1988_geonovas_litalgarve

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  eonovas Lis boa  . Vol. 10: 113-128, 1988. Aspectos geológicos do Litoral Algarvio 1) por J . M . AL V EIRI N HO DIAS 2) 1 . INTRODUÇÃO O Litoral Algarvio Fig. 1) é caracte r izado por elevada diver s i dade litológica e grande riqueza de formas . Com a x t n s ~ o de ce rca de 50 km de Odeceixe a Sagres e de cerca de 1 60 km de Sagres à foz do Guadiana, a costa desenvolve - se, de modo geral , em formações cuja idade vai sendo ma is re ce nte à medida que se ca minh a para or iente. Assim , a N do Cabo de São Vicente ,o litoral é talhad o em formações paleozói cas . Dest e cabo para l este surgem sucessivamente forma ções jurássicas , c retácicas, miocé nicas, plio-quaternár ias e actuais. Na cos ta ex i stem tipos litológicos muito variados , nomeadamente xistos , grauvaques calcários, dolomitos , calca renitos , siltitos, are nitos , co nglomerados, rochas eruptivas e areias actuais . /-1 / 2 / 3 Também no que resp eita ao clima de agitação marítima que atinge a costa se verifica va ri abi li dade. O lit oral a Norte do Cabo de São Vicente , aberto à agitação marítima dominan te do quadrante de NW) do Atlântico , é ventoso e afectado por o n dulação a l tamente energét ica. O litoral virado a Su l encontra-se abrigado das condições dominantes no Atlântico Norte , sendo a energia associada à ondulação que o atinge , de modo geral , moderada . Com t roços irados a NW , a SW , a S e mesmo a E , esta parte do litoral algarvio responde de formas dife r entes às agitações marít i mas que o atingem de SW , do min ante, de S e de SE). E sta variabilidade , notável a nível mundial , faz do Algarve região privilegiada para es t udos de geolog ia li toral. N t Tavira. Z Fuzeta Olhã o ;? .  . . Fa r o ., .. i g.1 - O litoral do Algarve , com indicação da localização das principais des ig na ções geográf ic as referidas no texto e dos tipos de cost a dominantes . l - Arriba com menos de 50 m ; 2 - Ar riba com mais de 50 m ; 3 -C05ta arenosa . ( 1) VI Curso de Actualização de Professores de Geociências ( Montechoro, 1986 ) . (2) Serviços Geológicos de Portugal. Rua da Academia das Ciências, 19 - 2. 0  1200 Lisboa , Portugal. Actualmente no Insti tuto Hidrográfi co,  Rua da s Trinas 49 . 12 96 Lisboa Codex. Portugal. 2. O LITORAL DO ALGARVE Podem considerar - se, no Algarve, dois tipos de costa com características contrasta nt es : a) o litoral de arribas , que

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Geonovas (Lisboa !. Vol. 10: 113-128, 1988 .

Aspectos geológicos do Litoral Algarvio (1 )

por

J. M . ALV EIRI NHO DIAS (2)

1. INTRODUÇÃO

O Litoral Algarvio (Fig. 1) é caracte rizado por elevada diver

sidade litológica e grande riqueza de formas. Com a e x t e n s ~ o de cerca de 50 km de Odeceixe a Sagres e de cerca de 160km de Sagres à foz do Guadiana, a costa desenvolve -se, de

modo geral, em formações cuja idade vai sendo mais rece nte

à medida que se ca minha para oriente. Assim, a N do Cabo

de São Vicente , o litoral é talhado em formações paleozói

cas . Deste cabo para leste surgem sucessivamente forma

ções jurássicas, cretácicas, miocénicas, plio-quaternárias e

actuais. Na cos ta existem tipos litológicos muito variados,

nomeadamente xistos, grauvaques , calcários, dolomitos , calca

renitos , siltitos, arenitos, conglomerados, rochas eruptivas e

areias actuais .

/-1/-2/-3

Também no que respeita ao clima de agitação marítim

que atinge a costa se verifica va ri abi lidade. O lit oral a Nor

do Cabo de São Vicente, aberto à agitação marítima domina

te (do quadrante de NW) do Atlântico, é ventoso e afecta

por ondulação altamente energét ica. O litoral virado a Sencontra-se abrigado das condições dominantes no Atlântic

Norte, sendo a energia associada à ondulação que o ating

de modo geral, moderada . Com t roços virados a NW , a SW ,

S e mesmo a E, esta parte do litoral algarvio responde d

formas diferentes às agitações marít imas que o atingem (d

SW , do min ante, de S e de SE).

Esta variabilidade, notável a nível mundial , faz do Algar

região privilegiada para est udos de geolog ia li toral.

N

t Tavira. 'Z . .. .

Fuzeta/ ' "

Olhã o ' ; ? .....Fa ro ., '

.. ...

Fig. 1 - O litoral do Algarve, com indicação da localização das principais des ig na

ções geográf icas referidas no texto e dos tipos de costa dominantes .

l -Arriba com menos de 50 m ; 2-Arriba com mais de 50 m ; 3 -C05ta

arenosa.

(1) VI Curso de Actualização de Professores de Geociências (Montechoro, 1986).

(2) Serviços Geológicos de Portugal. Rua da Academia das Ciências, 19 -2.0 ,

1200 Lisboa , Portugal. Actualmente no Instituto Hidrográfi co, ' Rua das Trinas

49 . 12 96 Lisboa Codex. Portugal.

2. O LITORAL DO ALGARVE

Podem considerar-se, no Algarve, dois tipos de costa co

características contrastantes : a) o litoral de arribas, qu

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ocorre na costa oeste desde o Cabo de São Vicente até

às proximidades da Quinta do Lago e b) o litoral arenoso que

desde este local se prolonga até à fronteira .

2.1 . O litoral com arribas

o estudo do recuo e evolução geomorfológica das arribas

não é simples. Ocorrendo na interface litosfera / hidrosfera //a tmosfera , as arribas sofrem a acção de processos muito

variados, da in teracção dos quais resulta o tipo e intensidad e

do recuo. Acresce ainda o facto de factores biológicos, com

particular ênfase nos antropozóicos, se constitui rem como

elementos perturbadores do sistema . Na Fig. 2 apresenta-se

um esquema simplificado que pretende traduzir os factores e

interacções acima aludidos.

Em consequência da erosão marinha na base das arribas,

estas tornam -se instáveis, instabilidade essa que induz movi

mentos de terras tais como deslizamentos rotacionais e pla

nares e quedas de blocos . O recuo das arribas pode, ocasio

nalmente, ser espectacular, mesmo a curto prazo. Referem-se,

a título exemplificativo, as arribas talhadas em materiais láv i

cos da ilha de Surtsey, na Islândia, que recuaram cerca de 10 0metros em 5 dias, em consequência da erosão induzida por

uma tempestade (SU NAMURA. 1983).

No estudo e evo lução das arribas, a aná lise e compara

ção de fotografias aéreas assim como de mapas antigos reve

lam-se auxiliares preciosos. Os mapas históricos, se bem que

tenham pequena precisão (frequentemente da ordem das

dezenas de metros), podem também fornecer indicações va lio -

ONDAS

sas. Em complementaridade com os estudos referido:;

importante efectuar a análise dos perfis das arribas. Rece

temente , EMERY & KUHN (1982) apresentaram um método

est udo destes perfis, baseado na loca lização e relações ge

métricas, na arriba, das camadas mais resistentes, o qual

tem revelado bastante eficaz.

A concavidade ou convexidade do perfil das arribas

condicionada pela taxa relativa de erosão por processos manhos e sub-aéreos , bem como pela existência e loca lizaçã

na arriba, das camadas mais resistentes (Figs. 3 e 4). E

arribas activas de litolog ia homogénea, sujeitas a intensa er

são marinha, desenvolvem-se perfis com tendência para

vert icalidade. Se a erosão marinha diminui de importânc

relativamente à sub-aérea verifica-s e "adoçamento" do per

por arredondamento da parte superior e desenvolvimento

talude, na base, com inclinação da ordem dos 30 °. Em arrib

subtraídas à acção dos processos erosivos marinhos, o " ad

çamento" do perfil continua, gerando-se perfis sigmoidais p

erosão da parte superior e deposição desses produtos

base da arriba (Fig. 5).

A aplicação, às arribas do Algarve, dos métodos de est ud

referidos (Figs. 5 e 6) revela que esta parte do litoral é, nomalmente , rectrogradante, apresentando por vezes taxas

recuo bastante elevadas (DIAS. 1984). No entanto, detecto

-se a existência de algumas arribas inactivas e, pontualment

de arribas que atingiram estado fóssil, o que aliás já tinh

sido verificado por GODARD (1967).

Podem considerar-se, na costa de arribas do Algarve, cin

sectores:

r--------------------------,r - - - - - ~ - - - - - - _ ,

I Caracter ís t icas das ção h i d r ã u l i c a lnerg la das o n d a s ' - - - f _ ~

Iao 1ar o r ondas na base da

arriba

L _______ _Acção mecânica

- -,

IL ________ 1opografia da pra ia

e da elataformaprox 1ma f - - - - - - ~ S e d i r r e n t o re prai a

L---'----____ '

Acti vi rede bio lógica

MATERI AL DA ARRIBAr - - - - - - - ------ -----,

Força de ataque

das ondas. fw

IIII

r-:--:----:-1---------..j I Re si s tênc i a do ma-Re-sistência mecânica f - - - ' - - - - - - - - - - ~ terial da arriba

Estrutura geolÓgicaL _____________ _

I L - ~ f ~ r - _ - - ' II

__ ..1 Não

Sim>------ol EROSI\O

Não

Sim

Fig . 2 - Factores Que afectam a erosão das arribas marinhas. A erosão das arribas é fundamentalmente determinada pe la intensidade relativa da

força de ataque das ondas e da resistência do material que constitui a arriba (adaptado de SUNAMURA, 1983 ).

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blocos ecalhaus

'-..

ACT I VA

t a lude

"INACTIVA

FOS S I L

Fig . 3 - Representação esquemática dos três estágios principais de evolução

de uma arriba marinha (adaptado de E MERY & KUHN, 1982 ).

11

A C

(homooen e a) {re, l l lent e ( ru lst ont eno topo 1 na bue )

M»S A ~ J ~ M'>SA J J ~ M=SA ~ M<SA ~

Fig . 4 - Matriz de perfis de arribas activas contemplando três aspectos litológ

CDS e quatro graus de actividade de erosão marinha (M) versus erosã

sub-aérea (SA I. As linhas diagonais representam camadas mais re sis tente

(adaptado de EMERY & KU HN, 19821.

Fig. 5 - Alguns perfis de arribas ocorrentes no lit oral do Algarve (extraído de D IAS , 1984).

2 ,1 ,1, Litora l a Norte do Cabo de São Vicente

A N do Cabo de São Vicente as arribas estão ta lhadas

no Soco Hercínico de litolog ia xisto-grauváquica , pouco resis

te nt e à erosão, Tendo sido sujeitas a repe tidos episód ios tec

tó nicos e metamo rfi smo mode rado, estas fo rmações paleozói

cas apresen tam múltiplas zonas de fraqueza estrutural de

pequena e grande escala. O desenho quase rect il íneo da

costa , com or ientação N NE-S SW, expõe estas arribas à ondu

lação e às tem pestades que, predominantem ente, chegam

do quadrant e NW, O carácter altamente ene rgé t ico da ondu

lação que atinge a costa deixa pressupor viole nta erosão

facto este confirmado pe la aná lise dos perfis das arribas,

qual indica ser a taxa relativa de erosão marinha /e rosã

sub-aérea fortemente positiva ,

Os pe rfis destas arr ibas são, em gra nde parte , condic iona

dos pe la geometria das zonas de fraqueza estrutural ma

susceptíve is à erosão, Qua ndo estas descontinuidades incl

nam para terra, a evo lução do perf il não é con t ínua, efectuan

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~ 1 ~

4

o - - - - - _ ~ ) ~ ' " I '"

~ 5 ~ ~ 6 . . . . . - -7

~ 8 Fig . 6 - CaracterizaçAo dos tipos de litoral do Algarve ocidental. Diferenciam-se as zonas de arribas talhadas predor:ninantemente em rochas paleozóicas

11 1. jurássicas (2), cretácicas (3), miocénicas com exumaçao do paleo-relevo cársico (4) e mio-pliocénicas pouco consolidadas (5). Representam-se ainda arribas em estádio de fossilização (6 ) e os principais corpos arenosos (7) . Estao também indicados os cinco sectores considera

dos nesta costa (A a E) bem como a ta xa relativa de recuo das arribas (8) para cada um dos se ctores (extraído de DIAS . 1984 ),

do-se principalmente por forte erosão dos níveis inferiores àszonas mais resistentes, aí se desenvolvendo concavidades que

acabam por provocar o desmoronamento das partes superio

res da arriba. Quando as zonas de fraqueza principais inclinam para o ma r, estas servem de zonas privilegiadas deescorregamentos, verificando-se certa tendência para a inclinação geral da arriba se aproximar da inclinação dessas superfícies de fraqueza estrutural.

Os factores referidos indicam que o recuo da arriba podeser bastante rápido, o que é confirmado pela presença, na

base das arribas, de grande quantidade de blocos e calhausdenunciando graus de rolamento muito diferentes, desde o nãorolado (com arestas vivas) até ao muito bem rolado.

2.1.2. Litoral entre o Cabo de São Vicente e a praia da

Figueira

Do Cabo de São Vicente até às imediações da praia daFigueira as arribas são talhadas quase sempre em formações

jurássicas cuja litologia dominante é calcária, frequentemente

dolomitica , por vezes margosa . A análise dos perfis das arri bas (Fig. 5), os quais, geralmente, pelo menos na base, seapresentam verticais, e com as partes superiores desenhando

muitas vezes ãngulos quase rectos, permite concluir que a

erosão marinha é, de modo geral, superior a muito superior àerosão sub -aérea.

As irregularidades des'te sector da costa, constituídas por

pequenas identações formando sucessão de ponta s e angras,são atribuíveis quer à fracturação, quer a variações litológicas.

A erosão .continental destas formações é responsável pe

desenvolvimento de pequenos " canyons " e ravinas, em cuparte terminal se desenvolveram, frequentemente , reduzidcorpos arenosos que constituem as praias deste sector.re cuo das arribas parece não ser grande , principalmen

quando estas são talhadas em espessas bancadas dolomi

zadas, como acontece na península de Sagres. Quando

rochas expostas são de litologia mais branda, como aconte

mais a oriente, o recuo da arriba é maior. Todavia, a erosdiferencial , deixando em saliência "ponta s" constituídos p

rochas mais resistentes , tem como consequência a dissipaçã

da energia da vaga , reduzindo a erosão nas partes reetrantes.

2 .1.3 . Litoral entre a praia da Figueira e a praia de Por

de Mó s

As arribas talhadas predominantemente em formações didade cretácica estendem-se desde as proximidades da prada Figueira até um pouco a leste da praia de Porto de Mó

A litologia é essencialmente carbonatada, frequentemen

margosa ou gresosa, o que imprime a este sector caracterí

ti cas até certo ponto semelhantes às do sector precedent

Certas irregularidades no desenho da linha de costa sãprovocadas pela presença de rochas eruptivas , como se ve

fica , por exemplo, na Ponta das Ferrarias. Por vezes, comacontece a oeste da praia da Luz, as camadas inclina

para o mar, apresentando as " arribas" declives condicionado

pela estratificação . É também de referir a existência de fen

menos de lapiasação que conferem à costa, por vezes, aspetos característicos. A análise dos perfis das arribas continu

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a evidenciar, de modo geral, erosão marinha superior à erosãosub-aérea.

2 .1.4 . Litoral entre a praia de Porto de Mós e Olhos de

Água

De um pouco a oriente da praia de Porto de Mós até

aos Olhos da Água a linha de costa é talhada. em rochas deidade miocénica , com litologia variada, nomeadamente calcá rios, calcarenitos e siltitos. Este sector do litoral algarvio éfrequentemente condicionado pela existência de antigo mode

lado cársico actualmente em fase de exumação marinha . Estetipo de modelado, conjugado com o recuo da linha de costa,o qual é facilitado pela pequena consistência do materialque preenche as depressões cársicas, é responsável pelaexistência frequente de escolhos e leixões. Estes são maisabundantes quando a costa está protegida da agitação mar í-

tima predominante (como se verifica entre a Ponta da Piedadee Lagosl e, consequentemente, da sua acção destruidora.

Este litoral entre a Ponta da Piedade e Lagos apresentadesenho muito rendilhado sendo possível , com frequên cia ,deduzir o antigo modelado cársico agora em fase de destru i

ção. É o que se verifica na Ponta da Piedade, cujo contornocomplexo advém nitidamente da coalescência .de vários algares. Há , neste sector, ind ícios seguros de recu o da costa .Refere-se, a título de exemplo, o leixão da Cruz, junto à

Ponta da Piedade, encimado pela haste de . antiga cruz, oqual em tempos não: muito. distantes esta. la ligado a terra .Diz a tradição que por lá passava a procissão de NossaSenhora da Piedade.

A oriente de Lagos estendem-se longos areais em cone xão com a foz · do Bensafrim e do sistema Alvor-Odiáxere.A progressão de restingas arenosas a partir da Meia Praia, aocidente, e da zona da Ponta. João de Arens, a oriente,anastomosou as· fozes do Alvor e·.do Odiáxere, formando

ambiente barreira mediamente desenvolvido e muito assorea

do . Subtraídas à acção erosiva do mar, .as arribas da regiãotornaram-se inactivas, atingindo actualm ente estado de fossili zação (Figs .5 . e 61 . A forma geométrica do. Litoral sugere cla ramente a actuação, dos fenómenos de refracção e difracção

da ondulação dominante .

A evolução recente da praia da Rocha, localizada a oci dente da foz dO' rio Arade , é bastante interessante, nomea damente por 'constituir um dos únicos casos de realimentaçãoartificial de praia, em Portugal, que teve amplo sucesso. Aevolução do litoral nesta zona está bem expressa nos artigos

de GO M ES & WEINHO LTZ (19711 e WE I NHOLTZ (1980 1. onde

também se referem pormenorizadamente as obras realizadas.A descrição que se . segue está essenc ialmente baseada nestes trabalhos.

A evo lução da praia da Rocha está essen€ialmente ligadaà evolução dos bancos do delta de juzante do rio Arade. Nofinal do século passado e início deste século a praia era ba stante larga . Em 1884 tinha largura de 10 0 a 15 0 m. Em

1916 , a largura da praia emersa ' tinha aumentado de forma

11

notável , atingindo mesmo 27 5 m na adjacência da foz d

Arade, devido ao banco W do delta de juzante deste rio ster desenvolvido e unido à praia. Devido ao assoreamento dbarra dragaram-se nesta, em 1926 e 1927 , cerca d360000 m3 de sedimentos . No entanto, os bancos da emb

cadura reconstituiram-se rapidamente e os fundos voltara

para as cotas que anteriormente tinham. Por efeito das dragagens realizadas, as praias da embocadura começaram

diminuir de largura, tendência que se agravou nos anos trintO mar começou então a atacar e a erodir os rochedos , mode

lando-os com aspecto rendilhado, consagrado nos postais

pinturas da época.

Em 1947 iniciou-se a construção do molhe W do por

de Portimão, tendo as obras sido interrompidas em 1951

sendo o comprimento do molhe, então, de cerca de 10 0 mComo consequência, a praia entrou em rápido emagrecimen

geral, desaparecendo praticamente. Apenas junto ao molh

permaneceu pequena praia . As arribas começaram a ser submetidas a intenso ataque pelo mar. Os molhes foram conclu

dos na década de 60 . Junto ao molhe W desenvolveu-spraia até cerca de 50 0 m para ocidente, mas de cotas sem

pre baixas junto à base da arriba. Em 1970 a praia era pra

camente inexistente nos períodos de maré-cheia viva. Só erpossível colocar toldos e apoios balneares em 3 ou 4 locajunto à arriba, pois mesmo nas marés cheias normais a praemersa era muito reduzida .

Entre Junho e Novembro de 1970 efectuaram-se dragagens para estabelecimento do anteporto, tendo as areias sid

repulsadas para a praia da Rocha, no sentido de realimenta

esta praia. Volvidos 10 anos sobre a realização destes traba

lhos constatava-se que a arriba estava bem protegida po

praia com largura de cerca de 10 0 m, sendo as cotas dordem dos 5-6 m. Próximo da base da arriba verifica-se aparecimento de vegetação pioneira a qual, todavia, é destru

da todos os anos pelos adjudicatários dos estabelecimento

balneares, não se permitindo , deste modo, que esta vegetaçã

efectue a retenção das areias .

A situação actual não é preocupante, embora junto amolhe W a areia se encontre já a cotas superiores ao secoroamento, sendo frequentemente transportadas, por acçãeólica, para o interior do anteporto, assoreando-o . Por outr

lado, a parte ocidental da praia da Rocha (próximo da pont

dos Castelosl evidencia sintomas de emagrecimento . Dadosucesso da anterior realimentação da praia, seria de estudar

possibilidade de efectuar o repulsamento de novas dragagendo anteporto para a zona da ponta dos Castelos, procedendo

-se, assim, a nova realimentação.

Para oriente de Portimão (na foz do Aradei desenvolve

ram -se também areais em conexão com as desembocad uradas ribeiras principais, como em Armação de Pera e Albufeir

Como a resultante do transporte litoral é, em geral, de oestpara leste, estes depósitos têm tendência para se disporem

preferencialmente, a oriente da foz, com direcção tendend

para NW -SE , perpendicular à direcção da agitação marítim

dominante . Devido a este processo algumas arribas tornaram

-se inactivas. O extenso areal, com mais de 5 km de co mpr

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mento, situado a leste de Armação de Pera, apresenta orientação NW-SE e localiza-se a oriente das fozes da ribeira deAlcantarilha (praia de Armação de Pera) e da ribeira de Espiche (Praia da Galé) . Mais para leste, e até aos Olhos deÁgua , o litoral é constituído por arribas talhadas em forma ções do Miocénico marinho (biocalcarenitos e níveis detríticos,geralmente siltosos). As praias desta zona são pequenas (ra ramente ultrapassando os 1000 m de comprimento) e apre

sentam orientação W-E a NW -SE.

A análise dos perfis das arribas revela que, em geral , aerosão marinha é intensa e, por via de regra, maior que aerosão sub-aérea . Todavia, esta análise é dificultada pelanecessidade de interpretar a topografia pré -existente para averiguar até que ponto o perfil actual foi condicionado pelo

paleo-relevo cársico. Nas zonas em que as arribas estão protegidas pela existência de praias, os perfis revelam tendência

para forma sigmoidal , a qual é tanto mais evidente quanto

mais largo é o areal. O cordão arenoso, protegendo a arribada acção marinha , provoca importância crescente da erosão

sub-aérea . Como atrás se referiu , algumas destas arribas to rnaram-se inactivas. Neste sector do litoral o recuo das arribaspode ser importante. Efectivamente, há indícios de que alguns

leixões actuais estiveram , em tempos não muito recuados,ligados a terra. Por outro lado, não são raros desmoronamentos e desabamentos na arriba como , por exemplo, oque se verificou há cerca de cinco anos na Praia Nova. Narealidade, .é possível que a interacção da erosão actual com opaleo- relevo cársico possa, esporadicamente, provocar recuo

da linha de costa bastante rápido em certos locais.

2.1.5. Litoral entre Olhos de Agua e Quinta do Lago

Para oriente dos Olhos de Agua desenvolve-se sistema

de arribas talhadas em formações atribuídas ao Miocénio

e/ ou pós - Miocénico , as quais estão protegidas, em maior ou

menor grau, da acção directa do mar, pela existência de praiacontínua na base da arriba. A litologia dominante é constituída

por arenitos e siltitos mal consolidados, por vezes com cama das cascalhentas . Como estes tipos litológicos são facilmente

desagregáveis, os processos de erosão continental , actuando

sobre eles, provocaram intenso abarrancamento. Parte importante da areia da praia existente no sopé das arribas provém

da erosão destas formações (DIAS. 1986). A susceptibilidade

destas arribas à erosão marinha é extremamente elevada.Nalguns locais o recuo chega a atingir 2 m / ano (GR ANJA,

1984; DIAS , 1984 , 1986). Verifica -se forte desgaste nabase quando o tipo de agitação marítima é tal que ultrapassa

a protecção que lhes é conferida pela existência da praia .Provavelmente , é esta a explicação para a orientação geralNW -SE destas arribas, perpendicular à ondulação dominante .

Podem considerar-se, nestas arribas, tréls tipos principais

de erosão: marinha , na base; sub -aérea, no topo; eólica epluvial incidindo em toda a face da arriba . A estas haveráque adicionar a erosão induzida pelo próprio homem, quiçá

tão ou mais importante que aquelas.

É costume de muitos turistas esculpirem na face desta

arribas inscrições em baixo relevo (graffittil, frequentement

acompanhadas pela data. O facto de raras serem as inscriçõe

visíveis datadas do ano anterior, e de o sulco das inscriçõe

te r a profundidade média de 1 a 2 cm, permite conclu

que a erosão generalizada da face da arriba é igualou sup

rior a 2 cm/ano . Os perfis das arribas revelam , frequente

mente, formas concavas com base tendendo para a vertica

lidade. É comum a existência de blocos provenientes de demoronamentos das arribas. Normalmente, tais depósitos nãresistem à acção das primeiras vagas de tempestade .recuo destas arribas é extremamente rápido, o que é atestad

por inúmeros vestígios tais como: importantes desmorona

mentos recentes (p. e ~ praia da Falésia); vestígios de edif

cações atingidas pelo recuo da arriba (p.ex.: perto de Ouarte

ra); árvores caídas provenientes da parte superior da arrib(p .ex.: Olhos de Água); construções descalças na base devid

à erosão (p.ex.: piscina de Vale do Lobo).

Este sector do litoral pode considerar-se dividido em trêpartes :

a) Olhos de Agua - Ouarteira, constituído por arribas con

tínuas, cuja altura varia entre 15 e 50 m. A praia subjacen

te , vulgarmente denominada por praia da Falésia, é estreit

Com o perfil de Verão, esta praia confere protecção razoávà arriba . Todavia , quando atinge o perfil de Inverno, a praemersa reduz-se substancialmente, permitindo que õ ma

mesmo em condições de agitação moderada , ataque de form

violenta a base da arriba, induzindo nesta fortes recuos.

b) Quarteira - Vale do Lobo, em que as arribas, com 1a 20 m de altura, são frequentemente interrompidas pel

vales das ribeiras e linhas de água que afluem a este tro

do litoral. Devido ao emagrecimento da praia, os fenómeno

de erosão começaram a ameaçar a própria vila da Ouarteir

chegando a registar-se destruições na marginal. Construiram-s

então, esporões de protecção (enrocamentos). No entant

estes, retendo as areias provenientes de oeste, provocara

deficiências de abastecimento a oriente, o que obrigouconstrução de novos esporões (14 actualmente ), sem qu

contudo, se tenha resolvido o problema. A construção, e197 3 , do molhe de entrada da marina de Vila Moura,oeste de Ouarteira , l imitou ainda mais a eficácia do camp

dos esporões (Fig. 7). Actualmente , os problemas de erosã

subsistem, e os esporões carecem de manuterlção e reforç

periódico devido à cedência da parte terminal dos esporõe

induzida pela erosão da praia submarina (BETTENCOURT. 1985

A oriente da Ouarteira o recuo da arriba é espectacula

O Forte da Ouarteira ou Forte Novo que, em 1970, se erguno topo da arriba estava já, em 1977 , cortado ao me

(metade permanecia no alto da arriba e as ruínas da out

metade jaziam na praia subjacente). Actualmente, o Forte finteiramente destruído, sendo visíveis as suas ruínas (grande

blocos) a mais de uma dezena de metros da base da arribTal facto permite quantificar o recuo da arriba em cerca d2 m/ano ou mais.

A oriente da arriba do Forte Novo, na foz das ribeiraque aí afluem (por exemplo, na ribeira da Carcával, pode

observar-se, na praia , afloramentos de materiais silto-argiloso

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LITORAL DE QUARTEIRA

Ondas dominantes (SW)

=:;> acumul açã6esporao

inicial

~ Transportesedimentar

o

®

~ -acumulaçao necessidade de novos esporoes

novo esporão damarina de Vilamoura

.' ~ . ' . to ... o· .· • •. ..

t 7 l ' --=>s aul lzaçao

erosao

©

erosao

~ : l J ~ t ~ · - - - ~ - - - ~ l f - - -

erosao necessidadede novosesporoes

Fig. 7 _ Evo lução d? litoral da Quarteira (segundo BETIENCOURT. 1985) . A) Estado inic ial : costa em erosão ; B) Construção de espo

rão e ace leração da erosão a oriente; C) Novos esporões e continuação da erosão a oriente ; O) Estabilidade a ocidente , ero são

progredindo para oriente ; E) Situação actual ' cedência dos esporões frente a Quarteira e continuação da erosão a oriente.

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120

frequenteme.nte com abundantes vestígios " in situ " de vege

tação .típica de sapal. Denunc iam que as fozes destas ribeirasse localizavam. não há muito tempo, bastante mais para sulda posição que hoje ocupam .

Continuando para oriente , encontra -se o empreendimento

turístico construído no Vale do Lobo. A piscina, loca lizada notopo da arriba, encontrava-se , no início da década de 80 , emgrave perigo . Parte do logradouro da piscina tinha sido des truído e o recuo da arriba estava a atingir, de forma acelerada , o campo de golfe. A comparação dos levantamentos

topográficos permite deduzir que, nesta zona, o recuo m édioda arriba (desde 1964). fo i superior a 1 m/ ano , sendo provável que tenha chegado a atingir valores superiores a 2 m/ ano.Em 1984 / 85 construiu-se um enrocamento na base da arri ba para obviar ao recuo desta. No início de 1986 era jáobservável que , a ocidente do enrocamento, a praia era mais

larga, que as arribas apresentavam alguns sintomas de activi

dade reduzida e que a vegetação pioneira se instalara , de fo r ma persistente, na parte superior da praia. A oriente , contudo,era já nítido o emagrecimento da praia, vestígios de depósitos

de sapal da foz da ribeira do Lobo afloravam no litoral (com

resíduos bem evidentes, da vegetação típica desses am bientes). e era evidente a aceleração do recuo das arribas(nomeadamente nas arribas junto ao Vale do Garrão e dasAreias Douradas) .

c) Zona de "enraizamento " da Península do Anção. Aparte mais oriental deste sector de arribas (até à Quinta do

Lago) encontra -se actualmente protegida da acção marinha

pelo enraizamento oeste do sistema de ilhas barreira de Faro- Olhão. Os respectivos perfis denunciam forte tendência

sigmoidal. verificando-se transição gradual das arribas activas

para as inac tivas e destas para as arribas fósse is.

2 .2 . A costa arenosa

A oriente das arribas acima referidas o litoral é do tipo

arenoso, estendendo-se até à foz do Guadiana , na fronteira .

Mais para oriente , o litoral espanhol apresenta ca racterísticasanálogas.

Há a considerar, nesta parte do litoral algarvio, dois

sectores distintos: o sistema de ilhas barreira de Faro-Olhão

(Ria Formosa), e o litoral arenoso que se lhe situa a oriente,até ao banco de O'bril , na foz do Guadiana.

2.2 .1 . O sistema de ilhas barreira

São conhecidos sistemas de ilhas barreira em muitos

locais do mundo. Todavia, o sistema de ilhas barreira do

Algarve (ou de Faro-Olhão ou da Ria Formosa, nomes pelos

quais também é conhecido) apresenta características particu

lares que lhe conferem especial interesse. Efectivamente , amaior parte dos sistemas deste tipo ocorrem em adjacência

a planícies costeiras, associados a regime de marés do tipo

micro- maré (O a 2 m) ou meso- maré (2 a 4 m ), situan

do -se, frequentemente, na dependência da desembocadura de

rios importantes (LEATHERMAN . 1979) . As ilhas barreiras dFaro-Olhão (Fig. 8 ) ocorrem em condições limite pois qu

em período de marés-vivas, estas atingem quase 4 m d

amplitude. Encontram -se, consequentemente, no limite acim

do qual não se desenvolvem sistemas deste tipo (HAYE1979) . Por outro lado, não se verifica a existência , nregião, de planície costeira desenvolvida , nem de qualqu

rio importante . Tal bastava para revelar o interesse do estud

destas ilhas. No entanto, a disposição geral do sistema, fo

mando "g rosso modo" um triângulo escaleno (um vértice d

qual é o cha mado Cabo de Santa Maria) confere - lhe interesssuplementar v isto que os sistemas deste tipo ocorrem, 'geramente, como alinhamento mais ou menos rectilíneo de ilhaA forma protuberante do sistema algarvio é peculiar e rarComo foi reconhecido por VANNEY & M OUGENOT (1981 ).

caso mais semelhante a este é o do Cabo Haterras, na Carlina do Norte, para o qual não foi encontrada ainda exp licção genética satisfatória .

2.2.1 .1. Origem

É actua lm ente ace ite que a origem e evolução das ilhbarreira está relacionada com variações relativas do nível d

mar resultantes, principalmente, das glaciações e deg la ciaçõeSegundo HoYT (1967 ), quando o nível do mar estava próxim

do bordo da plataforma (há cerca de 18000 anos) form

ram-se cordões arenosos (beach-ridges) paralelos à costa . Coa posterior subida do nível do mar, estes co rdões arenosoforam inundados pelo lado do continente, formando ilhaparalelas à costa . Depois de formadas , as ilhas respondera

à progressiva subida do nível marinho co m um conjunto dprocessos de que resultou a sua migração transversal at r

vés da p lataforma cont inental . Como facilmente se depreend

a velocidade de migração das ilhas é função da inclinaçã

da plataforma, sendo tanto mais rápida quanto menor fô

essa inc linação.

Baseados no modelo de Hoyt e na batimetria da plataforma do sotavento algarvio, MO NTEIRO et aI. (1 98 4 ) propuse

ram um esquema que permite explicar a forma geométric

do sistema de ilhas do Algarve e que se coaduna com a

caracte rísticas das diferentes ilhas. Frente ao Cabo de San

Maria , a plataforma continental é muito mais inclinada que

leste e a oeste (Fig. 8) . A migração das ilhas barreira tersido, por consequência , mais lenta frente a este Cabo e ma

rápida de um e do outro lado. Segundo o esquema apresentado por estes autores, a Península do Anção (Ilha de Faroterá veloc idade de migração muito superior à da parte cent rdo sistema. Tal facto é confirmado pelos estudos 'j á realizadoCom efeito, na zona do Cabo de Santa Maria, a Ilha da Barretmostra -se robusta , evidenciando relativa estabilidade ao long

do temp o. Na zona da praia de Faro, pelo contrário , verifica-srecuo da parte frontal , tendo a linha de baixa-mar sofrid

t ranslacção, em direcção ao continente , co m velocidad

média, entre 1945 e 1964, de cerca de 1 m/ ano (WEINHOLT1978a)

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37°10 ' / '- ' ~ . . . . - - - - : : : ' 3 0 0 ~   , ~ ou

+-'

C

<cu

8°100'

20 - - - - - - - - - - -30 ------.......

40'-__

~ 0

;::::....-,---- 70----. ._ -_ _ _ eo ---J

100___

_ -------- 20U - - - - - - - ~

o 5Km

r140'L.... . . . . .

Fig 8 - A "Ria Formosa" com indicação das barras e das ilhas e penínsulas do cordão externo. Representou-se também a batimetria

(em metros) da plataforma adjacente.

r130'

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122

2.2.1.2. As ilhas e as barras

o sistema barreira da Ria Formosa é constituído por

série de penínsulas e ilhas que delimitam um ambiente lagu- .nar interior. De oeste para leste encontram-se a Penínsulado Anção, as ilhas da Barreta, da Culatra , da Armona , deTavira e de Cabanas e a Península de Cacela. Cada uma

destas ilhas (e penínsulas) apresenta características particu

lares. Os processos destrutivos e const rutivos (tais como gal gamentos oceânicos (overwashes) , vegetação , cortes eólicos(blow -outs), canais de maré, " sand flats" e deltas de enchente

e vazante) actuam de forma diferenciada em cada ilha, conferindo-lhes aspectos específicos .

A Península do Anção é comprida e estreita (cerca de10 km de comprimento e 10 0 a 20 m de largura), dispondo-sesegundo a direcção NW -SE . Podem considerar-se, nestaPenínsula , três sectores (BETTENCOURT. 1985) :

a) Do "e nraizamento" à zona urbanizada a duna é elevada(a altura é, frequentemente, superior a 10m ), observando-se

vestígios de galgamentos oceânico s (overwashes ), por vezesmuito importantes (que chegam a atingir mais de 35m delargura e interrompem completamente o cordão dunarl. Oscor tes eólicos (blow -outs) originados por pisoteio são numerosos, o que evidencia intensa ocupação humana desordenada.

b) O sector urbanizado (conhecido pelo nome de praiade Faro), constitui a parte central da Península, e é o único

local do sistema facilmente acessível co m automóvel (atravésda ponte). O cordão dunar está totalmente destruído . A construção (maioritariamente clandestina) é completamente desor

denada. Em período de marés-vivas cheias, as águas chegam

a atingir as casas, nomeadamente na parte junto á laguna(esteiro do Anção) . Em período de tempestades verificam-se ,com frequência , danos na muralha que limita e proteje olargo fronteiro à ponte, bem como inundações de arruamen tos e habitações . Como índice da fragilidade desta ilha podereferir-se, por exemplo, que no decurso da tempestade de

20 / 21 de Fevereiro de 1966 se verificou galgamento oceânico em onze locais, dev ido a vagas provenientes de SW eSSW (GUILLEMOT. 1974) .

c) Entre a parte urbanizada e a barra do Anç ão o cordãodunar é estreito e pou co elevado, acabando por desaparecer

junto à extremidade SE . Corresponde à zona de mi gração,para oriente, no sec. XX, da Barra do An çã o (WEINHOLTZ.1978al.

A Barra do Anção efectua a separaçã o entre a Penínsulado Anção e a Ilha da Barreta. A tendência natural desta barraé a de migrar de ocidente para oriente, até uma posição

limite , localizada aproximadamente onde actualmente sesitua, verificando-se, então, o seu assoreamento e abertura

de nova barra a ocidente , na zona loca lizada frente à Quintado Lago (WEINHOLTZ. 1978al. Esta barra parece ter atingido

certa estabilidade, visto que a sua evolução tem sido muito

pequena desde 1966 . É pro váve l que , se não fosse a intervenção humana no sistema, esta barra estivesse já fechada ese tivesse aberto nova barra a oeste.

A /lha da Barreta tem form a encurvada , aí se localizando chamado Cabo de Santa Maria , extremidade merid ionalterritório português co ntinental. Tem comprimento de cercde 8000 m e largura variável entre 85 e 70 0 m (BETTE

COURT. 1985). Ao contrário de um único cordão dunar, co m

na Península do Anção, verifica -se aqui a existência de váriocordões dunares, cuja co mplexidade aumenta de ociden

para oriente. A construção dos molhes da barra artificial d

Faro-Olhão, interrompendo a deriva litoral, provocou acumulçã o intensa de areias junto ao molhe oeste . Esta acumul

ção verdadeiramente notável evidenc ia , de forma espectaculaa actividade da deriva .Iitoral e a resultante , muito forte, des

t ipo de transporte, de ocidente para oriente . Após a conclsão dos trabalhos de abertura e protecção da barra artificide Faro-Olhão, em 1952 , a praia oceânica progrediu pasul 22 0 m em 12 anos (BETTEN couRT. 1985). Este ritmo dprogressão diminuiu, após 1964 , provavelmente porque

atingiu o equilibrio entre a acumulação de areias e o molh

que a originou e/ou porque o delta de vazante da barmigrou para o largo devido à canalização do flu xo de vazantO facto de se te r desenvolvido pequena reentrânc ia de erosãapós cedência da parte terminal dos molhes suporta a pmeira hipó tese expendida.

A Barra artificial de Faro-Olhão, que separa as ilhas dBarreta e da Culatra, co meçou a ser aber ta em 1927 , tend

os trabalhos terminado em 1952 . Como se referiu , a co nstr

ção do molhe W induziu espectacular crescimento, para suda Ilha da Barreta. Simultaneamente , a refracção e difracçã

da ondulação no delta de juzante da barra e nos molhecomeçaram a provocar erosão na Ilha da Culatra , per to d

farol , tendo aí sido construídos esporões na tenta t iva deliminar tal erosão. Os fenómenos de canalização at ravéda barra são intensos, atingindo a velocidade do flu xo dvaza nte valores muito elevados. Em período de marés-morta

a corrente de vazante atinge velocidades da ordem do60 cm/ s. Nas marés-vivas, essas velocidades ultrapassam o20 0 cm/ s (LIMA & VALE . 1980 ). Em consequência , o canentre molhes, projectado para manter fundos de 4 a 4,5

abaixo do zero hidrográfico, foi -se aprofundando progress

vamente, atingindo profundidades superiores a 25m , d

resultando graves danos nos troços terminais dos molh e(WEINHOLTZ. 1978al. Em co nsequência de tal facto, é nítidaexistência de zona de erosão que vai desgastando o areprev iamente depositado de encontro ao mo lhe oeste.

A /lha da Culatra tem orientação SW-N E, e é constituídabasica mente, por cinco co rpos arenosos encurvados , disposto

diagonalmente em relação -à parte exterior da ilha, onde s" enraizam" e anastomoseiam. Estes corpos arenosos estã

separados por baías ou golfos abertos para a lag una. Actua

mente, encontra-se em desenvolvimento um sexto co rpo arenoso, na extremidade NE da ilha. O crescimento, para oriente

da Ilha da Culatra tem sido muito rápido. Entre 1950 e 197

a ilha progrediu 1450 m para NE (cerca de 52 m /a nos ), verficando-se , simultaneamente, erosão importante na facoceânica (virada a SE) ; entre 1973 e 1983 o cresciment

fo i de 2900 m para NE , o que corresponde a ta xa média dprogressão de 27 m/ ano (BETTENco uRT. 1985 ). Este compo

tamento , e a sua variação ao longo das décadas mai s recen

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tes, está seguramente relacionado com as modificações indu

zidas pelas obras da Barra artificial de Faro-Olhão.

A Barra da Armona, que separa as ilhas da Culatra e da

Armona, é a que apresenta delta de juzante mais desenvol

vido. Esta barra tem-se mantido mais ou menos na mesma

posição ao longo do tempo (WEINHO LTZ. 1978aL embo ra a

sua largura se tenha reduzido substancialmente no último

século devido, principalmente, à progressão da Ilha da Culatrapara NE (ESAGUY . 1984). Constata -se que essa largura dimi

nu iu quase 2 ,5 km entre 1877 e 1983 . Apresenta actual

mente largura de 1 80 0 m (BETTENcouRT . 1985).

A /lha da Armona tem também orientação SW -NE , com

primento aproximado de 9 km e largura máxima de cerca de

1 30 0 m (na ext remidade SW ). Apresenta uma forma caracte

rística em "coxa de galinha ", típica de ilhas em que os

processos ligados às marés predominam sobre os ligados à

ondulação (HAYES . 1979 ). Nos últimos 40 anos registou-se um

crescimento espectacular da ilha para NE, da ordem dos

3 km . Simultâneamente, a praia recuou 80 a 10 0 m ime

diatamente a oriente da ponta SW , e esta ponta progrediu

para SW cerca de 45 0 m (BETTENCOURT, 1985 ).

A Barra da Fuzeta, entre as ilhas da Armona e de Tavira,

é ca ra cterizada por evolução muito rápida, migrando de W

para E. Ocupa actualmente a posição mais oriental de que

há registo (WEINHOLTZ, 1978a ). A velocidade média de migra

ção é superior a 72 m/ ano, pois que progrediu 2900 m entre

1944 e 1984 (ESAGUY, 1985). Esta migração efectua -se quer

progressivamente , quer por " saltos" bruscos. Caso revelador

desta dinâmica é a existência , na extremidade NE da Ilha da

Armona, das ruínas de uma casa de alvenaria , bem visível na

maré vazia, a qual se encontrava , há cerca de uma dezena de

anos, na ponta SW da Ilha de Tavira .

A /lha de Tavira é a maior do sistema . Tem forma alon

gada segundo o eixo SW-N E, co mprimento aproximado de 11

km e largura máxima de cerca de 80 0 m na parte central.

Estreita progressivamente para SW , existindo indícios, nestaextremidade , de forte erosâo. Na maré vazia são nít idos, nesta

ponta, afloramentos de materiais silto-argilosos com elevado

co nteúdo vegetal típico de ambiente de sapal, a que se

sobrepõem as areias que constituem a ilha . Testemunham ,

por um lado, a progressão da ilha sobre a laguna e, por outro,

a erosâo que esta ponta tem vindo a sofrer. Com efeito,

desde 1951 , a parte SW da ilha fo i sujeita a recuo da ordem

dos 2 ,5 km . A parte NE da ilha foi recentemente (1961)

fixada artificialmente at ravés da construção dos molhes da

Barra artificial de Tavira.

A Barra de Tavira é artificial. Naturalmente, tem tendência

para m igrar para oriente. Verifica -se que a barra natural

cami nhou até uma posiçâo a nascente de Cacei a, por volta

de 1923, fechando por comp leto em 1930 , depois de, em1927 , se ter aberto uma barra artificial através da Ilha de

Tavira, em frente à foz do ri o Gilão, a qual rapidamente se

assoreou (WEINHOLTZ, 1978a). O cic lon e de 1941 abriu nova

barra (Barra do Cochicho) imediatamente a nascen te da posi

ção do antigo canal artificial, a qual rapidamente se alargou

12

e começou a migrar para oriente . Face às di ficuldades d

navegação, a barra artificial foi reaberta em 1961 . Ness

ano, em Março, violento temporal rompeu o cordão em fren

à povoação de Cabanas, desaparecendo 'o troço da ilha com

preendido entre esta nova barra e a Barra do Cochich

-Almargem , o qual , no entanto, rapidamente se reconstitui

sendo actualmente conhecido como Ilha de Cabanas (WE

NHOLTZ, 1978a). Mais recentemente, esta barra tem sido sujei

a obras de melhoramento, nomeadamente dragagens e fortalecimento dos diques .

A /lha de Cabanas constitui, na realidade, o prolong

mento para NE da Ilha de Tavira, da qual está separada pe

barra artificial de Tavira, a qual carece, periodicamente, d

dragagens. Destruída pelo cic lone de 1941 , e novamente pe

violento temporal de 1961, tinha -se já reconstituído, e

1962 , numa extensão de cerca de 10 0 m. Actualmente apr

senta co mprimento de quase 4 km , apresentando velocidad

média de crescimento para N E superior a 15 0 m /ano.

ilha é estreita (cerca de 30 0 m na parte mais larga) e

cordão dunar, de um modo geral, é incipiente .

A Barra de Cabanas corresponde, como atrás se referi

à barra natural da parte oriental da Ilha de Tavira. Situa··sentre a chamada Ilha de Cabanas e a Península de Cacei a,

deriva da antiga Barra do Cochicho-AI margem, aberta pe

ciclone de 1941 e, novamente, pela tempestade de 1961

Actualmente , migra para oriente à taxa de cerca de 10 0 m

f ano, encontrando-se muito assoreada.

A Peninsula de Cacela constitui o extremo oriental d

sistema . Tem cerca de 5 km de comprimento e largura d

cerca de 250 m (BETTENcouRT. 1985) . Apresenta certas seme

lhanças com a Península do Anção, pois é constituída por u

único cordão dunar, o qual é frequentemente sujeito a galga

mentos oceânicos. Como atrás se referiu, esta Península est

sujeita a erosão acelerada devido à migração da Barra d

Cabanas. Tal como junto ao Anção, a parte co ntinental face

esta Península exibe arribas, em estado de inactividade o

fossilização, as quais atingem altura máxima (25m) junto

Cace a .

2.2 .1.3 . Processos de Construção/ Destruição das ilhas

Como se depreende dos valores referidos no ponto ante

rior, o sistema de ilhas barreira da Ria Formosa é altament

dinâmico . As taxas de crescimento de algumas ilhas são ve

dadeiramente notáveis a nível mund ial. Por outro lado, e em

consequência desta dinâmica, o sistema é muito vulneráve

respondendo de forma rápida e intensa à construção de obra

de engenharia litoral. O caso mais espectacular é, provave

mente, o da construção da Barra artificial de Faro-O lhão

as respostas que induziu no sistema .

A evolução das barras, a qual determina, como acima s

referiu, a migração lateral das ilhas, foi descrita no excelent

t rabalho de W EINHOLTZ (197 8a) . De modo geral, as barra

uma vez constituídas, migram para nascente até atingirem um

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posição limite, na qual se começam a assorear, abrindo-se

nova barra aproximada mente na posição inicial. A ba rraGrande ou da Armona (ent re esta ilha e a da Culatra ) constitui excepção visto que se vem mantendo, mais larga oumais estreita, mas sempre dentro da mesma zona. É provável

qu e tal seja co nsequ ênc ia da re fra cção da ondulação no

delta de maré de juzante que , neste caso, se encontra bem

desenvolvido (M ONTEIRO et aI. , 1985).

As ilhas migram simultâneamente de duas formas di fe

rent es : longitudinalmente e transversalmente. A migração

longitudinal ocorre, em gera l, po r destruição (e rosão) da parte

ociden t al das ilh as e construção (acumulação) na parte

oriental. Estes processos construtivos/destru t ivos são ge ral mente muito ac ti vos nas partes lat erais do sistema. A migra ção transversal é resu ltante de mecanismos vários. Citam -se,por exemplo, os leques de galgament o oceânico (ove rwash

fansL os processos eó licos, a incorporação de de ltas deenc hente, a dinâmica dos canais de maré e a incorporação

de deltas de maré . A análise das ilhas permite concluir qu ena parte ce ntral do siste ma (parte or iental da Ilha da Barretae ilhas da Culatra, da Armona, e de Tavira ) estes processos

de progradação das ilhas sobre a laguna são predominantes.Nos ext remos do sistema (como nas penínsulas) predominam

processos de destruição, havendo ind ícios de "e magreci mento". Os perfis apresentados por W EINHOLTZ (1978a) para apraia de Faro ilustram , de certo modo, esta situação. Embora ,neste caso, a erosão da parte interna da Ilh a de Faro (Penín sula do A'nção) se possa relacionar com fe nómenos de canalização no este iro do Anção, devido à construção da ponte

de acesso, é provável que esteja também relacionada (talcom o a erosão da parte externa) com o incremento recente

da taxa de sub ida do nível do mar.

A análise do sistema perm it e conc luir que as partes laterais do sistema , principalmente a Península do An ção, têm

ca racterísticas de dominância dos processos relacionados com

as ondas (wave-domi nated). As ilhas são comp ridas e es trei

tas, constituídas por um co rdã o du nar ún ico, e os .galgamen' tos oceânicos são frequentes. As ilhas da parte cen tral do

sis t ema (parte E da Ilha da Barreta e ilhas da Culatra,Armona e Tavira) são mais largas, const ituídas por várioscordões dunares, os galga mentos oceânicos são menos frequentes e a morfologia está profundamente influ enciada por

rede complexa de canais de maré. Têm características dedominância dos processos relacionados com as marés (tide

dominated) . Por outro lado, a parte cent ral do sistema apre

senta características regressivas enqu anto as lat era is sãotransgressivas .

Nalgumas ilhas é ev idente a sobreposição de duas redesde ca nais de maré . Uns " funcionam " diariamente com ocic lo normal de maré . Outros só " fun cio nam " em período demarés-vivas. A localização dos canais de maré é co ntrolada

pelos aspectos morfológicos das ilhas, tais como os camposdunares, as cristas de praia (beachridges) e os leques dega lgamento oceânico . O grau de inc isamento dos canais(supe rior a 2 m ) varia com a idade da superficie erodida .Assim, os deltas de maré incorporados mais rece nt emen te

exibem canais menos incisados que os deltas de maré inco

porados há mais tempo (PILKEY et aI. , 1986 ).

2.2 .1.4. Fornecimento é!ctual de areias para o sistema

O estudo das areias e dos perfis das praias do sistema revevaria ções imputáveis ao mecanismo de deriva litoral, operan

de W pa ra E, e responsável por aca rreio de tr íti co nessentido (ANDRADE & ROMARIZ. 1986) . Estudos efectuados co

base em comparações car tográf icas, v isando a qu ant ificaç

dos vo lumes erod idos e acumulados (GRANJA, 1984 ; BETIE

COURT. 1985L revelam que a deslocação de sedimentos te

s ido muito grande e rápida . No enta nto, verif ica-se certo equ

Ilbrio quand o o sis tema é enca rado de uma forma globisto é, a acu mulação (e cresciment o) de umas ilhas efectu

-se, fundamentalmente , à custa da erosão de outras. Existodavia, um saldo excedentário no s istema . No período

1951 a 19 76, a acumulação excede ntária co rrespondeu

72400 m2 , ou seja, aproximadamente 3000 m2 / ano (BETIE

COURT. 1985 ).

As origens mais pro váve is das areias que abastece

actualmente o sistema de ilhas barreira são : 1) As arriblocal izadas a oriente do sistema, principalmen te as que

s ituam entre o Anção e os Olhos de Ág ua; 2) Os sedimento

de cobertura da p lataform a co nt inental adjacen te; 3) As areitransport adas de orient e, por deriva litoral, nomeadament eque têm origem .no rio Guadiana ; 4 ) Os sedimentos transpo

tados directamente da pa rt e continental situada a norte d

sistema, principalmente nos períodos mais pluviosos . A anál ido sistema e dos processos nele ac tu antes conduzem

co nc lusão qu e as duas últimas origens consideradas cont

buem apenas com pequena quantidade de materiais, sendo

sist ema dominado por abastecimentos pro ve n ientes das arbas e/o u da plataforma cont inental.

As arribas têm sido cons ideradas como o principa l elmento abastecedor de are ias para o sistema, o que é d

algum modo consubst anciado pelos resultados da aná lise catográ fi ca e da esti mativa dos volumes deslocados (GRANJ

19 84 ; BETIENCOURT. 1985 ). Em termos volumétricos, os cácu los efec tu ados indi ca m que a erosão da cost a situada ocidente do sistema pode con tribu ir, para este, co m ce rca d19 6000 m3 / ano de sedimentos. Os sed im entos que sdepositam actua lmente na praia submar ina do sistema corre

pondem, em média , a 180000 m3 /a no, e os que se depos

tam no interior da la guna por acção das cor rent es de mar

correspondem a 200000 m3/ano (GR ANJA, 1984 ; GRANJA

aI. , 1984). No entanto, a aná lise das curvas granu lométrica

das areias do sistema, das arribas e da cobertura sed im ent

da plataforma co ntinent al, permite colocar a hipótese dest

última ser também um con t ribuinte em areias bastan

im portante (DIAS . 1985 , 19 86 ; DIAS & M OITA. 1986).

2 .2 .2 . l i toral entre Caceia e a foz do Guadiana

Para oriente do enraizamento E do sistema de ilhabarreira (junto a Cacela L existe extenso area l que se prolong

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até ao mol he ocidental da ba rra do Guad iana . Da Manta Rota

até próximo de M onte Gordo a costa desenvo lve-se segundoa d irecção W SW - E E. Jun to a Monte Gordo, a costa toma a

direcção W - E, inf lecti ndo depois para WNW -ESE até ao

mo lhe da fo z do Guadiana .

Na ante -praia deste area l, com quase 10 km de compri

ment o, existe cordão dunar em fase de enrobus tec imento, o

qual reve la importânc ia crescente à medida qu e se aproximada foz do Guad iana . Todo este sector está em fase de acu

m ulação act iva, em parte indu zida pelas obras da barra do

rio Guad iana . A compar ação cartográf ica revela que entre

19 5 1 e 19 76 a pra ia cr esceu para o mar . Ess e avan ço fo i

m áximo junto a M anta Rota (15 0 m ). Na zona de . Monte

Gordo o crescim ento fo i bastante menor, ainda que muito

im portante : 25 m (BETI ENCOU RT , 1985) .

Na fo z do Guadiana merece destaque especial o banco

de O'br il. Segundo WEINHOLTZ (1978b), " o caminhamento

marít imo das are ias, que se faz de poente para nascente, ao

longo da co sta , encontra o obstáculo natural que é a corrente

de vazante do rio que faz que essas areias se vão depositando

a oeste da embocadura, contribuindo para a formação dos

bancos de poente. A acç ão conjugada do vento e da ondula ção de SW , dominan tes, fez que esses bancos se uniss em a

terra fo rmando o ban co de O'bril e engrossando cad a vez

mais a pra ia, desde a Ponta 'da Areia até para além de Monte

Gordo "

Desde a sua reconstituição , por volta de 1900 , o ban co

de O'bril tem-se robustecido e estendido para oriente , pro

vocando pro b le mas de assoreamento na barra do Guadiana .

As sucessiv as dragagens efectuadas tiveram sucesso reduzido.

Os diqu es de canalização da corrente, no troço terminal do

estuár io, con cluídos em 1976 , parece terem sido melhor

suced idos. Contra o dique de poente (com cerca de 2 km )

depositou-se extenso areal. Entre os diques, o canal de saída

mantem-se com problemas de assoreamento minorados . Para

leste do d ique oriental (submerso e com mais de 1300 m )

situa-se actualmente a parte externa do banco de O'bril , o

qual parece continuar a crescer .

A construção destas obras de engenharia provocou ,

como se referiu , intensa acumulação de areias junto ao

dique ocidental. No sentido de diminuir essas taxas de acu

mulação construiu-se, a cerca de 1,2 km para W , um esporão

com ce rca de 300 m. No entanto, as taxas de acumulação

continuam a ser grandes junto ao dique , estando o esporão

quase completamente colmatado, verificando-se mesmo ten

dên ci a nítida para este ser coberto pelas areias.

12

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Do que se expôs pode concluir-se que o litoral do Algarv

é, além de extraordinariamente belo, local privilegiado par

estudos de geologia litoral. As obras artificiais costeira

ainda que em número limitado e com sucessos variávei

permitem chamar a atenção para o perigo eventual da futur

" artificialização" da costa. O litoral é um sistema que s

mantem em equillbrio dinâmico , o qual é resultante de numerosos factores, alguns dos quais bastante complexos. A inte

venção humana pode perturbar esse equillbrio, provocand

danos irreparáveis, por vezes até catastróficos, mais a juzant

por vezes a dezenas de quilómetros de distância . Nas Fig

9 e 10 exemplificam-se alguns aspectos de intervençã

humana destinada a "proteger " e " salvar" o litoral, que pode

induzir impactos fortemente negativos. A compreensão d

litoral como um todo e o conhecimento dos factores do qu

ele depende é, por conseguinte , imprescindível para uma bo

gestão desse litoral. O investimento prioritário deve inc id

fundamentalmente , na aquisição desses conhecimentos , re

tringindo -se, entretanto , as obras de " protecção" ao mínim

A este propósito parece -nos relevante reproduzir as pr

meiras linhas de um livro escrito por PI LKE

Yet ai

(1980" Há cerca de 2500 anos, os cidadãos de Cartago constru

ram um porto no litoral do Golfo de Túnis, na Africa do Nort

Est e porto, de onde Hanibal largou para atacar Roma , aind

hoje é utilizado por pequenos barcos de pesca árabes, Algun

anos mais tarde e a cerca de 20 milhas de distância, o

romanos, um povo mais poderoso, construiram o porto d

Utica . O Norte de África era então o celeiro do Impér

Romano e, nas docas de Utica , foram embarcadas enorme

quantidades de alimentos e riquezas com destino à Terra

- Mãe. Hoje, um turista que se coloque na mais alta das colu

nas das ruínas de Utica não consegue vêr o mar. A linha d

costa deslocou -se 17 km para o largo, para longe do qu

foi o .porto. Os cartagineses eram cuidadosos nas suas rela

çôes co m a Natureza. Os romanos , primeiros adeptos d

tecnologia da força bruta, optaram pelo confronto , alteraçã

e destruição da Natureza. O que os romanos não compreen

diam era que, a longo prazo, no litoral, a Natureza acaba sem

pre por vencer"

O estudo do Litoral Algarvio está ainda no início . S

identificando as tendências evolutivas do litoral se poderã

programar e projectar empreendimentos e obras costeira

que estejam em sintonia com essas tendênc ias naturais.

tentativa de oposição a essas tedências é, além de extrao

dinariamente dispendiosa , luta perdida à partida. Mais tard

ou mais cedo a Natureza acabará por ven cer.

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126

I . A [ " S ~ O LI TORAL AMEAÇA CON STRUÇO (S MAL LOC ALIZADAS

(a) As construções na praia

nao têm protecção contra a

• rosão l i toral . opção: C o n ~ trulr .sporões para tornar

• praia mais larga.

(b) As con struções nas

dunas não são ameaçadas

pela e ~ o s ã o l i tora l en

quanto a praia subsiste

II . A CONShRUçAO DOS PRIMEIROS ESPOROES INTERROMPE O

TRANSPORTE LITORAL DE AREIA

(a) Os .sporoes alteram o

.Istem. dinâmico da praia .

C de not.r que há emagreci

mento de partes da pral . ao

mesmo tempo Que e s t ~ se alar

ga junto aos esporoes.

(b) Como o abastecimen

to de areia foi Inter

rompido, verif ica-se a

aceleração da erosio da

p r a l ~ . As n s t r u ç ~ e s estão agora ameaça·das.

opção: construir espo

roes.

III. DEST INO OLTI MO DE UM L ITORAL DE ESPOROES

(a) Praia estrel ta ou Inexl stente

Recuo da linha de dunas devido àfalt'b de abastecimento em areia .

Construções destruldas devido

erosão. apesar dos esporões .

Esporõe s inicia i s da ni ficado s ou

destruidos .

(b) Construções ame!

çadas. O recuO da IInha de dunas gera si

tuações análogas às

de I Ia .

(c) Construções atrás das

dunas estã o protegidas .

(c) O abastecimento de areia

é deflcl tárlo a longo prazo

de modo que as c ~ n s t r u ç õ e s sofrerão eventualmente as

mesmas cond ições ae {aI e (b).

(c) LI torai cheio de obras

costeiras . A situação dapraia e da duna ass.melham-se

às de Ilb. Destino finai: o

mes mo Que 1110.

Fig. 9 - Evo lução de um litoral em que se co nstruiu um campo de esporões (adaptado de PIL KEY et ai . 1980 ). Note -se o pa ralelismo

entre esta evo lução geral e o caso específico da costa da Qu art elra (Fig. 7) .

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Existência de escarpa n. duna,

; ~ J l i ~ = ( : ) . [ AO CONST RUTDO

e sa-se qu e a zona está

prot e9 ' da pe lo paredão.

A QUATRO AN OS MA IS TARDE

. ) El A SESSENTA ANOS HA IS TA

A praia torna-se Imediatamente

A praia submersa torna-se mais

Inclinada.

Inexlstencla de pral • . No decurso das

tempestades as ondas passam sobre o

(" Ne", Jerseyzação")

t con struTdo novO paredão mais forte,

ma I o r e "me I ho r" .

~ j ~RESULTADO FINAL: Con s tr ço es atrás de paredões. Inexistência de

pr a i a . Fundo do mar adjacente pejado de rufnas

de pa r edõ es e qu ebra-mares.

Fig 10 - Saga de um paredão (adapt ado de P ,LK EY er ai . 19801 

127

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