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© Sidclay Cordeiro Pereira, 2019
Analyse d'un siècle de représentations territoriales et de gestion hydrique dans l'État du Pernambouco, Brésil
(1909-2019)
Thèse
Sidclay Cordeiro Pereira
Doctorat en sciences géographiques
Philosophiæ doctor (Ph. D.)
Québec, Canada
II
Análise de um século de representações territoriais e da gestão hídrica no Estado de
Pernambuco, Brasil (1909-2019)
Sidclay Cordeiro Pereira
Sous la direction de:
Nathalie Gravel, directrice de recherche
III
Résumé
Le Brésil est l’un des pays les mieux desservis en ressources en eau de la planète, avec 12
pour cent du total mondial. Pourtant, son processus de gestion est encore immature comparé
aux pays européens, asiatiques et américains. Les problèmes d’accès, d’utilisation et de
gestion de l’eau présentent des contextes et des problèmes différents à l’intérieur du pays. La
région du Nord-Est représente un tiers de la population et dispose d’environ 3, 3 % des
ressources en eau. Dans cette région se trouve la région du semi-aride qui, historiquement,
souffre des impacts sociaux et économiques des sécheresses périodiques. Dans ce contexte, la
thèse propose une réflexion pouvant mener à un modèle de gestion durablede la région semi-
aride brésilienne. Celle-ci a pour but de contribuer à une gouvernance de l’eau applicable pour
les acteurs concernés et respectant les caractéristiques sociales, économiques et culturelles de
la région. De prime abord, nous avons opté pour des choix conceptuels et méthodologiques
permettant de comprendre les effets d’un siècle d’histoire de gestion hydrique dans la région à
l’étude. Ainsi, ce sont les représentations territoriales, la gouvernance de l’eau et la vision de
l’État qui ont été choisies comme cadre théorique. La méthodologie se situe dans le paradigme
interprétatif multivarié qui, par une analyse qualitative, a permis de mesurer le poids des
variables et des indicateurs. L’étude de cas a été choisie comme stratégie de vérification. S’est
ajoutée l’analyse de contenu documentaire et du discours recueilli par des entretiens réalisés
auprès de membres du comité de la zone intermédiaire du bassin versant du fleuve San
Francisco. Le résultat a été l'identification et l'analyse des représentations du territoire semi-
aride au cours des siècles où il fut appelé sertão. Ainsi, le semi-aride a été représenté
alternativement comme frontière de la colonisation et des espaces vides, comme région
problématique, comme représentation du passé et des espaces de la mémoire et, enfin, de
durabilité par le biais de la coexistence avec le climat semi-aride. Cela a fortement influencé la
vision de l’État et de la société civile organisée sur le territoire en ciblant les politiques et les
actions de gestion de l’eau. La gestion de l’eau au sein du territoire étudié, dans une
perspective multiscalaire, présente trois niveaux. Le premier est l’État, le second les
organisations sociales civiles en partenariat avec l’État et le troisième la Chambre consultative
régionale du sous-bassin San Francisco dans le cadre des travaux du Comité du bassin
hydrographique du fleuve San Francisco. Cela entraîne des chevauchements de compétences
et, en même temps, a rendu la gestion difficile pour la compréhension et la participation
populaire. La thèse propose un cadre conceptuel pour la construction d’un modèle de gestion
durable impliquant un changement dans la vision du territoire, la consolidation des relations
institutionnelles et des lois, l’approfondissement de la décentralisation et de l’autonomie dans
les décisions des comités de bassins hydrographiques et l’encouragement de la culture
d’anticipation des problèmes et des crises.
Mots-clés : Bassin hydrographique, Gestion de l’eau, Gouvernance, Nord-Est brésilien,
Région semi-aride brésilien, Représentations territoriales, Sous-bassin du fleuve San
Francisco, Sertão.
IV
Abstract
Brazil is one of the most served countries in terms of water resources, with 12% of the world's
total. However, its management process is still immature compared to European, Asian and
North American countries. The problems of access, use and management of water present
different contexts and problems within the country. The Northeast region accounts for one
third of the population and has about 3, 3% of water resources. In this region is the semiarid
region, which historically suffers the social and economic impacts of periodic droughts. In this
context, this thesis proposes a reflection to direct to a sustainable management model of the
Brazilian semiarid. Its objective is to contribute to water governance applicable to
stakeholders and to respect the social, economic and cultural characteristics of the region. At
first glance, we have conceptual and methodological choices to understand the effects of a
century of water management history on the region under study. Thus, there are territorial
representations, water governance and the vision of the state that were chosen as the
theoretical framework. The methodology is part of the multivariate interpretative paradigm,
which, through qualitative analysis, allowed us to measure the weight of variables and
indicators. The case study was chosen as a verification strategy. In addition, documentary
content and discourse analysis was collected through interviews with members of the São
Francisco River Basin Committee in their submediate excerpt. The result was the
identification and analysis of representations of the semiarid territory over the centuries in
which it was called sertão. Thus, the semiarid has been represented as a frontier of
colonization and empty spaces, as a problem region, as a representation of the past and the
spaces of memories and, finally, of sustainability through coexistence with the semiarid. These
representations strongly influenced the view of the state and organized civil society in the
territory, regarding water management policies and actions. Water management in the study
area, from a multi-scale perspective, has three levels. The first is the state, the second is civil
society organizations in partnership with the state, and the third is the São Francisco Sub-basin
Regional Advisory Chamber, as part of the work of the São Francisco River Basin Committee.
This leads to overlapping skills and, at the same time, hindered administration for popular
understanding and participation. The thesis proposes a conceptual framework for the
construction of a sustainable management model that involves changing the view of the
territory, consolidating relations and institutional laws, deepening decentralization and
autonomy in committee decisions, watersheds and fostering a culture of anticipating problems
and crises.
Keywords: RiverBasin, Water Management, Governance, NortheasternBrazil, Territorial
Representations, Subdivision São Francisco, BrazilianSemiarid, Sertão.
V
Resumo
O Brasil éum dos países mais servidos em termos de recursos hídricos, com 12% do total
mundial. No entanto, seuprocesso de gestãoainda é imaturo em comparaçãocom países
europeus, asiáticos e norte-americanos. Os problemas de acesso, uso e gestão da
águaapresentam diferentes contextos e problemas dentro do país. A região Nordeste responde
por umterço da população e possui cerca de 3, 3% dos recursos hídricos. Nessaregião, fica o
semiárido, que sofrehistoricamente os impactos sociais e econômicos das secas periódicas.
Nesse contexto, essa tese propõeumareflexão para direcionar a um modelo de
gestãosustentável do semiárido brasileiro. Seu objetivo é contribuir para a governança da
águaaplicávelàs partes interessadas e respeitar as características sociais, econômicas e
culturais da região. À primeira vista, optamos por escolhasconceituais e metodológicas para
entender os efeitos de umséculo de história da gestão da águanaregião em estudo. Assim, tem-
se as representaçõesterritoriais, a governança da água e a visão do Estado que foramescolhidas
como quadro teórico. A metodologia faz parte do paradigma interpretativo multivariado, que,
por meio da análisequalitativa, permitiu medir o peso das variáveis e indicadores. O estudo de
caso foiescolhido como estratégia de verificação. Alémdisso, foifeita a análise do conteúdo
documental e dos discursos coletado por meio de entrevistas commembros do Comitê da da
Bacia do Rio São Francisco em seu trecho do submédio. O resultado foi a identificação e
análise de representações do território semiárido ao longo dos séculos em que foi chamado
sertão. Assim, o semiárido tem sido representado como umafronteira da colonização e
espaçosvazios, como umaregião problema, como umarepresentação do passado e dos espaços
da memória e, finalmente, da sustentabilidadeatravés da convivênciacom o semiárido.
Essarepresentaçõesinfluenciaramfortemente a visão do estado e da sociedade civil organizada
no território, quantoàs políticas e ações de gestão hídrica. O gerenciamento da águana área de
estudo, em uma perspectiva de múltiplas escalas, possuitrêsníveis. O primeiro é o estado, o
segundo são as organizações da sociedade civil em parceriacom o estado e o terceiro é a
Câmara Consultiva Regional da Sub-bacia do São Francisco, como parte do trabalho do
Comitê da Bacia do Rio São Francisco. Isso leva à sobreposição de habilidades e, ao mesmo
tempo, dificultou a administração para a compreensão e participação popular. A tese
propõeumarcabouçoconceitual para a construção de um modelo de gestãosustentável que
envolvamudançanavisão do território, consolidação de relações e leisinstitucionais,
aprofundamento da descentralização e autonomianasdecisões dos comitês. bacias
hidrográficas e fomentando a cultura de antecipar problemas e crises.
Palavras-chave: Bacia Hidrográfica, Gestão Hídrica, Governança, Nordeste do Brasil, Região
semiárida brasileira, RepresentaçõesTerritoriais, Submédiodo Rio São Francisco, Sertão.
VI
SUMÁRIO Résumé ........................................................................................................................................................................... III
Abstract .......................................................................................................................................................................... IV
Resumo ........................................................................................................................................................................... V
Lista de tabelas ............................................................................................................................................................. XI
Lista de figuras ............................................................................................................................................................ XII
Lista de Siglas ............................................................................................................................................................ XIV
Agradecimentos ........................................................................................................................................................ XVII
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................................. 1
I. Problemática........................................................................................................................................................... 1
II. Questão da pesquisa ..........................................................................................................................................12
III. Objetivos ............................................................................................................................................................12
IV. Hipóteses da pesquisa .....................................................................................................................................13
V. O território e período de análise.....................................................................................................................14
VI. Limites da pesquisa .........................................................................................................................................16
VII. Justificativa e contribuição da pesquisa ....................................................................................................17
VIII. A apresentação da tese.................................................................................................................................18
Capítulo 1 - Marco conceitual da pesquisa ............................................................................................................22
1.1. O Estado ............................................................................................................................................................22
1.2. Sociedade Civil Organizada e Organizações Não Governamentais ....................................................24
1.3. A Gestão Territorial .......................................................................................................................................26
1.4. A Análise Multiescalar ..................................................................................................................................27
1.5. A aridez - definição e distribuição no mundo ..........................................................................................31
1.6. A seca ................................................................................................................................................................33
Capítulo 2 - Considerações teóricas da pesquisa e construção do quadro teórico ........................................37
2.1. As representações territoriais .......................................................................................................................38
2.1.2. As representações sociais e as representações territoriais: uma diferenciação necessária .....40
2.1.3 Caracterizando as representações territoriais.....................................................................................42
2.1.4 As representações e a Geografia ...........................................................................................................44
2.2. Governança como uma estratégia de gestão hídrica ...............................................................................46
2.3. A visão do Estado ...........................................................................................................................................51
Capitulo 3 - A Metodologia ......................................................................................................................................56
VII
3.1. O Estudo de caso como estratégia de verificação....................................................................................56
3.2. Instrumento de coleta de dados....................................................................................................................57
3.2.1. Fontes do CBHSF ...................................................................................................................................58
3.2.2. Fontes de órgãos governamentais .......................................................................................................60
3.2.3. Fontes das organizações sociais civis.................................................................................................60
3.3. Tratamento dos dados ....................................................................................................................................61
3.4. Análise de conteúdo e analise de discurso............................................................................................61
3.4.1. A análise documental .............................................................................................................................63
3.4.2. A análise dos resultados das entrevistas ............................................................................................64
3.5. Modos de apresentação dos resultados ......................................................................................................65
3.6. As variáveis e indicadores da pesquisa ......................................................................................................65
Capítulo 4 - Delimitação ambiental e legal do semiárido brasileiro ................................................................68
4.1. Delimitação ambiental do semiárido brasileiro........................................................................................68
4.1.1. Considerações sobre o clima do semiárido brasileiro.....................................................................69
4.1.2. Uma breve caracterização do relevo semiárido brasileiro .............................................................74
4.1.3. O semiárido brasileiro e seus solos .....................................................................................................77
4.1.4. A Caatinga, o principal bioma do semiárido ....................................................................................79
4.1.5. Redes hidrográficas do semiárido .......................................................................................................83
4.1.6. As bacias hidrográficas do Brasil ........................................................................................................85
4.1.7. Os brejos de altitude áreas de exceção no semiárido brasileiro ...................................................88
4.1.8. As ecorregiões do semiárido brasileiro ..............................................................................................90
4.1.9. As unidades Geossistêmicas do semiárido ........................................................................................91
4.2. Delimitação legal do semiárido brasileiro .................................................................................................92
Capítulo 5 - O semiárido, o Sertão e suas representações territoriais ..............................................................96
5.1. Considerações sobre a origem e o uso do termo sertão como designador do semiárido brasileiro
.....................................................................................................................................................................................96
5.2. As representações territoriais do semiárido a partir da sua concepção como sertão .......................97
5.2.1. O sertão como fronteira da colonização e dos espaços vazios .................................................. 100
5.2.2. O sertão como uma região problema ............................................................................................... 105
5.2.3. O sertão como representação do passado e dos espaços das memórias................................... 113
5.2.4. O sertão da sustentabilidade na convivência com o semiárido.................................................. 118
Capítulo 6 - O Estado brasileiro e a gestão das águas no semiárido ............................................................. 124
6.1. Bases legais da gestão hídrica no Brasil ................................................................................................. 125
VIII
6.1.1. A lei de águas no Brasil - o aparato legal para a gestão dos recursos hídricos atualmente . 127
6.2. A visão do Estado, em nível federal, na gestão dos recursos hídricos no Brasil ........................... 130
6.3. A visão do Estado nas obras de combate à seca no semiárido .......................................................... 143
6.3.1. Represamento e deslocamento da água - o progresso técnico no combate à seca ................ 144
6.3.2. A transposição do Rio São Francisco .............................................................................................. 147
6.4. Ação multiescalar na descentralização da tomada de decisão ........................................................... 150
Capitulo 7 - A sociedade civil organizada na gestão da água no semiárido brasileiro ............................. 156
7.1. Os saberes locais e a construção da memória sobre o semiárido ...................................................... 158
7.2. As ideias de convivência com o semiárido no Brasil .......................................................................... 161
7.3. Institucionalização da convivência com o semiárido .......................................................................... 164
7.4.1. Programa Um Milhão de Cisternas .................................................................................................. 166
7.4.2. Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2) .................................................................................. 168
7.4.3. Programa Cisternas nas Escolas ....................................................................................................... 170
7.4.4. Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivênciacom o Semiárido: Manejo da
Agrobiodiversidade – Sementes do Semiárido ................................................................................................ 171
7.5. Descentralização e convivência com o semiárido ................................................................................ 171
Capitulo 8 - Governança da água através do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco
(CBHSF)..................................................................................................................................................................... 176
8.1. A construção dos comitês de bacias hidrográfica no Brasil ............................................................... 177
8.2. O Comitês da bacia do rio São Francisco............................................................................................... 180
8.2.1 Câmara Consultiva Regional do Submédio São Francisco .............................................................. 183
8.3. A Câmara Consultiva Regional e a gestão da água no semiárido pernambucano ......................... 184
8.3.1. Percepções e objetivos dos membros .............................................................................................. 185
8.3.2. As estratégias para a tomada de decisão ......................................................................................... 188
8.3.3 Participação cidadã e dos membros no comitê ............................................................................... 190
8.3.4 As tomadas de decisão ......................................................................................................................... 192
8.3.5 O Estado de Pernambuco na gestão da CCR do submédio São Francisco .............................. 196
8.3.6 Avaliação da gestão a partir da bacia hidrográfica ........................................................................ 197
8.4. As representações territoriais e a governança da água no CBHSF ................................................... 198
Capítulo 9 - Lições para uma governança hídrica sustentável no semiárido de Pernambuco ................. 199
9.1. Mudança na visão do território semiárido .............................................................................................. 200
9.2. Entrelaces institucionais entre os órgãos governamentais e as instituições públicas de ensino . 202
9.2.1. Órgãos estatais e Instituições públicas de ensino ......................................................................... 203
IX
9.2.2. Entrelaces institucionais - Órgãos estatais e OSC's ..................................................................... 204
9.2.3. Entrelaces institucionais - OSC's e Instituições públicas de ensino ......................................... 204
9.2.4. Órgãos estatais, OSC's e as Instituições públicas de ensino ...................................................... 205
9.3. Institucionalizar da gestão hídrica através das leis ............................................................................... 206
9.4. Consolidar a cultura da antecipação dos problemas ............................................................................ 207
9.5. Participação popular na gestão hídrica.................................................................................................... 208
9.6. Economia que não escasseie ou deprecie os recursos hídricos.......................................................... 209
9.7.Descentralizaçaomultiescalar na tomada de decisão............................................................................. 210
9.8. À guisa de conclusão .................................................................................................................................. 212
CONCLUSÕES ........................................................................................................................................................ 214
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................................................ 219
ANEXOS.................................................................................................................................................................... 231
X
Lista de Anexos
Anexo 1 - municípios por mesorregiões e microrregião do Estado de Pernambuco ................................. 231
Anexo 2 - participantes das reuniões do CBHSF- atas das plenárias 2003-2018 ...................................... 234
Anexo 3 - questionário aplicado aos membros da CCR do Submédio São Francisco .............................. 244
Anexo 4 - Estrutura e funcionamento do estado brasileiro ............................................................................. 246
Anexo 5 - documento da declaração do semiárido ........................................................................................... 250
Anexo 6 - lista dos membros do CBHSF (Gestão 2016-2020) ...................................................................... 257
Anexo 7 - lista com os membros da CCR do Submédio São Francisco (Gestão 2016-2020) ................ 269
XI
Lista de tabelas
Tabela 1 - Volume de água doce dos rios por continente ..................................................................................... 2
Tabela 2 - População, densidade demográfica e disponibilidade hídrica per capita nas bacias
hidrográficas brasileiras ............................................................................................................................................... 2
Tabela 3 - Característica da disponibilidade hídrica nas grandes bacias hidrográficas brasileiras ............. 4
Tabela 4 - Níveis de cogerenciamento....................................................................................................................50
Tabela 5 - Membros entrevistados da CCR do submédio São Francisco. ......................................................60
Tabela 6 - Variáveis e Indicadores da pesquisa ....................................................................................................67
Tabela 7 - Correspondência entre Unidades Geomorfológicas do IBGE, as unidades de Paisagem da
EMBRAPA e as Grandes Unidades Geossistémicas da FUNCEME ..............................................................92
Tabela 8 - Quantitativo de municípios no semiárido (2005 e 2017) e área do semiárido brasileiro ........94
Tabela 9 - Comparação entre as ideias-chave dos paradigmas de combate à seca e a convivência com o
semiárido .................................................................................................................................................................... 120
Tabela 10 - As constituições federais e o entendimento da água e seus usos ............................................. 127
Tabela 11 - Sistematização das ações estatais ao longo do século XX e início do século XXI ............. 147
Tabela 12 - Ações e tecnologias de convivência com o semiárido ............................................................... 163
Tabela 13 - Quantitativo de Organismos, associações de classes e empresas que atuam, em princípio,
na gestão da bacia do São Francisco .................................................................................................................... 182
XII
Lista de figuras
Figura 1- Região do semiárido brasileiro ...............................................................................................................10
Figura 2 - O semiárido no Estado de Pernambuco...............................................................................................14
Figura 3 - Mapa mundial da distribuição da aridez .............................................................................................32
Figura 4 - Localização das regiões áridas e semiáridas no mundo...................................................................33
Figura 5 - Esquema com o quadro teórico e seu uso na tese .............................................................................55
Figura 6 - Esquema da operacionalização das variáveis.....................................................................................67
Figura 7 - Classificação climática do semiárido ...................................................................................................70
Figura 8 - Os oito regimes de precipitação anual que ocorrem na América do Sul .....................................72
Figura 9 - Precipitação do semiárido ......................................................................................................................73
Figura 10 - Geomorfologia do semiárido ...............................................................................................................75
Figura 11 - Domínios geomorfológicos propostos para o estado de Pernambuco. ......................................76
Figura 12 - Solos da Caatinga...................................................................................................................................78
Figura 13 - Fertilidade do solo na região semiárida ............................................................................................79
Figura 14 - Biomas do Semiárido ............................................................................................................................80
Figura 15 - Coberturas vegetais do semiárido ......................................................................................................81
Figura 16 - Bacias hidrográficas do semiárido .....................................................................................................84
Figura 17 - Percursos do Rio Parnaíba e do Rio São Francisco........................................................................85
Figura 18 - As bacias e sub-bacias hidrográficas do Brasil ...............................................................................86
Figura 19 - Perfil esquemático dos brejos de altitude no Nordeste do Brasil ................................................88
Figura 20 - Principais brejos de altitude nos estados da Paraíba e Pernambuco ...........................................90
Figura 21 - Ecorregiões do semiárido .....................................................................................................................91
Figura 22 - Linha do tempo com as representações territoriais do sertão ................................................... 100
Figura 23 - Açude Lopes II na cidade de Bodocó (Pernambuco) .................................................................. 138
Figura 24 - trecho da transposição do Rio São Francisco no Município Custória (Pernambuco) ......... 149
Figura 25 - Cisterna construída no semiárido de Pernambuco ....................................................................... 168
Figura 26 - Organograma da CBHSF .................................................................................................................. 180
Figura 27 - Divisão político-administrativa da Bacia do Rio São Francisco .............................................. 182
Figura 28 - Esquema com as relações institucionais ........................................................................................ 205
Figura 29 - Esquema com as multiescalas de atuação dos atores na gestão hídrica em ........................... 212
XIII
Lista de Gráficos
Gráfico 1 - Evolução quantidade de OSCs por ano de fundação................................................................... 172
Gráfico 2 - Transferências federais ...................................................................................................................... 172
Gráfico 3 - Repasse de recursos ............................................................................................................................ 173
XIV
Lista de Siglas
ABONG Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais
ADENE Agência de Desenvolvimento do Nordeste
ANA Agência Nacional de Águas
APAC Agência Pernambucana de Água e Clima
APNE Associação Plantas do Nordeste
ASA Articulação do Semiárido
AS-PTA Associação Caatinga, a Agricultura Familiar e Agroecologia
BNB Banco do Nordeste do Brasil
BNDE Banco Nacional de Desenvolvimento
CAATINGA Centro de Assessoria e Apoio aos Trabalhadores e Instituições Não
Governamentais Alternativas
CBH Comitê de Bacia Hidrográfica
CBHSF Comitê da Bacia do Rio São Francisco
CCR Câmara Consultiva Regional
CECPA Comissão Estadual de Controle da Poluição Ambiental
CEEIVASF Comitê Executivo de Estudos Integrados da Bacia Hidrográfica do São
Francisco
CEMADEN Centro de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais
CHESF Companhia Hidrelétrica do São Francisco
CNIP Centro Nordestino de Informações sobre Plantas
CNRH Conselho Nacional de Recursos Hídricos
CODEVASF Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do
Parnaíba
COMPESA Companhia Pernambucana de Saneamento
CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente
CONVIVER Programa de Desenvolvimento Integrado e Sustentável do Semiárido
CPATSA Centro de Pesquisa Agropecuária do Trópico Semiárido
CPPCA Comissão Permanente de Proteção dos Cursos D'Água
CPRH Agência Estadual de Meio Ambiente
CVSF Comissão do vale do São Francisco
DAB Diagnóstico Analítico da Bacia do São Francisco e da sua Zona Costeira
DNAEE Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica
DNOCS Departamento Nacional de Obras contra a Seca
EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
EMBRATER Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural
ENENORDE Comitê de Estudos Energéticos do Nordeste
FINOR Fundo de Investimentos do Nordeste
FNE Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste
FUNCEME Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos
GAPA Gerenciamento da Água para Produção de Alimentos
GEF Fundo Mundial para o Ambiente
GTDN Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste
XV
GTI Grupo de Trabalho Interministerial
GTP Geossistema, Território e Paisagem
IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDH Índice de Desenvolvimento Humano
IDHM Índice de Desenvolvimnto Humano Muncipal
IFOC Inspetoria Federal de Obras contra a Seca
IS-Sertão Instituto Federal do Sertão Pernambucano
INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
INMET Instituto Nacional de Meteorologia
INPE Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
INSA Instituto Nacional do Semiárido
IOCS Inspetoria de Obras Contra as Secas
IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
MARE Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado
MDA Ministério do Desenvolvimento Agrário
MDS Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
MIN Ministério da Integração Nacional
MMA Ministério do Meio Ambiente
OEA Organização dos Estados Americanos
ONG Organização Não Governamental
OS Organizações Sociais
OSC Organização da Sociedade Civil
OSCIPS Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público
P1MC Programa Um Milhão de Cisternas
PAE Programa de Ações Estratégicas para a Bacia do Rio São Francisco e
sua Zona Costeira
PBHSF Plano Decenal de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio São
Francisco
PELD Programa de Pesquisas Ecológicas de Longa Duração
PNRH Plano Nacional de Recursos Hídricos
PNUMA Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
PROINE Programa de Irrigação do Nordeste
PRONI Programa Nacional de Irrigação
PROVÁRZEAS Programa de Aproveitamento Racional de Várzeas Irrigadas
RIMA Relatório de Impacto Ambiental
SAAE Serviço Autônomo de Água e Esgoto
SESAN Secretaria Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional
SIG Sistema de Informação Geográfica
SINGREH Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.
SRH/MMA Secretaria de Recursos Hídricos do Ministério do Meio Ambiente
SSMA Sistema Simplificado de Manejo da Água
SUDENE Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste
SUVALE Superintendência do Vale do São Francisco
UFRPE Universidade Federal Rural de Pernambuco
XVI
UNEB Universidade do Estado da Bahia
UNIVASF Universidade Federal do Vale do São Francisco
UPE Universidade de Pernambuco
ZCIT Zona de Convergência Intertropical
XVII
Agradecimentos
A trajetória dessa tese se fez com a participação direta e indiretamente de muitas pessoas e
mesmo correndo o eminente risco de esquecer alguém ou de minimizar sua importância,
citarei a todas e todos. Alguns foram importantes em momentos distintos, mas sem suas
presenças, esse trabalho não seria possível ou, no mínimo teria sido mais difícil do que já foi.
Agradeço a minha orientadora, professora Dra. NathalieGravel (Departamento de Geografia
da UniversitéLaval) pelo convite para ser seu aluno e pela marcante presença em toda a
jornada que foi esse processo de doutoramento. Muito obrigado por compartilhar seus
conhecimentos e experiências acadêmicas durantes esses anos e logro que o aprendizado esteja
apenas começando.
Registro meus agradecimentos aos membros do comitê da avaliação, os professores Dr. Caio
Maciel (Universidade Federal de Pernambuco), Dr Alan Viau (UniversitéLaval) e Dr. Jorge
Virchez (UniversitéLaurentienne) que trouxeram valiosas reflexões e contribuições.
Ao corpo docente a administrativo do Departamento de Geografia e da Faculdade de Estudos
Superiores e Posdoutorais da UniversitéLavalpelo acolhimenento e todo o suporte.
Aos amigos e colegas que a UniversitéLaval e o Canadá me proporcionaram, Sara Venegas,
ChloéDordonnat, EmelineGergaud, Ana Alberto, Juan David Niño, Richard Gonzalez,
EmelieKoeng, FleurJulliat, SebátianKoller, Gregory Olleff, Griselda Tomé, François-Xavier
Drapeau, Bernard Lemay, Marta Cintia Teixeira, Ronaldo Tavares e Rafael Vieira. Por fim, a
Héctor Martinez, NayiveBalcázar e Damián Martinez.
À Universidade de Pernambuco pelos anos de licença que porpiciaram a conclusão desse
curso. Em especial, aos colegas do Campus Petrolina, lugar onde coloco em prática meus
aprendizados e experiências. Um agradecimento ainda à todas e todos que contribuem na
consolidação do Curso de Geografia.
XVIII
Aos amigos e colegas da Universidade de Pernambuco, Luiz Henrique Barros Lyra, Renata
Sibéria de Oliveira, Silu Caldeira, CeliceQuiroz, KenjiShiosaki, Janaína Guimarães, Moisés
Almeida, Ana Clara Brito, Flávia Martins, Thiago Mota, Pâmela Bagano, Luciana França,
João Tavares, Cláudio Smalley, Virgínia Ávila, Dyogo Álvaro, Ronilson Barboza, Carla
Fabiana Viana, Mábio Dutra, Camila Roseno, Gesner Santana, Edmilson Gomes, José Edson e
João Henrique Dourado.
Agradeço ainda aos colegas de outras instituições que se fizeram presentes nesse momento,
como Robert Allkin (RBG-Kew); Manoel Fernandes de Souza Filho e Antonio Carlos Robert
Moraes (in memorian) (Universidade de São Paulo); Luzineide Dourado Carvalho
(Universidade do Estado da Bahia); Antonio Filho, Paulo Ramos e Nilton Almeida
(Universidade Federal do Vale do São Francisco); Alexandre Sabino (Universidade Federal da
Paraíba), Marcos Galindo, Marlene Barbosa, Edson Hely Silva e Sofia Corrêa (Universidade
Federal de Pernambuco); Edgar Luca, Paulo Muzio e Hiroyassu Uehara (in memorian) (Horto
Florestal de São Paulo).
Aos amigos da vida e sempre tão presentes, Fernando Falcão, Nelson Félix, Márcio Aguiar,
André Bezerra, Francisco Lima Jr., Anna Ulbrick, Cláudia Tapety, Carolina Rocha, Fabiana
Farias, PaulusHaluli, Juliana Andrade, Robert Dougan, Edlúcia Costa, Caio Raphael, Flávia
Novaes, Alyne Mesquita e Alyson Barbosa.
Na coleta dos dados, é preciso agradecer aos membros da Agência Peixe Vivo, especialmente
à Maria Zuleide Monteiro, e da CCR Submédio São Francisco que, gentilmente, cederam seu
tempo e conhecimento nas entrevistas.
Agradeço a todos os estudantes com quem trabalhei ao longo da minha vida profissional. Cada
um, à sua maneira, é responsável por essa conquista. Afinal, um professor só existe se tiver
seus alunos para compartilhar experiências e aprendizados.
Por fim, e mais importante, agradeço à minha família. Primeiro àquela que me recebeu,
Roberto e Rosita Godoy; ao meu pai, Severino "Biu" Pereira; ao meu irmão, Eduardo
XIX
Cordeiro, a minha irmã Luciana Nogueira e sua belíssima família (José Augusto, Enzo, Pedro
e Julia) e, finalmente, às minha meninas: minha companheira de vida, Roberta Vasconcelos;
minha filha querida, a "pipoquinha", Ana Pereira e à minha mãe, Ana Maria!
1
INTRODUÇÃO
Essa tese apresenta-se, de maneira geral, no domínio da Geografia Regional, uma vez que
aborda a governança da água no Brasil a partir de um recorte regional e territorial. Como
território de estudo, elegeu-se o semiárido1 brasileiro que é, comumente, chamado de sertão2.
Busca-se analisar, em diferentes escalas, o Estado, os governos, a sociedade civil organizada e
os conselhos de gestão hídrica que atuam como atores na governança da água na região.
I. Problemática
O Brasil, atualmente, possui a população estimada em 208.494.900 de habitantes. Ocupa a
sétima posição de economia mais forte no mundo, sendo a segunda no continente americano,
atrás apenas dos Estados Unidos (IBGE, 2018). Porém, o que deveria ser motivo para se
pensar num avanço social, na verdade é fonte de inquietação e preocupação. O Brasil é um
país economicamente rico, porém com enormes desigualdades sócio-econômicas internas.
Enquanto o país vende a ideia de uma economia cada vez mais fortalecida, ainda apresenta
índices baixos de qualidade de vida e educação. Soma-se a isso as abissais desigualdades
econômicas entre suas macrorregiões (Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul), seus
vinte e seis Estados e o Distrito Federal3.
Do total de recursos hídricos disponíveis no mundo, 97,3 por cento são águas salgadas de
oceanos, 2,4 por cento são águas em forma de gelo ou localizadas nos lençóis freáticos
profundos e apenas 0,36 por cento são provenientes de rios, lagos e pântanos, apropriadas
para o uso, mas distribuídas desigualmente pelos países. Do total da água adequada ao uso, 80
por cento são utilizados pela agricultura, 15 por cento pela indústria e apenas 5 por cento são
destinados ao consumo humano (Castro, 2012; Fagundes, 2015).
1Atualmente, a palavra semiárido é escrita como se apresenta no texto e tem sido assim desde 2009 com a última
reforma ortográfica operada nalíngua portuguesa. Porém, no texto desta tese, comcertafrequência a palavra será
escrita comhífen (semi-árido) toda vez que seja oriunda de umacitaçãodireta de um texto que assim a tratou. 2Termo registrado pela primeira vez antes do início da colonização portuguesa na América e que foi,
primeiramente, associado ao interior do Brasil. A partir do século XX tornou-se praticamente um sinônimo de
semiárido. Sertão é, à priori, uma designação qualitativa de lugares. 3 Desde 1960, a sede do governo brasileiro está em Brasília, sendo o Distrito Federal uma unidade da federação
que não é um Estado ou Município e possui organização político-administrativa própria.
2
Continentes Volume de água doce dos rios
(Km3)
Europa 76
Ásia 533
África 184
América do Norte 236
América do Sul 916
Oceania 24
Fonte : Macêdo (2001 : 5) apud (Fagundes, 2015 : 50).
Tabela 1 - Volume de água doce dos rios por continente
O Brasil possui um posição considerada privilegiada em comparação ao restante do mundo
quando se fala de recursos hídricos, seja na ausência de conflitos externos, seja na
disponibilidade da água. Entretanto, as discussões sobre o seu gerenciamento e os conflitos
inerentes são tímidos e não possuem a dimensão que deveriam. Passa-se a impressão que,
salvo alguns episódios como as secas no Nordeste ou a crise hídrica na recente estiagem em
São Paulo (2014-2016)4, não existem conflitos para o acesso e utilização da água.
Para colocar a questão hídrica brasileira em evidência, convém apontar que a América do Sul
possui o maior volume de água doce do mundo como ver-se abaixo a partir de uma divisão
por bacias hidrográficas:
Bacia Área de drenagem (km2)
População (ano-base 1996)
Densidade populacional
(hab./km2)
Disponibilidade de água per capita
(m3/hab./ano)
Amazônia 3.900.000 6.687.893 1,7 628.938,24
Tocantins 757.000 3.503.365 4,6 106.219,25
Atlântico Norte 242.000 406.324 5,3 284.063,36
Atlântico Nordeste 787.000 30.846.744 32,4 55.100,44
São Francisco 634.000 11.734.966 18,5 7.658,96
Atlântico Leste (1) 242.000 11.681.868 48,3 1.835,71
Atlântico Leste (2) 303.000 24.198.545 79,9 4.782,81
Paraná 877.000 1.820..569 4,9 22.345,45
Paraguai 368.000 49.924.540 56,9 6.948,41
Uruguai 178.000 3.837.972 21,6 37.099,88
Atlântico Sudeste 224.000 12.427.377 55,5 10.911,78
Brasil 8.512.000 157.070.163 18,5 36.575,46
Fonte : Lerner (2006 : 3).
Tabela 2 - População, densidade demográfica e disponibilidade hídrica per capita nas bacias hidrográficas
brasileiras
4 Nesse momento, os reservatórios chegaram a seis por cento de sua capacidade e o Estado não estava preparado,
uma vez que não possuíam plano para crises hídricas.
3
Ressalta-se que é justamente na América do Sul onde há maior presença de água que os
problemas de acesso e gestão desse recurso são graves. Para Ribeiro (2008 : 131), "a carência
de água só pode ser explicada pela ausência de políticas públicas que permitam a adoção de
um sistema de coleta, tratamento e distribuição de água para a população local". Então, "a
gestão dos recursos hídricos é decisão política, motivada pela escassez relativa de tais
recursos e pela necessidade de preservação para as futuras gerações" (Castro, 2012 : 8).
Destaca-se também pelo maior aquífero subterrâneo do mundo e ainda apresenta recordes em
índice de chuva (Castro, 2012; Fagundes, 2015). Entretanto, ao aferir-se os dados
internamente e compará-los aos dados externos, as desigualdades internas tendem a ser
diluídas.
Quando se estabelece as discussões sobre governança das águas no Brasil, parte-se do
pressuposto de que o país possui reservas ou recursos hídricos a serem gerenciadas, mas fala-
se, essencialmente, na sua má distribuição. Tal assertiva pode levar a se pensar que nas
demais localidades do mundo, existe uma uniformidade na distribuição das reservas aquíferas
quando na realidade esta premissa é falsa.
Mesmo possuindo cerca de 12 por cento da água doce do mundo, considerando-se, assim, um
país privelegiado, o Brasil sofre com escassez de recursos hídricos e passa, frequentemente,
por colapsos nos grandes centros urbanos. Isso acentua-se com a distribuição irregular e
desigual dentro da sua divisão macrorregional.
4
Bacia Área de
drenagem
(km2)
Precipitação
média (m3/s)
Vazão
média
(m3/s)
Evapotranspiração
real (m3/s)
Disponibilidade
(por cento)
Amazônica 6.112.000 476.773 209.030 1.381,5 71,1
Tocantins 757.000 39.847 11.800 1.168,4 7,0
Atlântico
Norte
242.000 16.338 6.000 1.353,7 3,6
Atlântico
Nordeste
787.000 27.981 3.130 995,8 1,9
São Francisco 634.000 18.415 2.850 774,2 1,7
Atlântico
Leste (1)
242.000 6.868 680 806,4 0,4
Atlântico
Leste (2)
303.000 11.808 3.670 847,0 2,2
Paraná 877.000 35.516 1.100 989,5 6,5
Paraguai 368.000 15.987 1.290 1.259,5 0,8
Uruguai 178.000 8.845 4.150 831,8 2,5
Atlântico Sul 224.000 9.902 4.300 788,6 2,5
Total 10.724.000 671.270 257.900 413.370
Brasil 8.512.000 468.840 168.870 299.970 100,0
Fonte : Tucci, Hespanhol e Netto (2000) apud Castro (2012 : 36).
Tabela 3 - Característica da disponibilidade hídrica nas grandes bacias hidrográficas brasileiras
Os dados acima apresentam a distribuição da água internamente. Aproximadamente 80 por
cento da água está na Amazônia, onde vivem apenas 5 por cento da população brasileira,
enquanto que o Nordeste apresenta um terço da população e dispõe em torno de 3,3 por cento
dos recursos hídricos. Nas regiões Sul e Sudeste, que concentram a maior parte da população
inclusive indústrias e fábricas, encontram-se aproximadamente 12 por cento dos recursos
hídricos (Castro, 2012; Fagundes, 2015).
A desigualdade na distribuição da água no território brasileiro não pode ser colocada, via de
fato, como o empecilho para o seu acesso e uso. Concorda-se, então, com Tundisi et al.
(2008), quando afirmam que as causas principais para a crise da gestão hídrica é a falta de
articulação e ações consistentes na gestão de recursos hídricos e na sustentabilidade
ambiental5.
Os problemas de acesso, uso e gestão da água também apresentam contextos e problemas
diferentes a depender das regiões. O Nordeste é, nesse contexto, a região que mais chama
5As outras causas são: intensa urbanização, aumentando a demanda pela água e ampliando a descarga de
recursos hídricos contaminados, com grandes demandas de água para abastecimento e desenvolvimentos
econômico e social; estresse e escassez de água em muitas regiões do planeta em razão das alterações na
disponibilidade e no aumento de demanda; infraestrutura hídrica deficitária e em estado crítico, em muitas áreas
urbanas com até 30% de perdas na rede após o tratamento das águas; e os problemas de estresse e escassez em
razão de mudanças globais, com eventos hidrológicos extremos aumentando a vulnerabilidade da população
humana e comprometendo a segurança alimentar (chuvas intensas e períodos intensos de seca);
5
atenção negativamente dentro do país quanto à disponibilidade, acesso, uso e gestão da água
por conta do semiárido que é
certamente, uma das áreas com maior volume de análises feitas sobre a sua
realidade, e com significativo acúmulo de proposições para enfrentamento de suas
problemáticas. Embora as análises das suas características e as explicações das
suas problemáticas possam variar no tempo e segundo as concepções do analista,
grande parte dos diagnósticos e proposições sobre o Semi-árido tem como
referência imagens historicamente construídas sobre um espaço problema, terra
das secas e da miséria (Silva, 2006 : 93).
A região semiárida brasileira é comumente chamada de sertão, termo que começou a ser
utilizado desde o início da colonização brasileira pelos portugueses. O Sertão Semiárido é,
assim, um território plural e multidimensional, com imagens enraizadas e mitos que, como
força estruturante e estruturada, estabelecem imagens primordiais que constroem uma dada
territorialidade (Joachim e Queiroga, 2011; Haesbaert, 1996; 2004; Bourdieu, 2007).
Por ser um território semiárido, há incidência do fenômeno natural conhecido como a seca,
que é periódica. Entretanto, existe a percepção de que esse fenômeno é o causador dos altos
índices de desigualdade social encontrados na região quando comparadas às demais do país,
bem como ser o empecilho para que essa se desenvolva economicamente e socialmente. A
ligação causa e efeito, aqui entendido como seca e subdesenvolvimento sempre foi utilizada
na explicação dos problemas regionais, numa visão fatalista e calcada no determinismo
ambiental.
A relação territorial pode retificar uma visão mítica do território marcado pela rusticidade e a
seca, ligada ao passado como uma natureza bruta, (Lima, 1999; Vasconcelos, 2012). Pode
marcar também a territorialidade através de uma visão igualmente hierarquizada e
estereotipada do território. E, por outro lado, pode evidenciar uma territorialização que
promove o enraizamento através da valorização dos atributos físicos, simbólico e culturais do
Sertão Semiárido, gerando novas matrizes referenciais para o imaginário geográfico através
da convivência (Carvalho, 2012).
Desde o início do século XX, o Estado brasileiro vem atuando, sistematicamente, na região
através de obras de infraestrutura de acesso à água, bem como põe em prática ajudas pontuais
em momentos mais críticos de seca. A partir de meados dos anos oitenta do século passado, a
região vem recebendo também a atuação cada vez mais presente das Organizações Sociais
6
Civis (OSC). Soma-se a isso, a gestão hídrica conduzida pelos comitês e subcomitês de bacias
hidrográficas distribuídos no território que começam a atua no início do presente século. Não
obstante, a gestão hídrica vivenciada até o momento não conseguiu modificar de maneira
profunda o quadro de fortes desigualdades socioeconômicas quando comparado,
principalmente, as demais macrorregiões brasileiras6.
O semiárido brasileiro possui um regime pluviométrico concentrado em poucos meses do ano
(comumente entre os meses de novembro e fevereiro), além de natural irregularidade do
quantitativo pluviométrico nos anos. A isso, somam-se as secas mais prolongadas que
ocorrem, normalmente, em intervalos que variam entre cinco e doze anos e não ocorrem de
forma uniforme no território. "Pode haver anos de seca total, com efeitos observados em todas
as áreas da Região Semi-Árida, e anos de seca parcial, em que os problemas da seca são
verificados apenas em algumas áreas dos estados do Nordeste" (MIN, 2005 : 7). Este conjunto
de fatores resulta em problemas de captação e armazenamento d'água (Ab'saber, 1999) que,
estudados no contexto social, econômico, histórico e cultural dão uma complexidade à região.
Com isso, temporalidade e espacialidade precisam ser entendidas para a compreensão dos
problemas e, consequentemente, a busca de ações que minimizem seus impactos.
Considerado o acesso a água como o maior problema para o desenvolvimento da região, o
Estado desenvolveu políticas buscando soluções. Por décadas, foram implementadas as
chamadas soluções hidráulicas que consistem em priorizar ações de armazenamento d'água a
partir da construção de grandes repositórios hídricos, tais como barragens e açudes através de
órgãos estatais. Essa foi a base do pensamento de órgãos como o Departamento Nacional de
obras contra a Seca (DNOCS) iniciado em 1909, a Companhia Hidrelétrica do São Francisco
(CHESF) criada em 1945 e a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE)
iniciada em 1959. Todos com foco na região Nordeste do Brasil e, em especial, o semiárido7.
6 Nos últimos cinquenta anos, a água se fez presente em diversos fóruns internacionais, como exemplo, tem-se: Conferência de Mar del Plata (1977), Conferência de Dublin (1992), Conferência do Rio (1992), Conferência de
Noordwijk (1994), Convenção de Cursos D'Água Internacionais (1997) Conferência de Paris (1998),
Conferência de Bonn (2001), Conferência de Johannesburgo (2002), Os fóruns Mundiais de Água (1997, 2000,
2003 e 2006), O Ano Internacional da Água (2003) (Ribeiro, 2008). As discussões nesses fóruns também
contribuíram no processo de amadurecimento e tomada de decisão sobre a gestão hídrica no Brasil nas últimas
décadas.
7Programas como Destino semelhante teve o Plano Integrado para o Combate Preventivo aos Efeitos das Secas
no Nordeste, elaborado sob o impacto da seca 1970-71, bem como os Planos Diretores de Bacias Hidrográficas,
como Parnaíba, Acaraú, Apodi-Mossoró, Piranhas-Açu, elaborados durante a década de 70 (Rebouças, 1997)
7
Embora, o documento elaborado pelo grupo que posteriormente viriam a criar a SUDENE já
demonstrasse, ainda nos 50, que as soluções hidráulicas para a seca trouxeram resultados
aquém do esperado, a maior parte da atuação estatal utiliza tais soluções como a melhor
maneira de se resolver os problemas sociais da região.
A criação de órgãos estatais é uma prova de como o estado procurou pensar territorialmente e
sempre levou em conta o pensamento geográfico8 de cada época9. Ao longo do século XX
predominou a ideia da possibilidade de gerenciamento, em conjunto, da sociedade e natureza
como, as ações estatais seguindo este caminho. A enorme expansão e fortalecimento do
Estado brasileiro na década de setenta, resultou no crescimento da sua malha institucional e
também na crescente dificuldade de articulá-la eficientemente. A criação de novos órgãos e
secretarias, apesar de maiores em nível federal, ocorreu também em suas escalas
administrativas estadual, municipal e mesmo na regional (com suas especificidades) com
consequente ampliação e superposição territorial de suas burocracias (Castro, 1997). Com
isso, órgãos estatais atuam de maneira sobrepostas na região e, na maioria das vezes, sem que
a população entenda bem os papéis e objetivos de cada um.
A partir de uma necessidade regional aliada ao desenvolvimento das ideias de
sustentabilidade, começam a surgir nos anos de 198010 as ações das sociedades civis
organizadas. Em vez da mudança de uma condição natural ambiental através de soluções
modernizadoras, buscava-se a convivência com o ambiente e, consequentemente, com as
secas. As ações propostas demonstram um caminho possível para minimizar os impactos da
seca, bem como o desenvolvimento do capital humano e social. A descentralização se tornou
uma discussão presente no cenário internacional de políticas públicas. Buscava se distinguir a
seriam um avanço no sentido de antecipar ações de combate aos problemas oriundos da seca, porém foram
arquivados antes mesmo de sair do papel. 8A história institucional da geografia brasileira está ligada às necessidades do estado gerenciar o seu território. A
criação do primeiro curso de geografia no país e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, ambos em
1934 são exemplos de como o estado criou as condições necessárias para a implantação e o desenvolvimento do
pensamento geográfico acadêmico no Brasil para servir aos seus interesses. 9Seria então a solução da seca um paradigma da época. Não se conhecia no passado as condições físicas dos ambientes, então buscavam-se fora, experiências consideradas exitosas para se implantar no Brasil. Não se havia
a cultura de se perguntar o que as pessoas da região achavam ou faziam, afinal, elas eram tidas como vitimas,
bem como permanecer na ignorância ou não participar do processo de gestão era interessante para uma elite. 10 E aqui é necessáriosomar a informação de que o Brasil passou por um período de Ditadura Militar (1964-
1985), onde generais se sucediamnapresidência. Após o seu término, seguiram-se os presidentes: José Sarney
(1985-1990) (assumiu a presidênciaapós a morte de Tancredo Neves que veio a falecer antes de tomar posse);
Fernando Collor de Mello (1990-1992) (teve seu mandado encurtadoapós renunciar em 1992); Itamar Franco
(1992-1995); Fernando Henrique Cardoso (1995-2003); LuizInácio 'Lula' da Silva (2003-2011); Dilma Rouseff
(2012-2016) (teve seu segundo mandado encurtadoapós o impeachment em 2016); Michel Temer (2016-2018) e,
atualmente, Jair Bolsonaro (2019-).
8
“'desconcentração, na qual atores locais continuam subordinados ao poder central, a
descentralização política se refere à transferência de poder decisório aos agentes que prestam
contas às populações locais, normalmente através de eleições" (Abers e Jorge, 2005 : 2).
Nas políticas voltadas ao meio ambiente no Brasil, a participação social foi fortalecida na
década de 1990 com a criação de vários conselhos consultivos e deliberativos em todos os
níveis governamentais, com a participação regulamentada da sociedade civil organizada . Os
Conselhos de Meio Ambiente, os Comitês de Bacias Hidrográficas e os Conselhos Gestores
de Áreas de Proteção Ambiental (APA's) prevêem a participação de segmentos da sociedade
como Organizações Não Governamentais (ONG) e movimentos sociais no seu funcionamento
(Jacobi, 2009).
Foi, sobretudo na primeira década do corrente século que houve uma maior participação da
sociedade civil organizada no gerenciamento de ações pontuais no semiárido através de
parcerias com OSC's que recebiam recursos federais, a criação de institutos de pesquisa e
aplicação como o Instituto Nacional do Semiárido (INSA)11, bem como grandes
investimentos em universidades públicas e institutos de educação técnica. Começava-se a
intensificação de um processo de descentralização das tomadas de decisão.
A gestão dos recursos hídricos no Brasil inicia nova fase com a aprovação da Lei no 9.433, da
Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH), em janeiro de 199712. Além desta lei
nacional, outros doze estados também promulgaram legislações semelhantes13. Quatro
princípios desta lei são inovadores na gestão hídrica brasileira: a gestão por bacia, a unicidade
da outorga, a exigência de plano de gestão e o instrumento de cobrança. Esse processo
aconteceu também em países como Argentina, Chile e México (Castro, 2012).
11 Criado 2003 como "a mais nova unidade de pesquisa do Ministério de Ciência e Tecnologia tem por finalidade
promover a execução e divulgação de estudos e pesquisas na área do desenvolvimento científico e tecnológico
para o fortalecimento do desenvolvimento sustentável da Região, possibilitando a integração de pólos
socioeconômicos e os ecossistemas estratégicos do Semi-árido brasileiro" (Silva, 2006 : 89). 12 Entre os princípios internacionalmente aceitos sobre gestão de recursos hídricos, incorporados a Lei nº 9.433,
estão os fixados na Agenda 21, da conferência Rio-92, que foram aprimorados para serem factíveis e passiveis
de serem implementados (Castro, 2012 : 42). 13 O Estado de São Paulo foi o primeiro a tratar da descentralização da gestão da água ainda no início dos anos
noventa do século passado. "Datada de 1991, a lei estadual nº . 7 .633 definiu a gestão como sendo participativa,
integrada e descentralizada em nível de unidades de bacias hidrográficas" (Martins e Lima, 2017 : 118).
9
A visão do Estado tal como apresenta James C. Scott em seu livro Seeing like a state (1998)
sempre aponta para uma organização e normatização do território e uso da ciência e
tecnologia como meios de modificação da realidade, o que permite o maior controle, não
apenas do espaço como da população, inclusive com a cobrança de impostos. Não obstante,
isso gerou uma expectativa por parte da população de que Estado é o centro da tomada de
decisão no seiárido.
Por outro lado, a atuação da sociedade civil organizada ainda está incipiente e extremamente
dependente desse mesmo Estado, que é o seu maior financiador. Esse processo de gestão
gerou centenas de ações governamentais e não governamentais e um acelerado processo de
urbanização. Mesmo assim, o semiárido ainda é reconhecido como um lugar rural, mesmo
que a maioria da sua população resida nos centros urbanos; pobre, mesmo que existam polos
de crescimento econômico14 e vítima das secas.
O semiárido do século XXI é bem mais complexo que uma região vitima das secas. Iniciada
em meados do século passado e fortalecida desde então, a região está cada vez mais urbana. A
população estimada do Semiárido atingiu 23.846.982 habitantes, equivalendo a 42,44 por
cento e 11,76 por cento da população do Nordeste15 e do país, respectivamente. Nas áreas
urbanas, estão cerca de 62 por cento, enquanto, 38 por cento estão na zona rural (INSA,
2014). Desde o recenseamento de 2010 a população do Semiárido cresceu 5,24 por cento. São
ao todo 1,135 municípios (20,4 por cento do total brasileiro) na região, dos quais 1,060 são
classificados como de pequeno porte; 74 de médio porte e apenas 1 considerado um grande
município16 (IBGE, 2018). Abaixo tem-se o mapa da delimitação mais recente do semiárido
brasileiro.
Alguns dados podem contextualizar a situação diferenciada que o semiárido vivencia quando
comparado ao restante do Brasil. De acordo com estatísticas do Ministério da Integração
Nacional (MIN) e sistematizadas pela Articulação do Semiárido (ASA) (2012), cerca de 58
por cento da população brasileira considerada em situação de pobreza habitam na região.
Aproximadamente, 62 por cento da população da região vive sem as condições mínimas
14Como exemplohá o vale do São Francisco com os projetos de irrigaçãooualguns centros urbanos como Teresina
(PI), Campina Grande (PB) ouJuazeiro do Norte (CE), que sãopólos urbanos que cresceram a partir do comércio
e serviços. 15 A região Nordeste possui 56.560.081 habinates segundo (IBGE, 2013). 16Isso a partir de umavisão, estritamente, quantitativa que considera pequeno os municípioscom até 50,000
habitantes, médios entre 50,001 e 500,000 e grande commais de 500,001 habitantes.
10
necessárias de qualidade de vida em relação aos indicadores de renda, longevidade e
educação. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do semiárido é de 0,65 por cento
para aproximadamente 82 por cento dos seus municípios. No meio rural, 63 por cento das
famílias não possuem rede geral de abastecimento d'água, dos quais 43 por cento utilizam
poços ou nascentes e 24 por cento utilizam outras formas de abastecimento como busca em
lugares mais distantes de onde residem. Apenas 5 por cento da população possui água para
irrigação de plantações. Ainda hoje o semiárido brasileiro é, majoritariamente, reconhecido
como um lugar rural, mesmo que a maioria da sua população resida nos centros urbanos;
pobre, mesmo que existam pólos de crescimento econômico17 e vitima das secas.
Fonte : SUDENE (2017).
Figura 1- Região do semiárido brasileiro
Aos dados apresentados acima, pode-se ainda adicionar uma percepção mais subjetiva que
ajuda a contextualizar a região. No Brasil, há uma significativa valorização do urbano em
detrimento ao rural. O moderno é viver na cidade, enquanto o campo representava o atraso18,
imagem já iniciada e consolidada como apresentado anteriormente. A transposição do modelo
de civilização do litoral para o semiárido pode ser visto nas paisagens cada vez mais
urbanizadas e nos índices que mostram uma população que cada vez mais habita nas cidades,
17Como exemplohá o vale do São Francisco com os projetos de irrigaçãooualguns centros urbanos como Teresina
(PI), Campina Grande (PB) ouJuazeiro do Norte (CE), que sãopólos urbanos que cresceram a partir do comércio
e serviços. 18 Houve em meados do século XX, uma tentativa de industrialização do semiárido. Em alguns municípios,
foram instaladas fábricas com subsídios estatais. Atualmente, a presença de indústrias está restrita a alguns
municípios que dão subsídios fiscais para suas instalações.
11
bem como no desenvolvimento econômico do comércio e serviço, o terceiro setor. O interior
vai então se parecendo cada vez mais com o litoral. As representações territoriais materiais e
imateriais historicamente construídas tendem a se modificar, dentro da ideia de Breux (2007)
por não serem congeladas em temporalidades e espacialidades.
Ao se partir da certeza que recursos financeiros são investidos na região, porém essa ainda
continua padecendo de problemas sociais, principalmente aqueles oriundos das secas
sazonais, percebe-se que o modelo de gestão em vigência não é o mais adequado e criar novos
órgãos ou burocratizar ainda mais o processo certamente não minimizará o problema. Por
outro lado, a população residente na região, pouco foi ouvida sobre seus conhecimentos
aplicados às minimizações dos impactos sociais resultantes da falta de acesso à água.
Ao se associar sertão e semiárido, se faz imperativo entender o que os aproxima e os
diferencia. Assim, sertão e semiárido podem ser palavras que designam as mesmas
espacialidades. Porém, enquanto o semiárido é uma região delimitada, necessariamente, por
características ambientais, o sertão é uma construção social e cultural.
Neste sentido, faz-se aqui o uso da teoria das representações territoriais, sejam elas materiais
ou imateriais. Com isto, busca-se identificar e contextualizar quais são as representações
dominantes. Assim, como um ponto de partida para exemplificar, numa simples busca em
ambientes virtuais sobre a palavra-chave “sertão” já se tem muito sobre o uso atual desse
termo e sobre as representações em torno dele. Todas as centenas de imagens e sítios, sejam
estatais, de OSC's ou particulares, que surgem apresentam fotos, pinturas, mapas ou qualquer
outro tipo de representação tendo o semiárido brasileiro como foco. As imagens apresentam o
solo rachado; o céu azul com poucas nuvens; o gado, ora vivo, ora padecendo; as festas
normalmente associadas ao estilo de música forró; a população sofrendo os impactos dos
períodos de estiagens; estradas cortando a paisagem semiárida; imagens de obras de açudes; a
transposição do Rio São Francisco; a fruticultura irrigada e a caatinga19. Todas as imagens
representam verdadeiramente o sertão, mas chama atenção que elas apresentarem apenas o
19 A Caatinga é o único bioma exclusivamente brasileiro. Andrade-Lima (1970) e a Empresa Brasileira de
Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) (1993) possuem trabalhos fundamentais na sua análise e classificação com
uma base geomorfológica e foco na vegetação. A partir dos seus esforços, Rodal e Sampaio (2002)19 afirmam
que a Caatinga ocupa um total de 935 mil km2 sendo, aproximadamente, 297 mil km2 de Caatinga hiperxerófila;
247 mil km2 de Caatinga hipoxerófila; 169 mil km2 de Caatinga mesclada com florestas subperenifólias,
subcaducifólias ou caducifólias; 110 mil km2 com Caatinga mesclada com Cerrado, 101 mil km2 com mistura de
Caatinga, Floresta e Cerrado e 22 mil km2 de Caatingas e campos de altitude.
12
semiárido. As demais regiões brasileiras que outrora foram chamadas de sertão, não estão
encontradas. Hoje, sertão é igual ao semiárido. É uma representação consolidada na
identidade brasileira e norteadora de discursos e práticas na região.
As ações governamentais e não governamentais, sejam aquelas tomadas e executadas em
conjunto ou ainda em iniciativas próprias, construíram um processo de governança no
semiárido com sérios problemas, uma vez que os dados apresentados confirmam que a gestão
vivenciada até o momento não garantiu uma melhoria dos índices que aferem a pobreza e a
qualidade de vida da população. Evidencia-se assim, a necessidade de se repensar e se
rediscutir a governança para que uma proposta de gestão mais adequada à melhoria da gestão
hídrica e da qualidade de vida seja apresentada. O uso da governança como uma estratégia de
co-gerenciamento vem sendo utilizada no Brasil, sobretudo a partir dos anos noventa do
século passado. Entretanto as pesquisas são, em sua maioria, sempre traçando um diagnóstico
de uma realidade ou a avaliação de ações pontuais. As discussões de proposição de um
modelo de co-gestão para o semiárido é ainda algo incipiente, salvo algumas contribuições da
chamada economia solidária.
II. Questão da pesquisa
A partir do que foi problematizado até aqui, buscou-se elaborar a pergunta que norteou a
pesquisa e, por conseguinte, permitiu chegar aos resultados que serão apresentados nos
capítulos que se seguirão a essa introdução.
Perguntou-se então qual deve ser o papel do Estado, nos seus três níveis de atuação federal,
estadual e municipal, em um processo mais adequado de gestão hídrica no semiárido
brasileiro que permita à região um desenvolvimento social e econômico em direção a um
processo de tomada de decisão mais descentralizado e uma governança sustentável da água?
III. Objetivos
Uma vez elaborada a pergunta norteadora da pesquisa e as hipóteses, definiu-se como
objetivos os que seguem.
13
Objetivo Geral
Propor uma reflexão que contribuana elaboração de um modelo de gestão sustentável da água
para o semiárido brasileiro visando uma governança hídrica exequível para os atores
implicados e respeitando as características sociais, econômicas e culturais da região.
Objetivos específicos, propôs-se:
Estudar o fenômeno das secas na região semiárida do Brasil através do tempo;
Analisar a construção das representaçõesterritoriais por parte da população, do Estado
e da sociedade civil organizada sobre o semiárido através do seu entendimento como
sertão em um século;
Entender o papel da atuação da sociedade civil organizada nas últimas três décadas
como um contraponto e, ao mesmo tempo, uma alternativa no processo de
descentralização da gestão no semiárido;
Analisar de maneira multiescalaro processo de gestão hídrica vivenciado no semiárido
e, por último,
Propor apontamentos para a construção de um modelo de cogestão da água, em seus
diferentes níveis (multiescalar) para o semiárido do Estado de Pernambuco que esteja
de acordo com as características naturais e culturais da região, bem como melhoria da
qualidade de vida da população.
IV. Hipóteses da pesquisa
Foram, então, construídas duas hipóteses,
1 - a gestão da água no semiárido brasileiro promovida pelo Estado, desde o início do século
XX, priorizou ações de intervenções territoriais de modificação do ambiente e ações pontuais
de urgência para minimizar situações críticas de seca em vez de privilegiar um modelo de
governança sustentável que permita a população buscar um desenvolvimento integral e
2 - a região semiárida pode contribuir como um laboratório de experiências e inovações
sociais na gestão compartilhada e integrada da água.
14
V. O território e período de análise
Estabeleceu-se também um recorte regional que permitisse alcançar os objetivos, uma vez que
se considera o semiárido como uma região grande, mesmo para os padrões brasileiros. Assim,
optou-se por estudar o semiárido no Estado de Pernambuco a partir da sua divisão
mesorregional20. O Estado está dividido em cinco mesorregiões: Metropolitana do Recife
(41,76por cento da população do estado); Mata (15,55por cento); Agreste (25,22 por cento);
Sertão Pernambucano21 (11,69por cento) e Sertão do São Francisco (5,68 por cento) (CPRM,
2014 : 74). As duas últimas são objeto de estudo dessa pesquisa e estão evidenciadas na figura
a seguir.
Fonte : Elaboração própria (2014).
Figura 2 - O semiárido no Estado de Pernambuco
Aqui então se estuda as mesorregiões do São Francisco e do Sertão, que possuem dinâmicas
diferentes entre si. A primeira, assim se chama por estar na área de influência do rio de
mesmo nome, fazendo um extenso uso das suas águas. A região do Sertão possui uma
20 Reconhece-se que a SUDENE possui uma divisão própria baseada nos critérios aprovados pelas Resoluções
do Conselho Deliberativo da SUDENE de nº 107, de 27/07/2017 e de nº 115, de 23/11/2017. Nessa resolução, o
semiárido pernambucano possui 123 municípios. Entretanto, a divisão da SUDENE engloba o que se conhece
atualmente por Agreste e aqui precisou-se trabalhar com o que se conhece por sertão, que será discutido,
principalmente no Capítulo 4. 21 Não confundir com o Sertão como denominação ao semiárido. No caso específico de Pernambuco, há uma
mesorregião que se chama Sertão e é ela a que se referencia nesse momento.
15
dinâmica diferente a essa pelo não acesso direto às águas do Rio São Francisco22, dependendo
de rios menores com regimes perenes ou da construção de repositórios d'água como açudes e
barragens. A região do Sertão possui quarenta e um municípios, enquanto a região do São
Francisco possui quinze (Anexo 1).
Pernambuco possui, ao todo, 185 municípios, dos quais 122 estão no semiárido, os demais
encontram-se nas áreas de Mata Atlântica e litoral. Do ponto de vista demográfico,
Pernambuco possui total de 8.796.448 habitantes, sendo 3.655.822 residentes no semiárido e,
por fim, deste total 2.376.320 residem em áreas urbanas e 1.279.502 nas zonas rurais. (INSA,
2011). É ainda um dos Estados que mais recebeu investimentos no seu semiárido, bem como
um local, reconhecidamente, importante nas políticas públicas. Do total de municípios do
estado, nenhum com nível muito alto de IDHM. Seis estão com alto nível de IDHM; setenta
com médio; um está muito baixo e os demais como baixo. Nenhum município do semiárido
possui alto nível de IDHM (ADH23, 2018).
Uma vez delimitado o recorte regional de estudo, partiu-se para o estabelecimento do recorte
temporal a ser contemplado. Estabeleceu-se o período que se incia em 1909 com a criação do
primeiro órgão estatal que atua diretamente no semiárido, a Inspetoria Federal de Obras
contra a Seca (IFOC) até 201824, por ser, notadamente, um século de profundas mudanças na
gestão hídrica do semiárido a partir das representações territoriais construídas.
A gestão hídrica no Brasil segue a lógica da atuação multiescalar. Isso posto, o Estado de
Pernambuco tem seus recursos hídricos, ora geridos pelo governo do Estado, ora por pelo
governo federal com influência da escala regional que, nesse caso, torna-se interestadual. Esse
complexo engendramento, aliado às decisões político-partidárias, a atuação das OSC'se dos
conselhos de gestão, tais como os comitês de bacias hidrográficas torna a gestão hídrica
complexa em sua execução.
22 Está em curso no Brasil, atualmente, o processo de transposição das águas do Rio São Francisco que projeta o transporte por canais das águas do referido rio para uma parcela do norte do Estado de Pernambuco e os Estados
da Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Entretanto, não se tem certeza se esse processo estará finalizado antes
do término dessa pesquisa. 23 Refere-se ao Atlas de Desenvolvimento Humano. 24 Inicialmente, não se havia delimitado claramente o recorte temporal, esperava-se que fosse 2015. Entretanto
com o impeachment da presidente Dilma Rousseff, iniciado em abril de 2016, iniciaram-se mudanças profundas
na gestão das águas no país. Assim, estabelecer esse marco temporal como fim das pesquisas tornou-se prudente.
No momento de término dessa tese percebe-se o caminho da privatização das águas no Brasil e uma diminuição
no poder participativo da sociedade civil organizada, porém entende-se que essas discussões, bem como o
comparativo entre o que se vivencia hoje e o passado são temas para pesquisas vindouras.
16
VI. Limites da pesquisa
Reconheceu-se que vários atores estiveram e estão presentes no processo de gestão hídrica do
semiárido. Até a segunda metade do século XX, a Igreja Católica exerceu forte influência na
tomada de decisão, principalmente no semiárido. Reconhece-se a importância de atores, mas
devido às escolhas e os limites necessários para a pesquisa, eles foram preteridos.
A presença indígena é sensível no semiárido. A produção de seus saberes foi de fundamental
importância tanto no processo de colonização como de sua resistência. A história indígena no
semiárido vem recebendo mais atenção nas últimas décadas na recuperação e valorização da
sua cultura em busca de uma existência mais digna na sociedade hodierna. Entretanto, essa
discussão não se aprofunda na tese por se tratar do processo de gestão da água a partir de uma
atuação do Estado, OSC's e Bacias Hidrográficas.
Outro limite foi o acesso aos dados que não estão disponibilizados online pelos governos
brasileiros para um território tão grande como o semiárido. Todos os órgãos de intervenção e
de pesquisas estatais possuem sítios na Internet e materiais impressos com o resultado de suas
experiências, bem como bibliotecas em suas sedes com acesso livre aos pesquisadores.
Algumas dessas publicações são acessíveis apenas mediante a visita as suas sedes ou
recebimento pelos correios. Para os dados que não foram obtidos em linha, buscou-se visitar
as instituições, sejam governamentais ou não governamentais e a solicitação por correio
eletrônico.
A literatura pesquisada foi, em sua maioria, em português. Em contrapartida, a maior parte
das fontes bibliográficas teóricas estavam em francês e inglês, o que demandou o esforço de
aprendizagem e aprofundamento nos dois idiomas. Isso resulta em disponibilizar, em
português, autores e teorias pouco ou nunca estudadas no Brasil.
A gestão dos recursos hídricos no Brasil é, por deveras, complexa. Quando se trata, por
exemplo, dos organismos que gerem a água nos municípios, encontra-se presente as
autarquias com o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) e as empresas estaduais como
a Companhia Pernambucana de Saneamento (COMPESA) em Pernambuco que também
17
dispõem da gestão do saneamento e dos serviços de provimento de água potável para as
populações. Desde já, estabelece-se que essas ações não são temas dessa tese.
Ao se tratar dos órgãos estatais que atuaram no semiárido, não se fez um levantamento
extensivo de todos os seus projetos. Entende-se que esses órgãos possuem histórias ricas e
complexas, bem como suas atividades estão difusas no espaço e cada uma, merece um estudo.
São incontáveis os programas, projetos e ações estatais em todo o semiárido brasileiro. Deu-se
atenção, por outro lado, ao que direcionava as tomadas de decisões e ações para o semiárido.
Para essa tese, importa as representações territoriais que direcionaram as atuações dos órgãos,
o que será tratado no capítulo seis.
Não se pretendeu, também, analisar todos os programas, projetos e ações que foram
desenvolvidos para o Nordeste. Desde já se sabe que o foco é a gestão hídrica do semiárido,
mesmo entendendo que ela toca todo o desenvolvimento da região.
Há certamente dificuldades em se lidar com esse recorte geográfico, uma vez que os recursos
hídricos exigem a gestão compartilhada com a administração pública, órgãos de saneamento,
instituições ligadas à atividade agrícola, gestão ambiental, entre outros, e a cada um desses
setores corresponde uma divisão administrativa certamente distinta da bacia hidrográfica
(Porto e Porto, 2008 : 44-45). Por isso, um dos limites aqui estabelecidos foi o de tratar de
como o CBHSF gere os recursos hídricos para o Estado de Pernambuco.
VII. Justificativa e contribuição da pesquisa
A partir do conhecimento prévio sobre o sujeito e da pesquisa, buscou-se a construção de um
quadro teórico-metodológico pouco utilizado no Brasil e, especificamente, inédito para o
semiárido brasileiro. Espera-se que este quadro possa, pelo seu ineditismo, abrir novos
horizontes sobre as análises da gestão da água no semiárido brasileiro. Assim, a maior parte
dos autores tratados no quadro teórico não são, recorrentemente, discutidos no Brasil. Essa
contribuição é, desde já, pontuada.
Parte-se da necessidade de construir uma proposta de gestão que seja possível dentro da
dinâmica regional do semiárido brasileiro, respeitando as culturas que há séculos se
desenvolvem localmente, ou seja, entendendo que um modelo aplicado com êxito em uma
18
localidade não corresponde a um modelo padrão a ser seguido. Sendo assim, faz-se necessário
construir um modelo de gestão hídrica que atenda às demandas ambientais, sociais e
econômicas locais entendendo que cada localidade está inserida em um contexto diferente e
possui características próprias. O semiárido não é homogêneo e assim deve ser pensado.
Nesse sentindo, a Geografia é a ciência que possui o melhor arcabouço teórico-metodológico
para essa tarefa, possibilitando uma análise que leva em conta o ambiente e a população; o
Estado e a sociedade civil organizada; o passado, o presente e a projeção sobre o futuro.
Possibilita ainda abarcar o rural, o urbano, o econômico, o político e o ambiente físico.
Contribui-se, assim, ao aprofundamento dos estudos geográficos brasileiros a partir das inter-
relações das suas subáreas em uma realidade tão complexa como a vivenciada no semiárido.
A opção própria de buscá-los fora do Brasil, onde essa pesquisa poderia ser realizada,
evidencia esse esforço. Fazer uso da visão do Estado desenvolvida por James Scott foi uma
escolha para entender como o estado brasileiro pensou e atuou no gerenciamento do seu
território. A perspectiva do autor nunca foi aplicada no Brasil e até onde se tem
conhecimento, suas obras sequer foram traduzidas para o português. Ressalta-se também o
estudo das representações territoriais que ainda não se consolidaram no Brasil. Os autores
utilizados nesse tese ainda são pouco conhecidos na academia brasileira.
VIII. A apresentação da tese
O primeiro capítulo apresenta o marco conceitual da tese. Estabelecem-se como os principais
conceitos foram e são entendidos ao longo da pesquisa. Aqui, pretende-se clarificar o que se
entender por Estado, diferenciado-o de governo, bem como eles são entendidos no Brasil;
Organização Social Civil e suas diferentes ramificações, com destaque às Organizações Não
Governamentais; Gestão territorial e como ela imbrica o Estado e a sociedade; a Análise
Multiescalar, fundamental no entendimento da gestão que envolve o nacional, o regional, o
estadual e o local; a definição do que é semiárido e como ele se materializa no mundo e,
particularmente, no Brasil e, por fim, a seca e seus impactos, colocando em tela os diferentes
tipos de seca e como se materializam do ponto de vista hídrico e sócio-econômico.
O segundo capítulo traz o quadro teórico da pesquisa. Nele, apresentam-se e justificam-se as
escolhas teóricas a partir de uma breve revisão de literatura. Contextualiza-se as opões de se
19
trabalhar com a teoria das representações territoriais e suas interfaces com a Geografia. Essa
teoria ainda é pouco utilizada no Brasil e, certamente, uma novidade para a compreensão do
sertão como construção simbólica e, igualmente, do semiárido. Em seguida, discute-se a
governança como um processo de descentralização no processo de tomada de decisão. Essa
teoria é fundamental para o entendimento da gestão hídrica. Por fim, apresenta-se a visão do
Estado proposta e desenvolvida por James C. Scott. Essa teoria procura compreender como o
estado vê e pensa o território e, consequentemente, como toma as suas decisões. Essa
abordagem é, particularmente, interessante, uma vez que também é pouco utilizada no Brasil.
O terceiro capítulo traz a metodologia construída e desenvolvida na tese. A apresentação e
discussão dos procedimentos seguem de forma a contemplar todo o caminho percorrido para
se atingir os objetivos propostos que foram dispostos como resultados e partir do capítulo 4.
Então, nesse sentido, o capítulo 3 traz o estudo de caso como estratégia de pesquisa; os
instrumentos de coleta de dados; as fontes e coleta de dados, quais sejam as oriundas de
governamentais, das organizações sociais civis e do CBHSF (as atas de plenárias e as
entrevistas com os membros da Câmara ConssultivaRegional doSubmédio São Francisco).
Em seguida, apresentam-se a estratégia de tratamento dos dados através da análise de
conteúdo dos documentos e entrevistas e os todos de apresentação dos resultados. Por fim, são
apresentadas as variáveis e indicadores da pesquisa.
No quarto capitulo, tem-se a delimitação ambiental e legal do semiárido. Tratam-se,
inicialmente, da aridez, com sua definição e distribuição no mundo e o clima do semiárido
brasileiro. Logo após, tem-se a caracterização ambiental do semiárido dividido a seguinte
ordem: o relevo; os solos, a Caatinga como o principal bioma; as redes hidrográficas; os
brejos de altitude como áreas de exceção; as ecorregiões e as unidades Geossistêmicas. Posto
isso, partiu-se para a delimitação legal do semiárido com as leis e decretos que o definiram.
A partir desse momento, entra-se no processo de entendimento da construção e da gestão
hídrica no semiárido. Os dados levantados, analisados e sistematizados são apresentados em
quatro capítulos em sequência, entre os capítulos cinco e oito.
O quinto capítulo apresenta como foram construídas as representações territoriais do
semiárido brasileiro ao logo de sua história. As representações são fundamentais para
entender como os recursos hídricos foram geridos no estado de Pernambuco. A construção
20
seguiu, primeiramente, com a discussão do semiárido e do sertão no pensamento brasileiro. A
partir desses contextos, buscou-se evidenciar a origem e o uso do termo sertão como
designador do semiárido brasileiro. Em seguida, apresenta-se a construção e consolidação das
quatro representações territoriais do semiárido, a saber: o sertão como fronteira da
colonização e dos espaços vazios; o sertão como uma região problema; o sertão como
representação do passado e dos espaços das memórias e o sertão da sustentabilidade na
convivência com o semiárido. Essas representações nortearam a análise da gestão dos
recursos hídricos no semiárido brasileiro.
O sexto capítulo discute as representações territoriais que guiaram a visão do estado brasileiro
em direção à construção das políticas de gestão da água. Essa visão se materializa na
multiescala de análise, tendo o Brasil como um todo na escala nacional e o semiárido numa
escala regional. Inicialmente, têm-se bases legais da gestão hídrica no Brasil e a lei de águas
como aparato legal para a gestão dos recursos hídricos. Em seguida, aponta-se a visão do
Estado, em nível federal, na gestão dos recursos hídricos no Brasil com ênfase nas obras de
combate à seca no semiárido (represamento e deslocamento da água e a transposição do Rio
São Francisco). Por fim, discute-se a ação multiescalar na descentralização da tomada de
decisão
No sétimo capítulo, tem-se o contraponto à gestão estatal que são as ações da sociedade civil
organizada através das OSC's. Nesse capítulo, se mostra a construção do pensamento voltado
à convivência com o semiárido iniciado nas últimas décadas do século passado; a valorização
dos saberes locais; a institucionalização das ações das OSC's e o processo de descentralização
da gestão hídrica.
O oitavo capítulo discute o processo de governança da água no semiárido de Pernambuco a
partir da CBHSF, com foco da CCR do Submédio São Francisco. Então, há, inicialmente, o
processo de construção dos comitês de bacias hidrográfica no Brasil e, em particular, os
comitês da bacia do rio São Francisco com suas câmaras consultivas regionais. Em seguida,
discute-se, a partir das entrevistas coletadas a análise das atas a atuação da CCR do submédio
São Francisco com destaque nas percepções e objetivos dos seus membros; as estratégias para
a tomada de decisão; a participação cidadã e dos membros no comitê; as tomadas de decisão;
o Estado de Pernambuco na gestão da CCR e, por fim, a avaliação da gestão a partir da bacia
21
hidrográfica. O capítulo se encerra com a discussão sobre as representações territoriais e a
governança da água no CBHSF.
No nono capítulo, faz-se uma reflexão a partir das lições aprendidas no decorrer da pesquisa
para a construção de apontamentos para um modelo de governança da água para o semiárido.
Esse capítulo é o resultado da aferição de dados e de um intenso processo de reflexão que
buscou entender como o semiárido foi construído e representado territorialmente. Buscou-se,
ainda, compreender como os recursos hídricos de um território foram gerenciados em diversas
temporalidades, mas com foco em Pernambuco. O resultado está organizado em sete eixos:
Mudança na visão do território semiárido; Entrelaces institucionais entre os órgãos
governamentais e as instituições públicas de ensino; Institucionalizar da gestão hídrica através
das leis; Consolidar a cultura da antecipação dos problemas; Participação popular na gestão
hídrica; Economia que não escasseie ou deprecie os recursos hídricos e Descentralizando na
tomada de decisão.
Por fim, as conclusões do trabalho em tela busca discutir os resultados a partir da
problemática apresentada na introdução, da verificação das hipóteses, dos resultados obtidos e
analisados ao longo dos capítulos e, por fim, apontam as lacunas para pesquisas futuras.
22
Capítulo 1 - Marco conceitual da pesquisa
Este capítulo objetiva apresentar de maneira sintética os conceitos que são utilizados na tese.
Em absoluto, objetiva-se fazer uma revisão literária ou uma discussão mais aprofundada sobre
cada conceito, pelo contrário, optou-se pela objetividade em suas apresentações.
Com a necessidade de verificação das hipóteses de pesquisa, construiu-se o quadro conceitual
em seis noções, a saber: o estado, a sociedade civil organizada e organizações não
governamentais, a gestão territorial, a análise multiescalar, a aridez com suas definições e
distribuições pelo mundo e, por fim, a seca.
1.1. O Estado
O Estado é uma palavra que exige outras palavras para explicá-lo em termos de teoria e
pensamento. No passado, o estado estava atrelado às ideias de virtude, ordem. Hoje é a ideia
de soberania, poder, lei, administração. O Estado é um conceito-chave nesta pesquisa, uma
vez que são suas ações, bem como a ausência delas que caracterizam o processo de gestão do
semiárido brasileiro. Entende-se que diferentes configurações aconteceram através de
temporalidades e espacialidades distintas, porém trabalha-se aqui com a noção do estado
moderno baseado na ideia de nacionalismo que foi, evidentemente, implementado no Brasil
(Creveld, 1999).
Entende-se o Estado como "um conjunto centralizado de instituições que facilitam o poder
coercitivo e a capacidade de governabilidade sobre um território definido25" (Gregory et al.,
2009 : 722). Sendo mais abrangente, tem-se o Estado como um conjunto de instituições e seu
pessoal; possuidor de um grau de centralidade, com decisões políticas oriundas do seu centro;
uma fronteira definida que demarca os seus limites territoriais e o monopólio coercitivo do
poder e da habilidade de criar leis (Jones et al., 2004).
Esse conceito é largamente baseado nas experiências europeias de construção dos Estados-
Nações nos últimos séculos, com influências das idiossincrasias e temporalidades distintas ao
longo do processo.
25Traduçãolivre de: "a centralized set ofinstitutionsfacilitatingcoercivepower and governingcapabilitiesover a
definedterritory".
23
A afirmação obtida na organização de alguns países do centro da economia-
mundo capitalista acabou por fazer do modelo ocidental do Estado-Nação a forma
por excelência do exercício legítimo do poder e da representação política,
consolidado pelas disputas e acordos interestatais na arena das relações
internacionais. Contudo, tal modelo formal se confrontou - nos diferentes
quadrantes do globo - com comunidades, identidades e tradições prévias, algumas
estabelecidas há muito tempo, e muitas desconhecendo limites político-territoriais
semelhantes aos vigentes na Europa (Said, 1995 apud Moraes, 2006 : 42).
O exposto acima é vastamente documentado no processo de colonização dos autóctones das
américas pré-chegada europeia e a consequente apropriação dos seus territórios. Este processo
levou alguns séculos a depender de cada contexto, mas findou, principalmente no século XIX,
na constituição dos países de todo o continente. Como afirma Moraes (2006 : 42), "na escala
mundial, os arranjos institucionais de poder territorial efetivo se multiplicam em diferentes
projetos e estruturas de Estado, todos buscando amparo no argumento formal de
representarem uma "soberania popular" legítima (de base religiosa, étnica, linguística, etc.).
Assim, "configura-se um Estado quando coexistem os três elementos elementos: povo,
território e governo" (Andrade, 2007 : 9).
Para Costa (2013 : 53),
Estados totalitários ou democráticos, ao longo da história, nasceram ou tornaram-
se centrais, pois o seu desenvolvimento implicou sempre um conjunto de
processos políticos de concentração de poder, face à vida privada dos cidadãos,
dos lugares, etc. A antítese desse processo é o não Estado.
Assim, para Castro (2005 : 118),
O Estado é na realidade uma instituição e como tal está inscrito nos tempos do território
e da sociedade. É desta inscrição que resulta o processo de transformação a que ele se
encontra frequentemente submetido. Como a relação entre forma institucional Estado,
por princípio, incorpora a dinâmica das mudanças, mesmo que nele elas sejam mais
lentas do que aquelas que ocorrem na sociedade.
Particularmente no Brasil26, o Estado é constituído da sociedade política, incluindo o governo
e possui as funções executiva, legislativa e judiciária. A atuação estatal é centralizada em
nível federal, comandando as ações em nível regional e ainda normatizando as ações locais. A
26 Há diversas perspectivas de se entender o Estado, com destaque no Brasil, a de Max Weber que o vê como
uma comunidade humana que, com sucesso, reivindica o monopólio do uso legítimo da força em um
determinado território (Greth e Mills, 1978 apud Jones e MacLeod, 2004) e a de Antonio Gramsci certamente a
mais utilizada na discussões sobre as ações estatais aqui se destacando no que tange a questão regional, ou seja,
"é necessariamente uma questão do Estado, à medida que sua resolução passa, necessariamente, pela composição
do bloco no poder e pelas medidas de políticas públicas que afetam a economia nacional e a distribuição
territorial da renda" (Egler, 2000 : 209).
24
origem dessa estrutura escalar remonta à formação da república brasileira no século XIX que
tinha no Estado como o único com poder de pensar e intervir territorialmente27.
Por fim, soma-se o conceito de governo, aqui entendido como um grupo político que está no
comando de um Estado momentaneamente, possuindo função executiva e se ocupando em
gerir os interesses sociais e econômicos da sociedade. De acordo com sua orientação
ideológica, os governos estabelecem níveis maiores ou menores de intervenção no território e
na economia (Rocha, 2009), bem como de centralização e descentralização da tomada de
decisão.
O Brasil possui um regime presidencialista, onde o chefe de Estado é ainda o chefe do
governo. Em cada estado, possui um governo e, em cada município, uma prefeitura. Para
todos os casos, há eleições em intervalos de quatro anos, havendo possibilidade de reeleição
para mais um mandado, caracterizando-se assim como uma democracia representativa. Em
suma, a atuação no território do ponto de vista legal segue a atuação em três escalas:
municipal, estadual e federal e não é raro elas se sobreporem ou haver divergências e
desarranjos institucionais. "Considera-se como um estado federal aquele que as unidades
administrativas que o compõem gozam de autonomia, embora não possam considerar-se
independentes" (Andrade, 2007 : 9).
1.2. Sociedade Civil Organizada e Organizações Não Governamentais
Entende-se como sociedade a composição de cidadãos que usufruem dos direitos civis e
políticos garantidos pelo Estado, bem como desempenham os deveres que as leis e normas de
conduta exigem e possuem um sentimento de grupo e de pertencimento a uma composição
social (Schmidt. 2006). Entretanto, nas sociedades modernas, há um processo de
individualização significativa que pode dificultar as ações em prol do coletivo ou mesmo o
sentimento de "não no meu quintal"28 que distanciam muitos indivíduos da sensibilização com
as causas coletivas.
27 O próprioprocesso de institucionalização da Geografia no Brasil, seguiu o interesse do estado em expandir
seusconhecimentos para a inclusãoeconômica e política de localidades poucoconhecidas do poder central. 28Tradução da expressão em inglês "not in mybackyard" que significa refutar o que considera negativo e esteja
próximo fisicamente, no caso, um quintal. Mas não se interessa pelos mesmos temas se estãolonge. No Brasil, é
pouco difundida.
25
Como contraponto, tem-se as associações de sociedade civil organizada, notadamente,
organizações coletivas com diferentes objetivos e graus de formalização que buscam maior
eficiência à ação governamental, seja tentando eleger candidatos com maior afinidade às suas
propostas, seja através da pressão nas bases políticas ou diretamente no campo legislativo.
Buscam, a priori, promover oportunidades para as trocas de conhecimento e cooperação entre
seus participantes e confronto de ideias para possíveis ações coletivas, onde os cidadãos
aprendem e exercitam valores e práticas democráticos (Schmidt, 2006).
No Brasil, atualmente, as principais formas de organização social civil são os Movimentos
Sociais, as ONG's, as Organizações Sociais (OS) e as Organizações da Sociedade Civil de
Interesse Público (OSCIPS). Cada uma atuando à sua maneira de acordo com os objetivos que
traçam para si.
Os movimentos sociais são, em geral, organizações que representam classes ou grupo de
indivíduos. No Brasil, como exemplos de Movimentos Sociais tem-se os Movimentos
Feministas, os Movimentos pelo Respeito à Diversidade, o Movimento Sem Teto, Os
Movimentos dos Trabalhadores Sem Terra e o Movimento Negro. As Organizações Sociais
são um modelo de organização pública não estatal
destinado a absorver atividades publicizáveis mediante qualificação específica.
Trata-se de uma forma de propriedade pública não estatal, constituída pelas
associações civis sem fins lucrativos, que são propriedade de nenhum indivíduo
ou grupo e estão orientadas, diretamente, para o entendimento do interesse público
(MARE,1997 : 13).
A OSCIP é um título fornecido pelo Ministério da Justiça do Brasil, cuja finalidade é facilitar
o aparecimento de parcerias e convênios com todos os níveis de governo e órgãos públicos
(federal, estadual e municipal) e permite que doações realizadas por empresas possam ser
descontadas no imposto de renda. As OSCIP são ONG criadas por iniciativa privada, que
obtêm um certificado emitido pelo poder público federal ao comprovar o cumprimento de
certos requisitos, especialmente, aqueles derivados de normas de transparência
administrativas. Em contrapartida, podem celebrar com o poder público os chamados termos
de parceria, que são uma alternativa interessante aos convênios para ter maior agilidade e
razoabilidade em prestar contas. Uma ONG, essencialmente, é uma OSCIP, no sentido
representativo da sociedade, mas OSCIP trata de uma qualificação dada pelo Ministério da
Justiça no Brasil (Instituto Alfa Brasil, 2014).
26
As ONG que são entidades privadas e sem fins lucrativos, contando com participação
voluntária e se diferenciando do Estado, governo, mercado e empresas (Scherer-Warren,
1994). Ainda se diferenciam dos Movimentos Sociais por não serem representativas de
classes ou de indivíduos (Fernandes, 1995). Seus agentes são privados e seus fins são
públicos. Tem como objetivo oferecer serviços à sociedade e, geralmente, não são
autossustentadas financeiramente e assim necessitam buscar fundos através de doações
privadas, do Estado ou de outras organizações (Schmidt. 2006). Tal particularidade torna seu
papel na sociedade tão fundamental como complexo, uma vez que em certos momentos seus
interesses colidem com interesses estatais, porém são recursos também do Estado que as
mantêm. Constrói-se, assim, uma dinâmica particular, principalmente no contexto brasileiro.
1.3. A Gestão Territorial
Há quase um consenso entre pesquisadores que possuem o espaço como objeto de estudo de
que o território é um dos seus conceitos mais importantes no entendimento das relações poder
no espaço utilizado, organizado e gerenciado por um grupo social, indivíduo ou instituições
que restringem e controlam acesso a pessoas e lugares (Egler, 2000; Moraes, 2005; Santos e
Silveira, 2001). A existência de um território "pressupõe a existência de relações de poder,
sejam elas definidas por relações jurídicas, políticas ou econômicas" (Egler, 2000 : 215).
Os territórios são, particularmente, associados aos estados modernos que reivindicam controle
absoluto sobre uma população com fronteiras externas bem definidas (Buchman e Moore,
2003 apud Gregory et al., 2009). Porém, para isso acontecer duas premissas são
fundamentais. A primeira diz respeito às entidades políticas, aquelas que não conseguem um
mínimo de soberania29 sobre um território contínuo, normalmente não tem seus atores
políticos reconhecidos e assim não são legitimadas. A segunda premissa diz respeito ao
reconhecimento, o território de um estado necessita ser reconhecido por outros estados. Esses
atributos criaram um mundo no qual não se pode haver território sem estado (Gregory et al.,
2009; Scott, 1998), sendo o Estado que o gerencia.
A gestão é entendida aqui como "diferentes processos de tomada de decisão dos atores
sociais, econômicos e institucionais de um determinado âmbito espacial, sobre a apropriação e
29 Soberania é aqui entendida como a reivindicação final e definitiva sobre uma comunidade política.
27
uso dos territórios. Em geral, resulta desses processos a definição sobre as estratégias de
desenvolvimento". Com isso, a gestão "precisa ser entendida como um processo de gestão de
diferenciadas visões de mundo e interesses conflituosos que têm origem em diferentes escalas,
com vistas ao desenvolvimento territorial" (Dallabridaet al., 2009 : 2).
Posto isso, chama-se então atenção para a necessidade de observar, identificar e analisar o
processo de gestão e a consequente distribuição de poder. Nesse sentido, Brandão (2004)
contribui com algumas questões conceituais sobre a gestão. Para o autor é necessário se
estabelecer quais são os atores, agentes e sujeitos da gestão; quais são seus interesses
concretos, seus instrumentos táticos e estratégicos; em que escala espacial eles atuam; os
fenômenos estudados se dão em que escala espacial; em que escala esses fenômenos se
manifestam (local, metropolitana, nacional) e, por fim, onde estão os centros de decisão e
comando determinantes dos fatos territoriais sob análise. Esses pontos aproximam,
claramente, a gestão territorial da análise multiescalar.
1.4. A Análise Multiescalar
Os problemas de conceituação e definição de escalas são freqüentes, isso acontece porque as
escalas cartográficas, ou seja, aquelas dos mapas, exprimem a representação do espaço como
forma geométrica, enquanto a escala geográfica exprime a representação das relações que as
sociedades mantém com esta forma geométrica (Souza, 2013; Howitt, 2006; Castro, 1996).
Nesta tese, trabalha-se com geográfica, enquanto a cartográfica será a informação contida nos
mapas e cartas aqui utilizados.
Destaca-se que diferencia-se aqui a escala cartográfica como a "relação matemática que existe
entre as dimensões de um objeto qualquer no mundo real e as dimensões do desenho que
representa o mesmo objeto, como se visto do alto, em um mapa (ou carta, ou planta)" (Souza,
2013 : 179-180) da escala geográfica aqui entendida como o não fracionamento "da divisão de
uma superfície representada em um documento cartográfico, mas sim com a própria extensão
ou magnitude do espaço que se está levando em conta (idem : 181)30.
30 Tem-se em mente que existem autores como Smith (1993), por exemplo, que defende a existência de sete
escalas, sendo estas a do corpo, da residência, do urbano, da região, da nação e do global, mas não é o foco desta
tese analisar nesse nível de diferenciação de escalas.
28
Entende-se que "diferentes escalas estão associadas a diferentes papéis institucionais e a
escolha da escala, bem como o estabelecimento das fronteiras não são politicamente
neutros31" (Wilbanks, 2006 : 7-8), com isso, "a construção social da escala afeta as paisagens
culturais e políticas32" (Howitt, 2006 : 138). A constatação deste arranjo permite assumir que
a complexidade das relações entre sociedade com a natureza não podem prescindir de uma
análise que seja multiescalar.
Há necessidade de se identificar as escalas33 e entendê-las a partir das suas interações. Nas
definições de escalas, estabelecer o que é local, regional ou internacional nem sempre é uma
tarefa simples, uma vez que a própria perspectiva do regional não prescinde sempre de uma
delimitação do espaço com aferições predefinidas. Nas grandes escalas há uma tendência à
valorização do vivido e da heterogeneidade, enquanto nas pequenas escalas percebem-se a
organização e a homogeneização.
Sendo assim, tanto a homogeneidade como a heterogeneidade são resultados da perspectiva
de observação, resultado de uma escolha que deve ser consciente e explicitada. Por isso, ao se
tomar a ação estatal, sabe-se que esta está em uma escala gerencial que envolve o poder
federal, estadual e municipal atuando sobre o mesmo território. Por outro lado, a sociedade
civil organizada atua em uma escala predeterminada por cada organização, porém quase
sempre se manifestando em ações locais.
Por um longo tempo assumiu-se que a escala era uma questão de tamanho ou nível e
o que emerge da literatura recente é que a escala é proeminentemente uma questão
de relação e que a esta abordagem que procura resumir esta dimensão com rótulos
tais como global ou local sem se envolver com o que é realmente abrangido no
contexto pelo termo, vai realmente perder a substância do termo e o fenômeno que
representa34 (Howitt, 2006 : 151).
31Tradução livre de: "a different scales are related to different institutional roles and the choice of scale and a set of boundaries is not politically neutral". 32 Tradução livre de: "social constructionofscaleaffects cultural andpoliticallandscapes". 33 Mesmo que existam autores que defendam que as escalas não existem, como o fez Boudon (1991 : 186) apud
Castro (1996 : 133) ao tratar da arquitetura. Para o autor, "ela é por natureza multiplicidade, e como tal
irredutível a um principio único, a menos que um tal princípio seja arbitrariamente colocado. As discussões que
envolvem escalas locais e globais tiveram um acréscimo a partir dos anos 90 do século passado". 34Tradução livre de : What emerges from the recent literature is that scale is pre-eminently a matter of relation,
and that approaches which seek to summarize this dimension with the gloss of labels such as “global" or
“local” without engaging with what is actually encompassed in context by the term, will actually miss the
substance of the term and the phenomenon it represents.
29
A proposta de visualização dos fenômenos em escalas de análises geográficas é frequente na
literatura. Flint e Taylor (2007) trabalham com três escalas: a local como experiência, a
nacional como ideologia e a global como realidade35. A partir do princípio de que uma visão
de escala tendo, ao menos três dimensões, o tamanho, o nível e a relação, Howitt (2006)
reforça a importância das relações sociais na construção das escalas. Souza (2013) aponta que
a escala geográfica subdivide-se em escala do fenômeno, escala de análise e escala de ação. Já
Cox (1998) sugere que não é só a construção social da escala que importa, mas a construção
social das políticas de escala. Fazendo uso do foco nas instituições da governança local, o
autor identifica uma divisão da escala social".
Em uma análise multiescalar, a escolha da escala ou das escalas depende de três antecipações.
A primeira se refere à escala gráfica, ou seja, aquela dos mapas, definida a partir do problema
da pesquisa. A segunda é de ordem metodológica, por ser a escala da coleta dos dados, onde
os padrões e processos podem ser classificados de acordo com sua escala de operação,
podendo operar em múltiplas escalas e qualquer processo de uma escala pode estar em
intersecção com outros processos em diferentes escalas. Por fim, a antecipação, que é assumir
que as escalas são socialmente, produzidas, com isso, entender que escalas espaciais não são
plataformas fixas para as atividades sociais e processos que conectam em seus níveis de
hierarquia para cima e para baixo, mas são resultados dessas atividades e processos para os
quais contribuem através de uma espacialidade desigual e o desenvolvimento temporário das
dinâmicas (Castro, 1996; Gregory et al., 2009). A realidade dos fenômenos dar-se em
diferentes espacialidades, justificando assim a análise multiescalar.
Entender a governança de uma determinada região ou território ao longo do tempo, pressupõe
o entendimento das fenômenosmultiescalares, uma vez as estas mudam de acordo com a sua
escala. A escolha das escalas possibilita identificar e analisar o que muda e, principalmente, o
alcance espacial de tais mudanças. Com isso,
a combinação resultante é a proliferação de escalas e da complexidade escalar,
mais do que qualquer substituição de escalas nacionais por uma escala global de
ação. O resultado é uma nova disputa entre espacialidades que incluem fluxos de
capital internacional, blocos de economia regional, o espaço de transações
35 Uma proposta que segundo os autores seria uma verticalidade em comparação à horizontalidade (centro, semi-
periferia e periferia) de Wallerstein. Esta proposta não defende a existência de três processos operando em três
escalas, mas de um processo que se manifesta nas três escalas, defendem ainda que isso acontece quando as
necessidades são sentidas localmente, justificadas nacionalmente para benefícios globais.
30
corporativas, normas e padrões globais, novos localismos, tribalismos, um
nacionalismo ressurgente e assim por diante36 (Amin, 2002 : 387).
Assim um mesmo lugar, a depender de como se o observa e analisa, está presente em diversas
escalas distintas. Essas escalas se sobrepõem quando diferenciamos o lugar em comparação
ao global, ao nacional e até nas interações locais. O objetivo da observação e análise, assim,
permite estabelecer em que nível escalar o lugar será entendido. Aqui se baseia na ação
multiescalar desenvolvida por Wilbanks, (2006); Lebel (2006) e Boyd (2006).
Tem-se em mente que a escala pode se apresentar como um problema porque normalmente é
estabelecida no momento operacional da pesquisa. Entretanto, "lugares são mais do que seus
conteúdos e o que acontece neles são mais do que a soma das práticas e poderes localizados e
ações em outra escala espacial37" (Amin, 2002 : 395). Com isso, a escolha da escala levou
mais em consideração o que ocorre na gestão hídrica do que o mero exercício de fazer um
recorte no espaço para analisá-lo.
Posto isto, se estabelece aqui que a análise multiescalar trabalhada nesta tese leva em conta as
ações locais de um estado do Brasil, mas a tomada de decisão é feita em três níveis (federal,
estadual e municipal). A dinâmica da tomada de decisão em múltiplas escalas segue a análise
dos processos propostas por Wilbanks (2006). O uso das escalas se faz aqui fundamental. A
sobreposição de competências, deve-se se incluir a escala regional. Há uma clara definição do
que é nacional, estadual e municipal no país. Mesmo com os problemas de ordem prática, essa
definição pode ser utilizada como parâmetro para dirimir dúvidas. Entretanto, a escala
regional predispõe a necessidade do governo federal dialogar com vários governos estaduais,
assumindo que o recorte regional ultrapassa as fronteiras territoriais de cada estado. Quando
isso acontece, há uma confusão ainda maior sobre de quem é a competência e, principalmente,
quem vai gerenciar os recursos oriundos do governo federal para obras de impacto e interesse
regional. Posto isso, a cada momento da gestão, se faz necessário estabelecer também a sua
escala.
36Tradução livre de :The combined outcome is a proliferation of scales and scalar complexity, rather than any
simple replacement of national scales by a global scale of action. What results is a new jostling between
spatialities, which include international capital flows, regional economic blocs, virtual regions, the spaces of
transnational corporations, global norms and standards, new localisms, tribalisms, and resurgent nationalisms,
and so on. 37Tradução livre de :places are more than what they contain, and what happens in them is more than the sum of
localised practices and powers, and actions at other ‘spatial scales’.
31
1.5. A aridez - definição e distribuição no mundo
A aridez38 pode ser definida de várias formas. A mais comum leva em conta o quantitativo de
precipitação anual como principal critério numa perspectiva mais simples ou a eficácia do
impacto das chuvas numa versão mais complexa. De maneira mais simples, a aridez é
definida pela precipitação anual. As áreas secas são então estabelecidas como áridas e
semiáridas com o máximo de 200 mm para as zonas áridas e entre 200 mm e 500 mm para as
zonas semiáridas. De maneira mais complexa, o uso da precipitação anual simples é
substituída pela expressão e efetividade da chuva. Isto se consegue ajustando os dados de
precipitação anual (em milímetros) pela própria evaporação refletida na temperatura,
estabelecendo-se um índex climático (Verheye, 2004).
A partir do que se estabelece por aridez, pode-se definir os seus diversos níveis no mundo e,
consequentemente, entende-se que "as terras secas são classificadas pelo índice de aridez39,
desenvolvido por Thornthwaite40 em 194141. Segundo este índice, os climas podem ser
classificados42 como hiperárido, árido, semiárido, subúmido seco, subúmido úmido e úmido.
As áreas secas ocupam cerca de um terço da superfície terrestre como pode ser visto na
imagem a seguir.
38 Ressalva-se que "a semi-aridez tem sido julgada conforme critério de cada especialista que estudou uma parte
do mundo. Muitas vezes os dados de investigações semelhantes em países diferentes não foram colhidos de
maneira confrontável. Dai a razão por que as denominações de regiões ecológicas secas, semi-áridas e sub-
úmidas do mundo não demonstrarem relativa concordância" (BNB, 2005 : 11). 39O índice é calculado dividindo-se a quantidade de precipitação média anual pela evapotranspiração potencial
média anual" (Carvalho, 2012 : 61) Para se chagar ao resultado, são necessários, no mínimo, 30 anos de dados e
informações coletados sobre um mesmo lugar. 40 Sistema de classificação climática proposta pelo pesquisador e professor Charles Warren Thornthwaite. 41 Essa metodologia foi desenvolvida por Thornthwaite e Holzman (1941) e, em 1977, já era considerada para
fins de aplicação do Plano de Ação de Combate à Desertificação (PACD) elaborado pelas Nações Unidas em
resposta às consequências da grande seca que assolou o Sahel (região da África situada entre o deserto do Saara
e as terras mais férteis a sul) no início dos anos de 1970. O índice teve sua fórmula posteriormente ajustada por
Penman (1953) e subsidiou a classificação utilizada para elaboração do “World Atlas ofDesertification” (Torres e
Pfaltzgraff, 2014 : 173). 42 Existe ainda a classificação proposta por Hare (1985) que faz uso de uma abordagem semelhante, porém
utiliza a classificação de seca de Budyko-Lettau para definir as áreas áridas do planeta. Este é o balanço entre a
energia de radiação anual da superfície da terra e da energia térmica necessária para evaporar a precipitação em
um ano.
32
Fonte : UNEP (1997).
Figura 3 - Mapa mundial da distribuição da aridez
Em 1979, a UNESCO introduziu um sistema de classificação mundial baseado em princípio
na relação de precipitação com a evapotranspiração potencial anual calculada pelo padrão do
método de Penman. Este método é mais confiável para avaliar consumo de água das plantas.
Esta classificação incorpora ao mesmo tempo um número de vegetação e elementos de uso da
terra e a esse respeito faz uma diferenciação entre árido e hiperárido. Nos últimos anos, a
classificação tem sido validada e levemente adaptada para os critérios de diagnóstico. Tornou-
se padrão para a classificação de terras secas (Verheye, 2004).
O sistema de classificação climática proposto por Köppen43, bastante utilizado por
pesquisadores brasileiros, baseia-se em presumir que:
(1) quanto maior for a temperatura, maior será a quantidade de precipitação que
resultará no mesmo grau de aridez, e (2) relativamente menos precipitação é
necessária se ela está concentrada durante a estação fria; é necessária mais
precipitação se ela está distribuída de maneira uniforme durante o ano e ainda
mais precipitação é necessária se ela está concentrada na estação quente44
(Verheye, 2004 : 13).
O sistema de Köppen possui cinco grandes categorias de clima, das quais uma é considerada
seca. Na sua classificação, baseada em letras e símbolos, os climas que se iniciam com a letra
B são os considerados secos, podendo ser BW e BS. Em praticamente todos os trabalhos
sobre o semiárido brasileiro, a classificação de Köppen é utilizada.
43 Wladimir Köppen, geógrafo, meteorologista, climatólogo e botânico que desenvolveu o sistema de
classificação climática mais utilizado no Brasil. 44Tradução livre de : (1) the higher the temperature, the greater the amount of precipitation that will result in the
same degree of aridity, and (2) relatively less precipitation is needed if it is concentrated during the cool season,
more is required if distribution throughout they earis uniform, and the highestrequirement is associated with
precipitation that is concentrated in the warm season.
33
Não importa qual classificação seja utilizada, é consenso que o semiárido brasileiro está bem
delimitado do ponto de vista ambiental. Entretanto, antes de se aprofundar em sua
caracterização, se faz necessário apresentar as demais áreas áridas e semiáridas do Planeta
para que se possa ter em mente as particularidades encontradas no Brasil sem perder de vista
que existem ambientes semelhantes até mesmo na América do Sul. Com exceção de algumas
áreas na Ásia e América do Norte, as áreas áridas se estendem na faixa tropical do globo, na
área de convergência intertropical, onde a chuva é irregular e a evaporação é alta (Verheye,
2004).
Fonte :Verheye (2004 : 4).
Figura 4 - Localização das regiões áridas e semiáridas no mundo
A partir de uma visão continental, a maior presença de áreas áridas estão na África, na Ásia,
no Oriente Médio, seguido pela Austrália e América. Comumente o semiárido, em diversas
partes do mundo, se caracteriza como uma área de transição entre as áreas de clima úmido e
climas secos. Entretanto, no Brasil se apresenta como um bolsão de semiaridez com uma
extensão entre áreas úmidas e quentes, não sendo uma área de transição (Jatobá e Silva,
2015). Esta particularidade o diferencia de todos os demais semiáridos encontrados no
planeta.
1.6. A seca
Em princípio, o conceito de seca está em concordância com a visão de quem a observa, uma
vez que esta pode se manifestar de distintas maneiras em diversas temporalidades e
espacialidades. Com isso, a quantidade e distribuição anual da precipitação, assim como os
altos números referentes à temperatura são condições precípuas na determinação da
intensidade e das consequências das secas.
34
Antes de se prosseguir, é necessário se fazer a ressalva de que o termo seca é utilizado no
senso comum de formas variadas e sem, necessariamente, a acuidade acadêmica. Isto decorre
das diferentes percepções que um grupo, comunidade ou sociedade tem da natureza, uma vez
que a seca é percebida de distintas formas a depender do lugar; de quem é impactado e dos
problemas sociais e econômicos que pode causar. Porém, em alguns momentos esta falta de
acuidade aparece em trabalhos acadêmicos.
As definições de seca podem variar de acordo com autores e instituições que trabalham
diretamente com a temática. Com isso, observa-se uma dificuldade em se estabelecer uma
definição rigorosa e global, causado uma ideia difusa do que é a seca e como aferir seus
impactos. Há uma encaminhamento consensual de que a seca pode atingir contornos
extremos, distinguindo-se de outros desastres naturais por começar a ocorrer de um modo, por
vezes, imperceptível. Verifica-se, geralmente, uma progressão lenta, podendo prolongar-se
por um período de tempo longo. As áreas afetadas podem englobar uma grande escala e,
sendo assim, a sua recuperação processar-se de um modo também lento (Cunha, 2008).
A Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da
Seca (UNCCS ou UNCCD), da qual o Brasil é signatário, define a seca como
um fenômeno que ocorre naturalmente quando a precipitação registrada é
significativamente inferior aos valores normais, provocando um sério
desequilíbrio hídrico que afeta negativamente os sistemas de produção
dependentes dos recursos da terra [...] e as atividades relacionadas com previsão
da seca e dirigidas à redução da vulnerabilidade da sociedade e dos sistemas
naturais àquele fenômeno no que se refere ao combate à desertificação são
definidas como a mitigação de seus efeitos (MMA, 2006 : 18).
Para Cunha (2008 : 25), a "seca é um fenômeno natural complexo, de caráter recorrente e não
aleatório, de origem meteorológica e climatológica e que pode resultar num desastre natural
(catástrofe natural)", bem como um “fenômeno natural que pode assumir características
extremas e que é originado, essencialmente, por uma afetação temporária das condições de
precipitação". Com isso, as secas "são caracterizadas como sendo a ausência, escassez,
frequência reduzida, quantidade limitada e má distribuição das precipitações pluviométricas
durante as estações chuvosas (Carvalho, 2012 : 63).
35
Para Campos et al., (2008), existem três tipos de secas, a climatológica, a edáfica e a
hidrológica. As secas climatológicas referem-se a insuficiência de precipitação em um dado
tempo e espaço quando comparado ao seu padrão normal estabelecido, decorrem de causas
naturais estão, normalmente, associadas à circulação atmosférica global. As secas edáficas
resultam da irregularidade u insuficiência das chuvas, podendo ser identificadas pela umidade
insuficiente do solo para o sistema radicular da vegetação. Por fim, a seca hidrológica, aquela
ligada ao abastecimento d'água pode ser entendida como insuficiência hídrica nos rios ou
reservatórios para o atendimento das demandas de uma região determinada. Esta última seca
pode ser causada por uma sequencia de anos com escoamento superficial insuficiente ou mau
gerenciamento da água armazenada.
Por outro lado, Cunha (2008) define quatro tipos de seca, a meteorológica, a agrícola, a
hidrológica e a socioeconômica. Para a autora, a seca meteorológica é mudança na
normalidade da precipitação, caracteriza-se pela falta de água induzida pelo desequilíbrio
entre a precipitação e a evaporação, a depender de outros elementos como a velocidade do
vento, temperatura e umidade do ar, insolação. A seca agrícola é o desequilíbrio entre a água
disponível no solo e a necessidade das culturas e a transpiração das plantas, ou seja, dos
sistemas agrícolas em geral. A seca hidrológica envolve a redução dos níveis médios de água
nos reservatórios e nos solos. Por fim, a seca socioeconômica amalgama os impactos naturais
e sociais resultantes da falta de água, associando o fornecimento e a demanda dos recursos
hídricos que afeta diretamente a sociedade.
Posto isto, para se estimar as probabilidades de ocorrência das secas45, ou a sua severidade,
deve se conhecer as condições climáticas de cada ambiente, ou seja, os dados meteorológicos
mais importantes que se devem conhecer são a precipitação, a temperatura do ar, a umidade
do ar e a quantidade de água no solo (Cunha, 2008).
Para Magalhães et al. (1988), existem dois tipos de esforços de predição das secas. Um
procura prever, a partir de uma análise física em grande escala da troposfera e do Oceano
Atlântico, como será a próxima estação chuvosa. O outro esforço é baseado em métodos
45 "No entanto a ausência prolongada de precipitação não determina obrigatoriamente a ocorrência de uma seca.
Se a situação antecedente de humidade no solo for suficiente para não esgotar a capacidade de suporte dos
ecossistemas agrícolas, ou se existirem medidas estruturais com capacidade de armazenamento superficial ou
subterrâneo suficiente para colmatar as necessidades de água indispensáveis às actividades socioeconómicas, não
se considera estar perante uma seca" (Cunha, 2008 : 25).
36
estatísticos, a partir da aparente existência de uma periodicidade no histórico das precipitações
de uma estação específica. Para os autores, é possível prever a seca com vários anos de
antecedência.
A seca é, na realidade, uma palavra-chave. Ela representa objetivamente falta de chuva, mas
também simbolicamente a Região Nordeste e os problemas sociais e econômicos que são
peculiares às condições da sua natureza hostil, como miséria, analfabetismo, doença,
descapitalização, etc. Ela é ainda fundamento da produção de uma solidariedade social,
criadora de um nós coletivo que equaliza a todos diante da força da sua tragédia, produtores
grandes e pequenos, proprietários ou não. Nesse sentido, o significado desses conteúdos vai
muito além da relação entre natureza e atividade produtiva, evidenciando-se nas
possibilidades da natureza para a produção de um imaginário político, socialmente
equalizador e institucionalmente eficiente para obtenção de recursos financeiros e de poder
(Castro, 2006 : 182).
Finalizando, no caso especifico dessa tese, dar-se-á atenção ao que entende-se por seca
socioeconômica e hidrológica, uma vez que entende-se que são os que se aproximam entre si
no recorte de análise aqui estabelecido, permitindo, assim, um diálogo com as ideias de
governança do território semiárido.
37
Capítulo 2 - Considerações teóricas da pesquisa e construção do quadro teórico
Parte-se, inicialmente, que o semiárido brasileiro é uma região complexa, onde se operam
camadas de percepções e delimitações construídas e resignificadas ao longo do tempo, bem
como interações múltiplas, por vezes sobrepostas, entre atores e instituições. Assim, constitui-
se como um território definido por critérios naturais de regionalização, ou seja, a partir de
níveis de aridez; por delimitação legal dentro dos aparatos da legalidade brasileira e, ao
mesmo tempo; é uma região chamada historicamente de sertão, possuindo assim uma carga de
simbologia, percepções e representações em espacialidades e temporalidades distintas.
O quadro teórico aqui apontado permitiu, primeiramente, coletar diferentes tipos de dados,
sejam quantitativos e qualitativos, bem como entender como estão conectados e se
retroalimentam. Com isso, foi possível construir uma proposta de modelo de gestão territorial
no semiárido brasileiro quanto à governança da água.
Optou-se por escolhas conceituais que permitissem abordar o sujeito de pesquisa de uma
maneira inédita, tanto do ponto de vista acadêmico a partir da Geografia, como na
contribuição à produção do conhecimento na devolutiva dos resultados aqui obtidos para a
própria região.
Para tornar isso possível, entendeu-se, primeiramente, o sertão e o semiárido construído e
reconstruído ao longo da sua história, em temporalidades e espacialidades distintas, bem
como possuidores de gestões que ora se aproximavam, ora se distanciavam do restante do
Brasil. Ressaltando que faz-se aqui o recorte temporal da sua história como sendo aquela
iniciada com o processo de colonização europeia na região, ou seja, a partir do século XVII.
Para entender a construção simbólica e de representação do sertão, foi utilizada a teoria das
representações territoriais materiais e imateriais. Procurando entender a atuação estatal no
semiárido, optou-se pela visão do Estado desenvolvida pelo teórico James C. Scott (2008).
Visando entender o processo de cogestão da região e propor um modelo de gestão, fez-se uso
da governança da água.
Agora, parte-se para uma breve revisão de literatura dos conceitos entendo e apontando as
suas polissemias.
38
2.1. As representações territoriais
Ao longo da história da sua utilização, a teoria as representações possui significados distintos
a depender de quem a trabalha e seus contextos. Por vezes pode ser confundido com os
significados de imagem, mito, identidade, símbolo ou signo (Breux, 2007).
Para Gumuchian (1989 : 30), "uma representação é uma criação social de padrões a partir do
real"46. Para Rey (1994 : 1775) apud Parent (2003 : 24) "a representação se define como uma
ação de fazer algo presente ou sensível ao espírito, à memória, por meio de uma imagem, uma
figura, um signo"47. Tem-se ainda que "a representação é uma organização psicológica, uma
modalidade particular do conhecimento"48 (Moscovici, 1961 : 302 apud Breux, 2007 : 10).
A despeito dos três conceitos apontados acima, conclui-se que a representação designa uma
atividade mais complexa da simbolização do real. Para isso, é necessário a percepção que
estabelece um fenômeno cognitivo, constituído seja de uma repetição, seja de uma
substituição de objetos que podem estar ou não presentes atualmente. A partir da percepção se
pode construir uma representação. Toda representação, seja do senso comum ou científica é
uma criação (Bailly, 1995).
Autores como Gumuchian (1991) e Bailly (1993) comungam da mesma ideia de que as
representações são atos de criação e ambos partem de Jean Piaget49 considerado como um dos
principais nomes que trabalham o caminho da percepção até a representação. Para Piaget,
existiria uma distinção entre percepção, como função naquela o espírito se representa dos
objetos em sua presença e representação, que evocaria os objetos mesmo que eles não sejam
perceptíveis diretamente.
O geógrafo Di Méo (1991), observa que há sempre três elementos essenciais nas
representações, são eles: o objeto da percepção e da representação; o sujeito e suas
46Tradução livre de : "Une représentation est une création sociale de schémas pertinents du réel". 47Tradução livre de : "La représentation se définit comme l’action de rendre quelque chose présent ou sensible à
l’esprit, à la mémoire, au moyen d’une image, d’une figure, d’un signe". 48Tradução livre de : "La représentation est [...] une organisation psychologique, une modalité de connaissance
particulière". 49 Jean Piaget (1896-1980) é um dos principais nomes da psicologia ocidental e um dos principais pensadores
que desenvolveram a Teoria dos Estágios de Desenvolvimento largamente utilizada nas discussões sobre
processos de aprendizagem.
39
particularidades e o sujeito dentro da sociedade com seu conhecimento e códigos sociais. O
conceito de representação permite então apontar a identidade de um grupo, de uma sociedade
ou de um individuo, e ainda de entender como esta identidade é vivenciada, notadamente em
comparação às outras.
Bourdieu (1979, 1980) mostra que as práticas e representações resultam de um processo duplo
(mental) de "interiorização do exterior" e (social) de "exteriorização do interior". Isso
significa que as estruturas sociais objetivas condicionam a subjetividade. Essa última,
automaticamente atua também o contexto social que a produziu50 de modo que as
representações tendem a se perpetuarem, mesmo que no processo sofram modificações.
Enfim, as representações têm a função de orientar o comportamento dos indivíduos formando
as relações sociais (Moscovici, 1961; Jodelet, 1984).
Moscovici (1961) aponta três características das representações: a primeira como sendo a
mediação entre a percepção e o conceito; a segunda como sendo o conteúdo da representação
figurativa e estruturada por um significado dado e a terceira como a representação
dependendo da qualidade do objeto. Por fim, o autor traz a afirmação que interessa
diretamente a esse trabalho, "a representação se estrutura através de duas orientações: uma
que tende a refletir mais plenamente o objeto e outra que tende a apreender o real de maneira
a formar uma unidade com o conjunto das experiências anteriores e a situação do sujeito"51
(Moscovici, 1961 : 304 apudBreux, 2007 : 10).
Buscando direcionar discussão para a gestão do território, tem-se que o conceito de
representação possui duas características:
Primeiramente, compreende o conjunto de ideias e de percepções coletivas de
ordem política, religiosa ou outras que congregue os grupos sociais e que estruture
sua visão de mundo. Segundo, o conceito de representação tem por objetivo
mostrar como a percepção se transforma, ela mesma, em justificação de ações e
em inspirações de posturas geopolíticas52 (Breux, 2007 : 45).
50Tradução livre de : "P. Bourdieu (1979, 1980) a montré que pratiques et représentations résultent en
permanence, pour chaque individu vivant en société, d'un double processus (mental 'd'intériorisation de
l'extériorité' et (social) 'd'extériorisation de l'intériorité'. Cela signifie que si les structures sociales objectives
conditionnent la subjectivité, cette dernière, en s'automatisant, rétroagit aussi sur le contexte social qui l'a
produit". 51Tradução livre de : "La représentation se structure à travers deux orientations : l'une qui tend à refléter le plus
complètement l'objet, l'autre qui tend à saisir le réel de façon à former une unité avec l'ensemble des expériences
antérieures et la situation du sujet". 52Tradução livre de : "Premièrement, il comprend l'ensemble des idées et des perceptions collectives d'ordre
politique, religieux ou autre qui anime les groupes sociaux et qui structure leur vision du monde. Dans un
40
As representações, em princípio, não são visíveis ao pesquisador de maneira evidente, elas
são construídas como objeto após a análise. Para isso, vários materiais podem ser utilizados,
como discursos linguísticos, iconográficos e cartas mentais (Gumuchian, 1991; Bailly, 1993).
A variedade de estudos permite classificar as análises em três categorias diferentes. Uma
primeira que analisa lugares específicos, outra que enfoca um grupo sócio-demográfico
preciso e o último que se distingue por empregar como suporte metodológico as cartas
mentais e entrevistas (Breux, 2007).
Alguns exemplos de estudos sobre representações mais recentes são as teses de Breux
(2007)53 e Parent (2003)54; as dissertações de Messaoud (2013)55, Paran (2009)56 e os artigos
de Gonçalves (2012)57, Salamanca-Ávila et al. (2013)58 e Larrueet al. (2000)59. No Brasil, é
particularmente interessante a obra de Arruda (2000)60 que discute as representações
territoriais na construção material do espaço de um país, usando como exemplo o sertão da
atual região Sudeste do Brasil.
2.1.2. As representações sociais e as representações territoriais: uma diferenciação
necessária
Mesmo que à princípio pareçam sinônimos e venham de uma mesma matriz conceitual, há
diferenças entre os conceitos de representação social e representação territorial. Registra-se,
entretanto, que existe algo mais próximo de uma confluência do que uma divergência entre
eles.
deuxième temps, le concept de représentation a pour objectif de montrer comment cette perception se transforme
elle-même en justifications d'actions, et en inspiration de postures géopolitiques". 53De l'imaginaire géographique à l'acte politique l'influence des représentations territoriales sur la participation
politique individuelle a l'échelle locale et urbaine. 54Entre empire et nation Gravures de la ville de Québec et des environs, 1760-1833. 55Les représentations socio-spatiales de la ville et de son territoire métropolitain Une étude de cas à Québec et
Lévis. 56Représentations territoriales pour la gestion équilibrée d’un patrimoine écologique et anthropique dans le
domaine de l’eau 57 A estrutura e o conteúdo das representaçõessociais elaboradas por docentes da escola pública acerca do projeto
político pedagógico. 58Exploration de la structure et du contenu de la représentation de l’écologie, commune à une cohorte
d’étudiants. 59Étude des liens entre plusieurs objets de représentations sociales. 60Cidades e Sertões: entre história e a memória.
41
Uma tentativa de separar os dois conceitos, mesmo correndo o risco de o fazê-lo de maneira
simplória é entender a representação social como mais calcada nos aspectos psicológicos e
afetivos do individuo. A partir disto, se constrói a representação. Nessa abordagem há uma
aproximação entre as ciências sociais e a psicologia.
Por outro lado, a representação territorial é a busca dos símbolos, das imagens e dos discursos
que representam uma região. Estes podem ser criados pelos próprios habitantes da região ou
por quem exerce poder sobre ela, mesmo que sejam um poder simbólico.
Nos estudos sobre representações, o pesquisador necessita desenvolver uma pesquisa para
estabelecer as representações sociais, enquanto as representações territoriais podem ser
construídas. Para se discutir as duas representações, normalmente se faz uso dos mesmos
instrumentos como o discurso, as imagens cartográficas e iconográficas e as entrevistas com o
público-alvo. Reforça-se que a diferenciação é difícil e a linha que as separa é tênue e
dependem dos seus elementos. Aqui optou-se pelas representações territoriais que foram
evidenciadas pelas imagens e discursos acerca da semiaridez brasileira.
Quanto a estrutura dos elementos61 que deram lugar à representação do território, tem-se uma
aproximação às ideias de representações sociais, que são mais trabalhadas a partir do
pensamento de Émile Durkheim, Denise Jodelet, Serge Moscovici e da geografia social de
Armand Frémont, Jacques Chevalier, Robert Hérin e Jean Renard, bem como uma
aproximação maior com a psicanálise promovida pelos autores que possuem essa base62.
61 Quando se fala de elementos da estrutura de uma representação, isso faz se remeter às ideias de Abric (1994)
que estipula que os elementos constitutivos de uma representação não possuem o mesmo valor, alguns são
essenciais (conforme o núcleo) e outros secundários (conforma a periferia). Essa ideia direciona a uma discussão
sobre representações sociais. Os estudos são, em praticamente sua totalidade, com grupos pré-estabelecidos e em
determinados contextos, possuindo um universo tangível e mensurável. A partir disto, o pesquisador consegue
estabelecer um controle em sua pesquisa. Por outro lado, ao mudar-se a escala para abranger uma população de
maior número em uma região com diversas diferenças internas, esse caminho torna-se cada vez mais difícil e a
presença das generalizações é cada vez mais forte. Assim, chama-se atenção que para se pensar em estrutura de
uma representação é necessário desde cedo evitar cair em uma visão determinista, caricata (André et al., 1989).
Os estudos de representações sociais aqui examinados fazem uso de entrevistas com pessoas de um determinado grupo (etário, de gênero ou residentes no mesmo lugar) como os de Abric (1994); Breux (2007); André et al.
(1989); André et al. (1990) e Marut (1995). 62 Destaca-se os estudos de Messaoud (2013) sobre as representações sócio espaciais em Lévis e Quebec
)Província de Québec, Canadá), onde há uma clara confluência entre o social e o espacial caminhando para o
territorial, assim como Breux (2007) que fez uso da paisagem como uma representação do território que
influencia a participação cidadã nas políticas em Québec. Por outro lado, Marut (1995) fez um estudo sobre a
região de Casamance no Senegal a partir da sua construção como região fazendo uso de representações
territoriais como mapas e discursos. Lacerda e Marques (2008) desenvolveram um estudo de caso sobre
agricultores familiares no estado de Santa Catarina e suas representações territoriais valorizando o seu saber-
fazer para a manutenção de sua cultura, segurança alimentar e preservação ambiental.
42
2.1.3 Caracterizando as representações territoriais
As representações territoriais podem ser chamadas por outros nomes, porém mantendo uma
unidade. São, na verdade, sinônimos ao excluirmos maiores aprofundamentos
epistemológicos. Então temos representações espaciais ou representações regionais para
André et al. (1989) e Bailly (1989; 1995); representações mentais para Foumand (2003) e
representações geográficas para Debarbieux (2003). Para esse trabalho, busca-se uma
uniformização e se fará uso da expressão representação territorial (Pereira, 2016).
Uma representação territorial não é, necessariamente, uma imagem, mas um conjunto de
imagens do espaço que podem ser, inclusive, contraditórias. A imagem é, então, "um evento
psicológico é como um suporte eventual de outras atividades mentais"63 (Denis, 1979 apud
Gumuchian, 1989 : 33).
As representações territoriais podem ser de duas ordens, material e imaterial e a identificação
de um território pode ser feita tendo como base esses dois tipos de representação. Geralmente,
os estudos privilegiam um dos dois tipos e uma ferramenta pode ser utilizada para as duas
representações: as cartas mentais (Debarbieux, 2003; Breux, 2007).
As discussões sobre representações territoriais tentam evidenciar a multiplicidade de formas
que podem emergir de relações particulares de grupos sociais, dos Estados, das sociedades e
seus espaços e ainda as relações que estabelecem a representação de um território, seja como
espaço vivido, imaginário, sonhado investido de um valor simbólico, político e cultural
(Lasserre e Lechaume, 2003).
Para Breux (2007 : 45):
a análise das representações espaciais sugere a identificação da presença de
práticas antigas e suas reformulações na sociedade atual. Uma certa característica
das representações espaciais que lhes conferem uma notória pertinência é que
nunca estão congeladas. Esta característica de não estar congelada permite
compreender as mutações que afetam o objeto, ligando as práticas espaciais que a
suscitam e às criam64.
63Tradução livre de : "Un événement psychologique est comme UN? support éventuel d'autres activités
mentales". 64Tradução livre de : "L'analyse des représentations spatiales suggère l'identification de la présence de pratiques
anciennes et leurs reformulations dans la société d'aujourd'hui. Un trait caractéristique des représentations
43
Entender as representações territoriais possibilita identificar o que foi mais proeminente na
construção das ações sobre um determinado território. Ao se evidenciar como algo se
construiu, por conseguinte, pode-se pensar em como modificá-lo ou reconstruí-lo. É sabido e
antecipado que mudar as representações de um território pode não ser fácil e/ou desejável,
mas em alguns casos, é algo necessário. O estudo de representação territorial permite
compreender melhor as questões fundamentais das tensões sociais e espaciais com foco nas
estratégias dos atores (individuais e sociais).
Gumuchian é um dos autores que mais contribuíram com as discussões recentes sobre
representações territoriais e o papel dos atores na reflexão e tomada de decisão. Ele apresenta
a representação territorial focando três ideias, a primeira como a necessidade de se posicionar
quanto ao que é desenvolvimento, bem como os seus tipos; a segunda como a necessidade de
se entender os atores e o jogo de escalas de atuação e, por fim, dar nome a um espaço para se
produzir um território (Gumuchian. 1989; 1991).
Segundo Lefebvre (1986 : 48),
as representações do espaço formam o espaço concebido, são os pensadores,
planejadores, urbanistas, tecnocratas e artistas próximos das ciências,
identificando o vivido e o percebido ao concebido. Este espaço constitui o espaço
dominante. Os espaços de representações formam o espaço vivido, quer dizer, o
espaço dos 'habitantes', dos 'usadores', dos artistas65.
As relações de afetividade e os símbolos criados pelas pessoas sobre cada espaço produzem
valores mentais que vão influenciar os conflitos entre os diferentes atores e suas respectivas
valorizações na utilização de cada espaço. Nesse sentido, "o espaço pode então ser
considerado como um lugar onde os homens de ideologias diferentes buscam impor suas
representações, práticas e interesses"66 (Bailly, 1995 : 380).
spatiales, qui leur confèrent une pertinence notoire, est qu'elles ne sont jamais figées. Ce caractère non figé des
représentations spatiales permet de comprendre les mutations qui touchent son objet, en lien avec les pratiques
spatiales qu'elles suscitent d'une part, et qui les créent d'autre part". 65Tradução livre de : "Les représentations de l'espace forment l'espace conçu, « celui des savants, des
planificateurs, des urbanistes, des technocrates, de certains artistes proches de la scientificité, identifiant le vécu
et le perçu au conçu » (Lefebvre, 1986 : 48). Cet espace constitue l'espace dominant. Les espaces de
représentations forment l'espace vécu, c'est-à-dire l'espace des "habitants", des "usagers", des artistes". 66Tradução livre de : "L'espace peut alors être considéré comme le lieu où des hommes d'idéologie différentes
cherchent à imposer leurs représentations, leurs pratiques et leurs intérêts".
44
As representações territoriais, ora podem estar mais próximas das ciências políticas, ora da
psicologia, porém por ser um conceito que toca, fundamentalmente, o território, são
geográficas em sua essência.
2.1.4 As representações e a Geografia
Há uma necessária aproximação e um entrelace entre as ideias que constroem a região como
um espaço vivido e as representações territoriais. Região e território são conceitos quase
onipresentes no desenvolver da geografia moderna67 e podem ser utilizados como algo
instrumental ou analítico ligados às questões teóricas e epistemológicas. Isso não exclui,
absolutamente, que tanto a região como o território, como conceitos e categorias de análise,
possam ter nuances e, em alguns casos, interrelações entre si. Podem, inclusive, apresentar
características um do outro. Isso depende, é válido ressaltar, das bases filosóficas e dos
contextos (no tempo e no espaço) em que o pesquisador está inserido, bem como o contexto
geográfico e ideológico de onde são pensados e discutidos, o que vai mudar os conceitos em
seu conteúdo68 (Haesbaert, 2010).
A polissemia que vem ao se tratar de região e território traz à tona a necessidade de
diferenciá-los. Destarte, Região não é um dado da natureza, mas uma construção intelectual
através do ato de poder delimitar, deliberadamente, uma diferenciação de lugares. Esse ato é
chamado regionalização que pode ser motivada pelas mais diversas razões como o exercício
do poder; finalidade didática; planejamento; reconhecimento das idiossincrasias de grupos
populacionais; diferenciação de lugares; distinção ecológica. Por território, entende-se como
um recorte do espaço delimitado e reconhecido politicamente internamente e externamente. O
território possui o sistema antrópico e biofísico e é sempre aproriado por alguém, gerando
percepções e representações materiais e imateriais. Em seu interior, comumente, vivencia-se
disputas de comando e controle que podem ser dentro do aparato legal que rege o território ou
por grupos com interesses conflitantes. Os territórios são entidades que espaciais conflitantes
em sua essência. (Gregory et al., 2009;Corrêa, 2007; Haesbaert, 1996, 2010; Santos e
Silveira, 2001; Lencioni, 2007). Na tese, entende-se região como um recorte espacial a partir
67Entende-se aqui como geografia moderna, a ciência sistematizada, inicialmente, por Alexander Von Humboldt
ainda no século XIX, que veio a se difundir na Europa e, em seguida, nas Américas (Moraes, 2009). 68A reflexão colocada acima se faz necessário quando se percebe que as representações territoriais estão ligadas
também às regiões como espaço vivido. Essa discussão e aproximação conceitual é percebida, sobretudo, na
geografia francofônica a partir dos anos setenta do século passado.
45
de critérios pré-definidos e o território como uma delimitação a partir do aparato legal do
Estado brasileiro.
A ideia de espaço vivido desenvolvida por Frémont e, posteriormente, por autores como
Pellegrini (1982), Poche (1983) e Ricq (1983)69, engloba o espaço de vida e o espaço
representado. Tendo isso em mente, o território mesmo tendo sua dimensão política pode ser
construído a partir de uma visão mais subjetiva em resposta à visão cartesiana de
representação do espaço. O território se situa sempre entre o real e o imaginário, entre as
práticas e as representações espaciais, ou seja, ele necessita de tempo para se construir e
consolidar (Gumuchian, 1991). Adiciona-se que "o espaço necessita da espessura do tempo,
da repetição silenciosa, da maturidade lenta, do trabalho da imaginação social e da norma para
existir como um território70" (Marié, 1982 apud Gumuchian, 1991 : 69).
Porém, a inserção de questões subjetivas na geografia humana e mais precisamente regional,
data ainda de décadas anteriores ao exposto acima. Em 1925, Jean Brunhes já discutia as
paisagens a partir do sentimento de pertencimento de um ou outro grupo e de maneira mais
indireta, Forcin fez algo semelhante um pouco antes, em 1916. Hardy em 1939 aceitou, na
Geografia, o conceito de representação territorial permitindo referir aos espaços não
atualmente percebidos, por vezes imaginados. A lista de autores que contribuíram nesse
momento pode ser longa, entretanto, pode se afirmar que possuíam um encaminhamento de
interpretações direcionadas aos espaços vivenciados, aos testemunhos, às intimidades, às
afetividades ligadas aos grupos e aos territórios da vida cotidiana É possível perceber que nos
anos oitenta e noventa do século passado há um diálogo entre os autores e, praticamente, um
consenso sobre as representações territoriais de quem trabalha com questões mais subjetivas
na geografia, seja na humanista, seja na cultural (Gumachian, 1989, 1991).
A representação territorial segue dois caminhos, um que é a representação material e como
melhor exemplo pode-se apontar as cartas e mapas e o outro caminho é o imaterial, com os
fenômenos e os discursos produzidos em um dado espaço. Assim, é possível identificar que a
69 Em 1982 e 1983, a revista Espace et Societé lançou dois números dedicados aos estudos regionais, nos quais
pode-se perceber o esforço de pesquisadores em adicionar uma vertente mais subjetiva aos estudos sobre região
notadamente calcada no pensamento de Frèmont. 70Tradução livre de : "L'espace a besoin de l'épaisseur du temps, de répétitions silencieuses, de maturations
lentes, du travail de l'imaginaire social et de la norme pour exister comme territoire".
46
representação material é algo mais palpável e objetivo, mesmo mantendo suas abstrações,
enquanto a representação imaterial é algo mais subjetivo e abstrato.
2.2. Governança como uma estratégia de gestão hídrica
A governança pode significar qualquer tipo de articulação entre organizações, partes de
organizações, grupos e indivíduos que buscam um modelo de comando e controle
hierarquizado para formas de interação descentralizadas e mais horizontais. De maneira mais
vertical, governança se refere às formas de coordenação interorganizacional modeladas por
redes, especialmente as que são auto-organizadas (Gregory et al., 2009).
Governança não é sinônimo de governabilidade. Aqui entende-se a governabilidade,
vinculada ao sistema político-institucional, como a dimensão estatal do exercício do poder
que direciona o desenvolvimento do controle e da ordem, bem como possui atributos
considerados essenciais para o exercício do governo (Gravel, 2009).
A governança é diferente da governabilidade, refere-se a um guia de gerenciamento e ao
mesmo tempo um processo de coordenação social e econômico. Com isto, envolve os
diversos atores não estatais no processo de negociação e tomada de decisão. Em um plano
mais amplo, a governança engloba os atores da sociedade civil representando setores da
população (Gravel e Lavoie, 2009; Rosenau, 2002; Gonçalves, 2006).
A governança refere-se ao processo de coordenação, gerenciamento e direcionamento social e
econômico em um processo democrático que combina a participação de diversos atores em
constante negociação. Para a ONU (2009) "a boa governança promove a igualdade, a
participação, o pluralismo, a transparência, a responsabilidade e o Estado de Direito, de forma
efetiva, eficiente e duradoura". Mais comumente governança é uma forma de coordenação
inter-organizacional modeladas em redes, especialmente as auto-organizadas (Gregory et al. :
2013).
Pensar a governança das águas é entender que esse debate envolve essencialmente diversas
áreas do saber, ações políticas e de gestão porque "a governança democrática traz avanços ao
desenvolvimento, ao juntar esforços para lidar com tarefas como a erradicação da pobreza, a
proteção ao meio ambiente, a garantia da igualdade de sexos, proporcionando meios
47
sustentáveis de subsistência. Ela assegura que a sociedade civil desempenhe um papel ativo
no estabelecimento das prioridades e torne conhecidas as necessidades das pessoas mais
vulneráveis" (ONU, 2009).
Segundo Dallabrida e Becker (2003), a origem do termo governança remonta à primeira
metade do século XX com o trabalho de Ronald Coase em 1937 sobre o mundo corporativo,
porém sem grande impactos acadêmicos naquele momento. Nos anos 70, Oliver Williamson
recupera o seu uso, aplicando-o às práticas de gestão empresarial. Desde então, o termo
governança vem sendo discutido, desenvolvido e aplicado como uma mudança na maneira de
se gerenciar, saindo de uma coordenação baseada na hierarquia para uma coordenação através
de redes de participantes.
Considerando a governança como oriunda das ideias de gerenciamento cooperativo, Berkes
(1991) discute que tal gerenciamento é a combinação dos sistemas de níveis estatal e local. O
primeiro é conduzido por uma autoridade centralizadora, baseada em dados científicos ou em
boas estimativas reforçadas pela autoridade do governo através de leis e regulamentações. O
segundo é baseado na autorregulação de maneira descentralizada e tendem a ser reforçados
pelas pressões sociais. O ponto fundamental é o reconhecimento mútuo das duas forças, que
nem sempre acontece de maneira fácil. Porém, são forças não excludentes, podendo inclusive
convergir para o mesmo objetivo.
Rhodes (1997) aprofunda o conceito de governança através de quatro pontos que caracterizam
o seu processo. São eles: 1) A independência entre as organizações, a governança é mais
abrangente que os governos incluindo atores não estatais; 2) A interação contínua entre os
membros das redes devido às necessidades de trocas de recursos e objetivos compartilhados;
3) As interações baseadas em confiança, dentro do jogo de negociações e acordadas entre os
participantes da rede e, por fim, 4) Um grau significativo de autonomia do Estado, as redes
não são responsabilidades do Estado, são auto-organizadas e embora este não ocupe uma
posição de soberania, ele pode, de maneira indireta, guiar essas redes que podem ser formadas
não apenas de órgãos institucionais.
De fato, uma das principais proposições da governança é a geração e implementação de
políticas públicas que incluam as Organizações da Sociedade Civil (OSC), iniciativas
privadas, organizações voluntárias, comunidades e grupos em geral. A coordenação de um
48
sistema social complexo e o guia de uma sociedade desenvolvida não deve ser
responsabilidade apenas do Estado. Deve-se assim analisar e refletir o seu papel
principalmente no século XXI, quando o avanço tecnológico possibilita gerenciar diversas
escalas de entendimento do território.
O processo de governança envolve múltiplas categorias de atores, instituições, inter-relações e
temas, cada um dos quais suscetível a expressar arranjos específicos entre interesses em jogo
e possibilidades de negociação, expressando aspectos de interesse de coletividades, com
ênfase na prevalência do bem comum. A governança, na gestão hídrica, propõe caminhos
teóricos e práticos alternativos que façam uma real ligação entre demandas sociais e seu
diálogo em nível governamental. Geralmente, a utilização do conceito inclui leis, regulação e
instituições, mas também se refere a políticas e ações de governo, as iniciativas locais, e a
redes de influencia, incluindo mercados internacionais, o setor privado e a sociedade civil, os
quais são influenciados pelos sistemas políticos nos quais se inserem (Jacobi, 2009; 2012).
Como defende Scott (1998), há tentativas centralizadoras de se sobrepor uma legitimidade a
uma possível ilegalidade da atuação da sociedade civil. Isso acontece ao se simplificar o que
se reconhece como governo e, assim, controlar a população com mais facilidade. Tais ações
dependem de uma retórica visionária com uma fé intransigente na tecnologia em detrimento
ao conhecimento popular, principalmente. Essas experiências têm falhado com um grande
custo às vidas humanas, ao ambiente, à estrutura social e à cultura porque a ação estatal é,
comumente, a mais presente na gestão hídrica. O Estado é tido como legítimo em suas ações,
mesmo que sejam decididas de maneira centralizada e pouco considere o que a população
almeja. Tais ações colocam em discussão a legitimidade e a legalidade da atuação estatal, da
sociedade civil organizada e até de indivíduos.
Quando se discute as ações de atores não estatais, presencia-se, frequentemente, uma
contestação sobre a sua legitimidade71 e legalidade em um processo de governança.
Gonçalves (2006) chama atenção ao tema defendendo que sendo a governança um processo
que necessita da participação da sociedade civil organizada, seus órgãos de representação são,
necessariamente, legítimos e devem ser entendidos como tal. "A legitimidade é alimentada de
71Entende o autor como legitimidade "parte da atitude do sujeito que legitima comrespeitoao poder de legitimar,
isto é, de uma ‘crença’, sejanavalidade do que é racional (segundo um valor ou propósito), naforça da
tradiçãoounavirtude do carisma” (Bobbio, s/d : 172 apud Gonçalves, 2006 : 9).
49
'baixo para cima', surgindo a partir da aceitação de que o poder conferido e exercido é
apropriado, sendo então a ação decorrente legítima" (Gonçalves, 2006: 9).
Quanto à legalidade, internacionalmente, as sociedades civis organizadas possuem legalidade
se preencherem três critérios: a) a capacidade de apresentar reclamações surgidas de violações
do direito internacional; b) entrar em relações com outros sujeitos de direito internacional e
concluir acordos internacionais válidos e c) gozar de privilégios e imunidades da jurisdição
nacional (Noortmann, 2001 : 64 apud Gonçalves, 2006 : 10). No Brasil, as ONG são
reconhecidas pelo Estado, atuando em praticamente todo o território nacional, possuindo um
marco regulatório desde 201172.
É possível destacar três tipos de governança, a ambiental, a corporativa e a territorial. A
governança ambiental se define por dois elementos, o primeiro sendo um processo em que
grupos de atores, mesmo com interesses divergentes, organizam-se para tomar decisões e
realizar atividades em gestão ambiental (recursos naturais, como exemplos) e o segundo
sendo o conjunto de processos e normas regulatórias das trocas entre os próprios atores
(Barriga et al., 2007). A governança corporativa é compreendida como um sistema de
relacionamento entre acionistas, auditores independentes e executivos de uma empresa,
liderados por um conselho de administração e tem um caráter eminentemente privado (Lodi,
2000). Por fim, a governança territorial são "as iniciativas que expressam a capacidade de
uma sociedade organizada territorialmente, para gerir os assuntos públicos a partir do
envolvimento conjunto e cooperativo dos atores sociais, econômicos e institucionais"
(Dallabrida, 2006 : 3).
No entanto, ressalta-se dois pontos. O primeiro diz respeito às discussões sobre governança no
Brasil que, normalmente, são associadas às corporações, ou seja, partindo-se da iniciativa
privada como parte da governança corporativa. O segundo trata das ONG's que, com
exceções, são financiadas pelo próprio Estado brasileiro.
72 A Associação Brasileira de OrganizaçõesNãoGovernamentais (Abong) desenvolveuumaproposta de marco
regulatório das atividades das ONG no Brasil que foi discutida e teve alguns pontos modificados para se
transformar na que foi votada e aprovada pelo senado brasileiro como Projeto de LeiNº 649 de 2011 (Senado
Federal, 2013).
50
Berkes (1991), a partir dos níveis da participação cidadã proposto, inicialmente, por
Arnstein73 como uma tipologia utilizada por planejadores, estabelece os níveis de co-
gerenciamento em sete degraus apresentados a seguir do mais alto ao mais baixo nível:
7 Controle comunitário e
parcerias
Parcerias igualitárias, institucionalização das decisões em conjunto.
Poder delegado à comunidade quando possível.
6 Conselho de gestão
Dar-se à comunidade a oportunidade de participar no desenvolvimento e
na implementação dos planos de gestão.
5 Comitê consultivo
Início de parcerias na tomada de decisão. Ações em conjunto com
objetivos comuns.
4 Comunicação
Início da troca de informação. As preocupações locais começam a entrar
no plano de gestão.
3 Cooperação
A comunidade contribui de maneira pontual à gestão. Ex: utilização do
saber local, ajuda nas pesquisas sobre a comunidade, etc.
2 Consulta
Início do contato direto, as contribuições da comunidade são escutadas,
mas não necessariamente levadas em conta.
1 Informação As pessoas são informadas sobre regras e regulamentações.
Adaptado de Berkes, George e Preston (Berkes, 1994).
Tabela 4 - Níveis de cogerenciamento
Para Berkes (1991), com o último estágio, as decisões tomadas estão institucionalizadas e
partilhadas igualmente e, com isso, há uma divisão para se acomodar duas possibilidades
diferentes. A primeira chamada de Controle Comunitário, onde a comunidade possui plenos
poderes de gerenciamento dos recursos locais e a segunda, chamada de Parceria, onde os
recursos são partilhados por diferentes localidades, mas todas trabalhando em parcerias. Esse
estágio parte do princípio de que quanto mais gerenciamento em nível local for possível,
menor é a regulação estatal.
É de se ter em conta que a experiência democrática brasileira ainda é incipiente ao se
comparar com países europeus e da América do Norte. Após vivenciar vinte anos de um
regime ditatorial militar, o Brasil voltou a ser um país democrático em 1985 e teve sua
constituinte promulgada em 1988. Portanto, toda a experiência de democratização da gestão, é
ainda imatura.
73Arnstein propôs oito níveis de participação cidadã divididos em três blocos que mensuram a participação
compartilhada de poder entre os cidadãos e o estado para a tomada de decisão. Esses níveis de participação vão
da completa passividade ao controle efetivo das decisões por parte da população. Os dois níveis abaixo,
Manipulação e Terapia, representam uma participação superficial ou a não participação; os três níveis
intermediários, Informação, Consulta e Conciliação, representam uma divisão simbólica de poder e os três
degraus de cima, Parceria, Delegação de Poder e Controle do Cidadão, indicam um aumento no real poder
compartilhado.
51
Posto isso, pode-se afirmar que a redemocratização e o surgimento e fortalecimento das
organizações civis organizadas nos anos oitenta são contemporâneos e as primeiras
experiências começam a ser implementadas, no país, na década de 90. Neste caso, o Brasil
segue lento na aplicação das decisões descentralizadas quando se observa em escala mundial.
Por fim, destaca-se as palavras de Martins (2013 : 2), quando afirma que:
Além da sociedade em rede, vivemos um Estado em rede. Significa dizer que
agentes públicos e privados (empresas e organizações não-governamentais de
distintos tipos, setores e escalas) formam redes de governança para co-produzir e
co-criar (fazer com várias partes, inclusive e principalmente com o beneficiário)
serviços, políticas e bens públicos nos mais distintos domínios temáticos.Redes de
governança são aqui definidas como conjuntos de nós (organizações, grupos,
indivíduos), links (comando e controle, concessão e inclusão, cooperação e
colaboração, competição etc.) e funções (coordenação, mobilização,
compartilhamento e difusão de informação, desenvolvimento de capacidades,
aprendizado e transferência de tecnologia, enunciado de problemas, desenho e
planejamento de soluções, prestação serviços, regulação, avaliação, alinhamento
político etc.).
Os estudos sobre gestão da água são numerosos no Brasil. Entretanto, as pesquisas sobre
governança ambiental são recentes e vêm ganhando espaço na academia brasileira nas últimas
décadas. Destacam-se os trabalhos Castro (2012); Cirillo (2008); Dallabrida (2006; 2011),
Jacobi (2009; 2012); Fernandes (2012), Tundisi et al. (2008), assim como aqueles
desenvolvidos pela ASA (2014; 2017) e MMA (2006; 2017).
2.3. A visão do Estado
Entender a governabilidade brasileira no semiárido é fundamental para se ter o contra-ponto
com a governança. Para isso, busca-se uma teorização que dê conta deste objetivo. São
incontáveis e competentes os estudos sobre a atuação estatal no Brasil. Refazê-los pode ser
um exercício inócuo, então parte-se aqui em busca de uma abordagem que esteja atrelada aos
objetivos desta tese e, ao mesmo tempo, seja nova ou pouco utilizada no Brasil.
Para entender o processo de gestão do território brasileiro é necessário partir do princípio de
que o Estado sempre desempenhou um papel fundamental através de governos centralizadores
que, habitualmente, tomavam, e ainda tomam, decisões de cima para baixo a partir das
informações e dos interesses de cada grupo que ocupa o poder em cada tempo.
52
Os estudos sobre território e sua gestão extrapolam qualquer área do conhecimento e para o
caso brasileiro, necessitam estar bem contextualizados, caso contrário, podem direcionar às
explicações generalizadoras, ou ainda, como na maioria dos casos, uma visão apenas
depreciativa do Estado como instrumento de manutenção do poder.
Nesse sentido, algumas escolhas conceituais foram feitas. A mais importante e norteadora
desta discussão vem de Scott (1998)74. Em sei livro, Seeing Like A State, o autor analisa como
o Estado moderno tem imposto uma ordem sobre os aspectos da sociedade visando
compreendê-la e controlá-la, o que ele chama de legibilidade. Tal ordem é imposta a partir da
simplificação de fenômenos complexos, forçando uma legitimidade do Estado ao mesmo
tempo que despreza os conhecimentos locais.
Scott defende a ideia de que a centralização e o planejamento são dois dos mais importantes
conceitos sociopolíticos do século XX e que qualquer cidadão que não entenda as
consequências disso, corre o risco de permitir que seu governo tome decisões destrutivas. O
cerne das discussões e proposições do autor é entender como funcionam os governos,
consequentemente, o Estado e como a população reage em cada contexto.
Para Scott (1998), os episódios mais trágicos de iniciativas estatais de engenharia social foram
originadas numa combinação perniciosa de quatro elementos:
1. A ordenação administrativa da natureza e sociedade - pode ser evidenciada com o
controle e regulamentação estatal de alguns pontos-chaves. Para fazer isso, é
necessário normatizar algumas características sociais como o tamanho, formato e
parcela da terra; uso de nomes convencionais; rotas de viagens e o formato das
cidades. Esse processo é, inevitavelmente, recursivo e as pessoas se sujeitam às
normatizações e seguem os padrões impostos. É a simplificação da complexidade em
nome da inteligibilidade. Em casos extremos de regimes autoritários, isso pode ter um
impacto devastador na vida das pessoas.
2. A confiança de que o progresso técnico e científico dá à ciência todo o conhecimento
74 É professor de Ciências Política e Antropologia da Universidade Yale, bem como diretor do Programa de
Estudos Agrários e membro de organizações como a Academia Americana de Artes e Ciências Fundação
Memorial John Simon Guggenheim. Possui uma extensa obra bibliográfica que foca em como as pessoas em
posição subalterna resistem ao domínio através da resistência cotidiana. Seus trabalhos possuem um viés
considerado anarquista e vão de encontro às ideias de Antonio Gramsci sobre homogeneização. Seus trabalhos
possuem normalmente a Ásia como objeto de estudo, mas as ideias que desenvolve em sua produção literária
podem ser aplicada em todo o mundo.
53
para maximizar a produtividade, o qual ele chama de 'ideologia ultramodernista' -
normalmente acontece quando o Estado centraliza dados que o auxiliam a descrever a
sociedade. Essas descrições se tornam normas que são vistas como padrões elevados.
A partir do princípio de que o individuo pode se aprimorar, o Estado assume então que
toda a sociedade pode se aprimorar se as regras forem impostas, unilateralmente, sobre
suas populações. Assumindo a posse do conhecimento científico, o Estado se vê na
posição de liderar toda a sociedade75. É evidente que o planejamento centralizado
retira as fontes de inovação, progresso e modifica o que emerge dos elementos
localizados, privilegiando um único corpo-guia que determina os resultados desejados
e as ações sociais estruturadas para criar esses resultados. Scott ainda discute que a
ideologia ultramodernista surgiu no século XX76, gerando práticas de controle e
planejamento centralizados77.
3. Um estado autoritário que se perpetua e está apto a fazer completo uso do seu poder
coercitivo - para que um estado administre as suas funções, ele precisa entender sua
população através da quantificação. Assumindo que todas as sociedades são mais
antigas e complexas que os estados onde existem, esse tem que buscar simplificá-las
para administrá-las. A quantidade de conhecimento necessário sobre uma sociedade é
proporcional aos objetivos da administração estatal. Historicamente, os estados tentam
obter as informações através de uma imposição de ordem que isola e simplifica as
sociedades que buscam entender e administrar. Enquanto o governo defende a
importância do planejamento para o progresso da humanidade, as pessoas se
reconhecem como categorizadas e controladas através de uma enumeração e
geometrização.
4. Uma sociedade civil sem força e sem a capacidade de resistir a esses planos - a última
condição é, na verdade uma reação, ou a falta dela, à atuação estatal. As razões que
75 Scott aprofunda a questão ao dizer que mesmo parecendo algo inerentemente destrutivo, vários dos projetos
mais progressistas e benéficos no mundo surgiram da grande escala de planejamento. Projetos de centralização
enormes surgiram durante os períodos de guerra e da Depressão com resultados positivos para a economia dos
Estados Únicos. Entretanto, dois outros fenômenos políticos obtiveram resultados catastróficos como a
revolução e o colonialismo. 76 Surgiu na Alemanha ainda na primeira guerra mundial quando se acreditava que planejando cada aspecto da
economia se poderia manter os esforços da guerra e fazendo isso, criou-se um mecanismo, um processo
mecanizado que realmente funcionava. O sucesso de uma produção racionalizada inspirou políticas além de suas
fronteiras e aqueles que acreditavam nela, também acreditavam que se eliminariam os problemas da sociedade
ao aumentar a produtividade, diminuindo a insatisfação com o trabalho, eliminando a opressão capitalista e
equalizando a distribuição da saúde. Com o fim da guerra, parecia lógico expandir essa prática de controle e
planejamento que iria florescer sem as drenagens da guerra. 77 Essas ideias influenciaram bastante Vlademir Lênin e o governo soviético que acreditavam que o
conhecimento superior, a instrução autoritária e o delineamento social transformariam a sociedade de uma
maneira melhor e mais eficiente.
54
levam uma sociedade a não reagir são diversas e devem ser analisadas caso a caso,
levando-se em consideração cada contexto histórico, político, econômico, cultural e
social.
Scott (1998) estuda e aprofunda78 a prática do século XX de impor estruturas em diversos
elementos sociais, ao mesmo tempo em que oferece uma forte crítica aos métodos políticos
que buscam tornar legíveis as sociedades, culturas e práticas que se desenvolvem sem uma
ordem hierárquica e geométrica restrita.
A escolha das ideias de Scott como norteadora da atuação estatal no semiárido brasileiro se dá
pela universalidade do seu pensamento. O que o autor propõe como análise do planejamento e
da centralização estatal se pode aplicar em qualquer escala, da menor à maior. Não obstante, o
que se vê de atuação estatal no Brasil segue, em princípio, os quatro elementos listados
anteriormente.
É necessário entender a atuação do Estado. As discussões sobre centralização e
descentralização são fundamentais, pois parte-se do pressuposto de que a gestão deve ser
constantemente aprimorada para se aproximar às necessidades de quem é alvo das suas
políticas. Nesse ponto, faz-se uma ligação com as discussões sobre governança apresentadas
anteriormente, pois como afirma Egler (2000: 234) "a definição de metas de desenvolvimento,
nas diversas escalas de gestão local, regional e nacional pressupõe a montagem de um espaço
de negociação entre os distintos objetivos de uso do território pelos agentes públicos e
privados".
Após o exposto, apresenta-se abaixo esquematicamente o quadro teórico da pesquisa.
78 Seus trabalhos ainda contemplam estudos sobre o Sudeste da Ásia e seu período colonial.
55
Fonte : elaboração própria.
Figura 5 - Esquema com o quadro teórico e seu uso na tese
56
Capitulo 3 - A Metodologia
A metodologia dessa pesquisa se situa no paradigma interpretativo multivariado que pode, em
análise qualitativa, medir o peso das variáveis que serão avaliadas por meio de indicadores.
Essa escolha se aplica à pesquisa aqui proposta, uma vez que
o argumento multivariado supõe que uma sociedade é composta de sistemas
(unidades de análise) relativamente autônomos com os indivíduos, as
comunidades, as famílias, as organizações, os Estados, etc. Os atributos destas
unidades são as variáveis (gênero, educação, dividendos, existência ou não de
democracia, etc.)79 (Gravel, 2011 : 10-11).
3.1. O Estudo de caso como estratégia de verificação
Para Mace (1992 : 70), "não é a estratégia ou a técnica que determina o problema de pesquisa,
mas muito mais a natureza do problema que impõe a estratégia e determina a técnica a ser
utilizada80", sendo assim, optou-se pelo estudo de caso como estratégia de verificação, uma
vez que "o estudo de caso sintetiza um processo ou um conjunto complexo de processos
demonstrando como ferramentas teóricas podem ser aplicadas ao mundo social81" (Gregory et
al., 2009 : 72).
Essa escolha se justifica também por se caracterizar como uma estratégia empírica em que o
pesquisador observa as interações possíveis entre as variáveis, permitindo entender a
realidade contemporânea onde as fronteiras entre os fenômenos e seu contexto não são sempre
evidentes e onde, habitualmente, tem-se que fazer uso de múltiplas fontes de informações e
evidências (Mace, 1992). É ainda uma estratégia de verificação interna que busca apreender
um fenômeno dentro do seu contexto em uma abordagem de estudo integral (holística) e
assegurar uma validade à pesquisa, uma vez que os fenômenos revelados são representações
autênticas da realidade estudada e que as variáveis não podem ser manipuladas pelo
pesquisador(a) (Gravel, 2011).
79Tradução livre de: "L’argument multivarié suppose qu’une société est composée de systèmes (unités d’analyse)
relativement autonomes comme des individus, des communautés, des familles, des organisations, des états, etc.
Les attributs de ces unités sont les variables (genre, éducation, revenus, existence ou non de la démocratie,
etc.)". 80Tradução livre de: "ce n'est pas la stratégie ou la technique qui détermine le problème de recherche mais que
c'est bien plutôt la nature du problème qui impose la stratégie et détermine la tachnique à utiliser". 81Tradução livre de: "the case study epitomizes a process or complex set of processes in context, thereby
demonstrating how theoretical tools can be applied to the social world".
57
As unidades de análises delimitadas possuem três níveis de atuação estatal, o federal, o
estadual e o municipal. Tal escolha se dá pela necessidade de se entender a gestão hídrica a
partir do Estado brasileiro (que atua em três escalas) e ainda a necessidade de uma
delimitação que torne o estudo possível. Como atores, selecionou-se o Estado em seu nível
federal e estadual; a sociedade civil organizada através das Organizações Sociais Civis (OSC)
e a participação de conselho de gestão, a saber o Comitê da Bacia Hidrográfica do São
Francisco (CBHSF). As escolhasenfatizaram a escala regional,uma vez que a gestão da água
tem um caráter interestadual que, necessariamente, impôea necessidade do entendimento
regional.
Chama-se atenção então que se objetiva a proposição de um modelo para a gestão hídrica no
semiárido brasileiro que contribua com uma governança da água de maneira exequível para os
atores implicados e respeitando as características sociais, econômicas e culturais da região.
Entretanto, como o semiárido é uma região grande e complexa para um estudo de tese, que
deve entender e respeitar os limites da pesquisa já expostos na introdução, optou-se por
estudar o caso do semiárido do Estado de Pernambuco. Essa eleição se fez pertinente porque o
recorte do estado mantém as características principais (físicas, políticas, econômicas, culturais
e sociais) do todo o semiárido, bem como segue todos os requisitos de gestão dos seus
recursos hídricos a partir das leis nacionais e das bacias hidrográficas no Brasil.
3.2. Instrumento de coleta de dados
Tendo a estratégia do estudo de caso e da coleta de informação documental, tem-se como
instrumento elegido, a consulta documental aqui entendida como a consulta dos "documentos
de onde se extrai informação factual (estatísticas ou material bruto de conversação verbal
como uma declaração ministerial ou não verbal como um voto, uma visita, etc.) ou as
opiniões ou conclusões científicas que servirão de apoio à argumentação"82 (Mace, 1992 : 80).
Tem-se assim, os dados primários e secundários, ou de primeira mão e segunda mão.
Para Mace (1992), a coleta de informação deve ser feita de maneira seletiva. É necessário
precisar os instrumentos de coleta de informação, sejam observação de campo, consulta de
documentos ou realização de entrevistas. No caso dessa tese, fez-se uso dos três.
82Tradução livre de: "des documents desquels il est extrait une information factuelle (statistique ou faits bruts de
comportement verbal, telle une déclaration ministérielle, ou non verbal, tel un vote, une visite, etc.) ou des
opinions ou conclusions scientifiques qui serviront à appuyer l’argumentation".
58
As fontes primárias utilizadas nessa tese são os documentos coletados nos sites
governamentais, das organizações sociais e do CBHSF, bem como as entrevistas realizadas
com os membros da CCR do Submédio São Francisco. As fontes secundárias são os livros,
teses, dissertações e artigos acadêmicos consultados.
3.2.1. Fontes do CBHSF
Para o entendimento da gestão a partir do CBHSF, foram consultadas todas as atas de
plenárias das reuniões da CCR São Francisco entre 2003 e 2018. A sua escala de atuação é
local, mas pensada regionalmente a partir do submédio São Francisco.
O CBHSF realiza reuniões plenárias nas quais participam o poder público, usuários e as
comunidades, com o intuito de discutir e planejar ações que contribuam para uma gestão dos
recursos hídricos eficiente, proporcionando aos municípios que integram a bacia um
desenvolvimento sustentável. Até o momento, foram realizadas trinta e cinco Reuniões
Plenárias Ordinárias, as quais ocorreram em: maio e dezembro de 2003; julho e outubro de
2004; junho e de dezembro de 2005; julho e dezembro de 2006; abril de 2007, agosto e
dezembro de 2007; setembro e novembro de 2009; agosto e dezembro de 2010; julho e
novembro de 2011; julho, agosto e novembro de 2012; abril, agosto e dezembro de 2013;
maio e novembro de 2014; maio e dezembro de 2015; maio, julho, setembro e dezembro de
2016; maio, agosto e dezembro de 2017 e, por fim, maio e dezembro de 2018 (Anexo 2).
Na construção do plano de trabalho da tese, não se decidiu, inicialmente, por fazer entrevistas, então a
metodologia foi construída para abarcar o uso de dados primários e secundários publicados pelos
órgãos estatais e OSC's. Entretanto, no decorrer das pesquisas e, principalmente, depois do
levantamento das informações contidas nas atas das plenárias do CBHSF, percebeu-se lacunas
sobre o processo de tomada de decisão que não eram, suficientemente, preenchidas pela
documentação. Destarte, percebeu-se a necessidade de ouvir seus participantes.
3.2.1.1 As entrevistas com os membros da CCR Submédio São Francisco
O questionário (Anexo 3) para ser aplicado com os membros nas entrevistas semi-dirigidas, titulares e
suplentes da CCR do submédio São Francisco foi construído visando dar voz e aprofundar o
conhecimento sobre a gestão da água. Buscava-se entender o que não é revelado nas atas das plenárias,
59
tais como as ideias defendidas e suas estratégias; preencher as lacunas de conhecimento e também
contemplar as variáveis que da pesquisa.
Nesse sentido, o questionário contou com dezessete perguntas divididas em cinco blocos. O primeiro
bloco tratou da atuação dos membros; o segundo bloco versou sobre os critérios para a tomada de
decisão sobre a gestão das águas; para o terceiro bloco procurou-se entender como são
tomadas as decisões; o quarto bloco buscou entender a participação cidadã nos comitês e, por
último, o quinto bloco intencionou compreender como os membros entrevistados avaliam a
gestão das águas através dos comitês. O questionário também reservou um espaço, no seu
final, para dar liberdade aos entrevistados trazerem quaisquer temas que eles julgassem
relevantes e que não haviam sido tratados nas perguntas.
A escolha dos entrevistados seguiu o critério da sua participação na Câmara Consultiva
Regional do comitê, seja como conselheiro titular ou suplente no mandato de 2016-2020. Ao
todo são sessenta e duas vagas de conselheiros, sendo metade titular e metade suplente.
Entretanto, nem todas as vagas estão preenchidas. Assim, existem membros que participam de
mais de uma CCR e diversas cadeiras que ainda aguardavam, na época, indicação ou
substituição.
Entretanto, alguns membros habitam em localidades com sérias restrições de contato
telefônico e/ou correio eletrônico, o que dificultou encontrá-los. Posto isso, enviou-se
correspondência a vinte e seis conselheiros, obtendo-se resposta de dezoito, entretanto apenas
nove concederam as entrevistas. Entre as explicações nas recusas estavam a indisponibilidade
de tempo; exigência de entrevista apenas pessoalmente, inviável pela dificuldade de
deslocamento para às suas cidades e falta de interesse em contribuir com a pesquisa. Das nove
entrevistas, quatro foram realizadas pessoalmente através de gravação; uma entrevista por
ligação telefônica e quatro por correio eletrônico através do preenchimento do questionário
por escrito. As entrevistas in loco e por telefone foram registradas por software do telefone
celular. Em seguida, salvas em arquivos de áudio que foram guardados no computador,
juntamente com as entrevistas por email que foram salvas em formato .doc.
As datas, locais, duração das entrevistas e os nomes fictícios estão na tabela abaixo:
60
Data Local da entrevista Duração da entrevista Nome fictício
23/11/2018 Juazeiro (BA) 62 minutos Luiz
30/01/2019 Petrolina (PE) 33 minutos Chico
04/02/2019 Correioeletrônico Geraldo
07/02/2019 Correioeletrônico Oswaldo
16/02/2019 Correioeletrônico Alceu
20/02/2019 Juazeiro (BA) 67 minutos Fred
22/02/2019 Petrolina (PE) 43 minutos Adilson
24/02/2019 Correioeletrônico Jorge
29/03/2019 Portelefone 35 minutos Maria
Tabela 5 - Membros entrevistados da CCR do submédio São Francisco.
3.2.2. Fontes de órgãos governamentais
Como órgãos estatais pesquisados, selecionou-se: a Superintendência para o Desenvolvimento
do Nordeste (SUDENE), o Departamento Nacional de Obras contra a Seca (DNOCS), a
Companhia Hidroelétrica do São Francisco (CHESF), a Companhia de Desenvolvimento dos
Vales do São Francisco e do Parnaíba (CODEVASF), a Agência Nacional de Águas (ANA), o
Instituto do Semiárido (INSA), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o Ministério
do Meio Ambiente (MMA) e a Companhia Pernambucana de Saneamento (COMPESA). Os
dados foram extraídos dos sítios na Internet e são, sobretudo, sobre obras de infraestrutura
hidráulica, como barragens, açudes, represas, lagos artificiais, usinas hidrelétricas e projetos
de irrigação. Notadamente ações de modificações no território.
3.2.3. Fontes das organizações sociais civis
Assim como os órgãos estatais, as OSC's possuem sítios na Internet com informações
publicadas. As publicações são, em sua maioria, relatórios de articulações institucionais e
relatos de experiências locais que permitiram a compreensão das ações em uma escala
diferente da atuação estatal.
Os dados dessas publicações podem ser considerados dispersos e não sistematizados, porém
partiu-se da perspectiva de que o conhecimento informal e local está reservado a usos,
tradições e sistemas locais de utilizações, não eliminando, entretanto, o conhecimento formal,
normalmente, de iniciativas em larga escala e convenções globais (Fabriciuset al., 2006).
As principais fontes de informações foram Articulação do Semiárido (ASA) e a Associação
Brasileira de Organizações Não-Governamentais (Abong).
61
3.3. Tratamento dos dados
O critério para seleção dos dados se deu pela ação de gestão dos recursos hídricos no
semiárido a partir do seu entendimento como sertão, ou seja, o recorte se deu a partir do que
foi definido, previamente pelo Estado e pelas OSC's como políticas de gestão hídrica no
semiárido. Esse critério foi fundamental na análise do conteúdo das ações estatais e da
sociedade civil organizada, restringindo o leque de milhares de ações que ocorreram ao longo
das últimas décadas, ao mesmo tempo que, direcionou o foco dentro dos limites da pesquisa
apontados anteriormente.
Seguindo o mesmo encaminhamento apresentado acima, as ações das OSC's foram também
levantadas e sistematizadas, permitindo entender sua escala de atuação. Os dados obtidos da
sociedade civil organizada foram sistematizados a partir da sua escala de atuação que é,
essencialmente, local.
3.4. Análise de conteúdo e analise de discurso
Tendo em vista que esse é uma tese de Geografia Humana, utilizou-se a abordagem
metodológica qualitativa, aqui entendida como "esforço intelectual, constante, intuitivo e
natural, visando encontrar um reorganização relevante dos dados para torná-los
compreensíveis, globalmente, diante de um problema prático ou teórico que preocupa o
pesquisador83" (Paillé e Mucchielli, 2003 : 35). Indo além, Mucchielli (2007 : 22) afirma que
a "pesquisa qualitativa é, portanto, principalmente um fenômeno social. Ela se apresenta para
nós como a implementação de um tipo de conduta chamado 'científico' por uma população de
pesquisadores que têm a característica comum de fazer pesquisas em ciências humanas e
sociais (e não em ciências físicas e naturais)"84..
Para isso, apoiou-se, no plano metodológico, na análise de conteúdo entendida, inicialmente,
como uma forma de pesquisar que dá ao objeto, uma descrição objetiva, sistemática e
quantitativa do conteúdo (Belson 1952 apud Gumuchianet al., 2000). É, ainda uma "técnica
de análise de dados para descrever e interpretar sistematicamente o conteúdo que emerge das
83Tradução livre de : Un effort intellectuel, constant, intuitif et naturel, visant à trouver un ré-arrangement
pertinent des données pour les rendre compréhensibles, globalement, compte tenu d’un problème pratique ou
théorique qui préoccupe le chercheur. 84Tradução livre de : Une recherche qualitative est donc d’abord un phénomène social. Elle se présente à nous
comme la mise en œuvre d’un type de conduites dites « scientifiques » par une population de chercheurs qui ont
la caractéristique commune de faire de la recherche en sciences humaines et sociales (et non en sciences
physiques et naturelles).
62
comunicações. Essa é uma técnica usada para responder a cinco questões levantadas pela
análise interna de uma comunicação: Quem fala? Para dizer o quê? Por quais processos? A
quem? Com que efeito?85" (Mace e Pétry,2000 : 96). Os dados foram coletados, descritos,
sistematizados, mensurados e avaliados.
Fez-se uso ainda da análise de discurso, aqui entendida como uma técnica de pesquisa em
ciências sociais que permite analisar a articulação de um texto com o lugar social em que ele é
produzido (Maingueneau, 1996 apud Barry, 2002). Entende-se que um texto possui vários
discursos e que necessita-se estar atento também ao que não é dito. Assim,
parte-se do princípio de que as declarações não aparecem como sentenças ou
sequências de sentenças, mas como textos. Mas um texto é um modo específico de
organização que deve ser estudado como tal, relacionando-o às condições sob as
quais é produzido. Considerar a estrutura de um texto, relacionando-o com suas
condições de produção, é considerá-lo como discurso86 (Grawitz, 1999 : 345).
Para Lejeune (2017 : 212),
a análise do discurso postula que qualquer texto contém traços de seu contexto de
produção. A análise desses traços informa, portanto, sua origem e possibilita
elaborar uma tipologia dos discursos: cada gênero, cada estilo, cada discurso é
caracterizado por propriedades formais particulares, como os conectores
argumentativos, os tempos verbais, a duração dos discursos. frases ou o registro
de idioma. Assim definida, a análise do discurso visa caracterizar cada discurso de
maneira precisa e depurada, o que implica identificar suas características
formais87.
Para identificar e analisar as categorias emergentes, é fundamental estar atento á recorrência
das informações observadas. "'A 'recorrência' é assim identificada a partir de uma 'forma de
troca'. O observador inclui, sob um conjunto de conteúdos variados, uma categoria idêntica
que pode especificar da mesma maneira esses conteúdos variados. O processo intelectual aqui
85Tradução livre de : une technique d’analyse des données visant à décrire et à interpréter de manière
systématique le contenu manifeste des communications. C’est une technique que l’on utilise pour répondre à
cinq questions soulevées par l’analyse interne d’une communication : Qui parle ? Pour dire quoi ? Par quels
procédés ? À qui ? Avec quel effet recherché ? 86Tradução livre de : partent néanmoins du principe que les énoncés ne se présentent pas comme des phrases ou
des suites de phrases mais comme des textes. Or un texte est un mode d’organisation spécifique qu’il faut étudier
comme tel en le rapportant aux conditions dans lesquelles il est produit. Considérer la structure d’un texte en le
rapportant à ses conditions de production, c’est l’envisager comme discours. 87Tradução livre de : l’analyse de discours postule que tout texte comporte des traces de son contexte de
production. L’analyse de ces traces informe dès lors sur son origine et permet d’élaborer une typologie des
discours : chaque genre, chaque style, chaque discours se caractérise par des propriétés formelles particulières,
comme les connecteurs argumentatifs, les temps verbaux, la longueur des phrases ou le registre de langue. Ainsi
définie, l’analyse de discours vise à caractériser précisément et finement chaque discours, ce qui implique d’en
recenser les caractéristiques formelles.
63
é um processo que combina comparação para a busca de similaridade e categorização. O
'mesmo' é nomeado88 (Mucchielli, 2007 : 22).
Ao se buscar perceber as categorias que surgem, é necessário ter em mente que
quando um sujeito é entrevistado, ele ou ela não está ciente das categorias de
análise utilizadas pelo pesquisador. Ele ou ela transmitirá um material bruto, sua
trajetória de vida, suas experiências, opiniões pessoais, que deverão ser
classificadas posteriormente. Como o pesquisador não pode estudar tudo, é
normal impor limites ao que é relevante e deixar de lado informações, ou mesmo
partes de entrevistas ou entrevistas na íntegra (Gravel, 2011 : 2)89.
Destarte, as categorias vão emergir do trabalho do pesquisador sobre o material recolhido.
3.4.1. A análise documental
A análise dos documentos concernentes às estratégias de gestão hídrica do Estado e da
sociedade civil organizada serviram para compreender o processo de gestão do semiárido.
Essa proposta se baseia na ação multiescalar que vem sendo desenvolvida, recentemente, por
autores como Amin (2002), Wilbanks, (2006), Lebel (2006) e Boyd (2006).
Os dados levantados foram do tipo quantitativo e qualitativo, uma vez que contemplaram
informações disponibilizadas por diversos tipos de fontes, tal como foi apontado
anteriormente nos indicadores. Foram seguidas três etapas: a primeira, sistematização dos
dados a partir da sua categorização e, com isso, a construção de bancos de dados. Em posse
desta sistematização, conduziram-se às comparações e relações entre os dados e a busca por
lacunas ou ausências.
A última etapa consistiu em analisar o conjunto dos dados de acordo com os temas
recorrentes. Essa foi desenvolvida a partir da proposta de Paillé e Mucchielli (2003) para a
análise temática. Esses autores propõem que para a criação de um tema pertinente, os
documentos deverão ser lidos e marcados (através de termos sublinhados e anotações) e, em 88Tradução livre de : La « récurrence » est donc repérée à partir d’une « forme d’échange ». L’observateur
subsume, sous un ensemble de contenus variés, une catégorie identique pouvant spécifier de la même manière
ces contenus variés. Le processus intellectuel est ici un processus combinant la comparaison pour la recherche
de ressemblance et la catégorisation. Le « pareil » est nommé. 89Tradução livre de : lorsqu’un sujet est interviewé, celui‐ci n’est pas au courant des catégories d’analyse
utilisées par le chercheur ou la chercheure. Il ou elle transmettra un matériel brut, sa trajectoire de vie, ses
expériences, des opinions personnelles, qu’il faudra trier par la suite. Comme le chercheur ou la chercheure ne
peut tout étudier, il est normal de mettre des limites à ce qui est pertinent et de mettre de côté des informations,
voire des pans d’entrevues ou des entrevues en entier.
64
seguida, classificados. A partir disso, os temas e sub-temas emergirão e, com isso, feita a
inferência, que consiste na análise de uma porção do material e atribuição de temas para cada
extrato. Em seguida, se constrói a árvore temática que aqui consistiu em um reagrupamento
dos temas e sub-temas apresentados de forma esquematizada. Para essa tarefa foi utilizado o
software gratuito Qiqqa que permite a catalogação, organização, manejo, análise e construção
de interações entre documentos em formato digital e, posteriormente, a montagem de
diagramas em mapas mentais permitindo a visualização e interação entre conceitos, temas e
sub-temas.
Assim, no quadro desse projeto de pesquisa, os levantamentos e sistematização de dados
documentais e cartográficos mostram o processo de gestão da água vivenciado no semiárido.
3.4.2. A análise dos resultados das entrevistas
A construção do guia de entrevistas qualitativo e semiestruturado levou em conta,
primeiramente, os objetivos da tese; as variáveis e indicadores da pesquisa (presentes no item
3.6 da metodologia); as lacunas deixadas pelo levantamento de dados realizados nas atas das
plenárias e, por fim, a possibilidade dos entrevistados darem vazão ao que pensam e como
atuam no comitê. Uma vez realizada as entrevistas, procedeu-se com as transcrições. Esse
material bruto foi a base da analisis presente no capítulo 8.
De posse do material bruto, ou seja, as transcrições, fez-se uso da técnica de análise de
verbatim que consiste em um processo de representação e análise de dados de entrevistas
coletivas e/ou individual (Paillé e Mucchielli, 2003; Paillé, 2007). Os dados das entrevistas
foram analisados de forma rigorosa, sistemática e verificável apontando quem são as pessoas
entrevistadas e quais órgãos representam no comitê.
Em seguida, procedeu-se com a leitura das transcrições para a identificação de pontos de
aproximação. A análise prosseguiu executando uma codificação axial do texto literal. Assim,
cada parte do texto foi classificada em uma categoria que representasse a ideia que ela
transmite. Essas categorias foram agrupadas em temas gerais, aqui identificados como:
Percepções e objetivos dos membros, As estratégias para a tomada de decisão, Participação
cidadã e dos membros no comitê, As tomadas de decisão, O Estado de Pernambuco na gestão
da CCR do submédio São Francisco e Avaliação da gestão a partir da bacia hidrográfica.
65
Cada categoria foi analisada, aprofundada e confrontada com as informações constantes nas
atas das plenárias. Assim, fez-se o uso de documentação e entrevistas para, em conjunto, ter
uma ideia mais verticalizada e, ao mesmo tempo, mais próxima da realidade de um fórum de
discussões com formação heterogênea e objetivos convergentes e divergentes.
3.5. Modos de apresentação dos resultados
Os resultados foram representados de diversas maneiras. Os dados obtidos, sistematizados e
analisados foram apresentados em uma discussão objetivando uma proposta de cogestão para
o semiárido brasileiro.
Para comunicar todo o processo de gestão hídrica no semiárido, construíram-se os capítulos
trazendo a narrativa, respeitando a suas espacialidades e temporalidades. Assim, optou-se pela
sequência de capítulos em que se apresenta, primeiramente, a delimitação ambiental e legal do
semiárido (capítulo 4) e, em seguida, a construção das suas representações territoriais em
ordem cronológica (capítulo 5). Esta sistematização permitiu a análise integrada em diferentes
escalas, uma vez que "a escala é, na realidade, medida que confere visibilidade ao fenômeno"
(Castro, 1996 : 123). Assim, o capítulo 6 apresenta como os recursos hídricos foram e são
geridos pelo Estado; o capítulo 7 discorre sobre a relação Estado-OSC's nessa gestão e o
capítulo 8 traz a gestão a partir da CCR submédio São Francisco. Esses capítulos, dispostos
em sequência, apresentam a gestão multiescalar no semiárido do Estado de Pernambuco.
A construção, a partir do quadro teórico proposto, foi organizada e apresentada em formato de
textos, intercalados de gráficos, tabelas, esquemas explicativos como fluxogramas e figuras. O
capítulo 9, por conseguinte, apresenta a proposta de gestão dos recursos hídricos a partir dos
dados levantados e da discussão apresentada ao longo da tese. Nesse sentido, o capítulo 9
objetiva ser uma proposição exequível e mais eficiente na gestão.
3.6. As variáveis e indicadores da pesquisa
As variáveis foram estabelecidas como Antecedentes, Independentes, Intermediárias e
Dependentes. A indicação de cada uma se fez a partir da necessidade de conduzir a um
66
encaminhamento e mensuração dos dados a serem levantados. Uma vez estabelecidas as
variáveis, partiu-se para a escolha dos seus indicadores.
Como variável antecedente, optou-se pelas "Condições naturais do semiárido" por ser
antecedente a qualquer atuação humana pós-colonial na região. Em seguida, as variáveis
independentes foram escolhidas a partir da necessidade de se entender o que foi construído no
semiárido independente da pesquisa aqui apresentada. Então, a construção das percepções que
deram ao semiárido brasileiro a ideia de uma região a ser modificada e assim entendida como
sertão e a ação estatal nortearam a escolha das variáveis "a construção das representações
sobre o semiárido" e "a capacidade do Estado para governar o semiárido" foram estabelecidas.
A partir das variáveis antecedentes e independentes e norteado pelos objetivos da pesquisa,
estabeleceram-se as variáveis intermediárias como um caminho para se chegar às variáveis
dependentes. Sendo assim, "Atuação multiescalar dos governos" e a "Descentralização das
decisões" são variáveis fundamentais para se chegar a "gestão dos recursos hídricos" e
"adequação das políticas públicas às necessidades das populações".
Por fim, da necessidade de localização, coleta, sistematização, mensuração e análise dos
dados e tendo as variáveis estabelecidas, foram estabelecidos os indicadores que, juntamente
com as variáveis, são demonstrados na tabela e, posteriormente na figura que apresenta o seu
fluxo.
Variáveis Indicadores
Variáveis
Antecedentes
Condições naturais
do semiárido Dados climatológicos (temperatura, precipitação, umidade
relativa, pressão atmosférica e radiação solar); hidrológicos
(presença de rios e lagos temporários e perenes, evaporação);
geomorfológicos (altitude, tipos de relevo); pedológicos (tipos
de solos e sua distribuição no espaço); Dados fitogeográficos
(tipos de vegetação e sua distribuição no espaço)
Frequência da ocorrência das secas (e seus períodos).
Variáveis Independentes
Construção das
representações sobre
o semiárido
Ocorrência do uso da palavra sertão como sinônimo ou
substituto de semiárido
Capacidade do
Estado para governar o semiárido
Ações estatais implementadas no semiárido de Pernambuco
Dados utilizados pelo Estado através das suas instituições para tomada de decisão
Variáveis
Intermediárias
Atuação multiescalar
dos governos Recursos financeiros federais depositados na região entre 1985 e
2018
Descentralização das
decisões Transferência de responsabilidade e ações do nível federal para o
estadual entre 1985-2018
Variáveis Gestão dos recursos
hídricos Tipos de transferência de responsabilidade entre o Estado e OSC
Evolução das ações das OSC em Pernambuco entre 1985 e 2018
67
Dependentes Ações implementadas pelas OSC nos últimos 30 anos Adequação das
políticas públicas às
necessidades das
populações
Número de políticas públicas implementadas no semiárido entre
1985-2018
Mudanças nas políticas públicas federais e estaduais depois de
serem implementadas Tabela 6 - Variáveis e Indicadores da pesquisa
Figura 6 - Esquema da operacionalização das variáveis
Variáveis Antecedentes
Condições naturais do semiárido
Variáveis Independentes
Construção das representaçõessobre o semiárido
Capacidade do Estado paragovernar o semiárido
Variáveis Intermediárias
Gestão do território e dosrecursos naturais
Adequação das políticas públicasàs necessidades das populações
Variáveis Dependentes
Atuação multiescalar dosgovernos
Descentralização das decisões
68
Capítulo 4 - Delimitação ambiental e legal do semiárido brasileiro
As zonas áridas, semiáridas e subúmidas secas estão presentes em todos os continentes à
exceção da Antártida. Ocupam aproximadamente um terço das terras emersas do planeta com
mais de cinco bilhões de hectares distribuídos em cerca de 100 países (Ab'Sáber, 1999).
"Segundo dados do PAN-Brasil, aproximadamente 42 por cento da população mundial vive
em áreas suscetíveis, com predominância de indicadores socioeconômicos baixos e muito
baixos" (Torres e Pfaltzgraff , 2014 : 173).
No Brasil, existe uma delimitação legal para o semiárido que segue critérios ambientais e
políticos. Uma particularidade brasileira necessita ser levantada e discuta. A despeito de
possuir um semiárido com características semelhantes aos demais do mundo, no caso
brasileiro existe a denominação de sertão, termo utilizado pelos portugueses desde antes a sua
chegada ao Novo Mundo. O termo sertão possui uma história de significados e resignificados,
ao longo dos séculos, que influenciaram as visões e as ações das sociedades no semiárido
brasileiro.
Posto isso, este capítulo está dividido em quatro partes. A primeira aborda as características
ambientais dos semiárido e, em particular, o semiárido brasileiro. Numa segunda parte
detalha-se a delimitação legal do semiárido brasileiro. A terceira parte trata do sertão como
um qualitativo de lugares e a trajetória do seu uso no Brasil. A quarta e última parte aborda as
representações territoriais materiais e imateriais do semiárido brasileiro.
4.1. Delimitação ambiental do semiárido brasileiro
Como toda região ou território, o semiárido brasileiro se diferencia por características
ambientais que, em maior ou menor influência, se impuseram no processo de ocupação
humana e, consequentemente, se apresentam na cultura, na sociedade e na economia. A
seguir, serão tratados os aspectos ambientais do semiárido.
Numa visão mais clássica das caracterizações naturais do ambiente, a compartimentação e
separação do ambiente em categorias, tais como relevo, clima, solos, vegetação, corpos
líquidos, é frequente. Os primeiros trabalhos de geógrafos no Brasil, com forte influência da
geografia regional francesa e ainda de base positivista traziam, em sua maioria, os chamados
aspectos geomorfológicos, climáticos, edafológicos, biogeográficos e hidrogeográficos. Mais
69
recentemente, sobretudo após os anos setenta do século passado e com a influência da teoria
geral dos sistemas no Brasil, procurou-se entender o ambiente como um sistema integrado. As
discussões e delimitações através das ecorregiões são oriundas de estudos mais recentes90.
Posto isso, as características ambientais do semiárido serão apresentadas a seguir,
primeiramente numa visão mais sedimentada na Geografia e, consequentemente,
compartimentada para, em seguida, serem apresentadas as ecorregiões e as bacias
hidrogáficas.
Ressalva-se ainda que haverá um momento para a apresentação das chamadas áreas de
exceções conhecidas como brejos, áreas inseridas dentro do semiárido, porém completamente
diferentes em suas características ambientais. Em todos os casos, haverá ênfase ao Estado de
Pernambuco.
4.1.1. Considerações sobre o clima do semiárido brasileiro
A classificação de aridez quando utilizada no semiárido brasileiro permitiu concluir que a
presença de localidades consideradas áridas está presente em 98.521,479 km2; o subúmido
úmido ocorre em 16.119,327 km2, o subúmido seco ocorre em 136.586,013 km2; o semiárido,
tropical ou subtropical aparece em 628.049,208 km2 e, por fim, o úmido, tropical ou
subtropical registra-se em 929.062 km2.
90 Os trabalhos de pesquisa desenvolvidos a partir das ecorregiões dão subsídios aos zoneamentos ambientais de
pesquisadores e não necessariamente fazem parte de órgãos que atuam diretamente nos ambientes. No Brasil,
autores como Velloso, Sampaio e Pareyn (2001), Ab'Sáber (2003) e Ross (2009) contribuíram na construção e
difusão das discussões sobre as ecorregiões.
70
Fonte : INSA (2014).
Figura 7 - Classificação climática do semiárido
Segundo Ab'Sáber (1999), existem na América do Sul três grandes áreas semiáridas, são elas:
a região de Guajira entre a Venezuela e a Colômbia; a diagonal seca do Cone Sul entre a
Argentina e o Chile e o semiárido brasileiro, o único contido em apenas um país.
Os climas presentes no Brasil são o Equatorial, o Tropical, o Tropical de Altitude, o Tropical
Atlântico, o Subtropical e o Semiárido. Com uma grande extensão, mesmo para os padrões
continentais brasileiros, o semiárido possui uma biodiversidade bastante significativa. Soma-
se a isso uma grande diversidade de relevos, vegetações e solos.
O semiárido brasileiro localiza-se na faixa de clima tropical, porém ficando mais próximo da
linha do Equador que dos trópicos. Mesmo assim, o ritmo do seu clima continua sendo
tropical, com duas estações bem marcadas, uma muito seca, outra moderadamente chuvosa,
cuja continuidade, entretanto, está sujeita a fortes rupturas ao longo dos anos (Ab'sáber,
1999). Entretanto, tais características permitem um regime pluviométrico com características
distintas do restante do Brasil.
71
A explicação do porquê da existência de uma região semiárida no Brasil vem da circulação
atmosférica91 e de suas massas de ar92. Os totais pluviométricos são baixos e estão atrelados
ao que acontece com a Zona de Convergência Intertropical (ZCIT)93 que no verão e outono
está localizada no Hemisfério Sul. Para Jatobá e Silva (2015: 18), "quando esse mesmo ar é
forçado a descer, por exemplo, para uma depressão como as que existem no semiárido, o ar se
aquece e se torna ainda mais seco, ou seja, as áreas mais secas são exatamente as que se
localizam na depressão sertaneja94".
As áreas mais afetadas pelas secas são as se encontram sob influência direta da ZCIT, quer se
trate de secas anuais ou plurianuais. A variabilidade climática decorrente da ação da ZCIT é
combinada com os fatores que determinam o regime pluviométrico na Zona da Mata e no
Nordeste meridional. Quando essa conjunção de fatores se articula é que ocorrem as secas de
amplas proporções como as anuais (de 1951, 1958 e 1970) e plurianuais (de 1979-1983)
(MIN, 2005).
Por outro lado, a massa de ar equatorial continental proveniente da Amazônia perde força e
umidade em seu percurso oeste-leste. Essa combinação gerou tanto uma concentração de
umidade no litoral brasileiro como a pouca umidade no interior e a consequente formação e
manutenção do semiárido95 (Ab'saber, 1999).
Essa configuração favorece a precipitação na região, já no inverno a precipitação é inibida
pelos movimentos descendentes deste sistema, que agora se localiza no Hemisfério Norte.
91 Entende-se por circulação atmosférica o deslocamento do ar atmosférico que empurra grandes blocos de ar,
denominados massas de ar. 92 As massas se caracterizam por serem mais ou menos homogêneas em temperatura, umidade e pressão
atmosférica. Tais características são adquiridas da área sobre a qual o ar se forma. As massas de ar levam para
outras regiões, as características das regiões de origem. 93 Chamada de Zona de Convergência Intertropical é um dos mais importantes sistemas meteorológicos que atua
nos trópicos. Influencia diretamente o regime pluviométrico da costa brasileira. 94 Este tipo de relevo será melhor explicado mais adiante. 95 Outra proposta de explicação é que o ar que atua no semiárido é decorrente de uma massa de ar seca originária
do Deserto do Kalahari (na África), com influência da corrente marinha fria de Banguela. Essa massa de ar
atravessa uma grande parte do Oceano Atlântico, mas como viaja sobre o frio, chega até o Nordeste brasileiro
ainda seca. Toda vez que esse ar seco encontra um relevo mais alto, é forçado a subir, se resfria e a pouca
umidade que ele carrega pode originar chuvas. É o que acontece em locais conhecidos como brejos de altitude,
áreas mais úmidas e com vegetação mais densa, daí serem chamadas de ilhas de umidade ou área de exceção
dentro do semiárido. (Jatobá e Silva, 2015).
72
Existe ainda uma influência, mesmo que pequena, dos movimentos descendentes da atividade
convectiva que ocorre no oeste-noroeste da Amazônia96.
A partir dos dados de estações meteorológicas usados para determinar a climatologia anual da
precipitação, chegou-se à presença de oito regimes de precipitação97 na América do Sul. A
imagem a seguir, que evidencia tal regime foi um cruzamento do Atlas Climático de
Sudamerica (elaborado na Universidade de Buenos Aires) e da divisão dos regimes de
precipitação elaborada por Reboitaet al. em 2010 (Reboitaet al., 2012).
Fonte :Reboitaet al. (2012 : 40).
Figura 8 - Os oito regimes de precipitação anual que ocorrem na América do Sul
Sobre isso, "é interessante ressaltar que os ventos alísios de leste provenientes do oceano e
carregados de umidade são importantes para a precipitação na R6, mas não na R7. Uma
explicação estaria associada com o relevo da região: o planalto da Borborema é uma barreira
topográfica para o escoamento atmosférico. Assim, sugere-se que os ventos de leste, ao
encontrarem a barreira topográfica, ascendam favorecendo precipitação orográfica no lado
leste da montanha e, dessa forma, os ventos de leste chegam secos na R7. Além disso, os
96 Outros sistemas como, por exemplo, frentes frias e VCANs quando chegam até o sertão nordestino também
podem causar chuva. 97 Os oito ciclos anuais de precipitação na América do Sul, são: R1 corresponde ao sudoeste da América do Sul;
R2 ao norte do Chile, noroeste e centro- sul da Argentina; R3 ao oeste do Peru, oeste e sul da Bolívia, norte e
centro-leste da Argentina e centro-norte do Paraguai; R4 ao sul do Brasil, sul do Paraguai e Uruguai; R5 ao
noroeste a sudeste do Brasil; R6 ao norte da região norte do Brasil e litoral do nordeste; R7 ao sertão nordestino
do Brasil e R8 ao norte da América do Sul, incluindo o estado de Roraima (Reboitaet al., 2012).
73
ventos de leste transportam ar mais frio do oceano para o semiárido do Brasil e é possível que
ao penetrarem na R7 sejam aquecidos e a umidade relativa do ar diminua. O fenômeno
dificulta a formação de nuvens e, consequentemente, de chuva. Entretanto, acredita-se que a
causa dos baixos totais pluviométricos na R7 esteja mais associado com mecanismos
dinâmicos de grande escala do que com a topografia regional" (Reboita, 2012).
No que se refere ao regime pluviométrico do semiárido, as chuvas podem ser consideradas
escassas e irregularmente distribuídas ao longo dos meses. O período de chuva de uma
localidade, pode não coincidir com outra dentro da mesma região (Jatobá e Silva, 2015;
ROSS, 2009). Comumente se diz que o inverno é seco e quase sem chuva, com duração de
cinco a oito meses, enquanto o verão é chuvoso, com quatro a sete meses de precipitações
pluviais, os valores médios anuais das precipitações podem ocorrer num só mês ou se
distribuir de forma irregular em até cinco meses do período chuvoso (Rebouças, 1997;
Ab'sáber, 1999)98. Os índices pluviométricos variam entre 300 e 800 mm/ano (Ross, 2009;
Rebouças, 1997), O semiárido pernambucano possui o regime de precipitação chamado de
R7.
Fonte : Velloso et al. (2002 : 57).
Figura 9 - Precipitação do semiárido
98 Para Ab'sáber (1999), os índices que buscam medir médias de precipitação guardam alta dose de irrealidade,
servindo como mera referência genérica, para efeito de comparação com as regiões úmidas e subúmidas do país.
74
As temperaturas médias ficam entre 23°C e 27°C de acordo com a localidade (Rebouças,
1997), as temperaturas médias das máximas estão entre 30ºC e 36ºC e as médias das mínimas
entre 20ºC e 22ºC (Ross, 2009). As altas temperaturas aliada a forte insolação ao longo do ano
estimulam a evaporação das águas superficiais e a transpiração vegetal que supera as
precipitações anuais, ou seja, abre espaço para a deficiência hídrica (Jatobá e Silva, 2015).
O clima do semiárido de Pernambuco, pode ser classificado como de clima tropical semiárido
(Bsh), com índices pluviométricos variando entre 400 a 700 mm e chuvas concentradas nos
meses de janeiro a abril, no período de maior avanço da massa equatorial continental (mEc),
associado à oscilação máxima para o hemisfério sul da Zona de Convergência Intertropical
(ZCIT) (Torres e Pfaltzgraff , 2014).
4.1.2. Uma breve caracterização do relevo semiárido brasileiro
Cerca de 85 por cento do território semiárido brasileiro é composto de depressões
interplanáticas, ou seja, de espaços mais típicos e representativos, tanto do ponto de vista
fisiográfico como ecológico esses estão situadas entre maciços antigas e eventuais chapadas99,
sob a forma de intermináveis colinas (Ab'sáber, 1999). Todavia, existem as áreas que fogem a
essa predisposição como o exemplo das chapadas e dos brejos100 de altitude e exposição.
99 Para Ab'sábernão é império das chapadas, como jáfoi considerado no passado. 100 Sobre a origem do termo, Ab'sáber (199 : 19-20) apresentaumaproposta de entendimento que mescla a objetividade científica com metáforas. Brejo, então, "foi usado para designar planícies alveolares encharcadas,
existentes em serrasúmidassob a forma de vales suspensos, cujoexemploremanescente é o da serra do Baturité.
Posteriormente, elepassou a abranger todos os tipos de terrenos que constituíam o própriomaciço serrano, onde
ocorriam solos vermelhos profundos, dotados de bomteor de umidade, clima quente e úmido,
comprecipitaçõesmuitomaiores do que a dos sertõesadjacentes. Navisão dos sertanejos, acostumadoscom o chão
duro de seuespaço natal, parece ter havidoumacertaassociação de ideias entre aluvião encharcado e solos
molhados de vertentes de serrasúmidas. De qualquer forma, é difícil precisar desde quando o termo brejo se
projetou para todo um subconjunto de paisagens e de ecossistemas relacionados àsserrasúmidas, passando a
designar áreas que podem atingir dezenasou mesmo centenas de km2 de extensão, como no caso de Baturitéou
do brejoparaibano.
75
Fonte : Velloso et al. (2002 : 63).
Figura 10 - Geomorfologia do semiárido
As depressões101 no território brasileiro102 foram geradas por processos erosivos com forte
atuação nas bordas das bacias sedimentares e com alternâncias de ciclos secos e úmidos que
esculpiram, ao longo do Terciário e do Quaternário, as depressões periféricas, as marginais e
as monoclinais que circundam as bordas das bacias e se interpõem entre estas e os maciços
antigos de cristalino103 (Ross, 2009). As depressões interplanálticas são aplainações104
imensas, desenvolvidas entre chapadas e maciços antigos se apresentando também como o
paleoespaço do semiárido105 (Ab'sáber, 1999).
101 Ross (2009) reconhece as depressões como AmazôniaOcidental, marginaisAmazônicas, marginal Norte-
amazônica, marginal Sul-amazônica, Araguaia, Cuiabana, Alto Paraguai e Guaporé, Miranda, Tocantins,
sertaneja e do São Francisco, borda leste da bacia do Paraná, periférica central ousulgrandense. 102Comexceção da depressãoAmazônicaOcidental. 103 A atuação das atividades erosivas evidentemente nãoocorreusomenteao longo das atuaisdepressões, mas sobre
os planaltos: nasprimeiras, as influências erosivas sãomais evidentes. Igualmente marcante é o fato de a
extensividade da esculturaçãodessasdepressões ser marcada por estruturasmuito diferenciadas. Isso se
devecertamenteàsalternâncias das fases erosivas dos períodos secos com as de meteorização química e erosão
linear dos períodos úmidos (Ross, 2009 : 81). 104 As aplainações dos fins do Terciário pouparam massas de rochas resistentes, dando origem a inselbergs (serrotes) e cristas alongadas, algumas das quais cruzadas por gargantas (boqueirões). Alguns agrupamentos de
inselbergs, como os de Patos (PB), os de Quixadá (CE), os do noroeste do Ceará ou ainda os de Milagres (no
município de Amargosa, BA), constituem paisagens monumentais, dotadas de marcante individualidade
(Ab'sáber, 1999). 105 Trata-se, aliás, de um tipo de velhoespaçofacilmentedelimitável pela análise da atualcompartimentação
topográfica regional. Nasuaprimeira fase de elaboração, enquanto os compartimentos interiores eramrebaixados
e aplainados por erosão, as grandesmassas de detritos removidos eram depositadas nafaixasublitorâneaantiga,
onde hojeestão as camadas do grupo Barreiras, nos tabuleiroscosteiros no Nordeste oriental. Os aplainamentos se
fizeram por mecanismos de arrasamento de solos e plainaçõeslaterais. São processos de erosão complexos e
agressivos, designados por nomes técnicos poucorotineiros: ektaplanização e pediplanação (Ab'sáber, 1999).
76
Torres e Pfaltzgraff (2014) procederam com uma análise e sistematização da geodiversidade
no Estado de Pernambuco a partir das obras de diversos autores que estudaram o semiárido,
tais como Ab’saber (1969); Andrade (2005) e Andrade (1972). Sendo assim, em Pernambuco,
observa-se nove domínios geomorfológicos, são eles: a Planície Costeira, os Tabuleiros
Costeiros, os Patamares Orientais da Borborema, o Planalto da Borborema, a Depressão do
Baixo Rio São Francisco, o Planalto Sedimentar da Bacia do Jatobá, a Chapada do Araripe, a
Depressão Sertaneja e a Planície do Rio São Francisco (Torres e Pfaltzgraff, 2014). Dentre
esses, seis se fazem presentes no semiárido.
Fonte : Torres e Pfaltzgraff (2014 : 55).
Figura 11 - Domínios geomorfológicos propostos para o estado de Pernambuco.
A primeira é o Planalto da Borborema que possui relevo de degradação em um maciço
cristalino pré-cambriano, de direção geral NNE-SSW, com vastas superfícies planálticas de
relevos aplainados, intercalados com áreas francamente dissecadas em terrenos de morros
amplos a montanhosos. Esse conjunto de terrenos elevados está alçado em cotas que variam
entre 450 e 1.000 m de altitude, destacando-se nitidamente em relação às áreas circundantes.
Em seguida, temos a Depressão do Baixo Rio São Francisco,caracterizada por ser uma vasta
superfície aplainada dessa área deprimida, sendo constituída por dois níveis de pedimentação:
o primeiro, localizado no sopé das elevações, com os pedimentos dissecados em lombas; o
segundo, em níveis altimétricos mais baixos, é formado por um plano irregular que converge
para o rio São Francisco, acompanhando o sentido da drenagem. Encontra-se ainda o Planalto
Sedimentar da Bacia do Jatobá que está assentado em rochas da Bacia Sedimentar do Jatobá,
77
que, juntamente com as bacias do Recôncavo e Tucano, formam um grande rifte, feição
estrutural eocretácea abortada da megafratura que originou o oceano Atlântico Sul. Outro
domínio presente é a Planície do Rio São Francisco, unidade deposicional recente, que
consiste de vastas planícies de inundação em superfícies sub-horizontais, constituídas de
depósitos arenoargilosos a argiloarenosos, com terrenos imperfeitamente drenados, sendo
periodicamente inundáveis, e campos de dunas, localizados a sudoeste de Petrolina. Presente
ainda no Estado de Pernambuco está a Chapada do Araripe que se apresenta como um vasto
platô alçado em cotas que variam entre 800 e 950 m de altitude, sendo abruptamente
delimitada em todos os flancos por escarpas festonadas em franco recuo erosivo, com
desnivelamentos que variam entre 250 m a 500 m. As áreas aplainadas que fazem contato
com a imponente escarpa sul da chapada estão inseridas na Depressão Sertaneja. Este domínio
geomorfológico, mais presente e característico das paisagens do semiárido, apresenta vastas
superfícies arrasadas com cotas altimétricas entre 150 e 300 m nas áreas mais próximas ao rio
São Francisco, podendo atingir cotas entre 400 e 500 m. Esse domínio é o mais extenso do
território de Pernambuco.
4.1.3. O semiárido brasileiro e seus solos
No semiárido brasileiro, a pouca umidade e permanência das águas no subsolo propicia um
baixo nível de decomposição química das rochas, o que contribui para gerar mantos de solos
descontínuos. Sendo assim, numa visão menos detalhada, os tipos de solos predominantes
possuem nomes totalmente distintos aos que, comumente, são associados ao calor e a
umidade, tais como: solos litólicos (litossolos, esqueléticos), solos bruno não-cálcicos (para
vertissolos), eventuais vertissolos típicos e manchas de planossolossolódicos e
solonetzsolodizados (Ab'sáber, 1999).
78
Fonte : Velloso et al. (2002 : 69-70).
Figura 12 - Solos da Caatinga
Em geral, os solos são rasos e extremamente favoráveis à erosão, sobretudo em função das
chuvas, que tendem a ser muito intensas, concentradas e com bastante irregularidade temporal
como já dito anteriormente. "A deterioração ambiental pode levar aos processos de
desertificação, que podem ser observados em pontos localizados e dispersos pelo território do
semiárido brasileiro" (Ross, 2009 : 120).
Para o Estado de Pernambuco, Araújo Filho et al., (2000) fizeram um reconhecimento dos
solos de baixa e média intensidade, com o resultado foi possível constatar "que os solos de
maior expressão geográfica são: Argissolos (25 por cento), NeossolosLitólicos (20 por cento)
e Planossolos (16 por cento), somando 61 por cento da área total" (Torres ePfaltzgraff, 2014:
117) para todo o Estado de Pernambuco, não sendo possível inferir o exato percentual do
semiárido. Existe ainda a presença de Latossolos (9 por cento), Luvissolos (9 por cento),
NeossolosQuartzarênicos (5 por cento), NeossolosRegolíticos (5 por cento) e
NeossolosFlúvicos (2 por cento) que ocupam cerca de 30 por cento da superfície do estado.
Com baixa expressão geográfica, têm-se: Chernossolos, Cambissolos e Vertissolos (Torres e
Pfaltzgraff, 2014).
A explicação para a grande extensão ocupada por solos pouco desenvolvidos, como
Neossolos (Litólicos, Quartzarênicos, Regolíticos e Flúvicos), acontece pela abrangência do
79
semiárido, uma vez que a baixa de umidade restringe o desenvolvimento pedogenético dos
solos106 (Torres e Pfaltzgraff, 2014).
Os tipos de solos apresentados até aqui também foram diferenciados a partir da sua
fertilidade, concluindo que os solos considerados de alta fertilidades em 61,296,34 km2,
Média e baixa em 173,753,140km2, Baixa em 433,031,80km2 e Muito Baixa em
306.322,60km2.
Fonte : INSA (2014).
Figura 13 - Fertilidade do solo na região semiárida
4.1.4. A Caatinga, o principal bioma do semiárido
O Brasil possui, ao todo, sete biomas terrestres, a Floresta Atlântica, a Floresta Amazônica, o
Cerrado, o Pampa, o Pantanal, o Manguezal e a Caatinga107. O semiárido localiza-se entre
duas grandes florestas ombrófilas, a Amazônia e a Floresta Atlântica, nesta intersecção ocorre
106 Por outro lado, os solos mais evoluídos, como Latossolos, normalmente ocorrem em ambientes mais úmidos, onde as condições ambientais favorecem o seu desenvolvimento. Entretanto, também ocorrem em condições
semiáridas, em locais onde o material de origem já sofreu, em épocas pretéritas, intemperismo mais intenso. Tais
condições, geralmente, são verificadas em bacias sedimentares ou em determinadas coberturas pedimentares
sobre rochas cristalinas. (Miranda e Pfaltzgraff, 2014 : 118). 107 "O nome 'caatinga' é de origem Tupi-Guarani e significa 'floresta branca', que certamente caracteriza bem o
aspecto da vegetação na estação seca, quando as folhas caem" (Albuquerque e Bandeira, 1995 apud Prado, 2003
: 3) "e apenas os troncos brancos e brilhosos das árvores e arbustos permanecem na paisagem seca. A etimologia
Tupi-Guarani consiste das partículas ca’a, planta ou floresta; tî, branco (derivado de morotî, branco); e o sufixo
’ngá (de angá), que lembra, perto de (Peralta e Osuna, 1952). Assim, 'a floresta esbranquiçada'" (Prado, 2003 :
3).
80
a predominância da Caatinga, considerada o único bioma exclusivamente brasileiro. O mapa
abaixo evidencia essa predominância.
Fonte : INSA (2014).
Figura 14 - Biomas do Semiárido
Apesar de ser bem delimitada do ponto de vista biogeográfico, a vegetação de Caatinga está
longe de ser homogênea do ponto de vista fisionômico. Daí, a diversidade de paisagens que
proporciona. É portadora de uma biodiversidade ainda carente de pesquisas, mesmo que nos
últimos anos, muitos pesquisadores se debruçam em estudá-la.
No semiárido, além da Caatinga, estão presentes as formações vegetais como os Campos de
Altitude, o Cerrado, A Floresta Atlântica, a Floresta de Transição e a Mata Caduficólia. Para o
semiárido de Pernambuco, registra-se o predomínio da Caatinga como na imagem a seguir:
81
Fonte : INSA (2014).
Figura 15 - Coberturas vegetais do semiárido
Os estudos mais clássicos sobre a Caatinga sempre apontaram para uma descrição mais
enfática às suas características visíveis, tais como a de uma vegetação xerófila,
dominantemente arbustiva, que perde totalmente as folhas no período seco; dominantemente
de arbustos espinhosos, verde-vivos no período das chuvas, a cinzentos nas longas estiagens
(Ross, 2009; Andrade, 2005) ou ainda uma descrição mais detalhada informando que a
vegetação é arbustivo-arbórea, comportando folhas miúdas e hastes espinhentas, adaptadas
para conter os efeitos de uma evapotranspiração muito intensa. Podem ser caracterizadas
"como florestas arbóreas ou arbustivas, compreendendo principalmente árvores e arbustos
baixos, muitos dos quais apresentam espinhos, microfilia e algumas características
xerofíticas" (Prado, 2003 : 23).
É ainda uma vegetação quase totalmente caducifólia, cinza nos meses secos e
exuberantemente verdes nos chuvosos, possuindo uma flora constituída por espécies dotadas
de longa história de adaptação ao calor e à secura (Ab'sáber, 1999). Em todas as descrições, a
presença das cactáceas são sempre evidenciadas.
Entretanto, Andrade-Lima (1970) e a EMBRAPA (1993) possuem trabalhos fundamentais na
análise e classificação da Caatinga com uma base geomorfológica e foco na vegetação. A
82
partir dos seus esforços, Rodale Sampaio (2002)108 afirmam que a Caatinga ocupa um total de
935 mil km2 sendo, aproximadamente, 297 mil km2 de Caatinga hiperxerófila109; 247 mil km2
de Caatinga hipoxerófila110; 169 mil km2 de Caatinga mesclada com florestas subperenifólias,
subcaducifólias ou caducifólias; 110 mil km2 com Caatinga mesclada com Cerrado, 101 mil
km2 com mistura de Caatinga, Floresta e Cerrado e 22 mil km2 de Caatingas e campos de
altitude.
As fisionomias de caatinga são muito variáveis, dependendo do regime de chuvas e do tipo de
solo. Podem ser florestas altas e secas com até 15-20 m de altura, conhecida, comumente, por
caatinga arbórea; ocorrendo em solos mais férteis e localidades mais úmidas, bem como
podem se apresentar como afloramentos de rochas com arbustos baixos esparsos e espalhados,
com cactos e bromeliáceas nas fendas. Existem ainda as fisionomias intermediárias que são
numerosas, mas podem ser reduzidas a poucos tipos generalizados a exemplo da “caatinga
arbórea aberta com camada arbustiva aberta”; a “caatinga arbóreo-arbustiva com camada de
arbustos fechada”; a “caatinga arbustiva espinhosa fechada com árvores baixas espalhadas”; a
“caatinga arbustiva espinhosa fechada”; a “caatinga arbustiva aberta”; a “savana arbustiva
com camada de grama” e os “palmares de Copernicia” ao longo de rios intermitentes
principalmente nas províncias das Caatingas do noroeste (Andrade-Lima, 1960, 1961, 1970;
Eiten, 1974, 1983 apud Prado, 2003).
Para Alves (2007 : 6),
na caatinga passa-se de uma formação bem definida para outra através de diversos
fácies de transição, mas, muitas vezes a passagem entre formações diferentes é
brusca e seus limites são de fácil observação. Na caatinga, a altura da formação
permite a separação em três categorias: (I) a floresta seca, (II) as caatingas
arbustivas e as (III) estepes. Todas as descrições da caatinga salientam que as
formas caducifólias, arbóreas e arbustivas predominam na formação. Elas
constituem quase que exclusivamente os estratos lenhosos, sem que apresentem,
contudo, outras características de adaptação à estação seca. Em seguida, vêm as
xerófilas muito especializadas, tais como, Cactáceas, Bromeliáceas e
Euforbiáceas, que por vezes apresentam grande porte e não são encontradas em
todo o domínio das caatingas.
108 Os autores possuem uma discussão aprofundada sobre os critérios da divisão da Caatinga em seis unidades,
bem como as lacunas no conhecimento em cada uma. 109 A caatinga hiperxerófila é o tipo de vegetação de baixo a médio porte. São, comumente, caducifólias e
apresentamumcaráter xerófilo (que define plantas típicas de regiões secas) (Andrade-Lima, 1970; Sampaio,
2002). 110 A caatinga hipoxerófila é formada, em suamaioria, por árvores de pequeno a médio porte com troncos
retorcidos, vegetação herbácea e arbustos espinhentos(Andrade-Lima, 1970; Sampaio, 2002).
83
Para Prado (2003), o trabalho mais coerente e compreensivo para se entender os tipos de
vegetação e de comunidades da Caatinga foi sistematizado por Andrade-Lima111 (1970). A
isso, Prado (2003) incluiu mais uma e as apresenta em sete unidades, a saber: Unidade I:
Floresta de caatinga alta; Unidade II: Floresta de caatinga média; Unidade III: Floresta de
caatinga baixa; Unidade IV: Caatinga arbustiva densa ou aberta; Unidade V: Caatinga
arbustiva aberta baixa; Unidade VI: Floresta ciliar e Unidade VII: Floresta de caatinga
média112.
4.1.5. Redes hidrográficas do semiárido
O semiárido possui redes hidrográficas hierarquizadas e drenagem aberta para o mar com a
maior parte dos seus rios intermitentes. Seus rios nascem normalmente nas chapadas ou
planaltos, percorrem as extensas depressões interplanálticas quentes e secas, mencionadas
anteriormente, em direção ao mar ou servindo de afluentes para outros rios. O funcionamento
hidrológico de todos os rios que nascem e correm dentro dos limites do semiárido dependem
do ritmo das precipitações, tornando seus cursos intermitentes113 ou sazonais, alguns chegam
a ficar diversos meses secos (Ab'Sáber, 1999).
111 "Essencialmente, o conceito de caatingas de Andrade-Lima, que foi basicamente uma concepção florística da
província, porém sem perder a relação com a fisionomia e a ecologia da vegetação, é a mais seguida aqui, e tem
se mantido praticamente sem alterações até o momento" (Prado, 2003 : 31). 112 Unidades adicionada à classificação de Andrade-Lima (1981), porém já identificada como existente por esse autor quando afirmou que “nos estados do Rio Grande do Norte e Ceará, esta unidade {II} apresenta uma região
(que pode ser uma unidade independente a ser reconhecida após estudos complementares) na qual
Auxemmaoncocalyx é uma das espécies dominantes”(Andrade-Lima, 1981 apud Prado, 2003 : 37). Sendo assim,
em estudos complementares, Prado (2003) confirmou que por apresentar um conjunto distinto de espécies
altamente restritas a esse tipo de vegetação, deve se constituir uma entidade separada. 113 A despeito do caráter intermitente dos rios regionais, a drenagem extensivamente aberta para o mar impediu a
formação, em larga escala, de solos verdadeiramente salinos, sobretudo nas vertentes e nos interflúvios. Os sais
dissolvidos das rochas cristalinas (predominantes no substrato geológico local) são quase totalmente evacuados
pelo fluxo das águas na estação chuvosa, havendo saída dos materiais solúveis para todos os quadrantes costeiros
da região. A construção de açudes contribui para a salga das águas retidas (Ab'Sáber, 1999).
84
Fonte : INSA (2014).
Figura 16 - Bacias hidrográficas do semiárido
Muitos dos principais rios da região nascem sobre coberturas sedimentares e encontram
depois os complexos substratos rochosos situados abaixo delas. São ditos rios epigênicos ou
superimpostos, cuja posição é herança de um quadro geológico e estrutural que hoje não
existe mais nesses locais (Ab'Sáber, 1999). Dois exemplos são os rios mais importantes da
região, o São Francisco e o Parnaíba, cujas nascentes ficam fora do contexto semiárido como
demonstrado na figura 16.
O Rio São Francisco114, considerado o mais importante do semiárido (também conhecido por
Velho Chico), tem sua nascente no estado de Minas Gerais e sua foz no Oceano Atlântico,
passando pelos estados da Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe, drenando uma área de
aproximadamente 641.000 km2 e extensão de aproximadamente 2814 km (Silva, 2006).
Possui trechos navegáveis entre Minas Gerais e Bahia. É o maior responsável pela produção
de energia elétrica na região, com o Complexo Hidrelétrico de Paulo Afonso, a Usina
Hidrelétrica de Xingó e a Barragem de Sobradinho (terceiro maior lago artificial do mundo).
Em seu trecho médio, possui a região conhecida como Vale do São Francisco que é a maior
produtora de frutas tropicais do país (em sua maior parte para exportação), bem como
produtora de vinho (com duas safras anuais de uva por ano) a partir da prática do
114Desde 2007, vem sofrendo um processo controverso de transposição das suas águas para atender os Estados
do Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte, prevista para ser terminada em 2012, a obra ainda não foi finalizada e
segue com graves impactos ambientais e sociais.
85
agronegócio. O Rio Parnaíba115 é considerado o segundo rio mais importante do semiárido
(também conhecido como Velho Monge), tem sua nascente no sul do Estado do Piauí e segue
em sentido sul-norte, em um percurso de 1450 km, passando pelo Estado do Maranhão até a
foz no Oceano Atlântico.
Fonte : elaboração própria (2014).
Figura 17 - Percursos do Rio Parnaíba e do Rio São Francisco
4.1.6. As bacias hidrográficas do Brasil
Sem uma definição universal que seja consenso, as bacias hidrográficas são regionalizadas há
séculos. Entretanto, podem assumir diferentes configurações a depender de onde são
delimitadas. Posto isso, entende-se que uma bacia hidrográfica é a área total de superfície de
terreno de captação natural da água precipitada, na qual um aqüífero ou um sistema fluvial
recolhe sua água (Tucci, 1993). Com efeito, a bacia é "a área que possuí uma única
confluência (exutório) das águas sob seu domínio e separada topologicamente pelos terrenos
mais elevados (divisores de águas)" (Marcuzzo, 2017 : 6). Assim, "as características
principais da bacia hidrográfica são a área de drenagem, o comprimento do rio principal,
declividade do rio e a declividade da bacia" (Tucci e Mendes, 2006 : 19). Pode ainda ser
subdividida em sub-bacias a depender do interesse de quem se debruça sobre ela, seja para
estudá-la ou geri-la.
115Por ser navegável em toda a sua extensão, foi bastante utilizado no processo de entrada do colonizador no
semiárido. É utilizado na produção de energia elétrica através da Usina da Boa Esperança, bem como nas
atividades pesqueiras, agropecuárias e de abastecimento de centros urbanos.
86
Para a ANA (2005 : 11),
Bacia hidrográfica é a região compreendida por um território e por diversos cursos
d’água. Da chuva que cai no interior da bacia, parte escoa pela superfície e parte
infiltra no solo. A água superficial escoa até um curso d’água (rio principal) ou
um sistema conectado de cursos d’água afluentes; essas águas, normal- mente, são
descarregadas por meio de uma única foz (ou exutório) localizada no ponto mais
baixo da região. Da parte infiltrada, uma parcela escoa para os leitos dos rios,
outra parcela é evaporada por meio da transpiração da vegetação e outra é
armazenada no subsolo compondo os aquíferos subterrâneos.
Na figura a seguir é possível visualizar as bacias hidrográficas brasileiras, a saber: A do rio
Amazonas; do rio Tocantins; do Atlântico Trecho Norte/Nordeste; do rio São Francisco; do
Atlântico Trecho Leste; do rio Paraná; do rio Uruguai e do Atlântico Trecho Sudeste. No
semiárido brasileiro, estão as bacias do Tocantins e São Francisco.
Fonte :Marcuzzo (2017 : 5).
Figura 18 - As bacias e sub-bacias hidrográficas do Brasil
O Rio São Francisco possui cerca de2.700 quilômetros, desde a sua nascente Serra da
Canastra, Município São Roque de Minas (MG), até a sua foz, entre os Estados de Sergipe e
Alagoas no Oceano Atlântico. A bacia hidrográfica do Rio São Francisco abrange 639.219
quilômetros quadrados de área de drenagem (7,5 por cento do país) e vazão média de 2.850
metros cúbicos por segundo (2 por cento do total do país). Abrange 504, ou 9 por cento do
total de municípios do País. Destes, 48,2 por cento estão na Bahia, 36,8 por cento em Minas
87
Gerais, 10,9 por centoem Pernambuco, 2,2 por cento em Alagoas, 1,2 por cento em Sergipe,
0,5 por cento em Goiás e 0,2por cento no Distrito Federal. A bacia está presente nos seguintes
estados e sua, conseguinte, porcentagem: Bahia (48,2por cento), Minas Gerais (36,8 por
cento), Pernambuco (10,9 por cento), Alagoas (2,2 por cento), Sergipe (1,2por cento), Goiás
(0,5por cento), e Distrito Federal (0,2por cento) (CBHSF, 2017).
Existe umadivisão regional do Rio São Francisco em quatro trechos:
Alto São Francisco: das nascentes até a cidade de Pirapora (MG), com100.076
quilômetrosquadrados, ou16 por cento da área da Bacia, e 702 quilômetros de
extensão. Suapopulação é de aproximadamente6.247milhões de habitantes.
Médio São Francisco: de Pirapora (MG) até Remanso (BA)
com402.531quilômetrosquadrados, ou53 por cento da área da Bacia, e
1.230quilômetros de extensão. Suapopulação é de aproximadamente 3.232milhões de
habitantes.
Submédio São Francisco: de Remanso (BA) até Paulo Afonso (BA),
com110.446quilômetrosquadrados, ou17 por cento da área da Bacia, e 440
quilômetros de extensão. Suapopulação é deaproximadamente1.944milhão de
habitantes.
Baixo São Francisco: de Paulo Afonso (BA) até a foz, entre Sergipe e Alagoas,
com25.523quilômetrosquadrados, ou4 por cento da área da Bacia, e
214..000quilômetros de extensão. Suapopulação é deaproximadamente1.373milhão de
habitantes (CBHSF, 2018).
Em Pernambuco, destaca-se a região do submédio São Francisco, sendo o trecho do rio de
mesmo nome entre os municípios de Remanso e Paulo Afonso, ambos no Estado da Bahia.
Porém, nesse percurso, o rio é praticamente uma fronteira político-administrativa entre os
estados da Bahia e Pernambuco e passa por dois dos principais municípios do semiárido,
Petrolina, em Pernambuco e Juazeiro, na Bahia. É nesse trecho onde se vivencia um forte
agronegócio baseado na irrigação utilizando as águas dos rios em empreendimentos privados
para o cultivo de uva, côco, melância, melão, banana, arroz, tomate entre outros.
88
4.1.7. Os brejos de altitude áreas de exceção no semiárido brasileiro
Dentro do semiárido, uma particularidade precisa ser apresentada, são os brejos116 de altitude
ou áreas de exceções dentro ou no entorno do semiárido117. Tratam-se, via de regra, de
formações geomorfológicas altas de relevos serranos com dimensões variadas e que são
submetidos às influências de mesoclimas118 de altitude com, normalmente, mais de 1.200 mm
de chuvas por ano, permitindo a existência de zonas mais úmidas Assim, possuem
características fisionômicas muito mais próximas às da Floresta Atlântica do que da vegetação
típica do semiárido, a Caatinga (Andrade-Lima, 1960; 1961). Nas palavras de Ab'Sáber
(1970, 1974), os brejos são verdadeiras “ilhas verdes” no domínio da Caatinga.
Os estudos de Andrade-Lima (1960, 1961, 1970)e Tabarellie Santos (2004) apresentam que
os brejos são parte da Floresta Atlântica no semiárido. A sua existência está associada à
ocorrência de planaltos e chapadas entre 500m e 1,000m (tais como o Planalto da Borborema,
a Chapada do Araripe e a Chapada de Ibiapaba) onde ocorrem as chuvas orográficas que
proporcionam níveis de precipitação que podem ser superiores a 1,200 mm/ano. Abaixo é
possível visualizar um perfil esquemático dos brejos de altitude a partir de um recorte do
Planalto da Borborema.
Fonte : Dias-Terceiro (2011 : 97) Adaptado de Mayoe (1982).
Figura 19 - Perfil esquemático dos brejos de altitude no Nordeste do Brasil
116 Para Ab'sáber (1999), a expressão brejo pode ter sido utilizada para designar os “solos pantanosos
ribeirinhos”, terrenos ribeirinhos encharcados d’água, “áreas de solos pantanosos marginais ao rio”, ou ainda de “setores de planícies aluviais, encharcados e ricos em matéria orgânica de acordo com a população do semiárido
(Ab'Sáber, 1999). 117 Os brejos estão presentes, normalmente, nas serras e encostas de maciços que captam a umidade de
barlavento; piemontes com acumulações detríticas retentoras de água; agrupamentos de nascentes ou fontes;
encostas ou sopés de escarpas; bordas de chapadas; bolsões aluviais de planícies alveolares e setores de vales
bem arejados por correntezas de ar marítimo (Ab'Sáber, 1999). 118 O mesoclima é aqui entendido como uma unidade climática intermediária. Isso porque, os macroclimas
correspondem às grandes unidades climáticas regionais, enquanto que os microclimas têm um significado bem
mais restrito, qual seja, aquele em que as condições ambientais podem ser, eventualmente, modificadas pelo
homem (Reis, 1988).
89
Diferentemente das áreas interplanálticas onde está o semiárido mais característico, os brejos
possuem um excesso hídrico durante, normalmente, um terço do ano. Tal balanço é
decorrente de duas fortes características. A primeira é o regime térmico influenciado pela
altitude e, consequentemente, pela condensação do vapor d'água presente no ar, provocando o
aumento na nebulosidade e a redução de isolação e temperatura. A segunda é o aumento e
uma distribuição mais regular das precipitações durante o ano119. Ambas as características
tornam os brejos menos quentes e mais úmidos que o seu entorno120.
Para Vasconcelos-Sobrinho (1971), os brejos estão pressentes em quatro estados, são onze no
Ceará, cinco no Rio Grande do Norte, oito na Paraíba e vinte e três em Pernambuco. Neste
último estado podemos listá-los pelos nomes que receberam, assim têm-se os brejos de
Triunfo, Tacaratu, Taquaritinga, Gravatá, Bezerros, São Miguel, Camocim de São Félix e
Agrestina (em municípios homônimos a cada brejo); Mimoso e Varas (em Arcoverde); Serra
do Olho d'água e Serra do Vento (em Belo Jardim); Serra Negra (em Bezerro); Brejo dos
Cavalos (em Caruaru); Serra do Genipapo (em Sanharó); Serra Negra (em Floresta); Serra do
Ororubá (em Pesqueira), Catimbau (em Buíque), São José (em Moxotó), Poções (em Poção),
Serra do Comunati (em Águas Belas), Serra do Arapuã (em Floresta) e Serra do Araripe (em
Exu).
119 O regime pluviométrico depende dos deslocamentos da Massa Equatorial Atlântica que condiciona as
correntes perturbadas de leste. No inverno, a área é submetida aos efeitos dos deslocamentos das massas polares
do sul que, incorporadas aos alíseos, produzem os maiores volumes de chuvas, registrados nos meses de junho e
julho. Em Brejo da Madre de Deus e Belo Jardim os totais pluviométricos médios anuais variam de 952,0 a
2,180 mm, respectivamente (Souza e Oliveira, 2006 : 97). 120 Tais características provocam ainda um "maior permanência ao escoamento fluvial, intensificando, por
consequência, a capacidade de escavamento dos vales pelos rios. Isso faz com que haja uma maior declividade
do relevo pelos processos erosivos lineares (rios) que originam feições morfológicas aguçadas (cristas),
convexas (colinas) e de topos planos (interflúvios tabulares). Essas feições são intercaladas por vales estreitos
(em forma de V) ou ligeiramente alargados nos setores de suavização topográfica" (Souza e Oliveira, 2006 : 88).
90
Fonte : Vasconcelos Sobrinho (1971).
Figura 20 - Principais brejos de altitude nos estados da Paraíba e Pernambuco
4.1.8. As ecorregiões do semiárido brasileiro
Discussões fomentadas mais recentemente, principalmente a partir da última década do século
passado, trazem o conceito de ecorregiões. Tal conceito foi, inicialmente, desenvolvido por
biólogos, ecólogos e conservacionistas do mundo inteiro a partir dos anos 40 e consolidado
para a América do Norte121 por Bailey em1976 (Vellozo et al., 2002). Os anos noventa
vivenciaram uma profunda discussão sobre o ambiente e ação antrópica no Brasil. Um dos
resultados dessa discussão foi o Seminário de Planejamento Ecorregional da Caatinga
realizado em 2002 que resultou em uma proposta de estudo para o bioma Caatinga.
Uma ecorregião foi definida como:
uma unidade relativamente grande de terra e água delineada pelos fatores bióticos
e abióticos que regulam a estrutura e função das comunidades naturais que lá se
encontram. É, portanto, um grande bloco geográfico que engloba diversos
sistemas biológicos, que podem ser diversos entre si, mas que se diferenciam de
outros por possuírem grandes processos bióticos (ex.: padrões de distribuição de
taxa) e abióticos (ex.: clima, história geomorfológica) que os conectam de alguma
maneira. As fronteiras entre ecorregiões correspondem a lugares onde fatores
controladores mudam significativamente, por exemplo, padrões de precipitação,
altitude ou relevo. Em geral, diversos fatores controladores sofrem alterações
significativas nessas zonas de fronteira (Bailey, 1998 apud Velloso et al, 2002 :
8).
121 Por isso, naquele pais é conhecido como o "Sistema Bailey". A partir da Conferencia da Organização das
Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento no Rio de Janeiro em 1992 ("Eco92"), o sistema
foi adotado no mundo inteiro como uma ferramenta fundamental para o planejamento ambiental. As ecorregiões
buscam refletir a verdadeira distribuição da biodiversidade e por isso são muito úteis para a diminuição de planos
de desenvolvimento sustentável e de conservação, assegurando a eficiência e a eficácia de ações. (Velloso et al,
2002 : 8).
91
A partir da definição acima, as ecorregiões estabelecidas no semiárido foram: o Complexo da
Chapada Diamantina, o Complexo do Campo Maior, o Complexo Ibiapaba-Araripe, a
Depressão Sertaneja Meridional e a Depressão Sertaneja como se pode visualizar na imagem
abaixo.
Fonte : Velloso et al, (2002 : 14).
Figura 21 - Ecorregiões do semiárido
4.1.9. As unidades Geossistêmicas do semiárido
Coadunando com as ideias de Ecorregiões, estão as unidades geoambientais122 produzida a
partir de estudos de uma equipe de geógrafos e engenheiros agrônomos financiado pelo Banco
do Nordeste do Brasil (BNB) e pela Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos
(FUNCEME). A sua elaboração se sucedeu após as contribuições do IBGE (1985) e da
EMBRAPA (1993) e calcadas nas ideias de domínios superpostos por uma província
fitogeográfica defendida por Ab'Sáber (1974). O resultado foram sete unidades
geoambientais, a saber: Depressão Sertaneja, os Planaltos Sedimentares, o Planalto da
Borborema, os Planaltos com Coberturas Calcárias, os Maciços Serranos Residuais, a
Chapada Diamantina e as Encostas do Planalto Baiano e Tabuleiros pré-litorâneos e parte da
planície costeira.
122 O emprego do modelo sistêmico na geografia fez surgir o método geossistêmico, metodologia científica
específica para os trabalhos de geografia física.
92
Unidades Geomorfológicas (IBGE,
1985)
Unidades de Paisagem (EMBRAPA,
1991)
Grandes Unidades Geossistêmicas
(FUNCEME, 1993)
Depressão São Franciscana
Depressão Cearense
Planuras do Baixo São Francisco
Depressão sertaneja
Áreas de dunas continentais
Superfícies dissecadas diversas
Serrotes, Inselbergs e maciços
residuais
Grandes áreas aluviais
Depressão sertaneja
Cuestas Do Meio Norte E Chapada
Do Araripe Chapadões E Chapadas Do Meio
Norte
Chapadão Oriental São
Franciscano
Bacia Sedimentar Tucano-Jatobá
Chapadas Altas
Chapadas, Intermediárias E Baixas Bacias Sedimentares
Superfícies Dissecadas Diversas
Planaltos sedimentares
Superfície Borborema Planalto da Borborema Planalto da Borborema
Depressão São Franciscana e
Centro Norte do Espinhaço
Superfícies Cársticas Planaltos com Coberturas Calcárias
Maciço Inselbergs
Inselberg e Testemunhos
Maciços e Serras Altas
Maciços e Serras Baixas
Maciços Serranos Residuais
Serra do espinhaço
Superfície Conquista-Maracás
Chapada Diamantina
Superfícies retrabalhadas
Chapada Diamantina e Encostas do
Planalto Baiano
Litoral com tabuleiros e dunas Tabuleiros costeiros Tabuleiros pré-litorâneos e parte da
planície costeira
Fonte : FUNCEME (2005 : 26).
Tabela 7 - Correspondência entre Unidades Geomorfológicas do IBGE, as unidades de Paisagem da EMBRAPA
e as Grandes Unidades Geossistémicas da FUNCEME
Estão presentes no semiárido do Estado de Pernambuco as unidades da Depressão sertaneja e
o Planalto da Borborema. A Depressão Sertaneja é a maior e a mais representativa, se
estendendo continuamente por uma área de 415.921.036 quilômetros quadrados, equivalendo
a 48,74 por cento do semiárido.
A caracterização do semiárido apresentada até aqui pode ser tratada como uma visão mais
tradicional dos pesquisadores que se debruçaram na tentativa de entender o ambiente e
apresentá-lo com rigor acadêmico. As discussões que permeiam geógrafos, geólogos,
meteorologistas, edafólogos, pedólogos, biólogos entre tantos outros profissionais produziu
uma horizonte de publicações e, sem receio, pode-se afirmar que deixou um legado de enorme
importância para o conhecimento da região.
4.2. Delimitação legal do semiárido brasileiro
A delimitação do semiárido é de competência e responsabilidade da Superintendência para o
Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) através da Lei nº 7.827, de 27 de setembro de
1989, cujo inciso IV do art. 5º estabelece que
93
para efeito de aplicação dos recursos, entende-se por: IV - semi-árido, a região
natural inserida na área de atuação da Superintendência de Desenvolvimento do
Nordeste - SUDENE, definida em portaria daquela Autarquia. A redação desse
dispositivo corresponde à alteração introduzida pela Lei Complementar nº 125, de
3 de janeiro de 2007123 (Pereira Junior, 2007 : 3).
Para se delimitar o semiárido brasileiro foi estabelecido um Grupo de Trabalho que possuía
representantes dos seguintes órgãos: Ministérios do Meio Ambiente, da Ciência e Tecnologia
e da Integração Nacional; Agência de Desenvolvimento do Nordeste (ADENE); Companhia
de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (CODEVASF); Departamento
Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS); Agência Nacional de Águas (ANA); Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA); Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE); Instituto Nacional do Semiárido (INSA); Instituto
Nacional de Meteorologia (INMET); Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias
(EMBRAPA) e Banco do Nordeste (BNB).
Esse grupo, chamado de GTI (Grupo de Trabalho Interministerial) finalizou o seu trabalho em
março de 2005 e estabeleceu como critérios de delimitação do semiárido primeiramente a
precipitação pluviométrica média anual inferior a 800 milímetros (isoieta de 800mm), em
seguida, utilizou o Índice de aridez de até cinco décimos calculado pelo balanço hídrico que
relaciona as precipitações e a evapotranspiração potencial, no período entre 1961 e 1990 e,
por último, estabeleceu o risco de seca maior que 60 por cento, tomando-se por base o período
entre 1970 e 1990 (Pereira Junior, 2007).
Por ser uma equipe com a presença de representantes de instituições tão diversas em suas
atuações com o objetivo de delimitar uma região tão diversa, além dos critérios expostos
acima, fizeram uso de cinco modelos para se chegar ao resultado final. Tais modelos são o
índice de aridez de Thornthwaite de 1941124, o risco de ocorrência de seca125, as unidades
123 "Na redação anterior, a delimitação, também definida por portaria de SUDENE, deveria atender também ao
limite de precipitação pluvial média anual igual ou inferior a 800mm. O critério atual, trazido pela Lei Complementar nº 125/2007 é, portanto, mais flexível" (Pereira Junior, 2007 : 4). 124 Faz-se o uso dos indicadores de precipitações e temperaturas visando o cálculo de evapotranspiração
potencial. "O resultado obtido com essa metodologia – considerando-se semi-áridos os municípios com Índice de
Aridez de 0,21 a 0,50 –, diminui consideravelmente a atual área de abrangência da região semi-árida do
Nordeste, delimitada pela isoieta de 800mm: dos atuais 1.031 municípios restariam apenas 396" (Pereira Júnior,
2007 : 5). 125 A ANA comparou os resultados do índice de aridez com valores médios de precipitações anuais de 1.953
postos dentro do semiárido, deste número, 123 foram utilizados (pela confiabilidade) para o cálculo da
evapotranspiração potencial. Entretanto, pela falta de confiabilidade dos dados, este modelo foi descartado
(Pereira Junior, 2007).
94
geossistêmicas126, as isoietas de 800mm127 e o percentual de dias com déficit128 hídrico129. Por
fim, o GTI avaliou cada metodologia com base nos seguintes critérios: compatibilidade com
os objetivos; consistência técnica; objetividade; operacionalidade; e viabilidade política.
Sendo assim,
Com base nas avaliações de cada critério proposto, o GTI sugeriu que fossem
acrescentados ao critério já utilizado da isoieta de 800mm o critério de Índice de
Aridez de Thornthwaite, de 1941, considerando-se semi-árido o município com
índice de até 0,50, e o critério de Risco de Seca, desde que superior a 60 por
cento. Assim, passará a integrar a região semi-árida do Nordeste, todo município
pertencente à área de atuação da ADENE que atender a pelo menos um desses três
critérios (Pereira Junior, 2007 : 11).
Estado Total de
Municípios
Municípios
no
semiárido
(2005)
Municípios
no
semiárido
(2017)
Área total
do Estado
(Km2)
Área de
semiárido
no Estado
(Km2)
% de área
do Estado
no
semiárido
Alagoas 102 38 38 27,819 12,687 45,61
Bahia 417 266 269 564,693 393,056 69,61
Ceará 184 150 165 148,825 126,515 85,01
Minas Gerais 853 85 85 586,528 103,590 17,66
Paraíba 223 170 170 56,440 48,785 86,44
Pernambuco 185 122 122 98,312 86,710 88,20
Piauí 223 128 164 251,530 150,454 59,82
Rio Grande do
Norte
167 147 147 52,797 49,590 93,93
Sergipe 75 29 29 21,910 11,17 51,01
Total 2429 1135 1187 1.808,854 982,563 54,32
Fonte : dados do Relatório Final do Grupo de Trabalho Interministerial para delimitação do semiárido nordestino
e do Polígono das Secas do MIN (2005; 2017) (Pereira Júnior, 2007; INSA, 2014).
Tabela 8 - Quantitativo de municípios no semiárido (2005 e 2017) e área do semiárido brasileiro
126 Modelo elaborado FUNCEME, com o apoio do Banco do Nordeste (BNB) que definiria o semiárido a partir
da Caatinga. Porém, pela dificuldade de precisar os limites dos ecossistemas devido à presença das áreas de
transição em seus limites e a forte atuação antrópica que descaracterizou algumas dessas áreas, o modelo foi
considerado de difícil aplicação, o que dificultaria a precisão de alocação de recursos e benefícios estatais.
Soma-se a isso, que "o modelo geraria uma área (de demarcação contestável) praticamente igualà obtida por
meio da isoieta de 800mm, com 388 municípios totalmente inseridos e 921 parcialmente inseridos no semi-árido,
totalizando 1309 municípios" (Pereira Junior, 2007 : 6). 127 O índice de precipitação já havia sido utilizado anteriormente. A ADENE o defendeu por ser o mais incontestável pela precisão dos dados. "A delimitação a partir da 800mm, isoladamente, consideraria como
inseridos no semiárido 604 municípios, número inferior ao vigente antes de 2005" (Pereira Junior, 2007 : 7). 128 Com frequência palavras com déficit, deficiência, irregularidade são utilizadas por pesquisadores ao tratar da
região. É claramente o uso de uma nomenclatura que procura aproximar o semiárido das demais regiões e o
compara, todo o tempo com o externo. Entende-se aqui que essas palavras podem ser utilizadas em trabalhos
acadêmicos porque já fazem parte de um arcabouço teórico-metodológico extremamente consolidado, mas
ressalva-se que contribuem para a região ser vista como algo inferior ao restante do país. 129 O critério do Deficit hídrico foi sugerido pelo INPE/CPTEC, utilizando como dados os totais anuais de
precipitação no período de 1960-1990 e a frequência de ocorrência de déficit hídricos no período de 1970-1990.
Pelo esse critério, 1108 municípios seriam considerados como semiáridos (Pereira Junior, 2007).
95
A definição dos municípios que compõem o Semiárido foi estabelecida pelo Ministério da
Integração Nacional em 2005 ampliando a relação de municípios anterior de 1.031 para 1.133.
Abrangendo inclusive 85 municípios da região norte de Minas Gerais. O resultado dessa
delimitação é uma área de 982.563 km2, ou seja, cerca de 12 por cento do território brasileiro
e 63 por cento da região Nordeste. O semiárido está presente em oito estados da região
Nordeste: Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia,
bem como no sul do Estado de Minas Gerais (que se encontra na região Sudeste) como é
possível visualizar na Figura 1 apresentada na introdução.
Em 2017, foram acrescentando mais municípios à região semiárida brasileira, sendo 36 no
Piauí, 15 no Ceará e 3 na Bahia, desse total, 31 estão entre os 20 por cento do país com pior
IDH. A proposta foi enviada pelo MIN ao conselho deliberativo da SUDENE que a acatou. O
semiárido passou a ter 1187 municípios e uma estimativa de 25 milhões de
habitantes130(SUDENE, 2017).
O objetivo seria proporcionar mais atenção do governo federal para minimizar os efeitos da
seca e proporcionar o desenvolvimento regional. A inclusão desses municípios vem a atender
interesses regionais de alocação de recursos, onde os critérios técnicos da semiaridez são
utilizados com fins políticos. Os resultados dessa nova delimitação só serão sentidos
ulteriormente.
130 Nos últimos anos, um Grupo de Trabalho (GT) coordenado pelo Ministério da Integraçãodedicou-se
aumasérie de estudos e análises para definir a nova composição da região semiárida. Os índices pluviométrico e
de aridez e o percentualdiário de déficit hídrico foram os critériosselecionados para adequar a delimitação que
estava vigente desde 2005. Além de equipes da Pasta, compõem o GT representantes do MMA, Sudene, Dnocs,
Codevasf, ANA, Ibama, INPE, Instituto Nacional do Semiárido (INSA), INMET, BNB e Centro de
Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden).
96
Capítulo 5 - O semiárido, o Sertão e suas representações territoriais
As discussões sobre o semiárido brasileiro seguem vertentes construídas em momentos e
espaços distintos. Tem-se início com o pensamento científico positivista de meados do século
XIX até a produção plural, considerando-se as escolhas metodológicas e ideológicas de quem
a produz no século XXI. As espacialidades e temporalidades distintas legaram uma produção
extensa, ora aprofundada, ora superficial, porém difusa sobre o semiárido. A construção desse
pensamento contribuiu, sobremaneira, às representações territoriais associadas ao semiárido131
e ao sertão que, por conseguinte, nortearam a governança da região.
5.1. Considerações sobre a origem e o uso do termo sertão como designador do
semiárido brasileiro
Atualmente a palavra sertão é próxima de um sinônimo de semiárido, todavia revisitar a
trajetória do uso desse termo possibilita entender a origem e os significados adquiridos ao
longo do tempo.
Sertão pode ser considerado como um filtro ou uma lente entre quem observa e o objeto
observado. Sem um bom entendimento do termo
a própria noção de 'Nordeste' se esvazia, carente de um de seus referendos
essenciais. Que seria de Minas Gerais, Goiás ou Mato Grosso sem seus sertões,
como pensá-los? Em Santa Catarina, ainda hoje se emprega a expressão "sertão"
para referir-se ao extremo oeste do Estado. Em partes do Paraná, a mesma
expressão identifica uma área do interior de outro estado, São Paulo, próxima a
Sorocaba (provavelmente, uma reminiscência dos antigos caminhos das tropas).
No Amazonas, 'sertão de dentro' refere-se à fronteira do estado com a Venezuela,
enquanto, no interior do Rio Grande do Sul 'sertão de fora' também nomeia área
de fronteira, porém situada ... no Uruguai! (Amado, 1995 : 145).
A origem da palavra sertão ainda segue algumas incertezas, uma vez que é um termo com
mais de seis séculos de uso. A grafia "sertão" ou "certão" seria corruptela de desertão"
(Amado, 1995; Lima, 1999). Entretanto há ainda a explicação de que sertão proviria do latim
clássico serere, sertanum (trançado, entrelaçado, embrulhado), desertum (desertor, aquele que
sai da fileira e da ordem) e desertanum (lugar desconhecido para onde foi o desertor) (Amado,
1995). Outra explicação, dessa vez apresentada por Barroso (1962) apud Rodrigues (2004)
diz que celtão e certão surgiram como corruptelas do termo mulcetão, que seria a maneira
131A visão negativa do semiárido brasileiro não encontra paralelo em outras partes do mundo, seja na América do
Norte, Europa, África ou Oceania. Semiárido existe em outros continentes, entretanto com a lente ou o filtro de
quem observa e o objeto observado só no Brasil.
97
portuguesa de pronunciar michitu, muchitu ou muchitum. Estas palavras seriam de origem
africana, do dialeto angolano mbunda e para seus falantes queria dizer propriamente mato,
tornando-se designativo de mato longe da costa ou das terras africanas coberto de mataria.
Amado (1995)132 fez um apanhado sobre a origem e o início do uso do termo sertão. Para a
autora, desde o século XIV os portugueses empregavam a palavra, grafando-a como "sertão"
ou "certão" ao se referirem às áreas situadas no interior de Portugal e distantes de Lisboa. Por
volta do século XV, sertão já era usado para nomear espaços vastos, interiores, situados
dentro dos territórios recém-conquistadas, sobre os quais poucas informações estavam
disponíveis.
Desde o século XVI, as duas grafias, sertão e certão, foram empregadas por diversos viajantes
e cronistas do império colonial português, tanto na África como na Ásia e, principalmente, na
América, onde designavam o interior dos continentes ainda pouco conhecidos. O termo sertão
pode designar uma ou diversas regiões. Sendo assim, toda vez que se encontra a palavra na
literatura, seja ela acadêmica, romancista ou no senso comum, numa visão mais aprofundada,
é necessário saber o contexto de onde foi aplicada.
5.2. As representações territoriais do semiárido a partir da sua concepção como sertão
As estruturas das representações territoriais do semiárido brasileiro remontam ao início de sua
colonização. Os seus primeiros séculos, delimitam um processo constante de entrada, domínio
territorial a partir da percepção do “desconhecido”, da “alteridade”, do “estrangeiro”, do
“outro” que pressupõe a existência do “conhecido”, do “próprio”, do “pátrio”, do “eu” como
ponto de referência (Silva, 2010). É o início do sertão construído “de fora” para “dentro". As
percepções sobre a região vão gerar as suas representações nos mapas e relatos produzidos
por pessoas que, em vários casos, não estiveram no ambiente que descriam.
Ao se constatar na literatura a associação de sertão ao interior e, posteriormente,
consolidando-se ao semiárido, chama-se atenção que nomear um espaço é construir um
território. Isto contribui com a criação de uma ordem simbólica, ou seja, o estabelecimento de
132A partir de Nunes (1784), Cortesão (1958), Godinbo (1990) e Teles (1991).
98
uma coerência e ordem em um espaço pré-estabelecido. Esta coerência, ao mesmo tempo,
refere-se a uma certa visão do mundo e um processo de apropriação133 (Gumuchian, 1991).
Como aqui se objetiva entender as representações dominantes sobre o semiárido, uma vez que
enumerar todas elas seria impossível, faz-se necessário chamar atenção de que:
a análise das representações territoriais sugere a identificação da presença de
práticas antigas e suas reformulações na sociedade atual. Uma certa característica
das representações territoriais que lhes conferem uma notória pertinência e que
nunca estão congeladas. Esta característica de não estar congelada permite
compreender as mutações que afetam o objeto, ligando as práticas sociais que as
suscitam e as criam134 (Breux, 2007 : 45).
A depender de quem, de onde e quando se observa, "sertão" aparece de distintas maneiras
construídas e resignificadas ao longo dos séculos. Surge, no Brasil primeiramente, como
fronteira da civilização e dos espaços vazios135 móvel da colonização portuguesa que via no
interior a possibilidade de riquezas ou a promessa de uma terra quase agraciada pelos
desígnios divinos (Moraes, 2005; 2009; 2011).
Foi no século XIX que outras duas perspectivas de sertão ganham força. A primeira aparece
como singularidade espacial da memória brasileira associada às regiões do interior, onde as
temporalidades não seguiam, necessariamente, as mesmas do litoral. Esta perspectiva foi,
posteriormente, associada ao semiárido a partir do início do século XX. A segunda via o
semiárido como uma região problema devido aos supostos condicionantes naturais que o
impedia de se desenvolver economicamente e socialmente, estariam assim abaixo das regiões
consideradas civilizadas.
133 O autor dáalgunsexemplos como "espaçonovo" na África negra; "país novo" no Canadá; Abitibi em Québec e
aqui pode-se adicionar o Sertãonacolonização portuguesa na América. 134Tradução livre de : "L'analyse des représentations spatiales suggère l'identification de la présence de
pratiques anciennes et leurs reformulations dans la société d'aujourd'hui. Un trait caractéristique des représentations spatiales, qui leur confèrent une pertinence notoire, est qu'elles ne sont jamais figées. Ce
caractère non figé des représentations spatiales permet de comprendre les mutations qui touchent son objet, en
lien avec les pratiques spatiales qu'elles suscitent d'une part, et qui les créent d'autre part". 135Fronteira, assim como sertão, ounação, não é conceito estático e atemporal. Seu sentido de delimitação,
definição e referência territorial de unidades sócio-políticas envolveuum longo e múltiplo caminho. Através de
diferentes processos, chegou-se à noção de exercício soberano do poder sobre umterritório, mas para
istofoinecessário conseguir um controle militar, econômico, populacional, cultural e político- administrativo. O
que hoje os mapas apresentam como parte natural do espaço dos países, seuespaço territorial, suaidentidade
geográfica, foi resultado de políticas - entre outras, fiscais - pelo estabelecimento de pontos de controle
aduaneiro(Oliveira, 1998 : 9).
99
Mais recentemente, sobretudo a partir dos anos setenta do século XX, o semiárido tem sido
visto como fronteira econômica e uma região com grande potencial ainda não desenvolvido
plenamente. Nesta última perspectiva a palavra sertão se esvazia em seu significado para dar
lugar às ideias de convivência com o semiárido.
Na base das representações territoriais do semiárido, a palavra sertão é quase onipresente na
literatura. Entender o início dessa imbricação se faz necessário. Para o senso comum e para
pesquisadores de distintas áreas, são sinônimos. Ressalta-se que ao se revisitar as origens e o
desenvolvimento do uso de sertão para o semiárido se faz, ao mesmo, tempo um exercício de
imaginar uma região homogênea, que nunca existiu, seja do ponto ambiental como do ponto
cultural. A ocupação do sertão não foi uniforme e as diversas temporalidades são observadas
até mesmo nas fundações das vilas e nas paisagens construídas ao longo do século. Feito essa
ressalva, procura-se, em princípio, trazer autores que buscaram discutir, cada um à sua
maneira, o processo de ocupação e construção de uma cultura no sertão levando-se em conta
as grandes lacunas que se deixar pelo caminho na redação deste texto. Escrever uma história
do semiárido é impossível e claro, a cada escolha significa renúncias para um pesquisador.
Aqui se apresenta um recorte temporal longo, porém com um objetivo de trazer uma visão
panorâmica da associação do termo sertão ao espaço brasileiro.
A sistematização acima apresentada consolidou-se a partir das leituras de autores que se
debruçaram em estudar e entender o sertão em sua associação ao semiárido ou ao interior do
Brasil. Como exemplo temos Ab'Sáber, (1999), Albuquerque Júnior (2006), Amado (1995),
Andrade (2005), Arruda (2000), Capistrano de Abreu (1976), Carvalho (2012), Castro (1997),
Cirilo (2008), Freixinho (2003), Lima (1999), Maciel e Pontes (2016), Moraes (2009),
Oliveira (1998), Rebouças (1997), Silva (2006; 2007), Silva (2010) e Villa (2001). São
autores que, em princípio, não comungam das mesmas perspectivas ideológicas e
metodológicas, bem como possuem obras realizadas em tempos e espaços distintos.
Sendo assim, apresenta-se, a seguir, a construção das representações territoriais do sertão ao
longo do tempo, mas evidenciando que à medida que uma nova representação se constrói, não
apaga a anterior. Outrossim, elas vão se sobrepondo. Destarte, tem-se o sertão como fronteira
da colonização e dos espaços vazios, o sertão como uma região problema, o sertão como
representação do passado e dos espaços das memórias e o sertão da sustentabilidade na
convivência com o semiárido.
100
Fonte : elaboração própria a partir de imagens disponibilizadas gratuitamente
Figura 22 - Linha do tempo com as representações territoriais do sertão
5.2.1. O sertão como fronteira da colonização e dos espaços vazios
Com uma origem colonial portuguesa que data do início do século XVI, a ocupação do Brasil
seguiu o processo de apropriação de novos lugares com suas populações autóctones, suas
riquezas e seus recursos naturais136. O mesmo se aplica ao semiárido que foi ocupado
seguindo um padrão extensivo (do ponto de vista do espaço) e intensivo (do ponto de vista
dos recursos naturais) de uso de solo (Moraes, 2005).
Esse panorama nos dá a ideia da origem dos elementos das representações territoriais
imateriais, ou seja, a origem dos discursos de uma região longe e selvagem. Há uma
comparação entre o sertão brasileiro e o velho oeste estadunidense137 (Oliveira, 1998) como
fronteiras de uma entrada europeia civilizatória que julgava selvagens os indígenas que ali
viviam (Moraes, 2009, 2011; Puntoni, 2008).
Na entrada para o interior do Brasil, o semiárido, assim como todas as regiões interioranas da
colônia incluindo as atuais regiões Sudeste e Centro-Oeste, eram os sertões. A noção de sertão
136 O primeiro momento de ocupação do semiárido se inicia em fins do século XVI, perdura até finais do século
XVIII gerando uma série de ocupações no interior. O semiárido tem sua colonização baseada, em grande parte
pela implantação da pecuária. Neste processo, os assentamentos iriam se consolidando em vilas, e os caminhos,
nas estradas. 137 O paralelo que se faz entre o sertão como fronteira móvel no Brasil e o velho oeste estadunidense é
interessante. " Roosevelt, que teve papel fundamental na releitura da fronteira e do cowboy no nacionalismo
americano, após deixar a presidência fez uma viagem aos sertões do Brasil. O governo brasileiro, através de seu
ministro das Relações Exteriores, Lauro Müller, designou o então coronel Cândido Mariano da Silva Rondon
para acompanhá-lo nesta viagem. Dela resultou o livro ThroughtheBrazilianwildness, publicado em Nova York
em 1914 e só publicado no Brasil trinta anos depois" (Oliveira, 1998 : 5).
FRONTEIRA DA COLONIZAÇÃO E
DOS ESPAÇOS VAZIOS
A partir do século XVII
REGIÃO PROBLEMA
A partir das últimas décadas do Século XIX
REPRESENTAÇÃO DO PASSADO E DOS ESPAÇOS
DAS MEMÓRIASPrimeira metade do século XX
SUSTENTABILIDADE NA
CONVIVÊNCIA COM O
SEMIÁRIDOÚltima década do Século XX
101
como lugar longe da costa, assim, era uma demarcação de fronteira. Usava-se uma palavra
para delimitar espaços indefinidos e vagos, ou seja, um nome para um espaço desconhecido.
Iniciava-se, nesse momento, a hierarquização dos territórios coloniais. A cultura sertaneja que
se construiria nos séculos vindouros seria, então, estranha à açucareira litorânea desde cedo
(Silva, 2010), mesmo antes de se construírem como tal.
Escritores como Pêro de Magalhães de Gândavo138, Gabriel Soares de Souza139 e Ambrósio
Fernandes Brandão140, cronistas de um mundo colonial, mesmo não estando mais na Europa,
construíram um discurso a partir dos valores deste continente141. Como cronistas, por mais
que tentassem direcionar sua interpretação, não fugiam do imaginário dominante. Sendo
assim, as imagens do sertão eram produzidas a partir da ideia conhecida pelo cronista,
levando-se em conta a imaginação e suas crenças, apresentavam uma literatura não calcada no
verídico e sim no verossímil (Silva, 2010). As primeiras representações da região semiárida
vieram em forma de discursos com os relatos de pessoas que não a visitaram.
No entendimento de fronteira de uma civilização europeia que se instalava no Novo Mundo,
existia Oliveira (1998 : 2) afirma que "a versão da terra como natureza paradisíaca está
presente desde sua 'certidão de nascimento' com a carta de Pero Vaz de Caminha142 e vem
sendo retomada como mito de origem que perdura até os dias de hoje". A ideia da
superioridade do litoral em relação ao interior é uma consequência e ao mesmo tempo uma
transposição do pensamento português sobre a sua colônia na América. A escrita era uma das
maneiras de se registrar a superioridade europeia sobre o Novo Mundo.
A dizimação de grande parte dos povos indígenas iniciada já nas primeiras décadas de
colonização deixou livre uma grande área e por ela se alastraram numerosas fazendas de gado
(Capistrano de Abreu, 1976, 1988; Puntoni, 2008). Como assinala Silva (2006b), o índio143 é
138 (c. 1540 c. 1580). 139 (1540-1591). 140 (1555-1618). 141 Ressalta-se que esse pensamento se baseia nas discussões sobre o Orientalismo de Edward Said transposta
para a América. 142 (1450-1500). 143 A produção acadêmica sobre a presença indígena e seu papel na história do Brasil quando se toca o semiárido
é ainda muito tímida. Se faz urgente um aprofundamento sobre essas questões.
102
um dado natural do sertão e sempre aparece como um elemento marginal no seu interior144. A
autora ainda será mais incisiva ao dizer que a presença de africanos escravizados é uma
realidade invisível no sertão. Os estudos sobre o tema são praticamente inexistente e não serão
tratados aqui por não estarem dentro dos limites estabelecidos para o estudo.
O sertão como construção simbólica é um resultado, inicialmente, do colonizador e os
indígenas faziam parte da uma visão pejorativa endossada pelos portugueses145. Do confronto
entre o colonizador e o indígena, o primeiro leva vantagem e então se inicia uma sociedade
distante, isolada e desconhecida chamada de sertaneja que precisava ser construída depois da
“derrota” dos autóctones. Para isso, adota-se o modelo do dominador. Houve uma imposição
da “civilização” colonial litorânea para o lugar da “barbárie" e essa imagem vai perdurar nos
séculos seguintes146 (Dantas, 2000; Marcial, 2010; Santos, 2010).
A ocupação aconteceu em duas frentes, a que Andrade (2005) chama de sertão de fora, pelo
litoral norte (onde hoje estão o estado do Rio Grande do Norte e parcelas consideráveis dos
estados do Piauí e Ceará) e o sertão de dentro, saindo da foz do rio São Francisco (atualmente
entre os estados de Sergipe e Alagoas) em sentido montante, inclusive, "os colonizadores
perceberam que os povos indígenas buscavam abrigo nos brejos, onde obtinham água e caça
com mais facilidade e onde a terra era mais fértil" (Silva, 2006 : 38). Os pontos de partida
levavam em conta as possibilidades de entrada que não esbarrassem no planalto da
144”Como diz Katia Abud, o índio histórico foi derrotado, escravizado. O índio mitológico de antes da chegada
do homem branco à terra permanece. Mas frente a este o bandeirante é difícil de ser incorporado à história pátria
na medida em que destruiu o mito da invencibilidade do indígena. Na questão da escravização dos índios, a
historiografia tem de lidar com o papel dos jesuítas e da Companhia de Jesus, outro grande tema que não será
aqui discutido" (Oliveira, 1998 : 13). 145 "Na maioria dos discursos do pensamento social brasileiro sobre os sertões e a importância do contingente
populacional não-branco na sua formação, sobretudo no discurso histórico, são constantes duas atitudes
intelectuais básicas: a primeira insiste na insignificância numérica destas populações não-brancas
(principalmente do negro) e na sua precária influência para a composição racial que formou o que se considera
como o típico homem sertanejo; a segunda enfatiza a significativa participação do sangue destas populações
(principalmente o indígena, nas suas misturas com o branco) na base formativa do elemento humano considerado o mais legítimo representante destas regiões do país" (Silva, 2006 : 429). 146 Pode-se destacar como o pensamento brasileiro refletiu continuamente sobre as distinções entre litoral e
interior, entre cidade e sertão, demarcando as diferenças de vida social e de tipos humanos. Civilização versus
barbárie, cosmopolitismo versus brasilidade parecem marcar o paradoxo do "estilo tropical" que permanece
como um dos traços do pensamento brasileiro. Roberto Ventura (1991) aponta para a ambivalência do discurso
europeu que oscila entre a imagem positiva da felicidade natural e inocência dos habitantes da terra americana e
a condenação dos seus costumes bárbaros. É preciso lembrar que um discurso negativo sobre o homem e a
natureza da América permite a legitimação da expansão europeia. A tese da degeneração dos animais, das
plantas e do homem americano assim como a tese da juventude do continente abrem espaço para a ação
civilizadora do homem branco (Oliveira, 1988 : 8).
103
Borborema147, bem como as limitações de transportes dos sistemas de engenharias disponíveis
na época (Santos, 2004).
Amado (1995) faz um paralelo entre a ocupação do semiárido brasileiro e a conquista do
Oeste estadunidense. Para a autora, nos Estados Unidos,
a história uniu-se ao mito para construir a identidade nacional; 'a mito-história do
Oeste fez parte da construção de uma hegemonia nacional e internacional' através
de uma narrativa única capaz de simbolizar a nação. No Brasil, diferentemente, há
dois espaços simbólicos da conquista do Oeste: o sertão e a Amazônia. São ambos
mitos de caráter regional e não foram capazes de incluir a nação inteira em uma
única narrativa (Amado, 1995 : 67).
A partir do século XVII, iniciam-se as primeiras tentativas de elaboração de uma História do
Brasil, como a realizada por frei Vicente do Salvador" (Amado, 1995) e os discursos sobre o
interior, ou seja, o sertão se incorporam nessa tentativa. Esse panorama nos dá a ideia da
origem dos elementos das representações territoriais imateriais, ou seja, a origem dos
discursos de uma região longe e selvagem.
No século XIX, com a abertura dos portos brasileiros, intensifica-se a chegada de viajantes.
Foi considerado grande o número de naturalistas que visitaram o Brasil interessados em
estudar História Natural, Zoologia, Botânica, Geografia, Mineralogia, Paleontologia,
Astronomia, Meteorologia, entre outras áreas. Moraes (2005) considera esse momento como a
segunda “descoberta” do sertão pelo olhar estrangeiro, uma vez que a primeira teria iniciado
nos primórdios da colonização. Dessa vez, não apenas observando do litoral, mas visitando o
interior. As suas produções estão nas crônicas, romances, poesias, diários e relatos científicos,
bem como imagens iconográficas.
A partir da teoria da percepção e da representação social, Silva (2006) buscou entender o
sertão através da literatura de intelectuais brasileiros dos século XIX e de viagem e cientistas
europeus como Johann Baptist von Spix, Carl Friedrich von Martius e Auguste de Saint-
Hilaire. Para a autora, estes estudos tiveram forte impacto na produção do pensamento
brasileiros sobre o sertão.
Enfim, tanto do ponto de vista imagístico ou pictórico, quanto do ponto de vista
do artefato literário, os sertões descritos por Saint-Hilaire, Spix e Martius e outros
147Formação geológica com grande altitude, distante cerca de 100 km partindo-se do litoral da região Nordeste e
direção oeste. No início da colonização, procurava-se contorná-lo, uma vez que atravessá-lo era extremamente
difícil.
104
autores estão antes determinados pelos seus “olhares”, construídos a partir do
patrimônio cultural referentes aos lugares de origem destes autores e dos valores
próprios da época em que eles escreveram. Qualquer aproximação do homem
sertanejo ou do não-branco feito a partir deles implica acionar mediações
lingüísticas, simbólicas ou um quadro prévio de valores, concepções e
determinado contexto histórico (Silva, 2006 : 451).
A outrora colônia portuguesa havia se tornado o maior império e, em seguida, a república da
América Latina em termos territoriais, porém seu conhecimento era ínfimo, assim como a
interligação entre norte e sul. Com exceção de relatos e mapeamentos do interior do Brasil,
pouco se conhecia e pouco se representava desse espaço no século XIX.
Outra ação implementada no século XIX é a consolidação de uma história oficial do Brasil
através da recuperação de nomes de personalidades e grandes feitos patrióticos do passado.
Há busca de características que diferenciasse o brasileiro das outras nacionalidades e a
procura cada vez mais intensa de se conhecer um território imenso e diverso. Em princípio,
"os habitantes do sertão são descritos como verdadeiros heróis numa eterna luta com a
natureza para sobreviver" (Arruda, 2000 : 94), entretanto,
Capistrano de Abreu, que considerava que até o final do século XIX e início do
XX a história do Brasil tinha sido a história do litoral. Defendia a necessidade de
voltar os olhos para o interior, escrever a história das incursões pelos sertões,
como estava indicado em seu livro Caminhos antigos e o povoamento do Brasil.
Em sua obra, todavia, Capistrano questiona a matança e destruição dos povos
indígenas pela ação dos bandeirantes (Oliveira, 1998 : 13).
Construir as imagens de um país e assim se estabelecer suas representações era necessário
para o projeto unitário brasileiro. Uma boa síntese do houve nesse período pode ser vista em
Arruda (2000 : 99) quando diz que:
as preocupações com os espaços internos do país, com suas populações e
utilização dos seus recursos, remontam ao período imperial mas sofrem uma
grande revitalização nos quadros da montagem do chamado 'estado nacional
moderno'. Nestes termos, a questão colocava-se como uma necessidade de
'civilizar' os sertões, impondo aos seus moradores novas concepções de tempo,
propriedade e trabalho. Os mecanismos utilizados para esta tarefa de 'civilizar' que
pode ser entendida como 'homogeneizar' ou 'soldar' territórios aos novos ideários,
inscrevem-se no chamado ingresso do Brasil no campo da modernidade.
Ferrovias, estradas, telégrafos, mapeamentos, urbanização, civilização,
modernização são termos corolários deste processo.
105
A ideia de sertão como fronteira da colonização portuguesa no Brasil perde força, uma vez
que palavra sertão começou a perder seu significado para os portugueses de um lugar
longínquo e desconhecido e torna-se sinônimo de interior, opondo-se ao marítimo.
É possível que, em Portugal, "sertão" tenha sido uma categoria muito importante
para a classificação e hierarquização dos espaços do império português. À medida
que este império se decompunha, 'sertão' perdia seus significados, até guardar
apenas o original, anterior à constituição das colônias: o de 'interior' (Amado,
1995 : 150).
Num apanhado sobre o uso de sertão nos quatro primeiros séculos brasileiros, Oliveira (1998,
: 3) sintetiza que "o sertão, para o habitante da cidade, aparece como espaço desconhecido,
habitado por índios, feras e seres indomáveis. Para os bandeirantes e sertanistas148, era interior
perigoso, mas fonte de riquezas. Para os governantes lusos das capitanias, era exílio
temporário. Para os expulsos da sociedade colonial significava liberdade e esperança de uma
vida melhor". Em todos os casos, o sertão era a fronteira da civilização e o espaço vazio a
espera de se construir uma história.
No Brasil, para Lima (1999), duas associações ao sertão se fortalecem em fins do século XIX.
A primeira apresenta o resultado dos séculos de colonização no semiárido e enfatiza as
atividades econômicas e os padrões de sociabilidade, aproximando sertão e o sertanejo à
civilização do couro (Lima, 1999; Andrade, 2005; Capistrano de Abreu, 1976), o que vai se
desdobrar depois da associação de sertão aos espaços de saudade. A segunda é o
fortalecimento da associação do sertão ao semiárido brasileiro (Lima, 1999; Albuquerque
Júnior, 2006), que consolida a visão do sertão como uma região problema e vítima das
calamidades ambientais, principalmente as secas.
5.2.2. O sertão como uma região problema
As representações, sejam em imagens de uma região vitima das secas e atrasada socialmente
quando comparada ao restante do Brasil, bem como os discursos de um determinismo
ambiental extremamente presente no pensamento do século XIX, começam a se fortalecer e se
perpetuar. Ao tempo em que o Brasil vai se conhecendo, se conectando e, sobretudo, os
148 Nesse período, o sertanista era uma pessoa que frequentemente o visitava o sertão em busca de riquezas, caça
e pesca. Atualmente, sertanista é alguém com profundo conhecimento sobre a região. Bandeirante é a
denominação dada aos sertanistas desde o período colonial. Os bandeirantes tornaram-se parte dos mitos e
histórias brasileiras no processo de colonização. Vários bandeirantes tornaram-se célebres posteriormente, sendo
parte da cultura do país.
106
efeitos das secas naturais do semiárido passam a ser entendidos como um empecilho para o
desenvolvimento da região, o sertão passa a ser percebido como uma região problema.
O projeto brasileiro de integração do sertão ao litoral procurou unir esses dois territórios a
partir daquilo que os unificava, o idioma e a fé católica (Moraes, 2009). A isso, somam-se "a
crença da técnica como elemento de progresso e civilização com a integração do território
nacional e fortalecimento de sua unidade, isto é, a necessidade de 'devassamento e
reconhecimento' dos espaços nomeados 'sertões'! Para 'atualizá-los' e integrá-los à civilização"
(Arruda, 2000 : 105).
A integração passou pela intensificação de um sistema de circulação e incorporação
econômica, fato que contribuiu muito para o sertão ser visto como algo a ser superado
(Arruda, 2000). A partir do século XVIII começa-se a se desenvolver o aparato burocrático
luso-brasileiro para gerir o semiárido, mas isso não impactou substancialmente nos
significados de sertão. Havia a "imposição da lei pelo comando centralizado da burocracia da
administração pública e pela uniformização das instituições sociais, língua, moeda, pesos e
medidas, etc" (Castro, 2005 : 114).
Para Fortunato e Moreira Neto (2010 : 51),
Ao longo história, as questões que envolvem a região Nordeste tem sido debatidas
sempre apontando esse espaço como uma 'região problema', já que guarda em seu
conjunto os piores índices de desenvolvimento econômico e social do país. O
reconhecimento e a aceitação das condições sociais e históricas de produção dos
discursos que cristalizam as imagens de 'Sertão' e 'Semiárido', neste contexto, são
enunciados importantes que permitem entender como as relações de força, os
lugares sociais de onde se fala irão imprimir, historicamente, suas marcas.
As representações, sejam em imagens de uma região vitima das secas e atrasada socialmente
quando comparada ao restante do Brasil, bem como os discursos de um determinismo
ambiental extremamente presente no pensamento da época, século XIX, começam a se
fortalecer e se perpetuar.
Esse Brasil, em teoria, moderno rejeita o sertão e abraça a ideia de que o urbano e o industrial
devem ser a representação do país. O sertão é incompatível com a modernidade desejável e
deve ser modificado. Uma vez construídas as representações territoriais materiais e imateriais
do sertão, seria o momento de acabar com elas, não do ponto de vista simbólico e de mudança
107
da visão e da sua consequente representação, mas sim a mudança efetiva através de
intervenções sistemáticas no território.
Na primeira seca a ter repercussão nacional e a atingir os médios proprietários de terra, a de
1877, vivenciou-se a primeira ajuda governamental federal em recursos para as vitimas. A
partir desse momento, os políticos de origem ou com interesses no semiárido percebem que
possuem uma grande arma para reivindicar cada vez mais ajuda do governo central. A seca
torna-se então o principal problema da região e assim torna-se a representação material
dominante da região. A ela se adiciona a representação imaterial através dos discursos e da
cultura, como dita anteriormente, distinta do restante do Brasil. De problema social com
soluções políticas e econômicas, a seca passa a ser o grande problema da região.
É ainda no século XIX, sobretudo após a seca de 1877-1879149 que o semiárido passou a ser
identificado como uma região problema. Se alguns marcos podem ser apontados na história
da região, certamente essa grande seca é um deles. A partir desse momento, não só a região
passou a ser vista como um problema pelo restante do país, principalmente por aqueles que
formavam opinião, os cientistas da época e os que tinham o poder de tomar decisão. Com
isso, "a seca começou a ocupar um espaço cada vez maior na grande imprensa e
transformando-se em tema literário" (Villa, 2001 : 105). Para Albuquerque Júnior (2006 : 72),
"o ano de 1877 é erigido como o marco da própria decadência regional, como um momento
decisivo para a derrota do Norte diante do Sul".
A seca torna-se o tema central no discurso dos representantes políticos do sertão, que a
instituem como o problema de suas províncias ou Estados. Todas as demais questões são
interpretadas a partir da influência do meio e de sua calamidade. As manifestações de
descontentamento dos domínios, como o banditismo, as revoltas messiânicas e mesmo o
149Villa (2001) chama atenção que mesmo sendo este momento o grande marco da seca como representação do
semiárido, outras secas já tinham causado impactos sociais na região. Para o autor, ainda em 1796, "a chegada de
uma seca encontrava o sertão absolutamente despreparado para resistir aos seus efeitos: a história acabava se repetindo, somente aumentando as proporções da tragédia devido ao crescimento populacional. Por outro lado,
as dificuldades de comunicação e a pequena importância econômica do sertão no interior da economia colonial
permitiram certo isolamento do domínio colonial português, fundando uma sociedade com características
peculiares em relação àquela do litoral" (Villa , 2001 : 21). Em outro exemplo, "em 1833, o ministro do Império
autorizou a abertura de fontes artesianas no Ceará, na Paraíba e em Pernambuco. Já com a ascensão do padre
José Martiniano de Alencar ao governo do Ceará, em 1834, pela primeira vez o governo provincial criou
condições para que a população pudesse resistir aos efeitos do terrível flagelo. Foram incentivadas as
construções de açudes, cacimbas e a perfuração de poços. Foi fundado o Banco Provincial do Ceará - o segundo
do Brasil, depois do Banco do Brasil, criado por d. João VI. Mas em 1845 novamente outra grande seca atingiu
boa parte do Nordeste" (Villa , 2001 : 23).
108
atraso econômico e social da área, são atribuídos à seca, e o apelo por sua “solução” torna-se
um dos principais temas dos discursos regionais (Albuquerque Júnior, 2006, Arruda, 2000;
Freixinho, 2003). As imagens da "seca, a terra rachada, a fome, embora atinjam só alguns
espaços, alguns períodos e alguns grupos sociais da região, são generalizados, tornam-se
permanentes. De problemas sociais, eles terminam por se tornarem problemas de um dado
espaço" (Albuquerque Junior, 2006 : 224).
Os relatórios das secas em fins do século XIX foram o início de aplicação de políticas
baseadas em um melhoramento do semiárido. Buscavam-se soluções que finalizassem os
impactos sociais causados por um fenômeno natural através da intervenção e modificação
direta do território. Imperava nesse momento as ideias de modernidade e, com isso, a busca
do aperfeiçoamento do território através de modificações pontuais com total uso da autoridade
e poder sempre que fosse demando (Silva, 2007).
Portanto, seja na imprensa do sul, seja nos trabalhos de intelectuais que adotam os
paradigmas naturalistas, seja no próprio discurso da seca. O Norte150 aparece
como uma área inferior do país pelas próprias condições naturais. Ainda que no
discurso da seca essa deficiência de meio e de raça deveria ser compensada pela
atuação do Estado, investindo na modernização da área, numa política de
imigração, numa série de medidas para 'solucionar' o problema das secas151
(Albuquerque Junior, 2006 : 75).
Na primeira metade do século XX, as notícias dos problemas sociais oriundos das secas
periódicas eram utilizadas para disputar recursos nacionais com outras regiões brasileiras, ao
mesmo tempo em que atraíam privilégios para essa elite local que gerenciava o semiárido. A
seca passou a ser vista como um problema recorrente que demandava cada vez mais de um
Estado paternalista. A região estaria condenada pelo clima e pela raça à decadência. É a seca
que está presente nos veículos de comunicação do Sudeste e das cidades litorâneas. As
imagens da seca tornam-se a representação territorial dominante para a região Nordeste. Neste
tocante, é o semiárido sendo representando por um fenômeno natural e sua população sendo
vista como vitima e, ao mesmo tempo, inferior ao restante dos brasileiros.
150 O Norte refenciado pelo autor, naverdade é a atualRegião Nordeste, onde está a maior parte do semiárido
brasileiro. 151 A certeza de que o rápido desenvolvimento do Sul, notadamente São Paulo se explicava pela sua
superioridade de clima e de raça, por ser um estado de clima temperado e raça branca, levava a que não se
tivesse dúvidas do destino desta área, “puxar o trem descarrilhado de uma nação tropical e mestiça”. O Norte
fica “naturalmente” para trás. Só, pois, com a crise desse paradigma naturalista, com a emergência de um novo
olhar em relação ao espaço, com uma nova sensibilidade social em relação ao país e à nação, capaz de incorporar
os diferentes espaços do país, vai ser possível a invenção do Nordeste como reelaboração das imagens e
enunciados que construíram o antigo Norte(Albuquerque Junior, 2006 : 75-76).
109
De acordo com Albuquerque Júnior (2006), as bancadas nortistas152 conseguem incluir, já na
constituição de 1891, o artigo 5º, que obrigava a União153 a destinar verbas especiais para o
socorro de áreas, vitimas de flagelos naturais, abrangendo aí as secas. Esta institucionalização
das secas consegue, progressivamente, abrir maiores espaços no aparelho de Estado para os
grupos dominantes do 'Norte'154. Isto fica claro com a criação do Instituto de Obras contra a
Seca (IOCS), em 1909. Esta instituição, destinada ao 'combate às secas', torna-se o lócus
institucional da produção de um discurso regionalista que ganha tons cada vez mais
inflamados.
A história da formação político-territorial no país se fez com a acomodação dos interesses das
oligarquias regionais através de sua participação, direta ou indireta, no governo central. No
período pós-indepedência155 nenhuma das regiões brasileiras tinham força econômica ou
política suficiente para assegurar, por si só, o domínio do Estado. Os governos buscavam
reprimir secessões territoriais ao se privilegiar uma suposta unidade nacional e, com isso, uma
unidade política estabelecendo e fortalecendo os laços com elites regionais, ao mesmo tempo
que também fortalecia essas elites (Castro, 1997).
"Desde o início do período de independência política, o Estado Brasileiro e suas elites
governamentais mantiveram uma grande preocupação em assegurar a integridade do território
nacional" (Arruda, 2000 : 113). Para isto, representar esse território era fundamental. O
processo histórico político do país, que progressivamente delineou os limites das unidades
administrativas e o significado do seu território, e de sua sociedade, numa estrutura de
representação territorial, contribuiu para forjar escalas de interesse reforçadas pelo discurso da
solidariedade da identidade. Nesse sentido, problematizar o espaço político, no qual se fazem
a representação e a administração de interesses contraditórios, requer identificar tanto seus
conteúdos simbólicos e materiais, como a articulação do espaço da função política com outras
dimensões do espaço da sociedade (Castro, 1997). Com isso, "áreas diversas culturalmente
como o Recôncavo Baiano, o litoral pernambucano e paraibano, o sertão cearense ou a parte
amazônica do Maranhão, passam a ser pensadas como uma unidade, desde geográfica, étnica,
152 O autor utiliza o termo "nortista" para designar quemvinha do norte do Brasil, que eglobava, em suadiscussão
a região Nordeste e nãonecessariamente o que se conhecehoje no Brasil como região Norte. 153Também entendida como o governo central do Brasil. 154Assim como dito sobre os nortistas, aqui se trata da região Nordeste e não da atualregião Norte do Brasil. 155Após 1822.
110
até cultural" (Albuquerque Junior, 2006 : 350). Essas regiões receberam a representação do
seco, do semiárido, uma homogeneização de uma região complexa chamada Nordeste,
representada pelos discursos de flagelo, inferioridade ambiental e social, bem como lugar de
memórias do passado. De fato, o antimoderno.
Há uma memória social,
numa sociedade que transita de rural para urbana, em que a tradição oral,
marcadamente popular, começa a sofrer um processo de desqualificação com a
ampliação da urbanização, através da memória escrita e do surgimento e da
expansão dos modernos meios de comunicação, como é o caso do Brasil na
primeira metade do século156 (Arruda, 2000 : 43).
Para Castro (1997 :3),
a história da conquista territorial no Brasil deixou marcas profundas no imaginário
político nacional. A tradição unitária durante o domínio colonial157e durante o
Império158 refletia-se fortemente na busca da unidade territorial, forjando a
herança de um imaginário de unidade e de identidade nacionais apoiada na
conquista territorial159.
Arruda (2000 : 114) reforça isso ao dizer que "a unidade territorial seria mantida a ferro e
fogo, com repressão do poder central a qualquer ameaça regional, como nos casos das
revoltas de Pernambuco durante o período imperial, ou de Canudos, durante a república160".
Albuquerque Júnior (2006) defende que, até o princípio do século XX, havia no Brasil apenas
o norte e o sul. O Nordeste foi sendo construído a partir de uma elite que entrava em
decadência e, para se manter em evidência política e econômica, construía um discurso a
partir dos estados de Pernambuco e Ceará. Defendiam a ideia do tradicional e do antimoderno
e usavam as representações do semiárido, acentuando as características naturais do semiárido
como empecilho para o desenvolvimento econômico da região. Houve uma grande adesão, na
maioria das vezes espontânea, dos intelectuais e artistas nesse sentido.
156Referindo-se aoséculo XX, 157 O período colonial brasileiro é tratado na historiografia do país como tendo início em 1500 e finalizando com a independência brasileira de Portugal, em 1822. 158 O período imperial brasileiro é tratado na historiografia do país como tendo início em 1822 com a
independência brasileira de Portugal até 1888 com a proclamação da república. 159 A autora continua a discussão afirmando que "Este imaginário tem origem no mito fundador do Estado no
Brasil, atribuído à estratégia colonial portuguesa da conquista territorial. No momento da independência o
território brasileiro era um desenho no mapa, não haviam fronteiras definidas por acordos internacionais que
garantissem a soberania sobre o território. No entanto, em nome dessa unidade territorial todos os movimentos
de caráter regional eram sufocados, mesmo os que não tinham reivindicações separatistas" (Castro, 1997 : 3). 160O período da república do Brasil está consolidado na historiografia do país como tendo início em 1888 com a
proclamação da república durando até os dias atuais.
111
A consolidação do uso de sertão como qualitativo para lugares se aprofunda, não mais para
todo o interior do Brasil e sim, cada vez mais associado ao semiárido e suas características
naturais
E é através não só da destinação de recursos públicos, mas, do controle,
manipulação e reinvenção dos mesmos, pelas elites regionais, que se dá
sustentabilidade à chamada indústria da seca. Uma indústria que tem como
principal pressuposto a construção de grandes obras hídricas e a apropriação
privada dos recursos públicos destinados à região, sobretudo, em momentos de
registro de calamidades climáticas, já que as memórias desse espaço trazem as
marcas de uma realidade predominantemente povoada pela dispersão, pelo ermo
dos sertões secos e sem vida (Fortunato e Moreira Neto, 2010 : 54).
A invenção do sertão se alimenta, assim, não só da institucionalização da seca, mas da sua
compreensão como problema que precisa ser combatido, sobretudo a partir da intervenção
estatal. A Gênese desse pensamento está no século XIX, mas se confirma no século seguinte.
O sertão tornou-se mais afetado pelo domínio sulista, transformando-se em símbolos do
atraso, ante a modernidade representada pela burguesia cafeeira (Villa , 2001).
Em princípios do século XX é lançado a primeira edição do livro Os Sertões de Euclides da
Cunha161, calcado nas ideias do determinismo social, o autor acreditava em uma raça superior
e que o mestiço brasileiro seria inferior. Entretanto é dessa obra a expressão "o sertanejo é
antes de tudo, um forte" que influenciou bastante o pensamento sobre os habitantes do
semiárido dentro e fora da região e foi utilizado exaustivamente nas descrições a análises
sobre a região desde então (Murari, 2007). A expressão acima colocada é a maior
representação de um discurso simples, rápido e eficiente sobre o sertanejo. Nas duas décadas
seguintes à publicação de Os sertões, "será notada a influência de escritores como Alberto
Torres, Oliveira Vianna, Gilberto Freire e Gilberto Amado, cuja característica teórica é a
percepção de contrastes, oposições e polarizações na sociedade brasileira" (Lima, 1999 : 28).
161 Para Oliveira (1998 : 9) "Euclides da Cunha produziu, é preciso lembrar, tanto narrativa referida ao sertão
quanto à Amazônia, marcando o pensamento social brasileiro ocupado em produzir uma identidade nacional para
o país. Um dos desdobramentos do mito do sertão é o do bandeirante, responsável pelo aumento do espaço
territorial da colônia portuguesa nos séculos XVII e XVIII. O movimento das bandeiras constitui a principal
experiência de fronteira na história brasileira. A categoria de fronteira seria resultado da mudança de perspectiva
em relação ao sertão, já que estaria relacionada aos processos econômicos de incorporação e ocupação de "vazios
demográficos". A noção de fronteira seria capaz de diluir a dicotomia litoral/sertão, já que significa a
oportunidade de chegada da civilização- litoral ao sertão-interior, conciliando a qualidade positiva do litoral - a
civilidade - com a crença de que no interior/sertão está preservado um Brasil autêntico".
112
Para Oliveira (1998 : 7),
Como missionário do progresso, Euclides da Cunha deseja integrar o sertão à vida
nacional. Isto deveria começar por um trabalho de produção de um minucioso
estudo da região recolhendo os elementos causadores de sua desordem climática.
Defende também um plano de combate à seca pela construção de pequenos e
numerosos açudes capazes de transformar o deserto em rica região agrícola. Na
Amazônia, Euclides propõe a recuperação do rio Purus, a construção de uma
estrada de ferro - a Transacreana - que seria capaz de espalhar frentes de
colonização e proteger as fronteiras do país. Neste sentido, Euclides pode ser visto
como um precursor de idéias e projetos que foram implementados, com ou sem
sucesso, anos mais tarde, como a Madeira-Mamoré, o IBGE, o DNOCS e, até
mesmo, a Calha-Norte. André Rebouças, Euclides da Cunha e Cândido Rondon
podem ser considerados como os mais importantes membros do panteão dos
missionários do progresso e da civilização no Brasil.
Para Murari (2007 : 57),
O resultado foi a produção de um volume expressivo de informações cartográficas
e estatísticas, que instrumentalizavam a ação dos agentes do Estado e o
levantamento das potencialidades de exploração econômica dos recursos naturais,
de acordo com as demandas estatais e com sua articulação aos interesses
localistas. Objetivava-se, em suma, impor o primado da razão à barbárie dos
territórios não relacionados com a atividade hegemônica, bem como aos setores
não privilegiados dentro do próprio território hegemônico.
A partir da década de trinta "a seca começa a receber, por parte do Estado, um tratamento
'planejado', legitimando uma miséria que deve ser reelaborada pelas políticas governamentais
dirigidas à região" (Fortunato e Moreira Neto, 2010 : 55). Albuquerque Júnior (2006)
contextualizou esse período do sertão como qualitativo de lugares. Para o autor,
a década de trinta é um momento de intensa disputa entre os diferentes projetos
ideológicos e intelectuais para o país, momento em que as organizações e
instituições como a Ação Integralista Brasileira, o Partido Comunista, a Aliança
Nacional Libertadora, a Igreja, o Estado e seus ideólogos travam uma intensa
batalha e torno da distribuição de um novo sentido à história do país, à nação e ao
seu povo (Albuquerque Júnior, 2006 : 234).
A configuração política da região começou a mudar em meados do século XX. Em
decorrência das constantes secas e da cada vez mais visível e mensurável permanência da
miséria no semiárido, milhares de sertanejos migraram também para as cidades do Sudeste,
principalmente Rio de Janeiro e São Paulo. "Em 1950 viviam nas cidades do Nordeste
4.744.808 pessoas; dez anos depois o número tinha crescido para 7.680.681. Nesses anos, a
população de Recife cresceu 52 por cento, a de Salvador 57 por cento e a de Fortaleza 90 por
cento" (Villa, 2001 : 188). Os processos migratórios passam a ser apresentados como um
113
problema que, dessa vez, afetaria as demais regiões brasileira. O semiárido era, de fato, um
problema para o Brasil, assim pensavam intelectuais e governantes. O projeto de
desenvolvimento em execução no semiárido estava calcado nos preceitos do positivismo e no
ideário de progresso autosuficiente e não consideravam as particularidades da região.
Iniciado no século XVI e perdurado nos séculos seguintes, o sertão foi considerado um lugar
de gente pobre, ignorante e preguiçosa, enquanto o litoral, o lar do civilizado (Freixinho,
2003). Ao pensar em sertão, certamente, a maioria dos brasileiros o associa às paisagens
semiáridas (mesmo que nem saiba o que isso quer dizer), solo rachado, pouca água e pessoas
com fome, imagens essas que são generalizadas para toda a região. O sertão é um lugar
distante (ainda que se chegue rapidamente com o transporte aéreo); desconhecido (mesmo
com a TV e Internet enviando informações em tempo real) e selvagem (embora com o
acelerado grau de urbanização).
5.2.3. O sertão como representação do passado e dos espaços das memórias
A partir do século XIX, as ideias de modernidade começam a se difundir de maneira mais
incisiva no Brasil. Em principio, o moderno rejeita o sertão e abraça a ideia de que o urbano e
o industrial devem ser a representação do país. Neste contexto, o sertão é incompatível com o
que se desejava para o país e deveria ser, obviamente, modificado e modernizado. Murari
(2007) disseca como o pensamento modernizando chegou e se instalou no Brasil, a autora
afirma que:
O moderno racionalismo europeu foi assimilado no Brasil de acordo com
interesses políticos e culturais da elite do país, em função da qual ele viria
fundamentar um pensamento autoritário e conservador ligado à afirmação do
estatuto social da classe política em relação à maioria da população, vista, em
termos étnicos, como 'inferior'. O racionalismo aplicado à sociedade hierarquizada
e estamental, de modo que a partir dele se constituiu uma visão etnocêntrica do
povo brasileiro (Murari, 2007 : 145-146).
As representações territoriais materiais e imateriais construídas até este momento,
notadamente do sertão como fronteira da colonização e dos espaços vazios seriam
substituídas. Além da região problema, surgiriam também os espaços de memória. Seria o
momento de mudança da visão e da simbologia da região, consequentemente, das suas
representações. A conexão do país via desenvolvimento dos transportes e das comunicações
114
fez com que diferentes partes do país começassem a se ver e, em muitos casos, não se
reconhecer.
Para exemplificar esse pensamento, os habitantes do semiárido devido a uma série de razões
(distância do litoral, dificuldade deslocamento na região e a necessidade de adaptação a um
local com pouca pluviosidade) desenvolveram uma cultura que é bem diferente do restante do
país e está fortemente ligada à natureza (Andrade, 1993; Capistrano de Abreu, 1976, 1988).
As práticas da população em diversos locais, aparentemente isolados, distantes e diferentes
entre si compuseram um mosaico que somados posteriormente construiriam uma cultura
chamada de sertaneja. Essa construção permitiu uma homogeneização da região e a
construção de uma representação que a mostrava uma grande região rural, devastada pelas
calamidades e em contraponto ao fenômeno urbano e a modernização de cidades do Nordeste,
como Recife, Salvador e Fortaleza.
A unidade interna de um pensamento que cerziria os sertões de todos os estados foi dada
também pela produção literária ao longo do século XX, principalmente por aquela literatura
taxada de regionalista. Aliás, contrastando com a literatura tida como nacional, especialmente
aquela produzida no Rio de Janeiro e São Paulo, a
literatura regionalista tem o sertão como lócus, ou se refere diretamente a ele. A
chamada 'geração de 1930' (Graciliano Ramos, Raquel de Queirós, José Lins do
Rego, Jorge Amado, etc.), por sua vez, é a principal responsável pela Construção
dos conturbados sertões nordestinos, de forte conotação social. Entretanto, talvez
o maior, mais completo e importante autor relacionado ao tema tenha sido João
Guimarães Rosa (1965), o evocador dos sertões misteriosos, míticos, ambíguos,
situados ao mesmo tempo em espaços externos e internos. O tema continuou a ser
abordado por vários autores (Ariano Suassuna e João Ubaldo Ribeiro são apenas
exemplos), chamando a atenção de escritores recentemente editados, como
Francisco C. Dantas, em Os desvalidos (1993) (Amado, 1995 : 146).
No caso específico do sertão, "eles - os membros da elite brasileira da época - tentam
construir uma imagem, um texto único, homogêneo para a região [...] O Nordeste deveria ser
visto e lido numa só direção para que seu efeito de verdade fosse eficiente politicamente"
(Albuquerque Júnior, 2006 : 84).
Na percepção do sertão, tendo por base a obra Os Sertões, Murari (2007 : 77) afirma que:
115
pode-se dizer que o Brasil continha, para Euclides da Cunha, uma região
europeia, civilizada, e outra selvagem, pertencente ao domínio da natureza. O
autor de Os sertões não concebeu, neste momento de sua obra, que o dualismo
existisse tanto no país como um todo quanto dentro de suas regiões mais
progressistas, nas quais conviviam o atraso e os avanços da modernidade.
Ganharam adesão de intelectuais e da população de vários estados que começaram a se ver
como nordestinos, diferenciando-se ainda mais do restante do país (Albuquerque Junior,
2006). Destaca-se assim, a imagem do sertanejo e das paisagens semiáridas como símbolos do
Nordeste Ressaltando que o sertanejo difere do homem civilizado pela distância espacial e
temporal, ou seja, o sertanejo é como um ser do passado que remanesce no presente e "a
natureza representa-se aí como elemento definidor de uma nacionalidade a ser ainda
construída" (Murari, 2007 : 47). Por fim, "o que se supõe é que a diferença entre os povos
corresponderia a uma diferença de posicionamento de cada um deles na escala temporal do
progresso humano" (Murari, 2007 : 104). Consolidava-se uma região calcada no tradicional e
na seca.
O sertão está presente em diversas obras de romancistas brasileiros, sejam aqueles
considerados regionalistas ou não. O próprio termo regionalista é empregado
quando se tem o sertão como pano de fundo nas tramas dos romances [...]. A
literatura brasileira povoou os variados sertões que construiu com personagens
colossais, poderosos símbolos. narrativas míticas, marcando com eles forte, funda
e definitivamente o imaginário brasileiro (Amado, 1995 : 146).
Freixinho (2003) vai às raízes do que se entende por arcaico no Brasil e de como essas
imagens estão associadas ao semiárido. No processo de modernização engendrado pelo
Estado, todo o interior foi deixando de ser chamado de sertão, à exceção do semiárido. O
Estado de São Paulo, por exemplo, livrou-se rapidamente da memória de que havia “sertões”
em seus domínios. Como resultado, uma visão cada vez mais negativa da região e da sua
população foi reforçada (Lima, 1999; Silva, 2010; Arruda, 2000162). Assim, "no sertão a
sociedade teria sido mantida, ano após ano, com as mesmas feições que lhe conferiram seus
primeiros colonizadores" (Murari, 2007 : 101).
O sertão tornou-se os espaços da memória a partir da produção cultural que envolvia a
música, a dança, a literatura, o cinema, o teatro (Arruda, 2000) e a gastronomia163, tal adesão
162Esse autor aprofundouessadiscussãoanalisando o contraponto entre o sertão, visto apenas com o rural e as
cidades, cada vez maisícones de modernidade e materialização de um modelo de civilizaçãolitorânea. Esses
autores utilizamum enfoque semelhanteaoanalisar as construçõesimateriais e o discurso construído exteriormente
aosertão. 163Não obstante a culináriatida como sertaeja é reconhecida nas demais regiões do Brasil.
116
reforçou e legitimou o imaginário da unidade nacional, garantida pela centralização do poder
formal, que refletiu-se na difícil incorporação do tema do regionalismo, como questão
relevante a ser pesquisada (Castro, 1997). "O sertão é visto, portanto, ora como a relíquia
arqueológica de um estágio evolutivo já superado pela civilização, ora como um museu onde
a história da humanidade se desenrola no momento presente aos olhos do observador"
(Murari, 2007 : 103). O entendimento da construção desse regionalismo se faz a partir de
estudos de escritores, artistas e jornalistas que foram interpretando e registrando o sertão ao
longo do século XX. É com base nessa concepção que se observa a consolidação de uma
identidade sertaneja. Sertão passa a ser praticamente o termo que define as terras semiáridas
brasileiras.
Como afirmou Murari (2007 : 48), "o sertão é um espaço em branco a ser ainda preenchido,
cravado no território onde deveria figurar uma nação imaginada como unidade. Por fim,
Albuquerque Júnior (2006 : 134) resume afirmando que:
um sertão que é o Nordeste, espaço mítico já presente na produção cultural
popular, no cordel e em romancistas do século XIX, sistematizado definitivamente
por Euclides da Cunha e, agora, agenciado para representar uma região. O sertão
deixa de ser aquele espaço abstrato que se definia a partir da 'fronteira da
civilização', como todo o espaço interior do país, para ser apropriado pelo
Nordeste. Só o Nordeste passa a ter sertão e este passa a ser o coração do
Nordeste, terra seca, do cangaço, do coronel e do profeta. A negação do Brasil
verde, do Brasil aquático, do Brasil de jardins amáveis. Terá angustiada pelo sol,
gretada pela decomposição violenta, esboroada, desfazendo-se nos pés dos
redemoinhos.
Alguns elementos do semiárido são evidenciados e reforçados como representantes da região.
Assim, a figura do cangaceiro, do messianismo, do coronelismo, do catolicismo e da violência
com a "justiça pelas próprias mãos" serão expoentes de uma imagem associada à região e
tidas como representações do sertão. Essa associação não foi aleatória, pelo contrário, foi
planejada para dar unidade ao sertão e diferenciá-lo das demais regiões (Freixinho, 2003,
Albuquerque Júnior, 2006). As imagens do semiárido como sertão seriam então as
representações da região Nordeste. A imbricação semiárido-sertão-nordeste confunde-se a
partir daí.
Assim, Murari (2007) ao interpretar a obra Os Sertões , afirma que
O sertão é, assim, na definição de Euclides da Cunha, um espaço alheio à história,
ou pelo menos a uma concepção de história centrada no fluxo das rápidas
transformações tecnológicas e sociais engendradas pela modernidade. Ao
117
contrário, a noção de temporalidade que o escritor imprime ao sertão é similar ao
que Braudel definiu como a longa duração, estrutura profunda associada às
condições geográficas que o tempo demora muito a alterar, e que limita a ação
humana. Prevalece aí a metáfora do sertão como um oceano imóvel, sem vagas e
sem praias, uma instância puramente geográfica definida pela fixidez do tempo,
porém capaz de se tornar, por meio da ação do homem, um espaço paradisíaco
(Murari, 2007 : 51).
As representações apontadas acima são
destacados para preencher a imagem da região, impõem-se como verdades pela
repetição, o que lhes dá consistência interna e faz com que tal arquivo de imagens
e textos possa ser agenciados e vir compor discursos que partem de paradigmas
teóricos os mais variados. Vamos encontrar as mesmas imagens e os mesmos
enunciados sobre o Nordeste em formulações naturalistas, positivistas,
culturalistas, maxistas, estruturalistas etc. (Albuquerque Júnior, 2006 : 62).
Assim, "vivido como experiência histórica, 'sertão' constituiu, desde cedo, por meio do
pensamento social de entendimento do Brasil, inicialmente na condição de colônia portuguesa
e, após o século XIX, como nação" (Amado, 1995 : 146). A isso, soma-se uma memória
social que:
numa sociedade que transita de rural para urbana, em que a tradição oral,
marcadamente popular, começa a sofrer um processo de desqualificação com a
ampliação da urbanização, através da memória escrita e do surgimento e da
expansão dos modernos meios de comunicação, como é o caso do Brasil na
primeira metade do século (Arruda, 2000 : 43).
A partir das representações construídas ao longo dos séculos e resignificadas no século XX e
aqui buscando-se afunilar para evidenciar o sertão como uma perspectiva dos espaços de
memória, traz-se a sistematização proposta por Oliveira164 (1988 : 5-6):
Na literatura brasileira o tema do sertão aparece pelo menos sob três perspectivas.
A primeira é o "sertão como paraíso", que se expressa basicamente no
romantismo. Evoca-se um paraíso perdido em que tudo era perfeito, belo e justo e
cuja linguagem retrataria uma pureza original a ser apreciada e preservada. Esta
linha romântica se mantém no século XX por figuras como as de Catulo da Paixão
Cearense, no âmbito da cultura popular, e Afonso Arinos, na veia mais erudita e
de elite. A segunda forma de lidar com o sertão o associa ao inferno. O
destempero da natureza, o desespero dos que por ele perambulam (retirantes,
164 Oliveira discute a visão de sertão em vários autores. Para ela, "Euclides da Cunha se sente um estrangeiro no
próprio país, não só pela distância espacial como temporal, uma vez que ele percebia um sertão que seguia uma
temporalidade distinta do restante do país, uma terra que ficou no passado, abandonada e estaria aí uma das
explicações para seu atraso. Para Euclides, diferente da Amazônia onde ele via uma terra inacabada e imprópria
à ocupação humana, o sertão seria "um território estranho, um vazio, um hiato, um espaço em branco a ser
preenchido. Na indiferença dos brasileiros por sua própria terra estaria a raiz desta ignorância e deste
desconhecimento do território sertanejo. O sertão seria mesmo a prova da existência de fronteiras internas que
ameaçavam a nacionalidade. Para Euclides era mister tornar a totalidade do espaço territorial um espaço
nacional" (Oliveira, 1998 : 6-7).
118
cangaceiros, volantes, beatos), a violência como código de conduta, o fatalismo,
são os principais traços apontados. Euclides da Cunha é certamente um dos
representantes desta leitura do espaço do sertão como inferno ainda que sua
explicação seja de ordem político- cultural. Por fim, o sertão é o purgatório. Lugar
de passagem, de travessia, definido pelo exercício da liberdade e pela
dramaticidade da escolha de cada um. Identificado como lugar de penitência e de
reflexão, o sertão aparece como reino a ser desencantado e decifrado. Aqui
estamos no mundo de Guimarães Rosa. O sertão como reino do fantástico e do
mítico aparece em vários estudos sobre os movimentos messiânicos no Brasil
(Oliveira.1988 : 5-6).
Arruda (2000 : 97-98) traz uma reflexão e ao mesmo tempo uma síntese sobre o que vai ser
dominantes em termos de representação do semiárido,
numa mirada de mais de cem anos pode-se perceber que se alteraram as visões
sobre o território brasileiro. De um país só natureza em meados do século XIX
para um país totalmente rico em potencial em meados do século XX. A transição,
ou melhor, os elementos constituintes da mudança encontram-se nitidamente
representados, na virada do século em ações que se tornaram ícones.
5.2.4. O sertão da sustentabilidade na convivência com o semiárido
Em fins do século passado se registra uma discussão mais aprofundada dos significados que a
palavra sertão em temporalidades e espacialidades diferente. Autores como Moraes (2005),
Amado (1995), Rodrigues (2004) e Silva (2010) procuram entender a construção e o percurso
de sertão como um qualitativo para lugares. Há, inclusive, autores como Oliveira (1998) que
considera sertão como uma categoria de análise. Sem entrar nesse mérito, a partir dos anos
oitenta, percebe-se um esvaziamento do uso da palavra sertão pelos pensadores do território e
um aumento significativo do uso do termo semiárido.
A associação sertão-semiárido ganha uma textura diferente. Estabelece-se um debate,
principalmente a partir da sociedade civil organizada que propõe um novo paradigma de
entendimento e ação sobre o território. Se até este momento, o sertão era identificado e
representado como uma região problema e vitima de calamidades naturais, a sua
desconstrução se fazia necessária.
Partiu-se das ideias de sustentabilidade que ganharam força nos anos setenta, mas chegaram
de maneira mais efetiva no Brasil nos anos oitenta. Este pensamento foi fundamental para se
entender o sertão não como uma região problema que demandava ações estatais de mudanças
119
territoriais para adaptar o meio às pessoas, outrossim a busca da convivência harmoniosa dos
seus habitantes e o meio em que viviam.
Estabelece-se uma dicotomia. De um lado o sertão como uma região problema teria sido mal
gerido, uma vez que as ações eram norteadas por premissas equivocadas, gerando o que foi
denominado de políticas de combate à seca. Do outro lado, uma nova proposta baseada na
sustentabilidade construída a partir de uma nova maneira de pensar e entender o território que
foi chamada de convivência com o semiárido165. Com isso,
A palavra sertão representa antigo, o arcaico e o anti-moderno. Por outro lado, a
terminologia semiárido ganha força nos discursos desenvolvimentistas das ONG's
e órgãos estatais. São novos dizeres para as relações das populações sertanejas
com seu entorno. Esvazia-se a ideia de sertão e se enche de semiárido. As ideias
de convivência com a seca traz um semiárido como possibilidade e afunda o
sertão para o passado, quando o trata como ultrapassado e o sertão apenas para
evocar uma história rica e pitoresca (Fortunato e Moreira Neto, 2010 : 55-56).
Destaca-se que na perspectiva da convivência com o semiárido, o sertão e seus significados
perdem espaço. Porém, a dicotomia apresentada possui camadas mais complexas de
entendimento.
A nova releitura da região semiárida procura desmistificar a ideia de que o
problema central desse espaço é a falta de água. Aponta também que o nordestino
não deve abandonar o seu espaço, não sendo preciso deixar a sua localidade, mas
adaptar-se a ela, quebrando a ideia de que no Nordeste não se vive. Este debate
tem como principal suporte a ideia da convivência, que se apoia nos parâmetros
do desenvolvimento sustentável como possibilidade concreta de construção de
alternativas de vida e de promoção do protagonismo dos habitantes do Semiárido
(Moreira Neto e Lira, 2015 : 171).
O sertão não será completamente esquecido, pelo contrário, nos momentos em que for
oportuno o seu uso será sempre lembrado. Fortunato e Moreira Neto (2010 : 52) sintetizam
bem o que aconteceu em fins do século passado quando se discute sertão e semiárido ao
afirmarem que
os discursos sobre a convivência, à medida que repensam o espaço Sertão,
ressignificam e cristalizam uma memória que o redimensiona. Nessa perspectiva,
165 A ideia da convivência se apresenta dentro de uma realidade atualizada em função de novos saberes e novas
demandas do mundo atual. Sugere uma nova racionalidade para o Semiárido, fundamentada na perspectiva da
sustentabilidade e que encontra nos movimentos sociais, em sindicatos e organizações não governamentais, o
espaço próprio de sua elaboração e legitimação. Segmentos que, sobretudo a partir da década de 1980, passam a
representar ou expressar interesses da sociedade até então negligenciados, visando reelaborar as relações de
poder que se estabelecem e possibilitar a instituição de novas formas de convivência social, de processos
educativos, culturais e políticos pautados nos princípios democráticos e na solidariedade como resistência
política (Fortunato e Moreira Neto, 2017 : 56).
120
elege-se para o Semiárido a viabilidade da sustentabilidade, de uma convivência
com as peculiaridades e especificidades da região, operacionalizando um
deslocamento da memória, já cristalizada no imaginário social, do “Sertão”
ausente de possibilidade de vivência e pressupondo novas formas, estratégias e
táticas de lidar com este ambiente, suplantando os territórios rurais que sempre
foram traços característicos da elaboração de memórias sobre o Sertão e lidando
com uma nova dizibilidade que envolve também as cidades e centros urbanos que
se inserem no Semiárido.
As diferenças entre as ideias de combate à seca, tão vigentes ao longo do século XX nas
representações territoriais do sertão dão lugar às de convivência com o semiárido. Para
Moreira Neto e Lira (2015 : 180), "a proposta da convivência com o Semiárido não é algo que
sempre existiu, mas uma ideia que surgiu graças à atuação de entidades governamentais e não
governamentais, e vem ganhando cada vez mais espaço e legitimidade. Não obstante, a
convivência com o semiárido se assemelha, em essência, à maneira como a população do
sertão convivia com seu ambiente até o século XIX como evidenciado no quadro a seguir.
Combate à seca Convivência com o semiárido
Meio ambiente caracterizado por seca inevitável e
sociedade marcada pelo fatalismo
Meio ambiente como inspiração; a sociedade pode
incrementar a coexistência
Agricultura dependente de chuvas ou grandes obras
hídricas favorecendo o agronegócio
Práticas produtivas adaptadas aos recursos naturais
disponíveis. Manejo sustentável de ecossistemas
com ênfase em tecnologias sociais
Participação política marcada por clientelismo e
assistencialismo; políticas sociais compensatórias e
emergenciais
Participação política ativa minimiza interferências
externas, fortalecendo a identidade e os papéis
sociais de indivíduos e entidades envolvidas
Políticas burocráticas e medidas técnicas,
planejamento autoritário
Gestão coletiva do conhecimento e cooperação,
onde os técnicos são apenas mediadores
Horizonte: melhoria de vida pela emigração em
busca de emprego e renda
Horizonte: permanência no semiárido, com
perspectivas de ampliar a segurança hídrica,
alimentar e renda
Fontes: Galindo (2008) adaptado por Maciel e Pontes (2016).
Tabela 9 - Comparação entre as ideias-chave dos paradigmas de combate à seca e a convivência com o semiárido
Os exemplos das ações de combate à seca, já apontados nesse texto, são aqueles que
envolvem fortes mudanças no território. A isso, somam-se as ajudas financeiras e pontuais em
momentos de secas mais severas, bem como programas sociais que visam à minimização dos
impactos sociais. As ações a partir da convivência com o semiárido se baseiam na premissa
das inovações sociais, uma vez que "artifícios de baixo custo possuem impacto social na
proporção inversa de sua simplicidade" (Maciel e Pontes 2016 : 38), assim envolvem o
manejo sustentável da caatinga com as lavouras de carnaubeira, umbuzeiro, juazeiro e jurema
(Pereira et al. 2003); as tecnologias hídricas alternativas para captação e armazenamento
121
d´água como as cisternas de placas, as bombas d´água manual e as barragens subterrâneas; as
agroflorestas e o manejo sustentável da caatinga; os métodos alternativos de irrigação como a
irrigação de salvação e o mecanismo de micro-aspersão. Além dessas ações, existe a produção
mais apropriada à região como a caprinovinocultura, a apicultura e meliponicultura, a
piscicultura e a avicultura. Outro exemplo é a lavoura seca de algodão agroecológico. Existem
também as iniciativas econômicas solidárias como os fundos de pastos; bancos e casas de
sementeiras comunitárias; as feiras de agricultura familiar e agroecologia e as redes e
cooperativas de beneficiamento e comercialização, bem como as finanças solidárias como os
fundos rotativos solidários e as cooperativas de crédito (Silva 2007). Tais ações são também
entendidas, no âmbito brasileiro, como inovações sociais.
À distinção entre o combate à seca e a convivência com o semiárido, tratadas quase como
dicotômicas, começa a apresentar uma nova perspectiva. Em 2013, foi aprovada a Lei de
convivência com o semiárido no estado de Pernambuco166 e três anos seguinte, na Bahia167,
ou seja, o Estado168 está se apropriando da discussão que teve origem na sociedade civil
organizada. Essa aproximação já começava anos atrás a exemplo da parceria entre a
Articulação do Semiárido (ASA) e o Governo Federal para o Programa Um Milhão de
Cisternas169 (P1MC)170. Tem-se em tela que órgãos como a EMBRAPA e a CODEVASF
166Pernambuco foi o primeiro estado brasileiro a possuir uma lei de convivência com o semiárido promulgada em
março de 2013 sob o número 1422. " Nela, há o incentivo em implementar políticas pelos estado e municípios,
para a universalização do acesso à água, o monitoramento climático, a educação para a convivência com o
Semiárido, a estruturação fundiária e a assistência técnica e extensão rural aos agricultores familiares"
(Medeiros, 2006). 167Lei aprovado em 30/08/2016 que em seu Art. 2º define " Política Estadual de Convivência com o Semiárido, como componente estratégico do desenvolvimento sustentável do Estado da Bahia, é um instrumento de gestão e
planejamento intersetorial e transversal de políticas e programas governamentais e ações da sociedade civil". No
seu Art. 3º estabelece convivência com o semiárido: perspectiva orientadora da promoção do desenvolvimento
sustentável do semiárido, cuja finalidade é a melhoria das condições de vida e a promoção da cidadania, por
meio de iniciativas sociais, econômicas, culturais, ambientais e tecnológicas contextualizadas e adequadas à vida
na região (IRPAA, 2016). 168 A isso, pode-se ainda adicionar que em 2003 foi criado o Instituto Nacional do Semi-árido – Celso Furtado,
em Campina Grande/PB. A mais nova unidade de pesquisa do Ministério de Ciência e Tecnologia tem por
finalidade promover a execução e divulgação de estudos e pesquisas na área do desenvolvimento científico e
tecnológico para o fortalecimento do desenvolvimento sustentável da Região, possibilitando a integração de
pólos socioeconômicos e os ecossistemas estratégicos do Semi-árido brasileiro (Silva, 2006 : 89). 169 "A configuração de um discurso político sobre a convivência pode ser evidenciado no exemplo da cisterna de
placa, que emerge das falas de forma dominante, como um artefato que não traz apenas água, mas também a
autonomia das famílias em relação aos grupos políticos que ao longo de décadas escravizaram a população com
a utilização de carros-pipa e outras esmolas públicas. (Moreira Neto e Lira, 2015 : 174-175) E esse discurso está
presente em diversas instituições que lidam diretamente ou indiretamente com a convivência". Os mesmos
autores ainda afirmam que "Um caso especial é a construção de cisternas de placa, permitindo que as pessoas
tenham acesso à água no período de estiagem, que atualmente tem uma aceitação majoritária na região, e que,
independente de um envolvimento direto ou não com a proposta da convivência com o Semiárido,
ressignificaram e ressignificam uma compreensão sobre o sertão e o Semiárido. No entanto, essa compreensão
não se legitima como uma ideia" (Moreira Neto e Lira, 2015 : 178).
122
estão cada vez mais desenvolvendo pesquisas e ações baseadas na concepção de uma
convivência com o semiárido.
Na convivência com o semiárido,
busca-se, através da elaboração de projetos e de sua execução, no âmbito da
educação, da ambiência ou do desenvolvimento sustentável, entre outros, abrirem
caminhos para solucionar o problema da falta de água; das deficiências do sistema
educacional e do acesso e uso dos recursos naturais; bem como, da geração de
trabalho e renda, no intuito de amenizar: a falta de planejamento da produção, a
resistência e insensibilidade de alguns representantes do Poder Público frente à
realidade do povo e outros impasses (Fortunato e Moreira Neto, 2010 : 57).
Sob a ótica das ideias de convivência com o semiárido, as representações territoriais tendem a
mudar. Saem de cena as imagens de solos rachados e população faminta e sem água para dar
lugar ao semiárido que, se bem cuidado, pode ser verde e produtivo. Essas representações são
cunhadas pelas OSC's que atuam diretamente na região e reverberam nas instituições de
ensino que, não obstante, são parceiras. Enquanto as OSC's provêm com as ações diretas e o
fomento das discussões em nível local, as instituições de ensino reforçam o debate na
academia e divulgam, do ponto de vista científico, as benesses de tais ações. A parceria tem
sido prolífica.
Nesta nova configuração de discussão sobre as representações,
os binômios Sertão-Semiárido, seca-convivência, dependência-sustentabilidade,
são enunciativos das polarizações que fundamentam a construção de uma
interpretação histórica sobre a região semiárida, como um espaço de degredo, de
inviabilidade social, mas, também, como um território de muitas possibilidades,
cuja memória deve ser repensada e se reconstituir, por meio de experiências e
vivências culturais, como continuidade entre passado e presente, a partir de um
distanciamento crítico que ressignifique e/ou reelabore a relação do homem com o
meio, o protagonismo social, e/ ou o desenvolvimento regional entre outros
(Fortunato e Moreira Neto, 2010 : 52).
Por fim, na visão de Silva (2006 : 435), o sertão
é muito mais do que apenas um termo ou vocábulo caracterizador de uma região
específica. É, acima de tudo, um campo simbólico, uma região de significados e
relações de sentido estruturadas por um conjunto mais ou menos aberto de
170 Iniciativa promovida pela ASA e que conta com a participação e colaboração dos moradores de cada um dos
municípios envolvidos no programa. Proposto em 2003 pela ASA – organização que reúne 750 ONGs –, o
P1MC faz parte do Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semiárido, e busca
universalizar o acesso à água potável, beneficiando cinco milhões de pessoas em todo o semiárido brasileiro
(ASA, 2012).
123
categorias cognitivas que, muito mais do que reproduzir ou caracterizar
objetivamente uma unidade geográfica, a constrói simbolicamente, sempre no
sentido de produzir uma narrativa da formação histórica do país, da fundação da
nação ou da construção da identidade nacional (Silva, 2006 : 435).
Como apontado anteriormente na Introdução e no Capítulo 4, o semiárido é uma região
grande, o que resulta em quantidade de precipitações diferentes a depender da localidade.
Ainda é importante reforçar que dentro do semiárido, existem as áreas de exceções, os
chamados brejos de altitude que possuem uma dinâmica ambiental completamente diferente.
Porém a seca, o solo rachado, a fome, embora atinjam só alguns espaços, alguns períodos e
alguns grupos sociais dentro do semiárido, são generalizados para toda a região.
Com isso, pode-se concluir que esta representação é também produzida e reforçada pela a
academia no Brasil. De uma origem rural, o semiárido brasileiro possui hoje uma população
mais numerosa em seus núcleos urbanos, porém continua sendo representado como um
território rural, atrasado economicamente e vitima de secas periódicas. Nos diversos discursos
e, principalmente, nas imagens que são veiculadas em diversas mídias, sejam impressas ou
virtuais, isso é evidente.
Por fim, nos Capítulos 6, 7 e 8 será apresentada a gestão hídrica a partir da análise
multiescalar, tratar-se-á a região apenas como semiárido e não como sertão. A decisão se deu
para minimizar as confusões; evitar a ambiguidade que ambos os termos podem causar, bem
como a uniformização na redação.
124
Capítulo 6 - O Estado brasileiro e a gestão das águas no semiárido
A partir do final do século XIX e durante praticamente todo o século XX, o semiárido
vivenciou o tipo de gestão hídrica que consolidou-se na literatura como o paradigma do
combate à seca. Tendo a representação territorial do sertão como uma região problema, as
ações estatais buscavam as chamadas soluções hidráulicas e, não obstante, as grandes obras de
armazenamento d'água com forte impacto ambiental no território. As ações do Estado eram,
via de regra, desenvolvidas por órgãos e instituições com forte influência das elites
econômicas regionais em articulações com os governos nacionais. Havia pouco ou nenhum
espaço para a população local para, pelo menos, opinar171 (Albuquerque Junior, 2006; Silva,
2006; Cirilo, 2008).
Só na última década do século XX que a gestão hídrica começou a ser modificada de maneira
mais profunda, quando houve promulgação da Constituição Federal de 1988 que redefiniu a
gestão ambiental no Brasil. A partir deste momento, altera-se a dominialidade172 das águas em
território nacional, ao mesmo passo que são consideradas bens de uso comum da sociedade. A
partir do aparato legal disposto da Constituição Federal, criou-se o Plano Nacional de
Recursos Hídricos (PNRH)173. Neste sentido, as bacias hidrográficas foram consideradas as
unidades de gestão.
Desde já, se ressalva que
O Brasil ao possuir florestas úmidas e regiões semiáridas não se apresenta como
passível de uma gestão que olhe para suas regiões de maneira igualitária. As
experiências de gestão são distintas em si. Assim, "a distribuição regional dos
recursos hídricos é de 70 por cento para a região Norte, 15 por cento para a
Centro-Oeste, 12 por cento para as regiões Sul e Sudeste, que revelam o maior
consumo de água, e 3 por cento para a Nordeste (Castro, 2012 : 35).
171 É possível assumir que o Brasil sempre valorizou o modelo de gestão dos notáveis, dos sábios e capacitados,
detentores dos valores morais e de conhecimento técnico para gerir o ambiente. Esses, não obstantes, eram
pertencentes às famílias mais poderosas (o que é uma forte características do clientelismo). As pessoas das
camadas mais pobres raramente chegavam ao poder e tão pouco suas vozes eram ouvidas. Isso só começa a mudar de fato com a redemocratização a partir dos anos oitenta do século passado. 172Ressalta-se "que a dominialidade está definida sobre os corpos hídricos e não sobre a bacia hidrográfica, por
essa se constituir em território e, portanto, estar sujeita a outros diplomas legais. Assim, para a gestão da bacia
hidrográfica, exige-se, de fato, o exercício do princípio federativo, de atribuições e competências dos três entes
federativos (união, estados e municípios), visando à gestão compartilhada do bem de uso comum, a água" (Porto
e Porto, 2008 : 47). 173O Plano Nacional de Recursos Hídricos (PNRH), estabelecido pela Lei nº 9.433/97, é um dos instrumentos
que orienta a gestão das águas no Brasil. O conjunto de diretrizes, metas e programas que constituem o PNRH
foi construído em amplo processo de mobilização e participação social. O documento final foi aprovado pelo
Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) em 30 de janeiro de 2006 (MMA, 2010).
125
Representação territorial de uma região problema, centralização nas tomadas de decisões com
pouca ou nenhum participação popular, aliado às leis sobre os usos e a dominialidade da água
promulgadas até o fim do século XX legaram o semiárido brasileiro a uma visão do Estado,
em nível federal, de uma natureza hostil e de uma população submissa às suas intempéries.
Ou como atesta Castro (2001 : 105), "a natureza semi-árida é o sujeito e a sociedade, seu
objeto, instituindo a perspectiva de uma sociedade vitimada por seu meio. Ao contrário da
Amazônia cuja natureza é vista como vítima dos homens, a natureza semi-árida da região
Nordeste faz dos homens suas vítimas". Em um processo de digressão, buscar-se-á analisar
esse engendramento.
6.1. Bases legais da gestão hídrica no Brasil
Atualmente, a gestão dos recursos hídricos é regulamentada pela Constituição Brasileira de
1988, em seus Artigos 20 (inciso III), 21 (inciso XIX), 22 (inciso IV) e 26 (inciso I). O art. 21,
inciso XIX, institui o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos
(SINGREH)174 e define os critérios de outorga de direitos de uso. O art. 26, inciso I, inclui as
águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, ressalvadas, neste
caso, na forma da lei, às decorrentes de obras da união, entre os bens dos estados e do distrito
Federal (Castro, 2012; Porto e Porto, 2008).
Porém, até se chegar à Lei de Águas atual, o Brasil vivenciou a promulgação de constituintes
que, a depender de cada contexto, deram maior ou menor destaque às águas. A seguir se
apresentam de maneira pontual e cronológica, os artigos e incisos das diversas constituições
que estabelecem a legalidade do entendimento da água e seus usos no Brasil.
174O Sistema é composto por: Conselho Nacional de Recursos Hídricos, órgão deliberativo e normativo, instância administrativa mais elevada da hierarquia do Sistema que cabe definir as diretrizes nacionais da
Política Nacional de Recursos Hídricos; ANA, Autarquia de regime especial, vinculada ao Ministério do Meio
Ambiente, tem por finalidade implementar, em sua esfera de atribuições, a Política Nacional de Recursos
Hídricos; Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito Federal, órgãos deliberativos e normativos
mais elevados na hierarquia dos respectivos Sistemas Estaduais ou Distrital de Recursos Hídricos; Comitê de
Bacia Hidrográfica, instância deliberativa e normativa, no âmbito de uma bacia ou sub-bacia hidrográfica;
Agências de Água, secretaria executiva do Comitê de Bacia Hidrográfica, diretamente subordinada ao mesmo,
sem fins lucrativos, com estrutura administrativa, financeira e personalidade jurídica própria e, por fim, órgãos e
entidades dos serviços públicos federal, estaduais, distritais e municipais, com relevante atuação na gestão dos
recursos hídricos (Kettelhut e Barros, 2001).
126
Constituição Artigos e Incisos que tocam a água
Constituição
Imperial de
1824
Atestava apenas que os rios pertenciam à Coroa. Por outro lado, o Código Penal de 1890
ocupava-se, embora de forma tímida, com a proteção das águas, cujo art. 162 previa
“Corromper ou conspurcar a água potável de uso comum ou particular, tornando-a
impossível de beber ou nociva à saúde. Pena: prisão celular de 1 (um) a 3 (três) anos”.
Constituição da
República dos
Estados Unidos
do Brasil de
1891
Consagrou as competências legislativas federais e estaduais em sede de águas, conforme
infere-se da leitura dos artigos 13 e 34 da referida Constituição que estabeleciam: Art. 13.
O direito da União e dos Estados de legislarem sobre viação férrea e navegação interior
será regulado por lei federal e o Art. 34. Compete privativamente ao Congresso Nacional:
6° Legislar sobre a navegação dos rios que banhem mais de um Estado, ou se estendam a
territórios estrangeiros. Em 1891 foi editado o Código Civil de 1º de janeiro de 1916 que
no Livro II, Título II, Seção V, que assegurava que o proprietário tinha o gozo da água da
forma como desejasse, limitando-se a respeitar os direitos de vizinhança.
Constituição da
República dos
Estados Unidos
do Brasil de
1934
Em 1934, estabelecem-se as competências para legislar sobre as águas, bem como seu
domínio. Destaca-se o Art. 20. São do domínio da União: I, os bens que a esta pertencem,
nos termos da lei atualmente em vigor; II, os lagos e quaisquer correntes em terrenos de
seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países ou
se estendam a território estrangeiro e III, as ilhas fluviais e lacustres nas zonas
fronteiriças. Já diz o Art. 21. São do domínio dos Estados: II, as margens dos rios e lagos
navegáveis destinadas ao uso público, se por algum título não forem do domínio federal,
municipal ou particular. O Art. 119 estabelecia que o aproveitamento da água dependia
de autorização ou concessão nos termos legais. O Artigo 5º, inciso XV, define como
papel do Estado: organizar defesa permanente contra os efeitos da seca nos Estados do
Norte175
Em 10 de julho de 1934 foi editado o Decreto 24.643 denominado Código de Águas.
Constituição dos
Estados Unidos
do Brasil de
1937
O Art. 143 da Norma Fundamental estabelecia que as quedas d'água constituem
propriedade distinta da propriedade do solo para o efeito de exploração ou
aproveitamento industrial. O aproveitamento industrial das minas e jazidas minerais, das
águas, e da energia hidráulica, ainda que de propriedade privada, depende de autorização
federal.
Constituição dos
Estados Unidos
do Brasil de
1946
O Art. 35 estabelece que “Incluem-se entre os bens do Estado os lagos e rios do seu
domínio e os que têm nascente e foz no território estadual”. Chama-se atenção ainda para
o Art. 5°, no inciso XIII, quando dispunha que competia à União organizar defesa
permanente contra os efeitos da seca, das endemias rurais e das inundações.
Estabeleciam, ainda, Art. 152. As minas e demais riquezas do subsolo, bem como as
quedas d’água, constituem propriedade distinta da do solo para o efeito de exploração e
aproveitamento industrial e Art. 153. O aproveitamento dos recursos minerais e de
energia hidráulica depende de autorização ou concessão federal na forma da lei.
Constituição do
Brasil de 1967
O Art. 8°, inciso III, dispunha que era da competência da União “organizar a defesa
permanente contra as calamidades públicas, especialmente a seca e as inundações.
Constituição da
República Federativa do
Brasil de 1988
O capítulo IV é dedicado ao Meio Ambiente. Nele, o Art. prevê o direito de todos de
gozar de um meio ambiente, dentro do qual inserto estão os recursos hídricos, ecologicamente equilibrado, assim como a imposição do dever de a coletividade e o
Poder Público defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. A
Constituição Federal de 1988 delegou à União, de acordo com o Art. 22, a competência
para legislar sobre as águas. Destaca-se o Art. 26. Incluem-se entre os bens dos Estados: I
– as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, ressalvadas,
neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União; II – as áreas, nas ilhas
oceânicas e costeiras, que estiverem no seu domínio, excluídas aquelas sob domínio da
União, Municípios ou terceiros e III – as ilhas fluviais e lacustres não compreendidas
175 Norte aqui é o atual Nordeste.
127
entre as da União. O Art. 20, § 1° assegura aos entes federativos e administração pública
direta da União a participação no resultado da exploração de recursos hídricos para fins
de geração de energia elétrica; o Art. 21, incisos XII, alínea b e XIX tratam da
competência da União para explorar o aproveitamento dos cursos de água e para instituir
o sistema nacional de gerenciamento dos recursos hídricos e definir critérios de outorga
de direitos de seu uso; o Art. 43, § 2°, inciso IV disciplina a prioridade para o
aproveitamento econômico e social dos rios e das massas de água represadas ou
represáveis nas regiões de baixa renda e que sofrem secas periódicas; o Art. 176 caput
estabelecendo que os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade diversa do solo para fins de exploração e aproveitamento e pertencem à União.
Fonte :Almeida (2008); Granzieira (2001); Henkes (2008) e Pompeu (2011).
Tabela 10 - As constituições federais e o entendimento da água e seus usos
Até 1988, as discussões sobre o ambiente, em geral, e a água, em particular não se
apresentavam como prioridade nas constituições. Isso muda em 1988 quando se tem um
capítulo exclusivo dedicado ao tema.
6.1.1. A lei de águas no Brasil - o aparato legal para a gestão dos recursos hídricos
atualmente
A água é considerada um recurso ambiental de acordo com o Art. 3º, V, da Lei 6.938/81 e do
Art. 2º, IV da Lei 9.985/2000 da constituição federal. Pelo Art. 225 da Constituição Federal, a
água é um recurso natural superficial e subterrâneo, excetuando-se o pluvial; não é patrimônio
privado do poder público, corporativo ou de indivíduos; é um bem alienável e de uso comum
das populações e, por fim, cabe ao poder público apenas o papel de gestor dos recursos
hídricos (Porto e Porto, 2008, Castro, 2012).
A resolução Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) 357/2005 normatiza que as
águas podem ser consideradas salobra (com salinidade entre 0.5 por cento e 30 por cento),
salinas (com salinidade igual ou superior a 30 por cento) e doce (salinidade igual ou inferior a
0.5 por cento). As águas são classificadas ainda de acordo com a sua localização em relação
ao solo, podendo ser subterrâneas (os lençóis freáticos) ou superficiais. No segundo caso,
tem-se as águas superficiais internas como os rios, os mares interiores e os lagos e externas
como os mares territoriais, o alto mar e as águas contíguas. A água é ainda considerada um
recurso limitado, uma vez que há poluição das bacias hidrográficas; mananciais existentes
podem escassear e o constante aumento do consumo.
A água é considerada um recurso natural, ou seja, dotada de valor econômico de acordo com
o Art.19, I, da Lei 9.433/97 quando atesta que a "cobrança pelo uso dos recursos hídricos
128
objetiva reconhecer a água como um bem econômico e dar ao usuário uma indicação do seu
real valor". Com isso, substitui-se a palavra água por recursos hídricos e, assim, dispõe-se que
o usuário a utilize com racionalidade, sem desperdício e que o poder público seja o
responsável pelo seu gerenciamento, obtendo recursos financeiros para projetos, programas e
financiamentos176. A "Lei N. 9.433 é um instrumento legal que visa garantir às gerações
futuras a disponibilidade do recurso. Concretiza-se a modernização do setor e a Lei n. 9.433 e
coloca o Brasil entre os países de legislação mais avançada do mundo no setor de recursos
hídricos" (Porto e Porto, 2008 : 47-48). Destarte, a lei reflete o momento em que foi
estabelecida quando as discussões sobre o desenvolvimento sustentável dominavam as
discussões ambientais.
Por fim, o Art. 1º, IV da Lei 9.433/97 dispõe sobre os usos múltiplos dos recursos hídricos.
São esses, o consumo humano direto e a dessedentação dos animais, considerados de uso
prioritário em caso de escassez; o abastecimento público e privado; a diluição dos esgotos; o
aproveitamento de potenciais hidroelétricos; o transporte e a navegação; a agricultura; os
esportes; a recreação; a pesca (para a produção pesqueira comercial e esportiva); os usos
industriais no resfriamento, diluição e aquecimento; o turismo; a aquicultura; a mineração e os
usos estéticos.
Para Porto e Porto (2008), a Lei n. 9.433/97 é atual, avançada e importante para a ordenação
do uso da água, mas implica mudanças importantes dos administradores públicos e dos
usuários, já que precisam ser receptivos ao processo de parceria. Desde o processo de
discussão da lei, percebia-se a dificuldade da colocação dessas diretrizes em prática. Um dos
principais desafios está em vencer a tradição de decisões centralizadas rumo à gestão regida
pelo princípio da subsidiariedade (MMA, 2010).
176 No que diz respeito aos recursos hídricos, em 1934, ocorreu a aprovação do Código de Águas, importante
marco legal neste tema, ainda vigente no país. Este tinha, como objetivo geral, estabelecer regras de controle
federal para o aproveitamento dos recursos hídricos, principalmente com fins energéticos. Por sua vez, o código
também formulava alguns princípios que podem ser considerados um dos primeiros instrumentos de controle do
uso de recursos hídricos no país e a base para a gestão pública do setor de saneamento, sobretudo no que se
refere à água para abastecimento (Castro, 2012 : 40).
129
A ANA (2005 : 19) entende que:
A política nacional dos recursos hídricos177 objetiva assegurar à atual e às futuras
gerações a necessária disponibilidade de água em padrões de qualidade adequados
aos respectivos usos (tanto o prioritários como os múltiplos); a utilização racional,
integrada dos recursos hídricos incluindo o transporte aquaviário com vistas ao
desenvolvimento sustentável e, por fim, a prevenção e defesa contra eventos
hidrológicos críticos, seja de origem natural, seja decorrentes do uso inadequado
dos recursos naturais. Estes objetivos procuram trazer à sociedade o
desenvolvimento sustentável, a utilização racional dos recursos, a busca de uma
melhor qualidade de vida para o presente e futuras gerações e, por fim, evitar
enchentes em áreas críticas.
É interessante notar que esse sistema não exigiu a criação de uma nova e pesada estrutura
administrativa e burocrática. Criar-se-ia apenas as agências de Água como novas estruturas
administrativas no início do século XIX. Com isso, havia a expectativa de promoção da
descentralização da gestão (Porto e Porto, 2008). Assim,
a descentralização integrada e participativa seria realizada através da criação de
dois entes públicos em cada bacia: os “comitês de bacia hidrográfica” e “as
agências de bacia”. Os comitês teriam a representação do poder público, usuários,
e da sociedade civil, sendo um novo fórum privilegiado de deliberação. As
agências seriam os “braços executivos” desses comitês. Dentre outras atribuições,
os comitês seriam responsáveis pela determinação dos preços e da aplicação dos
recursos da cobrança pelo uso da água. As agências dariam o apoio técnico e
administrativo ao processo decisório, realizariam a cobrança e executariam os
projetos. Além de ser o principal meio de gerar recursos para a gestão da água em
cada bacia, a cobrança seria chave para a sustentabilidade de um novo sistema
decisório descentralizado e participativo (Abers e Jorge, 2005 : 1)
As discussões acerca da gestão hídrica a partir das bacias hidrográficas em Pernambuco serão
apresentadas no capítulo 9. Segue-se agora para o entendimento da visão do Estado e sua
gestão dos recursos hídricos.
177 A Lei de Recursos Hídricos definiu alguns instrumentos para promover adequada gestão destes recursos.
Entre esses instrumentos, estão: 1. Planos de recursos hídricos das bacias hidrográficas. Estes planos têm como objetivo orientar a gestão dos recursos hídricos nas bacias hidrográficas; 2. Enquadramento dos corpos de água
em classes, segundo os usos preponderantes da água, com o intuito de assegurar as águas qualidade compatível
com os usos e planejar ações preventivas permanentes dos mananciais; 3. Outorga de direito de uso da água. Este
mecanismo visa garantir os controles quantitativo e qualitativo dos usos da água e o efetivo exercício dos direitos
de acesso à água; 4. Instituição de mecanismos de cobrança pelo uso da água. Este instrumento objetiva
incentivar a racionalização do uso da água e obter recursos financeiros para o financiamento dos programas de
intervenções contemplados nos planos de recursos hídricos e, por último, 5. A criação de sistema de informações
sobre recursos hídricos, com a finalidade de armazenar dados e informações sobre as situações qualitativa e
quantitativa dos recursos hídricos de forma a caracterizar a situarão de cada bacia (Castro, 2002; Porto e Porto,
2008; CBH, 2017).
130
6.2. A visão do Estado, em nível federal, na gestão dos recursos hídricos no Brasil
O Estado brasileiro, desde a sua fundação como Estado-Nação no século XIX buscou a sua
centralidade na gestão178. Desde então, elabora-se a estruturação burocrática republicana para
a tomada de decisão no país, o que levou, via de regra, a construção de leis e ações de
intervenção nos territórios por tomadores de decisão que não conheciam, necessariamente, o
sujeito de suas ações e não estavam dispostos, em princípio, a construir um processo de
aprendizado a partir dos saberes locais. Isso toma proporção maior devido à dimensão
territorial do Brasil com grandes diferenças e desigualdades regionais.
Aprofundando o que propõem Silva (2006; 2018), evidencia-se que a atuação estatal no
semiárido, através das suas políticas hídricas seguiu três períodos em que as ações se
construíram à base dos mesmos discursos de época. Primeiramente, o que período que vai do
final do século XIX até meados do século XX, com as políticas de combate à seca e os
primeiros estudos mais técnicos e científicos sobre o semiárido. O segundo entre os anos 50 e
início dos anos 90, com o processo de modernização técnica, industrialização e o pensamento
regional mais evidente. Por fim, o terceiro período, já com a redemocratização brasileira e
novos processos de disputa de interesses, concepções, práticas e projetos que emergem em
defesa de políticas de convivência, como base da sustentabilidade do desenvolvimento
regional179. Nesse capítulo, tratar-se-á dos dois primeiros períodos, ficando o terceiro para o
Capítulo 7.
Para dar luz a esse processo, retorna-se, então, para Scott (1998) e os quatro elementos que
contribuem às iniciativas e ações equivocadas na gestão: 1 - A ordenação administrativa da
natureza e sociedade. 2 - A confiança de que o progresso técnico e científico dá à ciência todo
o conhecimento para maximizar a produtividade, 3 - Estado autoritário que se perpetua e está
apto a fazer completo uso do seu poder coercitivo e 4 - Sociedade civil sem força e sem a
178 Não obstante, "a capital de um país, a sede do poder estatal, centralizar geograficamente a estrutura político-
administrativa, ou mesmo, como no caso de muitos países, a própria estrutura de circulação a nível nacional"
(Costa, 2013: 53 ). 179 Cabe ressaltar que as mudanças de perspectivas nas políticas governamentais não significam o total
esgotamento ou aniquilamento de padrões anteriores (o combate à seca ainda permanece nos discursos e nas
instituições). Ao contrário, as transições nas políticas públicas são caracterizadas por processos de disputas – de
sentidos, significados e recursos – diante das crises de concepções (conhecimento e tecnologias) e de modelos
políticos de intervenção que haviam sido formulados e defendidos com base em determinados interesses sociais
e econômicos (Silva, 2018 : 75).
131
capacidade de resistir a esses planos. Esses elementos são fundamentais para entender a
gestão hídrica no semiárido a partir da visão do Estado.
É no século XIX que o semiárido brasileiro começa a ser sistematicamente pensado pelo
Estado. Neste contexto, a manutenção e a ampliação do poder de grupos ligados às elites
regionais se fazia necessário, o que repercute em como se construíram. Chama-se atenção à
representação nesse contexto, afinal, "o território é o objeto das políticas do Estado e constitui
um elemento central no discurso identitário, tanto é verdade que as sociedades humanas se
definem também no tempo e no espaço, sobre um território que se apropriam através das
estruturas que chamamos de representações territoriais180 (Lasserre e Lechaume, 2003 : 9).
Tendo o território representado como uma região problema, o direcionamento das ações
seriam para extingui-lo. Entretanto, concernente à água, as leis ainda eram imaturas, bem
como o conhecimento sobre os territórios ainda não eram profundos para lidar com a
realidade complexa. O que se tinha em fins do século XIX era uma lei para punir quem
sujasse a água potável de consumo humano (de 1924) e outra identificando a água como um
recurso privado e de valor econômico limitado, bastando respeitar os direitos da vizinhança
(de 1891)181.
A produção do conhecimento sobre as regiões, tão necessária na gestão, começava a se
consolidar. Os dois primeiros elementos de entendimento da ação elaborados pro Scott são
base fundamental para entender as políticas de recursos hídricos do semiárido. A seca surge
como um problema de uma região e a cresça que a ciência e a técnica seriam suficientes para
extingui-la seria suficiente. Somado a isso, o estado administraria a sociedade e a natureza.
Os primeiros estudos tidos como científicos sobre o semiárido objetivavam, em sua maioria,
análises e catalogações de dados e informações que, normalmente, preteriam a sociedade ao
180Tradução livre de: "Le territoire est l'objet des politiques de l'État et constitue un élément central du discours
identitaire, tant il est vrai que les sociétés humaines se définissent aussi dans le temps et dans l'espace, sur un
territoire qu'elles s'approprient par le biais de ces constructions que l'on nomme représentations territoriales". 181 A gestão publica da água teve seus antecedentes com a criação da Comissão de Estudos de Forças
Hidráulicas, do Serviço Geológico e Mineralógico do Ministério da Agricultura. Em conjunto com o IFOCS,
iniciou-se a formulação de normas de regulamentação da propriedade e aproveitamento dos cursos d’água em
todo o território nacional, presentes no Código de Águas que se discutia desde então (Castro, 2012 : 39-40).
132
enfatizar os aspectos naturais ou estudavam a sociedade a partir de um viés determinista
social e ambiental. Datam do século XIX as primeiras iniciativas de pesquisa182sobre o
semiárido, principalmente, após a maior seca registrada até então, em 1877-79. Silva (2006 :
92) identifica que "na segunda metade do século XIX, quando as ocorrências de secas
prolongadas colocaram em risco o povoamento e as atividades econômicas do chamado
'complexo sertanejo', tiveram início os estudos científicos sobre a problemática". Esses
estudos visavam explicar quais as causas naturais para o fenômeno e ao abordar a sociedade,
colocavam-na como vítima de um ambiente inóspito. Cientistas brasileiros e estrangeiros
adentraram o semiárido interessados em entender suas paisagens, principalmente a fauna e
flora, bem como a formação das sociedades que ali habitavam. O olhar estrangeiro dá o tom
da produção bibliográfica desse tempo (Albuquerque Junior, 2006; Castro, 1992; Moraes,
2005; Lisboa, 1997; Murari, 2007).
Porém, pesquisadores sobre a seca como Joaquim Alves e Thomas Pompeu Sobrinho
destacam que:
o pensamento político dominante (das oligarquias sertanejas que detinham
mandatos parlamentares e cargos de governo) buscou na natureza a causa
essencial do problema das secas, enfatizando as questões de natureza climática e
meteorológica, as limitações hidrológicas e a irregularidade pluviométrica (Silva,
2006 : 94).
É, desse período, o pensamento do combate à seca e aos seus efeitos com as soluções
hidráulicas183 e ajudas pontuais184. Scott discute que a ideologia ultramodernista surgiu no
século XX, momento que coincide também com o processo de pensamento territorial
brasileiro, em que o Estado começa a traçar metas à sua gestão. O gerenciamento dos recursos
182 Ressalta-se que a pesquisa estatal brasileira sempre foi muito forte, promoveu levantamentos e sistematização
de dados ambientais e cartográficos que foram utilizados como subsídios em intervenções, ora em escala local,
ora em escala regional no território semiárido. A partir dos anos 60, principalmente sob o domínio do regime
militar brasileiro, produziram-se incontáveis relatórios, livros, artigos e anuários norteados pelo pensamento
neopositivista em vigor no Brasil. É importante ressaltar que o Brasil não possui uma profunda experiência de
pesquisas a partir da iniciativa privada. 183A adoção de tecnologias da engenharia hidráulica para armazenamento de água – a chamada solução hídrica – catalisou a crença na possibilidade de combater a seca e aos seus efeitos. As principais modalidades de solução
hídrica, propostas desde fins do século XIX e início do século XX, expressam a capacidade tecnológica de
modificação do ambiente e de correção dos limites às atividades econômicas. A água armazenada poderia
atender a quatro finalidades: a manutenção do rebanho, a produção agrícola (vazante e irrigada), o abastecimento
humano e a geração de energia. Com tantas virtudes e possibilidades, a açudagem foi escolhida pelos técnicos e
políticos como a solução fundamental para os problemas regionais, colocando em segundo plano as outras
soluções propostas pelos estudos realizados até então (Silva, 2006 : 183). 184As açõesassistenciaisemergenciaiseram apenas uma das variáveis do problema, tendo em vista que o volume
de recursos enviados emergencialmentedependia de umcerto “grau da calamidade”, do quantitativo da população
flagelada, da redução dos reservatórios de água para consumo humano (Silva, 2006 : 204).
133
hídricos encontra-se encaixado no processo de ordenação administrativa da natureza e da
sociedade, bem como na confiança de que o progresso técnico e científico dá à ciência todo o
conhecimento para maximizar a produtividade, minimizando as desigualdades. As escolhas
metodológicas seguiam a base das ciências positivistas praticadas no país àquela época e eram
realizadas, em sua maioria, por pesquisadores oriundos de outras regiões que não o
semiárido185.
Ao longo da primeira metade do século XX, encorpa-se a ideia de uma região problema,
vítima de seca e de miséria. Daí, surgiram as principais ideias de entendimento da região
como um território a ser modificado pelo homem, com estudos direcionados pelo paradigma
da modernidade do século XX; da imposição de um modelo de uma região sobre a outra,
notadamente, oriundo da região Sudeste e do litoral e implementado por órgãos estatais186. Há
ainda os estudos que procuram entender o discurso da seca como empecilho para o
desenvolvimento da região. Os problemas sociais vivenciados no semiárido seriam, assim,
problemas naturais (Furtado, 1974, 1979; Andrade, 2005; Cirilo, 2008; Ab'Sáber, 1999,
Castro, 1992; 1996).
A estrutura estatal brasileira buscava se consolidar, conhecer seu território e gerenciar seus
recursos187, ao passo que tentava equilibrar os interesses regionais. As relações entre União e
seus estados, desde cedo, eram acomodações de interesses em escala nacional, regional e
estadual, ou seja, a sustentação nacional se dava com as articulações regionais quem, em
troca, propunham sua própria agenda que não, necessariamente, atendia aos interesses de suas
populações (Castro, 2005; Andrade, 2005; Albuquerque Junior, 2006). E isso dava a tônica
das ações de gerenciamento dos recursos hídricos.
185As pesquisas e seus resultados são de difícil acesso, uma vez que eram realizadas, basicamente, a partir da
região Sudeste, onde estava a capital do país, Rio de Janeiro, e encontram-se, normalmente, em arquivos de acessorestrito. 186 Como exemplotemos os estudos do DNOCS, SUDENE, CHESF e IBGE. 187Na realidade, a história da formação político-territorial no país se fez com a acomodação dos interesses das
oligarquias regionais através de sua participação, direta ou indireta, no governo central. No período pós-
indepedência nenhuma das regiões brasileiras tinham força econômica ou política suficientes para assegurar, por
si só, o domínio do Estado. Os governos buscavam reprimir secessões territoriais ao se privilegiar uma suposta
unidade nacional e, com isso, uma unidade política estabelecendo e fortalecendo os laços com elites regionais, ao
mesmo tempo que também fortaleciam essas elites (Castro, 1997). "Desde o início do período de independência
política, o Estado Brasileiro e suas elites governamentais mantiveram uma grande preocupação em assegurar a
integridade do território nacional" (Arruda, 2000 : 113).
134
Entretanto, as estratégias estatais gestadas no período não garantiram nem a autonomia das
decisões dessas esferas, nem asseguraram o controle democrático da política. Ao contrário, o
que se convencionou chamar de pacto federativo brasileiro permitiu a contraditória
convivência entre um centralismo, que apenas em curtos períodos da história, como aquele
entre a implantação da República e a Revolução de 1930, foi mais brando e um
clientelismo188, que nem mesmo a modernização do país na segunda metade do século
passado foi capaz de eliminar (Camargo, 1992 apud Castro, 1997; Silva, 2006; Andrade,
1997).
Nesse sentido, a partir da região Nordeste, as notícias dos problemas sociais oriundos das
secas periódicas eram utilizadas para disputar recursos nacionais com outras regiões
brasileiras. Ao mesmo tempo, atraíam privilégios para essa elite local que gerenciava o
semiárido. A seca era vista como um problema recorrente que demandava cada vez mais de
um Estado paternalista. Todas as demais questões são interpretadas a partir da influência do
meio e de sua calamidade189 (Albuquerque Júnior, 2006; Arruda, 2000; Freixinho, 2003).
No final dos anos 1920, a população brasileira chegou a 17,5 milhões de pessoas, sendo 80
por cento de pessoas ainda residindo nas áreas rurais. Tanto os serviços públicos de
abastecimento de água e saneamento eram quase que restritos aos centros urbanos como a
água utilizada para as grandes fazendas e na geração de energia elétrica a partir das usinas
eram gerenciados por empresas privadas (Castro, 2012). O semiárido era essencialmente
rural. Assumindo o monopólio do conhecimento científico, o Estado se vê na posição de
liderar190 toda a sociedade construindo e aprofundando ações. Isso se fez sob a representação
territorial do semiárido191 como uma região problema192.
188 O patrimonialismo e o clientelismo, combinados à violência ativa do coronelismo, são características
fundamentais dos processos políticos “restritos” que predominaram historicamente na formulação e execução
das políticas governamentais no Semi-árido brasileiro. A violência foi a primeira forma de exercício do poder no
Semi-árido. As políticas de repressão violenta que existem desde o período colonial, na tentativa de garantir a
ocupação e a exploração do território e para controlar as desordens que, normalmente, aumentam nos períodos
de seca com os saques e outras ameaças (Silva, 2006 : 201). 189Mesmo as manifestações de descontentamento dos domínios, como o banditismo, as revoltas messiânicas e
mesmo o suposto atraso econômico e social da área, são atribuídos à seca, e o apelo por sua solução torna-se um
dos principais temas dos discursos regionais (Albuquerque Júnior, 2006; Arruda, 2000; Freixinho, 2003). 190 Scott aprofunda a questão ao dizer que mesmo parecendo algo inerentemente destrutivo, vários dos projetos
mais progressistas e benéficos no mundo surgiram da grande escala de planejamento. 191 O semiárido sempre foi utilizado como critério no processo de regionalização brasileiro. Até o início dos anos
quarenta do século XX, seis processos de regionalização já haviam sido postos em prática, todos baseados em
aspectos naturais. Entretanto, em 1945 houve a primeira regionalização oficial e nela, o semiárido estava
dividido em três regiões: o norte com o estado do Piauí, o leste com Sergipe e Bahia e o Nordeste, com Alagoas,
Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. As matrizes positivistas norteavam esse processo e assim
135
Ainda na primeira metade do século XX e sobretudo, a partir da década de trinta "a seca
começa a receber, por parte do Estado, um tratamento 'planejado', legitimando uma miséria
que deve ser reelaborada pelas políticas governamentais dirigidas à região" (Fortunato e
Moreira Neto, 2010 : 55). Albuquerque Júnior (2006 : 234) contextualizou bem o período.
Para o autor,
a década de trinta é um momento de intensa disputa entre os diferentes projetos
idológicos e intelectuais para o país, momento em que as organizações e
instituições como a Ação Integralista Brasileira, o Partido Comunista, a Aliança
Nacional Libertadora, a Igreja, o Estado e seus ideólogos travam uma intensa
batalha e torno da distribuição de um novo sentido à história do país, à nação e ao
seu povo.
É nesse contexto que a Constituição de 1934 mostrava um Estado mais empenhado em
legislar os seus recursos, legislando sobre a água e seus domínios. Ao mesmo passo,
estabeleceu-se, em 1934, o Código de Águas193. Considerado moderno, avançado e complexo
para a época porque previa não só punições como parte das leis anteriores, mas identificava "a
navegação, aproveitamento, águas nocivas, força hidráulica, fiscalização, concessões,
autorizações, relações com o solo e sua propriedade, desapropriação, entre outros" (Henkes,
2003 : 5). O domínio hídrico era da união, estados e municípios, bem como as propriedades
particulares (Pompeu, 2015). A Constituição dava ainda prioridades ao setor urbano-industrial
em detrimento das oligarquias rurais (Castro, 2012).O Estado brasileiro promoveu o projeto
industrial, financiando, protegendo, criando alíquotas e produzindo insumos básicos (Araújo,
2000) e tendo a água inserida nesse processo194.
Destarte, a água era agora considerada um recurso fundamental para o desenvolvimento do
país. Para Barbosa (2007 : 153) o referido código,
perduraram até os fins dos anos sessenta, quando o neopositivismo já se apresentavam mais fortemente e, com
ele a perspectiva sistêmica. 192 Entretanto, faz a ressalva de que projetos de centralização enormes surgiram durante os períodos de guerra e
da Depressão com resultados positivos para a economia dos Estados Unidos. Entretanto, dois outros fenômenos
políticos obtiveram resultados catastróficos como a revolução e o colonialismo. 193 Os debates em torno do Código de Águas se iniciaram ainda em 1907. Na época, uma subcomissão foi
formada para construir o projeto que só foi aprovado pelo governo em 1934 (Castro, 2012). 194 O Brasil possui uma das maiores redes hidrográficas do mundo, mas a poluição hídrica em todo o país
cresceu drasticamente desde seu processo de urbanização e de industrialização (Marques et al., 2018 : 48).
136
foi editado com finalidade industrial, em especial, o desenvolvimento de energia
hidráulica195. Nesta época ainda não tinha sido incorporado o princípio ou
fundamento do ‘usos múltiplos de águas’, ou seja, apenas um setor, qual seja,
industrial era privilegiado em detrimento dos outros setores, tais como agricultura,
consumo humano, piscicultura, lazer, etc.
A constituição seguinte, em 1937, reforça esse processo.
As áreas oficialmente reconhecidas como de ocorrência comum de secas no Nordeste foram
delimitadas em 1936, através da lei 175196, sendo denominadas Polígono das Secas197. Entre
1936 e 1989, a sua superfície foi ampliada e passou de 672.281,98 km² para 1.085.187 km²,
chegando a 1348 municípios inscritos definidos por critérios técnicos e político-
administrativos198 (MIN, 2005). Entretanto, é válido ressaltar que essa delimitação
não corresponde necessariamente à zona semi-árida, tendo em vista que foi uma
divisão efetuada em termos político-administrativo, apresentando diferentes zonas
geográficas, com distintos índices de aridez, desde áreas com características
estritamente de seca, com paisagem típica de semi-deserto a áreas com balanço
hídrico positivo (Silva, 2006 : 52).
O polígono das secas está dentro da perspectiva da ordenação administrativa da natureza e
sociedade, bem como corroborando que o progresso técnico e científico dá à ciência todo o
conhecimento. No caso do polígono, a organização se faz através dos municípios. A natureza
aqui tem uma dimensão político-administrativa.
Desde cedo, as soluções hidráulicas foram priorizadas. A premissa da dificuldades no acesso à
água, requeria a construção de repositórios. A crença na solução científica, discutida por
195 A expansão da hidroeletricidade foi fundamental para a industrialização e a urbanização do país, uma vez que
esta tecnologia é responsável por grande parte da matriz energética nacional. No setor de abastecimento de água,
em 1954, é introduzido sistema mais centralizado de planejamento e é criado o Departamento Nacional de Obras
Sanitárias (DNOS), com o objetivo de subvencionar as companhias municipais (Castro, 2012 : 41). 196 A lei 175 foi modificada várias vezes, diante das críticas científicas e dos diferentes interesses políticos que
foram surgindo (Silva, 2006). 197 A partir de 1989, a Sudene deixou de utilizar a figura do Polígono das Secas como referência. Passou a
produzir informações para a Região Semi-Árida do FNE, região que abrange parte dos estados situados na Área de Atuação da Sudene, integrada pelo Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco,
Alagoas, Sergipe e Bahia, e para a Área Mineira do Polígono das Secas (MMA, 2005 : 11). 198 Quando os engenheiros da antiga Inspetoria de Obras contra as Secas (IFOC) introduziram a noção de
polígono das secas, estavam realizando a própria regionalização da área nuclear do domínio morfoclimático,
fitogeográfico, hidrológico e geoecológico do que se entendia por sertões secos. Ali, o balanço da
evapotranspiração é predominantemente negativo durante um intervalo da ordem de seis a nove meses por ano.
O excesso de calor desconpensa o nível e o volume das precipitações estacionais até fazer secar os cursos d’água
à chegada da estação sem chuvas ou com muito pouca chuva. À medida que as chuvas cessam, os restos de água
existentes no solo se evaporam rápida e progressivamente. Os lençóis d’água subsuperficiais se aprofundam até
que os próprios rios passam a alimentar os lençóis mais próximos de seus leitos (Ab'sáber, 1999).
137
Scott, abraçava a técnica, preterindo o conhecimento local. Não obstante, as decisões tomadas
sobre o semiárido são construídas e implementadas a partir do litoral do Nordeste, da capital
do Brasil199 ou de cidades do Sudeste.
A esse contexto, soma-se a perspectiva do que se convencionou chamar de “Indústria da
Seca”200, onde a situação de dependência da região é mantida para o favorecimento201 de
alguns que detém o poder de gerenciar os recursos naturais. Isso acontece, sobretudo, através
de discursos202 e lobby203 que demandam verbas para a solução dos problemas sócio-
econômicos da seca204 (Fortunato e Moreira Neto, 2010). Em maior ou menos intensidade,
essa situação esteve presente em todos os governos brasileiros beneficiando as mesmas elites.
A Constituição de 1946205 é, até então, a que toca de maneira mais contundente as questões da
água, estabelecendo a organização da defesa permanente contra os efeitos da seca e enchentes.
O uso da água para a energia hidráulica demandaria autorização ou concessão federal. Era
uma mudança na perspectiva do Estado em relação às águas e, particularmente, dos episódios
de sua escassez e abundância. O IFOCS torna-se DNOCS, agora o órgão buscava
199Primeiramente Rio de Janeiro e, a partir dos anos 60, Brasília. 200 O termo foi utilizado pelo jornalistaAntônio Callado, do Jornal Correio da Manhã, que visitou a região em
1959, constatando que as máquinas e equipamentos do DNOCS eram utilizados diretamente pelos fazendeiros
em suasterras, que as obras de emergênciaerampré-financiadas por comerciantes que cobravam juros
escorchantes dos trabalhadores das frentes de trabalho, que os reservatórios de águaconstruídoscom recursos
públicos eram cercados e controlados por grandes proprietários. Em síntese, a seca era um grande e próspero
negócio (Silva, 2006). 201 Para as atividades que deveriam ser coordenadas pelo Dnocs, a Constituição de 1946, no seu Artigo 198,
manteve a determinação do gasto mínimo da Uniãonas obras e serviços de assistênciaeconômica e social,
naexecução do plano de defesa contra os efeitos das secas. O percentual sugerido foireduzido para 3% da renda tributária anual da União. Regulamentando a Constituição, a Lei 1004 de 1949, criou o “Fundo Especial das
Secas”, introduzindo novas prioridades nadestinação dos recursos: deveria destinar um quinto da verba para o
socorro àspopulações atingidas pela seca (obras de emergência e serviços de assistência) e o restante para
empréstimosaosprodutoresrurais (Silva, 2006 : 52). 202 A indústria da seca semprebeneficiou as mesmas elites que, de fato, nunca se preocuparam em mudar as
estruturasregionais e usaram a seca para captar verbas e manteremseus poderes locais (Andrade, 1993; Silva,
2018). 203 O Estado fica muito mais vulnerável aos lobbies dos poderosos, mas intenso à pressão social. Dado o seu
caráter autoritário, não precisa se legitimar com a grande parcela da sociedade (Araújo, 2000 : 263). 204 A indústria da seca tem "como principal pressuposto a construção de grandes obras hídricas e a apropriação
privada dos recursos públicos destinados à região, sobretudo, em momentos de registro de calamidades climáticas, já que as memórias desse espaço trazem as marcas de uma realidade predominantemente povoada
pela dispersão, pelo ermo dos sertões secos e sem vida (Fortunato e Moreira Neto, 2017 : 54). 205 A centralização político-administrativa durante o "Estado Novo" (1937-1945) se fez segundo mecanismos os
mais variados possíveis. Eliminando o poder Legislativo e submetido o Judiciário, o Executivo passou a "armar"
a estrutura concentracionista. O presidente nomeava os interventores em cada estado, segundo, evidentemente,
critérios de lealdade pessoal e política e também de conveniências em termos de arranjos da política regional e
local que beneficiasse o governo central. Os interventores, por sua vez, nomeavam os prefeitos, além de
controlar os seus gastos e limitar a sua ação administrativa. Por esse mecanismo, é de certa forma mantido o
coronelismo no meio rural, já que os proprietários de terras, em geral, apoiam e se beneficiam do sistema de
nomeações (Costa, 2013:46).
138
"modernizar-se e diversificar suas atividades, mesmo que mantivesse a concentração nas
atividades de açudagem206 e irrigação. O destaque do período foi para a exploração agrícola
dos açudes construídos anteriormente" (Silva, 2006 : 52). O resultado é que nos anos 50
percebe-se uma mudança em como o Estado via a questão hídrica, as ideias de combate à seca
faciam parte do enfoque no desenvolvimento econômico da região.
Foto: Jandir Souza (2014)
Figura 23 - Açude Lopes II na cidade de Bodocó (Pernambuco)
A constituição seguinte, de 1967, não trouxe mudanças profundas na gestão hídrica, mas
aprofundava a participação estatal na organização e defesa contra as calamidades públicas,
tais como secas e inundações.
Esse é o contexto que se desdobra na criação e consolidação de órgãos estatais com objetivos
de atuarem diretamente no semiárido a exemplo do DNOCS, SUDENE, CHESF e
CODEVASF. Esses órgãos possuem histórias complexas ao longo de suas trajetórias de
décadas. Em suas atuações, estão tomadas de decisão centralizadas e, em vários momentos
fazendo o uso coercitivo do Estado. Com efeito, produziram obras difusas no território
semiárido. A exemplo temos que a "política hidráulica do DNOCS cede espaço para as ações
desenvolvimentistas da SUDENE, que incrementa a oferta de infraestrutura (de energia,
206 A política de acumulação de água em açudes, típica da região, tem sido feita sob duas formas. a primeira, em
grandes reservatórios com capacidade de regularização plurianual, em bacias hidrográficas de maior porte. a
segunda política de acumulação de água decorre do emprego de pequenos reservatórios com capacidade da
ordem de poucos milhares de metros cúbicos, os chamados barreiros, espalhados por toda a região (Cirilo, 2008).
139
transporte, comunicações, armazenagem etc.)" (Araújo, 2000 : 160) ou ainda das atividades
da CODEVASF e CHESF que mesmo atuando sobre o mesmo rio, não possuem um histórico
de renomadas parcerias ou de conflitos institucionais.
Como atesta Araújo (2000 : 160), "a forte centralização de recursos e de poderes do Poder
Executivo Federal e o caráter autoritário do regime de governo marcaram a ação do Estado
brasileiro nos anos pós-64207. É nesse contexto que o Estado desenvolvimentista, proposto
pelo Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN)208, inscreve sua
atuação no Nordeste". A ação estatal encontra na industrialização209 seu principal objetivo.
Entretanto, "a proposta central do GTDN, a de intensificar no Nordeste o desenvolvimento
industrial, encontra respaldo das políticas governamentais, embora assuma uma trajetória que
não era a originalmente pensada pelos autores do relatório do GTDN e dos primeiros planos
da SUDENE" (Araújo, 2000 : 161).
Silva (2006 : 68) ressalva que
do final do século XIX até a década de 1960, os programas de irrigação se
caracterizam pela descontinuidade das ações governamentais relativas ao
desenvolvimento da irrigação e drenagem. Após várias tentativas de implantação
da irrigação nas bacias dos açudes públicos, sem sucesso, na década de 1960, a
agricultura irrigada passou a ser uma das prioridades governamentais.
Tal mudança, vai impactar seriamente no processo de gestão hídrica, que agora tem no
processo de irrigação um forte componente gerador de conflito na região trazendo à tona o
processo de privatização das águas.
Em comum, esses órgãos possuíam as representações territoriais de uma região problema que
buscava solução. Com isso, em vez de se investir em políticas de prevenção das
207 Não só o Brasil, como grande parte dos países da América do Sul vivenciaram regimes autoritários nas
últimas décadas. Não obstante, o Estado sempre foi ponto central e monopolizador da tomada de decisão. Isso se
reflete nas décadas pós regimes em que a descentralização e o poder democrático da população são incipientes
ou até inexistentes. Por contraditório que possa ser, é o Estado, através de sua infraestrutura institucional e uso mediano da coerção que comanda o processo de descentralização das tomadas de decisão. 208 Grupo constituído pelo governo brasileiro para pensar em ações na região Nordeste do Brasil, que em um dos
seus desdobramentos, fez surgir a SUDENE. O GTDN tinha na industrialização seu principal objetivo, uma vez
que a gestão federal do país àquela época acreditava que seria este o caminho para tirá-lo do
subdesenvolvimento. A economia regional seria então uma das formas para se alcançar este objetivo. O país se
pensava regionalmente e procurava, com isso substituir as importações pela produção setorizada. Na prática, era
a implementação de uma política substitutiva de bens de consumo. 209 A industrialização era vista quase como a “única saída” para combater o atraso do Nordeste em relação ao
Centro-Sul, funcionando como elemento dinâmico da economia para crescimento do Produto Interno Bruto
(PIB), em substituição ao setor agrário-exportador (Silva, 2006 : 59).
140
consequências das secas, preferiu-se as grandes intervenções territoriais que, não obstante,
não conseguiam atingir toda a população necessitada, ou seja, os seus objetivos não foram
atingidos. O semiárido ainda vivencia a seca sem o preparo que poderia ter caso o
entendimento fosse, desde sempre, a prevenção.
Não se trata aqui de discutir a atuação pormenorizada de cada órgão, nem suas competências,
ações e negligências, mas reforçar o entendimento de suas atuações centralizadoras na tomada
de decisão e fragmentárias no território. Evidencia-se que cada instituição e,
consequentemente, suas atividades, são resultados de temporalidades e espacialidades
diversas, assim como foram geridos mais na perspectiva político-partidária e para uma elite
regional que, de fato, no entendimento técnico e voltado para o bem estar da maior parte das
populações. Desses órgãos foram gestados ou gerenciados centenas de programas, projetos e
financiamentos de desenvolvimento que tocam diretamente os recursos hídricos. O
planejamento regional articulado e perpetrado em escala nacional atuava diretamente na
gestão dos recursos hídricos no semiárido através das suas instituições. Entretanto, a
espacialização dessas ações é difícil de apontar quando se procura observar os jogos de
escalas. Cada ação merece um estudo para entender seus contextos e resultados.
Araújo210 (2000 : 237) sintetiza esse processo quando afirma que
O pensamento dominante busca na natureza (a existência do imenso e frágil
semiárido) a causa essencial do problema da seca no Nordeste brasileiro. Questões
de natureza climática e meteorológica, as limitações hidrológicas e a
irregularidade pluviométrica, por exemplo, estariam na base do drama social211
que sistematicamente afeta milhões de nordestinos. A natureza eximiria o homem,
segundo este tipo de abordagem, que conseguiu se impor por muito tempo. E que
fundamentou, por exemplo, a 'política hidrológica'. Se o problema era
disponibilidade de água, acumular esse bem resolveria a questão. Grande açudes
foram feitos, e o drama social das populações sertanejas não se resolveu.
210 Entretanto, Araújo (2000) não deixa de ver o semiárido de uma maneira homogênea. Nas suas abordagens
sempre trata da economia do algodão e seu declínio para explicar a economia da região, mesmo que sabe-se que
o algodão não foi a principal economia, nem esteve presente em toda a região. 211 Concomitante à produção de conhecimento estatal, alguns pesquisadores buscavam uma discussão que saísse
desse eixo. Autores como Menezes (1970) buscavam analisar o semiárido a partir de uma visão que abordasse
mais o social que o natural e, com isso, rompesse com a ideia vigente de que os problemas sociais teriam
soluções em intervenções apenas no ambiente natural. Capistrano de Abreu (1976; 1988) abordou o semiárido,
pela primeira vez, a partir da própria região, buscando contribuir com um discurso menos fatalista. Outro autor
que seguiu um perfil semelhante foi Josué de Castro (1951; 2001) que deu uma atenção ainda maior às questões
populacionais relacionando os problemas de subdesenvolvimento econômico e social da região com a má ou a
subalimentação de suas populações. Estes autores defendiam uma imersão do pesquisador no processo social que
estudava, sem o qual, não seria possível entender de fato os fenômenos que observava. Das suas observações,
propunham um debate que buscava entender a região e não apenas modificá-la.
141
A segunda metade do século XX, tem o envolvimento estatal ainda mais forte no que
convencionou-se na literatura ser chamado de nacional-desenvolvimentismo. Iniciado nos
anos 50, mas aprofundado durante o período militar no Brasil. Esse período fez o processo
que já era centralizado ser ainda mais autoritário e com uso coercitivo das forças do estado
para garantir seus interesses. O que coaduna com o terceiro elemento trazido por Scott
apresentado no início desse capítulo.
E o caráter industrial para a região, previa o uso dos recursos hídricos em larga escala. É nesse
período que se intensificam os projetos de irrigação212 tão presentes atualmente213. Marca o
início da mudança da visão da representação territorial de uma região problema para uma
região como fronteira econômica. O Estado, através das parcerias público-privadas estabelece
relações ainda mais intrínsecas com as elites econômicas locais214.
Assim, surgem, apoiados pelo governo pontos de concentração de uma moderna agricultura
irrigada215 voltada para a exportação como o submédio São Francisco na fronteira entre
Pernambuco e Bahia e o Vale do Açu no Rio Grande do Norte (Oliveira, 1981; Silva, 2006;
Araújo, 2000; Andrade, 2005). Entretanto, como a organização socioeconômica e política não
se alterou, as secas continuam gerando crise econômica e produzindo calamidade social,
concretizada nos milhões de alistados nos programas emergenciais que se repetem (Araújo,
2000; Villa, 2001).
212Em parte impulsionadas por esses planos das décadas de 1940 e 1950, as áreas de irrigação tiveram aumento a uma taxa de 30% por década, desde 1950, e expandiram-se do Sul para outras regiões do pais — em especial,
para o Sudeste e o Nordeste. No semiárido, apesar de diversos projetos de irrigação e da criação da Companhia
de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco (CODEVASF), em 1948, e da Superintendência do
Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), em 1959, a escassez de água continuou a afetar largas parcelas da
população regional (Castro, 2012 : 41-42). 213 O complexo agroindustrial de Petrolina/Juazeiro surgiu nos anos 70, com base na implantação de grande
projetos de irrigação. Também nesse caso, a presença do Estado foi fundamental, uma vez que montou a maior
parte da infraestrutura de capitação e distribuição de água. Contatou-se o cultivo cada vez maior de produtos de
elevado valor comercial, destinados tanto à venda 'in natura' para s mercados de maior poder aquisitivo, externo
inclusive, quanto ao processamento local em plantas industriais. Ao longo dos anos 80, os projetos elevaram a
intensidade de uso do capital. Ao mesmo tempo se deu a implantação de grandes projetos de médias empresas nacionais e, mesmo, internacionais (Araújo, 2000 : 175). 214 "Nas décadas de 1980 e 1990, a iniciativa privada assumiu a liderança desse processo, aproveitando a infra-
estrutura instalada na Região e pressionando o Governo para ampliar o apoio ao setor, pela necessidade de
competição nos mercados nacionais e internacionais. Com isso, o sucesso da agricultura irrigada foi motivado
pelos incentivos creditícios e fiscais do Governo, por meio do Finor, BNB e FNE" (Silva, 2006 : 70). 215 "Do total de hectares irrigados no Semi-árido, apenas 30% são de iniciativa pública. No entanto, os 70% de
áreas privadas irrigadas dependem da infra- estrutura e de incentivos fiscais dados pelo Estado. Quase sempre,
há necessidade da intervenção governamental na estruturação fundiária do projeto, e de sua participação direta
no processo de reorganização fundiária, regularização ou compra de terras, redistribuição em lotes para
pequenos, médios e grandes irrigantes (Silva, 2006 : 71).
142
Os anos 80 são especialmente complexos no Brasil. O modelo de industrialização216 baseado
no nacional-desenvolvimentismo217 implementados em momentos anteriores não surte os
efeitos esperados, principalmente porque foraforjados numa reação perniciosa entre o Estado,
as elites regionais e as empresas privadas. Neste sentido, o pais vive um novo momento na
sua democracia e, consequentemente, nas discussões participativas ao mesmo momento
procura dinamizar as regiões para minimizar as desigualdade, pelo menos em discurso218.
Em 1988 é promulgada a constituição que traz o caráter descentralizador da gestão da água.
Pela primeira vez, uma constituição brasileira apresenta um capítulo exclusivamente sobre
Meio Ambiente e impacta, sobremaneira, o que se vem depois na gestão dos recursos naturais
do país. O processo de gestão das águas mudaria significativamente, mas ainda levaria mais
de uma década para a lei de águas entrar em vigor.
Para Cirillo (2008), o semiárido apresenta, até a década de 1990, um histórico de políticas
públicas equivocadas, quando não ausentes, calcadas especialmente na implantação de
pequenos reservatórios altamente vulneráveis às estiagens. Aliada a esses equívocos, a falta
de gestão das águas foi a tônica da manutenção do quadro regional crítico a cada seca. Como
forma de dirimir o sofrimento das populações, eram implantadas as soluções de sempre:
carros-pipa para transporte de água e frentes de trabalho para assegurar-lhes alguma renda
para sustento. Em síntese, medidas puramente paliativas. Isso é reforçado por Ab'saber (1999
: 8) ao dizer que o semiárido "é uma região sob intervenção, onde o planejamento estatal
define projetos e incentivos econômicos de alcance desigual, mediante programas
incompletos e desintegrados de desenvolvimento regional".
216 A industrialização e a dinamização das atividades agrícolas estiveram em evidências no planejamento
regional do Nordeste. Não obstante, as discussões sobre a gestão dos recursos hídricos seguiu-se subalterna à
essas. 217 Para Gonçalves (2012), o nacional-desenvolvimentismo é o projeto de desenvolvimento econômico assentado no trinômio: industrialização substitutiva de importações, intervencionismo estatal e nacionalismo. Essas ideias
são oriundas de uma concepção neo-mercantilista ainda do século XIX. Esteve presente em outros países da
América Latina como México e Argentina a partir da primeira metade do século XX. 218 Os anos 80 vivenciam um preterimento nas políticas de desenvolvimento e gestão das regiões para abarcar
uma luta pelo controle da economia. O endividamento gerado pelas políticas das décadas anteriores faz reduzir-
se o montante destinado às políticas sociais e os programas de desenvolvimento. "A propósito de combater o
processo hiperinflacionário que se acentua nos meados da década de 80, tais políticas promovem explicitamente
a contenção da demanda interna (exceto o rápido hiato expansionista que sucedeu ao Plano Cruzado I) e o apoio
às exportações. A redução persiste do poder de compra da massa salarial é um de seus pilares (Araújo, 2000 :
163-164).
143
A esse contexto,
tem sido disseminada uma compreensão de que o agronegócio deveria gerar maior
agregação de valor à produção, permitindo incrementos expressivos no nível de
emprego e de renda, contribuindo para o desenvolvimento do Semi-árido. Foram
valorizados, com os incentivos fiscais, os empreendimentos agroindustriais que
tinham maior porte de investimento, maior possibilidade de introdução de
inovações tecnológicas e gerenciais, além da capacidade de inserção no mercado
competitivo externo (Silva, 2006 : 73)
Os órgãos estatais, principalmente EMBRAPA e CODEVASF serão fortes braços nesse
processo. No século XXI, tem-se a ampliação do sistema de ensino técnico e superior no
semiárido e estrategicamente, se dará atenção especial à criação e fortalecimento de cursos
que gerem mão-de-obra qualificada para o agronegócio. Assim, o Estado duplamente
beneficia o agronegócio.
O século XX finaliza com a lei de águas, e um semiárido que possuiu décadas de intervenção
estatal centralizada que não conseguiu emancipar a região e nem diminuir, sensivelmente, os
problemas de acesso e uso dos recursos hídricos. Pelo contrário, o semiárido continuava
dependente de ajudas em momentos de crise e detentor e tendo na seca, a naturalização dos
índices de desenvolvimento humano219.
6.3. A visão do Estado nas obras de combate à seca no semiárido
Apesar das mudanças nos discursos e proposições, a perspectiva de combate à seca e seus
efeitos permaneceu instalada nos órgãos governamentais. O modelo esteve em vigor em
órgãos como a DNOCS, SUDENE, CHESF, EMBRAPA e CODEVASF que seguiram uma
agenda com pouco diálogo com a população e alinhados aos interesses governamentais e
empresariais. Com isso:
mesmo renovando os discursos, com a incorporação das dimensões da inclusão
social e da sustentabilidade, permanece a perspectiva de solucionar os problemas
regionais com a implantação das grandes obras hídricas para o abastecimento das
cidades e para a moderna produção irrigada, geralmente orientada para o mercado
externo. O discurso da sustentabilidade assume significados contraditórios,
219 A análise do dispêndio público revelava que o governo federal gastava mais no Nordeste do que arrecada na
região. Quantitativamente, o gasto tinha papel positivo na região com menor ritmo de crescimento econômico.
No entanto, uma análise mais aprofundada da natureza do gasto público no Nordeste revelava que o dispêndio
atingia seus níveis mais elevados nos anos de seca, quando a despesa governamental se destinava essencialmente
a programas emergenciais, de subsídio ao consumo e não de patrocínio de investimentos produtivos. Eram gastos
em ações assistenciais aos 'flagelados' das secas e não contribuíam, assim, para aumentar a capacidade produtiva
da economia do Nordeste. Nem resolviam os problemas criados pelas secas periódicas que atingem a região,
nem contribuíam para aumentar o ritmo da produção nordestina (Araújo 2000 : 156).
144
subordinada à dimensão econômica, com o incentivo às atividades produtivas
rentáveis, com maior capacidade de competitividade (Silva, 2006 : 90)
6.3.1. Represamento e deslocamento da água - o progresso técnico no combate à seca
O processo de represamento d'água no semiárido é, sem dúvidas, o maior exemplo da
conjugação das ideias de ordenação da Natureza, progresso técnico como único na solução
dos problemas e uso da coerção pelo estado. A construção de açudes220, barragens221 e a
transposição das águas do Rio São Francisco, são construções que materializam no território o
pensamento do combate à seca. "As obras hidráulicas, para armazenamento e abastecimento e
para produção agrícola irrigada com grande potencial econômico são planejadas e executadas,
desconsiderando a integridade do meio ambiente e os interesses sociais da população local"
(Silva, 2018 : 78).
A região Nordeste tem o maior índice de açudes do mundo. São mais de 70 mil açudes com
capacidade para acumular 37 bilhões de m3 de água, suficiente para atender ao uso humano e
à dessedentação animal (Said, 2010), entretanto, segundo a ASA, "esse volume de água está
concentrado em propriedades particulares e não é compartilhado com a população difusa do
semiárido". Quanto às barragens, segundo a ANA e o Atlas Brasil de 2010, "considerando-se
os principais reservatórios da região Nordeste com capacidade de acumulação igual ou
superior a 10 m3, 65 por cento de todo o potencial de estoque está concentrado em apenas
quatro grandes reservatórios (Sobradinho222 e Itaparica, na Bahia; Castanhão, no Ceará; e Boa
Esperança, no Piauí)" (Silva, 2018 : 78).
220 O represamento de águas em açudes e barragens evita ummaior desgaste dos solos férteis, impedindo que
sejam levados pelas enxurradas, além de exercerumafunção preponderante naeconomia da regiãoao criar as
condiçõesfavoráveis à vida animal e vegetal em torno delas, permitindo o adensamentopopulacional. No entanto,
a açudagemtem limites técnicos, relacionados, entre outros fatores, pelo próprio clima semiárido, com
temperaturas bastante elevadas que causam a evapotranspiração das águas. É conhecida a fragilidade da estrutura
física de pequenos e médiosaçudes que, não raras vezes, se rompemcom as grandes enxurradas. O
baixorendimento hídrico e as variações elevadas naqualidade da águaexpressamquantoessas técnicas de
acumulaçãosãosujeitas à sazonalidade climática (Silva, 2008 : 78). 221 No caso das grandes barragens, apesar das virtudes de finalidade para geração de energia, irrigação e
abastecimento urbano (política maisrecente, com a implantação de adutoras), o questionamento é sobre a concentração das águas acumuladas nos reservatórios (Silva, 2018). 222 As políticas hídricas passaram a ter novosdirecionamentos para geração de energia e para os projetos públicos
e privados de irrigação, gerandoalgumas “ilhas de modernidade”. Foiconstruído, então,
umnovopensamentoeconômico sobre o Semiárido como o espaço da moderna agricultura empresarial e da
fruticultura irrigada, destinada aos mercados externos, com base nacrença e na justificativa de que o modelo
agrega maior valor à produção, permitindo incrementos expressivos no nível de emprego e de renda. O uso da
água do São Francisco para a geração de energiafoiumprimeiro grande projetoestruturante da modernização
regional, iniciando pelas Usinas de Paulo Afonso (I, II e III). Desde então, foramconstruídas grandes represas, a
exemplo de Sobradinho/BA comcapacidade de acumulação de mais de 34 hm3 de água, além de outras obras de
engenharia hidráulica para geração de energia em 14 hidrelétricas que compõem o sistema da Chesf61. A
145
Desta forma, expressa um método mecanicista de análise que fragmenta e simplifica a
realidade, desconhecendo a integridade, a inteireza e as interconectividades dos ecossistemas
e dos sistemas sociais e culturais. Além disso, a generalização de soluções, muitas vezes
concorre para a perpetuação de problemas de ordem ecológica, social e econômica (Silva,
2018 : 76).
A seguir, apresenta-se um levantamento e sistematização da criação de órgãos, leis, decretos,
obras, projetos, planos e programas do estado ao longo do século XX e início do século XXI.
Ano Ações
1909 Criação do IOCS (Inspetoria de Obras conta a Seca.
1919 O IOCS torna-se IFOCS.
1936 Definição do Polígono das Secas pela Lei Federal Nº 175 de 06/01/1936.
1945 O IFOCS torna-se DNOCS como é conhecido até hoje.
Criação CHESF.
1946 Criada, em Pernambuco a Comissão Permanente de Proteção dos Cursos D'Água (CPPCA)
1948 Criação da Comissão do vale do São Francisco (CVSF) pela Lei nº 541 de 15/12/1948.
1949 Criação do Fundo Especial das Secas.
1950 Criação do Plano Geral para o Aproveitamento Econômico do vale do São Francisco, da CVSF.
1952 Criação do Banco do Nordeste do Brasil (BNB).
1954 Início da operação da Hidroelétrica de Paulo Afonso I na Bahia, da CHESF.
1959 Criação da SUDENE.
1961 Formação do lago de Três Marias e início da operação hidroelétrica.
1962 Início da operação da Usina de Paulo Afonso RA na Bahia, da CHESF.
1964 Convênio entre a CVSF, a SUDENE e a United StatesAgency for InternationalDevelopment
(USAID), para execução pelo United States Bureau ofReclamation (USBR) do Reconhecimento dos
Recursos Hidráulicos e de Solos da Bacia do Rio São Francisco – 1964 a 1967.
1966 A CPPCA, torna-se a Comissão Estadual de Controle da Poluição Ambiental (CECPA).
1967 Início da operação da Usina de Paulo Afonso II na Bahia, da CHESF.
Criação da SUVALE através do Decreto-Lei nº 292 de 28/02/1967.
1968 Início da operação da Usina de Paulo Afonso III na Bahia, da CHESF.
Início da implantação do Projeto Bebedouro (PE).
1969 Início dos trabalhos do Comitê de Estudos Energéticos do Nordeste (ENENORDE).
1970 Início Plano Integrado para o Combate Preventivo aos Efeitos das Secas no Nordeste.
1972 Início da implantação do Projeto de agricultura irrigada chamado Jaíba entre os Rios São Francisco e
Verde Grande (MG).
1974 Conclusão do Plano de Desenvolvimento Integrado do Vale do São Francisco pelo
DevelopmentandResources Corporation (DRC).
Criação da CODEVASF, em substituição à SUVALE, que em 1967 substituiu a CVSF CODEVASF,
Lei nº 6.088 de 16/07/1974.
1976 Criação da Companhia Pernambucana de Controle da Poluição Ambiental e de Administração de
Recursos Hídricos (CPRH)
expansão da moderna indústrianaregiãosomentefoipossível a partir do aproveitamento das águas do Semiárido,
da regiãocommaiorescassez hídrica do Brasil (Silva, 2018 : 80).
146
1977 Início da operação da Usina de Moxotó, em Alagoas, da CHESF.
1978 Formação do lago de Sobradinho na Bahia.
1979 Início da operação da Hidroelétrica de Sobradinho.
Criação do Comitê Executivo de Estudos Integrados da Bacia Hidrográfica do São Francisco
(CEEIVASF).
Promulgação da Lei no 6.662 de 25/06/79, que estabelece a Política Nacional de Irrigação.
Ações no campo da agricultura irrigada registradas pela Lei no 6.662/79 e regulamentadas pelo
Decreto 89-496/84, objeto de aproveitamento racional de recursos de água e solo para implantação e
desenvolvimento da agricultura irrigada.
Início da operação da Usina de Paulo Afonso IV na Bahia, da CHESF.
1981 Início do Programa de Aproveitamento Racional de Várzeas Irrigadas (PROVÁRZEAS).
1982 Retomada dos estudos pelo governo federal para a transposição das águas do São Francisco.
1983 Início do Programa de Financiamento de Equipamentos de Irrigação (PROFIR) 1988 Formação do
lago de Itaparica e início da operação da hidroelétrica – junho de 1988.
1986 Início do Programa Nacional de Irrigação (PRONI).
Programa de Irrigação do Nordeste (PROINE).
1989 Conclusão do Plano Diretor para o Desenvolvimento do vale do São Francisco (PLANVASF),
coordenado pelo Ministério do Interior, pela CODEVASF e pela SUDENE, com a colaboração da
OEA, instituído pela Lei no 8.851/94.
Substituição do Polígono das Secas pela Região Semi-árida do Fundo Constitucional de
Financiamento do Nordeste (FNE), pela Lei nº 7.827 de 29/09/1989.
1993 Início da elaboração de Planos Diretores de Recursos Hídricos de 15 sub-bacias de afluentes do São
Francisco, elaborados por diversas empresas consultoras para a SRH/MNU, ainda não aprovados.
1994 Início da operação da Usina de Xingó em Alagoas, da CHESF.
1995 Criada a Comissão Especial para o Desenvolvimento do vale do São Francisco pelo Ato nº 480 do
Senado Federal.
Elaboração do Projeto Áridas: uma proposta de desenvolvimento sustentável para o Nordeste.
1996 Solicitação do governo brasileiro, por intermédio da Secretaria de Recursos Hídricos do Ministério do
Meio Ambiente (SRH/MMA), para que o Fundo Mundial para o Ambiente (GEF), o Programa das
Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e a Organização dos Estados Americanos (OEA)
elaborem um Projeto de Gerenciamento Integrado das Atividades Desenvolvidas em Terra na Bacia
do Rio São Francisco (1998-2001) e um Programa de Ações Estratégicas para a Bacia do Rio São
Francisco e sua Zona Costeira (PAE) (2002-2003).
Início do Programa de Apoio e Desenvolvimento da Fruticultura Irrigada do Nordeste.
1997 Promulgação da Lei de Águas.
1999 Início do Programa de Especial de Financiamento para Combate aos Efeitos da Estiagem.
2000 Criado o Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH), Resolução no 5, de 10/04/2000
normatiza os prazos e os procedimentos para a formação e a habilitação de Comitês de Bacias
Hidrográficas.
A ANA é criada a partir da Lei no 9.984, de 17/07/2000.
2001 Inícios dos Estudos de Revitalização Hidroambiental da Bacia do São Francisco pelo Ministério da
Integração Nacional através do Decreto de 05/06/2001, arts. 37 e 38 da Lei no 9.433 de janeiro de
1997, que instituiu o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco.
Transferência da execução nacional do Projeto GEF São Francisco para a ANA.
Criação, pelo Decreto de 05/06/2001, do Projeto de Conservação e Revitalização da Bacia do Rio São
Francisco, coordenado pelo MMA. Este mesmo decreto cria o CBHSF.
Início dos trabalhos da Comissão Especial de Acompanhamento do Projeto de Revitalização do Rio
São Francisco do Senado Federal.
A CNRH aprova a criação do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) O MMA
institui a Diretoria Provisória do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco – 5 de junho de
2001.
Criado o Programa Sertão Cidadão.
147
2002 Apresentação da proposta do Plano Diretor de Recursos Hídricos da Bacia do São Francisco,
preparado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) para a SRH/MMA.
Mobilização para instalação, eleição e posse dos sessenta membros titulares e sessenta suplentes do
CBHSF.
Decisão de realizar, em nível ministerial, um Plano de Revitalização e Conservação da Bacia do São
Francisco.
Criação do Programa Sertão Cidadão: convívio com o Semi-árido e inclusão social.
2003 Revisão dos planos e dos programas referentes à revitalização da Bacia pelos Ministérios da
Integração Nacional (MI) e do Meio Ambiente (MMA) e de suas companhias e agências.
Elaboração do Diagnóstico Analítico da Bacia do São Francisco e da sua Zona Costeira (DAB).
Início das atividades do CBHSF com a eleição da sua primeira Diretoria.
1ª Reunião Plenária do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, em São Roque de Minas-
MG.
2ª Reunião Plenária do CBHSF em Penedo-AL, onde foi deliberada a elaboração do Plano de
Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (Deliberação nº 3) – 06/10/2003.
Aprovação na 9ª Reunião Ordinária do Conselho Nacional de Recursos Hídricos e criação do Comitê
da Bacia Hidrográfica do Rio Verde Grande, em 25 de junho.
2004 Publicação do Relatório Final do PAE (ANA/GEF/PNUMA/OEA). Realização das III e IV Plenárias
do CBHSF para apreciação do Plano Decenal de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio São
Francisco (PBHSF) (2004-2013).
Aprovação do Plano Decenal de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco
(PBHSF) (2004-2013) pelo CBHSF Intenso debate sobre o Projeto de Transposição das águas do rio
São Francisco para o Nordeste Setentrional.
Criação do Instituto Nacional do Semi-Árido (INSA).
Início do Projeto Pan-Brasil, vinculado ao Ministério do Meio Ambiente.
Início do Programa de Desenvolvimento Integrado e Sustentável do Semiárido (CONVIVER223).
2009 A lei nº 13.968 modifica a denominação e a competência da CPRH que agora passa a se chamar
Agência Estadual de Meio Ambiente, transferindo a execução das políticas estaduais de recursos
hídricos para a Secretaria de Recursos Hídricos e Energéticos
Fonte : Adaptado de ANA (2003).
Tabela 11 - Sistematização das ações estatais ao longo do século XX e início do século XXI
6.3.2. A transposição do Rio São Francisco
Conhecido oficialmente como Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias
Hidrográficas do Nordeste Setentrional224, é considerado pelo Ministério da Integração
Nacional (MIN) como a maior obra de infraestrutura hídrica dentro do PNRH. Possui 477
223 As regiões contempladas são Raimundo Nonato (PI), Médio e Baixo Jaguaribi (CE), Vale do Açu (RN), Souza-Piancó (PB), Santana do Ipanema (AL), Sergipana do Sertão de São Francisco (SE), Brumado-Bom Jesus
da Lapa-Guanambi (BA) e Serra Geral (Janaúba) (MG). 224 A ideia remonta ainda do século XIX, mas destaca-se aqui que "a Constituição de 1946 reconheceu a
importância do Rio São Francisco ao inserir, no Ato das Disposições Transitórias, o Artigo 29, que determinou a
execução de um plano de aproveitamento das possibilidades econômicas do Rio São Francisco e seus afluentes,
num prazo de 20 anos, aplicando-se quantia anual não inferior a 1% da renda tributária da União. Nasceu, em
decorrência, a Comissão do Vale do São Francisco (CVSF), criada pela Lei nº 541, de 15 de dezembro de 1948.
A Comissão inspirou-se no modelo norte-americano de aproveitamento do Vale do Tennessee. Sua função era
formular o Plano Geral de Aproveitamento do Vale do São Francisco, com ações de regularização dos rios,
utilização adequada de seu potencial hidrelétrico e desenvolvimento agrícola (Silva, 2006 : 56).
148
quilômetros de extensão em seus dois eixos225 (o Leste e o Norte) e objetiva levar a segurança
hídrica para uma população estimada em 12 milhões de habitantes distribuídos em 390
municípios226 nos estados do Rio Grande do Norte, Paraíba, Ceará e Pernambuco. Até 2018,
data da última atualização oficial, do MIN (2018), 96,40 por cento de avanços operacionais
nos dois eixos, com 100 por cento de execução física no eixo Leste227.
Em defesa da importância do projeto, o MIN afirma que: "conforme Relatório de Impacto
Ambiental (RIMA) produzido em julho de 2004, o Projetofoi a mais consistente alternativa
estrutural para o fornecimentoadequado de água à região. Estudos e avaliações técnicas foram
realizados (estudos de impacto ambiental, de inserção regional, de viabilidade técnica,
econômica e hidrológica) conforme diretrizes do Plano Decenal da Bacia Hidrográfica do Rio
São Francisco, concluído pela ANA. Mas ciente dos impactos que causa, destina mais de R$ 1
bilhão (o que seriam cerca de 10 por cento do valor total do projeto) do seuorçamento global
aos programas ambientais. Esse montante financia o conhecimento da biodiversidade, bem
como os desenvolvimentossócio-econômico e arqueológicos da região. Ao todo, sãotrinta e
oito228 programas acompanhados e executados por equipes multidisciplinares composta por
técnicos do ministério, órgãosestatais, empresas contratadas e parceirosintervenientes.
225Os dois eixos englobam a construção de 13 aquedutos, nove estações de bombeamento, 27 reservatórios, nove
subestações de 230 quilowats, 270 quilômetros de linhas de transmissão em alta tensão e quatro túneis. Com 15
quilômetros de extensão, o túnel Cuncas I é o maior da América Latina para transporte de água (MIN, 2018). 226As obras do Projeto São Francisco passam pelos seguintes municípios no Eixo Norte: Cabrobó, Salgueiro,
Terranova e Verdejante (PE); Penaforte, Jati, Brejo Santo, Mauriti e Barro (CE); em São José de Piranhas,
Monte Horebe e Cajazeiras (PB). Já no Eixo Leste, o empreendimento atravessa os municípios pernambucanos
de Floresta, Custódia, Betânia e Sertânia; e em Monteiro, na Paraíba. Suas águas abastecerão grandes centros
urbanos da região (Fortaleza, Juazeiro do Norte, Crato, Mossoró, Campina Grande, Caruaru), bem como pequenas e médias cidades inseridas no semiárido (MIN, 2018). 227 Ao todo, trinta e cinco cidades nos estados de Pernambuco e da Paraíba recebem as águas do Velho Chico
pelo Eixo Leste: Sertânia, Floresta, Arcoverde e Pesqueira, em Pernambuco; e os municípios paraibanos de
Monteiro, Campina Grande, Barra de Santana, Caturité, Queimadas, Pocinhos, Lagoa Seca, Matinhas, São
Sebastião de Lagoa de Roça, Alagoa Nova, Boqueirão, Boa Vista, Soledade, Juazeirinho, Cubati, Pedra Lavrada,
Olivedos, Seridó, Cabaceiras, Congo, Coxixola, Sumé, Prata, Ouro Velho, Amparo, Serra Branca, São José dos
Cordeiros, São João do Cariri, Parari, Gurjão, Livramento e o distrito do Santa Luzia do Cariri. São quase um
milhão de habitantes nessas localidades (MIN, 2018). 228A saber: Plano de Gestão, Controle Ambiental e Social das Obras - PBA 01, Plano Ambiental de Construção -
PBA 02, Programa de Comunicação Social - PBA 03, Programa de Educação Ambiental - PBA 04, Programa de
Treinamento e Capacitação de Técnicos da Obra em Questões Ambientais - PBA 05, Programa de Identificação e Salvamento de Bens Arqueológicos - PBA 06, Programa de Indenização de Terras e Benfeitorias - PBA 07,
Programa de Reassentamento de Populações - PBA 08, Programa de Recuperação de Áreas Degradadas - PBA
09, Programa de Supressão da Vegetação das Áreas de Obra e Limpeza dos Reservatórios - PBA 10, Programa
de Apoio Técnico às Prefeituras - PBA 11, Programa de Apoio as Comunidades Indígenas - PBA 12, Programa
de Compensação Ambiental - PBA 13, Programa de Conservação e Uso do Entorno e das Águas dos
Reservatórios - PBA 14, Programa de Implantação de Infraestrutura de Abastecimento de Águas ao Longo dos
Canais - PBA 15, Programa de Fornecimento de Água e Apoio Técnico para Pequenas Atividades de Irrigação
ao Longo dos Canais para as Comunidades - PBA 16, Programa de Apoio às Comunidades Quilombolas - PBA
17, Programa de Apoio e Fortalecimento dos Projetos de Assentamento Existentes ao Longo dos Canais - PBA
18, Programa de Regularização Fundiária nas Áreas de Entorno dos Canais - PBA 19, Programa de
149
Fonte: Pereira (2018)
Figura 24 - trecho da transposição do Rio São Francisco no Município Custória (Pernambuco)
Todo o processo que envolve as decisões tomadas e encaminhamentos para implementação e,
conseguinte, construção da infraestrutura de transposição das águasfoienvolta de diversas
polêmicas. Celeumasenvolvendo comunidades rurais, quilombolas e indígenas; problemas
najustiça, inclusive comações no Supremo Tribunal Federal; denúncias de estudosconduzidos
de maneirainapropriada para beneficiar os que a defendem; acusações sobre os maus usos da
água, bem como que elanãovai beneficiar realmente as pessoas que maisprecisam e, sim, o
agronegócio; participação de movimentos religiosos, etc. Por fim, o Estado fez o uso das
articulações políticas, de caráter regional e partidário, bem como o uso do poder coercitivo.
Monitoramento de Vetores e Hospedeiros de Doenças - PBA 20, Programa de Controle de Saúde Pública - PBA
21, Programa de Monitoramento de Qualidade da Água e Limnologia - PBA 22, Programa de Conservação de
Fauna e Flora - PBA 23, Programa de Prevenção à Desertificação - PBA 24, Programa de Monitoramento do
Sistema Adutor e das Bacias Receptoras - PBA 25, Programa de Cadastramento de Fontes Hídricas Subterrâneas
- PBA 26, Programa de Monitoramento de Processos Erosivos - PBA 27, Programa de Monitoramento de Cargas
Sólidas e Aportantes nos Rios Receptores e seus Açudes Principais - PBA 28, Programa de Apoio ao Desenvolvimento de Projetos Implantados, em Implantação e Planejados - PBA 29, Programa de Apoio às Ações
de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano - PBA 30, Programa de Apoio a Redução de Perdas
no Sistema de Abastecimento Público e Estímulo ao de Água nas Bacias Receptoras - PBA 31, Programa de
Apoio ao Saneamento Básico - PBA 32, Programa de Segurança e Alerta Quanto às Oscilações das Vazões dos
Canais Naturais que irão Receber as Águas Transpostas - PBA 33, Programa de Relocação das Infraestruturas a
serem Afetadas pela Implantação do Empreendimento - PBA 34, Programa de Acompanhamento da Situação
dos Processos Minerários da Área Diretamente Afetada - PBA 35, Programa de Monitoramento da Cunha Salina
- PBA 36, Programa de Corte e Poda Seletiva da Vegetação - PBA 37 e Programa de Monitoramento, Prevenção
e Controle de Incêndios Florestais na Faixa de Servidão - PBA 38 (MI, 2018). Os dois últimos ainda não estão
aprovados e sendo executados.
150
De fato, a transposição é umarealidade e os seus impactos jáestãosendo sentidos e
estudados229, ouseja, o projetonãopassa incólume pela sociedade.
A obra da transposição é de responsabilidade do governo federal, através de deus órgãos
como Codevasf em parceria com empreiteiras. Entretanto, o tratamento e a distribuição da
água para a população são de responsabilidade dos governos de cada estado.
A transposição do São Francisco, diferente das outras obras de combate à seca, faz uso
também do discurso de manutenção dos modos de vida dos habitantes do semiárido. É uma
obra pensada ao longo do século XX, mas só executada no século XXI, trazendo consigo as
mudanças de discurso e percepção do território que influenciou, diretamente, nas
representações territoriais.
6.4. Ação multiescalar na descentralização da tomada de decisão
Numa análise multiescalar, a gestão hídrica é entendida como fenômeno de escala regional,
em seguida, a escala de análise a trata em diversos recortes regionais para dar conta dos
estudos. As ações estatais são, essencialmente, multiescalares.
As discussões sobre a centralização da tomada de decisão no Brasil não são recentes. Ainda
no século XIX já se questionava que centralizar decisões em um país com as dimensões
territoriais brasileiras, bem como sua diversidade étnica e ambiental era, em princípio, fadadas
ao fracasso (Andrade, 1997). O Brasil já possuiu governos centralizados e descentralizados
desde que se tornou um império independente politicamente de Portugal em 1822230. "Na
perspectiva geopolítica atual, podemos afirmar que a descentralização e a adoção de um
regime federativo de estado ocorreram com a Proclamação da República, a partir de 1889231,
com a concessão232de autonomia às antigas províncias então elevadas à categoria de estados
229 Há uma prolífica produção de artigos, dissertações de mestrado, teses de doutorados e livros que discutem a transposição. O tema é ainda presente em documentários e reportagens nas mais diversas mídias. A controvérsia
prossegue. 230Para Andrade (2003 : 13), o país oscilou, no período colonial, entre um governo centralizado, na Bahia até
1763 e, a partir daí, no Rio de Janeiro e entre governos divididos, um com sede no Rio de Janeiro e outro na
Bahia (de 1572 a 1577 e de 1608 a 1612). Em seguida, por mais de um século, o Brasil foi dividido em dois
estados, o do Brasil e o do Maranhão (de 1621 a 1774). 231Este momento decreta o fim da monarquia no Brasil e a transformação de cada província em um estado
federado e autônomo. 232Isto foi resultado da influência estadunidense. Entretanto, Andrade (2003 : 11) chama atenção que "nos
Estados Unidos, a federação resultou de um movimento centrípeto - eram colônias que se separavam da
151
(Andrade, 1997 : 11). Entretanto, o pensamento centralizador estatal brasileiro esteve presente
em todo o século XX no que compete à necessidade de organização na coordenação das
ações. Assim, a criação de órgãos com que centralizarias as decisões, bem como integrar
órgãos de menor alcance.
As estruturas administrativas do país organizadas a partir das escalas da ação estatal amplia a
complexidade do processo decisório, uma vez que existem superposições de áreas de
influência gerando desperdício de recursos, lentidão de ações, em burocratização, ineficiência
e, consequentemente, desequilíbrio de poder e baixos níveis de democracia (Castro, 1997 :
39). Além disso, a burocracia gerada por essa estrutura somada aos interesses corporativos, de
partidos políticos e de lideranças políticas regionais ajudam a caracterizar a gestão do
território brasileiro que, não obstante terá a mesma região sob gestão de diferentes níveis da
ação estatal.
Esse contexto promove uma série de implicações na gestão do país, principalmente ao se
saber que essa é negociada por partidos políticos e lideranças locais e regionais. Ao longo de
sua história, as decisões foram, comumente, tomadas de cima para baixo e a população pouco
escutada. Isso começou a mudar já nesse século, mas ainda não se consolidou.
A estrutura burocrática brasileira (Anexo 4) parece ser eficiente, pois em princípio, perde-se
no clientelismo e dependência do orçamento da união (o Estado federal), bem como sua forte
tendência para centralização financeira. Entretanto, comumente, os estados e municípios são
dependentes do governo federal e estabelecem com ele uma relação de troca de favores.
Normalmente, os estados dão uma base de sustentação política para as ações federais o que
influencia diretamente na quantidade de recursos que irá receber a depender da relação de
coligação de partidos políticos ou de arranjos de blocos regionais. Esse engendramento
político e burocrático beneficia aos que o bem conhecem e o utilizam com interesses pouco
altruístas, ao mesmo tempo que deixa a população distante das tomadas de decisão.
RivièreD'arc (2003) chama atenção que a questão das transferências (de verbas) federais para
os estados é o centro do debate que dá ao Brasil uma cultura de política federalista como um
instrumento de governo e de autonomia ou de clientelismo.
metrópole e se uniam em uma confederação e em seguida em uma federação - enquanto no Brasil resultaram de
um movimento centrífugo, de vez que o Império era uma unidade administrativa que evoluía para a formação de
unidades autônomas, mas não independentes." A isto, ainda pode-se se somar que a influência estadunidense foi
tão grande que o país passou a se chamar Estados Unidos do Brasil a partir do artigo 1º da constituição de 1891.
152
Cerca de 60 por cento do orçamento dos estados no Brasil vem das transferências federais,
onde 5 por cento são repartidos aos municípios e distribuídos em função de um critério que se
estabelece pelo número de habitantes, "esse modo de transferência aos estados e aos
municípios, dentro de um quadro de discurso de um novo federalismo e de descentralização,
se torna uma questão política de primeira importância e uma rivalidade entre as partes"233
(RivièreD'arc, 2003 : 5).
Entretanto, Arretche (2007) examinou o impacto das representações territoriais nas decisões
tomadas pelas câmaras federais234, órgão legislativo do Estado brasileiro, a partir da premissa
que os representantes de cada estado (os deputados federais e os senadores) deveriam
usualmente proteger as unidades federativas (os estados). Após estudo sobre o
comportamento parlamentar entre os governos de Fernando Collor de Mello até o primeiro
mandado de Luis Inácio 'Lula' da Silva (no total, entre 1990 e 2006), chegou-se a conclusão
de que as bancadas levam mais em conta a agenda federal que a estadual e apresentam uma
coesão mais político-partidária do que a defesa dos interesses da unidade que representam. É
necessário fazer uma ressalva sobre o tema, segundo Arretche (2007 : 21-22),
Nos dois mandatos do presidente Fernando Henrique Cardoso, a regulação federal
dos gastos de estados e municípios veio para o centro da agenda de governo. A
centralização da arena parlamentar, por sua vez, lhe permitiu mudar a estrutura
federativa da CF 88, que conferia grande autonomia de gasto a estados e
municípios, excetuada a área de educação. Esta mudança na estrutura federativa
significou substancial redução da autonomia decisória dos governos estaduais e
municipais sobre o destino de suas próprias despesas. A partir de 1995, a
legislação federal passou a regular em detalhe os patamares de gasto com
educação, saúde, pessoal, legislativo municipal e regimes previdenciários; além
disto, normatizou o pagamento dos precatórios, obrigou a criação de Fundos de
Combate à Pobreza e estabeleceu limites para a expansão de gastos e
endividamento, definindo-os como crimes de responsabilidade fiscal.
As duas autoras, ao se debruçarem sobre temas semelhantes, porém com abordagens
diferentes, embora não conflitantes, evidenciam a complexa imbricação nas negociações e
233Tradução livre de : "Ce mode de transfert aux états et aux municipalités, dans le cadre d’un discours sur le
nouveau fédéralisme et la décentralisation, est donc devenu un enjeu politique de première importance et de
rivalité entre les partis". 234No caso brasileiro, as duascâmarasfederaisadotam a representação territorial. Não apenas os distritos eleitorais
da Câmara dos Deputados e do Senado sãoidênticos, mas, em ambas as casas, o princípio da sobre representação
é adotado para a distribuição das cadeiras. Em outraspalavras, a representação dos estados é central no sistema
político. brasileiro, afetando a composição das duas arenas parlamentares federais. Associado a este fato, o poder
de veto dos governosterritoriais está no centro das interpretações sobre o funcionamento das instituições
federativas brasileiras (Arretche, 2007 ; 2-3).
153
tomadas de decisão, uma vez que as obras dependem de interesses dos estados brasileiros e
dos partidos políticos que detém hegemonia em cada estado. Mesmo que pareçam
contraditórias, sabe-se que a política partidária brasileira se preocupa, ora com a manutenção
da sua base local ou regional dando atenção às demandas dos seus estados, ora em busca de
sua ampliação em nível nacional dando mais atenção à agenda federal, ou seja, não são
direcionamentos excludentes.
Com a necessidade de eleger-se e reeleger-se a cada quatro anos, as ações seguem, quase
sempre, uma agenda eleitoral. Descontinuidade entre os governos quase sempre afetam
diretamente os resultados porque as políticas precisam de tempo para mostrar seus resultados,
bem como para serem amadurecidas. O que se vivencia, comumente, são políticas de governo
que são ora apropriadas por governos seguintes, como se fossem os donos valorosos daquelas
ideias, ora caem no esquecimento como uma relíquia ultrapassada de um governo anterior.
A sobreposição de competências faz a gestão ficar confusa e, na maior parte do tempo,
centralizada. Assim, a escala municipal deve ser significativa de uma perspectiva de
demandas localizadas, nas quais os vínculos interpessoais são mais fortes e a visibilidade dos
problemas locais é maior. A escala estadual corresponde às relações políticas federativas,
sendo este nível de poder o mediador entre as demandas particulares e o conjunto do território
da unidade federada. A escala nacional, por sua vez, é significativa da direção que é dada à
sociedade e ao território da nação em conjunto. Desse modo, cada esfera de poder é
responsável por um conjunto de problemas, e soluções, na sua escala (Castro, 1996, 1997).
O planejamento centralizado retira as fontes de inovação, progresso e modifica o que emerge
dos elementos localizados, privilegiando um único corpo-guia que determina os resultados
desejados e as ações sociais estruturadas para criar esses resultados (Gomes, 1996).
O Brasil pode ser considerado um país descentralizado por causa do alto grau de poder que os
estados e municípios possuem para gerir seus territórios. Como apontado acima, os
governadores e os deputados estaduais, bem como os prefeitos e vereadores tem poderes para
criar leis e executá-las, desde que não firam a constituição federal.
154
Para Gomes (1996 : 52),
A questão da relação entre a centralização, a uniformização administrativa e a
diversidade especial, diversidade física, cultural, econômica e política, sobre a
qual este poder centralizado deve ser exercido. Este período da formação dos
Estados-Modernos assistiu, pois, ao renascimento das discussões em tomo dos
conceitos de região, nação, comunidades territoriais, diferenças espaciais etc. Foi
também neste momento que um campo disciplinar especificamente geográfico
começou a tomar forma, ai incluindo exatamente este tipo de questão e de
conceitos.
As relações de poder entre as escalas local e central provocam tensões que são, quase sempre,
absorvidas pelo sistema político.
Em muitos países, o federalismo é a estratégia político-administrativa de controlar
e reduzir os conflitos territoriais em outros, a articulação entre política e território
configura o regionalismo, cujo caráter conflituoso é mais nítido porque, apesar de
espacializado, se produz no confronto entre os interesses particulares de uma
sociedade civil territorializada e os interesses gerais (em tese) da sociedade
política (Castro, 2005 : 195-196).
Existe um hierarquia clara entre o Estado e os demais tomadores de decisão. A aceitação do
Estado onipresente inicia-se ainda no Séc. XIX e perdura até hoje, as ações de ONG só
começam a ser estimuladas a partir dos anos 90 do Séc. XX e discussões sobre o poder
popular são do atual século.
Uma síntese disso, é trazida por Araújo (2000 : 263):
O Estado brasileiro é, tradicionalmente, centralizador. A pouca ênfase no bem-
estar, ou seja, a tradição de assumir muito mais o objetivo do crescimento
econômico e muito menos o objetivo de proteção social ao conjunto da sociedade
fez com que o Estado assumisse uma postura de fazedor e não de regulador [...] A
tradição de público é governo, público é governamental, é uma tradição muito
forte na sociedade brasileira, e isso leva a que só haja - quando há - políticas
públicas governamentais. Essa é a grande dificuldade de se operar com a noção de
Estado no Brasil, que é uma noção mais ampla do que o governo. O Estado
regulador requer o diálogo entre o governo e a sociedade civil, e nós não temos
tradição de fazer isso. É um traço autoritário. O Estado centralizador, em muitos
momentos da nossa vida recente, se junta com o autoritário; tivemos uma longa
ditadura nos governos militares pós-64235. Então o viés autoritário é muito forte
nas políticas públicas do país.
235 No período militar, foram implementados uma série de planos e planejamentos regionais decididos cima para
baixo e que não contemplavam diretamente às questões ligadas ao planejamento e gestão hídrica. Assim, tem-se
o Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG) (1964-1966), que objetivava a criação e coordenação
centralizada e regional de ações estratégicas que gerou o Ministério Extraordinário para a Coordenação de
Organismos Regionais em 1965. Em seguida, foi criado o Plano Decenal de Desenvolvimento Econômico e
Social (1967-1976) que adotava uma nova perspectiva para as políticas territoriais do país, pois pregava o
desenvolvimento de uma política regional para o país aplicando no Brasil a teoria dos polos de desenvolvimento.
155
Nesse sentido, a caracterização da descentralização é
resultado de barganha entre forças políticas regionais/locais e centrais dentro das
instituições partidárias não parece ser suficiente quando a descentralização
envolve não somente a transferência de recursos, mas também a transferência de
responsabilidades. Entender o porquê da descentralização requer compreender não
somente porque o governo central cede poder, mas também porque o governo
local aceita novas responsabilidades (Abers e Jorge, 2005 : 5)
A descentralização esbarra na burocracia hierárquica que subalterna à população, desde
sempre ao ideário do que cabe ao poder estatal ser o principal eixo social, político e
econômico. A este contexto, pode-se adicionar às experiências das populações do semiárido
que raramente, foram, de fato, ouvidas. Porém, eram sempre alvo de políticas imediatistas e
assistencialistas. Isso pode ter gerado uma população, em sua maioria, passiva às ações
estatais, acreditando que os problemas só poderiam ser resolvidos através desse caminho.
Aqui se tem mais uma aproximação às ideias de Scott (1998), quando ele trata que uma
sociedade civil sem força e s sem a capacidade de resistir aos planos do Estado pode incorrer
em problemas para esta mesma sociedade, que pode incorrer em problemas drásticos de
gestão territorial.
A despeito das críticas que, efetivamente, devem existir é preciso ter em tela que as obras
hidráulicas eram um reflexo dos contextos em que foram pensadas. Ao passo que
contribuíram no fomento das desigualdades, também trouxeram benefícios às populações. O
problema não foi a criação dos órgãos e suas ações que, em princípio, visavam a melhoria da
qualidade de vida, mas sim as suas capturas pelas elites oligárquicas regionais e,
posteriormente, os partidos políticos e as relações pouco transparente com a iniciativa
privada236.
Mais um plano foi construído pelo governo, dessa vez chamado de Programa Estratégico de Governo (1968-
1970) que mantinham as diretrizes contidas no plano anterior quanto aos polos de desenvolvimento e ainda a ênfase na integração nacional. Como novidade, apresentava o Ministério do Interior. (Araújo, 2000; Costa,
2013). 236As barragens construídas diretamente pelo Estado ou em regime de cooperação com os grandes proprietários,
serviam, prioritariamente, para sustentação do gado, e apenas marginalmente, para a implantação das culturas de
subsistência nas várzeas. Da mesma forma, as ações emergenciais constituíam uma forma típica de acumulação
primitiva, com a utilização da mão-de-obra das frentes de serviços e os recursos do Estado nas grandes
propriedades. As frentes de emergência foram apropriadas ao enriquecimento e ao fortalecimento do poder
político das oligarquias sertanejas (Silva, 2006 : 54): “[...] não apenas os eleitores reais dos ‘coronéis’ tinham
prioridade para engajamento nas frentes de trabalho, como os eleitores-trabalhadores-fantasmas, povoavam as
frentes de trabalho das secas” (oliveira, 1981 : 55 apud Silva, 2006 : 54).
156
Capitulo 7 - A sociedade civil organizada na gestão da água no semiárido brasileiro
Há uma sensível mudança em como o semiárido é representado nas duas últimas décadas do
século XX e, principalmente, no século XXI. Gradualmente deixa de ser uma região problema
para se aproximar da representação que ora são os espaços da saudade evocando os usos dos
antepassados, ora através da sustentabilidade na convivência com o semiárido(Arruda, 2000;
Silva, 2006; Freixinho, 2003; Lima, 1999).
A partir da reflexão que a discussão sobre as representações territoriais permite, bem como
levando em conta as ideias de Gumuchian (1991) e Bailly (1993; 1995), sobretudo, observa-se
os discursos sobre a inferioridade do sertão, em comparação ao restante do Brasil. As imagens
construídas a partir das paisagens semiáridas, com um forte enfoque nas secas são as
representações dominantes nas práticas de gestão da água na região, ou seja, a região era um
problema.
A partir dos anos oitenta, tem-se "um deslocamento da imagem do Sertão para a imagem do
Semiárido, tendo como embasamento o desenvolvimento sustentável" (Fortunato e Moreira
Neto, 2010 : 55-56). A palavra sertão representa o antigo, o arcaico e o anti-moderno. Por
outro lado, a terminologia semiárido ganha força nos discursos desenvolvimentistas das
OSC's e órgãos estatais. São novos dizeres para as relações das populações sertanejas com seu
entorno. As ideias de convivência237 com a seca trazem um semiárido como possibilidade e
não como atraso.
É nesse período que se destaca o pensamento crítico sobre a política do combate à seca posta
em prática no país ao longo das décadas anteriores. Destarte, entendia-se que não se poderia
mais dar atenção, exclusivamente, à crença das soluções tecnológicas e da exploração política
da miséria (Andrade, 2005;Cirilo, 2008; Ab'sáber, 1999; Silva, 2006; 2018, Albuquerque
Junior, 2018), ou seja, ressignifica-se a percepção do semiárido e buscava-se o distanciamento
de que a natureza é um problema para, a partir da ideia de sustentabilidade, adaptar-se cada
vez mais a ela (ASA, 2014; Carvalho, 2011, 2012; Silva, 2006, 2007;Silva, 2018; Maciel e
Pontes, 2015; Moreira Neto e Lira, 2015;Fortunato e Moreira Neto, 2010).
237Autores do passado já chamavam atenção para a adaptabilidade da população sertaneja ao ambiente, só não
usavam a palavra convivência. Tais como Josué de Castro e Capistrano de Abreu.
157
O semiárido, a partir das ideias de sustentabilidade, estimula pesquisas que buscam entender e
aprofundar a relação da sociedade com o ambiente natural, procurando modificá-lo apenas
quando necessário através das tecnologias de inovações sociais e da economia solidária238. A
isto, somam-se os esforços em analisar, criticar e revalidar os discursos estatais e da sociedade
civil organizada sobre o sertão, o semiárido e a região Nordeste (Silva, 2006, 2007; Carvalho,
2012; Maciel e Pontes, 2016). "A nova releitura da região semiárida procura desmistificar a
ideia de que o problema central desse espaço é a falta de água. Aponta também que o
nordestino239 não deve abandonar o seu espaço, não sendo preciso deixar a sua localidade,
mas adaptar-se a ela, quebrando a ideia de que no Nordeste não se vive" (Moreira Neto e Lira,
2015 : 171).
As contribuições teóricas que constroem e subsidiam o discurso da convivência com o
semiárido, a prática das entidades que trabalham a ideia da convivência e as falas das
lideranças e dos agricultores buscam referenciar o semiárido como um espaço de
aprendizagem. “Outrora o conceito de seca era aquele de modificar o ambiente para o homem
nele viver melhor. A ecologia está nos ensinando é que nós devemos preparar a população
para viver com a semi-aridez, tirar dela as vantagens” (Guimarães Duque, 1996 : 9 apud
Silva, 2006 : 228). Assim, "é preciso aprender a conviver, adaptando-se ao meio e construindo
relações de interação entre o homem e o meio ambiente" (Moreira Neto e Lira, 2015 : 173).
Essa ideia será
defendida e protagonizado por movimentos sociais, como ONG’s, Sindicatos e
Cooperativas de agricultores familiares. O mesmo cenário de seca que
historicamente é mostrado nos veículos de comunicação, como aquele em que
predomina a perda de lavouras (milho e feijão), a morte de animais (gado), que
expulsa suas gentes para outras regiões produtoras do país é – no campo do
discurso e da prática da convivência com o semiárido – o mesmo cenário que
produz com fartura as culturas adaptadas ao clima, cultiva pequenos quintais
produtivos e áreas de captação de água de chuva, como barragens subterrâneas e
cisternas de produção (Marques et al., 2018 : 52).
238 Iniciativas econômicas baseadas no associativismo e no cooperativismo. 239O autor utiliza a palavra Nordestino que designa os habitantes de toda a região Nordeste do Brasil, incluindo
aqueles que estão em localidades que não são semiáridas. Entretanto, dentro do contexto que o autor se coloca,
ele claramente está se referindo ao sertanejo.
158
Nesse sentido, Estado240 e sociedade civil organizada constroem uma relação que se
materializa em obras e ações ao longo dos últimos trinta anos. O novo engendramento que vê
o semiárido duplamente como espaço de memória e sustentabilidade na convivência é basilar
nas políticas de gestão hídrica e o tem como viável, seja do ponto de vista ambiental, como
econômico.
7.1. Os saberes locais e a construção da memória sobre o semiárido
A valorização das práticas do que se conhece por senso comum podem ser pontos de partida
para encontrar soluções apropriadas aos locais, utilizando todo o repertório das ciências
atuais. O conhecimento local se refere ao experimental localmente, baseado e transmitido
oralmente, em contraste com aquele que é adquirido através da educação formal ou aprendido
nos livros (Wilbanks, 2006). Mas esses conhecimentos não são excludentes entre si. Pelo
contrário,
há um estoque significativo de conhecimentos desenvolvidos pelas instituições de
pesquisa da Região, e aqueles acumulados pela agricultura familiar sertaneja.
Uma das principais características das tecnologias não-convencionais
(intermediárias, apropriadas, alternativas e sociais) é a valorização do local, dos
saberes e da cultura local como base de desenvolvimento ou adequação das
soluções tecnológicas (Silva, 2006 : 189).
O conhecimento ecológico tradicional pode ou não ser indígena, mas possui suas raízes no
passado de um determinado lugar (Fabricius, 2006). Guimarães Duque (2004 : 38 apud Silva,
2006 : 189) ressalta a importância dos saberes locais, tendo em vista que: “a premência das
necessidades, os sentidos aguçados pelas induções ecológicas, o contato mais íntimo com as
dificuldades vislumbram sucessos, encontram soluções locais”.
Quando se pensa que "uma das características das políticas contemporâneas de
desenvolvimento é considerar o dinamismo local em termos de inovação, produção e
transferência de conhecimento como uma das chaves do desenvolvimento regional, daí o
grande esforço das regiões e das autoridades locais. nesta área241 (Torre e Wallet, 2012 : 60)",
240Na década de 90, o Estado brasileiro implementa o processo de diminuição das empresas estatais através de
privatizações e diminui seu papel de planejador das regiões. É nesse período em que o Estado, juntamente com o
capital privado nacional e internacional e a participação da sociedade civil, propiciam as maiores mudanças no
planejamento regional. Aliás, a própria ideia de semiárido era suprimida em nome de políticas regionais sem
uma acuidade das escalas (Araújo, 2000). 241Tradução livre de : Une des caractéristiques des politiques de développement contemporaines est de
considérer que le dynamisme local en matière d’innovation, de production et de transfert des connaissances
159
percebe-se que essa ideia não chega de maneira homogênea em todo o território, mesmo
aquele em que se deseja atender tais iniciativas.
A construção de uma cultura bem adaptada ao ambiente semiárido é apontada por Rebouças
(1997 :15) ao afirmar que "historicamente, verifica-se que o nordestino, nas diversas formas
de ocupação do território, fundamentou a sua economia no aproveitamento do potencial
hídrico localizado, explorando de forma extensiva tanto a agricultura quanto a pecuária".
Com uma origem colonial, a ocupação do Brasil seguiu o processo de apropriação de novos
lugares com suas populações autóctones, suas riquezas e seus recursos naturais. O mesmo se
aplica ao semiárido que foi ocupado seguindo um padrão extensivo (do ponto de vista do
espaço) e intensivo (do ponto de vista dos recursos naturais) de uso de solo. O processo de
colonização, especificamente, do semiárido proporcionou uma larga e intensa produção de
conhecimento a partir da vivência dos colonizadores em contato, nem sempre amistoso, com
os indígenas (Moraes, 2005).
O conhecimento do colonizador sobre a região, nos três primeiros séculos, se deu por duas
vias. A primeira a partir do contato e a troca de experiências com os indígenas que já estavam
há séculos habitando a região, ressaltando que esse contato sempre foi conflituoso. A segunda
via foi a sua própria vivência no ambiente. Era um local considerado distante do litoral e das
sedes governamentais devido ao pouco desenvolvimento dos transportes e comunicações,
somado às condições climáticas e de relevo, dificultando os deslocamentos. Tal configuração
resultou na formação de uma sociedade com um forte elemento de conquista territorial e
estabelecimento de relações de convivência com o ambiente (Capistrano de Abreu, 1976;
1988; Andrade, 2005; Freixinho, 2003). Isso gerou um repertório de conhecimentos sobre o
espaço, ao mesmo tempo em que "memórias ressignificam a convivência do homem com o
meio em prol da melhoria da qualidade de vida e do protagonismo da população semiárida"
(Fortunato e Moreira Neto, 2017 : 57).
As grandes distâncias entre o interior e o litoral, dificultado pelo relevo pouco propicio aos
deslocamentos terrestres e as altas temperaturas, bem como as dificuldades de comunicação
fizeram com que a sociedade localizada no semiárido tivesse que retirar do próprio meio tudo
constitue l’une des clés du développement régional, d’où l’effort important des régions et collectivités locales
dans ce domaine.
160
o que fosse fundamental às suas necessidades de existência242. Com isso, se consolidou uma
alimentação com base na carne e leite, frutas (de espécies nativas), feijão, fava e milho, que
eram cultivados, normalmente, nas lavouras, em áreas mais úmidas, como as bases dos brejos
e leito dos rios. O pouco contato com o litoral também estimulou o uso abundante do couro,
oriundo do gado, em vários utensílios como porta das cabanas, camas, cordas, mocó, alforje,
mala, mochila, bainhas, surrões, banguês, entre outros. O uso das espécies vegetais e animais
são parte significativa da cultura (Andrade, 2005; Capistrano de Abreu, 1976; 1988)243.
Estratégias de armazenamento d'água, melhor momento de semear e uso das plantas nativas
foram se desenvolvendo ao longo dos séculos. O conhecimento sobre solos, período mais
propício de plantio, uso das espécies de plantas nativas, conhecimento dos efeitos das
dinâmicas climatológicas foram se acumulando e, na maior parte, nas tradições orais
transmitidas às gerações futuras (Andrade, 2005; Capistrano de Abres, 1988; Freixinho,
2003). Esse conhecimento é reconhecido, valorizado, aprofundado, aperfeiçoado e difundido
no processo de convivência com o semiárido. Por fim, "esse recurso à história ou à memória
coletiva não significa que se conceda identidade à única região histórica que nasce de um
longo passado, vivido em comum por uma determinada coletividade244" (Ricq, 1982 : 27).
Em princípio,
o semiárido que o discurso da convivência delimita, organiza e institui, embora
redimensione a lógica econômica e político-social que viabiliza a ideia de sertão,
se assenta no campo e sua gente, sobretudo na agricultura familiar, produtora de
orgânicos, nas alternativas de captação, armazenamento e uso da água da chuva,
na valorização dos saberes do povo, disseminados e reproduzidos nas
capacitações, na educação contextualizada que organiza e define as fronteiras do
Semiárido e as incute nas novas gerações. São formas novas de dizer uma região,
pensando-a em suas especificidades, mas tentando inseri-la de maneira
propositiva no contexto mais amplo da sociedade contemporânea e instituindo
novas relações de saber/poder (Fortunato e Moreira Neto, 2017 : 58).
242 Até o início do século XX, o Brasil não dispunha de uma rede viária consolidada entre todas as grandes
cidades e o interior, mesmo com o incremento das construções das estradas em substituição dos caminhos que eram percorridos em cima de animais até aquele momento. "Apenas os portos comandavam as vias de
penetração para a hinterlândia" (Andrade, 2003 : 26). Tem-se início, então, estratégias geopolíticas de conhecer,
ocupar, conectar e integrar o interior ao litoral, onde estava notadamente a maior parte da população e todos os
centros político-administrativos (Santos e Silveira, 2001). 243 Até os dias atuais, a cultura culinária oriunda desse contexto é forte e continua presente, infelizmente, a
quantidade de estudos sobre o tema é escassa. Por outro lado, a maneira de utilizar o couro tornou-se um dos
símbolos regionais chegando mesmo a compor a imagem do sertanejo. 244Tradução livre de : ce recours à l'histoire ou à la mémoire collective ne signifie pas que j'accorde l'identité à la
seule région historique qui serait née d'un long passé, vécu en commun (que veut dire en commun), par une
collectivité déterminée.
161
Por fim,
A memória do Semiárido que o discurso da convivência vem tecendo, assim como
a memória do Sertão, se propõe homogênea e se apresenta a partir de um conjunto
de enunciados, tais como: a redução e eliminação dos impactos negativos da
atividade produtiva sobre o meio ambiente; a relação de convivência com as
especificidades climáticas regionais; a valorização econômica e política dos
agricultores; a manutenção, em longo prazo, dos recursos naturais e da produção
agrícola; o atendimento das necessidades sociais das famílias e das comunidades
residentes neste território. Caracteriza-se a partir da associação entre lembrança e
esquecimento e aponta para a necessidade de uma reflexão sobre as relações entre
presente, passado e futuro, vinculando a memória que deve ser lembrada à
identidade e às experiências e pensando-a como uma apropriação crítica do
passado, como uma fonte provedora de recursos para a construção de um futuro
possível, como cristalização de vivências culturais (Fortunato e Moreira Neto,
2010 : 58).
7.2. As ideias de convivência com o semiárido no Brasil
A partir de uma necessidade regional, aliado ao desenvolvimento das ideias de
sustentabilidade, consolidam-se as ações das sociedades civis organizadas no semiárido. Em
vez da mudança de uma condição através de soluções hidráulicas de alto impacto nos
territórios, buscava-se a convivência com o ambiente e, consequentemente, com as secas. As
ações propostas pelas organizações não governamentais envolvidas no desenvolvimento do
semiárido demonstram um caminho, em princípio, possível para minimizar os impactos da
seca, bem como o desenvolvimento do capital humano e social.
Foi, sobretudo, no início desse século que houve uma maior participação da sociedade civil
organizada no gerenciamento de ações no semiárido através de parcerias com OSC's que
recebiam recursos federais, a criação de institutos de pesquisa e aplicação como o INSA, bem
como grandes investimentos em universidades federais e institutos de educação técnica.
Começava-se a intensificação de um processo de descentralização das tomadas de decisão.
A ação de convivência com o semiárido tem uma capilaridade maior no território que as
políticas de combate à seca. As obras estão pulverizadas nas propriedades particulares e
coletivas. Resgataram os saberes locais ao mesmo tempo que adentraram na dinâmica
econômica. Destarte, as representações territoriais do sertão como espaço da saudade e do
semiárido na sustentabilidade e convivência com o semiárido estão presentes.
162
Silva (2006) compilou245 uma miríade de ações e tecnologias que focam na convivência com
o semiárido a partir das experiências institucionais, da sociedade civil organizada e de
pesquisadores.
Ações Tecnologias
Tecnologias hídricas alternativas de
captação e armazenamento de água da
chuva para abastecimento familiar no
semiárido brasileiro
Cisternas de placas
Cisterna de placas calçadão
Bomba d’água manual
Gestão e tratamento de água para o consumo humano
Tecnologias hídricas alternativas de
captação e armazenamento de água da
chuva para produção apropriada no
Semiárido brasileiro
Barragem subterrânea
Barragens sucessivas
Barreiro trincheira
Barreiro de Salvação
Uso sustentável de água de poço amazonas em pequena irrigação
Tanques de pedra
Agroflorestas e manejo sustentado da
caatinga
Agroflorestas ou roçados agroflorestais no bioma caatinga
Combinação de sistemas produtivos
Plantio em curva de nível
Barramento de pedra para reduzir as perdas de terras nos períodos
chuvosos
Captação de água de chuva in situ
Agroecologia no bioma caatinga Cobertura seca (ou cobertura morta) no plantio na Caatinga
Compostagem orgânica para adubação dos roçados na Caatinga
Uso de inseticidas naturais em roçados agroecológicos
Métodos alternativos de irrigação no
semiárido
Irrigação de salvação
Sistema irrigado de produção familiar com micro-aspersão
Produção Apropriada no semiárido: a
criação de pequenos animais
Caprinovinocultura
Fenação, silagem e bancos de proteínas animal
Apicultura e meliponicultura
Piscicultura
Avicultura (galinha de capoeira ou caipira)
Produção apropriada no semiárido, as
lavouras secas
Algodão agroecológico e algodão colorido
Mamona para a produção de biodíesel
Cajucultura e castanha orgânica
Beneficiamento do umbu (spondias tuberosa Arruda) no semiárido
Palma agroecológica
Iniciativas econômicas solidárias no
semi-árido
Fundos de pasto
Bancos e Casas de Sementes Comunitárias
Feiras de agricultura familiar e agroecologia
Redes e cooperativas de beneficiamento e comercialização
Finanças solidárias no semiárido Fundos rotativos solidários
Cooperativas de crédito
Alternativas de segurança alimentar no
semiárido brasileiro
Hortas orgânicas
Quintais produtivos
245 Serviram como base os trabalhos a seguir: ASA (2001, 2002, 2003, 2004), ASA-PB (2001), Bernat (1992),
Caatinga (2002), Cáritas Brasileira (2001, 2002, 2003), Castelo Branco e Marra (2004), Chapada (2002),
Cordeiro e Faria (1993), CRS (1996), Diaconia (2002), EBDA (1997), Embrapa (1989, 1995, 1996, 1999), Freire
e Almeida (2005), Holanda Júnior (2005), Irpaa (1996, 2001, 2000), Lima (2005), Macedo e Menezes (2004),
MOC (2002), Patac (1991, 1993), Rocha e Costa (2005), Sabiá (2002), Shistek (1998), Unicampo (2006).
163
Mandalas
Programa alimento por trabalho
Educação contextualizada e pedagogia
da alternância no semiárido brasileiro
Formação para a convivência com o
Semi-árido brasileiro
Capacitação para o desenvolvimento local sustentável
Agricultores experimentadores
Projeto UniCampo (Universidade Camponesa)
Fonte: Silva (2006).
Tabela 12 - Ações e tecnologias de convivência com o semiárido
As tecnologias, ações e iniciativas apontadas acima dão uma dimensão diferente e mais
adaptada às condições naturais e sócio-econômicas do semiárido (Marqueset al, 2018). Silva
(2006 : 249) assim sintetiza:
um desenvolvimento com qualidade de vida no Semi-árido brasileiro requer a
combinação entre um conjunto de ações culturais e políticas, com a disseminação
e a afirmação de novos valores e práticas de igualdade e respeito à dignidade de
cada ser humano e dos demais seres vivos. Entre essas políticas de inclusão social,
destacam-se: o acesso à água de qualidade e em quantidade suficiente para o
consumo humano e para a produção apropriada; o acesso à educação
contextualizada no Semi-árido, elevando a escolaridade da população local e
possibilitando conhecimentos adequados à convivência com essa realidade; o
combate ao trabalho infantil nas áreas urbanas e rurais, reduzindo os danos
morais, físicos e intelectuais sobre as crianças que trabalham e abandonam a
escola; o incentivo às atividades produtivas apropriadas, agrícolas e não-agrícolas,
capazes de melhorar a renda e garantir a segurança alimentar e nutricional; e o
acesso aos serviços sociais básicos, que possibilitem a satisfação das necessidades
fundamentais da população sertaneja.
Nesse sentido, a sustentabilidade246 está diretamente relacionada ao desenvolvimento
econômico e material sem agredir o meio ambiente. Considera práticas sustentáveis de uso
dos recursos naturais para que eles se mantenham no futuro, uma vez que exigem-se a
participação e negociação entre os atores locais, regionais e nacionais em um processo em que
percebem-se duas vias, a partida e a devoluta das discussões tendo o território e as pessoas
como eixo.
O discurso da sustentabilidade assume significados contraditórios, subordinada à dimensão
econômica, com o incentivo às atividades produtivas rentáveis, com maior capacidade de
246 Nestes termos, a sustentabilidade e a convivência passam a ser consideradas como fundamentos dos
programas e ações sociais interessados na melhoria das condições socioeconômicas da região, sejam estes
desenvolvidos pela sociedade civil organizada ou pelo poder público. Impõe-se como referencial a construção de
memórias que possam subsidiar alternativas que tornem possível o princípio da convivência com o meio, a
formação social e política das pessoas, a melhoria das suas condições de vida e a elaboração de uma nova
identidade para o “ser Semiárido” (Fortunato e Moreira Neto, 2017 : 56-57).
164
competitividade (Silva, 2006). Os desdobramentos disso é uma relação de parcerias das OSC's
com o Estado, mas ainda a manutenção da crítica quanto às políticas de combate à seca.
7.3. Institucionalização da convivência com o semiárido
A institucionalização das políticas de Convivência com o Semiárido247 se iniciam em 1982,
quando a EMBRAPA e a Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural
(EMBRATER) divulgaram um documento intitulado Convivência do Homem com a Seca.
Para Silva (2006 : 79), "uma proposta tímida, que surge no interior de órgãos do Governo
Federal, sugerindo uma orientação governamental inovadora de implantação de sistemas de
exploração de propriedades agrícolas, para assegurar a convivência do homem com a seca"248.
Em 1985 tem-se o Movimento Muda Nordeste, onde suas lideranças denunciavam que as
intervenções estatais não diminuíam as desigualdades sociais, pelo contrário, as ampliavam.
Em 1993, tem-se o movimento Fórum Nordeste, construído por sindicatos rurais, associações,
cooperativas e OSC's, que gerou o documento Ações Permanentes para o Desenvolvimento
do Nordeste/Semiárido Brasileiro (Carvalho, 2011; Fortunato e Moreira Neto, 2017). Esse
documento define que
a convivência do homem com a semi-aridez pode ser assegurada. O que está
faltando são medidas de política agrária e agrícola, tecnologias apropriadas,
gestão democrática e descentralizada dos recursos hídricos e da coisa pública para
corrigir as distorções estruturais seculares, responsáveis pela perpetuação da
miséria e da pobreza no meio rural (Fórum Nordeste, 1993 : 5).
Em 1999, por ocasião da 3ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas de
Combate à Desertificação (COP- 3), em Recife (PE), realizou-se o Fórum Paralelo de
organizações civis do Nordeste. Nele, se elabora o documento intitulado Declaração do
Semiárido (Anexo 5): Propostas da Articulação no Semiárido Brasileiro para a Convivência
com o Semiárido e Combate à Desertificação. Esse documento contou com a assinatura de
sessenta organizações, tido como a primeira manifestação da ASA. Essa declaração
é a Carta de Fundação da Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA), uma rede
que surge congregando diversas instituições da sociedade civil, que se
comprometeram a mobilizar e a articular a ‘Convivência’. Deflagrava-se, também,
247 Que possuía também fóruns estaduais como na Paraíba e Rio Grande do Norte. 248 Essa proposta surgiu porque "um conjunto ONGs que atuam no Semi-árido e algumas instituições públicas de
pesquisa e extensão rural, como a Embrapa e a Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural
(Embrater), passaram a desenvolver propostas e a experimentar tecnologias hídricas e produtivas, alternativas e
apropriadas à realidade ambiental, cultural e socioeconômica do Semi-árido (Silva 2006 : 79).
165
daquele contexto, o Semiárido Brasileiro, uma escala que aglutina os objetivos da
sociedade Civil com as ações de combate à desertificação da CCD, Essa mudança
escalar trouxe uma nova base política para tratar a proposta da ‘Convivência’
dentro das diretrizes e políticas públicas nacionais, não mais atreladas às políticas
para a região Nordeste (Carvalho, 2011 : 67).
Buscava-se, assim, uma maior horizontalidade na gestão das políticas públicas, em geral, e
nas consequências secas, em particular.
Portanto,
o Semiárido que o discurso da convivência delimita, organiza e institui, embora
redimensione a lógica econômica e político-social que viabiliza a ideia de sertão,
se assenta no campo e sua gente, sobretudo na agricultura familiar, produtora de
orgânicos, nas alternativas de captação, armazenamento e uso da água da chuva,
na valorização dos saberes do povo, disseminados e reproduzidos nas
capacitações, na educação contextualizada que organiza e define as fronteiras do
Semiárido e as incute nas novas gerações (Fortunato e Moreira Neto, 2010 : 58).
7.4. A Articulação do Semiárido (ASA)
A ASA é uma rede de organizações formada em 1999, durante a realização do Fórum Paralelo
da Sociedade Civil à III Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas para o
Combate à Desertificação (COP3) e, na atualidade, congrega mais de setecentas organizações
com atuação no Semiárido brasileiro (Gomes et al., 2015).
O I Encontro Nacional da ASA (ECONASA249) foi realizado em fevereiro de 2001250, em
Igarassu/PE, quando foi redigida a “Carta de Princípios da ASA”, expressando suas idéias e
propostas para o desenvolvimento sustentável e para a convivência com o Semi-árido. A ASA
assume a identidade de “um espaço de articulação política da sociedade civil no Semi-árido
brasileiro” (ASA, 2001 : 1), que tem como missão “Fortalecer a sociedade civil na construção
249Espaço de debate político-organizativo da rede, onde se formulam e propõem políticas e ações de
desenvolvimento para o Semiárido pautadas naproposta de convivênciacom o semiárido. Participam dos EnconASAs delegados eleitos de todos os estados que formam a ASA e convidados, que são os parceiros que
têmapoiado a ASA nasuaintervençãopolítica.Fazem parte desseespaço, além de organizações e pessoas, as
ideias, crenças, saberes e aspectos culturais que moldam as ações da ASA. Cada encontrocontribuiu, de forma
especial, para momentos e debates específicos que fizeram a rede ASA avançarnaconstrução do projeto de
convivênciacom a região (ASA, 2018). 250 Após esse encontro, já foram realizados mais oito. São sempre em cidades diferentes, assim, teve-se o
ENCONASA II, em 2001, novamente em Igarassu (PE); o ENCONASA III, em 2002 em São Luís do
Maranhão; o ENCONASA IV, em 2003, na cidade de Campina Grande (PB); o ENCONASA V, em Teresina
(PI); o ENCONASA VI, em 2006 no Crato (CE); o ENCONASA VII, em 2010 em Juazeiro (BA); ENCONASA
VIII, em 2012 em JANUÁRIA (MG) e o IX ENCONASA em 2016 em Mossoró (RN).
166
de processos participativos para o desenvolvimento sustentável e convivência com o Semi-
árido, referenciados em valores culturais e de justiça social251” (ASA, 2001 :1).
A partir da ação da ASA, foram criadas várias redes de organizações de base, associações,
sindicatos, grupos de mulheres, grupos de jovens e outras formas organizativas que
conduzemprocessos a partir das necessidades e recursos disponíveis (ASA, 2018). Essa rede
dásustentação e capilaridadeàsações promovidas pela ASA. As decisões tomadas
seguemumprocesso de escuta de toda a base. As experiênciaslocaissão levadas em conta em
todo o trabalho e, não obstante, as soluções para a gestão hídrica são simples, poucocustosas e
de fácil implementação.
A ASA vem, ao longo das últimas décadas construindo um caminho de trabalho interestadual,
integrando diversos fóruns para a proposição de políticas públicas252 para a gestão hídrica.
Possui quatro linhas de ações que são os seus principais projetos: o Programa Um Milhão de
Cisternas (P1MC), o P1+2, o Cisternas nas Escolas e Sementes do Semiárido. Os três
primeiros são experiências exitosas de gestão descentralizada dos recursos hídricos, uma vez
que se encontram Estado e OSC's, em parceria.
7.4.1. Programa Um Milhão de Cisternas
Em abril de 2000, iniciou-se a negociação com o Governo Federal para elaborar o P1MC,
resultando num primeiro convênio, que foi assinado com o Ministério do Meio Ambiente. No
mesmo ano, realizou-se um encontro da ASA, em Juazeiro (BA), com cerca de 120
participantes, para discutir a elaboração do P1MC.
251 A ASA é o espaço de articulação política regional da sociedade civil organizada no semiárido brasileiro. São
membros ou parceiros todas as entidades ou organizações da sociedade civil, que aderem à “Declaração do
Semi-árido” (Recife 1999) e à presente Carta de Princípios. A ASA se apresenta como uma articulação sem
partidos políticos, sem personalidade jurídica e rege-se por mandato próprio. 252Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (CNAPO), Comitê Consultivo do Grupo Gestor do
Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), Comitê de Desenvolvimento Territorial (CDT) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (Condraf), Comitê Gestor do Projeto Dom Hélder Câmara
(PDHC), Comitê Gestor do Projeto Marco Regulatório para as Organizações da Sociedade Civil (OSCs), Comitê
Gestor Garantia Safra, Comitê Nacional dos Fundos Solidários, Comitê Técnico de Tecnologias Sociais do
Programa Cisternas do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), Conselho Nacional de
Desenvolvimento Rural Sustentável (Condraf), Conselho Nacional de Economia Solidária (CNES), Conselho
Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e
Nutricional (FBSAN), Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social, Núcleo Executivo da Articulação Nacional
de Agroecologia, Ponto Focal Nacional da Sociedade Civil para o Combate à Desertificação (Convenção das
Nações Unidas para o Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos das Secas - UNCCD) e Programa de
Apoio a Projetos Produtivos Solidários.
167
No ano de 2003, o P1MC ganhou novo impulso ao ser incluído no programa governamental
Fome Zero. Neste ano, o P1MC institucionalizou-se, sob responsabilidade da Secretaria
Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SESAN), do Ministério do Desenvolvimento
Social e Combate à Fome (MDS). Por meio de um convênio entre governo federal e ASA, a
União passou a apoiar e financiar programas de construção de cisternas e formação de
multiplicadores (Gomes et al., 2015 : 229).
A ação do P1MC procura garantir a mobilização e a formação das famílias e comunidades
rurais como eixo fundamental da ação do programa, buscando também a
formaçãocomunitária e a participação social que estão previstas em todas as etapas de
execução do programa. O processo de mobilizaçãoteminíciocom a articulação da comissão
municipal, instâncias de controle social dos programas da ASA, responsáveis pelo processo
de seleção das famílias, organização dos eventos e acompanhamento das construçõescom as
equipes técnicas das organizaçõesexecutoras da ação. Esta comissão é formada, no mínimo,
por trêsorganizaçõessociaiscomatuação no município.
As cisternas sãoconstruídas a partir de placas de cimento pré-moldadas, possuem formato
cilíndrico, sãocobertas e ficam semienterrada ao lado das residências das famílias. O
seufuncionamentoprevê a captação de água da chuva aproveitando o telhado da casa, que
escoa a águaatravés de calhas. A suacapacidade é, geralmente de 16 mil litros d'água, volume
considerado suficiente para as famílias. De acordocom a ASA, "o P1MC possibilita inúmeros
avançosnãosó para as famílias, mas para as comunidades rurais como um todo, como o
aumento da frequência escolar, a diminuição da incidência de doenças em virtude do consumo
de água contaminada e a diminuição da sobrecarga de trabalho das mulheresnasatividades
domésticas".
168
Fonte: Cáritas (2012).
Figura 25 - Cisterna construída no semiárido de Pernambuco
7.4.2. Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2)
Criado em 2007, o P1+2 integra o Programa de Formação e Mobilização Social para a
Convivência com o Semiárido, da ASA e congrega também o P1MC. Objetiva ampliar o
estoque de água das famílias, comunidades rurais e populações tradicionais para dar conta das
necessidades dos plantios e das criações animais. Baseia-se na estrutura mínima que as
famílias precisam para produzirem, quais sejam, o espaço para plantio e criação animal; a
terra e a água para cultivar.
As comissõesmunicipais e comunitáriasparticipamefetivamente do cadastramento e seleção
das famílias e comunidades a partir de critériospré-estabelecidos253. Estas comissões ajudam
também a identificar as necessidades hídricas e as características do terreno onde as
tecnologias de captação e armazenamento d'água serão construídas. As tecnologiassão:
253 Para ser contemplada, a família precisa atender a critérios como: ter renda per capita familiar de até
meiosalário mínimo; estar inscrita no Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico); ter Número de
Identificação Social (NIS); possuir cisternas de água para consumo humano; ser beneficiada ouvir a ser
comprioridade no caso de extrema pobreza. As famíliaschefiadas por mulheres, comcrianças de 0 a 6 anos,
criançasfrequentando a escola, pessoascom 65 anosoumais e comdeficiência física e/ou mental devem ser
atendidas em caráter de prioridade. Alémdisso, somam-se requisitos de produção de alimentos - lógica de
produção (agricultura, pecuária, extrativismo) e as formas de manejo adotadas pelas famílias - e critérios
técnicos relacionados à construção de tecnologias como características de solos, formaçãorochosa (cristalino,
sedimentar, arenito), localização das implementações (tamanho da área, proximidade dos sistemas produtivos)
(ASA, 2018).
169
Cisterna-calçadão254, Barragemsubterrânea255, Tanque de pedraoucaldeirão256, Bomba d’água
popular257, Barreiro-trincheira258, Barraginha259 e Cisterna-enxurrada260.
O primeiropasso, antes da construção das tecnologias, é a participação das famílias em
formações para a convivênciacom o semiárido, a saber: as capacitações em Gerenciamento da
254Tecnologia que capta a água da chuva por meio de umcalçadão de cimento de 200 m² construído sobre o solo.
Comessa área do calçadão, 300 mm de chuva são suficientes para encher a cisterna, que temcapacidade para 52
mil. Por meio de canos, a chuva que cai no calçadão escoa para a cisterna, construídana parte maisbaixa do
terreno e próxima à área de produção. O calçadãotambém é usado para secagem de algunsgrãos como feijão e milho, e raspa de mandioca. A água captada é utilizada para irrigar quintaisprodutivos: plantar fruteiras,
hortaliças e plantas medicinais, e para criação de animais (ANA, 2018). 255Construída em áreas de baixios, córregos e riachos que se formamna época chuvosa. Suaconstrução é
feitaescavando-se umavala até a camada impermeável do solo, a rocha. Essavala é forrada por uma lona de
plástico e depois fechada novamente. Por fim, é construído o sangradouro de alvenariana parte onde a
águapassacommaisforça e por onde o excessodelavaiescorrer. Dessa forma, cria-se umabarreira que segura a
água da chuva que escorre por baixo da terra, deixando a área encharcada. Para garantir água no período mais
seco do ano, sãoconstruídospoços a, aproximadamente, 5 m de distância do barramento. O poço serve para
retirar a águaarmazenadanabarragem, que pode ser utilizada para pequenasirrigações, possibilitando que as
famíliasproduzam durante o ano inteiro (ASA, 2018). 256Tecnologiacomum em áreas de serraou onde existemlajedos, que funcionam como área de captação da água de
chuva. São fendas largas, barrocas ou buracos naturais, normalmente de granito. O volume de águaarmazenadovai depender do tamanho e da profundidade do tanque. Para aumentar a capacidade, são
erguidas paredes na parte maisbaixaouao redor do caldeirão natural, que servem como barreira para acumular
maiságua. É umatecnologia de uso comunitário. A águaarmazenada é utilizada para o consumo dos animais,
plantações e os afazeres domésticos. Lavar a roupa é uma das práticasmaiscomuns. As lavadeirasestendem os
panosnaspedras e vegetação próxima para secaremao sol (ASA, 2018). 257Aproveita os poços tubulares desativados para extrairáguasubterrânea por meio de umequipamento manual
que contémuma roda volante. Quando girada, essa roda puxa grandes volumes de água, compoucoesforço físico.
Pode ser instalada em poços de até 80m de profundidade. Nos poços de 40 m, chega a puxar até mil litros de
água em uma hora. É umatecnologia de uso comunitário, de baixocusto e fácil manuseio. Se bem cuidada, pode
durar até cinquenta anos. A água da bomba temvários usos: para produzir alimentos, dar de beber aosanimais e
usar nos afazeres domésticos. Geralmente, cada bomba beneficia dezfamílias (ASA, 2018). 258 São tanques longos, estreitos e fundos escavados no solo. Partindo do conhecimento que as famíliastêm da
região, é construído em terreno plano e próximo ao da área de produção. Comcapacidade para armazenar, no
mínimo, 500 mil litros de água, tem a vantagem de ser estreito, o que diminui a ação do vento e do sol sobre a
água. Isso faz com que a água evapore menos e fique armazenada por mais tempo durante a estiagem. A
tecnologiaarmazenaágua da chuva para dessedentação animal e produção de verduras e frutas que servirão à
alimentação da família, garantindosoberania e segurança alimentar. O excedente da produção é comercializado e,
assim, garante geração de renda para as famílias (ASA, 2018). 259Possui entre dois e três metros de profundidade, comdiâmetro entre 12 e 30 metros. É construída no formato
de concha ou semicírculo e armazenaágua da chuva por dois a três meses, possibilitando que o solo
permaneçaúmido por mais tempo. A sugestão é que as barraginhassejamsucessivas. Assim, quandoumaencher
completamente, a água abastece a seguinte. A umidade do solo no entorno favorece o plantio de frutas, verduras e legumes. A tecnologiadácondições para o manejo agroecológico das unidades produtivas familiares e mobiliza
as famílias para umaaçãocoletiva. Tambémmelhora a qualidade do solo por acumular matériaorgânica e mantém
o microclima aoseu redor maisagradável (ASA, 2018). 260Temcapacidade para até 52 mil litros e é construída dentro da terra, ficando somente a cobertura de forma
cônicaacima da superfície. O terreno é usado como área de captação. Quandochove, a águaescorre pela terra e
antes de cair para a cisterna passa por duasoutrêspequenascaixas decantadoras, dispostas em sequência. Os canos
instalados auxiliam o escoamento da água para dentro do reservatório. Com a função de filtrar areia e outros
detritos que possam seguir com a água, os decantadores retêmessesresíduos para impedir o acúmulo no fundo da
cisterna. A retirada da águaéfeita por bomba de repuxo manual. A água estocada serve para criação de
pequenosanimais, cultivos de hortaliças, plantas medicinais e frutíferas (ASA, 2018).
170
Água para Produção de Alimentos (Gapa)261 e em Sistema Simplificado de Manejo da Água
(SSMA)262. Prevê-se ainda a capacitação de quemvai participar do processo de construção das
tecnologias263.
7.4.3. Programa Cisternas nas Escolas
Objetiva armazenarágua da chuva para as escolasrurais, utilizando cisternas comcapacidade
de 52 mil litros. O projetoabrangeescolas dos nove estados do semiárido, incluindoaquelas
localizadas em aldeias indígenas e comunidades quilombolas, que devem ser priorizadas.
Para a seleção das escolas, sãoadotadostrêscritérios: comunidades que nãopossuem sistemas
de abastecimento regular de águapotável; tenhamnível alto de semiaridez e umquantitativo
elevado de crianças. Uma vez definida a escola, busca-se o trabalho conjunto com as
comissõesmunicipaisatravés do fórum constituído por um mínimo de trêsorganizações da
sociedade civil local que faz o controle social das ações da ASA. O poder público municipal
também precisa estar envolvidoneste momento. Em seguida, são realizadas oficinas e
reuniõescom diferentes públicos para o planejamento, monitoramento e avaliação do projeto,
até capacitações para debaterprincípios e estratégias de educação contextualizada264. Entre
2009 e 2011 foramconstruídas 875 cisternas escolares em 143 municípios do Semiárido.
261 Durante os cursos de Gapa, as famílias se apropriam de conhecimentos sobre o manejo da água no arredor de
casa, os cuidados com a horta, as plantas medicinais, o uso dos defensivos naturais, a fertilização do solo, o
acessoaos fundos Rotativo Solidário entre outrosassuntos (ASA, 2018). 262Após a implementação da tecnologia social, a família participará da capacitação em Sistema Simplificado de
Manejo da Água (SSMA). Durante o curso, nasatividades em campo, as famíliasmontamum sistema simplificado de aguamento que funcione comeconomia de água. O SSMA é realizado napropriedade de umafamília para que
os participantes percebam a estratégia utilizada pelos anfitriões para a produção do arredor do quintal, para o
manejo animal, preservação e multiplicação das sementescrioulas e outrasquestões relacionadas com o sistema
produtivo familiar (ASA, 2018). 263 A lógica da construção das barragenssubterrâneas, tanques de pedra/caldeirões, cisternas calçadão e cisternas
de enxurrada adaptadas praroçarequercapacitações diferenciadas dado às singularidades de cada tecnologia de
captação e armazenamento de água da chuva. Para além da técnica para a construção, os participantes
tambémaprendem a identificar o melhor local para a edificação da tecnologia, assim como a fazer a conservação,
manejo, reparos e outros aspectos. Nascapacitaçõestambémsão discutidos conteúdos teóricos relacionados com a
proposta da convivência o Semiárido. Um dos objetivos é inserir os pedreirosna lógica do Programa e torná-los
atores e sujeitos dos processos, pois eles têmcontatodiretocom as famílias e comunidades (ASA, 2018). 264 As experiênciasiniciaisdesteprojetonasceram no meio das organizações da ASA, impulsionadas pelo Fundo
das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional
(Consea). Lançado em 2004, o Pacto Nacional Um Mundo para Criança e Adolescente do Semiárido previa
medidas para a melhoria das condições de vida das crianças e dos adolescentes, cumprindo metas em algumas
áreas, incluindoeducação. Enquantoisso, a constatação de que inúmeras escolasnaregião e foradeladeixam de
funcionar por falta de águalevou a Plenária do Consea, ocorrida em Recife, em julho de 2009, a pautar a questão
da águanasescolas. Ainda em 2009, teve inícioumprojeto-piloto mais amplo e mais organizado, protagonizada
pela ASA Bahia, através do Centro de Assessoria do Assuruá (CAA), com o apoio do MDS e do Governo da
Bahia, através da Secretaria de Desenvolvimento Social e Combate à Pobreza (Sedes).A iniciativa foi ampliada
em 2010, dessa vez sob a coordenação da ASA Brasil, a partir da parceriacom o MDS, via Secretaria Nacional
171
7.4.4. Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivênciacom o Semiárido:
Manejo da Agrobiodiversidade – Sementes do Semiárido
Lançado em 2015, esse programa busca reforçar a cultura do estoque de sementes. Além de
infraestrutura para captar e armazenar a água para consumo e produção, como apontado
anteriormente, as famíliaspossuemtambém o apoio para guardar as sementesconhecidas como
crioulas265. Esta iniciativa está alicerçadanas inúmeras experiências de açãocomunitária em
rede, que vemsendo gestadas a partir do P1MC e do P1+2. O processo de escolhas dos
beneficiados seguem as capacitações: Técnicas; das ComissõesMunicipais; da
GestãoComunitária da Diversidade de Sementes; da Gestão de Estoques nos Bancos
Comunitários de Sementes; da Capacitação Territorial sobre Seleção; da Produção e
Multiplicação de Sementes e, por fim, da Formação Regional de Equipes (ASA, 2017).
7.5. Descentralização e convivência com o semiárido
As ações expostas acima, sozinhas, não garantem o bem estar da população. Estar adaptado ao
semiárido, não quer dizer que todos os problemas estão solucionados. Há uma complexidade
mais profunda que o entendimento de que com políticas de convivência, os problemas
cessam.
A configuração de um discurso político sobre a convivência pode ser evidenciada em várias
ações como apontadas acima. Caminha-se, nesse sentido, a uma descentralização e
democratização da gestão e dos usos dos recursos hídricos que "emergem das falas de forma
dominante, como um artefato que não traz apenas água, mas também a autonomia das
famílias em relação aos grupos políticos que ao longo de décadas escravizaram a população
com a utilização de carros-pipa e outras esmolas públicas" (Moreira Neto e Lira, 2015 : 174-
175). E esse discurso está presente em diversas instituições que lidam diretamente ou
indiretamente com a convivência.
de Segurança Alimentar e Nutricional (Sesan), Instituto Ambiental Brasil Sustentável (IABS) e a
AgênciaEspanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (Aecid) (ASA, 2018). 265 A depender da região do Semiárido, as sementescrioulastambémsãoconhecidas como Sementes da Paixão, da
Resistência, da Gente, da Fartura, da Vida. Variados nomes que simbolizam a relação de afeto das famílias
agricultoras e populaçõestradicionais pelas sementes que as acompanhamhágerações (ASA, 2018).
172
O crescimento da atuação da sociedade civil266 organizada é visível e mensurável. A
Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais (Abong) apresenta, no gráfico
abaixo, o crescimento sensível das OSC's a partir do início desse século.
Fonte :Abong267 (2019).
Gráfico 1 - Evolução quantidade de OSCs por ano de fundação
A relação entre OSC's e o Estado Federal fica evidente no gráfico abaixo. A relação de
parcerias, sobretudo na primeira metade da década atual se evidencia nas transferências
federais que, ficou, em cerca de R$ 23.708.545.669,41 (Abong, 2019).
Fonte :Abong268 (2019).
Gráfico 2 - Transferências federais
266As OSCs são entidades únicas, nascidas da livre organização e participação social das pessoas em busca de um
objetivo coletivo e sem visar lucro (Abong, 2018). 267 A Abong compilou a partir de: Quantidade OSCs e Quantidade Trabalhadores: CNPJ/SRF/MF 2016,
OSCIP/MJ, RAIS/MTE; de Recursos: SIGA Brasil 2010-2018, Valores deflacionados para dez/2018, IPCA
IBGE 2018 e Projetos: SALICWEB/MINC 06/2018, LIE/MESP 2017, Representante de OSC, FINEP/FNDCT,
SALICWEB/MINC, SALICWEB/MINC 03/2018, FINEP/FNDCT 2017, SICONV/MPOG 15-04-2019,
SICONV/MPOG 20-03-2019. 268 A Abong compilou a partiur de SIGA Brasil 2010-2018, Valores deflacionados para dez/2018, IPCA IBGE
2018.
173
A Abong (2019) informa que o Brasil possui, entre 2010 e 2018, 205.182 OSC's, com
310.512 trabalhadores. Foram desenvolvidos 6.434 projetos e um total de R$
14.287.876.465,13 como transferências federais (2010-2018). Para o Nordeste tem-se
208.182, das quais 28.709 OSC's atuam em Pernambuco e tem-se 5.960 no semiárido dos
mais diversos perfis de atuação e objetivos. Nordeste possui 50.3 por cento das OSCs atuando
em Desenvolvimento e defesa de direitos, enquanto o percentual médio nacional de OSCs
nesta categoria é de 39.91 por cento (Abong, 2019).
Fonte :Abong269 (2019).
Gráfico 3 - Repasse de recursos
O Nordeste é o terceiro em relação aos repasses de recursos para as OSCs, com média de
R$106.539.181,05 por ano. A média nacional de repasse de recursos é de R$ 472.982,58.
Além dos repasses federais, a categoria de recursos mais declarada foi Recursos públicos com
14.19 por cento do total" (Abong, 2019).
Vale destacar que essa nova postura frente à gestão hídrica encontra inúmeros desafios em sua
implementação, uma vez que muda de forma significativa o enfoque sobre o setor e se
contrapõe às práticas historicamente estabelecidas, tais como: a cultura de privatizar o uso da
água; as decisões governamentais tomadas de forma centralizada; as ações assistenciais que
caracterizam os períodos de seca; e o desinteresse e a ausência de iniciativa dos usuários e da
269 A Abong compilou a partir de: Representante de OSC, SIGABR 12/2018, OSCIP/MJ, CNPJ/SRF/MF 2016,
RAIS/MTE em valores correntes.
174
sociedade na busca de alternativas para gestão sustentável dos recursos hídricos (Castro,
2012).
Entretanto, traz-se à tona a reflexão de que a ideia de combate à seca foi um paradigma que
vem sendo vencido. Ressaltando-se que, à sua época de construção, não se conhecia
profundamente, do ponto de vista técnico-científico, as condições físicas do ambiente, então
buscavam-se fora experiências consideradas exitosas para se implantar no Brasil. A isso,
somam-se a cultura de não valorização dos saberes locais e do alijamento da população nas
tomadas de decisão. Aliás, em boa parte do pensamento pré-convivência com o semiárido,
havia a percepção da população como vítimas e não como ativas no processo de registro e
partilha do conhecimento.
Para Moreira Neto e Lira (2015 : 181),
Em suma, a ideia de convivência com o Semiárido, mesmo ganhando espaço no
debate intelectual e no diálogo social, não se expressa, na prática, como uma ideia
totalizante e unificadora. Ela sofre as tensões e contradições na sua
operacionalização. No entanto, é fundamental perceber que esse diálogo que vem
ocorrendo em inúmeras ONGs é responsável pela produção de uma compreensão
político-pedagógica que busca ressaltar a convivência com o semiárido como
essencial para se pensar as diferentes possibilidades de reprodução dos modos de
vida ali existentes.
Dessa forma, no discurso da convivência, o pressuposto da sustentabilidade é referenciado
como essencial para a reelaboração de relações de poder-saber que, deslocando-se do
tradicional discurso da dependência, procuram gestar novas possibilidades para o espaço do
Semiárido, ancoradas na reflexão de questões como respeito à diversidade, solidariedade,
coletividade, articulação em redes, autogestão etc (Fortunato e Moreira Neto, 2017).
As ações das OSC's no processo de entendimento da convivência com o semiárido são mais
eficientes e duradouras. Retoma-se aqui a ideia de escala, uma vez que as ações das OSC's
articulam soluções locais como sendo eficientes globalmente (Ogunseitan, 2003). E ainda,
ressalta-se que "em países continentais e muito desiguais, como o Brasil, é muito importante
discutir mecanismos de articulação entre atores locais. Passar do modelo centralizado do
passado para uma descentralização atomizada [...] A descentralização coordenada parece ser o
modelo a ser perseguido pelos atores locais de um país como o Brasil. E esforços nessa
direção ainda são muito incipientes (Araújo, 2000 : 63). Os
175
defensores da descentralização argumentam que essa nova alocação de poder
decisório implica na redução de custos de transação, no melhor aproveitamento de
informações, na maior capacidade de adaptação às necessidades locais e de
adequação dos custos em relação aos benefícios. Outros ainda defendem a
descentralização como um mecanismo de democratização, pressupondo que a
sociedade local terá maior capacidade de controlar as decisões políticas em nível
local do que em nível central (Abers e Jorge, 2005 : 2-3)270.
A forte repressão aos movimentos sociais aliado à uma democracia representativa que, com
poucas exceções não valorizou o conhecimento e os anseios dos mais pobres conduziu o
Brasil a possuir uma sociedade que não esteve acostumada a buscar ou compartilhar o
protagonismo na tomada de decisão.
A participação cidadã, embora incentivada do ponto de vista institucional através de seus
contatos oficiais não se consolida, uma vez que não se preparam ao longo do tempo para se
apropriar das discussões sobre a água e, principalmente, o seu papel na tomada das decisões.
Em perspectivas, são vistos como importantes, mas sabendo que sua participação será mínima
ou, em alguns casos, inócua. A participação da população que nem sempre domina o léxico
das discussões é abaixo do que pode-se esperar de uma gestão compartilhada. As ações das
OSC's vem mudando, aos poucos, essa realidade.
Cabe ressaltar que em países continentais e muito desiguais, como o Brasil, é muito
importante discutir mecanismos de articulação entre atores locais. O processo de
descentralização da gestão hídrica cresce nas últimas duas décadas. As ações em conjuntos
entre Estado e sociedade civil organizada são exemplos. A descentralização coordenada
parece ser o modelo a ser perseguido pelos atores locais de um país como o Brasil (Araújo,
2000; Silva, 2006). A esse, inclui-se o processo de gestão por bacias hidrográficas que será
tratado no capítulo seguinte.
270 Reflexão construída a partir de Agrawal e Ribot (2000); Campbell (2003) e Tendler (1997).
176
Capitulo 8 - Governança da água através do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São
Francisco (CBHSF)
A busca de uma descentralização no processo de gestão hídrica se intensifica a partir do
século XXI. A participação de diversos atores nesse processo, tais os órgãos estatais, as
organizações civis e cidadãos, se consolida nos comitês de bacias hidrográficas. Esses são
estruturas pensadas para um processo mais transparente e ligado aos contextos regionais e
locais onde inseridos para a tomada de decisão.
A governança da água refere-se ao conjunto de aspectos políticos, sociais, econômicos e
sistemas administrativos que estão no local para desenvolver e gerenciar os recursos hídricos,
a prestação de serviços de água e para implementação de soluções para melhoramento da
qualidade da água, em diferentes níveis da sociedade (ANA, 2011). A gestão hídrica através
do Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco (CBHSF) é, essencialmente, um processo
de governança da água.
A legislação brasileira de recursos hídricos criou o sistema institucional que possibilita a
articulação para atuar no gerenciamento dos recursos hídricos. Destarte, a União, os estados,
os municípios, os usuários de recursos hídricos e a sociedade civil atuam em conjunto,
preferencialmente, de forma harmônica e integrada (Pereira e Johnson, 2004). O comitê tem
por objetivo promover o debate das questões relacionadas aos recursos hídricos da bacia;
articular a atuação das entidades que trabalham com este tema; arbitrar, em primeira instância,
os conflitos relacionados a recursos hídricos; aprovar e acompanhar a execução do plano de
recursos hídricos da bacia; estabelecer os mecanismos de cobrança pelo uso de recursos
hídricos; sugerir os valores a serem cobrados e, por fim, estabelecer critérios e promover o
rateio de custo das obras de uso múltiplo, de interesse comum ou coletivo (Kettelhut e Barros,
2001).
As preocupações com os usos da água vão além do consumo humano e da dessedentação dos
animais em épocas de escassez. Tem sua dimensão econômica, social e cultural que precisam
estar contempladas na gestão a partir das bacias hidrográficas. Assim, as águas do Rio São
Francisco são bastante utilizadas na geração de energia; no fornecimento de recursos à
indústria e irrigação, notadamente o agronegócio e no fornecimento de água potável e
saneamento das cidades e áreas rurais. Entretanto, a água também tem uma dimensão religiosa
177
para as comunidades quilombolas e indígenas271. O amálgama desses temas quando estão em
pauta na gestão hídrica provoca tensões e lutas entre os membros.
8.1. A construção dos comitês de bacias hidrográfica no Brasil
No âmbito da Lei N. 9.433/97272, foi criado o Sistema Integrado de Gerenciamento de
Recursos Hídricos273, no qual se organiza estruturalmente a gestão dos recursos hídricos no
país por bacia hidrográfica (SINGREH). Integram o sistema, o Conselho Nacional de
Recursos Hídricos (CNRH)274, os Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados (CERHs)275, o
Ministério do Meio Ambiente (MMA), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
271A Lei Nº 9.433/97, no seu Capítulo I, rt. 1º e inciso II, afirma que - a gestão dos recursos hídricos deve sempre
proporcionar o uso múltiplo daságuas. Em seguida, no Capítulo III, Art. 3 e inciso I trata da adequação da gestão de
recursos hídricos às diversidade físicas, bióticas, demográficas, econômicas, sociais e culturais das diversas regiões doPaís.
Soma-se a isso, a construção da representação territoriao do sertão como representação do passado e dos espaços das
memórias apresentada no Capítulo 5 e a construção dos saberes locais no Capítulo 7. Esse panorama reforça a
importância da água em todas as comunidades e, em especial, as de origem quilombolas e indígenas que têm a
água como instrumento fundamental nas suas práticas religiosas e culturais.Inclusive, tem-se representantes de
comunidades quilombolas e indígenas participando do comitês. 272A Lei nº 9.435/1997 estabelece que a União se articulará com os estados para o gerenciamento dos recursos
hídricos de interesse comum; desta forma, as leis estaduais estabelecem que os estados deverão se articular com
a União, outros estados e municípios para o aproveitamento, o controle e o monitoramento dos recursos hídricos
de interesse comum. Porém, nenhum texto legal delineia ou detalha a Forma como deve ocorrer esta articulação
em bacias hidrográficas nacionais, seja no tocante aos instrumentos de gestão (outorga, fiscalização e cobrança),
seja no que concerne aos organismos de bacia (relação entre o comitê do rio principal e os comitês de rios
afluentes, sob jurisdição federal ou estadual) (Castro, 2012 : 46). 273O sistema nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos estabelecido pela Lei n. 9.433 deve cumprir os
seguintes objetivos: coordenar a gestão integrada das águas; arbitrar administrativamente os conflitos ligados ao
uso da água; implementar a Política nacional de Recursos Hídricos; planejar, regular e controlar o uso, a
preservação e a recuperação dos recursos hídricos; promover a cobrança pelo uso da água e integram o sistema nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos: o Conselho nacional de Recursos Hídricos; os Conselhos de
Recursos Hídricos dos estados e do distrito Federal; os Comitês de Bacia Hidrográfica; os órgãos de governo
cujas competências se relacionem com a gestão de recursos hídricos; agências de Água (Porto e Porto, 2008 :
48). 274Instituído pela Lei nº 9.433/1997 é um colegiado que desenvolve regras de mediação entre os diversos
usuários da água. Tendo como competências analisar propostas de alteração da legislação pertinentes a recursos
hídricos; estabelecer diretrizes complementares para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos;
promover a articulação do planejamento de recursos hídricos com os planejamentos nacional, regionais,
estaduais e dos setores usuários. Devendo ainda arbitrar conflitos sobre recursos hídricos; deliberar sobre os
projetos de aproveitamento de recursos hídricos cujas repercussões extrapolem o âmbito dos estados em que
serão implantados; aprovar propostas de instituição de comitês de bacia hidrográfica. E também, estabelecer critérios gerais para a outorga de direito de uso de recursos hídricos e para a cobrança por seu uso; e aprovar o
Plano Nacional de Recursos Hídricos e acompanhar sua execução (CNRH, 2011). 275É um órgão deliberativo e normativo central do Sistema Estadual de Recursos Hídricos, tendo como
competência estabelecer os princípios e as diretrizes da Política Estadual de Recursos Hídricos a serem
observados pelo Plano Estadual de Recursos Hídricos e pelos Planos Diretores de Bacias Hidrográficas; aprovar
proposta do Plano Estadual de Recursos Hídricos. Sendo ainda de sua competência decidir os conflitos entre
comitês de bacia hidrográfica; atuar como instância de recurso nas decisões dos comitês de bacia hidrográfica. O
CERH, do Estado de Minas Gerais foi criado pelo Decreto nº 26.961 de 28/04/87, a partir da necessidade da
integração dos órgãos públicos, do setor produtivo e da sociedade civil organizada, visando assegurar o controle
da água e sua utilização em quantidade e qualidade (CERH-MG, 2011).
178
Recursos Naturais Renováveis (Ibama), órgãos dos poderes públicos federal276, estaduais e
municipais cujas competências se relacionam com a gestão de recursos hídricos, os Comitês
de Bacias Hidrográficas e a Agência Nacional de Águas (ANA)277(Castro, 2012, 2012; Porto
e Porto, 2008; ANA, 2015).
O marco regulatório é baseado em instrumentos de comando e controle (planos de bacia,
autorização para captação e uso da água, classificação dos cursos de água e sistemas de
informação) e em incentivos econômicos para o uso racional dos recursos hídricos (cobrança
pelo uso da água e compensações financeiras). Em 2011, a ANA lançou um caderno em oito
volumes onde estabelece e discute os instrumentos previstos na Lei das Águas, bem como
sobre o SINGREH, definindo o funcionamento da gestão hídrica através das bacias
hidrográficas278.
Os comitês de bacias hidrográficas são interestaduais279 e estaduais280 e se caracterizam por
serem
organismos colegiados que fazem parte do Sistema Nacional de Recursos
Hídricos e existem no Brasil desde 1988. A composição diversificada e
democrática dos Comitês contribui para que todos os setores da sociedade com
interesse sobre a água na bacia tenham representação e poder de decisão sobre sua
276"Apesar de o tema da gestão de recursos hídricos ser afeito à União e aos estados, os serviços de
abastecimento de água e saneamento são de responsabilidade dos municípios. Assim, para se alcançar uma boa
gestão de recursos hídricos, é necessária uma articulação entre todos os entes federados" (Braga et al., 2008 apud
Castro, 2012 : 44). Com efeito, o engendramento da gestão fica ainda mais complexo, mas segue-se discutindo a
gestão dos recursos hídricos sem se aprofundar no saneamento. 277A ANA foi criada de forma a complementar a estrutura institucional da gestão de recursos hídricos do país. É a entidade operacional do sistema com responsabilidade pela implantação da política nacional de recursos
hídricos e que detém o poder outorgante de fiscalização e de cobrança pelo uso da água (Porto e Porto, 2008;
Castro, 2012). 278O primeiro volume discorre sobre um dos entes do Singreh: o comitê de bacia hidrográfica. O segundo volume
tem o objetivo mais prático: orientar o funcionamento dos comitês de bacia. O terceiro volume aborda
alternativas organizacionais para gestão de recursos hídricos. O quarto volume concentra-se em outro ente do
Singreh: a Agência de Água ou Agência de Bacia. O quinto volume concentra-se nos instrumentos de
planejamento da política: os planos de recursos hídricos e o enquadramento dos corpos d’água em classes
segundo os usos preponderantes. O sexto volume aborda a outorga de direito de uso de recursos hídricos. O
sétimo volume discorre sobre a cobrança pelo uso de recursos hídricos e o oitavo volume tem o objetivo de
apresentar a importância dos sistemas de informações sobre recursos hídricos para avanço da gestão da água (ANA, 2011). 279Os comitês de bacias hidrográficas de abrangência interestaduais são: Piranhas Açu; São Francisco; Verde
Grande; Paraíba; Rio Doce; Rio Grande; Paraíba do Sul; Piracicaba, Capivari, Jundiaí e, por fim, Paranapanema
(CBH, 2017). 280Os comitês estaduais estão inseridos dentro de cada estado brasileiros. Assim, temos no um comitê no Estado
do Amazonas; quatro no estado de Tocantins; seis no Mato Grosso; dois no Mato Grosso do Sul; oito em Goiás;
três no Distrito Federal; vinte e cinco no Rio Grande do Sul; dezessete em Santa Catarina; onze no Paraná; vinte
e um em São Paulo; nove no Rio de Janeiro; doze no Espírito Santo; trinta e cinco em Minas Gerais; quatorze na
Bahia; três em Sergipe; cinco em Alagoas; seis em Pernambuco; três na Paraíba; três no Rio Grande do Norte;
doze no Ceará; dois no Piauí e dois no Maranhão (CBH, 2017).
179
gestão. Os membros que compõem o colegiado são escolhidos entre seus pares,
sejam eles dos diversos setores usuários de água, das organizações da sociedade
civil ou dos poderes públicos. Suas principais competências são: aprovar o Plano
de Recursos Hídricos da Bacia; arbitrar conflitos pelo uso da água, em primeira
instância administrativa; estabelecer mecanismos e sugerir os valores da cobrança
pelo uso da água, entre outros (CBHSF, 2017).
Os Comitês atuam na promoção das discussões relacionadas aos recursos hídricos,
contribuindo para o caráter participativo da sua gestão. Possui, como órgão executivo, a
Agência de Bacia, que tem suas atividades relacionadas com a ANA e com os órgãos
estaduais. Assim, "o Comitê de Bacia, nesse contexto, é a massa crítica e a base decisória do
Sistema Integrado de Gerenciamento de Recursos Hídricos e o ambiente para a participação, a
negociação e a busca do consenso necessário à elaboração e à implementação do Plano"
(ANA, 2005 : 24).
A gestão hídrica a partir da bacia hidrográfica exige dos comitês um amplo repertório de
relações entre todos os envolvidos. A gestão hídrica precisa levar em conta as especificidades
locais, regionais e entender as bacias em níveis diferenciados de estrutura física e práticas
diferenciadas de gestão integrada, o que envolve, em diversos momentos, soluções complexas
(Jacobi, 2009).
Ao instituir as competências jurídicas, administrativas e financeiras voltadas para a gestão das
águas, o Estado brasileiro priorizou as condições sistêmicas e institucionais sob as quais se dá
o exercício da gestão dos recursos hídricos. A instalação da Agência Nacional das Águas e
dos comitês de bacias, juntamente com os instrumentos de gestão de recursos hídricos,
definidos pela Lei Federal 9.433/97, propiciou condições para a governabilidade dos recursos
hídricos no Brasil (Pereira, 2003b).
Em princípio, o processo de gestão dos recursos hídricos, no semiárido traria novas práticas e
extinguiria ações anteriores, tais as decisões governamentais tomadas de forma centralizada;
as ações assistenciais que caracterizam os períodos de seca e o desinteresse e a ausência de
iniciativa dos usuários e da sociedade na busca de alternativas para gestão sustentável dos
recursos hídricos (Castro, 2012).
180
8.2. O Comitês da bacia do rio São Francisco
O CBHSF foi criado por decreto presidencial em 5 de junho de 2001. Possui atribuições
normativas, consultivas e deliberativas, sendo formado por sessenta e dois membros titulares
e sessenta e dois suplentes. Só os membros titulares têm o direito ao voto. A divisão de
participação se apresenta com 38.7 por cento com os usuários, 32,2 por cento com o poder
público federal, estadual e municipal, 25,8 por cento com a sociedade civil e 3,3 por cento
com as comunidades tradicionais (CBHSF, 2017) e sua estrutura está representada abaixo.
Fonte : CBHSF (2017).
Figura 26 - Organograma da CBHSF
A Diretoria Colegiada (Direc)281 é constituída pela Diretoria Executiva (presidente, vice-
presidente e secretário) e pelos coordenadores das Câmaras Consultivas Regionais (CCR) e se
encarrega de desempenhar as atividades político-institucionais do CBHSF. Fica sob a
responsabilidade da Diretoria Executiva as atribuições administrativas encaminhadas pelos
membros, bem como as discutir e deliberar sobre as propostas de cunho técnico-científico e
institucional apresentadas pelas Câmaras Técnicas282. Entre a Diretoria Colegiada e a
281Atualmente, existe o Grupo de Acompanhamento do Contrato e Gestão (GACG), responsável pela supervisão
física e financeira da execução do contrato de gestão, com avaliação de desempenho da Agência Peixe Vivo e o
Grupo de Acompanhamento Técnico (GAT), criado para monitorar e auxiliar o CBHSF na atualização do Plano
de Recursos Hídricos da Bacia do São Francisco (PRH-SF). O GAT é formado por dezessete membros titulares, sendo oito representantes de órgãos gestores, quatro das Câmaras Consultoras Regionais, dois da CTTPP e os
três membros da Diretoria Executiva. 282As Câmaras Técnicas são instâncias colegiadas temáticas que prestam apoio técnico ao comitê através de
estudos de temas específicos de caráter técnico-científico e/ou institucional. Os seus membros são especialistas
indicados pelos membros titulares do CBHSF e exercem mandados voluntários. São, ao todo, cinco câmaras-
técnicas 1 - Câmara Técnica de Planos, Programas e Projetos (CTPPP) responsável por analisar a apresentar
propostas à contratação de projetos com recursos de cobranças, bem como avaliar o Plano de Aplicação
Plurianual. 2 - Câmara Técnica de Institucional e Legal (CTIL) trata dos assuntos legais e jurídicos e auxiliar
outras câmaras nas alterações dos regimes internos. 3 - Câmara Técnica de Outorga e Cobrança (CTOC) auxilia
o CBHSF na elaboração de estratégias para o aprimoramento da cobrança dos recursos hídricos. 4 - Câmara
181
Diretoria Executiva, ficam as agências de bacias283. No caso do CBHSF, quem atua é a
Agência Peixe Vivo284. O Anexo 6 apresenta os membros do CBHSF no mandato 2013 -
2016.
As Câmaras Consultivas Regionais (CCR) são o principal canal do CBHSF no processo de
gestão descentralizada, integrada e compartilhada. São as responsáveis por fazerem a
interlocução do CBHSF com os comitês de seus afluentes, bem como com as comunidades
usuárias dos recursos hídricos. Cabem às CCR promover a mobilização em suas regiões,
buscando o envolvimento da comunidade, com a realização de cursos, seminários, oficinas
temáticas e consultas públicas. Atuam ainda como mediadoras dos conflitos oriundos do uso
dos recursos hídricos. São quatro câmaras, a saber a do Alto, do Médio, do Submédio e do
Baixo São Francisco. O Anexo 7 apresenta a lista com o membros da CCR do Submédio São
Francisco.
A Agência Peixe Vivo é uma associação civil, pessoa jurídica de direito privado, criada em
2006 para exercer as funções de Agência de Bacia para o Comitê da Bacia Hidrográfica do rio
das Velhas. Desde então, com o desenvolvimento dos trabalhos e a negociação com outros
comitês para que fosse instituída a Agência única para a Bacia Hidrográfica do rio São
Francisco, o número de comitês atendidos aumentou consideravelmente, sendo necessária a
reestruturação da organização.
Técnica de Comunidades Tradicionais (CTCT) faz a ligação entre o CBHSF com as comunidades tradicionais. 5
- Câmara Técnica de Articulação Institucional (CTAI) articula e integra as ações dos estados e União na gestão
das águas. Existe ainda os Grupos de Trabalho como instâncias colegiadas encarregadas de auxiliar o CBHSF
em temas específicos. 283As agências de bacia são entidades dotadas de personalidade jurídica própria, descentralizada e semfins
lucrativos. Indicadas pelosComitês de Bacia Hidrográfica, poderão ser qualificadas pelo Conselho Nacional de
Recursos Hídricos – CNRH, ou pelos ConselhosEstaduais, para o exercício de suasatribuiçõeslegais. A
implantação das Agências de Bacia foiinstituída pela Lei Federal No 9.433 de 1997 e suaatuação faz parte do
SINGREH. As agências de Bacia prestamapoio administrativo, técnico e financeiroaosseus respectivos Comitês
de Bacia Hidrográfica. Os Comitêssãoórgãos normativos e deliberativos que têm por finalidade promover o gerenciamento de recursos hídricos nassuas respectivas bacias hidrográficas (AgênciaPeixe Vivo, 2018). 284A AgênciaPeixe Vivo é umaassociação civil, pessoa jurídica de direito privado, criada em 2006 para exercer,
inicialmente, as funções de Agência de Bacia para o Comitê da Bacia Hidrográfica do rio das Velhas.
Atualmente, está legalmente habilitada a exercer as funções de Agência de Bacia para
doisComitêsestaduaismineiros, CBH Velhas (SF5) e CBH Pará (SF2), além do Comitê Federal da Bacia
Hidrográfica do Rio São Francisco, CBHSF e CBH do Rio Verde Grande. A presta apoio técnico-operativo à
gestão dos recursos hídricos das bacias hidrográficas a ela integradas, mediante o planejamento, a execução e o
acompanhamento de ações, programas, projetos, pesquisas e quaisqueroutrosprocedimentosaprovados,
deliberados e determinados por cada Comitê de Bacia ou pelos Conselhos de Recursos Hídricos
EstaduaisouFederais (AgênciaPeixe Vivo).
182
Fonte : ANA (2005 : 3).
Figura 27 - Divisão político-administrativa da Bacia do Rio São Francisco
AS CCR contam com a participação de vinte Organismos Governamentais federais285 e seis
Organismos não governamentais e associação de classes, bem como três Organismos
internacionais286.
Estados Organismos Governamentais Organismos não
governamentais e
associação de classes
Empresas privadas
Estaduais Municipais
Pernambuco 3 5 7 1
Bahia 14 11 32 5
Sergipe 8 6 2
Alagoas 7 3 17 1
Minas Gerais 13 16 33 20
Total 45 41 91 27
Fonte : CBHSF (2017).
Tabela 13 - Quantitativo de Organismos, associações de classes e empresas que atuam, em princípio, na gestão
da bacia do São Francisco
285 Os organismos são os seguintes: Agência Nacional de Águas (ANA); Agência Nacional de Energia Elétrica
(ANEEL); Banco do Nordeste (BNB); Companhia Hidroelétrica do São Francisco (CHESF); Centro Federal de Educação Tecnológica – SE (CEFET); Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do
Parnaíba (CODEVASF); Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA); Fundação Nacional do
índio (FUNAI); Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA); Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA); Ministério da Agricultura (MA); Ministério da
Integração Nacional (MI); Ministério do Meio Ambiente (MMA); Ministério do Planejamento Orçamento e
Gestão (MPOG); Ministério dos Transportes (MT); Universidade Federal de Alagoas (UFAL); Universidade
Federal da Bahia (UFBA); Universidade Federal de Pernambuco (UFPE); Universidade Federal de Sergipe
(UFS) e Universidade Federal de Viçosa (UFV). 286Os Organismos internacionais são os seguintes: Fundo para o Meio Ambiente Mundial (GEF) Organização
dos Estados Americanos (OEA) Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).
183
8.2.1 Câmara Consultiva Regional do Submédio São Francisco
Todos os municípios287 do semiárido de Pernambuco possuem sistema de abastecimento
d'água e estão inseridos na bacia hidrográfica do São Francisco (INSA, 2011). É a CCR do
submédio São Francisco que contempla o semiárido do Estado de Pernambuco288 e possui a
seguinte configuração de representação:
Os organismos governamentais estaduais: Companhia Pernambucana de Saneamento
(COMPESA); Empresa de Operações Aeroportuárias (COMTRAP) e Secretaria de
Ciência,Tecnologia e Meio Ambiente de Pernambuco (SECTMA).
Organismos estaduais: Autarquia Educacional do Araripe (AEDA); Conselho Popular
de Petrolina (CPP) Prefeitura de Jaguarari; Prefeitura de Salgueiro e Prefeitura de
Santa Maria Boa Vista.
Organismos não governamentais e associações de classe: Associação Brasileira de
Recursos Hídricos – PE (ABRH-PE) Associação de Desenvolvimento Santa Quitéria
(ADSQ) Associação dos Guardiães Ambientalistas do Vale do São Francisco
(ÁGUAVALE); Associação Rural da Fazenda Barra (ARFB) Federação dos
Pescadores de Pernambuco (FPP) Associação de Representantes de Pequenas Centrais
Hidroelétricas (PCHs) e Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Juazeiro (STRJ).
Como empresa privada, apenas a Empresa de Operações Aeroportuárias (COMTRAP)
consta como participante.
Como todo fórum heterogêneo e com grupos com suas próprias agendas, o CBHSF possui uma
miríade de temas sendo discutidos ao mesmo tempo. Ao se analisar as atas de plenárias da CCR do
submédio São Francisco, percebeu-se como as discussões variam a depender do momento. Com isso,
há discussões como a outorga da água, dos projetos enviados pelas câmaras técnicas e problemas
específicos de comunidades.
287Os municípios de Pernambuco dentro da CCR do Submédio são: Afogados da Ingazeira, Afrânio, Águas
Belas, Alagoinha, Araripina, Arcoverde, Belém de São Francisco, Betânia, Bodocó, Bom Conselho, Brejinho,
Buíque, Cabrobó, Caetés, Calumbi, Carnaíba, Carnaubeira da Penha, Cedro, Custódia, Dormentes, Exu, Flores,
Floresta, Granito, Iati, Ibimirim, Iguaraci, Inajá, Ingazeira, Ipubi, Itacuruba, Itaíba, Itapetim, Jatobá, Lagoa
Grande, Manari, Mirandiba, Orocó, Ouricuri, Paranatama, Parnamirim, Pedra, Pesqueira, Petrolândia, Petrolina,
Quixabá, Salgueiro, Saloá, Santa Cruz, Santa Cruz da Baixa Verde, Santa Filomena, Santa Maria da Boa Vista,
Santa Terezinha, São José do Belmonte, São José do Egito, Serra Talhada, Serrita, Sertânia, Moreilândia,
Solidão, Tabira, Tacaratu, Terra Nova, Trindade, Triunfo, Tupanatinga, Tuparetama, Venturosa e Verdejante
(CBHSF, 2017) 288Inclui também o Estado da Bahia com 507 municípios.
184
A CCR possui uma região de atuação definida por critérios técnicos, o submédio São Francisco,
entretanto esse recorte é extenso e complexo. A sobreposição de escalas se faz na gestão e os
interesses corporativos e do Estado também. O engendramento de escalas, municipal, estadual e
federal torna a compreensão difícil para alguns grupos.
Em seguida, trata-se de como se organizam e se tomam as decisões na CCR do submédio São
Francisco a partir das falas de seus membros.
8.3. A Câmara Consultiva Regional e a gestão da água no semiárido pernambucano
Como enunciado na metodologia289, para a análise das entrevistas, fez-se uso da técnica de
análise de verbatim. Os dados das entrevistas foram analisados a partir da leitura das
transcrições para a identificação de pontos de aproximação. Isso gerou categorias que foram
agrupadas em temas gerais, a saber: percepções e objetivos dos membros, as estratégias para a
tomada de decisão, participação cidadã e dos membros no comitê, as tomadas de decisão, o
Estado de Pernambuco na gestão da CCR do submédio São Francisco e avaliação da gestão a
partir da bacia hidrográfica.
Os nomes dos entrevistados foram substituídos, assim como as instituições que pertencem não
são identificadas. Então, tem-se Luiz e Oswaldo representando ONG's que atuam diretamente
com as ideias da convivência com o semiárido, na Bahia e Pernambuco, respectivamente;
Chico representa um município do semiárido, mas também é funcionário de uma universidade
pública; Fred representa um órgão público de gestão hídrica do Estado de Pernambuco;
Adilson é membro da CCR a partir de uma federação de interesse privado de Pernambuco;
Maria é a representante de uma empresa que faz um grande uso da água do Rio São
Francisco; Jorge representa uma associação de trabalhadores; Geraldo representa um
consórcio de desenvolvimento sustentável e Alceu, representa um sindicato de trabalhadores.
Esses três últimos no Estado da Bahia290.
A seguir, dar-se-á espaço às vozes, através das informações e reflexões dos representantes de
cada órgão quando estão atuando na CCR do Submédio São Francisco. A organização das
289 Precisamente no Capítulo 3 e seção 3.4.2 A análise dos resultados das entrevistas. 290 Reforça-se que a gestão a partir da CCR do Submédio São Francisco atua diretamente nos estados de
Pernambuco e Bahia, uma vez que o Rio São Francisco serve como fronteira natural e político-administrativa
entre os dois estados.
185
falas estão de acordo com as categorias que emergiram da análise das entrevistas e foram
colocadas na sequência que segue.
A CCR do submédio São Francisco se reúne ordinariamente quatro vezes por ano, sendo duas
na Bahia e duas em Pernambuco. Caso seja necessário, solicita-se uma reunião extraordinária
e decide-se onde acontecerá. Normalmente, as reuniões acontecem em cidades diferentes para
possibilitar a participação de pessoas de diferentes comunidades e municípios. Cada reunião
dura dois dias conforme explica Chico:
Um dia a gente tem a exposição dos temas, das propostas de cada entidade e outro
a gente sempre traz professores, palestrantes, para que possam mostrar a gente
novos caminhos. No dia seguinte, são discutidos os temas em pauta para aquela
reunião e seguem para as deliberações.
Como todo conjunto de atores com interesses e formações distintas que precisam tomar
decisões juntos, a CCR do Submédio São Francisco faz uso de uma estrutura e dinâmica de
funcionamento que procura dar voz a todos que participam como membros, procurando não
excluir os que participam apenas como ouvintes. Isso não evita, entretanto, os conflitos e
interesses divergentes em convívio. As entrevistas colhidas para essa tese evidenciam isso.
As quatro CCR's, do Alto, Médio, Submédio e Baixo São Francisco possuem autonomia na
elaboração de suas agendas de discussões e a atenção que desprendem para cada demanda.
Não obstante, as regiões fronteiriças podem ter sobreposição de gestão, inclusive com a
participação do mesmo membro em mais de uma CCR. Mas isso não é apontado como um
problema por nenhum dos entrevistados e nem nas atas consultadas. O semiárido de
Pernambuco está exclusivamente na região de atuação da CCR do Subbmédio291.
8.3.1. Percepções e objetivos dos membros
Há na fala dos participantes um direcionamento no entendimento que a gestão das bacias, tal
qual está sendo feita tem seus avanços. Cada membro, à sua maneira, expôs seu entendimento
da água como bem comum, mas deixando claro que defendem, em princípio, os interesses das
instituições que representam. Luiz chama atenção que a configuração dos comitês é:
muito interessante porque reflete mais ou menos a sociedade e também todos os
conflitos e todos os interesses.
291 No Alto estão os estados de Minas Gerais, Bahia e Goiás; no Médio tem-se apenas a Bahia; no Submédio,
Bahia e Pernambuco e no Baixo tem-se Bahia, Alagoas, Sergipe e Pernambuco.
186
As tensões entre poder público e interesses privados se evidenciam em algumas falas. Para
Geraldo é difícil:
estabelecer a governança em uma área tão dominada pelo poder púbico e pelos
usuários. Sendo sociedade civil e não servil desses poderes.
Tem-se um contraponto com Chico, representante de um órgão estatal que está no comitê
para:
defender a água para usos múltiplos. E não só para o abastecimento humano.
Têm-se ainda as falas mais ponderadas como:
buscar equilibrar os interesses múltiplos do uso da água e tentar evitar os conflitos
da água na bacia (Alceu).
pautar nesse comitê a perspectiva da convivência com clima semiárido e a
agroecologia (Oswaldo).
E têm-se falas que veem o rio de maneira utilitária como de Maria quando afirma que
a minha participação seria para atender os interesses da 'Empresa292'.
Por fim, há falas sensíveis ao rio como as de Fred: "o rio é nosso maior bem" e a de Luiz
quando afirma que:
a gente defende essa parte primeiro, que um rio é um sujeito. Mas que vive dentro
da realidade, junto com o povo.
Não existe, em princípio, discordância de que a água é um recurso natural e deve ser usada.
Outrossim, há divergência em como ela deve ser utilizada e, principalmente, a prioridade dos
seus usos. Alceu afirma:
defendo o uso racional com qualidade e quantidade para o consumo humano, em
defesa de um desenvolvimento sustentável protegendo os povos ribeirinhos,
quilombolas, indígenas e prioridade para o consumo humano e animal sem
olhando para a vida do rio com menos agressão do agronegócio, indústrias que
estão matando todos os ecossistemas.
Oswaldo corrobora como esse pensamento, como pode-se observar na fala:
A ideia que a água possa ser usada de forma racional, atendendo a toda a
população, mas com especial atenção as populações mais vulneráveis293. Evitar
292A palavra Empresa vai substituir o real nome da corporação que Maria representa. 293 Nessa fala, ele não precisa onde estão essas populações. Entretanto, sabe-se que existe uma fragilidade nas
populações que dependem diretamente do Rio São Francisco e seus afluentes. Normalmente, são populações que
vivem no meio rural.
187
toda e qualquer forma de contaminação, desperdício, monopólio e domínio sobre
seu uso.
Adilson afirma que:
a gente defende como indústria294: a utilização da água conscientemente dentro de
padrões de controles normais, e, assim como, os dejetos, o retorno ao rio da água
dentro dos padrões de qualidade exigidas, no caso da indústria.
E Maria concorda com ele ao dizer que:
a conservação através da gestão né? através dos planos, principalmente do plano
de saneamento de cada município.
A preocupação de quem trabalha para o Estado e sabe da importância da manutenção do rio
fica clara na fala de Chico quando afirma que defende
a revitalização do rio, a gente sabe que hoje o desmatamento, a poluição através
do aterramento sanitário e ações que a gente possa trazer de volta as nascentes que
hoje já não existem mais. Esses são as ações que eu mais defendo lá dentro do
comitê para que a gente possa revitalizar a Bacia como um todo, e aí sim, a gente
poder garantir que a gente vai ter água no rio São Francisco.
Por mais que a dinâmica de funcionamento do comitê seja definida e registrada. A sua
compreensão não é assimilada por todos, sejam eles membros ou não. Os mandatos de quatro
anos são apontados como razoáveis, mas como a participação nos comitês não é a atribuição
principal dos seus membros, se leva tempo para a compreensão de todo o processo e quando
isso acontece é, normalmente, na parte final dos mandatos. Isso é apontado por Luiz, que já
está no seu terceiro mandato e por Fred que está no primeiro.
Luiz critica a hierarquização do comitê, tratando ainda que nem todos os membros se sentem
à vontade na hora do diálogo. Há registros de conflitos por falas menos acadêmicas serem
criticadas por profissionais do estado ou de empresas que nem sempre se sentem confortáveis
ao escutar críticas e denúncias de alguns usuários e representantes de comunidades
ribeirinhas. A vivência de um ambiente heterogêneo requer abnegação e respeito mútuo.
O entendimento do ambiente como um todo e as consequências das ações em médio e longo
prazo, são temas sensíveis. As divergências afloram quando os diversos interesses são
colocados em discussão. Existe, claramente, uma defesa de se demandar mais água para
294 Nesse ponto, ele procura situar a instituição que ele representa que trata, diretamente, das indústrias de
Pernambuco.
188
práticas existentes, bem como o interesse em facilitar o seu uso futuro com o discurso calcado
no progresso e na produção de riqueza e oportunidade para a população. O contraponto se faz
por aqueles que defender o uso mais racional e sustentável.
8.3.2. As estratégias para a tomada de decisão
Para entender como funciona a dinâmica do comitês para a tomada de decisão, perguntou-se:
Quais propostas você defende? Como você estabelece as estratégias para defender suas
pautas?
A defesa das propostas convergem no entendimento do uso racional da água, mesmo que
exista aí uma ambiguidade. O entendimento daqueles que representam o capital privado
diverge dos que defendem a população que usa diretamente a água do rio, sobretudo nas áreas
rurais, bem como das pessoas que residem nas cidades e são abastecidas diretamente pelo
serviço de água fornecido pelo Estado.
As preocupações quanto aos vários usos da água e a necessidade de se pensar a gestão a partir
da ideia de convivência com o semiárido é presente nos discursos. Entretanto, nas falas ficam
claras as tensões, os conflitos e as estratégias para a tomada de decisão. O clientelismo e o uso
do Estado para interesses privados tão presentes na gestão estatal não cessam a sua existência
na gestão a partir da bacia hidrográfica.
As tensões afloram quando os usos sobre a água divergem. Para Oswaldo:
o viés econômico quase sempre tem um peso maior que o ambiental.
E Alceu reitera:
somos atropelados pelos interesses entre os dois segmentos, usuários e poder
público.
Luiz sintetiza o processo:
tem muita força e o eixo irrigado295. Ele não liga com o comitê não. Só quando
tem alguma problemática. Vamos supor aqui, a Empresa tem mais uns 15 mil, 14
mil hectares, então eles tiram muita água, é mais água que a transposição para
295Aqui ele faz menção ao grupo que defende os interesses dos grandes irrigantes que fazem uso da água. O
agronegócio é presente e tem muita força política, principalmente, no trecho que compreende os Municípios de
Petrolina, Lagoa Grande, Santa Maria da Boa Vista, Orocó, Cabrobó e Belém do São Francisco em Pernambuco.
189
Campina Grande296, mas não paga quase nada por essa água. Então eles pagam
nos últimos anos menos de 15 mil reais por ano. Enquanto Juazeiro, o SAAE297
pagou 480 mil. E parece que a Empresa gasta mais água que a própria cidade de
Juazeiro. Ou de Petrolina. Então, tem esses interesses é muito difícil o comitê
conseguir enquadrar.
Os problemas da gestão autoritária do Estado e o uso dos comitês para atender fins privados é
evocado em várias falas. Há problemas no represamento da água para a produção de energia,
bem como a ausência de preocupação com o rio e com as pessoas que possuem menor
influência política. Luiz afirma que:
um senador que não tem a água ele promete mais irrigação... têm essas
dificuldades, e porque isso? Têm essas divergências dentro do comitê, mas
também tem grupos que querem usar comitê para os interesses deles. Então, se a
ANA... eu pensei que o comitê fosse nosso ajudante para ajudar uma ou outra
coisa, assim penso também a CHESF e a CODEVASF. Aí, essas entidades ainda
não entrou na cabeça que ia fazer parte do comitê, aí mexeu dentro do comitê, aí
eles pensam assim que tem entidade, a CHESF, a CODEVASF ou... então eu
posso usar comitê para escutar as minhas propostas, assim foi sempre a história.
Alceu afirma que:
a disputa é grande, tentamos sempre conscientizar a sociedade, principalmente a
civil a lutarem por seus direitos, pois entendemos que os grandes empresários
estão preocupados com o lucro, são verdadeiros predadores, destroem onde
passam, deixam só a terra nua e sem nutrientes e vão embora a busca de novas
áreas para degradar deixando o povo na miséria e sem condições de
sobrevivência, na totalidade os interesse entre usuários e poder público andam
juntos com a tal utopia de progresso destruidor onde massacra os menos
favorecidos, ou seja, as comunidades.
Os temas que mais suscitam discussões são aqueles que tocam diretamente no uso da água
para indústria, produção de energia, outorga e a transposição. Temas como a preservação do
rio, suas nascentes e afluentes não ocupam a mesma proporção de discussão nas reuniões.
Outro tema, não tão candente, surge, como a instalação de Usina Nuclear de Itacuruba (PE),
com deposição de rejeitos na Unidade de Conservação do Raso da Catarina (BA).
Do lado de quem defende o uso da água do rio para fins empresariais, existe a falsa premissa
de que a água que vai para o mar e deve ser utilizada antes de se perder298. Soma-se a isso, a
296Referindo-se ao município de Campina Grande no Estado da Paraíba. 297Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Juazeiro, órgão que gerencia esses serviços para o município. 298 Existe uma crença de quem defende essa ideia de que a água que vai para o oceano foi perdida, uma vez que o
oceano não necessita de mais água. Mesmo que tal pensamento não encontre sustentação acadêmica, é
evidenciada em várias falas de quem defende o uso industrial da água do rio.
190
defesa de que as indústrias pagam pelo seu uso e geram empregos, movimentando a economia
local e regional. Para os defensores, tanto a regulamentação como a cobrança da água servem
para evitar os usos clandestinos. Maria chama atenção que existe uma discussão sobre a
metodologia de cobrança pelo uso da água:
o grupo ele é muito diversificado de membros, alguns defendem que sim, outros
defendem que não concordam, a Empresa em particular... ela não concorda, assim
como toda nossa categoria de irrigantes. A nova metodologia proposta não visa o
atendimento uniforme para todas as categorias usuárias do recurso hídrico.
As estratégias para a tomada de decisão são reflexos da sociedade brasileira e, em especial, os
valores daqueles que vivem no semiárido. Fica claro, seja nas atas, como nas entrevistas, a
força que o poder econômico tem no momento de articular e buscar as decisões favoráveis aos
seus interesses. A resistência a esse movimento tem existido a partir do entendimento da
importância do rio para a atual geração e, sobretudo, às futuras gerações. O modelo de tomada
de decisão permite essa resistência.
8.3.3 Participação cidadã e dos membros no comitê
A participação no comitê é um tema essencialmente sensível, uma vez que esse é um fórum
de discussão e deliberação que necessita da presença efetiva daqueles que deliberam, bem
como daqueles que são direta ou indiretamente impactados pelas ações. Há divergências em
como se avalia a participação das entidades e dos cidadãos nas reuniões do comitê. Nesse
sentido, três perguntas foram feitas para dar voz aos membros do comitês, são elas: Como
você avalia a participação dos cidadãos e cidadãs nas reuniões do comitê? Existe uma
presença significativa? Existem empecilhos para suas presenças e falas?
Para Chico:
muita gente participa. Sempre nas reuniões, nas últimas, por conta dessa mudança
de hábito de trazer pesquisadores, palestrantes, então a gente sempre tem uma
participação significativa da população, a gente sempre consegue encher os
auditórios.
Alceu corrobora afirmando que:
estamos conseguindo mobilizar a sociedade civil, as dificuldades é que, quando
não veem as ações rápidas ficam um pouco desacreditadas, mas conseguindo
dentro dos conflitos marcarem presenças de muitos, outra dificuldade que
observamos é, para reuniões muitas vezes o deslocamento, alimentação e estadias
por não termos dinheiro dificulta, já o poder público e usuários de acordo com
191
seus interesses enchem a casa, quando é de interesse da sociedade, às vezes
dificultam até o Quórum.
Um contraponto é dado por Jorge quando declara que:
a participação não tem a amplitude requerida para uma bacia de mais de 18
milhões de pessoas. A presença não é significativa. Empecilhos para a presença e
poder de voz são de ordem individual e pessoal, além do incentivo e promoção
que o CBHSF sempre faz. Depende sempre da disponibilidade e capacidade das
pessoas. O que se nota é uma ausência dos gestores municipais e estaduais, na
maioria.
Maria faz uma análise conjectural sobre a participação, afirmando que:
Participação cidadã - o cidadão comum, que não é o cidadão usuário direto, eu
acho que deveria sim, não que ele não possa participar, mas infelizmente o que a
gente vê é que não existe, praticamente na maioria das reuniões, eu,
particularmente, pouco vi a participação de cidadão e civis, a sociedade civil em si
participando dessas reuniões. Então não existe uma presença significativa e
acredito que a maioria dos empecilhos para que eles não estejam tendo essa
representatividade civil é... a primeira coisa é a questão da divulgação, as pessoas
não sabem o que é o comitê, não sabem como funciona, quais são os objetivos, o
que é que o comitê defende, quais são suas atribuições, então é... a ignorância de
entender, de ter ciência do comitê, porque muita gente, a maioria das pessoas não
sabem nem o que é um comitê, imagina um comitê da Bacia do São Francisco, e
um outro ponto, os que sabem às vezes não vão por conta do acesso, à questão de
custo, de deslocamento, como as reuniões são em diversos lugares em todo o
trecho da Bacia que vai do Alto ao Baixo, toda reunião muda a cidade sede, então
fica inviável o deslocamento desses cidadãos e cidadãs para participar. Mas eu
acho que às vezes não justifica porque se eu tô no Alto, eu acho que a comunidade
do Alto deveria tá participando. Se eu tô no Submédio São Francisco, eu acho que
a população, o cidadão civil do Submédio São Francisco deveria estar na reunião
quando acontece dentro do trecho. Então eu acho que os principais empecilhos são
esses e que vêm acarretando essa presença não tão significativa que deveria ter.
Chico tem a seguinte análise sobre a participação no comitê:
a gente tá vivendo um processozinho que já mudou muita coisa no país, esse
processo de participação, esse processo de gestão, de governança, de... dar a voz,
eu acho que a gente melhorou muito, a gente conseguiu muita coisa, mas ele não é
um processo fácil de ser implementado, sabe? Você tem que achar as estratégias
pra que essa galera realmente participe, pra que o cidadão, que não deixa de ser o
poder público, porque eu não deixo de ser cidadão porque estou no poder público,
claro que eu... eu vou... às vezes eu sou obrigado a ir com outros olhos que o
prefeito tenha talvez um ponto que ele quer que eu analise, que eu veja, mas eu
não deixo de ser cidadão. E aí, essa... esse processo tem que ter isso, sabe? E
talvez tenha que ser maior né? Porque você vê, Pernambuco tem uma cadeira
titular que mal aparece...
192
Entende-se a complexidade de se lidar com um público tão heterogêneo, uma vez que envolve
cidadãos e cidadãs que vivem em áreas rurais e urbanas, possuem perfis sócio-econômicos e,
em sua maior parte, não foram preparados para esse tipo de fórum. Como discutido no
Capítulo 6, a sociedade civil sem força e capacidade de agir se exemplifica na pouca
participação cidadã nas reuniões da CCR do Submédio São Francisco.
O não conhecimento do que é um comitê e de como ele atua resulta em uma população alheia
às discussões que tocam o seu cotidiano. Isso repercute diretamente na falta de informação e
de foco na hora das cobranças por uma gestão hídrica mais eficiente. É urgente a necessidade
de se buscar uma maior comunicação com a comunidade que é diretamente impactada pelas
ações do comitês.
8.3.4 As tomadas de decisão
Os conflitos, normalmente, afloram o processo de tomada de decisão quando cada membro se
prepara para defender os seus interesses. Os conflitos entre os grandes e pequenos usuários se
evidenciam nesses momentos. Todas as demandas dos usuários e dos municípios podem ser
levadas aos comitês, o que não exclui demandas que são de entidades que não são membros
do comitê.
O processo de tomada de decisão foi abordado em dois grupos de perguntas, o primeiro
envolvia os critérios para a tomada de decisão sobre a gestão das águas e o segundo sobre as
decisões tomadas299. Então perguntou-se, inicialmente, As condições naturais de cada
localidade são levadas em consideração para se tomar uma decisão? As percepções sobre cada
localidade são levadas em consideração para se tomar uma decisão? Existem temas
polêmicos? Quais?
Com o que emergiu das respostas, pôde-se organizar em dois blocos de respostas. O primeiro
sobre a outorga da água, tema mais recorrente em todos os entrevistados e o segundo, a
submissão e aprovação de projetos hidroambientais.
299 Aqui perguntou-se: Quais das suas propostas lograram êxito em aprovação? Quais propostas nunca foram
acatadas? A que você atribui as recusas? Você percebe mudanças no perfil das decisões tomadas desde o início
da sua participação? Quais?
Existe uma crença de quem defende essa ideia de que a água que vai para o oceano foi perdida, uma vez que o
oceano não necessita de mais água. Mesmo que tal pensamento não encontre sustentação acadêmica, é
evidenciada em várias falas de quem defende o uso industrial da água do rio.
193
Sobre a tomada de decisão, Alceu alega que:
conseguimos fazer muitas coisas, pelo São Francisco na CCR com a cobrança de
outorgas estamos fazendo a parte políticas como: elaboração de planos
municipais, projetos de proteção de nascentes, recuperação de matas ciliares,
desassoreamentos de alguma região, implantação de uma ETA300 para
comunidade indígena da beira do São Francisco (aldeia Pankará) Itacuruba, dentro
das condições do CBHSF por ter poucos recursos são feitas ações dentro da bacia
com o próprio dinheiro da cobrança.
Dos temas elencados como mais conflitantes, a outorga da água é a mais sensível. Para Jorge:
a atualização da cobrança é a proposta mais relevante e de maior impacto no
CBHSF.
Fred afirma que
nós temos uma arma muito grande na mão que é cortar a outorga da Empresa, eu
quero ver, claro que não é assim né?
Maria, que representa uma empresa que faz uso da água diz que:
a metodologia de cobrança de água, é... a gente tem voz de direito, né? A gente
era citado dentro das pautas das reuniões, mas que a gente quase nunca se
manifestava, então hoje teve uma mudança de perfil de posicionamento tanto por
parte da empresa, quanto por parte dos outros membros da... que compõe o
comitê.
Há, entretanto, dentro do comitê quem defende o aumento da cobrança pelo uso industrial das
águas, bem como aqueles que defendem que esse tipo de uso deixe de existir, uma vez que a
geração de empregos e riqueza não coaduna com os fortes impactos ambientais causados pelo
agronegócio. Está em voga atualmente a interdição de captação da água por um dia na
semana, tem-se um conflito entre os membros do comitê que querem derrubar e os que
querem ampliar essa interdição. Maria explica o processo:
outorga da água - por exemplo, em relação à outorga d’água é a questão do dia do
rio, todas as propostas foram definidas com o comitê em conjunto com a ANA,
que é a agência nacional de águas, que tem o dia do rio que é o dia D, o qual a
gente não faz, nenhum usuário outorgado da ANA poderá fazer uso de captação
de água no rio. Então esse é um dos pontos que a gente precisa discutir bastante
porque é bastante polêmico, que são a favor, que são contra, então quais são as
categorias que são mais prejudicadas, as categorias que são mais beneficiadas,
então é um tema bastante polêmico, além, ainda falando de outorga, a questão da
regularização de muitos usuários que a ANA hoje não tem esse suporte para fazer
fiscalização da Bacia, então tem muitas ligações clandestinas, muitas captações
300ETA é a abreviação para Estação de Tratamento de Água.
194
clandestinas. Isso a gente discute bastante, discute estratégias para que a gente
possa regularizar essas pessoas, esses usuários, para a gente ter um número mais
assertivo do quanto de água que está sendo retirada do rio e o quanto está sendo
devolvida.
O comitê atua na discussão e aprovação de projetos que tocam direta ou indiretamente o uso
das águas do rio. Maria explica que as propostas são as mais variadas possíveis, discute-se
todo o contexto da Bacia do São Francisco, desde a questão social, a questão ambiental, a
questão econômica. Fred reitera essa fala quando diz que
o comitê investe, acho que você já deve ter visto também, investe muito nas ações
que são hidroambientais e ações realmente técnicas de preservação e conservação
da Bacia e ele teve um grande investimento em relação com os planos municipais
de saneamento básico. Todos os municípios que estão ali na Bacia estão... os que
já não tem né, estão em processo de construção com recurso do comitê. Então essa
é uma ação que a gente defende muito, essa coisa de construção do processo de
conservação através desses planos, de medidas estruturais que tão ali pra gente
defender.
Sobre os recursos disponíveis para viabilizar os projetos, Fred explica:
a gente tem os recursos de outorgas, as coisas estão começando a ser
implementadas, o comitê sobrevive, ele vive dessas outorgas né, então assim, a
gente cobra o... município paga uma outorga à ANA né, que é que faz o
gerenciamento disso e tem uma parte pra movimentar essas ações dentro do
comitê. [...]. Então a gente abre pra projetos hidroambientais [...], tem um recurso
lá, 1 milhão, então a gente vai dividir pra Bacia inteira, então são quatro regiões,
são 250 mil pra cada uma. Certo? quando começa a escrever, começa a apresentar,
aí você tem projeto de 100 mil e tem projeto de 1 milhão, 1 milhão e 100, né? ai o
corpo técnico, as universidades, a Univasf, a UPE301 [...]. O orçamento é dividido
por quatro, mas se pergunta se essa divisão atente os interesses, uma vez que a
divisão que leva em conta uma regionalização por características regionais não
necessariamente atende os interesses dos mais impactados ou necessitados nesse
recurso. A demanda é bem maior que a oferta orçamentária.
As estratégias de negociação para se chegar um acordo incluem não só os debates durante as
reuniões como as conversas de bastidores. Chico alega que
muitas vezes a gente tá ali e a fala é fria302, muitas vezes ele tá escutando, outras
vezes não, às vezes ele tá presente, às vezes não, então é importante que a gente
mostre, fazer toda aquela, toda aquela política, a boa política na verdade, mostrar
como aquela proposta, aquela ação ela vai ser importante pra a Bacia de forma
geral.
301 Universidade de Pernambuco. Trata-se de uma universidade estadual que possui campi em diversos
municípios do Estado, incluindo Petrolina, Salgueiro e Serra Talhada que ficam no semiárido. 302 Expressão que exprime a ideia de uma fala formal que nem sempre logra êxito no convencimento dos demais
membros do comitê.
195
Um ponto destacado por vários membros é a importância da participação da universidade no
suporte técnico e reflexivo sobre a tomada de decisão na gestão. Desde a chegada da
Univasf303 ao comitê, ampliou-se a dimensão da conservação do rio e das pessoas que mais
precisam dele. Anteriormente, isso ficava a cargo das OSC's. A reputação e o respeito que a
academia tem, fez diferença no encaminhamento das discussões. Chico exemplifica
afirmando que
essa mudança de cultura, de trazer a universidade para os processos que possam
sair de uma forma mais adequada às diretrizes do comitê, também a universidade
além de orientar, trazer novas propostas pra que a gente possa seguir e tudo isso
tem sido muito válido dentro do comitê, dentro da nossa coordenação. É tanto que
a gente na última, a gente apresentou 22 projetos, enquanto outras coordenações
no máximo apresentaram 06. Foi uma mudança bem significativa e que a gente tá
aos poucos conquistando.
Sobre o planejamento de ações preventivas, Jorge explica que:
não existe plano de contingência para as estiagens. O setor elétrico só implantou o
de cheias e inundações. Ficamos isso na atualização do plano como ideia
estratégica, mas não existe alerta sobre secas.
Quando perguntados sobre as decisões tomadas, as respostas foram convergentes. Dos
entrevistados, apenas dois propuseram projetos e, ambos, lograram êxito em suas aprovações.
São projetos ligados ao uso da água em pequenas comunidades, mas não entraram em
detalhes sobre os objetivos e impactos.
A outorga da água é entendida como um exercício de poder por aqueles que veem a
possibilidade de revogar ou modificar outorgas existentes. Isso se torna evidente nas falas
daqueles que buscam uma relação de maior convivência com o rio o não o vê de maneira
utilitarista. Por outro lado, as empresas que captam a água do rio para as suas atividades
buscam reforçar o discurso de rever ou cessar a cobrança pela água.
A receita que financia os projetos hidroambentais são oriundas das outorgas da água. Destarte,
tem-se, por parte daqueles que defendem o fim das outorgas das empresas, um desafio que é
lutar contra a origem da receita que financia projetos que podem beneficiar a população. Esse
engendramento é intencional e torna a gestão ainda mais complexa.
303 Universidade Federal do Vale do São Francisco, uma universidade pública que possui campi em Pernambuco,
Bahia e Piauí.
196
8.3.5 O Estado de Pernambuco na gestão da CCR do submédio São Francisco
No quinto bloco de perguntas304, tinha-se: Como você avalia a gestão da CBHSF
especificamente para o Estado de Pernambuco?
Essa pergunta gerou fortes críticas e evidenciou a imaturidade do processo de gestão hídrica
para o semiárido de Pernambuco, mesmo quando membros que são desse estado trouxeram
falas mais amenas.
Geraldo diz que a participação de Pernambuco é
péssima, passou a ter um empenho e desempenho melhor com a entrada da
Univasf no Comitê.
Jorge afirma que:
A gestão de Pernambuco, via APAC305 é sofrível, pois o estado que muito precisa
da água do SF, não coopera na gestão compartilhada a partir dos CONSUS. A
gestão pernambucana é fraca.
Divergindo de ambos, Alceu defende que:
Pernambuco esta recebendo bons projetos, como agora que entregamos uma
adutora e uma estação de tratamento na comunidade indígena Pankará na cidade
de Itacuruba306 que vai beneficiar mais de mil famílias tanto para o consumo
humano, quanto para a irrigação sustentável.
A fala mais ponderada vem de Chico ao explicar que:
a gente precisa de uma melhora em relação ao governo de Pernambuco de uma
forma geral. A preocupação hoje com o abastecimento passou a frente dos demais,
porque a gente tem uma situação de crise hídrica bastante agravante,
principalmente no Agreste do Estado, mas a gente avançou bastante, o governo de
Pernambuco conseguiu avançar, trazer projetos pra retirar água do rio São
Francisco pra transposição, de uma forma racional, sem colocar em limos, que a
gente vai ter água não só em superfície, já que os rios estão secos, há um
indicativo de que a água... a água do lençol freático dos subterrâneos das nossas
terras também estão escassas. Além de você alimentar o rio, a água de superfície
está alimentando a água ali superficial. E a gente tá trazendo a água, o governo de
Pernambuco está trazendo água através de adutoras, nossa perda com evaporação,
por infiltração, as perdas, furtos são bem menores e são mais controladas. Então,
ele avançou bastante nessa área de abastecimento humano, mas é preciso avançar
304 As demais perguntas são: Como você avalia a gestão a partir das bacias hidrográficas? Como você avalia a
gestão da CBHSF especificamente para o Estado de Pernambuco? Você sugere ajustes no modelo de gestão
objetivando um processo mais eficiente para a tomada de decisão? Quais? O que seria uma gestão ideal a partir
dos comitês de bacias hidrográficas? 305Agência Pernambucana de Água e Clima. 306 Essa comunidade indígena localiza-se no Município de Itacuruba no semiárido de Pernambuco.
197
agora nas outras áreas, que são as áreas de irrigação e também recuperação das
bacias dos demais afluentes do rio São Francisco.
Dos nove entrevistados, três ocupam postos de instituições de Pernambuco. Os demais estão
ligados à Bahia. Para além do que foi apresentado como avaliação de cada membro da gestão
em Pernambuco, percebe-se a pouca participação das instituições que representam o estado.
Na maior parte das vezes, os representantes estão ausentes das reuniões.
8.3.6 Avaliação da gestão a partir da bacia hidrográfica
Certamente, há convergência na avaliação da gestão da água pela bacia hidrográfica.
Perguntou-se: Como você avalia a gestão a partir das bacias hidrográficas? Você sugere
ajustes no modelo de gestão objetivando um processo mais eficiente para a tomada de
decisão? Quais? O que seria uma gestão ideal a partir dos comitês de bacias hidrográficas?
Para Oswaldo ainda:
é necessário ampliar participação, criar comitês de micro bacias, açudes,
mananciais espalhados pelo estado.
Essa ideia vem sendo colocada em prática com esforços nesse sentido.
Para Luiz:
o comitê ainda funciona muito separado da sociedade. Isso depende também
porque o submédio não é organizado, é difícil organizar a sociedade pra
participar. Nós temos no comitê uma parte de comunicação, e aqui também nessa
parte de comunicação, se terceiriza coisas.
Geraldo, ressalva que:
o governo que acha que Comitê é o próprio governo, não entende que os membros
do governo que compõe o Comitê são membros como qualquer um da sociedade
civil. Comitê não é governo, não é ONG, não é associação, é um ente de estado e
precisa ser visto assim.
O processo de gestão dos recursos hídricos no semiárido a partir das bacias hidrográficas
ainda está em processo de amadurecimento. Na prática, esses objetivos ainda não foram,
plenamente, alcançados, mas caminham para o seu aperfeiçoamento. Por fim:
a agenda da água precisa ocupar as políticas públicas dos municípios, estados e da
União, na medida em que se tem a consciência iniludível de que a água é mais
importante, para se ter saúde, educação, segurança e transporte (Jorge).
198
Nem todos os entrevistados responderam a essas perguntas, mas o que foi dito permite afirmar
que, com ajustes, esse modelo é o ideal.
8.4. As representações territoriais e a governança da água no CBHSF
As representações territoriais ficam claras nas falas dos membros. A diversidade de formação,
histórico e interesses defendidos pelos membros evidenciam isso. Dos nove entrevistados, três
possuem claramente o pensamento do semiárido como uma região problema, não obstante,
dois são defensores dos usos industriais da água do rio. O representante do estado de
Pernambuco, com uma visão mais estatal do rio, o vê como utilitário para a população, nesse
sentido, sua fala segue no caminho do entendimento do semiárido como uma região problema
e o rio precisa servir para atenuar isso. Quatro membros estão ligados aos movimentos da
sociedade civil organizada e, assim, estão alinhados com o pensamento da ideia de
convivência com o semiárido, discutidas no capítulo 7. Esses membros trazem, em suas falas,
o semiárido como representação do passado e dos espaços das memórias e da sustentabilidade
na convivência com o semiárido. Por fim, um dos entrevistados possui a vivência da academia
e do estado ao mesmo tempo, em sua fala, não foi possível claramente identificar quais
representações norteiam a sua visão.
Considera-se que a compreensão das idiossincrasias são fundamentais na elaboração dos
planos de ações e das políticas públicas a serem implementadas numa determinada região. Os
discursos técnicos nos comitês de bacia coadunam com o discurso democrático das OSC's. No
caso específico brasileiro, o Estado necessita estar sempre a serviço do desenvolvimento do
país. Entender isso é contribuir, sobremaneira, ao processo de governança da água a partir da
gestão dos comitês de bacias, em geral e do CBHSF, em particular.
É preciso mesmo entender os avanços e, consequentemente, fazer os ajustes necessários em
direção a um processo mais democrático e descentralizado do que aquele vivenciado,
principalmente, no século XX. Espera-se que o atual governo, bem como os vindouros deem o
suporte necessário para a ampliação e consolidação da gestão a partir das bacias hidrográficas.
199
Capítulo 9 - Lições para uma governança hídrica sustentável no semiárido de
Pernambuco
É particularmente desafiador se chegar a esse ponto de discussão de uma tese e tentar discutir
como deveriam ser gerenciados os recursos hídricos da região. Foram construídos se oito
capítulos e fez-se uso de autores da História, Sociologia, Botânica, Economia, Antropologia,
Economia, Pedagogia, Engenharias, Administração, Psicologia, Direito dentre tantas áreas,
mas como especial e fundamental destaque à Geografia, bem como o levantamento de dados e
sua análise. A complexidade da gestão ficou evidente, principalmente numa visão
multiescalar. Mesmo quando se debruça nos meandros das leis e na execução da gestão,
percebe-se uma realidade turva. Em outras palavras, a gestão não é clara e nem simples e isso
acontece, provavelmente, de maneira intencional.
Esse capítulo se propõe a refletir e apontar encaminhamentos que possam contribuir na
construção de um modelo de gestão da água exequível para o semiárido de Pernambuco a
partir das lições que foram tomadas ao longo da pesquisa e elaboração da tese.
Para pensar a gestão das águas e entendê-la na sociedade atual, retoma-se o exposto na
introdução, ou seja, a água é um recurso natural. E como tal, está dentro de uma lógica
econômica que envolve as escalas global, nacional, regional e local e dentro de um país como
o Brasil, a ideia das escalas administrativas que são municipais, estaduais e federal. Sendo um
recurso, a água tem uma dimensão econômica e devido a sua disponibilidade irregular dentro
dos países, ela também ganha uma dimensão geopolítica. Entretanto, a água possui uma
dimensão social, uma vez que seus usos estão em todas as temporalidades e territorialidades
da humanidade. Ela é a base que conecta todas as dimensões das necessidades à existência da
vida.
Pensar a gestão das águas como recurso é tentar vê-la não só como valor de troca, mas como
uso, uma vez que o sistema econômico vigente assim o faz. Isso impacta diretamente no
pensamento de que sociedade quer se ter. Não existe uma dualidade entre a gestão da água e a
sociedade almejada. Outrossim, estão imbricadas dentro do contexto hodierno (Albuquerque
Junior, 2008; Swyngedouw, 2004; Ribeiro, 2008; Jacobi, 2009).
Nesse sentido, pensa-se a água não só como um recurso de interesse privado, mas suas
dimensões sociais também. A água precisa ser discutida e direcionada para atender e garantir
200
os interesses dos múltiplos usos sociais, como define a própria lei 9.433/97. Mas, antes de
tudo, é preciso dar um caráter mais público à água, assim como a soberania para seu controle
permanecer internamente no Brasil (ANA, 2006; Fagundes, 2015).
Por mais que certas medidas sejam defendidas em nome do bem comum, não há garantias e
nem histórico que sustente que uma escolha de ação será melhor para todo mundo. Alguns
grupos sempre se sentirão prejudicados e esse é um dos principais desafios de quem planeja.
O movimento da transformação permanente da sociedade precisa seguir. As estruturas
precisam mudar. E aqui tem-se em pauta que os interesses locais e regionais caminham para
uma melhor gestão para todos.
As discussões propostas até aqui na tese direcionam o pensamento para a corrente
descentralizadora da gestão, somada a um maior poder decisório dos comitês que vem
acontecendo nas últimas duas décadas. Esse processo se amplia e se aprofunda no Brasil, mas
deseja-se uma maior participação popular possibilitando das mais visibilidade aos comitês
com o Estado descentralizando a tomada de decisão.
É ponderável reforçar que as quatro representações territoriais, entendidas aqui como
princípios norteadores da gestão da água, não são descartáveis ou precisam ser apagadas,
outrossim, fazem parte do repertório de conhecimentos acumulados e que estão à disposição
da gestão. É possível inferir um princípio propositivo a partir delas.
Nesse caminho, busca-se elencar as lições e, para isso, faz uso de sete pontos de partida:
Mudança na visão do território semiárido; Entrelaces institucionais entre os órgãos
governamentais, organizações sociais civis e as instituições públicas de ensino;
Institucionalização da gestão hídrica através das leis; consolidação da cultura da antecipação
dos problemas; participação popular na gestão hídrica; a busca de uma economia que não
escasseie ou deprecie os recursos hídricos e descentralizaçaomultiescalar na tomada de
decisão .
9.1. Mudança na visão do território semiárido
O sertão não é um lugar regido pelo ambiente numa perspectiva determinista que o condena à
pobreza, mas sim, uma construção social. Essa premissa norteou a produção da tese. Desde o
201
início da colonização brasileira se utiliza o termo sertão para o interior do Brasil, mas
atualmente, com poucas exceções, apenas o semiárido tem essa designação. Sertão ainda é
comumente utilizado no senso comum, bem como no Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), enquanto semiárido está cada vez mais presente nos demais órgãos
estatais, nas OSC's e instituições de ensino (Silva, 2006; Carvalho, 2012; Arruda, 2000,
Moraes, 2009; Amado, 1995).
Entender essas representações territoriais é fundamental para se planejar a gestão dos recursos
hídricos tendo as preocupações técnicas de engenharia, mas sem abdicar dos conhecimentos e
saberes locais. Isso perpassa também numa mudança da percepção do ambiente que vai,
necessariamente, transformar o modo como é representado (Pereira, 2016). A representação
do semiárido como fronteira na sustentabilidade procura fazer isso. Entretanto, não se pode
esquecer do valor social do rio e da sua importância na cultura (Fagundes, 2015; Jacobi,
2009). As decisões de gestão não podem seguir apenas uma premissa economicista.
Assim, é preciso desconstruir a imagem de um território hostil e da sua população subjugada.
Para isso, é fundamental provocar na população e naqueles que decidem sobre a água a
reflexão da importância do rio da construção histórica, social, cultural e até religiosa. Isso se
faz em fóruns de discussão e instrumentalizando através de debates que envolvam também os
setores de divulgação nas diversas mídias (Albuquerque Junior, 2018; Silva, 2006; Lima,
1999, Freixinho, 2003).
Posto isso, sugere-se a ampliação e aprofundamento do que já vem acontecendo e é
denominado como Educação Contextualizada para o Semiárido (Reis, 2018; Carvalho, 2012),
processo de ensino-aprendizagem que foi citado nos capítulos 5 e 7. Nesse sentido, "o que se
busca é uma escola construtora de conhecimentos que, na interação com as comunidades,
ajudem a transformar o Semiárido. Por isso, uma escola intérprete da realidade local, que
fortaleça a identidade das pessoas e comunidades, que respeite a cultura, preserve o meio
ambiente e promova um desenvolvimento sustentável" (ASA, 2017). A criação e
consolidação de programas de graduação e pós-graduação307 que atuam e estudam o
307 Como o exemplo, tem-se o Programa de Pós-Graduação e Ciência e Tecnologia Ambiental para o Semiárido
da Universidade de Pernambuco (UPE); O Programa de Pós-Graduação em Educação, Cultura e Territórios
Semiáridos da Universidade Estadual da Bahia (UNEB); o Programa de Pós-Graduação em Dinâmicas de
Desenvolvimento do Semiárido da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf); O Programa de
Pós-Graduação em Planejamento e Dinâmicas Territoriais no Semiárido da Universidade Estadual do Rio
202
semiárido têm contribuído com isso. Destarte, o aprofundamento do conhecimento sobre a
região, aliado a sua difusão torna-se um instrumento na mudança da percepção que o
semiárido desperta, seja para seus habitantes, seja para aqueles que não o conhecem. O
conhecimento produzido pelos pesquisadores e professores da área está disponível em
diversas publicações (livros, teses, dissertações e artigos) assim como o saber fazer cotidiano
dos professores em suas práticas pedagógicas diárias.
A Educação Contextualizada para o Semiárido vem sendo vivenciada, principalmente, em
escolas públicas rurais que possuem o suporte das OSC's que atuam diretamente nas
comunidades (ASA, 2017; Moreira Neto e Lira, 2015). Sugere-se, então, que esse
conhecimento chegue também nas escolas urbanas e se amplie na rede privada de
educação308. Esse processo pode envolver os componentes curriculares já existentes309 como
assim se faz com a Educação Ambiental310 para despertar a curiosidade nos indivíduos desde
criança e evitar a construção negativa que a região tem. Essa mudança de visão é fundamental
para a gestão hídrica.
9.2. Entrelaces institucionais entre os órgãos governamentais e as instituições públicas
de ensino
É preciso ir em busca de uma aproximação e adensamento de ações em conjunto entre as
instituições do Estado, sejam seus órgãos e Universidades em conjunto com as OSC's. A
premissa de que os órgãos estatais produzem pesquisas aplicadas, enquanto as universidades
discutem e produzem reflexões precisa ser superada.
Grande do Norte (UERN) eos cursos de graduação e pós-graduação da Universidade Federal Rural do Semi-
árido (UFERSA). 308 No Brasil, em todos os níveis de formação de educação, tem-se a escolas públicas primárias e secundária e o
ensino superior (municipais, estaduais e federais) e uma ampla rede de ensino privado que também atua em
todos os níveis de formação. 309 No Brasil, entende-se por componentes curriculares: Geografia, História, Matemática, Língua Portuguesa, Literatura, Biologia, Química, Física que são vivenciadas nas escolas primárias e secundária (respectivamente,
Ensino Básico e Ensino Médio na denominação brasileira). 310 A Lei 9795/99, em seu Capítulo 1 diz no Art. 1oEntendem-se por educação ambiental os processos por meio
dos quais o indivíduo e a coletividadeconstroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e
competênciasvoltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à
sadiaqualidade de vida e suasustentabilidade e no Art. 2o A educação ambiental é um componente essencial e
permanente da educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades
do processo educativo, em caráter formal e não-formal. Nesse sentido, a Educação Ambiental é orbigatória nas
escolas, embora não seja um componente curricular. Outrossim, um conhecimento transversal em todos eles
(Brasil, 1999).
203
9.2.1. Órgãos estatais e Instituições públicas de ensino
É preciso diminuir o abismo que existe entre as universidades públicas brasileiras, os
institutos de educação e os órgãos que lidam diretamente com a água e sua gestão. Todos são
fomentados pelo estado, mas as relações interinstitucionais são tímidas e imaturas. Os
membros do CBHSF nas entrevistas foram, especialmente, claros em suas exposições sobre a
importância da presença das universidades no entendimento da região, seja do ponto de vista
técnico e da engenharia, como também valorizando as subjetividades e das idiossincrasias.
Isso tem sido fundamental na proposição de ações e tomada de decisão.
No semiárido de Pernambuco, tem-se a COMPESA como órgão estadual; CODEVASF,
CHESF, DNOCS, SUDENE e INSA como órgãos federais. A isso, somam-se as Universidade
Federal Rural de Pernambuco (UFPE) e Universidade Federal do Vale do São Francisco
(Univasf), ambas federais; a Universidade de Pernambuco, uma instituição estadual e o
Instituto Federal do Sertão Pernambucano (IS-Sertão), que possui cursos técnicos e
graduações (bacharelado e licenciaturas). Essas instituições possuem um quadro técnico e
acadêmico com especialistas em diversas áreas que envolvem a gestão, sobretudo, hídrica.
As universidades públicas e os Institutos de educação precisam estar mais próximos dos
fóruns que proporcionam a tomada de decisão. O repertório de conhecimento técnico e
reflexivo precisa se alinhar para servir à sociedade, no processo ininterrupto de aprendizagem.
Isso pode acontecer ao se intensificar as parcerias nas pós-graduações lato sensu e stricto
senso, com pesquisadores transitando entre os órgãos estatais e as instituições públicas de
educação. Para os cursos de graduações ou técnicos, os trabalhos de extensão311 podem ser,
particularmente, importantes despertando o conhecimento nos futuros pesquisadores que
poderão trabalhar na gestão hídrica. Esse processo não exclui, absolutamente, as instituições
estaduais de ensino médio.
311A extensão se define como os trabalhos que envolvem diretamente a comunidade externa às universidades e
institutos de educação. Caracteriza-se por compartilhar os resultados das pesquisas e ensinos com o público
externo, bem como recebendo desse demandas e soluções para a prática docentes. Nesse sentido, são trabalhos
de duas vias. Nas últimas décadas os trabalhos extensionistas estão recebendo mais atenção dos docentes e
discentes.
204
9.2.2. Entrelaces institucionais - Órgãos estatais e OSC's
No capítulo 7, analisou-se a relação entre Estado e OSC's. A lição que essa discussão deixa é
a rapidez e eficiência na gestão hídrica quando há uma aproximação entre os órgãos estatais,
principalmente os ministérios, e a sociedade civil organizada. Os programas e projetos
desenvolvidos são de baixo custo, mas de forte impacto na vida das pessoas. As OSC's são
importantes vetores no processo de resgate, sistematização, valorização e difusão dos saberes
locais (ASA, 2017; Castro, 2012; Silva, 2006, 2007; Cirillo, 2008, Santos, 2018).
As estratégias, metodologias e instrumentos de aproximação com a população já existem, se
faz necessários fomentá-las e fortalecê-las. O conhecimento popular é relevante e por décadas
esteve alijado do processo da gestão hídrica. Isso pode ser feito, tanto com a ajuda do Estado
como vinha acontecendo mais efetivamente até 2016 e com a aproximação da população,
principalmente aquela que não está efetivamente organizada, mas se interessa.
9.2.3. Entrelaces institucionais - OSC's e Instituições públicas de ensino
Nas últimas duas décadas, a aproximação entre as universidades públicas e os institutos de
educação com as comunidades é notório. Os trabalhos de pesquisas e, principalmente, de
extensão demandados pela sociedade têm encontrado uma academia cada vez mais aberta ao
diálogo propositivo. O processo de interiorização das universidades públicas e institutos
contribuiu sobremaneira e, aos poucos, foram buscando a equivalência entre o que se ensina e
o que se aprende a partir dos saberes locais.
Nesse sentido, é urgente o incentivo de parcerias entre as universidades públicas, estaduais e
federais, os institutos de educação e a sociedade civil organizada. A relação entre a academia
e as experiências das OSC's, ao serem intensificadas e estimuladas proporcionam um
amálgama de conhecimento sobre o território e os saberes locais que podem ser aprofundados,
validados cientificamente e difundidos e trabalhos de conclusão de cursos, dissertações, teses,
artigos, livros, cartilha etc.
205
9.2.4. Órgãos estatais, OSC's e as Instituições públicas de ensino
As relações apresentadas entre Órgãos estatais-OSC, OSC-Instituições públicas de ensino e
Órgãos estatais-Instituições públicas de ensino não são excludentes, pelo contrário, podem ser
inclusivos, participativos e convergirem no processo de produção, validação e difusão do
conhecimento. Isso já acontece em vários casos, mas em projetos e programas que são finitos.
Uma vez que se encerram, não se garante a continuidade ou que as experiências vivenciadas
sirvam como laboratório para trabalhos vindouros.
As OSC's possuem a competência de capilarização pelo território que as credenciam a
estarem mais próximas no cotidiano da população (ASA, 2007; Silva, 2006; 2018, Reis,
2018). A isso, somam-se os corpos docente, discente e técnico das universidades e institutos
de educação que são, em sua maioria, oriundos das comunidades e cidades circunvizinhas.
Por fim, os órgãos estatais seguem as agendas governamentais e são geridos por leis que
determinam suas competências e abrangências.
Chama-se atenção que a discussão do Capítulo 7 e no Capítulo 9 já apontam a educação
contextualizada. Esse processo é fundamental e precisa ser fomentado. É preciso construir,
reconstruir e fortalecer os laços institucionais. Caminha-se para a necessidade de um fórum
perene para que se tenha uma aproximação e, por conseguinte, a consolidação das parcerias
multinstitucionais. Os aprendizados e experiências serão, assim, registrados e constantemente
aperfeiçoados.
Fonte : elaboração própria
Figura 28 - Esquema com as relações institucionais
206
9.3. Institucionalizar da gestão hídrica através das leis
As leis e decretos que regem a gestão da água no Brasil são, comumente, nacionais como
discutido no Capítulo 6. As experiências vivenciadas ao longo das décadas em que se tiveram
avanços e retrocessos no processo de gestão descentralizado da água estão à disposição para
que se possa refletir sobre o que foi vivenciado para o constante aprimoramento (MMA, 2005,
2006, 2010; Ribeiro, 2008; Almeida, 2008; ANA, 2005).
Seguindo na mesma premissa, é fundamental simplificar a gestão hídrica através das leis. A
sobreposição de entes federativos, tais como município, estado e união, no mesmo território
deixa a gestão pouco fluída e confusa. Aí está o desafio de se pensar institucionalmente em
parceria com as OCS's e população em busca da construção de leis e decretos que minimizem
essa sobreposição, descentralize a gestão e a deixe mais transparente.
As políticas públicas que funcionam precisam ser asseguradas e aperfeiçoadas. Nesse sentido,
para dar mais segurança aos avanços em direção a uma gestão mais descentralizada e
eficiente, é fundamental que elas estejam como leis para que se tornem políticas de Estado,
não ficando suscetíveis às mudanças de governos. Recentemente, ocorreram profundas
mudanças na gestão do país. Em 2016312, uma reorganização na gestão pública que extinguiu
os ministérios da Cultura; das Comunicações; do Desenvolvimento Agrário e das Mulheres;
da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos (Agência Senado, 2016) e em 2019 com a
extinção dos ministérios da Integração Nacional; do Trabalho e o do Desenvolvimento
Social313. Essa mudanças afetaram, sensivelmente, as populações mais vulneráveis, como as
do semiárido, e impactaram na redução e extinção de programas sociais em escala local e
regional. Os resultados ainda estão em análise por pesquisadores por serem muito recentes.
Para elaboração das leis que remetem aos usos da água, é primordial escutar representantes
das diversas regiões brasileiros, não só em sua escala macro (Nordeste, Norte, Centro-Oeste,
Sul e Sudeste), mas das mesorregiões e, possivelmente, das microrregiões dos estados. A
disponibilidade dos usos das águas requer um entendimento que possa ir além da escala
nacional e abarcar as idiossincrasias. Como apontado no inicio desse capítulo, é preciso ver a
água não só como valor de troca, mas como uso.
312 Isso aconteceu na gestão do ex-Presidente Michel Temer, quando assumiu a presidência deixada por Dilma
Rousself em 2016 após seu impcheament. 313 Essas extinções fazem parte da gestão do atual Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, eleito em 2018 e
empossado em 01 de janeiro de 2019.
207
Nesse sentido, sugere-se que se crie e promulgue uma lei nacional da convivência com o
semiárido, assim como já o fez os Estados de Pernambuco e Bahia; que se fomente, a partir de
dotação orçamentária prevista em lei, os programas que envolvam as tecnologias e inovações
sociais e, por fim, que delegue mais poder decisório aos comitês de bacias. Nesse sentido,
caminha-se para uma diminuição do estado e fortalecimento das atuação civil sobre o
território (Araújo, 2000; Castro, 2012).
Outro encaminhamento possível é a criação e promulgação de leis que beneficiem aos
produtores, sejam grandes ou pequenos, que façam uso racional da água, assim como penalize
aqueles que a desperdiçam. Esse uso racional envolve, além da quantidade da água, o seu
manejo com agrotóxicos e demais substâncias químicas oriundas dos usos industriais.
9.4. Consolidar a cultura da antecipação dos problemas
Uma das coisas que mais chama atenção quando se fala de países desenvolvidos que
convivem com catástrofes naturais recorrentes como terremotos e tsunamis, bem como países
que vivem com mudanças de tempo bruscas, tais como frio e calor intenso, é a cultura da
antecipação dos problemas. Eles estão preparados para esses eventos, bem como buscam
minimizar seus impactos econômicos, ambientais, sociais. A isso, somam-se o processo de
constante aperfeiçoamento nos instrumentos de previsão e recuperação dos impactos.
A seca, como visto no Capítulo 2, pode ser prevista com a antecedência de meses e o
semiárido vai, necessariamente, passar por secas periódicas. Os períodos de estiagem não
podem ser encarados como tragédias ou fatalidades, uma vez que se têm décadas de
conhecimento acumulado. A seca se materializa de formas diferentes a depender das
localidades. Destarte, estar preparado para a sua chegada é imperativo.
As técnicas de previsão de seca estão cada vez mais acuradas e se aperfeiçoando. Órgãos
estatais como o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e a Agência Pernambucana
de Águas e Clima (APAC), no caso específico de Pernambuco, já desenvolvem trabalhos
importantes nas previsões. Há pesquisas nas universidades públicas que monitoram e aferem
diariamente os indicativos climatológicos. Em 2016, foi construído o "Manual de indicadores
e índices de sequía" para a América do Sul. As OSC's desenvolvem trabalhos nesse sentido,
208
como apontado no Capítulo 7. Entretanto, o Estado ainda não estruturou e consolidou a
cultura de antecipação dos impactos sociais e econômicos oriundos das secas.
Essa prática não pode ser vista apenas para o meio rural. As cidades, cada vez maiores e mais
importantes economicamente no semiárido, necessitam também entrar nesse processo e
estarem mais próximas de ambientes salubres para a sua população. O planejamento urbano
se faz imprescindível e as urbes precisam ter suas configurações e construções de acordo com
o ambiente. Assim, demanda-se menos água, seja no consumo humano, seja na produção de
energia (com apontado no Capítulo 6). Para essa situação, os planos diretores de cada
Município precisam estar em sintonia entre si e com a discussão ambiental na gestão hídrica
numa escala regional e nacional.
Nesse sentido, é necessária a mudança estrutural e comportamental quanto aos períodos de
seca. Entendo-a como climática e inevitável, porém mantendo um estado perene de adaptação,
entendendo as idiossincrasias e aperfeiçoamento os instrumentos de antecipação dos
problemas (Silva, 2007; 2018). Os saberes locais precisam estar em evidência nesse processo.
Podem-se construir comitês populares para antecipação dos impactos, bem como ações
emergenciais em tempos de crises pensadas a partir dos locais. Esse engendramento pode ser
feito em nível municipal e regional, podendo estar dentro das agendas dos comitês de bacias
hidrográficas também.
A divulgação do comitê, das suas discussões e encaminhamentos precisam encontrar um
veículo de difusão de informação que seja eficiente. Assim, as mídias em seus diversos
formatos precisam dar vazão a isso.
9.5. Participação popular na gestão hídrica
A governança necessita de tempo para se enraizar nas práticas cotidianas. Precisa ser
vivenciada e avaliada constantemente para que o aperfeiçoamento seja contínuo e os
resultados eficazes. As experiências precisam ser estudadas uma a uma para se entender os
processos e seus resultados. É fundamental democratizar o acesso a água e, ao mesmo tempo,
preparar a população para a sua gestão.
209
Quando se fala de governança da água, a população não entende exatamente o que é; como
funciona e de quem é a responsabilidade. Existe o desentendimento sobre as jurisdições e a
atuação civil. As atas das plenárias do CBHSF e as entrevistas com seus membros deixaram
isso claro. A população não compreende o léxico e tão pouco é encorajada a participar. Aqui
não se trata exatamente da sociedade civil organizada, uma vez que essa já se faz presente e
desenvolve trabalhos relevantes. Trata-se daqueles que nem sempre se sentiram contemplados
porque as políticas estavam voltadas ao território e às elites como as ações hidráulicas, e não
às pessoas e suas necessidades.
O estímulo à participação popular no monitoramento e aperfeiçoamento da gestão hídrica
perpassa pela criação e estímulo de mecanismos que esclareçam como deve ser o processo de
gestão hídrica e qual o papel de cada ator. Isso pode ser compartilhado entre as OSC's e
Universidades públicas, inicialmente, porém com a anuência do Estado. Faz-se necessário
caminhar para o incentivo das inovações de técnicas e instrumentos que dêem conta do
aprimoramento da gestão e a população é parte desse processo.
Nesse caminho, sugere-se a aproximação dos que gerem os recursos com a população através
das associações de moradores de bairros e comunidade. Esses fóruns se caracterizam como
uma OSC e congregam cidadãos e cidadãs que têm interesse no processo de gestão e tomada
de decisão.
Outro caminho possível é a aproximação das escolas públicas e privadas e dos membros que
trabalham com a gestão hídrica. Sugere-se, visitas técnicas às instituições que lidam
diretamente com a gestão hídrica e as experiências concretas de suas ações; visitas às
comunidades rurais que desenvolvem as tecnologias ligadas à convivência com o semiárido e,
por fim, receber nas escolas os membros do estado, das OSC's e dos comitês de bacias em
trabalhos formativos de aproximação entre a população e a gestão. Isso pode ser feito dentro
da programação anual das atividades escolares.
9.6. Economia que não escasseie ou deprecie os recursos hídricos
Talvez o item mais difícil para se propor o debate. Não se pode continuar a olhar o semiárido
como uma região apenas rural ou, o que ainda é mais preocupante, a ideia de uma vocação
210
agrária. Essa discussão abre espaço para o agronegócio que utiliza água em grandes
quantidades com baixo custo, como discutido no Capítulo 8.
A heterogênea estrutura social, econômica, política e social exige uma articulação mais
próxima e perene de cooperação em busca de políticas de desenvolvimento regional. Entende-
se como fundamental a promoção da formação de reflexão, de inovação e, principalmente,
que o acúmulo de experiências seja base do aprendizado para o gerenciamento mais eficiente
dos recursos hídricos da região. As experiências exitosas na gestão hídrica precisam receber
visibilidade para que cheguem ao maior público possível, fomentando a produção do
conhecimento e a discussão sobre a água a partir de um arcabouço acadêmico que valoriza os
saberes locais.
Ao se investir no agronegócio, se faz uso quase irrestrito da água, que é o recurso pouco
abundante, bem como se afeta drasticamente os rios que as cedem. O balanço hídrico é
desnivelado quando, ao exportar os frutos, exporta-se também a água utilizada na sua
produção.
Outrossim, é necessário investir em culturas adaptadas aos ecossistemas como as plantas
nativas e a criação de animais de pequeno porte. Essas culturas não são tão lucrativas, por
isso, normalmente, ficam destinadas à pequena produção familiar.
Assim como o Estado beneficia o agronegócio com subsídios fiscais, a produção adaptada à
região deve seguir o mesmo caminho. Os atuais empréstimos que os produtores fazem podem
ser expandidos e melhorados. Entretanto, a estrutura de produção e seu escoamento são
fundamentais no incentivo que pode ser expressivo para essas culturas.
9.7.Descentralizaçao multiescalar na tomada de decisão
É fundamental a reflexão sobre qual foi e qual é o tamanho do Estado no Brasil e qual
tamanho ele deveria ter urgente a necessidade de se repensar a estrutura burocrática brasileira.
Permanecendo como estão, as representações territoriais podem se modificar, mas os
resultados tendem a ser o mesmo. Nesse sentido, percebe-se um avanço na maneira de se
tomar decisões no país. O século atual deu lugar à criação de órgãos estatais federais que
promovem ações locais com a sociedade (INSA, 2011, 2014), bem como um estreitamento
211
das relações entre o governo federal e os movimentos sociais (ASA, 2017; Silva, 2007). Isso
não pode se perder.
As ações mais eficientes de convívio entre população com ambiente se dá quando se busca
uma relação cooperativa entre quem toma a decisão com quem a recebe (Carvalho, 2012,
Reis, 2018). Pensar os recursos hídricos nacionalmente não é só uma tarefa a ser evitada por
não evidenciar a realidade como só trará distorções ainda maiores nos seus usos.
Nesse sentido, fortalecer os comitês de bacias e intensificar as parcerias com as OSC's são
fundamentais. A criação de conselhos e a descentralização na tomada de decisão constitui um
passo positivo em busca da democratização na elaboração das políticas públicas e,
consequentemente, de uma governança mais eficiente, uma vez que a descentralização de
recursos constitui um instrumento legal e formal, representando um instrumento para garantir
o funcionamento da democracia (Abong, 2019; Castro, 2012; Abers e Jorge, 2005).
Para os comitês, sugere-se que seus membros tenham uma contrapartida de recursos
financeiros, bem como mais tempo para se dedicarem ao estudo do funcionamento e
possibilidades de gestão através dos comitês. Ainda sobre o tema, é preciso que os comitês
possuam mais autonomia e respaldo do Estado no encaminhamento e tomada de decisão.
A visão multiescalar precisa se evidenciar na gestão, porém dentro do aparato legal e das
competências dos órgãos estatais e de representação civil. Então propõe-se atuações que não
se sobreponham e facilitem o entendimento da população entender a quem compete cada
ação.
Assim, a escala local precisa ter a atuação das OSC's e dos comitês, uma vez que esses
possuem as ferramentas de aproximação de diálogo com os usuários finais da água. A
participação das instituições de ensino e os órgãos estatais podem dar o suporte técnico e
reflexivo. A escala municipal tem nas agências de água como seu principal agente, no caso
específico de Pernambuco, a COMPESA que precisa se ocupar do abastecimento e
saneamento básico das zonas rurais e urbanas. Para a escala regional sugere-se a atuação dos
comitês e subcomitês de bacias em ação com os órgãos federais, tais como CODEVASF,
CHESF, DNOCS, SUDENE e INSA nas ações que são, inicialmente, demandadas pelos
membros dos comitês, as agências governamentais precisam se adequar à agenda das
212
sociedades. Para a escala estadual, mantém-se os órgãos de cada estado, no caso de
Pernambuco, além da COMPESA, tem-se a Agência Pernambucana de Águas e Clima
(APAC)314 e a Agência Estadual de Meio Ambiente (CPRH315), entretanto, eles precisam
estar mais próximos e apresentar claramente às suas linhas de atuação. Por fim, em escala
nacional, tem-se os ministérios que são vinculados ao governo federal, aponta-se que sua
atuação deva estar ligada a promoção das relações institucionais nas diversas escalas e na
busca da construção e promulgação das leis apontadas na seção 9.3 do presente capítulo.
Fonte : elaboração própria.
Figura 29 - Esquema com as multiescalas de atuação dos atores na gestão hídrica em
9.8. À guisa de conclusão
Pensar regionalmente é uma tarefa difícil mesmo em países menores, o que não é o caso do
Brasil. A gestão dos recursos hídricos exige a participação e negociação entre os diferentes
sujeitos locais, regionais e nacionais. É necessário pensar que a essa articulação local é
importante, mas não suficiente, sendo necessário extrapolá-la. As discussões sobre a gestão da
314 A APAC é responsável por Executar a Política Estadual de Recursos Hídricos, planejar e disciplinar os usos
múltiplos da água em âmbito estadual, realizar monitoramento hidrometeorológico e previsões de tempo e clima
no Estado como estabelece a Lei N. 14.028 de 26 de março de 2010 (APAC, 2019). 315 Inicialmente se chamava Companhia Pernambucana de Controle da Poluição Ambiental e de Administração
de Recursos Hídricos. Mudou algumas vezes de nome até chegar à Agência Estadual de Meio Ambiente, mas
manteve a sigla inicial. A Agência é detentora de poder de polícia administrativa, atuando através da gestão dos
recursos ambientais e sobre as atividades e os empreendimentos utilizadores dos recursos naturais considerados
efetiva ou potencialmente poluidores, ou que possam causar, sob qualquer forma, degradação ambiental. Na
conformidade da Lei n° 14.249, de 17 de dezembro de 2010, a CPRH é responsável pela execução da política
estadual de meio ambiente. Tem por finalidade promover a melhoria e garantir a qualidade do meio ambiente no
Estado de Pernambuco, visando ao desenvolvimento sustentável mediante a racionalização do uso dos recursos
ambientais, da preservação e recuperação do meio ambiente e do controle da poluição e da degradação ambiental
(CPRH, 2019)
213
água não se limitam em si própria, mas o ponto de partida para um entendimento de uma
maior participação na governança.
O semiárido vivencia situações que intensificam a fragilidade da gestão hídrica. O intenso
processo de urbanização que demanda água para o abastecimento humano, produção de
energia (em um clima semiárido isso se intensifica), bem como os rios recebem os seus
dejetos. A isso, adiciona-se perda de água devido a infraestrutura hídrica deficitária. Os
serviços de abastecimento de água e saneamento são de responsabilidade dos municípios. Mas
chama-se mais atenção a falta de articulação e ações consistentes na governabilidade de
recursos hídricos e na sustentabilidade ambiental.
Reforça-se o pensamento que apenas a gestão hídrica mais eficiente não garante a melhora na
qualidade de vida das pessoas que moram no semiárido. Pensar assim é reforçar a
representação territorial do semiárido como uma região problema discutida nos Capítulo 5 e
6. Do mesmo modo, é urgente ter o acesso à água de qualidade e em quantidade suficiente
para o consumo humano, dessedentação dos animais e para a produção agrícola; uma
educação que seja gratuita, de qualidade e contextualizada com o ambiente; acesso irrestrito à
saúde pública e aos serviços sociais fundamentais à existência humana.
Mirando para os próximos cem anos, não se pode abdicar do pensamento que a gestão hídrica
não seja um artifício ou um instrumento de privatização da água, porém seguindo os trâmites
legais. Essa discussão aflora no Brasil recentemente e necessitar ser acompanhada, um vez
que as reservas hídricas do país são atrativas às grandes corporações.
É preciso construir uma nova representação territorial para o semiárido que seja inclusiva;
diferente e não desigual do restante do país, bem como se busque a sinergia entre a população
e o ambiente.
214
CONCLUSÕES
No Brasil, a atuação estatal é centralizada em nível federal, comanda as ações em nível
regional e ainda normatiza as ações locais. A origem disso remonta à formação da república
brasileira no século XIX que tinha no Estado, o único com poder de pensar e intervir
territorialmente, ideia que perdura até hoje. Isso acarreta em uma população, em sua maioria,
pouco familiarizada com o processo de tomada de decisão e ainda à espera de soluções
tomadas de cima para baixo, enquanto procura sobreviver, em sua maioria, com o poucos
recursos financeiros e tecnológicos, porém com um grande conhecimento do ambiente onde
vivem. Esse conhecimento, nos últimos anos, vem provando ser mais eficiente e eficaz do que
as sistemáticas e dispendiosas ações estatais.
Tendo em mente as especialidades e temporalidades da gestão hídrica no Brasil, percebeu-se
que, no semiárido, foi voltada à manutenção de poder e controle de grupos políticos e
detentores do poder regional, porém fazendo sempre o uso de um discurso de mudança. Essas
práticas tiveram início em fins do século XIX, se fortaleceram no século posterior e ainda
hoje se mantém consolidada.
No Brasil, a experiência federativa não garantiu a democratização da representação política,
nem o atendimento de demandas sociais. A complexa estrutura administrativa para gestão e
atribuições de cada uma das três esferas de poder, que constituem três escalas territoriais
diferenciadas, a nacional, estadual e municipal, também não garantiu a eficiência e a
adequabilidade entre os problemas e os aparatos institucionais para sua administração.
A visão do Estado, a partir das representações material e imaterial do semiárido como uma
região pobre e vitima de seca, sempre apontou para uma organização e normatização do
território, bem como o uso da ciência e da tecnologia como meios de modificação da
realidade. Não obstante, isso gerou uma expectativa de que Estado é o centro da tomada de
decisão na região. Por outro lado, a atuação da sociedade civil organizada ainda é considerada
incipiente e extremamente dependente desse mesmo Estado.
O Estado brasileiro, a partir das representações territoriais construídas sobre o semiárido,
interveio na região com políticas e discursos de modernização e sua integração ao restante do
215
país. Os investimentos estatais foram voltados ao território e não à população, o que causou
um crescimento econômico em alguns pontos da região, notadamente os centros urbanos, sem
promover, necessariamente, uma melhor qualidade de vida para às pessoas.
Não se buscou defender ou atacar as ações estatais institucionais, mas entender os contextos
em que foram produzidas e as representações territoriais tão fortemente utilizadas na gestão
hídrica da região. É necessário contextualizar que as ações implementadas no passado eram
imbuídas em um contexto de ideias de combate à seca, pensamento ligado ao positivismo e a
crença da organização da natureza e sociedade pelo Estado e que a ciência seria suficiente
para dirimir os problemas sociais e econômicos. Olhar o passado com o objetivo de buscar
culpados e vilões é um exercício fácil e inócuo. Entretanto, entender o que foi feito, aprender
com os erros e equívocos e, em seguida, projetar o que vem, parece ser o caminho mais
frutífero nas discussões sobre o tema.
A seca é resultado de uma conjuntura climática. São as condições ambientais construídas nas
últimas eras geológicas. No semiárido há períodos de estiagens que são próprias da sua
condição. A sociedade precisa estar preparada para conviver com as suas particularidades.
Habitar um ambiente com tais características apenas transpondo modelos econômicos de
outras regiões desde o início, é um equívoco.
O que se defende nessa tese é que a gestão dos recursos hídricos no semiárido brasileiro foi
norteada pela representação do território e não pela sua realidade. Inicialmente, as políticas
eram voltadas ao território e não necessariamente para a população. A própria discussão sobre
sustentabilidade só ganha força a partir dos anos setenta do século passado. Ao longo do
tempo, quatro representações territoriais foram construídas e convivem, ora sobrepostas, ora
em conflito.
O sertão vem se consolidando como um objeto de estudo, e, sendo assim, um lugar de
observação, síntese e análise de diversos estudos, que vêm crescendo, seja nas instituições de
ensino ou em organizações não governamentais. Apesar das mudanças nos discursos e
proposições, a perspectiva de combate à seca e aos seus efeitos permanece instalada nos
órgãos governamentais, com menos força.
216
No caso específico do semiárido brasileiro, reconhecidamente uma região com
disponibilidade hídrica diferente das demais regiões, a quantidade de água disponível, bem
como seu armazenamento e uso são fundamentais necessitam de um aprofundamento do seu
conhecimento para a sua gestão. Para isso, o avanço tecnológico, juntamente com uma maior
sensibilidade às questões locais através de uma aproximação maior entre Estado e sociedade
civil organizada seguramente traz uma melhor gestão.
O engendramento multiescalar apresentado, analisado e discutido aqui se mostra ineficiente.
A sobreposição de competência torna a gestão confusa e distante daqueles que mais precisam,
a população. Políticas nacionais, regionais, estaduais e municipais se amontoam num miríade
de discussões e proposições que não atendem o interesse da população.
A governança da água necessita ser aprofundada no Brasil em sua totalidade, mas chama-se
atenção que isso é ainda mais sensível no semiárido, uma região marcada por processos de
decisões autoritários e centralizados. As experiências de gestão do semiárido precisam ser
mais estudadas porque seus equivocos e acertos são fundamentais para ser vista como um
laboratório propositivo para uma agenda futura. A relação entre os diversos aprendizados
acumulados ao longo do tempo precisam estar disponíveis para as demandas presentes e
futuras.
Em que pese a necessidade de utilizar os recursos hídricos para o desenvolvimento do país,
não houve uma simetria na sua gestão quando comparamos as regiões brasileiras que,
obviamente, possuem diferenças enormes quanto a disponibilidade e os usos.
Percebe-se a existência de uma enorme disparidade entre os índices sobre pobreza na região,
apresentados anteriormente na introdução dessa tese, quando comparados às obras que
demandaram bilhões ao longo do tempo e expostas no capítulo 6. É incalculável o que foi
gasto pelo estado na região nas últimas décadas. Porém, há duas questões a serem
consideradas quando se fala de gestão do território implementada pelo estado. As ações
estatais em nível federal foram caracterizadas muito mais como políticas de governo,
pensadas para promover quem o detinha momentaneamente. Por outro lado, as iniciativas
para solução dos problemas não podem ser tratadas apenas como maléficas e mantenedora de
uma situação desfavorável para maior parte da população. É necessário entender que são
produtos de um momento e de um contexto onde as decisões vinham sempre de cima e pouco
217
ou nunca escutavam a população local, que seria, teoricamente, a beneficiada e ainda eram
tomadas a partir de uma visão do litoral ou das regiões Sudestes e Centro-Oeste. Essa
discussão é extremamente necessária.
A mudança na gestão dos recursos hídricos posta em prática desde os anos noventa e
aprofundada na primeira metade deste século como tratados nos capítulos 7 e 8, mesmo sendo
um distanciamento lento e gradual da ideia de mudança do ambiente como norteador de
ações, ainda não foi suficiente.
Espera-se que seja fomentada a discussão no sentido de entender a estrutura do poder estatal e
como este se mantém através das representações construídas historicamente. Se a gestão
brasileira pode ser pensada a partir de uma mudança possível de uma estrutura, então
caminhar nesse sentido parece óbvio. Resta saber se há um interesse para isso, uma vez que a
reforma política que vem sendo debatida no país desde o final dos anos oitenta ainda não foi
devidamente colocada em discussão com a sociedade.
As ideias de desenvolvimento não podem ser entendidas como um mito, tão pouco como a
panaceia para a solução de todos os problemas de uma região, sobretudo quando tratamos do
semiárido brasileiro que se caracteriza como bem urbanuzado, contrastando as representações
do ambiente rural que possui. Não é com facilidade que se aceitará uma nova perspectiva de
ver o semiárido. Afinal, a ideia de convivência baseada na sustentabilidade ainda é muito
recente e mostrou, em vários lugares, uma visível melhora na vida das pessoas. A gestão via
comitê de bacias se mostra como a mais participativa e transparente e se consolida como o
modelo a ser seguido.
O sertão não é um lugar regido pelo ambiente e sim uma construção social. Para cada sertão,
uma identidade; para cada identidade, a necessidade de um estudo que procure se despojar dos
conceitos pré-estabelecidos ou dos preconceitos. O sertão vem se tornando um objeto de
estudo, e, sendo assim, um lugar de observação, síntese e análise de diversos estudos, que
vêm crescendo, seja nas instituições de ensino ou em organizações não governamentais.
Das lições que pode-se se tirar de Scott, uma das mais profundas e ao mesmo tempo óbvia, é a
de que as experiências de gestão anteriores não são aproveitadas em sua plenitude para as
218
ações hodiernas. Regularmente, somos expostos a ideias antigas reificadas de modernas e
panaceia para os problemas estruturais do país.
Mesmo sendo óbvio, ainda assim se afirma que essa tese não pretendeu esgotar o tema e
sequer dará apontará todas as possibilidade de abordagem. Existe claramente uma limitação
de tempo, conhecimento e aprofundamento teórico e metodológico que a datará. Mas entende-
se que isso norteia os trabalhos acadêmicos e fomenta futuras pesquisas. O horizonte reserva
novas abordagens e a busca pela superação de um modelo econômico e, consequentemente,
de gestão dos recursos hídricos. Vislumbra-se um novo pensar homem/natureza sem ser pela
sustentabilidade e sim pela ética
219
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231
ANEXOS
Anexo 1 - MUNICÍPIOS POR MESORREGIÕES E MICRORREGIÃO DO
ESTADO DE PERNAMBUCO
Município Mesorregião Microrregião
Afogados da
Ingazeira
Sertão Vale do Pajeú
Afrânio
São
Francisco
Petrolina
Araripina Sertão Araripina
Arcoverde Sertão Moxotó
Belém de São
Francisco
São
Francisco
Itaparica
Betânia Sertão Moxotó
Bodocó Sertão Araripina
Brejinho Sertão Pajeú
Cabrobó
São
Francisco
Petrolina
Calumbi Sertão Pajeú
Carnaíba Sertão Pajeú
Carnaubeira da
Penha
São
Francisco
Itaparica
Cedro Sertão Salgueiro
Custódia Sertão Moxotó
Dormentes
São
Francisco
Petrolina
Exu Sertão Araripina
Flores Sertão Pajeú
232
Município Mesorregião Microrregião
Floresta
São
Francisco
Itaparica
Granito Sertão Araripina
Ibimirim Sertão Moxotó
Iguaraci Sertão Pajeú
Inajá Sertão Moxotó
Ingazeira Sertão Pajeú
Ipubi Sertão Araripina
Itacuruba
São
Francisco
Itaparica
Itapetim Sertão Pajeú
Jatobá
São
Francisco
Itaparica
Lagoa Grande
São
Francisco
Petrolina
Manari Sertão Moxotó
Mirandiba Sertão Salgueiro
Moreilândia Sertão Araripina
Orocó
São
Francisco
Petrolina
Ouricuri Sertão Araripina
Parnamirim Sertão Salgueiro
Petrolândia
São
Francisco
Itaparica
Petrolina
São
Francisco
Petrolina
Quixaba Sertão Pajeú
233
Município Mesorregião Microrregião
Salgueiro Sertão Salgueiro
Santa Cruz Sertão Araripina
Santa Cruz da
Baixa Verde
Sertão Pajeú
Santa Filomena Sertão Araripina
Santa Maria da
Boa Vista
São
Francisco
Petrolina
Santa Terezinha Sertão Pajeú
São José do
Belmonte
Sertão Salgueiro
São José do
Egito
Sertão Pajeú
Serra Talhada Sertão Pajeú
Serrita Sertão Salgueiro
Sertânia Sertão Moxotó
Solidão Sertão Pajeú
Tabira Sertão Pajeú
Tacaratu
São
Francisco
Itaparica
Terra Nova
São
Francisco
Petrolina
Trindade Sertão Araripina
Triunfo Sertão Pajeú
Tuparetama Sertão Pajeú
Verdejante Sertão Salgueiro
234
Anexo 2 - PARTICIPANTES DAS REUNIÕES DO CBHSF- ATAS
DAS PLENÁRIAS 2003-2018
ATA/ CIDADE DATA REPRESENTANTE/INSTITUIÇÃO
I reunião plenária São Roque de Minas/ Minas
Gerais
11/05/2003 Antônio Fonseca Fraga-Serviços Autônomo Água e Esgoto - SAE de Juazeiro; Guilherme Tavares -Companhia Pernambucana de Saneamento – COMPESA; Maria de Fátima Acioly de Castro- Companhia de Abastecimento de Água e Saneamento de Alagoas – CASAL;
Geraldo Cabral da Silva- Associação dos Produtores Rurais de Sento Sé; Antônio Laurindo dos Santos- Associação dos Barqueiros da Ilha do Rodeadouro; Pedro Alves da Costa - Colônia dos Pescadores Artesanais de Remanso; Sandra Neuza Ferreira - CompanhiaEnergética da Bahia-COELBA;
Adinael Ferreira da Silva-Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Salitre (Bahia); Clarismar de Oliveira Campos - UNEB; José Almir Cirilo- Associação Brasileira de Recursos Hídricos (Pernambuco); Vicentina Dalva Lira de Castro - Fundação Municipal de Ação e Formação Cultural (Alagoas); Edson Ribeiro dos Santos - Fundação do Desenvolvimento
Integrado do São Francisco (Bahia); Pedro Lucio Rocha- Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Pão de Açúcar (Alagoas); Carlos Hermínio de Aguiar Oliveira - Companhia do Desenvolvimento do Vale de São Francisco-CODEVASF; Alexander Max Figueiredo de Sá- Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente (Pernambuco); Anivaldo de Miranda Pinto- Secretaria de Meio Ambiente, Recursos Hídricos e Naturais de Alagoas;
Jorge KhouryHadaye - Secretaria de Meio Ambientee Recursos Hídricos da Bahia; Roberval Alves de Souza - Prefeitura Municipal de Ibotirama (BA); Joseph Bandeira- Prefeitura Municipal de Juazeiro (BA); Cleuza Pereira - Prefeitura de Salgueiro (PE); Inácio Loiola Damasceno - Prefeitura de Piranhas (AL);
II Reunião plenária Penedo/Alagoas
01 a 04/10/2003 João Lotufo - Superintendente de Planejamento da Agência Nacional de Águas; Antônio Nelson Oliveira de Azevedo - Superintendente da 5ª Superintendência Regional da CODESVASF; Fátima Borges- Secretária de Articulação do Governo do Estado de Alagoas.
III Reunião plenária Juazeiro/ Bahia
28/07/2004 Não foi mencionado.
IV Reunião plenária Salvador/ Bahia
26/10/2004 Não foi mencionado.
V Reunião plenária Salvador/ Bahia
27/10/2004 Não foi mencionado.
VI Reunião plenária Pirapora/ Minas Gerais
16/06/2005 Não foi mencionado.
VII Reunião plenária Pirapora/ Minas Gerais
17/06/2005 Não foi mencionado.
VIII Reunião plenária Recife/Pernambuco
08/12/2005 Doutor Cláudio Marinho - Secretário do Estado de Pernambuco da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente; Rômulo Leão da Silva- Câmara do Submédio;
235
IX Reunião plenária
Aracajú/ Sergipe
13/06/2006 Não foi mencionado.
X Reunião plenária Aracajú/ Sergipe
14/06/2006 Não foi mencionado.
XI Reunião plenária 06/12/2006 Não foi mencionado. XII Reunião plenária 07/12/2006 Não foi mencionado. XIII Reunião plenária
Salvador/ Bahia 11/04/2007 Não foi mencionado.
XIV Reunião plenária
Salvador/ Bahia
12/04/2007 Não foi mencionado.
XV Reunião plenária Piranhas/ Alagoas
08/08/2007 Não foi mencionado.
XVI Reunião plenária Piranhas/ Alagoas
09/08/2007 Não foi mencionado.
2008 Não foram registradas atas no ano. XVReunião plenária e VIIReunião plenária
extraordinária
Três Marias/ Minas Gerais
04/11/2009 Não foi mencionado.
XVReuniãoplenáriaIX Reunião plenária
extraordinária São Roque de Minas - Minas
Gerais
19 e 20/08/2010 José Cisino Menezes Lopes, Associação dos Irrigantes da Bahia – AIBA Laurindo dos Santos- Associação dos Proprietários Condutores Barcos da Ilha do Rodeadouro; Antônio Gomes dos Santos - Federação dos Pescadores do Estado de Alagoas – FEPEAL Edite Lopes de Souza - Cáritas Diocesana - Barreiras;
Pedro Lúcio Rocha - FETAG; Genival Barros Júnior - Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE; Antônio Valadares de Souza Filho - Prefeitura Municipal de Afogados da Ingazeira; Alex Gama de Santana- Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Alagoas; Eugênio Spengler, Secretaria de Meio Ambiente - SEMA/BA; Geraldo Cabral da Silva - Associação dos Produtores Rurais
de Sento Sé; Denize dos Santos Pontes - Universidade Estadual de Alagoas - UNEAL; Marcelo CauásÁsfora- Secretaria de Recursos Hídricos de Pernambuco; José Roberto Valois Lobo - Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Alagoas; Athadeu Ferreira da Silva – CODEVASF;
Ághata Barreto Xavier- Companhia de Eletricidade do Estado da Bahia - COELBA; Johann Gnadlinger- Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada - IRPAA; José Valter Alves - Associação Comunitária Sobradinho II; José Maciel Nunes de Oliveira - Federação dos Pescadores do Estado de Alagoas - FEPEAL; Márcio Matos - Colônia de Pescadores Z-60 de Juazeiro; Flávio Aparecido Gonçalves- Universidade Federal da Bahia -
UFBA; Milene Maia- INGÁ - BA; Lívia Lemos Alves- Sema - BA; Melchior Carlos do Nascimento- Universidade Federal de Alagoas - UFAL; Maria das Dores Santos de Siqueira- Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Afogados da Ingazeira; Irene Glaucione Bezerra de Lacerda - Colônia de Pescadores
Z-35 de Cabrobó; Lindomar Freitas de Assis, - Codevasf; Maria Carolina da Motta Agra – CHESF; José Liberato de Oliveira - Associação dos Geólogos de Pernambuco; Júlio Cezar Busato- Associação dos Agricultores e Irrigantes da Bahia - AIBA; Sérgio Bastos- Federação das Indústrias do Estado da Bahia - FIEB;
XVIII Reunião plenária 02/12/2010 Júlio César Rocha Mota - Empresa Baiana de Saneamento –
236
Aracajú / Sergipe EMBASA;
Valeska Cavalcante da Costa - Companhia de Saneamento de Estado de Alagoas - CASAL; Júlio Cezar Busato - Associação dos Agricultores e Irrigantes da Bahia – AIBA; Israel Barreto Cardoso - Associação Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro; Maciel Nunes de Oliveira -Federação dos Pescadores do Estado de Alagoas -FEPAL; José Walter Alves - AssociaçãoComunitária Sobradinho II;
Maria das Dores Santos de Siqueira - Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Afogados da Ingazeira; Thiago Santos Gomes - Federação Estadual dos Trabalhadores na Agricultura –FETAG; Flávio Gonçalves - Universidade Federal da Bahia – UFBA; Melchior Carlos do Nascimento - Universidade Federal de Alagoas – UFAL; Márcio Alan Alves da Gama – Prefeitura Municipal de Irecê; Alex Gama de Santana - Secretaria de Meio Ambiente e
Recursos Hídricos de Alagoas – SEMARH; Claudemir da Fonseca - Bahia Mineração LTDA; Johann Gnadlinger - Instituto Regional da Pequena Agropecuária 43 Apropriada – IRPAA; LucivaneLamounier Faria - Fundação Educacional Vale de São Francisco – FEVSF; José Liberato de Oliveira - Associação dos Geólogos de Pernambuco;
Wanderley Rosa Matos - Instituto de Gestão das Águas e Clima da Bahia – INGA; Marcelo CauásAsfora - Agência Pernambucana da Águas e Clima; Athadeu Ferreira as Silva - Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Paraíba – CODEVASF; Sônia Elizabeth Lima - Fundação Nacional do Índio - FUNAI/BA; Milene Maia - INGÁ/BA;
Douglas Falcão Wanderley - CHESF; Marcio Alan Alves Gama – Prefeitura de Irecê - BA;
XVIII Reunião plenária Aracajú / Sergipe
03/12/2010 Júlio César Rocha Mota - Empresa Baiana de Saneamento – EMBASA; Valeska Cavalcante da Costa - Companhia de Saneamento do Estado de Alagoas – CASAL; Júlio Cezar Busato - Associação dos Agricultores e Irrigantes
da Bahia – AIBA; Israel Barreto Cardoso - Associação dos Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro; Maciel Nunes de Oliveira - Federação dos Pescadores do Estado de Alagoas – FEPEAL; José Walter Alves - Associação Comunitária Sobradinho II; Maria das Dores Santos de Siqueira - Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Afogados da Ingazeira; Thiago Santos Gomes - Federação Estadual dos Trabalhadores na Agricultura – FETAG;
Flávio Aparecido Gonçalves, Universidade Federal da Bahia – UFBA; Melchior Carlos do Nascimento - Universidade Federal de Alagoas – UFAL; Márcio Alan Alves da Gama – Prefeitura Municipal de Irecê; Johann Gnadlinger - Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada – IRPAA; LucivaneLamounier Faria - Fundação Educacional Vale de
São Francisco – FEVSF; José Liberato de Oliveira - Associação dos Geólogos de Pernambuco; Wanderley Rosa Matos, Instituto de Gestão das Águas e Clima da Bahia – INGA; Marcelo CauásAsfora - Agência Pernambucana da Águas e Clima; Athadeu Ferreira as Silva - Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Paraíba – CODEVASF.
237
Sônia Elizabeth Lima Santana - Fundação Nacional do Índio -
FUNAI/BA; Maria Carolina da Motta Agra - CHESF/PE;
XIX Reunião plenária Petrolina - PE
08/07/2011 Ana Paula Leal – EMBASA; Valeska Cavalcante da Costa – CASAL; Sérgio Bastos – FIEB Israel Barreto Cardoso - Associação dos proprietários e condutores de barcos da Ilha do Rodeadouro;
Ághata Barreto Xavier – COELBA; Domingos Marcio Matos - Colônia Z60; José Walter Alves- Ass. Comunitária Sobradinho II; Marcelo de Oliveira Latuf – UFBA; Genival Barros Junior- UFRPE; José Liberato de Oliveira-Associação dos geólogos de Pernambuco; José Carlos das Virgens - Prefeitura Municipal de Irecê; Athadeu Ferreira da Silva – CODEVASF;
XXIREUNIÃO PLENÁRIA ORDINÁRIA
BELO HORIZONTE
04 E 05 DE MAIO DE 2012
João Batista Araújo Silva, Associação dos Produtores Rurais Irrigantes do Vale do Moxotó, Israel Barreto Cardoso, Associação dos Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro;Américo Gomes Silva, Colônia de Pescadores Z-27, Belém de São Francisco; Marcelo de Oliveira Latuf, Universidade Federal da Bahia; Avani Terezinha Gonçalves Torres, Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE;Roque José Ferreira Soares, Serviço Autônomo de
Água e Esgoto-Município de Curaçá-BA; Januário Nunes de Carvalho-Companhia Pernambucana de Saneamento-COMPESA;JohannGnadlinger, Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada-IRPAA;Janaína Maria Gonçalves, Serviço de Tecnologia Alternativa - SERTA;LucivaneLamounier Faria, Fundação Educacional Vale do São Francisco-FEVASF; Marcelo CauásAsfóra, Agência Pernambucana de Águas e Clima - APAC;Antônio
Gomes dos Santos; Elvídio Landim do Rêgo Lima, CHESF; Sonáli Cavalcanti Oliveira, CHESF.
XX REUNIÃO PLENÁRIA ORDINÁRIA BOM JESUS
DA LAPA - BA
16 E 17 DE NOVEMBRO DE
2011
João Batista Araújo Silva, Associação dos Produtores Rurais Irrigantes do Vale do Moxotó; Israel Barreto Cardoso, Associação dos Proprietários de Barcos da Ilha do Rodeadouro; ; Américo Gomes Silva, Colônia de Pescadores Z-27, Belém de São Francisco; José Walter Alves, Associação Comunitária Sobradinho II; Marcelo de Oliveira Latuf,
Universidade Federal da Bahia - UFBA; Johann Gnadlinger, Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada – IRPAA; Athadeu Ferreira da Silva, Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Paranaíba – CODEVASF; Almacks Luís Silva, CBH Salitre.
XI REUNIÃO PLENÁRIA EXTRAORDINÁRIA
BRASÍLIA-DF
01 DE AGOSTO DE 2012
Cássio Domingues dos Santos Pinheiro, Companhia Pernambucana de Saneamento - COMPESA; João Batista Araújo Silva, Associação dos Produtores Rurais Irrigantes do Vale do Moxotó; Israel Barreto Cardoso, Associação dos
Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro; Américo Gomes Silva, Colônia de Pescadores Z-27, Belém de São Francisco; Mozart Bandeira Arnaud, Companhia Hidro Elétrica do São Francisco - CHESF; ; Geraldo José dos Santos, Associação Comunitária Sobradinho II; Avani Terezinha Gonçalves Torres, Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE; Marcelo CauásAsfóra, Agência Pernambucana de Águas e Clima - APAC; Athadeu Ferreira da Silva,
Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba – CODEVASF; Edison Ribeiro, SEMA/BA.
XXII REUNIÃO PLENÁRIA ORDINÁRIA
E XII REUNIÃO PLENÁRIA
EXTRAORDINÁRIA PENEDO - AL
27 A 29 DE NOVEMBRO DE
2012
O representante dos Povos indígenas, o Sr. Francisco de Assis - DipetaTuxá, o representante dos pescadores, o Sr. Toinho. Israel Barreto Cardoso, Associação dos Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro; Marcelo Oliveira Latuf, Universidade Federal da Bahia - UFBA; Avani Terezinha Gonçalves Torres, Universidade Federal Rural de
238
Pernambuco - UFRPE; Reginaldo Lopes da Silva, Companhia
Pernambucana de Saneamento - COMPESA Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada - IRPAA; LucivaneLamounier Faria, Fundação Educacional Vale do São Francisco - FEVASF; João Batista Araújo Silva, Associação dos Produtores Rurais Irrigantes do Vale do Moxotó; Almacks Luiz Silva, CBH Salitre; Luciano Barroso Lucena, JoãoPaulo L. - APAC/PE; Edison Ribeiro Santos; Sema/BA.
XIII REUNIÃO
PLENÁRIA EXTRAORDINÁRIA
BRASÍLIA-DF
04 E 05 DE ABRIL
DE 2013
João Batista Araújo Silva, Associação dos Produtores
11 Rurais Irrigantes do Vale do Moxotó; Associação dos Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro; Mozart Bandeira Arnaud, Companhia Hidro Elétrica do São Francisco - CHESF; Avani Terezinha Gonçalves Torres, Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE; Juliana de Oliveira Melo Bastos - Companhia Pernambucana de Saneamento - COMPESA; Johann Gnadlinger - Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada - IRPAA; Francisco Carlos Santos de Assis - Etnia Tuxá; Athadeu
Ferreira da Silva - CODEVASF; Sonáli Cavalcanti Oliveira – CHESF.
XXIII REUNIÃO PLENÁRIA ORDINÁRIA
SALVADOR/BA
19 DE AGOSTO DE 2013
João Batista Araújo Silva - Associação dos Produtores Rurais Irrigantes do Vale do Moxotó; Israel Barreto Cardoso - Associação dos Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro; Mozart Bandeira Arnaud – Companhia Hidro Elétrica do São Francisco – CHESF; Johann Gnadlinger - Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada –
IRPAA; Marcelo de Oliveira Latuf - Universidade Federal da Bahia – UFBA; Avaní Terezinha Gonçalves Torres - Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE; Domingos Márcio Matos - Colônia de Pescadores Z-60.
XIV REUNIÃO PLENÁRIA
EXTRAORDINÁRIA SALVADOR/BA
19 E 20 DE AGOSTO DE 2013
Cassio Domingues dos Santos - Companhia Pernambucana de Saneamento – COMPESA; João Batista Araújo Silva - Associação dos Produtores Rurais Irrigantes do Vale do Moxotó; Israel Barreto Cardoso, Associação dos Proprietários
Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro; Domingos Márcio Matos - Colônia dos Pescadores Z-60; Mozart Bandeira Arnaud - Companhia Hidro Elétrica do São Francisco – CHESF; Jose Valter Alves - Associação Comunitária Sobradinho II; Johann Gnadlinger - Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada – IRPAA; Marcelo de Oliveira Latuf - Universidade Federal da Bahia – UFBA; Aluísio Ferreira Gomes - Autarquia Educacional do
Vale do São Francisco; Manoel Uilton dos Santos - Povo Tuxá - Rodelas/BA; Marcondes Libório de Sá - Prefeitura Municipal de Salgueiro; Almacks Luiz Silva - Associação dos Condutores de Visitantes de Morro do Chapéu; Luiz Alberto Rodrigues Dourado - CBH Salitre.
A XV REUNIÃO PLENÁRIA
EXTRAORDINÁRIA E DA XXIV REUNIÃO
PLENÁRIA ORDINÁRIA RECIFE/PE
05 E 06 DE DEZEMBRO DE
2013
Israel Barreto Cardoso, Associação dos Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro; Domingos Márcio Matos, Colônia de Pescadores Z-60 de Juazeiro; José Valter Alves, Associação Comunitária Sobradinho II; Johann
Gnadlinger, Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada - IRPAA; Marcelo de Oliveira Latuf, Universidade Federal da Bahia - UFBA; Aluísio Ferreira Gomes, FACAPE - Autarquia Educacional do Vale do São Francisco; MarconesLibório de Sá, Prefeitura Municipal de Salgueiro; Sonali Cavalcanti Oliveira, Companhia Hidro Elétrica do São Francisco - CHESF; Athadeu Ferreira da Silva, Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba -
CODEVASF; Marcelo CauásAsfora, Nilson H. Silva - Agência Pernambucana de Águas e Clima - APAC; Edison Ribeiro Santos, SEMA/SPA/BA;
XXVI REUNIÃO PLENÁRIA ORDINÁRIA
MACEIÓ/AL
20 E 21 DE NOVEMBRO DE
2014
Rafael Araújo de Souza Coelho – Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco , FIEPE;HeronOuriques Gomes, UNIVALE – Associação dos Produtores Rurais Irrigantes do Vale do Moxotó; Israel Barreto Cardoso – Ass. dos Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro;
239
Domingos Márcio Matos – Colônia de Pescadores Z-60 de
Juazeiro;José Valter Alves – Associação Comunitária Sobradinho II; Johann Gnadlinger, IRPAA – Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada; Elias da Silva, ADESSUS – Associação de Desenvolvimento Sustentável;Almacks Luiz da Silva – Consórcio de Desenvolvimento Sustentável da Diamantina;Aluísio Ferreira Gomes – Autarquia Educacional do Vale do São Francisco;ManoelUilton dos Santos – TuxáRodelas;Antônio
Valadares de Souza Filho, SRHE – Secretaria de Recursos Hídricos e Energéticos de Pernambuco;Igor de Oliveira Galindo, COMPESA – Companhia Pernambucana de Saneamento; Luiz Alberto Rodrigues Dourado – Associação dos Condutores de visitantes do Morro do Chapéu; Sonáli Cavalcanti Oliveira, CHESF- Companhia Hidro Elétrica do São Francisco;Edison Ribeiro, SEMA – Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia; Athadeu Ferreira da Silva, CODEVASF – Companhia de Desenvolvimento dos Vales do
São Francisco e Parnaíba. XXV REUNIÃO
PLENÁRIA ORDINÁRIA BELO HORIZONTE/MG
22 E 23 DE MAIO DE 2014
Cássio Domingues dos Santos Pinheiro, Companhia Pernambucana de Saneamento - COMPESA; Rafael Araújo de Souza Coelho, Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco - FIEPE; Israel Barreto Cardoso, Associação dos Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro; Domingos Márcio Matos, Colônia de Pescadores Z-60 de Juazeiro; Marcelo de Oliveira Latuf, Universidade Federal da
Bahia - UFBA; Aluísio Ferreira Gomes, FACAPE - Autarquia Educacional do Vale do São Francisco; Manoel Uilton dos Santos - Povo TUXÁ, Rodelas/BA; Almacks Luiz Silva, Associação dos Condutores de Visitantes do Morro do Chapéu; Sonali Cavalcanti Oliveira, Companhia Hidroelétrica do São Francisco - CHESF; Edison Ribeiro dos Santos, Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia - SEMA; Nilson Silva - APAC/PE; Demerval Oliveira - Fundifran e
Luiz Alberto Rodrigues Dourado - CBH Salitre. XVI REUNIÃO
PLENÁRIA EXTRAORDINÁRIA E
XXVIII PLENÁRIA ORDINÁRIA
SALVADOR-BA
9 dezembro de 2015
Rafael Araújo de Souza Coelho, FIEP - Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco; Heron Ouriques Gomes, UNIVALE Associação dos produtores Rurais Irrigantes do Vale do Moxotó; Israel Barreto Cardoso, Associação dos Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro; Domingos Márcio Matos, Colônia de Pescadores Z-60 de Juazeiro; José Valter Alves - Associação Comunitária
Sobradinho II; Johann Gnadlinger, IRPAA - Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada; Almacks Luiz da Silva - Consórcio de Desenvolvimento Sustentável da Diamantina; Yvonilde Dantas Pinto Medeiros, UFBA – Universidade Federal da Bahia; Aluísio Ferreira Gomes, Autarquia Educacional do Vale do São Francisco; Manoel Uilton dos Santos, Tuxá Rodelas; MarconesLibório de Sá, Prefeitura Municipal de Salgueiro; José Almir Cirilo, SRHE – Secretaria de Recursos Hídricos e Energéticos de Pernambuco; Luiz
Roberto Rodrigues Dourado, Associação dos Condutores de Visitantes do Morro do Chapéu; Sonáli Cavalcanti Oliveira, CHESF – Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (no exercício da titularidade); Bruno Jardim da Silva, SEMA – Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia; Ivanilton de Araújo Aquino, Prefeitura Municipal de Jacobina.
XXVII REUNIÃO PLENÁRIA ORDINÁRIA
PETROLINA-PE
21 E 22 DE MAIO DE 2015
João Raphael Silva de Queiroz, COMPESA - Companhia Pernambucana de Saneamento (participou apenas no dia
22/05); Rafael Araújo de Souza Coelho, FIEP - Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco (participou no dia 22/05); Israel Barreto Cardoso, Ass. dos Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro; Domingos Márcio Matos, Colônia de Pescadores Z-60 de Juazeiro; Mozart Bandeira Arnaud, CHESF (participou no dia 21/05); José Valter Alves - Associação Comunitária Sobradinho II; Johann Gnadlinger, IRPAA - Instituto Regional da Pequena Agropecuária
240
Apropriada; ; Almacks Luiz da Silva - Consórcio de
Desenvolvimento Sustentável da Diamantina; Manoel Uilton dos Santos, Tuxá Rodelas; MarconesLibório de Sá, Prefeitura Municipal de Salgueiro; ; Edison Ribeiro dos Santos, SEMA-Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia; Luiz Roberto Rodrigues Dourado, Associação dos Condutores de Visitantes do Morro do Chapéu; Sonáli Cavalcanti Oliveira, CHESF; Yvonilde Medeiros e Ângela Damasceno, UFBA; Valdívia Thaís A de Lima – SAAE Juazeiro; Luiz Vicente
Berti, Prefeitura de Sobradinho; Silvana Leite Nunes, CBH Sobradinho.
XVII E XVIII PLENÁRIAS EXTRAORDINÁRIAS
SALVADOR/BA
08 DE JULHO DE 2016
Rafael Araújo de Souza Coelho, FIEPE – Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco; Heron Ouriques Gomes, UNIVALE- Associação dos Produtores Rurais Irrigantes do Vale do Moxotó; Israel Barreto Cardoso, Associação dos Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro; Domingos Márcio Matos, Colônia de Pescadores Z-60 de Juazeiro; José Valter Alves, Associação Comunitária
Sobradinho II; Almacks Luiz da Silva - Consórcio de Desenvolvimento Sustentável da Diamantina; Yvonilde Dantas Pinto Medeiros, UFBA – Universidade Federal da Bahia; Aluísio Ferreira Gomes, Autarquia Educacional do Vale do São Francisco; ; Manoel Uilton dos Santos, Tuxá Rodelas; Edison Ribeiro dos Santos, SEMA - Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia; Luiz Roberto Rodrigues Dourado, Associação dos Condutores de Visitantes do Morro
do Chapéu; Elias da Silva, ADESSUS – Associação de Desenvolvimento Sustentável; Marcelo CauásAsfora, APAC – Agência Pernambucana de Águas e Clima; Athadeu Ferreira da Silva, CODEVASF – Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba; Agenor do Amaral Souza Filho, Prefeitura de Juazeiro/BA; Manoel Ailton R. de Carvalho, CBH Salitre.
XXIX PLENÁRIA
ORDINÁRIA ARACAJU/SE
19 E 20 DE MAIO
DE 2016
João Raphael Silva de Queiroz, COMPESA – Companhia
Pernambucana de Saneamento; Heron Ouriques Gomes, UNIVALE - Associação dos Produtores Rurais Irrigantes do Vale do Moxotó; Israel Barreto Cardoso, Associação dos Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro; Domingos Márcio Matos, Colônia de Pescadores Z-60 de Juazeiro; Elias da Silva, ADESSUS – Associação de Desenvolvimento Sustentável; Almacks Luiz da Silva - Consórcio de Desenvolvimento Sustentável da Diamantina;
Aluísio Ferreira Gomes, FACAPE - Autarquia Educacional do Vale do São Francisco; Manoel Uilton dos Santos, Povo Tuxá - Rodelas/ BA; Edison Ribeiro dos Santos, SEMA - Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia; Luiz Roberto Rodrigues Dourado, Associação dos Condutores de Visitantes do Morro do Chapéu; Sonáli Cavalcanti Oliveira, CHESF – Companhia Hidro Elétrica do São Francisco.
XXX PLENÁRIA ORDINÁRIA E XIX
PLENÁRIA EXTRAORDINÁRIA
BELO HORIZONTE/MG
15 E 16 DE SETEMBRO DE
2016
Heron Ouriques Gomes, UNIVALE - Associação dos Produtores Rurais Irrigantes do Vale do Moxotó; Israel Barreto
Cardoso, Associação dos Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro; Domingos Márcio Matos, Colônia de Pescadores Z-60 de Juazeiro; José Valter Alves, Associação Comunitária Sobradinho II; Johann Gnadlinger, IRPAA - Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada; Elias da Silva, ADESSUS - Associação de Desenvolvimento Sustentável; Almacks Luiz da Silva - Consórcio de Desenvolvimento Sustentável da Diamantina; ; Yvonilde
Dantas Pinto Medeiros, UFBA - Universidade Federal da Bahia; Manoel Uilton dos Santos, Tuxá Rodelas; Edison Ribeiro dos Santos, SEMA - Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia; ; Luiz Roberto Rodrigues Dourado, Associação dos Condutores de Visitantes do Morro do Chapéu; Sonáli Cavalcanti Oliveira, CHESF - Companhia Hidro Elétrica do São Francisco; Marcelo CauásAsfora, APAC - Agência Pernambucana de Águas e Clima; Athadeu Ferreira
241
da Silva, CODEVASF - Companhia de Desenvolvimento dos
Vales do São Francisco e Parnaíba; Francisco Ivan de Aquino, CBH Sobradinho; Milton Bin, FIEPE.
XXXI PLENÁRIA ORDINÁRIA PENEDO/AL
01 E 02 DE DEZEMBRO DE
2016
Israel Barreto Cardoso, Associação dos Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro ; Luiz Alberto Rodrigues Dourado, Associação dos Condutores de Visitantes do Morro do Chapéu; Arnaldo Alves da Silva, Colônia de Pescadores Z-39; Johann Gnadlinger, IRPAA – Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada; Elias da Silva, Associação de Desenvolvimento Sustentável; Almacks Luiz Silva, Consórcio de Desenvolvimento Sustentável da
Diamantina; Yvonilde Dantas Pinto Medeiros, UFBA – Universidade Federal da Bahia; Julianeli Tolentino de Lima, UNIVASF – Universidade Federal do Vale do São Francisco; Cícera Leal Cabral, Povos indígenas – Pankará; Agenor do Amaral Souza Filho – Prefeitura Municipal de Juazeiro; Luciano Duque de Godoy Sousa – Prefeitura Municipal deJoão Virgílio Felipe Lima, COMPESA – Companhia Pernambucana de Saneamento Serra Talhada; Edison Ribeiro dos Santos,
SEMA/BA – Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia; Jordânia de Cássia de Araújo Costa, AGROVALE – Agro Indústrias do Vale São Francisco S.A; Heron Ouriques Gomes, UNIVALE – Associação dos produtores Rurais do Vale do Moxotó; Sonáli Cavalcanti Oliveira, CHESF – Companhia Hidrelétrica do São Francisco; Abelardo Antônio de Assunção Montenegro, UFRPE – Universidade Federal Rural de Pernambuco; Anália Aparecida da Silva, Povos
Indígenas – Tuxá. XX PLENÁRIA
EXTRAORDINÁRIA BRASÍLIA/DF
25 DE AGOSTO DE 2017
João Raphael Silva de Queiroz, COMPESA - Companhia Pernambucana de Saneamento; Israel Barreto Cardoso, Associação dos Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro; Luiz Alberto Rodrigues Dourado, Associação dos Condutores de Visitantes do Morro do Chapéu; Arnaldo Alves da Silva, Colônia de Pescadores Z-39;Johann Gnalinger, IRPAA - Instituto Regional da Pequena Agropecuário
Apropriada; Elias da Silva, Associação de Desenvolvimento Sustentável; Almacks Luiz Silva, Consórcio de Desenvolvimento Sustentável da Diamantina; Manoel Uilton dos Santos, Povos indígenas Tuxá Rodelas; Cícera Leal Cabral, Povos indígenas - Pankará;Ronaldo Melo por Luciano Duque de Godoy Sousa - Prefeitura Municipal de Serra Talhada;Thaisi C. Tavares de Oliveira, Agrovale - Agro Indústrias do Vale São Francisco S.A; João Batista Araújo Silva, UNIVALE - Associação dos Produtores Rurais do Vale
do Moxotó; Domingos Márcio Matos, Colônia de Pescadores Z 60 de Juazeiro; Sonáli Cavalcanti Oliveira, CHESF - Companhia Hidrelétrica do São Francisco; Abelardo Antônio de Assunção Montenegro, UFRPE - Universidade Federal Rural de Pernambuco;MarceloCauásAsfora, APAC - Agência Pernambucana de Águas e Clima..
XXXII PLENÁRIA ORDINÁRIA
RECIFE/PE
18 E 19 DE MAIO DE 2017
João Raphael Silva de Queiroz, COMPESA - Companhia Pernambucana de Saneamento;; Israel Barreto Cardoso,
Associação dos Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro;Luiz Alberto Rodrigues Dourado, Associação dos Condutores de Visitantes do Morro do Chapéu; Arnaldo Alves da Silva, Colônia de Pescadores Z-39; Elias da Silva, Associação de Desenvolvimento Sustentável; Almacks Luiz Silva, Consórcio de Desenvolvimento Sustentável da Diamantina; Yvonilde Dantas Pinto Medeiros, UFBA - Universidade Federal da Bahia; Julianeli Tolentino de Lima,
UNIVASF - Universidade Federal do Vale do São Francisco;Cícera Leal Cabral, Povos indígenas - Pankará;Agenor do Amaral Souza Filho - Prefeitura Municipal de Juazeiro;José Geraldo dos Reis Santos, SEMA/BA - Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia; Joaquim Ferreira de Medeiros Neto, SAAE Juazeiro;Thaisi C. Tavares
242
de Oliveira, AGROVALE - Agroindústrias do Vale São
Francisco S.A.; João Batista de Araújo Silva, UNIVALE - Associação dos Produtores Rurais do Vale do Moxotó; Domingos Márcio Matos, Colônia de Pescadores Z-60 de Juazeiro; Sonáli Cavalcanti Oliveira, CHESF - Companhia Hidroelétrica do São Francisco; Francisco Ivan de Aquino, SINDAE - Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente da Bahia ; Abelardo Antônio de Assunção Montenegro, UFRPE - Universidade Federal Rural de
Pernambuco;MarceloCauásAsfora, APAC - Agência Pernambucana de Águas e Clima.
XXXIII PLENÁRIA ORDINÁRIA
PAULO AFONSO/BA
07 E 08 DE DEZEMBRO DE
2017
João Raphael Silva de Queiroz, COMPESA - Companhia Pernambucana de Saneamento; Arnaldo Alves da Silva, Colônia de Pescadores Z-39; Almacks Luiz Silva, Consórcio de Desenvolvimento Sustentável da Diamantina; Yvonilde Dantas Pinto Medeiros, UFBA - Universidade Federal da Bahia; Julianeli Tolentino de Lima, UNIVASF - Universidade Federal do Vale do São Francisco;ManoelUilton, Povo
indígena Tuxá - Rodelas/BA;Cícera Leal Cabral, Povo indígena Pankará - Itacuruba/PE; João Pedro da Silva Neto, Prefeitura Municipal de Juazeiro/BA;José Geraldo dos Reis Santos, SEMA/BA - Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia; Domingos Márcio Matos, Colônia de Pescadores Z-60 de Juazeiro/BA; Sonáli Cavalcanti Oliveira, CHESF - Companhia Hidroelétrica do São Francisco; Abelardo Antônio de Assunção Montenegro, UFRPE - Universidade Federal
Rural de Pernambuco; Manoel Silvestre de Araújo, Prefeitura Municipal de Terra Nova/PE; Marcelo CauásAsfora, APAC - Agência Pernambucana de Águas e Clima.
XXXIV PLENÁRIA ORDINÁRIA
LAGOA DA PRATA/MG
17 E 18 DE MAIO DE 2018
Israel Barreto Cardoso, Associação dos Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro; Douglas Falcão por João Henrique de Araújo Franklin Neto, CHESF – Companhia Hidrelétrica do São Francisco;JohannGnadlinger, IRPAA – Instituto Regional da Pequena Agropecuária
Apropriada; Almacks Luiz Silva, Consórcio de Desenvolvimento SustentáveldaDiamantina;Yvonilde Dantas Pinto Medeiros, UFBA – Universidade Federal da Bahia; Julianeli Tolentino de Lima, UNIVASF – Universidade Federal do Vale do São Francisco;ManoelUilton dos Santos, TuxáRodelas;João Pedro da Silva Neto, Prefeitura Municipal de Juazeiro/BA; Marcelo CauásAsfora, APAC – Agência Pernambucana de Água e Clima;João Virgílio Felipe Lima,
COMPESA - Companhia Pernambucana de Saneamento;Thaisi C. Tavares de Oliveira, Agrovale – Agro Indústrias do Vale São Francisco S.A; João Batista Araújo Silva, UNIVALE – Associação dos Produtores Rurais do Vale do Moxotó; Domingos Márcio Matos, Colônia de Pescadores Z-60 de Juazeiro; Athadeu Ferreira da Silva, MI/CODEVASF – Ministério da Integração Nacional / Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba.
XXXV PLENÁRIA
ORDINÁRIA MONTES CLAROS/MG
06 e 07 DE
DEZEMBRO DE 2018
João Raphael Silva de Queiroz, COMPESA – Companhia
Pernambucana de Saneamento;Israel Barreto Cardoso, Associação dos Proprietários Condutores de Barcos da Ilha do Rodeadouro;Luiz Alberto Rodrigues Dourado, Associação dos Condutores de Visitantes do Morro do Chapéu; Arnaldo Alves da Silva, Colônia dos Pescadores Z-39;Johann Gnadlinger - Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada; Almacks Luiz Silva, Consórcio de Desenvolvimento Sustentável da Diamantina; Julianeli Tolentino de Lima,
Universidade Federal do Vale do São Francisco – UNIVASF;Cícera Leal Cabral, Pankará;João Batista Araújo Silva, UNIVALE – Associação dos Produtores Rurais do Vale do Moxotó; Sonáli Cavalcanti de Oliveira, Companhia Hidrelétrica do São Francisco – CHESF;Aderbal de Castro Meira Filho - Secretaria de Meio Ambiente da Bahia/SEMA-BA;Athadeu Ferreira da Silva, – Ministério da Integração Nacional /Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São
243
Francisco e Parnaíba-MI/CODEVASF.
244
Anexo 3 - QUESTIONÁRIO APLICADO AOS MEMBROS DA CCR
DO SUBMÉDIO SÃO FRANCISCO
Tese: Análise das representações territoriais na governança da água no semiárido
brasileiro.
Doutorando: Sidclay Cordeiro Pereira
Programa de pós graduação: Doutorado em Ciências Geográficas (Universidade Laval -
Québec, QC, Canadá)
Questionário sobre a atuação dos atores na gestão do Comitê da Bacia Hidrográfica do
Rio São Francisco (CBHSF) ou de Comitê dos afluentes do Rio São Francisco
Este questionário tem por objetivo entender a sua atuação como um dos atores
no Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) ou de algum comitê
dos afluentes do Rio São Francisco para a tomada de decisão sobre a gestão dos
recursos hídricos. As informações colhidas servirão como subsídios para demonstrar e
propor um modelo de gestão dos recursos hídricos vivenciado no semiárido do Estado
de Pernambuco, uma vez que esse é um dos objetivos da tese intitulada "Análise das
representações territoriais na governança da água no semiárido brasileiro".
As respostas podem ser fornecidas por escrito, em entrevista por telefone ou
pessoalmente. Para todos os casos, o anonimato é garantido.
Contato telefônico e/ou e-mail:
Órgão que pertence:
Papel/cargo na gestão do CBHSF:
Período em que pertence/pertenceu no CBHSF:
1º bloco - sobre sua atuação
1. Quais seus objetivos atuando no comitê desde que se tornou membro?
2. Quais propostas você defende?
3. Como você estabelece as estratégias para defender suas pautas?
2º bloco - sobre os critérios para a tomada de decisão sobre a gestão das águas
4. As condições naturais de cada localidade são levadas em consideração para se
tomar uma decisão?
5. As percepções sobre cada localidade são levadas em consideração para se
tomar uma decisão?
6. Existem temas polêmicos? Quais?
3º bloco - sobre as decisões tomadas
7. Quais das suas propostas lograram êxito em aprovação?
8. Quais propostas nunca foram acatadas? A que você atribui as recusas?
9. Você percebe mudanças no perfil das decisões tomadas desde o início da sua
participação? Quais?
245
4º bloco - sobre a participação cidadã nos comitês
10. Como você avalia a participação dos cidadãos e cidadãs nas reuniões do
comitê? Existe uma presença significativa? Existem empecilhos para suas
presenças e falas?
11. A agenda de discussão muda a depender das secas periódicas?
12. As comunidades recebem alertas sobre secas?
13. Experiências de gestão de outras bacias influenciam o trabalho do comitê
que você atua?
5º bloco - sobre a avaliação da gestão
14. Como você avalia a gestão a partir das bacias hidrográficas?
15. Como você avalia a gestão da CBHSF especificamente para o Estado de
Pernambuco?
16. Você sugere ajustes no modelo de gestão objetivando um processo mais
eficiente para a tomada de decisão? Quais?
17. O que seria uma gestão ideal a partir dos comitês de bacias hidrográficas?
246
Anexo 4 - ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO ESTADO
BRASILEIRO
Esse texto foi escrito visando dar ao leitor da tese uma explicação mais detalhada da
estrutura do Estado brasileiro. Apresenta-se, a seguir, um descrição e não uma análise
da estrutura.
O Brasil, desde 1822, adotou a estrutura federativa316 como mecanismo de
descentralização do então poder imperial. Essa estrutura se dá em três esferas: a federal,
a estadual e a municipal. Para efeito da análise aqui proposta, entende-se essas esferas
como as atuais escalas de atuação do Estado, uma vez que salvo as ações, as estruturas
permanecem praticamente as mesmas desde sua implantação.
A República Federativa do Brasil constitui-se como um estado soberano, composto de
entidades territoriais com governo próprios chamadas de estados317, que são subdividas
em municípios318. As unidades estaduais e municipais possuem um conjunto de direitos
garantidos pela constituição, bem como competências gerenciais que não podem ser
revogadas ou suprimidos de maneira compulsória ou unilateral pelo estado central319. O
Brasil possui uma constituição federal promulgada em 05 de outubro de 1988, sendo a
316 Entende-se aqui o federalismo como "uma engenharia política que tem por objetivo fundamental
acomodar as tensões decorrentes da união contraditória de diferenças para formar uma unidade, ambas
organizadas territorialmente" (Castro, 1997 : 34). 317 No Executivo Estadual, o chefe supremo é o governador do estado, eleito pelo voto direto da
população para um mandato de quatro anos, podendo ser reeleito para mais um mandato. Ele tem sob seu
comando secretários e auxiliares diretos. Cabe a ele representar a Unidade Federativa junto ao Estado
brasileiro e aos demais estados, coordenar as relações jurídicas, políticas e administrativas e defender sua autonomia (Portal Brasil, 2014). 318 Já o Poder Executivo Municipal tem como chefe o prefeito, escolhido para exercer um mandato de
quatro anos, por meio de eleições diretas e simultâneas, podendo ser reeleito por mais dois anos. Ele tem
atribuições políticas e administrativas que se consolidam em atos de governo e se expressam no
planejamento das atividades, obras e serviços municipais. Os municípios gozam de autonomia de acordo
com a Constituição Federal e as constituições estaduais. Cada município é regido por uma Lei Orgânica,
aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal. Cabe ao prefeito, ainda, apresentar,
sancionar, promulgar e vetar proposições e projetos de lei. Anualmente, o Executivo Municipal elabora a
proposta orçamentária, que é submetida à Câmara dos Vereadores (Portal Brasil, 2014). 319O Poder Executivo Federal atua para colocar programas de governo em prática ou na prestação de
serviço público. É formado por órgãos de administração direta, como os ministérios, e indireta, como as
empresas públicas e demais autarquias. O Executivo age junto ao Poder Legislativo, participando da elaboração das leis e sancionando ou vetando projetos. Em caso de relevância e urgência, adota medidas
provisórias e propõe emendas à Constituição, projetos de leis complementares e ordinárias e leis
delegadas. O chefe máximo do Executivo é o Presidente da República, que também é o chefe de Estado e
de Governo, já que o Brasil adota o regime presidencialista. É eleito por votação direta da população para
um mandato de quatro anos podendo ser reeleito por mais um mandato. O Presidente exerce, ainda, o
comando supremo das Forças Armadas e tem o dever de sustentar a integridade e a independência do
Brasil, entre outras atribuições (Portal Brasil, 2014).
247
mais importante forma normativa jurídica e norteadora de ações estatais no país. O
estado central brasileiro está divido em três poderes independentes, o Executivo, o
Legislativo e o Judiciário.
A chefia maior do estado brasileiro é a Presidência da República320 que, por meio de lei
especial, pode criar, modificar e extinguir ministérios, secretarias e órgãos da
administração pública.
A formulação, a implantação e o acompanhamento das políticas públicas de nível
federal estão a cargo dos ministérios321, secretarias especiais322, agências reguladoras323
e conselhos324, essa é a estrutura do poder Executivo.
O poder legislativo é composto pela câmara federal325 e pelo senado326. São, ao todo,
quinhentos e treze deputados federais327 e oitenta e um senadores328 eleitos pelo voto
320 A presidência da república é eleita para um mandato de quatro anos, podendo ser reeleita para mais um
mandado subsequente, em votação direta. 321 Os ministérios integram a cúpula administrativa. São diretamente subordinados ao presidente da República, auxiliando no exercício do Poder Executivo. Possuem autonomia técnica, financeira e
administrativa para executar as ações nas suas áreas de competência. O Brasil possui 39 ministérios e
todos os ministros são nomeados pela presidência da república (Portal Brasil, 2014). 322 Em áreas estratégicas, como Segurança Institucional e Direitos Humanos, o governopossui secretarias
especiais, diretamente subordinadas à presidência da República. A Secretaria-Geraltem a função de
assessorar o governo federal e o presidente da República no relacionamento e
naarticulaçãocommovimentossociais, entidades patronais e de trabalhadorescom a finalidade de criar e
mantercanais de consulta e participação popular nadefinição da agenda de prioridades do País. Para
cumpriresse papel, a Secretaria-Geral conta comumaestrutura formada pelas demais secretarias, cada
umaresponsável pela interlocuçãonas áreas em que atuam. O Brasil possui 10 secretarias e todos os
secretáriossãonomeados pela presidência da república (Portal Brasil, 2014). 323Foram criadas nos anosnoventa doséculopassadocom a finalidade de fiscalizar a prestação de serviços
públicos praticada pela iniciativa privada. Funcionam tanto como órgãosdiretaouindiretamente ligados à
administração. Elassão dirigidas em regime de colegiado, por umconselhodiretoroudiretoria composta por
conselheirosoudiretores, sendo que um deles é nomeado pelo presidente da República para ser o
diretoroupresidente.Os integrantes da direção das agênciassãoescolhidos pelo presidente da República.
Antes de seremnomeados, as pessoas indicadas devem ser aprovadas pelo Senado Federal (Portal Brasil,
2014). 324 Cabe a eles propordiretrizes, tomar decisões relacionadas às políticas ou cuidar da gestão de
programas. Dependendo da área e da finalidade, os conselhoscontamcom a participação de representantes
de diversos segmentos vinculados a uma área, além de integrantes da administração pública (ministérios e
órgãos de governo) (Portal Brasil, 2014). 325 A divisão das cadeiras é equivalente à população dos Estados e do Distrito Federal – respeitados o mínimo de oito e o máximo de 70 parlamentares por unidade da federação. A Câmara debate temas de
interesse geral da população e, junto com o Senado Federal, tem o poder de criar leis de abrangência
nacional e de emendar a Constituição (Portal Brasil, 2014). 326 O número de senadores é igual para todos os Estados e o Distrito Federal: três por unidade, Ao lado da
Câmara dos Deputados, o Senado tem o poder de criar e alterar leis e de emendar a Constituição. Assim
como a Câmara, opera com o auxílio de comissões temáticas (temporáriasoufixas). Os projetossóchegam
para votaçãoaoplenárioapósseremaprovadosnessasinstâncias (Portal Brasil, 2014).
248
direto da população, podendo serem reeleitos sem limites de mandatos. O mandato de
um senador dura oito anos e de um deputado federal, quatro anos.
Por fim, o poder judiciário é composto por onze órgãos329 que objetivam gerenciar e
dirimir conflitos dentro de sua jurisdição. O Supremo Tribunal Federal, instância mais
alta do poder no Brasil, tem seus juízes330 nomeados pela presidência da república e
avaliado pela Comissão de Constituição e Justiça do senado, que podem aprovar ou não
a indicação da presidência.
A gestão dos vinte e seis estados brasileiros e do distrito federal331 segue uma
organização com uma chefia maior, o governador, eleito pelo voto direto da população
para um mandato de quatro anos, podendo ser reeleito para mais um mandato. O
Legislativo é composto pelos deputados estaduais, também eleitos pela população, para
um mandato de quatro anos, podendo serem reeleito sem limites de mandatos.
Entretanto, a quantidade de deputados estaduais varia de acordo com o quantitativo
populacional de cada estado.
O Brasil possui a democracia representativa através do pluripartidarismos, ou seja, há
uma convivência e coexistência de diversos partidos das mais distintas ideologias,
sendo possível a criação novos partidos desde que se atenda aos critérios estabelecidos
327 Cada Estado possui os seus deputados federais definidos pelo O art. 45 da Constituição Federal através
da Lei Complementar nº 78, de 30 de dezembro de 1993. Sendo assim, o quantitativo de deputados
estaduais assim se segue: Acre, 8; Alagoas, 9; Amapá, 8; Amazonas, 8; Bahia, 39; Ceará, 22; Distrito
Federal, 8; Espírito Santo, 10; Goiás, 17; Maranhão, 18; Mato Grosso do Sul, 8; Mato Grosso, 8; Minas Gerais, 53; Pará, 17; Paraíba, 12; Paraná, 30; Pernambuco, 25; Piauí, 10; Rio de Janeiro, 46; Rio Grande
do Norte, 8; Rio Grande do Sul, 31; Rondônia, 8; Roraima, 8; Santa Catarina, 16; São Paulo, 70; Sergipe,
8 e Tocantins, 8 (Câmara dos Deputados, 2017) 328 Cada Estado possui três senadores, uma vez que eles são considerados representantes do Estado e não
da população. Sendo assim, cada Estado e o Distrito Federal possuem três representantes. 329Supremo Tribunal Federal, Conselho Nacional de Justiça (sem função jurisdicional, apenas funções
administrativas), Superior Tribunal de Justiça, Superior Tribunal Militar, Tribunal Superior do Trabalho,
Tribunal Superior Eleitoral, Tribunais Regionais Federais e juízes federais, Tribunais e juízes do
Trabalho, Tribunais e juízes eleitorais, Tribunais e juízes militares e Tribunais e juízes dos estados, do
Distrito Federal e dos territórios (Portal Brasil, 2014). 330 Os juízes podem também serem chamados de Ministros por uma questão de hierarquia. De acordo
com o Art 101 da Constituição Federal do Brasil " O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de
idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada.Parágrafo único. s Ministros do Supremo Tribunal
Federal serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria
absoluta do Senado Federal". 331 O Distrito Federal é uma das entidades territoriais do Brasil onde localiza-se a sede do governo central
do Brasil, Brasília. É um enclave no Estado de Goiás, mas possui gestão própria semelhante às demais
entidades territoriais do país.
249
pelo Tribunal Superior Eleitoral. Um cidadão brasileiro só pode concorrer às eleições se
estiver filiado a um dos partidos que existem atualmente no país.
250
Anexo 5 - DOCUMENTO DA DECLARAÇÃO DO SEMIÁRIDO
PROPOSTAS DA ARTICULAÇÃO NO SEMI-ÁRIDO BRASILEIRO
PARA A CONVIVÊNCIA COM O SEMI-ÁRIDO
E COMBATE À DESERTIFICAÇÃO
Recife, 26 de novembro de 1999
251
O SEMI-ÁRIDO TEM DIREITO A UMA POLÍTICA ADEQUADA!
Depois da Conferência da ONU,a seca continua
O Brasil teve o privilégio de acolher a COP-3 – a terceira sessão da Conferência das Partes das Nações Unidas da Convenção de Combate à Desertificação. Esse
não foi apenas um momento raro de discussão sobre as regiões áridas e semi-áridas do planeta, com interlocutores do mundo inteiro. Foi, também, uma oportunidade
ímpar para divulgar, junto à população brasileira, a amplidão de um fenômeno mundial – a desertificação – do qual o homem é, por boa parte,
responsável e ao qual o desenvolvimento humano pode remediar. Os números impressionam: há um bilhão de pessoas morando em áreas do planeta susceptíveis à desertificação. Entre elas, a maioria dos 25 milhões de habitantes do semi-árido brasileiro.
A bem da verdade, a não ser em momentos excepcionais como a Conferência da ONU, pouca gente se interessa pelas centenas de milhares de
famílias, social e economicamente vulneráveis, do semi-árido. Por isso, o momento presente parece-nos duplamente importante. Neste dia 26 de novembro de 1999,
no Centro de Convenções de Pernambuco, a COP-3 está encerrando seus trabalhos e registrando alguns avanços no âmbito do combate à desertificação. Porém, no
mesmo momento em que as portas da Conferência estão se fechando em Recife, uma grande seca, iniciada em 1998, continua vigorando a menos de 100 quilômetros do
litoral.
É disso que nós, da Articulação no Semi-Árido brasileiro, queremos tratar agora. Queremos falar dessa parte do Brasil de cerca de 900 mil km2, imensa porém
invisível, a não ser quando a seca castiga a região e as câmeras começam a mostrar as eternas imagens de chão rachado, água turva e crianças passando fome. São imagens
verdadeiras, enquanto sinais de alerta para uma situação de emergência. Mas são, também, imagens redutoras, caricaturas de um povo que é dono de uma
cultura riquíssima, capaz de inspirar movimentos sociais do porte de Canudos e obras de arte de dimensão universal – do clássico Grande Sertão, do escritor
Guimarães Rosa, até o recente Central do Brasil, do cineasta Walter Salles.
As medidas emergenciais devem ser imediatamente reforçadas
Nós da sociedade civil, mobilizada desde o mês de agosto através da Articulação no Semi-Árido; nós que, nos últimos meses, reunimos centenas de entidades para
discutir propostas de desenvolvimento sustentável para o semi-árido; nós dos Sindicatos de Trabalhadores Rurais, das Entidades Ambientalistas, das
Organizações Não- Governamentais, das Igrejas Cristãs, das Agências de Cooperação Internacional, das Associações e Cooperativas, dos Movimentos de Mulheres,
das Universidades; nós que vivemos e trabalhamos no semi-árido; nós que pesquisamos, apoiamos e financiamos projetos no Sertão e no Agreste nordestinos,
queremos, antes de mais nada, lançar um grito que não temos sequer o direito de reprimir: QUEREMOS UMA POLÍTICA ADEQUADA AO SEMI-ÁRIDO! Neste exato momento, a seca está aí, a nossa porta. Hoje, infelizmente, o sertão já conhece a fome crônica, como o mostram os casos de pelagra
encontrados entre os trabalhadores das frentes de emergência. Em muitos municípios está faltando água, terra e trabalho, e medidas de emergência devem ser tomadas
imediatamente, reforçando a intervenção em todos os níveis: dos conselhos locais até a Sudene e os diversos ministérios afetos.
Sabemos muito bem que o caminhão-pipa e a distribuição de cestas básicas não são medidas ideais. Mas ainda precisamos delas. Por quanto tempo? Até quando a
sociedade vai ser obrigada a bancar medidas emergenciais, anti-econômicas e que geram dependência? Essas são perguntas para todos nós. A Articulação,
252
por sua vez, afirma que, sendo o Semi-Árido um bioma específico, seus habitantes têm direito a uma verdadeira política de desenvolvimento econômico e
humano, ambiental e cultural, científico e tecnológico. Implementando essa política, em pouco tempo não precisaremos continuar distribuindo água e pão.
Nossa experiência mostra que o semi-árido é viável
A convivência com as condições do semi-árido brasileiro e, em particular, com as secas é possível. É o que as experiências pioneiras que lançamos há mais
de dez anos permitem afirmar hoje. No Sertão pernambucano do Araripe, no Agreste paraíbano, no Carirí cearense ou no Seridó potiguar; em Palmeira dos Índios (AL),
Araci (BA), Tauá (CE), Mirandiba (PE) ou Mossoró (RN), em muitas outras regiões e municípios, aprendemos:
que a caatinga e os demais ecossistemas do semi-árido – sua flora, fauna, paisagens, pinturas rupestres, céus deslumbrantes – formam um ambiente único no mundo e
representam potenciais extremamente promissores;
que homens e mulheres, adultos e jovens podem muito bem tomar seu destino em mãos, abalando as estruturas tradicionais de dominação política, hídrica e agrária;
que toda família pode, sem grande custo, dispor de água limpa para beber e cozinhar e, também, com um mínimo de assistência técnica e crédito, viver dignamente,
plantando, criando cabras, abelhas e galinhas;
enfim, que o semi-árido é perfeitamente viável quando existe vontade individual, coletiva e política nesse sentido.
É preciso levar em consideração a grande diversidade da região
Aprendemos, também, que a água é um elemento indispensável, longe, porém, de ser o único fator determinante no semi-árido. Sabemos agora que não há como
simplificar, reduzindo as respostas a chavões como “irrigação”, “açudagem” ou “adutoras”. Além do mais, os megaprojetos de transposição de bacias, em particular a
do São Franscisco, são soluções de altíssimo risco ambiental e social. Vale lembrar que este ano, em Petrolina, durante a Nona Conferência Internacional de Sistemas de
Captação de Água de Chuva, especialistas do mundo inteiro concluíram, na base da sua experiência internacional, que a captação da água de chuva no Semi-Árido
Brasileiro seria uma fonte hídrica suficiente para as necessidades produtivas e sociais da região.
O semi-árido brasileiro é um território imenso, com duas vezes mais habitantes que Portugal, um território no qual caberiam a França e a Alemanha reunidas.
Essa imensidão não é unifome: trata-se de um verdadeiro mosaico de ambientes naturais e grupos humanos. Dentro desse quadro bastante diversificado, vamos
encontrar problemáticas próprias à região (o acesso à água, por exemplo) e, outras, universais (a desigualdade entre homens e mulheres). Vamos ser confrontados com o
esvaziamento de espaços rurais e à ocupação desordenada do espaço urbano nas cidades de médio porte. Encontraremos, ainda, agricultores familiares que plantam no
sequeiro, colonos e grandes empresas de agricultura irrigada, famílias sem terra, famílias assentadas, muita gente com pouca terra, pouca gente com muita terra,
assalariados, parceiros, meeiros, extrativistas, comunidades indígenas, remanescentes de quilombos, comerciantes, funcionários públicos, professores,
agentes de saúde... O que pretendemos com essa longa lista, é deixar claro que a problemática é intrincada e que uma visão sistêmica, que leve em consideração os mais diversos aspectos e suas interrelações, impõe-se mais que nunca.
Dito isto, podemos apresentar a nossa contribuição – fruto de longos anos de trabalho no semi-árido –, destacando algumas das propostas que vêm sendo
discutidas pela sociedade civil nas duas últimas décadas.
253
PROPOSTAS PARA UM PROGRAMA DE CONVIVÊNCIA COM O SEMI-ÁRIDO
Esteprogramaestáfundamentadoemduaspremissas:
A conservação,uso sustentável e recomposição ambiental dos recursos naturais do semi-árido.
A quebra do monopólio de acesso à terra, á gua e outros meios de produção.
O Programa constitui-se, também, de seis pontos principais: conviver com as secas, orientar os investimentos, fortalecer a sociedade, incluir mulheres e jovens, cuidar
dos recursos naturais e buscar meios de financiamentos adequados.
CONVIVER COM AS SECAS
O semi-árido brasileiro caracteriza-se, no aspecto sócio-econômico, por milhões de famílias que cultivam a terra, delas ou de terceiros. Para elas, mais da metade do
ano é seco e a água tem um valor todo especial. Além disso, as secas são fenômenos naturais periódicos que não podemos combater, mas com os quais podemos conviver.
Vale lembrar, também, que o Brasil assinou a Convenção das Nãçoes Unidas de Combate à Desertificação, comprometendo-se a “atacar as causas
profundas da desertificação”, bem como “integrar as estratégias de erradicação da pobreza nos esforços de combate à desertificação e de mitigação dos efeitos da
seca”. Partindo dessas reflexões, nosso Programa de convivência com o Semi-Árido incluí:
O fortalecimento da agricultura familiar, como eixo central da estratégia de convivência com o semi-árido, em módulos fundiários compatíveis com as condições
ambientais. A garantia da segurança alimentar da região, como um objetivo a ser alcançado a curtíssimo prazo.
O uso de tecnologias e metodologias adaptadas ao semi-árido e à sua população, como ferramentas básicas para a convivência com as condições da região.
A universalização do abastecimento em água para beber e cozinhar, como um caso exemplar, que demonstra como tecnologias simples e baratas como a cisterna de
placas de cimento, podem se tornar o elemento central de políticas públicas de convivência com as secas.
A articulação entre produção, extensão, pesquisa e desenvolvimento científico e tecnológico adaptado às realidades locais, como uma necessidade.
O acesso ao crédito e aos canais de comercialização, como meios indispensáveis para ultrapassar o estágio da mera subsistência
ORIENTAR OS INVESTIMENTOS NO SENTIDO DA SUSTENTABILIDADE
A descentralização das políticas e dos investimentos, de modo a permitir a interiorização do desenvolvimento, em prol dos municípios do semi-árido.
A priorização de investimentos em infra-estrutura social (saúde, educação, saneamento, habitação, lazer), particularmente nos municípios de pequeno porte.
Maiores investimentos em infra-estrutura econômica (transporte, comunicação e energia), de modo a permitir o acesso da região aos mercados. Estímulos à instalação de unidades de beneficiamento da produção e empreendimentos não agrícolas.
A regulação dos investimentos públicos e privados, com base no princípio da harmonização entre eficiência econômica e sustentabilidade ambiental e social.
Estímulosàinstalaçãodeunidadesdebeneficiamentodaproduçãoe empreendimentosnãoagrícolas.
Aregulaçãodosinvestimentospúblicoseprivados,combasenoprincípioda harmonizaçãoentreeficiênciaeconômicaesustentabilidadeambientalesocial.
FORTALECER A SOCIEDADE CIVIL
254
Esquemas de dominação política quase hereditários, bem como a falta de formação e informação representam fortes entraves ao processo de desenvolvimento do semi-
árido. Sabendo que a Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação insiste bastante sobre a obrigatoriedade da participação da sociedade civil em todas
as etapas da implementação dessa Convenção, a Articulação está propondo, para vigência desse direito:
O reforço do processo de organização dos atores sociais, visando sua intervenção qualificada nas políticas públicas.
Importantes mudanças educacionais, prioritariamente no meio rural, a fim de ampliar o capital humano. Em particular:
A erradicação do analfabetismo no prazo de 10 anos
A garantia do ensino básico para jovens e adultos, com currículos elaborados a partir da realidade local.
A articulação entre ensino básico, formação profissional e assistência técnica.
A valorização dos conhecimentos tradicionais.
A criação de um programa de geração e difusão de informações e conhecimentos,
que facilite a compreensão sobre o semi-árido e atravesse toda a sociedade brasileira.
INCLUIR MULHERES E JOVENS NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO
As mulheres representam 40% da força de trabalho no campo e mais da metade começam a trabalhar com 10 anos de idade. No Sertão são, muitas vezes, elas
que são responsáveis pela água da casa e dos pequenos animais, ajudadas nessa tarefa pelos(as) jovens.
Apesar de cumprir jornadas de trabalho extenuantes, de mais de 18 horas, as mulheres rurais permanecem invisíveis. Não existe reconhecimento público da
sua importância no processo produtivo. Pior ainda: muitas delas nem sequer existem para o estado civil. Sem certidão de nascimento, carteira de identidade, CPF ou título de eleitor, sub-representadas nos sindicatos e nos conselhos, as mulheres rurais não podem exercer sua cidadania.
Partindo dessas considerações e do Artigo 5 da Convenção de Combate à Desertificação, pelo qual o Brasil se comprometeu a “promover a
sensibilização e facilitar a participação das populações locais, especialmente das mulheres e dos jovens”, a Articulação no Semi-Árido reivindica, entre outras medidas:
que seja cumprida a Convenção 100 da OIT, que determina a igualdade de remuneração para a mesma função produtiva;
que as mulheres sejam elegíveis como beneficiárias diretas das ações de Reforma
Agrária e titularidade de terra.
que as mulheres tenham acesso aos programas de crédito agrícola e pecuário;
que mais mulheres e jovens sejam capacitados para participar em conselhos de políticas públicas;
que mais mulheres adultas tenham acesso à escola, com horários e currículo apropriados.
PRESERVAR, REABILITAR E MANEJAR OS RECURSOS NATURAIS
A Convenção da ONU entende por combate à desertificação “as atividades que... têm por objetivo: I - a prevenção e/ou redução da degradação das terras, II -
a reabilitação de terras parcialmente degradadas e, III – a recuperação de terras degradadas.”
A caatinga é a formação vegetal predominante na região semi-árida nordestina. Apesar do clima adverso, ela constituí ainda, em certos locais, uma verdadeira mata
tropical seca. Haveria mais de 20 mil espécies vegetais no semi-árido brasileiro, 60% das quais endêmicas.
255
Contudo, a distribuição dessa riqueza natural não é uniforme e sua preservação requer a manutenção de múltiplas áreas, espalhadas por todo o território da região. A
reabilitação de certos perímetros também é possível, se conseguirmos controlar os grandes fatores de destruição (pastoreio excessivo, uso do fogo, extração de
lenha, entre outros). Mas podemos fazer melhor ainda: além da simples preservação e da reabilitação, o manejo racional dos recursos naturais permitiria
multiplicar suas funções econômicas sem destruí-los.
Entre as medidas preconizadas pela Articulação, figuram:
A realização de um zoneamento sócio-ambiental preciso.
A implementação de um programa de reflorestamento.
A criação de um Plano de Gestão das Águas para o Semi-Árido.
O combate à desertificação e a divulgação de formas de convivência com o semi-árido através de campanhas de educação e mobilização ambiental. O incentivo à agropecuária que demonstre sustentabilidade ambiental.
A proteção e ampliação de unidades de conservação e a recuperação de mananciais e áreas degradadas.
A fiscalização rigorosa do desmatamento, extração de terra e areias, e do uso de
agrotóxicos.
FINANCIAR O PROGRAMA DE CONVIVÊNCIA COMO SEMI-ÁRIDO
Os países afetados pela desertificação e que assinaram a Convenção da ONU, como é o caso do Brasil, se comprometeram a “dar a devida prioridade ao
combate à desertificação e à mitigação dos efeitos da seca, alocando recursos adequados de acordo com as suas circunstâncias e capacidades”.
Nossa proposta é de que o Programa de Convivência com o Semi-Árido seja financiado através de quatro mecanismos básicos.
A captação de recursos a fundos perdidos, a serem gerenciados pelas Organizações da Sociedade Civil.
A reorientação das linhas de crédito e incentivo já existentes, de modo a compatibilizá-las com o conjunto destas propostas.
Um fundo específico para todas as atividades que não são passíveis de financiamento através das linhas de crédito existentes.
Uma linha de crédito especial, a ser operacionalizada através do FNE (Fundo
Constitucional de Financiamento ao Desenvolvimento do Nordeste).
Vale lembrar que os gastos federais com as ações de “combate aos efeitos da seca”, iniciadas em junho de 1998, vão custar aos cofres públicos cerca de 2 bilhões de
reais até dezembro de 1999. A maior parte desses gastos se refere ao pagamento das frentes produtivas e à distribuição de cestas – isto é, ao pagamento de uma renda
miserável (48 reais por família e por mês) e à tentativa de garantir a mera sobrevivência alimentar.
Ou seja, o assistencialismo custa caro, vicia, enriquece um punhado de gente e humilha a todos. A título de comparação, estima-se em um milhão o número de
famílias que vivem em condições extremamente precárias no semi-árido. Equipá-las com cisternas de placas custaria menos de 500 milhões de reais (um quarto dos 2 bilhões que foram liberados recentemente em caráter emergencial) e traria uma solucão definitiva ao abastecimento em água de beber e de cozinhar para 6 milhões de
pessoas.
O semi-árido que a Articulação está querendo construir é aquele em que os recursos seriam investidos nos anos “normais”, de maneira constante e planejada, em
educação, água, terra, produção, informação... para que expressões como “frente de emergência”, “carro-pipa” e “indústria da seca” se tornem rapidamente obsoletas, de
modo que nossos filhos pudessem trocá-las por outras, como “convivência”, “autonomia” e “justiça”.
256
A ARTICULAÇÃO NO SEMI-ÁRIDO É FORMADA POR 61 ENTIDADES A SEGUIR LISTADAS
#AACC, ABONGPE, ACB, ADERT, AMAS, AMAVIDA, APAN, APEB/SERRINHA, APIME, APTA, ASPAN, ASPOAN, AS-PTANE, AS-PTAPB, ASS, ASSEMA,
ASSOCENE, ARTICULAÇÃOÁGUA, CAA/GENTIODOOURO, CAA/NORTEDEMINAS, CAATINGA, CÁRITAS/CNBB, CEALNOR, CECOR,
CENTROLUIZFREIRE, CENTROSABIÁ, CERIS, CESE, COMPLETA, CONTAG, CRS, DED, DIACONIA, ECOS/FLORESTA, ECOS/RECIFE, ESPLAR, FETAPE,
FETARN, FETRAECE, FÓRUMBRASILEIRODEONG’SE MOVIMENTOS SOCIAISPARAOMEIO AMBIENTEEDESENVOLVIMENTO,
FUNDAÇÃOGRUPOESQUELBRASIL, FUNDAÇÃOQUINTETOVIOLADO, GARRA, GRUPOTERRA, IEH, IRPAA, MOC, NAPER, OXFAM, PATAC,
PÓLOSINDICALDEPETROLÂNDIA, SASOP, SEAN, SENV, SNE, SOSCORPO, TECHNE, TERRAVIVA, TIJUPÁ, UNICEF, VISÃOMUNDIAL
257
Anexo 6 - LISTA DOS MEMBROS DO CBHSF (Gestão 2016-2020)
REPRESENTANTE INSTITUIÇÃO TELEFONE / E-MAIL
1.
Tales Heliodoro Viana COPASA - Companhia de
Saneamento de Minas Gerais
Eduardo Luiz Rigotto COPASA - Companhia de
Saneamento de Minas Gerais
2.
Helder Freire Cardoso ASSEMAE - Associação das Empresas
Municipais de Água e Esgoto
Tânia Duarte
ASSEMAE - Associação das Empresas Municipais de Água e
Esgoto
3.
Ana Paula Leal Meira EMBASA - Empresa Baiana de Águas
e Saneamento
Vaga da Bahia – não preenchida
4.
Cássio Domingues dos Santos Pinheiro COMPESA - Companhia Pernambucana de
Saneamento
Igor de Oliveira Galindo COMPESA - Companhia
Pernambucana de Saneamento
5.
Valeska Cavalcante da Costa
CASAL - Companhia de Saneamento de Alagoas
José Roberto Valois Lobo CASAL - Companhia de Saneamento
de Alagoas
6.
José Edson Leite Barreto DESO - Companhia de Saneamento
Sergipe
Vaga de Sergipe – não preenchida
258
REPRESENTANTE INSTITUIÇÃO TELEFONE /E-MAIL
7.
João Carlos de Melo IBRAM - Instituto Brasileiro de
Mineração
Júlio César Nery Ferreira SINDIEXTRA
8.
Wagner Soares Costa
FIEMG - Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais
Marisa Arantes Teixeira BambuíBioenergia
9.
Jadir Silva de Oliveira
SINDAÇUCAR - Sindicato da Indústria de Fabricação
do Álcool no Estado
de Minas Gerais
Carina Mirian Barbosa Ferreira
Associação das Indústrias Sucroenergéticas do Estado
de
Minas Gerais
10.
Sérgio Bastos Federação das Indústrias do Estado
da Bahia – FIEB
Bruno Ferreira
Bahia Mineração LTDA
11.
Rafael Araújo de Souza Coelho Federação das Indústrias do Estado
de Pernambuco – FIEPE
Josias Inojosa de Oliveira Filho
Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco - FIEPE
REPRESENTANTE INSTITUIÇÃO TELEFONE /E-MAIL
12.
Adson Roberto Ribeiro Associação da Bacia do São Pedro
Dalmi Veloso Sindicato dos Produtores Rurais de
Paracatu
259
13.
Maria Gabriele dos Santos
Pessoa Física–Irrigante
Antônio José Machado Rocha
Condomínio de Irrigação Paracatu Entre Ribeiros
14.
José Cisino Menezes Lopes AIBA - Associação dos Agricultores e
Irrigantes da Bahia
César Augusto TumlleroBusato Associação dos Criadores de Gado
do Oeste da Bahia
15.
Ednaldo de Castro Campos Associação dos Fruticultores da
Adutora da Fonte – AFAF
MarileneZancanaroZanella
Pessoa Física–Irrigante
16.
Heron Ouriques Gomes
Associação dos Produtores Rurais Irrigantes do Vale do
Moxotó -
UNIVALE
Vaga de Pernambuco – Não preenchida
17.
Vaga de Sergipe – Não preenchida
Vaga de Sergipe – Não Preenchida
REPRESENTANTE INSTITUIÇÃO TELEFONE / E-MAIL
18.
Israel Barreto Cardoso Ass. dos ProprietáriosCondutores
de Barcos da Ilha doRodeadouro
Vaga da Bahia – Não preenchida
REPRESENTANTE INSTITUIÇÃO TELEFONE /E-MAIL
260
19.
Raimundo Ferreira Marques
Federação dos Pescadores Artesanais e Aquicultores de
Minas Gerais – FEPAMG
Orlando Felix da Fonseca
Colônia de Pescadores Z-05 de Três Marias
20.
DomingosMárcio Matos
Colônia de Pescadores Z-60 de Juazeiro
Almacks Luiz Silva
Associação dos Condutores de Visitantes do Morro do
Chapéu
21.
Vaga de Pernambuco – Não preenchida
Vaga de Pernambuco – Não preenchida
22.
José Maciel Nunes de Oliveira
FEPEAL- Federação dos Pescadores do Estado de Alagoas
Alfredo Fernandes
Colônia de Pescadores Z-12
REPRESENTANTE INSTITUIÇÃO TELEFONE /E-MAIL
23.
Mozart Bandeira Arnaud
CHESF
261
Sonáli Cavalcanti Oliveira
CHESF
24.
Renato Junio Constâncio
CEMIG - Companhia Energética de Minas Gerais
Marcelo de Deus Melo
CEMIG - Companhia Energética de Minas Gerais
REPRESENTANTE INSTITUIÇÃO TELEFONE /E-MAIL
25.
Lessandro Gabriel da Costa Associação Ambientalista do Alto São Francisco – ASF
Hilda de Paiva Bicalho Ambiental Piedade
26.
Silvia Freedman RuasDurães Instituto Opará
Antônio Eustáquio Vieira MOVER - Movimento Verde
Paracatu
27.
José Valter Alves
Ass. ComunitáriaSobradinho II
Dayse Maria Aparecida da Fonseca Ass. Comunitária dos Apicultores de Engenheiro Navarro/MG
28.
ApoloHeringerLisboa Instituto Guaicuy
Regina Célia Greco Santos Associação de Usuários da Bacia
Hidrográfica do rio Pará
29.
Johann Gnadlinger IRPAA - Instituto Regional da
Pequena Agropecuária Apropriada
262
Remir José dos Santos
Associação dos Pequenos Produtores Agrovila 18
30.
Elias da Silva
Associação de Desenvolvimento Sustentável –Adessus
Vaga de Pernambuco – Não preenchida
31.
Anivaldo de Miranda Pinto
FDA - Fórum de Defesa Ambiental
Jorge Izidro dos Santos
Instituto Ecoengenho
32.
Rosa Cecília Lima Organização Sociocultural Amigosdo
Turismo e Meio Ambiente –Oscatma
Vaga de Sergipe
REPRESENTANTE INSTITUIÇÃO TELEFONE /E-MAIL
33.
Raquel Pereira de Sousa
COMLAGO - Consórcio e Associações dos Municípios do Lago
de Três
Marias
Wilson José da Silva
Associação dos Municípios da Microrregião do Alto Paranaíba -
AMAPAR
34.
Vaga da Bahia – Não preenchida
Vaga da Bahia – Não preenchida
263
REPRESENTANTE INSTITUIÇÃO TELEFONE /E-MAIL
35.
MárcioTadeu Pedrosa
ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária
e Ambiental
Seção Minas Gerais
Josias Gomes Ribeiro Filho
Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e
Agronomia –
CREA/MG
36.
Marcelo de Oliveira Latuf UFBA - Universidade Federal da Bahia
Shirley Pimentel de Souza IFBA – Instituto Federal da Bahia
37.
Aluísio Ferreira Gomes
Autarquia Educacional do Vale do São Francisco
Lucio Alberto Pereira EMBRAPA –Semiárido
38.
Melchior Carlos do Nascimento
UFAL - Universidade Federal de Alagoas
Ana Catarina Pires Azevedo Lopes
ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária
e Ambiental
Seção Alagoas
39.
Tobias Basílio São Mateus
Ordem dos Advogados do Brasil – OAB/SE
Artemizio Cardoso de Resende
Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e
Agronomia.-CREA/SE
REPRESENTANTE INSTITUIÇÃO TELEFONE /E-MAIL
264
40.
Cláudio Pereira da Silva
Associação dos Quilombolas da Lagoa das Piranhas
Eliete Freitas da Rocha Associação dos Quilombolas Santo
Inácio
REPRESENTANTE INSTITUIÇÃO TELEFONE /E-MAIL
41.
ManoelUilton dos Santos
Tuxá - Rodelas
Anália Aparecida da Silva Tuxá - Pirapora
42.
Iveraldo Pereira Junior
Fulni-ô
Ricardo de Campos Tingui-Botó
REPRESENTANTE INSTITUIÇÃO TELEFONE /E-MAIL
43.
João Nogueira S. Júnior Prefeitura Municipal de Lagoa da
Prata
Cristiano Dias Carneiro Prefeitura Municipal de Itaúna
44.
Luciano de Sousa Lino Prefeitura Municipal de Pompéu
Adenilson Rodrigues Rubim Prefeitura Municipal de Três Marias
45.
Edivan Roberto Alves Cardoso
Prefeitura Municipal de Mamonas
Ronaldo Soares Campelo Prefeitura Municipal de Lassance
265
46.
Demósthenes da Silva Nunes Júnior Prefeitura Municipal de São Desidério
Mário Eduardo Mignot
Prefeitura Municipal de Formosa do Rio Preto
47.
Fernanda de Cássia Aguiar Prefeitura Municipal de Luis Eduardo
Magalhães
Fabiano José G. Reis Prefeitura Municipal de Santa Rita
de Cássia
48.
MarconesLibório de Sá
Prefeitura Municipal de Salgueiro
José Coimbra Patriota Filho
Prefeitura de Afogados da Ingazeira
49.
Claudionor Vieira de Melo
Prefeitura Municipal de Cedro de São João
Albino Tavares
Prefeitura Municipal de Porto da Folha
50.
Antônio AvânioFeitosa
Prefeitura Municipal de Belo Monte
Antônio Jackson Borges Lima
Prefeitura Municipal de Penedo
REPRESENTANTE INSTITUIÇÃO TELEFONE / E-MAIL
266
Marília Carvalho de Melo
51.
SEMAD - Secretaria de Estado de Meio Ambiente e
Desenvolvimento Sustentável
Renata Maria de Araújo
SEMAD - Secretaria de Estado de Meio Ambiente e
Desenvolvimento
Sustentável
Maria Amélia de ConieMoura I
52. MattosLins
NEMA - Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos
Edison RibeirodosSantos S
EMA - Secretaria de Meio Ambiente
do Estado da Bahia
Antônio Valadares de Souza Filho
53.
SRHE - Secretaria de Recursos Hídricos e Energéticos
de
Pernambuco
HélioGurgel Cavalcanti
SRHE - Secretaria de Recursos Hídricos e Energéticos
de
Pernambuco
54. Artur Rogério Ferreira daMata SEMARH - Secretaria de Meio Ambiente e Recursos
Hídricos de
Alagoas
Aguardandoindicação S
RH - Superintendência de Recursos
Hídricos do Estado de Alagoas
55. GenivalNunesSilva A
SEMARH - Secretaria de Meio mbiente e dos Recursos
Hídricos de
Sergipe
Pedro de AraújoLessa A
SEMARH - Secretaria deMeio
mbiente e dos Recursos Hídricos de Sergipe
267
REPRESENTANTE INSTITUIÇÃO TELEFONE /E-MAIL
5
8
.
José Luiz de Souza
MI - Ministério da Integração Nacional
Athadeu Ferreira da Silva
CODEVASF - Companhia de
Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba
5
9
.
Renato Saraiva Ferreira MMA - Ministério do Meio
Ambiente
Larissa Alves da Silva Rosa MMA - Ministério do Meio Ambiente
6
0
.
Renato Dalla Lana MME - Ministério de Minas e
Energia
Domingos Romeu Andreatta MME - Ministério de Minas e Energia
6
1
.
Marcos Antônio Pereira de
Oliveira Silva
MPOG - Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão
Paulo Henrique Siqueira Isobe MPOG - Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão
Paulo Lima Penha
56.
Secretaria de Meio Ambientee Recursos Hídricos do DF
Maria Silvia Rossi Secretaria de Meio Ambientee
Recursos Hídricos do DF
João Ricardo Raiser
57.
Maurício da Veiga Jardim Jácomo
SEMARH - Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricosde
Goiás
SEMARH - Secretaria de Meio
Ambiente e Recursos Hídricosde
Goiás
268
6
2
.
Graziela Rodrigues de Almeida FUNAI - Fundação Nacional do Índio
Carlos Roberto dos Santos
FUNAI - Fundação Nacional do Índio
269
Anexo 7 - LISTA COM OS MEMBROS DA CCR DO SUBMÉDIO SÃO
FRANCISCO (GESTÃO 2016-2020)
CONSELHEIRO INSTITUIÇÃO
1. João Raphael Silva de
Queiroz
2. João Virgílio Felipe Lima
Companhia Pernambucana de Saneamento - COMPESA
Companhia Pernambucana de Saneamento - COMPESA
3. Titular pertence à CCR Médio
4. Joaquim Ferreira de Medeiros Neto
Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Juazeiro - SAAE Juazeiro
5. Milton Bin
6. Rafael Araújo de Souza
Coêlho
Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco -
FIEPE
Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco –
FIEPE
7. Titular pertence à CCR Médio
8. Thaisi Caroline Tavares
Oliveira
Agro Indústrias do Vale São Francisco S/A - Agrovale
9. Titular pertence à CCR Médio
10. Cláudio Ademar da Silva
Cooperativa dos Produtores Agropecuários do Projeto
Glória Ltda. – COOPAG
11. Antônio Alexandre Balbino Reis
12. João Batista de Araújo Silva
Associação dos Irrigantes da Boa Vista Associação dos Produtores Rurais do Vale do Moxotó–
UNIVALE
13. Israel Barreto Cardoso Associação dos Proprietários Condutores de Barcos da
Ilha do Rodeadouro-
14. Luiz Alberto Rodrigues
Dourado
15. Domingos Márcio Matos
Associação dos Condutores de Visitantes do Morro do
Chapéu
Colônia de Pescadores Z-60 de Juazeiro
16. Arnaldo Alves da Silva
17. José Ribeiro Filho
Colônia de Pescadores Z-39
Colônia de Pescadores Nossa Senhora Aparecida da
Serrinha
18. João Henrique de Araújo
Franklin Neto 19. Sonáli Cavalcanti Oliveira
Companhia Hidrelétrica do São Francisco - CHESF Companhia Hidrelétrica do São Francisco – CHESF
20. Johann Gnadlinger
21. Francisco Ivan de Aquino
Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada -
IRPAA
Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio
Ambiente da Bahia – SINDAE
22. Elias da Silva
23. Giovanne Henrique Sátiro
Xenofonte
Associação de Desenvolvimento Sustentável
Centro de Assessoria e Apoio aos Trabalhadores e
Instituições Não Governamentais Alternativas –
CAATINGA
24. Almacks Luiz Silva Consórcio de Desenvolvimento Sustentável da
Diamantina
25. Yvonilde Dantas Pinto
Medeiros
26. Vivien Luciane Viaro
Universidade Federal da Bahia – UFBA
Departamento de Engenharia Ambiental
Universidade Federal da Bahia
27. Julianeli Tolentino de Lima
28. Aberlado Antônio de
Assunção Montenegro
Universidade Federal do Vale do São Francisco -
UNIVASF
Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE
29. Manoel Uilton dos Santos Tuxá – Rodelas
270
CONSELHEIRO INSTITUIÇÃO
30. Suplente pertence à CCR Alto
31. Cicera Leal Cabral
32. Suplente pertence à CCR
Baixo
Pankará
33. João Pedro da Silva Neto
34. José Marcelo dos Santos
Prefeitura Municipal de Juazeiro/BA
Prefeitura Municipal de Abaré/BA
35. Luciano Duque de Godoy
Sousa 36. Manoel Silvestre de Araújo
Prefeitura Municipal de Serra Talhada/PE Prefeitura Municipal de Terra Nova/PE
37. José Geraldo dos Reis Santos
38. Aderbal de Castro Meira Filho
Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia -
SEMA
Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia- SEMA
39. Marcelo Cauás Asfora
40. Mauro Roberto de Souza
Lacerda
Agência Pernambucana de Águas e Clima – APAC
Secretaria Executiva de Recursos Hídricos de Pernambuco
41. Manoel Ailton Rodrigues de
Carvalho
42. Minéia Clara dos Santos
CBH Salitre
CBH Salitre
43. Cícera Silvana L.L. Nunes
44. Aguardando indicação
CBH Lago de Sobradinho
CBH Lago de Sobradinho
45. Aguardando indicação
46. Aguardando indicação
CBH Pajeú
CBH Pajeú
47. Aguardando indicação
48. Aguardando indicação
CBH Moxotó – CBH CONSU/Poço da Cruz
CBH Moxotó – CBH CONSU/Poço da Cruz