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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Iuri Victor Romero Machado O DIREITO À NÃO AUTO-INCRIMINAÇÃO E SUAS EXTENSÕES CURITIBA 2012

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

Iuri Victor Romero Machado

O DIREITO À NÃO AUTO-INCRIMINAÇÃO E SUAS EXTENSÕES

CURITIBA

2012

O DIREITO À NÃO AUTO-INCRIMINAÇÃO E SUAS EXTENSÕES

CURITIBA

2012

Iuri Victor Romero Machado

O DIREITO À NÃO AUTO-INCRIMINAÇÃO E SUAS EXTENSÕES

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Profº. Daniel Ribeiro Surdi de Avelar

CURITIBA

2012

TERMO DE APROVAÇÃO

Iuri Victor Romero Machado

O DIREITO À NÃO AUTO-INCRIMINAÇÃO E SUAS EXTENSÕES

Este trabalho de conclusão de curso foi julgado e aprovado para a obtenção do titulo de Bacharel no

curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, ________ de ___________________ de 2012.

________________________________________

Bacharel em Direito

Universidade Tuiuti do Paraná

______________________________________

Orientador: Profº. Daniel Ribeiro Surdi de Avelar

_______________________________________

Prof.

________________________________________

Prof.

Dedico este trabalho ao meu pai, que além de

um pai dedicado e companheiro para todos os

momentos, é um verdadeiro exemplo de como

superar as barreiras da vida, pessoa a qual

me espelho em minhas atitudes como

homem. A minha mãe, por todo carinho e

amor que sempre dedicou aos seus filhos. A

minha amada esposa, pelo apoio nas horas

de estudo.

Dedico, também, ao Professor Avelar pela

paciência e dedicação com que ensina a

todos nós.

RESUMO

O presente trabalho mostra as raízes históricas do direito à não auto-incriminação e como o mesmo evoluiu até atingir seus contornos atuais. Mostra como tem sido sua aplicação no que concerne à possibilidade de um acusado (termo aqui utilizado de forma ampla para designar qualquer indiciado, suspeito ou réu) permanecer em silêncio em um interrogatório. Ainda, buscou-se estudar como tem sido a aplicação do princípio no direito comparado, especialmente no tocante as provas que dependam da colaboração do acusado (as provas invasivas). Por fim, mostrou-se como tem sido aplicado o direito de não produzir provas contra si pelos Tribunais Brasileiros, e como tal aplicação tem entendimento isolado no ordenamento internacional. Palavras chaves: Direito à não auto-incriminação, direito ao silêncio, interrogatório, provas invasivas, ordenamento estrangeiro, jurisprudência pátria.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 3

2 ORIGEM DO DIREITO À NÃO AUTO-INCRIMINAÇÃO..........................................4

2.1 O HISTÓRICO DO DIREITO À NÃO AUTO-INCRIMINAÇÃO NA LEGISLAÇÃO

BRASILEIRA..............................................................................................................11

3 O DIREITO AO SILÊNCIO COMO GARANTIA NO INTERROGATÓRIO.............13

3.1 O DIREITO AO SILÊNCIO ANTERIOR AO INTERROGATÓRIO EM

DELEGACIA...............................................................................................................14

3.2 DIREITO AO SILÊNCIO QUANDO DA CONDIÇÃO DE TESTEMUNHA SE

TRANSFORMA EM INDICIADO................................................................................17

3.2.1 O dever de informação qualificada....................................................................18

3.3 DIREITO AO SILÊNCIO NO INTERROGATÓRIO DE IDENTIFICAÇÃO............19

3.4 DIREITO A MENTIRA COMO DECORRÊNCIA DO DIREITO AO SILÊNCIO NO

INTERROGATÓRIO DE MÉRITO..............................................................................23

4 O PRIVILÉGIO CONTRA AUTO-INCRIMINAÇÃO NO DIREITO

COMPARADO............................................................................................................26

4.1 FRANÇA...............................................................................................................28

4.2 ESPANHA............................................................................................................28

4.3 ITÁLIA...................................................................................................................30

4.4 PORTUGAL..........................................................................................................32

4.5 ALEMANHA..........................................................................................................33

4.6 ARGENTINA.........................................................................................................36

4.7 INGLATERRA.......................................................................................................37

4.8 ESTADOS UNIDOS.............................................................................................38

4.9 O TRIBUNAL EUROPEU DE DIREITOS HUMANOS..........................................42

5 A GARANTIA À NÃO AUTO-INCRIMINAÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO.........46

5.1 O DIREITO A NÃO AUTO-INCRIMINAÇÃO NOS TRIBUNAIS

SUPERIORES............................................................................................................49

CONCLUSÃO............................................................................................................53

BIBLIOGRAFIA..........................................................................................................56

3

1 INTRODUÇÃO

O direito à não auto-incriminação foi uma das grandes conquistas do período

Iluminista, pois separou a produção de provas por parte do Estado da, até então,

obrigatória participação do acusado no que viria a ser sua própria condenação.

A compreensão do princípio no ordenamento brasileiro é de importância única

na aplicação direito processual penal. A garantia ao silêncio está expressamente

prevista no art. 5º, LXIII da Constituição Federal, que embora cite apenas o preso,

deve ter sua aplicação estendida a todas as pessoas (presas ou não),

principalmente, por conta do art. 8.2, g da Convenção Americana sobre Direitos

Humanos.

Ainda, o Código de Processo Penal, moldado sobre uma estrutura inquisitiva,

foi recentemente alterado (2003) para amoldar-se à garantia constitucional. Desta

forma, o art. 186 e seu parágrafo único passaram a resguardar o direito ao silêncio,

sem que haja qualquer prejuízo ao interrogado quanto ao seu exercício.

O princípio significa que ninguém deve ser obrigado a declarar contra si

próprio, todo acusado tem direito de permanecer silente e, não ser prejudicado por

exercer tal direito. Qualquer ato que force um acusado a declarar contra si é nulo,

como afirma Pacelli de Oliveira:

(...) instituído como direito, impõe ao Estado o dever de respeitar a opção pelo seu exercício, o que impedirá a adoção de quaisquer ações tendentes à extração forçada- extorsão- da confissão, com o que se poderá bem e melhor tutelar a integridade física e psíquica do acusado, o seu direito à personalidade e à dignidade humana. De fato, em um Estado de Direito devem ser absolutamente banidas quaisquer intervenções que possam afetar a capacidade de autodeterminação da pessoa. (2009, p. 188).

4

Rodriguez afirma que o fundamento do direito à não auto-incriminação se

encontra num triplo axiológico, composto pelo respeito à liberdade, dignidade e

integridade da pessoa. (2002, p. 203).

De total pertinência no estudo do tema saber desde que momento a

garantia se aplica e em quais situações, quais são suas raízes históricas,

descobrindo o porquê de seu surgimento.

Ainda, quando se aborda o tema, até mesmo por conta da pouca definição

da lei, não se sabe, perfeitamente, quais são suas extensões. Teria uma pessoa o

direito de mentir, de se auto-acusar falsamente? O direito ao silêncio deve existir

apenas no interrogatório formal ou mesmo antes, quando de uma abordagem policial

rotineira? O direito ao silêncio permite ao acusado apresentar falsa identidade

quando de sua prisão no intuito ocultar dados?

Além disso, a doutrina brasileira afirma que decorre do direito à não auto-

incriminação, a possibilidade do acusado se recusar a produzir ou participar de

qualquer meio de prova que possa incriminá-lo, e nossos Tribunais são praticamente

unânimes quanto a tal recusa. Todavia, um breve estudo do direito comparado,

especialmente de suas leis e julgados, bem como do Tribunal Europeu de Direitos

Humanos demonstra que o princípio tem uma aplicação muito diferente da que se

divulga em nosso país.

O presente trabalho analisa algumas hipóteses do princípio, e como tem

sido sua aplicação prática no ordenamento nacional e internacional.

2 A ORIGEM DO DIREITO À NÃO AUTO-INCRIMINAÇÃO

5

A origem do instituto, como sua própria conceituação, é muito discutida

doutrinariamente. Neste sentido, afirma Trois Neto: “Os autores não são concordes

na determinação da origem do direito à não auto-incriminação, e nem há facilidade

de identificar sua razão de existência- e sobrevivência- ao longo da história.” (2011,

p. 82).

No mesmo sentido, Helmholz afirma que “das muitas das controvérsias que

cercam o privilégio, o ponto inicial tem sido sua história.”1 (1997, p. 5).

Na visão de Couceiro, citado por Albuquerque sua origem remonta ao direito

hebreu, pois um acusado não poderia ser forçado a acusar a sim mesmo, pois tal ato

poderia levá-lo, em certas ocasiões, a própria morte, o que infringiria a vontade

divina, na medida em que a vida humana pertencia à deus (2008, p. 15). Também

baseado na lição de Couceira, Trois Neto afirma:

Defende-se que um antecedente remoto do direito à não se autoincriminar era conhecido no direito hebraico já por volta do século III a.C, fundado na regra talmúdica de que a ninguém é dado tirar a própria vida, entendia-se que o acusado não podia ser levado a depor contra si mesmo, pois sua confissão em relação a um crime punível com a sanção capital permitiria uma forma indireta de suicídio. Não havia distinção entre autoincriminação voluntária ou induzida; a lei proibia a qualquer pessoa confessar ou testemunhar contra si própria.(2011, p. 82).

É importante anotar que a doutrina de Couceiro se baseou na obra de

Leonard Levy (Origins of the Fifth Amendment- The right against self incrimination),

todavia, tal obra não tem aceitação unânime no país de origem de Levy. Com efeito,

afirma Helmolz:

Origins of the Fifth Amendment de Leonard Levy, muito embora largamente tratado como um relato definitivo, não encontrou, de fato, o ponto central. O trabalho de Levy, com freqüência, aborda o contexto legal e se concentra demais, exclusivamente, nos famosos ‘julgamentos espetáculos’. A consequência é que ele não faz completa justiça à complexidade do desenvolvimento atual do privilégio. Um produto da era do McCarthismo nos Estados Unidos, o trabalho de Levy produziu um forte argumento para o vigor do privilégio como uma liberdade civil básica. Todavia, esta

1 Tradução livre.

6

abordagem não se faz, necessariamente, a mais precisa da história. Hoje, algo a mais é necessário. (1997, p.5).

2

No direito romano, o direito ao silêncio era inexistente, sendo que no período

clássico de Roma, o silêncio do acusado tinha como conseqüência a confissão.

Quando o Processo Penal Canônico adotou o sistema inquisitivo, em 1215,

através do IV Concílio de Latrão, surgiu uma era de violência institucionalizada. É o

que se depreende da doutrina de Trois Neto:

Contudo, em 1215, no IV Concílio de Latrão, com a introdução do jusjurandum de veritate dicenda (juramento inquisitivo), pelo qual o acusado estava obrigado a dizer a verdade, a Igreja modifica o entendimento de que a confissão só poderia ser voluntária. Em 1252, Inocêncio IV autoriza o emprego de torturas para a obtenção da confissão e do arrependimento do acusado em casos de heresia cátara. Argumentou o Papa que, se a violência contra os réus era comumente aplicada no direito comum em relação a ladrões assassinos, seria injustificável conceder tratamento privilegiado aos hereges, que não passariam de “ladrões e assassinos de alma” (2011, p.83).

Com efeito, assim que o sistema inquisitivo atingiu seu ápice, com a lógica da

presunção de culpa, o ser humano deixou de ter direitos e passou a ser um objeto,

de onde deveria ser extraída a verdade. De acordo com Zanoide de Moraes “a

confissão tornava o acusado o maior colaborador em sua condenação, o que, na

visão dos inquisidores, legitimava a decisão e os meios com os quais ela se

chegou”.(2010, p. 55).

Em tal período, surgiu o Directorium Inquisitorum, escrito por Nicolau

Eymerich, um manual que detalhava como “extrair a verdade” dos interrogados.

Zanoide de Moraes cita passagem desta obra, na qual se demonstra um dos ardis

para se extrair a “verdade”:

Nessa passagem pela relação direta entre inquisidor e inquirido, depreende-se a postura preconceituosa e antiética daquele, in verbis; “23. ‘Os dez truques do inquisidor para neutralizar os truques dos hereges’.(...)4. O herege- ou réu- não quer confessar. O inquisidor sabe que os depoimentos das testemunhas não são suficientes como provas, mas não faltam indícios

2 Tradução livre.

7

de que é culpado. Neste caso, o inquisidor deporá contra ele. O acusado nega? O inquisidor apanhará o seu dossiê, começará a folhá-lo atentamente, dizendo, depois: ‘Claro que estás mentindo, eu é que tenho razão! E então? Dize a verdade sobre teu problema’ (o truque consiste em fazê-lo ouvir o que o dossiê realmente o incrimina e que ele aparece como uma pessoa verdadeiramente culpada de heresia). Ou, então, o inquisidor espantado, dirá: ‘Como podes negar: ainda não está bastante claro?’ E começará a ler o papel, mudando o que achar melhor. Depois dirá: ‘Eu é quem dizia a verdade! Confessa logo, porque como estás vendo, sei de tudo!’. Porém, o inquisidor, ao proceder assim, deve tomar cuidado para não se deter muito nos detalhes, para que o herege não perceba que o inquisidor, na verdade, ignora os fatos! (2010, p. 56).

Denota-se que nessa época, não existia qualquer direito ao silêncio, a

confissão era a rainha das provas. O acusado era um mero objeto de onde deveria

ser extraída toda verdade. Ainda, segundo Albuquerque, as práticas inquisitoriais e

autoritárias aumentaram e se tornaram mais violentas, principalmente em

decorrência da falta de recursos, alimentos e guerras.(2008, p. 17).

A tortura era método aplicado, comumente, pelo inquisidor. De acordo com

Zanoide de Moraes, quando o número de provas não atingisse o que a lei entendia

como suficiente para condenação, o acusado era encaminhado à tortura para que

confessasse, a tortura era apenas a forma de se legitimar uma certeza prévia. (2010,

p. 65).

A situação começou a mudar em meados do século XVI, principalmente em

decorrência do Iluminismo. Cypriano Machado afirma: “Mas, buscando identificar na

história a origem de tal princípio, verifica-se que foi no período Iluminista que ganhou

força e se mostrou como uma garantia relativa do acusado no interrogatório.” (2007,

p. 2).

Rodriguez afirma que foi a partir da Revolução Francesa e a, posterior,

Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que se encontra o antecedente

moderno do direito à não auto-incriminação.(2002, p. 183).

8

Na obra de Beccaria se encontra crítica aos interrogatórios feitos sob

juramento (numa clara desaprovação aos procedimentos religiosos), muito embora

não fosse o autor favorável ao direito ao silêncio com relação a todos os crimes:

Observemos, finalmente, que aquele que se obstina a não responder ao interrogatório a que é submetido merece sofrer uma pena que deve ser fixada pelas leis. É mister que essa pena seja muito pesada; porque o silêncio de um criminoso, perante o juiz que o interroga, é para a sociedade um escândalo e a justiça uma ofensa que cumpre prevenir tanto quanto possível. (...) Outra contradição entre as leis e os sentimentos naturais é exigir de um acusado o juramento de dizer a verdade, quando ele tem o maior interesse em calá-la. Como se o homem pudesse jurar de boa-fé que vai contribuir para a sua própria destruição! Como se, o mais das vezes, a voz do interesse não abafasse no coração humano a religião! (2011, p. 44/45).

Com efeito, no período Iluminista se constataram diversas críticas doutrinárias

quanto às práticas que levavam os acusados à se auto-acusarem. Como exemplo,

Albuquerque cita a obra de Thomas Hobbes, Do cidadão, publicado pela primeira

vez em 1642: “Em apenas um parágrafo, o pensador britânico desenvolveu o

princípio, então representado pela fórmula nemo tenetur se ipsum acusare ou nemo

proedere seipsum” (2008, p. 27).

No mesmo sentido, Trois Neto aponta obras de alguns pensadores:

As críticas de Hobbes, no De Cive (1642), de Voltaire, no Traite sur la tolérance (1762), de Beccaria, em seu Dei delitti e delle pene (1764) e de Pietro Verri, no Osservazioni sulla tortura (1770), influenciaram o direito continental, porém não na época em que tais obras foram publicadas.(2011, p.84).

Helmolz afirma que a máxima latina nemo tenetur se tornara constante dos

manuais de processo penal do período, pouco antes ao período Iluminista:

Um princípio canônico estabelecido assegurava que “ninguém é forçado a ser uma testemunha contra si mesmo, porque ninguém é obrigado a revelar sua própria desonra”. Era normalmente expressado pela máxima latina Nemo tenetur detegere turpitudinem suam. (...) O princípio fora endossado pela maioria dos comentadores medievais, e era repetido praticamente em todos os manuais de procedimentos criminais europeus dos séculos dezesseis- e dezessete. (1997, p. 26).

3

3 Tradução livre.

9

O referido autor explica que, dentre os motivos que levaram a recusa de

responder às perguntas auto-incriminatórias, três se destacaram na Inglaterra: o

primeiro o rompimento com a Igreja católica (e criação da Igreja Anglicana); o

segundo, o fim do interrogatório preliminar que determinava a fama publica (uma

espécie de repercussão popular); e, o mais importante, a permissão em alguns

julgamentos, da representação do acusado por um advogado. Afirma o autor:

A terceira razão foi a presença dos advogados. Como nas cortes do direito consuetudinário, os tribunais eclesiásticos medievais negavam aos réus criminais o direito de serem representados por um advogado na maioria das circunstâncias. Advogados profissionais, chamados procuradores ou fiscais, na verdade representavam a maioria das partes nos litígios civis. Mas não nos procedimentos inquisitoriais. De acordo com uma clássica lei canônica, a presença de um fiscal interferiria com a legitimidade dos sistemas de lidar com as ofensas contra as leis da igreja, e esta era a regra posta em prática no espírito das corte inglesas. A utilidade dos advogados era reconhecida no direito consuetudinário, mas era sentido que eles trariam mais prejuízos que ganhos nos casos criminais. Não havia advogado de defesa (...) Era numa minoria dos casos que sua presença ocorria. Mas também não era algo raro. (1997, p.43).

4

Pacelli de Oliveira é breve e conclusivo no sentido de que o princípio se

fortaleceu na medida em que se fazia necessário acabar com os abusos cometidos

no regime absolutista:

Na perspectiva de sua origem, pode-se concluir que o nascimento do nemo tenetur se detegere está ligado à necessidade de superação das mais variadas formas de absolutismo, estatal ou eclesiástico, que ao longo da história submeteram o homem ao exercício do poder. Seja como instrumento de manipulação religiosa, como ocorreu entre católicos e não-católicos no início da Renascença na velha Inglaterra ou em França, seja como instrumento de imposição de determinada ordem nos sistemas processuais inquisitoriais, a exigência do compromisso de revelação da verdade sempre esteve a serviço de certos poderes públicos, em face dos quais o indivíduo jamais recebia o tratamento de sujeito de direito. (2009, p. 184).

Albuquerque cita, também, o importante avanço das ciências como uma

importante fonte para reação ao Estado Absolutista:

4 Tradução livre.

10

Como sói acontecer em momentos que precedem às grandes mudanças, a situação tornou-se insustentável e, no final do século XVI, os tribunais franceses, com o início do processo de laicização do Direito, acolhendo pareceres de juntas médicas que contestaram vários casos de supostas intervenções demoníacas. Com o estímulo proporcionado pelo avanço, a repugnância sentida em face das práticas autoritárias e cruéis inflamou os ânimos dos pensadores. Os alicerces ideológicos sobre os quais se ergueram os estados modernos eram então questionados pelos filósofos humanistas e a inquisição viu desmoronar sobre si as ruínas do absolutismo. (2008, p. 22/23).

Antes mesmo da independência e da promulgação da Constituição dos

Estados Unidos, o princípio havia sido reconhecido em duas Constituições estaduais

(a da Virgínia e da Pensilvânia, as quais foram importantes fontes para quinta

emenda constitucional), tendo a Constituição da Pensilvânia, expressamente,

garantido o direito do acusado ser representado por um advogado (o que

efetivamente possibilitou de forma ampla o princípio). Neste sentido, Moglen afirma:

Neste contexto nós devemos ler a seção 8 da Declaração de Direitos da Virgínia, na qual George Manson providenciou um modelo para expressões constitucionais, dos direitos num julgamento, adotado com poucas alterações em todas as cartas de direitos estatais dos anos 1770 e 1780. (...) A Declaração de Virgínia foi aprovada em 12 de junho de 1776, e foi publicada nos jornais da Filadélfia antes mesmo do Congresso Continental ter votado pela independência no começo de julho. Ela viajou com os representantes estaduais ao resto dos estados e passou a ser um modelo para as Constituições por toda costa atlântica. Ao final de setembro, a convenção da Pensilvânia destacara o prefácio da Declaração de Direitos, esta publicada no final de agosto e estritamente modelada na de Manson. Seção 9 repetiu a seção 8 de Manson, mas com uma crítica adicional: “que em todas as acusações por ofensas criminais, um homem tinha o direito de ser ouvido por si próprio e por um advogado.” (1997, p. 134).

5

Conclui, o referido autor, que a constitucionalização do privilégio contra auto-

incriminação, pelo Congresso Americano, foi parte de um longo trabalho doutrinário

para que o princípio se tornasse uma lei fundamental (1997, p. 138) e,

principalmente, do trabalho dos advogados que procuravam excluir dos julgamentos

os depoimentos incriminatórios de seus clientes; chegando Moglen a afirmar que

5 Tradução livre.

11

“Advogados, não Constituições, estavam refazendo os procedimentos criminais”

(1997, p. 144).

Já Rodriguez afirma que foi precisamente no direito anglo-saxão, que este

direito foi inicialmente desenvolvido até assumir os contornos que apresenta

atualmente, sendo o modelo para as Constituições e legislações de diversos países.

(2002, p. 211).

2.1 O HISTÓRICO DO DIREITO À NÃO AUTO-INCRIMINAÇÃO NA LEGISLAÇÃO

BRASILEIRA

O Brasil não reconheceu o direito ao silêncio como uma garantia expressa até

a promulgação da Constituição Federal de 1988. Entretanto, tal direito já era

aplicado de uma forma mitigada desde o século XIX. Segundo Trois Neto, o Código

de Processo Criminal de Primeira Instância, de 1832, cuidou do interrogatório como

meio de defesa, não sendo o acusado obrigado a responder sobre juramento nem

mesmo a responder a determinadas perguntas.(2011, p. 95). Já na República, foi

editado o Decreto 848; este não reconheceu de forma direta a garantia, todavia

limitou as perguntas a serem realizadas no interrogatório, bem como assegurou ao

interrogado o direito de responder com um mero “sim ou não”.

Com a Constituição de 1891, cada Estado passou a ser competente para

legislar sobre matéria processual, tendo alguns positivado qual a consequência que

poderia ser extraída do silêncio do acusado. Conforme Trois Neto, “os Códigos do

Distrito Federal, do Rio Grande do Sul e do Paraná prescreveram que tal atitude

poderia ser interpretada em desfavor do acusado.” (2011, p. 95).

12

Em 1941, sob o Estado Novo, ocorreu a uniformização legislativa através do

Decreto-lei n. 3.689/41, o “atual” Código de Processo Penal. Moldado sob uma

cultura fascista, ele previu o direito ao silêncio, possibilitando, todavia, que o juiz

interpretasse o silêncio em desfavor do réu. Neste sentido, seu artigo 186 dispunha:

“antes de iniciar o interrogatório, o juiz observará ao réu que, embora não esteja

obrigado a responder às perguntas que lhe forem formuladas, o seu silêncio poderá

ser interpretado em prejuízo da própria defesa.”

Ainda, o Código em vigor colocou o interrogatório como meio de prova,

possibilitando inclusive a condução “sob vara” do acusado, conforme disposição do

art. 260: “se o acusado não atender à intimação para o interrogatório, o

reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado, a

autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença.”

Com o fim do regime militar, foi promulgada a Constituição de 1988, a qual

em seu art. 5º, inciso LXIII positivou que: “o preso será informado de seus direitos,

entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da

família e de advogado”.

Albuquerque tece considerações sobre a mesma, e sua reação em face dos

abusos cometidos no regime militar:

Tal como no século das luzes, a reação foi intensa e a Constituição da

República, promulgada em 1988, introduziu um rol de direitos e garantias

fundamentais jamais visto no ordenamento pátrio, por meio de enunciados

categóricos, sendo certo que a grande maioria deles se pretendia absoluto.

Tal tendência que pode ser criticada do ponto de vista da técnica legislativa,

considerando a dinamicidade da sociedade contemporânea, na medida em

que “qualquer mudança, por mínima que seja, exige uma emenda

constitucional, algo bastante trabalhoso”, é perfeitamente explicada por

Francisco Carlos Teixeira Silva que, em feliz síntese, destaca que “o caráter

enciclopédico da Constituição derivava do medo do retorno ao arbítrio,

13

ainda muito recente na memória nacional” (apud Castro, 2005, p. 564).

(2008, p. 32).

Cunha Delpizzo faz importante anotação, ao abordar os tratados

internacionais, destacando que:

No Direito Brasileiro, a observância da garantia do nemo tenetur se detegere, de acordo com a majoritária doutrina, tem hierarquia constitucional, pois embora não prevista expressamente em nossa Constituição Federal, foi estabelecida no art. 14, n.3, alínea g, do Pacto Internacional dobre Direitos Civis e Políticos, adotado pelo ONU em 1966, que expressamente dispõe que toda pessoa acusada de um crime tem o direito de “não ser obrigada a depor contra si mesma nem a confessar-se culpada”, e também no art. 8º, parágrafo 2º, alínea g, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, de 1969, que estabeleceu o direito do acusado não ser obrigado a depor contra si mesmo, nem a declarar-se culpado, tratados internacionais que foram ratificados pelo Brasil através dos Decretos n. 592 e 678, respectivamente, ambos em 1992. (2010, p. 27).

Em que pese a Constituição garantir o direito ao silêncio, bem como

compromisso brasileiro com os pactos internacionais assinados, somente com a

superveniência da Lei nº 10.792/03, o interrogatório teve sua redação alterada,

passando a constar que: “o silêncio, que não importará em confissão, não poderá

ser interpretado em prejuízo da defesa.”. Redação que, efetivamente, garantiu a

vertente mais importante do princípio: a impossibilidade de qualquer prejuízo quando

do uso do silêncio.

3 O DIREITO AO SILÊNCIO COMO GARANTIA NO INTERROGATÓRIO

Optou-se neste trabalho por tratar do princípio e sua incidência no

interrogatório, seja o formal ou informal, de forma isolada pois, conforme exposto

adiante os outros meios de prova que dependem da colaboração do acusado tem

14

entendimento divergente na doutrina e aplicações e contornos diferentes no direito

comparado. Neste sentido, Albuquerque afirma:

O interrogatório é ocasião em que a garantia de não auto-incriminação manifesta-se em sua plenitude. Na hipótese da omissão em participação em outros atos processuais, a situação pode apresentar contornos diversos. (2008, p. 54).

Ao abordar o tema do interrogatório, encontramos no autor citado:

É, sem laivo de dúvida, no interrogatório que a garantia de não se auto-incriminar revela-se necessária e cientificamente justificada, seja por razões históricas, já que renasceu da resposta iluminista às atrocidades implementadas especificamente nesse ato processual, seja por questões inerentes à própria natureza do homem, que sempre encontra dificuldades em espontaneamente assumir seus desacertos e aquiescer com as consequências que deles advêm, justificando a necessidade de um instrumento que, por isso, preserve sua integridade mental, seja finalmente, por motivos tipicamente processuais, já que a prerrogativa de silenciar sob interrogatório, como veremos, acaba por conferir efetividade ao princípio da ampla defesa. (...) Por certo, quando alguém se vê sob a séria acusação de ter praticado um ilícito penal, é imperioso que se lhe permita participar da formação do convencimento do julgador, pois a nosso sentir, é isso que evidenciará sua condição de sujeito processual e legitimará eventual condenação num contexto democrático. Para tanto, nosso sistema processual desconhece oportunidade melhor do que o interrogatório, único momento em que o acusado dirige-se diretamente à autoridade para dar-lhes sua versão dos fatos.(2008, p. 69).

3.1 O DIREITO AO SILÊNCIO ANTERIOR AO INTERROGATÓRIO EM DELEGACIA

Em que pese a leitura do art. 5º, LXIII se referir somente ao preso; o direito ao

silêncio deve ser garantido seja no interrogatório judicial, policial, ou, mesmo, numa

mera oitiva informal de um futuro acusado.

É muito comum nossos órgãos policiais efetuarem abordagens e prisões sem

qualquer alerta quanto à possibilidade dos suspeitos permanecerem calados; muito

ao contrário, as autoridades policiais efetivamente interrogam os suspeitos logo na

abordagem. Posteriormente, os policiais são ouvidos, primeiramente na condição de

15

condutores e, depois na condição de testemunhas de acusação, sendo utilizado tudo

que extraíram dos suspeitos/ acusados.

Todavia, tal prática é ilegal por ofensa ao princípio debatido. Fere, ainda, um

dos precedentes mais conhecidos mundialmente, o aviso de Miranda. Mendes

ensina quanto ao direito ao silêncio que: “hão de se aplicar desde quando o inquirido

está em custódia ou de alguma outra forma se encontre significativamente privado

de sua liberdade de ação” (2010, p. 782).

Lopes Jr. afirma que o direito ao silêncio abrange as pessoas presas ou em

liberdade e, que a não informação desse direito acarreta em nulidade:

“o direito de silêncio está expressamente previsto no art. 5º, LXIII, da CB (o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado...). Parece-nos inequívoco que o direito ao silêncio se aplica tanto ao sujeito passivo preso como também ao que está em liberdade. Contribui para isso o art. 8.2, g, da CADH, onde se lê que toda pessoa (logo, presa ou em liberdade) tem o direito de não ser obrigada a depor contra si mesma nem a declarar-se culpada. (...) O direito a calar também estipula um novo dever para a autoridade policial ou judicial que realiza o interrogatório: o de advertir o sujeito passivo de que não está obrigado a responder as perguntas que lhe forem feitas. Se calar constitui um direito do imputado e ele tem de ser informado do alcance de suas garantias, passa a existir o correspondente dever do órgão estatal a que assim o informe, sob pena de nulidade do ato por violação de uma garantia constitucional. (2010, p. 629).

A posição é, também, explicada na lição de Dias Neto:

O risco a ser evitado é que a polícia interessada na eficiência da investigação, utilize-se indevidamente do seu poder discricionário, prolongando-se mais do que o necessário na esfera das ‘indagações preliminares’ para evitar o momento da instrução. Maiores esclarecimentos são necessários para evitar que as ‘indagações informativas’ se constituam instrumento de manobra para privar o acusado de seus direitos. À vista disso, sustenta Rogall, para que a instrução do direito ao silêncio possa cumprir com os seus objetivos é necessário que esta ocorra o quanto antes.(1997, p. 192).

Slaibi Filho não diverge e afirma no mesmo sentido que, antes do

interrogatório policial ou judicial, a autoridade processante tem o dever de advertir o

interrogado sobre seu direito de permanecer em silêncio, não somente no ato

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previsto em lei, mas na oitiva formal ou informal, do acusado, mesmo que fora da

relação processual. (1989, p. 304).

Tanto o Supremo Tribunal Federal, quanto o Superior Tribunal de Justiça, já

tiveram a oportunidade de apreciar a matéria, sendo que ambos garantiram o direito

ao silêncio, com a necessária obrigação policial de informar o acusado sobre sua

prerrogativa no momento da abordagem (não no momento “oportuno”). O Ministro

Sepúlveda pertence lavrou a seguinte ementa no HC 78.708:

Informação do direito ao silêncio (Const., art. 5º, LXIII): relevância, momento de exigibilidade, conseqüências da omissão: elisão, no caso, pelo comportamento processual do acusado. I. O direito à informação da faculdade de manter-se silente ganhou dignidade constitucional, porque instrumento insubstituível da eficácia real da vetusta garantia contra à auto- incriminação que a persistência planetária dos abusos policiais não deixa perder atualidade. II. Em princípio, ao invés de constituir desprezível irregularidade, a omissão do dever de informação ao preso dos seus direitos, no momento adequado, gera efetivamente a nulidade e impõe a desconsideração de todas as informações incriminatórias dele anteriormente obtidas, assim como das provas delas derivadas. III. Mas, em matéria de direito ao silêncio e à informação oportuna dele, a apuração do gravame há de fazer-se a partir do comportamento do réu e da orientação de sua defesa no processo: o direito à informação oportuna da faculdade de permanecer calado visa a assegurar ao acusado a livre opção entre o silêncio - que faz recair sobre a acusação todo o ônus da prova do crime e de sua responsabilidade - e a intervenção ativa, quando oferece versão dos fatos e se propõe a prová-la: a opção pela intervenção ativa implica abdicação do direito a manter-se calado e das conseqüências da falta de informação oportuna a respeito. (HC 78708, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, julgado em 09/03/1999, DJ 16-04-1999 PP-00008 EMENT VOL-01946-05 PP-00874 RTJ VOL-00168-03 PP-00977)

Analisando esta decisão proferida, Mendes esclarece, em sua obra, que:

Como se pode depreender da decisão em apreço, o direito à informação oportuna da faculdade de permanecer em silêncio tem por escopo assegurar ao acusado a escolha entre permanecer em silêncio e a intervenção ativa.(...) Não há dúvida, porém, de que a falta de advertência quanto ao direito ao silêncio, como já acentuou o Supremo Tribunal, torna ilícita “prova que, contra si mesmo, forneça o indiciado ou acusado no interrogatório formal e, com mais razão, em ‘conversa informal’ gravada, clandestinamente ou não” (2010, p. 785).

Já no Superior Tribunal de Justiça, o Ministro Paulo Galloti, lavrou a seguinte

ementa no HC 22.371:

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Habeas corpus. Pedido não examinado pelo tribunal de origem. Writ não conhecido. Prova ilícita. Confissão informal. Ordem concedida de ofício para desentranhar dos autos os depoimentos considerados imprestáveis. Constituição federal . Art. 5º , incisos LVI e LXIII . 1 - Torna-se inviável o conhecimento de habeas corpus, se o pedido não foi enfrentado pelo Tribunal de origem.2 - A eventual confissão extrajudicial obtida por meio de depoimento informal, sem a observância do disposto no inciso LXIII , do artigo 5º , da Constituição Federal , constitui prova obtida por meio ilícito, cuja produção é inadmissível nos termos do inciso LVI, do mencionado preceito . 3 - Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício. (HC 22371/RJ, Rel. Ministro PAULO GALLOTTI, SEXTA TURMA, julgado em 22/10/2002, DJ 31/03/2003, p. 275)

3.2 DIREITO AO SILÊNCIO QUANDO DA CONDIÇÃO DE TESTEMUNHA SE

TRANSFORMA EM INDICIADO

Choukr critica o hábito, corriqueiro, dos órgãos policiais primeiro ouviram o

suspeito na condição de testemunha, conseqüentemente, com a obrigação de dizer

a verdade para depois serem ouvidos como indiciados:

No entanto, no inquérito policial (assim como em outras formas de investigação) há um aspecto que diz respeito à possibilidade de alguém vir a ser ouvido como testemunha inicialmente- e, portanto, com a obrigação de dizer a verdade ou, mais ainda, não poder calar-se- para, em seguida, ser “indiciado”, com óbvios prejuízos ao exercício do direito apontado. (2006, p. 100).

Lopes Jr., também, critica o método policial que impossibilita o interrogado de

saber em que qualidade está sendo ouvido:

É censurável a práxis policial de tomar declarações sem informar se a pessoa que as presta o faz como informante/ testemunha ou como suspeito, subtraindo-lhe ainda o direito de silêncio e demais garantias do sujeito passivo. É patente a violação do contraditório e da ampla-defesa nesses casos. (2010, p. 625).

O Supremo Tribunal Federal já enfrentou a questão similar e garantiu o direito

do acusado. O caso foi analisado no HC 106.876, tendo como relator o Ministro

Gilmar Mendes:

Habeas Corpus. 2. Falso testemunho (CPM, art. 346). 3. Negativa em responder às perguntas formuladas. Paciente que, embora rotulado de testemunha, em verdade encontrava-se na condição de investigado. 4.

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Direito constitucional ao silêncio. Atipicidade da conduta. 5. Ordem concedida para trancar a ação penal ante patente falta de justa causa para prosseguimento. (HC 106876, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 14/06/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-125 DIVULG 30-06-2011 PUBLIC 01-07-2011 RB v. 23, n. 574, 2011, p. 46-50)

3.2.1 O dever de informação qualificada

Interessante e de toda pertinência com o presente tópico, é o caso analisado

por Claus Roxin, sobre o dever de informação qualificada, o qual ocorre quando uma

pessoa é ouvida inicialmente como testemunha e, posteriormente, como interrogado.

Veja-se o resumo do caso:

Sobre a decisão, um breve resumo e, após, alguns comentários. Trata-se de decisão na qual C, T e Sch foram condenados por tentativa de roubo qualificado. Sch foi também condenado por lesões corporais graves. Ocorre que, a despeito de haver fortes e graves suspeitas da participação de C no acontecimento criminoso, este foi ouvido pela polícia primeiramente apenas na qualidade de testemunha, e não de indiciado. Somente em um segundo momento C foi ouvido como indiciado, qualidade que lhe confere uma série de direitos, especialmente o de permanecer em silêncio, mas não foi cumprido o dever adicional exigido pela jurisprudência e doutrina alemãs de informar ao sujeito, nessas situações, que o primeiro depoimento era impassível de ser valorado (dever de informação qualificada). Está fora de discussão que aquele primeiro depoimento não pode ser valorado, diante da alteração na qualidade de sujeito processual de C: de testemunha a indiciado. Afinal, tanto lá como cá, não é permitido ser testemunha e indiciado no mesmo procedimento investigativo. No segundo depoimento, como já foi dito, não foi cumprido o dever de informação qualificada. Esse dever adicional se justifica pelo fato de que o indiciado pode, no segundo interrogatório, ainda crer erroneamente estar vinculado ao primeiro interrogatório, que já não pode mais ser valorado. Aqui está o coração do problema: diante dessa nova violação, é o segundo depoimento de C válido? Ou essa violação do dever adicional é menos grave do que a não informação do direito de permanecer em silêncio? (2010, p. 45).

O autor alemão afirma que “é indiscutível que o direito ao silêncio não é

garantido em toda sua extensão quando o indiciado avalia de forma equivocada as

conseqüências jurídicas de seu silêncio (...)”. (2010, p. 48).

Ainda, em crítica ao Tribunal alemão, que optou por aplicar o princípio da

proporcionalidade, na solução do caso, afirma o autor:

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Se o referido “interesse no esclarecimento dos fatos” sempre se sobrepuser à garantia da ausência de obrigação de se auto-incriminar, então a omissão do dever de informação nunca conduzirá a uma proibição de valorar a prova. Tampouco se pode dizer que nos delitos graves o interesse no esclarecimento dos fatos se sobrepõe ao dever de informação sobre o direito ao silêncio e sobre as conseqüências desse silêncio. Isso porque o § 136 StPO não contém qualquer limitação ou gradação de acordo com a gravidade do delito sub judice. (2010, p. 49).

3.3 DIREITO AO SILÊNCIO NO INTERROGATÓRIO DE IDENTIFICAÇÃO

De acordo com a redação do artigo 187 do Código de Processo Penal, o

interrogatório se divide em duas partes, sendo a primeira sobre a qualificação do

interrogado e a segunda sobre os fatos que lhe são imputados.

Ainda, o artigo 186 do referido Código tem redação clara: “Depois de

devidamente qualificado ... o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o

interrogatório, do seu direito de permanecer calado ...”.

Em que pese a letra da lei, a doutrina diverge sobre o interrogado ter ou não o

direito a mentir ou mesmo silenciar quanto à sua qualificação.

Couceiro, citado por Albuquerque, nega a possibilidade de o interrogado

mentir sobre sua qualificação:

O direito ao silêncio só abrange o verdadeiro interrogatório, como exercício de autodefesa, ou seja, o denominado ‘interrogatório de mérito’. Incide, apenas, sobre as declarações relacionadas ao fato delituoso, e não sobre aquelas pertinentes aos antecedentes ou à identidade da pessoa que está sendo ouvida. Afinal, se o direito ao silêncio está relacionado ao direito de defesa, e se o agente só se defende de fatos, é evidente que não poderia abranger as declarações referentes à vida pregressa e identificação (apud Albuquerque, 2008, p. 86).

O autor conclui que “o fornecimento de dados não tem o condão de agredir

qualquer direito fundamental, nem prejudica o exercício de autodefesa, de forma que

só resta ao acusado cooperar com a justiça.” (2008, p. 86).

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Pacelli de Oliveira possui o mesmo entendimento, no sentido de que somente

quanto aos fatos imputados na denúncia é possível o direito ao silêncio, por se tratar

de matéria de defesa.(2009, p. 371).

Cunha Delpizzo cita Maria E. Queijo e Ada Pellegrini Grinover que lecionam,

respectivamente:

(...) a correta identificação do acusado é elementar para a adequada persecução penal, evitando inclusive que os dados pessoais de terceiros sejam fornecidos indevidamente pelo acusado.(QUEIJO) As perguntas sobre a qualificação do acusado não estão acobertadas pelo direito ao silêncio, porquanto em sua resposta não se caracteriza qualquer atividade defensiva. O art. 187 e seus parágrafos do CPP, na redação dada pela Lei n. 10.792/03, traçam bem essa distinção, assentando que o interrogatório será constituído de duas partes: sobre a pessoa do acusado e sobre os fatos.” (GRINNOVER) (apud, Cunha Delpizzo, 2010, p. 37).

Cumpre salientar que a Quinta e Sexta Turmas do Superior Tribunal de

Justiça já afirmaram no passado (v.g., respectivamente: HC 173.545/SP; HC

139.843/MS), ser atípica a conduta de dar documento falso ou atribuir-se falsa

identidade para esconder possíveis mandados de prisão preventiva ou

antecedentes.

Veja-se como exemplo, a longa ementa do HC 188.141/AL, que tinha como

Relatora, a Ministra Laurita Vaz:

HABEAS CORPUS. ART. 307 DO CÓDIGO PENAL. CRIME DE FALSA IDENTIDADE. EXERCÍCIO DE AUTODEFESA. CONDUTA ATÍPICA. "PRIVILÉGIO CONSTITUCIONAL CONTRA A AUTO-INCRIMINAÇÃO: GARANTIA BÁSICA QUE ASSISTE À GENERALIDADE DAS PESSOAS. A PESSOA SOB INVESTIGAÇÃO (PARLAMENTAR, POLICIAL OU JUDICIAL) NÃO SE DESPOJA DOS DIREITOS E GARANTIAS ASSEGURADOS" (STF, HC 94.082-MC/RS, REL. MIN. CELSO DE MELLO, DJ DE 25/03/2008). PRINCÍPIO "NEMO TENETUR SE DETEGERE". POSITIVAÇÃO NO ROL PETRIFICADO DOS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS (ART. 5.º, INCISO LXIII, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA): OPÇÃO DO CONSTITUINTE ORIGINÁRIO BRASILEIRO DE CONSAGRAR, NA CARTA DA REPÚBLICA DE 1988, "DIRETRIZ FUNDAMENTAL PROCLAMADA, DESDE 1791, PELA QUINTA EMENDA [À CONSTITUIÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA], QUE COMPÕE O "BILL OF RIGHTS"" NORTE-AMERICANO (STF, HC 94.082-MC/RS, REL. MIN. CELSO DE MELLO, DJ DE 25/03/2008). PRECEDENTES CITADOS DA SUPREMA CORTE DOS ESTADOS UNIDOS: ESCOBEDO V. ILLINOIS (378 U.S. 478, 1964); MIRANDA V. ARIZONA (384 U.S. 436, 1966), DICKERSON V. UNITED STATES (530 U.S. 428, 2000). CASO MIRANDA V. ARIZONA: FIXAÇÃO DAS

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DIRETRIZES CONHECIDAS POR "MIRANDA WARNINGS", "MIRANDA RULES" OU "MIRANDA RIGHTS". OCASIÃO EM QUE SE RECONHECEU O DIREITO QUE TEM QUALQUER INVESTIGADO DE NÃO PRODUZIR QUAISQUER PROVAS CONTRA SI MESMO PERANTE A AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, POLICIAL OU JUDICIÁRIA. ORDEM CONCEDIDA, NESSE PONTO. QUANTO AO CRIME DE ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO, NÃO HÁ RAZÃO PARA O ENCERRAMENTO PREMATURO DA PERSECUÇÃO PENAL. DEFEITO INSANÁVEL DO DESPACHO QUE RECEBEU A DENÚNCIA E EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ DE SOLTURA. PEDIDOS DEFERIDOS PELO TRIBUNAL A QUO. ORDEM PARCIALMENTE PREJUDICADA E, NO RESTANTE, PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. O direito do investigado ou do acusado de não produzir prova contra si foi positivado pela Constituição da República no rol petrificado dos direitos e garantias individuais (art. 5.º, inciso LXIII). É essa a norma que garante status constitucional ao princípio do "Nemo tenetur se detegere" (STF, HC 80.949/RJ, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, 1.ª Turma, DJ de 14/12/2001), segundo o qual, repita-se, ninguém é obrigado a produzir quaisquer provas contra si. 5. É atípica a conduta de se atribuir falsa identidade perante autoridade policial com o intuito de ocultar antecedentes criminais, pois se trata de hipótese de autodefesa, consagrada no art. 5.º, inciso LXIII, da Constituição Federal, que não configura o crime descrito no art. 307 do Código Penal. Precedentes. 8. Ordem parcialmente prejudicada e, no restante, parcialmente concedida, tão somente para determinar o trancamento da ação penal quanto ao crime de falsa identidade atribuído ao Paciente. (HC 188141/AL, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 16/06/2011, DJe 28/06/2011).

Todavia, tal entendimento está sendo modificado, visto que o Supremo

Tribunal Federal reconheceu repercussão geral ao Recurso Extraordinário 640.139,

tendo como Relator o Ministro Toffoli:

EMENTA CONSTITUCIONAL. PENAL. CRIME DE FALSA IDENTIDADE. ARTIGO 307 DO CÓDIGO PENAL. ATRIBUIÇÃO DE FALSA INDENTIDADE PERANTE AUTORIDADE POLICIAL. ALEGAÇÃO DE AUTODEFESA. ARTIGO 5º, INCISO LXIII, DA CONSTITUIÇÃO. MATÉRIA COM REPERCUSSÃO GERAL. CONFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DA CORTE NO SENTIDO DA IMPOSSIBILIDADE. TIPICIDADE DA CONDUTA CONFIGURADA. O princípio constitucional da autodefesa (art. 5º, inciso LXIII, da CF/88) não alcança aquele que atribui falsa identidade perante autoridade policial com o intento de ocultar maus antecedentes, sendo, portanto, típica a conduta praticada pelo agente (art. 307 do CP). O tema possui densidade constitucional e extrapola os limites subjetivos das partes. (RE 640139 RG, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, julgado em 22/09/2011, DJe-198 DIVULG 13-10-2011 PUBLIC 14-10-2011 EMENT VOL-02607-05 PP-00885 ).

De tal modo o Superior Tribunal Justiça passou a aderir, em ambas as turmas

o entendimento empossado pelo Supremo Tribunal Federal, conforme bem relatam

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os Ministros Sebastião Reis Junior (6ª Turma) e Jorge Mussi (5ª Turma), relatores,

respectivamente, dos HC 195.634/SP e HC 183.312/SP abaixo transcritos (ambos

votados de forma unânime):

PENAL. HABEAS CORPUS. MOEDA FALSA E FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. PLEITO DE APLICAÇÃO DA TESE DA AUTODEFESA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. INVIABILIDADE. 1. O Juízo de primeiro grau imputou ao paciente o crime de falsificação de documento público, uma vez que o crime de uso de documento falso restou absorvido por aquele. 2. Esta Corte Superior de Justiça possuía o entendimento de que a atribuição de falsa identidade, ainda que por meio de uso de documento falso, objetivando ocultar maus antecedentes, configuraria exercício da autodefesa, impedindo a atribuição do crime previsto no art. 304 do Código Penal (uso de documento falso). 3. Recentemente, a Sexta Turma, no julgamento do HC n. 205.666/SP, de relatoria do Ministro Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ/RS), aderiu ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que a conduta de utilizar documento falso para ocultar a condição de foragido configura o delito previsto no art. 304 do Código Penal. 4. Assim, além de o caso dos autos não se adequar ao anterior entendimento desta Corte, por se tratar de falsificação de documento público, e não uso de documento falso, a pretensão do impetrante esbarra no entendimento atual da Turma. 5. Ordem denegada. (HC 195634/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 03/11/2011, DJe 28/11/2011). HABEAS CORPUS. ART. 304 DO CP. USO DE DOCUMENTO FALSO PARA OCULTAR ANTECEDENTES CRIMINAIS E EVITAR PRISÃO. AUTODEFESA QUE ABRANGE SOMENTE O DIREITO A MENTIR E OMITIR SOBRE OS FATOS E NÃO QUANTO À IDENTIFICAÇÃO. CONDUTA TÍPICA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. INVIABILIDADE. HIPÓTESES EXCEPCIONAIS NÃO CONFIGURADAS. ORDEM DENEGADA. 1. No âmbito desta Corte Superior de Justiça consolidou-se o entendimento no sentido de que não configura o crime disposto no art. 304, tampouco no art. 307, ambos do Código Penal a conduta do acusado que apresenta falso documento de identidade perante a autoridade policial com intuito de ocultar antecedentes criminais e manter o seu status libertatis, tendo em vista se tratar de hipótese de autodefesa, já que amparado pela garantia consagrada no art. 5º, inciso LXIII, da Constituição Federal. 2. Contudo, o Supremo Tribunal Federal, ao examinar o RE 640.139/DF, cuja repercussão geral foi reconhecida, entendeu de modo diverso, assentando que o princípio constitucional da ampla defesa não alcança aquele que atribui falsa identidade perante autoridade policial com o objetivo de ocultar maus antecedentes, sendo, portanto, típica a conduta praticada pelo agente. 3. Embora a aludida decisão, ainda que de reconhecida repercussão geral, seja desprovida de qualquer caráter vinculante, é certo que se trata de posicionamento adotado pela maioria dos integrantes da Suprema Corte, órgão que detém a atribuição de guardar a Constituição Federal e, portanto, dizer em última instância quais situações são conformes ou não com as disposições colocadas na Carta Magna, motivo pelo qual o posicionamento até então adotado por este Superior Tribunal de Justiça deve ser revisto, para que passe a incorporar a interpretação constitucional dada ao caso pela Suprema Corte.

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4. O trancamento de inquérito policial ou de ação penal em sede de habeas corpus é medida excepcional, só admitida quando restar provada, inequivocamente, sem a necessidade de exame valorativo do conjunto fático ou probatório, a atipicidade da conduta, a ocorrência de causa extintiva da punibilidade, ou, ainda, a ausência de indícios de autoria ou de prova da materialidade do delito, hipóteses não configuradas no caso em tela. 5. Ordem denegada. (HC 183.312/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 14/02/2012, DJe 29/02/2012).

3.4 DIREITO A MENTIRA COMO DECORRÊNCIA DO DIREITO AO SILÊNCIO NO

INTERROGATÓRIO DE MÉRITO

Outro ponto que causa muito debate doutrinário diz respeito ao direito de

mentir como decorrência do direito ao silêncio. O debate é causado, dentre tantos

motivos por estar expresso tanto no Código de Processo Penal, quanto na

Constituição Federal somente o direito ao silêncio.

Quanto ao tema, Cunha Delpizzo cita a doutrina de Queijo:

(...) inexistência da obrigação de dizer a verdade é outra decorrência do nemo tenetur se detegere. Em razão dele, de um lado, afasta-se o juramento e, conseqüentemente, a observância desse dever pelo acusado. E, de outro, excluem-se as sanções que possam ser impostas a ele por faltar com a verdade. (...) A eventual mentira e a reticência do acusado não poderão ser valoradas pelo juiz, como indícios de culpabilidade, porque nada mais são do que a expressão do direito a não se auto-incriminar. A vinculação da mentira e da reticência do acusado à culpabilidade associa-se, indubitavelmente, à idéia de que o inocente tem todo interesse em dar diretas e amplas explicações sobre o fato delituoso e de que, aquele que mente ou mantém uma postura reticente, no interrogatório, o faz porque não tem elementos a aduzir em sua defesa. Tal posicionamento, além de confrontar diretamente com o nemo tenetur se detegere, é contestado amplamente pela psicologia judiciária. (apud Cunha Delpizzo, 2010, p. 40).

Na doutrina de Grinover, citada por Maia Santos, encontra-se orientação no

mesmo sentido, possibilitando ao réu mentir em seu interrogatório:

O réu, sujeito de defesa, não tem obrigação nem dever de fornecer elementos de prova que o prejudiquem. Pode calar-se ou até mentir. Ainda que se quisesse ver no interrogatório um meio de prova, só o seria em sentido meramente eventual, em face da faculdade dada ao acusado de não responder. A autoridade judiciária não ´pode dispor do réu como meio de prova, diversamente do que ocorre com as testemunhas: deve respeitar sua liberdade, no sentido de defender-se como entender melhor, falando ou

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calando-se, e ainda advertindo-o da existência da faculdade de não responder. (apud Santos, 2010, p. 3).

A posição de Hélio Tornagui não difere das citadas, afirmando que não se

trata de um direito de mentir, mas sim que a mentira do réu não constitui um crime,

portanto, não sofrerá nenhuma sanção caso o faça. (apud, Santos, p.6). A posição

de Rodriguez afirma que se trata de uma simples possibilidade ou recurso da defesa

e não que se trata de um direito propriamente dito. (2002, p. 221).

Na obra de Albuquerque, se encontra valiosa análise da mentira, sob o prisma

da prova processual:

Isso considerado, afirmamos que um sistema no qual subsista a obrigação do acusado de depor e, mais que isso, de dizer a verdade, além de violar sua integridade moral em favor de uma norma incapaz de alcançar sua finalidades, é extremamente temerário, pois assume o risco de retroceder às práticas inquisitoriais. A outro giro, soa evidente que, tratando-se de questão envolvendo a atividade probatória, a norma deveria pautar-se pelo fim de fornecer, e alguma maneira, elementos que permitissem a formação do convencimento judicial. Ocorre que não há como se constatar, de forma objetiva, a violação do hipotético preceito legal antes do trânsito em julgado da condenação, com o que do ponto de vista da verdade processual, verificar-se-ia que o réu mentiu em seu interrogatório. Todavia, aí, a norma não cumpriria mais função processual alguma, pois não só a atividade probatória, mas todo o processo, já teria encerrado. No mais, não cabe descartar a possibilidade de o acusado realmente acreditar naquilo que falou, principalmente quando se tratam de impressões pessoais acerca de determinado fato, contaminadas elo afã de se justificar. Aí, definitivamente, a questão cai num subjetivismo incompatível com a segurança jurídica. Finalmente, a situação normativa ventilada reduziria sensivelmente a ampla-defesa, pois tomaria de angústia o espírito do obrigado a depor, retirando-lhe a possibilidade de decidir pela submissão ao interrogatório, que deixaria de ser visto como oportunidade aberta para esclarecimento dos fatos para retornar à condição de meio de prova, fazendo, com isso, com que o acusado volvesse à condição de objeto, descendo do patamar de igualdade perante o autor para o de submissão diante de sua vontade. (2008, p. 84/85).

Todavia, faz-se necessário afirmar que a possibilidade de o acusado mentir

quando do interrogatório de mérito não é pacífica. Pacelli de Oliveira e Fischer,

citados por Cunha Delpizzo, afirmam:

Não é incomum encontrar-se opiniões no sentido de que o princípio nemo tenetur se detegere abrangeria também um suposto direito à mentira,

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sobretudo em relação aos fatos, devendo o réu, porém, informar corretamente sua identidade. Bem, que não há direito algum a prestação de informações falsas não pode restar dúvidas. Aliás, se o réu acusar terceiro como autor do fato, sabendo-o inocente, poderá até responder por denunciação caluniosa, na medida em que pode não se mostrar inteiramente justificada (excludente de ilicitude) a conduta, mesmo que em defesa de seu interesse. Pode-se mesmo aceitar que o réu elabore qualquer versão em seu favor; o limite seria o tangenciamento voluntário a direitos alheios, quando ciente da inocência alheia. [...] De modo que não existe direito algum à prática de violação ao Direito. [...]. Do mesmo modo, não constitui direito do réu a apresentação de documentação falsa para eximir-se do processo, até porque o falsum não esgotaria sua potencialidade lesiva naquele processo. (apud Cunha Delpizzo, 2010, p. 41).

O Supremo Tribunal Federal já decidiu acerca da possibilidade de o

interrogado mentir, tendo o Ministro Celso de Mello, em 1991, lavrado no HC 68.929,

a seguinte ementa:

"HABEAS CORPUS" - INTERROGATORIO JUDICIAL - AUSÊNCIA DE ADVOGADO - VALIDADE - PRINCÍPIO DO CONTRADITORIO - INAPLICABILIDADE - PERSECUÇÃO PENAL E LIBERDADES PUBLICAS - DIREITOS PUBLICOS SUBJETIVOS DO INDICIADO E DO RÉU - PRIVILEGIO CONTRA A AUTO-INCRIMINAÇÃO - CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CARACTERIZADO - PEDIDO INDEFERIDO. - A SUPERVENIENCIA DA NOVA ORDEM CONSTITUCIONAL NÃO DESQUALIFICOU O INTERROGATORIO COMO ATO PESSOAL DO MAGISTRADO PROCESSANTE E NEM IMPÔS AO ESTADO O DEVER DE ASSEGURAR, QUANDO DA EFETIVAÇÃO DESSE ATO PROCESSUAL, A PRESENCA DE DEFENSOR TECNICO. A AUSÊNCIA DO ADVOGADO NO INTERROGATORIO JUDICIAL DO ACUSADO NÃO INFIRMA A VALIDADE JURÍDICA DESSE ATO PROCESSUAL. A LEGISLAÇÃO PROCESSUAL PENAL, AO DISCIPLINAR A REALIZAÇÃO DO INTERROGATORIO JUDICIAL, NÃO TORNA OBRIGATORIA, EM CONSEQUENCIA, A PRESENCA DO DEFENSOR DO ACUSADO. - O INTERROGATORIO JUDICIAL NÃO ESTA SUJEITO AO PRINCÍPIO DO CONTRADITORIO. SUBSISTE, EM CONSEQUENCIA, A VEDAÇÃO LEGAL - IGUALMENTE EXTENSIVEL AO ÓRGÃO DA ACUSAÇÃO-, QUE IMPEDE O DEFENSOR DO ACUSADO DE INTERVIR OU DE INFLUIR NA FORMULAÇÃO DAS PERGUNTAS E NA ENUNCIAÇÃO DAS RESPOSTAS. A NORMA INSCRITA NO ART. 187 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL FOI INTEGRALMENTE RECEBIDA PELA NOVA ORDEM CONSTITUCIONAL. - QUALQUER INDIVIDUO QUE FIGURE COMO OBJETO DE PROCEDIMENTOS INVESTIGATORIOS POLICIAIS OU QUE OSTENTE, EM JUÍZO PENAL, A CONDIÇÃO JURÍDICA DE IMPUTADO, TEM, DENTRE AS VARIAS PRERROGATIVAS QUE LHE SÃO CONSTITUCIONALMENTE ASSEGURADAS, O DIREITO DE PERMANECER CALADO. "NEMO TENETUR SE DETEGERE". NINGUEM PODE SER CONSTRANGIDO A CONFESSAR A PRATICA DE UM ILICITO PENAL. O DIREITO DE PERMANECER EM SILENCIO INSERE-SE NO ALCANCE CONCRETO DA CLÁUSULA CONSTITUCIONAL DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. E NESSE DIREITO AO SILENCIO INCLUI-SE ATÉ MESMO POR IMPLICITUDE, A PRERROGATIVA PROCESSUAL DE O ACUSADO NEGAR, AINDA QUE FALSAMENTE, PERANTE A

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AUTORIDADE POLICIAL OU JUDICIÁRIA, A PRATICA DA INFRAÇÃO PENAL. (HC 68929, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Primeira Turma, julgado em 22/10/1991, DJ 28-08-1992 PP-13453 EMENT VOL-01672-02 PP-00270 RTJ VOL-00141-02 PP-00512)

Já no Superior Tribunal de Justiça, o Ministro Og Fernandes afirmou a

impossibilidade de o julgador aumentar a pena por ter o réu mentido em seu

interrogatório. A decisão foi proferida no RHC 18.441/CE:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO. PENA-BASE. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem proclamando que a pena-base deve ser fixada concreta e fundamentadamente (art. 93, IX, CF), de acordo com as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do delito. 2. A sentença se valeu de considerações vagas a respeito da repercussão da infração, sem justificar, por elementos concretos, em que ponto teriam as ditas "consequências" ultrapassado o normal à espécie. 3. O fato de o paciente ter negado a autoria do crime não pode militar em seu desfavor, pois, em processo penal, é cediço, ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo. 4. Embora tenha o magistrado de primeiro grau reconhecido cuidar-se de réu primário e de bons antecedentes e até admitido não possuir ele personalidade perigosa, estabeleceu a pena-base de forma desproporcional, 6 (seis) anos acima do mínimo legal. 5. Pena-base reajustada ao mínimo de 12 (doze) anos. Elevação a 14 (quatorze) anos, pela incidência da agravante de recurso que dificultou a defesa da vítima. 6. Recurso provido para reduzir a pena de 18 (dezoito) anos para 14 (quatorze) anos de reclusão, inicialmente no regime fechado. (RHC 18441/CE, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 11/12/2009, DJe 01/02/2010)

4 O PRIVILÉGIO CONTRA AUTO-INCRIMINAÇÃO NO DIREITO COMPARADO

A garantia contra auto-incriminação é garantida em muitos países do mundo

ocidental. Todavia, ela tem uma aplicação que em muito diverge da que é aplicada e

propagada por parte de nossa doutrina e jurisprudência.

Ao contrário da aplicação brasileira, o nemo tenetur se detegere diz respeito

apenas ao interrogatório do acusado e, sua possibilidade de permanecer em silêncio

ou não depor e, em alguns ordenamentos não ser sancionado por isto.

Neste sentido, Albuquerque afirma que:

27

O certo, porém, é que em países de reconhecida tradição no âmbito dos direitos humanos e em outros de também indiscutível desenvolvimento nas dogmáticas Penal e Processual Penal, o nemo tenetur se detegere quase nunca vai além da prerrogativa de se calar em interrogatório ou de se recusar a depor, protegendo o acusado contra a obrigatoriedade de emitir declarações verbais de conteúdo, em nada interferindo na questão probatória, contexto em que sequer é estudado. (2008, p. 59).

O referido autor cita Maria Elizabeth Queijo, que aborda o tema da produção

de provas contra si no direito comparado:

Maria Elizabeth Queijo anuncia que enquanto a incidência do nemo tenetur se detegere no interrogatório, inclusive com admissão do direito ao silêncio e vedação de determinados métodos de inquirição, está, como regra, assimilada pelos ordenamentos jurídicos, o mesmo não se pode dizer quanto ao reconhecimento da garantia em relação a provas que dependam da colaboração do acusado (2003, p. 240/241). Prossegue a mencionada autora afirmando que na questão probatória os ordenamentos jurídicos por ela pesquisados, em geral, alternam-se entre duas soluções- a execução coercitiva de medida que obrigue o acusado a prestar a colaboração exigida ou a aplicação de sanções por desobediência. (2008, p. 59/60).

Cunha Delpizzo traz outra importante passagem da referida autora:

O estudo do direito estrangeiro revela que o nemo tenetur se detegere tem incidência muito restrita nas provas que dependam da colaboração do acusado. Alguns ordenamentos sequer reconhecem a incidência do referido princípio nas aludidas provas. Reservam sua aplicação ao momento do interrogatório, exclusivamente. Em outros, admite-se a execução coercitiva de intervenções corporais no acusado. Há ainda a orientação de permitir que sejam extraídas inferências de culpabilidade a partir da recusa do réu em submeter-se às provas que necessitem de sua cooperação para serem produzidas. Mas a tendência predominante é a de somente considerar violadora do nemo tenetur se detegere a prova que implique uma postura ativa do acusado. Desse modo, entende-se que impliquem intervenção corporal no acusado, nas quais se exige que este apenas “tolere” a sua realização, permanecendo passivo, não violam o nemo tenetur se detegere. (apud, Cunha Delpizzo, 2010, p.52).

Pacceli de Oliveira ao fazer breve abordagem sobre a legislação estrangeira

quanto ao tema afirma que:

As legislações européias de modo geral, bem como a anglo-americana e algumas de países da América do Sul, como ocorre com a Argentina (art. 218, Código Processo Penal de la Nación), por exemplo, prevêem situações nas quais o réu, embora sujeito de direitos, e não mero objeto do processo, deve se submeter a (ou suportar) determinadas ingerências corporais, com finalidades probatórias. Em todos os casos, porém, como regra, deverá haver previsão expressa na lei e controle judicial da prova. É o que ocorre com os exames para coleta de sangue, testes para a comprovação de DNA, desde que realizados por

28

médicos, os testes de alcoolemia, fornecimento de padrões gráficos e de voz etc. para realização de perícia técnica. (2009, p. 377).

Percebe-se, nesta breve análise comparada que não existe um direito a não

produção de provas contra si mesmo decorrente do direito ao silêncio no

ordenamento estrangeiro. Ocorre na verdade, a submissão das provas aos princípio

da legalidade e da dignidade da pessoa humana. De modo que se faz necessário

abordar a legislação de alguns países, e ao final o posicionamento do Tribunal

Europeu de Direitos Humanos, para demonstrar tal fato.

4.1 FRANÇA

Na França o princípio contra não auto-incriminação não está previsto de

forma expressa na Constituição. No processo penal não há regras claras sobre

como deve colaborar o acusado, todavia a questão não se amolda ao princípio

debatido. Vejamos o que leciona Albuquerque:

(...) há leis específicas que determinam que a constatação de certas infrações, tais como embriaguez ao volante e uso de substâncias entorpecentes, deve ser feita necessariamente por meio da análise de amostras de sangue (ASSOCIATION DE RECHERCHES PENALÉS EUROPÉENNES, 200, P.337), sendo certo que, nesses casos “há dever de colaborar na produção das provas” (QUEIJO, 2003, p.281) e a recusa por parte do motorista constitui delito punível com detenção de até dois anos (QUEIJO, 2003, p.281). O mesmo país exige, ainda, para verificação de fraude ou falsificação de produtos tóxicos postos à venda, a análise de amostras recolhidas e periciadas após a constatação do delito (ASSOCIATION DE RECHERCHES PÉNALES EUROPÉENNES, 2000, p.337). (2008, p.60).

4.2 ESPANHA

A Constituição espanhola positivou a garantia em dois artigos, o 17.3, no qual

se encontra que : “toda pessoa detida deve ser informada de forma imediata, e de

29

modo que lhe seja compreensível, de seus direitos e da razão de sua detenção, não

podendo ser obrigada a depor”; já no artigo 24.2 se lê que: “todos tem direito (...) a

não depor contra si mesmos, a não se confessar culpado e a presunção de

inocência”.

No país, a jurisprudência afirma que, as provas que dependam de

colaboração do acusado não tem, necessariamente, conotação de atos de

inculpação, pois o resultado pode ser tanto favorável quanto desfavorável ao

acusado (Albuquerque, 2008, p. 64).

A legislação espanhola positivou no art. 363, a possibilidade do Juiz

determinar a realização de intervenções corporais:

Artigo 363. Os Juizados e Tribunais ordenarão a pratica de analises químicas, somente, nos casos em que se considerem absolutamente indispensáveis para a necessária investigação judicial e reta administração de justiça. Sempre que concorram razões que a justifiquem, o Juiz de Instrução poderá determinar, por decisão motivada, a obtenção de mostras biológicas do suspeito que resultem indispensáveis para a determinação de seu perfil de DNA. Para tal fim, poderá decidir a pratica de atos de inspeção, reconhecimento ou intervenção corporal, desde que sejam adequados aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Castanho de Carvalho cita o conceito de intervenções corporais na doutrina

espanhola, a qual se realiza sem o consentimento do acusado:

Inicialmente, cumpre conceituar as intervenções corporais. Seguindo proposta de Nicolas Gonzáles-Cuellar Serrano, são medidas de investigação que se realizam sobre o corpo das pessoas, sem a necessidade de obter seu consentimento, e por meio de coação direta, se necessário, com fim de descobrir circunstâncias fáticas que sejam do interesse para o processo, em relação às condições ou ao estado físico ou psíquico do sujeito, ou com o fim de encontrar objetos nele escondidos. (2009, p. 65).

Trois Neto tece considerações sobre a legislação espanhola e julgados da

Corte constitucional daquele país:

Na legislação ordinária, a LEcrim confere à pessoa detida o direito de permanecer calada, o que compreende a faculdade de não responder a algumas ou a todas as perguntas formuladas pelas autoridades (art. 520). O

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tribunal Constitucional afirma que a liberdade de declaração é uma garantia do direito de defesa, mas entende que é possível extrair inferências do silêncio do acusado quando este se recusar a responder a algumas perguntas (silêncio parcial), ou quando as respostas contiverem ou conformarem evasivas. Não recebem proteção constitucional condutas do acusado que, embora possivelmente autoincriminatórias, não sejam “equiparáveis a uma declaração”, como a submissão ao controle de alcoolemia” e a colaboração do contribuinte à realização da fiscalização tributária. Quanto ao problema das investigações corporais, entende-se que a proteção da não submissão do acusado a determinados exames se situa no direito à intimidade e à inviolabilidade corporal, e não em um direito geral à não auto-incriminação. (2011, p.87/88).

Albuquerque, cita em sua obra a sentença 103/1985, proferida pela Corte

constitucional espanhola quando confrontada com a exigência de contribuição do

acusado (em exame de alcoolemia) em face do princípio nemo tenetur se detegere:

O dever de se submeter ao controle de alcoolemia não pode ser considerado contrário ao direito de não declarar, e a declarar contra si mesmo e a não se confessar culpado, pois não se obriga o detido a emitir uma declaração que exteriorize um conteúdo, admitindo sua culpabilidade, senão que tolere que se faça objeto de uma modalidade especial de perícia, exigindo-lhe uma colaboração não equiparada a declaração compreendida no âmbito dos direitos proclamados nos arts. 17.3 e 24.2 da C.E.

6 (2008,

p.65).

Ainda, no mesmo sentido Pacelli de Oliveira, cita alguns julgados da mesma

Corte, corroborando a exigência de produção de provas:

Na Espanha, a jurisprudência do Tribunal Constitucional indica que “no cabe considerar em si misma degradante o contraria a la digninidad de la person la verificación de um examen ginecológico por parte de um profesional de la medicina (STC 37/1989), e também que “...en cualquier caso, la ejecución de tales intervenciones corporales se habrá de efectuar por personal (STC 7/1994), que deberá ser personal médico especializado em el supuesto de intervenciones graves que lo requieram por sus características”. (2009, p. 194).

4.3 ITÁLIA

A Constituição italiana não positivou o princípio de forma expressa. Mas, de

acordo com Trois Neto, a doutrina italiana entende que ele está inserido no direito à

6 Tradução Livre.

31

autodefesa tutelado no art. 24.2 do texto constitucional, na perspectiva de não

colaboração e ainda na presunção de não culpabilidade (2011, p. 88).

No que concerne ao ato do interrogatório, o autor citado afirma:

A legislação ordinária admite a condução coercitiva para interrogatório e para acareação, mas o acusado não é obrigado a responder às perguntas que lhe forem dirigidas. Na ausência de resposta, a pergunta é consignada no termo, e o silêncio poderá ser valorado pelo juiz em desfavor do réu. O direito de não depor diz respeito apenas a fatos próprios, e não a fatos de terceiros. De acordo com a lei 63, introduzida em 2001, o imputado pode ser chamado a depor como testemunha, com a conseqüente obrigação de dizer a verdade, para responder sobre fatos aos quais se referiu em um depoimento precedente e que incriminam apenas terceiros. Esse novo depoimento, que deve ser colhido com a participação do terceiro incriminado, não pode ser utilizado em prejuízo do depoente, nem em processos pendentes, nem em processos sujeitos à revisão. Com essa configuração, pretendeu-se conciliar a busca da verdade com o direito de defesa do correu delatado e com o direito do corréu delator de não produzir prova contra si. (2011, p.89).

No tocante as intervenções corporais, as medidas eram amplamente

realizadas e aceitas, até que a Corte Constitucional declarou a inconstitucionalidade

das mesmas; não por ofensa ao princípio da não auto-incriminação, mas sim pelo

princípio da legalidade já que o Código de Processo Penal previa as intervenções de

forma genérica, neste sentido Castanho de Carvalho:

Na Itália, a sentença nº 238, da Corte Constitucional, de 27/07/1996, declarou a inconstitucionalidade do art. 224, §2º, do Código de Processo Penal italiano, que permitia de forma genérica, as medidas que se fizessem necessárias para submeter o indiciado ou réu a um exame pericial. O fundamento da decisão é o artigo 13, da Constituição, que somente permite restrições à liberdade pessoal nos casos e modos previstos em lei. Ou seja, pela Constituição, as hipóteses de restrição devem estar especificadas na lei, não sendo permitido que a lei restritiva seja genérica, como era o caso. (2009, pg. 66).

Paolo Tonini, citado por Albuquerque, é enfático em suas críticas a inércia do

legislador em regulamentar a matéria:

Por derradeiro, a Corte constitucional salientou que a matéria referente aos acertamentos coercitivos necessita de uma rigorosa regulamentação operada pelo legislador. Devemos, infelizmente, ressaltar que, até hoje, o legislador, não conseguiu cumprir a tarefa que lhe foi incubida. Importante questionar quais são as conseqüências práticas de mencionado pronunciamento, na falta de uma nova regulamentação legislativa. É terrível ter de admitir que, apesar de a exigência de aquisição da prova de um delito

32

constituir um ‘valor primário sobre o qual se baseia todo ordenamento inspirado no princípio da legalidade’, atualmente o exame de sangue pode ser realizado apenas com o consenso do interessado. Nesse sentido, aquilo que foi requerido ao legislador pela Corte constitucional é uma reforma factível, que parece não interessar ao Estado. (2008, pg. 64).

Importante frisar que, desde 2005, uma parte dessa lacuna legislativa foi

superada pelo Decreto Pasini (posteriormente convertido em lei), o qual possibilita

determinadas intervenções corporais em crimes de terrorismo e conexos. (Trois

Neto, 2011, p. 89).

4.4 PORTUGAL

A Constituição portuguesa não previu o princípio contra auto-incriminação de

forma expressa, todavia, afirma-se que ele se encontra implícito em outros

princípios.

O Código de Processo Penal português prevê o direito ao silêncio. Está

positivado no artigo 343, I:

O presidente informa o argüido de que tem o direito a prestar declarações em qualquer momento da audiência, desde que elas se refiram ao objecto do processo, sem que no entanto a tal seja obrigado e sem que o seu silêncio possa desfavorecê-lo.

Quanto à aplicação do direito ao silêncio, ensina Trois Neto:

A lei processual penal portuguesa confere ampla proteção à liberdade de declaração no interrogatório (CPP, art. 61, n.1, alínea c), proibindo a valoração contra o argüido tanto do silêncio total (CPP, art. 343º, n.1) como do silêncio parcial (CPP, art. 345º, n.1). Embora esses dispositivos digam respeito apenas ao interrogatório judicial, sua aplicabilidade tem sido estendida às acareações, aos interrogatórios policiais e “informais”, além daqueles praticados em instâncias administrativas ou disciplinares. Não podem influir no convencimento judicial as declarações prestadas sem a formal cientificação do direito de permanecer calado (CPP, art. 58º,n.3), bem como quaisquer elementos de provas obtidos à custa de tortura, ameaça, coação, perturbações da memória ou da capacidade de avaliação, ou por meios enganosos (CPP, art. 126º). De acordo com a legislação, o direito ao silêncio estaria assegurado apenas quanto ao interrogatório de mérito (sobre os fatos imputados), e não quanto ao interrogatório de qualificação (sobre a pessoa do argüido), mas certos aspectos dessa

33

restrição, sobretudo quanto ao dever de o réu informar seus antecedentes criminais (CPP, art.342º, n.2), têm sido contestados pela doutrina. (2011, p. 90).

Quanto às intervenções corporais o Código de Processo Penal português é

claro em determinar que o réu se submeta as mesmas. Assim determina o art. 172:

“1- se alguém pretender eximir-se ou obstar a qualquer exame devido ou a facultar

coisa que deva ser examinada, pode ser compelido por decisão da autoridade

judiciária competente.” No inciso 2 do artigo, faz-se uma exceção: “Os exames

susceptíveis de ofender o pudor das pessoas devem respeitar a dignidade e, na

medida do possível, o pudor de quem a eles se submeter.”

Castanho de Carvalho ao tratar das intervenções corporais sintetiza:

Em Portugal, admite-se a realização de exames na pessoa do arguido, mesmo contra sua vontade, desde que com as cautelas de não ofender o pudor e a intimidade do sujeito, o que será avaliado pelo juiz, nos termos dos artigos 172, 154.2 e 156.5 e 6, do Código de Processo Penal, com as alterações da Lei nº 48/2007, de 29 de agosto. Diante das críticas à essa possibilidade ampla, feitas por Figueiredo Dias e Side Monteiro, manifestou-se Manuel Lopes Maia Gonçalves, defendendo a coerção judicial: “o simples facto de o exame ser ordenado contra a vontade do examinando não é, de per si e respeitadas as cautelas do nº 2, atentatório à integridade física ou moral” (2009, p. 66).

Ao comentar a intervenções corporais no país, Pacelli de Oliveira cita o

processualista Silva:

Em Portugal, em relação às inspeções previstas nos arts. 171 e 172 do Código de Processo Penal português, ensina o Prof. Germano Marques da Silva que “os exames susceptíveis de ofender o pudor das pessoas devem respeitar a dignidade e, na medida possível, o pudor de quem a eles se submeter e só devem ser ordenados quando necessários para as finalidades do processo”. (2009, p. 195).

4.5 ALEMANHA

Segundo Trois Neto, a Constituição alemã (Lei Fundamental de 1949) não

trata de forma expressa do princípio a não auto-incriminação, mas a doutrina afirma

34

estar o mesmo implícito nos princípios do estado de Direito, da intangibilidade da

pessoa humana e do direito ao livre desenvolvimento da personalidade. (2011, p.

86).

O direito ao silêncio está expressamente previsto na lei processual penal,

resguardando e delimitando o direito. A seção 115, inciso 3, positiva:

Seção 115. (Exame por um Juiz) 3) Durante o exame, as circunstâncias incriminadoras devem ser apontadas ao acusado e ele deve ser informado de seu direito de responder a acusação ou de permanecer calado.(...)

Trois Neto, aborda como se dá a proteção:

A legislação processual penal alemã protege a liberdade de declaração, assegurando ao acusado o direito de não responder às perguntas da autoridade e prevendo a proibição de certo métodos de interrogatório (StPO, parágrafo 36ª). Não são admitidas confissões obtidas mediante influência corporal (maus-tratos, fadiga, ataques corporais, etc.), influência psíquica direta (engano, hipnose, ameaça, promessa de sentenças ilegais, tortura), coação ilegítima segundo o ordenamento ou qualquer medida que afete a memória ou a capacidade de compreensão. Admite-se a valoração do silêncio do réu se este, após aceitar responder ao interrogatório, decide deixar sem resposta perguntas específicas (silêncio parcial), mas não se permite extração de qualquer inferência judicial se o réu recusa por completo a oportunidade de dar declarações (silêncio total). (2011, p. 86).

A Constituição alemã, segundo Albuquerque, prevê a possibilidade de

restrições a direitos fundamentais através de leis gerais, desde que não se afete o

núcleo essencial do direito fundamental, sendo que, a produção de provas contra si

está prevista em diversos artigos da legislação processual penal. (2008, p. 62).

A previsão constitucional a que se refere o autor está prevista no art. 19 da

Constituição Alemã, assim redigido:

Artigo 19 (restrição aos direitos fundamentais) 1) Enquanto que, sob esta lei, um direito fundamental pode ser restrito por ou por consequência de uma lei, tal lei deve ser aplicada de forma ordinária e não simplesmente a um caso específico. Ainda, a lei deve especificar qual o direito fundamental a ser afetado e o artigo do qual ele consta. 2) Em nenhum caso, pode o núcleo essencial do direito ser afetado.

35

O Código de Processo penal alemão prevê em diversos artigos (seções) a

possibilidade de serem realizadas medidas invasivas no acusado, tais como: exame

de sangue (seção 81a); fotografias e impressões digitais (seção 81b); exame de

DNA (seção 81g).

Claus Roxin, citado por Pacelli de Oliveira, tece alguns comentários acerca do

art. 81 do referido Código:

Assim, segundo o parágrafo 81 do Código de Processo Penal deve deixar extrair o sangue para esclarecimento de eventual responsabilidade o que, para o delito de condução sob efeito de bebidas alcoólicas (parágrafo 136 do Código Penal) se converte no meio de prova mais decisivo. Desde 1977 estão permitidos também os exames genéticos para determinar a responsabilidade de suspeitos. (apud, Pacelli de Oliveira, 2009, p. 193).

Albuquerque afirma ainda, que as medidas podem ser realizadas pelo

Ministério Público ou por suas polícias auxiliares, sem a necessidade de autorização

judicial. O autor cita passagem da obra de Maria Elizabeth Queijo, a qual cita

exemplos de medidas coercitivas admitidas pela corte constitucional alemã:

Os tribunais alemães, inclusive o Tribunal Constitucional Federal, têm admitido o reconhecimento e ainda a imposição de outras medidas, como cortar o cabelo ou a barba; usar de artifícios para forçar uma posição da cabeça; manter os olhos aberto; manter dada expressão facial. Tal orientação invoca, por vezes, a analogia com a relação à submissão do acusado a exames, como o de sangue, e à identificação dactiloscópica. Outras vezes o fundamento é o de que tais medidas coercitivas exigem do acusado apenas uma colaboração passiva, ou seja a tolerância. (2008, p. 63).

Na obra de conjunta de Roxin, Arzt e Tiedemann se lê que as medidas

corporais devem ser ordenadas por um juiz, mas que na prática o Ministério Público

que as tem determinado:

Entretanto, meios coercitivos como a coleta de uma amostra de sangue ou a apreensão do veículo do crime somente podem ser ordenados pelo Ministério Público e seus auxiliares em casos urgentes. De acordo com a lei, meios coercitivos que intervenham de modo incisivo nos direitos fundamentais devem ser ordenados, em princípio, pelo juiz. Todavia, prevalece na prática a competência do Ministério Público ante a urgência da medida (freqüentemente com a exigência jurídica de confirmação posterior do juiz pela parte atingida- cf. para a apreensão, o § 98, 2º, do CPP alemão).(2007, p.171).

36

4.6 ARGENTINA

Na América Latina, a situação não é diferente. O direito ao silêncio é

expressamente garantido no Código de Processo Penal argentino, o qual descreve,

em três artigos, de forma detalhada o tema:

296. Liberdade para depor. O acusado pode se negar a depor. Em nenhum caso, ser-lhe-á exigido juramento ou promessa de dizer a verdade. Nem deve ser exercida contra ele ameaça ou coação para forçá-lo, induzindo-lhe ou determinar-lhe a depor contra sua vontade, nem será acusado ou recriminado com o objetivo de obter sua confissão. A inobservância deste preceito gerará nulidade do ato, sem prejuízo da responsabilidade penal ou disciplinar correspondente. 297. Interrogatório de identificação. Depois de proceder ao disposto nos artigos 107,197,295 e 296, o juiz convidará o acusado a dizer seu nome, sobrenome, o endereço se o tiver; idade, estado civil, profissão, nacionalidade, lugar de nascimento, domicílio principal, lugar de residência anterior e condição social, se sabe ler e escrever; nome, estado civil e profissão dos pais; se já foi processado e, por qual crime, por qual Tribunal, se foi condenado e se a pena foi cumprida. 298. Formalidades previas. Concluído o interrogatório de identificação, o juiz informara detalhadamente ao acusado qual é o fato que se atribui, quais são as provas existentes contra ele e que pode abster-se de falar, sem que seu silencio implique em uma presunção de culpabilidade. Se o acusado se negar falar, constará em ata. Se ele se negar a assinar, constará o motivo.

Quanto às provas que dependam de participação do acusado, o Código

argentino afirma que os acusados poderão se recusar a realizar a reconstituição dos

fatos, todavia os mesmos devem se submeter a inspeções corporais:

218.Inspeção Corporal e mental. Quando se julgue necessário.o juiz poderá demandar a inspeção corporal e mental do acusado, cuidando sempre que possível o respeite ao seu recato. Poderá dispor de igual medida com respeito à outra pessoa, com a mesma limitação nos casos de grave ou fundamentada suspeita ou de absoluta necessidade. Caso necessário, a inspeção poderá ser praticada com o auxílio de peritos. Só poderá assistir o ato, o defensor ou uma pessoa de confiança, que será advertido previamente de tal fato. 221.Reconstrução do fato. O juiz poderá ordenar a reconstrução do fato para comprovar como se efetuou ou se poderia ocorrer de uma maneira específica. Não poderá obrigar o acusado a participar da reconstrução, mas terá direito de solicitar.

37

Ao analisar o tema, Albuquerque afirma que “a doutrina portenha nem aventa

a hipótese de recusa legítima do acusado em se submeter à inspeção com base na

garantia de não auto-incriminação.”, pois esta se encontra dentre as faculdades

judiciais. (2008, p. 67).

Thiago Ruiz cita, obra do processualista argentino Carbone, que leciona:

A extração de sangue, de cabelos e dos pêlos pubianos, mostras epiteliais, é legitima mesmo contra vontade do indiciado, se cumprir os requisitos indispensáveis, de razoabilidade, proporcionalidade, necessidade, utilidade e pertinência e não viola seu direito à intimidade, a integridade física nem tampouco sua dignidade humana, já que só afeta de forma leve a integridade corporal e não viola a proibição de tratos desumanos e degradantes quando são realizados pelas pessoas habilitadas e com o limite de por em perigo a vida ou a saúde. Tampouco é necessário seu prévio consentimento para levar a cabo a diligencia de extração de mostra sanguínea. (2011, p. 14/15).

7

4.7 INGLATERRA

O país no qual o princípio contra auto-incriminação se desenvolveu,

atualmente, tem uma interpretação muito restritiva do mesmo. Com efeito, desde

que entrou em vigor o Criminal Justice and Public Order Act, de 1994, o silêncio

pode ser avaliado, nos julgamentos, em desfavor do acusado.

Alschuler tece alguns comentários sobre a legislação:

O Criminal Justice and Public Order Act de 1994 determina que, uma vez que o acusado seja alertado das conseqüências de sua falha no testemunho, “a corte ou júri (...) pode tomar suposições da falha dos acusados em dar provas.”. E mais, a lei solicita que jurados e juízes tomem conseqüências do silêncio os réus nos pré-julgamentos em muitas situações. A lei incentiva suspeitos a colaborar com as investigações policiais, a revelar táticas da defesa na mais rápida oportunidade, e a submeter-se às perguntas no julgamento; mas seus defensores sustentam que ela é compatível com o privilégio contra auto-incriminação porque ela não trata a falha dos suspeitos em falar um crime ou um desacato no tribunal. (1997, p.200).

7 Tradução livre.

38

O autor, logo após, critica a legislação levando em consideração a história do

princípio e sua estreita relação com o país:

Após séculos de autocongratulação pelos juízes e advogados ingleses, os quais denegriam as práticas inquisitoriais do continente Europeu, os juízes continentais podem ter o prazer irônico de denunciar o novo procedimento “inquisitorial” inglês. (1997, p. 200)

No que concerne às provas auto-incriminatórias, Trois Neto afirma que de

acordo com o Criminal Justice and Public Order Act, o acusado é obrigado a

submeter-se ao recolhimento de amostras biológicas (desde que não sejam íntimas).

(2011, p.91). Pacelli de Oliveira cita quem pode realizar as intervenções:

No Reino Unido, são admitidas diversas intervenções corporais que se distinguiriam entre íntimas e não íntimas, podendo estas últimas ser realizadas pela própria autoridade policial, enquanto as primeiras somente com a intervenção de profissional especializado, como médico, odontólogo (para exame de arcada) etc. (2009, p. 194).

4.8 ESTADOS UNIDOS

De toda legislação comparada, a americana é a mais importante quanto ao

princípio, pois influencia diretamente (mesmo que de forma distorcida) nossa

doutrina e jurisprudência (vários julgados fazem citação direta ao aviso de Miranda,

v.g., STF, HC 94.082/RS, STJ, HC 188.141/AL; e muitos outros julgados afirmam

que a visão brasileira do princípio da não auto-incriminação decorre do privilege

against self incrimination americano).

Albuquerque traz passagem do afirmado em sua obra, com crítica a

interpretação brasileira do princípio:

Embora seja corriqueira, por parte de nossas doutrina e jurisprudência, a invocação ao direito anglo-americano para sustentar, em um nível principiológico, conclusões sobre o suposto direito de o imputado não prestar contribuição na prova produzida pela acusação, observa-se que os próprios juristas estadunidenses conceituam o privilege against self incrimination,- garantia que extraem da citada Emenda e cujo texto é muito próximo daquele que consta da Convenção Americana sobre Direitos Humanos- como um instituto muito menos abrangente. (2008, p. 4).

39

A Constituição Americana garante de forma expressa o direito à não auto-

incriminação, o qual foi positivado através da quinta emenda. Segundo Alschuler, o

princípio começou a ser aplicado de forma rotineira em Nova York a partir de 1835

(1997, p. 198). O autor cita dois casos julgados pela Suprema Corte Americana que

delimitaram a impossibilidade de se extrair qualquer presunção do interrogatório do

réu e, o direito ao silêncio aos suspeitos não juramentados (Caso Miranda):

Em 1965, Griffin v. Califórnia assegurou que qualquer acusação ou comentário judicial sobre a falha do acusado em testemunhar, violava o privilégio da Quinta Emenda. Os fundadores da Quinta Emenda, que poderiam não ter aprovado testemunho sob juramento pelo acusado, provavelmente, teriam concordado que a recusa de um réu a ser compelido a prestar juramento, não poderia ser matéria de comentário adversário. Griffin, entretanto, proibiu comentários não somente da recusa do réu em submeter-se ao juramento, mas “do silêncio do acusado”. A corte não ofereceu indicação de que a recusa em se submeter ao juramento possa ser diferente das outras formas de silêncio, e um ano após Griffin, a Corte estendeu o direito ao silêncio aos suspeitos não juramentados sob custódia policial, no caso Miranda v. Arizona. Que a presença ou ausência do juramento poderia ter feito diferença parecia inconcebível em 1966. Porque um relato sem juramento, feito como resposta ao interrogatório policial seria utilizado contra o acusado no julgamento, ele equivaleria ao testemunho. (1997, p. 199/200).

8

Importante afirmar que mesmo após o julgamento Miranda, algumas decisões

permitiram que o silêncio do acusado fosse tratado como indicação de culpa em

procedimentos disciplinares nas prisões (Baxter v. Palmigiano, 425 U.S., 1976) e,

que os promotores alegassem a falha do acusado em responder as perguntas

realizadas num procedimento prévio. (Alschuler, 1997, p. 275).

De acordo com o referido autor o princípio tem pouca aplicação prática no que

concerne aos Miranda warnings (aviso de Miranda), tendo inclusive, o Departamento

de Justiça (na administração Reagan) sugerido o abandono do aviso. (1997, pg.

200).

8 Tradução livre.

40

O autor, em outra passagem de sua obra, afirma que a grande maioria dos

indiciados não sabe da possibilidade de permanecerem calados e que as guilty plea

e plea bargaining esvaziam o conteúdo do princípio:

Todos os anos, cortes descobrem que suspeitos, nas salas das estações policiais, fizeram um largo número de desistências de seus direitos previstos na Quinta Emenda. Se estes suspeitos tivessem compreendido, suas situações (no menor grau possível), a maioria deles teria permanecido em silêncio. Além do que, 92% de todas as condenações por crimes sérios nos Estados Unidos são por “reconhecimento de culpa”. Além deste instituto é comum a prática do “acordo de culpa”. Promotores e outros oficiais exercem uma pressão extraordinária sob os acusados não somente para obter uma resposta, mas para assegurar uma total admissão da culpa. O Guia Federal de Sentença, promete um desconto significante na sentença para o acusado que fornece “completa informação para o governo acerca de seu envolvimento na ofensa”. Poucas outras nações são tão dependentes como a nossa, de provar a culpa pela boca do próprio acusado. (1997, p.184).

A quinta emenda americana, em nada protege os acusados contra a

produção de provas contra si mesmo além do interrogatório. Na obra de Trois Neto

se lê:

Contudo, nos EUA o privilege against self incrimination abrange apenas formas orais de autoincriminação, não se estendendo a outros atos de colaboração ativa ou passiva do acusado. A Suprema Corte americana tem afirmado a possibilidade de o acusado ser obrigado, até mediante coação física, a colaborar para a realização de provas incriminatórias, seja pelo fornecimento de impressões digitais e de amostras sanguíneas, caligráficas ou fonéticas, seja pela submissão a diligências de reconhecimento pessoal ou fotográfico. Quanto à apresentação de documentos autoincriminatórios, a jurisprudência também já admitiu que o réu fosse intimado para apresentação compulsória de documentos negociais e de cópias dos memorandos investigativos da defesa, mas introduziu, recentemente a atenuação de que esses mandados coercitivos somente poderiam ser emitidos se a acusação pudesse afirmar a existência dos documentos pretendidos, estabelecer o que pretende demonstrar com eles e comprovar a relevância de sua introdução no processo. (2011, p. 92).

Alschuler, muito embora fazendo uma crítica ao sistema acusatório americano

(que para ele tem muitas feições inquisitórias) também cita alguns casos de provas

incriminatórias:

Muito embora a Suprema Corte já tenha afirmado que o privilégio é o “pilar essencial” de um sistema acusatório, e que o mesmo requer do governo que tome para si a carga probatória, nosso sistema legal é, substancialmente, menos acusatório do que sua retórica sugere. Nossa Suprema Corte já requisitou que os acusados assumissem tal ônus

41

produzindo documentos incriminatórios, fornecendo notícias sobre as táticas da defesa, providenciando cópias dos relatórios investigativos da defesa, e fornecendo todo tipo de prova não testemunhal -amostras de sangue, amostras de voz, e até mesmo, num caso, o corpo de uma criança da qual a suspeita era dito ter assassinado. (1997, p. 183).

9

As decisões, citadas, que permitiram a produção das provas auto-

incriminatórias foram tomadas nos seguintes casos respectivamente: United States

v. Doe (U.S. 605, 1984), Williams v. Florida (U.S. 78, 1970), United States v. Nobles

(U.S. 225, 1975), Schmerber v. Califórnia ( U.S. 757, 1966), United States v. Dionísio

(U.S. 1, 1973). O caso emblemático em que uma mulher (a mãe da vítima) suspeita

de homicídio foi condenada por não ter fornecido a “prova” (indicado a localização

do corpo da criança) foi tomado no julgamento Baltimore City Department of Social

Services v. Bouknight (U.S. 549, 1990).

No caso Fischer v. Estados Unidos, a Corte Constitucional americana afirmou:

Mas a Corte nunca sugeriu que qualquer tipo de invasão à intimidade viola o privilégio. Dentro dos limites impostos pelo linguagem da Quinta Emenda, que nós necessariamente observamos, o privilégio verdadeiramente serve aos interesses da privacidade; mas a Corte nunca teve por nenhum motivo, a intimidade incluída, aplicado a Quinta Emenda para evitar, de outra forma, a correta aquisição ou uso da prova a qual, a critério da Corte, não envolva depoimento obrigatório auto-incriminante.

10(apud, Rodriguez, 2002, p. 200).

No precedente Schmerber v.Califórnia (citado no Caso Jalloh v. Alemanha,

julgado pelo TEDH) a Corte Constitucional estabeleceu alguns critérios a serem

seguidos quando da necessidade de exames:

Após Rochin, a Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu em Schmerber v. Califórnia, 384 US 757 (1966), 86 S. Ct. 1826, 16 L.Ed.2d 908, na qual um policial ordenou a um individuo suspeito de dirigir, enquanto sob efeito de drogas, a se submeter a um teste de sangue, no hospital onde ele estava sendo tratado por ferimentos causados num acidente mobilístico. A Suprema Corte registrou que a função adequada da Quarta Emenda é limitar, não contra todas as invasões, mas somente contra as que não são justificadas nas circunstâncias, ou que são feitas de uma maneira imprópria. Não achando violação a Quarta Emenda, a Corte marcou em seguida vários critérios a serem considerados na determinação da racionalidade da busca invasiva: 1) o governo deve ter uma indicação clara de que a prova

9 Tradução livre.

10 Tradução livre.

42

incriminatória será achada; 2) os policiais devem ter um mandado, ou, devem existir circunstâncias exigentes, como a iminente destruição das provas, para justificar a ausência do mandado; e 3) o método usado para extrair a evidência deve ser razoável e deve ser realizado de maneira razoável.

Desde que os Estados Unidos iniciaram a “guerra ao terror”, em 2001, com

promulgação do USA PATRIOT Act, os “inimigos” (via de regra cidadãos islâmicos)

não tem qualquer tipo de garantia ao silêncio (dentre outras garantias). Com efeito,

são utilizados diversos meios para que o interrogado fale (confesse e delate) tais

como: isolamento, interrogatórios prolongados (podendo durar 20 horas por dia),

raspar a cabeça ou barba, privação do sono, ordenar que o acusado se exercite,

tapear o estomago ou face, retirar as roupas, dentre outras formas.

Recentemente, o Tribunal Federal de Recursos de São Francisco, Estado da

Califórnia, decidiu, por 2 votos à 1 que a lei estadual que possibilita que a polícia

colete amostras de pessoas presas para exames de DNA, sem autorização judicial,

é constitucional. Referida lei entrou em vigor em 2009 e modificou lei anterior que

permitia o exame de DNA apenas de pessoas já condenadas. Para o juiz Milan

Smith, que votou pela constitucionalidade da lei, a coleta é “apenas uma pequena

inconveniência, muito menos invasiva do que a coleta de amostras de sangue, pela

polícia, de motoristas alcoolizados.”. Todavia, os que se opõe à lei, alegam que ela

viola o direito constitucional das pessoas à proteção contra buscas e apreensões

não razoáveis e sem mandato judicial (em nenhum momento se afirma ofensa ao

princípio contra auto-incriminação).11

4.9 O TRIBUNAL EUROPEU DE DIREITOS HUMANOS

11

Disponível no site: http://www.conjur.com.br/2012-fev-25/corte-eua-autoriza-coleta-material-suspeitos-

exame-dna. Acesso em: 26 de março de 2012.

43

O TEDH já teve oportunidade de se manifestar por diversas vezes quanto ao

princípio da não auto-incriminação e suas vertentes; e afirma que apesar de o direito

à não auto-incriminação não estar expresso na Convenção Européia de Direitos

Humanos, ele decorre do art. 6º da mesma, e que o mesmo se situa na noção de

processo equitativo.

Antes de proceder aos julgamentos, a primeira tese a ser vencida pelo

Tribunal, é a de verificar se o queixoso (quem recorre ao TEDH) pode se enquadrar

na condição de suspeito ou acusado, para após verificar, se o mesmo pode invocar

o direito à não auto-incriminação.

Ao analisar os casos Serves v. França e Heaney and Macguinnes v. Irlanda,

foram estabelecidos alguns critérios. Costa afirma quanto aos mesmos:

Segundo o TEDH, o conceito de acusado utilizado no art. 6º da Convenção, para além de autônomo em relação ao conceito homólogo que vigore no ordenamento dos Estados contraentes, tem ali um sentido mais material do que formal, conduzindo a que como tal deva considerar-se todo aquele a quem foi oficialmente comunicada pela autoridade competente a qualidade de suspeito da prática de um crime. (...) O TEDH renovou o entendimento segundo o qual conceito de acusação tem, no âmbito do art. 6º da Convenção, um significado próprio, devendo como tal considerar-se, para os efeitos ali previstos, todo aquele cuja situação individual, enquanto suspeito, se encontre substancialmente afectada. (2011, p. 121/122).

O TEDH já teve oportunidade de avaliar a prática policial de se intimar uma

pessoa a depor como testemunha, sendo que na verdade, tal pessoa era suspeita

da prática do crime. Costa cita o caso Shannon v. Reino Unido:

O TEDH considerou que, se a pessoa sobre a qual não recaísse qualquer suspeita e que não houvesse já intenção de sujeitar a julgamento, o uso dos meios coercitivos para alcançar tal objectivo poderiam ser compatíveis com direito à não auto-incriminação nos mesmos termos em que são os pedidos de informação recorrentemente dirigidos ao cidadãos no âmbito da atividade reguladora (ambiente, consumo, etc.). Porém, segundo o TEDH, no momento em que fora intimado para prestar declarações, o queixoso encontrava-se, não apenas em risco de ser perseguido criminalmente pelos crimes que estavam a ser investigados, mas já naquele momento acusado por crime pertencente ao mesmo âmbito temático. Em tais circunstâncias, comparecer à inquirição teria envolvido uma possibilidade muito real de ser

44

solicitado a prestar informação sobre assuntos que poderiam surgir no procedimento criminal em que fora já acusado(...). (2011, p.137).

No que concerne à aplicação do princípio, segundo Costa, o TEDH distingue

três hipóteses: a) situações em que o queixoso se vê obrigado a prestar

declarações; b) situações em que o queixoso é coagido a entregar documentos; c)

situações em que se faz necessária obtenção de material corpóreo do queixoso.

(2011, p.122).

Dentre o grupo de prerrogativas que se encontram inseridas no direito à não

auto-incriminação, mais especificamente na possibilidade de não prestar

declarações, o TEDH firmou as seguintes, no julgamento Murray contra Reino Unido:

1) Uma imunidade geral, possuída por todas as pessoas, de serem coagidas mediante punição a contestar perguntas feitas por outras pessoas ou entidade. 2) Uma imunidade geral, possuída por todas as pessoas, de serem coagidas mediante punição a contestar perguntas cuja respostas possam-nas incriminar. 3) Uma imunidade geral específica, possuída por todas as pessoas sob suspeita de responsabilidade criminal, quando sejam interrogadas por oficiais de polícia ou outras pessoas em semelhante custódia de autoridade, de serem coagidas mediante punição a contestar perguntas de qualquer natureza. 4) Uma imunidade específica, possuída pelos acusados no curso de um julgamento, de serem obrigadas a fornecer provas, e de serem coagidas a contestar as perguntas que lhe sejam feitas no banco dos réus. 5) Uma imunidade específica, possuída por pessoas acusadas em matéria penal, sobre perguntas referentes à infração a elas dirigidas por oficiais de polícia ou pessoas em posição de autoridade semelhante. 6) Uma imunidade específica, possuída pelos acusados no curso do julgamento, contra implicações negativas de sua recusa a: a) responder perguntas em juízo, ou b) oferecer provas em juízo. (apud, Rodriguez, 2002, p. 204).

No mesmo caso, o Tribunal se viu confrontado com a possibilidade de o

silêncio ser valorado pelo juiz, e afirmou tal possibilidade, bem como definiu os

critérios para tanto:

O TEDH considerou ser, por um lado, evidente que os direitos ao silêncio e à não auto-incriminação excluem a possibilidade de uma condenação se sustentar exclusiva ou prevalecentemente na recusa do acusado em prestar declarações ou apresentar elementos de prova e, por outro, igualmente óbvio que, nas situações que claramente reclamem uma explicação do acusado, tais direitos não podem nem devem impedir que o seu silêncio seja tido em conta na valoração da prova, em especial na apreciação da concludência e do alcance dos elementos probatórios produzidos pela acusação. Segundo o TEDH, onde quer que a linha entre estes dois

45

extremos deva ser traçada, decorre aqui que o direito ao silêncio não é absoluto em não prestar declarações durante o processo criminal não tem qualquer implicação no momento em que o Tribunal deva valorar a prova produzida contra si. (...) A possibilidade da formulação de juízos de inferência de tipo incriminatório encontra-se, segundo o TEDH, em si mesma condicionada, apenas devendo ser admitida sob verificação cumulativa dos seguintes pressupostos: i) a acusação deverá estabelecer previamente, através de prova directa, as circunstâncias que permitem o juízo de inferência; ii) estas deverão permitir que nelas se apóie a conclusão inferida; e iii) a conclusão inferida (de que se encontram provados os elementos essenciais do crime) deveria ser estabelecida para além da dúvida razoável. (apud, Costa, 2011, p. 148).

Quanto à realização de provas invasivas, que necessitem de material

corpóreo, o TEDH já afirmou a possibilidade das mesmas serem realizadas

independente da vontade do acusado, e definiu os critérios para sua realização.

Ao avaliar o tema, Costa afirma que o direito à não auto-incriminação não

resguarda, em qualquer ação penal, a utilização de elementos possíveis de serem

obtidos do acusado através de meios coercitivos, desde que a existência de tais seja

independente da vontade do acusado, tais como amostras de sangue, DNA, urina,

tecidos corpóreos. (2011, p. 156).

No caso Jalloh contra Alemanha, a Corte Européia deixou consignado no

parágrafo 70, que a retirada de sangue não ofende os dispositivos da Convenção, e

citou precedentes:

70. Mesmo quando não justificado por razões de necessidade médicas, os artigos 3º e 8º da Convenção não proíbem o recurso a procedimentos médicos a despeito da vontade do suspeito, em regra, para obter dele prova de seu envolvimento no cometimento de uma ofensa criminal. Assim, as instituições da Convenção descobriram em vários casos, que a retirada de amostras sangue ou saliva contra a vontade de um suspeito, em regra, para investigar uma ofensa não viola estes artigos nas circunstâncias dos casos examinados por eles. (ver, por todos, X v. Holanda, no. 8239/78, decisão da Comissão de 4 de dezembro de 1978, Decisões e Relatórios (DR) 16, pp. 187-89, e Schimidt v. Alemanha, no. 32352/02, 5 de janeiro de 2006). (apud, Rodriguez, 2002, p. 200).

12

12

Tradução livre.

46

Segundo Costa, o TEDH firmou entendimento de que a extração de material

corpóreo não ofende o art. 6º, nem mesmo o 3º (artigo que proíbe a tortura e

tratamento desumano) da Convenção Européia. O autor cita os critérios

estabelecidos para realização de intervenções corporais, os quais devem obedecer

aos seguintes limites:

i) a prova pretendida obter através do material corpóreo deverá relacionar-se com um crime grave e sério (idéia de um catálogo de crimes); ii) as autoridades deverão demonstrar que tomaram em consideração todos os métodos alternativos de recolha de prova (princípio de subsidiariedade); iii) a intervenção não pode exceder nunca o mínimo de severidade tolerado pelo art. 3º da Convenção- isto é, não pode implicar risco relevante de lesão duradoura na saúde do visado, nem provocar-lhe sofrimento físico sério-, o que deverá ser estabelecido em razão da duração da intervenção e dos seus efeitos físicos e mentais, do nível de supervisão médica disponibilizada e, em determinados casos, do sexo, idade e saúde do destinatário do procedimento. (2011, p. 157).

Por fim, cumpre salientar que as legislações de emergência, voltadas a crimes

graves não tem o condão de afastar a aplicação do princípio. No caso Heaney and

MacGuinnes v. Irlanda, o TEDH deixou registrado, segundo Costa:

O TEDH rejeitou por último, o argumento segundo o qual se trataria em todo o caso de procedimentos especiais previstos no âmbito do combate ao terrorismo, afirmando, como critério geral, o de que as exigências básicas de equidade contidas no art. 6º da Convenção, incluindo o direito à não auto-incriminação, são aplicáveis a todos os procedimentos criminais independentemente do tipo de crime tido em vista, não constituindo a segurança e a ordem pública valores susceptíveis de justificar a existência de normas que extingam a essência do direito ao silêncio e à não auto-incriminação. (2011, p. 134).

5 A GARANTIA À NÃO AUTO-INCRIMINAÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO

Cabe, desde logo, trazer passagem da obra de Albuquerque, que informa a

contradição existente na doutrina brasileira acerca do direito ao silêncio:

Com efeito, muito embora a Constituição limite-se a dispor sobre o direito do preso de se calar, a doutrina parece reconhecer, com pequeníssima margem de hesitação, a existência do citado instituto, dando à expressão “não produzir” uma acepção tão ampla que se estende para além de seus significados semântico e jurídico, abrangendo então a idéia de que o sujeito passivo de um processo penal ou de uma investigação criminal não pode

47

ser compelido sequer a participar, prestando qualquer forma mínima de colaboração, de uma atividade probatória cujo resultado lhe possa ser, eventualmente, prejudicial. (2008, p. 2).

Pacelli de Oliveira, em crítica, afirma que somente no Brasil chega-se a

extremos interpretativos do texto constitucional e conclui:

Mas a doutrina processual penal brasileira normalmente não se satisfaz com esses limites, preferindo atribuir ao nemo tenetur se detegere uma verdadeira imunidade corporal, não reduzida ao direito de não ser obrigado a depor contra si mesmo, nem a confessar-se culpado, como expressamente se contém no art. 8º, 2, g. da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, ou ao direito de não ser obrigado a testemunhar contra si mesma ou confessar-se culpada, consoante se tem no art. 14.3, g, do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis. (...) A nosso juízo, a questão sequer pode ser enfrentada nessa perspectiva, isto é, na perspectiva do direito ao silêncio. Direito ao silêncio é direito a permanecer calado, direito a não ser obrigado a depor- nos países em que não existe o interrogatório como meio de defesa- e que tem por objetivo e por justificativa a proteção da integridade física e psíquica do acusado relativa à obtenção forçada de seu depoimento, de sua personalidade e dignidade, e, além disso, o exercício de um certo controle da atividade judicante, impedindo que se construam certezas judiciais com base exclusivamente na atuação passiva do réu. (2009, p. 188/189).

Na outra ponta, existe a doutrina que entende o direito ao silêncio como uma

manifestação de algo maior, o nemo tenetur se detegere. Apoiados nessa premissa,

afirmam que o direito ao silêncio garante a não produção de provas contra si

mesmo. Lopes Jr. afirma neste sentido:

O direito ao silêncio é apenas uma manifestação de uma garantia muito maior, insculpida no princípio nemo tenetur se detegere, segundo o qual o sujeito passivo não pode sofrer nenhum prejuízo jurídico por omitir-se de colaborar em uma atividade probatória da acusação ou por exercer seu direito de silêncio quando do interrogatório. (2010, p. 629).

Trois Neto avalia e resume essas posições antagônicas encontradas na

doutrina:

Muitos autores, de um lado, identificam o direito à não autoincriminação tão somente com a liberdade de não depor contra si, pois as razões históricas do instituto não justificariam que ele pudesse proteger as comunicações não verbais do acusado ou desobrigar alguém da participação em diligências probatórias. Afirmam em favor dessa postura restritiva, que a liberdade de declaração, historicamente, limita-se a prevenir a extração de confissões forçadas e a impedir a submissão do acusado ao trilema cruel de acusar-se

48

(resignando-se à própria condenação), falar (arriscando-se a cometer perjúrio) ou negar-se a falar (o que configuraria perjúrio). Outros autores defendem, de seu turno, que embora o reconhecimento do instituto, sob o aspecto histórico, coincida com o intento de erradicação da prática de tortura para fins de obtenção de uma confissão verbal do imputado, o direito à não autoincriminação albergaria, atualmente, muito além do aspecto meramente verbal da liberdade de declaração, ficaria dispensado de qualquer contribuição para apuração da verdade ou para o desfecho do processo, ainda que não esteja em jogo a proteção da integridade física ou mental do imputado. Um dos fundamentos comumente citados é o de que, “com os avanços da ciência, não é apenas pelas sua declarações (tomando o termo em seu sentido estrito), que uma pessoa pode se incriminar”. (2011, p. 99).

O autor citado critica, ainda, a ausência de uma fundamentação adequada por

parte da doutrina que propugna pela interpretação ampliada do direito à não auto-

incriminação:

O reconhecimento de uma compreensão ampla da proteção contra a autoincriminação, contudo, deve ser feita com cautela. Muitos dos defensores das correntes ampliativas freqüentemente deixam de ser fundamentar a expansão do direito sob as bases de uma teoria constitucional claramente exposta, preferindo aderir, sem qualquer argumentação racional, à mera tirania dos slogans. Sem qualquer tomada de posição sobre conceitos indispensáveis à tarefa do intérprete, como os de tipo normativo, barreira, intervenção, direito prima facie e direito definitivo, parte significativa da doutrina acaba contribuindo para que os conceitos importados sem qualquer justificativa açambarquem boa parte do espaço que deveria ser ocupado pela discussão científica. (2011, p. 101).

Cabe destacar, também, como exemplo do impasse doutrinário, passagens

das obras de Albuquerque e Lopes Jr., na qual citam o processualista italiano

Ferrajoli e chegam a diferentes conclusões quanto ao princípio.

Com efeito, na obra de Ferrajoli, citado por Albuquerque, se encontra:

Nemo tenetur se detegere é a primeira máxima do garantismo processual acusatório, enunciado por Hobbes, e recebida desde o século XVII no direito inglês. Disso resultaram, como corolários: a proibição daquela “tortura espiritual”, como a chamou Pagano, que é o juramento do imputado, o ‘direito ao silêncio’ nas palavras de Filangieri, assim como a faculdade do imputado de responder o falso, a proibição não só de arrancar a confissão com violência, mas também de obtê-la mediante manipulação da psique, com drogas ou práticas hipnóticas; pelo respeito devido à pessoa do imputado e pela inviolabilidade de sua consciência; e conseqüente negação do papel decisivo da confissão, tanto pela refutação de qualquer prova legal, como pelo caráter indisponível associado à situações penais; o direito do imputado à assistência e do mesmo modo à presença de seu defensor no interrogatório, de modo a impedir abusos ou ainda violações das garantias processuais. (apud, Albuquerque, 2008, p. 97).

49

Ao comentar a lição de Ferrajoli, Albuquerque afirma:

Observe-se que nem mesmo Ferrajoli- o mais importante sistematizador do chamado “garantismo”- extrai como consequência da cláusula nemo tenetur se detegere a conotação de imunidade plena que a doutrina brasileira insiste em reconhecer (...). Como se percebe, se comparada aos extremos alcançados por nossas doutrina e jurisprudência, a leitura que Ferrajoli faz é bastante restritiva, pois vê a garantia de não auto-incriminação aplicável apenas ao interrogatório do acusado, única oportunidade em que sua liberdade de consciência e autodeterminação poderia ser afetada pelos métodos violentos ou insidiosos de extração da verdade destacados pelo jusfilósofo peninsular. (2008, p. 98/99).

Já Lopes Jr., logo após analisar a doutrina de Ferrajoli, chega à uma

conclusão demasiado diferente, e que não coaduna com o pensamento do jurista

italiano:

Destarte, através do princípio do nemo tenetur se detegere, o sujeito passivo não pode ser compelido a declarar ou mesmo participar de qualquer atividade que possa incriminá-lo ou prejudicar sua defesa. (2010, p. 630)

Percebe-se, facilmente, o impasse doutrinário quanto a extensão do princípio

no tocante as provas; impasse este, que reflete nas decisões dos tribunais de todas

as regiões do Brasil.

5.1 O DIREITO A NÃO AUTO-INCRIMINAÇÃO NOS TRIBUNAIS SUPERIORES

O Supremo como um todo, compartilha da corrente doutrinária que propugna

pela impossibilidade de o acusado produzir provas contra si mesmo como

decorrência do direito ao silêncio; conseqüentemente, aplicando o instituto de forma

diferente da qual ocorre nos tribunais e ordenamentos estrangeiros.

Neste sentido, Bottino afirma que:

(...) o Supremo Tribunal Federal deu ao inc. LXIII, do art. 5º, da Constituição uma interpretação sensivelmente diferente daquela que poderia ser extraída da simples leitura do dispositivo e distinta, ainda, da interpretação atribuída por outras cortes judiciais.(2008, p.2).

50

De acordo com o referido autor, o alcance da garantia contra não auto-

incriminação foi estabelecida pelo Supremo por conta de seu ativismo judicial.

Trois Neto afirma no mesmo sentido que embora haja uma imprecisão

terminológica, por se confundirem as expressões direito ao silêncio, direito à não

auto-incriminação e nemo tenetur se detegere, o Supremo Tribunal Federal

reconhece um direito subjetivo ao indivíduo, em não colaborar com os órgãos

perseguitórios, impedindo o sujeito de realizar qualquer diligência probatória que

dependam de uma atuação positiva. (2011, p. 97).

Na obra de Pacelli de Oliveira se encontra:

No Brasil, as intervenções corporais previstas em lei são pouquíssimas e, não bastasse, nem sequer vêm sendo admitidas pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, sempre fundamentada no princípio constitucional da não auto-incriminação. (2009, p. 377).

Em outra passagem de sua obra, o autor afirma:

Já deixamos registrado que a posição de nossa jurisprudência, particularmente a do Supremo Tribunal Federal, é em sentido absolutamente ampliativo do princípio da não auto-incriminação. Sustenta-se a existência de um direito a não produzir qualquer tipo de prova contra si, sem que, entretanto, haja qualquer previsão constitucional nesse sentido. (2009, p. 382).

Com efeito, no Supremo se encontram decisões em diversos sentidos

afirmando não ser o acusado obrigado a produzir prova contra si, tais como: a

participar de reconstituição do crime (HC 69026, Relator(a): Min. CELSO DE

MELLO, Primeira Turma, julgado em 10/12/1991, DJ 04-09-1992 PP-14091 EMENT

VOL-01674-04 PP-00734 RTJ VOL-00142-03 PP-00855); de não ser obrigado a

fornecer padrões vocais (HC 83096, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda

Turma, julgado em 18/11/2003, DJ 12-12-2003 PP-00089 EMENT VOL-02136-02

PP-00289 RTJ VOL-00194-03 PP-00923); de não ser obrigado a fornecer padrões

gráficos de próprio punho (HC 77135, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Primeira

51

Turma, julgado em 08/09/1998, DJ 06-11-1998 PP-00003 EMENT VOL-01930-01

PP-00170); de não ser o suposto pai obrigado a retirar sangue para fins de DNA (HC

76060, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, julgado em

31/03/1998, DJ 15-05-1998 PP-00044 EMENT VOL-01910-01 PP-00130).

O Superior Tribunal de Justiça, assim como o Supremo, tem vasta

jurisprudência quanto à impossibilidade de o acusado ser obrigado a produzir provas

contra si mesmo.

Neste sentido, alguns exemplos: a impossibilidade de ser coletado sangue

(RMS 18.017/SP, Rel. Ministro PAULO MEDINA, SEXTA TURMA, julgado em

09/02/2006, DJ 02/05/2006, p. 390); a impossibilidade de ser o acusado obrigado a

fornecer sua imagem (HC 179.486/GO, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA

TURMA, julgado em 14/06/2011, DJe 27/06/2011); a não obrigação de se submeter

a exame de DNA (RHC 15316/SP, Rel. Ministro PAULO MEDINA, SEXTA TURMA,

julgado em 13/04/2004, DJ 16/08/2004, p. 283).

Em recentíssimo julgado (Resp 1.111.566), o Ministro Bellize demonstrou sua

preocupação com a extensão que se dá ao direito ao silêncio no Brasil:

Quanto ao direito de não se autoincriminar, Bellizze observou que em nenhum outro lugar ele ganhou contornos tão rígidos como no sistema nacional. Para o ministro, a interpretação de tal garantia tem sido feita de maneira ampliada. Nem mesmo em países de sistemas jurídicos avançados e com tradição de respeito aos direitos humanos e ao devido processo legal a submissão do condutor ao exame de alcoolemia é considerada ofensiva ao princípio da não autoincriminação. “Trata-se de um exame pericial de resultado incerto. O estado tem o ônus de provar o crime, não se lhe pode negar meios mínimos de fazê-lo”.

13

Em suma, os Tribunais do Brasil reconhecem de forma unânime

(excepcionando, algumas poucas hipóteses) o direito do acusado de não produzir

qualquer tipo de prova auto-incriminatória. Impossibilitando desta forma, os órgãos

de acusação de demonstrar ou mesmo produzir suas provas. Ainda, nossos

13

Disponível em: http://www.conjur.com.br/2012-fev-09/ministro-stj-afirma-embriaguez-comprovada-bafometro. Acesso em 23 de mar. de 2012.

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Tribunais afirmam que tal prerrogativa decorre do direito ao silêncio, e citam

precendentes estrangeiros que, na verdade não corroboram o julgado.

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CONCLUSÃO

O princípio teve origem para evitar os abusos cometidos pelo Estado, o qual

se valia de todos os meios para obter do interrogado a confissão da culpa.

O interrogado não existia como um sujeito de direitos, mas sim como um

objeto, de onde deveria ser extraída toda “verdade”. Contra estes abusos, criou-se

uma garantia que inicialmente, apenas, protegia um acusado de ser forçado a falar.

Todavia sem a efetiva participação de um advogado, tal direito não poderia trazer

qualquer benefício, por isso concluiu Moglen que foram os advogados e não as

Constituições que estavam mudando a feição do processo penal; um direito

positivado sem um meio adequado para ser utilizado não é mais do que um mero

pedaço de papel.

Após a positivação do direito na Constituição americana, o privilege against

self-incrimination (previsto na Quinta emenda), o direito se espalhou pelo mundo

ocidental.

No Brasil, o direito ao silêncio foi previsto expressamente na Constituição

Federal de 1988. Todavia, não foi devidamente regulamentado, o que tem causado

inúmeras divergências quanto ao que ele significa efetivamente. Muitos

doutrinadores têm afirmado que deriva do silêncio, um suposto direito à não

participação de provas auto-incriminatórias, e a jurisprudência pátria tem inúmeros

julgados neste sentido.

O estudo do direito comparado demonstrou que a doutrina brasileira que

propugna por um direito de permanecer inerte, intocável, somente existe em nosso

país. Em todos os países analisados, não existe qualquer garantia a não produzir

provas auto-incriminatórias como decorrência do direito ao silêncio. Existe, na

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verdade, uma limitação à atividade estatal por conta dos princípios da legalidade, da

proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana.

Países com reconhecida tradição no respeito aos direitos humanos, com

democracias estabelecidas, possibilitam que as autoridades policiais (alguns

mediante autorização judicial, outros sem esta necessidade) realizem diversos tipos

de prova que dependem de colaboração do acusado (reconhecimento, exames de

sangue, testes de alcoolemia, etc).

No que concerne ao ato do interrogatório, o direito ao silêncio não encontra

guarida na sua vertente mais importante, em todos os ordenamentos europeus: não

poder o silêncio, ser utilizado para aumentar a pena (exemplos: Inglaterra e Itália).

No Brasil, fez-se do princípio à não auto-incriminação, um direito absoluto,

pois se traduziu o privilege against self incrimination americano de forma literal,

transformando-o em um princípio que não existe fora de nossas terras. Com efeito, o

privilégio americano se divide em três partes: o direito ao silêncio; de não ser

obrigado a depor e não ser criminalizado por isto; e de não ter o silêncio valorado

contra si. Nada além disso.

O direito ao silêncio no Brasil deve ser interpretado no sentido da garantia

americana pois a possibilidade de permanecer silente é apenas uma faceta do

princípio, a qual já existia, inclusive, no Código de Processo Penal. Ainda, a

doutrina, mesmo após, 24 anos da promulgação da Constituição, não é pacífica

quanto aos direitos do acusado quando do exercício do silêncio ou, mesmo quando

opta por uma defesa ativa.

Faz-se necessário criticar o legislador, que permanece “tímido” quanto à

questão, não definindo quais os limites do princípio. O Código de Processo Penal

em vigor pouco cuida do tema, sem mencionar suas especificações. O PLS 156/09,

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da mesma forma, optou por não enfrentar mais detalhadamente o tema (afirma

apenas que o interrogado não é obrigado a responder a todas as perguntas), quanto

à produção de provas que dependam de colaboração do acusado, não faz qualquer

referência.

Tal inércia legislativa causa insegurança jurídica na medida em que se aplica

o princípio de formas completamente diferentes por todo Brasil.

No que concerne à produção de provas auto-incriminatórias, faz-se

necessário uma reavaliação por parte de nossos Tribunais e doutrina, para se

alinharem ao que vêm sendo praticado no mundo ocidental; pois, nos moldes como

se aplica o princípio, atualmente, o mesmo se tornou a maior garantia constitucional

prevista na carta cidadã, como bem afirma Pacelli de Oliveira:

(...)a radicalização ou absolutização de tal direito o colocaria em posição superior a qualquer outro interesse ou direito, individual, coletivo ou público, o que, para além de manifesto equívoco hermenêutico, não se justificaria

enquanto Direito. (2009, p. 193).

Frise-se que não existe direito absoluto (com algumas ressalvas doutrinárias

quanto à dignidade da pessoa humana) no ordenamento. Como muito bem

salienta Alexandre de Moraes, as garantias fundamentais

“não podem ser utilizados como um verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas, nem tampouco como argumento para o afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos.” (apud Albuquerque, 2008, pg.51).

É imperioso que o legislador tome uma posição ativa, na descrição do que

consiste a garantia fundamental; da mesma forma, faz-se imprescindível que

doutrina e jurisprudência se amoldem aos precedentes existentes no mundo. A falta

de clareza da lei, bem como a falta de compromisso com os conceitos jurídicos traz

insegurança à sociedade como um todo; como exemplo final, pode-se citar o

impasse quanto ao bafômetro, o que seria facilmente resolvido no direito comparado.

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