valdirene gonÇalves lima
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FACULDADE LATINO-AMERICANA DE CIÊNCIAS SOCIAIS
FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO
VALDIRENE GONÇALVES LIMA
DIREITO UNIVERSAL X RECURSOS LIMITADOS: A PROBLEMÁTICA DA
JUDICIALIZAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL
SÃO PAULO - SP 2019
Valdirene Gonçalves Lima
DIREITO UNIVERSAL X RECURSOS LIMITADOS:
A PROBLEMÁTICA DA JUDICIALIZAÇÃO DE
POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL.
Dissertação apresentada ao curso Maestría Estado, Gobierno y Políticas Públicas da Faculdade Latino-
Americana de Ciências Sociais e Fundação Perseu
Abramo, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Magíster en Estado, Gobierno y Políticas Públicas.
Orientador: Prof. Dr. Alexandre Lalau Guerra
SÃO PAULO – SP
2019
Ficha Catalográfica
LIMA, Valdirene Gonçalves
DIREITO UNIVERSAL X RECURSOS LIMITADOS: A
PROBLEMÁTICA DA JUDICIALIZAÇÃO DE
POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL /
Valdirene Gonçalves Lima. São Paulo: FLACSO/FPA, 2019.
71 f.
Dissertação (Magíster en Estado, Gobierno y Políticas
Públicas), Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais,
Fundação Perseu Abramo, Maestría Estado, Gobierno y
Políticas Públicas, 2019.
Orientador: Prof. Dr. Alexandre Lalau Guerra
Orientador/a: Nome do/a orientador/a
Valdirene Gonçalves Lima
DIREITO UNIVERSAL X RECURSOS
LIMITADOS: A PROBLEMÁTICA DA
JUDICIALIZAÇÃO DE POLÍTICAS
PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL.
Dissertação apresentada ao curso Maestría Estado, Gobierno y Políticas
Públicas da Faculdade Latino-Americana
de Ciências Sociais e Fundação Perseu Abramo, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de Magíster en Estado, Gobierno y Políticas Públicas.
Aprovada em
__________________________________________________________ Prof. Dr. Alexandre Lalau Guerra
FLACSO Brasil/FPA
__________________________________________________________
Prof.ª Dra. Ana Luiza Matos de Oliveira Fundação Perseu Abramo
________________________________________________________
Prof.ª M.ª Anny Karinne de Medeiros Centro Universitário Senac
__________________________________________________________ Prof. Dr. Marcelo Prado Ferrari Manzano
Fundação Perseu Abramo
Dedico este trabalho aos meus companheiros petistas da Turma 3 do curso Maestría Estado,
Gobierno y Políticas Públicas Flacso/FPA.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente quero agradecer a Deus por ter colocado no meu caminho a
oportunidade de cursar um Mestrado, bem como ao Partido dos Trabalhadores por
ter feito esse investimento na formação de sua militância. Agradeço muito ao meu
orientador, Dr. Alexandre Guerra, por ter toda a paciência do mundo em me orientar
e buscar soluções para o melhor andamento da pesquisa.
Tendo em vista que o tema de trabalho está diretamente relacionado ao fato
de eu ter trabalhado por mais de 10 (dez) anos para a Secretaria da Saúde de
Ilhabela, não poderia deixar de agradecer a todos que fizeram parte da minha
caminhada. Meus sinceros agradecimentos aos meus gestores na Unidade Básica
de Saúde da Água Branca e no Hospital Municipal Governador Mário Covas Junior:
Elair Melão, Suelen Monteiro, Sandra Macedo, Roselene Medeiros e Eduardo
Rosmaninho, com quem pude vivenciar o cotidiano e os desafios enfrentados pelos
gestores do SUS. O tempo de trabalho na saúde pública, bem como o período em
que fiz parte do Conselho Municipal de Saúde do município de Ilhabela, me
propiciaram conhecer vários lados dentro do mesmo SUS: dos gestores, dos
funcionários e dos pacientes, experiências que, com certeza, fizeram toda a
diferença na minha formação profissional e pessoal.
Também não poderia me esquecer dos companheiros da Turma 3 e 4 do
curso Maestría Estado, Gobierno y Políticas Públicas da Flacso/FPA, que muito
enriqueceram as aulas com suas experiências profissionais e de vida, o que
propiciou uma grande troca de vivências, advindas de diversas regiões do Brasil:
desde o Rio Grande do Sul até o Acre, em especial agradeço ao meu colega de
almoço Moyses e também aos colegas Nilson e José Viana, sempre muito
atenciosos e preocupados com o andamento do meu trabalho, com certeza a ajuda
dos dois foi fundamental para que eu não desistisse quando o desânimo batia à
porta.
Deixo também os meus sinceros agradecimentos ao meu primeiro orientador
Dr. Jeferson Mariano da Silva, que apesar de não ter sido possível me acompanhar
até o final do trabalho, contribuiu e muito para o início da pesquisa, principalmente
pela indicação de muitas das obras utilizadas na investigação.
Agradeço a minha família, em especial aos meus pais, que não tiveram
oportunidade de estudar, mas sempre zelaram pela boa educação das filhas.
Por fim, deixo também meu agradecimento a todos os professores que
contribuíram com conhecimento e experiências de vida para tornar o curso um
sucesso, bem como todos da equipe da Fundação Perseu Abramo, sempre muito
solícitos para com os alunos.
RESUMO
A máxima do artigo 196 da Constituição Federal que “a saúde é direito de todos e
dever do Estado” favorece a judicialização, já que a existência do direito de forma
ampla permite que muitos serviços ou produtos sejam solicitados pela via judicial.
O presente trabalho analisa o fenômeno da judicialização de políticas públicas no
âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS. O objetivo é verificar as consequências
dessas demandas judiciais no trabalho do Poder Executivo, especialmente na
implementação das ações de saúde coletiva. A presente investigação foi realizada
por meio de método qualitativo, ao analisar os resultados de pesquisas já
publicadas.
Palavras-chave: Judicialização de Políticas Públicas – Políticas Públicas de Saúde – Sistema Único de Saúde – Acesso a direitos – Poder Judiciário
RESUMEN
La máxima del artículo 196 de la Constitución Federal que "la salud es derecho de
todos y deber del Estado" favorece la judicialización, ya que la existencia del
derecho de forma amplia permite que muchos servicios o productos sean solicitados
por la vía judicial. El presente trabajo analiza el fenómeno de la judicialización de
políticas públicas dentro del Sistema Único de Salud - SUS. El objetivo es verificar
las consecuencias de eses procesos judiciales en el trabajo del Poder Ejecutivo,
especialmente en la implementación de las acciones de salud colectiva. La presente
investigación fue realizada por medio de método cualitativo, al analisar los resultados
de investigaciones já publicadas.
Palabras llave: Judicialización de Políticas Públicas - Políticas Públicas
de Salud - Sistema Único de Salud – Acceso a derechos – Poder Judicial
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 – Sistematização de argumentos de Marques e Dallari, 2007), referentes
à judicialização no SUS em ações no Estado de São Paulo de 1997 a
2004....................................................................................................................... 36
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 – Custo do tratamento com medicamentos mais modernos no Brasil em
2007 ..........................................................................................................................49
TABELA 2 – Gastos com Sentenças Judiciais pelas Secretarias Estaduais de Saúde
de 2010 a 2013 – UF selecionadas ...........................................................................53
TABELA 3 – Comparação dos gastos com Internações e Medicamentos na cidade de Juiz de Fora de 2012 a 2014 – Políticas coletivas x Sentenças Judiciais............54
TABELA 4 – Gastos com assistência farmacêutica via judicial de 2010 a 2014 -
Estado de São Paulo .................................................................................................55
TABELA 5 – Custo da saúde per capita de 2010 a 2014 no Estado de São Paulo..56
TABELA 6 – Custos da judicialização de medicamentos na região administrativa de
Ribeirão Preto de 2013 a 2015...................................................................................57
TABELA 7 - Custo estimado de processos judiciais na área da saúde contra a Prefeitura de Juiz de Fora- De setembro de 2014 a março de 2015 ........................59
TABELA 8 - Distribuição do gasto com saúde pública. Países selecionados,
2003 ..........................................................................................................................61
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AL – América Latina
ANVISA – Agência nacional de Vigilância Sanitária
CAP – Coeficiente de Adequação de Preços
CIB – Comissão Intergestora Bipartite
CIT – Comissão Intergestora Tripartite
DATASUS – Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde
FDA – Food and Drug Administration
HIV – Sigla em inglês para Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços
IPVS – Índice Paulista de Vulnerabilidade Social
LDO – Lei Orçamentária Anual
LOA – Lei Orçamentária Anual
MS – Ministério da Saúde
NASF – Núcleo de Apoio à Saúde da Família
OECD – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
PIB – Produto Interno Bruto
PNAF – Programa nacional de Assistência Farmacêutica
PPA – Plano Plurianual
PPI – Programação Pactuada e Integrada
PSF – Programa de Saúde da Família
RENAME – Relação Nacional de Medicamentos Essenciais
SAS – Secretaria de Atenção à Saúde
SCTIE – Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos
STF – Supremo Tribunal Federal
SUS – Sistema Único de Saúde
UF – Unidade da Federação
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ………………………………………………………..………… 15
CAPÍTULO 1 – POLÍTICAS SOCIAIS E A CONSTITUIÇÃO DE 1988 ........... 17
CAPÍTULO 2 – SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE .................................................. 21
CAPÍTULO 3 – A JUDICIALIZAÇÃO DE POLÍTCAS PÚBLICAS ..................... 29
CAPÍTULO 4 – A JUDICIALIZAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE 34
4.1 – Relativização de direitos: direito universal x recursos
limitados ........................................................................................... 44
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................ 62
REFERÊNCIAS .............................................................................................. 66
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INTRODUÇÃO
A Constituição de 1988 trouxe uma grande inovação nos direitos sociais, pois
universalizou o direito à saúde, determinando que “saúde é direito de todos e dever
do Estado”, assim, o direito que antes era limitado e acessível apenas aos que
estivessem aderidos ao sistema de previdência, agora é um direito sem qualquer
tipo de contribuição direta.
A mesma constituição que determina a universalização do direito à saúde
colocando isso como dever do Estado, também estipula a separação dos poderes
Legislativo, Executivo e Judiciário, impondo limites na atuação de cada um.
No entanto, a universalização do direito à saúde fez com que muitas pessoas
buscassem auxílio no judiciário para ter demandas atendidas, tais como pedidos de
medicamentos, já que a lei maior do país impôs que é dever do Estado garantir o
direito à saúde.
O objetivo deste trabalho é analisar as consequências da judicialização das
políticas públicas de saúde na atuação do poder executivo brasileiro. Será analisado
o período pós-constituição de 1988.
A pesquisa propõe analisar os processos de judicialização no Sistema Único
de Saúde – SUS, por meio de procedimento metodológico de tradição qualitativa.
Por meio de análise documental, foram estudadas publicações que tratam do
assunto.
Os principais autores que embasaram esta pesquisa foram Tate e Vallinder,
os primeiros a trazer à tona a questão da expansão do Poder Judiciário, sendo que
na questão de judicialização de políticas públicas de saúde tiveram destaque os
autores Scheffer et al., Messender, Marques e Dallari, Chiefi e Barata, Pepe et al.,
Machado et al., Ferraz e Vieira, Vasconcelos, Bianca e Damascena, Mapelli Junior,
Laffin e Bonacim, Wang et al. e Nunes.
O presente estudo está dividido em quatro capítulos. O primeiro trata da
origem das políticas sociais, já que como afirmado por Tate e Vallinder (1995), para
existir judicialização é necessário que exista uma política de direitos. O segundo
capítulo trata da estrutura do SUS, importante de ser conhecido, já que a
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organização do sistema sofre grande interferência por conta da judicialização. O
terceiro capítulo trata da judicialização de políticas públicas em seus aspectos
histórico e geral e por fim, o quarto capítulo trata da judicialização na área da saúde,
no âmbito do SUS, bem como os seus impactos.
17
CAPÍTULO 1 – POLÍTICAS SOCIAIS E A CONSTITUIÇÃO DE 1988
De acordo com Guerra (2017), o marco temporal da expansão do conjunto
das políticas sociais foi o segundo pós-guerra. Nesse período foram implementadas
as políticas de bem estar social e os modelos de políticas sociais implementados em
cada sociedade se basearam em modelos de origem bismarkiana (seguro social) e
beveridgiana (seguridade social).
O modelo bismarkiano surgiu em 1883 na Alemanha, quando o então
Chanceler Otto Von Bismark criou um sistema de seguro social condicionado à
contribuições de empregados e empregadores; sendo que os benefícios recebidos
deveriam ser proporcionais aos valores e número de prestações recolhidas. Nesse
modelo, as políticas sociais exigem uma contraprestação, não são universais,
podem ser tratadas também como seguro social.
Inclusive, foi também na Alemanha que em 1919 foi votada a constituição de
Weimar, que se tornou um grande marco na implementação de políticas sociais. O
interessante, é que a Constituição de Weimar colocava como direito e obrigação o
exercício do trabalho e na impossibilidade, previa o direito de ajuda financeira do
governo:
Apesar de sua liberdade pessoal, todo alemão é obrigado a investir sua energia física e intelectual de forma necessária ao benefício público. A cada alemão será dada a oportunidade de ganhar a vida mediante um trabalho econômico. Não sendo oferecidas aberturas apropriadas de trabalho, ele receberá apoio financeiro.( in MARTINS, 2017, p. 89)
Assim, o modelo bismarkiano, de caráter excludente ao associar a inserção
no sistema de seguro social ao vínculo formal de trabalho, ganha uma versão
inclusiva na Constituição de Weimar, já que no documento o Estado garantia o
direito ao emprego, e em não sendo possível, havia o direito de receber ajuda
estatal.
Já o modelo beveridgiano surgiu em 1942 na Inglaterra. O modelo do Plano
Beveridge pretendia instituir um estado de bem estar social (Welfare state) em que
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os direitos sociais são universais sem necessidade de contraprestação, cujo
financiamento é proveniente de tributos. Pode-se classificar o sistema de
previdência social brasileiro como misto, pois é bismarkiano nos benefícios que
dependem de prévia contribuição e beveridgiano com relação à aposentadoria
especial rural, cujo benefício é de 1 (um) salário mínimo, sem necessidade de ter
contribuído com o sistema. Já o Sistema Único de Saúde – O SUS - é beverigdiano,
já que para o acesso não exige qualquer contribuição direta. Guerra (2017) elenca
ainda um terceiro tipo como sendo “seletivo”, nele se enquadra a assistência social
brasileira, que para acesso aos seus programas é necessário preencher alguns pré-
requisitos.
No Brasil, antes da Constituição de 1988, o sistema público de saúde era
vinculado ao sistema de previdência, ou seja, somente os trabalhadores que
contribuíam tinham acesso à saúde pública, mostrando-se característica da vertente
bismarkiana. Para que esse sistema fosse realmente inclusivo, era necessário que
todos tivessem acesso ao trabalho formal, como isso não acontecia, o sistema
acabava sendo excludente.
No entanto, com a promulgação da Constituição de 1988, foram implantados
os princípios da seguridade social de origem beveridgiana, para nortear os serviços
de saúde, previdência e assistência social. Um imenso avanço, com certeza, foi na
saúde, que passou a ser “direito de todos e dever do Estado”. Assim, com relação
ao direito à saúde, a Constituição de 1988 adotou o modelo beveridgiano,
universalizando o direito sem qualquer restrição, e mais, impondo ao Estado o dever
de garanti-lo.
Por ser a lei maior do país, a Constituição federal estabeleceu a separação
dos poderes, determinando a atuação do Legislativo, do Executivo e do Judiciário,
as ferramentas existentes para limitar o poder de cada um, bem como mecanismos
de freios e contrapesos para os poderes fiscalizem uns aos outros, sem que haja
invasão de competência ou sobreposição de um poder sobre o outro.
O Poder Executivo tem a função administrativa, devendo atuar dentro da lei. É
o Poder Executivo quem executa as políticas públicas, escolhe as obras e serviços
que terão prioridade. Como a legalidade é um princípio constitucional que rege a
administração pública, somente é possível fazer o que é previsto em lei; a lei
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orçamentária com o planejamento de onde serão aplicadas as verbas públicas
sempre é votada no ano anterior, tanto na esfera municipal, quanto na estadual e
federal. Em algumas situações existe algum grau de discricionariedade nas
decisões do administrador, como nos casos de nomeação de cargos em comissão
de livre provimento.
Já o Poder Legislativo tem como função a fiscalização do Executivo e também
a criação de leis para organização da administração pública, sendo que a atuação
também é limitada, já que algumas leis somente podem ser aprovadas se respeitado
o quórum mínimo, como nas situações de lei complementar, que para aprovação
são necessários votos da maioria absoluta dos membros ou no caso de emenda à
constituição, que exige aprovação de três quintos dos membros de cada casa do
Congresso Nacional e votação em dois turnos em ambas as casas. Já o Poder
Judiciário é aquele a quem compete julgar, de acordo com o que existe no
ordenamento jurídico.
Sobre o Poder Judiciário, é importante frisar que um de seus princípios é o da
inércia, ou seja, não pode agir de ofício. Qualquer julgamento do Poder Judiciário
somente pode ocorrer após provocação de parte legítima (definida em lei). Assim o
termo “ativismo judicial” muito utilizado na atualidade não está em sintonia com o
regime jurídico brasileiro e com o regime de separação dos poderes, já que o
Judiciário não pode atuar por conta própria, devendo agir com imparcialidade e
somente se for provocado por parte interessada.
A Constituição também aborda a competência de cada ente federativo e em
cada poder, ou seja, dispõe sobre a competência legislativa das casas do
Congresso Nacional, Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais; competência
administrativa da União, Estados, Municípios e Distrito Federal, bem como a
organização e competência dos órgãos do Poder Judiciário. A carta magna também
estabelece os tributos e a limitação de tributar de cada ente, bem como apresenta
como deve ocorrer a implementação de políticas públicas, estabelecendo as
responsabilidades de cada ente federativo e as formas de custeio de cada política
pública.
No âmbito do Sistema Único de Saúde, a organização foi estabelecida por
meio da Lei 8080/90. A lei do SUS também trouxe vários princípios para nortear as
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ações do Poder Público, entre os quais merecem destaque a universalidade,
integralidade, participação da comunidade e descentralização. Outro princípio muito
importante que também é elencado na lei 8080/90 é o da igualdade, no entanto, na
atualidade foi adotada a palavra equidade que é bem mais específica, já que trata da
igualdade material, pois trata iguais de forma igual e desiguais de forma desigual
para equilibrar as diferenças.
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CAPÍTULO 2 – SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE
É sabido que a Constituição Federal de 1988, também chamada de
Constituição Cidadã, foi um verdadeiro marco na conquista de direitos sociais, a
conquista da universalização da saúde foi talvez o mais desafiador.
Antes da Constituição de 1988, as ações de saúde pública eram divididas
entre o Ministério da Saúde e o Ministério da Previdência Social, enquanto o
primeiro cuidava das ações preventivas como vacinação, o segundo incumbia-se de
ações curativas que estavam disponíveis apenas àqueles que contribuíam com o
sistema previdenciário, conforme já mencionado.
A nova constituição, em seu artigo 196 trouxe a máxima:
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
Estava criado o SUS - Sistema Único de Saúde, que foi regularizado em
1990 com as Leis nº 8080/90 e 8142/90. A Lei 8080/90 coloca que o direito à saúde
vai muito além de atendimento médico:
Art. 2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.
§ 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.
Em seu artigo 3º, a Lei 8080/90 deixa claro que a saúde da população
demonstra a situação em que vive, e para se ter plena saúde, é necessário que
outros serviços essenciais estejam disponíveis e acessíveis:
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Art. 3o Os níveis de saúde expressam a organização social e econômica do
País, tendo a saúde como determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, a atividade física, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais.
Parágrafo único. Dizem respeito também à saúde as ações que, por força do disposto no artigo anterior, se destinam a garantir às pessoas e à coletividade condições de bem-estar físico, mental e social.
Isso demonstra que está claro o entendimento que a plena saúde
depende de ações que promovam o bem estar físico, mental e social, o que
aumenta ainda mais as responsabilidades do Estado, já que para promover saúde
faz-se necessário que haja investimentos em muitas áreas para que as pessoas
tenham qualidade de vida, o que inclui moradia digna, segurança, educação,
saneamento básico, cultura, lazer, entre outros.
Na verdade o SUS representa a materialização de uma nova concepção
acerca da saúde em nosso país. Antes a saúde era entendida como “o estado
de não doença”, o que fazia com que toda a lógica girasse em torno da cura
de agravos à saúde. Essa lógica, que significava apenas remediar os efeitos
com menor ênfase nas causas, deu lugar a uma nova noção centrada na
prevenção dos agravos e na promoção da saúde. Para tanto, a saúde passa
a ser relacionada com a qualidade de vida da população, a qual é composta
pelo conjunto de bens que englobam a alimentação, o trabalho, o nível de
renda, a educação, o meio ambiente, o saneamento básico, a vigilância
sanitária e farmacológica, a moradia, o lazer, etc. (BRASIL, 2000, p. 5)
Tal ênfase sobre a importância do bem estar na promoção da saúde
explica o porquê do tratamento que o SUS dá à atenção básica, que antes de
qualquer coisa, cuida da vigilância em saúde e prevenção de doenças. O SUS
segue um modelo descentralizado, sendo que há responsabilidades em âmbito
federal, estadual e municipal; as ações e programas também são organizados em
nível local e regional para melhor alcance da população. As políticas locais de saúde
geralmente são promovidas pelo Município com auxílio do Estado e Governo
Federal. Os atendimentos podem ocorrer em serviços próprios ou privados, por meio
de convênio (repasse financeiro) com um dos entes estatais.
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A gestão do SUS é única em cada nível e governo e se dá por meio de
pactuações (negociações) que são bipartite em âmbito estadual e tripartite em
âmbito nacional. Essas negociações ocorrem por meio de Comissões Intergestoras.
A Comissão Intergestora Tripartite (CIT) é composta por representantes do
Ministério da Saúde, do Conselho nacional dos Secretários Estaduais de Saúde e
Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde. Já uma Comissão
Intergestora Bipartite (CIB) é formada por representantes da Secretaria Estadual da
Saúde, do Conselho Estadual dos Secretários Municipais de Saúde ou órgão
equivalente. As negociações também ocorrem por meio de subcomissões regionais.
A Lei 8142/90 que trata da gestão do SUS, estabelece que deve haver
participação da comunidade. Logo em seu artigo 1º dispõe que em cada esfera de
governo deverá existir Conferência de Saúde e Conselho de Saúde como instâncias
colegiadas. Esses órgãos tornam o SUS mais democrático, por proporcionarem a
participação social.
Quanto à definição do conselho de saúde, tem-se:
“Pode-se definir um conselho de saúde como o órgão ou instância
colegiada de caráter permanente e deliberativo, em cada esfera de governo,
integrante da estrutura básica da secretaria ou departamento de saúde dos
estados e municípios, com composição, organização e competências
fixadas em lei. O Conselho consubstancia a participação da sociedade
organizada na administração do SUS, propiciando e melhorando o controle
social do sistema” (BRASIL, 2000, p. 10)
O Conselho de Saúde é um importante instrumento de democracia, pois
nele há representantes do Estado, dos trabalhadores, dos prestadores de serviços e
dos usuários.
Para uma gestão eficiente, no âmbito do SUS há uma série de
documentos que auxiliam todos os processos de trabalho, desde o planejamento até
a avaliação dos resultados. Entre os documentos mais importantes, estão o Plano
de Saúde (nacional, estadual e municipal), o Plano de Pactuação Integrada e o
Relatório de Gestão.
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Na programação anual, cada município estabelece os serviços que serão
oferecidos durante o ano, bem como os serviços que deverão ser realizados em
outros municípios. A Programação Pactuada e Integrada - PPI é criada a partir da
oferta e procura por serviços de um grupo de municípios, podendo o documento ser
a nível estadual ou regional.
O financiamento de todas as ações de saúde ocorre por meio da
integração dos orçamentos dos Municípios, Estados e Governo Federal. A Emenda
Constitucional nº 29, de setembro de 2000, estabeleceu o percentual mínimo
orçamentário a ser aplicada por cada ente federativo:
Art. 7º O Ato das Disposições Constitucionais Transitórias passa a vigorar
acrescido do seguinte art. 77:
Art. 77. Até o exercício financeiro de 2004, os recursos mínimos aplicados
nas ações e serviços públicos de saúde serão equivalentes:" (AC)
I – no caso da União:" (AC)
a) no ano 2000, o montante empenhado em ações e serviços públicos de
saúde no exercício financeiro de 1999 acrescido de, no mínimo, cinco por
cento;" (AC)
b) do ano 2001 ao ano 2004, o valor apurado no ano anterior, corrigido pela
variação nominal do Produto Interno Bruto – PIB; (AC)
II – no caso dos Estados e do Distrito Federal, doze por cento do produto da
arrecadação dos impostos a que se refere o art. 155 e dos recursos de que
tratam os arts. 157 e 159, inciso I, alínea a, e inciso II, deduzidas as
parcelas que forem transferidas aos respectivos Municípios; e (AC)
III – no caso dos Municípios e do Distrito Federal, quinze por cento do
produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 156 e dos
recursos de que tratam os arts. 158 e 159, inciso I, alínea b e § 3º. (AC)
§ 1º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios que apliquem
percentuais inferiores aos fixados nos incisos II e III deverão elevá-los
gradualmente, até o exercício financeiro de 2004, reduzida a diferença à
razão de, pelo menos, um quinto por ano, sendo que, a partir de 2000, a
aplicação será de pelo menos sete por cento. (AC)
§ 2º Dos recursos da União apurados nos termos deste artigo, quinze por
cento, no mínimo, serão aplicados nos Municípios, segundo o critério
populacional, em ações e serviços básicos de saúde, na forma da lei. (AC)
§ 3º Os recursos dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
destinados às ações e serviços públicos de saúde e os transferidos pela
União para a mesma finalidade serão aplicados por meio de Fundo de
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Saúde que será acompanhado e fiscalizado por Conselho de Saúde, sem
prejuízo do disposto no art. 74 da Constituição Federal. (AC)
§ 4º Na ausência da lei complementar a que se refere o art. 198, § 3º, a
partir do exercício financeiro de 2005, aplicar-se-á à União, aos Estados, ao
Distrito Federal e aos Municípios o disposto neste artigo. (AC)
Por conta da imposição da Emenda Constitucional nº 29, criou-se os
fundos de saúde em âmbito municipal, estadual e federal, o que facilitou também as
transferências de um ente a outro, conhecidas como fundo a fundo, facilitando a
descentralização.
A Lei 8080/90 apresenta vários princípios norteadores do SUS, entre eles
está o da universalidade de atendimento, que nada mais é que oferecer serviços a
todos que dele necessitarem, sem qualquer contraprestação. O princípio da
integralidade diz respeito ao tratamento integral a que os usuários têm direito, seja
em caráter individual ou coletivo, como políticas específicas para grupos específicos
com necessidades específicas (gestantes, crianças, hipertensos). A equidade é
outro princípio do SUS, e tem como missão tratar iguais com igualdade na tentativa
de reduzir diferenças sociais, promovendo um equilíbrio ao ajudar mais quem mais
necessita.
Outro grande princípio é o da descentralização, considerando que o SUS
é um sistema único e ao mesmo tempo integrado com gestão própria em cada nível
de governo.
O Sistema Único de Saúde (SUS) é constituído pelo conjunto das ações e
dos serviços de saúde sob gestão pública. Está organizado em redes
regionalizadas e hierarquizadas e atua em todo o território nacional, com
direção única em cada esfera de governo. O SUS não é, porém, uma
estrutura que atua isolada na promoção dos direitos básicos de cidadania.
Insere-se no contexto das políticas públicas de seguridade social, que
abrangem, além da saúde, a previdência (INSS) e a assistência social.
(BRASIL, 2009, p. 8)
As ações de atendimento são planejadas geralmente a nível municipal e
regional, por estarem mais próximos dos pacientes e da realidade local, sendo que
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os Estados e Governo Federal participam mais com repasses financeiros. Até
mesmo os programas nacionais são implantados com a adesão dos municípios, que
organizará a implementação das ações.
Os repasses fundo a fundo ocorrem de maneiras diferentes, uma parte é
regular de acordo com a política de destino (assistência farmacêutica, vigilância
epidemiológica, assistência hospitalar) e outra vinculada à produção (número de
atendimentos realizados). Os repasses que ocorrem de forma regular são
considerados mais eficientes, por facilitarem as ações de prevenção:
A remuneração de serviços produzidos “financia” a doença, trata a prefeitura como mero prestador de serviços e privilegia as localidades que já possuem estrutura de serviços. O repasse fundo a fundo, diferentemente, prioriza a atenção integral à saúde, atribui ao prefeito o papel de gestor do Sistema Único de saúde e estabelece planos de ações de saúde de acordo com a realidade local” (BRASIL, 2000, p. 35)
O trabalho conjunto dos entes federativos sustentam uma assistência
organizada em três níveis: atenção básica, média complexidade e alta
complexidade.
A atenção básica é definida pela Portaria nº 2.436/17 como:
Art. 2º A Atenção Básica é o conjunto de ações de saúde individuais, familiares e coletivas que envolvem promoção, prevenção, proteção, diagnóstico, tratamento, reabilitação, redução de danos, cuidados paliativos e vigilância em saúde, desenvolvida por meio de práticas de cuidado integrado e gestão qualificada, realizada com equipe multiprofissional e dirigida à população em território definido, sobre as quais as equipes assumem responsabilidade sanitária.
No âmbito do SUS, a atenção básica é ofertada dentro do Programa
Saúde da Família – PSF, com equipe multiprofissional composta de no mínimo
médico, enfermeiro, auxiliar de enfermagem e agentes comunitários de saúde; pode
ser ampliado com cirurgião-dentista, auxiliar de consultório dentário e técnico de
higiene bucal. Em 2008 surgiu o Núcleo de Apoio à Saúde da Família – NASF, que
amplia a abrangência do trabalho do PSF por possuir outros profissionais como
27
psicólogos, nutricionistas, terapeuta ocupacional, farmacêutico, fisioterapeutas entre
outros.
O atendimento de média complexidade é definido como “conjunto de
ações ambulatoriais e hospitalares, caracterizadas pela especialização médica,
procedimentos diagnósticos e terapêuticos, adensamento tecnológico e oferta
baseada na economia de escala” (GOTTEMS e PIRES, 2009, p. 192), enquanto a
alta complexidade é expressa como “um conjunto de procedimentos que, no
contexto do SUS, envolve alta tecnologia e custo, objetivando propiciar à população
acesso a serviços qualificados, integrando-o aos demais níveis de atenção”
(GOTTEMS e PIRES, 2009, p. 192).
Geralmente o município consegue oferecer os serviços de atenção
básica, enquanto os de média e alta complexidade são realizados de acordo com as
negociações da PPI, até mesmo para concentrar o volume de atendimentos para a
redução de custos (GOTTEMS e PIRES, 2009, p. 192).
Toda essa estrutura do SUS é importantíssima para que as políticas de
saúde possam ser planejadas, implementadas e oferecidas, sempre dentro do
orçamento disponível. Desde que o SUS foi criado na Constituição de 1988, o poder
executivo trabalhou muito para se chegar à estrutura que existe hoje. A estrutura é
criada para que o usuário encontre atendimento de acordo com o planejado,
geralmente procura pela assistência básica e em havendo necessidade de outro
tratamento, este é encaminhado para onde exista o serviço. Dentro do SUS há as
chamadas centrais de regulação, que controlam a oferta e procura dos serviços,
fazendo os agendamentos de acordo com a PPI, ou seja, o local onde o serviço será
oferecido de acordo com a negociação que ocorreu entre os gestores.
Sempre que alguém ingressa com uma ação judicial para conseguir um
serviço que lhe foi negado ou que seria muito demorado pela via normal, a decisão
judicial, no mínimo, interfere na estrutura montada e isso mexe também com a
questão orçamentária. Em pequenos municípios, uma condenação para fornecer
uma medicação cara pode comprometer uma série de serviços, inclusive salários de
servidores. O orçamento anual é criado justamente para organizar os gastos de
acordo com a previsão das receitas para o ano corrente. Como o orçamento é um
só, o aumento de despesa acaba por interferir no andamento do serviço de toda a
administração pública. Sem contar que a decisão judicial também pode interferir na
28
estrutura administrativa criada para oferecer o serviço, já que é possível que um
Município seja condenado a prestar um serviço que na pactuação ficou acordado
que seria oferecido e custeado pelo Estado.
29
CAPÍTULO 3 – A JUDICIALIZAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS
No sistema de separação de poderes, cada esfera tem sua área de atuação;
a judicialização acontece quando há a interferência do poder judiciário na esfera
administrativa ou legislativa, ou seja, quando uma decisão judicial interfere na
autonomia de outro poder.
Vallinder (1995), ao tratar do fenômeno de expansão do poder judiciário que
ocorreu no mundo todo, explica ainda que a judicialização da política é o aumento
do alcance do poder judiciário para áreas que antes eram restritas aos poderes
executivo ou legislativo. Resumidamente, Vallinder (1995) coloca que judicialização
é essencialmente transformar algo em uma forma de processo judicial, ou seja, a
judicialização só ocorre quando há a interferência do Poder Judiciário em uma ação
do Executivo ou do Legislativo.
Oliveira (2005) afirma que “em resumo, só há judicialização quando juízes
apresentam uma postura política ou ideológica contrária àquela predominante nas
instituições majoritárias, opondo-se, assim, às políticas por estas adotadas”. Oliveira
(2005) coloca ainda que a judicialização da política acontece, de fato, somente
quando o ciclo é finalizado, ou seja, quando o poder judiciário é acionado e ocorre
um julgamento de mérito, ou seja, a questão precisa ser apreciada e ter um
julgamento final.
Sobre a posição de Oliveira (2005), vale ressaltar que esta interpretação é
perigosa, haja vista que há situações como a do Brasil, em que o mais alto escalão
do judiciário é composto por membros indicados pelo Poder Executivo. Assim, com
esta interpretação, bastaria que o chefe do executivo tivesse influência sobre a
maioria dos membros do STF para que também tivesse controle sobre mais um
poder da República. No entanto, agir sob influência política não é o que espera do
poder judiciário, já que as decisões devem ser baseadas nas leis e princípios
norteadores; espera-se que as decisões sejam imparciais.
No sistema de separação de poderes, ao poder executivo cabe a função
administrativa. Em se tratando de poder judiciário, cabe apenas a interpretação das
leis existentes, devendo a interpretação ser pautada no texto da lei e também nos
princípios constitucionais e gerais que regem o direito. No entanto, muitas vezes
30
pode ocorrer de o judiciário determinar que certa lei não possa ser aplicada, sob a
alegação de que a lei é inconstitucional.
Sabe-se que as leis são criadas pelo Poder Legislativo, no entanto a
motivação para criá-las decorre da conveniência dos parlamentares, ou seja, mesmo
existindo setores internos que avaliam a pertinência e a compatibilidade da lei com
sistema constitucional, os parlamentares não estão vinculados aos pareceres, assim
a aprovação das leis ocorre pela decisão da maioria (vontade legislativa). Essa
premissa demonstra também que a criação de uma lei decorre de um processo
democrático, pois os parlamentares nada mais são que representantes do povo,
eleitos democraticamente.
Já no judiciário, as decisões são técnicas, os dois lados possuem direitos e a
argumentação apresentada pelas partes dará elementos para que os julgadores
avaliem os valores conflitantes e decidam qual o direito que deverá prevalecer sobre
o outro, sempre de acordo com o ordenamento jurídico.
Muitas vezes o argumento do governo para defender a aplicação de uma
política pública é a existência de lei específica, no entanto nem sempre a existência
de lei é garantia que a medida seja justa, pois muitas vezes a alegada lei não está
em harmonia com a constituição ou com os princípios norteadores. Nestas
situações, o controle de constitucionalidade também é função do Poder Judiciário.
Sobre o surgimento do controle de constitucionalidade, tem-se como principal
referência o caso de Marbury contra Madison, ocorrido em 1803 nos Estados
Unidos. Em 1800, após perder as eleições para Thomas Jefferson, John Adams,
ainda no poder, resolveu nomear vários juízes de sua confiança em altos cargos, no
intuito de deter certa influência no Estado após sua saída. Entre as nomeações
estava a de William Marbury como juiz de paz. O secretário de justiça de Adams era
John Marshall, que foi nomeado para exercer futuramente um cargo semelhante ao
que entendemos como presidente da Suprema Corte.
No entanto, após a posse de Jefferson, o então secretário de justiça, James
Madison, analisou que várias nomeações de juízes federais não haviam sido
concluídas, e por isso resolveu cancelá-las. Entre as nomeações pendentes estava
a de Marbury como juiz de paz, haja vista que o secretário de justiça anterior não
teve tempo hábil de efetivar a nomeação feita pelo ex-presidente Adams.
Inconformado, Marbury apresentou um pedido perante a Suprema Corte dos
Estados Unidos (semelhante ao mandado de segurança brasileiro) exigindo a
31
efetivação de sua posse no cargo. A decisão ficou nas mãos do presidente da
suprema corte Jonh Marshall, que tinha sido secretário de justiça do ex-presidente
Adams. A saída encontrada por Marshall foi de afastar a competência da suprema
corte para decidir a situação, haja vista que a lei federal que dava competência
originária à Suprema Corte para o caso contrariava a constituição federal, sendo que
com sua decisão não adentrou no mérito da questão e também não entrou num
conflito político entre republicanos e democratas. O caso foi a primeira decisão em
que um Tribunal proclamou sua competência de afastar a aplicação de leis sob a
alegação de inconstitucionalidade.
Observa-se que o caso Marbury contra Madison dá razão à posição de
Oliveira no que diz respeito à influência da posição política e ideológica dos
membros do judiciário em suas decisões. O fato de o ex-presidente ter feito
nomeações de tantas pessoas de sua confiança para ocupar altos escalões do
judiciário ocorreu na crença de que isso poderia ser levado em consideração em
algumas decisões, ou seja, a tão essencial “imparcialidade” poderia ser deixada de
lado.
Atualmente, o judiciário aparece não apenas para fazer valer as leis
existentes, mas também para declarar a inconstitucionalidade de leis que não estão
de acordo com a constituição ou princípios constitucionais.
Tate (1995) coloca em discussão a questão da judicialização de políticas
públicas dentro de uma democracia. Sabe-se que as leis são criadas por
representantes do povo (Poder Legislativo) e que as políticas públicas também são
criadas por representantes do povo (Poder Executivo). Diante dessa premissa, Tate
(1995) observa que uma decisão judicial que modifica decisões políticas tomadas
por representantes legítimos é uma forma de passar por cima da democracia, sem
contar que, na judicialização, a decisão fica na mão de alguém que não foi eleito
pela sociedade e que não sofre controle externo.
No entanto, por outro lado, a judicialização de políticas públicas somente é
possível dentro de um sistema democrático, já que num governo totalitário jamais
seria possível esse tipo de interferência do judiciário. Tate (1995) confronta as duas
situações: se, por um lado, muitos consideram que a judicialização interfere em
políticas públicas criadas por uma maioria em um sistema democrático, por outro
lado dificilmente se encontraria a judicialização de políticas publicas dentro de um
sistema não democrático. Nesse ponto, Werneck Vianna et al. (2014) afirmam que a
32
chamada judicialização da política é um fenômeno corrente em países de
democracia avançada.
Tate (1995) elenca vários fatores que contribuem para a ocorrência da
judicialização de políticas públicas, tais como: existência de democracia, o sistema
de separação dos poderes, uma política de direitos, grupos de interesses e oposição
política.
Tendo em vista que as decisões políticas podem ser colocadas como
decisões democráticas das maiorias (escolhas dos representantes do povo), as
minorias encontraram no Judiciário o meio de inverter decisões políticas. Werneck
Vianna et al. (2014) analisaram as Ações Declaratórias de Inconstitucionalidade –
Adins - apresentadas de 1988 a 1998. Como na administração publica impera o
princípio da legalidade, a Adin é o meio hábil para ver declarada a
inconstitucionalidade de lei, ou seja, um dos principais meios adotados para que o
Judiciário possa interferir na adoção de políticas públicas, ou melhor, nas decisões
tomadas pelos poderes Legislativo ou Executivo.
As leis são consideradas democráticas porque a sua aprovação ocorre pela
decisão de uma maioria (representantes legítimos do povo). No entanto, o sistema
político permite que várias decisões sejam tomadas por interesse político alheio ao
interesse público, principalmente dentro de um governo de coalizão. Assim, é
possível que as minorias invertam a decisão da maioria em algumas situações.
Em uma investigação feita por Werneck Vianna et al. (2014), percebeu-se
que, se de um lado o remédio constitucional é utilizado contra o Executivo, por outro,
apresenta-se como uma ferramenta também utilizada pelo Executivo contra ações
de parlamentares. O estudo demonstrou que mais de 50% das Adins propostas
tiveram a autoria de Governadores e Procuradores Federais. Werneck Vianna et al.
(2014) verificaram que, nas Adins propostas para dirimir controvérsias entre o
Executivo Estadual e Assembleia Legislativa, o assunto não versa sobre questão
que atinja o público geral, mas geralmente de assunto próprio da máquina
administrativa. Num recorte das ações, verificou-se que grande parte das ações
discutia normas criadas para promover isenção de tributos, anistia fiscal, isenção e
redução de multas e incentivos fiscais a alguns grupos.
Já Oliveira (2005) apresenta um estudo sobre a interferência do Poder
Judiciário no processo de privatização de estatais na década de 90. A autora coloca
que não basta que alguém proponha uma ação contra uma decisão política para que
33
seja considerada judicialização, pois a judicialização ocorre apenas quando há uma
interferência do Poder Judiciário em uma decisão política, ou seja, não basta apenas
a provocação do judiciário, a interferência precisa ocorrer de fato.
Em sua investigação, Oliveira (2005) concluiu que não ocorreu judicialização
da política na privatização das estatais na década de 90, já que não houve decisões
de mérito para impedir a ação do governo. Até a finalização da investigação do
estudo, nenhuma das ações finalizadas foram capazes de interferir na venda das
estatais, no máximo, retardar o processo; muitas das ações nem chegaram a ter o
mérito julgado, ou por desistência do autor ou por improcedência de plano. Assim,
de acordo com Oliveira (2005), mesmo com o acionamento do Poder Judiciário, não
houve a judicialização da política de privatizações, pois a atuação do Poder
Judiciário não barrou a decisão política para vender as estatais.
A judicialização de políticas públicas (tanto a imposição da obrigação de fazer
como a proibição de fazer algo) pode ocorrer em qualquer área, sendo que a área
da saúde é uma das mais sensíveis, já que, em certas situações, trata-se de risco de
vida.
34
CAPÍTULO 4 - A JUDICIALIZAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE
A existência de uma política de direitos está entre os fatores que Tate (1995)
elencou como importantes para a existência da judicialização. O fato de a
Constituição Federal brasileira estabelecer que a saúde é direito de todos e dever do
Estado torna clara a tutela desse direito em nosso ordenamento jurídico, no entanto,
nem sempre foi assim.
Carvalho (2013) fez um estudo sobre a efetivação do direto à saúde pública,
trazendo também o histórico da inclusão de direitos sociais na legislação brasileira.
Em sua explanação, a autora coloca que é recente a inclusão dos direitos sociais no
Brasil; no período colonial o Estado limitava-se á fiscalização sanitária, sendo que os
serviços assistenciais ficavam a cargo das Santas Casas. Com a Constituição de
1824, previu-se a criação de socorros públicos, mas não saiu do papel. Já na
Constituição de 1891, houve avanços na área social com a criação de institutos
como aposentadoria por invalidez a funcionários públicos e socorros públicos em
caso de calamidade.
O final do século XX também foi marcado por campanhas sanitárias, como
vacinação da população, no entanto, conforme observa Barroso, citado por Carvalho
(2013), a ação foi mais considerada imposição que um direito de fato, tanto que o
fato marcou a época como “revolta da vacina”, já que a vacinação era realizada
mediante força policial e abuso de autoridade.
A autora coloca que foi a partir da Constituição de 1934 que surgiram
dispositivos veiculadores de direitos sociais. Carvalho (2013) coloca que isso
interferiu na tradicional separação dos poderes, já que a edição de políticas públicas
na área social é decisão do Executivo, já que direitos sociais não são, por definição,
exigíveis, saindo assim da esfera de proteção jurisdicional.
Isso faz com que a área seja uma das mais atingidas pela judicialização de
políticas públicas, pois quando o orçamento destinado à saúde não é capaz de
atender certa demanda, processos judiciais entram em cena.
35
No campo da saúde pública, um dos pedidos mais comuns é o de
medicamentos. Existem várias pesquisas que apresentam a problemática, bem
como suas causas e consequências como nas realizadas por Scheffer et al. (2005),
Messeder et al. (2005), Marques e Dallari (2007), Chieffi e Barata (2009), Pepe et
al. (2009) e Machado et al. (2011). Na investigação de Scheffer et al. (2005),
buscou-se descobrir a causa de tantas ações judiciais para a aquisição de
medicamentos para tratamento do vírus HIV, bem como as consequências para
gestores e cidadãos.
Marques e Dallari (2007) foram mais além em sua investigação, pois também
analisaram a argumentação das ações judiciais. Entre os argumentos existentes em
cada processo, as ideias centrais apresentadas pelos autores, réus ou justificativas
das sentenças foram:
36
QUADRO 1
Sistematização de argumentos de Marques e Dallari, 2007), referentes à judicialização no SUS em ações no Estado de São Paulo de 1997 a 2004 Argumentos dos autores Argumentos dos réus Argumentos dos juízes nas
sentenças
O autor é portador de uma determinada doença, que está colocando em risco a sua vida ou a sua saúde.
Nenhum ato ou omissão de autoridade de saúde violou direito líquido e certo do autor;
O Estado de São Paulo, bem como seu Secretário de Estado da Saúde, são competentes para compor o polo passivo da ação.
O medicamento prescrito pelo profissional médico que assiste o autor representa um avanço científico e é o único capaz de controlar a moléstia que lhe acomete.
O pedido do autor não se enquadra na padronização da Política de Assistência Farmacêutica para o tratamento da respectiva doença, não merecendo prosperar.
A atuação do Poder Judiciário não está interferindo no princípio da separação dos poderes do Estado. Está apenas resguardando um direito constitucional.
O autor não possui condições financeiras para adquirir o medicamento.
O medicamento pleiteado não possui registro da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), não podendo ser comercializado no Brasil.
Demonstrado o autor ser portador de uma doença e necessitar de um determinado medicamento, é curial seja o Estado obrigado a providenciar a sua implementação.
O direito do autor à saúde e à assistência farmacêutica integral é um direito fundamental, garantido por Lei.
O Estado possui limitações legais e orçamentárias que obstam a garantia da pretensão do autor.
O direito de todos os indivíduos à saúde deve ser garantido integralmente, a despeito de questões políticas, orçamentárias ou entraves burocráticos.
As leis que subsidiam o direito à saúde e à assistência farmacêutica compreendem o fornecimento do medicamento específico necessitado pelo autor.
O Poder Judiciário não pode ser transformado em um co-gestor dos recursos destinados à saúde pública. Isso implica em afronta ao princípio da separação dos poderes do Estado.
A regra inscrita no artigo 196 da Constituição Federal é autoaplicável, não depende de regulamentação para ser exercida.
Os direitos à saúde e à assistência farmacêutica não dependem de regulamentação infraconstitucional para serem exercidos.
O Estado de São Paulo não é a pessoa jurídica de direito público competente para figurar no polo passivo da ação.
Os direitos fundamentais à saúde e à assistência farmacêutica não podem ser condicionados por políticas públicas de saúde ou por questões orçamentárias.
O direito à saúde deve ser interpretado em consonância com os demais preceitos constitucionais, de forma a atender os interesses de toda a coletividade. Atender à pretensão do autor é sobrepor o individual ao coletivo.
Os juízes têm se manifestado favoravelmente em pedidos semelhantes ao do autor.
Não há possibilidade de se garantir pretensão futura e incerta, como no caso de medicamentos ainda não prescritos ao autor. O pedido deve ser certo e determinado.
A política de assistência farmacêutica do Estado possui falhas e, por isso, não contempla o medicamento pleiteado.
O Estado não pode ser responsabilizado por eventuais danos morais e materiais que o autor alega ter sofrido, em decorrência da falta da medicação.
O Estado deve reparar o dano material e moral causado ao autor em decorrência de sua omissão.
Fonte: Marques e Dallari, 2007.
Scheffer et al. (2005) demonstraram que, nas situações em que o paciente
precisou que o judiciário impusesse ao executivo que fornecesse determinado
37
medicamento, nem sempre existiam provas concretas sobre a efetividade de
algumas drogas. Em algumas ocasiões, o medicamento pedido judicialmente é o
único capaz de salvar a vida do paciente, já em outros, o medicamento foi prescrito
para melhorar a qualidade de vida do paciente, principalmente por apresentar menos
efeitos colaterais.
Scheffer et al. (2005) chamaram a atenção para um processo do ano 2000 em
que pleiteava o fornecimento de um medicamento fitoterápico chamado “Canova”,
que seria eficaz no tratamento de aids e câncer. No entanto, não havia ainda
comprovação científica de sua ação. O pedido judicial foi atendido, já que, mesmo
sem a comprovação da eficácia do medicamento, existe um papel e dever ético do
médico escolher a melhor forma de tratamento.
De acordo com Ventura (2003) apud Scheffer et al. (2005, p. 22):
O modelo de assessoria jurídica foi iniciado pelo GAPA-São Paulo, desde
sua fundação, em 1985, e pelo Grupo Pela Vidda do Rio de Janeiro, em
1989. As reivindicações no judiciário e proporcionaram a formação de larga
jurisprudência que estabeleceu a obrigação do Estado de oferecer
tratamento integral, gratuito e universal às pessoas com HIV/aids.
Há alguns anos, o SUS passou a disponibilizar uma série de medicamentos
que podem ser utilizados no tratamento contra o HIV, sendo que cada paciente se
adapta com um tipo de droga diferente, no entanto, mesmo com a universalização
do direito aos medicamentos, os pedidos judicias não cessaram, pois sempre
aparecia alguma prescrição de um medicamento novo, ainda não padronizado.
Apesar de o governo brasileiro ter investido muito em terapia antirretroviral,
Scheffer et al. afirmam que a medida trouxe economia para os cofres públicos, já
que se deixou de gastar muito com internações e medicamentos para tratamento de
doenças oportunistas:
Um estudo avaliou 3,6 mil pacientes de aids adultos, que começaram a
procurar o Centro de Referência e Tratamento - CRT/SP (um dos maiores
serviços que atendem HIV/aids na capital paulista) entre 1992 e 1998 e que
estavam sendo acompanhados entre 1992 e 2003. Observou-se que, a
partir de 1997, todos os pacientes passaram a viver mais, em virtude do
amplo acesso à terapia anti-retroviral. Daqueles que se infectaram por via
sexual, 70% ainda estavam vivos cinco anos depois.
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Outro estudo conduzido pelo Ministério da Saúde, em 2002, provou que o
tratamento reconstitui o sistema imunológico dos pacientes (VITORIA,
2003). Além disso, depois da disponibilização dos anti-retrovirais no país, os
gastos com aposentadoria e auxílio doença por causa da aids caíram mais
de 25%.
Houve, certamente, economia para os cofres públicos, pois o custo para
disponibilização da terapia anti-retroviral é, em grande parte, compensado
pela redução de gastos com medicamentos para tratamentos de infecções
oportunistas e das internações hospitalares. (SCHEFFER et al., 2005, p.34)
Embora a Administração Pública programe seus gastos de acordo com o
Orçamento, não é possível ter a certeza de quanto será gasto com medicamentos, já
que não se pode controlar o número de ações judiciais para a obtenção de
medicamentos de alto custo.
Scheffer et al. (2005) apontam que, de 1996 a 2002, no Estado de São Paulo,
o número de ações judiciais para a aquisição de medicamentos cresceu seis vezes e
meia, sendo que isso representou cerca de 6% do orçamento reservado para a
saúde estadual.
Outro fator que também influencia o aumento de ações judiciais para pleitear
medicamentos antirretrovirais é a demora no processo de disponibilização do
medicamento pelo Ministério da Saúde após a liberação pelo FDA - Food and Drug
Administration - órgão estadunidense e principal referência mundial para a
aprovação e introdução de um novo medicamento. De acordo com dados
disponibilizados pelo Ministério da saúde ( in SCHEFFER et al., 2005), esse tempo
médio para disponibilização de medicamentos novos era de vinte meses e meio,
variando de 8 a 46 meses. Nesse mesmo período, o tempo médio de aprovação de
um medicamento pelo FDA era de 4,6 meses (SCHEFFER et al., 2005).
A demora na disponibilização dos novos medicamentos se dá porque, após a
liberação pela FDA, deve ocorrer também a liberação pela Anvisa e, depois disso, a
droga precisa ser inserida no consenso terapêutico do Ministério da Saúde, ou seja,
deve entrar no rol de medicamentos padronizados pelo Ministério da Saúde.
No Brasil, os medicamentos padronizados são inseridos na RENAME –
Relação Nacional dos Medicamentos Essenciais. A RENAME é um instrumento
racionalizador dentro da Política Nacional de Assistência farmacêutica - PNAF
(BRASIL, 2018, p. 7).
39
Quanto à RENAME, Laffin e Bonacim (2017, p. 10) destacam que a lista
apresenta medicamentos que satisfazem às necessidades de saúde da maioria da
população a um preço possível de ser pago, sendo composta por medicamentos
com segurança, eficácia e qualidade terapêutica, sendo que a lista passa por
atualizações contínuas.
Ocorre que, mesmo depois de ser padronizado, ainda deve-se esperar o
procedimento licitatório que autoriza a compra do medicamento. É por isso que a
ação judicial encurta o caminho, já que a urgência justifica a eliminação de etapas:
Outro critério para a dispensa de licitação é a urgência, nos termos da Lei
8.666/93, artigo 24. Em muitas ações judiciais, como se verá adiante, o
Judiciário reconhece a necessidade de medicamentos para HIV/aids como
incluído na hipótese de dispensa. Decisões judiciais também rechaçam o
argumento do Poder Público de falta de prévia dotação orçamentária.
(SCHEFFER et al., 2005, p. 48)
O grau de importância dado a essas demandas também pode ser percebido
pela duração do processo, que não costuma ser longa.
A análise dos tempos medianos entre a entrada do processo na primeira instância e a decisão liminar foi de sete dias; entre a decisão liminar e a sentença o tempo foi de 218 dias; e entre a entrada do processo na 1a instância e a sentença 239 dias. O tempo mediano entre a entrada na primeira instância e a decisão terminativa na segunda instância foi de 478 dias. A mediana dos tempos entre a entrada na segunda instância e a decisão final foi de 49 dias (PEPE et al., 2010, p. 464)
Pepe et al. (2010) analisou 185 processos judiciais julgados no ano de 2006.
Para a seleção dos processos, foi utilizado sistema de busca do Tribunal de Justiça
do Rio de Janeiro em segunda instância com as palavras chaves “medicamento” e
“essencial”. Ressalta-se que em 100% dos processos analisados por Pepe et al.
(2010), o pedido liminar foi concedido.
A Lei 9313/06 garantiu o acesso universal aos medicamentos contra HIV, o
que fortaleceu a justificativa para a procedência de ações judiciais; no entanto, os
40
gastos despendidos pelo governo nas ações para tratamento da doença ainda
continuaram sendo alvos de críticas, até mesmo por autoridades políticas:
A tensão maior veio a público em novembro de 1997, quando o então Ministro da Saúde, Carlos Albuquerque, afirmou – conforme registraram jornais da época – que não considerava justo o governo gastar R$ 428 milhões (na época) com “apenas 55 mil pacientes infectados pelo HIV”, situação que não era estendida a outros pacientes crônicos, com câncer, tuberculose, doenças do coração, hanseníase, etc. O Ministro também criticou a Lei 9.313/96, que garante o acesso universal aos medicamentos, o que gerou intensos protestos, não só por parte das ONGs/Aids, mas do próprio Programa Nacional de DST e Aids, subordinado ao Ministro. No dia 1º de dezembro do mesmo ano, Dia Mundial de Luta Contra a Aids, atos públicos em todo o país protestaram contra as posições do Ministro. (SCHEFFER et al., 2005, p. 50)
Scheffer et al. (2005) também apresentam a influência da indústria
farmacêutica na expansão do número de medicamentos disponibilizados pela rede
pública, bem como no crescimento das ações judiciais. Os autores colocam que a
indústria farmacêutica exerce influência sobre os médicos que prescrevem os
medicamentos, e, se o medicamento ainda não é padronizado, a saída é mover uma
ação judicial:
As empresas se relacionam de várias maneiras com os médicos, desde o modo aparentemente trivial, como doação de presentes, canetas, blocos de anotação com o nome do medicamento a modos mais preocupantes, como artigos escritos por ghost writer, para médicos acadêmicos; pagamento de honorários de consultorias a médicos proeminentes que exaltam as virtudes de produtos, e o apoio para viagens luxuosas que incluem o entretenimento. Outra maneira bastante comum de interação é por meio da educação continuada em Medicina (SCHEFFER et al., 2005, p. 64)
O fato é que os laboratórios investem vastamente em marketing e em outros
meios de propagação de seus produtos no meio médico. Como o custo é alto, pode-
se induzir que existe um retorno financeiro dessas práticas.
Já estudos do professor José Augusto Cabral de Barros, da Universidade Federal de Pernambuco, demonstraram que laboratórios já chegaram a gastar cerca de US$ 8.000 por ano por médico no Brasil, o que, segundo Monteleone, “inclui visitas de propagandistas, amostras grátis, balangandãs de toda espécie, financiamento de congressos e publicações médicas, assinaturas de revistas científicas, passagens e hospedagem em eventos
41
no exterior (às vezes incluindo as despesas do cônjuge) e até isenção de anuidade em cartão de crédito” (SCHEFFER et al., 2005, p. 65).
Os autores também expõem que a influência dos laboratórios no crescimento
de ações judiciais não está somente nas prescrições médicas, como também na
contratação de advogados:
Mas há vários relatos, ainda não comprovados, de que há indústrias
farmacêuticas que contratam escritórios de advocacia especializados em
gerar ações judiciais em todo o país para o fornecimento de novos
medicamentos, a partir das prescrições de médicos que também têm alguma
relação com o laboratório. (SCHEFFER et al., 2005 p.70)
Scheffer et al. (2005) citaram uma das falas do procurador geral do Estado de
São Paulo, Elival da Silva Ramos, com a informação que existem relatos de
situações em que o médico entregou ao paciente a receita médica e o cartão de um
advogado. Sendo que o procurador geral também revelou que “alguns laboratórios
multinacionais chegam a armar esquemas por meio de ações judiciais para forçar o
Ministério da Saúde a registrar novos medicamentos importados, sob a alegação de
que os remédios já estão sendo usados via liminares” (SCHEFFER et al., 2005, p.
70).
Embora a influência exercida sobre médicos possa ser algo subjetivo, na
maioria das vezes entendida como estratégias de marketing, existem situações que
são práticas criminosas:
Segundo notícia da Agência Associated Press 71 de maio de 2004, a polícia de Veneza entregou para promotores de justiça o nome de mais de 4.000 pessoas de toda a Itália como parte da investigação sobre suposto esquema da corrupção do laboratório Glaxo SmithKline, acusado de dar presentes e dinheiro para médicos para que eles prescrevessem seus medicamentos. Domenico Cuzzocrea, da polícia de Veneza, disse que “entre 1999 e 2002 a Glaxo gastou US$276 milhões no esquema, incluindo viagens luxuosas e computadores pessoais, além de dinheiro vivo. A investigação mostra que o sistema estava enraizado e difundido por todo o país”. (SCHEFFER et al., 2005 p. 67)
Além da Itália, os Estados Unidos também registraram fatos criminosos
envolvendo farmacêuticas e médicos:
42
O jornal The New York Times 72, em junho de 2004, descreve casos de médicos nos Estados Unidos que chegaram a receber, de grandes laboratórios farmacêuticos, cheques de até US$ 10.000 em troca de prescrever novos medicamentos. Segundo o jornal, várias outras denúncias, que envolvem favores financeiros da indústria farmacêutica para persuadir os médicos em favor de suas drogas, estavam sendo investigadas pelo governo dos Estados Unidos. Dentre os laboratórios investigados estariam Shering-Plough, Johnson & Johnson, Wyeth e Bristol Myers Squibb. (SCHEFFER et al., 2005, p. 67)
De acordo com Vieira e Zucchi, citados por Ferraz e Vieira (2009, p. 23),
como o acesso ao Judiciário é ainda bastante restrito, o uso da via judicial como
meio para alocar recursos escassos da saúde favorece automaticamente aqueles
que têm maior facilidade de acesso à justiça, geralmente as camadas mais
favorecidas da sociedade.
Como o acesso efetivo ao Judiciário no Brasil, assim como a outros serviços essenciais, é mais fácil às pessoas de condições socioeconômicas mais avantajadas, o resultado da “judicialização da saúde”, nos termos atualmente em vigor, é uma inversão perversa dos objetivos primordiais do SUS (FERRAZ e VIEIRA, 2009, p. 246)
No entanto, esse entendimento que a judicialização na saúde pública
favorece pessoas de melhores condições econômicas é contestável. Messeder et al.
(2005) também realizou um estudo sobre ações judiciais para pleitear
medicamentos, no entanto o seu foco foram as ações de 1991 a 2002 contra o
Estado do Rio de Janeiro. Os autores verificaram que a maioria dos pedidos judiciais
analisados advinham de atendimento jurídico gratuito e com prescrição da rede
pública de saúde.
Verifica-se que a grande maioria dos mandados é conduzida por escritórios de advocacia gratuita (defensoria pública e escritórios-modelo das universidades). Cabe ainda ressaltar que os escritórios particulares são, em grande parte, integrantes das associações de portadores de condições patológicas específicas ou de organizações não governamentais (ONG); esta constatação indica que grande parte desta assessoria também é gratuita, ainda que não pública. As informações dando conta da relativa constância quanto à participação de escritórios particulares parecem indicar que, pelo menos no período estudado, as ações judiciais pleiteando medicamentos não se configuram como mercado para a advocacia particular. Nota-se que apenas 16,0% dos pedidos foram gerados por autores atendidos em unidades fora do SUS e que a grande maioria vem de unidades vinculadas ao sistema. (MESSENDER et al., 2005, p. 530)
43
Já Marques e Dallari (2007) analisaram sentenças proferidas de março a
novembro de 2004 em 71,4% das Varas da Fazenda Pública do Estado de São
Paulo. A amostra analisada contou com cópias das peças principais de 31
processos, sendo que os anos dos processos variavam de 1997 a 2004. A amostra
revelou que 67,7% dos autores tinham advogados particulares, sendo que destes
apenas 23,8% tinham apoio de alguma associação. Importante observar que da
amostra 35,5% dos pedidos apresentavam explicitamente o nome do laboratório do
medicamento e em 77,4% dos processos, pelo menos um medicamento era pedido
com o nome de marca (e não o nome genérico).
Machado (2011) fez um estudo semelhante, no entanto o objeto de estudo
foram processos judiciais com pedidos de medicamentos contra o Estado de Minas
Gerais de julho de 2005 a junho de 2006, sendo que 60,3% das ações foram
propostas por advogados particulares.
Esses resultados sugerem que os pacientes que recorrem ao Poder Judiciário podem ter melhores condições socioeconômicas, considerando que podem arcar com as despesas processuais e podem ter maior conhecimento de seus direitos. Essa hipótese corrobora estudos que constataram maior proporção de processos oriundos de pacientes com menor grau de exclusão social. Dessa forma, a judicialização da saúde poderia agravar a iniqüidade no acesso à saúde de um sistema já marcado por desigualdades socioeconômicas (Machado, 2011, p. 594)
Ou seja, esses autores chegaram à mesma conclusão que Ferraz e Vieira,
que a judicialização de políticas de saúde favorece quem tem melhores condições
socioeconômicas.
A investigação de Chieffi e Barata (2009) também analisou a situação
socioeconômica dos autores de pedidos judiciais de medicamentos. No entanto, o
estudo teve como foco o endereço residencial dos autores e com isso foi deduzida a
situação econômica. De acordo com o endereço na capital paulista, foi utilizado O
IPVS – Índice Paulista de Vulnerabilidade Social; os autores foram divididos em
grupos de 1 a 6, sendo: 1 - nenhuma vulnerabilidade social, 2 - vulnerabilidade
social muito baixa, 3 - vulnerabilidade social baixa, 4 - vulnerabilidade social média,
5 - vulnerabilidade social alta e 6 - vulnerabilidade social muito alta. Foram objeto da
44
pesquisa os processos que foram cadastrados de janeiro a dezembro de 2006, cujos
demandantes informaram residir na capital paulista.
A conclusão foi que os autores das ações pertenciam 16% do grupo 1, 35%
ao grupo 2, 22% ao grupo 3, ou seja, mais da metade dos pedidos foi feito pelos
grupos de nenhuma vulnerabilidade social e vulnerabilidade social muito baixa. E
mais uma vez a conclusão é que as demandas judiciais favorecem pessoas de
melhores condições econômicas
A análise dos processos referentes à dispensação de medicamentos mediante demandas judiciais permitiu evidenciar os efeitos que essas decisões têm sobre a formulação e a execução da política de saúde. Os dados mostram que a parcela da população atendida por demandas judiciais tem em média melhores condições sócio-econômicas, residindo em áreas com baixa ou sem nenhuma vulnerabilidade social.(CHIEFFI E BARATA, 2009, p. 1840)
Tendo em vista que um dos princípios do SUS é a equidade, o judicialização
fere este princípio se considerar-se que os beneficiários geralmente são pessoas de
melhores condições econômicas, que serão atendidas em melhores condições em
detrimento dos menos favorecidos que não possuem acesso ao Judiciário.
4.1 - Relativização de direitos: direito universal x recursos limitados
Sabe-se que a Constituição Federal estabelece que a saúde é direito de todos
e obrigação do Estado. No entanto, sabe-se também que os recursos são escassos.
É justamente pelo fato de os recursos serem escassos que o executivo trabalha
dentro de um orçamento, ou seja, há um planejamento prévio sobre onde o dinheiro
será gasto e o montante a ser utilizado em cada setor.
É claro que o Estado não pode ser negligente frente a indivíduos que correm risco de vida iminente. No entanto, como o direito à assistência farmacêutica depende de uma política pública para ser garantido, sob a perspectiva da justiça distributiva, é preciso que as necessidades individuais sejam contextualizadas dentro da política pública de medicamentos. Assim, a noção de justiça distributiva pode nortear a prestação coletiva e o próprio atendimento às necessidades terapêuticas individuais. (MARQUES e DALLARI, 2007, p. 106)
45
O orçamento público, nas esferas federal, estadual e municipal, é organizado
basicamente por três leis principais: o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA), todas elas previstas na
Constituição Federal:
Art. 165. Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão:
I - o plano plurianual;
II - as diretrizes orçamentárias;
III - os orçamentos anuais.
§ 1º A lei que instituir o plano plurianual estabelecerá, de forma
regionalizada, as diretrizes, objetivos e metas da administração pública
federal para as despesas de capital e outras delas decorrentes e para as
relativas aos programas de duração continuada.
§ 2º A lei de diretrizes orçamentárias compreenderá as metas e prioridades
da administração pública federal, incluindo as despesas de capital para o
exercício financeiro subseqüente, orientará a elaboração da lei orçamentária
anual, disporá sobre as alterações na legislação tributária e estabelecerá a
política de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento.
(...)
§ 5º A lei orçamentária anual compreenderá:
I - o orçamento fiscal referente aos Poderes da União, seus fundos, órgãos
e entidades da administração direta e indireta, inclusive fundações
instituídas e mantidas pelo Poder Público;
II - o orçamento de investimento das empresas em que a União, direta ou
indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a voto;
III - o orçamento da seguridade social, abrangendo todas as entidades e
órgãos a ela vinculados, da administração direta ou indireta, bem como os
fundos e fundações instituídos e mantidos pelo Poder Público.
A elaboração das três leis orçamentárias tem como etapa a realização de
audiências públicas para apresentação e discussão das políticas a serem
desenvolvidas, o que propicia a participação popular para o estabelecimento
democrático de onde será empregado o dinheiro público, bem como o que será
priorizado.
46
A própria lei de responsabilidade fiscal, Lei Complementar nº 101/2000,
estabelece em seu artigo 48 que a realização de audiências públicas para a
elaboração de leis orçamentárias faz parte da transparência pública.
Art. 48. São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será
dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público:
os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de
contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução
Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas
desses documentos.
§ 1o A transparência será assegurada também mediante:
I – incentivo à participação popular e realização de audiências
públicas, durante os processos de elaboração e discussão dos planos, lei
de diretrizes orçamentárias e orçamentos;
O PPA é uma espécie de “plano de governo” estabelece objetivos e metas
para o período de quatro anos, sempre englobando o segundo ano do mandato de
um governante (Prefeito, Governador e Presidente da República) e o primeiro ano
de governo do eleito para o próximo mandato.
Já a LDO é uma lei anual que, em conformidade com o foi estabelecido no
PPA, aponta quais serão as prioridades para o próximo ano. A LDO é um elo entre a
PPA e a LOA. A LOA já estabelece o orçamento para o próximo ano, com a previsão
de receitas e despesas e a dotação orçamentária para cada pasta do governo.
O Constituição Federal ainda estabelece a proibição de o Administrador
Público implementar políticas públicas não incluídas na lei orçamentária, bem como
realizar despesas que excedam o estabelecido na lei orçamentária.
Art. 167. São vedados:
I - o início de programas ou projetos não incluídos na lei orçamentária anual;
II - a realização de despesas ou a assunção de obrigações diretas que
excedam os créditos orçamentários ou adicionais;
47
III - a realização de operações de créditos que excedam o montante das
despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos
suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder
Legislativo por maioria absoluta;
Assim, fica evidente que o orçamento público, criado por processos
democráticos que envolvem planejamento e participação popular, é uma ferramenta
de trabalho do gestor público para trabalhar em prol da coletividade, e que as
decisões judiciais que “passam por cima” de todos esses processos acaba se
tornando antidemocráticas, sem contar os custos da compra direita, que são
superiores aos encontrados em um processo licitatório.
Harrison Ferreira Leite, citado por Fischer e Oliveira (2015, p. 413), explica
que “o orçamento é lei e como tal deve ser cumprido nos moldes aprovados pelo
Legislativo. Logo, permitir a sua alteração por individuais decisões judiciais significa
alterar a própria lei e o Judiciário não altera lei’.
Nessa mesma linha de pensamento, tem-se:
Em alguns casos, o STF tem decidido no sentido de não considerar ingerência do Judiciário na esfera da administração a imposição judicial ao Executivo de que este satisfaça, nos termos determinados pelo tribunal, um direito social previsto na Constituição, a requerimento de qualquer cidadão, pois, diante de um direito consagrado pela Constituição e explicitado por norma infraconstitucional, é dever do Judiciário torná-lo realidade, ainda que ocorra obrigação de fazer com repercussão na esfera orçamentária. Porém, ao se falar em orçamento, e sendo este aprovado por uma lei do orçamento (do Poder Legislativo), o ato de um juiz que se proponha a alterar essa lei modificando a afetação das receitas, ou que determine ao Executivo o dever de alterar esta lei para cumprir determinada sentença, acaba por carecer de legitimidade no campo orçamentário, pois não é função do judiciário legislar e determinar como se devem aplicar os recursos financeiros. O Poder Judiciário e o Poder Executivo não podem usurpar competência reservada do Poder Legislativo. (MAZZA e MENDES, 2013, p. 58)
Mazza e Mendes (2013) citam ainda a opinião do Ministro Ricardo
Lewandowski sobre o artigo 196 da Constituição.
A interpretação do Art. 196 da Constituição Federal, portanto,passa necessariamente pelo acesso universal à saúde e tendo consideração que se trata de distribuir recursos orçamentários por definição escassos. Penso que o papel do Judiciário seja o de garantir que essa distribuição seja realizada dentro de parâmetros constitucionais e legais, garantindo, sempre que possível, a universalização do acesso à saúde. Para tanto, não pode o
48
Judiciário – salvo em situações extremas, em que a própria vida esteja em risco – ir além da fixação de critérios para a atuação da Administração Pública, impedindo que determinados cidadãos sejam privilegiados em detrimento de outros. (...) Não pode – insisto – o Judiciário e, em especial, esta Suprema Corte, guardiã dos valores constitucionais, definir, de maneira pontual e individualizada, como a Administração deve distribuir os recursos públicos destinados à saúde. (MAZZA e MENDES, 2013, p. 61)
Já Barroso, hoje também ministro do Supremo Tribunal Federal, citado por
Leite e Bastos (2018, p. 109), defende que ‘”as decisões concessivas de
medicamentos sem uma efetiva observação criteriosa da demanda podem redundar
em efeitos negativos para todo o sistema de saúde pública, ou seja, acaba por
causar uma disfunção em todo o sistema”.
As ações judiciais ocorrem por vários motivos: por o paciente estar com risco
de morte pela demora do serviço público, pela demora em se conseguir algo pelas
vias normais ou simplesmente porque o paciente pleiteia um tratamento mais
eficiente já disponível no mercado e não disponível no SUS. Sobre a terceira
situação, o SUS cria suas políticas padronizando tratamentos com redução de
custos, assim fica muito difícil oferecer o tratamento que mais de adequa a cada tipo
de paciente, pois isso envolve um custo bem maior.
Ferraz e Vieira (2009) fazem uma crítica à judicialização de políticas de
saúde, tendo como justificativa a escassez de recursos. Na análise, os autores
expõem uma tabela hipotética (Tabela 1) que demonstra que o gasto com apenas
duas doenças (hepatite viral crônica C e artrite reumatoide) custaria mais do que se
gasta no SUS em todas as esferas de governo, no entanto se atingiria apenas 1%
da população e ainda tratando apenas doenças específicas.
49
TABELA 1
Custo do tratamento com medicamentos mais modernos no Brasil em 2007 Doença Medicamento Memória de cálculo Total Ano (R$)
Hepatite viral crônica C
Interferon Peguilado
Incidência: 13.261 casos em 2005 (Fonte: DATASUS)
704.948.394,70
Posologia: 180 mcg. 1x por semana, por 48 semanas (Fonte: Portaria SAS/MS nº. 863, de 4 de novembro de 2002
Preço Unitário (seringa preenchida, 180 mcg): R$ 1.107,49, preço de fábrica, ICMS = 18% (Fonte: ABCFarma, jun/2007)
Cálculo: 13.261 x 48 x 1.107,49
Artrite Reumatoide
Infliximabe
Prevalência estimada: 1% da população mundial. No Brasil, em julho de 2006 1% da população representava 1.867.706 pessoas (IBGE)
14.565.126.268,80
Pressuposto: 1/3 dos pacientes tratados com esse medicamento = 622.569 pacientes
Posologia: 3 mg/kg a cada 8 semanas = 210 mg por aplicação 9 peso médio adulto = 70 kg) e 6 aplicações por ano (Fonte: Portaria SCTIE n° 66, de 6 de novembro de 2006)
Preço unitário (frasco 100 mg) : R4 2.588,76, preço de fábrica, ICMS = 18% (Fonte: ABCFarma, junho de 2007) – 24,695 (CAP) = 1.949,60*
Cálculo: 622.569 x 2 x 6 x 1.949,60
Etanercepte
Pressupostos: 1/3 dos pacientes tratado com esse medicamento = 622.569 pacientes.
53.741.451.023,52
Posologia: 25 mg. 2x por semana (Fonte: Portaria SCTIE nº. 66, de 6 de novembro de 2006)
Preço unitário = 3.320,06 (estojo com 4 seringas preenchidas com 25 mg), preço de fábrica, ICMS= 18% (Fonte: ABCFarma, jun/2007) = R$ 830,02
Cálculo: 622.569 x 2 x 52 x 830,02
Adalimumabe
Pressuposto: 1/3 dos pacientes tratados com esse medicamento = 620.569 pacientes
30.460.147.081,26
Posologia: 40 mg a cada 2 semanas (Fonte: Portaria SCTIE nº 66, de 6 de novembro de 2006)
Preço unitário: R$ 4.997,46 (2 seringas preenchidas com 40 mg), preço de fábrica, ICMSS = 18% (Fonte: ABCFarma, junho de 2007) – 24,69% (CAP) r$ 1881,79
Cálculo: 622.569 x 26 x R$ 1881,79
Total 99.471.672.768,28
Fonte: Ferraz e Vieira, 2009. *CAP (Coeficiente de Adequação de Preços) Desconto para venda a setor público – Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos por meio da Resolução nº 4, de 18 de dezembro de 2006.
Os autores deixam claro que políticas públicas de saúde são pensadas
numa visão de benefício coletivo, pois se deve considerar o custo-benefício das
ações. Ferraz e Vieira (2009) para exemplificar o que significaria o custo com os
50
medicamentos para as duas doenças, apresenta o custo total para as ações de
saúde no Brasil no ano de 2006, que representou 85,7 bilhões de reais, valor que é
inferior ao custo total com medicamentos na situação hipotética apresentada pelos
autores.
Conclui-se, assim, que os recursos financeiros necessários (99,5 bilhões de reais) para implementar essa política de assistência terapêutica a apenas 1% da população e em relação a apenas duas doenças seriam superiores ao gasto total de todas as esferas de governo como conjunto de ações e serviços de saúde (85,7 bilhões de reais).Ou seja, para fornecer apenas quatro medicamentos para tratar duas doenças, cobrindo 1% da população, gastar-se-ia mais que o que é atualmente gasto com todo o atendimento feito pelo SUS com internação, diagnóstico, tratamento, cirurgias, ações de educação em saúde, vigilância sanitária e epidemiológica, entre outras 3. Esse simples exemplo, que pode parecer extremo, é bastante ilustrativo do problema da escassez de recursos. (FERRAZ e VIEIRA, 2009, p. 238)
A situação apresentada por Ferraz e Vieira (2009) demonstra que utilizar
recursos em despesas não previstas pode representar prejuízos em outras áreas, já
que o orçamento é um só, se houver um gasto maior em certa área, os recursos
deverão ser retirados de outra.
Nessa mesma linha estão Chieffi e Barata (2009, p. 1839):
No ano 2006, a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (SES-SP) gastou, com o cumprimento das decisões judiciais da comarca da capital, 65 milhões de Reais, para atender cerca de 3.600 pessoas. Em comparação, no mesmo ano, ela investiu 838 milhões de Reais no Programa de Medicamentos de Dispensação Excepcional (alto custo), atendendo 380 mil pessoas. Foram gastos aproximadamente 18 mil Reais por paciente com ações judiciais naquele ano, enquanto o Programa de Medicamentos de Dispensação Excepcional consumiu 2,2 mil Reais por paciente.
Já em Machado et al. (2011, p. 591) tem-se:
Em 2005, o Governo Federal gastou diretamente R$ 2,5 milhões com aquisição de medicamentos solicitados pela via judicial e foi citado como réu em 387 processos. Em 2007, o gasto passou para R$ 15 milhões destinados ao atendimento de aproximadamente três mil ações. Em 2008, as despesas alcançaram R$ 52 milhões. O Estado de Minas Gerais gastou
51
nesses anos, respectivamente, R$ 8,5 milhões, R$ 22,8 milhões e R$ 42,5 milhões com o cumprimento de processos judiciais na área da saúde.
Buhler (2017) apresenta uma série de números que demonstram de forma
clara o impacto financeiro de ações judiciais no âmbito do SUS. O autor cita uma
pesquisa da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (INTERFARMA), em
que restou concluído que os gastos do Ministério da Saúde com processos judiciais
dobraram em três anos, já que em 2012 o gasto foi de R$367,89 milhões e em 2014,
R$844,21 milhões. A pesquisa citada por Buhler (2017) também destaca que no
período de 2012 a 2014 o gasto total do Ministério da Saúde com processos judiciais
foi de R$ 1,76 bilhão.
Os números impressionam, já que são valores que poderiam fazer muito pela
saúde coletiva, já que com planejamento e os custos são bem reduzidos. Os
números citados por Buhler demonstram o custo da somatória de vários processos
judiciais, no entanto, o autor também cita um outro caso em que o Estado de São
Paulo foi condenado em 2010 a custear um tratamento milionário. Trata-se de uma
ação movida por um paciente portador de doença rara chamada de Hemoglobinúria
Paroxística Noturna (HBN), que é uma espécie de anemia que causa a destruição
irregular das hemácias. O tratamento da doença é feito com o Soliris, um dos
medicamentos mais caros do mundo (BUHLER, 2017), sendo que o custo do
medicamento já foi até matéria da revista Forbes. Segundo a Revista Forbes, citada
por Buhler (2017), o tratamento com o medicamento custava em 2016 U$ 440 mil
dólares por ano (o que em reais era e é uma cifra milionária).
Os tratamentos que não são padronizados pelo SUS e por isso não são
ofertados pelas vias normais acabam sendo acessados somente por quem os
pleiteia pela via judicial, já que a lei maior do país universaliza o direito à saúde.
Quanto a esse tratamento privilegiado que muitos conseguem, Mazza e Mendes
(2013) afirmam que essa não é a “vontade constitucional”:
No entanto, aceitar que somente uma única pessoa ou um determinado grupo tenha direito à saúde pelo fato de tê-lo alcançado por vias jurídicas (determinando assim que o Estado despenda milhões de reais em seu tratamento), não implementa o direito social à saúde conforme descrito na Constituição. Ao contrário, agindo assim atribui-se o requerido direito
52
somente aos que tiveram acesso ao Poder Judiciário e àquela decisão. (Mazza e Mendes, 2013, p. 48)
Já Vasconcelos (2014), defende que essas decisões judiciais fazem o Estado
gastar mais e de uma forma muito injusta:
Decisões judiciais, ao contrário, teriam o condão não só de fazer o Estado gastar mais que o previsto, mas de forma potencialmente injusta, desestruturando políticas públicas elaboradas para promover eficientemente tais direitos sociais de acordo com o critério de justiça escolhido. Isto se daria, entre outros motivos, principalmente porque as decisões judiciais não contemplam todos os interessados e todas as necessidades igualmente, uma vez que se debruçam apenas sobre o caso concreto e consideram apenas os argumentos das partes em juízo (Vasconcelos, 2014, p. 23)
É fato que uma despesa não prevista no orçamento faz com que o serviço
público seja prejudicado, já que o dinheiro terá que sair de algum lugar. Por conta
disso, em muitos orçamentos, os gestores já deixam uma reserva para possíveis
condenações judiciais, com a finalidade de que essas condenações interfiram o
mínimo possível no planejamento orçamentário.
Vasconcelos (2014) contabilizou a diferença do estabelecido na Lei
Orçamentária Anual para ser gasto com ações judiciais e o efetivamente gasto nos
anos de 2010 a 2013 pelas Secretarias Estaduais de Saúde de São Paulo, Minas
Gerais, Rio de Janeiro, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
53
TABELA 2
Gastos com Sentenças Judiciais pelas Secretarias Estaduais de Saúde de 2010 a
2013 – UF selecionadas (Valores em milhões de Reais)
Ano Estado Previsto na LOA Autorizado
2010 São Paulo 0,00 2,22
Minas Gerais 40,00 61,56
Santa Catarina 56,77 80,75
Rio Grande do Sul 53,00 53,00
Rio de Janeiro 1,42 0,00
2011 São Paulo 0,00 93,00
Minas Gerais 40,00 94,00
Santa Catarina 36,73 111,21
Rio Grande do Sul 93,14 93,14
Rio de Janeiro 4,41 4,41
2012 São Paulo 0,00 150,00
Minas Gerais 50,00 143,00
Santa Catarina 68,10 93,70
Rio Grande do Sul 129,34 129,34
Rio de Janeiro 4,41 4,41
2013 São Paulo 1,35 1,08
Minas Gerais 145,00 314,53
Santa Catarina 74,25 135,32
Rio Grande do Sul 188,51 188,51
Rio de Janeiro 3,10 3,10
Fonte: Vasconcelos, 2014, p. 73
54
O quadro demonstra que mesmo os Estados reservando valores no
orçamento para possíveis condenações, na maioria das vezes foi necessário mexer
no orçamento, já que o valor das condenações foi superior à reserva orçamentária.
Bianca e Damascena (2015) também fizeram um estudo parecido, porém com
dados da Lei Orçamentária da Prefeitura de Juiz de Fora, em Minas Gerais, de 2012
a 2014.
TABELA 3
Comparação dos gastos com Internações e Medicamentos na cidade de Juiz de Fora de 2012 a 2014 – Políticas coletivas x Sentenças Judiciais
Ano Despesa Orçamento Inicial Orçamento atualizado
2012 Políticas Públicas - Internações 111.844.221,34 119.855.175,76
Políticas Públicas - Medicamentos 883.352,10 1.033.994,72
Mandados Judiciais - Internações 622.220,00 1.621.255,96
Mandados Judiciais - Medicamentos 6.737.560,00 10.329.400,00
2013 Políticas Públicas - Internações 121.706.943,73 136.928.912,85
Políticas Públicas - Medicamentos 1.025.864,64 792.534,28
Mandados Judiciais - Internações 320.627,40 1.150.812,90
Mandados Judiciais - Medicamentos 1.804.000,00 8.039.815,52
2014 Políticas Públicas - Internações 131.531.542,94 145.796.303,50
Políticas Públicas - Medicamentos 908.141,00 929.210,20
Mandados Judiciais - Internações 692.734,12 1.310.894,12
Mandados Judiciais - Medicamentos 1.486.666,68 7.791.813,98
Fonte: Bianca e Damascena, 2015, p. 19-20 (Desconsiderados os precatórios e requisições de
pequeno valor)
55
O levantamento de Bianca e Damascena (2015) também confirmam que
mesmo reservando verbas para custear mandados judiciais, as decisões do
Judiciário acabam por alterar a previsão orçamentária. Em muitos casos os valores
com demandas judiciais superam os gastos com políticas coletivas; no caso dos
medicamentos muito provavelmente o município sofreu condenação por algo que
deveria ser custeado pelo Estado, razão pela qual os valores que aparecem para as
políticas coletivas são muito inferiores aos para custear condenações judiciais.
Mapelli Junior também fez um levantamento dos custos com a judicialização
na assistência farmacêutica no Estado de São Paulo, bem como a quantidade de
processos.
TABELA 4
Gastos com assistência farmacêutica via judicial de 2010 a 2014 - Estado de São
Paulo
Ano Valores em Reais
R$
Número de pessoas
(processos )
Custo médio por pessoa – em
Reais R$
2010 188.916.917,43 23.405 8.071,64
2011 267.536.175,21 28.616 9.349,18
2012 321.223.337,77 31.917 10.064,33
2013 373.374.368,80 35.375 10.554,75
2014 394.380.967,89 39.454 9.995,96
Fonte: Mapelli Junior, 2015, p. 175
56
TABELA 5
Custo da saúde per capita de 2010 a 2014 no Estado de São Paulo
Ano Valores em Reais População (IBGE) Custo médio por pessoa
2010 11.731.900.001 42.298.906* 227,35
2011 13.889.846.905 42.707.383* 325,23
2012 14.659.899.972 43.119.841* 339,98
2013 16.630.721.029 43.528.708* 382,06
2014 18.823.302.003 43.937.755* 428,40
Fonte: Leis Orçamentárias do Estado de São Paulo dos anos de 2010 a 2014 e IBGE, 2010 (população estimada por projeção) * População estimada: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de População e Indicadores Sociais, Estimativas da população residente com data de referência 1o de julho de 2018
As tabelas acima demonstram claramente o impacto orçamentário.
Considerando que o custo médio por pessoa nos cinco anos analisados é de R$
340,60 (trezentos e quarenta reais e sessenta centavos) no orçamento estadual e de
R$ 9.607,17 (nove mil seiscentos e sete reais e dezessete centavos) em processos
judiciais, percebe-se que a judicialização promove um gasto por pessoa superior em
2820%. Sem contar que o custo do orçamento estadual envolve todos os serviços
de saúde, de todos os programas e graus de complexidade, enquanto os valores
das ações judiciais apresentam apenas o custo com assistência farmacêutica.
As despesas não planejadas causadas por decisões judiciais acabam
tornando o Estado ineficiente, de acordo com Vieira, citada por Laffin e Bonacim
(2017)
A utilização de mecanismos diversos daqueles do SUS para viabilizar acesso aos medicamentos tem gerado prejuízos à eqüidade na saúde. O atendimento dessas demandas é outro problema. A grande quantidade
57
causa transtornos para as finanças públicas porque o Estado acaba sendo ineficiente, perdendo seu poder de compra (VIEIRA, citada por LAFFIN e BONACIM, 2017, p. 7)
Laffin e Bonacim (2017), ao analisarem os processos de judicialização da
saúde na região administrativa de Ribeirão Preto de 2013 a 2015 também fizeram o
levantamento dos custos envolvidos. Os autores constataram que os processos
judiciais muitas vezes tem como objeto medicamentos que são padronizados pelo
Ministério da Saúde e fazem parte da RENAME, porém, por algum motivo não foi
disponibiolizado ao paciente pelas vias normais, ou então houve muita morosidade
na via normal.
Quanto aos custo com a judicialização no período estudado, o valor mais alto
foi encontrado na compra de medicamentos não padronizados.
TABELA 6
Custos da judicialização de medicamentos na região administrativa de Ribeirão
Preto de 2013 a 2015
Variável Valor
Custo médio dos medicamentos presentes na RENAME R$ 86,53
Maior custo de medicamento presente na RENAME R$ 4.568,84
Custo total da judicialização de medicamentos R$ 1.296.187,83
Custo da judicialização de medicamentos presentes na RENAME R$ 215.167,18
Fonte: Laffin e Bonacim, 2017, p. 11
Laffin e Bonacim (2017) ainda tiveram como conclusão que por conta da
judicialização o custo de um medicamento pode ser até 7,6 vezes mais caro:
58
No que diz respeito ao impacto geral dessas solicitações nas contas públicas, realizou-se um levantamento junto aos órgãos competentes para fazer uma estimativa de quanto o Estado poderia economizar se o fornecimento desses medicamentos respondesse às reais necessidades da população. Nesse sentido, os dados da pesquisa mostram que, quando é necessário acionar a justiça para garantir um direito constitucional à medicamentos, o Estado gasta até 7,6 vezes mais do que gastaria se o mesmo medicamento (com as mesmas características) fosse adquirido em condições gerenciais normais – ou seja, com compras eficientes em escala e com poder de compra (LAFFIN e BONACIM, 2017, p. 11)
Outro fato que também merece destaque é que o Supremo Tribunal Federal
já decidiu que Municípios, Estados e União tem responsabilidade solidaria para
promover o acesso universal ao direito à saúde:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. (REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO
EXTRAORDINÁRIO 855.178 SERGIPE, julgamento em 5//03/2015, publicado no Diário da Justiça Eletrônico de 1166//03/2015)
Tal entendimento também aumenta o impacto orçamentário, já que é bem
mais fácil para uma pessoa mover uma ação contra a Fazenda Pública Municipal
pelas facilidades de acesso e uma alteração no orçamento municipal tem muito mais
impacto na vida das pessoas, seja pelo fato de os recursos financeiros serem
menores, seja por mexer em outras dotações orçamentárias para serviços
municipais, o que tem maior capacidade de atingir a população por se tratar de
políticas locais.
Nunes (2016), ao analisar o custo estimado de processos judiciais na área da
saúde contra a Prefeitura de Juiz de Fora, verificou que 99,70% dos medicamentos
e 100% dos complementos/suplementos alimentares solicitados não eram de
competência do Município:
59
TABELA 7
Custo estimado de processos judiciais na área da saúde contra a Prefeitura de Juiz
de Fora- De setembro de 2014 a março de 2015
Pedido Custo total Competência Administrativa da Secretaria de
Saúde
Sim Não
R$ % R$ %
Internação 892.750,01 805.798,60 90,26 86.951,41 9,74
Medicamento 2.055.600,64 6.151,81 0,30 2.049.448,83 99,70
Complemento/
Suplemento
336.880,01 0,00 0,00 336.880,01 100,00
Total 3.285.230,66 811.950,41 24,72 2.473.280,25 75,28
Fonte: Nunes, 2016, p. 69
Outro estudo realizado por Wang et al. (2014) demonstrou que no ano de
2011, o gasto da Prefeitura Municipal de São Paulo com “judicialização da saúde”
somou um valor de R$8.806.221,98, sendo que R$ 4.856.794,85, mais de metade
do valor, era referente insumos e medicamentos de competência de outros entes da
federação.
O tema judicialização da saúde envolve muitos debates, seja na questão da
escassez de recursos, seja no direito à saúde atrelado ao direito à vida, bem jurídico
mais precioso. O tema também envolve muitos debates acerca da má administração
dos recursos, já que tantas demandas judiciais podem ser reflexo de políticas
públicas ineficientes. Ferraz e Vieira (2009) apresentam uma análise do impasse
60
existente entre o judiciário e profissionais de saúde na questão do direito à saúde
em confronto com a escassez de recursos.
De outro lado, o Judiciário parte da premissa de que a saúde (e a própria vida) foi (foram) erigida(s) ao status de direitos fundamentais pela Constituição de 1988. Diante da irrefutável importância desses valores e da força normativa que a Constituição lhes empresta, o problema da escassez de recursos é colocado em plano secundário (FERRAZ e VIEIRA, 2009, p. 224)
Os autores afirmam ainda que existe uma má gestão dos recursos pelo
governo brasileiro, pois apesar de gastar mais em saúde que outros países da
América Latina, tem piores índices. No entanto, se comparado a países
desenvolvidos, o gasto ainda é pequeno, se relacionado ao Produto Interno Bruto -
PIB (FERRAZ e VIEIRA, 2009)
Não estamos afirmando que já existem recursos suficientes no SUS. O que defendemos é simplesmente o seguinte: por mais recursos que sejam destinados à saúde, nunca será possível atender a todas as necessidades de saúde de uma população, esteja ela em um país economicamente desenvolvido ou em um país em desenvolvimento, como o Brasil. (FERRAZ e VIEIRA, 2009, p.231)
A comparação dos gastos em saúde pública também foi objeto da
investigação de Ocké-Reis (2006). Em seu estudo, o autor revelou que o Brasil
poderia gastar mais com saúde pública, já que tanto o gasto per capita ou em
comparação com o PIB é bem menor que o de países desenvolvidos.
61
TABELA 8
Distribuição do gasto com saúde pública. Países selecionados, 2003 Países %PIB %Público Per capita
Brasil 7,6 45,3 597
Argentina 8,9 48,6 1.067
Chile 6,1 48,8 707
Colômbia 7,6 84,1 522
México 6,2 46,4 582
Venezuela 4,5 44,3 231
Média AL 6,7 54,4 622
Alemanha 11,1 78,2 3.001
Canadá 9,9 69,9 2.989
Holanda 9,8 62,4 2.987
Reino Unido 8,0 85,7 2.389
Estados Unidos 15,2 44,6 5.711
Média OECD 10,8 68,2 3.415
Fonte: OCKÉ REIS, 2006
O autor coloca como exemplo os Estados Unidos, que gastam dez vezes
mais em saúde do que o observado no Brasil, em que pese sua renda per capita
seja cinco vezes maior (OCKÉ REIS, 2006, p. 7). No entanto, gasto com saúde nem
sempre demonstra qualidade, já que, como se sabe, mesmo gastando muito, os
Estados Unidos não possuem um sistema de saúde pública.
62
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Constituição Federal que estabeleceu amplos direitos e garantias foi
também a que estabeleceu a separação de poderes entre executivo, legislativo e
judiciário, assim como a área e limites de atuação de cada um. Enquanto cabe ao
poder Executivo a função administrativa, englobada pelo condão de decidir quais
políticas públicas implementar, ao Legislativo cabe a criação de leis e a
fiscalização do Poder Executivo. Já ao Poder Judiciário, cabe julgar as matérias que
lhe são apresentadas por meio de ações judiciais propostas por pessoa legítima
(com interesse na causa). A existência de uma gama de direitos garantidos na lei
maior do país favorece a judicialização, já que para o acionamento do Poder
Judiciário faz-se necessário que exista uma fundamentação jurídica, ou seja, uma lei
que assegure o direito.
A área da saúde é muito vulnerável à judicialização, já que a carta magna
ao declarar que “saúde é direito de todos e dever do Estado” não deixou dúvidas
quanto à responsabilidade estatal na garantia do direito á saúde, sem contar que se
for uma questão de risco de morte, a demora da decisão pode trazer consequências
irreversíveis. Diante de tamanha responsabilidade, os entes federados estruturaram
o SUS dividindo as ações e o custeio entre os municípios, Estados e Governo
Federal, bem como os meios necessários para se garantir um maior alcance com o
menor custo. Com isso, criaram-se várias subdivisões dentro do SUS para organizar
a divisão orçamentária como assistência farmacêutica, vigilância epidemiológica,
vigilância sanitária, bem como por nível de complexidade (baixa, média e alta).
Assim, as ações de baixa complexidade são oferecidas dentro do
Programa de Saúde da Família (PSF), sendo que os tratamentos de demandarem
procedimentos de média e alta complexidade geralmente são oferecidos por meio de
pactuação, onde a negociação entre gestores agrupa um volume de atendimentos
na intenção de se reduzir custos.
Ocorre que, quando um usuário da saúde pública faz um pedido pela via
judicial, essa organização na maioria das vezes não é levada em consideração, pois
o judiciário entende que a Constituição garantiu o direito e por isso o poder público
63
(seja municipal, estadual ou federal) precisa garantir o serviço ou atendimento (seja
para acesso de um cidadão a medicamento ou a procedimentos). No entanto, para
se atingir a eficiência almejada, é necessário que a organização dos processos seja
respeitada, já que o Sistema Único de Saúde é organizado de forma a garantir o
atendimento coletivo, ou seja, o orçamento é utilizado para atingir o máximo de
usuários com o máximo de eficiência e com o menor custo possível.
Conforme se verificou no estudo realizado por Scheffer et al. (2005), no
caso dos pedidos judiciais de medicamentos para controlar o vírus do HIV, o que se
buscava muitas vezes era a melhor qualidade de vida, já que os medicamentos
padronizados pelo Ministério da Saúde causavam mais efeitos colaterais. No
entanto, o que se conseguia pela via judicial não estava disponível aos demais
usuários do SUS. Assim, é visível que a judicialização não promove uma equidade,
pelo contrário, aumenta a diferença de tratamento entre usuários, já que seria
impossível que o orçamento da saúde cobrisse o tratamento mais moderno, e
provavelmente mais caro também, a todos os usuários.
Essa foi a conclusão no estudo de Ferraz e Vieira (2011) que
demonstraram que se o SUS resolvesse implantar os medicamentos mais modernos
para tratar hepatite C e artrite reumatoide, com apenas essas duas doenças gastaria
o mais do que todo o orçamento destinado a todas as ações do SUS. Sem contar
que mesmo “estourando” o orçamento, atingiria apenas 1% da população. Esse
estudo deixa claro que em se tratando de políticas públicas deve-se sempre pensar
no coletivo, pois como o maior impacto da judicialização é em interferir no
orçamento, fica evidente que isso atrapalha e muito a implementação de políticas
coletivas.
Os autores Chieffi e Barata (2009), Ferraz e Vieira (2009) Machado
(2011) e Marques e Dallari (2007) mencionam que a maior parte dos pedidos
judiciais na área da saúde são propostos por pessoas de condição social
privilegiada, assim, a tendência é que se a judicialização de políticas públicas
continuar em ascensão, os prejudicados serão os mais pobres, por dependerem
mais do serviço público de saúde e também por terem menos acesso à justiça.
Tudo que é gasto no serviço público passa por um processo de
planejamento para a inclusão da despesa na Lei Orçamentária Anual (LOA), antes
64
disso a política pública deve ser inserida no Plano Plurianual (PPA) e na Lei de
Diretrizes Orçamentárias (LDO); todas estas etapas incluem a participação popular
por meio de audiências públicas.
Considerando que a decisão judicial criará uma nova despesa, o
administrador terá que descumprir a lei orçamentária, pois terá uma despesa não
prevista, cujo dinheiro terá que sair de outra área. Tudo isso faz com o Estado gaste
mais e de forma injusta, diminuindo a sua eficiência (Vasconcelos, 2014). Sem
contar que a decisão judicial sai de alguém que não foi eleito para decidir sobre
políticas públicas e orçamento público e ainda afrontará a lei orçamentária que foi
criada e aprovada por pessoas escolhidas (executivo e legislativo) e dentro de um
processo democrático que incluiu a participação popular nas audiências públicas.
Para tentar contornar os impactos da judicialização, muitos governos já
incluem na lei orçamentária valores para custear possíveis condenações judiciais, no
entanto, na maioria dos casos os valores são insuficientes e o gestor acaba tendo
que utilizar outras dotações orçamentárias para cobrir a despesa, conforme estudos
de Vasconcelos (2014) e Bianca e Damascena (2015).
A judicialização também promove um custo a mais em gasto com saúde
por pessoa, já que com planejamento muitos custos são reduzidos por conta do
volume de produtos nas compras. Laffin e Bonacim (2017) chegaram na conclusão
que a compra avulsa pode ser até 7,6 vezes mais cara se comparada à compra em
uma licitação em que há volume de produtos.
O fato de haver responsabilidade solidária entre municípios, Estados e
Governo Federal no dever de promover o direito à saúde também faz com que
muitos municípios sofra oneração. Mesmo existindo um “acordo” com a distribuição
de custos e competências, muitos municípios ainda são condenados a prestar um
serviço ou fornecer um produto que seria de competência do Estado ou do Governo
Federal, conforme verificado por Nunes (2016) e Wang et al. (2014).
A judicialização causa muitos problemas para os gestores, que precisam
escolher de onde sairão as verbas para cobrir os custos com as condenações; no
entanto, o maior prejuízo ainda é da população, pois a serviço público é direcionado
65
a ela e se existe ineficiência, os piores reflexos serão sentidos por aqueles que mais
necessitam dos serviços públicos.
66
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