golan 13 neurotransmissao 5ht ne

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Farmacologia da Neurotransmissão Serotoninérgica e Adrenérgica Central 13 Mireya Nadal-Vicens, Jay H. Chyung e Timothy J. Turner Introdução Caso Bioquímica e Fisiologia da Neurotransmissão Serotoninérgica e Adrenérgica Central Síntese e Regulação da Serotonina Receptores de Serotonina Fisiopatologia dos Transtornos Afetivos Características Clínicas dos Transtornos Afetivos A Teoria Monoamínica da Depressão Limitações da Teoria Monoamínica Classes e Agentes Farmacológicos Inibidores do Armazenamento da Serotonina Inibidores da Degradação da Serotonina Inibidores da Recaptação Antidepressivos Tricíclicos (ATC) Inibidores Seletivos da Recaptação de Serotonina (ISRS) Inibidores da Recaptação de Serotonina–Norepinefrina (IRSN) Antidepressivos Atípicos Agonistas dos Receptores de Serotonina Antagonistas dos Receptores de Serotonina Estabilizadores do Humor Lítio Conclusão e Perspectivas Futuras Leituras Sugeridas INTRODUÇÃO Este capítulo introduz o neurotransmissor serotonina  (5- hidroxitriptamina ou 5-HT), que constitui o alvo de muitos dos fármacos utilizados no tratamento da depressão. Muitas des- sas medicações antidepressivas também afetam a neurotrans- missão da norepinefrina (NE); acredita-se que ambas as vias de neurotransmissores sejam essenciais para a modulação do humor. São também discutidos os diferentes mecanismos pelos quais os fármacos podem alterar a sinalização da serotonina e da norepinefrina. Embora muitos dos fármacos apresentados atuem como antidepressivos e hipnóticos, outros medicamentos incluídos nesse grupo farmacológico constituem tratamentos efetivos para a enxaqueca e a síndrome do intestino irritável. O lítio e outros fármacos utilizados no tratamento do transtorno afetivo bipolar também são discutidos de modo sucinto. Os transtornos do humor maiores são definidos pela pre- sença de episódios depressivos e/ou maníacos. Os pacientes que sofreram pelo menos um episódio maníaco, com ou sem história adicional de episódios depressivos, apresentam trans- torno afetivo bipolar (TABP), enquanto aqueles com episó- dios depressivos recorrentes, sem nenhuma história de mania, sofrem de transtorno depressivo maior (TDM). A prevalência do TDM durante a vida é de cerca de 17%, enquanto a do TABP é de 1 a 2%. Existe um risco hereditário particularmen- te forte de TABP, embora os fatores ambientais sejam, com freqüência, deflagradores dos episódios maníacos ou depres- sivos. Embora a mania seja uma característica do TABP, os pacientes bipolares passam períodos significativos de sua vida em estado deprimido, e a taxa de mortalidade do transtorno decorre, primariamente, dos impulsos suicidas. O TDM pode ocorrer como doença isolada ou pode ser precipitado por outras doenças, como acidente vascular cerebral, demência, diabetes, câncer e coronariopatia. Embora exista uma certa predisposi- ção genética ao TDM, acredita-se que ambientes estressantes ou a ocorrência de doença possam desencadear um TDM na ausência de vulnerabilidade genética. O envelhecimento e a aterosclerose microvascular cerebral também estão associados à depressão de início tardio no indivíduo idoso. Além dos fato- res genéticos e ambientais desencadeantes, muitas classes de drogas podem exacerbar a depressão. Tanto o TDM quanto o TABP constituem causas importantes de morbidade no mundo inteiro, resultando em perda da produ- tividade e uso considerável de recursos médicos. O transtorno afetivo está associado a um risco aumentado de suicídio; as taxas de suicídio cometido são estimadas em até 15% entre pacientes não tratados. Na maioria dos casos de suicídio, o paciente tinha sido examinado por um médico (não necessaria- mente um psiquiatra) menos de 1 mês antes do suicídio.  n Caso Mary R., de 27 anos de idade, é uma funcionária que procura o seu médico, o Dr. Lee, devido a uma perda de peso de 8 kg ocorrida nos últimos 2 meses. A Sra. R lamenta-se de que vem sendo ator- mentada por sentimentos quase constantes de tristeza e por uma

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    Farmacologia da NeurotransmissoSerotoninrgica e Adrenrgica Central

    13

    Mireya Nadal-Vicens, Jay H. Chyung e Timothy J. Turner

    IntroduoCasoBioqumica e Fisiologia da Neurotransmisso Serotoninrgica e

    Adrenrgica CentralSntese e Regulao da SerotoninaReceptores de Serotonina

    Fisiopatologia dos Transtornos AfetivosCaractersticas Clnicas dos Transtornos AfetivosA Teoria Monoamnica da Depresso

    Limitaes da Teoria MonoamnicaClasses e Agentes Farmacolgicos

    Inibidores do Armazenamento da Serotonina

    Inibidores da Degradao da SerotoninaInibidores da Recaptao

    Antidepressivos Tricclicos (ATC)

    Inibidores Seletivos da Recaptao de Serotonina (ISRS)Inibidores da Recaptao de SerotoninaNorepinefrina (IRSN)

    Antidepressivos AtpicosAgonistas dos Receptores de SerotoninaAntagonistas dos Receptores de SerotoninaEstabilizadores do Humor

    LtioConcluso e Perspectivas FuturasLeituras Sugeridas

    INTRODUO

    Este captulo introduz o neurotransmissor serotonina (5-hidroxitriptamina ou 5-HT), que constitui o alvo de muitos dosfrmacos utilizados no tratamento da depresso. Muitas des-sas medicaes antidepressivas tambm afetam a neurotrans-misso da norepinefrina (NE); acredita-se que ambas as viasde neurotransmissores sejam essenciais para a modulao dohumor. So tambm discutidos os diferentes mecanismos pelosquais os frmacos podem alterar a sinalizao da serotonina eda norepinefrina. Embora muitos dos frmacos apresentadosatuem como antidepressivos e hipnticos, outros medicamentosincludos nesse grupo farmacolgico constituem tratamentos

    efetivos para a enxaqueca e a sndrome do intestino irritvel.O ltio e outros frmacos utilizados no tratamento do transtornoafetivo bipolar tambm so discutidos de modo sucinto.

    Os transtornos do humor maiores so definidos pela pre-sena de episdios depressivos e/ou manacos. Os pacientesque sofreram pelo menos um episdio manaco, com ou semhistria adicional de episdios depressivos, apresentam trans-torno afetivo bipolar (TABP), enquanto aqueles com epis-dios depressivos recorrentes, sem nenhuma histria de mania,sofrem de transtorno depressivo maior (TDM). A prevalnciado TDM durante a vida de cerca de 17%, enquanto a doTABP de 1 a 2%. Existe um risco hereditrio particularmen-te forte de TABP, embora os fatores ambientais sejam, comfreqncia, deflagradores dos episdios manacos ou depres-sivos. Embora a mania seja uma caracterstica do TABP, os

    pacientes bipolares passam perodos significativos de sua vidaem estado deprimido, e a taxa de mortalidade do transtornodecorre, primariamente, dos impulsos suicidas. O TDM podeocorrer como doena isolada ou pode ser precipitado por outrasdoenas, como acidente vascular cerebral, demncia, diabetes,cncer e coronariopatia. Embora exista uma certa predisposi-o gentica ao TDM, acredita-se que ambientes estressantesou a ocorrncia de doena possam desencadear um TDM naausncia de vulnerabilidade gentica. O envelhecimento e aaterosclerose microvascular cerebral tambm esto associados depresso de incio tardio no indivduo idoso. Alm dos fato-res genticos e ambientais desencadeantes, muitas classes dedrogas podem exacerbar a depresso.

    Tanto o TDM quanto o TABP constituem causas importantes

    de morbidade no mundo inteiro, resultando em perda da produ-tividade e uso considervel de recursos mdicos. O transtornoafetivo est associado a um risco aumentado de suicdio; astaxas de suicdio cometido so estimadas em at 15% entrepacientes no tratados. Na maioria dos casos de suicdio, opaciente tinha sido examinado por um mdico (no necessaria-mente um psiquiatra) menos de 1 ms antes do suicdio.

    nCaso

    Mary R., de 27 anos de idade, uma funcionria que procura o seumdico, o Dr. Lee, devido a uma perda de peso de 8 kg ocorridanos ltimos 2 meses. A Sra. R lamenta-se de que vem sendo ator-mentada por sentimentos quase constantes de tristeza e por uma

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    Farmacologia da Neurotransmisso Serotoninrgica e Adrenrgica Central 187

    sensao de desamparo e inadequao no trabalho. Sente-se tomal que no consegue ter uma boa noite de sono h mais de umms. No sente mais prazer na vida e, recentemente, ficou assus-tada quando sua mente foi invadida por pensamentos suicidas. ASra. R confessa ao Dr. Lee que ela j se sentiu assim h algumtempo, mas que isso passou. O Dr. Lee interroga a Sra. R sobreo seu padro de sono, apetite, capacidade de concentrao, nvelde energia, humor, nvel de interesse e sentimentos de culpa. Faz

    perguntas especficas sobre os pensamentos suicidas, em particularse ela arquitetou algum plano especfico e se j alguma vez tentousuicdio. O Dr. Lee explica Sra. R que ela tem transtorno depressivomaior, provavelmente causado por um desequilbrio qumico nocrebro, e prescreve o antidepressivo fluoxetina.

    Duas semanas depois, a Sra. R telefona para dizer que o medi-camento no est surtindo efeito. O Dr. Lee a incentiva a conti-nuar tomando o remdio e, depois de mais 2 semanas, a Sra. Rcomea a sentir-se melhor. No se sente mais triste nem abatida;os sentimentos de desamparo e de inadequao que antes a ator-mentavam diminuram. De fato, ao retornar ao mdico 6 semanasdepois, declara estar se sentindo muito melhor. No sente maisa necessidade de tanto sono, e est sempre com muita energia.

    Agora, est convencida de que ela a pessoa mais inteligenteda companhia. Acrescenta orgulhosamente a seu mdico que elah pouco tempo comprou um novo carro esporte e fez muitascompras. O Dr. Lee explica Sra. R que ela pode estar tendo umepisdio manaco e, aps consultar um psiquiatra, prescreve ltioe diminui a dose de fluoxetina. A Sra. R hesita em tomar a novamedicao, argumentando que est se sentindo muito bem e queest preocupada com os efeitos colaterais do ltio.

    QUESTESn 1. Em que difere um episdio depressivo do estado de sentir-se

    ocasionalmente triste?n 2. Como a fluoxetina atua?n 3. Por que existe uma demora no incio do efeito teraputico

    da fluoxetina?n 4. O que causou a hipomania da Sra. R? Por que necessrio

    tratar o transtorno afetivo bipolar se a paciente sente-sebem?

    n 5. Que preocupaes especficas poderia ter a Sra. R sobre osefeitos adversos do ltio?

    BIOQUMICA E FISIOLOGIA DANEUROTRANSMISSO SEROTONINRGICA EADRENRGICA CENTRAL

    A serotonina (5-hidroxitriptamina ou 5HT) e a norepinefrina(NE) desempenham papis crticos na modulao do humor,no ciclo de sonoviglia, na motivao, na percepo da dor ena funo neuroendcrina. As projees serotoninrgicas paraa medula espinal esto envolvidas na percepo da dor, regu-lao visceral e controle motor, enquanto as projees para oprosencfalo so importantes na modulao do humor, na cog-nio e na funo endcrina. O sistema noradrenrgico modulaa vigilncia, as respostas ao estresse, a funo neuroendcrina,o controle da dor e a atividade do sistema nervoso simptico.

    A liberao de 5HT e de NE ocorre primariamente atravs devaricosidades. Ao contrrio das sinapses, que formam contatosfirmes com neurnios-alvo especficos, as varicosidades liberamgrandes quantidades de neurotransmissor a partir de vesculas

    presentes no espao extracelular, estabelecendo gradientes deconcentrao de neurotransmissor nas reas de projeo dasvaricosidades. As clulas que contm 5HT nos ncleos da rafee as clulas que contm NE no locus ceruleus projetam-seamplamente atravs do crtex cerebral, enquanto a dopaminaapresenta um padro mais focado de projees. Cada um dessessistemas possui auto-receptores pr-sinpticos proeminentes, quecontrolam as concentraes locais de transmissores. Essa auto-

    regulao resulta em descarga coordenada, produzindo ondasespontneas e sincrnicas de atividade, que podem ser medi-das como freqncias de descarga. Por exemplo, as clulas nosncleos da rafe habitualmente apresentam descargas numa taxade 0,3 a 7 picos por segundo. Como a freqncia de descarga nose modifica rapidamente, e os quanta de transmissor liberado emcada descarga so razoavelmente bem conservados, a concentra-o de neurotransmissor nas proximidades das varicosidades mantida dentro de uma estreita faixa.

    A concentrao mdia estabelece o tnusbasal de atividadenos neurnios-alvo que recebem projees de 5HT e NE. Almdisso, estmulos especficos podem provocar rpidos surtos dedescarga, superpostos atividade tnica basal, fornecendoinformaes adicionais. Por conseguinte, os sistemas de pro-

    jeo difusos podem fornecer dois tipos de informao: umadescarga neuronal rpida e distinta, semelhante neurotrans-misso mais tradicional, e uma freqncia de descarga tnicamais lenta, que presumivelmente proporciona uma integraoda informao no decorrer de um maior perodo de tempo.

    SNTESE E REGULAO DA SEROTONINAA serotonina sintetizada a partir do aminocido triptofanopela enzima triptofano hidroxilase (TPH), que converte otriptofano em 5-hidroxitriptofano.A seguir, a L-aminocidoaromtico descarboxilase converte o 5-hidroxitriptofano emserotonina (Fig. 13.1A). Essas enzimas so encontradas no cito-

    plasma dos neurnios serotoninrgicos, tanto no corpo celularquanto nos processos celulares. A serotonina concentrada earmazenada no interior de vesculas localizadas nos axnios,corpos celulares e dendritos.

    O ciclo metablico da serotonina (Fig. 13.2) envolve a suasntese, captao em vesculas sinpticas, exocitose, recaptaono citoplasma e, a seguir, captao em vesculas ou degradao. importante assinalar que pode ocorrer regulao dos nveisde neurotransmisso da 5HT e NE em qualquer uma dessasetapas.

    A bioqumica da sntese e regulao da norepinefrina dis-cutida no Cap. 9. Para uma reviso, a sntese de norepinefrinaencontra-se resumida na Fig. 13.1B, enquanto o seu ciclo meta-blico apresentado de modo sucinto na Fig. 13.3.

    Para todas as monoaminas, a primeira etapa de sntese quelimita a velocidade. Assim, a sntese de DA e NE tem a sua velo-cidade limitada pela tirosina hidroxilase (TH), e a sntese de5HT pela triptofano hidroxilase (TPH). Ambas as enzimas soestritamente reguladas por retroalimentao inibitria atravsde auto-receptores. Os auto-receptores pr-sinpticos de 5HTrespondem a aumentos locais das concentraes de 5HT atravsde sinalizao de protenas G, o que leva a uma reduo dosnveis de cAMP, resultando em atividade diminuda da protei-nocinase A e da clcio-CaM cinase II. Como a fosforilao daTPH aumenta a sua atividade, a reduo da atividade da cinaseresulta em sntese diminuda de 5HT. Essa ala de auto-regula-o pode fornecer uma explicao para o tempo observado deao dos antidepressivos clinicamente, conforme discutido naseo sobre a teoria monoamnica da depresso.

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    188 Captulo Treze

    A reserpina liga-se irreversivelmente ao VMAT e, portanto,inibe o acondicionamento da DA, da NE, da EPI e da 5HTem vesculas.

    Os transportadores de recaptao seletiva da serotonina reci-clam a 5HT da fenda sinptica de volta ao neurnio pr-sinp-tico. Os transportadores da recaptao seletiva de monoaminasso protenas que atravessam doze vezes a membrana e queacoplam o transporte do neurotransmissor ao gradiente de sdiotransmembrana. Ao contrrio do VMAT, que um transporta-dor inespecfico de monoaminas, os transportadores de recapta-

    o de monoaminas exibem seletividade, alta afinidade e baixacapacidade para cada monoamina especfica. Os transportado-res seletivos de monoaminas, que incluem o transportador deserotonina (SERT), o transportador de norepinefrina(NET)e o transportador de dopamina (DAT), tambm so capazesde transportar as outras monoaminas, porm com menos efi-cincia.

    Quando a 5HT retorna ao citoplasma neuronal, o neuro-transmissor transportado em vesculas atravs do VMAT ousofre degradao pelo sistema de monoamina oxidase (MAO).As MAO so enzimas mitocondriais que regulam os nveis demonoaminas nos tecidos neurais e que inativam as monoami-nas (como a tiramina) circulantes e dietticas no fgado e nointestino. As duas isoformas, a MAO-A e a MAO-B, diferemde acordo com a especificidade de substrato: a MAO-A oxida

    NH2HO

    O

    OH

    NH2

    HO

    HO

    OH

    O

    NH2HO

    HO

    HO

    OH

    HO

    NH2

    HO

    OH

    HO

    HN

    HN OH

    O

    NH2

    HNNH2

    OH

    HN OH

    O

    NH2

    OH

    A B

    Tirosina

    L-DOPA

    Dopamina

    Norepinefrina

    Epinefrina

    TriptofanoTriptofanohidroxilase

    L-aminocido

    aromticodescarboxilase

    5-Hidroxitriptofano

    5-Hidroxitriptamina(Serotonina; 5HT)

    Tirosinahidroxilase

    L-aminocidoaromticodescarboxilase

    Dopamina--hidroxilase

    FeniletanolaminaN-metiltransferase

    5HT

    5-Hidroxitriptofano

    Serotonina

    CO2

    Na+

    Triptofano

    Triptofano hidroxilase(limitadora de velocidade)

    L-aminocidoaromtico

    descarboxilase

    Ca2+

    Transportador de 5HT

    VMAT

    Transportador de L-aminocidosaromticos

    Neurnioserotoninrgico

    5-hidroxindolacetaldedo

    5HT5HT

    5HT

    5HT

    5HT

    5HT

    5HT

    5HT

    Na+

    Triptofano

    Potencial de ao

    Receptor 5HT1D

    (auto-receptor)

    MAO

    Na+

    H+

    Fig. 13.2 Regulao pr-sinptica da neurotransmisso da serotonina.A serotonina (5HT) sintetizada a partir do triptofano em uma via de duasreaes: a enzima que limita a velocidade a triptofano hidroxilase. Tanto a5HT recm-sintetizada quanto a reciclada so transportadas do citoplasma parao interior de vesculas sinpticas pelo transportador de monoaminas vesicular(VMAT). A neurotransmisso iniciada por um potencial de ao no neurniopr-sinptico, que acaba produzindo a fuso das vesculas sinpticas com amembrana plasmtica, atravs de um processo dependente de Ca2+. A 5HT removida da fenda sinptica por um transportador seletivo de 5HT, bemcomo por transportadores no-seletivos de recaptao (no indicados). A 5HT

    pode estimular os auto-receptores 5HT1D, proporcionando uma inibio porretroalimentao. A 5HT citoplasmtica seqestrada em vesculas sinpticaspelo VMAT ou degradada pela MAO mitocondrial.

    A 5HT transportada em vesculas por intermdio do trans-portador de monoaminas vesicular (VMAT, vesicular mono-amine transporter). Este um transportador inespecfico demonoaminas, que importante no acondicionamento vesicularda dopamina (DA) e da epinefrina (EPI), bem como da 5HT.

    Fig. 13.1 Sntese de serotonina e de norepinefrina. A. A 5-hidroxitriptamina(serotonina) sintetizada a partir do aminocido triptofano em duas etapas: a

    hidroxilao do triptofano, para formar 5-hidroxitriptofano, e a descarboxilaosubseqente desse intermedirio, produzindo a 5-hidroxitriptamina (5HT).A triptofano hidroxilase a enzima que limita a velocidade nessa via. B. Anorepinefrina sintetizada a partir do aminocido tirosina, em um processoem trs etapas semelhante via de sntese da serotonina. A tirosina inicialmente oxidada a L-DOPA pela enzima tirosina hidroxilase e, em seguida,descarboxilada a dopamina. Aps o seu transporte na vescula sinptica, adopamina hidroxilada pela enzima dopamina -hidroxilase, formando anorepinefrina. A mesma enzima descarboxila o 5-hidroxitriptofano e a L-DOPA;ela conhecida, genericamente, como L-aminocido aromtico descarboxilase.A tirosina hidroxilase a enzima que limita a velocidade nessa via.

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    Farmacologia da Neurotransmisso Serotoninrgica e Adrenrgica Central 189

    a 5HT, a NE e a DA, enquanto a MAO-B oxida preferencial-mente a DA. As monoamina oxidases inativam as monoaminasatravs de desaminao oxidativa, utilizando uma flavina fun-cional como aceptor de eltrons. A catecol-O-metiltransferase(COMT) no espao extracelular outra enzima importante dedegradao das monoaminas, embora a COMT desempenhe um

    papel menos significativo no SNC do que na periferia.

    RECEPTORES DE SEROTONINAForam caracterizados mltiplos subtipos de receptores de 5HT,e todos eles, exceo de um, esto acoplados protena G(Quadro 13.1). Em geral, a classe de receptores 5HT1inibe aadenilil ciclase, a classe 5HT2aumenta a renovao do fosfati-dilinositol, e as classes 5HT4, 5HT6 e 5HT7estimulam a adenililciclase. O nico canal inico regulado por ligante conhecido o receptor 5HT3, embora vrios subtipos de receptores de5HT ainda no estejam totalmente caracterizados. O receptor5HT1A expresso tanto nos corpos celulares serotoninrgicosdos ncleos da rafe quanto em neurnios ps-sinpticos nohipocampo, e a sua ativao resulta em diminuio dos nveis

    de cAMP. O receptor 5HT1Dpr-sinptico medeia os mecanis-mos auto-inibitrios da neurotransmisso da 5HT nos termi-nais axnicos. A sinalizao dos receptores 5HT2A e 5HT2C excitatria e baixa o limiar de descarga neuronal. Os vriossubtipos de receptores esto diferencialmente expressos nocrebro. Por exemplo, um subgrupo de projees de 5HT parao crtex estimula os receptores 5HT2ps-sinpticos, enquantooutras projees para o sistema lmbico estimulam os recep-tores 5HT1A ps-sinpticos. Entretanto, existe uma conside-rvel superposio na expresso dos subtipos de receptores,e a importncia fisiolgica dessa superposio no est bemelucidada.

    Os mecanismos de sinalizao dos subtipos de receptores denorepinefrina (adrenrgicos) so discutidos no Cap. 9 e revistosno Quadro 13.1.

    FISIOPATOLOGIA DOS TRANSTORNOS AFETIVOS

    O transtorno depressivo maior (TDM) e o transtorno afetivo

    bipolar (TABP) caracterizam-se por uma desregulao dohumor. O transtorno depressivo maior caracteriza-se por epis-dios recorrentes de depresso, enquanto o transtorno bipolar definido pela presena de mania ou hipomania (embora osperodos de depresso sejam mais comuns do que os perodosde humor elevado no TABP). Alm disso, vrios outros trans-tornos, como distimia e ciclotimia, envolvem combinaes oumanifestaes menos extremas de depresso e mania. As teoriasmoleculares atuais para a etiologia da depresso tm a sua basena hiptese monoamnica,enquanto as teorias para a etiologiada mania originam-se, principalmente, das aes deduzidas doltio, um agente de primeira linha utilizado no tratamento damania. Entretanto, como as etiologias subjacentes desses trans-

    tornos ainda no esto bem elucidadas em nvel molecular, oscritrios para diagnstico baseiam-se, primariamente, na aval-iao clnica. Os critrios diagnsticos da American PsychiatricAssociation para o transtorno depressivo maior e o transtornobipolar esto resumidos nos Boxes 13.1 e 13.2.

    DA

    L-DOPADopamina

    Na+

    Tirosina

    Ca2+

    Transportador de NE

    Transportador de L-aminocidosaromticos

    DOPGAL

    DA

    DA

    Na+

    Tirosina

    Potencial de ao

    Neurnioadrenrgico

    H+ NE

    NE

    NE

    Receptor 2-adrenrgico(auto-receptor)

    VMAT

    NE MAO

    ATP ADPH+

    Fig. 13.3 Regulao pr-sinptica da neurotransmisso da norepinefrina.A norepinefrina presente na vescula sinptica provm de duas fontes. Emprimeiro lugar, a dopamina sintetizada a partir da tirosina transportada na

    vescula pelo transportador de monoaminas vesicular (VMAT). No interiorda vescula, a dopamina convertida em norepinefrina pela dopamina--hidroxilase. Em segundo lugar, a NE reciclada transportada do citoplasmapara o interior da vescula, um transporte tambm efetuado pelo VMAT. Aneurotransmisso iniciada por um potencial de ao no neurnio pr-sinptico, o que acaba levando fuso das vesculas sinpticas com a membrana

    plasmtica, atravs de um processo dependente de Ca2+. A NE removida dafenda sinptica por um transportador seletivo de norepinefrina (NET), bemcomo por transportadores no-seletivos da recaptao (no indicados). A NEpode estimular auto-receptores 2-adrenrgicos a proporcionar uma inibiopor retroalimentao. A NE citoplasmtica que no seqestrada em vesculassinpticas pelo VMAT sofre degradao pela monoamina oxidase (MAO) a 3,4-diidroxifenilglicoaldedo (DOPGAL) na membrana mitocondrial externa.

    QUADRO 13.1 Mecanismos de Sinalizao dos Subtipos deReceptores de Norepinefrina e de Serotonina

    SUBTIPO DERECEPTOR DE NE

    MECANISMOSDE SINALIZAO

    1 IP3, DAG

    2* cAMP

    1,2 cAMP

    SUBTIPO DE RECEPTOR DE 5HT

    5HT1A,B,D*, E,F cAMP

    5HT2A,B,C IP3, DAG

    5HT3 Canal inico regulado porligante

    5HT4,6,7 cAMP

    Abreviaturas: cAMP = AMP cclico; IP3= 1,4,5-trifosfato de inositol; DAG= diacilglicerol.

    *Os receptores 2-adrenrgicos e 5HT1D so auto-receptores pr-sinpticosimportantes para a inibio por retroalimentao.

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    190 Captulo Treze

    pessoa querida so considerados como sentimento normal depesar) ou a uma afeco clnica geral, como hipotireoidismoou administrao de altas doses de bloqueadores dos receptores-adrenrgicos.

    Existem trs subtipos clnicos de TDM: a depresso tpica,a depresso atpica (que, na verdade, mais comum do quea depresso tpica) e a depresso melanclica. Em todos ospacientes deprimidos, crucial determinar se existe qualquerideao suicida e se h evidncias de psicose. Embora a psicose

    seja mais tpica do transtorno bipolar, os pacientes gravementedeprimidos podem tornar-se psicticos, e a ideao suicida ou apsicose constituem indicaes para encaminhamento imediatoa um psiquiatra ou hospitalizao psiquitrica.

    A depresso tpica caracteriza-se por acordar cedo pelamanh (por exemplo, acordar espontaneamente s 5 horas damanh, com incapacidade de voltar a dormir), diminuio doapetite com perda de peso e sentimentos pronunciados de rom-pimento social. No caso descrito na introduo, o Dr. Lee esta-beleceu um diagnstico clnico de episdio depressivo maiorbaseado na presena de praticamente todos esses sintomas pormais de 1 ms. Em geral, a depresso tpica responde de modosatisfatrio aos inibidores seletivos da recaptao de serotoni-na (ISRS). Como possvel no observar qualquer melhorasignificativa no decorrer de 2 a 3 semanas, pode-se indicar a

    BOXE 13.1 Manual de Diagnstico e Estatstica deDistrbios Mentais, Critrios de Revisopara o Transtorno Depressivo Maior (TMD)

    A. Pelo menos um dos seguintes estados anormais do humor, queinterferem significativamente na vida do indivduo:

    1. Humor deprimido anormal a maior parte do dia, quase todosos dias, durante pelo menos 2 semanas

    2. Perda anormal de todo interesse ou prazer na maior parte dodia, quase todos os dias, durante pelo menos 2 semanas

    3. Indivduo com menos de 18 anos de idade: humor irritvelanormal na maior parte do dia, quase todos os dias, durantepelo menos 2 semanas

    B. Pelo menos cinco dos seguintes sintomas foram observadosdurante o mesmo perodo de depresso de 2 semanas:1. Humor deprimido anormal (ou humor irritvel se for uma

    criana ou adolescente)2. Perda anormal de todo interesse e prazer3. Transtorno do apetite ou alterao do peso:

    perda anormal de peso (na ausncia de dieta) oudiminuio do apetite, ou ganho anormal de peso ou aumento do apetite

    4. Transtorno do sono, insnia anormal ou hipersoniaanormal

    5. Transtorno da atividade, agitao anormal ou lentidoanormal (passvel de ser observada por outras pessoas)

    6. Fadiga anormal ou perda de energia7. Autocensura anormal ou culpa inadequada8. Concentrao anormal ou indeciso9. Pensamentos mrbidos anormais de morte (no apenas

    medo de morrer) ou suicidaC. Os sintomas no so atribuveis a uma psicose de humor

    incongruenteD. Nunca houve um episdio manaco, episdio misto ou episdio

    hipomanacoE. Os sintomas no so atribuveis a doena fsica, lcool,

    medicamentos ou drogas de ruaF. Os sintomas no so atribuveis a uma perda normal

    BOXE 13.2 Manual de Diagnstico e Estatstica deDistrbios Mentais, Critrios de Revisopara Transtorno Bipolar (Abreviados)

    TRANSTORNO BIPOLAR I

    Um nico episdio manaco:

    A. Presena de apenas um episdio manaco ou ausncia deepisdios depressivos maiores passados (Nota: A recorrncia definida como uma mudana de polaridade a partir da depressoou intervalo de pelo menos 2 meses sem sintomas manacos)

    B. O episdio manaco no mais bem explicado por um transtornoesquizoafetivo e no est superposto a esquizofrenia, transtornoesquizofreniforme, transtorno de delrio ou transtorno psicticosem outra especificao

    Nos casos em que um paciente apresentou mltiplos episdios dehumor, os subtipos bipolares I so definidos pelo episdio maisrecente de humor:

    Episdio hipomanaco mais recente Episdio manaco mais recente Episdio misto mais recente

    Episdio deprimido mais recente Episdio mais recente sem outra especificao

    TRANSTORNO BIPOLAR II

    A. Presena (ou histria) de um ou mais episdios depressivosmaiores

    B. Presena (ou histria) de pelo menos um episdiohipomanaco

    C. Nunca houve episdio manaco ou episdio mistoD. Episdios de humor nos critrios A e B no so mais bem

    explicados por transtorno esquizoafetivo e no esto superpostosa esquizofrenia, transtorno esquizofreniforme, transtorno dedelrio ou transtorno psictico sem outra especificao

    E. Os sintomas provocam sofrimento clinicamente significativo

    ou comprometimento na funo social, ocupacional ou outrasreas importantes de funo

    CARACTERSTICAS CLNICAS DOSTRANSTORNOS AFETIVOSO transtorno depressivo maior caracteriza-se por episdiosrecorrentes de humor deprimido, juntamente com aumento doisolamento social (diminuio do interesse ou da sensao deprazer, sentimentos de menos-valia) e sintomas somticos carac-tersticos (diminuio da energia, alteraes do apetite e dosono, dor muscular e reduo dos movimentos com latncia dafala). O TDM pode ser precipitado por fatores estressantes soci-ais significativos ou pode surgir de modo espontneo, devidoa alguma predisposio biolgica. O episdio depressivo devedurar 2 semanas ou mais e deve interferir significativamentenas atividades dirias do paciente, como trabalho e relaciona-mentos pessoais. Um episdio no considerado como TDMse for devido a algum sofrimento (isto , os sintomas depres-sivos que surgem nos primeiros 2 meses aps a perda de uma

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    Farmacologia da Neurotransmisso Serotoninrgica e Adrenrgica Central 191

    administrao a curto prazo de um sonfero, como um benzo-diazepnico, para produzir alvio inicial dos sintomas.

    A depresso atpica caracteriza-se por sinais neurovege-tativos, que so o inverso daqueles observados na depressotpica. O paciente apresenta maior apetite, particularmente paraalimentos reconfortantes ricos em gordura/carboidratos, ehipersonia. Esses indivduos tambm se mostram particular-mente sensveis crtica (interpretam at mesmo comentrios

    inocentes como crticas intensas s suas aes); entretanto, aocontrrio dos pacientes tipicamente deprimidos, so capazes depassar por breves perodos de prazer e apresentar um comporta-mento de busca do prazer. Do ponto de vista clnico, os pacien-tes com depresso atpica podem no responder to bem aosISRS quanto os pacientes com depresso tpica. Foi constatadoque os inibidores da monoamina oxidase (IMAO) so particu-larmente efetivos nesse grupo de pacientes; todavia, em virtudedos efeitos adversos significativos dessa classe de frmacos,os IMAO so considerados como agentes de segunda ou deterceira linha. Entretanto, a eficincia dos IMAO, juntamentecom o comportamento de busca do prazer observado nesse tipode indivduo depressivo (ingesto excessiva de alimento, con-sumismo em shopping), sugere que a depresso atpica resultade uma diminuio relativa em ambas as vias da serotonina edopamina. Tipicamente, os medicamentos mais efetivos paraessa classe de depresso atuam sobre as monoaminas de modogeral. Esses frmacos incluem a bupropiona,a venlafaxina eestimulantes como o metilfenidato.

    A depresso melanclica o subtipo menos comum dedepresso, porm freqentemente o mais severo e incapaci-tante. O paciente perde todo o interesse pelo seu entorno e,com freqncia, mostra-se totalmente indiferente a crticas oupreocupao. Esses indivduos so incapazes de sentir prazer,mesmo que por um breve perodo. Os ISRS ou a mirtazapinaso considerados os agentes de primeira linha para esse sub-tipo de depresso; todavia, os pacientes podem exigir o uso

    de antidepressivos tricclicos (ATC) ou at mesmo uma provade terapia eletroconvulsiva se os sintomas forem refratriosaos agentes de primeira linha. Com freqncia, justifica-se ahospitalizao psiquitrica do paciente, mesmo na ausncia deplano suicida, visto que esses pacientes freqentemente estoincapacitados a ponto de no conseguir sequer formular umplano, apesar do intenso sentimento de vazio.

    O episdio manaco o inverso clnico do episdio depressi-vo. Embora o paciente possa sentir-se irritado, h habitualmenteuma sensao de humor elevado e sentimento de auto-estimaaumentada (denominada grandiosidade). Em lugar da falalatente e suave observada na depresso, verifica-se um aumentoda fala, que rpida e alta, freqentemente difcil de interrom-per. Em lugar da sensao de fadiga e necessidade de sono

    observadas na depresso, verifica-se uma reduo da necessi-dade de sono. O paciente pode no ter necessidade de dormirdurante vrios dias, e, em lugar de sentir-se cansado, sente-serevigorado. Em geral, existe alguma forma de atividade noitequando o indivduo deveria estar dormindo, como, por exem-plo, dirigir, fazer faxina ou trabalhar. Os episdios manacoscaracterizam-se por pensamentos desorganizados, que corremde modo incontrolvel, freqentemente a ponto de o pacien-te no conseguir permanecer no mesmo assunto por mais dealguns segundos; esses pensamentos podem estar associadosa psicose e alucinaes auditivas. Em geral, a mania resultaem algum desfecho adverso (acidentes de trnsito, deteno ouhospitalizao psiquitrica) dentro de poucos dias.

    Um episdio hipomanaco(literalmente pequena mania)refere-se a um paciente que apresenta sintomas manacos por

    mais de 4 dias, porm na ausncia de desfecho adverso. Nocaso descrito na introduo, a Sra. R teve um episdio hipo-manaco. Caso o Dr. Lee no tivesse intervindo, seus sintomaspoderiam ter evoludo para a mania franca. Quando sintomas deepisdio manaco e de episdio depressivo aparecem simulta-neamente, o transtorno descrito como episdio misto,e essespacientes correm maior risco de cometer suicdio (os pacientesdeprimidos freqentemente carecem da energia necessria para

    executar um plano suicida).Embora o transtorno bipolar seja caracterizado por sintomas

    manacos (mania ou hipomania), o distrbio habitualmentedominado por perodos de depresso debilitante e significati-va. Com freqncia, os episdios depressivos ocorrem antesdo aparecimento de qualquer mania, e, com freqncia, esta-belece-se um diagnstico incorreto de TDM nesses pacientes.Os pacientes com transtorno bipolar freqentemente sofremmudanas rpidas e que ameaam potencialmente a sua vidapara o episdio de mania quando tomam antidepressivos (comono caso da Sra. R). Entretanto, se os sintomas manacos surgi-rem apenas com o uso de antidepressivos ou com estimulan-tes, esses sintomas no preenchem tecnicamente os critriosde transtorno bipolar. As classes farmacolgicas utilizadas notratamento do transtorno bipolar so discutidas no final daseo de farmacologia e so descritas como estabilizadoresdo humor.Com freqncia, os pacientes continuam sofrendode depresso enquanto fazem uso de estabilizadores do humor,podendo ser necessrio um tratamento adjuvante com antide-pressivos (o risco de induzir mania significativamente dimi-nudo na presena de um estabilizador do humor).

    A TEORIA MONOAMNICA DA DEPRESSOA base biolgica da depresso comeou a ser desvendada nasdcadas de 1940 e 1950, quando observadores perspicazes veri-ficaram que a imipramina, a iproniazida e a reserpina exerciam

    efeitos inesperados sobre o humor.No final da dcada de 1940, foi desenvolvido o agente tric-clico imipraminapara uso no tratamento de pacientes psicti-cos; entretanto, foi subseqentemente constatado que o frmacoexercia efeitos antidepressivos pronunciados. A imipraminabloqueia preferencialmente os transportadores de 5HT, e o seumetablito ativo, a desipramina, bloqueia preferencialmente ostransportadores de NE. Por conseguinte, os neurotransmissorespersistem na sinapse em concentraes mais altas e por maistempo, produzindo maior ativao dos receptores ps-sinpti-cos de 5HT e NE.

    Em 1951, foi constatado que o agente antituberculose ipro-niazida possui efeitos antidepressivos. A iproniazida inibe amonoamina oxidase e, portanto, impede a degradao da 5HT, da

    NE e da DA. O conseqente aumento no neurotransmissor cito-slico resulta em aumento da captao do neurotransmissor nasvesculas e, portanto, em sua maior liberao aps exocitose.

    Na dcada de 1950, foi observado que o agente anti-hiper-tensivo reserpina induzia depresso em 1015% dos pacientes.A seguir, os pesquisadores verificaram que a reserpina tinhaa capacidade de induzir depresso em modelos animais, bemcomo em seres humanos. A reserpina provoca depleo da 5HT,da NE e da DA nos neurnios pr-sinpticos ao inibir o trans-porte desses neurotransmissores nas vesculas sinpticas. O fr-maco liga-se irreversivelmente ao VMAT e, por fim, destri asvesculas. A 5HT, a NE e a DA que se acumulam no citoplas-ma so degradadas pela MAO mitocondrial. Acredita-se que aconseqente reduo da neurotransmisso monoamnica sejaresponsvel pela produo de um humor deprimido.

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    192 Captulo Treze

    Os achados anteriormente descritos sugerem fortementeque os sistemas monoaminrgicos centrais da serotonina e danorepinefrina estejam intimamente envolvidos na patogenia dadepresso. A teoria monoamnica da depressosustenta quea depresso resulta de uma diminuio patolgica na neuro-transmisso de serotonina e/ou norepinefrina. Com base nessahiptese, pode-se deduzir que o aumento na neurotransmissoda serotonina e/ou norepinefrina pode melhorar ou reverter a

    depresso. Como se trata de uma doena biolgica relacio-nada com alteraes patolgicas a longo prazo na atividadedas monoaminas, o TDM deve ser passvel de tratamento commedicamentos.

    Limitaes da Teoria MonoamnicaEmbora quase todas as classes de antidepressivos sejam farma-cologicamente ativas em seus locais de ao moleculares ecelulares, com atividade quase imediata, seus efeitos antide-pressivos clnicos em geral so apenas observados depois de 3semanas ou mais de tratamento contnuo. De forma semelhante,embora a reserpina provoque rpida depleo do neurotrans-missor nos sistemas monoaminrgicos, so necessrias vriassemanas de tratamento contnuo com reserpina para induzirdepresso. A demora inexplicada no incio de ao desses fr-macos continua sendo um enigma central na elucidao dafisiopatologia da depresso.

    Em alguns pacientes, os frmacos que aumentam seleti-vamente a neurotransmisso da 5HT eliminam a depresso,enquanto os que aumentam de modo seletivo a neurotrans-misso da NE exercem pouco ou nenhum efeito. Em outrospacientes, os frmacos que afetam o sistema da NE so maisbenficos do que os que afetam o sistema da 5HT. De modoglobal, cada frmaco individual mostra-se efetivo em cerca de70% dos pacientes que sofrem de depresso, e os frmacos queapresentam eficcia acentuadamente diferente no bloqueio da

    recaptao de NE e/ou 5HT podem exibir uma eficincia clnicasemelhante quando testados em grandes populaes clnicas.Essas observaes clnicas no so facilmente explicadas pelateoria monoamnica.

    O intervalo de tempo necessrio para a eficincia clnicados antidepressivos pode ser explicado pelos mecanismos auto-reguladores que afetam os neurnios monoaminrgicos pr-sinpticos. De modo um tanto paradoxal, o tratamento comum agente antidepressivo clssico produz uma diminuioimediata na freqncia de descarga neuronal no locus ceruleuse/ou ncleo da rafe (dependendo do frmaco), com diminuioconcomitante na sntese e liberao de 5HT e NE. Essa obser-vao sugere que o aumento induzido pelo antidepressivo naconcentrao de neurotransmissor na fenda sinptica resulta

    em inibio aguda por retroalimentao da descarga neuronalatravs dos auto-receptores 5HT1D e 2para a 5HT e a NE, res-pectivamente. Em resposta aos nveis elevados de neurotrans-missor, a estimulao inibitria dos auto-receptores infra-regulaagudamente a atividade das enzimas que limitam a velocidade,TPH e TH, alm de reduzir tambm de forma aguda a taxa dedescarga neuronal. O efeito final que a exposio inicial aagentes antidepressivos pode no aumentar significativamentea sinalizao ps-sinptica.

    Em contrapartida, o uso crnico de agentes antidepressivosinduz uma infra-regulao dos prprios auto-receptores inibi-trios, levando a um aumento da neurotransmisso. (Observeque os receptores de 5HT e NE ps-sinpticos tambm soinfra-regulados por alteraes na liberao e recaptao dosneurotransmissores, porm em menor grau.) O tratamento cr-

    nico, mas no agudo, aumenta os nveis de cAMP nos neur-nios-alvo, indicando que o efeito final do tratamento crnicocom frmacos antidepressivos consiste em aumentar a sinaliza-o do segundo mensageiro atravs das vias da 5HT e/ou NE.So necessrias vrias semanas para que ocorra a mudanana sensibilidade dos auto-receptores, em concordncia com aseqncia temporal da resposta teraputica dos pacientes. Porconseguinte, o atraso no incio da resposta teraputica poderiaser produzido por mecanismos fisiolgicos de retroalimentaoinibitria; somente aps terapia farmacolgica crnica quea dessensibilizao gradual dos auto-receptores permite umaumento da neurotransmisso (Fig. 13.4). Apesar de terica,essa hiptese sobre as alteraes na sensibilidade dos receptoresmonoamnicos oferece uma explicao para o atraso no inciode ao teraputica da fluoxetina observado na Sra. R. Podeexplicar tambm por que alguns pacientes apresentam agrava-mento agudo da depresso ou ideao suicida nos primeirosdias de tratamento com antidepressivos, e ressalta a necessidadede acompanhamento rigoroso dos pacientes durante as primei-ras semanas de tratamento.

    CLASSES E AGENTES FARMACOLGICOS

    A transmisso serotoninrgica modulada por uma ampla gamade agentes cujos alvos de ao consistem no armazenamento,degradao e captao de neurotransmissores e receptores deneurotransmissores. Como a serotonina est envolvida em diver-sos processos fisiolgicos, tanto centrais quanto perifricos, osagentes que alteram o tnus serotoninrgico possuem aesdiversas sobre o crebro (humor, sono, enxaqueca), o sistemagastrintestinal (GI) e a temperatura central e hemodinmica(sndrome de serotonina). Muitos desses efeitos biolgicos sodiscutidos medida que os agentes farmacolgicos forem intro-duzidos, embora a nfase seja sobre os agentes que regulamo humor.

    INIBIDORES DO ARMAZENAMENTODA SEROTONINAA anfetamina e drogas relacionadas interferem na capacidadedas vesculas sinpticas de armazenar monoaminas, como aserotonina. Por conseguinte, a anfetamina, a metanfetamina e ometilfenidato deslocam a 5HT, a DA e a NE de suas vesculasde armazenamento. Para a depresso atpica e para a depressodo idoso, os estimulantes como a anfetamina,o metilfenidato

    e a modafinila mostraram-se teis como agentes de segundalinha, em parte devido a seus efeitos combinados sobre a seroto-nina, a norepinefrina e a dopamina. Entretanto, esses frmacospodem induzir psicose em pacientes suscetveis, razo pela qual preciso ter cautela no transtorno bipolar. Alm disso, a fen-fluramina e a dexfenfluramina so derivados halogenados daanfetamina que so modestamente seletivos para a 5HT. Essaassociao foi utilizada por pouco tempo nos Estados Unidospara a perda de peso, porm a ocorrncia de cardiotoxicidadegrave levou a seu abandono. Outro derivado da anfetamina, ametilenodioximetanfetamina (MDMA), um inibidor sele-tivo do armazenamento da serotonina e ligante do receptor de5HT. No foi aprovada para uso na prtica clnica, porm repre-senta um problema clnico significativo, em virtude de seu usoilcito (como ecstasy).

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    Farmacologia da Neurotransmisso Serotoninrgica e Adrenrgica Central 193

    INIBIDORES DA DEGRADAO DA SEROTONINAA principal via de degradao da serotonina mediada pelaMAO, e, por conseguinte, os IMAO possuem efeitos significa-tivos sobre a neurotransmisso serotoninrgica. Os IMAO soclassificados com base na sua especificidade para as isoenzimasMAO-A e MAO-B e de acordo com a reversibilidade ou irre-versibilidade de sua ligao. Os IMAO mais antigos no so

    seletivos, e a maioria deles, como a iproniazida,a fenelzinae a isocarboxazida, consiste em inibidores irreversveis. OsIMAO mais recentes, como a moclobemida, a befloxatonae a brofaromina, so seletivos para a MAO-A e ligam-se demodo reversvel, razo pela qual so denominados inibidoresreversveis da monoamina oxidase A (IRMA). A selegilina,um inibidor da MAO-B (ver Cap. 12), tambm inibe a MAO-Aem doses mais altas.

    Os IMAO bloqueiam a desaminao das monoaminas atra-vs de sua ligao flavina funcional da MAO (Fig. 13.5),inibindo-a. Ao inibir a degradao das monoaminas, os IMAOaumentam a 5HT e a NE disponveis no citoplasma dos neu-rnios pr-sinpticos. O aumento dos nveis citoplasmticosdessas monoaminas leva no apenas a um aumento na captao

    e no armazenamento da 5HT e da NE nas vesculas sinpticas,como tambm a algum extravasamento constitutivo das mono-aminas na fenda sinptica.

    Conforme assinalado no Cap. 9, o efeito adverso mais txicodo uso dos IMAO consiste na toxicidade sistmica datirami-na.Como a MAO gastrintestinal e heptica metaboliza a tirami-na, o consumo de alimentos que contm tiramina, como carnesprocessadas, queijos envelhecidos e vinho tinto, pode levar anveis circulantes excessivos de tiramina. A tiramina um sim-paticomimtico indireto, que tem a capacidade de estimular aliberao de grandes quantidades de catecolaminas armazena-das atravs de reverso dos transportadores da recaptao. Essaliberao descontrolada de catecolaminas pode induzir uma cri-se hipertensiva,caracterizada por cefalia, taquicardia, nusea,arritmias cardacas e acidente vascular cerebral. Os IMAO maisantigos no so mais considerados como terapia de primeiralinha para a depresso, devido ao potencial de toxicidade sis-tmica da tiramina; podem ser prescritos apenas para pacientescapazes de comprometer-se a seguir uma dieta desprovida detiramina. Os IMAO mais recentes (isto , os IRMA, que seligam de modo reversvel MAO) so deslocados por concen-traes elevadas de tiramina, resultando em metabolismo sig-nificativamente maior da tiramina e, conseqentemente, menortoxicidade da tiramina. Recentemente, a selegilina (consideradaum inibidor da MAO-B, mas tambm com capacidade de inibira MAO-A cerebral) foi aprovada na forma de disco transdrmi-co, transpondo, assim, o sistema GI. A selegilina transdrmica

    pode exercer uma inibio mxima sobre a MAO-A cerebralem doses que reduzem a MAO-A gastrintestinal em apenas 30 a40%, diminuindo, assim, o risco de crise hipertensiva induzidapor tiramina e permitindo ao paciente ter maior liberdade nasua dieta. Os IMAO, assim como outros frmacos antidepres-

    Sntese deNeurotransmissor

    (NE e/ou 5HT)

    Baixo nvel desinalizao

    Baixo nvelde sinalizao

    Nvel teraputicode sinalizao

    Auto-receptorpr-sinptico

    Transportador de NE e/ou 5HT

    Receptorps-sinptico

    Liberao doNeurotransmissor

    EfeitoPs-sinptico

    A Antes do tratamento

    B Tratamento agudo

    C Tratamento de longo prazo

    ATC ou ISRS

    ATC ou ISRS

    Fig. 13.4 Mecanismo postulado do atraso no incio do efeitoteraputico dos frmacos antidepressivos. A. Antes do tratamento, osneurotransmissores so liberados em nveis patologicamente baixos e exercemnveis de retroalimentao auto-inibitria em estado de equilbrio dinmico.O efeito final consiste em nvel basal anormalmente baixo de atividade dosreceptores ps-sinpticos (sinalizao). B. O uso a curto prazo de medicaoantidepressiva resulta em liberao aumentada de neurotransmissor e/ou

    aumento da durao da ao do neurotransmissor na fenda sinptica. Ambosos efeitos produzem aumento da estimulao dos auto-receptores inibitrios,

    com inibio aumentada da sntese de neurotransmissores e da exocitose.O efeito final consiste em reduzir o efeito inicial da medicao, e a atividadedos receptores ps-sinpticos permanece em nveis de pr-tratamento. C. Ouso crnico de medicao antidepressiva resulta em dessensibilizao dosauto-receptores pr-sinpticos. Em conseqncia, ocorre reduo na inibioda sntese de neurotransmissor e da exocitose. O efeito final consiste emaumento de atividade dos receptores ps-sinpticos, levando a uma resposta

    teraputica. NE, norepinefrina. 5HT, serotonina. ATC, antidepressivo tricclico.ISRS, inibidor seletivo da recaptao de serotonina.

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    194 Captulo Treze

    inativados por acetilao no fgado. A excreo ocorre prima-riamente atravs de depurao renal. Os IMAO mais antigos,de ligao irreversvel, so depurados da circulao na formade complexos com a MAO e so inativados efetivamente ape-nas quando uma nova enzima sintetizada. Devido aos efeitosextensos do IMAO sobre as enzimas do citocromo P450 dofgado, esses frmacos podem causar numerosas interaesmedicamentosas. Todos os membros da equipe mdica de um

    paciente devem prescrever outros frmacos com cautela quandoo paciente estiver em uso de IMAO.

    INIBIDORES DA RECAPTAOO tnus serotoninrgico mantido no estado de equilbriodinmico atravs do equilbrio entre a liberao e a recaptaodo transmissor. Assim, os inibidores do transportador da recap-tao de serotonina (SERT) aumentam tipicamente a quanti-dade de 5HT no espao extracelular. Esses frmacos aliviamos sintomas de uma variedade de transtornos psiquitricoscomuns, incluindo depresso, ansiedade e transtorno obses-sivo compulsivo. So utilizadas trs classes de inibidores da

    recaptao: os antidepressivos tricclicos (ATC) no-seletivos,osinibidores seletivos da recaptao de serotonina (ISRS)e os inibidores da recaptao de serotoninanorepinefrina(IRSN) mais recentes. Cada classe discutida adiante, segui-da de uma discusso dos antidepressivos atpicos que no seenquadram claramente em nenhuma dessas trs categorias.

    Antidepressivos Tricclicos (ATC)Os ATC devem o seu nome sua estrutura qumica comum, queconsiste em trs anis que incluem dois anis aromticos fixadosa um anel de ciclo-heptano. O prottipo dos ATC a imipra-mina, e outros membros dessa classe incluem a amitriptilina,a desipramina,a nortriptilina e a clomipramina (que um

    agente de primeira linha para o transtorno obsessivo-compul-sivo). Os ATC com aminas secundrias afetam principalmenteo sistema da NE, enquanto aqueles com aminas tercirias atuamprimariamente no sistema da 5HT. Foram tambm desenvolvi-dos antidepressivos tetracclicos, que incluem a maprotilina,porm esses frmacos no so amplamente utilizados.

    Os ATC inibem a recaptao da 5HT e NE da fenda sinp-tica atravs do bloqueio dos transportadores de recaptao da5HT e da NE, respectivamente. Esses agentes afetam a recap-tao da DA (Fig. 13.5). O mecanismo molecular da inibiodos transportadores ainda no foi elucidado. Como o maiortempo de permanncia do neurotransmissor na fenda sinpticaleva a uma ativao aumentada dos receptores, os inibidoresda recaptao produzem uma intensificao das respostas ps-

    sinpticas. Apesar das afinidades amplamente variveis pelostransportadores da recaptao de 5HT e de NE, os ATC soacentuadamente semelhantes na sua eficcia clnica. Os ATCtambm so teis no tratamento das sndromes de dor e, comfreqncia, so utilizados para essa indicao em doses maisbaixas do que aquelas necessrias para produzir efeitos antide-pressivos. Mostram-se particularmente teis no tratamento daenxaqueca, de outros distrbios de dor somtica e na sndromeda fadiga crnica.

    O perfil de efeitos adversos dos ATC resulta de sua capaci-dade de ligao a diversos canais de receptores, alm de seusalvos teraputicos. Os efeitos adversos mais perigosos dos ATCenvolvem o sistema cardiovascular. Os ATC parecem afetar oscanais de sdio de modo semelhante quinidina. Os efeitoscolaterais dos ATC semelhantes aos da quinidina incluem atra-

    A

    B

    Serotonina

    Na+

    5-hidroxindolacetaldedo

    5HT

    5HT5HT

    5HT

    5HT

    5HT

    5HT

    5HT

    5HT

    Receptor 5HT1D(auto-receptor)

    Dopamina

    Antidepressivos tricclicos(ATC)

    Antidepressivos tricclicos(ATC) Inibidores seletivos da

    recaptao de serotonina(ISRS)

    Reserpina

    Na+

    DOPGAL

    IMAO

    DA

    DA

    H+

    H+

    NE

    NE

    NE

    NE

    IMAO

    Reserpina

    VMAT

    VMAT

    Receptora

    2-adrenrgico

    (auto-receptor)

    Fig. 13.5 Locais e mecanismos de ao dos frmacos antidepressivos.Oslocais de ao dos agentes antidepressivos e da reserpina (que pode induzirdepresso) esto indicados nos neurnios noradrenrgicos (A)e nos neurniosserotoninrgicos (B). Os inibidores da monoamina oxidase (IMAO) inibema enzima mitocondrial, a monoamina oxidase (MAO); o aumento resultantedas monoaminas citoslicas leva a uma captao vesicular aumentada deneurotransmissor e a um aumento de sua liberao durante a exocitose. Osantidepressivos tricclicos (ATC) e os antidepressivos heterocclicos inibem tanto

    o transportador de norepinefrina (NET) quanto o transportador de serotonina(SERT), resultando em nveis elevados de NE e de 5HT na fenda sinptica. Osinibidores seletivos da recaptao de serotonina (ISRS) inibem especificamentea recaptao da 5HT mediada pelo SERT. Os ATC, os antidepressivosheterocclicos e os ISRS aumentam a durao de ao dos neurotransmissoresna fenda sinptica, resultando em aumento da sinalizao distal. A reserpina,que tem a capacidade de induzir depresso em seres humanos e modelosanimais, bloqueia a captao mediada pelo VMAT de monoaminas nas vesculassinpticas, destruindo, em ltima anlise, as vesculas.

    sivos, podem precipitar episdios manacos ou hipomanacosem alguns pacientes bipolares.

    Todos os agentes antidepressivos, incluindo os IMAO, sohidrofbicos e atravessam a barreira hematoenceflica. Sobem absorvidos por via oral e metabolizados a metablitosativos pelo fgado. Subseqentemente, esses metablitos so

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    so potencialmente letal da conduo, como bloqueio atrioven-tricular de primeiro grau e bloqueio de ramo. Por conseguinte,os ATC devem ser sempre prescritos com cautela a pacientescom risco de tentativa de suicdio, e deve-se efetuar um ECGpara excluir qualquer possibilidade de doena do sistema deconduo antes de administrar ATC.

    Os ATC tambm podem atuar como antagonistas nos recep-tores muscarnicos (colinrgicos), histamnicos, adrenrgicos e

    dopamnicos. Os efeitos anticolinrgicos so mais proeminen-tes e consistem em sintomas tpicos de bloqueio dos receptoresmuscarnicos de acetilcolina: nusea, vmitos, anorexia, bocaseca, viso turva, confuso, constipao, taquicardia e reten-o urinria. Os efeitos anti-histaminrgicos incluem sedao,ganho de peso e confuso (no idoso). Os efeitos antiadrenr-gicos consistem em hipotenso ortosttica, taquicardia reflexa,sonolncia e tonteira. A hipotenso ortosttica constitui um ris-co particularmente significativo em pacientes idosos, e nessesindivduos necessrio proceder a uma cuidadosa monitori-zao. Por fim, os ATC tambm podem precipitar mania empacientes com transtorno afetivo bipolar.

    Inibidores Seletivos da Recaptao de Serotonina (ISRS)Em 1987, o tratamento da depresso foi revolucionado com aintroduo dos inibidores seletivos da recaptao de seroto-nina (ISRS). O primeiro ISRS introduzido foi a fluoxetina,que continua sendo um dos ISRS mais largamente prescritos.Outros ISRS incluem o citalopram, a fluvoxamina,a paroxe-tina,a sertralinae o escitalopram.Embora a eficincia dosISRS seja semelhante dos ATC no tratamento da depresso,tornaram-se os agentes de primeira linha para o tratamento dadepresso, bem como para a ansiedade e o transtorno obsessivo-compulsivo, devido sua maior seletividade e perfil reduzidode efeitos adversos. Os ISRS tambm so utilizados no trata-mento das sndromes do pnico, transtorno obsessivo-compul-

    sivo e transtorno de estresse ps-traumtico.Os ISRS assemelham-se aos ATC quanto a seu mecanismode ao, com a exceo de que os ISRS so significativamentemais seletivos para os transportadores da 5HT (Fig. 13.5B). Ainibio da recaptao de serotonina aumenta os nveis sinp-ticos de serotonina, produzindo aumento de ativao do recep-tor de 5HT e intensificao das respostas ps-sinpticas. Embaixas doses, acredita-se que os ISRS ligam-se primariamenteaos transportadores de 5HT, ao passo que, em doses mais altas,perdem essa seletividade e ligam-se tambm aos transporta-dores de NE. Apesar de suas estruturas qumicas amplamentevariveis, os ISRS possuem eficcia clnica semelhante dosATC e entre si. Por conseguinte, a escolha de um frmaco fre-qentemente depende de certas questes, como custo e tolerabi-

    lidade dos efeitos adversos. Alm disso, devido variabilidadedas respostas singulares dos pacientes a cada antidepressivo,pode ser necessrio que um paciente utilize mais de um ISRSpara encontrar o frmaco mais efetivo.

    Como os ISRS so mais seletivos do que os ATC em dosesclinicamente efetivas, apresentam um nmero bem menor deefeitos adversos. Os ISRS carecem de cardiotoxicidade sig-nificativa e no apresentam ligao to vida aos receptoresmuscarnicos (colinrgicos), histamnicos, adrenrgicos e dopa-mnicos. Em conseqncia, os ISRS so, em geral, mais bemtolerados do que os ATC. A seletividade aumentada dos ISRStambm significa que esses agentes possuem maior ndice tera-putico do que os ATC. Isso representa um importante aspectono paciente deprimido, que pode tentar cometer suicdio atravsde overdoseintencional de sua medicao.

    Todavia, os ISRS no so totalmente desprovidos de efei-tos adversos. Todos os ISRS podem provocar certo grau dedisfuno sexual. Outro efeito adverso comum consiste emdistrbio gastrintestinal; a sertralina est mais freqentementeassociada com diarria, enquanto a paroxetina est associadacom constipao. Um efeito adverso mais grave observado como uso dos ISRS a sndrome da serotonina,caracterizada porelevao rara, porm perigosa, da 5HT, que pode ocorrer com

    a administrao simultnea de um ISRS e de um inibidor damonoamina oxidase (IMAO; ver adiante). As manifestaesclnicas da sndrome da serotonina consistem em hipertermia,rigidez muscular, mioclonus e flutuaes rpidas do estadomental e dos sinais vitais. Os ISRS tambm podem causarvasoespasmo em uma pequena percentagem de pacientes. Porfim, a exemplo dos ATC e dos IMAO, os ISRS podem causaruma mudana de depresso para mania ou hipomania empacientes com transtorno bipolar. A fluoxetina prescrita para aSra. R no tratamento do TDM foi provavelmente responsvelpelo episdio manaco subseqente. O mecanismo da mudanada depresso para a mania ou hipomania, induzida pelos ISRS,permanece desconhecido.

    Inibidores da Recaptao deSerotoninaNorepinefrina (IRSN)Embora os ISRS sejam agentes de primeira linha teis para otratamento da depresso, existe uma populao significativa depacientes que s responde parcialmente a esses frmacos, par-ticularmente quando existem afeces mdicas ou transtornospsiquitricos co-mrbidos. Sabe-se que os ATC so particu-larmente teis nos casos em que a dor somtica constitui umproblema significativo, embora o amplo perfil de receptoresde ATC tornem a sua prescrio particularmente difcil empacientes com complicaes clnicas ou frgeis. Uma classemais recente de frmacos, os inibidores da recaptao de sero-toninanorepinefrina, que atualmente inclui a venlafaxina ea duloxetina, est se mostrando particularmente til. A ven-lafaxina bloqueia o transportador de recaptao de 5HT e otransportador de recaptao de NE atravs de um mecanismoque depende de sua concentrao; em baixas concentraes,o frmaco comporta-se como um ISRS, ao passo que, emconcentraes elevadas, aumenta tambm os nveis de NE. Aduloxetina tambm inibe especificamente a recaptao de NEe de 5HT, e o seu uso foi aprovado para o tratamento da dorneuroptica e de outras sndromes de dor, alm do tratamentoda depresso.

    ANTIDEPRESSIVOS ATPICOSOs outros frmacos que interagem com mltiplos alvos soalgumas vezes designados como antidepressivos atpicos eincluem a bupropiona, a mirtazapina, a nefazodona e a tra-zodona. So considerados juntos aqui apenas pelo fato de nose enquadrarem convenientemente em outras categorias. Essesagentes, que so mais novos do que os ATC, atuam atravsde vrios mecanismos diferentes, embora alguns deles tenhammecanismos de ao desconhecidos ou que ainda no foramtotalmente caracterizados.

    A bupropiona parece atuar de modo mecnico, como asanfetaminas, e mostra-se particularmente til no tratamento dadepresso atpica, visto que aumenta os nveis de serotonina ede dopamina no crebro. A bupropiona o antidepressivo commenores efeitos adversos sexuais. Acredita-se tambm que esse

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    frmaco induz menor mudana para a mania, em comparaocom outros antidepressivos. A principal contra-indicao parao uso da bupropiona consiste na presena de distrbio con-vulsivo concomitante, visto que o frmaco diminui o limiarconvulsivo.

    A mirtazapina bloqueia os receptores 5HT2A, 5HT2C e oauto-receptor 2-adrenrgico e, presumivelmente, diminui aneurotransmisso nas sinapses 5HT2, enquanto aumenta a neu-

    rotransmisso da NE. A mirtazapina um potente sonfero, bemcomo estimulante do apetite, tornando-a um antidepressivo par-ticularmente til para a populao idosa (que freqentementeapresenta insnia e perda de peso).

    A nefazodona e a trazodona tambm bloqueiam os recep-tores 5HT2ps-sinpticos e so discutidos adiante.

    De modo global, os antidepressivos atpicos apresentamrelativamente poucos efeitos adversos e exibem eficcia clni-ca semelhante, a despeito de seus mecanismos de ao e alvosmoleculares amplamente heterogneos.

    AGONISTAS DOS RECEPTORES DE SEROTONINA

    Os alcalides do esporo do centeio so agonistas do receptorde serotonina (5HTR) de ocorrncia natural. Vrias dzias dealcalides do esporo do centeio estruturalmente semelhantesso elaboradas pelo fungo do centeio, Claviceps purpurea.Muitos alcalides do esporo do centeio de ocorrncia naturalproduzem vasoconstrio intensa em decorrncia de sua aocomo agonistas dos 5HTR no msculo liso vascular. Essaao era responsvel pelo ergotismodescrito na Idade Mdiacomo Fogo de Santo Antnio, em que os indivduos queconsumiam cereais infectados pelo fungo apresentavam vaso-constrio perifrica grave, resultando em necrose e gangrena.Nos tempos mais modernos, diversos alcalides do esporo docenteio passaram a ser utilizados clinicamente. A dietilamida docido lisrgico (LSD), um alcalide do esporo do centeio semi-

    sinttico, tem sido de interesse para psiquiatras (e outros profis-sionais), devido s alucinaes e disfuno sensorial que provocaem doses pequenas, de apenas 50 g, em seres humanos.

    Os agonistas seletivos para subtipos do 5HTR tornaram-seum alvo teraputico de interesse crescente nessa ltima dca-da. Esses agentes so utilizados primariamente no tratamentoda ansiedade e da enxaqueca. A buspirona um ansiolticono-benzodiazepnico que no se liga aos receptores de GABAmas que atua como agonista seletivo do 5HT1AR. No seda-tivo e apresenta propriedades ansiolticas moderadas. Emborafreqentemente no seja to efetivo clinicamente quanto umbenzodiazepnico, trata-se de um frmaco interessante, vistoque no produz adico e carece de potencial de abuso.

    Acredita-se que a enxaquecaseja precipitada por vasodila-

    tao cerebral, com ativao subseqente das fibras pequenaspara a dor. Foi constatado que uma classe de agonistas seletivosda serotonina (agonistas 5HT1) particularmente efetiva no tra-tamento da enxaqueca, presumivelmente devido a seus potentesefeitos vasoconstritores. A sumatriptana o prottipo do ago-nista do 5HT1DR desse grupo, coletivamente conhecido comotriptanas e que tambm inclui a rizatriptana,a almotriptana,a frovatriptana,a eletriptanae a zolmitriptana.As triptanas,bem como o alcalide do esporo do centeio menos seletivo,a ergotamina,atuam sobre o 5HT1R na vasculatura, alterandoo fluxo sangneo intracraniano. Esses agentes so de grandeutilidade para as crises agudas de enxaqueca quando tomadosno incio do episdio, mais do que como profilaxia. Devemser administrados no incio de uma enxaqueca (idealmente porocasio da aura) para bloquear efetivamente a ativao dos

    receptores de dor. Acredita-se que as triptanas ativam tantoo 5HT1DR quanto o 5HT1BR. No SNC, ambos os subtipos dereceptores so encontrados nas terminaes pr-sinpticas deuma variedade de neurnios na vasculatura.

    Existe um nmero relativamente pequeno de agonistas do5HT2R utilizados clinicamente. A trazodona um pr-fr-maco que convertido em metaclorofenilpiperazina (mCPP),um agonista 5HT2A/2CR seletivo utilizado no tratamento da

    depresso e da insnia. A trazodona utilizada principalmentecomo sonfero, visto que as doses mais altas necessrias paraproduzir efeitos antidepressivos so habitualmente muitosedantes. O derivado do esporo do centeio, a metisergida, um agonista parcial do 5HT2R, mas tambm possui efei-tos adrenrgicos e muscarnicos; no mais disponvel nosEstados Unidos.

    A serotonina e os receptores de serotonina so abundantesno trato gastrintestinal. A serotonina um mediador crticoda motilidade gastrintestinal, mediada, em grande parte, pelo5HT4R. A cisaprida, um agonista do 5HT4R e que tambmaumenta a liberao de acetilcolina do plexo mioentrico, induzmotilidade gstrica. Todavia, a cisaprida foi retirada do mer-cado nos Estados Unidos, devido a preocupaes quanto suasegurana, em virtude da ocorrncia de prolongamento QT earritmias cardacas.

    ANTAGONISTAS DOS RECEPTORES DE SEROTONINAOs antagonistas dos receptores da serotonina so frmacos cadavez mais importantes em terapia. A exemplo de muitos ligan-tes de receptores, esses antagonistas exibem graus variveisde seletividade para subtipos de receptores e, com freqn-cia, apresentam reao cruzada com receptores adrenrgicos,histamnicos e muscarnicos. Essa propriedade vantajosa emalguns casos (por exemplo, antipsicticos atpicos), mas tam-bm pode limitar sua utilidade clnica, devido a efeitos adversos

    intolerveis.A cetanserina um antagonista do 5HT2A/2CR, com consi-dervel atividade -adrenrgica. Reduz a presso arterial emgrau semelhante ao dos bloqueadores e tem sido utilizadatopicamente para reduzir a presso intra-ocular no glauco-ma.

    A ondansetrona um antagonista do 5HT3R. Esse frmacopossui interesse particular, visto que, entre todos os recepto-res monoamnicos atualmente identificados, apenas o 5HT3R receptor ionotrpico que pertence superfamlia de recep-tores pentamricos nicotnicos de acetilcolina. Os 5HT3R soexpressos no sistema nervoso entrico, nas terminaes ner-vosas do vago e no SNC, particularmente na zona de gatilhoquimorreceptora. A ondansetrona um poderoso antiemtico,

    que especificamente utilizada como adjuvante na quimiote-rapia do cncer ou em casos de nusea refratria. Em virtudede seu mecanismo de ao, exerce pouco efeito sobre a nuseaprovocada pela vertigem.

    Acredita-se que a sndrome do intestino irritvel (SII) sejaprimariamente um distrbio de motilidade gastrintestinal, par-ticularmente no clon. Os pacientes podem sofrer episdiosde diarria, constipao ou ambas, com clica gastrintestinalsignificativa. Os antagonistas do 5HT4R, o tegaserode e a pru-caloprida,aumentam a motilidade gastrintestinal e mostram-seefetivos no tratamento da constipao associada SII. A alose-trona um antagonista do 5HT3R, que diminui o tnus seroto-ninrgico nas clulas intestinais, com conseqente reduo damotilidade. Mostra-se particularmente til para o controle dadiarria associada SII.

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    Farmacologia da Neurotransmisso Serotoninrgica e Adrenrgica Central 197

    ESTABILIZADORES DO HUMOREm 1949, um pesquisador australiano observou que o ltioexercia um efeito calmante sobre animais e aventou a hiptesede que o ltio pudesse ter um efeito semelhante em pacientesmanacos. Estudos subseqentes apoiaram essa hiptese. Essadescoberta estimulou a realizao de pesquisas intensas sobreos efeitos bioqumicos do ltio e os mecanismos pelos quais esse

    frmaco exerce efeitos antimanacos. Embora a pesquisa sobreo ltio tenha fornecido alguns dados, os mecanismos respon-sveis pelos seus efeitos psiquitricos ainda no esto bemelucidados. Aproximadamente na mesma poca, foi constatadoque as medicaes antidepressivas podem precipitar episdiosmanacos em alguns pacientes com TDM. O mecanismo peloqual os agentes antidepressivos induzem a mudana do TDMpara o transtorno bipolar tambm est pouco elucidado.

    Na dcada de 1970, alguns pesquisadores sugeriram a possi-bilidade de que a mania poderia estar relacionada com a epilep-sia, visto que ambos os distrbios exibem padres episdicosque envolvem uma hiperatividade cerebral. Pesquisas subse-qentes no corroboraram essa relao, porm foi constatadoque os anticonvulsivantes, como a carbamazepinae o cidovalprico,apresentam alguma eficcia no tratamento do TABP.A carbamazepina, o cido valprico e a lamotrigina (ver Cap.14) so utilizados no tratamento da mania e depresso bipolar,bem como na preveno de episdios futuros de transtorno dohumor. Tradicionalmente, o termo estabilizador do humor temsido utilizado para referir-se tanto ao ltio quanto ao cido val-prico. O ltio e a lamotrigina so mais teis para a depressobipolar. O cido valprico considerado de maior utilidadepara a irritabilidade e a impulsividade.

    Devido semelhana dos sintomas psicticos apresentadosdurante a mania com aqueles observados na esquizofrenia (aluci-naes auditivas, alucinaes de comando, parania persecutriae hiper-religiosidade), os antipsicticos tambm tm sido utiliza-

    dos com sucesso no tratamento da mania. A olanzapina, a risperi-dona e o aripiprazol (discutidos no Cap. 12) possuem indicaesespecficas para o transtorno afetivo bipolar, embora no sejamgeralmente considerados como estabilizadores do humor.

    LtioO ltio,que comumente administrado na forma de carbonatode ltio, um pequeno ction monovalente, cujas propriedadeseletroqumicas assemelham-se s do sdio e do potssio. Emconcentraes teraputicas, o ltio penetra nas clulas atravsdos canais de Na+. Como o ltio pode imitar outros ctionsmonovalentes pequenos, possui o potencial de afetar quais-quer protenas e transportadores que necessitam de co-fatores

    de ctions especficos.O ltio exerce numerosos efeitos em nvel intracelular.

    Seu efeito sobre a regenerao do inositol para a sinalizaode segundos mensageiros foi particularmente bem estudado,embora esse efeito no seja necessariamente essencial para suasaes teraputicas. Na via lipdica do inositol, os receptoresacoplados protena G (como os receptores 5HT2) ativam afosfolipase C (PLC), que cliva o fosfatidilinositol 4,5-difosfato(PIP2) nas molculas de sinalizao, o diacilglicerol (DAG) eo inositol 1,4,5-trifosfato (IP3). A sinalizao do IP3 inter-rompida pela sua converso em inositol 4,5-difosfato (IP2),diretamente ou atravs de um intermedirio IP4. O ltio inibetanto a inositol fosfatase, que desfosforila o IP2 a fosfato deinositol (IP

    1), quanto a inositol fosfatase, que desfosforila o

    IP1 a inositol livre. Como o inositol livre essencial para a

    regenerao de PIP2, o ltio bloqueia efetivamente a cascata desinalizao do fosfatidilinositol no crebro. Apesar de o inositolcircular livremente no sangue, ele no consegue atravessar abarreira hematoenceflica. Os dois mecanismos de sntese deinositol nos neurnios do SNC regenerao a partir do IP 3e sntese de novo a partir da glicose-6-fosfato so ambosinibidos pelo ltio. Ao bloquear a regenerao do PIP2, o ltioinibe a neurotransmisso adrenrgica central, muscarnica e

    serotoninrgica.A princpio, acreditou-se que a ruptura da cascata de sinali-

    zao do fosfatidilinositol fosse o principal mecanismo da aoestabilizadora do humor do ltio. Entretanto, estudos recentessugerem que outras aes do ltio tambm podem ser rele-vantes. Essas aes incluem: aumento da neurotransmisso da5HT atravs de aumento na sntese e liberao do neurotrans-missor; diminuio da neurotransmisso da NE e DA atravsda inibio da sntese, armazenamento, liberao e recaptaodos neurotransmissores; inibio da adenilil ciclase atravs dodesacoplamento das protenas G dos receptores de neurotrans-missores; e alterao dos gradientes eletroqumicos atravs dasmembranas celulares com substituio dos canais de Na+e/ou

    bloqueio dos canais de K

    +

    . Os possveis efeitos neurotrficosdo ltio tambm esto sendo investigados.O ltio apresenta uma janela teraputica estreita e ampla

    gama de efeitos adversos, levando os pacientes, como a Sra. R,a preocupar-se quanto a suas possveis reaes adversas. A into-xicao aguda pelo ltio,uma sndrome clnica caracterizadapor nusea, vmitos, diarria, insuficincia renal, disfunoneuromuscular, ataxia, tremor, confuso, delrio e convulses, uma emergncia mdica cujo tratamento pode exigir dilise.A hiponatremia ou a administrao de agentes antiinflamatriosno-esterides (AINE) pode levar a uma reabsoro aumentadade ltio no tbulo proximal e elevao das concentraes plas-mticas de ltio para nveis txicos.

    A inibio da entrada de K+nos micitos pelo ltio resulta em

    anormalidades na repolarizao, com conseqente anormalida-de das ondas T observadas no ECG. Alm disso, o potencial el-trico transmembrana desviado, visto que a inibio da entradade K+ nas clulas leva ao desenvolvimento de hipercalemiaextracelular e hipocalemia intracelular. Esse desvio no poten-cial eltrico transmembrana expe o paciente a maior risco deparada cardaca sbita em decorrncia de pequenas alteraesno equilbrio do potssio.

    Tanto o hormnio antidiurtico quanto o hormnio tireo-estimulante ativam a adenilil ciclase, que inibida pelo ltio.Atravs desse mecanismo, o tratamento com ltio tambm podelevar ao desenvolvimento de diabetes inspido nefrognico ehipotireoidismo e/ou bcio.

    Devido ampla gama de efeitos adversos que podem acom-panhar o tratamento com ltio, e devido euforia que pode estarassociada a episdios manacos ou hipomanacos, muitos pacien-tes hesitam em iniciar o tratamento. Todavia, o ltio e um nmerolimitado de outros agentes estabilizadores do humor (ver Resu-mo Farmacolgico) ajudam a impedir os episdios depressivos,bem como a mania. Alm disso, o ltio a nica medicao quedemonstrou, nos estudos clnicos realizados, reduzir o risco desuicdio em pacientes com transtorno bipolar.

    nConcluso e Perspectivas Futuras

    Este captulo tratou da neurotransmisso monoamnica central,primariamente da via da serotonina, mas tambm das vias danorepinefrina e, em menor grau, da dopamina. A serotonina um mediador crtico do humor e da ansiedade, que tambm

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    est envolvido na fisiopatologia da enxaqueca e da SII. Estecaptulo enfocou a classe de frmacos antidepressivos. A teoriamonoamnica da depresso forma a base para a fisiopatologia eo tratamento do TDM, embora essa teoria possua inconsistn-cias, exigindo um estudo mais aprofundado. A terapia comfrmacos que aumentam as concentraes sinpticas de 5HTe NE mostra-se efetiva em muitos casos de TDM e constitui abase do tratamento desse distrbio. A demora entre a instituio

    do tratamento e o aparecimento de uma melhora clnica podeocorrer devido a mudanas lentas na sensibilidade dos auto-receptores pr-sinpticos.

    Os ATC, os ISRS, os IMAO e outros antidepressivos pos-suem eficcia clnica semelhante quando testados em grupos depacientes, embora cada paciente em particular possa respondera um frmaco e no a outro. Os ATC inibem no-seletivamen-te os transportadores da recaptao de 5HT e NE (alm deoutros receptores). Os ISRS bloqueiam de modo seletivo ostransportadores de 5HT; os ISRN bloqueiam seletivamente ostransportadores da recaptao de 5HT e NE; e os IMAO inibema degradao da 5HT e da NE. A escolha do antidepressivo paracada paciente depende de duas metas: encontrar um agente efe-

    tivo para o paciente e minimizar os efeitos adversos. O tipo desintomas depressivos observados no paciente pode sugerir umamodalidade de tratamento em relao a outra. Devido ao ndiceteraputico favorvel dos ISRS, tornaram-se os antidepressivosmais comumente prescritos e representam a escolha de primeiralinha para o TDM, a ansiedade, o transtorno obsessivo-compul-sivo e o transtorno de estresse ps-traumtico.

    O TABP est bem menos elucidado do que o TDM emtermos de fisiopatologia e mecanismos subjacentes ao trata-mento efetivo. Os agentes empregados no tratamento do TABPincluem o ltio, os anticonvulsivantes e os antipsicticos. O ltioe o cido valprico so considerados estabilizadores do humor,visto que limitam os extremos da mania e da depresso, todavia,seus mecanismos de ao ainda no esto bem elucidados.

    Os recentes avanos no desenvolvimento de frmacos parao tratamento do TDM enfocaram uma compreenso mais pro-

    funda do mecanismo de ao dos frmacos atuais e fisiolo-gia de seus alvos moleculares. Os antidepressivos atualmenteaprovados so administrados como misturas racmicas, e oisolamento de estereoismeros ativos, como o S-citalopram,pode produzir frmacos mais bem tolerados. As abordagensfarmacogenmicas revelaram polimorfismos no transportadorda recaptao de 5HT, passveis de afetar a probabilidade deresposta do indivduo ao tratamento com ISRS. Por conseguin-

    te, a farmacogenmica poder levar a um melhor ajuste dosfrmacos aos pacientes, atravs da identificao dos indivduosque particularmente apresentam tendncia ou no a respondera um frmaco especfico ou a toler-lo. Outros alvos farmaco-lgicos alm dos sistemas monoamnicos tambm so promis-sores, incluindo antagonistas neuropeptdicos da substncia Pe hormnio de liberao da corticotropina.

    nLeituras Sugeridas

    Arane GW, Hyman SE, Rosenbaum JF. Handbook of Psychiatric DrugTherapy. 4th Ed. Philadelphia:Lippincott Williams & Wilkins,2000. (Livro de Psiquiatria que enfatiza a compreenso molecu-lar dos transtornos psiquitricos, inclusive transtorno depressivo

    maior e transtorno bipolar, e os frmacos prescritos para trataresses transtornos.)

    Price LH, Heninger GR. Lithium in the treatment of mood disorders.NEngl J Med1994;331:591594. (Reviso do ltio e de seus possveismecanismos de ao no transtorno bipolar.)

    Richelson E. Pharmacology of antidepressants. Mayo Clin Proc2001;76:511527. (Resumo amplo e meticuloso dos mecanismosmoleculares e dos alvos celulares dos medicamentos antidepres-sivos.)

    Santarelli L, Saxe M, Gross C, et al. Requirement of hippocampalneurogenesis for the behavioral effects of antidepressants. Science2003;301:805809. (Artigo que descreve pesquisa sobre o trans-torno depressivo maior.)

    Tkachev D, Mimmack ML, Ryan MM, et al. Oligodendrocyte dysfunc-tion in schizophrenia and bipolar disorder. Lancet2003;362:798

    805. (Artigo que descreve pesquisa sobre o transtorno afetivobipolar.)

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