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APROPRIAO DE SIGNIFICAES DO CONCEITO DE NMEROS RACIONAIS: UM ENFOQUE HISTRICO-CULTURAL

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APROPRIAO DE SIGNIFICAES DO CONCEITO DE NMEROS RACIONAIS: UM ENFOQUE HISTRICO-CULTURAL

Marlene Pires Amorim Universidade do Extremo Sul [email protected] Damazio Universidade do Extremo Sul Catarinense [email protected]

IntroduoA aprendizagem escolar sempre foi um tema gerador de discusses nos mais variados espaos acadmicos e escolares, organizados no Brasil e em todo o mundo, principalmente aqueles que se caracterizam como eventos cientficos.Focando o olhar para o ensino de matemtica, mais especificamente sobre a apropriao de significao de conceitos cientficos, percebemos que ainda comum os professores fazerem a abordagem dos conceitos, por vias metodolgicas totalmente desprovidas de uma reflexo terica. Ou, quando a estuda, o objetivo buscar uma forma dos alunos aprenderem com rapidez aquela extensa relao de contedos que as propostas curriculares oficiais e os livros didticos propem. Muitas vezes, dependendo da concepo, a corrida em busca de recursos didticos alternativos que prendam a ateno do aluno, entendida como condio primordial para a aprendizagem matemtica. Com isso, no queremos fazer julgamento de certo ou errado dos professores que galgam sua prtica pedaggica em concepes que priorizam um aspecto do processo educativo em detrimento de outros. Entendemos que a concepo de educao do professor se constitui ao longo de sua formao profissional ou mesmo antes de adentrar no curso de graduao. Ela surge por influncias oriundas da relao homem e sociedade, traduzidas implcita ou explicitamente nos contedos escolares e acadmicos. No entanto, vale dizer que no nos sentimos conformados com relao matemtica, o seu ensino e sua aprendizagem, que a literatura tem mostrado como situao pouco alentadora, principalmente, quando a referncia a escola bsica pblica. Tambm, no comungamos com o referencial terico de matriz idealista que fundamenta o processo educativo e produz esse estado incmodo do ensino-aprendizagem de matemtica. Por isso, no presente estudo, procuramos atender os pressupostos da abordagem Histrico-Cultural, teoria que fomos assumindo, por atender convices construdas num processo de reflexo sobre a concepo de mundo, homem, sociedade e matemtica.A referida teoria no cria pares dicotmicos entre: contedo e forma, conhecimento e conscincia, produo e apropriao do conhecimento, abstrato e concreto, conhecimento cientfico e conhecimento cotidiano, aprendizagem e desenvolvimento, professor e aluno, entre outros elementos conceituais do processo educativo. Em vez disso, trata-os de forma inter-relacionada, compondo um todo indissocivel, porm, cada um desses elementos tem sua especificidade e funo na formao humana. Diante desse contexto do ensino de matemtica, dvidas se apresentam sobre o ensino-aprendizagem e questionamos sobre a forma como os alunos se apropriam das significaes dos conceitos cientficos de matemtica. A nossa problemtica diz respeito ao estudo dos aspectos essenciais ao entendimento do campo numrico dos Nmeros Racionais que, atualmente, so negligenciados no processo educativo escolar, privando os alunos da plena compreenso conceitual. Para tanto, levantamos as seguintes questes: Quais os elementos fundamentais a serem considerados da categoria lgico-histrica para elaborao das atividades de ensino-aprendizagem e levar os alunos elaborao do conceito de nmeros racionais? Quais as manifestaes dos alunos que revelam a aprendizagem ao desenvolverem as atividades, considerando o processo sincrtico-analtico-sinttico?A razo da opo pelos nmeros racionais est na exigncia de um salto qualitativo de pensamento em relao aos nmeros naturais, normalmente privilegiado pelos currculos escolares.Nesse novo campo numrico, as operaes bsicas no mais atuam sobre o princpio do anterior, como por exemplo, a diviso entre dois nmeros inteiros que teria como resultado um nmero inteiro menor do que o dividendo; no novo campo, a diviso entre nmeros fracionrios, por exemplo, poder resultar num nmero maior que seus termos. Assim, tambm, na reta numrica entre um nmero racional e outro h infinitos pontos que so representados pelos nmeros fracionrios, enquanto entre dois inteiros, no existe outro. Na quinta srie do Ensino Fundamental, as atividades avanam para as operaes com nmeros fracionrios. Comumente, o professor ensina a adio e subtrao pela tcnica de mnimo mltiplo comum, em que o aluno memoriza o procedimento de dividir o m.m.c. (abreviao do mnimo mltiplo comum) pelo denominador e o quociente obtido, multiplica pelo numerador; em seguida, adiciona ou subtrai, conforme a operao indicada, os novos numeradores e conservando o denominador.A aprendizagem efetiva da matemtica no consiste apenas no desenvolvimento de habilidades (como do clculo ou da resoluo de problemas), ou na fixao de alguns conceitos atravs da memorizao ou da realizao de uma srie de exerccios. De acordo com Fiorentini (1995), numa perspectiva histrico-crtica, aluno apreende significativamente quando consegue atribuir sentido e significado s idias matemticas sobre elas, capaz de pensar, estabelecer relaes, justificar, analisar, discutir e criar.Nesse contexto terico que foi estabelecido o objetivo da pesquisa como uma nova leitura do ensino e aprendizagem dos nmeros racionais, analisando as mltiplas relaes do processo de formao do conceito, tendo como base a categoria lgico-histrica, o processo sincrtico-analtico-sinttico e a relao de ascenso do abstrato ao concreto. De forma mais especfica, propomo-nos: a) Estabelecer critrios concernentes Teoria Histrico-cultural para elaborao das atividades de ensino-aprendizagem que levem os alunos da 5 srie do Ensino Fundamental apropriao do conceito dos nmeros racionais; b) Analisar os procedimentos adotados e as caractersticas de pensamentos manifestados pelos alunos durante o desenvolvimento das atividades referentes ao conceito de nmeros racionais.

Apropriao de significaes de conceitosA abordagem psicolgica Histrico-Cultural e a tendncia pedaggica Histrico-Crtica enunciam que a apropriao do conhecimento cientfico reivindica um mtodo que permita ao aluno compreender-se como sujeito scio-cultural.Nesse aspecto, Vigotski (2001) define ensino-aprendizagem como processo que se desenvolve no linearmente e ocorre em estgios interligados do pensamento: sincrtico-analtico-sinttico.O estgio sincrtico estabelece entre o pensamento e o objeto uma relao de imagem confusa, de forma que, no se identifica claramente as relaes e as significaes do contedo do mesmo. O sujeito necessita do sensrio-perceptivo e estabelece relao com o contexto. No analtico, identifica caractersticas comuns dos objetos e estabelece vnculos com outros conceitos criando cadeias de elementos comuns. A caracterstica fundamental deste estgio a possibilidade de anlise das mltiplas relaes entre os conceitos. O estgio sinttico determinado pela generalizao, as significaes ou os vnculos relacionais que estabelecem com outros conceitos, fortemente marcados pela abstrao. A criana ou pr-adolescente apesar de pensar sinteticamente o conceito, ainda operam analiticamente estabelecendo vnculos com o concreto-material.Na fase inicial da elaborao do conceito, o adolescente busca alguma referncia em situao concreta e, aos poucos, vai dissociando e movimentando-se em um plano mais abstrato. Mesmo o adulto num momento de elaborao do conceito, tende o seu pensamento a transcorrer no nvel de pensamento por complexo, chegando s vezes, a descer a formas mais elementares e mais primitivas. Vigotski (2001).Vigotski (2001) alerta que o ensino direto dos conceitos se mostra impossvel e, pedagogicamente, estril. O professor que tende a abordar os conceitos de forma mecnica conseguir com os alunos uma assimilao vazia de palavras, um verbalismo puro, sem significao. O aluno no assimila o conceito, mas a palavra, ou seja, capta mais de memria que de pensamento configurando uma impotncia para a resoluo de problema que exige o emprego do conhecimento adquirido. Para Vigotski (2001, p. 247) a ao escolstica do professor acaba substituindo a apreenso do conhecimento vivo pela apreenso de esquemas mentais mortos e vazios.As vinculaes conceituais que dizem respeito especificidade da presente pesquisa foram buscadas no processo histrico de produo das significaes do conceito de nmeros racionais.Segundo Vigotski (2001), um conceito a palavra com seu significado, produzido historicamente pelo homem. Por isso, primeiro social e depois individual. O sujeito se apropria das significaes do conceito ao resolver um problema, de posse de outros conceitos j abstrados, que daro suporte para internalizar e introduzir mais um conceito em seu sistema de conhecimento. Mas, sozinho o sujeito no se apropria de forma integral do conceito. Afirma esse autor que necessrio a mediao de outro que possa propor no s a atividade que explicite a lgica do conceito, como tambm se disponha a auxili-lo nos momentos que ele necessita de ajuda.Anuncia Vigotski, que no processo de apropriao de significao de conceitos so percebidos dois tipos: os cotidianos e cientficos. Damazio (2000) diz que o conhecimento cotidiano assistemtico, involuntrio, dependente do contexto e so desenvolvidos sem a necessidade de escolarizao formal. Os conceitos cientficos so sistemas de relaes formulados historicamente pela cultura e no pelo indivduo em si, e constitui-se de leis, princpios e teorias. Os conceitos cientficos e cotidianos seguem caminhos opostos de desenvolvimento, mas de modo algum se separam, ao contrrio, tendem a se inter-relacionarem. Eles se encontram, porm, no se fundem; os conceitos cotidianos so ressignificados pelos conceitos cientficos que subsidiam as formas elementares, no porque tem um fim inferior, ao contrrio, a sua forma superior de estruturao permite que no seu processo de elaborao mostre toda a sua supremacia e dinmica na movimentao das funes psicolgicas superiores. Estes tendem a trazer para uma forma mais complexa de conhecimento, o que at ento, era conhecido de forma dependente do contexto, por no ter uma estrutura superior para representar a existncia e funo desse conceito. A criana ao aprender na escola o conceito cientfico, de acordo com Vigotski (2004, p. 527), atinge outro nvel de desenvolvimento e estabelece relaes lgicas entre esses conhecimentos, germinando para dentro, vinculando-se experincia cotidiana. Complementa o pesquisador que, do ponto de vista da dinmica, esses conceitos apresentam uma histria diferente. O ponto fraco dos conceitos cotidianos no chegar ao nvel abstrato; em contrapartida aos conceitos cientficos que so compreendidos pela forma puramente verbal. Esse verbalismo no ameaa os conceitos cotidianos, mas mostra a diferena entre eles. A inter-relao existente no processo de desenvolvimento desses dois conceitos consiste em que os conceitos cotidianos devem atingir certo nvel para poder assimilar de forma geral os conceitos cientficos. Esses, por sua vez, tornam possvel a assimilao quando atingiu um determinado nvel de desenvolvimento dos conceitos cotidianos. no vnculo de desenvolvimento dos dois conceitos que se revela a sua verdadeira natureza e se constitui a zona de desenvolvimento prximo e do nvel atual de desenvolvimento. O conceito cotidiano adquire novas relaes com outros conceitos e tambm com o objeto ao colocar-se entre o conceito cientfico e o seu objeto. O nvel de pensamento mais elaborado o algbrico. Para Vigotski (2001, p. 267): A lgebra liberta o pensamento da criana da priso das dependncias numricas concretas e o eleva a um nvel de pensamento mais generalizado. Essa citao conclama ao papel do professor e da escola para o desenvolvimento do pensamento algbrico, por permitir que o aluno elabore os conceitos em outra ordem e chegue ao nvel mais elevado do pensamento matemtico. O pensamento algbrico d liberdade de ao para inter-relacionar com diversos campos numricos e geomtricos da matemtica. Mas esse nvel de pensamento ocorre com apropriaes de significaes e da lgica conceituais produzidas historicamente. Isso significa dizer que o lgico e o histrico constituem uma categoria imprescindvel do processo de apropriao de conceitos.Duarte (1987, p. 29) define: O lgico o ponto de partida e de referncia para a seleo dos traos essenciais do desenvolvimento histrico, mas essas etapas no se encontram direta e imediatamente expressas no lgico.O lgico entendido como a abstrao da realidade objetiva. Mas, para tal, necessria uma busca histrica da significao conceitual, ou seja, a anlise da multiplicidade de determinaes. Como ponto de chegada, o lgico o concreto pensado.A respeito do estudo histrico do conceito, diz Vigotski (2003, p. 85-86): Estudar alguma coisa historicamente significa estud-la no processo de mudana: esse o requisito bsico do mtodo dialtico. Assim sendo, o estudo histrico no apenas um aspecto auxiliar, mas sua verdadeira base. Por sua vez, Giardinetto (1991) afirma que a relao lgico-histrica um mtodo de investigao indispensvel para a pesquisa em Matemtica. O estudo do processo de desenvolvimento histrico que vai fornecer elementos para elaborao de uma seqncia lgica de ensino, de forma tal que reflita a histria.No ensino-aprendizagem de matemtica, o lgico como ponto de partida se justifica porque a referncia o conceito cientfico que vai ressignificar o conceito cotidiano. Dessa forma, as abstraes - prprias do conceito cientfico - passam a ser indispensveis no movimento de ascenso e descenso, respectivamente dos conceitos cotidianos e cientficos. Como afirma Giardinetto (1991, p. 27): As abstraes so, portanto, mediaes de um concreto catico, obscuro, para um concreto na compreenso da multiplicidade de suas partes. O concreto, portanto, revela-se como ponto de partida e de chegada do processo de elaborao do conhecimento.

Portanto, partir do concreto e chegar ao concreto, significa estar diante de uma realidade que foi construda historicamente pela humanidade, organizada e fundamentada em conceitos cientficos. Se a apropriao de um conceito matemtico requer a compreenso dos seus traos essenciais elaborados historicamente, ento deve existir um espao social para que isso ocorra: a escola. Nesse espao, o professor o sujeito humano com a incumbncia social de elaborar a seqncia de ensino-aprendizagem em que entra em cena: o concreto sincrtico do pensamento do aluno, ponto de partida, por representarem uma imagem confusa e no terem vnculos com outros conceitos; o concreto sntese, atingido com a apropriao das significaes histricas. Segundo Giardinetto (1991) nos meios escolares, o abstrato traz o estigma de algo difcil de ser compreendido por no ter vnculo com a realidade do aluno. Da mesma forma, o concreto entendido como o imediato, apreenso do real, decorrendo duas interpretaes: o concreto traduzido na forma de materiais concretos, com o objetivo de organizar atividades de forma que o concreto seja manipulado, observado ou desenhado; a segunda interpretao associa o concreto com o cotidiano, ao no escolar. Afirma o autor que nessa perspectiva espera-se, com o ato de manipular o concreto, o aluno supere suas dificuldades de aprendizagem. O par categorial abstrato-concreto no processo lgico-histrico no concebido como mera classificao de apreenso da realidade, como mencionado no pargrafo anterior. O concreto mediatizado por abstraes, ou seja, do concreto sincrtico ao concreto sntese, o pensamento opera analiticamente. (GIARDINETTO, 1991, p. 12). Vale lembrar que os estgios de evoluo dos conceitos, abordados por Vigotski (2001), refletem esse processo lgico-histrico. No estgio sincrtico, o sujeito diante da realidade compreende o concreto de forma catica, obscura, pois no percebe as caractersticas, os vnculos do conceito; no estgio analtico, desenvolve vnculos e forma cadeias com outros conceitos na multiplicidade das relaes; e no estgio sinttico, chega-se ao concreto pensado, s significaes lgico-histricas do conceito. Giardinetto (1991) faz uma anlise da operao realizada durante o processo de elaborao do conceito, dizendo que o pensamento no se encerra em abstraes. Segundo ele, das determinaes abstratas que o pensamento promove, num movimento de sntese, uma articulao de suas partes, fazendo com que a imagem do objeto deixe de ser um todo catico, transformando-se em todo coeso, compreendido em sua essncia, na unidade de suas relaes. Diante dos pressupostos tericos, elaboramos uma seqncia de atividades que contemplasse o surgimento, as propriedades de equivalncia e denominadores comuns e as operaes de adio, subtrao, multiplicao e diviso de Nmeros Racionais. O estudo foi desenvolvido com alunos de quinta srie do Ensino Fundamental de uma escola pblica.

As significaes lgico-histricas dos Nmeros RacionaisDurante o desenvolvimento das atividades propostas, vrias idias e relaes conceituais foram se estabelecendo, das quais destacaremos algumas delas relacionadas ao conceito de frao, noo de equivalncia e das operaes de adio, subtrao e multiplicao. Vale dizer que, por questes de limitaes do espao para este artigo, a operao de diviso no foi possvel tratar aqui. Primeiramente, enunciaremos os princpios adotados para elaborao das atividades: a) O ponto de partida e de chegada foi a generalizao do conceito; b) a medio de segmentos de reta como o elemento geomtrico principal das operaes de medidas; c) manuteno das propriedades do campo dos nmeros inteiros; d) pensamento algbrico das relaes de medidas apropriadas como ponto de chegada.Caraa (2003), a partir da idia de medio, diz que a humanidade se viu diante da situao de resolver uma relao aritmtica que culminou num salto de pensamento matemtico. Isso ocorreu quando o problema que se apresentava era medir, por exemplo, dois segmentos, AB

de 11 unidades e CD

medindo 3 (figura 1): Quantas vezes o segmento de reta CD

cabe em AB

? A _._._._._._._._._._._ B C _._._ D Figura 1

No campo dos nmeros naturais ou inteiros no h uma resposta. A dificuldade surgida tornou-se impulso para um salto de qualidade em relao ao conhecimento matemtico, pois, at ento, o nico sistema numrico conhecido era os nmeros naturais. A comunidade cientfica buscou uma soluo: a criao do novo campo numrico os nmeros racionais. O desenvolvimento dessa atividade com os alunos, suscitou muitas dvidas e, conseqentemente, muitas descobertas, pois se apresentam primeiramente, as novas terminologias, representao de um segmento por AB

e o uso da rgua para traar os segmentos. Os procedimentos eram para verificar quantas vezes os segmentos CD

caberiam nos segmentos AB

. A dificuldade inicial para alguns alunos, residia em traar os segmentos e, para outros, como identificar o dividendo e determinar o divisor e o quociente. Insistimos com a pergunta-guia de verificarem quantas vezes o segmento CD

que a medida menor representam o divisor - caberiam no segmento AB

, conforme figura 2.

Figura 2

A finalidade era que os alunos no s representassem, mas atribussem significado e sentido ao nmero racional e sua forma b

a

de registro. Como diz Caraa (2003), operar com a idia inicial desse campo, equivale a partir da diviso de medidas. Quando a diviso exata se obtm um nmero inteiro; caso no seja exata, h uma parte inteira colocada antes da frao b

a

. Outra relao essencial que a (o numerador) conseqentemente o resto da operao de diviso, e b (o denominador), o divisor da operao.Prosseguimos as atividades com a propriedade de equivalncia e propomos para os alunos determinar uma frao equivalente a 3

2

. O simples procedimento de multiplicar ou dividir os dois termos pelo mesmo nmero, por si, no justifica o que ocorre com a frao em termos de relaes conceituais, pois no basta dizer que a frao primitiva se altera e passa ser outra, que se diz equivalente a anterior. Buscvamos que os alunos entendessem a relao implcita nesse momento operacional, ou seja, a lgica que a sustenta. Solicitamos, ento, traarem um segmento de 12 cm e representarem 3

2

dessa medida. Entretanto, ainda ocorreu de os alunos apresentarem dificuldades em dividir 12 por 3. Transportar esse pensamento para a diviso na rgua em trs partes, foi um tanto desafiador. Aos poucos, com nossa ajuda e de colegas foram compreendendo a relao.O outro passo a funo do dois no numerador da frao 3

2

. Perguntamos a eles: Que relao tinha esse nmero na representao do segmento? Uma aluna, prontamente, respondeu: - Pegar dois dos trs segmentos divididos.Solicitamos novamente, que traassem outro segmento de 12 cm para representar a frao 6

4

(equivalncia de 3

2

), como mostra a atividade desenvolvida por um aluno na figura 3.

Figura 3

Perguntamos: - Como procederamos? A sugesto de uma aluna foi para dividirmos em 6 partes e tomar 4. Porm, os procedimentos aritmticos s teriam significado se os alunos percebessem a relao existente na multiplicao de 3

2

x 2

2

. Aps vrias discusses, um aluno, disse: Divide em duas partes cada parte dos trs. A expresso dos alunos enunciada por Bzout, como: Tomar a metade de teros. Nas atividades com operaes de fraes, inicialmente a adio, o ponto de partida foi a representao geomtrica. O dilogo continuou sobre o significado de cada valor numrico da escrita aritmtica do resultado 3

3

, obtido pela juno dos dois segmentos.Nesse contexto, apresentamos uma adio cujas parcelas fracionrias tinham os denominadores diferentes (3

1

2

1

+

). A pergunta-guia foi: De que forma a operao ser realizada, uma vez que no se pode somar os denominadores e eles agora no tm o mesmo valor? Foram apresentadas vrias idias produzidas pelos alunos. Uma delas: representar os dois segmentos e unir um ao outro, como o exemplo em que os denominadores so iguais. Fizemos a representao no quadro de giz, com as fraes 3

1

2

1

+

. Ao unirmos a extremidade final do segmento um meio com a origem segmento um tero, alguns alunos perceberam algo diferente - em relao ao ocorrido quando a operao apresentava denominadores iguais - pois as medidas das partes eram diferentes. Outro questionamento foi lanado: Podemos juntar partes de uma frao que est dividida em meios com outra que est dividida em teros? Houve resposta indicando a impossibilidade. Entretanto, fizemos perceber que a juno geomtrica das duas fraes se concretiza, porm o problema que se apresenta est na leitura geomtrica e escrita aritmeticamente, ou seja, qual a frao soma.Valendo do nosso papel de mediador na relao professor/aluno/ conhecimento matemtico, fizemos lembrar da possibilidade e necessidade de transformao em fraes de denominadores iguais. Uma aluna diz: temos que achar a frao equivalente.Acatamos a sugesto da aluna e chegamos aos denominadores comuns, 2

1

6

3

, e para a frao 3

1

6

2

. A soma apresentada foi 6

5

. A figura 4 uma amostra da atividade desenvolvida pelos alunos. Naquele caso especfico, a aluna resolve no s 3

1

2

1

+

, como tambm 5

1

3

1

+

. possvel observar os procedimentos de clculos que levam a transformao para 15

3

15

5

+

, cuja a soma fracionria 15

8

. Figura 4Para a operao de subtrao com denominadores diferentes, a proposio inicial foi que eles representassem geometricamente 4

1

2

1

-

. Perguntamos aos alunos: possvel seguir o procedimento adotado com as fraes de denominadores iguais? Um nmero bem representativo de alunos indica a propriedade de equivalncia, adotada na adio, como uma ao necessria para transformar as referidas fraes de mesmo denominador. Fizeram a representao geomtrica e a escrita aritmtica, 8

2

8

2

8

4

=

-

, precedidas do clculo aritmtico no momento de transformar as duas fraes em equivalentes com denominadores iguais. A anlise em relao a essas atividades indica que a relao geomtrica com a aritmtica traduz ao aluno a idia de que, a adio e a subtrao de fraes tm princpios fundamentados na idia de medida, e no somente operaes aritmticas em si. A representao geomtrica traz a medida percebida, isto , no campo visual, concomitantemente, no desenho esto implcitas as relaes e idias matemticas que permitem ao aluno compreender a lgica dos procedimentos aritmticos.A partir das discusses, foram sistematizadas as idias essenciais que fundamentam os conceitos das operaes de adio e subtrao de nmeros fracionrios: a) Os termos fracionrios a serem adicionados ou subtrados devem ter como referncia a mesma unidade-todo, tanto em sua representao aritmtica quanto geomtrica. Assim, quando as fraes tiverem denominadores diferentes, a unidade-todo ser dividida em partes iguais ao nmero de um dos denominadores; tambm subdividida em quantidades de partes iguais ao nmero do segundo denominador; finalmente a diviso exigir tantas partes quanto for o produto dos denominadores. b) Quando os denominadores forem diferentes, as operaes de adio e subtrao requerem a transformao em fraes equivalentes. c) As fraes equivalentes, na adio e subtrao, necessariamente apresentam os mesmos denominadores.d) Geometricamente, a adio ocorre quando se faz coincidir a extremidade da primeira frao com a origem da segunda; e, para a subtrao, compara-se a segunda frao com a primeira para determinar a diferena. Vale salientar, por ser 5 srie e os alunos ainda no dominam o campo dos nmeros inteiros relativos, a frao minuendo deve ser maior que a frao subtraendo.Com a relao multiplicao de fraes, numa abordagem Histrico-Cultural, no faz sentido o procedimento usual de apresentar aos alunos que o produto de duas fraes obtido ao multiplicar numeradores e denominadores entre si.Um enfoque estritamente aritmtico, com base na definio, faz com que a multiplicao de nmeros fracionrios fique restrita a ela mesma, no havendo necessidade de recorrer a outras operaes. Portanto, toma uma caracterstica bem distinta da adio e subtrao que, antes da operao em si, faz necessrio valer-se da multiplicao para a transformao em fraes de mesmo denominador. Colocamos no quadro de giz a multiplicao 4

1

.

2

1

. A alerta de Bzout (1849) que as relaes contidas nessa operao so complexas incumbiu-nos de muita ateno no dilogo mediador com os alunos. Primeiramente, solicitamos aos alunos que traassem um segmento de reta de medida 8 cm e representassem ou tomassem a frao 2

1

. A mediao exigiu dos alunos alm de operarem os clculos aritmticos - de 8 cm dividir em 2 partes iguais - teriam que representar o quociente de medida 4 no segmento. A dificuldade no residia em operar a diviso de 8 cm por 2, mas em compreender toda a funo relacional entre os nmeros representativos de cada elemento dessa operao. Dito de outra forma, a dificuldade de alguns alunos estava na ao que envolvia o manuseio e a interpretao dos aspectos conceituais que se apresentavam implicitamente. Isso porque exigia a diviso do segmento-unidade (8 cm) em meios; cada uma dessas partes (4 cm) representava a frao 2

1

(multiplicando).Quando todos, aparentemente, j haviam compreendido o processo at aqui desenvolvido, propomos que tomassem 4

1

da medida 2

1

. Recorremos naquele momento, sugesto de Bzout (1849) ao exprimir a relao existente entre as duas fraes: Tomaremos a quarta parte de uma vez 2

1

.Passamos a orientar os alunos para que tomassem como referncia uma das medidas 2

1

(4 cm) e tomassem a quarta parte desse segmento. Fizemos observar tambm que cada uma dessa quarta parte corresponde a um oitavo do segmento-unidade. Isso significa que 4

1

.

2

1

= 8

1

.Outra multiplicao foi 3

2

.

5

4

. Sugerimos aos alunos para proceder de maneira anloga ao que fizeram na atividade anterior. A questo que se apresentou foi qual o comprimento segmento-unidade que possibilitasse uma diviso com quociente inteiro para representar o segmento 5

4

. Depois de algumas discusses se estabeleceu 15 cm.Vale salientar que nessa atividade o aluno precisa realizar vrias operaes e estabelecer relaes entre elas. Vejamos: os 15 cm se referem a medida do segmento unidade-todo. Como a frao que ser representada nesse segmento 5

4

, tero que dividir a unidade-todo em 5 partes iguais de 3 cm.Em seguida, se fez necessrio marcar a frao 5

4

. De cada quinta parte da unidade-todo tomada a tera parte, ou seja, os quintos so transformados em quinze avos em relao ao inteiro. Agora, 3

1

de 5

4

se transformou em 15

4

. Como temos que tomar 3

2

de 5

4

, se faz necessrio tomar 2 vezes a nova medida que significa 2. 15

4

, que igual a 15

4

+15

4

= 15

8

. Portanto, 5

4

.3

2

= 15

8

.

O processo de ensino e de desenvolvimento do conceito de multiplicao de frao, de um modo geral, em que uma das noes essenciais a idia geomtrica, demanda em srie de operaes mentais complexas. O pensamento sinttico da multiplicao com nmeros naturais passa a ser sincrtico, porm base, para atingir o nvel sinttico da referida operao no campo dos nmeros racionais.A abordagem adotada criou condies para os alunos conviverem com interpretaes da dinamicidade conceitual de multiplicar fraes. Tal operao, nesse campo numrico, no se sustenta por si s, pois articula uma srie de relaes com outros conceitos, como:a) medida de segmento de reta; diviso aritmtica e geomtrica (segmento); b) diviso da diviso (por exemplo, tomar dois teros de quatro quintos);c) identificao de uma nova frao (tomar teros de quintos que se transforma em quinze avos);d) adio de frao (por exemplo, 15

4

+15

4

, cuja soma, 15

8

, o produto esperado da operao da multiplicao 5

4

. 3

2

).Essas relaes subsidiaram cientificamente a elaborao da sntese que explicita a multiplicao propriamente dita, uma vez que nas articulaes conceituais ela no aparece.

Consideraes FinaisO trabalho com os alunos exigiu muito esforo, no sentido de dar nfase s relaes conceituais em cada proposio a ser resolvida, de forma que eles desenvolvessem uma lgica de pensamento de cada especificidade ou significaes concernentes ao conceito. Isso reivindica que, ao propor uma nova atividade, a ateno se redobre para manter a consistncia pr-estabelecida com base na categoria lgico-histrica. No caso especfico do conceito de nmero racional, o lgico-histrico tem como referncia a idia de medida, se estende para a propriedade de equivalncia e atinge um nvel de complexidade cada vez maior em cada operao adio, subtrao, multiplicao e diviso fazendo com que a literatura (Caraa) abandone a representao geomtrica na multiplicao e diviso, recorrendo exclusivamente sntese algbrica e aritmtica. A ateno tambm se volta para dois focos de manifestaes: de cada aluno e do grupo como todo. O acompanhamento individual uma necessidade para aqueles alunos que, desde a primeira atividade, apresentam dificuldades. Muitas delas vo sendo superadas com o desenvolvimento de novas situaes de aprendizagem no decorrer da pesquisa. Para um aluno, elas se alastraram at o final e permaneceram merc de um trabalho de continuidade e ateno exclusiva do professor ou dos colegas com nvel de compreenso conceitual. Seu pensamento sincrtico tem um predomnio em relao ao pensamento analtico e sinttico, apontando para as suas possibilidades de elaborao conceitual zona de desenvolvimento prximo por isso, ainda de forma dependente de mediaes sociais. A ajuda se deu desde o manuseio da rgua para traar os segmentos de reta, resoluo de operaes simples de multiplicao e diviso e transposio dos resultados para a representao geomtrica, at as relaes interpretativas que levariam sntese aritmtica e algbrica.Por sua vez, a ateno para o grupo todo visava trazer evidncias das regularidades de procedimentos e pensamentos no momento de apresentao e discusses de cada atividade. Foram dessas observaes que percebemos um movimento entre o sincrtico ponto de partida da representao geomtrica ao sinttico ponto de chegada. Isso necessitou de ajuda para a prpria construo do segmento, passando pelo processo analtico - estabelecer relaes num nico segmento e entre dois deles, fazer identificaes, traduzir para a representao escrita, resgatar propriedades e conceitos anteriormente aprendidos, atribuir significado e funo aos termos atingindo a sntese algbrica.O olhar atento, no momento em que o grupo desenvolvia as atividades, indica que o processo de elaborao do conceito de nmeros racionais pelos alunos da quinta srie, na perspectiva terica aqui adotada, marcado por um movimento de continuidades e rupturas na forma que eles desenvolvem o pensamento. No h unicidade tanto no plano individual quanto do coletivo. Em determinadas etapas, enquanto alguns alunos operavam sinteticamente, outros se encontravam no estgio sincrtico ou analtico. Ou, como dito anteriormente, um aluno numa atividade revelava desenvoltura de domnio de pensamento analtico ou sinttico e, na seguinte, sincrtico. O pensamento sinttico se revelava quando, ao propormos uma operao adio, subtrao, multiplicao e diviso - os alunos buscavam seu resultado quer por vias da definio como tambm por representao geomtrica com as devidas interpretaes.Apresentar uma seqncia de ensino em que se confluem as categorias e conceitos da abordagem Histrico-Cultural (lgico-histrica, concreto-abstrato, sincrtico-analtico-sinttico) para o processo de desenvolvimento do conceito de nmeros racionais no significa que torne mais fcil a aprendizagem. Pelo contrrio, exige do aluno operaes mentais complexas, distintas daquelas realizadas diariamente e no ensino convencional.Diante do exposto, nessas consideraes finais, pensamos que a seqncia de ensino defendida no presente estudo oportunizou o desenvolvimento do pensamento conceitual de Nmeros Racionais pelos alunos, dentro dos limites a que se props. RefernciasBZOUT, Etienne M. Elementos de arithmetica. Coimbra: Livraria Portuguesa, 1849.CARAA, Bento de Jesus. 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