livro educacao matematica utfpr 2015

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    EDUCAO MATEMTICA:

    pesquisas e possibilidades

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    Reitor: Carlos Eduardo Cantarelli.Vice-Reitor: Luiz Alberto Pilatti. Diretora de Gesto da Comunicao: Noemi Henriqueta Bran-

    do de Perdigo. Coordenadora da Editora: Camila Lopes Ferreira.

    Conselho Editorial da Editora UFPR. itulares: Bertoldo Schneider Junior, Hieda Maria Pagliosa Corona, Hypolito Jos Kali-

    nowski, Isaura Alberton de Lima, Juliana Vitria Messias Bittencourt, Karen Hylgemager Gongora Bariccatti, Luciana Furlaneto-Maia,

    Maclovia Corra da Silva e Sani de Carvalho Rutz da Silva. Suplentes: Anna Silvia da Rocha, Christian Luiz da Silva, Jos Antonio

    Andrs Velsquez Alegre, Ligia Patrcia orino, Mrcio Barreto Rodrigues, Maria de Lourdes Bernartt, Mrio Lopes Amorim, Ornella

    Maria Porcu e Rodrigo Lingnau.

    Editora filiada a

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    Marco Aurlio Kalinke

    Luciane Ferreira Mocrosky

    (Organizadores)

    Curitiba

    UFPR Editora

    2015

    EDUCAO MATEMTICA:

    pesquisas e possibilidades

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    2015 Editora da Universidade ecnolgica Federal do Paran.

    Esta obra est licenciada com uma Licena Creative Commons - Atribuio-NoComercial-SemDerivaes 4.0 Internacional.

    Esta licena permite o download da obra e o compartilhamento desde que sejam atribudos crditos ao(s) autor(es), mas sema possibilidade de alter-la de nenhuma orma ou utiliz-la para fins comerciais.

    Disponvel tambm em: .

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao

    Bibliotecria: Rosana da Silva CRB: 9/1745

    UFPR Editora

    Av. Sete de Setembro, 3165 Rebouas

    Curitiba PR 80230-901www.utpr.edu.br

    Coordenao editorial

    Camila Lopes Ferreira

    Emanuelle orino

    Projeto grfico, capa e editorao eletrnica

    Vanessa Constance Ambrosio

    Normalizao

    Camila Lopes Ferreira

    Reviso gramatical e ortogrfica

    Ado de Arajo

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    SUMRIO

    PREFCIO ..................................................................................................................................................9

    Maria Aparecida Viggiani BicudoMALDADES NA PRICA COM A MAEMICA ESCOLAR .....................................15

    Emerson Rolkouski e Carlos Roberto Vianna

    SOBRE A PRICA NA FORMAO DE PROFESSORES DE MAEMICA

    NO BRASIL: DAS DIRERIZES LEGAIS ESSNCIA DO CONCEIO ...........................29

    Flvia Dias de Souza e Vanessa Dias Moretti

    PS-MODERNIDADE, CULURA E ENDNCIAS EM EDUCAOMAEMICA .......................................................................................................................................49

    Luciane Mulazani dos Santos e Valdir Damazio Junior

    POSSIBILIDADES PARA UMA EDUCAO MAEMICA INERCULURAL:

    ENSAIO SOBRE UM PROCESSO DE SEDUO ..................................................................67

    Marcos Aurelio Zanlorenzi

    O MIO DA ANLISE REAL NA FORMAO CONCEIUAL DO PROFESSOR DEMAEMICA SOBRE OS NMEROS REAIS E A ANLISE MAEMICA ..........95

    Jos Carlos Ciuentes

    ECNOLOGIAS E PRICA PEDAGGICA EM MAEMICA: ENSES E

    PERSPECIVAS EVIDENCIADAS NO DILOGO ENRE RS ESUDOS.........117

    Adriana Richit, Luciane Ferreira Mocrosky e Marco Aurlio Kalinke

    A POSURA FENOMENOLGICA DE PESUISAR EM EDUCAOMAEMICA ....................................................................................................................................141

    Luciane Ferreira Mocrosky

    ECNOLOGIAS E EDUCAO MAEMICA: UM ENFOUE EM LOUSAS

    DIGIAIS E OBJEOS DE APRENDIZAGEM ...................................................................... 159

    Marco Aurlio Kalinke, Bruna Derossi, Laza Erler Janegitz e Mariana Silva Nogueira Ribeiro

    SOBRE OS AUORES ......................................................................................................................187

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    PREFCIO

    Sempre me sinto emocionada e honrada ao ser convidada a apresentar um livro.

    Esses sentimentos se intensificam medida que vou trazendo presena as pessoas queesto envolvidas na realizao da obra, bem como o local de onde se ex-pem, dizendo

    de sua pesquisa, dos modos pelos quais compreendem o tema norteador dessa realiza-

    o; vo enlaando outros modos de estar-com a obra e seus autores e entrelaam-se

    com questes ticas profissionais que dizem da responsabilidade de ler, buscar entender

    e interpretar intencionalidades postas em propostas e presentificadas em textos. am-

    bm me conduzem a sentir-me comprometida no dilogo com meus pares e com a rea,

    pois devo ex-por-me, dizendo dos modos pelos quais vejo o realizado e anunciandooutras questes que se levantam para mim, ao adentrar a dialticaver-visto.

    O livro que apresento, Educao matemtica: pesquisas e possibilidades, orga-

    nizado porMarco Aurlio Kalinke e Luciane Ferreira Mocrosky, proessores do Programa

    de Ps-Graduao em Educao em Cincias e em Matemtica (PPGECM). raz oito ca-

    ptulos, sobre dierentes assuntos e perspectivas de pesquisa assumidas. No h uma tem-

    tica que os articule. Essa articulao se encontra, porm, no programa de ps-graduao

    onde seus autores atuam como proessores ou como colaboradores em pesquisa, alunosem ormao e alunos j titulados. Nesse sentido, ainda que o livro no se apresente como

    trazendo a pesquisa realizada nesse programa, com seus temas e concepes terico-meto-

    dolgicas e posturas assumidas, ele revela um leque de preocupaes e modos de conduzir

    o investigado que j anuncia a configurao de um estilo desse programa.

    H textos que se preocupam com o leitor, tentando coloc-lo em sintonia com-

    preensiva a respeito do assunto tratado. H os que ocam mais o leitor como proessor

    em exerccio e buscam esclarec-lo sobre questes importantes com as quais todos nos

    deparamos ao nos colocar na posio de ensinar e aprender matemtica; outros apro-

    undam um pensar filosfico sobre matemtica e educao matemtica e h, tambm, os

    que tematizam o prprio modo de investigar. H, portanto, uma diversidade de visadas

    que revelam o curso da vida desse programa, evidenciando tenses, debates, conver-

    gncias e divergncias. Evidencia-se, assim, um ambiente propcio investigao, o que

    indica possibilidades de o programa, ainda jovem, impor-se de modo orte. Essa ora,

    a meu ver, nutrida tambm pela reunio colaborativa de docentes oriundos de die-

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    preendo, ela traz consigo a polmica que se instalou entre a comunidade de matemticos,

    que, de modo geral, veem nesse curso o objetivo de ormar o matemtico e no o proessor

    de matemtica. Nesse sentido, h uma tendncia em trabalhar nos espaos destinados s

    atividades da prtica na ormao desse proessor com contedos especficos de matem-tica, complementando com alguma aplicao de exerccios, entendidos, por eles, como

    prtica. Por outro lado, h, tambm, entre profissionais da educao matemtica, aqueles

    que acabam por privilegiar to somente questes de educao, esta tomada como rea de

    ensino e de pesquisa, sem atentar para os aspectos de trabalharem-se contedos matem-

    ticos importantes ormao desse proessor, mediante procedimentos que privilegiem a

    aprendizagem e no apenas, ou preponderantemente, o ensino de matemtica. Considero

    que essa questo se mostra como significativa para tomar como objeto de discusso, indoem direo a desdobramentos do captulo acima considerado.

    O captulo Ps-Modernidade, cultura e tendncias em educao matemtica,

    de autoria de Luciane Mulazani dos Santos e Valdir Damazio Junior, traz um debate so-

    bre modernidade e ps-modernidade, buscando apresentar um panorama dessa discusso,

    centrado em uma postura crtica da educao matemtica. A dmarchedo discurso do

    texto realiza um movimento importante, ao expor o sentido que modernidade costuma

    assumir, bem como o de ps-modernidade. destacvel, nesse captulo, a chamada dos au-tores para o ato de haver, nos currculos de cursos de matemtica, a orte presena da viso

    da filosofia moderna, de modo que se passa ao largo de importantes trabalhos da atuali-

    dade, como o teorema de Gdel ou os da Fsica contempornea, sem que sejam conside-

    rados os que significam para a matemtica do mundo ocidental. A racionliado captulo

    vai em direo a expor crticas sobre o prevalecimento da filosofia moderna no ensino da

    matemtica. Seria oportuno e importante, em desdobramentos desse tema, ocar possveis

    modos de inserirem-se essas discusses em atividades de ensino da matemtica.

    Marcos Aurelio Zanlorenzi escreve Possibilidades para uma educao mate-

    mtica intercultural: ensaio sobre um processo de seduo. O autor oca sua vivncia

    com o tema do captulo e mostra como oi sendo seduzido pela questo do intercultural

    e respectiva dificuldade de assumir a atitude que trabalhar com essa viso em educao

    matemtica exige do educador. Sua vivncia por ele retomada e refletida, expondo-se em

    sua trajetria ao chegar para trabalhar no Setor Litoral da UFPR. Relata que, ao chegar,

    depara-se com o projeto poltico pedaggico que tem como objetivo principal operacio-

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    nalizar uma proposta inovadora que orienta seus princpios a partir do diagnstico da

    realidade socioeconmica da regio onde se instalou, ou seja, uma proposta que, por meio

    de uma concepo de educao anti-hierrquica e antiexclusivista, abra-se ao outro, cul-

    tural local. Ao dar-se conta da complexidade do tema, ps-se a caminho de esclarecer con-cepes que deixam a temtica densa e que se reerem ao intercultural e ao multicultural.

    raz trabalhos desenvolvidos sobre interculturalidade em educao matemtica, tomando

    autores significativos para esclarecer as noes chaves do texto. Coloca-se, em seu estudo,

    a pergunta: a etnomatemtica pode se apresentar como uma possibilidade intercultural

    no seio da educao matemtica? Responde que pode, mas que essepodeexige mais do

    que explicar, conhecer e entender. Volta-se, ento, ao seu trabalho no litoral do Paran e

    presenteia o leitor com realizaes de experincias possveis, segundo a viso que assumeao responder positivamente pergunta por ele levantada.

    OMito da anlise real na ormao conceitual do proessor de matemtica

    sobre os nmeros reais e a anlise matemtica, de Jos Carlos Ciuentes, um en-

    saio de filosofia da matemtica bem articulado e que apresenta significativas discusses

    acerca das ideias matemticas que povoam os discursos e as prticas de matemticos

    e de educadores matemticos. J no incio do captulo sente-se a ora desse trabalho

    ao deparar-se com o por ele escrito homenagem a Karl Wilhelm Teodor Weirstrass(1815 -1897), o pai da anlise matemtica moderna, no seu bicentenrio. E o captulo

    az jus a essa homenagem. De modo claro, expe e abre seu pensar crtico e reflexivo

    sobre importantes temas pertinentes ao assunto: mitos e preconcepes na delimitao

    da rea anlise na reta; o mito da anlise real; a propriedade arquimediana da reta real e

    seu significado epistemolgico; o carter esttico do mito da anlise real: o princpio da

    simplicidade. raz, no item final do captulo, sua compreenso sobre o mito da anlise

    real, expondo que ele se apresenta como um processo terico de constituio do conhe-

    cimento matemtico e, como tal, pode ser entendido, em uma primeira aproximao,

    como a passagem do intuitivo ao lgico, do epistemolgico ao ontolgico. Ao refletir

    sobre a educao matemtica, entende como o principal problema, do ponto de vista

    pedaggico, o como transpor as noes implcitas ao conceito de nmero real e suas

    relaes que, muitas vezes, so de carter epistemolgico, para o ensino nos diversos

    nveis da educao matemtica, especialmente para a educao bsica. Afirma que essa

    constatao se mostra como um campo aberto pesquisa em educao matemtica.

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    Adriana Richit, Luciane Ferreira Mocrosky e Marco Aurlio Kalinke so autores

    do captulo ecnologias e prtica pedaggica em matemtica: tenses e perspectivas

    evidenciadas no dilogo entre trs estudos. significativo o trabalho realizado pelos

    autores ao disporem-se ao dilogo, visando compreenso de investigaes j conduzidasanteriormente por eles. Como produto desse dilogo, tem-se um captulo articulado, que

    oca nas palavras dos autores discusses sobre as mudanas deflagradas pela crescente

    presena das tecnologias digitais nos contextos social, cultural e educacional que ganha-

    ram espao ao longo das ltimas dcadas, motivando estudos em diversas reas do conhe-

    cimento. Com isso, pesquisas que buscam compreender e discutir a presena e o uso das

    tecnologias nos processos educacionais tm assumido relevncia no cenrio acadmico e

    educacional, ao tempo que seus resultados oerecem novas compreenses sobre o modocomo esses recursos impactam em dierentes aspectos, tanto do ensino quanto da apren-

    dizagem, em especial na prtica docente e na produo de conhecimento. um captulo

    claro, em que os autores expem suas compreenses e inquietaes a respeito da presena

    das tecnologias na prtica pedaggica em matemtica. Esse captulo um convite para

    que se assuma como necessria e importante a educao tecnolgica no projeto poltico

    pedaggico de cursos que tenham por alvo a ormao do proessor de matemtica.

    A postura enomenolgica de pesquisar em educao matemtica,de autoria deLuciane Ferreira Mocrosky, expe a postura da autora ao investigar e realizar orientaes

    de pesquisa em educao matemtica, no PPGECM, da UFPR. um captulo esclarece-

    dor sobre o modo de proceder ao se investigar enomenologicamente. Apresenta ideias

    chaves desse pensar filosfico de modo simples, mas com o rigor solicitado pela filosofia.

    Marco Aurlio Kalinke, Bruna Derossi, Laza Erler Janegitz e Mariana Silva No-

    gueira Ribeiro apresentam o captulo ecnologias e educao matemtica: um eno-

    que em lousas digitais e objetos de aprendizagem. um texto importante, conorme

    entendo, por expressar o trabalho do Grupo de Pesquisa sobre ecnologias na Educao

    Matemtica (GPEM), sediado no PPGECM da UFPR. um grupo que busca com-

    preender as possibilidades do uso de novas tecnologias em atividades que envolvam

    processos pedaggicos relacionados matemtica, e, nos ltimos semestres, ocalizou

    mais detalhadamente o estudo das lousas digitais (LD) e objetos de aprendizagem

    (OA). O desenvolvimento do captulo traz um panorama do que est sendo realizado

    a respeito desse tema. Isso importante, pois contribui com os leitores no seu processo

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    de compreenso desse assunto, bem como, auxilia investigadores a visualizar temas a

    serem pesquisados.

    De minha leitura atenta dos vrios captulos de autoria de proessores, alunos,

    em ormao e titulados, do PPGECM e de proessores de outras instituies que cola-boram com esse ncleo de ensino e pesquisa, entendo tratar-se de um programa jovem,

    pois oi criado pelo Conselho Universitrio da UFPR em 2010, oi recomendado pela

    Coordenao de Apereioamento de Pessoal de Nvel Superior (CAPES) e iniciou

    seus cursos em 2010, porm que mostra ora para constituir-se um ncleo importante

    de ensino e pesquisa em educao em cincias e em matemtica. H captulos j desen-

    volvidos como um pensar amadurecido e que se mostra como sendo de undo, no que

    diz respeito a compreenses de temas filosficos, como os de epistemologia e ontolo-gia, importantes para o entendimento de ideias significativas da matemtica; h os que,

    tambm expondo um pensar amadurecido, dizem de questes cruciais prtica do en-

    sino e da aprendizagem da matemtica, colocadas de modo simples que, a um primeiro

    olhar, podem parecer apenas uma conversa para quem gosta de alar do assunto. Porm,

    conorme entendo, podem disparar discusses entre alunos que esto se iniciando no

    mundo da educao matemtica, conduzindo o pensar para alm da certeza e instau-

    rando a dvida; h captulos de proessores que j expem um pensar de um grupo depesquisa; outros que refletem sobre sua prtica investigativa; h os que elegeram temas

    importantes para o oco do programa.

    Este livro organizado e por Marco Aurlio Kalinkee Luciane Ferreira Mocrosky

    traz esse trabalho e o esoro para expor o programa nisso que ele az e do modo como

    az. Essa coragem necessria para o acontecer do programa.

    Maria Aparecida Viggiani Bicudo

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    MALDADES NA PRICA COM AMAEMICA ESCOLAR

    Emerson Rolkouski

    Carlos Roberto Vianna

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    INRODUO

    Pessoas cuja inncia decorreu at por volta dos anos 1980 pouco conviveram

    com os dilemas provocados pelos termos e atitudes do assim chamado politicamen-

    te correto. Impunemente praticavam pequenas maldades com pequenos animais que,

    indeesos, no traziam ameaas. H maldades clssicas: jogar sal na lesma, arrancar pa-

    tinhas e asinhas de insetos ou prend-los em potes de vidros azendo-os girar ladeira

    abaixo. certo que havia maldades carregadas de boas intenes, como atestam os rela-

    tos que contam sobre gatos que oram salvos de dentro de ornos de micro-ondas, onde

    oram colocados com a inteno de salv-los do rio.

    Hoje as crianas, flagradas praticando tais maldades, so repreendidas por pais eproessores da era ecolgica. Os tempos mudaram e, s crianas, resta escutar os argu-

    mentos dos adultos que, na inncia, aziam coisas como capturar girinos e jog-los em

    um copo com Coca-Cola mais uma entre as maldades clssicas.

    Ao consultarmos um dicionrio de Houaiss e Villar (2001), dentre outros signifi-

    cados para maldade encontramos: crueldade, atitude m, o que prejudica ou oende, inten-

    o maliciosa. De tal orma, podemos dizer que s praticamos uma maldade quando temos

    conscincia de que estamos prejudicando algum. por isso que poderamos/deveramos

    reler os pargraos acima refletindo sobre se havia a inteno em causar mal quando assim se

    agia. Mas, lembremos, h crimes e julgamentos, mesmo quando no h a inteno de matar.

    Este captulo trata de maldades da matemtica escolar, e talvez o maior objetivo seja,

    exatamente, desvelar prticas e argumentar sobre os prejuzos delas decorrentes. E assim, ao

    tomar-se conscincia, continuando a agir da mesma maneira, percebermo-nos maldosos.

    Maldades, assim como pecados, so datados e localizados. Por exemplo, em nos-sa sociedade, hoje, nos preocupamos com a gravidez na adolescncia, que ocorre entre

    jovens de mesma idade. No entanto, h algumas dcadas, jovens se casavam com 14 anos

    e tinham o consentimento da sociedade e da igreja. Estas jovens engravidavam e eram

    adolescentes; o que hoje consideraramos como um problema social. Dessa maneira,

    iniciamos este captulo azendo uma breve incurso histrica sobre maldades e, a partir

    disso, esboamos uma categorizao dessas maldades evidenciando razes que as azemser consideradas prejudiciais em nossa poca.

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    MALDADES DE ONEM E DE HOJE

    Vamos considerar algumas afirmaes eitas sobre as mulheres:

    Afirmao 1: No lhe deixes comodidades, eu te digo. Enquanto a mantiveres aten-ta, ela no permanecer janela, e no lhe passar pela cabea ora uma coisa, ora outra.

    Afirmao 2: Eva oi o comeo e a me do pecado, da ento a mulher passa a

    sera arma do diabo, ela onte de toda a perdio e uma ossa prounda. A mulher

    atrai os homens por meio de chamarizes mentirosos a fim de melhor arrast-los para

    o abismo da sensualidade. No h nenhuma imundcie para a qual a luxria no con-

    duza. Para melhor enganar ela se pinta, se maquia. A mulher insensata, lamurienta,

    tagarela, ignorante, briguenta, colrica, invejosa.

    Afirmao 3:A mulher de temperamento melanclico, dbil, rgil e mole.

    A sua natureza imbecil e enerma.

    ais afirmaes oram eitas por padres (1 e 2) e mdico (3) segundo Delumeau

    (1989) e utilizadas por Vianna (1997) com a finalidade de discutir as possibilidades de

    um curso de Histria para proessores de matemtica.

    Na leitura das afirmaes acima dicil no se sentir um tanto enojado, tamanhoo preconceito e a maldade que deixam transparecer. Entretanto, se pudssemos voltar

    no tempo, para o sculo XIV, ser que pensaramos da mesma maneira? Afinal, so do

    prprio Papa, na poca, algumas daquelas afirmaes.

    Este deslocamento para outro tempo e sociedade pode nos auxiliar a refletir so-

    bre nossos problemas atuais. Prticas escolares antigas, transportadas para hoje, podem

    ser consideradas to maldosas quanto o que pensavam (e at alavam) alguns Papas,sobre as mulheres. Em seguida, veremos algumas dessas maldades, tais como eram pra-

    ticadas nas escolas.

    MALDADES DA MAEMICA ESCOLAR

    ual o objetivo da matemtica escolar?

    De modo geral, a matemtica escolar deveria dar a conhecer aos alunos uma per-cepo sobre a matemtica enquanto corpo de conhecimentos e ormas de raciocnio e,

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    ainda, instrumentaliz-los com erramentas que lhes permitissem compreender o mun-

    do que os cerca.

    Desta maneira, importante que os proessores questionem suas prticas de sala

    de aula bem como os encaminhamentos didticos propostos nos livros didticos: serque temos contribudo para desenvolver este pensar matematicamente e instrumenta-

    lizar nossos alunos com erramentas matemticas essenciais para a vida ora da escola?

    Chamaremos de maldosa matemtica escolar presente nas prticas e nos livros que

    no so pertinentes a este pensar matematicamente e/ou no so necessrias no dia a dia.

    MALDADE 1H proessores que se escandalizam ao ouvir alunos dizendo:A rea da circun-

    erncia 5cm2.

    H aqueles que, em uma avaliao, ao lerem tal afirmao, a classificam como

    prola, levando-a para a sala dos proessores, com um certo sarcasmo: - Imagine, no

    sabe a dierena entre crculo e circunerncia.

    J houve quem se debruasse sobre tratados didticos, a fim de descobrir se deve-ramos nos reerir a crculo ou circunerncia trigonomtrica. Para provocar uma reflexo

    sobre este tipo de prtica, basta procedermos da seguinte maneira: tome um quadrado,

    calcule seu permetro e sua rea.

    Algum problema?

    Precisaramos criar o termo quadradnciapara nos reerirmos linha poligonal

    que determina o quadrado?A maldade no est em apresentar o uso convencionado dos termos, mas sim em

    tom-los como objeto de estudo, deixando de abordar outros assuntos que melhor se

    prestariam a cumprir os objetivos da matemtica escolar. Isso uma maldade escolar,

    pois no um problema para a matemtica acadmica ou para a matemtica da rua.

    uma maldade por ser um problema intrnseco escola e vontade do proessor! Cremos

    que a escola no deveria ter a si mesma como finalidade. Fica bvio se dissermos assim:as pessoas no vo para a escolapara ir para escola, elas vo para... aprender.

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    MALDADE 2

    Dentre as possibilidades de aprendermos sobre as rotinas nas salas de aula, pode-

    mos observar as paredes da sala de aula e ver nelas o que oi colocado como proposta

    de ensinar matemtica. Observe uma sala de aula da rede pblica da cidade de Curitiba

    (Figura 1):

    Figura 1 Sala de aula da rede pblica em CuritibaFonte: Autoria prpria (2012).

    rata-se de uma sala de aula do recm-implantado primeiro ano, ou seja, trata-se

    de uma sala de aula para crianas cuja idade em torno dos 6 anos. Nesta sala de aula, h

    s um trabalho explicitamente intencional com a matemtica: a sequncia dos nmeros

    de zero a dez. Esta sequncia de nmeros est assim caracterizada: h uma estrelinha

    colada no nmero um, duas no dois, trs no trs e assim por diante. Esta talvez a ree-rncia mais orte presente nas salas de aula. Em alguns casos, esta reerncia substitu-

    da por olhas de sulfite, onde se l o nmero escrito de duas ormas distintas, com um

    conjunto onde se v uma determinada quantidade de bolinhas. No por acaso, nestas

    mesmas salas, o trabalho presente na parede a respeito da lngua portuguesa limita-se s

    olhas sulfites onde se l: A, a, a, AVIO, B, b, b, BOLA, entre outras.

    Ao sairmos da sala de aula e abrirmos um jornal, por exemplo, lemos: pgina 3,R$ 449,75 que o valor de um monitor com display de cristal lquido (LCD), conta-se

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    que o dlar subiu 1,7% e que o imvel a ser vendido por R$ 370.000,00 mede 67m2e

    situa-se no nmero 43 da Avenida gua Verde.

    Uma distncia grande, no ? Na escola os nmeros so utilizados para contar

    bolinhas, na rua eles esto em contextos diversos, sempre significando algo e, na maioriadas vezes, no esto sendo utilizados para contar, muito menos para contar bolinhas.

    Esta outra maldade: desvincular, sem necessidade, a matemtica escolar da ma-

    temtica da rua. Afinal, trabalhos como aqueles que podem ser eitos mediante a cons-

    truo de grficos simples expressando coisas como a quantidade de aniversariantes de

    cada ms, dariam outra perspectiva para a construo destes nmeros.

    alvez seja por isso que estudantes aplicados no reconhecem o que veem na ruacomo matemtica. E, o que mais grave, muitas vezes no se utilizam das erramentas

    que construram na escola para resolver seus problemas dirios e tomar decises.

    Para citar um exemplo, muitos estudantes de ensino mdio, quando se deparam

    com correntes, pirmides da ortuna ou, mais recentemente, o marketing de rede, conti-

    nuam utilizando a rase: - No unciona porque algum quebra a corrente. E no perce-

    bem que um simples clculo de soma de termos de uma progresso geomtrica bastaria

    para demonstrar que rapidamente a quantidade de pessoas envolvidas em um negciodesta natureza torna-se maior que a quantidade de pessoas do planeta. Afinal, porque

    deveriam azer esta analogia? As coisas que a gente aprende na escola s servem para a

    escola, no mesmo?

    MALDADE 3

    comum encontrarmos proessores que se maniestam como descrentes dos li-vros didticos. Alguns alegam que utilizar estes livros ere sua autonomia. Muitos pro-

    essores, de ato, utilizam o livro didtico apenas como apoio para exerccios. E h uma

    grande descrena em relao aos livros didticos mais recentes. Muitos afirmam: - Os

    livros de hoje so racos, tm menos contedo. Bom era no meu tempo.

    A partir de situaes assim, no raro encontrarmos proessores que resgatam e

    utilizam os livros que estudaram quando eram alunos. E isto eito na melhor das in-tenes, eles costumam dizer: - Eu, proessor, cheguei l utilizando estes livros; - Como

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    quero que meus alunos tambm cheguem l, nada mais natural que utilizar os mesmos

    livros e as mesmas tcnicas de ensino que me fizeram chegar l.

    Vamos olhar para alguns destes livros que, na sua poca, oram campees de

    vendas. O primeiro deles aparece na Figura 2.

    Figura 2 Capa e pgina do livro Aprendizagem e educao: matemticaFonte: Giovanni e Giovanni Jnior (1990).

    Observa-se neste ragmento uma sequncia de itens absolutamente idnticos do

    ponto de vista de resoluo, justapostos do mais cil para o mais dicil:

    4. Resolva as equaes do 1 grau, sendo U = Q.

    2x 6 = 8

    3x 5 = 4

    5x 7 = 8

    3x 4 = 2

    7x 4 = 10

    5 x = 1

    2x = -6 + x

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    Pode-se notar que somente a partir do sexto item h alguma mudana na estrutu-

    ra dos exerccios e uma mudana mais radical s ocorre a partir do stimo. Praticamente

    todos os exerccios da maior parte dos livros desta poca eram assim estruturados.

    Para a poca em que oram escritos, estes livros cumpriam bem o propsito a quese destinavam. No entanto, importante perceber que o mundo de 20 ou 30 anos atrs

    era muito dierente do que temos hoje.

    Uma rpida incurso no cotidiano de anos atrs pode ampliar nossos argumen-

    tos. omando apenas uma aceta da vida diria, consideremos o mundo de consumo.

    H cerca de 20 ou 30 anos, mesmo em grandes cidades, tnhamos poucos supermer-

    cados, portanto, era comum azer-se a compra do ms, em alguns estados chamava-se

    pedido, em outros rancho. Nesse dia, em geral o quinto dia til do ms, quando se re-cebia o salrio, a amlia tpica de classe mdia iria encher carrinhos de supermercado. A

    quantidade de marcas que havia na poca era muitas vezes menor do que temos hoje e,

    ainda, as embalagens continham quase sempre a mesma quantidade de produto: papel

    higinico em rolos de 40m, ovos em dzias, latas de leo de 900ml, e assim por diante.

    Dessa maneira, caso se optasse por levar produtos sempre mais baratos, isso seria muito

    simples, bastando comparar preos de produtos de marcas dierentes.

    Atualmente, em cada gndola, h variedade de inormaes nas embalagens e

    nos olhetos de propaganda, de modo que uma simples deciso para saber qual oerta

    mais vantajosa se torna um problema de aritmtica razoavelmente complexo.

    O mesmo se d quando comparamos o mundo do trabalho de antigamente com

    o de hoje. Antigamente era comum um operrio iniciar em uma indstria e se aposentar

    na mesma indstria, por vezes, executando exatamente a mesma tarea. Atualmente,

    dadas as diversas crises pelas quais a economia tem passado e a quantidade de novastecnologias adentrando o mercado de trabalho em geral, isso se tornou muito dicil.

    O mercado editorial de livros didticos evoluiu muito de uns anos para c, da

    mesma orma que a sociedade tambm evoluiu, e manter na escola prticas escolares de

    20 ou 30 anos , no mnimo, uma maldade.

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    MALDADE 4

    o perverso quanto manter na escola prticas e rotinas escolares destinadas

    sociedade de 30 anos atrs manter contedos curriculares e contedos procedimentais

    que s tinham sentido para aquela poca.

    Podemos tomar livros mais recentes, mas o exemplo apresentado na Figura 3 acaba

    causando certo estranhamento, e so poucos os proessores que no se chocam ao v-lo:

    Figura 3 Capa e parte de uma pgina do livro Curso de matemtica: 1olivro do ciclo colegialFonte: Maeder (1953).

    rata-se de um livro da dcada de 1930, que teve, ento, um impacto considervel.

    Este livro, destinado a jovens de 14 ou 15 anos, traz, em uma de suas pginas,

    uma tcnica para calcular o quociente de 53783,2437486 por 824,3592753 com a

    aproximao de 0,01.

    Alm da estranheza do prprio assunto, so dignos de nota os termos utilizados.Observa-se que o autor inicia o primeiro pargrao da explicao com Evidentemente.

    ermos como este so largamente utilizados por autores de livros de matemtica supe-

    rior, bem como por proessores de matemtica em vrios nveis, e causam no leitor, ou

    no ouvinte, certa sensao de incapacidade ao no compreender de imediato o que o

    autor ou o proessor quis dizer com a afirmao. o que ocorre neste caso, pois raro o

    leitor que no precise reler vrias vezes o pargrao para entender o que o autor afirma

    ser evidente. Mas isso um assunto para outras investigaes, voltemos ao contedo.

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    Poucos proessores deenderiam que deveramos continuar ensinando esta tc-

    nica aos alunos de hoje, e aqui reside um dos maiores potenciais deste tipo de argu-

    mentao. Pois, ainda que no deendam que este procedimento deva ser ensinado, ar-

    gumentam em avor da permanncia, por exemplo, do ensino de tcnicas enadonhasde racionalizao ou do manuseio das tbuas de logaritmo, que, assim como a tcnica

    mostrada, s tinham verdadeiro sentido quando no existiam mquinas de calcular.

    Com receio de um sucateamento, ou barateamento da matemtica escolar, mui-

    tos acabam por deender a manuteno do ensino de tcnicas enadonhas, no obser-

    vando que o tempo da escola finito e, em uno desses contedos obsoletos, os alunos

    esto deixando de ter contato com contedos ormativos e/ou utilitrios que poderiam

    ser mais relevantes aos dias de hoje.

    MALDADE 5

    Vamos a livros de matemtica para crianas mais novas, tal como o apresentado

    na Figura 4:

    Figura 4 Pginas do livro Aprendizagem e educao: matemticaFonte: Giovanni e Giovanni Jnior (1990).

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    Aqui observamos duas situaes interessantes. Em primeiro lugar, se exige da

    criana que escreva Sentena matemtica, clculo e resposta. O livro do proessor no

    deixa lugar para dvidas sobre o que se espera que o aluno escreva em cada espao. Ao

    lado, temos continhas armadas de 7 x 8, 4 x 5 e assim por diante.Duas exigncias desnecessrias; no primeiro caso, retira-se o oco do objetivo de

    resolver problemas na escola, crianas e proessores acabam por acreditar que resolver

    problemas no encontrar a resposta e sim preencher os espaos com os procedimentos

    corretos. A seguir, um excerto de uma pesquisa sobre a lgebra escolar que vem auxiliar

    a ampliar esta discusso (PINO, 1997, p. 83):

    Neste momento, a proessora volta para a classe e pergunta se eles re-solveram o problema. No pede para ver as estratgias de resoluo dosalunos. Vai direto ao quadro-negro e pergunta o que significa o quadradode um nmero. Como nenhum aluno se maniesta, ela retoma o conceitode potenciao como uma linguagem que simplifica a linguagem da mul-tiplicao de atores iguais e coloca no quadro: 3.3 = 32, ressaltando paraeles o significado de quadrado na potenciao.

    Fala para eles perceberem que, no problema, a coisa est elevada ao qua-drado, e coloca:

    ( )2 + 1 = 10

    Pro.: - O que mesmo que est elevado ao quadrado?

    AAA: - A coisa.

    Pro.: - Imaginem que a coisa est aqui dentro, presa numa gaiola! (Aomesmo tempo que ala, escreve coisa dentro dos parnteses.)

    AAA: - Risos!!! Os alunos maliciam o comentrio da proessora. E elacomplementa o que j havia escrito no quadro:

    (coisa)2 + 1 = 10

    A Metamorose da CoisaAps algumas tentativas de tirar dos alunos o que poderia significar acoisa, pergunta se eles j aprenderam equao do 1 grau. Eles respon-dem afirmativamente e lembram (com o seu auxlio) que a letra usada

    para representar o valor desconhecido, a coisa, na equao, o x. A subs-titui no quadro:

    x2 + 1 = 10

    Alguns alunos maniestam-se dizendo que x = 3. A proessora no aznenhum comentrio sobre esta resposta e ala para eles que no resolver

    a equao por esta ser do 2 grau e por eles necessitarem saber raiz qua-drada para resolver.

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    Observa-se que, para esta proessora, resolver a equao no encontrar o valor

    da incgnita, mas, sim, utilizar-se de uma sequncia de passos para se chegar ao valor de

    x. Ou seja, a tcnica acaba por ocultar o conceito matemtico.

    De maneira anloga, exige-se do aluno que arme a continhapara clculos como3 x 4, ainda que saiba o resultado mentalmente.

    anto uma prtica quanto a outra trazem a mensagem subliminar criana: na

    escola, inventamos procedimentos que no tm o menor sentido, seja para a vida, seja

    para a matemtica acadmica, afinal, nunca vimos em livros de clculo algo como Sen-

    tena matemtica, clculo, resposta.

    CONSIDERAES FINAIS

    Neste captulo, ressaltamos o carter intil de determinados conceitos e prticas

    que permeiam a matemtica escolar. Com o objetivo de argumentar sobre a necessida-

    de de colocarmos em suspenso permanncias de contedos e prticas escolares, ez-se

    uma breve incurso sobre aspectos histricos relacionados imagem da mulher em s-

    culos passados e, a partir da, em analogia, descreveu-se cinco maldades da matemtica

    escolar que oram ilustradas por textos didticos, otos de salas de aulas e citaes depesquisas acadmicas. Espera-se que a leitura deste captulo contribua para a reflexo

    sobre aquilo que azemos na escola e esperamos que provoque a necessidade de ampliar

    as possibilidades de argumentao dos ormadores de proessores, tendo em vista uma

    educao matemtica de melhor qualidade, inclusive com o desenvolvimento de pes-

    quisas que aproundem as temticas aqui abordadas.

    REFERNCIASDELUMEAU, J.A histria do medo no ocidente: 1300-1800. So Paulo:Companhia das Letras, 1989.

    GIOVANNI, J. R.; GIOVANNI JNIOR, J. R.Aprendizagem e educao:matemtica, 6. So Paulo: FD, 1990.

    HOUAISS, A.; VILLAR, M. S. Dicionrio Houaiss da Lngua Portuguesa. Rio de

    Janeiro: Objetiva, 2001.

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    MAEDER, A. M. Curso de matemtica: 1 livro do ciclo colegial. 7. ed. So Paulo:Edies Melhoramentos, 1953.

    PINO, R. A. Erros e dificuldades no ensino de lgebra: a percepo e o tratamento

    dado por proessores de 7 srie em aula. 1997. Dissertao (Mestrado em Educao) -Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1997.

    VIANNA, C. R. Introduo histria da matemtica para proessores. In:ENCONRO LUSO-BRASILEIRO DE HISRIA DA MAEMICA, 2.,1997, guas de So Pedro.Anais...guas de So Pedro: UNESP, 1997.

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    SOBRE A PRICA NA FORMAO DEPROFESSORES DE MAEMICA NO BRASIL:

    das diretrizes legais essncia do conceito

    Flvia Dias de Souza

    Vanessa Dias Moretti

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    INRODUO

    A temtica da necessria articulao teoria-prtica na ormao de proessores

    e, em particular, na ormao de proessores de matemtica, tem sido constante e re-

    corrente na produo acadmica brasileira (ALMEIDA, 2006; VEIGA, 2009). Nesse

    cenrio, conta-se com diretrizes legais para a ormao inicial de proessores no Brasil

    que preveem a insero da prtica no processo ormativo, com a incluso da denomina-

    da prtica como componente curricular. No entanto, a compreenso desse conceito e a

    incorporao de prticas ormativas tem se revelado bastante heterognea.

    Essa situao pode ser evidenciada, de modo geral, tanto nas aes dos proes-

    sores que atuam nas licenciaturas quanto nas proposies dos projetos de cursos. Sen-do assim, a discusso e a compreenso desse panorama, no contexto desse trabalho,

    objetivam promover um processo de reflexo e anlise acerca das condies atuais,

    bem como alavancar a atribuio de novas qualidades prtica na ormao inicial de

    proessores de matemtica.

    A PRICA COMO COMPONENE CURRICULAR NOS

    DOCUMENOS OFICIAIS

    luz dos pressupostos da Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional vi-

    gente (LDB 9394/96) (BRASIL, 1996), as Resolues No1 e 2 do Conselho Nacional

    de Educao, datadas de 18 e 19 de evereiro de 2002, respectivamente, estabelecem

    normativas especficas para a organizao de cursos de licenciatura, em nvel superior,

    com a proposio de Diretrizes Curriculares Nacionais para a ormao de proessores

    da educao bsica, em nvel superior, curso de licenciatura, de graduao plena, bemcomo a definio de critrios reerentes durao e carga horria dos cursos (BRASIL,

    2002a, 2002b).

    Na Resoluo 1/2002 do Conselho Pleno do Conselho Nacional de Educao

    (CP/CNE) (BRASIL, 2002a), em seu Artigo 15, consta a necessidade de adequao

    dos cursos de ormao de proessores em uncionamento s diretrizes estabelecidas, no

    prazo de dois anos. Frente s novas regulamentaes, tanto instituies de ensino supe-rior que j oertavam cursos de licenciatura quanto aquelas interessadas na oerta desses

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    cursos, viram-se diante da necessidade de organizar e/ou adequar os projetos de cursos

    de modo a atender as normativas previstas.

    Entre os itens que se destacam nas diretrizes para organizao dos projetos peda-

    ggicos, insere-se a definio de carga horria mnima de 2.800 (duas mil e oitocentas)horas para integralizao do curso, distribudas em quatro grandes dimenses, com des-

    taque para a atribuio de 400 (quatrocentas) horas de prtica como uma das compo-

    nentes, conorme segue no Artigo 1 da Resoluo CNE/CP 2/2002:

    I - 400 (quatrocentas) horas de prtica como componente curricular, vi-venciadas ao longo do curso;

    II - 400 (quatrocentas) horas de estgio curricular supervisionado a par-

    tir do incio da segunda metade do curso;III 1.800 (mil e oitocentas) horas de aulas para os contedos curricula-res de natureza cientfico-cultural;

    IV - 200 (duzentas) horas para outras ormas de atividades acadmico--cientfico-culturais (BRASIL, 2002b, p. 1).

    Com o intuito de estabelecer critrios para a dimenso da prtica no contex-

    to da organizao curricular dos cursos de licenciatura, a Resoluo CNE/CP 1/2002

    (BRASIL, 2002a, p. 6), em seu Artigo 12, esclarece que: 1 A prtica, na matriz curricular, no poder ficar reduzida a um espa-o isolado, que a restrinja ao estgio, desarticulado do restante do curso.

    2 A prtica dever estar presente desde o incio do curso e permeartoda a ormao do proessor.

    3 No interior das reas ou das disciplinas que constiturem os compo-nentes curriculares de ormao, e no apenas nas disciplinas pedaggi-cas, todas tero a sua dimenso de prtica.

    Atentos a essas orientaes, dierentes modos de ver e compreender a ormao

    de proessores no tratamento da prtica como componente curricular, explicitados no

    processo de elaborao e/ou reorganizao de projetos dos cursos, vm sendo propostos

    pelos docentes rente das licenciaturas nas instituies de ensino superior. Em algumas

    instituies, o estabelecimento de propostas de organizao das 400 horas de prtica

    comum a todas as licenciaturas oertadas. Em outras, as orientaes para proposio

    dessas horas so bastante heterogneas no interior das prprias instituies, variando deum curso para outro. Identificam-se, ainda, casos em que a adequao dos projetos de

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    curso com a insero dessas horas se deu, centralmente, com o aumento da carga horria

    da disciplina de prtica de ensino.

    Desde a instaurao legal da prtica como componente curricular nos cursos de

    licenciatura, conorme prev a legislao, as instituies de ensino superior brasileirasvm propondo e/ou reorganizando seus projetos de curso de modo a contemplar essa

    questo. Nessa mesma direo, pesquisadores brasileiros vm adotando a temtica como

    objeto de investigao, necessrio melhoria da organizao curricular dos projetos de

    cursos de licenciatura. Estudo realizado por Diniz-Pereira (2011) revela a preocupao

    em se estabelecerem compreenses mais apuradas sobre a prtica como componente

    curricular e o estgio supervisionado como elementos distintos no processo ormativo.

    Em sntese, o autor elaborou um quadro-resumo com as principais orientaes oriundasda legislao sobre a prtica e o estgio, conorme o uadro 1:

    Prtica como componente curricular Estgio curricular supervisionado

    Mnimo de 400 horas Mnimo de 400 horas

    Desde o incio do curso A partir da segunda metade do curso

    Ao longo de todo o processo formativo Em um tempo mais concentrado

    Em outros espaos (secretarias

    de educao, sindicatos, agncias

    educacionais no escolares, comunidades)

    Em escolas (mas no apenas em salas de aula)

    Orientao/superviso da instituio

    formadora

    Orientao da instituio formadora e superviso da

    escola

    Orientao/superviso articulada ao

    trabalho acadmicoOrientao articulada prtica e ao trabalho acadmico

    Tempo de orientao/superviso: no

    defnido

    Tempo de superviso: que no seja prolongado, mas seja

    denso e contnuo tempo de orientao: no defnido

    uadro 1 Orientaes sobre a prtica e o estgio na legislaoFonte: Diniz-Pereira (2011, p. 211).

    Embora algumas distines estejam bem delimitadas, como se pode observar

    no quadro, a organizao desses elementos nos cursos de licenciatura ainda apresenta

    muitas divergncias e ragilidades, reduzindo-se a prtica a momentos de insero na

    escola, nem sempre bem planejados, e o estgio s estruturas convencionais de insero

    na escola, pautadas na observao, participao e regncia.

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    Sobre a apropriao de elementos constitutivos da organizao do ensino, Ri-

    beiro (2011) desenvolveu uma pesquisa sobre a aprendizagem de uturos proessores de

    matemtica nas disciplinas de prtica de ensino e estgio, tendo como ulcro explicitar

    indicadores de um movimento ormativo na direo da prxis docente. Dentre as con-sideraes decorrentes da pesquisa, evidenciou-se que a aprendizagem da docncia no

    se concretiza em momentos isolados, cabendo aos proessores ormadores na universi-

    dade a necessidade de [...] compreender um modo de organizao do ensino para que

    o uturo proessor desenvolva a aprendizagem da docncia (RIBEIRO, 2011, p. 166).

    Se, por um lado, a pesquisa desenvolvida destacou as disciplinas de prtica de ensi-

    no e estgio como momentos privilegiados no processo de ormao do proessor, por ou-tro, procurou revelar elementos necessrios compreenso do movimento ormativo para

    a docncia com base no entendimento de que [...] acreditar que a ormao do proessor

    acontece apenas em intervalos independentes ou num espao bem determinado negar o

    movimento social, histrico e cultural de constituio de cada sujeito (FIORENINI;

    CASRO, 2003, p. 124). Nessa direo, a investigao realizada, alm de possibilitar o

    estabelecimento de indicativos para o processo ormativo em prtica de ensino e estgio,

    constituiu-se motor de novas situaes desencadeadoras de pesquisa.

    Nesse campo se insere a problemtica da prtica como componente curricular nos

    cursos de licenciatura, em consonncia com a observao de Formosinho (2009, p. 116)

    de que [...] a anlise de ormao prtica dos proessores no mbito da ormao inicial

    uma boa porta de entrada para revisitar a problemtica de ormao inicial de proessores.

    Diante da normatizao da prtica como componente curricular nos cursos de li-

    cenciatura oertados no pas, decorrem algumas questes de investigao: como essa pr-tica vem sendo incorporada nos projetos de curso? ue situaes de ensino caracterizam

    a incorporao da prtica como componente curricular? Essas inquietaes nos remetem

    necessidade de aproundar a compreenso do conceito de prtica em consonncia com

    as diretrizes legais que amparam a sua proposio na ormao inicial docente.

    Ao situar as situaes em que se insere a prtica no interior dos cursos de licencia-

    tura, as Diretrizes Curriculares definidas pela Resoluo 1/2002 do CNE/CP, em seuArtigo 13 1, destacam que A prtica ser desenvolvida com nase nos procedimentos

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    de observao e reflexo, visando atuao em situaes contextualizadas, com o registro

    dessas observaes realizadas e a resoluo de situaes-problema (BRASIL, 2002a, p. 6).

    Ao mesmo tempo em que as diretrizes contemplam a preocupao com a or-

    mao do proessor evidenciando ateno necessria articulao teoria-prtica, res-salta-se a importncia da constituio de novas qualidades para a ormao ensejada

    pela insero da prtica como componente curricular em oposio a um tendencioso

    praticismo, ainda comum e presente em alguns programas de ormao, um praticismo

    que no leva o uturo proessor a uma compreenso mais prounda sobre a sua profisso

    e, de modo geral, pautado em processos de reflexo esvaziados, sem contedo, como

    critica Contreras (2002). Com essa observao, pretende-se esclarecer que a simples

    atribuio de carga horria de prtica no conjunto de disciplinas do curso como umtodo ou a incluso de algumas disciplinas especficas de prtica ao longo do curso, por

    si s, no subsidia a melhoria do processo ormativo.

    Com a implementao da resoluo que prev a prtica como componente cur-

    ricular nas licenciaturas, cada curso ou instituio de ensino superior oi adotando di-

    erentes estratgias para sua incorporao. No campo especfico da licenciatura em ma-

    temtica, objeto deste estudo, a realidade no dierente. Estudos realizados por Gatti

    (2010) sobre propostas curriculares de cursos de ormao inicial de proessores em trs

    licenciaturas letras, matemtica e cincias biolgicas revelam dissonncias entre os

    projetos pedaggicos. Segundo a pesquisadora, ao analisar uma amostra de 31 cursos de

    licenciatura em matemtica, destacou-se que:

    A questo das prticas exigidas pelas diretrizes curriculares desses cursosmostra-se problemtica, pois ora se coloca que esto embutidas em diver-sas disciplinas, sem especificao clara, ora aparecem em separado, mas

    com ementas muito vagas. Na maior parte dos ementrios analisados nooi observada uma articulao entre as disciplinas de ormao especfi-cas (contedos da rea disciplinar) e a ormao pedaggica (contedos

    para a docncia) (GAI, 2010, p. 1373-1374).

    Considerando as diretrizes legais e as vrias discusses acerca da prtica como um

    dos temas de investigao sobre a ormao inicial de proessores na atualidade (FOR-

    MOSINHO, 2001; MOURA, 2004; FIORENINI; NACARAO, 2005; FORMO-

    SINHO; NIZA, 2009; RIBEIRO, 2011), destaca-se a notoriedade do entendimento dolugar da prtica como um dos componentes da ormao dos proessores e que esta deve

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    estar presente desde o incio do curso. Cumpre-nos, ento, compreender mais amplamen-

    te a essncia do conceito de prtica de modo a avorecer o processo de aprendizagem da

    docncia na ormao inicial rumo constituio da prxis (VZUEZ, 2007).

    SOBRE O CONCEIO DE PRICA E SUA RELAO COM AEORIA

    No raro que, junto ao senso comum, a noo de prtica seja compreendida

    como algo que se ope teoria, relacionada [...] execuo de alguma coisa que se

    projetou (por oposio a teoria) ou, ainda, a um [...] processo, [uma] maneira de

    azer (DICIO, 2015). Em tal contexto, que compreende a ruptura e at mesmo a

    oposio entre a teoria e a prtica, talvez seja vlido o conhecido dito popular: na

    prtica, a teoria outra.

    Guerra (2005, p. 4), ao discutir os undamentos da ragmentao entre a teoria e

    a prtica, deende que tal ragmentao estaria undamentada em uma noo emprica

    e pragmtica de teoria, segundo a qual a [...] teoria tem o seu valor, alcance e papel

    condicionados sua capacidade de dar respostas prtico-empricas realidade. Como

    consequncia, produz-se uma desqualificao da teoria que acaba por neg-la como ele-mento de compreenso e potencial transormao da realidade.

    Ainda segundo Guerra (2005, p. 4), a desqualificao da teoria, e a consequente

    ragmentao entre teoria e prtica, serve a uma perpetuao da alienao do trabalho,

    enquanto racionalidade hegemnica da sociedade capitalista, uma vez que o:

    Produto necessrio do processo de reificao uma concepo de co-nhecimento que no ultrapasse a aparncia dos atos; que no supereo mbito da experincia imediata; que conceba os enmenos na sua

    positividade; que descarte o seu movimento de constituio e que, porisso, no seja capaz de captar o movimento; que suprima as mediaessociais constitutivas e constituintes dos processos; que deenda a impos-sibilidade de conhecer a essncia (a coisa em si). Sem o conhecimentodos undamentos, a elaborao terica nega-se a si mesma. Esta orma de

    produo do conhecimento vira presa cil para servir de instrumentode manipulao.

    Compreende-se, dessa orma, que apenas na unidade dialtica entre a teoria ea prtica que possvel a apropriao da realidade, a compreenso de sua essncia e das

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    relaes que a constituem, bem como sua consequente transormao. Ou seja, apenas

    na atividade terico-prtica (VZUEZ, 2007), compreendida como prxis, que o

    conhecimento da realidade e dos objetos que a constituem pode se produzir. Sendo

    assim, no podemos compreender o conceito de prxis em Marx, sem passarmos neces-sariamente pelo que constitui a atividade prtica e a atividade terica.

    A atividade prtica aquela na qual o homem age sobre uma matria exterior

    a ele, transormando-a. em, portanto, um carter material, objetivo, e o seu objeto

    [...] a natureza, a sociedade ou os homens reais (VZUEZ, 2007, p. 194). Como

    toda atividade humana, busca satisazer alguma necessidade e, embora esteja voltada

    para uma ao sobre a realidade concreta natural ou humana , no prescinde de certa

    atividade cognoscitiva, ou seja, de algum conhecimento acerca da realidade sobre a qual

    se intenciona agir. J a atividade terica no transorma a realidade, embora sua existn-

    cia esteja vinculada prtica, uma vez que ornece conhecimentos imprescindveis para

    essa transormao. O objeto da atividade terica s tem existncia subjetiva (sensaes,

    percepes) ou ideal (conceitos, teorias, hipteses). Dessa orma, a transormao pos-

    svel mediante a atividade terica a ideal e no a real.

    Na relao entre atividade prtica e atividade terica se configura a prxis. Issoporque, se, por um lado, a prxis compreendida como uma [...] atividade material,

    transormadora e ajustada a objetivos, por outro, [...] no h prxis como atividade

    puramente material, isto , sem a produo de finalidades e conhecimentos que caracte-

    rizam a atividade terica (VZUEZ, 2007, p. 208). Assim, se, por um lado, a prtica

    o undamento da teoria, por outro, a teoria no tem como uno justificar a prtica

    e sim servir-lhe de guia e possibilidade de esclarecimento, muitas vezes estabelecendo

    relativa autonomia em relao primeira e at se antecipando a ela. Sendo, portanto, a

    prxis uma atividade terico-prtica, resulta da:

    [...] ser to unilateral reduzir a prxis ao elemento terico, e alar inclusi-ve de uma prxis terica, como reduzi-la a seu lado material, vendo nelauma atividade exclusivamente material. Pois bem, da mesma maneira quea atividade terica, subjetiva, por si s, no prxis, tampouco o a ati-

    vidade material do indivduo, ainda que possa desembocar na produode um objeto como o caso do ninho eito pelo pssaro quando lhe

    alta o momento subjetivo, terico, representado pelo lado conscientedessa atividade (VZUEZ, 2007, p. 241).

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    Compreendida de tal orma a unidade entre a teoria e a prtica, o ato de co-

    nhecer passa necessariamente por uma postura ativa do sujeito diante do objeto de

    conhecimento e, portanto, implica uma dimenso prtica da atividade. Marx e Engels

    (1998) exploram essa ideia na tese I sobre Feuerbach, ao azer a crtica tanto ao idealis-mo quanto ao materialismo tradicional. Segundo este autor, o materialismo tradicional

    conceberia o conhecimento como mera contemplao do sujeito diante de um objeto

    exterior a ele e, portanto, um sujeito passivo que [...] se limita a receber ou refletir uma

    realidade; o conhecimento no passa do resultado da ao dos objetos do mundo exte-

    rior sobre os rgos dos sentidos (VZUEZ, 2007, p. 151). J o idealismo, embora

    considere a atividade do sujeito, considera-a apenas abstratamente, ou seja, no inclui a

    atividade prtica. Marx prope ao mesmo tempo, como orma de superao, a negaoda contemplao e a negao da atividade meramente abstrata. Para ele, conhecer [...]

    conhecer objetos que se integram na relao entre o homem e o mundo, ou entre o ho-

    mem e a natureza, relao que se estabelece graas atividade prtica humana (VZ-

    UEZ, 2007, p. 153). Como, no entanto, toda atividade prtica no prescinde de uma

    atividade terica, conclumos que o conhecimento s possvel na prxis.

    No entanto, Vzquez (2007) chama a ateno a que, no senso comum, associa-seo prtico ao utilitrio. De acordo com esse raciocnio, o conhecimento s seria verda-

    deiro conorme osse til. No entanto, o que se deende exatamente o inverso, ou seja,

    o conhecimento til na medida em que verdadeiro, e o critrio de verdade dado

    pela prtica social.

    Nesse sentido, a compreenso da prxis como atividade terico-prtica traz im-

    plicaes importantes para a organizao da prtica como componente curricular na

    ormao inicial de proessores de matemtica, de modo a no ser conundida com um

    certo praticismo, entendido do ponto de vista do senso comum, no qual a prtica se

    eetiva sem teoria, ou com muito pouco dela e, diversas vezes, associada a uma viso

    simplistada ideia de contextualizao no ensino de matemtica, por meio da qual se re-

    duz a prtica ideia de associar com a realidade.Nessa direo, alerta Vzquez (2007)

    para a preocupao com a compreenso prtica entendida como uma atividade acrtica

    em relao a si mesma. nessa perspectiva que se situam muitas das crticas s teoriassobre a epistemologia da prtica, por meio das quais se acredita que, em decorrncia

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    de um processo de reflexo, garante-se a ormao de um bom proessor, mesmo numa

    condio esvaziada teoricamente (ALMEIDA, 2006).

    Assim, apenas por meio do conceito de prxis que se torna possvel adentrar no

    conceito de conhecimento, dentro de uma concepo histrico-cultural e, por conse-guinte, no conceito de educao escolar, como lugar de apropriao de conhecimento

    cientfico. Da a sua importncia, se buscamos compreender as contribuies desse en-

    oque para o trabalho e a ormao docente.

    Sobre educao escolar, destaca Moura (2012, p. 190) que:

    Esta vai alm do ensinamento do que acontece no cotidiano. A educa-o para a aprendizagem do cotidiano no requer a escola como espao

    de aprendizagem. A aprendizagem do cotidiano se d nas prticas coti-dianas. Ir alm da aparncia dos objetos e enmenos que exige a aointencional de desvel-los para o estudante que ao se apropriar das suasmltiplas determinaes dever compreender o modo como oram seconstituindo. Em sntese, apropriar-se do objeto de conhecimento passa

    pelo domnio do modo de az-lo e dos instrumentos mediadores paraconcretiz-lo. Esse modo de organizar o ensino poder impactar os pro-cessos de ormao dos alunos possibilitando-os a resolver problemasque superem as aes cotidianas.

    A compreenso de educao escolar, conorme descrita por Moura (2012), nosleva a pensar sobre a necessidade de que o entendimento de prtica, em sua essncia,

    supera a compreenso desse conceito como aproximao ao cotidiano, mas como um

    modo de apropriao do objeto o conhecimento por meio das mltiplas determi-

    naes que o constituem.

    A PRICA COMO COMPONENE CURRICULAR NA

    LICENCIAURA EM MAEMICA

    Ao adentrarmos a necessidade de compreender a prtica como componente

    curricular em cursos de licenciatura em matemtica no Brasil em consonncia com a

    legislao vigente e na direo da essncia desse conceito, cumpre-nos a necessidade de

    desvelarmos elementos centrais sobre a produo acadmica brasileira j desenvolvida

    nessa rea. Esse levantamento de pesquisas j desenvolvidas tem como intuito principal

    evidenciar que situaes vm sendo compreendidas como prtica e um pouco do cami-nho percorrido pelos pesquisadores para o aproundamento do tema.

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    Pesquisa desenvolvida por Pereira (2013) procurou mapear a produo acad-

    mica que trata da disciplina de prtica de ensino de matemtica e da prtica como com-

    ponente curricular no perodo de 2005 a 2012, de modo a descrever um estado da arte

    sobre a pesquisa brasileira nessa temtica. Ao utilizar como filtro para a coleta de dadoso termoprtica como componente curricularoram identificadas 5 dissertaes, data-

    das de 2008 a 2012.

    O primeiro trabalho encontrado, de autoria de Perentelli (2008 apud PEREI-

    RA, 2013), analisou os projetos pedaggicos de dois cursos de licenciatura em matem-

    tica de duas instituies de ensino superior da Grande So Paulo. A pesquisa revela que

    as duas instituies aziam um esoro para diminuir as divergncias existentes e buscar

    coerncia entre o que estava escrito no projeto pedaggico e o que acontecia na ao dos

    proessores ormadores em sala de aula.

    O segundo trabalho, pesquisa desenvolvida por Mayer (2008 apud PEREIRA,

    2013), analisou a maneira como oi trabalhada a questo da integrao entre as disciplinas

    especficas e pedaggicas, pelo corpo docente do curso de licenciatura em matemtica da

    Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Os resultados apontaram a alta de in-

    tegrao entre as reas que aziam parte do currculo do curso e que a incluso das prticascomo componente curricular em disciplinas especficas e pedaggicas no projeto pedag-

    gico oram vistas como uma possibilidade de integrao entre as duas reas.

    J a pesquisa desenvolvida por Moriel Jnior (2009 apud PEREIRA, 2013) in-

    vestigou as propostas de ormao de proessores presentes em atuais projetos poltico

    pedaggicos de cursos de licenciatura em matemtica no estado do Paran. Aps an-

    lise, concluiu que metade dos projetos poltico pedaggicos apresentam indcios de ar-

    ticulao teoria-prtica em todas as disciplinas destinadas eetivao da prtica comocomponente curricular e, na outra metade, h evidncias em apenas algumas disciplinas.

    Da pesquisa de Guidini (2010 apud PEREIRA, 2013), depreendeu que tinha

    por objetivos reconhecer indcios de identificao com a profisso docente por parte

    dos uturos proessores de matemtica, durante o curso de licenciatura, e conhecer e

    analisar as contribuies das experincias vividas pelos licenciados no desenvolvimento

    da prtica como componente curricular, para a constituio de sua identidade profissio-nal docente. Constatou-se que:

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    [...] o estmulo e o desenvolvimento de uma postura reflexiva, questio-nadora e investigativa, promovidos pela Prtica como ComponenteCurricular, geram, no s um complexo processo de socializao com oambiente docente, mas tambm conflitos, rupturas, incertezas, escolhase batalhas internas, o que propicia que os licenciandos confirmem ou

    vetem a escolha pela docncia (PEREIRA, 2013, p. 12).

    Por fim, destacou-se a pesquisa de Nogueira (2012 apud PEREIRA, 2013) em

    que analisou como as prticas entendidas como componentes curriculares esto dis-

    tribudas na organizao curricular dos projetos pedaggicos e como acontecem nas

    disciplinas dos cursos de licenciatura em matemtica. Constatou que a Universidade

    Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho (UNESP) alocou as horas de prtica como

    componente curricular no conjunto das disciplinas de contedos especficos e pedag-gicos via projetos articuladores, contando com a presena de um proessor articulador

    para cada ano.

    Seguido do estado da arte realizado por Pereira (2013), no perodo de 2005 a

    2012 e situado no rol de pesquisas vinculadas a programas de ps-graduao, destacam-se

    os trabalhos de Brandalise e robia (2011) e de Marcatto e Penteado (2013).

    O trabalho de Brandalise e robia (2011) provm de pesquisa realizada no anode 2010 em uma instituio pblica paranaense, para investigar as principais contri-

    buies da prtica como componente curricular a partir da implantao das 400 horas

    nos projetos de cursos. A pesquisa oi desenvolvida por meio de anlise documental,

    entrevistas com proessores da disciplina de instrumentao para o ensino de matem-

    tica, criada para atender as diretrizes vigentes e, por fim, questionrios com estudantes

    concluintes naquele ano.

    Para a incorporao da prtica como componente curricular, a disciplina de Ins-trumentao para o ensino oi implantada nos quatro anos de curso, aliada disciplina

    de laboratrio de matemtica, totalizando a carga horria prevista, conorme segue:

    instrumentao I, no primeiro ano (68 horas); instrumentao II, no segundo ano (102

    horas); instrumentao III, no terceiro ano (102 horas); instrumentao IV, no quarto

    ano (68 horas) e laboratrio de ensino de matemtica (68 horas), tambm para o quarto

    ano de curso.

    Segundo Brandalise e robia (2011, p. 343):

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    As disciplinas de Instrumentao para o Ensino de Matemtica e de La-boratrio de Ensino de Matemtica caracterizam-se por um conjunto deestudos, vivncias, intervenes, experincias e produes cientficas edidtico-pedaggicas sobre o conhecimento matemtico, sua produoe socializao. Cabe a ambas propiciar os momentos interdisciplinares e

    contextualizados, no mbito do Curso.

    A pesquisa de Marcatto e Penteado (2013) investigou a insero da prtica como

    componente curricular em cursos de licenciatura em matemtica, a partir da anlise de

    30 projetos de cursos de licenciatura, sendo 24 (80,0%) de instituies pblicas, 14

    (58,3%) de instituies ederais e 10 (41,7%) de cursos que pertenciam aos estados.

    Completa a amostra o setor privado com seis projetos (20,0% do total).

    Primeiramente, a pesquisa revelou que:50% dos projetos de curso tm as horas de prtica como componentecurricular distribudas durante toda a ormao do uturo proessor, do

    primeiro ao ltimo semestre, sem interrupo. Em 40% dos projetos decurso, as horas de prtica como componente curricular no esto presen-tes do primeiro ao ltimo semestre do curso. Pelo menos um semestreou mais na matriz curricular no contempla as horas de prtica. Em 10%dos projetos, dois semestres consecutivos, dentro do mesmo ano, nocontam com as horas de prtica como componente curricular (MAR-

    CAO; PENEADO, 2013, p. 66).

    A anlise dos projetos realizada por Marcatto e Penteado (2013) possibilitou,

    ainda, a identificao de trs grandes modelos de cursos, no que tange organizao da

    prtica como componente curricular. Num primeiro modelo, encontram-se os projetos

    que criaram em sua matriz curricular disciplinas com carga horria contabilizada inte-

    gralmente na categoria prtica como componente curricular, totalizando 11 projetos

    do total de 30. Um segundo modelo revela aqueles que inseriram parte da carga horria,

    de 8 a 30 horas, em algumas disciplinas ou todas, contabilizadas como prtica como

    componente curricular, somando 7 projetos. O terceiro modelo uma juno dos dois

    primeiros, ou seja, h disciplinas que so contabilizadas integralmente na categoria pr-

    tica como componente curricular e h disciplinas que so contabilizadas parcialmente

    nessa categoria, contemplando 12 projetos.

    Da produo acadmica sobre a prtica como componente curricular em cur-

    sos de licenciatura em matemtica, embora encontremos dissertaes e outros trabalhosacadmicos que abordem o tema, pouco se tem destacado sobre indcios da organizao

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    da prtica no contexto das disciplinas, ou seja, na organizao do ensino pelos docentes

    para a sua incorporao como componente curricular. A nase de muitos dos trabalhos

    na proposio de disciplinas que se enquadrem nessa categoria ou na previso de parte

    da carga horria para atendimento dessa especificidade, cabendo aos docentes definiraes e estratgias de encaminhamento.

    Na busca de compreenso sobre a organizao da prtica como componente

    curricular, Mocrosky, Kalinke e Estephan. (2012) apresentam experincia desenvolvida

    na disciplina de unes reais de uma varivel real, em um curso de licenciatura de uma

    universidade pblica ederal paranaense, com a discusso de um roteiro de atividade

    para a dinamizao da prtica. A proposta revela o entendimento dos pesquisadores so-

    bre a prtica na ormao de proessores de matemtica como [...] atividades diversifica-das que, repletas de teoria, so direcionadas ormao do proessor (MOCROSKY;

    KALINKE; ESEPHAN, 2012, p. 357). No entendimento dos pesquisadores, no

    se trata de estabelecer um modelo terico para a prtica, mas sim omentar a discusso

    sobre a necessria articulao da prtica no processo ormativo.

    CONSIDERAES FINAIS

    A insero da prtica como componente curricular nos projetos poltico peda-

    ggicos dos cursos de licenciatura no Brasil ainda um desafio para muitas instituies.

    Sendo um processo relativamente recente, ainda so poucas as pesquisas que apresen-

    tam dados e anlises sobre o modo como tem se dado a compreenso e implementao

    de tal prtica.

    Em particular, nos cursos de licenciatura em matemtica, as pesquisas apontam

    que a exigncia legal de insero da prtica como componente curricular nos projetospoltico pedaggicos de cursos tem se dado por meio de trs estratgias bsicas rela-

    cionadas grade curricular dos cursos: disciplinas contabilizadas integralmente como

    sendo de prtica; prtica como componente curricular inserida em algumas disciplinas

    do curso; disciplinas de prtica e prtica inserida nas disciplinas (MARCAO; PEN-

    EADO, 2013).

    No entanto, este panorama curioso se compreendermos a necessria articula-o entre teoria e prtica para a produo e apropriao do conhecimento. Afinal, o que

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    seria uma disciplina totalmente prtica? Uma disciplina totalmente prtica no teria

    por objetivo a apropriao de conhecimentos tericos sobre a docncia? Ou ser que

    o saber docente seria um conhecimento unicamente emprico, entendido como aquele

    ocado exclusivamente na experincia sensorial e que [...] se apoia nas observaes erepresentaes (DAVYDOV, 1988, p. 80)? No concordamos com essa compreenso

    de prtica. Deendemos a existncia de um saber docente subsidiado por um conheci-

    mento terico sobre a docncia. Nesse sentido, entender a prtica como componente

    curricular implica possibilitar aos estudantes a experincia que inclui a observao que:

    [...] se apoia na ao cognoscitiva, que revela as conexes internas comoonte dos enmenos observados. As aes que estabelecem as conexes

    entre o externo e o interno (singular e universal) constituem a base paraa compreenso do objeto. A continuao do processo de ormao doconcreto, com ajuda destas aes, o pensamento realizado em ormade conceitos, isto , o pensamento terico (DAVYDOV, 1988, p. 80).

    De orma equivalente, a prtica perpassa a apropriao de conhecimentos tericos.

    Mais especificamente, possvel vislumbrar o componente da prtica como componente

    curricular na ormao de proessores de matemtica em disciplinas como clculo, topo-

    logia, anlise real, entre outras. Nesse sentido, qual articulao possvel estabelecer entreos conceitos abordados em tais disciplinas e avanos cientficos e tecnolgicos? Como

    ressignificar conceitos a serem ensinados na educao bsica a partir das abordagens pos-

    sibilitadas por essas disciplinas? Por exemplo, ser que a compreenso dos conceitos de

    densidade ou convergncia no tem implicaes na maneira como o proessor organiza o

    ensino dos nmeros reais ou de uma soma de progresso geomtrica infinita?

    Assim, embora evidentemente algumas disciplinas do curso de licenciatura em

    matemtica estejam mais diretamente relacionadas com a prtica docente, como est-gio, laboratrio de matemtica, didtica da matemtica, resoluo de problemas ou mo-

    delagem matemtica, o princpio ormativo a ser perseguido a eetiva articulao entre

    a teoria e prtica.

    Em sntese, assim como a abordagem terica de conceitos no prescinde da sua

    articulao com a atividade prtica histrica, social e dos sujeitos, tambm o oco na

    realidade escolar e na prtica pedaggica demanda conhecimento terico que permitaaos sujeitos compreender tal realidade na superao do olhar emprico que a configura

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    como caso particular. al superao, como afirma Davydov (1988, p. 76), permite que

    o sujeito compreenda os objetos na [...] sua relao dentro de certo todo e na depen-

    dncia dele [...], o que possvel pelo desenvolvimento do pensamento terico, na arti-

    culao entre prtica e teoria.Nesse sentido, a compreenso do conceito de prtica e, por conseguinte, seu

    entendimento no contexto da prtica como componente curricular no processo or-

    mativo de proessores de matemtica, constitui questo central a ser problematizada e

    apropriada por pesquisadores e ormadores de proessores que investigam e/ou atuam

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    PS-MODERNIDADE, CULURA EENDNCIAS EM EDUCAO MAEMICA

    Luciane Mulazani dos SantosValdir Damazio Junior

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    INRODUO

    O objetivo deste texto discutir educao matemtica e ps-modernidade. Para

    isso, apresentamos um estudo que versa sobre educao e cultura na sociedade ps-mo-

    derna. Nossa inteno provocar reflexes sobre os caminhos da educao matemtica

    e suas tendncias. Assim, situamos os termos modernoeps-modernopara entendi-

    mento do tempo em que vivemos e problematizamos a impossibilidade de uma defini-

    o nica para o termops-moderno. Contrapomos o entendimento de ps-moderni-

    dade com aquilo que se define por modernidade, mais particularmente o conceito de

    verdade: na modernidade, a verdade assume papel central, e isso tem um impacto deci-

    sivo no ensino de matemtica; na ps-modernidade, a verdade deixa de ocupar posiocentral, dando espaos a vrias verdades e vrias ormas de se relacionar com o conheci-

    mento. Se assim, o que seria uma educao matemtica ps-moderna? Uma vez que a

    noo de verdade e de conhecimento puro questionada na ps-modernidade, o qu e

    por qu ensinar? Enrentando essas perguntas, abordamos o tema encarando a ps-mo-

    dernidade no sentido de oposio modernidade. Para isso, fizemos trs movimentos.

    O primeiro, de demarcar as principais caractersticas e promessas da modernidade, por

    acreditarmos ser essa uma boa maneira para compreender algumas das caractersticasda ps-modernidade. No segundo, trazemos pontos de discusso de dierentes autores

    a respeito do ps-moderno. No terceiro, relacionamos a questo da ps-modernidade

    como oposio modernidade em educao matemtica.

    HISRIAS SOBRE O PASSADO, REFLEXES SOBRE OPRESENE E SOBRE O FUURO

    Museu um espao que rene coisas que preservam memrias, que guardam

    histrias que sobrevivem a diversos perodos histricos, que colocam uma cultura em

    exposio. Uma visita ao museu rende viagens no tempo e na histria. De acordo com

    os estatutos do International Council o Museum (2015), um museu uma organizao

    permanente, sem fins lucrativos, aberta ao pblico a servio da sociedade e do seu desen-

    volvimento, que adquire, conserva, pesquisa, comunica e expe o patrimnio material

    e imaterial da humanidade e seu ambiente para fins de educao e prazer. O trabalhorealizado pelo museu com seu acervo undamental para a criao de identidades cul-

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    turais, perpassando aspectos da educao, histria, arte e tecnologia. odas as coisas

    expostas em um museu e o prprio espao do museu revelam cotidianos de outros

    tempos, de outras histrias. Ainda que conte histrias sobre o passado, uma visita ao

    museu rende tambm reflexes sobre o presente e sobre o uturo.Foi uma visita a uma exposio do Museu de Arte Contempornea de Curitiba

    que ez render as reflexes que iniciam este texto. A exposio do projeto Conservao

    e Restaurao de elas do Museu de Arte Contempornea do Paran mostrou como oi

    eito o trabalho de restaurao de algumas pinturas, apresentando as telas restauradas e as

    inormaes sobre como cada processo oi eito por meio de tcnicas especializadas para

    cada tipo de obra.

    O objetivo da restaurao no eliminar os eeitos da passagem do tempo sobre

    uma obra. Isso seria apagar a sua histria. O objetivo preservar a histria, evidenciando

    as belezas da obra e o estilo e as intenes do artista. por isso que, por exemplo, as restau-

    raes em telas pintadas com tinta a leo so eitas utilizando tinta base de gua. Como

    sabemos, o solvente da gua no o mesmo do leo: o trabalho de uma restaurao pode

    ser deseito sempre que desejvel sem, com isso, comprometer a obra original. As restau-

    raes eitas so sempre negociadas, ou com o artista ou com sua amlia, porque a unodo restaurador no reconstruir uma obra e sim preserv-la da orma mais fiel ao original.

    O caso da restaurao do autorretrato do pintor e escultor curitibano Oswald Lo-

    pes (19101964) particularmente interessante e nos leva a algumas reflexes a respeito

    da passagem do tempo para uma obra de arte. A pintura um leo sobre tela. Oswald

    Lopes era conhecido por sua arta barba, que aparece retratada na tela que necessitava de

    reparos por conta das condies em que se encontrava. Durante os exames da tela, usan-

    do diversas tcnicas especializadas, os restauradores descobriram que a obra, em algum

    momento de sua histria, havia sido repintada. A barba de Oswald Lopes oi pintada em

    cima do autorretrato original, muito provavelmente por outra pessoa, pois as pinceladas e

    as tintas tinham outras caractersticas se comparadas ao estilo do artista. Foi uma surpresa

    para os restauradores perceber a condio da barba de Oswald Lopes no quadro. Havia

    uma deciso a tomar durante o restauro: manter a barba ou retir-la? Consultada, a a-

    mlia do artista autorizou a remoo da barba, deixando o quadro como oi pintado porOswald Lopes.

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    UMA ABORDAGEM INRODURIA

    No mundo das cincias, muitas vezes, novas ideias aparecem como oposio ou

    conrontamento a ideias anteriores. Isso traz rupturas ou mudanas de pensamento,

    construindo transies paradigmticas. Um bom exemplo, encontrado na histria da

    cincia, o modelo heliocntrico proposto por Coprnico - e diundido por Galileu

    -, em oposio ao modelo geocntrico ptolomaico. Outro exemplo so as revolues

    ocorridas na Fsica moderna graas aos trabalhos de Einstein, uma oposio mecnica

    clssica newtoniana.

    uando tratamos das cincias humanas includa a a educao e, por extenso,

    a educao matemtica , as rupturas ou mudanas de pensamento no so to con-sensuais, tornando mais dicil a tarea de demarcar um ponto de ocorrncia de uma

    transio paradigmtica. Alm disso, no raras vezes, nas cincias humanas coexistem

    dierentes campos tericos que so considerados contraditrios em muitos de seus

    pontos conceituais, mas, ainda assim, so campos vlidos enquanto cincias, abarca-

    dos por comunidades cientficas bem estruturadas. No mbito das cincias humanas,

    mesmo teorias reconhecidamente importantes para o pensamento ocidental atual no

    assumem um carter demarcatrio decisivo de ruptura, ou seja, podem at possibilitarmudanas de pensamento, mas no so aceitas como teorias dominantes.

    Neste trabalho, chamamos a ateno para um dos pontos crticos da histria das

    cincias e do pensamento que influenciaram e continuam influenciando tanto as cincias

    naturais quanto as cincias humanas: a oposio entre modernidade e ps-modernidade.

    H muitos complicadores na tarea de discutir a questo da oposio entre mo-

    dernidade e ps-modernidade. De incio, o primeiro deles, discutir o uso e o significa-

    do do termops-modernidade. udo o que se pode usar como definio, justificativa

    ou exemplos para a ps-modernidade leva a todos os outros complicadores, marcada-

    mente repousados no tratamento dado s possveis atuaes ou influncias dos con-

    ceitos de ps-modernidade no mundo em que vivemos. Os complicadores aparecem,

    pois, a discusso em torno do tema depende do contexto de ideias e paradigmas em que

    so tratados. Assim, tarea delicada discutir o tema; nos dedicamos a ela, neste texto,

    apresentando um possvel panorama de discusso, considerando nossas leituras de pes-quisa e nossa inteno de contribuir para uma discusso crtica em educao matemtica.

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    Por consideramos a tarea delicada, no pretendemos definir o que ps-modernidade e

    muito menos traar pontos e diretrizes do que seria uma educao ps-moderna. Se tivs-

    semos a pretenso de responder decisivamente a tais problemas, estaramos caindo num

    mesmo erro do que chamaremos de lgica da modernidade, que tem como uma de suascaractersticas undamentais a iluso de chegar a uma soluo, mesmo que provisria, aos

    problemas por ela tratados. Essa impossibilidade, que j de antemo impusemos ao nosso

    trabalho, no significa que o tema no possa ser discutido, ou mesmo que no podemos

    tirar proveito dessa discusso. Partimos do pressuposto de que no possvel incluir as dis-

    cusses evolvendo ps-modernidade numa mesma lgica moderna de certezas e controle.

    Neste sentido, as concluses obtidas nesta discusso so de outra natureza, onde daremos

    mais relevncia s novas perguntas e aos novos problemas que podem ser alcanados nestecaminho, do que em possveis respostas a velhos problemas ormulados.

    UMA ENAIVA DE DEFINIR A PSMODERNIDADE...

    O termops-modernidade usado, com requncia, para se reerir ao que vem

    depois da modernidadeou ao que se ope modernidade. Ainda que no exista uma

    clara demarcao do ponto onde deixamos a modernidade para trs e adentramos a ps--modernidade ou mesmo se tal ato aconteceu , esse o uso mais comum do termo.

    al uso corriqueiro no tira, contudo, o carter polissmico do termo. E na esteira

    dessa polissemia que nosso texto se desenvolve: trabalhamos com a possibilidade de o

    conceito assumir dierent