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1 Psicoterapia Humanista: um convite à Sombra das polaridades Humanistic Psychotherapy: an invitation to the Shadow of the polarities Fernanda Minella Resumo Este artigo enfoca o fenômeno do desconhecimento de certos aspectos de nossa personalidade e a importância deles serem trazidos à consciência durante o processo psicoterápico para uma melhoria da saúde psíquica. Utilizamos como base o conceito da Sombra de Carl Gustav Jung. Falamos então sobre a sombra de polaridades da personalidade, tema abordado pela teoria da Gestalt-Terapia, e sobre conflitos inter e intrapsíquicos como decorrentes deste fenômeno e como eles podem ser vistos através da teoria de psicoterapia humanista, integrando as abordagens da Psicoterapia Centrada na Pessoa e da Gestalt-terapia. Palavras-chave: sombra, polaridades, conflitos psíquicos, psicoterapia humanista. Abstract This article focuses the phenomenon of the obscurity of certain aspects of our personality and the importance of them being brought to consciousness for an improvement of the psychic health during the psychotherapy process. Thus, we use the concept of Shadow, by Jung. We´ll then approach the matter of polarities´ shadow, concept by the Gestalt-Therapy theory and the issue of inter and intra-psychic conflicts as a consequence of that obscurity and how the Person-Centered Therapy and the Gestalt-Therapy approach those matters. Key words: shadow, polarities, psychic conflicts, humanistic psychotherapy. Por que pessoas “boas” fazem coisas “ruins”? Temos acompanhado, através das redes de comunicação nacionais e internacionais, verdadeiros escândalos morais envolvendo pessoas acima de qualquer suspeita. Estamos

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Psicoterapia Humanista: um convite à Sombra das polaridades

Humanistic Psychotherapy: an invitation to the Shadow of the

polarities

Fernanda Minella

Resumo

Este artigo enfoca o fenômeno do desconhecimento de certos aspectos de nossa

personalidade e a importância deles serem trazidos à consciência durante o processo

psicoterápico para uma melhoria da saúde psíquica. Utilizamos como base o conceito da

Sombra de Carl Gustav Jung. Falamos então sobre a sombra de polaridades da personalidade,

tema abordado pela teoria da Gestalt-Terapia, e sobre conflitos inter e intrapsíquicos como

decorrentes deste fenômeno e como eles podem ser vistos através da teoria de psicoterapia

humanista, integrando as abordagens da Psicoterapia Centrada na Pessoa e da Gestalt-terapia.

Palavras-chave: sombra, polaridades, conflitos psíquicos, psicoterapia humanista.

Abstract

This article focuses the phenomenon of the obscurity of certain aspects of our

personality and the importance of them being brought to consciousness for an improvement of

the psychic health during the psychotherapy process. Thus, we use the concept of Shadow, by

Jung. We´ll then approach the matter of polarities´ shadow, concept by the Gestalt-Therapy

theory and the issue of inter and intra-psychic conflicts as a consequence of that obscurity and

how the Person-Centered Therapy and the Gestalt-Therapy approach those matters.

Key words: shadow, polarities, psychic conflicts, humanistic psychotherapy.

Por que pessoas “boas” fazem coisas “ruins”?

Temos acompanhado, através das redes de comunicação nacionais e internacionais,

verdadeiros escândalos morais envolvendo pessoas acima de qualquer suspeita. Estamos

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falando de indivíduos tidos pela sociedade contemporânea como “pessoas boas”. Em

noticiários sensacionalistas, ouvimos falar de personalidades reconhecidas mundialmente por

seus trabalhos seja nas Artes, na Política e na Religião que se viram envolvidas em situações

socialmente inaceitáveis ou inadequadas e incongruentes à sua imagem social. Da mesma

forma, nesses meios de comunicação, ouvimos – estarrecidos – manchetes revelando pais e

mães de família como pessoas desalmadas devido a comportamentos violentos e anti-sociais

com seus próprios filhos. No entanto, a pergunta que cada vez mais é feita pela sociedade é:

por quê? Como é possível que aquela mãe zelosa tenha sido capaz de violentar seus próprios

filhos? Como é possível que aquela atriz rica roube artigos de uma loja de departamento?

Como explicar aquele ator que produziu um filme cristão e que se diz extremamente religioso,

após beber demais, acaba proferindo declarações anti-semitas? O que dizer daquele político,

pai de família que defendia valores cristãos e familiares e que revelou viver uma vida dupla

ao anunciar ter um caso sexual com um homem? Como é possível que religiosos

aparentemente com valores nobres que julgam e condenam o homem por usar camisinha, ao

mesmo tempo, sejam exploradores sexuais de crianças?

Neste artigo provavelmente não encontraremos uma resposta definitiva a tais

perguntas. No entanto, podemos buscar uma forma de tentarmos compreender este fenômeno:

ou seja, da sombra de nossas polaridades, e sobre a importância dela ser trazida à luz da

consciência para a melhoria da saúde psíquica. Falaremos de conflitos intra e inter-psíquicos

resultantes do desconhecimento da sombra. Nesta tentativa de compreensão, sugerimos a

psicoterapia de enfoque humanista, integrando as abordagens Centrada na Pessoa e Gestáltica,

como uma possibilidade de auxiliar pessoas em conflito no processo de desvendamento de

suas sombras.

A Sombra

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A visão dicotômica do ser humano ainda impera na sociedade ocidental

contemporânea. E, por conta desse modo de se ver o homem, muitas pessoas possuem

dificuldade de aceitar que ambas as dualidades, bem e mal, por exemplo, possam residir

harmonicamente num mesmo indivíduo. Para muitos, há uma divisão bastante clara e rígida

entre o bem e o mal, de modo que seriam excludentes: ou somos pessoas boas ou pessoas

más. E, conscientemente, jamais alguém escolheria identificar-se com a segunda opção.

O psicólogo Carl Gustav Jung, em sua teoria acerca do Inconsciente Pessoal, criou o

conceito de Sombra que seria uma instância psíquica que abrigaria todos os conteúdos

negados e reprimidos pela Persona, ou seja, conteúdos não identificados como pertencentes à

personalidade. Dentre os aspectos “escondidos” na sombra estariam desejos, tendências,

experiências e memórias rejeitadas por serem consideradas incompatíveis à noção de eu do

indivíduo e aos padrões sociais vigentes; seria a sombra do Ego (Ballone, 2005). Para Jung,

possuir uma sombra não é privilégio de ninguém: todas as pessoas detêm, inconscientemente,

diversas facetas desconhecidas de sua personalidade. E, em geral, como defesa, as tememos,

negamos ou projetamos no meio. Ainda, segundo Ballone, a sombra pode ser perigosa

quando não trazida à luz da consciência, à medida que o indivíduo tende a projetá-la no

exterior ou deixar-se dominar por ela. Sendo assim, quanto mais a pessoa tiver consciência

dos elementos de sua sombra, haverá menos possibilidade dela ser “pega de surpresa” pelo

Inconsciente. Entretanto, a sombra não pode simplesmente cessar de existir, pois segundo o

autor “uma pessoa sem Sombra não é uma pessoa completa, mas uma caricatura

bidimensional que rejeita a mescla do bom e do mau e a ambivalência presentes em todos

nós” (Ballone, 2005, Psiqweb). De tal forma, a noção de que uma pessoa considerada “boa”

jamais seria capaz de ter pensamentos ou ações incongruentes a tal imagem passou a ser uma

ilusão. Ballone ressalta que a sombra não é uma força exclusivamente negativa no psiquismo:

“Ela é um depósito de considerável energia instintiva, espontaneidade e vitalidade, e é a fonte

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principal de nossa criatividade”. Poderíamos dizer então que tal conceito revolucionou a

visão estanque acerca do psiquismo humano, proporcionando uma compreensão mais

integrativa acerca dos fenômenos psíquicos que se tornaram muito mais complexos e, por

que não, misteriosos. Afinal, facetas opostas, de fato, poderiam residir numa mesma

personalidade e a saúde psíquica implicaria um necessário desvelar da sombra.

A Gestalt-terapia, nos escritos de Perls, Hefferline e Goodman (1997), também traz a

noção de aspectos escondidos da consciência, entretanto, fala-se em outro termo: o anti-social.

Na obra Gestalt-Terapia (1997, p.142), os autores referem que anti-sociais seriam “todos os

instintos ou objetivos que temos, mas que não aceitamos como nossos, que mantemos

inconscientes ou projetamos nos outros”. Tais instintos seriam inibidos e deliberadamente

expulsos da awareness (fluxo de conscientização sensório-motor-emocional-cognitivo-

energético) por não combinarem com uma imagem aceitável de nós mesmos. Perls et al.

referem que uma vez que este instinto é liberado e aceito como parte de quem somos,

podemos perceber que não se trata de algo incomum. Inclusive podendo até ser aceito pela

sociedade; e a intensidade destrutiva que lhe era atribuída diminui: “um impulso que

sentíamos vagamente ser diabólico ou homicida resulta ser um simples desejo de evitar ou

rejeitar alguma coisa, e ninguém se importa se a rejeitamos ou não”. (Perls et al., 1997,

p.142). Os autores gestálticos discorrem sobre o papel da repressão na formação da sombra ou

do lado anti-social da personalidade. Para eles, é a repressão que: 1- torna a ideia uma ameaça

persistente; 2 – obscurece sua intenção limitada e faz com que não vejamos a realidade social;

3- pinta-a com cores vívidas do proibido e 4- cria ela mesma a ideia de destrutividade,

“porque a repressão é uma agressão contra o self e essa agressão foi atribuída ao instinto”

(Perls et al., 1997, p.142).

Através de uma breve revisão teórica a respeito do conceito de sombra, fica muito

clara a importância do papel da sociedade em sua constituição. É algo como se as normas

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sociais fossem responsáveis por determinar quais elementos seriam considerados negativos e

não-aceitáveis e que outros aspectos seriam positivos e desejáveis a um indivíduo. Entretanto,

regras sociais costumam mudar de geração para geração e de cultura para cultura. Perls e seus

colegas (1997) apontam que houve diversas mudanças nas convenções sociais no decorrer

dos anos, acarretando numa relativização de conceitos. Por exemplo, algo que anos atrás era

considerado vergonhoso hoje não o é mais. O que ocorre? Sucede-se que talvez a sociedade

venha ampliando o seu conceito de humanidade. Se aceita determinado comportamento a

partir do momento em que este é incorporado à imagem do que é ser humano: “o homem não

se esforça para ser bom, mas é humano esforçar-se para conseguir o que é bom” (Perls et al.,

1997, p.143).

A constituição da sombra dá-se paralelamente à formação de nosso self. Se por um

lado há a repressão, por outro há um processo de identificação. Reprimimos certos aspectos

para mantermos a face polida que adquirimos ao nos identificarmos e introjetarmos a face

polida de pessoas critério, ou seja, figuras significativas em nosso desenvolvimento. Para Carl

Rogers (1992), autor da Abordagem Centrada na Pessoa, formamos nosso self a partir da

interação com o ambiente e, principalmente, através da percepção que temos do modo como

as pessoas fazem suas avaliações. Para Rogers e Kinget (1977), todas as crianças, desde a

mais tenra idade, possuem uma necessidade de consideração positiva (de aceitação), o que

significa que necessitam de uma avaliação positiva da parte de suas pessoas critério. Elas

agem como modelos de “como-devo-ser” para a criança, que por sua vez, responde a isso se

identificando com determinadas características desses modelos e introjetando-as. Se os

responsáveis por essa criança estabelecerem com ela uma relação de aceitação condicional,

ela tenderá a personificar os aspectos considerados positivos ou aceitáveis pelos outros e

reprimir experiências organísmicas inaceitáveis pelo meio. E, dessa forma, diversos

elementos passam a ser jogados à sombra dessa criança; no entanto, não se trata de elementos

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negativos necessariamente. Falamos de aspectos que o meio considerou inaceitável, mas que

originalmente eram congruentes à experiência daquela criança e, dessa forma, deveriam ter

sido permitidos sua expressão. Estamos falando aqui da expressão da tendência à atualização

(Rogers e Kinget, 1977) que é presente em todo ser vivo e aponta para o desenvolvimento de

suas capacidades.

A psicóloga gestáltica Beatriz Cardella discorre sobre o processo de formação do self

e o papel da introjeção. A autora (2002) fala que o processo de crescimento ocorre pela

assimilação de diversos construtos vindos do exterior como: conceitos, valores, moral, fatos,

comportamentos, padrões sociais. No entanto, a assimilação deve acontecer pela integração de

tais elementos a fim de que se tornem, de fato, parte da personalidade. “A introjeção,

entretanto, implica a incorporação de aspectos do meio que se tornam elementos estranhos, já

que não passaram por uma discriminação prévia para serem aceitos ou rejeitados” (Cardella,

2002, p.59). Neste sentido, elementos que são introjetados, mas não assimilados

criativamente, tornam-se um obstáculo à formação de uma personalidade autêntica, podendo

culminar numa desintegração da própria personalidade à medida que surgem conflitos

imobilizadores que impedem o crescimento da pessoa. Cardella (2002, p.59) explica que “ao

incorporar elementos estranhos, o indivíduo corre o risco de deparar com aspectos

incompatíveis e empregar uma enorme energia na tentativa de reconciliá-los”. Essa pessoa

pode ter se deparado com sua sombra e estar vivenciando um conflito. Podemos inferir que

determinados aspectos “engolidos” pelo indivíduo e não integrados à sua personalidade

poderão ser projetados no meio. Como forma de defender-se de partes de si mesmo que

considera ofensivas ou difíceis, a pessoa desapropria-se destas e as projeta nos outros,

responsabilizando-os pelo que na verdade é seu (Cardella, 2002). Perls et al. (1997, p.149)

afirmam que o aspecto introjetado poderá ter dois destinos: “ou é uma substância estranha e

dolorosa no corpo, e é vomitado (um tipo de aniquilação); ou o self se identifica parcialmente

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com o introjeto, reprime a dor e procura aniquilar parte de si mesmo”. Neste sentido, fica

claro qual seria a escolha mais saudável.

Polaridades e Conflitos

Até aqui falamos um pouco sobre o processo de formação do self e da sombra. E

agora, entramos então no campo dos conflitos - produto da interação de forças até então

desconhecidas pelo indivíduo que se chocam por representarem dois times aparentemente

adversários: luz versus sombra; eu versus não-eu...

O tema das polaridades não é recente na Psicologia, nem nas Religiões Ocidentais ou

na Filosofia Oriental. Podemos inferir que polarizar é uma tendência humana devido ao nosso

hábito de classificar, categorizar e analisar a fim de facilitar nosso modo de lidar com o

mundo. A psicóloga gestaltista Sônia Galarza, em seu artigo sobre polaridades publicado no

site soniagalarzapsicologa.com (sem data), refere que o ato de polarizar implica a

incapacidade de contemplarmos simultaneamente os pólos de uma qualidade. Para integrar o

conceito de polaridades, Galarza explica que Perls utiliza a influência da teoria da Indiferença

Criativa de Sigmund Friedlander, que diz que em cada acontecimento há um ponto zero a

partir do qual ocorre a diferenciação dos contrários e estes, por sua vez, demonstram uma

grande afinidade um pelo outro. O ponto zero seria o ponto de união entre os opostos; onde as

forças se neutralizam. A psicóloga segue explicando que para Perls, os opostos existem pela

diferenciação de algo “não diferenciado”. Dessa forma, partindo do princípio que a existência

de um oposto depende do outro, a relação entre eles se dará num processo dialético.

Joseph Zinker é um autor gestáltico que aborda de maneira criativa a questão dos

conflitos inter e intrapsíquicos, utilizando-se do trabalho com as polaridades e de sua

integração como forma de possibilitar uma ampliação da awareness e do contato do indivíduo

acerca de seus aspectos desintegrados. É importante ressaltar que Perls et al. (1997) criticam a

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diferenciação entre os conceitos inter e intra. Os autores (1997, p.162) referem que “(...) a

distinção entre ‘intrapessoal’ e ‘interpessoal’ é pobre, porque toda personalidade individual e

toda sociedade organizada se desenvolvem a partir de funções de coesão (...) e na realidade, as

funções contrárias de divisão são também essenciais para ambos”. Para estes autores

gestálticos, ao invés de interno/externo, o conceito fundamental é o de fronteira-de-contato –

que é onde se dá a experiência entre o organismo e o meio e é o local em que o indivíduo

experiencia o eu em relação ao não-eu; e sintetiza a necessidade de união e de separação

(Cardella, 2002). Entretanto, a expressão ‘conflito interno’ contém uma verdade importante:

estes tipos de conflitos, que ocorrem dentro da pele, na psique (tensões opostas, mecanismos

de regulação), “são todos em geral confiáveis e não-neuróticos; pode-se confiar que sejam

auto-reguladores” (Perls et al., 1997, p.162).

Zinker, no livro “Processo Criativo em Gestalt-terapia” (1999), fala sobre a

importância da reconciliação das diferenças para o bem-estar seja individual ou social. E

quando fala de reconciliação, fala de integração dessas forças opostas. Para este

psicoterapeuta, o ser humano é um conglomerado de forças polares que se entrecruzam, sendo

que para cada força existem diversas outras opostas a ela. As polaridades estão relacionadas à

história pessoal e à autopercepção. É a percepção da realidade interior de cada um que irá

determinar que características serão aceitáveis (ego-sintônicas) ou inaceitáveis (ego-

distônicas) para a consciência do indivíduo: “em geral, a auto-imagem exclui a dolorosa

awareness das forças polarizadas em nosso íntimo” (Zinker, 1999, p.219).

O autor gestaltista (1999) diz que os conflitos, sejam intrapessoais ou interpessoais,

têm origem no embate entre forças polares que residem no indivíduo. O autor (1999, p.218)

ressalta que nem todos os conflitos são não-saudáveis: “os conflitos podem ser saudáveis e

criativos ou confluentes e improdutivos”. Sendo que estes implicam o uso dos mecanismos de

defesa repressão e projeção, uma vez que o indivíduo acusa o outro de algo que é seu. Zinker

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(2001, p.138), em seu livro “A Busca da Elegância em Psicoterapia” que aborda a terapia

gestáltica de sistemas familiares e conjugais afirma doer muito “ficar sabendo de algo

horrível, vergonhoso, embaraçoso ou até mesmo belo sobre nós mesmos ou sobre os outros à

nossa volta (...). Não nos responsabilizamos por nossos sentimentos e ideias de ressentimento,

ciúme, raiva, estupidez, timidez, chatice, egoísmo (...)”. Já nos conflitos saudáveis, as

pessoas assumem suas diferenças e não as projetam. Trata-se aqui de indivíduos integrados e

com algum grau de autoconsciência.

Sobre a pessoa saudável, Zinker (1999) aponta que ela está ciente da maioria de suas

polaridades, inclusive daquelas pertencentes à sua sombra e, portanto, condenáveis pela

sociedade; mas é capaz de aceitar-se assim. Entretanto, é praticamente impossível que alguém

conheça totalmente as forças polares que residem em si. O autor diz que naturalmente haverá

pontos-cegos na awareness da pessoa saudável, mas que ao se deparar com eles, sua tendência

será encará-los e não defender-se. Já na pessoa perturbada, Zinker (1999, p.222) revela que há

imensos buracos em sua awareness: “sua visão de si mesma é rígida e estereotipada; ela é

incapaz de aceitar muitas partes de si mesma, como mesquinhez, homossexualidade,

insensibilidade, dureza”. Ou seja, aprende a projetar os aspectos que lhe foram condicionados

como inaceitáveis, pois se tornar consciente de determinadas polaridades geraria muita

ansiedade – terreno fértil para o surgimento de sintomas neuróticos. Pensando por este viés,

poderíamos inferir que alguns estados psicóticos surgiriam do aparecimento desorganizado e

caótico da sombra em pessoas com uma estrutura de personalidade frágil, especialmente em

situações inadequadas e ilógicas ao olhar externo.

Zinker (1999), ao falar sobre a auto-imagem, faz uma analogia aos lados claro e escuro

da lua, dizendo que o conflito intrapessoal envolveria o choque entre as polaridades clara e

escura da pessoa. Sendo que “um aspecto do lado escuro da lua é a consciência, ou superego –

inflexível e rígido” (Zinker, 1999, p.222). Já o conflito interpessoal decorreria do conflito

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intrapessoal: “quando o indivíduo reprime a awareness de parte de si mesmo e a projeta em

mais alguém. (...) É mais fácil brigar com alguém do que conosco mesmo. (...) É menos

doloroso atacar uma parte de nós mesmos culpando outra pessoa (...)” (Zinker, 1999, p.227).

Como exemplo de um conflito interpessoal, temos o caso dos cônjuges: “em geral,

apaixonamo-nos pela pessoa que representa as polaridades que estão em nossa sombra, depois

de dez anos de casamento, a característica atrativa não é mais uma coisa boa. Tornou-se algo

detestável” (Zinker, 1999, p.229 e 230). Normalmente, os conflitos acontecem quando um

parceiro ataca o outro em uma polaridade que lhe é sombria ou desconhecida.

Perls et al. (1997, p.160) referem que “pequenos conflitos simbólicos, e grandes

conflitos falsos e portanto inacabáveis como Mente+Corpo, Amor+Agressão,

Prazer+Realidade são meios de evitar os conflitos excitantes que teriam solução”. E que

conflitos importantes que poderiam modificar o status quo do indivíduo costumam ser

cuidadosamente evitados, pela necessidade de apego à segurança. “Renuncia-se ao conflito

tanto por medo quanto para não nos arriscarmos à desaprovação” (Perls et al., 1997, p.168).

Ainda, para os autores (1997, p.168), “é fácil evitar ocasiões de tentação, uma vez que

tenhamos concordado em sermos bons; é fácil considerar um impulso maligno e estranho a

nós quando nos identificamos com aqueles que o consideram assim”.

A psicoterapia faz um convite à sombra

A psicoterapeuta Christina Queiroz (2009, clinicadepsicoterapia.blogspot.com),

influenciada pelos autores Jung, Toro, Vieira, Reich e Rogers, diz que “quando deixamos de

trabalhar com nossa sombra, ela vai se tornando um espectro descabelado, de unhas

compridas, sem modos e costuma desenvolver certa autonomia. Essa autonomia é o que nos

surpreende”. Ela segue explicando que a sombra exerce uma influência silenciosa em nosso

dia-a-dia, no entanto, suas manifestações podem se irromper impulsiva e inesperadamente em

nossos comportamentos. Estamos falando de aspectos escondidos e renegados que precisam

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ser internalizados e integrados à nossa totalidade. Dessa forma, com o objetivo de

proporcionar um espaço seguro que promova a conscientização e a integração dos aspectos

sombrios, a psicoterapia humanista faz um convite para o desvelamento da sombra do cliente.

Tal processo pode vir a ocorrer a partir do momento em que a pessoa experiencia

determinadas atitudes do terapeuta, primeiramente descritas por Carl Rogers - criador da

Abordagem Centrada na Pessoa - como facilitadoras do processo terapêutico. Falaremos então

principalmente sobre o modo como a Gestalt-Terapia, através de técnicas, aborda o trabalho

com as polaridades e conflitos.

Em 1957, Rogers apontou, dentre outras, três principais atitudes como condições

necessárias e suficientes para promover uma mudança na personalidade durante o processo

terapêutico (Rogers e Kinget, 1977). Seria necessário que o cliente apreendesse e

experimentasse do terapeuta os estados de congruência, de consideração positiva

incondicional e de compreensão empática na relação. Segundo a teoria de relações humanas

proposta por Rogers, não cabe ao psicoterapeuta o papel de agente da mudança terapêutica.

Tal pressuposto vai ao encontro da crença na “ativação das forças vivas da reorientação”

(Rogers e Kinget, 1977, p.73) que seria a ação da tendência a atualização presente no

organismo. No entanto, tal ativação não se dá no vazio, mas sim num contexto que propicie

seu desenvolvimento. E, no caso da situação de psicoterapia, cabe ao terapeuta oferecer tais

condições. Rogers criticava a supervalorização da utilização das técnicas terapêuticas de

exploração e de interpretação dos fenômenos psíquicos, de modo que pouca atenção era dada

ao aspecto humano da relação. Deste modo, Rogers tinha o receio de que a descoberta das três

atitudes poderia vir a tornar-se mais uma técnica e perder o seu objetivo de estimular a

retomada de valores humanos nas relações.

O cliente geralmente chega ao profissional de saúde num estado de desacordo interno

(incongruência), ou seja, ele experimenta algum grau de sofrimento e de conflito. “Com

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efeito, durante meses, às vezes anos, viveu na certeza angustiante de que certos aspectos de

sua personalidade eram ou diferentes, ou inferiores, ou ‘maus’ ou ‘anormais’” (Rogers e

Kinget, 1977, p. 85). O terapeuta que o recebe, por sua vez, deve estar congruente –ser ele

mesmo - e integrado na relação. É imprescindível que o profissional esteja consciente de seu

modo de estar com o cliente naquele momento, no que tange aos seus sentimentos e suas

ações. O ideal é que o cliente consiga perceber e experimentar no terapeuta a atitude genuína

de consideração positiva incondicional, ou seja, a sensação de que o terapeuta aceita cada

aspecto de sua experiência. A terceira atitude é a empatia, qualidade responsável pela

formação da ponte psicológica entre terapeuta e cliente. É através dela que o terapeuta entra

em contato com a realidade psicológica do outro. Empatia refere-se à “capacidade de se

imergir no mundo subjetivo do outro e de participar de sua experiência” (Rogers e Kinget,

1977, p.104); é colocar-se no lugar do outro e enxergar o mundo através de seus olhos,

momentaneamente. No entanto, é extremamente raro encontrar essas três atitudes

verdadeiramente presentes na personalidade de alguém ou presenciar um terapeuta que as

tenha desenvolvido habilmente. Mas aqueles terapeutas que, de fato as possuem, são capazes

de oferecer um ambiente que facilita a emergência da força vital em seus clientes.

Inicialmente, eles passam a sentir-se aliviados do peso da sombra a partir do momento em que

se sentem à vontade para conhecê-la, expô-la e dividi-la com o terapeuta e ainda perceber que

este a aceita como parte do self deles. Rogers e Kinget (1977) estabeleceram quatro etapas

características do processo terapêutico: descrição, análise, avaliação e integração ou

reorganização. Na primeira fase, há a apresentação dos problemas e sintomas e atitudes

críticas com relação ao “eu”. Na fase de análise, há a exploração e avaliação do

comportamento; emergência de uma imagem consciente do eu e a descoberta de contradições

experienciais. Na etapa da avaliação, ocorre uma percepção de si a um nível mais profundo; a

pessoa passa a tomar-se como centro de avaliação e uma reorganização inicia-se. Na última

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fase, há uma integração: aceitação de si; há uma percepção de progresso; existe uma avaliação

positiva de si e projetos começam a ser esboçados. Obviamente, não estamos falando aqui de

um efeito mágico, mas de um processo que pode durar de semanas a anos e irá depender

totalmente da qualidade de relação estabelecida entre terapeuta e cliente. Rogers (2001, p.205)

através de sua experiência como terapeuta aprendeu que, uma vez “libertos de toda a ameaça

e com possibilidade de escolha” os objetivos que muitos clientes buscam encontram-se na

expressão “ser o que realmente se é” por detrás das fachadas, para além do “devia”, para além

do que os outros esperam, para além de agradar aos outros. E ainda, a caminho da

autodireção, a caminho de ser um processo, a caminho de ser, a caminho de uma abertura para

a experiência, a caminho de uma aceitação dos outros, a caminho de uma confiança em si

mesmo. Todavia, Rogers (2001, p.201) reconhece os mal-entendidos provindos da libertação

do “ser quem realmente se é”: “uma reação (...) habitual (...) é que ser o que realmente se é

significaria ser mau, descontrolado, destrutivo. Significaria largar uma espécie de monstro no

mundo”. Entretanto, a vivência na terapia desmistifica tal impressão, à medida que “o

indivíduo descobre pouco a pouco que pode ser a sua irritação, quando essa irritação é sua

verdadeira reação, e que aceita ou transparente, essa irritação não é destrutiva” (Rogers, 2001,

p.201). O autor percebeu que quanto mais os clientes aceitarem e se permitirem sentir o que

realmente sentem, mais facilmente entrarão em harmonia em seu organismo. Os indivíduos

passam a descobrir que da mesma forma que podem ser hostis, coléricos e sensuais, também

podem ser ternos, cooperadores e respeitosos. Dessa forma, quando a pessoa vivencia tais

aspectos de “maneira íntima e os aceita na sua complexidade, realizam uma harmonia

construtiva e não um mergulho em qualquer forma de vida descontrolada” (Rogers, 2001,

p.201). O autor complementa: “ser completamente esse nosso caráter único como ser humano

não é, segundo a minha experiência, um processo que se deva qualificar de mau”.

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Segundo Beisser (1970, p.110), “Perls não delineou explicitamente a sua teoria de

mudança, mas esta encontra-se subentendida em grande parte de sua obra e está implícita na

prática das técnicas da Gestalt. Eu chamo-lhe a teoria paradoxal da mudança”. Esta teoria

consiste num paradoxo, pois propõe que a mudança é conseqüência do ato de permanecer

onde se está: a pessoa se torna o que é. Assim como os rogerianos, os gestaltistas rejeitam o

papel de agentes de mudança: “acreditam que a mudança não acontece por ‘experimentação’,

coerção ou persuasão, nem por introvisão, interpretação ou quaisquer outros meios desse

gênero” (Beisser, 1970, p.110). Uma mudança é possível apenas a partir do momento em que

a pessoa consolida uma base, sendo o que se é. Beisser diz que a pessoa que procura

psicoterapia está em conflito entre duas facções intrapsíquicas. O indivíduo, como um

pêndulo, “desloca-se constantemente entre o que ‘deveria ser’ e o que pensa que ‘é’, nunca se

identificando plenamente com uma nem outra”. A Gestalt-Terapia propõe então que o cliente

experimente ao máximo como é estar em cada polaridade, ou seja, trazê-las à luz. “O gestalt-

terapeuta acredita em encorajar o paciente a penetrar e tornar-se seja o que for que ele estiver

experimentando nesse momento” (Beisser, 1970, p.111). Segundo Galarza (sem data),

sinteticamente, o trabalho com as polaridades e conflitos se dá de acordo com o seguinte

processo: os opostos devem ser claramente definidos (formação de uma figura nítida) para

que possa haver um diálogo entre eles (diferenciação e expressão). Então, após começarem a

entrar em contato, a se reconhecerem, que essas polaridades se escutem e se entendam,

chegando a um acordo. Portanto, “as polaridades não são contradições irreconciliáveis, apenas

distinções que serão integradas ao processo de formação e destruição de gestalten.(...) As

emoções negativas são essenciais para a dicotomia da personalidade” (Galarza, sem data). De

acordo com essa psicóloga, é necessário reconhecermos e expormos tal dicotomia, pois a

partir do momento em que passa a ser integrada, sua energia – antes paralisada no conflito – é

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liberada; e a pessoa terá a possibilidade de perceber a totalidade da situação, como uma

gestalt, apreciando seus próprios recursos.

Perls et al. (1997) falam sobre por que clientes e terapeutas costumam acreditar que

conflitos internos são nocivos e devem ser obrigatoriamente dissolvidos: 1- são ruins porque

desperdiçam energia e causam sofrimento; 2- levam à agressão e à destruição; 3- são ruins

porque uma das partes não é saudável ou é anti-social, e em lugar de se permitir que participe

do conflito, deveria ser eliminada ou sublimada e 4- conflitos equivocados são ruins, e os

conteúdos do inconsciente são, na sua maior parte, arcaicos e estão equivocados (deslocados).

Os autores levantam uma polêmica ao afirmarem que a dissolução de conflitos não é tarefa da

psicoterapia. “Os ‘conflitos internos’, em particular, são fortemente energizados e plenos de

interesse, e são o meio de crescimento; a tarefa da psicoterapia é torná-los conscientes de

modo que se nutram de material ambiental novo e atinjam um ponto de crise” (Perls et al.,

1997, p.163). Este tipo de conflito leva a uma nova figura, que nem terapeuta ou cliente sabe

qual é de antemão, mas objetiva-se que quando as forças opostas estão em awareness e em

contato “um impulso difícil encontre espontaneamente sua medida numa nova configuração,

por meio do ajustamento criativo e da auto-regulação organísmica convalescente” (Perls et al.,

1997, p.165). Dessa forma, seria insensato que o terapeuta, por uma angústia pessoal ou

inabilidade, tente apaziguar um conflito ou erradicá-lo ou anular pela interpretação os

elementos em disputa. Se isso for feito, a neurose se instala, havendo o impedimento do

processo de destruição e de assimilação; condenando o cliente “a um sistema débil que nunca

será perfeitamente auto-regulador” (Perls et al., 1997, p.164). Não deve se enfraquecer o

conflito, mas sim fortalecer o self e a awareness. Os autores (1997, p. 167) referem que “à

medida que prestamos atenção ao conflito e este se intensifica, alcançamos mais depressa a

atitude de imparcialidade criativa e nos identificamos com a solução que surge”.

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Shepherd (1970, p. 303) refere que a abordagem gestáltica “oferece poderosas técnicas

para a intervenção nos comportamentos neuróticos e de autofrustração, assim como para a

mobilização e reorientação da energia humana, no sentido do desenvolvimento da capacidade

de independência e de criação”. Entretanto, devem ser utilizadas com cautela devido a seus

efeitos poderosos, pois facilitam o acesso e a libertação de intensos afetos. Para tanto, o

terapeuta que utiliza “essa abordagem não deve recear nem ser incapaz de permitir ao

paciente que continue até findar sua experiência de dor, cólera, medo ou alegria. (...) Sem tal

capacidade, o terapeuta pode deixar o paciente abortado, inacabado, aberto e vulnerável”

(Shepherd, 1970, p.303).

“Uma das mais valiosas contribuições de Perls é a sua abordagem das projeções como

atributos repudiados do paciente que este não logrou assimilar no processo de crescimento”

(Shepherd, 1970, p.307). Dessa forma, foi criada a técnica de “representar” as projeções (os

papéis ou características repudiadas). Tal ferramenta tem sido comprovadamente valiosa no

auxílio ao cliente para a recuperação e integração de polaridades e de energias presas em

conflitos, restabelecendo um senso de autonomia (Shepherd, 1970). Zinker (1999), por sua

vez, diz que a tarefa da psicoterapia é desvelar as sombras, removendo o mistério: “no escuro,

imaginamos demônios e forças maléficas escondidas lá. Quando acendemos a luz, sentimo-

nos a salvo” (Zinker, 1999, p.223). Para este autor, o processo de trabalhar com polaridades e

conflitos também passa inicialmente pela separação das forças beligerantes, de forma a

proporcionar uma maior awareness de cada uma e da forma como se relacionam. Zinker

propõe que quando o cliente está aware (consciente) de uma das polaridades, a outra será

contatada naturalmente. Ele diz que o processo de crescimento passa necessariamente pela

contatação com nossa sombra, com aquela parte em nós mesmos que desaprovamos:

“primeiro, devo identificar a parte de mim que desaprovo. Depois, entrar em contato com ela”

(Zinker, 1999, p.224). E, após travar um diálogo entre essas partes e entendê-las melhor,

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através de técnicas em psicoterapia, poderemos nos relacionar com as pessoas mais

livremente, sem aquele medo ou ameaça constantes de que nossa sombra poderá se irromper.

Haverá então um processo de integração de tais aspectos. O autor chama “esse processo

inteiro de ampliação da auto-imagem. Quanto mais amplo é o conhecimento que tenho de

mim, mais confortável me sinto comigo mesmo” (Zinker, 1999, p.225). Ele desmistifica a

ideia de que se aceitarmos determinada faceta que seja inaceitável ou condenável estaremos

estimulando-a. Por exemplo, quanto mais alguém aceitar seu lado sádico e punitivo, menor

será a possibilidade de agir de modo sádico no futuro. Por outro lado, quanto menos tiver

consciência dos aspectos negativos de si, mais se perceberá atuando essas partes.

Considerações finais

Enfim, falar de polaridades é falar de conflitos; encarar as sombras remete ao crescimento. A

integração de polaridades sucede o crescimento. Como vimos anteriormente, para que haja

espaço para uma evolução autêntica em direção a saúde, é necessário um olhar corajoso em

direção a nossas sombras, afinal, tanto quanto nosso self, ela também faz parte de nós. Para

muitos, falar de crescimento é algo maravilhoso e inspirador, no entanto, encará-lo pode

trazer uma sensação diferente. Crescer pode ser assustador ao depararmo-nos com aquilo que

escondemos com tanto cuidado, consciente ou inconscientemente - é uma tarefa difícil e

conflituosa. E, para tal, podemos recorrer à ajuda, posto que nem sempre conseguimos

percorrer o caminho do autoconhecimento sozinhos. Obviamente, somente nós poderemos

escolher o que enxergar ou não no percurso, ou que batalhas temos condições de encarar.

Podemos pensar que a relação terapêutica no enfoque humanista se presta a tal

objetivo: oferecer apoio até obtermos nosso próprio auto-suporte; lançar luz sobre a sombra

devagar para não ofuscar nossos olhos e permanecer ali conosco enquanto vamos descobrindo

o que estava escondido ali. E durante este processo, começamos a compreender que ninguém

é de todo mal ou de todo bem; não somos pessoas puramente boas ou ruins. Qualquer ser

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humano possui um universo complexo dentro de si repleto de sentimentos e emoções

contraditórias. Entretanto, atuá-los ou não será uma questão de escolha a partir do momento

que entramos em contato e iluminamos a sombra. Tornamo-nos senhores de nós mesmos.

Concluímos tomando a liberdade de fazer uso das palavras criativas da psicoterapeuta

Christina Queiroz (2009) em seu blog clinicadepsicoterapia quando fala que o caminho para a

individuação e totalidade só começa quando nos dispomos a enfrentar nossas sombras: “trazê-

las à tona, cortar suas unhas, pentear-lhes os cabelos, conhecer suas causas. Enfim, integrá-las

a quem somos. Este é um caminho”. Aqui fica um desafio convidando você a conhecer a sua.

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