diário de bordo

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Sete países, sete realidades e um só desejo O dia-a-dia de uma equipe de filmagem ilcilene Figueira, coordenadora do Setor de Produção Audiovisual da JMM, lidera as viagens a campos missionários, realizadas anualmente com objetivo de entrevistar, registrar depoimentos, desafios, testemunhos... e trazer matéria-prima para a preparação dos vídeos que integram o material de cada Campanha de Missões Mundiais. Nil, como é conhecida pelos amigos, a pedido de nossa gerente de Comunicação e Marketing, Jaci Madsen, cedeu seu diário pessoal de viagem para que pudéssemos dividir com você os registros e impressões de alguém que tem o coração, a vida, a mente, os olhos e os pés – literalmente – na obra missionária mundial. A equipe visitou sete países – dois na Europa e cinco na África – e registrou a luta diária nos campos de missões transculturais. Burkina Fasso e Níger foram os campos inéditos nesta viagem. E passar alguns dias nas aldeias era a maior expectativa do grupo. Durante 58 dias, a equipe fez uma dezena de voos e percorreu mais de 13 mil quilômetros por terra em busca de imagens. A Europa, de onde saíram pregadores como Martinho Lutero e Charles Haddon Spurgeon, hoje é o continente com o menor número de evangélicos. Na África, apesar da perseguição contra os que deixam a religião tradicional, o trabalho está crescendo. Acompanhe um pouco da alegria, da dor, da emoção de quem vive por Missões.

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Sete países, sete realidades e um só desejo Dia-a-dia de uma equipe de filmagem da JMM

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Sete países, sete realidades e um só desejoO dia-a-dia de uma equipe de f ilmagem

ilcilene Figueira, coordenadora do Setor de Produção Audiovisual da JMM, lidera as viagens a campos missionários, realizadas anualmente com objetivo de entrevistar, registrar

depoimentos, desafios, testemunhos... e trazer matéria-prima para a preparação dos vídeos que integram o material de cada Campanha de Missões Mundiais.

Nil, como é conhecida pelos amigos, a pedido de nossa gerente de Comunicação e Marketing, Jaci Madsen, cedeu seu diário pessoal de viagem para que pudéssemos dividir com você os registros e impressões de alguém que tem o coração, a vida, a mente, os olhos e os pés – literalmente – na obra missionária mundial.

A equipe visitou sete países – dois na Europa e cinco na África – e registrou a luta diária nos campos de missões transculturais.

Burkina Fasso e Níger foram os campos inéditos nesta viagem. E passar alguns dias nas aldeias era a maior expectativa do grupo.

Durante 58 dias, a equipe fez uma dezena de voos e percorreu mais de 13 mil quilômetros por terra em busca de imagens. A Europa, de onde saíram pregadores como Martinho Lutero e Charles Haddon Spurgeon, hoje é o continente com o menor número de evangélicos. Na África, apesar da perseguição contra os que deixam a religião tradicional, o trabalho está crescendo.

Acompanhe um pouco da alegria, da dor, da emoção de quem vive por Missões.

epois de uma noite inteira de voo, chegamos a Portugal para 14 dias de visita. Na imigração, apresentamos a carta-convite da Convenção

Batista Portuguesa, mas três vezes fomos revistados. Somente quando falamos que íamos gravar os jogadores de futebol brasileiros, nos deixaram passar. Uma semana depois, entendemos a reação daqueles agentes federais.

Ser evangélico em Portugal é como ser de uma seita de enganadores, de retrógrados sem inteligência, como ouvimos dos portugueses. Mais espantoso ainda foi quando uma nova convertida nos disse que pensava que todos os protestantes haviam morrido na Inquisição.

Do aeroporto, fomos para a primeira entrevista. Na cidade de Vila Nova de Gaia, encontramos o pastor de uma igreja de mais de 40 anos, 120 membros e uma frequência aos cultos de 40 pessoas. O belo país dos casarios antigos e o famoso bacalhau começava a se mostrar.

Atravessamos o país de norte a sul, de carro, visitando os missionários da JMM e algumas igrejas locais. Portugal, o primeiro campo para onde os batistas brasileiros, em 1911, enviaram o primeiro missionário, parecia um país de não alcançados.

O secularismo domina a sociedade. A crise econômica tem trazido desespero às pessoas, mas não a busca por Deus. A depressão se tornou um problema de saúde. A política do bem-estar ruiu.

Portugal tem menos de 1% de evangélicos, e as igrejas têm, em média, 50 membros. Em muitas delas só há idosos, e a falta de pastor tem trazido tristeza aos poucos crentes que permanecem.

Num domingo, visitamos uma igreja na fronteira com a Espanha. Num pequeno templo, oito irmãos nos aguardavam. O cheiro de mofo, as teias de aranha nas janelas e as informações antigas no mural mostravam uma realidade distante e sombria. Eles cantavam tristemente e pediam um pastor.

Uma tarde, fomos almoçar num restaurante em Lisboa. Ao lado de nossa mesa havia uma senhora de uns 80 anos, sozinha, tomando cerveja e comendo caracóis.

Puxando conversa, ela nos perguntou se éramos

brasileiros e pediu para tirar uma foto com a gente. Disse que gostava de brasileiros, enfim, queria conversar.

Tiramos a foto e então ela escreveu seu endereço num papel e disse que mataria o cinegrafista Josias Siqueira, se não enviasse uma cópia para ela.

Um pouco surda, mas muito alegre talvez por causa da bebida, ela foi até nossa mesa e nos ofereceu caracóis. A aparência era horrível, e somente o missionário Ricardo Magalhães, pra não fazer feio, aceitou.

Depois ela sentou-se, calada, ficou comendo sua iguaria até nos despedirmos dela, com a promessa de que o missionário iria visitá-la depois para entregar-lhe a foto.

Imaginei aquela senhora chegando em casa sozinha, alcoolizada, dormindo do jeito que estava, e acordando no outro dia com uma baita dor de cabeça e pouco se lembrando do dia anterior.

Aquela mulher representa a situação de Portugal. Um país com um dos maiores índices de idosos da Europa, onde pessoas morrem sozinhas, sem esperança, trancadas em seus apartamentos.

Encontramos igrejas vazias e poucos vocacionados para o ministério. E foi para revitalizar essas pequenas igrejas e implantar outras que vários missionários estão hoje lá. E os resultados já começam a aparecer.

O primeiro campo missionário dos batistas brasileiros pede socorro

Portugal tem menos de 1% de evangélicos, e as igrejas têm, em média, 50 membros. Em muitas delas só há idosos, e a falta de pastor tem trazido tristeza aos poucos crentes que permanecem.

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uiné-Bissau, na África, foi nosso se-gundo destino. Nosso voo para Bissau atrasou. Depois de quatro horas no

avião, com muito sono e cansaço, chegamos. Era de madrugada.

Após o alvoroço, que é sair de um aeroporto afri-cano, e embaixo de uma chuva fina, arrumamos as bagagens na pickup da Missão Batista Bafatá e viaja-mos mais duas horas até Bafatá.

Dormimos de 6h às 10h e nos aprontamos para visi-tar a primeira aldeia muçulmana, a Tabanca de Águi-la, a 20 minutos dali. O calor e as casinhas simples perdidas entre o verde nos traziam a um outro mundo.

Ali, encontramos a missionária Adriana Justino sentada em-baixo de uma árvore junto com o povo. As crianças do PEPE (programa socioeducativo) local se reuniram numa sala e can-taram pra nós. Muitas delas tinham um amuleto amarrado à cintura ou ao pescoço para se protegerem dos espíritos maus. Elas se encantavam com as coloridas fotos que Jaci Madsen, gerente de Comunicação da JMM, fazia com o seu tablet.

Depois, seguimos para Campano, outra aldeia muçulma-na, 17 quilômetros mata adentro, onde a dentista e mis-sionária Elaine e o Pr. Freddy Ovando atendem 50 crian-ças com o POPE (Programa de Odontologia Preventiva e Educativa). Com escova de dentes e muita espuma, elas iam aprendendo a cuidar dos dentes. O POPE é o único trabalho evangelístico naquela aldeia.

Na capital, Bissau, encontramos a missionária Rosenilda Al-meida com um grupo de crianças muçulmanas. Na sala de sua casa, cerca de 85 crianças se reúnem a cada semana para ouvir histórias bíblicas. Depois os adultos se reúnem para a EBD.

Pelo asfalto, terra, trilha, mata fechada, sol, chuva... ía-mos filmando aquelas aldeias de casebres, num chão de barro vermelho, cercadas de um verde exuberante.

Um dos trabalhos mais impressionantes que vimos foi o da clínica médica, em Bafatá, onde há apenas um hospital.

As pessoas chegam com malária, verminose, feridas pelo cor-po, Aids... Muitas delas sem dinheiro para comprar os medi-camentos. Então elas recebem o remédio e ouvem a Palavra de Deus por fitas cassetes enquanto aguardam atendimento.

Na clínica, a nutricionista Sônia Santos, com seu esposo, Pr. José Roberto, realiza um projeto de nutrição com gestan-tes e bebês e aplica teste de diagnóstico de HIV.

Outro projeto que funciona ali é a clínica odontológica, um antigo sonho transformado em realidade, em uma região onde a única opção de “tratamento dentário” era se submeter à extração feita por um homem, debaixo de uma árvore e sem qualquer anestésico.

Hoje, há fila na porta da clínica. Pessoas até de outros países como Senegal e Guiné vão à Bafatá para atendimento.

Muitas chegam com dor, com fome, cansadas depois de caminharem até três dias. Então recebem um pedaço de pão com leite, e enquanto aguardam atendimento, ouvem a Palavra de Deus. Assim ficam confortadas.

Foram seis dias intensos. Sempre à tardinha chegávamos à casa cansados, empoeirados, famintos e então podíamos nos refrescar com um banho, comer e acessar a internet. À noite, cercados por mosquiteiros, dormíamos com um abençoado ventilador. Triste era quando na madrugada, o gerador de energia parava, e então, com as janelas abertas, tentávamos nos refrescar até pegar no sono de novo.

Foi restaurador encontrar um trabalho plantado há 18 anos, dando frutos num país onde até as ONGs desistiram de investir. A escola, a clínica médica, a rádio e o templo são o resultado de uma equipe de missionários visionários, desbravadores e de igrejas brasileiras fiéis sustentadoras.

18 anos depois

Um dos trabalhos mais impressionante que vimos foi o da clínica médica, em Bafatá, onde há apenas um hospital.

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O país onde fabricamos esperançaiferente das outras vezes em que visitamos o país, passamos pela imigração sem revistarem nossas bagagens. Às 16h, o clima era de total

tranquilidade. Era o tempo do jejum do Ramadã e talvez, por isso, aquele sossego.

Nossa primeira saída foi para a cidade de Mbour, onde está sendo construído um templo com várias salas. Um sonho para os convertidos que se reuniam na casa dos missionários, Pr. Ronaldo e Ana Paula Lourenço. Um diferencial num país onde 98% da população é muçulmana.

A visita ao projeto Surdos do Senegal, desenvolvido pelo casal missionário Pr. Walter e Alzira Freire, estava em nosso roteiro. A implantação do ministério nas igrejas e o treinamento de pessoas para trabalharem com esse grupo têm feito o projeto avançar.

Num país onde a criança surda é desprezada, por atribuírem esta deficiência física à ação de maus espíritos, ver o adolescente Ibrahim, o primeiro aluno adotado pelo projeto, ajudando no POPE, foi gratificante.

Numa manhã, saímos com a missionária Elizângela Chagas para uma gravação externa. A hostilidade comum em Dacar nos deixou em dúvida se conseguiríamos êxito. Era sexta-feira, e muitas pessoas estavam se dirigindo às ruas principais da cidade para a hora da oração. Fomos então até o Centro Cultural, e o cinegrafista Josias subiu na varanda e conseguiu ter uma visão geral do povo.

Era impressionante o mar de pessoas vestidas com roupões longos, todas sentadas em seus tapetinhos ao longo da rua, se inclinando naquele ritual que bem conhecíamos. Do alto falante, um homem dirigia a oração. Uns 10, 15 minutos depois, a multidão se

dispersou e as ruas voltaram ao normal.

Outra alegria foi visitar o projeto Fábrica de Esperança, onde o médico Humberto Chagas e a dentista Elizângela atuam. É como ver o deserto florescer. Os pacientes bem tratados sentem o amor de Deus nos gestos, nas atitudes e assim vão experimentando o amor de Deus.

Além das clínicas médica e odontológica, ali funciona, há três anos, a escolinha de futebol. Num campo de terra batida e embaixo de um forte sol, gravamos a alegria da garotada com a bola no pé. Cerca de 250 meninos já passaram pelo projeto e hoje estão inseridos na sociedade.

Outro braço do projeto é a escola dirigida pela missionária Andréa Chrysóstomo. Uma escola cristã num contexto muçulmano e animista, onde crianças de 5 anos de idade podem aprender histórias bíblicas. São crianças com dificuldades de aprendizagem porque não dormem à noite, dominadas pelo medo, oprimidas espiritualmente.

O PEPE, dirigido pelo missionário José Ricardo Nascimento, é outra ferramenta de trabalho para alcançar crianças. Hoje já são seis unidades funcionando no país. Uma esperança em uma nação onde 50% da população

tem menos de 18 anos de idade.

Foram seis dias de intenso trabalho no Senegal. E chocante por fazer entrevistas, almoçar, acordar e dormir ouvindo o cântico da mesquita. Cinco vezes por dia todo o país para por causa da oração. Crianças de 7 anos de idade jejuam. Um zelo religioso, uma determinação que mexe com qualquer coração cristão.

Nossa primeira saída foi para a cidade de Mbour onde está sendo construído um templo com várias salas. Um sonho para os convertidos que se reuniam na casa dos missionários.

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Um pequeno e desconhecido país

ossa aventura pela África continuou. Depois de quase descermos no Mali por engano, chegamos a Burkina Fasso. Fazia

calor e o lugar era simpático, bonitinho e organizado, como havia dito a missionária Cristiane Oliveira.

Minutos depois, entramos na periferia. À beira da rua havia muita mercadoria exposta e gente circulando. No trânsito, o número de motos impressionou.

Gravar em igrejas, em mercados, nas ruas e mesquitas estava em nosso roteiro, mas nossa grande expectativa era visitar a aldeia Naná.

Pela primeira vez iríamos dormir numa aldeia, e isso nos preocupava. A missionária Cristiane havia dito que sempre que ia lá, dormia numa barraca de camping dentro de uma casa. Como ela não tinha conseguido barracas pra equipe, dormiríamos em colchões no chão. Então ficávamos imaginando os insetos, as cobras.

Um dia antes, compramos pão, biscoitos, refrigerantes, água, mosquiteiro, lanterna, arrumamos alguns colchões e partimos. Pelo caminho compramos arroz e banana. A aldeia Naná ficava a 250 quilômetros da capital. Cinco horas depois de muitos solavancos e poeira, chegamos.

A família do missionário da terra Oumar Koné e alguns membros da igreja ali, nos aguardavam. Sentamos, conversamos, tomamos chá verde com açúcar enquanto observávamos o local.

Uma pequena casa de tijolo de barro, com quarto, sala e uma cozinha ao lado se destacava na plantação de quiabo, gergelim, crisântemo, feijão e milho. Ao redor, cabritos, galinhas e um burrinho completavam a paisagem. Ao lado, outra casinha abrigava uma família.

O banheiro, nos fundos da casa, era formado por dois cômodos minúsculos, sem teto, com paredes na altura dos ombros. O sanitário era um buraco, que ao meio-dia era povoado de moscas azuis.

Já noite, e com o estômago roncando, nos sentamos ao redor de uma pequena mesa, comemos arroz com frango caipira, conversamos e demos muita risada. Uma lua cheia, esplendorosa iluminava, fazendo silhuetas no chão como se fosse dia.

Lá pelas 22h, nos despedimos e fomos para o local onde dormiríamos. Atravessamos um terreno com plantação

Milagres de cura, vida de oração, perseguição, ir aos povos não alcançados... Pr. Koné e os líderes das igrejas nas aldeias ao redor tinham muita coisa a contar.

e chegamos. Uma casa com dois cômodos, coberta de zinco, foi nosso refúgio naquela imensidão.

Pr. Koné montou nossos mosquiteiros e colocou os colchões em cima de tapetes de palha trançada. Uma pequena lanterna iluminava o espaço.

Na entrada do quarto, um pequeno espaço acumulava cascalhos, plásticos, madeiras, tecidos velhos. Um bom lugar para insetos e escorpiões. Mas depois que os colchões e mosquiteiros foram montados, ficamos protegidos.

O clima era agradável, quase frio. Lá fora, milhares de sapos cantavam. Um basculante de ferro, pequeno e sem vidro, renovava o ar. Pela madrugada, acordava e agradecia a Deus pelo teto de zinco e o cortinado, pelo conforto e proteção. Quanta energia desperdiçada com preocupações.

Cedo começamos as gravações. Atravessamos o imenso terreno de plantações e chegamos ao pequeno templo. Os bancos eram feitos com toras de árvore, sem encosto e bem perto do chão. Imaginei o desconforto daqueles irmãos nos cultos.

A imagem dos missionários sendo entrevistados em frente ao templo era singular, com meninas e meninos pastoreando cabras ao fundo. Parecia uma montagem.

Milagres de cura, vida de oração, perseguição, ir aos povos não alcançados... Pr. Koné e os líderes das igrejas nas aldeias ao redor tinham muita coisa a contar.

Amamos esse pequeno e tão pouco conhecido país e sua gente amável. O trabalho da Cristiane era claro, incontestável. Havia a horta comunitária, a fabricação de sabão, a abertura de poços, o testemunho do Evangelho, o discipulado e muito treinamento de obreiros. É dessa forma que a Palavra de Deus é anunciada naquela região do planeta.

O Evangelho chega às aldeias

epois de duas horas e meia de voo, chegamos ao Níger. O clima calorento e abafado da capital, Niamey, era desconfortável, mas não

se comparava aos 50 graus que costuma fazer no país. Do avião, dava pra ver a pouca vegetação e uma grande área desértica.

Fomos para a casa dos missionários Josué e Kely Pacheco, que abriga os Radicais do programa Voluntários Sem Fronteiras que chegam ao país.

Nossa primeira viagem foi para a aldeia de Seberi Zarma onde a turma Radical 7 morava. A turma 8 foi conosco para conhecer o local. Depois de uns 40 minutos, chegamos.

Na entrada, um poço comunitário estava rodeado de mulheres com suas bacias e baldes coloridos. Ao entrarmos na aldeia, demos de cara com bois, vacas, carneiros, ovelhas e muitas galinhas e pintinhos. As casas ficavam ao redor. A residência dos Voluntários Sem Fronteiras é a única com energia elétrica.

Nos instalamos, tomamos o café da manhã com os jovens e começamos as visitas pela comunidade. Uma aula transcultural ao vivo e em cores.

À tarde, fomos conhecer o único hospital da região, onde a Radical Paula Cristine ajuda com curativos e nos serviços da farmácia. No portão de entrada, um grupo aguardava a senha de atendimento. As crianças choravam de fome e cansaço. Estavam ali desde às 5h da manhã esperando.

De volta à aldeia, visitamos casas, gravamos com a comunidade, conhecemos o trabalho de costura, de cabeleireiro e de informática realizado pelos jovens missionários, nos ocupamos com tantas novidades que nem vimos o dia passar.

A arrumação dos mosquiteiros, a comida, a escovação dos dentes, o banho, tudo naquele jeito simples e improvisado estava se tornando comum para nós. A noite foi tranquila, e os ventiladores, um presente dos céus.

No outro dia, saímos cedo para visitar outra aldeia a duas horas e meia dali. Na aldeia de Dargol, encontramos uma família cristã. Sentamos todos embaixo de uma árvore, e Josué fez um estudo bíblico com eles.

Aquela era a única família cristã naquele local, fruto do trabalho dos Voluntários Sem Fronteiras que moraram com eles um período. Depois de uma ameaça feita pela Al Qaeda na Nigéria, os jovens tiveram de se mudar e passaram a ir à aldeia somente durante o dia.

A família sofreu pressão para deixar o cristianismo, mas como se manteve firme, a comunidade começou a respeitá-la.

O cristão, líder da aldeia, trabalha fazendo objetos de metal como faca e outros instrumentos. E por lidar com fogo, é temido pelo povo porque eles associam o fogo ao poder espiritual.

As mulheres da aldeia, sem saberem ler, ouviam a Bíblia por um rádio e decoraram capítulos inteiros da Palavra de Deus.

Josué e Kely estavam felizes e sonhando com a ampliação do projeto de reforço escolar, com o apoio ao trabalho, com o discipulado feito nas aldeias, certos de que os frutos continuarão vindo. Saímos do Níger com a certeza de que Missões é o plano de Deus para a humanidade.

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Onde se vive o amor1h da madrugada, fomos para o aeroporto de volta à Europa. Passamos por Casablanca, no Marrocos, e por Lisboa, e por causa dos

atrasos, 24 horas depois, chegamos à Espanha.

Da Espanha, fomos de carro até o porto, ao sul, tomamos um barco e chegamos a um território espanhol de 17 mil quilômetros quadrados.

Ali, ficamos pouco tempo porque estávamos de passagem para o Marrocos, mas queríamos conhecer um pouco a realidade local, com 45 mesquitas e uma população de pessoas vindas da Europa e da África.

As ruas estão sempre cheias de gente, há muito comércio e controle do governo. Deprimente foi ver as “mulheres-cavalo” que atravessam do Marrocos para a região levando mercadorias para burlar a fiscalização. Mulheres, algumas idosas, envergadas com enormes sacolas na cabeça para ganharem 1 euro por carregamento.

Nosso objetivo era ir até as montanhas do Marrocos, mas estávamos apreensivos com a repercussão que um vídeo sobre Maomé lançado na internet havia causado. Em sete países houve atentados, e Marrocos era um deles. Orientados por um obreiro, teríamos de viajar por fora das grandes cidades.

Nos preparamos em oração e partimos cedinho para uma viagem de 10 horas. A paisagem aos poucos ia se transformando, ora numa vegetação seca, ora sem vegetação, alguns trechos com muito verde. As montanhas de pedras, as ovelhas pastando lembravam a terra dos hebreus.

Era quase noite quando chegamos e encontramos a família muçulmana que nos hospedaria. O principal contato de nossos obreiros naquele local. Pai, mãe, filhos e netos, simples e agradáveis.

Nos alojamos na parte superior da casa. Em seguida, nos serviram chá de hortelã com chá verde, pão caseiro, mel, manteiga e bolinhos em lascas fritos.

Estávamos no norte da África, numa comunidade muçulmana bem diferente dos lugares por onde havíamos passado. Não podíamos falar que éramos cristãos, não podíamos fazer barulho, dar gargalhadas, enfim, teríamos de ser discretos e recatados, e as mulheres usarem saias longas e cobrir os braços.

Depois de uma agradável noite fria, mas com bons cobertores, acordamos e saímos para uma comunidade

no alto da montanha onde vivem os beduínos beneficiados pelo projeto.

Subimos e, em meia hora, estávamos no meio do nada, com um vento forte batendo e umas poucas casinhas ao longe, um deserto. De repente, as pessoas começaram a chegar sem que víssemos de onde.

Uma mulher, duas, três, sempre com crianças e um burrinho. Chegavam tímidas, sorriam, nos beijavam, pegavam suas sacolas com alimentos básicos e saíam alegres. Ali no ermo, a mala do carro aberta, os pacotes iam sendo distribuídos. Um beduíno morador local e o senhor que nos hospedava ajudavam o missionário no controle.

Depois, fomos convidados para entrar na pequena tenda do beduíno que estava ajudando a equipe. Tiramos os calçados, entramos e sentamos nos tapetes onde dormiam. Numa pequena mesa quase rente ao chão, tomamos chá de hortelã e comemos pão com mel, tudo produzido ali mesmo.

Ficamos orgulhosos de estar ali numa missão, naquele deserto, num lugar aonde ninguém havia chegado antes.

Outra visita que fizemos foi à escola primária onde funciona a escolinha de futebol. Na entrada já se podia ver o entusiasmo das crianças ao verem os missionários chegando com bolas e redes. Ficamos ali uma hora vendo a garotada pular, correr, chutar, e sob os olhares cautelosos do diretor e de um professor.

As meninas ficavam ao nosso redor, tentando nos fazer entender o árabe delas. A missionária todo o tempo respondia perguntas. Elas olhavam nossos cabelos, nossas unhas e faziam perguntas de todo o tipo. Rostos e olhos ávidos por aprender que ficaram em minha memória.

Ficamos orgulhosos de estar ali numa missão, naquele deserto, num lugar aonde ninguém havia chegado antes.

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Um país em crise

ns cinco dias depois, estávamos de volta à Espanha para nossa última parada. Nossa ênfase ali era registrar o ministério dos

obreiros brasileiros na evangelização.

Nos instalamos na igreja do Pr. Elton e Miriam Rangel, em Sevilha. Parecia que estávamos retornando ao século 21.

À hora da sesta, de 14 às 18 horas, tudo parava. O calor forte era um convite ao descanso. Todos os dias era assim. Não havia lojas abertas e poucas pessoas permaneciam nas ruas. À noitinha, elas saíam para passear, fazer compras, tomar sorvete.

Nesse horário, almoçávamos, organizávamos os equipamentos, fazíamos relatórios, respondíamos e-mails e assim descansávamos.

A Europa que encanta turistas e historiadores estava lá, intacta para quem quisesse ver. A beleza da milenar Espanha com seus castelos, suas lojas de grife, seus teatros e templos católicos escondia a crise.

A realidade era outra. Os encontros com as dezenas de obreiros brasileiros e líderes espanhóis nos mostraram algo bem além da aparência.

A sociedade tem sido bombardeada pela quebra de valores. A família com pai, mãe e filhos está acabando. O índice de mulheres maltratadas é grande. Há cidades com altos índices de prostituição. A maioria do povo se esqueceu de Deus.

A Espanha católica está se tornando um país muçulmano. Há uma mistura de paganismo, secularismo, um vazio existencial. O povo está decepcionado com o cristianismo.

Os 10 anos de entrada de imigrantes latinos ajudaram no crescimento das igrejas. Hoje, com a volta deles aos seus países, as igrejas diminuíram. A população de evangélicos não chega a 2%.

Os missionários têm uma luta árdua diária na implantação de novas igrejas e no fortalecimento das que estão sem pastor. Há trabalho de música e esporte alcançando adultos e crianças. Há cultos nos lares, discipulado, distribuição de roupas e alimentos, treinamento, discipulado, convívio, amizade, vida de integridade.

Nilcilene FigueiraEnviada especial da JMM aos campos missionários para registro de imagens e entrevistas. Coordenadora do Setor Audiovisual da JMM

A Espanha católica está se tornando um país muçulmano. Há uma mistura de paganismo, secularismo, um vazio existencial. O povo está decepcionado com o cristianismo.

Foram 13 dias visitando os campos missionários em Sevilha, Huelva, La Línea, Estepona e Málaga, revezando o trabalho com a jornalista Raquel de Lima. E com ela presenciamos belos templos vazios, rostos abatidos, idosos solitários, europeus remexendo lixo, mas sem perder a esperança de ver a Espanha renascendo para Cristo.

Da Espanha, retornamos ao Brasil. Estávamos cansados, com saudades de nossa gente, nosso guaraná, o arroz com feijão, mas realizados pela missão cumprida. Sem malária e com muitas histórias e imagens registradas.

Vimos risos e lágrimas, ouvimos desabafos, corações palpitando, vidas transformadas, vidas doadas, e muito desejo de fazer o nome de Jesus conhecido em toda a Terra. Olhar com a lente da câmera e ver com os olhos de Deus foi nosso maior objetivo nessa viagem.

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