uruá-tapera - 182 - janeiro 2013

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www.uruatapera.com O tempo parou nos municípios da margem esquerda do rio Amazonas, que não conseguem ter indústria e nem comércio forte. PáG 5. Calha Norte exige energia Ano XX Nº 182 JANEIRO 2013 MINERAÇÃO EM FOCO A Frente Parlamentar de Apoio ao Desenvolvimento Sustentável da Mineração no Pará já desenvolve cronograma de ações. VARIEDADES | PáG 7. Territórios habitados por povos tradicionais terão pro- tegidos o modo de viver. Preservação de identidade e da memória CULTURA ATUALIDADES | PáG 4. GAVIÃO- REAL NO ARAGUAIA NATUREZA SERVIçO | PáG 2. Magistrados dão bom exem- plo e vão às escolas com seus projetos educativos. Campanha de combate à violência MULHER COMPORTAMENTO | PáG 8. Ademar Ayres do Amaral lança luzes sobre um perío- do com escassa bibliografia. A saga da juta recontada por um obidense LITERATURA ATUALIDADES | PáG 4. As velhas, precárias e poluidoras usinas termelétricas movidas a óleo diesel condenam a população dos dez municípios da região a viver décadas de atraso e sem perspectivas. Pesquisadores do Inpa : achado Maquete da Alcoa mostrando as camadas no subsolo e como se dá a lavra da bauxita em Juruti.

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Page 1: Uruá-Tapera - 182 - Janeiro 2013

www.uruatapera.com

O tempo parou nos municípios da margem esquerda do rio Amazonas, que não conseguem ter indústria e nem comércio forte. Pág 5.

Calha Norte exige energia

Ano XX Nº 182JANEIRO 2013

Mineração eM focoA Frente Parlamentar de Apoio ao Desenvolvimento Sustentável da

Mineração no Pará já desenvolve cronograma de ações. vARIEdAdES | Pág 7.

Territórios habitados por povos tradicionais terão pro-tegidos o modo de viver.

Preservação de identidade e da memória

cultura

AtuAlIdAdES | Pág 4.

gavião-real No araguaia

natureza

SERvIçO | Pág 2.

Magistrados dão bom exem-plo e vão às escolas com seus projetos educativos.

Campanhade combate à violência

MulHer

cOmPORtAmENtO | Pág 8.

Ademar Ayres do Amaral lança luzes sobre um perío-do com escassa bibliografia.

a saga da juta recontada por um obidense

literatura

AtuAlIdAdES | Pág 4.

As velhas, precárias e poluidoras usinas termelétricas movidas a óleo diesel condenam a população dos dez municípios da região a viver décadas de atraso e sem perspectivas.

Pesquisadores do Inpa : achado

Maquete da Alcoa mostrando as camadas no subsolo e como se dá a lavra da bauxita em Juruti.

Page 2: Uruá-Tapera - 182 - Janeiro 2013

2 l JANEIRO - 2013

Diretora-Editora responsável Franssinete Florenzano

Colaborador especial Emanuel Nassar

Editoração eletrônica Calazans Souza

www.uruatapera.com

www.uruatapera.blogspot.com [email protected]

Av. Independência, 1857

Oriximiná-PA. CEP 68270-000 Tel/Fax. 0xx91.3222-1440

CNPJ 23.060.825/0001-05

SERVIÇO

Biodiversidade e jovens naturalistasO V Prêmio José Márcio Ayres para Jovens Na-

turalistas evidenciou zoologia. Janilce de Nazaré Machado Batista, aluna do 3º ano da Escola Augus-to Meira, conquistou o 1º lugar do ensino médio. O trabalho “A mandioca e o sistema de engorda de peixes em São Domingos do Capim”, orientado pe-la professora Edna Gualberto, exigiu meses de pes-quisa e dedicação total em sua cidade de origem. A estudante investigou a prática de aproveitamento das sobras de mandioca pelos ribeirinhos na cria-ção de peixes. Ela acompa-nhou a engorda de quatro espécies – acarás catitu, roxo e roxinho e aracu -, que foram criadas em uma camboa às margens do rio Capim, registran-do todos os passos da pesquisa em mais de 700 fotografias.

O segundo lugar do Ensino Médio foi para André Hideo Umemura Paiva, aluno do 2º ano da Escola Tenente Rêgo Barros. A motivação para a pesquisa “Estudo sobre abelhas sem ferrão ama-zônicas”, orientada pelo professor Assis Melo, veio de dentro de casa: André cria sua própria colméia de abelhas sem ferrão há sete anos. Decidido a di-vulgar a importância dos insetos, visitou a cidade São João de Pirabas, onde a apicultura é uma forte atividade econômica, e pesquisou as caracterís-ticas das espécies aripuá, abelha mosquito, uruçu--amarela e uruçu-cinzen-ta. No trabalho, o aluno destaca o valor comercial das duas últimas, cujo mel é mais saudável pela menor quantidade de açú-car e chega a custar R$100 o litro.

Já a terceira colocação ficou com Carmen Fran-

çuasy Martins Nascimen-to, da Escola Albanízia de Oliveira Lima. A estudan-te do 1º ano encontrou o objeto de estudo na pró-pria escola e realizou a pesquisa “Artrópodes no ambiente escolar em área urbana de Belém-Pará”, sob orientação do profes-sor Cide da Silva Filho.A aluna espalhou armadi-lhas luminosas do tipo CDC para atrair insetos hematófagos e armadi-lhas feitas com garrafas pet para coletar mosqui-tos em diferentes pontos da escola, conseguindo um total de 310 exempla-res identificados em 39 morfoespécies. Ainda que tenha utilizado poucos métodos de coleta e amos-tragem, os resultados da pesquisa de Carmem de-monstraram a riqueza de espécies encontradas em um único espaço urbano.

O trabalho “Dicioná-rio ilustrado semi-siste-mático da botânica do açaí” de Railson Wallace Rodrigues dos Santos, 1º ano da Escola Enedina Sampaio Melo, recebeu Menção Honrosa. Com a orientação de Aldeno-ra Gonçalves, o aluno identificou cerca de 100 formas lingüísticas utili-zadas pela comunidade de Igarapé-Miri para di-ferenciar etnovariedades do açaizeiro, como o “açaí parau”, termo relaciona-

do ao fruto em fase de amadurecimento.

O 1º lugar do Ensino Fundamental foi para An-dré Vitor Tavares, aluno do 8º ano da Escola Vilhena Alves, onde integra o Nú-cleo de Atividades de Altas Habilidades – ele também é aluno da Escola Salesia-no do Trabalho. Seu estudo “Arara azul: em processo avançado de extinção”, orientado pelas professo-ras Marcia Veloso e Cacil-da Silva, foi constituído

pela observação de exem-plares de aves em cativeiro no Parque Zoobotânico do Museu Goeldi, entrevistas com uma bióloga e o vete-rinário do Goeldi, além de pesquisa bibliográfica.

Os resultados da in-vestigação de André Vitor serviram de base para a elaboração de um folder, utilizado para a conscien-tização da comunidade escolar. Os demais traba-lhos finalistas do Ensino Fundamental não obtive-

ram pontuação suficiente na avaliação oral.

Para a pesquisadora Ana Harada (MPEG), que participou da comissão julgadora na 1ª edição do Prêmio, a qualidade dos trabalhos têm aumenta-do. Ela destaca ainda a possibilidade que o Prê-mio tem de descobrir mentes curiosas para a ciência: “A gente pode encontrar grandes poten-ciais de jovens na Ama-zônia. É só procurar nas

escolas e ter pessoas que possam conduzi-los até nós”.

O Dr. Manoel Ayres, pesquisador pioneiro na área da estatística biomé-dica e pai do falecido pri-matólogo Márcio Ayres, durante a cerimônia de premiação, ofereceu ta-blets para o estudante Railson e a professora Al-denora, cujo trabalho ob-teve Menção Honrosa.

Realizada pelo Museu Emílio Goeldi e Conserva-ção Internacional do Bra-sil, com o apoio da Escola da Biodiversidade Ama-zônica do INCT Biodiver-sidade e Uso da Terra na Amazônia, a 5ª edição in-seriu o Prêmio no cenário das novas mídias através de diferentes estratégias de divulgação. Foram re-alizadas palestras, ofici-nas, materiais educativos, websérie “Naturalistas do Século XXI”, transmissão ao vivo e digitalização de conteúdos, além de cam-panhas informativas em jornal, Rádio e TV e nas redes sociais. Todo mate-rial educativo está dispo-nível no site do prêmio.

Coordenado pela jor-nalista Joice Santos e pe-las educadoras Filomena Secco e Maria de Jesus Fonseca, o Prêmio José Márcio Ayres mobilizar o debate sobre biodiversi-dade amazônica, foco de todas as pesquisas indi-viduais, que foram desen-volvidas em Belém, Igara-pé-Miri, São Domingos do Capim e Marajó. Foi a pri-meira vez que na disputa pelo Prêmio concorreram apenas escolas do sistema público de ensino.

Descoberta e lições de proteção ao Gavião-realPesquisadores do Ins-

tituto de Pesquisas da Amazônia (Inpa) catalo-garam outro ninho de Gavião-real (Harpia har-pyja) no interior da APA Araguaia em dezembro. O achado está localizado a seis quilômetros da vila Santa Cruz dos Martírios, que fica a 45 quilômetros da sede urbana de São Geraldo do Araguaia. Em

aos poucos, estamos cons-cientizando as pessoas da comunidade sobre a importância de preservar a espécie. Muitas pessoas já procuram membros da equipe para informar sobre possíveis ninhos em árvores da região”, esclarece.

Durante a expedição

em São Geraldo do Ara-guaia, a equipe visitou três ninhos: dois na APA Ara-guaia e o outro na Terra Indígena Suruí-Sororó, ma-peado em janeiro de 2012.

(Fonte: Nilson Ama-ral - Coordenadoria do programa de Comunica-ção do Parque Serra das Andorinhas)

fotos Janine Valente

Vencedores da quinta edição do Prêmio José Márcio Ayres: juventude talentosa.

O Dr. Manoel Ayres descreveu a contribuição de seu filho, José Márcio, para a ciência

menos de dois anos, já fo-ram catalogados e moni-torados no município cin-co ninhos da ave rapinei-ra, dois na APA Araguaia e três na Terra Indígena Suruí-Sororó. A expectati-va dos pesquisadores é de que existam mais ninhos na região.

Construído na forqui-lha principal de uma cas-tanheira de 40 metros, o ninho da Harpia está a 32 de altura do solo e mede 1,50x1,90m de diâmetro. O abrigo do Gavião-real foi descoberto por um mo-rador da região, em 2006, quando a ave atacou o ca-chorro da propriedade.

Para Helena Aguiar, pesquisadora do Inpa, há muitas possibilidades de existirem mais ninhos de Gavião-real na APA Ara-guaia. Isto porque as ca-racterísticas da vegetação local favorecem a repro-dução da ave. “A existên-cia de ninhos de Harpia nesta região é mais um

nobre motivo para manter protegida a mata”, explica.

A zootecnista Giselle Leandro, coordenadora do projeto em São Geral-do do Araguaia, conta que após as ações de educação ambiental sobre a Harpia harpyja realizadas nas comunidades da APA Ara-guaia, os moradores estão

mais conscientes sobre a importância da preserva-ção da espécie. “Durante as primeiras palestras sobre a Harpia, muitos moradores repudiavam a iniciativa do projeto. Eles até confessavam ter ma-tado a ave para alimenta-ção ou simplesmente por curiosidade. Felizmente,

Ave arredia e bela, o Gavião-real é importante achado, e tudo indica que mais exemplares poderão ser encontrados.

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3JANEIRO - 2013 l

informesCIDADES

Monte alegre recebeu a sua maior ação cultural

A exposição “Visões: a arte rupestre em Mon-te Alegre”, com pinturas do arquiteto e aquarelis-ta Mario Baratta, versos do escritor e poeta Juraci Siqueira, painéis fotográ-ficos dos sítios arqueoló-gicos, textos informativos e o vídeo-documentário “Imagens de Gurupatu-ba”, com direção de Fer-nando Segtowick, além do lançamento dos livros “Arte rupestre de Monte Alegre” e “Itaí – a cari-nha pintada” foi, talvez, a maior ação cultural já re-alizada no município de Monte Alegre.

Um ciclo de debates na biblioteca da Escola Esta-dual Tecnológica do Pará com alunos, professores e comunidade em geral, complementou a progra-mação. Na ocasião, houve palestra da arqueóloga Edithe Pereira, que há mais de 20 anos estuda a região e já elaborou diver-sos projetos e publicações científicas com diferentes abordagens sobre os sí-tios, incluindo a preocu-pação com o vandalismo na arte rupestre e o turis-mo nesses locais, e cujas informações técnicas ser-viram de base para a cria-ção do Parque Estadual Monte Alegre, unidade de conservação onde se loca-liza a maioria dos sítios já catalogados.

Em 2009 e 2010, a con-vite do Instituto do Patri-mônio Histórico e Artísti-co Nacional (Iphan), a pes-quisadora integrou uma equipe multidisciplinar – parceria entre Goeldi, Universidade Federal do Pará (UFPA) e Secretaria de Estado de Meio Am-biente (Sema) – no projeto “Socialização dos sítios arqueológicos da Ama-zônia”, que teve como produto principal outro projeto, de construção de um centro de visitantes no PEMA. “O objetivo é permitir que os sítios ar-queológicos tenham con-dições para receber o tu-rista, com infraestrutura para que ele os visite com segurança, e segurança para os próprios sítios”, diz Edithe Pereira.

Um dos projetos em andamento é “A ocupação pré-colonial de Monte Ale-gre”, aprovado pelo CNPq para os próximos dois anos, que conta com uma equipe interdisciplinar para investigar detalha-damente a ocupação hu-mana na região. Durante o debate, a arqueóloga do Museu Goeldi também anunciou a aprovação, pelos Correios, de uma sé-rie de selos sobre arte ru-pestre na Amazônia, com lançamento para 2013.

A proposta do projeto

“Arte Rupestre de Monte Alegre – difusão e memó-ria do patrimônio arque-ológico”, do Museu Para-ense Emílio Goeldi e da Sociedade de Arqueologia Brasileira, é aproximar a população de Monte Ale-gre (PA) de suas riquezas arqueológicas. Em espe-cial as pinturas e gravu-ras registradas em rochas pelo homem pré-histórico no município.

O projeto Arte Rupestre de Monte Alegre recorre à arte e também à educação para sensibilizar a popu-lação local. O curso de “Mediadores culturais” foi ministrado a 16 estu-dantes da rede pública municipal, selecionados para informar o público visitante da exposição “Visões”. Além de agregar conhecimento científico, um dos focos do curso foi provocar nos alunos uma reflexão sobre como se aproximar do público e fazer com que ele se ques-tione por que não deve depredar o patrimônio. Durante o ciclo de deba-tes, a equipe do Museu Goeldi homenageou o se-nhor Humberto Brito de Assunção, morador da co-munidade de Ererê – área localizada no entorno do Parque Estadual de Mon-te Alegre (Pema) –, que acompanhou as visitas da arqueóloga Edithe Pereira desde o início, em 1989. Nomeado “Guardião das Serras” por ato munici-

pal, “seu” Humberto teve participação fundamen-tal nas pesquisas enquan-to conhecedor e guia do local.

Estudantes do ensino médio participaram da oficina “Olhar, perceber, conservar”, ministrada por Mario Baratta na Es-cola Imaculada Concei-ção. Com duração de oito horas, a oficina teve uma abordagem de experi-mentação criativa, com o objetivo de sensibilizar o olhar dos participantes. Assim como os ances-trais, os jovens começa-ram fazendo a própria tinta e desenhando com os dedos e, em um segun-do momento, passaram aos pincéis e à aquarela. Durante os exercícios, os alunos interferiram nos trabalhos dos demais co-legas. Todos os trabalhos foram transformados em cadernos posteriormen-te. Na etapa seguinte, os participantes foram às ruas com o objetivo de olhar a cidade e escolher elementos significativos para inserir nos cader-nos. Além dos produtos do projeto “Arte Rupestre de Monte Alegre – difusão e memória do patrimônio arqueológico”, do ciclo de debates e da oficina, o grupo participou de um bate-papo ao vivo na Rá-dio Comunitária Gurupa-tuba em um programa es-pecial com duas horas de duração. Arqueólogos e

antropólogos da Universi-dade Federal do Oeste do Pará (UFOPA) e da Univer-sidade de São Paulo (USP), que acompanhavam o lançamento do projeto, além da equipe do Museu Emílio Goeldi, participa-ram de uma visita guiada pela pesquisadora Edithe Pereira a alguns dos sítios com pintura rupestre lo-calizados nas Serras do Ererê e do Paituna, no Parque Estadual Monte Alegre.

Segundo Edithe, a cria-ção do parque em novem-bro de 2001, como uma unidade de conservação integral, não basta para preservar essa herança. “São necessárias estru-turas para viabilizar o funcionamento do par-que, de modo a garantir a proteção do patrimônio arqueológico”, adverte. A preservação tem estado em xeque nos últimos anos, em função da dinâ-mica da natureza, como os efeitos do sol, do vento e da chuva, e, principal-mente, da ação humana, que destrói os registros ancestrais por meio da pichação.

Vinte sítios com pin-turas rupestres já estão identificados na região, além de paredão com vá-rias gravuras, submersas na maior parte do ano pe-lo rio Maicuru.

(Com informações da Agência Museu Goeldi)

O aquarelista Mário Barata e o escritor Juraci Siqueira, em ação junto à comunidade.

Todos puderam tirar dúvidas quanto ao significado e a importância da arte rupestre.

O Projeto “A cidade e o rio na Amazônia: mudanças e permanências face às trans-formações sub-regionais”, coordenado

pelo professor Saint-Clair Trindade Jr., do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da Universidade Federal do Pará (NAEA/UFPA), estuda os espa-ços urbanos de Santarém, Marabá e Cametá e sua interação com os rios Tapajós, Itacaiúnas e Tocantins, respectivamente. A pesquisa é volta-da aos espaços denominados de “orlas fluviais”, “beiras” ou “frentes das cidades”, tidos como es-paços representativos das cidades ribeirinhas. E atribui diferença entre as “cidades beira-rio” e as “cidades ribeirinhas”. “Para além da localização, as cidades ribeirinhas também trazem consigo um conteúdo de fortes e múltiplas interações de sua população residente com o elemento hídrico que lhe está próximo. Nesse sentido, toda cidade ribeirinha é uma cidade beira-rio, mas nem toda cidade beira-rio é, necessariamente, ribeirinha”, resume o professor Saint-Clair Trindade Jr..

universo etnográficoO Centro Nacional de Folclore e Cultura Popu-lar, ligado ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), e o Programa de Extensão Patrimônio Cultural na Amazônia, da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), realizam a Mostra Etnodoc, de documentários etnográficos sobre patrimônio cultural imaterial, até 11 de janeiro, na Sala de Exibição do SESC/Santarém (Rua Floriano Peixoto, 535, Centro), das 17:30 às 20h. Serão exibidos os documentários “Memórias Cabanas”, de Clodoaldo Corrêa, feito com base em relatos de indígenas, quilombolas e ribeirinhos da região do baixo rio Tapajós; e “O Barco do Mestre”, de Gavin Andrews, que trata do universo ribeirinho dos fazedores de barcos na foz do rio Amazonas.

Alternativa para o JuáO Ministério Público Federal encomendou à UFOPA estudo de impacto socioambiental em relação ao empreendimento Buriti Imóveis, que devastou a área no entorno do Lago do Juá, entre a Rodovia Fernando Guilhon e a margem do rio Tapajós, contígua ao aeroporto de Santarém. A universidade propõe que a área seja recuperada, sob sua orientação, e destinada à implantação de um Jardim Botânico representativo da flora regional. A retirada, de forma rasa, da vegetação original, sem a manutenção de qualquer exem-plar, fere frontalmente a legislação e levanta a pos-sibilidade de esterilização do solo com o risco de assoreamento do Lago do Juá, visto que iniciado o período chuvoso, alerta o documento. O Grupo de Trabalho tem 45 dias, a contar da data de 19 de dezembro, para entregar o estudo.

corda bambaO ministro dos Portos, Leônidas Cristino, e o seu antecessor e presidente da Antaq, Pedro Brito, ambos da quota do PSB no governo federal, estão envolvidos na operação Porto Seguro, da Polícia Federal. E só não caíram ainda porque a presidenta da República, Dilma Rousseff, alinhava com cuidado a reforma ministerial, para evitar a candidatura do governador de Pernambuco, Eduardo Campos(PSB), em 2014. No Pará, a CDP está engessada por causa da briga intestina entre seus três diretores. No fim do ano passado, o pre-sidente da estatal causou rebuliço ao trocar sem dar bola para a diretoria os gerentes dos portos de Santarém e Vila do Conde.

consorciamento das culturasSessenta famílias de 40 comunidades de Oriximi-ná receberam mais de uma tonelada de sementes de milho, doadas pela Secretaria Estadual de Agricultura, por meio do Programa de Fomento à Produção de Alimentos Básicos. Cada agricultor recebeu, nos dias 3 e 4 de janeiro, uma saca de 20 quilos da variedade Al Bandeirante. Em 90 dias eles podem colher o milho verde e em 120 dias o milho fica seco. A partir de abril os produtores oriximinaenses se preparam para plantar feijão. As sementes são compradas a R$ 10 o quilo. Levantamento feito pela Empresa de Assistên-cia Técnica e Extensão Rural do Estado do Pará (Emater) sinaliza a viabilidade de implantar em Oriximiná o sistema bragantino de plantio de consorciamento das culturas de milho, feijão e mandioca, a fim de potencializar a produção de alimentos básicos na região.

fotos Jussara Kishi

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4 l JANEIRO - 2013 ATUALIDADES

o universo ribeirinho e a saga da jutaO lançamento de “Sementes do Sol”, o mais re-

cente livro do escritor obidense Ademar Ayres do Amaral, atraiu ao terrace da Assembleia Paraense, em Belém do Pará, cerca de 200 pessoas que fizeram questão de entrar na fila para cumprimentar o autor e ganhar seu autógrafo.

Ademar Amaral fez menção especial às pes-soas que o ajudaram nas pesquisas para escrever a obra, cuja capa foi ide-alizada por Carlos Antô-nio Silva (in memorian) e, emocionado, recebeu das mãos de Augusto Silva um quadro de sua antiga casa, no Paraná de Dona Rosa, lugar de sua infância.

“Semente do Sol” é um romance que resgata a vi-da ribeirinha e a saga dos koutakuseis, os japoneses pioneiros no cultivo da ju-ta na Amazônia.

“A narrativa faz jus-tiça a um punhado de pioneiros japoneses que superando as adversida-des da floresta densa e por vezes impenetrável, dedicaram-se de corpo e alma a um projeto de vida onde não havia lugar para o meio termo. Ou seriam bem sucedidos, ou a saga do plantio, colheita, lava-gem, secagem e venda da fibra para as usinas de beneficiamento, a preços aviltados, eternizariam no nascedouro suas aspi-rações de prosperidade”, descreveu o advogado e acadêmico do Instituto Histórico e Geográfico do Pará e da Academia Artís-tica e Literária de Óbidos, Célio Simões.

No prefácio, o roman-cista e poeta Roberto Car-valho de Faro, membro da Academia Paraense de Letras, assim se expressa:

“A Amazônia é isto: indecifrável, esmagadora, misteriosa. Essa percep-ção vem dos primeiros desbravadores e continua assim, desafiando inteli-gências de todas as épo-cas. De aparência pacífica, submissa, é indomável, vingativa, ao ser agredi-da. Poderá ser totalmente devastada, mas nunca es-cravizada, domesticada. Parece que não foi conce-bida para projetos faraô-nicos, ainda que suas di-mensões descomunais e potencialidades infinitas possam conduzir a essa enganosa conclusão. Os malogros vários já prova-ram isso. Na contramão de sua imensidade, pu-jança e aparentes possibi-lidades, só se permite do-ar parcimoniosamente. É como se quisesse mostrar que só é magnânima para a subsistência dos seus fi-lhos. Acima disso, reage. É a mãe que não tolera des-perdício. Não se submete à ambição. Parece nos di-zer que é partidária ferre-nha da socialização de su-as imensuráveis riquezas. Só que os aventureiros e piratas, ignorando essa vocação, não comparti-lham desse princípio. En-tão, é a hora do basta. Di-reta ou indiretamente, por inimagináveis caminhos, sufoca o que lhe parece afronta ou agressão. Fra-cassaram os grandiosos projetos econômicos. Bor-racha, juta, arroz, exten-

sas rodovias estão nesse rol. Este belo livro de Ade-mar Ayres do Amaral, ainda que em roupagem de ficção, aborda esses malogros, notadamente no capítulo da juta. Ao mesmo tempo em que é um bem urdido romance, é também um documen-

tário histórico da saga dos imigrantes japoneses que, enfrentando adversidades de toda ordem, lograram um ciclo, ainda que efê-mero, de prosperidade com a aclimatação da ju-ta originária do oriente. Com a habilidade de um escritor seguro e bem

informado, associado ao indisfarçável atavismo telúrico de sua origem ri-beirinha, Ademar Amaral oferece ao leitor, não uma desbotada fotografia an-tiga, mas uma sequência viva e vibrante de ins-tantâneos do exuberante Baixo Amazonas, onde

nas suas várzeas, tesos e cidades seus múltiplos personagens de origens tão diversas revelam suas paixões, dando vida à tra-ma de SEMENTES DO SOL. A obra já encanta a partir do título de profundo e singular significado, tão bem ajustado ao elabora-do conteúdo. Dizer mais é desnecessário.”

Ademar Ayres do Amaral é autor de “A En-comenda e o Deputado”, coletânea de contos; e “Ca-talinas e Casarões”, cola-borador do Uruá-Tapera, onde publica deliciosas crônicas, e membro fun-dador da Academia Artís-tica e Literária de Óbidos – AALO. O livro “Sementes do Sol” pode ser encon-trado na banca de revista Yamada Plaza, em Belém.

A Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvi-mento Sustentável da Câ-mara Federal aprovou a criação das Unidades de Preservação do Patrimô-nio Cultural Brasileiro. A medida, que modifica o Estatuto da Cidade (Lei 10.257/01), está prevista no Projeto de Lei 3056/08, do deputado Angelo Va-nhoni (PT-PR).

Pela proposta, as uni-dades terão como objeti-vo reconhecer segmentos da população que, ao lado de portugueses, índios e negros, foram cruciais na formação populacional e territorial, como os imi-grantes europeus e asiá-ticos. Assim, essas unida-des de preservação serão “territórios habitados por povos e comunidades tra-dicionais, participantes do processo civilizatório” do Brasil.

Para constituírem uma unidade de preservação, os povos devem preservar bens de natureza mate-

Criação de Unidades de Preservação do Patrimônio Cultural

rial e imaterial referentes a identidade, ação e me-mória. Poderão ser salva-guardados pelo Estado o modo de vida, expressões orais, manifestações ar-tísticas e culturais, obras, objetos, documentos e

edificações, entre outros.O relator, deputado

Penna (PV-SP), defendeu a aprovação da proposta. Ele lembrou que a Cons-tituição Federal inovou ao reconhecer o princípio da diversidade cultural

como característica mar-cante da nossa sociedade. “A produção material e imaterial dos diferentes grupos precisam ser pre-servadas para permitir, igualmente, a preservação da nossa memória cultu-

ral e nacional”, defendeu.O projeto, que tramita

em caráter conclusivo, se-rá analisado pelas comis-sões de Direitos Humanos e Minorias; de Educação e Cultura; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Luta marajoara: expressão cultural que vem sendo resgatada também em eventos que remetem ao esporte e lazer.

Quilombola e a religiosidade

das comunidades

interioranas

Ademar Ayres do Amaral, em sua prestigiada noite de autógrafos: terceira obra confirma sua vocação literária.

Digno de registro o interesse que a obra despertou na comunidade acadêmica.

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5JANEIRO - 2013 lREGIONAL

Calha Norte exige linhão energéticoRecentemente, a Mineração Rio do Norte expôs

em audiência pública projeto que prevê a constru-ção de subestações e de uma Linha de Transmissão em tensão de 230 mil volts para interligar a MRN ao Sistema Nacional de Energia.

A linha de transmissão Oriximiná – Mineração Rio do Norte deverá ser construída totalmente no município de Oriximi-ná e terá uma extensão aproximada de 98 Km. Trata-se de investimento com o propósito de obter vantagem competitiva no mercado em que atua. Com energia de UHE, a mineradora economiza-rá 1 dólar por tonelada de bauxita produzida, e poderá explorar outros platôs dentro do municí-pio, dilatando em mais 20 anos o tempo de lavra.

Na ocasião, o recém eleito vereador Francisco Florenzano(PSDB) foi por-ta-voz de uma proposta da sociedade oriximina-ense no sentido de que a MRN aproveite a execu-ção do seu projeto para uso no distrito industrial de Porto Trombetas e con-tribua com o desenvolvi-mento do município em que retira a sua riqueza, financiando a Celpa, que, obviamente, não dispõe dos recursos para os in-vestimentos necessários em toda a Calha Norte, para o imediato rebaixa-mento da rede energéti-ca em Oriximiná, o que alavancaria o comércio e permitiria o nascimento da indústria local, viabi-lizando o beneficiamento da produção primária dos setores agrícola, pecuário, extrativo e florestal e a economia regional como um todo, cujo desenvol-vimento, sem a energia elétrica de Tucuruí, conti-nuará a ser adiado.

Mas a mineradora des-conversou. Disse que não pode fazer o papel da concessionária, de distri-buir energia, o que, ab-solutamente, é o propósi-to, e sim uma espécie de adiantamento à sociedade oriximinaense, que mere-ce ser contemplada com um gesto de boa vontade e parceria da empresa que há mais de três dé-cadas retira lucros astro-nômicos de seu subsolo. A população, contudo, não vai esmorecer e cha-mará a Equatorial, que comprou a Celpa, a Eletro-norte, a ANEEL, e outras estatais ligadas ao setor

para buscar os canais de negociação, robustecer e viabilizar a questão. Pre-feitos, vereadores, líderes municipais da sociedade civil dos municípios da re-gião estão se mobilizando nesse sentido.

A construção do linhão de transmissão de energia de Tucuruí atravessando a Calha Norte até o Amazo-nas e o Amapá é um plei-to muito antigo da região. Até hoje, os municípios da área são supridos por usinas termelétricas, in-suficientes para o atendi-mento da necessidade de crescimento, além dessas usinas não serem ambien-talmente recomendáveis.

O rebaixamento da tensão elétrica do linhão para menos de 230 quilo-volts é uma obrigação da concessionária. O proje-to da Eletronorte prevê a construção de apenas du-as subestações de rebai-xamento em toda a Calha Norte paraense: na ilha Jurupari, em Almeirim, e na cidade de Oriximi-ná. O trecho entre esses dois extremos, que passa pelos demais municípios paraenses, segue com ten-são de 500kv, sem poder atender às demandas de consumo residencial, co-mercial e industrial. Essa é a discussão central.

Enquanto a Eletronor-te não constrói as subes-tações de rebaixamento e Celpa está atolada em dívida, sem crédito para novos financiamentos e sem poder assumir a obra, os municípios de Prainha, Monte Alegre, Alenquer, Curuá, Óbidos, Oriximiná, Terra Santa e Faro ficam literalmente a ver navios.

A estatal Empresa de Pesquisa Energética (EPE), anunciara que todo o Norte do Brasil, inclusive a região da Calha Norte do rio Amazonas, esta-ria integrado ao sistema nacional de energia elé-trica a partir de maio de 2013. O projeto inicial da Eletrobras/Eletronorte, orçado em mais de R$ 3 bilhões, previa a inaugu-ração da obra em agosto do ano passado, o que não aconteceu. O linhão leva-ria energia da hidrelétrica

de Tucuruí aos estados do Amapá e Amazonas e também aos municípios paraenses localizados na margem esquerda do rio Amazonas, na região oes-te, totalizando 1.800 qui-lômetros de extensão.

Agora a nova previsão aponta só em 2017 a con-clusão da obra, inclusive com o rebaixamento da tensão elétrica do linhão, adaptando-a para os con-sumos residencial, comer-cial e industrial.

Mas o projeto oficial do linhão prevê a construção de apenas duas subesta-ções de rebaixamento da tensão na região da Calha Norte: na ilha Jurupari, município de Almeirim – de 500kv (quilovolts) para 230kv – e na cidade de Oriximiná – de 500 kv para 138kv.

Acontece que, entre Ju-rupari e Oriximiná, o li-nhão vai passar sobre os municípios de Prainha, Monte Alegre, Alenquer, Curuá e Óbidos, com ten-são de 500kv, sem rebai-xamento e sem atender às demandas dos consumido-res locais. Também não há

previsão para essa energia chegar aos municípios de Terra Santa e Faro, no ex-tremo oeste paraense.

Altino Ventura Filho, secretário nacional de Planejamento e Desenvol-vimento do Ministério das Minas e Energia, garantiu que a EPE já está elabo-rando o projeto comple-mentar para o rebaixa-mento da tensão elétrica do linhão de 500kv para 230kv na Calha Norte. Os recursos, em valor ainda não definido, viriam da Reserva Global de Rever-são, um fundo financeiro constituído por 1,5% das faturas de energia elétrica de consumidores do sis-tema integrado nacional – algo em torno de R$ 1 bilhão ao ano.

Cabe à Eletronorte o rebaixamento da tensão até 230kv. Abaixo disso, a responsabilidade é das concessionárias. Ou seja, a Celpa, que está atolada em dívidas que somam mais de R$ 2 bilhões e, em fevereiro passado, en-trou em processo de recu-peração judicial.

O projeto para constru-

ção de l.811 quilômetros de linha de transmissão, estendendo a energia pro-duzida na usina de Tucu-ruí até Manaus, no Ama-zonas, com ramificação até o Amapá, integrada por sete subestações, é o sonho de todos os mu-nicípios localizados na margem esquerda do rio Amazonas, no Pará. A obra será preparada de modo a receber também energia gerada pela usina de Belo Monte. As torres para sustentar o linhão têm cerca de 300 metros, o equivalente à altura da torre Eiffel, em Paris. O empreendimento está or-çado em R$3,7 bilhões e o processo licitatório foi dividido em três lotes.

Para vencer obstáculos naturais, como os campos de várzea e rios, que serão atravessados, a obra de-manda utilização de heli-cópteros e

pontes provisórias para transportar homens, ma-terial e equipamento. A necessidade de construir torres tão altas é para não prejudicar a navegação nos pontos de travessia e

também não tocar nas co-pas das imensas árvores da região, principalmen-te entre os rios Uatemã e Nhamundá.

Os efeitos perversos da insuficiência do abasteci-mento de energia elétrica impedem há décadas o comércio, a indústria e os serviços de prosperar. To-dos os municípios da Ca-lha Norte são servidos por usinas movidas a óleo die-sel, caras e ineficientes.

Com a entrada em ope-ração do linhão, a expec-tativa é de que haja redu-ção da Conta de Consumo de Combustíveis e, con-sequentemente, baratea-mento ao consumidor, ge-rando economia anual de R$2 bilhões e redução na emissão de gás carbônico.

O linhão vai atravessar cinco rios, dois incluídos no lote A e três no lote C. As maiores travessias são as do rio Amazonas, em dois pontos, com ex-tensão de 2.045 metros e 1.600 metros, respectiva-mente. A adoção de cabos submarinos foi descarta-da, por ser mais cara. Por causa das áreas alagadas, na várzea, vai ser preciso fazer fundações maiores. Serão sete trechos: Tucu-ruí - Xingu

(PA, 264 quilômetros); Xingu - Jurupari (PA/AM, 257 quilômetros); Laranjal - Macapá (AP, 244 quilô-metros); Jurupari - Laran-jal (PA/

AP, 95 quilômetros); Jurupari - Oriximiná (PA/AM, 370 quilômetros); Ita-coatiara – Cariri (AM, 211 quilômetros); e Oriximi-ná - Itacoatiara (AM, 370 quilômetros).

Enquanto continuarem a ser abastecidos precariamente por usinas termelétricas a óleo diesel, os municípios não têm como desenvolver a pecuária e a agricultura de modo organizado

Não adianta aprender a criar peixe em cativeiro se não há energia para uma mera fabriqueta de filetamento.

Comunidades permanecem paradas no tempo, em suas casas de farinha rudimentares.

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6 l JANEIRO - 2013 CULTURA

AdemAr AYres do [email protected]

Célio Simõ[email protected]

Ao fim do atual perí-odo legislativo, a Câma-ra Municipal de Santa-rém aprovou e a prefeita Maria do Carmo Mar-tins sancionou a Lei n.º 19.132, de 28.11.2012, denominando de Rua Wilson Dias da Fonseca (Maestro Isoca) a atual Floriano Peixoto - o se-gundo presidente brasi-leiro da era republicana.

Com apenas três artigos, a norma legal materializa um ato de extrema justiça e gran-de reconhecimento ao ilustre personagem que dedicou sua longa e pro-fícua existência ao de-senvolvimento cultural dos santarenos, seja na música ou na literatura.

Tive o privilegio de trabalhar com o maes-tro durante dois anos (1970/1971) na mesma instituição financeira pública federal aonde éramos funcionários. Eu havia chegado de Marabá e não conhecia ninguém no meu novo ambiente de trabalho. Apresentei-me ao geren-te, ao subgerente e tomei assento no lugar que me foi reservado, tendo como chefe imediato

Wilde Dias da Fonseca, o Dororó, maestro, com-positor, escritor e irmão do homenageado. No intervalo do lanche, al-guém me segredou que o relacionamento entre todos, independente de hierarquia, era muito descontraído; porém me fez uma confidência: - É proibido contar piada cabeluda ou chamar pa-lavrão na “Torre”.

Não entendi pata-vina. Primeiro, porque sempre fui um péssimo contador de piadas e por isso as evito, preferindo deixar esse encargo para os mais espirituosos. Palavrão só um que ou-tro, para diluir a raiva. Finalmente, eu não sabia o que erra “Torre”. Mi-guel Augusto Fonseca de Campos, uma das mais fulgurantes inteligências que conheço, condoído da minha ignorância, deu-me os indispensá-veis esclarecimentos. Piadas e palavrões não eram do agrado do ma-estro Isoca, um homem de profunda religiosida-de. E a tal “Torre” era o local onde ele laborava no estabelecimento, de onde partiam todas as

Desde estudante se-cundarista, já lá se vão tantos anos, que eu ou-via falar, mas sempre passei ao largo de O Apanhador no Campo de Centeio (The Ca-tcher in The Rye, no original), obra cult e clássica do autor ame-ricano Jerome David Salinger(J. D. Salinger). Nunca me interessei ou tive curiosidade de ler o livro e nem sei explicar o porquê de eu achar que não ele passava de um daqueles romances açucarados que can-tam a vida lúdica e as vantagens da convivên-cia no campo. Talvez pelo centeio do título? Quanta estupidez.

Lembro que conti-nuei ignorando solene-mente o livro de Salin-ger mesmo depois do dia 08 de dezembro de 1980, ao tomar conhe-cimento do assassinato de John Lennon, no momento em que ele voltava para casa, ao lado de Yoko, após um dia estafante de gra-vação. Lendo a terrível notícia nos jornais da manhã seguinte e não vendo nenhuma lógi-ca para tragédia que acabara de acontecer, também não perce-bi e acho que quase ninguém percebeu um curioso detalhe do abo-minável crime: poucas horas antes de matá-lo

RUA MAESTRO ISOCA

diretrizes e interpreta-ções das instruções cir-culares da Direção Geral em Brasília, posto que o próprio gerente, desco-nhecendo no mais das vezes seu significado, com ele aconselhava-se no sentido de sua cor-reta aplicabilidade na prática.

Aos poucos fui con-quistando a confiança daquele homem admi-rável, de fala mansa e personalidade ímpar, apesar dos arroubos da juventude (eu tinha ape-nas 22 anos). Tornamo--nos amigos e dele ouvi muitas histórias sobre a “Pérola do Tapajós”, fa-miliarizando-me definiti-vamente não apenas com sua evolução política, como pelos seus encan-tos naturais a partir de incursões ao seu entor-no, como Alter do Chão (a mais bela praia fluvial do mundo, segundo o inglês The Guardian), os lagos Verde, Umaicá e Juá, o igarapé do Irurá, a foz do Rio Arapiuns e as encantadas praias de alvas areias do Rio Tapajós, cartões postais que rezo secretamente não venham um dia ser destruídos pela insensi-bilidade da usura e da desvairada especulação imobiliária.

Certo dia o maes-tro convidou-me para integrar a equipe de redatores de um jornal bimensal, noticioso e recreativo, elaborado para o incremento cul-tural dos seus muitos leitores. Além dele, o grupo era formado por Waldir Macieira da Cos-

ta, José Agostinho e José Wilson Fonseca (filhos do maestro) e Luís Maia, excelente cartunista. Por mais de um ano reunía-mos no último sábado do segundo mês para preparar o tablóide no velho mimeógrafo que nos foi cedido, uma fase um pouco mais adian-tada em relação àquela que os velhos jornalis-tas chamam de “era do chumbão”. A Santarém de então não dispunha de cursos superiores ou de um único jornal im-presso, após o desapare-cimento do periódico do seu Arbelo. De tudo que conseguimos produzir guardo apenas o n.º 21, de Março/Abril/1970, tendo algumas das nos-sas matérias assinadas com pseudônimos (Nu-randalugraburabara, Waires, Curicão, etc.).

Tendo estreitado a amizade pela feitura do jornal e pelo convívio no labor diário, sabendo-o um consagrado maestro e compositor, comecei a sonhar mais alto. Meti na cabeça a idéia de fazermos uma parceria musical, com poema meu e musica dele, que seria para mim o pódio de um talento que eu nunca tive. Dei voltas e voltas na memória e nada. O mestre orien-tou-me sobre as rimas toantes ou soantes e so-bre a métrica. Que coisa difícil... Mas um dia, os versos surgiram assim, do nada! Marcamos para um fim de semana e ele me recebeu em sua casa, justificando-se previa-mente porque estava “à

vontade”. Permitira-se usar naquele sábado, em pleno recesso do lar, sapato de couro, calça de linho engomada e camisa social de manga comprida – só faltava mesmo a gravata... Sen-tamo-nos lado a lado, leu o texto, dedilhou o piano, alterou coisinha pouca a letra, substituiu palavras, cantou baixi-nho e fez anotações para mim ininteligíveis, tipo chá preto espalhado no papel. Ao fim, a música fluiu com exuberância e ganhei de presente o rascunho da partitura.

A vida segue seu ritmo. Por pouco não esqueci nossa compo-sição, tantas foram as vicissitudes que eu iria enfrentar. Ralando para sustentar mulher e três filhos pequenos, por um tempo ficou em pla-no inferior alguns dos valores espirituais que hoje plenamente des-fruto, como a música, a poesia, o teatro e o jornalismo, capazes de tornar menos áridos os deveres de quem tem por profissão a advoca-cia. Intermediário entre o homem comum e o magistrado, o advogado mais e melhor percebe a angústia do litigante, a angústia do ser humano, e com ela também sofre. É de sua responsabilida-de aconselhar ou desa-conselhar condutas, em intenso assessoramento a empresas ou pessoas e defender seus atos no pleito judiciário. Daí a necessidade de usufruir de amenidades que pos-sam de alguma forma,

equilibrar os pratos da balança.

O maestro se foi. Nes-te novembro de 2012 completaria fecundos cem anos, se vivo esti-vesse. Da canção pacien-temente bolada por ele para satisfazer minha estréia no universo das composições musicais nasceu a atual parceria que tenho com o Desem-bargador Federal Vicen-te Fonseca, magistrado da Justiça do Trabalho, professor universitário, músico, compositor e o maior divulgador da obra do pai, o maestro Isoca. Não só Santarém, mas todo o Estado do Pará quedou-se em jus-tíssimas homenagens a um dos seus mais emi-nentes filhos, imortal da Academia Paraense de Letras que legou para a posteridade a coleção do “Meu Baú Mocorongo”, obra de vulto contendo suas anotações, observa-ções pessoais e acuradas pesquisas históricas.

A cidade que tanto amou já lhe rendera significativa homena-gem ao denominar de “Maestro Wilson Fon-seca”, seu aeroporto. Ao nomear uma rua do centro urbano com o seu patronímico, a Pre-feita Maria do Carmo repercute o desejo dos santarenos ao acatar o que decidiu a Câmara, e demonstra que os car-gos públicos existem primordialmente para benefício do povo e só acessoriamente para satisfazer os interesses pessoais dos que foram eleitos para ocupá-los.

na entrada do Edifício Dakota, Mark Chapman tinha pedido a Lennon que lhe autografasse O Apanhador no Campo de Centeio e, quando foi preso, carregava o exemplar do livro de-baixo do braço.

Logo em seguida, em 1981, um outro maluco, John Hinckley Jr., atentou contra a vida do Ronald Reagan e também declarou ter se inspirado no mesmo livro de Salinger para dar sua saraivada de tiros, que por pouco não tiraram a vida do presidente americano. Naquela época, impres-sionado com o tanto de mistério que cercava a obra desse autor, percorri as principais livrarias de Belém, mas não encontrei um úni-co volume para com-prar. O livro foi lançado nos Estados Unidos em 1951 e depois da edição em português, acho que as editoras brasileiras perderam o interesse nele por um tempo.

Os anos correram e eu também deixei de

pensar no Apanhador no Campo de Centeio até janeiro de 2010, quando li, na revista Veja, uma destacada matéria sobre a vida e a obra de J. D. Salinger. Ele acabara de falecer aos 91 anos de idade, depois de ter passado quarenta anos recluso em sua fazenda, de se recusar dar qualquer tipo de entrevista ou de se deixar fotografar nesse período. Cor-ri para a livraria e a resposta foi esta: não temos, tente comprar pela internet. Aí foi viagem quase toda se-mana e acabei tomando meu tempo com outras coisas até abril des-te ano, quando meus filhos me deram um IPAD de aniversário.

Avesso à novidade (pra mim, que fique cla-ro), menos de um mês depois já estava apai-xonado por todas as praticidades que o tal aparelhinho do recém--finado Steve Job vem me proporcionando. Na empresa onde trabalho, um desses entendidos no assunto inseriu uns

cem livros na biblioteca do meu IPAD e agora eu carrego esse tesouro a todos os lugares sem me pesar mais do que umas poucas gramas. Pois acreditem, na pri-meira passada nos li-vros, minha vista bateu direto no Apanhador no Campo de Centeio. O texto é fantástico. Li suas 300 páginas den-tro de um avião e sem ver o tempo passar, numa viagem de ida e volta a Belo Horizonte. A estória em si chega a ser até meio boba, mas não o cenário da década de 1950 nem os fatores de época que a cercam: conta as peripécias de um rico e revoltado jo-vem de 17 anos, Holden Caulfield, que, expulso de mais um colégio de alto nível, resolve embromar o fim de se-mana por hotéis e ruas de Nova York, onde morava, enquanto não enfrenta a autoridade do pai austero.

O Apanhador é todo narrado na primeira pessoa, mas J. D. Sa-linger já tinha 32 anos quando o escreveu.

Na verdade, o livro foi uma revolução, tanto de linguagem como no modo de dar voz a uma juventude que não tinha voz e nem vez. Daí os jovens terem se identificado com toda a revolta e com as ver-dades ditas de forma bruta, como se, final-mente, o personagem Caulfield falasse para os adultos tudo aqui-lo que eles tentavam dizer sem serem ouvi-dos. O livro vendeu 60 milhões de exemplares e continua vendendo 250 mil exemplares por ano só nos Estados Unidos. Transformou o recluso Salinger num milionário excêntrico e mexeu excessivamente com a cabeça de alguns jovens de pouca cabeça que, num ato de total insensatez, resolve-ram passar da teoria à prática. No meu caso, quero deixar bem cla-ro que terminei o livro em estado de êxtase pelo estilo do texto, mas, pelo menos por enquanto, ainda não senti vontade de matar ninguém.

ENCONTRO COM SALINGER

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7JANEIRO - 2013 lVARIEDADES

Frente Parlamentar discute mineraçãoOs temas nacionais e seus reflexos nos Estados

mineradores, em especial a CFEM (Compensação Financeira pela Exploração Mineral) e as hidrovias Araguaia/Tocantins/Rio das Mortes e Tapajós/Teles Pires/Juruena serão debatidos em sessão especial da Assembleia Legislativa, promovida pela Frente

nicípios e Estados mine-radores podem fortalecer o movimento para uma tributação mais justa da mineração no Brasil, de modo a evitar a manipu-lação de preços, além de outras questões igual-mente importantes, como o novo marco regulatório da mineração. A alíquota da CFEM para o minério de ferro é de 2%, muito aquém do que tributam a Índia (10%), Austrália (7,5%) e Rússia (4,8%), e cuja alteração está sendo

trabalhada no Congresso Nacional, inclusive com projeto de autoria do se-nador paraense Fernando Flexa Ribeiro.

“Almejamos todos um novo ciclo de desenvol-vimento com as novas regras propostas para o setor mineral, pugnando por justiça social e pre-servação ambiental nos municípios mineradores, investimentos na forma-ção de mão de obra local e verticalização da pro-dução mineral paraense.

Nesse sentido, é funda-mental a troca de expe-riências com os demais Estados brasileiros que vivenciam a exploração mineral, e que a Frente Parlamentar de Apoio ao Desenvolvimento Susten-tável da Mineração ouça as demandas municipais paraenses, servindo de canal junto ao governo do Estado e empresas mi-neradoras, no sentido de tentar conciliar os plei-tos com as possibilida-des”, assevera Raimundo

Santos.Todos os prefeitos e ve-

readores dos municípios mineradores do Pará, a bancada federal de depu-tados e senadores do Pará, Instituto Brasileiro de Mi-neração - Ibram; Sindicato das Empresas de Minera-ção do Pará - Simineral, Federação das Indústrias do Estado do Pará- Fiepa, FAMPEp - Federação das Associações dos Municí-pios do Pará, Serviço de Apoio às Micro e Peque-nas Empresas - Sebrae/PA, Associação Comercial do Pará, Conjove, Sindicato das Empresas de Navega-ção Fluvial e Lacustre do Pará – Sindarpa; Socieda-de Amigos da Marinha – Soamar/PA, AMAT, AMU-CAN, UFPA, Adminis-tração das Hidrovias da Amazônia Oriental – AHI-MOR, Companhia Docas do Pará, DNPM, DNIT, Mi-nistérios dos Transportes e do Planejamento, e Casa Civil da Presidência da Re-pública serão convidados para a sessão especial.

Parlamentar de Apoio ao Desenvolvimento Susten-tável da Mineração no Pa-rá, com a participação dos governos estadual e fede-ral, entidades da socieda-de civil, iniciativa privada, entidades municipalistas, municípios mineradores e de todas as Assembleias Legislativas do Brasil. Além da troca das expe-riências, a reunião poderá firmar uma grande parce-ria para os avanços neces-sários, como por exemplo o novo marco regulatório do setor mineral.

No Pará, estão prome-tidos investimentos da ordem de US$41 bilhões (mais de R$82 bilhões) pelas gigantes da mine-ração, até 2016. Mas a maior parte desses recur-sos – cerca de 26 bilhões de dólares - será aplicada na extração de minério, e menos da metade (US$ 11 bilhões) na indústria de transformação, US$ 2,7 bilhões em infraestrutu-ra e transporte e US$ 505 milhões em outros negó-cios. A intenção da Frente Parlamentar é de atuar de maneira a evitar que seja perpetuada a histórica si-tuação de exportação de matéria prima sem con-trapartida na verticaliza-ção da produção e qualifi-cação da mão de obra.

De caráter supraparti-dário, a Frente Parlamen-tar de Apoio ao Desen-volvimento Sustentável da Mineração no Pará é integrada por todos os 41 deputados com assento na Alepa e presidida pelo deputado Raimundo San-tos, líder do PEN. A vice--presidente é a deputada Bernadete ten Caten (PT) e o relator o deputado Ga-briel Guerreiro (PV).

As hidrovias Araguaia/Tocantins/Rio das Mortes e Tapajós/Teles Pires/Juruena, canais naturais de escoamento direto das riquezas do agronegócio e dos minérios de cinco Estados brasileiros - Mato Grosso, Goiás, Tocantins, Maranhão e Pará – pode se tornar a espinha dorsal norte-sul do Brasil, um imenso corredor de de-senvolvimento nacional, face as inúmeras poten-cialidades, propiciando oferta de transporte de baixo custo, com reduzi-do consumo energético e ecologicamente viável, além de gerar novas opor-tunidades de negócios, emprego e renda. Mas até hoje os afloramentos ro-chosos nos rios Tocantins e Araguaia, além dos tre-chos encachoeirados dos rios Tapajós e Teles Pires, são obstáculos à navega-ção e, em consequência, ao aproveitamento econô-mico que permita a com-petitividade dos produtos nacionais no mercado internacional.

A CFEM tem sua maior parte destinada aos Esta-dos e Municípios minera-dores. Entretanto, segun-do dados do próprio De-partamento Nacional de Pesquisas em Mineração (DNPM), algumas mine-radoras vendem produtos para subsidiárias no Exte-rior com preços menores em relação ao que é pra-ticado no mercado. Com isso, reduzem também repasse em CFEM, já que o valor é calculado em cima do faturamento dessas empresas.

O presidente da Frente Parlamentar, deputado Raimundo Santos, acre-dita que, juntos, os mu-

A antiga cava do garimpo de Serra Pelada, hoje alvo de lavra mecanizada por uma empresa canadense em modelo inovador.

Presidente da Alcoa América Latina, Franklin Feder, Celeste Franco e Raimundo Santos

Presidente e vice da Frente, Raimundo Santos e Bernadete ten Caten, deputado Zé Maria e

presidente da Associação Comercial de Marabá, Ítalo Ipojucan, durante visita técnica

Presidente do Simineral, José Fernando Gomes Jr., e presidente da Frente Parlamentar,

deputado Raimundo Santos, com o então presidente da Alepa, Manoel Pioneiro.

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8 l JANEIRO - 2013

atitude combate violência contra mulherCOMPORTAMENTO

Fruto de uma parceria entre o Conselho Nacio-nal de Justiça e a Secretaria de Políticas para as Mu-lheres, a campanha Compromisso e Atitude: A Lei é Mais Forte prevê, já para o início de 2013, agenda cheia de ações para fomentar o combate à violência doméstica no Brasil. Uma delas é incentivar os di-versos tribunais do júri a priorizarem o julgamento dos processos criminais que envolvem assassinatos

muitos magistrados que atuam em causas envol-vendo a violência contra a mulher. Exemplo disso é uma campanha iniciada por Olívia Ribeiro, juíza titular da Vara de Violên-cia Doméstica e Familiar de Rio Branco, no Acre. No ano passado, a magistra-da mapeou as regiões de seu estado com alto índi-ce de agressões. E, a partir daí, planejou uma série de atividades para chamar a atenção para o problema.

A primeira delas foi a realização de uma cicle-ata. Mais de 600 pessoas – entre cidadãos e ma-gistrados – participaram do circuito, que envolveu Tribunal de Justiça, Dele-gacia da Mulher e Gover-no do Estado. Olivia deu sequência ao projeto com visitas a escolas, onde re-

aliza palestras nas quais aborda questões como pa-triarcalismo, machismo e a história dos movimen-tos no Brasil, até a edição da Lei Maria da Penha.

Desde março, a magis-trada foi a 16 escolas. As palestras se destinam aos alunos, mas são abertas à comunidade em geral. A juíza aproveita essas ocasiões para divulgar o concurso que criou de redação e frases contra a violência doméstica. As escolas que participam da iniciativa terão de es-colher os três vencedores e enviar os trabalhos para a magistrada, que os enca-minhará para a Academia Acreana de Letras, que vai selecionar o primeiro, o segundo e o terceiro co-locado das redações e fra-ses. A ideia é premiar os

vencedores do concurso em uma conferência sobre a Lei Maria da Penha que a magistrada pretende orga-nizar até novembro.

Olivia ainda tem ou-tras ideias para dissemi-nar informações sobre a Lei Maria da Penha. Uma delas é criar uma vara da violência doméstica e fa-miliar itinerante. “Temos constatado que há um número significativo de audiências em que as par-tes não têm dinheiro para se deslocar para o fórum. Minha ideia é basear essa vara itinerante em uma escola e proporcionar atendimento pela Defen-soria Pública e por equipe multidisciplinar”, planeja.

Outro exemplo de pro-jeto que visa a prevenir a violência contra a mulher é o Maria Vai à Escola,

criado em 8 de maio de 2012 – Dia Internacional da Mulher – pelo juiz Nel-son Melo, da 1ª Vara Es-pecial da Mulher do Ma-ranhão. A iniciativa con-siste em visitar colégios da rede pública de ensino e realizar palestras para os estudantes sobre a Lei Maria da Penha. Nessas ocasiões, são debatidas questões como igualdade de gênero e respeito às mulheres. De acordo com o juiz, as escolas visita-das geralmente são as das regiões que registram o maior índice de violência contra a mulher. A ideia é que os próprios adoles-centes estimulem a cul-tura da não violência no âmbito familiar e domés-tico e que eles mesmos multipliquem as formas de prevenção.

de mulheres.“Um dos nossos ob-

jetivos é acompanhar o julgamento dos casos de homicídios femininos em curso nos tribunais do júri. A conclusão desses processos é necessária pa-ra fixar, perante a popula-ção, a ideia de que esses crimes terão consequên-cia. Essa é uma forma de coibir a sensação de im-punidade”, explica a juíza Luciane Bortoleto, convo-cada pelo CNJ para auxi-liar no desenvolvimento das ações relacionadas à Lei Maria da Penha.

A campanha Com-promisso e Atitude foi lançada no início de agos-to, em Brasília, para co-memorar os seis anos da Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/2006). Ao longo dos seis últimos meses foi lançada nas cinco regiões do País, nos estados que registraram as maiores taxas de homicídios femi-ninos, segundo o Mapa da Violência, uma pesquisa realizada pelo Instituto Sangari, sob a coordena-ção da SPM.

Segundo o estudo, de 1980 a 2010 aproximada-mente 91 mil mulheres fo-ram assassinadas no Bra-sil, sendo 43,5 apenas na última década. A pesquisa também aponta que 68,8% dos incidentes acontece-

ram na residência, o que leva à conclusão de que é no âmbito doméstico on-de ocorre a maior parte das situações de violên-cia experimentadas pelas mulheres.

O Estado do Espírito Santo lidera o ranking nacional de homicídios femininos, com a taxa de 9,4 assassinatos para cada 100 mil mulheres. O Pará registra taxa de homicídio de 6,0 para cada 100 mil mulheres.

O portal da campanha Compromisso e Atitude (www.compromissoea-titude.org.br), destina-do aos profissionais do Direito, principalmente aqueles que não têm fa-miliaridade com a Lei Ma-ria da Penha, mas que, em algum momento, têm de lidar com ela, reúne notí-cias, informações sobre a legislação referente à vio-lência contra a mulher e jurisprudência.

No âmbito do CNJ, a campanha Compromisso e Atitude e demais ações relacionadas à Lei Maria da Penha são coordena-das pela Comissão de Acesso à Justiça e à Cida-dania. O órgão é presidi-do pelo conselheiro Ney Freitas.

Prevenir tem sido a palavra de ordem para

ViCente mAlheiros dA [email protected]

O GÊNIO, O LIVRO E UMAMISSÃO DE VIDA

O ano de 2012 foi re-pleto de homenagens ao centenário de nascimento do compositor e escritor Wilson Fonseca (Maestro Isoca), desde a escolha de seu nome como patrono da XVI Feira Pan-Amazô-nica do Livro, realizada pelo Governo do Estado do Pará, até o lançamento de meu livro com o tema de sua vida e obra, lança-do em Santarém, em 17 de novembro, justamente na data de seu natalí-cio, no Centro Recreati-vo, e depois em Belém, no Tribunal Regional do Trabalho, durante a ce-rimônia de minha posse

no Instituto Histórico e Geográfico do Pará, em 14 de dezembro, quando fui saudado pelo advogado e parceiro musical Célio Simões, autor da letra do hino do IHGP, com músi-ca de minha autoria.

Em meus discursos de posse naquele Instituto e na Academia Nacional de Direito do Trabalho (para a qual também compus um hino), prestei home-nagem ao maestro cen-tenário. Por coincidência, no IHGP ocupo a Cadeira patrocinada por Domin-gos Rayol (Barão de Gua-jará), que é patrono da Cadeira que foi ocupada

por meu pai na Academia Paraense de Letras.

Em junho, os extra-ordinários concertos da Orquestra Sinfônica do Theatro da Paz, em Belém e em Santarém, sob a re-gência de José Agostinho da Fonseca Júnior, neto de Isoca, com a parti-cipação do Coro Car-los Gomes, promovidos pelo Governo do Estado do Pará, com peças do compositor tapajônico, gravado para registro em CD. Em setembro, a outorga da Comenda da Ordem do Mérito Jus et Labor, in memoriam, conferida pelo TRT-8ª Região. Em novembro, a edição da Lei Munici-pal nº 19.132/2012, que denomina Rua Wilson Fonseca, em Santarém. A homenagem musical dos filhos: Valsa ao Cen-tenário de Wilson Fonse-ca (Conceição Fonseca), Quarteto 2012, Trio 2012 e Dobrado Maestro Isoca (Vicente Fonseca). Enfim, inúmeros eventos em Santarém, sob o eficiente comando de José Agosti-

nho da Fonseca Neto.O livro sobre “A Vida

e Obra de Wilson Fonseca (Maestro Isoca)” constitui uma autêntica missão de vida. Uma homenagem filial. A realização de um sonho, de um ideal. Fruto de um sábio e pre-cioso conselho de meu tio Wilmar, autor da letra da bela Canção de Minha Saudade (1949), que tem música de Isoca, na épo-ca em que morei em São Paulo, a fim de estudar no Conservatório Musical José Maurício, na década de 60 do século XX. Eis o conselho: “Vicente, o teu pai é um gênio! E tu precisas divulgar melhor sua obra musical”. Foi ali, à distância, que aprendi a apreciar, ainda mais, a figura de meu pai, como homem e como artista. Desde então, ainda muito jovem, adotei esse conse-lho como missão de vida.

A obra é a síntese das pesquisas que venho rea-lizando há muitos anos a respeito de meu pai, aná-lise de suas composições musicais, discografia,

bibliografia, influências, suas parcerias, inclusive com os filhos, fotos etc. Foi impresso na Editora do Banco do Brasil, no Rio de Janeiro. Isoca foi funcionário do Banco do Brasil por 31 anos, sempre em Santarém, e dedicou o Dobrado nº 35 (BB-130) a essa instituição bancária (1990).

Boa parte da profícua produção musical de Wil-son Fonseca (mais de 1.600 composições) – o “Barroco do século XX”, conforme Vicente Salles – permanece inédita e aguarda ainda pela descoberta dos estu-diosos e da grande mídia nacional. Nascido e criado no interior da Amazônia, a obra musical do com-positor santareno revela influências do meio em que viveu, mas se projeta para muito além.

Embora Wilson Fonse-ca, “o alimentador da vida cultural de Santarém”, conforme o Prefácio de Lenora Menezes de Brito, seja mais conhecido pelo Hino de Santarém, Canção de Minha Saudade, Terra

Querida, Lenda do Boto e Um Poema de Amor, tenho a convicção de que existe um “outro” Isoca, menos conhecido do gran-de público, autor de peças de câmara e orquestrais, inclusive as suas maravi-lhosas músicas sacras, a meu ver a quintessência de sua produção musical, onde ele alcançou o ápice em sua carreira como compositor talentoso.

O livro – a primeira biografia do Maestro Iso-ca, segundo assinala Gil-berto Chaves, na Breve In-trodução – permite que se conheça um pouco mais sobre a vida e a obra de um gênio, autor de belas canções e do livro “Meu Baú Mocorongo” editado no mesmo ano da Lei Federal nº 11.338/2006, que denominou o Aero-porto de Santarém – “Ma-estro Wilson Fonseca”. Ele é o uirapuru-mor da Pérola do Tapajós, fonte de inspiração do músi-co e poeta homenagea-do, um dos mais impor-tantes compositores da Amazônia.

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