aterro e usina bandeirantes perus
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PERUS: OLHARES E PROCESSOS HISTÓRICO-
GEOGRÁFICOS; UMA PROPOSTA AOS FILHOS DA FÁBRICA DE
CIMENTO.
LUÍS FERNANDO DE ABREU
SÃO PAULO - 2008
2
O ATERRO SANITÁRIO BANDEIRANTES
Introdução
Sempre ouvimos
discussões sobre a
questão do lixo, da
reciclagem, da poluição
ambiental e tantas
outras relativas a esses
temas, sem
questionarmos qual é o
nosso papel nestas
questões? Ou ainda:
onde Perus entra nesta
discussão.
Em alguns casos
ouvimos cada
palavrão... Mecanismo
de Desenvolvimento
Limpo (MDL); Créditos
de Carbono; Protocolo
de Quioto (ou Kioto),
compostagem;
reciclagem, preciclagem
e tantos outros e o que
é pior em muitos casos
ficamos sem entender o que eu, você, nossos vizinhos ou parentes, enfim, o que
nossa comunidade tem a ver com essas questões... Será que temos que nos
importar com esse que seria um indesejável e permanente vizinho?
Im
agem
Eart
h (
adapta
da)
Aterro
Bandeirantes
Rodoanel
Rua Mogeiro
Recanto dos
Humildes
Mapa 1. Nosso vizinho: o Aterro Bandeirantes
Rodoanel
Rodovia dos
Bandeirantes
Aterro
Bandeirantes
3
Afinal quem nunca ouviu falar do “Lixão de Perus”? Mas há um lixão em
nossa região? Trataremos desses e outros temas neste capítulo ao discutirmos o
Aterro Sanitário Bandeirantes, esse nosso vizinho por vezes tão contestado e
indesejado, que fica logo ali, na rua Mogeiro (mapa 1), e que há quase três
décadas faz parte da paisagem e vida da população perusiana.
Lixão... Aterro... Afinal o que será o nosso vizinho?
Para iniciar nossos trabalhos, propomos que todos se perguntem; afinal, há
um aterro sanitário ou um lixão em Perus? O que é um aterro? E um lixão, o que
vem a ser? Melhor ainda; vamos sair à rua e perguntar aos nossos vizinhos a sua
opinião a respeito! O que será que sabemos sobre isto?
Bem, acreditamos que boa parte de nossa comunidade vai tratar esse
nosso famoso e indesejado vizinho como sendo o “Lixão de Perus”, o que consiste
em um equivoco, pois realmente temos um tipo de depósito de lixo aqui logo ao
lado, mas não é um lixão.
O lixão consiste em um depósito a céu aberto onde se acumula uma
enorme quantidade de lixo sem qualquer outro tipo de cuidado; só descarregam os
caminhões de resíduos (esse é outro nome do lixo) e pronto; dia-a-dia há o
acúmulo de montanhas e mais
montanhas de lixo.
Nestas montanhas não
há um trabalho de compactação
do lixo, e nem há uma cobertura
(com terra), para que se diminua
o forte odor ou se tenha um
mínimo de controle sobre a
proliferação de ratos e baratas
(entre outros bichos do tipo),
que acabam por contribuir
imensamente para o
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CR
Mo
reira
Aterro
Bandeirantes
Lixão: depósito de resíduos a céu aberto
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comprometimento de nossa saúde, afinal sempre perto de nossas casas
percebemos a presença destes vetores de doenças, isto quando não recebemos
uma “visita” deles...
Bem, se em nossa região não existe realmente o tão famoso lixão, qual
seria o nome do nosso vizinho?
Ele é o Aterro Sanitário Bandeirantes. Isto mesmo é um aterro! Agora que
sabemos o que realmente é o nosso vizinho, vamos procurar entender as suas
características e porque vem a ser tão questionado e é taxado como um grande
problema para a nossa região.
O Aterro Bandeirantes
Antes de falar propriamente sobre o
“Bandeirantes”, vamos entender o que vem a
ser um aterro sanitário. Temos que considerar
que esta é uma obra de engenharia, que tem
por objetivo a deposição de lixo, mas
diferente do lixão, temos a presença de certa
infraestrutura e toda uma tecnologia.
Primeiro, estudam a região para
mapear a existência de nascentes, caso haja
alguma onde será construído o aterro, fazem
a captação desta água, e a
canalizam para fora da área
de ação do aterro. O segundo
passo é impermeabilização
do solo, que há alguns anos
era feita com argila, um tipo
de solo que é pouco
permeável e colabora com
esse processo, atualmente
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CR
Mo
reira
F
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Intr
anscol
Mantas de PEAD;
Impermeabilização do solo
Colocação de manta de PEAD
5
são usadas mantas impermeabilizantes, e já que ouvimos tantos termos
incomuns, lá vem mais um: Polietileno de Alta Densidade, este é o “famoso”
PEAD, manta responsável pela impermeabilização nos aterros e que também é
usada em vários setores industriais, por ser um dos melhores isoladores da
atualidade. Mas afinal para que é necessária essa impermeabilização?
O lixo depositado em grandes quantidades acaba sofrendo um processo de
decomposição (apodrecimento) por vários microorganismos e libera um líquido
escuro e com forte odor
extremamente poluente,
que é chamado
chorume; quem já não
viu um caminhão de lixo
passando em nossa rua
e escorrendo um líquido
malcheiroso, então, o
chorume é algo similar...
Só que nos aterros temos que colocar uma
camada imperbealizante para evitar que esse líquido contamine o lençol freático.
Taí mais um palavrão: “lençol freático”, mas esse é fácil, na verdade ele consiste
em um depósito de água subterrânea proveniente da infiltração das chuvas, sendo
de extrema importância para o abastecimento de água, seja por sua exploração
em poços, seja por prover os rios deste nosso precioso recurso que é a água.
Podemos imaginar... Se fizermos um poço em nossa casa, sobretudo na
região do aterro e formos consumir essa água, esta poderá estar contaminada e
trazer sérios problemas de saúde aos nossos familiares, logo devemos ter
cuidados com o destino deste líquido mal cheiroso e poluidor... O famoso
chorume.
Mas somente a impermeabilização do solo, não resolve os nossos problemas.
Pensemos. Este líquido não infiltra logo ele tem que escoar para algum lugar... E
que lugar é esse? Se não tivermos cuidado esse chorume vai acabar
F
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CR
Mo
reira
Local destinado à deposição do chorume
Compactador de lixo em operação
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contaminando rios e lagos, e aí teremos um novo problema! Afinal de que vale
preservarmos o lençol freático, com a impermeabilização (citada acima) e
poluirmos ainda mais os nossos rios... Aí entra a outra ação estrutural do aterro,
constrói-se uma rede de capitação para todo esse chorume, que é enviado para
um reservatório, chamado de lagoa de acumulação e diariamente carretas tiram
esse líquido mal cheiroso desta “lagoa” e levam para ser tratado em uma Estação
de Tratamento de Esgoto.
Bem,
pensadas essas
etapas, temos
ainda uma
questão... O lixo é
depositado a céu
aberto? É
interessante
sabermos, pois
afeta diretamente
as nossas vidas, então vejamos...
Os caminhões despejam diariamente toneladas de lixo nos aterros, que são
prensados contra o solo por grandes tratores, essas máquinas são chamadas
compactadores, que passam diversas vezes sobre o lixo.
Agora, será que se faz necessária esta compactação? Diante da grande
quantidade de lixo e da escassez de áreas destinadas à construção de aterros, se
faz necessária esta compactação, desta forma prolongamos em muitos anos a
vida útil destes aterros.
Agora já sabemos que o nosso vizinho não é um lixão, e que há toda uma
preparação antes da deposição final do lixo; que este é compactado... Mas e
depois qual é a o próximo passo na construção de um aterro? O que vem por cima
desta camada de lixo prensada? E novamente: este lixo fica a céu aberto?
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Compactador em ação
Lagoa de acumulação de chorume no Aterro Bandeirantes
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Comecemos
pela última questão,
que nos ajudará a
entender as
demais. O lixo não
fica exposto, depois
de compactado é
jogado sobre ele
uma camada de
solo argiloso (mais impermeável) e de brita, para evitar mau cheiro e a proliferação
de vetores e, e logo em seguida há a deposição de mais uma camada de lixo que
é novamente compactada, e assim se segue por diversas vezes esse mesmo
trabalho. Essas camadas são denominadas células de lixo e no “Bandeirantes”
tem cinco metros de altura, cada uma.
Também sempre ouvimos falar sobre um tal gás que o lixo libera. Neste
processo de construção de um aterro, há espaço, para a implantação
de mecanismo para esse tal gás? E
mais... Existe realmente esse gás no
lixo?
É verdade, existe um gás
poderosíssimo liberado na
decomposição do lixo orgânico, e se
chama Gás Metano, só para termos
uma idéia ele é vinte vezes mais poluente que o já terrível CO2 (mais conhecido
como dióxido de carbono). Mas tratando do “nosso” gás (o Metano) tomamos
alguns cuidados.
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oto
CR
Mo
reira
Células de lixo e drenos de chorume no aterro sanitário
FA
U-U
SP
FA
U-U
SP
Células
de lixo
Dreno vertical de gás
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Quando são
construídos os aterros, é
implantado uma série de
dutos, como se fossem
grandes canos na
posição vertical, com
uma série de furos, que
vão desde as células
mais profundas do lixo
até a superfície. Esses
“tipos” de canos servem
para que o gás escape
para a atmosfera, ou ainda que seja transferido a reservatórios para
posteriormente serem reaproveitados, gerando energia (veremos mais adiante).
A partir desta definição, podemos começar a discutir e entender, o porquê
de se considerar o nosso vizinho tão indesejado; esse gás se por algum motivo
ficar muito concentrado
entre as células de lixo, e
devido a alguma falha no
sistema de dutos, não
conseguir escapar à
superfície, pode transformar
o aterro em uma grande
bomba. Mas pensando que
tudo que está ruim pode
piorar ainda mais, para
evitar tal explosão, acabam
por mandar todo esse gás para
a superfície, aí respiramos esse “ar puro” carregado de gás metano em Perus, e
acabamos nem percebendo...
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Dutos verticais de
gás Lixo
compactado
A nossa terrível “atração”: a queima do gás metano
Sistema de dutos: trás o gás para a superfície
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Para diminuir (isso mesmo, diminuir) esse impacto na atmosfera, por anos
queimaram esse gás, como vimos acima. Os dutos traziam o gás à superfície e ai
se dava a sua queima, no entanto, continuava-se a poluir e o que ocorreu foi uma
relativa diminuição das emissões, mas não houve a resolução do problema.
Inclusive quem passava pela rodovia dos Bandeirantes, e possivelmente até parte
da comunidade, sem saber o que significava aquela queima, achava muito bonita
aquela imagem do fogo, no meio daquele imenso vazio que era o aterro.
Podemos perceber a complexidade na construção de um aterro, mas
temos que lembrar ainda de outro fator: a chuva. Isto porque já pensamos na
drenagem do chorume e do gás, mas as águas superficiais também devem ser
drenadas de forma que não haja o acúmulo ou infiltração nas células de lixo, para
evitar isto, constroem-se dutos para o escoamento desta água, evitando que a
água da chuva infiltrada possa aumentar e muito o volume do chorume,
dificultando o seu processo de drenagem, armazenamento e transporte.
Agora que estamos conhecendo um pouco mais o aterro, e ganhamos certa
intimidade com nosso vizinho, podemos passar a questioná-lo sobre esta
convivência inconveniente, afinal um vizinho que se preze, não contamina o
quintal alheio, ainda mais se tratando de toda uma imensa comunidade como a
perusiana.
Desta forma vamos dar a palavra ao nosso vizinho para que possa se
defender destas acusações, e quem sabe nos convencer que não é tão errado
assim, e que tem consciência; por outro lado podemos juntos pensar em soluções
que agradem a ambos, ou pelo menos podemos propor alternativas para um
convívio mais agradável e harmonioso. Com a palavra o nosso vizinho o “Aterro
Sanitário Bandeirantes”.
O nosso vizinho por ele mesmo...
Ótimo que foi dada à oportunidade de me defender, assim poderei dizer um
pouco sobre mim, sobre a minha história, e quem sabe todos entendam que não
tenho culpa de ser assim, e mais; que entendam que não gosto de ter sido
concebido para esse fim. Talvez possam perceber quem são os verdadeiros
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responsáveis pela minha concepção e manutenção; e o mais importante que
juntos podemos encontrar sim alternativas para um melhor convívio.
Entrei em funcionamento em 1979 e recebi lixo até o dia vinte de março de
2006. Sempre fui um aterro e nunca um lixão como alguns pensam. Fui crescendo
ano a ano e hoje tenho aproximadamente 140 hectares (1.400.000m²), que
equivale mais ou menos a 180 campos de futebol do tamanho do Morumbi
ocupando hoje o que já foi uma antiga área florestada Durante toda a minha vida
recebi 38 milhões de toneladas de resíduos; célula a célula de lixo atingi a
impressionante altura de 110 metros, isso mesmo mais de 100 metros de lixo
compactados sendo que em meus últimos dias de vida recebia diariamente 6.500
toneladas de lixo.
Ah! Ia me esquecendo... Lembra do chorume aquele líquido escuro e mal
cheiroso? Então, vocês não imaginam a quantidade desta porcaria que meu lixo
gerava, imaginam? Pois eu falo para vocês; 19 litros por segundo... Isso mesmo, o
tempo que vocês demoram para piscar... A cada piscada de vocês, eu gerava 19
litros de chorume, era uma loucura... Por falar em loucura, lembram do gás que eu
jogava atmosfera, para respirarmos? Lembraram? Aliás, nem temos como se
esquecer de tal veneno... Então, a cada hora ganhávamos 12 mil m³ de gás
metano, sabem quanto é isso? Pensem naquela caixa de água que vocês têm em
casa, isso mesmo aquela de mil litros, pensaram? Pois é, a cada hora jogava no
ar o equivalente a 12 mil caixas d‟água cheias de veneno, o gás metano...
Também queria falar para vocês, que sempre recebi resíduos domésticos,
que possuem grande volume de carga orgânica, e entulhos de construções, os
chamados resíduos inertes, por outro lado nunca conheci lixos hospitalares ou
industriais, que eram encaminhados para outras localidades e incinerados ou
tratados.
Toda essa quantidade de lixo, como vocês viram acima, gerava uma
enorme quantidade de chorume e gás metano, que apenas bem mais tarde
quando eu já estava bem grandinho, perceberam que poderiam utilizar todo
aquele gás para gerar energia, logo pensei: “nossa que interessante”, pode-se
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gerar energia e ainda não se joga toda aquela porcaria na atmosfera para os meus
queridos vizinhos de Perus respirarem. Embora vocês não acreditem, eu tentava
ser um aterro consciente, mas sem o apoio de nossa comunidade, do poder
público e das empresas envolvidas em meu funcionamento nada podia fazer.
Neste momento já diziam que minha vida útil (alguém já viu vida inútil? Pois
é, diziam que a minha era.), estava perto do fim, que não poderia mais receber
lixo, foi uma alegria só pra mim, afinal o que mais eu poderia querer, além de não
receber mais tanta porcaria, ainda iria gerar energia e diminuir a emissão de gás
para que meus vizinhos pudessem respirar um ar mais puro... E o melhor. Ainda
ouvi dizer que no futuro, me transformariam em um parque; que beleza... Já
pensou, eu que por anos fui tão odiado, logo estarei recebendo crianças e adultos
para brincar...
A descoberta desse meu potencial energético foi um grande acontecimento
para mim e para a
nossa vizinhança,
mas também
apareceram
algumas questões
que me deixaram
confuso, primeiro
pelos palavrões que
começaram a dizer.
Coisas do tipo;
créditos de carbono,
Protocolo de Kioto,
um tal de MDL que
diziam ser um Mecanismo
de Desenvolvimento Limpo... Mas tenho certeza que até o fim deste trabalho
estarei entendendo todos eles.
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Radiação solar retida pelos gases estufa
O efeito estufa em ação: o aquecimento natural da Terra
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De tantos nomes esquisitos um dos poucos que eu estava acostumado, era
o tal do efeito estufa, mas isso muitos já conhecem, só o que demorei a entender
é porque diziam que ele é importante para a vida, e ao mesmo tempo diziam que
poderia decretar o fim da humanidade. Ainda bem que certo dia alguns estudantes
da região foram me conhecer e fiquei ouvindo a conversa, como sou um aterro
que não guarda segredo vou contar essa história para vocês...
Uma jovem garota disse que o nosso planeta recebe uma grande
quantidade de raios solares, e que eles chegavam até o nosso solo, parte era
retido por aqui e o restante tentava voltar para o espaço, foi quando percebi a
importância dos gases do efeito estufa, eles acabam não permitindo que todo o
calor saia de nosso planeta, ele “segura”, um pouco para a gente... O mais legal é
que entendi, também, que tudo isso é um processo natural, e que em outros
momentos da nossa história quando esses gases se concentravam em nossa
atmosfera em pouca quantidade, vivíamos uma era glacial, quer dizer, se não
tivéssemos os gases estufa, não haveria a nossa comunidade pelo intenso frio...
Bem, entendi porque os gases são importantes, mas afinal, porque tanto se
fala mal deles, se permitem que vivamos? Foi essa a pergunta que um coleguinha
desta menina a fez e ela prontamente respondeu... “Foi como eu te disse, o efeito
estufa é um processo natural, mas o homem vem interferindo nessa dinâmica,
aumentando significadamente as emissões de gases estufa logo se têm
aumentado consideravelmente o „armazenamento‟ dos raios solares em nosso
mundo trazendo um aumento da temperatura que pode por em risco a nossa
vida”.
Este dia foi muito importante em minha vida, primeiro por ter descoberto
que meus gases não iriam para a atmosfera, e sim utilizados para a geração de
energia, mas sem duvida o que fez deste dia o mais valioso, foi quando percebi
que eu, um aterro tão recriminado e odiado, estava dando a minha contribuição
para a melhora na qualidade de vida da minha comunidade.
Sugiro que façamos, todos nós, eu e vocês queridos vizinhos, uma reflexão.
Diminuímos a emissão de gases em nossa região, certo? Entendemos que já não
Energia solar absorvida
Radiação solar
refletida
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funciono mais. Tudo bem até aqui? Mas, afinal e todos aqueles palavrões, o que
são aquilo? E mais. A nossa comunidade realmente foi beneficiada com o meu
fechamento e com essa geração de energia? Todos estão contentes com a atual
situação? E o poder público quais são as suas ações e responsabilidades com a
nossa comunidade? Qual é o seu comprometimento com a melhora da qualidade
de vida da nossa querida Perus?
Espero que tenhamos respostas para essas e tantas outras questões que
dizem respeito ao nosso cotidiano, para que assim possamos, eu o famoso Aterro
Sanitário Bandeirantes e a comunidade de Perus ter uma convivência tranqüila.
Muitas questões... Algumas respostas...Certas dúvidas...
Podemos iniciar esta discussão, a partir de uma fala de nosso vizinho, o
aterro, quando diz que o gás metano seria “reaproveitado” e transformado em
energia, mas isso é realmente possível? Vamos conhecer a pouco divulgada usina
que faz esse trabalho limpo e que pode nos trazer essas e outras respostas...
A Usina Termoelétrica Bandeirantes (UTEB)
Realmente, desde o
final de 2003 com a
inauguração da Usina
Termoelétrica Bandeirantes
(UTEB), este gás, aliás,
passaremos a chamá-lo de
biogás, gerado pelo aterro é
“transformado” em energia
elétrica, o que contribui,
como já falamos, para a
redução da emissão de
poluentes para a atmosfera.
Ah! Íamos esquecendo...
Essa usina foi desenvolvida em
conjunto entre a Biogás Energia Ambiental, que faz a captação do gás e dá
Bio
gás E
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Usina Termoelétrica Bandeirantes
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encaminhamento as demais etapas para geração de energia e o Unibanco que foi
o financiador do projeto e ocupa uma área gentilmente cedida pela prefeitura em
forma de concessão.
Antes de continuarmos essa conversa, queríamos dizer que procuramos
alguns textos que falam sobre a geração de energia a partir do biogás, e ainda
visitamos a UTEB, para comprovar se realmente o processo de geração de
energia se dá como nos mostra os livros, aliás, sugerimos que quem tiver
curiosidade, faça o mesmo... Vá fazer uma visitinha à usina e aproveite também
para conhecer o aterro, mas lembrem; as visitas são sempre agendadas.
Engraçado, o nosso vizinho aterro é tão conhecido e mal amado, e junto a
ele tem essa tal usina que gera energia “limpa”... A UTEB ajuda a preservar o
meio ambiente, e como veremos adiante, trás lucros à nossa região e quase
ninguém conhece... Porque será? O poder público poderia trazer à população um
melhor esclarecimento sobre esta usina, não? Mas tudo bem, sigamos...
Lembram-se que em nosso vizinho foi depositado, incríveis 35 milhões de
toneladas de lixo? Pois é, os especialistas em geração de energia a partir do gás
metano dos aterros,
nos informa que
cada tonelada de
resíduo gera por
volta de 200 m³ de
biogás, e que se
pode iniciar a
captação desde
alguns meses da
compactação do
lixo (em células),
prosseguindo até 15
anos após o fechamento do aterro, o
“nosso” Bandeirantes, iniciou há apenas alguns anos a captação de biogás, como
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Dutos para captação do gás metano
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já dissemos, com a constituição da Usina Termoelétrica Bandeirantes em 2003, e
podemos imaginar que teremos muito gás para os próximos anos...
Como já vimos, por anos o gás metano gerado em nosso vizinho era jogado
na atmosfera e respirávamos aquele terrível veneno, mas com o a nossa querida
Usina (UTEB), agora não tínhamos mais motivos para nos preocupar, pois ela pôs
em funcionamento (será que podemos ficar tranquilos?) uma ampla rede de
captação do gás metano, a partir da construção de uma rede coletora (tubos) com
43 km conectados aos 250 drenos verticais que trazem à superfície o gás gerado
pelo nosso não tão amado, mas agora não tão odiado, Aterro Bandeirantes.
Bem, agora que já entendemos a captação do biogás, vamos ver como se
dá a sua transformação em energia elétrica. Na verdade, a melhor forma de
conhecer e entender esse processo com maior facilidade seria visitar a UTEB,
mas até que todos tenham condições de conhecê-lo pessoalmente, daremos uma
simplificada no processo, contando com a compreensão de vocês, queridos
leitores, e mais, contando que venham a conhecer esse nosso querido vizinho.
Vamos lá...
Recolhido todo o gás, o encaminhamos para limpeza e secagem, como
nem tudo é pureza e perfeição, parte do gás extraído do aterro não é aproveitado,
para gerar energia, por não ter qualidade suficiente, durante essa fase separa-se
líquidos que são escoados para um reservatório. Esse líquido é chamado de
chorume branco, por apresentar coloração clara e ser o oposto do chorume
produzido no aterro de coloração escura, mas podemos afirmar: ambos possuem
um odor insuportável.
O biogás neste momento se encontra com uma alta temperatura e depois
de separado líquidos e gases não aproveitáveis, passa por resfriadores, para
poder ser encaminhado ao moto-geradores, esses são grandes motores, que
serão os responsáveis por funcionar turbinas que irão gerar energia elétrica...
Mas gostaríamos de falar um pouco mais sobre esse processo, que pode
parecer complicado mais não é, vamos pensar em um motor de carro, por
exemplo, ele é movido à gasolina (pode ser a álcool, diesel ou GNV), ou seja,
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temos que colocar gasolina para ele funcionar, não é isso? Então no processo de
geração de energia elétrica temos algo similar, há grandes motores, chamados de
moto-geradores, que são abastecidos, não com gasolina, mas com o biogás...
Mas gostaria de perguntar uma coisa a todos: vocês já ouviram dizer que um carro
não anda com gasolina de má qualidade? Pois é, com os moto-geradores ocorre a
mesma coisa, se não houver um biogás rico em gás metano ele não consegue
funcionar e aí é impossível gerar energia. Por isso que se faz a separação do gás
metano e de líquidos que vem junto ao biogás. Vale lembrar que todo gás
excedente é queimado em um flair, que é uma espécie de chaminé, e como eles
dizem lá na usina “destroem” o gás, não mandando para a atmosfera os terríveis
gases não aproveitados.
Durante a nossa visita os flaires não estavam sendo utilizados, pois todo o
gás estava sendo encaminhado, para os moto-geradores, e pudemos ver que todo
esse processo é controlado por um grande Painel de Controle que obedece aos
mais rígidos sistemas de segurança, há assim uma grande preocupação para que
não ocorram acidentes e essa monitoração é fundamental para que se evitem
explosões, por exemplo. Se aumentar muito a concentração de Gás Metano
(muito acima de 50%) e oxigênio acima de 3% se alarma a usina, se a
concentração de oxigênio chegar a 6% a usina é desligada automaticamente, mas
segundo o operador que nos acompanhou durante a nossa visita isso nunca
ocorreu.
Agora que esclarecemos muitas questões... Temos algumas respostas, nos
falta acabar com certas dúvidas. Tudo bem, já entendemos como se dá o
funcionamento de nossos vizinhos: o aterro e a usina, mas ainda persistem as
dúvidas levantadas anteriormente, lembram? Os palavrões, o poder público, os
interesses da comunidade... Vamos tentar entender todos, e o mais importante:
aonde a nossa comunidade se insere nesta discussão? Quais vantagens
obtivemos com os nossos vizinhos, temos algo de positivo construído? Sim, pois
até agora, só foi prejuízo, ou quando muito alguns curativos para minimizar as
porcarias feitas em nossa querida Perus.
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Mas para nos ajudar nesta conversa recorreremos às lembranças da nossa
querida usina. Isso mesmo, ela tem lá suas histórias pra contar, ainda que seja
jovem, ela já recebeu várias visitas e assim como o nosso outro vizinho, o aterro,
também gostava de ficar bisbilhotando a conversa dos outros...
Em uma bela manhã de quarta-feira um jovem mestre, de nome Ronaldinho
das Figueiras, que vivia discutindo as problemáticas ambientais e de gestão
pública, foi fazer uma visita à usina, ele já era defensor de uma maior participação
da comunidade nas decisões locais, sempre dizia que somente uma sociedade
organizada, teria condições de conquistar melhorias na qualidade de vida, pois se
a tomada de decisões ficasse nas mãos do poder público ou do interesse privado,
os chamados primeiro e segundo setores, haveria uma defesa pelos interesses
destes, em detrimento da vontade do chamado terceiro setor, ou seja, da
sociedade.
Ronaldinho destacava, ainda, o papel da Escola nesta conscientização, e
sempre falava da responsabilidade do professor de Geografia neste processo,
sobretudo por tem uma visão mais ampla destas questões, logo teria muito a
contribuir... Mas deixemos de blá blá blá e vamos ao que interessa; à conversa do
professor neste dia de visita com sua jovem aluna, e intelectual Silvinha.
Primeiro eles conversavam sobre a geração de energia, créditos de
carbono, Protocolo de Kioto e Mecanismo de Desenvolvimento Limpo,
compostagem, reciclagem, para a seguir contextualizar o papel da comunidade e
do poder público nestas discussões, e é claro, a nossa vizinha usina, ficou de
ouvidos bem abertos para entender toda essa história agora vai nos ajudar com
seu relato...
Os Palavrões...
Bem, agora eu, a querida usina termoelétrica vai contar um pouco do que
ouvi nesta conversa; os famosos palavrões, ou seja, aquelas palavras, que para
mim uma simples usina, em um primeiro momento, parece de difícil entendimento,
mas que depois desta discussão, perceberemos que são conceitos
18
descomplicados, mas de fundamental importância, para o desenvolvimento de
nossa comunidade, mas vamos lá...
Como falamos acima, o professor e sua aluna começaram a falar sobre a
geração de energia em minha usina. Mais que uma alegria para o nosso vizinho
aterro, que era da onde vinha biogás que seria transformado em energia elétrica,
seria de grande alegria para toda a comunidade, uma vez que tal processo de
geração de energia traria dinheiro para a nossa Perus, mas como isso seria
possível? Vejamos e aproveitaremos para conhecer outros palavrões...
Já ouviram falar dos tais créditos de carbono? Pois é, daí que viria o
dinheiro para a nossa comunidade, mas afinal o que são esses tais créditos? Bem,
antes temos que entender outro palavrão, que é o Protocolo de Quioto e conhecer
alguns outros lugares, para podemos entender esse conceito. Vamos viajar um
pouco?
Há muitos anos a problemática ambiental vem se tornando não só uma
questão de nossa comunidade, mas do mundo inteiro. Tal problema ganhou
dimensão planetária, sobretudo após as décadas de 1940/50, com a explosão do
capitalismo e seu consumo desenfreado, que contribuiu muito para a degradação
do meio ambiente.
A partir deste momento, houve alguns encontros e conferências para
discutir a criação de mecanismos que garantissem o desenvolvimento
socioeconômico, mas de forma que não se comprometesse a qualidade de vida e
desenvolvimento, das gerações futuras. Entre esses encontros podemos destacar
a “Conferência de Estocolmo” na Suécia e a “Rio 92” (Eco 92), aqui no Brasil. A
parir deste momento intensificaram-se essas discussões e durante a 3ª
Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças
Climáticas, realizada no Japão em 1997, firmou-se o “Protocolo de Kioto”.
Este documento estabelecia o comprometimento, dos países
industrializados em reduzir as emissões de gás estufa, isto chamou a minha
atenção, pois ainda que seja uma usina e não entenda muito desses assuntos,
pensei: e os chamados “países em desenvolvimento”? Mas não fiquei sem
19
resposta, pois o professor Ronaldinho logo respondeu, que esses países, como
Brasil, China e Índia, por exemplo, não teriam metas de redução destes gases...
Nossa, mas logo eles que são grandes poluidores? Mas sei lá, vai ver eu, uma
mísera usina esteja errada e os mentores deste protocolo, que são tão estudados
devem saber o que fazem... Será que sabem mesmo? Quem sabe um dia não
terei a reposta...
B
FA
U-U
SP
PROTOCOLO DE QUIOTO
Legenda :
: Países que ratificaram o protocolo.
: Países que ratificaram, mas ainda não cumpriram o protocolo. : Países que não ratificaram o protocolo. : Países que não assumiram nenhuma posição no protocolo.
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agora que entendi esse tal de protocolo, fiquei interessado em saber o papel do
Brasil, e afinal onde entra a minha Perus nessa discussão? E os tais créditos de
carbono? Continuei atento na conversa entre o professor e sua aluna, e logo
disseram que temos um papel importante nesta história toda, que seria a
implantação de Mecanismos de Desenvolvimento Limpo (MDL)... Nossa lá vem
esse palavrão, prestei atenção ainda mais na conversa e entendi que esse era um
mecanismo onde se desenvolvia a chamada energia limpa, e como nós os
“subdesenvolvidos” diminuíamos a emissão de gases poluentes, poderíamos
vender aos países desenvolvidos o direito de poluir...
Nossa! Outra loucura, e o pior é que nós estávamos no meio, eu (a usina) o
aterro e toda a comunidade perusiana. Agora entendi quase tudo; quer dizer que o
meu projeto de gerar energia elétrica a partir do gás metano, extraído do Aterro
Bandeirantes era esse tal de MDL, e que a tal venda do direito a poluir, seria a
venda dos créditos de carbono.
Em palavras bonitas eles disseram que esses créditos são certificados
emitidos quando se dá a redução da emissão de gases do efeito estufa, sendo
que esses créditos podem ser comercializados no mercado internacional, porém
apenas os países chamados em desenvolvimento podem vendê-los, aos países
industrializados.
Entendi o processo, mas fiquei extremamente decepcionado, pelo menos
por um lado. Claro que o meu papel na redução de poluentes em nossa atmosfera
me gratifica, mas só em pensar que estou dando o direito a outros países de
continuarem poluindo, me entristeço, pois todos deveriam ter essa
responsabilidade, e não se aproveitarem da energia limpa gerada aqui em Perus.
Mas essa relação de decepção e gratificação não se resume a esses
fatores, fiquei sabendo que o dinheiro do leilão desse crédito de carbono, trouxe
recursos parta a nossa comunidade, foi mais de R$ 30 milhões, momento de
grande alegria, mas por outro lado, esse dinheiro todo, só pode ser revertido para
a área ambiental. Até aí tudo bem, mas o problema é que o poder público não
considera o Homem, como parte integrante desse meio, pelo menos em minha
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opinião, digo isso porque não se pode construir um hospital para nossa
comunidade, aliás, não temos nenhum; mas pode-se construir o Hospital dos
macaquinhos, a um custo de R$ 5 milhões...
Na verdade o que se discutia era a construção de um hospital veterinário, e
os opositores desta idéia, de forma pejorativa, e como forma de protesto passaram
a chamar esse empreendimento de ”hospital dos macaquinhos”. Enfim,
continuaremos sem o nosso hospital, mesmo tendo verba disponível, mas achei
interessante a fala do professor Ronaldinho sobre isto... ”Não se pode utilizá-la
para o „bicho Homem‟, só para os demais, temos a impressão que realmente não
fazemos parte do meio ambiente, e enquanto não tivermos uma visão sistêmica,
ou seja, enxergar „o todo‟ e o homem como agente do meio ambiente, não
conseguiremos encontrar alternativas para as problemáticas sócioambienteais...”
Mas voltando a falar sobre a relação “custo-benefício”, realmente parece
muito dinheiro, afinal, mais de Rl$ 30 milhões, para quem nunca viu dinheiro na
vida é uma quantia realmente significativa, e até para a nossa subprefeitura esse
valor é exorbitante e muito superior a todo o seu orçamento; mas será que o custo
ambiental de um aterro é só esse? Vale a pena recebermos essa quantia por
respirar por anos aquela porcaria de ar? O poder público vai dizer que sim, até
porque já iniciou a reforma das praças do bairro, as primeiras são: Vale do Saber
(Jardim Monte Belo), Mogeiro (Vila Nova Perus) e Cuitegi (Vila Caiuba) e
principalmente, porque agora em outubro (2008) acabou de acontecer o segundo
leilão dos créditos de carbono, e a prefeitura vai receber por cada um dos seus
713 mil créditos a quantia de € 19, 20, somando um total de R$ 37 milhões.
Desculpe a sinceridade de uma usina sem estudos e ignorante, mas acho que
não, a nossa qualidade de vida vale muito mais... Muito mais mesmo!
Diante da conversa que presenciei, me tornei uma usina questionadora, e
penso que a comunidade de Perus, bem que poderia ter acesso a essas
discussões, afinal, será que realmente temos a necessidades desses tais aterros
sanitários, ou poderíamos dar outro destino aos resíduos, ou quem sabe,
poderíamos pensar em reduzir essa emissão... A cada momento ficava mais
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interessado na conversa dos meus visitantes, e ainda bem que não me deixaram
sem resposta; logo passaram a discutir, essas questões e outras relativas aos
famosos, poder público e interesse privado. E o mais interessante é que
finalmente poderemos conhecer os últimos palavrões: compostagem, reciclagem e
preciclagem...
Uma alternativa aos aterros
Os meus queridos e estudiosos visitantes fizeram uma reflexão
interessante, e provocaram duas estudantes que passavam ali e se interessaram
pela conversa. Essas duas meninas eram as irmãs Ana Lúcia e Ana Maria, e
faziam parte de um grupo que estava fazendo uma visita ao meu vizinho, o Aterro,
mas desgarraram-se de seu grupo e foram ver o que tanto Ronaldinho e Silvia
discutiam. Ao se aproximarem Ronaldinho percebeu a curiosidade das meninas e
perguntou em tom de provocação, se elas sabiam que estavam passando em
cima de mais de 35 milhões de lixo compactados, elas já conheciam toda a
história do aterro, até porque moravam logo ali ao lado, e eram extremamente
comprometidas com o meio ambiente, e responderam a provocação de nosso
querido professor de forma surpreendente...
Logo falaram que elas eram comprometidas com as questões ambientais, e
não concordavam com os “ecobobos” e seus discursos ecologicamente corretos,
lembrando, que do discurso a pratica, existia um grande caminho e que elas
futuras professoras de Geografia realmente tinham que se preocupar com a
educação e conscientização da comunidade, pois só assim, realmente
conseguiriam alcançar melhorias na qualidade de nossa comunidade, e não
ficariam presas à “boa” vontade do poder público.
Vocês não imaginam como o nosso professor ficou surpreso com a fala das
meninas, uma vez que realmente a falta educação constitui um grande obstáculo a
implementação de qualquer projeto dito ambiental. Mas uma vez provocadas, as
meninas não pararam...
Perguntaram ao professor se ele sabia que em nossa cidade atualmente 74
bairros são atendidos pela coleta seletiva, e que Perus não era “contemplada” com
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essa coleta. Que em nosso bairro existe um Ecoponto, que é o lugar de entrega
voluntária de pequenos volumes de entulho (até 1 m³), grandes objetos (móveis,
poda de árvores etc.) e resíduos recicláveis, mas que por conta da falta de
educação (desconhecimento) já haviam presenciado um morador vizinho a esse
ponto de coleta de entulho, despejando vários carrinhos de “restos de construção”
na via pública... Mas uma vez provocadas, as meninas não pararam...
Falaram ao professor que curiosas, foram visitar um bairro da zona norte
atendido por essa coleta seletiva do lixo, o Parque Peruche, e constataram, sem
se surpreender (afinal sem educação nada funciona) que em um quarteirão, com
mais de 80 casas apenas 7 descartavam o chamado “reciclado”. Mas uma vez
provocadas, as meninas não pararam...
Devolveram a provocação, perguntando ao professor se ele fazia a
preciclagem, e o que ele pensava da compostagem, e diante da resposta (positiva
e explicativa) do professor, continuaram a discussão, a essa altura, eu já me
considerava uma usina pós-graduada em temáticas ambientais, diante de tão
produtiva conversa, mas queria mais, e tive muito mais...
Ana & Ana consideraram a importância da preciclagem, pois já no ato da
compra de certo produto pode-se escolher os que possuem menos embalagens,
ou os que são mais fáceis de reciclar, enfim, seguem o slogan simples e sensato:
"Reduza o lixo antes de comprá-lo" ou "Não compre lixo"! Mas uma vez
provocadas, as meninas não pararam...
Sobre a compostagem, citaram a grande quantidade de matéria orgânica
presente em nosso lixo; mais da metade do que descartamos é matéria orgânica,
que poderia ser reaproveitada e transformada em abudo natural, o que contribuiria
duplamente para a preservação do meio ambiente: primeiro por se reduzir os
resíduos encaminhados aos aterros, e segundo ao diminuir a produção de
fertilizantes (químicos) que comprometem seriamente a natureza. Então
pensemos: só com a compostagem poderíamos reduzir a quantidade de lixo do
nosso vizinho em mais de 18 milhões de toneladas, e isso ninguém fala, e muito
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menos as escolas trabalham essas informações. Mas uma vez provocadas, as
meninas não pararam...
Agora que as meninas apresentaram as primeiras alternativas ao aterro,
elas seguem falando sobre a reciclagem. Hoje menos de 4% do lixo produzido no
Brasil é reciclado, se pensarmos que poderíamos aumentar essa quantidade em
pelo menos 30%, chegaríamos a conclusão que o nosso aterro teria menos 8
milhões de toneladas de lixo. E o mais importante, menos lixo significaria menos
gás em nossa atmosfera, e melhor qualidade de vida a nossa comunidade. Sobre
a reciclagem elas também acham importante considerar esse projeto como de
fundamental importância enquanto política de inclusão social, geração de renda e
diminuição da desigualdade socioeconômica. Mas uma vez provocadas, as
meninas não pararam...
Ana Lúcia chamou a atenção para um ponto que é pouco discutido, e que
na cabeça dos “ecobobos” nem deve existir, e que vai além da discussão de se
preciclar, reduzir, reaproveitar, reciclar... Propôs que pensássemos na quantidade
de matéria prima e energia (por exemplo) que deixaríamos de consumir com
essas ações, logo, estaríamos colaborando com o tão divulgado, e pouco
realizado desenvolvimento sustentável, uma vez que estaríamos preservando e
oferecendo condições para as gerações futuras tivessem “seu desenvolvimento”
socioeconômico. Mas uma vez provocadas, as meninas não pararam...
Nossa, a cada novo argumento das meninas o professor Ronaldinho, ficava
mais espantado com o interesse e comprometimento das futuras professoras, que
a todo momento falavam que mais importante que ter todo esse conhecimento,
seria trabalhar junto à comunidade de Perus essas informações, para que a
comunidade organizada, pudesse, questionar o poder público.
Uma coisa posso dizer, eu, uma usina já não tão ignorante, considerava a
destinação de lixo ao aterro, nessas proporções, algo inconcebível. Tudo bem,
podemos ter aterros. Pensemos em nosso vizinho o Aterro Sanitário Bandeirantes,
ele é importante e necessário, mas com as medidas citadas pela irmãs Ana &Ana,
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hoje ele teria uma quantidade infinitamente menor de lixo e poderia ficar em
funcionamento por mais de 50 anos, pelo menos...
Já se findava o dia e a conversa tinha sido altamente produtiva, as meninas
voltaram para o seu grupo, depois de devolver todas as provocações ao professor,
que A PARTIR daquele momento, passou a questionar ainda mais o poder
público, pois afinal, diante de tudo o quer foi dito, qual a posição do nosso primeiro
setor? Será que eles consideram importante manter o sistema de coleta de lixo
nos moldes atuais? E mais... E a Educação?
Bem eu me despeço, e passo a palavra a outros que possam trazer novos
esclarecimentos à nossa comunidade, mas com certeza hoje estou feliz por
entender que existem pessoas realmente preocupadas com a nossa realidade...
O poder público, e o interesse das empresas... E a comunidade?
Podemos perceber que realmente temos grandes problemas em nossa
comunidade, sendo analisada aqui a questão do lixo, mas não podemos deixar de
considerar a falta de interesse político como um dos maiores problemas de nossa
região. Aliás, nem deveríamos chamar isto de falta de interesse, pois na verdade o
que mais se tem neste momento são interesses, mas esses não são os da
comunidade, e sim do poder público e das empresas envolvidas nestas questões.
Se não vejamos.
Como já foi citado a reciclagem e a compostagem são fundamentais para a
redução do lixo, um grande problema hoje, não só em nossa cidade, mas em todo
o planeta, mas para o poder público a implementação destas práticas, têm um
custo altíssimo, sem contar que da maneira como é feita atualmente não
consegue produzir resultados satisfatórios, pois falta educação à comunidade e as
ações não se dão em parceria com a escola, que poderia (e deveria) ser parte
integrante neste processo, desta forma falta interesse ao poder público em
atender a nossa comunidade.
Bem, se falta interesse por um lado, o de atender a comunidade, sobra
“interesses” do outro, sobretudo os das empresas envolvidas nesse processo.
Primeiro porque é mais fácil gastar milhões com transporte de lixo, com os aterros,
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por exemplo, do que investir em educação, que dá muito mais trabalho, ainda
mais em nosso falido sistema educacional. Segundo, e aí fica mais evidente o
interesse das empresas particulares envolvidas na questão do lixo, qual o
interesse em se diminuir a quantidade de lixo destinada aos aterros, uma vez que
com esse sistema de créditos de carbono, obtém-se lucro à custa da nossa
qualidade de vida?
Assim, fica muito claro quanto sobra interesse de um lado, e quanto falta do
outro, e o poder público que em tese, deveria atender aos anseios da nossa
comunidade, está a serviço, primeiramente, das empresas particulares...
Enfim, isso é um pouco de nossa realidade, triste e dura realidade, que
contrapõem interesses e que mostra a importância da Educação para a resolução
dos problemas, pois somente com grande comprometimento e envolvimento de
nossa comunidade, apoiada na Educação, é que poderemos questionar o poder
público, de forma a atender os nossos interesses, e principalmente, que possamos
mostrar que somos parte de um sistema, e que não devemos ser relegados a um
segundo ou terceiro plano nestas discussões. Afinal, ainda que nos encontremos
neste longínquo bairro do extremo norte da capital, temos uma comunidade,
temos uma população, temos sentimentos, temos famílias, temos filhos e que
fazemos parte do meio ambiente, ainda que nem todos pensem assim...
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