Amar é a eterna Amar é a eterna inocênciainocência

Fernando Pessoa – ficções do interlúdio

O meu olhar é nítido como um O meu olhar é nítido como um girassol.girassol.

Tenho o costume de andar Tenho o costume de andar pelas estradaspelas estradas

Olhando para a direita e para a Olhando para a direita e para a esquerda,esquerda,

E de vez em quando olhando E de vez em quando olhando para trás...para trás...

E o que vejo a cada E o que vejo a cada momentomomento

É aquilo que nunca antes eu É aquilo que nunca antes eu tinha visto,tinha visto,

E eu sei dar por isso muito E eu sei dar por isso muito bem...bem...

Sei ter o pasmo essencialSei ter o pasmo essencialQue tem uma criança se, ao Que tem uma criança se, ao

nascer,nascer,

Reparasse que nascera deveras...Reparasse que nascera deveras...

Sinto-me nascido a cada momentoSinto-me nascido a cada momentoPara a eterna novidade do Mundo...Para a eterna novidade do Mundo...

Creio no mundo como num Creio no mundo como num malmequer,malmequer,

Porque o vejo. Porque o vejo.

Mas não penso neleMas não penso nelePorque pensar é não Porque pensar é não

compreender...compreender...

O Mundo não se fez para O Mundo não se fez para pensarmos nelepensarmos nele

(Pensar é estar doente dos (Pensar é estar doente dos olhos)olhos)

Mas para olharmos para ele e Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...estarmos de acordo...

Eu não tenho filosofia; tenho Eu não tenho filosofia; tenho sentidos...sentidos...

Se falo na Natureza não é Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,porque saiba o que ela é,

Mas porque a amo, e amo-a por Mas porque a amo, e amo-a por issoisso

Porque quem ama nunca sabe o que Porque quem ama nunca sabe o que amaama

Nem sabe por que ama, nem o que Nem sabe por que ama, nem o que é amar...é amar...

Amar é a eterna Amar é a eterna inocência,inocência,

E a única E a única inocência não inocência não

pensar...pensar...

Alberto Caeiro, em "O Guardador de Rebanhos", 8-3-1914Alberto Caeiro, em "O Guardador de Rebanhos", 8-3-1914

Gravuras de CLAUDE MONET

Apresentação por Renato CardosoApresentação por Renato Cardoso

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