introdução à medições em física experimental med em fis exp.pdfcaso 1: anamorfose 56 3.3.2....

72
Introdução à Medições em Física Experimental Edson Giuliani R. Fernandes

Upload: dohanh

Post on 03-Apr-2018

217 views

Category:

Documents


3 download

TRANSCRIPT

Introdução à Medições em

Física Experimental

Edson Giuliani R. Fernandes

Prefácio

Este texto foi escrito visando aos alunos de nossos cursos de física

experimental, tanto físicos como engenheiros, servindo como complemento a usual

apostila: Laboratório de Física Geral 1. A presente apostila visa satisfazer tanto a

necessidade de material textual, em nosso idioma, quanto uma atualização da

terminologia e do cálculo de incertezas. Trata-se de uma introdução à Teoria dos Erros e

à experimentação em física. Deve, portanto, ser utilizada como manual de consulta

prévia para a realização das práticas de física (medições e construção de modelos).

Nesta primeira versão, atentou-se aos fundamentos da teoria e às concepções

envolvidas. Preferiu-se, sempre que possível, a análise sintética dos tópicos aqui

abordados. O texto está organizado como segue: Tem-se uma introdução sobre a

metodologia científica e o lugar da experimentação na epistemologia, ou seja, uma das

interpretações dadas ao conceito de “verdade científica”. No Capítulo 1, se discute a

questão da percepção humana na quantificação de grandezas, o conceito de medição e a

utilização de algarismos significativos em sua representação. A questão das incertezas,

Tipo A e Tipo B; os tipos de erros experimentais; alguns aspectos estatísticos e

propriedades das incertezas são discutidos no Capítulo 2. Também é visto a propagação

de incertezas em medidas indiretas. A construção de modelos e a utilização de gráficos

são vistos no Capítulo 3. É dado ênfase à linearização de curvas e ao método dos

mínimos quadrados (este, demonstrado segundo o método da máxima verossimilhança,

recorrendo à estatística). Ao final, é dada bibliografia para quem queira aprofundar um

pouco mais no assunto. Espera-se que este material seja de grande proveito aos alunos,

fazendo-os entender que a experimentação requer tanta conceituação quanto às

disciplinas teóricas. Mais que isso: em alguns aspectos, trata-se de uma arte!

Agradeço ao meu irmão, Luciano R. S. Fernandes, pela fotografia da capa.

Também agradeço ao meu antigo professor de laboratório de Física Geral, Prof. Dr.

Piotr Trzesniak, e aos coordenadores dos cursos de física experimental do Instituto

de Física de São Carlos (IFSC/USP): Prof. Dr. Tito José Bonagamba e Prof. Dr.

Valmor R. Mastelaro.

Qualquer erro encontrado aqui se deve unicamente ao autor.

São Carlos, 23 de maio de 2013

Edson G. R. Fernandes

Índice

Introdução 1

Metodologia científica e experimentação 2

Capítulo 1 – Algarismos significativos 6

1.1 Medição e padrão de medição 6

1.2. A codificação das percepções 8

1.3. Operações com algarismos significativos 10

1.4. Regras de arredondamento 12

1.5. Notação científica 13

1.6. Casos especiais 14

Capítulo 2 – Incertezas 17

2.1. A incerteza 17

2.2. Tipos de erros 20

2.2.1. Erros experimentais grosseiros 20

2.2.2. Erros experimentais intrínsecos 20

2.3. Avaliação de incertezas Tipo A 21

2.3.1. Valor médio 23

2.3.2. Distribuição normal 23

2.3.3. Rejeições 30

2.3.4. Incerteza padrão 31

2.4. Exatidão e precisão de uma medição 38

2.5. Propagação de incertezas 40

2.6. Reprodutibilidade e repetitividade 46

2.7. Instrumentação eletrônica 47

Capítulo 3 – Construção de modelos 50

3.1. Modelos empíricos 50

3.2. Gráficos 52

3.3. Linearização e escalas logarítmicas 54

3.3.1. Caso 1: Anamorfose 56

3.3.2. Caso 2: Linearização da função potencial 56

3.3.3. Caso 3: Linearização exponencial 56

3.4. Método dos mínimos quadrados 57

3.4.1. Ajuste para uma reta que passa pela origem 62

3.4.2. Barras de incerteza 63

3.4.3. Coeficiente de correlação R 65

Referências bibliográficas 66

1

Introdução

"In physical science the first essential step in the direction of learning any

subject is to find principles of numerical reckoning and practicable methods for

measuring some quality connected with it. I often say that when you can measure what

you are speaking about, and express it in numbers, you know something about it; but

when you cannot measure it, when you cannot express it in numbers, your knowledge is of

a meager and unsatisfactory kind; it may be the beginning of knowledge, but you have

scarcely in your thoughts advanced to the state of Science, whatever the matter may be."

[Lord Kelvin, PLA, vol. 1, "Electrical Units of Measurement", 1883-05-03]

Por meio da experimentação, podemos extrair informações quantitativas (ou

qualitativas) da natureza através das relações existentes entre os fenômenos observados,

expressando-os como uma grandeza física descrita por: um número, uma incerteza e uma

unidade. Experimentar, portanto, significa fazer medições as quais trarão respostas acerca

da validade dos modelos físicos adotados e transcritos em linguagem matemática.

As grandezas podem ser definidas como fundamentais e derivadas. Exemplos de

grandezas fundamentais são: espaço, tempo, massa e carga elétrica -- apesar de poder

existir outras grandezas fundamentais, estas são as principais. Já as grandezas derivadas

são expressas em termos das grandezas fundamentais como, por exemplo, velocidade

escalar (taxa de variação temporal do espaço percorrido por um móvel) e aceleração

escalar (taxa de variação temporal da velocidade).

Espaço e tempo são conceitos primitivos os quais não carecem de explicação

uma vez que tais conceitos são intuitivos. Massa pode ser definida como resultado da

interação entre os corpos, podendo ser expressa por meio de uma balança de braços iguais

(massa padrão) ou dinamicamente (massa inercial) sendo que não há uma diferença entre

essas duas massas (gravitação e inércia representam um único fenômeno físico e depende

do observador). Carga elétrica é o resultado da interação entre dois corpos carregados e

pode ser expressa em termos de múltiplos da carga de um elétron (ou próton) cujo

módulo é (1,602176565 ± 0,000000022) x 10-19

C (o menor valor de carga encontrado).

Embora possamos definir grandezas com base em medições análogas como, por

exemplo, o espaço percorrido expresso por meio de múltiplos de uma barra, feita de

2

material indeformável e não perecível de comprimento L, é usual redefinirmos essas

grandezas em termos de outras mais precisas como, por exemplo, o espaço percorrido em

termos do número de comprimentos de onda de um feixe de luz de certo λ (cuja incerteza

na medição é muito menor!). Outros exemplos são os relógios atômicos: 9.192.631.770

Hz é a frequência de irradiação do átomo de Césio e a incerteza em um relógio atômico é

da ordem de 1,7 x 10-15

, ou seja, uma exatidão de cerca de 1 segundo a cada 20 milhões

de anos! Claro que, quanto maior a precisão, mais caro deve ser o instrumento de

medição!!

Ao expormos a física como uma ciência, devemos especificar ao certo o que vem

a ser ciência e o que se costuma chamar Método Científico.

Metodologia científica e experimentação

Podemos dizer que a metodologia científica surge da dúvida e do

questionamento das ideias primitivas sobre o mundo, as quais eram imersas em lendas e

fábulas. Referenciando os gregos, quatro nomes merecem menção: Pitágoras de Samos

(ca. 580/572 a. C. – ca. 500/490 a. C.), o qual demonstrou relações matemáticas bem

definidas na natureza (para os pitagóricos a essência de todas as coisas é número);

Sócrates (ca. 469/470 a.C. - 399 a.C.) com suas discussões demonstrando a falta de

certeza nas “verdades” aceitas na época (verdades essas motivadas pela ideia de deuses

mitológicos); Platão (428/427 a.C. - 348/347 a.C.) o qual propôs a possibilidade do

conhecimento por meio do conceito da ideia imutável das coisas que nos afetam; e

Aristóteles (384 a.C. - 322 a.C.), o qual foi o grande organizador das ciências e quem

definiu os princípios primitivos do que seria, posteriormente, a Lógica (o posterior estudo

da natureza por meio da experimentação derrubou várias afirmações desse filósofo aceitas

como verdades absolutas até os Sec. XVI e XVII).

Da Vinci (1452 - 1519) propôs uma visão mecanicista do mundo abrindo várias

reinterpretações sobre o corpo humano e a relação, deste, com a de outros corpos numa

proposição mecanicista da própria natureza.

Além das bases gregas de nossa Filosofia ocidental, mais recentemente, sem

dúvida muito da forma como atacamos um problema se deve ao “Discurso sobre o

método”, proposto por Descartes (1596 - 1650). Este, considerado “o primeiro filósofo

3

moderno” e “pai da matemática moderna”, propôs, como método de conhecimento, a

simplificação de certa ideia, e sua redução a ideias mais simples e inquestionáveis a partir

das quais, aceitas sem dúvida nenhuma como axiomas, pudessem ser usadas como base

na construção do nosso conhecimento. Daí, nossas reduções dos fenômenos a

simplificações e aproximações em forma de modelos.

Digna de nota é a busca de uma ordem universal, retomando de certa forma as

ideias pitagóricas, feitas por Johannes Kepler (1571 - 1630). Kepler, cuja mãe foi

queimada viva acusada de bruxaria, deixou muito do misticismo em suas ideias ao

perceber que seus modelos teóricos iniciais conflitavam com os dados experimentais

extraídos por Tycho Brahe (1546 - 1601), um dos maiores experimentadores da história, e

formula as três leis fundamentais da mecânica celeste.

A partir do Sec. XVI, cai a ideia da autoridade como verdade científica assumida

pelos Aristotélicos com a experimentação. A experimentação passa a assumir um papel

fundamental na questão da verdadeira explicação de um fenômeno físico. Galileu Galilei

(1564 - 1642) foi quem propôs a experimentação como juiz na explicação dos fenômenos

do mundo.

Logo após a morte de Galileu, nasce uma das maiores mentes que o mundo já

viu: Isaac Newton (1643 - 1727). Newton o qual, “subindo sobre os ombros dos gigantes”

que o precederam, propõe uma síntese de todo pensamento até ele sobre a “Mecânica

Universal” a qual pode ser explicada, testada e prevista a partir da invenção do cálculo de

“fluxões” – O cálculo diferencial!

Assim, sem adentrarmos muito em questões epistemológicas, podemos propor

um diagrama para o método utilizado em ciências:

4

Figura 1: Diagrama do método científico. Em síntese, a partir das observações e

questionamentos sobre a natureza, delimitamos os fenômenos físicos de interesse, conceituamos,

definimos as condições iniciais e medimos e coletamos dados para o próximo passo: a

construção de um modelo. Este modelo é revestido de linguagem matemática que, por ser um

constructo do intelecto humano, nos leva ao que é verdadeiro matematicamente. A partir daí,

confirmamos nosso modelo pelo conflito, deste, com valores obtidos da própria natureza. Se tudo

estiver bem, testamos nosso modelo a fim de fazermos previsões e, se essas previsões são

satisfeitas, podemos generalizar nosso modelo na criação de leis e teorias.

Como filosofia natural a física se propõe a uma reflexão sobre o todo e as partes

desse todo. E como ciência, tenta gerar leis universais que possam ser comprovadas

matematicamente. Ou seja, restringe no universo de coisas que acontecem ao mesmo

tempo, os fatos relevantes na explicação de um determinado fenômeno. Já na escolha

desse fenômeno, o “observador” terá de restringir o que é importante do que não possui

relevância na análise. Assim, ao mesmo tempo em que se limita ao fato sob estudo,

também se faz aproximações para tirar as irrelevâncias. A esta abstração, primeira ação

do pensamento, cria-se um modelo que deve se basear em certas leis a que os fenômenos

devem se ajustar perfeitamente. Este teste de ajuste só é possível (e daí o termo ciência)

quando relacionamos, por indução, os fatos relevantes que implicam no fenômeno como

passamos a ter certa ideia de como e porque este fenômeno ocorre. Somente com uma

roupagem matemática essa ideia pode ser testada e outros fenômenos, previstos. Sendo a

Universo

Parcela do universo

- Conceitualização

- Debate

- Consenso

DelimitaçãoCondições de contornoAxiomática (princípios)

Hipóteses

Formalização

+

Linguagem Matemática

Modelo

Há outros modelos

NãoSim

Generalização

TeoriaLei

Experimentação

CoerênciaNão

*Retorno

*Retorno: Parcela acrescida ao universo

Consenso Sim

Busca por evidências Ceticismo

(Critérios de aceitação do

conhecimento científico)

(observação, curiosidade, dúvida)

5

matemática, um constructo do intelecto humano e “habitando” somente no “mundo das

ideias”, só pode resultar verdadeira. O teste último de uma lei ou teoria é a

experimentação, gerando valores que podem ser comparados, medidos e reavaliados

realimentando assim o sistema.

A questão, após a obtenção de um modelo físico para certo fenômeno cai na

experimentação, ou seja, na medição de grandezas físicas. A medição se dá por meio de

uma comparação entre grandezas de mesma espécie onde uma delas é padronizada. Por

exemplo, podemos medir o comprimento da aresta de um paralelepípedo por meio de uma

régua graduada. É importante observar que um instrumento de medição se compõe de

uma escala graduada e, para certificarmos que essa escala é válida, calibramos nosso

instrumento por meio de uma escala absoluta (antigamente uma barra feita de um aliga de

irídio e platina, atualmente, por meio de certo comprimento de onda de um laser).

Há dois tipos de medição: Medição direta e Medição indireta de uma grandeza

física.

A medição direta de uma grandeza física se dá pela comparação direta entre a

grandeza e a escala do instrumento utilizado para medi-la. Contudo, há grandezas as quais

não temos acesso diretamente a fim de medi-las. A obtenção do valor dessas grandezas se

faz por meio de medidas indiretas de outras grandezas, das quais a grandeza de interesse é

função. Por exemplo, podemos obter a velocidade de um automóvel por meio de uma

medição direta, usando um velocímetro, ou através da medição indireta do espaço

percorrido e do tempo transcorrido. A relação destas duas variáveis, espaço e tempo, nos

dá a grandeza de interesse velocidade.

Assim, devemos levar em consideração operações matemáticas sobre as

incertezas das grandezas medidas diretamente para o cálculo da incerteza numa medição

indireta (veremos isso com a ideia de propagação de incertezas).

6

Capítulo 1 – Algarismos significativos

1.1. Medição e padrão de medição

Para iniciarmos nossos estudos sobre as leis que regem o universo (no intuito de

extrairmos dados quantitativos) devemos ir além de nossos sentidos imperfeitos, uma vez

que são subjetivos. Por meio de nossas percepções podemos destacar aquelas mais

relevantes, para uma dada situação, e expressá-las em termos de grandezas. Abaixo,

seguem duas pinturas realizadas pelo mestre do impressionismo francês, Claude Monet,

em dois momentos diferentes de sua vida (ao fim da vida, Monet passou a sofrer de

catarata, começando a usar cores mais fortes)-- a catarata funciona como um filtro

amarelo que também escurece a imagem, tendo grande peso na acuidade visual e na

percepção das cores. [1]. Outro impressionista que também apresentava problemas de

visão foi Edgar Degas. Nós mesmos podemos experimentar a subjetividade das nossas

sensações quando observamos que corpos em equilíbrio térmico parecem ter temperaturas

diferentes, p. ex., uma barra metálica e outra de um material isolante elétrico em

equilíbrio térmico aparentam ter temperaturas distintas.

Figura 2: Duas obras de Claude Monet em momentos distintos de sua vida: a primeira foi a que

deu origem ao movimento impressionista: “Impressão, nascer do Sol” (1872); a segunda,

“Ninféias” (1916-1926), pintada já ao fim da vida, após a operação de catarata- a pintura se

apresenta diluída e desfocada, com cores mais fortes.

Assim, as percepções de um indivíduo não podem dizer nada. Não podem

comunicar, uma vez que são próprias de cada um. Quem nunca assistiu ao filme “Festim

Diabólico” (Rope, 1948), de Hitchcock, e não teve a noção de o tempo passar mais

devagar, embora a duração do filme não passasse de 1h20min? (aqui temos os efeitos do

chamado “tempo psicológico”). Muitas das vezes, quando essas percepções são

7

expressas, estão sujeitas às interpretações de quem as descreve: ver caso dos quadros de

Monet [1]. A noção subjetiva de tempo (nosso tempo psicológico) está diretamente

relacionada com nosso relógio biológico: uma percepção pode ser comunicada, porém

está sujeita a reinterpretações uma vez que conceitos como “maior”, “menor”, “mais”,

“menos”, etc. podem ter significados diferentes para cada um: Uma percepção desse tipo

é a comunicação de certa quantidade de água expressa em termos do volume de um

objeto. Para uma comunicação efetiva e objetiva, são necessárias duas percepções de

mesma espécie sendo natural a padronização de uma delas: unidade de medição.

A padronização envolve a comparação de percepções que, num primeiro

momento, são definidas por meio de comparações de igualdade, utilizando os sentidos e,

após, por interpolação. Por exemplo, verificar se a grandeza r é igual ou não a um padrão

p:

Padrão visivelmente diferente:

r

p

Não são iguais! (objetivo)

E para o caso abaixo, onde r parece ser igual a p?

r

p

Sim, são iguais! (subjetivo). Neste caso, a percepção pode coincidir com o

padrão e as grandezas serão iguais.

Quando os sentidos se tornam insuficientes, necessita-se de instrumentos de

medição. O instrumento permite tomar o padrão p e dividi-lo em N partes iguais às quais

serão a menor divisão de nossa escala (ou menor incremento digital ε). Medição,

portanto, é a codificação simbólica de uma percepção sensorial a qual pode ser obtida

diretamente por meio de uma comparação direta com uma escala ou, indiretamente por

meio de alguma relação entre o que se quer medir e outras grandezas (de mesma natureza

ou não) as quais deverão ser medidas diretamente.

8

A medição de uma grandeza física se faz, portanto, por meio de um número

acompanhado de uma unidade ou padrão. Ou seja, quantas vezes a unidade ou padrão foi

tomado na medição. Por exemplo, se dissemos que um pote possui 3,4 metros isto quer

dizer que o poste possui um tamanho 3,4 vezes maior que o padrão adotado: o metro.

Assim, a unidade é definida pelo padrão adotado. Uma vez que certa unidade é tomada

como padrão, devemos certificar que este padrão não se altere com o tempo, para que as

medidas sejam confiáveis e precisas.

1.2. A codificação das percepções

Na codificação de uma percepção se deve ater somente ao que se é capaz de

perceber e nada além dessa informação. Uma vez que os símbolos são mais facilmente

transportados que as percepções, eles devem ser sempre adotados. Para codificar é

necessária uma comparação, e há duas maneiras de se comparar:

Por contagem: Quando a percepção é maior que o padrão, podemos contar o

número de divisões de escala (menor incremento digital ε) do padrão:

AB = 7 ε (seguramente nem 6, nem 8)

Por interpolação: Quando a percepção é menor que o padrão (ou o menor

incremento digital ε) e é expressa por um número único de algarismo não nulo:

A’B’ = 0,8 do padrão

Ou seja, o menor incremento digital ε foi dividido mentalmente em N partes

iguais e uma nova contagem foi realizada, agora, mentalmente (geralmente N vale 2, em

nosso exemplo N é igual a 10!).

A B

ε P O

P O ε

A’

@”

B’

9

Assim, numa medição, devemos incluir:

i) Todos os algarismos resultantes de comparação por contagem.

ii) Um único dígito adicional decorrente de uma interpolação, ainda que resulte

em valor nulo (zeros à direita são informações válidas e não podem ser suprimidos ou

acrescentados aleatoriamente. Ex: 0,0001 possui um único algarismo; já 1,000 Possui 4

algarismos ditos significativos). A interpolação é um pouco subjetiva, ao se repetir uma

observação várias vezes, o resultado poderá variar aleatoriamente - voltaremos a isto

mais tarde quando falarmos de incerteza padrão.

iii) O nome do padrão utilizado (m, cm, mm, g, kg, ºC, K, etc.).

No caso anterior, temos:

AB = 7,8 ε (unidades de medida)

O algarismo 7, foi obtido por contagem.

O algarismo 8, foi obtido por interpolação.

Zeros à esquerda não carregam informação- não há erros em adiciona-los ou

suprimi-los (neste caso, notação científica é sempre bem vinda!):

0,012 Km é o mesmo que 12 m.

0,0120 Km não é o mesmo que 12 m (neste caso, teríamos 12,0 m!).

Aos algarismos encontrados por contagem mais a interpolação são ditos

algarismos significativos (A.S.). Em uma medição, quando expressamos um número por

7 ou 7,00, dissemos que a medição pode variar de 6 a 8 ou 6,99 a 7,99, respectivamente.

O que implica maior ou menor precisão em nossa medição. Portanto, A.S. são os

algarismos necessários para nos referirmos a um valor medido com a mesma precisão da

instrumentação utilizada para medi-lo (obviamente, quanto mais preciso o instrumento

mais caro ele provavelmente será!).

O processo de interpolação é um pouco subjetivo e pode flutuar de pessoa para

pessoa, ou mesmo para a mesma pessoa, ao se repetir o processo. Assim, será adotado um

divisor apropriado e que expressa a divisão mental, da menor divisão do padrão, em N

partes iguais (como dito anteriormente, geralmente se adota o valor 2, para os casos em

10

que as menores divisões do padrão possuem um comprimento de 1 mm. Para

comprimentos de escala maiores, por exemplo 2 mm, adotam-se outros valores, por

exemplo, 4).

Portanto, a medição é um processo de conversão analógico/digital (A/D),

baseando-se em: i) um menor incremento digital (ε), que é a mínima variação que o

instrumento detecta, ou seja, a menor divisão da escala. ii) um contador que registra (em

números inteiros M) a quantos ε corresponde a grandeza S a ser medida. iii) uma

interpolação, µ. iv) o padrão utilizado expresso pela unidade. Logo, a medição S é dada

por:

S=M ε + µ (unidade) (M é um número inteiro, e µ dará o número de casas

decimais)

Medições realizadas por um mesmo instrumento, numa mesma escala, poderão

ter quantidades diferentes de algarismos, contudo, sempre terão a mesma ordem decimal

final fixada por µ.

Tabela 1: Alguns exemplos de grandezas físicas expressas em termos do número de A.S.

Grandeza Número de A.S.

6,67259 6

1,60217730 9

0,0224

3

6,626075 7

- 273,16 5

1.3. Operações com algarismos significativos

Vimos, na sessão anterior, como se procede em casos de medições diretas de

grandezas físicas. Quando se medem diversas grandezas indiretamente devemos adotar

certas regras para melhor expressarmos o resultado final em termos de algarismos

significativos (A.S) uma vez que, as mesmas, resultam da aplicação de ao menos um

operador matemático. Vejamos algumas dessas regras:

11

Tabela 2: Algumas regras para obtenção de A.S. para alguns operadores matemáticos.

Operadores Não é significativo o que estiver além de:

+ ou - Ordem decimal final mais elevada que houver entre

os participantes.

x, /, Sen, Cos, etc. Quantidade de algarismos do participante do

cálculo mais pobre em algarismos.*

Potenciação e radiciação Manter o número de casas decimais da base ou

radicando.*

Logaritmo Contar o número de A.S. do argumento. O resultado

deve possuir o número de casas decimais iguais ao

número de A.S. do argumento.*

*Caso o resultado termine em dígito 1, aumenta-se um algarismo.

A subtração é a única operação em que se pode perder grande quantidade de

informação (em termos de algarismos significativos) em relação ao participante mais

pobre do cálculo. Por isso, adie sempre as operações de subtração.

Caso o resultado comece com o dígito 1, ele terá um A.S. a mais: perceba que

passar de 11 a 12, ou de 12 a 13, nos fornece uma variação de 1 e, portanto, de cerca de

10%. Já, uma variação de 11,0 a 12,0 nos fornece passos de 0,1, ou seja, de cerca de 1%.

Portanto, com o acréscimo de um dígito diminuímos a incerteza gerada pelo dígito 1 que

inicia o resultado.

Exemplos:

A1 = 1,5146 + 0,12 + 451,4 = 453,0

A2 = 28,5383 – 28,520 = 0,0183 (acréscimo de um dígito)

B1 = 5,3 x 7,817 = 41

B2 = 3,0 x 50,02 = 150 = 1,50x102 (acréscimo de um dígito)

B3 = 3,14 x sen(1,993) = 2,8643 = 2,86

C1 = 2,1452 = 4,601

12

D1 = Ln(31,5) = 3,44998 = 3,450 (3 A.S., 3 casas decimais)

Obs.: Quando o erro em uma medição não é mencionado, assumimos que a incerteza esteja

no último dígito (A.S.). Por exemplo: para uma medição resultando 10,94 s, a incerteza assumida é de

0,01 s.

Quando interpolamos o resultado final, truncamos o valor e o arredondamos de

acordo com o valor do próximo dígito encontrado.

1.4. Regras de arredondamento

Quando interpolamos certo valor, teremos de interromper a série de números

neste valor. Porém, desconsiderar todo restante da série pode resultar em um erro

substancial. Assim, interpolamos a grandeza e realizamos um arredondamento para

minimizarmos os demais números perdidos, de acordo com o valor do próximo dígito na

interpolação aplicando as regras:

- Desprezando-se algo que é > 5 aumenta-se 1 na última casa do número que

se conservou.

- Desprezando algo < 5 Deixe como está.

- Para algo = 5, número precedente sempre é par segundo as regras:

i) Mantenha o dígito precedente inalterado se ele for um número par.

ii) Aumente 1 ao dígito precedente se o mesmo for ímpar.

Exemplos:

P1 = 8,768 x 13,1 = 114,8(6)08 = 114,9 (acréscimo de um dígito)

P2 = 3, 483 + 1,23 = 4,71(3) = 4,71

P3 = 3,12 x 0,98 = 3,0(5)76 = 3,0

P4 = 0,32278 x 11 = 3,5(5)058 = 3,6

13

P5 = (2,4664 ± 0,0027) m = (2,466 ± 0,003) m

P6 = (45,1324 ± 1,984) m2 = (45,1 ± 2,0) m

2 = (45 ± 2) m

2

P7 = (0,033445 ± 0,000488) C = (0,03344 ± 0,00049) C = (3,344 ± 0,049)x102 C

Obs.: A norma N2T-DICLA-D21 (2003) diz que o arredondamento deve ser para mais

(acrescenta-se um dígito) se, e somente se, o incremento diminui o valor numérico da incerteza da

medição em mais de 5%.

1.5. Notação científica

Uma vez que zeros à esquerda não são significativos é conveniente expressar a

grandeza com o menor número possível de zeros por meio de um submúltiplo de sua

unidade ou utilizando a notação científica. Ainda, por vezes, é inconveniente e, até

mesmo, imprópria a representação de uma grandeza por um número elevado de zeros (a

questão das casas decimais foi vista em operações com A.S.). Neste caso, a notação

científica se mostra bastante adequada e seu uso se baseia nas potências de dez do valor

apresentado (exemplos B2 e P7 das sessões 1.3 e 1.4, respectivamente). Por exemplo:

1.000.000 pode ser convenientemente escrito como 1,0 x 106 conforme o número

de A.S. adequados, neste caso, 2.

Também empregamos notação científica sempre que queiramos exprimir os

resultados em que a parte significativa não chega à casa das unidades: 47.283 s com 3 AS

resulta: 4,73 x 104 s.

Note que há apenas um algarismo (não nulo) antes da vírgula.

Exemplo:

(0,005329875 ± 0,000015489) m

A representação mais correta seria:

(5,330 ± 0,015) mm - por mudança de unidade

(5,330 ± 0,015)x10-3

m – usando notação científica

14

Revendo a Tabela 1:

Tabela 3: Alguns exemplos de grandezas físicas expressas em termos do número de A.S. e com uso de

notação científica.

Grandeza e unidade Descrição

6,67259 (x10-11

m3s

-2kg

-1) Constante gravitacional G

1,60217730 (x10-19

C) Carga do elétron

22,4 L

Volume molar de um gás

6,626075 (x10-34

Js) Constante h de Planck

- 273,16 ºC Zero absoluto

Obs.: Um dos órgãos responsáveis pela análise e utilização das constantes físicas é o

CODAT: Commitee on Data for Science and Technology).

1.6. Casos especiais

i) Constantes aritméticas em fórmulas possuem infinitos algarismos

significativos.

P. ex.: c=1

mv

ii) Constantes físicas ou irracionais: Por exemplo, a velocidade da luz no vácuo,

c (c não é uma grandeza física experimental pois é obtida diretamente da definição de

metro, ou seja, a distância percorrida pela luz no vácuo em um intervalo de tempo

definido daí, decorre que c = 299.792.458 m.s-1

é um valor exato.

Devem, nos cálculos, serem tomadas com pelo menos 1 A.S. a mais do que a

medida mais pobre.

P. ex.: Cálculo do período de um pêndulo

= √l

g l = 1,216 m (4 AS)

= 3,14159265...

2,000000...

2,000000...

15

g = 9,80667 m.s-2

.: T = 2,212 s (4 A.S.)

Obviamente, quando se usa máquinas eletrônicas, a utilização de todas as casas

decimais disponíveis não causa nenhum problema!

Obs.: As constantes físicas definidas como, p. exe. a velocidade da luz no vácuo (29979458

ms-1

), são expressas por números exatos. Já, as demais constantes físicas são seguidas por suas

incertezas. Por exemplo: Constante de Faraday: (96.485,3365 ± 0,0021) Cmol-1

(para maiores

informações acessar: http://physics.nist.gov/cuu/Constants/).

Um exemplo de número exato é dizer que você tem uma nota de R$ 10,00 reais na carteira

ou, que possui 12 colegas de trabalho!

iii) Comparando dois valores A e B:

Podemos comparar dois valores A e B por meio da variação absoluta de um em

relação ao outro, ou por meio da sua variação relativa, conforme tabela abaixo:

Tabela 4: Comparação entre dois valores A e B.

Variação Absoluta Valor relativo Variação relativa

Com respeito a A B-A B/A B

=B

1

Com respeito a B A-B A/B B

B=

B 1

(com unidade) (sem unidade) (sem unidade)

Surge a questão de como se considerar duas medições de uma mesma grandeza,

com diferentes incertezas, como equivalentes. Suponhamos as medições da grandeza :

e . Podemos verificar a equivalência dos dois valores pela

comparação entre a diferença dos valores medidos e as incertezas da seguinte forma:

Se | | ( ), as medições são equivalentes.

Se | | ( ), as medições não são equivalentes.

16

Se ( ) | | ( ), os resultados do experimento são

inconclusivos e não podemos afirmar se há ou não equivalência entre as duas medições e,

portanto, o experimento deve ser repetido cuidadosamente a fim de se eliminar possíveis

erros sistemáticos.

17

Capítulo 2 – Incertezas

As generalizações feitas em ciência permitem que os resultados de experimentos

similares feitos em lugares distintos sejam semelhantes. Contudo, tais resultados nunca

serão iguais devido às variáveis que fogem ao controle do experimentador e, portanto,

não são levadas em consideração durante o experimento. Assim, resultados obtidos em

um experimento por diferentes experimentadores e em diferentes lugares deverão ser,

embora muito próximos, diferentes. A impossibilidade de se repetir as mesmas condições

iniciais de fato (como dizia Heráclito de Éfeso: “Não se pode banhar no mesmo rio duas

vezes”), leva a um desvio do valor “verdadeiro” denominado erro experimental o qual

pode ser expresso por . Esse desvio se deve às incertezas inerentes à própria

experimentação e serão discutidas nesta sessão. Além dessas incertezas, também

chamados de erros estatísticos, também serão discutidos os erros grosseiros e erros

sistemáticos devidos, respectivamente, ao experimentador “novato” e ao instrumento de

medição ou técnica utilizada para a medição.

2.1. A incerteza

Incerteza aqui tem o mesmo sentido de dúvida e pode ser explicada pelo fato de

que: i) o resultado de uma medição é uma informação limitada ao que se consegue

observar. ii) o valor “verdadeiro” de qualquer grandeza é inatingível, ou seja, as medições

são sempre aproximadas. Ambas têm a ver com a menor divisão da escala do

equipamento utilizado na medição e, portanto, não existe medição “exata”. Podemos

representar o desvio de uma medição, , do seu valor “verdadeiro”, , como a subtração

e, portanto, o erro da medição pode ser dado por (erro é, pois, a diferença entre o

valor medido e o valor real, desconhecido):

( )

Assim, o valor “verdadeiro” de uma medição deve estar no intervalo:

18

Como os algarismos significativos não podem dizer nada a respeito de

aproximações (± 0,1?; ± 0,2?; ± 0,5?), para o conhecimento dessas aproximações,

estabelece-se uma incerteza de medição que, somada e subtraída do valor obtido,

estabelece um intervalo o qual, com máxima segurança, contém o valor verdadeiro (ou

seja, incerteza é a quantificação daquela dúvida inicial). Portanto, a incerteza caracteriza a

dispersão dos valores que podem ser atribuídos ao mensurando, ou seja, a incerteza

delimita o valor do erro (o erro é indeterminado, ou seja, só pode ser determinado à luz

da estatística).

Uma mesma medida tomada mais de uma vez (mesmo pelo próprio observador)

pode resultar em valores diferentes. Para encontrar a incerteza, repete-se n vezes o

procedimento de medição nas mesmas condições iniciais, obtendo-se n leituras da

grandeza de interesse. Supondo valores estatisticamente independentes (ou seja, a matriz

de covariância para as n medições é diagonal: ver [2]), essas leituras devem flutuar em

torno do valor “verdadeiro”. É com base nessas medidas, que se define um valor central,

ou representativo, e a incerteza (veremos adiante que uma boa estimativa para o valor

“verdadeiro” é a média aritmética das n leituras). A figura abaixo mostra uma escala onde

foram feitas n leituras (medições), a seta indica o valor central (valor esperado da

medição “verdadeira”, ou seja, o valor médio) e a incerteza expressa por Δ.

Figura 3: A figura mostra uma série de medições de certa grandeza destacando o

valor médio e a distribuição dos valores em relação ao valor médio. A incerta é

dada por Δ.

Mais uma vez, Δ é a incerteza (± Δ fornece o intervalo de medida que, com

máxima segurança (e certo grau de confiança), contém o valor verdadeiro).

A incerteza é sempre positiva e pode ser expressa por um valor absoluto (com

unidades) ou relativo (em %). Deve possuir, no máximo, dois algarismos além de zeros à

1 2 3 4 5 6 6

0

5 3 2 1 0 4

Δ Δ

19

esquerda; e a incerteza e o valor representativo devem ter a mesma ordem decimal final.

Não existe incerteza nula!

Para expressarmos a incerteza, podemos recorrer as seguintes regras [2] (ABNT-

INMETRO (2004)):

Se o primeiro dígito for menor que 3, escrever a incerteza com 2 A.S.

Se o primeiro dígito for maior ou igual a 3, escrever a incerteza com 1 ou 2 A.S.

Quando a incerteza é fruto de uma estimativa ou apenas indicativa (metade do

menor incremento digital da escala do instrumento) usar 1 A.S.

Salvo contrário, para os primeiros dois casos, achamos por bem expressar

sempre a incerteza com 2 A.S.

Duas observações importantes:

i) Usar a mesma potência de dez tanto para o mensurando quanto para

sua incerteza.

ii) Ambos, mensurando e incerteza, devem possuir o mesmo número de

casas decimais (aqui não devemos nos preocupar com os A.S. finais,

pois o valor dependerá da incerteza).

Exemplos:

A Tabela 5 mostra a representação final de uma medição, com sua respectiva

incerteza.

Tabela 5: Representação de grandezas físicas com respectiva incerteza.

Valor representado Incerteza Medida – Intervalo

7,453 Kg 0,012 Kg (7,453 ± 0,012) Kg

4,35 x 10-2 N 12 x 10

-4 N (4,35 ± 0,12) x 10

-2 N

15300 g = 1,5300 x 104 g 100 g = 0,010 x 10

4 g (1,530 ± 0,010) x 10

4 g

3,795 V 10% = 0,38 V (3,80 ± 0,38) V

20

Obs.: Na notação de incertezas, para σ = 1,5 se adotarmos σ = 2 incorremos em erro, pois se

adotando 1 A.S. há uma perda de 25% na informação! Para o caso de adotarmos σ = 2 para as

incertezas: σ1 = 2,5 e σ2 = 1,5 damos a ideia errônea de que as incertezas são iguais, enquanto não são!

Por isso a adoção de 2 A.S. para o primeiro caso.

2.2. Tipos de erros

Vimos as incertezas envolvidas numa medição e como representa-las

corretamente. Veremos, agora, os tipos de erros que podem existir em uma medição.

2.2.1. Erros experimentais grosseiros

São erros decorrentes de falta de cuidado e atenção, e nunca podem ocorrer.

Como não geram incerteza, são erros considerados graves: ainda não há ciência para o

cômputo de tais erros!

Surgem de: Instrumentação visivelmente danificada, falta de ajuste de zero,

leitura equivocada de escala, erros de transcrição de dados, paralaxe: Binóculo e de

movimento (evita-se observando as escalas sempre perpendicularmente, na altura dos

olhos, e com apenas um dos olhos), valores indevidamente lidos ou incorretamente

anotados, etc.

2.2.2. Erros experimentais intrínsecos

São inerentes ao processo de medição, e são eles que definem a incerteza. São

classificados em:

a) Erros sistemáticos: Tais erros afetam uma ou todas as leituras, para mais ou

para menos. (Ex.: Trena calibrada a 20 °C e empregada a 40 °C, assim, os resultados são

todos menores do que deveriam ser; tempo de reação ao se apertar um cronômetro (em

torno de 0,1 s); considerar o seno de um ângulo como o próprio ângulo (experimento do

pêndulo simples); etc.). Na avaliação de incertezas, são chamados de incertezas do Tipo

B.

21

Em princípio podem ser (parcialmente) identificados e compensados, mas

sempre fica um limite de erro sistemático (ou erro sistemático residual), S, que não

mais se sabe se é para mais ou para menos (é uma das parcelas da incerteza). O piso

(mínimo) do S é metade (ou outro valor dependendo da interpolação) do menor

incremento digital da escala empregada (Ex.: para uma régua cujo menor incremento

digital é 1 mm, resultará em S = 0,5 mm; uma balança digital em que o fabricante

garante incerteza de 0,1 g, resultará S = 0,1 g).

b) Erros estatísticos: São os erros casuais, aleatórios, fortuitos: os valores

variam de medição a medição devido a fatores aleatórios os quais estarão sempre

presentes. Na avaliação de incertezas, são também chamados de incertezas do Tipo A e se

necessita de métodos estatísticos para descrevê-las. Afetam as leituras indistintamente

para mais ou para menos, fazendo-as flutuar em torno de um valor médio.

Incertezas do Tipo A são caracterizadas pelo limite de erro estatístico, E, sendo

a segunda parcela da incerteza.

A incerteza total, , é, pois:

= S + E

Obs.: Claro que, para estimarmos as incertezas referentes à instrumentação utilizada,

devemos levar em consideração que as medições sucessivas são similares e independentes. Aqui não

mostraremos os valores de covariância das grandezas medidas [2].

Aqui, ao se mencionar Limite de Erro, queremos dizer uma confiança de 100%

(como ocorre com a metade da menor divisão da escala assumida como S). Quando o intervalo de

confiança é assimétrico, se estabelece uma relação entre e como, por exemplo, (com

confiança assumida como 100% -- de fato, muito próximo disso, como veremos!). Assim, podemos

definir: S = ε/2 e E = 3 .

Foi dito que a incerteza é definida por métodos estatísticos. Adiante, veremos como

podemos relacionar estatisticamente a relação: = S + E.

2.3. Avaliação de incerteza Tipo A

As n observações de certa grandeza g fornecem uma distribuição com n leituras

gi. Tal distribuição nos dá a informação de quem foi encontrado e quantas vezes. Por

22

exemplo, tomemos duas séries de medições (Série A e Série B) da espessura de um fio de

cobre:

Tabela 6: Duas séries, A e B, para medições da espessura de um fio de cobre.

Por meio de histogramas podemos visualizar a distribuição das ocorrências

relativas a cada serie. Primeiro, estabelecemos um intervalo de valores (chamado, em

estatística, de intervalo de classes) e contamos o número de ocorrências em cada

intervalo, neste caso, nosso intervalo vale 0,01 mm:

Figura 4: Histogramas referentes às duas séries de medições mostradas na Tabela 5.

Série A Série B

Medição

± 0,05 (mm) Ocorrência

Medição

± 0,05 (mm) Ocorrência

2,13 1 2,13 1

2,14 2 2,14 1

2,15 3 2,15 3

2,16 5 2,16 5

2,17 6 2,17 8

2,18 8 2,18 12

2,19 7 2,19 10

2,20 5 2,20 7

2,21 4 2,21 4

2,22 3 2,22 2

2,23 2 2,23 1

2,24 1 2,24 1

2,14 2,16 2,18 2,20 2,22 2,24

0

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

11

12

Freq

uênc

ia

Diâmetro (mm)

Série A

2,142,162,182,202,222,24

Diâmetro (mm)

Série B

23

Se dividirmos o número de ocorrências pelo número total de medidas (50)

obtemos uma ideia da probabilidade do valor do diâmetro do fio em cada intervalo

escolhido.

2.3.1. Valor médio

O melhor valor representativo de uma distribuição é sua média aritmética (mais

tarde, usando o método dos mínimos quadrados, chegaremos a este mesmo resultado).

Como podemos notar pelos histogramas, há uma tendência de a maioria das medidas

estarem próximos a um valor central dado pela média de todos os valores

(estatisticamente, quando , ou seja, não só é uma boa estimativa como é a

melhor estimativa para o valor real de ):

Obs.: Assumimos aqui que não há nenhum erro sistemático presente nas medições!

2.3.2. Distribuição normal

Quando os valores mais prováveis caem mais próximos do valor médio que os

valores menos prováveis e, ainda, tais valores são independentes podemos expressar seu

comportamento por meio de uma função de distribuição chamada normal ou gaussiana.

Se prosseguíssemos com um grande número de medições muito maiores que 50

(matematicamente é dizer que ) observaríamos uma curva contínua ao

desenharmos um gráfico do número de ocorrências das medições tomadas em função dos

valores medidos. Ou seja, para um número suficientemente grande de medições, nosso

histograma tenderia a uma curva dada pela chamada distribuição normal, descrita por

Gauss. A Figura 5 mostra essa curva, também conhecida como “curva em forma de

sino”:

24

Figura 5: As curvas gaussianas representativas das distribuições para as séries de

medições A e B.

Percebemos um valor máximo nas curvas da Figura 5 referente ao ponto médio

e um comportamento assintótico em relação à abcissa. A área sob a curva representa o

número de medições que recaem dentro de um intervalo adotado. Comumente, a

distribuição normal é redefinida em termos de probabilidade (na verdade, densidade de

probabilidade), ou seja, a área total sob a curva é normalizada (unitária) e, para certo

intervalo tomado, corresponde à probabilidade dos pontos caírem dentro do intervalo.

Supondo o intervalo entre x e (x + dx) e, usando a função densidade de probabilidade

obtida por Gauss para descrever a curva normal, a probabilidade de é dada por:

( )

( ) ⁄ [

( )

]

A função acima não possui solução analítica (supomos ). Assim, para o

cálculo da probabilidade de certo intervalo, se recorre a valores tabelados da

normalização da função densidade de probabilidade (a referência [3] fornece uma boa

leitura sobre o tema).

O desvio padrão s dá uma ideia de como os dados se distribuem ao redor da

média. Assim, um desvio de 1s equivale a uma certeza de 68%; 2s equivale a 95% de

certeza; 3s, 99,7% (aqui, chegamos àquele valor adotado para o !) e 4s equivalem a

99,994%. E isto responde ao quão provável é a estimativa do valor medido acrescido de

um intervalo expresso por s.

2,12 2,14 2,16 2,18 2,20 2,22 2,24

0

2

4

6

8

10

12

Série A

Série B

Fre

qu

ên

cia

Diâmetro (mm)

25

Para o caso da Série A, obtemos uma curva “baixa” e “gorda”, ou seja, uma

maior dispersão dos pontos medidos em relação ao valor médio e, portanto, um resultado

não muito bom, possivelmente, devido à presença de erros residuais significativos

somados aos erros estatísticos. Para a Série B, reduzimos os erros residuais presentes e

obtemos uma curva melhorada-- “alta” e “magra”-- com menor dispersão dos valores

medidos (menor desvio em relação ao valor médio) e, portanto, menor incerteza.

As gaussianas podem se diferir, para um mesmo valor médio (como vimos na

Figura 5), e caracterizamos matematicamente essas diferenciações através do desvio da

média:

Uma vez que o somatório de tais desvios pode resultar nulo (ou muito próximo

de zero), podemos tomar sua média em valor absoluto (desvio médio):

∑| |

Uma melhor e mais prática representação dessa distribuição é o desvio padrão,

dado por:

( )∑( )

Obs.: O valor N-1 foi utilizado, ao invés de N, pois os dados já foram utilizados uma vez

para o cálculo da média havendo, portanto, N-1 valores independentes (ou N-1 graus de liberdade:

houve a perda de um grau ao se calcular o valor médio).

Vejamos:

∑( )

, mais rigorosamente:

∑( )

, para , , ou seja,

valor verdadeiro médio

Por fim, a diferença entre o valor o valor medido médio e o valor verdadeiro médio

tende a se anular com valores de n cada vez maiores!

26

O limite de erro estatístico ou incerteza do Tipo A, , é definido como o desvio

padrão da média, , (se uma população-- todos os valores possíveis para a grandeza

medida-- se distribui normalmente, não importa o conjunto de dados tomados, todos os

dados se distribuirão também normalmente e pode ser visto como o desvio padrão dos

valores médios ). O limite de erro estatístico é dado por (notar que é função de n!):

(o valor 3 indica uma certeza, ou intervalo de confiabilidade, de 99,7%, que é

uma boa aproximação para 100%. Aliás, deve ser sempre dado em termos de 99,7%

de certeza, em nosso caso-- em física de partículas se usa intervalos de 5s ou mais!)

Ou seja, a probabilidade do valor “verdadeiro”, , pertencer ao intervalo

é de 99,7% (intervalo de confiabilidade de 99,7%). Matematicamente:

( )

Claro que o intervalo de confiabilidade apresentado até aqui vale somente para

um número grande de medidas para que as dispersões, no mesmo intervalo, estejam

dentro do valor probabilístico esperado. Assim, o fator multiplicativo de , para certa

probabilidade, p. exe. 68%, deve variar conforme o número de medições (tais fatores são

reajustados e apresentados na Tabela 7, a seguir).

Obs.: Notar que s não depende do valor n e somente dos erros residuais!

Mas quais erros experimentais seguem uma distribuição normal? E como? O

Teorema do Limite Central (TLC) responde a essas indagações: para amostras cada vez maiores, a

distribuição amostral da média tende cada vez mais a uma distribuição normal. Lindenberg-Feller

propôs, com base no TLC, que uma distribuição de variáveis aleatórias independentes e

identicamente distribuídas, com média e variância bem definidas, quando n tende a um valor infinito

(suficientemente grande), as variáveis aleatórias convergem a uma distribuição normal (a condição

de variância finita exclui as Lorentzianas!- Estas, muito úteis para descrever espectros de absorção).

27

Tabela 7: Fatores multiplicativos para diferentes probabilidades (P) para vários graus de

liberdade (GL) – Distribuição t-Student.

GL | P 50,00% 68,27% 90,00% 95,00% 95,45% 99,00% 99,80%

1 1,00 1,84 6,31 12,71 13,97 63,66 318,31

2 0,82 1,32 2,92 4,30 4,53 9,92 22,33

3 0,76 1,20 2,35 3,18 3,31 5,84 10,21

4 0,74 1,14 2,13 2,78 2,87 4,60 7,17

5 0,73 1,11 2,02 2,57 2,65 4,03 5,89

6 0,72 1,09 1,94 2,45 2,52 3,71 5,21

7 0,71 1,08 1,89 2,36 2,43 3,50 4,79

8 0,71 1,07 1,86 2,31 2,37 3,36 4,50

9 0,70 1,06 1,83 2,26 2,32 3,25 4,30

10 0,70 1,05 1,81 2,23 2,28 3,17 4,14

20 0,69 1,03 1,72 2,09 2,13 2,85 3,55

30 0,68 1,02 1,70 2,04 2,09 2,75 3,39

40 0,68 1,01 1,68 2,02 2,06 2,70 3,31

50 0,68 1,01 1,68 2,01 2,05 2,68 3,26

60 0,68 1,01 1,67 2,00 2,04 2,66 3,23

80 0,68 1,01 1,66 1,99 2,03 2,64 3,20

120 0,68 1,00 1,66 1,98 2,02 2,62 3,16

150 0,68 1,00 1,66 1,98 2,02 2,61 3,15

250 0,68 1,00 1,65 1,97 2,01 2,60 3,12

500 0,67 1,00 1,65 1,96 2,01 2,59 3,11

1000 0,67 1,00 1,65 1,96 2,00 2,58 3,10

Obs.: Na verdade, a Distribuição t de Student é a mais apropriada para a estimação do

intervalo de confiança para pequenas amostras.

A contribuição da estatística para o cálculo da incerteza não se esgota com a

fixação dos percentuais de inclusão. Um pouco de raciocínio leva facilmente à conclusão

28

de que esses percentuais representam um compromisso entre a altura e a largura da

distribuição (normal) das medições. Então surge a questão: caso se aumente o número de

leituras de um valor n até um valor infinito o que acontecerá? Haverá um aumento

proporcional em toda a curva, ou uma diminuição, ou uma de suas dimensões (altura ou

largura) crescerá mais do que a outra? O que equivale a perguntar: as faixas

alargam-se ou ficam mais estreitas quando se passa de um número finito n para

infinitas leituras? E o valor médio, muda significativamente? As respostas fornecerão a

expressão final para o valor representativo e para a incerteza da medição desejada, e são

as seguintes:

i) O valor médio muda muito pouco, podendo adotar a correspondente a

apenas n leituras como uma boa representação de infinitas medições.

ii) O desvio, para infinitas leituras, corresponde ao de n dividido por √ .

Daí a necessidade de um ajuste para pequenos valores de n.

inda: Pode haver um limite de erro estatístico, ΛE, inferior à metade do menor

incremento digital µ? Resposta: em termos práticos (necessita-se de recalibração da

instrumentação a cada nova medição, para obtenção de medições independentes e

prevalência de erros puramente estatísticos, o que não é muito prático! [4]), ΛE nunca será

inferior à metade do menor incremento digital µ do sistema de medição que se está

empregando. Fica, portanto, em definitivo:

⁄ √

Em termos de algarismos significativos, geralmente o valor médio é

representado com uma casa decimal a mais que o mensurando e, o desvio padrão e desvio

padrão da média, com duas casas decimais a mais.

Obs: Seja uma série de medições e seus respectivos erros sistemáticos:

, o valor médio é dado por: ∑

. Assim, ∑

.

Logo, para , (o valor médio tende para o valor verdadeiro- já vimos isso!).

29

É um erro muito comum pensar que a conversão de uma unidade em outra tornará a

incerteza menor ou maior. Note que o valor da incerteza em relação ao valor da grandeza

continuará igual! P. exe.: (1,000 ± 0,001) L = (1000 ± 1) mL, e a relação entre a incerteza e o

valor da grandeza permanece a mesma!

Exemplo:

Seja a série de medições:

Tabela 8: Medições para intervalos de tempo com os termos utilizados para cálculo do desvio

padrão.

Medição (t ± 0,001) ms (ms) ( ) (ms)2

1 26,802 0,0303 9,1809E-4

2 26,987 0,2153 0,04635

3 26,680 -0,0917 0,00841

4 26,128 -0,6437 0,41435

5 26,808 0,0363 0,00132

6 27,400 0,6283 0,39476

7 26,743 -0,0287 8,2369E-4

8 27,005 0,2333 0,05443

9 26,686 -0,0857 0,00734

10 26,478 -0,2937 0,08626

ms

∑ ( ) ms (perceba que o somatório resultou

nulo)

√∑ ( )

( ) √

ms (intervalo de confiabilidade de 68%)

√ ms (intervalo de confiabilidade de 99,7%)

Resposta final: (26,77 ± 0,32) ms (com confiabilidade de 99,7%)

30

Questão interessante:

Temos dois conjuntos de medições: uma série de 10 medições do tempo

transcorrido para a queda de uma esfera metálica, e outra série de 10 medições do espaço

percorrido correspondente a cada tempo medido. Desejamos calcular o valor da

velocidade máxima da queda e, após, seu valor médio. Para tal, surge a dúvida: Tomar os

valores médios do espaço e do tempo, para o cálculo da velocidade máxima ou tomarmos

cada valor, de espaço e tempo, e calcularmos as respectivas velocidades e, após, sua

média? Bom, descartamos a última e ficamos com a primeira opção! Por quê? Pois, para

que tomemos a média e, para tal, recorremos à estatística, é necessário que cada valor seja

estatisticamente independente! (coisa que já não ocorre quando calculamos

primeiramente as distintas velocidades e, após, os seus valores médio e desvio padrão!).

2.3.3. Rejeições

O significado dos percentuais associados ao desvio padrão s é que, em termos

gerais, somente três em cada 1000 medições extrapola o intervalo de 3s em torno do valor

médio . Assim, embora seja possível encontrar-se um valor desse tipo, que extrapole o

intervalo 3s, em uma distribuição de, digamos, 50 ou 100 leituras, sua presença a

desequilibra, distorcendo a média e levando a um desvio excessivamente elevado. O

intervalo de ±3s em torno do valor médio é, por isso, denominado de intervalo de

inclusão e, se alguma leitura se encontrar fora dele, será excluída do conjunto, devendo-

se calcular uma nova média e um novo desvio (para o qual a inclusão será novamente

analisada, podendo levar a um novo cálculo e assim por diante, até se terem somente

valores aceitáveis). Em suma, se podem rejeitar certos dados experimentais ditos ruins!

Obs.: Este é o caso em que há a presença de erro grosseiro, ou erro residual superestimado,

na medição, que divergiu do comportamento esperado para o conjunto de medições.

Um critério bastante utilizado para rejeições é o Critério de Chauvenet [3] onde, para um

intervalo de confiança de 3s espera-se que 1 em cada 400 valores caiam fora da faixa confiável, ou

seja, 0,3% dos valores encontrados. O critério diz que: “um valor pode ser rejeitado da amostra se o

número de eventos que esperamos estar mais distantes da média que o valor suspeito, para os valores

calculados da média e desvio padrão, for menor que 0,5”. Um pouco complicado!

31

2.3.4. Incerteza padrão

A incerteza final ou incerteza padrão, σp (nosso Δ anterior), é dada pela fórmula:

fim de seguir uma notação mais atual, ΛE foi rebatizado de incerteza do Tipo

A: σm, e Λr foi rebatizado de incerteza do Tipo B: σr.

A incerteza padrão, ou incerteza combinada, pode ser obtida da seguinte forma:

Primeiramente, vamos considerar duas variáveis aleatórias, X e Y, e uma série

de medições, , com , para cada uma delas. Podemos extrair o valor

da média e desvio padrão de cada uma das variáveis com os valores medidos:

∑( )

∑( )

Consideremos, agora, uma terceira variável Z a qual pode ser escrita como a

soma das variáveis X e Y. O próximo passo é o cálculo da média e a variância de Z

sabendo que, para cada valor de X e Y, obteremos um valor de Z dado por:

Assim:

∑( )

Portanto:

Vejamos, agora, como calcular o desvio padrão para a variável Z, que é o que

efetivamente nos interessa no momento. Pela definição de desvio padrão:

32

( )∑( )

( )∑ ( ) ( )

Desenvolvendo:

( )∑[(

) ( ) ( ) ]

Reagrupando:

( )∑ ( ) ( ) ( )

( )∑ ( ) ( )

Resultando em:

( )∑ ( ) ( )

Para uma distribuição gaussiana, os valores de e estarão distribuídos em

torno de seus valores médios e, supondo os valores estatisticamente independentes,

possuem a mesma probabilidade de estarem à esquerda ou a direita da respectiva média.

Assim, o terceiro termo da equação acima pose ser considerado nulo. Por fim, chegamos

à expressão que queríamos:

Obs.: Mantive as duas notações devido a alguns autores que ainda utilizam o conceito de

“limite de erro” ou aos bons textos antigos sobre Teoria dos Erros. Aqui, o erro residual é encarado

como possuindo uma natureza estatística também.

Pela regra ortodoxa:

33

Exemplos:

1) Cálculo do diâmetro de um fio de cobre. Valores por equipe:

Equipe 1:

Valor: = ,188, σ = 0,01 290, ΛE = σm = 3,25x(0,0038864) = 0,012631

(99,7%), ΛS = σr = 0,005 (incerteza sistemática residual adotada: metade da menor

divisão do nônio)

Incerteza padrão:

p = 0,013585

Resposta final: (2,188 ± 0,013) mm

Tabela 9: Medições da Equipe 1.

Medida Valor: ± 0,01 mm

1 2,17

2 2,20

3 2,20

4 2,21

5 2,19

6 2,18

7 2,18

8 2,18

9 2,18

10 2,19

34

Equipe 2:

Tabela 10: Medições da Equipe 2.

Valor: = 2,182, σ = 0,016190, ΛE = σm = 3,25x(0,0051200) = 0,016640, ΛS =

σr = 0,005

Incerteza padrão:

p = 0,017375

Resposta final: (2,182 ± 0,017) mm

Medida Valor: ± 0,01 mm

1 2,17

2 2,18

3 2,22

4 2,17

5 2,17

6 2,20

7 2,17

8 2,18

9 2,18

10 2,18

35

Equipe 3:

Tabela 11: Medições da Equipe 3.

Valor: = , 0 , σ = 0,011350, ΛE = σm = 3,25x(0,0035900) = 0,011668, ΛS =

σr = 0,005

Incerteza padrão:

p = 0,012694

Resposta final: (2,202 ± 0,013) mm

Medida Valor: ± 0,01 mm

1 2,21

2 2,20

3 2,22

4 2,18

5 2,21

6 2,20

7 2,21

8 2,20

9 2,19

10 2,20

36

Equipe 4:

Tabela 12: Medições da Equipe 4.

Valor: = ,193, σ = 0,0 8690, ΛE = σm = 3,25x(0,0090700) = 0,029478, ΛS =

σr = 0,005

Incerteza padrão:

p = 0,029898

Resposta final: (2,193 ± 0,030) mm

Medida Valor: ± 0,01 mm

1 2,20

2 2,18

3 2,18

4 2,23

5 2,24

6 2,16

7 2,17

8 2,22

9 2,16

10 2,19

37

Equipe 5:

Tabela 13: Medições da Equipe 5.

Valor: = ,183, σ = 0,0094900, ΛE = σm = 3,25x(0,0030000) = 0,0097500, ΛS

= σr = 0,005

Incerteza padrão:

p = 0,010957

Resposta final: (2,183 ± 0,011) mm

Observações:

a) Considerou-se como erro residual o a metade do menor incremento digital do

instrumento de medida (nônio).

b) A média, geralmente, é escrita com uma casa decimal a mais.

c) O desvio padrão e o desvio padrão da média são escritos com mais duas casas

decimais.

d) O nível de confiança adotado foi de 99,7% (usando a distribuição t de

Student).

Medida Valor: ± 0,01 mm

1 2,17

2 2,19

3 2,20

4 2,19

5 2,18

6 2,18

7 2,18

8 2,17

9 2,18

10 2,19

38

2) Paquímetro:

Seja um paquímetro de 20 divisões. Logo:

.

e

(99,7%), então: √

(não há muito

sentido se trabalhar com paquímetros de divisão maior que 20!).

Às vezes também se adota, como limite de erro sistemático, o próprio valor

de ε (no caso: 0,05 mm).

2.4. Exatidão e precisão de uma medição

Supondo o valor verdadeiro como o centro de um alvo, e representando as

medições realizadas como tiros disparados sobre ele, podemos representar pictoricamente

a acurácia (ou exatidão) e a precisão numa medição conforme a figura abaixo:

Figura 6: Alvos representando a exatidão e precisão em uma medição.

A Precisão se associa ao número de casas decimais que se pode ter e a exatidão

se quantifica pela comparação com um padrão (calibração): o número de casas decimais

se relaciona com a precisão do instrumento, p. ex., um paquímetro com vernier dividido

em 20 partes iguais deve possuir uma precisão até a segunda casa decimal de 0,05 mm. Já

a exatidão está relacionada com a aferição de nosso instrumento de medida com um

padrão: podemos “errar o alvo” com boa precisão se, p. ex., utilizamos uma boa régua

Baixa exatidão Alta precisão

Alta exatidão Alta precisão

Alta exatidão Baixa precisão

Baixa exatidão Baixa precisão

••

••

••

••

••

••

• • • •

• •

• •

(a) (b)

(c) (d)

39

metálica aferida em 20 οC, num ambiente de 40

οC. Neste caso, nossa exatidão seria

exatamente como o da figura do alvo de cima, à direita (Figura 6b).

Quando o erro estatístico é pequeno, as flutuações entre uma medida e outra

também são pequenas e os resultados tendem a um valor médio, apresentando boa

repetitividade. Contudo, tais valores podem divergir do valor real (o “alvo”) quando não

se tem uma boa exatidão nas medições. Além de uma boa precisão e exatidão, os valores

de uma medição podem diferir conforme uma melhor aproximação do valor médio real

conforme o número de medições realizadas. Isto pode ser verificado por meio de uma

curva de distribuição “gorda” e “baixa” contra outra mais “alta” e “magra” (como vimos

na Figura 5). Obviamente, uma situação ideal seria a de uma distribuição com baixa

dispersão e desvio padrão, com o maior número de pontos próximos ao valor médio real

(aproximado sempre pelo valor médio amostral).

Supondo leituras de distâncias sobre uma régua representadas por pontos sobre a

mesma, podemos visualizar as distribuições relativas a cada série de medidas e as

respectivas, precisão e exatidão. Vamos supor três casos: dois com altas precisão e

exatidão, porém distintas dispersões dos valores em relação à média (ou seja, um mais

preciso que o outro), e outro com boa precisão e baixa exatidão:

Figura 7: Série de medições para três casos distintos: Caso 1- alta dispersão dos valores em

relação à média e presença de erro estatístico, Caso 2- alta dispersão dos valores e presença de

erro estatístico e sistemático, Caso 3- baixa dispersão dos valores em relação à média e erro

estatístico.

Para os casos (1) e (3), temos somente a presença de erros aleatórios, ou seja,

devido a flutuações estatísticas das medições. No caso (1), há uma maior flutuação e,

portanto, uma maior distribuição dos pontos em relação ao valor mais provável Ᾱ1 (uma

curva normal mais “baixa” e “gorda” se comparada com a do caso (3)). A distância entre

• • • •••• • • • Ᾱ2

• • •••• • • • Ᾱ3 •

3

• • •• ••• • • • Ᾱ1 Caso 1:

Caso 2:

Caso 3:

40

Ᾱ1 e Ᾱ2 equivale aos erros sistemáticos (ou erro residual) e nos fornece um valor para a

exatidão da medição (o caso possui, portanto, baixa exatidão).

Obs.: Para um instrumento utilizado para medir 100,0 unidades e se mede 99,6, sua

exatidão está limitada ao erro de 0,4%.

A precisão pode ser estimada por meio da distribuição dos valores obtidos em torno

do valor médio, ou seja, pela largura do histograma.

2.5. Propagação de incertezas

Não se pode ter acesso a um grande número de grandezas físicas as quais, por

definição, são dadas em termos de grandezas físicas mais fundamentais e mensuráveis.

Por exemplo, podemos definir velocidade escalar como a razão entre o espaço percorrido

e o tempo transcorrido. Medindo-se ambos, espaço e tempo, chegamos à velocidade

escalar. Podemos também construir um instrumento de medida que nos dê

automaticamente o valor da velocidade (velocímetro) desde que calibremos esse

instrumento para uma velocidade conhecida (padrão). Na primeira, temos o caso de uma

medição indireta da velocidade. No segundo caso, trata-se de uma medição direta.

Para o caso de medições indiretas, podemos expressar nossa grandeza de

interesse G como uma função das grandezas diretas. Por exemplo:

G = G(x1, x2, x3, x4, ..., xn)

Sendo que há, para cada uma dessas grandezas uma incerteza associada. Como

calculamos, pois, a incerteza em nossa grandeza de interesse G? Primeiramente, devemos

supor que as grandezas x1, x2, x3, x4, ..., xn sejam independentes entre si e G(x1, x2, x3, x4,

..., xn) seja lentamente variável [2]. Então, uma variação em G é dada por:

∑(

)

Incertezas nas grandezas xi, representadas por , devem resultar em erro na

medição da grandeza G, :

41

∑(

)

Uma vez que tais erros podem variar em termos de sinais negativos e positivos e,

em algum caso, resultar nulo, calcularmos a incerteza em G tomando o quadrado da

derivada parcial de G em relação a cada variável independente e multiplicando pelas

respectivas incertezas elevadas ao quadrado. Feito isso, obteremos o quadrado da

incerteza em G, , dada por:

∑(

)

(

)

(

)

(

)

(

)

Obs.: Para o caso de as medições das grandezas xi serem dependentes, um fator deve ser

acrescido à equação. Uma visualização importante desse conceito é dada por [5]:

Para o caso de as incertezas serem distintas, devemos ter:

∑(

)

∑ (

) (

)

E a segunda parcela da equação é chamada de covariância.

A seguir, é mostrado um resumo das fórmulas que podem ser utilizadas para o

cálculo da propagação de incertezas:

Seja: a = ( ± Δx) e b = ( ± Δy)

1 - Adição:

a + b = ( ± Δx) + ( ± Δy) = ( + ) ± (Δx +Δy)

2 - Subtração:

a - b = ( ± Δx) - ( ± Δy) = ( - ) ± (Δx +Δy)

3 - Multiplicação:

a . b = ( ± Δx) . ( ± Δy) = ( . ) ± ( .Δy + .Δx)

42

4 - Multiplicação por uma constante, c:

c . a = c ( ± Δx) = c. ± c.Δx

5 - Divisão:

=

6 – Potência

am

= ± ( )

7 - Coseno:

cos (a) = cos ( ± Δx) = cos( ) ± sen( ).Δx

8 - Seno:

sen (a) = sen ( ± Δx) = sen( ) ± cos( ).Δx

9 – Logaritmo:

log (a) = log ( ± Δx) = log ( ) ±

e = 2,7182...

10 – Raiz quadrada:

a1/2

= √( ) √

Exemplos:

1) (9,750 ± 0,070) /(4,800 ± 0,030) = 2,031 ±

= (2,031 ±

0,027)

2) (3,720 ± 0,040)3 + (2,110 ± 0,040) = (51,5 ± 1,7) + (2,110 ± 0,040) = (53,6 ±

1,7)

3) (3,350 ± 0,040) x (2,330 ± 0,070) = 7,8055 ± (3,35x0,07 + 2,33x0,04) =

7,8055 ± 0,3277 = (7,81 ± 0,33)

43

4) (7,500 ± 0,040)3 = 421,875 ± 3(7,500)

2x0,040 = 421,88 ± 6,75 = (421,9 ± 6,8)

= (422 ± 7)

As incertezas podem ser interpretadas em termos do cálculo diferencial.

Geometricamente podemos representar a incerteza como o gradiente da curva

representativa da função:

Figura 8: Propagação de incertezas: aproximação da incerteza para uma função de uma

única variável baseada no cálculo diferencial.

Ou seja, temos a aproximação da série de Taylor, com os primeiros dois termos,

no ponto x0:

( ) ( ) |

|

|

|

Para mais de uma variável:

√∑[(

)

]

G

G

G

44

Assim, a melhor estimativa da grandeza indireta, G, é aquele em que G é função:

( ) e a incerteza em G, , é dada pela seguinte função:

( ).

Obs.: O método proposto, obviamente, vale somente quando o erro Δx é suficientemente

pequeno! Para o caso de multivariáveis, assumimos que as variáveis xi sejam independentes e não se

correlacionem!

Exemplos:

1) Seja ∑

, cálculo de

, ou seja, cálculo da incerteza da média:

Cada xi ± σ, então:

∑ (

)

(

) ∑

, assim: √

Ou seja, o desvio padrão médio!

)

para: m = (15,432 ± 0,096) kg e v = (40,91 ± 0,12) m.s

-1

√⌈

√⌈

Logo: E = (12914 ± 89) J

Obs.: Se calculássemos os intervalos diretamente:

E = 0,5.15,432.40,912 = 12914

+ΔE = 0,5.(15,432 + 0,096).(40,91 + 0,12)2 – 12914 = 156

-ΔE = 12914 - 0,5.(15,432 – 0,096).(40,91 – 0,12)2 = 156

Logo: , então: ( ) J.

3) Seja a equação de Van der Waals para um gás ideal [6]:

(

)( )

45

Calcular: i) a pressão do nitrogênio com volume molar: (

) a uma temperatura de ( ) , dados os

coeficientes de Van der Waals: , e

. ii) A incerteza no valor da pressão. Dado:

.

i) Da expressão dada podemos explicitar a função em P:

( )

( )

Logo, fazendo 1J = 1 m3Pa, obtemos uma estimativa para o valor da pressão como

(usando o método funcional):

( )

ii) calculo das incertezas devidas a Vm e T:

( )

( )

( )

E

( ) ( )

( )

( )

A contribuição do erro na pressão devido à T é: ( )

( ), e o mesmo pode ser feito em relação a Vm. Resultando em:

A incerteza total em P é então dada por:

√( ) ( )

Resultando em: P = (11,892 ± 0,020) MPa.

Compare este método com o método baseado no cálculo diferencial!

4) Cálculo da densidade, ρ, de uma esfera de raio r e massa m:

√ (

)

(

)

Supondo os valores: r = (0,830 ± 0,005) mm e m = (26,76 ± 0,10) g

46

ρ = (11,178 ± 0,206) g.mm-3

= (11,18 ± 0,21) g.mm-3

2.6. Reprodutibilidade e repetitividade

Quando se reproduz várias medidas sujeitas às mesmas condições iniciais:

mesmo observador, mesmo instrumento de medição, mesmo mensurando, etc. se diz,

acerca do grau de concordância dos resultados, ter uma condição de repetitividade. Já,

quando várias medidas de um mesmo mensurando são tomadas sob condições distintas de

medição, como diferentes: observadores, instrumentos de medição, locais, dias, padrões

de referência, etc. dizemos ter uma condição de reprodutibilidade, quanto ao grau de

concordância dos resultados. A figura abaixo mostra a reprodutibilidade de um

mensurando medido por dois observadores e a respectiva repetitividade obtida por cada

um deles:

Figura 9: Duas séries de medições, A1 e A2, com dispersões aproximadamente iguais e presença

de erro sistemático para uma delas (série A2). A repetitividade é dada em termos da distribuição

dos valores em torno do valor médio. E a reprodutibilidade, em termos da presença de erro

residual (incerteza Tipo B), o que faz uma série divergir da outra.

Obs.: A respeito das definições dos termos adotados em metrologia, o INMETRO lançou a

portaria No 29, em 10 de março de 1995 (e revista em 2012), intitulada “Vocabulário de termos

fundamentais e gerais de metrologia” (VIM). Esta portaria está em conformidade com os órgãos

internacionais: ISO, BIPM, IEC, IFCC, ILAC, IUPAC, IUPAP, e OIML.

• • •• ••• • • • Ᾱ1

• • • •••• • • • Ᾱ2

reprodutibilidade

47

Segundo a VIM:

Exatidão “é o grau de concordância entre o resultado de uma medição e o valor

verdadeiro do mensurando”.

Repetitividade é o “grau de concordância entre resultados de sucessivas

medições de um mesmo mensurando, efetuadas sob as mesmas condições de medição”.

Reprodutibilidade é o “grau de concordância entre resultados de medições de

um mesmo mensurando, efetuadas sob condições variadas de medições”.

Obs.: Para o caso de reprodutibilidade, a média ponderada é a melhor aproximação para n

resultados experimentais. [4,7]

2.7. Instrumentação eletrônica.

Em se tratando de instrumentação eletrônica, não faz sentido tomarmos a metade

do último dígito da escala do equipamento. O que usualmente pode ser feito é adotar-se,

como incerteza Tipo B, o último dígito da escala do aparelho. Por exemplo, para uma

balança digital, temos: (25,45 ± 0,01) g (a incerteza recai sobre o último dígito que ela

pode fornecer, ou seja, 0,01 g).

Na eletrônica, os instrumentos são classificados por classes. Classe é o limite de

afastamento, ou máximo desvio, da indicação do aparelho em relação ao valor da

grandeza, expressa como um percentual do fundo de escala do instrumento.

Podemos indicar o instrumento de medição eletrônico segundo as classes de

precisão:

48

Tabela 14: Instrumento de medição eletrônico segundo as classes de precisão.

Instrumentação de: Precisão Serviço

Classe 0,1 0,2 0,5 1,0 1,5 2,5 5,0

Percentual de erro de fundo de escala ±0,1% ±0,2% ±0,5% ±1,0% ±1,5% ±2,5% ±5,0%

Assim, um instrumento que possui fundo de escala de 400 V de Classe 5, quando

se tem a indicação de um valor medido 324 V quer dizer: Erro de medição de 0,005 x 400

V = 20 V, o valor real deve estar entre: 304 e 344 V.

Quanto a forma de leitura do instrumento de medição eletrônico de acordo com

seu máximo desvio, toda leitura deve ser feita como múltiplos inteiros de D (desvio) e

escrita até a mesma ordem decimal de D. Então, a forma de leitura pode ser vista pela

Tabela 15:

Tabela 15: Forma de leitura do instrumento de medição eletrônico de acordo com seu máximo desvio.

Forma de leitura x10n

De 1 em 1 De 2 em 2 De 5 em 5

Máximo desvio (D) x10n

0,75 D 1,5 1,5 D 3,5 3,5 D 7,5

Exemplos:

Tabela 16: Exemplos de medições e leituras em instrumentação eletrônica.

Classe Fund. de Esc. D F. de Leitura Leitura Medição

5 100 V 5 5 em 5 V 13,8 V 15 V

79,2 V 80 V

38,7 V 40 V

97,4 V 95 V

0,5 12 mV 0,06 mV 5 em 5 x10-2

mV 1,1 mV 1,1 mV

7,8 mV 7,8 mV

3 300 Hz 9 Hz 1 em 1 x101 Hz 204 Hz 20 x10

1 Hz

4 Hz 0 x101 Hz

1 30 A 0,3 A 2 em 2 x10-1

A 17,43 A 17,4 A

27,70 A 27,6 A

2,12 A 2,2 A

22,48 A 22,4 A

Obs.: Verifique sempre se seu equipamento está adequadamente calibrado!

49

Em instrumentação digital, sua incerteza pode ser calculada de várias

maneiras. Vimos o caso de se adotar o valor da incerteza do último dígito, ou segunda a

classe do instrumento. Porém, a maioria dos fabricantes segue a norma IEC 485 que diz

que a incerteza é dada por:

( )

Sendo p% o percentual do valor medido especificado pelo fabricante, G a

grandeza medida, e m é a quantidade de dígitos menos significativos na escala

selecionada (LSD).

Exemplo:

Em uma medição de tensão obteve-se, em um multímetro digital na escala

19,999, o valor de 25,770 V. O fabricante especifica, para o multímetro adotado, que p%

= 0,1% e m = 1. A incerteza é dada, portanto, por ±(0,001x25,770 V + 1x0,001) =

0,02577, e a medição resulta: (25,770 ± 0,026) V.

50

Capítulo 3 – Construção de modelos

O objetivo da ciência é descrever a natureza através do estabelecimento de

modelos. O modelo de um fenômeno físico permite conhecer o resultado obtido, caso ele

ocorra, sem que ele de fato ocorra.

3.1. Modelos empíricos

Como ciência, a física deve propor resultados não somente qualitativos como

também, e principalmente, quantitativos sobre o mundo. Muitos dos mais interessantes

problemas físicos são modelados por equações diferenciais parciais as quais não podem

ser resolvidas analiticamente. Assim, uma saída é lançar mão do cálculo numérico. Outra

tentativa é expor qualitativamente as propriedades e ideias fundamentais desses

problemas.

Modelos relacionam dois ou mais conjuntos de medições, e podem ter forma de

funções, gráficos ou tabelas sendo, os gráficos, os mais intuitivos por serem pictóricos.

Os modelos frequentemente possuem validade restrita a certos valores das variáveis

envolvidas: por isso, deve-se sempre dar o domínio de validade de um modelo.

Experimentos físicos levam à obtenção de tabelas de valores correspondentes às

grandezas medidas. Cabe ao observador responder se existe alguma relação entre as

grandezas tabeladas, ou seja, se há algum modelo para o fenômeno em estudo e, caso

exista, como podemos expressar tal relação matematicamente. Para tal, primeiramente

construímos um gráfico exploratório e observamos se há alguma relação matemática entre

as grandezas. O resultado final será uma curva que, para o caso de uma relação entre

somente duas grandezas, podemos desenha-la em um plano cartesiano.

51

Por exemplo:

Figura 10: Verificação de alguma relação existente entre duas grandezas físicas: em (A) não obtemos

nenhuma relação por inspeção visual já, em (B), visivelmente há uma relação, possivelmente,

parabólica entre as grandezas: Espaço percorrido e Tempo.

As tabelas, primeiro passo na construção de gráficos, devem ser claras e

concisas. Os nomes adotados para as grandezas, bem como suas respectivas unidades,

devem ser colocados em um cabeçalho, separado do corpo da tabela onde serão colocados

os dados experimentais, como podemos ver nos exemplos de tabelas desenhadas aqui,

incluindo um comentário a respeito do que se está tratando na tabela. Como pôde ser

visto, nas tabelas modernas evitam-se as linhas horizontais e transversais separando os

dados para que a mesma seja mais “limpa”. Uma regra geral, tanto para as tabelas quanto

para os gráficos, é que os mesmos devem ser construídos para quem os lê e não por

quem os faz, portanto, devem ser concisos e claros!

As normas brasileiras para a construção de tabelas e gráficos são: NBR 6029 e

NBR 6822. Não confundir tabelas com quadros: a tabela é a apresentação, em forma de

colunas e linhas, dos dados experimentais resultantes de uma medição. As tabelas devem

ser acompanhadas dos seguintes itens:

a) Nome das grandezas com seus respectivos valores, incertezas e unidades.

b) Os valores devem ser expressos com o número adequado de algarismos

significativos.

c) Na parte superior, deve estar um comentário seguido do cabeçalho da tabela.

0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4 1,6 1,8 2,0

0

10

20

30

40

50

60

70

Es

pa

ço

pe

rco

rrid

o (

cm

)

Tempo (s)

1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0

0

2

4

6

8

10

12

14

16

Am

plitu

de

(c

m)

Tempo (s)

A) B)

52

d) Evitam-se as linhas horizontes e verticais deixando-as somente para a

separação do cabeçalho e do corpo da tabela do restante do texto.

e) O comentário deve ser conciso e autoexplicativo.

f) Qualquer observação extra deve ser marcada na tabela e explicada na parte

abaixo da mesma.

3.2. Gráficos

Estamos acostumados a visualizar figuras representativas de muitos aspectos de

nossa vida. Diariamente recebemos informações em forma de gráficos como, por

exemplo, gráficos em forma de: Histogramas, Diagramas, barras divididas por cores,

pizza, etc.

Estudaremos o tipo mais simples de gráfico que é a relação entre duas grandezas

sendo, uma delas, independente e, a outra, dependente. Lidaremos, portanto, com

coordenadas cartesianas onde y = f(x) e cada par ordenado (xi, yi) corresponde a um ponto

no plano cartesiano. Chamamos de curva ao conjunto de pontos Pi dados por (xi, yi) tal

que yi = f(xi).

Para a construção de bons gráficos, valem as seguintes regras:

a) Escolha do formulário gráfico mais adequado (milimetrado, semilog, dilog,

polar, etc.).

b) É comum as pessoas darem uma folheada nas figuras antes de ler o texto.

Assim, alguma informação a respeito do que se tratam ajudará na

visualização da ideia geral do texto. Portanto, coloque título e comentário

nos gráficos, os quais devem ser apresentados na parte inferior da figura

(como pode ser visto nos exemplo aqui apresentados).

c) Os eixos devem ser escolhidos apropriadamente (formato retrato ou formato

paisagem, de acordo com as dimensões de cada eixo) e devem conter apenas

os números necessários para a leitura das divisões de escala. Não deve ser

colocado nenhum valor experimental sobre o eixo: as escalas já possibilitam

a leitura dos dados experimentais expressos por pontos no plano da folha.

d) Mantenha a variável dependente na vertical, sempre que possível (às vezes

isso não é possível em papéis com escala logarítmica).

53

e) Devem ser colocadas as grandezas e suas respectivas unidades próximas aos

eixos. Identifique os eixos com nome, símbolo e unidades das variáveis:

f) Na escolha das escalas, as mesmas devem ser limpas e de fácil visualização.

As divisões de escala devem ser múltiplos de: 1, 2, 5 ou 10 (evitam-se

valores quebrados ou números primos como 7, 11 ou 13, os quais podem

resultar em dízimas periódicas). Os valores devem ser expressos

adequadamente conforme o número de algarismos significativos. Geralmente

se podem escrever as grandezas como: Nome da grandeza/unidade

(Exemplo: Tempo/s) ou Nome da grandeza (unidade) (Exemplo: Tempo (s)),

o primeiro caso é o mais adotado atualmente.

g) Escolha as escalas de modo a obter um dimensionamento adequado do

gráfico evitando, assim, falsas interpretações.

h) Quando necessário, colocar os intervalos de confiança nos pontos

desenhados de acordo com as incertezas nas medições. Localize os pontos

medidos no papel sem traçar linhas de apoio, apenas marque o ponto

adequado e suas respectivas barras de incerteza (). Para cada ponto,

construa barras de incerteza que correspondam, na escala, às incertezas de

suas varáveis, e que fiquem no intervalo: 0, ≤ L/mm ≤ .

i) Se houver mais de uma medida em um mesmo gráfico, separar os pontos por

meio de símbolos distintos como: ο, Δ, □, ◊, etc.

j) Posicionar o gráfico o mais próximo possível de onde ele é citado no texto e

de forma a que a leitura do relatório seja fluente.

k) O comentário deve ser conciso e autoexplicativo.

Obs.: Algumas regras geralmente adotadas pela comunidade científica e podem ser

incompatíveis com (d):

- Grandeza tempo (ou equivalente) sempre na horizontal.

- Dados de entrada sempre na horizontal.

- Grandeza livre de erros sempre na horizontal.

Seguir, portanto, o bom senso na escolha de qual regra adotar!

Tempo/s

54

Na construção da escala devemos proceder da seguinte forma: fazemos

primeiramente a razão do espaço disponível em folha pela variação de nossa grandeza. A

esta razão chamamos de módulo de escala, λ:

| ( ) ( )|

adotamos o valor inteiro mais próximo de λ! (em papel milimetrado, L pode

possuir os valores de 270 mm ou 180 mm).

3.3. Linearização e escalas logarítmicas

As relações entre as grandezas medidas podem ser obtidas usando os

conhecimentos de matemática: que função ajustaria muito bem para o caso (B) da Figura

10? Resposta: ! Surge a dúvida. Mas que expoente escolher?

Dentre as funções matemáticas, a função linear, a qual resulta em uma reta

, é a chave da análise gráfica: é a única função cuja forma (e expoente) são

obtidos diretamente sendo, seu traçado, o único que permite uma fácil visualização dos

dados sem ambiguidade. Para conhecê-la totalmente, devemos determinar somente os

coeficiente A e B, os quais podem ser determinados por meio da escolha de dois pontos

lidos no gráfico. Tais pontos, ( ) e ( ), substituídos na expressão da reta:

Resulta:

( )

( )

Agora, como escolher os pontos 1 e 2:

55

i) Devem ser pontos do gráfico construído, e não da tabela original. Os pontos da

tabela (a menos que coincidam com pontos da reta) têm erros experimentais (são afetados

pelos erros).

ii) Devem ser pontos distantes na abscissa para que o erro no denominador seja

minimizado (Por exemplo, reduzindo erro em A: 30/2=15; 30/3=10; 30/20=1,5;

30/21=1,45- valor correto próximo de 1,4!).

iii) Devem ser fáceis de ler na escala (Isto é, devem exigir interpolação em

espaços) ⇒ cruzamento de linhas do papel empregado (p. ex., papel milimetrado):

Para o caso em estudo, curva (B) da Figura 10, podemos linearizar a curva por

meio de anamorfose, ou seja, de uma mudança de variável. Mas, funções que aparecem

frequentemente em física e cuja variação é muito extensa, como as funções exponenciais

e as logarítmicas, carecem de uma extensão maior da escala. Portanto, uma modificação

dessas escalas de modo a englobar o maior número possível de valores se faz necessária.

Eixos cuja escala é logarítmica resolvem este problema. Existem alguns papéis especiais

que fazem esta modificação e são chamados de papéis de escalas logarítmicas.

Podemos, então, ter os seguintes casos: i) em que uma das escalas é linear e a outra,

logarítmica: papel semilog (ou monolog), e ii) em que ambas as escalas são logarítmicas:

papel dilog (ou Log vs Log).

Algumas propriedades importantes das escalas logarítmicas são: i) os valores

maiores são progressivamente comprimidos se comparados com a escala linear. Ou seja,

as distâncias entre os valores log(1) e log(10) é a mesma que entre log(10) e log(100), ou

entre log(104) e log(10

5). Esse comportamento deriva das propriedades do logaritmo:

( ) ( ( )) (

( )) ( ) , essa diferença de dez em dez é

chamada de ciclo ou década (já se pode notar que não importa a base em que se está

trabalhando. Tente provar isso!). ii) as barras de erro também são transformadas

aparentando serem menores do que realmente são! iii) não há zero na escala logarítmica.

56

Do exposto, podemos tipificar as linearizações em três casos especiais:

3.3.1. Caso 1: Anamorfose

Por exemplo, suponhamos um corpo em queda livre de uma altura h, cujo

modelo mecanístico newtoniano nos dá a seguinte relação:

, equação de uma parábola.

Para transformar a equação em uma reta basta fazermos a seguinte

transformação de variável (de t para z): desenhamos, pois, h em função de z=t2!

3.3.2. Caso 2: Linearização da função potencial

Suponhamos a relação potencial entre duas grandezas: , em geral n é

desconhecido, e K é uma constante. Façamos, pois, a linearização aplicando logaritmo a

ambos os lados da igualdade, o que resulta em:

( ) ( ) ( )

Assim, podemos utilizar o papel dilog e desenharmos uma reta de inclinação n.

O valor de n pode ser obtido pela leitura de dois pontos distintos, ( ) e ( ):

( ) ( )

( ) ( )

3.3.3. Caso 3: Linearização exponencial

Outro exemplo importante de linearização é o caso de uma relação exponencial

entre y e x: , sendo K,b e n, constantes.

Aplicando novamente o logaritmo em ambos os lados da equação:

( ) ( ) ( )

57

Pela equação, nota-se que há uma relação linear entre ( ) e x. Assim,

podemos utilizar papel semilog para desenharmos a reta, cujo coeficiente linear, B, deve

ser igual a: ( ). B é calculado, do gráfico, como:

( ) ( )

Lembre que:

( ) ( )

( )

Podemos encontrar sistemas que envolvam esse tipo de modelagem em:

decaimentos radioativos, resfriamento de corpos quentes por convecção ou condução de

calor, energia de ativação, etc.

Exemplos:

1) Lei de Hooke:

, log(x) = 3log(L) + log(k)

2) Pêndulo simples:

( )

Fazendo: , , e ( )

3) Plano inclinado:

Fazendo:

,

3.4. Método dos mínimos quadrados

Com os dados experimentais podemos em certo papel, seja milimetrado, semilog

ou dilog, associar uma reta tal qual vimos na sessão precedente. E podemos determinar os

coeficientes (A e B) que determinam a reta, traçada com ajuda de uma régua, pela escolha

58

de dois pontos, ( ) e ( ), como vimos. Mas, seja um mesmo experimento

realizado com os mesmos instrumentos e, portanto, com a mesma exatidão por distintos

observadores. Naturalmente, os valores, embora próximos, resultariam em diferentes

valores para A e B, pois as retas não devem ser necessariamente iguais. Surge a seguinte

pergunta: haveria, dentre essas retas, alguma que fosse a melhor dentre todas as retas?!

Caso negativo: haveria uma reta melhor possível para o conjunto de medições?! A

resposta é sim e há um método para encontra-la (sem, necessariamente, ter de desenha-

la): a técnica a ser utilizada para o traçado da reta (ou a regressão linear) é o método dos

mínimos quadrados, baseado no método da máxima verossimilhança, ou seja, da máxima

probabilidade [2].

Suponha n medições independentes sob as mesmas condições iniciais de um

mensurando. A melhor estimativa do valor real do mensurando é aquele que minimiza a

soma dos quadrados dos desvios das medições da sua melhor estimativa x, onde x é

desconhecido, assim:

∑( )

Derivando e igualando a zero:

∑( )

Logo, a melhor estimativa de x é o seu valor médio, como esperado!

Assumindo que os valores se distribuem segundo uma distribuição normal,

temos que a probabilidade de obtermos uma medida entre os intervalos x e x + dx é dado

por:

59

( )

( ) ⁄ [

( )

]

E x é a melhor estimativa para .

A probabilidade total é dada por:

( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ∏ ( )

( ) (

( ) ⁄)

[ ∑( )

]

Para que possamos ter uma máxima probabilidade, devemos minimizar o

expoente da equação, ou seja, minimizar:

∑( )

Obs.: Claro, estamos supondo que todas as medidas possuem uma mesma incerteza dada

por σ.

Agora, vamos supor medições sobre duas grandezas físicas, x e y, e uma

incerteza σy associada à variável y (neste caso, supomos que a incerteza de x é

desprezível ou a transferimos para a variável y: ver [2, 3]). Supondo uma relação linear

entre as grandezas x e y, podemos associa-las conforme a equação linear:

( )

A probabilidade para um dado é proporcional à densidade de probabilidade:

( )

[

( )

]

A probabilidade para todos os pontos é dada por:

∏ ( )

( ) [ ∑

( )

]

60

Observamos que ( ) é a distância vertical entre cada ponto ( ) e

a reta ideal y(xi).

Figura 11: Representação geométrica do método dos mínimos quadrados: O

método se baseia a minimização das distâncias entre os pontos experimentais e a

reta teórica tracejada.

Como queremos maximizar a probabilidade, minimizamos o expoente da

equação pelo método dos mínimos quadrados:

∑ ( )

Obs.: Novamente iremos considerar que os σyi são iguais a σy.

Como queremos encontrar os coeficientes, A e B, derivamos em relação a A e a

B, e igualamos a zero as derivadas. Olhando somente para o denominador do expoente da

equação e a desenvolvendo:

∑( ) ∑( ) ∑( ) ∑( ) ∑( )

Derivando em relação a A, e igualando a zero:

∑( ) ∑( )

Derivando em relação a B, e igualando a zero:

∑( ) ∑( ) ∑( )

Reta ideal: y(xi)

( )

X

Y

61

Resolvendo em relação a A e a B, obtemos:

(∑

) ∑ (∑ )(∑ )

∑ (∑ )

∑ (∑ )(∑ )

∑ (∑ )

∑( )

∑( )

Considerando a mesma incerteza para todos os valores , o desvio padrão para

todos os valores é dado por:

( )∑( ( ))

E o desvio padrão médio é dado por:

O cálculo para as incertezas em e , respectivamente, e , resulta em:

√∑

(∑ ) (∑ )

√∑

∑( )

(∑ ) (∑ )

√∑( )

E é dado por:

√∑( )

( )

Sendo, , a incerteza do ajuste. As bandas equidistantes da reta

( ) de são chamadas de bandas de incerteza de ajuste as quais

qualificam a dispersão do ajuste. Ou seja, supondo uma dispersão puramente estatística

dos dados, há uma probabilidade de ca. 68% de todos os pontos experimentais se

encontrarem na região delimitada por . Assim, se espera que cerca de um, em cada

três pontos, caiam fora dessa região. Caso isto não ocorra, a suposição de uma relação

62

linear entre as grandezas e está incorreta, ou erros sistemáticos não foram levados em

consideração.

3.4.1. Ajuste para uma reta que passa pela origem:

Para uma reta que passa pela origem, temos:

Assim,

e o coeficiente a pode ser dado por:

E:

Para incertezas iguais, vem que:

A maioria das calculadoras possuem funções estatísticas para resolver o

problema de se trabalhar com uma massa muito grande de dados. Caso tais funções não

estejam disponíveis, aconselhamos a construção da seguinte tabela para simplificação de

contas e a fim de se evitar erros:

63

Tabela 17: Modelo de organização dos dados para cálculos utilizando o método dos mínimos quadrados.

( ) ( ) ( ) ( )

1

2

3

...

...

n

Obs.: Para uma inspeção da nossa reta ajustada, podemos usar os resíduos ( )

e verificar se são consistentes com a reta encontrada, ou seja, se desenharmos um gráfico dos resíduos

em y como função das abcissas dos pontos experimentais devemos encontrar, para o caso de uma

reta, valores em torno de zero. Caso contrário, devemos impor uma ordem mais elevada à nossa

curva, a qual passa a não ser mais uma reta.

3.4.2. Barras de incerteza

Os pontos experimentais devem estar próximos da reta ajustada de forma

verossímil, ou seja, para Δy, espera-se que tenhamos uma certeza de 68%, portanto cerca

de um terço dos pontos (juntamente com as suas incertezas) não devem tocar a reta

ajustada (claro, pode ocorrer que todos os pontos toquem a reta devido a um valor

estimado para a incerteza maior que o esperado: incertezas sobreestimadas).

O método dos mínimos quadrados não permite a visualização da

verossimilhança. Então, devemos lançar mão de alguma técnica que nos forneça a

“qualidade” de nosso ajuste baseado nos pontos experimentais que temos. Quando a

relação entre as grandezas é bem conhecida (como o caso da reta ( ) )) a

“qualidade” do ajuste permite, ainda, ver se as incertezas foram corretamente estimadas!

Sobre as barras de incerteza: Os pontos no gráfico são valores médios e os

valores medidos para cada ponto estão sujeitos a uma distribuição estatística (normal).

Assim, a dispersão dos valores em torno do valor médio é dada pela barra de incerteza e

nos fornece um limite de confiança de cerca de 68%, ou seja, cerca de dois terços das

barras de incerteza devem cruzar a reta! Portanto, há uma relação entre as barras de

incerteza e as distribuições gaussianas de cada ponto do gráfico.

64

Figura 11: Barras de incerteza para os pontos experimentais: em (A) tem-se a distribuição

gaussiana representando a função de distribuição de probabilidade normal para cada ponto

médio, e em (B) tem-se as barras de incerteza para a variável dependente e o ajuste linear para os

pontos indicados. O limite de confiança esperado para os pontos é de 68%, ou seja, espera-se que

cerca de um terço das barras de incerteza caiam fora da reta ajustada.

Exemplo:

Dado os valores da Tabela 18, use o método dos mínimos quadrados para

determinação dos coeficientes A e B da melhor reta ajustada, Y = A + BX:

Tabela 18: Medições.

X Y

1,0 33

1,5 57

2,0 85

2,5 110

∑( )

∑( )

( ) ( ) ( ) ( )

( ) ( ) ( ) ( )

( )( )

Logo:

B) A)

Variável X Variável X

Y Y

65

3.4.3. Coeficiente de correlação R

Surge a seguinte questão: Como avaliar a “qualidade” de nosso ajuste? Resposta:

por meio do coeficiente R chamado de Coeficiente de Correlação. Supondo uma

representação de nossas incertezas como vetores no espaço , podemos visualizar o

grau de correlação entre duas variáveis como o produto escalar dessas variáveis (ou seja,

o cosseno do ângulo formado entre os dois vetores), resultando em:

∑ ( ) ( )

√∑ ( ) √∑ ( )

Ou seja, não nenhuma correlação linear entre as variáveis x e y se R resultar

nulo! Valores para R = 1, significa uma forte correlação linear entre as variáveis (na

verdade, usualmente se utiliza o valor de R2, e uma correlação aceitável deve ser aquela >

0,7).

Obs.: De fato poderíamos recorrer à álgebra vetorial para o estudo das incertezas.

66

Referências bibliográficas

[1] Michael F. Marmor. Ophthalmology and Art: Simulation of Monet’s

Cataracts and Degas’ Retinal Disease. ARCH OPHTHALMOL/VOL 124, DEC

2006. 1764-1769.

[2] VUOLO, J. H. Fundamentos da teoria de erros. Ed. Edgard Blucher LTDA.

2º Ed. (7º Reimpressão- 2012). 1996. São Paulo.

[3] BARROS NETO, B., SCARMINIO, I. S., BRUNS, R. E. Como fazer

experimentos- aplicações na ciência e na indústria. Editora Unicamp. 4º Ed.

2010. Campinas.

[4] DIONISIO, P. H. Sensibilidade do equipamento x precisão da medida

(Comentário sobre o artigo “O que é uma medida”). Revista de Ensino de Física,

Vol. 13, 1991, 30-33.

[5] ENEST RABINOWICS, An Introduction to Experimentation. Addison-

Wesley Publishing, Inc. 1970, pp. 30-36 (121).

[6] HUGHES, I. G. & HASE, T. P. A. Measurements and their uncertainties. A

practical guide to modern error analysis. Oxford University Press Inc., 2010,

New York.

[7] HELENE, O., TSAI, S. P., TEIXEIRA, R. R. P. O que é uma medida!

Revista de Ensino de Física, Vol. 13, 1991, 12-29.

[9] PRESTON, D. W. and DIETZ, E. R. JHON. The art of Experimental

Physics. wiley & Sons, Inc. 1991. Pp. 432.

[10] HELENE, O., VANIN, V. R. Tratamento estatístico de dados em física

experimental. Ed. Edgar Blucher, 1980, São Paulo.

[11] KENDALL, M.G. & STUART, A. The advanced theory of statistics. Vol. 2,

4a ed, Charles Griffin & Co, 1979, Londres.

[12] BIPM/IEC/IFCC/ISO/IUPAC/IUPAP/OIML, Vocabulário internacional de

termos fundamentais e gerais em metrologia, INMETRO. 1994, Rio de Janeiro.

[13] Vocabulário internacional de metrologia – Conceitos fundamentais e gerais

e termos associados (VIM 2012), INMETRO. 1º Ed.Luso-Brasileira. 2012, Rio

de Janeiro.