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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Tatiane Sayuri Maeda Cemitério é lugar de criança? A visita guiada ao Cemitério Consolação como recurso para abordar a educação sobre a morte nas escolas MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA São Paulo 2017

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Tatiane Sayuri Maeda

Cemitério é lugar de criança?

A visita guiada ao Cemitério Consolação como recurso para

abordar a educação sobre a morte nas escolas

MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA

São Paulo

2017

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Tatiane Sayuri Maeda

Cemitério é lugar de criança?

A visita guiada ao Cemitério Consolação como recurso para

abordar a educação sobre a morte nas escolas

MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como

exigência parcial para obtenção do título de Mestre em

Psicologia Clínica, sob a orientação da Profa. Dra. Maria

Helena Pereira Franco.

São Paulo

2017

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Banca Examinadora

____________________________________

____________________________________

____________________________________

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Dedico este trabalho aos meus avós falecidos.

À minha ancestralidade, Maria José, Vitor, Uto e Gisei.

Em especial, Gisei Maeda,

que morreu durante a escrita desse trabalho,

aos cem anos.

(In memorian)

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Agradecimentos ao CNPq – Conselho Nacional

de Pesquisa/Conselho Nacional de

Desenvolvimento Científico e Tecnológico pelo

incentivo financeiro na realização desta

pesquisa.

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AGRADECIMENTOS

Sou imensamente grata ao Universo, a Deus, a todas as forças divinas que me

possibilitaram crescer e aprender tanto durante esta jornada mesmo diante das dificuldades.

Sobretudo, por colocar pessoas tão especiais em minha vida sem as quais eu jamais chegaria a

este momento de conquista.

Àquela que sempre me incentivou e acreditou no meu potencial, em diferentes papeis

como minha orientadora, professora, supervisora, é a pessoa a qual carrego uma admiração

imensurável, minha eterna gratidão por cada abraço motivador, cada olhar encorajador, por

cada oportunidade, Lelê.

Professora e querida supervisora que guardarei para sempre em meu coração, foi a

primeira professora da PUC com quem dividi o meu desejo de começar o mestrado. Ela,

depois da supervisão, me ouviu atentamente, com seu olhar brilhando de orgulho, obrigada

por todas as palavras nutridas com tanto carinho, Silvana Rabello (in memorian).

Aos queridos colegas do aprimoramento do Espaço Palavra, que me acompanharam

em momentos tão importantes da minha vida, e por estarmos juntos no momento de despedida

da nossa querida supervisora, Sil. Obrigada, Bruna, Ana, Paula, Juliana, Vanessa e Márcio.

À Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, ao Laboratório de Estudos e

Intervenções sobre o Luto (LELu), ao Programa de Psicologia Clínica, por ter tido o

privilégio e a honra de conhecer e aprender tanto com as professoras doutoras, Mathilde

Neder, Rosane Mantila de Souza, Ceneide Cerveny, Rosa Maria Stefanini de Macedo, Ida

Kublikowiski, Marlise Bassani, presentes nas disciplinas e na construção desta dissertação.

Às professoras doutoras que leram cuidadosamente o meu trabalho, contribuindo para

o meu amadurecimento, reflexões tão importantes no exame de qualificação, Rosa Maria

Stefanini de Macedo e Maria Regina Maluf.

Minha gratidão à professora doutora Regina Szylit por sua solicitude a compor a

banca, contribuindo com sua experiência nos estudos relacionados ao luto e por sua leitura

atenta dedicada a este trabalho.

À professora suplente, doutora Maria Júlia Kovács, gratidão a sua participação ao

longo do escrito deste trabalho, sendo importante referência bibliográfica na construção dos

capítulos.

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À querida turma do LELu, por cada momento partilhado, cada aprendizado

compartilhado em aula, seminário, congressos...principalmente, pelos vínculos de amizade

construídos nesse nosso percurso acadêmico, Érika, Gabi, Gláucia, Dani, Giovana, Rê, Isa,

Iza, Cláudia, Cecília, Ágatha, Elis, Marina, Sara, Carol, Camila, Cibele, Thais, Luciana,

Natasha.

Às demais colegas, pessoas queridas que pude conhecer em outras disciplinas, que

cruzaram o meu caminho nos corredores da PUC de maneira muito especial, em diferentes

momentos ao longo deste percurso, obrigada, Zakiee, Marcela, Ingra, Paola.

À turma da eletiva “Morte e Luto”, do primeiro semestre de 2017, que pude

acompanhar e aprender tanto junto com vocês! E à professora Maria Helena Pereira Franco,

mais uma vez, por permitir que eu participasse das suas aulas com os alunos da graduação,

contribuindo para que esta experiência fosse regada de aprendizado, um grande exemplo de

postura ética e inspiração para esse meu início da carreira docente.

Ao grupo de trabalho do Projeto de extensão, fruto do tema dessa dissertação, que

carinhosamente apelidamos de “Cemetery angels”, por todas as reuniões de trabalho que se

tornaram mais divertidas ao lado de vocês, Thaís Ares, Giorgia Cruz, Giovanna Donno,

Cecília Cortês, Érika Motoyama, Isabela Hispagnol. À nossa fotógrafa de todas as reuniões,

sempre solícita e atenciosa aos nossos pedidos de ajuda, o nosso agradecimento à assistente de

coordenação do Programa de Psicologia Clínica, Mônica.

À revisora e colega que cuidou dos ajustes finais deste trabalho, lendo linha por linha,

contribuindo com tanto zelo e cuidado quando minhas vistas já estavam cansadas, obrigada,

Teresinha Rocha.

Aos colegas do grupo de pesquisa “Atitudes e Valores dos Adolescentes” coordenado

pela professora doutora Rosa Maria Stefanini de Macedo, pela oportunidade de somar tantos

aprendizados, contribuindo para o meu crescimento nesse início da carreira acadêmica.

À querida companheira que entrou comigo no mesmo momento do mestrado, com

quem tanto dividi momentos de alegrias, de tristeza, comemorações, frustrações... difícil

resumir, obrigada por tudo, amiga mais japa, Érika Perina Motoyama.

Àquela guerreira que abriu carinhosamente as portas da sua casa e me apresentou seus

filhos e sua gatinha preta, que tanto adorei. Obrigada por fazer parte deste meu caminhar e por

dividir comigo momentos tão importantes, as nossas conversas sempre tão enriquecedoras,

Chris.

Ao Serviço Funerário Municipal de São Paulo, aos profissionais que abriram as portas

do cemitério Consolação para a realização desta pesquisa e pelo tempo de trabalho juntos no

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Projeto de extensão, em especial, Lucia Salles Pinto, Khadiga Saleh, e o guia do cemitério,

Popó, que brilhantemente recebe as escolas com tanta atenção e cuidado.

À escola e às professoras que fizeram esta pesquisa acontecer, sem dúvida, tivemos o

grande privilégio de conhecer verdadeiras educadoras, que acreditam na força que a educação

têm de transformar vidas, para melhor, apesar de todo um cenário desafiante.

Às crianças que participaram da visita, aos pacientes que atendi ao longo do meu

percurso profissional, por dividirem comigo as inquietações sobre a morte e a me ensinarem

tanto sobre a vida.

À pessoa e profissional que conheci no momento de grande transformação, crise e

crescimento da minha vida, me ajudou e muito me ajuda a enfrentar os meus maiores medos,

sonhos e desbravá-los com coragem, lágrimas e sorrisos, obrigada por me acompanhar nesse

processo psicoterapêutico, Lilian Godau Biasoto.

Àqueles que sou grata pela minha existência e pelo meu crescimento, aos meus pais,

Paulo e Maria Josineide.

Àquele que nos momentos mais festivos, como feriados, me via à escrivaninha,

concentrada, escrevendo parte do capítulo deste trabalho. A ele que sempre deixava

bilhetinhos carinhosos para me encorajar, e por partilhar todas as mudanças e fases da vida, o

meu muito obrigada, meu irmão Henrique.

Aos amigos, cada um fazendo parte de uma fase da vida, e nesta, mais ainda... mesmo

com a minha ausência, sempre juntos, me dando forças para continuar, Kelly, Danilo, Jéssica,

Jeferson, Simone, Lari, Vânia, Gabi, Emerson.

Àquele que me acompanha desde a faculdade, em cada tropeço e conquista, em cada

lágrima de alegria, de tristeza... obrigada por existir na minha vida, meu noivo, amigo e

companheiro, aquele que escolhi para constituir a nossa família, Lucas.

A todos que partilharam comigo, direta ou indiretamente, as suas experiências infantis

sobre a morte, sou tão grata por ouvir cada história porque vocês fazem parte da minha.

Ao CNPq pela realização da pesquisa.

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Cemitério é lugar de criança?

A visita guiada ao Cemitério Consolação como recurso para

abordar a educação sobre a morte nas escolas

RESUMO

A presente pesquisa qualitativa teve como objetivo compreender como professores de São

Paulo percebem a questão da educação sobre a morte, a partir da experiência de levar os seus

alunos à visita guiada ao Cemitério Consolação. Realizou-se um grupo focal com 9

participantes, professores que lecionam no primeiro e segundo ano do ensino fundamental da

rede pública municipal, que tiveram esta experiência no mês anterior da data de realização do

grupo focal. Os instrumentos utilizados foram observação em campo da visita guiada com

uma escola no Cemitério Consolação e entrevista semiestruturada de grupo focal. O material

coletado foi avaliado a partir da técnica de análise de conteúdo de Bardin (2016), permitindo a

construção das categorias: medo da morte; contexto sociocultural e religioso; participação nos

rituais fúnebres; significado de cemitério; repercussões das vivências infantis na fase adulta;

luto; comunicação sobre a morte na escola; visita escolar ao cemitério; Programa Amigos do

Zippy; aprendizado dos alunos; aprendizado das estagiárias de pedagogia; educação sobre a

morte na escola. A observação evidenciou alunos e professores participativos e interessados

em refletir sobre o tema da morte, tendo explorado o cemitério como lugar de aprendizado. As

professoras percebem como sendo importante a educação sobre a morte na escola e que o

resgate de suas experiências pessoais de perdas e morte na infância, ajuda na empatia com o

sofrimento da criança assim como a validação de suas percepções e o luto infantil

reconhecido. Os resultados apontam que algumas crianças faziam perguntas a partir do que

tinham aprendido em sala de aula, em projeto anterior, enquanto que a existência de

capacitação das professoras indica que a visita ao cemitério foi um facilitador para a

valorização da inclusão do tema morte na escola e da importância de observar questões

emocionais dos alunos no processo de aprendizagem.

Palavras-chave: Luto. Educação sobre a morte. Crianças. Cemitério Consolação. Visita

guiada para escolas.

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Is the cemetery a place for children?

The guided visit to Consolação Cemetery as a resource

to address the school education on death.

ABSTRACT

The present qualitative research aimed to understand how teachers from the city of São Paulo

perceive the matter of education about death, from the experience of taking their students to a

guided visit to Consolação Cemetery. A focus group with 9 participants was formed, with

teachers who work with first and second grade students of municipal public elementary

school, who had had this experience a month before the focus group had it. The instruments

used were field observation of the school group which had a guided visit to Consolação

Cemetery and a semi-structured interview by means of focus group. The collected material

was analysed by the Bardin (2016) technique of content analysis, allowing identification of

the categories: fear of death; sociocultural and religious context; participation in funeral

ceremonies; meaning of the cemetery; effects of childhood experiences in the adult life;

bereavement; communication about death at school; school visit to the cemetery; Zippy‟s

Friends Program; students learning; pedagogy trainees learning; education on death at school.

The observation has shown that students and teachers were participative and interested in

thinking about the topic of death, having explored the cemetery as a place for learning.

Teachers perceived the education on death as important at school and that they can also use

their past personal childhood experiences with loss and death to help sympathise with the

child‟s pain, as well as validate their perceptions and child‟s bereavement acknowledge. The

results show that some children would ask questions based on what they had learnt in the

classroom, in a previous project, while the teachers training indicate that the visit to the

cemetery was an enabler for the appreciation of the idea of including the death topic at school,

and the importance of observing the student‟s emotional issues in the learning process.

Key words: Bereavement. Education about death. Children. Consolação Cemetery. Guided

visit for schools.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Foto do Zippy tirada no grupo focal. ...................................................................... 99

Figura 2 – Foto do Zippy tirada no grupo focal. ...................................................................... 99

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Participantes do grupo focal .................................................................................. 59

Quadro 2 – Organização dos temas e categorias ...................................................................... 74

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SUMÁRIO

RESUMO

ABSTRACT

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 15

1. OBJETIVOS ......................................................................................................................... 21

1.1 - Geral ................................................................................................................................. 21

1.2 - Específicos ....................................................................................................................... 21

2. CEMITÉRIOS: UM CAMPO SANTO, UM CAMPO DE ESTUDOS? ............................. 22

2.1 Breve história dos cemitérios ............................................................................................. 22

2.2 Cemitério Consolação ........................................................................................................ 24

2.3 Cemitério como espaço educativo ...................................................................................... 29

3. EDUCAÇÃO SOBRE A MORTE NA ESCOLA ................................................................ 36

3.1 O papel profilático das escolas ........................................................................................... 36

3.2 Parceria entre escola e família ............................................................................................ 39

3.3 A Morte respondeu a chamada: estou presente na sala de aula .......................................... 43

4. EXPERIÊNCIAS DE PERDA E MORTE NA INFÂNCIA ................................................ 49

4.1 Luto na infância .................................................................................................................. 49

4.2 Participação da criança nos rituais fúnebres ....................................................................... 51

4.3 Desenvolvimento: processo de aquisição do conceito de morte ........................................ 55

5. MÉTODO ............................................................................................................................. 58

5.1 Tipo de Pesquisa ................................................................................................................. 58

5.2 Local da pesquisa................................................................................................................ 59

5.3 Participantes ....................................................................................................................... 59

5.4 Instrumentos ....................................................................................................................... 60

5.4.1 Observação ...................................................................................................................... 60

5.4.2 Entrevistas por grupo focal .............................................................................................. 61

5.5 Procedimento para coleta de dados .................................................................................... 62

5.6 Procedimento para análise de dados ................................................................................... 64

5.7 Cuidados éticos ................................................................................................................... 65

6. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS ................................................................. 66

6.1 Diário de campo: observação e grupo focal. ...................................................................... 66

6.2 Descrições das categorias ................................................................................................... 72

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7. RESULTADOS E DISCUSSÃO ......................................................................................... 76

7.1 Medo da morte .................................................................................................................... 76

7.2 Contexto sociocultural e religioso ...................................................................................... 78

7.3 Participação nos rituais fúnebres ........................................................................................ 79

7.4 Significado de cemitério ..................................................................................................... 82

7.5 Repercussões das vivências infantis na fase adulta ............................................................ 85

7.6 Luto ..................................................................................................................................... 88

7.7 Comunicação sobre a morte na escola ................................................................................ 91

7.8 Visita escolar ao cemitério ................................................................................................. 93

7.9 Programa amigos do Zippy ................................................................................................ 97

7.9 Aprendizado dos alunos ................................................................................................... 104

7.10 Aprendizado das estagiárias de pedagogia ..................................................................... 106

7.11 Educação sobre a morte na escola .................................................................................. 110

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 118

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 121

ANEXO 1 – CARTA DE AUTORIZAÇÃO ......................................................................... 132

APÊNDICE A - ROTEIRO DE ENTREVISTA DE GRUPO FOCAL ................................. 136

APÊNDICE B - CARTA CONVITE AOS PARTICIPANTES DA PESQUISA .................. 137

APÊNDICE C - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ................. 138

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INTRODUÇÃO

A morte: “Você está aqui para amar a vida”(...)

Quando você crescer,

vai encontrar outras respostas

para a grande questão.

(ERLBRUCH, WOLF. A grande questão, 1948)

Durante a feitura desta pesquisa constatei que muito pisei no cemitério, lá estive por

diferentes motivos. Conheci cemitérios com olhos turísticos, fotografei, tive ideias. Fui para

trabalhar, realizar oficinas sobre luto, o que me permitiu abrir os olhos a tamanha demanda

que existe para um psicólogo nesse campo. O cemitério foi um local que me permitiu muitos

estudos e o nascimento do tema desta dissertação. Além do trabalho e dos estudos, também

fui ao cemitério para me despedir de pessoas queridas que perdi durante esta jornada – estive

em velórios, cerimônia de cremação, homenagens. Em todas essas idas ao cemitério, em

diferentes momentos, todas foram regadas de emoção, lágrimas, abraços, nas quais estive

rodeada de pessoas significativas. Assim, é a natureza do tema desta pesquisa que diz respeito

a este solo...ao qual vamos pisar uma vez ou outra...para falar sobre a Vida que há na morte.

A realização desta pesquisa me permitiu conhecer os relatos dos participantes a

respeito de suas vivências infantis sobre a morte. A coleta e análise dos dados foram convites

para revisitar as memórias infantis. Recordei-me e compartilho então, as minhas memórias

suscitadas. Convivi, desde sempre, com a ausência sentida por minha mãe e minhas tias, Dida

e Lúcia, pela perda da mãe delas, minha avó materna. Eu não a conheci, ela morreu quando

minha mãe tinha 5 anos de idade. No entanto, sua memória afetiva sempre foi presente e sei o

quanto elas sentem a falta do colo materno. Minha querida tia Dida, certa vez, quando eu lhe

disse o tema do meu estudo, me falou sabiamente: “Feliz daquele que morre e tem um

cantinho no cemitério”. Foi dela que também ouvi sobre a dor da perda da morte de sua filha,

ainda bebê, a Angélica. Durante a minha infância, quando eu ia visitar meus familiares que

moram num povoado no nordeste, recordo-me que era levada ao cemitério com eles. Era

comum, recordo-me de uma ocasião em que minha mãe foi acender uma vela para seu pai,

meu avô Vitor, e eu, ainda muito pequena, comecei a bater palmas e a cantar “parabéns”,

pois, de certa forma, era uma celebração. Essa história foi contada e lembrada de maneira

engraçada. Da época de escola, lembro-me de quando meu irmão perdeu um amigo na escola

quando era criança, a morte do Mateus o impressionou bastante. Lembro-me de eles

brincando e de estarem juntos nos aniversários, vê-lo adoecer e estar no velório de uma

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criança foi marcante, eu era pré-adolescente. Também já fui a cerimônias e velórios de

parentes orientais, pela minha descendência japonesa, e me recordo muito bem deles, pois

parecia uma festa, com banquetes de comidas típicas. Também convivi, na casa dos meus

avós paternos, odí e obá, com a tradição oriental do butsudan, no qual se rezava aos mortos,

cultua-se um respeito aos antepassados já falecidos. Na casa da minha tia Yoshiko, viúva,

também havia um templo com a foto do seu marido, o qual sempre tinha frutas e comidas

frescas. Eu era criança e não entendia bem o porquê dos alimentos ali. Depois, fui

compreendendo os sentidos desses rituais, preservando sempre a memória das pessoas

significativas. Nas conversas com a vó Dinoraide, ela conta-me de suas lembranças sobre a

morte da irmã, quando ela era criança, o banho que teve que dar na sua irmãzinha, ainda bebê,

morta, sua ida ao cemitério para procurar a irmã e o adeus ao cemitério quando mudou-se para

a cidade. Também converso muito com o Lucas sobre esse assunto, e ele, quando criança,

acompanhou a exumação de seu tio, foi um fato marcante e do qual se recorda que depois

disso, fazia muitos desenhos de caixão. Resgatei essas lembranças, e tomei a liberdade de

apresentar-me, pois de certa forma, apontam que convivi, desde criança com naturalidade,

com os assuntos relacionados à morte e propor um trabalho que aborde a educação sobre a

morte nas escolas significa revisitar e valorizar a infância, as relações e as diferentes visões e

maneiras que as famílias têm de lidar com a morte. O percurso teórico deste trabalho trilha

caminhos que nos levam a refletir sobre a importância das memórias infantis e da relação com

os adultos de referência que assumem o papel de cuidadores.

No meu percurso profissional, fui capturada por crianças que não tiveram vivências

tranquilas em relação às perdas, assim, inquietações advindas da prática clínica com crianças

fizeram com que surgissem os primeiros traços para esta pesquisa, ainda sem a consciência

disso. Esses traços não apontavam para respostas, e sim, para inúmeras indagações sobre

como um profissional de saúde poderia ajudar as crianças que apresentavam mudanças de

comportamento, pelo fato de ela e sua família estarem vivendo um momento muito doloroso

de suas vidas: estar diante da morte ou sofrendo a ruptura de um vínculo devido a separação

ou abandono por um ente querido. Algumas dessas mudanças de comportamento das crianças

se manifestavam na escola, assim, pedidos de ajuda se avolumavam entre professores e

cuidadores. As intervenções consistiam em nível secundário e terciário para o luto, ou seja,

mais voltadas à avaliação e tratamento psicoterápico.

Tempos depois surgem novos desafios profissionais da prática de um projeto em

parceria entre a Fundação São Paulo, mantenedora da Pontifícia Universidade Católica de São

Paulo, e o Serviço Funerário do Município de São Paulo (SFMSP). Este projeto de extensão

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decorre de um convênio que visa ações transformadoras em três cemitérios: Consolação,

Araçá e São Paulo, contando com uma equipe interdisciplinar, dentre elas, a Psicologia,

composta por pesquisadores do Laboratório de Estudos e Intervenções sobre o Luto (LELu).

É neste amplo campo interdisciplinar que se insere a Psicologia e dentre as suas

diversas ações, atuando desde a promoção de saúde mental dos servidores, intervenções com

as famílias enlutadas, também se ocupa de aproximar o tema da morte para as crianças e

adolescentes nesse contexto.

Em nossa pesquisa, o enfoque será dado ao Cemitério Consolação, onde ocorrem as

visitas das escolas interessadas que as agendam por meio da Assessoria de Imprensa do

SFMSP.

No Portal do SFMSP lê-se, sobre arte tumular e as visitas guiadas: “O Serviço

Funerário instituiu a visita guiada no Cemitério Consolação, criando um roteiro para

conhecer os túmulos de personalidades ilustres e as obras de arte instaladas nos túmulos. A

visitação é aberta para estudantes, professores, pesquisadores, turistas, entre outros”.

Morin (1997), examinando a sociologia da morte, pondera que “[...]a sociedade

funciona não apenas apesar da morte e contra a morte [...], mas que ela só existe, como

organização, por, com e na morte”. O sociólogo francês prossegue: “A existência da cultura,

isto é, de um patrimônio coletivo de saberes, habilidades, normas, regras de organização etc.,

só tem sentido porque as antigas gerações morrem, e é preciso transmiti-la incessantemente

às novas gerações” (MORIN, 1997, p.10).

Partindo desse pressuposto, podemos pensar o cemitério como um patrimônio coletivo

de saberes, cuja tônica das propostas que envolvem especificamente o Cemitério Consolação

visa promover atividades culturais que aproximem a população a ocupar este patrimônio

público. Sendo assim, considerando-se a relevância social, podemos entender que as visitas

guiadas, ao abrir espaço para as escolas, vão ao encontro da transmissão de saber às novas

gerações, por meio da história e da arte tumular. É neste espaço – da existência da cultura –

que iremos transitar, propondo a reflexão com e no social por meio do problema de pesquisa:

No cemitério, a visita escolar é um instrumento pedagógico de educação para a morte com

crianças e adolescentes?

De acordo com Gomes (2012), monitor de arte tumular e ex-sepultador do Cemitério

da Consolação, este local é como um museu histórico a céu aberto, que recebe visitação de

escolas públicas e privadas, e também de turistas, inclusive de outros países. Em sua

experiência nas visitas guiadas, explica-nos: “Nas visitas ao cemitério, procura-se quebrar

esse preconceito acerca da morte, que é vista pela sociedade como lúgubre e, em outros

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casos, tornando-se banalizada pelo distanciamento e frieza com que passou a ser tratada”

(GOMES, 2012, p. 89).

As motivações que nortearam a escolha deste tema se justificam a partir da concepção

de que as crianças que fazem a visita escolar não necessariamente são crianças enlutadas,

oferecendo-se a elas a oportunidade de educação para a morte. Assim, no que tange a

relevância científica, podemos vislumbrar um estudo em nível de intervenção primária, em

que entendemos a educação como um poderoso agente de prevenção para o luto complicado.

A pioneira brasileira a estudar sobre a morte e a refletir sobre o que hoje entendemos

como educação para a morte, foi a psicóloga Wilma Torres (1983), professora da UFRJ, que

fez parte da coordenação do primeiro seminário realizado em 1980, intitulado: “A Psicologia

e a Morte”. Em 1983 é publicado o livro com o mesmo nome resultante deste seminário e,

dentre as inúmeras discussões, focalizamos a sessão plenária „Educação e Morte‟ em que a

discussão do grupo girou em torno de dois questionamentos disparadores: “Por que se

preparar para a morte e Como educar para a morte?”(p.23), questões centrais do problema

de pesquisa deste trabalho. Aquela discussão levantou a temática da prevenção, questão que

nos aproxima da relevância científica sobre o tema: “A educação para a morte funciona como

um fator de prevenção para a saúde mental” (p.24). Podendo contribuir na elaboração do

luto, discutiu-se que “uma educação para a morte poderá favorecer a abordagem sadia do

luto, e as repercussões disto na saúde mental e emocional do indivíduo” (p.24).

DeSpelder e Strickland (2015) ao citarem Kastenbaum, salientam que embora o termo

Tanatologia tenha por definição o estudo da morte, o autor propõe que a melhor definição seja

“the stydy of life with death left in” ou seja: o estudo da vida estando a morte incluída. A

Tanatologia abrange diversas disciplinas e áreas de reflexão, como: filosófico e ético;

psicológico; sociológico; antropológico; clínico; político e educacional, entendidas como as

dimensões da Tanatologia.

Ainda DeSpelder e Strickland (2015) referem que Patrick Dean, ao observar a

valorização dos estudos sobre a morte, destaca a importância da educação para a morte como

preparação para a vida. Sugere que esta deveria ser renomeada como "educação para a vida e

para a perda", pois "somente por meio da consciência de nossas perdas por toda a vida e da

consciência da nossa finitude estamos livres para estar no presente e viver plenamente"

(p.31). De acordo com Sofka (2013), Patrick Vernon Dean (1995) é citado no Handbook of

Thanatology como um educador sobre a morte, que se mostrou grato aos críticos por quebrar

o silêncio em relação ao tabu da morte. Os esforços da educação sobre a morte continuam em

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muitos níveis, assim como os debates e discussões sobre questões éticas e jurídicas

relacionadas a eles.

Considerando estas dimensões que envolvem a Tanatologia, nesta dissertação, temos

como foco o os aspectos psicológicos e educacionais, também considerando as demais

dimensões. No foco educacional, a principal área de preocupação é a educação para a morte

que trata da sensibilização do público para as questões e inquietações relacionadas à morte,

assim como a inserção do tema no currículo escolar e instrução para a mesma e programas

comunitários (DESPELDER e STRICKLAND, 2015).

É compreensível que a presença da criança nos cemitérios ainda possa causar certas

dúvidas e estranhezas por parte do adulto – trata-se de um espaço a se levar uma criança ou

não? - seja nos rituais fúnebres de despedida, no turismo ou uma visita escolar. Estas

visitações, com diferentes fins, têm algo em comum: podem suscitar curiosidade, interesse e

perguntas por parte da criança ou jovem sobre a morte e o morrer.

Morin (1997) afirma que por muito tempo se subestimou a presença da morte na

experiência da criança. Defende que, mesmo não tendo a experiência da decomposição do

cadáver, a criança conhece desde muito cedo as angústias da morte. A realidade perturbadora

da morte faz parte da mentalidade infantil. Valida que a criança pensa na morte e tem horror a

ela.

Torres (1983) em “Como e por que começar com a criança?” (p.26), já desenvolvia

seus estudos nessa visão que Morin apresentou, destacando a importância de incluir a criança

quando o assunto é morte. Defendia que o tema da morte não deve ser omitido na educação da

criança.

No contexto da visita escolar, o professor pode desempenhar a função de figura de

apego para a criança, assim como a escola pode assumir uma função de base segura,

entendendo como uma referência de apoio e segurança. Entende-se que a criança aprende

sobre a morte pelas suas experiências de afastamento e aproximação, e para aprofundar na

aquisição do conceito de morte e referências sobre ela, teremos como base epistemológica a

Teoria do Apego proposta por John Bowlby (1989).

De acordo com Kovács (2010), a morte ainda é um assunto interdito na sociedade

atual, motivado pelo temor de que este possa causar dor e sofrimento. A mesma autora (2012)

discorre sobre o conceito de morte escancarada, entendida como a morte que invade a vida

das pessoas, e que é vista por todos, inclusive as crianças, seja a olhos nus, presenciando nas

ruas as mortes violentas ou por meio dos olhos expectadores da mídia televisiva e dos meios

de comunicação, nos noticiários da morte, muitas vezes repetidos a exaustão. Vale ressaltar

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que atualmente as crianças tem acesso facilitado aos veículos de comunicação devido a

acessibilidade da tecnologia. Assim, corrobora-se uma situação atual paradoxal: ainda há

questionamentos ou impedimentos de falar sobre a morte com as crianças, na tentativa de

poupá-las de sofrimento, mesmo que estas estejam diante da morte escancarada, presenciando

os fatos que invadem o seu dia-a-dia com a superexposição da morte e violência na mídia.

Acerca dessa dificuldade de comunicação dos adultos com as crianças quando o

assunto é morte, temos autores (ABERASTURY, 1984; TORRES, 1999; LIMA, 2007), que

se debruçaram sobre este tema, validando as percepções da criança sobre o que acontece a sua

volta.

Na composição deste trabalho, procuramos apoiar nosso estudo sobre o luto nos

referenciais teóricos de Bowlby (2006 [1982]); Parkes (2009); Franco (2010).

Esta pesquisa trata de encarar a morte não como um tabu e, sim, como possibilidade de

abrir espaço para a comunicação com a criança sobre o tema que paira na esfera no interdito,

velado e temido. O foco da nossa pesquisa está na experiência dos professores com a visita

escolar ao cemitério. Nos capítulos a seguir, procuramos discorrer sobre a breve história dos

cemitérios, focalizando no Cemitério Consolação, a educação sobre a morte na escola,

discutindo o papel profilático da escola, a parceria entre escola e família, as experiências de

perda e morte na infância, destacando o luto infantil, a participação da criança nos rituais

fúnebres e no que tange o desenvolvimento, o processo de aquisição do conceito de morte,

com a finalidade de compreender como professores de São Paulo percebem a questão da

educação sobre a morte, a partir da experiência de levar os seus alunos a visita guiada ao

Cemitério Consolação.

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1. OBJETIVOS

1.1 – Geral

Compreender como professores de São Paulo percebem a questão da educação sobre a

morte, a partir da experiência de levar os seus alunos a visita guiada ao Cemitério Consolação.

1.2 – Específicos

Conhecer as motivações dos professores a levar seus alunos a visita escolar no

cemitério;

Investigar o que a temática de perdas, morte e luto desperta neles;

Compreender o significado de cemitério e/ou morte atribuído pelos professores a partir

da experiência da visita escolar ao cemitério.

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2. CEMITÉRIOS: UM CAMPO SANTO, UM CAMPO DE ESTUDOS?

“[...] Vou fazer do meu fim minha esperança,

Oh sono, vem!… Que eu quero amar a morte

Com o mesmo engano que amei a vida”.

(Poema: Quarenta Anos, Mário de Andrade, 2013)

2.1 Breve história dos cemitérios

“E agora que irá ser de nós?” (p.26) – o homem indagava-se, gemendo em carpideiro

coro, diante da possibilidade de viver sem a morte, sem a sua matéria-prima gerou

preocupação para os profissionais das agências funerárias que estavam a beira de uma

catástrofe falência. Esta é a “pior calamidade coletiva” devido a falta de falecimentos, é a

história narrada por José Saramago (2005), escritor português, em sua obra As Intermitências

da Morte.

Segundo o mesmo autor “em todas as épocas da pré-história, pois nunca a um

cadáver humano deve ter faltado quem, mais cedo ou mais tarde, acudisse a enterrá-lo, ainda

que não fosse mais que a generosa terra abrindo-se. Respeitosamente, pedem deferimento”

(p.27). Diante do desaparecimento da morte, haveria a necessidade de criar “cemitérios de

vivos” (p.31), lugar da velhice, porém neste novo lugar os seus dias não teriam fim.

Destacamos os cemitérios dos vivos, pois nos ilustram a importância deste local, mesmo com

a “greve” da morte, o cemitério se faz presente na vida do homem.

Muitos autores (MORIN, 1997 [1970]; ARIÈS, 2014 [1977]; PAGOTO, 2004;

KOVÁCS, 2012; CARVALHO, 2014) se debruçaram a compreender o homem frente à

morte, sua relação com o local destinado aos mortos, suas práticas fúnebres, em estudos que

contemplam aspectos sociais, históricos, psicológicos e antropológicos.

Quanto à prática de sepultamento dentro das igrejas, Ariès (2014 [1977]) nos mostra a

relação do homem com os seus mortos e as mudanças do sepultamento ao longo do tempo. Os

antigos temiam que os defuntos pudessem voltar e perturbá-los, e seguiam a lei das Doze

Tábuas que prescrevia que nenhum morto deveria ser inumado e incinerado dentro da cidade,

por temê-los. Por isso, os cemitérios eram construídos ao longo das estradas, fora das cidades.

A partir do século VII houve uma mudança semelhante à que trouxe os mortos para o

interior das cidades, surgindo o cemitério no entorno da igreja. Para a civilização cristã havia

um elo entre igreja-cemitério, local onde eram enterrados os corpos dos santos; assim como o

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surgimento das basílicas cemiteriais e o bairro cemiterial, época em que os mortos deixaram

de suscitar o medo (ARIÈS, 2014 [1977]).

Apesar de o direito proibir o enterramento no interior da igreja, na prática, para os

cristãos ela servia para este fim sendo até o século XVIII verdadeiras necrópoles, pois havia

uma proximidade entre os vivos e os mortos que conviviam neste mesmo local sagrado “(...)

toda a superfície da igreja é um cemitério em compartimentos: os fiéis andam sempre em

cima de túmulos. Essas grandes lajes não são cimentadas” (p.64).

Ariès (2014 [1977]) afirma que os cristãos enterravam os mortos perto dos santos

dentro das igrejas, pois estes ofereciam proteção ao corpo até o dia do julgamento. Com o

aumento da população e das cidades começaram a surgir problemas com o enterro na igreja,

que passou a não ser acessível a todos, tendo privilégios os homens religiosos como os padres,

bispos, monges e alguns eleitos.

Para Carvalho (2014), a separação entre a cidade dos mortos e a dos vivos se deu após

o ideário iluminista, sendo possível observar as mesmas desigualdades entre os vivos,

refletindo-se nos cemitérios: “(...) já que uma sociedade secularizada e não mais submetida

ao poder da Igreja, em que os indivíduos passam a ter lugar com a emergência do sujeito,

passou a exigir túmulos diferenciados e personalizados, evidenciando as diferenças sociais

nela existentes” (p.43).

De acordo com Hipólito (2015), houve a época em que os cemitérios se afastaram das

cidades, no entanto, não das igrejas católicas, nas quais se evidencia a presença da capela

situada no centro da necrópole, ainda presente na construção de novos cemitérios para a

realização das missas e orações aos mortos; nas palavras do autor “esse padrão será o que

prevalecerá ainda mais nos dias atuais, mesmo com o crescimento e reconhecimento de

diferentes religiões” (p.52).

Considerando as mudanças ao longo do tempo, focalizaremos nos tempos atuais, no

contexto brasileiro e de um cemitério histórico da capital paulista. Segundo Pagoto (2004), o

cemitério a céu aberto passou a representar um sinal de progresso e higienização, sendo

considerado nas cidades mais modernas e desenvolvidas, um equipamento urbano

indispensável. Assim, com o crescimento da cidade de São Paulo, inaugurou-se o primeiro

cemitério público, o Cemitério Consolação, quando a Câmara Municipal decretou que haveria

a proibição definitiva dos sepultamentos nas igrejas.

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2.2 Cemitério Consolação

“Campo Santo ou Campo Profano?” É diante desta indagação que Pagoto (2004, (p.

99) retrata a história da inauguração de um novo campo de destino aos mortos: o cemitério

Consolação. Foi inaugurado em 15 de agosto de 1858 de forma arbitrária à maioria dos

paulistanos com tradição católica, reforçando tensões existentes entre o poder público e

membros da sociedade que entendiam o cemitério como uma ameaça a salvação das almas,

devido à ruptura das tradições anteriores.

Antes de sua inauguração, muitos estudos, debates e discussões acaloradas se fizeram

presentes. Segundo o Grupo de Estudos em Arte e Arquitetura Cemiteriais (GEAAC), da

PUCSP, a busca por um espaço para a fundação deste primeiro cemitério laico e extramuros

da capital paulista, teve início em 1855. No ano seguinte, a Câmara Municipal regulamenta e

cria algumas medidas para os sepultamentos, uma delas previa que não haveria mais

enterramentos dentro das paróquias, mas que poderiam ser realizados em seu entorno até que

o primeiro cemitério público fosse inaugurado. O espaço foi projetado pelo engenheiro

alemão Carl Rath (1802-1876), que realizou diversos estudos, inclusive, com relação às

condições do solo e dos ventos da região. A construção do Cemitério Consolação foi aprovada

por vereadores na assembleia datada em 5 de junho de 1858 (COSTA et al., 2016).

Berlinck (2016), em publicação também proveniente do Projeto Memória & Vida,

aponta que muito antes da inauguração, em 1789, D. Maria de Portugal havia recomendado ao

bispo Dom José Joaquim Justiniano Mascarenhas Castelo Branco, do Rio de Janeiro, que

fossem construídos cemitérios separados das igrejas, como já era feito na Europa. Em 1801,

chega a carta régia do Príncipe Regente Dom João ao Capitão-Geral de São Paulo em que

requisita a escolha de um terreno para a construção de um cemitério. Em 1822, D. Pedro I

torna-se Imperador ao declarar a independência do Brasil. Assim: “Vinte e sete anos depois

da carta régia enviada ao Capitão-Geral de São Paulo, Dom Pedro I promulga a Lei 1º de

outubro de 1828, a qual determina a obrigatoriedade dos cemitérios a céu aberto”

(BERLINCK, 2016, p. 14). A autora salienta que além das soluções higienistas para a redução

da insalubridade e enfermidades, também havia a preocupação em secularizar os cemitérios.

Isto diz respeito a uma preocupação política quanto a disputa e a separação de poderes do

Estado e da Igreja, que teve solução com a instauração da República.

Percebemos o quanto o estudo da origem dos cemitérios nos remete às mudanças

históricas, sociais, antropológicas e ao processo civilizador, intrinsecamente ligadas à história

do nosso país.

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Nesse momento da história paulistana, houve grande influência da medicina que se

referia a interdição dos sepultamentos tradicionais. O corpo antes visto como algo sacro passa

a ser objeto de intervenção da nova medicina preventiva devido aos possíveis focos de

contágio que culminaram em epidemias, os “miasmas pestilentos”. Os sepultamentos e os

ritos tradicionais eram vistos pelos higienistas como danosos à saúde pública, sendo

contrários aos padrões de modernização. Os médicos reformadores esclareceram que a ciência

continuaria a respeitar a religião, no entanto, diante da situação de risco que o corpo morto

apresentava à saúde da população, as crenças deveriam ser postas em segundo plano, ao passo

que as medidas de contenção dos miasmas seriam prioridade e o cadáver, portanto, seria

banido do convívio dos vivos (PAGOTO, 2004).

No início, neste novo cemitério eram sepultados em sua maioria os pobres e excluídos:

indigentes, presos e escravos. O autor define que: “no mesmo espaço delimitado pelos muros

do cemitério jaziam nobres e criminosos que, numa igreja, certamente não estariam juntos”

(p. 142). Percebe-se que veio à tona discussões e uma problemática social proveniente dessa

“mistura” de classes sociais num mesmo local.

O medo do contágio dos miasmas persistiu, gerando o medo do cemitério. Notava-se

nas classes paulistanas mais abastadas, a presença do discurso médico de que os miasmas

estariam presentes tanto no ar quanto na água, podendo envenená-los. Os moradores não

queriam grandes cemitérios próximos de suas casas, alegando que estes poderiam depreciar o

seu imóvel (CAMARGO, 1995). O mesmo autor refere que já na virada do século XIX para o

XX, nota-se que a região – antes temida pela depreciação com o elemento novo na

vizinhança: o cemitério - tornou-se um local privilegiado estendendo-se à Avenida Paulista,

em que se concentra até os dias atuais a elite paulistana com as classes média e alta: “[...] já

não estava mais presente todo esse medo com respeito aos cemitérios, tanto que, bem ao lado

daquele da Consolação, desenvolveu-se um novo bairro que se chamou Higienópolis (cidade

da higiene)” (p.148).

Cavalcanti (2014) aponta para a importância deste cemitério, pois é um exemplo

marcante da mentalidade da burguesia que imperou no fim do século XIX e início do século

XX em que se revela o período áureo, conhecido como “burguesia do luto”, que são

demonstradas a partir das obras de artistas nacionais e europeus em túmulos luxuosos. Por

meio da arte, “[...] expressam a riqueza do morto e a perpetuação da importância de sua

família onde o luto tem um significado amplo e duradouro” (p.43).

A burguesia também se refletiu na literatura, pelo escritor Mário de Andrade (1893-

1945), em sua obra Amar, verbo intransitivo: idílio (2013 [1927]) que choca a burguesia

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paulistana com uma temática ousada para a época, ao narrar a história de uma governanta

alemã que foi contratada por um membro da burguesia industrial paulistana para iniciar a vida

sexual de seu filho adolescente; a obra revela uma prática comum em famílias burguesas da

época.

Jardim (2015), ao escrever a primeira biografia de Mário de Andrade, revela que o

escritor, que marcou o modernismo brasileiro, tinha que a cidade de São Paulo era sua

verdadeira morada afetiva, na qual passou infância e juventude, cujo verso “São Paulo!

comoção da minha vida...” foi tido como o verso de inspiração que inaugura seu primeiro

livro modernista Pauliceia desvairada. Relata que: “Mário de Andrade era de uma família de

classe média, que tinha conexões com membros dos grupos abastados e tradicionais da

cidade, chamados por ele de donos da vida” (p.11).

A literatura acima foi mencionada, pois no Cemitério da Consolação estão enterrados

intelectuais, artistas e personalidades públicas, como o escritor que marcou o Modernismo

brasileiro, Mário de Andrade. Traremos um trecho de seu poema, presente no último livro de

poemas, Lira Paulistana (2013 [1944]):

“Quando eu morrer quero ficar,

Não contem aos meus inimigos,

Sepultado em minha cidade,

Saudade. [...]”

(Quando eu morrer quero ficar, p.524-525)

O seu desejo – o de ser enterrado em sua cidade inspiradora, “Meu São Paulo da

garoa” - expresso no poema, foi atendido. Assim como ele, outro expoente do Modernismo

brasileiro, Oswald de Andrade, também está enterrado neste cemitério.

O escritor Monteiro Lobato (1936), ícone da literatura infantil brasileira, escreveu em

Memórias da Emília um trecho em que mostra a possibilidade de se falar de morte com as

crianças, a partir de um diálogo sensível, valorizando a sabedoria dos seus pequenos leitores:

– A vida, senhor Visconde, é um pisca-pisca. A gente nasce, isto é,

começa a piscar. Quem pára de piscar chegou ao fim, morreu. Piscar

é abrir e fechar os olhos – viver é isso. É um dorme e acorda, dorme e

acorda, até que dorme e não acorda mais [...]

A vida das gentes neste mundo, senhor Sabugo, é isso. Um rosário de

piscados. Cada pisco é um dia. Pisca e mama, pisca e brinca, pisca e

estuda, pisca e ama, pisca e cria filhos, pisca e geme os reumatismos,

e por fim pisca pela última vez e morre.

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– E depois que morre? perguntou o Visconde.

– Depois que morre, vira hipótese. É ou não é?

(Memórias da Emília, Monteiro Lobato, 1936)

Monteiro Lobato também está enterrado no cemitério da Consolação, seu túmulo é

visitado por crianças e adolescentes que realizam a visita guiada com as escolas. Neste

capítulo, não tivemos como proposta ilustrar com profundidade todas as pessoas importantes

que lá estão enterradas. Conforme se lê no Portal do SFMSP, este cemitério, definido como

um museu a céu aberto - “[...] possui túmulos de personalidades como Monteiro Lobato,

Tarsila do Amaral, Ramos de Azevedo, Antoninho da Rocha Marmo, Mário e Oswald de

Andrade, além de obras de importantes escultores, tais como Victor Brecheret, Nicola Rolo,

Luigi Brizzolara, entre outros”.

Nesse sentido, as visitas guiadas para turistas e escolas vão ao encontro da ideia

defendida por Kovács (2012): “O cemitério também expressa um caráter cívico e patriótico,

uma vez que grandes personalidades da região são enterradas, e levam a visitação pública,

favorecendo um sentido de continuação histórica” (p. 65).

Na Idade Média, viu-se o surgimento de outra opção para os cemitérios. Além de ser o

lugar de visita aos mortos, também era considerado como praça ou passeio público em que as

pessoas se encontravam e realizavam diversas atividades (KOVÁCS, 2012).

Para Hipólito, “mesmo a Igreja Católica tendo proibido muitas das práticas sociais

antes desenvolvidas dentro dos cemitérios, estes ainda continuaram sendo um local de

agitação até o final do século XVIII, quando os cuidados com a higiene transportará os

cemitérios para longe das cidades” (2015, p. 51).

Tempos depois, os cemitérios além de serem reconhecidos como um equipamento

urbano necessário às cidades “(...) começavam a ser entendidos como espaços de afirmação

social, onde os barões do café e outros membros abastados da sociedade construíram

grandes mausoléus, visando demarcar o poderio econômico através de gerações”

(PAGOTO, 2004, p. 126). O Cemitério Consolação é um exemplo disso.

Acerca disso, Morin (1997), afirma que a sepultura traz o reconhecimento ao homem,

quando explica sobre o horror que temos da morte e o terror da decomposição. Assim,

podemos fazer alusão ao medo da contaminação que percorreu a história: “o horror não é o

cadáver em putrefação, e sim o cadáver em putrefação do semelhante, e é a impureza deste

cadáver que é contagiosa” (p.33).

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Podemos dizer que os cemitérios surgem para dar lugar aos homens tidos como os

“indesejáveis” àqueles que se privava de sepultura, como acontecia com os pobres, pessoas

com doenças contagiosas, suicidas, que eram excluídos.

Silva (2000) destaca alguns dos cemitérios mais importantes do Brasil, dentre eles está

o Cemitério da Consolação. Refere que assim como aconteceu no Cemitério Père Lachaise de

Paris, ele também foi rejeitado pela população em seu início e, com o passar do tempo,

tornou-se detentor de grande parte da história e cultura do Estado. A sua inauguração foi, para

o governo da época, uma medida urgente dado o avanço de uma epidemia de varíola. É nele

que se encontra a maior construção tumulária do país: o mausoléu do Comendador Ermelino

Matarazzo. Na figura do vereador José da Silva Telles, a Câmara Municipal deliberou em 31

de outubro de 1854, que se oficiasse ao Governo sobre a conveniência de estabelecer-se um

cemitério público geral, sendo este aprovado.

Segue uma descrição breve acerca dos demais cemitérios considerados os mais

importantes por Silva (2000):

- Cemitério São Francisco Xavier do Caju, no Rio de Janeiro, pois foi o primeiro cemitério

secularizado no Brasil, tendo a Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro a autorização

para administrar este cemitério municipal. Como importância histórica, destaca-se pelo fato

de ter grandes quantidades de mármores vindos de Portugal, que por meio dos mausoléus e

panteões foram preservados na memória nacional. Revela aspectos sociais e econômicos, uma

vez que continua sendo o lugar escolhido para os sepultamentos das famílias mais

afortunadas;

- Cemitério São João Batista, situado em Botafogo, também no Rio de Janeiro, é o mais

procurado por visitantes que querem conhecer túmulos de famosos, como Carmen Miranda,

Cazuza e Tom Jobim, dentre outros. Também foi delegada à Santa Casa da Misericórdia a sua

administração, guarda e manutenção desse cemitério municipal;

- Cemitério do Catumbi, no Rio de Janeiro, foi o primeiro cemitério da cidade construído

para particulares, no qual se destaca um grande número de pessoas ali sepultadas com o título

de nobreza. Por iniciativa de Ordens Religiosas, existem outros dois cemitérios no Rio: o da

Penitência e o do Carmo. A Ordem Terceira de São Francisco da Penitência criou o cemitério

da Penitência, em 10 de julho de 1857, ao lado do cemitério São Francisco Xavier. Já o

cemitério do Carmo da Ponta do Caju foi criado por iniciativa da Ordem Terceira de Nossa

Senhora do Monte do Carmo dos religiosos carmelitanos e começou a funcionar em 28 de

junho de 1859, confinando com o da Penitência.

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- Cemitério Santo Amaro do Recife, localizado entre Recife e Olinda, foi inaugurado um ano

depois da epidemia de febre amarela que encheu as igrejas de cadáveres. Foi projetado por um

engenheiro francês que teve seu nome associado a uma mudança significativa do costume

brasileiro, na época em que eram comuns as covas, catacumbas e carneiros nas igrejas. Assim

como aconteceu com os paulistanos católicos com a inauguração do Consolação, a população

logo de início também reclamou e apresentou sinais de revolta contra o cemitério, temendo

que o enterro fora das igrejas representasse um ato de irreverência contra os mortos.

Diante do exposto, vimos que o cemitério é um espaço que revela a cultura, a história

de um grupo social e suas transformações, sendo a visita guiada e escolar ao cemitério uma

possibilidade de novos aprendizados, inclusive para crianças e adolescentes. Alguns destes

cemitérios destacados por Silva (2000), principalmente os localizados no Rio de Janeiro, além

do Cemitério da Consolação, em São Paulo, são os cemitérios que realizam as visitas guiadas,

com finalidade educativa, como veremos a seguir.

2.3 Cemitério como espaço educativo

Apresentamos o início deste capítulo com um breve resgate da história dos cemitérios

em que nos apoiamos nas contribuições históricas e sociais para contextualizar a temática,

desta forma, salienta-se para a relevância destas áreas de conhecimento tendo o tema do

espaço cemiterial sido refletido na área da educação, em que se destacou o ensino da

disciplina de História, aproximando professores e alunos para este novo campo de estudos.

No Brasil, encontramos professores (RIGO, 2012, 2014, 2015; SANTANA, 2013;

HIPÓLITO, 2015) que têm visto o cemitério como um novo aliado em sua prática

profissional, propondo novas possibilidades e recursos pedagógicos com crianças e

adolescentes.

Rigo (2012, 2014) aponta para a falta de interesse por assuntos referentes à

religiosidade e à fé, por parte dos adolescentes. Apresenta o espaço cemiterial como uma

ferramenta de ação educativa para as aulas de ensino religioso, podendo também auxiliar os

educadores das ciências humanas. Destaca que no cemitério há inúmeros atributos para o

estudo da religiosidade, da arte, da morte e da história e vislumbra uma metodologia que

incentive novas práticas pedagógicas. Ressalta que o objetivo desta prática é despertar o

interesse dos alunos por história, pois a disciplina é tida como teórica demais para os

adolescentes. Propõe a temática cemiterial para as aulas, aliando teoria e prática a fim de ser

mais atrativo ao mundo adolescente: “O cemitério consegue estabelecer um elo entre a teoria

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histórica e a prática educativa com adolescentes. E, a partir dela, os alunos percebem que a

história está presente em tudo, até mesmo no cemitério” (RIGO, 2012, p. 108).

A mesma autora salienta ainda que trabalhar com este assunto em sala de aula requer

planejamento, criatividade e, sobretudo, habilidade retórica para convencer a escola e os pais

na liberação de seus alunos/filhos para visitarem o cemitério com finalidade pedagógica. Há

uma dificuldade por parte dos pais em enxergar o cemitério como objeto de prática

pedagógica, devido a falta de conhecimento sobre a multiplicidade cultural existente neste

espaço, pois o trabalho nesta área ainda é pouco explorado em nosso país (RIGO, 2012).

Tal qual o desenvolvimento da temática cemiterial no espaço escolar pode contribuir

em diferentes campos, desde a formação da identidade do adolescente, no desenvolvimento de

valores e reafirmação de crenças; ela entende que a possibilidade do aluno partilhar

experiências significativas na escola, acrescenta na formação de futuros adultos mais

centrados em sua condição humana.

Assim como Rigo, Hipólito (2015) também percebeu a partir de sua experiência que

os alunos se queixavam da maneira como a disciplina de História tem sido ensinada em sala

de aula. Sendo assim, sua pesquisa objetivou compreender como o cemitério São João Batista

de Guanabira-PB, poderia ser utilizado para o desenvolvimento de atividades didáticas

relativas ao ensino de história para alunos do ensino fundamental. Aponta como resultados a

elaboração de uma sequência didática que propunha aulas teóricas em sala, uma aula de

campo no cemitério e uma aula em que os alunos pudessem relatar suas experiências.

Observou a quebra do preconceito em relação ao cemitério, possibilidade de dialogar a teoria

com a prática, a notória empolgação, surgimento de questionamentos e o envolvimento que o

tema despertou nos alunos.

O autor destaca, já no início de sua dissertação, que sua pesquisa foi desafiadora

considerando que no cemitério os alunos se depararam com o elemento mais temível da

história da humanidade e que está presente em todas as temporalidades. “Este elemento é a

morte, tema que também tem historicidade e que muitas vezes é escamoteado como questão

de estudo nas escolas de nível fundamental” (HIPÓLITO, 2015, p.15).

Pesquisa feita na internet sobre cemitérios no Brasil, que realizam a visita guiada,

resultou em uma seleção de reportagens de outros exemplos de cemitérios, além do

Consolação, em que há visitações de escola, como o Cemitério da Santa Casa de Misericórdia

de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul; o Cemitério São Francisco de Paula, em Curitiba; os

Cemitérios São João Batista, São Francisco Xavier e da Penitência, no Rio de Janeiro;

Cemitério do Campo (Cemitério dos Americanos), em Santa Bárbara d‟Oeste, no interior de

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São Paulo e o Cemitério do Bonfim, em Minas Gerais. A seguir, destacaremos algumas dessas

reportagens, mostrando que estes cemitérios exemplificam a possibilidade deste ser

aproveitado como um espaço educativo.

O Cemitério do Bonfim, localizado em Belo Horizonte, em maio de 2012, foi o lugar

escolhido como sala de aula pelas professoras Patrícia Pinheiro e Marcelina de Almeida para

suas aulas de história e arquitetura, com estudantes de Design Ambiental da Escola de Design

da Universidade Estadual de Minas Gerais (UEMG). O objetivo em levar o grupo de alunos é

que o cemitério como um novo ambiente possa contribuir no aprendizado sobre a importância

dos símbolos e da semiótica, além de possibilitar a perda de preconceitos, ampliando a visão

da profissão. A professora Marcelina que também é pesquisadora da história deste cemitério

relata que: “é importante conhecer melhor este espaço que culturalmente é dos mortos, mas

que na realidade significa muito para os vivos, e, assim, romper com a barreira do

estereótipo”. Sobre a reação dos alunos, enfatiza que: “Muitos alunos chegam com receio e

saem daqui com uma nova visão de um cemitério”, como se lê na matéria publicada no portal

da Prefeitura de Belo Horizonte (2012).

Segundo o portal do cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro, o guia da visitação

é o professor e historiador Milton Teixeira, que é uma referência quando se trata da história da

cidade, considerando este cemitério o maior museu a céu aberto da estatuária brasileira: “é o

único cemitério da zona sul, o preferido das famílias abastadas, onde estão enterradas várias

personalidades que ajudaram a escrever a história do Brasil, seja na política, na arte, nos

esportes e na cultura”. Estes conhecimentos da história são transmitidos na visitação.

“Senhoras e Senhores

Trago boas novas

Eu vi a cara da morte

E ela estava viva”

(Música: Boas Novas, Cazuza)

Cazuza, compositor desta música, é uma dentre as diversas personalidades que estão

sepultadas neste cemitério. Teixeira também realiza visita guiada no Cemitério da Penitência,

no Rio de Janeiro e transforma o cemitério em sala de aula, ao levar alunos da rede pública de

ensino para aprenderem sobre a história da imigração do Rio. Apesar deste cemitério ser um

dos quatro mais antigos da cidade, que foi construído em 1875, recebeu a primeira visita de

uma escola em agosto de 2014. A direção da escola teve como proposta que as crianças

tivessem contato com a riqueza cultural escondida atrás dos muros, a partir das falas do

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historiador a respeito da arte sacra, das primeiras famílias ali sepultadas e da história da

época, além da conscientização do cemitério como um patrimônio histórico do bairro e da

oportunidade em falar sobre a morte e as perdas, tidos como assuntos difíceis, conforme

destaque da matéria no portal de notícias online O Dia do Rio (2014).

As visitas também são para turistas que querem conhecer a história da cidade pois, por

meio desse passeio cultural, é difundido o turismo cemiterial. Segundo o portal de notícias

online O Globo do Rio (2014) o administrador deste cemitério, Alberto Brenner, mostra a sua

visão em relação a este espaço: “Os cemitérios são fontes de materiais de extrema riqueza

que ajudam na construção do conhecimento. Não devem ser temidos, mas contemplados. Eles

são considerados patrimônios culturais em todo o mundo”.

De acordo com a reportagem concedida ao Diário do Rio, em maio de 2016, explica-

nos o professor Teixeira, que é especialista em História da Arte e pesquisador: “Além de

apresentar a história de figuras emblemáticas e contar sua importância para o Rio, o passeio

cultural tem o objetivo de desconstruir a imagem do cemitério como um lugar de tristeza.

Queremos mostrar que também pode ser um local de aprendizado”. Ele próprio se define

como um cidadão que batalha incansavelmente pela preservação dos bens culturais.

No que se refere essa temática da preservação, vai ao encontro do trabalho na área de

Urbanismo e Arquitetura, da historiadora Castro (2008) que evidencia o cemitério como

objeto de políticas de patrimônio cultural nas cidades atuais, a partir do estudo de caso do

Cemitério do Imigrante de Joinville (SC), uma vez que “(...) este cemitério chamou atenção,

primeiramente, por ser o único tombado pelo IPHAN, pelos projetos de preservação e

conservação nele realizados e, por oferecer, por meio da Casa da Memória, um local de

atendimento e pesquisa sobre o cemitério” (p.19). Explica que o IPHAN - Instituto do

Patrimônio Histórico e Artístico Nacional trata dos tombamentos de patrimônio funerário e

das ações de preservação cemiterial. Desta forma, a autora entende que os cemitérios estão

presentes nas cidades como equipamentos necessários para o sepultamento dos mortos, mas

que também são passíveis de inclusão dentre os bens culturais, para isso, são necessárias

ações de preservação do patrimônio cultural.

Quando os cemitérios são alvos de preservação, com regularidade surgem três

possibilidades: ser objeto de interesse histórico, artístico e cultural. Pode se transformar em

um museu, tendo como acervo, sua arquitetura funerária ou um sítio histórico, em que se

registra a memória local. Além disso, transfiguram-se como um espaço de lazer, em que se

pode conhecer os túmulos de personalidades de pessoas famosas ali sepultadas, sendo um

novo atrativo turístico (CASTRO, 2008).

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A Casa da Memória demonstra o cemitério como espaço educativo, com a iniciativa

do Projeto Razões: Laços e Leitos Entre a Vida e a Morte que fala sobre Tanatologia no

Cemitério do Imigrante, em Joinville, Santa Catarina. Contou com a palestra de um psicólogo

e tanatólogo, Aroldo Escudeiro, intitulada: “Morte: possibilidades educativas para refletir

sobre a vida”, como se lê na matéria publicada online em A Notícia (2013).

Castro (2013) mostra outro exemplo intencionado em criar um centro cultural para a

preservação, a partir de uma família interessada em preservar o acervo de sua empresa

funerária guardada por cerca de cem anos. Ressalta que: “O acervo está em fase de

inventariamento e conta com o apoio de instituições museológicas. Está sendo estudada a

proposta de criação de um museu para receber o acervo da Haas, por iniciativa da própria

família” (p.25).

Nessa perspectiva, o professor Hipólito (2015) nos mostra que é possível esta

conscientização do cemitério como patrimônio desde criança, a partir das aulas que traz o

diálogo com os conceitos de História, Memória, Identidade e Patrimônio, para que os alunos

relacionem com a história local e a cultura. Desta forma, com o ensino da história do lugar nas

séries fundamentais, acredita na formação de cidadãos mais críticos e conscientes de sua

realidade.

Assim, “com a utilização do espaço cemiterial pode-se compartilhar histórias de vida

que dentro de uma sala de aula possivelmente ficariam restritas ao pensamento individual”

(RIGO, 2012, p.114). Isso nos remete a uma fala do romance literário Antes de Nascer o

Mundo, de Mia Couto (2009), num diálogo entre os personagens pai e filho: “Pior que não

saber contar histórias, pai, é não ter ninguém a quem contar” (p.43). Assim, tanto para a

criança como para o adolescente é muito angustiante e solitário quando não vê por parte de

um adulto cuidador, alguém com quem possa compartilhar sua história e também as vivências

dolorosas que envolvem a morte e o luto.

Voltando ao cemitério como recurso de ensino aprendizagem, Rigo (2012, p.9-10),

cunhou uma metodologia própria desta prática pedagógica chamada “Pedagogia Cemiterial”,

que propõe:

1. Sondagem de interesse com a turma escolhida para a realização do cemitério como

mediador de conteúdos curriculares.

2. Apresentar à turma a relação existente entre o conteúdo desenvolvido e o uso do

cemitério.

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3. Estabelecer um contato visual entre os alunos e o espaço cemiterial por meio de imagens

fotográficas, considerando que muitos alunos jamais entraram em um cemitério.

4. Pedir uma análise pessoal sobre o que pensava e o que pensou sobre o cemitério após a

explicação sobre a pesquisa cemiterial e a sua relação com o conteúdo selecionado.

5. Visitação guiada ao cemitério local.

6. Debate dirigido no cemitério para estabelecer um momento de aprendizado mútuo.

7. Debate dirigido e relatório sobre a visitação no cemitério no espaço escolar.

Segundo Santana (2013), há outro grupo nesta mesma direção que leva estudantes para

os cemitérios como espaço educativo, como acontece no cemitério São Francisco Xavier no

Rio de Janeiro, com alunos de escolas municipais que fazem parte do projeto Bairro

Educador, em que é realizada a trilha educativa “Ilustres Mortais”. A proposta é resgatar a

memória local, por meio da visitação dos alunos a túmulos em que foram enterrados

personagens da história e cultura do Brasil. A aula passeio, como é chamada, é integrada ao

conteúdo curricular das disciplinas escolares, tendo o cemitério com um espaço turístico

educativo.

Em países como França. Uruguai, Chile e Argentina, o turismo cemiterial tem

funcionado inclusive como geração de renda para os moradores locais, que além da

restauração do equipamento urbano, o utilizam para estudos e lazer. Nesta trilha, destaca-se

que tal atividade tem contribuído na motivação e autoestima dos alunos, quando estimulados a

valorizarem o bairro onde vivem. Também há trabalhos com os alunos para que conheçam

outras culturas, como a cultura do povo mexicano (SANTANA, 2013).

Rigo (2015) apresenta a Pedagogia Cemiterial que objetiva introduzir o tema da morte

na escola, a partir da disciplina de Ensino Religioso com adolescentes, uma vez notados

comportamentos autolesivos e de suicídio em suas redes sociais virtuais. O projeto “Vamos

começar pelo fim?” foi organizado em forma de livro como um meio para facilitar esta

comunicação sobre morte.

A professora aponta que o cemitério como um aliado na prática educativa contribui na

proximidade do indivíduo com a própria finitude, e ainda integra aspectos da história, da arte,

sociologia, conceitos de finitude, fé e de percepção da morte.

Nessa perspectiva de educação, entendemos que a iniciativa destes professores trata de

uma proposta de prevenção primária, ou seja, ao trazer o tema para ser discutido, refletido e,

principalmente, que pode ser falado e compartilhado de forma coletiva, tanto a criança como

o adolescente podem sentir mais segurança num ambiente escolar que não seja proibitivo

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tratar de assuntos até então tido como temidos, difíceis ou conflituosos. É neste campo que

lançaremos um olhar sob a perspectiva da Psicologia, no que se refere a Educação para a

Morte. Torres (1983) e seu grupo de pesquisa já defendiam que a temática da morte deve

fazer parte da educação da criança. Novamente Rigo (2014) revela a importância dos

aspectos emocionais para que haja sensibilização neste trabalho: “Para que um projeto que

fale de morte e cemitério funcione, é preciso que todos estejam envolvidos no processo e que

o docente esteja aberto a pensar junto com o seu discente” (p. 138). Por isso, o nosso foco

junto aos professores que realizam a visita guiada, considerando que ao tratar de educação

para a morte com crianças e adolescentes se faz necessária a aproximação junto àquele que

está envolvido com seus alunos.

Assim, sendo o cemitério como um “museu histórico a céu aberto” (GOMES, 2012,

p.88), temos visto a possibilidade de este ter um potencial educativo, uma “escola a céu

aberto” (RIGO, 2015, p. 126), uma vez que possibilita o estudo das diversas áreas do

conhecimento.

Como reflexão à indagação do título deste capítulo, podemos pensar, sim, o Cemitério

como campo santo, e como um campo que se abre a muitos estudos. Para isso, precisamos

entender como é tratada a morte nas escolas junto aos educadores, conforme veremos no

próximo capítulo.

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3. EDUCAÇÃO SOBRE A MORTE NA ESCOLA

Com versos bem rimados

Hoje trago sorte,

Pois a rima de cordel

Servirá como transporte

Pra dar vida para a rima

Para lhes contar da morte [...]

(Sextilhas para a Morte, César Obeid

Meu Filho Pato e mais contos

sobre aquilo que ninguém quer falar)

3.1 O papel profilático das escolas

Sobre o quê ninguém quer falar e por que começar na escola? Por que educação para a

morte nas escolas? Talvez, essas indagações se façam presentes e na tentativa não só de

respondê-las, e sim, de refletir sobre este tema, alguns autores nos convidam a pensar no

papel profilático das escolas para as questões emocionais e complicações do luto, como

apontam Sukiennik (2000); Kovács (2002, 2010, 2012); Tinoco (2003); Meirelles e Sanches

(2005); Naletto (2005).

Katayama (2002) pesquisa os programas de educação sobre a morte em salas de aula

do ensino fundamental no Japão e investiga como os educadores desafiam esse tabu. Sua

inclusão no currículo escolar teve um reconhecimento significativo entre educadores no início

dos anos 90 devido a duas mudanças pelas quais o país enfrentou: uma delas se refere ao

reconhecimento formal do Ministério Japonês de Educação que em 1997, enfatizou a

necessidade de ensinar questões sobre a vida e a morte para crianças. A partir daí, cresceu

rapidamente o número de currículos escolares que passaram a incluir a educação para a morte.

A segunda mudança foi causada a partir de graves terremotos em 1994. Diante do desastre,

crianças se mostravam severamente deprimidas pela perda de familiares, com dificuldades em

voltar à rotina escolar, ou seja, educadores e estudantes tiveram que enfrentar a realidade da

morte e a dor do luto. Também ocorreu que no ano de 1997 houve um homicídio envolvendo

alunos do ensino fundamental e médio, o qual foi cometido por um aluno de 14 anos.

Katayama (2002) afirma que essa tragédia revelou a falta de entendimento sobre a

seriedade das questões de morte e vida entre as crianças japonesas. Por consequência, a

educação sobre a morte no Japão focava nos esforços para desenvolver atitudes saudáveis em

relação às questões de vida e morte, incluindo seus valores e significados, a fim de prevenir

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que estudantes se envolvessem em situações de ameaça a vida. Estes eventos tiveram um

importante impacto e impulsionaram mudanças na atitude diante do assunto morte, foi

entendido que seria uma medida preventiva, em relação aos suicídios e outras atitudes

autodestrutivas. Observou diferentes maneiras de abordar o tema em sala de aula, a começar

pela educação infantil até as séries mais avançadas, que foram desde explicações sobre o

início da vida, o ciclo reprodutivo, a educação sexual e moral, a experiência com animais, o

uso da literatura para expressar sentimentos em relação à morte, dentre outros métodos.

Aponta que apesar dos esforços, ainda é notória a falta de preparo dos professores para falar

de morte com seus alunos, e isso se evidencia pela mudança do título para „Educação sobre a

vida‟ a fim de evitar a negação da morte entre os professores.

Naletto (2005) entende que é essencial o preparo da escola para lidar com situações de

perdas, uma vez que atua com fases importantes do desenvolvimento: a infância e a

adolescência. Justifica a necessidade de o professor compreender o processo de luto e suas

implicações, considerando a escola como espaço de constante vivência de diferentes tipos de

luto. Salienta a importância da prevenção e do investimento na capacitação da escola para

enfrentar situações dolorosas. Relata sua experiência como psicóloga escolar junto à

professora de uma criança com leucemia e o processo de luto diante do seu adoecimento e

morte. Reitera a importância do papel desempenhado pelo professor, de abrir espaço para a

dor e ajudar as crianças, em sala de aula e com suas famílias, a expressarem seus sentimentos.

Isso vai de encontro a uma tendência comum dos adultos em poupar a criança de todo o

sofrimento, que pode causar uma falsa impressão de que sofrer a dor de uma perda não é

legítima. Aponta que a competência de lidar com a dor deve fazer parte do educador e do

currículo escolar: “As crianças têm muitas coisas a dizer e a saber sobre a morte, mas muitas

vezes não se expressam por falta de espaço, de receptividade” (p. 125). Ressalta a empatia e a

sensibilidade da professora como características importantes para vivenciar o luto com seus

alunos e da possibilidade de crescimento.

Desde a educação infantil, a escola que tiver uma postura e um olhar atentos para a

criança e sua dinâmica familiar pode intervir de forma mais profilática e, desta forma, ajudar

na prevenção de situações traumáticas e dificuldades no desenvolvimento emocional de seus

alunos. Isto implica atentar às questões emocionais no momento em que acontecem na vida

pessoal da criança e sua família, que se não forem consideradas no contexto escolar como, por

exemplo, uma vivência de separação, adoecimento ou morte de um parente próximo, podem

se tornar traumáticas. A escola tem um papel importante de não negligenciar e sim, de

favorecer um espaço para a sua elaboração quando percebido algum sofrimento e dificuldade,

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contando com a atuação conjunta dos professores, coordenadores, família, psicólogo

educacional e especialista, caso tenham sido encaminhados, possibilitando intervenções

psicoprofiláticas significativas (MEIRELLES e SANCHES, 2005). As autoras, quando

propõem o uso da psicanálise na instituição educacional, percebem resistência por parte de

alguns educadores que argumentam que as questões emocionais cabem aos psicólogos ou

orientadores (coordenadores), isentando-se de sua responsabilidade em relação aos seus

alunos.

Também pautada nessa perspectiva de que é na escola que as dificuldades da criança

podem se manifestar, Sukiennik (2000) falava que os educadores que estavam atentos às

mudanças de comportamento, de assiduidade, quedas no rendimento, comportamentos de

risco de seus alunos, podiam perceber sinais de luto complicado e ajudar no encaminhamento,

inclusive, perceber situações de depressão e risco de suicídio na escola durante a

adolescência. Assim como apontam Meirelles e Sanches (2005), é notório um grande número

de encaminhamentos feitos pelas escolas que chegam aos consultórios de psicologia, que em

sua maioria chegam por meio de terceiros: “escolas, pediatras, amigos das famílias, cumprem

esse papel de olhar para as crianças de uma forma mais distanciada e isenta do que os pais,

e assim conseguem perceber suas questões e sugerir os encaminhamentos” (p. 160).

Em 1980, no primeiro seminário realizado sobre o tema da educação para a morte,

coordenado pela psicóloga Wilma Torres, já se falava sobre a importância do papel do

educador, trazendo inquietações: “É por isso que devemos começar pelos educadores, porque

enquanto o educador não encontrar resposta para o problema da própria morte, ele não vai

ajudar os outros” (FEIJÓ, 1983, p. 29).

Em debate sobre a “Primeira Infância e Epigenética: um novo paradigma no

desenvolvimento infantil”, Maluf (2005) esclarece a importância de políticas públicas

voltadas a primeira infância e finaliza ilustrando com uma imagem de crianças interagindo,

sendo apresentados a elas diversos estímulos: “E eu vou finalizar com essa imagem

colocando para vocês, a importância de que psicólogos e educadores apostem na curiosidade

da criança, no desejo de aprender, no prazer de aprender durante os primeiros anos (...)”

(informação verbal) - o que nos faz pensar no cemitério como um local que desperta, também

nas crianças, curiosidades e questionamentos a respeito da morte e da vida.

Maluf (2015), na área da Psicologia da Educação, ao relatar um caso de uma criança

com a chamada queixa escolar, discute e evidencia a influência dos sentimentos e emoções na

aprendizagem e no processo de alfabetização. No recorte de um atendimento psicológico,

aponta para a importância da inclusão e participação dos pais/responsáveis da criança e do

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professor. Desta forma, o psicólogo não assume o papel, muitas vezes delegado pelas escolas,

daquele que irá resolver os problemas dos ditos “alunos que não aprendem”. Enfatiza que toda

criança é capaz de aprender. Portanto, segundo a autora, implicar a escola e a família no

processo é fundamental, como veremos no próximo item.

3.2 Parceria entre escola e família

Apesar de os estudos mencionados vislumbrarem a escola como um espaço de suporte

para situações de perdas e luto, Domingos e Maluf (2003) desenvolveram uma pesquisa sobre

as experiências dos adolescentes entre treze a dezoito anos, estudantes do ensino fundamental

e médio, de duas escolas públicas da região metropolitana de São Paulo que apontou que tanto

a escola como a família não foram percebidas por eles como fonte de suporte para suas

necessidades resultantes do luto, ao se tratar de casos específicos de perda por morte como

homicídio, suicídio e AIDS. Houve relato de adolescentes que reconheceram ter recebido

algum suporte da família, no entanto, destacam que o apoio poderia ter sido mais eficaz se o

ambiente familiar fosse mais acolhedor e tolerante ao seu luto, encorajando-os na expressão

de afetos. Da mesma forma aconteceu no ambiente escolar, embora notassem alguma ajuda de

ordem prática por parte de colegas e professores, os adolescentes enlutados consideraram um

ambiente escolar pouco responsivo em termos afetivos, tendo dificuldades em retomar e

acompanhar as atividades escolares devido a problemas de atenção e de concentração após a

perda de um ente querido. O estudo aponta para fatores de ordem individual, familiar e

escolar por trás das dificuldades dos adolescentes em lidar com a perda e conseguir suporte.

Desta forma, é fundamental diferenciar como a pessoa recebe e percebe este apoio,

pois um fator que promove proteção a uma determinada pessoa pode não ter a mesma função

de apoio para outra, como pesquisas voltadas ao atendimento a pessoas enlutadas, do LELu

apontam (FRANCO e KALAF, 2016; FRANCO e MAEDA, 2016). Nestes estudos, procura-

se compreender desde a triagem, ou seja, quando a pessoa chega à clínica, quem dá a

sustentação, se pertence à igreja, à família, às instituições educacionais, ou seja, quem a

pessoa pode contar como suporte social, que pode vir do próprio meio familiar, da religião ou

ajuda profissional, sendo este apoio muito importante para o enfrentamento do luto após a

morte de uma pessoa significativa, atentando-se aos fatores de risco e de proteção para o luto

complicado.

Existem muitas fontes de apoio possíveis ao enlutado no âmbito individual ou grupal;

ajuda especializada ou não especializada; médicos ou outros profissionais de saúde e

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voluntários; laica ou religiosa (PARKES, 1998). O que se percebe é a importância de

compreender o processo de luto como algo singular, considerando que aquele vínculo

rompido é único, portanto, cada pessoa irá vivenciar de uma forma, recebendo e percebendo o

apoio de diferentes maneiras – à sua maneira. Enquanto psicoterapeutas, entendemos que

apesar das especificidades e da existência de diferentes tipos de lutos e circunstâncias da

perda, “sabe-se que cada luto é único e não existe maneira de padronizar ou prever de que

forma o processo se dará [...]”, conforme salientam Franco e Polido (2014, p. 15).

Kovács (2012), em relação aos resultados da pesquisa de Domingos e Maluf (2003),

considera que “(...) nesses casos, família e escola deveriam trabalhar em parceria e não

empurrar a tarefa como se não coubesse realizá-las” (p. 74). Observa que a atitude defensiva

de ambos pode ser em função de a família também estar enlutada e diante de seu sofrimento

sentir-se sem condições de ajudar e os educadores sentirem-se impotentes por não terem tido

preparo em sua formação ou até mesmo por não considerarem esta, uma atribuição do

professor.

Desta maneira configura-se uma rede de apoio ineficaz, do ponto de vista dos jovens

enlutados, em que não se percebe nos adultos de sua referência, uma fonte de proteção e

segurança para as questões emocionais.

Macedo e Kublikowski (2009) também propunham uma parceria entre a escola e a

família para a construção de valores positivos dos jovens, em que foi feito um levantamento

de valores presentes nos jovens paulistanos, de 11 a 19 anos de idade, com o intuito de

planejar ações de promoção de saúde para eles, suas famílias e comunidades. Esta pesquisa é

parte do projeto “Os valores positivos e o desenvolvimento do adolescente: da vulnerabilidade

à responsabilidade”, que teve a adaptação cultural do questionário Search Institute Profiles of

Student Life: Attitudes and Behaviors (MACEDO et al., 2004) para a realidade brasileira, na

qual a partir dos 40 valores de desenvolvimento, busca-se a saúde e o bem estar dos jovens,

tendo como fundamento os fatores protetores ao desenvolvimento como o Projeto família na

escola, aproximando a convivência do adulto com o jovem.

Os resultados desta pesquisa apontam para a eficácia do instrumento utilizado para

conhecer o que os adolescentes pensam, sentem e como agem, indicando as atitudes tanto

protetoras quanto às de risco e alto risco. Assim, este estudo vai ao encontro da

responsabilidade compartilhada entre escola e família, conforme a teoria do desenvolvimento

de Benson (2006).

Paschoal (2016) mostra a importância das práticas colaborativas e dialógicas com

professores e alunos a fim de melhorar as relações no ambiente escolar; tece considerações

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acerca da função da escola e dos professores no século XXI. Trata-se de uma pesquisa-ação a

partir da demanda de uma escola interessada em ampliar a percepção e descrição que os

professores têm de seus alunos. A autora cita os 4 pilares da educação para o século XXI,

sendo eles: 1 – aprender a conhecer; 2 – aprender a fazer; 3- aprender a viver juntos e 4 –

aprender a ser, publicado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a

Cultura (UNESCO), que enfatiza “a necessidade de uma educação integral, abarcando os

aspectos cognitivos, emocionais e sociais dos alunos” (DELORS, 1996, p. 29). Discute que

no ensino que vemos em escolas públicas e privadas, os pilares 1 e 2 parecem ser os mais

valorizados, quando o aprendizado se resume apenas no currículo escolar, enfatizando assim,

a competitividade que vislumbra apenas o sucesso profissional dos alunos.

Desta forma, sua pesquisa realizada com professores, alunos, familiares e equipe

escolar do ensino fundamental (1º ao 5º ano) propõe integrar as quatro aprendizagens,

focalizando principalmente os pilares 3 e 4, que representam a função socializadora da

educação que encontram-se ameaçadas, criando atividades que possam contemplar o

autoconhecimento e o relacionamento entre professores e alunos. O estudo apresenta o

Modelo de Educação em Habilidades de Vida, proposto pela Organização Mundial da Saúde

(WHO, 1997), em que a escola é considerada o ambiente propício para o desenvolvimento

humano, sendo que as competências psicossociais são essenciais.

Destacaremos que dentre as dez competências apresentadas naquele modelo, estão o

lidar com os sentimentos e emoções, a empatia e a comunicação eficaz, ou seja, questões estas

que envolvem o luto. Portanto, este estudo recente de Paschoal (2016) evidencia que a escola

é o lugar que também cuida das habilidades para lidar com emoções, além das habilidades

cognitivas, sendo recomendada a inclusão deste modelo no currículo das escolas.

Assim, “uma escola que preocupa-se com a formação de seres humanos, para além

de conteúdos teóricos e notas no boletim, pode propiciar aos alunos novas formas de

relacionamento com os outros e com suas próprias capacidades e dificuldades” (p. 23-4).

Também aborda a importância da aproximação entre família e escola, aproximação esta que

atua na prevenção de comportamentos de risco e criando uma comunidade de aprendizado

colaborativo.

A partir destes estudos, podemos inferir que na escola que tem como base a educação

integral que engloba os aspectos cognitivos, emocionais e sociais há espaço para o luto, pois

este não está dissociado da vida escolar, já que faz parte do desenvolvimento humano e a

morte é parte da vida.

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Gorayeb (2002) já propunha o ensino de habilidades de vida em escolas brasileiras.

Gorayeb et al. (2003, 2006) relatam suas experiências com adolescentes, em que destacam a

promoção de saúde nas escolas. Assim como Paiva e Rodrigues (2008) consideram este

modelo proposto pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como uma estratégia preventiva

ao consumo de substâncias psicoativas no contexto educativo. Salientam que tal modelo atua

na prevenção já que focaliza na redução de comportamentos de risco e no aumento dos

cuidados com a saúde física e mental. Apontam para o papel da escola na prevenção e

promoção de saúde, indo ao encontro da educação para a morte nesse contexto.

Encontramos pesquisas na área da Psicologia (DOMINGOS, 2000, DOMINGOS e

MALUF, 2003; KOVÁCS, 2002, 2003, 2010, 2012; RODRIGUEZ, 2005, 2010; PAIVA,

2008, 2011) que indicam a importância do tema da morte nas escolas com crianças e

adolescentes.

Na escola, verifica-se que “o luto tem implicações no processo de ensino-

aprendizagem (...) como a escola poderia lidar com a demanda dos alunos enlutados? A

resposta a essa questão leva ao centro do debate a sempre atual discussão sobre o lugar da

afetividade nos processos de escolarização” (DOMINGOS e MALUF, 2003, p.588). Outros

questionamentos foram levantados a fim de se pensar na possibilidade do resgate da

responsabilidade da escola, sendo que os autores defendem que a escola tem um papel muito

importante na transmissão de conhecimento, e que também estejam atentos às necessidades

emocionais de seus alunos, já que no desenvolvimento psicológico, a cognição e as emoções

são indissociáveis. Para isso, salientam a importância da sensibilização para a questão do luto

e do educador como mediador por meio de treinamento e assessoria profissional.

As pesquisas de Kovács (2010, 2012) corroboram esta ideia da importância do

educador na sensibilização sobre o tema da morte nas instituições educacionais. Nesta

direção, essa autora tem se dedicado na formação dos possíveis mediadores, como

profissionais de saúde e educação, a partir de seu trabalho de livre-docência (2002).

Segundo Kovács (2012), “Educadores precisam entrar em contato com sua visão de

morte, seus processos de luto, já que exercem influência significativa em seus alunos, atentos

às suas palavras e ações. É importante haver espaço para emoções e sentimentos,

favorecendo a comunicação” (p.75).

Nesse sentido, escola e família ocupam o lugar de referência para as crianças,

assumindo os adultos o papel de cuidadores, tendo como função proteger, dar segurança e

apoio necessários, é o que se entende por base segura proposta por Bowlby (1989).

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Partindo da ideia de que para cada criança enlutada, há também, no mínimo, um adulto

enlutado, uma família em sofrimento, a escola nesse momento de crise tem um papel

fundamental de suporte, conforme explicação a seguir:

O educador pode ter o papel de cuidador na escola, complementando o papel da

família. Esse papel é fundamental quando os pais estão destroçados pelas perdas

vividas e não conseguem cuidar dos filhos. Os professores, pela convivência diária

com as crianças, têm conhecimento de suas reações e atitudes e podem ser referência

para elas nesse momento de sofrimento e dor (KOVÁCS, 2010, p.152-3).

A questão que a autora coloca é se os educadores estão preparados e se desejam

desempenhar essa função. A seguir, adentraremos as salas de aula, apresentando trabalhos em

que foi possível realizar essa aproximação do tema da morte junto aos educadores,

sensibilizando-os por meio de diferentes recursos e, sobretudo, potencializando-os em seu

papel de cuidador.

3.3 A Morte respondeu a chamada: estou presente na sala de aula

O tema da morte invade o seu cotidiano escolar. Os professores são impactados por

isso e não se sentem preparados para lidar com esta tarefa, conforme aponta Domingos

(2000).

Em consulta ao Programa Amigos do Zippy 1, vemos que trata-se de um programa de

Educação Emocional, ligado à Associação pela Saúde Emocional da Criança (ASEC), voltado

para crianças em idade escolar, do 1º e 2º ano do ensino fundamental. A proposta é ensinar as

crianças a lidarem com as dificuldades do cotidiano, identificando sentimentos, incentivando-

os a conversarem sobre eles, interagindo de forma mais saudável. Dentre as práticas

pedagógicas, há um módulo que trata sobre as mudanças da vida, incluindo perdas e morte,

tendo como proposta de atividade a visita ao cemitério, conforme se lê a explicação do

Módulo 5 – Lidando com mudanças e perdas:

Este módulo trata de como lidar com mudanças, tanto grandes quanto pequenas. A

maior mudança de todas é quando alguém morre. Embora os adultos constantemente

achem a morte um assunto muito difícil de ser discutido, isso raramente acontece

entre crianças pequenas. Elas recebem muito bem a oportunidade de falar

abertamente a respeito de um tópico que se tornou tabu para muitos adultos.

O Programa entende o professor como facilitador do desenvolvimento emocional dos

seus alunos e, por este motivo, promove a capacitação para educadores. O Programa Amigos

1 Programa Amigos do Zippy – <http://www.amigosdozippy.org.br>.

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do Zippy é originário de Londres, Inglaterra, desenvolvido por um grupo multidisciplinar de

especialistas. No Brasil foi implementado pelo Centro de Valorização da Vida (CVV),

entidade que oferece apoio emocional desde 1962, gratuitamente. Em 2004 o Programa teve a

sua primeira escala piloto, realizada com 276 crianças, de oito instituições da grande São

Paulo.

Kovács (2005) analisou e emitiu um laudo dessa primeira escala piloto. No laudo

constam a aprovação e os benefícios observados no comportamento das crianças,

demonstrando resultados positivos, semelhantes aos que estavam sendo obtidos em outros

países. Sugere que o Programa possa ser expandido para outras escolas, ampliando para

escolas públicas e para séries posteriores. Aponta que o Programa foi desenvolvido na

Europa, com o objetivo de atuar na prevenção do suicídio ou comportamento autodestrutivo,

que se não cuidados precocemente, podem acarretar em sérios problemas no desenvolvimento

futuro. Conclui que o Programa contribuiu na diminuição de comportamento agressivo e de

respostas de não envolvimento das crianças, ao passo que respostas de comunicação, de

percepção e expressão de sentimentos, de busca de ajuda, de colaboração com os outros,

tiveram um aumento significativo, o que demonstra ampliação de seus recursos de

enfrentamento diante de situações difíceis. Foi feita uma avaliação para que as crianças

pudessem opinar sobre a sua participação no Programa, o que resultou na aprendizagem das

áreas emocional e relacional, ajudando-os a lidarem melhor com seus sentimentos; da mesma

forma com os professores, que consideraram importante a capacitação recebida bem como o

material didático, o que ampliou sua visão e escuta para o lado emocional de seus alunos.

Kovács (2012) aponta pesquisa realizada com 478 professores do ensino fundamental

de escolas participantes do Programa Amigos do Zippy, tendo como principais resultados a

afirmação de que é necessário um preparo para lidar com o tema da morte, apesar de não

sentirem-se preparados, a morte ocorre com todos e, portanto, entendem que é um assunto que

não deve ser evitado. As questões religiosas são apontadas como difíceis de serem abordadas

e reconhecem a importância do tema ser tratado no cotidiano escolar, promovendo espaços de

reflexão. Esta pesquisa foi intitulada “A questão da morte nas instituições de saúde e

educação. Do interdito à possibilidade de comunicação entre profissionais de saúde e

educação” (p. 158), realizada no período entre 2006-2009, em que os educadores apontam

que a orientação de especialistas os ajudaria a abordar o tema da morte com seus alunos,

sendo que a maioria não se sente devidamente capacitada desde a sua formação, conforme

descreve Kovács (2010).

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Kovács (2012) observou que os professores que participam deste Programa

consideram que a morte é preocupação deles, apresentam capacidade reflexiva sobre o tema,

atentos às suas necessidades e que a preparação os ajudaria a lidar melhor no trato com os

alunos.

Também realizado pelo Laboratório de Estudos sobre a Morte (LEM/IPUSP),

desenvolveu-se o Projeto “Falando de morte” que é composto por quatro filmes, conforme

listados abaixo por Kovács (2010, p. 155-6):

“Falando de morte com a criança” (1997 e modificado em 2005);

“Falando de morte com o adolescente” (1999 e modificado em 2002);

“Falando de morte com o idoso” (2001);

“Falando de morte com os profissionais de saúde” (2004)

Como contribuição na Educação para a morte, sua elaboração teve como proposta

facilitar a comunicação sobre o tema com fins didáticos e preventivos. A autora (KOVÁCS,

2010) sugere que os dois primeiros filmes, direcionados às crianças e adolescentes, podem ser

utilizados como recursos de sensibilização para familiares e educadores, ao discutir o tema

nas escolas.

O filme para crianças aborda a morte do outro e o processo de luto e a própria morte.

Mostra a universalidade da morte, enfatizando que o rompimento de um vínculo desperta

muitos sentimentos, inclusive, o sentimento de culpa na criança. Quando a criança adoece

pode sentir a ameaça da própria morte, despertando o sentimento de medo da morte e dos

procedimentos hospitalares, assim, há o estímulo para que a criança atribua significados a seu

adoecimento e perceba seus sentimentos diante das perdas em vida, como a separação,

internações, e as reações dos familiares. Já com os adolescentes, o filme focaliza os

comportamentos de risco e autodestrutivo, considerando que neste período há grande índice

de suicídios. Propõe que o mesmo seja discutido com os adolescentes junto aos pais,

educadores e profissionais de saúde promovendo a reflexão tanto em sala de aula como em

casa (KOVÁCS, 2010).

Além desses, há o filme específico “Falando de morte na escola” (2003) que apresenta

propostas que podem auxiliar os educadores a tratar a temática morte com seus alunos no

acolhimento da dor do luto e quebrando o tabu ao falar abertamente e sem metáforas,

conforme se lê no portal do LEM sobre a produção dos vídeos didáticos sobre a morte.

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Rodriguez e Kovács (2005) trouxeram contribuições na educação para a morte em

escolas com adolescentes, em que realizaram uma pesquisa para saber qual a opinião dos

próprios adolescentes sobre o aumento da taxa de mortalidade nesta faixa etária e como estes

relacionam-se com o tema da morte. Para isso, utilizaram como recurso o vídeo “Falando de

morte com adolescentes”, seguido de discussões. As autoras explicam que este vídeo faz parte

do Projeto “Falando de Morte” (versão: 2003) que envolveu especialistas na área do luto

(KOVÁCS; ESSLINGER; VAICIUNAS; BROMBERG e MARQUES, 1997/2004), do LEM.

Os participantes foram duas escolas com alunos do ensino fundamental e médio; como

resultados os jovens apontam para a importância desse espaço de discussão em que se sintam

acolhidos e compreendidos, contrários a uma postura de julgamento por parte dos adultos.

Também não percebem a possibilidade da própria morte, não sendo este um motivo de

preocupação para eles, o que aponta para os sentimentos de imortalidade e onipotência e

dentre as hipóteses sobre os altos índices de mortalidade na adolescência, destacou-se o uso

de drogas e violência urbana, somado a outros fatores de vulnerabilidade social. A pesquisa

nos atenta que as mortes dos jovens estão relacionadas por causas “externas” e violentas,

como homicídios, suicídios e acidentes de trânsito, discutindo assim, a importância de

medidas preventivas, que é a proposta da educação para a morte.

No contexto hospitalar, Paiva (2000) estudou a relação dos médicos com seus

pacientes e observou intenso sofrimento por parte dos médicos que justificaram o seu

distanciamento e frieza, apontando para a falta de preparo para lidar com as questões de

finitude de seus pacientes. Em 2011, depara-se com a mesma fala – a falta de preparo –

porém, desta vez, por parte dos educadores. Constata que essa fala é recorrente tanto por

profissionais de saúde como de educação. A autora se questiona: “(...) De que adianta dizer

que não fomos preparados para essa tarefa? Será que, realmente, existe a disponibilidade

para esse possível preparo?” (p.24).

Em função destas indagações e instigada a buscar alternativas de preparo dos

cuidadores, para que possam acolher os questionamentos advindos de diferentes idades e fases

da vida, desde a infância, focalizou sua pesquisa no preparo de profissionais da área da

educação para lidar com situações de morte, perdas e luto, visto que a morte não é tida,

culturalmente, como parte da educação. Contou com a participação de professores de escolas

públicas e privadas, para verificar como abordam a temática morte utilizando a literatura

infantil como recurso facilitador com crianças e adolescentes. Dos 36 livros apresentados

sobre a morte, os professores fizeram apreciações sobre a sua utilização com seus alunos,

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resultando que os livros como um recurso pedagógico, ainda são pouco utilizados nas escolas

(PAIVA, 2008, 2011).

Zambeli (2014) também entende que a morte faz parte do cotidiano das crianças e que,

muitas vezes, são os adultos que velam falar deste assunto na tentativa de protegê-las, o que

acaba gerando desamparo nas crianças. A partir de sua experiência, entende que a morte nas

escolas, e principalmente com crianças pequenas permanece velada. Assim como Paiva

(2008) também seleciona livros de literatura infantil, no total 12, que abordam o tema da

morte, analisando-os para subsidiar trabalhos que poderão ser desenvolvidos na Educação

Infantil, contribuindo para a quebra de um tabu: o de falar, escutar e contar histórias sobre a

morte com crianças.

A equipe do LELu (FRANCO et al., 2016), inserida no projeto de pesquisa e extensão,

além de realizar intervenções voltadas aos servidores do serviço funerário e aos munícipes,

também se dedicou ao tema da educação para a morte nas escolas, a partir da solicitação do

SFMSP que houvesse intervenções junto à Secretaria da Educação. Respondendo a essa

demanda, ao longo do convênio, o LELu então realizou quatro encontros formativos com

profissionais da rede municipal de ensino da cidade de São Paulo, com a temática “Luto

Infantil e Parental”, com o objetivo de capacitar professores para a aproximação do tema da

educação para a morte no ambiente escolar. A princípio foi planejada uma aula teórica sobre o

panorama geral dos estudos mais recentes sobre o luto, na qual destacou as peculiaridades do

luto infantil; a visão sistêmica e o luto na família; as dimensões e reações comuns ao luto; o

Modelo do Processo Dual do Luto como uma nova compreensão oposta às fases do luto, mais

popularmente conhecida. Apesar dos fins didáticos, os professores trouxeram relatos de

experiências pessoais e no ambiente de trabalho, sobretudo, em situações de violência urbana.

Assim, o encontro também promoveu um espaço de troca e compartilhamento, de

sensibilização e empatia, apontando o quanto o tema da morte está presente no cotidiano

escolar.

Os encontros formativos aconteceram na Pontifícia Universidade Católica de São

Paulo, coordenados pela Professora Dra. Maria Helena Pereira Franco. A equipe pensou numa

intervenção que vislumbrasse em longo prazo e, para isso, elaborou um material educativo

para ser utilizado nas escolas, composto por dois livretos: um direcionado à criança e outro ao

educador; composto por atividades para ajudar as crianças e orientações para os professores.

Teve como objetivo que tal material servisse como instrumento facilitador na comunicação da

educação para a morte. A proposta desses materiais educativos foi entregue ao SFMSP, ao

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final do convênio, como parte da produção do projeto, portanto, a sua distribuição e a

efetivação do seu uso nas escolas fica de inteira responsabilidade da autarquia.

Ainda em contribuição para a Secretaria da Educação, a coordenadora do LELu

também participou em 16 de março de 2016, do Seminário Regional “Luto Infantil e

Parental”, na Diretoria Regional de Educação (DRE) em São Miguel Paulista. Do público

alvo envolveu profissionais do SFMSP; profissionais da educação da DRE São Miguel

Paulista; profissionais da Assistência Social Local; professores da Rede de Proteção Social

Local e profissionais da Saúde – Coordenadoria Regional de Saúde Leste, de São Paulo.

Destaca-se assim a abrangência e a importância do tema da morte e do luto na área da

Educação.

Como vimos, a morte está presente no cotidiano das crianças. Nas mais diversas

histórias: contadas, criadas, imaginadas e vividas. Está estampada na literatura, nos livros

infantis por meio de poesias, desenhos, contos. Nos livros preparatórios para o treinamento

dos educadores, permitindo a criação de personagens que ganham vida: como é o caso do

amigo Zippy. Livros com atividades, que também ajudam os adultos a conversarem em

família ou na escola sobre o assunto. Nos filmes, fotografias ou até mesmo conhecendo um

cemitério, podemos aprender sobre a morte e, por tratar-se de aprender, no próximo capítulo

buscamos essa compreensão: afinal, como a criança aprende sobre a morte?

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4. EXPERIÊNCIAS DE PERDA E MORTE NA INFÂNCIA

- Pai, a mãe morreu?

- Quatrocentas vezes.

- Como?

- Já vos disse quatrocentas vezes: a vossa

mãe morreu, morreu toda, faz de conta

que nunca esteve viva.

- E está enterrada onde?

- Ora, está enterrada em toda parte.

(MIA COUTO, Antes de nascer o mundo, 2009, p. 21)

4.1 Luto na infância

A ideia deste capítulo é discorrer acerca de como a criança aprende sobre a morte.

Para isso, ilustraremos com um trecho literário de Mia Couto (2009) a respeito da vivência do

luto infantil e os questionamentos e inquietudes de uma criança diante da morte de sua mãe:

“(...) nossa ausente mãe, a causa de todas as estranhezas. Em lugar de se esfumar o

antigamente, ela se imiscuía nas frestas do silêncio, nas reentrâncias da noite. E não havia

como dar enterro àquele fantasma. A sua misteriosa morte, sem causa nem aparência, não a

roubara do mundo dos vivos” (p.21). O personagem nos mostra como a morte está presente

em sua vida ao fazer inúmeras perguntas ao pai, na tentativa de entender o que aconteceu com

sua amada mãe. Observamos que neste conto, os filhos buscam respostas com seus adultos de

referência, e assim acontece na vida real e fictícia.

“A criança aprende com o adulto a lidar com perdas. Se este não está acessível e oculta

sentimentos, a criança registrará essa forma de enfrentar a situação. Observa-se então a

solidão dos envolvidos, cada um com seu sofrimento” (KOVÁCS, 2010, p. 153).

A respeito das fantasias da criança enlutada pela morte de um ou ambos os pais e sua

relação com o processo de elaboração do luto, sob o enfoque psicanalítico, Franco e Mazorra

(2007) apreenderam a partir de estudos de caso com crianças de três a oito anos de idade,

indicadas para psicoterapia de luto no LELu, fantasias de: aniquilamento, culpa, castração,

onipotência, rejeição, identificação, retaliação, idealização e desidealização do objeto perdido;

agressividade; negação da perda; regressão; reparação; repetição da situação da perda. O

resultado da pesquisa indica que trabalhar somente com a criança enlutada e suas fantasias

não parece ser tão eficiente quanto intervir, sobretudo inicialmente, também com a família,

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considerando que a elaboração do luto, na criança, está ligada ao processo de elaboração do

luto familiar e suas fantasmáticas inconscientes.

Recorremos novamente ao personagem de Mia Couto que exemplifica a fantasia de

culpa na criança pela morte do genitor: “E me veio à mente que eu era culpado da minha

própria orfandade. Minha mãe morrera não porque tivesse deixado de viver, mas porque

havia separado o seu corpo do meu. Todo nascimento é uma exclusão, uma mutilação.”

(p.26).

Autores que estudam sobre o luto infantil como Mazorra (2001), Hispagnol (2011),

Bousso (2011) e Franco e Polido (2014) discorrem a respeito da importância em atentar-se à

família, nos casos de psicoterapia de luto com crianças.

Hispagnol (2011), a partir de um estudo de caso com uma família que perdeu um dos

membros, e da qual fazia parte uma criança de seis anos que perdeu o seu pai, reforça ainda

que trabalhar somente com as crianças pode ser mais suscetível a erros, correndo menos riscos

ao inserir a família no trabalho psicoterapêutico, embasada pela premissa de Bowlby (2006

[1981]) de que a melhor forma de cuidar de seus filhos é cuidando de seus pais. Em sua

pesquisa busca compreender o luto infantil a luz dos significados familiares, demonstrando de

que forma estes adultos de referência coconstroem o processo de luto da criança, uma vez que

é nesse contexto que ela está inserida.

Franco e Polido (2014), ao apresentarem um caso clínico de uma criança que perdeu o

pai, têm como objetivo ilustrar a importância da saúde mental familiar no processo de luto

infantil, no qual discutem que “a evolução do processo de luto da criança será, por

conseguinte, diretamente influenciada pela dinâmica do luto familiar, ou seja, vai depender

muito dos recursos de enfrentamento das pessoas que passarão a cuidá-la a partir de então”

(p. 46) – ressaltando que muito possivelmente estes adultos também estão enlutados e poderão

precisar de ajuda, ou seja, de serem igualmente cuidados.

Estudos (WORDEN, 1996; MAZORRA, 2001; MAZORRA e TINOCO, 2005;

MONROE e KRAUS, 2005; HISPAGNOL, 2011) foram realizados para validar o luto da

criança, em decorrência da perda de uma figura significativa, propondo intervenções para

crianças enlutadas, em diferentes contextos.

Casellato (2013), ao citar Doka (1989) a respeito do conceito de luto não reconhecido,

cunhado por aquele autor, destaca que a razão pela qual o enlutado não é reconhecido “ocorre

quando a pessoa não é socialmente definida como capaz de enlutar-se; há pouco ou nenhum

reconhecimento do seu senso de perda ou necessidade de enlutamento. (p. 22), facilmente se

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percebe nos casos de luto infantil, pois a criança não é percebida como capaz de compreender

ou reagir à perda de um relacionamento significativo.

Pessoa (2017), em estudo exploratório a respeito da percepção de adultos jovens sobre

a perda de um irmão na infância, aponta que uma perda ocorrida na infância será revisitada e

ressignificada ao longo da vida. Dando enfoque à relação fraterna, observou que esta perda

pode produzir transformações em diferentes aspectos do desenvolvimento emocional e que

falar sobre o luto é benéfico para o enlutado.

4.2 Participação da criança nos rituais fúnebres

Considerando que “Os mortos não morrem quando deixam de viver, mas quando os

votamos ao esquecimento” (COUTO, 2009, p. 39), podemos entender que os rituais servem

para perpetuar a lembrança do morto, possibilitando homenagens e mantendo-os vivos na

memória daqueles que os amam.

Como bem explicou Morin (1997, p. 25), desde a pré-história “o cadáver humano já

então suscitou emoções que se socializaram em práticas funerárias, e esta conservação do

cadáver implica um prolongamento da vida. O não-abandono dos mortos implica a

sobrevivência deles”. Exemplifica com os koriaks do leste siberiano ao lançarem seus mortos

ao mar, confiando-os ao oceano, e não os abandonam. Desta forma, explica que não existe

nenhum grupo arcaico, por mais primitivo que seja, que abandone seus mortos sem ritos.

Houve tempos em que a atitude do homem diante da morte era de espera, aceitação e

proximidade. O moribundo esperava a própria morte ao leito, era organizada por ele a

cerimônia pública, em que tinha parentes, amigos, vizinhos ao seu redor, e que também

contava com a participação das crianças nos rituais de despedida. A esta morte familiar

retratada na história da morte no ocidente, Ariès (2003[1975]) denominou de morte domada –

era um evento público, social e natural, pois fazia parte da vida de todos “(...) não há

representação de um quarto de moribundo até o século XVIII sem algumas crianças. E

quando se pensa nos cuidados tomados hoje em dia para afastar as crianças das coisas da

morte” (p.34-5). Nascer e morrer, tal e qual, aconteciam em público. A antiga atitude se opõe

à nossa atual, em que a morte amedronta de tal maneira que não mais se ousa dizer nem

sequer seu nome.

“Hoje, basta apenas enunciá-la para provocar uma tensão emocional incompatível

com a regularidade da vida quotidiana” (p. 241-2). Assim considerando, podemos dizer que

nos tempos atuais é até ousado pronunciá-la - falar da morte - ainda mais com as crianças.

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Nos cortejos fúnebres dos séculos XVI e XVII, participavam figurantes análogos,

carpideiras, pobres e crianças de hospitais, que eram vestidos para tal ocasião com vestes

negras e, em troca, ao final da cerimônia recebiam esmolas. Houve reclusão e afastamento da

família na ritualização do luto; as crianças da burguesia francesa e das classes médias são

afastadas, pois as cerimônias assumem um papel traumatizante. Essa revelação se mostra a

partir de testamentos do século XVII, em que o testador ansiava pela participação de parentes,

inclusive, insistia e reclamava a presença das crianças em seu cortejo. Assim, quase nunca as

crianças participavam nos enterros de seus avós. Havia a presença de crianças, porém

desconhecidas ao morto, sem vínculo afetivo “Nas numerosas representações do moribundo

em seu quarto apinhado de gente, o pintor ou gravador nunca esquecia de colocar uma

criança” (p.257). Foi a partir da segunda metade do século XIX, que a presença da criança,

que antes assistia à grande cena da despedida, começou a provocar um mal-estar; foram

afastadas do leito de morte dos moribundos, no entanto, as crianças participavam das exéquias

(funerais, cerimônias prestadas aos mortos) nas quais eram vestidas de negro dos pés à

cabeça. Na sociedade moderna, observa-se que “já não são as crianças que nascem dentro de

repolhos, mas os mortos que desaparecem por entre as flores” (p.260) – como exemplo, na

França a explicação dada à criança que perdeu seu avô, é que este viajou para muito longe e,

na Inglaterra, que o morto descansa num lindo jardim junto às flores madressilvas (ARIÈS,

2003[1975]).

Autores como Schachter (1991, 1992), Shoen et al. (2004), Kovács (2012) e Esslinger

(2015) apontam como importante a participação da criança nos rituais de despedida, como

velórios e enterros, podendo ajudar na sua elaboração da perda e na construção de

significados junto a família. Os rituais oferecem conforto e suporte, em que se tem a

oportunidade de despedir-se do falecido, de expressar suas emoções e compartilhar a dor.

Em nossa sociedade, ainda é significativo o número de pessoas que questionam a

necessidade de envolver as crianças nos rituais após a morte de um ente querido. Muitos

desses questionamentos camuflam a dificuldade dos adultos em lidar com o sofrimento e

expressá-lo. Desse modo, burlam com muita frequência a necessidade da criança, excluindo-a,

alegando que ela não tem maturidade para compreender, nem tampouco, capacidade para

enfrentar a situação (CASELLATO, 2013).

Esslinger (2015), diante do questionamento se crianças devem ou não participar dos

rituais de enterro e velório, salienta a importância de considerar a singularidade de cada caso e

história, mas, de modo geral, entende que sua participação possa ser positiva, desde que um

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adulto possa estar com a criança, oferecendo-lhe suporte, e explicando a ela o que está

acontecendo.

Trata-se de oferecer base segura para a criança, conforme Bowlby (1989, p.25) a

conceitua como comportamento de cuidados por parte dos adultos (ambos os pais) ou que

desempenham esta função:

[...] a partir da qual uma criança ou um adolescente podem explorar o mundo e a ele

retornar certos de que serão bem-vindos, nutridos física e emocionalmente,

confortados se houver um sofrimento e encorajados se estiverem amedrontados.

Essencialmente, estar disponível, pronto para responder quando solicitado, para

encorajar, dar assistência, porém só intervindo ativamente quando for claramente

necessário.

Existem livros (CARNEY, 1995; JOHNSON e JOHNSON, 1997; HEEGAARD,

1998; HISATUGO, 2000) que abordam o tema da participação das crianças nos rituais

fúnebres, ajudando o adulto a conversar sobre este momento de despedida, em que familiares

e amigos se reúnem, sendo esperado que as pessoas se emocionem e expressem sua dor de

maneiras diferentes.

O Departamento de Serviço Social, do St. Christopher´s Hospice em Londres,

elaborou um guia intitulado “Someone Special has died” (1989) voltado para as crianças, no

qual dialoga sobre o que acontece quando uma pessoa significativa morre, incluindo

explicações sobre o funeral e as emoções que envolvem esse momento de despedida.

Costa e Hahn (2005) relatam experiência de intervenção com famílias enlutadas numa

empresa funerária, localizada em Caxias do Sul-RS. O projeto „Acompanhamento Psicológico

às famílias em situação de luto recente‟ criado em 2000, propunha o acompanhamento desde a

contratação do serviço funerário até o sepultamento. Além de intervir com foco nas situações

emergenciais, no treinamento específico em luto para os funcionários, também se deteve a

orientar as famílias sobre como inserir a criança no momento de despedida da pessoa falecida.

As autoras elaboraram um folheto informativo de „Orientações em Relação às Crianças no

Momento da Morte‟, material que fica disponível para as famílias. Nele, orientam como sendo

importante a participação da criança no funeral, desde que respeitado o seu desejo, assim

como o tempo de permanência por ela tolerado, preferencialmente, pouco tempo.

Apresentam-se as orientações mais as diretivas presentes na discussão do folheto

informativo se as crianças devem participar do funeral (COSTA e HANH, 2005, p. 143):

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Escolha momentos mais propícios evitando levá-la a abertura da sala velatória e ao

fechamento da urna, para preservá-la do impacto frente a possíveis reações de

desespero dos adultos.

Prepare-a antes, explicando as questões práticas de um velório, o que a criança irá

encontrar.

Preferencialmente, alguém que a criança confie deverá acompanhá-la, segurando-a

no colo ou pela mão para que se sinta mais segura.

Não a force a nada, como chegar perto da pessoa falecida, encostar ou beijá-la.

Mantenha-se disponível para responder perguntas sobre velório, urna, enterro, etc.

Para ajudar a família a lidar e a facilitar o processo de luto da criança, de modo geral,

Costa e Hanh (2005) apontam como fundamental a presença de um adulto que ofereça

continência e confiança, assegurando que a criança será cuidada, garantindo a manutenção do

amparo, ou seja, antes, durante e depois dos rituais; ressaltam a importância de estimular a

expressão dos sentimentos e possíveis fantasias, e que também seja inserida no circuito de

apoio, para que se sinta pertencente à família e capaz de tolerar e enfrentar situações que

causam sofrimento. Os objetivos que envolvem o processo de luto e apoio à família foram

pautados nos estudos de Bromberg (1998) e Parkes (1998).

Na pesquisa de Pessoa (2017) sobre o luto pela perda de um irmão na infância, dentre

as categorias emergentes a partir das falas dos seus participantes, adultos jovens, a

participação nos eventos relacionados à perda do irmão foi entendido como um fator

importante para a compreensão do processo de luto. Portanto, revisitar como se deu tal

participação nos rituais de despedida é um elemento significativo para a ressignicação ao

longo da vida.

Como vimos, desde a antiguidade até os dias atuais, lidar com a participação das

crianças nos rituais é algo passível de conflitos, inquietações, reflexões e mudanças.

Profissionais brasileiros e estudiosos do luto (COSTA e HAHN, 2005; KOVÁCS, 2012;

ESSLINGER, 2015) têm se dedicado a este debate, apontando como sendo importante a

participação da criança nos rituais de despedida, podendo ajudar na elaboração da perda,

desde que se tenha um adulto de confiança por parte da criança, a quem ela possa contar e ser

cuidada.

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4.3 Desenvolvimento: processo de aquisição do conceito de morte

Ao considerar a morte como um desafio cognitivo e afetivo, Torres (2012[1999]) parte

da compreensão de que o conceito de morte não é um conceito unitário, e para que se tenha

uma visão mais clara da compreensão da criança a respeito da morte em diferentes etapas do

seu desenvolvimento, sua apreciação requisita uma abordagem multidimensional. Antes de se

aprofundar nas pesquisas sobre a aquisição do conceito de morte na criança, entende como

sendo importante definir os principais componentes ou dimensões do conceito de morte:

irreversibilidade, não funcionalidade e universalidade. Trata-se, respectivamente, de

compreender o aspecto biológico do corpo físico, impossibilitando retornar ao estado anterior;

também chamado de disfuncionalidade, refere-se ao entendimento de que as funções que

mantinham a vida cessam com a morte e, por último, a compreensão de que tudo o que é vivo

morrerá, ou seja, é um evento pessoal inevitável.

Para Torres (2012[1999]), a morte foi o seu objeto de estudo, e para compreender o

desenvolvimento do conceito de morte na criança, fundamenta seus estudos nos estágios do

desenvolvimento de Piaget, considerando como características fundamentais a

irreversibilidade, a universalidade, a funcionalidade e a causalidade. Apresenta um

compilado de diversas pesquisas já realizadas, que partem de diferentes critérios para

compreender o desenvolvimento do conceito de morte na criança, em relação a: idade

cronológica, nível cognitivo e situações socioexperienciais de confronto com a morte

(experiência de perda, terminalidade, suicídio e privação socioeconômica e cultural).

Uma das pioneiras, Nagy (1948, 1959), apud Torres (2012[1999]), analisou em

crianças húngaras com idades entre 3 a 10 anos, o desenvolvimento do conceito de morte

tendo como critério a idade cronológica para, posteriormente, considerar o nível cognitivo.

Destaca três etapas a partir da análise da expressão da morte por meio de palavras ou

desenhos das crianças:

• Até 5 anos (Etapa 1) - a criança percebe a morte como sendo reversível, assim como

acontece no sono ou na separação; não a vê como definitiva, entende como sendo

gradual e temporária.

• 5 a 9 anos (Etapa 2) – compreende a dimensão da irreversibilidade, porém ainda não

como inevitável. Observa-se que há tendência para personificar a morte.

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• Acima de 9 anos (Etapa 3) – compreende a inevitabilidade da morte, reconhece que é

a cessação das atividades do corpo e que acontece com todos os seres vivos, logo,

entende a natureza universal da morte.

De acordo com DeSpelder e Strickland (2015), em relação ao desenvolvimento

cognitivo destacam as contribuições dos estudos de Piaget (1929, 1973) e Erikson (1950) na

forma como as crianças compreendem a morte ao longo do desenvolvimento.

Em relação a situações de confronto com a própria morte, pesquisas apontam

(RAIMBAULT, 1979; PINTO, 1996; CHIATTONE, 2003) que crianças gravemente

enfermas, diante da iminência da morte, evidenciam a capacidade de percepção da morte bem

como a antecipação dos conceitos e o enfrentamento do processo de luto.

DeSpelder e Strickland (2015) no capitulo „Aprendendo sobre a morte‟ por meio da

socialização, abrem o capítulo com a imagem de uma criança e seu pai, na China, na qual

fazem uma oferenda no túmulo de seus antepassados durante cerimônias de cremação. Desta

forma, entendem que as tradições religiosas e culturais passadas ao longo das gerações

sucessivas através de processos de socialização são importantes para que o aprendizado sobre

a morte se dê ao longo da vida, desde a infância. Conforme uma criança cresce, ela vai

introduzindo várias experiências de morte, seus conceitos e respostas à morte começam a se

assemelhar aos dos adultos na cultura. Assim, “como outros aspectos do desenvolvimento

humano, a compreensão da morte evolui à medida que as experiências estimulam a

reavaliação de conhecimentos, crenças e atitudes anteriormente mantidos” (p. 49). Observam

ainda que na idade escolar reações comuns de pesar no período da infância incluem

problemas escolares e de aprendizagem, fobias, raiva e hipocondria.

Agentes de socialização

Adquirir uma compreensão madura da morte é parte do processo de

desenvolvimento conhecido como socialização – isto é, o processo pelo qual um indivíduo se

torna identificado como membro de uma determinada cultura, aprendendo e internalizando as

normas, valores, regras e comportamentos da sociedade. A socialização primária é definida

como a preparação de uma criança para a participação na sociedade adulta, como o exemplo

da imagem acima citada, do pai com o seu filho num ritual da cultura. Ainda que as principais

fases da socialização aconteçam durante a infância, é importante salientar que ela não se

esgota nesta fase, pelo contrário, continua ao longo da vida, ao passo que os indivíduos

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desempenham novos papeis sociais e com estes, desenvolvem novas atitudes, valores e

crenças. Portanto, não se trata de um processo unidirecional pelo qual os indivíduos

simplesmente aprendem a se encaixar na sociedade – são entendidos como processos de

socialização bi-direcionais, ou seja, estão em constante mudança. A socialização tem

influências diversas, que se inicia na família, estendendo-se aos grupos de pares, na escola e

no trabalho, em situações sociais e através da socialização vicária pela mídia popular e

diversidade cultural. Nunca se teve uma gama de influências sobre a socialização, no qual

crianças e adultos são expostos, como acontece atualmente. A socialização secundária é

definida como a aprendizagem de novas regras e comportamentos, como ocorre quando a

criança entra na escola. Em suma, entende-se como agentes de socialização: a família, a

escola e seus pares, as mídias de massa (internet, televisão, jornais, livros), literatura infantil e

religião. (DESPELDER e STRICKLAND, 2015). Focalizaremos na família e na escola, já

que são os agentes de socialização que se destacam nesta dissertação. Os autores apontam que

a primeira fonte de educação sobre a morte em nossas vidas é a família, sua influência

continua ao longo de nossas vidas, inclusive, os membros da família falecidos, também

podem servir como agentes de socialização. Suscitam reflexões, como pensar na própria

infância: “Que mensagens você recebeu sobre a morte que permanecem até hoje no fundo de

sua mente?” (p.68).

Despelder e Strickland (2015) referem que é na escola que se amplia a rede social de

uma criança, logo, há um aumento na aprendizagem sobre a morte. Nessa visão, as escolas

ensinam mais do que aprender a ler e escrever; é o espaço em que as relações entre pares se

ampliam, assim como amigos, vizinhos, ambientes de lazer também influenciam na

socialização ao longo da vida “Como diz Hannelore Wass: As crianças adotam muitos valores

e crenças de adultos significativos em seu mundo (inclusive) pais, professores, figuras

públicas, heróis esportivos e artistas famosos” (p. 68).

Considerando que tanto a mídia de massa como a literatura têm uma poderosa

influência socializadora e que estas estão presentes tanto no cotidiano familiar e escolar da

criança, ilustra-se com a foto de uma avó com sua neta lendo um livro sobre perdas, na qual

compartilham um momento especial. Um ensinamento valioso para reflexão é de que

“ocasiões para discutir a morte surgem naturalmente das nossas interações com as crianças.

Muitas vezes, a contribuição mais importante que um adulto pode fazer para a aprendizagem

da criança é simplesmente ser um bom ouvinte” (DESPELDER e STRICKLAND, 2015, p.

74).

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5. MÉTODO

5.1 Tipo de Pesquisa

Para compreender como os professores de São Paulo percebem a questão da educação

sobre a morte a partir da experiência de levar os seus alunos para a visita guiada ao Cemitério

Consolação, realizou-se uma pesquisa de natureza qualitativa e interpretativa.

Creswell (2010) propõe uma discussão das características gerais da pesquisa

qualitativa, considerando que a pesquisa ocorre no ambiente natural, baseia-se no pesquisador

como instrumento para coleta de dados, emprega múltiplos métodos de coleta de dados, é

indutiva, é baseada no significado dos participantes, é emergente, frequentemente envolve o

uso de uma lente teórica, é interpretativa e holística. O mesmo autor aponta ainda que na

pesquisa qualitativa a ideia que a fundamenta é de que o pesquisador possa aprender sobre o

problema ou questão com os participantes e lidar com a pesquisa de modo a obter essas

informações.

No que se refere a questões conceituais, conforme Denzin e Lincoln (2006), a pesquisa

qualitativa é, em si mesma, um campo de investigação e apontam como definição inicial da

pesquisa qualitativa:

(...) envolve uma abordagem naturalista, interpretativa, para o mundo, o que

significa que seus pesquisadores estudam as coisas em seus cenários naturais,

tentando entender, ou interpretar, os fenômenos em termos dos significados que as

pessoas a eles conferem. (DENZIN e LINCOLN, 2006, p. 17)

Acerca da natureza interpretativa, os mesmos autores referem que os pesquisadores

dessa área, com o intuito de conseguirem compreender melhor o assunto em questão,

utilizam-se de uma gama de práticas interpretativas e de variedade na coleta de materiais

empíricos.

Conforme Minayo (2010), as investigações de grupo e segmentos delimitados e

focalizados, assim como análises de discurso e documentos, têm melhor consonância com as

abordagens qualitativas, como explica:

Esse tipo de método que tem um fundamento teórico, além de permitir desvelar

processos sociais ainda pouco conhecidos referentes a grupos particulares, propicia a

construção de novas abordagens, revisão e criação de novos conceitos e categorias

durante a investigação. (MINAYO, 2010, p.57).

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Desta forma, este tipo de método escolhido é o que mais contempla o objetivo da

pesquisa.

5.2 Local da pesquisa

A observação da visita guiada com as escolas foi realizada no Cemitério Consolação,

situado na cidade de São Paulo, na Rua da Consolação, 1.660. Trata-se de um cemitério

municipal, da autarquia do Serviço Funerário do Município de São Paulo (SFMSP). As visitas

escolares acontecem às quartas-feiras, em quatro horários: no período matutino às 10hs e no

período vespertino ao meio-dia, às 14hs e às 16hs.

As demais etapas da pesquisa foram desenvolvidas em uma escola da rede publica

municipal, uma vez que o grupo foi composto por professores da mesma escola, guardadas as

condições necessárias para a realização do grupo focal.

5.3 Participantes

As participantes são professoras de uma Escola Municipal de Ensino Fundamental

(EMEF) que atuam especificamente com as séries iniciais de alfabetização, com seus alunos

de faixa etária aproximada entre 6 a 9 anos de idade, considerando que estavam no 1º e 2º ano

do ensino fundamental, as quais foram convidadas a participar da pesquisa após a visita

escolar, na observação em campo. O grupo foi realizado com 9 participantes, sendo composto

por 1 coordenadora pedagógica 5 professoras e 3 estagiárias de Pedagogia, conforme quadro

abaixo:

Apresentação das participantes do grupo focal

Legenda Cargo Série em que leciona

Ensino fundamental

C Coordenadora --

P1 Professora 1º e 2º ano

P2 Professora 1º e 2º ano

P3 Professora 1º e 2º ano

P4 Professora 2º ano

P5 Professora 1º ano

E1 Estagiária Não especificou

E2 Estagiária 2º ano

E3 Estagiária 1º ano

Quadro 1 – Participantes do grupo focal

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Inicialmente, no pré- projeto pensou-se que seria interessante compor um grupo focal

heterogêneo, ou seja, professores de disciplinas diversificadas, como História, Literatura,

Artes, dentre outras, caso houvesse. Os participantes seriam professores do ensino

fundamental da rede pública e/ou privada que tivessem a experiência da visita guiada ao

Cemitério Consolação com seus alunos, crianças de faixa etária aproximada entre 7 a 14 anos

de idade, no máximo seis meses antes da data de realização do grupo focal. No entanto, foi

possível realizar esta pesquisa com as professoras que fizeram parte do Programa Amigos do

Zippy, um Programa de Educação Emocional, ligado à Associação pela Saúde Emocional da

Criança (ASEC), dedicado a crianças em idade escolar, do 1º e 2º ano do ensino fundamental.

As professoras relatam que tiveram conhecimento deste Programa por meio da DRE –

Diretoria de Ensino Regional.

Vale ressaltar que este não era um critério de inclusão; foi considerado um dado

relevante, uma vez que professoras relataram durante a visita guiada ao Cemitério

Consolação, que participaram deste Programa.

5.4 Instrumentos

Os instrumentos utilizados foram: observação, diário de campo e entrevista por grupo

focal, detalhados a seguir.

5.4.1 Observação

Segundo Creswell (2010), em muitos estudos qualitativos, os investigadores coletam

muitas formas de dados e despendem um tempo considerável na coleta de informações no

ambiente natural. Considerando que os procedimentos de coleta na pesquisa envolvem quatro

tipos básicos: observação, entrevistas, documentos e materiais audiovisuais, nesta pesquisa,

serão utilizados dois deles: a observação e entrevistas.

Dentro das opções do tipo de coleta de dados - Observação - a opção escolhida é a do

tipo: “o observador como participante – o papel do pesquisador é conhecido” (CRESWELL,

2010). O autor aponta como vantagem que o pesquisador poderá registrar informações.

Assim, pretende-se realizar a aproximação a campo, durante as visitas escolares, tendo como

objetivo o que Creswell (2010, p.214) define como observações qualitativas: “são aquelas em

que o pesquisador faz anotações de campo sobre o comportamento e as atividades dos

indivíduos no local da pesquisa”.

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Realizou-se uma observação descritiva, que Minayo (2010) descreve como sendo

aquela realizada de forma totalmente livre, porém, o investigador de campo deverá estar

focalizado no seu objeto de estudo. Partindo do roteiro para a observação participante

proposto pela mesma autora, a observação será registrada num instrumento – diário de campo

– e por meio dele, o investigador deverá anotar informações observadas em conversas

informais, comportamentos, gestos, ou seja, o conjunto de expressões que dizem respeito ao

tema pesquisado e também das próprias impressões pessoais.

Desta forma, tivemos como foco prestar atenção nas perguntas e comentários feitos

pelos alunos e professores durante a visita guiada.

Na segunda etapa, após ter sido realizado o trabalho de campo, foi proposto o grupo

focal com os professores, conforme explicitado no próximo tópico.

5.4.2 Entrevistas por grupo focal

Dentro das opções do tipo de coleta de dados - Entrevistas - a opção escolhida foi

“grupo focal – o pesquisador entrevista os participantes em grupo” (CRESWELL, 2010).

No grupo focal podem ser utilizados como recursos: filmes, contos literários ou

materiais de expressão gráfica. Segundo o roteiro para grupo focal proposto por Minayo

(2010), ele deve ser construído para a realização da entrevista em grupo, tendo como condição

de que este possa permitir um debate participativo e o aprofundamento de questões. Para

chegar a estes fins, podem ser usados como recursos: uma pergunta central acompanhada de

alguns itens ou um texto episódico, ambos, buscando a focalização numa discussão

provocativa, e a escolha de um audiovisual, um recorte de um filme, tendo na sequencia uma

discussão sobre o exposto.

Assim considerando, utilizamos como recurso um conto literário “O homem que

subornou a morte” (DRUMMOND, 1999), para provocar uma reflexão a respeito dos temas:

crenças sobre o morrer; como é possível enganar a morte e como aprendemos sobre a morte

desde a infância.

Para Minayo (2010), o grupo focal como técnica deve ser executado ainda em um

ambiente não diretivo, coordenado por um moderador, cuja função é promover a participação

de todos e que cada um possa expor a sua opinião.

Do ponto de vista operacional, de acordo com Creswell (2010), nas entrevistas

qualitativas o pesquisador que se engaja em entrevistas de grupo focal a realiza com seis a

oito entrevistados em cada grupo. Questões não estruturadas e em geral abertas, são

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encontradas nessas entrevistas, sendo composto por um grupo de pequeno número cuja

proposta é a suscitar concepções e opiniões dos participantes. Minayo (2010) acrescenta que a

discussão nos grupos focais acontece em reuniões com um grupo de seis a doze informantes, e

quanto ao tempo recomenda-se não ultrapassar uma hora e meia.

Foi realizado um encontro grupal, com duração de aproximadamente uma hora e meia.

O grupo focal contou com 9 participantes. Como procedimento de registro de dados, foi

balizado conforme (CRESWELL, 2010), ao conduzir uma entrevista a mesma foi gravada em

áudio, e transcrita posteriormente.

Assim, norteou-se a escolha da entrevista de grupo focal como técnica de grupo,

amplamente utilizada em pesquisa qualitativa, nesta pesquisa focalizou-se a temática da

educação para a morte a partir da visita guiada ao Cemitério Consolação.

Tipo de entrevista: entrevista semiestruturada

Segundo o roteiro para entrevista semiestruturada proposta por Minayo (2010), este deve

ser elaborado em tópicos de forma a permitir a flexibilidade nas conversas, indo de encontro a

uma enrijecida ordem de perguntas a serem feitas sequencialmente, evitando-se, sobretudo,

aquelas perguntas que podem suscitam respostas dicotômicas.

Desta forma, propõe-se o oposto: a abertura a novos questionamentos do interlocutor e ao

aprofundamento da comunicação. Assim, “A forma de colocação de um item na lista deve

induzir a uma conversa sobre a experiência”. (MINAYO, 2010, p. 191)

A partir deste referencial, elaboramos o roteiro para a entrevista de grupo focal,

apresentado no APÊNDICE A.

5.5 Procedimento para coleta de dados

Num primeiro momento, foi feito contato com o cemitério. Definido o local para a

realização da pesquisa, no dia 07/07/2016 entramos em contato com a Superintendência do

Serviço Funerário do Município de São Paulo, para apresentar o projeto de pesquisa e solicitar

a permissão por meio de uma carta de autorização para que a pesquisadora pudesse ser

observadora nas visitas escolares. Recebemos resposta da carta de autorização via e-mail

(ANEXO 01) no dia 22/07/2016.

A data para a realização da observação no Cemitério da Consolação foi agendada após

o projeto ter sido aprovado na Plataforma Brasil.

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Num segundo momento, com a devida autorização, a pesquisadora foi conhecer essa

realidade e participou de uma visita guiada, no dia 30/11/2016, acompanhando uma escola

pública que havia agendado a visita; estavam presentes três professoras e duas estagiárias com

turmas do 1º e 2º ano do ensino fundamental.

Ao acompanhar esta visita, que durou cerca de duas horas, a pesquisadora mediante a

observação, criou o diário de campo/diário de pesquisa.

O posterior contato com os participantes foi feito por meio de uma carta convite

(APÊNDICE B), entregue após a visita guiada. Uma das professoras, como porta voz do

grupo, logo após o convite, demonstrou interesse em participar da pesquisa, deixando claro

que seria mais viável para as professoras que o grupo focal acontecesse na própria escola e

não no consultório da pesquisadora.

Desta forma, a pesquisadora foi até a escola, após a professora ter entrado em contato

via e-mail, confirmando a autorização da coordenação, no qual foi enviada uma lista já com

os nomes das professoras e estagiárias participantes, foram listadas aquelas que participaram

do Programa Amigos do Zippy, razão pela qual, as professoras indicadas tinham maior

familiaridade em acompanhar os alunos na visita ao cemitério ou por ter trabalhado este tema

em sala de aula, considerando que uma das propostas de atividades do Programa incluía uma

visita ao cemitério, propondo a aproximação com o tema da morte com as crianças.

Guardadas as condições necessárias para não interrupção e busca de espaço que

possibilitasse a execução da pesquisa, o grupo focal aconteceu na escola, localizada na região

sul de São Paulo, na manhã do dia 21/12/2106. Esta data foi sugerida pela professora de

acordo com o calendário escolar, havendo maior disponibilidade neste período, pois os alunos

já estavam em férias. A mesma professora que enviou o e-mail recepcionou a pesquisadora,

apresentando a escola e as demais participantes, e direcionando-a até a sala reservada para o

encontro do grupo focal.

O grupo focal foi realizado numa ampla sala de aula, em que as participantes e a

pesquisadora se posicionaram ao redor de uma mesa retangular. O ambiente estava tranquilo,

com poucos funcionários, sendo uma sala mais afastada, garantindo assim a privacidade.

Neste encontro grupal, foi apresentado o TCLE (APÊNDICE C), sendo lido

conjuntamente, assegurando o sigilo de suas identidades e a confidencialidade das

informações. Em seguida, deu-se início a coleta de dados e a gravação de áudio e vídeo do

grupo focal, sendo explicado o funcionamento e as atividades propostas, que a duração do

encontro tinha a previsão de uma hora e meia, cujo objetivo era permitir um debate

participativo e o aprofundamento de questões, em que a pergunta central é compreender como

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os professores de São Paulo percebem a questão da educação para a morte, a partir da

experiência de levar os seus alunos a visita guiada do Cemitério da Consolação.

Posteriormente, como recurso de aquecimento, foi utilizada a leitura dramatizada de um conto

literário e, na sequencia, foi realizada a entrevista semiestruturada e o fechamento do

encontro.

As entrevistas foram gravadas por meio de um gravador de áudio e filmadas por meio

de uma câmera digital.

5.6 Procedimento para análise de dados

Após a coleta de dados, foi feita a transcrição literal e completa do material coletado e

os dados foram submetidos à análise de conteúdo, de acordo com procedimentos sugeridos

por Bardin (2016), os quais são organizados em três etapas: pré-análise; a exploração do

material e o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação.

Na etapa da transcrição do grupo focal, as gravações de áudio e filmagem foram

essenciais para ajudar na identificação da fala de cada participante, considerando que eram 9

participantes, interagindo entre si.

Em seguida, iniciou-se a fase da organização. Nesta primeira fase – pré-análise – foi

feita a leitura flutuante do material transcrito a fim de familiarizar-se com os dados; a escolha

dos documentos a serem submetidos à análise (entrevista por grupo focal), sendo feita toda a

preparação do material, tendo a entrevista digitada e impressa em papel.

Na segunda fase – a exploração do material – iniciou-se a procura pelos temas na qual

as falas das participantes foram destacadas, agrupando códigos em comum, permitindo a

codificação dos temas.

Na última e terceira fase – tratamento dos resultados e interpretações – foi realizada a

categorização, tendo como critério de agrupamento as categorias temáticas em que são

agrupados os temas que têm o mesmo significado, ou seja, com que conteúdos parecidos. Para

isso, foram feitas repetidas leituras a fim de extenuar todo o material. Continuamente, foram

formadas categorias a respeito de como se aprende sobre a morte e sobre a experiência das

professoras na visita ao cemitério, tendo o conteúdo sido agrupado em 12 categorias.

Finalmente, na produção da discussão foram relacionados os temas encontrados com

embasamento teórico construído ao longo dos capítulos, promovendo reflexões e

interpretações a partir do recorte das falas das participantes e discutindo com o que foi

encontrado no levantamento da literatura.

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Este procedimento permitiu uma compreensão de como professores de São Paulo

percebem a questão da educação sobre a morte, a partir da experiência de levar os seus alunos

a visita guiada ao Cemitério Consolação.

5.7 Cuidados éticos

Os cuidados éticos na elaboração desta pesquisa seguem a Resolução CNS/MS nº

466/2012, complementada pela Resolução nº 510/2016, da Comissão Nacional de Ética em

Pesquisa (CONEP), do Ministério da Saúde, que regulamenta pesquisas envolvendo seres

humanos no Brasil. Foi submetido à Comissão de Ética em Pesquisa da PUC-SP (Parecer

Consubstanciado do CEP nº 1.779.280). Na Plataforma Brasil, aprovado sob o Certificado de

Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) nº 60661616.5.0000.5482.

.

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6. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

Por que consigo me lembrar

de coisas que aconteceram

há muito tempo?

O que me leva a esquecer

de outras?

E o que me faz lembrar

delas de repente?

(GAARDER, J. Eu me pergunto...p.24)

6.1 Diário de Campo: observação e grupo focal.

Compartilho o diário de pesquisa, escrito em primeira pessoa, comumente

característico deste tipo de registro. Nele, foram registrados mais do que a coleta de dados, de

forma objetiva; foram registrados momentos – de troca, escuta e compartilhamento – os

primeiros pensamentos, inquietudes, questionamentos que a pesquisa provoca em todos os

envolvidos. Trata-se, portanto, do registro destes envolvimentos, que a própria palavra

significa “ação ou resultado de (se) envolver; referente ao ambiente de certa situação ou ato;

circunstância em que alguma coisa se insere; relação ou laço afetuoso, apaixonado ou

sentimental; colaboração ativa de certo programa ou iniciativa”. Compartilho a minha

percepção do quanto às crianças se mostraram envolventes e envolvidas com o tema da morte;

falaram abertamente, de maneira leve e até engraçada, sensível e com questionamentos

filosóficos e corajosos a respeito da vida e o fim dela. Puderam falar sobre suas experiências

de perdas e lutos, mostrando-nos que percebem e são capazes de lidarem com momentos

dolorosos. O que me fez pensar que, muitas vezes, é o tornar-se adulto que dificulta falar

assim sobre a morte, de maneira natural, curiosa e sem preconceitos.

Conforme o diário de pesquisa de Kreuz (2017), este trata de uma escrita que segue o

fluxo livre de algumas lembranças, não sendo padronizado e formal, formato este que é

permitido aos diários de campo. Assim sendo, este texto foi organizado como um convite

para acompanharmos os participantes e pesquisadora na construção desta pesquisa: vamos ao

cemitério junto à escola? O que as crianças e professores falam sobre a morte?

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Uma manhã diferente: acompanhando uma visita escolar no Cemitério

Consolação

OBSERVAÇÃO - DATA: 30/11/2016 – 4ª feira às 10h00.

Dia nublado com chuviscos. Tinha receio de que a escola cancelasse a visita por esse

motivo. Ao chegar no cemitério, sou recebida pelo administrador Jair e pelo guia Popó e

ficamos conversando no aguardo da escola. Popó conta que as visitas tiveram maior

repercussão em meados de 2001, na gestão da Marta Suplicy, na ocasião em que foi feita uma

exposição sobre arte tumular no Shopping Light, localizado na região central de São Paulo.

Em 2002, morre o professor que iniciou esse trabalho no Cemitério Consolação, foi

quando Popó deu continuidade assumindo a função de guia. Com as escolas, relata que no

início ele mesmo ia até às escolas, convidando professores a levarem os seus alunos ao

cemitério. Ia pessoalmente não apenas em escolas do entorno, como também em escolas de

outras regiões. Foi assim que as escolas começaram a se interessar pela visita. Desde então,

recebe visitas de escolas de várias regiões, da capital e do interior de São Paulo, públicas e

privadas. Ressalta o trabalho realizado com o Projeto Amigos do Zippy que levam alunos da

educação infantil.

Passando 1h do horário agendado da visita, o administrador liga para uma funcionária

que informa não ter conhecimento do cancelamento da escola. Logo em seguida, chega a

escola com cerca de 50 alunos. A professora pede desculpas pelo atraso justificando o trânsito

e que vieram da região sul. Havia três professoras e duas estagiárias com turmas do 1º e 2º

ano do ensino fundamental.

Desde o início e ao longo da visita, as crianças se mostram muito participativas,

fazendo inúmeras perguntas. Perguntam ao guia, às professoras, a mim e conversam entre

eles.

“Onde eles estão enterrados?”

“E esse caminhão?” – referindo-se ao carro que transporta o caixão.

“Por que é preto?” – referindo-se ao mausoléu.

Uma menina aproxima-se de mim e diz: “Meu luto durou 5 dias e da minha mãe 2”.

A colega ao lado, continua: “Meu luto durou 1 ano”.

Um menino pergunta para mim: “Aqui tem ladrão? “

“Onde os mortos vivem?”

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Popó pergunta quem está vindo ao cemitério pela primeira vez, a grande maioria

levanta a mão. Explica às crianças que irá apresentar o cemitério, e passa algumas regras

como: não pode correr, não pode mexer nas estátuas e que devem levantar a mão para fazer

perguntas.

“Enterra em pé ou deitado?” – uma criança pergunta para mim. A pergunta surge

novamente, direcionada ao guia: “As pessoas são enterradas em pé ou deitadas?” – Popó

explica que deitado, no entanto, a professora diz que no cemitério de Santos enterra-se em pé,

referindo-se ao cemitério vertical “Por causa do espaço”.

“Por que tem cigarro aqui?” – observa o lixo perto das flores.

Perguntaram sobre as flores e os arranjos: “Por que alguns têm plantas e outros

não?”. Popó explica que são as famílias que trazem.

Quando Popó me apresenta à turma, ele diz: “Ela vai olhar o comportamento de

vocês” (não imaginei que ele fosse me apresentar dessa forma, o que me fez pensar que essa

fala pode ter remetido a alguém que vai “vigiar” quem não se comportar bem), fiquei

preocupada com isso. Mas, ao final, eu pude esclarecer melhor a minha proposta de estar ali

naquele dia.

Túmulo do Monteiro Lobato: Popó pergunta quem conhece o Sítio do Pica Pau

Amarelo. A maioria grita e afirma que conhece os personagens, como o saci Pererê.

“Vocês podem dizer ao papai e a mamãe que hoje conheceram o túmulo do Monteiro

Lobato” – diz o guia.

“Por que tem as estátuas?”

“Por que quando as pessoas morrem tem que enterrar nas gavetas?” – Popó explica

que também pode ser enterrado direto na terra, mas que em outros cemitérios pode ser

diferente.

“Aqui tem crematório?” – a professora já havia conversado sobre o assunto em sala de

aula e explica novamente para eles.

Popó explica que tem famosos enterrados aqui. Perguntaram se o personagem Chaves

estava enterrado lá. A professora explica que não, que o Chaves está enterrado no país dele,

no México.

Túmulo da Marquesa de Santos: mostram curiosidade pela foto.

“De quem é a foto?” – Popó responde que é a foto do famoso, de uma pessoa que

morreu. É a foto de quem está enterrado.

“É a Lady Gaga? “ – todos caem na gargalhada.

Popó explica que não, que ela era a namorada de D. Pedro I, o primeiro imperador do Brasil.

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“Vocês sabem o que representa a estrelinha? A estrelinha é a data que nasceu e a

cruz a data que morreu” – explica o guia.

“A gaveta é grande?” – Popó responde: “A gaveta é do tamanho que cabe o tio Popó

ou se for criança é do tamanho da criança”.

Um menino próximo a mim se questiona: “Criança?”.

Chamou a atenção deles a estátua do anjinho, e conversam entre eles, um tanto

intrigados: “Ela morreu criança?”.

Popó explica o porquê do anjinho: “Era uma pessoa boa, legal, e a família construiu

assim para homenageá-la, que ela foi uma pessoa querida” (será que tal explicação pode

fazer com que a criança associe que quem não tem uma estátua de anjinho, pode não ter sido

uma pessoa boa ou merecedora?).

“Quando tem anjinho é porque está enterrada uma criança. Aqui está Heleninha, que

morreu com 20 meses de idade” – explica o guia.

Túmulo do Mário Zan: “Sabem quem está enterrado aqui?” – pergunta o guia às

crianças.

“Luiz Gonzaga” – arriscou uma criança. Havia uma foto do músico com uma sanfona.

Popó conta a história do músico Mário Zan e a professora aproxima à realidade deles:

“Sabe as músicas que tocam na festa junina? então, foi ele quem fez as músicas!”.

“Por que vai no velório quando morre? “

“Aqui tem velório?”

Popó explica o que é velório e que tem a sala de velório.

“Aqui foram enterradas mais crianças ou adultos?” – Popó responde que mais

adultos.

“Todos os caixões são iguais?”

Alguns meninos estavam lendo as placas “homenagem de seus amigos” – estavam

bem interessados no que estava escrito. Uma das professoras comenta: “Ele está lendo bem”

Túmulo de Luiz Gama.

“Eles eram gêmeos?” – referindo a duas estátuas parecidas. A professora responde:

“Não, são parecidos, mas são de famílias diferentes”.

Popó explica o que são coveiros, como é o trabalho deles: “são eles que fazem os

sepultamentos, eles se vestem com uniformes azuis”. Mostra a tampa, fala do buraco, da cova,

da quantidade de gavetas.

“Tem um monte de pessoa aí?” – Popó responde: “Sim, tem muitas pessoas

enterradas aqui dentro”.

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Túmulo de Antônio Aguiar – fundador da cidade de Osasco

“Quem quebrou aquilo? É um vaso quebrado”

“Jesus foi enterrado aqui?”

Uma das professoras conta sobre o Projeto Amigos do Zippy e que uma psicóloga do

LEM-USP foi até a escola ministrar uma palestra, em agosto de 2016 - o que mostra que estão

conversando sobre o tema na escola.

Popó novamente mostra um túmulo de uma criança: “Qual era o bicho de estimação

dessa criança?” – elas respondem “uma tartaruga”. Acertaram! Na estátua havia dois anjos

com uma tartaruga ao lado. Popó explica que foi uma homenagem à Heleninha.

Diante do túmulo da criança, um menino comenta: “Meu irmão morreu um dia”. As

professoras comentam entre elas se sabiam disso, uma delas afirma que sim e comenta

comigo: “O irmão dele morreu faz tempo e é uma história confusa, ele tem o nome do irmão

que morreu”.

As crianças olham com frequência e muita curiosidade dentro dos túmulos, um deles

protesta: “eu quero ver o morto!”. A professora comenta: “Mas agora só tem os ossos”.

“De quem é esse túmulo?” – Popó responde que é de uma família de industriais.

“É uma família rica?”

“Olha pro!” – chamando a professora; “Olha pro, dá pra ver”

“E se eu ver, o que acontece? O defunto vem e pega meu nariz” – uma menina

pergunta para mim e ela mesma responde, questionando o que aconteceria se também fizesse

como os colegas de olhar para dentro dos túmulos e mausoléus.

“Jesus morto ali”

Conversa entre eles: “Achei que os cemitérios fossem iguais” – a colega responde:

“lógico que não!”.

Uma menina me pergunta, quase ao final da visita: “Como os mortos falam? “ –

respondo que eles não falam mais. Ela, então, começa a falar de sua experiência pessoal:

“Meu tio morreu quando eu tinha 4 anos. Agora eu tenho 7”. Essa mesma menina vem até a

mim algumas vezes, pra dizer que a amiguinha não quer mais ser amiga dela (entendo que

está pedindo ajuda). Ela também fala isso ao Popó que coloca as meninas lado a lado e propõe

que deem um abraço e sejam amigas. E assim elas fazem.

“O corpo fica e a alma vai junto com o papai do céu” (novamente, temos a explicação

e um significado atribuído pelo guia a respeito do que acontece pós-morte a partir de sua

crença religiosa). Quando fala isso, ele aponta para o céu, indicando que a alma está junto à

Deus.

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Túmulo do Líbero Badaró. Professora comenta: “Não faz conexão para eles”

Ao final, falo para o Popó que gostaria de convidar às professoras para a pesquisa,

antes delas irem embora. Popó me entrega o microfone, me apresento e faço o convite,

explicando brevemente, pois entendo que as professoras estão atentas às crianças. Pego o

contato de uma delas e da escola. Uma das professoras sugere que é melhor eu ir até a escola,

pois facilitaria, já que tem um dia que não haverá aula. Refere que tem outras professoras que

viriam ao cemitério, mas não puderam participar: “Teremos o prazer em ajudar”.

A professora relata que tinha intenção de levá-los ao cemitério São Paulo, ainda hoje,

pois a realidade que conhecem é o cemitério São Luiz.

As meninas com frequência me fazem perguntas e comentários: “Você trabalha

aqui?”; “Você é professora?”; “Você tem filhos?”; “Você é linda!”; “Seu cabelo é liso de

verdade?”; “Você é brasileira? Parece que veio da Itália”; “Você gosta de criança feia?”;

“Você já veio aqui antes?”.

Pergunto para uma delas o que estava achando da visita: “Legal! “

As professoras com frequência chamam a atenção deles para não correrem, não se

empurrarem e prestarem atenção.

Impressões pessoais: A observação e o contato com as crianças foram muito

importantes e enriquecedoras para conhecer suas indagações sobre a morte. Essa turma

mostrou-se muito participativa, alunos e professores muito engajados a refletirem sobre o

tema, teve uma atmosfera de explorar o cemitério como lugar de aprendizado. Acredito que

essa exploração se deu pelo fato de já estarem trabalhando o tema na sala de aula, junto ao

Projeto Amigos do Zippy. Algumas crianças faziam perguntas a partir do que tinham

aprendido em sala de aula.

As professoras também se mostraram muito receptivas quanto ao convite, apontando

interesse em colaborar com a pesquisa. Novamente, percebe-se que a capacitação delas junto

ao Projeto Amigos de Zippy pode ter sido um facilitador.

A fala de Maluf (2015) no debate sobre políticas públicas na primeira infância me

reportou a esse dia da observação no cemitério, pois ela fala a respeito da importância da

curiosidade das crianças e dos adultos valorizarem as descobertas das crianças. Assim notei,

que elas fizeram inúmeras perguntas, comentários e reflexões. O cemitério pareceu ser muito

instigante e estimulante para as crianças. Despertou, sem dúvida, muitas valiosas

curiosidades.

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Grupo focal: o que as professoras falam sobre a educação para a morte nas escolas

ENTREVISTA - DATA: 21/12/2016 – 4ª feira às 09h00.

Impressões pessoais: O grupo se mostrou muito participativo, em que as participantes

puderam expor as suas opiniões e debater sobre elas. Chamou-me muita atenção os relatos

pessoais das professoras, em que trouxeram as memórias infantis de como aprenderam a lidar

com a morte e o quanto é refletido na fase adulta. Esse resgate da memória afetiva foi muito

interessante, pois nos faz refletir de que além da capacidade cognitiva da criança em cada

faixa etária, o quanto a percepção da morte para as crianças, a partir do relato delas, tem muita

influência do meio, do discurso parental, dos cuidadores de referência e das vivências em

família e comunidade que estão inseridas numa determinada cultura com suas crenças e

valores.

6.2 Descrições das categorias

A compreensão de como os professores de São Paulo percebem a questão da educação

sobre a morte, a partir a experiência de levar os seus alunos a visita guiada ao Cemitério

Consolação, foi realizada por meio do relato dos participantes, que puderam compartilhar em

grupo, suas experiências com a visita e as repercussões dela em sua prática em sala de aula.

A leitura da transcrição do grupo focal permitiu a construção de categorias de análise

da compreensão dos professores acerca da educação sobre a morte. As categorias não foram

preestabelecidas, elas emergiram a partir da conceituação teórica e da entrevista em grupo. O

Quadro 2 apresenta as categorias e os temas que emergiram em cada uma delas:

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Atividade

TEMAS

CATEGORIAS

1ª Parte:

- CONTO LITERÁRIO

REFLEXÃO A RESPEITO

DE COMO APRENDEMOS

SOBRE A MORTE

- Medo do morto

- Morte de criança

- Medo de dormir sozinha

-Explicações sobre a morte que

assustavam

- Figuras de apego (influência materna

e do irmão mais velho)

- MEDO DA MORTE

- Explicações religiosas do católico;

- Explicações religiosas do protestante

- CONTEXTO SOCIOCULTURAL

E RELIGIOSO

- Impacto de ter ido ao velório quando

criança

- Evitação de ir a velórios

- PARTICIPAÇÃO NOS RITUAIS

FÚNEBRES

- Influência do ambiente do cemitério

- Influência dos costumes familiares

- Influência da religião

- SIGNIFICADO DE CEMITÉRIO

- Medo na infância que continuou na

fase adulta

- Mudanças geracionais

- REPERCUSSÕES DAS

VIVÊNCIAS INFANTIS NA FASE

ADULTA

2ª Parte:

- ENTREVISTA DE GRUPO

FOCAL

CONVERSA SOBRE A

EXPERIÊNCIA DAS

PROFESSORAS NA VISITA

AO CEMITÉRIO

- Perda da avó

- Perda do pai

- Perda do avô

- Perda do tio

- LUTO

- Programa Amigos do Zippy e as

visitas ao cemitério como ferramentas

que facilitam a comunicação.

- COMUNICAÇÃO SOBRE A

MORTE NA ESCOLA

- Conhecimento a respeito da visita

- Objetivo inicial

- Preparação em sala de aula antes da

visita

- Reação de estranhamento

- VISITA ESCOLAR AO

CEMITÉRIO

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2ª Parte:

- ENTREVISTA DE GRUPO

FOCAL

CONVERSA SOBRE A

EXPERIÊNCIA DAS

PROFESSORAS NA VISITA

AO CEMITÉRIO

- Treinamentos dos professores

- Motivação para participarem do

Programa

- Cuidado com a saúde emocional dos

alunos

- União dos educadores

- Morte do Zippy: lidando com a morte

em sala de aula

- PROGRAMA AMIGOS DO

ZIPPY

- Redução de comportamentos ligados

ao bullying

- Expressão dos sentimentos

- Rede de apoio

- Aprender a nomear os sentimentos

- Acolhimento ao aluno enlutado

- APRENDIZADO DOS ALUNOS

- Reflexão sobre as experiências

pessoais de morte na família

- Importância de falar sobre morte com

as crianças

- Importância da participação dos pais

e das professoras

- Importância do diálogo entre pais e

filhos

- Futuro profissional

- Reação das crianças diante do túmulo

do Monteiro Lobato.

- APRENDIZADO DAS

ESTAGIÁRIAS DE PEDAGOGIA

- Preparo dos professores

- Participação da família

- Recursos de enfrentamento

- Rede de apoio da criança

- EDUCAÇÃO SOBRE A MORTE

NA ESCOLA

Quadro 2 – Organização dos temas e categorias

Na primeira parte, em que utilizamos o conto literário para a reflexão a respeito de

como aprendemos sobre a morte, emergiram as seguintes categorias:

Medo da morte: reações da criança frente a morte.

Contexto Sociocultural e religioso: influência dos costumes regional, cultural e

religioso.

Participação nos rituais fúnebres: aspectos relacionados a participação da criança

nos rituais de despedida, como velórios e as crenças envolvidas.

Significado de Cemitério: sentido atribuído às lembranças a respeito de sua

proximidade com o espaço cemiterial ao longo do desenvolvimento.

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Repercussões das vivências infantis na fase adulta: mostram como as experiências

infantis foram marcantes e exercem alguma influência na maneira como lidam com a

morte nesta fase da vida atual.

Luto: respostas emocionais frente às perdas na família pela morte de uma pessoa

significativa (vínculo significativo).

Comunicação sobre a morte na escola: como se dá o diálogo sobre as questões que

envolvem perdas e morte com professores e alunos.

Na segunda parte, em que foi realizada a entrevista de grupo focal para

promover uma conversa sobre a experiência das professoras na visita ao cemitério

com seus alunos, destacamos as seguintes categorias:

Visita escolar ao cemitério: conversa com as professoras sobre a experiência da visita

guiada para escolas, no cemitério da Consolação.

Programa Amigos do Zippy: informações acerca do programa de saúde emocional e

sua relação com a visita ao cemitério e a temática do luto com crianças em idade

escolar.

Aprendizado dos alunos: percepção das professoras acerca das contribuições no

aprendizado em sala de aula com esta experiência.

Aprendizado das estagiárias de Pedagogia: percepção das estagiárias sobre as

contribuições desta experiência para o seu aprendizado/formação.

Educação sobre a morte na escola: percepção das professoras de que o tema da

morte faz parte do seu cotidiano e que as crianças fazem perguntas em relação aos

processos que envolvem a morte e o morrer.

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7. RESULTADOS E DISCUSSÃO

As categorias identificadas e descritas aqui são apresentadas, de forma agregada, para

subsidiar a discussão. Os relatos e seus trechos selecionados são apresentados de acordo com

a fala das participantes, sem preocupação com a correção gramatical e ortográfica.

7.1 Medo da morte

Medo do morto; morte de criança; medo de dormir sozinha; explicações sobre a

morte que assustavam; Figuras de Apego (influência materna e do irmão mais

velho).

As recordações da infância evidenciam que elas estavam diante de um grande desafio

cognitivo e afetivo, que é o de compreender a morte, conforme já dizia Torres (2012[1999]).

Os principais componentes necessários para a compreensão do conceito da morte,

irreversibilidade, não funcionalidade e universalidade, serão exemplificados nas seguintes

falas:

P1- Nossa eu aprendi (tosse) Nossa, eu morria de medo quando alguém morria, eu

não ia olhar porque minha mãe falou uma vez, ela foi olhar e o morto fez careta

(risadas). [...] Eu acho, na verdade, que minha mãe não queria mesmo que eu

fosse olhar os mortos. E ela ainda falava essas coisas né, pra que eu não fosse. E olha

que pra isso acabar foi depois que alguns familiares faleceram que aí eu queria

ver, e foi aí que foi melhorando essa questão, mas eu morria de medo.

E2 – [...] como a morte, eu sempre tratei como algo assustador desde a infância e

como na minha voz eu refleti isso “Eu vim te buscar”. Fica uma coisa assustadora [...]

talvez seja lá atrás.

P1 – É, é sim. Ainda precisa de muitas aulas do Amigos do Zippy.

E2 – Nossa, muita.

E3 – [...] naquela época morria muita criança desnutrida, com diarreia, essas

coisas. E aí, falavam assim, a mãe chorando que o neném morreu, falavam assim

que você vai ter um anjinho no céu te esperando, era muito sei lá...pra elas era

normal, pra mim não era. Assustava! Aí falavam assim, aí por exemplo, porque

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morria muita criança antigamente e aí vai ter um anjinho no céu te esperando. Não sei,

quer dizer, eu acreditava e não acreditava, né. Será se é verdade, se vai estar, mas acho

que era um jeito de consolar a mãe que perdeu um bebê.

P1 – Eu já não tinha medo quando falava que virava anjo. Eu não tinha medo

porque achava anjo bonitinho, que era do bem, então não tinha medo. Mas,

quando eram os adultos, nossa, eu tinha medo! E as pessoas contavam as

histórias acho que era pra assustar mesmo!

P1 – Quando morria alguém era muito engraçado, que eu e meu irmão, meu

irmão é mais velho do que eu, mas também tinha medo da morte (risadas). Aí eu

ficava no meu quarto: (chama o irmão pelo nome), você está dormindo? E ele – não,

não estou. Mas porquê você não dorme? Eu também não estou conseguindo! Eu tô

com medo de dormir e acordar morto (risadas).

A fala da participante P1 aponta que nesta fase a criança tem a percepção da morte

como sendo reversível, ou seja, é transmitido a ela de que o morto poderá voltar ao estado

anterior, indicando que ainda não houve a compreensão da irreversibilidade e a não

funcionalidade, já que o morto poderá mexer o rosto e expressar-se por meio de caretas.

Nas falas das participantes E2, E3 e P1 destaca-se a reação de medo, a morte como

sendo assustadora. Podemos inferir que o medo pode ter sido gerado pela compreensão da

universalidade da morte. Quando é citada a morte de outra criança, fala-se da morte do igual,

isto é, a constatação de que a morte acontece com todos os seres vivos e que elas também

podem morrer, por isso, o medo de dormir e não mais acordar. Compreende-se, portanto, a

inevitabilidade da morte.

Vale ressaltar que, conforme Torres (2012[1999]) apontou, a compreensão do conceito

de morte não é um conceito unitário, ou seja, não é possível considerarmos apenas o nível

cognitivo da criança ou a sua idade cronológica. Entende-se como sendo importante

considerar que a criança aprende com alguém que tem credibilidade, pessoa ou instituição

com credibilidade emocional, e que a sua compreensão sobre a morte assim como o processo

de luto é indissociável aos significados familiares, uma vez que é nesse contexto que a criança

está inserida, como abordado por Hispagnol (2011).

As participantes relatam a mãe e o irmão mais velho como sendo essas figuras de

referência, assim como as explicações e crenças religiosas “a criança que morre vira anjo no

céu”; “E as pessoas contavam as histórias acho que era pra assustar mesmo!”, foram ditas

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pelos adultos do seu convívio, os quais assumem um papel de figuras de apego, seguindo a

teoria do apego proposta por Bowlby (2002[1969]) e (2006[1982]).

7.2 Contexto sociocultural e religioso

Explicações religiosas do católico e do protestante

As falas das participantes nos remetem ao que os autores DeSpelder e Strickland

(2015) chamam de processo de desenvolvimento pela socialização, em que aprender sobre a

morte faz parte desse processo. Identificamos nos relatos a socialização primária que é a

preparação de uma criança para a participação na sociedade adulta, ou seja, desde a infância o

indivíduo se identifica como membro de uma determinada cultura, na qual vai aprendendo e

internalizando as normas, regras e comportamentos da sociedade. A família representa a

primeira influência como agentes de socialização por meio das tradições religiosas e culturais

que são transmitidas de uma geração para outra.

E3 – [...] Eu sou baiana, só que na minha região, o costume e o sotaque é mineiro.

Então, eles tratavam de morte como um, como a maioria era católico né, que

morria e ia pro céu e quando os outros morressem encontravam na frente. Então,

acho que esse era um modo de não sofrer muito, sei lá como que era...

P1 – Sim, sim. Na minha casa também falava isso.

E3 – E eu, quando era criança, acreditava nisso também. E acreditava que as pessoas

morriam e a alma vinha buscar sei lá o que, e também tinha muito medo e até

hoje eu tenho.

P1 – E lá no Nordeste também é assim, quando falece uma pessoa, eles choram

muito...

E3 – (concorda) É, choram muito.

P1 – ai desmaia.

E3 – Na Bahia eu não durmo sozinha, no quarto não (risadas).

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P3 – Eu penso que tenho uma vivência muito diferente. Eu não sou de matriz

católica, então, eu sou protestante. Pra gente, a morte é um fim, mas que você...a

ideia é que você vai vir depois de uma outra forma, então essa coisa do medo,

não.

Observa-se que ao estar inserida nesta determinada cultura, a participante E3 percebe

que na infância, os seus conceitos e respostas à morte começam a se assemelhar aos dos

adultos da cultura, isto é, refletem em sua atitude as crenças religiosas desse grupo, as reações

emocionais comuns e o medo decorrente de tais explicações. Desse modo, acordamos com

DeSpelder e Strickland (2015), que destacam que a socialização tem influências diversas e

que têm seu início na família, estendendo-se a demais grupos como veremos nas próximas

categorias. As falas das participantes nos mostram as suas primeiras fontes de educação sobre

a morte que tiveram com suas famílias. A fala da participante P3 reflete o que os autores

apontam que a religião, assim como a família, também exerce o papel de agente de

socialização, influenciando sua atitude frente à morte.

7.3 Participação nos rituais fúnebres

Impacto de ter ido ao velório quando criança; evitação de ir a velórios

Influência da religião nos rituais

O cadáver humano desde a pré-história já despertava emoções que se socializaram em

práticas funerárias. Desse modo, Morin (1997) afirma que não existe nenhum grupo, por mais

primitivo que seja que abandone os seus mortos sem ritos.

Nesse sentido, a participação das entrevistadas nos rituais fúnebres perpassa esta

afirmação, da importância de homenagear os seus mortos e despedir-se deles - despedida esta

que suscita muitas emoções conforme as seguintes falas:

P3 – Então, de ir lá e ver, a única coisa relativa a morte, que eu lembro assim, da

minha mãe bloquear foi uma prima minha que morreu e foi afogamento, e não

achou, e então caiu num espaço, e demorou então...caiu numa terça e achada num

domingo e ela era da minha idade. Então, eu não tenho irmã, era né, considerada a

irmã. Foi a única vez que a minha mãe virou e falou: não, você não pode ver, está

muito feio! Eu tinha dez anos, aí ela falava pra mim: tá muito feio, ela tá maior e ela

era menor. Aí eu falei: Oi? né. Ela tá sem olho, por decomposição. É o único

bloqueio que ela não me deixou ver. Mas, todo ritual a gente ia e a ideia pra mim

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de enterro e morte é: você vai, você canta, você agradece, você lembra de quem é

que está lá, então, não tinha essa coisa do medo né. Acho que isso é tranquilo

assim. Agora lógico que a gente sofre, você chora, você pode chorar, agora medo não,

aí vai aparecer, não. Eu não tenho essa vivência.

P2 – Eu tive essa vivência porque nunca minha mãe me levou, nunca... podia

morrer quem morresse, ela nunca levava nós, crianças. Mas aí, aconteceu de

morrer umas crianças né, que tinham um convívio, a gente tinha aquele convívio no

bairro tudo, e aí morreram dois irmãos e daí pronto né, as crianças foram e eu fui. E

daí fomos, todos fomos pro velório e tudo. Mas pra mim, foi assim, aquilo foi

assim muito marcante, foi assim, foi horrível. Pra mim, assim, nós somos seis lá em

casa, somos seis irmãos, eu fui a única que passei quase uma semana sem dormir,

minha mãe teve que me levar pro hospital, né, o médico chegou a dizer: nossa, acho

que ela vai precisar de um tratamento porque eu fiquei muito, muito abalada mesmo.

E daí assim, eu evitei praticamente até os meus trinta e poucos anos, ir a qualquer,

sabe assim. E também teve aquela situação: eu nunca perdi ninguém da família, até o

momento em que a minha avó que era muito próxima veio a óbito e daí foi outro

momento muito difícil pra mim. E assim, eu não sei, porque todo mundo fala que eu

tenho uma sensibilidade muito grande, sou muito chorona, sou muito...sabe tudo me

atinge muito...então assim, a família ficou até preocupada comigo, quando minha avó

faleceu porque e aí agora ela tem que ir, porque não sei o que. Eu fui, com relutância

né. Eu lembro da minha vó falar assim uma vez que a gente tinha que ir nos enterros

das outras pessoas (risadas entre o grupo) porque a gente tinha que pensar que um dia

a gente ia morrer e quem ia no nosso enterro? A minha vó falava esse tipo de coisa.

Meu Deus, eu tenho que ir no enterro da minha avó, como eu vou fazer? Eu fui e foi

muito sofrido, e só depois de uma experiência muito, muito particular e espiritual que

eu tive, foi que eu vim a aceitar a situação da morte da minha vó. Mas, assim foi quase

sete meses depois. E aí, eu parei de chorar, me conformei, mas foi uma coisa pra mim,

sempre foi muito marcante isso. Hoje, eu posso dizer assim se alguém falar eu vou lá,

também tem a estrutura de cemitério, né.

As falas ilustram as experiências em que as cerimônias de despedida passam a assumir

um papel traumatizante para as crianças, e nos reportam ao momento histórico em que a

participação delas nos rituais fúnebres sofreu esta transformação. Estas experiências se

aproximam das crianças da burguesia francesa e das classes médias que foram afastadas dos

rituais, a partir da segunda metade do século XIX, conforme explica Ariès (2003[1975]), em

que a presença da criança começou a provocar um mal-estar. É possível notar o mal-estar

presente nas atitudes das mães das participantes, sobretudo, tendo em comum a morte de

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crianças. Assim, é importante considerarmos que nesses casos, as circunstâncias da morte –

por afogamento e morte do “igual” de crianças – tenham influenciado na atitude de

afastamento delas. Mesmo antes, os testamentos do século XVII revelam o momento em que

a morte deixou de ser domada, ou seja, um evento público, social e natural que contava com a

participação das crianças e familiares junto ao moribundo em seu leito de morte – passando a

ter o afastamento da família na ritualização do luto. Com este afastamento, era comum o

testador ansiar e insistir pela participação de parentes e crianças em seu cortejo – nessa época

raramente as crianças participavam dos enterros de seus avós (ARIÈS 2003[1975]).

Podemos levantar uma reflexão: antes da segunda metade do século XIX era comum

que a criança assistisse à grande cena da despedida, no entanto, com esta transformação de

atitude frente à morte, em que as únicas crianças que tinham a permissão de participar dos

rituais eram aquelas que não tinham vínculo afetivo com o morto – eram as crianças vestidas

de negro dos pés a cabeça que participavam das exéquias (funerais, cerimônias prestadas aos

mortos), ao passo que as crianças da família do morto eram afastadas. A reflexão gira em

torno de que mesmo sendo essas crianças desconhecidas, e por sua vez sem vínculo afetivo

com o morto, ao qual se prestava a homenagem, que impactos emocionais decorrentes das

exéquias estas crianças expressavam? Ou, as cerimônias neste momento histórico eram

ausentes de afeto? Nota-se que nas falas das participantes, ambas, tinham o convívio e um

vínculo afetivo com o morto – representando uma relação horizontal entre os pares – primos e

amigos. O que nos faz pensar que se fosse o velório de uma criança desconhecida, também

haveria este temor e afastamento por parte dos adultos?

Em relação à atitude dos adultos, as falas das participantes: “Então, de ir lá e ver, a

única coisa relativa à morte, que eu lembro assim, da minha mãe bloquear foi uma prima

minha que morreu e foi afogamento”; “Eu tive essa vivência porque nunca minha mãe me

levou, nunca... podia morrer quem morresse, ela nunca levava nós, crianças”, apontam para

a importância da figura materna como figura de apego para a criança, portanto, as atitudes

destas mães de evitarem estas situações específicas, exercem significativa influência como

modelo de enfrentamento das situações futuras e também podem dizer da própria dificuldade

dos adultos em lidar com o sofrimento e expressá-lo, alegando ser esta uma dificuldade da

criança e que a mesma não tem maturidade para compreender e capacidade para enfrentar a

situação, excluindo-a então destes momentos, o que está de acordo com Casellato (2013).

Observamos na fala da participante P2, que a religião é apresentada como um fator de

proteção, que influencia a maneira de lidar com os rituais. Destaca-se a validação do

sofrimento e a expressão dos sentimentos no processo de luto, em que a religião assume um

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papel de conforto e segurança, no qual as pessoas pertencentes a este grupo religioso

encontram, exercendo então, a função de base segura, conforme Bowlby (1989) já destacava.

P2 – O meu filho já teve essa situação, ele já vivenciou as duas...ele foi num,

num...porque nós somos religiosos, né? Então, faleceu uma pessoa que não era da

mesma religião que nós. Aí, ele falou assim: nossa né, mãe – aquele chororô, o povo

que desmaia. Aí eu falei assim: ah, filho, é porque eles estão muito emocionados. E

um pouquinho depois, alguns meses depois, faleceu uma pessoa e nós fomos num

enterro assim, já com o pessoal da nossa religião. Foi totalmente diferente. Foi

feita uma devocional pra essa pessoa, as pessoas falaram sobre ela, cantou-se

hino, passou-se vídeo. Aí, meu filho falou assim: Nossa mãe é tão diferente

daquele outro que a gente foi... as pessoas não tão sofrendo? Aí eu falei assim:

filho, você pode acreditar, eles estão sofrendo, mas existe uma conformação

também assim de...pelas pessoas que estão próximas, sabe assim, aquele conforto

que vem, que é muito importante. E às vezes a pessoa não encontra esse conforto

na hora que ela perde. É complicado isso.

7.4 Significado de cemitério

influência do ambiente do cemitério; dos costumes familiares e da religião

Ariès (2014 [1977]), Carvalho (2014) e Hipólito (2015) apontam que a relação entre a

localização do cemitério e a proximidade com este local estava atrelada à influência da igreja

católica. Nesse aspecto, as falas das participantes “porque o cemitério é no meio da cidade,

até hoje. Então pra mim, aquilo era comum sabe, não era uma coisa apavorante”; “eu não

gostava de ir ao cemitério. Porque quando eu voltava de lá, é...geralmente era só na igreja,

então virava ali e no cemitério eu nunca acompanhava” apresentam o que Ariès (2014

[1977]) aborda sobre a mudança que trouxe os mortos para o interior das cidades, a partir do

século VII, mostrando, desde então, que para a civilização cristã havia um elo entre igreja-

cemitério.

P3 – E assim, eu moro numa cidade que pra chegar até a minha casa, eu passava pelo

cemitério. Então assim, na rua, porque o cemitério é no meio da cidade, até hoje.

Então pra mim, aquilo era comum sabe, não era uma coisa apavorante.

P2 – [...] Quando esses meninos morreram, a gente foi num cemitério público e era

aquela coisa, lembro de as pessoas dizerem assim: ah, quando chove, os corpos

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ficam todos expostos, então tudo aquilo me assustou num primeiro momento, foi

horrível. [...] Hoje eu vou porque também assim, geralmente eu vou naqueles né,

que tem laguinho, com peixinho, aquele jardim lindo, aquele negócio. Ah, então o

negócio está ficando mais bonito...então, a minha família, por exemplo, a gente tem

né, um espaço lá no cemitério né. Que eu falo assim: eu tô dispensando, mas tudo

bem, é preciso...

P5 – [...] É, assim como a P3, sempre eu tive uma visão muito tranquila da morte, né,

na infância. Mas, por exemplo, eu não gostava de ir ao cemitério. Porque quando

eu voltava de lá, é.…geralmente era só na igreja, então virava ali e no cemitério

eu nunca acompanhava. E um dia um familiar acabou falecendo, então nós

tivemos que ir até o cemitério, coisa que geralmente a gente não fazia. E aí quando

voltou, é.…eu era muito pequena, acho que eu tinha uns cinco anos, mais ou

menos, e quando a gente voltou, ela (referindo-se à mãe) já pediu pra tirar a roupa

já, já colocar pra lavar. Porque lá é cheio de doença, não sei o que, né. Então, a

minha visão na infância era de que o cemitério era um lugar sujo, cheio de

doença, que era um lugar que não era pra pisar o pé lá. Tanto que quando meu

primo faleceu, que ele era um ano mais novo do que eu, eu tinha sete anos. E aí, eu dei

a desculpa: não mãe, eu não posso faltar na escola porque vai ter prova. E ela falou

assim: não filha, mas...ela chegou a conversar com a professora lá e diante da

professora eu falava: não, eu não posso perder essa prova! Não, eu não posso perder

essa prova!

Nestas falas das participantes: “a gente foi num cemitério público e era aquela coisa,

lembro de as pessoas dizerem assim: ah, quando chove, os corpos ficam todos expostos, então

tudo aquilo me assustou num primeiro momento, foi horrível”; “[...] já pediu pra tirar a

roupa já, já colocar pra lavar. Porque lá é cheio de doença, não sei o que, né. Então, a minha

visão na infância era de que o cemitério era um lugar sujo, cheio de doença, que era um

lugar que não era pra pisar o pé lá”, “é um lugar que criança não pode pisar, é cheio de

sujeira, cheio de bicho...” nota-se que o cemitério foi apresentado como um lugar relacionado

à doença, ou seja, um lugar que gerava medo por ser uma ameaça à saúde das pessoas, como

abordado por Camargo (1995), Pagoto (2004), Berlinck (2016), Costa et al (2016)

representando esta transformação do cemitério como campo santo para um campo profano,

ilustrando a ruptura das tradições anteriores, por meio das medidas higienistas até culminar na

construção de cemitérios públicos separados das igrejas.

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P2 – Porque a gente pensa assim, por exemplo, eu como falei, né, foram muitos anos,

então assim, a minha mãe nunca levava e ali não é lugar pra criança, não é lugar

pra criança!

P1 – (concorda) aham, é. Eu ouvi muito isso também.

P2 – Hoje, eu já tenho essa visão diferente. Então, acontece. Se eu tiver que levar a

minha pequena de três anos, eu vou levar né? Porque não existe isso, acho que ela

também, ela já precisa ter essa questão, esse contato, essa vivência, entendeu?

P1 – você já mudou

P2 – Pra que ela, porque os outros dois não tem problema, pra que ela também não

venha a sofrer o que eu sofri porque eu sofri. Particularmente eu sofri muito, então

assim, eu não quero isso pra um filho meu. É horrível você viver com medo, sabe,

com incerteza. Não é o que eu quero. Então assim, eu acho assim, tem as pessoas que

tem essa situação mesmo, minha mãe criou a gente assim: ali não é lugar pra

criança. Então, eu não posso pensar dessa forma: ali não é lugar para criança, né.

Quando minha vó faleceu, meu filho tinha de dois pra três anos, e eu tive que levar, eu

falei: vou levar, não tem com quem deixar. Até uma coisa que foi interessante, que

não foi assustador pra eles, que eram crianças, é porque lá no cemitério tinha uma

máquina daquelas que você enfia o dinheiro que sai refrigerante, salgadinho...

P2 – Olha, foi um tal de pedir dinheiro, que não dá nem tempo de você ficar sofrendo

tanto. Toda hora uma criança ficava pedindo dinheiro, lá dentro do negócio. Me dá um

dinheiro? (risadas). Então assim, eu acho que isso desmistifica um pouco. É um

lugar, é comum também, né. É especial? É. A gente tem que trabalhar né, é um

lugar de descanso, tem essas coisas. Mas, ao mesmo tempo, não é um lugar como a

P5 falou. Ai, aí eu fiquei pensando: é um lugar que criança não pode pisar, é cheio

de sujeira, cheio de bicho ou um outro pensamento né, que tem gente que tem

preconceito, aquelas coisas religiosas: aí porque você sai carregado de lá, e não

sei o que, de coisa de mau espírito, não sei o que. Entendeu? Tem essas visões,

tem sim essas visões. Tem gente que tem isso de tirar toda a roupa e lavar e não

sei o que, mas não é pensando nisso que é por causa de uma sujeira. É pensando

exatamente nisso: ai, né aquela coisa ruim que a gente trouxe de lá...

E1 – Eu nunca tinha entrado no cemitério da Consolação. Mas, ao entrar me veio

à memória, eu perdi um tio recentemente então, veio a reflexão, né? Que a casa do

luto é onde é lembrado, né, é onde você lembra.

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Esta fala “um outro pensamento né, que tem gente que tem preconceito, aquelas

coisas religiosas: aí porque você sai carregado de lá, e não sei o que, de coisa de mau

espírito, não sei o que. Entendeu? Tem essas visões, tem sim essas visões. Tem gente que tem

isso de tirar toda a roupa e lavar e não sei o que, mas não é pensando nisso que é por causa

de uma sujeira. É pensando exatamente nisso: ai, né aquela coisa ruim que a gente trouxe de

lá...” aponta um cemitério que causa medo e que, além de ameaçar a saúde, traz uma ameaça

à salvação das almas, segundo a tradição católica, como bem explica Pagoto (2004).

Este cenário, de uma época de mudanças de atitude e formas de se relacionar com o

espaço cemiterial em que predominou uma insegurança, provem da ruptura das tradições

anteriores. Pode-se entender que já que os adultos se sentiam ameaçados em suas crenças,

certamente, sentiam-se inseguros em levar as crianças para este local ameaçador. Assim

mostra a fala da participante a respeito de como foi educada sobre a morte por sua mãe, tendo

o cemitério como um local não apropriado para crianças. No entanto, hoje, assumindo o papel

de mãe, explicita a necessidade de mudança de significado: “minha mãe criou a gente assim:

ali não é lugar pra criança. Então, eu não posso pensar dessa forma: ali não é lugar para

criança, né.” – reconhecendo como sendo importante que seus filhos, mesmo pequenos,

possam conviver e ter contato com o cemitério desde cedo: “Então assim, eu acho que isso

desmistifica um pouco. É um lugar, é comum também, né. É especial? É. A gente tem que

trabalhar né, é um lugar de descanso, tem essas coisas”. Desde modo, se aproxima da fala

que atribui ao cemitério como sendo um local saudável, em que há espaço para a memória, o

afeto e o acolhimento às manifestações do luto: “Eu nunca tinha entrado no cemitério da

Consolação. Mas, ao entrar me veio à memória, eu perdi um tio recentemente então, veio a

reflexão, né? Que a casa do luto é onde é lembrado, né, é onde você lembra”.

Neste estudo, o significado atribuído ao cemitério foi apresentado pelas participantes

como sendo uma construção passível de transformações - como aprenderam com suas mães e

agora sendo mães como educam seus filhos – que sofre as influências do ambiente físico e

espaço cemiterial, dos costumes familiares, ou seja, como os adultos lidavam com este local e

das explicações e crenças religiosas presentes neste campo, como abordado por Morin (1997)

sobre a existência da transmissão cultural incessante às novas gerações.

7.5 Repercussões das vivências infantis na fase adulta

Medo na infância que continuou na fase adulta

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Mudanças geracionais (Não querer que os filhos tenham a mesma

dificuldade para lidar com a morte).

Considerando-se como se dá o aprendizado sobre a morte ao longo do

desenvolvimento, DeSpelder & Strickland (2015) afirmam que ainda que as principais fases

da socialização ocorram na infância, ela não se encerra nesta fase, ela continua ao longo das

fases do ciclo vital, na medida em que o indivíduo desempenha novos papeis sociais,

desenvolvendo assim, novas atitudes, valores e crenças. As participantes mostraram em suas

falas como se deu esse processo.

P2 – [...] minha mãe fala assim: mas pensa no lado bom, filha, quando a gente for

enterrada a gente pode sentar aqui nesse banquinho e ficar olhando a represa, né.

(risadas do grupo) entendeu? Eu tenho que trabalhar isso comigo porque eu tenho

os meus filhos, né. E é legal que os meus filhos, eles não tenham esse problema.

Esse problema é só meu e que eu continuo trabalhando na minha vida porque é

complicado. Pra mim é complicado. Mas assim, eu penso que foi tudo devido

àquela primeira experiência lá, de quando eu era pequena. E aí assim, por

exemplo, eu tenho horror de escuro, de ficar no escuro, entendeu? Eu entendo essa

situação da P1 contar de quando, “ai eu tenho medo de fechar os olhos e morrer”

porque pra mim foi assim. Foi assim. Eu fiquei quase uma semana sem dormir. Medo.

E3 – [...] é, e ela (referindo-se a filha) não tem isso que eu tenho, de medo de

escuro sabe, de medo. Aqui, eu não tenho medo de escuro, agora na Bahia eu

tenho. E ela, aqui, ela vai em velório, tudo. Só quando a minha tia morreu, uma

vez ela perguntou: mãe, quando a gente morre, a gente vai pra onde? Pro céu? E

eu falei: é, que eu nem sabia o que falar, né? Porque eu nem sabia o que falar e

eu falei é e também foi só. Ela não tem nada, de tipo assim, aí que eu fiquei... e já

eu... eu não, eu tenho. Aí, eu não sei se é porque eu criei ela longe deles, do

costume deles lá né, porque ela é criada aqui... então, quando a gente viaja pra lá,

nunca teve nenhum velório, né. Ninguém nunca morreu lá quando a gente vai, acho

que é por causa disso também, graças à Deus né, porque senão... já pensou se ela

fosse igual eu? (risadas).

Nota-se que há uma preocupação na fala das participantes de que o medo que elas

apresentavam na infância não se repita com seus filhos. Essa busca pela mudança de atitudes

na forma de educar os filhos, também expressa com seus alunos, como se verá também em

categorias posteriores voltadas ao contexto escolar, aponta para o que DeSpelder & Strickland

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(2015) chamam de processos de socialização bidirecionais, isto é, eles estão em constante

mudança. O contrário seria se as participantes apontassem, apenas, para um aprendizado que

caminhasse na direção de se encaixar na sociedade, daquela aprendida na socialização

primária. Se assim fosse, seria entendido como um processo unidirecional, o medo sentido por

elas na infância não possibilitaria mudanças de atitudes frente a morte. Sendo assim, pode-se

dizer que aprender sobre a morte se dá em diferentes fases e etapas da vida, deste modo as

repercussões das vivências infantis relatadas pelas participantes na fase adulta exemplificam

tal processo, que assim seguirá.

C – Então, mas eu acho que tudo isso é de acordo como é passado pra criança.

Como você passa essas informações pra criança. Que tem família que assusta a

criança mesmo e a criança vai crescendo com aquilo. É o que ela acabou de falar.

P5 – E às vezes, nem é a informação. De forma indireta, são ações [...]

E2– Mas você sabe que é muito importante porque aconteceu comigo. Meu pai

faleceu aos cinquenta anos e ele foi ao banheiro e falou: esquenta a janta? Aí eu

tava esquentando a janta e a minha filha de três anos estava perto. Ele

simplesmente caiu, teve um infarto. E ela olhando. Então foi todo o processo, ele

falecendo, tudo. E ela viu. Só que a gente achou que uma criança de três anos não

teria, assim, não tava entendendo nada. E quando foi o enterro, ela ficou no dia

do enterro, ela ficou: vovô! E a gente só falou assim: o vovô foi pro céu. Com todo

mundo nervoso, o vovô foi pro céu, morreu. Nunca tinha falado sobre a morte com

ela. É, no dia do enterro, ela ficou: vovô, vovô! E olhava pro caixão e queria ir com o

vô: eu quero ir com o vô! Muito apegada ao avô. A semana se passou, a gente tinha

uma estante que abre, essas estantes antigas e ela se enfiava lá dentro. E cadê?

(chamando a filha) Dentro da estante! E eu não entendia. Procurei ajuda e a

psicóloga falou: é o caixão, ela quer ficar com o avô. Então ela ficou muito tempo,

dentro da estante. Ela abria, pequenininha e fechava... E aí, a gente foi

trabalhando isso com ela. Mas assim, eu não sabia, eu nunca tinha perdido ninguém,

na família. E não soube, eu nunca falei, olha...a gente só falou: o vovô foi pro céu. E

ela fazia uma coisa também, olhava pra janela e ficava: vovô! Porque foi pro céu e

ficava chamando, por muito tempo. Então, é muito importante sim. Desde pequeno

a gente trabalhar a morte com criança.

P2 – [...] E eu não posso deixar meu filho pensar que lá tem uma coisa ruim

porque um dia, eu vou estar lá (cemitério) e aí como vai ser? Meu filho não vai

querer ir lá me ver? (professoras riem) Gente, mas é verdade isso. Então, são

sentimentos que a minha vó trabalhou isso comigo. A minha vó! Então, filha, mas

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como é que vai ser? Um dia, todo mundo morre. E como é, você não vai no

enterro de ninguém, e se ninguém for no seu, quem vai te enterrar, né? E se você

tem medo de lá, quem é que vai lá visitar você, colocar uma flor, conversar com

você? Não sei, falei: poxa, então, eu não quero isso pros meus filhos.

P2 – Hoje, eu já tenho essa visão diferente. Então, acontece. Se eu tiver que levar a

minha pequena de três anos, eu vou levar né? Porque não existe isso, acho que ela

também, ela já precisa ter essa questão, esse contato, essa vivência, entendeu? [...]

Pra que ela, porque os outros dois não tem problema, pra que ela também não

venha a sofrer o que eu sofri porque eu sofri. Particularmente eu sofri muito, então

assim, eu não quero isso pra um filho meu. É horrível você viver com medo, sabe,

com incerteza. Não é o que eu quero. Então assim, eu acho assim, tem as pessoas que

tem essa situação mesmo, minha mãe criou a gente assim: ali não é lugar pra criança.

Então, eu não posso pensar dessa forma: ali não é lugar para criança, né. Quando

minha vó faleceu, meu filho tinha de dois pra três anos, e eu tive que levar, eu falei:

vou levar, não tem com quem deixar. Até uma coisa que foi interessante, que não foi

assustador pra eles, que eram crianças, é porque lá no cemitério tinha uma máquina

daquelas que você enfia o dinheiro que sai refrigerante, salgadinho...

Estas falas apresentam as lições sobre a morte que são aprendidas nas relações

familiares. A mudança de atitude e na forma de educar sobre a morte está presente na fala das

participantes em relação às experiências com seus filhos, ainda pequenos – indo ao encontro

das seguintes afirmações de DeSpelder & Strickland (2015): “Que lição sobre a morte é

ensinada? - (...) As lições sobre a morte são aprendidas na família, são transmitidas por

ações, bem como palavras” (p.69). Entendem que os valores e crenças dos pais são

transmitidos aos filhos no cotidiano.

Assim, certamente, estas experiências também influirão nas próximas gerações e nos

vínculos que serão construídos ao longo da vida.

7.6 Luto

Perda da avó; perda do pai; perda do avô e perda do tio.

As falas que se seguirão ilustram que a perda de uma pessoa amada pode

ensinar a respeito da natureza do amor, como explica Parkes (2009), sendo amor e

luto duas faces de uma mesma moeda, logo, não é possível viver o primeiro sem que

se corra o risco de defrontar-se com o segundo.

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P2- Então assim, a família ficou até preocupada comigo, quando minha avó

faleceu porque e aí agora ela tem que ir, porque não sei o que. Eu fui, com

relutância né. (referindo-se ao velório). Eu lembro da minha vó falar assim uma vez

que a gente tinha que ir nos enterros das outras pessoas (risadas entre o grupo) porque

a gente tinha que pensar que um dia a gente ia morrer e quem ia no nosso enterro? A

minha vó falava esse tipo de coisa. Meu Deus, eu tenho que ir no enterro da minha

avó, como eu vou fazer? Eu fui e foi muito sofrido, e só depois de uma

experiência muito, muito particular e espiritual que eu tive, foi que eu vim a

aceitar a situação da morte da minha vó. Mas, assim foi quase sete meses depois.

E aí, eu parei de chorar, me conformei, mas foi uma coisa pra mim, sempre foi

muito marcante isso. Hoje, eu posso dizer assim se alguém falar eu vou lá, também

tem a estrutura de cemitério né.

E2– Mas você sabe que é muito importante porque aconteceu comigo. Meu pai

faleceu aos cinquenta anos e ele foi ao banheiro e falou: esquenta a janta? Aí eu

tava esquentando a janta e a minha filha de três anos estava perto. Ele

simplesmente caiu, teve um infarto. E ela olhando. Então foi todo o processo, ele

falecendo, tudo. E ela viu. Só que a gente achou que uma criança de três anos não

teria, assim, não tava entendendo nada. E quando foi o enterro, ela ficou no dia

do enterro, ela ficou: vovô! E a gente só falou assim: o vovô foi pro céu. Com todo

mundo nervoso, o vovô foi pro céu, morreu. Nunca tinha falado sobre a morte com

ela. É, no dia do enterro, ela ficou: vovô, vovô! E olhava pro caixão e queria ir com o

vô: eu quero ir com o vô! Muito apegada ao avô. A semana se passou, a gente tinha

uma estante que abre, essas estantes antigas e ela se enfiava lá dentro. E cadê?

(chamando a filha) Dentro da estante! E eu não entendia. Procurei ajuda e a

psicóloga falou: é o caixão, ela quer ficar com o avô. Então ela ficou muito tempo,

dentro da estante. Ela abria, pequenininha e fechava... E aí, a gente foi

trabalhando isso com ela. Mas assim, eu não sabia, eu nunca tinha perdido ninguém,

na família. E não soube, eu nunca falei, olha...a gente só falou: o vovô foi pro céu. E

ela fazia uma coisa também, olhava pra janela e ficava: vovô! Porque foi pro céu e

ficava chamando, por muito tempo. Então, é muito importante sim. Desde pequeno

a gente trabalhar a morte com criança.

E1 – Eu nunca tinha entrado no cemitério da Consolação. Mas, ao entrar me veio à

memória, eu perdi um tio recentemente então, veio a reflexão, né? Que a casa do

luto é onde é lembrado, né, é onde você lembra. Tem até uma música, não sei se

cabe falar aqui, fala: devia ter amado mais...então assim, é um momento que a

gente tem que viver o hoje, amar, respeitar, conversar, dialogar, às vezes, esquecer um

pouco o celular, olhar mais pra quem está do seu lado porque depois que essa pessoa

se for, você vai, como que você vai?

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As participantes mostram o quanto os membros da família falecidos também exercem

influência na educação sobre a morte, sendo importantes agentes de socialização, como

apontam DeSpelder & Strickland (2015).

No caso da participante P2, a avó exerce um papel importante, de referência mesmo

para ela. Na elaboração do seu luto, encontrou ajuda e suporte da espiritualidade.

A morte do pai da participante E2 coloca a família diante de um novo aprendizado: o

de lidar com o luto da criança que perdeu o avô. Ao buscarem ajuda profissional para o

enfrentamento do luto na família, validam o sofrimento da criança e mostram a importância

de incluir o adulto no circuito de cuidados quando se refere ao luto infantil, pois os adultos da

família, também estão enlutados, conforme apontam Mazorra (2001), Kovács (2010),

Hispagnol (2011), Franco e Polido (2014).

A filha de E2, na ocasião da perda, tinha três anos de idade, e aponta que a criança tem

capacidade para compreender e reagir à perda de uma figura significativa, sendo que num

primeiro momento, a família achava que ela não estava entendendo a morte do avô. Este era

um luto não reconhecido, de acordo com Caselatto (2013). É de se esperar que, após

orientação e cuidados psicológicos para a criança e seus cuidadores, a mãe E2 mude sua

percepção, reconhecendo a importância de trabalhar a morte com a criança que é capaz de

entender e enfrentar o processo de luto.

Para E1, a perda recente de seu tio a fez refletir sobre a vida, expressando seus

sentimentos por meio de uma música “Epitáfio” (Titãs), conforme a letra abaixo:

Devia ter amado mais

Ter chorado mais

Ter visto o sol nascer

Devia ter arriscado mais

E até errado mais

Ter feito o que eu queria fazer

Queria ter aceitado

As pessoas como elas são

Cada um sabe a alegria

E a dor que traz no coração

O acaso vai me proteger

Enquanto eu andar distraído

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O acaso vai me proteger

Enquanto eu andar

Devia ter complicado menos

Trabalhado menos

Ter visto o sol se pôr

Devia ter me importado menos

Com problemas pequenos

Ter morrido de amor

Queria ter aceitado

A vida como ela é

A cada um cabe alegrias

E a tristeza que vier

O acaso vai me proteger

Enquanto eu andar distraído

O acaso vai me proteger

Enquanto eu andar

Devia ter complicado menos

Trabalhado menos

Ter visto o sol se pôr

Assim, quando são conhecidas as histórias de perdas e as diversas maneiras de as

participantes expressarem a dor do seu luto e as consequências do rompimento por morte,

fala-se de diferentes perdas - dos avós, do pai, do tio – perdas que aconteceram em idades e

circunstâncias diferentes. No entanto, o que se tem em comum entre elas, na manifestação do

luto é o preço por amarem estas pessoas significativas em suas vidas, conforme Parkes

(2010).

7.7 Comunicação sobre a morte na escola

As professoras percebem a importância de falar sobre a morte com as crianças na

escola, sendo o Programa Amigos do Zippy e as visitas ao cemitério ferramentas importantes

para facilitar essa comunicação, aproximando o tema, inclusive, para que as crianças

compartilhem suas experiências pessoais de perdas e luto:

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P3 – Depois da visita, o tio de um aluno que estava lá, faleceu. A gente tem até,

porque nós tínhamos que aplicar um questionário e aí ele veio falando pra mim:

olha pro, meu tio né, morreu. E eu falei: e você foi? Fui. E aí a mãe ontem, durante

o questionário, a gente tem aí por escrito. Aí ela falou que ele foi muito tranquilo e

que ele até conseguiu consolar alguns familiares. E daí: olha, isso acontece mesmo,

é assim né. A morte acontece.

P1 – Nossa, o Programa Amigos do Zippy é maravilhoso

P3 – então assim, pra eles entenderem como é: e você foi? Fui. Então dá uma

tranquilidade. Claro que teve família que optou por não levar e eu respeito...

P3 – porque eu acho que cada um tem o seu tempo pra poder fazer. Mas, é

interessante porque assim, foi muito próximo né, fora o evento da Chapecoense. Não

teve como não falar.

P3 – Então pra gente acho que foi bem mais tranquilo: olha, o que aconteceu? E como

era? Não houve essa questão do desespero de: Ah, olha! acontece mesmo, olha

como é!

P3– É

P1 – Uma mãe relatou que no início do ano, uma irmã faleceu dentro de casa e o

menino que a encontrou morta, né. E esse menino no início do ano, ele chorava,

né P3?

P3 – Muito. Todo mundo o conhecia.

P1 - Chorava aqui na escola, chorava, chorava, chorava, chorava. E a mãe dele

falou que esse Programa ajudou muito. E ele foi no cemitério e ela falou que

quando ele voltou do cemitério foi a primeira vez que ele falou com ela da irmã.

E aí ela chorou e ele chorou junto. E ela chorou ontem e ela falou que foi muito

bom pra ele, e assim, só experiências boas. As mães só relataram coisas boas. Eles

chegam e falam assim: pro, lá no cemitério não tinha caveira.

O acidente que vitimou a equipe da Chapecoense que a professora menciona se refere

a morte coletiva de jogadores de um time de futebol bem como jornalistas e técnicos, que

aconteceu no dia 29 de novembro de 2016. A tragédia decorrente do acidente aéreo e a notícia

das mortes foram veiculadas pela mídia, com muita repercussão na televisão e nos jornais.

Este é um exemplo do que DeSpelder & Strickland (2015) chamam de socialização vicária, a

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influência que a mídia popular e diversidade cultural exercem no aprendizado sobre a morte.

Também exemplifica o que Kovács (2012) chama de morte escancarada, aquela exposta a

todos, inclusive as crianças.

Entendeu-se aqui que quando as professoras abrem espaço para que as crianças falem

abertamente a respeito dos fatos que invadem o seu cotidiano, possibilitam que a escola seja

um lugar seguro para falar sobre a morte e demais assuntos considerados um tabu. Apontando

que é possível melhorar a comunicação com a criança, minimizando a dificuldade de

comunicação que muitas vezes os adultos encontram para falar sobre morte com elas,

reconhecendo a importância de se validar a percepção da criança sobre o que acontece ao seu

redor, como apontaram Aberastury (1984) e Torres (1999).

Diante da postura atenta e disponível do professor, as crianças sentem-se mais seguras

para falar sobre suas percepções, inclusive reproduzindo este modelo de comunicação

vivenciada na escola com suas famílias, conforme o relato das mães. Estes relatos são

condizentes com os resultados da pesquisa de Lima (2007), que traz a importância de uma

comunicação aberta e clara com a criança, em que salienta os benefícios de se compartilharem

os sentimentos e da família receber apoio social no período de pós-morte de um ente querido,

como podemos perceber no relato das participantes, em que a escola pôde oferecer esse apoio

social para as crianças, estendendo esse cuidado às famílias, mesmo após a visita ao

cemitério, fortalecendo assim, os laços de afetividade, tão importante nesse processo de

comunicação.

7.8 Visita escolar ao cemitério

As participantes quando relatam sobre o seu conhecimento a respeito da visita guiada

ao cemitério, objetivos e expectativas quando decidiram levar os seus alunos até o cemitério

da Consolação, e o preparo para tal atividade estão em consonância com as experiências de

professores e pesquisadores, como Rigo (2012, 2014, 2015), Santana (2013) e Hipólito (2015)

que têm o cemitério como um novo aliado de trabalho, criando novos recursos pedagógicos

para crianças e jovens – desafiando o cemitério como espaço educativo.

Conhecimento a respeito da visita:

P3 – Então, eu já tinha visto na TV. Passa bastante, é bem veiculado. Na

verdade, acho que quando nós começamos, fazia parte né, uma das ações

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necessárias no Programa Amigos do Zippy, que nós estamos fazendo

curso desde o começo do ano e ele é um programa de educação

emocional. E aí, por causa né, vinham em várias etapas e tinha um bichinho,

que é o bicho pau, que lá é um animal de estimação e ele tem um tempo de

vida de seis meses porque é pelo tempo que dura o Programa. Se você pensar

da formação do professor até você terminar todas as sessões do Programa, dá

esse período incluindo recesso, tudo, dá esse tempo. Por quê? Porque é o

tempo de você começar, como é o relacionamento até a questão do bichinho

morrer.

P3 – É o Zippy, que é o bicho pau. Sabe o bicho pau? Que na Inglaterra é

comum as crianças terem como animal de estimação.

P4 – E esse projeto é originário da Inglaterra... Nós pedimos para

confeccionar, então cada turma que tinha a aplicação do Programa na escola,

a professora de pintura fez um de tecido pra nós que toda aula do Zippy ele

aparecia. Aí a professora P5 confeccionou o dela porque nem todas as

turmas participaram porque exigia de nós, educadoras, ir aos sábados lá.

Foram cinco encontros, o sábado o dia inteiro então você tinha que ter

essa organização pessoal também.

As professoras tiveram conhecimento da visita guiada para escolas ao cemitério a

partir do treinamento e formação no Programa Amigos do Zippy. Nesse programa que

envolve a saúde emocional, também há a proposta de trabalhar a morte com crianças, nesta

etapa, uma das atividades envolve levar as crianças até o cemitério, sobretudo quando se

deparam com a morte do personagem que elas mencionam, o Zippy.

Objetivo inicial: trabalhar a perspectiva de outras culturas, passar em três

cemitérios com visões diferentes

P4 – É que assim, nós tivemos que entregar o material, mas o material é uma

apostila que tem imagem inclusive dele né, porque as histórias vêm com uma

proposta que a gente apresente a sequencia. Só que a gente precisou entregar

o material que a gente assine e não pôde reproduzir. Inicialmente a gente

queria ir pra I. (cidade da Grande São Paulo) pra passar em três

cemitérios com visões diferentes. Um que é um cemitério jardim, que é o

Cemitério da Paz, que parece muito com o São Luiz; um que fica bem no

centro da cidade que tem alguns monumentos e o Ikakuji, que é um

cemitério japonês, inclusive, pra gente trabalhar a perspectiva de outras

culturas. Nós não tivemos a autorização por ser fora do município. Aí,

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nós ficamos sabendo do Consolação inclusive da monitoria. Então,

inicialmente a gente queria ir pro Consolação e na volta passar no São

Luiz.

P3 – Ter acesso ao cemitério. Porque era muito comum ter o relato das

pessoas: nunca fui. Daí então fazia parte vivenciar como era esse espaço.

Se não desse era através de fotografia, mas se conseguisse iria mesmo.

T – Vocês perceberam que foi importante levá-los ao cemitério? Porque pelo

que entendi, tinha a possibilidade de só mostrar as fotografias. E vocês foram

até lá, choveu, foi um dia com contratempos, tem a distância considerável, o

deslocamento...

P4 – Não, é. Nem tem comparação

P3 – Então, mas considerando o desenvolvimento deles, eles estão num

período que eles precisam ver!

P4 – Sentir

T – Vocês consideram que isso é importante no aprendizado?

P3 – É

P4 – Sim, fundamental

P5 – Vivência é essencial

P3 – O nosso trabalho vai muito disso. Você trabalha número, mas ele

precisa pegar...

P3 – Exatamente. Pra quem foi, por exemplo, eu ainda tive a curiosidade

e deixei passar um dia, dois e falei: gente, tudo bem, vocês voltarem do

passeio? Foi legal? Alguém ficou com medo? Foi, foi super legal! Contou

pra mãe? Contei! E agora na reunião de pais que nós tivemos, foi ontem,

não veio assim, sabe: ai meu filho demorou três dias, não veio!

P4 – Eu acho que parte também do princípio que nós temos uma

responsabilidade muito grande frente essas vidas e quanto mais

experiências eles tiverem, melhor. Pra uma formação muito mais do que

um caráter alfabetizador, do letramento das letras e dos números, uma

formação cidadã. Tanto que eu, com trinta anos, eu fui pra aquele

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espaço. Eu olhava pra eles, com sete, oito anos, podendo ter essas

oportunidades, de fazer todos os contrastes. Eu até brinquei com eles:

gente, se a professora partir amanhã, eu posso ser enterrada aqui? Não,

professora, só pros ricos e famosos.

P – risadas

P4 – Olha a percepção. Não é qualquer um que está naquele espaço.

P3 – Sim, foi muito engraçado os famosos. Chamou a atenção.

As professoras P3, P4, P5 ressaltam a importância de levar os alunos até o cemitério

considerando que a vivência é fundamental para o aprendizado e o desenvolvimento,

sobretudo, nesta faixa etária. Nessa perspectiva, poderiam trabalhar apenas com fotografias,

no entanto, não teria a riqueza de explorar o novo espaço. Assim, vai ao encontro da

explicação de Rigo (2012) que defende que a utilização do espaço cemiterial promove o

compartilhamento de histórias de vida que dentro de uma sala de aula provavelmente ficariam

limitadas ao pensamento individual.

A fala da P5 quanto a responsabilidade do professor na formação cidadã dos seus

alunos, remete à fala de Hipólito (2015) que acredita que é possível ensinar e conscientizar

desde criança que o cemitério é um patrimônio, portanto, ter acesso a história local e à cultura,

podem ajudar na formação de cidadãos mais críticos e conscientes.

Preparação em sala de aula antes da visita

P4 – A coordenação ligou pra agendar e lá eles falaram: a gente tem a

monitoria que acontece às quartas-feiras é só agendar o horário

P4 – Isso. E daí foi nesse processo do dia inclusive da data. Só que aí já tinha

tido as aulas. As crianças já estavam num outro momento, num outro módulo

que já era a finalização. Então a gente precisou resgatar com eles. Então, pra

dar continuidade no Programa, a gente apresentou as fotos, tivemos a

roda da conversa e as vivências propostas da aula. Então, por exemplo,

quando a gente chegou lá, teve aluno que falou: nossa professora, a gente

viu essa foto! De um dos monumentos. Porque a gente apresentou fotos

também de lá, não só, mas também de outros espaços. De outros

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cemitérios que tem o crematório, tanto que uma delas perguntou: Tem o

crematório? Porque veio dessas vivências anteriores em sala de aula.

A preparação dos alunos relatada pela P4 se aproxima da metodologia criada por Rigo

(2012) que incentiva novas práticas pedagógicas por meio da Pedagogia Cemiterial, tendo o

cemitério como recurso de ensino aprendizagem, com utilização de imagens fotográficas,

reflexão pessoal antes da visita e, após a visita um debate dirigido para o aprendizado mútuo.

Observa-se que a metodologia das professoras tem caminhado para um aprendizado que

favoreça a troca e a reflexão das experiências. Apesar de desbravarem o cemitério como um

espaço educativo, ainda deparam-se com o preconceito, reações de estranhamento entre os

próprios colegas da área da educação e familiares.

Reação de estranhamento

E2 – Mandei no grupo e meu marido: como assim você foi pro Sesc e não

mandou foto e você vai me mandar foto de cemitério? (risadas) Mas eu falei:

meus irmãos vão entender o que é. Foi muito gostoso.

P3 – No grupo também, né? Quem não estava no Programa: ah, as meninas

que vão pro cemitério! Vocês vão aonde?

P5 – Sim. Com tanto lugar pra ir, vocês vão ao cemitério?

P3 – Então, nós vamos ao cemitério. Com as crianças? (risadas)

P4 – Onde já se viu?

P3 – Não, é porque tem os professores do ensino fundamental II a partir, né.

Aqui é o nono ano de manhã, então às vezes a coordenadora chegou: ué ela já

sabia e tudo bem. Onde? Cemitério. Olha a cara! (risadas).

7.9 Programa amigos do Zippy

O tema da morte invade o cotidiano escolar e, muitas vezes, os professores não se sentem

preparados e capacitados para lidar com esta demanda dos alunos, como afirmam Domingos

(2000) e Kovács (2010). O Programa Amigos do Zippy, por tratar-se de um programa de

educação emocional e entender o professor como um facilitador do desenvolvimento

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emocional dos alunos, oferece capacitação para os educadores, mostrando uma saída possível

para a problemática da falta de preparo percebida pelos professores. As participantes apontam

para a importância do treinamento e suas motivações para participarem do Programa giram

em torno da educação integral, muito alinhadas ao que propõe a UNESCO, quanto à

necessidade de uma educação que envolva os aspectos cognitivos, emocionais e sociais dos

alunos, como explica Delors (1996).

Treinamento dos professores

P4 – [...] tanto que a cada módulo a gente fazia as vivências anteriores,

então tinha um cronograma e a gente tinha uma pasta que inclusive

tinha o passo-a-passo da aplicação das aulas e quando a gente entrou no

módulo cinco que era mudanças e perdas, temática inicial, cada módulo

era composto por quatro aulas. É, teve uma palestra com uma psicóloga, do

Laboratório da morte da USP, que foi numa noite, às sete horas da noite, lá na

Paulista. Então, muitos educadores não pôde ir. Eu fiz questão de ir porque

pra mim é um tema fantástico que eu tenho uma paixão por estudar,

principalmente pelas perspectivas religiosas e quando veio essa

oportunidade, depois que eu saí da palestra, eu falei o quanto foi

importante pra eu ter o suporte para lidar com essa temática em sala da

aula. Porque você saber das suas experiências pessoais é uma coisa, você

lidar com esse tema frente a um grupo que podem surgir inúmeras

perguntas e despertar coisas da vivência pessoal de cada uma delas,

então foi um preparo fundamental pra isso. E na terceira aula, pedia-se

essa visita ao cemitério.

P4 – E assim, a gente tinha duas opções: ou ir até o espaço ou fazer por

movimento de fotos. Nessa escola, eu fiz os dois processos. Eu apresentei

as fotos até por causa do cronograma, não ia dar pra cumprir até a data do

agendamento. Inicialmente não era o Consolação, nós tínhamos a ideia de ir

pro município de Itapecerica da Serra.

P4 – Esse é o Zippy.

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Figura 1 – Foto do Zippy tirada no grupo focal.

Figura 2 – Foto do Zippy tirada no grupo focal.

Figuras 1 e 2: Fotos do personagem Zippy, do Programa Amigos do Zippy, confeccionado pelas professoras para

trabalhar o tema da morte em sala de aula com seus alunos.

Motivação para participarem do Programa

P3 – [...] nós temos um processo de formação continuada, é comum.

Nesse processo a gente recebe um prospecto de vários cursos. [...] ele

explica basicamente o que é que você verá e se você está disposto a fazer.

Então assim, quando eu li, eu gostei por quê? Porque falava assim da

proposta de trabalhar com dificuldades relacionadas a questão

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emocional porque a gente tem assim, crianças que se batem muito, né,

com um índice de agressividade intensa. E aí assim, uma das descrições

eram trabalhar a questão emocional, né, respeitar o outro. Pô, legal! E

como era uma proposta assim diferente. Porque sempre vem curso:

alfabetização, matemática, ciências, história, geografia. Então, era uma

proposta diferente. E aí, você tem que ter a disposição porque o seu

sábado morreu, né. Então foi nessa ideia. Então, de verdade, nesse começo,

nós não sabíamos que ia chegar até aí. Você recebe como um Programa de

educação emocional, ta? Então, ele não fala assim, você vai, inclusive...não!

É um dos temas. Então era: como me relacionar com o outro, como que é

que eu faço novos amigos, como é que eu respeito o espaço que eu tenho

que estar, como é que eu lido com o outro, como é que eu faço amizade,

então vem todo esse processo. Isso, até chegar nesse espaço. Então assim,

a vida. A ideia da vida, dos relacionamentos e a morte é o rompimento

desse relacionamento.

P3 – Por isso eu acho que ele inclui. E o bichinho, então assim: é muito

interessante porque pra eles que são pequenos, pra você associar, né, e é

muito rápido. Então assim, desentendimento é desentendimento na

história é com o amigo da classe, mas rapidamente eles contam: meu pai,

minha mãe...transferem muito fácil, assim. Então, foi nessa ideia.

P3 – A Diretoria de Ensino manda e quem quiser, vai.

P5 – Eles oferecem para todas as escolas o curso e o professor é que

decide se vai aderir ou não.

P4 – Só que tem uma faixa né, então são professores do ciclo de

alfabetização, que é o primeiro, o segundo e o terceiro ano. Inicialmente,

na faixa etária do Programa de adesão de seis a oito, nove anos. E

quando veio, pra mim, quando eu vi saúde emocional, me encantei

porque na minha particularidade eu já busco esse caminho de auto

descobrimento há alguns anos e eu passei por algumas experiências de

vivências, de treinamentos muito fantásticas onde eu acionei coisas da

memória infantil. Então eu vi o quanto as crianças precisam disso. Então

quando eu vi essas temáticas eu falei assim: ual! O quanto isso vai

favorecer, além do ambiente escolar, pra uma sociedade e pra uma vida!

E quando a gente se deparou com o Programa, a gente até brincou: pra vida

funcional, esquece porque é um ponto.

P3 – não valia a pena

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P4 – Não vale-se a pena, porém quando a gente vê os relatos das famílias,

a gente vê a mudança de postura das crianças, que o Programa finaliza

com uma formatura e eles recebem uma coroa.

As motivações das participantes estão ligadas ao desenvolvimento humano dos seus

alunos, estendendo às famílias e à comunidade. Esta constatação revela sua consonância ao

que a Organização Mundial de Saúde (WHO, 1997) propõe: que a escola é o ambiente

propício para o desenvolvimento humano, sendo base para desenvolver as competências

psicossociais essenciais.

Cuidado com a saúde emocional dos alunos

P4 – E nesse movimento você percebe que, por exemplo, a morte nessa

perspectiva, ele diz: tudo que tem mudanças tem o lado positivo e o

negativo. E a morte também tem. E você aflorar isso num momento que

acontece, falando disso anteriormente é fundamental, né. Então assim, é

uma coisa que veio de proposta, tanto que a gente saiu divulgando e

falou: gente, façam! Ano que vem, faça! Tem um outro porque é outra faixa

etária...

P4 – Sim, nos momentos de reunião a gente falou pro grupo um

pouquinho e incentivou pros professores fazerem porque pra outra faixa

etária, agora eles estão com um projeto-piloto chamado Passaporte.

Passou umas semanas atrás inclusive no Fantástico que é pra lidar com a

questão de auto mutilação e outras temáticas também sobre a saúde

emocional.

P4 – Um desafio que foi da outra escola, que eu posso dizer assim, que a

gente não teve aqui, eu acho que pela união do grupo. Quando a gente tem

vários educadores no processo, eu acho que inclusive pra gente meio que

pressionar algumas ações frente a pedido de ônibus, por exemplo, que a gente

não tinha condições de cobrar. Porque a gente precisou solicitar nos

programas especiais da nossa DRE o envio de um ônibus. Na outra escola,

eu por ser a única educadora da unidade, eu não tive essa força. Então,

isso a gente também encontra uma barreira que desestimula. Porque

assim, você levar a proposta...porque as famílias foram avisadas

anteriormente numa reunião de pais que houve que nós teríamos esse

processo. Inclusive pedimos pra elas não contarem pras crianças porque a

gente tinha que fazer a parte da sequencia. Teve família que acabou contando,

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mas isso não interferiu tanto. É, mas lá, por exemplo na outra escola, eu só

tive que apresentar as fotos. Então assim, é uma barreira...

T – Você não conseguiu levá-los?

P4 – Não, mas eu relatei pra eles. E assim, você percebia uma necessidade

grande de interesse por parte deles de querer estar nesse espaço né. Então,

quando eu abri pros pais, na outra escola, porque também tem aquela coisa,

você vai cobrar dezessete reais pra ir ao cemitério? Se já não tem uma

apropriação tão grande da temática. Então, essas resistências do sistema

também, né, a gente pode dizer até de algumas questões da equipe gestora,

por não conhecer o Programa. Então, quando eu disse pra você, de você vir

trazer os resultados da sua pesquisa, eu acho que vai ser muito importante pra

nós, porque vai desmistificar esse tema pra nós, pessoalmente, que eu acho

que é um processo que não finda e para os demais colegas também.

As participantes comunicam que a união do grupo de educadores facilita a adesão ao

Programa, trazer a temática da morte na escola e a visita ao cemitério, apontando para a

importância do trabalho coletivo e do apoio dos colegas. Também demonstram o incentivo

para que outros professores conheçam este curso e outros ligados a saúde emocional,

disseminando assim, o conhecimento. A atitude das participantes no papel de educadoras, de

persistirem em atuar na promoção de saúde nas escolas, reconhecendo a importância de cuidar

da saúde emocional dos seus alunos, apesar das dificuldades encontradas, estão apoiadas no

modelo proposto por Gorayeb et al (2003, 2006) como estratégia preventiva uma vez que

focaliza na redução de comportamentos de risco e ampliando os cuidados com a saúde física e

mental.

Morte do Zippy: lidando com a morte em sala de aula

E3 – [...] Eu entrei na sua sala, eu era estagiária dela aí eu entrei em maio, né? Aí eu

entrei e já tinha o Programa do Zippy. Aí, ela fazia as aulas, né, passava pra todo

mundo pegar e eles pagavam, aí teve um dia que ela veio sem o Zippy... Foi o dia

que o Zippy morreu. Aí todo mundo: ah, ele morreu? E eu quase que chorei

(risadas) Mas, o Zippy morreu por que? O Zippy morreu. Aí, desse dia em diante

não levou mais o Zippy

P3 – Não levei.

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E3 – E eles não perguntavam.

T – E isso faz parte, tudo programado?

E3 – É, é

P3 – Sim, porque não faria sentido eu dizer que o bichinho morreu e ...

E3 – Ia levar o bichinho, ia ficar confuso né?

P4 – Apesar da gente dizer pra eles que quem morreu foi o Zippy do Tiago, que

era o personagem da história, porém o nosso Zippy desde o princípio era uma

figura representativa. Só que pra eles entenderem que não ia ver nunca mais, de

ver, não fazia mais sentido continuar as aulas com a presença dele.

P3 – Retiramos. Então, ele não ia mais.

E3 – E tinha um aluno que já conhecia o bicho-pau no Catavento, que lá tem muito.

Tem um espaço lá que tem bicho-pau aí ele já conhecia. Mas eu ficava, e eu ficava

atrás né, P3? E eu fazia: Meu Deus, cadê o Zippy? (risadas) e as crianças nem aí e

eu que não consigo lidar com morte, né? Não é bem trabalhado isso em mim, e

neles já, bem tranquilo.

A partir da fala da estagiária E3, constata-se a importância do cuidado com o cuidador

e, neste caso, do preparo dos profissionais da área da educação para que possam acolher os

questionamentos das crianças e lidar com situações de morte, perdas e luto, assim como

aponta Paiva (2008, 2011). A notícia da morte simbólica do personagem Zippy pareceu

impactar mais a participante E3 do que as próprias crianças. Segundo ela, sua dificuldade está

associada às suas experiências infantis em que os adultos lidavam com o assunto morte de

forma velada com as crianças, gerando desemparo, conforme explica Zambeli (2014). Nesse

sentido, trabalhar a morte no cotidiano escolar implica não só trabalhar com os alunos, como

também cuidar dos educadores, conforme a experiência do LELu (FRANCO et al, 2016).

aponta ao ressaltar a importância dos encontros formativos sobre luto para os professores,

transmitindo o conhecimento teórico sobre luto e, principalmente, acolhendo as experiências

do cotidiano escolar.

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7.9 Aprendizado dos alunos

A participação no Programa Amigos do Zippy, somada à visita escolar ao cemitério,

trouxe inúmeros benefícios e, dentro dos temas levantados pelas participantes, em relação ao

aprendizado dos alunos foram: redução de comportamentos ligados ao bullying, expressão de

sentimentos, rede de apoio, aprender a nomear os sentimentos e o acolhimento ao aluno

enlutado, que dizem respeito ao papel profilático das escolas para as questões que envolvem a

saúde emocional e ao luto, como abordado por Sukiennik (2000), Kovács (2002, 2010, 2012),

Tinoco (2003), Meirelles & Sanches (2005) e Naletto (2005).

redução de comportamentos ligados ao bullying; aprender a nomear e expressar

os sentimentos; rede de apoio

P3 – É que pra aula do Zippy acontecer tinha todo um enquadre né? Tinha uma

sequencia específica por isso que é um Programa. Então, eles sabiam. Agora a gente

consegue perceber no andamento, né, de acionar, de eu poder dizer o que penso,

sem que o outro dê risada. Então assim, é redução de comportamentos ligados ao

bullying, é no respeito ao outro, do poder falar, deles poderem compreender que

mesmo nós que somos adultos, nós temos problemas, e às vezes descontamos, eles

acabam recebendo a bronca e não é exatamente neles. Porque as histórias

trabalhavam isso. Então, deu uma melhorada sim. Mas, ela aparecia: ah, lembra

aquele dia do Zippy? E aparece do nada porque criança lembra do nada. Você está

dizendo, olha nós estamos agora vendo a dezena. Então, sabe o que aconteceu na

história do Zippy? Vem do nada, assim. Daí eles falam. Então essa percepção de que

podia falar, eu acho que isso é o mais legal. Eu posso contar pra você, eu posso

contar pros meus amigos o que acontece. E uma das falas que é bem interessante

do Programa é que você não precisa falar se não estiver com vontade. Então,

tinha criança que no começo não falava nada, de maneira nenhuma. Mas,

também quando falou...

P3 - Então tinha isso, de você saber que você já tinha um dia específico até pra

você já estar mais fortalecido pra aguentar o que é que viria porque sempre

vinham demandas pesadas. A gente está num espaço de muita violência, de muita

mudança e eles veem coisas, que eu acho que, algumas descrições que eles dão, eu

nunca vi.

P4 - E os recursos porque eles sabiam que eles, por exemplo, tinham o direito de

chorar. Se eles tivessem com algum sentimento de desconforto, eles aprenderam a

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nomear. Então tô num movimento: o que você está sentindo? Era uma pergunta

que eu fazia recorrente à eles em alguns espaços. Ai, eu estou triste. O que que

você quer fazer quando está triste? Quero bater porque ela me deixou triste porque

pegou meu sabonete. A gente faz umas reflexões, por exemplo, que a gente teve no

Zippy. Então, acho que teve um autocontrole frente às coisas que iam surgindo, no

decorrer. Essa questão também de eu poder falar, porém eu tenho o momento de

eu falar, o momento de eu ouvir. E o momento assim, aconteceu lá em casa um

problema, nesse momento eu preciso aprender, eu preciso estar na escola. Então

esses centramentos a gente percebe que foi uma construção que os pais relataram

muito fortemente nos questionários porque a gente não tem dimensão da

abrangência que isso tem porque às vezes a gente está tão envolvido na rotina do

dia-a-dia...

Observamos a importância de a criança aprender a nomear e expressar os sentimentos,

que esse processo implica aos adultos validarem a emoção da criança. As participantes

apontam que as professoras ajudam a refletir sobre como sentem, como usam e como

expressam, em que contexto determinada emoção aparece, atuando na regulação da emoção.

Dessa maneira, a educação emocional vai de encontro com a repressão, e isto, certamente,

facilitará no acolhimento ao luto quando se depararem com situações de perdas e morte, como

veremos a seguir.

Acolhimento ao aluno enlutado

P4 – a ajuda mútua entre eles. Eu tive um aluno na outra escola que a mãe

faleceu no final de novembro e ele era uma criança bem difícil, bem difícil em

vários sentidos. Mas, o acolhimento que as crianças tiveram por ele foi uma coisa

extraordinária. Eu também não esperava. O pai viu esses reflexos em casa e

pediu muita ajuda nossa na escola. Então, os próprios colegas, sem eu dizer nada,

trouxe esse acolhimento. Então você percebe uma sensibilização muito grande

também.

A fala das participantes nos remete a pesquisa de Katayma (2002) que aponta que, se a

educação sobre a morte fosse estabelecida efetivamente no sistema educacional, melhoraria as

relações entre crianças e professores, considerando que ao discutir sobre a morte, isto implica

compartilhar com os outros seus sentimentos sobre o luto. Assim, requer um esforço dos

professores para observar e conhecer bem cada criança, para que se estabeleça com ela uma

comunicação, além de criar relações de confiança entre eles, pois diante de outros problemas

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as crianças poderiam sentir segurança para solicitarem ajuda e ter esse suporte na escola. P3

também refere que as professoras lidam com demandas pesadas pelo contexto da violência, o

que aponta fortemente para a importância do tema, que faz parte do cotidiano escolar.

Na fala de P4, observa-se que o acolhimento ao aluno enlutado envolve o pedido de

ajuda da família, o de receber suporte e ajuda mútua, de perceber os colegas e professores

como rede de apoio. Nesse sentido, as falas das participantes exemplificam as possibilidades

de intervenções psicoprofiláticas que ajudam na prevenção de situações traumáticas e

dificuldades no desenvolvimento emocional dos seus alunos, em que o professor está atento

às questões emocionais que acontecem na vida pessoal da criança e sua família, como

apontam Meirelles e Sanches (2005). Os resultados indicam professoras que se

responsabilizam em relação aos seus alunos e que, diante dessa postura de não negligenciar,

abrem espaço para ampliar a rede de apoio da criança e da família quando se percebe algum

sofrimento ou dificuldades.

7.10 Aprendizado das estagiárias de pedagogia

A análise da narrativa das estagiárias E1 e E2 permite identificar seis temas levantados

por elas como temas centrais do seu aprendizado com esta experiência. Foram eles: reflexão

sobre as experiências pessoais de morte na família; importância de falar sobre morte com as

crianças; importância da participação dos pais e das professoras; importância do diálogo entre

pais e filhos; futuro profissional e reação das crianças diante do túmulo do Monteiro Lobato.

Reflexão sobre as experiências pessoais de morte na família

E1 – Eu nunca tinha entrado no cemitério da Consolação. Mas, ao entrar me veio

à memória, eu perdi um tio recentemente então, veio a reflexão, né? Que a casa do

luto é onde é lembrado, né, é onde você lembra. Tem até uma música, não sei se cabe

falar aqui, fala: devia ter amado mais...então assim, é um momento que a gente tem

que viver o hoje, amar, respeitar, conversar, dialogar, às vezes, esquecer um pouco o

celular, olhar mais pra quem está do seu lado porque depois que essa pessoa se for,

você vai, como que você vai? Então, pra mim foi uma experiência muito boa.

E2 – No meu caso, veio uma memória afetiva porque minha mãe trabalhava

perto da Consolação e há anos atrás ela trabalhou na casa de um santo, santo

Antoninho. E ele estava lá. E ela trabalhava lá perto e ia sempre limpar o túmulo

dele porque a família dele era muito devota. Ele já havia morrido quando ela

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trabalhou nessa casa e minha mãe levava sempre a gente. E a gente não tinha medo,

do cemitério a gente não tinha medo. [...] A gente ia direto. Nisso, quando eu fui

pro Consolação, eu falei: nossa! É aqui o túmulo do santo Antoninho, mas eu não

sabia onde era e por coincidência eu encontrei. Daí, quando eu vi, foi aquela

criança, veio a criança! Foi mesmo (risadas). O túmulo do santo Antoninho! E ali

veio toda aquela infância, toda aquela história. Foi muito gostoso. Eu fiquei

muito emocionada porque veio e eu falei: olha como a memória afetiva é

engraçada, como volta.

Observa-se também nestas falas que a visita ao cemitério proporcionou uma auto

reflexão sobre suas experiências de perdas na família, sendo percebida como uma experiência

positiva. Pode-se entender que, apesar de o objetivo da visita guiada ao cemitério ter a

proposta de um aprendizado sobre a arte tumular, o aprendizado não se esgota no campo

intelectual e cognitivo, ao contrário, possibilita novas maneiras de aprender sobre a vida, na

medida que as pessoas refletem sobre as suas relações e experiências pessoais, como destacou

Kovács (2012) sobre a importância de os educadores entrarem em contato com sua visão de

morte e processos de luto, pois exercem influência significativa em seus alunos que estão

atentos às suas ações e palavras. Desse modo, destaca-se como sendo importante essa reflexão

percebida pelas estagiárias, seja por meio do resgate da memória afetiva da infância ou de

perdas recentes na família, pois elas abrem espaço para as emoções e sentimentos, permitindo

a comunicação.

Importância de falar sobre morte com as crianças

E1 - A minha professora não participou, não pôde porque também ela dá aula

em outra escola, mas assim eu fui com as outras professoras e eu acho muito

importante mesmo falar sobre morte com as crianças. Seria necessário mesmo de

os pais levarem, já ouvi muito comentários: ah, eu não vou levar o meu filho porque é

pequeno. Então assim, eu acho que desde cedo tem que mostrar sim o outro lado

porque eles precisam combater isso porque que nem as professoras já falaram se

depois é uma mãe, eles não vão querer ir, eles não vão ter uma autodefesa. Então eles

vão ficar muito assim recuados. Então pra mim foi muito bom, foi uma pena de a

minha professora que eu acompanho não pôde ter participado, mas assim pela

experiência que ela andou me falando, né, da professora P4, com ela, a professora P3,

eu falei assim: nossa, que legal! Eu acho muito importante mesmo, seria bom se

todas participassem, que aí o trabalho seria melhor ainda. Porque tem crianças

que vivem em lugares difíceis, que vê morte praticamente todo dia.

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Para E1, a experiência pôde mostrar a importância de falar sobre morte desde a

infância, sobretudo, por observar no seu cotidiano de trabalho que estas crianças veem a

morte diariamente, considerando o contexto de violência e vulnerabilidade social a que estão

expostas. Assim discutem Domingos e Maluf (2003) sobre o lugar da afetividade nos

processos de escolarização e da importância da escola atentar-se às questões emocionais dos

alunos, uma vez que o luto tem implicações no processo de ensino-aprendizagem. Desse

modo, a fala da E1 aponta para o reconhecimento de que o desenvolvimento psicológico, a

cognição e as emoções são inerentes ao ambiente escolar.

Importância da participação dos pais e das professoras

Importância do diálogo entre pais e filhos

E1 – porque é o que a gente tá vivendo, a gente liga, vê o jornal e só vê morte.

Então assim, trazer essa lembrança às crianças é muito importante mesmo. Seria

bom se os pais trabalhassem mais junto com os professores. Hoje, eu entendo

melhor estando do lado de dentro porque às vezes as pessoas falam: é, a

professora não explica nada, o aluno não entende nada, mas não é e a

participação da família é muito importante. E hoje estando do lado de dentro junto

com as professoras, eu vejo que não está tendo tanto isso, às vezes não é culpa dos

pais porque tem que sair cedo pra trabalhar, chega tarde só que tem uma experiência

de uma vó que às vezes não sabe ensinar uma lição, mas pode conversar, falar a

respeito de suas experiências. Eu acho que os pais deveriam de parar às vezes um

pouco, esquecer o que tem que fazer às vezes dentro de casa e falar um pouco do

que viveu, falar da sua vida mesmo, não ter vergonha porque as crianças

precisam saber, saber a dificuldade que a mãe passou. E hoje eu vejo que tem

algumas crianças, não são todas, que não entende isso. Acha que tem que ter de

tudo e não é assim. Os pais não tiveram de tudo na vida e não é porque assim; é

lógico que os pais vão fazer das tripas o coração pra dar o melhor pros seus

filhos, mas os pais trazendo o que eles passaram, as histórias de vida, eu acho isso

muito importante. Principalmente, quando se relaciona à morte. Acho que seria

muito bom. Pra mim, eu fiquei um pouco chocada porque como eu perdi meu tio

recentemente, mas o que mais me doeu no dia que eu fui, porque no velório do meu

tio no mesmo dia tava tendo o enterro de uma criança, aquilo me doeu mais do que ver

meu tio. Eu falei assim: gente, é uma vida, é uma criança, mas assim já tá num bom

lugar, sem menor dúvida, mas a gente tem que ter essa confiança e refletir porque só

em velório que a gente pára pra refletir: olha, eu deveria ter conversado mais com essa

pessoa, eu deveria ter me achegado mais, ter trocado ideias porque hoje não tem mais

tanto diálogo igual antigamente. A tecnologia está um pouco afastando as famílias

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até mesmo dos próprios filhos, que hoje cada filho tem uma televisão no quarto,

tem computador, então está tudo sendo divido então, eu acho que quanto mais os

pais trabalhar juntamente com os professores, o trabalho vai ser bem melhor.

Para E1 a participação dos pais junto aos professores, assim como o diálogo dos pais

com seus filhos, reforça a importância da parceria entre escola e família, como destacam

Macedo e Kublikowski (2009) para a construção de valores positivos dos jovens. Esta

aproximação por meio da convivência do adulto com o jovem pode favorecer fatores

protetores ao desenvolvimento, assim como aponta Paschoal (2016) de que as práticas

colaborativas e dialógicas com professores e alunos impulsionam a melhora das relações no

ambiente escolar. Na fala da E1, a tecnologia pode ser um fator que distancia e dificulta esse

diálogo e o convívio familiar, como um reflexo das transformações e das configurações

familiares no mundo contemporâneo em que a comunicação pode ficar restrita ao virtual, e

propõe como alternativa, que o trabalho coletivo entre família e escola podem se fortalecer

para melhorar as relações com as crianças e jovens.

Futuro profissional

E1 – Mas eu vou sair daqui com um grande aprendizado e poder conhecer

também o trabalho das outras professoras que sempre estavam ali. [...] pra mim

foi muito importante ter ido. Eu refleti muito e assim, é viver o hoje e conversar

mesmo, falar, não ter medo de falar porque às vezes tem pais que tem receio de

falar com os próprios filhos. E eu acho que isso foi muito bom, esse trabalho das

professoras. Eu adorei. Se eu estivesse aqui, quem sabe ano que vem, de continuar aí

eu ia tá participando, mas foi muito prazeroso mesmo pra mim.

Nesta fala, a participação no Programa e a visita ao cemitério se mostram como

importantes componentes para a formação do professor, sendo que passar por esta experiência

ainda na graduação é percebido pela participante como um importante fator na sensibilização

para o tema, como propunha Kovács (2002) sendo a educação para a morte um desafio na

formação de profissionais de saúde e educação. Para E1, as próprias professoras que

participaram do Programa ficam para ela como exemplos positivos na construção de sua

própria carreira.

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Reação das crianças diante do túmulo do Monteiro Lobato

E1 – E teve até uma criança, acho que da sala da professora P5 [...] ele viu o nominho

dele né, assim o nome: mas por que o meu nome está aqui? Eu nem morri ainda

(risadas). Então assim, eles vão puxando: ué, mas porquê que meu nome tá aqui?

Então assim, quando chegou no túmulo do Monteiro Lobato, nossa! Tinha

criança que ficou com o sorriso aqui. Então assim, é um lugar assim de respeito,

mas tinha hora que a gente dava risada. Não era o caso de dar risada, mas de ver as

perguntas deles, não teve como!

A fala da E1 reflete a naturalidade que as crianças têm para falar sobre morte, seja por

meio da curiosidade, das brincadeiras, mostrando que é possível educar sobre a morte de uma

maneira lúdica e descontraída, longe da morbidez, muitas vezes temida pelos adultos. Nota-se

o quanto são as crianças que nos ensinam sobre as diferentes possibilidades de aprender,

como destaca Naletto (2005, p.125) de que “as crianças têm muitas coisas a dizer e a saber

sobre a morte, mas muitas vezes não se expressam por falta de espaço, de receptividade”.

Assim, a maneira como as crianças reagiram diante do túmulo do Monteiro Lobato, por

exemplo, mostra que foi possível expressar-se com risadas e brincadeiras, pois houve essa

receptividade por parte das estagiárias e professoras.

7.11 Educação sobre a morte na escola

As professoras identificam quatro temas centrais na discussão da educação sobre a

morte na escola, sendo eles: o preparo dos professores, a participação da família, os recursos

de enfrentamento e a rede de apoio da criança.

Preparo dos professores

P3 – É, eu acredito que assim. Nós não temos um programa específico pra trabalhar

com morte na escola. Se acontece alguma coisa, você acaba tendo que lidar e aí você

lida com a estratégia que você tiver. Não tem esse perfil. Acho que agora, quem

participou do Programa e teve toda essa vivência, acho que está mais respaldado

porque o tema morte vai aparecer sempre, né? Não tem como a gente fugir se ele não

aparece com familiares, como: se você pensar, né? num acidente ou em alguma coisa

e as crianças vem e elas perguntam. Acho que infelizmente a morte está sendo muito

banalizada pela programação de TV e as crianças são muito expostas, né? Eu acho que

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é muito duro pra eles, acho que eles não são muito protegidos dessa ideia. Não que

você não possa discutir, mas não precisa ser uma coisa escancarada. É meio grosseiro.

Mas eu acho que uma vez vivenciado algo nesse perfil, a gente tira um pouco né? Só

da percepção religiosa, só da percepção familiar e o que é que dá para ser feito? Não

dá pra gente retirar porque eles vão perguntar. Eles vão falar: olha, eu vi assim, é

assado. O que é que pode. E a partir daí, eles vão construir a imagem pra eles e não

uma imagem que o outro me contou e me fez medo, o outro me apavorou, o outro

apagou a luz só pra ver eu chorar. E acho que nessa ideia, a gente consegue.

P4 – O Programa nos deu um roteiro de conversação com os pais, explicando o

que fazer. [...] Então a gente teve também uma rede porque elas disseram assim,

que se tivesse algum problema, a gente podia acioná-los pra que eles viessem,

inclusive se a gente fosse procurado por gente da mídia, dos bairros e tal, que

teria essa equipe de apoio para nos dar sustentação, inclusive, de conversas e

tudo mais. Então eu acho que isso deu uma segurança muito grande pra que a

gente também pudesse esclarecer. Então, eu tive pais que na hora falaram: nossa

professora, isso é fantástico porque eu não levaria, ela nunca foi. Porque um dos

objetivos é os terrores noturnos, as impressões que podem trazer. Então, os pais foram

muito bem esclarecidos, né? Então ontem na reunião de pais a gente teve a...porque o

questionário também fazia parte do encerramento desse Programa.

T – E esse questionário é o que? Como que é?

P3 – Ah, ele pergunta o antes e o depois. Como é que os pais perceberam, o que que

as crianças...

P4 – Vou te mostrar. São perguntas que falam assim: como a criança era antes do

Programa e a gente pergunta lá no começo do ano, como os seus filhos eram frente a

essas perguntas e no final, tinha um campo que eles poderiam escrever as observações

que eles tiveram e tudo mais. Então eu tive de vinte e oito da turma, quatorze

entregaram a autorização, mas só onze foram porque choveu muito e teve famílias que

não conseguiu trazer. Mas também assim, uma das coisas que eles nos deram como

suporte é: se não quiser ir, respeita. E acolhe a decisão, por exemplo, da criança. Às

vezes a família autoriza, mas a criança não quer ir.

P4 - Eu não sei, se a gente não tiver porque com a mudança de gestão, a gente não

sabe se a DRE vai trazer esse Programa novamente, temos essas questões políticas que

a gente também não sabe como é que vai ficar. Mas, acredito né, que quando a gente

tem parceira de trabalho que também favorece essa formação, participar dessa

formação, favorece o processo da continuidade de outras formas.

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O relato das participantes aponta que o treinamento foi percebido como um importante

suporte aos professores para que pudessem se sentir mais capacitados a trabalhar com o tema

da morte em seu cotidiano escolar. Para P4, a formação continuada do professor também é

muito importante.

Participação da família

P5 – Na realidade a gente já tinha preparado antes os pais, durante uma reunião

anterior. Nós conversamos que haveria isso, perguntamos se alguém se negava a fazer

ou se queria algum esclarecimento e ninguém se manifestou. Foi bem tranquilo. Eles

sabiam o porquê da visita, o objetivo da visita, estava tudo bem claro.

P5 - Mas, ocorreu que posterior, como eu sou gestante eu tive que fazer a consulta

médica ontem e acabei que não participando da última reunião de pais e eu percebi o

quê? Que uma das mães, ela manifestou na realidade, ela fez uma projeção dela e não

da criança porque todas as crianças que foram lá, elas voltaram felizes, alegres, depois

comentaram com os amigos em sala de aula, nas outras aulas, também na outra aula

do Zippy que a gente teve. Então, eles amaram o passeio, compartilharam com os

amigos a experiência, amaram. E ela, falou em reunião de pais, que me deixou assim

muito surpresa, que com essa fala da mãe, dizendo que a filha tinha chegado

assustada, só que a filha não chegou assustada. Porque a filha saiu super alegre de lá,

não teve nenhuma criança que saiu assustada. Na realidade foi uma projeção dela do

passeio e não da filha. Porque a filha, eu observei e ela procedeu de forma muito

tranquila, pelo contrário. Ela fez até comentários a respeito das estátuas e eu falei que

algumas estátuas eram de escultores famosos, né. E ela ficou: nossa, que legal,

professora! Então assim, foi super tranquilo. E ocorreu também de um dos pais,

mesmo posterior à reunião, da primeira reunião que a gente explicou e ele não deixou

o filho ir. E aí ele falou: olha professora, acho que não convém essa visita. Só esse

mesmo que expôs que ele preferia que o filho dele não fosse, então ele não autorizou.

P3 – Uma outra justificativa que a gente teve muito foram pais que vem com o

transporte. E o transporte não te entrega em outro horário. Então assim, a gente tem

muita dificuldade porque tinha pai que falava: ai, eu queria ir, mas quem me busca?

Então assim, eu recebi algumas autorizações e olha: eu teria o maior prazer, mas eu

não posso pegar a criança fora de horário. Que daí passa e aí assim, nesse horário. Não

tem. Então a gente tem um monte de dificuldade até chegar.

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P4 – Mas num total de quatro primeiros anos e um segundo ano, foram cinquenta e

duas crianças no dia da visita.

P3 – Bastante

A participação da família se deu por meio de reuniões antes e depois da visita ao

cemitério, quando houve a aplicação de um questionário ao final, a fim de acompanhar como

a família percebeu a participação da criança durante o Programa. Os resultados apontam que

nestas reuniões os pais puderam compartilhar situações difíceis e dolorosas com as

professoras, havendo espaço para a expressão do afeto, em que foi possível falar sobre o luto.

Na fala da P4, quando se refere a equipe especializada que ofereceu o treinamento,

como sendo a “equipe de apoio” e quando esta rede de apoio os assegura de que mediante a

algum problema eles poderiam recorrer a eles, estes assumem um papel de base segura para

os professores. Isto é, a equipe de apoio oferece porto seguro para que os professores

pudessem explorar o mundo, permitindo que se lancem para fazer coisas, como as reuniões

com os pais e o trato com as crianças, e podem voltar ao porto seguro caso se deparem com

alguma adversidade, como relatado: “porque elas disseram assim, que se tivesse algum

problema, a gente podia acioná-los pra que eles viessem, inclusive se a gente fosse procurado

por gente da mídia, dos bairros e tal, que teria essa equipe de apoio para nos dar

sustentação, inclusive, de conversas e tudo mais”. Entende-se que na medida em que os

professores se sentem mais seguros, conforme disse P4: “Então eu acho que isso deu uma

segurança muito grande pra que a gente também pudesse esclarecer”, estes transmitem com

mais clareza as informações necessárias aos pais, acolhendo com empatia, esclarecem e

respeitam as decisões e escolhas tanto da família quanto da criança. Por sua vez, à proporção

em que os pais sentem confiança nos professores e encontram na escola uma rede de apoio

para falarem sobre situações difíceis e dolorosas, este circuito de cuidados tende a se

reproduzir no convívio familiar, ou seja, a família também pode aprender como este modelo

de educação, ocupando um lugar de referência para as crianças. Desse modo, quando

professores e pais/os adultos que assumem o papel de cuidadores da criança, cumprem com a

função de proteger, dar segurança e apoio necessários, encontra-se o que Bowlby (1989)

define por base segura. Os resultados apontam que, quando estes adultos cuidadores estão

sensíveis às necessidades das crianças, possibilitam que elas explorem os seus recursos de

enfrentamento para situações-problema, ajudando-as a perceber e a construir a rede de apoio,

como será visto mais detalhadamente no recorte das falas a seguir. Estes resultados

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possibilitam pensar que é possível uma educação sobre a morte quando se tem disponibilidade

para que esse circuito de cuidados aconteça continuamente.

Recursos de enfrentamento

- Acionar recursos internos para lidar com a morte

P4 – a gente percebe que pra nós adultos muitas vezes quando a gente tem que acionar

os recursos interiores, a gente não encontra. Então a gente, quanto criança, eu percebo

que quando a gente tem essas perguntas-chaves, essas intervenções, é fantástico pra

eles verem outras posições que eles podem ocupar e outras ações que eles podem ter.

Então, eu só recorro ao choro porque é um momento que eu...Eu acredito que um

mito. É um mito? É um tabu social, a morte, hoje. As pessoas evitam falar porque

inclusive acham que atrai energias pra que isso aconteça e quando vem essas mortes

escandalizadas da mídia, é, acho que em periferia inclusive é muito banalizado isso

porque a morte é muito próxima né? Acaba de matar um na esquina, eu venho pra

escola eu vejo um cadáver, acabaram de matar meu primo, então esse processo, eu

acho que falta muito pra gente alcançar.

- Exploração dos recursos de enfrentamento: para lidar com a morte

favorecendo o autoconhecimento.

P4 – Entre as atividades, a gente tinha a confecção de cartaz que ficava fixado na sala.

Então, por exemplo, na temática „lidando com a morte‟, eles já acionaram coisas que

eles viram lá no segundo e terceiro módulo. O que que eu posso fazer quando isso

acontecer? Chorar, posso escrever, posso falar com Deus, posso dormir, posso

desenhar, posso respirar. Então, apareceu coisas e mais coisas que assim, eles já

sabem que num determinado momento se isso acontecer, morre alguém amanhã: opa,

eu tive uma memória. Aí como eles vão acionar cada um...

P3 – de ter um leque pra eu poder escolher. E agora?

- Estratégias de enfrentamento: por meio de filmes, ampliação da visão

cultural do ritual de despedida

P4 - Mas, a gente teve como complemento, não foi parte que o Programa trouxe, mas

a gente trabalhou alguns filmes com eles, né? Então: Festa no Céu, Kubo e as cordas

mágicas, que trazem uma outra visão do que é morte e como se faz essas sustentações

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de recursos também nos dá aparato pra ampliar uma discussão como essa e eu acredito

que, nós educadores, não tem como mais passar por outras turmas sem trazer em

algum momento essa conversa, essa temática. A gente trabalhou a questão étnico

racial em indígena na escola, as crianças viram um vídeo, por exemplo, de como os

indígenas tratam, como eles enterram, como eles fazem o ritual. Então, existe uma

ampliação da visão cultural também desse ritual social. E que na nossa sociedade

assim, a gente vai fazendo uns paralelos.

Rede de apoio da criança

- Ajuda para construir a rede de apoio percebida pela criança

P3 – É. E como eu acho que não é uma coisa grosseira, que ele vem, no caminhar, que

com certeza as crianças chegam e contam: olha, aconteceu isso hoje, olha aconteceu

tal coisa e eles foram tendo várias estratégias né? Que tipo de auxílio eu peço, então,

algumas dificuldades que, por exemplo, na história falava: pra quem que você pede

ajuda? Então houve uma criança que falou assim pra mim: eu vou na minha janela e

grito briga, briga, briga! E outro perguntou: e se eu quiser ligar pra polícia, qual é

o número? Então assim, diversas formas, se eu não consigo com meus familiares

próximos, quem?

P3 – Sim, você consegue? Quem consegue? Ah, mas essa hora a professora não

está, quem está? Que adulto você chama? E aí, eles iam acionando e com certeza

falando. E dava muito, é, tinham algumas situações que falavam assim: às vezes os

adultos não querem nos ouvir e como é que você faz pra que eles entendam, que eles

precisam parar, pra te ouvir? E tinha um teatrinho. Então se a pessoa estava fazendo

outra coisa: não quero te ouvir! Daí virava e aí: olha, oi! Eles tentavam depois. Tinha

um aluno meu que falava assim: eu estou falando com você!

P4 – Mas, pra tomar essa atitude tinham algumas reflexões: tem que ser algo que

não me prejudique e que não prejudique alguém.

T – Que a criança não se coloque em risco, não é?

P4 – Isso. A si próprio e ao outro.

P3 – E agora, será que dá? Na hora do jogo, é a melhor hora pra chamar o seu pai?

Deles perceberem, eles tinham que perceber que eles tem uma demanda, mas que as

outras pessoas também tem.

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- Percepção da criança

P3 – Eu tenho alunos que estão em acompanhamento, até em avaliação por causa de

dificuldade de aprendizagem. E aí, ele está em acompanhamento e no dia do passeio

foi o dia que ele tinha a consulta, a terapia. Aí, ela falou que ele entrou na sala e falou

assim: então, você está atrapalhando porque eu não fui ao cemitério com meus

amigos! (risadas) Então, ele não pôde ir porque ele tinha consulta. E sabe que SUS é

muito complicado, né. Remarca, e aí a mãe falou assim: é, foi a primeira coisa que ele

reclamou. E é interessante porque assim, ele tem muita dificuldade de fala e a mãe

falou assim que foi a primeira coisa que ele falou.

- Acolhimento ao aluno enlutado

P3 - E aí, uma vez que, eu estando mais tranquilo, pra aprendizagem é (estalo na

mão) é um passo né? Porque muitas vezes ele paralisa ali. Morreu e aí? Me dói,

não é uma coisa tranquila? Não, nem pra adulto seria, quem dirá pra uma

criança pequena. E de conversar e assim, algumas vezes de trazer: olha, você pode

falar, você pode fazer...tem uma aluna da P1, que todo dia na hora do almoço, a

menina chorando. Um dia eu perguntei pra ela: o que que acontece? Ah, a mãe dela

morreu. Uma vez eu vi, segunda vez, na terceira, um dia a professora não estava, eu

abaixei e falei: amiga, o que que acontece? Não, é que minha mãe morreu e nessa hora

eu lembro. Ah, e ela fazia comidas boas pra você? Fazia. E você gostava? Sim. Mas,

se ela estivesse aqui ela ia gostar de ver você chorando toda vez? Ela falou assim:

come porque do mesmo jeito que minha mãe, né, que eu fazia comida pra você, eu ia

gostar, você não acha que é uma boa ideia? Não é? Porque tinha que ser uma ação e a

gente tinha muito essa ação. Era uma ideia minha, é. Ela parou. Né? Então assim, aí às

vezes ela comentava pra mim e fazia assim (gesto) (risadas). Ah, legal. E aí ela

conseguiu. Não que ela não pudesse, mas assim: precisa sofrer toda vez ou a gente

pode olhar essa mesma ação. Não quer dizer que ela esqueceu da mãe dela, tanto não

esqueci que às vezes eu via ela me olhando assim tipo óh! (gesto).

Destacamos estas falas das participantes P3 no diálogo com seus alunos: “pra

quem que você pede ajuda?; E outro perguntou: e se eu quiser ligar pra polícia, qual

é o número? Então assim, diversas formas, se eu não consigo com meus familiares

próximos, quem?; Sim, você consegue? Quem consegue? Ah, mas essa hora a

professora não está, quem está? Que adulto você chama” que nos mostram que a

rede de apoio da criança se configura a partir da validação da percepção da criança,

como aponta Aberastury (1984), e que o adulto possa ajudá-la nessa identificação de

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onde e com quem pode receber ajuda e compartilhar situações difíceis. P4 aponta a

importância do autocuidado para que a criança não se coloque em risco, nem a si

própria nem ao outro: “Mas, pra tomar essa atitude tinham algumas reflexões: tem

que ser algo que não me prejudique e que não prejudique alguém”.

As falas indicam que ao se ter um adulto sensível às percepções da criança,

este, por meio da empatia, consegue promover o acolhimento à criança enlutada e, no

contexto escolar, o professor atento às expressões do aluno enlutado. Entendemos que

para as professoras participantes, apoiar à criança implica em ajudá-la a perceber com

quem ela pode contar, ou seja, quem são as figuras que representam proteção e

cuidado para elas, validar o que a criança sente, percebe e como expressa seus

sentimentos e cuidar do luto.

Destacamos a fala da P3 para ressaltar a importância do acolhimento ao aluno

enlutado: “E aí, uma vez que, eu estando mais tranquilo, pra aprendizagem é (estalo

na mão) é um passo né? Porque muitas vezes ele paralisa ali. Morreu e aí? Me dói,

não é uma coisa tranquila? Não, nem pra adulto seria, quem dirá pra uma criança

pequena (...)”. Sua fala está de acordo com o que defende Domingos e Maluf (2003)

na área da Psicologia da educação, sobre a importância do afeto na escolarização,

reconhecendo que o luto tem implicações no processo de ensino-aprendizagem.

Assim, constatamos que a educação sobre a morte nas escolas está longe de ser

um assunto fora do universo infantil, pelo contrário, ela se aproxima pelo simples

potencial da criança em querer amar e ser amada, logo, o risco da perda também a

atinge.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo se dispôs a compreender como professores da rede de ensino municipal de

São Paulo percebem a questão da educação sobre a morte, a partir da experiência de levar os

seus alunos a visita guiada ao Cemitério Consolação. Foi possível observar durante o grupo

focal a auto referência das professoras, que resgataram a memória das suas experiências

pessoais de perdas e luto na infância para refletir sobre como aprendem sobre a morte.

Nesta pesquisa, foi adotada a expressão “educação sobre a morte”, ao invés de

“educação para a morte”. Esta é a tradução que se vê mais comumente na literatura levantada

sobre o tema. O termo em inglês se refere a Death Education, porém foi feita esta mudança a

fim de evitar distorções no entendimento de que o estudo faz referência a uma educação que

conduza ao fim, embora o estudo se direcione a refletir sobre a finitude.

Entendeu-se que, ao possibilitar que a criança interna das professoras pudesse ser

lembrada, escutada e acolhida, foi permitido que elas se colocassem no lugar das crianças,

caminhando ao lado dos seus alunos, com empatia, reconhecendo suas dores, seus

sentimentos, seus lutos, empoderando também as suas capacidades para o entendimento,

elaboração e enfrentamento.

Considerando a atitude das professoras em sinalizar as demandas com os alunos e

famílias, relatadas após a gravação da entrevista grupal, apontou-se que seria muito benéfica a

inserção do profissional psicólogo no ambiente escolar. Isto fica claro diante dos pedidos de

ajuda para lidar com as questões emocionais, nas reuniões com os pais, auxílio para

investigação diagnóstica diante das dúvidas quanto a crianças com distúrbios do

desenvolvimento que podem demandar um manejo da educação especial. Nesse sentido,

entende-se nesta pesquisa que a inclusão do psicólogo na educação pode contribuir na função

de suporte à equipe pedagógica, fortalecendo a rede de apoio, como foi levantado de que a

equipe de especialistas do Programa Amigos do Zippy pôde proporcionar segurança aos

professores quando lhes foi assegurado o suporte e oferecido o conhecimento teórico sobre o

tema.

Nos dados aqui apresentados, a participação no Programa Amigos do Zippy e a visita

ao cemitério da Consolação se mostraram como recursos pedagógicos que facilitam a

comunicação e a educação sobre a morte na escola. Destacou-se que, para as participantes, a

saúde emocional é valorizada como parte do processo de aprendizagem da criança.

Para que seja possível uma educação sobre a morte na escola, as participantes apontam

que se faz necessário investir no preparo dos professores e na participação da família, para

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que juntos possam construir recursos de enfrentamento e rede de apoio para as crianças com

foco no tema da morte. Desse modo, educação sobre a morte inclui a capacitação dos

professores, a inclusão da família, como estratégias de enfrentamento do tema em sala de

aula. Sugere a utilização de filmes e vídeos para ampliar suas visões sobre a morte e a rede de

apoio da criança envolve acolher o aluno enlutado, tendo o luto da criança reconhecido.

No decorrer da pesquisa, alguns limites foram encontrados, como, por exemplo, não

ter sido possível acompanhar outras visitas escolares, o que seria rico para ampliar o olhar,

uma vez que o cemitério recebe escolas de diferentes regiões, crianças e jovens de diferentes

faixas etárias e professores com fins didáticos específicos para a realização da visita.

Assim, ressalta-se a importância de que pesquisam sejam realizadas, com maior

diversidade entre os participantes, com professores que lecionam diferentes disciplinas e

níveis de ensino, a fim de compreender mais amplamente as motivações e percepções acerca

da educação sobre a morte, além de outras reflexões que pudessem emergir de diferentes áreas

do saber, como História, Filosofia, Sociologia, Artes, Ciências da Religião, sem dúvida,

ampliaria a visão sobre um tema tão complexo que é a morte.

Considerando que este estudo enfocou o olhar da Psicologia, pelo viés da teoria do

apego, constatou-se que a figura da mãe foi trazida como a figura principal de apego que

exerce significativa influência. As professoras, por assumirem esse papel de cuidadoras,

também se apresentam como importantes figuras de referência para as crianças.

Em suma, esta pesquisa evidenciou que as professoras participantes reconhecem como

sendo importante para o desenvolvimento dos alunos falar abertamente com as crianças sobre

a morte. Ao trazerem suas experiências infantis, mostram-se mais sensibilizadas, no papel de

educadoras, a promover experiências saudáveis com seus alunos, percebendo a educação

sobre a morte como um assunto que já faz parte da rotina escolar, principalmente, em

contextos em que a violência e a vulnerabilidade social os expõe cotidianamente à morte.

A pesquisa evidenciou que numa escola da rede pública municipal, os professores,

muitas vezes, se deparam com um ambiente que lhes oferece poucos recursos, desafiando sua

criatividade para continuar desempenhando seu papel com competência e qualidade. Na sala

de aula onde o grupo focal se reuniu, havia materiais artesanais confeccionados por elas, eram

flores em garrafas de plástico - são contrastes com um ambiente externo ameaçador, sendo a

escola cercada por grades, violência, drogas, criminalidade, que não promove segurança –

realidade esta a que os professores também estão expostos. Logo, pode-se imaginar que este

seja o grande desafio da escola inserida nesse contexto que, inclusive, representa a situação de

muitas escolas do país, num entorno cheio de violência e inseguranças, em que a resiliência

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das professoras faz saltar os olhos de alegria na busca da promoção de saúde emocional dos

seus alunos e de fazer a diferença no cotidiano das crianças, com tanta dedicação, disposição e

entusiasmo.

Longe de esgotar o assunto, retomando a pergunta inicial deste estudo - Cemitério é

lugar de criança? – espera-se que, a partir da inquietação que a pergunta pode suscitar, o

estudo tenha contribuído para a reflexão, abrindo novos questionamentos, tão logo, para novas

atitudes frente a morte.

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ANEXO 1 – CARTA DE AUTORIZAÇÃO

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APÊNDICE A - ROTEIRO DE ENTREVISTA DE GRUPO FOCAL

ENTREVISTA DE GRUPO FOCAL

Visita escolar ao Cemitério da Consolação

- conhecimento a respeito da visita

- motivações a levar seus alunos ao cemitério

- objetivo inicial em relação a visita

Contribuições no aprendizado em sua disciplina

- Experiência vivenciada na visita guiada ao Cemitério Consolação

- Disciplina lecionada.

Educação para a morte

- percepção do assunto morte e luto com seus alunos, a partir da visita

Família

- reação dos pais/responsáveis quanto a visita ao cemitério

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APÊNDICE B - CARTA CONVITE AOS PARTICIPANTES DA PESQUISA

CARTA CONVITE

Você, professor, que tenha tido a experiência de levar os seus alunos a visita escolar no

Cemitério da Consolação, neste ano de 2016, está sendo convidado a participar dessa

pesquisa, no Programa de estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica, do qual faz parte o

Laboratório de Estudos e Intervenções sobre o Luto (LELu), da PUCSP.

Essa pesquisa é sobre a Educação para a Morte no contexto cemiterial envolvendo crianças e

adolescentes.

Procedimento: Será realizada uma entrevista em grupo, com demais professores que

também realizaram a visita, com previsão de 5 a 7 participantes no máximo, por

grupo.

Frequência: será realizado 1 encontro com o grupo, que terá duração de

aproximadamente 1h30 min.

Local: Você irá realizar o encontro em grupo, no meu consultório, localizado na

região Oeste, São Paulo, capital. (próximo ao metrô Sumaré-linha verde do metrô)

ou caso o grupo seja composto por professores da mesma escola, poderá ser

considerado em ser realizado na própria escola, guardadas as condições necessárias.

Horários e datas: serão agendados em horário de conveniência e possibilidade de

todos.

Sou Tatiane Sayuri Maeda, psicóloga (CRP 06/108255) e pós-graduanda em Psicologia

Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Essa pesquisa é para a

minha dissertação de mestrado.

Todos os seus dados serão mantidos em sigilo e esse estudo está embasado nas Diretrizes e

Normas Regulamentadoras de Pesquisa Envolvendo Seres Humanos, de acordo com a

Resolução 510/16 do Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde.

A sua participação auxiliará a produção de conhecimento sobre a educação para a morte.

Lembre-se que você pode desistir de participar da pesquisa em qualquer momento.

Agradecemos desde já

Tatiane Sayuri Maeda e Profa. orientadora Dra. Maria Helena Pereira Franco. Contatos:

[email protected] / Tel.: (11) 96377-1271.

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APÊNDICE C - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM PSICOLOGIA CLÍNICA

NÚCLEO FAMÍLIA E COMUNIDADE

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Você está sendo convidado(a) como voluntário(a) a participar da pesquisa: Educação

para a Morte no contexto cemiterial, que está sendo realizada pela psicóloga mestranda

Tatiane Sayuri Maeda, CRP 06/108255, do Programa de Pós-Graduação em Psicologia

Clínica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. O objetivo da pesquisa é

compreender como os professores de São Paulo percebem a questão da educação para a

morte, a partir da experiência de levar os seus alunos a visita guiada ao Cemitério da

Consolação.

Os procedimentos de coleta de dados serão realizados da seguinte forma: um encontro

no consultório da pesquisadora, onde será feita uma entrevista em grupo, com previsão de 6 a

8 participantes, com duração de aproximadamente uma hora e meia. Sua participação será

absolutamente sigilosa, não constando seu nome ou qualquer outro dado que possa identificá-

lo em publicações que possam resultar deste estudo. Considerando que a pesquisa pode

apresentar um risco mínimo, caso a participação na pesquisa provoque alguma mobilização

emocional que necessite de orientação profissional, você poderá comunicar ao pesquisador

sobre seu desconforto, para que o mesmo possa oferecer suporte psicológico ou encaminhá-lo.

Sua participação não é remunerada, havendo liberdade para recusar, assim como

solicitar a exclusão de seus dados, retirando seu consentimento sem qualquer prejuízo ou

penalização. Após a conclusão da pesquisa, os dados obtidos farão parte da dissertação de

mestrado da pesquisadora e outras publicações científicas e acadêmicas que poderão ser

realizadas.

Agradecemos muito a sua participação, enfatizando que esta contribui para a

construção de conhecimentos na área da saúde e educação para a morte.

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139

Tendo ciência das informações contidas neste Termo de Consentimento, eu

_______________________________________________________________, portador do

RG nº _________________________ aceito participar e autorizo a utilização dos dados

fornecidos por mim nessa pesquisa.

Assinatura: _________________________________ Data:___/____/____.

Telefone: ____________________.