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CRDA – CENTRO DE REFERÊNCIA EM DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM ELAINE CRISTINA CASTELLO COMO A ESCOLA PODE AJUDAR CRIANÇAS COM DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM NA MATEMÁTICA OU DISCALCULIA? SÃO PAULO 2009

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CRDA – CENTRO DE REFERÊNCIA EM

DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM

DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM

ELAINE CRISTINA CASTELLO

COMO A ESCOLA PODE AJUDAR

CRIANÇAS COM DIFICULDADE DE

APRENDIZAGEM NA MATEMÁTICA OU

DISCALCULIA?

SÃO PAULO

2009

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CRDA – CENTRO DE REFERÊNCIA EM

DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM

DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM

COMO A ESCOLA PODE AJUDAR CRIANÇAS

COM DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM NA

MATEMÁTICA OU DISCALCULIA?

ELAINE CRISTINA CASTELLO

Monografia apresentada como parte dos requisitos para aprovação no Curso de Especialização Lato Sensu em Distúrbios de Aprendizagem e submetida ao Centro de Referência em Distúrbios de Aprendizagem – CRDA, sob orientação do prof. Ms. Iraci José Francisco.

SÃO PAULO

2009

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Dedico este trabalho a meus

queridos Roberto e Victor, pelo

carinho em entender minha

ausência e pelo apoio sempre

presente.

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Agradecimentos

Fazer o curso de Especialização em Distúrbios de Aprendizagem

foi uma oportunidade única, por isso, agradeço a minha vivência

profissional e ao meu esforço pessoal em buscar conhecimento e novas

idéias para poder contribuir com aqueles que possuem distúrbios de

aprendizagem.

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Resumo: Como a Escola Pode Ajudar Crianças com Difi culdade de

Aprendizagem na Matemática ou Discalculia?

Este trabalho teve por objetivo refletir sobre o papel das atividades lúdicas

cooperativas na aprendizagem de crianças com distúrbios de aprendizagem, no

caso a discalculia e no processo de aprimoramento do relacionamento interpessoal

no contexto escolar, na visão dos alunos e professores. Para tanto, foi elaborada

uma revisão literária sobre os elementos teóricos envolvidos e uma pesquisa

exploratória sobre o tema. O estudo foi desenvolvido por meio da análise das

atividades cooperativas, e como seria possível integrar dois temas amplos como os

Jogos Cooperativos e a Discalculia. Após a análise dos dados, interligamos os

temas e descobriu-se a importância que os Jogos Cooperativos têm para o processo

ensino-aprendizagem. O desenvolvimento social é um fator de extrema importância

em todos os segmentos da vida, especialmente no que tange à criança e seu

processo de aprendizagem, o fator da qualidade do relacionamento interpessoal é

primordial para o sucesso ou o fracasso de seu envolvimento no âmbito da escola.

Tendo os jogos como parte do processo educativo, aprende-se a reconhecer a

própria autenticidade e a expressá-la espontânea e criativamente. Jogando

cooperativamente tem-se a chance de considerar o outro como um parceiro, um

solidário, em vez de tê-lo como adversário, operando para interesses mútuos e

priorizando a integridade de todos.

Palavras-chave : jogos cooperativos, escola, relacionamento interpessoal, distúrbios

de aprendizagem, discalculia.

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Abstract: As the school can help children with learning diffi culties in mathematics or Discalculia?

This work aimed to reflect on the role of cooperatives in recreational activities for

children with learning disorders of learning, where the discalculia and in the

improvement of interpersonal relationships in the school context, the vision of

students and teachers. Thus was established a literary review on the theoretical

elements involved and a survey on the subject. The study was developed through the

analysis of cooperative activities, as would be possible to integrate two broad themes

such as Cooperative Games and Discalculia. After analyzing the data, linking the

issues and the importance it was discovered that the Games are cooperative for the

teaching-learning process. Social development is a factor of extreme importance in

all segments of life, especially in regard to children and their learning process, the

factor of quality of interpersonal relationships is paramount to the success or failure

of their involvement within the school. Since the games as part of the educational

process, learn to recognize their own authenticity and express it spontaneously and

creatively. Playing cooperatively has the chance to consider the other as a partner, a

supportive, rather than having you as opponents, working for mutual interests and

prioritizing the integrity of all.

Key Words: cooperative games, school, interpersonal relationships, learning disorders, discalculia

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Índice

Introdução ............................................................................................................. 09

Objetivo Geral ..................................................................................................... 12

Objetivos específicos .......................................................................................... 12

Metodologia ........................................................................................................ 12

Resultado e Discussão:

Capítulo 1 – Discalculia: O que significa isso?...................................................... 13

1.1- O que são Dificuldade e Distúrbio de Aprendizagem?.................... 16

1.1.1- O que é dificuldade de aprendizagem?................................. 17

1.1.2- O que é Distúrbio de Aprendizagem?...................................19

Capítulo 2 - As Dificuldades ou Transtornos no Ensino da Matemática................ 28

2.1- Os Jogos e os Processos de Aprendizagem.................................... 33

2.1.1- Piaget.....................................................................................38

2.1.1.1- A aprendizagem na concepção de Jean Piaget.........40

2.1.2- Vygotsky.................................................................................47

2.1.2.1. A construção do pensamento complexo e do

Abstrato.....................................................................................49

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Capítulo 3 – Os Jogos Cooperativos e os Distúrbios de Aprendizagem...............51

3.1- Características e princípios dos jogos cooperativos......................... 55

3.2- Atividades cooperativas na escola....................................................56

Conclusão ............................................................................................................. 61

Referências bibliográficas .................................................................................... 64

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Introdução

O assunto abordado neste trabalho tem como objetivo central, contribuir com o

educador para que este compreenda o jogo, do lúdico e dos jogos cooperativos

como espaço primordial para a aprendizagem de crianças com distúrbios de

aprendizagem.

Os jogos são mediadores das relações com o meio, com o outro, com a

realidade e com os conteúdos. A criança quando brinca interage com um grande

número de pessoas, permitindo um aprendizado significativo, de auto-descobertas,

assimilando e interagindo com o mundo por meio de relações e vivências.

Assim, pode-se dizer que o jogar é um dos processos facilitadores da

construção psicossocial. É preciso considerar que os jogos e as brincadeiras não

definem um saber pronto e acabado, mas que se alteram em função da cadeia

simbólica, imaginária e real.

A brincadeira na Educação Infantil e no Ensino Fundamental é fundamental

para o desenvolvimento da criança, devendo ser mais trabalhada pelos docentes

que atuam nesta área.

O problema mobilizador desta monografia reside em compreender como os

jogos e os jogos cooperativos podem contribuir para o processo de aprendizagem de

crianças das séries iniciais que apresentam distúrbios de aprendizagem, mais

especificamente a discalculia.

Sabe-se que não existe melhor maneira de se aprender um conteúdo que não

seja de uma forma lúdica e natural. Através da música, das brincadeiras, o jogo se

torna claro e objetivo no desenvolvimento dessas crianças. A quantidade de

informações e conteúdos que os professores, muitas vezes tentam transmitir a seus

alunos é um obstáculo bem difícil de ser superado.

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Quando existe a desvalorização do movimento natural e espontâneo da

criança em benefício do conhecimento formal, expulsando o brinquedo e a

ludicidade de um espaço escolar de liberdade e integração, o conhecimento e a

aprendizagem ficam defasadas, longe da realidade dos alunos. Ao se ignorar as

dimensões educativas da brincadeira e do jogo como forma particularmente

poderosa de estimulação, a vida social e a atividade construtiva da criança ficam

prejudicadas.

Estamos em um mundo estruturado por relações materiais, sociais,

emocionais e cognitivas que organizam as vidas cotidianas das crianças e de suas

relações com o mundo. Nesse contexto, elas constituirão suas identidades como

crianças e como membros de um grupo social ativo. Não deveriam ser vistas como

sujeitos passivos que apenas incorporam a cultura adulta que lhes é imposta, sendo

tratadas como adultos em miniatura, mas como sujeitos que, interagindo com esse

mundo, criam formas próprias de compreensão e de ação sobre a realidade. Este

contexto que se vive hoje constrange suas ações e lhes deixa à mercê de um mundo

sem possibilidades.

O jogo é um importante integrador entre os aspectos motores, cognitivos, e

sociais, assim, parte-se do pressuposto de que é brincando e jogando que a criança

ordena o mundo a sua volta, assimilando experiências e informações, e acima de

tudo, incorporando atitudes e valores que serão importantes para sua vida adulta.

Já houve e há vários olhares e muitas formas de se atender aos distúrbios de

aprendizagem. Alguns organizam aulas de reforço da recuperação do conteúdo não

compreendido ou organizam outras maneiras de se ensinar o mesmo. Há aqueles

que se detêm no desenvolvimento cognitivo e adéquam os programas e recursos

didáticos ao aprendiz; atendem aos pré-requisitos, à retenção de informações, à

reeducação. Muitos cuidam das questões que transversalizam os momentos do

aprender. Às vezes envolvem as famílias, se preocupam com o meio sócio-cultural,

com o psiquismo e as relações com o inconsciente. Outros tentaram e tentam

atender às dificuldades sociais e financeiras fornecendo o alimento e material básico

para a aprendizagem da escola, em especial; observam o organismo e suas

necessidades de sobrevivência.

Observa-se na sociedade atual uma deterioração completa de valores

humanos que tem reflexos na escola e nos alunos. O Ser do Homem no mundo

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globalizado está cada vez mais egoísta e materialista, e a sociedade cada vez mais

dividida em classes sociais desiguais, de ordem financeira e moral, o que torna o

consumo tão explorado ultimamente, acessível somente para alguns e a violência e

a criminalidade um resultado natural da natureza humana.

A injustiça social que se impõe tem continuidade na escola quando

educadores não se preocupam com a formação do aluno de maneira integral, como

cidadão para a vida social, quando os valores que representam são os do poder

dominante e não possibilitam a educação comprometida com a transformação social,

com a cooperação e com o humanismo.

Assim, para transformar o contexto em que se vivem milhares de crianças,

portadoras de distúrbios de aprendizagem, numa sociedade violenta, intolerante,

injusta e agressiva, é necessário que se tenha em mente quais pressupostos

axiológicos se pretende desenvolver, a serviço de quem e para quê, não perdendo o

foco de ação pedagógica, a aprendizagem prazerosa e ativa.

Parafraseando Brotto (1997):

Em resumo, a lógica proposta pelo Jogo Cooperativo, enquanto Pedagogia da Cooperação, é uma lógica dialógica, que busca uma sinergia entre Visão-e-Ação, Teoria-e-Prática, Sonho-e-Realidade, Todo-e-Parte, Indivíduo-e-Coletivo e Cada Um-Consigo Mesmo. Enfim, entre tudo e todos que se acham isolados, separados ou em oposição uns aos outros. (BROTTO, 1997:88)

Dependem apenas de cada educador, pai, adulto que conheça uma criança

com distúrbios de aprendizagem, preparar um ambiente favorável para a

aprendizagem, com um clima de cooperação, amizade e companheirismo.

Lembrando a música de Guilherme Arantes, que um dia a escola e os

educadores entendam que o ganhar deve ser coletivo e não isolado, para que a

aprendizagem seja total e não dividida, que seja compartilhada e não guardada:

Vivendo e aprendendo a jogar,

nem sempre ganhando,

nem sempre perdendo,

mas aprendendo a jogar. (GUILHERME ARANTES)

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Objetivo Geral

O objetivo geral deste trabalho é levantar algumas hipóteses sobre a

aprendizagem de crianças com discalculia, demonstrando a importância dos Jogos

Cooperativos no desenvolvimento de alunos com este distúrbio mostrando, através

de uma pesquisa bibliográfica que é possível uma aprendizagem significativa apesar

das dificuldades a serem enfrentadas.

Objetivos específicos

Temos como objetivos específicos do trabalho:

- Entender o que é discalculia e como ajudar crianças com este distúrbio;

- conhecer as dificuldades destes alunos em sala de aula, estimulando professores a criarem

um ambiente de cooperação;

- estimular o uso dos Jogos Cooperativos como auxílio na aprendizagem e no relacionamento

interpessoal da sala de aula com alunos que apresentam distúrbios de aprendizagem.

Metodologia

Utilizou-se a técnica de documentação indireta como metodologia de

pesquisa, onde através da leitura de livros específicos sobre o assunto e um

levantamento bibliográfico sobre o mesmo, através de diversos autores que tratam

do assunto em questão. Utilizou-se a metodologia da Análise de Conteúdo.

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Foram consultados livros, apostilas, revistas, sites da Internet e artigos

específicos de revistas especializadas e congressos.

Resultado e Discussão:

Capítulo 1 – Discalculia: O que significa isso?

Muito tem se discutido sobre as metodologias e os conteúdos ensinados na

escola, querendo-os relacionar com o que as crianças trazem de bagagem de sua

vida anterior à escolar.

Sabe-se que muitas crianças fazem contas de cabeça, utilizando a

matemática de maneira peculiar, resolvendo problemas como: Quantas sementes

devem ser plantadas aqui? Qual será o formato ideal para a plantação de papai

(isso é geometria)? Quanto de adubo deve ser colocado para esta quantidade de

pés plantados (isso é proporcionalidade)?

Outras muitas vezes não sabem como armar estas contas. Utilizam-se do

conceito matemático da porcentagem, dos juros, mas não sabem como colocá-las

no papel. Outras modificam mecanismos adotados na escola, por outros criados por

eles mesmos ao tentarem simplificar as contas que necessitam fazer em seu dia-a-

dia.

Discussões sobre o tema são inúmeras. O papel dos integrantes do processo

ensino-aprendizagem, o professor e o aluno são vistos e revistos, onde se tenta

modificar as abordagens para que se possa favorecer o processo.

Inicia-se aí um choque de idéias, comportamentos e conceitos, pois a escola,

estagnada em velhos conteúdos ensinados com velhas metodologias, faz com que

esta criança fique muito distante do mundo real, do mundo onde ela vive e utiliza a

matemática. Obrigam-lhes a aprender uma matemática que não é usual e que só

entenderão a funcionalidade mais tarde, se forem crianças sem dificuldades ou

ainda sem distúrbios da matemática.

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Apesar de todas estas discussões o fato é que: crianças ainda saem das

escolas de ensino básico sem saber matemática ou com grande dificuldade nas

operações fundamentais, soma, subtração, divisão e multiplicação. Uns afirmam que

as dificuldades na área da matemática advêm de inabilidades cognitivas e fatores

emocionais, outros acusam o sistema educacional, questionando a unidade escolar

e a capacitação dos professores frente à matemática.

O que realmente se constata é que muitas crianças apresentam dificuldade

de aprendizagem na matemática e aí começa nossa pesquisa sobre o assunto que

tanto preocupa pais, educadores e a sociedade em geral.

Hoje, nas escolas encontramos muitas crianças afirmando não gostar da

matemática, acham-na difícil, chata, nada ou pouco estimulante. Algumas, realmente

não têm afinidade com a matéria, mas outras não conseguem aprendê-la por

apresentarem uma dificuldade de aprendizagem na matemática. Cabe aos pais e

professores, que lidam diretamente com estas crianças observarem as

características e as dificuldades que elas apresentam para ajudarem estas crianças

num diagnóstico adequado. Pode ser um Transtorno da Matemática.

O Transtorno da matemática possui características muito específicas, onde a

criança não consegue sistematizar as operações aritméticas, interferindo seriamente

no rendimento escolar e mesmo nas atividades do dia-a-dia que envolvam

habilidades matemáticas.

Um dos transtornos mais conhecidos é a Discalculia, que pode ainda ser

acompanhada por comorbidades, como transtornos de leitura e escrita e muitas

vezes, em crianças disléxicas.

A discalculia é uma dificuldade em tudo o que está relacionado à matemática.

Manifesta-se, principalmente em crianças e não está relacionada à deficiência

mental, deficiências visuais e auditivas, nem falta de recursos da escola e dos

professores. Segundo Garcia (1998): “A discalculia está relacionada às crianças, é

evolutiva e não é lesional”. (GARCIA, 1998:12)

Neurologicamente falando, a discalculia ocorre através de uma má formação

neurológica e provoca transtornos de aprendizagem relacionados a números,

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operações matemáticas, classificação e sequência numérica. Também está

relacionada a uma dificuldade em aplicar a matemática na vida cotidiana e em

entender os conceitos matemáticos e como eles acontecem. Estudos ainda não são

suficientes para afirmar a causa dessa má formação, mas acredita-se que pode ser:

neurobiológica, epidemiológica ou genética.

Por manifestar-se em crianças, a discalculia pode ser observada já na idade

pré-escolar, onde são introduzidos termos e conceitos matemáticos concretos como

igual-diferente. Ela também não consegue compreender os termos utilizados para

definir as habilidades matemáticas. Para elas, compreender as relações de

quantidade, ordem, espaço, distância e tamanho são extremamente complicadas.

Mais tarde, quando se dá à aprendizagem de símbolos e conceitos mais

específicos, a dificuldade tende a ser acentuada. Chega à hora de procurar ajuda

para que o transtorno seja diagnosticado e a criança possa iniciar a terapia.

Para estas crianças, a tabuada e as ordens numéricas são muito

complicadas. Apresentam grande dificuldade em:

- posicionar corretamente os números ao escrevê-los,

- nas operações básicas (soma, subtração, divisão e multiplicação),

- memorizar fórmulas e cálculos,

- distinguir os símbolos matemáticos e

- os termos matemáticos.

Muitas vezes chamadas de “preguiçosas”, por não fazerem as atividades

solicitadas como cópias de problemas da lousa e saber qual é a operação a ser

utilizada para se resolver um problema ou questionamento, são discriminadas, por

professores e incompreendidas pelos pais e colegas, servido de chacota entre o

grupo social.

Faz-se importante neste momento entender o que são as dificuldades e

distúrbios de aprendizagem e como não se aprende, para viabilizar técnicas e

metodologias que auxiliem essas crianças a aprenderem. Conhecer como se

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aprende, é importante para se compreender porque não se aprende. Somente desta

maneira quem ensina e quem aprende podem entender melhor este mecanismo tão

complexo.

1.1- O que são Dificuldade e Distúrbio de Aprendiza gem?

Sabe-se que a emoção é a mola que impulsiona o pensar, e esta pulsão é

construída na convivência com pessoas de culturas diversas, com modos de pensar

e sentir diferentes.

Organizar aulas de reforço da recuperação do conteúdo não compreendido,

organizar outras maneiras de se ensinar o mesmo conteúdo já tantas vezes

explicado, adequar os programas e os recursos didáticos ao aprendiz e sua

capacidade cognitiva, saber se ele possui os pré-requisitos para reter as

informações, buscam a reeducação, enquanto outros transversalizam os momentos

do aprender.

Através das diversas abordagens que existem hoje em dia, os termos para

definir os problemas de aprendizagem diferem, por isso é importante conhecer dois

deles que irão permear nosso estudo.

Defensores da Abordagem Comportamental utilizam o termo distúrbio e os da

Abordagem Construtivista usam o termo dificuldade. A distinção entre será o tema

deste tópico, para que não haja dúvidas.

O termo distúrbio de aprendizagem está diretamente vinculado ao aluno, pois

podem existir comprometimentos neurológicos e funções corticais específicas, sendo

utilizado com maior freqüência no atendimento clínico ou remediativo.

O termo dificuldade está diretamente relacionado a problemas de ordem

psicopedagógica ou sócio-culturais, onde o problema não tem o aluno como centro.

Geralmente é utilizado numa visão preventiva.

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Abordaremos os dois termos, mas enfatizaremos o termo distúrbio ao

referirmo-nos a discalculia, tema de nosso trabalho; salientando quão importante se

faz entender o desenvolvimento do indivíduo holisticamente!

1.1.1- O que é dificuldade de aprendizagem?

Entender as dificuldades de aprendizagem e como elas acontecem nas séries

iniciais é o objetivo deste artigo, que buscará, através da pesquisa bibliográfica

mostrar os diversos caminhos a serem percorridos pela educação para amenizar o

sofrimento de muitas crianças.

As dificuldades de aprendizagem na escola podem ser consideradas uma das causas que

podem conduzir o aluno ao fracasso escolar. É importante ressaltar que as dificuldades de

aprendizagem são momentâneas. Não podemos desconsiderar que o fracasso do aluno também

pode ser entendido, como um fracasso da escola, por não saber lidar com a diversidade dos seus

alunos. É preciso que o professor atente para as diferentes formas de ensinar, pois, há muitas

maneiras de aprender. O professor deve ter consciência da importância de criar vínculos com os seus

alunos através das atividades cotidianas, construindo e reconstruindo sempre novos vínculos, mais

fortes e positivos.

O aluno, principalmente o das séries iniciais, ao perceber que apresenta dificuldades em sua

aprendizagem, muitas vezes começa a apresentar desinteresse, desatenção, irresponsabilidade,

agressividade etc. Segundo Bossa (2000): “A dificuldade acarreta sofrimentos e nenhum aluno

apresenta baixo rendimento por vontade própria.” (BOSSA, 2000, p.46)

Por muitos anos responsabilizaram-se apenas os alunos pelo fracasso escolar, pelas

dificuldades de aprendizagem. Esqueceu-se das dificuldades orgânicas, da relação entre o professor

e o aluno, a relação entre os colegas de classe, as dificuldades sociais e financeiras, entre outras.

Neste momento torna-se importante entender como se dá o processo de aprendizagem no

aluno, não nos esquecendo que os primeiros ensinantes são os pais, pois com eles aprendem-se as

primeiras relações sociais e ao longo do desenvolvimento, ela é aperfeiçoada. Estas relações, já

constituídas na criança, ao chegar à escola, influenciarão na produção deste indivíduo. Uma dinâmica

familiar saudável, onde haja uma relação positiva de cooperação, de alegria e de motivação ajudará a

criança nesta nova etapa de sua vida.

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As dificuldades de aprendizagem escolar vêm sendo estudadas desde a

década de 30, quando foi percebido o fato de crianças inteligentes não conseguirem

aprender a ler e a escrever. Antes dessa época, aquelas que não conseguiam ser

alfabetizadas eram desprezadas para cursar o estudo acadêmico e eram tidas como

preguiçosas ou com pouca inteligência. À medida que os estudos neuropsicológicos

e psiconeurológicos avançavam, alguns pesquisadores voltaram-se para o problema

do não conseguir ler e escrever, e de acordo com sua formação científica básica e

suas crenças teóricas, iam explicando as dificuldades de aprendizado, enfatizando

mais um ou outro aspecto, como perspectiva causal dessas dificuldades.

Os termos "Dificuldade de Aprendizagem" e "Distúrbios de Aprendizagem"

começaram a despertar interesse à medida que o ingresso às escolas se desligou

das elites e se democratizou. Estes dois termos têm diferenças básicas que valem a

pena serem mais estudadas.

Até o século XIV a entrada para a escola acontecia por volta aos 13 anos e, além disso, não eram todas as crianças de uma família que iam para a escola. O aprendizado das tarefas ligadas à economia familiar era mais importante que o aprendizado da leitura, da escrita e do cálculo matemático. (BARBOSA, 2002)

O médico era o único que fornecia um diagnóstico da criança com dificuldade

ou distúrbio de aprendizagem e isso aconteceu durante muito tempo. A família e a

escola esperavam o resultado ansiosamente confirmando ou negando a hipótese de

dificuldade.

Os casos de dificuldades ou distúrbios detectados, até bem pouco tempo

atrás, levava a criança às salas chamadas classes especiais, que diziam oferecer

um ensino diferenciado, mas essa atitude rotulava a criança e fazia com que ela

fizesse parte de um meio social marginalizado, sem oportunidades de estímulos e

aprimoramento de suas potencialidades. O que víamos é que, por apenas uma

opinião isolada, muitas crianças em sua tenra idade eram marcadas ao fracasso,

como pessoas incapazes de criar e de produzir conhecimento.

Hoje ainda prevalece muito do preconceito do passado, pois as dificuldades e

as pessoas que as têm são consideradas fora do padrão, um desvio de

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comportamento, principalmente na escola e nas séries iniciais. Tratam-nas, muitas

vezes como pessoas sem corpo, sentimentos, dotadas apenas por uma cabeça e

esta com um problema.

1.1.2- O que é Distúrbio de Aprendizagem?

O conceito de Distúrbio de Aprendizagem, quando analisados por Collares e

Moysés (1992), do ponto de vista etimológico, é o conceito proposto pelo National

Joint Comittee for Learning Disabilities, dos Estados Unidos, (Comitê Nacional de

Dificuldades de Aprendizagem).

Assim, segundo Collares e Moysés (1992):

Etimologicamente, a palavra distúrbio compõe-se do radical turbare e do prefixo dis. O radical turbare significa “alteração violenta na ordem natural” e pode ser identificado também nas palavras turvo, turbilhão, perturbar e conturbar. O prefixo dis tem como significado “alteração com sentido anormal, patológico” e possui valor negativo. O prefixo dis é muito utilizado na terminologia médica (por exemplo: distensão, distrofia). Em síntese, do ponto de vista etimológico, a palavra distúrbio pode ser traduzida como “anormalidade patológica por alteração violenta na ordem natural” . (COLLARES E MOYSÉS, 1992:32)

Para elas, a expressão Distúrbios de Aprendizagem tem o mesmo significado

de “anormalidade patológica por alteração violenta na ordem natural da

aprendizagem”. Assim, entende-se que um Distúrbio de Aprendizagem afeta ao

indivíduo de maneira individual e orgânica.

Esta expressão tem tomado um vulto grandioso nas escolas e tem sido muito

usado pelos professores, apesar de muitos deles não conseguirem explicar clara e

corretamente o significado dessa expressão, dentro das instituições escolares. Para

Colleres e Moysés (1992):

A utilização desmedida da expressão distúrbio de aprendizagem no

cotidiano escolar seria mais um reflexo do processo de patologização da

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aprendizagem ou da biologização das questões sociais. (COLLARES E

MOYSÉS, 1992:33)

O National Joint Comittee for Learning Disabilities (Comitê Nacional de

Dificuldades de Aprendizagem), estabelecido em 1981, define Distúrbios de

Aprendizagem, in Collares e Moysés (1992) como:

Distúrbios de aprendizagem é um termo genérico que se refere a um grupo heterogêneo de alterações manifestas por dificuldades significativas na aquisição e uso da audição, fala, leitura, escrita, raciocínio ou habilidades matemáticas. Estas alterações são intrínsecas ao indivíduo e presumivelmente devidas à disfunção do sistema nervoso central. Apesar de um distúrbio de aprendizagem poder ocorrer concomitantemente com outras condições desfavoráveis (por exemplo, alteração sensorial, retardo mental, distúrbio social ou emocional) ou influências ambientais (por exemplo, diferenças culturais, instrução insuficiente/inadequada, fatores psicogênicos), não é resultado direto dessas condições ou influências. (COLLARES E MOYSÉS, 1992: 32)

É importante ressaltar que o National Joint Comittee for Learning Disabilities

(Comitê Nacional de Dificuldades de Aprendizagem) é o órgão mais capacitado dos

Estados Unidos em normatizar tudo o que está relacionado a Distúrbios de

Aprendizagem. Collares e Moysés (1992), afirmam que:

A fim de prevenir a ocorrência de erros de interpretação o Comitê publicou a definição acima apresentada com explicações específicas ao longo de cada frase. (COLLARES E MOYSÉS, 1992: 32)

Conforme a afirmação citada acima, vê-se que quando o Comitê se

refere à “estas alterações são intrínsecas ao indivíduo e presumivelmente

devidas à disfunção do sistema nervoso central” ((COLLARES E MOYSÉS, 1992:

32), está sugerindo que a explicação para a fonte do distúrbio pode ser

encontrada no Sistema Nervoso Central, ou seja, é interna ao indivíduo. Assim,

para um diagnóstico preciso é necessário conhecer o indivíduo, observando-o

e fazendo exames no Sistema Nervoso Central para que um Distúrbio de

Aprendizagem possa ser detectado.

Segundo Ross (1979) apud Miranda (2000):

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A utilização do termo “distúrbio de aprendizagem”, chama a atenção para a existência de crianças que freqüentam escolas e apresentam dificuldades de aprendizagem, embora aparentemente não possuam defeitos físicos, sensoriais, intelectuais ou emocionais. Esse rótulo ocasionou durante anos que tais crianças fossem ignoradas, mal diagnosticadas ou maltratadas e as dificuldades que demonstravam serem designadas de várias maneira como “hiperatividade”, “síndrome hipercinética”, “síndrome da criança hiperativa”, “lesão cerebral mínima”, disfunção cerebral mínima”, “dificuldade de aprendizagem” ou “disfunção na aprendizagem.” (ROSS (1979) apud MIRANDA, 2000:34)

Há um pouco mais de uma década, pudemos perceber algumas mudanças

com relação ao atendimento e acompanhamento das crianças com dificuldade de

aprendizagem, principalmente com os avanços das pesquisas em neurologia,

psicologia, psicanálise e até mesmo da pedagogia. Descobriram-se as muitas

potencialidades existentes nas crianças com dificuldade de aprendizagem, pois seus

cérebros, mesmo lesionados, em muitos casos, tinham condições de reconstituir-se

e garantir assim seu funcionamento.

A psicologia, através da psicanálise pode contribuir com a descoberta de que

a criança é dotada de sentimentos e que juntamente com sua vida intra-uterina

poderiam influenciar em sua aprendizagem e no seu comportamento, através de

suas experiências positivas ou na maioria das vezes negativas.

A Pedagogia repensou sua prática, através de uma investigação profunda

sobre a relação ensino-aprendizagem e as dificuldades de aprendizagem, tornando

mais suave a jornada dessas crianças na escola.

Todos estes profissionais, atuando integradamente, como uma equipe

multidisciplinar, mostraram que é possível haver aprendizagem relevante em

crianças com as mais diversas dificuldades.

Com o surgimento da psicopedagogia e dos especialistas em Distúrbios de

Aprendizagem, as pesquisas e os tratamentos das crianças com dificuldade e

distúrbios de aprendizagem tornaram-se mais intensos, pois ao estudar as

dificuldades, procura-se mecanismos de ajuda à criança em questão, adaptando-a

ao mundo onde ela vive, encontrando maneiras favoráveis para que ela lide com

suas dificuldades de maneira positiva.

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Apesar de suas muitas definições, o conceito de dificuldade de aprendizagem,

pode gerar divergências, pois muitas vezes pode ser confundido com necessidades

educativas especiais ou mesmo, com inadaptações por déficit socioambiental, entre

outros termos equivocados e que não condizem com a realidade.

Segundo Jardim (2001), 15% das crianças nas séries iniciais apresentam

dificuldades de aprendizagem, que exigirão uma maior atenção das escolas,

precisarão de atividades extra-classe para superar suas dificuldades e farão com

que os professores tornem-se especialistas em leitura, escrita e cálculo, para

preparar melhor estes alunos.

Moojen (2002) afirma que:

Por exemplo, o método da escola pode dificultar a aprendizagem de uma criança com dificuldades na percepção visual quando se utiliza métodos visuais em que se enfoca o ensino de frases e textos. Neste caso métodos auditivos são mais indicados. Assim, o professor deve ter a capacidade de identificar o melhor para a criança utilizando, se possível, variação metodológica dentro da sala de aula. (MOOJEN, 2002:48)

O papel do professor, identificando a dificuldade é de muita importância, pois

as crianças que não aprendem, diferentemente dos colegas, precisam ser

acompanhados de perto. Devem informar os coordenadores ou orientadores

pedagógicos, para que estas sejam encaminhadas a especialistas, para uma

pesquisa sobre a dificuldade que apresenta, e assim possa receber o tratamento ou

a terapia adequada à sua dificuldade.

Segundo Ferreiro relata em seu livro que até 15% das suas crianças não

evoluem adequadamente nas fases de aprendizagem:

(...) aos 6 anos iniciam o primeiro ano no pré-silábico ou silábico e chegam ao 2º semestre nesta mesma fase de desenvolvimento. Este grupo de crianças é de risco para dificuldade ou das funções e deverão ser observadas.(FERRERO, PALACIO: 2007,p.79)

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Pode-se diagnosticar o distúrbio de aprendizagem muito precocemente, no

nível do maternal e jardim, onde o desenvolvimento da linguagem e do grafismo

ajuda muito a professora identificar estes problemas. Quando se identifica o mau

rendimento escolar de uma criança, deveremos ter consciência dos diferentes níveis

de dificuldade, já identificados.

Existem dificuldades transitórias em uma única área, onde pode existir uma

situação passageira, em um momento da vida da criança, por exemplo, a criança

não consegue realizar uma conta específica.

Quando o professor detecta que um aluno não está conseguindo aprender, é

importante que desenvolva estratégias variadas, colocando o assunto de diferentes

maneiras, até que seja possível a superação da dificuldade. O que fica para trás,

torna-se cumulativo, transformando-se num obstáculo à aprendizagem posterior. Ele

deve levar em conta que a aprendizagem só acontece quando está ligada à parte

afetiva da criança. Não se pode separar aprendizagem de afeto. É importante que o

professor conheça cada um de seus alunos e esteja atento às dificuldades de cada

um, para que essas não se transformem num problema.

Para evitar surgimento de dificuldades ou mesmo preveni-las, deve-se tomar

muito cuidado em respeitar o nível cognitivo da criança. Quando estão entre os 07 e

11-12 anos de idade estão numa fase de intensa atividade intelectual, mas

necessitam para sua aprendizagem, ter sempre presente a situação concreta. Ela

não consegue compreender assuntos abstratos. Isto significa que não se pode

transmitir conteúdos à criança simplesmente. Ela precisa operar sobre eles.

(RUBINSTEIN, 1999)

Trabalhar a repetição neste caso não é uma boa estratégia, por isso o

professor deve usar de muita criatividade na abordagem de diferentes facetas de um

mesmo ponto a ser estudado. Trabalha-se com essa dificuldade e ela obtém

sucesso. Afetando transitoriamente certa área.

Existem também as dificuldades globais, que já é uma situação mais

preocupante, pois pode ser grave, envolvendo aspectos sociais, culturais e

emocionais. Por exemplo:

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a) Na escola: A criança é transferida de uma escola menos exigente para

outra mais exigente, e pode ter se saído muito bem na primeira e

apresentar uma defasagem global na segunda. Outro fator pode ser a

didática deficiente ou inadequada que não permite a criança constituir o

seu conhecimento. A falta de estimulação do professor e do professor para

com o aluno (salário, formação insuficiente, falta de reciclagem), pode ser

outro fator importante de dificuldade.

b) Na família: Uma família desorganizada, com excesso de atividades extra-

escolares como balé, informática, esportes, excesso de televisão, vídeo

game, ausências de rotinas de estudo, pode ser um fator importante de

dificuldade de aprendizagem. Crianças muito dependentes ou com

problemas emocionais (pais alcoólatras, exigentes) não conseguem

apresentar assimilar os novos conteúdos.

c) Culturais: Crianças que mudam de país e precisam se adaptar a outra

língua e cultura, com um nível sócio econômico baixo, onde não há

exigências da família, não existe perspectiva futura, podem ser fatores que

dificultam a aprendizagem.

d) Medicamentos: O uso de medicamentos cujos efeitos colaterais interferem

na aprendizagem, como as medicações antiepilépticas, antiasmáticas,

antialérgicas causam sonolência, irritabilidade ou hiperatividade, causando

desatenção nas crianças, as drogas como a cocaína o álcool e a

maconha também interferem na aprendizagem, principalmente nos

adolescentes.

Quando a situação já está instalada, toma-se um pouco mais difícil sua

superação em sala de aula, mas não é impossível. Se a interferência for de origem

emocional, como superproteção, conflitos familiares etc, deve-se fazer o possível

para conseguir um auxílio profissional que possa desbloquear a área conflituosa,

possibilitando a abertura para a aprendizagem.

Havendo defasagem em relação aos conteúdos, por motivo de mudança,

transferência ou uma didática anterior deficiente, necessário se faz uma avaliação

minuciosa para detectar em que se encontra a criança em relação aos conteúdos

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que deveria ter assimilado e que se crie um programa para reestruturar esse

conhecimento, não do momento atual, mas do ponto em que iniciou a defasagem.

A construção do conhecimento é semelhante a uma escada, onde a criança

não pode pisar no quinto degrau sem antes pisar nos anteriores. Suas pernas não

alcançarão, mesmo que faça todos os esforços . É necessário fornecer-lhe ajuda,

para que suba um degrau de cada vez, até atingir o esperado.

Tanto na dificuldade transitória como na global, não existe um problema

orgânico, pois a estrutura cognitiva está intacta e o nível intelectual é normal, apesar

da dificuldade apresentada. O trabalho de orientação e atendimento destas

dificuldades é muito fortalecedor e recompensador, pois pode-se obter bons

resultados na maioria das vezes.

e) Doenças: A surdez, seja ela total ou parcial, o déficit visual, a cegueira, até

mesmo a mudez também causam interferência no rendimento escolar,

necessitando de atendimento especializado dentro e fora da escola.

Aqui estamos abordando os distúrbios:

Existem também outros níveis de dificuldades, chamados de Imaturidade

Funcional, que afetam a estrutura cerebral, com um potencial limitado. Podem ser

emocionais, cerebrais, onde a criança apresenta um atraso na aprendizagem por

algum fator relacionado à disfunção que ela tem.

Mesmo sendo inteligentes, quando existe uma disfunção cerebral, as

dificuldades são em áreas específicas relacionadas à linguagem, leitura, escrita,

cálculo, motricidade, raciocínio, memória, atenção etc.

São crianças que sofrem por serem confundidas como criança pouco

inteligente, preguiçosa, desleixada, quando na verdade o sua dificuldade não é em

nível intelectual, mas em nível de execução.

Segundo Antoniuk (2003), as principais disfunções na área da linguagem são:

disfasia (dificuldade de expressão ou compreensão), dislalia (atraso simples da

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linguagem), disartia (voz arrastada e lenta; está relacionada à coordenação motora),

dislexia (dificuldade de aquisição de leitura; distúrbio das funções de percepção,

meméria e análise visual), disgrafia (dificuldade parcial de escrita de uma língua),

disortografia (acompanha dislexia, muitas vezes; impossibilita a visualização correta

da escrita das palavras) e discalculia (incapacidade de compreender o mecanismo

do cálculo e as situações problema) .

É importante ressaltar que a criança das séries iniciais não tem condições de

operar matematicamente sem o concreto e precisa estruturar demoradamente a

construção do número e o raciocínio de situações problema. Se não lhe oferecerem

esta hipótese de aprendizagem, exigindo situações muito abstratas ela usará a

estratégia da mecanização, impedindo a aprendizagem verdadeira.

O déficit de atenção, ou T.D.H. - T.D.A.H. (Transtorno de Déficit de Atenção e

Hiperatividade), que hoje em dia tem afetado diversas crianças e adolescentes,

também faz parte dessa disfunção.

É um quadro em que os impulsos cerebrais acontecem numa velocidade

muito acima do normal e as conseqüências podem ser diversas como: falta de

atenção, impulsividade e agressividade. A criança portadora desse quadro tende a

ser desorganizada, desleixada, desastrada, recebendo repreensões freqüentes, que

prejudicam sua auto-imagem.

Finalmente, é importante ressaltar que o trabalho de uma equipe

multidisciplinar, como já citou-se anteriormente, que é composta de: médicos,

pedagogos, psicopedagogos, psicólogos, professores, fonoaudiólogos, terapeutas

ocupacionais, psicomotricistas e demais profissionais da área da saúde, é de

extrema importância para um diagnóstico preciso e um tratamento adequada à cada

dificuldade, assim estas crianças que apresentam as mais diversas dificuldades

podem ter a esperança de serem consideradas normais, e principalmente, serem

respeitadas em suas individualidades e suas necessidades.

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Capítulo 2 - As Dificuldades ou Transtornos no Ensi no da

Matemática

No ensino da matemática muitas tem sido as deficiências encontradas, o que

tem despertado o interesse de pesquisadores e estudiosos sobre o assunto, que

procuram investigar e descobrir novas metodologias ligadas ao ensino da

matemática, para que se possam ajudar os indivíduos com distúrbios de

aprendizagem ligados à matemática.

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Por falta de tempo ou de capacitação, os professores não modificam suas

práticas pedagógicas assim, muitas crianças que possuem dificuldades e distúrbios

de aprendizagem não conseguem sanar suas dúvidas ou dificuldades. Estes

profissionais vêem a matemática como um obstáculo a ser transpassado, até mesmo

por ele, necessitando de mais informação e estudo sobre o tema.

Segundo Floriani (2000): "Resta acrescentar ainda que a união entre teoria e

prática é, talvez, uma das melhores formas de superar a mediocridade na educação

escolar." (FLORIANI, 2000:67)

Muitas são as dificuldades encontradas nas salas de aula, principalmente com

a matemática, onde muitos alunos são promovidos de uma série à outra sem

estarem aptos a ela, causando assim um grave problema aos professores, que

precisam sanar as dúvidas das séries anteriores antes de iniciarem um novo

assunto.

Professores afirmam que os alunos não gostam da matemática, e por isso

não conseguem resolver problemas simples ou operações pequenas. Muitos assim

passam a ser discriminados nas escolas. Talvez, muitos educadores ainda não

leram o que Piaget (1994) diz: "Os educadores, todos nós, precisamos encontrar

formas eficientes de ensino e aprendizagem em nossa sociedade...". (PIAGET,

1994:145)

Abreu (1998) também fala sobre este problema enfrentado nas salas de aula

e no ensino da matemática:

Com efeito, não só as percentagens de insucesso escolar continuaram elevadas nos diversos níveis do sistema, como também se mantiveram altas taxas de desistência e abandono escolares. Além disso, apareceram novos indicadores de disfuncionamentos graves, reveladores da ineficácia estrutural do sistema e respeitantes a curta durabilidade dos conhecimentos adquiridos nas escolas. (ABREU, 1998:135)

Este se tornou um problema nacional, onde a matemática é tradicionalmente

tratada como uma matéria exata, onde os alunos sabem ou não sabem, sem que

eles sejam respeitados sobre seus conhecimentos anteriores e sobre os

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conhecimentos que já possuem, apesar de não serem aprendidos nas

escolas.

Camuflado neste triste contexto, estão as crianças com distúrbios de

aprendizagem na matemática, que sem entender muito bem o que está

acontecendo, sofrem discriminação e não recebem a atenção e o tratamento que é

de seu direito.

Sabe-se que os distúrbios de aprendizagem na matemática e nas demais

disciplinas são, na maioria das vezes descobertos na sala de aula, através da

observação do professor e do acompanhamento diário com o aluno. É ele quem vai

detectar que existe algo errado com o aluno e que este precisa de ajuda. Torna-se

claro, que a participação do professor na observação da sala de aula pode detectar

precocemente os distúrbios de aprendizagem, fazendo com que esta criança receba

tratamento mais rápido, tendo assim, suas dificuldades minimizadas ou adaptadas.

Floriani (2000) é brilhante ao afirmar:

O professor que quer voltar-se para a solução de problemas pedagógicos, orienta-se pela perspectiva das inter-relações entre sociedade e educação escolar. (FLORIANI, 2000:12)

O que podemos fazer diante desta realidade? Se os alunos ditos normais

enfrentam problemas com a aprendizagem da matemática, quando mais os com

distúrbios de aprendizagem? Cabe aí, um maior estudo e pesquisa que é a intenção

deste trabalho, mostrando que a aprendizagem da matemática, para as crianças

com distúrbios de aprendizagem especificamente na matemática, é possível e viável,

desde que os profissionais da educação sejam abertos às novas metodologias e

entendam como se dá o distúrbio.

Muitas têm sido as dificuldades enfrentadas pelos alunos com as linguagens

matemáticas. Na base, com a aritmética, mais à frente com a elaboração do

pensamento matemático. Algumas dificuldades acontecem em decorrência do mal

funcionamento do processamento lógico-matemático ao ser ouvido ou lido. Outras

acontecem em problemas com a percepção de tempo e espaço.

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É um termo usado para determinar uma inabilidade em executar operações

matemáticas ou aritméticas e conceitualizar números através de conceitos abstratos

de quantidades comparativas.

Apesar de ser um impedimento da matemática, apresenta limitações nas

áreas da: introspecção espacial, do tempo e da memória. Pode ser congênita ou

hereditária e atinge crianças e adultos.

Seus sintomas mais observados são:

- Dificuldades com números, confusão de sinais (+, -, x, ÷).

- Diferenciação entre lado direito e esquerdo.

- Dificuldade no senso de direção (norte, sul, leste, oeste), dificultando até

mesmo a manipulação de um compasso.

- Dificuldade em identificar maior e menor que.

- Dificuldade na leitura de tabelas de tempo e aritmética mental.

- Dificuldade com fórmulas.

- Dificuldade em estimar a passagem do tempo e com o conceito de tempo.

Inclusive verificar mudanças de relógios analógicos.

- Dificuldade em estimar o gasto de uma lista de comprar, fazer um orçamento

e planejar custos.

- Dificuldade em estimar a medida dos objetos ou das distâncias.

- Dificuldade em guardar, recordar e apreender regras matemáticas, fórmulas

e sequências numérica.

- Dificuldade em manter contagem de pontos em jogos.

- Dificuldades em atividades que necessitam de sequências como: danças,

leitura, escrita. Problemas com calculadoras por não conseguir introduzir as

variáveis do processo.

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As causas podem ser variáveis. As mais aceitas são:

a) Neurológica: associada a lesões do supramarginal e os giros

angulares, na junção dos lóbulos temporal e parietal do córtex

cerebral, a discalculia pode ter nesta complexa disfunção a sua

causa;

b) Déficits na memória: Segundo Geary (1995), alguns indivíduos com

déficits de memória podem sofrer de discalculia, mas não é possível

especificá-la, pois os déficits de memória podem ser ligados aos

demais distúrbios de aprendizagem.

c) Memória curta reduzida: alguns indivíduos que apresentam

distúrbios na memória curta podem desenvolver discalculia, pois não

conseguem lembrar os cálculos a serem feitos;

d) Quociente de Inteligência de menos de 70 (apesar de indivíduos

com QI normal também podem apresentar discalculia);

e) Desordem hereditária ou congênita; e

f) A combinação de dois ou mais fatores destes citados acima.

A discalculia ainda precisa ser mais estudada para uma maior compreensão e

conhecimento para que se possa ajudar, com o tratamento e a intervenção

adequada os indivíduos portadores deste distúrbio de aprendizagem.

Apesar de todas as dificuldades em entendê-la, sabe-se, no entanto, que

vários são os recursos utilizados para ajudar os portadores de discalculia a

aprenderem e assim, terem uma vida mais saudável e feliz.

Gardner (1995), na sua Teoria das Inteligências Múltiplas explica que os

indivíduos possuem várias inteligências e que cada uma delas está ligada a uma

habilidade humana. A que nos interessa no entanto, é a lógico-matemática, pois é a

que está diretamente ligada à discalculia.

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Esta inteligência é manifestada através de uma facilidade em interpretar

cálculos, perceber espaços, reconhecer figuras geométricas e abstrair situações

lógicas e problemáticas. O indivíduo portador de discalculia não consegue realizar

estas atividades com sucesso, a não ser que receba o estímulo adequado.

Antunes (1998) explica que:

Da mesma forma que a inteligência lingüística, essa competência não se abre apenas para pessoas letradas e, assim, muitas pessoas simples ou até analfabetas, como muitos “mestres-de-obras”, percebem a geometria nas plantas que encaram ou nas paredes que sabem erguer (...) Um aluno entenderá melhor os números as operações matemáticas e os fundamentos da geometria se puder torná-los palpáveis. Assim, materiais concretos como moedas, pedrinhas, tampinhas, conchas, blocos, caixas de fósforos, fitas, cordas e cordões fazem as crianças estimularem se raciocínio abstrato.(ANTUNES, 1998:71)

Segundo o autor, é possível estimular a inteligência lógico-matemática

através de jogos e com materiais recicláveis, quebra-cabeças, jogos de memória e

outros mais. Antunes (1998) continua afirmando que: “...a coordenação manual

parece ser a forma como o cérebro busca materializar e operacionalizar os símbolos

matemáticos.” (ANTUNES, 1998:71).

Antunes (1998) continua dizendo que:

A criança que manuseia os objetos, classificando-os em conjuntos, que abotoa sua roupa e percebe simetria, que amarra seu sapato e descobre os percursos do cadarço, mas também a que “arruma” sua mesa ou sua mochila está construindo relações, ainda que não seja a mesma lógica que “faz sentido ao adulto”. Para jogos voltados para essa inteligência, propomos como linhas de estimulação: jogos para fixar a conceituação simbólica das relações numéricas e geométricas e que, portanto, abrem para o cérebro as percepções do “grande” e do “pequeno”, do “fino” e do “grosso”, do “largo” e do “estreito”,o “alto” e do “baixo”. (ANTUNES, 1998:72)

Como vimos, os jogos podem ser a grande estratégia de estímulo para os

portadores de discalculia, mas para poder utilizar esta metodologia é necessário

conhecê-la, para isso estudaremos um pouco de DOIS grandes estudiosos dos

jogos: Piaget e Vygotsky , que basearam suas pesquisas sobre o desenvolvimento

da criança nesta estratégia de ensino.

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2.1- Os Jogos e os Processos de Aprendizagem

Percebemos que há uma dificuldade em definir os termos “jogar” e “brincar”,

pois ambos têm uma fronteira comum, indicando um grau de subjetividade, em que

estas atividades estão implícitas.

Segundo, Bomtempo (1987):

...a atividade do brincar, geralmente é vista como uma situação livre de conflitos e tensões, havendo sempre um elemento de prazer. Também é uma atividade com um fim em si mesma, pois não há resultado biológico imediato que altere a existência do indivíduo. (BOMTEMPO, 1987:13)

O brincar da criança não é equivalente ao jogo para o adulto, pois não é uma

simples recreação, o adulto que brinca/joga afasta-se da realidade, enquanto a

criança ao brincar/jogar avança para novas etapas de domínio do mundo que a

cerca.

Ao brincar, a criança desenvolve sua capacidade de experimentar, de criar

situações, modelos dominando a sua realidade e promovendo acontecimentos.

O brincar e o jogar da criança ao adulto. Vejamos a origem das palavras:

Jogar: do latim “jocare”: entregar-se ao; ou tomar parte no jogo de; executar as diversas combinações de um jogo; aventurar-se ou arriscar-se ao jogo; perder no jogo; dizer ou fazer brincadeira; harmonizar-se.

Brincar: “de brinco+ar”; divertir-se infantilmente; entreter-se em jogos de criança; recrear-se; distrair-se;saltar; pular; dançar, (...) (Dicionário da Língua Portuguesa – Aurélio, 1986:286-98)

Dos 2 aos 4 anos a criança desenvolve-se com base nas organizações

mentais, utilizando-se de símbolos, diferenciando o “eu” do “outro” a fantasia da

realidade. Dá vida a objetos, conversa com eles e atribuem-lhe sensações e

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emoções, como se ele fosse um ser vivo. A partir daí inicia o trabalho de simbolismo

coletivo, apesar de brincar sozinha muitas vezes.

Aos 4 anos a brincadeira torna-se um evento socializado, aparecendo regras

claras, com a exigência do cumprimento das mesmas. Suas emoções e afetos são

compreendidos através da brincadeira simbólica e desenvolvem-se conceitos como:

classificar, seriar, quantificar, reconhecer cores.

Huizinga (1980), filósofo da história em 1938, escreveu seu livro “HOMO

LUDENS” no qual argumenta que o jogo é uma categoria absolutamente primária da

vida, tão essencial quando o raciocínio (HOMO SAPIENS) e a fabricação de objetos

(HOMO FABER), então a denominação HOMO LUDENS, é cujo elemento lúdico

está na base do surgimento e desenvolvimento da civilização.

Para Huizinga (1980) jogo é:

uma atividade voluntária exercida dentro de certos e determinados limites de tempo e espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e alegria e de uma consciência de ser diferente de vida cotidiana. (HUIZINGA,1980:56)

Em seu livro Huizinga (1980) nos conta que:

Nas sociedades antigas, não havia destinação entre jogos infantis e adultos, eram coletivos.

O jogo era considerado como um vínculo entre as pessoas, grupos, classes e gerações, entre passado e futuro. Gradualmente este caráter foi sendo perdido ao longo da história, transformando-o mais individual. A influência educacional, religiosa e� social altera os valores morais, considerava a criança como, um ser não maduro para convívio com adulto, sendo que deveria ser submetida a um “regime especial”.

Os jogos e divertimentos coletivos foram abandonados e o ato de brincar desvalorizado, por não ter função aparente. (Huizinga 1980:69)

É através do brincar e do jogo que a criança vê e constrói o mundo, expressa aquilo que tem

dificuldade de colocar em palavras. Sua escolha é motivada por processos e desejos íntimos, pelos

seus problemas e ansiedades. É brincando que a criança aprende que, quando se perde no jogo, o

mundo não se acaba.

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Sendo objeto de estudo de filósofos, psicólogos, psicanalistas, teólogos, antropólogos,

médicos, terapeutas, educadores e pais, estudar o brinquedo, a brincadeira e os jogos não são

assuntos de interesse da atualidade, pois eles sempre fizeram parte do universo infantil. Através

desses estudos pode-se conhecer o processo de desenvolvimento do indivíduo e o seu significado na

vida de cada um deles.

Entendendo que FROEBEL (apud KISHIMOTO, 1990) é uma figura significativa no contexto

educativo, porque traz uma importante contribuição quanto ao papel do jogo, acreditamos que suas

idéias sejam fundamentais no sentido de confrontá-las com as demais. No entanto, em virtude da

dificuldade de encontrar material a seu respeito, consideramos adequado o referencial de Kishimoto,

já que a mesma faz uma relevante abordagem sobre Froebel: "Embora não tenha sido o primeiro a

analisar o valor educativo do jogo, Froebel foi o primeiro a colocá-lo como parte essencial do trabalho

pedagógico, ao criar o jardim de infância com uso dos jogos e brinquedos”.

A partir de sua filosofia educacional baseada no uso dos jogos infantis, FROEBEL (apud

KISHIMOTO, 1990) delineia a metodologia dos dons e ocupações, dos brinquedos e jogos, propondo:

1- Dons, materiais como bola, cubo, varetas, anéis etc, que permitem a realização de

atividades denominadas ocupações, sob a orientação da jardineira, e

2- Brinquedos e jogos, atividades simbólicas, livres, acompanhadas de músicas e

movimentos corporais, destinadas a liberar a criança para a expressão das relações que

estabelece sobre objetos e situações do seu cotidiano. Os brinquedos são atividades

imitativas livres, e os jogos, atividades livres com o emprego dos dons.

Brincar é a fase mais importante da infância - do desenvolvimento humano neste período - por ser a auto-ativa representação do interno - a representação de necessidades e impulsos internos.... A brincadeira é a atividade espiritual mais pura do homem neste estágio e, ao mesmo tempo, típica da vida humana enquanto um todo - da vida natural interna no homem e de todas as coisas. Ela dá alegria, liberdade, contentamento, descanso externo e interno, paz com o mundo... A criança que brinca sempre, com determinação auto-ativa, perseverando, esquecendo sua fadiga física, pode certamente tornar-se um homem determinado, capaz de auto-sacrifício para a promoção do seu bem e de outros... Como sempre indicamos, o brincar em qualquer tempo não é trivial, é altamente sério e de profunda significação. (KISHIMOTO, 1990: 54-55)

Segundo Friedmann (1998):

Portanto, o ato de brincar é importante, é terapêutico, é prazeroso, e o prazer é ponto fundamental da essência do equilíbrio humano, principalmente o ser humano que apresenta algum tipo de dificuldade de aprendizagem. Logo, podemos dizer que a ludicidade é uma necessidade

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interior, tanto da criança quanto do adulto. Por conseguinte a necessidade de brincar é inerente ao desenvolvimento. (FRIEDMANN, 1998:34)

O ato de brincar incorpora à criança valores morais e culturais, principalmente nas atividades

lúdicas que estimulam a auto-imagem, a auto-estima o autoconhecimento e a cooperação, pois

podem assim, moldar suas vidas conforme sua necessidade e a necessidade de seu meio social

solicitarem.

As crianças, com ou sem dificuldade aprendem através do lúdico, pois ao experimentar

constroem seu conhecimento. O brincar e o jogar proporcionam à criança um conhecimento

abrangente e não isolado, favorecendo a aprendizagem de conceitos que ela levará para a vida toda.

Desde os primeiros anos de vida, o jogo cria na criança processos criativos onde elas

reelaboram os fatos vividos, construindo uma nova realidade, através de seus gestos e de suas

necessidades, acumulando conhecimento e experiências, definindo as futuras lideranças e

desenvolvendo outras, obedecendo e respeitando regras que serão importantes na sua vida

profissional.

Observar a brincadeira das crianças é função de todos os adultos que interagem com a criança,

para que assim possam conhecê-la melhor e descobrir, com antecedência muitas dificuldades que ela

poderá desenvolver. Dificuldades emocionais, de relacionamento, de aprendizagem, cognitivas

podem ser facilmente observadas, prevenindo e solucionando problemas que poderiam interferir de

maneira negativa no desenvolvimento da criança.

Por tudo isso, cabe a nós, adultos responsáveis, proporcionar à criança ambientes de

brincadeiras saudáveis e diversificados, estimulando a fantasia, a criatividade, a linguagem e a ação,

para que futuramente, nossas crianças cresçam mais capazes e realizadas.

No processo de desenvolvimento infantil compreendemos a educação pelo

corpo em movimento. Esse processo significa a amplitude das estruturas sociais,

afetivas, cognitivas e motoras. O movimento do corpo relaciona-se com os jogos e

brincadeiras das crianças.

Piaget foi um dos primeiros a despertar para a ação da criança sobre o meio,

pois se preocupou em estudar a gênese do pensamento humano. Ele observou a

criança e percebeu que desde que esta nasce, já possui um tipo de inteligência, que

é anterior a linguagem, assim pôde entender o desenvolvimento da inteligência.

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Para Vygotsky (1991), o brinquedo e o jogo criam uma zona de desenvolvimento proximal

(capacidade que a criança possui), pois na brincadeira e no jogo a criança comporta-se num nível que

ultrapassa o que está habituada a fazer, funcionando como se fosse maior do que é.

2.1.1- Piaget

Para o teórico existe uma inteligência chamada motora, que é a primeira

desenvolvida pelo ser humano. A criança traz consigo uma bagagem genética, que

são os movimentos chamados reflexos e a partir do contato com o ambiente, no que

Piaget chama de reações circulares, ela constrói um movimento intencional.

Até por volta dos 2 anos, a criança constrói a inteligência sensório-motora,

que é a capacidade de perceber a intencionalidade e a conseqüência dos gestos,

sendo esses os recursos que ela terá para interagir com o meio.

Para Piaget o desenvolvimento da inteligência é um processo que oscila entre

o equilíbrio e o desequilíbrio, através de dois mecanismos denominados por ele

como: a assimilação e acomodação. A assimilação é a integração do mundo exterior

às estruturas do indivíduo, e a acomodação, a mudança que ocorre no interior do

indivíduo em função das influências exteriores. É através desses dois mecanismos

que a criança desenvolve sua inteligência prática, denominada por Piaget como

sensório-motora, onde diferentes esquemas de ação vão se aperfeiçoando,

tornando-se mais variáveis e adaptáveis a diferentes situações.

Nos primeiros meses e anos de vida, cada toque, movimento e emoção

sentidos por uma criança significam uma imensa atividade elétrica e química no

cérebro, pois à medida que qualquer informação é transmitida através do sistema

nervoso, ela deve repetidamente converter-se de um lado para o outro de um

Impulso Elétrico para uma Liberação Química. O que torna este processo de

mensagens de estímulo em uma resposta do cérebro uma vez que bilhões de

células estão se organizando em redes que requerem trilhões de sinapses entre si.

Conforme a UNICEF, 2001:

Nesses primeiros anos da infância, experiências e interações com os pais, os membros da família e outros adultos influenciam a maneira como a mente de uma criança se desenvolve com o impacto tão grande quanto o

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de fatores como nutrição adequada, boa saúde e água limpa. (UNICEF. Situação Mundial da Infância 2001- Desenvolvimento Infantil).

A socialização da criança acontece através de diversos processos de

desenvolvimento, onde o conhecimento que a criança e seu grupo social têm é

importante. A criança deve ser considerada como um ser que existe, pensa, realiza

ações.

A criança descobre o prazer de brincar com suas mãos e com os pés, que é o

essencial prazer do movimento do seu corpo. O domínio do corpo é a aprendizagem

progressiva que acompanha diferentes movimentos.

Winnicott (1985), psicanalista inglês, estudioso do crescimento e desenvolvimento infantil considera que:

O ato de brincar é mais do que a simples satisfação do desejo. O brincar o fazer si, um fazer que requeira tempo e espaço próprios. Um fazer que se constitua de experiências culturais que conversa é próprio de saúde, porque facilita o crescimento, conduz aos relacionamentos grupais, podendo ser uma forma de comunicação consigo mesmo (a criança e com os outros). (WINNICOTT 1985:63)

Analisando a concepção Winnicottiana, tanto o adulto como da criança estão

plenamente libertos para a criação. Através da criatividade se percebe suas

potencialidades e a importância das trocas interindividuais. A palavra jogo pode ter

uma gama de sentidos como: divertimento, passatempo, distração, etc.

As ações, a ludicidade e a aprendizagem têm objetivos distintos. No jogo e na

brincadeira as regras e a imaginação favorecem a criança ao comportamento além

dos habituais. Para Winnicott (1975), os jogos das crianças estão divididos em:

puramente funcionais; de ficção; de aquisição e de fabricação.

Os jogos puramente funcionais relacionam uma atividade que busca efeito:

mover os dedos, tocar objetos, produzir ruídos e sons, dobrar os braços ou as

pernas.

Os jogos de ficção consistem em atividades cuja interpretação é a mais ampla

definição diferenciada: O jogo de bonecas, de cavalo de pau etc.

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Os jogos de aquisição se relacionam com a capacidade de olhar, executar e

esforçar para perceber e compreender; canções, relatos, imagens, coisas e seres,

etc. Os jogos de fabricação se resumem em agrupar objetos, combiná-los, modificá-

los, transformá-los e criar outros novos.

Na concepção de jogo Piaget (1994:18-24) descreve quatro estruturas

básicas de jogo infantil. Destaca em síntese que o jogo é uma forma de atividade

particularmente poderosa para estimular a vida social e a atividade construtiva da

criança.

Apresenta uma classificação que segue a presente ordem:

a) Jogo de exercícios: simples prazer funcional, ou pela tomada de

consciência de suas novas capacidades; jogo simbólico: representação de

um objeto ausente ou simulação funcional. O interesse centrado na

realidade simbolizada.

b) Jogo de construção: dos quatro aos sete anos as crianças fazem

reprodução exata e seus símbolos se tornam cada vez mais imitativos.

c) Jogo de regras: combinação sensório-motor e intelectual de competências

dos indivíduos ou por acordo e o que não pode, e o que garante certa

regularidade organizada a ação.

Piaget (1994) concebe o jogo como um processo de desenvolvimento da

criança uma atividade conseqüente de seu próprio crescimento. “A criança aprende

com seu próprio corpo em movimento.” (Barros, 2002:40).

2.1.1.1- A aprendizagem na concepção de Jean Piaget

Segundo Piaget (1994):

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...inteligência é adaptação e sua função é estruturar o universo, da mesma forma que o organismo estrutura o meio ambiente, não havendo diferenças essenciais entres os seres vivos, mas somente tipos específicos de problemas que implicam níveis diversos de organização. Para ele as estruturas da inteligência mudam através da adaptação a situações novas e têm dois conceitos básicos: a assimilação e a acomodação. Ele entende assimilação como a integração de elementos novos em estruturas ou esquemas já existentes. A noção de assimilação, implica na significação e também expressa o fato de que todo conhecimento está ligado a uma ação, de que conhecer um objeto ou acontecimento é assimilá-lo a esquemas de ação. (PIAGET 1994:18)

Piaget acreditava que o conhecimento era a possibilidade de transformar e

agir sobre a realidade de cada indivíduo, podendo assim entendê-la. Afirmou que

tudo aquilo que o indivíduo conseguia transpor formava um esquema de ação, onde

o indivíduo poderia repetir e modificar as ações praticadas. Estas ações acomodam-

se.

A acomodação é definida como as modificações dos esquemas de assimilação, tendo como potencial influenciador as situações exteriores. Quando um esquema não é suficiente para responder a uma situação ou resolver um problema, aparece a necessidade do esquema modificar-se em função da situação. Exemplo: para o bebê aprender a chupar um copo com canudinho, o que é diferente da mamadeira. Deve haver, neste caso, uma acomodação do esquema de chupar.

Assimilação e acomodação são, portanto, mecanismos complementares, não havendo assimilação sem acomodação, e vice-versa. A adaptação do sujeito a esses mecanismos acontece através da equilibração entre eles. Não devemos entendê-los como um equilíbrio estático, mas ativo e dinâmico. Trata-se de uma série de sucessões de equilibração, cada vez mais amplas, que possibilitam as modificações dos esquemas já existentes, para que possam atender à ausência de equilíbrio, representada pelas situações novas, para as quais não exista um esquema próprio. (PIAGET, 1994:27)

Para Piaget (1994), as crianças não herdam capacidades mentais prontas,

pois, o pensamento é dinâmico e contínuo. Impossível chegar ao pensamento sem o

conhecimento sensorial (sensação-percepção).

Apresento a seguir um resumo das idéias-chave de Piaget sobre como as

crianças aprendem e crescem intelectualmente, segundo Barros (2002),

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1. As crianças têm estruturas mentais diferentes das dos adultos. Não são

adultos em miniatura; têm seus próprios caminhos distintos, para

determinar a realidade e para ver o mundo.

2. O desenvolvimento mental infantil progride através de estágios definidos,

que ocorrem numa seqüência fixa - uma seqüência que é a mesma para

todas as crianças.

3. Embora os estágios do desenvolvimento mental ocorram numa ordem fixa,

crianças diferentes passam de um estágio para outro em idades

diferentes. Além disso, uma criança pode estar num determinado estágio

para algumas coisas, e em outro estágio para outras.

4. O desenvolvimento mental é influenciado por quatro fatores

interrelacionados:

a) Maturação - amadurecimento físico, especialmente do sistema

nervoso central;

b) Experiência - manipulação, movimento e pensamento sobre objetos

concretos e processos de pensamento que os envolvem;

c) Interação Social - jogo, conversa e trabalho com outras pessoas;

d) Equilibração - o processo de reunir maturação, experiência e

socialização de modo a construir e reconstruir estruturas mentais.

Piaget (1994) acreditava que o desenvolvimento intelectual ocorre por meio

de dois atributos aos quais chama de Organização e Adaptação. Organização é a

construção de processos simples - como ver, tocar, nomear - em estruturas mentais

de ordem mais elevada. Um indivíduo compõe assim seus sistemas de considerar o

mundo. Adaptação é a mudança contínua que ocorre no indivíduo como resultado

de sua interação com o meio. Isto ocorre à medida que ele assimila experiências -

as adapta às suas estruturas mentais já existentes - e acomoda (modifica) estruturas

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mentais de modo a permitir a inclusão de experiências que não se ajustam às

estruturas existentes.

5. Quatro estágios do desenvolvimento mental são especialmente

importantes:

a) Período Sensório Motor – do nascimento até os 2 anos;

b) Pensamento Intuitivo – dos 4 aos 7 anos;

c) Operações Concretas – dos 7 aos 11 anos e

d) Operações formais – dos 11 aos 15 anos. Neste trabalho nos

deteremos apenas nas duas primeiras.

A fase de sensório-motora caracteriza-se pela ênfase no movimento corporal,

pela exploração sensorial e pela inteligência essencial prática. Quando se fala em

movimento, na criança desta fase significa dizer que ele vai muito além de apenas

mexer o corpo, de deslocar-se no espaço. É através dele que ela se comunica,

expressa suas vontades. Com gestos, mímicas, movimentos faciais consegue

interagir com o mundo e as pessoas através de seu corpo.

O Pensamento Intuitivo acontece quando as crianças pensam e dão

explicações na base de intuições - pressentimentos - em vez de lógica. O

pensamento da criança nesse momento é marcado por uma deficiência em:

expressar a ordem dos eventos; explicar relações de causa e efeito; compreender

com precisão o que outras pessoas falam e relembrar regras.

Observa-se que as crianças deste nível raciocinam e dão explicações na base

de intuições e pressentimentos, ao invés de fazê-lo na base do adulto - tipo lógico.

Também observo que apesar do grande progresso intelectual que fazem, ainda não

conseguem compreender a ordem dos eventos, explicar relações, compreender

números e suas relações, compreender com precisão o que as outras pessoas falam

e compreender regras.

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A linguagem verbal das crianças neste nível apresenta-se de dois tipos:

comunicativa e egocêntrica. A linguagem comunicativa consiste em falar com a

intenção de transmitir informação a outros ou de fazer perguntas. A linguagem

egocêntrica é não comunicativa. Pode consistir na mímica de sons e de palavras ou

pode ser um monólogo - a criança simplesmente fala enquanto brinca, sem intenção

de se comunicar com outros. Os professores que se dedicam à educação de

crianças deveriam compreender que isto é perfeitamente normal. As crianças

simplesmente falam consigo mesmas, mesmo estando em grupos.

O jogo da criança torna-se cada vez mais social. Anteriormente egocêntrico e

espontâneo, torna-se agora cada vez mais relacionado e dependente de outros. Os

jogos favoritos incluem correr para pegar outras crianças, esconder e achar, procurar

objetos que estão faltando e jogos de adivinhação. Certas regras são necessárias.

Estão ligadas ao tipo de jogo e não a quem vence ou perde. Ainda a criança é

incapaz de conhecer ou seguir mais do que regras simples.

Devemos lembrar continuamente que as crianças não pensam como os

adultos. Neste estágio elas não podem efetuar operações em suas cabeças.

Operações como adicionar e subtrair, seguir passos de um processo ou descrever

como chegar de um lugar para outro. Ainda não conseguem explicar essas relações.

São incapazes de pensar uma vez em vários aspectos de uma situação. Podem

pensar no todo ou em algumas partes, mas não em ambos ao mesmo tempo.

Atos são pensamentos e vice-versa. Suas propriedades e resultados são vistos

como absolutos: certo-errado, melhor-pior, maior-menor, sem variações. As crianças

fazem estes juízos de valores na base das primeiras impressões, sobre intuições e

conforme o prazer ou desprazer pessoal.

Durante este estágio a criança progride rapidamente da habilidade de apenas

agrupar de modo rudimentar para a habilidade de classificar adequadamente. Está

se tornando capaz de fazer coleções e está desenvolvendo interesse em fazê-lo.

Além disso, é capaz de fazer subdivisões ou sub-agrupamentos dentro de um grupo

maior. No entanto, quando solicitada a considerar tanto o grupo maior como os

menores dentro dele, é capaz de fazê-lo. Isto é, ela não pode apreender em sua

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mente simultaneamente a noção de suas partes. Esta incapacidade obviamente tem

importância no ensino da aritmética.

A competição em jogos e no trabalho virtualmente não significa nada para

crianças deste estágio. Elas têm uma idéia muito limitada do significado de ganhar e

perder ou de superar outros. Cada criança joga ou trabalha para si mesma e pelo

prazer da atividade. Ela não joga contra outros.

Grande parte da linguagem da criança, no começo deste estágio, é

egocêntrica. À medida que avança para as idades de 6 e 7 anos, seu interesse

social aumenta. Envolve-se em uma linguagem mais comunicativa e menos

egocêntrica. As crianças deste estágio imitam cada vez mais as outras.

Na fase das Operações concretas, as crianças desenvolvem o conceito de

número, fazem relações, pensam através de problemas, apesar de pensarem em

objetos reais, concretos e não em coisas abstratas.

Em média, a criança de mais ou menos sete anos de idade começa a passar

do estágio do pensamento intuitivo para o estágio das operações concretas.

Algumas crianças começam a transição mais cedo; outras, mais tarde. E nenhuma

delas faz a transição repentinamente. Em geral, podemos dizer que a transição

ocorre primeiro, para o que consideramos operações simples como conservação de

comprimento e mais tarde para operações complexas, como conservação de

volume. As capacidades de efetuar operações concretas desenvolvem-se uma por

uma e não todas de uma vez. É necessário entender que estas novas

compreensões estão ocorrendo a expensas de crenças anteriores, das quais não é

fácil livrar-se. Podemos esperar que a criança em transição, quando sob tensão,

tenderá a voltar para idéias e comportamentos anteriores.

Mas então, quais são algumas das diferenças essenciais entre as habilidades

das crianças dos dois estágios - pensamento intuitivo, quando comparado ao das

operações concretas? A diferença principal é que a criança torna-se capaz de

efetuar operações mentalmente ou "em sua cabeça". Isto é, ela pode pôr idéias em

seqüência, lembrar o todo enquanto o divide em partes e tornar reversíveis essas

ações para voltar aos seus estados originais. Em termos mais técnicos, a criança

pode conservar e tornar reversíveis as operações. "Conservar" refere-se à

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habilidade de considerar, ao mesmo tempo, tanto o todo como os vários

reagrupamentos de suas partes. A criança vê que o todo e suas partes são

recíprocos e vê como se combinam. Vê também como a quantidade permanece a

mesma apesar das distorções.

A criança pode agora, pela primeira vez, explorar vários caminhos diferentes

na resolução de um problema. Quando um deles não dá certo, ela pode retornar ao

começo e iniciar de novo. Isto é, ela pode testar pressentimentos, mentalmente,

sendo sempre capaz de voltar e recomeçar, se necessário.

Em resumo, diz-se que a criança atua no estágio das operações concretas,

quando capaz de: organizar as experiências num todo consistente, fazer juízo

racional de suas experiências, fazer classificações e agrupamentos, tornar

reversíveis as operações que efetua sobre eles e pensar sobre um evento de

diferentes perspectivas, simultaneamente.

Anteriormente grande parte da linguagem da criança era egocêntrica, não

comunicativa. Agora se tornou bem mais comunicativa, embora ela ainda seja

observada falando consigo mesma, ocasionalmente. As palavras também se tornam

instrumento do processo do pensamento - a criança cada vez mais pensa com

palavras em vez de visualizações. Porém, as palavras têm de sempre se relacionar

com as experiências concretas anteriores. Ela usa muitas palavras altamente

sofisticadas embora, muitas vezes, esteja apenas vagamente consciente dos seus

significados.

As habilidades recentemente adquiridas permitem à criança fazer uma série

de coisas que não era capaz de fazer antes, especialmente nas ciências e

matemática. Realizar experimentos e fazer explanações e predicações lógicas são

exemplos. Torna-se cada vez mais capaz de estabelecer relações válidas entre as

coisas que observa. De fato, maiores oportunidades para observação e manipulação

de objetos parecem ser de extrema importância para o crescimento mental. As

explanações que ela faz sobre o que observa mudam vagarosamente da

concentração anterior sobre artificialismo e animismo para explanações mais

"naturais". Para uma descrição detalhada dos tipos de explicações que as crianças

fazem sobre fenômenos naturais.

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Os jogos tornam-se cada vez mais coletivos e menos individualistas. Exigem-

se cooperação e esforço de grupo. Aos nove anos, em média, as crianças mostram

desejo de regras definidas para regular o jogo. Enquanto qualquer criança

individualmente pode querer transpor as regras de jogo, ela não desejará isto da

parte de outra criança. Ela reclama a violação das regras e grande parte das

discussões entre crianças, procedem de disputas sobre se as regras do jogo foram

adequadamente seguidas.

Além da crescente necessidade de regras, emerge um forte sentido de

competição. As crianças ainda são bastante cooperativas na maioria dos esforços de

grupo e continuarão assim. Quanto a jogos, a boa vontade torna-se muito

importante. Ao mesmo tempo, perder torna-se quase intolerável para muitas

crianças. Mas nos esportes e nos jogos elas necessitam de ajuda para aprender a

perder esportivamente.

Como é através da ação, do movimento sobre o meio físico e o meio social,

através da interação entre eles, que a criança vai desenvolver a aprendizagem.

Experiências que produzam transformações qualitativas, que estimulem as

experiências corporais e de conhecimento corporal vão ser de extrema importância

para cada uma destas fases, pois será através delas que o “eu corporal” da criança

será estruturado, evitando assim uma má estruturação do esquema corporal infantil,

que determina movimentos desajeitados, falta de coordenação motora, insegurança,

que desencadeiam agressividade, mau humor e até apatia. Teremos aí um sério

problema motor manifestado através dos sentimentos e do comportamento.

2.1.2- Vygotsky

Vygotsky (1984) acreditava na idéia de interação entre as condições sociais e

a base biológica do comportamento humano que vive em constante mutação.

Partindo de estruturas orgânicas elementares, determinadas pela maturação,

formam-se novas e complexas funções mentais, a depender da natureza das

experiências sociais a que as crianças se acham expostas.

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O pensamento complexo e abstrato individual sofrem a influência da forma

como a fala é utilizada na interação social com adultos e com os colegas mais

velhos, pois formarão e organizarão este pensamento. Através da experiência com

os mais velhos, o pensamento infantil, aos poucos se auto-regula.

O meio social não é interiorizado linearmente, pois a criança é um ser ativo. O

processo de internalização é, um processo ativo, onde a criança se apropria do

social de uma forma particular. Assim, interiorização e transformação interagem

constantemente, de forma que o sujeito, ao mesmo tempo em que se integra no

social, é capaz de posicionar-se frente ao mesmo, ser seu crítico e seu agente

transformador. Assim, à medida que as crianças crescem, elas vão internalizando a

ajuda externa que se forma cada vez menos necessária: a criança mantém, agora, o

controle sobre sua própria conduta.

Através da própria fala, o ambiente físico e social pode ser melhor aprendido,

aquilatado e equacionado: a fala modifica, assim, a qualidade do conhecimento e

pensamento que se tem do mundo em que se encontra.

As crianças modificam suas funções psicológicas ao internalizar instruções. A

percepção, a atenção, a memória e a capacidade para solucionar problemas são

formas que ela tem de organizar e operar as informações, influenciando seu

conhecimento individual e a consciência de si e do mundo.

Segundo Vygotsky (1984):

A aquisição de um sistema lingüístico reorganiza, pois, todos os processos mentais infantis. A palavra dá forma ao pensamento, criando novas modalidades de atenção, memórias e imaginação. Mas não só isto. Além de indicar um objeto do mundo externo, ela também especifica as principais características desse objeto (abstraindo-as das características dos demais objetos), generaliza as características percebidas e as relaciona em determinadas categorias. Daí a importância da linguagem para o pensamento: ela sistematiza a experiência direta da criança e serve para orientar o seu comportamento.(VYGOTSKY, 1984:23)

No decorrer do desenvolvimento da criança a fala externa e o pensamento se

modificam. Aos dois anos a criança descreve o que faz e agi ao mesmo tempo. Por

volta dos três anos a fala acompanhará seu comportamento infantil. Aos poucos,

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esta fala irá preceder o comportamento anunciando a ação. A fala adquire a função

de pensamento complexo onde a criança planeja a ação e guia suas atividades.

Depois dos seis anos, o falar em voz alta vai diminuindo e é substituído pelos

sussurros, com pensamentos direcionados. Contudo, sempre que há confronto com

situações-problemas de difícil solução, a fala externa volta a aparecer, auxiliando a

atividade cognitiva.

Assim, Vygotsky (1984) adota a visão de que pensamento e linguagem são

dois círculos interligados. Surge o que ele chama de pensamento verbal. Existem,

portanto, áreas do pensamento que não têm relação direta com a fala, como é o

caso da inteligência prática, em geral. Ele dá muita importância ao pensamento

verbal afirmando que as estruturas de linguagem dominadas pelas crianças passam

a construir as estruturas básicas, de sua forma de pensar.

Vygotsky (1984) reconhece a diversidade de condições histórico-sociais em

que vivem as crianças e aceita a existência do que Piaget chama de estágios

cognitivos. Para ele, os fatores biológicos preponderam sobre os sociais apenas no

início da vida das crianças e as oportunidades que se abrem para cada uma delas

são muitas e variadas, adquirindo destaque, em teoria, as formas pelas quais as

condições e as interações humanas afetam o pensamento e o raciocínio.

2.1.2.1. A construção do pensamento complexo e do a bstrato

Para Vygotsky (1984):

O processo de formação do pensamento é, portanto, despertado e acentuado pela vida social e pela constante comunicação que se estabelece entre crianças e adultos, a qual permite a assimilação da experiência de muitas gerações.(VYGOTSKY, 1984:31)

Como já foi dito, a linguagem, intervém no processo de desenvolvimento

intelectual da criança praticamente já desde o nascimento. Quando os adultos

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nomeiam objetos, indicando para a criança as várias relações que este mantém

entre si, ela constrói formas mais complexas e sofisticadas de conceber a realidade.

Sozinha, não seria capaz de adquirir aquilo que obtém por intermédio de sua

interação com os adultos e com as outras crianças, num processo em que a

linguagem é fundamental.

Em sala de aula, por exemplo, ao ensinar, o professor destaca alguns objetos

existentes no ambiente chama a atenção dos alunos para determinados aspectos

enquanto negligenciam outros e levanta questões acerca dos elementos

destacados. Nessa interação com o professor os alunos têm oportunidade para

reestruturar sua percepção, discriminar pontos centrais daqueles que são acessórios

ou pouco relevantes. Tais formas comportamentais usadas pelo professor na

situação de aprendizagem vão sendo apropriadas, pelos alunos que podem passar a

usá-las de modo independente, ao tentar compreender novos aspectos de ambiente.

O conceito de "zona de desenvolvimento potencial" dá-nos a oportunidade e

compreender as funções de desenvolvimento que estão a caminho de se completar.

Assim, pode ser utilizado tanto para mostrar a forma como a criança organiza a

informação, como para verificar o modo como o seu pensamento opera. Este

conceito é extremamente importante para um ensino efetivo, pois ao se conhecer o

que é possível à criança realizar, com e sem ajuda externa, é que se pode planejar

situações de ensino efetivas e avaliar realmente os progressos individuais.

O papel da educação e, conseqüentemente, o da aprendizagem, ganham

destaque na teoria de desenvolvimento de Vygotsky (1984), que também mostra que

a qualidade das trocas que se dão no plano verbal entre professor e alunos irá

influenciar decisivamente na forma como as crianças, tomam mais complexo o seu

pensamento e processam novas informações.

Em resumo, para Vygotsky, o processo de desenvolvimento nada mais é do

que a apropriação ativa do conhecimento disponível na sociedade em que a criança

nasceu. É preciso que ela aprenda e integre em sua maneira de pensar o

conhecimento da sua cultura. O funcionamento intelectual mais complexo

desenvolve-se graças à regulações realizadas por outras pessoas que,

gradualmente, são substituídas por auto-regulações. Em especial, a fala é

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apresentada repetida e refinada, acabando por ser internalizada, permitindo à

criança processar informações de uma forma mais elaborada.

Capítulo 3 – Os Jogos Cooperativos e os Distúrbios de

Aprendizagem

Através da história do homem muitos foram os autores que se interessaram,

pelo jogo, o brincar e o brinquedo e tudo o que os rodeia.

Na Idade Média o jogo é considerado algo não-sério, pois estava associado

ao jogo de azar. Servia para divulgar princípios de moral, ética e conteúdos de

disciplinas escolares, pois como eram um mau exemplo, usavam-no para disciplinar

os rebeldes.

No Renascimento, o jogo e a brincadeira se tornaram o auge da ludicidade.

Eram vistos como uma atividade de conduta livre que favorecia o desenvolvimento

da inteligência e facilitava a aprendizagem, sendo assim utilizado nos conteúdos

escolares.

Montaigne e Vives (1612) apud Duflo (1999) afirmaram que:

O jogo é um instrumento de desenvolvimento da linguagem e do imaginário. É do escritor, o poeta, sua prioridade.

O jogo é um meio de expressão de qualidades espontâneas ou naturais da criança, como recriação, momento adequado para observar a criança, que expressa através dele sua natureza psicológica e inclinações. (DUFLO, 1999:12)

Rosseau (1761), Kant (1787), Tomás de Aquino (1856) e Nicolas Delamare

(séc. XVIII) apud Duflo (1999) diziam que:

O jogo tem valor educativo, na medida em que alia o prazer à condição de uma livre aprovação e de uma submissão autônoma às regras ... O valor

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do jogo tem implicações políticas e morais, indo bem além da simples distração ... O jogo passa a ser associado à formação do ser humano em sua plenitude.

Os jogos da criança são o insubstituível lugar de uma auto-aprendizagem por si mesma, em que vemos que se trata de uma cultura livre ... Por meio do jogo, a criança aprende a coagir a si mesma, a se investir de uma atividade duradoura, a conhecer e a desenvolver as forças do seu corpo.

O jogo é necessário na vida humana.

O jogo é um remédio e um repouso que se dá ao espírito para relaxá-lo, restabelecer suas forças, junto com as do corpo. (DUFLO, 1999:13)

Stanley Hall (1882) apud Duflo (1999) acreditava que:

A brincadeira reflete o decurso da evolução do homem, desde a pré-história até o momento presente. É como se a historia da raça humana fosse recapitulada por cada criança, cada vez que ela brinca. (DUFLO, 1999:14)

Froebel (1912) apud Kishimoto (1990) disse que:

A brincadeira é a atividade espiritual mais pura do homem neste estágio e, ao mesmo tempo, típica da vida humana enquanto um todo.... Ela dá alegria, liberdade, contentamento, descanso externo e interno, paz com o mundo ... O brincar em qualquer tempo não é trivial, é altamente sério e de profunda significação. (KISHIMOTO, 1990:22)

Huizinga afirmou em 1938 apud Huizinga (1990) que:

O jogo é uma atividade livre, conscientemente tomada como não-séria e exterior à vida habitual, mas– ao mesmo tempo capaz de absorver o jogador de maneira intensa e total. É uma atividade desligada de todo e qualquer interesse material, com a qual não se pode obter qualquer lucro, praticada dentro de limites espaciais e temporais, próprios, segundo certa ordem e certas regras. (HUIZINGA, 1990:34)

Vygotsky (1984) disse que: “Os jogos tem um papel expressivo no

desenvolvimento de certas habilidades cognitivas.” (VYGOTSKY, 1984:31)

Piaget (1994) acreditava que:

O jogo é uma atividade espontânea oposta à atividade do trabalho.

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É uma atividade que dá prazer .

Caracteriza-se por um comportamento livre de conflito. (PIAGET, 1984:45)

Wallon (1979) disse: “O jogo é uma forma de infração do cotidiano e suas

normas.” (WALLON, 1979:49)

Friedmann (1998) afirma que:

O Brincar traz de volta a alma da nossa criança: no ato de brincar, o ser humano se mostra na sua essência, sem sabê-lo, de forma inconsciente. O brincante troca, socializa, coopera e compete, ganha e perde. Emociona-se, grita, chora, ri, perde a paciência, fica ansioso, aliviado. Erra, acerta. Põe em jogo seu corpo inteiro: suas habilidades motoras e de movimento vêm-se desafiadas.

No brincar, o ser humano imita, medita, sonha, imagina. Seus desejos e seus medos transformam-se, naquele segundo, em realidade. O brincar descortina um mundo possível e imaginário para os brincantes. O brincar convida a ser eu mesmo.

O brincar, assim como a arte, o movimento, a expressão plástica, verbal e musical, é uma das linguagens expressivas do ser humano.

O jogo designa tanto a atitude quanto o objeto que envolve regras externas. (FRIEDMANN, 1998:12, 24, 59, 67)

Como se viu anteriormente, o jogo é um instrumento de grande capacidade

estimulativa e pode ser um grande aliado da educação e das dificuldades de

aprendizagem. Os jogos cooperativos são uma inovação do jogo, onde a competição

é deixada de lado e a cooperação toma seu lugar.

Ao contrário do que se pensa, os jogos cooperativos nasceram há milhares de

anos, quando membros das comunidades tribais se reuniam para celebrar a vida em

volta de uma fogueira.

Segundo Barreto apud Soler (2003):

Jogos Cooperativos são dinâmicas de grupos que tem por objetivo, em primeiro lugar, despertar a consciência de cooperação, mostrar que a cooperação é uma alternativa possível e saudável no campo das relações sociais; em segundo lugar, promover efetivamente a cooperação entre as pessoas, na exata medida em que os jogos são, eles próprios, experiências cooperativas. (BARRETO apud SOLER 2003: 21)

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Os valores que surgem numa situação de cooperação, como: a amizade,

sensibilidade, ajuda mútua, a intercomunicação de idéias e o orgulho em pertencer

ao grupo, que são características das crianças, são também formas de

aprendizagem.

Na Educação, novos paradigmas estão mostrando formas diferentes de ver o

ser humano e o mundo, como é o caso da corporeidade, do pensamento complexo e

da teoria sistêmica, que são perspectivas mais humanas, onde a competição vai

senndo deixada de lado para dar lugar à cooperação.

Capra (1996) escreve sobre o assunto através de duas tendências atuais:

A primeira seria a “auto-afirmativa” (cartesiana, tradicional, exclusiva, competitiva, diretiva) e, a segunda a “integrativa” (abrangendo as novas perspectivas). A competição pertence à primeira tendência e a cooperação à segunda. (CAPRA, 1996:34)

Para Brotto (1997) diz que:

A cooperação, é um processo de interação social, em que os objetivos são comuns, as ações compartilhadas e os benefícios distribuídos para todos. E a competição, é um processo de interação social em que os objetivos são mutuamente exclusivos, as ações são isoladas ou em oposição umas as outras e, os benefícios são destinados somente para alguns. BROTTO (1997: 27)

Para Soler (2003):

Jogos cooperativos são uma abordagem filosófica pedagógica criada para promover a ética da cooperação e a melhoria da qualidade de vida para todos, sem exceção. SOLER (2003: 23)

Continua enfatizando que o problema maior seria a omissão, pois conforme

fala em SOLER (2003):

Omissão é um processo de isolamento social, caracterizado pela indiferença, em que os objetivos podem ser qualquer um ‘tanto faz’, as

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ações não existem, e os benefícios, se vierem, já será lucro. (SOLER, 2003: 22).

Nos jogos cooperativos, os participantes jogam uns com os outros e, não uns

contra os outros, buscando a participação de todos, sem que alguém fique excluído,

pois possuem o objetivo e a diversão centrados em metas coletivas e, não

individuais. Ganhar e perder, são mecanismos de aperfeiçoamento pessoal e

coletivo, o que é essencial para crianças que apresentam distúrbios de

aprendizagem, pois elas, muitas vezes, sentem-se desprezadas e colocadas de

lado, pelas outras que não apresentam suas dificuldades. Os jogos cooperativos

entram no cenário escolar como uma solução para os grandes problemas de

relacionamento que afetam as escolas, o preconceito e a falta de respeito pelo

próximo.

3.1- Características e princípios dos jogos coopera tivos

Conforme Soler (2003), os jogos cooperativos têm várias características

libertadoras e coerentes com o trabalho em grupo:

- Libertam da competição: participação de todos para o alcance de uma meta comum;

- Libertam da eliminação: buscam a integração de todos;

- Libertam para criar: as regras são flexíveis e, todos podem contribuir para mudar o jogo;

- Libertam da agressão física: todos trabalham juntos, então não podem brigar.(SOLER, 2003:47)

Algumas atitudes podem ser desenvolvidas nos jogos cooperativos para o

benefício do indivíduo:

- A empatia: pôr-se no lugar do outro;

- A cooperação: trabalhar em prol de uma meta comum;

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- A estima: reconhecer e expressar a importância do outro;

- A comunicação: diálogo, intercâmbio de sentimentos, conhecimentos,

problemas e perspectivas.

Segundo Barreto apud Soler (2003), os jogos se baseiam em cinco princípios

fundamentais:

1. Inclusão: trabalhar com as pessoas no sentido de ampliar a participação e a integração delas no processo em curso.

2. Coletividade: conquistas e ganhos que somente conseguem coletivamente.

3. Igualdade de direitos e deveres: responsabilidade de todos pela decisão e gestão, como a repartição dos benefícios promovidos pela atividade cooperativa.

4. Desenvolvimento Humano: o aprimoramento do ser humano enquanto sujeito social.

5. Processualidade: a cooperação privilegia os meios, cada passo é dado levando-se em conta os anteriores. BARRETO apud SOLER (2003: 24),

3.2- Atividades cooperativas na escola

Ao se introduzir os Jogos Cooperativos na escola, o aluno e o professor terão

um importante meio para uma tomada de consciência de como é essencial diminuir

o número de pessoas marginalizadas dentro da escola, seja por qualquer motivo,

pois a escola de conhecemos tem como especialidade reforçar a competição. As

crianças são estimuladas a tirar notas altas, cada vez mais altas e aprendem a amar

o aprendizado. A Escola é o local ideal para se oportunizar o jogo, utilizar-se dele

com propriedade para sanar dificuldades de relacionamentos, acabar com os

preconceitos e ajudar crianças com distúrbios de aprendizagem, mas na maioria das

vezes ele só é utilizado para se passar o tempo, perdendo todo seu potencial de

educar através do lúdico.

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Lemos a primeira vez sobre jogo na obra que trata especificamente do

assunto, de forma sistemática, que é o livro “Homo Ludens” de Johan Huizinga,

escrito por volta de 1938. Nele lemos que:

O jogo uma ação ou uma atividade voluntária, realizada em certos limites físicos de tempo e lugar, segundo uma regra livremente adotada, mas absolutamente imperiosa, com um fim em si mesmo, acompanhado de uma sensação de tensão e júbilo e, da consciência de ser diferente da vida real. HUIZINGA apud SOLER (2003: 45)

Para o autor, os jogos da primeira infância são como “sementes”, que serão

“germinadas”, durante toda vida da pessoa.

Para se iniciar atividades cooperativas na escola, o primeiro passo é fazer um

levantamento, a partir da opinião dos alunos, propondo um mural cooperativo com

fotos e desenhos realizados por eles e pelo professor. Apresentar os jogos

cooperativos e estimular a criação e a transformação de outros jogos, tornando-os

mais cooperativos. Pode-se utilizar a música e a dança como forma de integrar e

aproximar as crianças.

Trabalhar com os Jogos Cooperativos é um trabalho para muito tempo, e todos, no final, são vencedores. Os participantes irão se divertir muito, elaborando, formando conceitos, tudo de uma forma lúdica e interdisciplinar, e no futuro, com certeza, teremos pessoas mais felizes, respeitando e valorizando as outras pessoas. E assim, uma nova geração nascerá, mais cooperativa e solidária, (SOLER, 2003: 61).

A pedagogia dos jogos cooperativos para Brotto apud Soler (2003), é apoiada

em três dimensões de ensino-aprendizagem:

1. Vivência: incentivando inclusão de todos.

2. Reflexão: incentivar as pessoas a refletir sobre as possibilidades de modificar o jogo, para melhorar a aprendizagem de todos.

3. Transformação: ajuda a sustentar a disposição para dialogar, decidir em consenso. (BROTTO apud SOLER, 2003: 20)

O processo do jogo cooperativo é dividido em: ação - reflexão - ação

melhorada. É preciso viver o jogo e depois fazer uma reflexão do que foi jogado,

para recomeçar sempre de forma melhorada, pois a principal característica do jogo

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cooperativo é não ter fim, fazer com que as pessoas que jogam sintam prazer em

sempre continuar jogando.

Para se criar ou separar grupos, existem alguns critérios que podem ser

utilizados conforme Brotto apud Soler (2003):

Quando queremos “mexer” com o grupo, misturando as diferenças: Dia do nascimento (grupo 1ª quinzena); cor das roupas (clara e escura); tipo de calçado (tênis, sapato); cor dos cabelos (claro e escuro); mês de nascimento (1º trimestre, 2º trimestre). (BROTTO apud SOLER, 2003: 61)

O facilitador do jogo, que é aquele que vai mediá-lo pode também criar outros

critérios de separação de grupos que sejam mais convenientes à sua turma de

alunos, sempre procurando unir o que é considerado diferente ou que sofre algum

tipo de preconceito.

Segundo Orlick apud Soler (2003):

Quando todos podem ganhar com a contribuição de todos, algo estranho acontece. As pessoas começam a ajudar umas as outras. ORLICK apud SOLER (2003, p. 67)

Segundo Brown apud Soler (2003):

O facilitador deve criar um ambiente para o jogo, deve acender o jogo. Se um facilitador sugere um jogo seca e desinteressadamente, o grupo não vai responder. É preciso mostrar com alegria, entusiasmo e riso, que o jogo é cooperação e celebração. BROWN apud SOLER (2003:81)

Este facilitador deveria ter, segundo Brown apud Soler (2003):

- comunicativo (mais que explicar o jogo, mas comunicar o sentido do mesmo);

- amável-amigo (união e solidariedade, mais um que se diverte com o jogo);

- criativo (no momento em que sugere um jogo, que adaptação deve ser feita?);

- flexível (é preciso mudar algo?);

- alegre (motivar a alegria);

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- sensível (ao grupo e as suas necessidades); paciente (é preciso esperar). BROWN apud SOLER (2003)

Ser um facilitador de um jogo não é deixar apenas que ele aconteça, mas

interferir, ajustando e contando com a colaboração do grupo que joga.

Para crianças pequenas, segundo Soler (2003), o jogo precisa ser explicado

de forma clara e objetiva, demonstrando como se joga, utilizando jogos em que a

participação seja total. Quanto mais música se utilizar melhor, sempre ficando atento

aos sinais de cansaço, pois as crianças pequenas se cansam com mais facilidade e

sempre verificar quando é necessário fazer a troca do jogo.

Deve-se, após o jogo, realizar o feedback, que segundo Soler (2003): “...é a

discussão do grupo após a atividade. Os feedbacks devem ser curtos e focalizados

no trabalho executado”. (SOLER, 2003: 90)

Algumas habilidades são desenvolvidas através dos Jogos Cooperativos e

elas podem ser de grande utilidade na escola, com crianças ditas normais e com

distúrbios de aprendizagem. São elas:

- Habilidades intelectuais: imaginar, perguntar, decidir;

- Habilidades interpessoais: encorajar, explicar, ajudar;

- Habilidade em relação aos outros: respeito, paciência, apoio.

- Habilidades físicas: falar, ouvir, escrever;

- Habilidades pessoais: alegria, compreensão, sinceridade.

Os componentes dos Jogos Cooperativos também são de essencial

necessidade nas escolas, pois estimulam as habilidades vistas anteriormente e

criam no aluno autoconfiança e elevam sua auto-estima. Segundo Soler (2003), os

componentes essenciais de um jogo cooperativo são:

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1. Cooperação: está ligada a comunicação, desenvolvimento de capacidades de interação social. É através dela que as crianças compartilham, preocupam-se com os outros.

2. Aceitação: no jogo cooperativo, todos são aceitos pelo que são e não pelos pontos que podem vir a marcar.

3. Envolvimento: sentimento de fazer parte de um todo. Satisfação por estar jogando.

4. Diversão: sem a diversão a criança verá o jogo como algo sem atrativo, pois o que prende a criança no jogo é a alegria. (SOLER, 2003: 97)

Trabalhar com os jogos cooperativos é fazer com que a criança que

apresenta qualquer distúrbio de aprendizagem veja uma luz, um alento para sanar

suas dúvidas e suas dificuldades.

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Conclusão

Para compreender as crianças portadoras de distúrbios de aprendizagem é

necessário uma série de estudos na área psicológica que mostrem as necessidades,

condições de aprendizagem, melhores metodologias e especificidades do indivíduo,

entendendo que se trata de um ser em desenvolvimento e é importante estudar os

modos mais adequados de mediação do conhecimento, específicos a esse

desenvolvimento.

Não é possível compreender as dificuldades que a criança encontra para

adquirir os conceitos numéricos, se não é possível entender que a base dessa

aquisição é um processo de construção-apropriação de conhecimentos, como

descreve Vergnaud (1991). Ao considerar-se a criança com distúrbio de

aprendizagem como um ser em desenvolvimento, é importante centrar-se no sujeito

e não no distúrbio.

O caminho para a inserção social está na educação. A inclusão veio

revolucionar o sistema educacional e modificar de modo geral as propostas

curriculares vigentes, que viam o aluno como mais um e não de maneira

individualizada. A educação inclusiva não se destina somente a atender

necessidades educativas especiais de alguns alunos, mas sim a abrir novos

horizontes para crianças e jovens sem perspectiva, sem futuro.

Mantoan (1998) afirma que:

O ensino que não se especializa em grupos típicos de aprendizes. É urna proposta escolar ampla e abrangente, que deve ajustar-se às necessidades e especificidades próprias de cada aluno, com ou sem deficiência, sem discriminar e segregar. Nesse sentido, nossa intenção neste estudo foi de colaborar com a descrição da aquisição do sistema numérico como um processo de construção, para compreensão do professor, do profissional da educação sobre a importância de não considerar somente o comprometimento do sujeito como uma necessidade de se especializar, seja em qualquer área, visual, motora, mas como um sujeito em desenvolvimento. Portanto, o professor necessita aprofundar o conhecimento teórico para favorecer o processo de ensino-aprendizagem. (MATOAN, 1998: 78)

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Trabalhar com os jogos cooperativos, pode ser o início de uma aprendizagem

produtiva e ativa nas escolas. Se eles estiverem presentes na vida das crianças, não

haverá crianças feridas em sua auto-imagem e nada mais haverá a temer.

São as crianças as que mais se favorecerão com essa experiência, que lhes

ajudará a serem crianças mais felizes, aprendendo a compartilhar e a ter um bom

relacionamento com os outros, sendo ele diferente ou não, com necessidades

especiais ou não. Maturana (1998) fala sobre a competição e a cooperação,

mostrando as diferenças que entre elas existem:

O ser humano individual é social, e o ser humano social é individual. Quando há interações cooperativas entre dois ou mais seres vivos, o resultado pode ser um sistema social. Nos seres humanos, as interações cooperativas se estabelecem espontaneamente em muitas circunstâncias diferentes, como expressão de nosso modo de ser biológico normal. (MATURANA, 1998:75).

Segundo Maturana (1998):

A conduta social está baseada na cooperação, não na competição. A competição é constitutivamente anti-social, porque como fenômeno consiste na negação do outro. Não existe a “sã competição”, porque a negação do outro implica a negação de si mesmo ao pretender que se valide o que se nega. A competição é contrária a seriedade na ação, já que quem compete não vive no que faz, se aliena na negação do outro. (MATURANA, 1998: 76)

O jogo ou brincadeira é um elemento que leva à motivação e à diversão e

está sempre presente nas brincadeiras infantis realizadas por vontade própria, sem a

estimulação do adulto. O jogo representa liberdade de expressão, renovação e

criação, do ser humano.

Devido a estas qualidades e por sua motivação própria acredita-se que

atividades lúdicas, relacionadas aos jogos, podem representar uma diferente forma

de ensinar, pois conseguem que a criança se interesse pela aula e participe dela de

uma forma natural, levando-a a uma aprendizagem significativa.

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O jogo pode ser um instrumento relevante para a formação de indivíduos com

distúrbios de aprendizagem, pois melhora-se o entendimento da gramática, da

matemática, da vida, fugindo da visão tradicionalista.

Baseados nestes momentos, buscar uma nova proposta que aproveite de

forma consciente o jogo, como instrumento metodológico durante as aulas,

possibilitará um desenvolvimento que respeite o aluno como ele é, com suas

limitações e seus progressos.

Portanto, criar ludicamente um ambiente de aprendizagem crítica e

participativa, onde o aluno sinta-se estimulado a aprender é o mínimo que se pode

fazer.

O educador, para ensinar, deve também estar imbuído de conhecimentos que

permita diversificar e criar estratégias de intervenção no ambiente escolar,

garantindo a igualdade de possibilidades do aprender de todos os alunos, em uma

busca constante de crescimento pessoal e profissional, levando esse aluno a uma

aprendizagem que valha a pena.

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