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A narrativa como ferramenta para análise da formação do professor de Matemática no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo: potencialidades do curso e a prática docente KELLY APARECIDA DUARTE TORQUATO

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A narrativa como ferramenta para análise da formação do professor de Matemática no Instituto Federal de Educação, Ciência

e Tecnologia de São Paulo: potencialidades do curso e a prática docente

KELLY APARECIDA DUARTE TORQUATO

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A narrativa como ferramenta para

análise da formação do professor de

Matemática no Instituto Federal de

Educação, Ciência e Tecnologia de

São Paulo: potencialidades do curso

e a prática docente

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Kelly Aparecida Duarte Torquato

Celi Espasandin Lopes

A narrativa como ferramenta para

análise da formação do professor de

Matemática no Instituto Federal de

Educação, Ciência e Tecnologia de

São Paulo: potencialidades do curso

e a prática docente

Universidade Cruzeiro Do Sul

2016

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© 2016

Universidade Cruzeiro do Sul

Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa

Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

Reitor da Universidade Cruzeiro do Sul – Profa. Dra. Sueli Cristina Marquesi

PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA

Pró-Reitor – Profa. Dra. Tania Cristina Pithon-Curi

MESTRADO PROFISSIONAL EM ENSINO DE CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

Coordenação - Profa. Dra. Norma Suely Gomes Allevato

Banca examinadora

Profa. Dra. Celi Espasandin Lopes

Profa. Dra. Maria Delourdes Maciel

Prof. Dr. Antonio Vicente Marafioti Garnica

FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL DA

UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL

T64n

Torquato, Kelly Aparecida Duarte.

A narrativa como ferramenta para análise da formação do

professor de matemática no instituto federal de educação, ciência e tecnologia de São Paulo: potencialidades do curso e a prática docente / Kelly Aparecida Duarte Torquato. -- São Paulo: Universidade Cruzeiro do Sul, 2016.

32 p. : il. Produto educacional (Mestrado em Ensino de Ciências e

Matemática). 1. Ensino de matemática 2. Formação de professores –

Matemática 3. Matemática – Projetos pedagógicos 4. Instituto federal de educação, ciência e tecnologia de São Paulo (IFSP). I. Título II. Série.

CDU: 51

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Sumário

1 APRESENTAÇÃO ......................................................................................................... 5

2 APORTE(S) TEÓRICO(S) ............................................................................................. 7

3 O PRODUTO ................................................................................................................. 9

3.1 TEMA 1 ....................................................................................................................... 9

3.1.1 Potencialidades do Curso de Licenciatura em Matemática pelas narrativas dos

professores formadores do IFSP..................................................................................... 9

3.2 TEMA 2 ..................................................................................................................... 21

3.2.1 A prática docente, de acordo com os formadores do IFSP................................. 21

4 ORIENTAÇÕES AO PROFESSOR ............................................................................ 28

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................ 29

REFERÊNCIAS .............................................................................................................. 31

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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

1 APRESENTAÇÃO

Este produto foi construído a partir da dissertação intitulada “A formação

do professor de Matemática no Instituto Federal de Educação, Ciência e

Tecnologia de São Paulo – campus São Paulo, pelas narrativas de professores

formadores”, sob orientação da profa. Dra. Celi Espasandin Lopes, do Programa

de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática, da Universidade

Cruzeiro do Sul.

O produto encontra-se baseado no Capítulo 3 da dissertação, que

apresenta as análises das narrativas de quatro professores formadores do

Instituto Federal, os quais, além de atuarem no curso de Licenciatura em

Matemática, também participaram, de alguma forma, da elaboração do projeto

que deu origem a essa licenciatura e/ou das discussões para a reestruturação

do curso na instituição.

Para a realização do trabalho de dissertação foram identificados quatro

temas significativos, que emergiram da leitura e releitura das narrativas:

Potencialidades do Curso de Licenciatura em Matemática pelas narrativas dos

professores formadores do IFSP; A prática docente, de acordo com os

professores formadores do IFSP; Algumas expectativas de mudanças para a

melhoria do curso de Formação de Professores de Matemática segundo as

perspectivas dos professores entrevistados e que atuam na licenciatura; A

formação dos futuros educadores de Matemática do IFSP e o sentido do trabalho

docente, presentes nas entrevistas do grupo de colaboradores.

Observando o limite de páginas para a realização do produto educacional,

optamos por selecionar dois temas, produzidos a partir das narrativas das

trajetórias profissionais de professores formadores do IFSP, com a intenção de

socializar com alunos e professores da instituição, além de interessados em

cursar a Licenciatura em Matemática oferecida pelo Instituto Federal, ações de

práticas e intervenções educacionais, expectativas quanto a formação do

formador de professor e o sentido do trabalho docente que é percebido ao longo

das narrativas, especialmente quando tratado do tema da prática docente, onde

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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

professores e futuros professores compartilham de experiências vivenciadas

dentro e fora do Instituto Federal, tornando o processo educativo mais relevante,

mais eficiente e mais satisfatório para todos os envolvidos.

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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

2 APORTE(S) TEÓRICO(S)

Nosso estudo se fundamenta na pesquisa qualitativa de cunho narrativo.

Apresentamos uma discussão sobre quatro entrevistas narrativas com

professores do Instituto Federal por entendermos que as vozes desses

professores formadores sejam a essência da nossa investigação.

Nesse contexto apresentamos o referencial teórico que fundamentou a

proposta da nossa pesquisa e a confecção do produto educacional. Usamos

como referência: Bertaux (2010), Bolivar, Domingo e Fernandez (2001),

Clandinin e Connelly (2011) e Abrahão (2014).

A possibilidade de conhecer a formação do professor que o Instituto

Federal oferece aos futuros educadores de Matemática e descobrir dados que

não encontramos nos documentos, mas que podemos desvendar por meio dos

discursos dos professores participantes da pesquisa, pode ser concebida por

meio da investigação narrativa e auto-biográfica que, segundo Bolivar, Domingo

e Fernandez (2001), permite representar um conjunto de dimensões da

experiência que a investigação formal habitualmente deixa de fora.

Ao mesmo tempo que buscamos o discurso desses educadores,

articulamos os dados obtidos com os registros encontrados no Projeto do Curso

de Licenciatura em Matemática. Essa discussão e análise possibilita alcançar

algumas expectativas quanto a formação do professor de Matemática do Instituto

Federal, evidenciando a potencialidade da investigação narrativa para este

estudo.

A realização de entrevistas narrativas gera a possibilidade de

evidenciarmos as diferentes percepções que contemplam, dessa forma, uma

visão mais ampla e enriquecedora sobre o objeto de estudo e “extrair das

experiências daqueles que viveram uma parte de sua vida no interior desse

objeto social informações e descrições que, uma vez analisadas e reunidas,

ajudem a compreender seu funcionamento e suas dinâmicas internas”.

(BERTAUX, 2010, p.60)

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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

Os autores Clandinin e Connelly (2011) consideram a experiência como

uma palavra-chave e a narrativa como o melhor modo de representar e entender

a experiência. Educação e estudos em Educação são formas de experiência.

Estudar a experiência de forma narrativa, na Educação e em estudos em

Educação, é assertivo porque o pensamento narrativo é uma forma-chave de

experiência e um modo-chave de escrever e pensar sobre ela.

Vemos o ensino e o conhecimento do professor como expressos em histórias sociais e individuais corporificadas, e pensamos narrativamente à medida que entramos na relação de pesquisa com os professores, à medida que criamos textos de campo e escrevemos histórias sobre vidas educacionais. (CLANDININ; CONNELLY, 2011, p. 48)

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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

3 O PRODUTO

O produto apresenta dois temas desenvolvidos nas análises das

narrativas dos professores: Potencialidades do Curso de Licenciatura em

Matemática pelas narrativas dos professores formadores do IFSP e A prática

docente, de acordo com os professores formadores do IFSP.

3.1 TEMA 1

Este tema apresenta uma discussão em torno das narrativas de quatro

professores do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São

Paulo, relacionadas ao Projeto do curso de Licenciatura em Matemática, além

de recorrermos a autores voltados para a Educação Matemática, para dialogar

com as experiências rememoradas, vivenciadas dos professores formadores.

Os relatos dos professores, a seguir, destacam algumas características e

potencialidades do curso de Licenciatura em Matemática que é oferecido pelo

Instituto Federal. Este tema, nos possibilita, também, conhecer como e por que

alguns componentes curriculares foram estrategicamente pensados para

integrar a matriz curricular dessa licenciatura, além de percebermos como cada

educador conduz suas aulas diante da concepção pedagógica da instituição e

alunos, futuros professores de Matemática.

3.1.1 Potencialidades do Curso de Licenciatura em Matemática pelas

narrativas dos professores formadores do IFSP

Uma das fortes características do Curso de Licenciatura em Matemática

do IFSP, de acordo com os educadores entrevistados, são as disciplinas de

Fundamentos, contempladas nos dois primeiros semestres do curso e

destacadas por todos os docentes colaboradores desta investigação, que

discutiram sobre o tema em suas narrativas.

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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

Os componentes curriculares de Fundamentos para o Ensino da

Matemática, que contemplam aulas sobre Conjuntos, Equações e Polinômios;

Geometria 1; Funções e Logaritmos; Trigonometria e Números Complexos;

Sistema Linear e Sequências, fazem parte das competências a serem

articuladas no 1º semestre do curso de Licenciatura em Matemática, juntamente

com disciplinas como Filosofia da Educação, Comunicação e Linguagem

1(negro e índio), Inglês Instrumental 1 e Projeto Interdisciplinar – Qualidade de

Vida 1.

No 2º semestre do curso os alunos continuam com aulas de

Fundamentos, cujos conteúdos são distribuídos entre as disciplinas de

Combinatória e Probabilidade, Geometria Analítica, Geometria 2, Estatística

Descritiva, além de Fundamentos da Educação 1 e outras disciplinas como:

Matemática e sua História 1, Matemática, Comunicação e Linguagem 2, Inglês

Instrumental 2 e Projeto Interdisciplinar – Qualidade de Vida 2.

“Uma novidade que esse curso iria apresentar, e apresenta realmente,

são as disciplinas de Fundamentos, coisa que os outros cursos de Licenciatura

em Matemática, pelo menos que a gente saiba, não apresentam”. (Entrevista

Narrativa, Professor Porfírio, 2015), destaca o professor, que dá aula para as

turmas iniciais do curso, como um diferencial do Projeto.

A educadora Alice reforça a necessidade e importância de trabalhar essas

disciplinas de Fundamentos com os futuros professores e lembra que o Instituto

Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo, tem tradição na área

técnica e que os cursos de nível médio já contemplavam o ensino de cálculo,

“por que cálculo era um pré-requisito para uma porção de disciplinas que eles

tinham lá na área técnica” (Entrevista Narrativa, Professora Alice, 2015). Mas, a

professora lembra, também, o quanto era difícil conquistar uma vaga na antiga

Escola Técnica Federal de São Paulo, e “então, o aluno que vinha para cá era

muito selecionado” (Entrevista Narrativa, Professora Alice, 2015). E mesmo

assim, com excelentes alunos, o índice de reprovação na disciplina de cálculo

era muito grande, chegando a 25%, enfatiza.

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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

Essa observação, contudo, levou toda a comissão de elaboradores do

Projeto a pensar como seria ensinar cálculo logo nas aulas iniciais dessa

Licenciatura para alunos que vieram da rede pública, com provável defasagem

na aprendizagem. Mas, parece que a preocupação era ainda maior, pois esses

educandos se tornariam educadores.

Então nós pensamos em fazer um semestre que poderia fazer a revisão, mas não tinha só o objetivo de fazer a revisão, não era só isso. Seria revisão para aquele aluno que tivesse dificuldade e não aprendeu a matéria direito, mas também seria uma discussão de como se ensinar o conteúdo. (Entrevista Narrativa, Professora Alice, 2015)

Assim, priorizou-se estudar as disciplinas de Fundamentos, para depois

introduzir o cálculo, com o objetivo de reforçar o conteúdo do Ensino Médio,

conforme justifica o professor Porfírio, e especialmente para preparar esses

alunos para a profissão docente como reafirma a professora Alice.

Para o professor Pedro, o que dizem os professores Porfírio e Alice, é

realmente o que deveria acontecer no Curso de Licenciatura em Matemática do

IFSP, lembrando do projeto pedagógico e suas concepções, especialmente da

proposta referente as disciplinas de Fundamentos:

Eles pensaram na seguinte forma, que essa parte de Fundamentos viria para preparar o professor para a Educação Básica, com os conteúdos da Educação Básica, mas, na prática eu via que funcionava da seguinte forma: eles pegavam aqueles livrinhos do Iezzi, do I ao X e trabalhavam os conceitos matemáticos, mas nunca discutindo aqueles conceitos na perspectiva de, olha, como você vai dar aula disso? Mas, sim na perspectiva de aprender aquilo e daquela maneira que estava no livro. Então, definição, exemplos e exercícios e até hoje é assim. (Entrevista Narrativa, Professor Pedro, 2015)

O professor Pedro contesta a prática de alguns docentes do Instituto

Federal que trabalham esses conteúdos voltados para a Educação Básica,

utilizando-se de recursos didáticos que, na sua visão, não favorecem a formação

do futuro professor de Matemática, perdendo inclusive as características dessas

disciplinas de Fundamentos, na sua origem:

Fundamentos passou a ter uma característica do quê? É, de aprofundamento de conhecimento da Educação Básica para quem já viu e para quem nunca viu a possibilidade de aprender aquele conteúdo, mas, como se ensinaria um aluno do ensino médio, não trabalhando com

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aquele conteúdo como se fosse para um futuro professor de Matemática. Então, não tem nesses conteúdos uma discussão didático-pedagógica, tem uma discussão exclusivamente matemática, e não de matemática para o ensino, mas, matemática pela matemática. (Entrevista Narrativa, Professor Pedro, 2015)

Então, quando ministra alguma disciplina de Fundamentos, o professor

Pedro conta que procura trabalhar de forma diferenciada e, tomando como

exemplo o conteúdo de Trigonometria, revela que descarta o modelo tradicional

da sequência utilizada por alguns professores, com definições, exemplos e

exercícios, optando por apresentar aos alunos um pouco de atividades práticas

e “quando possível eu sempre busco fazer uma articulação: olha, como eu

ensinaria isso lá na Educação Básica também? Além de fazer essa discussão

que nós estamos fazendo aqui, observem, eu poderia fazer diferentes

representações”. (Entrevista Narrativa, Professor Pedro, 2015)

Para melhor entendimento de sua maneira de conduzir o processo de

ensino e aprendizagem, o professor formador esclarece, lembrando uma prática

utilizada com os alunos:

Por exemplo, para trabalhar com a Construção de Gráficos, para estudar o período da função trigonométrica, função seno, função cosseno, então nós íamos para o laboratório de informática e aí fazíamos a representação da função e ao invés de eu entregar para eles eu pedi para que eles mesmos pesquisassem nas funções as diferentes alterações. Ah, se eu alterar aqui, o valor no argumento, o que vai acontecer? E se eu adicionar aqui, acontece o que com o gráfico, expansão da imagem? Ah, se eu mexer aqui eu estou mexendo no domínio, então, eles acabam explorando. (Entrevista Narrativa, Professor Pedro, 2015)

Em consonância com os pensamentos de Skovsmose (2014), a

expectativa do educador Pedro é de que os alunos aprendizes conheçam a

importância de desenvolver atividades onde o aluno investiga possibilidades de

se resolver determinada situação-problema, participando do processo de

construção do conhecimento, com a esperança de que eles a guardem na

memória e utilizem suas aulas como modelo para seus planos de aulas no futuro,

como professores de Matemática, por isso o esforço em “não só ampliar o

conhecimento matemático, mas também para tratar dessa parte do ensino”.

(Entrevista Narrativa, Professor Pedro, 2015).

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Skovsmose (2014) apresenta exemplos de exercícios e situações em que

são explorados os “cenários para investigação”, que segundo o autor favorecem

as práticas de sala de aula, contrastando com práticas baseadas em listas de

exercícios, estabelecendo diferentes meios de aprendizagem, que é

minuciosamente explicado por meio do termo em francês Milieus de

aprendizagem.

Um cenário para investigação é um terreno sobre o qual as

atividades de ensino e aprendizagem acontecem. Ao contrário

da bateria de exercícios tão característica do ensino tradicional

de matemática, que se apresenta como uma estrada segura e

previsível sobre o terreno, as trilhas dos cenários para

investigação não são tão bem-demarcadas. (SKOVSMOSE,

2014, p.45)

São justamente os meios de aprendizagem que definem as zonas de

conforto e zonas de risco, também ilustradas pelo autor por meio de tabelas e

exemplos, a que professores e alunos estão submetidos dependendo da forma

utilizada para se ensinar e aprender a matemática. Porém, alerta Skovsmose:

“[...] zona de risco é uma zona de possibilidades. Lidar com riscos também

significa criar novas possibilidades”. (SKOVSMOSE, 2014, p.64). Este autor

defende as ideias de educação matemática crítica para que haja transformação

e superação do ensino tradicional de matemática, o que implica sair da zona de

conforto e entrar em uma zona de risco, pois existe um momento em que um

paradigma não mais satisfaz os ensejos de um novo tempo, com novas

necessidades e inquietações.

Hoje essa concepção de educação matemática crítica é discutida não só

entre os pesquisadores do campo da ciência, como especialmente entre

educadores, filósofos, estudiosos e intelectuais, fazendo emergir discussões,

debates e, por que não dizer, ideias críticas acompanhadas da construção de

novos conhecimentos e até mudança de postura de si próprio ou de outros que

a partir dessas reflexões passam a enxergar um novo horizonte, com novas

possibilidades.

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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

O educador Pedro, em sua prática como professor formador, procura

possibilitar aos alunos, diante de um cenário investigativo, que sua aula propõe,

criar possibilidades para que eles se constituam, assim, educadores críticos e

não “bons resolvedores de exercícios, simplesmente”. (Entrevista Narrativa,

Professor Pedro, 2015)

A favor também de um ensino voltado para a educação matemática crítica,

a professora formadora, Alice, reforça as palavras do professor Pedro,

demonstrando que há um esforço entre os docentes em contribuir para uma

formação que vai além da preparação do conhecimento específico da sua área

de atuação, apoiando-se, em sua narrativa em pensamentos como “ninguém

poderá ser um bom professor sem dedicação, sem preocupação com o próximo,

sem amor num sentido amplo”. (D´AMBROSIO, 2012), que é a essência da

filosofia da educação.

A professora Alice, que passou três anos do seu doutorado

acompanhando professores da Educação Básica no ensino de Estatística,

depois de discutir o material utilizado, prática pedagógica e concepções de

ensino desses professores, percebeu que o professor, apesar de querer

contribuir mais para com a formação do aluno, além do conteúdo da disciplina,

“ele não sabia como” (Entrevista Narrativa, Professora Alice, 2015), mas, quando

havia uma oportunidade, seus estudos afirmam que esse professor “agiu como

educador, mas, ter uma atividade preparada para isso, eles não tinham”

(Entrevista Narrativa, Professora Alice, 2015). Assim, a educadora matemática

passou a se preocupar em oferecer aos seus alunos uma formação que

comtemplasse, também, uma preparação para a vida.

Então, o professor quer ser um educador, ele quer contribuir um pouco mais com o aluno, com a sua vida, com a cidadania, com outras coisas na vida. Ele quer fazer isso, mas ele não tem uma preparação, ele não tem um programa para isso, ele não sabe como ele faz isso de maneira programada. Então eu pensei em trabalhar isso. Como é que eu faço para o professor criar exercícios de matemática ou de estatística, onde eu trabalho o conteúdo, mas eu também contribuo com esse aluno? No tipo da educação matemática crítica, foi aí que eu tive contato com o D´Ambrosio, Skovsmose, e aí eu fui somando e no mais, se você pega profissionais de várias áreas, você percebe que essa formação faz falta.

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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

Essa formação para o geral. (Entrevista Narrativa, Professora Alice, 2015)

Essa percepção da educadora em relação às necessidades dos

professores que atuam na Educação Básica aconteceu, especialmente, porque

Alice fazia um estudo como pesquisadora e conseguiu observar as ações de

professores de Matemática que, naquele momento, se permitiram fazer parte

dessa investigação como sujeitos da pesquisa, contribuindo para com o trabalho

da professora-pesquisadora e possibilitando, também, um crescimento social e

intelectual no processo de ensino e aprendizagem, apoiando-se nas concepções

de educação de Ubiratan D’Ambrosio (2012).

Para D´Ambrosio (2012, p.79) “A responsabilidade maior do professor vai,

portanto, além da sua disciplina específica. Mas hoje cidadania implica

conhecimento”. Assim o cientista matemático explica que é fundamental na

preparação para a cidadania o domínio de um conteúdo relacionado com o

mundo atual.

A educação para a cidadania, que é um dos grandes objetivos da educação de hoje, exige uma “apreciação” do conhecimento moderno, impregnado de ciência e tecnologia. Assim, o papel do professor de Matemática é particularmente importante para ajudar o aluno nessa apreciação, bem como para destacar alguns dos importantes princípios éticos a ela associados. (D’AMBROSIO, 2012, p.81)

Já para o professor José Augusto, a função dessas disciplinas de

Fundamentos vai além da preparação para os semestres seguintes, ou até

mesmo para ser utilizado na prática profissional, depois da formação como

professor de Matemática, porque além de proporcionar ao aluno a construção de

bases sólidas de conteúdos matemáticos para que eles possam seguir para as

disciplinas mais complexas, voltadas para o cálculo, o educador explica que esse

é também o momento que o aluno tem para decidir se é essa a carreira que ele

vai se dedicar:

Desde a primeira turma, a gente percebe essa defasagem de uma formação básica em matemática, que costuma ser um entrave nos primeiros semestres do curso, então hoje a gente tem nitidamente que os dois semestres do curso eles são uma espécie de um novo vestibular que realmente seleciona aqueles que vão dar conta de fazer o curso dali para

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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

a frente. Os nossos primeiros dois semestres até por uma característica que nós temos no nosso PPC que é ter as disciplinas de Fundamentos de Matemática nos dois primeiros semestres, isso acaba fazendo a peneira do curso, que a gente chama pelas nossas siglas aqui, o M1 e o M2, eles são realmente o que dá uma delimitação dos alunos que vão levar o curso adiante ou não. Vários deles refazem algumas disciplinas do M1 e do M2 e aí sim conseguem levar o curso adiante e a contento. (Entrevista Narrativa, Professor José Augusto, 2015)

Em sua narrativa, o professor José Augusto afirma que, apesar dessa

deficiência básica de Matemática, alguns alunos ingressam no curso com um

desejo muito forte de ser professor e se dedicam em fazer mais de uma vez um

ou mais componentes curriculares voltados para os Fundamentos. Para ajudá-

los nesse desafio, o educador cita um dos recursos utilizados entre o corpo

docente do Instituto Federal:

[...] repartir essas turmas do M1 e do M2 para que um professor tratasse somente com aqueles alunos que tem uma deficiência mais grave e um outro professor para tratar com alunos que já vieram de um ensino fundamental II, de um ensino médio razoável, que dariam conta de seguir o conteúdo sem essa necessidade de recuperações muito intensas. Nós já conseguimos fazer isso, mas, não é todo semestre que nós temos força de trabalho suficiente para isso. Quando isso não é possível fica dependendo da boa vontade e do esforço de cada docente e de conseguir fazer esse tratamento de heterogeneidade da turma. (Entrevista Narrativa, Professor José Augusto, 2015)

Outra maneira que os professores encontraram para atender esses

alunos, foi oferecendo um plantão de dúvidas a eles, mas não um plantão de

dúvidas convencional voltado para as disciplinas iniciais do curso, mas sim um

tempo dedicado a rever ou ver pela primeira vez assuntos de uma base ainda

anterior.

[...] uma base do ensino fundamental II, do ensino médio, que alguns ainda não conseguiram desenvolver e o professor Rafael ele fazia esse atendimento, invadindo o horário de almoço. As nossas aulas aqui terminam às 11:45, ele começava o atendimento em torno de 12:00 e ia até às 13:00, um pouco mais desse horário, para dar conta de sanar essas deficiências anteriores. (Entrevista Narrativa, Professor José Augusto, 2015)

E quando está em sala de aula, o professor José Augusto, prefere contar

com a colaboração de alunos “que têm um desenvolvimento um pouco mais

acelerado para atuarem como uma espécie de monitores dento da própria sala,

auxiliando aqueles colegas que têm maior dificuldade” (Entrevista Narrativa,

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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

Professor José Augusto, 2015). Para tanto o professor propõe atividades em

grupo, de forma que sempre haja dentro das equipes formadas a presença de

um aluno “que desponta um pouco mais, e acaba também sendo para ele um

treinamento do próprio exercício de docência, por que ele vai acabar sendo

obrigado a não só resolver o exercício para si mesmo mas, ensinar outro a

resolvê-lo” (Entrevista Narrativa, Professor José Augusto, 2015).

O professor formador garante que essa identificação dos alunos não tem

a intenção de tratar dois grupos separadamente, pelo contrário, é uma estratégia

que se justifica por tentar fazer com que haja interação entre os alunos e um

possa contribuir para com o conhecimento do outro, numa experiência que

certamente será vivenciada com seus futuros alunos, em sala de aula.

Outra característica do curso de Licenciatura, que o Instituto Federal de

Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo oferece aos futuros professores

de Matemática, conforme chamam a atenção os educadores Porfírio e Alice, são

os componentes curriculares interdisciplinares. O curso “[...] apresenta uma

novidade também que é a interface com outras disciplinas” (Entrevista Narrativa,

Professor Porfírio, 2015).

As disciplinas em questão propiciam a contextualização de aplicações da

Matemática e a interrelação com outras áreas do conhecimento como a Física,

com a disciplina Interface da Matemática com a Física, oferecidas do terceiro ao

sexto semestre, a Química, por meio da disciplina Interface da Química com a

Matemática, contemplada no sétimo semestre e a Biologia, cuja disciplina é a

Interface da Biologia com a Matemática, oferecida aos alunos no oitavo semestre

do curso.

Além das competências e habilidades desenvolvidas nessas disciplinas

que fazem interface com a Matemática, indicadas na tabela 3, de acordo com as

tabelas 4, 5 e 6, o professor Porfírio, demonstra, em sua narrativa, a importância

dos conteúdos trabalhados, especialmente pelo exercício da

interdisciplinaridade que esses componentes curriculares propõem, utilizando

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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

conceitos matemáticos no ensino de Física, Química e Biologia, favorecendo “a

criatividade e flexibilidade do pensamento científico”. (IFSP, 2009, p. 115).

A atitude interdisciplinar diz respeito à constituição da competência de articulação dos saberes específicos de uma determinada área à totalidade do espectro de conhecimentos. No âmbito da formação do professor, ela se relaciona com a capacidade de compreender o papel do recorte específico da sua disciplina na área de organização curricular em que se insere, bem como na elaboração e execução de projetos e atividades que favoreçam abordagens integralizadoras do saber.

(IFSP, 2009, p. 115).

Comparado a outros cursos de Licenciatura em Matemática, pelo

educador Porfírio, os componentes curriculares Matemática e sua História e

História da Ciência, envolvem conteúdos mais completos, com carga horária

específica para cada disciplina. “[...] Normalmente é dado História da Matemática

e alguma coisa de História da Ciência, ou só História da Ciência e dentro dela

alguma coisa de História da Matemática”. (Entrevista Narrativa, Professor

Porfírio, 2015). O educador Porfírio reforça a importância em preparar o futuro

professor com o conhecimento histórico a respeito da atividade matemática

desde os primeiros registros, lembrando que os números estão em nosso dia-a-

dia e em todas as culturas.

Matemática e sua História é contemplada no segundo e terceiro

semestres do curso de Licenciatura em Matemática do IFSP. O objetivo é que o

aluno perceba a Matemática como uma atividade humana, pois ela “pertence à

cultura de diferentes povos e que, por isso, nem sempre se desenvolve da

mesma forma”. (IFSP, 2009, p.69)

Quanto ao componente curricular História da Ciência, esse é introduzido

ao aluno de Licenciatura em Matemática no sexto semestre, quando os futuros

professores estão numa fase mais avançada do curso, não só em relação ao

conhecimento matemático, mas com uma rica bagagem cultural de elementos

históricos e filosóficos, favorecendo a sua compreensão e reflexão a respeito das

grandes questões da ciência.

Nesta disciplina são construídos os conceitos de Ciência, epistemologia e paradigma. A estrutura das revoluções

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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

científicas. A História da Ciência como prática pedagógica para o ensino da Ciência. A pré-história da Ciência. O conhecimento grego. A ciência na Idade Média. A ciência moderna. Ciência no século XIX. A ciência no século XX. Desenvolvimento histórico da ciência no Brasil. (IFSP, 2009, p.109)

A disciplina Qualidade de Vida, proposta de integração ao currículo do

curso de Licenciatura em Matemática pela professora Alice, e já contemplada

logo no primeiro semestre do programa, representa, segundo a educadora, um

dos mais importantes componentes curriculares em contribuição à formação dos

futuros professores, promovendo informações, atividades e discussões a

respeito da saúde emocional, física, intelectual e social dos profissionais da

educação.

E aí, eu quis colocar lá uma disciplina que é Qualidade de Vida, que se preocupasse com a qualidade de vida do professor, por que tem muito professor aí que tem a história do mal-estar docente que a gente sabe, né? Com a qualidade de vida do professor, postura, manutenção de voz. A qualidade de vida física e a qualidade de vida emocional também, por que os professores estão muito desanimados, eles vão lá, então o professor já esqueceu, ele já não quer nem saber, o aluno não quer nada, ele também não, e aí o que que a gente acaba percebendo, que o aluno não quer nada, o professor acha que não pode fazer nada, ninguém faz nada. Ai, no meio de quarenta alunos que não querem nada, tem dois que queriam e você deixou de atender esses dois. (Entrevista Narrativa, Professora Alice, 2015)

A ementa do projeto do Curso de Licenciatura em Matemática contempla

um conteúdo voltado para o aprimoramento da saúde, com diversas indicações

de bibliografia básica e complementar, objetivando:

Familiarizar o aluno com estratégias multidisciplinares e interdisciplinares, desenvolver modelos pedagógicos que levem o aluno a perceber a importância da atividade física na otimização de aspectos fisiológicos, psicológicos e sociais, correlacionar educação física, cultura, natureza e ecologia; compreender a diversidade cultural e o respeito às diferentes culturas, vivenciar e identificar as possibilidades expressivas e lúdicas dos movimentos corporais, compreender a unidade do ser humano e a integração absoluta do corpo com a mente por meio de abordagem prática de meditação, energização e relaxamento; conhecer a analisar a relação saúde e sociedade, conhecer a organização do sistema de saúde pública brasileira. Qualidade de vida e saúde coletiva. Saúde como dever do estado e direito de cidadania. A experiência multicêntrica das cidades saudáveis. A relação saúde/doença. Cuidado no âmbito do coletivo. Esporte, exercício e atividade física, segundo a

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Organização Mundial de Saúde. Conceitos básicos, características e identidades. Evolução das principais concepções e práticas. (IFSP, 2009, p.63)

A professora Alice, revela ainda, em sua narrativa, situações adversas

que seus alunos enfrentam, enquanto estagiários na Educação Básica, e que

são socializados no momento dedicado a Orientação de Estágio, numa das

disciplinas conduzidas pela educadora nas turmas de Licenciatura em

Matemática, onde “tem hora que quase eu fico desanimada” (Entrevista

Narrativa, Professora Alice, 2015), desabafa a educadora.

Considera-se que não é recente o reconhecimento de que as situações de trabalho podem interferir negativamente na saúde dos indivíduos. Especificamente, no que se refere aos professores, considera-se que esta profissão favoreça o aparecimento de síndromes nervosas. Já em 1981, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), considerou o stress como uma das principais causas de abandono da profissão docente, considerando a docência como uma profissão de risco físico e mental. (International Stress Management Association no Brasil)

Pensando no bem-estar e no bom desempenho de seus alunos, na

carreira escolhida, a professora formadora desenvolve, em suas aulas,

atividades intencionalmente pensadas para promover a socialização das

experiências vivenciadas por cada um de seus alunos, e a discussão de ações

a serem realizadas para favorecer o processo de ensino e aprendizagem de

forma saudável e satisfatória, além, de trabalhar temas diversificados,

associando o conteúdo matemático a questões ambientais, de saúde, étnico

raciais, “[...] então, quando eu coloquei Qualidade de Vida, eu estava preocupada

com isso, como é que o professor lida, por exemplo, com tema de drogas, e eu

acho que ele precisa te um preparo” (Entrevista Narrativa, Professora Alice,

2015).

Sobretudo a educadora Alice, apoiada nos conceitos de Skovsmose

(2014), volta-se para a educação matemática e contempla a importância da

reflexão na educação, trazendo questionamentos que podem ser abordados por

meio de projetos, propostas de aprendizagem, apostando no trabalho em equipe

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entre alunos e trazendo à tona situações da vida real, mostrando a relevância da

resolução das questões por meio de discussões em grupo, do diálogo.

3.2 TEMA 2

O Tema 2, referente à prática docente, demonstra como os componentes

curriculares, voltados ao Estágio Supervisionado, colaboram para que os futuros

professores de Matemática tenham contato com a legislação escolar, observem

as diferentes concepções pedagógicas e elaborem planos de aula.

A articulação da teoria com a prática, propiciada pelo estágio obrigatório,

é a oportunidade do aluno aprendiz socializar com os professores formadores e

colegas do curso de Licenciatura em Matemática, situações vivenciadas na

Educação Básica enquanto realizam o estágio de observação e regência,

conforme demonstram os relatos dos professores entrevistados.

3.2.1 A prática docente, de acordo com os formadores do IFSP

Ele dava trabalho, por que ele era de fazer bagunça, ele era de fazer molecagem, de puxa o cabelo de um, puxa o cabelo do outro, não para sentado, sai da aula, não faz lição, mas, de repente, o menino ficou agressivo, começou a bater em todo mundo. Então, assim, ele era bagunceiro, mas ele não era agressivo, ele não era revoltado. Ele metia a mão na cara de um, por qualquer coisa, sabe, assim, ficou agressivo. Aí, essa menina, que estava lá observando no estágio... a diretora falou que não sabia mais o que fazer, a coordenadora falou também: não, já chamamos para conversar, já falamos um monte de coisa, já ameaçamos suspender, mas, a gente não sabe o que está acontecendo com ele. Aí, a menina que estava no estágio, que sempre estava muito motivada no estágio, queria tentar fazer alguma coisa, ela falou: Eu posso conversar com ele? (Entrevista Narrativa, Professora Alice, 2015)

Nesse exemplo a professora Alice compartilha conosco uma situação

vivenciada por uma aluna sua, durante a realização de seu estágio

supervisionado, numa escola pública, descrevendo um episódio ocorrido com

um adolescente da 6ª série, em que a aluna estagiária se oferece para ajudar,

levando-o para a biblioteca da escola para uma conversa.

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Ai, ele falou: eu já sei, você vai vir falar sobre o meu comportamento. Aí, ela ficou conversando com ele, perguntou para ele o que estava acontecendo, aí é que ela foi descobrir: o pai dele fazia parte do PCC, por que o avô fazia parte do PCC. Não era escolha dele fazer parte do PCC. Até uma determinada altura, seu pai quis sair do PCC. Ele não queria mais fazer parte do PCC, então ele mudou de bairro, mudou de cidade, mudou de tudo, para tentar viver uma vida diferente e o PCC achou e matou o pai dele. Então, como é que fica a cabeça desse menino, por que ele falou assim, a única hora que ele viu o pai dele querer fazer alguma coisa boa, o mataram. (Entrevista Narrativa, Professora Alice, 2015)

Na aula destinada à Supervisão de Estágio, a aluna estagiária socializou

os acontecimentos vivenciados em sua prática docente e a professora Alice, que

orienta os alunos da licenciatura nos 5º e 6º semestres do curso, a conduziu

nessa nova experiência, que vai além de ensinar os conteúdos matemáticos em

sala de aula. “Pergunta para ele, o que ele acha que o seu pai gostaria que ele

fizesse agora” (Entrevista Narrativa, Professora Alice, 2015).

E assim, a futura professora de Matemática conseguiu não só com que o

estudante da 6ª série se sentisse um pouco abraçado, mas fez com que ele

voltasse para a sala de aula com novas esperanças no olhar, pois como

lembrado por ele, certamente era desejo de seu pai que ele cuidasse da sua

mãe, que ele tivesse um emprego e que ele terminasse a 6ª série. Então, ele

retornou para a sala de aula, sentou-se numa das primeiras carteiras e passou

a acompanhar a disciplina com atenção.

Segundo a educadora Alice, “nem todos os alunos que vão à escola estão

precisando só de um bom professor” (Entrevista Narrativa, professora Alice,

2015), e após uma semana de observação, os alunos aprendizes de professores

já começam a conhecer a realidade do dia a dia escolar e as demandas sociais,

presentes na profissão docente que escolheram seguir, afinal, “como ensinar,

como formar sem estar aberto ao contorno geográfico, social, dos educandos”?

(FREIRE, 2015, p.134)

A formação dos professores e professoras devia insistir na constituição deste saber necessário e que me faz certo desta coisa óbvia, que é a importância inegável que tem sobre nós o contorno ecológico, social e econômico em que vivemos. E ao saber teórico desta influência teríamos que juntar o saber teórico

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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

prático da realidade concreta em que os professores trabalham. (FREIRE, 2015, p.134)

Para Freire, “a prática educativa é tudo isso: afetividade, alegria,

capacidade científica, domínio técnico a serviço da mudança” (2015, p.140). É

assim que a professora formadora Alice conduz a sua classe no processo de

Supervisão de Estágio, atenta aos conteúdos matemáticos, ajudando o futuro

professor a se constituir como educador, com capacidade técnica, mas

sobretudo com consciência de que o trabalho docente lida “com os sonhos, as

utopias e os desejos, as frustrações, as intenções, as esperanças tímidas, às

vezes, mas às vezes, fortes, dos educandos”. (FREIRE, 2015, p.141)

Nos quatro últimos semestres do curso de Licenciatura em Matemática

que o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo oferece,

são contemplados os componentes curriculares vinculados à Supervisão de

Estágios e a partir do 5º semestre são trabalhados temas voltados para a prática

reflexiva do professor, como Vivência no ambiente escolar; Formação do

profissional; Reflexão da Prática no Ensino e Trajetória da Práxis; e os

professores orientadores do IFSP acompanham os alunos estagiários a partir

dessas disciplinas de Supervisão de Estágio.

O estágio tem uma primeira parte de observação, normalmente feito aqui na escola, mas não só aqui, que o aluno se senta junto com os alunos de um professor e assiste às aulas, faz o seu relatório e coloca lá suas impressões. Isso num primeiro momento. Num segundo momento, ele vai a campo, existe um convênio da escola com escolas oficiais, e aí ele vai, inclusive, trabalhar ele mesmo como professor. (Entrevista Narrativa, Professor Porfírio, 2015)

Para o educador Porfírio, o momento do estágio é muito importante para

a formação do futuro professor, por que o aluno tem a oportunidade de observar,

primeiramente, conhecendo assim a sala de aula, as atividades desenvolvidas,

além de entender as variadas formas de organização da escola. E neste

processo de aprendizagem, o aluno estagiário, num segundo momento,

chamado de Estágio de Regência, terá a chance de vivenciar a prática docente,

assessorado pelo professor da instituição conveniada, no preparo, execução e

avaliação de atividades.

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Eu não vejo como você se formar professor sem este trabalho. Sem você assistir a uma aula, mesmo de boca fechada, mas, analisando o que está sendo feito. Analisando como o professor age. Aí ele vai saber como fazer e como não fazer. Vale as duas coisas. E depois, como professor, expondo o assunto do momento ele procura aplicar o que ele aprendeu. (Entrevista Narrativa, professor Porfírio, 2015)

A professora Alice também explica, em sua narrativa, esse momento de

entendimento que o estágio propicia ao futuro professor dentro da comunidade

escolar, destacando não só as atividades de rotina por que passam os

professores no exercício da profissão, mas o quanto é importante e faz parte do

dia a dia do trabalho docente a intimidade com a realidade da escola. E depois

de perceber os contextos reais daquela escola e comunidade, o acadêmico leva

toda a sua percepção em relação a sua participação no estágio para interagir

com seus futuros colegas de trabalho.

Então, no 5º semestre ele começa a fazer as disciplinas de estágio. Ele só vai observar. E aí, nesse 5º semestre ele vai observar a escola, o entorno, se essa escola tem inserção com uma comunidade, como é a biblioteca, o que que tem nessa biblioteca, como é a secretaria, como é a sala dos professores. E ele observa todo o ambiente da escola, ele observa a secretaria, ele observa como preenche um diário. E aí ele tem o espaço que ele faz fora da escola e junto tem duas aulas que ele tem aqui na instituição. Então, ele vai lá, observa e quando ele vem para cá, tem um professor que vai perguntar o que foi que ele observou para socializar. (Entrevista Narrativa, Professora Alice, 2015)

Mas, é no momento de Regência, conforme relata o professor Porfírio,

que o aluno estagiário tem a oportunidade de assimilar a teoria com a prática,

colocando em ação todo o conhecimento matemático adquirido ao longo dos

quatro semestres do curso de licenciatura, por onde já passara pelas disciplinas

de Fundamentos e já vira os assuntos relacionados ao ensino básico, e também

já conhecera algumas metodologias de ensino, discutidas nos textos da

professora Alice.

Ainda podem utilizar os conhecimentos que estão sendo adquiridos neste

momento nas disciplinas atuais do curso, tomando posse da legislação

educacional, estudada na disciplina de Supervisão de Estágio, ou começar a

anotar os modelos de aulas do professor Pedro para elaboração de um plano de

aula, pois neste momento é necessário também maturidade para começar a

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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

responder aos questionamentos da professora Alice: “Que tipo de professor você

vai ser? Que orientação pedagógica você acha que vai seguir”? (Entrevista

Narrativa, Professora Alice, 2015) para ter condições de apropriar-se da sua

prática e assim, ir construindo a sua identidade como professor.

Parece que os professores formadores do Instituto Federal de Educação,

Ciência e Tecnologia de São Paulo, representados aqui por quatro educadores

do instituto que nos concederam seus depoimentos acerca de suas expectativas

em relação ao curso de Licenciatura em Matemática, mantêm um olhar especial

e cuidadoso para a questão da prática docente, demonstrando em suas

narrativas que o estágio não só faz parte da preparação do futuro professor, mas,

significa um processo de aprendizagem indispensável, o qual possibilita a

aproximação do aluno estagiário com as demandas sociais e da escola, como

dito acima, e também a interação de conteúdos matemáticos com estudantes da

educação básica.

Quanto a preocupação com o empenho dos futuros professores em

relação aos conteúdos matemáticos é claramente expressada na fala do

professor José Augusto, do IFSP, ao declarar sua maneira de conduzir as aulas

para as turmas de Licenciatura em Matemática do instituto, onde os trabalhos

coletivos são estrategicamente pensados para que os alunos possam trocar

conhecimento, ajudando uns aos outros, mas, especialmente já comecem a

experimentar a prática docente.

Então, trabalhos em grupo, trabalhos coletivos em que tenha sempre a presença de um aluno que desponta um pouco mais, e acaba também sendo para ele um treinamento do próprio exercício de docência, por que ele vai acabar sendo obrigado a não só resolver o exercício para si mesmo, mas, ensinar outro a resolver aquele exercício. (Entrevista Narrativa, professor José Augusto, 2015)

Assim, o professor Pedro, que em suas aulas instiga os alunos a

participarem da construção do conhecimento matemático, fazendo-lhes

perguntas que os conduzem a explorar as possibilidades de aprendizagem,

também como o educador José Augusto, cria condições para que seus alunos

da licenciatura possam pensar desde os primeiros semestres do curso como

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será planejada e desenvolvida suas aulas como professores de Matemática,

mesmo que ainda nesse momento eles demonstrem mais interesse em somente

aprender o conteúdo dado e não pensem ainda em como ensinar futuramente

esse conteúdo.

Os alunos estavam chegando no processo de formação de professor, mas o próprio aluno ele estava muito mais preocupado em aprender a matemática do que aprender a matemática para o ensino. E as discussões mesmo, acho que muito pouco fica para ele naquele momento, por que ele está preocupado, focado em aprender a matemática, ele quer saber a matemática para fazer um gráfico, para ele saber resolver uma equação trigonométrica, é isso que ele quer saber. Ele não quer muito as discussões didático-pedagógicas naquele momento. (Entrevista Narrativa, professor Pedro, 2015)

Mas nas aulas da professora Alice, que trabalha os temas Vivência no

Ambiente Escolar e Formação do Profissional, nas disciplinas voltadas a

Supervisão do Estágio, depois de responderem aos questionamentos quanto a

sua postura enquanto profissional da educação e métodos de ensino que

desejam apoiar, os futuros professores são chamados à atenção, também,

quanto a prática pedagógica, sobre plano de aula, sobre como elaborar uma

atividade em sala de aula, reforçando as ações dos educadores José Augusto e

Pedro, e demonstrando que há uma sintonia entre os professores formadores do

IFSP em relação a qualidade da formação dos alunos da Licenciatura em

Matemática.

Eu tenho pedido para eles prepararem uma aula. Então, como é que é dar uma aula? Vamos preparar uma aula assim? Se de repente eles têm uma dúvida, olha professora, olha, o professor lá no estágio está ensinando, por exemplo, Equação do 1º Grau, está ensinando Números Negativos, e os alunos estão cheio de dúvidas. Tem algum jeito da gente ensinar melhor isso? Então eu falo, vamos parar e vamos pensar? Vamos parar e vamos discutir, vamos ajudar ele, como você acha que poderia fazer isso? (Entrevista Narrativa, Professora Alice, 2015)

Para o educador Pedro, do Instituto Federal, essa vivência do aluno

estagiário no ambiente escolar, além de integrar a teoria com a prática, nesse

movimento proposto pela aula da professora Alice, e avivar em cada futuro

professor o encanto da profissão docente, também serve para aproximar os

próprios formadores de professores do IFE da realidade da maioria das escolas

públicas brasileiras, fazendo com que essa formação de professor seja mais

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significativa, em compasso com a demanda da sala de aula. “Os professores das

escolas acabam ajudando na formação dele como futuro professor e pelo gosto

de ser professor”. (Entrevista Narrativa, Professor Pedro, 2015)

Ele acaba desenvolvendo atividades do ser professor e também acaba ajudando um pouco, eu acho que ajudou até bastante o formador de professor, as pessoas que atuam no curso de licenciatura. Por quê? Essas pessoas acabaram se aproximando um pouco mais da verdadeira necessidade do professor de Matemática que está lá na escola, então quando esse aluno traz para nós as demandas, do que eles precisam desenvolver com aqueles alunos, por conta dos pedidos dos colegas, dos professores que estão lá na educação básica, aí para nós é uma reflexão, eu falo: poxa vida, olha, eles estão querendo é isso, aprender isso e o professor não consegue ensinar números racionais para esses estudantes, vamos ensinar estratégias diferentes para ensinar esses números racionais para os estudantes. E aí, nós formadores acabamos também fazendo uma reflexão a respeito disso, do que é necessário realmente para formar um professor de Matemática. (Entrevista Narrativa, Professor Pedro, 2015)

Ao final desse processo de aprendizagem, “após o aluno integralizar as

408 horas de estágio e após ter sido aprovado nos componentes curriculares

relacionados ao estágio supervisionado” (IFSP, 2009, p.130), certamente terá

amadurecido como aluno, como pessoa, como profissional. Estimulado em

dominar cada vez mais a matemática para o Ensino Básico, acomodando uma

prática pedagógica em constante melhoramento e contemplado com uma visão

mais abrangente e humana do universo educacional, seguramente estará pronto

para tomar posse dessa profissão tão complexa e tão linda, com solidariedade.

Precisamos aprender a compreender a significação de um silêncio, ou de um sorriso ou de uma retirada da sala. O tom menos cortês com que foi feita uma pergunta. Afinal, o espaço pedagógico é um texto para ser constantemente ‘lido’, ‘interpretado’, ‘escrito’ e ‘reescrito’. Neste sentido, quanto mais solidariedade exista entre educador e educandos no ‘trato’ deste espaço, tanto mais possibilidades de aprendizagem democrática se abrem na escola (FREIRE, 2015, p.95)

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4 ORIENTAÇÕES AO PROFESSOR

Este produto apresenta dois temas da análise das narrativas de

professores formadores do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia

de São Paulo: Potencialidades do Curso de Licenciatura em Matemática pelas

narrativas dos professores formadores do IFSP e A prática docente, de acordo

com os formadores do IFSP.

A discussão sobre quatro entrevistas narrativas com professores do

Instituto Federal, que acompanharam a elaboração e/ou participaram da

reestruturação do Projeto do Curso de Licenciatura em Matemática e atuam na

efetivação desse projeto, busca algumas perspectivas sobre a formação de

professores viabilizada pelo Instituto Federal.

Estudar a vida dos professores mediante as narrativas das suas

experiências vivenciadas, possibilitou-nos, entre outros, acessar informações

fundamentais para conhecer de modo mais profundo o processo educativo, com

um entendimento das necessidades de soluções voltadas para a qualidade da

formação dos futuros professores.

Com os dois temas socializados neste produto, observamos

características que imprimem ao curso um potencial diferencial, desde os

conhecimentos fundamentais até o estágio profissionalizante, necessários à

formação dos futuros professores de Matemática do Instituto Federal de

Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo. A análise dos demais temas

encontram-se no trabalho completo.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O primeiro tema destaca alguns componentes curriculares, contemplados

especialmente nos semestres iniciais do curso, e que têm como objetivo principal

preparar os alunos para a profissão docente. O tema também expõe ações de

práticas e intervenções educacionais, narradas pelos professores formadores,

como forma de criar possibilidades para que os estudantes da Licenciatura em

Matemática se constituam, assim, educadores matemáticos e possam atuar com

criatividade e autonomia.

Os depoimentos acerca do segundo tema, revelam que os educadores do

Instituto Federal, representados aqui por quatro professores formadores,

mantêm um olhar especial e cuidadoso para a questão da prática docente,

demonstrando em suas narrativas que o estágio não só faz parte da preparação

do futuro professor, mas, significa um processo de aprendizagem indispensável,

o qual possibilita a aproximação do aluno estagiário com as demandas sociais e

da escola.

Quanto a preocupação com o empenho dos futuros professores em

relação aos conteúdos matemáticos é claramente percebida nas falas dos

professores formadores, e expressa na maneira que os educadores conduzem

suas aulas para as turmas de Licenciatura em Matemática do Instituto Federal.

A discussão, a partir das narrativas docentes, num processo de análise

subjetiva, nos concebeu uma visão holística do curso de Licenciatura em

Matemática que é concebido pelo Instituto Federal, permitindo-nos um olhar de

dentro para fora, onde levamos em conta o principal, a comunidade, os

professores que ali estão, os alunos que ali estão.

Não consideramos apenas os fatores objetivos, desenhados pelo Projeto

do Curso de Licenciatura em Matemática, embora esse documento tenha sido

necessário para a compreensão do todo, mas que sozinho não acomoda, por

exemplo, diferentes modos de aprender.

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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

Bolivar, Domingo e Fernandez (2001) afirmam que as narrativas

docentes, além de evidenciar o processo educativo é também um meio para que

o professor reflita sobre sua vida profissional e a partir de suas próprias

experiências adquira novas compreensões sobre como vivenciam seus

trabalhos, promovendo não só desenvolvimento pessoal e profissional, mas

também mudanças em sua atuação docente, eliminando aquilo que não gostam.

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Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática

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