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THAIS PAULINA GRALIK AS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS NO ENSINO DE ARTES VISUAIS NA PERSPECTIVA DOS ESTUDOS DA CULTURA VISUAL FLORIANÓPOLIS - SC 2007

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THAIS PAULINA GRALIK

AS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS NO ENSINO DE ARTES VISU AIS

NA PERSPECTIVA DOS ESTUDOS DA CULTURA VISUAL

FLORIANÓPOLIS - SC

2007

Livros Grátis

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA – UDESC

CENTRO DE ARTES – CEART

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTES VISUAIS

THAIS PAULINA GRALIK

AS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS NO ENSINO DE ARTES VISUA IS

NA PERSPECTIVA DOS ESTUDOS DA CULTURA VISUAL

FLORIANÓPOLIS – SC

2007

Dissertação de Mestrado elaborada junto ao Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais do CEART/UDESC, para obtenção do título de Mestre em Artes Visuais. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Teresinha S. Franz

2

THAIS PAULINA GRALIK

AS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS NO ENSINO DAS ARTES VISU AIS

NA PERSPECTIVA DOS ESTUDOS DA CULTURA VISUAL

Dissertação de Mestrado elaborada junto ao Programa de Pós-Graduação em Artes

Visuais do CEART/UDESC, para obtenção do título de Mestre em Artes Visuais, na

linha de pesquisa Ensino das Artes Visuais.

Banca examinadora:

Orientador: ___________________________________________________ Prof.ª Dr.ª Teresinha Sueli Franz (CEART/UDESC)

Membro: ____________________________________________________ Prof.ª Dr.ª Neli Klix Freitas (CEART/UDESC)

Membro: _____________________________________________________ Prof.ª Dr.ª Ana Maria P. Liblik (UFPR)

Florianópolis, 16 de agosto de 2007.

3

Dedico este trabalho a Deus e a minha mãe, por sua generosidade, diplomacia e inteligência peculiares, que me fazem crer que tudo é possível de ser realizado.

4

AGRADECIMENTOS A Deus, em primeiro lugar e a Roselis, mãe e companheira, pelo seu apoio,

incentivo e muitas colaborações que recebi nesta caminhada, tendo a graça de

poder contar com sua presença e paciência em todos os momentos, difíceis ou

alegres, que jamais poderei agradecer suficientemente.

Aos professores do mestrado, em especial, à Dr.ª Sandra R. Ramalho, pelo

respeito e admiração que sinto por sua capacidade, profissionalismo e devoção ao

ensino, que me proporcionaram um sério aprendizado, conquistando meu coração,

transformando este mestrado em algo muito especial para mim. À Dr.ª Yara R.

Guasque, por seu brilho intelectual e por ter-me proporcionado um reencontro com a

arte e as novas tecnologias, plantando sementinhas.

Aos professores que ministraram os Seminários Temáticos intensivos, Dr.

Sérgio Basbaum, por sua dedicação e Dr.ª Analice D. Pillar, pela oportunidade de ter

compartilhado sua luz e seu amor contagiante pelo ensino da Arte.

Aos membros da Banca, Dr.ª Neli K. Freitas, que contribuiu na área de

Metodologia de Pesquisa, com seu bom senso e sobretudo por seu apoio e carinho.

À Dr.ª Ana M.ª Petraitis Liblik por suas prestimosas colaborações, leituras e pelo

prazer que proporcionou em me dedicar seu tempo. Meu muito obrigado por

aceitarem o convite.

À UDESC e ao CEART, que promoveram um excelente trabalho de direção e

coordenação, através dos professores Dr. Antonio Vargas e Dr.ª Regina Melim. À

Dr.ª M.ª Lucia B. Duarte e aos demais professores do mestrado e funcionários do

CEART sempre solícitos e prestativos. Meu agradecimento especial à Sandra Lima

Siggelkow, por ter encontrado em sua pessoa uma rara devoção ao trabalho,

atenção e amizade, graças a quem nada me faltou neste mestrado, apesar de meu ir

e vir de um Estado à outro.

5

A todos os colegas do mestrado de Florianópolis, que embora o tempo e a

distância não favorecessem mais encontros, contribuíram de diversas formas para

realizar este trajeto, especialmente àqueles com quem convivi de forma mais

próxima e se transformaram em amizades: Silvia G., Sandra F., Alessandra K., M.ª

da Glória e Tambi, a qual se tornou uma amiga e companheira de muitas horas.

Aos professores de Curitiba que participaram com seus depoimentos, sem os

quais este trabalho não teria sido possível, meu reconhecimento por sua boa

vontade. Também meu agradecimento às escolas que participaram deste trabalho, à

Gibiteca da Fundação Cultural e ao Solar do Rosário de Curitiba.

A minhas queridas irmãs, sobrinhos, amigos e colegas professoras dos

grupos Arte na Escola, UFPR e FAP que, de uma forma ou de outra, também

contribuíram para que eu pudesse concretizar esta etapa de minha vida.

Aos professores e pesquisadores da Universidade de Barcelona, Dr.

Fernando Hernández e Dr.ª Joana M.ª Sancho, que ministraram o Seminário de

Supervisão no Programa de Pós-Graduação – Mestrado em Artes Visuais.

À professora Dr.ª Teresinha Sueli Franz, por suas ricas orientações e que

participou deste trabalho com correções, “dicas”, contribuições teóricas e rigor

acadêmico necessário para um sério trabalho de dissertação.

6

[...] como aponta Mitchell (2000, p. 210), [...] o gênio e a obra-prima não desaparecerão do contexto da cultura visual, mas o status, o poder e as formas de prazer que nos proporcionam tornar-se-ão mais objetos de investigação do que um ‘mantra a ser entoado ritualisticamente em frente a monumentos inquestionáveis’. Fernando Hernández (2007, p. 52)

Figura 1 - Maurício de Souza. Mônica Lisa,1989.

7

RESUMO

Na presente pesquisa investigamos como os professores compreendem a Arte Seqüencial/histórias em quadrinhos no ensino de Artes Visuais. A análise de dados segue a perspectiva da educação para a compreensão da Cultura Visual e da Pedagogia Crítica da Arte. Durante muitas décadas, as HQs causaram polêmicas e não eram admitidas nas escolas. Foi somente a partir de 1970 que começaram a ser incluídas no currículo escolar. Na pós-modernidade o campo da arte se amplia, e o ensino de Arte passa a enfatizar o estudo das artes eruditas e artes populares sem fazer distinções, assim como a reclamar por um vínculo entre o cotidiano das imagens de crianças e adolescentes e a educação escolar. Observando a relação escola e quadrinhos, notamos que as HQs raramente são incluídas como conteúdo de estudos no ensino de Artes Visuais, ou são estudadas de maneira superficial. Paradoxalmente, são amiúde utilizadas no ensino de Língua Portuguesa, pelo caráter narrativo visual de sua linguagem. Dentro da temática abordada, as HQs são consideradas um importante objeto de estudos, seja como Arte Seqüencial, seja como elemento presente no cotidiano dos estudantes. Essas questões nos levaram a este estudo investigativo buscando analisar a relação existente entre as HQs e o ensino de Artes Visuais. Para esta pesquisa, realizamos 20 entrevistas com professores do ensino fundamental na cidade de Curitiba/PR, encontrando evidências de que se atribui pouca importância para as HQs como objeto de estudo crítico e que estas não são seriamente consideradas em relação a outros conteúdos. Ao final, apresentamos uma proposta educativa para interpretação de imagens de HQs, com o objetivo de incentivar a análise e a reflexão crítica em contextos de ensino de Artes Visuais. Esperamos que os resultados deste trabalho possam contribuir para uma reflexão do professor de Arte sobre o uso de HQs como objeto de ensino. Se abordados na perspectiva da Cultura Visual, os quadrinhos podem ser elos entre o universo visual cotidiano e a educação escolar, favorecendo a compreensão mais consciente dos estudantes sobre o mundo e sobre si mesmos, levando à revisão da função crítica da educação, no ensino de Arte, que vem sendo relegada em favor da informação e instrução.

Palavras-chave : Histórias em Quadrinhos; Pedagogia Crítica; Cultura Visual

8

ABSTRACT

In the present research we investigate how teachers understand the Sequential Art/comic books in the education of Visual Arts. The data analysis follows the perspective of the education to the understanding of the Visual Culture and the Critical Pedagogy of Art. During many decades, comics caused controversies and were not accepted in schools. It was only from 1970 that comics started to be included in the school curriculum. In post-modernity the field of the art has increased, and the teaching started to emphasize the study of the classical arts as well as the popular arts without distinctions, and at the same time demanding a relationship between the children’s and adolescents’ everyday images and the school education. Observing the relationship school and comics, it is noticed that comics are rarely included in the contents of the Visual Arts studies, or only superficially touched. Paradoxically they are often used in the teaching of Portuguese, because of the narrative-visual character of its language. Within the approached subject, comics are considered an important aspect to be studied as Sequential Arts as well as an element present in students’ everyday life. These issues have leaded us to this investigating study trying to analyze the relationship between comics and Visual Arts. For this research, we interviewed 20 school teachers in the city of Curitiba/PR, and we found out evidences that little importance is given to comics as an object of critical study and that they are not taken seriously comparing to other contents. Finally we present an educational proposition for the interpretation of the comics images, having as objective to motivate the analysis and critical reflection in the context of the teaching of Visual Arts. We hope that the results of this study will contribute to the reflection of the teacher of art on the use of comics as a teaching device. If taken from the perspective of Visual Culture, comics can become a link between the everyday visual universe and the school education, favoring students’ conscious comprehension of the world and of themselves, leading to the revision of the critical function of education in the teaching of Arts, which has been relegated in favor of information and instruction. Key words: Comic Books; Critical Pedagogy; Visual Culture

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1– Maurício de Souza. Mônica Lisa,1989 ......................................................06 Figura 2 – Thais Gralik. O personagem Clara e o Gato Felizardo, 2002...................23 Figura 3 – Thais Gralik. O personagem Francisco, 2002 ..........................................24 Figura 4 – Ziraldo. Página dupla da história O Menino Quadradinho. p. 4-5.............30 Figura 5 – Ziraldo. Página dupla da história O Menino Quadradinho. p. 6-7.............30 Figura 6 – Trechos da história Loja Proibida, publicada na Revista Disney Explora, jun. 1999. p. 24-27 ....................................................................................................39 Figura 7 – Trechos da história Loja Proibida, publicada na Revista Disney Explora, jun. 1999. p. 29-30 ....................................................................................................40 Figura 8 – Julian Beever. Batman and Robin to the Rescue, s.d ..............................58 Figura 9 – Falas do personagem Loki sobre o Capitão América. Imagem da Revista Heróis Renascem Vingadores, n. 1, dez.,1998. Não paginada.................................81 Figura 10 – O pioneiro Yellow Kid. “O Menino Amarelo, que não falava por balões, mas em textos escritos na roupa.” Imagem da Revista Nova Escola, abr.,1998.......83 Figura 11– Mônica no Nascimento de Vênus, 1992. Releitura de Maurício de Souza, baseada na obra Nascimento de Vênus, de Sandro Botticelli. Acrílica s/tela 106 x 145,5 cm .................................................................................................................124 Figura 12 – Imagem da Revista Heróis Renascem Vingadores, n. 5 abr., 1999. Não paginada .................................................................................................................180

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LISTA DE QUADROS E TABELAS

Quadro 1 – Roteiro de entrevista semi-estruturada para o estudo exploratório ........96 Quadro 2 – Escolas em que os professores entrevistados lecionam......................102 Quadro 3 – Formação e perfil dos professores de Arte entrevistados ....................103 Quadro 4 – Formação e perfil dos professores de outras disciplinas entrevistados...... ................................................................................................................................103 Quadro 5 – Roteiro base para entrevista e categorias de análise – Arte (e outras disciplinas)...............................................................................................................107 Quadro 6 – Roteiro base para a entrevista e categorias de análise selecionadas de início para Português, Ciências e Matemática ........................................................107 Quadro 7 – Síntese das respostas – entrevistas nºs 1, 2, 3 e 4 ..............................108 Quadro 8 – Síntese das respostas – entrevistas nºs 5, 6, 7 e 8 ..............................108 Quadro 9 – Síntese das respostas – entrevistas nºs 9, 10, 11 e 12 ........................109 Quadro 10 – Síntese das respostas – entrevistas nºs 13, 14, 15 e 16 ....................109 Quadro 11 – Síntese das respostas – entrevistas nºs 17A, 17B, 18A, 18B, 19 e 20 ..... ................................................................................................................................110 Quadro 12 – Categoria 1 - Trabalho com Imagens - referente à pergunta 1 – Arte ...... ................................................................................................................................111 Quadro 13 – Categoria 1 - Trabalho com Imagens - referente à pergunta 1 – Português, Ciências e Matemática..........................................................................111 Quadro 14 – Categoria 2 - Tipos de Imagens que o Professor Trabalha - referente à pergunta 2 – Arte.....................................................................................................112 Quadro 15 – Categoria 2 - Tipos de Imagens que o Professor Trabalha - referente à pergunta 2 – Português, Ciências, Matemática.......................................................112 Quadro 16 – Categoria - Leituras de Imagem – Arte........................................113-114

11

Quadro 17 – Categoria - Leituras de Imagem – Português..............................114-115 Quadro 18 – Categoria 3 - Trabalho com Histórias em Quadrinhos - referente à pergunta 3 – Arte.....................................................................................................129 Quadro 19 – Categoria 3 - Trabalho com Histórias em Quadrinhos - referente à pergunta 3 – Português, Ciências e Matemática..............................................129-130 Quadro 20 – Categoria 4 - Desenvolvimento das Atividades sobre Quadrinhos - referente à pergunta 4 – Arte ...........................................................................130-131 Quadro 21 – Categoria 4 - Desenvolvimento das Atividades sobre Quadrinhos - referente à pergunta 4 – Português, Ciências e Matemática ...........................131-132 Quadro 22 – Categoria 5 - Critérios Utilizados para a Escolha de Histórias em Quadrinhos - referente à pergunta 5 – Arte......................................................132-133 Quadro 23 – Categoria 5 - Critérios Utilizados para a Escolha de Histórias em Quadrinhos - referente à pergunta 5 – Português, Ciências e Matemática.............133 Quadro 24 – Categoria - Professores que não Trabalham com HQs ou Utilizam como Recurso Didático – Arte ..........................................................................................134 Quadro 25 – Categoria - Professores que não Trabalham com HQs ou Utilizam como Recurso Didático - Português, Ciências e Matemática ...........................................134 Quadro 26 – Etapas de trabalho e avaliação no instrumento de mediação e análise crítica.......................................................................................................................178 Quadro 27 – Níveis de compreensão, segundo Franz (2003a)...............................186 Tabela 1 – Freqüência de alunos e alunas na Gibiteca ..........................................206 Tabela 2 – Freqüência de alunos e alunas no Solar do Rosário .............................206

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

CEART – Centro de Artes - UDESC

CEFET/PR – Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná

DBAE – Discipline Based Art Education

ECA/USP – Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo

EJA – Educação de Jovens e Adultos

FAP – Faculdade de Artes do Paraná

HQs – Histórias em Quadrinhos

LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEC – Ministério da Educação e Cultura

PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais

SEED/PR – Secretaria de Estado de Educação do Paraná

UDESC – Universidade do Estado de Santa Catarina

UFPR – Universidade Federal do Paraná

13

SUMÁRIO

RESUMO...................................................................................................................07

ABSTRACT ...............................................................................................................08

INTRODUÇÃO ..........................................................................................................15

CAPÍTULO I .............................................................................................................20

1.1 O LUGAR DE QUEM FALA.................................................................................21 1.2 PROBLEMA DE PESQUISA ..............................................................................27 1.2.1 Tema e objetivos da pesquisa..........................................................................36 1.3 JUSTIFICATIVA ..................................................................................................37

CAPÍTULO II ............................................................................................................44

2.1 CONCEITUALIZAÇÕES E TENDÊNCIAS DO ENSINO DE ARTES VISUAIS ...45 2.1.1 A década de 1980 e posteriores.......................................................................50 2.1.2 Arte-educação na pós-modernidade ................................................................54

2.2 AS ABORDAGENS SOCIOCULTURAIS EM ARTES VISUAIS ..........................59 2.2.1 A Cultura Visual como um campo de estudos.................................................60 2.2.1.1 A educação para a compreensão crítica da Cultura Visual ...........................64 2.2.2 A Pedagogia Crítica da Arte ............................................................................69 2.2.2.1 As teorias feministas e as abordagens socioculturais ..................................74 2.2.2.2 A Antropologia como fundamento das abordagens socioculturais ..............78 2.2.3 Introdução à história das histórias em quadrinhos ..........................................82

CAPÍTULO III ...........................................................................................................87

3.1 METODOLOGIA.................................................................................................88 3.2 ESTUTO EXPLORATÓRIO.................................................................................95 3.2.1 Roteiro base e esboço de categorias de análise............................................. 96

14

3.2.2 Síntese dos resultados obtidos no estudo exploratório ................................... 96 3.3 ESTUDO EMPÍRICO...........................................................................................99 3.3.1 Perfil das escolas e dos professores entrevistados...................................... 102 3.3.2 Roteiro base e categorias de análise ........................................................... 106 3.3.3 Análise de dados......................................................................................... 107 3.3.3.1 Quadros síntese de respostas................................................................... 108 3.3.4 Categorias 1 e 2 .......................................................................................... 110 3.3.4.1 Outras categorias identificadas nas respostas dos entrevistados ............. 113 3.3.4.2 Descrição e interpretação de dados: categorias 1 e 2 .............................. 115 3.3.4.3 Interpretação e avaliação crítica: categorias 1e 2 ..................................... 117 3.3.5 Categorias 3, 4 e 5 .........................................................................................129 3.3.5.1 Outras categorias identificadas nas respostas dos entrevistados ...............133 3.3.5.2 Descrição e interpretação de dados: categorias 3, 4 e 5.............................135 3.3.5.3 Interpretação e avaliação crítica: categorias 3, 4 e 5 ..................................137 3.3.6 Conseqüências do estudo para o ensino de Artes Visuais.............................170 3.4 PROPOSTA DE INTERPRETAÇÃO E ANÁLISE CRÍTICA DE IMAGENS DE HQS PARA O ENSINO DE ARTES VISUAIS ....................................................... 175 3.4.1 O significado do Instrumento de Mediação e Análise Crítica de imagens.... 176 3.4.2 Procedimentos na proposta de trabalho com o Instrumento de Mediação... 177 3.4.2.1 A imagem: Heróis Renascem Vingadores................................................. 178 3.4.3 Âmbitos de compreensão............................................................................. 181 3.4.4 A avaliação e as compreensões................................................................... 186 3.4.4.1 Avaliação inicial, avaliação de processo e avaliação final......................... 187

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 189

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 196 APÊNDICE ............................................................................................................ 205 APÊNDICE A – Relação entre freqüência e gênero nos cursos de HQs da Gibiteca e Solar do Rosário......................................................................................................206 APENDICE B – Modelos de autorização utilizados para entrevistas no estudo exploratório e estudo empírico ................................................................................207 APÊNDICE C – Amostras de entrevistas realizadas no estudo exploratório e estudo empírico ..................................................................................................................208 APÊNDICE D – Sinopse da mini-série Heróis Renascem Vingadores....................212

15

INTRODUÇÃO

Esta pesquisa tem origem em uma trajetória que passa por experiências

pessoais, que vão desde o envolvimento com a Arte Seqüencial/histórias em

quadrinhos por meio de ilustrações e a criação de tiras humorísticas até a prática de

ensino de Artes Visuais em escolas públicas.

No início do primeiro capítulo, citamos os motivos que levaram a este estudo

investigativo através de um relato pessoal – O Lugar de Quem Fala – narrando

brevemente nossa aproximação com essa arte. Em seguida, delimitamos o problema

de pesquisa, citando ainda outros motivos que se fundamentam em abordagens e

teóricos que também justificam o presente trabalho.

Um dos motivos que levou a questionamentos, originando esta pesquisa, é o

fato de que nas escolas, “os ventos sopram” principalmente em direção às obras e

aos artistas já consagrados, que quase sempre são colocados como único conteúdo

no ensino de Arte1, desmerecendo outras linguagens visuais que também poderiam

ser significativas. Nas escolas onde trabalhamos, encontramos práticas superficiais

para ensinar sobre histórias em quadrinhos, que se restringiam a poucos elementos

dessa linguagem. Outro motivo relacionava-se à quantidade e diversidade de

conteúdos implícitos nessas histórias. O universo das HQs oferece uma imensa

variedade de histórias e é necessário saber selecionar temas que contenham valor

intrínseco e que sejam significativos para ampliar o conhecimento dos alunos. Tais

escolhas podem ser particularmente difíceis, principalmente para aqueles que têm

pouco contato com as HQs.

Como decorrência do trabalho prático de criação, e de observações feitas

sobre a diversidade de conteúdos nas produções da área dos quadrinhos2, surgiram

questionamentos a respeito de como as pessoas lêem e interpretam as imagens.

1 Conforme os PCNs/97 (v. 6, p.19), utilizamos neste trabalho a grafia Arte, “quando se trata de área curricular [...] e nos demais casos, arte.” 2 Histórias em quadrinhos.

16

Este assunto mais tarde viemos a saber era também objeto de estudos da Prof.ª Dr.ª

Teresinha S. Franz. As teorias de Franz3 são esclarecedoras neste sentido – as

pessoas não compreendem as imagens da mesma maneira e podem revelar

diferentes níveis de complexidade de compreensão, que vão desde os mais

ingênuos até os mais complexos, críticos e elaborados. Essas teorias, são

abordadas dentro da temática sobre a Cultura Visual4 no segundo e terceiro

capítulos e formam parte das bases para a fundamentação teórica deste estudo.

Talvez em decorrência de sua própria história, a Arte Seqüencial/HQs vem

sendo pouco valorizada em relação a outros conteúdos no ensino de Artes Visuais.

Décadas atrás, as histórias em quadrinhos causaram muitas polêmicas e não eram

admitidas nas discussões do ensino acadêmico (EISNER, 1989). Somente a partir

de 1970, segundo Quella-Guyot (1994) e Rama e Vergueiro (2004) é que deixariam

de ser rejeitadas pelas escolas e outros países passariam a incluí-las em seu

currículo escolar. No Brasil, as HQs passaram a contar com recomendação do MEC,

nos Parâmetros Curriculares Nacionais,5 em 1997/98.

Segundo Quella-Guyot (1994), as HQs entraram nas escolas, como

decoração para exercícios gramaticais e mediante o desejo de ensinar a língua.

Hoje, muitas disciplinas se utilizam largamente delas para ensinar suas matérias,

enquanto o ensino de Artes Visuais deixa de explorar esse modo de expressão

artística. Nem todos os cursos de licenciatura em Artes Visuais, oferecem suporte

para que professores trabalhem com essa linguagem. Atualmente, os cursos

enfatizam o preparo de sujeitos para a produção artística já consagrada. Embora

haja também uma preocupação com as demais imagens do cotidiano, no ensino de

histórias em quadrinhos, a tendência denota superficialidade.

Por outro lado, quando se trata de abordar histórias em quadrinhos, aparecem

sempre duplicidades ou contradições: são consideradas um perigo para alguns, mas

muito válida para outros. Pesquisando acerca da existência de teses e dissertações

na área de Artes Visuais, encontramos maior produção acadêmica sobre quadrinhos

em Educação, Letras e Comunicação. Um dos trabalhos encontrados nessa

pesquisa, sobre as tiras humorísticas de Maurício de Souza, pertencente a Giovana

Scareli (2003) aluna do curso de Pedagogia, cita que as HQs, ou as tiras

3 Franz (2000, 2001, 2003a, 2003b, 2003c, 2003d, 2005a, 2005b). 4 Hernández (1998, 2000, 2001, 2003a, 2005, 2006, 2007). 5 Ver PCN/1997, vol. 2, Português, 1ª a 4ª series, p. 37, 42 e 82 e PCN, vol. 6, Arte, 1997/98.

17

humorísticas, muitas vezes são utilizadas por professores apenas como um recurso

didático e em seguida são descartadas.

Os teóricos atuais da Educação enfatizam que o ensino de Arte deve estar

conectado com a arte pós-moderna sem fronteiras e a necessidade crítica e plural

da educação contemporânea. Nota-se hoje uma tendência crescente para estudos

de imagens e outros artefatos da cultura visual, devido a sua importância como

mediadores de significados. As HQs incluem-se nesse contexto, pois são uma arte

popular amplamente conhecida e exercem fascínio natural sobre o público infantil e

juvenil.

No modernismo havia uma concepção de arte baseada em padrões estéticos

universais. Segundo Mason (2001), hoje critica-se o projeto estético moderno, que

se baseia em distinções estilísticas entre as Belas Artes e a arte popular. Nesse

sentido, as diretrizes curriculares para o ensino fundamental de Educação Artística

da SEED/PR (2004/2005), destacam que há necessidade de valorização de

diferentes culturas e de combater visões excludentes que perpetuam hierarquias

entre Belas Artes ou artes eruditas e artes do povo ou menores, considerando

ambas como importantes fontes geradoras de significado para a compreensão do

mundo.

Em teoria, o professor de Artes Visuais deveria ser mais bem habilitado para

trabalhar com as possibilidades da Arte Seqüencial. Mas considerando a história

conturbada entre HQs e Educação, percebemos a necessidade de questioná-las

segundo as perspectivas dos professores. Surge então, a necessidade de investigar

as relações dessa linguagem com o ensino de Artes Visuais, tentando responder a

principal pergunta que guia esta pesquisa:

Como os professores de ensino fundamental se relacionam com a Arte

Seqüencial/histórias em quadrinhos no ensino de Artes Visuais?

O segundo capítulo trata da revisão bibliográfica sobre o marco teórico.

Compreende as teorias do ensino de Arte, as abordagens socioculturais e estudos

sobre quadrinhos, que fundamentam o estudo empírico e a análise dos dados. Esse

capítulo inclui as conceitualizações e tendências do ensino de Artes Visuais,

iniciando por um breve histórico até as tendências atuais. O texto aborda

principalmente as teorias da Cultura Visual, educação para a compreensão crítica da

arte, Pedagogia Crítica e histórias em quadrinhos.

18

As abordagens socioculturais dão ênfase às transformações na arte e na

sociedade contemporâneas que levam à necessidade de propostas educativas mais

críticas e atentas à vida social, apontando para o desafio de contribuir para a

construção crítica da realidade sociocultural (RICHTER, 2004; FRANZ, 2004).

Para os teóricos6 que seguem essas abordagens, a arte é uma representação

complexa que traz consigo contradições inerentes à sociedade e à cultura na qual foi

produzida. Nessas teorias, considera-se a arte como uma representação

sociocultural e a identificação e compreensão de seu contexto de origem como

fundamentais para sua interpretação. As HQs por vezes trazem conteúdos

contraditórios e dentro dessa linha de pensamento não podem ser vistas apenas

como desenhos, pois envolvem idéias, conceitos, valores, ideologias e crenças.

No terceiro capítulo, abordamos a metodologia empregada para o estudo

investigativo, incluindo uma síntese dos resultados obtidos no estudo exploratório.

Nas tendências atuais em educação destaca-se sobretudo, a necessidade e o

papel fundamental do professor para atuar como um mediador entre a compreensão

dos alunos, suas experiências e as imagens (FRANZ7; HERNÁNDEZ, 1998, 2000,

2007; CORRÊA, 2004, 2005). O professor não somente assume-se como

profissional, mas como aprendiz e pesquisador. Devido a sua importância nesse

processo, deu-se prioridade para investigar através de entrevistas, como estes

compreendem e utilizam as HQs no ensino fundamental. Segundo Franz (2000),

Demo (2000) e Duarte (2005), a entrevista é uma fonte de acesso ao mundo de

conceitos e significados e práticas individuais. Detectar pontos positivos ou

negativos, concepções, práticas ultrapassadas ou diferenciadas colaboram para

realizar uma reflexão crítica sobre o ensino de histórias em quadrinhos. Conforme

Demo (2000), somente conhecendo uma realidade em profundidade é que se pode

falar e atuar com segurança sobre ela.

Na primeira fase de investigação, realizamos um estudo com alunos da

Gibiteca, em Curitiba/PR, que trouxe evidências sobre o problema de pesquisa, bem

como demonstrou aspectos sociais da arte dos quadrinhos indicando diferenças e

6 Freedman (2000, 2001); Mason (2001); Pollock (2003); Chalmers (2003); Mirzoeff (2003); Efland, Freedman, Sthur (2003); Efland (2005); Steinberg e Kincheloe (2004); Richter (2004); Corrêa (2004, 2005); Franz (2000, 2001, 2003a, 2003b, 2003c, 2003d, 2004, 2005a, 2005b); Hernández (1998, 2000, 2001, 2003a, 2005, 2006, 2007). 7 Franz, idem.

19

preferências decorrentes de gênero, levantando novas questões que podem ser

investigadas futuramente.

O estudo empírico propriamente dito, consiste em 20 entrevistas semi-

estruturadas individuais com professores de Arte e outras disciplinas, analisadas do

ponto de vista da teoria da educação para a compreensão da Cultura Visual,

Pedagogia Crítica e estudos sobre HQs. Trata-se de uma pesquisa qualitativa

interpretativa crítica. A análise de dados, orienta-se pelas dimensões da crítica

educativa explicitadas por Elliot Eisner (1998) e estrutura-se deste modo, em

descrição, interpretação e avaliação crítica.

Com base nesta análise, apresentam-se as conseqüências deste estudo para

o ensino de Artes Visuais, desejando que os resultados também possam contribuir

para a reflexão de outros professores desta área. A análise revela práticas

pedagógicas que em sua maioria concebem as histórias em quadrinhos apenas

como trabalhos manuais, em geral padronizadas e destituídas de senso crítico.

Denotam valorizar a cultura local, mas mantêm uma posição passiva e à parte dos

processos globalizantes e hegemônicos das indústrias culturais, demonstrando a

necessidade de estabelecimento de pontos de contato que articulem entre

especificidades locais e códigos dominantes da arte dos quadrinhos, dentro de uma

postura crítica e reflexiva.

Nesse mesmo capítulo, ao final, incluímos uma proposta de trabalho para

mediação e análise crítica de imagens de histórias em quadrinhos, que associa

estudos da Pedagogia Crítica, com estudos da Cultura Visual e Educação, segundo

Hernández (1998, 2000, 2001, 2003a, 2007), Franz (2003a) e outros teóricos. Não

se pretende alcançar originalidade nesta proposta, uma vez que tem por base um

instrumento de análise de imagens, criado por Franz em 2003, para a compreensão

crítica de obras de arte. Mas tem importância para este estudo, ligado a um ensino

que pretende auxiliar alunos e professores a irem além da simples reprodução

mecânica e leituras acríticas de histórias em quadrinhos.

Por fim, este é um trabalho que convida para uma reflexão dos professores de

Artes Visuais, sobre suas próprias práticas pedagógicas no que se refere ao ensino

de histórias em quadrinhos, considerando sua importância como agentes que

contribuem para a configuração deste ensino.

.

20

CAPÍTULO I

21

1.1 O LUGAR DE QUEM FALA

Como professora, comecei lecionando Artes Plásticas e Música em uma

escola de educação complementar. Dos diversos estágios que realizei em escolas

particulares e públicas, aquele que fiz em 1984, em uma escola do Estado, no bairro

do Ahú, em Curitiba, para mim foi dos mais significativos. Consistiu em ensinar

desenho animado e montar pequenos filmes de animação com os alunos, com o

apoio da Cinemateca do Museu Guido Viaro. Por outro lado, a gravura envolveu-me

bastante e, durante algum tempo, pude me dedicar a ela, sendo que logo depois

entrei para o mercado de trabalho, em agência de propaganda, e mais tarde,

trabalhando em jornal com arte final e diagramações.

Depois de alguns anos de permanência no jornal, saí com a intenção de voltar

para a gravura. Mas alguma coisa havia mudado: pintar quadros ou fazer gravuras

não fazia mais sentido. Uma fala do Prof. Dr. Emílio Burucua, em um colóquio

realizado na UDESC em 2006, sobre o processo que possibilitou a passagem da

pintura à arte contemporânea, pode ilustrar meu pensamento e essa passagem da

minha vida: “a pintura não pode mais voltar a suas fontes” (informação verbal)8.

Pintar também foi algo que me pareceu uma forma de arte que havia esgotado seu

tempo, já o desenho, nunca deixou de fazer parte de minha vida.

Como eu tinha mais contato com as mídias, o caminho mais natural foi o de

me ligar à área de comunicação visual. Passei a realizar muitos trabalhos de criação,

a ilustrar e criar personagens. A Escola de Dança onde uma de minhas irmãs

leciona, produz em média três espetáculos por ano. Minha ligação com a escola

permitiu-me a criação desde material gráfico para eventos, até a produção de

adereços e cenários para os espetáculos de Ballet Clássico e Ritmos Modernos.

Esta ligação indireta com a educação acontecia também com minha outra irmã que

8 BURUCUA, José Emílio. A iconografia de Ulisses, releituras moderna e contemporâneas do personagem. In: I Colóquio Estadual de História, Teoria e Crítica da Arte. A Obra de Arte e Leitura de Imagens . Florianópolis, UDESC, jun. de 2006.

22

trabalhava no ensino fundamental em escola particular, produzindo interações sobre

assuntos e problemas de ensino. Uma das observações que fazíamos era sobre o

excesso de conteúdos que se cobra para ensinar e aprender, em função da

concorrência das escolas particulares, para estar no topo dos escores do vestibular.

Isso aliado ao excesso de informação promovida pelas mídias, gera um stress muito

grande entre os professores e os alunos.

Os comentários sobre os problemas das escolas e ilustrações recentes que

eu havia realizado para profissionais da comunicação e da educação, convergiram

para a produção de tiras humorísticas destinadas ao público infanto-juvenil. Essa

produção não poderia ser apenas espontânea, no sentido de uma expressão livre

para dizer tudo o que se pensa, como defendem artistas que trabalham

fundamentados pela idéia de que não pode haver censura de espécie alguma para a

expressão artística, seja qual for o meio. É muito comum, encontrar produções

justificadas com base nesse pensamento, que trazem críticas e protestos sem

reflexão. Como por exemplo, os que surgiram dentro do lema criado na década de

1970, pelos quadrinhos underground. Naquela época, os quadrinhos, a fim de se

oporem aos valores dominantes, procuravam celebrar o sexo e as drogas (SILVA,

2002). A fim de legitimar seu perfil transgressivo, “o lema era a total espontaneidade,

não se deixando afetar por qualquer espécie de código de ética oficial.” (SILVA,

2002, p. 21). Até nossos dias essas propostas alcançam repercussão.

Ligada ao processo de criação, havia uma preocupação com relação à

qualidade das imagens recebidas diariamente, nem sempre agradáveis e muitas

vezes banalizadas. Em geral, o artista de HQs ou tiras humorísticas, faz seu trabalho

e já lhe ocorre uma comunicação com o leitor. Mas não é comum a preocupação do

artista com os efeitos nos âmbitos social ou individual que suas imagens possam

causar. Para representar suas idéias, alguns fazem uso da linguagem de modo

radical, a fim de chamar a atenção do leitor. Nisso está a preocupação pelo sucesso

da produção e não com os efeitos que possa produzir. Para isso, o artista não poupa

o leitor, que, por sua vez, pode possuir ou não capacidade crítica.

Comecei a questionar as preferências em torno do lado degradante do humor.

Observava que algumas pessoas apreciavam tiras humorísticas ou HQs, sem critério

algum. Compartilhava do pensamento de Saliba (in MATTAR, 2003, p. 171),

segundo o qual, em nossa época, há uma “dificuldade, cada vez maior, de definir e

diferenciar o ‘riso bom’ do ‘riso mau’.” Segundo ele, nos desenhos de humor, os

23

níveis de crueldade duplicaram desde os tempos do “Amigo da Onça”. Tornou-se

uma preocupação sobre o modo como as pessoas lêem e interpretam as imagens e

como isso estaria relacionado com sua forma de pensar e atuar em função de suas

concepções. Se, de fato, as imagens que recebemos diariamente, em seu conjunto,

ou isoladas, ficam gravadas, mesmo que parcialmente em nossas mentes,

influenciando nosso inconsciente, devemos preocupar-nos com a qualidade, com os

modos de compreender essas imagens e com seus possíveis efeitos no leitor.

Assim, minha própria produção de tiras humorísticas deveria estar de acordo

com estes pressupostos: produzir algo que não fizesse uso de recursos agressivos

ou humilhantes e, ao mesmo tempo, tivesse um toque de humor. Cada tirinha9

produzida transformou-se em um exercício dentro desta perspectiva. A escolha dos

personagens foi decidida em função desta concepção (Figuras 2 e 3).

Pouco tempo depois de começar a produzir tiras humorísticas, vi-me

novamente às voltas com o ensino de Arte. Para proporcionar um ensino atualizado

e adequado para meus alunos, pesquisava sobre os conteúdos e sobre o modo de

aplicá-los. Isso estava muito relacionado com o grau de envolvimento que poderia

haver entre eles e as tarefas propostas. Nas escolas públicas, muitos alunos

freqüentam a escola apenas como obrigação e até para se alimentar. Este e outros

motivos causam desinteresse dos alunos pelo aprendizado e também acabam

afetando os professores. Por isso, a cada aula, havia necessidade de modificações

nos conteúdos ou nos recursos didáticos, a fim de adequar ao contexto.

Minha experiência com a arte dos quadrinhos poderia ser bastante útil nas

escolas, ensinando muitas técnicas de desenho para os alunos. Porém, à medida

9 Tira humorística.

Figura 2 – Thais Gralik. Tira humorística. O personagem Clara e o Gato Felizardo, 2002.

24

Figura 3 – Thais Gralik. O personagem Francisco, 2002.

que nos aproximamos do universo das HQs, descobrimos que é um universo

extremamente abrangente e existe uma imensa variedade de publicações. Suas

histórias, tanto podem ser boas, ruins, “inocentes” ou não. As HQs não constituem

apenas desenhos, nelas estão envolvidos idéias, conceitos, crenças e valores. Por

essa razão, a mim não satisfazia a idéia de apenas transmitir habilidades técnicas.

Creio que todo o conhecimento, matéria ou conteúdo que se ensina, deve implicar

uma reflexão do professor e, se possível, dos alunos. É como diz Paulo Freire (1997,

p. 37), “transformar a experiência educativa em puro treinamento técnico é

amesquinhar o que há de fundamentalmente humano no exercício educativo.”

A quantidade e a diversidade de conteúdos fazia com que me preocupasse

em saber como os alunos poderiam aprender a interpretar e não somente reproduzir

mecanicamente ou consumir HQs. Sempre acreditei na responsabilidade social

daquele que ensina, mas o que eu observava nas escolas fez com que tais

preocupações acabassem se estendendo a outros professores.

Um exemplo de Quella-Guyot (1994) mostra algumas preocupações que

podem ocorrer quando se pensa em ensinar sobre HQs nas escolas. O desenhista

Giraud e o especialista Moliterni criaram, na década de 1970, em Vincennes, na

França, um ensino prático de HQs. A. Roux, então, escreveu uma obra chamada La

bande dessinée peut être éducative (L’École, 1970), em que esse autor “se colocava

o problema de apresentar a HQ à escola, mas não a escola à HQ. Em outras

palavras, que atitude se deveria ter diante dessa literatura: ensinar com ela, ensinar

por meio dela ou simplesmente ensiná-la?” (QUELLA-GUYOT, 1994, p. 43).

O caso mostrado por esse autor ilustra como as HQs geraram polêmicas,

quando se pensou em trabalhar com elas nas escolas. Ainda hoje existem críticos de

arte mantêm preconceito com relação a esta arte.

A questão da diversidade, também esbarrava com o problema da escolha de

25

imagens decorrente da abrangência do extenso campo em Artes Visuais. Para

alguns professores é motivo de preocupação. Porém, muitas vezes, essas escolhas

são arbitrárias. Conforme Almeida (1999, p. 73) assinala, hoje é importante que o

professor fique “atento às imagens consumidas por seus alunos, resgatando na

cultura da imagem o que é relevante para a formação do indivíduo.”

Como tinha a idéia de ensinar Arte Seqüencial em algumas turmas,

interessava-me sobre o modo pelo qual os professores ensinavam sobre quadrinhos

em suas aulas. Em certa ocasião, em um dos colégios10 em que eu lecionava, pude

verificar que a Arte Seqüencial era ministrada somente nas 6ª séries. O conteúdo

teórico, era restrito a apenas duas ou três frases e depois disso, a atividade

relacionada resumia-se a solicitar ao aluno para fazer uma história em quadrinhos.

Por outro lado, havia um trabalho sempre em torno das mesmas obras de arte.

Em outra escola11 em que eu também trabalhava, a preocupação dos

professores de Arte era a de ensinar a fazer “releituras de obras de arte”. Entretanto,

uma das professoras regentes do ensino de 1ª a 4ª que pude observar,

freqüentemente fazia uso de HQs para ensinar Português. Os alunos de vez em

quando desenhavam histórias, a fim de aplicar os conteúdos ensinados pela

professora regente. A decoração da sala ficava sob sua responsabilidade, assim

como a decoração das outras salas, ficava a cargo das outras professoras regentes.

Nas salas, a decoração era sempre substituída em função dos conteúdos de

Português, de datas e de outros assuntos – com muitos Mickeys, Minies, Mônicas,

Bidus e Snoopys mimeografados, pintados em série pelos alunos, que se

substituíam a fim de “dar um ar sempre renovado”, demonstrando o que eles

estavam estudando. Tudo isso refletia uma boa intenção dos professores regentes,

mas também revelava uma atitude acrítica diante dessas imagens.

Com relação a estes assuntos, havia indiferença por parte dos professores de

Arte. No planejamento da disciplina, eram incluídos apenas os principais

movimentos artísticos, obras e artistas já consagrados. Outras manifestações

artísticas, como cinema, propaganda e histórias em quadrinhos, não eram incluídos.

Haveria preconceito com relação às histórias em quadrinhos também entre os

professores? Assuntos relacionados à Cultura Visual, pareciam não ser

considerados importantes. Isso fez com que a preocupação anterior existente com

10 Escola Pública de 1º e 2º grau, no Bairro de Santa Felicidade em Curitiba, 2003. 11 Escola Pública de 1º e 2º grau, na Cidade Industrial de Curitiba, 2003.

26

as pessoas a respeito das imagens fora da escola, viesse cada vez mais à tona,

estendendo-se aos professores. Passei a questionar essas leituras e a preocupar-

me também com aqueles que trabalhavam com histórias em quadrinhos em sala de

aula. Quais seriam os critérios, que encontravam para a escolha de suas imagens?

Considerando também os hábitos dos alunos, o que poderia ser adquirido e

transmitido em virtude de suas escolhas?

Essas questões geraram este estudo, com a finalidade de analisar mais

profundamente práticas de ensino ligadas à Arte Seqüencial, de modo que aqueles

que trabalham com HQs nas escolas também possam fazer uma reflexão a respeito.

27

1.2 PROBLEMA DE PESQUISA

O ensino contemporâneo de Arte volta-se principalmente para o fazer e o

pensar artísticos, bem como a contextualização histórica, mas continua centrando-se

em obras de arte consideradas como "universais, estáveis e únicas." (HERNANDEZ,

2000, p. 46). Entretanto, há muito mais do que isso. Não podemos mover-nos

apenas em direção ao passado ao selecionar os conteúdos nas aulas de Artes

Visuais. É preciso pensar no futuro e, principalmente, no presente. O campo das

Artes Visuais é extenso e atualmente amplia-se para além de suas fronteiras.

Nosso cotidiano está cada vez mais repleto de imagens das mídias e novas

tecnologias, que atuam em nossa mente, mediante o cinema, a televisão, a Internet

e os meios impressos. A imensa quantidade e a velocidade com que estas imagens

são veiculadas faz com que aprendamos por meio delas inconscientemente

(BARBOSA, 2003). Para Stuart Hall (apud GIROUX, 2003), as mídias e as novas

tecnologias moldam o significado e o comportamento humanos e regulam nossas

práticas sociais a todo instante. As imagens massificadas preenchem nossa vida a

tal ponto, que condicionam nossos mais íntimos desejos e percepções.

Ilustrações e Arte Seqüencial são muito comuns e largamente consumidas

em nossa sociedade. Crianças e adolescentes têm acesso diário à cultura das

mídias, nas quais estas artes estão presentes e, segundo Hernández (2000), muitas

vezes sem o reconhecer, fazem uso de valores, crenças e significações que as

mídias veiculam, para dar sentido ao mundo em que vivem. Diante das

transformações na sociedade contemporânea e das relações que se produzem,

surgem novas perguntas entre os educadores. Como mediar as experiências que as

crianças e os adolescentes têm com as mídias, quando se quer que aprendam

também a interpretar e não apenas consumir ou “apreciar”?

Conforme Ramalho (2006), se considerarmos o universo das imagens, desde

o início de sua história até nossos dias, é um campo imenso. Nós, professores,

ficamos aturdidos quando temos que selecionar imagens. As HQs de maneira

28

semelhante, oferecem uma diversidade muito grande de histórias e constituem um

universo extremamente abrangente. O uso do off-set, a partir de 1965, ampliou

sobremaneira as possibilidades de publicação de HQs (SILVA, 2002). À grande

quantidade de publicações corresponde outra de variedades de conceitos, idéias,

valores e crenças dos quais HQs são portadoras. Dentro deste universo, é

necessário saber selecionar temas que contenham valor intrínseco e que sejam

significativos para ampliar o conhecimento dos alunos. Para aqueles que estão

pouco familiarizados ou têm a intenção de trabalhar com esta arte de maneira mais

ampla, essas escolhas podem ser particularmente difíceis. É da competência do

professor selecionar dentro desse universo e auxiliar para que os próprios alunos

aprendam a selecionar e a interpretar criticamente essas imagens.

Entretanto, quando os professores ensinam Artes Visuais nas escolas, as

HQs, parecem ser colocadas como menos importantes. As histórias em quadrinhos,

particularmente, durante muito tempo, foram consideradas como indignas de estudo

acadêmico. O exemplo de Quella-Guyot (1994), que citamos anteriormente,

demonstra como as HQs geravam preocupações entre teóricos e educadores, que

se perguntavam que atitude deveriam tomar diante das HQs.

Hoje, os quadrinhos são uma arte oficialmente reconhecida, porém os

debates em torno delas geralmente são polêmicos. Em décadas anteriores, códigos

de ética foram elaborados em muitos países temerosos da expansão dos comics

americanos. A fim de regular a produção de HQs, a Itália, em 1938, criou uma lei de

censura e normas a que os editores deveriam obedecer, a qual repercutiu em muitos

países. No Brasil, em 1948 a Associação Brasileira de Educadores criou um código

de ética e, em 1956, segundo Scareli (2003) a Secretaria da Educação e Cultura da

Prefeitura de São Paulo elaborou um parecer que proibiu a entrada de histórias em

quadrinhos nos parques infantis e nas bibliotecas do município.

Ainda existem artistas e críticos de arte que demonstram preocupação ou até

preconceito com relação à arte dos quadrinhos. Em uma reportagem12 sobre uma

mostra de Roy Lichtenstein, que permaneceria no Museu Oscar Niemeyer, de

dezembro de 2005 a março de 2006, o crítico de arte Agnaldo Farias, declarou:

A partir de imagens vulgares e banais, extraídas de cartuns, histórias em quadrinhos e anúncios publicitários, Lichtenstein demonstrou que as

12 Artigo publicitário sem assinatura. Pop arte no Mon. Revista View , Curitiba, n. 62, p.18-20, dez. 2005.

29

imagens veiculadas pelos canais de comunicação de massa são meticulosamente produzidas com a finalidade de esvaziar o pensamento, rebaixar a leitura e a escrita, transformar a fala numa forma de expressão repleta de gírias e balbucios sem sentido.

Ziraldo é um artista que demonstra preocupações, embora sob outras formas.

Hoje com mais de 70 anos, é autor de desenhos de humor, tiras humorísticas e

histórias em quadrinhos. Na história O Menino Quadradinho, que foi editada em

1989 pela Editora Melhoramentos, quase dez anos depois de ter criado O Menino

Maluquinho, em 1980, Ziraldo o demonstra. Esta história revela a preocupação com

a importância que se dá ao visual em relação às palavras, mediante os problemas

do personagem – um menino – preso por atrativos formais das HQs e indiferente à

leitura das palavras.

Em um trabalho de leitura de imagem13, realizado sobre algumas imagens

dessa obra, pudemos analisar mais profundamente como o autor fez para dizê-lo. A

história é dividida em duas partes: uma construída por imagens e outra por palavras.

Na primeira parte, usando metalinguagem, Ziraldo constrói sua narrativa e

coloca o leitor diante de um duplo cenário representando uma história em

quadrinhos (Figuras 4 e 5). O duplo cenário – um alegre colorido e ensolarado – com

o menino por trás das “grades” de uma janela, que também representam os espaços

em branco dos quadrinhos; e outro, que representa o verso deste cenário, ou o que

“há por trás” das histórias em quadrinhos. No cenário do verso, o autor representa os

múltiplos caminhos que o menino pode percorrer com sua imaginação. Aludindo aos

mistérios da mente humana, tal como os níveis de pensamento que podem estar em

planos elevados, mas também descer a níveis que não se revelam.

A imagem sugere que o leitor observe os diferentes caminhos que o menino

com sua imaginação e liberdade pode percorrer. Uma liberdade que pode estar

limitada pelo próprio espaço físico dos quadrinhos ou pelo excesso de atração que o

menino possa sentir pelas imagens das histórias em quadrinhos tornando-o preso.

Sugere, ainda, que entrando neste universo, o menino pode “sair de cena”, como

forma de escapismo e experiência de prazer, fugir, esconder-se, deixar a mente

vagar por muitos caminhos, mergulhado em fantasias. Na segunda parte da história,

as palavras tornam-se as protagonistas para demonstrar sua importância nas

histórias em quadrinhos.

13 Artigo realizado durante o Curso de Mestrado em Artes Visuais. UDESC, 2º sem. de 2005.

30

Porém, como explica Ramalho (2006, p. 6), não só a configuração, “mas o

conceito de arte também muda ao longo do tempo e do espaço [...] além dos modos

de ver.” Conforme Franz (2001, p. 15), “o conceito sobre o que é arte mudou muitas

vezes no decorrer da história.” Segundo essas autoras, muitas imagens antigas que

classificamos como arte hoje, não eram consideradas como tal no contexto de sua

criação. Para Ramalho (2006, p. 6),

Figura 4 – Ziraldo. Página dupla da história O Menino Quadradinho. p. 4-5.

Figura 5 – Ziraldo. Página dupla da história O Menino Quadradinho. p. 6-7.

31

o tempo, somado a questões culturais complexas, acaba transformando imagens religiosas, ou imagens míticas, histórias em quadrinhos, ou imagens puramente informativas, como os cartazes de Toulouse-Lautrec em obras de arte.

Outro trecho da reportagem14 citada ilustra essa mudança de conceito,

quando menciona que Lichtenstein e outros artistas, após a Segunda Guerra,

“defendiam uma arte que deveria comunicar-se com o público com símbolos

retirados do imaginário popular e recusavam a separação entre arte/vida.”

Lichtenstein questionava o próprio conceito de arte na era da reprodução de massa,

segundo a curadora da mostra “Vida Animada”, de Roy Lichtenstein, Lisa Phillips15.

Conforme teóricos da educação, a arte-educação também é modelada pelo

mundo da arte (HERNÁNDEZ, 2001; BRENT WILSON, 2005b; EFLAND, 2003,

2005). Assim, pressupõe-se que este ensino deveria estar conectado com o

pensamento da arte pós-moderna. O modernismo havia estabelecido padrões

morais, políticos, intelectuais e estéticos que os pós-modernistas questionam,

contrapondo-se às produções instituídas pela História da Arte oficial, reconhecendo

a arte elaborada por diferentes grupos e minorias culturais. Segundo Mason (2001)

criticou-se o projeto estético moderno, porque se baseava em distinções estilísticas

entre a arte erudita e a arte popular. Na opinião de Chalmers (2003, p. 143),

os educadores artísticos hão de reconhecer que todas as culturas possuem definições de qualidade e que os membros de todos os grupos podem encontrar, dentro do mundo artístico de cada um deles, exemplos de obras excelentes, medíocres ou pobres (tradução nossa).

O projeto pós-moderno busca alcançar uma forma mais democrática em arte

educação (FREEDMAN, 2000) incluindo a arte das minorias e reconhecendo o valor

de outras culturas, assim como há um novo gosto pela variedade e pluralidade

(CHALMERS, 2003). Mas nem sempre o que acontece nas mudanças educativas e

no mundo da arte, se reflete imediatamente nas escolas ou nas práticas que os

professores utilizam para ensinar. Assim como artistas e críticos de arte, nossas

práticas ligadas às histórias em quadrinhos, ainda podem (ou não) estar

impregnadas ou manter resquícios de antigos preconceitos. Ou, como diz Efland

(2003), podem estar ainda apegadas à modernidade. 14 Artigo publicitário sem assinatura. Pop arte no Mon. Revista View , Curitiba, n. 62, p.18-20, dez. 2005. 15 Ibid. Ver também o site: <http://www.museuoscarniemeyer.org.br/exposicoes/roy.htm>. Acesso em: 5 jul. 2006.

32

As tendências educativas atuais enfatizam a necessidade de valorizar as

diferentes culturas e a arte popular. Em 1998, nos PCNs a pluralização das culturas

já constava nos temas transversais, como forma de inclusão, propondo a valorização

de outras culturas e manifestações artísticas. Mas a própria SEED/PR, em 2004-

2005, por intermédio de sua equipe técnico-pedagógica, ao traçar as diretrizes

curriculares16 para o ensino fundamental de Educação Artística, entre outros

aspectos, destaca ainda a “necessidade de desmistificação da arte erudita em

relação à arte popular considerando ambas como referenciais culturais importantes

para a compreensão do mundo.” (SEED/PR, 2004-2005, p. 1). As histórias em

quadrinhos são uma arte popular. Também fazem parte desse processo.

Nem todos os cursos de licenciatura17 em Artes Visuais dão suporte para que

os professores trabalhem com estas linguagens. Costumam voltar-se mais para as

artes tradicionais, para as obras dos museus e para artistas já consagrados, embora

as tendências pedagógicas atuais afirmem uma preocupação para que haja preparo

dos indivíduos para a análise crítica também das imagens presentes no cotidiano.

Aqui se encontra um paradoxo. Ao mesmo tempo que se consome mais as

produções realizadas pelas mídias no dia-a-dia e que existe também uma

preocupação de pais e professores quanto aos conteúdos que veiculam, podemos

dizer que Arte Seqüencial/HQs são estudadas com seriedade ou dentro de uma

disciplina que permita estudos mais aprofundados desta linguagem? Como são

realizadas as atividades com histórias em quadrinhos nas escolas? São atividades

livres ou contextualizadas? Promovem conhecimentos significativos em Arte? Há

preocupação real com relação a conceitos, valores, crenças e ideologias que podem

estar envolvidos nas produções encontradas em histórias em quadrinhos? Os

professores se preparam, ou pesquisam para a realização dessas atividades?

Segundo Hernández (2000), com freqüência, se fazem atividades na escola

que não refletem sobre os valores que as histórias da indústria cultural veicula.

Hoje a atenção das investigações parece estar mais voltada para a televisão

e para as novas tecnologias, dando a impressão de que as HQs deixaram de existir

16 As diretrizes curriculares da SEED/PR, para o ensino fundamental de Educação Artística da rede estadual, estão disponíveis em: <http://www.seed.pr.gov.br/portals/portal/diretrizes/dir_ef_educart.pdf>. Acesso em: 10 jul. 2006. 17 A UFPR, por exemplo, oferecia a disciplina Técnicas de Estruturação da Imagem Seqüenciada que englobava assuntos da Arte Seqüencial (cinema, quadrinhos, fotonovela, incluindo sua história), mas que existiu apenas de 1982 a 1994, segundo as Resoluções nº 85/94 e nº 60/02 do CEPE (Conselho de Ensino e Pesquisa) e informações do secretário deste curso, colhidas em março de 2006.

33

entre as outras mídias. Mas na realidade exercem um papel significativo dentro do

universo visual. De um lado, muitas crianças e adolescentes lêem menos em função

da TV. Por outro lado, há influência de desenhos animados e histórias em

quadrinhos americanas e japonesas nas produções dos alunos. Além de manter

relações muito próximas com o cinema e os desenhos animados, as HQs vêm

formando novos leitores e novos mercados, como os Mangás por exemplo, que se

desenvolveram e se espalharam pelo mundo e também no Brasil (LUYTEN, 2000).

Há poucos trabalhos acadêmicos18 em torno da Arte Seqüencial/HQs e

existem poucas análises em torno dessas imagens no ensino de Artes Visuais,

embora estas sejam mais conhecidas das crianças e adolescentes do que a arte

tradicional. Embora sem ter formação artística, ou estudos da linguagem visual,

professores de outras disciplinas utilizam tirinhas, cartuns, HQs, para ministrar suas

matérias, tanto para ensinar seus conteúdos, quanto para que o aluno "crie", usando

a linguagem dos quadrinhos.

Antes rejeitadas pela escola, a partir da década de 1970, em muitos países,

os órgãos de educação passaram a incluir histórias em quadrinhos no currículo

escolar, “supondo seu estudo uma revalorização oficial.” (QUELLA-GUYOT, 1994, p.

43). Com o pretexto de facilitar uma série de aquisições, os quadrinhos passaram a

entrar nas escolas como um método milagroso. Uma das razões para isso era o fato

de que as HQs facilitavam intercâmbios entre professores e alunos e atraíam alunos

para exercícios gramaticais (QUELLA-GUYOT, 1994).

Desde que as HQs comprovaram sua eficácia para o auxílio no aprendizado

da leitura, os professores de Língua Portuguesa utilizam amplamente essa

linguagem, enquanto os professores de Arte trabalham muito menos com essa arte.

Para o ensino de Artes Visuais, as HQs têm importância principalmente pelas

18 Até o momento de realizar esta pesquisa, encontramos uma série de monografias sobre histórias em quadrinhos, mas poucas teses ou dissertações vinculadas ao ensino de Artes Visuais. De três bibliotecas pesquisadas em Curitiba/PR, a biblioteca da FAP, foi onde encontramos o maior número de monografias nesta área. “A psicomotricidade em quadrinhos” (1980), “Explorando os recursos expressivos de Will Eisner (2001), “Uma linguagem híbrida dos quadrinhos (2002)”, foram algumas, dentre outras monografias, encontradas na FAP no primeiro semestre de 2006, mas não foram encontradas teses ou dissertações nesta biblioteca neste período. Algumas bibliotecas digitais, também foram pesquisadas: Biblioteca Digital da UNICAMP: http://libdigi.unicamp.br; Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP: http://www.teses.usp.br; Biblioteca Digital da UFRGS: http://www.biblioteca.ufrgs.br/bibliotecadigital. Nessa busca, até onde pudemos avançar, constatamos um maior número de teses e dissertações relacionadas a outras disciplinas, principalmente Língua Portuguesa e Pedagogia, que em geral abordam o uso das HQs como ferramenta para o aprendizado da leitura.

34

imagens que veiculam e, o que essas imagens representam, tem interesse relevante

para esta disciplina, bem como, para o campo da Cultura Visual e da Educação.

Em sua pesquisa, Scareli (2003, p. 1) observou que “a presença de

quadrinhos em livros didáticos é uma constante”, e muitos professores fazem uso

deles como recurso didático para atrair as crianças ou para introduzir o tema da

aula, mas em ambos os casos, os quadrinhos são abandonados logo em seguida.

Podemos desta forma considerar as histórias em quadrinhos apenas como

acessório pedagógico? Será que os professores de Arte concordam com isso?

No Brasil, o emprego das histórias em quadrinhos passou a ser reconhecido

pela LDB (Lei de Diretrizes e Bases) e pelos PCNs. No volume 6 (1997, p. 62 e 63),

dedicado ao ensino de Arte de 1ª a 4ª série, sugere que as Artes Visuais no fazer

dos alunos e como objeto de apreciação (observação, experimentação e leitura)

além das artes tradicionais pintura, gravura, ou escultura, deve incluir também

outras, como o vídeo, a fotografia e histórias em quadrinhos19. Segundo M.ª C. R.

Pereira, coordenadora geral dos PCNs (apud SERPA e ALENCAR, 1998), por

associarem imagem e texto, as histórias em quadrinhos, passaram a ser

consideradas como meio para auxiliar crianças a aprender a ler e escrever. Assim, o

MEC/1997 passou a recomendar o uso das HQs nas escolas. Esta recomendação

consta no volume 2 dos PCNs pertencentes ao ensino de Língua Portuguesa20.

O risco que se corre em usar histórias em quadrinhos apenas como recurso

para ensinar assuntos variados como a “descoberta da música [...] ou da

jardinagem” é o de vulgarizar mais ainda seus objetos (QUELLA-GUYOT, 1994,

p.45). Isso pode acentuar a idéia de que é uma subliteratura, ao invés de se

incentivar a criação artística de qualidade e a interpretação crítica de conteúdo das

HQs.

Quando crianças ou adolescentes trabalham histórias em quadrinhos junto a

professores de outras disciplinas, estão aplicando conhecimentos da área do ensino

de Artes Visuais. Os professores de outras disciplinas irão trabalhar dentro de suas 19 Nos PCNs (1998, vol. 6, 5ª a 8ª séries, p. 66-67), recomenda-se que o aluno deve realizar a produção, o conhecimento e a leitura das formas visuais, aprendendo a analisá-las criticamente “em diversos meios de comunicação da imagem: fotografia, cartaz, televisão, vídeo, histórias em quadrinhos [...] etc.” 20 Os PCNs (1997, vol. 2, 1ª a 4ª séries, p. 42), consideram que para “aprender a ler, é preciso interagir com a diversidade de textos escritos [...]” e que algumas situações favorecem o aprendizado da leitura e da escrita quando o aluno ainda não sabe ler e escrever. Entre as diversas opções adequadas para o trabalho com a linguagem escrita, tais como textos de jornais, revistas e suplementos infantis, notícias, resenhas, classificados, anúncios, slogans, cartazes, folhetos, etc., citam também os quadrinhos (ver também PCN/97, p. 82).

35

áreas. O estudante poderia estar aplicando o que aprendeu em Arte. Mas crianças

não fazem estas conexões sozinhas.

A Arte Seqüencial/HQs necessita ser estudada dentro de uma disciplina

apropriada a sua linguagem. Os estudantes podem apresentar dificuldades para

realizar trabalhos práticos de histórias em quadrinhos por não terem desenvolvido a

prática do desenho, da composição ou por não terem desenvolvido habilidade

técnica, por falta de idéias ou pela incapacidade para representar suas idéias. O

professor de Arte poderia estar mais bem preparado para intervir e auxiliar. Nesse

contexto, o ensino de Arte é o que está em melhor posição para isso. Tanto pode

desenvolver seu aprendizado para a linguagem gráfica dos quadrinhos, quanto o

aprendizado para a interpretação e a compreensão crítica.

Supomos que o professor de Artes Visuais deveria estar mais habilitado para

trabalhos interdisciplinares e em melhor posição para trabalhar com essas

linguagens junto aos alunos, respeitando seu desenvolvimento e auxiliando para

uma compreensão mais consciente das imagens.

Tratando de assuntos relacionados à revisão do sentido do saber escolar,

Hernández (1998, p. 73) destaca a importância da “compreensão da realidade

pessoal e cultural de professores e alunos”, citando René Zaggo, que afirma:

Quando estamos diante de um fato complexo e contraditório, tendemos a decompô-lo em elementos a fim de eliminar o contraditório. Esse modo de proceder, clássico, supõe que explicar seja reduzir. O método de Wallon (esse é seu legado [...]) consiste em instalar-se no centro da contradição: em saber de onde esta procede, para onde vai e qual é sua finalidade.

Para nossas preocupações, essas considerações também são importantes.

Levando em conta as contradições polêmicas na história das HQs e as

necessidades da sociedade contemporânea dentro da problemática do tema de

pesquisa, há que se questionar a realidade das HQs segundo a perspectiva dos

professores. Nós os educadores, podemos estar sujeitos a crenças, concepções e

valores ultrapassados que não atendem às necessidades da educação atual, o que

nos leva à pergunta principal que guia esta pesquisa:

Como os professores de ensino fundamental se relaci onam com a Arte

Seqüencial/histórias em quadrinhos no ensino de Art es Visuais?

36

Esta pergunta problema, vai ao encontro dos interesses daqueles que atuam

no cotidiano do ensino de Artes Visuais. Cabe refletir então, sobre qual atitude os

professores tomam diante das HQs. Ensinam com ela? Por meio dela? Como a

ensinam? Implica tentar compreender o que os professores pensam sobre as HQs

no ensino escolar.

1.2.1 Tema e objetivos da pesquisa

O problema parte da suposição de que há despreparo e preconceito com

relação à Arte Seqüencial/histórias em quadrinhos no ensino de Artes Visuais.

Conforme Riviere (apud SANCHO, 1997-1998), os processos de mudança são

lentos. Assim como podemos encontrar críticos e artistas que seguem pensando

segundo crenças ultrapassadas, as práticas de ensino de HQs nas escolas podem

refletir o mesmo. Por isso, vemos a necessidade de realizar estudos sobre essa

questão, a fim de obter dados para uma reflexão mais aprofundada, desejando que

esses dados contribuam para a elaboração de proposta educativa atualizada para a

compreensão crítica da linguagem dos quadrinhos.

Fica deste modo caracterizado o tema de pesquisa, ou seja, a relação entre

as HQs e o ensino das Artes Visuais. Para a delimitação do universo de pesquisa,

restringimos o estudo aos professores de ensino fundamental em escolas de

Curitiba/PR, com o objetivo principal de investigar como estes docentes

compreendem e utilizam as histórias em quadrinhos, analisando essas práticas e as

conseqüências dessas compreensões para o ensino de Artes Visuais.

Seguem naturalmente, objetivos específicos relacionados, como levantar

dados concretos sobre a situação da Arte Seqüencial/histórias em quadrinhos no

ensino fundamental, examinando o que é enfatizado ou realizado neste ensino.

Analisar esses dados dentro da fundamentação teórica deste estudo, isto é, na

perspectiva das teorias da Cultura Visual e desenvolver proposta de trabalho para

realizar estudos de imagens dos quadrinhos para os professores de Artes Visuais do

ensino fundamental.

37

1.3 JUSTIFICATIVA

O que está em questão para pais, educadores e outras pessoas, é a maneira como a cultura, particularmente a cultura da mídia, tornou-se uma força educacional substancial, senão a principal, na regulação de significados, de valores e gostos, que estabelecem as normas e convenções que oferecem e legitimam determinadas posições do sujeito. GIROUX, 2003

Como exposto na situação problema, segundo Scareli (2003), os quadrinhos

são uma constante nos livros didáticos e amplamente utilizados por outros

professores, enquanto o ensino de Artes Visuais parece deixar de lado

oportunidades para explorar um modo de expressão que lhe é próprio e particular.

As causas para isso podem ser várias. Eisner (1989, p. 5), que ministrou aulas na

Escola de Artes Visuais, de Nova York, comenta:

Por motivos que têm muito a ver com o uso e a temática, a Arte Seqüencial tem sido geralmente ignorada como forma digna de discussão acadêmica. Embora cada um dos seus elementos mais importantes, tais como design, o desenho, o cartum e a criação escrita, tenham merecido consideração acadêmica isoladamente, esta combinação única tem recebido um espaço bem pequeno (se é que tem recebido algum) no currículo literário e artístico. Creio que tanto o profissional como o crítico são responsáveis por isso.

Segundo Dowing (2002, p. 214), HQs são muitas vezes desconsideradas "por

sua aparente falta de seriedade e tidas às vezes como um emblema de decadência

e perigo cultural.” Apesar disso, tornaram-se populares nas décadas de 1960 e 70 e

se transformaram em força significativa entre adultos jovens em muitos países.

Segundo esse autor, muitas produções de histórias em quadrinhos, não giram em

38

torno de temas radicais. A maioria transmite os mesmos valores que as outras

mídias, “embora como os jogos de vídeo e de computador, alguns sejam bem mais

descaradamente violentos, sexistas e etnocêntricos que a maior parte da mídia

convencional.” (DOWING, 2002, p. 214).

Hoje vivemos uma época na qual nos deparamos com crianças, jovens e

adultos cada vez mais interessados nos meios visuais e acostumados às linguagens

permissivas das mídias, que acatam passivamente. Exemplos de fatores que podem

influenciar, inibindo ou desenvolvendo a capacidade criadora do aluno (e do ser

humano em geral), encontramos em Babin (1989, p. 30):

É essa espécie de passividade que precisamos assinalar. Ela não vem do fato de se assistir à televisão ou de se estar exposto a mil mídias, mas talvez do fato e do poder de impacto dessas mídias e da sociedade que as mantém ser forte demais para a subjetividade das crianças.

As mídias se transformaram nos educadores do público, mediando

representações "que jogam com as fantasias, os medos ou os fantasmas."

(HERNANDEZ, 2000, p. xi). Para Steinberg e Kincheloe (apud HERNANDEZ, 2001),

produz-se uma distância cada vez maior entre a pedagogia cultural, que é produzida

pelas mídias e a pedagogia escolar. O que significa que há uma diferença entre

como a "escola educa e como educam os meios da cultura popular." (HERNANDEZ,

2001, p. 2).

Podemos observar como a cultura da mídia regula significados que

determinam normas sociais na relação gênero e HQs, pelo fato de que, durante

muito tempo, as histórias em quadrinhos foram mais consumidas pelo sexo

masculino. Em finais dos anos 50, os quadrinhos eram criados em estilo

sensacionalista e "num formato adequado para leitores adolescentes do sexo

masculino, que eram o pão com manteiga do mercado." (McCLOUD, 2006, p. 27).

Pode-se perceber como as pessoas do sexo feminino se posicionaram com relação

às histórias em quadrinhos, durante aquela época, senão até hoje, mediante alguns

trechos da história Loja Proibida com a personagem Pepper Ann, publicada pela

revista Disney Explora, em junho de 1999 (Figuras 6 e 7).

39

Figura 5 – Trechos da História Loja Proibida, publicada na Revista Disney Explora, jun. 1999.

Figura 6 -Trechos da história Loja Proibida, publicada na Revista Disney Explora, jun. 1999. p. 24-27.

40

Este exemplo demonstra como as mídias são capazes de determinar o

pensamento e a atitude das pessoas. É uma referência aparentemente simples, mas

mostra também parte das idéias que influenciaram na formação do pensamento de

adultos e adolescentes de hoje e quanto o estudo destas imagens pode auxiliar a

compreender o meio em que vivemos.

Figura 7 – Trechos da história Loja Proibida, publicada na Revista Disney Explora, jun. 1999. p. 29-30.

41

As mídias não somente podem influenciar na construção das identidades

como podem definir a identidade "como sendo do sexo masculino, feminino, pessoa

branca, negra; cidadã ou não cidadã" e ainda, o significado da infância, do passado,

da verdade ou protagonismo social. (GIROUX, 2003, p. 128).

As mídias, as novas tecnologias, os meios de informação e a comunicação

estão engendrando profundas transformações nas subjetividades. Uma maneira de

compreender as mudanças que repercutem na educação é estudar o universo visual

com o qual crianças e adolescentes se relacionam “e as formas de apropriação [...]

que fazem deste universo visual.” (HERNANDEZ, 2001, p. 2, tradução nossa).

Nas últimas décadas, vivemos uma inevitável sensação de crise na

sociedade, na cultura, na escola e nas práticas docentes. Efland (2005) detecta

áreas que estão afetando e irão afetar a arte-educação nos próximos anos. Uma

delas é o surgimento de um mercado cultural internacional. Segundo esse autor, as

nações não podem evitar que a nova cultura popular internacional se espalhe e seja

difundida pelo marketing de massas. Mas o excesso de violência, sexismo e

produções voltadas para a formação de consumidores, bem como a formação de

indústrias culturais homogeneizadoras, levanta questões pertinentes e a

necessidade de novas propostas e práticas para o ensino de Artes Visuais.

As imagens da Arte Seqüencial encontradas nas mídias (meios impressos,

televisão, cinema e Internet), além de distrair e entreter, trazem referências estéticas

derivadas do desenho, da pintura e do design; elas contêm códigos culturais, valores

e significações complexas. O estudo destas imagens pode proporcionar

oportunidades antes ignoradas pelos professores no ensino de Artes Visuais.

Hernández (2000, p. ix) faz considerações importantes relacionadas ao

problema exposto. Para ele, “vincular experiências educativas com as

representações da realidade que constroem de si mesmos e do meio, com a pressão

dos meios e da indústria do consumo [...]”, significa colaborar para que as pessoas

possam interpretar criticamente o mundo do qual fazem parte como sujeitos, e sejam

capazes de dar respostas ao que acontece no mundo em que vivem.

Conforme Hernández (apud FRANZ, 2003a, p. 16), a escola deve ser uma

facilitadora da “construção das subjetividades, para as crianças e adolescentes que

se socorrem nela”, auxiliando para que se sintam seguros para atuar e transformar

sua própria vida. O que nos leva a crer que devemos atuar dentro de propostas

pedagógicas, que incentivem a produção de histórias em quadrinhos, voltadas para

42

o ensinamento artístico e estético, mas que ao mesmo tempo incentivem a análise e

a reflexão crítica, como forma de favorecer a construção de conhecimentos e para

que os professores possam auxiliar os estudantes a construir referências para

interpretar o que as mídias apresentam. Além do incentivo à leitura, o estudo das

HQs pode auxiliar na reflexão sobre os processos hegemônicos globalizadores que

aniquilam a diversidade e provocam a perda de nossos referenciais culturais.

Sobre a experiência estética, Ferraz e Fusari (1993, p. 23) citam Thomas

Munro, para quem “a experiência estética não é necessariamente derivada da arte”,

lembrando que há outras experiências estéticas, além daquelas que encontramos

em obras de arte eruditas. HQs também podem promover experiências neste

sentido, pois o desenvolvimento estético se dá mediante um exercício constante “de

discriminação a respeito das qualidades perceptuais das imagens” da percepção e

da composição. (MUNRO, apud FERRAZ e FUSARI, 1993, p. 23).

A realização de atividades com histórias em quadrinhos, além de desenvolver

as habilidades do desenho e da composição, estimulam a capacidade da

representação de idéias e situações. Portanto, nas aulas de Arte, não se justifica

excluir ou incluir precariamente certos modos de expressão, como a Arte

Seqüencial, que está intimamente ligada a outros meios de comunicação e à

experiência estética. Mas incluí-la de maneira que se possa compreender melhor

essa linguagem, também no sentido de promover a educação para a compreensão

crítica deste universo.

Fazer um recorte dentro de um campo extenso como o das Artes Visuais e

tratar exclusivamente da Arte Seqüencial/histórias em quadrinhos, avaliando nossas

práticas, pode contribuir para o desenvolvimento de um aspecto específico, deste

ensino, tornando-o cada vez mais completo e significativo.

As mudanças nos conceitos sobre a arte dos quadrinhos, a ampla divulgação

através das tecnologias digitais atraindo novos leitores e formação de indústrias

culturais globalizantes, outrossim, justificam a realização desta pesquisa, a fim de

fazer análise e reflexão sobre o ensino relacionado às HQs.

Segundo Sancho e Hernández (1997), Elliot Eisner (1998), e Gómez (2001),

fazer reflexão e análise crítica sobre as práticas ligadas a essa arte exige uma

investigação próxima desse ensino em seu dia-a-dia. Investigar o modo como os

professores compreendem a Arte Seqüencial/HQs no ensino de Artes Visuais, pode

revelar concepções, preconceitos, tendências, visões, práticas utilizadas, e

43

dificuldades, permitindo realizar uma análise reflexiva mais próxima da realidade do

ensino das HQs no dia de hoje. Pode igualmente contribuir para detectar pontos

positivos ou negativos, desvendando elementos que necessitem ser trabalhados ou

transformados em função das necessidades do ensino atual.

Um estudo sobre as histórias em quadrinhos no ensino de Artes Visuais,

dentro da perspectiva da Cultura Visual associado à Pedagogia Crítica, pode ser útil

para fundamentar a construção de proposta para leituras mais críticas e conscientes

associadas às imagens dessa arte e outras imagens semelhantes. Espera-se desse

modo contribuir nas reflexões sobre as práticas contemporâneas do ensino de Artes

Visuais.

44

CAPÍTULO II

45

2.1 CONCEITUALIZAÇÕES E TENDÊNCIAS DO ENSINO DE ARTES VISUAIS

Ensinar inexiste sem aprender e vice-versa e foi aprendendo socialmente que, historicamente, mulheres e homens descobriram que era possível ensinar. Foi assim, socialmente aprendendo, que ao longo dos tempos, mulheres e homens perceberam que era possível – depois, preciso – trabalhar maneiras, caminhos, métodos de ensinar. PAULO FREIRE,1997

Encontramos na educação várias tendências filosóficas que orientam as

práticas educativas, as quais se vinculam à pedagogia ou teoria da educação que,

por sua vez, estão impregnadas de concepções ideológicas e políticas. A Arte na

educação, desde o início de sua história vem atendendo a diferentes finalidades em

razão das transformações ocorridas na sociedade, nas políticas, nas visões e nas

concepções da arte e de seu ensino. A cada mudança, surgem novas denominações

para este ensino, as quais correspondem a novas posturas pedagógicas referentes

ao saber arte e ser professor de Arte. De acordo com Hernández (2000), as

mudanças na denominação não ocorrem por acaso e correspondem a novas formas

de compreender, ordenar e interpretar a realidade, ou seja, refletem ideologias.

O desenho, a educação estética, os trabalhos manuais, a expressão plástica, a educação visual e plástica, não são meras mudanças de rótulos, mas respondem a mudanças nas representações que refletem estratégias de legitimação que podem mediar essa matéria curricular. (Hernández, 2000, p. 70).

Conforme já o destacamos21, o próprio conceito da arte também muda e tem

sido interpretado de diferentes maneiras: “arte como técnica, materiais artísticos,

lazer, processo intuitivo, liberação de impulsos reprimidos, expressão, linguagem,

comunicação.” (FUSARI e FERRAZ, 1992, p. 18). Para Barbosa (2005b), em função

21 Item 1.3 - Problema de Pesquisa.

46

das concepções e finalidades adotadas, a arte na educação assume diferentes

sentidos: arte como preparação para o trabalho, como solução criadora de

problemas, como expressão criadora, como disciplina, como cognição e como

cultura visual.

De acordo com Fusari e Ferraz (1992), existe uma tendência idealista liberal

na educação de característica pouco crítica, que tende a crer que, a educação

sozinha, pode garantir a construção de uma sociedade mais justa e democrática.

Para essas autoras, essa tendência inclui a Pedagogia Tradicional, a Pedagogia

Nova e a Pedagogia Tecnicista.

Na Europa, em fins do século XIX, o ensino artístico enfatizava o desenho

ligado ao interesse pelo enriquecimento dos países e às influências das idéias

liberais e positivistas (BARBOSA, 1978). Procurando atender às demandas da

expansão industrial, o desenho era ensinado com a finalidade de preparar operários

para o trabalho nas fábricas e serviços artesanais – ornamentação, decoração e

manufaturas. Segundo Ferraz e Fusari (1993), o Brasil seguia os modelos europeus

e tal como na Europa, o desenho, aqui era considerado a base de todas as artes. No

ensino de Arte, no caso, desenho, predominava a Pedagogia Tradicional.

Na Pedagogia Tradicional, a relação professor-aluno é vertical e ao primeiro

compete informar e conduzir seus alunos. Em todos os campos do saber, a

Pedagogia Tradicional dava ênfase aos modelos. Nas aulas de arte, predominava a

teoria mimética que considerava importante a cópia como treino para a observação.

O aprendizado se fazia mediante cópias do “natural” e de “modelos” que os alunos

deveriam imitar. Conforme Fusari e Ferraz (1992), essa atitude implicava a adoção

de padrões de beleza de produtos artísticos, seres ou pessoas. As cópias deveriam

ser produções realistas ou idealistas. Práticas educacionais baseadas nessa

concepção, mantêm-se vivas até os dias de hoje.

Nas primeiras décadas do século XX, no Brasil, esse ensino ainda

predominou entre as classes para as quais o desenho era considerado útil para o

trabalho. Entre os anos de 1930 e 1970, conforme Fusari e Ferraz (1992), enfatizava

o desenho do natural, o desenho decorativo, o desenho pedagógico e o desenho

geométrico. Nos anos 50, ainda predominava uma visão utilitarista da arte. Além de

desenho, o currículo escolar passou a incluir Música, Canto e Trabalhos Manuais.

Os exercícios ainda eram baseados em modelos convencionais e o ensino técnico.

Valorizavam-se principalmente as habilidades manuais e os “dons artísticos”.

47

Entre os anos 20 e 70, o ensino ligado às artes, passou por outras

experiências, sustentadas pela estética modernista e as tendências pedagógicas e

psicológicas que marcaram o período. Nessa época, ainda não havia uma disciplina

que contemplasse o ensino de Arte nas escolas de ensino fundamental. No século

XX, segundo Fusari e Ferraz (1992), além dos movimentos filosóficos e estudos da

psicologia cognitiva e da psicanálise, o ensino superior artístico, também sofreu

influências da Gestalt .

A Pedagogia Nova surgiria em finais do século XIX, na Europa e nos Estados

Unidos. No Brasil, começaria a despontar em torno de 1930. Também conhecido por

escolanovismo ou Escola Nova, este movimento contrapôs-se à educação

tradicional, considerando menos significativa a estruturação racional e lógica dos

conhecimentos. Conforme Fusari e Ferraz (1992), o movimento propunha

experiências cognitivas que deveriam ocorrer de maneira progressiva, levando em

conta os interesses dos alunos. Os seguidores da Escola Nova abraçaram as idéias

de Dewey, para quem a aprendizagem deveria ocorrer a partir de um problema de

interesse dos alunos, desenvolvendo experiências para que aprendessem fazendo.

Tal movimento caracterizou-se principalmente pela ruptura com as “cópias de

modelos”, valorizando os processos criativos, provocando um deslocamento nas

práticas de ensino. Da centralização no professor como transmissor de conteúdos,

passou a centrar-se no aluno e em sua criação, enfatizando a criatividade e a

espontaneidade. Conforme Fusari e Ferraz (1992), a concepção estética passou a

ser proveniente de experiências individuais da percepção, com base na Psicologia

Cognitiva e de estéticas de expressão criadoras apoiadas pela Psicanálise.

A arte como expressão criadora surge com o início do modernismo e teve

como patrono Franz Cizek, que levou intelectuais a se interessarem pela produção

artística de crianças. Lowenfeld, influenciado pelas teorias de Freud, abordava a arte

como meio para se compreender o desenvolvimento individual em suas diferentes

fases e como desenvolvimento da consciência estética e criadora do aluno (FUSARI

e FERRAZ, 1992).

Augusto Rodrigues foi grande divulgador das teorias da educação pela arte,

de Herbert Read, criando em 1948 a Escolinha de Arte do Brasil, no Rio de Janeiro.

As escolinhas de arte, como eram chamadas, proliferaram, valorizando a arte infantil

no Brasil e enfatizando principalmente a concepção de arte como expressão e

liberdade criadoras.

48

Depois dos anos 60, entretanto, a prática da livre-expressão firmada pela

tendência escolanovista, acarretou em um ensino livre e descompromissado, “onde

tudo era permitido” (FUSARI e FERRAZ, 1992, p. 35) gerando um esvaziamento de

conteúdos e preconceitos com relação ao ensino ligado à arte.

Nessa época, segundo Fusari e Ferraz (1992), a Pedagogia Tecnicista

surgiria nos Estados Unidos, quando o mercado tecnológico em expansão

necessitava de profissionais habilitados, e a educação era considerada insuficiente

para essa demanda. No Brasil, foi introduzida entre 1960 e 1970. Inicialmente, tinha

por objetivo a melhora da eficiência na escola e a preparação de indivíduos mais

competentes e produtivos, que deveriam estar aptos para a sociedade industrial.

Na década de 70, sob a influência da Pedagogia Nova e principalmente da

Tecnicista, foi implantada no Brasil a Lei 5.692/71 que introduzia e tornava

obrigatória a disciplina Educação Artística, no currículo escolar, o que significou um

avanço para o ensino de Arte, que até então não tinha amparo legal.

Os cursos de formação de professores da então chamada Educação Artística,

foram criados em regime de urgência, no intuito de atender à lei. Nos primeiros anos

de implantação, eram de curta duração e abrangiam todas as linguagens artísticas –

Música, Teatro, Dança e Artes Plásticas. Tinham pouca fundamentação teórico-

metodológica sobre o ensino e a aprendizagem em Arte. Estavam mais voltados

para o desenvolvimento de técnicas artísticas, bem como enfatizavam a criatividade

e a livre expressão artísticas.

Como assinalam Fusari e Ferraz (1992), a educação de tendência Liberal

idealista, recebeu influências das três pedagogias – Tradicional, Nova e Tecnicista.

Conforme essas autoras, o ensino de Arte até década de 90, vinha apresentando

imbricadas essas práticas, em maior ou menor grau.

Os problemas da Educação Artística baseada no laissez-faire começaram a

levantar questionamentos e outras tendências começaram a ter origem neste

cenário. Desde os anos 60, também surge uma tendência mais crítica, realista e

progressista, mobilizando novas propostas pedagógicas em busca de soluções para

a baixa qualidade do ensino público. Essa tendência reúne as pedagogias

Libertadora, Libertária e Histórico-Crítica, que recebem influências das teorias

críticas. A Pedagogia Libertadora, representada principalmente por Paulo Freire,

preocupa-se em compreender e solucionar problemas com a intenção de obter

melhora das práticas sociais. A Pedagogia Libertária valoriza mais as experiências

49

educativas independentes e de autogestão, livre de amarras sociais. A Histórico-

Crítica, também chamada Crítico-Social dos Conteúdos, ou ainda Sociopolítica,

segundo Fusari e Ferraz (1992), surge mais tarde, em inícios dos anos 80. Tem em

comum com a Pedagogia Libertadora o pensamento de revalorização da escola

como parte integrante da totalidade social.

Na concepção crítica, o professor como mediador é uma presença

insubstituível para relações pedagógicas que trabalha experiências pouco

elaboradas dos alunos, reavaliando experiências e preparando para que exerçam

uma cidadania consciente, crítica e participante, o que significa realizar ações que

propiciem transformações na prática (FUSARI e FERRAZ, 1992).

Ainda na década de 1960, surgiram autores defendendo um ensino

“contextualista”. Segundo Richter (in CORRÊA, 2004), esse grupo contestava as

visões essencialistas da arte, defendendo a idéia de que a arte deveria ser estudada

tomando-se como referência seu contexto cultural de origem, fundamentando-se em

conhecimentos antropológicos e sociológicos que também contemplassem o

contexto social e cultural dos alunos.

O ensino de Arte com ênfase na livre-expressão acabou gerando um

esvaziamento “conteudístico”. Surgiu, então, um movimento nos Estados Unidos, na

década de 1960, que desejava a volta dos conteúdos para as aulas de Arte. Essa

idéia concretizou-se na década seguinte, com o surgimento do Discipline Based Art

Education, o DBAE22. Ana Mae Barbosa sistematizou idéias baseada nas

concepções do DBAE através da Proposta Triangular, no final dos anos oitenta e

início da década de 1990.

A Proposta Triangular significou uma valorização da disciplina como área de

conhecimentos, com conteúdos próprios referentes à História da Arte, à estética e

introduzindo a “leitura da imagem” no ensino de Arte. Desde então, os professores

passaram a utilizar uma abordagem que envolve a apreciação, a História da Arte e a

produção artística, interrelacionados. Ao mesmo tempo, buscou-se romper com o

preconceito referente à arte-educação23 como sinônimo de arte apenas para

crianças e adolescentes.

22 Discipline Based Art Education. O DBAE corresponde à Educação Artística com base em disciplinas: produção de arte, História da Arte, crítica e estética (BARBOSA, 1991). 23 Segundo Barbosa (1991), a expressão “arte-educação” também havia servido para identificar uma posição de vanguarda contra a Educação Artística que foi oficializada com a Lei 5.692/71 através do acordo MEC-USAID.

50

Em sua análise histórica da arte-educação, Eisner (apud BARBOSA, 2005b,

p. 17) considera a livre-expressão como a visão “mais fortemente implantada no

imaginário popular.” Porém no Brasil a abordagem que mais se impõe, segundo

Barbosa (2005b), é a que considera a educação estética como semelhante à

educação intelectual, ou como cognição. Em Arte, o aprendizado nessa abordagem

é visto como diretamente ligado ao desenvolvimento do processo de percepção e

capacidade de observação. Conforme Barbosa (2005b, p. 17) é uma visão na qual

se afirma "a eficiência da arte para desenvolver formas sutis de pensar, diferenciar,

comparar, generalizar, interpretar, conceber possibilidades, construir, formular

hipóteses e decifrar metáforas.”

2.1.1 A década de 1980 e posteriores

A década de 1980 viu surgir uma maior politização dos arte-educadores,

decorrente do nascimento de diversas associações, coincidindo com o

revigoramento das idéias de Paulo Freire, que "voltou ao Brasil em 1980."

(BARBOSA, 2005b, p. 15). A formação e o conhecimento em arte-educação,

entretanto, ainda deixavam a desejar, pois havia poucos programas de pesquisa e

de aperfeiçoamento para os profissionais da área.

Nessa década, “o ensino da arte começa a ser repensado em novas bases

conceituais e revisado quanto a sua relação com as pesquisas contemporâneas em

Arte." (PILLAR, 1999, p. 11). O processo de democratização vivido pelo país nesse

período, bem como a criação de programas, festivais e novas linhas de pesquisa e

pós-graduação aliadas a participações dos professores nas associações

contribuíram para este avanço.

Esse movimento foi se transformando em rejeição ao ensino polivalente,

trazendo reivindicações por um ensino mais especializado. Em Educação Artística

e/ou arte-educação, uma das finalidades principais era o desenvolvimento da

criatividade. Com o desejo de redenominar esta área do currículo para “Ensino de

Arte”, a criatividade e a expressão individuais, associadas à idéia de originalidade e

pureza, foram aos poucos sendo questionadas. Alguns arte-educadores passaram a

51

desenvolver propostas que tornassem o ensino e a formação de professores de Arte

mais eficazes e significativos, tentando superar um ensino no qual não havia

compromisso com as linguagens específicas da arte.

As primeiras tentativas para incluir imagens no ensino de Arte, segundo

Barbosa (1991), foram amplamente rejeitadas. Mas a Proposta Triangular,

sistematizada por essa autora, mediante leituras de imagens contextualizadas, logo

se tornou uma das propostas mais difundidas nas escolas.

Conforme Barbosa (1991), o primeiro programa a conectar a análise da obra

de arte, além de outras imagens, com a História da Arte, associado a trabalho

prático, foi o Festival de Campos de Jordão, em São Paulo, em 1983. Segundo essa

autora, no festival, os cursos se baseavam na decodificação do meio ambiente

estético, de composições musicais populares, pintores, grupos de dança, etc., e se

voltavam para a decifração de imagens da TV, da arte xerox, de pinturas e

esculturas da arte moderna brasileira. Essa idéia teve continuidade na Secretaria de

Educação de São Paulo, em cursos na Universidade de São Paulo.

Em 1987, Barbosa (1991) deu início a um programa no Museu de Arte

Contemporânea (MAC/USP), associando trabalho prático, História da Arte e leitura

de imagem. Nessa proposta de leitura, a idéia é construir uma metalinguagem da

imagem, falando sobre a pintura em outros discursos: verbais, silenciosos ou

gráficos. Segundo Barbosa (1991), a metodologia empregada para a leitura pode ser

estética, semiológica, iconológica ou ainda outra, conforme o conhecimento do

professor. A Proposta Triangular não trabalha com uma concepção linear de História

da Arte, mas contextualizando a obra de arte no tempo a partir de cada obra

examinada, fazendo conexões com outras obras e outras manifestações culturais.

Em 198624, surgiram políticas contrárias ao ensino da Arte nas escolas,

abrindo a novas discussões sobre um eventual caráter de não obrigatoriedade desse

ensino. Mas, a despeito disso, nas últimas décadas, Arte vem alcançando maior

consolidação e consciência como disciplina necessária no currículo e uma melhora

significativa na qualidade do ensino da Arte no Brasil (BARBOSA, 2005b).

24 Segundo Barbosa (1991), em 1986, o Conselho Federal de Educação não incluiu a Educação Artística entre as disciplinas básicas, colocando-a em parágrafo separado, no qual se mencionava sua exigência. Na interpretação da lei, o resultado foi que a grande maioria das escolas particulares passou a desconsiderar a disciplina, eliminando-a do currículo.

52

A LDBEN nº 9.394/96 trouxe importantes alterações para a educação básica,

com o artigo 2625, uma vez que põe fim às discussões sobre a obrigatoriedade ou

não da arte no currículo escolar. Na lei anterior, a Educação Artística, era

considerada como mera atividade. Com o Parecer CNE/CEB nº 22/2005, aprovado

em outubro de 2005, a retificação do termo “Educação Artística” por “Arte”,

preconizada pela lei nº 9.394/96, efetivou-se, entendida a arte não mais como

atividade, mas como forma de conhecimento.

O cenário que chega ao final dos anos 90 mobiliza diferentes tendências no

ensino de Arte. Nas décadas anteriores, muitas pesquisas se desenvolveram sobre

a arte e a aprendizagem da arte, que contribuíram com novos dados para as

propostas pedagógicas, acarretando o aumento de importância tanto para os

conteúdos quanto para os processos de aprendizagem.

Conforme Pillar (1999), na década de 1970 havia surgido uma série de

pesquisas sobre a leitura e a compreensão de imagens. Feldman, Parsons, Gardner

Housen e Perkins, estão entre os autores que estudam a compreensão. Os estudos

de Parsons, para Hernández (2001), embora ainda presos às proposições da

modernidade e a referências estéticas de base formalista, foram os que motivaram

pesquisas posteriores e atuais sobre os estágios e usos de compreensão dos

indivíduos acerca das obras de arte. Segundo Hernández (2000), Vygotsky tem

papel fundamental para essas pesquisas, à medida que destaca a importância das

relações sociais no desenvolvimento das atividades mentais e das funções que

desempenham papel estratégico na forma com que a mente se relaciona com a

informação, transformando-a em conhecimento pessoal.

Concomitantemente a esses acontecimentos, que não ocorrem em uma

ordem única, nos Estados Unidos surge uma concepção mais radical da Pedagogia

Crítica. O movimento iniciou-se com uma "minoria dentro da comunidade

acadêmica" mas que constituía uma presença crescente nas academias.

(McLAREN, 1997, p. 192). Considerando que a cultura está sempre implicada em

relações de poder, práticas sociais e favorecimento de formas de conhecimento, a

Pedagogia Crítica também busca pela maior consciência sobre os fatores

socioculturais nas produções dos significados, influenciando as propostas

pedagógicas e tendências atuais no ensino de Arte.

25 Art. 26 § 2º. “O ensino da arte constituirá componente curricular obrigatório, nos diversos níveis da educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos.”

53

No Brasil, conforme os PCNs de 1998, as propostas que mais se destacam

são as que se afirmam por sua abrangência e que interferem na melhoria da

aprendizagem e do ensino de Arte. Essas propostas, segundo os PCNs (1998, vol. 6

p. 28) “não propõe apenas códigos hegemônicos, mas também a apreciação de

valores de múltiplas culturas, do meio ambiente imediato e do cotidiano.” Segundo

Richter (in CORRÊA, 2004, p. 142), embora o multiculturalismo tenha sido “uma

constante em debates e encontros sobre ensino de Arte, desde os anos 80”,

somente com sua inclusão nos PCNs/98, com a denominação de “pluralidade

cultural” é que o tema passou a ser mais amplamente discutido no Brasil.

A crítica ao ensino da livre-expressão, o recurso à contextualização, o uso de

diferentes imagens provenientes tanto de fontes diversas quanto de matrizes

culturais distintas, para Nascimento (2006), parecem ser o ponto de confluência ou

continuidade discursiva entre Proposta Triangular, a perspectiva Intercultural26, e a

Cultura Visual.

Essas propostas também chamadas pós-modernas, ora convergem e se

imbricam, apresentando idéias em comum, ora se confrontam e divergem em seus

pontos de vista. A Proposta Triangular questiona o repertório artístico e estético

limitado das camadas que não têm acesso à arte e ao museu, originado pelas

diferenças sociais. A interculturalidade, defensora das estéticas do cotidiano,

enfatiza a valorização dos fazeres cotidianos e a interação com valores e artefatos

produzidos pertencentes a diferentes culturas. A Cultura Visual considera as

imagens como representações sociais e questiona o papel que exercem na

construção das identidades. Considera que a arte é uma manifestação cultural e que

as representações são mediadoras de significados em cada época e cultura. A

finalidade principal dessa proposta é promover a interpretação e a compreensão

crítica desses significados.

Para Nascimento (2006, p. 4), a Proposta Triangular e a Intercultural têm em

comum o questionamento sobre “o monoculturalismo na educação e na arte, os

estereótipos e a indiferença cultural.” Porém, estudos na perspectiva da Cultura

Visual também questionam os currículos hegemônicos que excluem outras formas

26 Conforme Richter (In: CORRÊA, 2004, p. 141), “o termo ‘pluralidade cultural’ tem sido utilizado, no Brasil, como sinônimo de ‘multiculturalidade’ ou ‘diversidade cultural’, indicando as múltiplas culturas hoje presentes nas sociedades complexas. É, no entanto, a denominação ‘multicultural’ que se encontra consagrada na literatura internacional.” Porém, segundo essa autora, atualmente o termo “interculturalidade” vem substituindo o termo “multicultural” em função do sentido de inter-relação e reciprocidade entre culturas com códigos culturais diferentes.

54

de saber (HERNÁNDEZ, 1998, 2001, 2007) e investigam imagens e temas

vinculados a “situações de diferença de poder (racismo, etnicidade, desigualdades

sociais, gênero, saber, olhar).” (HERNÁNDEZ, in FRANZ, 2003a, p. 12).

Os teóricos da Cultura Visual consideram que vivemos em uma época na qual

o visual adquire maior importância tanto no conhecimento, como em muitas formas

de entretenimento. Por isso, esse campo de estudos, além da arte tradicional, inclui

objetos e artefatos visuais além dos considerados como arte. A proposta da Cultura

Visual busca estar conectada com as demandas da sociedade contemporânea.

A Proposta Triangular, encontra-se bastante difundida entre os arte-

educadores. Como vimos, essa proposta postula a necessidade da apreciação de

obras de arte, da história e do fazer artístico (BARBOSA, 1991). A perspectiva

intercultural assume diferentes feições. Tanto o meio é importante, como fonte de

conhecimento no qual podem estabelecer-se diálogos estéticos e artísticos, quanto

amplia a discussão sobre as diferentes culturas. Trabalha questões sobre

etnocentrismo, estereótipos, preconceitos, discriminação, racismo e tem por objetivo

promover o entendimento entre grupos culturais. A Cultura Visual, segundo

Hernández (2000, 2007) busca exemplos na cultura visual que nos cerca, com a

finalidade de interpretá-los, a partir de diferentes pontos de vista, a fim de favorecer

a tomada de consciência dos alunos sobre si mesmos e sobre o mundo do qual

fazem parte. O professor assume o papel de mediador e tem a função de auxiliar os

alunos a compreenderem a realidade, examinando os fenômenos que os rodeiam de

maneira questionadora.

2.1.2 Arte-educação na pós-modernidade

A arte-educação, até inícios do século XXI, esteve fortemente baseada em

crenças modernistas sobre a arte. Conforme Efland (2003) e Brent Wilson (in

BARBOSA, 2005b), as idéias modernistas sobre a natureza da arte, seu papel na

cultura e na sociedade, assim como a concepção de criatividade e originalidade é

que determinavam o currículo artístico.

“Mas agora o clima do mundo da arte mudou.” (WILSON in BARBOSA,

2005b, p. 82). Os teóricos sustentam que entramos em um novo período cultural. A

55

arte-educação, hoje denominada ensino da Arte, mudou bastante desde as

primeiras décadas do pós-modernismo. A busca insaciável pelo novo ligado à noção

de avanço progressivo e da concepção de arte como algo separado do mundo social

passaram a ser questionadas por críticos e historiadores da arte.

Para Efland (2005), a transição do modernismo para o pós-modernismo, o

aparecimento de um mercado cultural internacional e a situação do mundo após a

Guerra Fria são questões importantes que atuam com impacto e provocam

transformações que afetam e afetarão o cenário da educação no futuro.

O modernismo, transportou para a arte as qualidades da abstração e pureza

formais, que tendiam a excluir qualquer referência externa, criando assim o mito da

arte independente e auto-referente. As obras de arte eram consideradas como

resultado de práticas individuais que somente poucos gênios possuíam talento para

expressar. A arte tornou-se um domínio cognitivo separado, logo era ensinada como

algo isolado do mundo e sem relação com a história e com o mundo social. As

qualidades das obras existiam em virtude de suas relações internas e podiam ser

compreendidas apenas pelos olhos. Segundo Parsons (1999), qualquer coisa

cultural, ou que precisava ser aprendida verbalmente, era considerada como

estritamente irrelevante. Em conseqüência, a meta em arte-educação foi a de

desenvolver o aprendizado da percepção estética. “A visão contemporânea, em

contraste, entende que uma obra de arte pode ser constituída por dois tipos de

coisas: por suas qualidades estritamente estéticas e por um conhecimento de seu

contexto.” (PARSONS, 1999).

A estética modernista fixou um conjunto universal de elementos e princípios

que eram tomados como modelos no ensino de Arte. Apenas os cânones ocidentais

de código dominante passaram a ser aceitos como a melhor arte e tudo o que não

estivesse de acordo com estes princípios, era considerado como de menor valor.

Dessa forma, o modernismo transformou a arte em um “projeto elitista” que

enfatizava uma separação entre a arte erudita e a cultura popular (EFLAND, 2005).

Esse pensamento acarretou em padronização e homogeneização nos currículos e

apenas determinados tipos de arte eram consideradas como conteúdo digno de

estudo acadêmico. Segundo Chalmers (2003), isso refletiu também em uma

configuração etnocêntrica e egocêntrica nos currículos do ensino de Artes e boa

parte do pensamento artístico, encobrindo interesses colonialistas, raciais, estruturas

classistas e diferenças hierárquicas entre os gêneros.

56

"Desde os anos 50 - década em que por convenção se encerra o

modernismo" (GADOTTI, 2002, p. 310), com a entrada das sociedades na era pós-

industrial e as culturas na idade pós-moderna, ocorrem modificações profundas

causadas pelo impacto das transformações tecnológicas na própria ciência, na

sociedade e na arte. O cenário pós-moderno, muito mais informatizado gera crises e

mudanças nos conceitos e discursos modernos, com suas pretensões atemporais e

universalizantes, impondo sérias reflexões sobre a diversidade e identidade

culturais, globalização e questões político-sociais.

A ampla divulgação da cultura popular por meio de marketing dos meios de

informação e comunicação, vem sendo uma das principais preocupações de teóricos

e críticos pós-modernos. Para Efland (2005), trata-se de um fenômeno semelhante à

modernidade ocidental, só que alimentado por forças econômicas mais fortes que o

Ocidente - um novo mercado cultural internacional que se impõe às demais culturas

através do marketing de massas das mídias e novas tecnologias, unindo o mundo

todo, levando à uniformização e homogeneização. Enquanto isso ocorre, as pessoas

correm o risco de perder suas identidades culturais tradicionais (EFLAND, 2005).

Ao lado desse processo rumo à homogeneização cultural, o colapso da URSS

e desintegração do comunismo cedem lugar a conflitos e contradições em áreas

abandonadas que deixaram de ter interesse para EUA e Rússia, no início da década

de 1990. Sem a antiga bipolaridade, no mundo pós-Guerra Fria surgem atores locais

agindo sem qualquer regulação externa ou interna, criando o que Lellouche (apud

VIANNA, 2005) designa de “mundo à deriva”, uma desordem entre as nações, que

clama por um novo equilíbrio mundial. Essa desordem, segundo Efland (2005, p.

180), causa o que presenciamos hoje, “uma retribalização de grande parte da

humanidade por meio da guerra e do derramamento de sangue [...]” que opõe

cultura contra cultura, pessoas contra pessoas, tribos contra tribos.

Como assinala Barber (apud EFLAND, 2005), os conflitos gerados pelas

culturas, contra qualquer cooperação social, contrastam com as forças econômicas

do mercado cultural internacional, que pressiona as nações a virarem um mesmo

parque temático. Para Barber (apud EFLAND, 2005 p. 181) “entre a Babel e a

Disneylândia”, o planeta se desfaz e ao mesmo tempo, tenta recompor-se.

Esse cenário dá impulso à crítica cultural pós-moderna dirigida à cultura

ocidental, fazendo surgir na Educação, uma Pedagogia Crítica mais radical, que

questiona as limitações do modernismo, sob a forma de argumentos às vezes

57

identificados como “feminismo, teoria marxista, hermenêutica e multiculturalismo.”

(EFLAND, 2005, p. 175). Diante das desilusões causadas pela modernidade,

segundo Gadotti (2002, p. 311-312), critica-se o racionalismo que levou à

desumanização, pretendendo “resgatar a unidade entre história e sujeito que foi

perdida durante as operações modernizadoras da cultura e da educação”,

defendendo a igualdade social para os diferentes grupos étnicos e raciais.

Uma das finalidades principais, no ensino de Arte, passa a ser alcançar uma

educação mais democrática, considerando que uma forma de atingir esse objetivo é

contribuir para a compreensão do mundo social e cultural no qual os indivíduos

vivem. Uma educação democrática e pós-modernista, para Freedman (2000, p. 325,

tradução nossa), fundamenta-se em quatro idéias principais:

a) uma ampliação do domínio da arte-educação; b) uma mudança na ênfase do ensino formalista para a construção do conhecimento; c) a importância do contexto social para tal construção e d) uma nova definição e ênfase na crítica.

No pós-modernismo as fronteiras entre as formas de arte eruditas e não-

eruditas desaparecem (EFLAND, 2005). Com a sensação de esgotamento estilístico

do movimento modernista, Efland (2003, p. 14) assinala que a corrente crítica, “vem

ganhando influência entre os artistas provocando um deslocamento cultural.”

Desde o início da década de 1990, a arte mostra “uma série de mudanças

que antes se percebiam como incipientes.” (HERNÁNDEZ, 2001, p. 3). Desde então,

denota a dependência cada vez maior da cultura, das novas tecnologias e das

formas de visualidade geradas por esses meios. Surgem os produtos híbridos, novas

dinâmicas de produção, utilização e manipulação de imagens preexistentes (MELLO,

2003). Reaparece também o realismo. Porém, conforme Efland (2005, p. 179), de

maneira diferente do realismo tradicional, amiúde emprega o imaginário da

propaganda e do comércio e “gira em torno de símbolos sociais e culturais.” Um

exemplo desse emprego de imagens da propaganda e imagens da cultura popular,

pode se ver em Julian Beever, um artista inglês que mantém seus trabalhos na

Internet (Figura 8).

58

Figura 8 – Julian Beever. Batman and Robin to the Rescue27, s.d.

Como destaca Efland (2003, p. 17, tradução nossa), “os artistas pós-

modernos se apropriam de imagens e formas de épocas e lugares distintos,

incorporam elementos de representação em sua obra, e, freqüentemente,

mensagens socialmente comprometidas.” Tanto artistas como críticos tornam-se

mais propensos a criar e interpretar as obras a partir de seu contexto de origem.

A ampliação do campo das artes e dissolução de fronteiras entre arte erudita

e artes populares, bem como grande parte do material imagético produzido pelas

mídias atuando com impacto na subjetividade e identidade, trazem questões

pertinentes para a revisão de conceitos no ensino de Arte, transformando em desafio

a construção de propostas comprometidas com a contemporaneidade e a realidade

social. Nesse contexto, surge a emergência de um novo campo de estudos

denominado como o campo da Cultura Visual, identificado por Julie Matthew (apud

HERNÁNDEZ, 2007, p. 22) como resposta frente à necessidade de “investigar e

analisar uma cultura dominada por imagens.” Hoje, uma das propostas mais

divulgadas, os estudos da Cultura Visual giram em torno das artes, das mídias e da

vida cotidiana.

27 Imagem disponível em <http://users.skynet.be/J.Beever/>. Acesso em: 16 set. 2006.

59

2.2 AS ABORDAGENS SOCIOCULTURAIS EM ARTES VISUAIS

As teorias sobre a Cultura Visual, Pedagogia Crítica da Arte e Educação,

abordagens consideradas socioculturais, fundamentam este estudo. Na presente

pesquisa, dentro da perspectiva da Cultura Visual, é particularmente importante a

relação entre este campo e a Pedagogia Crítica, assim como a Antropologia que

fundamenta ambas as abordagens.

Em sentido genérico, a abordagem sociocultural, é interacionista e considera

o homem e o mundo conjuntamente, porém dando ênfase ao sujeito como

elaborador do conhecimento. O trabalho de Paulo Freire inspira essa tendência no

Brasil. Segundo Freire (1979, 1997), o desenvolvimento da consciência crítica pode

tornar o sujeito cada vez mais capaz de sua práxis, libertando-o e tornando-o apto

para responder aos desafios provocados por seu mundo. Essa abordagem vem ao

encontro das necessidades do ensino de Arte, que hoje se depara com o desafio de

contribuir para a construção crítica da realidade social por meio da educação para a

liberdade (RICHTER, in CORRÊA, 2004; FRANZ, 2004).

As transformações na sociedade e na cultura levantaram aspectos sociais

antes ignorados pela arte-educação, bem como apontam a importância do visual na

sociedade contemporânea e, naturalmente, a necessidade de propostas mais

conectadas com os problemas da atualidade. Desde que a imagem passou a ser

fundamental como fonte de informação e conhecimento no ensino de Arte, outras

questões começaram a ser evidenciadas e há maior preocupação com as relações

entre pessoas e seus contextos sociais e culturais singulares.

Segundo Meneses (2003), desde a década de 60, a Antropologia tem dado

origem ao reconhecimento de uma dimensão da cultura associada à visualidade.

Nas últimas décadas, segundo esse autor (2003, p. 15)28, têm surgido propostas que

28 Segundo Meneses (2003, p. 16), a formação do que se chama hoje Antropologia Visual surgiu mediante o reconhecimento do potencial informativo das fontes visuais que gerou a consciência de sua natureza discursiva. Com isso, os objetivos desse novo campo de estudos - produção, circulação e consumo das imagens – “incluíram a interação entre o observador e o observado.” Dessa forma,

60

procuram entender as imagens como objetos que participam das relações sociais e

“para o entendimento da arte como agency, em sua capacidade de produzir efeitos,

produzir e sustentar formas de sociabilidade.”

Para os teóricos29, que adotam a concepção de ensino pós-moderno, a arte é

considerada como uma representação social e como uma forma de produção ou

reprodução cultural destinada a criar símbolos de uma realidade comum. Para esses

autores, a obra de arte como prática sociocultural traz consigo contradições

inerentes à sociedade e à cultura na qual foi gerada e aceita.

2.2.1 A Cultura Visual como um campo de estudos

As teorias de Hernández30 sobre a Cultura Visual, são as que mais

contribuem para esta pesquisa, uma vez que valorizam práticas e concepções de

ensino de Artes Visuais relacionadas às HQs.

A Cultura Visual, segundo Hernández (2006), é um campo que emerge de

diversas disciplinas e da história cultural da arte. Pode-se pensar este campo como

formado pelas “formas culturais vinculadas ao olhar e que denominamos como

práticas de ‘visualidade’; e o estudo de um amplo aspecto de artefatos visuais que

vão mais além dos recolhidos [...] nas instituições de arte.” (HERNÁNDEZ, 2006, p.

5). Não se trata, portanto, de um campo que se refere apenas a uma série de

objetos. No ensino de Arte, a Cultura Visual, leva em conta que,

como educadores do campo das artes visuais, estamos relacionados com artefatos que são, em primeiro lugar, significativamente representações visuais e, em segundo lugar, que constituem posições e discursos, através de atitudes, crenças e valores, o que quer dizer que mediam significações culturais. (HERNÁNDEZ, 2006, p. 5, tradução nossa).

conforme Meneses (2003. p. 16-17), “aos estudos de manifestações ‘imagéticas’ da cultura se acrescentou a necessidade de compreender os mecanismos variadamente localizados de produção de sentido – sentido dialógico, portanto socialmente construído e mutável e não pré-formado ou imanente a fonte visual.” 29Geertz (1997); Cary (1998); Freedman (2000, 2001); Mason (2001); Chalmers (2003); Mirzoeff (2003); Efland, Freedman, Sthur (2003); Richter (2004); Efland (2005); Corrêa (2004, 2005) Franz (2000, 2001, 2003a, 2003b, 2003c, 2003d, 2004, 2005a, 2005b); Hernández (1998, 2000, 2001, 2003a, 2005, 2006, 2007). 30 Hernández , idem.

61

Para construir interpretações sobre as manifestações do visual, conforme

Hernández (2006), não é possível ficar apenas com a História da Arte, a estética ou

a semiótica. Para isso, a Cultura Visual nutre-se principalmente da teoria crítica, dos

estudos culturais, do feminismo, da psicanálise, da lingüística, da teoria literária, da

fenomenologia, da antropologia e dos estudos dos meios, a fim de poder explorar,

mediante o visual, "a dimensão social do olhar." (HERNANDEZ, 2000, p. 24). Dentro

dessa perspectiva, é possível estabelecer nexos entre problemas, lugares e tempos

com a finalidade de opor-se ao potencial etnocentrista e unidirecional de enfoques

ainda presentes.

Para Mirzoeff (2003), a história intelectual que separa termos entre alta cultura

e cultura popular cria um difícil legado para os estudos sobre a Cultura Visual. “O

papel que desempenham todas as variedades culturais é demasiado complexo e

demasiado importante para ficar reduzido a estes termos.” (MIRZOEFF, 2003, p.33,

tradução nossa). Conforme Hernández (2000, p. 84), “desde a metade do século

passado foram fixadas as premissas reguladoras dos fundamentos do ensino da arte

nas quais se pode observar uma separação entre a cultura popular, o gênio

individual e os valores oficiais.”

Ao invés de dividir a Cultura Visual em partes opostas, Mirzoeff (2003) prefere

considerar e examinar o modo como a trajetória do visual tem dado lugar à aparição

do visual no mundo contemporâneo. Hernández (2006) considera que suas teorias

sobre a Cultura Visual estão próximas ao projeto de Mirzoeff (2003) que explora o

modo “como a visualidade chega a desempenhar um papel tão relevante na vida

moderna [...] que se projeta nas trajetórias que conduzem ao estudo das formas da

visualidade contemporânea.” (HERNÁNDEZ, 2006, p. 6).

Para Mirzoeff (2003, p. 34), as partes constituintes da Cultura Visual não

estão definidas pelo meio [televisão, Internet, ou cinema], “mas pela interação entre

o espectador e o que ele olha e observa, o que pode definir-se como acontecimento

visual.” (tradução nossa). A Cultura Visual, segundo esse autor, interessa-se pelos

acontecimentos visuais nos quais o consumidor busca a informação, o significado ou

o prazer conectados com a tecnologia visual. Abrange desde a pintura a óleo, a

televisão até a Internet, enfocando os momentos nos quais o visual se transforma

em lugar de debate e lugar de interação social e de definição de classe, gênero ou

identidade. É um campo novo, segundo Mirzoeff (2003, p. 24-27), porque centra-se

no visual “como um lugar em que se criam e discutem os significados.” O autor

62

explica que, assim como os estudos culturais procuram “compreender de que

maneira os indivíduos buscam o sentido do consumo da cultura de massas, a cultura

visual dá prioridade à experiência cotidiana do visual”. Nesse sentido, a cultura

visual também “está ligada à crise da informação e à sobrecarga do visual no

cotidiano.”

Para Mirzoeff (apud HERNÁNDEZ, 2006, p. 19-20) o hiper-estímulo da cultura

visual satura o campo do visual, “um processo que continuamente falha enquanto

aprendemos a ver e conectar cada vez mais depressa.” A Cultura Visual é um

campo mutante em constante formação dos meios e dos usos e apropriações.

Mirzoeff (2003) busca interpretar o processo de visualização cada vez mais

crescente e radical da contemporaneidade, e como no contexto da modernidade a

visualidade ajudou a fixar maneiras de ver, dizer, agir e fazer. Para esse autor (apud

HERNÁNDEZ, 2006), a condição da imagem na pós-modernidade, devido à

circulação global é mais que um problema local.

A noção de Cultura Visual, dentro do enfoque de Hernández (2000) define-se

como o conjunto de valores, crenças e significados que as crianças e adolescentes

em geral, mesmo sem o reconhecer, utilizam para dar sentido às coisas vividas em

seu mundo. Esta noção de cultura está relacionada a visualidade que torna possível

modelar comportamentos e identidades: vídeo games, filmes, desenhos animados,

revistas, propagandas e outras formas possíveis.

No campo da Cultura Visual, “é possível organizar [...] propostas

transdisciplinares, a partir de problemas que vão além de uma disciplina e que são

reflexos das mudanças” que se produzem na sociedade. (HERNÁNDEZ, 2000, p. ix).

Essas propostas sobretudo, permitem interpretar e construir experiências educativas

vinculadas às representações que as crianças e adolescentes constroem de si e do

meio e que são influenciadas pela indústria do consumo, relacionando a construção

do conhecimento com a sociedade da informação e a comunicação com o que se

aprende na escola.

Na obra Cultura Visual, Mudança Educativa e Projetos de Trabalho (2000),

Hernández faz uma crítica a algumas práticas utilizadas pelos professores que usam

obras de arte apenas para ensinar elementos da linguagem visual. Algumas dessas

formas de ensino, denominadas por Hernández de racionalidade eclética, encaram

alunos apenas como consumidores de imagens. Na opinião desse autor, dizer que

63

estamos na cultura da imagem mas ensinar com estratégias dos anos 20 ou 60 é

uma contradição que reduz o conhecimento a fragmentos disciplinares.

Cada concepção de ensino da Arte, segundo Hernández (2000), tem uma

forma de argumento utilizada para justificar sua presença no currículo, denominada

por ele de “racionalidade”. Conforme esse autor, existem as racionalidades:

industrial, histórica, forasteira, moral, expressiva, cognitiva, criativa, comunicativa,

interdisciplinar e a racionalidade cultural.

Cabe lembrar dentro deste tópico que, para Hernández (2000, p. 45), "a

racionalidade cultural considera que a arte é uma manifestação cultural e que os

artistas realizam representações mediadoras de significados em cada época e

cultura.” Conforme assinala, essa forma de racionalidade coloca-se diante da

“racionalidade comunicativa” – concepção que considera importante que os alunos

aprendam a ler e produzir imagens, pelo fato de que vivemos uma cultura dominada

pela imagem. Nesta abordagem, conceitos da semiótica e da linguagem formal são

os fundamentos.

A racionalidade cultural, segundo Hernández (2000, p. 46), se encontra

também presente nos Parâmetros Curriculares Nacionais Brasileiros em que

consideram o “‘objeto artístico’ como produção cultural”, tendência que participa das

revisões sobre o status da arte e o papel que exercem as imagens na construção

das representações sociais na pós-modernidade.

Conforme Hernández (2000), a concepção de educação baseada na

percepção de imagens31 enfatiza as propriedades visuais da obra ou das imagens e

são propostas que em geral, tendem a considerar as propriedades visuais da obra

de arte, como universais, estáveis e únicas. Centrar-se na percepção, para

Hernández (2000, p. 46), “significa estabelecer uma clara distinção entre as

qualidades estéticas” e outras características não visíveis na obra.

Essa concepção da arte, baseada no comportamento perceptivo, conforme

Parsons (apud HERNÁNDEZ, 2000, p. 46), surgiu de uma “confluência de idéias,

correntes e propostas que afetam diversos campos de conhecimento” e que coincide 31 A educação baseada na percepção das imagens é o eixo que segundo Hernández (2000, p. 46), “articula os conteúdos do Programa Curricular Espanhol.” Os PCNs/1997-98 brasileiros, embora enfatizem a importância para a compreensão das diferentes culturas, interpretação e contextualização, também dão igual importância à linguagem visual e a percepção. No volume 6 - Arte, dedicado à 1ª a 4ª e os PCNs de 5ª a 8ª séries (1998, p. 64) destacam que “o desenvolvimento do aluno nas linguagens visuais requer, então, a aprendizagem de técnicas, procedimentos, informações sobre história da arte, artistas e sobre as relações culturais e sociais envolvidas na experiência de fazer e apreciar arte.”

64

com o interesse pela chamada “revolução cognitiva”, promovido pelas teorias de

desenvolvimento de Piaget, com as correntes formalistas da arte.

Os fundamentos dessa concepção, de acordo com Hernández (2000), têm

por base, as idéias modernas sobre arte que propunham a necessidade de explorar

o meio visual reduzindo-o a suas características formais32.

2.2.1.1 A educação para a compreensão crítica da Cultura Visual

Diante dessa última concepção, surge a necessidade da educação para a

compreensão da Cultura Visual. Para Bruner (1991, apud HERNÁNDEZ, 2000) esta

tendência se define “como de volta ao significado”, preocupando-se mais com a

interpretação do discurso e menos com as regras da linguagem. Centra-se na

compreensão dos fenômenos artísticos, não apenas dos que favorecem uma

experiência estética, dirigindo-se mais para a interpretação do que para a

percepção, enfatizando o contexto como eixo principal.

Essa tendência, de acordo com Hernández (2000), reivindica a interpretação

como conteúdo central para as propostas em arte-educação. Nesse enfoque, a

interpretação une e vincula dois processos: o visual e o verbal. O que se pretende é

estabelecer relações e conexões entre as produções culturais e a compreensão das

representações que qualquer pessoa ou grupo cultural elabora.

Para Hernández (2000, p. 49), trata-se de ir além de “o quê” são as coisas e

“começar-se a estabelecer os ‘porquês’ dessas representações, aquilo que mostram

e o que excluem” e os valores que consagram.

No processo para a compreensão, segundo Parsons (apud HERNÁNDEZ,

2000), a linguagem ocupa o papel de mediadora e estabelece marcos de

compreensão, por meio de comparação, geração e interpretação de significados

sobre meios verbais e visuais. Palavras e imagens interagem produzindo contextos

de interpretação e redes de múltiplos significados.

Conforme Franz (2003a, p. 129), há um deslocamento da preocupação com

as regras da linguagem para a interpretação do discurso. Segundo essa autora, “a

32 O crítico de arte Clemente Greemberg teve grande influência na divulgação dessa corrente, como mentor do movimento abstrato (HERNÁNDEZ, 2000).

65

compreensão toma o lugar da experiência estética e supõe relacionar a biografia de

cada um com os artefatos visuais, com os objetos artísticos.” Este deslocamento,

para Franz (2003a), é o que possibilita expandir o conhecimento base dos alunos, e

desenvolver estratégias para que continuem aprendendo, favorecendo também uma

atitude reconstrutiva ao promover uma autoconsciência da própria experiência em

relação à obra ou imagem.

Para Hernández (2000), esse enfoque exige especial atenção em como os

alunos (ou outras pessoas) modificam, ou levam adiante, suas compreensões sobre

o significado das obras e representações visuais em estudo. Esse caminho oferece

alternativas para que os alunos aprendam a “avaliar, selecionar e interpretar a

avalanche de informações que recebem todos os dias.” (HERNÁNDEZ, 2000, p. 50).

Na proposta da educação para a compreensão crítica da Cultura Visual, o

objeto de estudo são as diferentes manifestações da Cultura Visual e não apenas

objetos considerados canônicos, mas também aqueles produzidos no presente e no

passado, bem como os que estão vinculados à própria cultura e às de outrem.

A proposta da compreensão crítica da Cultura Visual significa, em primeiro

lugar, reconhecer que convivemos com uma imensa variedade de imagens; em

segundo, aproximar-se dos objetos visuais, deixando de lado as crenças sobre os

valores estéticos determinados como universais. Essa postura ajuda a entender

como certas representações contribuem para fixar visões sobre a realidade e as

identidades.

Prestar atenção à compreensão da cultura visual implica aproximar-se de todas as imagens (sem os limites demarcados pelos critérios de um gosto mais ou menos oficializado) e estudar a capacidade de todas as culturas para produzi-las no passado e no presente com a finalidade de conhecer seus significados e como afetam nossas ‘visões’ sobre nós mesmos e sobre o universo visual em que estamos imersos. (HERNÁNDEZ, 2000, p. 51).

Esse olhar sobre os objetos envolve considerar a arte como um fenômeno

complexo e também levar em conta sua história, localizando seu contexto de origem

e sobretudo que a arte atua como um mediador cultural.

O significado da função mediadora da arte, na teoria de Hernández (2000, p.

52), é derivado da idéia de Vygostsky que “pressupõe que o ‘signo é possuidor de

significado’.”

66

Hernández considera que a arte, os objetos e os meios da Cultura Visual,

contribuem para que os indivíduos fixem suas representações sobre si, sobre o

mundo e sobe seus modos de pensar. A cultura

cumpre a função de manufaturar as experiências dos seres humanos mediante a produção de significados visuais, sonoros, estéticos [...]. Esses significados [...] contribuem para a construção da consciência individual e social pela incorporação dos índices visuais com valor simbólico produzidos por grupos diferentes [...] nos processos de intercâmbio social. (HERNÁNDEZ, 2000, p. 52).

Hernández enfatiza que a Cultura Visual, os objetos e a arte não existem

independentes de um meio em que os seres humanos se valem dos significados

para construir sua subjetividade e sua vida mental. A construção da identidade é

modelada segundo a maneira pela qual os indivíduos fazem uso dos significados e

recursos encontrados em seu ambiente sociocultural.

“Os signos e símbolos são o veículo de significado e ocupam um papel na

vida da sociedade”; é ela quem lhes dá vida. (HERNÁNDEZ, 2000, p. 53). Para esse

autor, isso implica a construção e a desconstrução dos sistemas simbólicos

mediante os quais os indivíduos e grupos dotam de sentido as coisas ou os fatos em

seu entorno. Assim, para Hernández (2000) e Franz (2003a), os estudos da arte e

da Cultura Visual não devem ser realizados tanto como signos cujos significados

devem ser identificados, mas de considerar a arte ou os artefatos como formas de

pensamento, ou como um idioma que deva ser interpretado, a fim de encontrar o

significado das coisas a partir da vida que os rodeia.

Hernández (2000, p. 53) argumenta ainda que “a variedade das expressões

artísticas corresponde à variedade de concepções que os indivíduos têm sobre o

que são as coisas” o que o leva a dizer que as obras artísticas e os elementos da

Cultura Visual são, portanto, objetos que levam a refletir sobre as formas de

pensamento que as geraram. Estudar uma manifestação artística de outra época ou

outra cultura, nessa perspectiva supõe uma compreensão mais profunda do que

permanecer ligado somente ao visual. Para Geertz (1997, apud HERNÁNDEZ, 2000,

p. 53), a cultura “seria a construção e participação dos indivíduos num sistema geral

de formas simbólicas, e o que denominamos arte seria uma parte dessa cultura.” Os

conceitos de Geertz levam esse autor a considerar que

67

a arte e a cultura visual atuam como mediadores de significados; o significado pode ser interpretado e construído; os objetos artísticos se produzem num contexto de relação entre quem os realiza e o mundo; os artefatos visuais podem informar àqueles que os vêem sobre eles mesmos e sobre temas relevantes sobre o mundo. (HERNÁNDEZ, 2000, p. 54).

Para ele, a elaboração da realidade não é somente um processo individual.

As inserções do indivíduo em categorias sociais e culturais e grupos distintos

incidem na elaboração da realidade tanto individual como a elaboração da realidade

pelos grupos, que compartilham as mesmas visões e interpretações dos

acontecimentos, que têm a ver com as compreensões relacionadas à Cultura Visual.

Nas pesquisas sobre a compreensão, a psicologia construtivista, segundo

Hernández (2000, p. 54), trata-se de

compreender as funções mentais de ordem superior em termos de processo de construção simbólica (Bruner, 1991; Prawat, 1993). Essas funções desempenham um papel estratégico na forma como a mente se relaciona com a informação e em como, mediante processos de interação social, vai transformando-a em conhecimento pessoal. (KOROSCIK, 1992; EFLAND, 1993, 1996).

Vygotsky inspira essa abordagem que, segundo o autor citado, destaca o

papel das relações sociais no desenvolvimento das atividades mentais complexas, e

também da internalização, transferência e a zona de desenvolvimento proximal nos

processos da construção do conhecimento.

Seguindo essa proposição, na educação para a compreensão, a

aprendizagem tem por objetivo estabelecer processos de inferência e transferência

entre os conhecimentos já adquiridos e novos problemas ou situações colocados

para quem aprende. Boix Mansilla (apud HERNÁNDEZ, 2000, p. 55) destaca que um

dos objetivos da educação para a compreensão “é que os estudantes sejam

capazes de transferir o que aprendem para outras situações e problemas.” Conforme

Prawat (apud HERNÁNDEZ, 2000), a capacidade de transferência está ligada a dois

fatores: à organização mental do conhecimento e ao nível de autoconsciência que o

sujeito possui de seu próprio conhecimento.

Na perspectiva de Hernández (apud FRANZ, 2003a, p.135), as imagens

devem ser abordadas “de maneira interdisciplinar, baseando-se nas características

evolutivas dos estudantes, estabelecendo conexões interculturais e partindo de uma

posição crítica social.” As relações entre os saberes (interdisciplinaridade) favorecem

o desenvolvimento de um conhecimento crítico e a realização de produções “nos

68

quais esse conhecimento se projete em novas produções simbólicas”.

(HERNÁNDEZ, 2000, p. 56).

Esse mesmo autor questiona o currículo organizado em compartimentos que

exclui outras formas de saber, e assinala a necessidade de propostas

interdisciplinares que possam ir além de conteúdos considerados como estáveis e

universais. O objetivo principal da proposta da Cultura Visual é promover a educação

para a compreensão crítica, com base no pensamento do visual como mediador de

significados e na interpretação como meio para favorecer o conhecimento.

Segundo Franz (2003a), a compreensão crítica da arte na perspectiva da

Cultura Visual exige o domínio de diferentes âmbitos que transpassam as disciplinas

escolares e vão além, em direção ao universo pessoal e social dos estudantes. Para

compreender a arte, segundo essa autora, é necessário uma profunda imersão no

contexto sociocultural da obra de arte ou da imagem em estudo. Mas isso por si só

não basta. Conforme Franz (2003a), educar para a compreensão crítica da arte

exige conhecimentos relacionados a como se ensina e como se aprende,

denominado âmbito pedagógico. Para Franz (2003a), é necessário saber relacionar

conhecimentos de caráter histórico, estético, artístico e antropológico com a vida

social e pessoal dos educandos, fazendo como quer o ensino da pós-modernidade,

de modo reflexivo e crítico. Segundo essa autora, esta é uma maneira de abordar

conhecimentos em Artes Visuais que não passa pela simples identificação de

elementos da linguagem visual e do essencialismo estético.

Franz (2003a), assinala que esse processo nos situa na teoria crítica, à

medida que acontece uma tomada de consciência de cada um para construir a

relação entre sua própria identidade e as representações sobre o mundo. Essa

atitude favorece a auto-reflexão sobre os processos de influências, sobre si e sobre

o meio.

Educar para a compreensão crítica das imagens, segundo Hernández (2000),

supõe que os estudantes adquiram as destrezas que lhes permitam ir além do

mundo tal como estão acostumados a percebê-lo. À medida que o refazemos e o

renomeamos, damos-lhe novo sentido. A interpretação tem papel fundamental nesse

processo, participando de um diálogo que permite a construção do conhecimento

por meio de ações e comentários. Facilita-se “a aprendizagem a partir do

estabelecimento de relações entre imagens e seus contextos de produção”.

(HERNÁNDEZ, in FRANZ, 2003a, p. 11).

69

Esses autores enfatizam a importância da problematização na educação para

a compreensão. Ensinar a fazer perguntas é uma estratégia para favorecer a

compreensão dos processos e significados da Cultura Visual. Mas, para isso,

segundo Hernández (2000, p. 50), é necessário que elas estejam vinculadas a uma

"reflexão crítica sobre as diferentes tradições históricas, filosóficas e culturais que

serviram de guia para construir ‘representações’ mediadoras de significados em

diferentes momentos e lugares” da história.

O “Ensino para a Compreensão”, segundo Franz (2003a), teve entre seus

principais investigadores, Perkins, Gardner e Victor Perrone. Esses pesquisadores

partiram das idéias de Dewey, segundo o qual estabelecer relações é fundamental

para o processo do conhecimento. Dewey reivindicava uma educação que

integrasse conteúdos escolares com a vida cotidiana e via na educação um caminho

de crescimento e desenvolvimento autônomos. Considerava a experiência como

conhecimento. Bruner, herdeiro de suas idéias, segundo Wiske (apud FRANZ,2003a

p.161), “propunha uma aproximação à aprendizagem reflexiva que estabelecesse

conexões sólidas com a vida das crianças.” A educação pós-moderna retoma esses

conceitos e amplia a noção de experiência.

Conforme Franz (2003a, p. 162), nem sempre conseguimos fazer com que os

alunos atinjam um nível desejável de compreensão “apenas estudando a imagem

em si.” De acordo com essa pesquisadora, ensinar a fazer perguntas e a

problematizar em torno de uma questão em estudo é o caminho que leva à

compreensão das obras. Para Franz (2003a), ensinar a fazer perguntas sobre obras

e imagens da cultura visual é uma maneira de introduzir os alunos em investigações

críticas, examinar e aprender a observar atentamente. Esse processo os leva a

refletir e a interpretar de modo mais profundo e significativo.

2.2.2 A Pedagogia Crítica da Arte

Denominada também por “nova sociologia da educação” ou “teoria crítica da

educação”, segundo McLaren (1997), a Pedagogia Crítica teve origem na Escola de

Frankfurt de Teoria Crítica, iniciada antes da Segunda Guerra Mundial, na

Alemanha. Nos Estados Unidos, essa escola atualmente segue com novas

70

pesquisas sociais e vem influenciando inúmeras disciplinas, “tais como a crítica

literária, a antropologia, a sociologia e a teoria educacional.” (McLAREN, 1997, p.

191). Conforme esse autor, a Pedagogia Crítica vem conquistando novos avanços

na teoria social e desenvolvendo novas categorias de investigação e metodologias.

Para Santaella (2002), a teoria crítica criou o conceito de indústria cultural, e

essa é uma das suas questões originárias. Conforme essa autora, os filósofos da

escola de Frankfurt criaram em meados dos anos 40 este conceito, desmistificando

a idéia acalentada pela sociologia funcionalista, das mídias como ferramentas da

democracia moderna.

Na educação, segundo McLaren (1997), a Pedagogia Crítica examina a

escola em seus contextos históricos, considerando que são “parte do tecido social e

político existente que caracteriza a sociedade dominante” (MCLAREN 1997, p. 191),

contrapondo-se às análises positivistas, não históricas e despolitizadas. Investiga e

desafia o poder que a escola representa em nossa vida política e cultural.

Os teóricos educacionais críticos consideram as escolas não apenas como

locais de instrução, mas também locais onde coexistem uma heterogeneidade de

formas ideológicas e sociais que estão em incessante luta pelo poder (McLAREN,

1997). No enfoque crítico, a escolarização é uma forma de política cultural e é

sempre uma forma de introdução, preparação e legitimação de formas particulares

da vida social. A Pedagogia Crítica é revolucionária e fundamentalmente aberta a

mudanças, e um de seus objetivos principais é fortalecer as minorias e transformar

desigualdades e injustiças sociais (McLAREN, 1997; CARY, 1998; FREIRE, 1979,

1997; GIROUX, 1997, 2003; POLLOCK, 2003).

No pensamento de McLaren (1997), a escola deve trazer a vida de fora para

dentro dela, com toda a sua dinâmica e suas contradições, no sentido de considerar

suas dimensões econômicas de classe, relações de poder e gênero. As teorias de

McLaren (1997) são, em grande parte, influenciadas pelo teórico Henry Giroux. Este

e Paulo Freire, são teóricos que têm grande importância para a Pedagogia Crítica.

Giroux (1997, 2003) contribui para a Pedagogia Crítica com sua crítica ao

sistema educacional e cultural influenciado pelas indústrias culturais norte-

americanas. Para Paulo Freire (1979, 1997), frente às alienações culturais vividas

pela sociedade, o profissional de educação deve estar engajado em promover a

ação e a reflexão críticas. Paulo Freire (1979, 1997) acredita na educação para o

desenvolvimento da consciência crítica como instrumento de transformação. Esse

71

desenvolvimento somente se faz mediante um processo educativo, do qual o aluno

deve participar ativamente. Um dos saberes fundamentais para a prática educativa

crítica, na opinião de Paulo Freire (1997, p. 99) é o despertar da “necessária

promoção da curiosidade espontânea para a curiosidade epistemológica.” Inspirado

em Paulo Freire, Giroux (1997, 2003) dedica-se a questões relacionadas à

escolarização, práticas pedagógicas e à cultura das mídias.

Giroux (1997) afirma que existem formas de regulação, nas práticas

pedagógicas que estão relacionadas com tecnologias de poder, as quais não estão

interessadas na aprendizagem para o desenvolvimento da consciência crítica.

Independente disso, para esse autor, as escolas não são neutras. Nos modelos

pedagógicos há sempre “forças que trabalham ativamente para produzir

subjetividades que, consciente ou inconscientemente, manifestam um <<sentido>>

particular de mundo.” (GIROUX, 1997, p. 137, tradução nossa).

Dentre as práticas que Giroux (1997) analisa, ele destaca aquelas que são

caracterizadas por um discurso que chama de gestão e controle. Nesses modelos

pedagógicos, há uma visão de cultura e conhecimento que são tratados como

“pacotes modelo,” e os estudantes devem dominar habilidades e formas de

conhecimento. Mas não se menciona a eles, como se relaciona o currículo com os

interesses que representa. Nessa perspectiva, os estudantes constituem um corpo

unitário. O corpo de conhecimentos é distribuído igualmente, independente das

diferenças ou interesses. Esses modelos em geral, segundo Giroux (1997) não

contribuem para uma boa relação entre professores e alunos.

A cultura popular, de acordo com esse autor (2003), por intermédio das

mídias e das novas tecnologias, age como máquina de ensinar, sobre o modo como

se definem as identidades, bem como define o significado da infância e outras

convenções sociais. Grande parte do que as crianças e os adolescentes aprendem

hoje em dia é apresentado pelas elites empresariais. A indústria da propaganda e a

cultura das mídias, basicamente, visam ensinar crianças e adolescentes a serem

consumidores. Sobre o mundo Disney, o autor comenta que

a máquina da fantasia comercial da Disney utiliza a inocência como uma imagem representacional para infantilizar os próprios adultos aos quais ela é dirigida. O apelo à fantasia no mundo perfeitamente desenhado da Disney funciona para incapacitar a imaginação em vez de liberá-la. (GIROUX, 2003, p.130).

72

Giroux (2003) explica que na paisagem perfeita da Disney, “o pessoal” e o

“empresarial” se misturam propositalmente. Evitando e aliviando adultos e crianças

de terem que fazer suas próprias escolhas, o mundo Disney edita para eles os

conflitos, a política e as contradições. “Dentro desse contexto, o protagonismo crítico

é substituído pelo planejamento empresarial.” (GIROUX, 2003, p. 130). Com

freqüência, por meio dessa pedagogia pública o consumo se transforma em

única forma de cidadania a ser oferecida às crianças, e a democracia é privatizada por uma ênfase no individualismo egoísta, nos baixos níveis de participação na vida política e numa diminuição da importância das esferas públicas não-mercantilizadas. (GIROUX, 2003, p. 132).

Para Giroux (2003), as pessoas fazem mediações e conferem diferentes

significados ao que vêem, compram, vestem e consomem. Mas para que não fiquem

apenas no “reconhecimento”, o autor assinala que é importante uma pedagogia que

desafie os diversos significados e versões de senso comum que os estudantes e

outras pessoas trazem sobre a cultura em suas diferentes manifestações.

Na análise que Giroux (1997, p. 140) faz das práticas pedagógicas que não

despertam interesse nos alunos e reproduzem um sistema que alimenta a violência

no espaço escolar, um dos motivos para o insucesso destas práticas, também está

no fato de que “mostram escassa relação com o cotidiano e a realidade dos alunos”.

Esta é uma das razões que, para Hernández (1998, p. 51), traz a necessidade

de elaborar estratégias “para explorar as diferentes parcelas da realidade e da

experiência dos próprios alunos” e para que aprendam a relacionar os saberes

escolares com outras situações.

Para Hernández (2000, p. 61), das novas correntes didáticas que surgiram

principalmente a partir do começo da década de 1980, “foi a ‘perspectiva crítica’ a

que trouxe ‘novas preocupações sobre o ‘quê’ e o ‘para quê’ da educação’.”

Para saber como a Pedagogia Crítica vem ganhando corpo, no entanto, é

preciso voltar aos anos 60. Como recorda Tomaz Silva (2003), essa foi uma década

de grandes transformações no mundo e na cultura. Foi a partir daí que a Pedagogia

foi se consolidando na educação. Segundo esse autor, nessa época aconteceram: o

movimento de independência das antigas colônias européias, os protestos

estudantis na França, o movimento dos direitos civis nos Estados Unidos, os

protestos contra a guerra do Vietnã, os movimentos da contracultura, o movimento

73

feminista, a liberação sexual, as lutas contra a ditadura militar no Brasil e outros. Não

por coincidência, também foi nessa década que se colocou em xeque a estrutura da

educação tradicional.

Como vimos anteriormente,33 Efland (2003, 2005) é de opinião que essas

transformações na sociedade e na cultura, ligadas à crítica cultural pós-moderna em

resposta ao modernismo, é que propiciaram o nascimento da Pedagogia Crítica.

Diante dessas transformações, Efland (2005) assinala que a Pedagogia Crítica

assume formas como o feminismo, multiculturalismo e outras que buscam por uma

educação mais democrática.

Com freqüência, a Pedagogia Crítica “questiona as suposições e premissas

do modernismo.” (EFLAND 2005, p. 175). A crítica pós-modernista às questões da

modernidade tem conseqüências enormes e polêmicas para o ensino de Arte.

O pós-modernismo, de acordo com Cary (1998), no ensino de Arte, surgiu

como paradigma no qual o conhecimento é subjetivo e socialmente construído. Em

sintonia com o paradigma pós-modernista, a Pedagogia Crítica da Arte “aceita a

realidade e o conhecimento como construções sociais [e] reconhece a relação entre

poder e conhecimento e aqui, entre poder e valor artístico.” (CARY, 1998, p. 337-

338). A Pedagogia Crítica da Arte, entende que “a arte opera dentro de um contexto

social e deve estar comprometida [...] com essa ligação ao invés de seguir o mito

modernista da arte independente auto-referente; isolada do mundo, da história e das

interações humanas.” (CARY, 1998, p. 326).

Cary (1998) assinala, que a arte pós-moderna e a Pedagogia Crítica, fazem

parte de uma ecologia sociocultural, na qual a conectividade tem um papel

fundamental. Na sociedade contemporânea, a troca e a informação se fazem de

maneira interconectada e estão em contínua renovação. Para Franz (2004),

decorrente da globalização, na qual o cruzamento local e global é praticado no dia-a-

dia, também surgem conflitos de tentativas de diálogo. Tais problemas são levados

em conta no movimento para a reconstrução social e a educação pós-modernista,

que, segundo Franz (2004, p. 2), deve estar conectada com o resto da vida, mas

“sem limites entre a arte e seu contexto social de origem”, enfatizando a habilidade

de compreensão e interpretação críticas da arte como principal resultado de ensino.

Princípio que para Efland (apud FRANZ, 2004, p. 3) “é válido tanto para a arte

33 Item 2.1.2 – Arte-educação na pós-modernidade.

74

erudita quanto para as tendências e impactos da cultura popular e da arte do

cotidiano.”

Para a Pedagogia Crítica da Arte, como recorda Cary (1998), é fundamental

abraçar o mundo da arte contemporânea, explorar e entender o pós-modernismo

como um paradigma cultural e como um movimento da arte associado ao ensino da

Arte. A Pedagogia Crítica, visa entender as limitações modernistas que

desvalorizavam e separavam o ensino da Arte do mundo social. Esta separação é

um dos questionamentos pelos quais passam as mudanças reivindicadas pela

Pedagogia Crítica da Arte. Na opinião de Cary (1998) o fato de o ensino da Arte

manter-se centrado em idéias modernistas e dissociado do mundo social é motivo

para que esse ensino não seja considerado como uma das principais disciplinas. A

Pedagogia Crítica não vê quase nada na arte e no ensino de Arte, “sem estabelecer

vínculos com os discursos sociais, políticos e ideológicos do mundo da arte

contemporânea” (CARY, 1998, p. 336) e considera que as pessoas criam significados

mediante a esfera social.

2.2.2.1 As teorias feministas e as abordagens socioculturais

A Pedagogia Crítica e as teorias feministas, coincidem na consideração de

que as mídias exercem um papel fundamental na criação de significados,

comportamentos e práticas sociais. Nessa perspectiva, as HQs são vistas como um

fenômeno sociocultural.

As teorias feministas têm interesse para as questões socioculturais da arte

porque estão relacionadas ao estudo da problemática da diferença nas artes e da

formação do pensamento patriarcal e falocêntrico na história. Por conseqüência, têm

importância para esta pesquisa, que se realiza com base na Pedagogia Crítica e na

Cultura Visual. Contudo, por encontrarmos poucos teóricos que tratam da relação

arte e gênero, aborda-se aqui principalmente as teorias de Pollock (2003) para fins

de introdução nesta problemática, que por sua relevância mereceria estudos mais

aprofundados.

Conforme Pollock (2003), no modernismo, legendas canônicas da criatividade

masculino-ocidental tornaram-se sinônimos de arte, pura e simplesmente. Na

75

história dos quadrinhos uma linha de pensamento próxima inclui questões ainda

mais polêmicas. Segundo Quella-Quyot (1994, p. 107) “entre a falta de mulheres e o

excesso de sexualidade, a HQ nem sempre conseguiu encontrar o equilíbrio” e, por

isso, os quadrinhos foram rejeitados por muitos educadores e feministas. E, apesar

de o número de artistas femininas autoras de HQs ter aumentado, ainda hoje,

constituem-se em minoria.

Nos histórias em quadrinhos, jargões e cânones muitas vezes se repetem. Ao

abordar as imagens, estas teorias sugerem examinar os pensamentos artísticos que

mascaram interesses raciais, classistas e que promovem diferenças hierárquicas

entre os gêneros, questionando os significados de símbolos e signos, lembrando

que são produtos da sociedade. Diante da fragmentação que apresentavam os

estudos da modernidade, na educação pós-moderna, Freedman (2001) sugere

também incluir considerações e explicações das razões pelas quais os historiadores

da arte se interessaram no passado por determinados artistas e objetos. A partir daí,

os estudantes podem desenvolver métodos de crítica que lhes sejam úteis para

interpretar.

A História da Arte, segundo Griselda Pollock (2003), esconde uma tradição

seletiva, uma versão canônica como História da Arte única. Para essa autora, as

questões sobre as mulheres nas artes são assuntos que necessitam ser explorados,

dada a formação dos discursos configurados sob leis fálicas. A pluralização das

histórias da arte é significativa porque pode promover uma abertura do campo além

da interpretação histórica tradicional e seletiva.

O conhecimento dá formas nas relações de poder e está impregnado de

interesses políticos, ideológicos e psicológicos. Por esta razão, Pollock (2003) é de

opinião que a necessidade de investigações ao redor da globalização e das

diferenças culturais é inquestionável. Os discursos privilegiados da arte têm servido

a finalidades simbólicas, que disseminam conceitos de eurocentrismo e supremacia

masculina. A História da Arte que estabeleceu legendas canônicas de criatividade

cristã masculina ocidental e se tornou sinônimo de arte, segundo Pollock (2003), é

uma versão do passado que serve para consolidar o gênero como uma linha central

do poder, de um lado, e de outro, serve como marca de exclusão e desvalorização,

ignorando a arte de quase todas as mulheres que participam de atividades criativas.

O trabalho da teoria feminista não é somente a restituição de artistas

mulheres às histórias oficiais da arte, mas também de incluir outras contribuições e

76

reconhecer o significado das diferenças sexuais e outros jogos sociais –

econômicos, ideológicos, semióticos e psicológicos.

Apesar da pressão de teóricos mais novos para tentar suprimir ou ridicularizar

as intervenções feministas na História, segundo Pollock (2003, p. xxii), o

pensamento e as teorias de “Einstein, Saussure, Freud, Lévi-Strauss, Barthes,

Derrida, Lacan, Lyotard, Adorno, Benjamin, Klein, Arendt, Merleau-Ponty, Foucault,

Bal” permitiram uma abertura para as intervenções feministas e transformações no

campo da prática artística e domínio estético.

Para Swain (2001), que pesquisa as representações sociais nas revistas,

algumas transformações ocorreram em diversos setores da sociedade, graças aos

movimentos feministas. No entanto, segundo Faludi34 (apud SWAIN, 2001, p. 13),

essas mudanças têm visto seu grau de dinamismo e alcance de mudanças reduzido

“ou mesmo regredido na medida em que as transformações não atingem as

representações de gênero que constituem os corpos humanos em modelos de ser.”

As pesquisas realizadas por Swain (2001, p. 14) levam-na a dizer que o

discurso das mídias “em seu dialogismo com o rumor social decreta o fim do

feminismo, o campo conotativo do que é dito e do dizível indica a recuperação e/ou

atualização de representações binárias excludentes e hierarquizadas sob novas

roupagens.” Todavia mulheres e homens continuam a ocupar lugares demarcados

tradicionalmente, segundo suas “naturezas” – as mesmas “naturezas”

desconstruídas pelo feminismo contemporâneo.

Pollock (2003) assinala que o desafio feminista não se limita ao trabalho

histórico da arte, e os deslocamentos ocorrem em todas as práticas acadêmicas.

Segundo essa autora, os interesses de gênero não revelados dos historiadores da

arte são apenas um ponto de partida inicial para essas teorias, que na realidade

reivindicam um deslocamento mais profundo na recognição, na auto-transformação

e na culturalidade. A finalidade é provocar um deslocamento de muitas bases de

nossos pensamentos e sistemas de conhecimento para um reconhecimento polido

mas político do poder, do eurocentrismo ou universalização falocêntrica

heteronormativa, que exclui todo aquele que não seja branco, cristão e europeu.

Como explica essa autora, as intervenções feministas nas artes são uma redefinição

dos objetos que estudamos e das teorias e métodos com os quais lemos as práticas

34 FALUDI, S. Backlash. La guerre froide contre les femmes . Paris: Des femmes, 1991.

77

artísticas/culturais, de maneira que possamos examinar seu lugar na esfera

ampliada das artes e das humanidades.

Conforme Pollock (2003), a História da Arte confina a arte aos museus e aos

colecionadores. Em geral, curadores evitam o confronto com as intervenções

feministas ou a sexualidade e as classes culturais comuns e outras diferenças, com

o artista herói – a idealização do eu masculino. As teorias feministas demonstram

que é necessário intervir e reposicionar os estudos das Artes Visuais, sugerindo que

estes sejam configurados complexamente mediante um duplo eixo da História e sua

localização sociocultural. “Os cânones”, argumenta Pollock (2003, p. xxx), “têm sido

mantidos no lugar, não por preconceito ou por ignorância [...] mas por uma estrutura

psico-fantasmática mais profunda do desejo e narcisismo masculino”, que

contribuem para a produção e perpetualização de uma hierarquização de gênero.

Na opinião dessa autora, devemos sair dessa infância intelectual para poder

estudar a arte e os artistas de maneira não mítica, reconhecendo a diversidade das

culturas e desejando o conhecimento de grupos diferentes resistindo a qualquer idéia

de separação ou categorização, a fim de produzir transformações nas percepções e

desejos.

Conforme Said (apud POLLOCK, 2003, p. 1, tradução nossa), “o que nós

aprendemos sobre o mundo e seus povos é modelado ideologicamente em

conformidade com a ordem social dentro da qual é produzida.” Da mesma forma, os

estudos sobre as mulheres têm sido feitos em conformidade com o sistema que

sustenta a dominação masculina. No início, a História da Arte feminista se fez dentro

dos mesmos protocolos, mas logo percebeu-se que isso poderia reproduzir e fixar o

status normativo da arte e dos artistas masculinos, de maneira que a História da Arte

feminista não poderia ficar amarrada às categorias da História da Arte já pré-

estabelecidas. A História da Arte tradicional dá a entender que não existem mulheres

artistas significativas, uma vez que não possuem “a chama inata do gênio (o falo),

que é propriedade natural dos homens.” (POLLOCK, 2003, p. 2).

Para Linda Nochlin (apud POLLOCK, 2003, p. 3), isso demonstra a

necessidade de uma crítica feminista da disciplina

que possa detectar limitações culturais-ideológicas, a fim de revelar não meramente polarizações e inadequações com respeito às questões sobre artistas mulheres, mas na formulação de questões cruciais da disciplina como um todo (tradução nossa).

78

As teorias de Marx, para Pollock (2003), permitem repensar uma análise social

da cultura. Na totalidade das forças sociais, cada força tem suas próprias condições

de existência, mas são distintas das outras no todo. Cada uma é mediada pela outra,

não pode existir sozinha. Na arte, para Marx (apud POLLOCK, 2003, p. 4, tradução

nossa) a produção de um objeto gera e condiciona seus consumos e vice-versa: “[...]

A produção cria não somente um objeto para o sujeito, mas também um sujeito para

o objeto [...].” Isto revela a maneira como somos ensinados a apreciar os artistas, a

qualidade das suas obras e os objetos da arte.

Para Willians (apud POLLOCK, 2003, p. 6) os estudos não devem cair no

engano de que as convenções artísticas sejam ordens separadas de outras

instituições, quer sejam sociais quer políticas. Política, arte, ciência, religião, assim

como a vida são categorias consideradas absolutas, mas que pertencem a um

mundo inteiro e interativo de relações. Diante disso, os estudos da arte sob a

perspectiva das teorias feministas vêem a arte como uma prática social que

compreende a totalidade de muitas relações, nas quais não devem ser suprimidas

relações importantes para que não resultem em estudos parciais e fragmentados.

2.2.2.2 A Antropologia como fundamento das abordagens socioculturais

O campo da Cultura Visual, segundo Hernández (2000) e Franz (2003a,

2004), pode ser fundamentado no conceito de arte de Geertz. Para esse autor, a

arte é um sistema particular de formas simbólicas, porque participa de um sistema

geral chamado cultura, e a teoria da arte é ao mesmo tempo uma teoria da cultura e

não um empreendimento autônomo. Desde que o pensamento pós-modernista

passa a estar associado ao ensino de Artes Visuais, enfatiza-se a importância da

compreensão crítica dos “códigos simbólicos e convenções culturais que circulam

nos contextos de origem da obra.” (FRANZ, 2004, p. 3).

Para entender as questões da arte e da pluralidade cultural consideradas na

Pedagogia Crítica e nos estudos sobre a Cultura Visual, é preciso compreender a

noção de cultura do ponto de vista antropológico. A visão de cultura como civilização

amplamente difundida, conforme Richter (in CORRÊA, 2004), foi construída,

progressivamente, durante o século XIX. Essa idéia de civilização, no início do

79

século XX, era entendida como um processo que deveria ser atingido pelos não-

civilizados. Essa visão etnocêntrica foi revisada e perdeu o sentido na

contemporaneidade, pois passou-se a entender que “as sociedades [...] antes

consideradas como primitivas ou exóticas, também possuíam uma lógica interna,

com outras formas de representação, outras idealidades, outras formas de vida

social.” (RICHTER, in CORRÊA, 2004, p. 142-143). Na opinião de Barbosa (1998) e

Richter (2004), a visão atual sobre outras culturas mostra que há muito que se ver

no universo do outro. O olhar sobre outras culturas pode dizer muito sobre nós

mesmos e enriquecer nossa visão de mundo. Para Richer (in CORRÊA, 2004, p.

143), “a cultura vem sendo entendida como um código simbólico, que possui

dinâmica e coerência internas”, assim como contradições inerentes à sociedade com

a qual se relaciona. Segundo Thomaz Ribeiro (apud RICHTER, 2004, p. 143), a

cultura é um fenômeno que

se refere à capacidade que os seres humanos têm de dar significado às suas ações e ao mundo que as rodeia. [...] é compartilhada pelos indivíduos de um determinado grupo, não se referindo pois a um fenômeno individual; por outro lado, cada grupo de seres humanos, em diferentes épocas e lugares, dá diferentes significados a coisas e passagens da vida aparentemente semelhantes.

Em qualquer sociedade, “a definição de arte, nunca é totalmente intra-

estética; na verdade, na maioria das sociedades ela só é marginalmente intra-

estética.” (GEERTZ, 1997, p. 146). Todavia, como observa esse autor, falar sobre

arte não é uma coisa fácil, e diante do fenômeno estético, seja qual for a forma sob a

qual se apresente, existe a dificuldade de como associá-lo a outras formas de

atividade social ou como incorporá-lo a um modo específico de vida. Essa

incorporação – esse processo de atribuir significado aos objetos da arte, segundo

Geertz (1997), é sempre um processo local. Para ele, assim como os objetivos de

um pintor não estão separados de sua pintura, a arte não está separada do contexto

e das demais expressões humanas e dos modelos de vida a que está conectada.

“Os meios através dos quais a arte se expressa e o sentimento pela vida que os

estimula são inseparáveis.” (GEERTZ, 1997, p. 148). Como Geertz enfatiza, outros

tipos de discurso que derivam de interesses culturais se conectam e se congregam

ao redor da arte, integrando tudo à dinâmica e experiência da vida humana. Não se

80

pode compreender os significados dos objetos estéticos se não os relacionamos

com a vida social.

Silva (2002), que analisa quadrinhos da década de 1980, pode dar-nos um

exemplo radical para compreender a relação que tem um grupo com a vida e a arte

que representa. Para ele, pensar em quadrinhos requer primeiro pensar a respeito

de seu público, e nos tipos de relação social o envolvem. Silva (2002, p. 11) afirma

que as histórias em quadrinhos têm uma relação muito forte com seu público e

trazem consigo uma marca bem forte que é o fato de serem um produto com identidade de cultura de massa. Essa característica traz várias implicações para o seu entendimento, tais como o tipo de relação que mantêm com seu público, seu processo de produção, distribuição, consumo, fruição. É a partir desse parâmetro de cultura de massa que os quadrinhos devem ser compreendidos em nossa sociedade. Mas, por outro lado, compreendê-los nessa perspectiva pode induzir a erro, como o de se generalizar o mesmo tratamento a tipos diferentes de produtos. Apesar de serem cultura de massa, há especificidades que os diferenciam em vários níveis.

Nem sempre as HQs são dirigidas para um grande público indistintamente e

não são consumidas da mesma forma. Elas possuem hoje uma grande diversidade,

e há uma tendência crescente para maior segmentação de seu público, devido à

busca por opções diferenciadas (SILVA, 2002; VERGUEIRO, 2006).

Conforme Silva (2002), alguns quadrinhos nacionais produzidos na década de

1980, eram destinados a um público específico. Não mostravam uma realidade

privilegiada pelas criações tradicionais. Nessa época, observou-se uma proliferação

até então nunca vista no mercado nacional de quadrinhos. Surgiram revistas que

exploravam as idéias da contracultura dos anos 60 ou a ideologia punk dos anos 70.

Conforme esse autor, nesse período, houve uma proliferação de “tribos urbanas”

invadindo os grandes centros urbanos. Concomitantemente ao surgimento de tribos

punk é que nasceram essas revistas.

Na metade dos anos 80, foi criada uma revista chamada “Chiclete com

Banana”, que Silva (2002) analisa. Havia uma afinidade grande entre o público leitor

jovem urbano e essa revista, que o levaram a pesquisar porque havia essa relação.

Silva (2002) observou que, na “Chiclete com Banana” havia uma seção de cartas

através da qual seu autor mantinha uma relação com seu público. “A seção de

cartas foi um mecanismo de sedução através do qual o autor aos poucos foi

delimitando um público e elaborando mensagens para ele.” (SILVA, 2002, p. 13).

Nessa revista surgiram personagens que alcançaram repercussão considerável

81

Figura 9 – Falas do personagem Loki sobre o Capitão América. Imagem da Revista Heróis Renascem Vingadores, n. 1, dez. 1998. Não paginada.

entre essas tribos, mostrando a relação que Geertz (1997) enfatiza entre a

experiência dos diferentes grupos e a arte. “Bob Cuspe é uma personagem punk,

criada por Angeli, que expressava fielmente as idéias da tribo punk.” (SILVA, 2002,

p. 12).

Da mesma forma, as HQs da série Heróis Renascem Vingadores35,

elaboradas por artistas norte-americanos, refletem a cultura e a visão de mundo

desse povo. Analisando as falas dos personagens e suas características, pode-se

perceber a relação entre os conceitos de vida de uma sociedade, o que pensam de

si e de outrem (Figura 9).

Para Geertz (1997), a preocupação estética surge em conseqüência de uma

sensibilidade que participa da totalidade da vida e está relacionada ao próprio

significado das coisas. A formação da sensibilidade está ligada à própria vida social

e à vida coletiva e é tão profunda quanto ela. A conexão entre a arte e a vida

coletiva não está em um plano instrumental e sim em um plano semiótico, que

Geertz chama de estético, por razões teóricas.

Para esse autor, os elementos constitutivos da arte, sinais e símbolos,

materializam uma forma de viver e transpõem um modo específico de pensar para

os objetos, tornando-o visível. Sinais ou elementos simbólicos têm uma “conexão

ideacional – e não mecânica com a sociedade em que se apresentam.” (GEERTZ, 35 Série da Marvel Entertainment Group, publicada sob licença no Brasil pela Editora Abril, de dezembro 1998 a janeiro de 1999.

82

1997, p. 150) e são conceitos que buscam um lugar para si próprio em meio a outros

semelhantes. As representações são visões de mundo e estão relacionadas com a

cultura na qual foram geradas refletindo conceitos subjacentes à vida social.

2.2.3 Introdução à história das histórias em quadrinhos

Antes de falar de histórias em quadrinhos, é importante definir e conhecer um

pouco sobre desenhos de humor. Conforme Carvalho (2006), quem não está

acostumado com eles, confunde facilmente as diferentes formas artísticas de humor

gráfico. Como assinala Quella-Guyot (1994), é muito comum ouvirmos alguém

chamar as histórias em quadrinhos de “gênero”, quando se trata na realidade de um

meio de expressão que permite abordar diversos gêneros reconhecidos, tais como

aventura, humor, ficção, policial e outros.

Para Quella-Guyot (1994, p. 64), a história em quadrinhos é “[...] uma arte

narrativa que sugere o desenrolar de uma ficção por meio de uma sucessão de

imagens fixas (em oposição ao desenho animado) e organizadas em seqüências

(em oposição ao desenho humorístico) [...].” A definição que parece ser a mais

aceita entre os teóricos é a de Will Eisner (1989, p. 5), para quem as histórias em

quadrinhos são uma “Arte Seqüencial [...] um veículo de expressão criativa [...] uma

forma artística e literária que lida com a disposição de figuras ou imagens e palavras

para narrar uma história ou dramatizar uma idéia.”

A caricatura é o desenho que pelo traço e detalhes, acentua ou revela

aspectos caricatos da pessoa ou fato e que mantém as características próximas do

original para que haja referenciais na identificação. Segundo Carvalho (2006), tem

sua origem no século XVIII e inicialmente designava outros desenhos que

exageravam e não apenas pessoas. A charge, para alguns teóricos, nasceu da

caricatura. O termo “vem da palavra francesa [...] traduzida como ‘tensão’, ‘exagero’

ou ‘ataque’.” (CARVALHO, 2006, p. 16). A charge costuma estar ligada aos

costumes de uma época ou região e comunica acontecimentos do dia-a-dia por

intermédio de personagens reconhecíveis localmente. Em geral, satiriza um fato

específico, político ou de conhecimento público, apresentado em um único quadro.

No Brasil, por vezes, a cena é dividida em dois ou mais quadros.

83

O cartum, ou cartoon (termo inglês), como também é chamado, caracteriza-se

por apresentar um humor universal, podendo ser reconhecido por qualquer pessoa

em qualquer lugar do mundo. É usado para expressar críticas políticas, esportivas,

religiosas ou sociais. Diferencia-se das HQs e tiras humorísticas por não ter

personagens fixos. As tiras humorísticas, ao contrário, possuem personagens fixos.

Para Carvalho (2006, p. 19), elas podem ser consideradas a origem das HQs, “pois

estas, afinal, são uma evolução das tiras”, e era desta forma que eram publicadas de

início nos jornais. Aos poucos foram ampliando seu espaço e passaram a ser

produzidas em seqüências mais longas.

Quando surgiram exatamente as histórias em quadrinhos, ou quando foi feita

a primeira HQs, ao certo ninguém sabe. Conforme Carvalho (2006, p. 23), esta é

“uma tarefa difícil e subjetiva.” Segundo esse autor, alguns defendem que a primeira

HQ, foi criada por Ângelo Agostini, um ítalo-brasileiro, em 1869, com a história As

Aventuras de Nhô Quim. Os norte-americanos, por sua vez, afirmam que é seu o

pioneirismo, através da publicação do personagem Yellow Kid nos jornais de Nova

York, por Richard Outcaut, em 1895. Para Quella Guyot (1994, p. 60), “Yellow Kid,

fundou a HQ como arte narrativa de massa.” (Figura 10).

Figura 10 – O pioneiro Yellow Kid. “O Menino Amarelo, que não falava por balões, mas em textos escritos na roupa.” Imagem da Revista Nova Escola, abr. de 199836.

Muito antes disso, no entanto, no Oriente, segundo Carvalho (2006), já se

faziam histórias em quadrinhos, os Mangás, como os japoneses costumam chamar

essa arte, desde o século XVIII. Alguns teóricos vão mais longe e costumam buscar 36 In: SERPA, Dagmar; ALENCAR, Marcelo. As boas lições que aparecem nos gibis. Revista Nova Escola , abr. 1998. Versão on-line. Disponível em: <http://www.ensino.net/novaescola/111_abr 98/html/repcapa.htm>. Acesso em: 25 jul. 2006.

84

as raízes das HQs, na Pré-história e na herança do passado, das artes narrativo-

figurativas, que contribuíram para a evolução da linguagem dos quadrinhos

(LUYTEN, 2000). Em todo o caso, como diz Quella-Guyot (1994, p. 59), “parece bem

indispensável considerar as histórias em imagens do século XIX, como ancestrais

diretas das histórias em quadrinhos.”

Segundo Quella-Guyot (1994), as primeiras histórias em quadrinhos eram

estáticas e o texto era uma simples legenda. Mas na realidade, segundo esse autor,

a relação entre palavras e imagens constitui uma história nada simplista, que

remonta à Antigüidade, quando as primeiras palavras eram figuras estilizadas até as

histórias em imagens – graças às quais se prepara a arte das histórias em

quadrinhos para o século XX. Rodolphe Toffer apresentou, no século XIX, a primeira

combinação interdependente de palavras e imagens, criando uma linguagem

bastante próxima à dos quadrinhos de hoje.

Nas histórias com imagens, segundo Quella-Guyot (1994), na primeira etapa,

o texto supera a imagem, é preponderante e auto-suficiente. Os desenhos apenas

ilustram frases ou situações evocadas, e a imagem não passa de uma concessão

aos analfabetos e às crianças. O texto literário não fazia referência ao desenho. A

imagem por sua vez, servia de explicação ou de descrição.

Aos poucos, o texto consente em dialogar e delegar parte de seu poder ao

desenho. Certas informações passam a ser gráficas, fazendo com que o texto perca

a autonomia. “Melhor que isso, a imagem se encarrega dos detalhes picantes que o

texto não menciona” (QUELLA-GUYOT, 1994, p. 68), fazendo surgir a noção de

complementaridade entre texto e desenho. Ambos passam a manter relações

lúdicas. Deste ponto em diante tornam-se, um para o outro, indissociáveis.

“Legenda, balão e imagem vão doravante guerrear. Nascida na Europa

literária e burguesa em que a arte do discurso tem primazia, a história em

quadrinhos” não passava inicialmente de simples seqüências de imagens

legendadas, com tímidas aparições de onomatopéias e interjeições. (QUELLA-

GUYOT, 1994, p. 68). Mais tarde surgiam textos-comentário que se instalaram nos

cantos dos quadros, tomando parte do espaço reservado ao desenho. Para Quella-

Guyot (1994), essa foi a primeira brecha que levou ao balão.

Os primeiros balões eram tão malfeitos e informes que assustavam e

amedrontavam os educadores, que logo pensaram que as crianças não iriam gostar

de ler. De imediato, as HQs americanas desfizeram os balões e mantiveram o texto

85

abaixo do desenho. Contudo, o texto se incorporaria cada vez mais à margem, e o

uso do balão levaria os autores a encurtarem os textos e a refinarem seus desenhos,

fazendo com que as HQs atingissem plena forma narrativa com um conjunto cada

vez mais eficaz. Para McCloud (2005), o balão de fala constitui, hoje, o ícone

cinestético mais complexo e versátil usado pelas histórias em quadrinhos. Dentro e

fora dele, letras fazem esforço contínuo procurando captar a essência do som.

Nos quadrinhos, os sons são representações exclusivamente visuais.

Segundo Quella-Guyot (1994), como as imagens das HQs são fixas; para

dinamizarem as imagens, os artistas contemporâneos criaram ideogramas para dar

vida às imagens estáticas. Os ideogramas surgiram para conferir a visualização do

som e do movimento, aos quais se acrescentou a função de dar vida às

representações psicológicas dos personagens. A sonorização das HQs, hoje, não se

limita a falas e comentários, mas inclui os ruídos da vida e os “sons selvagens”. Por

magia da palavra escrita ou desenhada – mostram a imagem do som. A economia

de meios é inversamente proporcional às informações fornecidas. Para Quella-Guyot

(1994, p. 87), “a reificação do som misturada à realidade desenhada é uma audácia

que é justo reconhecer à HQ.”

Entre os anos 1965 e 1990, as histórias em quadrinhos “se esforçaram por

alcançar um sério conteúdo literário.” (WILL EISNER, 1998, p. 4, tradução nossa).

Essa tendência começou com o movimento underground, e sua continuidade deu

início a uma grande variedade, ampliando o espectro de leitores. O que, para Will

Eisner (1998), significou o amadurecimento do meio. Nesse caminho, segundo esse

autor, as HQs buscavam temas que até então eram tidos como próprios apenas de

livros, teatro e cinema.

As inovações na linguagem e na estética dos quadrinhos revelam a influência

não só da televisão, mas também das novas tecnologias digitais. Nos anos 50, a

ameaça da televisão fez com que os artistas da geração pós-televisão

desenvolvessem Mangás cada vez mais dotados de uma orientação visual

extremamente marcada, em que dezenas de páginas ocorrem sem uma única

palavra (LUYTEN, 2000).

Depois de muitos aperfeiçoamentos, o que mais surpreende Quella-Guyot

(1994) é que os autores contemporâneos de quadrinhos voltam à antiga forma de

narração, com textos densos realçados por quadros ilustrativos, embora o todo

86

assuma a forma de tiras e pranchas, o que para ele significa que a história em

imagens não morreu.

Na década de 1980, com o surgimento dos computadores pessoais e o

desenvolvimento de interfaces gráficas mais acessíveis, as HQs aos poucos foram

adaptando seu fazer artístico às novas tecnologias. Algumas HQs, nessa época,

foram realizadas totalmente em computador, embora fragmentadas e quebradiças.

Na década de 90, a revolução informática atingiu um tal grau de

popularização, que mesmo os fanzines37 passaram a aderir, tirando proveito das

ferramentas da editoração eletrônica, embora uma reação se fizesse no início “num

apelo à pureza dos fanzines sujos e artesanais.” (MAGALHÃES, 2004, p. 107). No

início, o uso do computador mais poluía do que enriquecia o visual. Contudo, uma

progressiva familiarização fez surgir fanzines que fazem a adequada utilização das

ferramentas digitais. Para muitos, hoje, o computador tornou-se não apenas um

instrumento, mas o próprio veículo.

A televisão e as novas tecnologias digitais provocaram temores entre editores

e quadrinistas. Segundo David Fehrmann38, havia o medo de que as tecnologias

“matassem” os quadrinhos, e isso perdurou por muito tempo. Porém, segundo esse

editor, além da diversidade, que contribui para o sucesso atual dos quadrinhos, a

Internet hoje funciona como ferramenta de apoio, e as histórias em quadrinhos no

Brasil, agora, passam por um período de reaquecimento ampliando o acesso e o

número de leitores.

O computador, enfim, tem permeado todas as instâncias do vivido nas

sociedades contemporâneas. Conforme Mirzoeff (2003) e Basbaum (2005), a

aventura humana acaba convergindo rumo à totalização da paisagem midiática, e a

mediação digital é o lugar para onde converge a experiência. A visualização, que se

tornou comum na modernidade – uma tendência radical para imaginar ou visualizar

a existência – torna-se obrigatória na contemporaneidade e envolve a todos.

37 Revista produzida por aficcionados em histórias em quadrinhos. 38 David Fehrmann é atual coordenador do Atelier de Produção do gibi Smilingüido e sua Turma, da editora Luz e Vida. In: Hoje é dia nacional dos quadrinhos. Entrevista para o Jornal O Estado do Paraná . Curitiba, 30 jan. 2007, Caderno Almanaque, p. 20.

87

CAPÍTULO III

88

3.1 METODOLOGIA

Desde o século XIX até nossos dias, os experimentos da esfera científico-

tecnológica e as investigações educativas associam-se a pesquisas sobre processos

de aprendizagem para a melhora da eficácia e produtividade, a partir de uma visão

tecnicista de ensino. Dessa maneira, depositou-se grande confiança no sistema

escolar como mecanismo não somente para a compensação social, mas como

motor para a criação de riquezas.

Críticas sobre a falta de soluções para as práticas educativas supõem que a

investigação científica tem centralizado um fenômeno complexo, aplicando modelos

estereotipados desde os âmbitos que os originaram. Esses modelos se efetivaram

como a melhor forma de elaborar conhecimento científico e, até hoje, ainda são

utilizados. As limitações dos modelos anteriores, para Sancho (1997-1998), estão

relacionadas aos elementos que o configuram, como por exemplo, o caráter aberto e

dinâmico do “sistema educativo” e o inapropriado de confundi-lo com “sistema

escolar”. Segundo Sancho (1997-1998), o desejo pela melhora da qualidade de vida

criou uma visão fortemente enraizada de educação em função do progresso

econômico. Hoje há uma crise em todos os setores da sociedade e a noção de

progresso está sendo questionada.

Essa consideração de Sancho é importante para esta pesquisa, que busca

analisar os modos de ensinar com relação às crenças e às concepções dos

professores, considerando-se que o ensino e a prática escolar têm-se voltado mais

para práticas informativas, distanciando-se das funções educativas.

Quando se questiona o sentido da escola, sua função social e a natureza da

atividade educativa, em conseqüência das transformações radicais vividas pela

sociedade, tanto nas esferas econômicas, quanto nos elementos que compõem a

cultura, tais como valores, idéias e costumes, Gómez (2001) destaca que nós

professores, aparecemos deslocados, fazendo com que uma série de fatos torne

obsoletos nossos conteúdos e práticas.

89

Para Gómez (2001), diante das prioridades econômicas, a função educativa

está sendo relegada. Conforme esse autor, nós, docentes, vivemos no “olho do

furacão” da inegável crise social, econômica, política e cultural, mas, por outro lado,

as forças sociais não promovem as mudanças necessárias.

Também o ensino de Arte não escapa aos problemas. Este ensino tem

passado por muitas transformações39 desde sua implementação obrigatória com a

lei 5.692/71, passando de um ensino tecnicista à livre expressão, e depois da

Proposta Triangular às subseqüentes releituras de imagens, que hoje têm sido

criticadas (PILLAR, 1999; BARBOSA, 2005b) e ainda, a tendência à inclusão de

múltiplas imagens provenientes de diferentes fontes e culturas.

Em meio a tantas crises e transformações, é importante situar as posições

dos professores com relação a essa arte e o uso que fazem das suas compreensões

sobre HQs em suas práticas.

Esta pesquisa se encaixa dentro de uma pesquisa qualitativa. Dentre as

características essenciais que podem identificar esse tipo de pesquisa, Godoy

(1995), Elliot Eisner (1998) e Demo (2000) destacam como preocupação do

investigador: o ambiente natural como fonte direta de dados e o pesquisador como

instrumento; o caráter descritivo e o significado que as pessoas dão às coisas e a

sua vida. A investigação “pode oferecer um ponto de vista crítico sobre muitas

crenças e práticas que se baseiam no sentido comum ou em convenções.”

(SANCHO e HERNÁNDEZ, 1997, p. 108).

É fundamental para esta pesquisa compreender a perspectiva do professor na

situação problema e, a partir daí, realizar interpretações sobre os fenômenos

estudados. Para isso, optamos pela metodologia qualitativa interpretativa crítica,

tendo em vista analisar as compreensões que determinado grupo de professores

pode ter com relação à arte dos quadrinhos e suas conseqüências para a educação

no ensino de Artes Visuais, conforme Franz (2006)40. Esta abordagem metodológica,

segundo Cohen e Manion (1989, apud FRANZ, 2000), é adequada para uma

investigação educativa quando se tem por objetivo a clarificação de temas que

tenham conexão direta ou indireta com os conceitos de ensinar e aprender.

39 Ver sobre o ensino tecnicista, a livre-expressão e a Metodologia Triangular, no capítulo II – item 2.1 - Conceitualizações e Tendências no Ensino de Artes Visuais. 40 Franz, in: Seminário de Orientação, Curso de Mestrado em Artes Visuais – UDESC, 2006.

90

A investigação qualitativa interpretativa centra-se no estudo das interações

humanas com aspectos da realidade ou com a própria realidade. Considera que os

significados e as interpretações que as pessoas atribuem aos objetos influenciam ou

determinam suas reações a estes objetos ou eventos. “Quando falamos em

construção e interpretação de significados, entendemo-los como as idéias, os

valores, sentimentos, atitudes e interesses dos sujeitos humanos individual e

coletivamente considerados.” (GOMEZ, 1998, apud FRANZ, 2000, p. 279).

Essa perspectiva também participa do enfoque construtivista que considera o

mundo social como uma entidade dinâmica e mutável, na qual as complexas

relações entre indivíduos, grupos e sociedades criaram o que se denomina de

realidade social. Para Gómez (2001, p. 64), “os modos de pensamento e de

comportamento individual ou coletivo, bem como normas de convivência, os

costumes [...] são o produto histórico de um conjunto de circunstâncias” que as

pessoas constroem e elaboram. Do enfoque construtivista, no âmbito social, são tão

importantes as representações subjetivas dos fatos como os próprios fatos (os fatos

e os valores). Esse autor considera que, para compreender a complexidade real dos

fenômenos, é necessário chegar aos significados, valores e interesses, através do

acesso ao mundo conceitual dos indivíduos.

Uma fonte de acesso ao mundo de conceitos e significados e práticas

individuais (FRANZ, 2000; DEMO, 2000; DUARTE, 2005) é a entrevista que

escolhemos como instrumento de investigação. A utilização deste recurso tem por

objetivo saber se há ou não preconceito, despreparo ou ausência de conhecimento,

como os professores trabalham e quais as dificuldades que encontram com relação

à Arte Seqüêncial/HQs. A entrevista tem a possibilidade de identificar estes e outros

elementos sobre os quadrinhos nas aulas de Arte. A informações colhidas podem

servir para elaborar um quadro sobre as crenças, visões e preconceitos dos

professores, de que maneira costumam incluir e a importância que atribuem à Arte

Seqüencial/HQs com relação ao ensino de Artes Visuais.

O papel do estudante é importante para o problema de pesquisa. Crianças e

adolescentes depositam no professor a responsabilidade por aquilo que aprendem

na escola. Costumam aceitar como verdadeiro o que ele ensina. Igual credibilidade,

ou até maior, é encontrada com a relação ao que as crianças e adolescentes

estabelecem com os meios, televisão, Internet, revistas e games. A cultura infantil

popular age com impacto sobre as crianças, produzindo uma pedagogia cultural

91

configurada pelo contexto social que apreende e edifica a percepção, atuando na

formação das identidades, produção e legitimação de conhecimento, levando-as a

pensarem que as melhores coisas “são produzidas pelos seus amigos da América

corporativa." (STEINBERG e KINCHELOE 2004, p. 16).

A relação da criança ou do adolescente com a Arte Seqüencial/HQs, pode ser

totalmente diversa daquela que o professor adulto possa ter. Sobretudo, este tem

por necessidade e obrigação administrar os conteúdos que irá fornecer ou trabalhar

junto aos estudantes, conforme determinação da escola ou sua própria.

Embora os estudantes tenham papel relevante para o problema de pesquisa,

por uma necessidade de fazer um recorte, demos prioridade à questão do professor

com relação à Arte Seqüencial/HQs, levando em conta o papel fundamental que

ocupa como principal mediador do aprendizado para a compreensão sobre as

imagens da cultura visual.

De início, o problema de pesquisa mostrou-se particularmente subjetivo.

Partindo da pergunta principal, surgiu a necessidade de um estudo preliminar, a fim

de buscar evidências sobre o problema de pesquisa, que determinasse com mais

clareza os caminhos a serem percorridos no estudo empírico. Elliot Eisner (1998),

considera que, no estudo qualitativo, o ideal é empregar formas múltiplas para

colher evidências a fim de atingir os objetivos. Com base nessa teoria, um estudo

exploratório foi escolhido como primeiro passo. O segundo envolveria o professor,

com entrevistas em profundidade.

Na entrevista em profundidade, de acordo com Duarte (in DUARTE e

BARROS, 2005, p. 63), “as perguntas permitem explorar um assunto ou aprofundá-

lo [...] analisar, discutir e fazer prospectivas”, além de permitir identificar problemas,

microinterações e obter juízos de valor, interpretações e explicar fenômenos. O

objetivo "está relacionado ao fornecimento de elementos para a compreensão de

uma situação ou estrutura de um problema." (DUARTE, in: DUARTE e BARROS,

2005, p. 63).

Para Eisner (1998), somente o estudo por meio da investigação ou da

indagação qualitativa possibilita gerar a conscientização e o conhecimento

necessários para interpretar e avaliar uma situação. A indagação qualitativa é

importante para entender como funcionam os professores e as aulas antes de partir

para as recomendações de mudanças. Há programas educativos que sugerem

92

mudanças para os professores e as escolas; no entanto propõem-nas de forma

independente do contexto e

não tem observações atuais sobre o ensino dos professores com quem falam. Como resultado aconselham [...] que não se pode ter em conta pontos fortes concretos e as debilidades de cada um dos professores aos quais se dirigem. (EISNER, 1998, p. 29, tradução nossa).

Eisner (1998) considera que é necessário conhecer o cenário, como

interagem seus principais traços ou dimensões. Por isso, a entrevista ocupa um

lugar importante para a observação direta, para esse autor.

A análise de dados das entrevistas, realizadas no estudo exploratório e

empírico, guia-se principalmente pelas teorias de Eisner (1998), cuja perspectiva

metodológica centra-se em tipos particulares de indagação qualitativa chamados

conhecimento educativo e crítica educativa. A crítica educativa é um dos principais

recursos utilizados por Eisner (1998) como parte das ferramentas da indagação

qualitativa41. Esse teórico incentiva utilizar a prática da crítica de maneira

semelhante à tarefa que os críticos realizam para dar sentido a trabalhos complexos

como as obras de arte. O conhecimento e a crítica se aplicam aos fenômenos

sociais e ao mundo da arte. “Podem ser aplicados às escolas, às aulas, ao ensino, à

percepção e à análise de recursos instrutivos” (EISNER, 1998, p. 21, tradução

nossa), pois ambos dirigem-se às qualidades.

Para algumas pessoas, a crítica pode trazer algumas conotações negativas

mas na realidade seu papel é iluminar uma situação ou um objeto para que se possa

ver ou apreciar (EISNER, 1998). Desse enfoque não se pretende alcançar verdades

eternas ou universais. Na indagação qualitativa, o juízo deve estar bem vivo e,

conseqüentemente, o debate estará sempre aberto.

“A principal função da crítica educativa, como de qualquer crítica, é a

expansão da percepção e o aumento da compreensão.” (Elliot Eisner, 1998, p. 136).

A crítica é um ato reconstrutivo, uma narrativa argumentada, que proporciona

material para a reflexão. Para Carr (1996, p. 14), “pensar reflexiva e criticamente [...]

41 O termo “indagação qualitativa” é utilizado por Eisner (1998), no lugar de “investigação” e “avaliação”, porque, revela não somente as qualidades das aulas e a escola, mas também os processos de ensino. Eisner situa a indagação como um “conceito limite entre investigação e avaliação. A investigação e a avaliação são exemplos de indagação, mas nem toda indagação é um exemplo de investigação ou avaliação.” (EISNER, 1998, p. 20, tradução nossa).

93

supõe sempre um compromisso com a educação”, e pode ser um dos meios para

sua transformação.

Para realizar a “indagação qualitativa em geral ou a crítica educativa em

particular”, segundo Eisner (1998, p. 197, tradução nossa), “não existe um corpo

codificado de procedimentos.” Isto é, não há uma fórmula ou um conjunto de regras

específicas - os investigadores que estudam escolas, aulas, ou que se ocupam de

trabalho de campo, dão tratamento conforme o problema que investigam e o

contexto de seu trabalho.

Tendo em vista as considerações de Eisner (1998), levando em conta os

dados obtidos com as entrevistas, em função destes, associamos a esta perspectiva

crítica, o uso do método da análise de conteúdo, a fim de obter uma organização e

uma análise preliminar, bem como, a reordenação das falas dos entrevistados,

relacionando-as às categorias estabelecidas. A operacionalização realizada com

base no método da análise conteúdo42, neste trabalho, mostrou-se bastante útil e

adequada para encaminhar a análise a fim de alcançar uma interpretação crítica.

Uma das características que torna qualitativo um estudo é seu caráter

interpretativo, que se relaciona com “a aptidão para explicar porque se ocupa um

lugar com algo. Às vezes isto requer a utilização de construtos tomados das ciências

sociais. Outras vezes requer a criação de uma nova teoria.” (EISNER, 1998, p. 52,

tradução nossa). Nesse sentido, a investigação não se limita a um material

quantitativo ou qualitativo, ou à idéia de ser uma coisa ou outra. Não há razão para

que não se possa combiná-los. As indagações ou investigações qualitativas43 podem

ser realizadas em diferentes graus e podem empregar formas diversas de

representações e interpretação de dados, de maneira que possibilitem “ver a

situação de maneira distinta.” (EISNER, 1998, p. 58, tradução nossa).

A estrutura da crítica educativa, pode ser considerada como tendo as

seguintes dimensões: descrição, interpretação e avaliação44. A identificação destas

42 Conforme Stewart e Shandasani (apud ROMERO, 2000), Strauss e Corbin (1990) e Laville e Dionne (1999) (apud SILVA C. R., 2005). 43 Para Eisner (1998, p. 58, tradução nossa), “não somente os estudos podem ser qualitativos em diferentes graus – isto é, alguns estudos qualitativos podem ser extremamente figurativos e literários, tanto como outros que são mais literais na utilização da linguagem –, mas também podem empregar tanto formas de representação literárias como quantitativas.” 44 Eisner (1998) aponta que essas dimensões - descrição, interpretação, avaliação - podem envolver também uma quarta: a temática. Porém, esse autor não prescreve uma seqüência idêntica para todos os casos de indagação ou investigação. Conforme Franz (In: Seminário de Orientação - Curso de Mestrado, UDESC, 2006), adapta-se a sugestão de Eisner (1998), neste estudo, para descrição, avaliação e interpretação crítica.

94

dimensões não implica que cada uma seja completamente independente uma das

outras. Fazer estas distinções, contudo, pode ser um fator de auxílio para propósitos

analíticos. Ainda que os críticos possam utilizá-las com o propósito de organizar

seus escritos, Elliot Eisner (1998, p. 109, tradução nossa) recomenda “tratar estas

distinções como ferramenta com as quais trabalhar, não como regras a seguir.”

Para esse autor, a descrição permite aos leitores visualizar como é um lugar

ou um processo, proporciona o conteúdo básico com o qual trabalham os críticos.

Mas depois deve operar com uma forma escrita que empregue os significados

através de prosa descritiva, com o propósito de ajudar o leitor a entender.

Conforme Eisner (1998), pode-se considerar a descrição como a obtenção de

uma informação e a interpretação como uma “justificação” ou explicação dos

significados do que foi experimentado. Significa também aclarar as conseqüências

potenciais do que se observa, e proporcionar as razões que justifiquem o que se tem

visto. Dentro dessa perspectiva, é mais razoável considerar as teorias como guias

para a percepção do que como mecanismos que conduzem ao controle severo ou

exato. Os propósitos são explicativos e para satisfazer a racionalidade, não para

encontrar provas rigorosas, mas para aprofundar a conversação e fazer novas

perguntas. Uma teoria dificilmente “poderá satisfazer todas as dimensões sobre o

que os críticos podem desejar falar ou escrever.” (EISNER, 1998, p. 116).

Em resumo, “interpretar é situar em um contexto, expor, desvelar, explicar. É

[...] ‘decodificação’ de mensagens dentro de um sistema. [...]. Se a descrição trata do

que é, a interpretação se enfoca no porquê ou o como.” (EISNER, 1998, p. 119).

A avaliação é vital na indagação qualitativa. Os críticos também têm a tarefa

de avaliar. A significatividade do que ocorre nas escolas é o que permite examinar

seu valor educativo. Requer avaliar o tipo de experiência que têm os indivíduos. É

uma tarefa sutil e complexa, o que não significa que se deve deixar de fazer juízos

sobre o valor educativo daquilo que se vê.

95

3.2 ESTUDO EXPLORATÓRIO

O objetivo do estudo exploratório foi o de buscar evidências sobre o ensino da

Arte Seqüencial/HQs em Artes Visuais - problema de pesquisa. Entendendo que

alunos também fazem parte desse processo e que poderiam fornecer dados úteis

para a investigação com os professores, realizamos um estudo preliminar antes do

estudo empírico propriamente dito. Depoimentos de experiências escolares com

histórias em quadrinhos de diferentes indivíduos poderiam gerar bases mais

ampliadas para essa investigação.

A Gibiteca da Fundação Cultural de Curitiba foi ideal para este estudo,

permitindo que encontrássemos ao mesmo tempo em um mesmo lugar, indivíduos

que estivessem cursando ou que já haviam cursado o ensino fundamental em

diferentes estabelecimentos de ensino. Do contrário, essa pesquisa teria que ser

realizada em diversas escolas, colhendo dados separadamente sendo menos

produtiva. Partimos também do pressuposto de que indivíduos interessados em

fazer curso de histórias em quadrinhos poderiam mais facilmente fornecer dados

relacionados ao assunto, como de fato, encontramos boa receptividade entre estes,

com os quais pudemos realizar duas entrevistas de grupo, conforme Flick (2004).

Na Gibiteca do Solar do Barão, localizado à rua Carlos Cavalcanti, nº 533, em

Curitiba, realizamos essas entrevistas com 10 alunos inscritos no curso básico de

sábado de HQs, nos dias 1º e 8 de abril; esse curso iniciou em 11 de março e

encerrou em 8 de julho de 2006. As duas entrevistas de grupo, foram gravadas e

transcritas na íntegra45. Realizamos para estas, uma análise de conteúdo preliminar,

conforme Stewart e Shandasani (apud ROMERO, 2000), Laville e Dionne, e Strauss

e Corbin (apud SILVA C. R., 2005). O método da análise de conteúdo aqui, foi

associado à perspectiva metodológica interpretativa crítica com o objetivo de

realizarmos uma interpretação crítica.

45 Como norma neste estudo e no estudo empírico, adotamos colocar entre aspas, todas as citações integrais das respostas dos entrevistados.

96

Com base em Elliot Eisner (1998), que emprega formas múltiplas, para colher

e/ou demonstrar evidências, e para a interpretação de dados, completamos a coleta

entrevistando a responsável pela Gibiteca. Também colhemos informações no Solar

do Rosário46, ampliando as possibilidades de análise e interpretação de dados. A

análise do estudo, forneceu pistas sobre a situação problema e bases para o estudo

empírico. Apresentamos os resultados em forma de síntese no item 3.2.2.

3.2.1 Roteiro base e esboço de categorias de análise

Para este estudo, utilizamos um roteiro base de entrevista semi-estruturada e

duas categorias de análise como esboço para o estudo empírico (Quadro 1):

Entrevista Semi-estruturada Categorias de Análise

1 Qual motivo o levou a fazer um curso de histórias em quadrinhos?

2 O que o professor de Educação Artística (Arte) costuma ensinar (ou ensinou) na sua escola?

3 Você já teve alguma experiência (ou atividade) escolar na área de quadrinhos?

4 O que você espera do curso que você está fazendo aqui?

1 Motivo para fazer um curso de histórias em quadrinhos

2 Experiência escolar com quadrinhos

Quadro 1 – Roteiro de entrevista semi-estruturada para o estudo exploratório

3.2.2 Síntese dos resultados obtidos no estudo exploratório

O grupo, que foi dividido em dois para duas entrevistas, era bastante

heterogêneo, com faixa etária variando entre 13 e 32 anos de idade, e os

participantes tinham diferentes níveis de formação escolar. Dos dez entrevistados, 4

estavam cursando escola superior e 1 já havia concluído. No ensino médio, 2

estavam no primeiro ano, 1 no segundo ano e 1 havia recém-concluído. Apenas 1

estava cursando ensino fundamental. A presença maior era do sexo masculino, com

oito pessoas.

Os depoimentos revelaram como conteúdo mais enfatizado em Arte, no

ensino fundamental dos entrevistados em primeiro lugar, a História da Arte e

Educação Artística (teoria e prática), em seguida o desenho geométrico e geometria

e, por último, o ensino baseado em desenho e pintura livres.

46 O Solar do Rosário, localiza-se à Rua Duque de Caxias, nº 4, esquina com a rua Claudino dos Santos, no Centro Histórico de Curitiba/PR.

97

Os resultados encontrados se aproximaram do problema principal da

pesquisa: apenas três, entre os dez entrevistados, tiveram alguma experiência com

HQs, no ensino de Arte, por uma ou duas vezes no ensino fundamental. Além

desses três, um participante respondeu que não teve HQs em Arte, mas teve uma

experiência com quadrinhos na disciplina de Inglês.

Entre os três entrevistados que tiveram alguma experiência com quadrinhos

no ensino de Arte, um deles revelou que sua única experiência, foi a de colocar

balõezinhos nos desenhos. Segundo suas palavras “foi algo bem perfume, assim, só

colocando os balões. [...] nada de linguagem dos quadrinhos.” Os outros dois,

relataram que o assunto referia-se à charge e o fazer prático relacionado a tirinhas.

Embora restrita, a amostra investigada reflete antiga valoração e

marginalização das HQs. Esses valores foram atribuídos a esta arte, a partir das

polêmicas que se levantaram em torno dela, desde a época após a Segunda Guerra

Mundial. Will Eisner47 (1989), teórico dos quadrinhos, observou que a Arte

Seqüencial foi ignorada como forma digna de discussão acadêmica durante muitas

décadas, embora se estudassem seus elementos mais importantes isoladamente: o

design, o desenho, o cartum e a criação escrita. A charge recebe uma valorização

oficial normalmente nos jornais, desde que foi criada no século XIX. O que se

destacou nessa relação de ensino foi o fato de alguns elementos, ou outras artes,

serem tomados mais seriamente como objeto de estudos.

Os entrevistados demonstraram, em sua maioria, que sua principal motivação

para fazer HQs é antes que qualquer outra, gostar de desenhar. Esta motivação foi

associada ao desejo de desenvolvimento de suas aptidões individuais e a busca por

um ensino e conhecimentos que pudessem aplicar no mercado de trabalho, em

particular na Publicidade, Marketing e Propaganda.

Além das entrevistas, acompanhamos o curso de sábado na Gibiteca,

observando que a freqüência de pessoas do sexo masculino, nos cursos de HQs, é

maior do que as pessoas do sexo feminino – dados que foram complementados com

a secretária dos cursos da Gibiteca e também no Solar do Rosário, outra instituição

que mantém um curso de histórias em quadrinhos, aos sábados (ver Apêndice A,

Tabelas 1 e 2).

Nesse acompanhamento, verificamos que as histórias em quadrinhos não são

uma arte fácil como afirmam Will Eisner (1989), Acevedo (1990), Quella-Guyot 47 Citado no problema de pesquisa do presente trabalho.

98

(1994) e outros teóricos - significando que para fazer HQs com regularidade, é

necessário muito interesse e motivação. Ao final dos cursos, há sempre um grande

percentual de desistentes – em torno de 23% no Solar do Barão e 37% no Solar do

Rosário. Nos cursos da Gibiteca, entre os que abandonam o curso, o número de

desistências é bem mais acentuado entre as meninas.

De acordo com Pollock (2003), deveríamos estudar a totalidade das relações

sociais que dão forma às condições de produção e de consumo dos objetos

designados como arte. Segundo a responsável pela Gibiteca,48 “o mercado

profissional, no caso do cartunismo, de histórias em quadrinhos é um mercado

dominado por homens. Dificilmente se vêem mulheres nesta área.” Conforme nos

informou, desde que foram criados os cursos de HQs na Gibiteca, há 15 anos, a

maior presença sempre foi de meninos.

A história das histórias em quadrinhos, conforme Quella-Guyot (1994) e

McCloud (2005) é uma história de desequilíbrio entre os sexos, o que significa que

essa arte, atualmente ainda mantém este estatuto assinalado por esses autores.

Para McCloud (2005) a medida que as HQs se constituíram em um “Clube do

Bolinha” deixaram de desenvolver metade do seu potencial. Embora haja algumas

mulheres que produzem quadrinhos, estas formam uma minoria. Segundo esse

autor, ainda há muitos obstáculos para as artistas que fazem histórias em

quadrinhos; a escassez de revistas elaboradas por mulheres não é bom sinal para

futuras gerações femininas. Esses aspectos, refletem uma característica

sociocultural da arte dos quadrinhos, assim como muitas das suas temáticas

principais e personagens, como os super-heróis, por exemplo, que são baseados em

legendas canônicas e éticas masculinas.

Na interpretação e avaliação crítica do estudo exploratório, realizada durante

o segundo semestre de 2006, concluímos que deveríamos prosseguir com a

investigação no ensino formal a fim de conhecer a relação entre o ensino de Artes

Visuais e as HQs, do ponto de vista dos professores de escolas de ensino

fundamental.

48 Em entrevista, na Gibiteca do Solar do Barão, gravada e transcrita na íntegra com sua autorização, em setembro de 2006.

99

3.3 ESTUDO EMPÍRICO

Tendo em vista o problema principal de pesquisa que trata da relação entre a

Arte Seqüencial/histórias em quadrinhos e este ensino, o presente estudo investiga

a prática de docentes que atuam em escolas públicas e particulares de ensino

fundamental em Curitiba e Região Metropolitana, por meio de entrevistas individuais.

Nesta investigação, desejava-se conhecer as compreensões dos professores

com relação às HQs, suas visões e concepções, analisando-as dentro da

perspectiva da educação para a compreensão crítica da Cultura Visual, com o

objetivo de fazer uma reflexão crítica sobre as práticas de ensino relacionadas. Para

realizar este objetivo, foi preciso conhecer mais de perto a realidade dos

professores.

Conforme relatamos no primeiro capítulo49, o problema surgiu de observações

feitas na própria escola, acerca dessas práticas, sendo que essas observações

representavam apenas um ponto de partida para o desenvolvimento deste estudo.

De acordo com Demo (2000, 2001), Flick (2004) e Jorge Duarte (in DUARTE e

BARROS, 2005b) para obter uma parcela representativa significativa e conseguir

apanhar também o lado subjetivo dos fenômenos, o ideal são entrevistas individuais,

com perguntas que permitam obter “pormenores que se transformem em dados

relevantes.” (DEMO, 2000, p. 152). Com essa prática investigativa, esperávamos

também desencadear novos conhecimentos ou insights que trouxessem

contribuições para o ensino de histórias em quadrinhos em Artes Visuais.

Com base nesses autores, foram realizadas 16 entrevistas semi-estruturadas

com professores de Artes e 4 com professores de outras disciplinas, perfazendo um

total de 20 entrevistas, as quais foram gravadas e transcritas na íntegra. Como

referido no problema de pesquisa, outros professores fazem uso das HQs para seu

ensino. No estudo realizado com alunos da Gibiteca isso também foi constatado

através de um dos entrevistados, que comentou que teve contato com essa arte 49 Item 1.1 – O Lugar de Quem Fala.

100

somente na disciplina de Inglês: “[...] em Artes, no ensino fundamental, a gente

nunca chegou a fazer quadrinhos [...]. O professor de Inglês foi o único professor

que pediu.” Desta forma, julgamos apropriado entrevistar alguns professores de

outras disciplinas, a fim de complementar a investigação, embora de modo menos

extensivo, visto que o trabalho está direcionado para o ensino de Artes Visuais.

A análise do estudo empírico segue a perspectiva metodológica interpretativa

crítica e as teorias de Elliot Eisner (1998), com vistas a alcançar uma interpretação

crítica. Esse autor indica a descrição, interpretação e avaliação crítica, como

dimensões da crítica que podem guiar as etapas de realização de uma crítica

educativa. A análise dos dados tem por princípio norteador esta estrutura,

caracterizando o trabalho de análise do presente estudo. Eisner (1998) enfatiza que

os elementos da crítica não podem ser parcelados com facilidade e destaca a

independência uns dos outros, ainda que se façam distinções para fins de análise,

conforme foi exposto no início do capítulo (item 3.1).

Como no estudo exploratório, associamos aqui, à perspectiva crítica, o uso do

método da análise de conteúdo como etapa preliminar de análise. O método,

segundo Stewart e Shandasani (apud ROMERO, 2000), Laville e Dionne, e Strauss

e Corbin (apud SILVA C. R., 2005), envolve o recorte e a categorização dos tópicos

relevantes para as questões pesquisadas, para constituir as unidades de análise e

uma categorização final, a fim de aprofundar os recortes com base em critérios

discutidos. Conforme esses autores, empregamos o Modelo Misto50 acrescentando

novas categorias, em função do curso da análise. O uso desse método, facilitou a

construção de quadros com respostas que sintetizam informações relevantes

(Quadros 7 a 11) e auxiliou o trabalho de análise dos dados51.

50 Segundo Laville e Dionne (1999, apud SILVA, C. R., 2005, p. 76), as categorias de análise podem ser definidas por três modelos distintos: “Modelo Aberto – as categorias não são fixas no início, mas tomam forma no curso da análise; Modelo Fechado – o pesquisador decide a priori as categorias apoiadas em um ponto de vista teórico que submete freqüentemente à prova da realidade; Modelo Misto – as categorias são selecionadas no início, mas o pesquisador permite modificá-las em função do que a análise aportará.” 51 Para Laville e Dionne (apud SILVA, C.R., 2005, p. 74), “uma operacionalização que facilite o trabalho do pesquisador apresenta-se necessária [...] não como uma estrutura rígida e sim como um direcionador do trabalho de pesquisa.” Conforme os autores citados, a partir dos dados coletados nas entrevistas (gravados e transcritos na íntegra), o segundo passo de nosso trabalho, consistiu em realizar uma análise preliminar dos conteúdos manifestos nos discursos dos entrevistados. Foram então identificadas as informações relevantes das falas dos entrevistados relacionando-as às categorias estabelecidas previamente. A fase seguinte compreendeu em realizar uma descrição e interpretação, as quais associamos as dimensões da crítica apontadas por Eisner (1998), relacionando-as também a fundamentação teórica do presente trabalho.

101

A análise tem por base principalmente as teorias de Hernández52 e Franz53 da

educação para a compreensão crítica da Cultura Visual. Fundamenta-se, também,

em teóricos que seguem a tendência crítica: Paulo Freire (1979, 1997); McLaren

(1997); Cary (1998); Freedman (2000, 2001); Gómez (2001); Giroux (1997, 2003);

Efland, Freedman e Sthur (2003); Chalmers (2003); Pollock (2003); Richter (2004);

Efland (2005); Corrêa (2004, 2005) e ainda em outros autores que contribuem para o

entendimento das questões relacionadas à pesquisa. Entre teóricos dos quadrinhos

contamos com: Will Eisner (1989, 1998); Acevedo (1990); Quella-Guyot (1994);

Conde (2000); Brent Wilson (2005a, 2005b); Rama e Vergueiro (2004); Vergueiro

(2006); McCloud (2005, 2006) e outras contribuições.

Na bibliografia estudada pertinente ao ensino de Artes Visuais da

contemporaneidade, destaca-se que cada vez mais este ensino vem valorizando o

desenvolvimento da habilidade de compreensão crítica e o aprender a aprender do

aluno. Também há uma mudança na postura do professor, que deve ser também

pesquisador (HERNÁNDEZ, 1998, 2000; FRANZ 2003, 2004; CORRÊA, 2004).

É importante lembrar que, dentro do enfoque da perspectiva da educação

para a compreensão crítica da Cultura Visual, o fazer, o produzir e a leitura da obra

de arte são substituídos por uma postura mais crítica, na qual a prática deve estar

associada à teoria como instrumento para interpretação crítica e condição de

criatividade, alimentando um processo para desenvolver a tomada de consciência do

aluno. Ou seja, deve apropriar-se do conhecimento historicamente construído de

forma crítica e criativa relacionando-o a sua vida e ao seu tempo.

No contexto atual, há grande preocupação com a atuação dos professores e a

necessidade de valorização desse ensino, e também, a necessidade de

desmistificação da separação entre arte erudita e arte popular, trazendo novas

condições para o ensino de Artes Visuais e exigindo uma reflexão mais aprofundada

sobre nossas visões e práticas, bem como uma avaliação sobre elas.

O problema de pesquisa está relacionado à compreensão de uma situação

ligada ao ensino. Cohen e Manion (apud FRANZ, 2000), para esse tipo de estudo,

recomendam a metodologia qualitativa interpretativa crítica. Conforme Franz

(informação verbal)54, Carr (1996) e Elliot Eisner (1998), a crítica educativa é um

52 Hernández (1998, 2000, 2001, 2002, 2003a, 2005, 2006, 2007). 53 Franz (2000, 2001, 2003a, 2003b, 2003c, 2003d, 2004, 2005a e 2005b). 54 FRANZ, In: Seminário de Orientação II, Curso de Mestrado em Artes Visuais – UDESC, 2006.

102

meio apropriado para alcançar esta compreensão. Entende-se que uma

interpretação e reflexão crítica sobre esta investigação, isto é, sobre a Arte

Seqüencial/HQs no ensino de Artes Visuais, pode contribuir para construir novos

posicionamentos mais críticos e que professores desta área, interessados em

trabalhar com essa arte também possam beneficiar-se deste estudo.

Ao final, consideramos que as entrevistas individuais foram úteis, conforme

Demo (2000), Flick (2004) e Duarte (2005), para ampliar os conceitos da situação

analisada, saber como os professores trabalham e fazer observações a respeito.

3.3.1 Perfil das escolas e dos professores entrevistados

a) Escolas em que os professores lecionam

Escolas Públicas Municipais

1 Escola Municipal Erasmo Piloto Curitiba

2 Escola Municipal Herley Mehl Curitiba – Pilarzinho

3 Escola Municipal Jardim Santo Inácio Curitiba – Bairro Jardim Santo Inácio

4 Escola Municipal Julia Di Lenna Curitiba

5 Escola Municipal Papa João XXIII Curitiba

6 Escola Municipal Prof. Guilherme Butter Curitiba – Bairro do Boqueirão

Escolas Públicas Estaduais

1 Escola Estadual Amintas de Barros Pinhais – Região Metropolitana de Curitiba

2 Escola Estadual Dom Ático E. da Rocha Curitiba – Bairro do Portão

3 Colégio Estadual Emília Busato Campo Magro – Região Metropolitana de Curitiba

4 Escola Estadual Lamenha Pequena Almirante Tamandaré – Região Metropolitana de Curitiba

5 Escola Estadual Luarlindo dos Reis Borges Pinhais – Vila Maria Antonieta

6 Escola Estadual Máximo Atílio Asinelli Curitiba – Bairro Uberaba

7 Escola Estadual Maria Pereira Martins Curitiba – Bairro da Barreirinha

8 Escola Estadual Pinheiro do Paraná Curitiba – Bairro de Santa Felicidade

9 Escola Estadual Rodolpho Zaniehi Curitiba – Bairro Vila Verde

10 Escola Estadual Tiradentes Curitiba – Centro

11 Instituto de Educação do Paraná Curitiba – Centro

Escolas Particulares

1 Colégio Dom Bosco Sede do Ahú Curitiba – Bairro Ahú

2 Colégio Bom Jesus Internacional Colombo – Região Metropolitana de Curitiba

Total de Escolas: 19

Quadro 2 – Escolas em que os professores entrevistados lecionam

103

b) Formação e outros dados dos professores entrevistados

Professores de Arte

Curso de Graduação Superior Pós-Graduação

(Especialização)

Área em que Atua

Idade

(em 2006)

1 Belas Artes - Gravura -Pelotas Licenciatura em Educação Artística - CEFET/PR - 2001

Não 1. Artes Visuais

2. Teatro e Música

45

2 Pedagogia - 1994 Arteterapia 1. Artes Visuais 2. Música

3. Teatro 4. Dança

32

3 Artes Visuais - FAP - 2000 Não 1. Artes Visuais

2. Música (eventualmente)

34

4 Teatro - FAP - 1993 Não 1. Teatro

2. Artes Visuais

59

5 Artes Plásticas - FAP - 1998 Não 1. Artes Visuais

2. Teatro (eventualmente)

50

6 Artes Plásticas - FEMP - 1982 Musicoterapia 1. Artes Visuais

2. Música 3. Dança 4.Teatro

51

7 Artes Plásticas - FEMP - 1990 Sim em outra área 1. Artes Visuais

2. Música (eventualmente)

48

8 Artes Plásticas - UFPR - 1979 Não 1. Artes Visuais 46

9 Música - FAP - 1988 Não 1. Música 2. Artes Visuais

3. Teatro 4. Dança

61

10 Artes Plásticas - UFPR - 2004 Não 1. Artes Visuais 25

11 Teatro - FAP - 2005 Não 1. Artes Visuais 23

12 Música - FEMP - 1998 Educação Especial 1. Artes Visuais

2. Música

46

13 Arquitetura e Urbanismo – Faculdade Tuiuti - 2005

Não 1. Artes Visuais

2. Teatro 3. Música

28

14 Artes Plásticas - FAP - 1991 Não 1. Artes Visuais 42

15 Artes Visuais - FAP - 1993 1. Arte Educação e

2. Educação Especial

1. Artes Visuais 30

16 Teatro - FAP - 1994 Não 1. Artes Visuais

2. Teatro

32

Quadro 3 – Formação e perfil dos professores de Arte entrevistados

Professores de Português, Ciências e Matemática

Curso de Graduação Superior

Pós-Graduação

(Especialização e/ou Mestrado)

Área em que Atua

Idade

(em 2006)

17A Letras Português Literatura Português 49

17B Letras Português - Inglês Interdisciplinaridade Português 49

18A Matemática Matemática Matemática 49

18B Curso Químico Industrial Educação para Ensino Fundamental e Médio e Mestrado em Matemática

Matemática 51

19 Ciências Biológicas Ciências Ciências 38

20 Português Mestrado em Literatura Brasileira Português 46

Quadro 4 – Formação e perfil dos professores de outras disciplinas entrevistados

104

No Quadro 2 fazemos uma relação das escolas em que os professores

lecionam Aqui é necessário fazer uma observação. Para realizar a entrevista, foi

solicitada autorização aos docentes, mas de modo que fosse assegurado não

revelar sua identidade – o modelo de autorização para as entrevistas de grupo e

individuais consta no apêndice B.

Assim sendo, as escolas não estão relacionadas com o número das

entrevistas neste quadro. Caso o fizéssemos poderia haver uma identificação dos

professores, pois algumas escolas possuem apenas um professor de Arte. Pelo

mesmo motivo, no Quadro 2, não constam as datas em que foram realizadas. Não é

nosso objetivo identificar nem desrespeitar os professores que gentilmente cederam

as entrevistas.

Relacionamos, então, as escolas, não por número de ordem e data, mas por

ordem alfabética das entidades. É suficiente acrescentarmos que as entrevistas

foram realizadas em agosto, e algumas delas foram complementadas em setembro

de 2006, em dias e horários marcados conforme a disponibilidade das escolas e dos

professores. Outra observação é que nem todas as entrevistas aconteceram na

própria escola. Em alguns casos, por solicitação dos professores ou necessidade,

algumas foram realizadas em outros locais. Incluímos uma amostra de entrevista do

estudo empírico e uma do exploratório, no apêndice C.

Os entrevistados, em sua maioria (16), são professores de Arte e lecionam

em escolas públicas pertencentes ao Estado ou Município. Ao todo, são 6 escolas

públicas municipais, 11 escolas públicas estaduais e 2 escolas particulares. Algumas

das escolas pertencem à Região Metropolitana de Curitiba.

Nos Quadros 3 e 4, pode-se visualizar a formação dos professores e outros

dados. Na primeira coluna encontra-se o curso de graduação superior. Na segunda

coluna, a pós-graduação – especialização e/ou mestrado. Na terceira coluna está a

área de atuação do professor. No Quadro 3, para a disciplina Arte, utilizamos a

convenção 1 para a primeira área de atuação e 2, 3 e 4 para outra(s) área(s) em

que o professor atua. Na quarta coluna está a idade do entrevistado em 2006.

Somando-se as 16 entrevistas com professores de Arte, com as 4 de outras

disciplinas, são no total 20 entrevistas, das quais participam 22 professores. Explica-

se: seis são professores de outras disciplinas. Quatro entrevistas foram feitas com

professores de Português, Ciências e Matemática. Em uma das escolas fizemos

uma entrevista com uma dupla de professores de Português, (nºs 17A e 17B) e outra

105

com uma dupla de professores de Matemática (nºs 18A e 18B). Essas professoras

trabalham em conjunto há muitos anos e por isso solicitaram para fazer a entrevista

em duplas. Seu planejamento curricular, visão e concepção de ensino são os

mesmos e utilizam o mesmo material didático e organizam em duplas todas as

atividades e provas. As duas entrevistas restantes, de Português e Ciências (nºs 19

e 20), foram feitas individualmente.

Dos professores de Arte, 6 são formados em Artes Plásticas55, 1 é formado

em Pedagogia, 1 em Gravura e Educação Artística, 2 em Artes Visuais e 1 formado

em área afim – Arquitetura e Urbanismo. Três são formados em Teatro na FAP.

Desses três, apenas um trabalha efetivamente com Teatro, os outros dois com Artes

Visuais. Apenas duas professoras têm habilitação em Música, na mesma faculdade

– a FAP – e também trabalham com Artes Visuais. Dessas duas, a primeira (nº 9)

prioriza o ensino de Música, mas como trabalha com educação infantil e de 1ª a 4ª

série, procura ensinar sempre todas as linguagens. A outra (nº 12) tem alunos com

deficiência, visual e auditiva, sendo maioria deficientes auditivos. Segundo esta

professora pós-graduada em Educação Especial, com as turmas de surdos, todo o

trabalho é essencialmente visual.

Somente 5, dos 16 professores de Arte têm curso de pós-graduação. As

professoras de Português, Ciências e Matemática todas possuem um curso de

especialização ou mestrado. É uma situação bastante desequilibrada. Nenhum dos

professores de Arte dessa mostra tem curso de mestrado. Uma das professoras de

Arte (nº 7) tem especialização, mas não dentro da área de arte e mencionou que é

curso que não tem nada a ver com o ensino de Arte. Uma das entrevistadas,

graduada em Artes Visuais, possui dois cursos de especialização, um em Arte-

educação e outro em Educação Especial (nº 15). Das professoras que têm curso de

especialização em Musicoterapia e Arteterapia somente uma tem curso de

graduação em Arte (nº 6), a outra (nº 2) é formada em Pedagogia.

A maioria dos professores de Arte trabalha com mais freqüência em Artes

Visuais. Apenas eventualmente os professores entrevistados trabalham com alguma

outra linguagem conforme seu domínio.

As idades são bastante variadas e vão desde 23 a 61 anos. Entre os 22

professores (Arte e outras disciplinas) há uma grande faixa de nascidos entre 1955 e

1960, ao todo 10 professores, que estão com idades em torno de 46 a 51 anos. No 55 Artes Plásticas chama-se atualmente Artes Visuais na FAP (Faculdade de Artes do Paraná).

106

conjunto de entrevistados, a situação de equilíbrio entre os sexos inverte-se com

relação ao estudo anterior realizado com alunos que fazem curso de HQs. De 22

professores, apenas 2 são do sexo masculino, nºs 11 e 14. Mais um reflexo dos

papéis estabelecidos por nossa sociedade, que costuma atribuir à mulher a

responsabilidade pela educação. Isso também causa reflexos no currículo do ensino

de Arte. Os dois professores manifestaram que gostam mais intensamente de

histórias em quadrinhos do que as professoras. Um deles ainda não trabalha com

quadrinhos, porque ministra aulas apenas até a 7ª série e segue o planejamento do

colégio que é bastante rígido. O colégio só trabalha com quadrinhos na 8ª série;

porém manifestou gostar bastante e com freqüência lê HQs. O outro professor, idem:

gosta de quadrinhos e costuma ensinar esta arte para todas as suas turmas.

3.3.2 Roteiro base e categorias de análise

O Quadro 5 corresponde ao roteiro base e as categorias de análise utilizadas

para as entrevistas semi-estruturadas individuais com os professores de Arte. O

Quadro 6 refere-se ao roteiro base e categorias de análise selecionadas de início

para as entrevistas com professores de Português, Ciências e Matemática. As

categorias 1, 2, e 5, do Quadro 5 seriam aplicadas somente aos professores de

Artes Visuais, a princípio. Todavia os professores de Português também trabalham

com imagens, de modo que estendemos essas categorias também a estes, e aos

outros professores, conforme suas respostas.

Devido ao caráter aberto das questões semi-estruturadas, muitas vezes, além

das perguntas principais, outras surgiam no decorrer das entrevistas. As entrevistas

com docentes de outras disciplinas contribuem sobremodo para o estudo. Para o

aprofundamento das questões, entretanto, priorizamos a disciplina de Artes Visuais,

dado que o problema de pesquisa está centrado nesta disciplina. Durante as

entrevistas também foram solicitadas informações úteis, como por exemplo, dados

sobre a formação do professor para lecionar a disciplina de Artes Visuais, ou

detalhes sobre encaminhamentos metodológicos para atividades com quadrinhos e

ainda outros complementares.

107

Entrevista Semi-estruturada

Categorias de Análise

1 Costuma trabalhar com imagens na sala de aula ?

2 Com que tipo de imagem?

3 Ensina sobre a linguagem dos quadrinhos? (Para quem?)

4 Como desenvolve esta atividade?

5 Qual critério utiliza para a escolha das histórias em quadrinhos a serem trabalhadas em aula ? (Que autor(es) utiliza ?)

1 Trabalho com imagens

2 Tipos de imagens que o professor trabalha

3 Trabalho com histórias em quadrinhos

4 Desenvolvimento das atividades sobre quadrinhos

5 Critérios utilizados para a escolha de histórias em quadrinhos

Quadro 5 – Roteiro base para a entrevista e categorias de análise definitivas - Arte (e outras disciplinas)

Entrevista Semi-estruturada

Categorias de Análise

1 Trabalha com histórias em quadrinhos junto aos alunos?

2 Como desenvolve esta atividade?

1 Trabalho com a linguagem dos quadrinhos

2 Desenvolvimento das atividades sobre quadrinhos

Quadro 6 – Roteiro base para a entrevista e categorias de análise de início para Português, Ciências e Matemática

3.3.3 Análise de dados

Na etapa de pré-análise, elaboramos quadros com respostas síntese -

Quadros 7, 8, 9, 10 e 11 (item 3.3.3.1) - usando a técnica do recorte, conforme

Laville e Dione (1999, apud Silva, C.R., 2005) e outros autores citados, extraindo

informações significativas que permitem a identificação dos dados que serão objeto

de análise, partindo das categorias estabelecidas anteriormente. Estes quadros,

além das perguntas principais contêm outras complementares, que são levadas em

consideração na análise, embora não tenhamos estabelecido categorias específicas

para estas. Somente quando relevantes foram criadas novas categorias, em função

do curso da análise, levando em conta a importância das informações.

Para visualizar mais facilmente as entrevistas com professores de Arte e de

outras disciplinas, colocamos em quadros separados, as entrevistas de nº 1 a 16

para a área de Artes Visuais e nºs 17 a 20, para Português, Matemática e Ciências.

A organização do trabalho de análise segue o Quadro 5 (itens 3.3.4 e 3.3.5).

108

3.3.3.1 Quadros síntese de respostas

5 6 7 8

Tempo que trabalha como professora de Arte

26 anos*

11 anos de Arte 29 anos 15 anos 24 anos

Série(s) em que leciona Pré a 4ª, 5ª a 8ª e EJA Pré a 4ª, 5ª a 8ª e Ensino Médio

5ª a 8ª série 5ª a 8ª e Ensino Médio

Costuma trabalhar com imagens? Com que tipo de imagens?

Sim.

Geralmente obras de arte.

Sim.

Obras de arte, propaganda.

Sim.

Obras de arte, propaganda.

Sim (raras vezes).

Obras de arte e imagens que sirvam de referência para o desenho da figura

humana.

Ensina sobre a linguagem dos quadrinhos? (Para quem?)

Sim. Quando era professora de

1ª a 4ª, usou HQs para ensinar Português, e agora,

para ensinar sobre a charge, abordou os

quadrinhos - para o 6ª período (8ª série) do EJA.

Sim.

Uma vez por ano, para as 5ªs, 6ªs, 7ªs e 8ªs séries.

Sim.

Para 6ªs e 7ªs séries.

Não.

Trabalha com releitura e mais com composição.

Como desenvolve esta atividade?

Iniciou com a história dos quadrinhos, para poder ensinar sobre a charge.

Trabalha a parte visual das HQs, depois do trabalho de

criação de texto realizado na disciplina de Português.

Ensina pelo que vê nos livros. Primeiro a

construção do personagem, depois criação da história.

Não desenvolve.

Adota metodologia para ensinar sobre HQs?

Ainda não trabalhou com HQs.

Interdisciplinaridade. Técnica e livre criação. Não trabalha com HQs.

Qual critério utiliza para a escolha das HQs a serem trabalhadas em aula? (Que autor(es) utiliza?)

Prefere escolher primeiro autores locais (Maurício de Souza, Ziraldo). Faria uma

pesquisa em função do tema.

Usa autor nacional: Maurício de Souza.

Autor conhecido, “brasileiro”: Maurício de

Souza.

Não trabalha com HQs.

* Outra disciplina ou ensino de 1ª a 4ª série. Quadro 8 – Síntese das respostas - entrevistas nºs 5, 6, 7 e 8

1 2 3 4

Tempo que trabalha como professora de Arte 5 anos

12 anos*

6 anos de Arte 9 anos 20 anos*

13 anos de Arte

Série(s) em que leciona 5ª a 8ª e Ensino Médio (1º e 2º ano)

1ª a 4ª série 1ª a 4ª, 5ª a 8ª e Ensino Médio

5ªs e 6ªs séries

Costuma trabalhar com imagens? Com que tipo de imagens?

Sim.

Obras de arte, histórias em quadrinhos e outras.

Sim.

Obras de arte, propaganda.

Sim.

Geralmente, obras de arte.

Sim.

Obras de arte, propaganda.

Ensina sobre a linguagem dos quadrinhos? (Para quem?)

Sim.

Uma vez por ano, para as 5as e 6as séries.

Sim.

Ensinou 2 vezes, para a 2ª série.

Sim.

Ensinou 1 vez, para a 5ª série.

Não.

Como desenvolve esta atividade?

Leva várias histórias, os alunos lêem, observam, copiam ou desenham.

Geralmente 3 quadrinhos.

Uma vez, levou a história, depois pediu para os alunos desenharem uma seqüência. Outra vez ensinou sobre os

planos, usando as HQs.

Ensinou sobre as onomatopéias.

Não.

Porque “a professora de Português tem trabalhado muito.”

Adota metodologia para ensinar sobre HQs?

Usa método tradicional, desenho de observação,

cópia, memória.

Procura ser criativa, faz associações com outras

atividades.

Solicitou para identificar os elementos

(onomatopéias) no gibi.

Não trabalha com HQ.

Qual critério utiliza para a escolha das HQs a serem trabalhadas em aula? (Que autor(es) utiliza?)

Usa autor conhecido – Maurício de Souza. Acha “mais rápido” para levar

para os alunos.

Prefere usar Maurício de Souza, porque tem um desenho

claro e limpo.

Deixa a critério dos alunos e leva algumas opções.

Não trabalha com HQ.

* Outra disciplina ou ensino de 1ª a 4ª série. Quadro 7 – Síntese das respostas - entrevistas nºs 1, 2, 3 e 4

109

9 10 11 12

Tempo que trabalha como professora de Arte

30 anos 1 ano e meio 3 anos 10 anos*

5 anos de Arte

Série(s) em que leciona Educação Infantil e 1ª a 4ª 5ª, 6ª e 7ª série 1ª a 7ª série 5ª a 8ª série

Costuma trabalhar com imagens? Com que tipo de imagens?

Sim.

Obras de arte, propaganda e outras.

Sim.

Obras de arte, propaganda, imagens de

revistas.

Sim.

Obras de arte, propaganda.

Sim.

Obras de arte.

Ensina sobre a linguagem dos quadrinhos? (Para quem?)

Não ensinou. Mas usou as onomatopéias uma vez para ensinar música, no

pré, 1ª e 2º série.

Sim.

Para as 6ªs e 7ªs séries.

Não. Sim.

Ensinou uma vez para a 6ª série.

Como desenvolve esta atividade?

Não ensinou porque acha difícil. Não teve tempo para

se preparar para isso.

Leva a história, os alunos lêem, ensina sobre a

linguagem, depois os alunos constroem uma história.

Não desenvolve, porque no colégio é ensinado só na 8ª

série.

1º as partes isoladamente, finalizando com criação da história.

Também ensina a ampliar e reduzir figuras.

Adota metodologia para ensinar sobre HQs?

Não. Técnica e livre criação. Não trabalhou com HQs. Criação livre e cópia.

Qual critério utiliza para a escolha das HQs a serem trabalhadas em aula? (Que autor(es) utiliza?)

“Difícil escolher.” Usou Maurício de Souza, quando ensinou música

com os sons das onomatopéias.

Autor nacional. Maurício de Souza e outros.

Se o fizesse, utilizaria revistas e gibis que os alunos costumam ler.

Prefere usar Maurício de Souza - distingue das HQs que têm temas

“mais pesados.”

* Outra disciplina ou ensino de 1ª a 4ª série.

Quadro 9 - Síntese das respostas - entrevistas nºs 9, 10, 11 e 12

13 14 15 16

Tempo que trabalha como professora de Arte

1 ano e meio 15 anos 13 anos

1 ano Artes

15 anos*

2 anos de Arte

Série(s) em que leciona 1ª a 4ª e 5ª a 8ª série 6ª série e ensino Médio 7ª série e ensino Médio 1ª a 4ª e 5ª série

Costuma trabalhar com imagens? Com que tipo de imagens?

Sim.

Obras de arte, propaganda.

Sim.

“Dentro do possível.” Obras de arte, imagens de revistas, propaganda,

histórias em quadrinhos.

Sim.

Obras de arte, propaganda.

Sim.

Obras de arte, propaganda,

rótulos, adesivos.

Ensina sobre a linguagem dos quadrinhos? (Para quem ?)

Sim

Ensinou uma vez para a 6ª série.

Sim

Todo ano, para todas as turmas - de 5ª à 8ª série.

Sim

Ensinou duas vezes - na 4ª e 7ª série.

Não ainda.

Como desenvolve esta atividade?

Levou as releituras de obras de arte de Maurício de Souza e falou sobre a

história das HQs. Atividade: bloquinho de

animação.

Passa as noções básicas de “como criar um quadrinho”, depois pede

para o aluno criar.

Enquanto contava uma história (inventada) os alunos desenhavam.

Não desenvolve. Já usou desenhar seqüências como

técnica para memorizar peça

de teatro.

Adota metodologia para ensinar sobre HQs?

Não. Desenho de observação, treinamento técnico e criação livre.

Procura variar. Trabalha por temas.

Não.

Qual critério utiliza para a escolha das HQs a serem trabalhadas em aula? (Que autor(es) utiliza?)

Autor conhecido – Maurício de Souza. “É mais fácil

porque os alunos podem levar.”

O critério é material que sirva como referência para desenho. Nem

sempre leva HQ. Pede aos alunos para levar e trabalha conforme o

material que o aluno tiver: Maurício de Souza e outros.

Acha Maurício de Souza muito estático.

Prefere usar filmes de animação.

“Acho [Anima Mundi] material muito bom.”

Levaria HQs menos comerciais.

* Outra disciplina ou ensino de 1ª a 4ª série.

Quadro 10 – Síntese das respostas - entrevistas nºs 13, 14, 15 e 16

110

17

18

19

20

Tempo que trabalha como professora de ...

Português

27 anos

Português

25 anos

Matemática

28 anos

Matemática

17 anos

Ciências

15 anos

Português

12 anos

Série(s) em que leciona

7ª série 5ª e 6ª série 5ª e 6ª série 7ª e 8ª série 5ª e 6ª série 5ª a 8ª série

Costuma trabalhar com imagens? Com que tipo de imagens?

Sim.

Todo tipo de imagem. Obras de arte, desenhos de humor, HQs, etc.

Sim.

Todo tipo de imagem. Obras de arte, desenhos de humor, HQs, etc.

Não. Não. Não. Sim.

Todo tipo de imagem. Obras

de arte, desenhos de humor, HQs,

etc.

Ensina sobre a linguagem dos quadrinhos? (Para quem?)

Sim.

Para a 7ª série (e todas as turmas

em que lecionou).

Sim.

Para as 5ª s e 6ªs séries (e todas as

turmas em que lecionou).

Não.

Usa para ensinar ou ilustrar situações em que apareçam

operações matemáticas.

Nas 5ªs e 6ªs séries (todas as turmas).

Não.

Usa para ensinar ou ilustrar situações em que apareçam

operações matemáticas.

Nas 7ªs e 8ª s séries (todas as turmas).

Não.

Usa como atividade para sair da rotina.

Faz essa atividade em

todas as turmas que leciona.

Sim

Para turmas de 5ª à 8ª série.

Como desenvolve esta atividade?

Faz leituras e construção de histórias em quadrinhos.

Nas leituras, faz 1º leitura do texto, 2º leitura da imagem

3º associação entre texto e

imagem, para depois o aluno construir sua

história, utilizando conteúdos da

disciplina.

Faz leituras e construção de histórias em quadrinhos.

Nas leituras, faz 1º leitura do texto, 2º leitura da imagem

3º associação entre texto e imagem,

para depois o aluno construir sua

história, utilizando conteúdos da

disciplina.

Os alunos constroem histórias

em quadrinhos onde deve aparecer

o conteúdo trabalhado em Matemática.

Os alunos constroem histórias

em quadrinhos onde deve aparecer

o conteúdo trabalhado em Matemática.

Primeiro passa o conteúdo em

Ciências, depois pede para os

alunos construírem uma história na qual

conste este conteúdo.

Parte da imagem para

construir a história e vice-

versa – parte do texto para construir a imagem.

Qual critério utiliza para a escolha das HQs a serem trabalhadas em aula? (Que autor(es) utiliza?)

Escolhe imagens de HQs mais

freqüentemente veiculadas pelas mídias e mais

curtas, como as tiras humorísticas.

Escolhe imagens de HQs mais

freqüentemente veiculadas pelas mídias e mais

curtas, como as tiras humorísticas.

Não utiliza imagens de HQs (impressas ou semelhantes). Trabalha com a

criação do aluno.

Não utiliza imagens de HQs (impressas ou semelhantes). Trabalha com a

criação do aluno.

Não utiliza imagens de HQs

(impressas ou semelhantes).

Trabalha com a criação do aluno.

Seleciona as imagens de

HQs das apostilas, em

função da necessidade do aprendizado do

aluno.

Quadro 11 - Síntese das respostas - entrevistas nºs 17A, 17B, 18A, 18B, 19 e 20

3.3.4 Categorias 1 e 2

Para analisar as questões 1 e 2 do roteiro base (Quadro 5), que têm por

objetivo saber se os professores trabalham com imagens e com que tipos de

imagens costumam trabalhar, estabelecemos as categorias 1 e 2: Trabalho com

Imagens e Tipos de Imagens que o Professor Trabalha, respectivamente. As

respostas referentes a estas questões, encontram-se nos Quadros 12, 13, 14 e 15.

111

a) Pergunta 1: Costuma trabalhar com imagens na sala de aula ?

Trabalho com Imagens – Professores de Artes Visuais

1 “Muito, muito. [...].”

2 “Sim, sim.”

3 “Trabalho muito com imagens.”

4 “[...] normalmente eu trabalho com imagens. Eu levo a imagem.”

5 “Bastante.”

6 “Livros de arte, porque tenho muitos livros. [...]. Muitas imagens eu pego desses livros. [...]. Agora eu tenho usado fitas de vídeo, porque a escola tem bastante.“

7 “Sim.”

8 “Utilizo muito pouco. [...]. Trabalhava com releitura e muita composição.”

9 “É claro, com imagens, também.”

10 “Dentro do que eu posso sim. Eu tenho algumas. Outras eu ganhei também. Algumas a gente compra. Mas a escola acaba não fornecendo, então a gente tem que fazer do próprio bolso.”

11 “Sim.”

12 “Trabalho.” [com imagens]

13 “Eu trabalho com imagens de livros específicos. Tem a pasta do Arte BR [...]. Também pego imagens da Internet [...]. [...] a gente não tem livros, não tem nada, para nenhum dos eixos. Eu trabalho três eixos. Mas não tem material, tem que pesquisar. Os alunos também têm que pesquisar.”

14 “Dentro do possível. Porque a escola pública, é tão limitada! Não adianta falar que não é. E o problema da limitação não é só que não existe material. [...]. Até recebemos uns livros bons de arte, do governo. [...]. Só que eu não posso pegar aquele livro e mostrar de carteira em carteira. Tenho que fazer uma transparência, daí tenho que tirar do meu bolso, xerox, também. Em Artes Visuais, eu isso acho meio traiçoeiro. Porque em alguns momentos o xerox, ajuda. Em outros atrapalha. Eu mesmo, na escola pública, me mostraram muita coisa de xerox e na Faculdade, quando fui ver me decepcionei. Porque não é a mesma coisa. [...]. Você vai falar de artes, mostrando tudo em preto e branco? É complicado ! O colorido já é uma outra situação, que não é muito possível na escola.”

15 “Trabalho bastante, geralmente de livros porque não tem recurso na escola de slide, não tem projetor. Então, trabalho direto com livros e raramente eu tiro xerox. Xerox colorido também não dá, então trabalho com xerox preto e branco, o que não dá para fazer muita coisa.”

16 “Sim. Trabalho com livro que tem imagens. Também tenho [...] aquele material do Arte BR. [...]. E também peço doações. Peço para os colegas, alunos, tenho alguns materiais de revistas que eu plastifiquei e uso. [...] tiro da Internet [...]. Peço para a Pedagoga da escola que presta esse serviço.”

Quadro 12 – Categoria 1 - Trabalho com Imagens - referente à pergunta 1 – Arte

Trabalho com Imagens – Outras Disciplinas

17A Sim. “Utilizamos bastante.”

17B Sim. Idem.

18A Não trabalha em função do ensino sobre as imagens.

18B Idem.

19 Idem.

20 “Sim. A imagem é fundamental. A imagem associada à questão da letra, é fundamental. Para os menores, isso é mais freqüente, embora para os maiores também.”

Quadro 13 – Categoria 1 - Trabalho com Imagens - referente à pergunta 1 – Português, Ciências e Matemática

112

b) Pergunta 2: Com que tipo de imagens ?

Tipos de Imagens que o Professor Trabalha – Artes Visuais

1 “A maioria das vezes, eu mostro imagem do artista tal e vamos fazer uma releitura. Eu pergunto: __ O que vocês estão vendo? E aí segue. [...]. [...] outras imagens e histórias em quadrinhos. [...] Obras de arte.”

2 “Imagens de artistas, de obras de arte.”

3 “Principalmente com obras de arte. Faço visitas constantes à casa de artes, também.”

4 “[...] eu trabalho com obras de arte e outras imagens também [...] as vezes de propaganda, tem umas imagens. [...] ou de obras abstratas [...]. pintura [...].”

5 “Obras de artistas, mas tudo relacionado, por exemplo, com o conteúdo que eu quero dar.”

6 “Obras de arte. [...]. A escola tem várias coleções. [...]. Tem uma coleção que se chama Grandes Gênios da Pintura. Esta coleção tem em livros e também em fitas. [...] Leonardo da Vinci, Miguel Ângelo, e aí vem. [...]. Eu usei muitas imagens de propaganda, quando eles fizeram um trabalho sobre a influência das obras de arte na propaganda.”

7 “Levo, mostro transparências. Falo sobre o autor. [...]. [...] trabalho propaganda.”

8 “[Obras de arte] raras vezes [...]. Às vezes a gente usa imagens de livros de anatomia, de figuras humanas que servem como referência para o desenho e a modelagem.”

9 “Eu procuro levar artistas acessíveis às crianças [...] Uso muito jornal. [...] além de artista eu uso bastante a propaganda, outdoors, a televisão que eles estão vendo, tal propaganda que eles conhecem. Então uso imagem da revista, do jornal, da mídia.”

10 “Normalmente não trabalho só com imagens de artistas, de obras, mas até com revistas, a gente faz leitura de revistas, jornais, propaganda.”

11 “De todos os tipos. [...]. Todo tipo de imagem, por exemplo, sobre o Egito, Portinari. [...]. Na 5ª série, imagem da Tarsila, Van Gogh. [...] propaganda.”

12 “Tudo levando imagens de artistas [Tarsila, Di Cavalcanti, Van Gogh, David, do gótico].”

13 “Obras de arte, artistas.”

14 “Eu trabalho bastante com imagens de revistas, que a gente tem mais a mão. A escola tem, então é mais fácil de trabalhar. Jornais, propaganda.”

15 “Contemporânea. [...]. O que a gente tem de recurso é em jornal e revista (propaganda também). [...]. [...] por exemplo, Cubismo, pego imagem da revista e fazemos montagem. Alguma coisa assim. É o recurso que tem.”

16 [Obras de arte, arte postal, propaganda] “Pego adesivos, rótulos, fui trazendo.”

Quadro 14 – Categoria 2 - Tipos de Imagens que o Professor Trabalha - referente à pergunta 2 – Arte

Tipos de Imagens que o Professor Trabalha – Outras Disciplinas

17A “Todo o tipo de imagem. Utilizamos bastante as imagens. Mesmo porque o próprio material da escola já está elaborado incluindo imagens. Imagens de obras de arte, vários artistas, tiras humorísticas, cartuns, charges, propaganda.”

17B Idem. “Todo o tipo de imagem.”

18A Não utiliza imagens para ensinar sobre elas. Usa apenas as imagens didáticas que a apostila contém para o ensino da disciplina.

18B Idem.

19 Idem. Não utiliza outras imagens, além das imagens da apostila de Ciências.

20 “Todo tipo de imagem. A imagem é fundamental, eu acho assim. [...]. O próprio material didático escolhido, contempla a questão da imagem, não só o texto. É claro que a proporção é menor. Para os pequenos e os mais jovens da 5ª a 8ª, a imagética é bem maior. A utilização das imagens é bem mais intensa, até porque eles precisam do concreto para depois transformar isso em um representado, que é a letra. [...]. Esse material normalmente contempla a questão visual [...]. E sempre a imagem acaba fazendo parte. [...]. As tiras humorísticas são recorrentes no material didático. Hoje se você for fazer uma análise de material didático, os bons materiais trazem.”

Quadro 15 – Categoria 2 - Tipos de Imagens que o Professor Trabalha - referente à pergunta 2 – Português, Ciências, Matemática

113

3.3.4.1 Outras categorias identificadas nas respostas dos entrevistados

A partir das respostas obtidas com as questões 1 e 2, estabelecemos outra

categoria, a fim de analisar o trabalho realizado com essas imagens. Inserimos as

respostas dos docentes sobre o trabalho que realizam com as imagens,

relacionadas às leituras e releituras de imagem, nos Quadros 16 e 17, dentro da

categoria Leituras de Imagem. Matemática e Ciências não foram incluídas nesta

categoria, pois as três professoras destas disciplinas (nºs 18A, 18B e 19), utilizam

HQs mais como atividade para os alunos e não para fazer leituras interpretativas ou

outro tipo de leitura (ver Quadros 13, 15 e Quadros Síntese).

Leituras de Imagem - Professores de Artes Visuais

1 “A maioria das vezes, eu mostro imagem do artista tal e vamos fazer uma releitura. Eu pergunto: __ O que vocês estão vendo? E aí segue. [...]. Ah! Até os alunos reclamam um pouco: __Ai! Professora, o que estou vendo, olha! Então digo para eles: __ Mas isto é para vocês não chegarem frente quadro e dizer:__ Ah! O que é isto? Vocês têm que observar a cor que foi mais usada nesse trabalho. São várias perguntas que eu faço para eles. Daí eles vão olhando no trabalho.”

2 “Eles olham uma vez a obra e eles me dizem o que vêem, à primeira vista. Depois vou instigando com algumas perguntas: _ Mas, e as cores? E os formatos? A imagem em si, o que ela está apresentando, aonde nos leva? O que elas nos faz ? Eles vão criando uma idéia, uma problematização. A própria escola, o que tem a ver com a própria escola, alguma coisa. Em cima dessa problematização, eles vão chegar a fazer uma obra, mas não refazendo a obra, [...]. Eles criam uma obra em cima daquela problematização, que saiu da imagem, não releitura. Eles fazem uma construção deles. O que mudaríamos, se mudaríamos a forma, a maneira de pintar, utilizaríamos qual material [...].” “[...] digo para eles que é um texto, a imagem é um texto que você põe e não precisa falar nada, porque a pessoa vai ter um entendimento sobre aquilo.”

3 “Trabalho com a leitura. A leitura é sempre feita com os alunos e a professora junto, sobre as obras do artista. Faço a leitura do dia para que eles visualizem e interpretem a partir do conhecimento que eles possuem. A seguir passo a biografia e as obras do artista. Assim eles podem fazer uma análise bem melhor da obra. [...]. Nem sempre faço atividade prática.”

4 “Mesmo dentro dos jogos teatrais, que é aquilo que a gente já tinha comentado, eu uso muitas vezes as obras de arte. Esta obra é de fulano, é de tal época, retratou isso... dou uma pincelada sobre o artista e eles trabalham a parte da obra. Montam a cena, dão vida à cena, então já trabalhando com as artes visuais. [...]. É uma leitura corporal, digamos. [...]. Eu procuro sempre situar o artista dentro da época dele, que tipo de técnica ele usava, falo alguma coisa da técnica, dentro do contexto sócio político que ele vivia, dentro do contexto da História da Arte. [...].”

5 “Levo a imagem, daí faço eles fazerem uma leitura do que estão vendo. Eles dizem: _ Ah! Estou vendo isso, isso. Eles vão fazendo uma listagem daquilo que eles vêem, e depois a gente vai comentando. Depois eu falo da obra, do artista. [...].” “[...]. Depois que falar da obra vou situar a obra em tempo e espaço, daí vou falar dele, do artista, porque o artista fez aquela obra, porque pintou, esculpiu.” [a professora contextualiza, depois faz atividade com os alunos]

6 “A leitura da obra, como sempre, estabeleço alguns critérios para eles. Por exemplo, vou trabalhar volume, profundidade, a forma, a cor que se usava, a época. Fico mais dentro de uma análise assim. Eles já sabem, quando olham uma obra o que tem que ver, quais as formas, se é figurativo ou abstrato, se tem volume, ou não, cor forte, viva, suave... caminham por aí, para eles perceberem os elementos caracterizadores da arte nas obras de arte, época, diferenciar épocas.”

7 “Levo, a imagem mostro transparências. Falo sobre o autor. [...]. Falo sobre a História da Arte. As obras, algumas releituras, a gente faz. [...]. Atividade prática, atividade plástica, tudo relacionado.”

8 “Gosto mais de trabalhar com temas livres, não gosto muito de releituras e trabalho muito pouco com isso. [...]. Na releitura, trabalhei muito com impressionismo. Fazia o trabalho de releitura em cima de obras impressionistas. Levava a obra de um artista e em cima disso, os alunos faziam a produção deles.”

9 “Vou descrever [...] o cartão do dia dos pais [...]. Esse foi o último trabalho de leitura, que fizemos. A inspiração foi em Mondrian. Eu conto quem era o artista, dou uma breve palavrinha sobre o artista, onde ele nasceu, que já faz tempo,

114

que já morreu. Como ele começou a pintar, como ele pintou mais tarde. Uma breve história do desenho dele. Depois eles fizeram um cartão, do dia dos pais, com colagem, inspirados na última fase do Mondrian, que era o geometrismo.”

10 “[...] ano passado a gente trabalhou em grupo. A princípio pegava [um artista] como exemplo. Normalmente tenho trabalhado com cores. Então começava pelas cores, quais as cores que eles viam, se eram primárias, secundárias, terciárias, isso na 5ª série. Eles vão apontando, se não me engano era Renoir. Depois feita essa primeira parte com eles, começava a incitar para eles perceberem mais coisas. [...]. Cada grupo ficou com uma imagem de um artista. Atrás [da imagem] eu tinha a história dos artistas [...]. Então cada grupo responde algumas perguntas, no mesmo molde daquelas que eu fazia com eles. Eles têm um questionário para responder, então o grupo se ajuda. Isso dentro do conteúdo anterior que eu dei, aí eles vão fazer aquela leitura.”

11 “Na 5ª série, trabalhei com imagem da Tarsila, Van Gogh. Comecei também um auto-retrato. Na 4ª série, muita imagem da Tarsila, comecei a trabalhar figura e fundo com eles. Eu sempre levo esse tipo de coisa, para dar respaldo para a gente poder trabalhar [...]. Eu trabalho o conteúdo, a linguagem.”

12 “Trabalho. [...] para eles observarem as imagens, fazerem uma análise daquela imagem não só oralmente mas também por escrito. [...]. Então por exemplo, estou trabalhando com a 6ª série: a perspectiva. Antes de entrar na perspectiva, trabalhei figura e fundo. O que é figura, o que é fundo. Tudo levando imagens de artistas e estou trabalhando agora, 1º e 2º planos. E está dando um resultado bem legal. Trabalhei assim: levei 4 imagens, uma da Tarsila, outra do Di Cavalcanti, outra do Van Gogh e uma do David, do gótico.Fiz algumas perguntas sobre as imagens, eles responderam por escrito. [...].”

13 “Também pego imagens da Internet, que eu imprimo e trago para realizarmos uma releitura em sala de aula. [...]. Levo e apresento. Explico quem é o autor. Pego por movimentos. Movimento da arte Moderna, Cubismo, por exemplo, explico como foi. Porque nasceu, quais os objetivos daquele movimento. Falo de cada autor do cubismo, que foi como ele era, porque era feito daquela maneira.”

14 “Depende da proposta que eu tenho para aquela aula. Pode ir para várias situações. Ou partir de uma leitura, ou o aluno criar um texto em cima. Não obrigatoriamente fazendo uma leitura só da imagem, mas fazendo uma contextualização, ou estar trabalhando a parte visual da imagem. Recompondo sem pensar em cópia, nem releitura, entrando naquela linha e tentando entrar naquele tipo de composição. Então tem várias formas de trabalhar a imagem.”

15 “[...] os alunos de 7º série, se for coisa muito teórica, eles já não gostam [...]. Então fiz um acordo com eles. Minha metodologia é essa: uma aula teórica, uma prática, uma teórica, uma prática.”

16 Trabalha com livro: “a parte teórica do movimento artístico. [...] Sempre tem um ou dois artistas. Mas o enfoque é sempre um, com duas ou três obras desse mesmo artista em momentos diferentes e daí propõe mais duas obras como referência do mesmo movimento, mesmo estilo que está sendo trabalhado. Propõe atividades práticas, uma ou duas vezes.”

Quadro 16 – Categoria - Leituras de Imagem - Arte

Leituras de Imagem - Professores de Português

17A

“Num primeiro momento fazemos a leitura do texto. Esta é uma 1ª leitura. Depois partimos para a imagem. Esta é a 2ª leitura. Em seguida passamos para uma 3ª leitura, que é uma associação entre texto e imagem. Fazem-se ligações entre a imagem e o texto e vice-versa.” Então são três leituras diferentes ? “_ Sim, 3 leituras. Na primeira, a gente lê o texto, depois passa para a imagem, depois fazemos ligações entre uma e outra.” E essa segunda leitura, a leitura da imagem, como você faz [...]? “Começamos pelo que está no primeiro plano, o que está na frente. Por exemplo: aquela imagem da parede. Tem dois cachorrinhos no primeiro plano, atrás deles tem um objeto - uma ponte. __ O que está fazendo essa ponte ali? Como é esta ponte? Depois o plano posterior, e assim por diante. Nesta outra imagem [...] é uma imagem que está associada ao movimento. Então perguntamos ao aluno: __ Porque a imagem está associada ao movimento ? O que indica isso? A cor do fundo, qual o efeito dessa cor?” “[...]. Depois de feita esta leitura, passamos para as associações entre imagem e texto. O aluno vai estabelecendo conexões. O que este elemento, esta cor, esta figura tem a ver com o texto? Porque foi usada essa imagem para ilustrar esse texto? Etc.”

17B “A imagem é semelhante a um texto. É como o texto escrito.” “[...]. Agora por exemplo, estou trabalhando com os alunos uma obra de Van Gogh, os Girassóis. Eles fazem primeiro a leitura da imagem, depois elaboram um texto escrito sobre esta imagem.” “[...]. Falamos sobre a imagem também, neste caso a obra do Van Gogh. Até podemos trabalhar algum conteúdo, como a gramática, ou regras da linguagem. [...]. Mas o objetivo principal nosso, é que eles que eles interpretem essa imagem e aprendam a fazer uma leitura da imagem.” Obs.: Ambas, 17A e 17B, trabalham a leitura de imagem, da mesma maneira: “Trabalhamos da mesma forma. Esta leitura é feita com todos as turmas. Começamos desde a 5ª série, até a 8ª.”

20 “Pode-se por exemplo, fazer-se uma interpretação que não é específica, não só porque é língua portuguesa, interpretação de mundo, que transcende essa questão da língua. É claro que o fim pedagógico é o ensino e o domínio da língua portuguesa. Só que não fica restrito a isso.” Obs.: Para a leitura das imagens, tiras humorísticas e HQs, parte da própria imagem, trabalha a parte da

115

interpretação sem o texto, depois parte para o texto, que é interpretação da imagem.

Quadro 17 – Categoria - Leituras de Imagem - Português

3.3.4.2 Descrição e interpretação de dados: categorias 1 e 2

Os Quadros nºs 7, 8, 9, 10 e 11 contêm as sínteses das respostas das

entrevistas. Nestes quadros podemos ver que todos os professores de Arte

trabalham com imagens. Cem por cento deles utiliza imagens de obras de arte e a

maioria faz leituras de obras no seu ensino. Isso pode ser observado com detalhes

nos Quadros 12, 14 e 16 que contêm os trechos das entrevistas que o revelam.

Entre os professores de outras disciplinas, nem todos o fazem (ver Quadro 13).

Doze entre os 16 professores de Arte citaram fazer leituras ou trabalhar com

de imagens de propaganda e imagens diversas, como da televisão ou do jornal (ver

Quadros síntese e Quadro 14). Alguns fazem leituras dessas imagens, outros as

utilizam com outras finalidades, como por exemplo, ensinar elementos da linguagem

visual e montagem de trabalhos de expressão ou criação. Alguns professores

relacionam, outros não relacionam com o movimento artístico que está sendo

estudado. Uma delas (nº 3) mencionou na entrevista considerar as mídias, mas não

deixou claro se já havia feito um trabalho de leitura ou outro trabalho com imagens

de propaganda. Três professores de Arte demonstraram nunca ter trabalhado com

imagens diferentes de obras de arte tradicionais (nºs 5, 8 e 12). Porém nºs 5 e 12, já

trabalharam com HQs, pelo menos uma vez.

O único motivo encontrado para dificultar o trabalho com imagens foi o

problema para conseguir material, citado por 4 professores que trabalham em

escolas públicas do Estado. Segundo um deles, as escolas até recebem alguns

livros, mas para o trabalho com imagem não é suficiente, porque é preciso ampliar

as imagens para o trabalho em sala de aula. Normalmente, como disseram esses

professores, acabam fazendo isso “do próprio bolso”.

Os 3 professores formados em Teatro também fazem uso da imagem. Dos

três, 2 trabalham com Artes Visuais e normalmente utilizam imagens. A única

professora que trabalha mais especificamente com Teatro (nº 4) utiliza imagens para

116

fazer releituras corporais e geralmente leva imagens de obras de arte – às vezes

utiliza imagens de propaganda – mas nunca histórias em quadrinhos.

Pelas respostas obtidas, parece ser difícil hoje encontrar uma concepção de

ensino de Arte que não se baseie no uso da imagem. Desde que no final da década

de 1980 passou-se a incluir a imagem como fonte de conhecimento associada à

História da Arte (BARBOSA, 1991) e, mais propriamente, com a difusão da Proposta

Triangular a partir do início da década de 1990, tornou-se elemento imprescindível

no ensino de Artes Visuais (PILLAR, 1999), trazendo também melhora significativa

para este ensino. Desde então o trabalho com outras imagens passou também a ser

requisitado e valorizado. Porém a questão das imagens divulgadas pelas mídias

trouxe novas preocupações, e o grande desafio tornou-se qualificar novas propostas

que tivessem relação com o mundo contemporâneo e com a formação dos alunos

(HERNÁNDEZ, 2000; FRANZ, 2003b, 2003c, 2003d; ALMEIDA, 1999).

Quanto aos professores de Português entrevistados, trabalham

freqüentemente com imagens, mesmo porque o próprio material didático já as inclui,

tanto na escola particular quanto na escola pública. Estes docentes não se limitam a

fazer breves referências às imagens que acompanham os textos, ou usar somente

para ensinar conteúdos de sua disciplina. Costumam também fazer leituras de

imagens (ver Quadros 13, 15 e 17). O mesmo não ocorre com os professores de

Ciências e Matemática, que não trabalham com leituras de imagens. Para esses

últimos, a imagem serve mais como recurso didático, apoio ou visualização dos

conteúdos, explicação do texto, ou ilustração conforme o assunto.

Além de trabalharem com leituras de imagens diversas, os professores de

Português também fazem leituras de imagens de histórias em quadrinhos, da

mesma forma como trabalham com outras imagens. Com os professores de Arte, da

amostra colhida isso não acontece, o que nos aproxima do problema de pesquisa

levantado no início da presente investigação (ver Quadro 16). Nenhum deles realiza

leituras interpretativas críticas de histórias ou de imagens de HQs. Há um único

professor que relata fazer discussões sobre quadrinhos algumas vezes, (nº 14), mas

não leituras com vistas a interpretação e esta é uma prática que realiza mais no

ensino médio. Duas professoras de Português (nºs 17A e 17B) indicam fazer leituras

baseadas nos elementos da imagem e uma delas (nº 20) trabalha com leituras

críticas.

117

3.3.4.3 Interpretação e avaliação crítica: categorias 1 e 2

No ensino que enfatizava a livre-expressão individual, as interferências

externas eram consideradas prejudiciais e havia preconceito para incluir imagens no

ensino de arte. A partir de finais de década de 1980, como visto no Capítulo II (item

2.1 e 2.1.1), a Proposta Triangular desenvolvida por Ana Mae Barbosa, por meio de

leituras de imagens contextualizadas, passou a ser uma das propostas mais

difundidas nas escolas. A Proposta Triangular corresponde à leitura da obra, História

da Arte e fazer artístico associados. Segundo os PCNs/98 (p. 29), corresponde aos

três aspectos da aprendizagem propostos por Eisner56, denominados por produtivo,

crítico e cultural, ou ainda ao que aponta Howard Gardner57 “como três aspectos da

competência em artes visuais, a saber: a percepção, a conceitualização e a

produção.”

Desde então, a imagem tornou-se fundamental no ensino de Artes Visuais,

época em que surgiram também as releituras – criações realizadas tomando-se por

referência outras obras de arte (PILLAR, 1999). Conforme Pillar (1999) e Barbosa

(1991), existem diversas possibilidades de leituras: biográfica, estética, formal,

iconográfica e semiótica e a leitura crítica, que este estudo aborda.

Segundo os depoimentos, a maioria dos docentes entrevistados não relaciona

as imagens com a vida do estudante, conforme os pressupostos da educação pós-

moderna, nem trabalha com a leitura crítica da sociedade e da cultura. Nas

entrevistas analisadas, alguns demonstram que trabalham leituras de obras de

maneira semelhante à Proposta Triangular (nºs 3, 4, 5, 6, 7, 9, 16), ou seja, associam

a leitura com a contextualização da obra e o fazer artístico, muito embora grande

parte dessas leituras seja realizada superficialmente. Alguns enfatizam mais a

História da Arte (nº 3). Um ou outro, não se prende tanto à História da Arte, como um

deles (nº 14) que não segue um modelo fixo e procura diversificar suas propostas de

trabalho. Outros acreditam mais na arte como instrumento de desenvolvimento da

sensibilidade, como diz uma das professoras:

56 EISNER, Elliot W. Educar la visión artística . Barcelona: Paidós Educador, 1995. 57 GARDNER, Howard. Educación artística y desarrollo humano . Barcelona: Paidós, 1994.

118

“Olha, acho que a História da Arte, ainda é importante. Só que é muito importante, a gente sensibilizar essas crianças. Se você for uma pessoa sensível, você vai conseguir enxergar outras coisas. Você ver uma obra arte, ou assistir alguma coisa. Se você foi tocado, se você estudou, com sua sensibilidade você vai respeitar, vai ter outros olhos para ver aquilo. Acho que está muito na sensibilidade.” (nº 7).

Essa resposta está associada à concepção de ensino modernista, de livre-

expressão, ou a educação através da arte58, na qual se enfatizava a arte como meio

para o desenvolvimento da expressão e da harmonia ou do equilíbrio emocionais.

Segundo Pillar (1999) e Barbosa (2005b), tem havido equívocos e pouca

compreensão sobre o conhecimento implícito em leituras e releituras de imagens.

Para essas autoras, muitos professores acabam trabalhando a releitura como cópia

e não como uma criação baseada em um referencial, transformando e criando novos

significados. Equívocos também foram encontrados nas entrevistas dos professores,

porém de outra natureza. Alguns deles atribuem o termo “leitura” quando na

realidade estão fazendo uma “releitura” e vice-versa (ver Quadro 16, nº 1, 2, 4, 9 e

13).

As respostas, em sua maioria, indicam que os professores entendem leitura

de obra apenas como olhar, ver o que está na imagem, no sentido que Franz (2003,

2005b) assinala: “o sentido comum” (ver Quadros 16 e 17).

Grande parte dos professores não chega a fazer com que os alunos falem

sobre as imagens. As professoras nº 13 e 15 realizam aulas expositivas sobre os

movimentos artísticos, incluindo as imagens, o que não significa, estarem fazendo

leituras. Isso denota, sim, ensino tradicional, em que o conhecimento é transmitido

pelo professor, sem a participação dos alunos. Uma das professoras (nº 15), depois

de expor os assuntos, movimento artístico, sua história, artistas integrantes e obras,

parte diretamente para atividade de criação dos alunos.

No primeiro trecho do Quadro 16, a professora nº 1, cita releitura quando na

realidade está fazendo uma leitura com os alunos. De maneira semelhante a

professora nº 13, diz fazer uma releitura, quando leva a obra, apresenta e fala sobre

ela, o autor, o movimento, quando trabalha somente a parte teórica. Ambas

denominaram esse trabalho como releitura.

Ler uma obra é explorar um texto com o objetivo de compreendê-lo e “reler é

ler novamente é reinterpretar, é criar novos significados.” (PILLAR, 1999, p. 18).

58 Ver também READ, Herbert. A educação pela Arte . São Paulo: Martins Fontes, 1982.

119

Segundo Pillar (1999), a leitura vem sendo concebida como algo mais teórico, e

releitura como uma nova criação a partir de uma obra.

Para saber o que é ler, conforme Pillar (1999), é preciso saber antes o que é

um texto – o que é compreender um texto. Segundo Gadotti (apud PILLAR, 1999, p.

12), texto “vem do latim ‘textus’, que significa ‘tecido, trama, encadeamento de uma

narração [...] algo acabado, uma obra tecida, um complexo harmonioso.”

Compreender um texto é adentrar seu contexto, adentrar seus significados. A

compreensão é realizada sempre por um sujeito e depende de seu contexto mental,

de sua história de vida e do contexto da obra. Pillar (1999) destaca que “o

observável” sempre terá a marca e dependerá daquele que observa.

Ao ler, estamos entrelaçando informações do objeto, suas características formais, cromáticas, topológicas; e informações do leitor, seu conhecimento acerca do objeto, suas inferências, sua imaginação. Assim, a leitura depende do que está em frente e atrás de nossos olhos. (PILLAR, 1999, p. 18).

Assim como Pillar (1999) assinala que a leitura terá suas conclusões afetadas

pelo conhecimento do próprio sujeito, para Franz (2003a), igualmente é importante a

relação do mundo pessoal e social do educando. Na obra Educação para uma

Compreensão Crítica da Arte (2003a), essa autora faz uma análise das

compreensões que os indivíduos possuem para analisar e interpretar obras de arte.

As compreensões variam e vão desde as mais ingênuas ao nível do especialista

(FRANZ, 2003a). As compreensões têm influência no resultado das interpretações.

Compreender, segundo Hernández (2000, apud FRANZ, 2003a, p. 45),

é uma virtude cognoscitiva e experiencial de tradução entre um original, isto é, uma informação, um problema, e o conhecimento pessoal e grupal relacionado com ela. Essa relação implica estabelecer trajetórias entre o passado e o presente, entre os significados que diferentes culturas dão às manifestações simbólicas e às versões dos fatos que são objetos de estudo. Implica também níveis de compreensão, pois ainda que em termos gerais tudo seja válido, nem tudo tem o mesmo valor.

Conforme Franz (2005b, p. 1), “diante do desafio de ensinar os estudantes a

compreender a arte é comum a crença, entre professores e estudantes, de que a

arte fala por si mesma”, da mesma forma que existe uma outra crença sobre o que

dizem os estudantes a respeito da arte ou imagens: tudo o que é dito é aceito como

tendo o mesmo valor.

120

Todavia existem diferenças quando os estudantes se pronunciam a respeito

das obras de arte e outras imagens. Segundo Franz (2005b), as pesquisas mais

recentes sobre a compreensão da arte comprovam que há um grande diferencial

entre compreensões de iniciantes e de especialistas. Por isso, deixar os estudantes

falarem livremente sobre as imagens e manifestações artísticas pode ser importante,

mas isso, por si só, não é suficiente. Essa autora argumenta que, neste caso, existe

apenas um deslocamento do “eixo do ‘livre fazer’ (laissez-faire)” para o ‘livre-

interpretar’ com claras influências das práticas modernistas no ensino de Artes

Visuais.” (FRANZ, 2005b, p. 1). Destaca-se, ainda, que neste processo também o

papel do educador se anula, pois este não interfere no nível de conhecimento do

aluno, acarretando que os discentes permanecem em uma mesma etapa ou nível

compreensivo. Raramente se dá conta de que as compreensões podem ser mais

coerentes e melhores se houver uma intervenção educativa adequada.

De acordo com Franz (2005b, p. 6), “no processo de compreensão da arte há

níveis variados.” Para o professor de Artes Visuais que pretende que os alunos

alcancem um nível mais avançado de compreensão, é necessário que anteriormente

tome conhecimento sobre o nível inicial do estudante. A verbalização, ou o falar

sobre a arte, ainda que de maneira ingênua oportuniza o desenvolvimento do que

Prawat (1996, apud FRANZ, 2005b) chama de consciência reflexiva. Mas, para sair

do nível ingênuo, “o primeiro passo é avaliar as compreensões iniciais, para, a partir

delas, inferir estratégias didáticas que os ajudem a superar as respostas tiradas do

senso comum” (FRANZ, 2005b, p. 2); para isso, é preciso entender como aprendem

os alunos59, explica a autora.

Segundo Hernández (apud FRANZ, 2005b, p. 2), “o objetivo de toda a

aprendizagem é estabelecer um processo de inferências e transferências entre os

conhecimentos que já se possui e os novos problemas-situações que são

59 Para Hernández (2000), a Psicologia Cognitiva é importante para entender o processo das compreensões. Embora a teoria de Piaget tenha sido revisada e renovada, conforme afirma o autor, o fundamento básico desta teoria não deve ser esquecido e serve de fundamento para o construtivismo crítico. No enfoque construtivista da aprendizagem, todo “conhecimento é resultado da organização de um conhecimento anterior, e toda nova aquisição que tenha aspecto de novidade se coloca em relação ao que se tenha adquirido previamente.” Atualmente, não se considera que os estágios de desenvolvimento ocorrem de maneira linear e considera-se que o conhecimento não emerge nem dos sujeitos nem dos objetos, mas sim de uma relação dialética entre eles. “O conhecimento é concebido e construído culturalmente, o que leva, na educação, a estabelecer critérios que permitam avaliar a qualidade desse conhecimento. Essa visão do construtivismo como processo de atribuição de sentido implica que o docente possa explicar aos estudantes e introduzi-los no mundo social e físico [...] e ajudá-los a construir por eles próprios uma infra-estrutura epistemológica para interpretar os fenômenos com os quais e relacionam.” (HERNÁNDEZ, 2000, p. 106).

121

propostos.” Como explica Franz (2005b), quando não se leva em conta os

conhecimentos que o aluno já possui, as concepções prévias dos alunos se

mantêm, mesmo que haja esforço do professor para ensinar o novo tema. Seu papel

deve ser sobretudo o de interferir para que os alunos possam superá-las e

transformá-las. Avaliar as concepções é o primeiro passo, mas para que haja avanço

é necessário “fomentar as conexões explícitas dos elementos da base de

conhecimentos dos alunos” (FRANZ, 2005b, p. 3), e o professor deverá estar

consciente de que este processo não é imediato – o aluno deverá percorrer um

longo caminho até poder abandonar suas compreensões iniciais.

Para ampliar a compreensão sobre a arte, conforme Franz (2005b), os alunos

precisam encontrar novas conexões entre as obras de arte e as imagens da cultura

visual, considerando novas informações e idéias, sendo que o professor pode

auxiliar o processo com sugestões verbais explícitas.

Conforme o item 2.2.1.1, a educação para a compreensão da Cultura Visual

enfatiza a interpretação crítica como conteúdo central para as propostas em arte-

educação atuais. Para Hernández (1998, 2000), na interpretação crítica, os alunos

devem estabelecer conexões entre as representações que o artista ou grupos

culturais elaboram com os porquês dessas representações e os conhecimentos que

estão implicados com sua vida pessoal, estabelecendo novas conexões e relações.

Significa, também, reconhecer as relações que existem entre as imagens e outros

fenômenos. Efland (apud FRANZ, 2005b, p. 7) afirma que

quando questiona as idéias do currículo em espiral de Bruner [...] desafia os educadores a iniciar os seus alunos em um campo de conhecimentos complexo e mal estruturado, como é o caso da educação em Artes, conservando a complexidade inerente ao campo e, ao mesmo tempo, facilitando-lhes a aprendizagem futura.

Para Franz (2005b) e Hernández (1998, 2000), isso significa um desafio que

consiste em ajudar o aluno a transcender a simplificação, estabelecendo relações ou

com a vida do artista, ou com o contexto social e cultural no qual a obra foi

produzida, indo além do que se vê na imagem. Pressupõe uma atitude investigativa,

que envolve a descoberta de significados, relacionando aquilo que já se sabe com

novas informações. Franz (informação verbal)60, em suas pesquisas sobre a

compreensão crítica da arte, prefere utilizar o termo “compreensão”, em lugar de

60 FRANZ, in: Seminário de Orientação, Curso de Mestrado em Artes Visuais, UDESC, 2006.

122

“leitura”, ou “interpretação”. Para esta autora, o termo “leitura” tem um sentido menos

reflexivo, que exclui o papel de mediação do professor, o que não ocorre com os

termos “compreensão crítica”, que envolve a mediação.

A leitura crítica, na visão de Paulo Freire (apud PILLAR, 1999), é a

compreensão do texto a ser alcançada e está implicada com as relações entre texto

e contexto. Freire (apud PILLAR, 1999, p. 14) considera que aprender a ler é antes

de tudo “aprender a ler o mundo, compreender seu contexto, não numa manipulação

mecânica de palavras mas numa relação dinâmica que vincula linguagem e

realidade.” Esta relação dialética com os contextos e o contexto do leitor, é aplicada

de maneira semelhante aos textos imagéticos. Ao ler uma imagem, é preciso ter

clara esta relação entre o contexto da obra, do autor e do leitor, relacionando todos

eles.

Alguns dos entrevistados consideram que apenas “falar do artista” sem fazer

outras relações e conexões com a obra estudada é estar contextualizando. Dentro

do enfoque da compreensão crítica (ou interpretação crítica), esses professores em

sua maioria, conforme os depoimentos, não estão fazendo a contextualização das

imagens, ou o fazem muito superficialmente (ver Quadros 16 e 17).

A valorização da contextualização, conforme o Capítulo II (item 2.1), surgiu na

década de 1960, quando um grupo de teóricos passou a defender a idéia de que se

deveria estudar a arte levando-se em conta seu contexto cultural de origem e

fundamentar-se em conhecimentos antropológicos e sociológicos que

contemplassem o contexto social e cultural dos estudantes (RICHTER, in Corrêa,

2004). Com a valorização e a diferenciação das culturas na atualidade, esta relação

da obra com o contexto pessoal do aluno, considerando seu contexto social e

cultural, vem sendo cada vez mais enfatizada, como experiências que fazem parte

do seu conhecimento.

A nova regra se baseia nas idéias de contexto, segundo as quais, ainda que se reconheçam os aspectos formais e temáticos das obras de arte, há que compreendê-los em relação a suas conexões com o mundo social e cultural do artista. (EFLAND, 1996, apud FRANZ, 2003b).

Quando o aluno elabora sua própria versão da obra de um artista,

transformando e atribuindo significados pessoais, está fazendo uma releitura. Ou,

como diz Anamália Barbosa (in BARBOSA, 2005b, p. 145), estou fazendo uma

releitura quando: “aproprio-me de imagens da História da Arte e as incluo em minha

123

obra, ou seja, tiro a imagem de seu local de origem e a utilizo para construir outra

imagem.” A releitura pode também ser feita a partir de uma imagem, ou como a

autora citada, que utiliza várias para fazer relações umas com as outras e depois

elaborar a sua própria. Este é o caso da professora (nº 9) que, a partir da última fase

do artista Mondrian e de várias obras do artista, propõe aos alunos criar um novo

produto. Ou a pedagoga (nº 2) que, a partir de uma leitura feita com os alunos e uma

problematização, lhes propõe uma construção “saindo” da imagem, ou seja com

base nas referências da imagem, sugere aos estudantes que façam sua própria

construção – mudando forma, material, etc.

Os artistas contemporâneos, conforme Brent Wilson (in BARBOSA, 2005b),

procuram na História da Arte, imagens para preencher com outros ou novos

significados. Brent Wilson (in BARBOSA, 2005b, p. 91) cita o trabalho do artista afro-

americano Robert Colescott:

ele repinta o famoso quadro americano, George Waschington Carver Crossing in Delaware. O trabalho não é apenas uma adaptação de um dos ícones americanos, mas sim, uma declaração irônica da história dos afro-americanos e uma percepção bem humorada desse status.

Não somente na arte tradicional, mas também artistas que fazem histórias em

quadrinhos realizam releituras e se apropriam de obras de arte como os artistas pós-

modernistas. Maurício de Souza, a partir de finais dos anos 80, em um trabalho de

pesquisa que durou cerca de dez anos, baseou-se em obras eruditas que fossem

amplamente conhecidas do público e relevantes para a história da pintura para

recriar uma série de mais de quarenta quadros e uma escultura. Série intitulada

História em Quadrões, inspirada em Leonardo da Vinci, Monet, Botticelli, Van Gogh,

Degas, Michelangelo, Toulouse-Lautrec, Renoir, Portinari, Auguste Rodin e outros

artistas, utilizando personagens da Turma da Mônica (Figura 11 e Figura 1).

Apesar de ser cada vez mais comum artistas contemporâneos apropriarem-se

de elementos da arte popular nas obras de arte e vice-versa, nenhum dos

professores de Arte, nessa amostra, mencionou fazer releituras, nem trabalhos com

leituras interpretativas de histórias ou imagens de histórias em quadrinhos – quer

fossem semióticas, estéticas ou críticas. Uma professora de Arte (nº 13) chega a

citar que abordou as releituras de Maurício de Souza, na 6ª série, porém não

realizou trabalho de releitura com os alunos (ver perguntas 3, 4 e 5).

124

Figura 11 – Mônica no Nascimento de Vênus, 1992. Releitura de Maurício de Souza, baseada na obra Nascimento de Vênus de Sandro Botticelli. Acrílica s/tela 106 x 145,5 cm.61

Na amostra de entrevistados, também há professores (ver Quadro 16, nº 2,

10, 11 e 12) que utilizam obras de arte apenas para ensinar elementos da linguagem

visual. Hernández (2000) critica professores que procedem desta maneira, porque,

segundo ele, não relacionam história da obra e seu contexto. Desta forma os alunos

não podem compreender a visão simbólica do mundo mediante a obra, porque estão

fixados no aprendizado do ponto, da linha, da cor, ou da figura e do fundo.

Na disciplina de Português, algumas professoras, conforme o Quadro 17 (nºs

17A e 17B), utilizam o mesmo procedimento de leitura para tiras humorísticas, HQs,

cartuns, imagens da propaganda, folhetos, cartazes, obras de arte ou qualquer outro

tipo de imagem. Essas professoras realizam leituras baseadas na decodificação da

imagem como um texto, e isso porque, segundo elas, “hoje tudo é visual” e é

importante que os alunos aprendam a ler imagens. Conforme seus relatos:

“Porque hoje nosso universo é visual. É importante que o aluno aprenda a ler imagens. Hoje em dia tudo é visual. Eles precisam aprender a ler estas imagens. Nós ensinamos o aluno a fazer uma leitura da imagem. A imagem é como se fosse um texto também, por isso a gente trabalha com a imagem.” (nº 17A). “A imagem é semelhante a um texto. É como o texto escrito. [...]. O importante é que o aluno aprenda a ler a imagem, hoje tudo é imagem. Para

61 Imagem disponível em <http://www.monica.com.br/diversao/wallpap/quadroes/welcome.htm> Acesso em: 7 fev. 2007.

125

nós este objetivo é o principal, que o aluno leia a imagem como um texto.” (nº 17 B).

A professora de Arte, nº 2, usa a mesma abordagem e de forma semelhante,

considera que a imagem é um texto, e que a pessoa “só olhando a imagem, vai ter

um entendimento sobre aquilo.”

Na opinião de Hernández (2000, p. 28), alguns educadores pensam nos

alunos apenas “como consumidores de imagens que devem aprender a decompor

em elementos da linguagem” e consideram a imagem somente como um texto cujo

significado seja interpretado com base em análises de morfemas e grafemas.

Para Hernández (2000, p. 28), estas são formas de racionalidade eclética de

ensino, de visão limitada sobre as possibilidades do ensino da arte, que em geral

destacam como objetivo o desenvolvimento da capacidade do aluno “para ler e

produzir imagens, porque [...] estamos na era da imagem.”

Os educadores que agem dessa maneira estão trabalhando com propostas

analíticas da imagem de forma que não possibilitam aos alunos aprenderem a

interpretar. O universo visual modela comportamentos e contribui para fixar valores.

A importância da interpretação de obras e imagens na atualidade está relacionada

com as significações culturais que implicam e a relação destas com nossa vida.

Como destaca Gómez (2001), estamos mergulhados em uma crise em todos

os setores, mas as forças sociais não promovem mudanças necessárias, e a escola

deixa de ser um espaço para reflexões críticas. A educação permanece voltada para

os modelos que privilegiam as prioridades econômicas e em virtude disso a função

educativa fica em segundo plano. Gómez (2001) recorda que o mundo atual deixa

transparecer que não está preparado para entender seu entorno. Os adultos atuais

foram criados para a certeza, mas as estruturas sociais e pessoais têm

experimentado mudanças tão profundas que, tanto jovens como adultos, não se

encontram preparados emocional e intelectualmente para dar sentido ao mundo e

direcionar a própria história (SANCHO e HERNÁNDEZ, 1997). Quando os

professores deixam de relacionar a obra ou a imagem com a realidade, com as

esferas que a envolvem e com sua história de vida, deixam de lado a oportunidade

para promover conhecimentos e mudanças significativas na própria vida.

Uma das professoras de Português relata que trabalha com leituras mais

críticas. Sua visão de ensino está mais ligada à concepção pós-modernista da

educação, a qual questiona os cânones que alguns materiais didáticos reproduzem

126

– “modelos”, conforme diz, quando se refere a certas imagens que trazem estes

materiais:

“Existe um certo cânone. Os professores acabam nem tendo condição de fazer uma análise muito apurada disso. Acho que o material didático acaba determinando muito a prática do professor. [...] o material didático é fundamental para o aluno, mas ele não se esgota aí. Os cânones das tiras estão lá. Na verdade os próprios autores de materiais didáticos já têm uma certa tendência de usar cânones. Tanto nas tiras como em textos literários, textos consagrados aparecem muito. Há pouca inovação, na minha opinião. Até porque isso demanda uma série de estudos. Então os professores ficam muitas vezes nesses cânones, acabam ficando naquilo. Quando você, por exemplo produz material didático, pensando numa situação específica de uma turma, acho que isso dá uma mobilidade maior. No caso de 5ª a 8ª, em que eu uso bastante a questão da imagem, muitas leituras que a gente tem levado para eles na sala de aula são leituras supostas.” (nº 20).

O problema dos cânones, como destaca ela, é o fato de se transformar algo

em um modelo a ser seguido. O projeto pós-modernista questiona os cânones

estabelecidos pelo modernismo, que acarretam em uma única versão para a arte

erudita como modelo a ser seguido pelos demais. Também nos quadrinhos existem

cânones. “No caso das tiras, é a mesma coisa. Está lá, Quino, Mafalda, Maitena,

Maurício de Souza, Charles Brown. Esses são cânones”, diz a professora. Segundo

suas palavras, os materiais didáticos do ensino de Português geralmente incluem os

quadrinhos que são de valor já conhecido, que têm sucesso garantido e, desta

forma, são mantidos.

A questão dos cânones nos quadrinhos tem importância para a formação da

cultura e para o aprendizado dos alunos. Conforme Freire (1979, 1997), não há

educação neutra. Quando não estão relacionados com um ensino que promove a

educação para a compreensão crítica, podem acarretar em reprodução, ou

dependência dos valores dominantes. Para Paulo Freire (1979), o verdadeiro

profissional deve estar engajado em promover a ação-reflexão frente às alienações

culturais vividas por nossa sociedade. A preocupação desse autor está relacionada

com uma difícil busca pela autenticidade e com a preocupação pelo projeto histórico

de nossa própria cultura. Suas considerações têm importância para o contexto da

formação da cultura com relação ao ensino dos quadrinhos.

Recorda-se como décadas atrás no Brasil, em função das HQs estrangeiras,

foram lentas a aceitação e a divulgação de quadrinhos brasileiros no mercado

nacional. As histórias estrangeiras entravam no país a custo muito baixo e desta

forma dificultavam a entrada dos desenhistas nacionais no próprio país. Segundo

127

Maurício de Souza (apud SCARELI, 2003, p. 75), o custo das histórias estrangeiras

era tão baixo, que não era possível para “os desenhistas nacionais trabalharem pelo

mesmo preço. Havia uma pressão econômica tão forte, exercida pelas distribuidoras

internacionais, que durante muito tempo, sufocaram a produção nacional.” Em

função dessas dificuldades, poucos autores nacionais dos quadrinhos, como

Maurício de Souza, firmaram-se nesse contexto.

Para Freire (1997), a prática educativa crítica na educação é uma forma de

intervir no mundo. Esta intervenção significa que os conteúdos (bem ou mal)

ensinados implicam “tanto o esforço de reprodução de ideologias dominantes quanto

seu desmascaramento.” (FREIRE, 1997, p. 110). O autor enfatiza que a

compreensão mecanicista hipertrofia o papel da consciência do acontecer histórico.

Quanto às imagens de propaganda, a maioria dos entrevistados chega a

trabalhar com elas, mas em geral, não para fazer leituras de imagem. Alguns não

trabalham com essas imagens, nºs 5, 8 e 12, não citaram nenhum trabalho. Nºs 13 e

7 descrevem a atividade que fazem relacionada à propaganda:

E imagens da televisão, de revistas ou da propaganda, já trabalhou? “_ Já trabalhei as letras. Na propaganda tem bastante isso. As letras ilustram as propagandas. Eu fiz um trabalho assim. Peguei umas propagandas, para que eles reconhecessem as letras. Uma aula sobre letras ilustrativas dos anúncios.” [...]. Você explicou a função dos logotipos? “_ Falei sobre o trabalho da Publicidade e do Marketing, para que servem as mensagens que eles passam com as letras. Trouxe para a realidade deles.” Fez alguma atividade? “_ Eles trabalharam todos os tipos de letras. [...]. Trouxe bastantes exemplos de letras ilustrativas. Então eles trabalharam com a ilustração das letras e elaboraram o próprio nome com elas. Fizeram um trabalho pessoal com as letras.” É um trabalho sobre elementos, recursos da linguagem visual, então? “_ Sim. Trabalho com os elementos visuais. O desenho, a linha, o claro escuro.” (nº 13).

Você pode descrever uma das atividades que você mais trabalha? “__ Olha, essa da propaganda, já faz tempo que estou trabalhando com as 8ªséries! A gente faz com que eles inovem. Vamos supor uma mercadoria, aquelas gelatinas. Até pouco tempo eram só naquela caixa quadradinha. Hoje a gente já encontra em saquinhos. Digo a eles que quero que mudem, ao criar uma nova embalagem para o produto, sair do tradicional. Depois, eles têm que fazer a propaganda daquele produto para convencer a sala para comprar o produto. Tem que apresentar o produto final em todos os passos: rough (esboço), layout, arte-final, além da propaganda.” (nº 7).

Ambas trabalham apenas os aspectos técnicos e criação. Assim como outros

professores, não incluem a leitura crítica das imagens da propaganda. Hoje, a

128

educação pós-moderna leva em conta que a vida cotidiana é demarcada pelo visual

e isso torna necessário que também as imagens da propaganda sejam abordadas

no ensino de Arte. Considerando que motivam a vontade e o desejo e são também

emblemas de forças e relações de poder, para Hernández (2000, p. 132), isso

impossibilita “reduzir a experiência estética apenas a uma questão de informação.”

Por isso, sugere a leitura crítica dos artefatos e imagens vinculando a questões

sociais com as quais estão relacionados e à reflexões críticas que auxiliem a

compreender a realidade. Situação que reclama, segundo este autor, uma análise

dos artefatos e imagens como objetos sociais.

Conforme Franz (2003b, 2004), Hernández (2000, 2001) e Efland (2003), a

educação pós-modernista enfatiza a conexão com outras imagens que fazem parte

do cotidiano dos alunos, considerando o impacto que têm na construção das

identidades e na formação de valores, crenças e visões de realidade. Não porque

vivemos na era da imagem, mas porque os alunos precisam aprender a interpretá-

las de maneira crítica. Como diz Hernández, conhecimentos da Cultura Visual não

são conhecimentos inúteis, porque são as representações do campo artístico as

“que mais contribuem para configurar as representações simbólicas portadoras dos

valores que os detentores do poder utilizam para fixar sua visão de realidade.”

(HERNÁNDEZ, 2000, p. 43). A influência dessas imagens sobre as crenças e a

consciência não podem ser deixadas em branco.

Qualquer método de leitura de obra de arte pode apenas fornecer visões

parciais sobre os fenômenos estudados, como explica Franz (2003a, p. 158), por

esta razão, essa autora acredita que “mais do que leitura e análise de obra de arte, o

que precisamos é ensinar os alunos a realizar estudos [...] com o objetivo de buscar

elevados níveis de interpretação.”

Contrapondo-se às modalidades de leituras acríticas, a educação para a

compreensão crítica da Cultura Visual propõe que os professores ajudem seus

alunos a compreender a realidade, examinando os fenômenos que os rodeiam e

questionando as versões e visões, a fim de avaliar o que é produzido culturalmente,

processo válido não somente para obras de arte como para imagens diversas e

histórias em quadrinhos.

129

3.3.5 Categorias 3, 4 e 5

As categorias 3 e 4 têm por estratégia analisar se os professores ensinam

sobre histórias em quadrinhos, em quais turmas tem por hábito ensiná-las e como

desenvolvem essas atividades, ou seja, como são essas práticas (Quadros 18 e 19,

20 e 21). Nos Quadros 20 e 21, os professores que afirmam que as ensinam, ou que

dizem que já as ensinaram pelo menos uma vez, descrevem suas atividades com

essa arte. A categoria 5, tem por objetivo aprofundar a questão 4, e refere-se às

escolhas do professor ou de sua turma, quanto às histórias em quadrinhos, ou o

autor, a serem trabalhadas em sala de aula (Quadro 22 e 23).

a) Pergunta 3: Ensina sobre a linguagem dos quadrinhos ?

Trabalho com Histórias em Quadrinhos – Artes Visuais

1 “História em quadrinhos, sim.”

2 “HQ, a gente já trabalhou. Mas eu não trabalhei muito.”

3 “Já. Trabalhei com HQ, na 5ª série. Trabalhei uma vez. [...]. A idéia principal era trabalhar com as características das HQs, o objetivo era trabalhar com a onomatopéia. Uma [aula] falamos sobre a linguagem - as onomatopéias - e na outra assistimos um filme.”

4 “[...] essa parte não cheguei nem a levar, porque além do professor de Artes, o professor de Língua Portuguesa também trabalha.”

5 “Só agora, por que estou fazendo com uma turma do sexto período, é 8ª série da EJA, noite, estou fazendo com eles.”

6 “Eu já trabalhei muito HQ.”

7 “Quadrinhos, sim. Trabalho também.”

8 “Quadrinhos nunca trabalhei. Já trabalhei com desenho e pintura aqui, mas não com quadrinhos.”

9 “Histórias em quadrinhos, não.”

10 “Já. Esse ano eu fiz um trabalho. Ano passado eu trabalhei também.”

11 “Não trabalhei com gibi, específico não.”

12 “[...] a HQ, eu trabalho na 6ª série, porque a gente tem um conteúdo, um planejamento que a gente tem que seguir. A HQ, é um conteúdo de 6ª série.”

13 “Comecei a fazer. [...].”

14 “Já trabalhei com HQ, no fundamental e no médio. Todas as turmas.”

15 “Trabalhei quadrinhos com eles, inclusive porque está no planejamento do Colégio.”

16 “Não. [...]. Não trabalhei ainda.”

Quadro 18 – Categoria 3 - Trabalho com Histórias em Quadrinhos - referente à pergunta 3 – Arte

Trabalho com Histórias em Quadrinhos – Outras Disciplinas

17A “Sim.”

17B “Sim.”

130

18A “Estou usando na 7º agora.” [para trabalhar o conteúdo de Matemática]

18B “Fiz também.” [para trabalhar o conteúdo de Matemática]

19 “Muitas vezes.[...]. Em todas as minhas turmas eu faço atividades com histórias em quadrinhos.”

20 Sim. “Normalmente o professor se utiliza [de tiras humorísticas e histórias em quadrinhos], até porque chega muito mais, é uma linguagem lúdica. Mesmo para os maiores, uma linguagem muitas vezes que a ironia se estabelece. E isso é importante para a questão da formação crítica.”

Quadro 19 – Categoria 3 - Trabalho com Histórias em Quadrinhos - referente à pergunta 3 – Português, Ciências e Matemática

b) Pergunta 4: Como desenvolve esta atividade ?

Desenvolvimento das Atividades sobre Quadrinhos – Artes Visuais

1 “Eu levo as histórias. [...]. Primeiro eu mando eles lerem. Alguns têm esse: __Ah! Eu não gosto de ler! Então eu digo: __ Olhe! Se você não gosta de ler história em quadrinhos, o que você será? Heim? São textos curtos e tal. Daí todos têm que ler a historinha. Depois, peço para eles fazerem três quadrinhos só. Do que quiserem. Mas podem se espelhar no gibi que eles têm.” Para servir como referência? “__ É, assim que eles gostam. [...].”

2 “É complicado [na 2ª série]. Daí, você trabalha HQ, mas de outro jeito. Com desenho de palito, palitinho, virando as páginas rapidinho. Bloquinho de animação e o bonequinho se mexe.” Pode descrever como você trabalhou ? “__ Em cima do Maurício de Souza, mesmo. Levei e apresentei a história. Mostrei a seqüência dos quadrinhos, a lógica da HQ, a estrutura. Depois trabalhei em cima da folha mesmo, montando direto. [...]. Pedi para eles desenharem e fazerem uma seqüência de fatos. [...]. Eles trabalharam mais com a imagem em seqüência, que a gente fazer tradução do texto. Utilizo a última página do gibi, que não tem história nenhuma e eles montam a história em quadrinhos.” Em outra ocasião a professora fez outro tipo de atividade: “A gente queria trabalhar a profundidade. [...]. A gente trabalhou assim com eles: o que se vê primeiro na imagem, a gente fez o plano; daí a gente ia fazendo o fundo, depois montava a frente do desenho. É bacana, porque as cores são tão nítidas na imagem dos quadrinhos do Maurício que eles conseguem perceber os planos: __ Esta imagem aqui está no fundo, essa está mais à frente e aqui está o personagem. Então ficou bem gostoso trabalhar. [...]. Por exemplo, uma caixa com fundo tal e tal, o personagem na frente, só que eu vou montar um pedaço, o outro monta outro pedaço e assim por diante. Depois eu posso escolher: __ Eu vou montar o meu pedaço com o de quem? Como é que vai ser a história? Daí já pode puxar para o teatro, porque neste ponto você já pode trabalhar a fala dos personagens. A fala você pode trocar, fazer o balãozinho encaixar, fazer um furinho e depois trocar.”

3 “Primeiro eles fizeram anotações no caderno sobre a HQ e como trabalhar com HQ, identificando as onomatopéias. Também eles tiveram que fazer uma pesquisa, trazer um gibizinho para sala de aula [...]. Gostaram muito de fazer essa pesquisa, de trazer e tiveram que identificar e passar para o caderno os sons da onomatopéia. Em seguida, eu pedi para que eles escolhessem as histórias que gostariam de ver em DVD. [...] Seriam da Turma da Mônica e Chico Bento. [...]. Então foi assistido um DVD em sala de aula. [...]. E também pedi para eles identificarem os elementos com que se constrói uma HQ”.

4 Não ensina sobre histórias em quadrinhos (ver Quadro 24).

5 “Estou trabalhando, porque a gente fez um projeto sobre o jornal, junto com outra professora. [...]. Da minha parte vou trabalhar com charge, com eles. [...] Estou começando agora com eles o que é quadrinhos. [...]. Estou pegando quadrinhos do Ziraldo, da Ciça. Alguns quadrinhos fiz transparência e levei para a sala. [...]. Eu peguei primeiro quadrinhos, para eles entenderem a seqüência de uma história e depois a simplificação. A charge é mais simplificada, você faz o desenho e não tem aquela seqüência, não precisa, nem a escrita. Você pega e já dá para ver, se é de um político, de um artista. O cartunista ele evidencia muito o desenho, na charge. Então pode ser uma frase só, uma palavra.” [Obs.: Trabalho realizado com o 6º período do EJA e não com ensino fundamental normal.]

6 “Eu sempre trabalho integrado com a professora de Língua Portuguesa. Trabalho interdisciplinar por causa do texto. O que ficava para mim, como professora de arte, era a forma, a composição do quadro, o próprio quadrinho, o que é um personagem, o que é estilizar a forma e sempre a figura humana. Mostrava como o Maurício de Souza estilizava a forma da menina Mônica, que é muito parecida com a menina Magali, que tem a mesma estrutura do Cascão e do Cebolinha, que é o estilo desse artista. Eu trabalhava muito com eles como estilizar a forma. Começava por aí e como os artistas estilizavam a forma. Depois eles pesquisavam o desenho na revista.”

7 “Na 6ª série eu ensino o início, na 7ª, mais um pouco. [...] primeiro os passos, como é criar a história, criar um personagem. Daí você tem que criar um personagem, uma historinha. Então lógico, na 6ª série, uma coisa menor. Na 7ª já se exige mais. [...]. Eu trabalho primeiro com eles construindo o personagem, acho mais fácil.”

8 Não ensina sobre histórias em quadrinhos (ver Quadro 24).

9 Não ensina sobre histórias em quadrinhos (ver Quadro 24).

131

10 “Eu levei para a 7ª série, esse ano. Alguns já tinham estudado comigo ano passado, na 6ª série. Nós estudamos um pouco da linguagem dos quadrinhos, da forma, do desenho, porque eu comecei a trabalhar com o cânone do desenho da figura humana. No ano anterior introduzi a questão de que HQ (conhecido como gibi, por eles) também é arte, que é preciso ter desenhistas, roteiristas, qual é a linguagem usada (balões, onomatopéias...), e o tema da história. [...]. Levei cerca de 3 aulas. Na 1ª, introduzi essas questões, decidimos um tema (política no Brasil, foi opção deles, pelo que vinha acontecendo na época, “dólares na cueca”) e iniciamos o trabalho, nas outras terminamos e revisamos! Eu trabalhei um pouco com caricatura, com cartum para daí eles criarem uma historinha.”

11 Não ensina sobre histórias em quadrinhos (ver Quadro 24).

12 “[...]. Primeiro as partes, o que é onomatopéia, os balões, o desenho em si, o enredo que é enredo, personagem. Eu trabalho tudo isoladamente. Eu trabalho tudo isoladamente. Tudo o que faz parte, quais os elementos que fazem parte de uma HQ, finalizando é claro, com uma história, que eles tem que criar. Assim eu trabalhei, eles tinham que criar um personagem, desenhar o personagem. Em cima do personagem, fazer uma história em quadrinhos. Eu trabalhei com isso um ano já.”

“[...]. E o que eu trabalho com desenho, vamos dizer assim, do Maurício de Souza, quando eu trabalho é ampliação. Ampliação e redução. Peguei nesses almanaques do Maurício de Souza, as imagens maiores para reduzir e as menores para aumentar [...].”

13 “Comecei a fazer. Mas fiz em cima do Maurício de Souza, mesmo. Não sei se você já viu, ele fez uma releitura. Pegou obras de arte e trouxe para a realidade dele. A Mônica, o Cascão - e eu mostrei isso para os alunos, como ele levou para os quadrinhos. Então comecei o trabalho com histórias em quadrinhos, a partir daí.” “ Comecei pegando a História. Como nasceu, pegando da mesma maneira que os movimentos históricos da arte.” Trabalhou uma definição de HQ com eles? O que é HQ? “__ Sim, o que é. Falei como surgiu, porque houve a necessidade de criar uma história em quadrinhos. Em cima disso vou trabalhando as atividades.” [...] Você fez alguma atividade? “__ É. Dá para montar a história em quadrinhos relacionando com outras disciplinas. Aqueles bonequinhos que mexem, também.”

14 “Eu sempre trabalhei assim: passando noções básicas de como criar um quadrinho, dando os requisitos e em seguida pedindo para que eles criassem um quadrinho, usando as noções que eles tiveram. Sempre tive o cuidado de nunca pedir para criar um quadrinho a partir da experiência própria deles, que eles também tem. Alguns têm até boas experiências. Mas não é pedagógico. Então sempre acreditei que você tem que passar noções básicas, e depois pedir para que façam. Foi assim que sempre trabalhei. [...]. Desde o histórico dos quadrinhos. Principalmente no ensino médio, você pode aprofundar um pouco mais. Trabalho um pouco o histórico, como é o quadrinho em vários países, além do Brasil. Às vezes se faz até algumas discussões sobre quadrinhos, tudo. Depois eu trabalho a criação dos personagens. As linguagens visuais que o quadrinho utiliza, para falar, para pensar. A linguagem visual da imagem, a diagramação. Eu procuro fazer assim, quase que técnico.”

15 “Trabalhei a parte da imaginação. Eu fiz sempre assim. Contei uma história bem fantástica, até por sinal bem surreal, com fatos absurdos, coisas que não estão acostumados a ver. Enquanto vou contando a história, eles vão fazendo um rascunho, um do lado do outro: o desenho, o esboço, com bonequinho palito. Depois que eles terminaram isso, na outra aula, ou atividade para casa, eles montam os quadrinhos, porque por ali não se perdem. Então eles não criam a história, quer dizer, alteram um pouco as coisas, porque o que ficar na memória deles, eles vão conservar, vão aumentar, mudar, mudam o personagem. Essa é a maneira que eu trabalhei. Outra maneira que trabalhei, foi na 4ª série*, foi trabalhado em conjunto. O tema escolhido em conjunto foi a Copa, era bem na época. Dividimos a turma em 3 grupos grandes, porque são 37 alunos mais ou menos. Cada grupo se juntou e eles mesmos se distribuíram para fazer os quadrinhos. Um fez o começo da história, outro o meio da história e outro o final da história. Isso texto, personagem e a parte visual.” * Educação Especial

16 Não ensina sobre histórias em quadrinhos (ver Quadro 24).

Quadro 20 – Categoria 4 - Desenvolvimento das Atividades sobre Quadrinhos - referente à pergunta 4 – Arte

Desenvolvimento das Atividades sobre Quadrinhos – Outras Disciplinas

17A Trabalha com leituras (1) e construção de histórias em quadrinhos (2): 1. Ver Quadro 17. A leitura com as imagens da propaganda, e a leitura com tiras humorísticas é feita da mesma forma. Primeiro faz-se a leitura do texto, depois da imagem e segue-se com associações entre texto e imagem. 2. “[...] por exemplo, podemos transformar a prosa em um texto para uma história em quadrinhos e depois construir a história. Pede-se ao aluno que transforme o texto. Depois eles desenham e empregam o texto em forma de diálogo na história em quadrinhos.[...].”

17B Trabalha com leituras (1) e construção de histórias em quadrinhos (2): 1. Idem (ver Quadro 17). 2. Idem.

18A “[...] dentro do contexto da história deles, tinha que aparecer essas operações: operações com números inteiros e operações com frações e eles tinham também que desenvolver essas operações. Ou seja, resolver a questão conforme o trabalho dado.” (Ver também Quadro 25).

18B “A gente dizia as operações, tinham que aparecer, mais ou menos que tipo de operações que a gente gostaria e

132

eles encaixavam dentro da história. Criavam a história, então aparecia muito professor dando aula e ali no quadro aparecia através de compras ¼ de tanto [...].” (Ver também Quadro 25).

19 “Eu passo o conteúdo, depois peço a eles que façam um desenho, do assunto que a gente estudou. Se tiver uma seqüência de acontecimentos, de fatos, eu peço que mostrem a seqüência, as transformações, no desenho. Eles usam a criatividade deles, como acham melhor.” “[A parte estética] não chego a cobrar [...]. Algumas coisas eu peço, como um tamanho, número de quadrinhos, tal, mas além disso, não.” (Ver também Quadro 25).

20 Trabalha com leituras críticas (1) e com a construção de histórias em quadrinhos (2): 1. “[...] essa leitura parte da própria imagística. O que essa imagem remete à você, que é a questão da interpretação – que é muito sugestiva, sem o texto. Quando você parte para um texto, a interpretação pessoal tem que estar vinculada àquilo. O que é que a imagem tem a ver com o texto que está sendo escrito. Que representação de letra, corresponde à representação imagística. Qual? Tem que trabalhar a memória. A questão da visão, da imagem que provoca a visão ela é muito mais rápida, principalmente para os menores. Ela suscita uma leitura que muitas vezes o texto não diz. Daí quando você faz o entrosamento entre texto e imagem, é que pode se estabelecer a junção, o “interlidinho”, o domínio da linguagem, do que é entrelinha. Qual a entrelinha dessa fala, desse texto e como é que ele se sobrepõe, a questão da imagem. Como uma coisa complementa a outra. Que tipo de marcação é essa, que tipo de linguagem é essa. Acho assim, bastante recurso. Mas ele não se esgota no fim pedagógico.” 2. Parte da imagem ou do texto para a construção das histórias em quadrinhos (ou tiras humorísticas): “Por exemplo, a questão da imagem, do quadro sem texto, para que os alunos possam montar uma história. Podem recortar uma seqüência de imagens e ela pode ser remontada de algumas maneiras, não infinitas, mas pelo menos de mais uma maneira. Acho que isso, para fazer um texto narrativo é uma boa saída pedagógica.” “O texto transformado em imagem, principalmente na 5ª a 8ª é muito recorrente: desenhe tal ou tal situação. Você tem o texto, se tivesse que transformar isso num quadrinho, como é que você procederia isso, não só a questão da adequação da linguagem, que seria um pouco diferente, porque às vezes é uma coisa direta, outras vezes indireta. Às vezes, você faz esse jogo pedagógico, para aprenderem a adequação de uma coisa e outra. Como é que conseguiria essa cena, por exemplo. Esse inverso também. Isso pode facilitar muita a desenvoltura do aluno na questão da arte visual e da apreensão imagética.”

Quadro 21 – Categoria 4 - Desenvolvimento das Atividades sobre Quadrinhos - referente à pergunta 4 – Português, Ciências e Matemática

c) Pergunta 5: Qual critério utiliza para a escolha das histórias em quadrinhos a

serem trabalhadas em aula ?

Critérios Utilizados para a Escolha de Histórias em Quadrinhos – Artes Visuais

1 “Eu pego a Turma da Mônica. Quando vou na biblioteca trocar todos, é da turma da Mônica! Na faculdade, eu tive pouca referência com histórias em quadrinhos. É, foi pouca coisa na faculdade.”

2 Usa Maurício de Souza porque “tem muito limpo o desenho. [...]. O que eu conheço é Maurício de Souza. Fora esse, acho que não. Não pesquisei isso ainda.”

3 “Eu sempre passo a pergunta para os alunos. Acho que eles têm condição de escolher. Então eles escolhem o material que querem trabalhar.”

4 Não trabalha com HQs.

5 “Eu partiria primeiro, do assunto que eles gostariam de abordar, primeira coisa. As vezes até sobre o corpo humano, numa 7ª série, não sei. Aquilo que eles tem necessidade de saber.”

6 Prefere usar Maurício de Souza, pelo fato de ser um autor nacional.

7 “Eu procuro trabalhar as nossas. Turma da Mônica, Chico Bento. [...] eu procuro nem pegar essa parte de Mangás. [...].”

8 Não trabalha com HQs.

9 Não trabalha com HQs.

10 Usou Maurício de Souza. Também considera o interesse dos alunos: “No ano anterior [...] foi opção deles [dos alunos].”

11 Não trabalha com HQs.

12 “Para mim não tem melhor que Maurício de Souza, mesmo tendo o Cebolinha que fala tudo errado, falando uma outra linguagem. Quando eu dava aulas para a 4ª série, usava a forma do Cebolinha falar, para eles mudarem, para escreverem um texto mudando a fala dele.”

13 “Trabalharia com Maurício de Souza, mesmo. Fica mais fácil, ele podem trazer.”

133

14 “Nem sempre eu levo. A escolha, quando eu levo, é em função do conteúdo de desenho que eu vou trabalhar se é figura humana, cor, etc., o critério é em função disso. Geralmente eu peço para o aluno trazer alguma para servir de referência. Então a gente trabalha com o material que ele trouxer. Maurício de Souza, Mônica, Ziraldo, o que eles tiverem.”

15 “Na questão dos quadrinhos, como vou selecionar material para o aluno que não influencie negativamente e nem !? É complicado. Mas acho que tem que usar o bom senso. [...].”

16 Não trabalha com HQs.

Quadro 22 – Categoria 5 - Critérios Utilizados para a Escolha de Histórias em Quadrinhos - referente à pergunta 5 – Arte

Critérios Utilizados para a Escolha de Histórias em Quadrinhos – Outras Disciplinas

17A Utiliza as imagens que são veiculadas com mais freqüência pelas mídias (jornais, revistas, TV, Internet) e mais curtas, como as tiras humorísticas. Por exemplo: “Hagar, Calvim, Snoopy, Mafalda, Turma da Mônica, Super-Homem, Papa-Léguas, Coiote e outros.”

17B Idem.

18A A apostila de Matemática não contém imagens de HQs. Trabalha com a criação do aluno. Não utiliza outras imagens.

18B Idem.

19 Idem.

20 Você tem critérios para escolher? “__ Tenho. O fato de ter o material didático para uma determinada série, não significa que tudo aquilo será aproveitado. [...]. Não é porque está lá, que vai ser utilizada. O diagnóstico da turma, a necessidade da turma é que determina tudo, de qualquer material didático, não só questão daquilo.”

Quadro 23 – Categoria 5 - Critérios Utilizados para a Escolha de Histórias em Quadrinhos -referente à pergunta 5 – Português, Ciências e Matemática

3.3.5.1 Outras categorias identificadas nas respostas dos entrevistados

Conforme Laville e Dione (1999, apud SILVA C.R., 2005), a partir das

respostas obtidas nas questões 3 e 4 do roteiro base (Quadro 5), incluímos a

categoria Professores que não Trabalham com HQs ou Utilizam como Recurso

Didático, nos Quadros 24 e 25, a fim de aprofundar algumas informações.

Nesta categoria reúnem-se os trechos das respostas dos professores de Arte

que explicam porque não ensinam sobre quadrinhos ou porque ainda não ensinaram

(Quadro 24 - nºs 4, 8, 9, 11 e 16). A entrevistada nº 9 chegou a usar uma vez os

quadrinhos, mas para ensinar sobre música. De certa forma, isso a aproxima da

entrevistada nº 5, que, para ensinar sobre a charge, introduziu o assunto com

histórias em quadrinhos. Porém não são casos idênticos. Esta última, não se inclui

neste grupo, porque apesar de seu objetivo principal ser a charge, aborda os

quadrinhos, para ensinar algo sobre eles, mesmo que rapidamente. A professora nº

9, seu objetivo era ensinar música e em seu caso não houve a intenção de se deter

nessa parte. Alguns professores (nºs 4 e 8) nunca ensinaram e não têm a intenção

134

de ensinar sobre quadrinhos. Há outros ainda, (nºs 18A, 18B e 19), cujo objetivo

principal é ensinar conteúdos específicos de sua disciplina (Quadros 25).

Professores que não Trabalham com HQs ou Utilizam como Recurso Didático – Artes Visuais

4 “Eu não tenho trabalhado HQ, porque isso a professora de português tem trabalhado muito, exaustivamente. Todos os anos desde o prézinho, é uma coisa que ela vem trabalhando. Sempre que eles trabalham em linguagem visual estão trabalhando, então nem me preocupo com essa parte.”

8 “Só com desenho de observação eu trabalhava. Aqui nós temos vários professores de desenho e cada um trabalha uma linha. [...]. Porque aqui costumamos respeitar a linha do professor. [...]. Porque tem pessoas que são muito boas, por exemplo, a prof.ª [...] ela é excelente para desenho de observação, luz e sombra. Então porque que ela vai ficar em quadrinhos se não é a linguagem, a praia dela, vamos dizer assim?!” E na outra escola, alguma vez você chegou a trabalhar com HQs? "__ Não. Trabalhei mais com composição, alguma coisa que eu podia levar daqui, como papel reciclado. Eles faziam o papel reciclado e depois em cima do papel reciclado, técnicas de impressão, mas daquele jeito, com batata [...], etc. Porque aqui a gente tem tudo [...]. Lá não. [...].” Você não trabalha com HQ, porque prefere ficar mais com técnicas ? “__ Composição. Gosto muito de trabalhar composição, com eles. Porque qualquer pedaço de papel serve, eles mesmos as vezes coloriam e trabalhavam. Porque eu acho composição uma coisa tão importante, aprender a compor. Aprender a compor é aprender a selecionar e agrupar elementos de forma harmônica.”

9 “[...]. Porque eu vejo tanta especialização que me assusto. Eu acho que não conheço suficiente para ficar trabalhando quadrinhos. [...]. [...] com os bem pequenos, não é que eu não possa. É que eu não tive tempo de me preparar para isso. [...]. Estive pensando, até. Cheguei a fazer alguma coisa com eles utilizando quadrinhos, mas só me lembrei depois, faz muito tempo [...]. Eu utilizei para trabalhar a música com eles, usando os sons das onomatopéias. Os quadrinhos podem ser utilizados para muitas coisas. [...]. Os quadrinhos em função dele mesmo, não me lembro assim.” “É, o quadrinho ele é um gancho. Uma ponte para muita coisa. O quadrinho você pode fazer mil coisas, valores, ética. Então tem muita coisa. Mas em quadrinhos, como é que faz, para ensinar. Isso realmente não fiz.”

11 “Não, ainda não. Porque a linguagem dos quadrinhos, na escola que eu trabalho começa a partir da 8ª série, ou Ensino Médio. Eu nem dou aula nestas séries. [...]. Eles separam os ciclos. Eles utilizam a linha do tempo. Então talvez na 8ª, talvez eu comece ensinar HQ [...].”

16 “Não. Esse ano ainda não. Até tem no livro, na seqüência. Só que acho que não vou trabalhar. Não trabalhei ainda.” E antes, você já trabalhou alguma vez, a linguagem dos quadrinhos?

“__ Eu trabalho como professora há 15 anos. Eu trabalhei com imagens, seqüência, tal mas assim com vistas à produção de texto, conteúdos mais do tipo Língua Portuguesa, do que de arte. Especificamente, de pensar como possibilidade do desenho, não. Assim dessa forma, ainda não, não trabalhei. Agora, quando a gente monta roteiro, para peças assim, desde 2004 eu tenho feito como exercício para os alunos, eu uso seqüência de quadrinhos, mas como um reforço, uma ajuda para gravar a seqüência, gravar falas dos personagens. A minha intenção, o meu objetivo não tem a ver com o desenho, ou com histórias em quadrinhos.” “[...]. Eu acho que a escola deve, tem a função de trabalhar sim, como todos os elementos, as linguagens da arte e essa também. Só que eu não me sinto à vontade, porque eu acho que não domino.[...].”

Quadro nº 24 – Categoria - Professores que não Trabalham com HQs ou Utilizam como Recurso Di-dático - Arte

Professores que não Trabalham com HQs ou Utilizam como Recurso Didático – Outras Disciplinas

18A “Nós usamos as HQ pelo seguinte, primeiro para cobrar de uma outra maneira um conteúdo, para tornar a coisa mais divertida. Porque os alunos gostam muito de ler histórias em quadrinhos. Então, usamos para desenvolver a criatividade deles também, saber como eles se saem, a organização, a limpeza, para cobrar tudo isso. De uma maneira cobrar matemática, mas dentro de um contexto, dentro de uma história, para a criatividade da história, para a criatividade dos quadrinhos. E eles gostam.”

18B Idem. “Para não ficar só naquilo ali, colocar um texto, + 2/5= [...], então a gente procura isso.”

19 “Uso para que os alunos fixem o conteúdo, dentro das Ciências, dentro de um tópico de estudos. Eu passo um conteúdo, depois peço para eles criarem uma história, com o que eles estudaram. [...]. Sempre faço atividade com histórias em quadrinhos se não fica tudo muito preso ao texto, aos mesmos exercícios. Assim os alunos podem variar um pouco e não ficarem presos só na apostila. É uma maneira de saírem da rotina. Do contrário, o trabalho fica só relacionado ao texto, aos mesmos exercícios de sempre. [...]. Essa é a principal finalidade.”

Quadro 25 – Categoria - Professores que não Trabalham com HQs ou Utilizam como Recurso Di-dático - Português, Ciências e Matemática

135

3.3.5.2 Descrição e interpretação de dados: categorias 3, 4 e 5

Os Quadros 18 e 19 indicam os professores que trabalham e aqueles que não

trabalham com histórias em quadrinhos. Cinco, entre os 16 professores de Arte,

nunca fizeram um trabalho ou ensinaram histórias em quadrinhos na escola: nºs 4, 8,

9, 11 e 16. Dentre os que trabalham menos freqüentemente com HQs, estão nºs 2, 3,

5, 12, 13, e 15. Os professores que têm por hábito sempre ensinar a fazer histórias

em quadrinhos, são nºs 1, 6, 7, 10 e 14.

A professora nº 10, embora tenha começado a lecionar há pouco tempo, em

2005, desde o início, inclui essa arte popular como um conteúdo que faz parte de

seu ensino e já ensinou duas vezes, em anos consecutivos para uma mesma turma,

de maneira programada. A entrevistada nº 13, começou a lecionar na mesma época

que aquela (nº 10) e também abordou as HQs, na 6ª série, mas por menos tempo,

em uma única aula. Ao contrário da professora nº 10, uma delas (nº 15) trabalhou

com quadrinhos na 7ª série, mas porque estava no planejamento do colégio. Como

havia recém-começado a trabalhar nesta escola, teve que improvisar, segundo ela.

Alguns dos professores, nºs 12, 2, 3, 5, embora estejam no ensino de Arte, há

cinco anos ou mais, incluíram histórias em quadrinhos em seu ensino, apenas uma

ou duas vezes. A entrevistada nº 5, normalmente trabalha com obras de arte.

Através de um projeto recente com outros professores da escola, entretanto,

começou a trabalhar com a charge no EJA e para isso achou melhor começar pela

história das HQs, para depois abordar seu objetivo principal. Isso remete ao estudo

com alunos. Três dos entrevistados, no estudo exploratório, mencionaram ter

aprendido algo sobre quadrinhos na escola e dois relataram que este ensino estava

associado à charge. A outra entrevistada, nº 12, idem, normalmente trabalha apenas

com obras de arte erudita. Não fez referência a trabalhos com outros tipos de

imagem, mas citou ter trabalhado uma vez com histórias em quadrinhos na 6ª série,

conforme o planejamento do colégio.

Dentre os 5 professores de Arte que nunca ensinaram sobre HQs, um deles,

a entrevistada nº 9, como vimos, já as utilizou como recurso didático para ensinar

música, e o entrevistado nº 11 começou a dar aulas de Artes Visuais recentemente;

segundo ele, não teve ainda a oportunidade. Porém ambos (nºs 9 e 11)

manifestaram interesse por essa arte. Somente duas professoras (nºs 4 e 8)

declararam não ter gosto ou interesse em ensinar sobre histórias em quadrinhos.

136

Uma não tem afinidade com esta arte e a outra prefere ensinar desenho livre,

técnicas e regras de composição que considera mais importantes para o trabalho de

criação. Nº 16, formada em Teatro, trabalha normalmente com Artes Visuais e

ensina sobre obras de arte, inclusive outras manifestações artísticas como arte

postal e propaganda. Para isso, entretanto, diz que teria que ter um preparo.

Os Quadros síntese, nºs 7 a 11, auxiliam a identificar em que turmas o

professor leciona e para as quais delas o professor, ou a escola, dá preferência para

incluir histórias em quadrinhos no planejamento. Conforme as entrevistas,

geralmente na 6ª série, é que os professores de Arte costumam trabalhar com

quadrinhos. Sete deles relatam que já ensinaram a fazer histórias em quadrinhos

neste nível de ensino. Com menos freqüência, as HQs são incluídas na 7ª série,

citada por quatro professores de Arte, e três as incluem na 5ª série. Em outras

turmas é menos freqüente. Na 8ª série, apenas dois professores as incluem (nºs 6 e

14), e na 2ª série, apenas uma professora (nº 2).

Dentre aqueles que estão no ensino de Arte há mais tempo, nºs 8, 6, e 9, (24,

29 e 30 anos), somente uma (nº 6) trabalha regularmente com histórias em

quadrinhos todos os anos, em todas as turmas de 5ª a 8ª série. O professor nº 14,

idem, embora este ano esteja apenas com turmas de 6ªs séries e ensino médio.

Os professores de Português trabalham com histórias em quadrinhos em

todas as turmas, de 5ª a 8ª série, independente de ser esta ou aquela, assim como

em Ciências e Matemática. O trabalho destas últimas, em geral fica mais

caracterizado como atividade, do que para o ensino dessa arte e tem por objetivo

fixar conteúdos da disciplina. Na disciplina de Português, conforme as entrevistas, o

trabalho com HQs na maior parte das vezes se volta para o uso dos quadrinhos a

fim de ensinar assuntos da Língua Portuguesa, leituras de imagem ou para a

produção de histórias em que o aluno possa empregar o que aprendeu na disciplina.

Às vezes, tem por objetivo ensinar a criar textos em função da própria criação de

histórias em quadrinhos ou tiras humorísticas - produções que acabam envolvendo

também a linguagem e a criação visual.

As atividades com histórias em quadrinhos, no ensino formal, podem ser

resumidas em ensinar como criar e desenhar um personagem, algumas

características da linguagem dos quadrinhos, para em seguida o aluno criar uma

história. Variam pouco com relação à escolha de materiais a serem trabalhados em

137

sala de aula. A maioria dos professores tem preferência por Maurício de Souza,

autor que costumam levar para sala de aula.

3.3.5.3 Interpretação e avaliação crítica: categorias 3, 4 e 5

Embora nem sempre os docentes verbalizem diretamente o que pensam

sobre as HQs e sobre suas atividades com esta arte, seus trabalhos denotam

superficialidade e muitas vezes práticas casuais, isoladas, geradas no senso

comum. Algumas falas abaixo sintetizam, como grande parte dos professores,

encaminha as atividades com histórias em quadrinhos:

E sobre os diferentes tipos de histórias em quadrinhos ou as diferenças com os desenhos de humor ? Nos quadrinhos existem gêneros diferentes, histórias de histórias (biografias), ficção, aventura, chegou a falar sobre isso? “__ Não, não. Passa por alto. Não dá para trabalhar esse tipo de coisa. Mesmo porque a gente tem muito pouco tempo. Para falar sobre histórias em quadrinhos eu precisaria de mais tempo. A gente só tem duas aulas de artes por semana. [...]. Tem muito conteúdo que a gente tem que dar, se fosse trabalhar com histórias em quadrinhos eu precisaria um trimestre ou um semestre pelo menos. Tem outras coisas também.” (nº 13).

“Eu não falo tanto da HQ. A princípio eu passo a história em quadrinhos para eles e depois mando observar como é feito o desenho.[...]. A maioria gosta de trabalhar com HQ. Eles vão muito na biblioteca retirar histórias em quadrinhos e eu percebo. Não vejo muita dificuldade. Quando eu chego com os gibis todos querem. Um ou outro, claro – numa turma de 38, 40 - não está muito a fim de ler HQ. Mas daí ele desenha. E isso de por a obra e desenhar, eles gostam.” (nº 1).

“Mas eu não falo tanto disso. Falo mais da personagem, de como desenhar, construir a personagem.” (nº 2).

“Eu trabalho primeiro com eles construindo o personagem, acho mais fácil.” E porque você trabalha dessa maneira? “__ O porquê, nunca pensei. A gente vê em livros como é que se vai criando. É automático.” (nº 7).

Nem todos os entrevistados consideram ter dificuldades para ensinar quando

o assunto é histórias em quadrinhos, mas alguns problemas foram revelados pelos

professores. Nºs 2, 12, 13, citam alguns motivos que dificultam, quando as ensinam.

Nºs 9 e 16 relatam alguns obstáculos que as impedem de ensiná-las. Conforme os

depoimentos, em geral se considera que ensinar HQs é uma tarefa fácil. Mas por

seu lado, entre os que não encontram dificuldades, há também aqueles que

138

trabalham de maneira simplificada ou que seguem passos já pré-determinados (ver

Quadro 20).

Ainda que alguns dos professores não se incluam no grupo que revela

dificuldades para o trabalho com HQs, entre esses surgem práticas análogas e

equiparam-se aqui algumas, para fins de análise. Uma das professoras, nº 3, expõe

como qualifica o trabalho que fez com histórias em quadrinhos, na 5ª série:

Você me disse que foi fácil trabalhar com HQ, não teve dificuldade. É mais fácil de trabalhar, com HQ? “__Foi fácil de trabalhar. Não tive dificuldade, porque primeiro teve a explicação, depois fizeram a pesquisa, para identificar as onomatopéias. Foi feita a correção do que eles fizeram e assim foi passado o DVD e eles tiveram que identificar novamente.” (nº 3).

Ao contrário desta, que apresenta seu estilo para ensinar as onomatopéias na

5ª série, a professora que ensina da Educação Infantil à 4ª série, (nº 9), diz o

seguinte:

Então você não chegou a trabalhar história em quadrinhos ? “__ Histórias em quadrinhos, não.” Mas porque? Você nunca estudou essa parte? “__ Não, nunca estudei. Claro que eu uso revistinha também para eles perceberem isso, aquilo, chamo a atenção. Levo, mas assim, para eles montarem alguma coisa, mas um trabalho em quadrinhos, não.” O fato das histórias em quadrinhos serem uma linguagem híbrida, por terem texto e imagem, é o que atrapalha você? “__ Não, porque por exemplo, com os bem pequenos, não é que eu não possa. É que eu não tive tempo de me preparar para isso. Mas até com os bem pequenos, posso fazer a imagem e ali no quadrinho eles usarem a linguagem onomatopaica. Eu posso fazer exclamações, com eles. Eles são capazes de entender essas coisas. Letras, posso fazer um código, para eles lerem. As crianças do Jardim já são estimuladas a conhecerem letras. Eu poderia fazer alguma coisa, mas eu vejo que requer um estudo a mais, do que aquele que eu tenho.” (nº 9).

Ela conta que chegou a trabalhar a música usando as onomatopéias: “uma

vez [...] utilizei os sons das onomatopéias para trabalhar a música com eles. Os

quadrinhos podem ser utilizados para muitas coisas [...].” (Ver Quadro 24, nº 9).

São visões um pouco diferentes, de ambas as professoras. Uma as concebe

como linguagem artística e a outra vê as histórias em quadrinhos mais como recurso

didático ou pedagógico. Esta última, nº 9, é de opinião que até os bem pequenos, do

Jardim, seriam capazes de entender o que são onomatopéias e inclusive utilizou-as

para ensinar assuntos musicais com as crianças de pré a 2ª série.

139

Isso nos leva a indagar, então, até que ponto são válidas atividades isoladas

para ensinar determinados assuntos? O que alunos da 5ª série, aprendem quando

identificam e escrevem elementos da linguagem dos quadrinhos de forma

simplificada? O que aprenderam sobre as histórias em quadrinhos? Não poderiam

alunos deste nível de ensino, já estar iniciando em investigações acerca da

complexidade inerente às HQs?

A linguagem onomatopaica é uma das características principais da linguagem

das HQs. Assim como os balõezinhos de fala, não são esquecidas pela maioria dos

professores quando ensinam sobre quadrinhos. O balão, o ruído onomatopaico e o

ritmo visual, são elementos fundamentais das HQs. As onomatopéias, de acordo

com Quella-Guyot (1994, p. 85), “constituem a sonoplastia (a trilha sonora) das

histórias em quadrinhos”, isto é, são uma tentativa de sonorização gráfica. Uma

enorme quantidade de ruídos pode ser evocada pelas onomatopéias. Contudo não

são simples ruídos. Os quadrinhos são menos simples do que aparentam.

Segundo Acevedo (1990), vários países utilizam onomatopéias que provem

do idioma e verbos ingleses62 e este é um fenômeno que está ligado à difusão dos

quadrinhos norte-americanos. Acevedo (1990, p. 130) assinala que “dessa forma, os

quadrinhos americanos não só disseminam seus conteúdos específicos (de acordo

com seus interesses específicos) como também impõem suas formas lingüísticas.”

Como explica esse autor, dentro de uma perspectiva crítica, não se recusariam as

onomatopéias trazidas de fora, mas também não seria o caso de repeti-las

mecanicamente, o que significa estar fugindo a tarefas criativas e negando a própria

identidade. Lembra ainda que há exemplos de artistas que ao perceberem tal fato,

procuraram criar onomatopéias pertencentes a seus idiomas.

O que se destaca, além da ausência de estratégias para a interpretação

crítica nos estudos propostos aos alunos, quando se comparam algumas atividades

realizadas, é sua semelhança em grau de aplicação e dificuldade em diferentes

etapas escolares. O pensamento destas professoras pode ilustrar como atividades

casuais podem coincidir e abordar assuntos de maneira idêntica tanto nos primeiros

anos escolares, quanto em anos bem posteriores. Denota ser algo que ocorre não

apenas com o ensino relacionado à arte dos quadrinhos, mas também quando se

aborda outras artes. Esses casos, se repetem como se verá adiante.

62 Por exemplo: click (to click – estalar), smack (to smack – beijar), sniff (to sniff – cheirar), splash (to spash – salpicar de água), etc. (ACEVEDO, 1990).

140

Dentro do enfoque das teorias da Cultura Visual, as observações indicam

falhas nas noções dos docentes sobre a construção do conhecimento e aprendizado

artísticos e por conseqüência da compreensão em níveis e estratégias para alcançar

um conhecimento mais complexo. A necessidade de aprofundamentos sobre o

processo de ensino e aprendizagem63 da arte é um dos aspectos que emerge em

vários pontos das falas dos professores.

Como observa Franz (2005b), quando entram na escola, as crianças em sua

maioria, ainda sabem muito pouco sobre os conteúdos de determinadas matérias,

como por exemplo, Matemática ou Ciências. Contudo, mesmo tendo consciência

disso, os professores dessas disciplinas, não se satisfazem com os conhecimentos

iniciais dos alunos e se esforçam para que estes “dominem uma considerável soma

de conhecimentos para superar o ano letivo e avançar no domínio dos seus

campos.” (FRANZ, 2005b, p. 2). Para essa autora, devido a preconceitos e barreiras

criados no campo da arte e da cultura visual, gerou-se a crença de que para

compreender objetos artísticos, não há necessidade de estudar com seriedade.

Nas pesquisas sobre a aprendizagem e a construção do conhecimento,

segundo Gardner (1990, apud Hernández 2000, p. 120), chegou-se à conclusão de

que “o nível de compreensão de um indivíduo sobre artes é o lento resultado de sua

interação com o domínio artístico e o desenvolvimento cognitivo e social.” Esse

enfoque leva a considerar o conhecimento prévio dos alunos como ponto de partida

para a elaboração de estratégias que favoreçam um processo de inferências e

transferências entre os conhecimentos já adquiridos para novos problemas e

situações. Diante das falas analisadas, torna-se importante enfatizar essa

necessidade.

Paralelamente aos problemas relacionados ao aprendizado, nota-se falta de

consenso entre os professores, no que toca aos planejamentos, que evidenciam a

forma como se (des)configura o ensino de Arte no contexto escolar. Em Artes

Visuais, há uma multiplicidade de conhecimentos e assuntos que podem ser

abordados, que por vezes se oferecem como fragmentos ou pequenas parcelas,

carentes de uma organização e seqüências que conduzam a aprofundamentos.

63 A indefinição de princípios comuns que orientem o planejamento curricular do ensino de Arte e a necessidade de discussão a respeito dos processos de ensino e aprendizagem em Arte, também são problemas citados no documento elaborado pela SEED/PR em 2004-2005. Documento já citado (ver item 1.2 - Problema de Pesquisa).

141

Ambos são problemas pertinentes ao ensino de Arte. A organização do

planejamento curricular e planejamento individual do professor é assunto tão

importante para se decidir o que e como ensinar, quanto para garantir a

sistematização do ensino de Arte. Há muitos casos em que o professor é o único

responsável pela elaboração do planejamento do ensino da disciplina na escola.

Contudo este assunto implica em uma discussão não apenas a nível individual, mas

também coletivo. Diante dos múltiplos fatores que interferem nesse processo, tal

como as transformações na sociedade, trazendo mudanças nas necessidades para

o ensino e educação atuais e aparecimento de novas abordagens e metodologias,

torna-se um desafio para professores e escolas, a elaboração de programas bem

definidos e estruturados. Cabe ao professor ou equipe de professores e escola,

decidirem quais as metas e objetivos a serem atingidos, selecionando os

conhecimentos mais significativos em função de seus objetivos e optarem por

encaminhamentos que julguem mais adequados a fim de garantir graduações nos

conteúdos programáticos e a continuidade dos estudos para os alunos.

Segundo Hernández (2000, p. 137) há muitas formas de se organizar o

currículo. O ensino por projetos de trabalho é uma delas. Porém não são uma

fórmula para todos os problemas e sim uma concepção de ensino. De acordo com

Hernández (2002), há muitas maneiras de aprender, e os projetos são apenas uma

dessas formas. “É bom e é necessário que os estudantes se encontrem com

diferentes situações para aprender.” (HERNÁNDEZ, 2002). Conforme explica ele,

também é importante que os alunos tenham aulas expositivas, participem de

seminários, façam trabalhos individuais e em grupo, para que tenham a possibilidade

de estudar em diferentes situações.

No relato da professora pedagoga (nº 2), surge uma das dificuldades

relacionadas ao ensino das histórias em quadrinhos. Na sua opinião, o trabalho com

histórias em quadrinhos com crianças da 2ª série:

“É interessante porque a leitura é visual. A criança não precisa ler - não precisa dos balões para saber o que está acontecendo. Tem toda uma seqüência, uma lógica. Eles gostam de construir histórias em quadrinhos. Mas é mais fácil trabalhar com os maiores, com certeza. É muito desenho para montar. Fazer uma montagem.” (nº 2).

A professora fez atividades com HQs por duas vezes neste nível escolar. Em

uma das ocasiões, utiliza os gibis de Maurício de Souza, como recurso didático para

142

demonstrar os planos. Para ensiná-los na prática, propôs às crianças fazerem uma

caixa com desenho do plano de fundo e personagens, passando daí para um

teatrinho improvisado. A outra atividade envolveu desenhos. A professora explicou

como era a “seqüência das histórias em quadrinhos”, sua lógica e estrutura, depois

os alunos partiram para a atividade prática, desenhando “seqüências de animação”

no bloquinho, diretamente nas folhas (ver Quadro 20). Conforme seu relato o que

mais dificultou esse trabalho com os alunos, foi:

“A própria construção da imagem, por ela ser pequena e ter que repetir o personagem nos outros desenhos. É complicado [na 2ª série]. Daí você trabalha HQ, mas de outro jeito. Com desenho de palito, palitinho, virando as páginas rapidinho. Bloquinho de animação e o bonequinho se mexe.” [...] Pediu para eles desenharem? “__ Pedi para eles desenharem e fazerem uma seqüência de fatos.” E eles fizeram? “__ É, foi meio complicado. Não foi uma experiência boa. [...] Eles trabalharam mais com a imagem, em seqüência, que a gente fazer tradução do texto. Utilizo a última página do gibi, que não tem história nenhuma e eles montam a história em quadrinhos.” (nº 2).

O insucesso atribuído a essa atividade, parece estar mais ligado ao resultado

esperado na produção com relação às aptidões dos alunos, ou seja, estaria na

inadequação da tarefa com relação ao estágio de desenvolvimento gráfico-plástico.

Seqüências de desenhos animados exigem, além da reprodução fiel dos

objetos, a observação acerca das leis físicas do movimento. Até uma bola, ou um

simples palito, são regidos por essas leis, e para explorá-las é preciso compreendê-

las. Mesmo que haja uma compreensão natural ou intuitiva sobre as leis do

movimento é preciso traduzir tudo em desenho. Se aí não houver um trabalho

cuidadoso, pode não ocorrer o resultado que se espera frustrando as expectativas.

Caberia lembrar que as teorias sobre a aquisição do conhecimento artístico e

evolução gráfico-plástica, são bases para o ensino de Artes Visuais e todo educador

deve levá-las em conta. Pillar (1996a), que pesquisa a construção do desenho na

criança a partir das teorias do construtivismo, explica que há diferentes níveis de

desenho que dependem do estágio em que se encontra a criança. Como destaca

essa autora, esses estágios existem, e há diferenças individuais que também

determinam especificidades em cada um desses níveis. De acordo com as teorias

revisadas do construtivismo, segundo Hernández (2000), os estágios não ocorrem

143

de modo tão linear; podem ocorrer variações. Caberia ao professor observar para

poder adequar as tarefas em função do contexto de seus alunos.

Há que se notar ainda a incoerência entre mostrar a lógica da estrutura de

uma história em quadrinhos e fazer uma atividade prática com seqüência de

desenhos animados. As histórias em quadrinhos, conforme Will Eisner (1989), são

uma Arte Seqüencial. Por seu lado, os desenhos animados também não deixam de

ser uma arte visual em seqüência. Assim, antes de partir para a prática, como faz

Conde (2000), ao traçar paralelos para abordar a arte do cinema e HQs, convém

antes demarcar os campos, diante da confusão que podem causar suas imbricações

e semelhanças.

Para McCloud (2005, p. 7) “a diferença básica é que a animação é

seqüencial em tempo, mas não espacialmente justaposta como nos quadrinhos.” O

espaço é para os quadrinhos, o que o tempo é para o filme. O tempo nos quadrinhos

é algo mais complexo (McCLOUD, 2005). Enquanto um filme tem seus quadros

projetados em um mesmo espaço; nos quadrinhos esses quadros ocupam espaços

diferentes.

Conta a professora nº 13 que realizou na 6ª série, atividade análoga. Para ela,

as dificuldades para ensinar histórias em quadrinhos estão relacionadas a outras

questões, como se explica mais adiante e não a esta atividade que descreve. A

professora pedagoga, nº 2, talvez julgue como não necessária a parte teórica para

os alunos de 2ª série. Conforme suas palavras, para falar sobre quadrinhos iniciou

com as releituras de obras de arte de Maurício de Souza para em seguida explicar o

que são “histórias em quadrinhos”, como surgiram e depois propor uma atividade

prática com “bloquinhos de animação” (ver Quadro 20). Segue seu relato com o

seguinte:

[...] Você fez alguma atividade? “__ É. Dá para montar a história em quadrinhos, relacionando com outras disciplinas. Aqueles bonequinhos que mexem, também.” Mas você chegou a montar uma história com eles? Ou fizeram o bloquinho? “__ Eles fizeram o bloquinho, história no bloquinho. Faz o bloquinho e eles fazem aqueles desenhos, daí o bonequinho mexe a perninha, o braço.” O que eles fizeram nos bloquinhos? “__ Alguns fizeram bonequinho mesmo. Alguns fizeram pássaro voando. Outros fizeram paisagem, dá para mexer alguma coisa na paisagem, a nu-vem, por exemplo, vai mexendo. Cada um faz uma coisa.” [...] Você falou que dá para relacionar com outras disciplinas. Isso você chegou a fazer?

144

“__ Já. Vou relacionando com a aula de Português, por exemplo. Fazendo um trabalho interdisciplinar. Dá para fazer isso, trabalhar a interdisciplinari-dade.” [...] Fez um trabalho interdisciplinar com histórias em quadrinhos? “__Não, não. Só trabalhei a poesia de Cecília Meirelles com eles.” (nº 13).

Passando do tema HQs, diretamente para uma atividade prática em

animação, a professora desvinculou a prática da teoria, caracterizando, assim, uma

atividade fora de contexto. Embora o tema animação possa ser “derivado”, ambas as

artes - animação e histórias em quadrinhos - têm características e especificidades

próprias: história, forma, produto e meios diferem. A professora poderia ter

construído uma história em quadrinhos com os alunos, ou explorado as releituras -

tanto partindo da arte erudita, quanto da própria história da arte dos quadrinhos -

articulando a parte teórica com a parte prática e a contextualização. Contudo, partiu

para uma atividade de criação livre e não trabalhou a parte prática, de acordo com o

produto, isto é, com as histórias em quadrinhos.

Conforme Hernández (2000), considerando os limites antes impostos pela

antiga visão disciplinar da História da Arte, os estudos da Cultura Visual, englobam

novos objetos de pesquisa que estão presentes na sociedade contemporânea:

artefatos como anúncios, desenhos, moda, televisão, filmes, grafites, imagens

digitais, fotografias e muitos outros, além da arte tradicional. Entretanto, como

enfatiza esse autor, perante essa multiplicidade, não se deve cair na tentação da

homogeneidade ou do vale-tudo.

Cada manifestação cultural, cada arte e cada meio têm algumas características e uma história, e, atualmente, a cultura é cada vez mais híbrida, o que faz com que os limites a partir dos quais se confronta a pesquisa sobre os novos ‘objetos’ da cultura visual sejam cada vez mais imprecisos. (HERNÁNDEZ, 2000, p. 136).

Esta observação é particularmente importante para o estudo de histórias em

quadrinhos e desenhos animados. Há muitos pontos em comum e reciprocidades

que dificultam delimitar seus contornos. Ambos são artes narrativas de

entretenimento, mas na realidade são diferentes. Os primeiros desenhos animados,

que foram produzidos por Emile Cohl em 1908, na França, mostravam bonecos

simples de um traço só. Segundo Halas (1979), ainda em seus primórdios, os

desenhos animados eram tão rudimentares quanto as histórias em quadrinhos da

época, os diálogos flutuavam em balões amarrados à boca dos personagens. Mas

145

tal como ocorreu com o filme normal, a animação teve de criar suas próprias leis e

técnicas. Hoje surgem novamente híbridos decorrentes da utilização das tecnologias

digitais, que envolvem seqüências de animação e cartuns, adquirindo novas

características.

Conde (2000) assinala que as HQs são um meio mais relacionado com a

narrativa icônico-escritural e a literatura. As HQs narram por meio de uma

sobreposição de imagens e palavras. Conforme Will Eisner (1989), as regências da

arte visual, superpõem-se às regências da literatura. “Ainda que entre as historietas

mudas e o cinema mudo se possa estabelecer semelhanças, entre o cinema sonoro

e as historietas modernas cabem muitas diferenças.” (CONDE, 2000 p. 36, tradução

nossa).

Diante dos procedimentos analisados, como se verá mais adiante, pode-se

dizer que caberia elucidar conceitos, histórias e diferenças, antes ou depois de partir

para as atividades, a fim de, no mínimo, buscar pela coerência entre teoria e prática.

A professora nº 15, tem uma concepção de ensino mais próxima à nº 2, isto é,

mais prática. Descreve duas atividades, que considera como de ensino de histórias

em quadrinhos. Também menciona uma terceira, que realizou na 7ª série, com o

intuito de preencher um tempo que sobrou, e assim propôs aos alunos que criassem

histórias em quadrinhos sobre sua vida. A primeira, na 7ª série, foi resultado de

improviso e estratégia de pronto atender o planejamento da escola, em que havia

recém-ingressado. A inventividade denota ser a marca pessoal da professora. Desta

forma, propôs aos alunos elaborarem uma história em quadrinhos, com base em

uma história inventada por ela na hora. Os alunos fizeram o esboço em aula,

conforme a professora lhes falava. Produziram suas histórias em casa, levando na

aula seguinte o trabalho pronto.

Já ensinou alguma coisa sobre a linguagem dos quadrinhos? “__ Trabalhei quadrinhos com eles, inclusive porque está no planejamento do Colégio.” Está no planejamento da 7ª? “__ Está no planejamento da 7ª. Quando entrei nessa escola, muito em cima da hora, a diretora precisava de professora, então eu não tive tempo de fazer o meu projeto, o meu planejamento, que geralmente fazemos. Eles pegaram o planejamento do ano passado da professora anterior e passaram para mim. Achei por bem, não alterar nada. [...]. Neste planejamento tem quadrinhos no 2º semestre.” [...]. O que tinha nesse planejamento para ser feito e como você trabalhou ? “__ Tinha só escrito: “quadrinhos”, mais nada. Tanto que eu imaginei um jeito de trabalhar quadrinhos com eles. Trabalhei a parte da imaginação. Eu

146

fiz sempre assim. Contei uma história bem fantástica, até por sinal bem surreal [...].” (Ver Quadro 20, nº 15).

Na segunda atividade, percorre um caminho semelhante às professoras nº 2 e

13, embora de modo inverso, isto é, de animação para quadrinhos. Nesta, o tema foi

escolhido em conjunto pelos alunos da 4ª série da Educação Especial. O trabalho

idem, feito em equipes, dividindo-se as tarefas de produção. Segundo ela, utilizou

como recurso didático, vídeos de animação, por considerar histórias em quadrinhos,

muito estáticas. Com base nos desenhos animados, os alunos deveriam criar

histórias em quadrinhos que tivessem a sensação de movimento.

“[...]. Outra maneira que trabalhei, foi na 4ª série, foi trabalhado em conjunto. O tema escolhido em conjunto foi a Copa, era bem na época. [...].” (Ver Quadro 20, nº 15). “[...]. Como esse trabalho que eles fizeram da Copa, eu coloquei movimento. O quadrinho na verdade, não é aquela coisa estática da Mônica. Todo ele tinha que dar sensação de movimento e eles conseguiram. A gente menospreza eles, às vezes, não é?” Trabalhou quase como se fosse uma seqüência de animação? “__ Eu passei animação para eles. Eu passei o Anima Mundi, aqueles que usam bastante grafismo. Separei aqueles vídeos [...]. Acho aquele material muito bom. É adulto, mas para eles é... eles são adultos na verdade. Eles entendem tudo o que o adulto entende. Aquele material que tem grafismo, eu mostrei para eles e eles entenderam bem, conseguiram aprender bastante.” (nº 15).

A crítica anterior aqui também é válida. Podemos dizer ainda, como Hallas

(1979), que a essência da animação é o movimento e isso é óbvio. Para Hallas

(1979, p. 26), “se a estátua do Discóbolo realmente se pusesse a mover, deixaria de

ser o Discóbolo dotado das virtudes particulares de uma estátua e passaria a uma

outra categoria de arte.”

Nos desenhos animados obtém-se a ilusão do movimento com a projeção de

aproximadamente 24 imagens por segundo, “enquanto que as histórias em

quadrinhos, simulam o movimento, o insinuam ao passo de um fragmento de um

espaço a outro.” (CONDE, 2000, p. 35, tradução nossa). Nas HQs, o movimento está

ligado a duas questões, a leitura de quadro a quadro e a representação do

movimento em cada quadro. Conforme McCloud (2005, p. 67), “os quadros das

histórias fragmentam o tempo e o espaço, oferecendo um ritmo entrecortado de

momentos dissociados”; nossa mente conecta esses momentos transformando-os

em uma realidade contínua e unificada. Também há a questão do grafismo,

conforme citou a professora. No caso dos quadrinhos, linhas de expressão podem

147

dar sensação de movimento e existem várias formas de se representar o movimento

em um único quadro.

Nesta atividade, o que fica claro é a ênfase na prática e no aprendizado para

o emprego criativo da linguagem visual. Concepção de ensino que está voltada para

a observação dos elementos formais e desenvolver as habilidades plásticas e

criativas dos alunos. O objetivo fica por conta de ensinar o aluno a representar “o

movimento”. A ausência de planejamento e teoria, justifica-se com o argumento de

que alunos da 7ª série, não gostam da parte teórica. O acordo feito entre a

professora e os alunos parece ser válido apenas para assuntos da arte erudita.

Desta forma, as atividades com quadrinhos ficam apenas na prática (ver Quadro 16).

Mesmo que haja similitudes entre essas artes, dentro de uma perspectiva

crítica, caberia discutir conceitos e também pesquisar com os alunos a fim de não

reduzir este aprendizado a fragmentos isolados e ao acaso.

Subentende-se também, no discurso dessa professora, o desejo de trabalhar

com algo que considera mais dinâmico. Conforme disse, para ela, os quadrinhos são

algo muito estático. No entanto, resolve a questão do fazer na prática com “histórias

em quadrinhos”, como uma solução mais fácil, assim como funcionam os

“bloquinhos” referidos anteriormente. Há meios para se direcionarem os trabalhos

para ambas as artes, tanto tecnicamente, quanto para promover conhecimentos

críticos mais significativos. Mas depende também do professor e seus alunos

promoverem essa busca. Nas teorias da Cultura Visual, supõe-se que

a educação escolar possa possibilitar a aquisição de estratégias de conhecimentos que permitam ir além do mundo tal como estamos acostumados a representá-lo por meio de códigos lingüísticos e sinais culturais estabelecidos e ‘dados’ pelas matérias escolares. (HERNÁNDEZ, 1998, p. 27).

Diante do contexto contemporâneo, na educação para a compreensão crítica

da Cultura Visual, torna-se importante ampliar o olhar investigativo e potencializar

este ensino articulando o fazer prático e criativo com questões históricas e sociais.

Seria também importante promover discussões e reflexões sobre os filmes assistidos

e as produções realizadas pelos alunos, relacionando-as à vida pessoal do aluno.

A terceira atividade surgiu também de improviso, na turma de 7ª série. Nesta

prática, aparecem referências acerca de um dos potenciais das histórias em

quadrinhos, utilizado por diversos profissionais da educação atualmente. A atividade

148

descrita, com relação ao ensino de Artes Visuais, ficou em um plano secundário, a

título de preencher um tempo e, ao acaso, transformou-se em um recurso útil, para

resolver outros problemas:

“Uma certa ocasião, eu pedi para eles criarem uma história sobre a vida deles e eles fizeram em forma de quadrinhos, porque eu já havia terminado de trabalhar e eles acharam melhor fazer isso do que uma redação. A maioria deles apresentou em forma de quadrinhos. Ali você vê, aparece tudo, eles aparecem com os nomes dos personagens, aquilo que eles queriam. Aparece a questão familiar, assim bem forte. Violência na família, meio que subliminar, nas entrelinhas, mas dá para ver e até essas histórias foram levadas para o Conselho. Com base nessa produção, assistente social e tal, a gente resolveu muita coisa. Foi útil não só a nível pedagógico, mas também a nível emocional, sociocultural do aluno. Problemas deles que trazem para a escola.” (nº 15).

Um dos entrevistados do estudo exploratório, também citou, muito

rapidamente, que fazia um trabalho regular de produção de histórias em quadrinhos

com a orientadora educacional de sua escola. Seus trabalhos deveriam retratar as

situações, como imaginasse que fossem, como gostariam que fossem e assim por

diante, conforme ia lhe propondo a orientadora.

A vertente terapêutica da arte foi difundida no Brasil desde 1930 e está

intimamente ligada ao movimento da livre expressão. Duas correntes, uma de

orientação psicológica e outra, a expressiva, orientada pela psicanálise, segundo

Fusari e Ferraz (1992), tiveram influências nas concepções estéticas da arte. A auto-

expressão, auto-identificação dos sentimentos, emoções e pensamentos, estavam

associados ao conceito de saúde psicológica e tinham por finalidade o ajuste do

indivíduo à sociedade (EFLAND, 2003). Desta forma justificava-se a arte na

educação. Essa vertente, no ensino de arte, hoje não é mais enfatizada. Conforme o

relato, essa função da arte é delegada a outros profissionais da educação.

A educação pós-moderna, conforme Efland (2003, p. 55, tradução nossa),

questiona esses conceitos à medida que os psicólogos na modernidade

tendiam a estabelecer normas universais inspiradas nas características particulares de um grupo concreto e [...] até que ponto certas <<normas>> têm contribuído para reproduzir as condições de falta de igualdade e dar formas às representações reflexivas dos sujeitos.

No enfoque crítico, as ações educativas, procuram promover o próprio

indivíduo e não sua transformação em mero instrumento que deva se adequar à

sociedade. Um dos objetivos da pedagogia crítica da arte é auxiliar para a

149

compreensão do mundo social e cultural do aluno, através de um exercício para o

desenvolvimento da consciência crítica, não apenas das representações alheias,

mas suas próprias, com vistas à liberdade e autonomia.

Na opinião de Pereira (in CORRÊA, 2004), a prática na Educação Artística,

encontra-se esvaziada de propósitos formativos e está predominantemente

dissociada do complexo da totalidade dos indivíduos. As novas propostas em Arte,

conforme assinala, tentam comprometer-se com a construção integral do indivíduo.

Para esse autor, desde um corte de cabelo, ou roupas, músicas, rituais de romance,

amizade, relacionamento com pais, subalternos, superiores, parceiros, escolhas,

opções, vivências e aprendizagens, etc., enfim, tudo tem uma estética. Porém,

existem conflitos e dificuldades para leituras da estética do cotidiano em função dos

postulados acadêmicos que se produzem nos cursos de formação em Arte.

Segundo Pereira (in CORRÊA, 2004, p. 224), “normalmente os valores

produzidos no dia-a-dia não são reconhecidos como de natureza estética: a

tendência é o enquadramento de origem acadêmico-científica” porque se reconhece

como procedentes e dignos apenas os valores canonizados institucional e

historicamente.

A insatisfação com os resultados relacionados às tarefas propostas também

surge em outro relato, o da professora nº 12, que tem turmas de alunos com

deficiências auditivas. Esta segue os passos já citados, tal como a professora nº 7,

que ensina a fazer histórias em quadrinhos na 6ª e 7ª série: ensinar sobre a

linguagem das HQs, como fazer um personagem, para depois os alunos criarem sua

história (ver Quadro 20). Além disso, a professora nº 12 costuma utilizar perso-

nagens dos gibis de Maurício de Souza, porque considera que são fáceis para os

alunos aprenderem a ampliar e reduzir desenhos.

A dificuldade desses alunos para fazer histórias em quadrinhos, segundo ela,

está relacionada mais à parte escrita. A capacidade de compreensão visual dos

alunos surdos é mais apurada que a de outros alunos. No trabalho que fez para

ensinar sobre os planos, por exemplo, antes da parte prática, levou imagens de

obras de arte e em cima disso fez perguntas por escrito (ver também Quadro 16):

“[...]. Foi tempo, foi umas duas ou três aulas para eles fazerem isso, para conseguirem escrever, principalmente os surdos. Na escrita deles eles comem muitas letras. [...]. E o interessante, é que as turmas de surdos, têm uma capacidade de compreensão visual muito melhor do que a turma de ouvintes. Porque para o surdo tudo é visual. Essa questão do primeiro e

150

segundo plano, eles entenderam com mais facilidade do que as outras turmas.” (nº 12).

A professora considera que ainda não encontrou o caminho para trabalhar

com histórias em quadrinhos:

“Trabalhei um pouco com uma turma, mas é muito pouco. Pelo fato dos surdos terem essa dificuldade da escrita, não encontrei ainda o caminho.” [...] E como você trabalha HQ na 6ª série? “__ Quando eu trabalhei? Primeiro as partes, o que é onomatopéia, os balões [...].” (Ver Quadro 20, nº 12).

Para o aprendizado do desenho freqüentemente costuma levar desenhos

prontos e utilizar a cópia como recurso didático:

“Mesmo que eu leve um desenho pronto e meu objetivo seja a pintura. Se meu objetivo é a pintura e não o desenho, então não quer dizer que estou dando desenho estereotipado, alguma coisa nesse sentido.” Eles precisam de alguma referência? “__ É, exatamente. Principalmente os meus que têm dificuldade. Então eu levo aqueles livros que tem desenho de bordado. Aí eles fazem assim mesmo, colocam a folha por cima e copiam, porque eles têm dificuldade. [...]. E o que eu trabalho com desenho, vamos dizer assim, do Maurício de Souza, quando eu trabalho é ampliação. Ampliação e redução. Peguei nesses almanaques do Maurício de Souza, as imagens maiores para reduzir e as menores para aumentar, que ficassem 1/4 da folha de A4. Daí colei na cartolina. Eu tenho então esse material, que levo para eles. Em cima disso, eles fazem a ampliação, com os bonequinhos do Maurício de Souza. Acho que os desenhos Maurício são fáceis para eles aprenderem a ampliar. Ampliação assim, sem quadriculado, a mão livre mesmo. [...]. Trabalho assim, porque histórias em quadrinhos mesmo, têm que ser assim até aprender.” (nº 12).

A professora nº 1, formada em Gravura, na Faculdade de Belas Artes, utiliza

recursos didáticos semelhantes. Leva um gibi do Maurício de Souza para cada

aluno, que toma emprestado na biblioteca. Cada um lê o seu e faz o trabalho

individualmente, baseando-se na revista:

“É assim que eles gostam. Muitos copiam até, mas eu deixo, porque eu acho que também a cópia ajuda. Até a cópia – colocando em baixo da folha. Até isso acho que ajuda. Muitos eu digo, olha é melhor olhar e fazer, ampliar. Aprender a ampliar a imagem. E assim, eu trabalho com a 5ª.” [...]. Não sei se o que eu estou passando para eles está correto ou não. Na faculdade também, eles quando mandavam a gente criar uma historinha. Mandavam observar.” (nº 1).

151

Ambas manifestam dúvida quanto ao procedimento que utilizam para o ensino

de desenho. Uma, (nº 12), refere-se ao uso da cópia como uma justificativa em

função de seu desconhecimento acerca de outras estratégias e da deficiência e

dificuldade dos alunos. Outra, (nº 1), justifica seu uso, por ter ela mesma aprendido

segundo o método tradicional de ensino de desenho. Aparentam ter receio de estar

indo contra a concepção que valoriza mais a criação e a originalidade.

Receio, ou medo, que não seria infundado, porque quase cem por cento dos

professores de Arte, independente de trabalhar ou não com histórias em quadrinhos,

privilegia mais a criatividade do aluno, até mesmo os professores de outras

disciplinas. A professora nº 2, por exemplo, usa também os gibis para os alunos se

basearem (ver Quadro 20). Mas suas descrições sobre as produções dos alunos, a

partir das obras de arte erudita, indicam que valoriza bastante a criação do aluno:

“Eles fazem uma construção deles. [...]. Fica bem mais enriquecedor do que você dizer: __ Faça um desenho. Ou um mimeografado pronto: __Oh ! Pinte o desenho! É diferente. Vou trabalhar diferentes técnicas de pintura, para depois chegar noutro trabalho? Assim estaria fazendo um caminho primeiro pela técnica. Mas eu quero chegar em algum lugar.” (Ver também Quadro 16, nº 2). “Eles criam, ou individual ou em grupo. De alguma forma, eles têm que passar essa imagem do papel para o corpo, para o teatro, traduzir, digamos.” (nº 4). “Com base nas obras da Tarsila, na parte prática, eles vão fazer a construção deles, colocar o que aprenderam de figura e fundo.” (nº 11). “As vezes eles só desenham, ou então trabalho com Teatro.” [...]. Eles ficam livres para fazer no Teatro? “__ Não, eu dou algumas diretrizes. Tem que ver quais são os pontos que precisa atingir, primeiro. Daí eles podem fazer, podem inventar. Às vezes é um trabalho de criação individual, às vezes em grupo.” (nº 13). “[...] usamos para desenvolver a criatividade deles também [...].” (Ver Quadros 21 e 25, nºs 18 A e 18 B). “Eu só dou umas dicas. Normalmente eles usam a criatividade deles essa parte [do fazer artístico] eu deixo livre.” (nº 19).

O professor nº 14 faz uso de referências, mas prefere ensinar os passos para

que o aluno mesmo possa criar, mesmo que já tenha alguma experiência (ver

Quadro 20). Duas das professoras (nºs 5 e 6), nas produções dos alunos, sempre

avaliam em função da criatividade e da originalidade. Outra, nº 7, enfatiza mais a

criação do produto. Alguns não aprovam a cópia.

152

“[...]. Eles usam a criatividade deles. Mas primeiro a gente faz toda aquela parte. Faz a leitura, a parte teórica antes.” (nº 5).

“Já trabalhei personagem com aluno, o Batman e disse para reconstruir. Ele veio e mostrou o personagem: tudo igual. Eu disse que aquilo não era uma criação. O aluno respondeu que tinha mudado a roupa. Então lhe disse que tinha incrementado, mas não tinha mudado nada.” Não criou nada? “__ Não. Eles vêem uma coisa e acham que é aquilo só. Não saem muito daquilo. Porque quando alguém faz uma coisa, eles também querem fazer. [...]. Os estereótipos. O difícil é eles enxergarem que podem criar.” (nº 6). “Eu trabalho bastante com a criação deles.” (nº 7).

Uma das professoras, nº 8, nunca fez atividades com quadrinhos. Para ela, o

trabalho de criação livre, é mais importante e evita até influenciar o aluno. Prefere

inclusive deslocar-se de uma escola até outra, carregando materiais para que os

alunos possam fazer trabalhos criativos, do que usar “livrinhos”, como diz:

“Emprestava e levava para a outra escola. Depois devolvia, cansei de levar. Até restos de material, quando já estava quase estragando, porque realmente não tem. E é uma pena, porque eles têm vontade de trabalhar. Você leva uma coisa diferente assim, eles estão meio cheios daqueles livrinhos, sabe? Porque cada professor que entra vem com aqueles livrinhos.” [...] “O que eu procuro fazer com os meus alunos, é que se desvinculem da cópia. Eu sempre dou ênfase à criatividade. O aluno que cria. Isso porque em todos esses anos de experiência, a gente tem tido muitos alunos que dizem que nunca criaram nada. Dizem que são um zero à esquerda: __ Eu sou péssimo para isso. Tive uma aluna inclusive, que começou e não fazia nada. Eles estavam trabalhando figura humana [...]. E ela começava e desmanchava, isso em modelagem. [...]. Então eu disse para ela começar a observar. [...]. Acabou se batendo, ficou dois meses, mas fez uma figura humana super expressiva e eu não encostei o dedo.[...]. Veja tudo isso, ela não se acreditava, mas ela passou a observar, a olhar. Então acho que é uma questão de envolver o aluno também. Eles têm potencial. [...].” (nº 8).

Com o ensino modernista que preconizava a livre expressão criadora, a cópia

era amplamente rejeitada. Segundo Pillar (1996a, p. 40), “a invenção da fotografia

na modernidade alterou a função da pintura.” Em função disso, aos poucos os

artistas modernos desvincularam-se dos objetos, evitando na obra qualquer

semelhança com o real. Isso “fez com que a inventividade, a experimentação, o novo

se impusessem como necessários na estética da modernidade.” (PILLAR 1996a, p.

41). As vanguardas recusavam qualquer idéia de arte como cópia, ou imitação.

O ensino passou a enfatizar a expressão livre individual, procurando evitar

qualquer influência no processo de criação do aluno. A crença de que a arte das

crianças se desenvolve naturalmente perdurou por quase um século. Desde então,

153

encorajava-se a arte espontânea. Conforme Brent e Marjorie Wilson (in BARBOSA,

2005a, p. 60), “fechava-se os olhos para os desenhos copiados das crianças.”

O interesse pela arte infantil fez com que muitos teóricos voltassem sua

atenção para os estágios iniciais de desenvolvimento. Como resultado, segundo

esses autores, hoje se sabe menos a respeito dos estágios posteriores de crianças

mais velhas e a respeito das influências que recebem pela arte dos adultos.

Para Brent e Marjorie Wilson (in BARBOSA, 2005a), o aprendizado mais

importante está ligado ao processo de perda da ingenuidade em arte - o processo

que envolve a aquisição de convenções artísticas. Esse processo torna-se mais

predominante em crianças de oito ou nove anos em diante e é “mais importante de

que qualquer outro no desenvolvimento artístico, porque é o processo que

permanece operacional durante toda a vida.” (WILSON in BARBOSA, 2005a, p. 61).

Existem muitas teorias sobre o processo e a natureza do desenho, mas que,

segundo Brent e Marjorie Wilson (in BARBOSA, 2005a), começam por objetos reais,

ignorando as influências que as crianças recebem desde o início de outras pessoas

e de sua cultura. Por essa razão partem do princípio que o desenho de um objeto

não é uma representação64, mas um signo configuracional. Nessa teoria, aprender a

desenhar signos configuracionais é um processo semelhante ao aprendizado de

signos verbais. Aprender a formar e usar signos visuais, como explicam Brent e

Marjorie Wilson (in BARBOSA, 2005a, p. 74), “pode ser considerado coisa análoga

ao ato de aprender formar e usar palavras”, observando e imitando outras pessoas a

desenharem. Esses autores afirmam que sempre existe uma convenção a partir da

qual as pessoas iniciam e consideram que o processo de invenção (de signos

configuracionais) existe também, mas é mais raro e ocorre em torno dos oito ou

nove anos.

Brent Wilson e Marjorie Wilson (in BARBOSA, 2005a) pesquisaram sobre as

influências das fontes externas e o papel que ocupa o processo imitativo no

aprendizado do desenho. Essas pesquisas indicaram que as crianças mais bem-

dotadas em arte, ou avançadas na habilidade de construir idéias visuais e na

representação de coisas, são principalmente aquelas que desenham a partir de

ilustrações e imagens das mídias populares. Segundo esses autores, estes são os

meios primários pelos quais se expandem as habilidades de construir símbolos

64 Conforme Pillar (1996, p.39), esses autores parecem empregar o termo representação, “como uma cópia do referente pelo sujeito.”

154

visuais. Brent Wilson e Marjorie Wilson acreditam, pois, que não há mal em crianças

serem influenciadas pelos professores ou apresentarem comportamento de cópia.

Contudo suas pesquisas também demonstraram que alguns indivíduos são

capazes de empregar vários programas de desenho, isto é, as pessoas não utilizam

apenas uma forma de desenhar. Em sua teoria, esses autores comparam a mente a

um programador para o computador/cérebro. Neste sentido, concebem “o ato de

desenhar ou comportamento de fazer signos configuracionais, como sendo um

programa.” (WILSON, in BARBOSA, 2005a p. 64). Segundo essa teoria, as

discrepâncias na habilidade em representar objetos, ocorrem devido ao uso dos

alguns programas de desenho. Alguns programas funcionam melhor porque estão

em uso contínuo. Os programas desusados, tornam-se inoperantes para os

indivíduos. Isso os leva a dizer que, os usos pedagógicos nas aulas de desenho,

para crianças a partir de 8 ou 9 anos, deveriam centrar-se no maior número possível

de programas de desenho.

Não há que se confundir, entretanto, com a teoria de aquisição de

conhecimento, que considera que o indivíduo é moldado pelo meio, e supõe que a

aprendizagem do desenho é um “exercício de cópia puramente mecânico e que o

sujeito registra graficamente o que observa, sem interpretar.” (PILLAR, 1996b, p. 33

- 34). Ou, ainda, conforme Duarte (2000), reduzir o aprendizado do desenho ao

treino de habilidades motoras, por meio de exercícios de reproduzir contornos e

estratégias didático-pedagógicas que oferecem todas as respostas e estabelecem

um padrão estético único a ser copiado.

No construtivismo, acredita-se que o conhecimento emerge de uma relação

dialética entre o sujeito e o objeto. A teoria construtivista, segundo Hernández

(2000), sustenta que o sujeito constrói sua própria compreensão e que as funções

cognitivas têm base biológica, mas também estão fundamentadas historicamente e

culturalmente. Para Hernández (2000, p. 105), isso significa que “em todas as

culturas, os instrumentos não são só utilizados, mas também ensinam.”

Poucos entrevistados chegam a trabalhar outras relações que envolvem as

HQs. Uma das professoras, nº 20, na questão do fazer artístico, não interfere e deixa

livre o aluno, mas enfatiza sua interpretação. Outra, nº 10, tem uma certa tendência

a considerar outras relações além das formais, apesar disso, não chega a efetivar

trabalhos de interpretação crítica, a ênfase fica no fazer técnico e criativo do produto:

155

“O livro didático, é como o livro literário. Se você ficar só naquilo ali, eles vão sempre trabalhar sempre Guimarães Rosa. [...]. Não estou dizendo que o professor não possa usar, mas ele tem que incrementar. No caso das tiras, é a mesma coisa. [...]. Quando você dá material didático, por exemplo, que tem uma série de figuras, de personagens, de situações que não são de autores conhecidos, eles mesmos vão me criar. Não que não haja um autor ali, mas não é um autor canonizado, que caiu no gosto do público, o grande público não conhece. Acho que isso também ajuda o aluno a criar.” (nº 20). (Ver também Quadros 21 e 23).

“Eu acho bacana você colocar essa questão da HQ, essa variedade que tem, do Mangá, do cartum, das tirinhas de jornal, toda essa diversidade. Porque você trabalha a leitura de mundo. Está trabalhando uma coisa que eles vão ver na banca, vão ver no jornal do pai. E a leitura que você encontra de problemas sociais que são colocados no gibi, que muitas vezes eles não percebem, eles passam por cima. Faz você tocar tanto na parte literária, quanto no desenho. Você vai trabalhar cartum, a variedade de desenhos, cânone da figura humana, tudo isso.” Comentário: O Maurício de Souza tem umas personagens novas de inclusão. Ele está colocando umas figuras novas... “__ A personagem cega.... a de cadeira de rodas. Acho que é válido. De alguma forma tem que começar, as vezes a gente olha um pouco torto, mas acho que é bem válido. [...]. O ano passado a história que eu trabalhei era referente a crítica social. Esse ano não, era mais pelo cunho da figura humana, mesmo. Daí consegui trabalhar com seqüência em uma história, fazer a figura parecida até o final, criação de personagem mesmo.” (nº 10).

O aluno dificilmente chegará por si a compreender outros aspectos conforme

comenta a professora (nº 10), e ainda outros entrevistados, se o trabalho ficar no

plano da linguagem técnica, servindo o tema apenas para inspiração do aluno sem

ser questionado. Segundo Prawat (apud Franz 2005b, p. 3), para que o estudante

não permaneça em conhecimentos incipientes é necessário “intervir nas concepções

dos alunos, para que estes consigam superá-las e transformá-las”, fomentando

outras conexões a partir dos elementos de base de conhecimentos que já possuem.

É preciso primeiro que se sintam insatisfeitos em relação a seus conhecimentos,

para daí partirem em busca da compreensão de novas situações. Conforme explica

Prawat (apud Franz, 2005b), não é fácil fazer com que os estudantes cheguem por si

mesmos a este desconforto cognitivo. Para isso, é necessária a intervenção do

professor, que deve auxiliar a formar essas conexões de maneira correta, integrando

conhecimentos prévios com novas informações.

Assim, entende-se que na educação para compreensão crítica, o professor

necessita direcionar sua prática a fim de auxiliar o aluno a interpretar os fenômenos

com os quais se relaciona e explorar como estes influenciam e se refletem em sua

consciência de mundo e de si mesmo.

156

Outra dificuldade que surge quando se fala em abordar as histórias em

quadrinhos, quem destaca são as professoras nºs 9, 13 e 16. Aqui surgem

contradições do ensino e não apenas em Arte. Aparecem aqui, os problemas da

falta de formação específica. Essas professoras têm formação em outra área

(Música, Arquitetura e Teatro); segundo o que dizem, crêem que para ensinar sobre

quadrinhos seriam necessários mais estudos. A formação em uma das linguagens

da arte, no entanto, traz o reconhecimento de alguma forma, que para ensinar sobre

a arte, seja qual for ela, é preciso ter preparo e conhecimentos teóricos abrangentes,

como assinalam:

“A história em quadrinhos? Eu nunca me dediquei, me detive muito. Porque eu vejo tanta especialização que me assusto. Eu acho que não conheço suficiente para ficar trabalhando quadrinhos. Vejo que tem tanta, tanta coisa do quadrinho, que eu não me senti muito capaz de mexer com quadrinhos. [...]. Eu acho que eu peco, que poderia usar mais. Aí é que está aquela história do professor ter um tempo para estudar. Eu abandonei HQ, por falta de estudo. Mas acho muito interessante, que tem um grande poder. A imagem aliada a alguma coisa escrita, tudo isso ajuda. [...].” (nº 9). “Só que em histórias em quadrinhos - não só em HQs - a grande dificuldade é que muitos conteúdos têm toda uma história, toda uma teoria bem abrangente. Muitos alunos não têm nenhuma base [...]. Parece que não tiveram aula de Arte. [...]. Outra coisa, é que a gente não tem livros, não tem nada, para nenhum dos eixos. Eu trabalho três eixos. Mas não tem material, tem que pesquisar. Os alunos também têm que pesquisar. Em HQ, é 100% nada, nada de livros. Eles não fizeram muita coisa neste ponto. Falta material, para tudo.” (nº 13). “É uma arte interessante. Só que eu não me sinto à vontade, porque eu acho que não domino. Acho que no mínimo tem que saber desenhar para trabalhar com histórias em quadrinhos, na minha opinião pessoal. E eu não sei desenhar, eu não tenho o domínio da técnica. Se fosse para eu trabalhar, teria que estudar bastante previamente. [...]. Mas acho importante, acho bem interessante, lindo, só que eu particularmente não sinto domínio para fazer um trabalho bem seguro. Teria que ter algum apoio, um suporte e teria que estudar mais, como tenho feito em geral com as linguagens das Artes Visuais. [...]. É, muita coisa. Não é só saber, é muita coisa, muito complexo. Tem que ter um domínio, na minha opinião, no caso de quadrinhos, domínio de cor, de desenho. Por isso acho que a formação é pré-requisito.” (nº 16).

Por seu lado, a preocupação com conhecimentos específicos, parece não

constranger os professores de outras disciplinas. Muitos docentes realizam

atividades com quadrinhos freqüentemente. Seja para mudar a rotina, ensinar a

língua ou atrair o aluno para o conteúdo de outras disciplinas. Nesses casos,

geralmente a importância é dada para o conteúdo específico que o professor aborda

e o aluno é livre para o fazer artístico:

157

“Uso histórias em quadrinhos, para sair da rotina [...]. Se não fica tudo muito fica tudo muito monótono, preso aos mesmos exercícios, ler o texto, responder questionário, preencher com dados do texto. Eles gostam de fazer histórias em quadrinhos. Alguns chegam a caprichar, sem a gente pedir. Tem alunos que são bem criativos. [...]. O meu objetivo, é fazer uma atividade em que eles possam sair da rotina. Eu cobro mais o conteúdo que eu pedi, de Ciências. Algumas coisas eu até peço, como um tamanho, número de quadrinhos e tal, mas além disso, não. Normalmente eles usam aquilo que eles conhecem para fazer histórias em quadrinhos. Eu só dou umas dicas. Eles usam a criatividade deles, essa parte eu deixo mais livre.” (nº 19).

“[...] no meu caso, eu não tenho formação de Artes Plásticas e não saberia dizer, instrumentalizar o aluno a produzir uma personagem, uma caricatura, não tenho essa condição. Então eles são livres, em razão da história. Se eles conceberem a menininha, com uma carinha, um palito e duas perninhas, eu nem posso e nem tenho a pretensão de dizer, nem de ensinar o aluno a desenhar, isso não é assim, porque eu não tenho competência para tal.” (nº 20).

Poder-se-ia dizer aqui que a falta de formação é o maior empecilho de nºs 9,

13 e 16, para ensinar sobre esta arte, não fosse pelo fato de que ensinam

normalmente sobre imagens, linguagem visual e obras de arte erudita. Para ensinar

histórias em quadrinhos, o que parece estar pesando mais nesta relação é a

distinção que se faz entre arte erudita e arte popular decorrente do pensamento da

educação modernista e também visão formal de ensino.

A complementação que a professora nº 16 faz para compensar a falta de

formação específica, prioriza a arte erudita; e o mesmo se pode dizer com relação às

outras professoras, que acentuam esta distinção. Não há tanto um preconceito como

havíamos indagado, no sentido de como apresentam ainda muitos teóricos sobre

quadrinhos, acerca de suas possíveis influências negativas, desconfiança e medo de

que sua leitura possa embotar o raciocínio lógico, a dificuldade de apreensão de

idéias abstratas e ainda outros problemas, conforme observam Rama e Vergueiro

(2004). Os professores entrevistados demonstram em sua maioria, que aprovam o

estudo desta forma artística, porém existe maior tradição em estudar as artes

eruditas e muitos acabam permanecendo com as versões mais seguras da arte.

Na contemporaneidade, o campo da arte se amplia com a dissolução das

fronteiras entre artes eruditas e artes populares. Segundo Efland (2005, p. 177)

“ambas se tornam disponíveis para a apreciação. Porém tanto a arte erudita, como a

não erudita apresentam desafios para o educador.”

158

A arte-educação de cunho modernista, segundo Cary (1998), considerando a

arte como objeto independente e auto-referente, tende a aplicar padrões de bom

gosto e critérios de excelência artística; porém tal arte torna-se isolada do resto da

experiência. A arte pós-moderna faz parte de uma ecologia cultural e seu tema

dominante é a conectividade. A educação pós-modernista “está, potencialmente,

conectada ao resto da vida, porém não tendo limites entre a arte e o contexto social

maior ao qual ela pertence, torna-se bastante difícil escolher o que deve ser

estudado.” (EFLAND, 2005, p. 177-178). A pluralidade das formas artísticas, como

diz Efland (2005), é motivo de confusão para muitos.

Os mecanismos de mercado engendrados pela indústria cultural também

trazem outras questões para o ensino de Artes Visuais. Esses mecanismos

produzem pessoas à imagem de sua própria lógica, tendem a uma padronização,

homogeneização e passividade, integrando as audiências em uma mesma ordem

social. Ao mesmo tempo, tendem a reforçar códigos dominantes e estereótipos

culturais (GIROUX, 2003; STEINBERG e KINCHELOE, 2004; EFLAND, 2005).

Como observa Efland (2005, p. 182), os professores chegam até a perceber a

seriedade do problema, “porém não o enxergam para além das preocupações

diárias das aulas de artes. É possível que digam que não há tempo para ensinar

tudo”, como de fato isso ocorre nas falas de muitos dos entrevistados.

No entanto, nos anos vindouros os professores serão forçados a considerar o impacto de sons e imagens para poder, simplesmente, continuar ensinando aquilo que estão acostumados a ensinar, pois as imagens na cultura cotidiana, na TV, em revistas e jornais, criam um impacto direto sobre as crianças: acabam construindo a visão da realidade delas, formando valores e crenças, e isso pode não deixar espaço psicológico para desenhar e pintar, ou mesmo espaço para imagens de qualquer tipo de cultura tradicional. (EFLAND, 2005, p.182).

Existe ainda, a visão histórica e institucionalizada sobre HQ, que faz por

exemplo, com que uma (nº 9) a veja mais como recurso didático ou pedagógico.

Outra (nº 16) considera que este ensino é essencialmente prático e que é preciso

estar associado ao ensino de desenho e isso também depende de conhecimento

específico. Os discursos de nº 9, 13 e 16, além de outros entrevistados, também

denotam estar ligados a uma visão de profissional, própria ainda da Pedagogia

Liberal, que considerava que o indivíduo deve assimilar e transmitir as informações

que recebe, atribuindo ao docente e alunos um papel insignificante na elaboração do

159

conhecimento. A educação hoje enfatiza cada vez mais a necessidade da pesquisa

como um processo de contínua construção do conhecimento (HERNÁNDEZ, 1998;

CORRÊA, 2004).

A prática educativa atual é crítica e parte da realidade a fim de promover e

uma formação mais consciente. “Hoje já não se concebe um docente que não seja

pesquisador, especialmente em se tratando do ensino de Artes.” (CORRÊA, 2004, p.

12). As relações na prática educativa crítica, são dialéticas, e há uma redefinição do

papel do professor como orientador e pesquisador. “Esta nova visão de professor é

considerada por todos aqueles que se envolvem com a formação de docentes e que

comungam da visão crítico-transformadora de educação como um componente

essencial.” (CORRÊA, 2004, p. 14). Para muitos teóricos, a atitude investigatória é

fundamental para a solução de problemas que estamos vivendo no momento.

Corrêa (2004, p. 174), considera que “a apropriação do conhecimento de

forma crítica e criativa, torna possível desvelar e socializar a libertação do aluno

como ser social e participante do processo de ensinar e aprender.” A criatividade é

determinante para a solução de problemas e o engajamento do aluno e a

participação de todos no processo de ensinar e aprender são essenciais para a

construção da cidadania e meios para uma educação democrática.

Para Demo (apud Corrêa, 2004, p. 17) “o professor deve perceber que sem

pesquisa não há ensino.” As exigências básicas concernentes a ser um bom

professor de Arte, hoje segundo Hernández (1998, 2000, 2007), Franz (2003, 2004)

e Corrêa (2004), em resumo, requerem:

• Levar em conta as relações e inter-relações dos alunos e seu contexto educacional e sociocultural;

• considerar a importância da ligação entre o ensino de Arte e a vida cotidiana; • ter em vista um ensino de qualidade; para isso o professor deve se engajar em trabalhos de

pesquisa, assumindo uma outra postura, envolvendo seus alunos neste mesmo processo e incentivando o gosto pela pesquisa;

• envolver a prática educativa com um sentido crítico a fim de despertar os alunos para uma formação consciente;

• levar em conta o visual como mediador de significados e a interpretação como favorecedora do conhecimento;

• o professor tem a função e a responsabilidade de mediar as compreensões dos alunos sobre as imagens.

Além das professoras nº 9, 13 e 16, quase a totalidade dos entrevistados não

associa a pesquisa ao ensino quando se trata de histórias em quadrinhos. Como

resultado, os conhecimentos abordados são geralmente restritos aos elementos

160

básicos das HQs. Ao serem indagados sobre conhecimentos relacionados às HQs

obtivemos poucas respostas que denotassem um conhecimento que ultrapassasse o

senso comum. Somente dois dos professores, nº 10 e 14, que se aprofundam um

pouco mais na parte teórica dos quadrinhos, e nº 5 que começou a introduzir-se no

assunto. Com exceção de uns poucos, a maioria costuma confundir HQs com outros

desenhos de humor, e desconhece gêneros, estilos, outras produções nacionais ou

estrangeiras, ou quaisquer outras especificidades desta arte:

“Ai, ai, ai. O desenho, eu acho assim que são, por exemplo, o Bolinha tem um desenho, a Turma da Mônica tem um desenho. [...]. Como é que vou dizer? Mais estilizado? __ É, porque tem uns assim. Eu nunca fiquei lendo, mas a gente vê alguns que tem mais linhas, mais desenho mesmo e esse da Turma da Mônica é mais simples, não tem tanto.” (nº 1). “Eu não fiz muito uso dessa idéia de HQ.” (nº 2). Qual estilo de HQ você gosta mais? “__ Estilos, seria o quê?” O que você conhece de quadrinhos, tem quadrinhos diferentes. Você observa? __ Ah [...] diante daquele planejamento que eu te passei, eu fiz perguntas a eles, o que eles gostariam [...]. Eles escolheram o Maurício de Souza. Mas independente de usar para aula ou não, o que você conhece? Qual você gosta mais ? __ No meu caso ? Sim, tem estilos diferentes, de HQs, qual você prefere ? “__ Entendi. Vamos supor, eu gosto dos Simpsons. Vejo que é um desenho contemporâneo. É muito criativo porque envolve toda a família. É um desenho animado que envolve adulto e criança, é familiar. [...]. Comparado com a Turma da Mônica, que eu passei para eles, agrada adultos também.[...]. A Mônica também tem a ver com a questão familiar, porque o Maurício se inspirou na filha dele, eles [os alunos] conhecem. [...].” (nº 3). “Eu acredito assim, que seria os que têm para crianças menores e para os adolescentes, que são aqueles que tem mais violência. Os Mangás também.” (nº 7). “Ai, mas isso eu não sei, tipo? [...]. É, para falar a verdade, não conheço nenhuma [...]. Nunca me interessei em pesquisar.” (nº 15).

Os professores nºs 10 e 14, e inclusive nº 13, abordam a parte histórica dos

quadrinhos. Esta última, muito rapidamente. A professora nº 10 foi a única

entrevistada que antes de trabalhar na escola com quadrinhos, havia adquirido

alguma experiência com esta arte. Segundo suas palavras, quando trabalhou nas

linhas (estágio)65, junto com seus alunos, fez um curso rápido de Mangá na Gibiteca

65 Projeto da Fundação Cultural de Curitiba.

161

Solar do Barão. Apesar de não entrar no histórico propriamente, inclui os conceitos e

diferenças entre os desenhos de humor, a fim de ensinar o que são histórias em

quadrinhos. O professor nº 14 denota realizar essa parte de modo mais didático,

inicia com o histórico no ensino fundamental e aprofunda o assunto, acrescentando

discussões sobre quadrinhos no ensino médio.

Os critérios de escolha de autor e material de HQs também refletem certa

ausência de pesquisa. Há também aqui, uma diferença nos critérios de escolha,

entre professores de Arte e professores de Português entrevistados. Enquanto no

ensino de Arte, a tendência é incluir um único autor em todos os ciclos do ensino

fundamental, na disciplina de Português, a tendência é a inclusão de diversas

imagens dos quadrinhos e tiras humorísticas que têm maior destaque nas mídias e

que são veiculadas diariamente, no ensino de 5ª a 8ª série. As professoras nº 17A e

17B, elas mesmas, por vezes elaboram66 a apostila do colégio e conforme seu

depoimento, é com base neste critério que selecionam (ver Quadros 22 e 23).

De concepção mais crítica de ensino, a professora de Português (nº 20),

questiona este procedimento, o mesmo utilizado pela maioria das editoras de livros

didáticos, que em geral apresentam os autores mais conhecidos de tiras

humorísticas e HQs. Procura selecionar em função nas necessidades dos alunos:

“O fato de ter o material didático para uma determinada série, não significa que tudo aquilo será aproveitado. [...]. Não é porque está lá, que vai ser utilizada. O diagnóstico da turma, a necessidade da turma é que determina tudo, de qualquer material didático, não só questão daquilo. Mas no caso específico aí, nem tudo que funciona para uma turma pode funcionar para outra, então há que ter uma sensibilidade para ser a condição de aprofundar, de análise desse trabalho, dessa imagem que vai formar na cabeça dessa criatura, enfim, trabalhar com a questão do quadro, da tira, de uma maneira interessante para ela e para o processo de ensino aprendizagem.” (nº 20).

No ensino de 1ª a 4ª, é comum professores de Português ou professores

regentes usarem os personagens do Maurício de Souza. Todos os entrevistados que

trabalharam no primeiro ciclo (nº 2, 5, 12, 16), antes de entrar para o ensino de Arte,

utilizavam os personagens Chico Bento e Cebolinha para ensinar Português.

No ensino de Arte, os professores escolhem geralmente Maurício de Souza,

por ser autor nacional e pelo fato de ter um desenho mais simples que facilita o

processo de desenho do aluno. Em segundo lugar, há uma seleção baseada na 66 No colégio onde estas professoras trabalham, são feitos rodízios entre os professores de cada disciplina, para a elaboração das apostilas.

162

escolha dos alunos, e ainda critério de escolha de material baseado no que possa

servir de referência para o desenho. O critério de escolher começando pelos artistas

locais, quando se trata também da arte erudita, é um hábito adquirido, não por

todos, mas por muitos professores de Arte, a fim de valorizar os artistas nacionais:

“Procuro citar primeiro os artistas mais conhecidos, principalmente os do Paraná, depois os internacionais.” (nº 3). “Primeiro eu pego aqui, o que eu posso trabalhar. Depois que trabalho Brasil, trabalho com os artistas de fora. Bastante ao redor primeiro, porque acho que diz respeito ao aluno.” (nº 5).

Com HQs, esta seleção não vai além da escolha local e torna-se muitas

vezes automática em função do que se encontra mais facilmente disponível. A

maioria, como exemplifica nº 6, considera Maurício de Souza como única, ou melhor

opção (ver Quadro 22):

“Acho que tem muita banalização de histórias em quadrinhos, aqui no nosso Brasil. Porque o que temos de nosso? Só o Maurício de Souza. Nós não temos criadores. [...] A fama do Ziraldo é mais na literatura. Só temos o Maurício, se você pensar.” (nº 6).

Waldomiro Vergueiro (2006) professor coordenador do Núcleo de Pesquisas

de Histórias em Quadrinhos da ECA/USP, em entrevista para o Rio Mídia, destaca

que o Brasil é um dos poucos do mundo que ainda possui uma produção de

histórias em quadrinhos infantis. Segundo as informações de Vergueiro (2006), as

revistas de Maurício de Souza, correspondem a 85% do que é produzido para o

público infantil. Os Estados Unidos quase não publicam mais quadrinhos infantis, só

para jovens. E há poucos investimentos para este segmento.

Dessa forma, pode-se dizer que é justificável que se trabalhe praticamente

com um só autor, principalmente quando se trata de abordar histórias em quadrinhos

infantis, porque raramente se encontram outras produções, além de Maurício de

Souza. No entanto restringe-se a um único para todos os ciclos. Independente de

trabalhar ou não com quadrinhos, todos os entrevistados, sem exceção, citaram

esse autor.

A presença de Maurício de Souza nas escolas é relevante para a valorização

da cultura local e respeito à infância, particularmente no processo que provoca

perdas de referenciais culturais diante da globalização. Neste contexto, as histórias

163

em quadrinhos brasileiras, segundo Vergueiro (2006), também veiculam modelos e

padrões de comportamento transmitidos pelas outras mídias. Refletem a realidade

urbana dos jovens e a influência da cultura pop, da televisão e outros meios. Para

esse autor, o que há de diferente em nossas histórias são algumas características,

por exemplo, de “relacionamentos de amizade e de amor e na apresentação de

grupos sociais”, de nossa cultura local.

Steinberg e Kincheloe (2004) assinalam, no entanto, que observadores

críticos estão começando a advertir que novos tempos têm anunciado uma nova era

da infância decorrente das mudanças nas condições sociais e culturais e muitos

ainda não se deram conta desse momento histórico. O amplo acesso da criança ao

mundo da informação e tecnologias digitais altera inclusive a concepção da infância.

A produção infantil indica que a educação tem lugar em diversos setores

sociais e não se limita à escola. Por seu lado, os docentes trabalham exclusivamente

com Maurício de Souza e não levam em conta que a criança hoje tem acesso

ilimitado à televisão67, filmes, jogos, revistas e Internet. Existe até certa queixa entre

os educadores, de que poucas as crianças têm pouco hábito de leitura.

Diante da pedagogia cultural que crianças e adolescentes tem acesso, para

Steinberg e Kincheloe (2004), não é possível ir contra simplesmente auto-excluindo-

nos ou excluindo as crianças desta cultura. Para esses autores, é preciso formular

estratégias entre a pedagogia escolar, a produção do conhecimento e a formação da

identidade de crianças e adolescentes, para o resgate de sua própria cultura.

Ao serem questionados acerca das mensagens e valores das diferentes HQs,

nº 15, e alguns dos outros entrevistados, mencionaram o debate como forma de

avaliar essas produções. Contudo são depoimentos contraditórios. A análise sobre

as práticas dos professores, demonstra que são basicamente voltadas para o

aprendizado da linguagem visual e sua experimentação na prática, principalmente

quando se trata de histórias em quadrinhos.

Ao se tentar utilizar outras produções, surgem dificuldades entre os docentes,

porque se conhece pouco a respeito de outros autores e HQs que possam ser

explorados no ensino de Arte. Para ir além da arte erudita, é necessário pesquisar e

67 Segundo as pesquisas da professora Vânia Carneiro (2003), em todo mundo, as crianças e adoles-centes brasileiros são os que mais assistem TV. Passam mais de três horas por dia em frente da tele-visão. Disponível em: <www. unb.br/acs/bcopauta/educacao19.htm>. Acesso em: 27 maio 2006.

164

muitos não têm esse hábito adquirido. Alguns, como a professora nº 9, ficam

atônitos quando se vêem diante da diversidade.

Uma das professoras, a nº 4, embora não ensine sobre quadrinhos, cita a

pesquisa - um dos aspectos hoje que é requisitado para o estudo de qualquer objeto

da arte erudita ou da cultura visual. Isso nos leva a enfatizar que um dos caminhos

possíveis para a busca de outros autores, é também, a pesquisa.

“Primeira coisa, eu mesma nunca fui, desde adolescente, muito fã de HQ. Eu não sei o que escolheria. Mônica, do Maurício de Souza, eu acho que já está muito batido, de conhecido. [...]. Uma coisa que eu escolheria, que eu sempre gostei seria o Asterix. Acho que além de ser bem humorado, tem alguma visão de histórico, que se não exatamente, mas leva a eles terem que procurar, pesquisar. Não levei, mas levaria se fosse para fazer um trabalho.” (nº 4). “Eu tinha muito medo de usar histórias em quadrinhos, por isso eu nunca trabalhei. Porque havia coisas demais. Muitas histórias, eu não saberia como escolher dentre as melhores que tem. Isso me assustava. Eu acho que se houvesse algo como um livro, alguma coisa que indicasse com quais autores começar. Quais seriam os autores indicados para trabalhar com crianças pequenas e depois as maiores no fundamental. Eu não tinha nada que pudesse me instrumentalizar para trabalhar com histórias em quadrinhos. Também hoje, não tenho visto nada que auxilie nesse sentido.” (nº 9). “Na questão dos quadrinhos, como vou selecionar material para o aluno que não influencie negativamente e nem !? É complicado. Mas, acho que tem que usar o bom senso. Todo material tem seu lado ruim e bom. Bom ou ruim, é bom para você ensinar os bons conceitos. [...]. Você faz uma análise, em cima daquilo, cria um debate e tal.” (nº 15).

A seleção de histórias em quadrinhos ou tiras humorísticas, quando se está

diante da diversidade, pode implicar as vezes, em ter que realizar uma pesquisa

prévia. As produções estrangeiras de HQs vão desde as produções norte-

americanas, até quadrinhos europeus e japoneses, os chamados Mangás, que estão

sempre lançando novidades. Existem produções de tiras ou revistas, que

apresentam séries repetitivas com poucas variações pelo fato de serem produzidas

em larga escala. Ou HQs que são publicadas apenas em série, o que impossibilita

adquirir revistas isoladas. Em séries como essas, pode ser necessário realizar uma

busca para saber o que é mais relevante ou representativo na produção, ou mais

relacionado ao tema de interesse que se pretende abordar.

No mercado editorial para adolescentes, segundo as informações de

Vergueiro (2006), “o predomínio das histórias em quadrinhos com base nos super-

heróis e nas histórias americanas é total.” Quando chegam na adolescência, os

165

jovens que cresceram lendo os gibis da Turma do Mônica, não encontram nada, a

não ser produções estrangeiras. Conforme explica, este processo dá origem a um

circulo vicioso, porque os jovens que crescem lendo os quadrinhos importados, ou

que se formam nessa área, acabam reproduzindo os mesmos formatos e conteúdos.

Para Vergueiro (2006), este é um movimento difícil de ser quebrado e uma

competição desleal para os produtos nacionais. O quadrinho americano do super-

herói, chega ao mesmo tempo em que são lançados o filme e o bonequinho. O

próprio leitor jovem acaba desejando este mesmo tipo de produção, porque é um

material amplamente divulgado e reforçado pelas demais mídias.

Frente à crescente proliferação e ampliação do campo das imagens, uma das

questões fundamentais na atualidade, é que o indivíduo “saiba como ter acesso,

analisar e interpretar a informação.” (HERNÁNDEZ, 1998, p. 79).

Um critério de seleção, dentro da perspectiva da educação para a

compreensão e da Cultura Visual está relacionado aos objetos que tem maior

presença entre as crianças e adolescentes, conforme Hernández (2000). O que não

quer dizer “‘partir dos interesses dos alunos’ e muito menos do que ‘gostariam de

estudar ou saber’.” (HERNÁNDEZ,1998, p. 27). Nessa perspectiva, é importante que

a aprendizagem esteja vinculada a temas que tenham relação com a vida dos

estudantes e que sejam interessantes para sua formação. Na opinião de Hernández

(2000, p. 140), para selecionar as representações que são relevantes para os

estudos, pode-se levar em conta, entre outras características, que: sejam

inquietantes; estarem relacionadas com valores compartilhados em diferentes

culturas; refletirem vozes da comunidade; estarem abertas a múltiplas

interpretações; referir-se à vida das pessoas; expressarem valores estéticos; serem

capazes de fazer o espectador pensar.

Nas concepções mais antigas de ensino, conforme Corrêa (2004), o professor

selecionava os saberes de acordo com sua área específica de conhecimento e

importava-se apenas com os conteúdos de sua disciplina. Cabia a sua

responsabilidade transmitir esses conhecimentos que deveriam ser reproduzidos

pelos alunos. A escola hoje tem necessidade de dialogar com as situações em

constante transformação que afetam as relações sociais e as representações

culturais.

Com os saberes pedagógicos em crise, ampliação e diversificação das fontes

de saber, nas recentes disposições curriculares, têm surgido tendências para o

166

aumento de propostas interdisciplinares e transdisciplinares que, segundo

Hernández (1998), surgem como formas de relacionar conhecimentos ensinados

anteriormente ensinados de maneira separada. “Tudo isso como forma de enfrentar

o dilema da seleção de alguns conteúdos diante da multiplicidade de possíveis

matérias e temas saberes organizados [...] e as diferentes realidades sociais e

culturais” (HERNÁNDEZ, 1998, p. 51), que são possibilidades oferecidas pelas

diferentes disciplinas e principalmente para a atualização dos conhecimentos, e

ainda, que correspondam às expectativas dos indivíduos que se debatem, entre o

local e o global.

As histórias em quadrinhos têm uma linguagem de natureza interdisciplinar.

Como destaca Will Eisner (1989), a diversidade de disciplinas envolvidas na

realização de uma história em quadrinhos, mesmo sendo de tamanho médio,

surpreende. Tanto podem envolver conhecimentos de ordem psicológica, valores e

costumes, quanto técnicas artísticas cinematográficas, cênicas e ainda outras, daí

sua complexidade. Basta ver a professora (nº 2) que intuitivamente, uma vez

direciona para o teatro, outra vez para seqüências de animação.

Alguns professores, (nºs 6, 18A e 18B), realizam trabalhos de caráter

interdisciplinar, com histórias em quadrinhos. Também nº 5, participa de projetos

organizados com vários professores da escola, que integram a arte aos mais

diversos assuntos. Uma delas (nº 6) faz esse trabalho, não tanto a fim de criar um

produto novo, mas como uma atitude de troca e envolvimento a fim de

complementar os saberes, no sentido que Fazenda (apud Corrêa, 2004, p. 24)

assinala: “atitude de humildade diante da limitação do próprio saber [...] atitude de

envolvimento [...].”

“Trabalhávamos sempre com interdisciplinaridade. Os professores de Língua Portuguesa gostam de trabalhar o texto. Então nisso eu ia trabalhando sons onomatopaicos e as funções que tinham na imagem. Mostrava como poderia, através do desenho que aquilo se transformasse na imaginação da pessoa em um som. A professora de português construía um texto, uma história com os alunos. Nós fazíamos uma interligação.” (nº 6).

As professoras de Matemática entrevistadas realizam atividades com histórias

em quadrinhos que envolvem desde a elaboração de textos, com a participação dos

professores de Português, até a parte artística e estética.

167

Vocês trabalhavam somente dentro de matemática ou também com a parte artística? Também cobravam a parte estética no trabalho do aluno? B: ”__ Cobrava sim. O aluno tinha que usar aqueles balõezinhos, como a gente chama, de uma forma correta. Tanto que pedia até um pouquinho da ajuda da professora de Arte. Se ele estivesse gritando, se fosse uma coisa que ele gritava, aparecia uns raiozinhos, se fosse pensamento, com nuvenzinha, a gente cobrava isso também.” [...] Esse trabalho você fez também? A: “__ Fiz também. Inclusive um ano, fizemos junto com a professora de Português. Então Português e Matemática trabalharam em conjunto. A história tinha que envolver matemática, mas todas as falas, toda história e todo enredo foi corrigido pela professora de Português. E a professora de Arte, deu essa aulinha para eles dos balõezinhos, como eles iriam utilizar os tipos de balõezinhos para cada situação.” B: ”__ Eles capricham.” [...] A: ”__ Nós exigimos que fosse com espiral, a propaganda, o anúncio. Alguns alunos colocavam até cruzadinha no meio. Então era uma história em quadrinhos que era uma verdadeira revistinha.” B: “__E nós colocamos em exposição aqui na escola. Os alunos tinham acesso para ler. Ficaram expostos os melhores trabalhos. Foi bem interessante.” A: “__ Estamos fazendo essa atividade, na 7ª série agora.” [...] B: “__ Mas quando nós trabalhamos com Português, eu acho que houve uma complementação melhor, porque daí ela corrigiu primeiro a parte dela e depois passavam para nós corrigirmos a nossa parte.” (nº 18A e 18B).

Vergueiro (2006) acredita que as histórias em quadrinhos devem “ser usadas

nas escolas de forma interdisciplinar, integrando várias disciplinas.” Na opinião

desse autor, não há limites para a utilização dos quadrinhos na educação e tudo

deve depender da criatividade do professor na maneira que irá utilizá-los a fim de

atingir seus objetivos de ensino. Rama e Vergueiro (2004) prescrevem seu uso para

todos os professores: “para introduzir um tema que será depois desenvolvido por

outros meios, para aprofundar um conceito já apresentado, para gerar uma

discussão a respeito de um assunto, para ilustrar uma idéia” e ainda outros usos.

Quella-Guyot (1994) se opõe a essa idéia, pois segundo ele, se não há o

entendimento desta forma artística como arte, o uso dos quadrinhos como meio para

ensinar outros assuntos pode acentuar a idéia de que são uma subliteratura, e,

acrescentando, nesse sentido, o ensino de Artes Visuais, pode ter seu papel

diminuído, ficando à margem deste processo.

Este risco de que fala Quella-Guyot (1994), acerca do que ocorre com os

quadrinhos, parece ocorrer também com a arte erudita. Parsons (1999) cita que têm

surgido, nos Estados Unidos, muitos projetos que visam uma integração de

diferentes disciplinas por meio da arte. Ao fazer considerações sobre o contexto

168

cultural, diz que é algo que se inclui no currículo atual, mas em geral, não é visto

como importante. Em sua opinião, esta é uma visão contemporânea que oferece a

oportunidade de integrar a arte com outras disciplinas. Uma maneira de não reduzir

a arte a mero instrumento para ilustração ou suporte para outros conteúdos

escolares. Ao contrário explica, outras matérias é que se tornam suporte para a arte,

“porque providenciam o contexto necessário para a interpretação.” Parsons (1999)

acredita que, quando a arte se liga com temas como a destruição ambiental, por

exemplo, pode emprestar significado ao conteúdo em história, biologia e outras

disciplinas, ganhando interesse e significado. Com base nestas idéias, conforme o

autor, é que tem surgido uma tendência nos Estados Unidos, para que arte-

educadores exerçam a liderança para reformar currículos escolares como um todo

“por via da integração de diferentes disciplinas escolares e do fornecimento de um

grande número de modos de aprendizagem.”

Mas a arte e o ensino da Arte, sofreram e ainda sofrem preconceitos por

vincular a aprendizagem ao fazer, ligado aos sentimentos e emoções. Alguns

teóricos em arte-educação alertam que muitas vezes a arte é interpretada como

atividades comuns, ou produtos e que “a Arte pode facilmente tornar-se apenas

‘trabalhos manuais’ para as outras áreas do currículo, se a integração for realizada

sem valorizar os conteúdos de cada disciplina acadêmica.” (GRAUER, 1981, in

BARBOSA, 2005b, p. 352)68. Com as HQs, este risco torna-se ainda mais

acentuado, pois são consideradas uma arte popular e sempre houve polêmicas a

seu respeito.

Os discursos analisados indicaram que mais da metade dos professores de

Arte entrevistados, vêem as HQs como uma linguagem artística, mas que ao mesmo

tempo há distinção entre outras artes e a arte dos quadrinhos:

O que você trabalha mais na 5ª e 6ª, e por que? “__ Obras de arte. Tem chance de explorar mais coisas.” O quê tem mais chance de explorar? “__ Um dia para observar como o artista desenvolve suas obras, seu estilo. Eu estou conseguindo mais com as obras de arte, sabe” (nº 1). Essa problemática que você trabalhou com obra de arte, poderia ter feito com HQ ?

68 GRAUER, Kit et al. Imagens para Compreensão: fotografias de Aprendendo através da Arte (Learning trought the art). In: Barbosa, Ana Mae. Arte/Educação Contemporânea: consonâncias internacionais. São Paulo: Cortez, 2005.

169

“__ É, poderia. Mas sempre gostei até mais de trabalhar com obras de arte. A HQ aparece assim, o professor trabalhando.” (nº 2). “Trabalho [...]. Principalmente com obras de arte.” (nº 3). “Eu não tenho trabalhado HQ, porque isso a professora de português tem trabalhado muito, exaustivamente. [...].” (nº 4). (Ver Quadro 34). “Eu acho que HQ é uma linguagem maravilhosa, muito rica. Lembro, quando eu tinha mais tempo, eu adorava ler gibi, fotonovelas, eu gostava. Acho interessante, acho que é uma expressão artística, sim. Não é de todo nem ruim, nem bom. Eu acho que o problema é se tornar comercial e o problema de ser comercial é que ela fica descartável, a ideologia muitas vezes se perde. [...]. Então eu acho que os quadrinhos teriam que ser mais voltados para a arte e não para o comércio.” (nº 16).

Nas falas de alguns dos professores nºs 6, 10, 11, 14 e 15, embora entre estes

também haja contradições, parecem ser mais propensos a conceber as HQs como

uma arte, fazendo menos distinções entre esta e outras artes:

“Além da arte dos quadrinhos, também trabalhei com cinema.” Trabalharam o princípio básico da animação? “__ Quando trabalhei com cinema. O ano passado, eu entrei no projeto Fazendo Escola. Nesse projeto fizemos vários trabalhos assim” (nº 6). “No ano anterior introduzi a questão de que HQ (conhecido como gibi, por eles) também é arte.” (nº 10). “Olha, para mim quadrinho é linguagem artística e como linguagem artística reflete alguma característica do mundo. [...]” Como você vê essa linguagem com relação às obras de arte ? “__ Acho difícil isso, eu não consigo separar isso de obra de arte. É provável para mim... não dou ponto nem a mais nem a menos para isso. Para mim o gibi está junto, junto do Da Vinci, do Duchamp, de todo mundo. [...].” (nº 11). “Eu fico até meio maravilhado com a capacidade que o ser humano tem. Nos quadrinhos a gente percebe isso. Em todas as artes a gente percebe. [...]. As questões da infância, alguns jogam isso mais forte, outros já trabalham mais com arquétipos, outros com o homem mais idealizado, os super-heróis. São conteúdos da cabeça humana, que são colocados. Tem várias cabeças fazendo quadrinhos, por isso tem quadrinho para todo o tipo de gente. Eu olho assim e acho que é uma riqueza. É um espaço bem amplo, porque você vê coisas muito boas, tem coisas muito ruins, muito negativas. [...]. É o ser humano - o resultado do ser humano.” (nº 14). “Para mim é arte, pelo fato de que eu também achava que não era. Antes de entrar na Faculdade eu achava que não. Depois que eu entrei na Faculdade tenho amigos que trabalham com HQ, mesmo desenho ocasional. [...]. Acho interessante.” (nº 15).

Talvez se encontre menor distinção entre uma e outra arte, na disciplina de

Português, pelo uso de toda e qualquer imagem como apoio didático para o ensino

da Língua. Não nos estendemos tanto neste ponto com estes docentes, porque

170

nossa intenção era analisar as concepções dos professores acerca dessa arte no

ensino de Arte. Então é possível dizer algo a respeito, porém de modo mais restrito.

Esses professores, segundo seus depoimentos, não trabalham em função das

questões específicas da arte das HQs, assim como história, estilos ou outras

questões afins. Embora seja freqüente, talvez seja engano pensar, que todo

professor de Português, pelo fato de ter a possibilidade de abordar as HQs, através

de material didático, realize “exaustivamente” atividades com a esta arte. Até pode

ocorrer, em alguns casos, conforme observam alguns professores de Arte. Mas em

geral, a disciplina aborda os mais variados assuntos através de textos e imagens e

tem por prioridade ensinar a língua. Da mesma forma, engano seria pensar que

todos os professores de Artes Visuais ensinam “sobre” histórias em quadrinhos, e

aqui, onde foi possível observar de modo mais abrangente, não são tantos e nem

todos, que costumam trabalhar com esta arte. Ao contrário, geralmente os docentes

no ensino de Arte se voltam para a arte considerada erudita.

3.3.6 Conseqüências do estudo para o ensino de Artes Visuais

O estudo contribuiu para ampliar nossa compreensão sobre a relação dos

quadrinhos e o ensino de Artes Visuais, identificando problemas e dificuldades deste

ensino na prática. Além das reflexões críticas realizadas, esboçamos algumas

prospectivas para o ensino de Artes Visuais, envolvendo as HQs. Acreditamos que a

pesquisa realizada também seja útil para que outros professores de Artes Visuais

possam refletir sobre suas práticas em sala de aula.

Na maior parte das vezes, quando questionamos sobre o ensino de histórias

em quadrinhos, as respostas automaticamente associavam este ensino a uma

atividade prática. Como resposta ao problema de pesquisa, podemos dizer que os

professores ensinam a “fazer” histórias em quadrinhos e não “sobre” histórias em

quadrinhos. Há ainda, aqueles que ensinam “com” histórias em quadrinhos. As HQs

são assim concebidas, na maioria das vezes, como trabalho prático manual. Isso de

alguma forma traz um denominador comum para essas atividades em Artes Visuais

e em outras disciplinas. A diferença é que nessas últimas, embora haja as leituras

realizadas pelos professores de Português, com mais freqüência, são utilizadas

também como artifícios para fixar conteúdos, atrair os alunos para as matérias que

171

cansam ou que não gostam de estudar. Como vemos em Quella-Guyot (1994), as

HQs podem favorecer intercâmbios entre professor e alunos e isto, parece ser um

fato, mas não pode ser a única razão para sua presença no currículo escolar.

Desde a década de 1990, o ensino de Artes Visuais passou a ter como

objetivo principal, preparar o indivíduo para analisar criticamente a produção artística

já consagrada e as demais imagens do cotidiano. A vida cotidiana é demarcada pela

proliferação de imagens, e a educação contemporânea requer que ambas sejam

abordadas neste ensino. Talvez nós, os professores de Arte, tenhamos algo a

aprender com os professores de Português, no sentido de incluir a diversidade das

imagens, sem fazer distinções. Segundo Mason (2001), a educação pós-modernista

é aberta para incluir outras formas de arte, bem como as artes populares.

Mas há descompasso entre as teorias da educação pós-moderna e o ensino

de Arte Visuais. Mesmo que algumas tendências tenham sido superadas

teoricamente, ainda se refletem no ensino atual das HQs. Pelas evidências

encontradas nesta pesquisa, o ensino é baseado nos ideais tradicional e modernista

que valorizam o aprendizado do desenho, o fazer criativo do aluno e o produto.

Como assinalam Riviere (1987, apud SANCHO, 1997/98) e Efland (2003), mudanças

no ensino ocorrem lentamente.

Em nenhum depoimento houve relatos acerca de práticas que envolvessem

estratégias para a compreensão dos valores, ideologias, crenças, conceitos ou

idéias, códigos ou mensagens que podem trazer as HQs, com apenas uma exceção.

Entre os professores, até existe uma certa percepção de que essas questões

existem, mas no cotidiano do ensino de Arte, não se leva as HQs de fato, para o

plano de interpretação e análise crítica, em conseqüência de desconhecimento de

métodos para estas ações.

Durante as entrevistas, pudemos perceber que, na medida em que há diálogo

sobre conceitos, valores, ideologias e outros aspectos ou assuntos ligados às HQs,

há também uma certa mudança na compreensão do professor com relação a essa

arte. O que demonstra a importância da reflexão para a conscientização e a

interpretação crítica, que podem ser estendidas para as aulas de Arte.

Para Corrêa (2004), mesmo com o avanço das ciências da Educação, o fazer

pedagógico ainda permanece enraizado nos modelos acríticos conforme a

Pedagogia Liberal que sustenta a idéia de que a escola deve preparar os indivíduos

para o desempenho de papéis sociais estabelecidos de acordo com suas aptidões

172

individuais. “Logo, a ideologia e a prática docente que envolve o cotidiano escolar

não visam à transformação nem à mudança e sim à manutenção do modelo vigente

de forma acrítica.” (CORRÊA, 2004, p. 13). A prática docente com relação aos

quadrinhos, segue junto com este modelo acrítico.

Neste modelo, segundo Rays (apud Corrêa, 2004), despreza-se a

dialeticidade dos fatos pedagógicos e sociais inerentes à prática educativa.

Enquanto não houver outro posicionamento ou maior compreensão a respeito do

significado da importância de leituras críticas, história e contextualização de outras

artes e imagens além das eruditas, os próprios professores de Artes Visuais estarão

utilizando as histórias em quadrinhos apenas como trabalhos manuais.

Segundo Steinberg e Kincheloe (2004), a excessiva informação da sociedade

contemporânea, bombardeia os sentidos. Tanto adultos como crianças perdem a

confiança em que podem compreender tudo. A interpretação crítica vem a ser então,

uma prática necessária para negociar a identidade do indivíduo e os valores diante

da realidade saturada pelo poder. Neste contexto, as HQs têm também seu papel.

Em muitas escolas, como assinalam Steinberg e Kincheloe (2004 p. 22), “tais idéias

nunca foram consideradas, muito menos discutidas com seriedade.” Entre os

entrevistados, muitos crêem e argumentam que as crianças por si mesmas

compreendem tudo o que lêem ou assistem. Por esta razão, a maioria não tem real

preocupação com relação a conceitos, valores, crenças, ideologias que trazem as

histórias em quadrinhos.

A Pedagogia Crítica, não apenas demonstra a necessidade de desenvolver a

habilidade de interpretar, mas também que os alunos passem a entender os meios

pelos quais eles mesmos consomem e investem afetivamente nas mídias. Além do

desenvolvimento da consciência crítica, conforme Steinberg e Kincheloe (2004, p.

23), esta abordagem pode encorajar a auto-análise, e os estudantes passam a

compreender que muitas das decisões que tomam não são necessariamente livres e

racionais, mas inscritas em um “compromisso físico e emocional relacionado com a

produção do desejo” que leva a todos em direção à “manufatura do consentimento”.

A valorização das leituras centradas em obras de arte já consagradas, ou a

concepção de arte baseada no pensamento modernista, faz com que muitos

professores deixem ou não saibam como incluir a leitura crítica de outras imagens

em seu ensino. Quando há ênfase na concepção da arte como linguagem, os

elementos constitutivos das imagens e as leis da composição passam a ser

173

considerados como mais importantes. Como resultado dessa crença, conforme

explica Hernández (2000, p. 100), há maior reforço das “qualidades externas e

materiais dos objetos e se deixa de lado os aspectos simbólicos e culturais com o

argumento subjacente de que os alunos do ensino fundamental não podem

compreendê-los.”

Esses pressupostos modernistas também afetam o ensino de histórias em

quadrinhos que, além disso, fica reduzido à atividades livres, ou treinamento da

habilidade motora. Em geral, o aluno fica limitado a aprender a desenhar um

personagem de modo elementar, distribuir idéias em um espaço determinado,

alguns elementos básicos, ou a fazer inventários de onomatopéias e balõezinhos.

Como exposto durante a avaliação das entrevistas, também há muitas

práticas que os docentes associam como sendo de histórias em quadrinhos, quando

na realidade são resultado de produções sem compromisso com esta ou aquela arte.

Essas práticas se caracterizam por insuficiência de aprofundamentos teóricos e dos

conceitos que a envolvem. Em conseqüência de falsas noções sobre

interdisciplinaridade e liberdade do ensino contemporâneo para abertura em abordar

a diversidade de formas e imagens da arte e da cultura visual, muitas vezes os

docentes perfazem um trânsito aleatório entre uma atividade e outra - ou, na melhor

das hipóteses - entre a teoria e a prática, em uma ordem reducionista que acontece

por conveniência, gerando produtos destituídos de significado.

Na opinião de Quella-Guyot (1994, p. 45), para que os alunos não venham a

considerar as histórias em quadrinhos como uma subliteratura, “para começar a HQ

deve deixar de ser um meio de atrair o aluno para que ele se interesse pela

matemática ou pela língua pátria e mesmo ainda um pretexto para fazer digerir

Balzac ou Racine”, assinalando que as histórias em quadrinhos são antes de tudo

uma arte narrativa e qualquer ensino que não considere esse pressuposto a

desacredita. Conforme suas palavras, as HQs têm uma história e também tem seus

“clássicos,” sendo que não é tolice querer estudá-los mais a fundo.

O ensino de histórias em quadrinhos, conforme as evidência encontradas na

análise, segue preso ao passado e não acompanha as transformações que

ocorreram relacionadas às tecnologias digitais nas duas últimas décadas que

ampliam o acesso, particularmente ao público infantil e juvenil. As HQs hoje têm

mais recursos e a vantagem de abordar maior diversidade de assuntos, que podem

ser explorados tanto estética, quanto criticamente. A educação atual em Artes

174

Visuais vem enfatizando o ensino estruturado mediante a articulação entre estética,

crítica e História da Arte. Acreditamos que, para os estudos sobre quadrinhos,

poderíamos acrescentar leituras mais críticas, que levassem em conta o

pensamento da nova História de Arte, noções de código e mensagem e a relação

pessoal e social com produções de HQs veiculadas em diferentes mídias.

Desde a década de 1970, segundo Acevedo (1990) e Quella-Guyot (1994)

quando se passou a incluir as HQs nas escolas, percebeu-se que esta não era uma

arte fácil, então manuais passaram a se encarregar de ensinar a fazer histórias em

quadrinhos. Também se produziram livros dedicados à análise da linguagem e dos

conteúdos das HQs. Enquanto os manuais são de linguagem fácil, estes últimos são

de linguagem austera e inacessível para a maioria, segundo Acevedo (1990). Este

pode ser mais um fator que contribui para a configuração deste ensino, evitando o

acesso para estudos mais aprofundados dos quadrinhos. Muitos professores de

Artes Visuais se queixam da ausência de material que possa auxiliar seu trabalho

nessa área de estudos.

Como é importante para nós que os professores tenham estratégias que

possam trabalhar com essa arte junto aos alunos, e ao mesmo tempo tenham meios

para auxiliar sua educação e formação, acrescentamos uma proposta que possa

servir como base para a mediação de análise crítica de histórias e imagens de HQs.

E, no sentido citado por Acevedo (1990), também possa ser útil, sem ser de difícil

compreensão para professores e alunos. A proposta é educativa e pode ser utilizada

por aqueles que não têm formação específica em desenho, a fim de trabalhar com

ações necessárias para uma compreensão crítica de imagens em contextos de

ensino de Artes Visuais.

175

3.4 PROPOSTA DE INTERPRETAÇÃO CRÍTICA DE IMAGENS DE HQs PARA O

ENSINO DE ARTES VISUAIS

Esta proposta de trabalho fundamenta-se nas teorias da Pedagogia Crítica da

Arte, da Cultura Visual e da Educação, tendências que se fundem nas abordagens

pós-modernistas do ensino das Artes Visuais, segundo Giroux (1997, 2003), Cary,

(1998), Hernández (1998, 2000, 2001, 2003a, 2007), Efland, Freedman e Sthur

(2003), Pollock (2003) e Franz69 e outros teóricos, citados no presente estudo.

A proposta tem por característica o trabalho de pesquisa interdisciplinar e

transdisciplinar. Baseia-se sobretudo, no Instrumento de Mediação e Análise Crítica,

criado por Franz (2003a) a princípio para uma obra de arte, o qual pode também ser

utilizado como referência para realizar estudos de outras imagens da cultura visual.

Tendo em vista que os indivíduos, ao fazerem uma leitura crítica de imagem, utilizam

diversos âmbitos de compreensão, Franz (2003a) pesquisou esses âmbitos,

ordenando-os para que pudessem ser abordados através de um instrumento, a fim

de ampliar a compreensão em trabalhos de análise interpretativa. A proposta aqui,

tem por objetivo mediar as compreensões dos alunos sobre imagens de HQs,

através deste instrumento, dirigindo-se à professores e alunos do ensino

fundamental, interessados em desenvolver um trabalhos de análise crítica. Não se

trata portanto de reunir uma série de exemplos que podem ser associados aos

conteúdos de outras matérias, mas de abordar outros assuntos em função das

necessidades de contextualização e interpretação da própria imagem.

Tendo em vista que a função da escola não é somente transmitir conteúdos

(HERNÁNDEZ, 1998, 2000), a proposta encaminha estudos sobre as HQs e tem

como meta principal promover a consciência crítica sobre o poder das

representações socioculturais presentes nas imagens, facilitando a reconstrução das

subjetividades, considerando que crianças e adolescentes têm amplo acesso a

outras imagens dos quadrinhos e não apenas àquelas que são abordadas na escola. 69 Franz (2003a, 2003a, 2003b, 2003c, 2003d, 2004, 2005a, 2005b).

176

3.4.1 O significado do Instrumento de Mediação e Análise Crítica de imagens

Imagens produzidas pelas indústrias do entretenimento que impregnam o

cotidiano das crianças e adolescentes, são muitas vezes consideradas como

inofensivas. Desta forma, não lhes é dado o devido valor informativo e formativo.

Todavia contribuem na construção de visões sobre a realidade, transmitem valores e

crenças e modificam a maneira de pensar e atuar no mundo. Franz (2003c) e

Steinberg e Kincheloe (2004) assinalam que crianças e adolescentes dificilmente

conseguem entender isso sozinhas. Segundo FRANZ (2003b, p. 1), “desenvolver

habilidades de interpretação crítica é considerado por muitos teóricos a principal

meta do ensino em arte hoje.” Leituras críticas, conforme Barbosa (2003, p. 19)

podem ajudar “a exercitar a consciência daquilo que aprendemos por meio da

imagem” e as leituras devem centrar-se na significação que esses atributos

conferem à imagem em diferentes contextos.

Entretanto compreender as relações que se estabelecem na própria imagem,

e fazer conexões com conceitos históricos ou artísticos, com o tempo ou a época,

“realidades e formas de pensamento que estão fora do quadro” (FRANZ, 2003a, p.

10) indo além do objeto visível é uma tarefa bastante complexa, não somente para

crianças. Este é um problema que os professores também enfrentam; “no entanto

são desafiados a ensinar a seus alunos algo que muitas vezes eles próprios não

compreendem.” (FRANZ, 2003b, p. 1). Falta-lhes o instrumental necessário,

estratégias para o acesso às diferentes significações complexas e variáveis que as

diferentes obras e imagens apresentam.

Facilitar esta tarefa complexa em contextos de estudos é o que propõe o

instrumento de mediação. O instrumento assume a função de um mediador da

compreensão desejada. Significa a proposta de um caminho que se há de percorrer

entre a imagem e a compreensão, através de perguntas e diálogos construídos

dentro de determinadas esferas de conhecimento, chamadas de âmbitos de

compreensão (FRANZ, 2003a). Em outras palavras, significa fazer uma série de

diálogos realizadas em determinados âmbitos, a fim de atingir o conhecimento

desejado, isto é, para alcançar a compreensão. Para isso, o instrumento

fundamenta-se nas abordagens socioculturais, que auxiliam na compreensão crítica

da sociedade e da cultura. Para que esta compreensão aconteça, o estudo não se

177

detém apenas no plano aparente da imagem, mas vai além em busca de identificar

as conexões desta com seu contexto social e cultural de produção e a relação dos

significados encontrados com o mundo pessoal e social do estudante.

3.4.2 Procedimentos na proposta de trabalho com o Instrumento de Mediação

O trabalho de mediação, consiste em elaborar um processo consciente de

problematização, através de perguntas, pesquisas e reflexões sobre a imagem, para

que o aluno possa atingir uma compreensão crítica e autônoma. Na construção dos

diálogos, parte-se do princípio de que "uma pergunta que não problematiza, não

ajuda a compreender", conforme Hernández (in FRANZ 2003a, p. 10), que enfatiza

que a pergunta inicial deve considerar o que sujeito irá aprender com ela. As

perguntas não podem servir apenas para que os alunos digam o que vêem. Como

explica Franz (2003d), devem ir além da identificação pura e simples perfazendo um

trajeto entre o contexto de produção e o contexto de recepção e uma relação dos

significados da obra com o mundo pessoal e social do estudante.

Franz (2003a) ordena os âmbitos de compreensão em âmbito pedagógico,

âmbito biográfico, âmbito estético/artístico, âmbito histórico/antropológico e âmbito

crítico/social, estruturando os diálogos, a fim de levar à compreensão mais holística

e complexa das imagens.

Há que se observar um detalhe importante, que Franz (2003d, p.1) assinala: o

fato de que os diferentes âmbitos não aparecem de modo seqüencial e ordenados

na compreensão de uma imagem, mas sim interligados porque são

interdependentes - ao se trabalhar com os diversos âmbitos surgem relações e inter-

relações entre eles. Faz-se a delimitação destes âmbitos; no entanto a título de se

conseguir um trabalho por etapas e facilitar o aprendizado.

Aqui se propõe que professor e estudantes se envolvam em processo de

pesquisas, mudando suas posturas. "O professor passa de transmissor a mediador,

a organizador do processo de estudos." (FRANZ, 2003d, p. 2). Na medida em que

se trabalham os âmbitos de compreensão os níveis de interpretação vão ficando

mais coerentes e complexos. De modo que não se estabelece um prazo pré-

determinado para a duração e conclusão do trabalho com o instrumento de

mediação, nem um nível ideal de compreensão. O trabalho está sujeito ao interesse

178

e necessidade do contexto de estudos e dependerá das intenções e planejamento

que o professor e cada classe determinarão de acordo com seus objetivos.

O primeiro momento insere-se no Âmbito Pedagógico que envolve a escolha

da imagem e o planejamento. Depois de selecionada uma imagem (de uma história

em quadrinhos), o professor parte para o planejamento do processo de estudos. Em

todo processo de ensino, como recorda Hernández (2000), é necessário pensar na

avaliação da aprendizagem. Hernández (2000) e Franz (2003d) recomendam que a

avaliação seja realizada durante todo o processo desde o início, a fim de

acompanhar as transformações ocorridas nas compreensões dos alunos. Nesse

caso, se propõe que seja realizado em diferentes etapas: 1) Avaliação inicial ou de

sondagem; 2) Avaliação de processo; 3) Avaliação final. O quadro a seguir

representa a seqüência das etapas de trabalho:

Etapas de Trabalho

1. Âmbito Pedagógico: momento para planejar, olhar e fazer a avaliação inicial ou de sondagem*

2. Âmbito Biográfico

3. Âmbito Estético/Artístico

4. Âmbito Histórico /Antropológico

5. Âmbito Crítico/Social

Processo de Pesquisa

Avaliação Final ou Somativa

Ava

liaçã

o * A avaliação final ou somativa também faz parte do Âmbito Pedagógico, ainda que seja realizada em etapa posterior.

Quadro 26 - Etapas de trabalho e avaliação no instrumento de mediação e análise crítica

3.4.2.1 A Imagem: Heróis Renascem Vingadores

A imagem que aqui se propõe para ser trabalhada através do Instrumento de

Mediação de Análise Crítica, é uma imagem de página dupla, da revista mensal nº 5,

da mini-série Heróis Renascem Vingadores70, publicada em abril de 1999, pela

Editora Abril Divisão Jovem (Figura 12). A revista é propriedade da Marvel

Entertainement Group e não possui numeração de páginas. Dimensões: 33,7 x

70 Informações sobre Vingadores podem ser encontradas nos sites <http://pt.wikipedia.org/wiki/Vingadores> Acesso em: 9 out. 2005, e <http://members.fortunecity.com/gibionline/htm9/biovingadores.htm> Acesso em: 10 out. 2005.

179

25,7cm. A mini-série possui doze fascículos (ver Apêndice D – sinopse desta mini-

série).

A escolha recaiu sobre esta imagem devido à temática de a revista estar

relacionada a questões históricas e problemas atuais, como expansão americana,

política, violência e ainda outras. O personagem Hulk, segundo Cavalcanti (s.d, p.

73) “foi criação de Stan Lee em fins da década de 50”, e Thor foi criado em 1962, por

Stan Lee e Jack Kirby, autores que têm importância para a história dos quadrinhos.

Thor e Hulk são bastante conhecidos do público infanto-juvenil e já fazem parte do

imaginário popular. Além de serem encontrados em diversos títulos diferentes de

HQs, esses personagens têm sites próprios na Internet, joquinhos e bonecos, que

crianças utilizam para simulação de lutas em brincadeiras ou fazer coleção. O

Instrumento pode mediar a compreensão crítica sobre o papel que esta imagem, ou

outra semelhante, a critério do professor, tem na construção das identidades, idéias,

valores e crenças de seus alunos, quais as verdades que mostra, interesses e

relações de poder que reproduz.

Durante a seleção de imagens para nosso trabalho, observamos que a

maioria das HQs para adolescentes (em torno dos 13 anos em diante), como por

exemplo, Batman, X-Men, Homem-Aranha e outros, são publicadas apenas em

série71. Assim, optamos por fazer a leitura de uma única imagem, e a partir daí

realizar estudos em torno dos personagens, ficando em aberto um trabalho para

classes que tenham condições e interesse em adquirir o material e que não tenham

dificuldade para leituras mais longas. Vale dizer que, em geral, muitos meninos de 7ª

e 8ª séries lêem normalmente este tipo de revista.

A Marvel Comics72 publica HQs com o Quarteto Fantástico, Homem-Aranha,

Incrível Hulk, Capitão América, X-Men e outros personagens. O Homem-Aranha,

também foi um dos personagens criados por Stan Lee, juntamente com Steve Ditko

em 1963. Para muitos, este é um dos personagens de maior sucesso da editora. Se

o professor e a classe preferirem, esta pode ser uma boa opção de trabalho73.

71 As séries podem ser adquiridas em lojas “Sebo” ou através de sites da Internet. 72 Sobre a editora Marvel Comics, ver <http://pt.wikipedia.org/wiki/Universo_Marvel#Hist.C3.B3ria>. Acesso em: 25 fev. 2006. 73 Há também outras séries de super-heróis, publicadas para adolescentes pela Marvel e pela DC Comics (Super-Homem, Batman, Liga da Justiça, Flash, Lanterna Verde etc.). Outros tipos de personagens e histórias em quadrinhos são publicados por empresas como a Disney e a Cartoon Network Studios. Atualmente a Cartoon Network Studios desenvolve os antigos desenhos da Hanna Barbera: Flintstones, Jetsons, Bóbi Pai e Bóbi Filho,Tom & Jerry, Smurfs, etc.

180

Figura 12: Imagem da Revista Heróis Renascem Vingadores, nº 5 abr., 1999. Não paginada.

181

3.4.3 Âmbitos de compreensão

a) Âmbito pedagógico

O trabalho inicia no Âmbito Pedagógico. Esta etapa envolve principalmente o

professor e inclui um processo de pesquisas a respeito da imagem, momento para

determinar os objetivos a serem atingidos. O que se quer aprender e o que as

estratégias didáticas que melhor se adaptem ao nível de sua classe e também, qual

a melhor maneira para iniciar o estudo. Ordenar as perguntas permite que se

construa um referencial para o desenvolvimento do trabalho, mas novas perguntas

poderão surgir conforme o andamento das tarefas e as necessidades do grupo. É

recomendável que o professor tente responder a si mesmo algumas perguntas antes

de começar o trabalho com os estudantes:

1. O que se espera aprender com esta imagem? 2. Quais informações buscar para contextualizar os estudos? 3. Quais informações transformarão o estudo desta imagem em aprendizado e

conhecimento para os estudantes? 4. Quais as estratégias didáticas adequadas para o nível dos estudantes e objetivos

propostos? 5. Que outras imagens e textos podem auxiliar na compreensão? 6. Como saber se os estudantes estão compreendendo, e como ordenar e avaliar a

compreensão desta imagem? 7. O que dizer e fazer ao apresentar a imagem? 8. Esta imagem será suficiente para visualização conjunta em sala? 9. A escola ou os estudantes podem colaborar com outras imagens?

É importante que nesta etapa o professor realize uma pesquisa74 sobre a

imagem, o que irá facilitar o processo de mediação. Por outro lado, conforme sugere

Hernández (2000), esta pesquisa pode ser realizada em conjunto com os

estudantes, formando com eles um grupo de investigação, em bibliotecas, gibitecas,

livros, jornais, revistas e sites da Internet. Este é o momento de delinear um campo

de estudos para serem trabalhados e da apresentação da imagem para os

estudantes. Apresentar a imagem significa ter um momento para observá-la com

atenção. Desta forma é possível questionar os alunos quanto ao conhecimento que

já possuem a respeito dos personagens ou da revista. Ao final desse momento,

74 Dependendo da idade e do nível escolar dos estudantes, estes podem ser envolvidos nesta etapa do planejamento do processo de estudos e pesquisa. O professor também pesquisa e aprende.

182

pode-se pedir aos estudantes que escrevam um texto sobre a imagem. Esse registro

pode servir como avaliação inicial. Conforme a classe, pode-se solicitar depois que

leiam a história. As perguntas que seguem podem auxiliar a observação sobre a

imagem.

1. Conhece esses personagens? 2. Conhece alguém que gosta desses personagens? 3. Onde costumam aparecer? 4. O que chama mais atenção nessa imagem? 5. O que os personagens estão fazendo? 6. Quais suas idades? De onde eles são? 7. Quais suas aparências? 8. Qual é a história que estão contando? 9. O que pensa a respeito deles?

b) Âmbito biográfico

O trabalho nesse âmbito faz uma aproximação com o aluno, relacionando sua

vida com a imagem. Conforme Franz (2003b) procura resgatar a unidade entre

história e sujeito, conectando o ensino e a aprendizagem da arte com uma prática

pedagógica que visa alcançar a cidadania e autonomia do aluno. Produtos culturais

não são apenas entretenimento, porque estão ligados a certas formas de satisfação

dos desejos através da fantasia (SILVA, 2002). Os alunos devem ser incentivados a

questionar sua própria biografia e modos de vida para que possam refletir e analisar

seu próprio meio. As perguntas podem ajudá-los a compreender qual o papel que a

imagem possui em sua vida, relacionando os significados encontrados na imagem

com sua história pessoal, procurando em sua própria vida referências que o ajudem

a interpretar a obra (Franz, 2003d). Além das perguntas que colocamos, o professor

pode elaborar outras, de acordo com a situação.

1. Já conhecia esses personagens de revistas em quadrinhos, ou de algum outro lugar? 2. Onde costumo encontrar desenhos com esses personagens? 3. Quais são meus super-heróis preferidos? São diferentes dos personagens da imagem ? 4. Imito, já imitei, ou já brinquei com algum desses personagens? 5. Quais os significados encontrados na imagem que influenciaram meu modo de vida? 6. Como é que alguém é levado a pensar que os norte-americanos seriam “super-

poderosos”? 7. Como vejo as atitudes representadas pelos personagens dessa imagem? 8. Como a violência, na realidade interfere em minha sala de aula, escola ou minha vida? 9. O que penso sobre a violência? 10. O que posso aprender com essa imagem?

183

c) Âmbito estético/ artístico

Obras de arte são sistemas de representações convalidados e aceitos por

determinados grupos sociais, através de códigos simbólicos, referências culturais,

influências de outros artistas e tendências estilísticas (FRANZ, 2003d). Apesar de

possuírem um lado fortemente comercial, as HQs também contêm códigos aceitos

por determinados grupos e são produtos de uma época e um lugar. Podem

pertencer a gêneros diferentes, tais como fantasias de superpoder, autobiografias,

ficção científica, animais cômicos, aventuras, etc., possuindo estilos que podem

variar desde os mais realistas, até os mais icônicos75. O gênero super-heróis,

segundo McCloud (2006) possui características estilísticas e estruturas narrativas

próprias e em geral o estilo enfatiza anatomias musculosas.

1. O que foi desenhado nesta cena? 2. Qual o estilo utilizado pelo desenhista? Simplifica e/ou cartuniza os traços? É realista ou é

um estilo intermediário entre o realismo e o cartum? 3. Quais são as características físicas dos personagens? 4. Que tipo de roupas os super-heróis costumam usar ? 5. Quais os elementos usados na imagem que dão expressão à cena? 6. Qual a função das cores empregadas na imagem? E no personagem Hulk? 7. O que o desenhista que criou esta cena precisava saber para poder desenhá-la? Quais

materiais ele usou?

Produzir HQs é assunto complexo e requer habilidades diversificadas. Em

geral, muitas pessoas trabalham para que uma revista de histórias em quadrinhos

possa ser produzida. Com a colaboração de Jack Kirby, Stan Lee76 criou os

personagens Hulk, Thor e outros que fazem sucesso até hoje. Profundo conhecedor

de técnicas cinematográficas e de noções dinâmicas da perspectiva, Jack Kirby foi

um inovador das HQs. Antes dele, poucos artistas inovaram nas HQs. As primeiras

histórias em quadrinhos utilizavam quadros e planos invariáveis (Quella-Guyot,

1994). A partir de então, as histórias em quadrinhos que se mantinham presas a

seqüências simples passaram a fazer uso de splash pages77 e páginas duplas.

Delimitar os estudos práticos pode facilitar o aprendizado e emprego dos

conhecimentos na prática. Para desenvolver uma compreensão mais complexa

75 Segundo Quella-Guyot (1994, p. 128), “a maioria das HQs podem se considerar dotadas de realismo, que varia de acordo com o grau de exatidão da representação gráfica.” Para McCloud (2006, p. 44) há também, os estilos híbridos (ou semi-realistas, conforme o termo utilizado por alguns autores), que associam “personagens muito cartunizados e fundos quase fotográficos.” 76 Ver <www.devir.com.br/marvel/autores_stanlee.php>. Acesso em: 24 de fev. 2006. 77 Splash Page: página de abertura, ou de um único quadrinho que procura criar impacto visual.

184

neste âmbito, é interessante fazer visitas a ateliês ou de editoras onde são

produzidas HQs, para que os alunos compreendam o processo. Também pode ser

interessante receber visitas de profissionais desta área, que costumam divulgar seus

trabalhos em escolas. Após este percurso, é importante partir para um trabalho

prático de produção de histórias em quadrinhos com os estudantes. O fazer artístico

é uma excelente estratégia de compreensão. Pode-se realizar um trabalho prático

nesta fase e também ao final do processo, para fins de avaliação e comparação,

depois dos estudos nos âmbitos histórico/antropológico e crítico social, ou trabalhar

com este âmbito somente ao final do processo. Conforme Hernández (2003a, p. 12),

os alunos podem elaborar HQs “como respostas e como modo de diálogo” com a

imagem estudada. Recorda-se que nas teorias atuais do ensino de Arte o fazer

artístico deve estar associado de maneira criativa com as problemáticas abordadas

durante os estudos.

d) Âmbito histórico/antropológico

Na história da Cultura Visual, existem motivos e intenções para que se

fabriquem produtos para entretenimento. HQs são vendidas principalmente para

divertir e entreter. Através de seus personagens, os quadrinhos retratam situações

vividas ou revelam anseios e desejos com os quais os leitores se identificam. Por

trás disso está o poder do mercado. Como objetos artísticos, as imagens da Cultura

Visual também possuem funções e significados implícitos elaborados pela própria

sociedade que a produziu, de modo que histórias e personagens refletem valores,

crenças e ideologias de seus autores, editoras ou grupos. Valores, crenças e

ideologias nem sempre estão evidentes na imagem. As perguntas aqui têm como

objetivo fazer com que os professores possam auxiliar os alunos na compreensão do

contexto cultural que a imagem/revista foi produzida e a relação desse contexto com

os significados da imagem.

1. Qual editora produz essa revista? 2. Onde se localiza e há quanto tempo existe? 3. Quem são as pessoas que produziram essa revista? 4. Em quais lugares o(s) autor(es) se inspirou para criar os cenários da revista? 5. Quais são os valores, crenças ou ideologias veiculados através dos personagens da

imagem, presentes no imaginário sociocultural contemporâneo?

185

6. Quais as estratégias que a revista utiliza para manter e vender seus produtos aos leitores?

7. Por que existem 4 títulos de revista nessa mesma série? 8. Por que compramos esses produtos? 9. As idéias veiculadas pela revista interessam para nossa sociedade? Por quê? 10. Em que sentido esta imagem ajuda a compreender o homem contemporâneo? E a

história?

e) Âmbito crítico/social

Neste âmbito, procura-se entender como a imagem pode ajudar na

compreensão de temas e problemas da sociedade à qual a imagem e espectador

estão vinculados, porque as imagens da arte e, neste caso, as HQs são

compreendidas como representações da sociedade e da cultura.

Os heróis conhecidos das histórias em quadrinhos são em sua maioria

homens: Super-Homem, Batman, Homem Aranha, Hulk, Thor, Demolidor e outros,

que expressam narcisismo e onipotência masculina. Apenas recentemente “diante

das várias faces do espectador do século XXI”, há uma tendência que surge em

Hollywood para a criação e inclusão de heróis de ambos os sexos, mas segundo

Housel (2005, p. 84), ainda baseados em regras e éticas masculinas.

Para Freedman (2001) e Pollock (2003), é fundamental detectar

inadequações e limitações culturais ideológicas estabelecidas por legendas

canônicas nas artes que disseminam conceitos de supremacia e narcisismo

masculinos, através de leituras críticas que possibilitem transformações nas

percepções e desejos, resistindo a todo tipo de separação e categorização a fim de

produzir um desejo para a diferença, ao invés de identidades nacionais, culturais ou

genéricas. Segundo Franz (2003c), "as perguntas devem ser contextualizadas para

a sociedade da época" em que a imagem foi produzida, relacionando os significados

desse contexto com a vida do aluno (contexto de recepção). Compreender é algo

mais do que uma habilidade rotineira automatizada (PERKINS, in WISKE, 1999). O

trabalho deve ajudá-lo a compreender o meio social e cultural em que vive, de forma

reflexiva e crítica. Essa é a meta dos estudos em Artes Visuais em que a arte é

compreendida como uma representação sociocultural (Cary, 1998; Hernández, 2000;

Franz, 2003a; Efland, Fredman e Sthur, 2003; Chalmers, 2003). As perguntas devem

ajudar os alunos a saírem do nível ingênuo de compreensão, para superar as

respostas de senso comum (Franz, 2003a).

186

1. Que poderes os personagens Thor e Hulk estão representando? 2. Conhece super-heróis nacionais? Quais? 3. Existem heroínas ou super-heroínas no grupo dos super-heróis da revista? 4. Quais são as características, qualidades ou defeitos dessas personagens femininas? 5. Quais os tipos de inimigos que os super-heróis da revista enfrentam? 6. Quais as influências da cultura americana atualmente no mundo? 7. Qual a influência dessa cultura em nossa sociedade? Afeta nosso estilo de vida, nossas

idéias, comportamentos e o que pensamos sobre nós? 8. Cenas semelhantes as da imagem, acontecem na realidade? 9. Quais os tipos de guerra ou conflito que são produzidos em nossa própria sociedade? 10. Quais os efeitos da violência para uma sociedade?

3.4.4 A avaliação e as compreensões

Na avaliação é interessante recordar que as pessoas interpretam em

diferentes níveis, diferentemente umas das outras. Conforme Parsons (1987, apud

HERNANDEZ, 2000), os estágios de desenvolvimento de apreciação estética, estão

relacionados com as idéias sobre um determinado objeto ou tema que o indivíduo

vai adquirindo ao longo da vida. As interpretações dos significados de uma imagem,

segundo Franz (2003b, p. 1), apresentam diferentes níveis de complexidade e vão

desde as mais superficiais, parciais, fragmentadas e errôneas até as de nível

superior, mais holísticas, críticas e complexas:

1. Nível ingênuo 2. Nível principiante 3. Nível aprendiz 4. Especialista

Prevalecem as idéias intuitivas e míticas. Acredita ser desnecessário conhecimento específico para interpretar.

Mistura de crenças intuitivas sobre a imagem, com fragmentos de conhecimentos, mas prevalecem as idéias intuitivas. Não chega a estabelecer relações significativas.

Fértil rede de idéias prévias sobre a obra/imagem. Compreensão inicial da obra/imagem como uma produção cultural que traz implícitas representações socioculturais.

Estabelece numerosas relações entre dados, contexto de produção e de recepção. Emite juízo próprio, demonstrando consciência crítica. Compreensão autônoma da realidade.

Quadro 27 - Níveis de compreensão, segundo Franz (2003a)

Depois de pesquisar sobre a compreensão, Franz (2003a, p. 283-288)

apresenta quatro níveis básicos de interpretação: ingênuo, principiante, aprendiz e

especialista. O Quadro 27 resume os níveis de compreensão, demonstrando que

terão variações de indivíduo para indivíduo. Para o professor é importante conhecer

o nível de compreensão inicial dos estudantes para levá-los a fazerem progressos

alcançados na compreensão, durante os estudos. Descobrir o estágio em que uma

pessoa se encontra, conforme Hernández (2000, p. 113) “não implica classificar

187

esse indivíduo, mas sim situar o 'lugar' em que se encontram suas idéias em torno

da temática que se aborde em cada caso”, para que o professor possa auxiliar o

desenvolvimento da compreensão desejada.

3.4.4.1 Avaliação inicial, avaliação de processo e avaliação final

a) Avaliação inicial ou de sondagem

É essencial para obtermos uma noção prévia do conhecimento que os alunos

possuem a respeito da imagem. Esta avaliação tem por objetivo, encontrar

concepções equivocadas, fragmentadas, pobres, preconceitos, suposições,

limitações na base de conhecimentos e outros problemas que possam surgir nas

compreensões iniciais (FRANZ, 2003d). Servirá também para uma análise pessoal

do aluno e posterior avaliação do professor sobre o progresso da compreensão

alcançada, ao final do trabalho.

b) Avaliação de processo

O estudo pode estender-se por dias ou semanas (FRANZ, 2003d). Como esta

avaliação tem por objetivo acompanhar a passagem de uma compreensão ingênua

para uma compreensão mais profunda e complexa sobre a imagem estudada, é

recomendável que os alunos arquivem e registrem em diários ou portfólios78 os

trabalhos e outras tarefas realizados durante o processo de estudos.

Esta atitude facilitará a visualização do próprio aluno e também do professor

acerca do percurso que este realizou, suas evoluções e transformações ocorridas na

sua compreensão. Hernández (2000) sugere que o professor empregue durante o

processo, a avaliação formativa. Este tipo de avaliação requer que o professor

realize uma tarefa de ajuste entre o processo de ensino e o de aprendizagem, para 78 Portfólio, segundo Hernández (2000, p. 164), é “uma modalidade de avaliação retirada do campo da arte.” Em geral, artistas interessados em participar da seleção para exposições ou para outras situações, costumam montar pastas (portfólios) com mostras de seus trabalhos. No ensino de Arte, os portfólios, não necessariamente irão apresentar produtos acabados como os artistas, mas produtos “em processo”. Podem ser definidos como uma coleção ou reunião de diversos documentos, tais como anotações, trabalhos escritos, práticos, fotos, avaliações e outros. Conforme Gardner (1994, apud HERNÁNDEZ), é uma maneira para auxiliar a identificar questões relacionadas ao modo como os estudantes realizam os objetivos de sua aprendizagem.

188

ir-se adequando à evolução dos alunos e ir estabelecendo novas pautas de ação a

medida em que ocorre a aprendizagem. Nesta avaliação, como explica Hernández

(2000), na análise dos trabalhos dos alunos, é muito menos importante considerar se

estão bem ou mal realizados, do que levar em conta a exigência cognitiva das

tarefas propostas e detectar erros conceituais e outras relações que posam surgir de

improviso.

c) Avaliação final

Nesta avaliação, Hernández (2000) recomenda uma avaliação somativa, não

no sentido de medir êxitos ou fracassos, mas como um meio para que os

professores possam também avaliar suas próprias tarefas, além de avaliar o

progresso ou as dificuldades dos alunos. A avaliação somativa, segundo Hernández

(2000), sintetiza um tema de uma série e permite que o professor reconheça se os

estudantes atingiram os resultados com relação ao trabalho proposto. Alguns

professores podem preferir solicitar como avaliação somativa uma atividade

semelhante à da avaliação inicial, para comprovar se as concepções dos alunos se

mantiveram ou se modificaram e evoluíram. O professor pode ainda, solicitar um

trabalho prático de história em quadrinhos, para fins de avaliação final que envolva

as habilidades práticas o senso crítico desenvolvido durante o processo. Isto é,

associando o trabalho final de avaliação com a produção e os estudos realizados

durante as etapas de trabalho.

O instrumento de mediação e análise crítica mostra um caminho possível para

favorecer a tomada consciente dos estudantes sobre si mesmos, as imagens dos

quadrinhos e suas relações com o mundo e a realidade. Por outro lado, não é um

roteiro prescritivo. As seqüências não precisam ser seguidas na ordem em que

foram apresentadas, e o trabalho não precisa se restringir ao que está proposto. Ao

contrário, deve ser adaptado para cada contexto de ensino, modificando-se ou

acrescentando-se tópicos de estudos conforme as necessidades de cada turma e a

critério do professor.

189

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os estudos teóricos, os depoimentos e diálogos, foram úteis para ampliar

nossa compreensão pessoal a respeito da relação entre as HQs e o ensino de Artes

Visuais. À medida que aprofundamos as análises esta questão se tornou mais clara

para nós. A participação em cursos de HQs como ouvinte ou como professora

também contribuiu para este processo. Da mesma forma que ampliou nosso

conhecimento sobre o tema problema estudado, esperamos que a pesquisa amplie

a compreensão de outros professores a respeito dos estudos em torno das HQs, em

situações de ensino das Artes Visuais.

É importante assinalar ainda que, no decorrer da análise, foram surgindo

novas perguntas sobre o ensino das histórias em quadrinhos, e as relações que se

produzem em seu entorno, além de outras sobre a própria arte dos quadrinhos,

deixando em aberto questões que podem ser investigadas futuramente.

A análise revela práticas de ensino relacionadas às histórias em quadrinhos,

apegadas à concepção tradicionalista da educação e voltadas para o aprendizado

de habilidades técnicas do desenho e da criação livre, teoricamente superficiais e

que não fomentam conhecimentos críticos, confirmando indagações feitas no início

da pesquisa. Conforme Hernández (1998), a aprendizagem vinculada ao fazer, à

atividade manual e à intuição também são formas de aprendizagem. Segundo esse

autor, embora a psicologia cognitiva tenha valorizado mais a aprendizagem

conceitual, deixando de lado as atividades manuais e artesanais, estas também

podem recuperar “toda uma série de habilidades que nossa cultura tende a

menosprezar” (HERNÁNDEZ, 1998, p. 86) e ainda podem dotar os alunos de novas

estratégias e possibilidades para dar respostas às necessidades que encontram em

sua vida, se estiverem vinculadas a projetos de ensino direcionado para tais

objetivos.

190

A tendência para o ensino conceitual, citada por Hernández (1998), talvez se

encontre mais relacionada ao ensino da arte erudita. No caso da arte dos

quadrinhos, o ensino indica estar menos ligado a conceitos e mais apegado às

atividades manuais e espontâneas. Como destaca esse autor, o fazer manual ou

técnico e a educação para a compreensão crítica são ambas importantes para o

ensino da arte dos quadrinhos. Porém os professores “esquecem” que esta arte

também está ligada a valores, conceitos, idéias e crenças e, segundo os relatos, não

trabalham de modo crítico com estas questões e não as trazem para debate. Diante

da diversidade de produções e conteúdos no universo das histórias em quadrinhos,

os professores não se posicionam a seu respeito e não as incluem nas aulas.

Quando as HQs são trabalhadas no ensino de Arte, os professores em sua

maioria, o fazem apenas com um autor - Maurício de Souza - em todas as séries do

ensino fundamental, porque seus desenhos são claros, simples e fáceis para os

alunos e, de maneira implícita, indicam sua aceitação pelo fato de possuir

características educativas, geralmente associadas ao ensino da Língua e a

valorização de um trabalho nacional.

Grande parte das práticas analisadas, que usa personagens da Turma da

Mônica, porque os alunos gostam deles, encaixa-se nas proposições da perspectiva

da satisfação, citadas por Hernández (2007). Como explica esse autor, a ausência

de um trabalho crítico e reflexivo faz com que os professores acabem validando

prazeres ao invés de estabelecer perspectivas educativas que ofereçam às crianças

e adolescentes meios para discernimento criterioso, diante de questões morais,

sociais e éticas. Além disso, como observa David Buckingham (1993 apud

HERNÁNDEZ, 2007, p. 68), os professores não fazem mais que deixar os

estudantes permanecerem onde estão.

Acreditamos que seja válido, que os professores tenham essa preocupação

em selecionar conteúdos que consideram interessantes para os estudantes e que

valorizem a cultura local. No entanto é uma forma um pouco limitada de trabalhar,

pois permite apenas o entendimento de um único sentido ou uma visão única, o que

não impede o contato dos alunos com a diversidade das HQs em seu cotidiano, que

hoje não ocorre somente por meio das revistas. Como Steinberg e Kincheloe (2004)

assinalam, não adianta nos autoexcluir da cultura que nos cerca, como se esta não

existisse. Não basta apenas transmitir técnicas ou ficar apegado a um só autor.

191

Segundo Freire (1979, 1997), Hernández (1998, 2000, 2007), Giroux (1997,

2003), Chalmers (2003) e Pollock (2003), entre outros teóricos, não existe educação

neutra. É interessante que os valores utilizados pelas diferentes culturas com as

quais estamos envolvidos sejam questionados, para que os alunos aprendam a

refletir e a emitir julgamentos próprios a seu respeito. Assim como considerar que a

prática pedagógica é também política e não se reduz ao processo de ensino-

aprendizagem. O que implica, segundo Hernández (2007, p.39) “prevenir-se dos

discursos que procuram, sob a aparência da neutralidade e de objetivismo, delinear

visões do mundo e de representações do sujeito que excluem e deixam à margem

muitas das representações identitárias existentes.” Recorda Hernández (2007) que

muitas das formas de representação marginalizadas, contribuem de maneira

poderosa para a construção das subjetividades de crianças e adolescentes.

O estudo demonstra que os docentes pouco levam em conta as premissas da

educação pós-moderna que buscam não fazer distinções valorativas entre a cultura

erudita e a cultura popular. Tampouco consideram a necessidade da pesquisa e sua

importância como mediadores de conhecimentos dos alunos. Conforme Freitas

(2006, p. 3), existe um descompasso entre o que muitos professores introjetaram

sobre o significado de ser professor e o que se espera do profissional docente na

atualidade. Como destaca essa autora, a nova postura do professor como mediador

dos saberes, possibilita o intercâmbio e o encontro com as pessoas. Para o aluno,

conforme Franz79, Freire (1979, 1997), Hernández80 e Corrêa (2004), a mediação,

facilita a construção de novos conhecimentos.

Segundo Freitas (2006, p. 3), muitos professores permanecem presos ao

passado e a um modelo romanceado de formação, “onde não há espaço, nem

tempo disponível para novas demandas e novos conhecimentos.”

Hoje ainda é comum pensar apenas em revistas quando se fala em histórias

em quadrinhos, pois somente a partir da década de 1990, com a popularização da

Internet, fanzines e tiras humorísticas passaram a proliferar rapidamente na rede,

depois de um tempo em que se acreditava que esta arte deixaria de existir. Poucos

de nós se deram conta disso, pois a preocupação de que as HQs migrassem

integralmente para as novas tecnologias, na opinião de McCloud (2006), faria com

que muitos leitores de revistas em quadrinhos os abandonassem. Conforme alguns

79 Franz (2000, 2003a, 2003b, 2003c, 2003d, 2005a, 2005b). 80 Hernández (1998, 2000, 2003a, 2005, 2007).

192

editores, parece que isso não aconteceu. As produções e o mercado das HQs, hoje,

ao contrário, experimentam um período de reaquecimento, ampliando o número de

leitores. Os avanços tecnológicos das mídias digitais permitiram novas conquistas

para a sociedade e para a arte dos quadrinhos, mas também trazem novos

problemas e desafios para o ensino e para os educadores.

Para alguns pesquisadores das novas tecnologias aplicadas às HQs, a

Internet pode funcionar como um espaço democrático, como afirma Edgar Franco

(apud MAGALHÃES, 2004, p. 108), para quem a “Internet aponta para uma ruptura

da hegemonia das grandes editoras, [...] indicando uma nova tendência para o

mercado das HQs impressas em todo o mundo.”

Para outros teóricos, como Frohne (2001), a realidade hoje contrasta com o

discurso inicialmente otimista, no qual as novas tecnologias trariam uma igualdade

ideal, acima dos limites nacionais intelectuais, e livre dos papéis de gênero. Para

essa autora, a rede está se transformando em um campo de batalha de interesses

de poder e segmentação e principalmente em um lugar de acumulação de capital,

enquanto afasta um grande número de pessoas incapazes de se conectarem, por

condições psicológicas, idade ou classe social.

Conforme Papert, teórico da inteligência artificial (apud FREITAS, 2006), tanto

os avanços tecnológicos podem ser colocados a serviço da solidariedade social,

quanto ampliar a sede destruidora pelo poder. Segundo Freitas (2006, p. 1), hoje os

seres humanos se encontram perante um duplo desafio: “ou permanecem presos

nas armadilhas tecnológicas, que direcionam a vida em sociedade através da

produção e do consumo desenfreado de bens, ou podem avançar rumo ao convívio

solidário”, unindo as tecnologias aos processos de subjetivação humanos.

Décadas atrás81, questionavam-se as histórias em quadrinhos, porque se

considerava que eram prejudiciais para o aprendizado da leitura e eram um meio de

alienação cultural (SCARELI, 2003; JUNIOR, 2004). A despeito disso, o meio em

que vivemos tornou-se essencialmente visual, e hoje as HQs ocupam espaço cada

vez mais amplo na Internet. A cada dia, um número maior de crianças, segundo

Steinberg e Kincheloe (2004) compartilham do mundo adulto através da hiper-

realidade da mídia eletrônica e das mídias digitais.

Conforme esses autores, as mídias e novas tecnologias digitais alteram

profundamente o modo de aquisição de conhecimentos da criança e até mesmo o 81 Ver item 1.2 – Problema de Pesquisa.

193

seu conceito sobre a autoridade do adulto. Crianças e adolescentes têm um contato

constante a Arte Seqüencial/HQs, mediante as mídias. Porém, buscam o

entretenimento, a diversão e o passatempo, a fim de aliviar tensões, e não o

conhecimento em si mesmo, embora aprendam muitas coisas neste relacionamento.

O acesso de crianças e adolescentes ao mundo das imagens é ilimitado e os

contatos que fazem são importantes não apenas para o ensino de Artes Visuais,

mas para sua formação. Contudo pouco sabemos a respeito desses

relacionamentos, particularmente no que se refere às histórias em quadrinhos.

Diante da troca dos meios técnicos e/ou artesanais pelos meios digitais, para

Poissant (1997, apud CORRÊA e MATTÉ, 2005, p. 206), “é preciso mudar de

atitude, de corpo e espírito para captar em que estas imagens inovam e sobretudo

como elas estão transformando fundamentalmente o nosso meio.”

Então como fica a relação de crianças e adolescentes com as HQs hoje?

Qual a importância real que tem esta arte para as crianças e adolescentes na

atualidade? Qual o significado que tem para eles? Como a compreendem?

No estudo exploratório, a meta era encontrar evidências sobre o problema de

pesquisa82, mas também surgiram indagações sobre questões de gênero. Em

princípio, acreditávamos que pelo fato de gostarem de desenhar, tanto meninas

quanto meninos, crianças e adolescentes, gostassem da mesma maneira de

histórias em quadrinhos. Mas naquele estudo, percebeu-se uma aproximação maior

de meninos com esta arte, ao contrário do que acontece com as meninas. Inclusive

hoje há uma tendência para uma maior segmentação das histórias em quadrinhos.

Todavia em sala de aula costuma-se ensinar sobre as HQs de modo

indistinto. Este é um dado que leva à necessidade de investigar qual a realidade

desta arte para crianças e adolescentes. Acreditamos que não apenas aquilo que o

professor de Artes Visuais leva para sala de aula é importante, mas o que os alunos

encontram fora dela. Geertz (1997) recorda que a arte, os objetos estéticos não são

apenas um mero encadeamento de formas, mas objetos ou artefatos que se

relacionam aos demais componentes da experiência humana.

Essas considerações abrem a possibilidade para novas pesquisas sobre a

relação de crianças e adolescentes ligadas às representações da Arte

Seqüencial/HQs, presentes também em desenhos animados e Internet, incluindo

82 “Como os professores de ensino fundamental se relacionam com a Arte Seqüencial/Histórias em quadrinhos no ensino de Artes Visuais?”

194

questões de gênero e que podem ser realizadas em projeto de pesquisa para

doutorado. Uma futura pesquisa seria importante para consubstanciar o presente

trabalho, a fim de conhecer o que os alunos costumam ler e em quais mídias lêem

sobre quadrinhos. Análises neste sentido poderiam dizer-nos coisas úteis sobre

como crianças e adolescentes compreendem e utilizam essa arte, qual o significado

que tem para eles, como isso influencia sua vida, seu aprendizado e sua relação

com as Artes Visuais, trazendo dados importantes para os professores, fornecendo

elementos para o trabalho com os alunos na escola.

Por fim, cabe dizer que a pesquisa auxiliou para compreendermos as relações

dos docentes com a Arte Seqüencial/histórias em quadrinhos, contudo tem seus

limites assim como o instrumento de mediação para análise crítica de imagens de

histórias em quadrinhos proposto, que pode auxiliar aqueles que tenham interesse

em ensinar sobre essa arte.

Consideramos que as questões estéticas dos quadrinhos, neste trabalho

ficaram um pouco à parte, embora não tenham sido esquecidas. Da mesma forma

que a pesquisa demonstra que as leituras críticas são particularmente importantes

para o ensino de HQs e que estas necessitam ser divulgadas entre os professores, a

fim de permitir que os próprios alunos adquiram autoconsciência e posicionamentos

críticos diante das produções e representações existentes na área dos quadrinhos,

há necessidade de maior compreensão sobre esta arte, também no âmbito artístico.

Os depoimentos revelam que há total desconhecimento entre os professores

entrevistados, a respeito de obras, autores e estilos dos quadrinhos, denotando uma

carência de estudos nesta área, própria do ensino de Arte.

Vasta bibliografia pode ser encontrada sobre a história e como fazer histórias

em quadrinhos. Bibliografia relacionada ao uso desta arte em sala de aula, pode

também ser encontrada. Deixa a desejar, no entanto, bibliografia referente a obras,

autores e estilos, para o ensino de Artes Visuais, denotando ser um dos elementos

limitadores deste ensino. À parte sua história polêmica, como enfatiza Quella-Guyot

(1994, p. 44), as HQs são um produto cultural e artístico e também produziram obras

“que não merecem a superficialidade habitual de alguns excertos perdidos numa

página de manual.” Hoje existem muitas produções autônomas de artistas de

histórias em quadrinhos pouco preocupadas com sua distribuição em série em larga

escala, que buscam a qualidade dos conteúdos e dos aspectos artísticos, mas que

são desconhecidas entre os professores e alunos, podendo ser investigadas e

195

estudadas com atenção no ensino de Artes Visuais. Levando em conta esta

carência, considerando a importância que têm para o ensino de Artes Visuais,

estudos neste âmbito poderiam ser incluídos em projeto de pesquisa futuro, com a

finalidade de ampliar as possibilidades de estudos dessa arte.

Na contemporaneidade, o ensino de Artes Visuais se encontra diante de

muitos desafios, tais como a pluralidade das formas artísticas. Sem desconsiderar

esses aspectos e as dificuldades com que se depara este ensino hoje, é

fundamental, do ponto de vista deste estudo, também levar o professor a questionar-

se sobre suas práticas pedagógicas, conceitos e valores com as quais estão

relacionadas e sobre a importância de estar conectado e atendo às transformações

atuais da sociedade da cultura e da arte.

196

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205

APÊNDICE

APÊNDICE A – Relação entre freqüência e gênero nos cursos de HQs da Gibiteca e Solar do Rosário

APENDICE B – Modelos de autorização utilizados para entrevistas no estudo explo-ratório e estudo empírico

APÊNDICE C – Amostras de entrevistas realizadas no estudo exploratório e estudo empírico

APÊNDICE D – Sinopse da mini-série Heróis Renascem Vingadores

206

A - Relação entre freqüência e gênero nos cursos de HQs da Gibiteca e Solar do

Rosário

1. Cursos de histórias em quadrinhos da Gibiteca

Tabela de freqüência por sexo

Início do curso Final do curso Cursos do 1º semestre de 2006 feminino masculino feminino masculino

Básico 6ªs feiras 10/03 a 14/07 3 13 0 13

Básico Sábados 11/03 a 08/07 3 18 2 10

Mangá 6ªs feiras 10/03 a 14/07 5 18 0 18

Intermediário 5ªs feiras 09/03 a 29/06 1 3 0 3

Mangá 2ªs feiras 06/03 a 26/06 3 7 3 7

Avançado 3ªs feiras 07/03 a 20/06 1 2 1 2

Nº de pessoas por sexo 16 61 6 53

Nº de pessoas no total 77 59

Percentual (20,77%)

21 % (79,22%)

79 % (10,17%)

10% (89,83%)

90%

Percentual aproximado de desistentes ao final dos cursos 23%

Obs.: Os números acima de 0,5 décimos foram arredondados para cima; os abaixo de 0,5 décimos o foram para baixo.

Tabela 1 – Freqüência de alunos e alunas na Gibiteca

2. Cursos de histórias em quadrinhos do Solar do Rosário

Tabela de freqüência por sexo

Início do curso Final do curso Curso de HQ (semestral)83

feminino masculino feminino masculino

1º semestre de 2005

Sábados 10h às 12h 12 29 8 21

2º semestre de 2005

Sábados 10h às 12h 3 11 2 8

1º semestre de 2006

Sábados 10h às 12h 9 18 5 8

Nº de pessoas por sexo 24 58 15 37

Nº de pessoas no total 82 52

Percentual (29,27%)

29% (70,73%)

71% (28,84%)

29% (71,15%)

71%

Percentual aproximado de desistentes ao final dos cursos 37%

Obs.: Os números acima de 0,5 décimos foram arredondados para cima; os abaixo de 0,5 décimos o foram para baixo.

Tabela 2 – Freqüência de alunos e alunas no Solar do Rosário

83 O Solar do Rosário possui um único curso de HQs, aos sábados.

207

B – M

odelos de autorização utilizados para entrevistas no estudo exploratório e

estudo empírico

C – A

mostras de entrevistas realizadas no estudo exploratório e estudo em

pírico

UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA - UDESC / CEART Programa de Pós-Graduação - Mestrado em Artes Visua is

Caro professor (a), o seu grupo de alunos está sendo convidado para participar, como voluntário, em uma pesquisa. Após o grupo ser esclarecido sobre as informações a seguir, no caso de aceitar fazer parte do estudo, assine no final deste documento, em duas vias . Uma via é sua (professor do grupo) outra do pesquisador. Projeto de Pesquisa: As histórias em quadrinhos no ensino de Artes Visuais na perspectiva dos Estudos da Cultura Visual. Pesquisadora responsável: Telefone para contato: e-mail:

O objetivo desta pesquisa é investigar como os professores se utilizam de algumas manifestações artísticas do universo visual cotidiano, particularmente da Arte Seqüencial/histórias em quadrinhos no ensino de Artes Visuais. As informações obtidas contribuirão para estudo, reflexão e fundamentação de propostas alternativas para o ensino de Arte. A participação de seu grupo consiste em fazer parte de uma entrevista, que será realizada pela pesquisadora, sem qualquer prejuízo ou constrangimento para o grupo. Os procedimentos aplicados não oferecem risco à integridade moral, física, mental ou qualquer tipo de constrangimento e suas identidades serão totalmente resguardadas. As informações obtidas através da entrevista, serão utilizadas para alcançar os objetivos da pesquisa e dissertação de Mestrado. Caso haja desistência para fazerem parte da pesquisa, favor entrar em contato pelo telefone ou e-mail acima.

Contamos com sua colaboração para a concretização desta pesquisa.

Termo de consentimento de participação

Eu (nome),___________________________________________________________

R.G:_____________________________CPF________________________________

abaixo assinado (a), concordo em participar desta pesquisa. O grupo sob minha

orientação foi devidamente informado (a) pelo pesquisador

(a)____________________________, sobre a pesquisa e os demais procedimentos

envolvidos, bem como os benefícios decorrentes da participação. Foi me garantido

que eu e meu grupo podemos retirar nosso consentimento a qualquer momento.

Local: ___________________________________ Data _____/_____/_____

Assinatura: ________________________________________________________

UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA - UDESC / CEART Programa de Pós-Graduação - Mestrado em Artes Visua is

Caro professor (a), você está sendo convidado (a) para participar, como

voluntário(a), em uma pesquisa. Após ser esclarecido(a) sobre as informações a seguir, no caso de aceitar fazer parte do estudo, assine no final deste documento, em duas vias (uma via é sua, outra do pesquisador). Projeto de Pesquisa: As histórias em quadrinhos no ensino de Artes Visuais na perspectiva dos Estudos da Cultura Visual. Pesquisadora responsável: Telefone para contato: e-mail:

Em virtude das problemáticas do ensino de Arte atual, tal como a imensa proliferação de imagens, formação, ensino e prática ainda modernistas e que não atingem os objetivos para uma leitura crítica das imagens do amplo universo visual a que estamos expostos e, ainda, falta de conteúdos que façam sentido para professores e alunos, a finalidade desta pesquisa é investigar como os professores compreendem e utilizam algumas manifestações artísticas do universo visual cotidiano, particularmente a Arte Seqüencial/HQs. A pesquisa permitirá conhecer visões e concepções dos professores sobre esta arte no ensino de Artes. As informações contribuirão para estudos e fundamentação de propostas que auxiliem a interpretação crítica e que tenham conseqüências educativas.

A sua participação consiste em fazer parte de uma entrevista (semi-estruturada) que será realizada pela pesquisadora, sem qualquer prejuízo ou constrangimento para sua pessoa. Os procedimentos aplicados não oferecem risco à integridade moral, física, mental ou qualquer tipo de constrangimento. Sua identidade será totalmente resguardada. As informações obtidas através da entrevista, serão utilizadas para alcançar os objetivos da pesquisa e dissertação de Mestrado. Caso você não queira mais fazer parte da pesquisa, favor entrar em contato pelo telefone ou e-mail acima.

Contamos com sua colaboração para a concretização desta pesquisa.

Termo de consentimento de participação

Eu (nome),__________________________________________________________

RG.:__________________________CPF _______________________________, abaixo

assinado (a), concordo em participar desta pesquisa. Fui devidamente informado (a) pelo

pesquisador(a)___________________________, sobre a pesquisa e os demais

procedimentos envolvidos, bem como os benefícios decorrentes da participação. Foi me

garantido que posso retirar meu consentimento a qualquer momento.

Local: _____________________________________ Data ______/______/_____

Assinatura: ________________________________________________________

208

C) Amostras de entrevistas realizadas no estudo exploratório e estudo empírico 1) Amostra de entrevista realizada com o grupo da Gibiteca em abril de 2006

Entrevista nº 8 Nome fictício: "Scorpion" Idade: 16

Sexo: Masculino Feminino

Colégio que estuda: Santa Cândida Qual a série? 1º ano do Ensino Médio

O Colégio é :

Trabalha?

1. Qual foi o motivo que o levou a fazer um curso de histórias em quadrinhos?

Melhorar o desenho. Tentar aprender figuras humanas, porque eu desenho Mangás. 2. Você imita, desenha bastante Mangá? Pega revistas e copia?

Hum-hum. Estou tentando - até fazendo um gibizinho em quadrinhos lá em casa, mais ou menos. 3. (Comentando) Você estava compenetrado ali desenhando com aquela turminha. Você se concentra assim para

desenhar em casa também? É, mais ou menos. Quando estou desenhando eu me concentro bem para fazer bem feito o desenho.

4. (Comentário) Ah. É bom, se concentrar é ótimo para quem desenha, é uma qualidade... Então o motivo seu é melhorar o desenho. Fora este, você tem algum outro motivo? Pensa profissionalmente?

É. Tentar seguir carreira, também. 5. Você pensa mais tarde que isso vai ser útil para você?

É. Tentar ser desenhista... 6. Você está estudando?

Estou. 7. Que ano você está?

1º. 8. Primeiro ano do ensino médio?

É. 9. O que você está aprendendo no ensino médio, em Arte?

Perspectiva... hum... 10. Perspectiva? Onde você estuda?

Santa Cândida. 11. É colégio estadual?

É. 12. (Comentário) Nossa, que diferente...

Comentário de “B.” (outro membro do grupo): ___ Lá é muito bom, já estudei lá. É um modelo de colégio. 13. Você tem História da Arte também, ou só a parte técnica?

Mais ou menos. 14. Tem História da Arte também?

É. 15. Tem geometria?

Não. 16. Mas perspectiva, sim?

É. 17. (Comentário) Não é qualquer professor de Arte que ensina perspectiva...

Não, e lá é muito bom ! Comentário de “B.”: ___ É, é professora e ela é legal ainda !

18. É uma professora? É. Na última aula ela pediu para fazer um corpo em movimento. Só o corpo - sem a roupa com se fosse um rosto, mais ou

menos... 19. E você não gostou? Você deve ter adorado então, porque você gosta de desenhar!?

Risos do grupo. 20. (Comentando) Hoje em dia o que ensinam normalmente no ensino médio é História da Arte. E no ensino fundamental, teve alguma vez que o professor de Artes pediu para você fazer algum trabalho de histórias em quadrinhos?

Acho que na 5ª série, ou na 6ª série, tinha um professor que pedia para fazer aquele tipo de... 3 quadrinhos assim. Charge também, é... bem pouco, assim. 21. Uma vez, duas vezes ou quantas vezes?

Ah. Bem pouco assim. Acho que umas duas, ou três. 22. Mas em geral, o que vocês trabalhavam? Obras de Arte? História da Arte?

Minha professora do ano passado passava mais texto, não passava muita prática. Obrigada. [...]

Público

Sim Não

Particular

����

����

����

209

2) Amostra de entrevista individual realizada com os professores

Entrevista nº 5 Nome fictício: “Madelon” Idade: 50

Formação: Artes Plásticas – FAP Tempo que leciona Arte: 11 anos

Professor(a) de: Ensino Fundamental Ensino Médio

Turma(s) que leciona: Pré a 4ª, 5ª a 8ª e EJA

1. Madelon, qual sua formação? Que curso você fez, onde você se formou?

__ Estudei na Faculdade de Artes do Paraná e fiz a graduação e pós na FAP. A graduação que escolhi foi Artes Plásticas. 2. Você trabalha com Artes Visuais?

__ Sim. 3. Ensina outras linguagens?

__ Sim. Eu gosto muito de teatro. Eu uso bastante teatro também. 4. Você costuma trabalhar com imagens na sala de aula?

__ Bastante. 5. Que tipo de imagens?

__ Obras de artistas, mas tudo relacionado com o conteúdo que eu quero dar. Se for trabalhar junto com a professora de História ou de Português, eu pergunto para ela, o que ela está vendo, o que está trabalhando com o aluno, para aproveitar o conteúdo.

6. Você trabalha em conjunto com outros professores então? __ É, elas trabalham a parte delas. Mas aproveito dentro da arte o que acontece nesse período da História, mas como História da Arte mesmo.

7. E a obra? __ A obra também, a leitura daquela obra dentro do mesmo contexto.

8. Você trabalha a leitura, o contexto... __ A leitura da obra no contexto, o que era a obra, a época que foi feita e sempre procurando o lado que o aluno vai caminhando. Ele pede, ele pergunta. Então vou pelo interesse do aluno. Junto com o interesse dele, eu trabalho essa parte da leitura. Eu acho que a gente tem que dar subsídios para eles. Não só da pintura, da obra de arte em si, mas dos questionamentos que eles fazem. Eles vêm perguntando, perguntas deles, interesse deles.

9. Tem algumas obras que você aborda mais? Para uma série você trabalha tal obra, em outra série você trabalha com outra?

__ Isso. É como eu falei, vou caminhando junto, vou vendo o conteúdo para poder aproveitar. 10. Artistas internacionais, locais?

__ Locais também. Aqui de Curitiba. Primeiro eu pego aqui, o que eu posso trabalhar. Depois que trabalho Brasil, trabalho com os artistas de fora. Bastante ao redor primeiro, porque acho que diz respeito ao aluno.

11. Como você faz a leitura da imagem com os alunos? Você começa pela obra, ou pela História da Arte? Como você faz, leva a imagem?

__ Levo a imagem, daí faço eles fazerem uma leitura do que estão vendo. Eles dizem: “__Ah! Estou vendo isso, isso”. Eles vão fazendo uma listagem daquilo que eles vêem, e depois, a gente vai comentando. Depois eu falo da obra, do artista.

12. Depois que eles fazem essa leitura, você fala do artista? __ Depois que falar da obra - vou situar a obra em tempo e espaço, a partir daí vou falar dele, do artista, porque que o artista fez aquela obra, porque pintou, esculpiu.

13. Você entra um pouco no social? __ Isso, História da Arte.

14. Depois faz alguma atividade? __ Eles fazem atividade, por exemplo, estou trabalhando Frans Krajcberg. Primeiro mostrei a obra dele. Eles viram, acharam muito bonito: “__ Ah, que legal !” Começaram a perguntar porque ele fazia isso. Então foi interesse deles também. Assim fui contando, que ele começou fazer escultura a partir da árvore morta, e tal.

15. Você chegou a fazer uma escultura com eles? __ Não, estou na metade do caminho ainda com eles. Eles vão pesquisar fora o que acharem, para daí montar uma mini escultura. Uma coisinha assim, só para representar. Até tenho uma menina que mandou uma para mim, eu trouxe justo hoje.__ Olha! Bem simples. Ela não matou aquela árvore, porque ela me disse que estava no chão, ela juntou ou os galhinhos.

16. Comentário: Podia ser um Frans Krajcberg com ares “Art Nouveau”! __Você viu!? Então assim, ela já veio com ele todo amarradinho!

17. Mas ela já encontrou assim? __ Não, ela encontrou os galhinhos. Mas ela viu antes a obra do Krajcberg, então ela achou os galhinhos e pensou em fazer uma mini escultura com eles. Eles trabalham com isso, trabalham todo o contexto. Depois eles trazem revistas, livros, jornal sem eu pedir: “__ Olha! O que eu encontrei!” Bem legal. Trazem o que vêem, o que encontram.

18. Essa turma é de qual série? __ Essa turma é de 6ª série. Com a turma da noite, também vou fazer, com a EJA.

19. Com a 1ª a 4ª, também você vai fazer essa aula? __ Não, só com a 6ª. Com a 1ª a 4ª estou trabalhando a reciclagem do lixo. Porque eu trabalhei fundo do mar. Vou fazer uma escultura com eles, escultura de peixinho. Eles vão fazer no papel machê. Eles usam a criatividade deles. Mas primeiro a gente faz toda aquela parte. Faz a leitura, a parte teórica antes.

20. Então você trabalha dentro do fazer, ler e contextualizar, dentro desta linha? __ Sim.

21. Você também ensina sobre a linguagem dos quadrinhos? Já ensinou alguma coisa sobre isso?

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__ Só agora, por que estou fazendo com uma turma do sexto período, é 8ª série da EJA, noite, estou fazendo com eles. Estou trabalhando, porque a gente fez um projeto sobre o jornal, junto com outra professora. Ela já está vendo uma parte, o jornal. Da minha parte vou trabalhar com charge, com eles. O pessoal do jornal, da escola.

22. Quantas aulas você planejou para este trabalho? __ Três a quatro aulas mais ou menos.

23. Tem algum jornal específico que você vai usar? __ O que tiver. O que eles tiverem podem trazer também para poder aproveitar.

24. Como você vai desenvolver a atividade? __ Eu começo com quadrinhos, para poder entrar na charge. Começo com história dos quadrinhos, até chegar na charge.

25. Fala sobre o que é quadrinhos, o que é charge? __ Estou começando agora com eles o que é quadrinhos. A gente passa transparência, para eles entenderem melhor. Estou pegando quadrinhos do Ziraldo, da Ciça. Alguns quadrinhos fiz transparência e levei para a sala.

26. Esse trabalho é a primeira vez que você está fazendo? __ Primeira vez.

27. Faz quanto tempo que você leciona? __ Eu? Nossa, faz muito tempo.

28. Dez anos? __ Não. Vinte e poucos anos, mas é que Arte não tinha antes. Comecei bem depois.

29. Quando você começou em Arte? __ Comecei quando estava estudando. Porque não podia pegar aluno sem ser formada. Então eu pensei, vou estudar então, pelo menos encaminhando... vou ver se consigo trabalhar assim. Quando entrei na Prefeitura, pelo menos em 95 comecei a estudar.

30. A partir de 95, começou a dar aulas de Arte? __ De artes, mesmo.

31. Agora, você resolveu fazer esse projeto? E o que você pretende com ele, porque está desenvolvendo dessa maneira?

__ Eu peguei primeiro quadrinhos, para eles entenderem a seqüência de uma história e depois a simplificação. A charge é mais simplificada, você faz o desenho e não tem aquela seqüência, não precisa, nem a escrita. Você pega e já dá para ver, se é de um político, de um artista. O cartunista ele evidencia muito o desenho, na charge. Então pode ser uma frase só, uma palavra.

32. Para eles conseguirem retratar uma situação, representar através de uma charge? __ Isso. Assim o aluno vai para aquela parte do jornal que aquela professora está fazendo.

33. Então seu objetivo é esse, que eles consigam representar através de um fato? __ Sim. Eles vão ler um texto, alguma coisa, ou vão ouvir uma notícia, ou vão participar de algum evento na escola. Eles têm que usar a criatividade deles, também. O que eles acharem que evidencia aquele fato, aquele acontecimento eles vão colocar no trabalho. A gente vai tentar na escola, alguma coisa até da sala deles, para depois partir para um evento maior ou até uma notícia. Tem que ser assim, porque eu perguntei e eles nunca trabalharam, nunca fizeram.

34. Comentário: Sabe que em um jornal a charge vale como um artigo assinado? Já o cartum, no jornal, não tem o mesmo peso, não vale como artigo. E caricatura? Você vai trabalhar caricatura também?

__ Caricatura, não sei. Acho que não. Um ou outro que faz, que gosta. Mas a charge dá para trabalhar. 35. E o fato das HQs serem uma linguagem híbrida, uma linguagem que usa texto e imagem, você acha que atrapalha, dificulta?

__ Não. Até acho até melhor para eles entenderem, até para quando eles forem desenhar, no caso, eles tem que ver se a pessoa está correndo, se a pessoa está em movimento, ou ela está parada, então conforme eles vão se expressando ele vai ter que fazer o desenho também. É interessante porque associa as duas coisas. Eu tenho um livrinho, uma história em quadrinhos de um menino de 3ª série, que me deu de presente.

36. Ele fez sozinho? __ Fez. Vou te mostrar.

37. Comentário (enquanto ela mostrava): Não tem pessoas, alunos, que são mais visuais e outros que gostam mais de escrever, de fazer outras coisas ?

__ É, eu acho que a expressão, ou ele faz um desenho ou ele faz escrevendo. 38. E como você acha que o professor pode trabalhar com essa arte na sala de aula? Com uma 5ª ou 6ª série, por exemplo, como você poderia trabalhar com histórias em quadrinhos? Que tipo de histórias usaria? Que autor?

__ Eu partiria primeiro, do assunto que eles gostariam de abordar, primeira coisa. As vezes até sobre o corpo humano, numa 7ª série, não sei. Aquilo que eles tem necessidade de saber: __ Ah! Vamos falar sobre tal coisa. Eu sempre procuro os autores locais, primeiro (tem o Ziraldo, o Maurício de Souza). Mas no caso, eles teriam que fazer uma pesquisa, um estudo primeiro para ver do que se trata para depois começar a desenhar, a colocar a historinha, ou a fazer a historinha deles dentro daquele tema, daquele assunto. Acho que teria que ser bem pesquisado mesmo.

39. Um tempo atrás, diziam que os gibis ensinavam coisas erradas, tinham vocabulário pobre, podiam tornar a criança preguiçosa porque tinham muitas imagens. Então se acreditava que a criança seria prejudicada na leitura.

__ Só para ficar vendo as figurinhas ! 40. Sim, e diziam também que as cenas eram muito exageradas, que deformavam a realidade. Mas hoje até são recomendadas pelos PCN. Então esses conceitos mudaram, e as HQs hoje? O que você pensa sobre elas ?

__ Acho que mudou também. Mudou, e ficou mais voltado para a criança. Mesmo você pegando o gibi do Cebolinha, que fala o “L”, trocando pelo “R”, se você levar para a sala de aula e trabalhar o Português ali, brincando eles vão lendo, achando engraçado, rindo, participando com o professor, eles vão gravar melhor porque está errado – e daí colocar certo na linguagem culta. Acho que eles participam melhor, acho que foi feito mais para a criança mesmo. O Maurício de Souza, então, ele continuou com o Cebolinha dele, mas mais ajudando até.

41. E o que você acha sobre a violência nos desenhos - dos desenhos animados e das histórias em quadrinhos ? Tem bastante ?

__Tem, tem. Como tem. Até a Mônica, não é ? Ela também dá uns petelecos. Acho que eles exageram para poder dar ação na história. Ele começa a ler aqui, daí vai indo, indo, quando chega a certa altura na história, é tão... ou ela começa já. Você vai ver lá atrás, porque que aquela personagem estava tão furiosa, tão braba. Daí você vai ler toda a história. Acho que é mais nesse sentido.

42. E o que você acha que a criança pode aprender com esses desenhos?

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__ E acho que ela imita. A maioria das crianças imita. Lá na escola, esses dias estavam falando do “pai”: “__ Meu pai só falta colocar o rosto dele nessa capa aqui! ” Daí ele mostrou para mim, a figurinha que era o homem... como é, aquele de capa?

43. Super herói ... __ ... Super herói, bem, um super-herói. Pai herói, daí ele colocou.

44. (Ah, o Super-homem). __ Ele disse: “__ Professora, se eu colocar a fotografia do meu pai aqui, ele é igualzinho a esse homem”. Desse jeito! É admiração que eles tem, então eles imitam, querem fazer igual. Eles gostam, se identificam. Identificam com o pai.

45. E como você vê a questão dos gêneros nos quadrinhos? Como são representados o homem e a mulher? Lembrando alguns, tem as Superpoderosas, a Mônica, Magali, os super-heróis. Como você acha que a mulher é representada, e como o homem é representado? Como você vê isso?

__ Acho que é mais o visual mostram mais o corpo. Eles não querem tanto o que ela pensa, é mais o que ela representa visualmente. Já o homem, não. Mostra também um pouco - os músculos. Mas ele fala mais, ele manda mais. As palavras dele... mas isso aí, eu acho que é a nossa história, não é? A história nossa, feminina e masculina, está representada nos quadrinhos, o poder, a força, o medo. Nós poderíamos estar representadas como eles.

46. As HQs representam o ideal deles? __ A mulher bonita, toda cheia de curvas...você não vê uma que está mal. Nos quadrinhos ela aparece muito bonita, bem desenhada.. muito bonita. Então é mais o corpo, mais visual mesmo.

47. Tem muito editor que associa as histórias com uma série de objetos... __ Para vender!

48. Sim, para vender bonequinhos, joguinhos, CD... __ Tem álbum também.

49. E os alunos compram, colecionam, utilizam isso... __ Para brincar, brincam de “Bate-fafo”. 50. Como você acha que isso interfere na vida deles?

__ É, eu acho que ensina violência e o poder também: “__ Ah eu posso, você não pode!” Desde para comprar, até para ter, ter, ter. Tem gente que não tem na sala. Ficam brigando, as vezes eu recolho material. Recolho e digo assim:__ No final da aula, eu devolvo! Porque senão, eu não consigo dar a aula. Principalmente 3ª e 4ª série. Que incrível, a idade deles. Então eu digo: __ Olha, se alguém tiver algum brinquedo aqui na sala, enquanto eu estou explicando eu não quero. Depois que terminou a aula, bateu o sinal, devolvo para vocês pegarem novamente. Isso influencia até para você trabalhar, de tão importante que eles acham aquilo, de tanta importância que eles dão. E televisão ? Eles ficam em casa de manhã. As vezes eu pergunto: __O que vocês ficam fazendo? “__ Ah! Eu fico vendo televisão”. __ Mas a manhã inteira? Mas o que você faz? “__ Ah! Eu levanto 9 horas, tomo café e vou ver televisão”. __ E daí você não estuda? Não lê um pouquinho? Não faz a lição? “__ Não. Faço no sábado e no domingo”. Então eu questiono também. Porque eles ficam brincando e você vê. Tem a TV, tem histórias, depois mais a revistinha. Daí eles trazem para a escola o álbum de figurinhas, que eu digo que vou tomar se eles pegarem novamente.

51. Comentando: E esses? (mostrando uma revista dos Transformers que tínhamos em mãos). Tinha uma época que era moda o desenho desses robozinhos.

__ Ah, não, meu filho também! Nossa, a TV também! Ele era louco, louco por isso! Mas não tinha a revista assim ainda. Eu não comprava para ele. No desenho da TV, o robô se transforma em veículo, depois já não era mais um robô, era um homem [...].

52. Qual a sua opinião sobre o uso de HQ na sala de aula? __ Eu acho que você pode usar a HQ dependendo do objetivo que você quer atingir com aquilo. Se é reforçar a leitura, se é ensinar outras linguagens. Não pegar só o livro didático, só um texto que você leva.

53. Pode ter alguma vantagem ou dificuldade em trabalhar com HQ na sala de aula? __ Pode. A vantagem da diversidade. E a dificuldade é se o professor não souber encaminhar. Se ele der só para ler, por ler, também não adianta. As vezes até dá para dar uns 10 minutos no final da aula, para eles lerem um pouquinho, quem gosta e tal. Se você for encaminhar no trabalho da sala de aula, acho que tem que preparar muito bem. No caso, antes de começar com Artes, eu trabalhei na 4ª série, o Chico Bento. Falei da linguagem, disse que lá na roça eles falam assim, desse jeito. Não é errado, é o jeito deles, mas se for usar a língua padrão, a língua culta, não se pode falar dessa maneira. Tem que escrever e ler corretamente.

54. Você comentou do Maurício de Souza. E quais os estilos de quadrinhos que você conhece, independente de você trabalhar com eles na sala?

__ Ah! Que eu conheço? 55. Sim.

__ Como charge? 56. É, charge seria um desenho de humor.

__ É, charge, as tirinhas de humor, que são mais curtas que as histórias em quadrinhos. E mais, o que era? Charge, quadrinhos, tirinha – quadrinho que não é a história toda, como a Mônica é história toda que tem mais do que uma página. Também tem quadrinhos assim, com 5, 6 ou 8 páginas.

57. E fora Maurício de Souza, o que mais você conhece? __ A Mafalda, que tem histórias em quadrinhos, tem tirinhas. Do Jaguar também.

58. Você tinha mencionado para mim a Ciça. __ Ciça! Tinha falado a Ciça, e o nosso aqui, aquele que fez o Menino Maluquinho.

59. Ziraldo? __ Ziraldo. Tem vários. Tem um que sai agora, mais recente, aquele... “Los Manos”, os três. Ah como é? Los Três Hermanos. É, eles não querem falar Português, colocam todo um “portunhol”.

60. Seria um tipo de cartum ou uma charge? __ Isso.

61. Estava ótimo, obrigada ! __ De nada [...].

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D) Sinopse da mini-série Heróis Renascem Vingadores

A série Heróis Renascem Vingadores, pertence a Marvel Comics. É uma continuação da revista Vingadores e possui quatro títulos: Quarteto Fantástico, Heróis Renascem Vingadores, Homem de Ferro e Capitão América. O grupo chamado Vingadores foi criado em 1963 por Stan Lee e Jack Kirby e era originalmente formada pelos personagens Thor, Homem de Ferro, Vespa, Gigante e Hulk, mas mudou várias vezes de personagens. A Marvel costuma relançar os títulos quando as revistas começam a perder consistência ou o interesse dos leitores. Como estratégia para relançar os Vingadores, a Marvel simulou uma hecatombe de proporções cósmicas, causadas por um vilão mutante chamado Massacre, que fez desaparecer os Vingadores da face da Terra. Os Vingadores vão parar em um universo paralelo onde ficam exilados e tem suas vidas reformuladas. Assim surgiu a mini-série Heróis Renascem Vingadores. Uma equipe formada por Capitão América, Thor, Feiticeira Escarlate, Gavião Arqueiro, Espadachim, Felina e Visão. A história começa sem que os Vingadores se lembrem do conflito que aconteceu com o vilão Massacre. Nos capítulos dos fascículos de nºs 1 a 4, os Vingadores encontram Thor, congelado em uma pedra, na Noruega. Thor é convidado a fazer parte do grupo. Na volta para Nova York, os Vingadores encontram Hulk que se desloca sem rumo, destruindo tudo o que encontra pela frente. Sem saber quem é Hulk, os Vingadores travam uma luta com ele mas vão sendo derrotados um a um. No capítulo, nº 5 resta Thor que trava uma luta contra Hulk*. Do alto, o coronel Nick Fury, em um dos vários foguetes, que carregam a "principal força do mundo", observa a cena e achando que Thor acaba de ser morto pelo oponente - diz : "Magnífico, só tem quatro pessoas no planeta capazes de impedir isso. Uma é o Rei da Lavtéria. Outra é um Magnata Canalha. Tem ainda o Elástico Vivo. E a última está morta...". O capítulo termina mostrando Hulk vencendo Thor. Nos capítulos seguintes (fascículos nºs 6 a 12), Hulk volta a seu estado “Bruce” e vai para a sede do Quarteto Fantástico onde é reconhecido por um deles, como o Dr. Bruce Banner. A Ilha de Nova York entra em perigo por causa dos estragos causados por Hulk. O reator gama está avariado e ameaça destruir tudo. Loki, inimigo de Thor e dos Vingadores, faz uso das energias do reator para aumentar sua força e materializar outros inimigos para combater os Vingadores. Thor consegue vencê-lo também fazendo uso da energia do reator. Quando todos pensam que o perigo acabou, surge o Dr. Victor Von Doom, dizendo que chegou Galactus e este irá destruir a todos se não unirem suas forças. Dr. Victor Von Doom tem um plano para ficar com o poder sobre o mundo, colocando os todos os heróis do mundo e os Vingadores contra Galactus. Com estes inimigos enfraquecidos Von Doom poderá tomar posse de tudo. Mas Galactus vence a batalha. Para destruir Galactus e impedir que ele também tome posse de outros mundos, como vinha fazendo sem parar, os Vingadores, com o auxílio do Dr. Bruce Banner, destroem o reator. A destruição faz com que o planeta Terra e tudo o mais desapareça, restando o nada. * A imagem utilizada como exemplo para o Instrumento de Mediação e Análise Crítica, é uma

cena desta luta.

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