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sHOT! Você lembra quem apelidou Micarla de Borboletinha? Miguel Mossoró está de volta! Sidarta Ribeiro fala de drogas, sono, capoeira. Só não fala muito do Palmeiras Onde estaria Hunter Thompson se ele estivesse vivo? Lorde Pavê te leva a uma viagem pela rave BOA! ENTREVISTA MÃOZADA NELES! 48941515464 DR. GONZO ANO 1, EDIÇÃO Nº 0. JUNHO DE 2013

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A edição de número zero da revista Shot!

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sHOT!Você lembra quem apelidou Micarla de Borboletinha? Miguel Mossoró está de volta!

Sidarta Ribeiro fala de drogas, sono, capoeira. Só não fala muito do Palmeiras...

Onde estaria Hunter Thompson se eleestivesse vivo?

Lorde Pavê te leva a uma viagem pela

rave BOA!

ENTREVISTA

MÃOZADA NELES!

48941515464

DR. GONZO

ANO 1, EDIÇÃO Nº 0. JUNHO DE 2013

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EDITORIAL

MEDO E DELÍRIO NO UNIVERSO SHOT! A cada dia que passa você fica mais velho, o dinheiro está acabando, sua saúde só piora, e a ressaca parece ser eterna. Neste mundo só resta você e a sua falta de caráter. Um profissional treinado e lapidado por anos para finalmente depois de várias tentativas ter a responsabilidade de desco-brir o que é pior: chegar ao fundo do poço, ou continuar cain-do. Não espere que eu vá agradecer por você ter ido em meu lugar. Antes você que eu. Em um mundo onde a desordem governa só a des-construção pode nos levar além. Dúvida? Olhem a sua volta, todos os que tentaram ajeitar algo falharam, e falharam feio. Sobre suas costas pesam milhares de vidas banalizadas pelo cotidiano. Eu por outro lado vou seguir outro caminho. Se é o melhor, não sei. A única certeza a qual carrego é de que estou me afastando da destruição. E na pior das hipóteses, estou me divertindo. A cidade lá fora está pegando fogo, na noite passada mais de 200 mil brasileiros foram às ruas pedir mais justiça. Não aquela justiça banalizada dos jornais policiais “Eu que-ro justiça”, ou “eu quero é JÛstiça”, que os sobreviventes in-sistem em clamar sem saber do que se trata. O povo parece estar bem revoltado com a situação do nosso país e cansou de deixar pra lá. Talvez isso dê certo. Talvez. O país está envolto

em uma esperança contagiante, e não é aquela esperança que vem logo após a conquista de um título mundial de futebol, é a esperança de fazer algo com as próprias mãos. Eu já estive em passeatas e sei bem o que é isso. Até de paralisação par-ticipei. Eu também já fiz algo com as próprias mãos. O des-graçado nunca mais voltou a ver a luz do dia.Políticos aparentemente loucos, são mais confiáveis que aqueles há 40 anos no mesmo cargo, um cientista professor de capoeira, estudioso do sono e da maconha. Gente estranha, com música estranha, em um universo paralelo de sensações, pessoas respeitáveis na casa de tolerância mais elitizada da cidade, jornalismo policial feito por jogador de futebol (se não entendeu assista a alguma entrevista de um jogador). Bra-sileiros que mesmo sem a melhor organização ainda vão para as ruas protestarem contra o governo. Nesse mundo abstrato Shot! te convida para uma viagem, você escolhe, é bala ou doce. Todo esse convite te pareceu estranho? Não hesite:“Existe um prazer na loucura que só os loucos sabem”.Não sei quem disse isso, muito provavelmente estava na ala psiquiátrica de algum hospital soviético, por isso não tenho o nome.

Edgar Sabinno - –O chefão

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EXPEDIENTE- Diretor de Redação:

Emanoel Barreto

- Chefes de Redação:

Felipe Galdino

Everson Andrade

Diego Ciríaco

Edgard Sabinno

- Projeto gráfico e diagramação:

Erick Attos de Andrade

Everson Andrade

- Equipe Revista Shot!:

Emanoel Barreto

Yuri Borges

Alexis Peixoto

Pedro Andrade

Aura Mazda

Yanna Medeiros

Ariston Bruno

Lorde Pavê

Sara Liuda

Aureliano Meds

Edgard Sabinno

Juão Nin

Capa por; Yanna Medeiros

FUTEBOL PARA AMERICANO VER 06Nosso repórter faz um tributo a George Plimpton e parte para cima dos

adversários.

ACORDADO FAZ TEMPO 14Se o gigante levantou agora a Revolta do Busão estava acordada desde o

ano passado na terra do sol.

RUM 24Ensaio fotográfico baseado no romance de Hunter Thompson, o jornalista

mais bêbado do caribe agora em versão natalense.

YURI BORGES 31Coluna de Yuri Borges te leva a ficar cara a cara com a Bazuca de Thomp-

son.

ENTREVISTA 32Sidarta Ribeiro, respeitado cientista e diretor do Instituto do Cérebro se

prestou a ser entrevistado por nossa equipe.

FRACASSO 40Acompanhe o fracasso de um repórter em fazer uma matéria, ele está

procurando um lugar para enfiar a cara até agora.

FICÇÃO 44E se o Dr. Estivesse vivo? O jornalista Alexis consulta orixás e xamãs

para decifrar o mistério dessa pergunta.

MÚSICA 49Conheça alguns festivais bem porra louca! Mas vamos deixar para ir

depois dos 60, que é mais legal!

JORNALISMO 54Genésio Pitanga, saímos a procura do jornalista que causa sensações

antagónicas nas pessoas desta cidade.

EMANOEL BARRETO 61Uma perspectiva do futuro do hospital mais movimentado da capital

potiguar, será que dessa vez vai?

BOA 62Lorde Pavê, se despiu do pudor da monarquia do jornalismo para seguir

gente estranha. Veja a sua análise totalmente excelente.

POLÍTICA 68Nem Oscar Niemeyer poderia ter projetos tão ousados, o autor? Um te-

nente reformado do exército, por onde anda Miguel Mossoró?

TRIPINHAS 78

ÍNDICE

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TOUCHDOWN

Acabou o jogo e nós estávamos todos cabisbaixos, tristes... Não dava para entender o que tinha dado erra-do. Eram umas dez da noite. Não lem-bro exatamente porque no momento eu era um jogador do Natal Scorpions, e não um repórter preparado em regis-trar horas alheias. Aliás, nem mesmo queria olhar para a porcaria do relógio. A derrota havia sido um baque: 8 a 0, um placar apertado (sim... apertado, se você não conhece futebol americano, não estranhe), mas tínhamos perdido. E o pior era ouvir a torcida atrás da gente gritando; os adversários comemoran-do uma vitória que para mim simples-mente não era para ter acontecido... Não dava para engolir. Jogamos melhor que o Recife Pirates, eu sei que jogamos,

mas o placar não mostrava isso. Pelo contrário, o mascote ridículo deles (um pirata com barbicha e cabeção esquisi-to, como qualquer outro mascote, mas esquisito) pulava de alegria do outro lado do campo. O pior era cumprimen-tar os caras do outro time. “Bom jogo”, dizia um. “Jogou bem, cara”, falava out-ro. Mero fair play, sabemos. É complica-do falar com um adversário, logo após o jogo, só um atleta sabe disso. Alguns, como os argentinos (rsrs) têm vontade de dar uma de político japonês, como aqueles que vemos de vez em quan-do na TV, e partir para a pancadaria. O sangue ainda fervendo. Mas isso é o esporte. Ok, é preciso se contentar, argentinos. Voltando para o relato. E quanto aos árbitros do jogo? Cara, para

mim, esses cidadãos erraram sim em alguns lances. Bem, não vou entrar em detalhes quanto a isso, vai que o Su-premo Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) está de olho nesse texto e me puna. Não chamo de filhos da puta pelo respeito que tenho a eles. Ah, mas quer saber? Desculpe-me o “mimimi”, acho que é o que parece; pense o que quiser. Mas não sou hipócrita! Essa historinha de que o que vale é participar não cola. Quero ganhar e pronto, porra!Bem, voltando mais uma vez; como eu dizia, o jogo acabou. O técnico nos cha-mou para um círculo na beira do campo.– Senta todo mundo aí! Senta todo mun-do aí!– Pronto – pensei – agora que fodeu mesmo. Ele está puto.

TEXTO POR FELIPE GALDINOFOTOS POR AURA MAZDA

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Preferi ficar de joelhos. Pensei realmente que vinha um sermão daque-les do tipo: “Vocês são uns merdas!” ou “Não era pra termos perdido prum time merda desse!” ou ainda: “Viajei tudo isso pra perder? Mas que merda!”. Só sei que achei que tinha dado merda na história. Errei feio. Daniel Torres, o nosso quar-terback (o cidadão que no jogo lança a bola), coach, e também presidente do time, nos elogiou... Sim, ele nos elogiou!

Tô muito feliz pelo futebol que jogamos; todos com vontade do inicio ao fim, nin-guém baixou a cabeça ou desanimou, postura de campeões. Mesmo sem trei-no e tendo que reorganizar as coisas em pouco tempo, seguramos a onda. Vimos que a nossa união e a vontade que te-mos de jogar não vai atrapalhar nossa caminhada nesse campeonato. Mostra-mos pra quem achava que o Scorpions estava morto que nós estamos mais

vivos do que nunca e quem nos subesti-mar vai ficar pelo caminho! – Disse.E, cara, ouvindo essas palavras o time foi se animando, e o clima pesado aos poucos ficou leve. No final, todo mundo brincava como se a missão tivesse sido cumprida. E analisando o longo discur-so do técnico, foi isso que aconteceu. Perdemos, mas vencemos...

Concentração é fundamental

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Horas antes sabia que o jogo seria tenso para mim. Minha primeira partida como jogador de futebol americano, e ainda longe pra cacete de casa: Recife. Aliás, Recife porra nenhuma... Camaragibe (PE)! Era o Estádio Municipal Luiz Al-exandrino. Minha posição (acabei vi-rando atleta efetivo do time, não sei como, mas virei) é a de running back, ou seja, o cara que tem basicamente a função de correr com a bola para tentar avançar pelo campo e quem sabe con-seguir o touchdown. Mas, além disso, é o maldito que leva mais porrada du-rante o jogo. Não que os outros joga-dores não se choquem no gramado, mas o RB (como chamamos o running back no jogo) leva cada porrada segura! São pancadas fortes pra caralho! Pois é, baixinho como sou, em tese sou mais rápido que um jogador mais pesado, en-tão me puseram nessa função. Ok...

Pasme, mas até que eu gosto. Vamos ao amistoso. O jogo começou às 19h. Fiquei no banco, obviamente por opção técni-ca, mas eu mesmo queria deixar a bola pros caras mais experientes do time. Tinha só acho que um mês de treino e tinha medo de cagar tudo. Fiquei na torcida. O jogo até que começou meio morninho pro meu gosto. Ninguém fez ponto.

No futebol americano é preciso fazer cara de mau

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Terminei de me limpar de grama e areia que cobriam meu uniforme, e o jogo continuou. Joguei por alguns minutos ainda. Próximo do final do jogo, um pouco cansado (e confesso, temeroso de errar), resolvi pedir para sair. Voltei a ser torcedor até o apito final.Nesse último quarto é que começamos a atacar mais ainda com bons avanços tanto em passes quanto em corridas. Chegamos a marcar um touchdown com nosso quarter back, mas since-ramente, não sei porque foi anulado pela arbitragem (desgraça!). Disseram que fizemos falta na jogada. Aí veio o desânimo e já sabemos como tudo ter-minou.DOIS EM UMUma coisa que percebi assim que entrei no time, aliás, assim que fiz o teste para entrar, em março deste ano, foi que no

futebol americano são duas equipes numa só. É impressionante a rivali-dade entre os jogadores de ataque e os de defesa. É “pau no cú da defesa!” para lá; “ataque de merda” para cá. Impres-sionante as provocações!A rivalidade é toda passada nos própri-os coletivos dos treinos. Os caras se bicam mesmo. O “trash talk” (as provo-cações) são intensos a ponto de às vez-es ter até dedo na cara entre colegas do próprio time. Isso me estranhou muito no início porque como estava acostu-mado com outros esportes, não imag-inava que um mesmo time tivesse essas coisas.Até para um jogo a rivalidade interna é levada. Lembro-me bem de contra os Pirates, quando nossa defesa estava em campo, o pessoal gritava: “Bora, defesa! Bora defesa!!”.

– Que defesa porra nenhuma! É ‘Bora Scorpions!’, porra! – eu gritava de volta para os colegas.Mas não pense você que essa é uma particularidade do nosso time. Recor-do-me de ouvir a torcida pernambu-cana fazer o mesmo. “Ataque! Ataque!” ou então: “Defesa! Defesa!”, berravam das arquibancadas.ESPORTE CARO, MAS PRAZEROSOO futebol americano é um esporte caro. Como não é tão praticado no Brasil, os custos dos equipamentos pesam no bol-so. Eu sinto na pele isso. Para conseguir meu shoulder (armadura que protege seu peito e costas) desembolsei uma grana alta. E para achar não foi tão fácil. Pesquisa, pesquisa e mais pesqui-sa. Você, procurando, acha num preço mais em conta, porém, ainda salgado.

No segundo quarto, depois de uma corrida de umas 20 jardas do RB George Alcântara, os adversários abri-ram o placar marcando um touchdown. E no ponto extra, após um pequeno, porém mortal, vacilo da nossa defesa, os caras ainda marcaram mais um mini touchdown com Davidson Soares. Ficou 8 a 0 pra eles e acabou o primeiro tempo.Eu entrei na segunda etapa do jogo. No intervalo, enquanto ouvíamos as orien-tações de Torres, eu já falava que iria jogar. Passou o terceiro quarto e nada de a gente marcar ou pior, de eu entrar. A gente perdia e aí é que eu estava com medo de foder tudo de uma vez. E se eu levo um fumble (deixar a bola ciar) e os piratas pegam a bola? E se eu perder a chance de fazer um touchdown? E se... E se... E se... Essa maldição não saía da cabeça. Mas tive de esquecer tudo isso quando pintou a oportunidade de entrar

em campo, no último quarto do jogo. Nossa, a tensão era grande. Eduardo Madruga, nosso outro quarterback, es-tava em campo no lugar de Torres. Na jogada combinada eu deveria bloquear quem aparecesse na minha frente para dar chance de Madruga lançar a bola. Foi quando vi um brutamontes bem mais alto e forte que eu na minha frente. O cidadão parecia um armário. “Como danado vou parar esse cara, meu Deus?”. Foi inevitável não pensar isso. Não dava para vacilar, então resolvi ir com tudo na barriga dele. Errei, pois sa-bia que deveria ir nas pernas para der-rubar e ser esmagado por ele no chão. Mas milagrosamente consegui parar o cara. Ele não caiu, só que também não avançou. Foi de certa forma um alívio.Na jogada seguinte, eu não precisava bloquear. Era só correr e se Madruga quisesse passar a bola para mim era

só fazer isso. Nesse momento veio meu primeiro e único estresse com os ár-bitros na partida. A bola foi lá para o outro lado do campo de onde eu estava, e tinha sido passe incompleto. O jogo já estava parado, mas de repente recebi um safanão pelas costas. Um filho da puta me derrubou com o jogo parado. Nem vi quem foi o desgraçado. Levantei já reclamando com o juiz, que só per-guntou: – Você é jogador de linha? Você é jogador de linha? – indagou em meio aos cantos de incentivo da torcida pernambucana.– Mermão, sou running back! Isso é fal-ta, o jogo já estava parado!– Vá pra lá... Foi nada não – respondeu.Ainda arrisquei reclamar mais com o FDP da arbitragem, que usava vermel-ho, mas vieram os colegas de time e mandaram eu me afastar.

Natal Scorpions x Recife Pirates

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Ainda quero meu capacete e a calça pad (vestimenta com proteções na coxa, joelhos e outras partes) ainda não tive coragem de comprar. Meu bolso chora toda vez que tomo coragem, aí vem a covardia de volta. Prefiro ir me virando com uma calça leg feminina mesmo. É até irônico um esporte de brutamontes recorrer a calças femininas de ginásti-ca. Mas cada um, assim como eu, se vira com o que pode.E ainda tem as luvas. Essa é que estou longe de adquirir. Um simples par pode custar uma centena e pouco de reais. Sim, luvas. O que ela tem de especial é uma cola que, digamos, prende a bola na sua mão e outra vantagem é que evita que seus dedos quebrem com o contato

com a bola.Isso me faz lembrar meu segundo treino nos Scorpions. O lance era o seguinte: tinha de correr tantas jardas, fazer uma rota de corrida (uma determinada tra-jetória), virar e receber a bola.Pois bem... Corri para receber a bola, fiz uma rota, como o combinado; mas demorei a me virar. Quando olhei, o quarterback já havia lançado e aquele ovo laranja pontudo já estava na minha cara. Tentei agarra-lo, só que não fui rápido o bastante. A maldita bola acertou meu dedo mínimo (o dedinho) esquerdo e caiu no chão. A dor foi in-stantânea, meu dedo latejava. Depois ficou numa espécie de dor com dormên-cia. Não conseguia deixar ele esticado

devido a uma dor desgraçada. Até hoje estou aleijado.São acidentes de jogo. Mas não pense que é um horror jogar o futebol lá do “Tio Sam”. É no mínimo interessante; para mim, é prazeroso. Você dese-stressa quando dá uma pancada forte noutro jogador. E o melhor, na maioria das vezes não há ferimentos. Devido à verdadeira armadura que o atleta usa, dificilmente as contusões vêm como resultado de um choque mais forte. Já levei encontrão de todo os lados e ainda estou vivo (é difícil de acreditar).Sem contar as boas amizades que você pode criar. Jogador de futebol america-no, claro, fala muito do esporte, além das compras e vendas de assessórios e equipamentos de jogo. Mas tem outros assuntos também. Até sobre o futebol “brasileiro” se conversa. Fora isso, tem os assuntos normais do dia a dia. Com isso, dá para ter bons papos com a gal-era.

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PERFIL INDEFINIDO

Não há um padrão para se jogar futebol americano. Você pode ser gordo ou ma-gro; alto ou baixo; forte ou “raquítico”; ser barbudo ou não. Cada posição tem suas especificidades. Eu, por exemplo, sou baixinho e então sou running back.Um dos nossos capitães de ataque, o vice-presidente do time, Felipe Dantas (ou “Poya”, como é mais conhecido) é um sujeito com um porte físico, diga-mos, maior. Por isso é nosso “center” (o cara que lança a bola para trás, para o quarterback) porque ele precisa blo-quear os jogadores adversários. Bruno Morais é mais forte e bem mais alto. O garoto tem 16 anos, mas não tem que diga. Pela altura, ele é nosso tire end (jogadores de ataque mais altos). Por falar no vice-presidente, o nosso cam-isa #59 é uma das figuraças da equipe. Tem pouco mais de 1,70, tantos quilos, costuma usar barba, e é um dos car-as mais hilários dos Scorpions. O de-staque é seu temperamento: além de bem humorado e cheio de piadinhas, é pavio curto. Lembro-me do jogo contra os Pirates e dos gritos que ele dava.– Porra, mermão! Vamo atacar, vamo jogar, vamo dar o sangue nessa por-ra, mermão! – gritava Poya, na sideline

(tipo o banco de reservas), super nervo-so. A versatilidade do futebol america-no proporciona um fato que dificilmente vemos noutros esportes. Não precisa ser cheio de músculos, aquele estilo bombado de ser, ou magrinho feito pali-to, ou obeso para ser um jogador de fu-tebol americano. Por isso, qualquer um pode praticar o esporte. E engana-se quem pensa que no Brasil, o futebol da bola oval é um mero coadjuvante. Não! Pasme, Unimed, mas a modalidade ocu-pa nada mais, nada menos do que a déci-ma posição tanto no ranking de esportes mais praticados quanto de preferidos do

país pentacampeão de soccer. Segundo levantamento da empresa de pesquisa esportiva Delloite Touche Tohmatsu, feito em 2011, 3% dos entrevistados ale-garam praticar FA, enquanto que 7% confessaram ser seu esporte preferido. No que se refere à prática, o touchdown está à frente de modalidades tradicio-nais como basquete (2%) e handebol (1%). Um verdadeiro tackle (quando se derruba o adversário) nos ignorantes que não dão valor à modalidade, que conta com mais de 100 equipes regis-tradas pela Confederação Brasileira de Futebol Americano (CBFA).

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MEDO E DELÍRIO NA REVOLTA DO BUSÃO

TEXTO E FOTOS POR EVERSON ANDRADE

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“Podiam pedir de maneira educada, mas preferiram latir. Peguei a chave de roda que sempre re-solve esse tipo de situação por aqui.”/Matanza/

“Bomba de efeito moral, pra quem não tem moral de falar nada.”/Emicida/

Eu estive na #RevoltadoBusão que aconteceu ano passado, estive naquela que foi “A vitória”. Quando o Opressor se curvou ante a luta popular. E foram dias maravilhosos aqueles. Os estudantes de Natal caminhavam pela Avenida Salgado Filho, enquanto papel picotado caia do céu, os cidadãos da ci-dade cantavam coros em homenagem àqueles que tão bravamente lutaram pela redução da passagem do ônibus. Os oprimidos eram carregados nos camin-hões do Corpo de Bombeiros, a polícia abria o caminho entre os carros para a passagem dos heróis desta cidade. Nas capas dos jornais estavam fotografias com jovens impetrando palavras de or-dem, e nas páginas interiores, o repórter relatou tudo o que viu, e até levou em consideração alguns pontos negativos, alguns atos de vandalismo causados por uma minoria. Até mesmo o diretor de

jornalismo, quando não o próprio dono, escreveu um editorial de primeira pági-na ressaltando a importância de a pop-ulação ir às ruas reivindicar pelos seus direitos. Mas eu acordei logo depois, minhas pernas ainda estavam doendo da caminhada do dia anterior, minha pele ardia pelas queimaduras do sol, e eu não estava nenhum pouco disposto a mais um dia de trabalho depois de tudo o que caminhei. A verdade é que nada daquilo aconteceu. Principalmente a parte da vitória. Ela não aconteceu de fato, foi apenas um contra tempo, aliás, ela está tão longe de acontecer quanto o fim da corrupção neste país, ou em qualquer outro, principalmente aque-les que parecem perfeitos. Acredite se tudo está bonitinho, é porque o crime é muito bem feito, e não ficam pontas sol-tas.

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Este ano a passagem aumen-tou outra vez, e mais uma vez, os es-tudantes foram às ruas para forçar a sua redução. Só que dessa vez, amigo, eu ia contar tudo o que estava vendo, ou só o desejado. Atrás da maioria das conquistas populares existe apenas a descoberta de um novo caminho para continuar dominando, ou pelo menos uma retirada estratégica. Mas isso não se deve à inteligência dos empresári-os e políticos, alguns até são espertos, entretanto, a maioria é um bando de desajustados, principalmente quando estão sob pressão. A sorte deles é que seus inimigos sempre estão um passo atrás, são desorganizados, não sabem o que querem, e ainda por cima, nad-am na desunião. A nossa esperança no dia em que todos irão se cansar, e como bois correndo para arena vão descer pe-

las ruas quebrando tudo o que vêm pela frente, sem paciência para os bois que querem conversar. Quando o povo se ir-ritar, tudo vai cair por chão. Motivados pela Primavera Árabe, Occupy Wall Street e outros movimentos sociais dos que tem acon-tecido nos últimos anos, uma parcela dos jovens com as bundas grudadas na frente do computador decidiu sair ao primeiro motivo de luta, o que não é um erro, muito pelo contrário, é muito im-portante, embora ainda algumas coisas precisem ser revistas, como a organi-zação e o momento de se ter unidade. E o mais principal, artimanhas de defesa, contra aqueles que são pagos para de-fender. Alguns questionamentos devem ser levados em consideração como: Por qual motivo estou lutando? Qual a mel-hor forma de se chegar ao meu objetivo?

Quem eu estou seguindo? E o mais im-portante: Eu sei me defender da polícia? Ou saberei correr para direção certa quando o couro cantar? Como qualquer outro movimento nesta nossa geração, este surgiu na internet, Facebook e o Twitter foram as principais platafor-mas utilizadas para a disseminação das propostas, e a divulgação das ativi-dades. Um dos resultados disso foi mui-ta energia, e pouca sapiência no discur-so e muito menos nas ações. É claro que dentro de um movimento heterogêneo tem muita gente embasada, mas isso não representa nem cinquenta por cen-to de todo ele. Para falar a verdade, o a Revolta do Busão é dividida em diversas facções, alguns deles não admitem isso, mas é a verdade, e não admitir é um erro grave.

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Existem os filósofos, os estu-dantes de ensino médio, os radicais, os moderados, e uma senhorinha professo-ra universitária, esta, sempre pertinen-te. Os filósofos são estudantes univer-sitários que se refugiaram no paraíso da biblioteca Zila Mamede, e passaram tanto tempo lá, entre Marx e Rousseau, estudaram teses, argumentações, liv-ros, artigos e todo tipo de alimento, que suas mentes se transformaram em ver-dadeiras fábricas de boas ideias, porém todo esse tempo voltado para o estudo, não os ensinou a ler com clareza a re-alidade onde vivem, por este motivo, suas ideologias não são aplicáveis na sociedade X, nem na Y. Outro proble-ma desta facção é o ego, muitos deles reclamam dos políticos, e de quem os coloca lá, neste caso os mais pobres e sem educação. Mas eles não saem da frente de seus livros para transmitirem seus conhecimentos para essas comu-nidades. Claro, sigam o mestre, neste caso eu e toda a minha arrogância de inteligência. Os estudantes de ensino médio, em sua esmagadora maioria, algo em torno de 99,98% estão apenas para somar número, e para não ter aula. Isso de acordo com o meu Contador para Assuntos de Dados de Matérias Nada Parciais, um homem careca e com bi-gode, que também faz levantamentos de manifestantes para a Polícia Militar do RN.

Eles ainda não têm uma formação política formada, por isso é a única facção “temporária”, pois logo mais eles se tornarão qualquer uma das out-ras, ou então um ou outro vai ganhar um carro logo depois de passar no ves-tibular, e desses, uma parte vai ficar em casa xingando os protestos, que deixa o trânsito lento. Mas eles tem a sua importância para dar aquele volume. E isso numa fotografia de jornal conta muito. A classe dos radicais, ou como alguns se denominam Anonymus, só recentemente fizeram uma intervenção cibernética. Seria no mínimo engraçado ver no site da Seturn algo como:

“Perdeu playboys!” Ou “Obrigado Na-tal, nós te amamos por encher os nossos bolsos”.

Até onde a minha ausência de ignorân-cia pode me levar, Anonymus se refere ao anonimato das pessoas que com-põem este grupo, mas só eu conheço um quarto dos seus integrantes, e não duvi-do que qualquer outra pessoa não tenha conhecidos no movimento.

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Esta categoria gosta da guerra, eles e os moderados são os únicos que enfrentam a polícia, de maneiras difer-entes, pois estes ainda tentam reagir, ou outros desafiam nos argumentos, clamam por direitos humanos enquanto são espancados, mas não existe conver-sa quando um policial do Batalhão de Choque está munido de cassetete, balas de borracha, e botinas bem lustradas. Ainda assim, com toda essa agressivi-dade, na hora do pega pra capá, eles afi-nam, como todo mundo que não é besta. Se você questiona tudo, ou é da família Guarani Kaiowá, ou votou em Aman-da Gurgel para vereadora na última eleição, muito provavelmente seria um moderado. Essa é a gelara que fica mais perto do “normal” ou racional. Tirando a chatice de alguns nas redes sociais. Os moderados são os fiscais da mídia, sempre com opiniões contrárias aos jornais da cidade, e quando a imprensa “acerta” não fez mais que a obrigação. A palavra acerta veio com aspas, pois tudo varia de acordo com a intenção co-municativa. Bem, isso é uma coisa que se aprende na universidade, a qual eu poderia resumir explicando como “o que se quer dizer”, o que é bem óbvio. O problema não está na crítica feita, e sim como ela acontece. Estes críticos conhecem muito de comuni-cação na hora de falar mal dos jornais e da parcialidade dos mesmos, entretan-to, na hora de construírem seus posicio-namentos.

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A maioria deles são agressivos, gen-eralistas e mal embasados. A mídia comete seus erros, muitos deles por in-teresses, outros por construções socio-culturais dos jornalistas, ou então por se apegarem demais às regras da con-duta do profissional, como, por exemplo, a da fonte oficial. A mídia televisiva é ainda pior, seu posicionamento é ainda mais agressivo. Outro dia acompanhei a entrevista com um cientista político da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, e o entrevistador fez aquela típica entrevista, que deverá ser usada por toda a eternidade, durante todas as aulas de jornalismo, como uma manei-ra de não se entrevistar, a menos que a sua inteção seja deixar na cara a sua intenção comunicativa. Em outro caso, no meio do confronto com a polícia, um militar, chegou para o cinegrafista e apresentou um paralelepípedo, daque-les que são usados para calçar as ruas, ele afirmou ter sido arremessado por estudantes, os quais estavam há mais de 50 metros de distância.Sério, nem o campeão mundial de arremesso de peso vai conseguir arremessar este objeto a esta distância. Conclusões que eu tirei com essa matéria:

1-ESTUDANTES VÃO PARA A ESCOLA

OBTEREM SUPERFORÇA.

2-POLICIAIS VÃO PARA A ACADEMIA

APRENDEREM A MENTIR DES-

CARADAMENTE.

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Entretanto, boa parte dos

moderados que criticam a mÃdia, gos-

tam de acessar, e se embasar de infor-

mações tiradas de veÃculos nada im-

parciais, muito pelo contrÃrio, eles sÃo

tÃo parciais, ao ponto de sà existir uma

opiniÃo certa. A deles. Este veÃculo foi

fundado por um misto de pessoas que

podem ser consideradas moderadas,

e filosÃficas, que agora jà se formaram

e acham que nÃo tem mais idade para

apanhar.Todas essas diferenças sÃo

mais perceptÃveis nas plenÃrias. Ou pelo

menos naqueles que estive presente, e

o tempo de enrolaçÃo nÃo passou do lim-

ite do suportÃvel. Você pode achar que

é preguiça minha, pode até ser, mas

a verdade é que muitas pessoas usam

movimentos como estes de trampo-

lim para alguma coisa. E essa algu-

ma coisa tem nome: polÃÃiÃtica. Ou pelo

menos para aparecer. Ainda mais a

Revolta do BusÃo. Os movimentos que a

inspiraram como a Primavera Ãrabe, e

o Occupy Wall Street nÃo tinham lÃder.

Nos debates, e conversas internas,

algumas pessoas se destacam mais

que as outras, porém nÃo existia a in-

stituiçÃo de liderança formada. Ou pelo

menos uma comissÃo a quem deveria

se recorrer. Isso funcionou muito bem

lÃ. Até em SÃo Paulo teve um sucesso.

Aqui também dà para ver alguns pontos

positivos, principalmente na boca dos

componentes, mas ainda assim algu-

mas deficiências sÃo claras.

Page 23: Revis Shot! #0

Primeiro: nÃo tem organizaçÃo.

Toda essa diversidade de pessoas e in-

teresses leva a discrepÃncia de ações,

enquanto algumas pessoas apenas

caminham com faixas, outras que-

bram os Ãnibus. E quando as pessoas

do movimento sÃo questionadas sobre

essas ações, elas sempre respondem

dizendo nÃo poder fazer nada, pois o

movimento é aberto, mas eu me per-

gunto, nÃo seria necessÃrio pegar um

vÃndalo desse, e botar para fora, para

ele deixar de prejudicar um bem maior,

que o seu interesse de destruir? Eu sou

a favor do caos, mas na hora certa.

Segundo: nÃo ter alguém que

fale pelo ato. Isso é uma colher de sopa

para quem for da imprensa e tiver al-

guma intençÃo contrÃria ao movimento,

claro, pois é sà pegar uma pessoa sem

uma formaçÃo polÃtica decente e abrir a

tampa da privada, para que esta solte

suas merdas no bojo do microfone.

Terceiro, e o mais preocupante: a falta

de liderança é o sinÃnimo de uma cadei-

ra vazia, e algumas pessoas vÃo querer

sentar nela, ou apenas aparecer para

a mÃdia. No ato do dia 21 de maio, um jo-

vem relativamente alto, com sobrepe-

so, cabelo louro e cacheado, em todos

os momentos que eu o vi ele estava

se comportando como um lÃder, dando

ordens, dando ordens, dando ordens.

Bem essa era a parte da liderança que

ele estava exercendo.

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Mas ele não tinha essa com-petência, não o conheço, mas sei que ele não tinha a cara de um líder. Sim, líder tem cara, eu mesmo sou capaz de achar alguém que nasceu para ser um, na Avenida Rio Branco, com todas aquelas pessoas passando.Neste mesmo dia, este jovem lançou a regra, gritando para todos os que pas-savam pela portaria da governadoria:

NINGUÃM FALA COM A IMPRENSA!

NINGUÃM FALA COM A IMPRENSA.

Cerca de 300 metros depois a mesma criatura estava falando com todos os representantes da imprensa, menos eu. Esse tipo de gente deveria procurar um psicólogo, dentre os mil-hões de problemas que esta ação pode diagnosticar, a ausência de senso é es-colhida na mesa de apostas aqui. Com toda sinceridade, não compreendo o medo que todos eles tem da imprensa, os jornalistas são como alguns advogados, ele não mente, ape-nas encontram brechas nos fatos e dis-cursos, e omitem informações. E você manifestante é o culpado disso tam-bém, afinal, as brechas foram deixa-das por alguém. Então a preocupação deve ser de não deixar nenhuma ponta solta. Mas confesso isso é quase impos-sível. Ainda assim ele não deve deixar de falar de um manifestante quebran-do um ônibus, uma parada, ameaçando

o poodle de uma desavisada senhoria passando na rua. Neste mesmo dia após fazer a passeata pelas avenidas da ci-dade, pois um juiz proibiu a interdição da BR 101, os manifestantes seguiram para o centro administrativo aproxima-damente ao meio dia, com o sol a pino, quando debaixo de uma árvore, no cen-tro administrativo do governo do estado os estudantes preparam outra plenária, nesta, eles deveriam tomar a decisão do que fazer, entre algumas propostas a que mais me chamou a atenção foi de voltar, e fechar a BR 101, é claro que contrariar uma recomendação duvido-sa, de um juiz me agrada, entretanto, eu prefiro ficar com a facção moderada “não adianta ir para a BR, só apanhar!”. Já os filósofos, argumentaram dizendo numa revolução, algumas baixas são necessárias. Eu não sou contra ir para um protesto sabendo que a polícia es-tará lá, sedenta para descer o cacete em estudante desarmado. Mas se você sabe do projeto da Choque, aliás, não é segredo para ninguém, eu não gostar-ia de ir desarmado, ou desprotegido. E isso não é incitar a violência, é autode-fesa. Incitar a violência é falar para um policial “manter a ordem”. Mas você ir às ruas, sabendo que não será recebi-do com doces e chá, e sim com botina na cara e balas de borracha na perna, é melhor levar, no mínimo um escudo, afinal, onde existe ordem dentro de uma pancadaria ou massacre?

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Estar preparado é sim trabalhar para manter a ordem e o equilíbrio, pois poli-ciais armados e manifestantes de peito aberto, não tem cara de equilíbrio, é a mesma coisa de um Barcelona jogar contra o América no Barretão.O fato é que a luta não deve se concentrar em fatores pontuais como a redução de tarifas. Pois lutar por passagens mais baratas é uma espécie de tiro no pé, os empresários até podem baixar, e daqui

há mais 8 meses ou um ano, ela vai sub-ir outra vez, os estudantes tomarão as ruas, e apanharão, e brigarão, e ela vai baixar. E em menos de um ano tudo vai acontecer outra vez. Enquanto no meio disso tudo, eu continuarei pegando ôni-bus velhos, esperando horas por veícu-los nos finais de semana, sendo mal tratado por alguns motoristas que cum-prem duas funções, vendo empresários mandarem mais que vereadores. Outro

dia peguei um veículo, e alguns bancos foram tirados, para caber mais pessoas em pé. Sinceramente não vejo a hora de caminhões boiadeiros se tornarem transporte de primeira classe nessa cidade onde as pessoas são verdadeiro bezerros prontos para o abate, e o voraz predador não vai deixar nada, nenhum pedaço de osso, ou gota de sangue. É por isso que eu digo, vamos lá, vamos pegar tudo, pois é melhor eles que eu.

Nota do editor

Esta matéria foi escrita antes dos even-tos do mês de junho, os quais enchem de esperança os mancebos brasileiros, aguardando dias melhores no horizon-te. Esse editor também espera que esse dia chegue, mas prefiro pegar a cadeira e esperar sentado.

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Abandonar a vida em Nova York para trabalhar no San Juan Daily News, um jornal decadente da capital por-to-riquenha, não parecia ser a melhor ideia para o jornalista Paul Kemp. Com grande afinidade e relação próxima com a bebida, especialmente, o rum, a vida na ilha caribenha não foi tão árdua, principalmente devido às bebedeiras ao lado de colegas do jornal e dos momentos de amor vividos no Caribe.As fotos a seguir mostram um pouco do cotidiano de Paul Kemp em San Juan, capital de Porto Rico. Dominada pela crescente especulação imobiliária e pelos negócios de em-presários norte-americanos, a ilha caribenha apresentava,

ao mesmo tempo, os novos prédios voltados aos turistas, e as antigas construções, abandonadas e extremamente de-terioradas, junto à realidade de pobreza de grande parte da população local. Com dia-a-dia nas praias de San Juan, tran-sitando pelas ruas estreitas com prédios um dia ocupados, hoje deixados de lado, Kemp não costumava passar muitos de seus dias sem interagir com sua máquina de escrever, onde pôs muitos de seus pensamentos, sua rotina e efeitos de suas bebedeiras.

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Memórias de San

Juan

Personagem principal de “Rum: diário de um jor-nalista bêbado”, primeira ficção escrita pelo jornalista Hunt-er Thompson, Kemp é servido aos leitores como criatura mol-dada pela cabeça do pai do jornalismo gonzo. A semelhança do jornalista fictício com o estilo de vida do próprio Thomp-son, consumidor de todo tipo de drogas e admirador da con-tracultura, mostra uma personalidade forte daquele inspira-do no também norte-americano Ernest Hemingway – membro da “geração perdida”, comunidade de escritores expatriados em Paris, e contestador do fascismo espanhol, onde também viveu parte de sua vida. Nesse relato fotográfico, o leitor é convidado a conhecer um pouco mais de Paul Kemp e dos dias que passou em terras paradisíacas extremamente visadas pelos Estados Unidos em meados do século passado.

FICHA TÉCNICA DAS FOTOS:Fotos: Pedro Andrade e Yanna MedeirosModelo: Juão Nin

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A bazuca contracultural de Hunter Thompson

POR YURI BORGES, JORNALISTA

“Uma noite, no inverno de 1965, eu levei a minha moto – e um pas-sageiro – pro lado mais alto de uma estrada es-corregadia por causa da chuva ao norte de Oak-land. Eu entrei numa cur-va obviamente perigosa a uns 110 Km/h, esticando a minha segunda marcha. A pista molhada impediu que eu inclinasse o suficiente para compen-sar a tremenda inércia e, em algum lugar no meio da curva, percebi que a roda traseira não estava mais seguindo a diantei-ra. A moto estava indo para o lado na direção de uma rampa de trilho de uma ferrovia e não havia nada que pudesse fazer a não ser esperar. Por um instante, a sensação era de muita paz... E depois foi como ser atirado para fora da estrada por uma bazuca, mas sem nenhum barulho.”O trecho acima, do livro Hell’s Angels, em que o jornalista e escri-tor Hunter S. Thompson narra como se esbagaçou em sua moto, pode ser considerado como uma síntese de duas modal-idades de jornalismo surgidas quase que no mesmo período e profun-

damente inspiradas pelo movimento de contra-cultura das décadas de 50 e 60: o Novo Jornalis-mo e o Jornalismo Gonzo . Mas Hell’s Angels, por ser uma espécie de obra de transição de Thomp-son, ajuda a demonstrar mais do que isso: expli-ca as diferenças entre o Novo Jornalismo e o Gonzo e explica porque foi ele, Thompson, – e não Capote, Talese ou Mail-er, por exemplo – quem levou a contracultura às últimas conseqüências em sua obra jornalísti-co-literária. O livro foi pub-licado originalmente em 1967 e trata dos grupos ou gangues de Hell’s An-gels, que na década de 60 foram alvo de grande es-tardalhaço por parte da imprensa americana e po-voaram o imaginário da população do país como perigosos malfeitores. Thompson desvenda os exageros e mitos criados pela imprensa da época a respeito deles e expli-ca como surgiram e o que eram essas gangues de motoqueiros. Mas o grande lance é que o livro não é um amontoado de relatos

de segunda mão – como tão freqüentemente costuma continuar a ser o jornal-ismo – nem uma tese de antropologia, apesar de ser tão profundo quanto uma e com certeza mui-to mais vibrante. Hell’s Angels é um livro feito a partir de uma técnica chamada “imersão na realidade” ou “captação participativa”.Isso quer dizer simplesmente que, para escrever sobre os caras, Thompson prati-camente virou um deles: passou a conviver com eles diariamente durante cerca de um ano, a rodar em cima de sua própria motocicleta e a ver pes-soalmente como eles viv-iam e o que faziam. Até aí se trata da mesma técni-ca fundamental do Novo Jornalismo, que incluía, ainda, outros procedi-mentos constitutivos. Mas Thompson ainda extrapolaria ainda mais na “imersão” e é aí que se encontra a pedra de toque que iria distin-gui-lo dos novos jornalis-tas. Ele terminaria por se tornar o protagonista de suas histórias, inverten-do completamente a lógi-ca jornalística. Isso fez com que inclusive outras

características – presentes em Hell’s Angels – se exacerbassem depois, em liv-ros como Medo e Delírio em Las Vegas (1972). Dentre elas está 1.) a utilização do narrador em primeira pessoa, 2.) o consumo de drogas e a descrição dos acontecimentos a partir deste pon-to de vista, 3.) o uso do sarcasmo e/ou vulgaridade como forma de humor, 4.) a dificuldade de discernir ficção de reali-dade e 5.) a tendência de se distanciar do assunto principal ou do assunto por onde o texto começou, ou seja, o mote jornalístico inicial.Thompson teve colhões suficientes para, primeiro, renegar o jornalis-mo convencional – e simultaneamente afrontar os literatos. Mas isso já havia sido feito pelos novos jornalistas. Ele, então, resolveu ir além do que se faziam no Novo Jornalismo e foi fundo na sub-jetividade, a ponto de mandar a regra número um do jornalismo, a referencial-idade, pras cucuias. Sua obra foi parar num limbo entre jornalismo e literatura e literatura confessional, confrontando, ao mesmo tempo, as regras de todos eles e demonstrando quão frágeis podem ser vários de seus parâmetros. Assim como queriam vários dos movimentos con-traculturais, ele consegue questionar discursos sociais (nos quais se incluem discursos profissionais também) cris-talizados e desfazer determinados lim-ites ou linhas divisórias pré-estabeleci-das pela tradição. É claro que tudo isso teve seu preço, que pode ter a ver com a sua morte por suicídio, com um tiro na cabeça, em fevereiro de 2005.

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Entrevista

CIENTISTA CABEÇA

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Os anseios, lembranças, opiniões, declarações do famoso e polêmico neurocientista brasileiro, Sidarta Ribeiro, diretor do Instituto do Cérebro da UFRN.

TEXTO POR FELIPE GALDINOFOTOS POR AURA MAZDA

Saí da redação apressado... Não podia me atrasar. A assessora de im-prensa foi bem clara ao tele-fone: “Chegue na hora porque ele é muito atarefado”. Pois bem. Dirigindo mais rápido que podia em Natal, a ci-dade em que estrutura de trânsito parece trafegar num caminho distinto da organização, acabei por che-gar dez minutos antes da hora marcada. Era 13h50 em Natal e a Cidade do Sol fazia jus a sua alcunha. Estava um calor danado naquela tarde. Não sei ao certo se porque eu estava um tanto quanto nervoso. Eu era acompanha-do da fotógrafa Aura Mazda e iríamos entrevistar um dos caras mais fodásticos do país, quiçá do mundo. Che-gamos, estacionei minha Parati ano 1997 nos confins da Avenida Nascimento de Castro no cruzamento com a Avenida Xavier da Silveira.Estávamos no Instituto do Cérebro e nossa intenção era

conversar um pouco com o neurocientista, capoeirista e legalizador Sidarta Tollen-dal Gomes Ribeiro. Rapida-mente fomos atendidos, mas não pela figura que seria a entrevistada da tarde. Corri na minha velha Parati para nada. O homem ainda estava dando uma aula. Passado alguns minutos, quando ela finalmente acabou, pensei que fosse a hora. Não foi. A assessoria dele disse que o cientista estava com fome e iria almoçar antes.Minutos depois, chegou a hora. Fomos para a biblio-teca do prédio e esperamos um pouco mais. Então surgiu um homem de pouco mais de 1,70 metros, cabelo bem curto, grisalho. Lá pros seus 40 anos. Descobri que são 42 anos. Ali era Sidarta Ribeiro, o brasiliense que cursou Bi-ologia na universidade lo-cal, se mudou para o Rio de Janeiro para fazer mestrado em Neurociência, saiu do país para ser doutor na Uni-

versidade de Rockefeller, em Nova York, e fazer uma pós na Universidade de Duke, na Califórnia. Ele cumprimen-tou a todos na sala e sentou, demonstrou simpatia. Pron-to, a entrevista iria começar. Antes de conhecê-lo imag-inava que Sidarta fosse como quase todo cientista ou professor universitário, que parecem ter a “Síndrome de Estrelismo”. Os caras se acham o próprio Sol. Não o cientista de Brasília. Antipa-tia não dá para dizer que faz parte de sua personalidade.Bem, vem agora uma pequena entrevista com Si-darta Ribeiro, do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte desde 2011, quando o prédio foi inaugurado.- EU: O nome do senhor é

um pouco diferente... ÃSi-

dartaÃ... O senhor sabe

o porquê seus pais optaram

por ele?

= Sidarta Ribeiro: “Minha mãe escol-

heu esse nome. Ela veio de uma família meio liga-da ao budismo e meu avô era da teosofia, uma es-pécie de religião, não sei, e tem um livro chama-do ‘Siddharta’, do Hermann Hesse, que é a história do Buda e meu pai gostou”.- O senhor é religioso?

SR: “Não, sou cientis-ta. Na verdade eu acredi-to em todos os deuses, mas todos eles moram dentro da minha cabeça; não acho que tenha nada [espiritual] fora de mim”.- O senhor é capoeirista, nÃo

é? Como o senhor entrou

nessa?

SR: “Eu entrei quando es-tava no doutorado lá em Nova York. Lá é que come-cei a aprender capoeira. Ago-ra sou professor, mas lá pros 50 anos, se der certo sou me-stre... Se o joelho aguen-tar (risos).

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Cigarro

SR: “Acho que um bom ex-emplo é o que acontece com o tabaco. Ele é a única dro-ga cujo consumo realmente decresce nos últimos dez anos, isso acontece não porque foi proibido, acontece porque ele foi submetido a uma campanha de esclare-cimento. Você vai comprar se cigarro e vê lá a infor-

mação que aquilo causa câncer, e isso tem efeito. Doze anos atrás o con-sumo de cigarro no Bra-sil era de 47%, hoje é de menos de 15%. Você não conseg-ue isso com a proibição, mas com a informação. A proi-bição é a pior das formas de acabar com as drogas porque toda droga tem três eixos de

ação: a substância, que é o que a pessoa ingere; o cor-po do cara que vai receber a substância, e a terceira é o contexto social. A proi-bição agrava o eixo da sub-stância porque a pessoa nun-ca sabe o que tá ingerindo e qual a dose certa e é aí que vem a overdose; o eixo do cor-po é péssimo porque haven-

do a proibição não há debate aberto sobre os tipos de ris-co, não há um estudo pra saber se o cara é alérgi-co a cannabis; e no eixo da so-ciedade não preciso nem diz-er porque pra proteger o usuário a polícia vai e mata... que beleza. Eu faço parte de um grupo que é a fa-vor da mudança”.

Acho que isso é uma coisa nova... Brasile-iros que aprenderam capoe-ira fora do Brasil e hoje em dia dão aulas de capoei-ra no Brasil. A capoeira tá no mundo todo. Quando eu tava no Brasil, eu me sentia velho demais, gordo demais e não flexível suficiente pra

fazer capoeira; e quando eu tava lá com os gringos pen-sei: ‘Bom, se eles podem, eu também posso’ (risos)”.- Mas a capoeira trouxe al-

gum benefÃcio pra o senhor

como cientista?

SR: “Muitos. Sempre digo isso: capoeira e ciência têm dois pilares comuns, que é a

alegria e a disciplina. Você não faz ciência sem alegria e não faz sem disciplina. Você também não faz ca-poeira sem as duas coisas. A capoeira te dá a capacidade de cair e levantar.... venc-er é fácil, todo mundo sabe vencer, o difícil é perder, e a capoeira é um treinamento

de perder e levantar sorrin-do e continuar jogando”.- Uma coisa que foge um pou-

co, mas nem tanto, da ciên-

cia é a questÃo da legalizaçÃo

da maconha. O senhor é

bem engajado nisso. O sen-

hor acha que o Brasil estÃ

preparado para essa mu-

dança?

SR: “Acho que o Brasil está despreparado para manter a proibição. A proibição cus-ta muito em perdas de vi-das... Tem muita gente na cadeia à toa, morta à toa. A proibição é um desastre; qualquer mercado negro é um desastre. E não sou fa-vorável à legalização da maconha, sou favorável à le-galização, regulamentação e taxação de todas as drogas. Não tem nenhuma razão pra algumas drogas serem liberadas e outras não. Todas elas tem benefícios e malef-fícios e isso tem que ser in-formado pra população. Uma das drogas mais perigo-sas que temos é o álcool, por outro lado é uma droga com benefícios maravilho-sos... Você faz uma festa sem álcool e veja como é chata. Esse discurso moralista de ‘Ah, essa droga é o demônio’ e a outra ‘Ah, que maravil-ha’... O álcool e o tabaco são uma maravilha e o outro é o demônio tá errado.

“Não sou favorável à legalização da maconha, sou favorável à legalização, regulamentação e taxação de todas as drogas. Não tem nenhuma razão pra algumas drogas serem liberadas e outras não”

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OEA

SR: “Tem um documen-to da Organização dos Estados Americanos [OEA] dizendo que a proi-bição não dá certo, ela é mui-to mais deletéria do que as drogas; com as drogas a gen-te lida, a humanidade só é o que é por causa das drogas. Sempre vai haver o individ-uo que abusa... tem o abusa-dor de álcool e de açúcar, uma droga pesada, altamente vi-ciante que as pessoas com-pram livremente”.- Para o senhor o que faz

a sociedade ser tÃo Ãparanoi-

caÃ?

SR: “Isso é uma reali-dade histórica, não foi sem-pre assim. Isso aconteceu nos anos 1910, nos Estados Unidos, no protecionis-mo americano... Eles pri-meiro proibiram o álcool, e os resultados foram desas-trosos, o maior índice de criminalidade nos Estados Unidos foi durante a proi-bição, com Al Capone e toda a máfia ligada ao merca-do negro, e depois que eles voltaram atrás, passaram a proibir as drogas que eram utilizadas pelas classes marginalizadas. A maconha era usada por mexicanos e negros, e a co-caína principalmente por negros, então demonizaram essas drogas e passaram a glorificar o álcool como a droga de todos. As pessoas não fazem ideia que nem sempre foi assim. Se você for em 1972 perguntar sobre o divórcio, as pessoas iri-am falar que era do demônio, e no entanto o divórcio vir-ou lei. A mesma coisa do ho-mossexualismo, que era um tabu enorme há 20 anos e hoje em dia não é mais”.- O senhor usa essa questÃÃÃÃao

das drogas nas suas pesqui-

sas?

SR: “Eu não pesquiso can-

nabinóide ou tenho tra-balhos publicados, não por falta de curiosidade, mas porque é muito difícil ob-ter essas substâncias. A gente consegue substân-cias ilícitas um tempo atrás, mas foi uma dificuldade. Há um problema danado e isso gera coisas engraçadas porque eles dizem que não podem legalizar porque não há pesquisa, mas não há pesquisa porque não é legalizado (risos). Boa parte do que fazemos na neuro-ciência é estudo de substân-cias no cérebro. Por isso pra a gente é muito estran-ho que umas sejam proibi-das e outras não, porque a gente sabe que são to-das elas substâncias com ações específicas. No meu cérebro e no seu cérebro está cheio de substân-cias cannabinóides, a gen-te produz essas substân-cias”.- Por que o senhor resolveu

seguir pela Ãrea do sono, do

sonho e da memÃria?

SR: “Fui fazer doutorado em Nova York pra trabalhar com canto dos pássaros, como os pássaros aprendem a cantar e como guardam na memória. Mas logo quando cheguei eu tive um período de uns dois meses em que eu não conseguia ficar acorda-do; ia pras aulas e dormia, ia pro laboratório e dormia, cheguei a dormir 16 horas por dia. Eu ia pras aulas e não entendia direito, foi mui-to difícil. Foi num inverno, cheguei em janeiro. Fiquei assustado, achando que não fosse conseguir. Eu chegava a ficar calado pra ninguém perceber que eu não tava entendendo nada; aí quan-do veio a primavera passei de um estado de nenhuma adaptação pra um de muita adaptação. Em uma sem-ana saí de um desconforto

enorme pra um conforto de entender tudo, saber o que tá fazendo e as coisas darem certo no laboratório. No in-ício pensei: ‘Ah, o sono tá me sabotando’. Só que depois eu percebi que o sono não estava me sabotando, tava me preparando. Eu tava pas-sando por um momento difí-cil: eu tava longe da família, sozinho, num país diferente com língua diferente, um frio danado, cheio de neve com pouca luz. Meu corpo tava sofrendo e o sono tava me preparando. Me interessei por isso e fui procurar um livro do famoso [Eric] Kan-del. O livro dizia que a gente sabe bem o mecanismo que leva ao sono, mas não sabe o porquê do sono existir. Pensei que se um cara como ele, que ganhou um Nobel, tá dizendo que ninguém sabe, então é um bom lugar pra trabalhar, já que ninguém

sabe de nada. Comecei um projeto em paralelo onde us-ava a expressão gênica em ratos dormindo pra saber como o sono trabalha com a memória. Aconteceu que ao final de cinco anos e meio, tempo do meu doutorado, acabei optando por esse out-ro caminho”.- Houve outros problemas de

adaptaçÃo no exterior?

SR: “Quando eu estava no pós-doc, na época do ataque de 11 de setembro, em 2001, passei a ver coisas que eu não gostava. O país ficou muito conservador, repres-sivo, muita paranoia e vi-olência. Não me atrapalhou diretamente, mas senti que algo mudou. Meu vizinho na Carolina do Norte, após o ataque botou um adesivo no carro dele que dizia algo do tipo: ‘Pega a gasolina deles e joga uma bomba no traseiro deles’.

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E ele sabia que eu era brasile-iro, aí passei a ficar preocu-pado como esse cara estaria me olhando. Eu morava no sul, mais conservador e essa foi a experiência de estar no meio daquilo”.- O Instituto Cérebro vem

sendo seu foco pessoal e

profissional. Como està o in-

stituto apÃs esses dois anos?

SR: “Estamos muito bem di-ante das circunstâncias. Há dois anos esse prédio aqui era uma casa vazia, hoje os laboratórios estão todos montados, tá tudo funciona-ndo, estamos num processo de crescimento acelerado. Quando a gente começou eram 90 pessoas, hoje são 157. E atrai pessoas de fora do país, aqui no prédio tem pessoas da Suécia, Ale-manha, Argentina, Portugal, Tunísia, Colômbia; então é um ambiente muito interna-cionalizado. Existe um mov-imento de neurociência hoje em Natal fortíssimo e isso não existia antes; existia al-guma pesquisa de neurociên-cia na UFRN, na fisiologia, mas era um pessoal fazendo neurociência num ambiente que não é de neurociência. Agora temos um grupo só dessa área”.- Eu: Podemos dizer que

mesmo com apenas dois

anos de existência o in-

stituto do cérebro jà é uma

referência nacional ou até

mundial?

SR: “Nacional sim, claro que não são dois anos porque na verdade esse projeto tem 15 anos. Foi um processo que culmina na criação do in-stituto há dois anos. Mas, internacional não. Nossa produção é de nível interna-cional porque a gente publica nas melhores revistas que existem, só que enquanto a gente faz um gol, os gringos fazem 100 gols; então se-ria uma ingenuidade minha a gente falar que somos

referência internacional”.- E o que falta pra estar en-

tre os melhores?

SR: “Ah, falta muito. A gente está pros americanos assim como a Bolívia está pro nosso futebol brasileiro”.- Mas isso é por falta de in-

centivo do governo?

SR: “Não, o governo está dando incentivo, estamos com dinheiro. Não tá faltan-do dinheiro, não tá faltando equipamento... A questão é da formação intelectual do povo brasileiro. Temos um ensino básico péssimo, ensino médio péssimo, uni-versidades que também não são tão boas... Não tem como ter uma pós-gradu-ação de alto nível se a base é ruim. Hoje em dia tenho uma visão mais crítica. Quan-do vim pra cá há sete anos, eu tinha um discurso mui-to utópico: ‘Vamo fazer isso aqui, vai ser revolucionário e vamo tomar a liderança!’, mas hoje depois de sete anos, vejo que a gente avançou, só que falar que vamos ganhar o campeonato é diferente. No Brasil o que não falta é dinheiro, a gente compra um equipamento e eles só chega daqui a um ano. Nos outros países se eu pedir chega em um dia. Assim fica difícil, e a ciência é baseada em quem chega primeiro à verdade. O caminho pro Brasil se tornar cientificamente forte é lon-go, mas estamos caminhan-do nessa direção”- Enquanto Ãs pesquisas do

instituto, estÃo avançadas?

SR: “Vemos um monte de resultado. O trabalho da pesquisa é algo que culmina no artigo científico. Um ano de trabalho que se transfor-ma em quatro ou cinco pá-ginas. Cada professor tem várias pesquisas rolando e uma hora chega ao ponto de conclusão e é publicada. Temos tido uma produção bastante alta, mas na ver-

dade o que conta pra a gente não é o número de artigos, mas sim o impacto que eles promovem. A qualidade é que é relevante. Um pouco do problema do Brasil é que privilegiamos por muitas dé-cadas a quantidade. O pes-soal comemora sermos o 13º país do mundo em número de artigos publicados, mas o número de artigos publica-dos não significa absoluta-mente nada porque se você escrever algo que ninguém cita, do que adianta fazer? Nossa ênfase aqui é na qual-idade; não quero publicar 20 artigos por ano... Se eu puder publicar um artigo por ano, mas que ele seja revolu-cionário, tá ótimo.

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Então vamos nessa direção, que é um pouco contrária ao que o pessoal faz em outros lugares por aí”.- Já há aplicações práticas, professor?SR: “Tem... Uma, que é meu xodó porque é um trabalho nosso, é um método pra faz-er diagnóstico diferencial em psiquiatria, no caso, de pa-cientes psicóticos utilizan-do apenas a fala. Aquilo que eles falam é gravado e anal-isado matematicamente, um programa totalmente feito aqui pelos nossos técnicos. A gente descobriu que se você perguntar pro paciente como foi o seu sonho, o que ele fala é altamente revelador sobre o tipo de paciente que ele é. Mas se eu perguntar a esse paciente ‘como foi seu dia on-tem?’, isso não acontece. Em outras palavras: tenho um maníaco, um esquizofrêni-co e uma pessoa ‘normal’... se eu perguntar a eles sobre o dia, é mais ou menos pare-cido o resultado, mas quando você vai falar do sonho, aí os resultados são completa-mente distintos”.- Como é a situaçÃo cientÃfica

do Brasil na América Lati-

na?

SR: “Hoje o Brasil é mais im-portante cientificamente na América Latina do que há 20 anos. Mas o problema do Bra-sil é como transformar todo o dinheiro em ciência boa. Por muitos anos achávamos que o problema fosse a falta de dinheiro, e agora que o din-heiro é um problema menor, estamos vendo que tem out-ras questões que o dinheiro não resolve. Agora, o que acho que resolveria isso em um longo prazo seria colocar os salários dos professores do Ensino Fundamental num mesmo patamar dos profes-sores universitários. Num longo prazo atrairia pessoas com vocação e talento para

o básico, e em vez de um fim de carreira, a profissão seria uma carreira promissora; eu acho que no final das contas essa é a diferença; não são os métodos pedagógicos, mas sim o fato de as pessoas que estão dando aula pras cri-anças serem pessoas ou to-talmente idealistas e loucas ou que não tem perspectiva pra vida porque o salário é muito baixo”.minha opinião, paciência; então vamo trabalhar pra que na próxima tenham 20 mil estudantes. Quando o governo fala que vai mandar 100 mil pessoas ele tá pen-sando: ‘Tá bom, mesmo que 80 mil não deem em nada, 20 mil vão dar’. É nisso que tão falhando. É um investimento em educação, mas é a mel-hor forma de fazer? Acho que não. Acho errado que falte bolsa dentro do Brasil e você tenha bolsa pra trabalhar em qualquer lugar lá fora sem a pessoas estar quali-ficada. Mas é um programa ajustável”.- Serà que a questÃao religiosa

tÃo predominante aqui atra-

palha esse desenvolvimen-

to?

SR: “É possível que sim, mas eu acho que essa não é a causa. Nos EUA tem muito conservadorismo religioso e a ciência é muito boa. A Ar-gentina que é nossa vizinha tem uma ciência muito boa e lá o catolicismo é fortíssimo. Claro que se a pessoa é muito religiosa e anti-ciência ela não vai se voltar pra ciência, mas o problema é a educação ruim. Se a gente tivesse o mesmo número de religio-sos, mas tivesse uma edu-cação boa, não seria assim”.

“Temos um ensi-no básico péssi-mo, ensino médio péssimo, uni-versidades que também não são tão boas... Não tem como ter uma pós-graduação de alto nível se a base é ruim”

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- E como é a relaçÃo do In-

stituto do Cérebro com a

UFRN?

SR: “No âmbito das universi-dades brasileiras e no âmbito das universidades pequenas, porque a UFRN é pequena, a universidade tá bem; há dez ou doze anos ela era uma das últimas no ranking e hoje no Nordeste é a primei-ra, e tá subindo. Recebemos um grande apoio da univer-sidade pra construir o que temos hoje e pra construir o que queremos ter daqui a cinco anos. Por outro lado, se olharmos criticamente pras universidades federais, que são as melhores no país, tirando a USP e Unicamp, é tudo muito ruim, comparado

a Estados Unidos e Europa Ocidental. Isso tem que ser dito pra chegarmos onde a gente quer chegar. Se você quer comprar um equipa-mento no Brasil, demora, é uma burocracia danada, você tem que comprar o mais barato, que é o pior; isso só pra dar um exemplo. Então estou muito feliz por ser pro-fessor da UFRN, fico feliz por ser de uma universidade que quer evoluir. Só que querer é uma coisa, e conseguir de fato é outra. Mas é uma coi-sa que vai mudar na prática, com o tempo. O que temos que criar no Brasil é uma ‘nova cultura’ e isso começa no segmento público. O públi-co tem que ser melhor que o

privado”- O que o senhor acha que

deva mudar no Programa

Ciência Sem Fronteiras?

SR: “O projeto é correto e a direção correta, a gente tem que internacionalizar nos-sa ciência: mais gente daqui lá fora e vice versa, agora, o governo fez isso numa escala muito grande e isso faz com que exista um descompasso no número de pessoas des-qualificadas que podem ir. Não adianta você oferecer a um aluno algo que ele não está apto a aproveitar. Você tem uma pessoa que não tá preparada e joga ela na mel-hor universidade do mundo, ela vai sofrer muito e não dar conta; você pega um cara

que só joga bola num camp-inho aqui do lado e bota ele num time de futebol grande, ele não vai durar. Então é um pouco isso que tá aconte-cendo. Outra coisa que acon-teceu e tá sendo corrigida é que as pessoas começaram a receber bolsa pras univer-sidades que não são muito boas, pra laboratórios não muito bons em país que não são referência na ciência. É um equívoco. Isso foi iden-tificado, eu senti que estão falando disso. O Ciência Sem Fronteira deveria ser volta-do pras universidade de ex-celência e pros alunos tam-bém. Ah, mas aí se tem 10 mil, não tem 100 mil... na

“Há um problema danado e isso gera coisas engraçadas porque eles dizem que não podem legalizar porque não há pesquisa, mas não há pesquisa porque não é legalizado (risos)”

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minha opinião, paciência; então vamo trabalhar pra que na próxima tenham 20 mil estudantes. Quando o governo fala que vai mandar 100 mil pessoas ele tá pen-sando: ‘Tá bom, mesmo que 80 mil não deem em nada, 20 mil vão dar’. É nisso que tão falhando. É um investimento

em educação, mas é a mel-hor forma de fazer? Acho que não. Acho errado que falte bolsa dentro do Brasil e você tenha bolsa pra trabalhar em qualquer lugar lá fora sem a pessoas estar quali-ficada. Mas é um programa ajustável”.- Serà que a questÃao religiosa

tÃo predominante aqui atra-

palha esse desenvolvimen-

to?

SR: “É possível que sim, mas eu acho que essa não é a causa. Nos EUA tem muito conservadorismo religioso e a ciência é muito boa. A Ar-gentina que é nossa vizinha tem uma ciência muito boa e

lá o catolicismo é fortíssimo. Claro que se a pessoa é muito religiosa e anti-ciência ela não vai se voltar pra ciência, mas o problema é a educação ruim. Se a gente tivesse o mesmo número de religio-sos, mas tivesse uma edu-cação boa, não seria assim”.

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A MINHA VAQUEJADA FOI: TEXTO E IMAGENS POR EDGAR SABINNO

Antes de tudo, queria avisar, esta é a matéria que eu mais sonhei para essa revista, por isso, leia-a com respeito, ou então se você leu Crepúscu-lo tenha o escrúpulo de ir até o final.Du-rante as reuniões de pauta para a revis-ta eu sugerir, acatei e me pautei de fazer uma matéria sobre as vaquejadas. Não sei se essa ideia veio mais influenciada pelo clássico do gonzo “The Kentucky Derby Is Decadent and Depraved”, ou ainda pelo livro O Sol Também se Le-vanta, de Ernest Hemingway, o qual estava lendo naquele período, ou ainda influência de meus tios que correm em bolões amadores no interior do estado. Independente disso ela foi aceita, e eu me deleguei para fazê-la. A primeira corrida selecionada para cobrir foi a grande Vaquejada de Macaíba, porém, devido a contratempos não foi possível acompanha-la

Então ficou decidido: Vou co-brir uma etapa do maior circuito amador do Brasil, no dia 26 de maio, em Monte Alegre. Porém, meu amigo, esta viagem começou no dia anterior, no sábado. Um dos maiores grupos de samba es-tava escalado para fazer o seu primeiro show em Natal, o Casocomsuaprima, se apresentaria na Praia Sol, na Via Inte-riorana de Natal, e isso se tornou uma preocupação para mim. Como conciliar as duas coisas? Você pode dizer:

-Mas é vai ser uma num dia e outra em outro, não tem problema.

Jovem andarilho do caminho do conhecimento, cada um conhece a vida e o carma que carrega..

Mas nós passamos por cima disso, superamos as barreiras e chega-mos à casa de Cassius. Não encontrei ninguém lá. Estava todo suado, pois o Fusca ainda vem com um bônus de es-tar numa sauna, o sol parecia estar a 30 metros de altura, era possível sen-tir minha pele borbulhando de calor. A casa estava vazia e onde estava todo mundo estava na casa de Edmundo, pri-mo de Cassius e amigo nosso. Uma coi-sa é ir para um lugar que você conhece, outro é seguir para outro que você não sabe onde fica, ainda mais nas minhas condições. Prestar atenção no trânsito e procurar um lugar desconhecido é de-mais para mim. Mas chamei a responsabilidade e saí. Chegando à casa de Edmundo, todos estavam reunidos assistindo ao jogo e, como é de lei to-mando cerveja. Fui logo servido, e com todo aquele calor, ela desce saborosa-mente, veio a próxima, e a próxima, até que todos atentaram para um detalhe: eu estava dirigindo! Vamos lá ver o fus-ca, beleza, a chave está aí na mesa.

NÃO! ELA NÃO ESTÁ AQUI! ONDE ESTÁ ESSE CARALHO?!

Desesperei, porém um lugar era certo... Dentro do carro.Saí desesperadamente enquanto na minha cabeça algo falava, sorrindo:

-Sua primeira vez, e já vai fazendo mer-da! Kkkkkkkkkkkkkkk Seu bosta! Kk-kkkkkkkkkkk

Ainda assim não deixei de ir, afinal, este é o jornalismo gonzo, quan-do você deixa de fazer alguma coisa por causa de uma matéria? Se fosse assim não estaria sendo sincero com o meu trabalho. E se tem uma coisa que eu tenho de cumprir aqui, e a originalidade com o estilo. Devido à essa matéria fiquei com responsável por um fusca 79, vermelho, o qual já teve dias melhores, logo depois da reforma passada por ele há uns 7 anos atrás. Agora ele voltou aos anos das vacas magras. Por incrível que pareça, ele ainda chama a atenção de algumas pessoas quando passa. De-talhe, a minha habilitação foi tirada em agosto de 2012, e desde esse dia, nunca tive o carro liberado para sair sozinho para Natal. E essa deveria ser a primei-ra vez. O plano é o seguinte: ir de ônibus até a casa de Cassius, um amigo meu, e de lá ir para o show, na volta, eu deveria passar a noite lá, e logo cedo voltar para casa, para esperar o meu pai, e ir com ele para a vaquejada. Simples e claro.

No primeiro momento foi tran-quilo, fui até a casa de Cassius sem muito imprevistos, deveria chegar lá de tarde para vez a final do campeonato europeu de tênis de mesa. É difícil das pessoas entenderem, mas você pode ter toda a confiança do mundo, entretan-to se algumas pessoas específicas, não depositam a mesma fé em você, tudo o que você e seu psicólogo trabalharam vai por águam abaixo. E por isso deixei o carro morrer em um dado momento. Mas isso não foi nada, comparado ao fato de ele não querer ligar mais e uma fila de pessoas buzinando logo atrás. Sem falar desta cena acontecer num cenário de um trecho em reformas.

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UM FUSCA, ALGUMAS CERVEJAS, SAMBA, E UM PNEU FURADO

Quando cheguei ao lado do car-ro olhei nos bancos e nada. A luz atra-palhava, pois o reflexo não me deixava ver o que tinha dentro do carro, ainda assim consegui ver, muito mal, a chave ainda na ignição. Neste momento voltei para a casa, e avisei o que tinha aconte-cido. Entre risadas sugeriram esperar a chegada de um bugy, quem sabe a chave funcionaria. Mas eu sabia que não ia dar certo, pois as chaves da ignição e da porta são diferentes, e qualquer Bugy Selvagem não tem porta. Eu estava fer-rado. Adeus vida social! Parabéns seu idiota! Fui para a rua tentando usar alguma habilidade criminosa, oriunda do lugar de onde eu venho, quem sabe tenha pego algo por osmose, ou pelo ar. Mesmo não sendo a melhor pessoa do mundo, para algumas mães da vizin-hança, eu sou um exemplo a ser seguido pelos filhos. Deixe-as pensando assim. O segredo de não ser condenado é ter um bom histórico, e sempre testemu-nhas de seu comportamento impecável. Tentei puxar os vidros para baixo, mas eles eram elétricos, por isso seria quase impossível. Já estava desistindo quando fiz minha última investida. Dessa vez, nos quebra vento. Se você não sabe o que é um, é uma parte do vidro, porém ele é separado e tem movimento indepen-dente, e trava separada também. Para a minha sorte, um deles estava quase ab-erto, bastava fazer uma pequena força, e a gravidade faria o resto puxando a trava para baixo.

Desta vez o meu plano funcionou. E con-segui abrir a porta. A chave estava sal-va. Travei tudo novamente e saí.Novamente suado, sentei e fui tomar mais uma, dei um gole, e parei.

PUTA QUE PARIU!!!!

Percebi que estava usando a minha carteira de motorista provisória, estava bebendo e tem uma maldita de uma lei seca fudendo qualquer um desgraça-do que saia de casa dirigindo e bêbado. Bêbado nada, basta ter cheirado antis-séptico bucal. E tenha uma boa estadia na cadeia, ou pague a fiança para re-sponder em liberdade. Se você não tem a grana o jeito é vender o seu carro para pagar ou então fazer amizades com a nova vizinhança.Parei naquele momento. Além do mais não deve ter muita sorte. Eu estava no bairro vizinho, o máximo que faria seria cruzar a BR.Durante o jogo conversáva-mos sobre várias coisas. Então surgiu a primeira questão: qual é o motor desse fusca? 1600. E qual é o ano? Não sei, mas deve ter no documento.

NÃAAAAAAAAAAAAAO JÁ CHEGA DE SURPRESAS! CADÊ O DOCUMEN-TO? Decidi que não sairia mais de carro por toda a minha vida! Esqueci a porcaria da documentação.Algumas pessoas deixam os documen-tos dos veículos no para sol, fui conferir e nada: uma última olhada no porta lu-vas, vai que dá certo, né?! E acreditem, estava lá!

Pude respirar outra vez. Agora é só ir para a casa de Cassius, deixar o carro lá e pegar só no outro dia. O retor-no para a casa dele foi tranquilo, nada de polícia, apenas deixei o carro morrer no mesmo lugar onde eu já tinha feito isso mais cedo. E sim, foi a mesma cena. O resto da noite foi tranquila, sem mais pedras no caminho, uma bela apresen-tação, como era de se esperar, e tomei algumas cervejas para acompanhar o clima. Voltamos e fui dormir. A nível de material para estimular o leitor o resto da noite não teve nada de interessante. Refiro-me a algo que interesse ao senhor leitor, pois a grande maioria gosta de ver o circo pegando fogo, a giripoca piando, o chamboque do dedo, o sangue escor-rendo pela face. Resumindo, alguém se fudendo. Então para não contar coisas legais para mim, e nada interessante para você, eu preferi resumir o resto da noite naquele parágrafo, pois é melhor do que ler um bocado de coisas legais, mas exclusivamente para mim, que não influenciam em nada neste texto, e par-tir para o que interessa. Como disse a giripoca piando.Confesso que estava ansioso para a va-quejada, nunca estive neste ambiente, talvez o meu tênis Converse vermelho não fosse lá muito aceito, ou outras at-rações planejadas por mim. Algo como todos os bois saíssem correndo desem-bestadamente pelo pátio entre as pes-soas. Pois por algum motivo do além, o curral onde eles estavam reunidos foi aberto. Assim, do nada.

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Devido a todo esse nervosis-mo acordei aproximadamente 23 vezes antes da hora programada para o des-pertado acordar. Às 05h da manhã. A cada momento que eu acordava e dava uma olhada no relógio imaginava ser a última vez em que voltaria a dormir. Três minutos antes de ser acordado por “Walk” de Foo Fighters, eu não dormi mais. liguei para Cassius, pois tinha de tirar o carro da garagem, até aí foi tranquilo, tirando o barulho ensurde-cedor na garagem da casa dos outros. me despedi e fui. Sem dúvida nenhuma, em se tratando de trânsito, não tem horário melhor para andar de carro por qualquer lugar que entre 00h30 e 06h. As avenidas e rodovias estão sempre vazias e tranquilas. E comigo não foi diferente. Chegaria em casa em dez ou quinze minutos, não mais que isso. Seria apenas entrar, tomar um café, e esperar meu pai voltar da pescaria, estava tudo definido. Só faltou combi-nar com o acaso. Logo antes de chegar ao viaduto de Parnamirim o pneu dian-teiro, direito furou. E o pior, estava na entrada do viaduto. Não sei você, mas não indico a parar o carro numa região como esta, se der para levar até um ponto com acostamento seguro, é bem melhor. Cansei de ver ultrapassagens ali, imagine parar um carro, e trocar o pneu. Obrigado, não. Saí de toda a área que corresponde ao viaduto, algo em torno de uns 500 metros. Parei e con-statei o estrago. Muito bom para uma primeira vez. E talvez a última, depois que o dono do veículo constatasse o ta-manho do estrago. Trocar o pneu é uma coisa fácil pra mim. Meu pai é funileiro, e sempre que eu o ajudava no serviço, nunca foi dificuldade fazer esse serviço. Exceto quando os parafusos estavam muito presos.

Decidi ligar para a minha casa, e de alguma forma trazerem um de lá para mim. Mas antes disso acontecesse parou um vizinho de bairro. Ele disse que estava passando do outro lado e notou o inconfundível fusca vermelho parado. Voltou para ver se poderia aju-dar com algo. Em incrível como se dão essas relações nas camadas mais baix-as da sociedade. Não tem ninguém aqui afirmando que em outras não acontece o mesmo, porém é muito mais comum essa vontade de ajudar. Eu relatei o problema a ele, e ele foi olhar no car-ro se tinha um macaco, porém estava quebrado. Ele foi à minha casa pegar um. Enquanto isso o calor começou a apertar, decidi fechar o carro, e ir até o posto há uns 40 metros na frente com-prar uma água com os 2,50 reais que me restaram. Mas o desespero do outro dia voltou.

- Onde está a chave do carro?

Mas vamos lá, separar os elementos:Estepe – OkChave de roda - OkMacaco - ...Macaco?- Cadê a porra do macaco?

Aos leigos o macaco é uma fer-ramenta de tração usada para levantar o veículo, tirando o contato de um ou dois pneus do chão. Seja para trocar um pneu ou para um reparo sob o veículo. Neste último caso é sempre bom usar um cavalete, pois o macaco pode que-brar e o peso de uma tonelada sobre os seus peitos ou seu joelho vai fazer um estrago memorável. Isso se você findar com a massa cefálica dentro do crânio.E esta peça tão importante para a minha missão estava faltando. Revistei todo o carro, o que não é dificultoso. Af-inal, um fusca não tem muitos espaços para se esconder um objeto como este.

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Já com a do meu vizinho o tra-balho correu mais tranquilamente. O mais triste é que enquanto isso, ônibus passavam ao lado. Os quais eu poderia ter pego, e já estaria em casa, sem ter me queimado ao sol, tranquilo, sem ter passado por nada que passei. Finalmente depois de algu-mas horas, uma hora e meia ou duas, o serviço ficou completo, agradeci ao meu vizinho. Como não tinha nada para aju-dar na gasolina, pedi para ele passar lá em casa depois, e seguimos nossos ru-mos. Depois de tudo isso só precisava descansar e esperar o meu pai. Quando ele chegou tomei a postura de um bom filho e disse o que acontecera.

Como eu poderia perder uma chave, num carro, aberto, e só tinha ele, revirei o fusca mais uma vez e nada da chave – legal, o pneu será trocado, mas eu con-tinuarei aqui, pois perdi a porcaria da chave. A essa altura a minha pauta já estava em segundo plano.Depois que o meu vizinho voltou com a minha irmã e o macaco eu disse a ela o ocorrido. Não acreditei quando ela en-controu a chave em 1 minuto. O pior, es-tava na minha bolsa.

COMO ASSIM NA MINHA BOLSA?

Entreguei o segundo item, e quando a chave de roda encaixou no parafuso, e começou a ser rodada, ela girava em torno dele, sem fazer o melhor efeito.

A PORRA DA CHAVE DE RODAS ES-TAVA QUEBRADA!

Definitivamente ele não fi-cou muito feliz, olhou a hora e não me levou mais para a casa do meu tio, de onde sairíamos para o parque. Infeliz-mente, se você é fã deste esporte e leu até aqui esperando que eu fosse falar al-guma coisa sobre a minha experiência, eu lamento e peço desculpas. Por outro lado, eu posso te garantir essa matéria na próxima edição desta revista. Ou pelo menos outra história em algum outro fusca qualquer.

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Enterrem meu coração

na beira do rioTEXTO POR ALEXIS PEIXOTOEDIÇÃO DE IMAGENS POR DIEGO CIRÍACO

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Ficção

Um dos livros que impressionaram o jovem Hunter Thomp-son, ainda na adolescência, foi O Coração das Trevas, de Joseph Conrad. A jornada do sujeito que parte em busca de outro na selva africana atingiu fundo o peito do rapaz, então apenas mais um candidato ao prêmio de Delinquente Juvenil do Mês, em Louisville, Kentucky. A descrição daquele mundo sombrio e misterioso por trás das árvores despertou um dese-jo adormecido. “Quando eu crescer”, pensou o jovem Hunter, “quero ir lá”. “Lá”, nesse caso, não era exatamente a África, mas qualquer lugar que não fosse aquela cidadezinha chata. Thompson se imaginava o próprio Marlow, esquadrinhando mapas com o olhar, procurando pelas formas estranhas das outras bandas da Terra. Em 1960 foi Porto Rico, regado à rum; de 1962 à 64 foi a América do Sul, quente & brutal. Em 1968, retorna aos Estados Unidos, a verdadeira selva de perigos e trevas. Aqui vai começar a “jornada ao coração selvagem do Sonho Americano”. Montado numa Harley Davidson ou cavalgando o Grande Tubarão Vermelho no deserto, Hunt-er procurava o rio de Marlow, o rio que parecia “uma cobra desenrolada, com a cabeça no mar e o corpo em descanso, serpenteando sobre a vastidão, com a ponta da cauda perdida nas profundezas do interior”.1

Eventualmente, ele encontrou não um, mas vários rios e se-guiu todos. Rios que cortavam o Kentucky Derby ao meio; que nasciam em Los Angeles e desaguavam em Las Vegas; que levavam à campanha presidencial de 1972 e ao Zaire, onde perdeu a oportunidade de assistir à Luta do Século. Em cada uma de suas aventuras, ia mais fundo para provar a teoria de Faulkner de que a melhor ficção é mais verdadeira do que qualquer jornalismo. Não que concordasse totalmente com isso: para ele ficção e jornalismo eram “dois meios diferentes para alcançar o mesmo fim”. A ideia era forçar os limites en-tre as duas linguagens e criar um novo monstro, híbrido, no qual a própria subjetividade serviria como prova de autentici-dade. Em teoria, “o olho e a mente do jornalista funcionariam como uma câmera. O texto seria seletivo e necessariamente interpretativo – mas, uma vez que a imagem fosse registrada, as palavras seriam definitivas”. 2

No final, Hunter Thompson conseguiu o que queria. Criou uma nova forma de escrever, a meio caminho entre o jornalismo e a ficção delirante dos autores beats. Mas a via-gem havia cobrado um preço: alienação, paranoia, delírios de grandeza alimentados por um exército de seguidores malu-cos que o colocavam num pedestal de guru. Tendo chegado ao fim do rio, Marlow se transformara em Kurtz. Hunter Thompson puxou o gatilho em 2005, deprimido e can-sado de tudo. Foi o ponto final em um texto que se alongara além do previsto. “Chega de jogos. Chega de bombas. Chega de caminhadas. Chega de diversão”, escreveu em seu bilhete de despedida.3

Vamos deixar as verdades biográficas de lado por um momento. E se o velho Hunter tivesse segurado a barra? E se o bom Doutor Gonzo ainda estivesse entre nós? O que estaria fazendo/escrevendo? Hunter poderia ter sobrevivido, mas seu alter ego Raoul Duke, não. Sua falta de modos e de limites hoje estariam obsoletas em um mundo mais deprava-do e, ao mesmo tempo, mais paranoico. Autodestruição é o prato do dia no mundo inteiro e o cinismo, artigo de brinde em qualquer compra acima de 5 dólares. E seria o próprio Duke, em um raro momento de lucidez, o primeiro a reconhecer o fim da linha. “Chega de falar de drogas, né? Até falar em dro-gas pode acabar pondo você na prisão. Os tempos mudaram drasticamente, e não foi para melhor”.4

1 CONRAD, Joseph. No Coração das Trevas. Tradução de José Roberto O’ Shea. São

Paulo: Editora Hedra, 2008. p. 30.

Sem Duke, Hunter Thompson ainda tentava man-ter a fama de mau, mas também havia se tornado um sujeito pacífico, devotado à família. A cirurgia corretiva que fizera no quadril há alguns anos ainda doía nas noites frias de fe-vereiro. Era um saco, mas a dor não parecia tão ruim quando pensava nos pequenos prazeres abandonados. Nada de an-dar de moto, dirigir ou jogar futebol. Caçadas? Nem pensar. Disparar qualquer coisa maior que um revólver exigia um es-forço que seu corpo não estava mais disposto a aguentar. Ah sim! Toda a dor do mundo pela chance de ser jovem outra vez! E para o inferno com os analgésicos prescritos!

2 THOMPSON, Hunter S. Texto de Capa para Medo e Delírio em Las Vegas: uma Jorna-

da Selvagem ao Coração do Sonho Americano. Tradução de Camilo Rocha. In: ______ A

Grande Caçada aos Tubarões. São Paulo: Editora Conrad, 2004. p. 46.

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Quase nunca saia de Owl Farm, seu pedaço de Paraí-so no Colorado. Passava a maior parte do dia assistindo aos jogos na tevê e alimentando seu blog no portal da ESPN. Cla-ro, ele ainda acompanhava política, assistia aos noticiários como todo mundo. Votou em Obama em 2008, mais porque te-mia entregar outros quatro anos nas mãos dos republicanos do que por acreditar no otimismo cego do “Yes, We Can”. Mas hoje em dia só falava em política se alguém perguntasse a re-speito – e eles raramente perguntavam. A última vez que saiu de casa foi para assistir Rum, filme produzido e estrelado por

seu velho amigo Johnny Depp, baseado em um livro seu. As críticas não haviam sido das melhores, mas Hunter nunca foi de ligar para a opinião dos outros. Aos detratores, dizia que o filme poderia ter saído muito pior, caso não tivesse exigido mudanças drásticas no roteiro. “Queriam dar uma porra de final feliz de Hollywood pro meu livro!”, resmungava. “Sem chance, cara”. Ainda que não fosse nenhuma maravilha, o filme impulsionara uma nova onda de interesse nele e naque-les livros “estranhos & brutais”, escritos há tanto tempo.

3 BRINKLEY, Douglas. Footbal Season is Over. Rolling Stone Magazine, 8 set. 2005.

Disponível em http://tinyurl.com/hunterRIP. Acesso em: 4 jun. 2013.

4 THOMPSON, Hunter S. Reino do Medo. Tradução de Daniel Galera. São Paulo:

Companhia das Letras, 2007. p.22.

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Agora, além de regar as plantas e polir sua coleção de armas, suas atividades cotidianas incluíam afugentar os cretinos das editoras, que não paravam de urubuzar atrás de uma migalha do velho Hunter. Só no mês passado, recebera três propostas para publicar Prince Jellyfish, seu romance rejeitado, escrito em 1960. Uma das editores oferecera até um contrato combinado, que além do livro incluía a produção de outro filme. Hunter rejeitara todos. Não porque desgostasse da grana ou da atenção, mas porque acreditava que já havia

se passado tempo demais para que alguém pudesse achar aquele livro bom. Ultimamente, vinha relendo todos os seus heróis – Conrad, Hemingway, Faulkner, Kerouac - e dizia ter encontrado o sentido da vida em uma frase de Mark Twain:“A diferença entre a palavra correta e a palavra quase corre-ta é a diferença entre o vaga-lume e o relâmpago”.

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Festivais para ir depois dos 60Universo Paralelo – BA - BRA

Mais um destinado para aqueles que curtem música eletrônica. Uma semana em Pratigi, praia paradisíaca da Bahia. O que acontecia todo ano, passou a ser de dois em dois. O festival acontece no final de dezembro até o início de janeiro, sendo assim, quem vai passa o réveillon por lá. Além da música, o festival oferece uma decoração psicodélica, artistas circenses e atores convidados que dão ao público um espetáculo à parte. Gente do mundo todo, trocando experiências, drogas e o que mais troux-erem em suas mochilas.

Wacken (Alemanha)Nem só de festivais de música eletrônica vive a Europa. Para os fãs de Metal, rola na Alemanha o Wacken. Wacken Open Air, chamado de WOA por quem curte, é o maior festival de heavy Metal da Europa. Com sua primeira edição em 1990 e até 2001 com apenas um dia de duração, de 2002 pra cá ele passou a ter 3 dias de duração. O Público recorde do WOA foi de 70.000 pessoas. Para a edição 2013, os 75.000 ingressos colocados a venda esgotaram-se dois meses após o início das vendas. Head-bangers a solta.

TEXTO POR DIEGO CIRÍACO

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Reading and Leeds Festival (UK)Um dos mais tradicionais da europa, o Leeds and Reading Festival, acontece anualmente nas cidades que dão nome ao festival. O evento ocorre nas duas ci-dades com o mesmo line up em dias diferentes durante o feriado bancário na Inglaterra no mês de agosto. Hoje o line up tem bandas de rock alternativo, indie rock, punk rock e metal. O festival já é um cinquentão, acontece desde 1961 até os dias de hoje. Só pela história, vale a pena conferir.

Coachella (EUA)Mulheres e homens seminus com a chegada da primavera na Califórnia – EUA. As temperaturas chegam aos 38º tranquila-mente durante o dia, o que faz com que as moçoilas usem biquininhos e os rapazes apenas bermudas. Rock, Indie, Hip Hop e Música Eletrônica é o que rola por lá. Atualmente o Festival recebe cerca de 225.000 pessoas por ano, cerca de 75.000 por dia em cada edição. Então, com tantos ingredientes deliciosos, simbora conhecer!

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Oktoberfest – AlemanhaUma festa típica e que lembra de longe uma festa nos interiores do Brasil. Um desfile com 7 mil participantes e carros alegóri-cos pelas ruas de Munique marca o início da tradicional festa da cerveja na Alemanha. O local onde acontece a Oktoberfest parece uma cidade de tão grande e reúne atrações como barraquinhas de bebidas, shows, concertos a céu aberto, estandes de tiros, e muito mais. Ao som de músicas típicas, cerca de 6.000.000 pessoas do mundo todo consomem mais de 5.000.000 litros de cerveja. Uma ótima oportunidade para se divertir e ver como se faz uma festa marcada pela tradição e culturalismo. Ao todo, a festa dura 16 dias, começando em um sábado e terminando no primeiro domingo de outubro. Pagar pra entrar? Que nada, a entra-da é gratuita, você só vai pagar pelas cervejas que consumir, e como foi dito ali em cima, haja cerveja.

Tomorrowland (Bélgica)Sonho de consumo de gente do mundo todo o Tomorrowland rola na Bélgica durante o verão europeu e reúne muita gente bo-nita e de todo o mundo. O Festival a cada ano tem atraído um público maior e mais fiel, principalmente, porque além dos top DJs, a estrutura é uma coisa digna de um filme Hollywoodiano. A decoração todo ano surpreende como por exemplo, quando o palco que é uma coisa extremamente gigantesca é todo inspirado em contos de fadas. O Festival rola três dias seguidos, pra quem gosta de festa, gente bonita e um som de primeira, comece a organizar sua viagem pro próximo ano.

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Burning Man - 50 mil pessoas se reúnem no deserto para viver por uma semana em uma comunidade temporária. Um lugar onde dinheiro não é necessário. No deserto de Nevada todos os anos, os participantes do Burning Man levam tudo que irão consumir e mais um pouco, para trocar com os demais participantes. O Burning Man aos poucos está mudando a cultura (Ou a contracultura) estadunidense. O festival tem seus fundamentos e desafios, veja aqui, alguns deles: 1) É proibido circular de carro dentro da cidade temporária, exceto os carros alegóricos quando autorizados. 2) A organização não oferece nenhuma lixeira, então, tudo que você utilizar e deixar algum rastro, tem que ser levado de volta com você. 3) Não leve seu cachorro, ou você ou ele não entrarão. Tudo isso para a segurança dos participantes e do seu bichinho. 4) Ingressos: Violar as regras ou ter um comporta-mento violento antissocial invalida na hora seu ingressos; 5) Leis: Drogas nem pensar, bebidas alcoólicas para menores de 21 anos, também não. Atos sexuais são proibidos em locais públicos. É uma comunidade e das mais incríveis que eu já ouvi falar.

Boom Festival (PT) O Boom é o maior festival da cultura trance e rola de dois em dois anos. Pessoas das mais variadas faixas etárias frequentam o festival. O Boom não aceita propaganda, é totalmente independente ante ao sistema comercial, o festival não aceita qualquer tipo de patrocínio, garantindo um maior contato com a natureza já que não tem poluição visual nenhuma. Por falar em na-tureza, o Boom também se destaca. De 2004 pra cá o Boom começou a desenvolver projetos de auto sustentabilidade de forma a

não contaminar a natureza e educar o seu público para uma consciência ecológica. Não se usa banheiro quími-co, faz-se o tratamento da água do festival através de biotecnologias, utiliza-se energia solar e éolica e tudo que é coletado por lá, é reci-clado. Em 2010 o festival foi convidado pela ONU a faz-er parte do projecto United Nations Environmental and Music Stakeholder Ini-tiative, que visa promover a consciência ambiental junto do grande público. Dá maior vontade de conhecer, né não?

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Sonar – BAR / ESPAlém de música de vanguarda, o festival aposta também em arte. Criado em 1994 em Barcelona, acontece por lá todos os anos desde então. Estava tudo certo para a edição brasileira, que aconteceria em São Paulo, entre os dias 24 e 25 de maio de 2013, quando de repente , foi cancelado em anúncio divulgado pelas produtoras Dream Factory e Advanced Music, no perfil do festival no Twitter. É o jeito ir para a Espanha no ano que vem.

Ultra Music FestivalUm dos festivais mais conhecidos do mundo, o Ultra Music Fes-tival já passou pelo Brasil.O UMF, como é conhecido no cenário mundial ganhou o prêmio de Melhor Evento de Música pela Dance Awards International, seis anos consecutivos, de 2005 a 2011 e Melhor Festival pela mídia Village Voice Times New por cinco anos consecutivos de 2005 a 2009. Sendo reconhecido e renomado no cenário mundial, com tanta premiação e com tanta gente falando desse danado, dá vontade de coloca-lo na lista de festivais para conhecer em breve.

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PERFIL

GENÉSIO PITANGA: O PÉ QUENTE JORNALISMO DE FURO

“A imprensa é uma gangue de covardes impiedosos. Jornalismo não é profissão, não é nem mesmo um ofício. É uma saída barata para vagabundos e desajustados – uma porta falsa que leva à parte dos fundos da vida, um buraquinho imundo e cheio

de mijo, fechado com tábuas pelo inspetor de segurança, mas fundo o bastante para comportar um bêbado deitado que fica olhando para a calçada se masturbando como um chimpanzé numa jaula de zoológico.”

“Em uma sociedade onde todos são culpados, o único delito é ser pego.”

- Hunter Stockton Thompson

TEXTO: EVERSON ANDRADEILUSTRAÇÕES: AURELIANO MEDS

Pela primeira vez vou escrever um tex-to sem saber como ele será feito. Não cabra cheio de gracinha, eu sei escrev-er: porque, caso contrário, estão me en-ganando até hoje. Será?Acho que não, na verdade ninguém che-garia ao final do curso sem saber o que está fazendo. E se for para considerar o verbo “enganar”, eu fico com a hipótese de eu estar passando todos para trás. A essa altura do campeonato vocês já de-vem ter lido algum texto meu; pegaram

essa revista e estão investindo algum tempo na leitura dela. E mesmo confes-sando não ter a menor noção de como escrever este texto você vai até o final desta matéria. Alguns esperando o meu sucesso, outros contando com o meu fracasso. E a maioria não está nem se importando se o leite fervido está cain-do da caçarola.A única verdade são duas: eu sei o que estou fazendo; e estou enganando todos vocês.

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GENÉSIO PITANGA: O PÉ QUENTE JORNALISMO DE FURO

Da mesma forma que ele, o meu person-agem, sabe o que está fazendo. Ninguém pode acumular tantos anos de carreira, numa profissão repleta de abutres à procura de carcaças humanas e sobrar vivo para contar a história contando histórias.E sim, ele está enganando. Ele me enga-nou. Claro que sim, ele é um jornalista. E jornalistas são treinados para deixar a melhor parte nas conversas informais com os amigos nas mesas do bar.Quando essa pauta foi sugerida fiquei surpreso. Numa conversa com os amigos, algumas histórias surgiram: olhares tortos, enquanto os meus olhos se fechavam desconfiados, como quem passa a desconfiar da própria sombra.Depois de conseguir o contato, liguei. E

do outro lado um homem muito solícito respondeu, confirmando a entrevista para quando eu quisesse. Fácil assim. E aí eu disse:- Ok Genésio, eu ligo essa semana para fechar um local. Obrigado.

Para o local da nossa conversa nada melhor que o próprio local de trabalho. Na SimTV, onde trabalha o repórter policial Genésio Pitanga, o meu person-agem.O dia prometia algo de diferente Surpre-sa: pois eu estava lá na hora marcada. Sou conhecido pelo meu atraso: muitas vezes pela indecisão se é hora ou não para sair. E eu vou ficando nessa, fi-cando nessa até chegar atrasado. Mas neste dia não; às 15h eu estava lá.

Mas ele, não. Entrei na sala de esper-ar, para... esperar. (Sinceramente, não acredito que eu fiz essa péssima piada. Se isso foi publicado, é a prova da aus-ência de escrúpulos em mim).Cerca de quinze minutos depois uma voz muito parecida com a dele pode ser ouvida na porta de entrada da emissora. Pensei, agora vai. Mas não foi. Ele saiu novamente. Passados vinte minutos re-solvi ligar. A minha real intenção era saber se ia rolar mesmo, ou se ele tinha esquecido, poderíamos marcar para outro dia, e eu não tenho nenhum prob-lema quanto a isso. Durante a ligação ele disse que não tinha esquecido, e es-tava chegando em 15 minutos.

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Nesse meio tempo chega um homem gordo, branco; daquela espécie que não basta ser apenas branco, mas aparen-temente nunca tomou sol, chegou car-regando a carteira de cédulas e mais dois celulares na mão. Bermuda e uma camisa estilo outdoor. Se você não entende o que é isso, é uma daquelas camisas básicas que carregam em letras garrafais a marca dela coisas como Hollister ou Abercrombie. Sin-ceramente, é muito mais estético uma camiseta básica. Esse tipo de produto é a mais pura ostentação. Pois mesmo com um tecido e costura melhores, com certeza eles devem ter uma versão com um logo mais simples. Além do mais existe uma etiqueta interna para essa identificação. Na região do extremo do Nordeste brasileiro, também conhe-cida como esquina do Brasil, ou ainda Natal-RN. Esse homem, aparentando seus 32 anos, queria falar com Genésio também. Aí sim, o meu gene da disputa entrou em ação, e pensei comigo mes-mo: estou esperando há mais tempo,

camarada. E pelo tempo que vou pre-cisar você vai esperar muito. Se eu fosse você, iria embora.Pobre de mim, mal sabia eu que ele iria abordar meu entrevistado antes de mim, subiria comigo, acompanharia toda a entrevista sentado ao lado, e eu iria sair de lá antes mesmo dele se le-vantar da cadeira. Durante toda a en-trevista ele foi até gentil, mas sempre dava a sua opinião, que era repetir ex-atamente as palavras do meu entrevis-tado. Sabe quando você acha que sabe de letra da música, e fica cantando, mas você só canta a última palavra de cada verso? Até parece que você está cantando, dá para enganar, mas com o tempo você se pergunta? A quem estou tentando enganar com essa dublagem de filme americano. O nosso colega, desconheço seu nome, mas vamos chamá-lo aqui de senhor Classe Média Natalense. Como eu estava dizendo, o nosso colega foi à procura de Genésio para tentar recuperar o seu veículo roubado. Ele tinha sido assaltado há

alguns dias na Avenida João Pessoa. Segundo disse, seria morto, mas toda a sua malemolência evitou essa fa-talidade quando ele disse que não era de Natal e estava aqui apenas de via-gem. Seu carro? Um jaguar. Uma figura como o Sr. Pitanga tem muitos conhe-cidos, muitas pessoas nas mais diver-sas escalas da sociedade potiguar. Por isso ele é uma pessoa indicada para solucionar problemas como este. Você, leitor da classe média, sobreviveu à leitura deste texto. Pronto, este é o seu prêmio preliminar. Agora, o pre-sente de verdade está no final, é para os fortes. Os que chegarem até lá. Uma das poucas frases formuladas pelo su-jeito de bermuda foi: “Pitanga não tem medo de nada”.Quanto a essa afirmação não temos a mesma opinião. Nem eu nem Gené-sio. O jornalista diz ter medo. Ele tem família e tem uma vida, mas isso não pode deixar o seu

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compromisso de lado. Já eu conside-ro o fato de ele não bater muito bem da cabeça. Durante a entrevista ele me contou coisas que não se conta a qualquer um. Pelo menos não se conta a um jornalista que veio fazer um perfil da sua pessoa. Ele podia estar mentin-do, e eu não pretendia tirar a prova. Mas ele pessoalmente me apresentou alguns números de cidadãos brasileiros sob custódia em penitenciarias.

Nessa tentativa absurda de dar con-tinuidade à matéria, o perfil de Genésio Pitanga, acabei de acordar tirei duas semanas de folga para escrever e cheg-uei agora nesta pauta. Não consegui es-crever mais merda nenhuma.

Voltando a falar do meu carismático personagem, a imagem que se tem de Genésio é que ele sabe muito, mas ele

deixa uma dúvida: ele sabe muito por quê? Ele sabe muito? Ou está querendo passar a ideia de saber muito? Sei lá, um estudante de comunicação, aca-bando de se formar, vai escrever uma revista, e decide fazer um perfil dele, talvez seja uma boa presa para o ego de alguém. Mas no caso de Genésio eu não sou o prato do dia, ele realmente é o que diz não importa o que é certo ou não, se eu concordo, acho legal o maneiro o que ele diz ser, e fazer, pouco importa. Ele é autêntico na sua personalidade. Graças a Deus, eu não estava no cardápio como o prato em promoção daquela quar-ta-feira. Com tanta acessibilidade à sua vida, muito provavelmente, era eu es-colhendo que forma degustaria aquela presa recheada de informações. Genésio ressalta muito que é jornalista investigativo. Mas quando vai dizer o que faz, quando vai argumentar, na ver-

dade não se trata de jornalismo inves-tigativo amigo, mas sim de jornalismo de furo. Porque o fato de alguém ligar para você, no meio da noite falando que vai prender alguém, não faz de ninguém um jornalista investigativo. Pois você não investigou nada, apenas recebeu o contato para um furo. Esse é o lado positivo dele, ele tem muitos contatos. Muitos contatos. Contatos estes que es-tão em todas as camadas da sociedade. E só uma pessoa com muito samba no pé sabe lidar e caminhar muito bem pe-los grupos da nossa sociedade cheia de truques e mutretas.Ele confunde jornalismo investigativo com o jornalismo de furo. Porque, pelo que ele falou para mim, ele faz jornal-ismo de furo. Não o vi falar que estava investigando.

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Não que ele falasse o que es-tava investigando, mas, até sobre os trabalhos anteriores, essa investigação era apenas chegar antes na notícia.Ele se mostrou muito egoísta com as suas pautas. Não que isso seja nega-tivo: o jornalismo é uma jaula com to-das as espécies mais bizarras. Juntas e famintas. Então, quem se comporta como ser humano acaba se tornando a refeição do dia. Por isso ele está cer-to, mas... Ele tá certo. O pessoal man-da pauta para ele e ela não é dividida com ninguém, como ele diz que sempre acontece entre os outros profissionais da área, e até de veículos concorrentes. E quando alguém liga no meio da noite, afinal no meio da noite tá todo mundo dormindo ou bebendo, só ele está esperando uma ligação para fazer um furo de reportagem.Genésio se dá muito para o trabalho, sempre a procura da melhor maneira de se produzir uma matéria, entretanto eu tenho dinheiro, ele sempre O interessante é que mesmo chegando antes de todo mundo, gravan-do e entrevistando as matérias de todas as TVs vão ao ar quase na mesma hora, pois os jornais em todas as emissoras

vão ao ar mais ou menos no mesmo horário. A informação que ele tirou com um policial pela manhã vai ser a mesma de um colega entrevistando o mesmo militar uma hora depois. Quando percebi a abertura do meu entrevistado, optei por questionar sobre alguns temas polêmicos do nosso tempo, para saber mais sobre o seu posi-cionamento acerca destas coisas. Como já imaginara, Genésio é uma pessoa de opinião formada. Porém, o embasamen-to dele está no campo do lugar comum e simplista. Afirmações como a ausên-cia da falta de solução para qualquer bandido, por isso, uma limpeza geral seria o melhor caminho, ou então de que a maconha é a porta de entrada para outras drogas, podem ser rebatidas por estudos, histórias, e contra argumen-tações. E não me venha com aquela conversa de cada um tem a sua opinião, pois eu sei, mas um jornalista deve ter bastante cuidado com a dele, afinal ele é um formador de opinião, goste você ou não essa é a melhor dádiva que essa raça pode receber. Ele pode criar uma legião de pessoas com as suas mesmas ideias. Mas tudo isso expõe uma marca de Genésio, ele procura justiça, procura

ser fiel, principalmente com ele mesmo e com os seus princípios. E tem o jornal-ismo como uma grande dádiva em sua via, ele é capaz de ir a qualquer lugar do mundo para buscar a informação, e seja preciso pegá-la com quem for.

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Sem o conhecimento acadêmi-co, Genésio credita o conhecimento das técnicas do jornalismo à prática com, segundo ele, grandes nomes do jornal-ismo potiguar entre eles J. Gomes, o famoso repórter de algumas matérias clássicas, entre elas o assassino de São Gonçalo, quando o assassino escreveu uma carta endereçada ao então apre-sentador. Pauta esta que Genésio Gomes cobriu, e mais tarde produziu um docu-mentário falando sobre o acontecido,

anos depois, confesso que este trabalho é um dos melhores documentários pro-duzidos no RN. Nele contem imagens da época quando o jornalismo era cheio de imagens quentes e marcantes. O sangue escorria pela TV da sala, enquanto a família almoçava aquele pedaço de bife mal passado. Sim o povo adora isso.Esta caçada marcou o jornalismo po-tiguar, um homem sai armado por uma cidade do interior do estado a procura de justiça, desejando lavar a sua honra

e no seu caminho fica um grande rasto de corpos. Esta foi uma das pautas feit-as por Genésio, o que anos depois ajudou na produção documentário Sangue de Barro. De pensar que ele sonhava em ser jogador de futebol, até se tornou, jo-gou em times profissionais do nordeste e do estado, mal sabia ele que o futebol era apenas um caminho para a sua real carreira.

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HITLER VAI DIRIGIR HOSPITAL WALFREDO GURGEL: PACIENTES SERÃO DEPENDURADOS DE CABEÇA PARA BAIXO (Alemanha – Urgente) O chanceler Adolf Hitler deverá assumir a direção do Hospital Walfredo Gurgel nos próximos dias, a fim de dar início a um amplo programa de reformas que inclui sua transformação em campo de concentração modelo. A proposta de Adolf Hitler é desenvolver experiência inovadora no setor: transformar o hos-pital em ambiente de teste de venenos e outras substâncias deletérias, a fim de estimar a capacidade humana de supor-tar dores e sofrimentos intensos. Segundo o ministro Joseph Goebbels, a situação do Walfredo em termos de humilhações, falta de éti-ca e descasos com a saúde e dignidade humanas é elogiável, mas isso pode ser bastante ampliado com a vinda de Hit-ler para dirigir o hospital. Citando um exemplo, disse que em vez de os doentes ficarem estirados no chão à espera de atendimento que nunca é feito, com a nova direção eles serão amarrados pe-los pés com grossas correntes e depen-durados de cabeça para baixo. Quando não houver mais espaço os doentes serão levados a subterrâneo a ser espe-cialmente construído. Lá também serão dependurados de cabeça para baixo. Os que se revoltarem serão processados na forma da lei, disse Goebbels e acrescen-tou:

“Deitados no chão eles ocupam precioso espaço. Dependurados, haverá possibil-idade de grande acumulação de corpos num mesmo espaço”, acentuou, consid-erando que isso é um “grande avanço” em termos de atendimento hospitalar. Acrescentou que com tal procedimento pretende amentar em muito a mortali-dade. O objetivo é criar nova fonte de rendas para o erário, e explicou:

“Todos os que morrerem serão vendidos ao Haiti. Ali serão transfor-mados em zumbis e terão emprego ga-rantido em filmes de terror classe B, nos Estados Unidos. Como se vê, um campo de concentração também fomenta cul-tura.”

Hitler, por sua vez, garantiu que os doentes do Walfredo Gurgel terão di-reito a chibatadas e choques elétricos. Os mais privilegiados serão levados a câmaras de gás, que utilizarão os mais modernos e mortíferos gases recen-temente descobertos. Quem escapar receberá a medalha de “Grande sobre-vivente” e terá direito de participar da propaganda oficial que enaltece a qual-idade da administração do Rio Grande do Norte. Quanto aos médicos, caso não queiram colaborar serão metidos a fer-ros, terão os diplomas cassados e em seguida serão considerados “insanos e temíveis”. A seguir, serão internados em clínica psiquiátrica sob a direção do conceituado Dr. Hannibal Lector, de onde somente sairão após total cura. “Coisa bem difícil”, destacou.Hitler manifestou grande interesse e disposição em dar ao Rio Grande do Norte essa grande colaboração em termos de saúde pública. Segundo as-segurou, quando o Walfredo começar a funcionar sob sua direção, os novos métodos, moderníssimos, serão gran-demente aplaudidos. Especialmente quando tiver início a segunda fase, a ser desenvolvida no restante da rede oficial de saúde, interior do RN. Ali, o objetivo é dotar os hospitais de câmaras de tor-turas a fim de que os doentes morram o mais rápido possível. “Com isso econ-omizaremos verba oficial, que poderá ser utilizada na construção de estádios de futebol e clubes de dança, onde as pessoas irão comemorar as grandes vitórias esportivas.”

POR EMANOEL BARRETO

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FESTA ESTRANHA COMGENTE ESQUISITAPOR LORDE PAVÊILUSTRAÇÕES: SARA LIUDA

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No entanto, nossa desvairada idéia original evidencia o espírito de afronta e deboche com o qual estáva-mos tratando a Boa. Éramos seres supe-riores, e iríamos participar dessa rave sebosa motivados exclusivamente pelo fervor jornalístico de se produzir uma boa reportagem. Finalizado este longo preâm-bulo, passemos agora ao relato em si. Era a tarde do dia era 31 de maio. Após gastarmos cento e vinte reais em nos-sos ingressos em uma loja de roupas para playboys, eu e Sara Liuda – minha amante e desenhista – fomos para a casa de um amigo e traficante de segunda instância nos preparar para a rave. Ad-quirimos um papelote de doce por trinta pratas e ficamos de dividi-lo na festa. Mais do que isso poderia ser perigoso. Nosso amigo ainda não havia provado o LSD daquela cartela e não estava certo da potência da droga. Não queríamos correr o risco de consumir uma para-da forte demais e começar a delirar naquele ambiente hostil, repleto de lunáticos e sem nenhum conhecido por perto. Compramos o papelote e fomos para a o meu apartamento. Esse foi o único preparativo necessário. Ficamos de bobeira no meu apartamento até por volta das 22h, quando fomos de carona com o meu velho para o lugar onde aconteceria o evento, um terreno cercado ao lado

do Hotel Imirá. Após sermos deixados na calçada, decidimos colocar logo as metades do papelote na boca antes de nos encaminharmos para a entrada. O rosto de Sara se contorceu numa care-ta. - Isso daqui tá amargo demais. - Também tô sentindo. Isso quer dizer que esse doce tá cheio de an-feta. - Ai meu Deus! É sério isso? Sério mesmo? - Não, relaxa, é mentira. Às vezes o doce é amargo, não tem nenhum problema. Eu estava mentindo. Minha parca experiência psicodélica era sufi-ciente para saber que LSD não tem gos-to. Quando o doce vem com gosto ama-rgo é porque de fato existe anfetamina misturada junto no papel – o que, no caso, poderia até ser considerado uma van-tagem. Nosso plano era ficar até o sol nascer, por isso as propriedades estim-ulantes da anfetamina eram bem vin-das. Contudo, eu não queria deixar Sara nervosa com a perspectiva de estar consumindo uma parada bichada e po-tencialmente mais perigosa, então fa-lei essa mentirinha para tranqüilizá-la e logo a puxei para a entrada da festa. Após entregarmos nossas entradas e sermos revistados, entramos na festa e demos uma boa olhada no local onde passaríamos as próximas oito horas.

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A cena era deprimente. O am-biente, com suas duas tendas rodeadas por barracas de comida, bebida e ban-heiros químicos, estava quase vazio, e a maioria dos gatos pingados presentes não parecia sequer estar gostando da música que explodia das caixas de som. Havíamos chegado por volta das 22h30, o que mais tarde descobri-mos ser bem cedo para os padrões de uma rave. Ainda assim, o evento estava marcado para começar às 18h. Era para ter mais gente. Sem ter muito mais o que fazer, eu e Sara caminhamos até uma barraca e compramos a primeira das três latas de Budweiser da noite, por cinco reais. Com apenas cinqüenta paus nos bolsos tivemos que nos controlar. Só o taxi de volta para casa custaria por volta de trinta reais. Uma longa madru-gada se estendia pela nossa frente. A partir desse ponto não há muito sentido em desfiar uma narrati-va linear do que nos aconteceu na Boa. Os acontecimentos transcorreram de maneira cíclica, não muito diferente do psytrance interminável que embalava

o ambiente. Todas as músicas seguiam a mesma estrutura rígida, começando com uns sons meio etéreos que se trans-formam numa batida regular que depois de algum tempo vai ficando cada vez mais rápida e rápida e rápida até cul-minar num silêncio de fração de segun-do repentino seguido mais uma vez do tuntz-tuntz-tuntz mais despojado. Diferentes DJs iam e vinham, mas a música tocada continuava a mes-ma. Eu e Sara nos vimos presos em uma rotina igualmente repetitiva. Após tirar uma onda dançando, nós nos cansáva-mos e passávamos eternidades senta-dos nas escadas na entrada do cerca-do, descansando e tentando curtir os suaves (no caso dela, fortes) efeitos vi-suais proporcionados pelo doce. Quan-do finalmente conseguíamos quebrar o marasmo, voltávamos para a muvuca. As únicas variações que aconteceram nesse esquema aconteceram nas pou-cas vezes em que nos deslocamos para as barracas atrás de comida ou bebida. Sendo assim, o relato a seguir consistirá em uma breve análise das dif-

erentes espécies que podiam ser encon-tradas no grande zoológico que foi a Boa. Ao contrário do que minha desprepara-da mente de virgem de raves concebia, o público da festa estava longe de ser uma massa uniforme de reiveiros entupidos de psicodélicos dispostos a dançar por dezenas de horas a fio. Existiam esses, é claro, e é com os integrantes desta cat-egoria que eu começo o meu estudo. Em linhas gerais, o reiveiro true é aquele que estava lá pela música e possuía en-ergia suficiente para aguentar longas sessões na pista de dança sem fraquejar em nenhum momento. O espécime mais representativo dos reiveiros true que eu e Sara encontramos foi um sujeito que nós apelidamos de O Robô. Avistamos essa figura solitária ainda no começo da festa, dançando com movimentos lentos, duros e robóticos, o que lhe ren-deu a alcunha que lhe demos. Durante o desenrolar da rave, no entanto, o apeli-do adquiriu uma outra significação e se tornou ainda mais apropriado.

Quando eu me dei conta já era tarde demais; o pior havia acontecido. Eu estava gostando da música que es-tava sendo tocada. Se eu havia começa-do a dançar de maneira esculhambada e só pra tirar uma onda, agora o meu corpo se movia de uma maneira estran-hamente natural, plenamente entregue ao ritmo. A barreira que eu havia ergui-do entre mim e os outros, aquela massa suada de gente bizarra se debatendo in-controlavelmente à minha volta, havia sido derrubada. Eu me tornara um deles. Pouco importa se foi pelo efeito hipnótico do batidão ensurdecedor ou simplesmente pela influência lisérgi-ca do doce que eu havia tomado horas antes. O que importa é que, ainda que tenha sido apenas por alguns momen-tos, eu fui um genuíno reiveiro. Essa minha transformação foi,

sem sombra de dúvidas, o acontecimen-to mais inesperado da rave – afinal, eu fui para o Bug Open Air (Boa, para os mais íntimos) já com o intuito de odi-ar ou pelo menos desprezar a festa. É bem verdade que o meu editor não me deu nenhuma instrução explícita a esse respeito. A única pauta que me foi dizia que eu deveria fazer um relato do even-to e ponto. No entanto, certos indícios me levaram a crer que o meu trabalho consistiria em ir para a festa, ficar mui-to doido e denunciar a corrupção moral e intelectual de quem freqüenta esse tipo de ambiente. Para dar um exemp-lo, basta relatar a maneira como eu e o tal editor planejamos participar da Boa. Como o evento aconteceria numa área cercada na praia e os ingressos estavam sendo vendidos a exorbitantes sessen-ta contos, tivemos a brilhante idéia de

arranjar um barco e invadir a festa pelo mar. O plano incluía ainda mil outros elementos retardados e irresponsáveis, como falsificar duas daquelas pulseiras que garantem a seus usuários livre cir-culação em festivais do tipo. Foi sorte nossa que tenhamos amarelado e abandonado essa ridícula empreitada. Para começar, a festa era completamente cercada. Uma grade enorme e vários seguranças impediam o acesso ao mar. Além do mais, as tais pulseiras nem sequer existiam. Bastava entregar o ingresso para poder circular desimpedido, pelo menos fora da área VIP. Aconteceu que o editor preferiu desembolsar a grana para a compra do meu ingresso e acabou ficando de fora da brincadeira. Nossa entrada triunfal se tornou o mais banal possível.

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O Robô simplesmente nunca parava de dançar. Ele não saía de lugar, não comia, não bebia, não conversava e sequer chegava a olhar para a multidão que pouco a pouco se estabeleceu em sua volta. Aquele autômato dançante com olhos inexpressivos não podia ser um humano. Era um robô. E aquele era um robô sabia o que estava fazendo. O segundo tipo que eu irei de-screver é um subgênero do reiveiro autêntico. O bizarro também estava lá pela música e pela dança, mas apresen-tava algum desvio comportamental ou de vestimenta que o tornava inferior em relação aos reiveiros de verdade. Marca-Texto foi o exemplo mais gri-tante dessa categoria. Ela trajava uma indumentária composta por legging e top amarelo-limão com padrão de on-cinha. Como se a vestimenta absurda não chamasse atenção o suficiente, a mulher constantemente interrompia a própria dança para, aos gritos e pu-los, conclamar os que estavam ao seu redor a dançar mais e com mais força. Para mim e Sara, que fizemos questão de sempre nos manter a uma distância saudável da dita cuja, Marca-Texto era uma inesgotável fonte de hilari-dade. Para os que tiveram o infortúnio

de se encontrar perto dela, no entanto, os acessos da bizarra reiveira devem ter sido experiências bastante desa-gradáveis. Antes Marca-Texto e os bizarros, porém, do que os playboys e as periguetes. Ao contrário das duas espécies descritas até agora, que pos-suem em comum a quase nobre carac-terística de frequentarem raves pelo batidão que se passa por música, os playboys e periguetes estavam na Boa apenas em busca de sexo. O conjunto de roupas curtas e justas com os saltos e maquiagem excessiva das mulheres, totalmente inapropriados para uma maratona de dança, não deixavam mentir quanto as suas intenções. Já os homens desse grupo podiam ser iden-tificados pela ausência de camisa. Um personagem que eu retrospectivamente decidi chamar de Johnny Bravo talvez tenha sido o playboy-mor da rave. Sua dança parada e insossa servia apenas para que ele pudesse exibir o seu corpo descamisado e esculpido em anos de ac-ademia enquanto seus olhos esquadrin-havam o ambiente e detectavam as mais gostosas periguetes disponíveis. Johnny não ficou muito tempo debaixo da tenda principal. Certamente sua meta foi atingida em dois tempos.

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Há, em meu sistema classifi-catório, ainda mais uma categoria. São os párias, os dalit, os absolutamente fracassados. Assim como os playboys eles estavam lá porque queriam fod-er, mas as semelhanças param por aí. Ao contrário dos orgulhosos machos alfa que exibiam seus grandes múscu-los e abatiam a presa que queriam, os fracassados se esgueiravam sozinhos pelos cantos, olhando desejosos para o sexo oposto e, vez por outra, arriscan-do alguns passos de dança – e falhando miseravelmente, é claro. A imagem que me vem a cabeça enquanto escrevo es-sas inclementes palavras é a de um po-bre coitado com uma pança enorme e uma lata de cerveja colada na mão com quem eu e Sara topamos diversas vezes na festa, indigno de qualquer apelido. Não que eu nutra ódio pelo homem. Sua figura não me despertava mais do que pena. É envaidecido que eu declaro que a metamorfose que eu relato no início desta reportagem foi referente à minha transformação de observador neutro para reiveiro true. Durante aquele mo-

mento eu pude, pela primeira vez na vida, perceber todas as sutilezas do tra-balho de um DJ. Acho que se tratava de um tal de Ace Ventura, mas bem que po-dia ser um dos outros tantos que tocar-am na Boa. Não tenho certeza de nada. O fato é que, para mim, cada textura nova e quebra de ritmo e seja lá mais o quê que o cara fazia pareciam sublimes. Eu passei a compreender o Robô. Eu cheguei até a ficar puto ao perceber que a grande maioria das pessoas se anima-va mais com o batidão mais despojado e banal do que com o tour de force técnico realizado pelo DJ em seus mais supre-mos acessos de inspiração. Ao contrário de mim, nenhum daqueles babacas en-tendia porra nenhuma de rave. Perman-eci um longo tempo estático com a mu-dança que se havia se operado em mim. Só recobrei minha consciência plena quando o sol finalmente despontou no horizonte. Eu e Sara decidimos que era hora de ir. Forramos o estômago com um espeto de queijo coalho, saímos da área cercada e pegamos um táxi para casa.

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O taxista começou a puxar um papo. - Tava boa a festa, hein? - Ô, boa demais. - Mas ir pra casa também é muito bom, né não? O negócio aí vai até de tarde, é muito tempo. E eu vi que já tava começando uma confusão, o pes-soal fica lá tomando drogas e acaba ar-ranjando briga. - É verdade. Tem gente que não sabe brincar. Só fui perceber o quanto estava cansado após saltar do táxi. Assim que cheguei ao meu apartamento, corri para o meu quarto, fechei as cortinas e desa-bei na cama. O efeito do doce havia pas-

sado e a exaustão causada pela noite de dança se fez sentir. Sara, no entanto, ainda estava alucinada e, embora não tenha dito nada, obviamente queria dar uma trepada. Para mim não dava. Antes que ela tivesse tempo de se insinuar de qualquer maneira mais evidente, anun-ciei que estava muito cansado e caí no sono. Naquele momento eu não queria saber de sexo. Os ecos da música tocada pelo suposto Ace Ventura ainda retum-bavam na minha cabeça e causavam uma sensação de quase orgasmo em todo o meu corpo. Eu era, afinal, um reiveiro de verdade e a única coisa que me excitava era o som.

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Eu não tinha nada que me fiz-esse chegar até Miguel Mossoró: nada de números telefônicos, ou endereço, um parente próximo, mas tinha amigos, amigos na grande imprensa potiguar. Fazendo o apanhado de tudo, consegui seis números diferentes para falar com o líder do PTC (Partido Tra-balhista Cristão) no Rio Grande do Norte. Mas por incrível que pareça nenhum funcionou. Veio aquela gota de desespero “será que não vai rolar?”. Alguns dias depois, numa quinta-feira,

eu mando uma mensagem para o meu amigo, e parceiro de revista, Galdino, dizendo: Cara, arrume um telefone de Miguel Mossoró que funcione, pois os que tenho aqui são o mesmo que nada. Em poucos minutos ele man-dou dois números, um deles eu já tinha na minha agenda, o outro seria a última chance. Já era, seria agora ou nunca. Liguei, chamou e nada. Liguei, chamou, e uma mulher atendeu, era a sua asses-sora, e por coincidência, filha.

Ela foi muito solícita ao tele-fone, eu informei a motivação da chamada, o desejo de entrevistá-lo para uma revista. Ela disse que ele não estava, mas que quando chegasse, ia li-gar para marcar um horário. Era mais ou menos 10h30 da manhã, ainda estava no trabalho, preparando para sair. Fui para a aula, fui para outra, fiquei até a noite pela universidade conversando besteira, e nada dele chegar. Me con-venci de retonar a ligar no dia seguinte, peguei o ônibus e fui para casa. Como

é de costume dormindo no caminho, o celular toca, atendo, e uma voz do outro lado, pergunta se sou Everson.

-Sim, é ele. Quem é?

-Aqui é Miguel Mossoró, tudo bem?

(Dando um pulo, acordo e respondo)

-Opa! Tudo bem, então, não sei se sua assessora já te adiantou alguma...

"Quem tem medo de cagar não come"

POR EVERSON ANDRADEFOTOS: EVERSON ANDRADE

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Falei para ele qual era a in-tenção da matéria, ele topou fazer a entrevista e marcamos para a segun-da-feira da outra semana. Na hora de decidir um local para a entrevista eu disse que não tinha um papel a minha disposição. Na verdade estava bêbado de sono. Marcamos de ligar no dia se-guinte, e fechar um local, ele concordou e eu desliguei o telefone. Quando olhei a hora, eram 21h59. Ótimo! Fiquei ani-mado, se eu tivesse um bloqueio na hora de escrever, poderia começar por isso. Já no dia seguinte, saí com a equipe da TVU para cobrir uma coletiva sobre

o mutirão da justiça, o qual adiantou muitos processo. No meio da gravação das sonoras o telefone começa a tocar no bolso. Toda a imprensa da cidade reunida, com suas câmeras ligadas em direção aos juízes, que não se sen-tem montados sobre o poder e a lei, e o telefone de um estagiário tocando no meu bolso. O meu braço estava estica-do ao extremo, e cansado, e o telefone não parava de tocar. Ao fim de tudo, vou conferir quem ligou: 1 ligação de um número qualquer, e outras 30 mil de casa. Todas com a mesma proposta: po-demos remarcar a entrevista para...

-...HOJE!

- Ok! Claro. Onde o senhor prefere?

- Não sei, diga aí você.

- Não tenho nada em mente, pode ser na sede do partido, ou algo assim.

- Olha, irei hoje para a UFRN, ajuda?

- Claro, então te espero aqui.

Era a hora marcada, e eu esperava na frente da TV Universitária pela chega-da de Miguel Mossoró, a recepcionista da emissora já tinha me adiantado que ele tinha passado pela portaria uma vez, então decidi aparecer lá na frente, quem sabe ele estivesse à espreita me

esperando. E estava. Ele tinha voltado ao carro e me esperava lá mesmo. Veio em minha direção com passos firmes, como se desconhecesse sua idade já avançada. Quando entrei com ele pelos corredores da TVU as pessoas paravam e olhavam para aquela figura icónica da

política potiguar, mesmo sem nunca ter ganhado uma eleição seu lugar estava garantido no hall da fama, infelizmente neste hall ele não estava acompanhado das figuras mais éticas de nossa políti-ca.

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Ele me seguiu pelo estreito corredor que leva para os estúdios, fiquei temeroso dele ter confundido o tipo de entrevista, ao invés da TV, era uma revista de jornalismo gonzo. “Que diabos é esse negócio de gonzo? Eu de-veria demitir a minha assessora se ela não fosse a minha filha”.

Quando entramos num local mais silencioso, liguei o gravador e disse:

- Olha seu Miguel, essa entrevista é para... – E repeti a mesma ladainha pela milésima vez, como alguém que dizen-do “essa é a sua última tentativa de desistir, de agora em diante, eu não re-spondo pelos meus atos, estou gravando para que eu tenha isso como prova. Pois não confio em políticos, mesmo que eles sejam idosos com cabelos mais alvos que a neve. O homem escolheu seguir.

Para compreender essa figura, pensei em começar pelo começo, então já fui questionando de onde ele veio, e funcionou.

Lembra daquela famosa “mãozada”? Aquela que ele prometeu dar nos gringos de visita em Natal, mas com intenções de visitar os pontos turísticos mais carnais de nosso povo.

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Toda essa brabeza veio de sua profissão, pois Miguel Mossoró nem sempre foi político, ele era um sargento do Exército Brasileiro. Para não atra-palhar a minha entrevista, eu não co-mentei a minha aversão a tudo o que o envolve a cultura do militar, principal-mente os mandos e desmandos de quem está uma patente acima de você. Eu es-tudei em uma escola militar, sei o que estou falando, pessoas que não sabem falar a não ser se for gritando como de-mentes a procura de alguma afirmação, ou então buscando algum poder que não teriam sobre ninguém se não fosse aqueles traços na manga da roupa, marcando sua patente. E para acabar de piorar você nunca deve perguntar nada a um militar mais fissurado por poder, pois ele pode te prender por desa-cato a autoridade.

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Em pleno ano 2013 de nosso Senhor Je-sus, o cidadão ainda se refere ao Golpe Militar que afundou o Brasil nos anos mais sombrios de ditadura como a Rev-olução de 64. Já estava sendo demais para mim, mas preferi não contestar por dois motivos:

1- Poderia fugir do foco da minha matéria;

2- Eu poderia ser preso por isso.

Segui adiante com o cronograma, eu não poderia deixar faltar a oportuni-dade de perguntar sobre o seu maior feito na política:

- Miguel Mossoró, e a história da ponte Natal-Fernando de Noronha?

- Essa história eu falei uma coisa e en-tenderam outra completamente difer-ente.

Ele se refere a uma ocasião em que um senador do Rio Grande do Norte, em um

evento um pouco antes da campanha perguntou a ele sobre a ponte Newton Navarro, que ainda estava sendo con-struída, o que ele faria com o dinheiro investido nela.E a sua resposta foi que com aquele din-heiro ele faria uma ponte daqui para Fernando de Noronha. Só isso.Notem que a sua habilidade para com-parar as coisas o gabaritam para escre-ver nesta revista. Olhando aqui nas fi-

chas, parece que ele é o único candidato interessado.

Humm

Ok Contratado!

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Mas Mossoró não contou com um detalhe, a presença de jornalistas naquele evento. E no outro dia, os jor-nais de Natal estampavam a frase de que o candidato do PTC tinha prometido fazer uma ponte sobre o mar com desti-no ao arquipélago pernambucano. Ufa! Agradeci a Deus, pelo menos não estava sozinho com um des-vairado qualquer. Muito pelo contrário.

Ele era mais esperto que todos nós, e assim como numa manobra de guerra, ele usou aquela arma a seu fa-vor. Do dia para a noite ele deixou de ser um candidato qualquer para se tor-nar o candidato do cofre de ideias. Mi-guel Mossoró percebeu ali a formação de uma grande onda, e nela ele surfou durante toda a campanha, e não se en-gane, ele esteve na crista dela o tempo

todo, o fato dele ter ficado em terceiro não significa que ele caiu no meio do caminho, e sim que os seus concorrentes surfavam nos melhores pontos da praia.Ainda assim, ele não ficou em terceiro a toa. Segundo o próprio, sua parcela de votos se deve a votos conscientes, as-sim como ele. E eu posso afirmar que ele não estava errado, pelo menos quanto à segunda afirmação.

Depois de conversar com ele, Miguel Mossoró se mostrou um can-didato que eu não votaria, mas me faz acreditar nele. Ele não tem as arti-manhas dos políticos por formação, como também tem sinceridade, e sua vontade de ajudar é sincera. Embora sua íntima ligação com o militarismo, e com a religião sejam uma jogada arri-scada ao optar por ele numa eleição.

Uma coisa é certa, ele ia lutar com todas as suas armas, talvez literal-mente, para fazer uma limpeza ética, onde quer que estivesse. O engraçado é que essa palavra “limpeza” me lem-brou duas coisas antagônicas: primeiro a campanha do último presidente do Brasil antes da Revolução de 64, aque-la campanha da “vassourinha”. Como também puxou na memória a limpeza

feita pelo governo golpista, “jogando para fora” de uma forma ou de outra, to-dos aqueles que não concordavam com sua ideologia. Mas que ideia a minha, só pode ter saído de uma cabeça paranoica como a minha. Acho melhor parar por aqui, antes que eu seja preso por falar essas coisas.

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COM A PALAVRA O CIENTISTA

A cada dois anos quem senta à frente da televisão para assistir ao Horário Eleitoral Gratuito Obrigatório, ou não tem nada mesmo para fazer, ou está querendo acompanhar por alguns momentos o festival de tosquices, bi-zarrices, anomalices - e cretinices por parte de alguns medalhões da política que ainda tem a cara de pau de voltar-em para à TV com o mesmo discurso de quatro ou dois anos atrás.

Não estou aqui para falar das deficiên-cias de nossa construção e educação do sistema eleitoral, e realmente não espe-ro terminar este texto e ver um artigo argumentativo querendo te convencer disso, pois só de pegar essa revista, por osmose você já deveria saber disso.

Na verdade estou, pois não vai adiantar eu falar sobre o sistema de democracia representativa, e todo o nosso sistema eleitoral, sem não questionar as suas deficiências. Até parece que o único sucesso deles foram as urnas eletrôni-cas.

Segundo o professor Antônio Spinelli, um dos principais fatores que levam ao aparecimento de políticos assim é a razão histórica. Por muitos anos as in-stituições ligadas à política perderam seu valor. Com uma política desvalori-zada aqueles tipos de baques e confron-

tos são comuns são até bom. Por isso perdemos de ver os grandes confrontos de ideias, o que nós vemos hoje no perío-do das eleições é uma verdadeira ceia eleitoral, em que o prato do dia vai des-de uma ajuda na feira, uma nova den-tadura, até um plano de saúde, uma gui-tarra. Ficou perdido aquele confronto de ideias, o debate entre os candidatos, mesmo com ideologias diferentes era até fácil manter um diálogo neste caso.

Resumindo: é como se a falta de recur-so aliado à falta de necessidade de tra-balhar a imagem para o eleitor em casa. Diferentemente dos políticos com mui-tos recursos, este usa a melhor forma de aparecer. Mas Miguel Mossoró enganou a todos nós com a sua história da pon-te Natal-Fernando de Noronha. Ainda hoje ele tem boa consciência sobre os problemas políticos do estado. Mas sem esclarecer bem os seus planos

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PARA DIAS FELIZES, NADA DE SE-

GUIR FELICIANO

Diferente da imagem puxada da memória de doido varrido ou algo do tipo, Miguel Mossoró é um politico sério e digno de confiança. Porém, como eleitor, ele não teria o meu voto devido à junção política, direitos gerais de uma nação e religião, o que na verdade não se junta, quando a intolerância religio-sa se manifesta não tem nada que uma essas coisas.Pensando bem agora o presidente do PTC lembra muito irmão Manoel, até a fisionomia. Manoel era pastor de uma igreja a qual eu fazia parte, um militar aposentado, ele devia passar a maior parte do seu tempo lendo a bíblia. Isso deu um vasto conhecimento a ele, o tipo

de conhecimento que faz de você a pes-soa ideal para viver na época de Moisés.A religião tem suas regras próprias, e não estou aqui questionando-as, mas ela são obrigatórias para quem opta por fazer parte do corpo daquela igreja. O que acontece é de todos os seres vi-ventes da face da terra serem obrigados a seguir essas normativas.Ainda hoje a comissão dos Direitos Humanos aprovou um projeto intitula-do de “cura gay”, no geral ele autoriza psicólogos a indicarem tratamentos para homossexuais. Ok, você deve está com a mesma pulga atrás da orelha que eu. Como assim? A Comissão dos Direitos Humanos aprova um projeto deste? É amigo, a política desgraçada desta nação, coloca José Genuíno na comissão de Ética e Justiça, e crentes

insensatos na comissão já citada.Neste ponto, meu novo amigo Miguel Mossoró perde o meu voto, não só pelo fato dele não apoiar a homossexuali-dade, o que é bem compreensível, ele vem de outro tempo, e ainda foi militar durante a Ditadura, não se deve pedir muita flexibilidade e compreensão de uma pessoa que passa por traumas como estes.Infelizmente ele teve poucas chances de provar o contrário do que a maioria das pessoas pensam sobre ele. E mui-to provavelmente não vai ter, essa é a prova, que assim como outros políticos diferentes do estereótipo de um deputa-do ou vereador, surpreenderam a socie-dade. Como dizia o Dr. Gonzo: “Quando as coisas ficam estranhas, os estranhos viram profissionais.”

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TRIPINHAS

JEAN MOURA

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TRIPINHAS

GABRIEL VASCONCELOS

AURELIANO

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