ou

seja eacute enunciado do que no mais das vezes sucede conforme a doxa partilhada de todos

da maioria ou dos mais saacutebios Assim por exemplo eacute eikos que se detestem os invejosos

ou que se tenha afeto pelos amados (cf ARIST Rhet II 27 70 a 2-5) Na Poeacutetica de

modo similar eikos eacute espeacutecie do possiacutevel () consentacircneo ao poeta eacute o que

como tal no poema pode suceder e no mais das vezes sucede sem que o sucesso por

isso decorra ou da necessidade ( do inevitaacutevel porque senatildeo seria de outra

726 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar

vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse

decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat

error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com

as licenccedilas necessarias p 175 Como em casos anteriores Francisco Joseacute Freire verte agrave liacutengua portuguesa

o tratado de Ludovico Antocircnio Muratori 727 Cf CHIAPPETTA A Ad animos faciendos comoccedilatildeo feacute e ficccedilatildeo nas Partitiones oratoriae e no De officiis

de Ciacutecero Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 1997 [tese de doutorado] pp 91 146-148

236

espeacutecie ou do acaso () porque assim seria inerte a obra improacutepria agraves razotildees da arte

(cf ARIST Poet 9 1451 a 36 ss)

Isto eacute para Aristoacuteteles o poeta diferencia-se do historiador pelo trato natildeo com o

sucedido (ldquordquo) mas com o possiacutevel e o necessaacuterio (ldquo

rdquo) (cf ARIST Poet 9 1451 a 38) ou seja ldquosecondo il verisimile o la

necessitardquo de acordo com a Poetica drsquoAristotele uulgarizzata de Ludovico Castelvetro

(1570) Essa interpretaccedilatildeo em vulgar de Castelvetro filia-se a leituras latinas de

Aristoacuteteles que a precederam a saber os comentaacuterios de Francesco Robortello (1548) e

a traduccedilatildeo de Alessandro Pazzi (1536) Consoante as glosas de Robortello ao passo tal

como traduzido por Pazzi o poeta ldquodebet confingere secundum possibile (sic enim libet

appellare ) aut necessarium aut probabile amp verosimilerdquo ou seja ldquodeve

fingir segundo o possiacutevel (pois acha-se por bem assim designar to dynaton) ou necessaacuterio

ou provaacutevel e verossiacutemilrdquo728 Esses derradeiros termos latinos os neutros ldquoprobabilerdquo e

ldquoverosimilerdquo vecirc-se bem traduzem o neutro grego ldquoto eikosrdquo segundo equivalecircncia que

remonta a Ciacutecero para quem provaacutevel e verossiacutemil superpotildeem-se ldquoprobabilia uel ueri

similiardquo (cf CIC Acad fr 19)

Haacute muito mereceu a atenccedilatildeo de Geacuterard Genette a noccedilatildeo de dever nos processos

de verossimilhanccedila construiacutedos tanto na tragicomeacutedia Le Cid de Pierre Corneille (1606-

1694) publicada em 1637 quanto na nouvelle La Princesse de Clegraveves de Madame de La

Fayette (1634-1693) datada de 1678729 Geacuterard Genette no artigo ldquoVraisemblance et

motivationrdquo recorda as Reacuteflexions sur la poeacutetique drsquoAristote et sur les ouvrages des

poegravetes anciens et modernes (1674) do jesuiacuteta Reneacute Rapin (1621-1687) e atenta para a

distinccedilatildeo proposta nesta obra entre verdade e verossimilhanccedila qual seja ldquola veacuteriteacute ne

fait les choses que comme elles sont amp la vray-semblance les fait comme elles doivent

estrerdquo (a verdade faz as coisas apenas como satildeo amp a verossimilhanccedila as faz como devem

ser) de forma que ldquoquase sempre defeituosardquo a verdade visto afastadas as coisas do

728 Alessandro Pazzi assim traduz o texto gregoldquoSanegrave constat ex supradictis non poeumltae esse facta ipsa

propria narrare sed quemadmodũ vel geri quiuerint vel verisimile vel omnino necessarium fueritrdquo cf

Aristotelis poetica per Alexandrum Paccium patritium Florẽtinum in Latinum conversa Basileaelig M D

XXXVII [1537] p 13v Na versatildeo anocircnima portuguesa de 1779 lecirc-se a seguinte paraacutefrase ldquoHe manifesto

pelo que jaacute fica dito que o Officio do Poeta natildeo he referir as cousas que realmente acontececircratildeo mas sim

as que poderiatildeo ou deveriatildeo acontecerrdquo visto que o ldquoPoeta deve seguir ou a verosemelhanccedila ou a

possibilidade das cousasrdquo cf A Poetica de Aristoteles traduzida do Grego em Portuguez Lisboa Na Regia

Officina Typografica Anno de MDCCLXXIX [1779] Com licenccedila da Real Meza Censoria p 39 729 GENETTE G ldquoVraisemblance et motivationrdquo In Communications 11 1968 Recherches

seacutemiologiques le vraisemblable pp 5-21

237

mundo das ideias de que pendem ao passo que fonte de originais e de modelos a

verossimilhanccedila 730 Refere-o Geacuterard Genette eacute liccedilatildeo do padre Reneacute Rapin que o

verossiacutemil exemplar em oposiccedilatildeo ao maravilhoso definido como ldquotout ce qui est contre

le cours ordinaire de la naturerdquo (tudo o que eacute contra o curso ordinaacuterio da natureza) seja

ldquotout ce qui est conforme agrave lrsquoopinion du publicrdquo (tudo o que eacute conforme agrave opiniatildeo do

puacuteblico) 731 de modo que se constitua como criteacuterio de conformidade com o dever ser da

opiniatildeo

Nesses termos que natildeo se afastam das liccedilotildees da Rhetorica ad Herennium compor

obra de poesia cuja invenccedilatildeo esteja em concordacircncia com a doxa a opiniatildeo eacute operar natildeo

soacute em conformidade com a verossimilhanccedila (ldquovraisemblancerdquo) senatildeo tambeacutem com a

conveniecircncia (ldquobienseacuteancerdquo) 732 enlaccediladas ambas verossimilhanccedila e conveniecircncia

segundo a leitura de Geacuterard Genette no dever ser da mateacuteria poeacutetica pela duplicidade de

sentido do verbo ldquodeverrdquo eacute dever como obrigaccedilatildeo (ldquoobligationrdquo) eacute dever como

probabilidade (ldquoprobabiliteacuterdquo) 733 Isso significa fingir segundo a verossimilhanccedila e por

conseguinte estar em concordacircncia com a opiniatildeo do puacuteblico supotildee natildeo o acordo

democraacutetico das opiniotildees e das vontades mas o uso o costume (consuetudo) o que no

acircmbito linguiacutestico Quintiliano entende como ldquoconsenso dos instruiacutedosrdquo (consensus

eruditorum) como fundamento letrado comum constituiacutedo segundo a auctoritas734

730 Escreve o padre Reneacute Rapin ldquoLa veriteacute est presque toucircjours deacutefectueuse par le meacutelange des conditions

singulieres qui la composent Il ne naist rien au monde qui ne srsquoeacuteloigne de la perfection de son ideacutee en y

naissant Il faut chercher des originaux amp des modeles dans la vray-semblance amp dans les principes

universels des choses ougrave il nrsquoentre rien de materiel amp de singulier qui les corromperdquo [A verdade eacute quase sempre defeituosa pela mistura das condiccedilotildees singulares que a compotildeem Nada nasce no mundo que natildeo

se distancie da perfeiccedilatildeo de sua ideia ao nascer Eacute preciso buscar os originais amp os modelos no verossiacutemil

amp nos princiacutepios universais das coisas em que natildeo concorre nada de material amp de singular que as

corrompa] cf Reacuteflexions sur la poeacutetique drsquoAristote et sur les ouvrages des poegravetes anciens et modernes A

Paris chez Franccedilois Muguet Imprimeur du Roy amp de M lrsquoArchevesque rueuml de la Harpe agrave lrsquoAdotation de

trois Rois MDCLXXIV [1674] Avec Priuilege du Roy pp 56-7 731 Idem p 53 732 Na traduccedilatildeo em liacutengua portuguesa do artigo de Ceacutelia Neves Dourado bienseacuteance traduz-se por

ldquodececircnciardquo Optei por manter no passo referido o campo semacircntico da retoacuterica com o substantivo

ldquoconveniecircnciardquo sem que o pressuposto de conformidade com coacutedigos de moralidade ou de eacutetica se

perdesse cf GENETTE G ldquoVerossiacutemil e motivaccedilatildeordquo In BARTHES R et alli Literatura e semiologia Petroacutepolis Vozes 1972 pp 8-9 733 GENETTE G ldquoVraisemblance et motivationrdquo In Communications 11 1968 Recherches

seacutemiologiques le vraisemblable pp 5-6 734 Quintiliano escreve ldquoResta pois o uso Com efeito seria quase ridiacuteculo preferir a linguagem com a

qual os homens falaram agravequela com a qual falam E seguramente que outra coisa eacute uma linguagem antiga

senatildeo uma velha forma de falar Mas eacute necessaacuterio que se observe com criteacuterio e se defina em primeiro

lugar aquilo que tratamos e chamamos de ldquousordquo Se se tomar o nome tendo em vista o que fazem muitos

oferecer-se-aacute um preceito por demais perigoso natildeo apenas para o discurso mas tambeacutem o que eacute mais grave

para a vida Ora onde residiraacute a vantagem de tomar por bom aquilo que agrada agrave maioria Portanto da

mesma forma que depilar-se cortar os cabelos em camadas e beber em excesso nos banhos por mais que

tais coisas tenham invadido a cidade natildeo constituem uso porque nenhuma delas estaacute livre de censura ndash ao

238

Ora defensor do verdadeiro como fundamento das invenccedilotildees poeacuteticas Francisco

Joseacute Freire sempre nos passos de Ludovico Antocircnio Muratori faz da verossimilhanccedila

da probabilidade criteacuterio de adequaccedilatildeo que evidentemente estaacute embasado nesses

pressupostos de autoridade Todavia o faz em consonacircncia com distinccedilotildees especiacuteficas

que Aristoacuteteles Ciacutecero ou o Anocircnimo desconhecem jaacute que a liccedilatildeo de Francisco Joseacute

Freire potildee-se em termos segundo os quais emparelhada com a verdade a verossimilhanccedila

seja ldquointernardquo ou ldquorelativardquo Da primeira espeacutecie pouco diz o tratadista Da segunda

espeacutecie concernente ao respeito agraves personarum dignitates (cf Rhet Her I 16) diz mais

Pelo que respeita aos conceitos verosimeis aacute condiccedilaotilde de quem falla

quem naotilde sabe que as reflexoacutees e imagens que viraacuteotilde ao entendimento

de hum Pastor sempre creado nos bosques e apartado das Cidades haotilde

de ser differentes das que conceberaacute ou poderaacute conceber hum Cidadaotilde

hum Guerreiro hum Heroe e hum Principe

E arremata

Saotilde neste particular bem solidos os versos de Horacio735 ensinando-nos

que diversamente ha de fallar o servo do senhor e o moccedilo do velho

contraacuterio noacutes nos lavamos cortamos os cabelos e fazemos juntos as refeiccedilotildees segundo um determinado

costume ndash assim tambeacutem no falar natildeo se tomaraacute por regra de linguagem algo de vicioso que muitos adotaram Com efeito para natildeo falar do modo como os incultos habitualmente se expressam sabemos que

muitas vezes os teatros inteiros e toda a multidatildeo do circo se expressam rudemente Logo chamarei de

ldquouso da linguagemrdquo o consenso dos instruiacutedos do mesmo modo que o consenso dos bons se chama ldquomodo

de viverrdquo Traduccedilatildeo de Marco Aureacutelio Pereira cf PEREIRA M A Quintiliano Gramaacutetico o papel do mestre

de gramaacutetica na Institutio oratoria 2ordf ed Satildeo Paulo Humanitas 2006 pp 159-160 Em Latim lecirc-se

(QUINT Inst or I 6 43-45) ldquoSuperest igitur consuetudo nam fuerit paene ridiculum malle sermonem quo

locuti sint homines quam quo loquantur Et sane quid est aliud uetus sermo quam uetus loquendi consuetudo

Sed huic ipsi necessarium est iudicium constituendumque in primis id ipsum quid sit quod consuetudinem

uocemus Quae si ex eo quod plures faciunt nomen accipiat periculosissimum dabit praeceptum non

orationi modo sed quod maius est uitae unde enim tantum boni ut pluribus quae recta sunt placeant

Igitur ut uelli et comam in gradus frangere et in balneis perpotare quamlibet haec inuaserint ciuitatem non erit consuetudo quia nihil horum caret reprensione (at lauamur et tondemur et conuiuimus ex

consuetudine) sic in loquendo non si quid uitiose multis insederit pro regula sermonis accipiendum erit

Nam ut transeam quem ad modum uulgo imperiti loquantur tota saepe theatra et omnem circi turbam

exclamasse barbare scimus Ergo consuetudinem sermonis uocabo consensum eruditorum sicut uiuendi

consensum bonorumrdquo 735 Em traduccedilatildeo de Francisco Joseacute Freire a liccedilatildeo de Horaacutecio pode-se assim sintetizar ldquoDemos a cada idade

o que lhe toca Ou como verdadeiro ou verosimil Senaotilde de velho e moccedilo home e menino Veremos

confundidos os costumesrdquo (cf HOR AP 176-78) cf Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e

Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC

LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo

dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D Henrique pelo mesmo Author p 115

239

Pelo que pertence ao verosimil que conveacutem aacutes paixotildees da pessoa que

falla todos igualmente sabem que as imagens que saotilde proprias a quem

falla sem paixaotilde alguma ficaraacuteotilde improprias a quem discorre movido de

algum affecto violento Humas devem ser as imagens para aquelle que

se introduz a fallar com pensamentos meditados e outras as que

conveacutem aacutequelle que se finge discorrer de repente e com discurso

continuado como succede na conversaccedilaotilde civil736

Esses postulados tal como propotildee Joatildeo Adolfo Hansen fornecem explicaccedilotildees ou

causas agrave mateacuteria narrada (ou dramatizada) e operam como princiacutepios de adequaccedilatildeo do

que ldquose considera natural habitual e normal que aconteccedila na realidade e como realidaderdquo

Nesses termos agrave luz dos passos tratadiacutesticos todos referidos nas palavras de Hansen em

concordacircncia com a reflexotildees citadas de Geacuterard Genette ldquoa verossimilhanccedila eacute uma

relaccedilatildeo de semelhanccedila entre discursosrdquo 737 e assim estabelecida estabelecidos os

pressupostos de semelhanccedila depreende-se que a ldquoficccedilatildeo eacute verossiacutemil quando o leitor

reconhece os coacutedigos que julga verdadeiros e que satildeo aplicados pelo autor para motivar

as accedilotildees da histoacuteriardquo738 Ou em chave inversa a ficccedilatildeo eacute inverossiacutemil caso esses coacutedigos

convencionalmente natildeo se reconheccedilam e desse modo eacute dita inacreditaacutevel Angeacutelica

Chiappetta lembra de maneira muito precisa que natildeo se contrapotildee o verossiacutemil ao

verdadeiro mas ao inacreditaacutevel ao incriacutevel (ldquordquo) incapaz como tal de

efetuar-se persuasivamente739

Ora as desrazotildees do monstrum satildeo particulares como particulares as razotildees que

o enunciam Agrave luz do conjunto de argumentos referidos desde o iniacutecio deste capiacutetulo

aparenta esforccedilar-se Francisco Joseacute Freire para declarar a impossibilidade de que a

tragicomeacutedia seja passiacutevel de significaccedilatildeo porque afirmando-a desarrazoada subtrai-lhe

as razotildees No mais as razotildees de Francisco Joseacute Freire mostram avanccedilar no seacuteculo XVIII

736 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar

vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse

decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat

error Horat in Poetic Tomo I Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com

as licenccedilas necessarias pp 175-6 737 Ver TODOROV T ldquoIntroduccedilatildeo ao verossiacutemilrdquo In Poeacutetica da prosa Traduccedilatildeo de Claudia Berliner Satildeo

Paulo Martins Fontes 2003 p 116 738 HANSEN J A ldquolsquoO imortalrsquo e a inverossimilhanccedilardquo Teresa revista de Literatura Brasileira 67 Satildeo

Paulo 2006 pp 71-72 739 Cf CHIAPPETTA A Ad animos faciendos comoccedilatildeo feacute e ficccedilatildeo nas Partitiones oratoriae e no De officiis

de Ciacutecero Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 1997 [tese de doutorado] p 149

240

em terras ibeacutericas debate de longa vigecircncia acerca da legitimidade da tragicomeacutedia

reverberando liccedilotildees que remontam aos fins do seacuteculo XVI anteriores mesmo agrave estampa

de Il Pastor Fido As censuras que Francisco Joseacute Freire propotildee asseveram-se em larga

medida amparadas na voz do cipriota Giason Denores (ca 1530-1590) ou Jason de Noris

como grafa o letrado portuguecircs professor da Universidade de Paacutedua e tambeacutem

comentador da Epistula ad Pisones740

Foi impresso em 1587 em Paacutedua o Discorso di Iason Denores intorno a quersquo

Principii Causae et Accrescimenti che la Commedia la Tragedia et il Poema Heroico

Ricevono dalla Filosofia Morale amp Ciuile amp darsquo Gouernatori delle Republiche Dele

depreendem-se doutrina da qual Freire eacute conhecedor e censura de que sua Arte Poetica

se mostra dependente Os argumentos satildeo conhecidos Supondo que o corpo da Poeacutetica

aristoteacutelica constitua-se da trageacutedia da comeacutedia e do poema heroico porque se proponha

o estagirita a tratar dessa sorte de gecircnero de poemas mesmo que outros refira 741 e

supondo que nem Aristoacuteteles nem outro ldquohonoratordquo tratadista antigo que lhe seja

conhecido trataram da tragicomeacutedia742 Giason Denores assevera a tragicomeacutedia como

ldquodisproportionato componimento misto di due contrarie attion amp qualitagrave di personerdquo

cuja faacutebula porque resultante de mistura de accedilotildees e de personagens traacutegicas e cocircmicas eacute

necessariamente dupla e oposta carente de unidade jaacute que a trageacutedia sabe-se bem fabula

ldquopersone illustrirdquo cujas accedilotildees arrematem ldquonellrsquoauuersa fortunardquo ao passo que a comeacutedia

fabula ldquopersone priuaterdquo particulares cujas accedilotildees arrematem ldquoin allegrezzardquo743

Assevera tambeacutem Giason Denores que no acircmbito do estilo a trageacutedia opera ldquoidea

del dir magnifica amp grauerdquo ao passo que a comeacutedia opera ldquoidea del dir tenue amp humilerdquo

740 Cf In Epistolam Q Horatii Flacci De Arte Poeumltica Iasonis de Nores Ciprij ex quotidianis Tryphonis

Cabrielij sermonibus interpretatio Parisiis Apud uiduam Mauricij agrave Porta in clauso Brunello sub signo

D Claudij 1554 741 ldquo[] Aristoteles quantunque nella sua poetica nominasse diuerse sorti di poesie non perograve propone di

trattar si non della comedia della tragedia amp del poema heroico amp con queste tre sole constituisce il

corpo dellarte poeticardquo [ldquoAristoacuteteles embora em sua Poeacutetica nomeasse diversos tipos de poesia natildeo se

propotildee a tratar poreacutem senatildeo que da comeacutedia da trageacutedia amp do poema heroico amp com estes trecircs somente constitui-se o corpo da arte poeacuteticardquo] Discorso di Iason Denores intorno a quersquo Principii Causae et

Accrescimenti che la Commedia la Tragedia et il Poema Heroico Ricevono dalla Filosofia Morale amp

Ciuile amp darsquo Gouernatori delle RepublicheAllrsquoIlustrissimo et Molto Reverendo Signor Abbate Galeazzo

Riario Con Priuilegio In Padova Apresso Paulo Meieto 1587 p 37v 742 Idem p 38v 743 Idem pp 38f 38v 39f 41v 42f Em siacutentese ldquoLa Tragedia egrave rappresentation di una atroce amp

misegraverabile attione di persone illuftri fra buone amp cattiue che per qualche errore humano cominciando da

allegrezza finisce in infelicitagrave nello spacio di un giro di Sole composta ograve con uerfi sciolti endecasillabi ograve

con uersi di sette syllabe ograve con ambidue mescolatamente con parole altiere amp graui per purgar gli

spettatori per mezzo del diletto dal terrore amp dalla misericordia amp per fargli abhorrir la uita de tiranni

amp de piu potentirdquo Idem p 36v

241

que lhes satildeo proacuteprias A mistura como se sabe diz-se proscrita ldquoper loro natura per

ragione per giudici di Demetrio fallereo non possono essere congiotildete in vno istesso

corpo ne in vna istessa compositionerdquo744 Desse modo para Giason Denores porque

indecorosa e inverossiacutemil como ldquocomposition mostruosardquo a tragicomeacutedia consoante

criteacuterios que o tiacutetulo do discurso enuncia ldquocontraria arsquo principi dersquo philosophi morali amp

civili amp dersquo gouernatori delle republiche tanto ben fondate a beneficio publicordquo745 Eacute

pressuposto que atravessa a argumentaccedilatildeo a sujeiccedilatildeo da poeacutetica e da retoacuterica agrave filosofia

moral norteadora do ofiacutecio do perfeito poeta que mira sempre interessado tornar

virtuosos os cidadatildeos e feliz a repuacuteblica746

O Discorso di Iason Denores assume a insujeiccedilatildeo filosoacutefica a contrariedade moral

da tragicomeacutedia declarando-a gecircnero que natildeo traz benefiacutecio algum a quem vive na cidade

nem tem fim que seja uacutetil a res publica pois que misto Afinal no entendimento de Giason

Denores se constituiacuteda a faacutebula pastoral em moldes traacutegicos da ventura agrave desventura

haveria um ldquotaacutecito conviterdquo a que os homens deixassem a cidade enamorados da vida no

campo Demais natildeo supotildee pastores ou camponeses entre ldquobuone amp cattiuerdquo entre ldquobons

e mausrdquo nem bem acomodados agraves accedilotildees traacutegicas nem bem acomodados agraves accedilotildees cocircmicas

constituintes como supotildee o tratadista do misto 747 Na trageacutedia deformam-se essas

personagens se tornadas capazes do terriacutevel e do miseraacutevel na comeacutedia se tornadas

capazes do ridiacuteculo e a elas natildeo conveacutem a faceacutecia mas a ldquoRusticitagraverdquo porque natildeo lhes

cabe a ldquoVrnabitagraverdquo isto eacute ldquoun tal abito di motteggiar e di star in giuocordquo (um certo haacutebito

de motejar e de dar ao jogo) afirma na Apologia Giason Denores 748

Todavia o Discorso di Iason Denores natildeo demorou a receber refutaccedilatildeo O

contendor Giovanni Battista Guarini anonimamente publicou no ano seguinte em 1588

em Ferrara Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le

tragicomedie e le pastorali in un suo discorso di poesia749 Trata-se de peccedila no gecircnero

744 Idem p 39v [ldquopela sua natureza pela razatildeo pelo juiacutezo de Demeacutetrio de Falero natildeo podem estar conjuntas

em um mesmo corpo nem em uma mesma composiccedilatildeordquo] 745 Idem pp 41v-42f [ldquocontraria aos princiacutepios dos filoacutesofos morais amp civis amp dos governadores das

repuacuteblicas tanto bem fundadas em benefiacutecio puacuteblicordquo] 746 Idem pp 2f 42f Teresa Chevrolet articula a contenda que opocircs Giason Denores a Giovanni Battista

Guarini ao que define como ldquocette massive marque morale [qui] restera longtemps imprimeacutee dans la

reacuteflexion poeacutetiquerdquo Os comentaacuterios averroiacutestas agrave Poeacutetica aristoteacutelica satildeo por assim dizer o ponto de partida

da reflexatildeo da estudiosa Cf Lideacutee de fable Theacuteories de la fiction poeacutetique agrave la Renaissance Genegraveve

Droz 2007 pp 337 e ss 747 Idem p 40f 748 Idem p 41f Apologia p 321 749 Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le tragicomedie e le pastorali

in un suo discorso di poesia Con privilegio In Ferrara Ad Instanza di Alfonso Caraffa 1588 Con licenza

242

dialoacutegico que dramatiza a controveacutersia e a integra por meio da qual sob a persona de

Verrato750 Giovanni Battista Guarini responde a Giason Denores e defende a fatura

tragicocircmica Houve resposta escrita ao poeta estampada em Paacutedua em 1590 sob o tiacutetulo

de Apologia contra lrsquoauttore del Verrato di Iason Denores di quanto ha egli detto in un

suo Discurso delle Tragicommedie e delle Pastorali O passo seguinte da dissensatildeo foi

dado por Giovanni Battista Guarini em 1593 quando impressa outra contestaccedilatildeo agraves

invectivas Il Verrato secondo ovvero replica dellAttizzato Accademico Ferrarese in

defesa del Pastor Fido contra la seconda scrittura di Messer Iason de Neres intitolata

Apologia Dessa vez natildeo houve resposta de Giason Denores falecido em 1590 ano em

que impresso Il Pastor Fido todavia a controveacutersia ainda motivou natildeo soacute mais ataques

os Discorsi poetici ne quali si discorreno le piu principali questioni de poesia amp si

dichiarano molt luoghi dubi amp difficili intorno allarte del poetare Secondo la mente de

Aristotile di Plantone e di altri buoni auttori (1600) de Faustino Summo e as

Considerationi di Giovanni Pietro Malacreta sopra Il Pastor Fido tragicomedia

pastorale del molto ilustre Sig Cavalier Battista Guarini (1600) de Giovanni Pietro

Malacreta como tambeacutem mais defesas a Risposta alle Considerationi o dubbi

dellEccmo Sig Dottor Malacreta sopra Il pastor fido con altre varie dvbitationi tanto

contra detti dubbi e considerationi quanto contra listesso Pastor fido (1600) de Paolo

Beni e a Difesa del Pastor Fido tragicommedia pastorale di Battista Guarini da quanto

gli egrave stato scritto contro da gli Ecc SS Faustin Summo e Gio Pietro Malacreta (1601)

de Orlando Pescetti751

Ora interessa a refutaccedilatildeo agrave tese de Giason Denores aos argumentos que Francisco

Joseacute Freire opera na medida em que no diaacutelogo Giovanni Battista Guarini defende a

legitimidade da tragicomeacutedia como gecircnero misto amparado natildeo apenas mas tambeacutem

nas prescriccedilotildees retoacutericas que ensinam o Peri hermēneias e o Peri ideōn752 Recorde-se Il

Verrato estrutura-se como diaacutelogo ou mais precisamente como exposiccedilatildeo intercalada de

de Superiori 750 Marvin Carlson afirma tratar-se de nome de um ator contemporacircneo de Guarini Cf CARLSON M

Teorias do teatro estudo histoacuterico-criacutetico dos gregos agrave atualidade Traduccedilatildeo de Gilson Ceacutesar Cardoso de

Souza Satildeo Paulo Editora da Unesp 1997 p 49 751 Cf CARLSON M Teorias do teatro estudo histoacuterico-criacutetico dos gregos agrave atualidade Traduccedilatildeo de

Gilson Ceacutesar Cardoso de Souza Satildeo Paulo Editora da Unesp 1997 p 49 ss Depois de finalizada a redaccedilatildeo

desta versatildeo do texto tive acesso a The critical fortune of Battista Guarinirsquos ldquoIl Pastor Fidordquo de Nicolas

J Perella obra de 1973 que esmiuacuteccedila a recepccedilatildeo histoacuterica da tragicomeacutedia Nesse sentido o passo da tese

poderaacute ser revisto e pormenorizado 752 Quanto a Hermoacutegenes PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style

Princeton New Jersey Princeton University Press 1970 pp 20 34-5

243

afirmaccedilotildees e contestaccedilotildees de perguntas e respostas atinentes ao caso em questatildeo ora na

voz da personagem Giason Denores cujos enunciados se compotildeem da transcriccedilatildeo do

Discorso di Iason Denores ora na voz de Verrato que procura natildeo soacute rebater o

aristotelismo estrito do contendor ou o que toma por equivocada interpretaccedilatildeo de

Aristoacuteteles senatildeo tambeacutem evidenciar passo a passo o despropoacutesito das censuras

arroladas

Ora o nome de Demeacutetrio leu-se jaacute no vitupeacuterio agrave tragicomeacutedia Para contestar a

interpretaccedilatildeo que dele o Discorso di Iason Denores faz Giovanni Battista Guarini

transcreve no diaacutelogo o passo que o apresenta

Den Oltreciograve inquanto ancho allelocutione la Comedia deue esser

scritta cotilde la idea del dir tenue amp humile conueniente alla qualitagrave delle

persone che in essa sono introdotte amp la Tragedia con la Idea del dir

magnifica amp grave Hor come eacute possibile adattar bene una

composition con idee di dir in tutto opposite amp contrarie che per loro

natura per ragione per giudicio di Demetrio Fallereo non possono

esser congionte in un istesso corpo ne in una istessa compositione753

Denores Ademais ainda quanto agrave elocuccedilatildeo a Comeacutedia deve ser escrita

com a ideia do dizer tecircnue amp humilde conveniente agrave qualidade das

pessoas que nela satildeo introduzidas amp a Trageacutedia com a ideia do dizer

magniacutefica amp grave Ora como eacute possiacutevel adaptar bem uma composiccedilatildeo

com ideias de dizer em tudo opostas amp contraacuterias que por sua natureza

por razatildeo por juiacutezo de Demeacutetrio de Falero natildeo podem ser reunidas em

um mesmo corpo nem em uma mesma composiccedilatildeo

Poderiam ser lidas no Discorso di Iason Denores as mesmas palavras Ali a

interrogaccedilatildeo que arremata a liccedilatildeo eacute recurso de progressatildeo argumentativa que soacute faz

enredar as censuras agrave tragicomeacutedia Aqui deslocada por Giovanni Battista Guarini a voz

de Denores a interrogaccedilatildeo ressignifica-se assume papel inquisitivo visto construir-se

interlocuccedilatildeo proacutepria do diaacutelogo e fica a deixa para a contraposiccedilatildeo de Verrato Essa

753 Idem p 35v Discorso di Iason Denores 1587 p 39v Manteacutem-se o itaacutelico do original que distingue

graficamente as vozes das personagens do diaacutelogo

244

contraposiccedilatildeo pesa a assertiva concernente agrave elocuccedilatildeo cocircmica segundo a qual ldquola

Comedia deue esser scritta cotilde la idea del dir tenue amp humilerdquo Adverte Verrato haver

entre a ldquoComedia vecchiardquo de Aristoacutefanes e a ldquoComedia nuouardquo de Menandro e Terecircncio

matizes de estilo que diversificam as ldquoidee del dir tenue amp humilerdquo haacute tenuidades haacute

humildades sempre em relaccedilatildeo pode-se presumir Como tambeacutem haacute magnificecircncias haacute

gravidades Dessa maneira plena de maledicecircncia e de riso eacute a ldquoComedia vecchiardquo mais

grave que ela e menos vulgar eacute a ldquoComedia nuouardquo todavia ainda assim eacute modesta

ante a gravidade do ldquostile piugrave nobilerdquo754

Embasando-se em Demeacutetrio Giovanni Battista Guarini maneja as armas do

adversaacuterio755 Como se lecirc e o diaacutelogo deixa ler eacute embate incessante entre interpretaccedilotildees

de autoridades retoacutericas e poeacuteticas que se encena Supotildee ademais o apologista comeacutedias

bem temperadas e ao fazecirc-lo desloca a iterada diferenccedila entre trageacutedia e comeacutedia que

atravessa as censuras de Giason Denores Desloca-a porque natildeo as subsume a ldquoComedia

vecchiardquo e a ldquoComedia nuouardquo agrave dicotomia estiliacutestica e subentende que a identidade de

gecircnero a qual faz concordes os poemas de Aristoacutefanes Menandro e Terecircncio natildeo anula

as diferenccedilas de estilo que lhes satildeo caracteriacutesticas ou em outra chave entende que as

diferenccedilas de estilo as quais tornam mais ou menos graves as comeacutedias natildeo se sujeitam

agraves diferenccedilas de gecircnero

A argumentaccedilatildeo de Giovanni Battista Guarini obviamente tem alvo preciso

Matizada a antinomia entre os gecircneros traacutegico e cocircmico desloca-se a tragicomeacutedia do

lugar imperfeito que o arrazoado de vitupeacuterio lhe impocircs Daiacute a afirmaccedilatildeo da virtude da

unidade como argumento de desfiguraccedilatildeo do monstrum tragicocircmico

Certamente haureste ragione se la Tragicomedia essendo comrsquoegrave nel

vero vna hauesse due stili tra loro oppositi amp repugnanti amp sella

fosse composta di Tragedia amp Comedia amp vsasse stili diuersi lerror

sarebbe nella fauola mal tessuta amp non ne gli stili variati Houui detto

amp vel replico che la Tragicomedia egrave vna amp ha vna forma sola da per

754 Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le tragicomedie e le pastorali

in un suo discorso di poesia Con privilegio In Ferrara Ad Instanza di Alfonso Caraffa 1588 Con licenza

de Superiori p 35v 755 Cf PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New Jersey

Princeton University Press 1970 p 35

245

se la quale per esser mista come di sopra vi segrave mostrato riceue

ancora vna Idea di dir mista756

Certamente teriacuteeis razatildeo se a Tragicomeacutedia sendo una como na

verdade o eacute tivesse dois estilos entre si opostos amp repugnantes amp se

ela fosse composta de Trageacutedia amp Comeacutedia amp usasse estilos diversos

o erro estaria na faacutebula mal tecida amp natildeo nos estilos variados Eu disse

amp repito que a Tragicomeacutedia eacute una amp tem por si mesma uma forma

apenas a qual por ser mista como acima vos foi mostrado recebe

entatildeo uma Ideia de dizer mista

Giovanni Battista Guarini natildeo desdiz a unidade como pressuposto de virtude

poeacutetica reafirma-a e concede que seria monstruosa e repugnante a fatura tragicocircmica e

mau poeta o artiacutefice que compotildee no gecircnero se resultasse a tragicomeacutedia de trabalho

artiacutestico tal qual supotildee Giason Denores tal qual supotildee Francisco Joseacute Freire a saber se

fosse ela ldquocomposta di Tragedia amp Comediardquo feito poema de ldquofauola mal tessutardquo de

faacutebula duacuteplice traacutegica e cocircmica repugnante em sua inadequaccedilatildeo Natildeo desdiz Giovanni

Battista Guarini a virtude da unidade assevera-a poreacutem em conformidade com

Hermoacutegenes ou Demeacutetrio de modo a tomar como alvo as razotildees fundamentais das

censuras agrave tragicomeacutedia

Pode-se aceitar nesses termos a afirmaccedilatildeo da unidade como pressuposto de

legitimaccedilatildeo da tragicomeacutedia Ricardo de Turia757 por exemplo no Apologeacutetico de las

comedias espantildeolas que serve de proacutelogo agrave recolha Norte de la Poesia Espantildeola de

Aurelio Mey impressa em Valecircncia de 1616 mais de duas deacutecadas apoacutes a contenda que

opocircs Giason Denores e Giovanni Battista Guarini afirma que o poema misto tragicocircmico

inclui

la mezcla de cosas tan distinctas y varias y la vnion dellas no en

forma de composicion (como algunos han pensado) sino de mixtura

756 Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le tragicomedie e le pastorali

in un suo discorso di poesia Con privilegio In Ferrara Ad Instanza di Alfonso Caraffa 1588 Con licenza

de Superiori p 36r 757 Finalizada a redaccedilatildeo deste capiacutetulo pude ler Il Compendio della poesia tragicomica de Giovanni

Battista Guarini impresso em 1601 Nele pude saber que os argumentos de Ricardo de Turia todos

retomam este resumo do poeta italiano posterior a Il Verrato

246

porque va mucho del vn termino al outro doctrina es del Philosopho

[Aristoacuteteles] en el primero de Generatione muy vulgar donde muestra

la diferencia que hay entre lo mixto y lo compuesto758

a mescla de coisas tatildeo distintas e varias e a uniatildeo delas natildeo em forma

de composiccedilatildeo (como alguns pensaram) senatildeo de mistura porque haacute

muito de um termo a outro doutrina eacute do Filoacutesofo [Aristoacuteteles] no

primeiro De Generatione muito conhecido onde mostra a diferenccedila

que haacute entre o misto e o composto759

Essa diferenccedila assim se argumenta

Porque en lo mixto las partes pierden su forma y hazen vna tercer

materia muy diferente y en lo compuesto cada parte se conserua ella

misma como antes era sin alterarse ni mudarse antes bien se

compone y junta y lo que nace desta composicion no es vn tercero

alterado debaxo de diferente forma pero son dos cuerpos que

trocaacutendose no se compadecen entre si y se quedan los mesmos que

eran antes assi en acto como en potencia Lo mixto podemos

comparar (porque exemplificando declararemos mejor nuestro

concepto) al fabuloso Hermofrodito este de hombre y muger formaua

vn tercero participante de la vna y otra naturaleza de tal manera mixto

que no se podia separar la vna de la outra Lo cotildepuesto es semejante

a vn hombre que se abraccedila con vna muger y desasidos cada vno buelue

en su ser porque sabida cosa es que el abraccedilarse no los confunde de

manera que assi el hombre como la muger dexen de ser el mismo

hombre y la muger misma que eran antes y qualquiera dellos no

guarde y reconosca entera su naturaleza su ser y su forma760

758 Apud Norte de la Poesia Espantildeola Illustrado del sol de doze Comedias (que formam segunda parte) de

Laureados Poetas Valencianos y de doze escogidas Loas y otras Rimas a varios sugetos Sacado a luz

aiustado con sus originales por Aurelio Mey Dirigido a Dontildea Blanca Ladron y Cardona hija primogenita

de Don Iayme Zeferino Ladron de Pallas Conde de Sinarcas Vizconde de Chelua Sentildeor de Beniarbech y

Beniomer y Sentildeor de Payporta Antildeo 1616 Con privilegio Impreso en Valencia En la Impresion de Felipe

Mey junto a S Iuan del Hospital A costa de Iusepe Ferrer Mercader de libros delante la Diputacion sp 759 Traduccedilatildeo nossa 760 Idem ibidem

247

Porque no misto as partes perdem sua forma e fazem uma terceira

mateacuteria muito diferente e no composto cada parte se conserva ela

mesma como antes era sem alterar-se nem mudar-se antes bem se

compotildee e junta e o que nasce desta composiccedilatildeo natildeo eacute um terceiro

alterado sob diferente forma mas satildeo dois corpos que trocando-se natildeo

se compadecem entre si e se manteacutem os mesmos que eram antes tanto

em ato como em potecircncia O misto podemos comparar (porque

exemplificando declararemos melhor nosso conceito) ao fabuloso

Hermafrodita este de homem e de mulher formava um terceiro

participante de uma e outra natureza de tal maneira misto que natildeo se

podia separar uma da outra O composto eacute semelhante a um homem que

se abraccedila com uma mulher e desasidos cada um volta ao seu ser

porque sabida coisa eacute que o abraccedilar-se natildeo os confunde de maneira que

tanto o homem como a mulher deixem de ser o mesmo homem e a

mulher mesma que eram antes e qualquer um deles natildeo guarde e

reconheccedila iacutentegra sua naturaleza seu ser e sua forma761

A autoridade aristoteacutelica consoante a liccedilatildeo do De Generatione et Corruptione

confere legitimidade agrave mistura762 Ricardo de Turia cita Giovanni Battista Guarini ou

Guarino como refere e propotildee no mesmo Apologeacutetico o Saacutetiro dramatizado em Il

Pastor Fido ldquoMezrsquohuomo e mezo capra e tutto bestiardquo (Past Fid 2 6)763 como

metaacutefora do discurso misto figura bestial personagem de qualidade humilde que em vez

do que assim lhe compete trata mateacuteria elevada e especulativa 764 No mais a

761 Traduccedilatildeo nossa 762 ARISTOacuteTELES Sobre a geraccedilatildeo e corrupccedilatildeo Traduccedilatildeo e notas de Francisco Choratildeo Revisatildeo cientiacutefica

de Alberto Bernabeacute Pajares Lisboa IN-CM 2009 p 47 763 Em italiano lecirc-se na voz da personagem Corisca (ato segundo cena VI) ldquoCo[risca] O uillano indiscreto

ed importuno Mezhuomo e mezo capra e tutto bestia Carogna fracidiszligima e difetto Di natura

nefando se tu credi Che Corisca non tami il uero credi Che uuoi tu chami in te quel tuo bel ceffo Quella succida barba quellorecchie Caprigne e quella putrida e bauosa Isdentata cavernardquo

[Corisca Oacute vilatildeo indiscreto e importuno Meio homem e meio cabra e todo besta Carniccedila corruptiacutessima

e defeito De natureza nefando se tu crecircs Que Corisca natildeo te ama a verdade crecircs Que queres tu que

ame em ti Essa tua bela fuccedila Essa barba suja Essa orelha Caprina E essa puacutetrida e babosa

Desdentada caverna] Traduccedilatildeo nossa Cf Il Pastor Fido Tragicomedia Pastorale di Battista Gvarini

Dedicata al SerMO D Carlo Emanvele Dvca di Savoia ampc Nelle Reali Nozze di SA con la serma Infante

D Caterina dAvstria Con privilegi In Venetia Presso Gio Battista Bonfadino [1590] sp 764 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 pp 291-2 HASEGAWA A P Os

limites do gecircnero bucoacutelico em Vergiacutelio um estudo das eacuteclogas dramaacuteticas Satildeo Paulo Humanitas 2012

pp 72-3

248

metaforizaccedilatildeo da tragicomeacutedia eacute conhecida lecirc-se referecircncia ao Hermafrodita em chave

oposta entre as reprimendas de Francisco Joseacute Freire765 Ricardo de Turia natildeo descompotildee

a natureza do ser nem refuta a monstruosa metaacutefora avalia-lhe as grandezas como

desproporccedilotildees proporcionadas proacuteprias ao riso porque efetuam o ridiculum Arrazoada

pois a tragicomeacutedia porque resultante de ldquomixturardquo natildeo de ldquocomposicionrdquo A distinccedilatildeo

mais do que minudecircncia lexical eacute presunccedilatildeo de unidade que o ldquocotildepuestordquo segundo a

taxonomia em operaccedilatildeo como acidental natildeo pode aspirar Eacute possiacutevel entatildeo depreender

do trecho lido segundo os criteacuterios do apologista asseverar com Giason Denores ou

Francisco Joseacute Freire que a tragicomeacutedia eacute ldquocomposto poeticordquo766 que busca conjugar as

antipatias dos gecircneros traacutegico e cocircmico nem eacute significar-lhe a natureza nem na justeza

dos termos eacute abarcar o ldquomixtordquo Essa distinccedilatildeo incide nos fundamentos de criacuteticas tais

quais as de ambos os preceptistas mira desautorizaacute-los e levar nos passos da

argumentaccedilatildeo o artiacutefice tragicocircmico do vitupeacuterio ao elogio

Nesses termos que vislumbram a virtude da unidade pode-se aventar para

Ricardo de Turia o ldquofabuloso Hermofroditordquo natildeo destoa do belo animal que Aristoacuteteles

figura na Poeacutetica de corpo bem ordenado e bem dimensionado antiacutepoda do monstrum

horaciano Natildeo destoa porque eacute de outra espeacutecie e metaforiza cada um convenientemente

um gecircnero de poemas diferente Recorde-se que para Aristoacuteteles deve ser bem ordenada

e bem dimensionada a trageacutedia cuja fabula eacute feita da mimese de accedilatildeo una e inteira cuja

unidade e cuja inteireza alheias ao acaso porque arrazoada a concatenaccedilatildeo dos episoacutedios

dramatizados sejam criteacuterios de distinccedilatildeo do poema verossiacutemil (cf ARIST Poet 7 1450b

21 ss)

Ora como ldquofabulosordquo como ser de faacutebula nem verdadeiro nem verossiacutemil

construiacutedo em discurso de vieacutes elogioso o Hermafrodita de Ricardo Turia afilia-se ao

Hipocentauro que Luciano de Samoacutesata (ca seacutec II dC) metaforiza num opuacutesculo

apologeacutetico cujo tiacutetulo eacute Contra quem disse tu eacutes um Prometeu em teus discursos (Pros

ton eiponta Promētheus ei em logois em latim segundo a versatildeo do inteacuterprete Jacob

Micyllus Contra eum qui dixerat Prometheus es in uerbis) Nele Luciano bate-se contra

765 Cf Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes

tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip

Fungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens

ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo

ferat error Horat in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX

Com as licenccedilas necessarias p 160 766 Idem p 150

249

esse anocircnimo interlocutor que o compara a Prometeu O cerne da comparaccedilatildeo discute

Jacyntho Lins Brandatildeo767 reside na afirmativa de que Luciano ao modo do Titatilde ldquocomo

um primeiro fabricanterdquo () tenha arquitetado algo novo () sem

qualquer arqueacutetipo () (cf LUC Prom 3) Diga-se o novo da combinaccedilatildeo do

diaacutelogo com a comeacutedia Luciano adverte natildeo ser suficiente para a boa forma ()

da obra esse arranjo ( ainda que beliacutessimos os dois gecircneros caso careccedila de

harmonia e de simetria a mistura () de modo que prive a obra da beleza da parte que

a constitui e tatildeo-somente brilhe a novidade que provoca o riso ou o pavor768

Luciano conta anedota do egiacutepcio Ptolomeu que ilustra o caso Daacute a conhececirc-la

Franccedilois Rabelais (1490-1553) que a reconta no proacutelogo do Tiers liure des faictz et dictz

heroiques du noble Pantagruel (Terceiro livro dos feitos e ditos heroicos do nobre

Pantagruel) estampado em Paris em 1546 Em 1546 em Paris imprimiu-se o volume

Luciani Samosatensis Opera em que o apologeacutetico luciacircnico e por conseguinte a anedota

na versatildeo de Jacob Micyllus se lecirc Refere Rabelais

Me souuient toutesfois auoir leu que Ptoleme filz de Lagus quelque

jour entre autres despouilles amp butins de ses conquestes praesentant

aux Aegyptiens en plain theatre un chameau Batrian tout noir amp un

esclave biguarreacute tellement que de son corps lrsquoune part estoit noire

lrsquoautre blanche non en compartiment de latitude par le diaphragme

comme feut celle femme sacreacutee a Venus Indicque laquelle feut

recongnue du philosophe Tyanien entre le fleuve Hydaspes et le mont

Caucase mais en dimension perpendiculaire choses non encores

veues en Aegypte esperoit par offre de ces nouveaultez lrsquoamour du

peuple envers soy augmenter Qursquoen advient il A la production du

Chameau tous feurent effroyez amp indignez a la veue de lrsquohome biguarreacute

aulcuns se mocquerent autres le abhominerent comme monstre infame

creacuteeacute par erreur de nature Somme lrsquoesperance qursquoil avoit de complaire

a ses Aegyptiens amp par ce moyen extendre lrsquoaffection qursquoilz luy

pourtoient naturellement luy decoulla des mains Et entendit plus a

767 BRANDAtildeO J L A poeacutetica do Hipocentauro literatura sociedade e discurso ficcional em Luciano de

Samoacutesata Belo Horizonte UFMG 2001 pp 75 ss 768 Idem p 79

250

plaisir amp delices leurs estre choses belles eleguantes amp perfaictes que

ridicules amp monstrueuses769

Lembro-me todavia de ter lido que Ptolomeu filho de Lago certo dia

entre outros despojos amp butins de suas conquistas ao apresentar aos

egiacutepcios em pleno teatro um camelo bactriano todo negro amp um

escravo de tal sorte variegado que de seu corpo uma parte era negra e

outra branca natildeo em compartimento de latitude pelo diafragma como

foi aquela mulher sagrada agrave Vecircnus Iacutendica a qual foi reconhecida do

filoacutesofo Tianeu entre o rio Hidaspe e o monte Caacuteucaso mas em

dimensatildeo perpendicular coisas natildeo ainda vistas no Egito esperava770

ao oferecer essas novidades o amor do povo para consigo aumentar O

que adveio disso Agrave exibiccedilatildeo do camelo todos ficaram assustados amp

indignados agrave vista do homem variegado alguns debocharam outros o

abominaram como monstro infame criado por erro da natureza Em

suma a esperanccedila que ele tinha de comprazer aos egiacutepcios amp por esse

meio estender a afeiccedilatildeo que eles naturalmente lhe dedicavam escapou-

lhe das matildeos E entendeu mais prazerosas amp deliciosas serem as coisas

belas elegantes amp perfeitas que as ridiacuteculas amp monstruosas771

Estribado em Luciano de Samoacutesata Franccedilois Rabelais enuncia fazer-lhe o

exemplo pender entre a esperanccedila e o temor de variar772 O camelo negro e o homem

bicolor prodigiosos plasmam os riscos dos temperos poeacuteticos frente agrave destinaccedilatildeo a que

se preveem Conforme Luciano o temor pende do risco da disjunccedilatildeo e da dissimetria da

mistura que mal concertada priva a obra da beleza da parte que a forma (cf LUC Prom

3) Ora tal como satildeo ldquoinimigas e incompatiacuteveisrdquo a comeacutedia e a trageacutedia no vitupeacuterio de

Francisco Joseacute Freire assim tambeacutem a comeacutedia e o diaacutelogo no opuacutesculo de defesa de

769 Tiers liure des faictz et dictz heroiques du noble Pantagruel composez par M Franccedil Rabelais docteur en Medecine amp Calloier des Isles Hieres Lautheur susdict suplie les Lecteurs beneuoles soy reseruer a

rire au soixante amp dixhuictiesme liure Nouuellemente Imprimeacute agrave Paris Auec priuileige du Roy pour six

ans 1546 pp 15-16 770 Note-se que a forma verbal ldquoesperavardquo (esperoit) tem como sujeito sintaacutetico o substantivo proacuteprio

ldquoPtolomeurdquo (Ptoleme) disposto distantemente pela estrutura perioacutedica empregada no passo Procurei

mantecirc-la ao verter o texto ao portuguecircs 771 Traduccedilatildeo nossa 772 Tiers liure des faictz et dictz heroiques du noble Pantagruel composez par M Franccedil Rabelais docteur

en Medecine amp Calloier des Isles Hieres Lautheur susdict suplie les Lecteurs beneuoles soy reseruer a

rire au soixante amp dixhuictiesme liure Nouuellemente Imprimeacute agrave Paris Auec priuileige du Roy pour six

ans 1546 p 16

251

Luciano natildeo se dizem nem familiares (ldquordquo) ndash de ēthos comum aponta Jacyntho

Lins Brandatildeo ndash nem amigos (ldquordquo) ldquodesde o princiacutepiordquo (ldquo rdquo) jaacute que segundo

Luciano apartados esses gecircneros nos termos da muacutesica afastam-nos duas oitavas de

intervalo entre o mais grave e o mais agudo e personificados ambos conforme distinta

caracterizaccedilatildeo enquanto o diaacutelogo conservava-se em casa e passava o tempo em passeios

acompanhado de poucos a comeacutedia dada a Dioniso e ao teatro ria e fazia rir amiuacutede das

amizades do diaacutelogo (cf LUC Prom 6)773

Entretanto apesar dessas diferenccedilas entre a comeacutedia e o diaacutelogo ou em razatildeo

delas visto amplificarem o feito e o efeito de imiscuiacute-las escreve Luciano ter ousado

conciliar esses gecircneros harmoniosamente (cf LUC Prom 6) 774 pois crente na

possibilidade do arranjo seja extraordinaacuterio () o todo de belas partes tal

como o Hipocentauro figurado por pintores antes desmedido ndash ldquoos mais desmedidordquo

() ndash que amaacutevel seja muitiacutessimo prazeroso como a mistura que se faz de

vinho e de mel (cf LUC Prom 5) A metaacutefora do Hipocentauro diga-se aparenta ser

clariacutessima enquanto historicamente vigem os protocolos retoacutericos que a tornam

significativa Agrave margem da traduccedilatildeo do opuacutesculo de Luciano na ediccedilatildeo parisiense de

1546 glosa-se ldquoCotildepositio diversa amp uaria hippocẽtaurus uoceturrdquo (Composiccedilatildeo

diversa amp vaacuteria diz-se hipocentauro)775

O exemplo dos seres exoacuteticos de Ptolomeu em Rabelais e em Luciano pode-se

afirmar com Jacyntho Lins Brandatildeo proscreve programaticamente a ldquoreduccedilatildeo do valor

da obra agrave mera novidaderdquo776 Nisso insiste Jacyntho Eacute passo relevante porque jaacute se sabe

assenta-se em censura dessa natureza a recusa de Gian Vicenzo Gravina a Il Pastor Fido

de Giovanni Battista Guarini dito poema dramaacutetico de ldquonovitagrave dinvenzionerdquo que lhe

parece ldquoaffettata e puerilerdquo

Como exemplo o Hipocentauro ganha contornos poeacuteticos e pictoacutericos mais

tramados em outra obra de Luciano o seu Zecircuxis ou Antiacuteoco tambeacutem lido na ediccedilatildeo

luciacircnica de 1546 em traduccedilatildeo do germano Vicentius Opsopoeus Lembra Jacyntho Lins

773 BRANDAtildeO J L A poeacutetica do Hipocentauro literatura sociedade e discurso ficcional em Luciano de

Samoacutesata Belo Horizonte UFMG 2001 pp 78 774 Idem pp 76 79 775 Luciani Samosatensis Opera quae quidem extant omnia a graeco semoni in Latinum conuersa nunc

portremugravem multo diligentius amp melius quagravem antegrave ad Graecum exemplar correcta amp emendata Pariis Ex

Officina Michaelis Vascosani M D XLVI [1546] p 4 776 BRANDAtildeO J L A poeacutetica do Hipocentauro literatura sociedade e discurso ficcional em Luciano de

Samoacutesata Belo Horizonte UFMG 2001 p 83

252

Brandatildeo Luciano faz de Zecircuxis ldquoo mais excelente dos pintoresrdquo (ldquordquo)

artiacutefice afamado por natildeo pintar coisas vulgares (ldquordquo) e comuns (ldquordquo)

afeito a fazer coisas novas () e a conceber algo extraordinaacuterio

(ldquordquo) e estranho (ldquordquo) com a acribia (ldquordquo) de sua arte (cf LUC

Zeux 3) assim como nesse Zecircuxis ou Antiacuteoco o deve demonstrar o quadro da famiacutelia de

Hipocentauros que a eacutecfrase plasma777 Da fecircmea monstruosa tal como retratada Luciano

escreve

[] καὶ ἡ μῖξις δὲ καὶ ἡ ἁρμογὴ τῶν σωμάτων καθ᾽ ὃ συνάπτεται

καὶ συνδεῖται τῷ γυναικείῳ τὸ ἱππικόν ἠρέμα καὶ οὐκ ἀθρόως

μεταβαίνουσα καὶ ἐκ προσαγωγῆς τρεπομένη λανθάνει τὴν ὄψιν ἐκ

θατέρου εἰς τὸ ἕτερον ὑπαγομένη (LUC Zeux 6)

A mistura e a junccedilatildeo dos corpos naquilo em que se conjuga e se conecta

ao feminino o equino por ser feita natildeo de brusco mas lentamente

efetuando-se a mudanccedila por aproximaccedilatildeo deixa oculto agrave vista que se

avanccedila do diferente ao diferente778

Nos termos da versatildeo em liacutengua portuguesa de Jacyntho a tecircmpera ldquoavanccedila do

diferente ao diferenterdquo e eacute conveniente que assim o avance mediante a acribia do artiacutefice

pintor como Zecircuxis prosador como Luciano versificador como os mais poetas de vaacuteria

estirpe cuja obra mista em conformidade com a liccedilatildeo da anedota de Ptolomeu supotildee

destinaccedilatildeo semelhantemente arguta perspicaz para dela fruir agrave custa de se improacutepria

agir como os egiacutepcios frente ao camelo negro e ao homem bicolor de olhos voltados

apenas aos brilhos novidadeiros ou como os espectadores a quem no Zecircuxis ou Antiacuteoco

se destinam a pintura dos Hipocentauros conforme o relato incapazes de apreciaacute-la

incapazes na voz de Zecircuxis de elogiar a teacutecnica e a beleza do conjunto bem executado

por sua acribia e propensos tatildeo-soacute a notar a exatidatildeo da parte que estranha (cf LUC Zeux

7)779 Nesse sentido parece hipoacutetese coerente o outro a quem se escreve eacute sempre o

mesmo visto que o estranhamento da novidade soacute causa oportuna surpresa e admiraccedilatildeo

777 Idem ibidem 778 A traduccedilatildeo eacute de Jacyntho cf BRANDAtildeO J L A poeacutetica do Hipocentauro literatura sociedade e discurso

ficcional em Luciano de Samoacutesata Belo Horizonte UFMG 2001 p 84 779 Idem ibidem

253

no puacuteblico que sabe reconhecer o desconhecido Eacute evidente como pragmaacutetica a liccedilatildeo de

Luciano implica um conjunto de procedimentos retoacutericos e poeacuteticos que regulam quando

se enunciam e enquanto historicamente surtem efeitos a produccedilatildeo de discursos em

gecircneros os mais variados consoante variados decoros reconhecidos reconheciacuteveis e

calculados que formulam portanto a novidade como imprevisibilidade prevista

O passo faz ressoar ademais a virtude da unidade e daacute a compreender a chave

elogiosa por meio da qual se mostra o Hermafrodita no Apologeacutetico de las comedias

espantildeolas de Ricardo de Turia No mais de acordo com Luciano a incompatibilidade de

princiacutepio entre comeacutedia e diaacutelogo como a que se enuncia afastar trageacutedia e comeacutedia soacute

o eacute de princiacutepio porque as diferenccedilas entre os dispositivos discursivos que produzem num

e noutro gecircnero devem-se mitigar com arte com a acribia artiacutestica lenta nunca abrupta

do concerto harmocircnico Nas liccedilotildees retoacutericas tomadas por Giovanni Battista Guarini para

contradizer a investida vituperante de Giason Denores a harmonia do concerto poeacutetico

assenta-se em preceitos concordes Os desdobramentos desses pressupostos de produccedilatildeo

do misto na voz de Verrato de Giovanni Battista Guarini assim satildeo enunciados como

jaacute se sabe conforme Demeacutetrio

Et si come il vostro Demetrio Falereo dice bene che le due forme

chrsquoegli chiama cioegrave dimessa amp

magnifica non si possono mescolar insieme cosi afferma che laltre

due cioegrave la polita amp la graue il possono far

con lrsquovna amp con lrsquoaltra per modo che il facitore della Tragicomedia

quando pure vi concedessi che le due prime non mescolasse non mi

potreste negare che dellaltre due non hauesse agrave fare a suo modo780

E assim como o vosso Demeacutetrio de Falero disse bem que as duas

formas que ele chama iskhnos kai megaloprepēs isto eacute modesta amp

magniacutefica natildeo se podem misturar juntamente tambeacutem afirma que as

outras duas glaphyros kai deinos isto eacute a polida amp a grave podem-no

fazer com uma amp com outra de modo que o fazedor da Tragicomeacutedia

se bem vos concedesse que as duas primeiras natildeo misturasse voacutes natildeo

780 Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le tragicomedie e le pastorali

in un suo discorso di poesia Con privilegio In Ferrara Ad Instanza di Alfonso Caraffa 1588 Con licenza

de Superiori pp 36f-36v

254

me poderiacuteeis negar que das outras duas natildeo houvesse a fazer de seu

modo781

Giovanni Battista Guarini segue bastantemente de perto a liccedilatildeo do Peri

hermēneias Sabe-se o retor que o redigiu creia-se hoje Demeacutetrio creia-se Pseudo-

Demeacutetrio de Falero supotildee quatro kharaktēresde estilo Satildeo eles (i) iskhnos (modesto)

(ii) megaloprepēsgrandioso) (iii) glaphyros (elegante) e (iv) deinos (veemente) nos

termos gregos como se pocircde observar incorporados agrave resposta de Verrato ou no

vernaacuteculo como quatro forme assim interpretadas (i) ldquodimessardquo (ii) ldquomagnificardquo (iii)

ldquopolitardquo e (iv) ldquograuerdquo Os quatro kharaktēressatildeo haploisimplesqualifica Demeacutetrio

e assim sendo podem-se dobrar desdobrar e temperar em combinaccedilotildees que a doutrina

natildeo nomina ainda que preveja o ldquoeleganterdquo pode-se mesclar com o ldquomodestordquo ou o

ldquograndiosordquo semelhantemente com ambos pode-se misturar o ldquoveementerdquo (cf DEMETR

36)782 Poreacutem como glosa Giovanni Battista Guarini nem todas as misturas estiliacutesticas

satildeo admissiacuteveis pois o ldquomodestordquo e o ldquograndiosordquo como kharaktēresantiteacuteticos mantecircm

oposiccedilatildeo que natildeo os deixa combinar783

Dessa liccedilatildeo jaacute se sabe Giovanni Battista Guarini eacute devedor porque ela legitima-

lhe o misto tragicocircmico Com base nessa doutrina e nas possibilidades de o artiacutefice operaacute-

la logo que elencados os tipos de estilo Il Verrato deixa ler os seguintes preceitos como

protocolos que datildeo forma agrave tragicomeacutedia

La sua propria amp principale egrave la magnifica la quale accompagnata

con la graue diuenta idea della Tragedia ma mescolata con la polita

fa qnel [sic] temperamento che conuiene alla Tragicomedia perciocheacute

781 Traduccedilatildeo nossa 782 ldquo[36] Εἰσὶ δὲ τέτταρες οἱ ἁπλοῖ χαρακτῆρες ἰσχνός μεγαλοπρεπής γλαφυρός δεινός καὶ λοιπὸν οἱ ἐκ τούτων μιγνύμενοι Μίγνυνται δὲ οὐ πᾶς παντί ἀλλ ὁ γλαφυρὸς μὲνκαὶ τῷ ἰσχνῷ καὶ τῷ μεγαλοπρεπεῖ καὶ ὁ δεινὸς δὲ ὁμοίως ἀμφοτέροις μόνος δὲ ὁ μεγαλοπρεπὴς τῷ ἰσχνῷ οὐ μίγνυται ἀλλ ὥσπερ ἀνθέστατον καὶ ἀντίκεισθον ἐναντιωτάτωrdquo (DEMETR 36) cf FREITAS G A DE Sobre o

Estilo de Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo e estudo introdutoacuterio do tratado)

Belo Horizonte [FL-UFMG] 2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p x ldquo[36] Quatro satildeo os tipos elementares

o simples o grandioso o elegante e o veemente os demais satildeo formados a partir de uma mistura entre

esses Mas nem todos se misturam com todos O elegante se mistura tanto com o simples quanto com o

grandioso de igual modo com ambos se mistura o veemente Mas o grandioso apenas natildeo se mistura com o simples os dois se antepotildeem como contraacuterios em maacutexima oposiccedilatildeordquo 783 No passo em questatildeo (DEMETR 36) o verbo empregado para significar ldquomisturarrdquo ou ldquocombinarrdquo eacute

[ldquoeu misturordquo ldquoeu combinordquo] equivalente grego do latim misceocirc de acordo com o Le Grand

Bailly Dictionnaire Grec-Franccedilais

255

trattandosi in essa di persone grandi amp di heroi non conuiene favellar

humilmente amp percheacute nella medesima non si vuole il terribile amp

latroce anzi si fugge lasciando da parte il graue prendesi il dolce che

tempera quella grandezza amp sublimitagrave chrsquoegrave propria del puro

Tragico784

A sua [forma] proacutepria amp principal eacute a magniacutefica a qual acompanhada

da grave tornada ideia da Trageacutedia mas misturada com a polida faz

aquele temperamento que conveacutem agrave Tragicomeacutedia pois que tratando-

se nesta de pessoas magnacircnimas amp de heroacuteis natildeo conveacutem falar

humildemente amp porque nela mesma natildeo se quer o terriacutevel amp o atroz

antes foge-se deixando de lado o grave toma-se o doce que tempera

aquele grandeza amp sublimidade que eacute proacutepria do puro Traacutegico785

O temperamento proacuteprio agrave tragicomeacutedia matiza a grandiosidade caracteriacutestica da

trageacutedia com a polidez a elegacircncia de modo a produzir combinaccedilatildeo estiliacutestica que

conhecendo as restriccedilotildees poeacuteticas do Peri hermēneias e no mais tendo em vista a

qualidade das personagens dramatizadas afirma a inconveniecircncia da humildade e a

ineacutepcia da terribilidade consoante o decoro que a tecircmpera tragicocircmica pressupotildee Nesse

sentido natildeo se sustenta retoacuterica ou poeticamente consoante Giovanni Battista Guarini a

antinomia que seus contendores tanto iteram visto que natildeo se nega que haja kharaktēres

opostos e sequer sugere-se que os opostos se combinem apenas afirma-se serem

convenientes agrave tragicomeacutedia os recursos discursivos cujos efeitos sejam decorrentes de

mistura

A posiccedilatildeo de Giason Denores embora expliacutecita a preceituaccedilatildeo do Peri hermēneias

porque entrevecirc comeacutedia e trageacutedia vecirc sobretudo a oposiccedilatildeo que distancia a ldquoidea del dir

tenue amp humilerdquo da ldquoIdea del dir magnifica amp graverdquo e renega agrave imoderaccedilatildeo ou agrave

imperfeiccedilatildeo viciosa a linhagem do misto que propotildee o retor grego como se supusesse

tatildeo-somente os tipos ldquohaploirdquo ldquosimplesrdquo ldquopurosrdquo786 como o ldquopuro Traacutegicordquo citado por

Giovanni Battista Guarini e nada que assim natildeo fosse Giason Denores busca a autoridade

784 Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le tragicomedie e le pastorali

in un suo discorso di poesia Con privilegio In Ferrara Ad Instanza di Alfonso Caraffa 1588 Con licenza

dersquo Superiori pp 36f-36v 785 Traduccedilatildeo nossa 786 Idem p 116

256

de Demeacutetrio e opera em italiano leacutexico que faz ecoar os Petri Victorii commentarii in

librum Demetrii Phalerei de elocutione ediccedilatildeo biliacutengue comentada do Peri

hermēneiasem grego e em latim estampada em 1562 Para o comentador florentino

Pietro Vettori (1499-1585) os kharaktēres satildeo notae (marcas) satildeo formae e ao latim

assim satildeo vertidos (i) (kharaktēr) iskhnos eacute (nota ou forma) tenuis (ii) megaloprepēs

magnifica (iii) glaphyros ornata (iv) deinosgrauis787

Sabe-se o sintagma ldquoidea del dirrdquo lido e relido nas glosas de Giason Denores

conhecido de obra seiscentista jaacute referida o DellrsquoArte di Predicar Bene de Paolo Aresi788

natildeo se aplica no Peri hermēneias e pressupotildee as liccedilotildees de Hermoacutegenes pois verte ao

italiano o grego idea tou logou o que faz entrecruzar doutrinas de retores diferentes numa

mesma exposiccedilatildeo A bem dizer esse entrecruzamento itera-se no prefaacutecio de Johannes

Sturm ao Hermogenis De formis orationum tomi duo editado em 1555 789 Esse

entrecruzamento condiz com as categorias empregadas por Pietro Vettori em seus

commentarii

Hermogenes qui multis post Halicarnasseum saeculis extitit accuratus

ac subtilis magister dicendi dum artem hanc traderet siue plures ipsius

partes melioresq explicaret de formis amp ipse dicendi diligenter

differuit quas vocauit auxit autem ille valde numerum earum

longeq aliam viam in describendis illis secutus est quod tamen ipse

efficere voluit studiose tractauit nec sine laude multa ad exitum

perduxit vero formas has siue notas vt veteres illi

fecerant amp qui Hermogenem aeligtate antecesserunt Demetrius

appellauit vt enim (nam inde tractum nomen videtur) notaelig impressae

humeris equorum aliarumq pecudum (quaelig nomine illo agrave Grœcis

787 Petri Victorii commentarii in librum Demetrii Phalerei de elocutione Positis ante singulas declarationes

Graecis vocibus Auctoris ijsdemque ad verbum Latine expressis Additus est rerum et verborum

memorabilium index copiosus Cum P II IIII Pont Max Cosmi Medicis Florentianorum Senensiumq Ducis

ampAlphonsi Ferrariensium Ducis privilegijs ampliszlig per decennium Florentiae In officina Iuntarum

Bernardi F MDLXII pp 35-6 788 Cf DellrsquoArte di predicar bene diuisa in due parti Nella quale oltre agraversquo precetti dersquo retori agrave questo

proposito applicati di danno nuoue regole per tesserordinatamente vna predica con vn trattato della

memoria amp vnrsquoaltro della imitatione e con alcune osseruationi retoriche sopra vna predica in lode di S

Tomaso dAquino DI MONSIG PAOLO ARESI PARTE SECONDAhellip In MIL Per Gio Batt Bidelli

1627 p 197 789 Idem [p 4]

257

significantur) indicant cuius generis stirpisque illi sint ita haelig notaelig

testantur cuius sectaelig amp quasi nationis sit790

Hermoacutegenes que nasceu muitos seacuteculos apoacutes [Dioniacutesio de]

Halicarnasso mestre do discurso acurado e sutil enquanto transmitia

esta arte ou as vaacuterias e melhores partes dela desdobrou as formas do

discurso e tambeacutem diligentemente diferenciou-as as quais chamou

ideai Ele pois ampliou bastante o nuacutemero delas e longamente e

seguiu outro meacutetodo ao descrevecirc-las O que ele poreacutem quis perfazer

tratou com zelo e natildeo sem muito elogio levou ao cabo Satildeo os

kharaktēresverdadeiramente estas formas ou marcas como a ele os

antigos ofereceram e agravequeles que antecederam Hermoacutegenes em idade

Demeacutetrio recorreu assim como de fato (pois daiacute o termo parece

derivado) as marcas impressas nas espaacuteduas dos cavalos e de outros

animais (as quais por aquele nome satildeo significadas pelos gregos)

indicam de que gecircnero e estirpe eles satildeo assim tambeacutem estas marcas

atestam de que escola e por assim dizer naccedilatildeo sejam791

Pietro Vettori expotildee ao leitor liccedilatildeo que naquilo que ora conveacutem mais do que

latinizar o vocaacutebulo ldquokharaktērrdquo e atribuir-lhe etimologicamente antecedente conforme

ao uso constroacutei equivalecircncia entre as doutrinas retoacutericas atribuiacutedas a Demeacutetrio e a

Hermoacutegenes de modo tal a por semelhanccedila de proporccedilatildeo estabelecer o tracircnsito de

categorias que muacutetuas se recobrem e se acomodam Assim na medida em que os

kharaktēressatildeo formae satildeo notae e satildeo ideai faz-se possiacutevel que se proponham as ldquoidee

del dirrdquo de Demeacutetrio mesmo que esses termos como versotildees italianas do grego ldquoideai

tou logourdquo estritamente nele natildeo se leiam visto natildeo seja esse o leacutexico empregado no Peri

hermēneias Essa equivalecircncia deslizante leu-se no Discorso di Iason Denores seraacute lida

em Il Verrato e no mais persistiraacute por exemplo nas Instituiccediloens oratorias de M Fabio

Quintiliano de Jerocircnimo Soares Barbosa contemporacircneo de Francisco Joseacute Freire792

790 Idem [p 2] O mesmo passo e a mesma a epiacutestola ao leitor podem-se ler em Petri Victorii epistolarum

libri X Orationes XIIII Et liber de laudibus Ioannae Austricaelig Cum licentia privilegiis Florentiae Apud

Iunctas MDLXXXVI p 97 791 Traduccedilatildeo nossa 792 Cf Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em

linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos que aprendem Ajuntaotilde-

se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no corpo destas Instituiccediloens por

Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e Poezia da Universidade de Coimbra

258

Ora a preceituaccedilatildeo dos kharaktēreselocutivos dos genera dicendi como

doutrinaacuteria opera leacutexico controlado natildeo raro em conformidade com usos e costumes

gramaticais e retoacutericos de longuiacutessima vigecircncia Por um lado no Discorso di Iason

Denores pode-se observar que em ldquoidea del dir tenue amp humilerdquo manteacutem-se o sentido

de iskhnos por meio dos adjetivos pleonaacutesticos ldquotenuerdquo e ldquohumilerdquo Ora pleonaacutesticos

sabe-se bem porque iskhnoseacute segundo a Institutio oratoria de Quintiliano um dos

genera dicendi o que os latinos dizem subtilis Eacute termo grego que tambeacutem se lecirc em Aulo

Geacutelio (seacutec II dC) como o genus dicendi ou o kharaktēr equivalente ao que se diz

latinamente gracilis (gracioso) dotado de uenustas (graccedila) e subtilitas (sutileza)

Segundo Fortunaciano (seacutec IV dC) eacute um dos characteres ou seja eacute genus orationis

tenuis ou subtilis Segundo Donato (seacutec IV dC) como um dos modi elocutionum ou um

dos kharaktēres iskhnos eacute tenuis equivalente no preceito ao character humilis de Seacutervio

Honorato (seacutec IV dC) ao genus humile de Filargiacuterio escoliasta de Vergiacutelio e demais

ao stilus humilis prescrito pela Rota Vergilii de Joatildeo de Garlacircndia (seacutec XII-XIII) do qual

as vergilianas Bucoacutelicas satildeo exemplares793

Por outro lado em ldquoIdea del dir magnifica amp graverdquo os adjetivos ldquomagnificardquo e

ldquograverdquo conforme a referida liccedilatildeo de Pietro Vettori guardam respectivamente os sentidos

de megaloprepēse de deinosSobra assim sem lugar no passo referido de Giason

Denores a polidez a elegacircncia cujo efeito retoricamente o adjetivo grego ldquoglaphyrosrdquo

classifica Parece o contendor de Giovanni Battista Guarini ainda que sob a autoridade

de Demeacutetrio conceber quadriparticcedilatildeo elocutiva que natildeo se explicita e assim abdicar desse

kharaktēra fim de amplificar a oposiccedilatildeo entre iskhnose megaloprepēs assumidos como

evidecircncia estiliacutestica da distacircncia extremada que afasta trageacutedia e comeacutedia de maneira a

construir protocolos de oposiccedilatildeo que deslegitimem a tragicomeacutedia e seu exemplum mais

afamado

Essa distacircncia fundamentada em Demeacutetrio eacute tambeacutem afirmada entre as jaacute

discutidas censuras da Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em geral a Il Pastor

Fido

Tomo Primeiro Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza

da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta

reis em papel p 46 793 Cf HASEGAWA A P Os limites do gecircnero bucoacutelico em Vergiacutelio um estudo das eacuteclogas dramaacuteticas Satildeo

Paulo Humanitas 2012 pp 56-57

259

[] Guarini ou naotilde soube ou desprezou na sua Tragicomedia este

dogma poetico que escreve Falereo a pag 149 e que tanto se deve

observar Risucircs artes amp lepograverum in Satyra amp Comœdiis in Tragœdia

autem ueneres quidem recipit in multis risucircs autem inimicus Tragœdia

neque enim cogitaret aliquis Tragœdiam ludentem quia Satyrum

scriberet pro Tragœdia794

Crecirc-se hipoacutetese coerente que Francisco Joseacute Freire e Giason Denores refiram a

mesma ediccedilatildeo do Peri hermēneias A indicaccedilatildeo da ldquopag 149rdquo no passo da Arte poetica

ou regras da verdadeira poesia em geral diz respeito agrave paginaccedilatildeo dos Petri Victorii

commentarii in librum Demetrii Phalerei de elocutione A autoridade de Demeacutetrio feita

enunciaccedilatildeo dogmaacutetica busca arrematar argumento conhecido a saber a afirmaccedilatildeo de

compor-se Il Pastor Fido ao modo de ldquohuma enfiada de Madrigaes amorososrdquo795 No

tratado do retor grego no passo ora citado estaacute em jogo como se pode depreender a

diferenccedila entre o ridiacuteculo e o gracioso entre ldquoto geloionrdquo (ldquoτὸ γελοῖονrdquo) e ldquoto eukharirdquo

(ldquoτὸ εὔχαριrdquo) o ridiculum e o uenustum especificaccedilatildeo teoacuterica que integra a doutrina do

glaphyros como kharatēr discursivo Essa diferenccedila constroacutei-se agrave luz de quatro criteacuterios

isto eacute (i) hylēmateria (ii) lexislocutio (iii) proairesisuoluntas (iv) toposlocus assim

depreendidos da ediccedilatildeo biliacutengue de Vettori796 Bastante sucintamente configuram-se as

distacircncias entre um e outro do seguinte modo 797 o ridiacuteculo figura personagens

794 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias pp 156-7 A versatildeo latina de Pietro Vettori traduz o seguinte passo do ldquo[169]

Καὶ ἐκ τόπου Ἔνθα μὲν γὰρ γέλωτος τέχναι καὶ χαρίτων ἐν σατύρῳ καὶ ἐν κωμῳδίαις Tραγῳδία δὲ χάριτας μὲν παραλαμβάνει ἐν ολλοῖς ὁ δὲ γέλως ἐχθρὸς τραγῳδίας οὐδὲ γὰρ ἐπινοήσειεν ἄν τις τραγῳδίαν παίζουσαν ἐπεὶ σάτυρονγράψει ἀντὶ τραγῳδίαςrdquo [ldquo169 E satildeo diferentes pelo lugar A

arte do riso e a da graccedila estatildeo no drama satiacuterico e nas comeacutedias Jaacute a trageacutedia muitas vezes lanccedila matildeo da

graccedila mas o riso eacute seu inimigo Afinal ningueacutem conceberia uma trageacutedia que brinca jaacute que acabaria escrevendo um drama satiacuterico ao inveacutes de uma trageacutediardquo] A traduccedilatildeo lecirc-se em FREITAS G A DE Sobre o

Estilo de Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo e estudo introdutoacuterio do tratado)

Satildeo Paulo [UFMG] 2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p XXXIX 795 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias p 156 796 Cf DEMETRIOS Du style Texte eacutetabli et traduit par Pierre Chiron Paris PUF 1993 p XC 797 Como jaacute referido segue-se esta traduccedilatildeo ao portuguecircs FREITAS G A DE Sobre o Estilo de Demeacutetrio

260

mendicantes sujos covardes feios impudentes798 tais quais Iro e Tersites personagens

da Odisseia e da Iliacuteada (DEMETR 163) por meio de vocabulaacuterio usual (DEMETR 165) a

fim de provocar o riso (DEMETR 168) como se observam no drama satiacuterico e nas

comeacutedias (DEMETR 169) ao passo que o gracioso figura mateacuteria de que natildeo se ri tais

quais as ninfas e os amores (DEMETR 163) por meio de adornos elocutivos e belas

palavras (DEMETR 164) a fim de encantar e efetuar elogios (DEMETR 168) como se

observam no drama satiacuterico nas comeacutedias e natildeo raro nas trageacutedias (DEMETR 169) A

adequaccedilatildeo do gracioso constroacutei-se ao cabo em qualquer desses gecircneros de poema

porque para Demeacutetrio demais a kharis (graccedila) pode-se figurar (i) elevada e nobre (ii)

comum mais cocircmica assemelhada aos escaacuternios (DEMETR 128) e tambeacutem (iii)

amedrontadora e aterrorizadora (DEMETR 130-1) conforme tipos (εἴδη) que natildeo se

confundem799

A diferenccedila entre o ridiacuteculo e o gracioso que interessa a Francisco Joseacute Freire eacute a

derradeira aquela que cita em latim Dela Freire reteacutem a inimizade entre o riso e a trageacutedia

o deslocamento do ridiacuteculo diante do traacutegico razatildeo pela qual dessa combinaccedilatildeo faz-se

drama satiacuterico em lugar de trageacutedia Para Demeacutetrio pode-se aventar afirmar ldquomas o riso

eacute inimigo da trageacutediardquo (ldquoὁ δὲ γέλως ἐχθρὸς τραγῳδίαςrdquo DEMETR 169) eacute como liccedilatildeo

de adequaccedilatildeo geneacuterica excluir dos efeitos traacutegicos o risiacutevel porque o riso natildeo enforma a

trageacutedia Para Francisco Joseacute Freire natildeo apenas afirmar ldquomas o riso eacute inimigo da trageacutediardquo

(ldquorisucircs autem inimicus Tragœdiardquo)800 eacute tambeacutem fazer do riso metoniacutemia da comeacutedia e

iterar que comeacutedia e trageacutedia natildeo combinam pois nesta conveacutem soacute o gracioso como

antiacutepoda estiliacutestico do riso cujos efeitos prescrevem-se de modo que pode o severo criacutetico

de Giovanni Battista Guarini repreender com o rigor da autoridade de Demeacutetrio a

tragicomeacutedia como composto de comeacutedia e trageacutedia

Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo e estudo introdutoacuterio do tratado) Satildeo Paulo [UFMG]

2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p XXXVIII-XXXIX 798 CHIRON P Un rheacuteteur meacuteconnu Deacutemeacutetrios (Ps-Deacutemeacutetrios de Phalegravere) Essai sur les mutations de la

theacuteorie du style agrave lrsquoeacutepoque helleacutenistique Paris Vrin 2001 p 115 799 Cf FREITAS G A DE Sobre o Estilo de Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo

e estudo introdutoacuterio do tratado) Satildeo Paulo [UFMG] 2011 [dissertaccedilatildeo de mestrado] p XXXI-XXXII Para

Chiron trata-se de impropriedade no uso do termo Χάρις visto supor o helenista ser conveniente falar de

γελοῖον Cf Du style Texte eacutetabli et traduit par Pierre Chiron Paris PUF 1993 p LXXXIX 800 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias pp 156-7

261

Trata-se de abraccedilar o mesmo passo em grego ou latim para afirmar posiccedilotildees um

tanto diferentes No caso de Francisco Joseacute Freire a posiccedilatildeo eacute a que abdica da

fundamentaccedilatildeo retoacuterica do temperamento tragicocircmico No mais sobram murmuacuterios dos

usos mistos entre as reflexotildees do tratadista sobre as incorreccedilotildees e ldquoo costume pouco

louvavel de alguns Poetas Tragicosrdquo A posiccedilatildeo do portuguecircs mesmo que natildeo mire a

tragicomeacutedia eacute evidentiacutessima

Eu com esta doutrina naotilde pertendo desterrar absolutamente na Tragedia

os costumes amorosos porque he preciso seguir o genio dos tempos em

alguma parte que quer com sua razaotilde temperar a severidade da

Tragedia introduzindo-se a amenidade dos amores o que eu condemno

he que o uso naotilde seja moderado e que hoje sejaotilde as paixotildees amorosas

taotilde geraes na Tragedia como se fossem precisas Fazendo como diz

Boileau801 vicio amavel aos olhos dos seus leitores802

A figura do monstrum eacute assombrosa As paixotildees amorosas os costumes amorosos

se Francisco Joseacute Freire natildeo os desterra da trageacutedia como a entende carecer de razatildeo que

os faccedila necessaacuterios pois alheios aos preceitos do gecircnero devem estar sujeitos agrave

moderaccedilatildeo que limita as tecircmperas Francisco Joseacute Freire supotildee arrisca-se desfigurar a

trageacutedia como desuna irracional e incoerente se inconsequente a mistura se

desconformes severidade e amenidade como efeitos concorrentes num mesmo poema

dramaacutetico cujo propoacutesito mira caso aristotelicamente bem feito a evidecircncia da

desventura Eacute nesses termos pois o preceito da moderaccedilatildeo do temperamento moderado

soacute minoraccedilatildeo de males a fim de como que pressuposta a suspeiccedilatildeo do misto

controlando-se a desmesura tornar-se possiacutevel afastar da trageacutedia em vista dos fins a que

801 Francisco Joseacute Freire colhe o seguinte verso de Lrsquoart poeumltique de Nicolas Boileau-Despreacuteaux ldquoAux yeux

de leurs Lecteurs rendent le Vice aimablerdquo (Canto IV v 96) Cf Oeuvres de Nicolas Boileau Despreacuteaux

Avec des eacuteclaircissemens historiques donnez par lui-meme Nouvelle Edition revueuml corrigeacutee amp augmenteacutee

par de diverses Remarques Enrichie de figures graveacutees par Bernard Picart le Romain Tome Premier

Amsterdam chez David Mortier MDCCXVIII Avec privilege p 318 802 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellip Fungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias pp 108-9

262

se compotildee as impropriedades que a Arte poetica ou regras da verdadeira poesia em

geral natildeo cansa de atribuir agrave tragicomeacutedia em sua praacutetica de escrita803

As glosas de Francisco Joseacute Freire agrave traduccedilatildeo portuguesa da Epistula ad Pisones

ademais iteram essas liccedilotildees Vale observaacute-las Sabe-se no trecho encerrado entre os vv

73 e 92 Horaacutecio aborda os versos e os ritmos adequados agraves diversas mateacuterias que

competem agrave poesia Assim aos feitos ilustres e agraves guerras tristes conveacutem o hexacircmetro

homeacuterico aos prantos e mesmo agraves alegrias o diacutestico de medida desigual elegiacuteaco feito

de hexacircmetro e pentacircmetro agrave raiva o iambo e tambeacutem aos socos cocircmicos e aos coturnos

traacutegicos verso proacuteprio aos discursos alternados dialoacutegicos aos deuses aos heroacuteis aos

vencedores dos certames aos cuidados amorosos juvenis e aos vinhos desregrados o

elegiacuteaco (vv 73-85)

De acordo com Horaacutecio o poeta para que seja saudado como tal deve conhecer

esses preceitos e guardaacute-los ou seja ldquoDescriptas seruare uices operumque coloresrdquo (v

86) ldquoConservar as vezes descritas e as cores das obrasrdquo ou ldquousar dos diferentes

Caracteres e estylos dos Poemasrdquo como quer o tradutor portuguecircs na Arte Poetica de Q

Horacio Flacco Os viacutecios que lhes satildeo correspondentes assim satildeo enunciados

Versibus exponi tragicis res comica non vult

Indignatur item priuatis ac propegrave socco

Dignis carminibus narrari caeligna Thyestaelig

Singula quaeligque locum teneant sortita decenter (HOR AP 89-92)

Os versos da Tragedia naotilde competem

A Comico argumento e o baixo metro

Quasi proprio do Socco faz aggravo

A narraccedilaotilde da cea de Thyestes

Decircse a cada Poema o seu decente

Lugar []804

803 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4

pp 191-202 804 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa

Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na

logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D

Henrique pelo mesmo Author pp 46-7

263

Enfim esta eacute a liccedilatildeo decenter ldquodecorosamenterdquo empreguem-se versos oportunos

agrave mateacuteria enformada ndash natildeo compete o cocircmico ao verso traacutegico nem o traacutegico ao verso

cocircmico ndash e mantenham-se os ldquolugares certosrdquo mantenham-se os gecircneros de poema805

Pode-se assim depreender que Demeacutetrio e Horaacutecio abonem o mesmo preceito assim

como aquele supunha topos adequado ao riso (DEMETR 169) assim tambeacutem este supotildee

locus apropriado a certo verso e a certo ritmo (HOR AP 92) Eacute topologia poeacutetica eacute

adequaccedilatildeo a gecircnero de poema

Consoante as glosas de Francisco Joseacute Freire a adequaccedilatildeo do verso e do ritmo a

cada caso trata-se de ldquoimportantissimo preceito de que quem quizer merecer o nome de

Poeta naotilde ha de confundir estes differentes caracteresrdquo806 isto seja

[] quem fizer huma Epopeia em estylo lyrico huma Elegia em tom

epico huma Ecloga com pensamentos de Epigrammas e derramar em

huma Ode que deve respirar majestade e doccedilura o fel que pertence agrave

satyra quem naotilde diraacute que he hum peacutessimo Poeta Convem pois saber

observar bem o caracter e assumpto proprio de cada Poema [hellip]807

Com o helenismo ldquocaracterrdquo aliaacutes com ldquocaracteresrdquo jaacute se pocircde notar Francisco

Joseacute Freire verte o latim ldquouicesrdquo ldquovezesrdquo vocaacutebulo que por assim dizer estabelece

prerrogativas de posiccedilatildeo de gecircnero de poema ao modo do ldquolocumrdquo que tenha o poeta de

manter com decoro ldquosegundo a differenccedila dos Poemasrdquo808 No corpo da traduccedilatildeo em

805 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4

pp 225-6 806 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa

Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na

logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D

Henrique pelo mesmo Author p 42 807 Idem ibidem Desse procedimento depreendem-se obviamente criteacuterios de juiacutezo criacutetico os quais

fundados nesse longuiacutessimo costume de produccedilatildeo poeacutetica que ademais sobreviveraacute mesmo aos

contemporacircneos de Freire norteiam a localizaccedilatildeo de virtudes e de viacutecios nas praacuteticas de escrita ldquoQuem

bem se fundar nesta infallivel regra se ler os nossos Poetas entaotilde pezaraacute bem o seu merecimento Veraacute que os pastores de Diogo Bernardes saotilde mais pastores que os de Luiz de Camotildees que Francisco Rodrigues

Lobo tem com justiccedila nome no seu pastoril mas que no Eacutepico naotilde merece ser lido que Antonio da Fonseca

na sua Filis desmerece tanto o nome de Eacutepico como merece o de bom Lyrico em outras obras segundo o

gosto que reinava no seu tempo Veraacute a differenccedila que ha entre hum Soneto de Bacellar do Conde de

Tarouca e de alguns outros e os de infinitos Poetas do seculo passado ultimamente veraacute que merecimento

he o dos nossos antigos e o dos modernos exceptuando hum ou outro que he bom porque estuda pelos

mestres da nossa idade de ouro que sabiaotilde em suas obrasrdquo Idem pp 42-3 808 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa

Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na

logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D

Henrique pelo mesmo Author pp 42-3

264

liacutengua portuguesa referida perde-se esse sentido topoloacutegico embora subsista

apropriadamente nas glosas como criteacuterio de adequaccedilatildeo Francisco Joseacute Freire como se

veraacute ao verter o v 86 da epiacutestola prefere aludir natildeo os gecircneros de poema mas os gecircneros

de discurso809 A adequaccedilatildeo destes gecircneros agravequeles gecircneros nas notas agrave traduccedilatildeo assim

se exemplifica

Entre a Comedia e a Tragedia corre huma grande differenccedila Os versos

desta pedem expressotildees e figuras nobres dignas da Acccedilaotilde que

representa e os daquella contentaotilde-se com vozes proacuteprias e com

expressotildees familiares porque a Tragedia imita huma Accaotilde illustre e a

Comedia huma popular Esta doutrina jaacute era de Aristoteles como se

poacutede ver na sua Poetica e naotilde menos de Cicero no seu poacutede Tratado de

Optim gen Orat dizendo In Trag[o]edia Comicum vitiosum est amp in

Comœdia turpe tragicum810

A afirmaccedilatildeo dessas diferenccedilas agrave luz das consideraccedilotildees de Francisco Joseacute Freire

eacute mateacuteria gasta Posto que jaacute se possam crer evidentes ora merecem referecircncia somente

porque iteradas em conformidade com as liccedilotildees de outra autoridade as de Ciacutecero no De

optimo genere oratorum segundo as quais ldquotanto o cocircmico eacute vicioso na trageacutedia como o

torpe na comeacutediardquo (CIC Opt I1)811 Nesse caso interessa observar que Demeacutetrio e Ciacutecero

abonam preceito concorde assim como aquele afirmava ser a trageacutedia topos inadequado

ao riso (DEMETR 169) assim tambeacutem este afirma deslocados o riso em mateacuteria traacutegica e

o traacutegico em mateacuteria cocircmica Pode-se aventar num e noutro caso itera-se que mal

colocados os topoi proacuteprios a cada gecircnero

Para Francisco Joseacute Freire que recorre a Demeacutetrio na Arte poetica ou regras da

verdadeira poesia em geral tratadas com juizo critico812 e a Ciacutecero nas glosas agrave Arte

809 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 pp 225-6 810 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano Lisboa

Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias Vendese na

logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D

Henrique pelo mesmo Author pp 42-3 811 ALONSO JUacuteNIOR C O melhor gecircnero de oradores I-IV V 15-16 VI 16-17 Letras Claacutessicas Satildeo Paulo

2000 v 4 p 343 812 Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas

com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellipFungar vice

cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo

Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat

265

Poetica de Q Horacio Flacco813 tendo em conta as liccedilotildees da Epistula ad Pisones a figura

monstruosa motiva o riso da ineacutepcia e em sua evidencia garante o escarnecimento de

poeta cuja praacutetica eacute dita extravagante e cujas extravagacircncias porque excessivas ignoram

as diferenccedilas entre os gecircneros de poemas e miram efeitos deslocados

Isto supposto considere o leitor qual seraacute entre os intelligentes o

merecimento dos Poetas Drammaticos de Hespanha confundindo no

seu theatro o tragico com o comico do que resulta hum monstro que

causa tanto riso como causaria o de Horacio se o vissemos pintado

como elle o imagina no principio desta Arte814

Todavia essas liccedilotildees natildeo se enunciam sem contrastes afinal Horaacutecio prescreve

cessotildees estiliacutesticas que transitam de gecircnero a outro da comeacutedia agrave trageacutedia ou da trageacutedia

agrave comeacutedia porque eacute apropriado agrave convenccedilatildeo que assim se faccedila

Interdum tamen amp vocem comœdia tollit

Iratusque Chremes tumido delitigat ore

Et tragicus plerumque dolet sermone pedestri

Telephus amp Peleus cugravem pauper amp exul uterque

Projicit ampullas amp sesquipedalia verba (HOR AP 89-92)

Com tudo agraves vezes a Comedia

Levanta a voz e Chremes agastado

Toma tragico tom para enfadarse

A Tragedia outras vezes se lamenta

Em baixo estylo hum pobre desterrado

Como Peleo e Telepho querendo

Mover a compaixatildeo naotilde enche a boca

De longas vozes de empollados termos815

in Poetic Tomo II Lisboa Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas

necessarias pp 156-7 813 Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por Candido Lusitano

Lisboa Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com as licenccedilas necessaacuterias

Vendese na logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros onde tambeacutem se acharaacute a Vida

do Infante D Henrique pelo mesmo Author p 43 814 Idem p 44 815 Idem pp 46-7

266

Ensina Francisco Joseacute Freire agraves margens da traduccedilatildeo ser o velho Cremes

personagem cocircmica que frequenta as cenas do Heautontimorumenos de Terecircncio816 A

essa personagem concede-se ldquofala tuacutemidardquo (ldquotumido orerdquo) ldquotragico tomrdquo Peleu e Telefo

diz serem personagens traacutegicas de obras perdidas de Euriacutepedes A essas personagens

concede-se ldquoconversa pedestrerdquo (ldquosermone pedestrirdquo) lamentaccedilatildeo em ldquobaixo estylordquo em

lugar de ldquoempollados termosrdquo (ldquoampullasrdquo) e ldquolongas vozesrdquo (ldquosesquipedalia verbardquo) ou

ldquopalavras de peacute e meyordquo glosa o tradutor817

Estatildeo em jogo no trecho da epiacutestola como o artigo ldquoO monstrum da Arte poeacutetica

de Horaacuteciordquo elucida os genera dicendi visto que a voz que a comeacutedia eleva (ldquovocem

comœdia tollitrdquo) e a conversa pedestre com a qual a trageacutedia se condoacutei (ldquotragicus

plerumque dolet sermone pedestrirdquo) dizem respeito natildeo aos ldquogecircneros de poemasrdquo mas

aos ldquogecircneros de discursordquo A bem dizer propotildee Marcos Martinho dos Santos trata-se de

empreacutestimos assim escreve ldquoao gecircnero grave de um lado pertencem o termo tumidus

que aqui se empresta agrave comeacutedia e o termo ampullae que aqui se subtrai agrave trageacutedia ao

gecircnero tecircnue de outro pertence a expressatildeo sermo pedester senatildeo soacute sermo que aqui se

empresta agrave trageacutediardquo818

Esses empreacutestimos operam-se numa relaccedilatildeo de gecircnero e espeacutecie Como que mais

geneacutericos os gecircneros de discurso que os gecircneros de poema entende Marcos Martinho dos

Santos de tal modo que agravequeles estes se subordinem ora diferentes gecircneros de poemas

sujeitos a diferentes gecircneros de discurso ora diferentes gecircneros de poemas sujeitos a

mesmo gecircnero de discurso Desse modo sistematiza o latinista torna-se possiacutevel de

acordo com a Epistula ad Pisones ldquoque comeacutedia e trageacutedia gecircneros de poemas diferentes

se subordinem a mesmo gecircnero de discurso ou melhor que a comeacutedia visite o gecircnero

grave mais proacuteprio da trageacutedia e esta o tecircnue mais proacuteprio daquelardquo819

Os versos de Horaacutecio no mais tecircm longuiacutessima fortuna Na ldquoCarta XIIIrdquo que

redigiu a Cangrande della Scala senhor de Verona por volta de 1316 ou 1319 o poeta

florentino Dante Alighieri cita-os ao contrastar ldquocomoediardquo e ldquotragoediardquo Segundo

Dante Alighieri o tiacutetulo Comoedia proveacutem de ldquocomosrdquo ldquovillardquo e de ldquoodardquo cantusrdquo

donde seja a ldquocomoedia quasi villanus cantusrdquo isto eacute a ldquocomeacutedia [eacute] por assim dizer

816 Lecirc-se tambeacutem em outra comeacutedia do autor Andria 817 Esta derradeira eacute a escolha de traduccedilatildeo de Marcos Martinho dos Santos Cf SANTOS M M ldquoO

monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p 226 818 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4

pp 226-7 Considero par a par as traduccedilotildees e comentaacuterios de Marcos Martinho dos Santos 819 Idem ibidem

267

canto vilatildeordquo ruacutestico eacute ldquoum gecircnero de narraccedilatildeo poeacuteticardquo (ldquogenus quoddam poeticae

narrationisrdquo) que difere de todos os outros (ldquoab omnibus aliis differensrdquo) e em particular

da trageacutedia caracterizada como ldquoquasi cantus hircinusrdquo isto eacute ldquopor assim dizer canto

hircinordquo na medida em que escreve o poeta tragoedia eacute termo derivado de ldquotragosrdquo

ldquohircusrdquo bode de ldquoodardquo donde ldquocanto dos bodesrdquo Segundo Dante Alighieri diferem

ambas trageacutedia e comeacutedia em termos de mateacuteria visto que a trageacutedia eacute de iniacutecio

ldquoadmiraacutevel e calmardquo (ldquoadmirabilis et quietardquo) e ao fim ldquofeacutetida e horriacutevelrdquo (ldquofoetida et

horribilisrdquo) canto ldquofeacutetido agrave maneira dos bodesrdquo (ldquofoetidus ad modum hircirdquo) como o

ldquoInfernordquo ao passo que a comeacutedia principia algo aacutespera (ldquoinchoat asperitatem alicuius

reirdquo) e conclui-se prosperamente (ldquosed eius materia prospere terminaturrdquo) como o

ldquoParaiacutesordquo E diferem ademais quanto ao modo de falar (ldquoin modo loquendirdquo) ldquoelevada

e sublimementerdquo fala a trageacutedia (ldquoelate et sublime tragoediardquo) ao passo que ldquofrouxa e

humildementerdquo fala a comeacutedia (ldquocomoedia vero remisse et humiliterrdquo) cujo ldquomodo [de

falar] eacute frouxo e humilde porque a elocuccedilatildeo eacute vulgar em que ateacute mulherzinhas se

comunicamrdquo (ldquoremissus est modus et humilis quia loquutio vulgaris in qua et

mulierculae communicantrdquo) Segundo Dante Alighieri diga-se bem ldquosicut vult Horatius

in sua Poetria ubi licentiat aliquando comicos ut tragoedos loqui et sic e conversordquo ou

seja ldquoassim como quer Horaacutecio em sua Poetria [sc a Epistula ad Pisones] onde permite

vez ou outra que cocircmicos falem como traacutegicos e vice-versardquo Aliquando sabe Dante

Alighieri haacute licenccedila para empreacutestimos820

Isso posto em conformidade com os preceitos horacianos assim diagramados

parece ser possiacutevel reler a advertecircncia que faz Giovanni Battista Guarini na voz de

Verrato a Giason Denores por um lado a ldquoComedia vecchiardquo de Aristoacutefanes e a

ldquoComedia nuouardquo de Menandro e Terecircncio podem-se afirmar exemplares do mesmo

gecircnero de poema por outro lado sujeitam-se a diferentes gecircneros de discurso pois que

esta diferente daquela partilha da gravidade do ldquostile piugrave nobilerdquo sem com ele se

confundir todavia821 No mais na voz de Verrato essas diferenccedilas de estilo metaforizam-

se como variados ldquotuonirdquo segundo diferentes graus de intensidade Assim como mais ou

820 Nota-se as afirmaccedilotildees de Dante Alighieri satildeo concordes com os preceitos da Arte gramatical de

Diomedes (seacutec IV dC) 821 Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le tragicomedie e le pastorali

in un suo discorso di poesia Con privilegio In Ferrara Ad Instanza di Alfonso Caraffa 1588 Con licenza

de Superiori p 35v

268

menos graves e agudos melodicamente variam os tons assim tambeacutem estilisticamente os

discursos Sabe-se o interlocutor a quem se destinam as asserccedilotildees eacute Giason Denores

Hauete agrave sapere che si come la corda graue amp acuta nelle loro

maggiori amp minori intensioni van discorrendo per gradi che tuoni

sono chiamati cosi gli stili passano per alcune parti dellorazione che

riceuendo gli piugrave amp meno gli rendon tali Queste sono la sentenza il

metodo la figura la locutione la testura amp il numero Da queste parti

risultano gli stili in quella guisa che dalla fronte amp dagli occhi amp dalla

bocca amp dal manto amp dallrsquoaltre parti del volto humano risulta la

sembianza in altri virile amp grave in altri molle amp dimessa amp in alcuni

altri temperata delluno amp dellrsquoaltro822

Haveis de saber que assim como a corda grave amp a aguda percorrem

graus de maiores amp menores intensidades que satildeo chamados tons

assim tambeacutem os estilos passam por algumas partes do discurso que

recebendo-lhes mais amp menos tornam-lhes tais [como satildeo] Estas satildeo

a sentenccedila o meacutetodo a figura a elocuccedilatildeo a textura amp o ritmo Dessas

partes resultam os estilos da mesma maneira que da fronte dos olhos

da boca amp do queixo amp de outras partes do rosto humano resulta a

aparecircncia em uns viril amp grave em outros suave amp modesta amp em

outros ainda temperada por um amp por outro823

A Giason Denores mais precisamente apontam-se duas comparaccedilotildees A primeira

referida faz analogia dos fazeres e pela arte da muacutesica ilustra a doutrina retoacuterica do

temperamento estiliacutestico Eacute procedimento conhecido de asserccedilatildeo da composiccedilatildeo

822 Idem pp 37f-37v O mesmo passo de Guarini eacute alvo de Annabel M Patterson no livro Hermogenes

and the Renaissance Seven Ideas of Style Afirma a estudiosa ldquoIts important that in this part of Il Verrato

[] Guarini sets Hermogenes as an exponent of stylistic flexibility against his opponents authority Demetrius whose scheme is made to seem rigid by contrast but more significant still is the fact that he

chooses to support a point of practical criticism by bringing out the big guns and defending tragicomedy

in terms of the compromise status and precarious intellectual dignity of manrdquo [Eacute importante que neste

trecho de Il Verrato [hellip] Guarini proponha Hermoacutegenes como um expoente da flexibilidade estiliacutestica

contra Demeacutetrio a autoridade de seu oponente cujo esquema faz-se parecer por contraste riacutegido poreacutem

ainda mais significativo eacute o fato de que ele escolha sustentar um ponto de criacutetica praacutetica exibindo as armas

e defendendo a tragicomeacutedia em termos de posiccedilatildeo de conciliaccedilatildeo e de precaacuteria dignidade intelectual do

homem] cf PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New

Jersey Princeton University Press 1970 p 35 Pocircde-se observar a leitura aqui proposta natildeo corrobora a

compreensatildeo de Patterson 823 Traduccedilatildeo nossa

269

harmoniosa que resulta da variedade leu-se passo semelhante no apologeacutetico A quem

disse tu eacutes um Prometeu em teus discursos de Luciano de Samoacutesata A segunda faz da

aparecircncia humana o resultado da junccedilatildeo de partes ldquodagli occhi amp dalla bocca amp dal

manto amp dallrsquoaltre partirdquo que arranjadas conferem determinada feiccedilatildeo Eacute o que

Giovanni Battista Guarini mira em termos discursivos

Assim os tons musicais assim o aspecto humano assim tambeacutem o poema

tragicocircmico A unidade de composiccedilatildeo poeacutetica que lhe eacute asseverada resulta de trabalho

de escrita com as parti que a doutrina entende serem constituintes discursivos ou seja

sentenza metodo locutione figura testura e numero Como Giovanni Battista Guarini

natildeo deixaraacute de explicitar Il Verrato apresenta exposiccedilatildeo de aparato teoacuterico que decorre

das liccedilotildees do Peri ideōnde Hermoacutegenes para quem a fim de que se enformem os

discursos devem ser orquestrados os elementos que operativamente lhes forjem as ideai

as formas do discurso Como jaacute eacute sabido satildeo eles ennoia (pensamento) methodos

(meacutetodo) e lexis (elocuccedilatildeo) a qual por sua vez se faz de skhēmata (figuras) kōla

(membros) synthesis ou synthēkē (composiccedilatildeo) anapausis (claacuteusula) e rhythmos (ritmo)

Eacute verdade Il Verrato natildeo deixa ler exposiccedilatildeo exaustiva nem seria apropriado que

assim o fosse imperativo o decoro de gecircnero que nada tem da tratadiacutestica no entanto daacute

agrave vista que Giovanni Battista Guarini embora abone os preceitos de Hermoacutegenes e

traduza ennoia por sentenza methodos pormetodo lexis por locutione skhēmata

porfigure synthesis ou synthēkē por testura e rhytmos por numero subtrai a esse elenco

de constituintes mediante os quais o logos ganha forma dois de seus elementos ou seja

natildeo aponta equivalentes vernaculares que signifiquem kōla e anapausis membros e

claacuteusula Em razatildeo disso Giovanni Battista Guarini diverge de Hermoacutegenes Mas natildeo soacute

diverge tambeacutem de leitores italianos do retor grego que lhe satildeo contemporacircneos como

Giulio Camillo Delminio ou Filiberto Campanile

Recorde-se Giulio Camillo Delminio no Discorso di M Giulio Camillo sopra

Hermogene (1560) afirma que ldquociascuna forma si compone di otto coserdquo a saber

ldquosensordquo ldquomethodordquo ldquoparolerdquo ldquofigurerdquo ldquomembrirdquo ldquocompositionerdquo ldquofirmamentirdquo e

ldquonumerirdquo 824 Essas cose no Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene

824 Cf Il secondo tomo dellrsquoopere di M di Giulio Camillo Delminio cioegrave La Topica ouero dellrsquoElocutione

Discorso sopra lrsquoIdee di Hermogene La Grammatica Espositione sopra il primo amp secondo Sonetto del

Petrarca Nvovamente dato in lvce Con privilegio In Venegia apresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLX

[1560] p 86

270

considerate amp ridotte in questa lingua per M Giulio Camillo Delminio Friulano satildeo

ldquosensordquo ldquomethodordquo ldquoparlarerdquo ldquofigurardquo ldquomembrordquo ldquocompositionerdquo ldquoposamentordquo e

ldquonumerordquo (1594) 825 Jaacute em Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto

Campanile secondo l a dottrina drsquoHermogene e datri retori antichi (1606) leem-se

senso ou sentenza methodo parole figura membro compositione posamento ou

finimento e numero Filiberto Campanile amiuacutede traduz os Rhetoricorum Libri V

vertendo o latim ao italiano826 Em Jorge de Trebizonda os termos empregados satildeo

sententia methodus ou artificium e compositio a qual por sua vez se distingue em dictio

ou uerba exornatio collocatio clausula e numero827 Num e noutro caso satildeo oito os

constituintes A confrontaccedilatildeo dos empregos lexicais evidencia que natildeo haacute estrita

correspondecircncia entre Filiberto Campanile e Jorge de Trebizonda a despeito das

aproximaccedilotildees Isso vale para Giovanni Battista Guarini marcadas as divergecircncias entre

as liccedilotildees

De fato sobretudo elas eacute que ecoam Ampliadas agrave medida que citadas diferentes

glosas e comentaacuterios ao Peri ideōn diferentes tratados que o referem A glosa de Giovanni

Battista Guarini em particular pode ganhar compreensatildeo plausiacutevel se consideradas as

Institutiones Rhetoricae ex progymnasmatis potissimum Aphtonii atque ex Hermogenis

arte de Pedro Juan Nuntildeez editadas em Barcelona em 1578 De acordo com Nuntildeez

ensina Hermoacutegenes serem oito as partes de que se faz qualquer ideia

[] sunt autem hae sententiae methodus idest figura sententiae (sic

enim appellat hoc loco figuras sententiarum) dictio figura idest figura

dictionis vt per excellentiam nomine generis appelletur longitudo

membrorum aut incisorum compositio clausula amp rhytmus Tzetzes

tamen existimauit ultimatilde partem superuacaneam esse quod ex

numerorum collocatione amp clausula ita perficiatur vt omnino nihil

aliud sit rhytmus quatilde apta quaedam numerorum in membris amp incisis

825 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste srsquoaggiunge lrsquoArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 3r 826 Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene e

drsquo altri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI [1606] Con licenza dersquo superiori

p 13 827 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] p 497

271

collocatio cum clausula illis congruente nam si clausula non sit

consentiens ceteris numeris orationis vt docet Hermogenes aliud

genus rhytmi constituetur posset quidem Hermogenes ex ijs quae

nuper diximus contra Tzetzem defendi sed quia sententia Tzetzae

faciliorem reddit totam hanc disputationem eam quia satis probabilis

est sequemur vt septem ad summum partes singulis ideis tribuamus

[hellip]828

Ora satildeo estas [as partes] pensamentos meacutetodo isto eacute figura de

pensamento (pois assim neste passo [Hermoacutegenes] denomina as

figuras de pensamento) dicccedilatildeo figura isto eacute figura de dicccedilatildeo como

por excelecircncia eacute designada com nome geneacuterico extensatildeo dos membros

ou dos incisos composiccedilatildeo claacuteusula amp ritmo Tzetzes todavia julgou

ser supeacuterflua a uacuteltima parte porque ademais tanto a claacuteusula perfaz-se

do arranjo das cadecircncias quanto o ritmo natildeo eacute em absoluto senatildeo que

um certo arranjo adequado das cadecircncias nos membros amp nos incisos

com claacuteusula apropriada a elas De fato se a claacuteusula natildeo estiver de

acordo com as demais cadecircncias do discurso como ensina Hermoacutegenes

seraacute constituiacutedo outro gecircnero de ritmo Poderia certamente Hermoacutegenes

defender-se disso que afirmamos haacute pouco contra Tzetzes poreacutem logo

que o pensamento de Tzetzes torna mais faacutecil toda esta disputa noacutes o

seguiremos pois eacute bastante provaacutevel que atribuamos no maacuteximo sete

partes a cada uma das ideias [hellip]829

Trata-se de siacutentese da doutrina retoacuterica de Hermoacutegenes amparada na autoridade

do gramaacutetico bizantino Joatildeo Tzetzes (seacutec XII) Muito possivelmente seja esta alusatildeo ao

seu Epitomē rhētorikēs830 Interessam do passo de Pedro Juan Nuntildeez a asserccedilatildeo da

assimilaccedilatildeo do rhytmus agrave clausula no esquema das partes constitutivas do discurso e a

consequente anulaccedilatildeo da especificidade dessa categoria de enformaccedilatildeo do logos De fato

Joatildeo Tzetzes parece amparar-se em Hermoacutegenes que ensina que o ritmo produz-se da

conjugaccedilatildeo de determinada claacuteusula com determinada composiccedilatildeo (cf HERM 260 7)

828 Institutiones Rhetoricae ex progymnasmatis potissimum Aphtonii atque ex Hermogenis arte 1573 pp

302-3 829 Traduccedilatildeo nossa 830 Trata-se de obra natildeo consultada

272

poreacutem disso resulta a explicitaccedilatildeo das razotildees pelas quais o gramaacutetico e o tratadista

subtraem o ritmo ao elenco dos stoikheia tal como apresentado por Hermoacutegenes Pode-

se dessa maneira supor que assim como Joatildeo Tzetzes e Pedro Juan Nuntildeez reduzam esse

elenco de oito para sete constituintes por entenderem haver assimilaccedilatildeo de categorias

assim tambeacutem talvez o faccedila Giovanni Battista Guarini ao reter em Il Verrato tatildeo-

somente seis dos oito ou seja (i) sentenza (ii) metodo (iii) locutione (iv) figura (v)

testura e (vi) numero Consoante Hermoacutegenes os stoikheia subtraiacutedos agrave doutrina satildeo

constituintes proacuteprios agrave lexis Supotildee-se que Giovanni Battista Guarini imiscua as partes

do discurso e natildeo atribua aos kōla e agrave anapausis traccedilos que lhes sejam distintivos

enquanto categorias elementares no acircmbito da enformaccedilatildeo discursiva Natildeo desaparecem

obviamente da praacutetica de oradores e poetas apenas reduzem-se a outras rubricas no corpo

da doutrina que enfrenta Giason Denores

Diga-se os stoikheia as ldquoparti dogni formardquo satildeo como que operadores cuja

designaccedilatildeo ou delimitaccedilatildeo nem sempre eacute coincidente de tratadista para tratadista de

tratado para tratado Sob as divergecircncias e sobretudo a despeito delas haacute a autoridade

de Hermoacutegenes que na particularidade de cada enunciado natildeo as anula nem as desdiz

antes lhes daacute consentimento e deixa liccedilatildeo de como operar o misto cujo temperamento

produz o misto tragicocircmico de acordo com Giovanni Battista Guarini Vale ler longo

passo de Il Verrato em que isso se enuncia

Hor come fa il Tragicomico nel temperar il suo stile Certamente non

faragrave come voi accennate la sentenza ograve la figura della forma sublime

amp la locuzione el numero del dimesso ma moderando la grauitagrave della

sentenza con que modi che la sogliono far humile amp altresi

sostenendo lrsquohumiltagrave dalcuna ograve persona ograve soggetto di che egli tratti

con vn poco di quella nobiltagrave di favella chrsquoegrave propria della magnifica

va facendo una Idea secondo la soggetta materia ne tanto grande che

sormonti alla Tragica ne tanto humile che saccosti alla Comica amp

cosi discorrendo nellaltre parti andragrave con le contrarie qualitagrave

dolcemente temperando la sua testura831

831 Idem pp 37r-37v O mesmo passo de Guarini eacute alvo de Annabel M Patterson no livro Hermogenes

and the Renaissance Seven Ideas of Style Afirma a estudiosa ldquoIts important that in this part of Il Verrato

[] Guarini sets Hermogenes as an exponent of stylistic flexibility against his opponents authority

Demetrius whose scheme is made to seem rigid by contrast but more significant still is the fact that he

chooses to support a point of practical criticism by bringing out the big guns and defending tragicomedy

273

Ora como faz o Tragicocircmico no temperar o seu estilo Certamente natildeo

faraacute como voacutes acenais [manejando] a sentenccedila ou a figura da forma

sublime amp a elocuccedilatildeo e o ritmo do [estilo] modesto poreacutem moderando

a gravidade da sentenccedila com aqueles modos que soem fazecirc-la humilde

amp tambeacutem sustendo a humildade de alguma personagem ou assunto de

que ele trate com um pouco daquela nobreza de palavra que eacute proacutepria

da [forma] magniacutefica vai [o Tragicocircmico] compondo uma Ideia

segundo a mateacuteria exposta nem tatildeo grandiosa que se sobreponha agrave

Traacutegica nem tatildeo humilde que se aproxime da Cocircmica amp tambeacutem

percorrendo as outras partes andaraacute com as qualidades contraacuterias

docemente temperando a sua textura 832

Giovanni Battista Guarini figura na voz dramaacutetica de Verrato coacutedigos que

prescrevem aptidatildeo e inaptidatildeo no trato poeacutetico No trecho antepotildee-se o viacutecio agrave virtude

Por um lado consoante os termos da contenda fazer como Giason Denores o interlocutor

a quem o Verrato interpela eacute natildeo enformar o misto tragicocircmico sequer compor boa poesia

mas forjar poema por intermeacutedio da ldquosentenza ograve la figura della forma sublime amp la

locuzione ersquol numero del dimessordquo isto eacute pocircr em praacutetica a desfiguraccedilatildeo da unidade

poeacutetica A assertiva vituperante de Giovanni Battista Guarini assim enunciada mira

desqualificar o contendor e faz da proacutepria dissensatildeo obra de ineacutepcia de juiacutezo e de

desconhecimento da arte

Por outro lado o entrecruzamento de doutrinas retoacutericas ganha corpo o nome de

Hermoacutegenes apotildee-se ao de Demeacutetrio e o ladeia como autoridade de apreccedilo Nomeados

ambos o alvo aparenta ser um soacute a saber a assertiva de Denores antes referida de que

nenhum autor antigo de seu conhecimento tenha abordado a tragicomeacutedia833 Refutar essa

assertiva pois eacute pocircr em quem a afirma a tacha de inculto Sabe-se em verdade os dois

in terms of the compromise status and precarious intellectual dignity of manrdquo [Eacute importante que neste

trecho de Il Verrato [hellip] Guarini proponha Hermoacutegenes como um expoente da flexibilidade estiliacutestica contra Demeacutetrio a autoridade de seu oponente cujo esquema faz-se parecer por contraste riacutegido poreacutem

ainda mais significativo eacute o fato de que ele escolha sustentar um ponto de criacutetica praacutetica exibindo as armas

e defendendo a tragicomeacutedia em termos de posiccedilatildeo de conciliaccedilatildeo e de precaacuteria dignidade intelectual do

homem] PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New Jersey

Princeton University Press 1970 p 35 Pocircde-se observar a leitura aqui proposta natildeo corrobora a

compreensatildeo de Patterson 832 Traduccedilatildeo nossa 833 Discorso di Iason Denores intorno a quersquo Principii Causae et Accrescimenti che la Commedia la

Tragedia et il Poema Heroico Ricevono dalla Filosofia Morale amp Ciuile amp darsquo Gouernatori delle

RepublicheAllrsquoIlustrissimo et Molto Reverendo Signor Abbate Galeazzo Riario Con Priuilegio In

Padova Apresso Paulo Meieto 1587 p 38v

274

retores gregos natildeo prescreveram o gecircnero contudo subentende-se da leitura de Il Verrato

a analogia das praacuteticas poeacuteticas fazer tragicomeacutedia eacute fazer ao modo de ldquoDemostene amp

Senofonte amp Platonerdquo (cf HERM 224 21) porque opera-se doutrina que a prevecirc Ou ao

modo de Dante Alighieri (1265-1321) Francesco Petrarca (1304-1374) Giovanni

Boccacio (1313-1375) e Pietro Bembo (1470-1547) considerados os exemplos que

Filiberto Campanile recolhe Assim Hermoacutegenes e Demeacutetrio sustentam o passo de

doutrina em discussatildeo como agudamente o contendor o enuncia Sustecircm enfim a

desfiguraccedilatildeo do monstrum

Sabe-se Giovanni Battista Guarini assevera a mistura tragicocircmica e refere

Hermoacutegenes agrave luz das liccedilotildees do Peri ideōn Mais especificamente jaacute parece claro

legitima a obra do poeta dramaacutetico a liccedilatildeo de Hermoacutegenes Ela codifica a praacutetica do

temperamento e enforma sobretudo a variedade amparada no pormenor da doutrina

visto o discurso decomposto em partes de efeito compor-se segundo o retor como

siacutentese do diverso Efetua-se assim de acordo com esta praacutetica de matizes a nuanccedila que

afasta a uniformidade averso inaacutebil e confere unidade a todo discursivo como o poema

tragicocircmico cujas partes o preceito fragmenta a fim de que se possam mesclar mirando

o hibridismo caracteriacutestico do gecircnero A mistura eacute de stili As partes Giovanni Battista

Guarini natildeo as esmiuacuteccedila de maneira exaustiva por razotildees jaacute aventadas De fato como foi

possiacutevel ler expotildee trecircs instruccedilotildees bastantemente breves que condensam a praacutetica ensinada

para combatecirc-la do descreacutedito Vale tentar desdobrar os passos da prescriccedilatildeo subjacente

ao argumento e agraves instruccedilotildees do poeta conveacutem moderar ldquoa grauitagrave della sentenza con

quersquo modi che la sogliono far humilerdquo

Sabe-se ldquograuitagraverdquo eacute termo que comumente verte ao italiano o grego deinotēs

como decalque do latim ldquograuitasrdquo em conformidade com as liccedilotildees estabelecidas por

Jorge de Trebizonda Como interessaraacute ensinam os Rhetoricorum libri V que nesta

acepccedilatildeo no sentido estrito que ora conveacutem grauitas eacute ldquoquaeligdam orationis elatiordquo

(elevaccedilatildeo de qualquer discurso) ou seja como ldquouerbo grauitasrdquo (gravidade de palavra)

eacute forma dicendi cujas sententiae sejam ldquosubtiles mirabiles altaelig acutaeligrdquo (sutis

admiraacuteveis altas agudas) as quais se creiam pensadas senatildeo que por homens

ldquoprudentiacutessimosrdquo e tambeacutem que sejam proacuteprias da grandis oratio (discurso grandioso)

a qual por definiccedilatildeo excede os usos comuns ao estilo puro834 Afirma-se ldquograuitagraverdquo eacute

834 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] pp 496-7 603-4

275

comumente empregado em lugar de ldquodeinotēsrdquo entre autores italianos natildeo se deve

esquecer todavia que Giulio Camillo Delminio lecirc natildeo deinotēs mas semnotēs como

ldquograuitaterdquo ou ldquoseueritaterdquo 835

Filiberto Campanile em Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia repotildee a prescriccedilatildeo

das ldquosentenzerdquo que constituem a grauitagrave poreacutem em lugar de buscar exemplos em Ciacutecero

como Jorge de Trebizonda que cita o Pro Cluentio refere Francesco Petrarca e Pietro

Bembo agrave guisa de ilustraccedilatildeo De Francesco Petrarca busca apenas dois versos a saber

ldquoVn bel morir tutta la vita honorardquo (Um belo morrer toda a vida honra) e ldquoGran giustitia

a gli amanti egrave grave offesardquo (Grande justiccedila aos amantes eacute grave ofensa) o primeiro dos

Canzonieri o segundo dos Triumphi Satildeo ambos sentenciosos em sua gravidade De

Pietro Bembo busca dois trechos de Gli Asolani diaacutelogo que tematiza a natureza do amor

Um dos trechos eacute este que segue

Se cosigrave egrave[ disse alhotta il santo uomo] che la ragione sia de gli

huomini amp il senso delle fiere percioche dubbio non egrave che la ragione

piugrave perfetta cosa non sia chel senso quelli che amando la ragione

seguono ne loro amori la cosa piugrave perfetta seguendo fanno intanto

come uomini e quelli che seguono il senso dietro alla meno perfetta

mettendosi fanno come fiere836

Se assim eacute[ disse entatildeo o santo homem] que a razatildeo seja proacutepria dos

homens amp o sentido das feras porque natildeo haacute duacutevida de que a razatildeo

seja coisa mais perfeita que o sentido aqueles que amando seguem a

razatildeo seguindo no seu amor a coisa mais perfeita fazem entrementes

como homens e aqueles que seguem o sentido pondo-se atraacutes da menos

perfeita fazem como feras837

835 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 8v 836 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 136

Filiberto Campanile exclui do exemplo o trecho entre colchetes citado aqui segundo a ediccedilatildeo de Aldo

Manuacutecio Gli Asolani di Messer Pietro Bembo [Impressi in Venetia nelle case dAldo Romano 1505] p

117v 837 Traduccedilatildeo nossa Em versatildeo francesa de 1576 lecirc-se ldquoSil est ainsi[ motilde filz repliqua le sain amp hermite]

que la raisotilde soit propre aux hotildemes amp le sentimẽt aux bestes pource quil ny agrave point de doubte que ceste

partie diuine est plus parfaicte que les sens cotildemun ceulx qui en leurs amours suyuẽt la voye plus louable

276

Filiberto Campanile natildeo tece comentaacuterios aos exemplos Supotildeem-nos graves e

evidentemente graves visto ilustrarem forma de grauitagrave ldquoche amp egrave e dimostra essererdquo838

Ademais evidenciam a mencionada interseccedilatildeo das idee no corpo da doutrina os passos

em verso de Francesco Petrarca e em prosa de Pietro Bembo compotildeem-se de sentenze

que efetuam tanto a gravitagrave quanto a maestagrave ou dignitagrave (diga-se semnotēs) espeacutecie de

grandezza (cf HERM 242-54) ou seja pensam mateacuteria concernente ao homem e agrave vida

humana da ordem da imortalidade da alma da justiccedila da prudecircncia e do que a isso se

assemelhe839 Eacute conveniente notar que na medida em que as sentenze os pensamentos

que efetuam a deinotēs efetuam tambeacutem a semnotēs neste caso pouco faz que gravitagrave

diga uma ou outra idea

Para compor-se o poema tragicocircmico de acordo com a instruccedilatildeo de Giovanni

Battista Guarini eacute adequado que pensamentos dessa grandeza sejam moderados Isto eacute

que o enlevo e a altivez que lhes satildeo caracteriacutesticos convenientes agrave mateacuteria que enformam

temperem-se por intermeacutedio de ldquoquersquo modi che la sogliono far humilerdquo Esses modi natildeo

satildeo meios quaisquer Em Filiberto Campanile o adjetivo ldquohumilerdquo qualifica os

procedimentos retoacutericos e poeacuteticos adequados agrave construccedilatildeo da semplicitagrave tambeacutem dita

bassezza ou humiltagrave (apheleia) espeacutecie de ēthos (affectio costume) que por contraste

manobra pensamentos comuns a todos ndash a saber de acordo com Campanile ldquoproprie dersquo

fanciulli di Dotildene di lauoratori di pastori e finalmente dogni maniera di persone rozze

amp idiote 840 (proacuteprios das crianccedilas das Mulheres dos lavradores dos pastores e

finalmente de toda maneira de pessoas ruacutesticas amp iletradas) ndash nada sutis natildeo raro

ingecircnuos pueris ateacute (cf HERM 322 5) tais quais os que tratam em muitos casos

Anacreonte e Teacuteocrito segundo a liccedilatildeo de Hermoacutegenes (cf HERM 322 20) Virgiacutelio

segundo a de Jorge de Trebizonda841 e Teacuteocrito Virgiacutelio Giovanni Boccacio e Jacopo

Sannazaro segundo a de Filiberto Campanile842 Refere no entanto Giovanni Battista

sont office amp devoir dhommes amp ceulx qui se laissent transporter agrave sensualiteacute poursuyuant la chose moins

parfaicte sont vraies actes des bestes brutesrdquo Cf Les Azolains de Mon Seignevr Pierre Bembo de la nature Damour Traduictz ditalien em Franccedilois par Jean Martin Secretaire de Monseigneur le reverendiszligime

Cardinal de Lenoncourt A Paris pour Galiot du Preacute rueuml S Iacque agrave lenseigne de la Galere dOr 1576

pp 246-7 838 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 135 839 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 33 840 Idem p 99 841 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] p 580 842 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

277

Guarini natildeo esses pensamentos mas o que mais compete agrave humiltaacute isto eacute os constituintes

de estilo que tornam humile e tambeacutem puro o discurso que natildeo se ocupa de pensamentos

dessa ordem (cf HERM 328 1) Satildeo esses constituintes como prescreve Hermoacutegenes a

lexis os skhēmata e ldquoos demaisrdquo stoikheia (cf HERM 328 4-5) Diga-se na doutrina

prescrita por Hermoacutegenes apheleia (humiltaacute) e katharotēs (puritagrave) recobrem natildeo raro

os mesmos efeitos e efetuam-se mediante as mesmas estrateacutegias Isso ocorre com a

elocuccedilatildeo as figuras dessa espeacutecie e os restantes constituintes discursivos os quais podem

temperar a gravidade dos pensamentos ou construir matizes pendentes agrave simplicidade

Assim o que se esmiuacuteccedila eacute revisatildeo de doutrina jaacute vista

Dessa maneira no acircmbito da elocuccedilatildeo segundo o passo da doutrina conveacutem fazer

uso de vocaacutebulos propriamente simples como adelphizein (ldquochamar de

irmatildeordquo) lido em Isoacutecrates843 e klausigelōs (ldquoriso aos prantosrdquo) lido em

Xenofonte844 visto que para Hermoacutegenes satildeo esses exemplos de muita simplicidade e

uacuteteis agrave composiccedilatildeo eacutetica do discurso Reafirma Campanile o uso de ldquovoci nouerdquo (palavras

novas) como imparadisa845 que ldquoconduce per lo paradisordquo e impola846 que ldquosi gira

sopra il polordquo lidos em Dante Esses termos de acordo com as liccedilotildees que os citam

conferem dolcezza ou glykytēs certo sabor agrave simplicidade (cf HERM 328 19) 847

Tambeacutem eacute conveniente fazer uso de leacutexico puro e simples isto eacute de emprego corrente

como se sabe nem translato nem foneticamente duro (cf HERM 229 10-16 258 14-

15)848 No acircmbito das figuras para o temperamento preceitua-se o uso da construccedilatildeo

direta (ldquoorationis rectitudordquo ldquoRettitudine del parlarerdquo) (cf HERM 230 19) que aparte

do discurso os pensamentos encadeados proacuteprios em conformidade com os preceitos do

Peri ideōn agrave peribolē (circuitione) Os demais elementos enformadores do discurso

bem temperado aptos a humildar a gravidade de sentenze no leacutexico de Giovanni Battista

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori p 99 843 Cf ISOCR 19 30 Segundo o Liddell-Scott-Jones Greek-English Lexicon traduz-se este infinitivo por

ldquoadopt as a brother call brotherrdquo O tradutor francecircs Michel Patillon 844 Cf XEN Hell 7 2 9 Segundo o Liddell-Scott-Jones o substantivo referido por Hermoacutegenes significa

ldquosmiles mixed with tearsrdquo Sigo nesse sentido Patillon que compotildee o neologismo ldquorire-en-pleursrdquo Lecirc-se

tambeacutem em Demeacutetrio (DEMETR 28) 845 Cf DANTE ALIGHIERI Commedia Paradiso XXVIII 3 O verso eacute ldquoQuella che imparadisa la mia menterdquo

(Aquela que emparaiacutesa a minha mente) 846 Cf DANTE ALIGHIERI Commedia Paradiso XXII 67 O verso eacute ldquoPerche non egrave in loco e non srsquoimpolardquo

(Porque natildeo estaacute no espaccedilo nem se impola) 847 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori pp 103-

104 848 Idem p 46

278

Guarini como os restantes modi que soem fazecirc-lo podem ser o ldquometodordquo a ldquotesturardquo e

o ldquonumerordquo como jaacute eacute sabido interpretaccedilotildees vernaculares de methodos synthesis (ou

synthēkē) e rhythmos respectivamente

Hermoacutegenes ensina que tornam simples e tambeacutem puras as formas os arranjos

sintaacuteticos soltos e os ritmos de mesma espeacutecie que deles decorrem (cf HERM 229 11-

13) De acordo com o tratadista a simplicidade de sintaxe consente o hiato intervocaacutelico

porque o preceito de evitaacute-lo manifesta diligecircncia mais afeita agrave ornamentaccedilatildeo que agrave

pureza e recomenda o texto prosaico em que sobressaia a prosoacutedia iacircmbica ou trocaica

em mescla com diferentes peacutes como o daacutectilo e o espondeu de modo que natildeo se

estabeleccedila a regularidade do verso mas a meacutetrica de feiccedilatildeo corrente que dissimule o

artifiacutecio O ritmo que o arranjo puro e a pausa () produzem conveacutem que

esteja entre o metro ausente e o metro por natureza da liacutengua grega (cf HERM 232 8-

233-2) 849 Hermoacutegenes pondera que embora synthesis (ou synthēkē) rhythmos e

anapausis concorram agrave efetuaccedilatildeo da pureza satildeo de contribuiccedilatildeo restrita Natildeo haacute

exemplos em Campanile que avancem a interpretaccedilatildeo da liccedilatildeo grega Resta agrave luz das

categorias estiliacutesticas em operaccedilatildeo com vistas agrave pureza do discurso o preceito do metodo

Muito brevemente eacute assunto jaacute percorrido conveacutem de acordo com a normatizaccedilatildeo do

Peri ideōn a aphēgēsis (narraccedilatildeo) restrista agrave accedilatildeo sem enredamentos circunstanciais (cf

HERM 227 19-228 3 228 24 229 2 229 4)

As liccedilotildees dos Progymnasmata retoacutericos atribuiacutedos a Hermoacutegenes fazem avanccedilar

a compreensatildeo do procedimento Eacute sabido esses exerciacutecios instruem a praacutetica do diēgēma

ldquoexposiccedilatildeo das coisas sucedidas ou como sucedidasrdquo (cf HERM 4 6-7) Tanto o

Pseudo-Hermoacutegenes como Eacutelio Teatildeo (ca I dC) Aftocircnio (seacutec IV dC) e Nicolau o

Sofista (seacutec V dC) Marcos Martinho dos Santos minuciosamente o demonstra

contrastam diēgēsise diēgēmaao modo de poesis (poesia) e poiēma (poema) de sorte a

propor que assim como a Iliacuteada eacute poesia e o iliaacutedico episoacutedio das armas de Aquiles eacute

poema como todo e parte assim tambeacutem diēgēsis pende agrave integralidade e diēgēmaagrave

parcialidade como parte que se compotildee de mais partes para a constituiccedilatildeo do todo850

849 Trata-se do iambo de acordo com Aristoacuteteles e Demeacutetrio (cf ARIST Poet 1449 a DEMETR 42) Satildeo

semelhantes as colocaccedilotildees de Ciacutecero em relaccedilatildeo ao latim (cf CIC Or 56 189 57 191) 850 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

195 SANTOS M M ldquoAcerca das diferenccedilas doutrinais entre os Praeexercitamina de Prisciano e os

Progymnaacutesmata do Ps-Hermoacutegenesrdquo In ASSUNCcedilAtildeO T R FLORES-JUacuteNIOR O SANTOS M M (Org)

Ensaios de retoacuterica antiga Belo Horizonte Tessitura 2010 pp 270-4 283-7

279

Tradutor dos Progymnasmata Michel Patillon busca manter essa distinccedilatildeo

vertendo diēgēsis por ldquoœuvre narrativerdquo ou ldquonarrationrdquo e diēgēmapor ldquoreacutecitrdquo851 Em

posiccedilatildeo semelhante George A Kennedy opta respectivamente por ldquonarrationrdquo e

ldquonarrativerdquo852 Marcos Martinho ao analisar o caso no artigo citado em nota interpreta

diēgēsis como ldquonarraccedilatildeordquo e diēgēma como ldquonarrado 853 Essas escolhas em liacutengua

portuguesa satildeo condizentes com as de Jacyntho Lins Brandatildeo no estudo A invenccedilatildeo do

romance Propotildee Jacyntho que narraccedilatildeo designe ldquoo ato de narrarrdquo como diēgēsis que

narrado ldquoo produto da narraccedilatildeordquo como diēgēma que narrativa o gecircnero como

diēgēmatikē e que narrativo refira a narrativa ou a narraccedilatildeo como diēgēmatikon de

maneira a guardar as diferenccedilas que haacute como visto entre poesis (poesia)

poiēma(poema) poiētikē(poeacutetica a arte) e poiētikos(poeacutetico)854

Il Pastor Fido talvez seja supeacuterfluo afirmaacute-lo como obra de poesia natildeo eacute

estritamente narraccedilatildeo narrativa ou poema narrativo todavia de acordo com o Pseudo-

Hermoacutegenes eacute liacutecito que se valha Giovanni Battista Guarini do narrado o diēgēma para

enformaacute-lo Esse produto da narraccedilatildeo de acordo com o Pseudo-Hermoacutegenes enuncia-se

sob quatro diferentes espeacutecies O segundo tipo diz-se ldquofictiacuteciordquo ()ou

ldquodramaacuteticordquo () Como plasmatikon o relato dessa espeacutecie resulta da forja

do enunciador e expotildee o que Sexto Empiacuterico (seacutec II dC) designa como plasma

() a saber mateacuteria de ficccedilatildeo de comeacutedias e pantominas mateacuteria como sucedida

por isso verossiacutemil distante tanto da faacutebula () afeita ao natildeo sucedido e ao falso

mateacuteria das trageacutedias quanto da histoacuteria () afeita ao sucedido e ao verdadeiro855

Como drammatikon ademais o relato resulta da exposiccedilatildeo imediata de personagem em

accedilatildeo sem a intervenccedilatildeo enunciativa do poeta como eacute proacuteprio da trageacutedia Conveacutem

851 HERMOGEgraveNE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon

Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 131 852 KENNEDY G A Invention and Method Two Rhetorical Treatises from the Hermogenic Corpus Translated with introductions and notes by George A Kennedy Atlanta SBL 2005 p 75 853 Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 p

195 SANTOS M M ldquoAcerca das diferenccedilas doutrinais entre os Praeexercitamina de Prisciano e os

Progymnaacutesmata do Ps-Hermoacutegenesrdquo In ASSUNCcedilAtildeO T R FLORES-JUacuteNIOR O SANTOS M M (Org)

Ensaios de retoacuterica antiga Belo Horizonte Tessitura 2010 pp 270-4 283-7 854 BRANDAtildeO J L A invenccedilatildeo do romance Narrativa e mimese no romance grego Brasiacutelia Editora UnB

2005 p 37 855 SANTOS M M ldquoAcerca das diferenccedilas doutrinais entre os Praeexercitamina de Prisciano e os

Progymnaacutesmata do Ps-Hermoacutegenesrdquo p 270 CASSIN B O efeito sofiacutestico sofiacutestica filosofia retoacuterica

literatura Traduccedilatildeo dos ensaios de Ana Luacutecia de Oliveira e Maria Cristina Franco Ferraz Traduccedilatildeo dos

documentos de Paulo Pinheiro Satildeo Paulo 34 pp 223-8

280

recordar nesse caso que como jaacute mencionado no princiacutepio deste trabalho drammatikon

abarca em Diomedes um dos trecircs genera poematos ou modi dicendi ou characteres

dicendi como propotildee Alexandre Hasegawa Escreve o gramaacutetico

Poematos genera sunt tria aut enim actiuum est uel imitatiuum quod

Graeci uel aut enarratiuum uel

enuntiatiuum quod Graeci uel dicunt

aut commune uel mixtum quod Graeci uel appellant

est uel actiuum in quo personae agunt solae sine poetae

interlocutione ut se habent tragicae et comicae fabulae []

est uel enarrativum in quo poeta ipse loquitur sine ullius

personae interlocutione [hellip] est uel commune in quo poeta

ipse loquitur et personae loquentes introducuntur [] (DIOM Art

Gramm III 482 14-25)

Trecircs satildeo os gecircneros de poemas pois ou eacute ativo e imitativo que os

gregos (chamam de) drammatikon e mimētikon ou narrativo e

enunciativo que os gregos chamam de exēgētikone apaggetikonou

comum e misto que os gregos nomeiam como koinon e mikton Eacute

drammatikon e ativo (o poema) em que agem soacute as personagens sem a

interlocuccedilatildeo do poeta como satildeo as faacutebulas856 traacutegicas e cocircmicas []

exēgētikon e narrativo (o poema) em que o proacuteprio poeta fala sem a

interlocuccedilatildeo de alguma personagem [hellip] koinon e comum (o poema)

em que o proacuteprio poeta fala e introduzem-se personagens que falam

[]857

Desse modo itera-se por meio da doutrina referida abonada por Seacutervio Honorato

e Probo conhecida de Joatildeo de Garlacircndia (seacutec XII-XIII dC) agrave luz da Repuacuteblica de

Platatildeo (cf 392 d-394 d) espeacutecie de diēgēma que se constitui como expediente narrativo

apropriado ao gecircnero de poema dramaacutetico 858 Essa conclusatildeo natildeo deve anular as

856 A traduccedilatildeo do estudioso traz ldquopoemasrdquo Altero pontualmente ldquopoemasrdquo por ldquofaacutebulas 857 Cf HASEGAWA A P Os limites do gecircnero bucoacutelico em Vergiacutelio um estudo das eacuteclogas dramaacuteticas Satildeo

Paulo Humanitas 2012 pp 56-7 858 Idem pp 54-8

281

diferenccedilas lexicais das liccedilotildees examinadas pois que Hermoacutegenes preceitua a praacutetica da

aphēgēsis narraccedilatildeo cujo produto pode-se supor seja dito aphēgēmanarrado e o

Pseudo-Hermoacutegenes a praacutetica da diēgēsisnarraccedilatildeo da qual resulta o diēgēmanarrado

no entanto talvez seja suposiccedilatildeo coerente que os atos e produtos designados pelos termos

gregos tenham-se confundido em versotildees latinas ou vernaacuteculas dessas liccedilotildees de retoacuterica

Leitor privilegiado de Hermoacutegenes Jorge de Trebizonda ao prescrever a pureza

de meacutetodo que interessa a Giovanni Battista Guarini conforme o Peri ideōn verte o

preceito ao latim e vale-se de enarro (ldquoenarrabimusrdquo explicaremos diremos em

detalhe859) para traduzir aphēgeomai Filiberto Campanile talvez estribado em Jorge de

Trebizonda faz uso do geruacutendio ldquonarrandordquo e do substantivo ldquonarrationerdquo860 Mas natildeo

soacute Johannes Sturm na interpretaccedilatildeo estampada em 1571 emprega ldquonarraturrdquo ldquoin

narrandordquo e ldquonarrandordquo 861 Na versatildeo de Garpard Laurent leem-se ldquonarratrdquo ldquoin

ldquonarrationib[us]rdquo ldquonarratiordquo ldquonarrationẽ rdquo ldquonarratiordquo e ldquoNarratiordquo862 Em todos esses

casos ainda que os exemplos natildeo sejam exaustivos a mesma famiacutelia lexical emprega-se

para encerrar a praacutetica da aphēgēsis Eacute famiacutelia latina e vernaacutecula que soe designar a esfera

de sentido da diēgēsis Na versatildeo do tratado do Pseudo-Hermoacutegenes elaborada pelo

gramaacutetico Prisciano (seacutec II dC) diēgēma eacute narratio e latinamente em estampa de 1544

define-se como ldquoexpositio rei factae uel quasi factaerdquo863

Natildeo eacute de todo ineficaz pois agraves estrateacutegias de produccedilatildeo do discurso misto que

instrui Giovanni Battista Guarini contra Giason Denores a doutrina de Hermoacutegenes ou

do Pseudo-Hermoacutegenes de acordo com distinccedilatildeo de autoria como histoacuterica que interessa

mais aos contemporacircneos deste trabalho do que aos contemporacircneos de Giovanni Battista

Guarini864 Eacute sobretudo indiacutecio essa doutrina de que a presenccedila em textos como os

analisados de retores gregos ldquoda decadecircnciardquo tal como diria ironicamente Machado de

859 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] p 502 860 Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori pp 17-8 861 Hermogenis Tarsensis rhetoris acutissimi De dicendi generibus siue formis orationum libri II Latinitate

donati amp scholis explicati atque illustrati a Ioan Sturmio Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo ad annos

octo Excudebat Iosias Rihelis MDLXXI pp 29 31 862 Hermogenis Ars Oratoria absolutissima et libri omnes Cum nova Versione Latina e regione Contextus

Graeci amp Comentariis Gaspariis Laurentii Coloniae Allobrogum Apud Petrum Aubertum Anno

MDCXIV pp 256-8 863 Hermogenis Rhetoris Ad Artem oratoriam praeexercitamenta Prisciano interprete Norimbergae

Petreius 1544 sp Cf SANTOS M M ldquoAcerca das diferenccedilas doutrinais entre os Praeexercitamina de

Prisciano e os Progymnaacutesmata do Ps-Hermoacutegenesrdquo pp 270-4 864 FOUCAULT M iquestQueacute es un autor Traduccioacuten de Silvio Mattoni Buenos Aires Ediciones literales 2010

282

Assis natildeo se potildee a despeito de outras teorias quer gregas mais antigas quer latinas ou

natildeo se potildee como ruptura crente em renascenccedilas visto que intersecccedilotildees aparentam ganhar

incessantemente as liccedilotildees de retoacuterica natildeo raro sem deixar vincos

Atente-se que segundo Giovanni Battista Guarini eacute conveniente a fim de

enformar temperadamente o poema tragicocircmico natildeo soacute moderar a gravidade das

sentenccedilas como se viu senatildeo tambeacutem suster ldquolrsquohumiltagrave drsquoalcuna ograve persona ograve soggetto

di che egli tratti con vn poco di quella nobiltagrave di favella chrsquoegrave propria della magnifica ldquoa

humildade de alguma personagem ou assunto de que ele trate com um pouco daquela

nobreza de palavra que eacute proacutepriardquo) 865 Supotildee-se Il Verrato reafirma a conveniecircncia dos

matizes que evitam a chaneza de personagens (persona) e de casos (soggetto) por meio

da elocuccedilatildeo que faz algo nobre o discurso tragicocircmico Eacute liccedilatildeo que se conhece de

Aristoacuteteles eacute liccedilatildeo que se conhece de Francisco Porto tradutor quinhentista de

Hermoacutegenes leitor da Retoacuterica aristoteacutelica ldquodebet autem oratio esse perspicua amp non

humilisrdquo 866 Natildeo se arremata Il Verrato no entanto sem que o poeta tragicocircmico italiano

explicite o que jaacute se crecirc expliacutecito

Ne questa egrave mia dottrina M Giasone ma di Hermogene famoso

artefice degli stili fauellando egli delle vaghe amp belle misture che

hanno fatto amp Demostene amp Senofonte amp Platone dice che gli stili si

mescolano insieme agrave guisa dei colori amp che si come dal bianco amp dal

nero che sono tanto contrari si forma un terzo colore chegli chiama

amp fosco diremo noi cosi dalle contrarie forme del dire nascono

i misti che vaga amp ragguardeuole rendono lorazione soggiugnendo

che non bisogna merauigliarsi se luna Idea communichi in qualche

parte con laltra amp com alcunaltra non si confaccia dandone esempio

delluomo il qual tuttorsquonsieme egrave molto diferente da tutti gli altri animali

ma nellesser mortale egrave perograve simile a molti amp nellhauer intelletto amp

ragione ha con gli Iddij alcuna cosa comune Voi intendete M Giasone

quella mistura che pare agrave voi mostruosa agrave due famosi retori greci par

leggiadrissima amp perograve contentateui di concederlo al facitore delle

Tragicomedie se per testimonio dErmogene lhan fatto le piugrave famose

865 Idem pp 37r-37v 866Cf Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices magistri Francisci

Porti Cretensis opera industriaacuteque illustrati atque expoliti Genevaelig apvd I Crispinvm MDLXIX [1569]

sp

283

lingue amp le piugrave scelte penne di tutta Grecia867

E natildeo eacute minha esta doutrina senhor Giasone mas de Hermoacutegenes

famoso artiacutefice dos estilos discorrendo ele sobre as vagas amp belas

misturas que fizeram Demoacutestenes amp Xenofonte amp Platatildeo disse que os

estilos se misturam juntamente agrave maneira das cores amp que assim como

do branco amp do preto que satildeo tatildeo contraacuterios se forma uma terceira cor

que ele chama phaione cinza diremos noacutes assim tambeacutem das formas

do dizer contraacuterias nascem os mistos que gracioso e distinto tornam o

discurso acrescentando que natildeo eacute preciso maravilhar-se caso uma Ideia

se comunique em qualquer parte [dele] com outra amp com alguma outra

natildeo se mostre conveniente dando-nos exemplo do homem o qual de

uma soacute vez eacute muito diferente de todos os outros animais mas em ser

mortal eacute todavia semelhante a muitos e em ter intelecto amp razatildeo tem

com os Deuses alguma coisa em comum Voacutes compreendeis senhor

Giasone aquela mistura que a voacutes parece monstruosa a dois famosos

retores gregos parece beliacutessima amp por isso satisfaccedila-vos de concedecirc-

la ao artiacutefice das Tragicomeacutedias se por testemunho de Hermoacutegenes a

fizeram as mais famosas liacutenguas amp as mais excelentes penas de toda

Greacutecia868

Ora Giovanni Battista Guarini como os demais leitores de Hermoacutegenes entre

eles Manuel de Galhegos tem clareza de que a excelecircncia no trato com as ideai e a defesa

poeacutetica da tragicomeacutedia e de Il Pastor Fido dependem da seacutetima entre as categorias

normatizadas no Peri ideōn a deinotēs Sabe-se este eacute vocaacutebulo que prolifera no tratado

Nos termos da preceptiva a deinotēs ou mais precisamente ldquoa deinotēs que efetivamente

867 Idem pp 37f-37v O mesmo passo de Guarini eacute alvo de Annabel M Patterson no livro Hermogenes

and the Renaissance Seven Ideas of Style Afirma a estudiosa ldquoIts important that in this part of Il Verrato

[] Guarini sets Hermogenes as an exponent of stylistic flexibility against his opponents authority Demetrius whose scheme is made to seem rigid by contrast but more significant still is the fact that he

chooses to support a point of practical criticism by bringing out the big guns and defending tragicomedy

in terms of the compromise status and precarious intellectual dignity of manrdquo [Eacute importante que neste

trecho de Il Verrato [hellip] Guarini proponha Hermoacutegenes como um expoente da flexibilidade estiliacutestica

contra Demeacutetrio a autoridade de seu oponente cujo esquema faz-se parecer por contraste riacutegido poreacutem

ainda mais significativo eacute o fato de que ele escolha sustentar um ponto de criacutetica praacutetica exibindo as armas

e defendendo a tragicomeacutedia em termos de posiccedilatildeo de conciliaccedilatildeo e de precaacuteria dignidade intelectual do

homem] PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New Jersey

Princeton University Press 1970 p 35 Pocircde-se observar a leitura aqui proposta natildeo corrobora a

compreensatildeo de Patterson 868 Traduccedilatildeo nossa

284

eacuterdquo (ldquordquo) eacute assim definida

HERM 368 25-369 2

A habilidade quanto ao discurso eacute de acordo com a minha

compreensatildeo senatildeo que o emprego correto de todas as formas do

discurso referidas e das contraacuterias a elas e ainda dos outros [elementos]

por meio dos quais o corpo de um discurso naturalmente se constitui869

Lecirc-se o substantivo grego ldquodeinotēsrdquo como ldquohabilidaderdquo Conveacutem ressaltar natildeo

se trata de leitura consensual nas ediccedilotildees do Peri ideōn hoje mais acessiacuteveis Na versatildeo

em inglecircs de Cecil W Wooten ldquodeinotēsrdquo eacute ldquoforcerdquo 870 na versatildeo espanhola de Consuelo

Ruiz Montero eacute ldquohabilidadrdquo871 na versatildeo francesa de Michel Patillon a mais recente eacute

ldquohabiliteacuterdquo872 Guardadas as diferenccedilas nota-se que Hermoacutegenes assenta indutivamente o

preceito nos usos dos antigos e para isso colhe dois versos de Teoacutecrito em que se lecirc que

Simocircnides de Coacutes eacute ldquodeinos aoidosrdquo (cf THEOC 16 44-5 ldquordquo) 873

Conforme o Peri ideōn assim eacute chamado o aedo porque conhece e eacute capaz de empregar

ldquoas formas proacuteprias da poeacuteticardquo (ldquordquo) e natildeo como se

poderia supor porque ao modo de muitos oradores empregue ou pensamentos ou

869 Traduccedilatildeo nossa 870 Cf HERMOGENES Hermogenesrsquo on types of style Translated by Cecil W Wooten Chapel Hill

University of North Carolina Press 1987 p 101 ldquoIn my opinion Force in a speech is nothing other than

the proper use of all kinds of style previously discussed and of their opposites and whatever other elements

are used to create the body of a speechrdquo 871 Cf HERMOacuteGENES Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz

Montero Madrid Editorial Gredos 1993 pp 271-272 ldquoLa Habilidad en el estilo no es en mi opinioacuten

otra cosa que el uso correcto de todas las especies estiliacutesticas antes expuestas y de sus contrarias y tambieacuten

de todos aquellos elementos que constituem el cuerpo del discursordquo 872 Cf HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 446 ldquoLrsquohabiliteacute dans le domaine du discours nrsquoest rien drsquoautre

agrave mon sens que lrsquoemploi correct de toutes les espegraveces stylistiques du discours preacutesenteacutees ci-dessus et des

espegraveces opposeacutees ainsi que des autres eacuteleacutements qui composent naturellementle corps drsquoun discoursrdquo 873 Hugo Rabe estudioso a quem se deve o estabelecimento do texto grego que serviu de base para as

traduccedilotildees de Patillon e Ruiz Montero aponta uma variante no verso de Teoacutecrito em vez de ldquordquo

ldquordquo em vez ldquohaacutebil aedordquo ldquoaquele aedordquo A variante como se veraacute natildeo invalida a argumentaccedilatildeo do

retor porque outros exemplos aprovam o uso do adjetivo em discussatildeo RABE H (ed) Hermogenis opera

Leipzig Teubner 1913 p 370

285

meacutetodos profundos ou meditados ou mesmo elocuccedilatildeo que tenha grandeza (ldquordquo)

(cf HERM 370 3-14)

Eacute evidente interessa ao tratadista delimitar o uso de ldquodeinosrdquo Polissecircmico o

adjetivo mostra Pierre Chiron abarca os ldquosemas de autoridade forccedila pavor e

habilidaderdquo874 Assim reitera o passo da doutrina em Teoacutecrito que se leia ldquohaacutebilrdquo e natildeo

ldquophoberosrdquo (assustador) ldquomegasrdquo (grande) ldquoiskhyrosrdquo (vigoroso) ou algo assim

Hermoacutegenes embasa em Homero a interpretaccedilatildeo dos versos idiacutelicos Lendo-o lecirc Teacuteocrito

e pode dessa maneira impor delimitaccedilotildees ao corpo da doutrina que expotildee Explicita o

retor se eacute possiacutevel asseverar que deinotēs guarda o sentido de ldquophoberosrdquo de ldquomegasrdquo e

de ldquoiskhyrosrdquo porque eacute Priacuteamo aos olhos de Helena ldquoaidoiosrdquo (veneraacutevel) e ldquodeinosrdquo

(terriacutevel) (HOM Il 3 172) porque eacute Goacutergone ldquodeinērdquo (terriacutevel) e ldquosmerdnērdquo (medonha)

(HOM Il 5 742) e porque eacute Helena aos olhos dos chefes troianos ldquoterrivelmenterdquo

() assemelhada agraves deusas imortais (HOM Il 3 158)875 conveacutem natildeo ignorar que

Odisseu eacute ldquohaacutebilrdquo que Homero o fez ldquodeinon rhētorardquoldquohaacutebil oradorrdquo Conveacutem ressaltar

que para o tratadista assim eacute Odisseu ldquopois empregou a grandeza a rudeza e a veemecircncia

para o que eacute preciso e conforme a ocasiatildeordquo (ldquo

rdquo)876 em epiacutefora contra Alexandro

(sc Paacuteris) e os troianos e tambeacutem porque eacute apto a falar com meliacutefluo respeito e a proferir

palavras coroadas de beleza enfim reiteradamente no tratado eacute haacutebil o heroacutei porque

capaz de ldquoempregar as formas do discurso para o que eacute preciso e conforme a ocasiatildeordquo

(ldquordquo) (cf HERM 370

15-371 25)

Assim evita o retor que o adjetivo ldquodeinosrdquo e o substantivo ldquodeinotēsrdquodenotem

o indesejado Circunscrevendo a prescriccedilatildeo Hermoacutegenes aparta da liccedilatildeo a terribilidade

e ao fazecirc-lo distancia o Peri ideōn de concepccedilotildees tais quais as que satildeo lidas no corpo

doutrinaacuterio atribuiacutedo a Demeacutetrio de Falero Recorde-se o Peri hermēneias prescreve

quatro kharaktēres discursivos quais sejam o magaloprepēs o glaphyros o iskhnose o

deinos e quatro viacutecios em que respectivamente pode incorrer o incauto orador ou o mal

874 CHIRON P ldquoAs ambiguidades da lsquograccedilarsquo (kharis) no tratado Do estilo de Demeacutetrio (Ps-Demeacutetrio de

Falero) Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2003 v 7 p 215 875 As liccedilotildees do texto homeacuterico que chegaram a noacutes como acentuam Patillon [p 467] e Montero [p 273]

transmitem outro adveacuterbio e deixam ler ldquordquo em lugar de ldquordquo 876 Recorde-se para Hermoacutegenes e satildeo espeacutecies de

286

poeta na instituiccedilatildeo de cada um desses caracteres a frieza a afetaccedilatildeo a sequidatildeo e a falta

de graccedila (cf DEMETR 36) Nessa regulaccedilatildeo a deinotēsnada reteacutem da ldquohabilidaderdquo eacute

preceituada como ldquoterribilidaderdquo E bem podera a esse respeito Michel Patillon agrave luz de

Zur Ideenlehre des Hermogenes de Dieter Hagedorn que a noccedilatildeo de deinosproposta no

Peri hermēneias guarda parentesco com liccedilotildees hermogenianas todavia constroacutei-se esse

parentesco natildeo pela ideia de deinotēs mas pelas de trakhytēs e de sphodrotēs duas das

espeacutecies jaacute citadas de megethos 877 Isso deixa agrave mostra como doutrinariamente

Hermoacutegenes abarca os efeitos de forccedila veemecircncia grandeza ou aspereza todos apartados

da esfera de significaccedilatildeo da deinotēs no Peri ideōn

Pode-se tambeacutem afirmar Hermoacutegenes deixa entrever que no tratado soacute eacute

grandioso rude ou veemente o orador se eacute haacutebil se habilmente (deinōs) orquestra o

discurso e nele produz a grandeza a rudeza e a veemecircncia como efeitos Eacute deinosdesse

modo atributo do orador ou do poeta que efetua deinōs o discurso dando a ele a feiccedilatildeo

oportuna ou que efetua o discurso em conformidade com a pragmaacutetica que supotildee a

habilidade como capacidade de orquestraccedilatildeo adequada das formas discursivas e tambeacutem

como efeito discursivo habilmente construiacutedo Ora na exposiccedilatildeo de Hermoacutegenes o ēthos

de Odisseu personifica a deinotēs como idea e a ficccedilatildeo do orador haacutebil daacute evidecircncia e

clareza agrave exposiccedilatildeo Natildeo eacute o heroacutei homeacuterico todavia o uacutenico exemplum Lecirc-se ainda no

tratado em discussatildeo o modelo de Demoacutestenes hipostasiado O Orador eacute como Odisseu

deinos ou seja tem saber (ldquordquo) e capacidade (ldquordquo) para tudo emprega

cada para o que eacute preciso ldquordquo) e ldquoatribuindo o que eacute preciso agraves causas agraves

ocasiotildees e agraves personagens eacute um nos [discursos] privados outro nos puacuteblicos

(ldquo

rdquo878 assim como eacute um nas

877 PATILLON M La theacuteorie du discours chez Hermogegravene le rheacuteteur essai sur les structures linguistiques

de la rheacutetorique ancienne Paris Les Belles Lettres 1988 pp 229 271-272 878 Parece que subjaz agrave doutrina de Hermoacutegenes a distinccedilatildeo aristoteacutelica entre a que eacute escrita

e a que eacute combativa Essa distinccedilatildeo assim Marcos Martinho dos Santos sintetiza ldquoDe fato

considerando que com cada gecircnero se harmoniza elocuccedilatildeo diferente (ARIST Rhet III 12 1 1413b 2-3) Aristoacuteteles distingue primeiro entre a elocuccedilatildeo escrita e a combativa na medida em que aquela eacute mais

precisa e esta mais teatral (id ib III 12 2 1413b 9-10) Daiacute observa que comparados os escritores

parecem estritos nos debates e os oradores que falam bem insignificantes na matildeo do leitor (id ib III 12

2 1413b 15-7 cf 125 1414a 15-7) Enfim de um lado atribui ao gecircnero popular [] a elocuccedilatildeo

combativa que se compara agrave pintura de sombra (cf id ib III 125 1414a 8 tēi skiagraphiacuteai) e atribui ao

judicial [] elocuccedilatildeo mais precisa Pois o gecircnero popular visa agrave turba e quanto mais numerosa esta

mais longe do orador estaacute a vista de maneira que a precisatildeo pareccedila entatildeo sobressalente e ruim o gecircnero

judicial poreacutem visa a juiz uacutenico de maneira que se entrevecirc mais o que eacute proacuteprio e o que eacute estranho ausenta-

287

Filiacutepicas outro nos discursos deliberativos mas sempre o mesmo sempre haacutebil (HERM

372 1-25) E tanto o eacute para Hermoacutegenes que ainda quando pareccedila natildeo ser haacutebil

Demoacutestenes eacute haacutebil

Nesses termos assenta-se a deinotēs na seguinte quadriparticcedilatildeo o discurso (i) eacute

haacutebil e parece secirc-lo (ldquordquo) (ii) eacute haacutebil e natildeo

parece secirc-lo (ldquordquo) (iii) natildeo eacute haacutebil e parece secirc-lo

(ldquordquo) e por fim (iv) natildeo eacute haacutebil e natildeo parece secirc-lo

HERM 372 20-3731 Escreve o retor eacute supeacuterfluo discorrer sobre o que natildeo eacute haacutebil nem

parece ser haacutebil Logo dicotomicamente eacute possiacutevel observar Hermoacutegenes afirma a

habilidade e nega a inabilidade de oradores e poetas ou noutros termos por um lado

prescreve a habilidade e a inabilidade como aparecircncias como efeitos discursivos

habilmente construiacutedos por matildeos haacutebeis por outro lado censura a aparecircncia de habilidade

dos discursos produzidos por matildeos inaacutebeis na medida em que a habilidade seja

manifesta seja dissimulada como dissimulatio artis travestida de inabilidade deve ser

atributo de oradores e poetas

Desse modo a deinotēs como tal pode-se plasmar discursivamente aparentando

ser haacutebil ou inaacutebil conforme a ocasiatildeo Essa a chave para a leitura do mecanismo que

opera no Peri ideōn e para a compreensatildeo do emprego das ideai enquanto formas

discursivas detalhamente normatizadas e prescritas Censurados e censuraacuteveis para

Hermoacutegenes sofistas como Menatildeo Polo Goacutergias e outros contemporacircneos deles a quem

satildeo imputadas praacuteticas que fingem a habilidade de aparecircncia que se intenta confundir

com a aparecircncia de habilidade e portanto induz ao erro

Ora tendo em vista que os Rhetoricorum libri V propotildeem a latinizaccedilatildeo das ideai

tou logou ditas formae dicendi como eacute sabido a deinotēs latinamente eacute proposta por

Jorge de Trebizonda nestes termos ldquoGrauitas est congrua omnibus circunstantijs oratio

uel quaeligdam orationis elatiordquo ou seja ldquoGravidade eacute o discurso congruente a todas as

circunstacircncias ou a elevaccedilatildeo de qualquer discursordquo 879 Eacute conveniente rememorar a

se o debate de maneira que o juiacutezo eacute mais puro (id ib III 125 1414a 8-15) De outro lado diz que ainda

mais precisa que a do gecircnero judicial eacute a elocuccedilatildeo do demonstrativo pois o ofiacutecio desta eacute a leitura (id ib

III 125 1414a 18-9)rdquo Cf SANTOS M M ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacutecio Letras Claacutessicas Satildeo

Paulo 2002 v 4 pp 209-10 879 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] p 497

288

prescriccedilatildeo do poema heroico Jorge de Trebizonda feita a definiccedilatildeo da grauitas assim a

distingue

Grauitatem in duas partes diuidimus quarum unam re ac veregrave

grauitatẽ alteram uerbo solugravem appellamus Prima est qua oratoris

iudicio personis rebus causis locis temporibus oratio accommodatur

quam singularem quandam ideam siue dicendi formam esse

arbitramur uerugravem cuncta quaelig in hac parte praeligcipiuntur ita complecti

putamus ut idẽ sit grauẽ oratorẽ amp omni laude accumulatũ appellare

Verbo grauitatem nominamus in qua sententijs uerbis caeligterisq quibus

oratio cotildeficitur sic utimur ut vulgograve graues videamur De hac grauitate

quam amp dicẽdi formatilde arbitramur priugraves dicẽdum est sed breuiter

deinde ad illatilde ueratilde qua tota eloquẽtia cotildetinetur reuertemur Triplicẽ

ergo hatildec esse cẽsemus Nam quũ sententijs et uerbis caeligterisq cotildestet

cotildeficitur ut aut grauis amp sit amp uideatur aut sit quidem minimegrave tamen

uideatur aut quamuigraves grauis non sit uideatur tamen quaelig nec grauis

quaelig est neque uidetur praeligcepitione nostra non indiget quaelig solugravem

uidetur uerbis maximegrave quaelig solugravem est methodo solugravem tertia omnibus

conficitur 880

Dividimos a gravidade em duas partes uma das quais nomeamos

verdadeiramente gravidade de coisa outra apenas de palavra A

primeira eacute aquela na qual pelo juiacutezo do orador o discurso acomoda-se

aos personagens aos casos agraves causas aos lugares aos tempos a qual

julgamos natildeo ser uma ideia particular ou forma do discurso mas na

verdade todas as coisas que satildeo ensinadas nesta parte de tal modo que

consideramos ter sido contemplado que seja o mesmo dizer que o

orador eacute grave e pleno de todo louvor Denominamos gravidade de

palavra aquela em que de tal sorte fazemos uso de sentenccedilas palavras

e demais [elementos] pelos quais um discurso eacute construiacutedo que

vulgarmente parecemos graves Dessa gravidade que tambeacutem

julgamos ser forma do discurso dissemos primeiro em seguida

retornaremos agravequela verdadeira que encerra toda a eloquecircncia

Estimamos entatildeo ser esta tripla visto que se constroacutei de sentenccedilas

880 Idem pp 603-604

289

palavras e demais [elementos] Por exemplo ou que seja grave e

tambeacutem o pareccedila ou que embora seja verdadeiramente grave pouco o

pareccedila ou que ainda que natildeo seja grave assim pareccedila Aquela que nem

eacute grave nem o parece natildeo necessita de nossa prescriccedilatildeo aquela que

apenas parece constroacutei-se sobretudo pelas palavras aquela que

apenas eacute apenas pelo meacutetodo a terceira por todos [os elementos]881

Pode-se compreender conveacutem a Jorge de Trebizonda decorosamente acomodar

os preceitos autorizados por Hermoacutegenes agrave latinidade partilhada pelos eruditos italianos

de meados do seacuteculo XV A liccedilatildeo dos Rhetoricorum libri V nesse sentido natildeo decalca a

exposiccedilatildeo apresentada no Peri ideōn e assume o latim grauitas em equivalecircncia ao grego

deinotēs Diferentemente de Hermoacutegenes poreacutem Trebizonda natildeo aparta do texto a

polissemia para ele lecirc-se a grauitas na chave da adequaccedilatildeo porque eacute ldquodiscurso adequado

a todas as circunstacircnciasrdquo (ldquocongrua omnibus circunstantijs oratiordquo) e tambeacutem na chave

da grandeza porque eacute ldquoa elevaccedilatildeo de qualquer discursordquo (ldquoquaeligdam orationis elatiordquo)

Nesses termos Trebizonda parece construir uma dicotomia que opera o par res et uerba

e especifica a noccedilatildeo de um lado a grauitas re ac veregrave de outro a grauitas uerbo solugravem

A primeira espeacutecie remete a ldquoē ontōs ousa deinotēsrdquo HERM 369 8-9e dependente da

compreensatildeo da deinotēs como capacidade de orquestraccedilatildeo das ideai tou logou supotildee o

oratoris iudicium atributo por meio do qual os discursos acomodam-se agraves circunstacircncias

a segunda eacute propriamente forma dicendi e dependente da compreensatildeo da deinotēs como

efeito discursivo contempla esses efeitos reinterpretados em sentido elevado

Os sentidos do adjetivo ldquograuisrdquo para a doutrina retoacuterica dos estilos jaacute se

discutiram Recorde-se emprega-se nos Rhetoricorum libri V para referir uma das trecircs

figurae ou characteres orationis em conformidade com a Rhetorica ad Herennium

aquele genus tambeacutem dito ldquosublimisrdquo ou ldquograndisrdquo ldquocomposto de palavras graves em

construccedilatildeo leve e ornadardquo (Rhet Her IV 11 ldquoGrauis est quae constat ex uerborum

gravium leui et ornata constructionerdquo)882 Lendo latinamente a preceituaccedilatildeo e tomando

deinotēs como grauitas Jorge de Trebizonda considera discerniacuteveis uma grauitas re ac

veregrave e outra uerbo solugravem Parece possiacutevel reler essa dicotomia agrave luz do diaacutelogo de Ciacutecero

em discussatildeo de iniacutecio agrave luz dos usos nesse texto do adjetivo grauis e do substantivo

881 Traduccedilatildeo nossa 882 Traduccedilatildeo de Faria amp Seabra

290

grauitas Desse modo eacute como termo que designa a espeacutecie elevada entre os tria genera

dicendi ou como qualificativo subsumido a essa triparticcedilatildeo elocutiva que se lecirc o adjetivo

E eacute como termo que indica o que eacute proacuteprio do gecircnero elevado ou como qualidade dos

procedimentos retoacutericos cujos efeitos satildeo graves que se lecirc o substantivo

Ora os preceitos estatildeo decorosamente dispersos ao longo do diaacutelogo e os passos

repotildeem mesmo que de modo pouco ou nada sistemaacutetico883 a jaacute referida doutrina dos

orationis genera na medida em que citam a construccedilatildeo da figura grauis ou

especificamente o emprego de recursos elocutivos proacuteprios agrave grauitas Para Trebizonda

essa grauitas eacute forma e eacute compreendida como orationis elatio e por isso como foi

exposto eacute adequada agrave amplificatio e agrave commiseratio Ademais eacute uerbo solugravem e nesse

sentido eacute resultado da orquestraccedilatildeo dos elementos dos quais se constituem os discursos

a saber (i) sententia (ii) methodus ou artificium (iii) compositio que se subdivide em

(1) dictio ou verba (2) exornatio (3) membrum (4) collocatio (5) clausula (6)

numerus 884 Ou seja satildeo esses latinizados os jaacute iterados e reiterados stoikheia

preceituados no Peri ideōn manipulando-os oradores e poetas podem produzir a

grauitas como forma da qual se compotildee a figura grauis visto as figurae fazerem-se da

permixtio das formae885

Tal como jaacute proposto a doutrina retoacuterica do Peri ideōn desconhece os tria genera

dicendi Desconhece tambeacutem natildeo poderia ser diferente essa liccedilatildeo que subsume as formae

agraves figurae Propotildee Montefusco discutindo as antecedecircncias doutrinaacuterias da liccedilatildeo que

talvez provenha de comentaacuterios agrave obra de Hermoacutegenes particularmente dos

Prolegomena ao Peri ideōn atribuiacutedos a Phoebammon e a Joatildeo de Siciacutelia nos quais se lecirc

que eacute conhecendo detalhadamente os stoikheia dos quais satildeo feitas as ideaique se

conhecem os kharaktēres886 A estudiosa recorda na anaacutelise em questatildeo a jaacute citada

missiva De suauitate dicendi Nela Trebizonda afirma

Nam multa esse [sc dicendi genera] omnes confitentur cum

Ciceronianus ille Lucius Crassus et Marcus Antonius uel ipso sole

883 Cf SCATOLIN A A invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23 Satildeo

Paulo [FFLCH-USP] 2009 [tese de doutorado] p 137 884 Como parece frequente Trebizonda natildeo decalca as liccedilotildees de Hermoacutegenes Montefusco esmiuacuteccedila as

diferenccedilas que abarcam esses preceitos cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences

on George of Trebizondrsquos Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26

No 2 (Spring 2008) pp 157-159) 885 Apud Idem p 143 886 Idem pp 152-153

291

ostendant clarius (TRAP De suau sect 2 apud MONTEFUSCO 2008 p

144)

De fato todos reconhecem ser muitos [os gecircneros do discurso] como o

famoso ciceroniano Luacutecio Crasso e Marco Antocircnio mostram mais

claramente que o proacuteprio Sol887

Ora o uso do substantivo ldquogenusrdquo subentendido no passo natildeo parece supor a

triparticcedilatildeo operatoacuteria em casos aqui referidos mas como afirma Crasso entre os gregos

a suauitas de Isoacutecrates a subtilitas de Liacutesias o acumen de Hipeacuterides o sonitus de

Eacutesquines a uis de Demoacutestenes e entre os latinos a lenitas de Leacutelio a asperitas de Galba

algo de profluens e canorus em Carbatildeo e a grauitas de Africano (CIC De or III 28) 888

Nesse sentido os preceitos podem-se desdobrar jaacute que alguns paraacutegrafos depois dessa

enumeraccedilatildeo de autoridades que supotildee a investigaccedilatildeo das diferentes naturezas de

diferentes oradores e o louvor do que notaacutevel em cada um e certamente digno de

imitaccedilatildeo Crasso diz

Ex qua mea disputatione forsitan occurrat illud si paene innumerabiles

sint quasi formae figuraeque dicendi specie dispares genere

laudabiles non posse ea quae inter se discrepant eisdem praeceptis

atque una institutione formari (CIC De or III 34-5)

A partir desta minha discussatildeo talvez se pense que se satildeo praticamente

inumeraacuteveis as formas por assim dizer e as figuras do discurso

diacutespares pela espeacutecie louvaacuteveis pelo gecircnero natildeo eacute possiacutevel que elas

que discrepam entre si sejam formadas pelos mesmos preceitos e pelo

mesmo tipo de educaccedilatildeo889

Jorge de Trebizonda ecoa afirmaccedilotildees como essa do diaacutelogo ciceroniano e sabe-

se para ele eacute conhecendo componentes discursivos discriminados e apreensiacuteveis que se

887 Traduccedilatildeo nossa 888 Cf FANTHAM E ldquoOn the Use of Genus-Terminology in Cicerorsquos Rhetorical Worksrdquo Hermes Band

Heft 4 1979 p 446 889 Apud SCATOLIN A A invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23

Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 2009 [tese de doutorado] p 270

292

domina o que pode parecer disperso inumeraacutevel e inapreensiacutevel Por conseguinte a

particularidade do estilo de cada orador tal como a grauitas de Africano articula-se agrave

doutrina das formae dicendi890 Ademais esse eacute um dos trecircs passos do De oratore em que

Ciacutecero emprega lado a lado o par formado pelos substantivos forma e figura Elaine

Fantham cita-o891 Lucia Calboli Montefusco tambeacutem e ainda recorda De or II 98892

poreacutem ocorre uma vez mais em De or III 179893 e lecirc-se em Orator II 9 Agrave luz dos usos

de Jorge de Trebizonda Lucia Calboli Montefusco rechaccedila qualquer dependecircncia em

relaccedilatildeo aos fragmentos do De oratore por ela referidos embora natildeo discorra sobre eles

O que se supotildee seja extensiacutevel aos demais casos Essa questatildeo escapa a este trabalho mas

talvez seja interessante natildeo perder de vista o par forma e figura em Ciacutecero visto que pode

estar aiacute um indiacutecio para a compreensatildeo da doutrina que embasa a biparticcedilatildeo da elocutio

em figurae orationis e dicendi formae que jaacute eacute sabido eacute sustentada nos Rhetoricorum

libri V e deles se espraia

Ora esses preceitos parecem relevantes para que se discuta a natureza da noccedilatildeo

de grauitas uerbo solugravem e os meios pelos quais foi acomodada latinamente por

Trebizonda a deinotēs que lida em chave elevada no acircmbito da figura grauis eacute operada

numa interseccedilatildeo entre as doutrinas retoacutericas autorizadas por Hermoacutegenes e por Ciacutecero Eacute

bastante claro Trebizonda considera a destinaccedilatildeo empiacuterica e particular dos Rhetoricorum

libri V e supotildee os propoacutesitos didaacuteticos da liccedilatildeo apresentada adequando-a agrave koinē retoacuterica

compartilhada pelos letrados vecircnetos de meados do seacuteculo XV Poreacutem esses preceitos

elocutivos natildeo satildeo suficientes para que se pense a chamada grauitas re ac veregrave Conveacutem

rememorar para Jorge de Trebizonda eacute assim compreendida a grauitas no acircmbito da

adequaccedilatildeo na medida em que est congrua omnibus circunstantijs oratio894 e est qua

890 Cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) pp

144 152-153 891 Cf FANTHAM E ldquoOn the Use of Genus-Terminology in Cicerorsquos Rhetorical Worksrdquo Hermes Band

Heft 4 1979 p 446 892 Cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) pp

143 893 Observe-se ldquo[] C Curio patre mea sententia vel eloquentissimo temporibus illis quemquam mihi

magno opere videtur imitari qui tamen verborum gravitate et elegantia et copia suam quandam expressit

quasi formam figuramque dicendi quod ego maxime iudicare potui in ea causa quam ille contra me apud

centumviros pro fratribus Cossis dixit in qua nihil illi defuit quod non modo copiosus sed etiam sapiens

orator habere deberetrdquo (CIC De or II 98) e ldquoReferte nunc animum ad hominum vel etiam ceterarum

animantium formam et figuram Nullam partem corporis sine aliqua necessitate adfictam totamque formam

quasi perfectam reperietis arte non casurdquo (CIC De or III 179) 894 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] p 497

293

oratoris iudicio personis rebus causis locis temporibus oratio accommodatur 895

Nesses termos percebe-se serem essas liccedilotildees dependentes de Hermoacutegenes porque

segundo a jaacute referida prescriccedilatildeo do Peri ideon eacute deinos o orador bem ao modo de

Demoacutestenes que faz uso correto e conveniente das ideai que opera as distinccedilotildees entre os

discursos poliacuteticos e privados e sabe nesses termos como conveacutem adequar-se agraves causas

agraves ocasiotildees e agraves personagens (HERM 372 1-25)

As liccedilotildees apresentadas por Jorge de Trebizonda a despeito dessa filiaccedilatildeo

novamente natildeo podem ser lidas sem que se pressuponha tambeacutem a autoridade de Ciacutecero

E na perspectiva de Lucia Calboli Montefusco eacute a virtude da adequaccedilatildeo que torna

possiacutevel esses viacutenculos doutrinaacuterios pois eacute o pressuposto na praacutetica do orador

digno de nome e nos procedimentos proacuteprios do que Hermoacutegenes diz ser ldquoa deinotēs que

efetivamente eacuterdquo (ldquoē ontōs ousa deinotēsrdquo)896 Para dar evidecircncia ao argumento no De

oratore haacute dois passos na voz de Crasso que merecem consideraccedilatildeo Primeiro assim se

lecirc

[] primum oratoris officium esse dicere ad persuadendum

accommodate deinde esse omnem orationem aut de infinitae rei

quaestione sine designatione personarum et temporum aut de re certis

in personis ac temporibus locata [] (CIC De or I 138)

[] o primeiro oficio do orador eacute discursar de maneira adequada para

atingir a persuasatildeo em seguida todo discurso diz respeito a uma

questatildeo de tema indefinido sem a designaccedilatildeo de pessoas ou

circunstacircncias ou de tema circunscrito a pessoas e circunstacircncias

determinadas []897

Aponta Adriano Scatolin no enunciado de Crasso leem-se periacutefrases que referem

theseis e hypotheseis898 Como se sabe eacute a precisatildeo circunstancial que as diferencia que

circunscreve as hypotheseis as quais vimos referidas em Hermoacutegenes e que eram em

895 Idem p 603 896 Cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) p

143 897 Apud SCATOLIN A A invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23

Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 2009 [tese de doutorado] pp 169-170 898 Idem pp 35-36

294

latim chamadas causae ensina o mesmo Crasso (CIC De or III 109 ss CIC Top 79-

80) e eacute a adequaccedilatildeo do discurso agraves circunstacircncias postulado de virtude como uma das

trecircs uirtutes dicendi (CIC De or III 144-5) e de persuasatildeo como oratoris officium No

tratado elaborado por Trebizonda tal como afirmado e reafirmado esse acircmbito de

congruecircncia discursiva eacute abarcado sob a rubrica da ldquograuitas re ac veregraverdquo

A prescriccedilatildeo que propotildee Crasso nesse trecho acerca da adequaccedilatildeo ganha outros

matizes jaacute avanccedilado o diaacutelogo de Ciacutecero Em De or III 210-1 a voz do mesmo

personagem de novo se apresenta e aleacutem da adequaccedilatildeo agraves causae afirma natildeo a

universalidade dos preceitos porque talvez pressuponha a sua insignificacircncia nesses

termos mas a conveniecircncia da acomodaccedilatildeo dos discursos ao puacuteblico ao qual satildeo

endereccedilados e agrave ocasiatildeo de enunciaccedilatildeo ao kairos enfim 899 Esse passo do livro III do

diaacutelogo eacute ainda mais relevante porque incorporado ao tratado de Trebizonda porque

citado ipsis litteris900 como se pode observar

Nam Cicero quidem quum multa de oratoria facultate nobis reliquerit

haeligc tament [sic] ita subticuit ut nil aliud nisi plura esse dicendi genera

in quibus necesse sit oratorem insudare nos commonuerit Idque quum

multis in libris tangat tum maximegrave in eo quem de oratore composuit

plurimis in locis horum dicendi generum mentionem facit Quaelig ut

autoritate eius plura esse pateant non grauabimur uerba quaeligdam de

Oratore sumpta huic sermoni inserere Quanquam inquit perspicuum

est non omni causaelig nec auditori nec personaelig nec tempori congruere

orationis unum genus Nam amp causaelig capitis alium quendam uerborum

sonum requirunt alium rerum priuatarum atque paruarum Aliud

dicendi genus deliberationes aliud laudationes aliud iudicia atque

sermones aliud consolatio aliud obiurgatio aliud disputatio aliud

historia desiderat Refert etiam qui audiant senatus an populus an

iudices frequentes an pauci an singuli an aeligquales ipsi quoque

oratores qua sint aeligtate honore auctoritate Debet hoc uideri tempus

pacis an belli festinationis an otij 901

899 Cf MONFASANI J George of Trebizond A Biography and a Study of his Rhetoric and Logic Leiden

Brill 1976 p 293 900 Cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) p

145 901 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

295

Pois de fato Ciacutecero embora nos tenha deixado muito sobre a

capacidade oratoacuteria tanto se calou acerca disso [sc as formas do

discurso] quanto nos fez recordar nada mais senatildeo que satildeo vaacuterios os

gecircneros do discurso diante dos quais o orador tem a obrigaccedilatildeo de suar

bastante E isso no que tange a muitos de seus livros principalmente

naquele que compocircs sobre o orador no qual menciona em passos

bastante numerosos esses gecircneros do discurso os quais tendo em vista

a autoridade dele mostram-se vaacuterios Natildeo recusaremos inserir neste

tratado quaisquer palavras adotadas no De oratore ldquoEmbora isso seja

algo evidenterdquo afirma ldquonem todo tipo de discurso eacute adequado a toda

causa ou ouvinte ou personagem ou circunstacircncia De fato natildeo apenas

as causas capitais requerem um tom de palavras diferentes do das

questotildees privadas e de pouca monta mas tambeacutem os louvores os

julgamentos a conversa a consolaccedilatildeo a repreensatildeo a discussatildeo e a

histoacuteria carecem de tons diferentes Importa tambeacutem quem satildeo os

ouvintes se o senado o povo ou juiacutezes se em grande nuacutemero pequeno

ou sozinhos e qual sua natureza os proacuteprios oradores devem parecer

ter idade honra autoridade se eacute tempo de paz ou de guerra de

prontidatildeo ou oacuteciordquo902

No tratado exibe-se a acomodaccedilatildeo como praacutetica discursiva na medida em que

Jorge de Trebizonda latiniza as liccedilotildees hermogenianas e opera a autoridade de Ciacutecero para

isso A concessatildeo que abre o fragmento justifica a exposiccedilatildeo de Trebizonda que prescreve

formae ditas natildeo prescritas e ao fim intenta imitar e emular Ciacutecero mas obviamente natildeo

minimiza essa autoridade superlativada pela longa citaccedilatildeo Ademais o trecho repotildee a

voz de Crasso segundo a qual em siacutentese dicere ad persuadendum accommodaterdquo eacute o

ldquoprimum oratoris officiumrdquo (cf CIC De or I 138) e produz uma interseccedilatildeo que garante

o encontro de decorum e grauitas de prepone deinotēs o qual em termos doutrinaacuterios

no leacutexico dos Rhetoricorum Libri V eacute proacutepria da grauitas re ac veregrave afinal como jaacute se

sabe eacute esta ldquoest congrua omnibus circunstantijs oratiordquo 903 E como tal a grauitas eacute

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] pp 494-495 902 Segue incorporada ao texto de Jorge de Trebizonda a traduccedilatildeo de Adriano Scatolin de CIC De or III

210-1 cf SCATOLIN A A invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23

Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 2009 [tese de doutorado] p 303 903 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] p 603

296

resultado do oratoris iudicium Ou seja tem a qualidade da grauitas re ac veregrave o orador

que considera a ldquopragmaacutetica do decorordquo 904 e o faz ajuizadamente na operaccedilatildeo elocutiva

do discurso considerada a elocutio bipartida em figurae orationis e formae dicendi

Nesses termos orientado o discurso pelo oratoris iudicium que eacute deliberativo e

deve escolher sempre o que eacute mais proveitoso agrave persuasatildeo o preceito de Jorge de

Trebizonda pode-se delimitar em contornos mais niacutetidos com a definiccedilatildeo da deinotēs que

apresenta a Eacutetica Nicomaqueia Conforme Aristoacuteteles

ἔστι δὴ δύναμις ἣν καλοῦσι δεινότητα αὕτη δ᾽ ἐστὶ τοιαύτη ὥστε τὰ

πρὸς τὸν ὑποτεθέντα σκοπὸν συντείνοντα δύνασθαι ταῦτα πράττειν

καὶ τυγχάνειν αὐτοῦ ἂν μὲν οὖν ὁ σκοπὸς ᾖ καλός ἐπαινετή ἐστιν ἐὰν

δὲ φαῦλος πανουργία διὸ καὶ τοὺς φρονίμους δεινοὺς καὶ πανούργους

φαμὲν εἶναι ἔστι δ ἡ φρόνησις οὐχ ἡ δύναμις ἀλλ οὐκ ἄνευ τῆς

δυνάμεως ταύτης ἡ δ ἕξις τῷ ὄμματι τούτῳ γίνεται τῆς ψυχῆς οὐκ

ἄνευ ἀρετῆς ὡς εἴρηταί τε καὶ ἔστι δῆλον (ARIST Nic Eth VI 13

1144a 23-29)

Haacute uma capacidade que chamam ldquodestrezardquo [deinotēs] Ela eacute tal que eacute

capaz de fazer as coisas que levam ao alvo pressuposto e capaz de o

atingir Assim se o alvo for belo ela eacute digna de elogio se for ruim ela

eacute esperteza Por isso chamamos tanto os sensatos como os espertos de

destros Ora a sensatez [phronēsis] natildeo eacute essa capacidade mas natildeo se

daacute sem essa capacidade Essa habilitaccedilatildeo desse olho da alma natildeo se

engendra sem a virtude como jaacute foi dito e eacute evidente905

Na versatildeo seiscentista de Bernardo Segni a liccedilatildeo aristoteacutelica eacute proposta tomando-se

deinotēs como ldquoHabilitagraverdquo agrave semelhanccedila do que se viu aplicado na interpretaccedilatildeo da

normatizaccedilatildeo do Peri ideōn

Egli egrave vna certa potenza nellrsquoAnima che Habilitagrave egrave chiamata la quale egrave di

questa natura chegrave ella puograve mettere in atto tutte quelle cose che tendono al

904 Cf HANSEN J A A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed

rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004 p 335 905 A traduccedilatildeo eacute de Lucas Angioni mantenho-a notando as variantes no leacutexico empregado a traduzir

phronēsis e deinotēs cf ANGIONI L ldquoEacutetica a Nicocircmaco Livro VIrdquo Dissertatio 34 2011 p 298

297

proposto segno amp puograve tutte cotildeseguirle Segrave il segno egrave adunche retto questa

Habilitagrave egrave lodeuole Segrave il segno egrave catiuuo ella fia detta vna Astutia Et diquigrave

nasce chegrave gli huomini prudenti sonrsquo chiamati anchorrsquo habili amp astuti Magrave la

Prudenza notilde egrave la facultagrave detta magrave ella notilde egrave anchora senza essa anzi questo

habito srsquoimprime in questo occhio dellrsquoanima amp di uirtugrave notilde manca sicome

io hograve detto amp come egrave manifesto906

Haacute uma certa potecircncia na Alma que se chama Habilidade a qual eacute de tal

natureza que pode pocircr em ato todas as coisas que tendem ao alvo proposto

amp pode tudo conseguir Entatildeo se o alvo eacute reto esta Habilidade eacute louvaacutevel

Se o alvo eacute mau ela eacute dita Astuacutecia E daqui nasce que os homens prudentes

sejam tambeacutem chamados haacutebeis amp astutos Mas a Prudecircncia natildeo eacute a dita

faculdade embora jaacute natildeo exista sem ela assim este haacutebito se imprime neste

olho da alma amp de virtude natildeo carece como eu disse amp como eacute manifesto907

O que se figura por Bernardo Segni da seguinte maneira

Figura 12 LrsquoEthica drsquoAristotele (1550)908

Ora como se observa aristotelicamente falando identidade natildeo haacute nem poderia

haver entre phronēsis e deinotēs entre Prudenza e Habilitagrave Aparta-as ao que se nota

certa ambivalecircncia que para Aristoacuteteles natildeo compete agrave virtude da prudecircncia porque

906 Cf LrsquoEthica drsquoAristotele tradotta in lingua vulgare fiorentina et commentata per Bernardo Segni In

Venegia MDL [1550] pp 320-321 907 Traduccedilatildeo nossa 908 Idem p 323

298

virtude e que parece proacutepria da deinotēs Fornece o criteacuterio eacutetico de qualificaccedilatildeo da

deinotēs entatildeo o skopos (ldquoil segnordquo) louvaacutevel ou natildeo como se pode notar Se indigno

eacute ela nada mais que panourgia (ldquoAstutiardquo) e pode-se supor agrave luz da liccedilatildeo aristoteacutelica eacute

desse acircmbito a deinotēs de sofistas como Menatildeo Polo e Goacutergias visto que nessa chave

doutrinaacuteria eacute viciosa aparecircncia que induz ao erro Se digno eacute certo que virtuoso reto e

assim bem deliberado e a deinotēs prudentemente orienta-se equilibrada no meio-termo

do qual natildeo pode pender para qualquer dos extremos ndash por falta ou por excesso ndash sem cair

em sua proacutepria desqualificaccedilatildeo

Com Aristoacuteletes o enunciado grauis pode-se matizar e ganha sentidos que a

grauitas uerbo solugravem natildeo compreende porque natildeo se confunde com o que a elocutio diz

sublimis ou grandis E desse modo ganha evidecircncia a polissemia segundo a qual Jorge

de Trebizonda entende a noccedilatildeo de grauitas em prescriccedilatildeo natildeo apenas elocutiva mas

tambeacutem eacutetica John Monfasani jaacute citado propotildee que o vocaacutebulo ldquograuitasrdquo ldquodoes

describe exactly what in Roman tradition would be considered the supreme and all

encompassing quality of the ideal paulordquo Note-se o pressuposto de anaacutelise conhece-se

das consideraccedilotildees atinentes ao uso nos Rhetoricorum libri V de ldquovelocitasrdquo para

interpretar gorgotēs Tanto laacute como aqui John Monfasani vecirc o erro

O propoacutesito argumentativo do estudioso eacute afirmar que o termo ldquograuitasrdquo estaacute

distante do substantivo ldquodeinotēsrdquo que crecirc seguindo outra vertente de circulaccedilatildeo das

ideai tou logou seria mais bem traduzido por ldquodecorumrdquo 909 Essa interpretaccedilatildeo

pressuporia uma superposiccedilatildeo de significado que a leitura de Jorge de Trebizonda pode

natildeo confirmar todavia se eacute pertinente a anaacutelise de John Monfasani acerca do que

romanamente seja ldquograuitasrdquo e se esse substantivo latino ndash e igualmente o adjetivo

ldquograuisrdquo ndash eacute assim significante e ainda assim significativo para a latinidade italiana do

seacuteculo XV eacute possiacutevel depreender que o emprego de Jorge de Trebizonda compartilha

certos usos ciceronianos no De oratore afinal pode ser essa a chave de entendimento dos

atributos do pai dos Graco segundo Ceacutevola ldquohomem prudente e severordquo (ldquohomo prudens

et gravisrdquo) (cf CIC De or I 38) de Platatildeo segundo Crasso ldquode longe o mais solene e

eloquente de todosrdquo (ldquolonge omnium in dicendo grauissimo et eloquentissimordquo) (cf CIC

909 Cf MONFASANI J George of Trebizond A Biography and a Study of his Rhetoric and Logic Leiden

Brill 1976 pp 322-323

299

De or I 47) e de Crasso segundo Cota ldquomais seacuterio dos homensrdquo (ldquohomine omnium

gravissimordquo) (cf CIC De or I 160)910

Para Jorge de Trebizonda entatildeo seria ldquograuitasrdquo ldquore ac veregraverdquo ou ldquouerbo solugravemrdquo

agrave luz de Ciacutecero do De oratore particularmente citado e da por assim dizer ciceroniana

Rhetorica ad Herennium um equivalente possiacutevel e significativo da deinotēs que natildeo se

deve ler pura e simplesmente como produto de um erro de traduccedilatildeo conclusatildeo a que tecircm

levado os comentaacuterios de John Monfasani911 mas como o resultado do esforccedilo de fixaccedilatildeo

em latim de uma doutrina retoacuterica sem equivalente latino exato que se constroacutei de

variaccedilotildees pendentes da accommodatio que parece preceituada pelo skopos louvaacutevel e

primeiro do tratado o docere Ora a escolha lexical de Trebizonda natildeo eacute despreziacutevel

visto que como aventado dessas liccedilotildees todas parece depender uma das vertentes de

circulaccedilatildeo desde meados do seacuteculo XV do corpo retoacuterico atribuiacutedo a Hermoacutegenes Essa

vertente eacute a que se pode perseguir a partir da leitura dos Rhetoricorum libri V e que

entende haver homologia entre deinotēse grauitas Serve de exemplo a breve passagem

de Filiberto Campanile em que a doutrina discutida em termos bastante semelhantes

ganha versatildeo toscana912

La Grauitagrave dellrsquoeloquentia saragrave di due maniere vna chrsquoegrave veramente e

propriamente grauitagrave amp vnrsquoaltra che ne tiene il solo nome o per dir

meglio lrsquovna quella che si puograve chiamare Grauitagrave di cose e lrsquoaltra

Grauitagrave di parole

La prima si faragrave quando lrsquoOratore anderagrave accomodando

giuditiosamente il suo parlare secondo le persone di cui si ragiona le

cose delle quali si tratta amp i luogui e le cagioni amp i tempi di quelle E

questa non diremo quigrave noi esser forma particulare ma vn dritto vso di

tutte lrsquoaltre forme insieme di modo tale che tanto sia il chiamar per

questa lrsquoOratore graue quanto colmo drsquoogni virtugrave degno drsquoogni lode

Quella chrsquoegrave solamente Grauitagrave di parole si faragrave ogni volta che noi

vseremo le sentenze le parole e tutte lrsquoaltre parti di cui si compone il

910 A discussatildeo poderia ainda se desdobrar visto que John Monfasani brevemente supotildee relaccedilotildees entre a

noccedilatildeo de grauitas re ac veregrave e o prefaacutecio do livro I do De oratore Idem ibidem 911 Cf MONFASANI J George of Trebizond A Biography and a Study of his Rhetoric and Logic Leiden

Brill 1976 pp 322-3 La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Salamanca Universidad de Salamanca

1994 p 80 912 Cf G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] pp 603-604

300

parlare in tal maniera chrsquoa ciascuno graui ci dimostriamo e di questa

per esser forma particulare habbiam proposto discorrere

primieramente

Egrave dunque questa Grauitagrave di tre manieire percioche alcuna volta si

compongono le cose in modo tale chersquol parlare saragrave e pariragrave graue

alcuna volta saragrave tale senza apparire amp altre volta appariragrave tale che

vi sia Quello poi che negrave egrave negrave appare essere non fa mestiere esser

trattato da noi913

A Gravidade da eloquecircncia seraacute de duas maneiras uma que eacute verdadeira

e propriamente gravidade e outra que tem apenas o nome ou para dizer

melhor uma eacute aquela que se pode chamar Gravidade de coisa e outra

de palavra

A primeira se faraacute quando o Orador acomodar judiciosamente o seu

discurso segundo as personagens das quais se arrazoa as coisas das

quais se trata os lugares as causas e os tempos dessas coisas E desta

aqui natildeo diremos noacutes ser forma particular mas uso reto de todas as

outras formas conjuntas de modo tal que tanto ocorra chamar por meio

dela o Orador grave como o aacutepice de cada virtude digno de todo elogio

Aquela que eacute apenas Gravidade de palavra se faraacute toda vez que noacutes

usarmos as sentenccedilas as palavras e todas as demais partes das quais se

compotildee o discurso de tal maneira que a cada um nos mostremos graves

e desta por ser forma particular propomos discorrer primeiramente

Eacute assim esta Gravidade de trecircs maneiras porque por vezes se

compotildeem as coisas de modo tal que o discurso seraacute e pareceraacute grave

por vezes assim seraacute sem parececirc-lo amp por vezes assim pareceraacute sem

que isto seja Aquele pois que natildeo eacute nem parece ser [grave] natildeo precisa

ser tratado por noacutes914

Aleacutem da obra de Filiberto Campanile que fez reverberar os Rhetoricorum libri V

antes no decurso do seacuteculo XVI outras de outros autores operaram de maneira

homoacuteloga e deixam observar escolha lexical que repotildee a latinizaccedilatildeo proposta por Jorge

913 Cf Lrsquoidee ouero forme dellrsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile secondo la dottrina drsquoHermogene

e drsquoaltri retori antichi In Napoli apresso Gio Battista Sottile MDCVI Con licenza dersquo superiori pp

134-135 914 Traduccedilatildeo nossa

301

de Trebizonda Semelhantemente Antocircnio Bonfine no Hermogenis Tarsensis

Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta versatildeo latina de 1538

propocircs ldquograuitasrdquo915 Natale Conti na obra homocircnima de 1550 tambeacutem916 Antocircnio

Sebastiano Minturno no De poeta (1559) 917 e em LrsquoArte poetica del Sig Antonio

Minturno (1564) 918 aplica o latim ldquograuisrdquo e o italiano ldquograverdquo respectivamente Giulio

Camillo Delmiacutenio no Lrsquoidee ouero forme della oratione da Hermogene considerata de

1594 propocircs gravitate 919 Recorde-se eacute uso lexical jaacute aventado Manuel Pires de

Almeida que se sabe conhecedor da versatildeo de Natale Conti emprega ldquograverdquo no tratado

Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia (1633)920 ao passo que Manuel de Galhegos tanto

ldquograverdquo como ldquoferozrdquo natildeo soacute referendando a liccedilatildeo sustentada por Jorge de Trebizonda

senatildeo tambeacutem buscando contemplar em liacutengua portuguesa com esses adjetivos a

polissemia do grego ldquodeinosrdquo sem se afastar das liccedilotildees retoacuterica atribuiacutedas a Demeacutetrio de

Falero (cf DEMETR 36) como se afasta Hermoacutegenes (cf HERM 370 15-371 25)

Essa liccedilatildeo de traduccedilatildeo do substantivo ldquodeinotēsrdquo natildeo eacute consensual Eacute relevante

afirmar que o adjetivo ldquograuisrdquo natildeo se aparta do Hermogenis Tarsensis rhetoris

Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II (1571) de Johannes

Sturm e que aiacute haacute passos em que deinos e deinotēs natildeo se traduzem Por exemplo ldquoē

ontōs ousa deinotēsrdquo eacute ldquovera [] grauis dicendi figura rdquo (cf HERM 369 8-

915 Cf Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica precepta Aphthonii

item Sophistaelig Praeligexercitamenta Antonio Bonfine asculano interprete Apud Seb Gryphivm Lvgdvni

1538 p 273 916 Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica praecepta Aphtonii item

sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud

Petrum Pernam [1550] p 294 917 Antonii Sebastianii Minturni De poeta ad Hectorem Pignatellum Vibonensium Ducem Libri Sex Cum

Priuilegijs Venetiis Ann MDLIX [1559] p 559 918 LrsquoArte poetica del Sig Antonio Minturno nella quale si contengono i precetti Heroici Tragici Comici

Satyrici e drsquoogni altra Poesia Con la dottrina dersquo Sonetti canzoni et ogni sorte de Rime Thoscane dove srsquoinsegna il modo che tenne il Petrarca nelle sue opere Et si dichiara arsquo suoi luoghi tutto quel che da

Aristotele Horatio et altri autori Greci e Latini egrave stato scritto per ammaestramento di Poeti Con le

postille del dottor Valvassori non meno chiare che breui et due tavole lrsquouna dersquo capi principali lrsquoaltra

di tutte le cose memorabile Con Privilegio Per Gio Andrea Valvassori del MDLXIII [1563] p 442 919 Cf Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp ridotte in questa lingua per M

Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal

detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea

Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica

Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini p 44v 920 MUHANA A Poesia e Pintura ou Pintura e Poesia Tratado Seiscentista de Manuel Pires de Almeida

Satildeo Paulo Edusp p 108

302

9)921 ldquodeinosrdquo eacute ldquo grauiter amp aptegraverdquo (cf HERM 369 10)922 ldquorētōr [] deinosrdquo eacute

ldquoOrator [] rdquo (cf HERM 369 15) 923 Todavia observa-se outra vertente de

interpretaccedilatildeo do Peri ideōn em Johannes Sturm como se sabe erudito dos mais profiacutecuos

na fortuna de Hermoacutegenes No proacutelogo da ediccedilatildeo Hermogenis De formis orationum tomi

duo (1555) o tradutor prefere considerando idea como genus dicendi as periacutefrases ldquoaptũ

grauiter amp cotildegruenterrdquo (apto grave amp congruentemente) e ldquoaptũ atq congruũ dicendi

genusrdquo (gecircnero de discurso apto e congruente)924 Jaacute na traduccedilatildeo do preceito na obra de

1571 considerando idea como figura opta por ldquoapta dicendi figurardquo (figura apta de

discurso)925 Mediante as Scholae pospostas ao texto biliacutengue desta ediccedilatildeo entende-se

serem pendentes da autoridade do De oratore especificamente do trecho que segue os

preceitos que nesse caso conduzem a latinizaccedilatildeo de Hermoacutegenes926

Qui distincte qui explicate qui abundanter qui inluminate et rebus et

uerbis dicunt et in ipsa oratione quasi quendam numerum uersumque

conficiunt id est quod dico ornate Qui idem ita moderantur ut rerum

ut personarum dignitates ferunt ei sunt in eo genere laudandi laudis

quod ego aptum et congruens nomino Qui ita dicerent eos negavit

adhuc se uidisse Antonius et eis hoc nomen dixit eloquentiae solis esse

tribuendum (CIC De or III 53-4)

Agravequeles que discursam de maneira distinta desenvolvida abundante

brilhante tanto pelos temas quanto pelas palavras e que constrotildeem como

que uma espeacutecie de ritmo e verso ndash eacute isso que quero dizer por

ldquoornadamenterdquo Aqueles que tambeacutem se controlam de tal forma a

respeitar as dignidades das ocasiotildees e das personagens satildeo os que

921Cf Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II

Latinitate donati amp scholis explicati atque illustrati A Ioan Stvrmio Cum Gratia amp Priuilegio Caeligsareo

ad anno octo Excudebat Iosias Rihelius MDLXXI [1571] p 305 922 Idem ibidem 923 Idem p 307 924 Cf Hermogenis De formis orationum tomi duo Argentorati apud haeredes Vuendelini Rihelij Anno

1555 [pp 4-5] 925Cf Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis orationum Libri II

Latinitate donati amp scholis explicati atque illustrati A Ioan Stvrmio Cum Gratia amp Priuilegio Caeligsareo

ad anno octo Excudebat Iosias Rihelius MDLXXI [1571] p 305 926 Cf ldquoIoannis Sturmii Scholae in Librum I De formis orationum seu dicendi generibusrdquo in Hermogenis

Tarsensis rhetoris acutissimi De dicendi generibus siue formis orationum libri II Latinitate donati amp

scholis explicati atque illustrati a Ioan Sturmio Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo ad annos octo

Excudebat Iosias Rihelis MDLXXI p 371

303

merecem louvor naquele tipo de qualidade que denomino ldquoadequadordquo

e ldquoconvenienterdquo Antocircnio afirmou que ainda natildeo viu quem discursasse

dessa forma e disse que apenas a tal pessoa deve-se atribuir a palavra

ldquoeloquecircnciardquo 927

Isto seja ldquoadequadordquo e ldquoconvenienterdquo na traduccedilatildeo de Adriano Scatolin ldquoaptum

et congruensrdquo no texto latino de Ciacutecero assim Crasso denomina o orador atento agraves

dignidades de ldquoresrdquo e de ldquopersonaerdquo de casos (ldquoocasiotildeesrdquo na traduccedilatildeo referida) e de

personagens928 No diaacutelogo sabe-se bem pelas palavras de Jorge de Trebizonda929 faz-se

evidente que um mesmo gecircnero de discurso natildeo seja congruente a toda causa a todo

auditoacuterio a qualquer personagem a qualquer ocasiatildeo (cf CIC De or III 210 ldquonon omni

causaelig nec auditori nec personaelig nec tempori congruere orationis unum genusrdquo) eacute liccedilatildeo

que se conhece de Quintiliano (cf QUINT XII 10 66-72) logo deve-se compreender

eloquente o orador que respeitante agraves especificidades enunciativas compotildee de modo

ldquoapto e congruenterdquo cujos discursos ademais sejam enunciados distinta desenvolvida

abundante e brilhantemente em termos de res et verba Na leitura de Johannes Sturm em

que de modo analiacutetico ldquodeinotēsrdquo eacute ou ldquoaptũ grauiter amp cotildegruenterrdquo ou ldquoaptũ atq

congruũ dicendi genusrdquo ou ldquoapta dicendi figurardquo a conformaccedilatildeo retoacuterica das ideai

subsume-se a esses preceitos e lecirc-se Hermoacutegenes conforme Ciacutecero o que parece validar

na anaacutelise do Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis

orationum Libri II as conclusotildees de Lucia Calboli Montefusco a respeito da latinizaccedilatildeo

da doutrina de Hermoacutegenes construiacuteda por Jorge de Trebizonda nos Rhetoricorum libri

V Ciacutecero eacute autoridade indispensaacutevel930

Os preceitos de Ciacutecero articulam-se doutrinariamente ao Peri ideōn se recordados

os termos que definem deinotēs como emprego () correto das ideai preceituadas

no tratado em conformidade com as conveniecircncias de causa (ὑπόθεσις) de ocasiatildeo

(καιρός) e de personagem (πρόσωπον) (cf HERM 368 25-369 2 372 1-25)

927 Apud SCATOLIN A A invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23

Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 2009 [tese de doutorado] p 273 928 Recorde-se o respeito agraves dignidades das personagens eacute forccediloso na construccedilatildeo de uma narraccedilatildeo

verossiacutemil ensina a Rhetorica ad Herennium (cf Rhet Her I 16) 929 G Trapezuntii rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis apud Ioannem

Roigny uia D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementi MDXXXVIII [1538] pp 494-495 930 Cf MONTEFUSCO L C ldquoCiceronian and Hermogenean Influences on George of Trebizondrsquos

Rhetoricorum Libri Vrdquo Rhetorica A Journal of the History of Rhetoric Vol 26 No 2 (Spring 2008) p

142

304

Semelhantemente recorde-se que em Siriano Filoxeno comentador de Hermoacutegenes

idea eacute qualidade discursiva concordante () com o personagem (πρόσωπον) e

com o caso ou mateacuteria (πρᾶγμα) (cf Syrian I 2 16-19 Rabe) 931 Na versatildeo de Johannes

Sturm a deinotēs torna-se no vabulaacuterio de Ciacutecero meio de regulaccedilatildeo dessas

conveniecircncias Assim tambeacutem o faz entenda-se Gaspar Laurent na traduccedilatildeo seiscentista

do Peri ideōn estampada no Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima de 1614 em que

perifrasticamente deinotēs de modo a repor as liccedilotildees de Ciacutecero enunciadas com as

palavras de Antocircnio o personagem do De oratore (CIC De or III 54) eacute categoria

compreendida como ldquoEloquentia vel solertia amp aptitudo oratoriardquo 932 (Eloquecircncia ou

soleacutercia amp aptidatildeo oratoacuteria) e assim definida ldquoEst igitur aptitudo iudicium amp

solertia oratoris hoc est ipsa Eloquẽtia appositegrave applicans in oratione omnes formas

dicendirdquo (ldquoEacute pois Deinotēs aptidatildeo juiacutezo e soleacutercia do orador isto eacute a proacutepria

Eloquecircncia sendo convenientemente aplicada no discurso a todas as formas de

dizerrdquo)933

No avesso que faz o vitupeacuterio conforme Johannes Sturm e Gaspar Laurent

ciceroneamente figura-se o orador inepto Para o primeiro

Ineptus autem dicitur qui nihil facit in loco nihil in tempore aut se

ostentat aut plura loquitur aut eorũ quibus cum versatur uel cotildemodi

uel dignitatis nullatilde rationẽ habet aut denique in aliqua re uel

inconcinnus uel multus est quẽ ἀπρεπῆ nominare notilde possumus

siquidẽ εὐπρέπεια est solugravem honestatis nec etiatilde ἀνάρμοστο rectegrave

dicitur quoniam εὐαρμοστία solũ ordinis est neq ἄτοπον dicere

debemus quia eius contrariũ non est ἔντοπος sed []934

De fato diz-se inepto quem nada compotildee no lugar certo nada compotildee

931 Idem p 149 932 Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 451 933 Cf ldquoIn Hermogenis tractatvm de ideis sive de formis eloqventiaelig Gasparis Laurentij commentariusrdquo

in Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 180 934 Cf ldquoIoannis Sturmii Scholae in Librum I De formis orationum seu dicendi generibusrdquo in Hermogenis

Tarsensis rhetoris acutissimi De dicendi generibus siue formis orationum libri II Latinitate donati amp

scholis explicati atque illustrati a Ioan Sturmio Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo ad annos octo

Excudebat Iosias Rihelis MDLXXI p 371

305

no momento apropriado [quem] ldquoou se exiberdquo ldquoou fala demaisrdquo ldquoou

natildeo leva em nenhuma conta a comodidade ou a posiccedilatildeo daqueles com

quem se encontra ou enfim eacute em algum caso deselegante ou

exageradordquo Quem natildeo podemos denominar aprepēs [inconveniente]

se decerto euprepeia [conveniecircncia] eacute relativa apenas agrave honestidade

nem tambeacutem anarmostos [desproporcionado] se diz corretamente

porque euarmostia [justa proporccedilatildeo] eacute relativa apenas agrave ordenaccedilatildeo

Nem atopon [deslocado] devemos dizer porque o contraacuterio de inepto

natildeo eacute entopos [bem posto] mas deinos []935

Para o segundo

Ei qui dicitur solers aptus industrius opponitur a Cicerone

Ineptus is qui non videt quid tempus postulet aut eorum quibuscum

versatur rationem non habet qui denique vitio laborat Cacozelię

[]936

Agravequele que se diz Deinos solerte apto industrioso opotildee-se em

Ciacutecero o Inepto ldquoaquele que natildeo percebe o que exige a ocasiatildeordquo ou

935 Traduccedilatildeo nossa Os trechos entre aspas provecircm do De oratore (CIC De or II 17) Incorporo agrave minha

traduccedilatildeo dos comentaacuterios a versatildeo de Adriano Scatolin ao passo do diaacutelogo Haacute divergecircncias poucas no

texto latino porque a liccedilatildeo de Ciacutecero fornecida por Johannes Sturm difere pontualmente da liccedilatildeo do De

oratore que hoje se aceita Portanto fiz ajustes oportunos no texto de Scatolin Para comparaccedilotildees o trecho

do diaacutelogo de que provecircm as citaccedilotildees eacute este e seguem sem o itaacutelico os passos empregados pelo tradutor e

comentador seiscentista de Hermoacutegenes ldquoquem enim nos ineptum vocamus is mihi videtur ab hoc nomen

habere ductum quod non sit aptus idque in sermonis nostri consuetudine perlate patet nam qui aut tempus

quid postulet non videt aut plura loquitur aut se ostentat aut eorum quibuscum versatur vel dignitatis vel

commodi rationem non habet aut denique in aliquo genere aut inconcinnus aut multus est is ineptus esse

diciturrdquo Na traduccedilatildeo de Scatolin sem alteraccedilotildees lecirc-se ldquode fato aquele a quem chamamos de inoportuno parece-me receber essa denominaccedilatildeo do fato de natildeo ser oportuno e isso fica muito claro no uso da liacutengua

latina pois aquele que natildeo percebe o que exige a ocasiatildeo fala demais exibe-se natildeo leva em conta a posiccedilatildeo

ou a comodidade daqueles com quem se encontra ou enfim eacute em alguma situaccedilatildeo deselegante ou

exagerado a esse daacute-se o nome de inorportunordquo Note-se estatildeo em itaacutelico na versatildeo em liacutengua portuguesa

os passos citados Adriano Scatolin traduz ldquoaptusrdquo por ldquooportunordquo e ldquoineptusrdquo por ldquoinoportunordquo cf

SCATOLIN A A invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23 Satildeo Paulo

[FFLCH-USP] 2009 [tese de doutorado] p 198 936 Cf ldquoIn Hermogenis tractatvm de ideis sive de formis eloqventiaelig Gasparis Laurentij commentariusrdquo

in Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu

Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614] p 180

306

ldquonatildeo leva em conta aqueles com quem se encontrardquo 937 que em suma

cultiva o viacutecio da Cacozelia []938

Concordes Johannes Sturm e Gaspar Laurent na definiccedilatildeo da ineacutepcia em acepccedilatildeo

cara ao De oratore como contraparte viciosa da deinotēs como uso desconforme das

ideai tou logou Agrave guisa de exemplo lidos com esses comentadores o ldquoDiscurso

Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason

Denores contra le tragicomedie e le pastorali in un suo discorso di poesia de Giovanni

Battista Guarini e o Discorso di Iason Denores intorno a quersquo Principii Causae et

Accrescimenti che la Commedia la Tragedia et il Poema Heroico Ricevono dalla

Filosofia Morale amp Ciuile amp darsquo Gouernatori delle Republiche de Giason Denores

compotildeem-se os dois primeiros para evidenciar a aptidatildeo o juiacutezo a soleacutercia a eloquecircncia

e a congruecircncia de Gabriel Pereira de Castro e de Giovanni Battista Guarini ao passo que

o derradeiro faz-se de modo a sustentar a ineacutepcia do poeta italiano A ineacutepcia que enforma

o monstro

Esta ineacutepcia Gaspar Laurent pensa-a em latim como Cacozelia Vale rememorar

que a noccedilatildeo jaacute vista e entrevista se cruza no Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima

com a definiccedilatildeo de kakozēlon tal como normatizada por Quintiliano na Institutio

oratoria eacute ldquomala adfectatio per omne dicendi genus peccatrdquo ou seja ldquomaacute afetaccedilatildeo peca

em todo gecircnero de discursordquo (QUINT VIII 3 56-58) Nesse sentido Gaspar Laurent natildeo

lecirc kakozēlon como Natale Conti agrave luz de Demeacutetrio Mais de Johannes Sturm pende o

que seja e o que natildeo seja deinos e ineptus o contraponto virtuoso e vicioso no trato com

as ideai Deve-se ressaltar que se nessa distinccedilatildeo o comentador busca discernir deinotēs

de euprepeia propondo natildeo ser aprepēs o ineptus por natildeo incorrer no viacutecio da

desonestidade isso natildeo supotildee afastar da deinotēs os valores semacircnticos do decorum 939

Eacute o que se aprende com as Scholae de Johannes Sturm agrave traduccedilatildeo para o latim do Peri

staseōn de 1570 segundo as quais ldquooportet omnia ista decore facere quod decorum

937 Como se pode aventar os passos satildeo citaccedilotildees do De oratore (CIC De or II 17) No primeiro caso

Gaspar Laurent propotildee ldquonon videt quid tempus postuletrdquo em vez de ldquotempus quid postulet non videtrdquo No segundo caso natildeo reordena as palavras mas recolhe um excerto da fala de Crasso cf SCATOLIN A A

invenccedilatildeo no Do orador de Ciacutecero um estudo agrave luz de Ad Familiares 1 19 23 Satildeo Paulo [FFLCH-USP]

2009 [tese de doutorado] p 198 938 Traduccedilatildeo nossa 939 Os termos ldquoεὐπρέπειαrdquo ldquoἀπρέπειαrdquo e ldquoἀπρεπήςrdquo emprega-os Platatildeo no Fedro em relaccedilatildeo agraves

conveniecircncias e inconveniecircncias da escrita (cf PLAT Phaedr 274 b) PLATAtildeO Fedro Φαῖδρος 3ordf ed

revisada e biliacutengue Beleacutem edufpa 2011 pp 180-181

307

uocatur rdquo ou seja ldquoconveacutem compocirc-las [sc as demais seis ideai] decorosamente

porque deinotēs denomina-se decorordquo940 Trata-se soluccedilatildeo tradutoacuteria iterada mais de

cinquenta anos depois no tratado DellrsquoArte di Predicar Bene de Paolo Aresi

[] il Decoro [] egrave chiamato da alcuni altri Grauitagrave in greco

che vuol dire ancora diligenza giudicio acutezza drsquoingegno

industria e si prende per la facoltagrave ouer arte del dire in somma

consiste questa in saper seruisi di tutte le passate forme secondo che

richiede la materia il tempo amp altre simili circonstanze che dichiamo

noi comunemente osseruarrsquo il decoro941

[] O Decoro [] eacute chamado por alguns outros Gravidade em grego

Deinotēs que quer dizer ainda diligecircncia juiacutezo agudeza de engenho

induacutestria e se vincula agrave faculdade ou arte de dizer em suma esta

consiste em saber servir-se de todas as referidas formas segundo o que

reivindica a mateacuteria o tempo e outras circunstacircncias similares que

dizemos noacutes comumente observar o decoro942

Antes de Johannes Sturm registra-se no De Oratione Libri Septem de Antocircnio

Lulio impresso na Basileia em 1558 escolha semelhante943 Mostra-o Pierre Laurens

Gerard Joannes Vossius diferentemente dos demais letrados afirma ser melhor

interpretar deinotēs como ldquodicendi visrdquo do que como ldquoapta gravitasrdquo escolha esta que

940 Cf Hermogenis Tarsensis rhetoris acutissimi Partitionum Rhetoricarum liber unus qui vulgograve de

Statibus inscribitur Latinitate donatus amp Scholis explicatus atque illustratus a Ioanne Sturmio Cum

Gratia amp Priuilegio Caesareo ad annos octo Excudebat Iosias Rihelis MDLXX p 99 Cf PATTERSON

A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New Jersey Princeton University

Press 1970 p 67 941 Cf DellrsquoArte di predicar bene diuisa in due parti Nella quale oltre agraversquo precetti dersquo retori agrave questo proposito applicati di danno nuoue regole per tesserordinatamente vna predica con vn trattato della

memoria amp vnrsquoaltro della imitatione e con alcune osseruationi retoriche sopra vna predica in lode di S

Tomaso dAquino DI MONSIG PAOLO ARESI PARTE SECONDAhellip In MIL Per Gio Batt Bidelli

1627 p 199 942 Traduccedilatildeo nossa 943 Cf Antonii Lulli Balearis de Oratione Libri Septem Quibus non modograve Hermogenes ipse totus

uerumetiam quicquid feregrave agrave reliquis Graecis ac Latinis de Arte dicendi tratactũ est suis locis aptissimagrave

explicatur Accessit etiam locupletiss Rerum amp uerborum toto hoc Opere memorabilium Index Basileae

[ex officina Ioannis Oporini impensis Henrici Petri] [Anno Salutis humanae 1558] p 424 O passo da

obra foi autonomizado do restante da doutrina e editado no opuacutesculo LULIO A Sobre el decoro de la poeacutetica

Introduccioacuten edicioacuten traduccioacuten y notas de Antonio Sancho Royo Madrid Edicines Clasicas 1994

308

muito proximamente se vecirc do que jaacute se leu944

Assim como os demais usos do Peri ideōn deixam aventar considere-se um ou

outro discurso de poesia o leacutexico empregado por Jorge de Trebizonda para quem

deinotēs eacute grauitas por Johannes Sturm para quem eacute decorum (e tambeacutem eacute ou ldquoaptũ

grauiter amp cotildegruenterrdquo ou ldquoaptũ atq congruũ dicendi genusrdquo ou ldquoapta dicendi figurardquo)

por Gaspar Laurent para quem eacute Eloquentia (ou ldquoaptitudo iudicium amp solertia oratorisrdquo)

ou por Gerard Joannes Vossius para que eacute dicendi vis (o que eacute preferiacutevel a ldquoapta

gravitasrdquo) confere valores semacircnticos distintos amiuacutede discordantes por vezes

excludentes ao mesmo corpo de doutrina e distintos valores de uso que natildeo se podem

pensar senatildeo que na particularidade dos discursos das artes retoacutericas em uso

Encerre-se com um exemplo que espera ver o poema heroico e natildeo ver o monstro

Na praacutetica compositiva do gecircnero pensado como ldquopoesia leuantadardquo o emprego da

saphēneia e do megethos tal como normatizados por Hermoacutegenes eacute debatido nas

Risposte del Sig Horatio Ariosto ad alcuni luoghi del Dialogo dellrsquoEpica Poesia del S

Camillo Pellegrino nersquoquali si riprendeua lrsquoOrlando Furioso dellrsquoAriosto editadas em

1585 e reeditadas em 1586 em Ferrara Horaacutecio Ariosto (ca 1555-1593) que no

proecircmio deste texto se diz sobrinho-neto do poeta Ludovico Ariosto (1474-1533)945

escreve

Ma agrave mio credere tutto quello che si diragrave della sẽtenza amp elocutione

del Tasso in paragone dellrsquoAriosto e della sentenza amp elocutione

dellrsquoAriosto in paragine del Taszligo seragrave in uano amp un andarsi

raggirando senza frutto poi che se male si puograve far paragone di questi

scrittori nel fatto della fauola per hauer essi tenute strade diuerse

peggio si potragrave fare in queste due parti che fondamento dello stile nel

quale stile essi sono andati uie non solamente diuerse ma quasi anco

contrarie hauendosi lrsquouno chrsquoegrave lrsquoAriosto proposto di usar nel suo

poema il charattere ouero lrsquoIdea dello stile chiamata da Hermogene

944 Cf Gerardi Ioannis Vossi Commentariorum rhetoricorum sive oratoriarum institutionum Pars altera

Lugduni Batavorum Ex officina Ioannis Maire MDCXLIII [1643] p 512 cf LAURENS P ldquoPrefacerdquo in

HERMOGEgraveNE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon

Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 14 945 Cf ldquoper esser egli stato fratello di mio Auo fugrave mi gran ziordquo Cf ldquoIn Hermogenis tractatvm de ideis sive

de formis eloqventiaelig Gasparis Laurentij commentariusrdquo in Hermogenis Ars Oratoria Absolutissima Et

Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii

Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno MDCXIV [1614] p 201

309

Diluciditagrave doue lrsquoaltro cioegrave il Tasso ha hauuto mira di servare lrsquoIdea

ograve forma dello stile Magnifico le quai due forme essendo poco meno

che dirittamente opposte chi non uede chrsquoegli egrave vanitagrave il farne

paragone p[er] cavar da loro poi maggior lode piugrave dellrsquouno che

dellrsquoaltro scrittore Ma che sia uero che queste due Idee di stile siano

cosi disimili ueggiamo di quai semplici si farsquol cotildeposto dellrsquouna e di

quai si faccia quello dellrsquoaltra Lo stile Grande e Magnifico se

crediamo ad Hermogene agrave Demetrio amp ad Aristotile stesso richiede le

sentenze o concetti che voglia chiamargli alti illustri ricercati con

studio raggirati e quasi in vn certo modo violẽti vuole lrsquoelocuzione

figurata massimamente per traslazioni accompagnate da epiteti usa i

nomi formati di nuovo composti peregrini hagrave il numero non rimesso

o molle ma chrsquoa uista ha un poco dellrsquoaspretto usa sempre la

comprehẽsione chrsquoegrave quella pregnezza di parole e di concetti dalli quai

cose tutte auuiene che questa forma di stile appar simile agrave punto ad

uno che cammini per vna via selvaggia e che passo passo troui

qualche intoppo o qualche resistenza Lo stile Dilucido dallrsquoaltra parte

si serue di sentenze aperte e piu tosto communi e famigliari che

altramente alle quali notilde egrave niente di sotto inteso niente drsquooscuro quanto

allrsquoelocutione vsa nomi proprij per piu schiva gli ambigui e non egrave

molto esquisitamente artificiosa e sopra tutto non egrave aspra il suo

numero egrave aszligai semplice lrsquoordine e la disposition sua si delle cose

come delle parole egrave distinta e scoperta Questo egrave lo stile dellrsquoAriosto

per lo piu e lrsquoaltro giagrave detto egrave per lo piu quel del Tasso onde si puograve

uedere quanto difficile e poco fondamento si possa far paragone tra

loro Ma perchrsquoio habbia detto che lo stile dellrsquoAriosto sia piugrave tosto da

porsi sotto la forma della Diluciditagrave che della Magnificenza non

uorrei perograve chrsquoaltri pensasse chrsquoegli foszlige tale che disconuenisse agrave

materia heroica perchegrave oltre che nersquo luoghi opportuni molto ben sa

lrsquoAriosto uestir la Magnificenza e pigliar la grandezza come per

essempio in tutto lrsquoabbattimẽto di Parigi egli poi anco non egrave senza

quegli ornamenti i quali parte proprij e parte participatigli dalla Idea

della Venustagrave (perchegrave si possono meschiare piu Idee o forme insieme)

della Venustagrave dico chiamata Eleganza da Demetrio lo rendono tale

quale sagrave il mondo che agrave questrsquohora e spero il medesimo anco

nellrsquoauuenire da lui troppo dolcemente allettato se nrsquoegrave rimaso quasi

310

ebro e fuor di segrave stesso il qual miracoloso effetto nasce dallrsquohauer egli

saputo al par drsquoognrsquoaltro trouare e trouata usar quella maniera

drsquooratione che si puograve dir carrattere di tutti i caratteri amp idea di tutte

le idee tanto lodata da Aristotele e da lui chiamata Decora946

Mas a meu crer tudo aquilo que se diraacute do pensamento amp da elocuccedilatildeo

de Tasso em paragone com os de Ariosto e do pensamento amp da

elocuccedilatildeo de Ariosto em paragone com os de Tasso seraacute em vatildeo amp um

perambular sem fruto porque se pode mal fazer o paragone desses

escritores na questatildeo da faacutebula por haverem ambos seguido estradas

diversas pior se poderaacute fazer nessas duas partes que satildeo fundamento

do estilo Nestes estilos eles tomaram vias natildeo somente diversas senatildeo

quase que contraacuterias tendo um que eacute Ariosto se proposto a usar em

seu poema o caraacuteter ou Ideia do estilo chamada por Hermoacutegenes

Clareza ao passo que outro isto eacute Tasso teve vistas de conservar a

Ideia ou forma do estilo Magniacutefico as duas formas sendo pouco menos

que diretamente opostas quem natildeo vecirc que eacute vanidade fazer o paragone

para extrair por elas em seguida maior louvor de um do que de outro

escritor Mas que seja verdadeiro que essas duas Ideias de estilo sejam

coisas dessemelhantes vejamos de quais simples se faz o composto de

uma e de quais se faz o de outra O estilo Grande e Magniacutefico se cremos

em Hermoacutegenes em Demeacutetrio amp em Aristoacuteteles semelhantemente

reivindica as sentenccedilas ou conceitos que se queiram chamar altos

ilustres refinados com estudo abundantes e de certo modo quase

violentos Quer a elocuccedilatildeo figurada maximamente por translaccedilotildees

acompanhadas de epiacutetetos usa os nomes formados do novo compostos

peregrinos Tem o ritmo natildeo remisso ou deacutebil mas que agrave vista tem um

pouco do aacutespero Usa sempre o periacuteodo que eacute aquela prenhez de

palavras e de conceitos de que tudo adveacutem que esta forma de estilo

parece de tal modo assemelhar-se agravequele que caminha por uma via

selvagem e que passo a passo encontra algum obstaacuteculo ou alguma

resistecircncia O estilo Claro por outra parte se serve de sentenccedilas

946 Apud Apologia del S Torquato Tasso in difesa della sua Gierusalemme liberata agli Accademici della

Crusca Con le acuse amp difese dellrsquoOrlando Furioso dellrsquoAriosto Et alcune lettere pareri amp Discorsi di

diuersi Auttori nel medesimo genere Di nuouo corretta amp ristampata Aggiontoni la risposta dellrsquoistesso

Tasso al Discorso del Lombardelli intorno agrave i constrasti della sua Gierusalẽme I titoli si leggono

nellrsquoottaua carta In Ferrara Ad instatildeza di G Vasalini Con licenza de i Superiori 1586 p 224-226

311

evidentes e antes comuns e familiares do que de outra sorte as quais

nada tecircm de subentendido nada de obscuro quanto agrave elocuccedilatildeo usa no

mais nome proacuteprios esquiva-se dos ambiacuteguos e natildeo eacute muito

refinadamente artificiosa e sobretudo natildeo eacute aacutespera o seu ritmo eacute

bastante simples a ordem e a sua disposiccedilatildeo tanto das coisas como das

palavras eacute distinta e descoberta Este eacute no mais o estilo de Ariosto e o

outro jaacute dito eacute no mais o de Tasso donde se pode ver quatildeo difiacutecil e

pouco fundamentado seja fazer o paragone entre eles Mas porque eu

havia dito que o estilo de Ariosto seja antes para pocircr-se sob a forma da

Clareza que sob a da Magnificecircncia natildeo gostaria todavia que outros

pensassem que ele fosse tal que desconviesse agrave mateacuteria heroica porque

natildeo soacute nos lugares oportunos muito bem sabe Ariosto vestir a

Magnificecircncia e tomar a grandeza como por exemplo em todo o cerco

de Paris senatildeo ele tambeacutem natildeo carece daqueles ornamentos que em

parte proacuteprios em parte participantes da Ideia de Beleza (porque se

podem misturar mais Ideias ou mesmo formas) da Beleza digo

chamada Elegacircncia por Demeacutetrio o tornam tal como sabe o mundo que

a esta hora e espero o mesmo tambeacutem no futuro eacute por ele muito

docemente atraiacutedo se natildeo quase embriagado e fora de si Este

miraculoso efeito nasce de ter ele sabido tanto encontrar todas as outras

[ideias] como tendo-as encontrado usar aquela maneira de discurso

que se pode dizer caraacuteter de todos os caracteres tatildeo louvada por

Aristoacuteteles e por ele chamada Decoro947

De acordo com Horaacutecio Ariosto o paragone entre a Gerusalemme liberata e o

Orlando Furioso natildeo haacute Natildeo haacute nem pode haver porque como compostos ambos os

poemas segundo ldquodue formerdquo distintas devam ser lidos segundo criteacuterios de ajuizamento

semelhantemente distintos Trata-se de pressuposto defendido por Giovanni Battista

Guarini natildeo deve ler Giason Denores Il Pastor Fido agrave luz do que natildeo eacute Para o apologista

antes claro que grandioso o stile do poema de Ludovico Ariosto eacute decorrente do uso

ciente daquela ldquomaniera drsquooratione che si puograve dir carrattere di tutti i caratteri amp idea

di tutte le idee tanto lodata da Aristotele e da lui chiamata Decorardquo (ldquomaneira de

discurso que se pode dizer caraacuteter de todos os caracteres amp ideia de todas as ideias tanto

947 Traduccedilatildeo nossa

312

louvada por Aristoacutetetes e por ele chamada Decorordquo) Ou seja leitor da preceptiva de

Hermoacutegenes como Johannes Sturm Horaacutecio Ariosto entende deinotēs como decoro e

enaltece o Orlando Furioso pela harmoniosa mistura das ideai que fazem o todo Bem

acomodado agraves razotildees nas razotildees do elogio natildeo eacute figura monstruosa948

948 Cf PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Seven Ideas of Style Princeton New Jersey

Princeton University Press 1970 pp 180-182 cf LAURENS P ldquoPrefacerdquo in HERMOGEgraveNE LrsquoArt

rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme

1997 p 19

313

EPIacuteLOGO

Agrave semelhanccedila do que jaacute disse Joatildeo Adolfo Hansen de Aristoacuteteles Hermoacutegenes eacute

nome plural neste trabalho natildeo haacute Hermoacutegenes o Sofista natildeo haacute Hermoacutegenes o Retor

natildeo haacute Hermoacutegenes cujas ideias estejam deslocadas e sejam atopicamente improacuteprias aos

gostos nacionais como gregas entre vozes e escritos italianos espanhoacuteis ou portugueses

nem haacute ideias ubiacutequas universais porque Ideias haacute usos oportunos e discursivamente

circunstanciados de um corpo doutrinaacuterio autorizado pelo costume e atualizado por

letrados eruditos tratadistas e poetas entre os seacuteculos XV e XVIII Esses usos definidos

finitos particulares eacute que interessam quando interessam os coacutedigos que prescrevem a

poesia que desconhece a ldquoliteraturardquo o ldquorenascimentordquo e o ldquobarrocordquo usos que o

hexacircmetro mnemocircnico latino pode indagar ldquoQuis quid ubi quibus auxiliis cur

quomodo quandordquo949

Trata-se de indagaccedilatildeo que visa ao esboccedilo verossiacutemil das vertentes da recepccedilatildeo da

pluralidade dos agenciamentos do corpo retoacuterico atribuiacutedo a Hermoacutegenes que visa agrave

reconstituiccedilatildeo possiacutevel dos regimes que codificam as representaccedilotildees letradas entre os

seacuteculos XV e XVIII Supotildee-se que o estudo das leituras do Peri ideōn da circulaccedilatildeo da

doutrina das ideai de Hermoacutegenes e dos modos sempre no plural pelos quais se

atualizaram nos discursos como os tantos citados permita aprofundar a compreensatildeo dos

protocolos de produccedilatildeo e de destinaccedilatildeo da poesia produzida nesse tempo vernacular

latina latinizante helecircnica ou helenizante dramaacutetica narrativa ou mista eacutepica cocircmica

traacutegica etc Sobretudo mimeacutetica em termos aristoteacutelicos Permite pois pensar a

historicidade e a especificidade das praacuteticas de representaccedilatildeo e refratar compreensotildees

etapistas e substancialistas das artes No plural

O ldquoDiscurso Poeacuteticordquo de Manuel de Galhegos e Il Verrato de Giovanni Battista

Guarini entre as obras e os autores referidos que preceituam o poema heroico ou a

tragicomeacutedia a partir de Hermoacutegenes natildeo apenas se enunciam em conformidade com a

autoridade do retor senatildeo tambeacutem encenam a movecircncia do leacutexico que interpreta a

949 Entenda-se Quem O quecirc Onde Por quais meios Por quecirc Como Quando cf DELEUZE G

Conversaccedilotildees Satildeo Paulo Editora 34 1992 p 37 Cf GOYET F Le sublime du ldquolieu communrdquo

Linvention rheacutetorique dans lrsquoAntiquiteacute et agrave la Renaissance Paris Honoreacute Champion 1996 pp 21-2

314

preceptiva grega e lhe reinstitui os efeitos e os sentidos agrave luz da doutrina retoacuterica em latim

fazendo falar as ideai com Ciacutecero com Quintiliano com a Retoacuterica a Herecircnio Ora em

consonacircncia com a tratadiacutestica de Hermoacutegenes devem-se ler Manuel de Galhegos e

Giovanni Battista Guarini como exempla das vigecircncias do Peri ideōn nas invenccedilotildees de

poesia quinhentista e seiscentista enfeixados com D Luiacutes de Goacutengora com Ludovico

Ariosto com Franccedilois Rabelais pode-se aventar com a numerosa porccedilatildeo de artiacutefices do

discurso misto construiacutedo em verso e em prosa mediante a complexidade das

modulaccedilotildees elocutivas das ideai dos matizes dos genera dicendi com vistas ao riso ou

natildeo segundo decoros especiacuteficos e habilmente calculados na variaccedilatildeo e na

copiosidade950

Ademais a movecircncia lexical deixa supor que natildeo haacute aleacutem do discurso epidiacutetico

a primazia de Jorge de Trebizonda na circulaccedilatildeo ocidental do corpo retoacuterico atribuiacutedo a

Hermoacutegenes visto que Hermoacutegenes natildeo haacute Haacute um nome que se faz que autoriza

doutrinas que distintos nomes gregos latinos e vernaacuteculos fizeram circular A circulaccedilatildeo

busca-se entrever por vertentes nunca rarefeitas nunca desbastadas mas pensadas em

aberturas muacuteltiplas ou seja com a ciecircncia das variaccedilotildees polissecircmicas parafraacutesticas

proliferantes das ideai conforme Johannes Sturm Francisco Porto Garpar Laurent

Antocircnio Bonfine Natale Conti Giulio Camillo Delminio Filiberto Campanile Antocircnio

Sebastiano Minturno Antocircnio Lulio Fernando de Herrera Juacutelio Cesar Escaliacutegero

Torquato Tasso Pedro Juan Nuntildeez Horaacutecio Ariosto Manuel de Galhegos Manuel Pires

de Almeida Jerocircnimo Soares Barbosa etc Logo mirando-se a presenccedila em terras

italianas portuguesas ou espanholas entre fins do seacuteculo XV e meados do XVIII da

preceptiva autorizada por Hermoacutegenes mira-se sobretudo a multiplidade dos valores de

uso da arte retoacuterica Multiplicidade dos mistos prescritos no Peri ideōn

950 Cf LAURENS P ldquoPrefacerdquo in HERMOGEgraveNE LArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale

introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAcircge drsquoHomme 1997 p 12

315

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS

Bibliografia primaacuteria

AGOSTINHO DE HIPONA ldquoAs ideias (de ideis)rdquo Discurso Satildeo Paulo n 40 pp 377-380 nov 2010

________ De diversis quaestionibus octoginta tribus (q XLVI) A Mutzenbecher (ed)

Corpus Christianorum Series Latina (CCSL) 44A

ALBERTI Leon Battista Da pintura Traduccedilatildeo Antonio da Silveira Mendonccedila Apresentaccedilatildeo Leon Kossovitch Campinas Editora da Unicamp 1992

APSINES Art rheacutetorique Problegravemes agrave faux-semblant Texte eacutetabli et traduit par M

Patillon Paris CUF 2002 AQUINO T de ldquoSuma Teoloacutegica Primeira Parte Questatildeo 15 Sobre as Ideiasrdquo Discurso

Satildeo Paulo n 40 pp 309-328 nov 2010

ARESI P DellrsquoArte di predicar bene diuisa in due parti Nella quale oltre agraversquo precetti dersquo retori agrave questo proposito applicati di danno nuoue regole per tesserordinatamente vna predica

con vn trattato della memoria amp vnrsquoaltro della imitatione e con alcune osseruationi retoriche

sopra vna predica in lode di S Tomaso dAquino DI MONSIG PAOLO ARESI PARTE

SECONDAhellip In MIL Per Gio Batt Bidelli 1627 ARISTOacuteTELES De anima Livros I II e III 2ordf ediccedilatildeo Apresentaccedilatildeo traduccedilatildeo e notas de

Maria Ceciacutelia Gomes dos Reis Satildeo Paulo Editora 34 2012

________ LrsquoEthica drsquoAristotele tradotta in lingua vulgare fiorentina et commentata per Bernardo Segni In Venegia MDL [1550]

________ Della Poetica di Francesco Patrici La Deca Disputata Nella quale e per

istoria e per ragioni e per autoritagrave dersquo grandi antichi si mostra la falsita et vi egrave aggiunto il

trimerone del medesimo in riposta alle oppositioni fatte dal signor Torquato Tasso al parer suo scritto in diffesa dellrsquoAriosto In Ferrara Per Vittorio Baldini Stampator Ducale 1586 Con

licenza de i Superiori

________ Poeacutetica Traduccedilatildeo de Eudoro de Souza 2ordf ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ars Poetica 1993 ________ Poetica drsquoAristotele uulgarizzata et sposta per Ludovico Castelvetro

Stampata in Vienna drsquoAustria per Gaspar Stainhofer lrsquoanno del Signore MD LXX [1570]

________ A Poetica de Aristoteles traduzida do Grego em Portuguez Lisboa Na Regia Officina Typografica Anno de MDCCLXXIX [1779] Com licenccedila da Real Meza Censoria

________ Retoacuterica Trad M Alexandre Juacutenior P F Alberto A N Pena Lisboa IN-

CM 1998

________ Rheacutetorique Texte eacutetabli et traduit par Meacutedeacuteric Dufour et Andreacute Wartelle Anotteacute par Andreacute Wartelle Paris Les Belles Lettres 1973

______ Sobre a geraccedilatildeo e corrupccedilatildeo Traduccedilatildeo e notas de Francisco Choratildeo Revisatildeo

cientiacutefica de Alberto Bernabeacute Pajares Lisboa IN-CM 2009 ASSIS M de Dom Casmurro Apresentaccedilatildeo de Paulo Franchetti Notas e comentaacuterios de

Leila Guenther Satildeo Paulo Ateliecirc 2010

BARBOSA A Dictionarium Lusitanico Latinum juxta seriem alphabeticam optimis

probatisq doctissimorum auctorum testimonijs perutili quadam expositione locupletatum cum Latini sermonis indice nec non libello uno aliquarum regionum civitatum oppidorum

fluviorum montium amp locorum quibus veteres uti solebant omnia in studiosae inventutis

gratiam amp usum collecta per Augustinum Barbosam Lusitanum Bracharae typis amp expensis Fructuosi Laurentij de Basto 1611

BARBUDA M M de Virginidos ou Vida da Virgem Senhora Nossa Poema Heroico

dedicado a Magestade da Rainha Dona Luiza Nossa Senhora por Manuel Mendes de Barbuda

316

amp Vasconcellos Lisboa Na Officina de Diogo Soares de Bulhoens 1667 Com todas as licenccedilas

necessaacuterias

BARRETO J F Micrologia camoniana Prefaacutecio de Aniacutebal Pinto de Castro leitura e integraccedilatildeo do texto de Luiacutes Fernando de Carvalho Dias e Fernando F Portugal Lisboa Imprensa

Nacional-Casa da Moeda 1982

BARROS J Grammatica da lingua Portuguesa Olyssippone Apud Lodiuicum Rotorigiũ

Typographum M D XL [1540] BEMBO P Gli Asolani di Messer Pietro Bembo [Impressi in Venetia nelle case dAldo

Romano 1505]

______ Les Azolains de Mon Seignevr Pierre Bembo de la nature Drsquoamour Traduictz ditalien en Franccedilois par Jean Martin Secretaire de Monseigneur le reverendiszligime Cardinal de

Lenoncourt A Paris pour Galiot du Preacute rueuml S Iacque agrave lrsquoenseigne de la Galere drsquoOr 1576

BOILEAU-DESPREAUX N Oeuvres de Nicolas Boileau Despreacuteaux Avec des

eacuteclaircissemens historiques donnez par lui-meme Nouvelle Edition revueuml corrigeacutee amp augmenteacutee par de diverses Remarques Enrichie de figures graveacutees par Bernard Picart le Romain Tome

Premier Amsterdam chez David Mortier MDCCXVIII Avec privilege

BLUTEAU R Vocabulario portuguez e latino aulico anatomico architectonico bellico botanico brasilico comico critico chimico dogmatico dialectico dendrologico ecclesiastico

etymologico economico florifero forense fructifero autorizado com exemplos dos melhores

escritores portugueses e latinos pelo padre D Raphael Bluteau Coimbra no Real Collegio das Artes da Companhia de Jesu Com todas as Licenccedilas necessaacuterias Anno Domini MDCCXIII

[1713]

BYRON G G Childe Harolds Pilgrimage Canto The Fourth By Lord Byron London

John Murray Albemarle-Street 1818 BYRON G G POPE A HUGO V Traducccedilotildees Poeticas de F J Pinheiro Guimaratildees

Bacharel em Sciencias Sociais e Juridicas Childe Harold e Sardanapalo de Lord Byron o Roubo

da Madeixa de Pope Hernani de Victor Hugo Rio de Janeiro Typographia Universal de Laemmert Rua dos Invalidos 61 B 1863

CAMOtildeES L Os Lusiadas de Luis de Camotildees Com Privilegio Real Impressos em Lisboa

com licenccedila da Sancta Inquisiccedilatildeo e do Ordinario em casa de Antonio Gotildeccedilaluez Impressor 1572 ______ Lusiadas de Luis de Camoens principe de los poetas de Espantildea Al Rey N S

Felipe IV El grande Comentadas por Manuel de Faria i Sousa Cavallero de la Orden de Christo

i de la Casa Real Tomos terceiro i quarto Antildeo 1639 Com privilegio En Madrid Por Iuan

Sanchez Impressor A costa de Pedro Coello mercador de libros ______ Rimas varias de Luis de Camoens priacutencipe de los poetas heroycos y liricos de

Espantildea Ofrecidas al muy ilustre sentildeor D Ivan da Sylva Marquez de Gouvea presidente del

Dezembargo do Paccedilo y mayordomo mayor de la Casa Real ampc Comentadas por Manuel de Faria Y Sousa Cavallero de la Orden de Christo Tomo I y II Que contienen la primera segunda

y la terceira Centuria de los Sonetos Lisboa Con Privilegio Real En la Imprenta de Theotonio

Damaso de Mello Impressor de la Casa Real Con todas las licencias necessarias Antildeo de 1685

______ Rhythmas de Lvis de Camoes divididas em cinco partes Dirigidas ao muito illustre senhor D Gonccedilalo Coutinho Impressas com licenccedila do supremo Conselho da geral

Inquisiccedilatildeo amp Ordinario Em Lisboa por Manvel de Lyra Anno de M D LXXXXV [1595] A custa

de Esteuatildeo Lopez mercador de libros CAMPANILE F LrsquoIdee overo Forme dellarsquoeloquentia scritte da Filiberto Campanile

secondo la Dotrina drsquoHermogene e drsquoaltri Retori antichi In Napoli Apresso Gio Battista

Sottile M DCVI [1606] Con Licenza dersquo Superiori CARDOSO J Dictionarium latino lusitanicum amp vice versa lusitanico latinu[m] cum

adagiorum fereacute omnium iuxta seriem alphabeticam perutili expositione ecclesiasticorum etiam

vocabulorum interpretatione noueacute omnia per Hieronymu[m] Cardosum Lusitanum congesta

recognita vero omnia per Sebast Stockhamerum Germanum Qui libellum etiam de propriis nominibus regionu[m] populorum illustrium virorum adiecit Conimbricae excussit Joan

Barrerius 1570

317

______ Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum adagiorum

fereacute omnium iuxta seriem alphabeticam perutili expositione per Hieronymum Cardosum

Lusitanum congesta recognita vero omnia per Sebast Stokhamerum Germanum Qui libellum etiam de propriis nominibus regionum populorum illustrium virorum adiecit Adhuc noui huic

ultimae impressioni adjuncti sunt varij loquendi modi ex praecipuis auctoribus decerpti

praesertim ex Marco Tullio Cicerone Olyssipone excussit Alexander de Syqueira expensis

Simonis Lopezij bybliopolae 1592 ______ Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum adagiorum

fere omnium iuxta seriem alphabeticam perutili expositione Ecclesiasticarum vocabulorum

interpretatione item de monetis ponderibus et mensuris ad presentem usum accommodatis per Hieronymum Cardosum lusitanum congesta recognita vero per Sebastianum Stokhamerum

germanum Qui libellum etiam de propijs nominibus regionum populorum illustrium virorum

fluviorum montium ac aliorum complurium nominum et rerum scitu dignarum historijs et

fabulis poeticis refertum in usum et gratiam lusitanicae pubis concinnavit et ex integro adiecit Adhuc noui huic ultimae impressioni adiuncti sunt varij loquendi modi ex praecipuis authoribus

decerpti praesertim ex Marco Tullio Cicerone Olyssipone excussit Antonius Alvares

typographus 1601 ______ Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum

adagiorum feregrave omnium juxta seriem alphabeticam perutili expositione Ecclesiasticarum [sic]

vocabulorum interpretatione item de monetis ponderibus et mensuris ad presentem usum accommodatis per Hieronymum Cardosum lusitanum congesta recognita vero omnia per

Sebastianum Stokhamerum germanum Qui libellum etiam de proprijs nominibus regionum

populorum illustrium virorum fluviorum historijs amp fabulis poeticis refertum in usum amp

gratiam lusitanicae pubis concinnavit amp ex integro adiecit Adhuc novi huic ultimae impressioni adjuncti sunt varij loquendi modi ex praecipuis auctoribus decerpti praesertim ex Marco Tullio

Cicerone nunc denuo amendarum colluvie qua scatebat diligenti lucubratione defaecatum

Ulyssipone ex officina Petri Crasbeeck 1613 ______ Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum adagiorum

feregrave omnium iuxta seriem alphabeticam perutili expositione amp Ecclesiasticorum vocabulorum

interpretatione item de monetis ponderibus amp mensuris ad praesentem usum accomodatis per Hieronymum Cardosum lusitanum congesta recognita vero omnia per Sebastianum

Stokhamerum germanum Qui libellum etiam de proprijs nominibus regionum populorum

illustrium virorum fluviorum montium ac aliorum complurium nominum amp rerum scitu

dignarum historijs amp fabulis poeticis refertum in usum amp gratiam lusitanicae pubis concinnavit amp ex integro adiecit Cui hac ultima editione praeter caetera hactenus alijs contenta in singulis

nominibus et verbis suae inflexiones appositae sunt in Dictionario lusitanico in latinum

sermonem converso multa singulari studio et diligentia addita cum varijs loquendi modis ex praecipuis auctoribus collectis aliaque ab innumeris pene erroribus non sine labore et studio

vindicata Ulyssipone Ex officina Petri Crasbeeck 1619

______ Dictionarium latino lusitanicum et vice versa lusitanico latinum cum

adagiorum fereacute omnium iuxta seriem alphabeticam perutili expositione amp Ecclesiasticarum vocabulorum interpretatione item de monetis ponderibus amp mensuris ad praesentem usum

accomodatis Hieronymum Cardosum lusitanum congesta recognita vero omnia per Sebastianum

Stokhamerum germanum Qui libellum etiam de proprijs nominibus regionum populorum illustrium virorum fluviorum montium ac aliorum complurium nominum amp rerum scitu

dignatum historijs amp fabulis poeticis refertum in usum amp gratiam lusitanicae pubis concinnavit

amp ex integro adiecit Cui hac ultima editione praeter caetera hactenus alijs contenta in singulis nominibus amp verbis suae inflexiones appositae sunt ac in Dictionario lusitanico in latinum

sermonem converso multa singulari studio amp diligentia addita cum varijs loquendi modis ex

praecipuis auctoribus collectis aliaque ab innumeris pene erroribus non sine labore amp studio

vindicata Ulyssipone ex officina Petri Craesbeeck 1630 ______ Dictionarium latino lusitanicum et lusitanico latinum cum aliquorum

adagiorum et humaniorum historiarum et fabularun perutile expositione item de Vocibus

Ecclesiasticis de ponderibus et mensuris et aliquibus loquendi modis pueris accommodatis per

318

Hieronymum Cardozum lusitanum Quod in hac ultima editione multis nominibus auctum et aacute

pluribus erroribus ijsque turpissimis quibus vel typographum incuriacirc vel correctorum maximacirc

negligentiacirc abundabat expurgatum in lucem damus Ulyssipone ex officina Laurentij de Anveres a custa de Domingos Carneiro mercador de livros 1643

______ Dictionarium latino lusitanicum et lusitanico latinum cum aliquorum

Adagiorum et humaniorum historiarum et fabularum perutili exposition item de Vocibus

Ecclesiasticis de Ponderibus et mensuris et aliquibus loquendi modis pueris accomodatis per Hieronimum Cardozum lusitanum Quod in hac ultima editione multis nominibus auctum et agrave

pluribus erroribus ijsque turpissimis quibus vel typographum incuriacirc vel correctorum maximaacute

negligentiagrave abundabat expurgatum in lucem damus Ulyssipone ex officina amp sumptibus Antonij Craesbeeck agrave Mello serenissimi principi typographi 1677

______ Hieronymi Cardosi Dictionarium latino-lusitanicum et lusitanico-latinum

quanta maxima fide ac diligentiagrave accuratissimegrave expurgatum adjectis Dictionariolis de vocibus

ecclesiasticis de ponderibus numismatis amp mensuris cunctis accesserunt etiam concinni loquendi modi phrases amp adagia ex optimis authoribus decerpta item magna sylva nominum

propriorum amp appellativorum humaniorum historiarum populorum marium fluviorum

montium urbium ventorum syderum deorum etc Editio novissima in quagrave est itidem appositus Catalogus dictionariorum authorumque plurimorum qui tam de linguacirc latina quagravem de studiosis

notitijs pertractarunt omnibus grammatices professoribus perutilissimus Reverendissimo

Domino D Georgio Cornelio archiepiscopo Rhodiensi Ulyssipone typis amp sumptibus Dominici Carneiro trium Ordinum Militarium typographi 1694

______ Hieronymi Cardosi Lamacensis Dictionarium ex Lusitanico in latinum sermonem

Ulissypone ex officina Ioannis Aluari 1562

CASCALAES F de Tablas poeticas del licenciado Francisco Cascales Dirigidas al Excelentiacutessimo Sentildeor D Francisco de Castro Conde de Castro Duque de Taurisano Virrey y

Capitaacuten general del Reyno de Sicilia Con privilegio En Murcia por Luis Beroacutes Antildeo de 1617

CASTELO BRANCO CAMILO A queda drsquoum anjo romance Lisboa Livraria de Campos Junior 1866

CASTILHO A F Tratado de metrificaccedilatildeo portugueza para em pouco tempo e ate sem

mestre se aprenderem a fazer versos de todas as medidas e composiccedilotildees obra aprovada pelo Conselho de Instrucccedilatildeo Publica do Reino para uso das escolas Auctor A F de Castilho

Presidente Honoraacuterio da Sociedade dos Amigos das Lettras e Artes em S Miguel Fundador das

escolas de Leitura repentina na mesma ilha etc etc etc Lisboa 1851

CASTRO G P Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico Composto pelo insigne Doutor Gabriel Pereira de Castro Corregedor que foy do crime da Corte amp nomeado por S

Magestade pera Chanceler mograver do Reyno de Portugal A El Rey Nosso Senhor Com licenccedila em

Lisboa por Lourenccedilo Crasbeeck impressor del Rey 1636 Acusta de Paulo Crasbeeck mercador de liuro

______ Ulyssea ov Lisboa Edificada Poema heroico de Gabriel Pereira de Castro do

Conselho de El Rey noszligo senhor [Sl sn 1642]

______ Ulyssea ou Lisboa Edificada Poema heroico composto pelo insigne doutor Gabriel Pereira de Castro corregedor que foy do Crime da Corte e nomeado por Sua Magestade

para Chanceller moacuter do Reyno de Portugal Offerecido a El Rey D Joam V Nosso Senhor Lisboa

Na Officina de Miguel Rodrigues Impressor do Senh Card Patriarc M DCC XLV [1745] Com as licenccedilas necessarias

______ Ulysseacutea ou Lisboa Edificada Poema heroico de Gabriel Pereira de Castro

Quarta ediccedilatildeo Lisboa na Typographia Rollandiana 1826 Com Licenccedila da Mesa do Desembargo do Paccedilo

______ Ulysseacutea ou Lisboa Edificada Poema heroico de Gabriel Pereira de Castro

Quarta ediccedilatildeo Lisboa na Typographia Rollandiana 1827 Com Licenccedila Vende-se em casa de

Rolland Rua Nova dos Martyres N 10 abaixo do Theatro de S Carlos ______ Ulisseia ou Lisboa edificada Texto estabelecido e comentado por J A

Segurado e Campos Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 2000

319

CATULO O livro de Catulo Traduccedilatildeo introduccedilatildeo e notas de Joatildeo Angelo Oliva Neto Satildeo

Paulo Edusp 1996

CICERO De lrsquoinvention Texte eacutetabli et traduit par Guy Achard Paris Les Belles Lettres 1994

________ De lrsquoorateur Livre III Texte eacutetabli par Henri Bornecque et traduit par Edmond

Courbaud Paris Les Belles Lettres 1930

________ De re publica De legibus Translated by Clinton Walker Keyes Cambridge Harvard University Press 1988

________ Em defesa do poeta Aacuterquias Introduccedilatildeo traduccedilatildeo e notas de Maria Isabel

Rebelo Gonccedilalves Lisboa Editorial Inqueacuterito 1986 ________ Livro dos oficios de Marco Tullio Ciceram o qual tornou em linguagem o

Infante D Pedro duque de Coimbra Ediccedilatildeo critica segundo o MS de Madrid prefaciada

anotada e acompanhada de glossaacuterio por Joseph M Piel Coimbra 1948

________ Lrsquoorateur Du meilleur genre drsquoorateur Texte eacutetabli et traduit par Albert Yon Paris Les Belles Lettres 1964

________ M T Ciceronis ad Marcum Brutum Orator cum Victoris Pisani Patritij Veneti

commentario Lvgdvni Apud Seb Gryphivm 1536 ________ Topica Edited with a translation introduction and commentary by Tobias

Reinhardt Oxford Oxford University Press 2005

COMANINI G Il Figino overo del fine della pittura Dialogo del Rever Padre D Gregorio Comanini Canonico Regolare Lateranense Ove quistionandosi sersquol fine della pittura

sia lrsquoutile overo il diletto si tratta dellrsquouso di quella nel Christianesimo Et si mostra qual sia

imitator piugrave perfetto amp che piugrave diletti il Pittore ouero il Poeta In Mantova Per Francesco

Osanna Stampator Ducale MDLXXXXI [1591] Continentur hoc volumine Georgii Trapezuntii Rhetoricorum libri V Consulti Chirii

Fortunatiani libri III Aquilae Romani de figuris sententiarum amp elocutionis liber P Rutilii Lupi

earundem figurarum e Gorgia liber Artistotelis rhetoricorum ad Theodecten Georgio Trapezuntio interprete libri III Eiusdem rhetorices ad Alexandrum a Francisco Philelpho in Latinum uersae

liber Paraphrasis rhetoricae Hermogenis ex Hilarionis monachi Veronensis traductione

Priscianus de rhetoricae praeexercitamentis ex Hermogene Aphthonii declamatoris rhetorica progymnasmata Io Maria Catanaeo tralatore Venetiis in aedibus Aldi et Andreae Asulani

soceri 1523

CONSULTI FORTUNATIANI Ars rhetorica Introduzione edizione critica traduzione

italiana e commento a cura di Lucia Calboli Montefusco Bologna Pagravetron Editore 1979 COVARRUBIAS OROZCO S Tesoro de la Lengva Castellana o Espantildeola Compvesto por

el licenciado D Sebastian de Cobarruuias Orozco Capelan de su Magestade Mastrescuela y

Canonigo de santa Iglesia de Cuenca y consultor del santo Oficio de la Inquisicion Dirigido a la Magestad Catolica del Rey Don Felipe III nestro sentildeor Con Privilegio En Madrid por Luis

Sanchez impressor del Rey N S Antildeo del Sentildeor M DC XI [1611]

DANTE ALIGHIERI Dante con le espositioni di Christoforo Landino et Alessandro

Vellutello Sopra le sua Comedia dellrsquoInferno del Purgatorio amp del Paradiso Con Tauole Argomenti Allegorie amp riformato riueduto amp ridotto alla sua uera Lettura con Francesco

Sansovino Fiorentino In Venetia Apresso Giambattista Marchio Sessa amp Fratelli 1578

DEacuteMEacuteTRIOS Du style Texte eacutetabli et traduit par Pierre Chiron Paris CUF 1993 DEacuteMEacuteTRIO Sobre el estilo lsquoLONGINOrsquo Sobre lo sublime Introduccioacuten traducioacuten y notas

de Joseacute Garciacutea Loacutepez Madrid Editorial Gredos 1979

DEMOSTHENES A oraccedilatildeo da coroa Versatildeo no original grego precedida de um estudo sobre a civilisaccedilatildeo da Grecia por J M Latino Coelho Segunda ediccedilatildeo da Academia Real das

Sciencias de Lisboa Lisboa Typographia da Academia 1880

DENORES G Discorso di Iason Denores intorno a quersquo Principii Causae et

Accrescimenti che la Commedia la Tragedia et il Poema Heroico Ricevono dalla Filosofia Morale amp Ciuile amp darsquo Gouernatori delle RepublicheAllIlustrissimo et Molto Reverendo

Signor Abbate Galeazzo Riario Con Priuilegio In Padova Apresso Paulo Meieto 1587

320

Diccionario de la lengua castellana en que se explica el verdadero sentido de las voces

su naturaleza y calidad con las phrases o modos de hablar los proverbios o refranes y otras

cosas convenientes al uso de la lengua [] Compuesto por la Real Academia Espantildeola Tomo primero Que contiene las letras AB Madrid Imprenta de Francisco del Hierro 1729

DIONIacuteSIO DE HALICARNASSO Tratado da imitaccedilatildeo Editado por Raul Miguel Rosado

Fernandes Lisboa IN-CM 1986

______ The critical essays With an English translation by Stephen Usher Cambridge Harvard University Press 1974 2 vols

DRYDEN J Drydenrsquos Essays Introduction by W H Hudson London New York J M

DENT amp SONS LTD 1954 Encyclopeacutedie ou dictionnaire raisonneacute des sciences des arts et des meacutetiers par une

socieacuteteacute de gens de lettres Mis en ordre et publieacute par M Tome seizieme TEA-VENERIE A

Neufchastel chez Samuel Faulche amp Compagnie Libraires amp Imprimeurs [1765]

ESCALIGERO J C Iuli Caesaris Scaligeri uiri Poetices libri septem Ad Syluium Filium [Lyon] Apud Antonium Vincentium 1561

FAJARDO D S Idea de un Principe politico Christiano representada en cien Empresas

Dedicada al Principe de Las Espantildeas nuestro Sentildeor por Don Diego Saavedra Fajardo En Monaco en la emprenta de Nicolao Eurico 1640

FERREIRA F L Nova Arte de Conceitos que com o titulo de Licccedilotildees Academicas Na

Publica Academia dos Anonymos de Lisboa dictava e explicava o Beneficiado Francisco Leytam Ferreyra Academico Anonymo Primeyra Parte dedicada ao Senhor D Carlos de Noronha

Primogenito do Excellentissimo Senhor Dom Miguel De Noronha Conde de Valladares ampc

Lisboa Occidental na Officina de Antoacutenio Pedrozo Galram Com todas as licenccedilas necessaacuterias

Anno de 1718 A custa de Miguel Rodriguez Mercador de Livros aacutes portas de Santa Catharina ______ Nova Arte de Conceitos que com o titulo de Licccedilotildees Academicas Na Publica

Academia dos Anonymos de Lisboa dictava e explicava o Beneficiado Francisco Leytam

Ferreyra Academico Anonymo Segunda Parte dedicada ao Senhor D Thomas de Almeyda Primeyro Patriarca de Lisboa Occidental Capelaotilde-mor DrsquoEl Rey N Senhor amp do seu Conselho

de Estado ampc Lisboa Occidental na Officina de Antoacutenio Pedrozo Galram Com todas as

licenccedilas necessaacuterias Anno de 1721 A custa de Miguel Rodrigues Mercador de Livros agraves portas de Santa Catharina

FOLQMAN C Diccionario portuguez e latino no qual as dicccedilotildees e frazes da lingua

portugueza e as suas variantes significaccedilotildees genuinas e metaforicas se achatildeo clara e

distinctamente vertidas na latina e authorizadas com exemplos dos authores classicos compilado do vocabulario do reverendo padre D Rafael Bluteau e dos melhores diccionarios de

varias linguas Por Carlos Folqman Lisboa na Officina de Miguel Manescal da Costa

Impressor do Santo Officio 1755 FONSECA P J da Elementos de Poetica tirados de Aristoteles de Horacio e dos mais

celebres modernos Lisboa na Offic de Miguel Manescal da Costa Anno 1765 Com as licenccedilas

necessaacuterias

FREIRE F J Arte Poetica ou Regras da Verdadeira Poesia em geral e de todas as suas especies principaes tratadas com juizo critico Composta por Franscisco Joseph Freire

Ulyssiponense Segunda ediccedilatildeo hellipFungar vice cotis acutum Reddere qui ferrum valet exfors

ipsa fecandi Munus amp Officium nil scribens ipse decebo Unde parentur opes quid alat formetque poetam Quid deceat quid non quo virtus quo ferat error Horat in Poetic Lisboa

Na Offic Patriarcal de Francisc[o] Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas necessarias

______ Diccionario poetico para o uso dos que principiaotilde a exercitarse na Poesia Portugueza Obra igualmente util ao orador principiante Seu author Candido Lusitano floriferis

ut apes in saltibus omnia libant Omnia nos itidem depascimur aurea dicta Aurea perpetua

semper dignissima vita Lucret 3 Tomo I Lisboa Offic Patriarcal de Francisco Luiz Ameno

MDCCLXV Com as licenccedilas necessarias Vende-se na portaria da Casa de N Senhora das Necessidades e na logea de Francisco Tavares livreiro ao Senhor da Boa Morte

GALHEGOS M de Gigantomachia de Manuel de Gallegos a don Antonio de Meneses en

Lisboa por Pedro Crasbeck an 1626

321

GARRETT A Da educaccedilatildeo Londres Sustenance e Stretch 1829

GIULIO CAMILLO Le Idee ouero Forme della oratione da Hermogene considerate amp

ridotte in questa lingua per M Giulio Camillo Delminio Friulano A queste saggiunge lArtificio della Bucolica di Virgilio spiegato dal detto M Giulio Camillo Opere novamente mandate in lvce

da Gio Domenico Salomoni Al Sigr Andrea Sasso svo compare Co i Priuilegij dell sommo

Pontefice amp del Regrave Catholico amp con pena di scommunica Con Licenza dersquo Svperiori In Vdine

M C XCIIII [1594] Apresso Gio Battista Natolini ______ Il secondo tomo dellrsquoopere di M di Giulio Camillo Delminio cioegrave La Topica

ouero dellrsquoElocutione Discorso sopra lrsquoIdee di Hermogene La Grammatica Espositione sopra

il primo amp secondo Sonetto del Petrarca Nvovamente dato in lvce Con privilegio In Venegia apresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLX [1560]

GOacuteNGORA Y ARGOTE L DE Faacutebula de Polifemo y Galatea 10ordf ed de Alexander A

Parker Madrid Catedra 2007

______ Lecciones solemnes a las obras de Don Luis de Gongora y Argote Pindaro Andaluz Principe de los poeta liricos de Espantildea Escrivialas Don Ioseph Pellicer de Salas y

Tovar Sentildeor de la Casa de Pellicer y Chronista de los Reinos de Castilla Dedicadas al

Serenissimo Sentildeor Cardenal Infante Don Fernando de Austria MDCXXX [1630] Con Priuilegio en Madrid En la Imprenta del Reino A costa de Pedro Coello Mercader de Libros

______ Obras completas edicioacuten de Juan Milleacute y Gimeacutenez Isabel Milleacute y Gimeacutenez

Madrid Aguillar 1967 GOacuteRGIAS Elogio de Helena e Tratado do natildeo-ente traduccedilatildeo do grego com introduccedilatildeo e

notas de Maria Ceciacutelia de Miranda Nogueira Coelho in Cadernos de Traduccedilatildeo no 4 Satildeo Paulo

Departamento de Filosofia USP 1999

GUARINI G B Il Pastor Fido Tragicomedia Pastorale di Battista Gvarini Dedicata al SerMO D Carlo Emanvele Dvca di Savoia ampc Nelle Reali Nozze di SA con la serma Infante

D Caterina dAvstria Con privilegi In Venetia Presso Gio Battista Bonfadino [1590]

______ El Pastor Fido Poeumlma de Baptista Guarino Traducido de Italiano en Metro Espantildeol y Ilustrado con Reflexiones por Dontildea Isabel Correa Dedicado agrave Don Manuel de

Belmonte Baron de Belmonte Conde Palatino y regente de Sua Magestad Catholica En

Amberez Por Henrico y Cornelio Verdussen Mercadores de Libros Antildeo M DC XCIV ______ O Pastor Fiel Tragi-comedia Pastoril do Cavalheiro Guarini Traduzida do

italiano por Thome Joaquim Gonzaga Lisboa Na Regia Officina Typografica Anno M DCC

LXXXIX Com a licenccedila da Real Meza da Comissatildeo Geral sobre o Exame e Censura dos

Livros ______ Il Verrato ovvero difesa di quanto ha scritto M Giason Denores contra le

tragicomedie e le pastorali in un suo discorso di poesia Con privilegio In Ferrara Ad Instanza

di Alfonso Caraffa 1588 Con licenza dersquo Superiori GUERREIRO M do C Tratado da versificaccedilaotilde portugueza dividido em tres partes A

primeira conteacutem hum brevissimo Compendio das regras mais praticaveis da Metrificaccedilaotilde a

segunda hum amplissimo Diccionario de consoantes e a terceira Instrucccedilotildees para a perfeita

Poetica Offerecido ao Exmo Ermo Senhor D Domingos Joseph de Assis Mascarenhas Principal da Santa Igreja Patriarcal de Lisboa do Conselho de sua Magestade ampc ampc ampc Por seu author

Miguel do Couto Guerreiro Lisboa Na Of Patr de Francisco Luiz Ameno MDCCLXXXIV

[1784] Com licenccedila da Real Mesa Censoria GRACIAacuteN Y MORALES B Agudeza y arte de ingenio Edicioacuten introduccioacuten y notas

Evaristo Correa Calderoacuten Madrid Editorial Castalia 1987

GRANADA Fr Luis de Los seis libros de la rhetoacuterica eclesiaacutestica o la manera de predicar Madrid 1793

GRAVINA V Di Vicenzo Gravina giurisconsulto della ragion poetica libri due In Roma

presso Francesco Gonzaga MDCVIII Con Licenza dersquo Superiori

HERMOGENE LrsquoArt rheacutetorique Traduction franccedilaise inteacutegrale introduction et notes de Michel Patillon Paris LrsquoAge drsquoHomme 1997

______ Hermogenesrsquo on types of style Translated by Cecil W Wooten Chapel Hill

University of North Carolina Press 1987

322

______ Ωάῥά In hoc volumine haec continentur Ausonii [ie

Aphtonii] sophistaelig praeligludia Hermogenis Rhetorica In aeligdibus Philippi Iuntaelig 1515

______ Ω Hermogenis

De inuentione tomo qvatuor Parisiis Christianus Wechel sub scuto Basilensi in via Iacobea anno 1530

______ Ω Hermogenis De formis

orationum tomi duo Parisiis Excudebat Christianus Wechelus sub scuto Basilensi in via

Iacobea anno 1531

______ Ω Hermogenis De formis

orationum tomi duo Argentorati apud haeredes Vuendelini Rihelij Anno 1555

______ Hermogenis Rhetoris Ad Artem oratoriam praeexercitamenta Prisciano

interprete Norimbergae Petreius 1544 ______ Hermogenis Tarsensis Philosophi ac Rhetoris acutissimi de Arte Rhetorica

precepta De inuentione libri quatuor De formis orationis tomi duo De methodo grauitatis siue

virtutis commode dicendi Aphtonii clarissimi Rhetoris praeexercitamenta Antonio Bonfine Asculano interprete Venetiis per Ioan Anto de Nicolinis de Sabio sumptu vero amp requisitione

D Melchioris sessae 1539

______ Hermogenis Tarsensis philosophi ac rhetoris acutissimi De Arte Rhetorica

praecepta Aphtonii item sophistaelig praxercitamenta nuper in Latinum sermonem versa a Natale de Comitibus Veneto Basileaelig apud Petrum Pernam [1550]

______ Hermogenis Tarsensis rhetoris Acvtissimi De Dicendi generibvs siue formis

orationum Libri II Latinitate donati amp scholis explicati atque illustrati A Ioan Stvrmio Cum Gratia amp Priuilegio Caeligsareo ad anno octo Excudebat Iosias Rihelius MDLXXI [1571]

______ Hermogenis Ars

Rhetorica Absolutissima Parisiis Excudebat Christianus Wechelus sub scuto Basilensi in via

Iacobea anno 1530

______ Hermogenis Ars

Rhetorica Absolutissima Parisiis In officina Christiani Wecheli sub scuto Basilensi in vico

Iacobeo Anno MDXXXVIII [1538]

______ Hermogenis Ars

Rhetorica Abolutissima Parisiis Apud Iacobum Bogardum sub insigne D Christophori egrave

regione gymnasij Cameracensium 1544

______ Hermogenis Ars

Oratoria Absolutissima Et Libri omnes Cum noua Versione Latina egrave regione contextu Graeci amp Commentariis Gasparis Lavrentii Coloniae Allobrogvm Apud Petrvm Avbertvm Anno

MDCXIV [1614]

______ Aphtonius Hermogenes Dionysius Longinus praeligstatissimi artis Rhetorices

magistri Francisci Porti Cretensis opera industriaacuteque illustrati atque expoliti Genevaelig apvd I

Crispinvm MDLXIX [1569]

______ Sobre las formas de estilo Introduccioacuten traduccioacuten y notas de Consuelo Ruiz Montero Madrid Editorial Gredos 1993

HERRERA F de Anotaciones a la poesia de Garcilaso Edicioacuten de Inoria Pepe y Joseacute

Mariacutea Reyes Madrid Caacutetedra

HOLANDA F de Da pintura antiga Introduccedilatildeo notas e comentaacuterios de Joseacute da Felicidade Alves Lisboa Livros Horizonte 1984

HONORATO M C Compendio de rhetorica e poetica (4ordf ediccedilatildeo consideravelmente

augmentada) Adaptado ao programma do Imperial Collegio Pedro II pelo Conego Manuel da Costa Honorato Rio de Janeiro Typ Cosmopolita rua do Regente 31 1879

HORAacuteCIO Arte Poetica de Q Horacio Flacco Traduzida e Illustrada em Portuguez por

Candido Lusitano Lisboa Na Officina de Francisco Luiz Ameno M DCC LVIII [1758] Com

323

as licenccedilas necessaacuterias Vendese na logea de Manoel da Conceiccedilaotilde Livreiro ao Paccedilo dos Negros

onde tambeacutem se acharaacute a Vida do Infante D Henrique pelo mesmo Author

______ Arte poetica de Q Horacio Flaco traduzida em verso rimado e dedicada a memoria do Grande Augusto por D Ritta Clara Freyre de Andrade hellip Coimbra Na Regia

Officina da Universidade M DCCLXXXI [1781] Com licenccedila da Real Meza Censoria

______ Diuersas rimas de Vicente Espinel con el Arte Poetica y algunas Odas de

Oracio traduzidas en verso Castellano Madrid Por Luis Sanchez 1591 ______ In Epistolam Q Horatii Flacci De Arte Poeumltica Iasonis de Nores Ciprij ex

quotidianis Tryphonis Cabrielij sermonibus interpretatio Parisiis Apud uiduam Mauricij agrave Porta

in clauso Brunello sub signo D Claudij 1554 ______ Obras de Horacio principe dos poetas latinos lyricos com o entendimento

litteral amp construiccedilam Portuguesa ornadas de hum index copioso das historias amp fabulas

contiudas nelas Emendadas nesta vltima Impressam Lisboa Na Officina de Ioam da Costa M

DC LVVIII [1668] Com as licenccedilas neceszligarias ______ Paraphrase da Epistola aos Pisotildees commumente denominada Arte Poetica de

Quinto Horacio Flacco com annotaccedilotildees sobre muitos lugares por D Gastatildeo Fausto da Camara

Coutinho Bibliothecario da Bibliotheca da Marinha Lisboa Na Typographia de Joseacute Baptista Morando rua do Moinho de Vento nordm 59 1853

______ Q Horacio Flacco poeta lyrico latino Sus obras con la declaracion magistral

en lengua castellana por el Doctor Villen de Biedma Con Privilegio En Granada Por Sebastian de Mena Antildeo de 1599 A costa de Iuan Diez mercader de libros

JOAtildeO VASEU Ioannis Vasaei Brugensis Collectanea Rhetorices In gratiam eorum qui

grauioribus occupati disciplinis prolixiores ueterum cotildementarios euoluere non possunt

[Salmanticae Gonzalo de Castantildeeda] Anno M D XXXVIII [1538] JORGE DE TREBIZONDA Georgii Trapesuntii viri doctissimi atque eloquentissimi

Rhetoricorum liber primus In libraria Leonardi Pachel officina 1493

_____ Georgii Trapesuntii viri doctissimi atque eloquentissimi Rhetoricorum liber primus In libraria Leonardi Pachel officina 1493

_____ Georgij Trapezontij Dialectica octo tractatus continens Et hos omnes cum

scholijs Iacobi agrave Contreiras Eborensis Conimbricae Apud Ioannem Barrerium amp Ioanne[m] Aluarum M D LI [1551]

______ Georgii Trapezuntii Rhetoricorum libri in quibus quid recens praestitum

proxima facie indicabit liminaris epistola In Inclyta Basilea 1522

______ Georgii Trapezuntii Rhetoricorum libri quinque Indicem capitum ac rerum in hoc opere contentatum in calcem operis reiecimus Lvgdvni apvd Seb[astianum] Gryphivm 1547

______ Giorgii trapezuntii qui suis temporibus sopitam amp tantum non mortua

Eloquentiam suscitauit Ars Rhetorica nunc in gallia impressa Et oratoribus nostri maacutexime accommotada Parisiis apud Aegidium gourmontium qui in utraque liacutengua libros fidelissime

imprimendos curat

______ Georgii Trapezuntii Rhetoricorum libri quinque ad manu scriptum exemplar

diligentissimegrave repurgati Parisiis excudebat Christianus Wechelus sub scuto Basiliensi in uico Iacobeo Anno M D XXXII [1532]

______ Opus absolutissimum Rhetoricorum Georgii Trapezuntii cum additionibus

Herrariensis [Compluti] Impressum est in cocircplutensi academi in officina Arnaldi Guillelmi de Brocario 1511

______ Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis In

Officina Christiani Wecheli M D XXXVIII [1538] ______ Rhetoricorum libri quinque nunc denuo diligenti cura excusi Parisiis Apud

Ioannem Roigny uia ad D Iacobum sub Basilico amp quatuor Elementis M D XXXVIII [1538]

LEONARDO DA VINCI Trattato della pittura di Lionardo da Vinci Tratto da un codice

della Biblioteca Vaticana e dedicato alla maestagrave di Luigi XVIII Re di Francia e di Navarra Roma MDCCCXVIII [1817] Nella Stamperia de Romanis Con licenza dersquo Superiori

324

LOBO F R O Condestabre de Portugal D Nuno Alvres Pereira de Francisco Rodrigues

Lobo oferecido ao Duque dom Theodosio segundo deste nome Em Lisboa Com todas as

licenccedilas necessarias por Pedro Crasbeeck 16010 [ie 1610] LONGINO Dionigi Longino Retore DellrsquoAltezza del dire tradotto dal greco da D Niccolo

Pinelli In Padoua per Giulio Criuellari 1639 Con Licenza dersquo Superiori

LULIO A Antonii Lulli Balearis de Oratione Libri Septem Quibus non modograve

Hermogenes ipse totus uerumetiam quicquid feregrave agrave reliquis Graecis ac Latinis de Arte dicendi tratactũ est suis locis aptissimagrave explicatur Accessit etiam locupletiss Rerum amp uerborum toto

hoc Opere memorabilium Index Basileae [ex officina Ioannis Oporini impensis Henrici Petri]

[Anno Salutis humanae 1558] ______ Sobre el decoro de la poeacutetica Introduccioacuten edicioacuten traduccioacuten y notas de

Antonio Sancho Royo Madrid Edicines Clasicas 1994

LUZAacuteN I de La Poetica o reglas de la poesia en general y de sus principales especies

Por Don Ignacio de Luzan Claramunt de Suelves y Gurrea Entre los Academicos Ereinos de Palermo llamado Eligio Mepalino Con Licencia En Zaragoza Por Francisco Revilla vive en

la Calle de S Lorenzo Antildeo 1737

MACEDO A S de Vlyssipo Poema heroico De Antonio de Sousa de Macedo Com as licenccedilas necessarias Em Lisboa Por Antonio Aluarez Anno de 1640

MACHADO D B Bibliotheca Lusitana Historica Critica e Chronologica na qual se

comprehende a noticia dos authores Portuguezes e das Obras que compozeraotilde desde o tempo da promulgaccedilaotilde da Ley da Graccedila ateacute o tempo prezente offerecida agrave Augusta Magestade de D

Joaotilde V Nosso Senhor por Diogo Barbosa Machado Ulyssiponense Abbade da Parochial Igreja

de Santo Adriatildeo de Sever e Academico do Numero da Academia Real Tomo I Lisboa Occidental

Na Officina de Antonio Isidoro da Fonseca Anno de M DCC XXXXI Com todas as licenccedilas necessarias

______ Bibliotheca Lusitana Historica Critica e Chronologica na qual se

comprehende a noticia dos Authores Portuguezes e das Obras que compozeraotilde desde o tempo da promulgaccedilaotilde da Ley da Graccedila ateacute o tempo presente por Diogo Barbosa Machado

Ulyssiponense Abbade Reservatorio da Parochial Igreja de Santo Adriatildeo de Sever e Academico

do Numero da Academia Real Tomo III Lisboa Na Officina de Ignacio Rodrigues Anno de MDCCLII Com todas as licenccedilas necessarias

______ Bibliotheca Lusitana Historica Critica e Chronologica na qual se

comprehende a noticia dos Authores Portuguezes e das Obras que compozeram desde o tempo

da promulgaccedilaotilde da Ley da Graccedila ateacute o tempo presente por Diogo Barboza Machado Ulyssiponense Abbade Reservatorio da Paroquial Igreja de Santo Adriatildeo de Sever e Academico

do Numero da Academia Real Tomo IV que consta de muitos authores novamente collocados na

Bibliotheca e de outros illustrados e emendados impressos nos tres Tomos precedentes Lisboa Na Officina Patriarcal de Francisco Luiz Ameno MDCCLIX Com as licenccedilas necessarias

MASCARENHAS B G Viriato tragico poema heroico em 20 cantos de Braz Garcia

Mascarenhas em dois volumes Lisboa na Phenix beco de Santa Martha nordm 123 1846

MEDRANO J de E Apologeacutetico en favor de Don Luis de Goacutengora Edicioacuten anotada de Luis Jaime Cisneros Lima Universidad de San Martiacuten de Porres 2005

MELLO F de P de S de Arte poeacutetica Apresentaccedilatildeo de Aniacutebal Pinto de Castro Introduccedilatildeo

ediccedilatildeo e notas de Antoacutenio Manuel Esteves Joaquim Lisboa Imprensa Nacional-Casa da Moeda 2005

______ Theatro da eloquencia ou Arte de rhetorica fundada nos preceitos dos melhores

Oradores Gregos e Latinos por Francisco de Pina de Saacute e de Mello Moccedilo Fidalgo da Casa de Sua Magestade Fidelissima e Academico da Academia Real da Historia Portuguesa

offerecida ao Reverendissimo Senhor Desembargador Joachim Salter de Mendoccedila Prior da

Collegiada de S Christovaotilde de Lisboa Juiz dos Cazamentos e Chanceller do Patriarcado ampc

ampc Por Antonio da Silva e Costa Lisboa Na officina de Francisco Borges de Sousa Anno de MDCCLXVI

______ Triumpho da Religiaotilde Poema Epico-Polemico que a Santidade do Papa

Benedicto XIV Dedica Francisco de e de Mello Moccedilo Fidalgo da Casa de Sua Majestade

325

Fidelissmo e Academico da Academia Real da Historia Portuguesa Coimbra Na Officina de

Antonio Simoens Ferreira impressor da Universidade Anno de 1756 Com todas as licenccedilas

necessarias MENANDRO EL REacuteTOR Dos tratados de retoacuterica epidiacutectica Introduccioacuten de Fernando

Gascoacute Traducioacuten y notas de Manuel Garciacutea y Joaquiacuten Gutiacuteerrez Calderoacuten Madrid Editorial

Gredos 1996

MEY A Norte de la Poesia Espantildeola Illustrado del sol de doze Comedias (que formam segunda parte) de Laureados Poetas Valencianos y de doze escogidas Loas y otras Rimas a

varios sugetos Sacado a luz aiustado con sus originales por Aurelio Mey Dirigido a Dontildea

Blanca Ladron y Cardona hija primogenita de Don Iayme Zeferino Ladron de Pallas Conde de Sinarcas Vizconde de Chelua Sentildeor de Beniarbech y Beniomer y Sentildeor de Payporta Antildeo 1616

Con privilegio Impreso en Valencia En la Impresion de Felipe Mey junto a S Iuan del Hospital

A costa de Iusepe Ferrer Mercader de libros delante la Diputacion

MINTURNO A S Antonii Sebastianii Minturni De poeta ad Hectorem Pignatellum Vibonensium Ducem Libri Sex Cum Priuilegijs Venetiis Ann MDLIX [1559]

______ LrsquoArte poetica del Sig Antonio Minturno nella quale si contengono i precetti

Heroici Tragici Comici Satyrici e drsquoogni altra Poesia Con la dottrina dersquo Sonetti canzoni et ogni sorte de Rime Thoscane dove srsquoinsegna il modo che tenne il Petrarca nelle sue opere Et si

dichiara arsquo suoi luoghi tutto quel che da Aristotele Horatio et altri autori Greci e Latini egrave stato

scritto per ammaestramento di Poeti Con le postille del dottor Valvassori non meno chiare che breui et due tavole lrsquouna dersquo capi principali lrsquoaltra di tutte le cose memorabile Con Privilegio

Per Gio Andrea Valvassori del MDLXIII [1563]

MONTESQUIEU C de S Conde de O gosto Traduccedilatildeo e posfaacutecio de Teixeira Coelho

Satildeo Paulo Iluminuras 2005 MURATORI L A Della forza della fantasia umana Tratado di Ludovico Muratori

Bibliotecario del Serenissimo Signor Duca di Modena In Venezia MDCCXLV [1745] Presso

Giambatista Pasquali Com Licenza Dersquo Superiori p 221 ______ Della perfetta poesia italiana spiegata e dimostrata con varie osservazioni da

Lodovico Antonio Muratori Tomo primo In Modena M DCCVI [1706] Nella Stampa di

Bartolomeo Soliani Con Lic dersquo Superiori NEBRIJA A de Antonii Nebrissensis VCL grammatici et regii chronograaphi

Dictionarium redivivum novissimegrave emendatum ac novis subinde accessionibus auctum

locupletatum hellip Opera et studio R P Fatr Ildephonsi Lopez de Rubinotildes Regii ac Militaris

Ordinis Beatae Mariae de Mercede Redemptionis Captiuorum Superiorum permissu Matriri apud Michaelem Escribano Typographum Anno MDCCLXXVIII [1778] Sumptibus Regiae

Societatis

______ Dictionarium Aelii Antonii Nebrissensis grammatici chronographi regii imo recens accessio facta ad quadruplex eiusdem antiqui dictionarij supplementum [hellip] Antildeo 1638

Cvm Priuilegio Regis Matriti Ex Typographia Regia Expensis Gabrielis agrave Leon Bibliopolaelig

______ Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum Aelio Antonio

Nebrissensi interprete nunc denuo ingenti vocum accessione locupletatum pristinoque nitori sublata mendarum colluuie restitutum Ad haec Dictionarium propriorum nominum ex

probatiszligimis Graecaelig amp Latinaelig linguaelig autoribus addita ad calcem neoterica locorum

appellatione concinnatum Antuerpiae In AEligdib Ioannis Steelij M D LX [1560] Cum Priuilegio Regis

______ Dictionarium Latino hispanicum et vice versa Hispanico latinum Aelio Antonio

Nebrissensi interprete nunc denuo ingenti vocum accessione locupletatum pristinoq nitori sublata mendarum colluuie restitutum Ad haec Dictionarium propriorum nominum ex

probatiszligimis Graecaelig amp Latinaelig linguaelig autoribus addita ad calcem neoterica locorum

appellatione concinnatum Antuerpiae In AEligdibus viduaelig amp haeligredum Ioannis Steelij M D LXX

[1570] Cum Priuilegio Regis NUNtildeEZ P J Pet Iohan Nunnesii valentini Institutionum rhetoricarum libri quinque

Editio tertia ceteris multo correctior et locupletior exemplis Barcinone ex typographia

Sebastiani agrave Cormellas An 1593

326

______ Tabulae institutionum rhetoricarum Petri Johannis Nunnesii Valentini Altera

editio multo accuratior priori Galenus in arte parua Methodus diuidendi quanto inferior est ea

quae sit per resolutionem dignitate amp methodo tanto superiorem inferior est ea quae sit per resolutionem dignitate amp methodo tanto superiorem illam comperiemus ad compendium totius

amp memoriam singulorum Barcinone excudebat Iacobus Cendrat Anno Domini 1588

PANIGAROLA F Il Predicatore di F Francesco Panigarola ouero Parafrase commento

e discorsi intorno al libro dellelocutione di Demetrio Falereo oue vengono i precetti e gli essempi del dire che giagrave furono dati a Greci ridotti chiaramente alla prattica del ben parlare in

prose italiane e la vana elocutione de gli autori profani accommodata alla sacra eloquenza de

nostri dicitori e scrittori ecclesiastici Con due tauole vna delle questioni e laltra delle cose piugrave notabili Venetia Bernardo Giunti Gio Battista Ciotti amp Compagni 1609

PEREIRA B Prosodia in vocabularium trilingue Latinum Lusitanicum amp Hispanicum

digesta authore Benedicto Pereyra fecit sumptus Dominicus Pereyra da Sylva Eborae

apud Emmanuelem Carvalho 1634 ______ Prosodia in vocabularium trilingue Latinum Lusitanicum amp Castellanicum

digesta authore Doctore P Benedicto Pereyra Societatis Iesu Cum facultate Inquisitorum

Ordinarij amp Regis Vlissipone Ex officina amp sumptibus Pauli Craesbeeck Anno Domini MDCLIII [1653]

______ Prosodia in vocabularium bilingue Latinum et Lusitanum digesta nona editio

Eborae cum facultacircte Superiocircrum ex Typographiacutea Acadeacutemiae Anno Doacutemini M DCC XXIII [1723]

______ Thesouro da lingoa portuguesa composto pelo Padre D Bento Pereyra da

Companhia de Iesu Portugues Borbano Lente que foy da primeira classe de Rhetorica em a

Vniversidade de Euora amp hoje o he da sagrada Theologia em a mesma Vniversidade Em Lisboa Com licenccedila da S Inquisiccedilam Ordinario amp del Rey Na officina de Paulo Craesbeeck amp agrave sua

custa Anno de 1647

PEREGRINI M Delle Acutezze che altrimenti spiriti vivezze e concetti volgarmente si appellano trattato del Sig Matteo Peregrini Bolognese di Teologia Filosofia e dellrsquouna e lrsquoaltra

Legge Dottore In questa seconda Impressione dallrsquoAutore riuiste e migliorate Allrsquo Illlustrissim

Sig Galleazzo Polti In Genoua amp in Bologna Presso Clemente Ferroni M DC XXXIX [1639] Con Licenza dersquo Superiori

PETRARCA F Cancioneiro Traduccedilatildeo de Joseacute Clemente Pozenato Satildeo Paulo Ateliecirc

Editorial Campinas Editora da Unicamp 2014

______ Le volgari opere del Petrarcha con la espositione di Alessandro Vellutello da Luca [Vinegia] MDXXV [1525]

PINCIANO A L Philosophia antigua poetica del doctor Alonso Lopez Pinciano Medico

Cesareo Dirigida al Conde Ihoanes Keuehiler de Aichelberg hellip En Madrid Por Thomas Junti M D XCVI [1596]

PLATAtildeO Dialoacutegos (Protaacutegoras Goacutergias O banquete Fedatildeo) Traduccedilatildeo de Carlos

Alberto Nunes Beleacutem Universidade Federal do Paraacute 1980

______ Fedro Φαῖδρος 3ordf ed revisada e biliacutengue Beleacutem edufpa 2011

POPE A Poemas Satildeo Paulo Nova Alexandria 1994 QUEVEDO F de Las tres musas ultimas castellanas de Don Francisco de Quevedo

Villegas Cavallero de la Orden de Santiago Sentildeor de la Villa de la Torre de Juan-Abad M

DC LXXI [1671]

______ Obras de D Francisco de Quevedo Villegas Cavallero de la Orden de Santiago Sentildeor de la Villa de la Torre de Juan Abad Dedicadas a la muy ilustre Academia de los

Deconfiados da la Excelentissima Ciudad de Barcelona Parte Primera Barcelona Por Jaime

Suriagrave 1702 ______ Obras propias y traducciones latinas griegas y Italianas Con la parafrasi de

algunos Psalmos y Capitulos de lob Sacadas de la libreriacutea de don Manuel Sarmiento de

Mendoccedila Canonigo de la Magistral de la santa Iglesia de Sevilla Dalas a la Impression don Francisco de Quebedo (sic) Villegas Imp del Reyno (Viuda de Luis Saacutenchez) A costa de

Domingo Gonccedilalez Madrid 1631

327

QUINTILIAN Institutio oratoria With an English translation by H E Butler Cambridge

Harvard University Press 1996 4 vols

______ Instituiccediloens oratorias de M Fabio Quintiliano escolhidas dos seus XII livros traduzidas em linguagem e illustradas com notas criticas histoacutericas e Rhetoricas para uso dos

que aprendem Ajuntaotilde-se no fim as Peccedilas originaes de Eloquencia citadas por Quintiliano no

corpo destas Instituiccediloens por Jeronymo Soares Barboza Jubilado na Cadeira de Eloquencia e

Poezia da Universidade de Coimbra Tomo Segundo Em Coimbra Na Imprensa da Universidade M DCC LXXXX Com licenccedila da Real Meza da Commissatildeo Geral sobre о Ехате e Censura

dos Livros Foi taxado este Livro a novecentos e sessenta reis em papel

______ Institution oratoire Texte eacutetabli et traduit par Jean Cousin Paris Les Belles Lettres 1975-1980 7 vols

______ Lrsquoinstitutioni oratorie di Marco Fabio Quintiliano retore famosissimo tradotte

da Oratio Toscanella della famiglia di maestro Luca Fiorentino et arricchite dal medesimo della

dichiaratione de i luochi piugrave difficili in margine Di quattro Tauole che seruono a tutta lrsquoopera della vita dello autore et drsquoannotationi in lettere grandicelle delle cose piugrave importanti Con

privilegio In Venetia appresso Gabriel Giolito dersquo Ferrari MDLXVI [1566]

______ Marci Fabii Quintiliani Orationum Institutionum Libri Duodecim diligenter emendati 1518

______ M Fabii Quintiliani Rhetoris clarissimi de Institutione Oratoria ad Marcellum

Victorium libri XII Pariis Ex Officina Michaeumllis Vascosani in uia quae est ad D Iacobum sub fontis insigni M D XXII [1527]

______ M Fabii Quintiliani oratoriarum institutionum libri duodecim Summa diligentia

tum iudicio ad uenustiszligimorum quorũq exemplariorum fidem recogniti additis simul eiusdem

declamationib amp eruditiszligimis amp stylo sui periculum facturis utiliszligimis Eucharius Ceruicornus excudebat ANNO M D XXII [1527] mense avg

______ M Fabii Quintiliani oratoris eloquentissimi Instituonum oratoriarum Libri XII

incredibili cum studio tum iudicio ad fibem uenustissimi exemplaris recens iam recogniti Eiusdem Declamationum Liber Basileae ex aedibus Ioannis Bebelii Mense Augusto M D XXIX

[1529]

______ Marci Fabii Quintiliani Instituonum oratoriarum Libri XII Declamationum Liber eiusdem Lvgdvni Apud Seb Gryphivm 1536

______ Marci Fabii Quintiliani Instituonum oratoriarum Libri XII Declamationum

Liber eiusdem Lvgdvni Apud Seb Gryphivm 1540

______ M Fabii Quintiliani Instituonum oratoriarum libri duodecim Declamationum Liber eiusdem Summa diligentia ad finem uenustiszligimorum codicum recogniti ac restituti Cum

rerum uerborumq Indice locupletiszligimum Lvgdvni Apud Seb Gryphivm 1555

______ Quintilianus cum commento [Raphael Regius] Venetiis per Bonetum Locatellum 1506

RABE H Hermogenis Opera Leipzig Teubner 1913

RABELAIS F Tiers liure des faictz et dictz heroiques du noble Pantagruel composez par

M Franccedil Rabelais docteur en Medecine amp Calloier des Isles Hieres Lautheur susdict suplie les Lecteurs beneuoles soy reseruer a rire au soixante amp dixhuictiesme liure Nouuellemente

Imprimeacute agrave Paris Auec priuileige du Roy pour six ans 1546

RESENDE Andreacute de As antiguidades da Lusitacircnia Introduccedilatildeo traduccedilatildeo e comentaacuterio de Rauacutel Miguel Rosado Fernandes Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 1996

Retoacuterica a Herecircnio Trad Adriana Seabra e Ana Paula Celestino Faria Satildeo Paulo Hedra

2005 Rhetores in hoc volvmine habentvr hi Aphthonii Sophistaelig Progymnasmata Hermogenis

ars Rhetorica Aristotelis Rhetoricorum ad Theodecten libri tres Eiusdem Rhetorice ad

Alexandrum Eiusdem ars Poetica Sopatri Rhetoris quaeligstiones de compone[n]dis

declamationibus in causis praecipuaelig iudicialibus Cyri Sophistaelig differentiaelig statuum Dionysii Alicarnasĕi ars Rhetorica Demetrii Phalerĕi de interpretatione Alexandri Sophistaelig de figuris

sensus amp dictionis Adnotationes innominati de figuris Rhetoricis Menandri Rhetoris diuisio

328

causarum in genere demonstratiuo Aristeidis de ciuili oratione Eiusdem de simplici oratione

Apsini de arte Rhetorica praeligcepta Venetiis 1508

Rhetores Latini Minoris Ex Codibus Maximam Partem Primum Adhibitis Emandabat Carolus Halm Leipzig Teubner 1863

SABATIER DE CASTRES A Dictionnaire de Litteacuterature Dans lequel on traite de tout ce

qui a rapport agrave lEloquence agrave la Poeumlsie amp aux Belles-Lettres amp dans lequel on enseigne la

Marche amp les Reacutegles quon doit observer dans tous les Ouvrages desprit Par M LrsquoAbbeacute Antoine Sabatier de Castres Tome Troiseme A Paris chez Vincent Imprimeur- Libraire rue Saint

Severin MDCCLXX [1770] Avec Approbation amp Privileacutege du Roi

SALAS J A G de Nueva ideia de la tragedia antigua o Ilustracion ultima al libro singular De poetica de Aristoteles Estagirita por Don Iusepe Antonio Gonccedilalez de Salas En

Madrid Lo imprimio Franc Martinez Antildeo MDCXXXIII [1633]

SALINAS M Rhetorica en lengua castellana en la qual se pone muy en breue lo

necessario para saber bien hablary escrevir y conoscer quien habla y escrive bien Juan de Brocar 1541

SANCHO ROYO A Hermoacutegenes Sobre los tipos de estilo y Sobre el meacutetodo del tipo

Fueza Introduccioacuten traduccioacuten y notas Sevilla Secretariado de Publicaciones de la Universidad 1991

SEacuteNECA L A Cartas a Luciacutelio Traduccedilatildeo prefaacutecio e notas de Joseacute Antoacutenio Segurado e

Campos Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 2004 SILVA A M Diccionario da lingua portugueza composto pelo padre D Rafael Bluteau

reformado e acrescentado por Antonio de Moraes Silva natural do Rio de Janeiro Tomo

primeiro A-K Lisboa Na Officina de Simatildeo Thadeo Ferreira Anno M DCC LXXXIX [1789]

Com licenccedila da Real Meza da Comissatildeo Geral sobre o Exame e Censura dos Livros Vende-se na loja de Borel Borel e Companhia quase defronte da Igreja nova da Nossa Senhora dos

Martyres na esquina

SILVEIRA M de El Macabeo Poema heroico de Migvel de Silveira En Napoles por Egidio Longo Stampador Real Antildeo 1638

STENDHAL Rome Naples et Florence Paris Michel Leacutevy Fregraveres Libraires-Eacutediteurs

1854 TASSO T Apologia del S Torquato Tasso in difesa della sua Gierusalemme liberata

agli Accademici della Crusca Con le acuse amp difese dellrsquoOrlando Furioso dellrsquoAriosto Et

alcune lettere pareri amp Discorsi di diuersi Auttori nel medesimo genere Di nuouo corretta amp

ristampata Aggiontoni la risposta dellrsquoistesso Tasso al Discorso del Lombardelli intorno agrave i constrasti della sua Gierusalẽme I titoli si leggono nellrsquoottaua carta In Ferrara Ad instatildeza di G

Vasalini Con licenza de i Superiori 1586

________ Discorsi del poema heroico del S Torquato Tasso Allrsquoillustrissmo e reverendissmo Signor Cardinale Aldo Brandino Nella Stamparia dello Stigliola In Napoli Ad

instantia di Paolo Venturino [1594]

________ Discorsi del Signor Torquato Tasso DellrsquoArte Poetica et in particolare del

Poema Heroico Et insieme il Primo Libro delle Lettere scritte agrave diuersi suoi amici lequali oltra la famigliaritagrave sono ripiene di molti concetti amp auertimenti poetici agrave dichiaratione drsquoalcuni

luoghi della sua Gierusalemme liberata Gli uni e lrsquoaltre scritte nel tempo chrsquoegli compose detto

suo Poema Non piu stampati Con Privilegi In Venetia MDLXXXVII [1587] Ad instanza di Giulio Vassalini Libraro agrave Ferrara

________ Gierusalemme liberata poema heroico del Sig Torquato Tasso Al Sereniss

Signore il Signor Donno Alfonso H DrsquoEste Duc adi Ferrara ampc Tratta del vero Originale Con aggiunta di quanto manca nellrsquoaltre Edittioni amp con lrsquoAllegoria dello stesso Autore Con

Priuilegio di S Santitagrave delle Maestagrave Christianissima amp Catholica della Sereniss Signoria di

Venetia del Sereniss Sig DVCA di Ferrara amp drsquoaltri Principi In Ferrara 1581

TESAURO E ldquoArguacutecias Humanasrdquo Traduccedilatildeo de Gabriela Cipollini e Joatildeo Adolfo Hansen in Revista do IFAC Ouro Preto IFAC-UFOP dez 1997 nordm 4

________ Il cannocchiale aristotelico orsquo sia Idea dellarguta et ingeniosa elocutione

che serue agrave tutta larte oratoria lapidaria et simbolica esaminata corsquo principii del diuino

329

Aristotele dal conte D Emanuele Tesauro Cavalier Gran Croce dersquo Santi Mauritio et Lazaro

Quarta impressione Accresciuta dallrsquo Autore Trattati cioegrave Dersquo Concetti Predicabili et Degli

Emblemi con un nuouo Indice Alfabetico oltre agrave quello delle materie Dedicato al Reuerendiss Padre Gio Paolo Oliva Vicario Generale della Compagnia di Giesu In Roma agrave Spese di

Guglielmo Halleacute Libraro nella Piazza di Pasquino M DC LXIV [1664] Con licenza dersquo

Superiori E Priuilegio

________ Cannocchiale Aristotelico esto es anteojo de larga vista o idea de la agudeza e ingeniosa locucion que sirve a toda arte oratoria lapidaria y simbolica examinada

del Divino Aristoteles Madrid 1741 2 vols

________ ldquoO juiacutezo (panegiacuterico acadecircmico)rdquo Traduccedilatildeo de Joatildeo Adolfo Hansen in CANIATO B MINEacute E (org) Abrindo Caminhos Homenagem a Maria Aparecida Santilli Satildeo

Paulo Aacuterea de Poacutes-Graduaccedilatildeo de Estudos Comparados de Literaturas de Liacutengua Portuguesa-

FFLCH 2002

________ Panegirici et ragionamenti del Conte D Emanuele Tesauro Caualier Gran Croce dersquo SS Mauritio e Lazaro Dedicati alla Regale Altezza di Madama Christiana di Franchia

Duchessa di Savoia Reina di Cipri Gloria del Nostro Secolo Volume Terzo In Torino MDCLX

[1660] Appresso Bartolomeo Zauatta Con licenza dersquo Superiori Et Priuilegio TEOacuteN HERMOGEacuteNES AFTONIO Ejercicios de retoacuterica Introduccioacuten traduccioacuten y notas

de Mordf Dolores Reche Martiacutenez Madrid Editorial Gredos 1991

EacuteLIO TEAtildeO ΩTheonis sophistae

primae apud rhetorem exercitationes innumeris quibus scatebant antea mendis Joachimi Camerarii Pabergensis opera purgatae amp in sermonem latinum conversae Adiectus est quoq

rerum amp uerborum in ijsdem memorabilium locupletiszlig Index Cum Gratia amp Priuilegio Caesareo

amp Regis Galliae ad serptenium annos octo Basileae [1541]

________ ΩTheonis Sophistae Pro-

gymnasmata accurate emendata ac recensita In usum Scholarum Holandiae WestFrisiaeque Ex

decreto Ilustriss DD Ordinum eiusdem Provinciae Accedit interpretatio Latina ita hac editione

emendata ut sit Nova Lvgdvni Batavorvm Ex Officina Bonaventurae amp Abrahanmi Elzevir Academ Typograph MDCXXVI [1626]

VEGA G de la Obras de Garcilasso de la Vega con anotaciones de Fernand o de

Herrera Al ilutrissimo i ecelentissimo Sentildeor Don Antonio de Guzman Marques de Ayamonte Governador del Estado de Milan i Capitan General de Italia Com licencia de los SS del Consejo

Real En Sevilla por Alonso de la Barrera Antildeo de 1580

VALADEacuteS D Retoacuterica Cristiana Traduccedilatildeo de T H Zapieacuten 2ordf ed Meacutexico FCE 2003

VETTORI P Petri Victorii commentarii in librum Demetrii Phalerei de elocutione Positis ante singulas declarationes Graecis vocibus Auctoris ijsdemque ad verbum Latine expressis

Additus est rerum et verborum memorabilium index copiosus Cum P II IIII Pont Max Cosmi

Medicis Florentianorum Senensiumq Ducis ampAlphonsi Ferrariensium Ducis privilegijs ampliszlig per decennium Florentiae In officina Iuntarum Bernardi F MDLXII

VIEIRA A Sermoens do P Antonio Vieira da Companhia de Iesu Preacutegador de Sua

Alteza Primeyra Parte Dedicada ao Principe N S Em Lisboa Na Officina de Ioam da Costa M DC LXXIX [1679] Com todas as licenccedilas amp Privilegio Real

______ Sermoens do Padre Antonio Vieira da Companhia de Iesu Preacutegador de Sua

Magestade Em Lisboa Na officina de Miguel Deslandes A custa de Antonio Leyte Pereyra

Mercador de Livros M DC LXXXIII [1683] Com todas as licenccedilas amp Privilegio Real VIRGIacuteLIO Bucoacutelicas Traduccedilatildeo e notas de Odorico Mendes Ediccedilatildeo anotada e comentada

pelo Grupo de Trabalho Odorico Mendes Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da

Unicamp 2008 ______ Bucoacutelicas Ediccedilatildeo biliacutengue Traduccedilatildeo e comentaacuterio de Raimundo Carvalho Belo

Horizonte Crisaacutelida 2005

VITRUacuteVIO I Dieci libri dellrsquoArchitettura di M Vitruvio Tradotti amp commentati da Mons

Daniel Barbaro eletto Patriarca drsquoAquileia da lui riueduti amp ampliati amp hora in piu commoda forma ridutta In Venetia Appresso Francesco dersquoFranceschi Senese amp Giouanni Chrieger

330

Alemano Compagni MDLXVII [1567]

VIVES J L El arte retoacuterica (De ratione dicendi) Estudio introductorio de Emilio

Hidalgo-Serna Edicioacuten traduccioacuten y notas de Ana Isabel Camacho Barcelona Anthropos Editorial 1988

______ Ioannis Ludouici Vivis Rhetoricae siue de recte dicendi ratione libri tres

Eiusdem De Consultatione liber I Basilea Balthasarem Lasiu[m] amp Thomam Platteru[m] 1536

VOSSIUS G J Gerardo Ioannis Vossi Commentariorum rhetoricorum sive oratoriarum institutionum Pars altera Lugduni Batavorum Ex officina Ioannis Maire MDCXLIII [1643]

ZINANO G Sommarii di varie retoriche greche latine et volgari Distintamente ordinati

in uno da Gabriele Zinano In Reggio Apresso Hercoliano Bartholi 1590

Bibliografia secundaacuteria

ACCORSI F ldquoPedro de Valencia y el Pseudo Longino sobre la recepcioacuten espantildeola del Peri hupsousrdquo CRITICOacuteN 113 pp 63-83 2011

ADAM J-M HEIDMANN U O texto literaacuterio por uma abordagem interdisciplinar Satildeo

Paulo Cortez 2011 ALONSO JUacuteNIOR C O melhor gecircnero de oradores I-IV V 15-16 VI 16-17 Letras

Claacutessicas n 4 pp 343-346 2000

AMBROSIO R De rationibus exordiendi os princiacutepios da histoacuteria em Roma Satildeo Paulo

Humanitas Fapesp 2005 ANGIONI L ldquoEacutetica a Nicocircmaco Livro VIrdquo Dissertatio 34 2011 pp 285-300

ARANCOacuteN A M La Batalla en torno a Goacutengora seleccioacuten de textos Barcelona Antoniacute

Bosch 1978 ASSUNCcedilAtildeO T R FLORES-JUacuteNIOR O SANTOS M M (Org) Ensaios de retoacuterica antiga

Belo Horizonte Tessitura 2010

BARTHES R ldquoLrsquoancienne rheacutetoriquerdquo in Œuvres complegravetes Tome II 1966-1973

Edition eacutetablie et preacutesenteacutee par Eric Marty Paris Seuil 1994 pp 901-60 BAXANDALL M Giotto and the orators humanist observers of painting in Italy and the

discovery of pictorial composition 1350-1450 Oxford Clarendon Press 1971

BONNER S F ldquoDionysius of Halicarnassus and the Peripatetic Mean of Stylerdquo Classical Philology Vol 33 No 3 (Jul 1938) pp 257-266

BRANDAtildeO J L A invenccedilatildeo do romance Narrativa e mimese no romance grego Brasiacutelia

Editora UnB 2005 ________ A poeacutetica do Hipocentauro literatura sociedade e discurso ficcional em

Luciano de Samoacutesata Belo Horizonte UFMG 2001

BROWNING R ldquoByzantine Scholarshiprdquo Past amp Present No 28 (Jul 1964) pp 3-20

CARDOSO Z de A ldquoO Anfitriatildeo de Plauto uma tragicomeacutediardquo Itineraacuterios Araraquara n 26 pp 15-34 2008

CARVALHO M S F de Poesia de agudeza em Portugal Satildeo Paulo Humanitas Edusp

Fapesp 2007 CARLSON M Teorias do teatro estudo histoacuterico-criacutetico dos gregos agrave atualidade

Traduccedilatildeo de Gilson Ceacutesar Cardoso de Souza Satildeo Paulo Editora da Unesp 1997

CASSIN B O efeito sofiacutestico Traduccedilatildeo de Ana Luacutecia de Oliveira Maria Cristina Franco Ferraz e Paulo Pinheiro Satildeo Paulo Editora 34 2005

CASSIN B (Org) Vocabulaire Europeacuteen des Philosophies Dictionnaire des

Intraduisibles Sous la direction de Barbara Cassin Paris Eacuteditions du Seuil Dictionnaires Le

Robert 2004 CASTRO A P de Retoacuterica e teorizaccedilatildeo literaacuteria em Portugal Do Humanismo ao

Neoclassicismo Coimbra Centro de Estudos Romacircnicos 1973

CHEVROLET T Lideacutee de fable Theacuteories de la fiction poeacutetique agrave la Renaissance Genegraveve Droz 2007

331

CHIAPPETTA A Ad animos faciendos comoccedilatildeo feacute e ficccedilatildeo nas Partitiones Oratoriae e

no De Officiis de Ciacutecero Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 1997 [tese de doutorado]

CHIRON P ldquoAs ambiguidades da lsquograccedilarsquo (kharis) no tratado Do estilo de Demeacutetrio (Ps-Demeacutetrio de Falero) Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2003 v 7 pp 201-218

________ Un rheacuteteur meacuteconnu Deacutemeacutetrios (Ps-Deacutemeacutetrios de Phalegravere) Essai sur les

mutations de la theacuteorie du style agrave leacutepoque helleacutenistique Paris Vrin 2001

CLASSEN C J ldquoThe Rhetorical Works of George of Trebizond and Their Debt to Cicerordquo Journal of the Warburg and Courtauld Institutes Vol 56 (1993) pp 75-84

CONLEY T ldquoAristotlersquos Rhetoric in Byzantiumrdquo Rhetorica Vol 8 No 1 (Winter 1990)

pp 29-44 ________ ldquoByzantine Teaching on Figures and Tropes An Introductionrdquo Rhetorica

Vol 4 No 4 (Autumn 1986) pp 335-374

________ ldquoGreek Rhetorics after the Fall of Constantinople An Introductionrdquo

Rhetorica Vol 18 No 3 (Summer 2000) pp 265-294

________ ldquoRevisiting lsquoZonaiosrsquo More on the Byzantine Tradition περὶ σχημάτωνrdquo

Rhetorica Vol 22 No 3 (Summer 2004) pp 257-268

________ ldquoSome Renaissance Polish Commentaries on Aristotlersquos Rhetoric and

Hermogenesrsquo On Ideasrdquo Rhetorica Vol 12 No 3 (Summer 1994) pp 265-292 CUNHA A G da Dicionaacuterio Etimoloacutegico da Liacutengua Portuguesa 4ordf ediccedilatildeo revista e

ampliada Rio de Janeiro Lexikon 2010

CUTLER A ldquoFrom Loot to Scholarship Changing Modes in the Italian Response to

Byzantine Artifacts ca 1200-1750rdquo Dumbarton Oaks Papers Vol 49 Symposium on Byzantium and the Italians 13th-15th Centuries (1995) pp 237-267

DELEUZE G PARNET C Diaacutelogos Traduccedilatildeo de Joseacute Gabriel Cunha Lisboa Reloacutegio

DrsquoAacutegua Editores 2004 DOWNEY G ldquoByzantium and the Classical Traditionrdquo Phoenix Vol 12 No 3 (Autumn

1958) pp 125-129

DUCROT O TODOROV T Dicionaacuterio Enciclopeacutedico das Ciecircncias da Linguagem 3ordf

ediccedilatildeo Satildeo Paulo Perspectiva 2007 DUPONT F Lrsquoinvention de la litteacuterature Paris La Deacutecouverte 1994

ECO U Sobre a literatura Traduccedilatildeo de Elena Aguiar 2ordf ed Rio de Janeiro Record 2003

FOUCAULT M Os anormais Curso no Collegravege de France (1974-1975) Ediccedilatildeo estabelecida sob a direccedilatildeo de Franccedilos Ewald e Alessandro Fontana por Valerio Marchetti e

Antonella Salomoni Traduccedilatildeo de Eduardo Brandatildeo Satildeo Paulo Martins Fones 2011

________ As palavras e as coisas Trad de Salma Tannus Muchail 8ordf ed Satildeo Paulo Martins Fontes 2002

________ iquestQueacute es un autor Traduccioacuten de Silvio Mattoni Buenos Aires Ediciones

literales 2010

FREITAS G A DE Sobre o Estilo de Demeacutetrio Um olhar criacutetico sobre a Literatura Grega (Traduccedilatildeo e estudo introdutoacuterio do tratado) Belo Horizonte [FL-UFMG] 2011

[dissertaccedilatildeo de mestrado]

GARBELLINI I L ldquoDos poemas (Diomedes Arte gramatical 3)rdquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2005 v 9 pp 231-243

GALIANA A A ldquoCuestiones de poeacutetica y retoacuterica en los preliminares de Quevedo a las

poesiacuteas de fray Luis de Leoacutenrdquo La Perinola 7 (2003) pp 61-102

GEANAKOPLOS D J Constantinople and the West Essays on the Late Byzantine (Palaeologan) and Italian Renaissances and the Byzantine and Roman Churches Madison

Wisconsin University of Wisconsin Press 1989

________ ldquoThe Discourse of Demetrius Chalcondyles on the Inauguration of Greek Studies at the University of Padua in 1463rdquo Studies in the Renaissance Vol 21 (1974) pp 118-

144

GENETTE G ldquoVerossiacutemil e motivaccedilatildeordquo In BARTHES R et alli Literatura e semiologia Petroacutepolis Vozes 1972 pp 8-9

332

________ ldquoVraisemblance et motivationrdquo In Communications 11 1968 Recherches

seacutemiologiques le vraisemblable pp 5-21

GEORGOPOULOU M ldquoLate Medieval Crete and Venice An Appropriation of Byzantine Heritagerdquo The Art Bulletin Vol 77 No 3 (Sep 1995) pp 479-496

GOYET F Le sublime du ldquolieu communrdquo Lrsquoinvention rheacutetorique dans lAntiquiteacute et agrave la

Renaissance Paris Honoreacute Champion 1996

GRAMMONT G de Ajeijadinho e o aeroplano o paraiacuteso barroco e a construccedilatildeo do heroacutei colonial Rio de Janeiro Civilizaccedilatildeo Brasileira 2008

GRUBE G M A ldquoThrasymachus Theophrastus and Dionysius of Halicarnassusrdquo The

American Journal of Philology Vol 73 No 3 (1952) pp 251-267 GUIRAO D N POU P J REYES A (Coord) La edicioacuten de textos Actas del I Congreso

Internacional de Hispanistas del Siglo de Oro London Tamesis 1990

HANSEN J A Alegoria Construccedilatildeo e interpretaccedilatildeo da metaacutefora Satildeo Paulo Hedra

Campinas Editora Unicamp 2006 ________ ldquoAs liras de Gonzaga entre retoacuterica e valor de trocardquo Via Atlacircntica Satildeo Paulo

1997 v 1 pp 40-52

________ ldquoBarroco neobarroco e outras ruiacutenasrdquo Teresa Revista de Literatura Brasileira 2 Satildeo Paulo 2001 pp 10-66

________ ldquoCategorias epidiacuteticas da ekphrasisrdquo Revista USP v 71 Satildeo Paulo 2006 pp

85-105 ________ ldquoEu nos faltaraacute semprerdquo in BECKETT S o inominaacutevel Traduccedilatildeo Ana Helena

Souza Satildeo Paulo Globo 2009 pp 7-25

________ ldquolsquoO imortalrsquo e a inverossimilhanccedilardquo Teresa revista de Literatura Brasileira

67 Satildeo Paulo 2006 pp 56-78 ________ ldquoNotas sobre o gecircnero eacutepicordquo in Teixeira I (Org) Eacutepicos Satildeo Paulo Edusp

Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo 2008

________ ldquoRepresentaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo na literatura de Machado de Assisrdquo Ciecircncia Hoje nordm 253 out 2008 pp 36-42

________ ldquoRetoacuterica da agudezardquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002 v 4 pp 317-42

________ A saacutetira e o engenho Gregoacuterio de Matos e Guerra e a Bahia do seacuteculo XVII 2ordf ed rev Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial Campinas Editora da Unicamp 2004

HANSEN J A MOREIRA M (Org) Para que todos entendais Poesia atribuiacuteda a

Gregoacuterio de Matos e Guerra Letrados manuscritura retoacuterica autoria obra e puacuteblico na Bahia

dos seacuteculos XVII e XVIII Volume 5 1ordf ed Belo Horizonte Autecircntica Editora HASEGAWA A P Os limites do gecircnero bucoacutelico em Vergiacutelio um estudo das eacuteclogas

dramaacuteticas Satildeo Paulo Humanitas 2012

HEATH M ldquoApsines and Pseudo-Apsinesrdquo The American Journal of Philology Vol 119 No 1 (Spring 1998) pp 89-111

________ ldquoThe Substructure of Stasis-Theory from Hermagoras to Hermogenesrdquo The

Classical Quarterly New Series Vol 44 No 1 (1994) pp 114-129

HENDRICKSON G L ldquoThe Origin and Meaning of the Ancient Characters of Stylerdquo The American Journal of Philology Vol 26 No 3 (1905) pp 249-290

________ ldquoThe Peripatetic Mean of Style and the Three Stylistic Charactersrdquo The

American Journal of Philology Vol 25 No 2 (1904) pp 125-146 IFFLAND J (Org) Quevedo in Perspective Newark Delaware Juan de la Cuesta 1982

JOHNSON F R ldquoTwo Renaissance Textbooks of Rhetoric Aphthoniusrsquo Progymnasmata

and Rainoldersquos A Booke Called the Foundacion of Rhetorikerdquo The Huntington Library Quarterly Vol 6 No 4 (Aug 1943) pp 427-444

JAURALDE POU P ldquoTexto fecha y circunstancias de La Culta Latiniparla de Quevedordquo

In Bulletin Hispanique Tome 83 ndeg 1-2 1981 pp 131-143

KENNEDY G A A new history of classical rhetoric Princeton Princeton University Press 1994

________ Classical rhetoric and its Christian and secular tradition from ancient to

modern times Chapel Hill University of North Carolina Press 1999

333

________ Greek Rhetoric under Christian Emperors Eugene Oregon Wipf and Stock

Publishers 2008

________ Invention and Method Two Rhetorical Treatises from the Hermogenic Corpus Translated with introductions and notes by George A Kennedy Atlanta Society of

Biblical Literature 2005

________ Progymnasmata Greek textbooks of prose composition and rhetoric

Translated with introductions and notes by George A Kennedy Atlanta Brill 2003 KILLY W et alii Dictionary of German Biography Volume 10 Thibaut - Zycha

Muumlnchen De Gruyter 2006

KOSSOVITCH L Condillac luacutecido e transluacutecido Satildeo Paulo Ateliecirc Editorial 2011 ________ ldquoContra a ideacuteia de Renascimentordquo in NOVAES A (Org) Artepensamento

Satildeo Paulo Companhia das Letras 1994 pp 59-68

________ Signos e poderes em Nietzsche Rio de Janeiro Azougue 2004

________ ldquoTradiccedilatildeo claacutessicardquo Desiacutegnio v 5 (2006) pp 15-21 LACAN J Eacutecrits Paris Eacuteditions du Seuil 1966

LAUSBERG H Elementos de retoacuterica literaacuteria Trad R M Rosado Fernandes Lisboa

Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 1966 ________ Manual de Retoacuterica LiterariaFundamentos de una Ciencia de la Literatura

Versioacuten espantildeola de Joseacute Peacuterez Riesco Madrid Editorial Gredos 1967 3 tomos

LICHAŃSKI J Z ldquoThe Polish Translation of Hermogenes of Tarsusrdquo Forum Artis Rhetoricae 2 33 (abr-jun 2013) pp 82-84

LICHTENSTEIN J A cor eloquente Traduccedilatildeo de Maria Elisabeth de Mello e Maria Helena

de Mello Rouanet Satildeo Paulo Siciliano 1994

________ The Blind Spot An Essay on the Relations between Painting and Sculpture in the Modern Translation by Chris Miller Los Angeles Getty Research Institute 2008

LOOMIS L R ldquoThe Greek Renaissance in Italyrdquo The American Historical Review Vol

13 No 2 (Jan 1908) pp 246-258 LOacutePEZ GRIGERA L La retoacuterica en la Espantildea del siglo de oro Universidad de Salamanca

1994

________ Anotaccedilotildees de Quevedo agrave Retoacuterica de Aristoacuteteles Campinas SP Editora da Unicamp 2008

LORIES D RIZZERIO L (Org) De la phantasia agrave lrsquoimagination Louvain Peeters 2003

MACDONALD K M ldquoSelling Lives the Publisher Bernardo di Giunta (fl 1518-1550)

Imitation and the Utility of Intellectual Biographyrdquo Renaissance and Reformation 25 (2001) pp 5-24

MACK P ldquoVivesrsquos De ratione dicendi Structure Innovations Problemsrdquo Rhetorica

Vol 23 No 1 (Winter 2005) pp 65-92 MAGALHAtildeES Domingos Joseacute Gonccedilalves de A Confederaccedilatildeo dos Tamoyos Rio de

Janeiro Livraria de B L Garnier 1864

MARTIN T M ldquoDos gecircneros de discurso (QUINT XII 1058-80)rdquo Letras claacutessicas Satildeo

Paulo 2005 v 9 pp 225-230 MARTINS P ldquoO paacuterodo de Fedra e a retoacutericardquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 1999 v 3

pp 181-210

________ ldquoVt Pictura Rhetoricardquo Revista USP Satildeo Paulo n91 setnov 2011 pp 104-111

MENDES M V A oratoacuteria barroca de Vieira Lisboa Editorial Caminho 1989

MONFASANI J George of Trebizond A Biography and a Study of his Rhetoric and Logic Leiden Brill 1976

________ Language and learning in Renaissance Italy selected articles Brookfield

Vermont Variorum 1994

MONTEFUSCO L C ldquoDuctus and color the right way to compose a suitable speechrdquo Rhetorica Berkeley University of California Press vol XXI n 2 2003 113-31

MUHANA A ldquoDiscurso sobre o poema heroico Comentaacuteriordquo REEL Revista Eletrocircnica

de Estudos Literaacuterios Vitoacuteria a 2 v 2 2006

334

________ A Epopeacuteia em Prosa Seiscentista uma definiccedilatildeo de gecircnero Satildeo Paulo Editora

da Unesp 1997

________ Poesia e pintura ou pintura e poesia tratado seiscentista de Manuel Pires de Almeida Satildeo Paulo Edusp 2002

________ Os Recursos retoacutericos na obra especulativa do padre Antocircnio Vieira e outros

escritos Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 1989 [dissetaccedilatildeo de mestrado]

MURPHY J J WINTERBOTTOM M ldquoRaffaele Regiorsquos 1492 Quaestio doubting Cicerorsquos authorship of the Rhetorica ad Herennium Introduction and Textrdquo Rhetorica A Journal of the

History of Rhetoric Vol 17 No 1 (Winter 1999) pp 77-87

NASCIMENTO C ldquoDa pintura antiga de Francisco de Holanda o encocircmio como gecircnero da prescriccedilatildeo e da arterdquo Floema Caderno de Teoria e Histoacuteria Literaacuteria Nordm 1 (2005) pp 37-50

OLIVEIRA C E de ldquoIdeias formas rationes e species A Quaestio de ideis de Tomaacutes de

Aquinordquo Discurso Satildeo Paulo n 40 pp 95-122 nov 2010

PANAGIOTAKES N M ldquoThe Italian Background of Early Cretan Literaturerdquo Dumbarton Oaks Papers Vol 49 Symposium on Byzantium and the Italians 13th-15th Centuries (1995) pp

281-323

PANOFSKY E Idea a evoluccedilatildeo do conceito de belo 2ordf ediccedilatildeo 2ordf tiragem Traduccedilatildeo de Paulo Neves Satildeo Paulo Martins Fontes 2013

PATILLON M La theacuteorie du discours chez Hermogegravene le rheacuteteur essai sur les structures

linguistiques de la rheacutetorique ancienne Paris Les Belles Lettres 1988 PATTERSON A M Hermogenes and the Renaissance Princeton Princeton University

Press 1970

________ ldquoTasso and Neoplatonism The Growth of his Epic Theoryrdquo Studies in the

Renaissance Vol 18 (1971) pp 105-133 PEacuteCORA A Maacutequina de gecircneros Satildeo Paulo Edusp 2001

________ (org) Poesia seiscentista Fecircnix renascida amp Postilhatildeo de Apolo Satildeo Paulo

Hedra 2002 ________ Teatro do sacramento A unidade teoloacutegico-retoacuterico-poliacutetica dos sermotildees de

Antocircnio Vieira Satildeo Paulo Edusp Campinas Editora da Unicamp 1994

PEREIRA B F ldquoA ediccedilatildeo conimbricense da Rhetorica de Joachim Ringelbergrdquo Peniacutensula Revista de Estudos Ibeacutericos n 1 (2004) pp 201-213

PEREIRA M A Quintiliano Gramaacutetico o papel do mestre de gramaacutetica na Institutio

oratoria 2ordf ed Satildeo Paulo Humanitas 2006

PEREIRA T A YAMUZA E R ldquoLas fuentes de la teoriacutea de los asystata en el Comentario de Grilio al De inuentione de Ciceroacuten Minuciano vs Hermoacutegenesrdquo Rhetorica Vol 21 No 4

(Autumn 2003) pp 255-284

PERINtildeAacuteN B GUAZZELLI F (Org) Symbolae pisanae Studi in onore di Guido Mancini Pisa Giardini 1989 vol II

PERNOT L La Rheacutetorique dans lrsquoAntiquiteacute Paris Librairie Geacuteneacuterale Franccedilaise 2000

PINEDA V La imitacioacuten como arte literario en el siglo XVI espantildeol Sevilla Diputacioacuten

Provincial de Sevilla 1994 PINHEIRO Joaquim Caetano Fernandes Historiografia da Literatura Brasileira textos

inaugurais Organizaccedilatildeo apresentaccedilatildeo e notas por Roberto Aciacutezelo de Souza Rio de Janeiro

EdUERJ 2007 PIRES M L G A criacutetica camoniana no seacuteculo XVII Lisboa Instituto de Cultura e Liacutengua

Portuguesa 1982

RENOUARD A A Annales de lrsquoimprimerie des Alde ou Histoire des trois Manuce et de leurs eacuteditions Paris 1803

ROBERTS W R ldquoThe Greek Words for lsquoStylersquo (With Special Reference to Demetrius

περὶ Ἑρμηνείας)rdquo The Classical Review Vol 15 No 5 (Jun 1901) pp 252-255

ROTHBERG I P ldquoCovarrubias Gracian and the Greek Anthologyrdquo Studies in Philology

Vol 53 No 4 (Oct 1956) pp 540-552 RUSSELL D A WINTERBOTTOM M Ancient literary criticism the principal texts in

new translations Oxford Oxford University Press 1972

335

RUTHERFORD I ldquoInverting the Canon Hermogenes on Literaturerdquo Harvard Studies in

Classical Philology Vol 94 (1992) pp 355-378

SANTOS M M Liccedilotildees sobre alegoria de gramaacuteticos e retores gregos e latinos Satildeo Paulo [FFLCH-USP] 2002 [tese de doutorado]

________ ldquoO monstrum da Arte poeacutetica de Horaacuteciordquo Letras Claacutessicas Satildeo Paulo 2002

v 4 pp 191-265

SETTON K M ldquoThe Byzantine Background to the Italian Renaissancerdquo Proceedings of the American Philosophical Society Vol 100 No 1 (Feb 24 1956) pp 1-76

ŠEVČENKO I ldquoThe Decline of Byzantium Seen Through the Eyes of Its Intellectualsrdquo

Dumbarton Oaks Papers Vol 15 (1961) pp 167-186 SCHEVILL R ldquoErasmus and Spainrdquo Hispanic Review Vol 7 No 2 (Apr 1939) pp 93-

116CHOULER B ldquoLa classification des personnes et des faits chez Hermogegravene et ses

commentateursrdquo Rhetorica Vol 8 No 3 (Summer 1990) pp 229-254

SKINNER Q Razatildeo e retoacuterica na filosofia de Hobbes Satildeo Paulo Editora Unesp 1999 SUMMERELL O F (Ed) et al Alkinoos Didaskalikos Lehrbuch der Grundsaumltze Platons

Einleitung Text Uumlbersetzung und Anmerkungen Sammlung wissentschaftlicher Kommentaumlre

Berlin and New York Walter de Gruyter 2007 TAFURI M Venice and the Renaissance Translated by Jessica Levine Cambridge

Massachusetts MIT Press 1995

TEIXEIRA I ldquoArtifiacutecio persuasatildeo e sociedade em Olavo Bilacrdquo Revista USP nordm 54 ago 2002 pp 98-111

________ Mecenato Pombalino e Poesia Neoclaacutessica Basiacutelio da Gama e a Poeacutetica do

Encocircmio Satildeo Paulo Edusp 1999

TODOROV T ldquoIntroduccedilatildeo ao verossiacutemilrdquo In Poeacutetica da prosa Traduccedilatildeo de Claudia Berliner Satildeo Paulo Martins Fontes 2003 pp 113-23

TONIQUA C (Org) El ofiacutecio del pintor nuevas miradas a la obra de Gregorio Vaacutesquez

Bogota Ministeacuterio de Cultura 2008 TRIMPI W Ben Jonsonrsquos poems a study of the plain style Stanford Stanford University

Press 1962

________ ldquoHoracersquos ut pictura poesis The argument for stylistic decorumrdquo Traditio (Studies in ancient and medieval history thought and religion) New York Fordham University

Press 1978 vol XXXIV pp 29-73

VALLE R M ldquoA ordem dos afetos A bucoacutelica de Claacuteudio Manuel da Costardquo Floema

Caderno de Teoria e Histoacuteria Literaacuteria Vitoacuteria da Conquista Ano I n 1 p 71-88 2005 VERNANT J-P ldquoNascimento de imagensrdquo in LIMA L C (Org) Miacutemesis e a reflexatildeo

contemporacircnea EdUERJ 2010

WEBB R Ekphrasis Imagination and Persuasion in Ancient Rhetorical Theory and Practice London Ashgate 2009

  • Doutrina do misto e anatomia do monstrousos da retoacuterica de Hermoacutegenes entre os seacuteculos XVI e XVIII
    • RESUMO
    • ABSTRACT
    • SUMAacuteRIO
    • PROacuteLOGO
    • DOUTRINA DO MISTO
    • ANATOMIA DO MONSTRO
    • EPIacuteLOGO
    • REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
Page 3: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 4: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 5: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 6: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 7: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 8: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 9: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 10: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 11: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 12: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 13: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 14: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 15: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 16: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 17: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 18: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 19: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 20: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 21: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 22: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 23: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 24: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 25: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 26: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 27: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 28: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 29: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 30: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 31: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 32: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 33: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 34: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 35: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 36: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 37: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 38: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 39: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 40: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 41: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 42: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 43: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 44: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 45: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 46: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 47: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 48: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 49: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 50: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 51: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 52: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 53: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 54: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 55: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 56: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 57: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 58: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 59: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 60: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 61: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 62: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 63: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 64: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 65: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 66: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 67: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 68: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 69: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 70: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 71: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 72: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 73: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 74: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 75: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 76: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 77: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 78: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 79: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 80: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 81: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 82: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 83: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 84: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 85: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 86: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 87: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 88: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 89: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 90: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 91: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 92: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 93: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 94: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 95: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 96: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 97: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 98: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 99: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 100: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 101: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 102: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 103: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 104: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 105: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 106: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 107: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 108: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 109: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 110: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 111: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 112: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 113: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 114: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 115: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 116: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 117: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 118: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 119: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 120: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 121: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 122: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 123: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 124: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 125: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 126: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 127: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 128: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 129: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 130: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 131: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 132: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 133: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 134: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 135: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 136: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 137: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 138: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 139: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 140: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 141: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 142: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 143: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 144: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 145: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 146: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 147: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 148: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 149: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 150: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 151: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 152: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 153: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 154: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 155: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 156: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 157: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 158: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 159: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 160: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 161: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 162: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 163: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 164: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 165: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 166: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 167: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 168: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 169: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 170: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 171: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 172: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 173: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 174: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 175: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 176: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 177: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 178: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 179: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 180: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 181: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 182: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 183: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 184: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 185: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 186: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 187: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 188: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 189: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 190: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 191: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 192: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 193: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 194: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 195: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 196: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 197: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 198: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 199: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 200: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 201: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 202: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 203: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 204: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 205: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 206: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 207: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 208: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 209: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 210: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 211: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 212: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 213: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 214: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 215: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 216: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 217: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 218: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 219: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 220: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 221: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 222: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 223: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 224: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 225: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 226: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 227: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 228: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 229: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 230: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 231: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 232: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 233: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 234: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 235: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 236: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 237: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 238: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 239: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 240: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 241: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 242: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 243: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 244: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 245: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 246: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 247: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 248: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 249: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 250: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 251: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 252: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 253: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 254: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 255: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 256: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 257: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 258: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 259: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 260: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 261: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 262: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 263: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 264: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 265: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 266: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 267: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 268: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 269: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 270: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 271: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 272: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 273: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 274: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 275: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 276: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 277: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 278: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 279: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 280: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 281: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 282: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 283: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 284: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 285: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 286: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 287: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 288: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 289: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 290: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 291: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 292: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 293: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 294: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 295: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 296: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 297: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 298: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 299: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 300: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 301: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 302: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 303: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 304: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 305: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 306: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 307: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 308: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 309: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 310: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 311: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 312: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 313: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 314: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 315: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 316: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 317: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 318: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 319: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 320: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 321: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 322: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 323: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 324: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 325: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 326: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 327: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 328: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 329: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 330: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 331: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 332: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 333: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 334: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras
Page 335: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ...teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8150/tde...os conhecimentos da arte, diz o biígrafo grego, não diz a Nova Rhetorica Brasileira, como palavras