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MD Magno - Clownagens

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  • www.tranz.org.br 1

    Edio 4 - dezembro 2009 ISSN: 1809-8312

    revista de studosransitivos do ontemporneo

    et c

    uma publicao do:

    Estudos Transitivos do Contemporneo

    ...etc.

    ResenhaCreodo Antrpico: Os Cinco Imprios

    MD Magno

    Texto retirado de A Psicanlise, NovaMente, originalmente publicado em: DANTAS, Rosane Araujo; ALONSO, Aristides (orgs). Pensamento Original Made in Brazil. Rio de Janeiro: Ofi cina do autor, 1999. p. 204-208

    Tenho tentado mostrar a universitrios, alm de a psicanalistas, que, das vistas da nossa psicanlise, o que se pode notar uma sucesso de estdios os quais chamamos de Imprios que se escalonam como caminho obrigatrio, isto , se houver movimento, para esta nossa espcie maluquete em seu modo prprio de existncia, ao qual chamamos genericamente de cultura. Esses imprios, nossa psicanlise os extrai de sua experincia e de suas bases tericas, a seguir, como um verdadeiro creodo (caminho necessrio), nosso possvel vetor de desenvolvimento, partindo do Primrio para o Secundrio, e da para o Originrio que especialmente nos qualifica. Sendo que devemos reconhecer definitivamente, que nada obriga nossa ascese (no temos nenhum imperativo kantiano), mas para ela estamos disponveis.

    Primeiro vem o Imprio da Me (que nomeio numa s palavra como AME, o qual se confundiu por vezes com um matriarcado que na verdade jamais existiu) com sua referncia facilmente comprovvel descendncia carnal de nossa existncia primria de animais, embora diferenciados. Imaginem vocs alguma suposta horda primitiva que na verdade jamais deve ter existido, pois sempre houve alguma ordem social entre os homens. Ma ali certamente no havia nenhuma noo de paternidade, mesmo fsica. Assim, eram as mulheres, ou melhor, as mes, que constituam a referncia da eu-dade. No que as mulheres governassem (certamente jamais houve nenhum matriarcado), mas as pessoas, de ambos os sexos, deviam viver e deslocar-se (pois o nomadismo devia

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    ser a regra) centradas nas mes (como acontece com os elefantes) enquanto centros de referncia na organizao do espao e do movimento, nomeadoras dos indivduos e organizadoras dos grupos. Como se v, a referncia era a, ento, estritamente ao que do Primrio.

    Em segundo lugar vem o Imprio do Pai (que nomeio numa s palavra como OPAI), quando se inventa a paternidade reconhecvel. Saber quem a me pode ser fcil, bastando verifi car e marcar ou atestar o nascimento. Outra coisa, bem mais difcil, garantir a paternidade isto , muito antes do teste de DNA hoje possvel. Digamos que a aparece o verdadeiro pai do... fi lho da me, aquela do primeiro Imprio, nem que para isto tenhamos tido que inventar expedientes to forados quanto a vigilncia contnua da fi delidade das mulheres e o apedrejamento das adlteras como, por exemplo, sancionado pelo Velho Testamento judaico. A que aparece a genial e revolucionria inveno do Pai, bem como de um Pai-do-cu, mas que pai... de certo povo dileto e no de todos os povos. Eis que a referncia agora a passagem do Primrio ao Secundrio.

    Em terceiro lugar vem o Imprio do Filho (que nomeio numa s palavra como OFILHO). Como, por exemplo tambm, essa inveno de Jesus Cristo (atire a primeira pedra...), tambm genialmente revolucionando o judasmo, quando a paternidade passada diretamente para os cus aonde habita um Deus que j no mais to somente o pai de um certo povo, mas sim de qualquer um como de todos, mas com uma importante ressalva: de todos os que ouvem a Sua (Dele) palavra. Naturalmente que, como no O conseguimos escutar diretamente, so necessrios os mediadores, claro que arrolados por alguma instituio que se diz porta-voz e aceita como tal e que, portanto, fala em Nome do Pai, j que no tem como pessoalmente apresent-lo: digamos, certas Igrejas e no necessariamente e confessadamente religiosas. E ns ainda restamos neste imprio por mais que pareamos os moderninhos ou mesmo ps-modernosos que fi ngem ter ultrapassado a era dos atravessadores bem instalados. A, a referncia estrita ao Secundrio. Modernidade mesmo seria nossa entrada, de vez, no quarto Imprio, o Imprio do Esprito (que nomeio numa s palavra como OESPRITO), quando largssemos mo no s dos mediadores, alis hoje em dia cada vez mais numerosos e diversifi cados, como da prpria paternidade com sua paternalizao indefectvel e acabssemos por reconhecer, de vez por todas, que o nosso regime Secundrio, simblico, transcritivo, linguageiro e subseqentemente monetrio, que d sustentao, mesmo desde os tempos

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    de antanho, a todas essas manobras culturais que at agora temos aviado. E tomssemos ento, de uma vez por todas, esse regime como a referncia fundante e determinante de nossas maquinaes culturais, as quais seriam, da por diante, cada vez mais abstratas e generalizantes. A sim que seramos, todos, genericamente, sem menor discriminao por me ou pai ou palavra assentada, absolutamente agora irmos defi nitivos, embora diferentes demais ou at mesmo contraditrios e mesmo que continussemos tendo me e pai e irmos, carnais e histricos, nem que fosse por hbito. E nossa referncia seria ento a passagem do Secundrio ao Originrio.

    Mas a verdade que este Imprio ainda no se instala. H lufadas do seu vento, de vez em quando e h algum tempo. Mas lufadas parciais ou regionais. E que justo por isto no prometem maior e mais fi rme assentamento. este imprio que estamos adentrando, canhestros e desajeitados, ainda mal preparados e apegados ainda aos obsoletismos do mais recente passado. Ao mesmo tempo que, como nos mostra qualquer artigo ou livro atual sobre globalizao e quejandos, o efeito primeiro dessas lufadas a recrudescncia de parciaridades: nacionalismos, regionalismos, confi sses religiosas, crendices e magias reentonadas, velhas moralidades reentronizadas. Enfi m, os mais diversos e recalcitrantes fundamentalismos. Mas se tivermos a sorte, acabaremos por tomar cabal assentamento neste novo estdio no antes ainda de nos desvencilharmos das amarras do Terceiro. Deixemos sem pensar o talvez ainda impensvel Quinto Imprio?: com sua estrita referncia ao Originrio, uma vez que, sem experimen-tarmos efetivamente o nosso Quarto, talvez nem saibamos conjeturar direito o que acaso vir depois do seu ocaso.

    O capitalismo pleno (no o larvar, nem o selvagem) no como ele agora ainda se apresenta uma das manifestaes mais precisas e mais claras desse Quarto Imprio. Mas vive entretanto refreado pelas verdadeiras neuroses culturais das estases passadas. E no somente pelo empenho dos seus inimigos, mas principalmente pelo de seus maiores entusiastas. Assim que as tempestades do capital com seu particular el nio e sua la nia privada sacodem e derrubam edifcios que pareciam bem slidos e alagam e afogam nossos mercados, nossas praas e nossas economias. Mas sem que nada acontea de mudana, em nossas culturas velhuscas de todos os dias, que as possa enfi m tornar mais maleveis, mais maneiras, mais jeitosas. E por isto capazes de rpida e efi caz resposta s intempries que cada vez mais nos aulam e nos assolam e provvel que o faro cada vez mais num futuro bem prximo: tempestades do dinheiro, da moral, do conhecimento, ou das engenhocas.

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    que, para a instalao de um Quarto Imprio defi nitivo, era preciso que pelo menos nos enderessemos ao Quinto, o Imprio do Amm (o AMM, como o chamamos). E que, por referncia a este Imprio derradeiro, pudssemos enfi m bendizer quase tudo, ou mesmo tudo (em latim valetudo signifi ca sade) mas sustentando ao mesmo tempo um juzo acirrado e rigoroso, para alm de nossa aderncia patolgica e pattica s nossas carssimas (em todos os sentidos) formaes sintomticas assim to particulares, isoladas e ociosas.

    Ser isto possvel? evidente que no. Ainda no, pelo menos por enquanto. Ento teremos que rojar por quanto tempo neste vale de afl ies culturais que dados os recursos disponveis j poderiam em muito ter sido sanadas. Mas que ainda no encontraram situao adequada para um salto maior at um pleno reconhecimento de todas as nossas faces multifrias e, quem sabe, talvez igualmente vlidas. Antes ainda de uma cura melhor a que fssemos enfi m aspirantes ou obrigados.