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Este texto foi escrito visando aos alunos de nossos cursos de física
experimental, tanto físicos como engenheiros, servindo como complemento a usual
apostila: Laboratório de Física Geral 1. A presente apostila visa satisfazer tanto a
necessidade de material textual, em nosso idioma, quanto uma atualização da
terminologia e do cálculo de incertezas. Trata-se de uma introdução à Teoria dos Erros e
à experimentação em física. Deve, portanto, ser utilizada como manual de consulta
prévia para a realização das práticas de física (medições e construção de modelos).
Nesta primeira versão, atentou-se aos fundamentos da teoria e às concepções
envolvidas. Preferiu-se, sempre que possível, a análise sintética dos tópicos aqui
abordados. Tem-se uma introdução sobre a metodologia científica e o lugar da
experimentação na epistemologia, ou seja, uma das interpretações dadas ao conceito de
“verdade científica”. No Capítulo 1, se discute a questão da percepção humana na
quantificação de grandezas, o conceito de medição e a utilização de algarismos
significativos em sua representação. A questão das incertezas, Tipo A e Tipo B; os
tipos de erros experimentais; alguns aspectos estatísticos e propriedades das incertezas
são discutidos no Capítulo 2. Também é visto a propagação de incertezas em medidas
indiretas. A construção de modelos e a utilização de gráficos são vistos no Capítulo 3. É
dado ênfase à linearização de curvas e ao método dos mínimos quadrados (este,
demonstrado segundo o método da máxima verossimilhança, recorrendo à estatística).
Ao final, é dada bibliografia para quem queira aprofundar um pouco mais no assunto.
Espera-se que este material seja de grande proveito aos alunos, fazendo-os entender que
a experimentação requer tanta conceituação quanto às disciplinas teóricas. Mais que
isso: em alguns aspectos, trata-se de uma arte!
Agradeço ao meu irmão, Luciano R. S. Fernandes, pela fotografia da capa.
Também agradeço ao meu antigo professor de laboratório de Física Geral, Prof. Dr.
Piotr Trzesniak, e aos colegas: Dr. Marcelo Gonçalves Vivas e Dr. Nirton Cristi S.
Vieira, por terem revisto a versão inicial. Também agradeço aos coordenadores dos
cursos de física experimental do Instituto de Física de São Carlos (IFSC/USP): Prof.
Dr. Tito José Bonagamba e Prof. Dr. Valmor R. Mastelaro.
Qualquer erro encontrado aqui se deve unicamente ao autor.
São Carlos, 23 de maio de 2013
Edson G. R. Fernandes
Índice
Introdução 1
Metodologia científica e experimentação 2
Capítulo 1 – Algarismos significativos 7
1.1 Medição e padrão de medição 7
1.2. A codificação das percepções 9
1.3. Operações com algarismos significativos 11
1.4. Regras de arredondamento 13
1.5. Notação científica 14
1.6. Casos especiais 15
Capítulo 2 – Incertezas 17
2.1. A incerteza 17
2.2. Tipos de erros 19
2.2.1. Erros experimentais grosseiros 20
2.2.2. Erros experimentais intrínsecos 20
2.3. Avaliação de incertezas Tipo A 21
2.3.1. Valor médio 22
2.3.2. Distribuição normal 23
2.3.3. Rejeições 29
2.3.4. Incerteza padrão 30
2.4. Exatidão e precisão de uma medição 35
2.5. Propagação de incertezas 37
2.6. Reprodutibilidade e repetitividade 43
2.7. Instrumentação eletrônica 44
Capítulo 3 – Modelos 47
3.1. Modelos empíricos 47
3.2. Gráficos 49
3.3. Linearização e escalas logarítmicas 51
3.3.1. Caso 1: Anamorfose 52
3.3.2. Caso 2: Linearização da função potencial 53
3.3.3. Caso 3: Linearização exponencial 53
3.4. Método dos mínimos quadrados 54
3.4.1. Ajuste para uma reta que passa pela origem 58
3.4.2. Barras de incerteza 59
3.4.3. Coeficiente de correlação R 61
Referências bibliográficas 62
1
Introdução
"In physical science the first essential step in the direction of learning any
subject is to find principles of numerical reckoning and practicable methods for
measuring some quality connected with it. I often say that when you can measure what
you are speaking about, and express it in numbers, you know something about it; but
when you cannot measure it, when you cannot express it in numbers, your knowledge is of
a meager and unsatisfactory kind; it may be the beginning of knowledge, but you have
scarcely in your thoughts advanced to the state of Science, whatever the matter may be."
[Lord Kelvin, PLA, vol. 1, "Electrical Units of Measurement", 1883-05-03]
Por meio da experimentação, podemos extrair informações quantitativas (ou
qualitativas) da natureza através das relações existentes entre os fenômenos observados,
expressando-os como uma grandeza física descrita por: um número, uma incerteza e uma
unidade. Experimentar, portanto, significa fazer medições as quais trarão respostas acerca
da validade dos modelos físicos adotados e transcritos em linguagem matemática.
As grandezas podem ser definidas como fundamentais e derivadas. Exemplos de
grandezas fundamentais são: espaço, tempo, massa e carga elétrica -- apesar de poder
existir outras grandezas fundamentais, estas são as principais. Já as grandezas derivadas
são expressas em termos das grandezas fundamentais como, por exemplo, velocidade
escalar (taxa de variação temporal do espaço percorrido por um móvel) e aceleração
escalar (taxa de variação temporal da velocidade).
Espaço e tempo são conceitos primitivos os quais não carecem de explicação
uma vez que tais conceitos são intuitivos. Massa pode ser definida como resultado da
interação entre os corpos, podendo ser expressa por meio de uma balança de braços iguais
(massa padrão) ou dinamicamente (massa inercial) sendo que não há uma diferença entre
as duas massas (gravitação e inércia representam um único fenômeno físico e depende do
observador). Carga elétrica é o resultado da interação entre dois corpos carregados e pode
ser expressa em termos de múltiplos da carga de um elétron (ou próton) cujo módulo é
(1,602176565 ± 0,000000022) x 10-19
C (o menor valor de carga encontrado).
Embora possamos definir grandezas com base em medições análogas como, por
exemplo, o espaço percorrido expresso por meio de múltiplos de uma barra, feita de
2
material indeformável e não perecível de comprimento L, é usual redefinirmos essas
grandezas em termos de outras mais precisas como, por exemplo, o espaço percorrido em
termos do número de comprimentos de onda de um feixe de luz de certo λ (cuja incerteza
na medição é muito menor!). Outros exemplos são os relógios atômicos: 9.192.631.770
Hz é a frequência de irradiação do átomo de Césio e a incerteza em um relógio atômico é
da ordem de 1,7 x 10-15
, ou seja, uma exatidão de cerca de 1 segundo a cada 20 milhões
de anos! Claro que, quanto maior a precisão, mais caro deve ser o instrumento de
medição!!
Ao expormos a física como uma ciência, devemos especificar ao certo o que vem
a ser ciência e o que se costuma chamar método científico.
Metodologia científica e experimentação
Podemos dizer que a metodologia científica surge da dúvida e do
questionamento das ideias primitivas sobre o mundo, as quais eram imersas em lendas e
fábulas. Referenciando os gregos, três nomes merecem menção: Pitágoras, o qual
demonstrou relações matemáticas bem definidas na natureza; Sócrates com suas
discussões demonstrando a falta de certeza nas “verdades” aceitas na época; e Aristóteles,
o qual foi o grande organizador das ciências e quem definiu os princípios primitivos do
que seria a Lógica.
Mais recentemente, sem dúvida muito da forma como atacamos um problema se
deve ao “Discurso do Método”, proposto por Descartes. Este propôs, como método de
conhecimento, a simplificação de certa ideia, e sua redução a ideias mais simples e
inquestionáveis a partir das quais, aceitas sem dúvida nenhuma como axiomas, pudessem
ser usadas como base na construção do nosso conhecimento. Daí, nossas reduções dos
fenômenos a simplificações e aproximações em forma de modelos.
Da Vinci propôs uma visão mecanicista do mundo abrindo várias
reinterpretações sobre o corpo humano e a relação, deste, com a de outros corpos numa
proposição mecanicista da própria natureza.
Digna de nota é a busca de uma ordem universal, retomando de certa forma as
ideias pitagóricas, feitas por Johannes Kepler. Kepler, cuja mãe foi queimada viva
3
acusada de bruxaria, deixou muito do misticismo em suas ideias ao perceber que seus
modelos teóricos iniciais conflitavam com os dados experimentais extraídos por Tycho
Brahe, um dos maiores experimentadores da história.
Mais tarde, cai a ideia da autoridade como verdade científica assumida pelos
Aristotélicos com a experimentação. A experimentação passa a assumir um papel
fundamental na questão da verdadeira explicação de um fenômeno físico. Galileu Galilei
foi quem propôs a experimentação como juiz na explicação dos fenômenos do mundo.
Logo após a morte de Galileu, nasce uma das maiores mentes que o mundo já
viu: Isaac Newton. Newton “subindo sobre os ombros dos gigantes” que o precederam,
propõe uma síntese de todo pensamento até ele sobre a “Mecânica Universal” a qual pode
ser explicada, testada e prevista a partir da invenção do cálculo de “fluxões” – O cálculo
diferencial!
Assim, sem adentrarmos muito em questões epistemológicas, podemos propor
um diagrama para o método utilizado em ciências:
Figura 1: Diagrama do método científico. Em síntese, a partir das observações e
questionamentos sobre a natureza, delimitamos os fenômenos físicos de interesse, conceituamos,
definimos as condições iniciais e medimos e coletamos dados para o próximo passo: a
construção de um modelo. Este modelo é revestido de linguagem matemática que, por ser um
constructo do intelecto humano, nos leva ao que é verdadeiro matematicamente. A partir daí,
Universo
Parcela do universo
- Conceitualização
- Debate
- Consenso
DelimitaçãoCondições de contornoAxiomática (princípios)
Hipóteses
Formalização
+
Linguagem Matemática
Modelo
Há outros modelos
NãoSim
Generalização
TeoriaLei
Experimentação
CoerênciaNão
*Retorno
*Retorno: Parcela acrescida ao universo
Consenso Sim
Busca por evidências Ceticismo
(Critérios de aceitação do
conhecimento científico)
(observação, curiosidade, dúvida)
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confirmamos nosso modelo pelo conflito, deste, com valores obtidos da própria natureza. Se tudo
estiver bem, testamos nosso modelo a fim de fazermos previsões e, se essas previsões são
satisfeitas, podemos generalizar nosso modelo na criação de leis e teorias.
Como filosofia natural a física se propõe a uma reflexão sobre o todo e as partes
desse todo. E como ciência, tenta gerar leis universais que possam ser comprovadas
matematicamente. Ou seja, restringe no universo de coisas que acontecem ao mesmo
tempo, os fatos relevantes na explicação de um determinado fenômeno. Já na escolha
desse fenômeno, o “observador” terá de restringir o que é importante do que não possui
relevância na análise. Assim, ao mesmo tempo em que se limita ao fato sob estudo,
também se faz aproximações para tirar as irrelevâncias. A esta abstração, primeira ação
do pensamento, cria-se um modelo que deve se basear em certas leis a que os fenômenos
devem se ajustar perfeitamente. Este teste de ajuste só é possível (e daí o termo ciência)
quando relacionamos, por indução, os fatos relevantes que implicam no fenômeno como
passamos a ter certa ideia de como e porque este fenômeno ocorre. Somente com uma
roupagem matemática essa ideia pode ser testada. Sendo a matemática, um constructo do
intelecto humano e “habitando” somente no “mundo das ideias”, só pode resultar
verdadeira. O teste último de uma lei ou teoria é a experimentação, gerando valores que
podem ser comparados, medidos e reavaliados realimentando assim o sistema.
A questão, após a obtenção de um modelo físico para certo fenômeno cai na
experimentação, ou seja, na medição de grandezas físicas. A medição se dá por meio de
uma comparação entre grandezas de mesma espécie onde uma delas é padronizada. Por
exemplo, podemos medir o comprimento da aresta de um paralelepípedo por meio de uma
régua graduada. É importante observar que um instrumento de medição se compõe de
uma escala graduada e, para certificarmos que essa escala é válida, calibramos nosso
instrumento por meio de uma escala absoluta (antigamente uma barra feita de um aliga de
irídio e platina, atualmente, por meio de certo comprimento de onda de um laser).
Há dois tipos de medição: Medição direta e Medição indireta de uma grandeza
física.
A medição direta de uma grandeza física se dá pela comparação direta entre a
grandeza e a escala do instrumento utilizado para medi-la. Contudo, há grandezas as quais
não temos acesso diretamente a fim de medi-las. A obtenção do valor dessas grandezas se
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faz por meio de medidas indiretas de outras grandezas, das quais a grandeza de interesse é
função. Por exemplo, podemos obter a velocidade de um automóvel por meio de uma
medição direta, usando um velocímetro, ou através da medição indireta do espaço
percorrido e do tempo transcorrido. A relação destas duas variáveis, espaço e tempo, nos
dá a grandeza de interesse velocidade.
Assim, devemos levar em consideração operações matemáticas sobre as
incertezas das grandezas medidas diretamente para o cálculo da incerteza numa medição
indireta (veremos isso com a ideia de propagação de incertezas).
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Capítulo 1 – Algarismos significativos
1.1. Medição e padrão de medição
Para iniciarmos nossos estudos sobre as leis que regem o universo (no intuito de
extrairmos dados quantitativos) devemos ir além de nossos sentidos imperfeitos, uma vez
que são subjetivos. Por meio de nossas percepções podemos destacar aquelas mais
relevantes, para uma dada situação, e expressá-las em termos de grandezas. Abaixo,
seguem duas pinturas realizadas pelo mestre do impressionismo francês, Claude Monet,
em dois momentos diferentes de sua vida (ao fim da vida, Monet passou a sofrer de
catarata, começando a usar cores mais fortes)-- a catarata funciona como um filtro
amarelo que também escurece a imagem, tendo grande peso na acuidade visual e na
percepção das cores. [1]. Outro impressionista que também apresentava problemas de
visão foi Edgar Degas. Nós mesmos podemos experimentar a subjetividade das nossas
sensações quando observamos que corpos em equilíbrio térmico parecem ter temperaturas
diferentes, p. ex., uma barra metálica e outra de um material isolante elétrico em
equilíbrio térmico aparentam ter temperaturas diferentes.
Figura 2: Duas obras de Claude Monet em momentos distintos de sua vida: a primeira foi a que
deu origem ao movimento impressionista: “Impressão, nascer do Sol” (1872); a segunda,
“Ninféias” (1916-1926), pintada já ao fim da vida, após a operação de catarata- a pintura se
apresenta diluída e desfocada, com cores mais fortes.
Assim, as percepções de um indivíduo não podem dizer nada. Não podem
comunicar, uma vez que são próprias de cada um. Quem nunca assistiu ao filme “Festim
Diabólico” (Rope, 1948), de Hitchcock, e não teve a noção de o tempo passar mais
devagar, embora a duração do filme não passasse de 1h20min? (aqui temos os efeito do
chamado “tempo psicológico”). Muitas das vezes, quando essas percepções são
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expressas, estão sujeitas às interpretações de quem as descreve: ver caso dos quadros de
Monet [1]. A noção subjetiva de tempo (nosso tempo psicológico) está diretamente
relacionada com nosso relógio biológico: uma percepção pode ser comunicada, porém
está sujeita a reinterpretações uma vez que conceitos como “maior”, “menor”, “mais”,
“menos”, etc. podem ter significados diferentes para cada um: Uma percepção desse tipo
é a comunicação de certa quantidade de água expressa em termos do volume de um
objeto. Para uma comunicação efetiva e objetiva, são necessárias duas percepções de
mesma espécie sendo natural a padronização de uma delas: unidade de medição.
A padronização envolve a comparação de percepções que, num primeiro
momento, são definidas por meio de comparações de igualdade, utilizando os sentidos e,
após, por interpolação. Por exemplo, verificar se a grandeza r é igual ou não a um padrão
p:
Padrão visivelmente diferente:
r
p
Não são iguais! (objetivo)
E para o caso abaixo, onde r parece ser igual a p?
r
p
Sim, são iguais! (subjetivo). Neste caso, a percepção pode coincidir com o
padrão e as grandezas serão iguais.
Quando os sentidos se tornam insuficientes, necessita-se de instrumentos de
medição. O instrumento permite tomar o padrão p e dividi-lo em N partes iguais às quais
serão a menor divisão de nossa escala (ou menor incremento digital ε). Mediçaõ,
portanto, é a codificação simbólica de uma percepção sensorial a qual pode ser obtida
diretamente por meio de uma comparação direta com uma escala ou, indiretamente por
meio de alguma relação entre o que se quer medir e outras grandezas (de mesma natureza
ou não) as quais deverão ser medidas diretamente.
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A medição de uma grandeza física se faz, portanto, por meio de um número
acompanhado de uma unidade ou padrão. Ou seja, quantas vezes a unidade ou padrão foi
tomado na medição. Por exemplo, se dissemos que um pote possui 3,4 metros isto quer
dizer que o poste possui um tamanho 3,4 vezes maior que o padrão adotado: o metro.
Assim, a unidade é definida pelo padrão adotado. Uma vez que certa unidade é tomada
como padrão, devemos certificar que este padrão não se altere com o tempo, para que as
medidas sejam confiáveis e precisas.
1.2. A codificação das percepções
Na codificação de uma percepção se deve ater somente ao que se é capaz de
perceber e nada além dessa informação. Uma vez que os símbolos são mais facilmente
transportados que as percepções, eles devem ser sempre adotados. Para codificar é
necessária uma comparação, e há duas maneiras de se comparar:
Por contagem: Quando a percepção é maior que o padrão, podemos contar o
número de divisões de escala (menor incremento digital ε) do padrão:
AB = 7 ε (seguramente nem 6, nem 8)
Por interpolação: Quando a percepção é menor que o padrão (ou o menor
incremento digital ε) e é expressa por um número único de algarismo não nulo:
A’B’ = 0,8 do padrão
Ou seja, o menor incremento digital ε foi dividido mentalmente em N partes
iguais e uma nova contagem foi realizada, agora, mentalmente (geralmente N vale 2, em
nosso exemplo N é igual a 10!).
A B
ε P O
A’
@”
’
B’
P O ε
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Assim, numa medição, devemos incluir:
i) Todos os algarismos resultantes de comparação por contagem.
ii) Um único dígito adicional decorrente de uma interpolação, ainda que resulte
em valor nulo (zeros à direita são informações válidas e não podem ser suprimidos ou
acrescentados aleatoriamente. Ex: 0,0001 possui um único algarismo; já 1,000 Possui 4
algarismos ditos significativos). A interpolação é um pouco subjetiva, ao se repetir uma
observação várias vezes, o resultado poderá variar (aleatoriamente).
iii) O nome do padrão utilizado (m, cm, mm, g, kg, ºC, K, etc.).
No caso anterior, temos:
AB = 7,8 ε (unidades de medida)
O algarismo 7, foi obtido por contagem.
O algarismo 8, foi obtido por interpolação.
Zeros à esquerda não carregam informação- não há erros em adiciona-los ou
suprimi-los (neste caso, notação científica é sempre bem vinda!):
0,012 Km é o mesmo que 12 m.
0,0120 Km não é o mesmo que 12 m (neste caso, teríamos 12,0 m!).
Aos algarismos encontrados por contagem mais a interpolação são ditos
algarismos significativos (A.S.). Em uma medição, quando expressamos um número por
7 ou 7,00, dissemos que a medição pode variar de 6 a 8 ou 6,99 a 7,99, respectivamente.
O que implica maior ou menor precisão em nossa medição. Portanto, A.S. são os
algarismos necessários para nos referirmos a um valor medido com a mesma precisão da
instrumentação utilizada para medi-lo (obviamente, quanto mais preciso o instrumento
mais caro ele provavelmente será!).
O processo de interpolação é um pouco subjetivo e pode flutuar de pessoa para
pessoa, ou mesmo para a mesma pessoa, ao se repetir o processo. Assim, será adotado um
divisor apropriado e que expressa a divisão mental, da menor divisão do padrão, em N
partes iguais (como dito anteriormente, geralmente se adota o valor 2, para os casos em
que as menores divisões do padrão possuem um comprimento de 1 mm. Para
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comprimentos de escala maiores, por exemplo 2 mm, adotam-se outros valores, por
exemplo, 4).
Portanto, a medição é um processo de conversão analógico/digital (A/D),
baseando-se em: i) um menor incremento digital (ε), que é a mínima variação que o
instrumento detecta, ou seja, a menor divisão da escala. ii) um contador que registra (em
números inteiros M) a quantos ε corresponde a grandeza S a ser medida. iii) uma
interpolação, µ. iv) o padrão utilizado expresso pela unidade. Logo, a medição S é dada
por:
S=M ε + µ (unidade) (M é um número inteiro, e µ dará o número de casas
decimais)
Medições realizadas por um mesmo instrumento, numa mesma escala, poderão
ter quantidades diferentes de algarismos, contudo, sempre terão a mesma ordem decimal
final fixada por µ.
Tabela 1: Alguns exemplos de grandezas físicas expressas em termos do número de A.S.
Grandeza Número de A.S.
6,67259 6
1,60217730 9
0,0224
3
6,626075 7
- 273,16 5
1.3. Operações com algarismos significativos
Vimos, na sessão anterior, como se procede em casos de medições diretas de
grandezas físicas. Quando se medem diversas grandezas indiretamente devemos adotar
certas regras para melhor expressarmos o resultado final em termos de A.S. uma vez que,
as mesmas, resultam da aplicação de ao menos um operador matemático. Vejamos
algumas dessas regras:
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Tabela 2: Algumas regras para obtenção de A.S. para alguns operadores matemáticos.
Operadores Não é significativo o que estiver além de:
+ ou - Ordem decimal final mais elevada que houver entre
os participantes.
x, /, Sen, Cos, etc. Quantidade de algarismos do participante do
cálculo mais pobre em algarismos.*
Potenciação e radiciação Manter o número de casas decimais da base ou
radicando.*
Logaritmo Contar o número de A.S. do argumento. O resultado
deve possuir o número de casas decimais iguais ao
número de A.S. do argumento.*
*Caso o resultado termine em dígito 1, aumenta-se um algarismo.
A subtração é a única operação em que se pode perder grande quantidade de
informação (em termos de algarismos significativos) em relação ao participante mais
pobre do cálculo. Por isso, adie sempre as operações de subtração.
Caso o resultado comece com o dígito 1, ele terá um A.S. a mais: perceba que
passar de 11 a 12, ou de 12 a 13, nos fornece uma variação de 1 e, portanto, de cerca de
10%. Já, uma variação de 11,0 a 12,0 nos fornece passos de 0,1, ou seja, de cerca de 1%.
Portanto, com o acréscimo de um dígito diminuímos a incerteza gerada pelo dígito 1 que
inicia o resultado.
Exemplos:
A1 = 1,5146 + 0,12 + 451,4 = 453,0
A2 = 28,5383 – 28,520 = 0,018
B1 = 5,3 x 7,817 = 41
B2 = 3,0 x 50,02 = 150 = 1,50 x102 (acréscimo de um dígito)
B3 = 3,14 x sen(1,993) = 2,8643 = 2,86
C1 = 2,1452 = 4,601
13
D1 = Ln(31,5) = 3,44998 = 3,450 (3 A.S., 3 casas decimais)
Obs.: Quando o erro em uma medição não é mencionado, assumimos que a incerteza esteja
no último dígito (A.S.). Por exemplo: para uma medição resultando 10,94 s, a incerteza assumida é de
0,01 s.
Quando interpolamos o resultado final, truncamos o valor e o arredondamos de
acordo com o valor do próximo dígito encontrado.
1.4. Regras de arredondamento
Quando interpolamos certo valor, teremos de interromper a série de números
neste valor. Porém, desconsiderar todo restante da série pode resultar em um erro
substancial. Assim, interpolamos a grandeza e realizamos um arredondamento, para
minimizarmos os demais números perdidos, de acordo com o valor do próximo dígito na
interpolação aplicando as regras:
- Desprezando-se algo que é > 5 aumenta-se 1 na última casa do número que
se conservou.
- Desprezando algo < 5 Deixe como está.
- Para algo = 5, número precedente sempre é par segundo as regras:
i) Mantenha o dígito precedente inalterado se ele for um número par.
ii) Aumente 1 ao dígito precedente se o mesmo for ímpar.
Exemplos:
P1 = 8,768 x 13,1 = 114,8(6)08 = 114,9 (acréscimo de um dígito)
P2 = 3, 483 + 1,23 = 4,71(3) = 4,71
P3 = 3,12 x 0,98 = 3,0(5)76 = 3,0
P4 = 0,32278 x 11 = 3,5(5)058 = 3,6
14
P5 = (2,4664 ± 0,0027) m = (2,466 ± 0,003) m
P6 = (45,1324 ± 1,984) m2 = (45,1 ± 2,0) m
2 = (45 ± 2) m
2
P7 = (0,033445 ± 0,000488) C = (0,03344 ± 0,00049) C = (3,344 ± 0,049)x102 C
1.5. Notação científica
Uma vez que zeros à esquerda não são significativos é conveniente expressar a
grandeza com o menor número possível de zeros por meio de um submúltiplo de sua
unidade ou utilizando a notação científica. Ainda, por vezes, é inconveniente e, até
mesmo, imprópria a representação de uma grandeza por um número elevado de zeros (a
questão das casas decimais foi vista em operações com A.S.). Neste caso, a notação
científica se mostra bastante adequada e seu uso se baseia nas potências de dez do valor
apresentado (exemplos B2 e P7 das sessões 1.3 e 1.4, respectivamente). Por exemplo:
1.000.000 pode ser convenientemente escrito como 1,0 x 106 conforme o número
de A.S. adequados, neste caso, 2.
Também empregamos notação científica sempre que queiramos exprimir os
resultados em que a parte significativa não chega à casa das unidades: 47,283 s com 3 AS
resulta: 4,73 x 104 s.
Note que há apenas um algarismo (não nulo) antes da vírgula.
Exemplo:
(0,005329875 ± 0,000015489) m
A representação mais correta seria:
(5,323 ± 0,015) mm - por mudança de unidade
(5,323 ± 0,015)x10-3
m – usando notação científica
Revendo a Tabela 1:
15
Tabela 3: Alguns exemplos de grandezas físicas expressas em termos do número de A.S. e com uso de
notação científica.
Grandeza e unidade Descrição
6,67259 (x10-11
m3s
-2kg
-1) Constante gravitacional G
1,60217730 (x10-19
C) Carga do elétron
22,4 L
Volume molar de um gás
6,626075 (x10-34
Js) Constante h de Planck
- 273,16 ºC Zero absoluto
Obs.: um dos órgãos responsáveis pela análise e utilização das constantes físicas é o
CODAT: Commitee on Data for Science and Technology).
1.6. Casos especiais
i) Constantes aritméticas em fórmulas possuem infinitos algarismos
significativos.
P. ex.: c=1
mv
ii) Constantes físicas ou irracionais
Devem, em cálculos, serem tomadas com pelo menos 1 A.S. a mais do que a
medida mais pobre.
P. ex.: Cálculo do período de um pêndulo
= √l
g l = 1,216 m (4 AS)
= 3,14159265...
g = 9,80667 m.s-2
.: T = 2,2125 s
Obviamente, quando se usa máquinas eletrônicas, a utilização de todas as casas
decimais disponíveis não causa nenhum problema!
2,000000...
2,000000...
16
Obs.: As constantes físicas definidas como, p. exe. a velocidade da luz no vácuo (29979458
ms-1
), são expressas por números exatos. Já, as demais constantes físicas são seguidas por suas
incertezas. Por exemplo: Constante de Faraday: (96.485,3365 ± 0,0021) Cmol-1
(para maiores
informações acessar: http://physics.nist.gov/cuu/Constants/).
Um exemplo de número exato é dizer que você tem uma nota de R$ 10,00 reais na carteira
ou, que possui 12 colegas de trabalho.
iii) Comparando dois valores A e B:
Podemos comparar dois valores A e B por meio da variação absoluta de um em
relação ao outro, ou por meio da sua variação relativa, conforme tabela abaixo:
Tabela 4: Comparação entre dois valores A e B.
Variação Absoluta Valor relativo Variação relativa
Com respeito a A B-A B/A B
=B
1
Com respeito a B A-B A/B B
B=
B 1
(com unidade) (sem unidade) (sem unidade)
Surge a questão de como se considerar duas medições de uma mesma grandeza,
com diferentes incertezas, como equivalentes. Suponhamos as medições da grandeza :
e . Podemos verificar a equivalência dos dois valores pela
comparação entre a diferença dos valores medidos e as incertezas da seguinte forma:
Se | | ( ), as medições são equivalentes.
Se | | ( ), as medições não são equivalentes.
Se ( ) | | ( ), os resultados do experimento são
inconclusivos e não podemos afirmar se há ou não equivalência entre as duas medições e,
portanto, o experimento deve ser repetido cuidadosamente a fim de se eliminar possíveis
erros sistemáticos.
17
Capítulo 2 – Incertezas
As generalizações feitas em ciência permitem que os resultados de experimentos
similares feitos em lugares distintos sejam semelhantes. Contudo, tais resultados nunca
serão iguais devido às variáveis que fogem ao controle do experimentador e, portanto,
não são levadas em consideração durante o experimento. Assim, resultados obtidos em
um experimento por diferentes experimentadores e em diferentes lugares deverão ser,
embora muito próximos, diferentes. A impossibilidade de se repetir as mesma condições
iniciais de fato (como dizia Heráclito de Éfeso: “Não se pode banhar no mesmo rio duas
vezes”), leva a um desvio do valor “verdadeiro” denominado erro experimental o qual
pode ser expresso por . Esse desvio se deve às incertezas inerentes à própria
experimentação e serão discutidas nesta sessão. Além dessas incertezas, também
chamados de erros estatísticos, também serão discutidos os erros grosseiros e erros
sistemáticos devidos, respectivamente, ao experimentador “novato” e ao instrumento de
medição ou técnica utilizada para a medição.
2.1. A incerteza
Incerteza aqui tem o mesmo sentido de dúvida e pode ser explicada pelo fato de
que: i) o resultado de uma medição é uma informação limitada ao que se consegue
observar. ii) o valor “verdadeiro” de qualquer grandeza é inatingível, ou seja, as medições
são sempre aproximadas. Ambas têm a ver com a menor divisão da escala do
equipamento utilizado na medição e, portanto, não existe medição “exata”. Podemos
representar o desvio de uma medição, , do seu valor “verdadeiro”, , como a subtração
e, portanto, o erro da medição pode ser dado por:
( )
Assim, o valor “verdadeiro” de uma medição deve estar no intervalo:
Como os algarismos significativos não podem dizer nada a respeito de
aproximações (± 0,1?; ± 0,2?; ± 0,5?), para o conhecimento dessas aproximações,
18
estabelece-se uma incerteza de medição que, somada e subtraída do valor obtido,
estabelece um intervalo o qual, com máxima segurança, contém o valor verdadeiro (como
visto acima). Portanto, a incerteza caracteriza a dispersão dos valores que podem ser
atribuídos ao mensurando, ou seja, a incerteza delimita o valor do erro.
Uma mesma medida tomada mais de uma vez (mesmo pelo próprio observador)
pode resultar em valores diferentes. Para encontrar a incerteza, repete-se n vezes o
procedimento de medição nas mesmas condições iniciais, obtendo-se n leituras da
grandeza de interesse. Supondo valores estatisticamente independentes (ou seja, a matriz
de covariância para as n medições é diagonal: ver [2]), essas leituras devem flutuar em
torno do valor “verdadeiro”. É com base nessas medidas, que se define um valor central,
ou representativo, e a incerteza (veremos adiante que uma boa estimativa para o valor
“verdadeiro” é a média aritmética das n leituras). A figura abaixo mostra uma escala onde
foram feitas n leituras (medições), a seta indica o valor central (valor esperado da
medição “verdadeira”, ou seja, o valor médio) e a incerteza expressa por Δ.
Figura 3: A figura mostra uma série de medições de certa grandeza destacando o
valor médio e a distribuição dos valores em relação ao valor médio. A incerta é
dada por Δ.
Mais uma vez, Δ é a incerteza (± Δ fornece o intervalo de medida que, com
máxima segurança (e certo grau de confiança), contém o valor verdadeiro).
A incerteza é sempre positiva e pode ser expressa por um valor absoluto (com
unidades) ou relativo (em %). Deve possuir, no máximo, dois algarismos além de zeros à
esquerda; e a incerteza e o valor representativo devem ter a mesma ordem decimal final.
Não existe incerteza nula!
1 2 3 4 5 6 6
0
5 3 2 1 0 4
Δ Δ
19
Para expressarmos a incerteza, podemos recorrer as seguintes regras [2] (ABNT-
INMETRO (2004)):
Se o primeiro dígito for menor que 3, escrever a incerteza com 1 ou 2 A.S.
Se o primeiro dígito for maior ou igual a 3, escrever a incerteza com 2 A.S.
Quando a incerteza é fruto de uma estimativa ou apenas indicativa (metade do
menor incremento digital da escala do instrumento) usar 1 A.S.
Salvo contrário, achamos por bem expressar sempre a incerteza com 2 A.S.
Duas observações importantes:
i) Usar a mesma potência de dez tanto para o mensurando quanto para
sua incerteza.
ii) Ambos, mensurando e incerteza, devem possuir o mesmo número de
casas decimais (aqui não devemos nos preocupar com os A.S. finais,
pois o valor dependerá da incerteza).
Exemplos:
A Tabela 5 mostra a representação final de uma medição, com sua respectiva
incerteza.
Tabela 5: Representação de grandezas físicas com respectiva incerteza.
Valor representado Incerteza Medida – Intervalo
7,453 Kg 0,012 Kg (7,453 ± 0,012) Kg
4,35 x 10-2 N 12 x 10
-4 N (4,35 ± 0,12) x 10
-2 N
15300 g = 1,5300 x 104 g 100 g = 0,010 x 10
4 g (1,530 ± 0,010) x 10
4 g
3,795 V 10% = 0,38 V (3,80 ± 0,38) V
2.2. Tipos de erros
Vimos as incertezas envolvidas numa medição e como representa-las
corretamente. Veremos, agora, os tipos de erros existentes em uma medição.
20
2.2.1. Erros experimentais grosseiros
São erros decorrentes de falta de cuidado e atenção, e nunca podem ocorrer.
Como não geram incerteza, são erros considerados graves: ainda não há ciência para o
cômputo de tais erros!
Surgem de: Instrumentação visivelmente danificada, falta de ajuste de zero,
leitura equivocada de escala, erros de transcrição de dados, paralaxe: Binóculo e de
movimento (evita-se observando as escalas sempre perpendicularmente e com apenas um
dos olhos), valores indevidamente lidos ou incorretamente anotados, etc.
2.2.2. Erros experimentais intrínsecos
São inerentes ao processo de medição, e são eles que definem a incerteza. São
classificados em:
a) Erros sistemáticos: Tais erros afetam uma ou todas as leituras, para mais ou
para menos. (Ex.: Trena calibrada a 20 °C e empregada a 40 °C, assim, os resultados são
todos menores do que deveriam ser; tempo de reação ao se apertar um cronômetro (em
torno de 0,1 s); considerar o seno de um ângulo como o próprio ângulo (experimento do
pêndulo simples); etc.). Na avaliação de incertezas, são chamados de incertezas do Tipo
B.
Em princípio podem ser (parcialmente) identificados e compensados, mas
sempre fica um limite de erro sistemático (ou erro sistemático residual), S, que não
mais se sabe se é para mais ou para menos (é uma das parcelas da incerteza). O piso
(mínimo) do S é metade (ou outro valor dependendo da interpolação) do menor
incremento digital da escala empregada (Ex.: para uma régua cujo menor incremento
digital é 1 mm, resultará em S = 0,5 mm; uma balança digital em que o fabricante
garante incerteza de 0,1 g, resultará S = 0,1 g).
b) Erros estatísticos: São os erros casuais, aleatórios, fortuitos: os valores
variam de medição a medição devido a fatores aleatórios os quais estarão sempre
presentes. Na avaliação de incertezas, são também chamados de incertezas do Tipo A e se
21
necessita de métodos estatísticos para descrevê-las. Afetam as leituras indistintamente
para mais ou para menos, fazendo-as flutuar em torno de um valor médio.
Incertezas do Tipo A são caracterizadas pelo limite de erro estatístico, E, sendo
a segunda parcela da incerteza.
A incerteza total, , é, pois:
= S + E
Obs.: Claro que, para estimarmos as incertezas referentes à instrumentação utilizada,
devemos levar em consideração que as medições sucessivas são similares e independentes. Aqui não
mostraremos os valores de covariância das grandezas medidas [2].
2.3. Avaliação de incerteza Tipo A
As n observações de certa grandeza g fornecem uma distribuição com n leituras
gi. Tal distribuição nos dá a informação de quem foi encontrado e quantas vezes. Por
exemplo, tomemos duas séries de medições (Série A e Série B) da espessura de um fio de
cobre:
Tabela 6: Duas séries, A e B, para medições da espessura de um fio de cobre.
Por meio de histogramas podemos visualizar a distribuição dos dados. Primeiro,
estabelecemos um intervalo de valores (chamado, em estatística, de intervalo de classes) e
Série A Série B
Medição
± 0,05 (mm) Ocorrência
Medição
± 0,05 (mm) Ocorrência
2,13 1 2,13 1
2,14 2 2,14 1
2,15 3 2,15 3
2,16 5 2,16 5
2,17 6 2,17 8
2,18 8 2,18 12
2,19 7 2,19 10
2,20 5 2,20 7
2,21 4 2,21 4
2,22 3 2,22 2
2,23 2 2,23 1
2,24 1 2,24 1
22
contamos o número de ocorrências em cada intervalo, neste caso, nosso intervalo vale
0,01 mm:
Figura 4: Histogramas referentes às duas séries de medições mostradas na Tabela 5.
Se dividirmos o número de ocorrências pelo número total de medidas (50)
obtemos uma ideia da probabilidade do valor do diâmetro do fio em cada intervalo
escolhido.
2.3.1. Valor médio
O melhor valor representativo de uma distribuição é sua média aritmética (mais
tarde, usando o método dos mínimos quadrados, chegaremos a este mesmo resultado).
Como podemos notar pelos histogramas, há uma tendência de a maioria das medidas
estarem próximos a um valor central dado pela média de todos os valores
(estatisticamente, quando , ou seja, não só é uma boa estimativa como é a
melhor estimativa para o valor real de ):
∑
2,14 2,16 2,18 2,20 2,22 2,24
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
Freq
uênc
ia
Diâmetro (mm)
Série A
2,142,162,182,202,222,24
Diâmetro (mm)
Série B
23
2.3.2. Distribuição normal
Quando os valores mais prováveis caem mais próximos do valor médio que os
valores menos prováveis e, ainda, tais valores são independentes podemos expressar seu
comportamento por meio de uma função de distribuição chamada normal ou gaussiana.
Se prosseguíssemos com um grande número de medições muito maiores que 50
(matematicamente é dizer que ) observaríamos uma curva contínua ao
desenharmos um gráfico do número de ocorrências das medições tomadas em função dos
valores medidos. Ou seja, para um número suficientemente grande de medições, nosso
histograma tenderia a uma curva dada pela chamada distribuição normal, descrita por
Gauss. A Figura 5 mostra essa curva, também conhecida como “curva em forma de
sino”:
Figura 5: As curvas gaussianas representativas das distribuições para as séries de
medições A e B.
Percebemos um valor máximo nas curvas da Figura 5 referente ao ponto médio
e um comportamento assintótico em relação à abcissa. A área sob a curva representa o
número de medições que recaem dentro de um intervalo adotado. Comumente, a
distribuição normal é redefinida em termos de probabilidade (na verdade, densidade de
probabilidade), ou seja, a área total sob a curva é normalizada (unitária) e, para certo
intervalo tomado, corresponde à probabilidade dos pontos caírem dentro do intervalo.
Supondo o intervalo entre x e (x + dx) e, usando a função densidade de probabilidade
obtida por Gauss para descrever a curva normal, a probabilidade de é dada por:
2,12 2,14 2,16 2,18 2,20 2,22 2,24
0
2
4
6
8
10
12
Série A
Série B
Fre
qu
ên
cia
Diâmetro (mm)
24
( )
( ) ⁄ [
( )
]
A função acima não possui solução analítica. Assim, para o cálculo da
probabilidade de certo intervalo, se recorre a valores tabelados da normalização da função
densidade de probabilidade (a referência [3] fornece uma boa leitura sobre o tema).
O desvio padrão s dá uma ideia de como os dados se distribuem ao redor da
média. Assim, um desvio de 1s equivale a uma certeza de 68%; 2s equivale a 95% de
certeza; 3s, 99,7% e 4s equivalem a 99,994%. E isto responde ao quão provável é a
estimativa do valor medido acrescido de um intervalo expresso por s.
Para o caso da Série A, obtemos uma curva “baixa” e “gorda”, ou seja, uma
maior dispersão dos pontos medidos em relação ao valor médio e, portanto, um resultado
não muito bom, possivelmente, devido à presença de erros residuais significativos
somados aos erros estatísticos. Para a Série B, reduzimos os erros residuais presentes e
obtemos uma curva melhorada-- “alta” e “magra”-- com menor dispersão dos valores
medidos (menor desvio em relação ao valor médio) e, portanto, menor incerteza.
As gaussianas podem se diferir, para um mesmo valor médio (como vimos na
Figura 5), e caracterizamos matematicamente essas diferenciações através do desvio da
média:
Uma vez que o somatório de tais desvios pode resultar nulo, podemos tomar sua
média em valor absoluto:
∑| |
Uma melhor representação dessa distribuição é o desvio padrão:
( )∑( )
Obs.: O valor N-1 foi utilizado, ao invés de N, pois os dados já foram utilizados uma vez
para o cálculo da média havendo, portanto, N-1 valores independentes (ou N-1 graus de liberdade:
houve a perda de um grau ao se calcular o valor médio).
25
O limite de erro estatístico ou incerteza do Tipo A, , é definido como o desvio
padrão da média, , (se uma população-- todos os valores possíveis para a grandeza
medida-- se distribui normalmente, não importa o conjunto de dados tomados, todos os
dados se distribuirão também normalmente e pode ser visto como o desvio padrão dos
valores médios ). O limite de erro estatístico é dado por:
√
(o valor 3 indica uma certeza, ou intervalo de confiabilidade, de 99,7%. Aliás,
deve ser sempre dado em termos de 99,7% de certeza!)
Ou seja, a probabilidade do valor “verdadeiro”, , pertencer ao intervalo
é de 99,7% (intervalo de confiabilidade de 99,7%). Matematicamente:
( )
Claro que o intervalo de confiaabilidade apresentado até aqui vale somente para
um número grande de medidas para que as dispersões, no mesmo intervalo, estejam
dentro do valor probabilístico esperado. Assim, o fator multiplicativo de , para certa
probabilidade, p. exe. 68%, deve variar conforme o número de medições (tais fatores são
reajustados e apresentados na Tabela 7, a seguir).
Obs.: Notar que s não depende do valor n e somente dos erros residuais!
26
Tabela 7: Fatores multiplicativos para diferentes probabilidades (P) para vários graus de
liberdade (GL) – Distribuição t-Student.
GL | P 50,00% 68,27% 90,00% 95,00% 95,45% 99,00% 99,80%
1 1,00 1,84 6,31 12,71 13,97 63,66 318,31
2 0,82 1,32 2,92 4,30 4,53 9,92 22,33
3 0,76 1,20 2,35 3,18 3,31 5,84 10,21
4 0,74 1,14 2,13 2,78 2,87 4,60 7,17
5 0,73 1,11 2,02 2,57 2,65 4,03 5,89
6 0,72 1,09 1,94 2,45 2,52 3,71 5,21
7 0,71 1,08 1,89 2,36 2,43 3,50 4,79
8 0,71 1,07 1,86 2,31 2,37 3,36 4,50
9 0,70 1,06 1,83 2,26 2,32 3,25 4,30
10 0,70 1,05 1,81 2,23 2,28 3,17 4,14
20 0,69 1,03 1,72 2,09 2,13 2,85 3,55
30 0,68 1,02 1,70 2,04 2,09 2,75 3,39
40 0,68 1,01 1,68 2,02 2,06 2,70 3,31
50 0,68 1,01 1,68 2,01 2,05 2,68 3,26
60 0,68 1,01 1,67 2,00 2,04 2,66 3,23
80 0,68 1,01 1,66 1,99 2,03 2,64 3,20
120 0,68 1,00 1,66 1,98 2,02 2,62 3,16
150 0,68 1,00 1,66 1,98 2,02 2,61 3,15
250 0,68 1,00 1,65 1,97 2,01 2,60 3,12
500 0,67 1,00 1,65 1,96 2,01 2,59 3,11
1000 0,67 1,00 1,65 1,96 2,00 2,58 3,10
Obs.: Na verdade, a Distribuição t de Student é a mais apropriada para a estimação do
intervalo de confiança para pequenas amostras.
A contribuição da estatística para o cálculo da incerteza não se esgota com a
fixação dos percentuais de inclusão. Um pouco de raciocínio leva facilmente à conclusão
27
de que esses percentuais representam um compromisso entre a altura e a largura da
distribuição (normal) das medições. Então surge a questão: caso se aumente o número de
leituras de um valor n até um valor infinito o que acontecerá? Haverá um aumento
proporcional em toda a curva, ou uma diminuição, ou uma de suas dimensões (altura ou
largura) crescerá mais do que a outra? O que equivale a perguntar: as faixas
alargam-se ou ficam mais estreitas quando se passa de um número finito n para
infinitas leituras? E o valor médio, muda significativamente? As respostas fornecerão a
expressão final para o valor representativo e para a incerteza da medição desejada, e são
as seguintes:
i) O valor médio muda muito pouco, podendo adotar a correspondente a
apenas n leituras como uma boa representação de infinitas medições.
ii) O desvio, para infinitas leituras, corresponde ao de n dividido por √ .
Daí a necessidade de um ajuste para pequenos valores de n.
inda: Pode haver um limite de erro estatístico, ΛE, inferior à metade do menor
incremento digital µ? Resposta: em termos práticos (necessita-se de recalibração da
instrumentação a cada nova medição, para obtenção de medições independentes e
prevalência de erros puramente estatísticos[4]), ΛE nunca pode ser inferior à metade do
menor incremento digital µ do sistema de medição que se está empregando. Fica,
portanto, em definitivo:
⁄ √
⁄
Em termos de algarismos significativos, geralmente o valor médio é
representado com uma casa decimal a mais que o mensurando e, o desvio padrão e desvio
padrão da média, com duas casas decimais a mais.
Obs: Seja uma série de medições e seus respectivos erros sistemáticos:
, o valor médio é dado por: ∑
∑
∑
. Assim, ∑
.
Logo, para , (o valor médio tende para o valor verdadeiro!).
28
É um erro muito comum pensar que a conversão de uma unidade em outra tornará a
incerteza menor ou maior. Note que o valor da incerteza em relação ao valor da grandeza
continuará igual! P. exe.: (1,000 ± 0,001) L = (1000 ± 1) mL, e a relação entre a incerteza e o
valor da grandeza permanece a mesma.
Exemplo:
Seja a série de medições:
Tabela 8: Medições para intervalos de tempo com os termos utilizados para cálculo do desvio
padrão.
Medição (t ± 0,001) ms (ms) ( ) (ms)2
1 26,802 0,0303 9,1809E-4
2 26,987 0,2153 0,04635
3 26,680 -0,0917 0,00841
4 26,128 -0,6437 0,41435
5 26,808 0,0363 0,00132
6 27,400 0,6283 0,39476
7 26,743 -0,0287 8,2369E-4
8 27,005 0,2333 0,05443
9 26,686 -0,0857 0,00734
10 26,478 -0,2937 0,08626
∑
ms
∑ ( ) ms (perceba que o somatório resultou
nulo)
√∑ ( )
( ) √
ms (intervalo de confiabilidade de 68%)
√
√ ms (intervalo de confiabilidade de 99,7%)
Resposta final: (26,77 ± 0,32) ms (com confiabilidade de 99,7%)
29
Questão interessante:
Temos dois conjuntos de medições: uma série de 10 medições do tempo
transcorrido para a queda de uma esfera metálica, e outra série de 10 medições do espaço
percorrido correspondente a cada tempo medido. Desejamos calcular o valor da
velocidade máxima da queda e, após, seu valor médio. Para tal, surge a dúvida: Tomar os
valores médios do espaço e do tempo, para o cálculo da velocidade máxima ou tomarmos
cada valor, de espaço e tempo, e calcularmos as respectivas velocidades e, após, sua
média? Bom, descartamos a última e ficamos com a primeira opção! Por quê? Pois, para
que tomemos a média e, para tal, recorremos à estatística é necessário que cada valor seja
estatisticamente independente! (coisa que já não ocorre quando calculamos
primeiramente as distintas velocidades e, após, os seus valores médio e desvio padrão.
2.3.3. Rejeições
O significado dos percentuais associados ao desvio padrão s é que, em termos
gerais, somente três em cada 1000 medições extrapola o intervalo de 3s em torno do valor
médio . Assim, embora seja possível encontrar-se um valor desse tipo, que extrapole o
intervalo 3s, em uma distribuição de, digamos, 50 ou 100 leituras, sua presença a
desequilibra, distorcendo a média e levando a um desvio excessivamente elevado. O
intervalo de ±3s em torno do valor médio é, por isso, denominado de intervalo de
inclusão e, se alguma leitura se encontrar fora dele, será excluída do conjunto, devendo-
se calcular uma nova média e um novo desvio (para o qual a inclusão será novamente
analisada, podendo levar a um novo cálculo e assim por diante, até se terem somente
valores aceitáveis). Em suma, se podem rejeitar certos dados experimentais ditos ruins!
Obs.: Este é o caso em que há a presença de erro grosseiro, ou erro residual superestimado,
na medição que divergiu do comportamento esperado para o conjunto de medições.
Um critério bastante utilizado para rejeições é o Critério de Chauvenet [3] onde, para um
intervalo de confiança ±3s espera-se que 1 em cada 400 valores caiam fora da faixa confiável, ou seja,
0,3% dos valores encontrados. O critério diz que: “um valor pode ser rejeitado da amostra se o
número de eventos que esperamos estar mais distantes da média que o valor suspeito, para os valores
calculados da média e desvio padrão, for menor que 0,5”. Um pouco complicado!
30
2.3.4. Incerteza padrão
incerteza final ou incerteza padrão, σp (nosso Δ anterior), é dada pela fórmula:
√
fim de seguir uma notação mais atual, ΛE foi rebatizado de incerteza do Tipo
A: σm, e Λr foi rebatizado de incerteza do Tipo B: σr.
Obs.: Mantive as duas notações devido à alguns autores que ainda utilizam o conceito de
“limite de erro” ou aos bons textos antigos sobre Teoria dos Erros.
Pela regra ortodoxa:
Exemplos:
1) Cálculo do diâmetro de um fio de cobre. Valores por equipe:
Equipe 1:
Valor: = ,188, σ = 0,01 3, ΛE = σm = 3,25x(0,00389) (99,7%), ΛS = σr = 0,01
(incerteza sistemática residual adotada: menor divisão do nônio)
Tabela 9: Medições da Equipe 1.
Medida Valor: ± 0,01 mm
1 2,17
2 2,20
3 2,20
4 2,21
5 2,19
6 2,18
7 2,18
8 2,18
9 2,18
10 2,19
31
Incerteza padrão:
√
p = 0,01612
Resposta final: (2,19 ± 0,02) mm
Equipe 2:
Tabela 10: Medições da Equipe 2.
Valor: = ,18 , σ = 0,01619, ΛE = σm = 3,25x(0,00512), ΛS = σr = 0,01
Incerteza padrão:
√
p = 0,01941
Resposta final: (2,18 ± 0,02) mm
Medida Valor: ± 0,01 mm
1 2,17
2 2,18
3 2,22
4 2,17
5 2,17
6 2,20
7 2,17
8 2,18
9 2,18
10 2,18
32
Equipe 3:
Tabela 11: Medições da Equipe 3.
Valor: = , 0 , σ = 0,01135, ΛE = σm = 3,25x(0,00359), ΛS = σr = 0,01
Incerteza padrão:
√
p = 0,01537
Resposta final: (2,20 ± 0,02) mm
Medida Valor: ± 0,01 mm
1 2,21
2 2,20
3 2,22
4 2,18
5 2,21
6 2,20
7 2,21
8 2,20
9 2,19
10 2,20
33
Equipe 4:
Tabela 12: Medições da Equipe 4.
Valor: = ,193, σ = 0,0 869, ΛE = σm = 3,25x(0,00907), ΛS = σr = 0,01
Incerteza padrão:
√
p = 0,03113
Resposta final: (2,193 ± 0,031) mm
Medida Valor: ± 0,01 mm
1 2,20
2 2,18
3 2,18
4 2,23
5 2,24
6 2,16
7 2,17
8 2,22
9 2,16
10 2,19
34
Equipe 5:
Tabela 13: Medições da Equipe 5.
Valor: = ,183, σ = 0,00949, ΛE = σm = 3,25x(0,00300), ΛS = σr = 0,01
Incerteza padrão:
√
p = 0,01397
Resposta final: (2,18 ± 0,01) mm
Observações:
a) Considerou-se como erro residual o menor incremento digital do instrumento
de medida (nônio).
b) A média, geralmente, é escrita com uma casa decimal a mais.
c) O desvio padrão e o desvio padrão da média são escritos com mais duas casas
decimais.
d) O nível de confiança adotado foi de 99,7%.
2) Paquímetro:
Seja um paquímetro de 20 divisões. Logo:
.
Medida Valor: ± 0,01 mm
1 2,17
2 2,19
3 2,20
4 2,19
5 2,18
6 2,18
7 2,18
8 2,17
9 2,18
10 2,19
35
e
(99,7%), então: √
(não há
muito sentido se trabalhar com paquímetros de divisão maior que 20!).
Às vezes também se adota, como limite de erro sistemático, o próprio valor
de ε (no caso, 0,05 mm).
2.4. Exatidão e precisão de uma medição
Supondo o valor verdadeiro como o centro de um alvo, e representando as
medições realizadas como tiros disparados sobre ele, podemos representar a acurácia (ou
exatidão) e a precisão numa medição conforme a figura abaixo:
Figura 6: Alvos representando a exatidão e precisão em uma medição.
A Precisão se associa ao número de casas decimais que se pode ter e a exatidão
se quantifica pela comparação com um padrão (calibração): o número de casas decimais
se relaciona com a precisão do instrumento, p. ex., um paquímetro com vernier dividido
em 20 partes iguais deve possuir uma precisão até a segunda casa decimal de 0,05 mm. Já
a exatidão está relacionada com a aferição de nosso instrumento de medida com um
padrão: podemos “errar o alvo” com boa precisão se, p. ex., utilizamos uma boa régua
metálica aferida em 20 οC, num ambiente de 40
οC. Neste caso, nossa exatidão seria
exatamente como o da figura do alvo de cima, à direita.
Baixa exatidão Alta precisão
Alta exatidão Alta precisão
Alta exatidão Baixa precisão
Baixa exatidão Baixa precisão
••
••
••
••
••
••
• • • •
• •
• •
•
•
•
•
36
Quando o erro estatístico é pequeno, as flutuações entre uma medida e outra
também são pequenas e os resultados tendem a um valor médio, apresentando boa
repetitividade. Contudo, tais valores podem divergir do valor real (o “alvo”) quando não
se tem uma boa exatidão nas medições. Além de uma boa precisão e exatidão, os valores
de uma medição podem diferir conforme uma melhor aproximação do valor médio real
conforme o número de medições realizadas. Isto pode ser verificado por meio de uma
curva de distribuição “gorda” e “baixa” contra uma mais “alta” e “magra” (como vimos
na Figura 5). Obviamente, uma situação ideal seria a de uma distribuição com baixa
dispersão e desvio padrão, com o maior número de pontos próximos ao valor médio real
(aproximado sempre pelo valor médio amostral).
Supondo leituras de distâncias sobre uma régua representadas por pontos sobre a
mesma, podemos visualizar as distribuições relativas a cada série de medidas e as
respectivas, precisão e exatidão. Vamos supor três casos: dois com altas precisão e
exatidão, porém distintas dispersões dos valores em relação à média (ou seja, um mais
preciso que o outro), e outro com boa precisão e baixa exatidão:
Figura 7: Série de medições para três casos distintos: Caso 1- alta dispersão dos valores em
relação à média e presença de erro estatístico, Caso 2- alta dispersão dos valores e presença de
erro estatístico e sistemático, Caso 3- baixa dispersão dos valores em relação à média e erro
estatístico.
Para os casos (1) e (3), temos somente a presença de erros aleatórios, ou seja,
devido a flutuações estatísticas das medições. No caso (1), há uma maior flutuação e,
portanto, uma maior distribuição dos pontos em relação ao valor mais provável Ᾱ1 (uma
curva normal mais “baixa” e “gorda” se comparada com a do caso (3)). A distância entre
Ᾱ1 e Ᾱ2 equivale aos erros sistemáticos (ou erro residual) e nos fornece um valor para a
exatidão da medição (o caso possui, portanto, baixa exatidão).
• • • •••• • • • Ᾱ2
• • •••• • • • Ᾱ3 •
3
• • •• ••• • • • Ᾱ1 Caso 1:
Caso 2:
Caso 3:
37
Obs.: Para um instrumento utilizado para medir 100,0 unidades e se mede 99,6, sua
exatidão está limitada ao erro de 0,4%.
A precisão pode ser estimada, portanto, por meio da distribuição dos valores obtidos
em torno do valor médio, ou seja, pela largura do histograma.
2.5. Propagação de incertezas
Não se pode ter acesso a um grande número de grandezas físicas as quais, por
definição, são dadas em termos de grandezas físicas mais fundamentais e mensuráveis.
Por exemplo, podemos definir velocidade escalar como a razão entre o espaço percorrido
e o tempo transcorrido. Medindo-se ambos, espaço e tempo, chegamos à velocidade
escalar. Podemos também construir um instrumento de medida que nos dê
automaticamente o valor da velocidade (velocímetro) desde que calibremos esse
instrumento para uma velocidade conhecida (padrão). Na primeira, temos o caso de uma
mediçaõ indireta da velocidade. No segundo caso, trata-se de uma medição direta.
Para o caso de medições indiretas, podemos expressar nossa grandeza de
interesse G como uma função das grandezas diretas:
G = G(x1, x2, x3, x4, ..., xn)
Sendo que há, para cada uma dessas grandezas uma incerteza associada. Como
calculamos, pois, a incerteza em nossa grandeza de interesse G? Primeiramente, devemos
supor que as grandezas x1, x2, x3, x4, ..., xn sejam independentes entre si e G(x1, x2, x3, x4,
..., xn) seja lentamente variável [2]. Então, uma variação em G é dada por:
∑(
)
Incertezas nas grandezas xi, representados por , devem resultar em erro na
medição da grandeza G, :
∑(
)
38
Uma vez que tais erros podem variar em termos de sinais negativos e positivos e,
em algum caso, resultar nulo, calcularmos a incerteza em G tomando o quadrado da
derivada parcial de G em relação a cada variável independente e multiplicando pelas
respectivas incertezas elevadas ao quadrado. Feito isso, obteremos o quadrado da
incerteza em G, , dada por:
∑(
)
(
)
(
)
(
)
(
)
Obs.: Para o caso de as medições das grandezas xi serem dependentes, um fator deve ser
acrescido à equação. Uma visualização importante desse conceito é dada por [5]:
Para o caso de as incertezas serem distintas, devemos ter:
∑(
)
∑ (
) (
)
E a segunda parcela da equação é chamada de covariância.
A seguir, é mostrado um resumo das fórmulas que podem ser utilizadas para o
cálculo da propagação de incertezas:
Seja: a = ( ± Δx) e b = ( ± Δy)
1 - Adição:
a + b = ( ± Δx) + ( ± Δy) = ( + ) ± (Δx +Δy)
2 - Subtração:
a - b = ( ± Δx) - ( ± Δy) = ( - ) ± (Δx +Δy)
3 - Multiplicação:
a . b = ( ± Δx) . ( ± Δy) = ( . ) ± ( .Δy + .Δx)
4 - Multiplicação por uma constante, c:
39
c . a = c ( ± Δx) = c. ± c.Δx
5 - Divisão:
=
6 – Potência
am
= ± ( )
7 - Coseno:
cos (a) = cos ( ± Δx) = cos( ) ± sen( ).Δx
8 - Seno:
sen (a) = sen ( ± Δx) = sen( ) ± cos( ).Δx
9 – Logaritmo:
log (a) = log ( ± Δx) = log ( ) ±
, e = 2,7182...
10 – Raiz quadrada:
a1/2
= √( ) √
√
Exemplos:
1) (9,750 ± 0,070) /(4,800 ± 0,030) = 2,301 ±
= 2,031 ±
0,027
2) (3,72 ± 0,04)3 + (2,11 ± 0,04) = (51,5 ± 1,7) + (2,11 ± 0,04) = 54 ± 2
3) (3,35 ± 0,04) x (2,33 ± 0,07) = 7,8055 ± (3,35x0,07 + 2,33x0,04) = 0,3277 =
7,8 ± 0,33
4) (7,500 ± 0,040)3 = 421,875 ± 3(7,500)
2x0,040 = 421,88 ± 6,75 = 421,9 ± 6,8
40
As incertezas podem ser interpretadas em termos do cálculo diferencial.
Geometricamente podemos representar a incerteza como o gradiente da curva
representativa da função:
Figura 8: Propagação de incertezas: aproximação da incerteza para uma função de uma
única variável baseada no cálculo diferencial.
Ou seja, temos a aproximação da série de Taylor, com os primeiros dois termos,
no ponto x0:
( ) |
|
( )
|
|
Para mais de uma variável:
√∑[(
)
]
Assim, a melhor estimativa da grandeza indireta, G, é aquele em que G é função:
( ) e a incerteza em G, , é dada pela seguinte função:
( ).
G
G
G
41
Obs.: O método proposto, obviamente, vale somente quando o erro Δx é suficientemente
pequeno! Para o caso de multivariáveis, assumimos que as variáveis xi sejam independentes e não se
correlacionem!
Exemplos:
1) Seja ∑
, cálculo de
, ou seja, cálculo da incerteza da média:
Cada xi ± σ, então:
∑ (
)
(
) ∑
, assim: √
√
Ou seja, o desvio padrão médio!
)
para: m = (15,432 ± 0,096) kg e v = (40,91 ± 0,12) m.s
-1
√⌈
⌉
⌈
⌉
√⌈
⌉
⌈
⌉
Logo: E = (12914 ± 89) J
Obs.: Se calculássemos os intervalos diretamente:
E = 0,5.15,432.40,912 = 12914
+ΔE = 0,5.(15,432 + 0,096).(40,91 + 0,12)2 – 12914 = 156
-ΔE = 12914 - 0,5.(15,432 – 0,096).(40,91 – 0,12)2 = 156
Logo: , então: ( ) J.
3) Seja a equação de Van der Waals para um gás ideal [6]:
(
)( )
Calcular: i) a pressão do nitrogênio com volume molar: (
) a uma temperatura de ( ) , dados os coeficientes de
Van der Waals: , e . ii) A incerteza no
valor da pressão. Dado: .
i) Da expressão dada podemos explicitar a função em P:
42
( )
( )
Logo, fazendo 1J = 1 m3Pa, obtemos uma estimativa para o valor da pressão como
(usando o método funcional):
( )
ii) calculo das incertezas devidas a Vm e T:
( )
( )
( )
E
( ) ( )
( )
( )
A contribuição do erro na pressão devido à T é: ( )
( ), e o mesmo pode ser feito em relação a Vm. Resultando em:
A incerteza total em P é então dada por:
√( ) ( )
Resultando em: P = (11,89 ± 0,02) MPa.
Compare este método com o método baseado no cálculo diferencial!
4) Cálculo da densidade, ρ, de uma esfera de raio r e massa m:
√ (
)
(
)
Supondo os valores: r = (0,830 ± 0,005) mm e m = (26,76 ± 0,10) g
ρ = (11,178 ± 0,206) g.mm-3
= (11,18 ± 0,21) g.mm-3
43
2.6. Reprodutibilidade e repetitividade
Quando se reproduz várias medidas sujeitas às mesmas condições iniciais,
mesmo observador, mesmo instrumento de medição e mesmo mensurando, se diz, acerca
do grau de concordância dos resultados, ter uma condição de repetitividade. Já, quando
várias medidas de um mesmo mensurando são tomadas sob condições distintas de
medição, como diferentes: observadores, instrumentos de medição, locais, dias, padrões
de referência, etc. dizemos ter uma condição de reprodutibilidade, quanto ao grau de
concordância dos resultados. A figura abaixo mostra a reprodutibilidade de um
mensurando medido por dois observadores e a respectiva repetitividade obtida por cada
um deles:
Figura 9: Duas séries de medições, A1 e A2, com dispersões aproximadamente iguais e presença
de erro sistemático para uma delas (série A2). A repetitividade é dada em termos da distribuição
dos valores em torno do valor médio. E a reprodutibilidade, em termos da presença de erro
residual (incerteza Tipo B), o que faz uma série divergir da outra.
Obs.: A respeito das definições dos termos adotados em metrologia, o INMETRO lançou a
portaria No 29, em 10 de março de 1995, intitulada “Vocabulário de termos fundamentais e gerais de
metrologia” (VIM). Esta portaria esta em conformidade com os órgãos internacionais: ISO, BIPM,
IEC, IFCC, ILAC, IUPAC, IUPAP, e OIML.
Segundo a VIM:
Exatidão “é o grau de concordância entre o resultado de uma medição e o valor
verdadeiro do mensurando”.
Repetitividade é o “grau de concordância entre resultados de sucessivas
medições de um mesmo mensurando, efetuadas sob as mesmas condições de medição”.
• • •• ••• • • • Ᾱ1
• • • •••• • • • Ᾱ2
reprodutibilidade
44
Reprodutibilidade é o “grau de concordância entre resultados de medições de
um mesmo mensurando, efetuadas sob condições variadas de medições”.
Obs.: Para o caso de reprodutibilidade, a média ponderada é a melhor aproximação para n
resultados experimentais. [4,7]
2.7. Instrumentação eletrônica.
Em se tratando de instrumentação eletrônica, não faz sentido tomarmos a metade
do último dígito da escala do equipamento. O que usualmente pode ser feito é adotar-se,
como incerteza Tipo B, o último dígito da escala do aparelho. Por exemplo, para uma
balança digital, temos: (25,45 ± 0,01) g (a incerteza recai sobre o último dígito que ela
pode fornecer, ou seja, 0,01 g).
Na eletrônica, os instrumentos são classificados por classes. Classe é o limite de
afastamento, ou máximo desvio, da indicação do aparelho em relação ao valor da
grandeza, expressa como um percentual do fundo de escala do instrumento.
Podemos indicar o instrumento de medição eletrônico segundo as classes de
precisão:
Tabela 14: Instrumento de medição eletrônico segundo as classes de precisão.
Instrumentação de: Precisão Serviço
Classe 0,1 0,2 0,5 1,0 1,5 2,5 5,0
Percentual de erro de fundo de escala ±0,1% ±0,2% ±0,5% ±1,0% ±1,5% ±2,5% ±5,0%
Assim, um instrumento que possui fundo de escala de 400 V de Classe 5, quando
se tem a indicação de um valor medido 324 V quer dizer: Erro de medição de 0,005 x 400
V = 20 V, o valor real está entre: 304 e 344 V.
45
Toda leitura deve é feita múltiplos inteiros de D (desvio) e escrita até a mesma
ordem decimal de D. Então, a forma de leitura pode ser vista pela Tabela 15:
Tabela 15: Forma de leitura do instrumento de medição eletrônico de acordo com seu máximo desvio.
Forma de leitura x10n
De 1 em 1 De 2 em 2 De 5 em 5
Máximo desvio (D) x10n
0,75 D 1,5 1,5 D 3,5 3,5 D 7,5
Exemplos:
Tabela 16: Exemplos de medições e leituras em instrumentação eletrônica.
Classe Fund. de Esc. D F. de Leitura Leitura Medição
5 100 V 5 5 em 5 V 13,8 V 15 V
79,2 V 80 V
38,7 V 40 V
97,4 V 95 V
0,5 12 mV 0,06 mV 5 em 5 x10-2
mV 1,1 mV 1,1 mV
7,8 mV 7,8 mV
3 300 Hz 9 Hz 1 em 1 x101 Hz 204 Hz 20 x10
1 Hz
4 Hz 0 x101 Hz
1 30 A 0,3 A 2 em 2 x10-1
A 17,43 A 17,4 A
27,70 A 27,6 A
2,12 A 2,2 A
22,48 A 22,4 A
Obs.: Verifique sempre se seu equipamento está adequadamente calibrado!
Em instrumentação digital, sua incerteza pode ser calculada de várias maneiras.
Vimos o caso de se adotar o valor da incerteza do último dígito, ou segunda a classe do
instrumento. Porém, a maioria dos fabricantes segue a norma IEC 485 que diz que a
incerteza é dada por:
( )
Sendo p% o percentual do valor medido especificado pelo fabricante, G a
grandeza medida, e m é a quantidade de dígitos menos significativos na escala
selecionada (LSD).
46
Exemplo:
Em uma medição de tensão obteve-se, em um multímetro digital na escala
19,999, o valor de 25,770 V. O fabricante especifica, para o multímetro adotado, que p%
= 0,1% e m = 1. A incerteza é dada, portanto, por ±(0,001x25,770 V + 1x0,001) =
0,02577, e a medição resulta: (25,770 ± 0,026) V.
47
Capítulo 3 – Modelos
O objetivo da ciência é descrever a natureza através do estabelecimento de
modelos. O modelo de um fenômeno físico permite conhecer o resultado obtido, caso ele
ocorra, sem que ele de fato ocorra.
3.1. Modelos empíricos
Como ciência, a física deve propor resultados não somente qualitativos como
também, e principalmente, quantitativos sobre o mundo. Muitos dos mais interessantes
problemas físicos são modelados por equações diferenciais parciais as quais não podem
ser resolvidas analiticamente. Assim, uma saída é lançar mão do cálculo numérico. Outra
tentativa é expor qualitativamente as propriedades e ideias fundamentais desses
problemas.
Modelos relacionam dois ou mais conjuntos de medições, e podem ter forma de
funções, gráficos ou tabelas sendo, os gráficos, os mais intuitivos por serem pictóricos.
Os modelos frequentemente possuem validade restrita a certos valores das variáveis
envolvidas: por isso, deve-se sempre dar o domínio de validade de um modelo.
Experimentos físicos levam à obtenção de tabelas de valores correspondentes às
grandezas medidas. Cabe ao observador responder se existe alguma relação entre as
grandezas tabeladas, ou seja, se há algum modelo para o fenômeno em estudo e, caso
exista, como podemos expressar tal relação matematicamente. Para tal, primeiramente
construímos um gráfico exploratório e observamos se há alguma relação matemática entre
as grandezas. O resultado final será uma curva que, para o caso de uma relação entre
somente duas grandezas, podemos desenha-la em um plano cartesiano.
48
Por exemplo:
Figura 10: Verificação de alguma relação existente entre duas grandezas físicas: em (A) não obtemos
nenhuma relação por inspeção visual já, em (B), visivelmente há uma relação, possivelmente,
parabólica entre as grandezas Espaço percorrido e Tempo.
As tabelas, primeiro passo na construção de gráficos, devem ser claras e
concisas. Os nomes adotados para as grandezas, bem como suas respectivas unidades,
devem ser colocados em um cabeçalho, separado do corpo da tabela onde serão colocados
os dados experimentais, como podemos ver nos exemplos de tabelas desenhadas aqui,
incluindo um comentário a respeito do que se está tratando na tabela. Como pôde ser
visto, nas tabelas modernas evitam-se as linhas horizontais e transversais separando os
dados para que a mesma seja mais “limpa”. Uma regra geral, tanto para as tabelas quanto
para os gráficos, é que os mesmos devem ser construídos para quem os lê e não por
quem os faz, portanto, devem ser concisos e claros!
As normas brasileiras para a construção de tabelas e gráficos são: NBR 6029 e
NBR 6822. Não confundir tabelas com quadros: a tabela é a apresentação, em forma de
colunas e linhas, dos dados experimentais resultantes de uma medição. As tabelas devem
ser acompanhadas dos seguintes itens:
a) Nome das grandezas com seus respectivos valores, incertezas e unidades.
b) Os valores devem ser expressos com o número adequado de algarismos
significativos.
c) Na parte superior, deve estar um comentário seguido do cabeçalho da tabela.
0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4 1,6 1,8 2,0
0
10
20
30
40
50
60
70
Es
pa
ço
pe
rco
rrid
o (
cm
)
Tempo (s)
1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0
0
2
4
6
8
10
12
14
16
Am
plitu
de
(c
m)
Tempo (s)
A) B)
49
d) Evitam-se as linhas horizontes e verticais deixando-as somente para a
separação do cabeçalho e do corpo da tabela do restante do texto.
e) O comentário deve ser conciso e autoexplicativo.
f) Qualquer observação extra deve ser marcada na tabela e explicada na parte
abaixo da mesma.
3.2. Gráficos
Estamos acostumados a visualizar figuras representativas de muitos aspectos de
nossa vida. Diariamente recebemos informações em forma de gráficos como, por
exemplo, gráficos em forma de: Histogramas, Diagramas, barras divididas por cores,
pizza, etc.
Estudaremos o tipo mais simples de gráfico que é a relação entre duas grandezas
sendo, uma delas, independente e, a outra, dependente. Lidaremos, portanto, com
coordenadas cartesianas onde y = f(x) e cada par ordenado (xi, yi) corresponde a um ponto
no plano cartesiano. Chamamos de curva ao conjunto de pontos Pi dados por (xi, yi) tal
que yi = f(xi).
Para a construção de bons gráficos, valem as seguintes regras:
a) Escolha do formulário gráfico mais adequado (milimetrado, semilog, dilog,
polar, etc.).
b) É comum as pessoas darem uma folheada nas figuras antes de ler o texto.
Assim, alguma informação a respeito do que se tratam ajudará na
visualização da ideia geral do texto. Portanto, coloque título e comentário
nos gráficos, os quais devem ser apresentados na parte inferior da figura
(como pode ser visto nos exemplo aqui apresentados).
c) Os eixos devem ser escolhidos apropriadamente (formato retrato ou formato
paisagem, de acordo com as dimensões de cada eixo) e devem conter apenas
os números necessários para a leitura das divisões de escala. Não deve ser
colocado nenhum valor experimental sobre o eixo: as escalas já possibilitam
a leitura dos dados experimentais expressos por pontos no plano da folha.
d) Mantenha a variável dependente na vertical, sempre que possível (às vezes
isso não é possível em papéis com escala logarítmica).
50
e) Devem ser colocadas as grandezas e suas respectivas unidades próximas aos
eixos. Identifique os eixos com nome, símbolo e unidades das variáveis:
f) Na escolha das escalas, as mesmas devem ser limpas e de fácil visualização.
As divisões de escala devem ser múltiplos de: 1, 2, 5 ou 10 (evitam-se
valores quebrados ou números primos como 7, 11 ou 13, os quais podem
resultar em dízimas periódicas). Os valores devem ser expressos
adequadamente conforme o número de algarismos significativos. Geralmente
se podem escrever as grandezas como: Nome da grandeza/unidade
(Exemplo: Tempo/s) ou Nome da grandeza (unidade) (Exemplo: Tempo (s)),
o primeiro caso é o mais adotado atualmente.
g) Escolha as escalas de modo a obter um dimensionamento adequado do
gráfico evitando, assim, falsas interpretações.
h) Quando necessário, colocar os intervalos de confiança nos pontos
desenhados de acordo com as incertezas nas medições. Localize os pontos
medidos no papel sem traçar linhas de apoio, apenas marque o ponto
adequado e suas respectivas barras de incerteza (). Para cada ponto,
construa barras de incerteza que correspondam, na escala, às incertezas de
suas varáveis, e que fiquem no intervalo: 0, ≤ L/mm ≤ .
i) Se houver mais de uma medida em um mesmo gráfico, separar os pontos por
meio de símbolos distintos como: ο, Δ, □, ◊, etc.
j) Posicionar o gráfico o mais próximo possível de onde ele é citado no texto e
de forma a que a leitura do relatório seja fluente.
k) O comentário deve ser conciso e autoexplicativo.
Na construção da escala devemos proceder da seguinte forma: fazemos
primeiramente a razão do espaço disponível em folha pela variação de nossa grandeza. A
esta razão chamamos de módulo de escala, λ:
| ( ) ( )|
Tempo/s
51
adotamos o valor inteiro mais próximo de λ! (em papel milimetrado, L pode
possuir os valores de 270 mm ou 180 mm).
3.3. Linearização e escalas logarítmicas
As relações entre as grandezas medidas podem ser obtidas usando os
conhecimentos de matemática: que função ajustaria muito bem para o caso (B) da Figura
10? Resposta: ! Surge a dúvida. Mas que expoente escolher?
Dentre as funções matemáticas, a função linear, a qual resulta em uma reta
, é a chave da análise gráfica: é a única função cuja forma (e expoente) são
obtidos diretamente sendo, seu traçado, o único que permite uma fácil visualização dos
dados sem ambiguidade. Para conhecê-la totalmente, devemos determinar somente os
coeficiente A e B, os quais podem ser determinados por meio da escolha de dois pontos
lidos no gráfico. Tais pontos, ( ) e ( ), substituídos na expressão da reta:
Resulta:
( )
( )
Agora, como escolher os pontos 1 e 2:
i) Devem ser pontos do gráfico construído, e não da tabela original. Os pontos da
tabela (a menos que coincidam com pontos da reta) têm erros experimentais (são afetados
pelos erros).
ii) Devem ser pontos distantes na abscissa para que o erro no denominador seja
minimizado (30/2=15; 30/3=10; 30/20=1,5; 30/21=1,45 reduzindo erro em A!).
iii) Devem ser fáceis de ler na escala (Isto é, devem exigir interpolação em
espaços) ⇒ cruzamento de linhas do papel empregado (p. ex., papel milimetrado):
52
Assim, para o caso em estudo, curva (B) da Figura 10, podemos linearizar a
curva por meio de anamorfose, ou seja, de uma mudança de variável. Mas, funções que
aparecem frequentemente em física e cuja variação é muito extensa, como as funções
exponenciais e as logarítmicas, carecem de uma extensão maior da escala. Portanto, uma
modificação dessas escalas de modo a englobar o maior número possível de valores se faz
necessária. Eixos cuja escala é logarítmica resolvem este problema. Existem alguns
papéis especiais que fazem esta modificação e são chamados de papeis de escalas
logarítmicas. Podemos, então, ter os seguintes casos: i) em que uma das escalas é linear e
a outra, logarítmica: papel semilog (ou monolog), e ii) em que ambas as escalas são
logarítmicas: papel dilog (ou Log vs Log).
Algumas propriedades importantes das escalas logarítmicas são: i) os valores
maiores são progressivamente comprimidos se comparados com a escala linear. Ou seja,
as distâncias entre os valores log(1) e log(10) é a mesma que entre log(10) e log(100), ou
entre log(104) e log(10
5). Esse comportamento deriva das propriedades do logaritmo:
( ) ( ( )) (
( )) ( ) , essa diferença de dez em dez é
chamada de ciclo ou década (já se pode notar que não importa a base em que se está
trabalhando!). ii) as barras de erro também são transformadas aparentando serem menores
do que realmente são! iii) não há zero na escala logarítmica.
Do exposto, podemos tipificar as linearizações em três casos especiais:
3.3.1. Caso 1: Anamorfose
Por exemplo, suponhamos um corpo em queda livre de uma altura h, cujo
modelo mecanístico newtoniano nos dá a seguinte relação:
, equação de uma parábola.
53
Para transformar a equação em uma reta basta fazermos a seguinte
transformação de variável (de t para z): desenhamos, pois, h em função de z=t2!
3.3.2. Caso 2: Linearização da função potencial
Suponhamos a relação potencial entre duas grandezas: , em geral n é
desconhecido, e K é uma constante. Façamos, pois, a linearização aplicando logaritmo a
ambos os lados da igualdade, o que resulta em:
( ) ( ) ( )
Assim, podemos utilizar o papel dilog e desenharmos uma reta de inclinação n.
O valor de n pode ser obtido pela leitura de dois pontos distintos, ( ) e ( ):
( ) ( )
( ) ( )
3.3.3. Caso 3: Linearização exponencial
Outro exemplo importante de linearização é o caso de uma relação exponencial
entre y e x: , sendo K,b e n, constantes.
Aplicando novamente o logaritmo em ambos os lados da equação:
( ) ( ) ( )
Pela equação, nota-se que há uma relação linear entre ( ) e x. Assim,
podemos utilizar papel semilog para desenharmos a reta, cujo coeficiente linear, B, deve
ser igual a: ( ). B é calculado, do gráfico, como:
( ) ( )
Lembre que:
( ) ( )
( )
54
Exemplos:
1) Lei de Hooke:
, log(x) = 3log(L) + log(k)
2) Pêndulo simples:
( )
Fazendo: , , e ( )
3) Plano inclinado:
Fazendo:
,
3.4. Método dos mínimos quadrados
Com os dados experimentais podemos em certo papel, seja milimetrado, semilog
ou dilog, associar uma reta tal qual vimos na sessão precedente. E podemos determinar os
coeficientes (A e B) que determinam a reta, traçada com ajuda de uma régua, pela escolha
de dois pontos, ( ) e ( ), como vimos. Mas, seja um mesmo experimento
realizado com os mesmos instrumentos e, portanto, com a mesma exatidão por distintos
observadores. Naturalmente, os valores, embora próximos, resultariam em diferentes
valores para A e B, pois as retas não devem ser necessariamente iguais. Surge a seguinte
pergunta: haveria, dentre essas retas, alguma que fosse a melhor dentre todas as retas?!
Caso negativo: haveria uma reta melhor possível para o conjunto de medições?! A
resposta é sim e há um método para encontra-la (sem, necessariamente, ter de desenha-
la): a técnica a ser utilizada para o traçado da reta (ou a regressão linear) é o método dos
mínimos quadrados, baseado no método da máxima verossimilhança, ou seja, da máxima
probabilidade [2].
Suponha n medições independentes sob as mesmas condições iniciais de um
mensurando. A melhor estimativa do valor real do mensurando é aquele que minimiza a
soma dos quadrados dos desvios das medições da sua melhor estimativa x, onde x é
desconhecido, assim:
55
∑( )
Derivando e igualando a zero:
∑( )
∑
∑
Logo, a melhor estimativa de x é o seu valor médio, como esperado!
Assumindo que os valores se distribuem segundo uma distribuição normal,
temos que a probabilidade de obtermos uma medida entre os intervalos x e x + dx é dado
por:
( )
( ) ⁄ [
( )
]
E x é a melhor estimativa para .
A probabilidade total é dada por:
( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ∏ ( )
( ) (
( ) ⁄)
[ ∑( )
]
Para que possamos ter uma máxima probabilidade, devemos minimizar o
expoente da equação, ou seja, minimizar:
∑( )
56
Obs.: Claro, estamos supondo que todas as medidas possuem uma mesma incerteza dada
por σ.
Agora, vamos supor medições sobre duas grandezas físicas, x e y, e uma
incerteza σy associada à variável y (neste caso, supomos que a incerteza de x é
desprezível ou a transferimos para a variável y: ver [2, 3]). Supondo uma relação linear
entre as grandezas x e y, podemos associa-las conforme a equação linear:
( )
A probabilidade para um dado é proporcional à densidade de probabilidade:
( )
[
( )
]
A probabilidade para todos os pontos é dada por:
∏ ( )
( ) [ ∑
( )
]
Observamos que ( ) é a distância vertical entre cada ponto ( ) e
a reta ideal y(xi).
Figura 11: Representação geométrica do método dos mínimos quadrados: O
método se baseia a minimização das distâncias entre os pontos experimentais e a
reta teórica tracejada.
Como queremos maximizar a probabilidade, minimizamos o expoente da
equação pelo método dos mínimos quadrados:
Reta ideal: y(xi)
( )
X
Y
57
∑ ( )
Obs.: Novamente iremos considerar que os σyi são iguais a σy.
Como queremos encontrar os coeficientes, A e B, derivamos em relação a A e a
B, e igualamos a zero as derivadas. Olhando somente para o denominador do expoente da
equação e a desenvolvendo:
∑( ) ∑( ) ∑( ) ∑( ) ∑( )
Derivando em relação a A, e igualando a zero:
∑( ) ∑( )
Derivando em relação a B, e igualando a zero:
∑( ) ∑( ) ∑( )
Resolvendo em relação a A e a B, obtemos:
(∑
) ∑ (∑ )(∑ )
∑ (∑ )
∑ (∑ )(∑ )
∑ (∑ )
∑( )
∑( )
Considerando a mesma incerteza para todos os valores , o desvio padrão para
todos os valores é dado por:
√
( )∑( ( ))
E o desvio padrão médio é dado por:
√
O cálculo para as incertezas em e , respectivamente, e , resulta em:
58
√∑
(∑ ) (∑ )
√∑
∑( )
√
(∑ ) (∑ )
√∑( )
E é dado por:
√∑( )
( )
Sendo, , a incerteza do ajuste. As bandas equidistantes da reta
( ) de são chamadas de bandas de incerteza de ajuste as quais
qualificam a dispersão do ajuste. Ou seja, supondo uma dispersão puramente estatística
dos dados, há uma probabilidade de ca. 68% de todos os pontos experimentais se
encontrarem na região delimitada por . Assim, se espera que cerca de um, em cada
três pontos, caiam fora dessa região. Caso isto não ocorra, a suposição de uma relação
linear entre as grandezas e está incorreta, ou erros sistemáticos não foram levados em
consideração.
3.4.1. Ajuste para uma reta que passa pela origem:
Para uma reta que passa pela origem, temos:
Assim,
e o coeficiente a pode ser dado por:
∑
∑
E:
∑
59
Para incertezas iguais, vem que:
∑
∑
∑
A maioria das calculadoras possuem funções estatísticas para resolver o
problema de se trabalhar com uma massa muito grande de dados. Caso tais funções não
estejam disponíveis, aconselhamos a construção da seguinte tabela para simplificação de
contas e a fim de se evitar erros:
Tabela 17: Modelo de organização dos dados para cálculos utilizando o método dos mínimos quadrados.
( ) ( ) ( ) ( )
1
2
3
...
...
n
∑
Obs.: Para uma inspeção da nossa reta ajustada, podemos usar os resíduos ( )
e verificar se são consistentes com a reta encontrada, ou seja, se desenharmos um gráfico dos resíduos
em y como função das abcissas dos pontos experimentais devemos encontrar, para o caso de uma
reta, valores em torno de zero. Caso contrário, devemos impor uma ordem mais elevada à nossa
curva, a qual passa a não ser mais uma reta.
3.4.2. Barras de incerteza
Os pontos experimentais devem estar próximos da reta ajustada de forma
verossímil, ou seja, para Δy, espera-se que tenhamos uma certeza de 68%, portanto cerca
de um terço dos pontos (juntamente com as suas incertezas) não devem tocar a reta
ajustada (claro, pode ocorrer que todos os pontos toquem a reta devido a um valor
estimado para a incerteza maior que o esperado: incertezas sobreestimadas).
60
O método dos mínimos quadrados não permite a visualização da
verossimilhança. Então, devemos lançar mão de alguma técnica que nos forneça a
“qualidade” de nosso ajuste baseado nos pontos experimentais que temos. Quando a
relação entre as grandezas é bem conhecida (como o caso da reta ( ) )) a
“qualidade” do ajuste permite, ainda, ver se as incertezas foram corretamente estimadas!
Sobre as barras de incerteza: Os pontos no gráfico são valores médios e os
valores medidos para cada ponto estão sujeitos a uma distribuição estatística (normal).
Assim, a dispersão dos valores em torno do valor médio é dada pela barra de incerteza e
nos fornece um limite de confiança de cerca de 68%, ou seja, cerca de dois terços das
barras de incerteza devem cruzar a reta! Portanto, há uma relação entre as barras de
incerteza e as distribuições gaussianas de cada ponto do gráfico.
Figura 11: Barras de incerteza para os pontos experimentais: em (A) tem-se a distribuição
gaussiana representando a função de distribuição de probabilidade normal para cada ponto
médio, e em (B) tem-se as barras de incerteza para a variável dependente e o ajuste linear para os
pontos indicados. O limite de confiança esperado para os pontos é de 68%, ou seja, espera-se que
cerca de um terço das barras de incerteza caiam fora da reta ajustada.
Exemplo:
Dado os valores da Tabela 18, use o método dos mínimos quadrados para
determinação dos coeficientes A e B da melhor reta ajustada, Y = A + BX:
B) A)
Variável X Variável X
Y Y
61
Tabela 18: Medições.
X Y
1,0 33
1,5 57
2,0 85
2,5 110
∑( )
∑( )
( ) ( ) ( ) ( )
( ) ( ) ( ) ( )
( )( )
Logo:
3.4.3. Coeficiente de correlação R
Surge a seguinte questão: Como avaliar a “qualidade” de nosso ajuste? Resposta:
por meio do coeficiente R chamado de Coeficiente de Correlação. Supondo uma
representação de nossas incertezas como vetores no espaço , podemos visualizar o
grau de correlação entre duas variáveis como o produto escalar dessas variáveis (ou seja,
o cosseno do ângulo formado entre os dois vetores), resultando em:
∑ ( ) ( )
√∑ ( ) √∑ ( )
Ou seja, não nenhuma correlação linear entre as variáveis x e y se R resultar
nulo! Valores para R = 1, significa uma forte correlação linear entre as variáveis (na
verdade, usualmente se utiliza o valor de R2, e uma correlação aceitável deve ser aquela >
0,7).
Obs.: De fato poderíamos recorrer à álgebra vetorial para o estudo das incertezas.
62
Referências bibliográficas
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Cataracts and Degas’ Retinal Disease. ARCH OPHTHALMOL/VOL 124, DEC
2006. 1764-1769.
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2º Ed. (7º Reimpressão- 2012). 1996. São Paulo.
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experimentos- aplicações na ciência e na indústria. Editora Unicamp. 4º Ed.
2010. Campinas.
[4] DIONISIO, P. H. Sensibilidade do equipamento x precisão da medida
(Comentário sobre o artigo “O que é uma medida”). Revista de Ensino de Física,
Vol. 13, 1991, 30-33.
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Wesley Publishing, Inc. 1970, pp. 30-36 (121).
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[11] KENDALL, M.G. & STUART, A. The advanced theory of statistics. Vol. 2,
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termos fundamentais e gerais em metrologia, INMETRO. 1994, Rio de Janeiro.
[13] Vocabulário internacional de metrologia – Conceitos fundamentais e gerais
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de Janeiro.