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    - Maio 2006 vol 34 nº 05

    Resumo

     As arritmias cardíacas são de ampla importância para o prognóstico fetal e podem acarretar em in-cremento na morbimortalidade perinatal, tornan-do-se área de grande valor na avaliação pré-natal.Realizar uma avaliação morfofuncional completae pormenorizada do aparelho cardiovascular fetalapresenta importância na ultra-sonografia. As al-terações do ritmo cardíaco fetal são definidas comotaquicardia fetal quando a freqüência for maiorque 180 batimentos por minuto e bradicardia fetalquando for menor que 100 batimentos por minu-to. Mediante o diagnóstico de arritmia cardíaca

     fetal, devem-se investigar alterações estruturaisdo coração através da ecografia em tempo real. Asarritmias benignas transitórias são muito comuns,incluindo as extrassistolias supraventriculares e

     ventriculares, a bradicardia sinusal e a taquicar-dia sinusal. As arritmias malignas englobam 10 a20% dos casos e incluem a taquicardia supraventri-cular, bloqueio átrio-ventricular total e taquicardia

     ventricular. A etiologia das arritmias malignas estárelacionada à presença de via de condução anôma-la ou acessória ou de foco ectópico autônomo. Asarritmias benignas podem ser decorrentes de fato-

     Arritmias Cardíacas Fetais:Diagnóstico e Tratamento Não-Invasivo

    Fetal Cardiac Arrhythmias: Diagnostic and Non InvasiveTreatment

    Elaine Christine Dantas MoisésRicardo de Carvalho CavalliSandra Regina CarvalhoLuciana de Barros DuarteAderson Tadeu Berezowski

    Sérgio Pereira da CunhaGeraldo Duarte

    Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto daUniversidade de São Paulo – Hospital das Clínicas

    res fetais, mecanismos auto-imunes, descontroleshormonais ou compressão da cabeça e/ou cordão.

    Dentre fatores maternos destaca-se uso de drogas, febre, infecções, anemia e doenças auto-imunes.O manejo especializado das arritmias fetais, in-cluindo a terapia farmacológica intra-uterina,diminuem a morbidade relacionada a hidropsia

     fetal, prematuridade e nascimento por via abdomi-nal, portanto torna-se importante o conhecimentodas características dos principais medicamentosutilizados no tratamento de taquiarritmias fetaise seus esquemas terapêuticos.

    PALAVRAS-CHAVE: Arritmias cardíacas. Ecocar-diografia fetal. Tratamento clínico.

    Introdução

     A gestação é um fato muito esperado e cercadode expectativas na vida de um casal, da família liga-da a este casal e de toda a sociedade. A ocorrênciade uma patologia congênita e suas conseqüênciaspode acarretar grave desestruturação deste círculofamiliar, principalmente quando diagnosticada ape-nas no período pós-natal, sem a prévia preparaçãopsicológica e estrutural para a mesma.

    ATUALIZAÇÃO

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    Nas últimas décadas, tem-se dado grandeênfase à avaliação morfofuncional fetal na buscade detecção precoce de alterações congênitas. Asarritmias cardíacas são de ampla importânciapara o prognóstico fetal e podem acarretar emincremento na morbimortalidade perinatal,tornando-se área de grande valor na avaliaçãopré-natal. Realizar uma avaliação morfofun-cional completa e pormenorizada do aparelhocardiovascular fetal apresenta importância naultra-sonografia (Muller ., 2005).

     A detecção precoce, durante o pré-natal,das anomalias cardíacas permite o apoio familiarnecessário e a possibilidade de encaminhamentoa centros de assistência terciária que ofereçamestrutura para atendimento pré e pós-natal ade-quado.

     A identificação de arritmias fetais, dentro dasdoenças cardíacas fetais, tem apresentado grandeavanço nas últimas décadas devido à avaliaçãoobstétrica rotineira por ultra-sonografia e monito-rização mais adequada da freqüência cardíaca fetal(Vergani et al., 2005).

    Histórico

    Descrições dos sons emitidos pelo coração

    fetal são encontradas há mais 150 anos. Em 1830,Kennedy relatou certos sons e murmúrios ouvidosatravés do abdômen de uma gestante, que nãoeram coincidentes com a freqüência cardíaca ma-terna (Hyman, 1930).

     A ausculta do ritmo cardíaco fetal começoua ser valorizada como marcador de bem-estar fetaldurante o trabalho de parto no final do século 19(Strasburger, 2000). O primeiro relato de detec-ção pré-natal de arritmia fetal foi realizado em1930 por Hyman. Em 1969, Silver et al. observarama associação de taquicardia supraventricular fetal

    e mortalidade por hidropsia fetal não-imune e, em1977, McCue et al. descreveram a associação debloqueio átrio-ventricular total e lúpus eritemato-so sistêmico materno (Boutjdir, 2000). No final dadécada de 70, iniciaram-se as primeiras tentativasde tratamento fetal através de administração ma-terna de drogas anti-arrítmicas.

    Na década de 80, surgiram várias descriçõesda anatomia normal do coração fetal humano e dealterações anatômicas e/ou funcionais, observa-das através de aparelhos de ultra-sonografia, pelatécnica de ecocardiografia em tempo real (Kleinmanet al., 1980; Devore et al., 1982; Devore et al 1983,Kovalchin & Silverman, 2004).

    Nas últimas duas décadas, o diagnóstico dearritmias cardíacas fetais apresentou grande in-cremento, devido à integração da ultra-sonografiaà prática clínica, à maior monitorização pré e peri-natal da freqüência cardíaca fetal e a formação decentros especializados em atendimento de gestaçãode alto risco.

    Com o aprimoramento das técnicas diagnósti-cas, principalmente na área de ecocardiografia fetal,houve a possibilidade de diagnósticos de anorma-lidades cardíacas mais precoces e mais precisas,inclusive no primeiro trimestre de gestação, possibi-litando seguimento e tratamento mais direcionadospara a doença específica (Allan et al., 1997).

    Incidência e Etiologia As alterações do ritmo cardíaco fetal são

    definidas como taquicardia fetal quando a fre-qüência for maior que 180 batimentos por mi-nuto e bradicardia fetal quando for menor que100 batimentos por minuto (Allan et al. 1997, Tanel& Rhodes, 2001).

     A suspeita de arritmias fetais não é rara, cor-respondendo por 15 a 32% dos encaminhamentospara avaliações de ecocardiografia fetal. A grandemaioria das arritmias fetais, cerca de 80 a 90%, são

    benignas e 10 a 20% são consideradas malignas, ouseja, que requerem tratamento e que apresentamprognóstico ruim para evolução pós-natal (Cros-son & Scheel, 1996; Strasburger, 2000; Kleiman &Neghme, 2004).

    Dois terços dos casos são diagnosticados du-rante o último trimestre da gestação, pois é a faseonde está mais sujeita a processos destrutivos nosistema de condução, principalmente auto-imunes,maior influência endócrina e em que se realiza mo-nitorização da freqüência cardíaca fetal de maneiramais intensa (Kleiman & Neghme, 2004).

     A maioria dos casos de arritmias cardíacasfetais não apresenta alterações maternas associadas(Tanel & Rhodes, 2001). Porém, qualquer fator quealtere o ritmo cardíaco materno poderia predispora arritmias fetais (Boutjdir, 2000; Sharland, 2001;Friedmanet al., 2001). Portanto, devem-se pesquisardoenças maternas, principalmente as auto-imunes,anormalidades endócrinas, infecções, anemia, febre,exercícios, ingestão de medicamentos ou drogas(Gymosky et al., 2004).

    Mediante o diagnóstico de arritmia cardíacafetal, devem-se investigar alterações estruturais docoração através da ecografia em tempo real (Sharland,2001; Manning, 2001). Defeitos do septo átrio-ventri-

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    cular podem cursar com bloqueio de condução átrio- ventricular total, devido à falha na união do nó átrio- ventricular e o sistema His-Purkinje. A persistênciade tecidos condutores átrio-ventriculares acessóriospodem acarretar taquicardia supraventricular reen-trante, e aneurisma de septo primário estão associadosa focos ectópicos.

    Técnicas Diagnósticas

     A maioria dos casos é primariamente detectadapor ausculta do batimento cardíaco fetal durante oseguimento de pré-natal ou durante monitorização,através da cardiotocografia, requerendo comprova-ção diagnóstica com métodos mais específicos.

    O eletrocardiograma fetal apresenta aplica-ções limitadas, quando realizado através da viatransabdominal. Apresenta melhor aplicabilidadequando feito através de eletrodos no escalpe fetal,durante o trabalho de parto, porém de difícil inter-pretação (Kleiman & Neghme, 2004).

    Os avanços técnicos em ecocardiografia emtempo real tornaram-na o método de escolha paraavaliação da anatomia e função do coração fetal,diagnóstico e seguimento das alterações cardía-cas fetais (Devore et al., 1982, Allan et al., 1984,Simpson, 2004). Esta técnica proporcionou também

    possibilidades de intervenções intra-útero de de-terminadas alterações, melhorando o prognósticofetal pré e pós-natal (Kohl et al., 2002).

     A ecocardiografia em tempo real é divididaem três modos que se complementam, sendo esteso M-mode, o modo bidimensional e o doppler  pul-sado (Devore et al., 1983; Simpson, 2004).

    O M-mode avalia a contração atrial e ventricu-lar simultaneamente. O ritmo é determinado atravésda movimentação das paredes das câmaras durantea sístole e das valvas AV durante a diástole. O eletro-cardiograma pode ser reconstituído baseando-se na

    contração atrial e na contração ventricular, já que osonograma expressa o sinal emitido e recebido atra- vés das estruturas do coração, e conseqüentementeà distância entre elas e a movimentação das mesmasem tempo real (Kovalchin & Silverman, 2004). Asprincipais limitações deste modo ocorrem durantea avaliação de fetos de gestantes obesas, na presen-ça de polihidrâmnio ou quando ocorre sombra dascostelas dificultando a visualização das imagens.O exame também é dificultado pela movimentaçãofetal, prejudicando a reprodução das imagens.

    O modo bidimensional facilita o posiciona-mento adequado do transdutor em relação aosplanos cardíacos, possibilitando a realização do

    exame, posteriormente, no M-mode e através dodoppler  pulsado. Este modo também auxilia naobservação de defeitos estruturais, hidropsiafetal, ritmo cardíaco em tempo real e de carac-terísticas funcionais do coração fetal. O planoutilizado possibilita a visualização de diferentese complementares setores do coração fetal, favo-recendo diagnósticos mais precisos da anatomia(Allan et al., 1984).

    O doppler  pulsado é empregado na avalia-ção das arritmias fetais, avaliação da hemodinâ-mica fetal. Complementa a avaliação do M-modee do modo bidimensional, sendo útil quando aaplicação do M-mode estiver prejudicada.

     Arritmia Cardíaca e Hidropsia Fetal Não-Imune Aproximadamente 22 a 50% dos casos de hi-

    dropsia fetal não imune estão associados a defeitoscardíacos estruturais ou arritmias (Strasburger,2000; Hallak et al., 2001)

     A fisiopatologia é explicada pela disfunção ventricular, decorrente de arritmias ou alteraçõescardíacas estruturais, ocasionando aumento daforça hidrostática em átrio direito e conseqüenteestase em território venoso e extravasamento defluído para o compartimento extravascular (Stras-

    burger et al., 1997).Não foi demonstrada correlação entre afreqüência ventricular ou o mecanismo da taqui-cardia supraventricular e hidropsia fetal, porémexiste correlação positiva entre o desenvolvimentode hidropsia e a duração sustentada de taquicardiasupraventricular. E a ausência da sustentação dataquicardia supraventricular também está direta-mente correlacionada com a ausência de hidropsiafetal (Naheed et al., 1996).

     A mortalidade por hidropsia não-imuneé elevada, chegando 50 a 80 % dos casos de um

    modo geral, porém aproximadamente 100% noscasos de hidropsia avançada. Outras complicaçõesobstétricas também podem estar relacionadas aesta patologia, como as alterações de transferênciade drogas, devido ao edema placentário, trabalhode parto pré-termo e baixa tolerabilidade fetal aoestresse. A morbimortalidade neonatal também seapresenta elevada devido à presença de derramesem cavidades, alta prevalência de síndrome dedesconforto respiratório do recém-nascido, acido-se e sepsis neonatal (Hallak et al., 2001).

    O tratamento da arritmia cardíaca pode re- verter o quadro de hidropsia, sendo o tempo destareversão muito variável (Hallak et al.,1991).

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    Tipos de Arritmias Cardíacas

     As arritmias benignas transitórias são muitocomuns, incluindo as extrassistolias supraventri-

    culares e ventriculares, a bradicardia sinusal e ataquicardia sinusal. As arritmias malignas englo-bam 10 a 20% dos casos e incluem a taquicardiasupraventricular, bloqueio átrio-ventricular total etaquicardia ventricular (Allan et al., 1984; Crosson& Scheel, 2001; Sharland, 2001).

     As arritmias benignas podem ser decorrentesde fatores fetais como alterações do sistema nervosoautônomo, mecanismos auto-imunes, descontroleshormonais ou compressão da cabeça e/ou cordão.Dentre os fatores maternos pode-se destacar o usode drogas, exercícios, febre, alterações hormonais,

    infecções, anemia e doenças auto-imunes. A etiologia das arritmias malignas está re-lacionada à presença de via de condução anômalaou acessória ou de foco ectópico autônomo, sendoo tratamento direcionado para o tipo de arritmia(Kleiman & Naghme, 2004)

     Extrassistolias

    Contração Atrial PrematuraOs ritmos cardíacos irregulares são geralmen-

    te decorrentes de contrações atriais prematuras, que

    são conduzidas ao ventrículo e, se ocorrer durante adiástole, deflagram um batimento cardíaco fora doritmo normal, denominado extrassistolia (Sharlandet al., 2001). Atinge de 1 a 3% das gestações, apre-sentando-se como bigeminismo ou trigeminismoatrial. Pode estar associada a defeitos estruturaisde septo inter-atrial, hipertireoidismo materno,trissomia 18 ou uso de drogas (Strasburger, 2000).O tratamento não é necessário, pois evoluem pararesolução espontânea do quadro clínico.

    Contração Ventricular Prematura A contração ventricular prematura isolada é

    rara. Pode ocorrer em fetos normais ou estar associadaa cardiomiopatias, miocardite, bloqueio átrio-ventricu-lar total, hidropsia fetal, síndrome do QT longo ou mal-formações cardíacas estruturais (Strasburger, 2000). Otratamento geralmente não é necessário, mas devem-seacompanhar as crianças, pelo risco de desenvolvimentode taquiarritmias.

     Bradiarritmias

    Bradicardia Sinusal Variações no ritmo cardíaco fetal com curtos

    períodos de bradicardia sinusal transitória ocorrem

    em fetos normais e são geralmente decorrentesde ação vagal, não acarretando conseqüênciasclínicas. A bradicardia sinusal persistente é rara,podendo estar associada ao tônus vagal aumentado,restrição de crescimento intra-útero, uso maternode -bloqueador, ritmo agônico em hidrópicosseveros ou ser idiopática (Strasburger, 2000; Shar-land, 2001).

    Bloqueio Átrio-ventricular TotalO bloqueio átrio-ventricular total ocorre em

    1:20.000 nascidos vivos (Gochberg, 1964). É possí- vel o diagnóstico em idade gestacional precoce du-rante o pré-natal, porém a verdadeira incidênciadesta patologia intra-útero ainda é desconhecida,podendo chegar ao dobro da referida em nascidos

     vivos, devido à elevada mortalidade. A primeira manifestação intra-útero desta

    doença é geralmente a bradicardia fetal. Atravésda avaliação simultânea dos átrios, ventrícu-los e movimentos das valvas pelo M-mode oudoppler  pulsado, observa-se que freqüência atrialé normal e que o ritmo ventricular está bradicár-dico, havendo, portanto, uma dissociação entreas contrações atriais e ventriculares (Ghani &Bedford, 2002).

    O bloqueio átrio-ventricular total estáassociado em 53% dos casos com malforma-ções cardíacas maiores, em 45% com doença

    de colágeno materna e em 25% dos casos comcromossopatias. A associação entre bloqueioátrio-ventricular total e doença do tecido conec-tivo materna está bem determinada, principal-mente com anticorpos maternos circulantes dotipo anti-Ro e anti-La, mesmo na ausência dedoença clínica (Boutjdir, 2000; Sharland, 2001;Friedman et al., 2001).

     Apr esent a pi or progn óstico qua nd o afreqüência cardíaca fetal é menor que 50 bati-mentos por minuto, quando anticorpos anti-Romaternos são negativos ou quando associado

    à hidropsia fetal, defeito estrutural, cromosso-mopatia, disfunção ventricular ou regurgitaçãode valva átrio-ventricular (Strasburger, 2000;Sharland, 2001).

     A hidropsia fetal está presente em 17% dosfetos com bloqueio átrio-ventricular total semdefeito estrutural e 63% dos fetos com defeito es-trutural. A mortalidade fetal está em torno de 50%quando associada à malformação complexa e de100% quando associada à hidropsia fetal.

     A terapia intra-útero do bloqueio átrio-ven-tricular total tem apresentado sucesso variável(Friedman et al., 2001). A administração materna de

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    corticosteróides, nos casos de pacientes portadorasde anticorpos anti-Ro positivas, tem mostrado fa-

     voráveis, evitando o desenvolvimento da alteraçãocardíaca fetal. O tratamento da arritmia é feitoatravés da prescrição materna de isoproterenol,terbutalina e ritodrina.

    Taquiarritmias

    Taquicardia SinusalNa taquicardia sinusal, a freqüência cardíaca

    fetal apresenta-se entre 180 e 200 batimentos porminuto. As causas estão relacionadas à hipóxia e/ouacidose fetal, infecção, miocardite ou a ingestãomaterna de drogas, hormônios ou catecolaminas,sendo o tratamento baseado na resolução da etio-logia de base (Gymosky et al., 2004).

    Taquicardia Supraventricular Na taquicardia supraventricular, a freqüên-

    cia cardíaca fetal mostra-se superior a 180 batimen-tos por minuto, estando geralmente entre 240 e290 batimentos por minutos. O mecanismo propos-to é o da reentrância por conexão átrio-ventricularacessória, havendo concordância átrio-ventricularem 1:1, geralmente apresentando início e resolu-ções espontâneas súbitas (Tanel & Rhodes, 2001;Jones & Garmel, 2001).

     A decisão em tratar a taquicardia depen-

    de da idade gestacional, presença de sinais deinsuficiência cardíaca, duração dos episódiosde taquicardia e da opinião dos pais sobre otratamento (Crosson & Scheel, 1996). Apresentaboa resposta com a utilização de digoxina, entreoutras, sendo esta a droga de escolha (Hallak etal., 1991; Jones & Garmel, 2001). A persistênciada arritmia pode resultar em insuficiência cardí-aca congestiva e, conseqüentemente, hidropsiafetal não-imune, piorando o prognóstico fetal(Sharland, 2001, Hallak et al., 1991). Em fetoshidrópicos, com maturidade pulmonar atingida,

    a resolução da gestação deve ser ultimada e otratamento realizado pós-natal, pois ocorre pre- juízo na transferência transplacentária de drogas,devido ao edema placentário.

     Flutter AtrialO flutter atrial representa um terço das ta-

    quiarritmias fetais, sendo a mais comum taquicar-dia atrial primária (Tanel & Rhodes, 2001). O ritmoatrial apresenta-se entre 400 e 500 batimentos porminuto, porém, como há bloqueio átrio-ventricular

     variável, a freqüência atrial é maior que a ventricu-lar, que é de aproximadamente 200 batimentos porminuto, normalmente sustentada.

    Esta taquiarritmia em fetos apresenta elevadaassociação com conexões átrio-ventriculares aces-sórias (Naheed et al., 1996). Também possui asso-ciações com mecanismo de reentrância, defeito desepto atrial, síndrome coração esquerdo hipoplásico,malformação de Ebstein de valva tricúspide, cardio-miopatia e raquitismo familiar (Porat et al, 2003). Otratamento evolui com sucesso em 60% dos casos,sendo realizado com a administração de quinidina,amiodarona ou sotalol (Porat, et al., 2003).

     Fibrilação Atrial A fibrilação atrial apresenta ritmo átrio-

     ventricular irregular. Geralmente é bem tolerada,persistindo por meses em neonatos, porém resol-

     vendo espontaneamente.

    Taquicardia Ventricular  A taquicardia ventricular compete com o

    ritmo sinusal, apresentando dissociação átrio-ven-tricular. Em muitas circunstâncias ocorre reversãoespontânea da arritmia, sendo o tratamento neces-sário nos casos persistentes, realizado pela admi-nistração materna de propranolol, amiodarona ousotalol (Crosson & Scheeel, 1996). Outra medicaçãousada no tratamento da taquicardia ventricular éa lidocaína (Tanel & Rhodes, 2001). Em fetos commaturidade pulmonar, a resolução da gestação deveser ultimada e o tratamento realizado pós-natal.

    Taquicardia Juncional EctópicaCondição clínica muito rara, difícil de dis-

    tinguir intra-útero, através da ecocardiografia, dataquicardia ventricular (Tanel & Rhodes, 2001).É caracterizada por taquicardia supraventricularsustentada, com dissociação átrio-ventricular. Pa-tologia geralmente resistente a tratamento, que érealizado com prescrição materna de amiodarona,porém apresentando alta mortalidade.

     Drogas Antiarrítmicas

    O manejo especializado das arritmias fetais,incluindo a terapia farmacológica intra-uterina, di-minuem a morbidade relacionada a hidropsia fetal,prematuridade e nascimento por via abdominal(Naheed et al., 1996), portanto torna-se importanteo conhecimento das características dos principaismedicamentos utilizados no tratamento de ta-quiarritmias fetais e seus esquemas terapêuticos.

     As drogas mais utilizadas, via de administraçãomaterna, estão relacionadas na Tabela 1.

     A digoxina é a droga mais comumente utili-zada para tratar taquicardia fetal, entretanto suareal efetividade permanece como um ponto contro-

     verso. Esta droga atravessa facilmente a barreira

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    placentária, desde que não haja hidropsia, e possuia vantagem de provocar poucos efeitos colaterais,nas doses terapêuticas (Tanel and Rhodes, 2001).

    Os  -bloqueadores são outro grupo de me-dicamentos utilizados para estas alterações. Estesagentes são inotrópicos negativos. Devem ser usa-dos com cautela em gestantes com antecedentes deasma e possuem a desvantagem de apresentarembaixa taxa de transferência placentária (Tanel andRhodes, 2001). Porém, o sotalol permanece comoagente promissor, principalmente como terapêuti-ca do flutter  atrial e da taquicardia supraventricularnão associada à hidropsia (Oudijk et al., 2002).

     Agentes como a procainamida e a quinidinatambém têm sido utilizados no tratamento de ta-quiarritmias fetais. A vantagem da procainamidaé a possibilidade de administração endovenosa,atingindo nível sérico terapêutico rapidamente,porém, como pode agir como irritante uterino temsido associado a trabalho de parto pré-termo, ten-do seu uso restrito (Kleiman & Neghme, 2004).

    O flecainide também é muito efetivo no trata-mento de taquicardia supraventricular fetal, porémseu uso é limitado devido seus possíveis efeitos pró-

    arrítmicos. A amiodarona é muito efetiva no trata-mento das taquicardias supraventriculares, porémsua baixa tolerabilidade também restringe seu usocomo droga de primeira linha, principalmente porestar associada à supressão da função tireoidiana(Oudijk et al., 2002, Jouannic et al., 2003).

    No tratamento da taquicardia ventricularpode-se utilizar também a lidocaína. A vantagem deseu uso é que pode ser administrada rapidamentepor via endovenosa (Tanel & Rhodes, 2001). Sendoque em casos agudos, pode-se injetar lidocaínadiretamente no feto, por cordocentese (Crosson

    & Scheel, 1996). A desvantagem é sua curtameia-vida.

     Abstract

    Cardiac arrhythmias are very important for fetal prognosis and may cause increased perinatalmorbidity and mortality, thus representing a very

     valuable area for prenatal evaluation. A completeand detailed morphofunctional evaluation of thecardiovascular apparatus is important in ultra-

     sonography. The alterations in the fetal cardiacrhythm are defined as fetal tachycardia when theheart rate is more than 180 beats per minute andas fetal bradycardia when the rate is less than100 beats per minute. On the basis of a diagnosis of

     fetal cardiac arrhythmia, structural changes of theheart should be investigated by real time echography.Transitory benign arrhythmias are very common, in-cluding supraventricular and ventricular extrasys-toles, sinus bradycardia and sinus tachycardia.

     Malignant arrhythmias occur in 10 to 20% of casesand include supraventricular tachycardia, totalatrioventricular block and ventricular tachycardia.The etiology of malignant arrhythmias is related tothe presence of an anomalous or accessory conduc-

    tion pathway or a conduction pathway involving anautonomous ectopic focus. Benign arrhythmias maybe due to fetal factors, autoimmune mechanisms,lack of hormonal control or compression of the headand/or umbilical cord. Among the maternal factors,important are the use of drugs, fever, infections,anemia, and autoimmune diseases. The speciali-

     zed management of fetal arrhythmias includingintrauterine pharmacological therapy reduces themorbidity related to fetal hydropsy, prematurityand abdominal birth. Thus, it is important to knowthe characteristics of the main medications used for

    the treatment of fetal tachyarrhythmias and theirtherapeutic schemes.

    Tabela 1 - Drogas antiarrítmicas utilizadas no tratamento de taquiarritmias fetais.

    Droga Dosagem Efeitos adversos

    Digoxina 0,5-1 mg/dia Náuseas, bradicardia, bloqueio de condução átrio-ventricular

    Procainamida 600 mg EV por 20 min

    3.000-6.000 mg/dia VO

    Trabalho de parto pré-termo, prolongamento de QT no Eletrocardiograma (ECG)

    Quinidina 300 mg a cada 4-6 h

    Máximo: 3.000 mg/dia

    Náuseas, vômitos, dor abdominal, trombocitopenia

    Flecainide 100-400 mg/dia Anormalidades de condução, óbito fetal, distúrbios visuais, prolongamento de QT

    Sotalol 40-180 mg Náuseas, tonturas, fadiga, prolongamento de QT

    Amiodarona Ataque: 600 mg VO 6/6 h por 2-7 dias

    Manutenção: máximo de 800 mg/dia

    Náuseas, trombocitopenia, disfunção tireoidiana, prolongamento de QT, restrição de

    crescimento intra-útero

    Propranolol 80-320 mg/dia Bradicardia, hipoglicemia, restrição de crescimento intra-útero

    Verapamil 80-160 mg a cada 8 h Náuseas, inotrópico negativo, óbito fetal

    Lidocaína 1 mg/kg/dose Alterações neurológicas maternas como sonolência, parestesia, desorientação

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    KEYWORDS: Cardiac arrhythmias. Fetal echocar-diography. Clinical treatment.

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