monografia pablo 2004

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P P A AB B L L O O S S E E B B A AS S T T I I A AN N M M O O R R E E I I R R A A F F E E R R N N A AN N D D E E Z Z T T R R I I L L H H A A D D E E I I M M A AG G E E N N S S G G E E O O F F O O T T O O G G R R Á Á F F I I C C A AS S D D O O R R I I B B E E I I R R Ã Ã O O C C A A M M B B É É : : E E X X P P E E R R I I Ê Ê N N C C I I A AS S D D E E L L U U G G A AR R P P O O R R Á Á G G U U A AS S D D E E L L O O N N D D R R I I N N A A - - P P R R L L o o n n d d r r i i n n a a P P r r i i m m a a v v e e r r a a d d e e 2 2 0 0 0 0 4 4

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Page 1: Monografia Pablo 2004

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Page 2: Monografia Pablo 2004

2

PABLO SEBASTIAN MOREIRA FERNANDEZ

TRILHA DE IMAGENS GEOFOTOGRÁFICAS DO RIBEIRÃO CAMBÉ: EXPERIÊNCIAS DE LUGAR POR

ÁGUAS DE LONDRINA

Monografia apresentada ao Curso de

Geografia, da Universidade Estadual de

Londrina, como requisito parcial à

obtenção do título de Bacharel, no verão

de 2004.

Orientadora: Profa. Dra. Lúcia Helena

Batista Gratão.

Londrina

2004

Page 3: Monografia Pablo 2004

3

FERNANDEZ, Pablo Sebastian Moreira Trilha de Imagens Geofotográficas pelo Ribeirão Cambé:

Experiências de Lugar por águas de Londrina - PR/ Pablo Sebastian Moreira Fernandez. - Londrina, PR : [s.n], 2004.

94f. + anexos

Orientadora: Dra. Lúcia Helena Batista Gratão. Monografia (Bacharelado) - Universidade Estadual de Londrina. Bibliografia: f.

1. Ribeirão Cambé. 2. Paisagem e Lugar. 3. Geografia e

Imagem. 4 Experiências Geofotográficas. I. Gratão, Lúcia Helena Batista. II. Universidade Estadual de Londrina.

CDU

Page 4: Monografia Pablo 2004

4

PABLO SEBASTIAN MOREIRA FERNANDEZ

TRILHA DE IMAGENS GEOFOTOGRÁFICAS PELO RIBEIRÃO CAMBÉ: EXPERIÊNCIAS DE LUGAR POR

ÁGUAS DE LONDRINA

Monografia apresentada ao Curso de

Geografia, da Universidade Estadual de

Londrina, como requisito parcial à

obtenção do título de Bacharel, no verão

de 2004.

COMISSÃO EXAMINADORA

______________________________________

Profa. Dra. Lúcia Helena Batista Gratão

DGEO/ Universidade Estadual de Londrina

______________________________________

Profa. Ms. Jeani D. Paschoal Moura

DGEO/ Universidade Estadual de Londrina

______________________________________

Profa. Dra. Anilde Tombolato T. da Silva

CECA/ Universidade Estadual de Londrina

Londrina, ____ de____________ de 2004.

Page 5: Monografia Pablo 2004

5

Dedicado à Geraldo Moreira (in memoriam).

Grande mestre e inspirador de inúmeras aventuras!

Dedicado à simplicidade do poeta matogrossense Manoel de Barros e a

profundidade da obra de Haruo O’hara.

Page 6: Monografia Pablo 2004

6

AGRADECIMENTOS

À Ana, por toda troca de experiências;

À minha família. Valeu por todo amor e carinho... Sem estes, nada havia acontecido!

À minha orientadora, Profa. Dra. Lúcia Helena Gratão (DGEO/UEL), pessoa boa

cerratense e companheira de muitos (per)cursos de pé e olhar caminhantes...

Aos Professores: Yoshiya F. Nakagawara (LPUR/DGEO); Jeani D. Paschoal Moura

(DGEO); Anilde Tombolato e Lucília Defreitas (“Projeto Trilhas”/ CECA/UEL); José

Marques Neto “Negativo” (CECA);

Aos companheiros de caminhar: Vanessa Tavares, Edmar e família Figueiredo,

Daniela e Tiago, Yoshiura, Thiago e Ana, Camila, Solange, Mário, Flávio, Ricardo,

André Santi (o flanêur) e Ju, Marcelo, Antônio e Wladimir (in memoriam), Vicente e

Sr. Nelson, Angélica, Leila, Renata, Fred e Rafael, Eduardo Marandola (pelas

riquíssimas prosas), André Acosta, Carlos Levy e amigos da ONG MAE, Vitor,

Família Monteiro, Sassá, Família Santa Rosa, José Fermino, Tony, Caê Galvão,

Adriana, Gibram, Prof. Wencesláo (OLHO), Renato Alemão, Hang Pang e Zé

Eduardo, Heitor, pessoal do LPUR, Daniel (Bimini) e Cláudio (PETAR), aos amigos

do Departamento de Geociências: Edna, Anderson, Perciliana e Jacira; Alunos,

Professores e Funcionários da Escola Municipal Norman Prochet;

Àqueles que me conduziram pelo Ribeirão Cambé: Natalino, Gaúcho, Aparecido,

João Batista (ONG Patrulha das águas), Sr. José Carlos e Sr. Jesus;

Aos “compadres” da Secretaria Municipal do Ambiente de Londrina: Marcus, Paulo,

Queila, Carlos, Laércio, Fátima, Carina, Luis, Antonio Carlos, e outras pessoas que

vou me esquecendo.

Pelas fotografias: Profs. José César e Áurea Yamane (Museu Histórico de Londrina);

Saulo Haruo O´hara (Estúdio Difotografia). Obrigado, Gracias!

Page 7: Monografia Pablo 2004

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FERNANDEZ, Pablo Sebastian Moreira. Trilha de Imagens Geofotográficas do Ribeirão Cambé: Experiências de Lugar por Águas de Londrina. 2004. Monografia (Bacharelado em Geografia) - Universidade Estadual de Londrina.

RESUMO

Esta proposta se dá pela investigação da imagem geofotográfica do Ribeirão Cambé, através de caminhos da experiência vivida por Paisagens e Lugares. A “Imagem – Paisagem” deste Lugar das águas têm se tornado ilegível no contexto da cidade contemporânea, deixando de ser um marco referencial para o sujeito que habita essa cidade. Sujeito confuso, que já não distingue as imagens reais e irreais, convivendo com uma ilusão proposta pela mídia, pela publicidade, pela política e por aqueles que escrevem a história desse Lugar. As Águas do Cambé tem, sido, fortemente difundidas por uma febre fotográfica, e ao mesmo tempo, têm sofrido com o esquecimento da maior parte da população londrinense. O pesquisador com o intuito de expressar-relatar suas experiências pelas margens desse Ribeirão de águas urbanizadas, se fez valer de métodos de leitura e construção de imagens propostos por Barthes e Flusser. Métodos que possibilitaram uma leitura detalhada de algumas expressões materializadas deste Lugar, como as imagens vividas e clicadas por Juliani, Ohara e Bavcar. Nesse contexto, emerge “A Trilha de Imagens do Ribeirão Cambé”, sendo forma de expressão das experiências vividas do pesquisador, baseada na linguagem do geógrafo almejada por Dardel. É vista também, como um meio para despertar nos sujeitos-moradores da cidade de Londrina, um olhar de zelo e de afetividade para com estas águas tão próximas. O (per)curso (exposição, mostra) de imagens fotográficas, nasce como uma proposta didática-educativa para o (re)conhecimento de Lugares e Paisagens, buscando trazer através d’um enfoque poético, expressões de valor, sentimentos e topofilia. Palavras-chave: Trilha de Imagens do Ribeirão Cambé – Londrina – PR; Paisagem e Lugar; Geografia e Imagens.

Page 8: Monografia Pablo 2004

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FERNANDEZ, Pablo Sebastian Moreira. Track of Geophotographic Images of the Cambé Brook: Experiencies of Place for Waters of Londrina. 2004. Monografia (Bacharelado em Geografia) – Universidade Estadual de Londrina.

ABSTRACT

This proposal if gives as an inquiry on the geofotographic image of the Cambé Brook, through ways of the experience lived for Landscapes and Places. The "Image - Landscape" of this Place of waters if became unreadable in the context of the city contemporary, leaving of being a referencial landmark for the citizen that inhabits this city. Confused citizen, that already does not distinguish the real and unreal images, coexisting an illusion proposal for the media, for the advertising, for the politics and for that they write the history of this Place. The Waters of the Cambé have, been, strong spread out for the Photograph, and at the same time, they have suffered with the forgetfulness of the biggest part of the londrinense population. The researcher with intention express-to tell its experiences for the edges of this urbanized water Brook, if made to be valid methods of reading and construction of images considered for Barthes and Flusser. Methods that make possible a reading detailed on some materialized expressions of this Place, as the lived images and click for Juliani, Ohara and Bavcar. In this context, the “Track of Images of the Cambé Brook” emerges, being form of expression of the lived experiences of the researcher, based on the language of the geographer longed for Dardel. It is also seen, as a way to awake in the citizens that inhabit the city of native of Londrina, an affectivity and zeal look stops with these so next waters. The course (exposition, shows) of photographic images, is born as a proposal didactics-educative for the (re)knowledge of Places and Landscapes, searching to bring through of the poetical approach, expressions of value, feelings and topofilia. Key-words: Track of Geophotographic Images of the Cambé Brook – Londrina – PR, Landscape e Place, Geography and Image.

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LISTA DE IMAGENS

Imagem 1 - ----------------------------------------------------------------------------------------------14

Imagem 2 – ---------------------------------------------------------------------------------------------18

Imagem 3 – ---------------------------------------------------------------------------------------------22

Imagem 4 - ----------------------------------------------------------------------------------------------49

Imagem 5 - ----------------------------------------------------------------------------------------------52

Imagem 6 - ----------------------------------------------------------------------------------------------54

Imagem 7 - ----------------------------------------------------------------------------------------------62

Imagem 8 - ----------------------------------------------------------------------------------------------63

Imagem 9 - ----------------------------------------------------------------------------------------------64

Imagem 10 - --------------------------------------------------------------------------------------------65

Imagem 11 - --------------------------------------------------------------------------------------------65

Imagem 12 - --------------------------------------------------------------------------------------------66

Imagem 13 ----------------------------------------------------------------------------------------------67

Imagem 14 - --------------------------------------------------------------------------------------------68

Imagem 15 - --------------------------------------------------------------------------------------------69

Imagem 16 – -------------------------------------------------------------------------------------------70

Imagem 17 - --------------------------------------------------------------------------------------------71

Imagem 18 - --------------------------------------------------------------------------------------------72

Imagem 19- ---------------------------------------------------------------------------------------------73

Imagem 20 – -------------------------------------------------------------------------------------------79

Imagem 21 – -------------------------------------------------------------------------------------------80

Page 10: Monografia Pablo 2004

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SUMÁRIO

1 EXPERIÊNCIAS CAMINHANTES... PRIMEIROS CONTATOS COM O RIBEIRÃO

CAMBÉ.......................................................................................................................12

2 LONDRINA... IMAGEM REFLETIDA NAS ÁGUAS DO CAMBÉ............................17

2.1 A imagem de um lugar urbano... Paisagem do Ribeirão Cambé.........................18

2.2 Exercícios imaginativos... ....................................................................................23

3 TRILHARES PELA CIÊNCIA GEOGRÁFICA...

DA IMAGEM À IMAGINAÇÃO E À GEOGRAFICIDADE...........................................26

3.1 Criatividade e imaginação numa construção geográfica.....................................28

3.2 Caminhos geográficos para uma leitura da realidade .........................................29

3.3 Fenomenologia e experiência geográfica.............................................................30

3.4 Geografia e mundo-vivido....................................................................................33

3.5 Espaço, paisagem e lugar na perspectiva da experiência...................................34

3.5.1 Espaço...............................................................................................................34

3.5.2 Paisagem...........................................................................................................36

3.5.3 Lugar.................................................................................................................37

3.5.4 Topofilia e topofobia..........................................................................................38

3.5.5 Algumas considerações sobre a geograficidade...............................................39

4 O RIBEIRÃO CAMBÉ DE JULIANI, OHARA E BAVCAR... EXERCÍCIOS PARA

UMA LEITURA GEOFOTOGRÁFICA DA IMAGEM...................................................42

4.1 A leitura da imagem fotográfica do lugar..............................................................43

4.1.1 A “imagem paisagem” do Ribeirão Cambé como expressão de mundos

vividos.........................................................................................................................45

4.2 José Juliani... o olhar do fotógrafo pioneiro.........................................................47

4.2.1 Juliani e a foto da Cachoeira do Cambézinho...................................................48

4.3 “Paisagem de Sonhos”: o olhar poético de Haruo Ohara.....................................51

4.3.1 O Lago Igapó... pelo olhar onírico do poeta.....................................................53

4.4 Evgen Bavcar... e a paisagem invisível das águas tropicais................................55

4.4.1 Paisagem do Invisível... Águas do Cambé........................................................56

Page 11: Monografia Pablo 2004

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5 ENSAIO GEOFOTOGRÁFICO... UMA FORMA DE EXPRESSAR

GEO(GRAFIAS).........................................................................................................59

5.1 O Uso do Solo e configurações utilitárias da paisagem.......................................61

5.2 Os lagos...............................................................................................................63

5.3 O lazer e as brincadeiras......................................................................................65

5.4 As formas de vida.................................................................................................68

5.5 A pesca.................................................................................................................68

5.6 O povo Kaingang..................................................................................................70

5.7 Os personagens do lugar.....................................................................................71

6 A TRILHA DE IMAGENS GEOFOTOGRÁFICAS DO RIBEIRÃO CAMBÉ.............75

6.1 O Trajeto da Trilha... na Escola Municipal Norman Prochet – Londrina..............76

6.2 Algumas expressões de sentidos, sentimentos e valores pelo Cambé...............78

7 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES..............................................................................84

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...........................................................................88

BIBLIOGRAFIA...........................................................................................................92

DISCOGRAFIA...........................................................................................................94

VIDEOGRAFIA...........................................................................................................94

ANEXO – Outras Imagens do Ribeirão Cambé.........................................................95

Page 12: Monografia Pablo 2004

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1 - EXPERIÊNCIAS CAMINHANTES... PRIMEIROS CONTATOS COM O

RIBEIRÃO CAMBÉ

Considero que todo esse envolvimento (ou encontro) com o Ribeirão Cambé,

se deu com meus primeiros anos de vivência na cidade de Londrina, a partir do

momento que iniciara a graduação no curso de Geografia da Universidade Estadual

de Londrina, no verão de 2000. Este grandioso corpo d´água despertaria inúmeras

aspirações de um recém chegado da pequenina cidade de São João da Boa Vista,

orientando o acesso deste ser à Londrina, cidade "nova criada" no sertão do Paraná.

De minha cidadela localizada no nordeste do Estado de São Paulo, região de divisas

com o sul do Estado de Minas Gerais, restaria lembranças de um povo caipira e de

paisagens caracterizadas por riquezas hídricas marcantes da face oeste da Serra da

Mantiqueira, região de cachoeiras e estâncias hidrominerais, próxima das "famosas"

cidades de Águas da Prata – SP e Poços de Caldas – MG. Olhando para o Ribeirão

Cambé, lembraria de minha infância próxima às águas cristalinas que nascem na

Serra, e logo quando longe destas pela primeira vez, me vi inquieto. O Ribeirão

Cambé, agora, teria que ser transformado em abrigo de minha imaginação, e

condutor do amadurecimento de um olhar aprendiz de (geo)grafias, por esta cidade

marcada por águas, águas imprevisíveis dos trópicos.

No decorrer destes (per)cursos, este olhar se viu orientado na disciplina

“Trilhas Interpretativas, Paisagem e Educação Ambiental”, ministrada pela

professora Lúcia Helena Gratão no segundo semestre de 2001, se constituindo num

rico encontro de idéias e vivências, norteando minhas percepções ambientais pelo

curso do Ribeirão Cambé. Encontro condutor de experiências ambientais entre

companheiros de curso, onde se desvelavam significantemente os estudos de

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topofilia e meio ambiente do geógrafo norte americano Yi-Fu Tuan, difundidos no

Brasil, pela Profa. Lívia de Oliveira (Unesp/Rio Claro) desde meados dos anos 70.

Assim, topofilia é definida por Tuan, como sendo um neologismo que considera os

laços afetivos do homem com o meio ambiente natural, sendo:

[...] A topofilia não é a emoção humana mais forte. Quando é irresistível, podemos estar certos de que o lugar ou meio ambiente é o veículo de acontecimentos emocionalmente fortes ou é percebido como um símbolo. [...] O termo topofilia associa sentimento com lugar. [...] O meio ambiente pode não ser a causa direta da topofilia, mas fornece o estímulo sensorial que, ao agir como imagem percebida, dá forma às nossas alegrias e ideais (TUAN, 1980, p.107 - 129).

Deste momento, lembro-me ainda, de minhas experiências de caminhar,

voltando “a pé” da Universidade pelo médio vale do Ribeirão Cambé, intuindo

economizar “algum” da condução. Certo dia, um colega do curso “pé vermelho” veio

chamar a minha atenção para lembranças de sua infância com esta paisagem

hídrica, evocando suas primeiras experiências de imagem e imaginação com este

lugar. Colocava-me após aquele momento, na condição de estrangeiro que teria de

(re)aprender suas brincadeiras espaciais de criança, agora em águas barrentas da

terra norte-paranaense.

Caminhando com este “personagem do lugar”, me vi próximo de valores de

sua intimidade, lugares e cantos que fizeram parte de sua (geo)grafia de vida. Este,

como que “apontando no horizonte”, dizia: - "(...) Alí era o lugar da mata, e ali ainda

não tinha estes bairros!!”. Ou: -“O rio aqui era limpo, aí que a gente nadava. Era o

Sport Club Igapó!!".

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Imagem 1 - Caminho de volta da UEL pela margem direita do médio vale do Cambé. Ao fundo se avista o divisor de águas ocupado pela área central urbana (Junho de 2001). “Caminhando, estamos no mundo, encontramo-nos num lugar específico e, ao caminhar nesse espaço [...] tornamo-lo um lugar, uma moradia, ou um território, uma habitação com um nome" (HILLMAN, 1993, p. 53).

A partir desta imagem da memória falada, o pesquisador se encontraria com o

filósofo francês Gáston Bachelard e sua obra intitulada “A Poética do Espaço”

(publicada originalmente em 1957), onde constrói uma reflexão sobre a imagem do

espaço de valores da intimidade, a casa.! Esta que transparece (e aparece!)

enquanto forma complexa e que integra os valores fundamentais mais profundos do

homem, sejam objetivos ou subjetivos. Para ele: “A casa nos fornecerá

simultaneamente imagens dispersas e um corpo de imagens" (BACHELARD, p.23).

Mostrando assim, que a imaginação (como forma de "interpretar" imagens) é algo a

ser valorizado em nosso existir, pois devemos (e deve) sonhar e devanear, no

valorizar a realidade. A casa como espaço que traz aconchego ao ser, existe como

estância imagética e acolhedora de uma diversidade de imagens, e nos possibilita o

exercício de nossas capacidades imaginativas. Neste rumo Bachelard nos orienta:

Page 15: Monografia Pablo 2004

15

Ao contrário, os verdadeiros pontos de partida da imagem, [...] revelarão concretamente os valores do espaço habitado, o não-eu que protege o eu. Aqui, com efeito, abordamos uma recíproca cujas imagens deveremos explorar: todo espaço realmente habitado traz a essência da noção de casa (BACHELARD, 1988, p.24-25).

Neste exercício de inspiração, em busca de novos sentidos à

imagem/paisagem do Ribeirão Cambé, é enfatizada a busca pelo sentido de

felicidade e segurança que o lugar nos traz na lembrança, na memória. Assim como

o lugar visto na ótica bachelardiana, o Ribeirão Cambé é considerado não só como

expressão de um campo de exploração geográfica (imagética, ambiental ou social),

mas é abrigo de sentido para experiências espaciais através da expressão poética e

do devaneio1 diurno.

Neste percurso de experiências caminhantes, o pesquisador pôde ampliá-las

no momento em que foi morar nas redondezas do Lago Igapó 4, e num segundo

momento, com o início de um estágio extracurricular na Secretaria Municipal do

Ambiente, com sede no interior do Parque Municipal Arthur Thomas, seguindo pelo

“caminho dos lagos” quase que diariamente. Percorrendo neste Parque, trilhas

interpretativas situadas num trecho do baixo Cambé com alunos do Ensino

Fundamental de Londrina, podendo aí, partilhar de experiências com seres que

talvez nem imaginassem estar tão próximo destas águas. Chamava-me atenção o

estranhamento que inicialmente tomava essas crianças, e que logo se transformava

em alegria pelo encontrar o ambiente próximo.

Enquanto estes contatos emergiam, Londrina ia se mostrando de extremo

valor didático na tentativa de compreender as metamorfoses que a paisagem

1 Para Bachelard: “O devaneio tem mesmo um privilégio de autovalorização”, sendo essencial para qualquer

mudança de atitude do sujeito perante o ambiente. Onde “[...] a casa abriga o devaneio, a casa protege o

sonhador, a casa permite sonhar em paz” (1988, p.26). A casa bachelardiana e o lugar nestas reflexões, adquirem

significados que se complementam.

Page 16: Monografia Pablo 2004

16

contemporânea sofre. Buscava “enxergar” a velocidade como a cidade é remodelada

nas vitrinas. Contatando superficialmente as pessoas em sua pressa cotidiana, me

olhava interiormente. Disputando caminhos com os automóveis em espaços que

deveriam ser do habitante citadino, percebia seres humanos insensíveis ao seu

ambiente. De uma maneira espontânea e andante, o “perder-se pela cidade”2

demarcaria, um primeiro encontro do olhar do aprendiz para a imensidade destas

águas barrentas e urbanizadas que habitam esta “Little London” subtropical.

Caminhando de maneira envolvente não só pelas margens do Cambé, mas

também por suas águas, quando pude acompanhar os remadores da ONG Patrulha

das Águas, na tentativa de ampliar as vivências da pesquisa. Nestas “aventuras

hídricas”, pelas nascentes, afluentes, foz e lagos, o pesquisador procurava um

sentido maior para o ato de caminhar, muito mais por uma necessidade de se

conhecer, de se descobrir como sujeito. Assim, consideremos que: “A linguagem do

caminhar acalma a alma, e as agitações da mente começam a tomar um rumo”

(HILLMAN, 1993). Fazendo-nos entender que o homem que não caminha, se põe a

mercê do sedentarismo e da ilusão que a imagem (principalmente a da televisão)

busca nos condicionar, reduzindo qualquer possibilidade para a ampliação de

nossas experiências do vivido. Boa leitura por este (per)curso!

2 Esta proposta nos foi inicialmente exposta por André Santi C. Silva e Lúcia H. Gratão (2002, p.67-69),

fundando-se nas experiências caminhantes da alegoria do flâneur de Walter Benjamim, e apresentada a nós por

Lucrécia D’Alessio Ferrara (2000).

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2 - LONDRINA... IMAGEM REFLETIDA NAS ÁGUAS DO CAMBÉ

“A Cidade e os Olhos”

Os antigos construíram Valdrada à beira de um lago com casas repletas de varandas sobrepostas e com ruas suspensas sobre a água desembocando em parapeitos balaustrados. (...) Nada existe e nada acontece na primeira Valdrada sem que se repita na segunda, porque a cidade foi construída de tal modo que cada um de seus pontos fosse refletido por seu espelho (...). Os habitantes de Valdrada sabem que todos os seus atos são simultaneamente aquele ato e a sua imagem especular, que possui a especial dignidade das imagens, e essa consciência impede-os de abandonar-se ao acaso e ao esquecimento mesmo que por um único instante. (...) Às vezes o espelho aumenta o valor da coisa. Às vezes anula. Nem tudo o que parece valer acima do espelho resiste a si próprio refletido no espelho.

Italo Calvino, As Cidades Invisíveis

A cidade imaginada por Calvino, serve neste momento de inspiração para a

leitura da imagem de uma Londrina refletida nas águas do Ribeirão Cambé, visto

como a mais importante fonte de água na época de sua instituição e sitio adequado

para sua construção. Cidade localizada na porção Norte do Estado do Paraná,

situando-se em terreno de suaves vales e instalada no alto do divisor de águas do

vale do Cambé. Uma situação nascida de atos pioneiros, planejada e desenhada na

prancheta de arquitetos britânicos em Londres, uma verdadeira city de traçado

europeu plantada como o café nas grandes fazendas brasileiras, no ano de 1929. O

"ouro verde", que proporcionara a derrubada da mata pelos desbravadores vindos

de muitos lugares (entre estes mineiros, paulistas, japoneses, italianos, alemães...)

para a colonização. Matas povoadas por Perobas, Figueiras, Palmitos (base da

alimentação) e Paus d´Alho centenários, "expressões do fértil solo vermelho

proveniente dos derrames basálticos do trapp paranaense" (GRATÃO, 2000, p.19-

20). Cidade de paisagem dinâmica, de múltiplas faces, fruto de um empreendimento

de exploração e do progresso da empresa capitalista denominada Cia. de Terras

Page 18: Monografia Pablo 2004

18

Norte do Paraná de proprietários arregimentados na Inglaterra. Já, após os anos 50,

Londrina despontava como o mais importante e dinâmico centro urbano do Paraná,

impulsionado pelas riquezas do café (FERREIRA et all, 1995, p.15-17).

Imagem 2 - O lugar da pesquisa, Ribeirão Cambé. Organização: Pablo Fernandez, 2004.

2.1 A imagem de um lugar urbano... Paisagem do Ribeirão Cambé

A imagem do lugar tem um grande significado prático e emocional nos

indivíduos e em suas experiências espaciais. Ela orienta, e os conduz em seus

percursos existenciais. Esta imagem é fundamental e necessária aos homens em

seus percursos diários, pois através desta, ele toma conhecimento de seus

Page 19: Monografia Pablo 2004

19

caminhos, localiza seus lugares e paisagens. Neste rumo, o pesquisador acredita o

quão é importante a imagem do Ribeirão Cambé em todas a suas formas e

expressões para a população de Londrina. Este corpo d´água (lugar) se consiste

num verdadeiro condutor, guia para as pessoas que habitam esta paisagem citadina.

Transformando-se em referência, como caminho de pessoas que por ali trafegam,

daqueles que buscam o lazer e as brincadeiras, como também para o sujeito que

devaneia em suas margens.

Esta imagem quando legível possibilita a estruturação de uma referência,

organizando as atividades, crenças e conhecimentos dos homens. A imagem “clara”

do lugar oferece mais do que segurança, pois conduz à profundidade e a

intensidade da experiência humana. Sobre esta legibilidade, nos encontramos com

Kevin Lynch em seus estudos sobre a imagem ambiental de grandes cidades norte-

americanas nos anos 80. Considerando que:

No processo de orientação, o elo estratégico é a imagem do meio ambiente, a imagem mental generalizada do mundo exterior que o indivíduo retém. Esta imagem é o produto da percepção imediata e da memória da experiência passada e ela está habituada a interpretar informações e a comandar ações (LYNCH, 1996, p.14).

Quanto a esta imagem legível dos lugares, notamos sua substituição a partir

do século XIX, notavelmente com a massificação da fotografia. Momento onde

ocorre uma multiplicação desenfreada de imagens que acabam por impregnar a

paisagem contemporânea urbana. A fotografia antes encarada como meio preciso

de representação da realidade, mudaria a forma como as pessoas se relacionam

com os lugares. Para se conhecer um lugar, não era mais preciso vivenciá-lo,

bastava tê-lo impresso numa “foto”. Barthes, comentando este contexto, se

expressa: "Vejo fotos por toda parte, como todo mundo hoje em dia; elas vêm do

Page 20: Monografia Pablo 2004

20

mundo para mim, sem que eu peça; não passam de ‘imagens’, seu modo de

aparição é o tudo-o-que-vier (ou tudo-o-que-for)" (BARTHES, 1984, p.30).

Esta sobreexposição hiper-realista3 de imagens vem difundida pela mídia e

pela cultura de massa, transformando as superfícies da cidade em um superoutdoor.

Assim, algumas particularidades, closes, ângulos, que podem conferir significados a

um lugar urbano, na maioria das vezes, não são percebidas pelo sujeito da

contemporaneidade.

Este ser que se encontra incapacitado de ler imagens e se orientar, têm suas

experiências espaciais delimitadas por um “biombo de imagens irreais". "Trata-se de

alienação do homem em relação a seus próprios instrumentos. [...] Imaginação

torna-se alucinação e o homem passa a ser incapaz de decifrar imagens, de

reconstituir as dimensões abstraídas" (FLUSSER, 2002, p.9). O olhar deste

personagem encontra-se perdido em seus itinerários cotidianos, onde a imagem

deixa de ser mediação entre o homem e o mundo, gerando exclusivamente a

confusão e a superficialização de suas experiências com o espaço.

Esta relação de alienação do sujeito contemporâneo com seus espaços nos é

dita por Wenceslao M. Oliveira Jr., como ampliado pela tele-percepção4 dos lugares,

onde a experiência espacial é dada a partir da observação das imagens de algum

3 Este termo é empregado por Nelson Brissac Peixoto, referindo-se a uma condição do século XX, em seu texto

“Ver o invisivel: A ética das imagens”, In: Ética. (org.) NOVAES. São Paulo, 1992. 4 O autor em sua tese de mestrado “A Cidade (Tele)percebida: em busca da atual imagem do urbano”,

UNICAMP/FE, 1994, utiliza este conceito a partir da seguinte consideração de Paul Virilio (1990): “Chamo de

tele-realidade a substituição da janela, que foi um elemento determinante da arquitetura, pela tela” (da tv).

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media. Pois: “Este espaço (tele)percebido é produzido pela lógica da propaganda e

do capital da informação, e está intimamente relacionado ao consumo dos lugares”

(OLIVEIRA JR., 1994, p. 7). Lógica, que veiculando imagens ilusórias passa a

conferir aos lugares um conjunto de representações que não correspondem à

totalidade das experiências vividas.

Referindo-se ao Ribeirão Cambé, vemos que este tipo de imagem superficial,

produzida pela indústria publicitária, sugere um utilitarismo para com estas águas

(suas margens, seu entorno,...), dando a estas uma forma capitalizável, seja pelo

uso do turismo (os Lagos Igapós como cartão-postal), do capital imobiliário (e o

discurso da morada com qualidade de vida, a rápida verticalização e a venda de

estilos de vida), da política, da imprensa e de tantas outras instâncias e seus

respectivos discursos. Forma de representar este lugar de águas, de maneira

desimpedida e supérflua, que têm distanciado as pessoas em suas ações e

intervenções nesta paisagem, além de propor o esquecimento de seus exercícios

como cidadão. O exercício da cidadania quando visto como participação, se dando

na capacidade de gerar informação sobre o cotidiano, sendo: “[...] uma ágil

capacidade inferencial capaz de produzir, a partir da informação de massa, um juízo

informacional atuante” (FERRARA, 1996, p.79). Retomamos à cidade de Calvino,

onde seus moradores são conscientes de seus próprios atos, e destes refletidos no

espelho. Não se deixam enganar pela ilusão especular, e nos motivam a acessar a

memória e a imaginação deste Ribeirão de águas barrentas, escondido nesta

sociedade que clama por imagens.

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Imagem 3 - Campanha Publicitária da Empresa Telefônica SERCOMTEL, 2004. Autor não citado.

Como no caso da imagem acima, onde vemos uma imagem “falseada” das

águas do Ribeirão Cambé, com uso de recursos da técnica fotográfica e do filtro

colorido, difundida grandemente à população durante o ano de 2004. Exaltação da

fertilidade desta “terra roxa” presente no imaginário5 londrinense, que abrigou

inúmeros pioneiros e que alicerçou o surgimento de uma cidade rica e desenvolvida,

abarca interesses daqueles que detém a história do lugar. Deparamos assim, com

uma “ode” ao pioneiro envolto numa atmosfera surreal, que vem apenas a

concretizar as contradições sociais e a posição hegemônica de alguns poucos que

chegaram e construíram fortuna. Assim nos embrenhamos pelos diversos

significados presentes no imaginário “pé-vermelho” amparados na leitura de

5 Imaginário nessas considerações é entendido como: “[...] o conjunto de representações, crenças, desejos,

sentimentos, através dos quais um individuo ou grupo de individuos vê a realidade e a si mesmo” (JAPIASSU e

MARCONDES, Dicionário Básico de Filosofia, 1996).

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Marandola Jr., que parte ao encontro de “Londrinas Invisíveis” em sua proposta de

investigação teórica sobre a Geografia e o Imaginário. Apontando este

relacionamento como: “uma seiva orgânica que liga homem-meio, num esforço de

enxergar o “que não existe”, mas vive e pulsa [...]” (MARANDOLA JR, 2003, p. 80).

Assim vemos o imaginário como um agrupamento de imagens (e imaginações,...)

que dizem a respeito e expressam a realidade de determinados grupos sociais. São

imagens que agem diretamente e dão contornos as experiências vividas dos

sujeitos.

Ampliando nosso olhar sobre as representações que envolvem uma cidade,

citaria o trabalho de Freitas sobre o espaço urbano de Sobral-PE, onde desmistifica

o discurso envolto na elevação desta cidade à Patrimônio Histórico Nacional. O

pesquisador identifica a elite política local, projetando através da imprensa, uma

auto-imagem afirmada em “ilusões passadistas”. Considerando que a representação

não é uma imagem falseada: “[...] mas uma projeção elaborada por interesses

específicos de determinados grupos sociais, a partir de estratégias pautadas em

discursos recheados de autoridades morais e históricas” (FREITAS, 2001, p.25).

2.2 Exercícios Imaginativos...

Antes de ser um espetáculo consciente, toda paisagem é uma experiência onírica. Só olhamos com uma paixão estética as paisagens que vimos antes em sonho.

Gaston Bachelard, A Água e os Sonhos.

Retomamos à "cidade invisível" de Calvino, cidade que se reflete num espelho

de águas e que é representada pela sua imagem especular, aquela que apenas se

“parece” com a realidade. Nessa cidade, seus habitantes nos mostram uma

exemplar relação com esta imagem, revelando-nos um conhecimento sobre seus

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espaços, paisagens e lugares. Exercitam assim uma legibilidade, não se deixando

iludir pela realidade impressa em dois planos da imagem. Através desta cidade

descrita, Calvino (2003) nos alerta que a imagem não é uma construção idônea, e

na maioria das vezes nem tanto sincera, falsa às vezes. A ausência do exercício da

imaginação leva o ser-habitante da cidade à desorientação num espaço

racionalizado, distanciando-se da cidade ilusória, errante, metafórica e pautada na

experiência vivida.

Neste caminho para a compreensão de uma imagem mais sincera do

Ribeirão Cambé, encontramos o filósofo Flusser para quem: "Imagens são

superfícies que pretendem representar algo”. E têm sua origem na capacidade de

abstração específica que chamamos de imaginação. A ausência desta consciência

está ligada com a ausência do exercício imaginativo. A: "[...] imaginação é a

capacidade de codificar fenômenos de quatro dimensões em símbolos planos e

decodificar as mensagens assim codificadas, [...] é a capacidade de fazer e decifrar

imagens" (FLUSSER, 2002, p.7).

Criar através da expressão imaginativa da fotografia uma legibilidade sobre o

Cambé, consiste-se na proposta da pesquisa. Conhecer a imagem deste Ribeirão

sobre a ótica da experiência, se faz fundamental numa busca por ângulos talvez,

não muito conhecidos pela maioria das pessoas. Assim, falaremos mais adiante de

uma proposta de linguagem, que venha despertar uma compreensão e o

conhecimento sobre este referencial hídrico da cidade – Ribeirão Cambé. Onde a

imagem que falseia as reais condições destas águas, pode também, despertar

olhares para a degradação ambiental e social, para a poluição, para a situação das

pessoas que vivem em suas margens, para as epidemias, o lixo e outros problemas

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às vezes tidos como virtuais. Não apenas representar paisagens e lugares, mas

sonhá-las.

Neste caminho imaginativo pelo Ribeirão Cambé, nos voltamos para a obra

do mestre, poeta e filósofo da águas, Gaston Bachelard com seu inspirador “Ensaio

sobre a imaginação da matéria”. A imaginação bachelardiana nos faz encontrar a

essência poética do espaço: “[...] por trás das imagens que se mostram, as imagens

que se ocultam, ir à própria raiz da força imaginante” (BACHELARD, 1997, p.2).

Assim, nos conduz ao desvelar de uma imaginação da matéria hídrica:

Os poetas e sonhadores são por vezes mais divertidos que seduzidos pelos jogos superficiais das águas. A água é, então, um ornamento de suas paisagens; não é verdadeiramente a ‘substância’ de seus devaneios. [...] Mas, se pudermos convencer nosso leitor que existe, sob as imagens superficiais da água, uma série de imagens cada vez mais profundas, cada vez mais tenazes, ele não tardará a sentir, em suas próprias contemplações, uma simpatia por esse aprofundamento; verá abrir-se, sob a imaginação das formas, a imaginação das substâncias. Reconhecerá na água, na substância da água, um tipo de intimidade, [...] Deverá reconhecer que a imaginação material da água é um tipo particular de imaginação (BACHELARD, 1997, p.6).

Interpretando e construindo imagens, o pesquisador se vê como ser

imaginante, capaz de criar, de poetizar, de cartografar um canto no mundo para o

devaneio. Devaneio que se traduz numa relação humana ética, sincera e de

conhecimento para com o ambiente próximo, e para com essas águas tão próximas

e esquecidas pelos seres que habitam esta citadina “Pequena Londres”.

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3 - TRILHARES PELA CIÊNCIA GEOGRÁFICA... DA IMAGEM À IMAGINAÇÃO E

À GEOGRAFICIDADE

Desenvolver uma monografia a ser realizada dentro das instâncias de um

Departamento de Geociências, numa perspectiva da valorização da imagem e da

imaginação, o que poderia se esperar, era o risco de ser considerado como “fora do

lugar”. Neste capitulo tentaremos mostrar como a Geografia pode se envolver nos

estudos da imagem e da imaginação, e também, buscar uma claridade sobre as

idéias do espaço e da realidade geográfica na perspectiva da experiência

(LOWENTHAL, 1982). Estas idéias aparecem fundadas primeiramente no

pensamento da “geograficidade” e do “mundo vivido”, sendo substanciadas pela

abordagem fenomenológica, esta que orienta a nossa pesquisa (RELPH, 1979;

BUTTIMER, 1982; TUAN, 1980, 1982, 1983).

Referindo-se à imagem, o que se sabe, é que ela sempre esteve presente nas

discussões da Geografia6, fazendo parte da maioria de suas motivações

investigativas. O questionamento sobre a imagem do espaço vem, desde os

primórdios clássicos deste saber como ciência, percorrendo até os dias de hoje,

quando vemos sua retomada em algumas correntes contemporâneas desta

disciplina. Conforme o geógrafo mineiro Cássio Vianna Hissa, nada mais próximo da

linguagem da geografia, do que a imagem e o olhar, pois para aquele que busca

compreender o espaço (e a espacialidade dos fatos), se faz necessário: “[...] dirigir o

olhar às relações invisíveis, muitas vezes constitutivas das formas aparentes”

(HISSA, 2002, p.187). Esta imagem espacial não delimita a reflexão sobre as formas

visíveis do espaço num compartimento estanque, mas direciona o olhar do

6 Utilizaremos a palavra Geografia – como sendo o saber acadêmico administrativamente distinto, a partir de

considerações de Relph (1979, p.1).

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pesquisador para a complexidade do mundo e suas relações, tantas vezes não

exteriores.

Sobre a imaginação, podemos dizer que ela se constitui num pré-requisito

para qualquer criação humana (seja cientifica, artística, filosófica...), pois qualquer

construção reflete a imaginação e a inventividade de quem a cria. Mas, a ciência

moderna e sua interpretação procuram caminhos para a distinção das demais

formas de conhecimento, através de seus objetivos, linguagem e principalmente de

seus procedimentos. É sabido que, a própria consolidação da ciência moderna de

cunho positivista, produziu uma ruptura entre esse modo de fazer ciência com o

senso-comum, gerando nos cientistas, um ilusório distanciamento perante outros

homens. Continuamos com Hissa, onde nos mostra que:

Na reprodução histórica da modernidade, a ciência desenvolve-se a partir de uma concepção filosófica compatível com a realidade em processo de edificação: o positivismo. Limites são impostos à imaginação, na expectativa de que se construam os pretendidos caminhos do rigor, na indiscriminada procura da objetividade como estratégia de solução de ‘erros científicos’ (HISSA, 2002, p.58).

O positivismo como premissa do pensamento moderno, sugere que esta

delimitação, simplesmente, tenha a finalidade de libertar o homem que faz ciência de

sensações como o desejo, a poética, o devaneio e a necessidade de se expressar

através da arte. Nessa posição distante o pesquisador passa apenas a “observar

cientificamente” o mundo que o envolve. A este sujeito da ciência, resta a negação

de suas emoções que não passam de um universo sentimental, que só vem

obscurecer o ato cientifico da objetividade e do rigor desmedido. Nesta realidade

paradigmática, as emoções compõem-se num universo ilusório e fictício, onde a

empreitada do conhecimento não alcança as reivindicações almejadas pela ciência.

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3.1 Criatividade e imaginação numa construção geográfica

Considerando aqueles que defendem uma visão de mundo racionalista,

podemos notar que acabam por esquecer que o próprio fazer cientifico moderno,

ainda depende da imaginação, pois esta construção nada seria, sem: “[...] histórias

anteriores de criação, de imagens de naturezas diversas que mobilizem o

pensamento e a ação. A criação é, enfim, a arte de sempre reinventar” (HISSA,

2002, p.60). Enganam-se, estes que consideram a objetividade como uma condição

equivalente à curiosidade, à vontade de conhecer, à capacidade de articulação do

pensamento. Desconhecendo que suas próprias buscas caminham rente à

imaginação, à poesia, às emoções, ao sonho e a outras forças constituintes, que na

maioria das vezes, são vistas como prejudiciais à produção da ciência. Assim, nos

valemos de Eric Dardel (1952) lido por Hissa, onde diz: “[...] vemos que nada

perderia a ciência em confiar sua mensagem a um observador que sabe admirar,

escolher a imagem justa e luminosa que tem diante dos olhos” (HISSA, p.197).

A Geografia, não se libertou ainda, desta visão compartimentada em sua

busca pela objetividade, acabando por considerar o mundo dentro de um discurso

universal e pré-conceituoso da imagem “palpável” do espaço. Confundindo este

“ideal” com a “idéia” de realidade geográfica, que é apenas uma das dimensões da

espacialidade assumida pelas coisas e seres. Nesta busca pelas verdades, ao se

depararem com formas, fluxos e volumes, acabaram por determinar ao estudo do

espaço, sua mensuração, quantificação e conceituação excessiva, desconsiderando

sua condição sincera e primordial de conhecimento humano.

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3.2 Caminhos geográficos para uma leitura da realidade

A Geografia moderna sofre ainda, com a “tradição do olhar” simplificador e

rigoroso. Para a apreensão da realidade, é preciso ir além; é preciso descortinar ou

descobrir o que não está aparente. Precisamos buscar a “essência”. Nesse sentido,

Eric Dardel, citado por Relph, aponta:

Geografia não é inicialmente uma forma de conhecimento, realidade geográfica não é primeiramente um ‘objeto’, espaço geográfico não é um espaço em branco esperando para ser colorido ou preenchido. Ciência geográfica pressupõe um mundo que pode ser entendido geograficamente e, também, que o homem possa sentir e conhecer a si como sendo ligado a Terra (Dardel apud RELPH, 1979, p.1).

Antes de parecer que desacreditamos da importância de um olhar que

caracterize o saber geográfico, queremos revelar o nosso sonho pela emergência de

uma disciplina em construção constante como ação transformadora, proposta pela

busca da felicidade humana sobre a Terra. Que o conhecimento geográfico somente

não se comprometa com a apreensão das dimensões de uma realidade dinâmica e

em movimento, mas que também, conduza as experiências humanas através da

espacialidade das coisas, dos seres, da história e do tempo.

O que se clama, não é simplesmente o preenchimento destas lacunas

epistêmicas com apontamentos sobre a falência do pensamento científico. O que se

pretende buscar é uma reflexão sobre a condição de amplitude que este saber pode

proporcionar aos seres, partindo de sua concretude acadêmica e indo ao encontro

da imensidão do saber geográfico. É a busca de uma Geografia que se liberte das

amarras positivistas sustentadas pela objetividade, clamando por interpretações

humanistas entrelaçadas pela subjetividade:

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Explanatória ou descritiva, a geografia permanece profundamente ligada ao real, e em Geografia, assevera, é impossível eliminar todo valor moral e estético, ou suprimir inteiramente o ‘ponto de vista’ do qual a realidade geográfica é envolvida, ou apagar a subjetividade do sujeito para quem a realidade se torna realidade (Dardel, 1952, apud RELPH, 1979, p.23).

Refletindo a partir das considerações de Relph, apoiado no pensamento do

geógrafo francês Eric Dardel7, nos seria difícil considerar quais os valores, que

levam alguns seres a determinar um objetivo, conceito ou categoria singularizante

para a Geografia. Acreditamos que esta demarcação vem apenas a aprisionar o

pensamento, fixando “o olhar que tudo vê e sabe” sobre a relação visível do homem

com o meio ambiente. Uma atitude científica, que não considera o envolvente

significado de que: “[...] qualquer pessoa que examine o mundo ao redor de si é, de

algum modo, um geógrafo” (LOWENTHAL, 1982, p.105).

3.3 Fenomenologia e experiência geográfica

Quando o pesquisador se propõe a investigar a realidade geográfica que

envolve o fenômeno hídrico Ribeirão Cambé, se vê na necessidade de construir um

arcabouço imaginativo dentro de sua proposta investigativa, que o faça se ver como

ser pensante e em ligação com o meio ambiente.

Assim, elegemos como guia, a maneira de interpretar o mundo proposto pela

fenomenologia8, que vem significativamente ao nosso encontro como condutor, no

7 Consideramos essencial este pensador, que ainda citaremos em outros momentos através de outros autores. Sua

obra “L´Homme et la Terre: Nature de La Realité Geographique” (1952), é de grande significado para a

Geografia contemporânea e ainda não foi traduzida no Brasil. 8 Encontramos no Dicionário Básico de Filosofia (JAPIASSÚ e MARCONDES, 1996) a seguinte consideração:

“O projeto fenomenológico se define com uma volta às coisas mesmas, isto é, aos fenômenos, aquilo que

aparece à consciência, que se dá como seu objeto intencional. O conceito de intencionalidade ocupa um lugar

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que se refere aos princípios, às origens do significado e da experiência. É proposta

aos fenômenos que não podem ser compreendidos somente pelo olhar cartesiano,

mas que sejam antes de tudo, vividos para poderem ser compreendidos como eles

realmente são.

Dentro desta investigação, gostaríamos de dizer o quanto tem sido

importantes, as contribuições do método fenomenológico em Geografia9,

principalmente, quando referente à demarcação de novos caminhos sobre antigas

fronteiras disciplinares da experiência. Segundo a geógrafa Anne Buttimer em seu

texto “Apreendendo o Dinamismo do Mundo Vivido” (originalmente publicado em

1976), os fenomenologistas têm sido os representantes de um esforço para a

reconciliação do saber. Pois, indo contra o pensamento positivista: “[...] expuseram

uma crítica radical ao reducionismo, da racionalidade e da separação de sujeitos e

objetos na pesquisa empírica” (BUTTIMER, 1982, p.167). Esta autora, pre-vê ainda

para o futuro da Geografia, a necessidade de uma guinada por uma orientação mais

“humanística” dentro da disciplina, baseada em perspectivas fenomenológicas e que

venham apontar novos interesses para a pesquisa geográfica.

Quando o pesquisador volta seu olhar investigativo para o Ribeirão Cambé,

busca compreender não apenas sua condição “visível” (a degradação, seu uso, sua

ocupação, ou sua constituição litológica, pedológica e geomorfológica) através do

olhar da objetividade, mas sim, se faz conduzir pelo desejo de apreendê-lo através

da experiência vivida, de sua significância, de seu valor como espaço simbólico e

representacional capaz de abrigar uma infinitude de subjetividades.

central na fenomenologia, definindo a própria consciência como intencional, voltada para o mundo: ‘toda

consciência é consciência de alguma coisa’ (Husserl)”. 9 Dentre os fenomenologistas citados por pesquisadores da Geografia como Dardel, Frémont, Tuan, Entrikin,

Buttimer e Relph, se encontram Heidegger, Bachelard, Husserl, Sartre e Merleau-Ponty. Tendo seus escritos

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A este sujeito-pesquisador que se propõe à experienciar de modo

transcendente o Cambé, faz valer-se do uso da abordagem fenomenológica, que:

“[...] respeita a riqueza e a complexidade do mundo-vivido e, desse modo, um

método usado com sensibilidade revelaria uma enorme riqueza de experiências

ambientais pré-conscientes” (RELPH, 1979, p.22). Experiências pré-conscientes,

que antecedem o mundo dos conceitos, das palavras e das terminologias, que é

repleto de imagens que se revelam pelo contato direto do pesquisador com o

mundo.

Nessa direção, na proposta de um trabalho sobre a geograficidade vista pelo

enfoque fenomenológico, podemos ver revelarem-se não só uma gama de valiosas

experiências pré-cientificas, mas uma preciosa quantidade de significados que para

a ciência moderna, não têm sido contemplados. Não podemos nos esquecer que,

ainda existe uma dificuldade apontada por alguns fenomenologistas sobre a forma

de expressar estas experiências, e de relacioná-las à linguagem e o esforço da

Geografia. Essa dificuldade será futuramente focada, num caminhar em busca da

linguagem do geógrafo.

Buscando ainda o entendimento sobre o significado do espaço na

experiência, citamos o geógrafo Yi-Fu Tuan, apontando-o, para um processo que

engloba as diversas maneiras pela qual uma pessoa conhece e constrói a realidade

pela experiência: “[...] Experiênciar é aprender; significa atuar sobre o dado e criar a

partir dele“ (TUAN, 1983, p.9-11). Assim, a experiência implica na capacidade de

aprender a partir da própria vivência, sendo características de um envolvimento

autoconsciente e subjetivo com o mundo.

utilizados principalmente em investigações epistemológicas sobre a consciência e a experiência geográfica. Não

nos esquecemos dos riquíssimos trabalhos de João Batista de Mello (1991), Werther Holzer (1997) que deram

orientações a nossos encontros.

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33

3.4 Geografia e mundo-vivido

Mundo-vivido seria de maneira simplificadora, aquele mundo da experiência

imediata e anterior às idéias da ciência. É aquele do contexto da experiência

humana, sendo instância primária e necessária para o entendimento da relação do

homem com o meio ambiente. Mundo vivido é uma categoria chave na abordagem

fenomenológica da Geografia que Anne Buttimer, assim esclarece:

‘Mundo’, para o fenomenologista, é o contexto dentro do qual a consciência é revelada. [...] Uma vez consciente do mundo vivido na experiência pessoal, um individuo deveria visar apreender os horizontes compartilhados do mundo de outras pessoas e da sociedade como um todo”. “[...] a noção de mundo vivido sugere essencialmente as dimensões pré-refletivas e tomadas como certas, da experiência, os significados não questionados e determinantes do comportamento” (BUTTIMER, 1982, p.172).

Este mundo apresentado é aquele das experiências primeiras, elementares,

livres de todo maneirismo pré-conceitual estabelecido pelo modo de fazer científico.

É a expressão das atitudes diárias das pessoas que o habitam e que lhe dão

sentido, sendo o modo pré-consciente que emerge da experiência. Conceitualmente,

o “mundo” é o meio ambiente, que exerce dinamicidade à experiência humana;

entretanto, o homem acaba por subordinar este dinamismo através de um diálogo,

onde este atribui ao meio, significado e significação. Este mundo é o da interação

humana cotidiana, sendo entendida como uma interação de desejos de estabilidade

e inovação. Interação que pode ser: ”[...] expressa pelo relacionamento entre lugares

e espaço, lar e a amplitude na experiência do mundo” (BUTTIMER, 1982, p.180).

Ampliando nossos olhares, consideramos o arquiteto Werther Holzer, para

quem a palavra mundo, é fundamental na busca pela compreensão do

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relacionamento entre a Geografia fenomenológica, e “[...] a sua essência, que pode

ser denominada como geograficidade” (HOLZER, 1997, p.80).

Ainda que os fenomenologistas se refiram ao mundo como “estrutura já

constituída” (pela cultura, pelas relações simbólicas,...), o geógrafo que segue por

este enfoque, se vê na condição de interpretar o relacionamento do homem com o

meio ambiente considerando esta relação de interação como mútua. Dessa forma,

consideramos a clareza de Buttimer dizendo que: “O mundo vivido, na perspectiva

geográfica, poderia ser considerado como o substrato latente da experiência”

(BUTTIMER, 1982, p.185).

3.5 Espaço, paisagem e lugar na perspectiva da experiência.

3.5.1 Espaço

Transitando por uma Geografia de perspectiva experiencial, nos vemos na

situação de esclarecer o sentido adquirido por algumas “terminologias espaciais”,

que serão trabalhadas. Nessa perspectiva, as categorias espaciais adquirem o

sentido da humanização, passando agora a serem definidas como centro de

significância ou foco de ação emocional do homem. Agora, a busca do geógrafo pelo

espaço, torna-se uma introspecção em busca do objeto da consciência, que só é

alcançada pelo caminho da percepção essencial10. Assim o espaço toma a seguinte

configuração:

10

Nicholas Entrikin, em seu texto “O Humanismo Contemporâneo em Geografia” (1980), apresenta-nos o termo

redução (“époche”), como sendo aquele dos processos mentais que visam aperfeiçoar a percepção essencial e

fazer-nos cientes de nossos pré-conceitos.

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35

Os espaços-vividos da experiência geográfica, são os desta rua da cidade, deste vale, desta paisagem. Todo espaço geográfico é idiossincrático para nós por causa da singularidade de suas formas, superfícies e cores, e devido às características das nossas associações com ele. [...] Mas todo espaço geográfico também tem propriedades comuns com outros espaços, porque há uma referência humana comum, porque nossas intenções e experiência possuem consistência e porque há similaridades na aparência e no contexto (RELPH, 1979, p.12).

Todo ser humano é agora um referencial, cada sujeito tem um mundo

espacial complexo a ser revelado pelo pesquisador de geografias. O espaço pode

ser também sonhado, constituído através do devaneio, como aquele expresso por

Gastón Bachelard, que se expressa pela projeção das capacidades da imaginação

(RELPH, 1979, p.9).

E mesmo que cada indivíduo seja foco de seu próprio mundo, alguns

horizontes comuns podem ser encontrados na particularidade de cada experiência

geográfica, sendo estes o ponto de contato que o pesquisador deve encontrar. Não

deve enganar-se, apontando a singularidade das experiências como fator

desestruturador da pesquisa, pois cada mundo é o contexto revelador da

consciência. O pesquisador através de suas percepções, quando toma consciência

de sua experiência de mundo vivido, deve: “[...] aprender os horizontes

compartilhados do mundo de outras pessoas e da sociedade como um todo”

(BUTTIMER, 1982, p.172).

Esta forma de investigação é vista pela fenomenologia como método

intersubjetivo, que se esforça para elucidar um diálogo entre as pessoas e a

subjetividade do seu mundo. Subjetividade que transparece como horizonte antes de

qualquer ação reflexiva e tomada como certa, que, são presentes no cotidiano e

determinam os comportamentos do homem em sua jornada sobre a Terra.

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36

3.5.2 Paisagem

A paisagem nestas considerações é o ambiente em sua forma abarcado pelo

olhar, não sendo simplesmente corpo substancial, mas cenário significante das

experiências diárias. Dardel é citado por Relph, no dizer que a paisagem é mais que

uma justaposição de particularidades e detalhes, pois ela é: “[...] um conjunto, uma

convergência, um momento-vivido” (RELPH, 1979, p.14). Nela existe uma ligação

interna que une uma grande quantidade de elementos.

Uma ligação interna que une os elementos da paisagem, a partir da presença

do homem e o envolvimento nela. Considerando que a paisagem é: “[...] a escrita

dos propósitos e experiências humanas sobre a terra e, portanto, constitui uma

mensagem que pode ser decifrada” (RELPH, p.14). A paisagem quando

experienciada como presença do vivido, partilha da condição humana, dando forma,

cor, luz, sensações, e sendo desenhada e configurada por ela.

Para Yi–Fu Tuan, paisagem, não significa uma unidade funcional, “[...]

Paisagem é como uma imagem, uma construção da mente e dos sentimentos”. Tem

lugar no “olho da mente” (TUAN,1979 apud Xavier, 1994, p.22). Contemplamos

assim, a paisagem como uma combinação de preferências objetivas e subjetivas,

que se localizam no imaginário das pessoas, e que se concretizam a partir de

esforços imaginativos dos seres humanos.

3.5.3 Lugar

O lugar focaliza o espaço e a paisagem em torno das intenções e experiência

humanas. Para Dardel, o lugar é o ponto de partida da experiência geográfica, pois

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37

ele se apresenta sob um caráter pré-consciente. Lugar refere-se a um tipo de

experiência de envolvimento com o mundo, ligada às necessidades do homem se

enraizar e se sentir seguro. O que podemos dizer, é que só tomamos conhecimento

sobre os lugares por meio de uma afeição profunda e envolvente, onde pontuamos

nossas paradas num percurso existencial pelo mundo. Os lugares são os pontos

“sublinhados” devido a uma significância adquirida, e ainda, por serem centros a

partir do qual olhamos para as paisagens e através da imensidão do espaço.

O lugar é para o homem a primeira realidade geográfica, emergindo de suas

lembranças mais primordiais. Vêm da memória da infância, sendo o ambiente que

clama pelo olhar, pela presença. É a terra onde o ser humano: “[...] passeia ou ara, a

borda do seu vale, ou talvez sua rua ou vizinhança” (Dardel, 1952, citado por

RELPH, p.17).

Ainda, em nossos (per)cursos experienciais pelo Ribeirão Cambé, o

pesquisador pode encontrar em seus caminhos, uma intensidade de significados e

uma segurança bem características de lugar. Quanto a essas impressões, Tuan nos

diz: “O Caminho e as pausas ao longo dele, juntos, constituem um lugar maior – o

lar” (TUAN, 1983, p.200). Ainda conhecendo o lugar, pela escrita de Tuan:

[...] O conhecimento abstrato sobre um lugar pode ser adquirido em pouco tempo se se é diligente. A qualidade visual de um meio ambiente é rapidamente registrada se você é um artista. Mas ‘sentir’ um lugar leva mais tempo: se faz de experiências, em sua maior parte fugazes e pouco dramáticas, repetidas dia após dia e através dos anos. É uma mistura singular de vistas, sons e cheiros, uma harmonia ímpar de ritmos naturais e artificiais, como a hora do sol nascer e se pôr, de trabalhar e brincar (TUAN, 1983, p.203).

Assim, olhando para o lugar de maneira envolvente e respeitosa, não apenas

como uma porção do espaço, buscando entendê-lo e compreendê-lo sob a

perspectiva das pessoas que lhe dão significado e expressão.

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38

3.5.4 Topofilia e topofobia

Quanto a estas experiências ambientais “do envolver-se”, sabemos que

podem ser boas ou ruins, intensas ou sem expressividade, podem dizer algo sobre a

realidade, como pode apenas gerar a desorientação e confusão. Tomaria como

termos esclarecedores para estas experiências, a idéia de topofilia, primeiramente

proposta por Bachelard em “A Poética do Espaço”, e recentemente pensada em

termos geográficos por Yi-Fu Tuan em sua obra de 1980, “Topofilia”. A topofilia diz

respeito à relação de afetividade, uma ética do sentir, um olhar de igualdade para

com o meio ambiente. Incluindo os estímulos e motivações positivas, a noção de

segurança em busca do lar, além das nossas atitudes ou costumes (RELPH, 1979,

p.19).

Estas experiências podem também ser topofóbicas, onde predomina uma

relação de desprezo, de indiferença, podendo ser causado por certos costumes e

posturas do grupo social, por determinadas circunstâncias, ou pelo próprio ambiente.

A topofobia para Relph é entendida como sendo as: “experiências de espaços,

lugares e paisagens que são de algum modo desagradáveis ou induzem ansiedade

e depressão” (RELPH, 1979, p. 21).

Neste último caso, encontramos algumas sociedades urbanas pós-industriais,

ou grupos tradicionais, que vêm na degradação de seu ambiente, na poluição, na

exploração dos recursos, no desrespeito com seus símbolos, fator motriz para a

transformação negativa dos sentidos e dos significados. Tanto a topofobia, quanto a

topofilia, estão associadas à experiências com a imagem intima do lugar, ligados à

nossas atitudes e modos de ver o mundo.

Page 39: Monografia Pablo 2004

39

3.5.5 Algumas considerações sobre a geograficidade

Este termo ilustra de maneira rica uma geografia da vida, das pessoas e de

suas experiências espaciais. Encontramos a idéia de geograficidade empregado por

Edward Relph (a partir de Dardel), considerando as bases fenomenológicas da

realidade geográfica, que são constituídas: de espaço, paisagens e lugares, desde

que sejam diretamente experiênciadas e referentes ao mundo-vivido. O termo

geograficidade (“geographicité”), vem assinalado pelo geógrafo Eric Dardel (1952),

referindo-se às experiências espaciais dos homens. Assim:

[...] um relacionamento definido liga o homem à terra – uma geograficidade do homem que é o seu modo de existência e seu destino . [...] Refere-se às várias maneiras pelas quais sentimos e conhecemos ambientes em todas as suas formas, e refere-se ao relacionamento com os espaços e as paisagens, construídas e naturais, que são ‘as bases e recursos da habilidade do homem’ e para as quais há uma ‘fixação existencial’ (Dardel, 1952, apud RELPH, 1979, p.18-19).

Esta geograficidade permanece entre os homens de forma aceita e discreta,

“mais vivida que expressa”. Abarcando as boas e as más relações com o ambiente,

podendo assim que, o que atrai uma pessoa desagrade outras, podendo ainda ser

notada como expressão, através de um exercício de comparação de preferências.

O excessivo rigor conceitual traz como conseqüência às relações e

experiências da geograficidade, o fim de um envolvimento profundo e significante,

onde: “[...] espaços são um pouco mais que vazios entre objetos, paisagem é o

cenário de fundo e lugares são simplesmente localizações das atividades”

(DARDEL, 1952; apud RELPH, 1979, p.19). Neste sentido entendemos

geograficidade como uma relação necessária, que o homem tem com o mundo

Page 40: Monografia Pablo 2004

40

através dos espaços, paisagens e lugares que encontra em sua vida cotidiana.

Sendo compreendida por atitudes e respostas imediatas humanas para com o

ambiente, e entendida como sendo correta.

Page 41: Monografia Pablo 2004

41

4 - O RIBEIRÃO CAMBÉ DE JULIANI, OHARA E BAVCAR... EXERCÍCIOS PARA

UMA LEITURA GEOFOTOGRÁFICA DA IMAGEM DO LUGAR

Esse momento da investigação se constitui num exercício de leitura (e de

construção) de paisagens/imagens fotográficas do lugar Ribeirão Cambé.

Considerando-as como representação geográfica, social, cultural, ambiental e

histórica da realidade. Esta tentativa vem orientada na proposta de leitura de

imagens fotográficas esboçada por Roland Barthes em sua obra intitulada “A

Camêra Clara” (1984) e por textos do filósofo Vilèm Flusser, em seu livro a “Filosofia

da Caixa Preta” (2002).

Este processo será iniciado pela leitura de imagens do Ribeirão Cambé

produzidas pelos fotógrafos José Juliani, Haruo O´hara e Evgen Bavcar que, em

singulares percursos de vida e contextos puderam experiênciar estas águas de

maneira fotografante. Consideramos numa busca por traçados metodológicos

adequados à pesquisa, a essencialidade da interpretação de imagens já

materializadas do Cambé, onde o pesquisador busca referenciais para sua escrita

de novas imagens fotográficas. Estas imagens de outra época não são somente

consideradas como registros de um momento (ou tempo) que se passou, mas são

também cartografias de vida, de outras experiências com estas águas de Londrina.

São impressões que conduzem nosso olhar a uma leitura geofotográfica deste

fenômeno hídrico.

A imagem do lugar nestas considerações é entendida como paisagem, termo

utilizado pelos geógrafos, e que se constitui no "resultado visível" da relação do

homem com o espaço. Espaço que se constitui quando o homem passa a dar

significado (desbrava, constrói, percorre,...) e acaba por imprimir relações simbólicas

Page 42: Monografia Pablo 2004

42

do plano visível e do invisível. Assim, consideraremos a imagem fotográfica como

possibilidade de representação11 do espaço e do lugar, conscientes de que esta não

diz tudo sobre os mesmos, não podendo substituí-las pelas próprias experiências

vividas no Cambé. Partindo de: “O que a Fotografia reproduz ao infinito só ocorreu

uma vez: ela repete mecanicamente o que nunca poderá repetir-se

existencialmente” (BARTHES, p.13, 1984).

A leitura destas imagens fotográficas do Ribeirão Cambé traz à pesquisa,

pistas que revelam outros sentidos ao lugar-paisagem, imagens de caráter temporo-

espacial, que podem contar a maneira que se deu a intervenção humana no

Ribeirão, seus usos, a modelagem da realidade paisagística urbana, a ocupação e

uso do solo, nesta Londrina refletida nas águas. Para tal empreitada, faz-se

necessária a sensibilização do pesquisador ao ponto de "acessar" a imagem em sua

complexidade. Como fator de importância nesta decodificação imagética, está o

aprofundamento na busca do significado e a restituição das dimensões abstraídas

numa primeira olhada deixando a vista vaguear pela superfície da imagem.

4.1 A leitura da imagem fotográfica do lugar

Barthes mostra que, para a leitura da imagem da Fotografia, deve-se

desmontar a estrutura da foto (no seu caso se exercita lendo Kerstez, Avedon,...)

pela desmistificação, num exercício para encontrar o studium e o punctum (partes

essenciais da Fotografia) da imagem, seguindo regras de leitura. A imagem

fotográfica quando interpretada a luz desta proposta, faz o campo de compreensão

ser aprofundado. Assim, diversos elementos não vistos, tomam visibilidade,

11

Segundo o Dicionário Aurélio, é: Ato ou efeito de representar; coisa que se representa; reprodução do que se

tem na idéia.

Page 43: Monografia Pablo 2004

43

“aparecem”. O studium é aquele que direciona o nosso interesse pelas fotografias,

pois participamos culturalmente (lendo) das figuras. Segundo Barthes: “Reconhecer

o studium é fatalmente encontrar as intenções do Fotógrafo, entrar em harmonia

com elas, aprova-las, mas sempre compreende-las, discuti-las em mim mesmo, pois

a cultura é um contato feito entre os criadores e os consumidores. Enquanto: “O

punctum de uma foto é esse acaso que, nela, me punge (mas também me notifica,

me fere)”. É como se fosse uma pequena trilha na imagem (BARTHES, 1984, p.47-

49).

Na proposta de Flusser, vemos algo semelhante (sem a pretensão de

comparar), considerando o ato como sendo um scanning, e se faz realizado

seguindo a estrutura da imagem, como também norteada pelos impulsos no íntimo

do observador. Neste scanning, o significado será determinado pelas

intencionalidades do emissor e do receptor. Pois para este filósofo: "Imagens não

são conjuntos de símbolos com significados inequívocos, (...)", ofertando aos seus

receptores, um espaço para a interpretação, sendo desta maneira “símbolos

conotativos” (FLUSSER, 2002, p.8-9).

Fundamentamos ainda, tal prática de leitura na proposta do geógrafo

Cosgrove dentro da Geografia Cultural, que considera como necessário ao

pesquisador das imagens, desenvolver uma: “(...) habilidade imaginativa de entrar no

mundo dos outros de maneira auto-consciente e, então, representar essa paisagem

num nível nos quais seus significados possam ser expostos e refletidos”

(COSGROVE, 1998, p.103). Este método que superficialmente se aparenta com o

ato do devanear, considera que muitos dos significados da imagem são encontrados

de forma natural, de forma envolvente, devendo o pesquisador considerar sua

(própria) experiência com a natureza, como referencial para a análise. A leitura

Page 44: Monografia Pablo 2004

44

imagética destas expressões culturais desta sociedade “pé vermelho”, deve ser

realizada num caminho metodológico que se apresenta minucioso e exigente, mas

também dinâmico e envolvente, apresentando como passos fundamentais: uma

leitura detalhada em todas suas possibilidades, a realização dos trabalhos de campo

e a elaboração de mapas.

Aqui, o pesquisador propõe a construção de um itinerário de conhecimento

pelo Ribeirão Cambé, através da leitura de sua imagem fotográfica de outros tempos

(também de seu imaginário e imaginação), e da construção de uma linguagem

geofotográfica criativa e imaginativa. Nesta proposta ainda, deve-se lembrar, o quão

inspirador é o trabalho da pesquisadora arquiteta Lucrécia D’Aléssio Ferrara em

suas leituras imagéticas sobre o rio Tietê e sobre a cidade de São Paulo de décadas

anteriores (FERRARA, 2000).

4.1.1 A “imagem paisagem” do Ribeirão Cambé como expressão de mundos

vividos

As imagens-paisagens fotográficas do Ribeirão Cambé produzidas por

O´hara, Juliani e Bavcar a serem focadas nesta pesquisa são expressões de uma

Londrina que não existe mais em sua forma concreta. São relatos de um mundo já

vivido, impressões que agem como a memória e trazem lembranças as vezes

esquecidas, se assemelhando a um diários e a crônicas, só que impressas no

instante do click fotográfico. A paisagem experienciada e descrita por estes

fotógrafos, se consiste em expressão, de experiências e propósitos dos homens

sobre a terra, e aguardam serem decodificados. Ou, conforme Relph, considerando

a paisagem como “ambiente palpável”, que: “[...] não somente possuem conteúdo e

Page 45: Monografia Pablo 2004

45

substância mas também são os cenários significantes das experiências diárias e das

excepcionais” (RELPH, p.13, 1979).

Num estudo sobre Geografia e Literatura, a geógrafa Solange T. de Lima

enfocando a paisagem do Sertão de Guimarães Rosa, nos mostra que a leitura de

um romance como expressão cultural (como a fotografia, a música, a poesia,...)

podem evocar mensagens que dizem sobre a percepção, a busca de significados, a

valorização e as rupturas do ser humano com seu espaço. Estas imagens de lugar,

paisagens geográficas, envolvem horizontes significativos de símbolos e signos

humanos em profunda dinamicidade. Conforme esta autora, o relato dos

romancistas são expressões de experiências com o lugar através de sua imagem,

conduzidas pela valorização e envolvimento com o espaço. A “imagem paisagem” é

condutora de experiências, num processo de conhecimento e apreensão da

realidade, fundadas em sentidos, sentimentos e valores que se revelam pela

significação do lugar. Este processo se dá, da seguinte forma:

[...] cada ser humano constrói, seleciona as paisagens que envolvem sua própria história de vida, numa revelação de símbolos que encerram em si as atitudes, percepções, os sonhos e sentimentos únicos, singulares, relativos às suas vivências. Estes símbolos atribuídos às paisagens vividas dizem respeito às maneiras de compreender a integridade e a complexidade das experiências, dos ritmos das relações existenciais com o mundo vivido [...]” (LIMA, 2000, p. 8).

Encaramos estas imagens fotográficas do Cambé, ao encontro da

intencionalidade de seus fotógrafos, pois estes de alguma forma queriam dizer algo

sobre este lugar. Podemos assim, considerar estas experiências como a busca

diária pelo conhecimento sobre o ambiente e sobre si próprio, nos fazendo deparar

com símbolos expressos, que podem possibilitar o acesso à imagens e ao

imaginário destas águas londrinenses. Assim, consideramos estes três personagens

Page 46: Monografia Pablo 2004

46

que nos deixaram imagens de suas experiências de vida com o mundo (Ribeirão

Cambé, Londrina), deixaram relatos de percepções e compreensões deste mesmo

ambiente, e em distintas perspectivas e contextos desvendaram de seus modos,

lugares e paisagens por meio da escrita da fotografia.

4.2 José Juliani... o olhar do fotógrafo pioneiro

O fotógrafo José Juliani veio para o Norte do Paraná, quando acabara

adquirindo um lote no Patrimônio Três Bocas, junto à Cia. de Terras Norte do

Paraná. Chegara ao dito “Novo Eldorado” no mês de março de 1933, trazendo

consigo sua mulher, seus cinco filhos e seus pertences. Haviam chegado numa

jardineira carregada de pioneiros, que adentravam o sertão do norte paranaense

para a colonização de Londrina. Constrói um pequeno rancho de madeira, e no

prolongamento dessa varanda voltada para oeste, construiu uma pequena “câmara

escura”, seu laboratório fotográfico.

No decorrer de sua vida em Londrina, Juliani acaba sendo contratado como o

fotógrafo oficial da CNTP, designado para registrar todos os acontecimentos, todas

as solenidades, o desmatamento, as estradas, as plantações, as curiosidades.

Registrando o desenvolvimento da região durante mais de dez anos, Juliani andou

de cá para lá, sempre com uma máquina à tira-colo registrando tudo o que via.

Enquanto isso, os colonizadores estavam por demais ocupados em seu trabalho na

derrubada da mata, na construção de suas casas, no plantio do café e de outras

lavouras.

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47

4.2.1 Juliani e a foto da Cachoeira do “Cambézinho”

Certo dia pára em frente de sua casa um automóvel, conduzido pelo Sr.

Ernest Rosemberg, engenheiro funcionário da CTNP. Precisava tirar uma foto do

Salto do Cambé com urgência, em conseqüência de um erro do fotógrafo oficial que

tinha “perdido o trabalho”. Assim: “Juntou sua máquina, carregou o chassi, pegou o

tripé e lá se foram rumo ao Cambézinho” (ARRUDA, 2002). Depois de uma longa

caminhada por trilha aberta na mata, chegaram a barranca do rio, de frente ao Salto

do Cambé (hoje atual Parque Municipal Arthur Thomas). A foto não tinha como

objetivo somente registrar as belezas naturais da região. Nos planos da Companhia

de Terras Norte do Paraná estava a construção de uma usina hidroelétrica, a fim de

fornecer energia às cidades de seu núcleo de colonização. Os estudos para esse

empreendimento seriam realizados na Inglaterra, e através de fotografias se poderia

ter uma idéia das quedas d´água e a viabilidade do projeto. Com pouca luz devido à

mata, Juliani armou sua máquina, focalizou, regulou a abertura do diafragma, a

velocidade e o tempo, registrando o momento.

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Imagem 4 - Cachoeira do Cambé, 1933. Fonte: Museu Histórico de Londrina.

Neste ponto, assinalamos o geógrafo francês Eric Dardel, para quem a

paisagem é vista como um instrumento que não deixa de apresentar suas reais

intenções, pois “[...] a intensão humana inscreve-se na terra”. Dizendo que a:

“Paisagem não é em sua essência feita para ser considerada, [...] mas antes é uma

inserção do homem no mundo, um sítio da luta pela vida, a manifestação de sua

existência e da dos outros” (Dardel, 1952; RELPH, 1979, p.15). A fotografia de

Juliani quando visto de maneira não objetiva, nos revela (ou representa) uma

postura dominadora do Homem perante a Natureza. Pois, podemos encontrar uma

intenção presente no discurso desbravador, do pioneiro que aqui chegou para

derrubar a mata e construir Londrina.

Page 49: Monografia Pablo 2004

49

Como studium desta fotografia, encontramos a cachoeira acompanhada de

um personagem (Sr. Ernest Rosemborg, engenheiro britânico da CTNP).

Enxergamos ainda como punctun na imagem da fotografia, os trajes de "escoteiro",

chapéu panamá e botas de cano alto do personagem, a água em movimento, sua

vazão e força (representada pelo tempo de exposição), sua queda, a luz que

atravessa a mata do seu entorno, sua composição litológica (rochas basálticas), e

algumas árvores caídas prendem nossa atenção investigativa. A pose deste

personagem lembra a de um guerreiro vitorioso, alguém que se porta imponente

sobre uma gigantesca árvore caída (Abatida? Subjugada?) sobre o curso d'água. Ele

pensa em dominar esta Natureza?

O que se sabe desta fotografia do Cambé, é que ela tinha uma finalidade

tecnicista, pois a Cia intuía através dela, não apenas relatar as belezas naturais do

“Norte Pioneiro”, mas também registrar o potencial hídrico do lugar. Esta fotografia

viria dar suporte para a construção da primeira usina hidroelétrica de Londrina,

desenhada por engenheiros da CTNP na matriz em Londres, possibilitando a

continuidade de seus planos capitalistas.

Sobre este ideal romântico do pioneiro que habita até os dias de hoje a

memória do londrinense, Tuan o apresenta como sendo o de construção de um

“mito” acerca do espaço selvagem. Este ideal é construído em contrapartida ao

espaço da cidade e do campo, estes propriamente criações humanas. Assim a

natureza virgem ou o selvagem, e não o campo torna-se o polo oposto à cidade,

“inteiramente feita pelo homem”. Buscamos um entendimento com Tuan nos

dizendo: (...) “Os pioneiros não apreciavam o selvagem; era um obstáculo a ser

vencido para se ganhar a vida e era uma ameaça constante na sobrevivência”

(TUAN, 1980, p.127).

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Não devemos simplesmente considerar Juliani como ator (operator) deste

palco de grandes transformações, não apenas vê-lo como aquele que não gosta ou

respeita o meio natural, e que veio para derrubar a mata. Juliani era fotógrafo

profissional, foi personagem (instrumento) de determinado contexto (situação) bem

característico à este lugar, mas parece absorver todo o discurso desenvolvimentista

de seus “patrões”. Não estava sozinho, mas estava inserido num processo histórico

e ideológico que talvez nem soubesse as proporções. Sua história de vida foi

apropriada, e hoje, sua imagem idealizada aparece nos inúmeros discursos que

exaltam a origem pioneira de Londrina.

Décadas depois as fotos de José Juliani são reproduzidas e veiculadas em

exposições, mostras, livros didáticos, jornais e revistas, nem sempre com o devido

respeito a seu uso e seus direitos de autoria. Hoje, seus negativos “de vidro”,

encontram-se acondicionados e em estado de conservação no Acervo Iconográfico

do Museu Histórico de Londrina. Neste mesmo museu encontra-se também uma

réplica da câmara fotográfica usada por ele.

4.3 “Paisagem de Sonhos”: o olhar poético de Haruo Ohara

Hoje você vê a flor. Agradeça a semente de ontem. Haruo Ohara, fotógrafo nipo-londrinense

Haruo Ohara nasceu no ano de 1909, na província de Kochi localizada na Ilha

de Shikoku no Sul do Japão. Chega ao Brasil com 18 anos em 1927, emigrando em

companhia de toda sua família que atravessara o Oceano em busca de “dias

melhores”, fugidos de anos de crise e guerra. Os Ohara vieram com a idéia fixa de

fazer riqueza no Brasil país onde se plantava o “kane no neruki” (pé de dinheiro): o

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café. Já em 1933 ele e sua família transferem-se para terras adquiridas junto à

Companhia de Terras no sertão norte-paranaense, adquirindo o lote de n.1 (Ikku:

Primeiro) do Patrimônio Três Bocas, lugar onde oficialmente viria “nascer” a cidade

de Londrina em 1934. Ohara relata suas primeiras impressões sobre esta paisagem

em seu diário, onde considera que: “(...) Tudo era uma grande mata, muito verde,

que cobria o céu. Não havia plantações, pastos, casas, nada. Tudo estava por ser

feito” (LOSNACK, 2003, p. 39).

Imagem 5 - Reprodução de um mapa de Londrina com as primeiras colônias japonesas e o centro urbano. Nota-se representado um trecho do Ribeirão Cambé (LOSNACK, 2002; YAMAKI, 2003).

O Lote 1, se constituía nos primeiros vinte alqueires de terra da Gleba

Cambé, era mata virgem, e no meio dela os Ohara ergueram a primeira morada, um

rancho construído com o autêntico palmito da região. Nestes tempos o que

começava a surgir, era uma pequena vila chamada Londrina. Para Haruo, eram só

algumas casas de madeira, construída entre os tocos e as cinzas da floresta.

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O desenvolvimento da arte de lavrar vinha em companhia com a arte de olhar

de Haruo Ohara. Construção fundada em estudo e dedicação, onde não havia

diferença fundamental entre semear e fotografar. As imagens fotográficas exerciam

fascinação sobre Haruo, sendo para ele um instrumento que podia revelar muitas

maneiras de ver o mundo, "tal como a terra revelava o mundo a cada semente

plantada em suas entranhas”. Era um “flanêur”, que caminhava e fotografava

debaixo de sol e chuva, por trilhas e caminhos, desbravando a cidade atento “às

formações tanto do orvalho como da lama” (LOSNACK, 2003, p.119).

Mesmo sendo pioneiro e quase contemporâneo de Juliani, Haruo conseguiu

em meio às rudes lidas do campo, criar fundamentais expressões poéticas e

artísticas para sua época12. Sua obra traz em si princípios da cultura oriental, o que

já confunde quaisquer que sejam as interpretações. Os temas, enquadramentos,

perspectivas e contornos de suas fotografias sugerem uma sabedoria transcendente,

um olhar além da própria imagem. Sua obra mostra mais que a relação do pioneiro

com o seu meio, e é inspirada na chuva, nas flores e na terra, nas matas, e também,

nos rios, lagos, águas de Londrina.

4.3.1 O Lago Igapó... pelo olhar onírico do poeta

12

Foi também integrante do grupo fundador do Fotoclube de Londrina no ano de 1951; e a partir deste momento

começou a participar de salões fotográficos, num rico momento da fotografia brasileira. Em 1959, é premiado na

Exposição Internacional de Paris.

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Imagem 6 - Banhistas no Lago Igapó, 1961. Fonte: Saulo Haruo O´hara.

Encontramos nesta foto de Haruo O'hara, a água que brilha e reflete a luz do

sol como o studium, ou fator predominante do quadro. A imagem caracterizaria uma

cena do cotidiano? Dê um momento de lazer característico desse lugar talvez ainda,

não afetado pela poluição proposta pelo progresso industrial de uma “Londrina

Sessentista”? Em busca do punctum, avistamos no primeiro plano uma mulher de

sombrinha (seria mãe de um deles?), observando essas crianças que se banham

despreocupadamente nas águas do Ribeirão Cambé. Algumas crianças encaram a

objetiva, teriam elas a consciência deste momento a ser imortalizado?

Banhistas também são avistados na outra margem do Lago, área hoje,

ocupada por mansões e chácaras. O punctum ainda é ampliado com a expressão

das crianças, seus olhares e suas roupas amontoadas. A sombra da mulher com

sombrinha complementa o plano da imagem. Encontro nesta imagem uma

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valorização afetiva destas águas, apresentando este espaço recém transformado

pelo homem em lugar de uso do lazer, do ócio e da brincadeira. Aqui as crianças

envolvidas se fundem com as águas, e só são despertados deste devaneio pela

figura da mulher, fora da água e com os pés no chão. Crianças que alçam vôo neste

céu iluminado, flutuam, permanecem intocados, protegidos pelo sonho.

Haruo com este relato, se torna um cronista urbano desta Londrina de águas;

transformando o Lago Igapó em “espaço do devaneio poético”, onde todos

(personagens e leitores) tornam-se envolvidos pela beleza aquática. Esta imagem

flui ao encontro das lembranças que este poeta traz de seus espaços vividos,

fazendo transcender o encontro de sua imaginação e de suas memórias. Seu olhar

de poeta deixa evidente outras cidades em uma (atreves de suas relações de

topofilia com o ambiente), nos revelando pela fotografia, imagens de leveza, em

oposição ao “lento, mas inexorável processo de petrificação” que ocorre no mundo,

apontado por Nelson Brissac Peixoto. O olhar de Haruo O´hara consegue: “Aliviar a

paisagem de todo o seu peso até fazê-la semelhante à luz da lua” (BRISSAC

PEIXOTO, 1992, p.312).

Haruo veio a falecer na Primavera de 1999, com 89 anos de idade; 70 deles

vividos no Brasil, deixando uma grande obra fotográfica, constituindo-se em

riquíssimos registros do cotidiano e da História de Londrina. Não nos deixa só este

tesouro, mas nos ensina a olhar o mundo como poeta, nos remetendo a sua sincera

maneira de buscar entendimento sobre a vida, a natureza, e seus espaços interiores.

4.4 Evgen Bavcar... e a paisagem invisível das águas tropicais

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Evgen Bavcar (pronuncia-se “Baushar”) nasceu em 1946 no povoado de

Lokavec, na Eslovênia (região dos Balcãs Europeu). Evgen ficou completamente

cego aos onze anos de idade em decorrência de dois acidentes sucessivos. Aos

dezesseis anos tirou sua primeira fotografia, com uma camêra Zorki6 (cópia

soviética da Leica). Estudou Filosofia na Universidade de Liubliana, se tornando o

primeiro professor cego da Eslovênia, lecionando Geografia. Mais tarde veio a se

doutorar pela Sorbonne, vindo a ingressar depois no Centre National de Recherche

Scientifique (CNRS) no início dos anos 80. Desde o início dos anos 90 suas

fotografias têm sido mostradas no Brasil, tendo próprio Bavcar vindo ao País por

algumas vezes, acompanhando algumas de suas exposições e proferindo

conferências (BAVCAR, 2003).

4.4.1 Paisagem do Invisível... Águas do Cambézinho

As idéias do fotógrafo Bavcar nos foram apresentadas numa mesa redonda

intitulada "O ponto zero da fotografia", em companhia do filósofo e coordenador do

escritório Artepensamento Adauto Novaes e da fotógrafa mineira Eliane Veloso. Esta

reunião de idéias se deu em Londrina, na primavera de 2002, integrando as

atividades do projeto "A Expressão Fotográfica e os Cegos", desenvolvido com

alunos do ILITC (Instituto Londrinense de Instrução e Trabalho para Cegos),

organizado pela artista plástica e fotógrafa londrinense Fernanda Magalhães. Além

de suas idéias, pudemos contemplar um pouco de sua criação fotográfica constituída

em imagens de grandiosa carga onírica. Para Magalhães, Bavcar contribui de

maneira especial com seu trabalho e com seu pensamento, fazendo-nos pensar no

invisível. Para ela: “Pensar no invisível é pensar no que está por trás das imagens,

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pensar nas emoções, pensar no que está por trás das aparências, além daquilo que

entendemos por “realidade” (PROJETO..., 2002).

Mesmo não materializada fotograficamente, a imagem do Cambé

apresentada por Bavcar, nos faz deparar com um olhar carregado de um sentido

místico, mitológico e sobrenatural que as águas de sua memória (de sua infância, de

seu vilarejo,...) trazem à sua imaginação. Conforme nos revela em sua experiência

no Lago Igapó:

A chuva tropical que se abateu sobre nós perto do lago foi tão violenta que não pude deixar de ver nela algo de divino, talvez as lágrimas de Urano desejoso de atenuar o calor tropical que nos assediava. Esse fenômeno, que parece ser muito freqüente em Londrina, lembrou-me que o céu é imprevisível, com ou sem deuses. [...] Londrina foi também para mim o lugar das águas que, por sua violência, lembravam-me a todo instante a lei dos trópicos. Assim, senti a alegria física de seus aguaceiros imprevisíveis, a ponto de abandonar as certezas meteorológicas que não levam em conta nossos velhos ensinamentos (BAVCAR, 2003, p.103 - 107).

Esse filósofo das imagens nos revela dentro do contexto da

contemporaneidade, uma proximidade segura para com a imagem do lugar. Mesmo

num mundo onde tudo se tornou visível demais, com uma sobreexposição e um

consumo desenfreado de imagens. Bavcar (re)conhece o lugar pela emanação de

sua luz, inebriado pelo cheiro da chuva, pelo calor dos trópicos, por todas suas

sensações. Luz que transforma a cegueira em paisagem visível, nos revelando uma

imagem invisível pela experiência de outros sentidos, que não o da vista. Consegue

nos mostrar que um simples olhar panorâmico não consegue mais dar conta de

conhecer os lugares, ainda mais, perante o distanciando das pessoas com suas

experiências dérmicas.

Conduz-nos ao que o filósofo Nelson Brissac Peixoto, considera como sendo

uma ética das imagens. “Esta atitude – esse respeito pelas coisas – é ético. Olhar o

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mundo como uma paisagem, algo dotado de luz, de uma capacidade de nos

responder ao olhar. Não se trata de um modo de procurar cenas naturais, mas de

um modo de ver” (PEIXOTO, p.309, 1992). Esta postura, ou questão ética, esta em:

“Retratar o mundo como paisagem, deixá-lo se constituir em horizonte. Mesmo que

não se possa mais vê-lo como totalidade” (PEIXOTO, p.318). Nesse sentido,

clamamos pela emergência de nossas experiências vividas com a paisagem,

fazendo com que esta imagem seja presente, mesmo que para enumerar sua

problematicidade. Não devemos consumir imagens em substituição de nossas

experiências, devemos sim, descobrir o mundo através de nossas capacidades

imaginativas. Mundo de sentidos, sentimentos, desejos e sonhos, que se revelam

pela expressão de outros olhares e formas de expressá-los.

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5 - ENSAIO GEOFOTOGRÁFICO... UMA FORMA DE EXPRESSAR

GEO(GRAFIAS)

O rio que fazia uma volta atrás de nossa casa era a imagem de um vidro mole que fazia uma volta atrás da casa. [...] Passou um homem depois e disse: Essa volta que o rio faz por trás de sua casa se chama enseada. [...] Não era mais a imagem de uma cobra de vidro que fazia uma volta atrás de casa. [...] Acho que o nome empobreceu a imagem.

Manoel de Barros, O Livro das Ignorãças.

Esse momento da investigação se constitui numa maneira de expressão do

(per)curso de experiências e vivências do pesquisador. Surge como uma proposta

de escrita alternativa, perante as exigências da escrita cientifica. Constitui-se numa

escrita de geograficidade através da imagem, algo que nos aproxima do poeta.

Quem nos conduz a esse caminhar é o poeta matogrossense Manoel de Barros, que

nos revela as possibilidades da poética como conhecimento e meio expressivo:

"Hoje eu atingi o reino das imagens, o reino da despalavra. [...] Daqui vem que os

poetas podem compreender o mundo sem conceitos. Que os poetas podem refazer

o mundo por imagens, por eflúvios, por afeto" (BARROS, 2001, p.23). O

pesquisador-poeta compreende a poesia como conhecimento sobre o mundo, como

emanação de sensações e sentidos, desprezados pelo rigor cientifico. Busca uma

maneira de não empobrecer os significados do Ribeirão Cambé, através da palavra

escrita, sem abarrotá-lo de conceitos distantes.

Retomamos o pensamento de Eric Dardel agora, lido por Cássio Viana Hissa,

em busca da linguagem do geógrafo:

Presença, presença insistente, quase obsessiva, sob o jogo alternado da sombra e da luz, a linguagem do geógrafo, sem esforço, torna-se a do poeta. Linguagem direta, transparente, que ‘parte’ sem sofrimento da imaginação, bem melhor, sem dúvida, que

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o discurso ‘objetivo’ do sábio, pois ele transcreve fielmente a escrita traçada sobre o solo (Dardel, 1952, apud HISSA, p.191, 2002).

O que o pesquisador da geografia (em crise com sua escrita) almeja, é

apenas se fazer entendido, através de um modo de escrever mais simples, uma

escrita um pouco mais sincera e com palavras simples. Fotografando, o pesquisador

(agora poeta, ser imaginante) tenta falar do invisível, de alguns recantos do espaço

não visível.

Novamente nos enveredamos pela amplitude de saberes proposta por Eric

Dardel, buscando demarcações para nossa escrita geofotográfica. Interpretado

agora por Gratão, em suas reflexões sobre “O Rio” – Paisagem... e... Lugar... . A

pesquisadora relata sua “busca” no (re)conhecimento de uma geograficidade

topofílica com “O Rio”, nascida do profundo vinculo afetivo com ele. “Uma

geograficidade hídrica! Uma topofilia hídrica! – Hidrofilia” (GRATÃO, p.38, 2001).

Assim, encontraremos nas imagens do pesquisador-fotógrafo, imagens fundadas

numa poética do cotidiano, da vida. Experiências geofotográficas demarcadas nas

margens do Ribeirão Cambé.

O espaço geográfico é agora visto pela imensidão poética e imagética

presente no ato fotográfico, ou como nos inspira Manoel de Barros em seus Ensaios

Fotográficos: “Difícil fotografar o silêncio. Entretanto tentei. Eu conto: [...] Olhei uma

paisagem velha a desabar sobre uma casa. Fotografei o sobre. Foi difícil fotografar o

sobre [...]” (BARROS, p.12, 2001). Aqui a busca é pelo encontro com uma linguagem

que amplie as possibilidades de representação sensível do lugar, sendo um caminho

almejado por este pesquisador para a fuga do clichê.

Ainda falando deste processo de construção (e leitura de imagens) o

pesquisador se encontra com o inspirador projeto-trabalho do fotógrafo baiano

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Christhian Cravo, intitulado “O Espírito Velado” e que vem sendo desenvolvido

desde o ano de 2003. Nesta proposta de escrita fotográfica, Cravo tem registrado a

influência e uso da água em várias religiões. Tem voltado o foco para a utilização e a

incorporação da água por religiões de alguns lugares do mundo. O sincretismo

aquático-religioso aparece como condutor de imagens sobre os lugares, como: a

Índia e o Rio Ganges, o Benim, a Geórgia, a Bahia e o Candomblé, além do Vodu

Haitiano. Neste trabalho, a água aparece como elemento poético e

consideravelmente fotogênico, sendo ainda condutor e mediador da crença e da fé

dos povos (CRAVO, 2004).

Encontramos ainda no caminho de nossa escrita geofotográfica, a belíssima

expressão de Manoel de Barros sobre as “águas pantaneiras” de sua infância.

Devaneio imagético e hídrico: “Desde o começo dos tempos águas e chão se amam.

Eles se entram amorosamente. E se fecundam. [...] As águas são a epifania da

Natureza” (BARROS, 2001, 7-17). Este poeta, com sua simplicidade e suas

revelações, nos conduziu das nascentes à foz do Ribeirão Cambé.

Não podemos ainda omitir, a inspiração que o trabalho poético de Haruo

Ohara com seus retratos, paisagens, composições e cenas de uma Londrina

pioneira, traz à nossa proposta. Estas fontes, em diversos momentos nos levaram a

compreender as imagens produzidas, sendo estas expressões condutoras

relevantes da pesquisa.

5.1 O Uso do Solo e configurações utilitárias da paisagem.

Nestes últimos vinte anos a antiga Gleba Palhano (ou Alto do Igapó) se tornou

o metro quadrado mais valorizado de Londrina. Mansões e sofisticados prédios,

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vieram conduzidos pelo mercado imobiliário a mudar a paisagem local pelo

fenômeno de verticalização das moradias. A questão da qualidade de vida, almejada

por muitos que se mudam para esta área, tem contribuído para a uma ocupação

desmedida e que tem ampliado o assoreamento e a degradação do Lago Igapó 2.

Status, terrenos maiores, e vista para as águas do Cambé, completam a paisagem

“standardizada” impressa nessas águas (Imagem 7).

Imagem 7 – Reflexos do progresso no espelho d’água do Igapó 2 / Fernandez, Inverno de 2004.

Hoje, cerca de seis mil famílias moram nos condomínios do Alto do Igapó,

sobrecarregando as redes de esgoto da região, ampliando a produção e deposição

de lixo em suas margens. De suas mansões, poucos moradores conseguem ver o

aumento da poluição (e contaminação) dos corpos d’água da Bacia do Cambé,

enquanto outros sujeitos praticam seu esporte e lazer (Imagem 8).

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Imagem 8 - Canoagem e mansões no Lago Igapó 1 / Fernandez, Verão de 2003.

5.2 Os lagos

O grandioso complexo de lagos formados no Ribeirão Cambé, acabaram por

adquirir forma com a construção da barragem do lago 1 em 1958. Igapó, na língua

Tupi, significa “mata cheia de água”. E o que antes eram fundos de vale se

transformou num grande coração hídrico da cidade. Espaço construído num discurso

da redução das distâncias e segregação que existia entre diversos cantos da cidade;

uma forma de unir o povo londrinense. De uma extremidade à outra, a identificação

destas diferenças se amplia, onde vemos o Igapó 4 (mais desvalorizado, que

apresentou expressões negativas como a violência, falta infra-estrutura e

degradação, proximidade de Bairros considerados violentos) numa ponta e o Igapó 1

e suas mansões e cenário, de outra.

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Imagem 9 – O Lixo no Lago Igapó 1 / Fernandez, Primavera de 2004.

O sentido das fotos seguintes (Imagens 9, 10 e 11) foi fazer emergir as

diferenças visíveis entre os quatro lagos; irmão de águas. Como o Igapó 1,

(per)curso mais valorizado, com maior infra-estrutura, o verdadeiro cartão postal de

Londrina encoberto por uma montanha de lixo. Enquanto o Igapó 3, transformado

numa paisagem sobrenatural (com o recurso de um filtro amarelo), vemos o Igapó 4,

coberto de luzes. Luzes que não são dos postes, mas de uma lua cheia e dos carros

que passam com sentido UEL. Interessante é que conversando, percebemos que a

maioria das pessoas que por ali passam de carro, desconhece este Ribeirão, seu

nome, sua forma, seu valor e lugares.

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Imagem 10 – Londrina refletida nas águas do Igapó 3 / Fernandez, Verão de 2003.

Imagem 11 – Luz da Lua e dos carros nas águas do Lago Igapó 4 / Fernandez, Inverno de 2004.

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5.3 O lazer e as brincadeiras.

O Ribeirão Cambé, principalmente no (per)curso dos lagos, sempre foi visto

como sendo a praia do londrinense. Espaço oposto ao da casa, espaço de encontro,

da fuga dos programas dominicais de televisão. Árvores, matas, playgrounds, pesca,

clubes, belezas cênicas, caminhada e outros esportes, além de muita água.

Para aqueles que podem pagar, exclui-se as doenças e o mal-estar causado

por estas contaminadas águas urbanas. Já, para aqueles que não podem consumir

lazer nos clubes, piscinas e sítios, estas águas se transformam numa importante

área de lazer; corredeiras e cachoeiras que inspiram aventuras (Imagem 12).

Imagem 12 - Banho no Cambé / Fernandez, Verão de 2003.

Piqueniques, banhos de sol e natação, mesmo com os avisos proibitórios

baseados nos indicadores de balneabilidade, crianças, famílias, curiosos, turistas,

moradores e vizinhos de outros bairros, transformam os fins de semana de calor em

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um rico mosaico de personagens, com suas músicas, vestimentas, costumes, etc.

As brincadeiras de água estão intimamente ligadas com o espaço bachelardiano e

assim, com a compreensão do mundo. A brincadeira no rio nos revela valores

universais da casa e do espaço habitado, faz transparecer o “não-eu que protege o

eu” (BACHELARD, 1988, p.19).

Imagem 13 - Brincadeira de Domingo no Lago Igapó 3 / Fernandez, Primavera de 2004.

Imagens de um momento que nos fazem lembrar aquela fotografia de Haruo

Ohara, onde uma mulher observa as crianças em suas brincadeiras de água.

Momento em que talvez, nem fossem poluídas essas águas. As brincadeiras

conduzem o pesquisador, às preferências e aos ambientes agradáveis daqueles que

vivenciam o Ribeirão Cambé. Os lugares mais ternos, aqueles da amizade, da

experiência lúdica com a natureza se fazem aflorar, mesmo que a cidade:”não seja

feita para as crianças e os adolescentes brincarem suas infâncias” (MACHADO,

1995, p.17).

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5.4 As formas de vida

Estas águas ainda são vistas como um refúgio da vida e de grande valor

ecológico. Tanto para a flora, onde ainda encontramos pequenos focos de mata

nativa, quanto para a fauna. Répteis, peixes, insetos e mais de vinte espécies de

pássaros encontram nestas águas urbanas, refúgio para reprodução e para

alimentação. Uma espécie de Pantanal, como me relatou certa vez, uma pessoa.

Imagem 14 – Garça no Cambé – “Entardecer” / Fernandez, Outono de 2004.

5.5 A pesca

O rápido e grande crescimento da cidade de Londrina viria trazer uma leva de

pessoas vindo de áreas rurais, bairros e pequenas cidadelas do entorno. Vieram,

trazendo em sua “matula” alguns hábitos e formas de viver bem típicas do homem

do campo, e que adquiriram hoje, novas facetas nas margens do Ribeirão Cambé.

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Imagem 15 - Pescador (Igapó 4) / Fernandez, Verão de 2004.

Lazer, forma de conseguir o alimento, de se ligar com a natureza, ou apenas

de matar o tempo, a pesca nos tempos de hoje vem sofrendo com a poluição,

contaminação e a mutação de peixes. Um dos pescadores com quem conversei

relatou que cresceu pescando neste Ribeirão, “que passava no fundo de sua casa

em tempos que a água era muito limpa”. Aponta que o inicio da mortandade dos

peixes, veio com a industrialização e o desenvolvimento da região de sua nascente,

com o despejo de esgotos industriais, lixo e outros tipos de poluição.

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Imagem 16 - Crianças Pescando / Fernandez, Primavera de 2004.

5.6 O povo Kaingang

Este povo que vivia por estas terras bem antes da chegada do pioneiro, se

encontra hoje, de maneira abalada. Desde os tempos das derrubadas, seus

costumes, hábitos, seus valores para com a mata e para com as águas mudaram

significativamente. Cultura em fragmentos, que não mais olha para as águas do

Ribeirão Cambé, com olhar dos ancestrais. Povo hoje, marginalizado que tenta

sobreviver nas margens do baixo Cambé, no Centro Cultural Kaingang cercado por

rodovias e avenidas, pelo barulho e pela poluição (Imagem 17). Preservam ainda

alguns de seus hábitos, como o banho e as brincadeiras de rio de suas crianças.

Pena que sejam em águas tão contaminadas, como um recente despejo de pilhas

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na sua proximidade. Níquel, Prata, Chumbo e outros metais pesados, que fazem

parte agora, da memória deste povo que já foi o “verdadeiro dono” de Londrina.

Imagem 17 - Casa Kaingang e o Ribeirão canalizado / Fernandez, Primavera de 2004.

5.7 Os personagens do lugar

Penso que os homens deste lugar São continuação destas águas

Manoel de Barros, Águas.

O personagem do lugar é aquele habitante que pode conduzir o pesquisador

à memória do espaço, através da expressão de seus sentimentos, valores, crenças

e significados adquiridos. O pesquisador pode acessar a experiência de lugar pelas

falas e pela imaginação dos moradores, representando-a através de imagens.

Habitantes que aparecem como narradores, de um saber enriquecedor fundado em

experiências do cotidiano, e podem expressar envolvimento com os lugares.

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Gaúcho trabalhou no Parque Municipal Arthur Thomas por cerca de cinco

anos. É um personagem do Cambé (Imagem 18) que considero muito importante,

pois convivi com ele um bom tempo, guiou-me, por muito dos caminhos do interior

desta Unidade de Conservação, situada no baixo curso do Ribeirão. Sempre

mostrou carinho e satisfação por trabalhar neste espaço, e de estar próximo do

Cambé.

Imagem 18 - O que Gaúcho considera mais feio no Ribeirão Cambézinho, é a quantidade de lixo que Londrina despeja nele!. / Fernandez, Outono de 2004.

Pude identificar alguns elementos topofóbicos, em seu discurso: “O feio na

verdade é relacionado com a grande concentração do lixo.! Tanto é uma poluição

visual, como é algo que entristece! Com certo tempo as pessoas vão começar a ver

a água desaparecer!”. Gaúcho ultimamente vinha coletando sementes de árvores

nativas no interior desta U.C., ajudando de forma significativa o repovoamento

dessas margens, com espécies como o palmito (euterpes euduli). Este personagem

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em diversos momentos se apresentou a mim, como guardião das matas, dos

animais e das águas, expressando sentidos de topofilia para com este lugar.

Sr. José Carlos (Imagem 19), de 65 anos, personagem que pesca nestas

águas desde 1942. Quando de nosso encontro, pescava pequenos camarões de

água doce com uma peneira, que seriam usados com isca numa pescaria no lago

Igapó 1. Lembra destas águas de outros tempos, de uma época em que não havia

poluição. Tempo que não volta, de quando ainda existia muito peixe. Segundo Sr.

José, estas águas abrigavam uma grande diversidade de peixes: Piaus, Barbados,

Curimbas. Rememorando, este melancólico personagem mostrou-me alguns

significados ecológicos, ambientais e históricos deste lugar (proximidades da

Prefeitura Municipal), associando a redução dos peixes com a construção dos

Lagos, moradias e avenidas no entorno.

Imagem 19 - Sr. José pescando “de loca” confessa triste, que nestes dez anos os peixes sumiram! / Fernandez, Outono de 2004.

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Assim, tentamos encontrar recantos do lugar, na face daqueles que o

carregam na memória e transmitem alguns de seus significados. O pesquisador

Luciano Bernardino, em sua experiência como fotógrafo-viajante, também se utiliza

das falas e do discurso numa leitura imaginativa e na produção de imagens em seus

percursos, relatando suas experiências com personagens do “Grande Sertão” de

Guimarães Rosa, que o conduziram a “reencontrar na permissão de um registro [...],

a conexão com a alma do lugar e de seus habitantes [...]" (BERNARDINO, 2002,

p.26).

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6 - A TRILHA DE IMAGENS GEOFOTOGRÁFICAS DO RIBEIRÃO CAMBÉ

O mundo meu é pequeno, Senhor. Tem um rio e um pouco de árvores.

Manoel de Barros, O Livro das Ignorãças

Um passo à frente, e você não está mais no mesmo lugar. Chico Science & Nação Zumbi, Um passeio no Mundo Livre

A Trilha de Imagens do Ribeirão Cambé pede para não ser entendida como

um instrumento para o ensino da Geografia ou de maneira que se pareça com as

trilhas interpretativas realizadas nas Unidades de Conservação, “construídas” para

uma Educação Ambiental instantânea.

A Trilha de Imagens..., é sim, uma expressão que pode ser lida à luz da Arte,

da História, da Geografia, das Ciências..., e deve ser compreendida ou seguida por

múltiplos “olhares” independente de “pré-conceitos academicistas”. O traçado busca

revelar aos passantes, cantos não muito conhecidos deste curso d’água – Ribeirão

Cambé, através de “paisagens-momentos” expreriênciadas, captadas e

representadas pelo pesquisador. São imagens que buscam despertar o

conhecimento como expressões de sentimentos e devaneios poéticos gravados pela

câmera fotográfica.

Pensamos o traçado desta Trilha..., como “exposição itinerante” num diálogo

de: "Técnica, Ciência e Arte, essenciais para a prática educativa e para a

valorização cênica da trilha pelo público caminhante" (Lima, 1998, p.39-43). Ampara-

se ainda, em reflexões que emergiram durante nossas experiências no Projeto de

Extensão à Comunidade/ CEC/ UEL (2002) “Trilhas Interpretativas, Paisagem e

Educação Ambiental”13. Espaço de trocas, onde concebíamos as trilhas

13

Este Projeto se apresenta como intercambio de idéias e ações, entre professores e alunos dos Departamentos de

Educação/CECA e Geociências/DGEO/ UEL, além de professores do ensino médio e fundamental de Londrina.

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interpretativas no despertar de relações afetivas com o “lugar” e, desta forma,

conduzisse os caminhantes à percepção ambiental (FERNANDEZ e GRATÃO, 2003

e 2004; GRATÃO et al, 2002).

6.1 O Trajeto da Trilha..., na Escola Municipal Norman Prochet – Londrina...

Uma proposta-piloto desta Trilha... foi apresentada no pátio da Escola

Municipal Norman Prochet, localizada à margem direita do Lago Igapó (Jardim

Guanabara) (per)curso do Ribeirão Cambé no dia 10 de Novembro de 2004.

Foi realizada com os alunos da 3ª série A e B e a 4ª série A do Ensino

Fundamental, composto por 60 alunos desta escola. Além dos alunos, participaram

também pais, moradores, professores, funcionários da escola, que puderam dar

suas contribuições, somando-se então 100 pessoas. Ou seja, a Trilha... foi

mostrada, vista, contemplada por 100 olhares.

Foram traçados em meio às árvores do pátio, varais de arame formando um

caminho demarcado por setas e fotografias emolduradas e legendadas. As

fotografias produzidas no “Ensaio Geofotográfico”, foram ampliadas (em tamanhos

20x25, 25x30 e 25x38) e emolduradas com papel paraná e pintadas na cor branca.

A Trilha seguiu pelo seguinte roteiro temático: a fauna, os lagos, o banho e o lazer, a

pesca, o Igapó de Haruo Ohara, a Cachoeira de José Juliani, o centro kaingang, o

lixo e a degradação relatada pelas falas dos personagens do lugar. Tentamos

imaginar a seqüência proposta buscando despertar a reação dos

caminhantes/observadores, começando o (per)curso com imagens topofilicas,

expressões afetivas e de alegria, encerrando com um (per)curso de expressões

topofóbicas, de descaso e de tristeza para estas águas urbanas. Composição que

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almejava indicar o (per)curso do olhar de maneira que pudesse realizar a leitura

narrativa da paisagem e do lugar – Ribeirão Cambé por imagens poéticas.

Buscando a atuação e “concentração” dos alunos, utilizamos da trilha sonora

composta por músicas instrumentais do violeiro Paulo Freire, do CD Rio Abaixo,

pelas faixas: Seca, Dona Júdica e Rio Abaixo, que, para nós, revelam um sentido de

despertar para a água.

Iniciamos a atividade em sala de aula conversando e apresentando aos

participantes a nossa proposta educativa, expondo as possibilidades deste

“caminhar”. Perguntando-lhes primeiramente idade, nome e lugar onde moravam, e

se conheciam o Ribeirão Cambé, relatando numa folha de papel. Na realização do

(per)curso nos valeríamos ainda de um mapa do Ribeirão Cambé com algumas

fotografias, além de relatos impressos e conversas da pesquisa. Finalizaríamos com

a volta à sala de aula, pedindo para que escrevessem sobre os sentidos que as

fotografias lhes tinham despertado. Perguntou-se, se as imagens lhes tinham trazido

algum contato com o Ribeirão Cambé, antes desconhecido.

Acreditamos nas possibilidades que a imagem (fotográfica, a do cinema, a

pintura, televisiva,...) pode adquirir no contexto do ensino e da aprendizagem, como

meio de conhecimento do lugar pelos sujeitos. Partilhamos do sentido dado às

fotografias por Oliveira Jr., para quem estas: "[...] participam da construção de uma

memória sobre o lugar e vão participando da configuração de uma inteligência que

nos permite ler e significar o mundo, as coisas e os lugares nele existentes".

(OLIVEIRA JR., s/d, p.11). Mesmo que a imagem fotográfica não possibilite uma

experiência vivida de lugar, achamos que elas podem conduzir experiências

humanas ao encontro do lugar. Como uma cartografia, que conduz pesquisador e

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sujeitos-aprendizes a uma troca de saberes, fazendo aflorar o conhecimento dos

espaços próximos e vividos, tantas vezes escondidos na paisagem contemporânea.

6.2 Algumas expressões de sentidos, sentimentos e valores pelo Cambé.

Considera-se esta primeira trilha-piloto, válida como proposição e

compreensão para futuras melhorias, a análise do discurso sobre percepções,

sentidos e sentimentos despertados pela atividade. O relato desses sujeitos-

aprendizes que participaram desta trilha, mostram ao pesquisador-aprendiz o

conhecimento e as possibilidades educativas da imagem. Sendo futuramente

adaptável a outras condições e a outros graus de aprendizagem do fundamental e

do ensino médio, como também por caminhantes universitários.

Pensamos ainda, esta proposta no contexto dos PCN’s - Geografia (Ensino

Fundamental), considerando que a Geografia se vale de imagens quando recorre: “a

diferentes linguagens na busca de informações e como forma de expressar suas

interpretações, hipóteses e conceitos”. Anseia por uma linguagem de localização e

de espacialização que são: “referencias da leitura de paisagens e seus movimentos”

(BRASIL, 1998, p.33). Visualizamos estes alunos como seres aptos a perceber a

própria existência, buscando a percepção e o conhecimento dos lugares. Seres

acostumados com imagens dinâmicas, que podem reconhecer seus conhecimentos

numa atuação criativa, responsável e respeitosa para com as paisagens e lugares.

Mesmo que as turmas tenham percorrido a Trilha... em momentos distintos,

faremos um apanhado de todas as percepções e expressões relatadas pelas 3

turmas. Nesta transcrição tomamos a liberdade de fazer algumas correções de

concordância e de escrita encontrada nas falas dos sujeitos/personagens.

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Estes alunos em sua maioria, se encontram na faixa etária entre 9 e 11 anos

de idade, tendo no grupo, uma grande parcela de moradores nas proximidades da

escola, morando em bairros próximos ao Ribeirão Cambé como os: Jardim

Guanabara, Gleba Palhano, Colina Verde, Quinta da Boa Vista, Jardim Maringá,

Jardim Cláudia, Jardim Higienópolis, Bairro Igapó.

Imagem 20 – Alunos da Escola Municipal Norman Prochet percorrendo a Trilha de Imagens do Ribeirão Cambé / Fernandez, Primavera de 2004.

Buscando compreender a proximidade dos sujeitos/caminhantes com o

Ribeirão Cambé e por que meio havia se dado esse contato, perguntamo-lhes antes

da trilha, se o conheciam e de onde. Após a Trilha, perguntaríamos aos

participantes, se haviam (re)conhecido alguns lugares e paisagens do Ribeirão, e

quais suas impressões sobre o (per)curso. Uma grande parte dos alunos

entrevistados nos disse conhecê-lo do pátio, do caminho de casa para a escola, do

Igapó, das caminhadas com a família, do lazer e do esporte, do ouvir as pessoas

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falarem, do jornal, da pescaria, “de olho”. Ou, como nos disse Isabella, de 10 anos:

“O conheci caminhando, olhando”.

Foram poucos os que disseram não conhecer o Ribeirão Cambé. Mas,

quando dito que eram as mesmas águas do Igapó, uma parcela de “indecisos”

chegou a mudar de idéia e, de todas as respostas apenas 3 disseram não conhecê-

lo. Enquanto isso, um aluno revelou “possuir” o Cambé em sua casa: “Conheço o

Ribeirão da frente de minha casa, por já tê-lo estudado e por ter uma foto dele”.

Imagem 21 – Alunos em segundo momento da Trilha hídrica... na Escola Municipal Norman Prochet / Fernandez, Primavera de 2004.

Sobre o (per)curso desta Trilha Hídrica..., traçado e apresentado, a maior

parte dos caminhantes... pediu por fotos da nascente. Enquanto uma aluna sugeriu

um tempo maior para a atividade e que se ampliasse o tamanho do mapa e das

legendas. “Podia ter começado mais cedo, deixado a trilha melhor, com mais

tempo!”.

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Quanto a trilha sonora utilizada, foi interessante a avaliação dos alunos

quando muitos deles, disseram que não gostaram da trilha sonora, pedindo que

fosse: “barulhos do rio, da cachoeira e dos pássaros”. Estas falas nos revelaram, o

“sentido das águas”; o “imaginário do rio”. Foi uma grande revelação e que veio ao

encontro da nossa proposta – “o vínculo com o rio”. Somente uma aluna disse ter

gostado da trilha sonora: “Muito bonita!”.

Observamos que a maior parte das expressões foi de “proximidade” e

“preferência” dos alunos com o Ribeirão Cambé, quando se percebeu que poucos o

desconheciam. É importante considerar nestas reflexões o fato de morarem

(viverem) próximos do Ribeirão - Lago Igapó 3, quando notamos que os alunos já

traziam algum sentido para as fotografias, pois estas águas já faziam parte de seu

repertório de imagens cotidianas, na maioria topofílicas. Partimos da idéia de que o

(re)conhecimento se deu principalmente, por aqueles sujeitos que já conheciam o

lugar. As imagens representadas já estavam em seus arquivos de imagens, de seu

repertório cultural, do seu mundo vivido. Como as imagens dos Lagos, que foram as

mais comentadas principalmente, as que mostraram recantos próximos à escola.

Quanto à receptividade, uma grande parte deste grupo se disse tocado pelas

fotografias, elegendo as imagens que mais gostaram como: a Cachoeira do Parque

Arthur Thomas, a garça, a do lixo e a brincadeira de “bike”. Para os meninos, a

imagem que mais lhes despertou sentidos positivos foi “brincadeira de domingo”,

talvez pela proximidade com suas experiências vividas. Enquanto para as meninas,

esta imagem foi a de maior rejeição. Expressão como a controversa beleza

encontrada por Rebeca de 9 anos: “Gostei da fotografia do Lago Igapó que mostra

muita sujeira com a natureza!”. Já, a composição “reflexo do desenvolvimento no

espelho d’água” mostrando os prédios e a verticalização da moradia refletidos no

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Lago 3, foi comentada somente por um aluno, que disse: “morar por alí na avenida

Maringá!”. Também a fotografia de Haruo O´hara foi comentada apenas pelo aluno

Pedro, de 10 anos: “Gostei daquela foto que mostrava o Igapó como era antes!”.

Algumas falas isoladas nos chamaram a atenção, quando perguntados sobre

a legibilidade da escrita. “Eu vi o seu Ribeirão!”, respondeu, levando-nos a pensar

em diversos ribeirões, rios, córregos, cursos de nossa existência ou apenas

expressão de entendimento do aluno pela proposta experiencial do pesquisador.

Enquanto Adam, 9 anos, diz: “Conseguiu mostrar a história e toda vida no ribeirão!”.

Já, para Mateus, de 10 anos, as fotos conseguiram mostrar “toda a sujeira e tristeza

daquela gente que vive no rio”, referindo-se às fotos do Gaúcho, dos kaingang e de

Sr. José. Gostaríamos ainda de revelar a fala de André, uns 25 anos, “zelador” da

Escola e morador crescido no bairro: “Tem criança aí (apontando para as salas de

aula) que todo fim de semana está nadando ou pescando nesse Lago! Vivem na

água, mas não sabem que é o Ribeirão Cambé e que ele está poluído!”. Enquanto

nos ajudava a montar a Trilha..., e folheando as imagens com curiosidade, nos

perguntou de maneira desconfiada se “estas águas são poluídas mesmo?”. Em

seguida, voltando aos seus afazeres, despediu-se, nos desejando boa sorte.

É importante relatar que muitos alunos, não entenderam a proposta,

principalmente com referência às perguntas e à própria proposta, o que é uma

avaliação natural, pois se refere a uma atividade nova até então, nova e

desconhecida por eles. Esta avaliação é importante principalmente,no que se refere

aos graus de cognição de cada sujeito. Como atividade-piloto, acreditamos que este

seja o momento de aprimorar a proposta, aprendendo com a simplicidade das

crianças sobre o que a imagem tem a oferecer no processo de aprendizagem e de

compreensão dos lugares.

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7 - ALGUMAS CONSIDERAÇÕES...

Findado nosso caminhar, tentaremos expressar algumas das impressões e

revelações de maior expressividade neste (per)curso pelas águas do Cambé. A

proposta investigativa do pesquisador se envolver com o “seu objeto”,

transformando-a em experiência vivida, veio num primeiro momento como

necessária à possibilidade de significância deste espaço. Posição esta, que tem

muito a mostrar ao pesquisador da contemporâneidade, emerso em seus

instrumentais, linguagem e postura, que o isolam do restante do mundo. Homem de

ciência, que vive enclausurado num mundo de rigor excessivo e da falta de

criatividade, que o impossibilita de expressar e acessar a complexidade do universo

humano. Postura que habilitou o pesquisador ao encontro de uma “Geografia da

Vida”, dos espaços habitados, das paisagens vistas e sentidas e dos lugares que

protegem o ser.

Mundo sensível que foi se revelando, pelo caminho de corredeiras, de lagos,

de cachoeiras, de nascentes e afluentes, além das conversas e presença daqueles

sujeitos que dão (e trazem) significado ao Ribeirão Cambé. Essas águas, até então

distantes do cotidiano acadêmico do pesquisador, foi se revelando através de

exercícios caminhantes, condutores de experiências de alegria, de medo, de beleza,

de feiúra, de topofilia e topofobia, além das, de conhecimento. Encontros dos mais

diversos surpreenderam este sujeito em busca de “outros ângulos e olhares” para o

Cambé, a policia e o medo da violência, pessoas em condições precárias de vida e

“escondidas” nos fundos de vale, crianças e adolescentes em suas brincadeiras,

turistas deslumbrados e viventes já acostumados, antigos moradores detentores da

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memória e de um rico saber cotidiano, contadores de estórias e pesquisadores de

diversas instâncias de saber. Encontros expressivos, que mostraram um “outro”

Ribeirão Cambé, que não aquele dos planos de gestão política, não aquele dos

cartões-postais, ou representado cartográficamente e pendurado numa sala de aula.

Significados, diálogos e buscas diversas, que se confluem pelo caminho das águas,

em direção de espaços de encontro não tão aceitos pela ciência moderna.

A proposta de um estudo da imagem do lugar Ribeirão Cambé, nos mostrou,

as incessantes possibilidades de exercício da escrita científica, modo de expressão

tão desgastado pelos dogmas científicos e positivistas. A proposta da realização de

uma escrita geofotográfica, levou o pesquisador da Geografia a percorrer mundos,

antes não sonhados. Exercício que o conduziu à diálogos com a arte, com a

fenomenologia, a pedagogia e a educação ambiental, com a poesia, com a ciência e

outros saberes, como o senso comum, contato mediado pela linguagem de imagens

e de (geo)grafias.

O (re)conhecimento do lugar pelo pesquisador, não se deu de forma

superficial, mas foi se ampliando durante exercícios de envolvimento e de respeito,

por caminhos que vieram a despertar sensações e sentidos de afetividade para com

estas águas. Sentidos que em determinado momento foram conduzidos pelo estudo

das imagens vividas de Juliani, Ohara e Bavcar. Considerado, como passo

fundamental desta investigação, pois fez parte de um esforço (exercício) para a

compreensão da linguagem imagética da fotografia. Quanto às propostas

metodológicas de leitura propostas por Barthes e Flusser, encaramo-as com o rigor

e o cuidado exigido, principalmente pela inexperiência do pesquisador em “trabalhar

com imagens”.

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Neste momento ainda, o pesquisador em sua tentativa de acessar o

pensamento destes sujeitos “operator”, exercitou-se em exercícios imaginativos em

busca do significado escrito sobre estes lugares. Este momento imaginativo, foi se

ampliando, quando o pesquisador iniciou a redação de sua narrativa geofotográfica

sobre as águas do Cambé, na busca pela expressão de suas experiências. Foi

marcado ainda, por um incomodo do pesquisador em estar produzindo “mais

fotografias”, num contexto do mundo superpovoado de imagens irreais.

Questionamento, que se deu sobre a condição de reprodutor das ilusões que

assolam o Ribeirão Cambé. Estaria este sujeito-pesquisador ampliando a ilusão

especular sobre as reais condições destas águas? Ou estaria apenas concretizando

a história vigente que nos mostram como verdadeira? Perante estes anseios e

dúvidas, foi demarcada uma fuga das imagens clichê, aquelas tão banalizadas e

repetidas incessantemente pelos veículos difusores de imagem.

Nesta necessidade, o pesquisador se encontrou com o olhar poético,

apresentado pelo geógrafo francês Eric Dardel com sua geograficidade; e conduzido

pela expressividade do poeta Manoel de Barros, para que o mundo deve ser

reescrito pela imaginação do poeta. São marcos orientadores para a escrita

geofotográfica, nos engajando ao encontro da imagem do espaço, do lugar e da

paisagem, e para a expressão dos significados aflorados nessas experiências

ambientais.

Num último momento, veio a possibilidade de transformar as expressões

fotográficas produzidas ao longo da pesquisa, numa Trilha Hídrica..., mostra

fotográfica, com a finalidade de revelar algumas faces deste Ribeirão londrinense.

Pela visão do pesquisador, seria uma possibilidade de compreender ou acessar o

imaginário que estas águas trazem em profundidade, além de meio para disseminar

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essas experiências, num âmbito de saber ambiental. A configuração de uma “Trilha

de Imagens do Ribeirão”, viria se demarcar como uma proposta educativa itinerante

a percorrer escolas, espaços públicos, áreas de lazer e de encontro, dentro da bacia

hidrográfica do Cambé.

Esta Trilha..., teve em todo momento, pretensão de ser uma ponte entre os

londrinenses e essas águas tão próximas e esquecidas. Onde, a proposta-piloto nos

mostrou muitos caminhos e horizontes a serem ainda trilhados, nos fazendo pensar

nas possibilidades de descoberta que a imagem pode trazer na valorização desse

lugar hídrico. Mesmo não possibilitando a experiência de lugar em si, as imagens

fotográficas, conduzem os sujeitos a um conhecimento do mundo baseado em ética,

cidadania e saber ambiental, fundamentais para a valorização dos espaços,

paisagens e lugares da vida humana. Mudança de postura vital para a consolidação

de uma ética dos homens para com as águas, com outros seres e com a Terra, a

verdadeira morada do homem.

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