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QUAIS PROFESSORES ALFABETIZAM CIENTIFICAMENTE SEUS ALUNOS? UMA PROPOSTA INVESTIGATIVA DE ENSINO ATRAVÉS DE SITUAÇÕES- PROBLEMA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE CIÊNCIAS Karen Cavalcanti Tauceda, UNIVATES / UFRGS José Cláudio Del Pino, UNIVATES/PPG Educação em Ciências UFRGS Introdução A alfabetização científica no contexto da educação em ciências no Brasil é uma questão preocupante, visto o resultado do último PISA (Programme for International Student Assessment) de 2012. Muitos estudantes participantes do PISA, na faixa dos 15, estão concluindo a escolaridade; no Brasil a realidade é outra, nível de escolaridade defasada e/ou baixo rendimento escolar. Entre 65 países, o Brasil obteve o 59º lugar. Este cenário nos faz refletir: a alfabetização científica é importante em todos os estágios, desde as séries iniciais até o nível superior de ensino. Isto porque, transcende a alfabetização da leitura e escrita, e ao mesmo tempo, dela é dependente; a transgrede quando não basta somente “ler o mundo”, mas questioná-lo, investiga-lo, problematiza-lo e propor soluções; e dela se associa, quando torna- se necessário compreender os significados das palavras e conceitos no contexto das situações. A aprendizagem de Ciências deve ser um “movimento educacional” constante, no qual encontram-se inseridos os sujeitos aprendizes dos diferentes níveis de ensino: estudantes e professores. Segundo Lorenzetti e Delizoicov (2001) as ciências no ensino fundamental, assim como nos anos iniciais, pode contribuir para a compreensão e participação efetiva na sociedade, pois possibilita a construção dos primeiros significados sobre o mundo, seus conhecimentos e sua cultura. Chassot (2003) também identifica o ensino de ciências como uma possibilidade para que o sujeito compreenda melhor o mundo, questionando e tomando decisões e não simplesmente momentos de ensino para a divulgação da ciência e tecnologia. A compreensão do desenvolvimento científico-tecnológico, possibilidades, implicações e consequências sociais e ambientais, constituem o contexto do ensino de ciências na perspectiva da Ciência-Tecnologia-Sociedade-Ambiente (CTSA).

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QUAIS PROFESSORES ALFABETIZAM CIENTIFICAMENTE SEUS ALUNOS?

UMA PROPOSTA INVESTIGATIVA DE ENSINO ATRAVÉS DE SITUAÇÕES-

PROBLEMA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE CIÊNCIAS

Karen Cavalcanti Tauceda, UNIVATES / UFRGS

José Cláudio Del Pino, UNIVATES/PPG Educação em Ciências – UFRGS

Introdução

A alfabetização científica no contexto da educação em ciências no Brasil é uma

questão preocupante, visto o resultado do último PISA (Programme for International Student

Assessment) de 2012. Muitos estudantes participantes do PISA, na faixa dos 15, estão

concluindo a escolaridade; no Brasil a realidade é outra, nível de escolaridade defasada e/ou

baixo rendimento escolar. Entre 65 países, o Brasil obteve o 59º lugar. Este cenário nos faz

refletir: a alfabetização científica é importante em todos os estágios, desde as séries iniciais

até o nível superior de ensino. Isto porque, transcende a alfabetização da leitura e escrita, e ao

mesmo tempo, dela é dependente; a transgrede quando não basta somente “ler o mundo”, mas

questioná-lo, investiga-lo, problematiza-lo e propor soluções; e dela se associa, quando torna-

se necessário compreender os significados das palavras e conceitos no contexto das situações.

A aprendizagem de Ciências deve ser um “movimento educacional” constante, no qual

encontram-se inseridos os sujeitos aprendizes dos diferentes níveis de ensino: estudantes e

professores. Segundo Lorenzetti e Delizoicov (2001) as ciências no ensino fundamental,

assim como nos anos iniciais, pode contribuir para a compreensão e participação efetiva na

sociedade, pois possibilita a construção dos primeiros significados sobre o mundo, seus

conhecimentos e sua cultura. Chassot (2003) também identifica o ensino de ciências como

uma possibilidade para que o sujeito compreenda melhor o mundo, questionando e tomando

decisões e não simplesmente momentos de ensino para a divulgação da ciência e tecnologia.

A compreensão do desenvolvimento científico-tecnológico, possibilidades, implicações e

consequências sociais e ambientais, constituem o contexto do ensino de ciências na

perspectiva da Ciência-Tecnologia-Sociedade-Ambiente (CTSA).

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O presente estudo construiu-se a partir da identificação destes problemas relacionados

ao ensino de ciências e em questionamentos produzidos a partir da reflexão em ação da

professora pesquisadora, em contextos de formação inicial e continuada.

Situações-problema significativas em atividades de ensino e a sua contribuição para a

formação de professores investigativos: conexões entre a alfabetização científica e a

Teoria dos Campos Conceituais de Vergnaud.

O contexto da escola é local de construção e reconstrução reflexiva, e por isso crítica,

dos conhecimentos prévios, cotidianos e escolares (coerentes com os científicos), produzidos

pelos atores/sujeitos da aprendizagem. A Teoria dos Campos Conceituais (TCC) insere-se

nesta ideia: é uma proposta teórico/metodológica a ser refletida na ação profissional dos

docentes. A TCC propõe a construção de conceitos à luz de situações-problema que darão

significados a estes conhecimentos. Estas situações devem conter elementos do cotidiano do

professor, isto é, problemas que ele considera significativos, pois os compreende como um

problema. Vergnaud (1996a) destaca que na teoria dos campos conceituais, a aquisição de

conhecimento é moldada pelas situações e problemas previamente dominados e que esse

conhecimento tem, portanto, muitas características contextuais; as concepções vêm das

primeiras situações dominamos ou da experiência tentando modificá-las.

O conhecimento é resultado da explicitação de conceitos na resolução das situações-

problema (VERGNAUD, 1990). As situações-problema apresentam conhecimentos

relacionados aos conceitos de ensino coerentes aos científicos e às concepções prévias. Cabe

ao professor/mediador da aprendizagem, identificar os conceitos prévios e

escolares/científicos que devem estruturar as situações. Na formação de professores a partir da

ótica da reflexão sobre prática dos sujeitos no contexto escolar, na construção de

conhecimentos pedagógicos (Schön, 1992), estas situações-problema devem estar constituídas

conceitualmente de conhecimentos cotidianos e científicos didáticos. Na resolução destas

situações, portanto, os professores em formação ressignificam seus conceitos prévios ao

proporem novas hipóteses que são também, novas interpretações e “releituras” dos conceitos

científicos.

Moreira (2002) salienta que o conhecimento muda se for comunicável, debatido e

compartilhado e o professor deverá mediar à explicitação dos conhecimentos implícitos. A

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explicitação dos conhecimentos através do diálogo, é a contribuição mais relevante da TCC

para o desenvolvimento da linguagem científica escolar (ou de uma linguagem mais próxima

à ela), pois enfatiza a importância de metodologias da aprendizagem e estratégias de ensino,

que contribuam para a promoção da explicitação dos conhecimentos durante o processo de

conceituação do real. O professor tem um papel fundamental neste processo.

O problema de disjunção da teoria pedagógica, que se aprende na academia, da prática

que desenvolve-se nas escolas, é uma das situações-problema que o nosso contexto

educacional evidencia. Rosa e Schnetzler (2003) afirmam ser necessário um redirecionamento

de concepções que atualmente embasam as práticas na formação continuada; da racionalidade

técnica à racionalidade prática, onde a teoria e a prática fundamentam as ações pedagógicas

nos saberes tácitos dos professores.

A TCC considera também a união da teoria com a prática no desenvolvimento do

conhecimento na resolução de situações-problema significativas, que o mediador (professor

formador), irá identificar/elaborar/propor no contexto das práticas docentes na escola e dos

conceitos da academia.

Vergnaud (1990) afirma que um conceito é constituído por um conjunto de situações

que darão sentido ao conceito; um conjunto de invariantes operatórios (conceito e teoremas-

em-ação) em que se baseia a operacionalidade dos esquemas, ou seja, os significados dos

conceitos que estão amplamente implícitos; e um conjunto de representações simbólicas que

permite representar um conceito, suas propriedades, as situações e os procedimentos. Um

esquema é um plano de ação, uma estratégia que abrange uma classe de situações. Teorema-

em-ação é uma proposição considerada como verdadeira sobre o real; conceito-em-ação é

uma categoria de pensamento tida como pertinente.

A pesquisa aqui discutida, enfatiza as possibilidades para a formação inicial e

continuada de professores de ciências, para que estes se constituam diferentes da “lógica” da

teoria tradicional; que estas teorias para o ensino, discutidas nas IES (Instituições de Ensino

Superior), se ressignifiquem no contexto da escola, formando professores pesquisadores e

investigativos, que por sua vez, através da docência reflexiva/crítica, ressignifiquem o dia a

dia escolar. Professores investigativos são formados em um contexto social/escolar

investigativo, como é o contexto educativo proposto pela mediação do professor nas

situações-problema significativas de Vergnaud. Demo (1998) afirma que só um ambiente

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questionador gera sujeitos questionadores. Este estudo é uma proposta para responder a

seguinte questão de pesquisa: As situações-problema de Vergnaud podem promover a

aprendizagem pelos professores do conceito da alfabetização científica?

Metodologia

O artigo apresenta alguns resultados de uma pesquisa de pós-doutorado - PPG

Ensino/UNIVATES RS, no período entre agosto e novembro de 2014, e traz reflexões sobre a

prática do professor de ciências relacionada à teoria dos campos conceituais de Vergnaud:

mediações em situações problematizadoras e significativas (que apresentam em sua estrutura

conceitual, conhecimentos prévios e novos, relacionadas a alfabetização científica). Os

campos conceituais consideram que os conhecimentos (invariantes operatórios) são

produzidos na resolução destas situações, isto é, quando são explicitados conceitos que os

sujeitos consideram pertinentes para solucionar os problemas propostos pelo professor.

Foram analisados dois contextos: a formação inicial, com 30 estudantes

aproximadamente, do Instituto Estadual de Educação Estrela da Manhã, do 3º ano do Ensino

Médio, Curso de Magistério, durante o desenvolvimento de seus estágios nas séries iniciais

em diferentes escolas de Estrela, RS, ou cidades próximas; a formação continuada, com dois

professores da Ciências da Natureza do ensino médio (biologia e química), com cinco anos

em média de prática profissional, do Colégio Estadual Júlio de Castilhos (CEJC), Porto

Alegre, RS. Na formação continuada, a pesquisa enfrentou revés na sua execução. Os

professores participantes não respondiam os questionários no prazo estipulado (apesar da

combinação do pagamento de uma bolsa-auxílio); a direção da escola concordou com a

realização da pesquisa e depois declinou da decisão por entender que os professores

prejudicariam suas aulas e sua participação no Seminário Integrado1 em função das atividades

no projeto.

Foram desenvolvidas situações-problema que consideravam os conhecimentos

produzidos através da reflexão das práticas da sala de aula, nos diferentes contextos, e

1 A disciplina “Seminário Integrado” faz parte de um projeto mais amplo proposto pela Secretaria de Educação

do Estado do Rio Grande do Sul (SEDUC/RS) em 2012, que tem como objetivo integrar as diferentes áreas do

conhecimento em projetos de pesquisa discutidos e propostos no dia a dia escolar e refletidos e organizados

por alunos e professores nos encontros semanais desta disciplina. As professoras da escola participantes da

pesquisa de pós doutorado, eram professoras regentes da disciplina “Seminário Integrado” no ano da

realização do estudo.

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conhecimentos relacionados à uma proposta investigativa de ensino para a construção de

conceitos escolares de ciências, como a metodologia dos campos conceituais. Estas situações-

problema, respondidas individualmente com lápis e papel, foram propostas em encontros

quinzenais (em torno de 90 minutos), e estes encontros foram organizados em situações de

ensino que proporcionassem o debate de ideias, enfocando a reflexão da prática pedagógica

vivenciada. Este processo investigativo de reflexão-ação apresenta potencial para o debate

(tornar os conhecimentos implícitos em explícitos), negociações de significados,

argumentações, exemplos, comparações, relações (GROSSI, 2006), onde os professores

decidirão e problematizarão a metodologia de ensino e o conteúdo que irão ensinar, em uma

investigação-ação da sua própria prática investigativa, em uma perspectiva de colaboração

(MALDANER, 1997).

Abaixo, são descritas duas situações-problemas avaliativas. Cada uma é composta de

várias situações com complexidade conceitual similares. A 1ª situação (debatida em agosto),

tinha como objetivo mobilizar e explicitar as concepções prévias. Estes conhecimentos, ao

serem identificados, são utilizados na organização da 2ª situação-problema (debatida em

novembro), e propõe-se a contribuir na reflexão da ação nos estágios dos professores de séries

iniciais e dos professores de ensino médio (química e biologia). No intervalo entre as

situações-problema, ocorreram debates e discussões que propunham questionamentos dos

conceitos prévios e novos.

As situações-problema organizadas para os professores em formação em diferentes

contextos (inicial e continuada) não são iguais, pois consideram as concepções prévias

produzidas nestes contextos e identificadas pelo professor pesquisador. É considerado então,

as estruturas cognitivas do aprendiz (conhecimentos prévios e novos, ressignificados), e as

possibilidades conceituais de integração do conceito da alfabetização científica, identificados

e mobilizados através do debate coletivo e da resolução das situações-problema avaliativas.

Algumas “palavras-chave” da alfabetização científica (questionamento, investigação, debate,

aprendizagem significativa) então, devem estar relacionadas às situações/contextos

específicos, portanto estas conceituações tornam-se diferentes, porém devendo sempre

considerar as aproximações com os conhecimentos que se quer ensinar.

Os invariantes operatórios descritos abaixo, foram selecionados pelo critério da

operacionalidade do conceito escolar em situação de ensino proposta pelo professor, isto é,

como o professor articula a aprendizagem do conceito escolar/científico com a didática

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baseada no desenvolvimento de conceitos relacionados à alfabetização científica. As

situações-problema propostas então são do tipo “práticas”. Este tipo de situação-problema

evidencia conhecimentos relacionados à metodologia de ensino baseada na alfabetização

científica, pois explicitam conceitos pedagógicos evidenciados na prática dos professores.

A professora de química, no contexto de formação continuada, é supervisora do PIBID

do Curso de Licenciatura de Ciências da Natureza, do Instituto Federal do Rio Grande do

Sul/campus - Porto Alegre (IFRS), desde setembro de 2014. O projeto que está sendo

desenvolvido pelo PIBID/IFRS/CEJC, refere-se às atividades práticas nas escolas.

Resultados

As resoluções das situações-problema pelos professores são explicitadas como

invariantes operatórios, estes, facilitam a compreensão da aprendizagem evidenciada pelos

professores em formação. Esta compreensão é importante para organizar situações

potencialmente significativas capazes de mobilizar as concepções prévias na ressignificação

do novo conceito.

Contexto de formação inicial – séries iniciais

Situação-problema avaliativa 1:

- Você pensa que será difícil a compreensão por parte de seus alunos, dos

conceitos/conhecimentos que você irá desenvolver no estágio? De quais

conceitos/conhecimentos? Por que? Quais as dificuldades que você espera encontrar?

Invariantes operatórios: Os conceitos não são difíceis quando bem explicados e aprofundados.

Não ocorre dificuldades na compreensão, pois os alunos apresentam curiosidade natural sobre

os animais. Haverá dificuldades em curiosidades que o professor não sabe explicar. O tema

escolhido, alimentação saudável, está de acordo com a faixa etária. A criança com este

conteúdo sabe o que são os ossos, os músculos e para que servem. A dificuldade é não

“passar” o conhecimento para os alunos. A compreensão não será difícil, pois os alunos estão

empenhados em aprender o novo, sanando dúvidas e expondo opiniões.

Situação-problema avaliativa 2:

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- Você considera importante para a aprendizagem, propor questões para investigar o que o

aluno já sabe, e a partir daí ensiná-lo de acordo? Por que? Como você faria isto considerando

uma proposta para a aula prática que problematize os conteúdos (conceitos, conhecimentos)

que você quer ensinar, para que este aluno investigue estes conhecimentos ao propor soluções

(hipóteses com concepções prévias) para resolver estes problemas. Estas situações

problemáticas podem apresentar alguns conhecimentos da sua matéria de ensino e concepções

prévias de seus alunos. Uma ideia para uma proposta de aula pratica, é identificar o problema

inicial que vai gerar a sua atividade de ensino.

Invariantes operatórios: Será proporcionado aos alunos novos conhecimentos a partir das

concepções prévias. Observa-se atentamente a turma e utiliza-se diversos recursos para as

aulas práticas, pois deve-se inovar. A partir dos conhecimentos prévios conhece-se a base dos

alunos para prosseguir os estudos com a turma. O início da aula prática é uma conversa

instigadora sobre os conhecimentos prévios para após esta etapa dar prosseguimento da aula

prática. Não é importante considerar os conhecimentos prévios dos alunos, pois há vários

assuntos que devem ser abordados e alguns alunos sabem e outros não sabem, e mesmo assim

deve-se passar o conteúdo. Observando a turma de modo geral, será desenvolvido os

conceitos de misturas homogêneas, heterogêneas e densidade. Os alunos serão observados

para atentar as suas falas e realizar o planejamento. Uma aula boa deve inovar, utilizar

materiais e propostas diferentes, então a parti do assunto das plantas será feita a experiência

do feijão no copo.

Contexto de formação continuada para o ensino médio

Situação-problema avaliativa 1:

- Quais as dificuldades encontradas em termos de aprendizagem dos alunos? Este é o

problema a ser investigado.

Prof. Biologia - Invariante operatório: Os alunos não conseguem assimilar os conceitos

porque as nomenclaturas são muito difíceis até para se pronunciar.

Prof. Química – Invariante operatório: Ocorre dificuldade para compreender o que é soluto e

solução. É explicado que solução é um conjunto de compostos e que soluto é o componente

que está em uma solução. Há troca de nomes. Está relacionado ao cotidiano: ar, mar,

refrigerante, sucos.

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- Qual (ais) as propostas para desenvolver estes conteúdos (conceitos), levando em

consideração estas dificuldades (hipóteses organizadas por você para resolver o problema de

investigação)?

Prof. Biologia - Invariante operatório: A prova oral resolve as dificuldades individualmente e

após é feita a prova escrita.

Prof. Química – Invariante operatório: São utilizados rótulos e preparo de soluções no

laboratório. São trabalhados novamente os conceitos de ppm, diluição e concentração. São

acrescentados conceitos e fórmulas, rótulos e aulas de laboratório sobre título e concentração

comum.

Situação-problema avaliativa 2:

- Quais foram as dificuldades que você identificou na aprendizagem de seus alunos no

decorrer da aula desta semana, considerando os conhecimentos (conceitos) que você ensinou?

Prof. Biologia – Invariante operatório: As dificuldades encontradas estão relacionadas às

nomenclaturas.

Prof. Química – Invariante operatório: Identificou-se dificuldades no cálculo de concentração

comum, que foi trabalhada no laboratório com suco em pó e água em jarras, mostrando as

embalagens e relacionando a proporção de massa que está contida no envelope ao tipo de

concentração, chamada concentração comum. Foram realizadas cinco práticas para cada

concentração diferente. A prática mais fácil de compreensão e que não foi realizada pelos

alunos foi a que indicou maior dificuldade de compreensão.

- Quais as estratégias pedagógicas que você utilizou para resolver estas dificuldades?

Prof. Biologia – Invariante operatório: Foram feitos os esquemas dos processos de formação

dos gametas, os quais foram visualizados e percebido qual o processo que atua na formação

do nosso corpo e dos gametas.

Prof. Química – Invariante operatório: Foram realizadas perguntas sobre evaporação da água,

concentração da solução do solvente, adição da água em uma solução e a concentração final

desta solução, quantidade mínima do soluto em uma solução e nome da solução. A

visualização de soluto nas soluções facilitou a compreensão dos nomes. O trabalho em

laboratório com diferentes tipos de concentração facilita a comparação e a aprendizagem das

proporções.

Discussão e Considerações Finais

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Na resolução da situação relacionada à identificação de concepções prévias (situações

1), no contexto de formação inicial, foram encontrados um maior número de invariantes

incoerentes com a conceituação da alfabetização científica. Estes resultados sugerem

dificuldades na construção conceitual deste conhecimento durante a prática dos estágios.

Na resolução da situação 2 relacionada à identificação da evolução conceitual, foram

produzidos os invariantes “Será proporcionado aos alunos novos conhecimentos a partir das

concepções prévias.”, e “A partir dos conhecimentos prévios, conhece-se a base dos alunos

para prosseguir os estudos com a turma.”. Estes invariantes não indicam conceitos

relacionados à alfabetização científica, por exemplo, a problematização dos conceitos.

Também mostram dificuldade de explicitar conceitos relacionados à operacionalização deste

conhecimento, por exemplo, desenvolver uma situação-problema na qual ocorra a interação

do novo com o prévio, como sugerem estes invariantes (forma predicativa de pensamento).

Os invariantes da situação 2 “Não é importante considerar os conhecimentos prévios

dos alunos, pois há vários assuntos que devem ser abordados e alguns alunos sabem e outros

não sabem, e mesmo assim deve-se passar o conteúdo.” e “Observando a turma de modo

geral, será desenvolvido os conceitos de misturas homogêneas, heterogêneas e densidade.”,

indicam uma aprendizagem relacionada à concepções racionalistas de ensino, pois o conteúdo

da matéria de ensino fundamenta a ação educativa e não a compreensão e a aprendizagem

destes conteúdos pelos alunos.

O invariante da situação 2 “Uma aula boa deve inovar, utilizar materiais e propostas

diferentes, então a partir do assunto das plantas, será feita a experiência do feijão no copo.”,

mostra que não ocorreu a aprendizagem do conceito de aprendizagem significativa (falta o

reconhecimento das concepções prévias), tampouco da alfabetização científica, pois não

foram produzidos conceitos relacionados à investigação através da problematização de

concepções prévias, cotidianas, relacionadas a este tema potencialmente significativo (muitas

crianças conhecem ou já realizaram a experiência do feijão).

Portanto, na resolução das situações-problema relacionadas à identificação da

evolução dos conceitos pesquisados (situação 2), foram identificados um número igual de

invariantes coerentes/incoerentes com o conceito da alfabetização científica, sugerindo uma

melhora na produção de invariantes coerentes com a aprendizagem significativa e a

alfabetização científica, em comparação com os invariantes produzidos na resolução do

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organizador/situação 1. Estas situações apresentam conceitos, que promoveram em parte, as

conceituações/aprendizagens propostas: desenvolvimento de uma aula prática para alunos de

séries iniciais com potencialidade de promover conhecimentos relacionados à alfabetização

científica em uma aprendizagem significativa. Ao mesmo tempo, os resultados também

indicam dificuldade de relacionar a teórica com a prática, encontrada em muitos estudantes.

Uma das consequências desta dificuldade está presente, por exemplo, quando eles não

conseguem resolver diferentes problemas do cotidiano que enfocam aspectos conceituais da

C-T-S-A, relacionados a assuntos que eles teoricamente estudaram na escola. Não

desenvolvem uma aprendizagem que indique a operacionalidade do pensamento nas

situações, e não somente coerência linguística, como ocorre em problemas explicativos e de

enunciação de propriedades e descrição de fenômenos.

Na resolução da situação relacionada à identificação de concepções prévias (situações

1), no contexto de formação continuada, tanto os invariantes produzidos pela professora de

biologia como de química, indicam uma proposta de aprendizagem fundamentada no

conteúdo de ensino e não na possibilidade de construção conceitual através de

problematizações, como por exemplo “Os alunos não conseguem assimilar os conceitos

porque as nomenclaturas são muito difíceis até para se pronunciar” e “É explicado que

solução é um conjunto de compostos e que soluto é o componente que está em uma solução”.

Quando é sugerido a formulação de uma hipótese (proposta de ensino) para resolver as

dificuldades de aprendizagem, os invariantes também são incoerentes com o conceito de

alfabetização científica: “São acrescentados conceitos e fórmulas, rótulos e aulas de

laboratório sobre título e concentração comum” e “A prova oral resolve as dificuldades

individualmente e após é feita a prova escrita.”.

Na resolução da situação relacionada à identificação da evolução conceitual (situações

2), no contexto de formação continuada, manteve-se a estrutura dos invariantes, isto é,

incoerentes com uma proposta investigativa de aprendizagem, por exemplo “As dificuldades

encontradas estão relacionadas às nomenclaturas”. No invariante “Identificou-se dificuldades

no cálculo de concentração comum, que foi trabalhada no laboratório.”, pode indicar uma

compreensão racionalista de conhecimento assim como empirista; ambas concepções não

contribuem para a alfabetização científica. O “cálculo de concentração...” parece basear-se

somente no conteúdo de ensino “concentração”, e ao levar este conteúdo de ensino para ser

trabalhado em situação de ensino prática, o professor possivelmente utiliza as atividades

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experimentais como situações a serem observadas (empirismo) para então, propor o conteúdo

de ensino “pronto”. Este processo de compreensão de construção do conhecimento, não

evidencia conceitos relacionados à alfabetização cientifica. Na situação que compõe a

situação-problema 2, que sugere a formulação de uma hipótese para resolver as dificuldades

de aprendizagem dos alunos, o invariante produzido pelo professor de biologia “Foram feitos

os esquemas dos processos de formação dos gametas, os quais foram visualizados e percebido

qual o processo que atua na formação do nosso corpo e dos gametas.”, não considera a

problematização como estratégia pedagógica para a aprendizagem. Já o invariante produzido

pelo professor de química “Foram realizadas perguntas sobre evaporação da água,

concentração da solução do solvente...”, indica uma compreensão de aprendizagem

relacionada ao conceito de alfabetização científica. Mas a produção deste invariante

provavelmente não é um indício da evolução conceitual da aprendizagem da alfabetização

científica como resultado da metodologia da TCC proposta nesta pesquisa, pois o professor de

química relatou que foi auxiliado para o desenvolvimento de propostas para melhorar a

aprendizagem dos alunos, pelo licenciando participante do PIBID na escola.

Algumas hipóteses podem ser sugeridas para explicar as dificuldades dos professores,

principalmente no contexto de formação continuada, na aprendizagem do conceito da

alfabetização científica:

- Situações-problema avaliativas que não continham elementos conceituais prévios e

novos que tencionassem a evolução conceitual, na resolução destas situações.

Por sua vez, podemos propor algumas hipóteses para explicar esta constatação:

- Situações de ensino para o debate e reflexões pouco frequentes. São nestes

momentos (e nas situações-problema avaliativas), que ocorrem a explicitação de conceitos

para serem utilizados na estrutura das situações. Segundo Vergnaud (1990) a aprendizagem

não ocorre em um curto espaço de tempo.

Os invariantes produzidos não indicaram uma contextualização dos conhecimentos, os

invariantes, no enfoque da CTSA. As situações-problema avaliativas identificaram esta

situação na aprendizagem dos conceitos escolares/científicos mas não foram organizadas

adequadamente para o desenvolvimento destas aprendizagens. Uma hipótese a ser

considerada é a inexistência de concepções prévias identificadas na resolução das situações

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relacionadas à CTSA. Neste caso, o organizador prévio/situação problema2 de Ausubel

(2000), seria adequado para facilitar o processo inicial destas aprendizagens.

Os resultados obtidos indicam que, tanto na formação inicial, como na continuada,

existe dificuldade de pensar o ensino de ciências como um momento de problematização e

reflexão da prática dos estudantes, na construção dos conhecimentos científicos escolares.

Também percebeu-se que as problematizações/situações-problema, que consideram o “refletir

sobre a prática”, indicam potencial para a evolução de concepções epistemológicas, e

consequentemente pedagógicas dos professores.

Referências Bibliográficas

AUSUBEL, D. P. The Acquisition and Retention of Knowledge: a Cognitive View. Dordrecht:

Kluwer Academic Publishers, 2000.

CHASSOT, A. Alfabetização científica: uma possibilidade para a inclusão social. Revista

Brasileira de Educação, n. 22, 2003.

DEMO, P. Educar pela Pesquisa. Campinas: Autores Associados, 1998.

GROSSI, E. P. Aprender é formular hipóteses. Ensinar é organizar provocações. Porto

Alegre: GEEMPA, 2006.

MALDANER, O. A. A formação inicial e continuada de professores de Química –

professores/pesquisadores. Tese (Doutorado). Unicamp: Faculdade de Educação, Campinas,

1997.

MOREIRA, M. A. A teoria dos campos conceituais de Vergnaud, o ensino de ciências e a

pesquisa nesta área. Investigações em Ensino de Ciências, v.7, n. 1, p. 7-29, 2002.

MOREIRA, M. A. Aprendizagem significativa, organizadores prévios, mapas conceituais,

diagramas v e unidades de ensino potencialmente significativas. Material de apoio para o

curso Aprendizagem Significativa no Ensino Superior: Teorias e Estratégias Facilitadoras.

PUCPR, 2013.

2 Organizador prévio é um recurso instrucional apresentado em um nível mais alto de abstração, generalidade

e inclusividade em relação ao material de aprendizagem. Não é uma visão geral, um sumário ou um resumo

que geralmente estão no mesmo nível de abstração do material a ser aprendido. Pode ser um enunciado, uma

pergunta, uma situação-problema, uma demonstração, um filme, uma leitura introdutória, uma simulação.

Pode ser também uma aula que precede um conjunto de outras aulas. As possibilidades são muitas, mas a

condição é que preceda a apresentação do material de aprendizagem e que seja mais abrangente, mais geral e

inclusivo do que este (MOREIRA, p. 14, 2013).

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LORENZETTI, L. e DELIZOICOV, D. Alfabetização Científica nas séries iniciais. Ensaio –

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