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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Ana Paula Vidigal de Oliveira Godoy RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO À LUZ DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR CURITIBA 2012

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

Ana Paula Vidigal de Oliveira Godoy

RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO À LUZ DO CÓDIGO DE

DEFESA DO CONSUMIDOR

CURITIBA

2012

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RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO À LUZ DO CÓDIGO DE

DEFESA DO CONSUMIDOR

CURITIBA

2012

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Ana Paula Vidigal de Oliveira Godoy

RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO À LUZ DO CÓDIGO DE

DEFESA DO CONSUMIDOR

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel.

Orientador: Prof. Marcos Aurélio de Lima Júnior

CURITIBA

2012

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TERMO DE APROVAÇÃO

Ana Paula Vidigal de Oliveira Godoy

RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO À LUZ DO CÓDIGO DE

DEFESA DO CONSUMIDOR

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do grau de Bacharel no Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, ___ de _____________ de 2012.

___________________________________________

Prof. Dr. Eduardo de Oliveira Leite Coordenador do Núcleo de Monografias do Curso de Direito

Universidade Tuiuti do Paraná

Orientador: __________________________________________ Prof. Marcos Aurélio de Lima Júnior Universidade Tuiuti do Paraná

Curso de Direito

Supervisor: __________________________________________ Prof. Universidade Tuiuti do Paraná

Curso de Direito

Supervisor:__________________________________________ Prof. Universidade Tuiuti do Paraná

Curso de Direito

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À minha família, pelo amor incondicional, por me ensinar tudo o que sei e me tornar a pessoa que sou

hoje.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por estar sempre ao meu lado me dando forças e iluminando os meus

caminhos.

À minha mãe Suely, por ser tão dedicada e guerreira, por me apoiar sempre e me

ensinar a ser forte.

Ao meu pai Daniel, pela educação que me deu e por todo o carinho.

Ao meu irmão Dani, por ser quem é, meu orgulho e meu amor.

Aos meus amigos da graduação que sempre me apoiaram, nos momentos felizes e

tristes.

A Maria Helena, pelo imprescindível apoio.

Ao meu orientador, Marcos Aurélio, por acreditar na minha capacidade, pelos

ensinamentos e toda a dedicação que foram indispensáveis para a concretização

desta monografia.

A todos os professores do Curso de Direito, pela dedicação e estímulo ao meu

aprendizado.

Por fim, gostaria de agradecer aos meus familiares e amigos, pelo carinho e

compreensão nos momentos em que a dedicação aos estudos foi exclusiva.

A todos os meus entes queridos a minha eterna gratidão.

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Ninguém conseguiria manter a ordem sem a justiça, mas ninguém constrói a paz sem amor.

Chico Xavier

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RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo geral trazer informações atuais e úteis aos operadores do Direito, no tocante à responsabilização do médico frente ao Código de Defesa do Consumidor, no qual analisaremos a responsabilidade civil de modo

geral, em seguida trataremos da responsabilidade do profissional da medicina e a sua relação com o paciente e ao final examinaremos a questão referente à responsabilidade que o profissional da medicina possui, por se tratar de profissional

liberal e prestar serviços frente ao consumidor/paciente neste vínculo que se forma a partir dessa relação de consumo. Para a elaboração deste trabalho foi utilizada a pesquisa bibliográfica, aplicou-se o conhecimento teórico publicado em livros das

áreas de Direito Civil e do Direito do Consumidor, artigos e revistas especializadas.

Palavras-chave: Responsabilidade civil; Médico; Código de defesa do consumidor.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 11

1 RESPONSABILIDADE CIVIL: ASPECTOS GERAIS ...................................... 14

1.1 CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES ............................................................ 14

1.2 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL.................................... 17

1.2.1 Ação ou Omissão ......................................................................................... 18

1.2.2 Culpa ou Dolo do Agente ............................................................................. 19

1.2.3 Nexo de Causalidade .................................................................................. 21

1.2.4 Dano .............................................................................................................. 22

1.3 RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E RESPONSABILIDADE OBJETIVA.. 23

1.4 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL................ 27

2 CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ... 31

2.1 CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES ............................................................ 31

2.2 NATUREZA CONTRATUAL DA RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE............... 32

2.3 OBRIGAÇÃO DE MEIO E OBRIGAÇÃO DE RESULTADO ......................... 34

2.4 RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO ................................................... 37

2.5 CULPA MÉDICA ............................................................................................. 38

2.5.1 Erro médico .................................................................................................. 42

2.5.2 Erro de Diagnóstico...................................................................................... 43

2.6 DANO MÉDICO ............................................................................................... 45

2.6.1 Dano Estético .............................................................................................. 46

2.6.2 Dano Moral ou Extrapatrimonial .................................................................. 47

2.6.3 Dano Material ou Patrimonial ...................................................................... 51

3 RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO E O CÓDIGO DE DEFESA DO

CONSUMIDOR ...................................................................................................... 54

3.1 RELAÇÃO DE CONSUMO E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS ..... 54

3.2 RESPONSABILIDADE MÉDICA NO CÓDIGO DE DEFESA DO

CONSUMIDOR ...................................................................................................... 55

3.2.1 Responsabilidade Pessoal do Médico ........................................................ 56

3.2.2 Responsabilidade dos Estabelecimentos de Saúde .................................. 60

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3.3 PROVA NO ERRO MÉDICO .......................................................................... 66

3.4 PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR NO DANO MÉDICO ...... 70

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 72

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 75

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INTRODUÇÃO

O presente tema de estudo tem como escopo analisar a fundo a

responsabilidade civil do médico, na qualidade de profissional liberal fornecedor de

serviços, o qual presta serviços ao consumidor, sob o enfoque do Código de Defesa

do Consumidor.

Em vista disso, o trabalho será dividido em três instantes, no primeiro

instante abordaremos a responsabilidade civil em seus aspectos gerais, onde

verificaremos as considerações preliminares, pressupostos e as diferenciações da

responsabilidade subjetiva e objetiva e da responsabilidade contratual e

extracontratual. Em seguida, trataremos da responsabilidade do profissional da

medicina e a sua relação com o paciente, a natureza da relação médico-paciente, as

diferenças entre obrigação de meio e de resultado, e suas peculiaridades relativas à

culpa médica, dano médico face ao ordenamento jurídico. E Por fim, analisaremos a

questão que trata da responsabilidade que o profissional da medicina experimenta,

por ser profissional liberal e prestar serviços frente ao consumidor/paciente,

igualmente trataremos da responsabilidade dos estabelecimentos de saúde, que

também são responsabilizados nesse contexto, a prova no erro médico, a

indenização por dano médico e ao final, a prescrição da obrigação de indenizar no

dano médico.

As chamadas garantias de proteção ao consumidor estão previstas na

Constituição de 1988, no inciso XXXII do art. 5°, que preceitua que: “Todos são

iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos

brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à

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liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: o Estado

promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor.” E ainda, no mesmo sentido

estabelece em seu art. 170, que: “A ordem econômica, fundada na valorização do

trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna,

conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: V -

defesa do consumidor”. Desta forma, a Carta Magna assegura ao consumidor o

amparo que ele necessita.

Destarte, com o advento da Lei n. 8.078/90, denominada Código de Defesa

do Consumidor, as relações de consumo foram normatizadas no direito brasileiro e a

partir daí o consumidor obteve seus direitos e diante disto, grandes avanços

ocorreram em muitas áreas da prestação de serviços, nas quais anteriormente o

mesmo ficava sem assistência e hoje é protegido por este diploma legal, que tem

como proposta atender as necessidades dos consumidores, por ser considerado

hipossuficiente, ou seja, a parte mais fraca nessa relação, respeitando os princípios

fundamentais, da dignidade, da saúde e da segurança, além dos interesses

econômicos, visando melhorar a qualidade de vida destes.

Insta ressaltar que a relação de consumo é uma relação jurídica que tem em

seus pólos o fornecedor e o consumidor, tendo como objeto no caso do profissional

liberal, um serviço oferecido, prestado ao consumidor, o qual dá azo a essa relação

de consumo.

Portanto, a relação entre o médico que atua como profissional liberal e o

paciente que contrata seus serviços é caracterizada como uma relação jurídica de

consumo, sendo esta regulada pelo referido Código de Defesa do Consumidor. Por

essa razão, se houver algum defeito na prestação de serviços ou nas informações e

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se esse defeito causar dano ao paciente fica o médico, na condição de fornecedor,

obrigado a reparar.

Sob essa análise, como veremos adiante, para a caracterização da

responsabilidade do profissional da medicina são necessários os elementos

essenciais, assim como a conduta do agente (ação ou omissão), dano, nexo causal,

culpa ou dolo. Desta forma, conclui-se que o médico age com culpa ou dolo quando

se comporta de maneira imprudente, negligente ou atua com imperícia, de forma

que causa um dano, devendo assim reparar o prejuízo causado ao seu paciente,

nas formas da lei e como veremos com mais precisão.

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1 RESPONSABILIDADE CIVIL: ASPECTOS GERAIS

1.1 CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

Originariamente a palavra “responsabilidade” derivou do verbo em latim

respondere, que nos dá a idéia de segurança, ou seja, uma garantia de restituição

ou compensação do bem que foi sacrificado. Significando, portanto, a recomposição

de uma obrigação de restituir ou ressarcir algo.1

Conforme René Savatier é possível dizer que a responsabilidade civil é a

“obrigação que pode incumbir uma pessoa de reparar o prejuízo a outra, por fato

próprio, ou pelo fato de pessoas ou coisas que dela dependam.” 2

O termo responsabilidade, embora com sentidos próximos e semelhantes, é

utilizado para designar várias situações no campo jurídico. A responsabilidade, em

sentido amplo, encerra a noção em virtude da qual se atribui a um sujeito o dever de

assumir as conseqüências de um evento ou de uma ação. Afirma VENOSA, “Em

nosso estudo, interessa a responsabilidade de alguém como fato ou ato punível ou

moralmente reprovável, como violação de direito na dicção do novo Código, o que

acarreta reflexos jurídicos.” 3 Neste campo o que interessa saber é identificar se a

conduta reflete na obrigação de indenizar, se for o caso, é necessário verificar se

estão presentes os requisitos da responsabilidade civil: ação ou omissão voluntária,

1 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Volume IV. Responsabilidade Civil- 4 ed. rev.

São Paulo: Saraiva, 2009. p. 23. 2 René Savatier, 1951 apud RODRIGUES, Silvio. Direito Civil Vol. 4. Responsabilidade Civil- 20 ed.

São Paulo: Saraiva, 2008, p. 6. 3 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2003. p.12.

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relação de causalidade ou nexo causal, dano e, finalmente, culpa, que veremos mais

adiante.

Nós que vivemos em sociedade e aceitamos as regras sociais e as

obrigações que nos são impostas pelo regramento institucional, assumimos o dever

de não ofender, não causar dano a outrem, nem de lesar alguém, ou pelo menos

deveríamos agir desta forma, entretanto para atingirmos esse ideal de conduta,

Segundo CAVALIERI FILHO, “a ordem jurídica estabelece regras e nos impõe

limites e deveres que, conforme a natureza do direito a que correspondem, podem

ser positivos, de dar ou fazer, com negativos, de não fazer ou tolerar alguma coisa.

Fala-se até em um dever geral de não prejudicar a ninguém, expresso pelo Direito

Romano através da máxima neminem laedere.” 4

Desta forma a responsabilidade civil é um instituto do Direito Civil que visa

reparar danos que podem ter sido gerados por uma conduta contratual ou

extracontratual e que se destina a restaurar o equilíbrio moral e patrimonial

provocado pelo causador do dano, tentando restabelecer a harmonia que fora

violada com a ocorrência deste dano.

Conforme leciona STOCO:

A responsabilidade civil é uma instituição, enquanto assecuratória de direitos, e um estuário para onde acorrem os insatisfeitos, os injustiçados e os que se danam e se prejudicam por comportamentos dos outros. É o resultado daquilo que não se comportou ou não ocorreu secundum ius. Toda a vez que alguém sofrer um detrimento qualquer, que for ofendido moralmente, que for desrespeitado em seus direitos, que não obtiver tanto quanto foi avençado, certamente lançará mão da responsabilidade civil para ver-se ressarcido. A responsabilidade civil é, portanto a retratação de um conflito.

5

4 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil, 7 ed. São Paulo: Atlas, 2007.p.1.

5 STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil: Doutrina e Jurisprudência- 7 ed. São Paulo:

Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 112.

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Deste modo, quando alguém se sentir lesado e tiver os seus direitos

desrespeitados poderá recorrer às alternativas que o instituto da responsabilidade

civil nos dá para resolver conflitos.

E ainda, completa Rui Stoco:

A responsabilidade, embora escorada no mundo fático, tem sustentação jurídica. Depende da prática de um ato ilícito e, portanto antijurídico, cometido conscientemente, dirigido a um fim, ou orientado por comportamento irrefletido, mas informado pela desídia, pelo açodamento ou pela inabilidade técnica, desde que conduza a um resultado danoso no plano material ou imaterial ou moral.

6

Como o ato ilícito se traduz em um comportamento voluntário que transgride

um dever e tem uma relevância enorme por ser o fato gerador da responsabilidade

civil é importante conceituarmos com clareza. Devido ao seu duplo sentido, é

necessário diferenciá-lo para maior compreensão.

Em sentido amplo, lato sensu, o ato ilícito é o conjunto de pressupostos da

responsabilidade, da obrigação de indenizar, os quais são, na responsabilidade

subjetiva, como veremos serão necessários, além da conduta ilícita, a culpa, o dano

e o nexo causal. A culpa está ali inserida como um dos pressupostos da

responsabilidade subjetiva, elemento nuclear do ato ilícito que lhe dá causa. Já na

responsabilidade objetiva a culpa não integra os pressupostos necessários para sua

configuração.

Em sentido estrito, stricto sensu, como ensina CAVALIERI FILHO:

[...] o ato ilícito indica apenas a ilicitude do ato, a conduta humana antijurídica, contrária ao Direito, sem qualquer referência ao elemento subjetivo ou psicológico. Tal como o ato lícito, é também uma manifestação de vontade, uma conduta humana voluntária, só que contrária à ordem jurídica.

7

6 STOCO, Rui, op.cit. p. 117.

7 CAVALIERI FILHO, Sergio, op. cit. p. 10.

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Por ser de grande extensão a responsabilidade civil pode ainda ser

relacionada com a responsabilidade profissional do médico, especificamente nas

relações de consumo, como aprofundaremos adiante, aonde trataremos dos atos

ilícitos, os quais se caracterizam quando há uma ação ou omissão voluntária do

agente. Posto isto, insta ressaltar que se a responsabilidade civil decorre da prática

de uma ação ou de uma omissão, ou seja, um fazer ou deixar de fazer alguma coisa

que viole o direito e da qual resulte um dano e ainda, se esse prejuízo for causado a

outrem, deverá ser reparado por quem lhe deu causa, compelindo o agente

causador do dano e compensando assim as perdas sofridas pela vítima, tentando

aproximá-la do status quo ante e desestimulando a repetição de condutas

semelhantes num futuro próximo, garantindo assim o equilíbrio social.

1.2 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

O Código Civil em seu art. 186 consagra uma regra universalmente aceita, a

qual alude que todo aquele que causa dano a outrem é obrigado a repará-lo.

Conforme o referido dispositivo legal, informativo da responsabilidade aquiliana ou

também chamada extracontratual, que resulta de um inadimplemento normativo, ou

seja, a prática de um ilícito por pessoa capaz ou incapaz, que dispõe:

“Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência,

violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato

ilícito.”

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Portanto, verifica-se que são quatro os elementos essenciais da

responsabilidade civil: ação ou omissão, culpa ou dolo do agente, nexo de

causalidade ou também chamado de relação de causalidade e o dano

experimentado pela vítima. Os quais serão tratados expostos a seguir de maneira

específica.

1.2.1 Ação ou Omissão

O elemento primário de todo ilícito é uma conduta humana e voluntária no

mundo exterior. Interessando à ordem normativa do Direito porque produz um dano,

pois não há responsabilidade sem um resultado danoso. Deste modo, a ação e a

omissão constituem o primeiro momento da responsabilidade civil.8

Como ensina GONÇALVES:

Inicialmente, refere-se a lei a qualquer pessoa que, por ação ou omissão, venha a causar dano a outrem. A responsabilidade pode derivar de ato próprio, de ato de terceiro que esteja sob a guarda do agente, e ainda de danos causados por coisas e animais que lhe pertençam.

9

A responsabilidade por ato próprio se justifica no princípio informador da teoria

da reparação, pois se alguém, por sua ação pessoal, infringindo dever legal ou

social, prejudica terceiro, assim é conveniente que esse prejuízo seja reparado.

A responsabilidade por ato de terceiro ocorre quando uma pessoa fica sujeita a

responder por dano causado a outrem não por ato próprio, mas sim por ato de outro,

se sujeitando então a este. Então, o pai responde pelos atos de seus filhos menores

que estiverem em seu poder ou em sua companhia, assim como o patrão pelos atos

8 STOCO, Rui, op. cit. p. 129.

9 GONÇALVES, Carlos Roberto, op.cit. p.35.

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dos seus empregados. Foi criada com o propósito de dar segurança, de proteger à

vítima, surgindo uma responsabilidade solidária entre o patrão e o empregado que

diretamente causou o dano, ficando a vítima com a possibilidade de demandar a

indenização a ela devida, tanto de um como de outro.10

Desta forma, para Frederico Marques, viola-se a norma jurídica, ou através de

um facere(ação) ou non facere(omissão). “Uma e outra conduta se situam no campo

naturalístico do comportamento humano, isto é, no mundo exterior, por serem um

„trecho da realidade‟ que o Direito submete, ulteriormente, a juízo de valor, no campo

normativo.” 11

Em suma, a omissão é um non facere relevante para o Direito, desde que atinja

um bem juridicamente tutelado, ou seja, que esteja sob a guarda do ordenamento

jurídico. E a ação, um facere que é determinado pelo imperativo jurídico para evitar a

ocorrência de um resultado e aquele que deveria praticar o ato exigido, pelos

mandamentos da ordem jurídica, permanece inerte ou pratica ação diversa da que

lhe é imposta.

1.2.2 Culpa ou Dolo do agente

Para que a conduta (ação ou omissão) seja relevante para fins de

responsabilidade civil, deve ela, em regra, ser culposa ou dolosa.

Desta maneira, com propriedade CAVALIERI FILHO, distingue o dolo da

culpa, dando a seguinte definição:

10

RODRIGUES, Silvio, op.cit. p. 15-16. 11

Frederico Marques, 1955 apud STOCO, Rui, op. cit., p. 129.

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Tanto no dolo como na culpa há conduta voluntária do agente, só que no primeiro caso a conduta já nasce ilícita, porquanto a vontade se dirige à concretização de um resultado antijurídico- o dolo abrange a conduta e o efeito lesivo dele resultante-, enquanto que no segundo a conduta nasce lícita, tornando-se ilícita na medida em que se desvia dos padrões socialmente adequados.

12

Completa ainda GONÇALVES afirmando que “O dolo consiste na vontade

de cometer uma violação de direito, a culpa na falta de diligência” 13. Portanto o dolo

é a vontade dirigida a um fim ilícito; é um comportamento consciente de violar

direito.

No entanto, ao contrário do dolo, a culpa em sentido estrito, stricto sensu

não há intenção do agente, nem ele pretende causar dano ou assume o risco de

produzi-lo. Nas palavras de STOCO a respeito da culpa:

Age apenas sem a diligência e cuidado que as circunstâncias exigiriam, atuando quando deveria abster-se; omitindo-se quando lhe seria exigida uma conduta positiva, ou intervindo profissionalmente sem o conhecimento ou habilidade específica que o mister impõe.

14

Desta forma, a culpa é uma conduta voluntária contrária ao dever de

cuidado imposto pelo Direito, produzindo um evento danoso involuntário, mas que

era previsto ou previsível.

Ademais, acrescenta RODRIGUES:

A lei declara que, se alguém causou prejuízo a outrem por meio de ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, fica obrigado a reparar. . De modo que, nos termos da lei, para que a responsabilidade se caracterize é necessária a prova de que o comportamento do agente causador do dano tenha sido doloso ou pelo menos culposo. O dolo ou resultado danoso afinal alcançado foi deliberadamente procurado pelo agente. Ele desejava causar dano e seu comportamento realmente o causou. Em caso de culpa, por outro lado, o gesto do agente não visava causar prejuízo à vítima, mas de sua atitude negligente, de sua imprudência ou imperícia causou um dano para ela.

15

12

CAVALIERI FILHO, Sergio, op.cit. p. 30. 13

GONÇALVES, Carlos Roberto, op. cit. p. 35. 14

STOCO, Rui, op.cit. p. 134. 15

RODRIGUES, Silvio, op. cit. p. 16.

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Logo, para obter a reparação do dano, a vítima terá que provar que houve

dolo ou culpa, que se verifica quando o agente age com imprudência, negligência e

imperícia. Mas, independentemente do agente ter agido com dolo ou culpa, em

momento algum será afastado o dever reparatório.

1.2.3 Nexo de Causalidade

Embora a responsabilidade civil tenha sido tradicionalmente construída no

conceito da culpa, o nexo causal constitui um dos elementos de grande importância

na responsabilização, pois é a relação de causa e efeito entre a ação ou omissão do

agente e o dano verificado. Até porque, antes mesmo de analisar se o agente agiu

com culpa ou não, é necessário apurar se ele deu causa ao resultado.

Desta maneira, não basta que o agente tenha praticado uma conduta ilícita,

muito menos se sofreu algum dano. É preciso que esse dano tenha sido causado

pela conduta ilícita do agente e que haja entre elas uma relação de causa e efeito.

Indica que é necessário que o ato ilícito seja a causa do dano, que o prejuízo sofrido

pela vítima seja resultado desse ato, sem o qual a responsabilidade não correrá a

cargo do autor material do fato.

Segundo Caio Mário da Silva Pereira:

[...] este é o mais delicado dos elementos da responsabilidade civil e o mais difícil de ser determinado. Aliás, sempre que um problema jurídico vai ter na indagação ou na pesquisa da causa, desponta a sua complexidade maior. Mesmo que haja culpa e dano, não existe obrigação de reparar, se entre ambos não se estabelecer a relação causal.

16

16

Caio Mário da Silva Pereira apud STOCO, Rui, op. cit. p. 76.

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Deste modo, como diria CAVALIERI FILHO: “o conceito de nexo causal não

é jurídico; decorre das leis naturais. É o vínculo, a ligação ou relação de causa e

efeito entre a conduta e o resultado. É através dele que poderemos concluir quem foi

o causador do dano.” 17

1.2.4 Dano

A responsabilidade civil não se propõe se não houver dano, somente haverá

possibilidade de indenização se o ato ilícito ocasionar dano a alguém. Ou seja, sem

o dano ou sem interesse violado, moral ou patrimonial, a indenização não se

solidifica.18

Assim como conceitua CAVALIERI FILHO:

O dano é, sem dúvida, o grande vilão da responsabilidade civil. Não haveria que se falar em indenização, nem em ressarcimento, se não houvesse o dano. Pode haver responsabilidade sem culpa, mas não pode haver responsabilidade sem dano. Na responsabilidade objetiva, qualquer que seja a modalidade do risco que lhe sirva de fundamento – risco profissional, risco proveito, risco criado etc. -, o dano constitui o seu elemento preponderante. Tanto é assim que, sem dano, não haverá o que reparar, ainda que a conduta tenha sido culposa ou até dolosa.

19

Ademais, como pontua DIAS, a definição de Fischer é a mais adequada, em

relação à definição de Carnelutti, pois considera o dano nas suas duas acepções, a)

vulgar, de prejuízo que alguém sofre, na sua alma, no seu corpo ou nos seus bens,

sem indagação de quem seja o autor da lesão de que resulta; b) a jurídica, que,

embora partindo da mesma concepção fundamental, é delimitada pela sua condição

17

CAVALIERI FILHO, Sergio, op. cit. p. 46. 18

VENOSA, Sílvio Salvo, op. cit. p. 28-29. 19

CAVALIERI FILHO, Sergio, op.cit. p. 70.

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de pena ou de dever de indenizar, e vem a ser o prejuízo sofrido pelo sujeito de

direitos em conseqüências da violação destes por fato alheio.20

A obrigação de indenizar decorre, pois, da existência da violação de direito e

do dano, concomitantemente. O dever de reparar assume, ainda que raramente, o

caráter de uma pena privada, uma sanção pelo comportamento ilícito do agente.

Algumas ofensas, assim como as dos direitos da personalidade autorizam uma

reparação pecuniária mesmo que nenhum prejuízo material advenha das ofensas,

por se tratarem de hipóteses de infração a uma norma jurídica tuteladora de

interesses particulares.

Doutrinariamente o dano é divido em: dano patrimonial e dano moral. Os

quais serão vistos ao longo do estudo.

1.3 RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E RESPONSABILIDADE OBJETIVA

O principal fundamento da responsabilidade civil está na culpa, por esta ser

insuficiente para cobrir toda a gama dos danos ressarcíveis; entretanto é fato

igualmente comprovado que, em sua grande maioria, os atos lesivos são causados

pela conduta antijurídica do agente, por negligência ou por imprudência. 21 A

negligência22 consiste na falta de cuidado de aplicação numa determinada situação,

20

Hans Albrecht Fischer apud DIAS, José de Aguiar, op. cit. p. 971-972. 21

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil, Volume III. 13 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 486. 22

DIAS, José de Aguiar, op. cit. p. 149: “Negligência é a omissão daquilo que razoavelmente se faz, ajustadas as condições emergentes às considerações que regem a conduta normal dos negócios humanos. É a inobservância das normas que nos ordenam operar com atenção, capacidade, solicitude e discernimento.”

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24

é agir com desleixo e sendo a imprudência23 a forma de agir precipitadamente, com

falta de cuidados. Embora a responsabilidade civil tenha sido tradicionalmente

construída no conceito da culpa, o jurista moderno convenceu-se que ela não basta

por si só, é necessário recorrer a outros meios técnicos, aceitando que o dano pode

também ser reparado sem o fundamento de culpa.

Dessa forma, existem então duas teorias que justificam a responsabilidade

civil: a teoria objetiva e a teoria subjetiva.

A teoria objetiva (teoria do risco) é aquela que não exige a prova de culpa do

agente causador do ano, bastando provar o dano e o nexo de causalidade para

existir a obrigação de reparar. Por sua vez, a teoria subjetiva se fundamenta na

existência da culpa do agente, sendo essa necessária para a materialização do dano

e para que surja o dever de indenizar.

Na responsabilidade subjetiva o Código Civil de 2002, em seu art.186,

manteve a culpa como pressuposto necessário do dano indenizável, sendo a palavra

culpa aqui empregada em sentido amplo, lato sensu, para abranger não só a culpa

strictu sensu, em sentido estrito, como o dolo também. Vem inserida no art. 186:

“Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar

direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”

Logo, para que se configure o ato ilícito, ou seja, o ato praticado em

desacordo com a ordem jurídica, violando o direito subjetivo individual, é necessário

que haja a concorrência do fato lesivo voluntário, causado pelo agente, por ação ou

omissão voluntária, negligência ou imprudência, a ocorrência de um dano material,

23

DIAS, José de Aguiar, op. cit. p. 149: “Consiste a imprudência da precipitação , no procedimento inconsiderado, sem cautela, em contradição com as normas do procedimento sensato. É a afoiteza no agir, o desprezo das cautelas que devemos tomar em nossos atos.”

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25

também chamado de patrimonial, ou moral, também denominado de extrapatrimonial

e o nexo de causalidade entre o dano e o comportamento do agente. Existindo

esses requisitos a responsabilidade é caracterizada como subjetiva.

Na responsabilidade objetiva, ou do risco, aquele que, através de sua

atividade, criar um risco de dano para terceiros deverá ser obrigado a repará-lo,

ainda que sua atividade e/ou o seu comportamento sejam isentos de culpa. A

situação deverá ser examinada e se for verificada a relação de causa e efeito entre o

comportamento do agente e o dano experimentado pela vítima, esta terá direito de

ser indenizada por aquele.24

Assim como determina o artigo 927, do Código Civil a respeito da

responsabilidade objetiva:

Art. 927- Aquele que, por ato ilícito (art. 186 e 187) causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

A adoção da responsabilidade objetiva na reparação de determinados danos

surgiu do fato da teoria baseada na apuração de culpa mostrar-se insuficiente na

indenização de determinados prejuízos decorrentes da vida moderna. No

entendimento de DIAS,

(...) não importa que a culpa conserve a primazia, como fonte da responsabilidade civil, por ser seu caso mais freqüente. O risco não pode ser repelido, porque a culpa muitas vezes é, sob pena de sancionar-se uma injustiça, insuficiente como geradora da responsabilidade civil.

25

24

RODRIGUES Silvio, op. cit. p. 11. 25

DIAS José de Aguiar. Da responsabilidade Civil. 11 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 22-23.

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26

Diante disto, a teoria da necessidade da prova da culpa, para a obrigação de

indenizar, mostra-se ineficaz ao tentar proteger determinados direitos, surgindo a

responsabilidade objetiva para que o patrimônio, ou até mesmo o bem maior da

vida, não sejam prejudicados.

Ademais, a responsabilidade estabelecida no Código de Defesa do

Consumidor é objetiva, fundada no dever de segurança do fornecedor em relação

aos produtos e serviços lançados no mercado de consumo, razão pela qual não

seria demasiado afirmar que, a partir dele, a responsabilidade objetiva, que era

exceção em nosso Direito, passou a ter um campo de incidência mais vasto do que

a própria responsabilidade subjetiva.

Completa CAVALIERI FILHO:

É possível dizer que o Código de Defesa do Consumidor trouxe a lume uma nova área da responsabilidade civil - a responsabilidade nas relações de consumo- tão vasta que não haveria nenhum exagero em dizer estar hoje a responsabilidade civil dividida em duas partes: a responsabilidade tradicional e a responsabilidade nas relações de consumo.

26

Deste modo, por ser tão relevante o tema da responsabilidade civil nas

relações de consumo, esse será visto de forma mais abrangente com o

desenvolvimento do estudo, especificamente em relação ao médico.

26

CAVALIERI FILHO, Sergio, op. cit. p. 17.

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27

1.4 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL

Quem infringe dever jurídico lato sensu, o qual possa resultar dano a outrem

fica obrigado a indenizar. Nesse sentido, CAVALIERI FILHO pontua:

Esse dever, passível de violação, pode ter como fonte de relação jurídica obrigacional preexistente, isto é, um dever oriundo de contrato, ou, por outro lado, pode ter por causa geradora uma obrigação imposta por preceito geral de Direito, ou pela própria lei.

27

Assim a distinção entre responsabilidade contratual e extracontratual é

importante para que possamos diferenciá-las no caso concreto. Como por exemplo,

quando um profissional não cumpre com o que foi ajustado no contrato, é uma forma

de contrato não adimplido, ou seja, um inadimplemento contratual, que acarreta a

responsabilidade de indenizar as perdas e danos, pois é aquela que decorre da

violação de obrigação disposta em um negócio jurídico, conforme o art. 389 do

Código Civil nos mostra:

“Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e

danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente

estabelecidos, e honorários de advogado.”

Para HENRI e LÉON MAZEAUD:

Na hipótese de responsabilidade contratual, antes de a obrigação de indenizar emergir, existe, entre o inadimplemento e seu co-contratante, um vínculo jurídico derivado da convenção; na hipótese da responsabilidade aquiliana, nenhum liame jurídico existe entre o agente causador do dano e a vítima até que o ato daquele ponha em ação os princípios geradores de sua obrigação de indenizar.

28

27

CAVALIERI FILHO, Sergio, op. cit. p. 15. 28

HENRI e LÉON MAZEAUD apud RODRIGUES, Silvio, op. cit. p. 9.

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28

Já quando não deriva de contrato é chamada de responsabilidade

extracontratual, ou seja, aquela que decorre diretamente da lei, sendo regida pelo

disposto no art. 186 do Código Civil que assim pontua “Aquele que, por ação ou

omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a

outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” Deste modo é derivada

de ilícito extracontratual e é também chamada de aquiliana, ou seja, a da Teoria

Aquiliana.

A responsabilidade contratual, portanto é aquela que decorre da violação de

obrigação disposta em um negócio jurídico, já a responsabilidade extracontratual é

decorrente diretamente da lei.

Segundo Carlos Roberto Gonçalves:

Na responsabilidade extracontratual, o agente infringe um dever legal, e, na contratual, descumpre o avençado, tornando-se inadimplente. Nesta, existe uma convenção prévia entre as partes que não é cumprida. Na responsabilidade extracontratual nenhum vínculo jurídico existe entre a vítima e o causador do dano, quando este pratica ato ilícito.

29

Na responsabilidade contratual, em matéria de prova, por exemplo, quando

é demonstrado pelo credor que a prestação foi descumprida, o onus probandi se

transfere para o devedor inadimplente, que terá que ressaltar a inexistência de culpa

de sua parte, ou a presença de força maior, caso fortuito, ou ainda outra excludente

da responsabilidade capaz de eximi-lo do dever de indenizar, enquanto, se a

responsabilidade for aquiliana, caberá à vítima o encargo de demonstrar a culpa do

agente causador do dano. 30

29

GONÇALVES, Carlos Roberto, op. cit. p. 26. 30

RODRIGUES Silvio. Direito Civil Vol. 4. Responsabilidade Civil- 20 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 10.

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29

O Código Civil distinguiu essas duas espécies de responsabilidade,

disciplinando genericamente a responsabilidade extracontratual nos artigos 186 a

188 e 927 a 954; e a contratual nos artigos 389 e seguintes.

Destarte, acrescenta MIRAGEM:

No caso da obrigação contratual, de regra presume-se a culpa do devedor na hipótese de inadimplemento. Já no caso da obrigação extracontratual, a realização de um dano, ao mesmo tempo em que exige a demonstração de sua relação causal com a conduta do titular do dever (que pode ser um dever genérico de não lesar), cabe, em regra demonstrar a existência de culpa. (...) O caráter obrigatório destes independe da existência ou não de previsão contratual expressa, mas simplesmente dos deveres de colaboração, lealdade e respeito decorrentes da boa- fé.(...) a responsabilidade profissional pressupõe, em geral, a existência de um dever de perícia, cuja violação, dando causa a dano, enseja no dever de indenizar.

31

Ademais, como enfatiza Ruy Rosado de Aguiar Jr.:

A diferença fundamental entre essas duas modalidades de responsabilidade está na carga da prova atribuída às partes: na responsabilidade contratual, ao autor da ação, lesado pelo descumprimento, basta provar a existência do contrato, o fato do inadimplemento e o dano, com o nexo de causalidade, incumbindo ao réu demonstrar que o dano decorreu de uma causa estranha a ele; na responsabilidade extracontratual ou delitual, o autor da ação deve provar, ainda, a imprudência, negligência ou imperícia do causador do dano(culpa), isentando-se o réu de responder pela indenização se o autor não se desincumbir desse ônus.

32

Com relação a essa dualidade de tratamento da responsabilidade civil

existem manifestações de duas correntes de pensamento. A primeira adota a tese

dualista33, que defende a diferença entre as duas espécies de responsabilidade,

exigindo regulamentação própria para cada uma e a segunda adota a teoria unitária

31

MIRAGEM, Bruno. Responsabilidade Civil Médica no Direito Brasileiro. Revista de Direito do Consumidor 2007 – RDC 63. p. 60-61. 32

AGUIAR JR, Ruy Rosado de apud STOCO, Rui, op.cit. p. 570. 33

São adeptos a essa Teoria Orlando Gomes e Washington de Barros Monteiro.

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30

ou monista 34 , que entende que pouco importam os aspectos sob os quais se

apresente a responsabilidade civil no cenário jurídico, pois os seus efeitos são

uniformes, completa Aguiar Dias:

[...] de fato basicamente as soluções são idênticas para os dois aspectos. Tanto em um como em outro caso, o que se requer, em essência, para a configuração de responsabilidade são estas três condições: o dano, o ato ilícito e nexo de causalidade, isto é, nexo de causa e efeito entre os primeiros elementos.

35

Contudo, nos códigos dos países em geral, inclusive no Brasil, tem sido

acolhida a tese dualista ou clássica.

Por sua vez, o Código de Defesa do Consumidor superou essa clássica

distinção entre responsabilidade contratual e extracontratual, pois as coloca num

único patamar, equiparando o consumidor a todas as vítimas do acidente de

consumo e submetendo- o a um mesmo tratamento, tendo como fundamento dessa

responsabilidade a violação do dever de segurança por parte deste,

responsabilizando-o pelo serviço lançado no mercado, sendo extracontratual ou

contratual, se este deu causa a um acidente de consumo.

34

São adeptos a essa Teoria Carlos Roberto Gonçalves e José de Aguiar Dias. 35

José de Aguiar Dias apud GONÇALVES, Carlos Roberto, op.cit. p. 27.

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31

2 RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO PROFISSIONAL LIBERAL

2.1 CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

Em decorrência das transformações socioeconômicas provenientes da

ampliação dos interesses da coletividade e o aumento significativo dos produtos e

serviços oferecidos no mercado de consumo, tornou-se obrigatória uma nova

concepção do profissional liberal.36 Porquanto, se antigamente o médico de família,

o experiente clínico geral, o então amigo e conselheiro, era muito requisitado,

atualmente ele desapareceu, pois veio sofrendo grandes pressões sociais, completa

VENOSA: “hoje, o médico, mesmo em pequenas comunidades, deve participar de

clínica, hospital, entidade associativa pública ou privada, convênio; na maioria das

vezes, em múltiplas atividades concomitantemente.”37 Sendo poucos os que mantêm

uma atividade singular, devendo cada qual se adaptar ao meio em que se

encontram, pois em nosso país a massa da população se encontra em uma situação

de medicina social completamente ineficaz, assim como o profissional da medicina

que sofre o reflexo global dos nossos problemas, teve de ser tratado de uma forma

específica para se adequar à modernidade.

Desta forma, nos dias de hoje, o médico se encaixa na definição do

profissional liberal, que é aquele que exerce uma atividade remunerada, ausente de

qualquer vinculação hierárquica perante aquele que o remunera. Assim, o médico

36

LISBOA, Roberto Senise, Responsabilidade Civil nas Relações de Consumo. 2 ed.rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. p. 288. 37

VENOSA, Sílvio de Salvo, op. cit. p. 89.

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32

passa a ser um agente importante para o auxílio dos interesses da sociedade,

devendo agir com profissionalismo e cautela em seus atos.

2.2 NATUREZA CONTRATUAL DA RESPONSABILIDADE MÉDICA

Apesar do Código Civil Brasileiro ter situado a responsabilidade médica

dentre os atos ilícitos, não há motivos de controvérsias em caracterizar a

responsabilidade como ex contractu.38 Pois a responsabilidade civil do médico é tida

como contratual, como completa AGUIAR DIAS: “Ora, a natureza contratual da

responsabilidade médica não nos parece hoje objeto de dúvida. (...) Acreditamos,

pois, que a responsabilidade do médico é contratual, não obstante sua colocação no

capítulo dos atos ilícitos”. 39

O nosso Código Civil esclarece a respeito dessa modalidade em seu art.

951:

O disposto nos arts. 948, 949 e 95040

aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.

38

KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 6 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 74. 39

AGUIAR DIAS, op. cit. p. 329. 40

Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações: I - no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família; II - na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima. Art. 949. No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do

tratamento e dos lucros cessantes até ao fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido. Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou

profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.

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33

Entretanto, logicamente que em alguns casos a responsabilidade do médico

se torna extracontratual, por se tratar de circunstâncias da vida, por exemplo, uma

pessoa doente necessita do auxílio do médico e não possui um contrato estipulado

anteriormente. Assim como esclarece Ruy Rosado de Aguiar Jr., sobre esse ponto:

Devemos admitir, para o plano expositivo, que a responsabilidade médica não obedece a um sistema unitário. Ela pode ser contratual, derivada de um contrato estabelecido livremente entre paciente e profissional, a maioria das vezes de forma tácita, e compreende as relações restritas ao âmbito da medicina privada, isto é, do profissional que é livremente escolhido, contratado e pago pelo cliente. Será extracontratual quando, não existindo o contrato, as circunstâncias da vida colocam frente a frente médico e doente, incumbindo àquele o dever de prestar assistência, como acontece no encontro de um ferido em plena via pública, ou na emergência de intervenção em favor de incapaz por idade ou doença mental. Será igualmente extracontratual a relação da qual participa o médico servidor público, que atende em instituição obrigada a receber os segurados dos institutos da saúde pública, e também o médico contratado pela empresa para prestar assistência a seus empregados. Nestes últimos casos, o atendimento é obrigatório, pressupondo uma relação primária de Direito Administrativo ou de Direito civil entre o médico e a empresa ou o hospital público, e uma outra entre o empregado com a empresa, ou entre o segurado com a instituição de seguridade, mas não há contrato entre o médico e o paciente. .(Jean Penneau, Lá reforme...cit., p.528; Markesinis, Basil. Problèmes de responsabilité médicale em droit anglais. Revue Internationale de Droit Comparé, 1988, n. 2, § 351- 367)

41

Deste modo, como já dito anteriormente, inexiste diferença significativa entre

as duas modalidades, pois se houver culpa, a obrigação de indenizar é devida.

Acrescenta VENOSA:

Contudo, existindo contrato, é no âmbito de seus limites que será apurado o inadimplemento total ou descumprimento, ou inadimplemento parcial ou mora. Se não há contrato e a culpa emerge de um dever de conduta, é nessa ação do agente que a culpa deve ser aferida.

42

41

Ruy Rosado de Aguiar Jr. apud STOCO, Rui, op.cit. p. 569. 42

VENOSA, Sílvio de Salvo, op.cit. p. 95.

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34

Assim, não importa se houve ou não um contrato prévio, o dever de agir com

perícia é próprio da função da atividade profissional do médico.

Por fim, insta ressaltar assim como leciona Gustavo Tepedino, que “em

qualquer circunstância e acima de qualquer outro interesse - pecuniário, profissional

ou mesmo científico - deve o médico zelar pela integridade psicofísica do paciente e

por sua dignidade, expressão da tutela constitucional incluída no rol dos

fundamentos da República (art. 1°, III, CF/88 ).”43

2.3 OBRIGAÇÃO DE MEIO E OBRIGAÇÃO DE RESULTADO

A distinção das obrigações como obrigação de meio ou obrigação de

resultado, se deve a René Demongue, “segundo o qual a diferença se justifica no

tocante à espécie de prestação e, em conseqüência, às espécies devidas pelas

partes.” 44

Existe então, a obrigação de meio, que é quando a própria prestação não

exige mais nada do devedor, não há um comprometimento do devedor com a

obtenção de um fim específico, de alcançar ou realizar um determinado resultado,

no entanto, faz o possível para realizá-lo, mas não se compromete com o resultado

final e com a satisfação específica do interesse do credor, mas o ônus da prova fica

incumbido ao credor, salvo os casos em que for possível a sua inversão (art. 6°, VIII,

Lei 8.078/90).

Já na obrigação de resultado existe um comprometimento, o devedor se

obriga a alcançar um determinado fim, um determinado objeto que satisfaça o

43

Gustavo Tepedino apud MIRAGEM, Bruno, op. cit. p. 61. 44

René Demongue apud MIRAGEM, Bruno, op. cit. p. 58.

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35

interesse do credor com o cumprimento da prestação, que se não for realizado, não

terá cumprido com o seu dever, com a sua obrigação, devendo necessariamente

atingir o resultado acordado anteriormente com o credor, liberando o consumidor do

ônus da prova, do elemento subjetivo, provando assim que agiu de forma prudente e

diligente, sendo somente afastada essa responsabilidade em caso fortuito ou força

maior, ou seja, as excludentes da responsabilidade civil subjetiva.45

Acrescenta VENOSA:

Assim como a obrigação assumida pelo advogado no patrocínio da causa, como regra geral é de meio e não de resultado assim também a contraída pelo médico em relação à terapia e tratamento do enfermo. O médico obriga-se a empregar toda a técnica, diligência e perícia, seus conhecimentos, da melhor forma, com honradez e perspicácia, na tentativa de cura, lenitivo ou minoração dos males do paciente. Não pode garantir a cura, mesmo porque vida e morte são valores que pertencem à esferas espirituais. Vezes haverá, no entanto, em que a obrigação médica ou paramédica será de resultado, como na cirurgia plástica e em procedimentos técnicos de exame laboratorial e outros, tais como

radiografias, tomografias, ressonâncias magnéticas, etc. 46

Ruy Rosado de Aguiar Jr. distingue essas obrigações com exatidão da

seguinte maneira:

A obrigação é de meios quando o profissional assume prestar um serviço ao qual dedicará atenção, cuidado e diligência exigidos pelas circunstâncias, de acordo com o seu título, com os recursos de que dispõe e com o desenvolvimento atual da ciência, sem se comprometer com a obtenção de um certo resultado. A obrigação será de resultado quando o devedor se comprometer a realizar um certo fim, como, por exemplo, transportar uma carga de um lugar a outro, ou consertar e pôr em funcionamento uma certa máquina(será de garantia, se, além disso, ainda afirmar que o maquinário atingirá uma

determinada produtividade). 47

Sendo a obrigação de resultado, basta ao lesado demonstrar, além da existência do contrato, a não obtenção do resultado prometido, pois isso basta para caracterizar o descumprimento do contrato, independentemente

45

MIRAGEM, Bruno, op.cit. p. 58 e KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 6 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 293. 46

VENOSA, Sílvio de Salvo, op. cit. p. 90-91. 47

Ruy Rosado de Aguiar Jr. apud STOCO, Rui, op.cit. p. 481.

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36

de suas razões, cabendo ao devedor provar o caso fortuito ou a força maior, quando se exonerará da responsabilidade.

Atualmente a maioria dos doutrinadores e jurisprudências tem entendido que

a obrigação médica é uma obrigação de meio, em virtude do risco em qualquer

intervenção cirúrgica, devido às particularidades do organismo de cada paciente, da

maneira como cada corpo reage às intervenções médicas. No entanto, as cirurgias

plásticas vêm sendo consideradas como obrigação de resultado, pois aqui existe o

interesse do credor, que espera da cirurgia estética ou reparadora um resultado que

foi acordado anteriormente.48

48

CIVIL E PROCESSUAL - CIRURGIA ESTÉTICA OU PLÁSTICA - OBRIGAÇÃO DE RESULTADO (RESPONSABILIDADE CONTRATUAL OU OBJETIVA) - INDENIZAÇÃO - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. I - Contratada a realização da cirurgia estética embelezadora, o cirurgião assume obrigação de resultado (Responsabilidade contratual ou objetiva), devendo indenizar pelo não cumprimento da mesma, decorrente de eventual deformidade ou de alguma irregularidade. II - Cabível a inversão do ônus da prova. III - Recurso conhecido e provido. (STJ- 3° T.-REsp 81101/PR RECURSO ESPECIAL 1995/0063170-9,-Rel. WALDEMAR ZVEITER- j. 13/04/1999- DJ 31/05/1999 p.140 LEXSTJ vol.123 p.155 RSTJ vol. 119 p. 290) RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. ART. 14 DO CDC. CIRURGIA PLÁSTICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. CASO FORTUITO. EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE.

1. Os procedimentos cirúrgicos de fins meramente estéticos caracterizam verdadeira obrigação de resultado, pois neles o cirurgião assume verdadeiro compromisso pelo efeito embelezador prometido. 2. Nas obrigações de resultado, a responsabilidade do profissional da medicina permanece subjetiva. Cumpre ao médico, contudo, demonstrar que os eventos danosos decorreram de fatores externos e alheios à sua atuação durante a cirurgia. 3. Apesar de não prevista expressamente no CDC, a eximente de caso fortuito possui força liberatória e exclui a responsabilidade do cirurgião plástico, pois rompe o nexo de causalidade entre o dano apontado pelo paciente e o serviço prestado pelo profissional. 4. Age com cautela e conforme os ditames da boa-fé objetiva o médico que colhe a assinatura do paciente em “termo de consentimento informado”, de maneira a alertá-lo acerca de eventuais problemas que possam surgir durante o pós-operatório. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. (STJ- 3ª T.- REsp 1180815/MG RECURSO ESPECIAL 2010/0025531-0- Rel.NANCY ANDRIGHI- j. 19/08/2010- DJe 26/08/2010 RB vol.563 p.29 RT vol. 903 p. 196) RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - DANOS MORAIS E MATERIAIS - CIRURGIA DE VASECTOMIA - SUPOSTO ERRO MÉDICO - RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA - OBRIGAÇÃO DE MEIO - PRECEDENTES - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE IMPRUDÊNCIA NA CONDUTA DO PROFISSIONAL - CUMPRIMENTO DO DEVER DE INFORMAÇÃO - ENTENDIMENTO OBTIDO DA ANÁLISE DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO - REEXAME DE PROVAS - IMPOSSIBILIDADE - ÓBICE DO ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ - RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO.

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Posto isto, vê-se que as obrigações de meio e de resultado aplicam-se, em

regra, às relações contratuais entre o particular e os profissionais ou prestadores de

serviços, podendo assim ser plenamente aplicada aos profissionais liberais, os quais

terão a responsabilidade pessoal, mediante a comprovação de culpa, conforme o

art. 14, § 4° 49, do CDC.50

2.4 RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO

No contexto das relações entre médicos e pacientes, merece destaque a

questão atinente a responsabilidade civil do médico, a qual decorre do

descumprimento de um dever, que pode ser tanto um dever de cuidado, de cautela,

como um dever de diagnóstico, de informação. 51

Neste sentido, o estudo em questão examinará a responsabilidade médica,

no direito brasileiro, dando ênfase, no capítulo seguinte, à temática sob a

I - A relação entre médico e paciente é contratual, e encerra, de modo geral (salvo cirurgias plásticas embelezadoras), obrigação de meio, e não de resultado. II - Em razão disso, no caso da ineficácia porventura decorrente da ação do médico, imprescindível se apresenta a demonstração de culpa do profissional, sendo descabida presumi-la à guisa de responsabilidade objetiva; III - Estando comprovado perante as instâncias ordinárias o cumprimento do dever de informação ao paciente e a ausência de negligência na conduta do profissional, a revisão de tal entendimento implicaria reexame do material fático-probatório, providência inadmissível nesta instância extraordinária (Enunciado n. 7/STJ); IV - Recurso especial não conhecido.(STJ- 3ª T.- REsp 1051674/RS RECURSO ESPECIAL 2008/0087259-0- Rel. MASSAMI UYEDA- j. 03/02/2009- DJe 24/04/2009) 49

Art. 14 - O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. § 4º - A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa. 50

STOCO, Rui, op. cit. p. 482. 51

MIRAGEM, Bruno, op. cit. p. 54.

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perspectiva do Código de Defesa do Consumidor. Antes, porém, importa verificar as

hipóteses em que se configuram a culpa e o dano médicos.

2.5 CULPA MÉDICA

O profissional da medicina, assim como outros profissionais, deve utilizar

todo o seu conhecimento para que possa exercer a profissão de modo satisfatório,

e, além disso, exercê-la com cautela, perícia e eficiência. Contudo, lhe é exigido

uma conduta mais rígida, pois a sua profissão está intimamente ligada ao maior bem

do ser humano, o bem da vida.52

No entanto, em relação à imputação da culpa, o direito não aduz ao médico

um tratamento diferenciado, ou seja, a culpa médica acompanha os mesmo critérios

de verificação da culpa, de maneira genérica, podendo variar as suas classificações

de acordo com o modo como manifesta ou por quem foi praticada. Deste modo, a

responsabilização se dá através da comprovação de culpa, ou seja, se aquele ato

gerou conseqüências danosas a outrem, o mesmo tem o dever e a obrigação de

indenizar o lesado. 53 Portanto, para que a culpa fique caracterizada é necessária a

52

Jurandir Sebastião apud DIAS, José de Aguiar. op. cit. p.332: “Sem dúvida que o exercício da Medicina envolve, como regra geral, contrato de meios. Mas [...] por contrato de meios, em Medicina, há que se compreender o dever de empenho técnico adequado e satisfatório por parte do médico, tal como expresso, dentre outros, nos artigos 2°, 5°, 14, 27 e 57 do Código de Ética Médica.

52 Quando o

empenho não é adequado tecnicamente, o paciente recebe menos do que devia. A questão é muito simples: quem procura o médico não o faz para receber o melhor desse profissional, mas sim, para receber o melhor da Medicina. Quando o médico deixa de aplicar ao paciente o melhor da Ciência Médica (por desídia profissional ou por omissão no acompanhamento da Ciência), estará prestando serviços de qualidade inferior, deixando de dar ao paciente o melhor. Com isso poderá retardar a sua cura, quando, por exemplo, diagnostica corretamente a doença em tempo oportuno, decorrendo, por isso, o agravamento ou consolidação de situação crônica.”

53 GIOSTRI, Hildegard Taggesell. Erro Médico à luz da Jurisprudência comentada, 1 ed. 2 tir. Curitiba:

Editora Juruá, 2002. p. 38-39.

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simples voluntariedade da conduta e que a mesma seja contrastante com as normas

impostas pela prudência ou perícia comuns.54

É importante analisar no momento de atribuição da culpa, se o evento

danoso realmente ocorreu de uma intervenção médica ou foi decorrente de

eventuais complicações provenientes do próprio organismo do indivíduo. Essa

distinção possui uma importância significativa na imputação da responsabilidade

médica, apesar de ser de difícil análise por parte do julgador.

Alguns dos principais obstáculos para a verificação da culpa são apontados

por GIOSTRI, os quais são: a natureza confidencial das relações médico-paciente, o

silêncio por parte daqueles que presenciaram ou que participaram do ato médico e o

aspecto técnico da culpa médica.55 Sem dúvida, é custoso ao paciente provar o que

de fato ocorreu no consultório médico, visto que o sigilo profissional da equipe

médica e do médico para com o paciente deve ser respeitado e desta forma, torna

mais difícil a comprovação do que realmente ocorreu. E, além disso, ainda há a

questão do aspecto técnico da culpa médica, por se tratar de outro profissional da

saúde que irá fazer o laudo pericial, há de se questionar sobre esse aspecto, visto

que pode prejudicar, e muito na averiguação da prova da culpa do médico.56

Portanto, para aferir a culpa médica devemos nos atentar a advertência que

o Des. Nogueira Garcez nos traz, afirmando que “Este é uma caso delicado, de

difícil solução por envolver questões relativas à ciência e arte médicas, em que o

54

Enrico Altavilla apud KFOURI NETO, Miguel, op. cit. p.75. 55

GIOSTRI, Hildegard Taggesell, op. cit. p. 40. 56

GIOSTRI, Hildegard Taggesell, op. cit. p. 41.

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magistrado, como leigo, há de se apoiar nos dados de comum experiência, sem se

esquecer, porém, do conselho dos entendidos”.57

Neste sentido, DIAS entende que para a apuração dessa responsabilidade é

necessário atender a certas normas:

a) a prova pode ser feita por testemunhas, quando não haja questão técnica a elucidar; caso contrário, será incivil admiti-la, dada a ignorância da testemunha leiga com relação aos assuntos médicos. Por outro lado, sendo a perícia o caminho naturalmente indicado ao julgador, é necessário que se encare esse meio de prova prudentemente, atenta a possibilidade de opinar o perito, por espírito de classe, favoravelmente ao colega em falta; b) é indispensável estabelecer relação de causa e efeito entre o dano e a falta do médico, que acarreta responsabilidade ainda quando o nexo de causalidade seja mediato.

58

Isto é, ao julgador cabe analisar os meios de prova, para que possa

estabelecer conexão entre a causa do dano e ato praticado pelo profissional da

saúde, que ensejará na responsabilização do mesmo.

Neste contexto, completa KFOURI:

O julgador deve ampliar seus limites ao examinar o conjunto probatório. Os laudos periciais, muitas vezes eivados de um censurável espírito de corpo, hão que ser analisados com objetividade, devendo o juiz- muito mais que em qualquer outra situação posta sob julgamento- avaliar os fatos de modo singelo, através da ótica da causalidade, mas sem deixar envolver pelo excessivo tecnicismo de prova.

59

Logo, cabe ao magistrado avaliar e sopesar as questões inerentes a culpa

do profissional da saúde. Devendo analisar a prova pericial que foi trazida ao caso e

aí então tirar as suas conclusões, reunindo outros dados do processo e julgando

57

Des. Nogueira Garcez, RJTJSP- Lex 76/2011, apud KFOURI NETO, Miguel, op.cit. p. 80 58

DIAS, José de Aguiar, op. cit. p. 334. 59

KFOURI NETO, Miguel, op. cit. p. 81.

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como entender correto, pois o juiz poderá desprezar as conclusões da perícia, de

acordo com o Princípio da Livre convicção do juiz, pois ele é o peritus peritorum.

Não obstante isso é importante ressaltar, entretanto, que aqui não nos

importa saber qual foi o grau da culpa, se caso existir, só servirá para determinar o

quantum indenizatório devido. Como diria KFOURI NETO, “Não é preciso que a

culpa do médico seja grave, basta que seja certa.” 60 Essa rispidez é ainda maior no

que concerne aos médicos especialistas, pois como ensina Angela R. Holder a

respeito do médico

que diz ter conhecimento e habilidade especiais para o tratamento de um órgão ou doença ou ferimentos específicos, é exigido desempenhar seu dever para com o paciente, empregando, como tal especialista, não meramente o grau normal de habilidade possuído pelos praticantes em geral, mas aquele grau especial de habilidade e cuidado que os médicos de igual posição, que dedicam especial estudo e atenção ao tratamento de tal órgão, doença ou ferimento, normalmente possuem, considerando-se o estágio do conhecimento científico àquele tempo.

61

Pois o médico tem o dever, a obrigação de prestar os seus serviços de

acordo com as normas e os métodos inerentes à sua profissão.

No mesmo raciocínio, Sourdat ponderava que:

Hoje em dia ninguém contesta, em tese, a responsabilidade do médico pelos danos que, por ato culposo seu, resultam para o cliente. Assim, se age com culpa, se por uma imprudência ou negligência manifestas resulta em prejuízo para o seu cliente, tem este contra ele a ação para exigir perdas e danos.

62

60

KFOURI NETO, Miguel, op. cit. p. 82. 61

Angela R. Holder apud GONÇALVES, Carlos Roberto, op. cit. p. 240-241. 62

Sourdat apud STOCO, Rui, op.cit. p. 585.

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Afinal, se for comprovada a existência de imperícia, imprudência,

negligência por parte do profissional da medicina, terá este procedido em culpa63 e

será obrigado a indenizar a vítima.64

2.5.1 Erro Médico

Os erros são comuns nos procedimentos que envolvem a responsabilização

por culpa médica, assim iremos destacar os mais importantes adiante, para melhor

entendimento do estudo em questão.

Pois bem, o erro médico se dá quando o médico possui um objetivo, no

entanto, não consegue alcançá-lo por má execução do ato médico, causando dano a

outrem por ter agido ou por não ter agido da forma que lhe exigia no momento do

ato. Isto é, verifica-se erro médico quando a técnica é correta e adequada, mas a

conduta ou atuação do médico é incorreta ou desastrosa, ou seja, o profissional não

atuou como deveria, aplicando de maneira mal feita uma técnica considerada boa.65

63

RESPONSABILIDADE CIVIL – Dano moral – Cirurgia – Culpa.

Ao médico cumpre o dever de instruir o cliente quanto aos riscos de intervenção cirúrgica a que será submetido, bem como proceder ao devido acompanhamento pré e pós-operatório, sob pena de responder civilmente na hipótese de insucesso do tratamento realizado. A evolução do processo infeccioso com a consequente perda do membro, proveniente de cirurgia realizada sem a observância de medidas indispensáveis ao restabelecimento do paciente, caracterizam a conduta culposa do médico, a acarretar-lhe responsabilidade indenizatória. Em caso de internação de paciente para tratamento de enfermidade decorrente de cirurgia anteriormente realizada, impõe-se ao médico que o assistiu comunicar à instituição hospitalar seu real estado de saúde, por meio de relatório, de modo a possibilitar-lhe diagnóstico da doença em tempo hábil, impedindo seu agravamento (TAMG, AC 180.069-5, Rel. Juíza Jurema Brasil Marins, RF 331/283)- grifo nosso. 64

Médico - responsabilidade civil - Quando ocorre - Ação improcedente. A responsabilidade civil dos médicos somente decorre de culpa provada, constituindo espécie particular de culpa. Não resultando provadas a imperícia, a imprudência e a negligência, nem o erro grosseiro, fica afastada a possibilidade de culpa dos doutores em Medicina, em virtude mesmo da presunção de capacidade constituída pelo diploma obtido após as provas regulamentares. (TJRJ- Ementa. Ap. Cív. nº 17.613. Relator: Des. Felisberto Ribeiro. 20 ago.1981. In RT. São Paulo, v. 558, p. 178-80, abr.1982)- grifo nosso. apud STOCO, Rui. op. cit. p. 565. 65

STOCO, Rui, op. cit. p. 590.

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Leciona GIOSTRI, que “o erro médico pode, então, ser entendido como uma

falha no exercício da profissão, do que advém um mau resultado ou um resultado

adverso, efetivando-se através da ação ou da omissão do profissional.” 66

Os meios de prova para a análise do erro médico são: o depoimento pessoal

do médico (no qual pode haver confissão por parte desse); inquirição de

testemunhas; prova documental; informes (notícias divulgadas pela imprensa por

exemplo); inspeção judicial; presunções; prova pericial; a convicção e o

convencimento do juiz.67

Posto isto, cabe ao magistrado analisar o ato médico e todos os meios de

prova, considerando os pressupostos da responsabilização, sendo eles, a culpa, o

dano e o nexo causal, levando em conta situações análogas e o senso comum.

2.5.2 Erro de diagnóstico

Esse tipo de erro acontece quando o médico não identifica ou não determina

o tratamento adequado à doença instalada, ou seja, não é preciso no diagnóstico,

propriamente dito.

Na avaliação de COSTALES, um dos momentos mais importantes na

atividade médica é o primeiro ato da análise diagnóstica que consiste na argüição do

paciente.

. O médico, para poder estabelecer qual a terapia adequada, deve investigar a natureza da enfermidade e sua gravidade. Por isso, para a obtenção de uma certeza diagnóstica, são necessárias providências preliminares, que podem ser reunidas em dois grupos: a) coleta de dados, com a averiguação

66

GIOSTRI, Hildegard Taggesell, op. cit. p. 136. 67

KFOURI NETO, Miguel, op.cit. p.86.

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de todos os sintomas pelos quais se manifeste a doença, e sua interpretação adequada; exploração completa de acordo com os sintomas apresentados, utilizando todos os meios ao seu alcance, procedimentos e instrumentos necessários (exames de laboratório, radiografias, eletrocardiogramas etc.); b) interpretação dos dados obtidos previamente, coordenando-os e relacionando-os entre si, com também comparando-os com os diversos quadros patológicos conhecidos pela ciência médica.

68

Deste modo, para um diagnóstico adequado, é necessário avaliar todo o

contexto em que o paciente se encontra, devendo o médico fazer uma investigação

do caso desde o início dos primeiros sintomas e como foram evoluindo. Resgatando

todas as informações necessárias e observando cada ponto de maneira sagaz.

Conceitua GIOSTRI:

Agirá o médico com culpa, não por ter errado o seu diagnóstico, mas por ter insistido em manter-se dentro de uma conduta não satisfatória e não adequada, não advindo daí nenhum benefício para o seu paciente e, por conta da qual, não poderá este último apresentar progresso ou melhora em sua patologia.

69

Portanto, cabe ao juiz examinar se o profissional da medicina teve culpa na

maneira como procedeu no diagnóstico70, se fez o possível para averiguar o que

afligia o paciente, se utilizou todas as técnicas e todos os meios praticáveis para

obter um exame satisfatório, e ainda, se para a doença diagnosticada foram

68

COSTALES apud KFOURI NETO, Miguel, op.cit. p.87. 69

GIOSTRI, Hildegard Taggesell, op. cit. p. 138. 70

RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO DE DIAGNÓSTICO. EXAMES RADIOLÓGICOS. DANOS MORAIS E MATERIAIS.

I - O diagnóstico inexato fornecido por laboratório radiológico levando a paciente a sofrimento que poderia ter sido evitado, dá direito à indenização. A obrigação da ré é de resultado, de natureza objetiva (art. 14 c/c o 3º do CDC). II - Danos materiais devidos, tendo em vista que as despesas efetuadas com os exames posteriores ocorreram em razão do erro cometido no primeiro exame radiológico. III - Valor dos danos morais fixados em 200 salários-mínimos, por se adequar melhor à hipótese dos autos. IV - Recurso especial conhecido e parcialmente provido. (REsp 594962 / RJ 2003/0171996-3 T3- R. ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, J. 09/11/2004)

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utilizados os remédios e tratamentos indicados pela prática da medicina. Logo, se

não o fez, se agiu com culpa, não se atentou ao cuidado necessário ao conduzir o

diagnóstico, sem dúvida será responsabilizado.71

2.6 DANO MÉDICO

Assim como a culpa o dano é, sem dúvida, como já vimos um dos

pressupostos para a responsabilização civil. Conceitua Hans Albrecht Fischer, “é

dano todo o prejuízo que o sujeito de direitos sofre através da violação dos seus

bens jurídicos” 72.

Logo, para que haja a responsabilidade médica, ressalta COSTALES, “deve

existir um dano ao paciente, de qualquer tipo ou espécie: lesão a um direito (à vida,

à integridade física, à saúde), lesão de um interesse legítimo, danos patrimoniais ou

danos morais.” 73

Desta maneira, os danos médicos possuem espécies, podendo ser físicos

(ou corporais), materiais (ou patrimoniais) ou morais. Sendo os danos físicos os que

assumem maior relevância, visto que a atividade médica é exercida sobre o corpo

humano, assim o prejuízo corporal é composto de elementos variáveis, indenizáveis

separadamente, conforma a gravidade da invalidez, que pode ser parcial ou total,

permanente ou temporária, do mesmo modo, o estado patológico do paciente, que

pode resultar agravado ou crônico, caracterizando assim o chamado dano físico.

71

KFOURI NETO, Miguel, op.cit. p.89. 72

Hans Albrecht Fischer apud REIS, Clayton. Dano Moral, 5 ed, atual. e ampl. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2010. p.73. 73

COSTALES apud KFOURI NETO, Miguel, op.cit. p.102.

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Os danos materiais (ou patrimoniais), em sua maioria, são consequência

dos danos físicos. Os quais abrangem despesas médico-hospitalares,

medicamentos, contratação de enfermeiros, viagens, lucros cessantes, ou seja, os

gastos que se tem em razão do dano causado.

A respeito dos danos morais, sendo os danos estéticos aqui inseridos, são

aqueles que causam uma dor interior, um abalo psicológico, a frustração pela

repentina cessação de uma atividade profissional, estudantil e muitas outras

situações que podem acarretar esse tipo de dano, principalmente aquelas que dizem

respeito aos direitos da personalidade. 74

Destarte, se não houver o elemento dano, não é possível caracterizar a

responsabilidade do médico e assim não há como obter o ressarcimento do prejuízo

causado, por mais severa que tenha sido a conduta do profissional da saúde.

2.6.1 Dano Estético

O dano estético é caracterizado quando ocorre uma lesão à beleza física, ao

conjunto harmônico das formas externas de alguém. Destaca Tereza Ancona Lopez

ainda, que “o conceito de belo é relativo. Ao apreciar-se um prejuízo estético deve-

se ter em mira a modificação sofrida pela pessoa em relação ao que era antes”.

Devendo considerar ainda que a lesão que deu ensejo a esse dano seja duradoura,

pois se essa não a for não teria como caracterizá-la no dano estético (dano moral),

visto que o dano moral se enquadra na ofensa a um direito de personalidade, e esse

74

KFOURI NETO, Miguel, op.cit. p.102-103.

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outro sendo reparável ou uma lesão passageira, não há porque se enquadrar nessa

definição, pois senão se encaixaria nos casos habituais de perdas e danos.75

Além disso, para Afrânio Peixoto e Alcântara Machado a aparência da lesão

é de máxima importância, sendo indispensável para a caracterização do dano

estético, pois importará o local aonde a lesão se encontra, a possibilidade de

remoção (completa ou parcial), as características pessoais da vítima (sexo, idade,

profissão, estado civil), as limitações pessoais que decorrem da irreparabilidade da

lesão (excluir-se do convívio social devido a aparência chocante da lesão), entre

outros aspectos que devem ser levados em consideração para a valoração do

quantum indenizatório.76 Logo, em nossa doutrina pátria a única pessoa legitimada à

litigar a indenização é a vítima da injúria, ou seja, a qual sofreu o dano em questão.

Insta ressaltar ainda, que quando se trata de dano moral ou estético, o

correto seria falar em compensação, ao invés de indenização, pois aqui tenta-se

restaurar o prejuízo causado, a fim de compensar o que foi modificado com a

ocorrência do dano.77

2.6.2 Dano Moral ou Extrapatrimonial

Com o advento do novo Código Civil, o artigo 186 consagrou que “aquele

que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e

causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”-grifo

nosso. Assim, estabeleceu apropriadamente a indenização por dano moral, o qual

75

Tereza Ancona Lopez apud KFOURI NETO, Miguel, op.cit. p.104. 76

Afrânio Peixoto e Alcântara Machado apud KFOURI NETO, Miguel, op.cit. p.105. 77

KFOURI NETO, Miguel, op.cit. p.105.

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anteriormente não tinha sido especificado. De tal forma que hoje o dano moral

enseja tamanha importância visto que a sua repercussão está diretamente ligada ao

bem estar da pessoa que foi violado por algum motivo. Sobre esse aspecto Wilson

Melo da Silva define o dano moral como sendo “lesões sofridas pelo sujeito físico ou

pessoa natural de direito em seu patrimônio ideal, entendendo-se por patrimônio

ideal, em contraposição ao material, o conjunto de tudo aquilo que não seja

suscetível de valor econômico”.78 Sendo, portanto, o dano que atinge o patrimônio

ideal das pessoas, ou seja, o que pode causar um sentimento negativo no seu

interior, em seu espírito, ocasionando sensações desagradáveis, provenientes das

perturbações psíquicas e/ou psicológicas, que foram originadas da agressão sofrida.

Com a instauração da dignidade da pessoa humana como direito

fundamental em nossa Carta Magna79, o dano moral passa a ser considerado como

ofensa ao princípio da dignidade da pessoa. No mesmo sentido completa Alexandre

de Morais:

A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida, e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo o estatuto jurídico deve assegurar, de modo que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos. O direito à vida privada, à intimidade, à honra, à imagem, entre os outros, aparece como consequência da consagração da dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil.

80

78

Wilson Melo da Silva apud REIS, Clayton, op. cit. p. 8. 79

Art. 1º- A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III - a dignidade da pessoa humana (Constituição da República Federativa do Brasil. Título I- Dos Princípios Fundamentais) 80

Alexandre de Morais apud REIS, Clayton, op. cit. p. 10.

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Isto é, se a dignidade de alguém for violada, se houver uma ofensa em seus

direitos, assim como preceitua o artigo 5°, incisos V e X da CF/ 198881, o lesado

poderá responsabilizar o ofensor pelos devidos danos morais que lhe forem

causados. Posto isso, vê-se que a ordem jurídica não tutela o dano em si, mas sim

as conseqüências decorrentes das ofensas aos direitos fundamentais do indivíduo.

Desta forma, o magistrado deverá dar importância ao sofrimento que o indivíduo

passou, as dores mais profundas que suportou, os aborrecimentos que teve de

agüentar em decorrência dos atos ilícitos praticados pelo ofensor, para a partir daí

fixar o quantum indenizatório que será devido.82

Segundo os ensinamentos de Carlos Alberto de Menezes Direito e Sérgio

Cavalieri Filho, citando Ruy Rosado de Aguiar, completam:

Deve o juiz expressar na fixação da indenização, aquilo que corresponda a uma idéia de justiça da consciência média, que está presente na sua comunidade e será, portanto, sempre um juízo fundamentado, que explica as razões pelas quais está chegando àquela conclusão.

83

Destarte, cabe ao magistrado 84 fixar o quantum da reparação pleiteada,

aplicando sempre a razoabilidade e a equidade para a quantificação da indenização

81

Art. 5º- Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;- grifo nosso (Constituição da República Federativa do Brasil. Título II- Dos Direitos e Garantias Fundamentais Capítulo I- Dos Direitos e deveres individuais e coletivos) 82

REIS, Clayton, op. cit. p. 12. 83

Carlos Alberto de Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho apud REIS, Clayton, op. cit. p. 251. 84

DANOS MORAL E ESTÉTICO. FIXAÇÃO DO QUANTUM DEBEATUR. PRUDENTE ARBITRAMENTO DO JUIZ. Os danos moral e estético, devido à sua natureza imaterial, subsumem-

se àqueles casos em que o juiz, inspirado pela lógica do razoável, deve prudentemente arbitrar o valor necessário à compensação do ofendido pela conduta ilícita (CC, art. 950, parágrafo único, e art. 953, parágrafo único). Entretanto, alguns critérios objetivos devem nortear essa fixação por

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apropriada, observando ainda o critério da culpa, que poderá reduzir o quantum nas

hipóteses de desproporção da culpa (art. 944, parágrafo único, C.C.) 85 e culpa

concorrente (art. 945, C.C.) 86, avaliando cada caso concreto e suas peculiaridades.

Elucida à respeito da matéria o Relator Ministro Sálvio de Figueiredo

Teixeira em decisão do STJ:

O valor da indenização por dano moral sujeita-se ao controle do Superior Tribunal de Justiça, sendo certo que, na fixação da indenização a esse título, recomendável que o arbitramento seja feito com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível sócio-econômico do autor e, ainda, ao porte econômico do réu, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso.

87

Todavia, fica claro que, por mais justa e apurada que seja a avaliação feita

pelo magistrado, é impraticável pensar que possa haver uma equivalência entre a

lesão e a indenização, visto que os danos causados no interior da pessoa são muito

arbitramento, tais como: a estipulação de um valor compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade sócio-econômica e financeira das partes e outras circunstâncias específicas de cada caso concreto. Nesse contexto, o ponto ótimo a ser alcançado é aquele em que o valor arbitrado sirva como punição da conduta ilícita e cumpra o caráter pedagógico de desestimular a reincidência dessa conduta, sendo que do outro lado da balança deve-se buscar apenas a compensação do ofendido, pois o que passar disso caracterizar-se-á como fonte de enriquecimento sem causa. A indenização por dano material, por sua vez, não pode ficar adstrita à mesma abstração utilizada para aferir a indenização por dano moral, pois sua demarcação cinge-se ao salário do empregado acidentado, o tempo de privação de suas atividades, o quanto deixado de se auferir ao longo dessa temporada em virtude da perda parcial de sua capacidade laborativa e, certamente, as despesas que assumiu com tratamento médico, fisioterápico e medicamentos para sua reabilitação. No caso dos autos, não merece nenhuma censura a sentença recorrida, vez que os valores fixados a título de danos moral e material encontram-se em fina sintonia com os parâmetros acima descritos. Ademais disso, não se caracterizou, neste caso, nenhum tipo de lesão capaz de resultar em dano estético.- grifo nosso-(TRT- 2ª T.- N° Acórdão 00450.2007.022.23.00-9 EDSON BUENO- j. 18/12/2008) 85

Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano. Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização. (Código Civil - CC - L-010.406-2002) 86

Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano. (Código Civil - CC - L-010.406-2002) 87

Relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, STJ- 4ª turma- REsp. 240.441 j. 25/04/2000, apud REIS, Clayton, op. cit. p. 222.

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amplos e tornam difícil determinar uma reparação pecuniária que amenize essa

perda. Devendo o juiz utilizar critérios sugeridos na doutrina e jurisprudência,

evitando valores aleatórios e se adaptando à realidade de cada contexto.88

2.6.3 Dano Material ou Patrimonial

Este tipo de dano é o que atinge exclusivamente os bens concretos que

constituem o patrimônio da vítima. Aqui a reparação visa repor os bens materiais

lesionados aproximando-os ao seu status quo ante, ou proporcionando à vítima a

obtenção de um bem semelhante ao que foi destruído.89

Enfatiza DIAS que:

O dano material nunca é irreparável: dada a sua ocorrência, ou se restaura a situação anterior ou se integra o patrimônio mediante o equivalente pecuniário do desfalque, intervindo, ademais, os juros de mora, para ajustar a compensação à maior ou menor duração do dano.

90

Portanto, os danos materiais ou patrimoniais são aqueles os quais o prejuízo

é evidente, podendo ser mensurável ou ainda possível de apuração, são os que a

indenização mais freqüente é feita através da pecúnia.91 E ainda, na maioria das

vezes, é resultado dos danos físicos causados, como já dito anteriormente, podendo

ser quaisquer tipo de despesas, gastos que tiveram de ser desembolsados por

causa do dano.

88

VENOSA, Sílvio de Salvo, op. cit. p. 202-203. 89

REIS, Clayton, op. cit. p. 7. 90

DIAS, José de Aguiar, op. cit. p. 993. 91

STOCO, Rui, op. cit. p.1236.

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Outrossim, os efeitos do ato danoso recaem sobre o patrimônio atual do

lesado, diminuindo assim os seus bens. No entanto, esses efeitos podem se

estender ao futuro, da dependendo da gravidade de cada caso, impedindo ou

diminuindo o benefício patrimonial da vítima. São os denominados danos

emergentes e lucros cessantes 92 , respectivamente o que o credor efetivamente

perdeu e o que poderia ter lucrado ou ganho, se não tivesse tido um prejuízo

anterior. No caso dessas perdas serem comprovadas, cabe então o pedido de

perdas e danos.

Insta ressaltar que as indenizações por danos morais, materiais e estéticos

poderão ser cumuladas desde que sejam provenientes do mesmo fato.93

92

Art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidos ao credor

abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar. - grifo nosso-(Código Civil - CC - L-010. 406-2002-Das Perdas e Danos) 93

RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. CIRURGIA DE CATARATA. PERDA DE VISÃO. INFECÇÃO HOSPITALAR. RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO. OCORRÊNCIA. Seguindo a

teoria da responsabilidade subjetiva, para que reste configurada a responsabilidade do médico, necessária se faz a prova do agir culposo, que, no caso, ficou demonstrada em razão de sua negligência, consistente na falta de cuidados para evitar as infecções, pois realizava cirurgias sem exigir a esterilização e a troca dos materiais (principalmente em relação às canetas e ponteiras utilizadas para a cirurgia de catarata). RESPONSABILIDADE CIVIL DO NOSOCÔMIO. A responsabilidade do hospital, por sua vez, deve ser apurada pela teoria objetiva, pois é regulada pelo art. 37, § 6°, da CF. Constatadas diversas falhas nas técnicas a serem observadas para a prevenção da infecção hospitalar, é de se concluir que os serviços prestados pelo hospital não foram adequados, estando presentes os pressupostos do dever de indenizar. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. Ainda que não se considerasse comum a todas as esferas de governo aresponsabilidade pela prestação do serviço público de saúde, in casu, a responsabilidade pela prestação de serviços de alta e média complexidade é do Estado do Rio Grande do Sul, em virtude da não efetivação da municipalização plena da saúde. Não há que se falar em culpa exclusiva de terceiros, pois competia ao próprio Estado o credenciamento e a fiscalização dos estabelecimentos destinatários das verbas do SUS. CUMULAÇÃO DE DANOS MORAIS E ESTÉTICOS. É possível a cumulação de ambas as espécies de danos, em razão de restarem violados a honra (tanto a objetiva quanto a subjetiva) e a imagem da autora. Lições doutrinárias. DANOS MORAIS E ESTÉTICOS. MANUTENÇÃO. Na fixação da reparação por dano, incumbe ao julgador, atentando, sobretudo, para as condições do ofensor, do ofendido e do bem jurídico lesado, e aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, arbitrar quantum que se preste à suficiente recomposição dos prejuízos, sem importar, contudo, enriquecimento sem causa da vítima. A análise de tais critérios, aliada às demais particularidades do caso concreto, bem como aos parâmetros utilizados por esta Câmara, em situações análogas, conduz à manutenção do montante indenizatório no quantum de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) por danos morais e R$ 15.000,00 (quinze mil reais) a título de danos estéticos, valores estes acrescidos de juros e correção monetária, conforme definido no ato sentencial. DANOS

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MATERIAIS. Comprovado que a parte autora restou em prejuízo com as despesas de medicamentos no tratamento dos danos ocasionados pelas demandadas, a condenação ao pagamento da indenização correlata é medida impositiva. CUSTAS. FAZENDA PÚBLICA. ISENÇÃO. Em face da alteração do art. 11 da Lei nº 8.121/85 pela Lei nº 13.471/10, a Fazenda Pública está isenta do pagamento de custas processuais. APELAÇÕES PARCIALMENTE PROVIDAS. - grifo nosso. (Apelação Cível Nº 70040763583, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Túlio de Oliveira Martins, Julgado em 27/10/2011).

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3. RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO E O CÓDIGO DE DEFESA DO

CONSUMIDOR

3.1 RELAÇÃO DE CONSUMO E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS

A aplicação do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor nas relações

entre médico-paciente é considerada matéria de debates na doutrina e na

jurisprudência. No entanto, não há dúvidas quanto a sua importância, no que diz

respeito à proteção do consumidor, em vista da vulnerabilidade que está sujeito,

como dispõe o artigo art. 4º, I, do CDC que elucida:

A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;

Neste aspecto, as normas que tutelam o interesse deste destinatário final de

produtos e serviços são instituídas em razão da necessidade de proteção do

mesmo, frente à condição de desigualdade em relação ao fornecedor de serviços.94

Do mesmo modo, o CDC preceitua em seu artigo 14 que:

O fornecedor de serviços responde independentemente da prova de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos a prestação de serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Logo, responsabiliza os fornecedores, hospitais, clínicas e demais

instituições de saúde, por danos causados aos consumidores por serviços prestados

de forma imprópria e ainda no referido artigo, em seu § 4º, estabelece taxativamente

94

MIRAGEM, Bruno, op. cit. p. 71-72.

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que “a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a

verificação de culpa”. Portanto, a verificação da culpa, como vista anteriormente, é

pressuposto para caracterizar a responsabilidade do profissional liberal, já para os

estabelecimentos de saúde, não é necessária a comprovação de culpa, em regra,

como veremos adiante no estudo.

3.2 RESPONSABILIDADE MÉDICA NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

A aplicação do CDC na responsabilidade médica teve efeitos diversos no

que diz respeito aos direitos básicos do consumidor 95 dentre eles a proteção da

vida, saúde e segurança (art. 6°, I), à informação (art. 6°, III), a efetiva prevenção e

reparação de danos patrimoniais e morais (art. 6°, VI), bem como a facilitação da

defesa de seus direitos (art. 6°, VIII), deliberando ao consumidor- paciente, o qual

sofre os danos causados da má prestação de serviços médicos, um regimento

95

Art. 6º- São direitos básicos do consumidor: I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos; II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações; III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços; V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas; VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados; VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências; X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral. (LEI Nº 8.078, DE 11 DE SETEMBRO DE 1990.- Código de defesa do Consumidor- CAPÍTULO III Dos Direitos Básicos do Consumidor)

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apropriado em matéria de responsabilidade do profissional da medicina e das

clínicas e instituições hospitalares.96

Logo, com o advento do Código de Defesa do Consumidor as discussões

sobre a natureza contratual ou extracontratual da responsabilidade civil do médico

perderam relevância, pois conduzem ao mesmo resultado. Desta forma, a

responsabilidade do médico deve ser examinada em dois aspectos, primeiramente

em relação à prestação de serviço direta e pessoalmente do médico, como

profissional liberal e posteriormente a responsabilidade dos médicos decorrente da

prestação de serviços médicos, em estabelecimentos de saúde, sendo requeridos

então, hospitais, clínicas, laboratórios médicos e outros relacionados ao ramo

empresarial e que envolvem o trabalho do profissional liberal.97

3.2.1 Responsabilidade Pessoal do Médico

A prática da medicina por envolver a prestação de serviços do médico e

logo, se tratar de profissional liberal como visto anteriormente, é regida pelo Código

de Defesa do Consumidor no seu artigo 14, § 4°, o qual expõe que se médico no

exercício de sua função tiver causado dano a outrem, e ficar demonstrado que agiu

com culpa será responsabilizado pessoalmente. Assim, este será obrigado a reparar

o dano que ocasionou se estiverem presentes os pressupostos da responsabilidade

subjetiva: ação ou omissão do agente, nexo causal, dano e culpa ou dolo, os quais

são regidos pelo Código Civil.

Completa GRINOVER acerca dos profissionais liberais:

96

MIRAGEM, Bruno, op. cit. p. 72. 97

DIAS, José de Aguiar, op. cit. p. 329.

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Explica-se a diversidade de tratamento em razão da natureza intuitu personae dos serviços prestados por profissionais liberais. De fato, os médicos e advogados- para citarmos alguns dos mais conhecidos profissionais- são contratados ou constituídos com base na confiança que inspiram aos respectivos clientes. Assim sendo, somente serão responsabilizados por danos quando ficar demonstrada a ocorrência de culpa subjetiva, em quaisquer de suas modalidades: negligência, imprudência ou imperícia. Se o dispositivo comentado afastou, na espécie sujeita, a responsabilidade objetiva, não chegou a abolir a aplicação do princípio da inversão do ônus da prova. Incumbe ao profissional provar, em juízo, que não laborou em equívoco, nem agiu com imprudência ou negligência no desempenho de sua atividade.

98

Deste modo, o profissional da medicina possui obrigações em relação ao

seu paciente, de tal forma que será responsabilizado se não cumprir certos deveres

que lhe são impostos, como por exemplo, ao prescrever um tratamento

medicamentoso ou mesmo ao conduzir um tratamento, deve informar ao paciente,

ou aos seus familiares, os efeitos que a medicação pode causar e todas as outras

questões relacionadas ao tratamento do mesmo, pois o médico tem o dever de

informar acerca de todos os riscos, também deverá informar a respeito das

condições de saúde e possibilidades atinentes ao tratamento. De maneira que se

não o fizer estará agindo com negligência em relação ao paciente e poderá ser

responsabilizado por falta de cumprimento desse dever, respondendo por ter agido

de forma negligente e conseqüentemente por culpa.

Nesse sentido, Gerson Luiz Carlos Branco 99 menciona como um dos

deveres do médico o dever de assistência, que é o de prestar atendimento “com a

98

GRINOVER, Ada Pellegrini...[et al.], Código Brasileiro de Defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9 ed. Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária, 2007. p. 205. 99

Gerson Luiz Carlos Branco apud CARDOSO, Hélio Apoliano. Responsabilidade Médica por Omissão no Dever de Informar. Revista Bonijuris- Ano XXII- N° 558- Maio/10. p. 56.

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maior correção e diligência possível, atendendo aos chamados e mantendo-se

constantemente informado sobre as condições reais de seu paciente.”

Seguindo o mesmo raciocínio a cerca do dever de informar, Sérgio Cavalieri

Filho leciona que:

Na verdade. O direito à informação está no elenco dos direitos básicos do consumidor: „informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, bem como sobre os riscos que apresentam‟ (art. 6º, III, do CDC). A informação tem por finalidade dotar o cliente de elementos objetivos de realidade que lhe permitam dar, ou não, o consentimento. É o chamado consentimento informado, considerado, hoje, pedra angular no relacionamento do médico com seu paciente. (...) Pois bem, embora médicos e hospitais, em princípio, não respondam pelos riscos inerentes da atividade que exercem, podem eventualmente, responder se deixarem de informar aos pacientes as conseqüências possíveis do tratamento a que serão submetidos. Só o consentimento informado pode afastar a responsabilidade médica pelos riscos inerentes à sua atividade. O ônus da prova quanto ao cumprimento do dever de informar caberá sempre ao médico ou hospital.

100

Na mesma compreensão a respeito do tema a jurisprudência nos ensina:

RESPONSABILIDADE CIVIL – Erro médico – Nexo causal – Prova.

O relacionamento que se estabelece entre o médico e o paciente é sui generis, tratando-se de obrigação de meio, não de resultado, pois tem por objeto a prestação de cuidados conscienciosos e atentos, e, portanto, para que haja responsabilização por dano causado a paciente em consequência da atuação do profissional, é necessário que resulte provado de modo concludente que o evento danoso se deu em razão de negligência, imprudência, imperícia ou erro grosseiro de sua parte. Não demonstrada a conduta médica contrária à obrigação de tratar do doente com zelo e diligência, utilizando-se dos recursos da ciência, e não determinado o nexo causal nem a causa eficiente do dano, impossível reconhecer responsabilidade dele decorrente (TAMG, 7.ª Câm.Cív., AC 205.037-1, rel. Juiz Geraldo Augusto, v.u., DJ 18.12.1996, ADV-Coad 5/97, em. 77032, p. 73)- grifo nosso.

APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. MEDICAMENTO. REAÇÃO ALÉRGICA. RELAÇÃO DE CONSUMO. MÉDICO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. DEVER DE INFORMAÇÃO. A responsabilidade do profissional médico perante seu paciente é a subjetiva, prevista no artigo 14, § 4º, do CDC, requerendo, portanto, a demonstração de culpa para a configuração do dever de reparar. Situação

100

Sérgio Cavalieri Filho apud CARDOSO, Hélio Apoliano, op. cit. p. 56.

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em que a médica não se desincumbiu do dever de informação, na medida em que não informou à paciente as possíveis reações alérgicas que poderiam advir do tratamento ministrado. Falha do dever de informação que acarreta o dever de reparar pelo dano moral sofrido. Orientação doutrinária e jurisprudencial. LABORATÓRIO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. RISCO INERENTE. O serviço prestado pelo laboratório fabricante de medicamento insere-se na relação de consumo, e a responsabilidade é objetiva. Situação em que os danos decorrentes da periculosidade inerente não dão ensejo ao dever de indenizar, uma vez que o laboratório fabricante do medicamento ingerido pela autora fez constar, da bula do remédio, todas as possíveis reações alérgicas que eventualmente poderiam ser sentidas pelos usuários. Orientação doutrinária. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70030952246, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Julgado em 09/12/2009)- grifo nosso.

Desta maneira, o profissional da medicina tem o dever de fornecer todas as

informações necessárias a fim de esclarecer ao paciente, todos os aspectos do

tratamento médico e eventuais dúvidas e questionamentos, para que não tenha

problemas futuros de cunho indenizatório.

No tocante a responsabilidade do médico e do estabelecimento de saúde, a

doutrina majoritária entende, assim como Antonio Herman Vasconcellos Benjamin

que o Código de Defesa do Consumidor “em todo o seu sistema, prevê uma única

exceção ao princípio da responsabilização objetiva para acidentes de consumo: os

serviços prestados por profissionais liberais”, dentre eles o profissional da saúde, os

quais mantiveram o sistema baseado na culpa. Diz ainda o referido autor que essa

exceção não atinge as pessoas jurídicas: “... se o médico trabalha para um hospital,

responderá ele apenas por culpa, enquanto a responsabilidade civil do hospital será

apurada objetivamente”. 101

101

Antonio Herman Vasconcellos Benjamin apud KFOURI NETO, Miguel, op. cit. p. 211.

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Em se tratando da responsabilidade subjetiva do médico, completa LISBOA:

Na atividade liberal do médico, o instrumento por ele utilizado tornou-se um ingrediente indispensável na análise dos fatos, assim como a cooperação da equipe médica. Desse modo, integrou-se à responsabilidade do profissional liberal a responsabilidade pelo fato da coisa (o instrumento realizado) e a responsabilidade pelo fato de terceiro (a cooperação dada pela equipe médica).

102

Logo, sob essa perspectiva o médico terá responsabilidade subjetiva,

devendo ser comprovado que houve a culpa do agente e o hospital responderá

objetivamente, sem precisar ficar demonstrada a culpa, bastando somente a

comprovação do dano, a menos que o estabelecimento comprove que tendo

prestado o serviço, o defeito inexiste ou ainda, quando ocorrer a culpa exclusiva do

consumidor ou de terceiro (art. 14, § 3° CDC).103

3.2.2 Responsabilidade dos Estabelecimentos de Saúde

Atualmente na doutrina, há um consenso em relação à responsabilização

dos estabelecimentos de saúde, compreendendo então as clínicas, os hospitais, as

casas de saúde e semelhantes, os quais estabelecem com o paciente uma relação

102

LISBOA, Roberto Senise. Responsabilidade Civil nas Relações de Consumo. 2 ed.rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. p. 299. 103

Art. 14. O fornecedor de serviços responde independentemente da existência de culpa, pela

reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. § 3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. § 4º A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.

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de cunho contratual de consumo, abrangendo deveres de hospedagem e assistência

médica, que conseqüentemente dão extensão à responsabilização dos mesmos.

Logo, a responsabilização dos estabelecimentos de saúde é caracterizada

objetivamente, ou seja, se houver prejuízo ao paciente, surgirá a obrigação de

reparar o dano causado, se tiver sido comprovado o nexo causal entre o fato

gerador e o prejuízo.

Todavia, insta ressaltar que tais estabelecimentos só serão destituídos deste

encargo se comprovarem que as excludentes da responsabilização104 estão a seu

favor, as quais estão dispostas no art. 14, § 3°, ou seja, se o estabelecimento

comprovar que a culpa foi de terceiro ou do consumidor; que tendo prestado o

serviço o defeito inexiste; ou ainda, que ocorreu força maior ou caso fortuito105, fica

exonerado dessa responsabilidade. Nas palavras de Miguel Kfouri Neto:

104

LISBOA, Roberto Senise. Responsabilidade Civil nas Relações de Consumo. 2 ed.rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. p. 308-313: “As excludentes da responsabilidade objetiva são aquelas aplicadas aos casos de responsabilidade civil pelo fato e pelo vício(...) A responsabilidade objetiva do agente é excluída se a vítima agira positiva ou negativamente, de forma a acarretar o dano, como conseqüência exclusiva da sua conduta.(...) A vítima deve ser considerada culpada pelo dano, parcial ou integralmente, apenas quando se demonstrar que ela violou o dever jurídico que tinha ao se valer do exercício da atividade perigosa do agente(...) Considera-se o terceiro culpado quando proporciona dano à vítima, por imperícia, imprudência ou negligência, durante o exercício da atividade perigosa do explorador, por si ou através de seu subordinado. Demonstrada a culpa de terceiro, isto é, do sujeito estranho a relação jurídica, o nexo de causalidade entre as partes somente se extinguirá se a violação do dever for integralmente imputado em desfavor daquele.(...) o terceiro poderá vir a ser responsabilizado por culpa concorrente, pela via regressiva, na proporção de sua participação para a causação do evento danoso.” Em nota de rodapé, p. 313: Consideram que o caso fortuito e a força maior são excludentes da responsabilidade do fornecedor na relação de consumo, ante a aplicação subsidiária da legislação comum(...), que sustentam a possibilidade de exclusão da responsabilidade por força maior ocorrida após a inserção do produto no mercado(...), afirmam que a força maior pode ser admitida, em seu sentido lato(...). 105

Massimo Bianca apud LISBOA, Roberto Senise, op. cit. p. 319-320: “Força maior e caso fortuito é o acontecimento inevitável e, por vezes imprevisível, que acarreta danos morais e patrimoniais a vítima.” LISBOA, Roberto Senise, op. cit. p. 319-320: “A irresistibilidade absoluta e a desnecessidade da intervenção humana são as notas distintivas entre a força maior e o caso fortuito. A força maior pode ser previsível e decorrer de um fato natural, independentemente da intervenção humana direta (act of God).(...) O caso fortuito é, pois um fato natural relacionado com a intervenção humana. Tanto o caso fortuito como a força maior podem impossibilitar, física ou juridicamente, a realização da obrigação, motivo pelo qual não se pode concluir que aquele que não a cumpriu esteja em mora.”

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62

[...] existindo vínculo empregatício entre o médico e a casa hospitalar, a vítima demandaria a reparação em face do estabelecimento, apenas provada a efetiva ocorrência do dano, incumbindo ao hospital provar as excludentes do art. 14, § 3°, como único modo de exonerar o encargo.

106

Completa a jurisprudência nesse sentido:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. LAQUEADURA TUBÁRIA REALIZADA SEM AUTORIZAÇÃO DO PACIENTE. PRESCRIÇÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA DO HOSPITAL. MAJORAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. O hospital possui legitimidade para figurar no pólo passivo de ação de indenização proposta em face de possível erro de profissional que utiliza suas dependências e equipamentos, ainda que não detenha vínculo empregatício com a entidade hospitalar. A quantificação do dano moral obedece ao critério do arbitramento judicial, que, norteado pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, fixará o valor, levando-se em conta o caráter compensatório para a vítima e o punitivo para o ofensor. Preliminar e prejudicial rejeitadas, primeira apelação provida parcialmente e segunda apelação não provida. (TJMG 1.0151.04.008727-3/001, 10ª Câmara Cível - Unidade Raja Gabaglia, Relator: Marcos Lincoln)

Em face disso, o relator Des. Marcos Lincoln justifica seu voto no tocante a

legitimidade passiva do estabelecimento de saúde, fundamentando-o de acordo com

os pensamentos de vários doutrinadores:

[...]

SERGIO CAVALIERI FILHO, a respeito da Responsabilidade médica empresarial - Hospitais, clínicas e casas de saúde, leciona:

"Doutrina e jurisprudência tradicionalmente enquadravam a responsabilidade dos estabelecimentos hospitalares no art. 1.5121, IV, do Código Civil de 1916 (art.932, IV, do Código de 2002), aquele que disciplinava a responsabilidade dos hotéis e das hospedarias. Sustentava-se que a instituição hospitalar, além da obrigação de curar, de dar tratamento médico ao paciente, assumia com ele uma obrigação de hospedagem da qual lhe resultava uma presunção de responsabilidade que o tornava responsável por tudo aquilo que viesse a ocorrer ao paciente. Tenho para mim que essa fundamentação perdeu a sua razão de ser em face do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor. Os estabelecimentos hospitalares são fornecedores de serviços, e, como tais, respondem

106

KFOURI NETO, Miguel, op. cit. p. 211.

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63

objetivamente pelos danos causados aos seus pacientes." (Programa de Responsabilidade Civil, 7ª Edição, p. 371, Atlas). - grifo nosso.

FRANCISCO CHAGAS DE MORAES assevera:

"Quando se tratar de serviços médicos prestados por hospital, como fornecedor de serviços (art. 14, caput), a apuração da responsabilidade independe da existência de culpa, conforme esclarece Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin: "O Código é claro ao asseverar que só para a 'responsabilidade pessoal', dos profissionais liberais, é que se utiliza o sistema alicerçado em culpa. Logo, se o médico trabalhar em hospital responderá apenas por culpa, enquanto a responsabilidade do hospital será apreciada objetivamente." (Comentários ao Código de Proteção do Consumidor, obra coletiva, Saraiva, 1991, p. 80, apud Francisco Chagas de Moraes, "Responsabilidade civil do médico", RT 672/275).- grifo nosso

RUI STOCO, por sua vez, ensina:

"Cabe esclarecer que, se o médico atuar no respectivo hospital mediante contrato de prestação de serviços, deve ser considerado seu preposto e este responderá pelos atos culposos daquele. Do mesmo modo, o hospital terá direito de reaver o que pagar através de ação regressiva contra o causador direto do dano." (Tratado de Responsabilidade Civil, Editora Revista dos Tribunais, 6ª ed., p.734).- grifo nosso

Ora, como se vê, diante do princípio da responsabilidade objetiva do prestador de serviço, consagrado no Código de Defesa do Consumidor, responde objetivamente a casa de saúde, como prestadora de serviços, nos termos de seu art. 14, caput.- grifo nosso

Em assim sendo, é manifesta a responsabilidade do co-réu, ora apelante, Instituto São Vicente de Paulo, Hospital, Asilo e Maternidade, devendo prevalecer quanto a ele a condenação externada na r. sentença hostilizada.

Não bastasse isso, impende acrescentar que mesmo não havendo relação empregatícia entre o hospital e o médico, o simples fato de o co-réu, ora apelante, Ubirajara Faleiros ter realizado a cirurgia nas dependências do nosocômio, utilizando de suas instalações e equipamentos para prestar serviços à primeira apelante, demonstra, à evidência, que o referido médico pertencia ao corpo clínico.- grifo nosso

A propósito, o "termo de autorização e responsabilidade de internação" de fl. 65-TJ corrobora tal afirmação, pois contém cláusula dispondo que o paciente e/ou responsável autoriza:

"(...) a execução de todos os tratamentos quer clínicos, quer cirúrgicos prescritos pelo seu Corpo Clínico, autorizando, ainda, necropsias se ocorrer óbito." (sic). (grifei).

Além disso, os documentos de fls. 39/43 e 57 TJ comprovam que o médico apelante utilizou de receituários, formulários e pedidos de exames com o timbre do hospital, o que demonstram a relação de preposição existente entre ele e o hospital.- grifo nosso

Outro fato que demonstra a relação de preposição e subordinação, bem como o interesse comum dos segundos apelantes (hospital e médico), é

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que eles contrataram os mesmos advogados, mandatos de fls. 133 e 154, e apresentaram defesa em peça única.- grifo nosso

Evidentemente, se os interesses do hospital e do médico fossem diferentes, certamente cada co-réu teria constituído um advogado, que apresentaria defesa autônoma.- grifo nosso

Com isso, não resta dúvida que o hospital é parte legítima para integrar o pólo passivo da ação, respondendo objetivamente pelos atos praticados por médico integrante de seu corpo clínico.- grifo nosso

Vale destacar que, nesse sentido este tribunal decidiu:

"Basta, para a configuração de legitimidade passiva do hospital, que o paciente tenha sido operado por médico que faça parte do seu quadro de profissionais e que tenha utilizado as suas dependências." (TAMG. 3ª Câmara Cível. Apelação nº 2.0000.00.383688-6/000. Rel. Juíza Albergaria Costa. DJ 10/05/03). - grifo nosso

Diante dessas considerações, rejeita-se a preliminar de ilegitimidade passiva.

Como visto e exemplificado na forma da jurisprudência, o hospital,

estabelecimento de saúde, responde por atos de seus prepostos, ainda que não

haja relação empregatícia, visto que o médico utilizou das dependências, instalações

e equipamentos do hospital para realizar tal conduta, ficando demonstrado assim a

responsabilização de ambos perante o consumidor-paciente. Ademais, se for de

interesse do hospital, esse pode reaver o que pagou através da ação regressiva

contra o causador direto do dano.

E ainda, se tratando dessa matéria, reforça a jurisprudência:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS. CIRURGIA PLÁSTICA. ERRO MÉDICO. DEFEITO NO SERVIÇO PRESTADO. CULPA MANIFESTA DO ANESTESISTA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO CHEFE DA EQUIPE E DA CLÍNICA.

1. O Tribunal a quo manifestou-se acerca de todas as questões relevantes para a solução da controvérsia, tal como lhe fora posta e submetida. Não cabe alegação de violação do artigo 535 do CPC, quando a Corte de origem aprecia a questão de maneira fundamentada, apenas não adotando a tese da recorrente. Precedentes.

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2. Em regra, o cirurgião chefe dirige a equipe, estando os demais profissionais, que participam do ato cirúrgico, subordinados às suas ordens, de modo que a intervenção se realize a contento. 3. No caso ora em análise, restou incontroverso que o anestesista, escolhido pelo chefe da equipe, agiu com culpa, gerando danos irreversíveis à autora, motivo pelo qual não há como afastar a responsabilidade solidária do cirurgião chefe, a quem estava o anestesista diretamente subordinado. 4. Uma vez caracterizada a culpa do médico que atua em determinado serviço disponibilizado por estabelecimento de saúde (art. 14, § 4º, CDC), responde a clínica de forma objetiva e solidária pelos danos decorrentes do defeito no serviço prestado, nos termos do art. 14, §1º, CDC. 5. Face as peculiaridade do caso concreto e os critérios de fixação dos danos morais adotados por esta Corte, tem-se por razoável a condenação da recorrida ao pagamento de R$ 100.000,00 (cem mil reais) a título de danos morais. 6. Recurso especial conhecido em parte e, nesta parte, provido.

(REsp 605435/RJ(2003/0167564-1) T4, Relator: JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Julgamento: 22/09/2009)- grifo nosso.

No mesmo sentido, pontua MIRAGEM:

A diferença fundamental no regime de responsabilidade dos hospitais clínicas (art. 14, caput) e dos médicos profissionais liberais (art. 14, § 4°), será que em relação a estes se exige mais uma condição para a imputação de responsabilidade, qual seja, a verificação da culpa. Identificada esta, ou ainda, quando for presumida nas condições que a lei autorize e o juiz decida (inversão do ônus da prova), ambos respondem nos mesmos termos, a não ser que demonstrem a existência de causa excludente.

As excludentes de prova de inexistência do defeito e da culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro são verificadas de modo distinto, conforme se trate de responsabilidade do profissional médico ou de instituição hospitalar ou clínica. No primeiro caso, o defeito da prestação pessoal de serviço pelo médico pessoal liberal confunde-se na prática com a existência da culpa no descumprimento dos deveres que lhe são impostos. Já em relação aos hospitais ou clínicas, a inexistência de defeito será observada na medida em que estes fornecedores demonstrem a correção de seus procedimentos em conjunto com a demonstração de que o dano sofrido pelo paciente decorre de uma outra causa que não as de sua responsabilidade ou de outros fornecedores, na hipótese da existência de conexidade contratual (e.g. com laboratórios, fabricantes de equipamentos médicos, distribuidores de medicamentos, etc.). Já no que se trate da culpa exclusiva de consumidor ou de terceiro, em primeiro lugar destaque-se que, no regime do CDC, qualquer dos membros da cadeia de fornecimento, tais como o profissional médico, o responsável pelo serviço de transporte médico, membros da equipe médica, não é considerado terceiro para efeito da exclusão da responsabilidade do médico ou da instituição hospitalar frente ao consumidor. E no que se refere à culpa exclusiva do consumidor-paciente, note-se que a hipótese excludente deve ser demonstrada de modo inequívoco, especialmente por que, desde o ponto de vista da relação de causalidade, este fato deve ser capaz de determinar por si só a realização do dano, sem qualquer espécie da culpa concorrente do profissional médico ou da violação do dever de segurança pelo profissional médico.

107

107

MIRAGEM, Bruno, op. cit. p. 74.

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66

Diante do exposto, conclui-se que frente ao dano causado, deve-se verificar,

primeiro, se houve culpa na conduta do médico, se não houver, estará isento da

responsabilidade de indenizar, da mesma forma o hospital estará desobrigado. No

entanto, se a conduta for culposa, o médico responderá pelos danos causados, se

comprovado que agiu com culpa e o hospital igualmente poderá ser pólo passivo

desta ação, podendo reaver do médico o montante que houver despendido no

pagamento da indenização.

3.3 PROVA NO ERRO MÉDICO

Em razão de o consumidor ser reconhecidamente a parte mais fraca da

relação de consumo, o legislador criou normas que garantem a proteção deste a fim

de equilibrar essa relação. O Código de Defesa do Consumidor em seu art. 6°

dispõe sobre os direitos básicos do consumidor, dentre eles merece destaque o

inciso VIII do referido artigo, o qual aduz a facilitação da defesa dos direitos do

consumidor, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo

civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele

hipossuficiente.108

O Ministro do Superior Tribunal de Justiça, José Augusto Delgado, tece

algumas considerações sobre a hipossuficiência do consumidor:

108

O Código de Defesa do Consumidor admitiu a inversão do ônus da prova em razão da hipossuficiência do consumidor, que é parte fraca na relação consumerista. Portanto, caberia ao recorrente/fornecedor provar a culpa exclusiva da recorrida/consumidora; porém, não o fez. Recurso provimento negado. (Turma Recursal de Cataguases - Rec. nº 153.04.030.643-0 - Rel. Juiz Vinícius Gomes de Moraes).

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O hipossuficiente, portanto, será considerado de acordo com a avaliação do juiz tomando em consideração vários aspectos do ambiente que ele desenvolve as suas atividades e as características econômicas que apresenta. [...] Há uma busca de se conceituar o que seja hipossuficiente sem se afastar da colocação de que ele está sempre numa situação de subordinação, quer seja subordinação cultural, quer seja subordinação técnica, financeira, educacional.

109

Desta forma, a inversão do ônus da prova poderá acontecer em uma ação

de reparação civil por dano médico. No entanto, para que isso ocorra é preciso que

o magistrado avalie se há a real necessidade de tomar essa providência, e ainda, se

verificar a verossimilhança nas alegações, isto é, que os fatos alegados são

prováveis de ser verdadeiros ou a hipossuficiência do consumidor-paciente, ou seja,

que a condição técnica do consumidor é inferior ou desfavorável em relação ao

fornecedor.

Acrescenta MIRAGEM a respeito da hipossuficiência do consumidor:

Esta compreensão de hipossuficiência é de extrema importância na responsabilidade civil médica, em que muito propriamente, a impossibilidade de produção de prova não se vincula à quaisquer outro fatores senão da dificuldade de demonstrar a existência de uma situação de fato da qual o paciente-vítima de um dano não tem como apresentar, e muitas vezes nem ele próprio tem conhecimento de como ocorreram determinados eventos. Assim, por exemplo, a hipótese de danos sofridos por um paciente em um procedimento cirúrgico durante o qual se encontrava sedado e cuja documentação médica é toda ela produzida pelos réus (médico, hospital) ou pessoas associadas com estes. O paciente-vítima, em tal circunstância, não tem como produzir prova relativamente a estes fatos, cujo conhecimento é de domínio exclusivo dos réus, razão pela qual deverá ser reconhecido como hipossuficiente, e invertido o ônus da prova, na forma do art. 6°, VIII, do CDC.

110

109

DELGADO, José Augusto. Hipossuficiência de uma das partes na relação de consumo com pessoas jurídicas. Texto básico da palestra proferida em Amparo, São Paulo, no mês de novembro de 2004, no Fórum Jurídico das Atividades Seguradoras, realização paulista dos magistrados. p. 39-40. 110

MIRAGEM, Bruno. Responsabilidade Civil Médica no Direito Brasileiro. Revista de Direito do Consumidor 2007 – RDC 63. p. 88

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Igualmente, no tocante à responsabilidade do profissional da medicina e ao

ônus da prova CAVALIERI FILHO expõe:

Não obstante subjetiva a sua responsabilidade, está sujeito à disciplina do Código de Defesa do Consumidor. Pode consequentemente o juiz, em face da complexidade técnica da prova da culpa, inverter o ônus dessa prova em favor do consumidor. A hipossuficiência de que ali fala o Código não é apenas econômica, mas também técnica, de sorte que, se o consumidor não tiver condições econômicas ou técnicas para produzir a prova dos fatos constitutivos de seu direito, poderá o juiz inverter o ônus da prova a seu favor, como observa insigne Nélson Nery Jr.(Princípios Gerais do Código Brasileiro de Defesa do consumidor, Direito do Consumidor, 3/5, setembro-dezembro/92)- grifo nosso.

111

Nota-se que o instituto de inversão do ônus da prova é uma garantia dada

ao paciente, pois esse se encontra fragilizado e não obstante isto, na hora de

produzir as provas se depara com a enorme dificuldade de consegui-las, pois na

maioria das vezes a vida clínica do paciente e os procedimentos adotados pelo

médico no tratamento ficam sob a guarda do profissional da medicina, o que

dificulta, e muito, o acesso do paciente a essas informações, até porque essas tem

uma relevância fundamental no momento de aferir as provas do fato.

Da mesma forma a doutrina manifesta-se neste sentido, através do

ensinamento transcrito por José Geraldo Brito Filomeno, extraído da dissertação da

mestranda e promotora da justiça Cecília Matos, sob o título "O ônus da prova

no Código de Defesa do Consumidor":

A prova destina-se a formar a convicção do julgador, que pode estabelecer com o objeto do conhecimento uma relação de certeza ou de dúvida. Diante das dificuldades próprias da reconstrução histórica, contenta-se o magistrado em alcançar não a verdade absoluta, mas a probabilidade máxima; a dúvida conduziria o julgador ao estado de non liquet, caso não fosse elaborada uma teoria de distribuição do ônus da prova. Conceituado

111

Sérgio Cavalieri apud DIAS, José de Aguiar, op. cit. p. 335.

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como risco que recai sobre a parte por não apresentar a prova que lhe favorece, as normas de distribuição do ônus da prova são regras de julgamento para afastar a dúvida. Neste enfoque, a Lei nº 8.078/90 prevê a facilitação da defesa do consumidor através da inversão do ônus da prova, adequando-se o processo à universalidade da jurisdição, na medida em que o modelo tradicional mostrou-se inadequado às sociedades de massa, obstando o acesso à ordem jurídica efetiva e justa. Fortaleceu sua posição através da associação de grupos, possibilitando a defesa coletiva de seus interesses, além de sistematizar a responsabilidade objetiva e reformular conceitos de legitimação para agir e conferir efeitos à coisa julgada secundum eventum litis. A inversão do ônus da prova é direito de facilitação da defesa e não pode ser determinada senão após o oferecimento e valoração da prova, se e quando o julgador estiver em dúvida. É dispensável caso forme sua convicção, nada impedindo que o juiz alerte, na decisão saneadora que, uma vez em dúvida, se utilizar das regras de experiência em favor do consumidor. Cada parte deverá nortear sua atividade probatória de acordo com o interesse em oferecer as provas que embasam seu direito. Se não agir assim, assumirá o risco de sofrer a desvantagem de sua própria inércia, com a incidência das regras de experiência a favor do consumidor.

112-grifo nosso

Insta ressaltar, ainda que embora seja necessário provar a culpa do

profissional liberal para que possa ser responsabilizado, a inversão do ônus da

prova pode desfavorecê-lo, na medida que, se não conseguir provar que não

concorreu com culpa, será responsabilizado pelo dano que deu causa.

Destarte, a prova é necessária para formar a convicção do juiz diante dos

fatos narrados no processo, assim, se ao magistrado restar dúvida determinará a

inversão do ônus da prova para a formação do seu convencimento.

112

Cecília Matos apud FILOMENO, José Geraldo Brito In GRINOVER, Ada Pellegrini...[et al.], Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9 ed. Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária, 2007. p. 151.

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70

3.4 PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR NO DANO MÉDICO

A responsabilidade civil pelo fato do produto e serviço proporciona o direito

da vítima do evento de reclamar a reparação por danos morais em até cinco anos

com o início da contagem do prazo a partir do momento que ocorreu o conhecimento

do dano e de sua autoria, como preconiza o Código de Defesa do Consumidor:

“Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados

por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a

contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.”

Contudo, quando há a pretensão da reparação civil em se tratando de uma

relação que não é de consumo, o Código Civil de 2002 reduz os prazos

prescricionais para três anos, de acordo com o artigo 206, §3º, inciso V, que dispõe:

“Art. 206. Prescreve: §3.º: Em três anos: V – a pretensão de reparação civil.”

De qualquer forma, nos importa que a norma de proteção do consumidor

institui um benefício ao consumidor, que pode tirar proveito do prazo de cinco

anos113 disposto no CDC. Pois, muitas vezes a constatação do prejuízo e do dano

causado à vida ou à saúde do paciente não pode ser percebido logo no início,

assim, a lei concede o início da contagem do prazo prescricional apenas quando o

paciente tiver conhecimento da autoria114, ou seja, ele somente começa a correr a

partir do instante em que o dano ao paciente se tornar conhecido, proporcionando

113

CIVIL E PROCESSUAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ERRO MÉDICO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. ARTIGO 27 DO CDC. AGRAVO IMPROVIDO.

Outras informações É aplicável o prazo de prescrição de cinco anos na hipótese de ação de indenização para reparação de danos decorrentes de erro médico, tendo em vista a aplicação do artigo 27 do Código de Defesa do Consumidor aos serviços médicos, conforme precedentes da Terceira Turma do STJ. (AgRg no Ag 1213352/SP Relator: Aldir Passarinho Junior Julgamento: 23/11/2010 DJe 03/12/2010) 114

LISBOA, Roberto Senise, op. cit. p. 325.

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ao paciente a chance de restituir os prejuízos a tempo, caso contrário, muitas vezes

o médico ficaria impune ao causar um dano ao paciente-vítima.

Ademais, para que haja o dever de indenizar, e para que o montante devido

do dano experimentado pelo paciente possa ser liquidado, deve-se comprovar

efetivamente quais foram os gastos despendidos em razão do dano sofrido, que só

poderá ser calculado após o conhecimento do mesmo.

Por fim, é de suma importância evidenciar, que para a existência do dever

de indenização, é devida a comprovação do dano causado ao paciente, se no caso

houve a omissão ou ação que ensejou em um ato culposo115, por parte do médico,

causador do dano à vítima, e se entre esse ato e o dano efetivamente causado,

houve o chamado nexo de causalidade, para a partir dessa premissa incumbir aos

responsáveis o ressarcimento.

115

RECURSO ESPECIAL. ERRO MÉDICO. CIRURGIÃO PLÁSTICO. PROFISSIONAL LIBERAL. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTES. PRESCRIÇÃO CONSUMERISTA.

I - Conforme precedentes firmados pelas turmas que compõem a Segunda Sessão, é de se aplicar o Código de Defesa do Consumidor aos serviços prestados pelos profissionais liberais, com as ressalvas do § 4º do artigo 14. II - O fato de se exigir comprovação da culpa para poder responsabilizar o profissional liberal pelos serviços prestados de forma inadequada, não é motivo suficiente para afastar a regra de prescrição estabelecida no artigo 27 da legislação consumerista, que é especial em relação às normas contidas no Código Civil. Recurso especial não conhecido. (REsp 731078/SP Relator: Castro Filho Julgamento: 13/12/2005 DJ 13/02/2006 p. 799 RSTJ vol. 206 p. 309)

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O instituto da responsabilidade civil está presente nos diversos sistemas

jurídicos e sua aplicação é cada vez mais necessária, na medida em que a

sociedade evolui, tornando-se indispensável para a caracterização da obrigação de

indenizar e reparar os danos causados a outrem. A responsabilidade civil é,

portanto, a obrigação que um indivíduo tem para com o outro quando lhe causa

dano. Devido à grande expansão da medicina em nossos tempos, a

responsabilidade civil exerce importante papel no sentido de reparar e (por que

não?) prevenir os danos que podem certamente decorrer da atuação dos

profissionais médicos.

Com tal motivação, este estudo principiou pela análise dos pressupostos da

responsabilidade civil, que são: a ação ou omissão, que é o fazer ou deixar de fazer

alguma coisa; a culpa ou dolo do agente, ou seja, se o agente com ou sem intenção,

concorreu com o dano; o nexo causal, isto é, a relação de causa e efeito entre a

conduta e o prejuízo sofrido; e o dano. Posteriormente à análise dos pressupostos

da responsabilização fundada em culpa ou dolo, passou-se ao exame da

responsabilidade objetiva, na qual não é necessária que se verifique a culpabilidade

do agente.

No Código de Defesa do Consumidor fica claro que a responsabilidade dos

médicos é subjetiva, visto que é necessário que se prove a culpa ou dolo. Isto é, se

ficar caracterizado que o médico, deliberadamente ou por imprudência, imperícia ou

negligência deu conseqüência a um dano ao paciente, terá o dever de indenizar. No

que diz respeito aos estabelecimentos de saúde, não é necessária a demonstração

de culpa, pois trata-se de responsabilidade objetiva, bastando à vítima provar que

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sofreu o dano em decorrência do atendimento prestado para que tenha o direito de

ser indenizada.

Em seguida, apresentada a distinção entre responsabilidade contratual e

extracontratual, concluiu-se que tal distinção é indiferente à luz do Código de Defesa

do Consumidor, pois ali equipara-se o consumidor a todas as vítimas do acidente de

consumo, pouco importando a natureza (contratual ou não) da relação entre médico

e paciente.

Restou demonstrado ao longo do presente trabalho que o consumidor é a

parte mais fraca na relação de consumo, o qual, por muitas vezes não possui

condições econômicas ou técnicas para produzir a prova dos fatos que dão ensejo à

indenização. Dessa forma, a lei consumerista, mais uma vez, protege-o, permitindo

ao juiz a inversão do ônus da prova em desfavor do fornecedor. A aplicação da

inversão do onus probandi em favor de pacientes que sofreram danos decorrentes

de serviços médicos pode ser determinante para a obtenção da indenização, já que

muitas vezes encontram-se em uma situação de vulnerabilidade devido ao seu

estado de saúde e as provas necessárias são de difícil acesso, visto que, na maior

parte dos casos, prontuários, fichas e afins encontram-se em poder do médico ou

estabelecimento de saúde.

Destacou-se também que, para a reparação dos danos ao consumidor,

existe norma inscrita no CDC estabelecendo prazo prescricional de cinco anos, a

partir da data do conhecimento do dano a ele causado. Trata-se, como visto, de

norma consideravelmente mais vantajosa ao consumidor do que a regra genérica de

prescrição vigente no Código Civil, em que a prescrição da pretensão de reparação

civil opera-se em três anos.

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Nota-se, pois, que o Código de Defesa do Consumidor representou

importante avanço na proteção dos direitos de pacientes/consumidores vitimados

por um número crescente de fornecedores/prestadores de serviços médicos, que,

infelizmente, nem sempre pautam suas ações pelos preceitos éticos e legais que

devem nortear a Medicina.

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