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Tese ao 33° Encontro Nacional de Estudantes de Direito ENED 2012 Coletivo Nacional Estudantil www.coletivolevante.com facebook.com/coletivolevante @levantenacional

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Tese do Coletivo Nacional Levante! ao 33º Encontro Nacional de Estudantes de Direito.

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Tese ao 33° Encontro Nacional de Estudantes de Direito ENED 2012

!Coletivo Nacional Estudantil

www.coletivolevante.comfacebook.com/coletivolevante

@levantenacional

Apresentação

Somos o Coletivo Nacional Levante!,um coletivo de juventude que quer construir ho-rizontalmente uma nova universidade, um novo direito e uma nova sociedade! Somos anticapitalistas porque acreditamos que a emancipação das classes historicamente oprimidas não cabe no sistema que nos di-ferencia e individualiza para se reproduzir. Construímos a FENED e o ENED porque acreditamos que espaços como encontros nacionais devem servir para nos fazer dia-logar sobre os problemas de hoje e construir sínteses para forjar nas ruas instrumentos de luta, como a federação.

O tema deste ENED é particularmen-te importante para acumularmos juntos e produzirmos formas de intervenção coleti-va, para questionar: “Desenvolvimento para quem?”, “Megaeventos para quem?” e lem-brar dos direitos humanos tão violados pelo capital e pelo Estado. Queremos aqui refletir como nadar contra essa corrente. Queremos transformar a realidade, porém não conse-

guiremos fazer isso sozinhos. Queremos pintar a universidade de lilás, de negro, de povo, mas não conseguiremos sozinhos.

Essa tese, portanto, é um diálogo sobre assuntos que consideramos de extrema im-portância nos dias de hoje, são áreas onde nós, estudantes, mulheres, homens, traba-lhadoras e trabalhadores, estagiários e es-tagiárias temos a nossa militância diária. Chamamos você pra discutir com a gen-te do Levante! cotas nas universidades, greve, megaeventos, feminismo, questão LGBT, educação jurídica, direito à memória e à verdade, legalização das drogas e con-cepção de movimento estudantil. Debata conosco! Construa também com a gente uma nova forma de fazer movimento capaz de criar uma nova sociedade, livre, onde não haja racismo, machismo, homofobia e nenhuma opressão de qualquer tipo entre os seres humanos, onde a igualdade seja plena e o respeito além de comum, natural.

Nada É Impossível De Mudar

“Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo.E examinai, sobretudo, o que parece habitual.

Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coisa natural,

pois em tempo de desordem sangrenta,de confusão organizada, de arbitrariedade consciente,

de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural nada deve parecer impossível de mudar.”

(Bertold Brecht)

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Certamente o ENED é o momen-to certo de conhecer novas pessoas e curtir as festas. Afinal, será talvez a única oportunidade de encontrarmos estudantes de tão variados lugares e com suas diferentes experiências para que percamos a oportunidade de fes-tejar. Entretanto, festejar durante o ENED vai além das festas, mas apro-veitar o momento para conhecer e comemorar o nosso lugar no mundo, que é a luta no e pelo direito, pela universidade e pela sociedade.

O lugar da nossa grande festa é este grande Encontro no qual aprimo-ramos nossas ideias e também nos organizamos. É também o lugar onde podemos e devemos opinar sobre os rumos, objetivos e lutas do movimen-to estudantil de direito, organizado na Federação Nacional dos Estudantes de Direito, a FENED. Este somos nós, estudantes de direito de todo o país, de faculdades públicas ou privadas, dispostos a interferir ao máximo na educação jurídica e em todos os de-mais pontos que nos tragam o bom e velho sentimento de indignação. As-sim, todos deverão estar presentes às variadas atividades e, sobretudo, no último espaço do evento, a Plenária Final, que produz o principal documen-to da FENED, o qual guiará seu rumo por mais um ano de acontecimentos políticos, tensões e atividades.

Não deixe também de participar das deliberações de seu Centro ou Di-retório Acadêmico, pois esta é a en-tidade de base que representa seus pares nos Conselhos Nacionais de En-tidades Representativas dos Estudan-tes de Direito – os CONERED’s. Esses conselhos são reuniões de todos os CA’s e DA’s que puderem estar pre-sentes para deliberar sobre as ativi-dades da FENED que forem tiradas em linhas gerais pela Plenária Final do ENED e acontecem regularmente pelo menos uma vez em cada região do país, ao longo do ano. Nesse espaço deliberativo, cada entidade tem um voto. É o legislativo da FENED.

Outro espaço importante da FE-NED é a Coordenação Nacional dos Estudantes de Direito, a CONED, que é eleita também na Plenária Final do ENED. Tem por objetivo operacionali-zar e executar as deliberações tiradas na Plenária Final e nos CONERED’s. É composta por dentre nove a onze CA’s ou DA’s que também represen-tam a FENED em suas respectivas pastas de acordo com o Estatuto. É o Executivo da nossa Federação, de grande importância para o perfil políti-co que queremos para ela.

Se sua faculdade ainda não possui um CA ou DA, junte-se aos seus ami-gos mais corajosos, funde um e venha participar da FENED!

E essa tal de FENED?

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Desde o dia 17 de maio passamos por um intenso processo de greve nas Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) brasileiras, num movimento que vem se fortalecendo de uma forma sem precedentes. Contamos hoje com a par-ticipação de 95% das IFES em uma greve unificada, na qual estudantes, professo-res e servidores lutam lado a lado por melhorias na educação superior brasileira.

Esse movimento não surgiu à toa. As reivindicações por reestruturação da carreira, maiores salários, aumento de bolsas, assistência estudantil, fim das privatizações e terceirizações e melhoria das condições de trabalho são acompa-nhadas pela insatisfação com a conjun-tura geral da nossa educação. A preca-rização do ensino superior que vivemos é fruto de uma política desenfreada de expansão de vagas nas universidades sem investimento proporcional, com transferência de verbas públicas para expansão do setor privado sucateando cada vez mais as universidades públicas. Tal política evidencia a opção do governo por um modelo de educação que valo-riza a formação de mão-de-obra para o mercado de trabalho em detrimento da formação de sujeitos histó-ricos comprometidos com a transformação da socie-dade, e que foi concretiza-da por meio da implemen-tação de programas como o REUNI e o Prouni.

O REUNI previa, entre outros, o aumento do nú-mero de estudantes por professor e aumento da proporção de estudantes formados em relação aos ingressantes, sem, no en-tanto, atentar às especifi-cidades dos cursos e sem agregar recursos suficien-tes para essa expansão. O resultado é que hoje, cinco

A greve nas IFES e o REUNIanos após a implementação do progra-ma, nos deparamos com salas de aula lotadas, falta de professores, estrutura insuficiente para suportar as mudanças advindas do projeto e comprometimen-to da qualidade do ensino. Da mesma maneira, o Programa Universidade para Todos (ProUni) prevê grande isenção tri-butária para as IES privadas e tal qual o FIES (Fundo de Financiamento Estudan-til) transfere recursos públicos para o se-tor privado, privatizando o serviço públi-co. Segundo estudo feito pelo Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES), para cada vaga aberta pelo ProUni, três poderiam ser criadas em instituições públicas.

E a festa do governo continua: tem sido debatida agora a adoção daquilo que vem se chamando de “REUNI 2”, o Programa de Expansão, Excelência e In-ternacionalização, que insere-se na mes-ma lógica tecnicista de ensino, com o financiamento para o sistema de ensino à distância e aumento na oferta de va-gas da graduação, mestrado e doutora-do. Nos últimos dois anos, cerca de 5 bilhões de reais deixaram de ser inves-tidos em educação devido aos cortes

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As cotas reconhecem aquilo que os grandes beneficiários do capitalismo não permitem que vejamos: que a merito-cracia burguesa, para milhões de jovens brasileiros, é uma falácia torpe que só beneficia os destinados a ter o mérito, quais sejam, aqueles que detiveram - e até hoje detém - o acesso à renda con-centrada de nosso país.

Entretanto, para além do corte social e de renda, combatido, por sua vez, pe-las cotas sociais que permitem o acesso àqueles vindos de escola pública e com baixa renda, há que se falar especialmen-te das cotas raciais, aquelas mais sacri-ficadas pelo discurso conservador, que é incapaz de confessar o racismo estrutu-ral quando vemos o negro nos consultó-rios médicos e hospitais, nas escolas e universidades, no judiciário e nos cargos eletivos somente enquanto funcionários da limpeza e da recepção, como serven-tes e merendeiras e como garçons e não os vemos como médicos, professores, juízes, deputados e governantes!

As cotas raciais, dessa forma, são uma política democratizante, includente, cuja necessidade é independente, mas relacionada, à divisão social pela renda. É independente porque tem a sua base na divisão estrutural da sociedade pelo racismo, com as origens escravocratas das nossas instituições. Ao mesmo tem-po, tem relação com as condições so-ciais, pois a maior parte da população negra está submetida à pobreza e, den-

tre mais explorados, a grande maioria é composta pelos negros e os empobre-cidos negros tem menor renda que os empobrecidos brancos. Este é o tama-nho do abismo social e racial brasileiro!

Contudo, não basta garantir somen-te acesso quando permanecer na uni-versidade é muito caro. Aqueles que adentram pelas cotas devem ter direito à uma bolsa permanência digna mais ajuda de custo para seus materiais. Além disso, devem poder acumular sua bolsa permanência com bolsa de estágio ou de pesquisa para que se vejam estimulados a produzir e utilizar seu conhecimento em prol dos seus grupos sociais e raciais há muito renegados pelo capitalismo.

Também temos que levantar nos-sas bandeiras em defesa da política de ações afirmativas que são a constituição de turmas especiais advindas de movi-mentos sociais. A primeira experiência vitoriosa está sendo a turma especial de beneficiários da reforma agrária cujos estudantes são assentados do MST, que se formaram na UFG e lutam no Judiciário pela validação do seu diploma. Tal iniciativa cumpre a função precípua da universidade popular, que é formar o povo para as suas lutas a partir das suas necessidades! Saudamos os companhei-ros da TURMA EVANDRO LINS e SILVA e lutamos para a implementação de ou-tras turmas de assentados no curso de Direito em todo o país.

Cotas e Ações Afirmativas

de orçamento feitos pelo governo. É o mesmo governo que, apesar da força e da intensidade dessa greve, se nega a negociar com o movimento grevista.

Depois de mais de dois meses de gre-ve e nenhum sinal de que o governo está disposto a negociar e ceder a nossas rei-vindicações, devemos responder fortale-cendo ainda mais o movimento. Somos a favor da democratização do ensino,

sim, mas com responsabilidade e quali-dade. O projeto de educação do governo não caminha para o comprometimento com a realidade social, crítica e não faz do estudante sujeito protagonista de seu conhecimento! Nossa luta não deve arrefecer e, portanto, precisamos seguir unidos na busca por uma educação pú-blica, gratuita e de qualidade, que esteja à serviço do povo e não do capital.

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Educação jurídica

Sabemos que a Educação Superior brasileira está desenhada sob o tripé fun-damental do ensino, da pesquisa e da extensão, pilares que devem ambicionar uma educação popular com a produção de conhecimento socialmente referen-ciado, com a reprodução deste conhe-cimento e, finalmente, o seu retorno à sociedade. Sabemos, por sua vez, que a educação jurídica é hipertrofiada no en-sino, sendo uma máquina de reprodu-ção de uma técnica burocrática ligada à manutenção do Estado ou à defesa de interesses corporativos. Com isso não concordamos! Se um dia conhecemos os reais conflitos socais, somos constante-mente convidados a esquecê-los em nos-sos cursos de graduação conservadores e elitizados.

A graduação em direito, em especial, costuma ser carente de pesquisa e intei-ramente órfã de extensão universitária. Queremos que o conhecimento jurídico seja produzido em nossas faculdades com a participação de nós, graduandos, com condições para tanto. Queremos mais: queremos que seja produzido pe-los grupos e movimentos sociais histori-camente oprimidos e, para isso, sabemos que mulheres, negros, pobres, sem-terra, quilombolas e índios devem ocupar as ca-deiras estudantis.

Mais que isso, este conhecimento jurídico socialmente referenciado deve retornar às comunidades e movimentos sociais e um elemento indispensável para isso são as assessorias jurídicas universi-tárias populares. Conhecer as lutas reais que perpassam toda a sociedade é algo que não pode nos ser extirpado. Sair dos muros universitários é a primeira tarefa que temos! Só assim pode o estudante de direito tomar ciência da luta, de que ela é real e de que se faz necessário to-marmos posição!

E os Megaeventos?A copa e as olimpíadas fazem re-

nascer na mídia e no poder público um discurso que há muito é conhecido em nosso país: o da modernização, do de-senvolvimento e do progresso. Tal retó-rica alimenta a burguesia e seu afã por introduzir o Brasil numa nova fase, num novo momento mundial. Ocorre que a experiência histórica e as projeções atu-ais denotam que o tal desenvolvimento circunscrevem-se a um grupo muito res-trito da população.

Bem afinados com os grandes capi-talistas aqui atuantes, os governantes, em distintos âmbitos, defendem o trans-porte rodoviário como principal matriz nacional, desprezando nossas dimensões continentais, o favorecimento da mobi-lidade urbana e todas as desvantagens do uso de carros, ônibus e caminhões. Do mesmo modo, ignoram as demandas sociais por moradia, educação, saúde e segurança verdadeiramente pautadas na construção popular.

Não se envergonham de legitimar as ilegais e arbitrárias remoções que ocor-rem em diversos locais do país, muitas só justificáveis pelo inacreditável discurso da estética urbana. A lei geral da copa, os projetos de equipamentos já em cons-trução e a reforma dos aeroportos, por exemplo: com quem foram discutidos? Qual será o legado de toda essa moder-nização e de todo esse progresso?

A copa e as olimpíadas não podem servir apenas para legitimar os projetos de controle social já em curso e expandi--los, como as UPPs, as remoções de comunidades de favelas e comunidades tradicionais. O coletivo Levante! entende que é necessário questionar o desen-volvimento, como e pra quem ele vem sendo imposto e formular, com a juven-tude da cidade e o campo, um projeto verdadeiramente popular para os even-tos mundiais, construído coletivamente e que forje a emancipação dos historica-mente oprimidos.

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O papel social do JudiciárioNossa atual educação jurídica ainda

caracteriza-se pelo atraso ideológico de um positivismo que preza pela neutra-lidade enquanto aspecto essencial da cientificidade do direito. Enquanto for-mos formados acreditando na função es-sencialmente técnica do Judiciário e das agências estatais que o gravitam – MP e Defensoria, principalmente – em oposição à função essencialmente política do Exe-cutivo e Legislativo, não conseguiremos entender certas atuações escabrosas do Estado policialesco e de classe que se revela nos conflitos fundiários e pela moradia, dentre outros. Olhemos para Pi-nheirinho e muitas outras comunidades ameaçadas de remoção com o advento dos megaeventos.

Os agentes de todo esse grande Sis-tema de Justiça são, desde sempre e na sua imensa maioria, recrutados dentre as classes médias e altas. Aqueles que necessitam trabalhar para o sustento próprio e de sua família são barrados ao acesso a essas carreiras pelas dificulda-des estruturais de tempo e dedicação para preparo aos concursos que, por sua vez, pouco estão preocupados com a re-alidade social de extrema desigualdade de

nosso país. Afirmamos: o conhecimento exigido das normas é inversamente pro-porcional ao conhecimento da realidade social e o desconhecimento do mundo de carne e osso é conditio sine qua non (como gostamos de dizer) para ter aces-so ao almejado sucesso profissional tal como colocado pela sociedade de hoje.

Por isso sabemos que o Judiciário é o filho mais parecido com a classe de onde veio e, sendo o mais fechado e recluso dos poderes, fica sendo o lugar de onde brotam as mais repressivas e conserva-doras medidas. Além do mais, quem fis-caliza o fiscal, quem controla aquele que tem a última palavra? A única resposta possível deve ser: o povo! Esse deve as-sumir que o Sistema de Justiça é uma arena política a ser disputada. Dado isso, assinalamos que a luta pelas ouvidorias externas, a participação da sociedade organizada nas bancas de concursos públicos, a exigência de estágios proba-tórios junto a lutas populares e a maior vinculação das decisões nos tribunais aos debates das audiências públicas são me-didas democratizantes importantes para o avanço na luta de classes dentro do mundo jurídico.

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Direito à memória e à verdadeO direito ao acesso à informação é condição para o exercício de demais direi-

tos humanos, como o direito à verdade e o direito à justiça, sobretudo em casos de graves violações de direitos humanos perpetradas em regimes autoritários do passado. O resgate histórico tem como propósito assegurar o direito à memória das vítimas e confiar às gerações futuras a responsabilidade de prevenir a repetição

das práticas negadoras de direitos. É dever do Estado assegurar o direito à verdade em prol do direito da vítima e de seus familiares – ga-rantindo o direito ao luto – e em prol do direi-to da sociedade à construção da memória e identidade coletivas.

Conferir amplo acesso aos arquivos da Repressão garante que conheçamos o terror desmedido e premeditado cometido contra a população brasileira. Tornaria público quem foram os beneficiados pelo Regime, bem como todos aqueles que o financiaram. Sig-nificaria solidificar o entendimento de que a ditadura foi além de militar, também civil, diri-

gida pelas classes dominantes, e perdurou até que surgisse o entendimento de que o golpe não trazia mais retornos econômicos.

Por outro lado, analisar reparação e memória perpassa, também, por colocar em análise uma política de segurança pública que se justifica em nome da “guerra contra os perigosos”, que, com o apoio dos grandes meios de comunicação, prega a Tolerância Zero, ―produzindo a “fascistização do cotidiano”, compreendida como a concentração do poder nas mãos de um pequeno círculo de pessoas, sem que haja participação democrática nas decisões, sempre pautadas pela ótica da violência, onde o aumento de tipos penais e recru-descimento das penas são sempre apon-tados como a melhor solução.

No Brasil, o processo de redemocratiza-ção permanece inconcluso, o que inclui na agenda política do País demandas como a questão em aberto dos desaparecidos, da reestruturação das instituições públicas e da abertura de arquivos militares. Tal situ-ação mantém uma manifesta e incômoda lacuna criada durante a transição política ao não tratar do assunto de forma ade-quada.

Um País Jamais poderá ser de fato De-mocrático sem varrer definitivamente de seus pilares os resquícios do Terror de Es-tado.

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Legalização das drogas

Após mais de 40 anos de “guerra às drogas”, é evidente que essa política fracassou. Bilhões de dólares investidos na repressão ao comércio e uso de dro-gas em nível mundial e o resultado são drogas mais valorizadas, mais potentes, grupos criminosos mais ricos e influen-tes e o aumento de encarcerados devi-do à produção, comércio e uso destas.

A atual Lei de Drogas (11.343 de 2006) mostra-se ineficiente ao distinguir a conduta do usuário e do traficante, pois a polícia e o judiciário, na sua seletivida-de intrínseca, utilizam critérios subjeti-vos para tal. São eles, principalmente, a condição econômica do detido (se teria condição de adquirir a droga que porta) e o local da ação (em bairros valorizados ou na periferia), critérios que realçam a verdadeira intenção dessa lei: criminali-zar a pobreza.

Acreditamos ser necessária uma re-forma legislativa capaz de regulamentar o comércio e uso de drogas no Brasil, estipulando qual a quantidade de cada

droga que será conside-rada como de “consumo pessoal”, os locais de ven-da ou distribuição e con-sumo, fomento da política de redução de danos pelo SUS, assim como outras medidas já adotadas para drogas legalizadas: proi-bição da venda para me-nores de idade, fórmula e ingredientes da fabricação e manipulação expostos na embalagem, proibição de dirigir sob o efeito das mesmas, taxação (carga tributária), etc.

Muitas vezes, a proi-bição dificulta o trabalho de informação e conscien-tização dos usuários e, certamente, foi uma das

responsáveis pela “epidemia” do crack. Quando esta droga chegou nas “bocas”, foi oferecida aos usuários como “uma droga um pouco mais forte” do que a maconha ou a cocaína e muito mais barata. Ludibriados, usuários de baixa renda preferiam comprar crack, pois te-riam mais “onda” por menor custo. Ledo engano, seus efeitos são devastadores e seu poder de viciar é enorme. Caso o mercado de drogas fosse regulamen-tado, os usuários teriam a informação necessária para rejeitar o crack.

No caso da maconha, ainda existe a possibilidade do cultivo caseiro ou em cooperativas de usuários, permitindo o acesso direto à droga, sem intermedi-ários (traficantes ou empresas), e extir-pando a possibilidade de lucro destes. Não existe aí relação de comércio, so-mente produção e consumo.

Por fim, deixamos para sua reflexão a palavra de ordem da Marcha da Ma-conha: “A maconha não mata, mas a proibição mata todos os dias!”

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LGBT

O movimento LGBT ganhou força no Brasil há menos de quarenta anos, mas a visibilidade das diversas orien-tações e identidades sexuais é ainda discutível: existe uma Parada Gay, mas não um casal homoafetivo nas novelas brasileiras; é possível celebrar a união estável, mas o casamento civil e imediato não é consenso no Judici-ário; celebramos o carnaval e a plura-lidade, mas sob o estereótipo do gay sensível, da lésbica rude, da (o) trans e da (o) bissexual promíscuas (os).

A transexualidade é um assunto de tal relevância na sociedade brasi-leira que merece tratamento exclusivo (e sob o recorte de classe e cor). A não-identificação com o próprio corpo pode levar à depressão, motivo pelo qual os indivíduos trans optam pelos métodos cirúrgicos. Freqüentemente, eles não encontram inserção no mer-cado de trabalho, realizada a mudan-ça cirúrgica ou não. É daí que surge a problemática social da prostituição e da violência nas ruas, visto que o Es-tado se ausenta de políticas públicas para pessoas trans.

A violência contra a diversidade se-xual é notável no Brasil, país que em tese aceita a pluralidade, mas que, na verdade, discrimina ainda mais. Nós,

do Coletivo Nacional Levante!, repu-diamos as práticas homo, trans e bi-fóbicas, claras incitadoras de ódio ao que não se encaixam no atual padrão heteronormativo da sociedade em que vivemos. Esse próprio padrão é, aliás, uma construção histórica - a bis-sexualidade, por exemplo, já foi que-rida entre os homens como modelo de fraternidade e hierarquização. Não há, portanto, nada de doentio em ser diferente do hegemônico, tampouco trata-se de uma opção frente a um mundo intolerante, que agride aqueles que não se encaixam no padrão de ‘normalidade’ imposto.

Cremos, entretanto, que tais prá-ticas não devam ser necessariamente tratadas com o Direito Penal, o instru-mento mais violento do Estado Demo-crático de Direito. O Levante! não en-dossa a criminalização das opressões por não crer que a transformação so-cial e cultural seja realizável (apenas) pela política criminal e por ter certeza de que o sistema penal é, por si só, desigual, seletivo (realizando, portan-to, recorte de classe, raça e gênero) e excludente. Não devemos esperar que o ódio às minorias se dissipe, como que por milagre, pelo tratamento ine-ficaz que é o penal.

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GêneroEmbora o senso comum propague

a ideia de uma suposta igualdade en-tre os gêneros, precisamos ter sempre em mente o papel de exploração a que estão sujeitas as mulheres e entender que a luta contra o machismo é parte fundamental da luta contra o sistema capitalista. No seio desse sistema, a mu-lher, que já se via confinada ao espaço privado - segundo uma divisão sexual do trabalho consolidada ainda no período renascentista - torna-se escrava do lar. Nesse sentido, Engels denuncia o papel da família como mecanismo essencial de manutenção da ideologia burguesa e machista, tendo em vista a transação de riquezas e a desresponsabilização do Estado da reprodução da classe traba-lhadora.

A constante reprodução do machis-mo através dos mecanismos do capital (que na atualidade se dão de modo ex-plícito, como pela mídia, e não somen-te nas estruturas das relações sociais e de trabalho) naturaliza a formatação hierárquica de gênero que sofremos desde o nascimento: meninas e meni-nos possuem papéis não só diferentes, mas desiguais na construção da socie-dade. A construção social do papel da mulher sempre a coloca como inferior ao homem, como o ser frágil e instável. O corpo da mulher é posto a serviço do homem e é biologicamente definido por uma inferioridade ‘natural’, que não passa de uma hierarquização camuflada dos sexos. É para isso que o movimento feminista aponta ao deixar clara a cons-trução cultural desses papéis, ao eviden-ciar que ‘masculino’ e ‘feminino’ não são mais do que comportamentos aprendi-dos durante o processo de socialização e que essa diferenciação de papéis es-conde na verdade uma relação de poder entre os sexos.

Não podemos ignorar, portanto, a li-gação entre as relações interpessoais e a organização política. Ao entender que

o sexo é também político, não devemos esquecer que nossa luta contra o siste-ma econômico em que vivemos preci-sa estar acompanhada pela luta contra qualquer forma de opressão, de modo que a superação da luta de classes não é possível senão ao lado da luta con-tra o machismo. Por isso, buscamos um movimento estudantil que seja também feminista, que escancare a tão velada e naturalizada opressão à mulher, num es-forço contínuo por inserir as mulheres no espaço político e cuidando sempre para que nossas práticas políticas não repro-duzam a ideologia machista em que es-tamos imersas e imersos. Nessa busca, as mulheres devem ser protagonistas e, por isso, defendemos a auto-organização como principal ferramenta no combate ao machismo. Chamamos todas e to-dos e se unirem à luta por uma socie-dade não desigual e plenamente livre, de opressões e do machismo!

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Assinam esta tese:São Paulo: Puc Campinas - Raquel Balbina Teixeira; Ana Veraldi

Favacho e Rafael Baptista “Chitão”.Rio de Janeiro: UFF - Manuela Martins; Camila Aguiar; Rodrigo

Vilhena; Monique Torres; Gabriel Barbosa Filho; Lucas de Mello Braga; Kahena Rivero e Allãn Sinclair. UFRJ - Gabriela Azevedo. UERJ - João Pedro Accioly Teixeira; Rafael Rodrigo “Pará”; Vinicius Alves; Luisa Pessoa; Vinícius Melo; Tailaine Brasil Regis; Darlan Silva Santos; Vítor Mendonça; Marco Antônio Sá; Mariana Bush; André Matheus e Augusto Waga.

Sergipe: UFS - Laryssa Linhares.Mato Grosso do Sul: UCDB - Rafael de Abreu. UFMS - Anna Brites.Santa Catarina: UFPR - Vanessa Ando; Ana Milani; Gabrielle Stricker

e Maurício Serenato.Rio Grande do Sul: UFPEL - Sabrine Gasperin e Lucas Vieira.

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